Xeno Fobia

May 5, 2018 | Author: Fernanda Morais | Category: Xenophobia, State (Polity), Racism, Ethnicity, Race & Gender, Human Nature


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XENOFOBIA Medo e rejeição ao estrangeiro Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro. Brasil) Índices para catálogo sistemático: . SP. Durval Muniz de Albuquerque Júnior XENOFOBIA Medo e rejeição ao estrangeiro . br www.com.cortezeditora.com. Morales Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou duplicada sem autorização expressa da autora e do editor.br Impresso no Brasil — junho de 2016 . 1074 – Perdizes 05014-001 – São Paulo – SP Tel. Coordenação editorial: Danilo A.PROTEÇÃO SOCIAL NO CAPITALISMO: crítica a teorias e ideologias conflitantes Camila Potyara Pereira Capa: de Sign Arte Visual Preparação de originais: Carmen Tereza da Costa Revisão: Maria de Lourdes de Almeida Assessoria editorial: Maria Liduina de Oliveira e Silva Editora-assistente: Priscila F. © 2016 by Camila Potyara Pereira CORTEZ EDITORA Rua Monte Alegre. Augusto Composição: Linea Editora Ltda. (11) 3864 0111 Fax: (11) 3864 4290 e-mail: cortez@cortezeditora. Q. em sala de aula. Aos professores que exercem. a digna e indispensável tarefa de combater todas as formas de preconceito. discriminação e intolerância. cotidianamente. . . .............................................................................................. FONTES........................................... CAPÍTULO 8 Desclassificados................................ CAPÍTULO 7 Ameaças do outro............... CONSIDERAÇÕES FINAIS... CAPÍTULO 6 Predadores................................................................................. CAPÍTULO 2 Diferentes modos................................ CAPÍTULO 1 Estranhos corpos.................... CAPÍTULO 5 Evitando contatos............... CAPÍTULO 4 Indesejáveis misturas.................................................................................. CAPÍTULO 10 Diversa crença....................................................... 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO..................................................................................... CAPÍTULO 9 Distintas convicções............................ CAPÍTULO 3 Invasores............................................................................................................................................................................................................................................................................... ................................................................................................ BIBLIOGRAFIA............................. . a antipatia e a profunda aversão ao estrangeiro. convivência ou contato com o estran- geiro até através de atitudes extremadas de agressão e tentativa de eliminação física ou simbólica do ser estranho. 9 INTRODUÇÃO A palavra xenofobia vem do grego. uma interioridade e uma exterioridade. estrangeiro) e phobos [φόβος] (medo). tanto territorial quanto cultural. tanto ma- terial quanto simbólica. atitu- des. se rejeita com maior ou menor intensidade. A xenofobia tende. portanto. a recusa. em que se estabelece um dentro e um fora. que observa. que se considera como estando em seu lugar. uma comunidade. Até mesmo seu corpo pode ser completamente diferente dos corpos daquele agrupamento huma- no em que está ingressando. da articulação das palavras xénos [ξένος] (estranho. fazendo daquele que vem de fora desse território ou dessa cultura um estranho ao qual se recusa. Ela implica uma desconfiança e um precon- ceito em relação às pessoas estranhas ao território. desde como uma simples recusa de aproximação. uma territorialidade. a ser uma . pois seus comportamentos. O estrangeiro. A xenofobia implica uma delimitação espacial. assim. a rejeição. o estra- nho tende a ser visto com suspeita. A xe- nofobia pode se manifestar de diferentes maneiras. ao meio. o medo. à cultura a que pertence aquele que julga. signifi- cando. códigos de valores não obedecem às mesmas regras que definem aquela cultura que o está recepcionando. definido. ela nasce da insegurança do próprio ser. Em casos extremos. por aquilo ou aquele que inspira desejo. literalmente. cons- ciente e o nível pulsional. Mas. para a perdição. comoção. como toda atitude humana. da possibilidade de que algo ou alguém faça com que se deixe de ser o que se pensa ser. justamente. à matança do estrangeiro. como tentarei mostrar ao longo deste livro. inconsciente. que provoca reações libidinais de difícil controle. naturalmente. a xenofobia pode levar. afeição. a atitude de agressão. do desamparo dos homens diante da possibilidade cons- tante da mudança do seu ser próprio. ao grupo que estaria sendo invadido e predado. muitas vezes. a tentativas de extermínio.10 DURVAL MUNIZ DE ALBUQUERQUE JÚNIOR maneira de expressão dos choques culturais causados pelo encontro de grupos e culturas humanas distintos. para a perda daqueles traços culturais e/ou étnicos que definiriam o ser de um dado grupo hu- mano. a xenofobia. de conflitos entre o nível racional. Ele tende a ser visto como capaz de arrastar cada um e a todos. O medo da perda da identidade individual ou coletiva pelo contato com esse outro. como um invasor do território e um predador dos recursos naturais. O estran- geiro é ameaçador pois pode levar à perda daquilo que foi construí- do como a forma de ser da pessoa ou do grupo que vive em um dado espaço. como todo sentimento humano. Muitas vezes. está carregada de ambiguidades. que provoca afecção. Os maiores medos hu- manos podem ser motivados. Como grande parte dos medos humanos. das oportunidades de trabalho e riqueza que pertenceriam. a pretexto de se manter a pureza da “raça” ou da cultura. Da mesma forma que o corpo estrangeiro. representante de formas distintas de ser humano. de rejeição funcionam como mecanismos de defesa em relação àquilo ou àquele que afeta. de evitação. é um dos motivos da xenofobia. pode ser objeto de . emoção em quem assim rea- ge. O medo de aproximação pode revelar-se como o medo de não resistir a esse outro. Tudo aquilo que inspira medo pode também ser objeto de fascínio e desejo. das fobias humanas. habitantes e construtores de um dado território. que o corpo estranho pode causar incômodo e aversão. todos os países tendem a se tornar multiétnicos e multiculturais. por um lado. como do ponto de vista dos valores e costumes. num momento de racionalização. por isso mesmo. de perversão. de sociedades e econo- mias com níveis de desenvolvimento econômico profundamente desiguais. tanto do ponto de vista tecnológico. não estão nunca dis- sociadas de certo grau de perversidade. de nossos sentimentos e posições. ao mesmo tempo. o duplo significado. Todas as sociedades. a inconstância. as maneiras que seduzem pelo inesperado e pela novidade podem. pelas maiores facilidades de transportes. as perseguições políticas. à medida que se caracteriza por ser um mundo marcado pela constante e ampla mobilidade das popula- ções. desde os mais qualificados. de violên- cia em relação aos estrangeiros. pelo menos. que se lançam à aventuras. sobreviver. de racismo. A xenofobia é um dos maiores problemas do nosso tempo. de agressão. em busca de um lugar que lhe dê acesso a um posto de trabalho e das mínimas condições para viver. dada. ele pode ser objeto de fantasias eróticas que. a ambivalência de nossas atitudes e convicções.XENOFOBIA 11 abjeção. têm que conviver com crescentes manifestações de intolerância. parecer amea- çador. bastante perigosas. o que intensifica os contatos culturais e. de subempregados. desejo. O corpo que atrai. pela convivência. O corpo exótico pode inspirar desejo e. a cultura ameaçadora. a cultura que fascina pela diferença. mesmo naquelas sociedades que se julgam as mais civilizadas e avançadas. ele pode causar curiosidade. . que levam milhares de pessoas a saírem de seus territórios e procurarem novos locais para habitar ou. A globalização dos fluxos de capitais e das empresas foi acompanhada pela globalização dos fluxos de mão de obra e de tra- balhadores. podemos vivenciar cons- tantemente a reversibilidade. lado a lado. Some-se a isso os distintos conflitos bélicos. as perseguições religiosas e étnicas. como sabemos. mas. num momento seguinte. tornarem-se o corpo recusado. O mundo contemporâneo. de desempregados do mundo. por outro. excitação. até a grande massa de deser- dados. as guerras civis. os choques. Seres situacionais e relacionais que somos. as maneiras inadequadas. uma sociedade constituída por gente vinda de todas as partes do mundo. que se consideravam estra- nhos e estrangeiros entre si. mais respeitadora dos direitos humanos. que desde o período colonial se constituiu pela chegada de povos estrangeiros a estas terras. a sedução e a rejeição que o estranho. assassinas contra pessoas estrangeiras. que o estrangeiro nos infunde. ou seja. a discussão do problema em casa ou na escola. uma sociedade mais democrática e republicana. das diferenças. com a globalização dos fluxos popu- lacionais. uma sociedade mais tolerante em relação ao outro. com meios de transporte e comu- nicação marcados pela rapidez. um país de pessoas desterritorializadas. É visando colaborar com essa tarefa decisiva para que tenhamos uma sociedade mais inclusiva. mas de agressões físicas. a xenofobia tende a ser uma presença cada vez mais mar- cante nas várias sociedades e é preciso que saibamos mais sobre esse sentimento. Mesmo no Brasil. como os europeus e africanos. para podermos lidar com ele e combatê-lo. que este livro foi escrito. me parece ser o caminho mais adequado para que apren- damos a lidar com esse medo e. contra imigrantes. ao mesmo tempo. com o desejo. Se os gregos antigos cunharam a palavra. deixando explícito que tal sentimento de rejeição e de medo do estrangeiro já existia naqueles tempos de menor contato entre os povos. ocorrendo não apenas casos de agressão verbal ou simbó- lica. que aqui encontraram inúmeros povos indígenas.12 DURVAL MUNIZ DE ALBUQUERQUE JÚNIOR os conflitos entre suas distintas formas. . as manifestações de xenofobia vêm numa crescente. no mundo contemporâneo. A educação. . 13 1 ESTRANHOS CORPOS Agência Estado Fotografia do menino sírio morto na praia de Bodrum na Turquia. . aquela sobra que se recolhe nas bordas das fronteiras do Ocidente. um pequeno corpo jogado à bei- ra da praia de Bodrum. o short azul e a sandalinha. como o que sobrou de um projeto de ser humano (ele seria humano?). apenas a camisinha vermelha. pa- rece dormir ao rés das águas. . aquisições culturais. as mãozinhas para trás. da solidão. Aquele corpo jogado fora. da ideia de humanidade?). ele jaz ali. por isso. condição mesma de todo humano. próteses para além do corpo. é um fracasso. e não apenas por sua idade. que o discurso humanista nunca deu conta de todos os homens. na Turquia. é um doloroso e lacerante documen- to de que o projeto iluminista do Homem. do ser metafísico e univer- sal. 15 A gora ele é apenas um corpo. aquele corpo pequenino atirado à areia. ao mesmo tempo que já é cadáver. Ele é a própria encarnação do desam- paro. como uma unidade universal e racional. Um corpo de criança. que o humanismo parece sempre ter enxergado apenas alguns homens — nem mesmo as mulheres e as crianças. de bruços. Talvez. nos lembre que se trata de uma figura humana. um corpo considerado menor. Aquela criança que voltou ao pó — irônica e dolorosa. é um corpo nomeado de sírio. como o que sobrou das pretensões humanas de se constituírem como seres civilizados. cruel reminiscência bíblica —. criadores de um corpo cultural. como uma tábua ou uma mala. desencarnação do ser do homem (ele seria mesmo uma encarnação do humano?). como escolho. um corpo de infante. como mostra esse acontecimento —: os homens ocidentais. Como um resto de um naufrágio (o naufrágio da própria humanidade. de uma defasagem entre o que no Ocidente chamamos de a humani- dade de uns e de outros. como fazendo parte das mesmas maneiras de ser. do não reconhecimento da sua humanida- de. nem sempre se acham dian- te de um corpo. de seus . no dia 02 de setembro de 2015. encontramos mui- tos outros acontecimentos como esse. quais corpos são humanos. Através da história. como pertencentes à mesma espécie.16 DURVAL MUNIZ DE ALBUQUERQUE JÚNIOR O menino sírio encontrado morto na praia turca. distinto que. quase sempre. culturas que não se reconheciam entre si como iguais. é um acontecimento doloroso e lancinante. passariam a ter. ele foi atirado fora também pelas dissensões em torno do que afinal é um ser humano. estamos pondo em questão seus direitos nascidos de sua pertença à nossa mesma espécie. do corpo exótico. de uma hierarquia. Sempre que manifestamos o sentimento de xenofobia estamos atribuindo um certo déficit de humanidade ao outro. Até mesmo do ponto de vista corporal. sequer enxergamos como pertencentes à nossa espécie. de um rosto que consideram idênticos a si mesmos. como tendo a mesma carne. por serem reconhecidos como tal. do estranhamento. A recusa e a aversão ao corpo do outro nasce. um corpo de humanos. que puseram frente a frente povos. estrangeiro. o medo e a rejeição ao estrangeiro. da percepção da existência de uma estranheza. não é uma unanimidade o que seria um corpo humano. nem sempre contemplam o que consideram ser uma figura humana. bizarro. muitas vezes. pois dada a diversidade das formas dos corpos humanos. não foi rejeitado apenas pelo mar Mediterrâneo. etnias. portanto. uma ferida aberta em nossas convicções e certezas sobre afinal quem é humano. o que define o ser humano. que figura tem um corpo humano. nasce. quando um homem enxerga outro homem. quais corpos merecem ser assim definidos e quais os direitos que esses corpos. os identificam como pertencentes à sua mesma espécie. A xenofobia. quando uma mulher se vê diante de outra mulher. Uma das mais básicas manifestações de xenofobia nasce da rejeição do corpo estranho. O corpo de Aylan Kurdi. um corpo de três anos. da imagem dos corpos. Nem sempre. em muitos casos extremados. implicando assim que as outras tribos. de malvados. de seus jeitos. que não partilha das mesmas qualidades humanas. os completos. como mau. reproduzem atitudes bastan- te ancestrais dos seres humanos e implica em comportamentos que o fundador da psicanálise. desprezível. Portanto. de suas cores. que não apresenta a mesma aparência. chamou de regressivos. Por não partilharem da mesma aparência. como in- completo. rejeição. inclusi- ve a agressão. . como privado. mas são. que não possui os mesmos traços físicos e mar- cas culturais. da condição humana. aquele corpo humano que não habita o mesmo terri- tório. a recusa. compostas de maus. não vê-lo como partilhando da mesma natureza humana. Sair correndo de medo ao se deparar com um corpo humano estranho foi uma atitude bastante comum na história humana. Após o estudo e observação de várias comunidades tribais. podem vir a acontecer. quando muito. às vezes. que grande número de popula- ções denominadas primitivas se designam por um nome que significa os homens. convertendo-o num fantas- ma. estranhá-lo. os ex- celentes. 223). vê-lo como uma ameaça. o antropólogo francês Claude Lévi-Strauss afirma: [. como podemos perceber. a mesma forma de aparecer em público. inclusive.. p. do grupo linguístico. daquilo que os marca como pertencentes a um dado grupo cultural. Não se identi- ficar com o outro. diremos com mais discrição. Chegam muitas vezes a privar o estran- geiro deste último degrau de humanidade. grupos ou aldeias não participam das virtudes ou mesmo da natureza humana. os bons..XENOFOBIA 17 traços. podem ser reduzidos à condição fantasmática de aparições. sendo reduzido à condição de animal inferior. o que pode gerar medo. a tal ponto. às vezes mesmo da aldeia.] a humanidade cessa nas fronteiras da tribo. o medo. ou numa aparição (Lévi-Strauss. ou. daquilo que os complementa e adorna. de seus gestos. Sigmund Freud. 1970. pânico. o estranhamento. ver o estranho e o estrangeiro como alguém inferior. de símios da terra ou de ovos de piolho. tende a ser enxergado e dito como inferior. são traços fundamentais daquilo que denominamos hoje de xenofobia que. Ou seja. pode ser dito e visto como humano. aprenderemos que humano e humanidade são conceitos que nem sempre estiveram disponíveis. mas é uma atribuição que é feita no contexto de uma dada comunidade de homens e mu- lheres. Muitas vezes tendemos a naturalizar o conceito de humano. comportamentos que expressam e remetem a emoções bas- tante primitivas da espécie. portanto. a história dos homens. é a partir do corpo que os Krahô definem quem pertence ao grupo e quem é estrangeiro. “aquele que não tem a mesma carne”. de sua carne. Achamos que é a natureza. atitudes. performances. enquanto para o estrangeiro utilizam a designação “krepeu”. a pulsões agressivas. designam a si mesmos. considerado. Por exemplo. não fizeram parte de todas as culturas e que nem todos aqueles que nasceram com a forma humana assim foram vistos e ditos. ou seja. de corpos que por sua cor. do jeito como ela se . traços. ser humano. àque- les que pertencem ao grupo como sendo “mehii”. que vivem no nordeste do Estado de Tocantins. O estranhamento do corpo do outro. quem é estranho. os índios Krahôs. que é o simples fato de algum ser nascer com a forma humana. embora dela dependa.18 DURVAL MUNIZ DE ALBUQUERQUE JÚNIOR ou seja. “os da mesma carne”. é a partir da carne. “o mesmo jeito”. Um dos motivos fundamentais para a existência da xenofobia. que nos fazem retornar a desejos. que utilizam critérios que são culturais. que fazem com que reajamos diante de dadas situações como os hominídeos vivendo nas formas mais primárias de organização social reagiram. apesar de todo o processo civilizatório pelo qual a espécie humana passou. medos e aversões que perduram ao longo do tempo. no entanto. é a própria reação de estranhamento que nós humanos tendemos a manifestar diante de corpos que diferem dos nossos. estatura. de humanidade. Se observar- mos. pertencer à humanidade não é uma decisão tomada pela natureza. proporções. comportamentos nos parecem não idên- ticos ao nosso próprio corpo e àquilo que a cultura a que pertencemos definiu como sendo o humano. para dizer quem pode ou não pertencer a humanidade. Como é um conceito. gestos. que ele será imediatamente assim identificado. movimen- tos. na terra indígena Kraolândia. daí porque o estrangeiro. de seu corpo. quando o rei Carlos V reúne quatorze teólogos para discutir se era justa a conquista espanhola do Novo Mundo. Quando os europeus se depararam com a novidade do nativo americano. Um corpo. o pertencimento à cidade grega. pelo menos. os grupos humanos tenderam a ver no estranho. A aversão ou o desejo em relação ao outro começa a partir de sua carne. Ele se apoiava na argumentação do filósofo grego Aris- tóteles que já advogara que os bárbaros. com o filósofo Juan Ginés de Sepúlveda defendendo a tese de sua inferioridade enquan- to humanos. todos aqueles que não eram gregos. indagaram sobre o seu caráter humano. Portanto. um certo défi- cit de humanidade. considerar que aquele corpo ocupa um lugar inferior na escala do que seria o humano. em seu livro A Política. o mesmo corpo. ou. ou seja.XENOFOBIA 19 movimenta. Não possuir a mesma carne. como ela faz figuras é um dos elementos que explicam a existência do sentimento de xenofobia. como o retorno de sentimentos recalcados. de emoções e expe- riências vividas pelos homens em outros tempos. uma figura só se tornava propriamente humana ao ser dotada de uma condição política. muito se discutiu sobre a condição de humanidade dos índios. pode levar ao questionamento da própria condição de humanidade do outro. que a vida se tornasse propriamente humana. quando se viram diante dos indígenas. No famoso deba- te ocorrido na cidade de Valladolid. no estrangeiro. historicamente. Aristóteles. apesar de humanos. o pertencimen- to a uma entidade política era fundamental para que o corpo. Para Aristóteles. que sobrevivem e reaparecem de formas variadas. possuíam uma natureza inferior. se apresenta. vai fazer a distinção . que não detinha direitos políticos nas cidades gregas. uma existên- cia inferior. quando não sua mais completa inexistência. não havia injustiça ou impedimento de que fossem reduzidos à condição de escravos. nos anos de 1500 e 1501. de medo e rejeição ao estrangeiro. na Espanha. mediadas e motivadas pelas condições do presente. por isso mesmo. formas de ver e pensar que continuam atuando na contemporanei- dade. uma carne. ao estranho. era considerado uma vida. se configura. ou as vidas. Quando uma vida. degolados a sangue frio por grupos . de vidas humanas. os corpos de distintos reféns oci- dentais torturados. ele perde. Transformado em mera carne nua. Se o estrangeiro era alguém visto como destituído da cultura e dos direitos políticos do cidadão grego. de tortura. O filósofo italiano Giorgio Agamben vai argumentar que essa distinção entre a vida humana. desrespeitada. cadáveres sendo profanados por soldados americanos. o mero fato de estar vivo. uma vida definida pelo pertencimento a uma dada entidade cultural e política. a sacralidade. sem di- reito à defesa. de desrespeito. quando ele é colocado numa posição de total estranhamen- to. ele pode ser submetido a todo tipo de sevícia. já que corpo que nasce do divino ou se relaciona com alguma divindade. destruída sem maiores remorsos. humilhada. a vida como zoé. humilhados. inclusive. inclusive corpos já mortos. os prisioneiros iraquianos seviciados sexualmente. submetidos a toda sorte de torturas na prisão de Abu Ghraib. sujeitos a toda sorte de maus-tratos. ele se torna matável. hu- milhados. tornam-se mera carne nua que pode ser torturada. dos seres humanos. sem direito sequer à identificação. não propriamente ou totalmente humana. percebido como vivendo uma forma de vida inferior. políticos e religiosos completamente distintos perdem sua condição de corpos. O estranhamento radical é assassino. de ser um corpo vivo e a vida como um modo distinto de viver. continua reverberando no mundo contemporâneo. quando um corpo perde todos os seus direitos políticos. a prerrogativa de reivindicar os direitos humanos.20 DURVAL MUNIZ DE ALBUQUERQUE JÚNIOR entre duas formas de vida. estrangeiros. o que ele chama de vida nua. entendida como vida política. Podemos citar a situação dos prisioneiros árabes mantidos pelos Estados Unidos na base de Guantánamo. o corpo humano como corpo cultural e político. e a vida entendida como mero dado biológico. era. ele perde a sua condição propriamente humana. entre o que hoje chamaríamos de uma mera vida biológica. pertencentes a universos culturais. O mundo contemporâneo está repleto de situações como essa. em que corpos considerados total- mente estranhos. a vida como biós. quando ele é colocado na condição radical de estrangeiro. pois ele perde. inclusive. sem direito de expressão. seviciada. portanto. como era defendida pelo pensamento cristão. com o encontro dos europeus com povos ditos exóticos. bárbaros. a uma dada genealogia. Se antes o corpo estranho. entre o surgimento das nações modernas e a emergência do racismo. se depois passou a ser aquele que não pertencia a uma dada cultura como a grega ou a persa. ou seja. A própria tese de que a humanidade não tivera uma origem comum. mas teria surgido a partir de diferentes matrizes raciais. no século XVIII. traços diacríticos e formas variadas e diferentes fez com que emergisse a noção de raça para classificá-los e.XENOFOBIA 21 radicais islâmicos. O fato de os corpos humanos apresentarem cores. ao corpo estranho. inclusive. É a partir da emergência dos Estados Nacionais europeus e das Grandes Navegações. região central da cidade de São Paulo. depreciando e inferiorizando os corpos pertencentes ao que se vai denominar de raças inferiores. ou seja. Mas é com o Iluminismo. Embora já se possa encontrar o termo raça nas línguas europeias desde a Idade Média. hierarquizá-los. estranhos. que emerge o que podemos chamar de doutrinas racialistas. o pertencimento a uma li- nhagem de sangue. ela significava. con- tribui para dar um caráter científico ao racismo. O filósofo francês Michel Foucault vai chamar a atenção para essa relação entre o surgimento dos Estados Nacionais. Ele vai chamar a atenção para o vínculo estreito que se vai estabelecer entre a ideia de nacionalida- de. é o que dá origem a um comportamento que está muito associado à xenofobia: o racismo. a uma visão hierarquizadora das raças. aquelas que utilizam a noção de raça para o estudo da história e dos grupos humanos. ou não pertencia à um . ou ainda os corpos de haitianos atingidos por disparos na Baixada do Glicério. O Estado Nacional emerge como insti- tuição responsável pelos corpos que habitam a sua nação. tornando- -se hostil aos corpos daqueles que dela estão excluídos. que o termo começa a ser usado para classificar grupos humanos. o corpo estrangeiro era aquele que não pertencia à tribo ou à aldeia. a ideia de pertencimento a uma nação e a ideia da existência de raças inferiores e superiores. o que se chamou de tese poligenista. Essa rejeição ao corpo do outro. no entanto. que em suas ações terroristas podem vir a atingir e matar indiscriminadamente qualquer corpo visto e dito como oci- dental. a educação dos corpos. Cuidar da vida do que passa a ser chamado de população passa a ser a obrigação maior daquele que governa. agora ele é o corpo que habita outra nação. que são ditos estrangeiros. no Estado Absolutista. um respon- . O Estado torna-se um gestor de corpos. inclusive. uma atividade de governo vol- tada para gerir e ter ingerência em aspectos fundamentais ligados à existência biológica e corporal dos humanos: o nascimento. o principal poder do so- berano se refere a sua prerrogativa de fazer morrer ou deixar viver os corpos de seus súditos. pois ela implica a necessária criação da figura do estrangeiro. a procria- ção. não pertencia à cristandade. a gestação. agora um aparato legislativo põe limites a esse poder. ele tem o poder de vida ou de morte. O governante deve fazer viver mais do que fazer ou deixar morrer. Já no Estado moderno. Para ele. a morbidade etc. aqueles surgidos das revoluções burguesas. corpos que eles terão que despender recursos para gerir e cuidar. o crescimento. O aumento da presença do sentimento de xenofobia nas socie- dades contemporâneas se dá à medida que. Gerir a vida da população dá origem ao que Michel Foucault nomeou de uma biopolítica. como corpos nacionais e corpos vistos. o governante não dispõe do poder dis- cricionário de vida ou de morte. ou seja. os Estados Nacionais cada vez são mais pressionados no sentido de admitirem como sendo nacionais. torna-se uma obrigação do governante cuidar da vida daqueles que agora deixam de ser súditos para serem cidadãos de seu Estado. corpos que são vistos como estranhos. ditos e tratados como estrangeiros. o soberano dispõe da vida de seus súditos. Michel Foucault vai estabelecer uma diferença entre as práticas de governo dos chamados Estados absolutistas ou do Antigo Regime e os Estados modernos. as práticas de governo realizadas pelos Estados Nacionais nunca estão desligadas da prática de dadas formas de racismo.22 DURVAL MUNIZ DE ALBUQUERQUE JÚNIOR império como o romano. Para Michel Foucault. a mortalidade. Ao mesmo tempo. Nesse tipo de regime político. ele decide quando e como matar mais do que como as pessoas vive- rão. estatu- to jurídico especial. justamente. ao qual será dado. As políticas de governo dos Estados Nacionais estão sempre apoiadas na criação e reprodução da diferença entre corpos que são admitidos como sendo pertencentes à nação. à população desse Estado e aqueles corpos que são estrangeiros. terminando por se envolverem com o tráfico de drogas. tendo que fugir sempre que uma viatura policial se aproxima. em situação irregular diante das leis do país. esses cor- pos que não possuem reconhecimento e direitos políticos tornam-se vidas e corpos disponíveis e sujeitos a todo tipo de violência e explo- ração. um espanhol que cobra propina de quem os uti- liza tanto para vender drogas quanto para vender as mercadorias baratas e repassa parte dela para um agente da polícia. inclusive os cor- pos clandestinos. na Espanha. entre os corpos que pertencem à nação. extrair o máximo de rentabilidade desses corpos. mas submetidos a todo tipo de exploração e abuso.XENOFOBIA 23 sável pela manutenção da vida. educar. O corpo do trabalhador e do soldado passam a ser uma preocupação de governo. que vivem na clandes- tinidade. à exploração e à deportação. Pela própria condição de ilegalidade e clandestinidade. ilegais. produzir distin- ções entre esses corpos. por seu turno. morando no próprio lugar onde trabalham. Os africanos sem documentos vivem do comércio ambulante ilegal. Sujei- tos a serem presos e espancados a qualquer momento. através do trabalho e das atividades de defesa do próprio Estado. Uma das distinções mais importantes vai se dar. que mantém uma indústria clan- destina de fabricação de réplicas de bolsas femininas de grife. definir. o que implica que ele termi- na por hierarquizar. adestrar. ele vai gerir. realizado em 2010. Eles são agenciados e “protegidos” pelo personagem principal da trama. Esse Estado da biopolítica vai exercer um governo cuja preocupa- ção se centra nos corpos. classificar. diagnosticar. ao mesmo tempo em que exige des- sas vidas cuidadas e preservadas que se dediquem ao serviço daque- le Estado e da sociedade. que deveria garantir a não perseguição das atividades ilegais que realizam. justamente. Atualizando a distinção grega entre zoé e biós. dormindo . explo- ra um grupo de cerca de vinte compatriotas. essas vidas. esses corpos estão sujeitos a serem marcados não apenas com o estigma e o preconceito. O filme mexicano Biutiful. eles são corpos expostos constantemente ao perigo. aborda a situação de um grupo de chineses e africanos vivendo clandestinamente na cidade de Barcelona. Um empresário chinês. entre vidas que são humanas e vidas que vivem num estado à beira do humano ou do inumano. hierarquias e exclusões de dados corpos. garantir a vida. ditos. como um semelhante. como o menino sírio. Talvez. unidade de corpos. implicou sempre uma dada presença do racismo. considerados. vítimas de intoxicação por gás que se desprende de aquecedores de má qualidade. A xenofobia contemporânea. por sermos vistos. Uma noite morrem todos. pelas próprias exigências legais e jurídicas que implicam. Em várias situações. vindo todos. passa ainda pelo corpo que temos. Seus corpos. a biopolítica sempre foi atravessada por uma ambiguidade à medida que. O agente espanhol garante que o negócio não seja molestado pela polícia e ainda agencia outros tipos de tra- balho para o grupo de chineses ilegais. à violência e. inclusive. na linguagem dos corpos nossa primeira forma de apresentação. também. continua repercutindo essa distinção entre vidas que contam. condenam a situações de perigo à vida os muitos corpos que são definidos e marcados com a condição de estrangeiros. pela aparência. em muitos casos. Sermos acolhidos e recep- cionados pelo outro como um igual. Não sei se poderíamos falar de uma crise ou de uma falência da biopolítica diante da situação em que todos os refugiados e imigran- tes vivem hoje. Nós humanos ainda continuamos tendo nos corpos. de onde saem todas as manhãs direto para um dia inteiro de trabalho. como um humano. de percepção e de recepção. da produção de classificações. a maioria sujeitos à semiescravidão. ao abuso físico e sexual. não deixar morrer. ao ser centrada sobre o governo dos corpos. os Estados que deveriam fazer viver. como nos chamou a atenção Michel Foucault. na presença. carne a ser jogada ao mar. sem nenhum direito. sociedade. terminar jazendo na areia da praia. portanto. inclu- sive legalmente. pela própria discricionariedade dos agentes públicos que os compõem. O filósofo italiano Giorgio Agamben vai também se referir a uma outra figura do direito na Antiguidade romana para tratar de algumas situações a que estão expostos os estrangeiros e toda e qualquer exis- . à morte. pela presença que fazemos. pertencentes à mesma comunidade. são vidas nuas.24 DURVAL MUNIZ DE ALBUQUERQUE JÚNIOR trancados em um porão. fascina. recusa e rejeição do corpo estranho está na ordem direta da intensidade do desejo. como sabemos. o corpo estrangeiro. sagrados. exigia uma forma de atuação do Estado fora de seus regramentos.XENOFOBIA 25 tência. mas. portanto. O homo sacer era alguém que. Ao se propor a cuidar dos corpos de seus cidadãos. Muitas vezes a atitude de evitação. a matança. vagando entre um Estado e outro. como os setenta corpos de imigrantes achados mortos. ocorrido na Europa. embora tratados e códigos internacionais os submetam e obriguem a tal cuidado. faz com que esses corpos oscilem entre a situação de corpos humanos e. ao mesmo tempo. O caráter aberrante de seu crime o tornava uma espécie de figura sacra. um corpo que não se pode profanar. perdia todos os seus direitos. dos ilegais. Um caso abominável de ra- cismo. atrai pela diferença. havia cometido um crime hediondo. abrindo-se o que Agamben chamará de um estado de exceção. da atração. tornando-os carnes nuas. o abuso. de muitos refugiados. No mesmo momento em que aquele corpo instaurava um Estado de exceção. dos clandestinos. no século XIX. um crime de suma gravidade e que. abandonados na beira de uma rodovia da Áustria. no interior de um caminhão baú. A situação de muitos imigrantes clandestinos. Sabemos que o corpo negro e mestiço se constituiu em fetiche sexual e em objeto erótico muito desejado pelos europeus. políticas que oscilam entre o fazer viver e o deixar morrer. O corpo exótico é também motivo de desejo e sedução. disponíveis para o uso. acampados em zonas fronteiriças entre os Estados. por definição. tornava-se matável. no mundo contemporâneo: a figura do homo sacer. os Estados. Mas o que vemos é uma oscilação nas políticas dirigidas para esses corpos. entre o fascínio e a abjeção do corpo estranho: . explicita essa ambiguidade entre o desejo e a recusa. na sociedade romana antiga. um corpo que não se pode tocar. da comoção que ele provoca. ele não nos causa apenas medo e rejeição. instaura uma espécie de Estado exceção. por isso. estranho. o fora do comum de seu crime impedia que fosse punido pelos ritos e práticas normais de punição. Mas. excluem do cuidado os corpos dos estrangeiros. O mesmo corpo que amedronta. da afecção. não matáveis e corpos que vivem uma situação de sub-humanidade ou de inumanidade. o desejo por um outro corpo não significa que necessariamente o con- sideremos portador da mesma humanidade. mais conhe- cida como a Vênus Hotentote. domador de animais. rejeição e sedução diante de um corpo estranho. perto da estação central do metrô da cidade de Colô- nia. na Europa. como tão bem explicitaram os filósofos franceses Georges Bataille e Michel Foucault. A atração. nesse caso. Tendo sido comprada. até serem reivin- dicados pelo governo de Nelson Mandela. por ter nádegas. em Paris. Seus restos mortais foram mantidos em formol no Museu Nacional de História Natural. inclusive do ponto de vista racial. um corpo outro. o misto de curiosidade. O erotismo humano. seios e vagina bastante avantajados. os humanos também são capazes de desejar. após ser levada para Londres. já que se tratava de um corpo feminino. uma mulher zulu. Mediante paga- mento extra podia-se tocar as suas nádegas. Vivemos. atração sexual e. do perigo que seus corpos desejáveis e desejantes representam. por um francês. da explicitação de hierarquias e desi- gualdades. procedente de tribos que viviam na atual África do Sul. sem abrir mão da ideia de que eram seres superiores. já que se tratava de um corpo negro. Mui- tas vezes a agressão. in- clusive. que. terminou por se tornar prostituta e alcoólica. a violência contra o estrangeiro nasce do medo do próprio fascínio que eles exercem.26 DURVAL MUNIZ DE ALBUQUERQUE JÚNIOR foi o caso de Sarah “Saartjie” Baartman (Yahima Torres). notadamente na Alemanha. Os coloniza- dores europeus foram capazes de sentir desejo. foi exibida como atração de feira e circo em várias cidades da Europa. É explícito. teriam . Na noite de Ano Novo de 2015. inclusive com casos de estupro. Como bem demonstra a existência da zoofilia. da mesma figura que o nosso. vir a se apaixonarem por aqueles considerados de raças exóticas. em 1814. forte tensão política e social. e de gênero. para merecerem o enter- ramento. do mesmo status e possuindo os mesmos direitos que o nosso. não está separado do exercício de relações de poder e domínio. motivada pelos recorrentes casos de ataques sexuais que estariam sendo cometidos por grupos de árabes e norte-africanos contra mu- lheres europeias. onde reside a direção de um movimento contra a imigração. nesse momento. estrangeiro. de gozar com os animais ou com um outro humano equiparado a esse situação. de erotizar. pessoa e mulher.XENOFOBIA 27 sido registrados cerca de noventa casos de ataques sexuais cometidos por estrangeiros. e torna-se objeto de ações que costumamos realizar com os animais (embora. de ser humano. notadamen- te aqueles corpos que julgamos estranhos. das mesmas sevícias e abusos. o estrangeiro tor- na-se semelhante a um mero animal. ele se torna alvo dos mesmos maus-tratos. Em casos extremos de manifestação de xenofobia. objeto. indignas de respeito e consideração. distintos da nossa cultura e excluídos da cidadania tal como a entendemos. inclusive sexuais. Esse corpo torna-se carne. Eventos que explicitam o funcionamento duplo da xenofobia: por um lado os alemães acusam imediatamente os árabes e africanos de serem responsáveis pelos ataques. objeto de desejo e erotismo. aque- le que a ela não pertencia. O ataque sexual explicita. Sendo a prática sexual uma prática que remete a nossa condição de animal. hoje. O cor- po estranho torna-se não apenas matável. O cidadão era. ao mesmo tempo. mas violável. e os árabes e africanos atacam as mulheres europeias por julgá-las mulheres fáceis. estrangeiros. brutalizável. o conceito de humanidade se elabora nos afastando e. o desejo pelo outro corpo e o desprezo por sua humanidade. o habitante da cidade. disponíveis. mas. usável. em grande medida. inclusive de desejo. . porque os veem como perigosos e lúbricos. perde sua condição de humanidade. pois na sua negação é que se constrói a própria noção de humano. não tinha os mesmos direitos. para os gregos. se tratem melhor os animais do que os humanos vistos como estrangeiros). justamente. condição que tendemos a negar. tem o condão de fazer os corpos serem novamente tratados como animais. negando a nossa animalidade. pelos seus direitos enquanto cidadão. o estrangeiro. coisa. ao mesmo tempo. em determinadas sociedades e camadas sociais.
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