UMA HIPÓTESE DIAGNÓSTICA

March 25, 2018 | Author: Dil Lima da Silva | Category: Learning, Psychological Concepts, Psychology & Cognitive Science, Behavioural Sciences, Cognition


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UMA HIPÓTESE DIAGNÓSTICA: Elementos de um Informe Psicopedagógico Seilla Carvalho* O Informe Psicopedagógico, Informativo ou Laudo é um documento organizado porescrito, comunicando o desenvolvimento de determinado processo de análise e avaliação diagnóstica. Nele é registrado o motivo da avaliação (encaminhamento), período e número de sessões, instrumentos utilizados, descritivo das dimensões do sujeito, síntese dos resultados, o prognóstico, recomendações e as indicações de atendimentos (Psicopedagogia, Fonoaudiologia, Clínica Pediátrica, Neurologia, Psicoterapia). Após a finalização do processo diagnóstico e já com a Hipótese Diagnóstica formulada é feito o agendamento da reunião destinada à devolutiva. Este documento é entregue à pessoa/pessoas ou equipe que encaminhou, apontou, discorreu, ilustrou, ou apresentou a “queixa” da dificuldade de aprendizagem do educando, criança ou jovem. É importante salientar que o processo de avaliação psicopedagógica implica numa tentativa de compreender a dificuldade de aprendizagem ou o fenômeno do fracasso escolar em sua pluricausalidade, de forma sistêmica, dentro de uma visão gestáltica, contextualizando as “facetas” de determinado comportamento ou sintoma apresentado pela criança/jovem. E para tanto se utiliza de uma metodologia que objetiva analisar os resultados considerando os aspectos: orgânico/corporal, cognitivo, social, emocional e pedagógico. As etapas a serem cumpridas e abordagem utilizada para se estruturar uma Sequência Diagnóstica passa por variações a depender da linha de atuação do profissional e segundo a necessidade de cada caso. Conforme WEISS (2004), “existem pacientes que não aceitam sessões diagnósticas formais. Tornando-se necessário, então, fazer uma avaliação ao longo do próprio processo terapêutico.” (...) “ao final do diagnóstico psicopedagógico, o terapeuta já deve ter formado uma visão global do paciente e sua contextualização na família, na escola, no meio social em que vive”. A título de socialização das informações segue abaixo o exemplo de um Informativo Psicopedagógico resultante na análise e avaliação de um cliente/criança do sexo masculino: Informativo Psicopedagógico xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx(nome cliente)xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx, nascido em __/__/__, atualmente com dez anos e seis meses de idade. Foi encaminhado para avaliação psicopedagógica pela Escola X. O encaminhamento psicopedagógico partiu da queixa de que o sujeito em questão tem um comportamento agressivo, não atende às regras, é desinteressado pelas atividades escolares e tem limitações quanto à socialização. A avaliação se deu no período de __/__/__ a __/__/__, com dois encontros semanais de com duração de 60minutos totalizando 32 horas de análise diagnóstica. Na consecução do diagnóstico foram utilizados os seguintes recursos avaliativos: Entrevista de Aproximação com a professora; - Entrevista Exploratória com a responsável (neste caso, a tia) pela criança; Contato de Estabelecimento Vincular (CEV); Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem (EOCA); Observação de algumas aulas; Verificação das atividades pedagógicas; Observação da criança durante o recreio; Testagem com Arranjo de Figuras; - Desenho Projetivo: HTP-F (Casa, Árvore, Figura Humana, Família); - Saco Psicopedagógico: Trabalho Operativo Centrado no Aprendizado e no Desenvolvimento da Ação (TOCADA); - Provas Projetivas: Parelha educativa, O Plano da sala de aula, Os quatro momentos de um dia, O dia do meu aniversário; Quebra-Cabeça Projetivo “Eumundo”; Organização de Historietas; Jogo de Memória; - Testes de Psicomotricidade: Posição no Espaço, Relações Espaciais, Coordenação Visual Motora; - Provas Operatórias: Conservação da Quantidade de Matéria; Conservação de Pequenos Conjuntos Discretos de Elementos; Quantificação da Inclusão de Classes; Anamnese. Após a análise dos dados obtidos durante o processo de investigação foi possível constatar que o comportamento apresentado até então pela criança reflete questões múltiplas resultantes da construção e constituição do sujeito e das relações estabelecidas com os seres e com o mundo. Observando as áreas específicas que compõem o ser em sua totalidade, foi identificado que: No aspecto orgânico e corporal o analisado apresentou dificuldades quanto à psicomotricidade e coordenação motora fina, bem como no que tange à lateralização e relações espaciais. Apresenta alterações na visão visto que a criança tem dificuldades nas visualizações gráficas à distância e apresenta o incômodo com uma insistente coceira nos olhos. Sua alimentação é deficitária para suprir as carências nutricionais e a recusa da alimentação salgada pode indicar uma infestação por verminoses. Na área cognitiva detectou-se alterações importantes quanto à atenção, memória, antecipação, classificação e percepção dificultando as globalizações visuais; Dificuldades nas relações espaços-temporais, de causalidade além limitações quanto as operações de cálculo mental e conceito de número – que evidencia um estágio de pensamento operacional-concreto inicial com predomínio no intuitivo; Deficiências quanto à competência lingüística, pois identifica as vogais, reconhece algumas consoantes, mas não faz a relação entre grafema e fonema, apresentando leitura e escrita no nível silábico além de sérias limitações na interpretação de fatos e na associação de idéias. No nível emocional foi percebido sentimentos de desconfiança, desproteção, abandono, medos generalizados e baixa auto-estima, além de insegurança nas relações familiares e sociais impedindo assim, vínculos importantes para o seu desenvolvimento afetivo; a angústia, o medo e as tensões são direcionadas para área corporal nos arroubos de impaciência, agressividade e na enurese noturna. A construção de baixa auto-estima como elemento marcante do meio em que está inserido tem sido um ponto que limita este sujeito no aspecto social, pois, o contexto em si assinala carências e dificuldades estruturais minimizando-lhe as potencialidades. Essas dificuldades têm sido pontuadas e reforçadas pela instituição escolar que ainda expressa seus rituais excluindo o diferente, classificando-o como „menos apto‟ e desconsiderando a singularidade do ser em permanente construção. Daí é percebido o distanciamento e a inércia do sujeito nas ações operativas que são de suma importância para a autonomia e liberdade de pensamento. No aspecto pedagógico apresenta uma modalidade de aprendizagem marcada pelo aparecimento de condutas dependentes. Ele não toma iniciativa, é queixoso e precisa ser conduzido nas suas produções bem como necessita de aprovação constante no trabalho que realiza. Esse comportamento representa ser o fruto dos constantes fracassos no seu processo de conhecimento, sendo um tipo de conduta que representa obstáculos quanto à construção dos vínculos com as primeiras aprendizagens e a relação estabelecida com os ensinantes. Em síntese, estes aspectos, ao serem analisados separadamente configura um quadro com pistas que podem explicitar mais claramente as causas do comportamento apresentado pelo analisado. Ao integrar os resultados obtidos durante todo o processo de investigação à queixa inicial podemos entender o que sinaliza o sintoma – um comportamento expresso pela agressividade, desinteresse, indisciplina. Sendo assim, perceber o ser integral possibilita entender o que ele traz em sua superfície, o que ele apresenta como comportamento destoante e que surpreende a escola e a família. O indivíduo em estudo traz um histórico de vida marcado por: - Debilidade do vínculo materno e familiar bem como carências quanto ao suprimento de suas necessidades básicas no que diz respeito ao orgânico e psicoafetivo; - Um meio familiar e social que não possibilitou construções enriquecedoras quanto ao seu conhecimento de mundo; - Construção de baixa auto-estima produzida pelo recorrente fracasso escolar; - Inadequação pedagógica favorecida por um modelo de aprendizagem limitado ao princípio de acomodação cognitiva, descontextualizado e pautado no estímulo à dependência e nos recursos básicos da memorização. Em suma a hipótese diagnóstica evidencia obstáculos que diz respeito à falta de conhecimento de determinados conteúdos que permita ao sujeito novas elaborações do saber. E revela obstáculos relacionados à vinculação afetiva que se estabelece com as situações de aprendizagem, podendo se apresentar de diferentes formas e múltiplas motivações. A criança apresenta uma modalidade de aprendizagem em desequilíbrio quanto aos movimentos de assimilação e acomodação; sintomatizada na hiperacomodação. Visto que evidencia pobreza de contato com o objeto necessitando em todo momento de aprovação e de modelos a serem seguidos. Faz-se necessário que tenha a oportunidade de se sentir como alguém capaz de conhecer e que sejam estabelecidas novas vinculações com a aprendizagem escolar. Cabendo a família e a escola gerarem estímulos significativos para que se estruturem nesse indivíduo novas formas de pensar o mundo. Dando condições de uma aprendizagem que o realize como cidadão capaz de ler e saber interpretar o mundo a partir do seu desejo de conhecer e de crescer. Pois, caso contrário, o resultado poderá ser configurado nas constantes reprovações ou em possíveis aprovações compulsórias diante do avançar cronológico da idade, porém, sem evolução quanto à construção de saberes e ressignificação de conhecimentos. E teremos mais um indivíduo talhado para fazer parte de um contingente de “fracassados institucionalizados” pelo estigma do aluno problemático, socialmente carente e com limitações cognitivas incapacitantes para o aprendizado. Portanto, quanto às recomendações necessárias ao desenvolvimento deste indivíduo/criança considera-se: - Intervenção psicopedagógica com inclusão de jogos terapêuticos, técnicas projetivas psicopedagógicas que viabilizem a ressignificação das primeiras modalidades de aprendizagem; - Vivências de movimento e percepção a fim de favorecer a assimilação do esquema corporal; - Atividades contextualizadas de escrita e leitura com a utilização de variados portadores de textos para que a construção das hipóteses lingüísticas possa ser elaborada com segurança; -Troca de professora a fim de que os vínculos afetivos com os elementos da aprendizagem possam ser estabelecidos; - Trabalho pedagógico que considere a singularidade do sujeito dentro do grupo e valorize seu conhecimento de mundo, realizado a partir de um planejamento flexível, com objetivos claros e estratégia metodológica criativa e desafiadora que combine os diferentes estilos de aprendizagem: Sinestésico, Visual, Auditivo; - Diagnóstico clínico com pediatra a fim de investigar os níveis de vasopressina produzidas durante o sono, exame parasitológico e avaliação oftalmológica. Referências Bibliográficas: BARONE, L. M. C. E Ler o Desejo ao Desejo de Ler. Petrópolis, Vozes, 1993. HAMMER, Emanoel F. Aplicações Clínicas dos Desenhos Projetivos. Rio de Janeiro. Interamericana, 1981. LAJONQUIÈRE de L. De Piaget a Freud: a (psico) pedagogia entre o conhecimento e o saber. Petrópolis. Vozes, 1993. LOWEN, Alexander. O Corpo Traído. São Paulo, Summus Editorial, 1979. LUQUET, G. H. O Desenho Infantil. Trad. Maria Teresa Gonçalves de Azevedo. Porto: Livraria Civilização, 1979. LUZ BORGES A. Te – Sendo Fios de Conhecimento: o paradigma a construção do ser e do saber. Rio de Janeiro. Uapê, 2005. MAC DONNEL, J. J. C. Manual das Provas de Diagnóstico Operatório. Tradução: Simone Carlberg. Apostila, 2006. PAIN, Sara. A Função da Ignorância. Porto Alegre. Artes Médicas, 1988, Vol 1. _________. Diagnóstico e Tratamento dos Problemas de Aprendizagem. Porto Alegre, Artes Médica, 1986. PIAGET, Jean. A Equilibração das Estruturas Cognitivas. Trad. Marion Merlone dos Santos Penna. Rio de Janeiro: Zahar, 1976. WEISS, M. L. L. Psicopedagogia Clínica: uma visão diagnóstica dos problemas de aprendizagem escolar. Rio de Janeiro, DP&A, 2004. _________________________________________________________ *Seilla Regina Fernandes de Carvalho – Pedagoga (UNEB-BA), Psicopedagoga Clínica e Institucional (FAP-PR), com Formação na Docência do Ensino Superior, Mediadora em Cursos de Aperfeiçoamento e Formação Continuada dos Profissionais de Educação; Orientadora em Projetos de Educação Sexual de Crianças e Adolescentes; Consultora Educacional e Co-autora, com João Beauclair, do livro “Sinergia: aprender e ensinar na magia da vida” (no prelo). Contato: [email protected] , [email protected] Joao Beauclair
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