Texto IV Senalic 71

March 21, 2018 | Author: Thiago Cardassi | Category: Greek Mythology, Dionysus, Poetry, Theseus, Death


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Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, V. 4, 3 e 4 de maio de 2012.ISSN: 2175-4128 1 DIONÍSIO: O DUPLO E A ALTERIDADE EM JÚBILO, MEMÓRIA, NOVICIADO DA PAIXÃO DE HILDA HILST Euler Lopes Teles (UFS) INTRODUÇÃO O objetivo deste artigo é debruçar-se sobre a obra poética da escritora Hilda Hilst com a finalidade de perceber de que forma o duplo opera na literatura contemporânea brasileira. Para tanto, o poema I inserido na Ode descontínua e remota para flauta doce e oboé. De Ariana para Dionísio, presente na obra Júbilo, Memória, Noviciado da Paixão (1974) servirá como corpus de análise. Este trabalho também tem como finalidade perceber como a alteridade corrobora para o surgimento do duplo. Primeiramente, investigaremos a imagem de Dionísio e Ariana para perceber de que forma esse deuses foram remitologizados na poética da escritora paulistana. Para isso, serão utilizados os estudos de Jean Peirre Vernant e Junito de Souza Brandão. Através desses suportes teóricos comprovaremos a relação do deus Dionísio com a alteridade. Em seguida daremos enfoque ao estudo cultural, principalmente a partir dos estudos de Kathryn Woodward, Stuart Hall, Tomaz Tadeu Silva e Zygmunt Bauman, para entender a alteridade e sua relação com a identidade. Posteriormente, traçaremos a relação entre a alteridade – e o seu correlato, a identidade – com a onde esse outro geralmente está ausente e distante. Eduardo Kalina e Santiago Kovadloff. utilizaremos os estudos de Nicole Bravo. Para tanto. entre crônicas. teatro – toda sua obra teatral condiz ao período dos anos 60 – e prosa.Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS. questionamento da existência. é composta por dez poemas onde o eu-lírico personifica Ariadne e escreve para um amado que personifica Dionísio. na obra. torna-se necessário conhecer essas figuras e suas narrativas na mitologia grega para entender de que forma elas contribuem para a poética da escritora. A Ode descontínua e remota para flauta doce e oboé. poesias. Noviciado da Paixão Hilda Hilst produz uma poesia voltada para o tema do amor devotado ao outro. V. ISSN: 2175-4128 2 questão do duplo. 3 e 4 de maio de 2012. erotismo. Recorrer a esses mitos nos ajudará a entender esses personagens que são reconfigurados pela escritora e dão voz. Na obra Júbilo. ao amado e a amante. torna-se necessário recorrermos à Mitologia Grega com o intuito de entender a presença das figuras mitológicas Dionísio e Ariana – ou Ariadne. inserida neste livro. Hilda Hilst é uma escritora que produziu avidamente. DIONÍSIO: A FIGURA DA ALTERIDADE. De Ariana para Dionísio. Memória. Para tanto. 4. . Antes de nos atermos à poesia da escritora Hilda Hilst. também pelo teor político e filosófico e principalmente pela temática amorosa. Clément Rosset . Sua literatura é fortemente marcada pelo feminino. que governava a cidade e era a encarnação do deus grego e dos direitos dos homens. o anômico. 4.Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS. desposou-a e levou-a consigo para o Olimpo (BRANDÃO. como deus da vegetação. ISSN: 2175-4128 3 A história de Ariadne envolve outro personagem grego. Teseu. Sobre essa união afirma Brandão (1995): Foi exatamente como deus da vegetação. Teseu a leva para a ilha de Naxos. se apaixona pela beleza da jovem cretense e decide unir-se a ela. em torno de cuja união com o deus. 3 e 4 de maio de 2012. Dionísio que passa pelo local. permitindo com isso que ele não se perca no caminho de volta. indo morar nas montanhas. Na própria narrativa da mitologia grega a imagem de Diónísio condiz com “o marginal. quando este adentra no labirinto do Minotauro. 139) Durante séculos.] Fascinado pela beleza da jovem cretense. V. Com o retorno de Dionísio à Tebas se percebeu a desordem que causa a recusa do outro.. Donísio aproveitando-se da curiosidade de Penteu. onde ele é descoberto pelas mulheres e despedaçado. E quando decide retornar à Tebas faz com que as mulheres se transformem em furiosas assassinas e se desprendam dos valores patriarcais gregos. que Dionísio celebrou um solene híeros gamos com Ariadne. mas na manhã seguinte a abandona sozinha na ilha. Como se a medida que um grupo humano se recusa a reconhecer o outro e abrir-lhe espaço. o estrangeiro. se teceram narrativas romanescas. ao que Dionísio se contrapõe. o vagabundo. Em agradecimento. Dionísio permaneceu confinado no campo. [. o leva às montanhas. na ilha de Naxos.. Isso desperta a fúria de Penteu. É Ariadne quem entrega um novelo de lã para Teseu. esse próprio grupo . 1995. da vida e da morte. p. tece algo . entre as figuras da mitologia grega. ao mesmo tempo em que se revela inacessível e misterioso. um deus de lugar nenhum e de todo lugar [. do que é diferente. estando sempre de passagem. Isso nos interessa. É capaz de estar ausente e presente ao mesmo tempo e não se fixa em nenhum lugar. segundo Louis Gennet. Para Vernant (2006): é um deus errante. Como alteridade. ele “penetra em todos os lugares. Vernant nos mostra que a imagem de Dionísio.. pois. 2006. se comprova a importância da alteridade em sua poética. em todos os meios religiosos” (BRANDÃO. 144). onde exige ser cultuado. em todos os povos. desnorteante. ISSN: 2175-4128 4 se tornasse monstruosamente outro” (VERNANT. desconcertante. o deus Dionísio mantém a sua presença..Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS. Sua relação com os humanos se dá de forma íntima. ele representa entre os deuses gregos. p. 2006.] A um só tempo vagabundo e sedentário. pois não permite enquadramentos. O poema que nos servirá de corpus de análise traz essas duas figuras – Ariadne e Dionísio.o verso. corresponde à alteridade. que assim como Ariadne com seu fio. . o que acontece quando da sua chegada em Tebas. 4.161). p. anômico (VERNANT. Conhecer essas narrativas nos leva a entender que esse conjunto de poemas nos traz algumas súplicas amorosas de um eu-lirico imerso na solidão e no abandono. Dessa forma. 1995. 138). V. em todas as terras. 3 e 4 de maio de 2012. Defini-lo é impossível. p. Um eu-lírico. a partir do momento que esse deus figura na poesia de Hilda Hilst. vagabundo. a figura do outro. V. devido a globalização ela tem sido discutida e repensada. Dionísio . Mas o conhecimento do outro é preciso para entender o seu correlato – a identidade. ou ao “outro”. A identidade depende da diferença. à poesia. Os dois conceitos são (inter) dependentes. relativos ao que não é. frequentemente na forma de oposições” (WOODWARD.Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS. ISSN: 2175-4128 5 E é através da figura da alteridade – no caso. A sociedade contemporânea toma o outro em seu aspecto negativo. Pensar a alteridade é adentrar num campo de forte significação. Muitas vezes são vistas de . Primeiramente é preciso entender que a identidade e a diferença são conceitos que fazem referência um ao outro.que esse eu-lírico se projeta. é Dionísio. convém conhecer sobre esse conceito para entender a sua função dentro da poética da autora. 2000. 41). mas hoje. p. A consciência do outro sempre existiu. As identidades são formadas relativamente ao “forasteiro”. que nos faz ter acesso à Ariadne. o outro. 4. os sistemas são classificatórios. ao afirmar uma identidade trazemos indissociável. o traço do outro. Ou seja. A questão da alteridade Após percebermos a relação da alteridade na poesia de Hilda Hilst. O outro tem fornecido material para estudo de diversos campos dos saberes. estabelecendo distorções. 3 e 4 de maio de 2012. pois é marcada por ela. socialmente ou simbolicamente. “A diferença é aquilo que separa uma identidade da outra. A identidade é vista como aquilo que se é e a diferença como aquilo que o outro é. Como identidade. ISSN: 2175-4128 6 forma negativa (marginalização) ou positiva como fonte de diversidade. p. heterogeneidade e hibridismo. É dessa falta que Ariadne se coloca na busca de se conhecer e se põe em relação ao Outro. 2000. econômicos e culturais.Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS. Isso implica o reconhecimento radicalmente perturbador de que é apenas por meio da relação com o Outro. sem cuja existência ela não faria sentido. Para Bauman (2003). 84). O líquido mundo moderno tem alterado alguns paradigmas e proporcionado uma nova forma de se pensar sobre algumas questões. V. a nova ordem mundial tem fragmentado e fragilizado os sujeitos e suas relações. é preciso repensar o sujeito em sua nova posição descentralizada. com aquilo que tem sido chamado de exterior constitutivo. que o seu significado ‘positivo’ de qualquer termo – e. assim. da relação com aquilo que não é. Como sabemos desde o inicio a diferença é parte atuante da formação da identidade” (SILVA. sua “identidade’ pode ser construído” (HALL. reconhecemos a posição que o sujeito ocupa em determinados contextos. 4. com precisamente aquilo que falta. Em contrapartida. 2000. 110) A identidade é vista como o lugar da dificuldade. Há uma diversidade de posições que podem ser ocupadas ou não. No caso da figura de Ariadne na obra de Hilda Hilst. 3 e 4 de maio de 2012. como a da identidade. “A identidade hegemônica é sempre assombrada pelo seu Outro. atreladas às mudanças que se operam nos setores sociais. onde o outro serve como espelho que reflete o sujeito. p. Falar sobre “identidade” e “crise de identidade” é . a identidade é posta a partir da ausência do seu amado Dionísio. através da poesia de Hilda Hilst está imersa em um processo de crise de identidade. sua face.Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS. 2003. onde se coloca entre esperar o amado. ou desejar sua ausência. Para Woodward (2000): a identidade importa porque existe uma crise de identidade. podemos perceber que a autora destaca a idéia contida nele. Dionísio. que não venhas” (HILST. 2000. pessoalmente e politicamente. ISSN: 2175-4128 7 uma tendência contemporânea que tem a ver com a globalização e as mudanças sociais. 39). localmente. O outro é indispensável dentro desse processo de estabelecer sua identidade. para quem são destinados as odes e sobre quem fala o eu-lírico. e para ele se preparar como amante. muitas vezes por meio da luta e da contestação política. sustentavam a fixação de certas identidades estão entrando em colapso e novas identidades estão sendo forjadas. Os processos históricos que. dela nasce a palavra. 3 e 4 de maio de 2012. pois. nos fornece algumas informações importantes. 4. . por exemplo. “É bom que seja assim. Nele somos informados que a figura de Dionísio. p. As dimensões políticas da identidade tais como se expressam. aparentemente. Por não estar encadeado com outros versos. nos conflitos nacionais e étnicos e no crescimento dos “novos movimentos sociais”. V. p. A Ariadne que temos acesso. 59). globalmente. estão fortemente baseadas na construção da diferença (WOODWARD. o verso. A poesia de Hilda Hilst O primeiro verso do poema que servirá de corpus para esse trabalho. V. Ainda no mesmo verso. Porque é melhor sonhar tua rudez E sorver reconquista a cada noite Pensando: amanhã. É sobre a ausência desse personagem e do que esse fato provoca que vai tratar o poema. A falta e evidente incerteza sobre a vinda de Dionísio é visto positivamente pela amante Ariana? Estaria ela ironizando a sua própria situação de incerteza sobre a chegada dele? Para refletir sobre essas perguntas prosseguiremos na leitura do poema: É bom que seja assim. podemos perceber a ambivalência que se opera no eulírico em relação a seu amado. Que não venhas. 4. . virá. Atento Meu ouvido escutaria O sumo do teu canto. sim. ISSN: 2175-4128 8 não está presente. 3 e 4 de maio de 2012. Voz e vento apenas Das coisas do lá fora E sozinha supor Que se estivesse dentro Essa voz importante e esse vento Das ramagens de fora.Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS. Dionísio. Eu jamais Ouviria. Dionísio. que não venhas. A repetição da vontade de Ariana “Que não venhas. ISSN: 2175-4128 9 E o tempo de amanhã será riqueza: A cada noite. eu Ariana. p. mas dessa vez subentende-se que Ariana põe em dúvida o prazer que a vinda de Dionísio proporcionaria. Como salienta Brandão. a única palavra que pode caracterizar o eu-lírico é o adjetivo “sozinha”.Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS. E o verso a cada noite Se fazendo da tua sábia ausência (HILST. 138). 1995.. tendo como companhia apenas a natureza. Dionísio” (HILST. V. preparando Aroma e corpo. Até então. pois. 2003. a identidade de poeta. 59) Como podemos perceber. o que o eu-lírico julga “bom” não é a ausência do amado. p. Na ausência do amado. 4. . como se a ausência do deus a privasse do contato com os outros. observamos a capacidade da amante de se envolver com Dionísio. mas o estado de lucidez que essa ausência provoca. Os advérbios “fora” e “dento” são importantes para essa percepção. como se o eu-lírico. mas na “presença do deus” ela se torna completamente surda ao mundo de “fora”. p.] todos esses terrores e revelações surgem de uma única fonte: a presença do deus” (BRANDÃO. o erotismo. a verdade universal [. Na terceira estrofe. 2003. “a embriaguez. tal qual Ariadne estivesse abandonada na ilha de Naxos.59) é posta. É embriagada que se sentiria o eu-lírico caso o amado aparecesse. Ariana consegue dar atenção e perceber as coisas ao seu redor. em sua ausência outro papel identitário lhe é imposto.. 3 e 4 de maio de 2012. pois a sua presença a desconcerta. O duplo representa uma saída para lidar com o outro. sendo o melhor caminho rejeitar o seu encontro. pois. É a partir desse conflito de aceitar ou retardar a vinda do amado que Ariana se coloca como poeta. p. Já que o outro nos cria problema. Ariana prefere mantê-lo na imaginação. V. que o eu-lírico se posiciona e se identifica como sujeito que produz poesia. É a ausência-presença do deus que faz surgir o verso. Para tanto é necessário estabelecer uma relação entre a alteridade e a questão do duplo. mostrando como as imagens de Ariana e de Dionísio evocadas no poema da escritora oferecem esse fenômeno. faz surgir a poeta. O surgimento do duplo É interesse desse artigo investigar o surgimento de duplos na poesia de Hilda Hilst. ISSN: 2175-4128 10 O estado de dúvida de Ariana demonstra como o outro pode provocar um conflito de identidade. Esse estado de espera que se renova a cada noite. a imagem de Dionísio como o outro que pode vir a interromper a tranqüilidade de Ariana. 97). “O outro cultural é sempre um problema.Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS. É a partir de então. 4. O duplo surge exatamente do conflito de identidade provocada pela a alteridade. Por mais envolvente que seja o deus Dionísio. O amanhã sempre inatingível é o tempo de refazer os votos e preparar o corpo para prosseguir na espera. coloca permanentemente em xeque a nossa própria identidade” (SILVA. 3 e 4 de maio de 2012. nos desloca da zona de conforto e nos . 2000. 1989. já que a presença de Dionísio elimina a poeta. a promoção do duplo representa uma solução do conflito desferido pela presença desse outro. na sua ausência. ISSN: 2175-4128 11 põe em crise. Dessa forma. Há uma incapacidade de conviver com a alteridade. a Ariana-poeta ou a Ariana-amante? A repetição da palavra “amanhã” no poema sugere uma projeção do tempo e das expectativas que o eu-lírico imagina. é nessa ausência que o verso é feito. afinal. 4. Dessa forma. uma duplicação da realidade. expectativas essas que não são efetivadas. Ariana se apresenta em conflito. onde Ariana teria “preparado aroma e . do amanhã. em crise. Como afirma Rosset (1998) é nessa confusão estabelecida pelo personagem de tentar ser o mesmo e outro onde se encontra a definição do duplo. o surgimento do duplo corresponde a uma fuga do contato com o outro. 3 e 4 de maio de 2012. podemos perceber que toda duplicação supõe o original e uma cópia. o amado não aparece. 53). podemos concluir que há uma projeção. pois. com o outro. O duplo permite aniquilar os sentimentos próprios que convertem esse outro em alguém necessário para nós (KALINA. Na poesia que nos serve de corpus para análise percebemos como Dionísio representa um problema para o eu-lírico. poeta. e vice-versa.Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS. KOVADLOFF. E essas duas identidades são opostas. Na presença dele Ariana é amante. que é ilusoriamente solucionada com a criação do duplo: A ideologia do duplo se assenta no descrédito de uma capacidade de vinculação do homem com seu próximo. p. Uma vez que a paranoia faz do outro um ser não confiável. qual seria a Ariana real. V. Dessa forma. entre a necessidade de esperar o amado e assim preparar aroma e corpo e a necessidade de que ele não venha. 70) . p. ao único. Ocorre a duplicação. porque sou eu quem morro. presenciamos uma Ariana solitária. é uma morte social. é o verso que é tecido na ausência do amado. 1988. podemos perceber a relação do duplo com a morte. que tem como companhia apenas a natureza. embora não seja uma morte física. mas o fato dela não ocorrer. Ao projetar o duplo. Eliminar o duplo significa retornar a realidade. um verso que denuncia uma solidão. Assim. Sobre o distanciamento do eu e sua identificação com o outro. O que realmente se concretiza e é real. mesmo se ela não a tem principalmente em vista(ROSSET. e não o meu duplo: a frase celebre de Pascal (‘morre-se só’) designa muito bem esta unicidade irredutível da pessoa face à morte. e tendo o próprio verso do eu-lírico como testemunha.Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS. Ariana está morta. pois. 2003. 4. Dessa forma. a Ariana-poeta. o que angustia o homem não é a sua proximidade. a ilha de Naxos e privada do convívio em sociedade. p. ISSN: 2175-4128 12 corpo” (HILST. 3 e 4 de maio de 2012. e que nos revela a Ariana real. V. escreve Clement Rosset: Essa fantasia de ser outro cessa naturalmente com a morte. o som que comprova a sua solidão. o outro aparece como sendo o original e o eu se anula. sabemos que ela é abandonada numa ilha deserta. Rosset (1988) estabelece durante todo o seu texto a idéia de que o duplo é o original. que é constituída por sucessivas faltas de Dionísio. Ao conhecer o mito de Ariana. De certa forma. o eu não consegue se ver como todas as coisas unívocas. 59) e não ouviria o mesmo som da natureza. Tendo a morte como certeza incontestada. Ariana está morta como indivíduo. dialogar também com a teoria do duplo. Conclusão Este trabalho nos permitiu adentrar na obra poética da escritora Hilda Hilst e dessa forma trabalhar com uma das vozes mais marcantes da literatura contemporânea brasileira. e a cada noite renova essa espera. pois. Ela espera o amado. . 4. e morta. 3 e 4 de maio de 2012. Permitiu também perceber de que forma a autora se utilizou das imagens da mitologia grega para tratar de temas como a falta. Também foi possível discutir através dessas imagens personificadas pela poeta. a questão da identidade e da alteridade que são temas recorrentes nos estudos culturais e que dialogam com a questão da contemporaneidade. ISSN: 2175-4128 13 Ariana nega a sua morte social. a de ser poeta.Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS. a solidão e o amor na atualidade. V. Dessa forma. ele a faz esquecer que tem como companhia apenas a natureza. ela deseja a presença de Dionísio. percebemos que a poesia de Hilda Hilst é de fundamental importância para o estudo de questões atuais como a identidade e a alteridade e que também permite abrir a discussão acerca do duplo na literatura brasileira. só. E assim. pois é essa esperança da chegada de Dionísio – que nunca ocorrerá – que evita o encontro do eu-lírico com sua própria realidade. ) Representando a Alteridade. 103HILST. Clément. Nicole Fernandez.). JOVCHELOVITCH. In: ARRUDA. Tomaz Tadeu (org. ISSN: 2175-4128 14 Referências BAUMAN.) . 2003. Carlos Alberto Medeiros. O real e seu duplo: Ensaio sobre a ilusão. 1995. Quem precisa de identidade. e trad. Dicionário de mitos literários. 113140. Angela (org. Júbilo. 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