Uma História de Desafios



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Psicologia Organizacional - Uma história de desafiosComo surgiu a Psicologia Organizacional e do Trabalho e para onde ela caminha Nos dicionários, o trabalho é concebido como um conjunto de atividades exercidas pelo homem - seja na produção, gestão ou transformação dos recursos da vida em sociedade - em busca de um determinado fim. Mas suas implicações vão muito além disso. Ele tem uma conotação existencial na medida em que os indivíduos se sentem produtivos por terem uma função, um emprego, uma rotina corporativa. É também fator de inclusão social, de reconhecimento pessoal. As relações entre o homem e o mundo do trabalho estão no foco da Psicologia Organizacional e do Trabalho (POT), um campo da ciência que tem pouco mais um de século de existência. A POT surge na segunda metade do século XIX, mas sua pré-história remonta à Revolução Industrial e à instauração definitiva do trabalho assalariado. Nesse período, com o surgimento das fábricas, as relações sociais igualmente se transformaram. Com o tempo, as organizações passaram a centrar seus esforços na busca de adesões e na minimização de conflitos, fosse pelo acordo, fosse pela ameaça. Iniciava-se um período em que as células de produção necessitariam do auxílio de mediadores capacitados. No século XIX, a psicologia apareceu como área inovadora na análise das condutas humanas, bem como fonte de técnicas aplicadas à busca do bem-estar mental. Esses conhecimentos acabaram logo apropriados pelas grandes corporações industriais do Ocidente. Os instrumentos teóricos desse novo campo de estudo foram utilizados no recrutamento de soldados e na seleção de empregados para as fábricas. Em 1913, Hugo Münsterberb publicou Psychology and Industrial Efficiency, obra que focalizava, sobretudo, as técnicas de seleção de pessoal e de ajuste funcional. Foi essa uma época fortemente marcada pelos estudos desenvolvidos por Frederick Taylor, o pioneiro da administração científica, destinada basicamente a estabelecer critérios para a ação laboral e aumentar a produtividade. A partir desses postulados, o engenheiro Frank em Chicago. a reação dos funcionários a alterações de luminosidade na fábrica. baseada em regras e procedimentos objetivos. que fez descobertas revolucionárias. E. com a crescente necessidade de incrementar a produção. Em 1924. ficava cada vez mais claro que os funcionários apresentavam distintas competências e podiam render mais – ou menos – em virtude do setor em que atuavam. O objetivo era projetar ambientes e elaborar sistemáticas que maximizassem a eficiência do trabalho humano. Vários desses estudos tinham viés behaviorista. Enfim.Gilbreth e sua mulher. a X e a Y. Nos anos 20 e 30. A teoria . a produtividade dos trabalhadores parecia estar associada a um conjunto complexo de razões. Douglas McGregor. com isso. as jornadas de trabalho se tornaram ainda mais pesadas. No final dos anos 50. analisou comparativamente essas dimensões da subjetividade ao apresentar análises de suas teorias. a psicóloga Lillian Gilbreth. Diversamente do que determinava dogmaticamente a lógica “científica” da eficiência. professor do MIT Sloan School of Management. acidentes e a elaboração de critérios e de fluxos de produção que a POT deu seus primeiros passos. iniciou-se um estudo na unidade Hawthorne Works. as atividades dos psicólogos se estenderam ao treinamento dos profissionais e também às investigações de fatores ambientais que afetavam a produtividade. Três anos depois. A satisfação estava associada à valorização da “função social” do indivíduo. Por que esse interesse? Naquele período. as baixas começaram a crescer. estudaram as maneiras pelas quais as tarefas eram executadas. a investigação ficou a cargo do australiano Elton Mayo. Avaliavam-se estímulos e respostas do grupo de trabalhadores ainda em processos destinados a elevar a produtividade. McGregor afirmou que os estímulos de administração dependem das visões que os gestores têm do comportamento das pessoas na esfera da produção. Mayo chegou à conclusão de que eram mais importantes as relações humanas e os sentimentos. Avaliava-se. em que a produtividade estavam também associada à interioridade do indivíduo. Foi a partir de estudos sobre fadiga. a princípio. Mayo percebeu que os fatores psicológicos e subjetivos tinham mais importância do que os fisiológicos. principalmente. com até 14 horas diárias. a seu desejo de aceitação. da Western Eletric. de pertencer harmonicamente a um grupo. existentes no campo da gestão de pessoas. No ritmo intenso exigido pelas indústrias – e sem a existência na prática de direitos trabalhistas como o descanso semanal –. Iniciou-se um período novo no universo do trabalho. à sua coleção de valores e. As tarefas também se diferenciavam. promover a humanização do trabalho. Afinal. McGregor destacou que o atendimento de uma necessidade básica gera um efeito que logo desaparece. Uma efetiva prática motivadora. a velha sociedade do patrimônio físico. muitas vezes assumindo espontaneamente responsabilidades. vigiados e. preguiçoso. desobediente. com o aprimoramento das máquinas e dos meios de produção. portanto. de acordo com o ambiente. De fato. as relações entre as pessoas e o trabalho se tornaram mais complexas. A Y.X funda-se na certeza de que o homem é. de auto-realização do trabalhadores. muitos administradores atribuíram aos psicólogos a função de criar esses acordos de cooperação e reciprocidade. dependeria de intervenções na esfera da subjetividade. os avanços tecnológicos transformaram mais uma vez o mundo do trabalho. A partir dos anos 90. Em ritmo veloz. o homem tem desempenhado mais as tarefas de . quanto possível. Hoje. O pesquisador afirmava que era possível alinha interesses corporativos a interesses pessoais. de modo que o comprometimento surgiria somente a partir do estabelecimento de uma relação de confiança entre a empresa (gestores) e funcionários. criativo. nas linhas de produção japonesas. as questões mais humanistas passaram a dominar os estudos da POT. desde sempre. Ele mostrou ainda que as leis trabalhistas já cuidavam da satisfação das necessidades básicas. A atenção voltava-se para a satisfação (ou não) dos indivíduos com suas atividades dentro das organizações. o trabalhador pode ser intra-empreendedor. penalizados. a partir dos 50. de certa forma. desprovido de ambições e. indica que. entretanto. Entre as décadas de 70 e 80. o ritmo ditado pela era digital em que vivemos é tão intenso que vem modificando as profissões e as funções dentro das organizações. Ou seja. avesso a responsabilidades. disciplinado e auto-orientado para atingir os objetivos da empresa. A era da globalização trouxe novos desafios para a psicologia organizacional dos dias atuais. os trabalhadores precisam ser controlados. algo que já existia. como o reconhecimento do empenho e a disponibilização dos meios para a auto-realização. com o advento da Internet. regidas pelo sistema toyotista. o aprimoramento das telecomunicações e as novas necessidades impostas pelo caráter cada vez mais competitivo do mundo corporativo – em que as disputas são globais e extremamente ágeis –. Na Europa e nos EUA. industrial e material começou a ceder à emergente sociedade do conhecimento: informática e digital. A proposta era tornar essa relação menos tensa e com menos conflitos entre gestores e empregados. quando necessário. Nesse caso. é um campo vasto para a POT. baseadas no crescimento compartilhado e no respeito mútuo. de busca de soluções. mas que contemple as necessidades tanto do empregado quando da organização. a grande tarefa dos profissionais é justamente estabelecer uma relação dinâmica de reciprocidade nas empresas. capaz de gerar um compromisso cooperativo entre proprietário e gestores. de criação. a tendência é de que o psicólogo seja. acredita que vai longe o tempo em que o psicólogo servia apenas como bom recrutador de pessoal. criando alternativas para que o indivíduo vivencie autenticamente os desafios na empresa. E isso não mais ocorre nos tempos atuais. Portanto. Os desafios para o trabalhador e para as organizações são diários. No passado alguém podia pensar em entrar em uma empresa e lá se aposentar. é fato que o trabalhador passou a ser visto por outro ângulo. de outro. nos próximos anos. muitas empresas já trabalham seriamente na busca dessas relações de reciprocidade. de um lado. Todas essas transformações criam um cenário que exige mais atenção para as questões do mundo do trabalho. também é certo que os discursos vigentes encontramse em descompasso com a prática da gestão na maior partes das empresas. hoje buscam expropriar as suas idéias). na sociedade moderna busca-se fornecer meios para que as pessoas e as corporações lidem melhor com as mudanças. Nas companhias que resolveram encarar o desafio da valorização efetiva dos colaboradores. professor de Psicologia Organizacional da PUC –SP.” Bruttin. algo antes reservado aos administradores e ao pessoal técnico. e trabalhadores. . que é também consultor e atende a grandes empresas. menos instrumental. de bancos a montadoras de automóveis. O empregado tem de lidar com a realidade de que precisar estar em constante atualização em um mercado altamente competitivo. O objetivo do especialista é promover e assegurar um ambiente saudável e produtivo. o psicólogo tem hoje importância fundamental. Se. “Ainda que existam dissonâncias no discurso. numa ação associada especialmente à oferta de condições que permitam a melhoria de desempenho”. diz Bruttin. Por outro lado. ele deve estar preparado para lidar com diferentes aspectos de sua atividade e não pode mais pensar que a função é imutável. integrado às equipes de planejamento estratégico das corporações. “Podemos contribuir efetivamente. Se antes a meta era desenvolver ferramentas para atender aos anseios da empresa. O objeto do desejo no mundo corporativo é o conhecimento (antes as organizações expropriavam a força de trabalho. o emprego ficou mais instável. De acordo com André Brutin. Para isso.liderança. aconselha. ele destaca a atenção ao pessoa do chão-defábrica. “Em cada lugar. com benefícios para quem empreende e para quem colabora. “Ainda que a qualificação dos profissionais tenha melhorado substancialmente nessa área. muitas empresas brasileiras ainda têm estruturas verticalizadas e pressupostos autoritários. afirma. e não há efetivo investimento em aprendizado. Paul Boston . as pessoas agem de acordo com padrões culturais muito singulares.” Fonte: Revista Diálogos 1 R Sharp. contudo.” Segundo ele.Entre suas atividades. nessas empresas ainda vale. “Mas esse profissional precisa ser bem formado e colocar seus projetos em prática”. J Lewis. o profissional de Psicologia precisa ter profundos conhecimentos. “Mesmo assim. um dos maiores especialistas do Brasil na área.Routledge & K. “Por isso. o lucro. realizada por meio de cursos e de dinâmicas destinadas à geração de sugestões. qualquer intervenção do psicólogo nesses processos deve levar em consideração a cultura da organização e a cultura regional e nacional. 1975 . um discurso participativo. participação e fixação de objetivos comuns. especialmente de padrões de comportamento e da subjetividade humana”. Education and social control. afirma. da Universidade Federal de Santa Catarina. Essa visão sobre a intervenção transformadora é compartilhada pelo professor José Carlos Zanelli. De acordo com Zanelli. muitas delas conseguem ter coerência e consistência”. “Ele somente ganhará crédito e mudará esses ambientes quando provar que é capaz de colaborar na construção de empresas mais rentáveis e mais humanas. para auxiliar na criação de novos modelos de relacionamento. que alteram suas respostas às proposta de interação”. o grande desafio do psicólogo na área é mostrar às organizações que esses paradigmas podem ser modificados. A Green. é importante que o psicólogo compreenda as especificações de nosso trabalho”. por conveniência. diz. “O entrave maior é quando mantém essa atitude e adotam. Zanelli adverte que não se pode confundir o fenômeno psicológico com o administrativo. Para o professor. acima de tudo. De acordo com o professor.
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