Teologia Dos Reformadores - Timothy George

March 28, 2018 | Author: Oseias Costa | Category: Protestant Reformation, Martin Luther, John Calvin, Calvinism, High Middle Ages


Comments



Description

TEOLOGIA DOSREFORMADORES TR A D U Ç A O Gérson Dudus Valéria Fontana S O C IE D A D E R E L IG IO S A E D IÇ Õ E S V ID A NOVA SÃO PAULO • 1 9 9 4 ® 1988 de Broadman Press Título do original: Theology o fth e Reformers Revisão de provas Fabiani S. Medeiros Diagramação Roger L. Malkomes Janete D. Celestino Capa Melody Pieratt Coordenação editorial Robinson Malkomes Coordenação de produção Eber Cocareli Publicado no Brasil com a devida autorização e com todos os direitos reservados por SOCIEDADE RELIGIOSA EDIÇÕES VIDA NOVA Caixa Postal 21486, 04698-970, São Paulo, SP. ISBN 85-275-0186-4 Impresso no Brasil. Fevereiro de 1994 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) George, Timothy Teologia dos reformadores / Timothy George ; tradução Gérson Dudus e Valéria Fontana. — São Paulo : Vida Nova, 1993. Bibliografia. ISBN 85-275-0186-4 1. Reforma 2. Teologia dogmática - História Século 16 I. Título. 93-3254 CDD-230.04409031 índice para catálogo sistemático 1. Reforma : Teologia protestante : Século 16 230.04409031 2. Teologia protestante : Reforma : Século 16 230.04409031 CONTEÚDO ABREVIATURAS - 9 PREFÁCIO - 11 1 / INTRODUÇÃO - 15 2 / SEDENTOS POR DEUS: A Teologia e a Vida Espiritual na Baixa Idade Média - 25 - Uma Época de Ansiedade - 25 - A Busca pela Verdadeira Igreja - 33 O Curialismo - 34 O Conciliarismo - 36 Wycliffe e Hus - 38 Os Franciscanos Espirituais - 40 Os Valdenses - 41 - Teologias em Constante Mudança - 42 O Escolasticismo - 42 O Misticismo - 46 O Humanismo - 48 3 / ANSIANDO PELA GRAÇA: Martinho Lutero - 53 - Lutero como Teólogo - 53 Coram Deo - 60 Christus pro M e - 61 Anfechtung - 62 - De Simul a Semper, a Justificação pela Fé Somente - 64 - Deixem Deus Ser Deus: a Predestinação - 74 - Cristo na Manjedoura: o Significado de Sola Scriptura - 80 - “Ela Me é Querida, a Digna Donzela” : Lutero e a Igreja - 87 A Prioridade do Evangelho - 88 A Palavra e o Sacramento - 91 O Sacerdócio de Todos os Cristãos - 96 - “A Mão Esquerda de D eus” : Lutero e o Estado - 98 - Últimas Palavras e Legado - 102 4 / ALGO CORAJOSO PARA DEUS: Ulrich Zuínglio - 109 - O Caminho da Reforma - 109 - Zuínglio como Teólogo - 119 O Criador em Vez das Criaturas - 121 A Providência em Vez do Acaso - 123 As Escrituras Sagradas em vez da Tradição Humana - 126 A Religião Verdadeira em Vez da Religiosidade Cerimonial - 130 O Reino Externo em Vez da Moralidade Particularizada - 133 - O Batismo como Evento Eclesiástico - 137 Iniciação e Identificação - 139 O Vínculo da Aliança - 140 O Batismo e a Fé - 142 O Batismo e a Ordem Social - 143 - O Conflito em Tom o da Ceia - 144 Os Antecedentes Medievais - 145 O Contexto Político - 148 O Problema Exegético - 150 A Divisão Cristológica - 152 As Conseqüências Teológicas - 154 - O Coração de Zuínglio - 158 5 / GLÓRIA A DEUS: João Calvino - 163 - A Crise da Teologia Reformada - 163 - O Homem Por Trás do Mito - 167 A Preparação de Calvino - 169 A Conversão de Calvino - 171 A Vocação de Calvino - 175 - Calvino como Teólogo - 185 Os Escritos de Calvino - 185 A Perspectiva de Calvino - 189 - O Deus que Age - 198 O Deus Trino - 198 A Criação - 200 A Providência - 203 - O Cristo que Salva -2 1 2 Harmatologia: a Doutrina do Pecado - 212 Cristologia: a Pessoa de Cristo - 215 Cristologia: a Obra de Cristo - 218 - A Vida no Espírito - 222 A Fé - 223 A Oração - 227 A Predestinação - 230 - Os Meios Externos de Graça - 233 As Pressuposições da Doutrina da Igreja Apresentada por Calvino - 233 A Eclesiologia Bipolar de Calvino - 235 Ecclesia Externa como M ater et Schola - 236 Ordem e Ofício - 238 O Pastor Reformado - 240 A Igreja e o Mundo - 242 - Post Tenebras Lux! - 245 6 / NENHUM OU TRO FUNDAM ENTO: M enno Simons - 251 - A Reforma Radical - 251 - Menno e o Anabatismo - 254 - A Nova Vida - 264 - A Palavra Infalível - 270 - O Senhor Encarnado - 278 - A Igreja Verdadeira - 283 A Congregação - 283 O Batismo - 285 A Ceia do Senhor - 288 A Exclusão - 292 - O Teatro Sangrento - 295 - O Modo Anabatista de Ver - 300 7 / A VALIDADE PERM A N EN TE DA TEO LO G IA DA R E FO R M A - 305 - Soberania e Cristologia - 307 - Escrituras e Eclesiologia - 311 - Culto e Espiritualidade - 314 - Ética e Escatologia - 317 GLOSSÁRIO - 321 ÍNDICES - 327 ABREVIATURAS CNTC CO CR CWE CWMS EE LW MQR Os PL SAW WA W A BR W A DB W A TR Z Calvin’s New Testament Commentaries, David W . Torrance e Thomas F. Torrance, eds. 12 vols. Grand Rapids: Eerdmans, 1959­ 1970. Ioannis Calvini opera quae supersunt omnia. G. Baum, E. Cunitz e E. Reuss, eds. 59 vols. Brunswick e Berlim: Schwetschke, 1863­ 1900. Corpus Reformatorum. Halle/Saale, 1835-1860; 1905-. Collected Works o f Erasmus. Toronto: University of Toronto Press, 1974-. The Complete Writings o f Menno Simons, John C. W enger, ed. Scottdale: Herald Press, 1956. Opus epistolarum Des. Erasmi Roterodami. 11 vols. Oxford: Oxford University Press, 1906-1947. Luther’ Works. Jaroslav Pelikan e H. T. Lehmann, et al., eds. The Mennonite Quarterly Review. Joannis Calvini Opera Selecta, P. Barth, W. Niesei e D. Scheuner, eds. 5 vols. Munique: Chr. Kaiser, 1926-1962. Patrologia Latina, J. P. Migne, ed, Paris: 1844-1864. Spiritual and Anabaptist Writers, George H. Williams e Angel M. Mergaí, eds. Filadélfia: Westminster Press, 1957. D. M artin Luthers Werke. Kritische Gesamtausgabe. 58 vols. Weimar: Böhlau, 1833-. Briefwechsel (Carias de Lutero, 14 vols, na W eimar Edition). Deutsch Bibel (Bíblia Alemã de Lutero, 12 vols, na W eimar Edition). Tischreden (Conversa de Mesa de Lutero, 6 vols, na W eimar Edition). Huldreich Zwinglis Sämtliche Werke, Emil Egli, Georg Finsler, et al. , eds. Berlim, Leipzig, Zurique: 1950-. conforme o grande hino de Lutero o expressa.PREFÁCIO Certa vez. 387. p. além de muitos outros discutidos neste livro. The Emergence o f the Catholic Tradition (Chicago: University of Chicago Press. e seu destaque à centralidade e ao caráter infalível de Jesus Cristo permanecem em acentuado contraste com as teologias enfraquecidas ’A. A Reforma não foi simplesmente uma tempestade em copo d’água. 2Jaroslav Pelikan. 1971). quando lia as cartas do apóstolo Paulo. L. Rowse. são profundamente indiferentes às minúcias da teologia da predestinação ou do fundamento lógico a favor da — ou contra a — prática do batismo de crianças. Na melhor das hipóteses. ensinado e confessado com base na Palavra de Deus” . não têm uma influência mensurável sobre o produto interno bruto. Os teólogos contemporâneos fariam bem em ouvir novamente a mensagem desses cristãos corajosos que desafiaram imperadores e papas.2 Sem dúvida. e pressupõe que não foram nem inúteis nem tolas. porque suas consciências estavam cativas à Palavra de Deus. para os que se mantêm comprometidos com a tradição cristã. L. p. na medida em que constituem um capítulo importante na história do que a igreja de Jesus Cristo “tem crido. 1950). Rowse reclamou que “o século x v i está repleto de discussões tolas e inúteis sobre doutrina” . entender o que estava tão decisivamente em jogo nos grandes debates da Reforma é uma questão de inegável interesse.1 Este livro trata essencialmente de tais discussões. Os mesmos trovões também ecoam mediante os escritos dos reformadores. podia ouvir trovões. Jerônimo disse certa vez que. o Senhor Deus Sabaote. . Esses temas. 1. Entretanto. Seu evangelho da graça livre do Deus todo-poderoso. reis e câmaras municipais. podem vir a calhar num jogo banal de preocupações teológicas de menor peso. a maioria das pessoas que vivem deste lado do Iluminismo. numa sociedade secular e pluralista. o célebre estudioso elisabetano A. The England o f Elizabeth (Londres. e demasiado transcendentais que dominam o cenário atual. Não é o propósito deste estudo canonizar os reformadores. O século x v i foi uma época de violência e coerção, e os principais reformadores não eram de todo destituídos de fanatismo e intolerância. Os anabatistas, que também tinham seu lado ruim, proporcionaram um testemunho contrário a esse respeito, um testemunho que ainda precisa ser ouvido neste nosso século dominado pela violência. A invectiva de Lutero contra os judeus, a ^cumplicidade de Zuínglio no afogamento dos anâbãtistãs~~è~ã^de Calvino quando Servêfõ foi qüêimMõ“sãõ^xfifèmamente trágicas, porque se sente que, dentre todos, não deveriam ter tido atitudes como essas. Contudo, o que é notável nos reformadores é que, apesar de seus pontos fracos, pecados e setores cegos, eles foram capazes de apreender com muita perspicuidade o caráter paradoxal da condição humana e a grande possibilidade de redenção humana mediante Jesus Cristo. Esse interesse escorava seu modo de encarar a igreja, o culto, o ministério, a vida espiritual e a ética. Em cada uma dessas arenas, precisamos demais ouvir o que eles têm a dizer. Grande parte desta obra foi composta durante um ano de licença na Suíça. O Prof. H. Wayne Pipkin, do Seminário Teológico Batista de Rüschlikon, emprestoume muitos livros de sua valiosa coleção e teceu comentários proveitosos sobre o capítulo que trata de Zuínglio. O Prof. Fritz Büsser, do Institute für Schweizerische Kirchengeschichte, em Zurique, e os Drs. Pierre Fraenkel e Irena Backus, do Institut de la Reformation, em Genebra, receberam-me de forma calorosa e colocaram à minha disposição os excelentes recursos de suas instalações respectivamente. O Prof. Jan Lochman, da Universidade de Basiléia, foi um agradável anfitrião em minhas freqüentes visitas à cidade onde as Instituías de Calvino foram publicadas pela prim eira vez, em 1536. Parte do capítulo 4 veio a lume anteriormente como “ThePressupositions of Zw ingli’s Baptismal Theology” , em Prophet, Pastor, Protestant: The Work ofH uldrych Zwingli After Five Hundred Years, publicado por E. J. Furcha e H. Wayne Pipkin. Agradeço a permissão de reproduzir esse material. Trechos deste livro foram apresentados originariamente como palestras a estudantes de teologia e pastores em diversos contextos. Tenho uma dívida para com os que me ouviram e fizeram valiosas sugestões, na Furman Pastors’ School, Furman University, em Greenvile, Carolina do Sul; no Union Theological Seminary, em Richmond, Virginia; na Wake Forest University, em WinstonSalem, Carolina do Norte; nos seminários batistas em Novi Sad, Iugoslávia, e em Budapeste, Hungria; e no Colóquio de Amsterdã sobre o Anabatismo, em 1986, patrocinado em conjunto pelo Doopsgezind Seminarium e pelo Theologisch Instituut da Universidade de Amsterdã. Meus alunos do The Southern Baptist Theological Seminary, em Louisville, Kentucky, serviram de sementeiras em que minhas idéias puderam crescer e ser testadas. Meus colegas dos departamentos de história eclesiástica e teologia foram notavelmente tolerantes com alguém que tem afirmado, um tanto de encontro ao consenso predominante L < j hp “rpformado” e “batista” (^Q -kãotermos mutuamente excludentes. Desde o início de meu cargo no cõrpo~3õcente, õ Diretor"Roy L. Honeycutt tem sido incansável em seu apoio a mim e à disciplina pela qual sou responsável. Gaylyn Bishop, Connie Easterling e Jackie M orcom dispensaram assistência qualificada e prestimosa na preparação deste manuscrito para a impressão. Barbara Bruce, uma candidata a doutorado em história eclesiástica, interrompeu sua tradução das homilias de Orígenes sobre Josué para preparar o índice deste livro. Assim como os escritos das quatro personagens de envergadura estudadas na presente obra, este livro foi escrito entre as lutas e alegrias da vida familiar cotidiana. Agradeço o apoio amoroso dado por minha esposa Denise, por si mesma autora talentosa e minha querida e especial Katie von Bora. Deve ficar registrado que, no momento em que este livro começa a ser impresso, meu filho Christian, de seis anos de idade, já dominou as dez primeiras perguntas do Catecismo de Calvino, enquanto minha filha Alyce, de quatro anos, está tendo bom desenvolvimento no Credo dos Apóstolos. Finalmente gostaria de mencionar os eruditos com quem estudei história e teologia da Reforma: os professores William J. W right, James S. Preus, A rthur C. M cGill, Caroline W alker Bynum, Donald R. Kelly, David C. Steinmetz, Ian D. K. Siggins, Heiko A. Oberman, John E. Booty, Peter J. Gomes e o último, mas não menos importante, George Huntston Williams. A cada um deles devo muito mais do que um reconhecimento preambular possa manifestar. Esta obra é dedicada ao Prof. W illiams, meu mentor e amigo, fonte contínua de estímulo e inspiração durante sete anos de estudos de graduação e pós-graduação na Harvard Divinity School. Um dos principais historiadores eclesiásticos do século XX, o Prof. Williams foi meu modelo para as duas qualidades exigidas de qualquer pessoa que aspire à profissão de, conforme Cotton M ather certa vez chamou, “lembrete do Senhor” : uma reverência crítica pela tradição cristã em todas as suas diversas modalidades e um sentimento de membro da igreja universal, o corpo de Cristo espalhado no tempo e no espaço. Este livro é dedicado ao Prof. Williams com afeição e estima, em pagamento parcial de um débito que nunca poderá ser liquidado. T imothy G eorge , The Southern Baptist Theological Seminary, Louisville, Kentucky. Dia de Reis, 1987. INTRODUÇÃO Em 1518,o estudioso holandês Desidério Erasmo, havendo completado 51 anos de idade e crendo na iminência de sua morte, desejou ser rejuvenescido alguns anos por “esta única razão: creio que vejo uma idade de ouro irrompendo no futuro próxim o” .1 Pensando no passado, parece que Erasmo estava indevidamente pessimista sobre o fim de si mesmo — ele ainda tinha quase 20 anos mais para viver — e excessivamente otimista a respeito de sua época. Sua visão precipitada de uma “era áurea” de paz e erudição desapareceria em breve diante de uma renovada guerra entre o papa e o imperador, revoltas de camponeses, o ataque dos turcos no Oriente e, acima de tudo, uma crise religiosa de impacto profundo. Essa crise, que chamamos de Reforma, sacudiria os alicerces da cristandade ocidental, deixando a igreja permanentemente dividida. Antes de m orrer, em 1536, Erasmo referia-se a sua época como “o pior século desde Jesus Cristo” .2 Contudo, essa avaliação negativa deve ser disposta ao lado de outras mais positivas. Dessa maneira, o teólogo presbiteriano escocês W illiam Cunningham iniciou seu vasto estudo da teologia da Reforma com a ousada declaração de que a Reforma do século xvi “foi o maior evento, ou série de eventos, desde o encerramento do Cânon das Escrituras” .3 De modo similar, o filósolo Hegel, outro tipo de protestante, referiu-se à Reforma como “o sol que a tudo ilumina e que ‘O tema da “idade de ouro” é assunto recorrente nos primeiros escritos de Erasmo. Compare sua exclamação no Panegírico escrito em 1504 para o Arquiduque Filipe da Áustria: “Ó feliz época nossa, idade verdadeiramente áurea, quando [...] toda a colheita das virtudes daquela idade da inocência é renovada, restaurada à vida e floresce novamente!” (CWE 27, p. 48). 2EE IV, n.° 1239. 3William Cunningham, The Reformers and the Theology o f the Reformation (Edimburgo: T. and T. Clark, 1866), p. 1. sucede aquela aurora do final da Idade M édia” .4 Até bem recentemente, a interpretação que se tivesse da Reforma dependia, quase invariavelmente, dos compromissos confessionais ou ideológicos anteriores. Adeptos do catolicismo romano, começando com Johannes Cochlaeus, no século x v i, e chegando a Heinrich Denifle e Hartmann Grisar, no século XX, não têm sido vacilantes em sua insistência em que a Reforma foi — para não dizer coisa pior — um erro. Quais foram as causas? Lutero, um monge louco impelido por narcisismo e compulsão sexual; os príncipes alemães, autocratas avarentos e auto-indulgentes; os pregadores protestantes, padres renegados dispostos a vender suas almas para tornar-se femeeiros. E as conseqüências? Igualmente óbvias: o rasgar do manto sem costura da civilização medieval, a divisão entre fé e razão, natureza e graça (tão perfeitamente harmonizadas por Tomás de Aquino), e a liberação das forças do absolutismo, do nacionalismo e do secularismo. Os polemistas protestantes, por sua vez, revidaram as ridicularizações católicas na mesma moeda. Em 1564, Jerome Rauscher, capelão da corte protestante, publicou um tratado intitulado Cem Grandes, Selecionadas, Vergonhosas, Lucrativas, Lavadas e Ofensivas Mentiras do Papa. Lutero, Zuínglio e Calvino, líderes do movimento protestante, eram descritos como heróis da fé. Suas palavras e obras ganharam importância cósmica no desenrolar da história da salvação.5 Na tradição do protestantismo liberal, os reformadores eram freqüentemente enaltecidos, não em virtude das doutrinas reformadoras em si, mas a despeito delas. Para Hegel, a Reforma e especialmente Lutero constituíram um momento crucial na história do pensamento, visto que foi nessa conjuntura que o conceito da liberdade humana tornou-se conspícuo. Assim, ele reduziu a teologia da Reforma à expressão: “O homem está destinado por meio de si mesmo a ser livre” .6 Nessa perspectiva, a Reforma foi apenas a prim eira fase do Iluminismo; Lutero e Calvino, os precursores de Rousseau e Voltaire! O historiador alemão Leopoldo von Ranke inaugurou uma nova era na historiografia da Reforma, ao publicar seu monumental livro A História Alemã na Época da Reforma (1839).7 Embora reconhecidamente luterano, Ranke procurou elevar-se acima do preconceito denominacional. (Ele também escreveu uma história dos papas, a fim de provar a sua imparcialidade!) Ranke destacou a interação entre 4H. Glöckner, ed., Georg Wilhelm Friedrich Hegel, Sämtliche Werke, (Stuttgart-Bad Constatt, 1956-1965), XI, p. 519. Quanto a Hegel como intérprete de Lutero, veja Gerhard Ebeling, “Luther and the Beginning of the Modern Age” , in: Luther and the Dawn o f the Modern Era, Heiko A. Oberman, ed. (Leiden: E. J. Brill, 1974), pp. 11-39. 5Gordon Rupp, “The Righteousness of God: Luther Studies” (Londres: Hodder and Stoughton, 1953), p. 20. 6Werke, XI, p. 524. ’Leopold von Ranke, Deutsche Geschichte im Zeitalter der Reformation (Leipzig: Duncter and Humblot, 1873). religião e política no período da Reforma e insistiu no uso amplo e importante das fontes originais. O objetivo próprio do historiador, conforme definido por Ranke, é conhecer e reconstruir o passado verdadeiro wie es eigentlich gewesen ( “como aconteceu realmente ”). Foi enorme a influência de Ranke na historiografia posterior da Reforma e, sem dúvida, no estudo da história em geral. Seu destaque ao uso escrupuloso das fontes tem elevado o estudo crítico da Reforma a novo nível. As obras de Lutero, Zuínglio e Calvino, bem como as de muitos católicos e reformadores radicais, têm sido publicadas desde então em edições críticas modernas. Hoje se sabe muito mais da complexidade dos fatores políticos, sociais e culturais que caracterizaram a Reforma. Ao mesmo tempo, o desejo de Ranke por um a história completamente objetiva não foi cumprido. Nem pode mesmo. A história nunca é o simples recontar do passado como realmente foi. É, inevitavelmente, uma interpretação do passado, uma visão retrospectiva do passado limitada tanto pelas fontes em si quanto pelo historiador que as seleciona e interpreta. Perspectivas em Estudos da Reforma Os estudos atuais da Reforma abrangem uma variedade de abordagens contraditórias. Antes de expor o objetivo e a perspectiva deste livro, examinemos três áreas gerais de interesse de estudos eruditos contemporâneos sobre a Reform a.8 O Problema da Periodização Lorde Acton, ardente estudioso da Reforma, declarou certa vez que os historiadores deveriam preocupar-se mais com os problemas do que com os períodos. A tentativa de situar a Reforma entre a civilização medieval que a precedeu, de um lado, e a cultura moderna que a seguiu, de outro, tem-se mostrado excessivamente inepta. No início deste século, Ernst Troeltsch sustentou que a Reforma, em suas tendências seminais, pertencia à cosmovisão “autoritarista” da Idade Média. A ruptura para os tempos modernos não ocorreu no século xvi, com a Reforma, mas no xvill, com o Iluminismo. Troeltsch foi refutado por Karl Holl, famoso historiador da igreja e especialista em Lutero, que afirmou haverem Lutero e os reformadores prognosticado muitos progressos positivos na cultura moderna, notavelmente nos conceitos de personalidade e de 'U m a útil introdução à historiografia da Reforma encontra-se em Lewis W. Spitz, ed., The Reformation: Basic Interpretations (Lexington, Mass.: D. C. Heath, 1962). Cf. também Hans J. Hillerbrand, Men and Ideas in the Sixteenth Century (Chicago: Rand McNally, 1969), pp. 1-8. comunidade.9 Estreitamente relacionada a esse debate encontra-se a questão da relação da Renascença com a Reforma. A palavra Renascença, originariamente apenas um termo na história da arte, veio a representar um período de florescimento cultural — intelectual, literário, artístico — que passou impetuosamente pela Itália e depois pelo norte da Europa, do século xiv até o xvi. Afirma-se freqüentemente que o elo entre a Renascença e a Reforma é o Humanismo, que se refere não a uma filosofia de vida antropocêntrica, mas, sim, a um padrão de educação e ativismo modelado com base numa reverência pararreligiosa pela precedência clássica. O Humanismo influenciou profundamente todas as ramificações da Reforma. Lutero desenvolveu seu discernimento na teologia paulina ao usar a edição do Novo Testamento grego de Erasmo. Zuínglio, Calvino, Melanchton e Beza, entre muitos outros, estavam profundamente envolvidos nos estudos humanísticos antes de abraçarem a mensagem protestante. Todavia, não podemos simplesmente igualar o humanismo à Reforma; pois, a exemplo do cisma luterano, um humanista estava dividido de outro humanista de forma tão profunda quanto um protestante de um católico. Foi a Reforma o cumprimento ou a antítese da Renascença? Enno van Gelder advogou esta última, alegando que a Reforma estava, de modo geral, em desavença com os elementos positivos da Renascença demonstrados por eruditos como Erasmo e M ontaigne.10 Por outro lado, W illiam Bouwsma chamou a atenção para a importante relação entre as profundas tensões da cultura renascentista e as soluções oferecidas pelos reformadores protestantes. Assim, referiu-se à Reforma como “a concretização teológica da Renascença” .11 O problema da periodização tem resistido a um consenso fácil. A Reforma, claro, estava ambígua e ecleticamente relacionada com os impulsos tanto medievais quanto modernos. Heiko A. Oberman, cuja pesquisa sobre a última fase do contexto medieval da Reforma pareceria validar a tese de Troeltsch, tem, contudo, encontrado “as dores de parto da Era M oderna” em três características da última 9Cf. Ernst Troeltsch, Protestantism and Progress: A Historical Study o f the Relation o f Protestantism to the Modern World (Londres: Williams and Norgate, 1912). A produtiva dissertação de Holl, “Was verstand Luther unter Religion?” foi traduzida em What D id Luther Understand by Religion? James Luther Adams e Walter Bens, eds. e trads. (Filadélfia: Fortress Press, 1977). Veja também Holl, The Cultural Significance o f the Reformation (Nova Iorque: Meridian, 1959). 10H. A. Enno van Gelder, The Two Reformations o f the Sixteenth Century (The Hague: Martinus Nijhoff, 1961). Podemos comparar a tese de Gelder à declaração mais contundente de Friedrich Nietzsche: “Se Lutero tivesse sido queimado, como Hus, o início do Iluminismo talvez teria ocorrido um pouco antes, e mais esplendidamente do que podemos agora imaginar”. Nietzsches Werke (Leipzig, 1899-1904), I, ii, pp. 224-225. “William J. Bouwsma, “Renaissance and Reformation: An Essay in Their Affinities and Connections”, em Oberman, op. cit. pp. 127-149. : Sixteenth Century Journal Publishers. Interpretações Políticas. (Kirksville. Economicamente. Mo. (Leiden: E. 1982). in: The Pursuit o f Holiness in Late Medieval and Renaissance Religions. Brill. J. interpretaram a luta de classes do século xvi como um protótipo das revoluções do século xx. Kyle C. fracassou na França e nunca se enraizou na Espanha somente pode ser compreendida à luz das histórias políticas inconfundíveis desses Estados. agora. Sociais e Econômicas Claramente. Na esfera política. Grimm: Pietas et Societas: New Trends in Reformation Social History. as características da vida urbana. as forças sociais operantes na Reforma têm sido investigadas muito minuciosamente. caracterizada pelo surgimento de um novo tipo de cultura que estava-se. Charles Trinkhaus e H. juntamente com o colapso das economias das terras feudais. A relação entre a Reforma e o surgimento do capitalismo tem sido vastamente estudada e ainda continua a gerar controvérsia. A Historiografia Ecumênica Talvez nenhum estudioso tenha exercido maior influência sobre as interpretações contemporâneas católicas romanas da Reforma do que Joseph Lortz. ed. 1974). eds. o impacto da imprensa. a última tentativa séria de tornar o Sacro Império Romano uma força viável na política européia e o começo das guerras dinástico-religiosas. 3-25. Sessions e Philip N. eds. a Reforma presta-se a um exame desses fatores. Do mesmo modo. A razão por que a Reforma teve sucesso na Alemanha. esforçando para nascer enquanto o velho tipo de cultura ainda estava morrendo. estruturas familiares em mutação — tudo isso afetou diretamente os impulsos religiosos da época. criou uma inflação galopante e um transtorno econômico. A. testemunhou o surgimento da moderna nação-estado. Uma boa amostra da moderna história social da Reforma é encontrada numa obra memorial dedicada a Harold J. Reformation Europe: A Guide to Research (St. Oberman. Oberman.12 Sem exagerar na definição de nossos termos. o influxo de ouro do Novo Mundo. de Friedrich Engels a Gerhard Zschabitz. Louis: Center for Reformation Research. A. pp.fase da Idade Média: 1) a descoberta do método indutivo na pesquisa científica.13 Algumas das interpretações mais criativas da Reforma foram apresentadas por historiadores marxistas que. Temos. Bebb. . é melhor considerar a Reforma uma era de transição. um quadro mais completo das realidade sociais do século xvi: o ressurgimento da bruxaria. “The Shape of Late Medieval Thought: The Birthpangs of the Modern E ra”. 1985). A Reforma na 12H. 2) uma nova visão da dignidade humana baseada numa compreensão pactuai da relação entre Deus e o homem e 3) o preenchimento da lacuna entre o sagrado e o profano.. 13Um levantamento útil das tendências nos estudos da Reforma é Steven Ozment. especialmente dos reformadores. teológicos. em vez daquelas da época que estamos estudando. Uma “escola” inteira de historiadores católicos ecumênicos tem seguido os passos de Lortz. pelo menos relembra-nos de que não podemos começar a avaliar a importância dos primeiros cristãos. o luterano Jorge de Brandenburgo. F. Se não é verdadeira a máxima de F. como os estadistas e os diplomatas modernos. respondeu que em breve se 14Citado de G. in: The Impact o f the Church Upon Its Culture Jerald C. ed. McNeill. Brauerm. . Do lado protestante podemos mencionar o novo interesse pelos reformadores gerado por Emil Brunner. Embora teremos a oportunidade de fazer uma avaliação crítica. 15John T. somos tentados a interpretar o passado sob o aspecto dos padrões contemporâneos. estamos interessados no auto-entendimento teológico de quatro importantes reformadores. quando obrigado pelo Imperador Carlos v a participar de uma procissão de Corpus Christi. por Paul Tillich e especialmente por Karl Barth. Essa tradição de erudição irenista recebeu mais um ímpeto desde o Concílio Vaticano II. seus mais profundos interesses. 168. The Holy Spirit in Puritan Faith and Experience (Oxford: Blackwell. “The Religious Initiative in Reformation History”. não estamos interessados em contar “toda a história” da Reforma. 1946). eram motivados principalmente por interesses seculares.15 Impressionados pelo contexto secular dos eventos atuais. A Reforma como Iniciativa Religiosa Embora as abordagens anteriores à história da Reforma forneçam discernimentos valiosos para a compreensão de um período tão complexo. Nuttall. Nossa principal maneira de ver não são nem as dimensões históricas político-sociais nem as estritamente eclesiásticas. devemos reconhecer que a Reforma foi essencialmente um evento religioso. uma avaliação basicamente positiva de Lutero. p. não devemos prejulgar a validade do pensamento dos reformadores.Alemanha (1939-1940). 1968). ele também tem contribuído para um maior reconhecimento dos reformadores como servos de toda a igreja. É fácil presum ir que os príncipes e os reformadores. McNeill chamou de “a iniciativa religiosa” na história da Reform a. Embora esse destaque tenha sido decididamente confessional em parte (c f a “renascença de L utero” associada com Karl Holl. pp. Antes. seu estudo em dois volumes. ainda que de maneira crítica. Neste estudo. M. rompeu decisivamente com as primeiras polêmicas católicas contra a Reforma e ofereceu. 173-205. mas pelo valor que tinha para o homem que a concebeu”14 —. Tal modo de ver requer aquilo que John T. sem que tenhamos feito a nós mesmos suas indagações e ouvido bem suas respostas. Todavia. Powicke — “uma visão ou teoria não deve ser julgada pelo valor que tem para nós. (Chicago: University of Chicago Press. 16 De igual modo.. Galaezzo Caracciolo. Lutero. as autoridade civis. até a Rússia. a Reforma foi a um tempo reavivamento e revolução. .17 Tais exemplos dão pungência aos versos de Lutero: “ ./ Se tudo se acabar/ E a morte. No entanto. que se espalhou para muito além dos limites de sua nação. pelos magistrados. os reformadores — protestantes. falou por muitos quando disse: “Não há nada por que eu queira quebrar o pescoço” . embora divergisse do outro significativamente.18 A tolerância religiosa era freqüentemente advogada por aqueles menos movidos pela devoção religiosa. É bom lembrar que a época da Reforma produziu mais mártires do que todas as perseguições na igreja primitiva.e . são os co-autores da tradição reformada.. no Ocidente. 1962). o gênio teológico criador de toda a Reforma.Se temos de perder/ Os filhos. este livro oferece um perfil teológico de quatro importantes reformadores do século xvi: Martinho Lutero. bens. Zuínglio e Calvino. como demonstra o caso dos les politiques na França. abrangendo movimentos reformadores desde a Escócia e a França até a Hungria e a Polônia. reformadores de Zurique e de Genebra respectivamente. 18Albert Thibaudet. p. preferiu uma vida de exílio. Early and Medieval Christianity (Boston: Beacon Press. Até o final do século xvi. foram muito ativos nos Países Baixos. foi um reformador magisterial. Lutero. Ele abandonou sua posição de sacerdote da Igreja Romana para tornar-se líder dos anabatistas. sem dúvida.ajoelharia e teria sua cabeça degolada. Certamente. os “luteranos” eram a facção religiosa dominante na maior parte da Alemanha e em toda a Escandinávia. no Oriente. a Suíça. Até o 16Roland H. deixou sua marca notável nos protestantes que abraçaram a Confissão de Augsburgo. Zuínglio e Calvino. Após um capítulo inicial./ Com Ele reinarem os” . Explorando esse profundo reservatório de aspirações espirituais. Cada uma dessas personalidades situa-se na nascente de uma tradição confessional importante na Reforma. católicos e radicais semelhantemente — foram capazes de suas realizações porque estavam sensíveis às mais profundas lutas e esperanças de sua épóca. Nesse sentido. M ontaigne. incluindo-se a separação de sua esposa e seis filhos. m ulher. Essais de Michel de Montaigne (Argenteuil. Os menonitas. os reformadores produziram grande mudança nas sensibilidades religiosas. 164. nem todos na Reforma foram afligidos pelo desejo de martírio. uIbid. 389. Bk. ed. a renunciar à sua fé recémdescoberta. seu movimento de reforma foi endossado. i. chegar. ou menonistas como originariamente chamados. Menno Simons-é um “estranho no ninho” em relação a esse trio. p. Bainton. Ulrich Zuínglio. parente do papa que se converteu à Reforma. enfim. aliás oficializado. no qual são descritas diversas tendências religiosas da última fase da Idade Média. A influência deles foi sentida desde a Inglaterra. João Calvino e Menno Simons. II. Cada um desses três... 1933). um dos grupos mais importantes da Reforma Radical. Muitos outros reformadores poderiam ter sido escolhidos. . os argumentos a favor do batismo infantil ou contra ele são assuntos de sensível insignificância. da segunda. não é outra senão os escritos proféticos e apostólicos tanto do Antigo quanto do Novo Testamento”. o teólogo mediador M artin Bucer — esses e muitos outros bem poderiam servir de prismas na riqueza de diversidade da teologia da Reforma. Calvino e Menno. contudo. de vida e morte. Philip Melanchthon. foram todos teólogos importantes que transmutaram bem como transmitiram as tradições que herdaram. III. Philip Schaff. Os reformadores católicos Inácio de Loiola e Girolamo Seripando. Lutero e Zuínglio foram reformadores da primeira geração. haviam adquirido certo grau de tolerância em alguns lugares. sucessores respectivamente de Lutero. suas vitórias e derrotas são nossas também. questões sobre quem seja Deus. veja Timothy George. Zuínglio encontrou-se uma vez com Lutero. Os quatro reformadores que focalizamos neste livro enfrentaram essas e muitas outras questões com uma 19Jaroslav Pelikan. Miguel de Serveto e Fausto Socino.. 1971). (Nova Iorque: Harper and Bros. sobre qual seja a igreja verdadeira. [o que] confessa e ensina com base na Palavra de D eus” . Para a maioria dos cristãos modernos. Nosso interesse na teologia dos reformadores não é nem um interesse por antigualhas. Baltasar Hubmaier foi mais instruído e Pilgram . Escondidas em tais questões controversas. Suas lutas e dúvidas. 1.M arpeck mostrou-se mais incisivo do que Menno. p. é universal com respeito a tempo e espaço. “Dogma Beyond Anathema: Historical Theology in the Service of the Church”. Creeds o f Christendom. os aspectos intrincados da predestinação. Para um relato mais completo da perspectiva sobre a teologia histórica que fundamenta este estudo. ardentes. Teologia histórica é o estudo daquilo em que “a igreja de Jesus Cristo crê. tentaremos uma investigação profunda de diversas personalidades formadoras.princípio do século x v i i . em vez de uma amostra ampla extraída de uma vasta gama de pensadores religiosos. Entre os anabatistas. os anglicanos Thomas Cranmer e Ricardo Hooker. na época de Menno. Henrique Bullinger e Teodoro Beza. de acordo com a qual todos os dogmas e todos os doutores devem ser avaliados e julgados. Zuínglio e Calvino.19 A igreja de Jesus Cristo. Muitas das questões teológicas com as quais se debateram parecem muito distantes de nossas preocupações contemporâneas. encontram-se outras. viveram sob perpétua ameaça de desterro e morte. 1877). pp. Nesta obra. sobre como a revelação divina foi comunicada. The Emergence o f the Catholic Tradition (Chicago: University of Chicago Press. A definição de Pelikan faz ecoar o artigo inicial da Fórmula da Concórdia: “Cremos. 93-94. ed. contudo. não houve outro contato pessoal entre esses quatro reformadores. Os reformadores que estudamos são tanto nossos pais na fé quanto nossos irmãos na comunidade dos fiéis. in: Review and Expositor 84 (1987). a maneira exata da presença de Cristo na eucaristia. nem obscurantista. confessamos e ensinamos que a única regra e norma. entretanto. . dum antiquorum tractatibus inhaerentes elegantiores eorum sententias. e os soerguemos. speculamur. fiquem certos que sou contra a venda ou troca de todo material disponibilizado por mim. apoderamo-nos de seus pensamentos seletos. sepultados pelo tempo e pela negligência humana. com. teólogo medieval que morreu quase 300 anos antes de Lutero nascer. mas também imitar. quas vetustas aboleverat.20 Todos que são beneficiados pelo que faço. Pedro de Blois. Ocupando-nos com os tratados escritos pelos antigos. por assim dizer. 20PL 207. podemos ver além deles. Criticas e agradecimentos para: mazinhorodrigues(*)yahoo. quorum beneficio longius. b r “ '’ Att: Mazinho Rodrigues. col. quam ipsi.integridade e uma coragem explícita que não podemos somente admirar. quasi nani super gigantum humeros sumus. 290 AB (epístola 92): “Nos. expressou um sentimento de gratidão pelos escritores cristãos da antiguidade que também deveria caracterizar nossa maneira de ver os reformadores do século xvi: “Somos como anões sobre os ombros de gigantes. mesmo sem poder concordar com todas as suas respostas. da morte para uma nova vida” . graças a eles. quasi jam mortas in quamdam novitatem essentiae suscitamus”. Infelizmente depois de postar o material na Internet nâo tenho o poder de evitar que alguns aproveitadores tirem vantagem do meu trabalho que é feito sem fins lucrativos e unicamente para edificação do povo de Deus. hominumve neglectus. os hussitas na Boêmia. De fato. cobiçoso. da desintegração e da decadência. os dois séculos anteriores à Reforma mostraram-se singularmente vitais em face de desafios e mudanças sem precedentes. os séculos x iv e x v tornaram-se terra de ninguém entre a síntese medieval do século xiri. de Johan Huizinga. decaído e fraco. e os grandes movimentos reformadores do século XVI.____________ SEDENTOS POR DEUS____________ A Teologia e a Vida Espiritual na Baixa Idade Média Uma Época de Ansiedade A baixa Idade Média em geral é descrita sobretudo sob o aspecto do declínio. nas peregrinações e nos santos. Época de adversidade e instabilidade. com suas catedrais góticas e sumas escolásticas. velho. Novas formas de piedade leiga. uma interpretação que se reflete no título de um estudo clássico desse período. tratados devocionais no vernáculo. movimentos religiosos populares — os lollardos na Inglaterra. vemos um sólido crescimento no poder e na profundidade dos sentimentos religiosos até a época da Reforma. assim como religiosas. The Waning o f the Middle Ages [O Declínio da Idade Média]. com as línguas confusas/ vejo apenas fêmeas e machos estúpidos/ o fim . Se proliferavam os desmandos ha igreja. O parecer do poeta Eustache Deschamps expressa um sentimento geral de desânimo e melancolia: “Agora o mundo está covarde. os valdenses e os franciscanos espirituais na Itália e na França — todos testificam uma espiritualidade firmemente arraigada e até frenética. Isso não significa negar que a sociedade da baixa Idade Média também enfrentou intensas sublevações políticas. De fato. renovado interesse nas relíquias. econômicas e sociais. o mesmo ocorria com os apelos pela reforma. longe de ser uma época de decadência vázia. em seu livro The Courage to Be [A Coragem de Ser\. que se desenvolveu a partir dela. 'Citado em Johan Huizinga. pp. aliada à crescente onda das expectativas religiosas. pp. quando ele vacilou e quase sofreu um colapso. a teologia dos reformadores foi uma resposta específica à ansiedade especial da época. Amedrontado por uma tempestade e receando a morte iminente. culpa e perda de sentido ressoam em marcante dissonância na literatura. Malament. a crise agrária era tão intensa. C arlE . Era. 36. ed. M orte. 1967). (Filadélfia: University of Pennsylvania Press. in: After the Reformation: Essays in Honor o f J. Esses três temas emergem vividamente na luta de Lutero por encontrar um Deus misericordioso. N. The Waning o f the Middle Ages.se aproxima.. abriu caminho. 215-246. Paul Tillich. The Age o f Adversity: The Fourteenth Century(Ithaca. 57-63. no fim da Era M oderna. I. talvez apenas algo mais.. noticiou-se que cadáveres de criminosos eram tirados das forcas e comidos pelos pobres na Polônia e na Silésia. 1968). . essa sensação de mal-estar. Hexter. No início do século xiv. Perto do fim da Idade Média. poderíamos dizer. The Courage to Be (New Haven: Yale University Press. Embora não discordemos da tese de Tillich acerca da crise moral nas vésperas da Reforma. a ansiedade da culpa e da condenação predominou.1 De fato. ed. simplesmente como todos os outros. Mesmo sendo a peleja de Lutero algo pessoal. também a abordagem de Tillich acerca da baixa Idade Média. Bouwsma. 1952). que alguns recorreram ao canibalismo: em 1319. em seu A History o f Christian Thought. sua doutrina da justificação e sua teologia da igreja. Além disso. Na raiz dessa experiência. 2Paul Tillich. essa expressão de que o tempo estava fora dos eixos. Cf. na realidade os três tipos de ansiedade estavam amplamente presentes. como Lutero os chamava. produziu uma época de excepcional ansiedade.3 Acrescente-se a tal catástrofe a destruição provocada pela peste bubônica. as Anfechtungen. Um desassossego mórbido com o sofrimento e a morte impregnou a Europa na baixa Idade Média. Barbara C. na verdade [. foi assaltado por uma esmagadora sensação de culpa. Lerner. esboçou a história da civilização ocidental sob o aspecto de três tipos de ansiedade.] tudo vai m al” . Por sua vez. à ansiedade espiritual do vazio e da falta de sentido. estavam os fenômenos geminados da fome e da peste. H. Já no mosteiro. Mais terríveis eram os ataques de medo e desespero. “Anxiety and the Formation of Early Modern Culture”. pp. 227-233.2 O fim da antigüidade clássica foi marcado pela ansiedade ôntica. 10-11. Nesse aspecto. Outros eruditos também aplicaram a categoria da ansiedade a esse período. Veja em especial o discernente artigo de William J. 3Robert E. p. na arte e na teologia desse período. pp. falaram poderosamente às concepções principais de seu tempo. Braaten. 1980). Lutero fez o voto de tornar-se monge. (Nova Iorque: Simon and Schuster. uma inquietação profunda com o destino e com a morte. ela é a epítome dos medos e das esperanças de sua época.:Cornell University Press. “Tools and Civilization”. 6Michael Seidlmayer. o céu. que sucedeu João Calvino como reformador de Genebra. pp. 138-151. Perspectives in Defense Management 24 (1975-1976). foi João Capistrano. veja J.5 A visão da morte manifestava-se nos sermões e nas xilogravuras. a fim de lembrar a quem o contemplasse que a vida estava passando rapidamente. a visão da morte a ameaçar 4Joseph Lortz. no Cemitério dos Santos Inocentes. assim como na pintura e na escultura daqueles tempos. 5Quanto à importância dessa invenção. o juízo. renunciei ao antigo eu. Uma das mais populares representações pictóricas foi a “dança da m orte” . Currents o f Medieval Thought (Oxford: Blackwell. nem o corpulento monge. ed. relembra que um a grave doença e o medo da morte ocasionaram sua conversão à religião reformada. aparecia como uma figura dançante tragando suas vítimas. (Nova Iorque: Random House.4 Além desses desastres “naturais” . Ele entregou seus sermões. dei-me inteiramente a ele. Em geral. Vendo seu terrível julgamento sobre mim. 13-44.ou peste negra. R. p. também Huizinga. Com milhares de lágrimas. A morte. 33-42. o inferno. que atingiu o ápice na Inglaterra por volta de 1349 e arrasou pelo menos um terço da população de toda a Europa. 1964). na forma de esqueleto. 6. A certeza da morte era tema usual para os pregadores também. pregou certa vez durante dez dias consecutivos. Assim. uma ampulheta era colocada num canto do quadro. Ricardo de Paris. pp. Lynn T. o mais popular de Paris. nem o pobre camponês. sobre o tópico das últimas quatro coisas: a morte. Não menos insólito. renovei meu juramento de servir sua verdadeira igreja e. não conseguia pensar no que fazer com minha vida infeliz. Deus mostrou misericórdia por seu desgraçado servo perdido e consolou-me de modo que eu não podia duvidar de seu amor. 1965). From the Renaissance to the Counter-Reformation: Essays in Honor o f Garrett Mattingly. em suma. que levou uma caveira para o púlpito e advertiu sua congregação: “Olhem e vejam o que resta de tudo aquilo que uma vez lhes deu prazer. 126. Carter. As sepulturas eram freqüentemente adornadas com imagens de cadáveres nus. sete horas por dia. bastante adequadamente. Finalmente. implorei seu perdão. How the Reformation Came (Nova Iorque: Herder and Herder. ou que outrora levou-os a pecar. cf. a invenção do canhão de pólvora transformou a guerra numa nova selvageria..6 Teodoro Beza. quando uma nova peste. Charles H. Jr. White. a sífilis. depois de um sofrimento interminável de corpo e alma. Ninguém podia escapar de suas mãos — nem o rico mercador. p. um frade franciscano. punhos cerrados e entranhas devoradas por vermes. . foi trazida do Novo Mundo pelos marinheiros de Cristóvão Colombo. pp. “Gunpowder and the Renaissance: An Essay in the History of Ideas”. de sua época. Os vermes comeram tudo” . 1960). com bocas escancaradas. Ele se aproximou de mim mediante uma doença tão grave que me desesperei. Hale. Os episódios da peste repetiram-se até o século xvi. açoitando-se publicamente com chicotes de couro. A igreja em Aachen ostentava as vestimentas da virgem Maria e o pano ensangüentado sobre o qual a cabeça cortada de João Batista havia jazido. a morte era uma realidade sempre presente para homens e mulheres na véspera da Reforma. pp.minha alma fez surgir em mim o desejo de uma vida verdadeira e eterna. A amostra mais terrível dessa situação é vista na cena freqüentemente retratada do leito de morte. Putnam’s Sons.. veneração dos santos. Cf. ascetas rigorosos que viajavam de cidade em cidade. que Tillich entendeu ser o tema dominante da época. ao passo que Henrique viu da Inglaterra. 1960. a doença foi para mim o começo da verdadeira saúde. 12 de maio de 1560). p. Heresy in the Later Middle Ages (Nova Iorque: Barnes and Noble. Hb 2. 204-205. 10As relíquias estavam especialmente em voga no século x v e início do xvi. 127-147. pp. pp.15: CNTC 2.). a qual incluía: 35 pedaços da cruz verdadeira. o rosário. 1899). peregrinações. 45 (carta n. exigiu que fossem rezadas missas 7Henri Meylan e Alain Dufour et al. em Henry Baird. senão da ira de Deus contra o pecado? Daí surge o estado de servidão ao longo de toda a vida. a repetida reza do “pai-nosso” — tudo isso era parte de um sistema de penitências mediante o qual assegurava-se uma maneira apropriada de estar perante D eus. p. III. 355. A igreja em forma de castelo situada em Wittenberg (a igreja de Lutero!) continha a valiosa coleção do Príncipe Frederico. onde anjos e demônios lutam igualmente pela posse da alma do moribundo. O Imperador Carlos v deixou uma provisão para 30 000 dessas missas. 485-493. Dolan.8 A ansiedade m oral. Houve diversas tentativas de aliviar a culpa que pesava tão fortemente na alma das pessoas. o Sábio. Gordon Leff. um frasco do leite da virgem Maria. II. relíquias. . History o f the Reformation (Nova Iorque: Descle Company. e o julgamento colocava o pecador face a face com um Deus santo e irado. surgiu do fato de que a morte implicava julgamento. ele poderia reservar uma doação para que se rezassem missas a seu favor após sua morte. que quis ter certeza em dobro. A mais radical de todas eram as várias companhias de flagelantes. trad. 1961). A íntima relação entre morte e culpa é percebida nesta declaração de Calvino: “De onde vem a morte. The Pursuit o f the Millenium (Nova Iorque: Oxford University Press. Assim. que é a ansiedade constante na qual as almas infelizes estão aprisionadas” . dias de festa. Theodore Beza (Nova Iorque: G.10 Se o pecador tivesse como pagar. adoração da hóstia consagrada. pp. P. Norman Cohn.9 A maioria dos pecadores preferia os meios mais usuais de perdão: os sacramentos e os auxílios parassacramentais autorizados pela igreja. Indulgências. %Comm. John P. 1967).° 156 para Melchior Wolmar. eds). A catedral de Colônia alegava abrigar os restos mortais dos três magos.7 De fato. 1965). 485-493. uma lasca da vara de Moisés e 204 partes dos corpos dos Sagrados Inocentes. na esperança de expiar pecados seus e da sociedade. Correspondence de Théodore de Bèze (Genebra: Droz. 9Cf. nIbid. As perguntas eram preparadas para mostrar à criança as várias maneiras pelas quais poderia ter transgredido os dez mandamentos.por ele “enquanto durasse o m undo” . flertou com mulheres. doença. diversão ou atividade sexual? Roubou peregrinos no caminho para Roma? Pensou em cometer adultério? Sodomia? "Seidlmayer. Steven Ozment. Você jogou bolas de neve ou pedras nas pessoas? Foi cruel com galinhas ou patos? Você matou o imperador com um machado duplo? [Uma pergunta capciosa para ver se a criança estava prestando atenção!] — Esses são pecados contra o quinto mandamento. apenas reforçava um já maciço peso de culpa. por exemplo: Você acredita em magia? Ama mais a seus pais do que a Deus? Você alguma vez não ajoelhou com os dois joelhos. p. 15-46. Ela apresentava-se ao padre. The Reformation in the Cities (New Haven: Yale University Press.11 Em nenhum outro lugar era mais evidente o caráter opressivo dos deveres da vida religiosa da baixa Idade Média do que nos manuais de confissão e nos catecismos para leigos. em sua análise desses documentos. cantou e dançou sensualmente. recitava o pai-nosso e o credo e depois respondia às perguntas do sacerdote. citando de Johannes Geffken. que se imprimiram em abundância nas recém-inventadas prensas tipográficas. Bilderkatechismus des fünfzehnter Jahrhunderts (Leipzig: Weigel. as perguntas eram formuladas a fim de provocar introspecção. 1975). ou matou uma criança recém-nascida e nãobatizada? Abortou por excesso de trabalho. ou dançou num domingo ou em dias santos? — Esses são pecados contra o terceiro mandamento. 110.12 Uma criança estava capacitada para a confissão já com a idade de sete anos. . ou trocou olhares adulterinos na igreja ou enquanto passeava no domingo? Você é uma mulher que abortou artificialmente uma criança. fugiu da missa ou dos sermões. Você cortou madeira. cometeu adultério. fez alçapões para passarinhos. 141. Foedera (Londres. XV. a morte de uma criança ou de um amigo? Vestiu-se de maneira orgulhosa. “Testamentum Regis Henrici Octavi”. o reconhecimento medieval da “idade da responsabilidade” . Thomas Rymer. pp. 1855). Poderiam perguntar-lhe.13 Semelhantemente. l2Steven E.. 1713). mostra que a confissão. pobreza. longe de transmitir um sentimento de perdão. para os adultos penitentes. Ozment. meticulosidade e uma sensação de não atingir uma confissão completa: “Você questionou o poder e a bondade de Deus ao perder um jogo? Resmungou contra Deus por causa de mau tempo. ou não tirou seu chapéu durante a comunhão? — Esses são pecados contra o primeiro mandamento. p. nunca conhecestes sofrimento comparável ao nosso. descreveu a índole religiosa de sua época como imaginatio melancholia.. inimigos aversivos e atormentadores maliciosos. salvo as visões desagradáveis e repugnantes. . espíritos malditos. Jean Gerson. sem descanso. pensai então que longa noite nós. l5C f a seguinte avaliação: “Essas atitudes ansiosas e edificantes. nem emplastro algum aplacaria nossa febre. de muitos anos juntos..14 A pressão para se purificar de todo pecado. Depois de tal confissão ser feita. 56. almas tolas. às vezes. Daí o ativismo febril da religião no fim da Idade Média: a construção de novas igrejas. ainda era preciso realizar obras de reparação. “uma imaginação melancólica” . na escultura e na pregação daqueles dias.] Vós tendes vossos médicos. p. padecemos. que não podemos colocar um pé para fora do fogo. Se tendes pena dos aleijados. irreconhecíveis. não há ninguém tão cego quanto nós. antes que a absolvição pudesse ser solicitada. que denunciam carência espiritual e a condição miserável da existência. 16Dolan. “Piety in Germany Around 1500” . assomava o espectro do purgatório e do inferno. que às vezes vos curam e confortam. nenhum médico poderia ajudar em nosso sofrimento. The Reformation in Medieval Perspective. que estamos aqui na escuridão. incluindo-se os motivos interiores e. Bernd Moeller. cujo fogo é muito mais ardente que o de qualquer outro lugar na terra e mais quente do que pareceria uma labareda pintada numa parede. de muitas semanas. nem temos as mãos livres para proteger nosso rosto das chamas. Steven E. Vossos guardas vos fazem bem e vos deixam em conforto. se tendes pena de qualquer homem em sofrimento. ofensivos. por meio do que. invejosos e odiosos. quando cada hora parecia durar mais que cinco.. queimando e torrando no fogo por uma longa noite de muitos dias. cujos tormentos eram retratados em detalhes aterradores na arte. de HIbid. o esforço incessante para obter m éritos. More colocou as seguintes palavras na boca de um morto atormentado: Se tendes pena dos cegos. colocava um peso insuportável sobre o penitente. nossos guardas são aqueles de quem Deus vos guarda — cruéis. até que venha algum conforto.16 Exemplo dessa imaginação é a vívida descrição feita por Sir Thomas M ore acerca dos horrores do purgatório. 201. em insônia. Se já ficastes doentes. pensastes como a noite era longa e ansiastes pela manhã. Em seu Suplication o f Souls [Súplica das Almas] (1529). ninguém é tão aleijado quanto nós. [. importante reformador do início do século XV. Ozment. Finalmente.15 Além de tudo isso. ed. foram de uma intensidade maior e mais abrangente do que antes desse período”. p. claro.Incesto?” . cuja companhia é mais horrível e atroz para nós do que o sofrimento em si: e o tormento intolerável que nos infligem. o comércio de indulgências. : Smithsonian Institution Press. Esse tema.C. e adicionava o seguinte comentário: “O sofrimento causado por uma fagulha do fogo do inferno é ainda maior do que aquele provocado por m ij//^ ” anos de trabalho de parto” . Reformation in the Cities. tornou-se cada vez menos sustentável. Todas essas situações levantaram questões novas e radicais para a cultura da baixa Idade Média. e. como indicam a Guerra dos Cem Anos. Shakespeare. The Workers o f Sir Thomas More. veja o fascinante artigo de Heiko A. diante de cuja ira os homens culpados poderiam apenas estremecer. D.17 Se o purgatório era tão ruim. Os temas da morte e da culpa estão relacionados ao que era talvez a ansiedade dominante na sociedade da baixa Idade Média. ed.. e mediante revoltas sanguinárias. Owen Gingerich.. Obermam. com rostos contorcidos. estenderam amplamente as fronteiras do universo removendo a terra — e a humanidade — do centro da realidade criada. Vespúcio e Magalhães despedaçaram a antiga geografia e ampliaram imensamente a esfera de influência européia. entre Inglaterra e França. 134-169. uma crise de sentido. quão incomparavelmente pior o inferno haveria de ser? Um catecismo ilustrado mostrava os habitantes do inferno consumindo as próprias entranhas. p. pp. estão sendo transportados acorrentados por demônios até o inferno. enquanto os amaldiçoados. não cessam jamais de nos despedaçar. 28. “Reformation and Revolution: Copernicus’ Discovery in an Era of Change”. os cálculos de Copérnico.19 As fronteiras políticas entre as nações estavam literalmente prontas para ser capturadas. apêndice 8. G. 1557). Do outro lado da escala social. 19Esse é o significado principal da palavra excêntrico. O mote medieval para Gibraltar — ne plus ultra — tornou-se simplesmente plus ultra — mais além. Dickens.todas as maneiras. Quanto ao contexto nominalista da revolução copernicana.. perfeitamente refletido numa sociedade harmoniosa na terra. 18Ozment. Em todas as áreas da vida. The English Reformation (Nova Iorque: Schocken Books. mais tarde confirmados pelas observações de Galileu e Kepler. quando possível. (Washington. 5-6. Ao mesmo tempo. os camponeses lutavam por livrar-se das correntes do feudalismo mediante protestos e súplicas. citado em A. 1964).18 Um dos portais de igreja na catedral de Mogúncia descreve o juízo final: Cristo. citando o Heidelberger Bildenhandschrift. Geffken. mas ainda usando imagens pré- 17Thomas More. comum a todas as principais igrejas da Europa. em The Nature o f Scientific Discovery. escrevendo no rumo desses desdobramentos. . os redimidos estão sendo levados por anjos para o Paraíso. organizado num sistema fixo de hierarquias celestiais. A cosmovisão de um universo ordenado. As viagens de Colombo. está no topo. pp. o Juiz. e a incursão de Carlos vm à Itália (1494). as antigas fronteiras estáticas vinham sendo transgredidas. refletia o etos medieval de um Deus de ira e juízo. pp. quando necessário. wrytten by him in the English tongue (Londres: s. 1975). 337-338. mas quando os planetas Em maligna mistura de desordem extraviam-se. quando as hierarquias se abalam. eles produziram o infame livro Malleus Maleficarum. eds. Inc. Por sua vez. Clark e W. seca. o Papa Inocêncio vm expediu sua bula Summis Desiderantes. Portanto. despedaçam-se A unidade e o calmo casamento dos estados Em sua fixidez. morte de animais da fazenda. pp. veja H. Que pestes e que portentos! que rebeliões! Que bramido do mar! tremor de terra! Comoção dos ventos! medos. VI. in: Transition and Revolution. (Nova Iorque: Nelson Doubleday. / É . Erik Midelfort. um texto oficial contendo instruções precisas sobre investigação e condenação de bruxaria. 32-44. ed. Cf. The Complete Works o f William Shakespeare. Ian Siggins. History o f the Christian Church (Nova Iorque: Charles Scribner’ s Sons. que autorizava dois inquisidores dominicanos a empreender o extermínio sistemático da bruxaria. Philip Schaff. em parte. Degraus de todos os altos desígnios. d. “Were There Really Witches?”. A. a conexão entre feitiçaria e heresia em geral era aceita. responde. 1981). Kingdon. um inquisidor siciliano. G. Ao todo.). pela obsessão dominante pelo mundo estranho do oculto. W. 89-233.20 A dilapidação cósmica. C. Luther and His Mother (Filadélfia: Fortress Press. Midelfort. Em 1484. p. pp. não se restringia aos católicos. RobertM . impotência sexual. mudanças. Cf. 1910).copernicanas. a inquietação social e religiosa. Origin and Progress o f the Inquisition (1597). p. A crença na feitiçaria. Troilus and Cressida. expressa a sensação daquela época: . horrores. 22Cf.. O empreendimento adoece.. Oh. (Minneapolis: Burgess Publishing Co.22 20Extraído do discurso de Ulisses sobre “graus”. milhares de mulheres pobres. obviamente. 21Este número vem de Louis de Paramo. com seu sucedâneo na terra. nas vésperas da Reforma. p. ou “Martelo das Bruxas” . que escreveu um tratado sobre a origem e o progresso da Inquisição. 696.. O teólogo puritano William Perkins publicou Discourse o f the Damned Art o f Witchcraft [Exposição da Arte Maldita da Feitiçaria] e 29 bruxas foram executadas no período de 1544-1545 por causarem uma epidemia na Genebra de Calvino. por volta der 30 000 execuções por feitiçaria aconteceram até o fim do século x v i. Quanto às diversas teorias a respeito da feitiçaria. 1974). s. velhas e desprotegidas (porque solteiras) foram sujeitadas a torturas inomináveis. em Shakespeare.21 As bruxas eram acusadas de todos os tipos de calamidade: tempestades. 189. Na histeria da feitiçaria que se seguiu. Wright. Da mesma forma.. 529. não é de surpreender que os detratores católicos de Lutero fizessem circular o inescrupuloso boato de que ele havia nascido da ilícita união entre sua mãe (uma bruxa!) e um incubo. Desviam e estalam. Não seria de nenhuma utilidade varrer as teias de aranha se os alicerces estavam podres. a doutrina da igreja nunca recebeu tal condição dogmática. mas certamente constituiu seu prérequisito. .Vimos que. do século xiv em diante. quer católicos.23 A sede de Deus / às vezes era refletida em padrões bizarros de espiritualidade: zurrar na missa e m ^ homenagem ao jumento que Maria montou. concubinato. Mais freqüentemente. Todos os reformadores. quer protestantes. in: A New Kind o f History. A Reforma é sempre retratada como tendo abalado a unidade da igreja 23Lucien Febvre. longe de ser um período de declínio. opuseramse de maneira extrema a essas práticas. A Busca pela Verdadeira Igreja Intimamente relacionada com a ansiedade que marcou todos os aspectos da vida na baixa Idade M édia estava uma crise de confiança na identidade e na autoridade da igreja. “The Origin of the French Reformation: a badly-put question? ”. baseada numa compreensão renovada do evangelho. Essa explosão de interesse pela eclesiologia coincidiu com grandes mudanças institucionais. em sua Summa Theologica. A maior realização da Reforma foi ter sido capaz de redefinir essas ansiedades sob o aspecto de novas certezas. publicado pela primeira vez em Revue historique (1929). porém. Em cada caso. ou melhor. Entretanto. y lh a s certezas redescohsrtas. O que se precisava era de uma nova definição da igreja. tanto dentro da Igreja quanto em relação às crises sociais e políticas de que já tratamos. tiveram um local à parte para a igreja em suas teologias sistemáticas. Nem Pedro Lombardo. em seu Livro de Sentenças. que foram objeto de definições conciliares oficiais na igreja primitiva. nem Tomás de Aquino. Entretanto. j a tuar o nome de Jesus no^peito. numerosos tratados apresentavam o título D e Ecclesia. seguia os conhecidos caminhos da espiritualidade comum. era uma época de “imenso apetite pelo divino” . quer radicais. O mal-estar espiritual da baixa Idade Média não foi a causa da Reforma. a baixa Idade Média estava viva. Dissemos muito pouco sobre as famigeradas contravenções da igreja préreformada: simonia. culpa e perda de sentido. O moralismo nervoso e as tentativas incessantes de aplacar um Deus sublime e irado serviram para agravar as ansiedades fundamentais de morte. nepotismo. venerar hóstias sangrentas. etc. 1973). Conforme Lucien Febvre a descreveu. sobre o coração. era considerada por muitos uma espiritualidade profundamente insatisfatória. Ao contrário das doutrinas da trindade e da cristologia. Peter Burke. ed. repleta de todos os tipos de vitalidades espirituais. alguns entre eles também perceberam que era necessário haver algo mais do que um pôr a casa em ordem. mau uso dos benefícios. (Nova Iorque: Harper and Row.clerical. declarou: Duas coisas há. 170. veja Gordon Leff. Canto XIX. pelas quais esse mundo é dirigido: a autoridade sagrada [auctoritas] do sacerdócio e o poder real \potestas].24 Examinemos brevemente cinco modelos conflitantes da igreja na baixa Idade Média. Veja Bernardo.. legando ao mundo moderno o legado de uma cristandade dividida. como veremos. pp. in: Journal o f Medieval and Renaissance Studies 1 (1971). Cf. que calamidade marcou o momento — não de sua conversão. mas da taxa que o primeiro Pai rico tomou de você como dote!” . o qual o Altíssimo deseja que seja preeminente 24Quanto aos conceitos medievais posteriores acerca da igreja verdadeira. . foi uma continuação da busca pela igreja verdadeira que havia começado muito antes que Lutero. Dessas. 25A revolução constantiniana. como um momento crítico nas propriedades do papado. que. Quando olhamos mais de perto os séculos anteriores à reforma. As raízes da soberania papal. O curialismo. descobrimos uma p lu r a lid a d e de formas e doutrinas eclesiais. O Curialismo Nos tempos medievais. Constantino. 958-959). Sermones in Cantica canticorum 33. a responsabilidade dos sacerdotes tem maior peso. Scott H.14-16 (PL 183.25 Esse evento. A reforma do século XVI.. tais como Bernardo de Claravel. pp. era citada pelos primeiros reformadores.. numa carta de 494 ao Imperador Anastácio. por John Ciardi (Nova Iorque: New American Library. 347-378.medieval. conjugado às invasões bárbaras do V século. augusto imperador. as mãos do papado. incluindo-se todos os oficiais e funcionários que assistiam o papa em seu governo da igreja. [. deixaram o bispo de Roma numa posição politicamente estratégica. que os anabatistas reconheceriam como a “queda” decisiva da igreja. tanto temporal quanto espiritual. se os corações dos cristãos devem-se submeter a todos os sacerdotes em geral [. A Igreja de Roma. porém. Calvino ou os padres de Trento entrassem na lista. com sua dupla filiação apostólica (tanto Pedro quanto Paulo foram martirizados em Roma). 1-25. remontam à conversão de Constantino e à subseqüente “cristianização” do Império Romano. A relação entre as esferas temporal e espiritual — geralmente citadas como “as duas espadas” (Lc 22. portanto. p.38) — recebeu uma formulação clássica do Papa Gelásio i. 109-111: The Inferno. Hendrix. logo reivindicou um tipo de hegemonia espiritual.] quão maior consentimento deve ser dado ao bispo daquela sé. trad. era uma teoria de governo eclesiástico que investia de suprema autoridade.] E . cols. também divergiam entre si a respeito da natureza e da função da igreja e de seu ministério. portanto. também o lamento de Dante: “Ah. 1954). “In Quest of the Vera Ecclesia: The Crises of Late Medieval Ecclesiology” . Inferno.. entretanto. Os reformadores protestantes. Viator 1 (1976). a Curia Romana referia-se à corte papal. “The Making of the myth of a True Church in the later Middle Ages”. p.e. quando. que o papa “é o único que deveria ter os pés beijados por todos os príncipes” . na hierarquia do ser. guiada por apenas um timoneiro. para a J f' salvação. que reinou sobre um vasto império. e pela chocante confusão do Grande Cisma Ocidental (1378-1417).. A ineficácia dos esforços de Bonifácio por empunhar as espadas tanto do poder espiritual quanto do temporal foi reconhecida por muitos de sua época. Ele acreditava que. no clímax da controvérsia das investiduras em 1075. o papa.29 O pontificado de Bonifácio marcou o fim de uma etapa e o início de outra na história do papado. The Crisis o f Church and State. que podia ser julgado apenas por Deus.. 1964).: Prentice Hall. assim também havia “uma única santa. presidida por um supremo poder espiritual. 13-14. o chamado Cativeiro Babilónico (1309-1377). é necessário que toda criatura humana esteja sujeita ao Pontífice Rom ano” . 49-50. o princípio gelasiano foi reafirmado com muita força na alta Idade Média. Assim. não pelos homens. pp. 132. 189. durante algum tempo. errará por toda a eternidade” . O Papa Gregório vn..sobre todos os sacerdotes e a quem a devoção da igreja sempre tem honrado. 1050-1300 (Englewood Cliffs. três papas alegaram simultaneamente ser o cabeça supremo da igreja. Dante. Sua morte foi seguida pelos 70 anos de exílio do papado em Avinhão. católica e apostólica igreja” . por exemplo. J. pelo testemunho das Escrituras.26 Mesmo tendo sido o poder papal significativamente reduzido no feudalismo. o Imperador) não passavam de pálidos reflexos. nem nunca. que o papa podia depor imperadores. 26Citado em Brian Tierney. Ele comparava-se à “luz m aior” que Deus colocara no firmamento da igreja universal. definimos e pronunciamos que. o Papa Bonifácio vm anunciou as mais extravagantes alegações da soberania papal em sua bula Unam Sanctam (1302). porém superior ao homem” ..28 Baseado na obra de seus predecessores. 2iIbid. o papa ocupava uma posição intermediária entre o divino e o humano — “inferior a Deus. N. dois e. Os pronunciamentos de três papas em particular constituem a mais alta marca das exigências papais à preeminência secular. descreve as conseqüências da posição curialista: “ .. ele l concluiu: “Declaramos. lançou seu famoso Dictatus Papae. p. 29Ibid. em face da qual todas as outras autoridades (i. pp. Como houve uma única arca. Mais ainda. mais tarde.27 O papa que este­ ve mais perto de colocar em prática os “Ditames” de Gregório foi Inocêncio m (1198-1216). estabelecemos.. convocar sínodos e absolver os súditos das obrigações feudais. Ele reivindicava. uma lista de 27 afirmações sobre o poder papal. junto com mais dois papas simoníacos. ele insistia que “a Igreja Romana nunca errou. . 21Ibid. Dessa forma. que colocou Bonifácio num dos mais baixos círculos do inferno. o clero. Está sendo requerida pelo sacrifício do sangue precioso que sobe aos céus. reuniu-se em 1414. Dessa crise.. a demanda por uma reformatio in capite et in membris — reforma na cabeça e nos membros — ecoou por toda a Europa. convocado pelo Imperador Sigismundo. 1961). mesmo uma mulher. I. p.. Os três papas foram 30Purgatorio. poderia conclamar um concílio geral num momento de emergência. Foundations o f Conciliar Theory (Cambridge: Cambridge University Press. 32Veja o magistral estudo de Brian Tierney. Conforme um teólogo contemporâneo expressou: O inundo todo. 127-29. todos os cristãos. ed. por John Ciardi (Franklin Center. 202-203. citado em Patrick Granfield. que afirmava a superioridade dos concílios ecumênicos sobre o papa no governo e na reforma da igreja. 47-67. History o f the Popes (Londres: Triibner and Co.33 Esse desvio era interpretado não apenas como heresia manifesta. Canto XVI. trad. A pergunta ainda persistia: no caso de um cisma múltiplo. 1955). cada um proferindo anátemas e interditos aos outros dois. O céu e os elementos a exigem. mas também como atos que ameaçassem a integridade da igreja. pp. Depois de várias tentativas malsucedidas de resolver a crise (e.g . 1983. pp. No âmago da teoria conciliar. 1980). Cf. n Ibid.visto que a igreja procurou ser dois governos ao mesmo tempo. As próprias pedras logo serão constrangidas a se unir a essas vozes. Pastor. quem estaria qualificado para manter os papas responsáveis? Guilherme de Occam declarou que qualquer cristão. tornou urgente o apelo por uma reforma. conspurcando tanto seu poder quanto seu m inistério” .32 Na lei canônica já se apresentara um escape à doutrina de que o papa estava acima do julgamento humano na oração — nisi deprehendatur a fid e devius. “a menos que se desvie da fé” . 174. 31Citado de L. The Papacy in Transition (Nova Iorque: Doubleday. original. o Concílio de Constança.31 O espectro do corpo de Cristo dividido em obediência a três papas. . 248.: The Franklin Library. Penn. 44. esp. ela está afundando muito.. surgiu a visão conciliar da igreja. 1-20. por renúncia forçada e negociação). sabem que uma reforma da igreja é tanto necessária quanto oportuna. p. 1891). a declaração de Panormitano (falecido em 1453): “O que quer que Deus possa fazer.30 O Conciliarismo No início do século XV. o papa pode fazer”. havia a distinção fundamental entre a igreja universal (representativamente composta num concílio geral) e a Igreja Romana (consistindo no papa e nos cardeais). Uma visão papal da igreja continuou a ser defendida. p. ordenando que futuros concílios fossem convocados em intervalos regulares. (Cambridge. Mass. mas relegá-lo ao papel que lhe era proprio dentro da igreja como um todo.] condenamos os apelos desse tipo. o Sacrosancta (1415).. Oberman et al. Defensorium Obedientiae Apostolicae et Alia Documenta. não visava a abolir o papado... portanto. o final do século XV assistiu ao ressurgimento da monarquia papal e à extinção do movimento conciliar. em 1460. Os conciliaristas advogavam um papa. “a plenitude de poder” . 1418). também a discussão de Oberman acerca dessa bula em Forerunners o f the Reformation.]. 34“Execrabilis” . Cf.destituídos. O dobre fúnebre do conciliarismo pode ser ouvido na bula papal Execrabilis. 212-215. Mesmo tendo o Concílio de Constança aprovado dois decretos. eliminando muitas fontes de sua renda: isenções.. eds.. não em qualquer indivíduo. desobrigações. imbuídos de espírito de rebelião [. teria reduzido em muito a imensa riqueza da cúria. se tivesse sido executado. [.. Tal programa. rejeitamo-los como errôneos e abomináveis e declaramo-los completamente nulos e inúteis. residia somente em Deus.: Harvard University Press. brotou em nossa época. .]. promulgada pelo Papa Pio II. nunca ouvido em tempos antigos. pp. vigário de Jesus Cristo [. Um abuso horrível. in: Gabriel Biel. como também os contínuos pedidos por reforma dos muitos que permaneceram fiéis a Roma.. afirmando a supremacia conciliar. de banir esse veneno mortal da igreja de Cristo [. para um futuro concílio. 1968). nem mesmo no papa. benefícios. O papado fora salvo — pelo concílio! A teoria conciliar. Doravante. Martinho V. Heiko A.. Execrabilis praticamente anulou tanto o Sacrosancta quanto o Frequens. foi eleito.34 O decreto ainda advertia que qualquer um que tentasse burlar essa ordem seria imediata e irrevogavelmente excomungado. uma igreja indivisível e um programa de reforma moral com base no exemplo da igreja primitiva. pp. a reforma — dentro da igreja — só poderia ser instaurada pelo papa. Um novo papa. Alguns homens. acreditam poder apelar do Papa. e o Grande Cisma Ocidental foi sanado. 225-226. conforme apresentada por pensadores comojgjgrre d’Ailly (m. indulgências plenárias e assim por diante. Jean Gerson (m. 1420). O fracasso do movimento conciliar contribuiu em parte para o sucesso da revolta protestante contra Roma. 1429) e Dietrich de Niem (m.] Desejosos.. Eles declaravam de fato que a plenitudo potestatis. pondo fim à era da reforma conciliar. e o Frequens (1417). Hubert Cunliffe-Jones. andT .Wycliffe e Hus Além de dar fim ao Grande Cisma... suas próprias eclesiologias radicais contribuíram significativamente para o desenvolvimento da doutrina de Lutero acerca da igreja. “antros de ladrões. 1978). 134-161. 36No final de 1520. mas sim o grupo dos eleitos estendidos através do tempo. English Works. . Clark. (Londres: Trübner and Co. p. Depois... a congregação dos fiéis espalhados pela terra.. voltaram-se para condenar à morte na fogueira o expoente principal das concepções de Wycliffe. veja Scott H.35 Mais tarde. 1982). a quem Gordon Rupp conferiu o título de “o Kierkegaard da baixa Idade M édia” . 292. Luther: A Life (Nova Iorque: Crossroad.38 A igreja universal não era. De Ecclesia. “On the Church”.37 O estridente anticlericalismo de Wycliffe surgiu de sua definição da igreja como o corpo predestinado dos eleitos. lares de demônios vivos” . 96-104. ninhos de serpentes. já que contava entre seus membros os réprobos — os “previstos” (praesciti). a igreja visível. visto que todos os seus filhos estão. o Concílio de Constança também declarou heréticos os ensinos do teólogo inglês João Wycliffe (m. Forerunners. De fato.. e na meta da bênção. unidos em bênção” . ele percebeu que sua afinidade com Wycliffe e Hus era apenas provisória. in: Oberman. ed. Lutero foi forçado a confessar: “Somos todos hussitas agora” . ed. 1981). John Wyclif. Gordon Rupp. (Edimburgo: T.. levantou um causticante ataque contra a cristandade de seus dias. in: A History o f Christian Doctrine. Mais tarde. Hus fez ecoar a idéia de Wycliffe: “A unidade da Igreja Católica reside no vínculo da predestinação. Em certo momento. Hendrix. não arraigados à vinha da igreja” . 1384) e ordenou que seus ossos fossem exumados da terra e queimados. pp. como Wycliffe os chamava — e também os redimidos. 38John Hus. visto que cada um de seus membros está unido ao outro pela predestinação. Ele denunciou os sacerdotes de “ladrões [. o reformador boêmio João Hus (m. 477. Luther and the Papacy: Stages in a Reformation Conflict (Filadélfia: Fortress Press. W ycliffe. Quanto ao relacionamento entre Lutero e Hus. Todd. quanto Hus são freqüentemente referidos como precursores da Reforma. no fundo. A igreja na terra.] raposas malignas [. 35John M. 218. pp. in: Archiv flir Reformationsgeschichte 65 (1974). ‘“ We Are All Hussites’? Hus and Luther Revisited”. p. 37E. Lutero protestou da seguinte forma: “Non recte faciunt.. qui me Hussitam vocant” . Matthew.] demônios [. teve um papel importante na ruptura posterior de Lutero com o papado.. 153.36 Entretanto. 1880). p. 1415). conforme os conciliaristas haviam sustentado. D. Tanto Wycliffe. o tratado de Hus. “Christian Doctrine from 1350 to the Eve of the Reformation”. F.] macacos” e os curas de “rebentos estranhos. O papa era “o vigário principal do demônio” . pp. não podia ser identificada com a verdadeira igreja.] glutões [. “a Estrela d’Alva da Reform a” . nenhum deles se aproximou de sua compreensão radical da justificação somente pela fé. e os mosteiros. 85-94. que os sacerdotes e os papas perversos — presumivelmente entre os praesciti. quem era quem. e nesse caso não deveriam ser obedecidos. O que Hus pedia não era a abolição da igreja institucional. Hus não repetia simplesmente a doutrina de Wycliffe. como Wycliffe era acusado de fazer. proporcionaram uma alternativa crítica para o curialismo e para o conciliarismo. nesta vida. era possível estar na igreja sem ser da igreja. iuxta sepe dicta non sic assereret quod sit predestinatus. que os sacramentos administrados por um sacerdote pecaminoso não tinham eficácia. Colo..41 O princípio da discriminação moral serviu para cortar tanto as pretensões papais quanto os privilégios clericais. 8: “Sic non dicimus ecclesiam catholicam nisi que in se continet ista tria: partem in celo triumphantem. Leff. veja Matthew Spinka. II. 41S.. Wycliffe repudiou o sistema papal como um todo e exigiu sua abolição. partem. como também sua avaliação das Escrituras como norma superior de doutrina.39 Como a igreja militante continha tanto trigo quanto joio e como ninguém podia saber ao certo. com base no princípio de “pelos frutos os conhecereis” — não deveriam ser obedecidos.: University of Colorado Press. 1966). Heresy. entretanto.W ycliffe dividiu a igreja em três partes: a igreja triunfante (incluindo-se os anjos) no céu. in purgatorio dormientem et partem in terris militantem”.40 Quase no fim de sua vida. tendo usado o conceito de predestinação para minar as reivindicações eclesiásticas de uma hierarquia corrupta.. Quanto à eclesiologia de Hus. Johann Loseth. nem a posse de qualquer cargo clerical garantia que alguém passasse a ser membro da igreja invisível. mas permanecia na tradição dos reformadores checos que sublinhavam a pregação.: Princeton University Press. Tanto Wycliffe quanto Hus foram reformadores essencialmente m orais. Magistri Johannis Hus Tractatus de ecclesia (Boulder. non est capitaneus in ecclesia sancta Dei” . mIbid. Insistia. Se a correlação que Wycliffe fazia entre a predestinação e a eclesiologia mostrou-se uma desmoralização para a supremacia papal na Inglaterra. De Ecclesia. nem a afiliação à igreja institucional. mas a reforma da igreja baseada no exemplo de Cristo e na simplicidade apostólica. cujo “abade-chefe” é Cristo. ela ateou um movimento reformista na Boêmia. Eles legaram aos reformadores do 39John Wyclif. O apelo deles à igreja invisível. Wycliffe aplicava esse conceito diretamente ao papado: mesmo os papas podiam estar entre os réprobos. a igreja militante na terra e a igreja adormecida no purgatório. p. . 655-685. o estudo das Escrituras e a eliminação dos abusos clericais. 1886). Harrison Thomson. p. desde que ele não se afaste da lei do Senhor Jesus C risto” . Ele não ensinava.] sed si non sit predestinatus. 32: “Item. N. 169. 1956). nem ainda a separação entre o sagrado e o impuro (conforme creram os hussitas posteriores). Portanto. ele escreveu: “A autoridade de Pedro permanece no papa. eo quod non est de substancia fidei catholice quod iste sit predestinatus [. (Londres: Triibner and Co. com o ímpeto do martírio de Hus. p.. John Hus' Concept o f the Church (Princeton. J. ed. pp. A propósito do cargo de papa. ed. que desejava consertar a igreja. quatro espirituais foram julgados pela Inquisição e queimados vivos em Marselha. A história dos espirituais é cercada de ironia. 1202). veja Marjorie Reeves. Francisco. Por serem um movimento de protesto dentro da igreja. ao Filho e ao Espírito Santo. Da mesma forma que Wycliffe e Hus opuseram-se à igreja empírica de sua nIbid. “o conceito de Cristo como homem tornou-se o mais poderoso desafio a uma igreja divina” . 2. foi originariamente um esforço para controlar os excessos da hierarquia papal. 1279) eram inerrantes e infalíveis! Esse argumento era dirigido precisamente contra as tentativas papais posteriores de evitar o ensino anterior. . Quanto à influência de Joaquim sobre os espirituais. asseverava que certos decretos papais que defendiam a doutrina de pobreza dos espirituais (principalmente a bula Exiit qui seminat. 208. O poder de seus apelos brotou de duas fontes: o ideal de Francisco da pobreza absoluta e a filosofia da história apresentada por (Joaquim Fiore (m. A influência deles continuou em vários grupos sectários no sul da França e da Itália. Combinados. Dessa forma. 1976). esses elementos resultaram numa crítica explosiva à igreja da época. que se oporiam à falsa hierarquia da igreja e preparariam o caminho para um milênio de paz que se estenderia até o juízo final.. disse o Papa João. sendo fiel a seu ideal. p. arma tão mortal no arsenal do curalismo passado. identificaram-se como essa nova ordem. e a obediência. associadas respectivamente ao Pai. os espirituais. o bem m aior” . opondo-se aos conventuais transigentes. de anticristos. p. Os franciscanos espirituais.42 Em 1318. O alvorecer da Terceira Era seria anunciada pelo aparecimento de uma nova ordem de homens espirituais descalços. Os Franciscanos Espirituais Uma das maiores forças dissidentes da baixa Idade Média foi o ramo radical da ordem franciscana. que eles aplicaram à sua própria ordem e época. exacerbados por suas lutas com o papado. os espirituais foram irremediavelmente esmagados. que se aliava aos conventuais na discussão sobre a pobreza / absoluta. Bonifácio VIII e João XXII em particular. Eles não hesitaram em cham ar^ aos papas que se opuseram a eles. Joachim o f Fiore and the Prophetic Future (Nova Iorque: Harper and Row. I. “A pobreza é grandiosa”. deu à luz um movimento que. desintegrou-a gravemente. 43Leff. Joaquim dividiu a história em três eras. um dos primeiros líderes dos franciscanos espirituais. a igreja foi rápida em sua reação contra os espirituais. “mas a integridade é mais grandiosa. a doutrina da infalibilidade papál. “The making of the myth”.século XVI a tensão não-resolvida entre um moralismo rígido e a verdadeira igreja dos eleitos. De sua parte. Assim.43 Outra ironia é que Pedro João Oliva. como se autodenominavam. como Brian Tierney demonstrou. época com o conceito de uma igreja invisível dos eleitos. muito mais do que Wycliffe ou Hus. modelando suas congregações pela simplicidade da igreja primitiva. no século IV. onde houve uma curiosa mistura de conceitos valdenses e hussitas. Eles acreditavam que a Igreja Romana havia perdido toda sua autoridade espiritual quando o Papa Silvestre i. poderiam ouvir uma confissão ou dar absolvição. “Les vaudois et la réforme tchéque”. como um realce para o argumento da supremacia papal. 45Quanto a esse tema como expressão característica de grupos reformadores no século XII. F. O movimento espalhou-se rapidamente pela maior parte da Europa: da França e da Itália para a Suíça. 1979). que abandonou sua carreira de rico mercador por uma vida de pregador mendicante. eds. J. veja Giles Constable. in: Continuity and Discontinuity in Church History: Essays Presented to George Huntston Williams on the Occasion o f His 65th Birthday. a exemplo do próprio Cristo. os valdenses eram às vezes chamados de nudi nudum Christum sequentes. humanista do século x v . a intensidade das expectativas e dos cálculos escatológicos aumentou. Os valdenses remontavam sua origem a um Valdès ou Valdo (mais tarde chamado “Pedro” . F. Nesse ^Quanto à relação entre os movimentos hussita e valdense. recebeu por dádiva uma propriedade e poder terreno do Imperador Constantino. já que somente eles eram limpos de pecado. pp. os valdenses. assim também os franciscanos espirituais ofereceram o ideal da igreja do futuro. provou pela análise lingüística que a “doação de ^Constantino” foi uma mentira. para m ostrar seu vínculo com o apóstolo Pedro). Conseqüentemente. veja Amadeo Molvar.46 Apenas os sacerdotes valdenses. como eram chamados os primeiros adeptos. (Leiden: E. destituídos de fervor apocalíptico. para a Alemanha e até para a Boêmia. portanto. a igreja da vindoura Terceira Era do Espírito. Essa “busca do m ilênio” continuou até a Reforma. ^Lorenzo Valla. 37-51. pp. 83-91. a esse respeito. Brill. No final da Idade Média. Church e Timothy George. numa maneira bastante diferente daquela dos valdenses. eram (herdei roseto legado de Joaquim e dos franciscanos espirituais. Os Valdenses Enquanto os espirituais esperavam ansiosamente a igreja da nova era vindoura. especialmente entre os reform adores radicais que.44 Os “Pobres de Lião” . ligavam a eficácia dos sacramentos à qualidade moral dos sacerdotes. era usada. . Por se haverem despojado dos bens terrenos. Os valdenses. Bolletino delss Societá di Studi Valdesi 103 (1958). conhecidos por perfecti. os nus seguidores de um Cristo nu.45 A visão dos valdenses acerca da igreja era caracterizada por uma tendência fortemente perfeccionista e uma predisposição anti-sacerdotal. logo conquistaram ampla aceitação entre as classes mais baixas. “Nudus Nudum Christum Sequi: Parallel Formulas in the Twelfth Century” . da qual eles eram pioneiros. voltaram em busca da ecclesia prim itiva. p. muitos dos valdenses uniram-se à Igreja Reformada sem perder a própria identidade.47 Eles continuaram a florescer como a Chiesa Evangélica Valdese até hoje. Anselmo da Cantuária (1033-1109) foi chamado de “o ápice do gênio escolástico primitivo e o fruto mais maduro das escolas 47Quanto ao relato da absorção deles pelo protestantismo. 80. dias de festa. cujo estudo da Bíblia.sentido. 48Heiko A. in: Speculum 53 (1978). Um acompanhamento completo desse período controvertido exigiria uma obra à parte. Oberman. Calvino e Menno tiveram de lutar. Dias santos.48 Cada um dos quatro reformadores que examinaremos neste livro foi moldado pelas contracorrentes que caracterizaram o desenvolvimento teológico desde a morte de Tomás de Aquino (1274) até a de Gabriel Biel (1495). levandose em conta o que um historiador chamou de “a pluralidade fértil” dos séculos xiv e XV. de uma maneira ou de outra. peregrinações. a teologia era basicamente trabalho dos monges. De fato. The Radical Reformation (Filadélfia: Westminster Press. Nos séculos desde a tomada de Jerusalém pelos invasores islâmicos (638) até sua retomada pelos cruzados cristãos (1099). relíquias. Os valdenses tiveram condições de sobreviver às freqüentes perseguições por causa de seu modelo separatista de igreja e devido à sua prática de culto clandestino. A afinidade manifesta que tinham com o movimento protestante tornou-os os candidatos principais à conversão. Teologias em Constante Mudança A partir do levantamento acima apresentado acerca da religiosidade e da eclesiologia da baixa Idade Média. O Escolasticismo O termo escolasticismo refere-se à teologia das escolas (scholae). indulgências e até a crença no purgatório — tudo isso foi varrido por se tratar de excrescências maléficas da falsa igreja. encontrava-se cercada de diversos modelos de espiritualidade e de comunidade cristã. na Reforma. Seu anti-sacerdotalismo levou-os a eliminar de sua adoração vários rituais comuns à Igreja Romana. Williams. nas vésperas da Reforma. Zuínglio. 1962). Lutero. A antiga idéia de que a Reforma destruiu completamente a imperturbável unidade de uma cristandade indivisível deve ser descartada. deve ficar claro que a igreja. veja George H. eles representam um ressurgimento do princípio donatista contra o qual Agostinho havia lutado. Aqui. pp. “Fourteenth Century Religious Thought: A Premature Profile”. dos pais da igreja e da literatura clássica fazia parte de sua devoção à vida contemplativa. . 518-529. apenas introduziremos várias das principais tendências com as quais. 1946). as Escrituras interpretadas mediante a tradição. viria a ser a hesitante preocupação da teologia escolástica desde a época de Anselmo até a Reforma. ea quae ad sacram doctrinam pertinet. A tentativa de aplicar os instrumentos da razão aos dados da revelação avançou significativamente com Pedro Abelardo (m. o sucesso de Aquino foi extraordinário. por uma análise do próprio conceito de Deus. mas sim pela observação dos efeitos de Deus no mundo visível. 1160). do outro. de um lado. Na teologia. 1. A existência de Deus pode ser provada pela razão natural. a fé encontra-se sempre por ser compreendida: fides quaerens intellectum. No prólogo à Summa Theologica. Pela razão tão-somente.” Summa Theologiae (Madri: Biblioteca de Autores Cristianos. 631 perguntas. 1961). Alberto Magno e. S. p. da encarnação. . Esse desenvolvimento atingiu seu ápice no século xni. dos sacramentos e assim por diante. Em qualquer aspecto.49 De fato. prometeu “seguir o que concerne à doutrina sagrada com tanta brevidade e clareza quanto a matéria perm ita” . p. S. sed credo ut intelligam. pode-se saber que Deus é. 51“Haec igitur et alia huiusmodi evitare studentes. mas não o que Deus é. secundum quod materia patietur. Quanto às origens monásticas do escolasticismo.51 A “brevidade” que se seguiu estende-se em 21 volumes. p. Pedro Lombardo (m. isto é. cum confidentia divini auxilii. Tomás 49David Knowles.50 O equilíbrio apropriado entre a fé e a razão. para fornecer o material de sua exposição da Trindade. Anselmi Opera Omnia. ed. como pensava Anselmo. I. mas creio para entender” . Obviamente. Esse é o fundamento das famosas cinco provas——^ de movimento. o famoso argumento ontológico de Anselmo para a existência de Deus encontra-se manifestado em forma de oração. tentabimus. 100. com o surgimento da grande summae escolástica e dos esforços de teólogos brilhantes como Alexandre de Hales. Prólogo. Anselmo está na encruzilhada das culturas monástica e escolástica. Nam et hoc credo: quia ‘nisi credidero. The Evolution o f Medieval Thought (Nova Iorque: Random House. Aqui. “Não procuro entender para crer. non intelligam’. Schmitt. 10 000 objeções ou réplicas! O resultado final dessa vasta produção foi m ostrar que Deus e toda a criação estavam unidos numa grande corrente de existência. acima de todos. 1961).” Proslogion. de grau e de desígnio — que constituem o argumento cosmológico de^qüm õ~ã~favor da existência de Deus. 50“Neque enim quaero intelligereut credam. 3. não. 1962). A maior parte da Summa relaciona-se com esse último. breviter et dilucide prosequi. The Love o f Learning and the Desire fo r God (Nova Iorque: Fordham University Press. de contingência. pois sua teologia começa com a fé e prossegue através do entendimento indo para a visão. F. 1142) e seu pupilo. de causa. conforme tinha sido infiltrado e transmitido desde Agostinho. Tomás baseou-se na revelação divina. Significativamente. I. Tomás de Aquino. veja Jean Leclercq. e entre a natureza e a graça.m onásticas” . (Edimburgo: Nelson and Sons. cujos Quatro Livros de Sentenças tornaram-se o padrão para o estudo teológico avançado durante os quatro séculos seguintes. 98. por harmonizar a recém-redescoberta filosofia de Aristóteles com o consenso patrístico. estava convencido de que havia uma harmonia essencial entre razão e revelação: ambas testemunhavam. como método de fazer teologia. 2) a da metafísica para a meta-história. sua promessa. algumas das quais tinham sido sustentadas por Tomás. livre para ligar-se mediante sua palavra. Tanto Duns Scotus quanto Occam fizeram grande uso da distinção entre o poder absoluto de Deus (potentia absoluta) e o poder ordenado de Deus {potentia ordinata). sua Summa Theologica foi colocada sobre o altar ao lado da Bíblia. Em 1879. condenou 219 teses.14: “ . mas sim a aperfeiçoa. quando canonizado pelo Papa João xxm . Tomás chegou perto de limitar a liberdade absoluta de Deus.. Um de seus textos-prova favoritos era Êxodo 3. mas poderia . o Papa Leão xm declarou que o ensino de Tomás seria a filosofia oficial da Igreja Católica Romana.. 1308) e Guilherme de Occam (m. Stephan Tempier. a unicidade de Deus. Ainda assim. Ambos os pensadores estavam envolvidos numa importante transmutação da síntese escolástica do século xm . Em 1277. Esse foi fundamentalmente um ataque ao aristotelianismo radical que levara alguns pensadores a negar fundamentos da doutrina cristã como a imortalidade da alma e a criação ex nihilo. Dentro do ser dê Deus. apenas três anos após a morte de Tomás. todavia. Tomás entendera Deus sobretudo relativamente ao esplendor da existência. os dois teólogos mais importantes eram franciscanos: Duns Scotus (m. por assim dizer._da vontade de Deus. a vitória final do tomismo não pode obscurecer o fato de que a baixa Idade Média estava longe de uma unanimidade na aceitação da teologia de Tomás. hipoteticamente. como meio de entendimento da relação entre Deus e o universo criado e 3) a do discurso ontológico para o lógico. Um ato é virtuoso simplesmente porque Deus ordena que assim seja. Duns Scotus reagiu contra essa tendência postulando . Enquanto Tomás tentava harmonizar a filosofia de Aristóteles à perspectiva cristã.. a unidade de toda a verdade e o fato de que a graça não destrói a natureza. 1347).. No século que se seguiu a Tomás. Tomás aparece sem rivais como o mais influente teólogo que viveu desde Agostinho até Lutero. Se Deus não está necessariamente atado à grande corrente de existência. podia fazer qualquer coisa que não acarretasse a lei da contradição. está. Na atraente percepção tardia da história.”. ~a vontade divina tem precedência sobre o intelecto divino. cada uma em sua própria esfera. o bispo de Paris. por insistir tão fortemente na conexão ontológica entre Deus e a ordem criada. Ele tornou-se “São” Tomás em 1323.^ -primazia. Podemos apontar três mudanças básicas que tiveram conseqüências significativas para o desenvolvimento da teologia durante o período da Renascença e da Reforma: 1) a da existência para a vontade. O primeiro diz respeito ao poder pelo qual Deus. ao enredá-lo em seu próprio sistema. E u Sou o que Sou. Deus não poderia tornar dois mais dois igual a cinco. Entretanto. No Concílio de Trento. como a metáfora básica para a compreensão de Deus. muitos sentiram que ele não havia logrado êxito total. Esse desenvolvimento implicou a morte da teologia natural como fora apresentada pelos mestres escolásticos. poderia ser um mentiroso. 1958) e The Dissolution o f the Medieval Outlook (Nova Iorque: Harper and Row. tornou-se importantíssimo salientar aquilo com que ele se comprometeu por seu poder ordenado. (Edimburgo: T. em oposição à via antiqua (caminho antigo). “The Middle Ages. das categorias ontológicas para as lógicas. 604-1351”. Concebivelmente. mas a suspeita de que ele poderia deixar de cumprir sua palavra. como Tomás. ressaltando. não a racionalidade da fé. mas sua bondade. 1976). em suma. a promessa ou palavra de Deus. de que não se poderia confiar no que ele tinha prometido. Não era mais possível remontar. em vez disso. é a base da história da salvação. Medieval Thought (Chicago: Quadrangle Books. Por esse poder. O “nominalismo” que se desenvolveu dessa posição centrava-se nos elementos individuais da experiência em seu sentido concreto e em sua realidade contingente. Insistindo tão firmemente na vontade de Deus e não em sua existência. Steven Ozment descreveu o impacto dessas mudanças e a cosmovisão de Occam na vida religiosa da baixa Idade Média. Clark. 1978). Occam criou as condições para uma nova ansiedade espiritual — não a possível inexistência de Deus. 1250-1550. in: A History o f Christian Doctrine. Dentro da estrutura da liberdade absoluta de Deus. Deus decretou que a salvação seria dispensada mediante os sacramentos da igreja e do recebimento de méritos. Deus de fato encarnou-se no homem Jesus. Occam negava a existência de fato dos conceitos universais. . foi levada a efeito mais coerentemente por Guilherme de Occam. mas a capacidade de crer em Deus — esses se tomaram problemas espirituais de relevo. pp. A aliança ou pacto de Deus. Primeira Causa e assim por diante. por seu poder absoluto. Por seu poder ordenado. A terceira mudança. Deus pode abolir as regras. Não a existência de Deus. de que Deus. The Age o f Reform. Hubert Cunliffe-Jones.52 52Steven Ozment. como Tomás fez. A existência de Deus e a imortalidade da alma eram artigos da fé exatamente iguais às doutrinas da Trindade e da encarnação. Deus pode abolir alguém fora do sistema ordenado de méritos e sacramentos — sola fid e : apenas pela fé. Quanto a outros relatos desse mesmo período. não num asno. Poderia ter decretado que o adultério seria uma virtude e não um mal.(assim acreditava Duns) ter-se encarnado num asno em vez de encarnar-se num homem. a saber. que remontava aos primeiros escolásticos. Tal perspectiva resultou numa posterior constrição da esfera da razão. de que o poder por trás de todas as coisas poderia por fim se mostrar não-confiável e não-amistoso. A via moderna (caminho moderno) originou-se de seus ensinos. 246-286. isto é. Cf. e não em sua condição ontológica numa pretensa ordem de existência. também o útil esboço de David Knowles. and T. 61-62. veja Gordon Leff. à existência de Deus como Força M otora. o caráter deles como nomes (nomina) ou constructos lógicos. Ainda assim. pp. a partir dos efeitos de Deus no mundo. ed. Boaventura ensinou em seu clássico trabalho Itinerarium Mentis ad Deum [A Viagem da M ente em direção a Deus].53 Desde o arrebatamento de Paulo ao terceiro céu (2 Co 12. p. 1979). . The Western Church in the Later Middle Ages (Ithaca. reitor da Universidade de Paris e um dos líderes do movimento conciliar. a experiência mística havia sido um amparo da espiritualidade cristã. 196. O terceiro caminho era a teologia mística.55 Na maior parte. 1976). Cons. Conta-se que ele disse: “Vi aquilo que faz tudo que já escrevi e pensei parecer pequeno para m im ” . 55Bonaventura. investigava as fontes da revelação especial de Deus nas Escrituras. iluminação e contemplação. Por ser “segura” . 89-90. passando pela recepção no corpo de Francisco dos estigmas. trad. A prim eira é o misticismo voluntarista.O Misticismo No início do século XV. pp. O segundo. ele foi possuído de uma profunda experiência mística. distinguiu três caminhos para o conhecimento de Deus.: Cornell University Press. o da teologia dogmática. essa abordagem teve uma influência maior na formação da religiosidade popular. o misticismo ontológico. Aqui. An Illustrated Encyclopedia o f Mysticism (Londres: Thames and Hudson. esse enfoque à vida mística apresentava poucos desafios às estruturas ortodoxas da vida da igreja. a alma era. Jean Gerson. a ênfase é na conformidade da vontade humana com a vontade de Deus. 2. 1327). nos credos e na tradição da igreja. por assim dizer.54 Os estudiosos identificaram pelo menos duas tradições da teologia mística na Idade Média. De fato. mediante os sucessivos estágios de purgação. 54Citado em John Ferguson. perto do final de sua vida. o da teologia natural. Ele proclamava que bem no íntimo de cada 53Veja Gerson. “arrebatada para além de si mesm a” e recebia uma experiência de Deus intuitiva e às vezes extática. e. N. discernia a obra de Deus na criação e • buscava entender o Criador aplicando o uso da razão humana ao mundo finito. Por esse meio. as marcas da paixão de Cristo. era possível que a mesma pessoa fosse um expoente nos três tipos de teologia. I. 1953). Tomás de Aquino é um exemplo disso. de Tomás de Kempis. Seus escritos escolásticos mostram que ele era um mestre tanto da teologia dogmática quanto da natural. até a exposição de Bernardo acerca do Cântico dos Cânticos como a união íntima da alma com Cristo. teólogo dominicano cujas idéias heterodoxas foram desenvolvidas numa série de sermões pregados a freiras. o noivo. citado em Francis Oakley. The M ind’s Road to God.1-4). sem concluir sua grande Summa Theologica. conforme. por George Boas (Indianapolis: Bobbs-Merrill. A versão mais intelectualmente refinada desse tipo de teologia mística foi apresentada por M eister Eckhart (m. De mystica theologia speculativa.. O prim eiro. enfatizava muito mais intensamente a desconexão entre Deus e a alma. como demonstra o sucesso de Imitação de Cristo. Uma linha mais mordaz. xxiii. dizendo: “Eu posso errar. com sua ênfase na imediação da graça. Ele foi acusado de heresia. Mais perigosamente ainda.. p. Como veremos. embora postumamente. ao menos. talvez “ Raymond B. 57Quanto à questão muito controvertida acerca do débito de Lutero para com a tradição mística. ataque que negou. uma centelha da vida divina que mantinha a possibilidade de união com Deus ou a absorção nele. Sua teologia foi traduzida em linguagem popular por seus discípulos. O primeiro livro que Lutero publicou foi uma edição dos sermões de Tauler. mas não posso ser um herege — porque o primeiro tem a ver com a mente e o segundo. “um deixar-se solto” — poderia ocorrer o momento da redenção final. Eckhart foi condenado. Blakney. em 1329. o misticismo ontológico aplicou o poder absoluto de Deus à alma individual. o mesmo papa que seis anos antes havia canonizado Tomás de Aquino. sobre o coração. As autoridades eclesiásticas não demoraram para reconhecer o caráter potencialmente explosivo da teologia de Eckhart. pp. In Medieval Perspective. 219-251. também durante esse período. Somente pelo processo doloroso de desligamento de si mesmo e de todas as outras criaturas — Eckhart chamava tal processo de Gelassenheit.indivíduo havia um “abismo da alma” (Seelenabgrund). à custa do poder ordenado de Deus. Oberman. na verdade. As idéias de Eckhart não morreram com sua condenação. Johannes Tauler e Heinrich f Snsn Alguns místicos medievais posteriores levaram sua piedade a extremos excêntricos.57 O espiritualismo refinado de Zuínglio. De uma forma ou de outra. pelo m enos. Suso foi um asceta austero que gravou o nome de Jesus em sua pele. . por João xxil. Para alguns. veja Heiko A. com a vontade!” . as tradições místicas da baixa Idade Média continuaram sendo fonte vital de vida espiritual e de reflexão teológica até a Reforma e. 1941). seu desdém pela materialidade na religião. Calvino também. Meister Eckhart (Nova Iorque: Harper and Row.56 Ainda assim. a menosprezar sua importância salvífica. in: Ozment. mediado pelas ministrações sacerdotais da igreja. ed. lembra o temperamento dos místicos. Tauler tendia a reduzir os aspectos mais questionáveis da doutrina de Eckhart acerca da união mística da alma com Deus. aquele instante quando o Filho eterno nasceria dentro da alma. a teologia mística de Eckhart parecia levar em consideração um “fim da linha” para os canais estabelecidos da graça sacramental. a que chamou de Theologia Deutsch [Teologia Alemã]. “Simul Gemitus et Raptus: Luther and Mysticism”. na apropriação direta e pessoal de Cristo pela alma. Em outras palavras. parecia que a doutrina de Eckhart acerca do nascimento do Filho eterno dentro da alma levava-o a negar a historicidade do nascimento humano de Jesus ou. ed. embora ele não tenha conseguido chegar à sua própria formulação madura dessa doutrina central até ter abandonado as premissas básicas do misticismo ontológico. o misticismo deu a Lutero o arcabouço que o possibilitou lançar sua crítica à doutrina medieval da justificação. que na realidade está na Imitação de Cristo: Tu. o humanismo. o humanismo foi um movimento de reação contra o escolasticismo predominante naqueles dias. p.”59 Aqui. Menno estava-se posicionando contra certos anabatistas e espiritualistas que usavam suas experiências místicas pessoais como um anteparo para evitar a obediência rigorosa à palavra escrita de D eus. cujo trabalho abriu novas perspectivas na história. referia-se nos séculos XV e x v i não tanto a uma filosofia universal de vida quanto a um método particular de aprendizado com base na redescoberta e no estudo das fontes clássicas da antigüidade. tanto pagã. o humanismo do período da Renascença e da Reforma estava muito mais próximo do que entendemos por humanidades atualmente. isto é. 59CWMS. Ainda assim.58 Menno desaprovou especificamente as revelações místicas. estás aqui completamente presente no sacramento do altar. meu Senhor Jesus Cristo. indistintamente. p. “Não sou nenhum Enoque” . meu Senhor Deus. baseando-se nela em sua interpretação positiva da vida cristã. romana e grega. Dessa forma. ele escreveu. quanto cristã. Nenhum dos reformadores tomou sem reservas as tradições místicas da Idade Média. Calvino poderia muito bem ter feito a seguinte oração.] ou inspirações angelicais. . Menno estava familiarizado com uma herança mística mais ampla da baixa Idade Média. que estendeu a possibilidade de união íntima com Deus a clérigos e leigos. Até certo ponto. foi um movimento de reforma que se originou com a elite intelectual da Europa. príncipes e camponeses. 108. Erasmo.o menos místico de nossos quatro reformadores. O próprio termo humanismo. A d fontes! — de volta às fontes! — era o mote dos estudiosos humanistas. sempre que és digna e devotamente recebido. 310. mas a teologia de cada um deles não pode ser entendida à parte de um intenso desejo por uma sensação de imediação divina que suscitava e caracterizava a visão mística. O Humanismo Se o misticismo era uma “teologia de todo o m undo” . na literatura e na teologia. onde o fruto da saúde eterna existe em abundância. Deus e Homem. Não sou alguém com visões [. por sua vez. hoje tão livremente jogado de um lado para outro.. tendo sido dominado por ela. homens e mulheres. “não sou nenhum Elias. que havia estudado teologia 580akley.. chegou perto de uma compreensão mística em sua doutrina da presença espiritual verdadeira de Cristo na Eucaristia. como Erasmo chamava seu enfoque da vida cristã.. A philosophia Christi. um documento no qual grande parte da reivindicação papal sobre a autoridade temporal estava baseada. por que canais a mancha do pecado infiltrou-se na posteridade. Erasmo ainda acrescentou que os próprios apóstolos precisariam da ajuda de outro Espírito Santo se tivessem de debater com “nossa nova geração de teólogos” . educação que valorizava a retórica sobre a dialética. ridicularizou em seu Elogio da Loucura os requintes excessivamente minuciosos dos teólogos da época: Então há os teólogos. pp. Qual foi o momento exato da geração divina? Há diversas filiações em Cristo? É uma proposição plausível que Deus Pai pudesse odiar seu Filho? Poderia Deus ter tomado a forma de uma mulher.] Eles interpretam os mistérios ocultos como lhes convém: como o mundo foi criado e planejado. de uma abóbora ou de uma pederneira? Nesse caso. Mas esses tipos de questões têm sido discutidos exaustivamente. como uma abóbora poderia ter pregado sermões. somente as principais. os clássicos sobre os escolásticos e a ação no mundo sobre a reclusão monástica. albertistas. “filosofia de C risto” . . Lorenzo Valia (m.. nominalistas. mas sim suas especulações áridas. na Eucaristia. Em certo nível. a colheita humanista de fontes clássicas levou a uma crítica radical das instituições eclesiais e da teologia tradicional. em que medida e em quanto tempo Cristo foi formado no ventre de Maria. que a chamada Doação de Constantino. Valia desafiou a tradução tradicional da palavra grega metanoia como “fazer penitência” . era de fato uma forjadura do século IX. tanto que você sairia mais facilmente de um labirinto do que das tortuosas obscuridades dos realistas. tomistas. mediante uma análise lingüística. de um burro.60 O problema do escolasticismo não era sua ênfase sobre o aprendizado. pressupunha a reforma pela educação. realizado milagres e sido pregada na cruz? E o que Pedro teria consagrado se o tivesse feito quando o corpo de Cristo ainda estava na cruz? E mais. Esses sutis refinamentos de minúcias tomam-se ainda mais sutis mediante todas as diferentes linhas de argumento escolástico. “ CWE 27. de que maneira. que podem realmente incitá-los à ação se forem enfrentados.escolástica na Universidade de Paris. Ele demonstrou que o termo realmente significava “arrependim ento” . como. Cristo poderia ao mesmo tempo ter sido chamado de homem? Teremos permissão de comer e beber após a ressurreição? Estamos tomando as devidas precauções contra a fome e a sede enquanto há tempo. os acidentes podem subsistir sem lugar estabelecido. Em outro aspecto. 1457) provou. occamistas e scotistas — e não mencionei todas as divisões. Há outros tópicos mais dignos de teólogos importantes e iluminados (como chamam a si mesmos). de um demônio. que levavam mais a um labirinto intelectual do que a uma reforma da igreja e da sociedade. [. grupo notavelmente arrogante e melindroso. 126-127. Concordia Theological Monthly 44 (1973). nunca alcançou nem a gravidade da condição humana. mas que em si mesma não era suficiente para fornecer uma resposta duradoura às obsessivas perguntas da época. pp. O humanismo. amplamente disseminadas graças ao sucesso fenomenal da imprensa. principalmente seu aliciamento das Noventa e Cinco Teses. o que marcou a teologia dos reformadores. Steinmetz. nos séculos imediatamente anteriores à Reforma. mas a fonte patrística mais influente para a teologia reformada sem dúvida foi Agostinho.17]. veja David C.referia-se a uma mudança genuína da mente e do coração.61 Talvez a contribuição mais positiva dos eruditos humanistas à renovação religiosa do século XVI tenha sido a série de edições críticas da Bíblia e dos pais da igreja. mas o relato de minha própria peregrinação” . que teve um menor treinamento formal do que os outros. lemos : “Quando nosso Senhor e M estre Jesus Cristo disse àrrependei-vos’ [Mt 4. e citou com aprovação diversos escritos de Erasmo. Reformation o f Church and Dogma (Chicago: University of Chicago Press. Lutero encontrou nessa nova leitura do texto original uma base para seu ataque frontal à prática das indulgências. O pai da igreja favorito de Erasmo era Jerônimo. Na primeira das Noventa e Cinco Teses de Lutero. nem o triunfo da graça divina. ele dizia: “Parece-me que não estou lendo a história de outra pessoa. p. 245-260. antes de se tornarem reformadores. Sem o apoio anterior dos humanistas a Lutero. De fato. . a maioria dos humanistas. 25. tais como Petrarca. que foi atraído especialmente pelas Confissões. Erasmo incorporou a tradução de Valia em sua edição de 1516 do Novo Testamento grego. Essa perspectiva continuou informando seus estudos bíblicos e seus esforços reformadores em Zurique e Genebra. “ Petrarca. é duvidoso que o ataque de Lutero contra Roma tivesse-se tornado a cause célèbre que incendiou as mentes e as energias de toda a Europa. assim como o misticismo.62 O impacto do humanismo na Reforma ainda é discutido por especialistas no período. citado em Jaroslav Pelikan. 20. foi parte da estrutura que possibilitou aos reformadores questionar certas suposições da tradição recebida. 1984). gerada em parte por um renovado interesse na teologia de Agostinho dentro da própria Ordem Agostiniana e pela atração que Agostinho provocava nos prim eiros humanistas. houve algo como uma “renascença agostiniana” . também não deixou de ser influenciado pelo movimento humanista. A despeito da importância do humanismo como uma preparação para a Reforma. p. queria que a vida inteira dos crentes fosse de arrependimento” . 61LW 31. ambos devotos do reavivamento humanista do saber. e principalmente Erasmo entre eles. Quanto ao reavivamento agostiniano dentro da Ordern Agostiniana. Menno. “Luther and the Late Medieval Augustinians: Another Look”. Sempre que lia essa obra. também. não à atuação ritual requerida pelo sacramento da penitência. Tanto Zuínglio quanto Calvino estavam imersos nos clássicos. Por sua vez. sociais. Misericórdia Dei: The Theology of Johannes von Staupitz in its Late Medieval Setting.Bibliografia Selecionada Bentley. David C. Leva em consideração as forças políticas. The Waning of the Middle Ages. 1983. Heiko A. Johan. Steven E. ed. Ray C.. Ozment. 1966. J. 297-308. Late Medieval Mysticism. D. 1980. Princeton University Press. Oberman.I. Steinmetz. The Reformation in Medieval Perspective. Oakley. Huizinga. 1957. Melhor acerca do período medieval posterior do que quanto à Reforma. 1949. Filadélfia: Fortress Press. “Seeing the Reformation in Medieval Perspective”. Jerry H. J. N.: Cornell University Press. Francis. Estudo da erudição do Novo Testamento no Renascimento. Antologia bem organizada de fontes primárias. Chicago: Quadrangle Books. em 1919. Steven E. este é um estudo indispensável acerca da vida. Panorama bibliográfico da literatura contemporânea na área. The Western Church in the Later Middle Ages. Humanists and Holy Writ. Leiden: E. pp. intelectuais e espirituais. 1250-1550. Forerunners of the Reformation. Excelentes capítulos sobre Valla e Erasmo. 1979. Journal of Ecclesiastical History 25 (1974). The Age of Reform. . Ozmen. ' " ~ Cargill-Thompson. New Haven: Yale University Press. Publicado originalmente em holandês. Valiosa coleção de ensaios escritos por oito respeitados eruditos na área. Brill. Ithaca. do pensamento e da arte dos séculos XIV e XV. Antologia de fontes fundamentais com introduções úteis. Petry. W. Apreciação esplêndida de Staupitz e das tradições medievais nas quais ele se baseou. Panorama abrangente do período. Nova Iorque: Doubleday. 1968. Filadélfia: Westminster Press. 1971. Certa vez. p. em 1546. voltou-se para o mosteiro. . após muitas lutas. Oswald Spengler1 Lutero como Teólogo M artinho Lutero nasceu em 10 de novembro de 1483. Não é difícil afogar-se num oceano assim.ANSIANDO PELA GRAÇA Martinho Lutero Lutero opôs-se à igreja não porque ela exigisse demais. trad. mal penetrou a superfície da matéria. a qual presidiu até m orrer. Agostinho e Aquino. no qual. alguém que acredite que um resumo desses ou mesmo uma extensa biografia que apresente sua obra durante toda a vida sob o aspecto dos acontecimentos externos possa realmente explicar Lutero. Destinado para o estudo de Direito. vi. 296. mas porque exigia muito pouco. Foram feitas diversas tentativas de interpretar Lutero sob o aspecto de sua ’Oswald Spengler. da fé e da igreja. aproximam-se da estatura de Lutero. mas também à sua poderosa originalidade e enervante profundidade. Apenas dois outros teólogos na história da igreja. filho de um m inerador de prata de classe média. Isso o envolveu num conflito com o papado. seguido de sua excomunhão e da fundação da Igreja Luterana. desenvolveu uma nova compreensão de Deus. Paul Althaus referiu-se a Lutero como um “oceano” . Contudo. The Decline o f the West (Nova Iorque: Alfred Knopf. os próprios documentos do Novo Testamento. foram estudados com tanto escrutínio quanto as obras do reformador de W ittenberg. por Robert C. II. 1928). Schultz. apenas outro conjunto de escritos. p.2 Essa imagem aplica-se não somente à enorme produção literária de Lutero. Essas três frases resumem a vida de Lutero. em Eisleben. 2The Theology o f Martin Luther. mais de cem fólios na grande edição de W eimar. . pp. 685. preguei. Martin Luther: An Introduction to His Life and Work (Filadélfia: Fortress Press.influência mais tarde na história. sim. escrevi a P alavra de D eus. e dirigir a atenção à fonte do pensamento do reformador. enquanto eu dorm ia. Longe de tentar fundar uma nova denominação. crucificado p o r ninguém . 1915). não era o protesto de uma falsa humildade. já em surgimento. m as cristãs. um psicótico demoníaco derrubando os pilares da Igreja Mãe.. 199-235. II. The Legacy o f Luther (Londres: Hollis and Carter. os teólogos nazistas fizeram dele um proto-ariano e o precursor do Führer. p. p. m iserável saco fétido de larvas cheguei ao ponto em que as pessoas cham am os filhos de C risto p o r m eu e não se N em fui que sou.3 A historiografia católica tradicional retrata um monge louco. os textos de Lutero podem ser citados em defesa de cada uma dessas caricaturas.5 3As inúmeras apreciações de Lutero desde a Reforma foram registradas por Ernst Walter Zeeden. um M oisés. Significativamente. na Inglaterra e na França. um Elias. considera seriamente a própria autocompreensão de Lutero. perverso nom e?4 Essa renúncia.” Compreender o que Lutero quis dizer com essa afirmação é apreender o impulso central de sua teologia da Reforma. C f também o sumário em Bernhard Lohse. 1986). Lutero foi o cavaleiro divino. Lutero sempre viu a si mesmo como um fiel e obediente servo da igreja. mas. terem sido chamados “luteranos” : A p rim eira coisa que peço é que as pessoas não façam uso de m eu nom e cham em luteranas. “O ensino não é m eu. pp. Lutero explicou sua percepção acerca de seu próprio papel nos eventos da Reforma: Sim plesm ente ensinei. Works o f Martin Luther (Filadélfia: Muhsenberg Press. entretanto.. a P alavra enfraqueceu tão intensam ente o papado que n enhum p rín cip e ou im p erador jam ais fez estrago assim . Os nacionalistas alemães celebravam-no como herói do povo e “pai de seu país” . até mesmo o Quinto Evangelista e o Anjo do Senhor. um Sansão (demolindo o templo dos filisteus!). 399-400. 4WA 8. ou bebia cerveja de W ittenberg com m eu F ilip e e m eu A m sdorf.] C om o eu. Para os protestantes ortodoxos. A P alavra fez tu d o . N ão fiz nada. Luther’s Progress to the Diet o f Worms. 5Citado em Gordon Rupp. Q ue é L utero? O ensino não é m eu. [. Nenhuma delas. Para os pietistas. foi o bondoso apóstolo da conversão. assim como na Alemanha. escrita em 1522. Daí seu profundo desgosto pelo fato de os primeiros protestantes. um real esforço de reduzir um “culto da personalidade” . . 99. Num sermão do mesmo ano. 1954). não fiz m ais nada. E en tão. que é onde uma avaliação satisfatória de sua teologia deve começar. mas certamente um cumpridor dela. a queima da bula papal. Os ouvidos são os únicos órgãos do cristão” . isto é. ele requer apenas os ouvidos. foram eliminados.Tal afirmação parece fantástica à mente moderna.7 Ele ouviu a Palavra porque era sua tarefa fazê-lo e porque veio a crer que a salvação de sua alma dependia disso. o debate com John Eck. o ouvir. Deixei a Palavra ag ir. não tão dramático e raramente relatado. 9: “Natura verbi est audiri” . a fé. o que foi chamado a fazer. no jardim .6 Lutero não via a si mesmo como agente da revolução eclesiástica. abrandando os camponeses. Contudo. pois. quando o ancião declarou que o jovem Lutero devia preparar-se para a 6Este é o título do excelente estudo de Ernst Bizer acerca da doutrina da justificação apresentada por Lutero: Fides ex Auditu: Eine Untersuchung über die Entwicklung der Gerechtigkeit Gottes durch Martin Luther (Neukirchen: Moers. a fé. foi ouvir a Palavra. entretanto. A vida de Lutero presta-se a uma narrativa dramática: a crise na tempestade. O fato de o papado e o império terem sido abalados. Fides ex auditu. as mãos ou qualquer outro membro. a perspicaz análise desse texto em Gerhard Ebeling. um homem de ação. Cf. “Não fiz nada. na nova lei. pelas palavras de um simples monge alemão. debatendo. ele não será capaz de dar absolutamente nenhuma outra resposta além da que é a escuta da Palavra de Deus. quando muito. Portanto. não pode haver nenhuma outra resposta senão que ele ouve a Palavra de Deus. os ouvidos são os únicos órgãos de um homem cristão. “a fé vem pelo ouvir” . Ele atacou as indulgências porque a Palavra já havia criado raízes profundas em seu coração. 1958). p. casando e dando-se em casamento: Lutero não era apenas um ouvinte da Palavra. Lutero não se tornou um reformador porque atacou as indulgências. . p. 70-75. Há. a confissão “aqui permaneço eu. foi apenas um subproduto providencial de sua vocação anterior. 224: “Mas a palavra ‘ouvidos’ é extraordinariamente enfática e poderosa. padre da ordem agostiniana. se não destruídos. Ele e Johann von Staupitz. segundo ele. LW 29. era primordial para Lutero. pois ele é justificado e declarado cristão por causa da fé. Luther: An Introduction to His Thought. Lutero também disse: “Se você perguntar a um cristão qual é sua tarefa e por que ele é digno do nome cristão. é talvez o melhor resumo de sua descoberta da Reform a. outro incidente em sua carreira. em W orms. todos aqueles incontáveis encargos das cerimônias. intervindo em crises políticas. Quanto a “ouvidos como os únicos órgãos do cristão” . 7WA 4. pp. Deus me ajude” . para a qual Lutero representou. “A Palavra tem por natureza o ser ouvida” . Pois se você perguntar a um cristão qual é a obra pela qual ele se torna digno do nome ‘cristão’. estavam sentados sob uma pereira. 222. A tal ponto que tudo foi reduzido a um modo fácil de viver. Deus não exige mais os pés. de importância decisiva para sua obra futura. ele ressaltou. o receber. em Leipzig. e não devido às obras de algum membro” . p. logo depois de Lutero ter saído de uma de suas depressões espirituais. ensinando. Desafiando o papa. mentor e confessor de Lutero. isto é. pregando. isto é. Aconteceu em setembro de 1511. os riscos de pecados. um Lenin ou um Robespierre do século xvi que abalaria o mundo e derrubaria reinos. veja WA 57/3.” O que Lutero realmente fez. o Formatus. Gálatas (1516-1517). observou: “No transcorrer desses estudos. o Rev. Lutero também responsabilizou a iniciativa divina. o papado cruzou meu caminho e quis impedir-me. p. p. pp. por pura obediência. 103: “Quando comprometido com esse tipo de ensino. contra minha vontade. o texto original em WA TR 3. M artinho. durante esses anos. nIbid. 187-188. Referindo-se ao estímulo de Staupitz. o grau foi solenemente conferido. Schwiebert. que o habilitava a dar preleções introdutórias da Bíblia. Lutero já havia completado os três graus exigidos para o doutorado: o Baccalaureus Biblius. fui chamado e forçado a tornar-me doutor. compilado em 1514. que tanto amo. e tive de aceitar um cargo de ensino como doutor. Dr. p. Lutero.carreira de pregador e tornar-se doutor em teologia. e irá acontecer de forma ainda pior. apegou- 8Essa é a paráfrase da resposta de Staupitz feita por Roland Bainton em Here I Stand: A Life o f Martin Luther. Cf. 59.. ele passou a preencher os requisitos para seu doutorado em teologia. Lutero passou da condição de monge desconhecido numa universidade atrasada para o palco central da política européia. E óbvio para todos como isso aconteceu. Deus tem muito trabalho para homens inteligentes lá no céu” . Em 18 de outubro de 1512. 386. . sucedendo ao próprio Staupitz. num tom de pilhéria: “Tem razão. mais tarde. Mais tarde. ele foi sustentado por um forte sentido da importância de seu chamado como professor das Escrituras Sagradas. o qual sentiu que Deus o havia “empurrado para o jo g o ” . Ao que Staupitz respondeu. que o autorizava a fazer preleções sobre os dois primeiros livros das Sentenças de Pedro Lombardo. casando-se com uma ex-freira. ele disse: “Eu.. o papado soltou-se de m im ” . pregar a ensiná-las fiel e sinceramente” . que significava um conhecimento prático da terminologia escolástica e o Setentiarius. replicou: “Vossa Reverendíssima vai privar-me da vida” .11 Embora Lutero mais tarde tivesse renunciado a seus votos monásticos. nem sequer chega a citar o nome de Lutero!) No tumulto que se seguiu. Então.10 Ademais. Como Calvino. 1950). Eu não serei impedido” . um anel de prata e duas Bíblias. e prometo e voto pelas Sagradas Escrituras. Luther and His Times (St. Hebreus (1517) e novamente Salmos (1518­ 1519). LW 34.9 No inverno de 1512. G.8 De fato. 193-196. a que se seguiram por sua vez Romanos (1515-1516). 9Os detalhes da promoção de Lutero ao doutorado encontram-se revistos em E. uma fechada e a outra aberta. M artinho Lutero começou a preparação para seus sermões sobre Salmos (1513-1515).] Dr. (Um Quem É Quem das universidades alemãs. [. 10WA 30/3. pp. Nessa ocasião. Lutero recebeu uma boina de lã. o compêndio doutrinário tomado como padrão na Idade Média. bastante espantado com tal sugestão. Louis: Concordia. Ele fora indicado para o resto da vida como lectura in Biblia na Universidade de W ittenberg. na Universidade de W ittenberg. O que temos em mente é a campanha que Lutero levantou contra a teologia escolástica de sua época e seus planos para uma reforma geral do currículo universitário. I3WA 40/1. isto é. A teologia de Lutero era ao mesmo tempo bíblica. Isso não significa que a teologia de Lutero era casual. Em nenhum deles. isso significa uma ruptura radical com o currículo padrão da teologia escolástica e uma reorientação da teologia ao texto bíblico. mas sim de irmão Andrew e caro vizinho.se tenazmente a seu professorado e a seu grau de doutor. tratados polêmicos. Lutero censurou o novo estilo de vida de Karlstadt em seu tratado “Contra os Profetas Celestiais” : “O que você acha agora? Não é uma bela nova humildade espiritual? Usar um chapéu de feltro e trajes cinzentos. Isso pode significar simplesmente que ele era um professor de exegese. cartas pessoais.13 De que maneira devemos compreender Lutero como teólogo? O corpus luterano contém muitos gêneros diferentes de escritos: comentários. LW 40. Devemos deixar que Deus opere em nós. 117. a fim de que “o estudo da Bíblia e dos pais da 12Nos primeiros anos da Reforma. sobretudo do Antigo Testamento. nem que não havia temas gerais e padrões em seu pensamento. controvérsias. Em termos mais amplos. com metas definidas em mente.. catecismos. não querer ser chamado de doutor. p. Dessa atividade basicamente passiva. dirigidos a situações particulares. em 1512. Para fazer isso. entretanto. como qualquer outro camponês [. WA 18. fornece somente afirmações teológicas específicas. ambos resultado de um desenvolvimento anterior. Andreas Bodenstein von Karlstadt. 610: “Na realidade. Lutero era um teólogo bíblico. demitiu-se de seu cargo universitário e juntou-se aos camponeses de Orlamíinde como seu pastor-fazendeiro. e não ativo. pp. em vez de impor nossa estrutura sobre ele. destituiu-se de suas insígnias acadêmicas.. há algo que remotamente se assemelhe a uma teologia sistemática. dedicou-se a ouvir a Palavra de Deus. sermões. pela qual Lutero foi apenas parcialmente responsável. Não estamos falando aqui da doutrina formal de Lutero sobre as Escrituras. será bastante útil examinar o enfoque teológico básico de Lutero. etc. ad hoc. Entretanto. a Conversa de Mesa. p. o qual podemos descrever sob o aspecto de três características constantes.] como se o comportamento cristão consistisse em tais dissimulações externas”. Mesmo a Confissão de Augsburgo. Lutero recebeu algo extraordinário para d izer. não um sistema doutrinário completo. contudo. superior de Calvino em Wittenberg que havia presidido a cerimônia de outorga do doutorado de Lutero. Os escritos de Lutero são invariavelmente contextuais. nosso saber é passivo. a meditar profundamente sobre as Escrituras. 100-101.12 Como professor da igreja. hinos. somos conhecidos por Deus em vez de o conhecermos. devemos deixar os temas emergirem das próprias preocupações primordialmente pastorais de Lutero. existencial e dialética. Ele dá a Palavra” . nem do princípio reformista da sola scriptura. renunciou seus próprios graus de doutor (ele possuía três!). . A verdade é que não pode tomar-se teólogo sem se livrar de Aristóteles. O que ele rejeitava era todo o esforço da teologia escolástica de fazer da filosofia aristotélica a pressuposição da doutrina cristã.14 Lutero instruiu-se completamente na tradição nominalista da baixa Idade Média.° 74: ". comparado com o estudo da teologia. o homem. 45. a fé com a razão. bem cedo em sua carreira. 15Veja Brian A. in: The Reformation in Medieval Perspective. p. Oberman faz desse texto em “Facientibus Quod in se est Deus non Dene gat Gratiam: Robert Holcot O . Lutero revelou um profundo ceticismo acerca do valor da filosofia na atividade teológica: “A teologia é céu. mesmo após seu aparecimento como reform ador. P . é terra. e suas especulações são fumaça” . tais como a questão dos universais.15 Entretanto. Luther in the Light o f Recent Research (Nova Iorque: The Christian Herald.. Brian Gerrish mostrou que o uso que Lutero fazia do termo razão (ratio. 16WA 9. 170. Steven Ozment. Em resumo. a igreja com a academia. quando ainda um Sententiarius. 269-270. 1962). Vernunft) era mais matizado. '’Heinrich Boehmer.. 65. fé. . p. 1916). ed. Lutero não denegriu de maneira 14WA BR 1. a inimiga de Deus. Gerrish. Luther: Early Theological Works (Filadélfia: Westminster Press. p. 1971). aproximadamente dois meses antes da explosão da Controvérsia das Indulgências.. Frau Hulda — que seus críticos muitas vezes o rotularam de irracionalista. p. pp.igreja possa ser imediatamente restaurado em toda sua pureza” . (Chicago: Quadrangle Books. seu antigo professor em Erfurt. ele se referiu aos nominalistas como “teólogos-porcos” . 119-141. Isso se encontra numa carta de 9 de maio de 1518 que Lutero escreveu a Jadotus Trutfetter. A partir de 1515. Em certos tópicos.18 Lutero não tinha nada contra Aristóteles em si. justificação — à algaravia escolástica.17 Em setembro de 1517. 87. Lutero resumiu seu ataque contra a teologia escolástica num disparo contra Aristóteles: É um erro dizer que um homem não pode tomar-se teólogo sem Aristóteles. Lutero continuou sendo um expoente da via moderna. mesmo o reino dos céus. Grace and Reason: A Study in the Theology o f Luther. a besta. 18James Atkinson. and the Beginnings of Luther’s Theology”. Os epítetos dados por Lutero à razão eram tão severos — a M eretriz do Diabo. ut rursum Bibliae et S. Lutero perguntava o que Jerusalém tinha a ver com Atenas. pp. Patrum puríssima studia revocentur”“ . sim. No espírito de Tertuliano. de reduzir os grandes temas das Escrituras — graça. Veja a análise que Heiko A. o todo de Aristóteles é como a escuridão para a luz. de interpretar a revelação bíblica relativamente à “sofística” pagã. entretanto.16 A percepção de Lutero com respeito ao abismo intransponível entre a teologia e as “especulações” humanas intensificou-se à medida que ele mergulhava mais profundamente nos textos bíblicos. ed. n. queremos dizer que. Poderemos apreender melhor esse conceito mediante um breve estudo de palavras em três expressões cruciais do vocabulário de Lutero. não posso e não irei me retratar” . 20WA TR 1. tirou a primazia da revelação. experiencial e relacional. “D eus” nunca pode ser colocado entre aspas.alguma a razão naquilo em que é cabível. da filosofia neokantista) foi precisamente a 19Gerrish. para ele. 21Gerrish. em todas as dimensões da vida. ele até mesmo conferiu à razão redimida uma tarefa funcional no trabalho da teologia. da perspectiva de Lutero. a razão incorporada à fé. Calvino fez uma afirmação semelhante ao insistir que.19 Para Lutero. O que ele realmente rejeitou como teólogo bíblico foi a arrogância da razão. Coram Deo A existência humana é vivida coram Deo. porque a razão informada pelo Espírito Santo “extrai todos os seus pensamentos da Palavra” . O grande pecado da teologia escolástica (e também. pp.21 Lutero não depreciava a racionalidade humana. 100: “Estou muito consciente de que é com Deus que tenho de me relacionar [mihi esse negotium cum Deo]”. isto é.2. 22CR 11. p. LW 54. no campo da verdadeira teologia. o interesse por Deus era uma questão de vida ou morte. 24-25. Para Lutero. Madame Jezabel” torna-se insuficiente. 71. Quando a razão ultrapassava esse nível “m undano” e começava a investigar e discutir sobre assuntos divinos. na teologia escolástica. 439. pp. A razão não era uma fonte independente de autoridade paralela às Escrituras — sua consciência ainda estava “cativa à Palavra de D eus” — mas meramente a inferência necessária das próprias Escrituras. porque “todas as obras e palavras de Deus são contra a razão” . a razão funcionava apenas ex p o st facto. . a teologia era sempre intensamente pessoal. que. poderia assim “servir a fé ao pensar sobre alguma coisa” . como princípio ordenador pelo qual a revelação bíblica era claramente apresentada. daí ele ter rejeitado os argumentos clássicos da existência de Deus. p.17. Institutes 1. envolvendo não apenas o intelecto de um homem. em sua habilidade de julgar e discernir os assuntos da sociedade e do governo humanos. Quando chamamos Lutero de teólogo existencialista.20 Isso deve ser firmemente lembrado quando ouvimos a famosa declaração de Lutero em Worms: “A menos que eu seja condenado pelas Escrituras e pela razão simples. ou seja.22 Isso não está relacionado a uma crença formal em Deus. os seres humanos têm “negócios com D eus” (negotium cum D eo). A razão iluminada. Para Lutero. “diante de D eus” ou “na presença de Deus” . mas sua existência como um todo. “essa mulher esperta. 19-20. Cf. p. tentativa de fazer de Deus um conceito ordenador. . 1969).” A tradução é a de J. eximia as pessoas de decidirem a favor de Deus ou contra ele. “por mim”. pro nobis ( “por mim ” . em Jesus Cristo. p. Apenas quando reconhecermos que Cristo foi dado pro me. Coram Deo significa que. Essa é uma acusação estranha. “por nós”). 299. Tal procedimento colocava Deus à distância. ele também não propôs nma “teoria” consistente sobre a expiação. Tal conhecimento é resultante de uma “fé meramente histórica” . The Protestan Tradition (Cambridge: Cambridge University Press. 108-143. Deus deu-se a si mesmo. que sustenta que. O Deus vivo da Bíblia é o Deus que nos encontra em juízo e misericórdia. p. eles crêem e tremem! A fé que salva deve penetrar até uma apropriação pessoal. pp. já que o lema de Lutero era a fórmula teocêntrica “deixe Deus 23“Habere deum est colere deum. teremos discernido a importância da realização de Cristo. 1955). Leia com grande ênfase estas palavras. 17. enquanto estamos sempre à disposição de Deus. Entretanto. 31/2. para nós. embora os temas de todas as teorias históricas acerca da expiação estejam presentes em Lutero. 24Essa é uma questão muito controvertida. Mas o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo não é um Deus que possamos discutir ou raciocinar. As palavras NOSSO. assim. 432. o Deus que nos condena e salva. ele não está ligado a nenhuma delas. fazia dele o objeto de uma inquirição neutra e. ou mesmo por que morreu. p. e acostume-se a aceitá-las e aplicá-las a você mesmo com uma fé segura. 25WA 40/1. Os demônios também possuem suas teorias acerca da expiação. “Acreditar num Deus assim ” . ele nunca está à nossa disposição. absolutamente e sem reservas. NÓS e p o r n ó s deveriam ser escritas em letras douradas — o homem que não acredita nelas não é cristão. disse Lutero.25 A forte ênfase de Lutero no “por mim ” do evangelho levou alguns críticos a caracterizarem sua teologia como subjetivista e antropocêntrica. Martin Luther’s Doctrine o f Christ. “é cair de joelhos.”23 Christus pro M e O âmago da teologia de Lutero era que.24 Nunca é o suficiente saber apenas que Cristo m orreu. S. Sigo aqui a tese de Ian Siggins. Gustal Aulén interpretou Lutero como um expoente da “clássica” teoria da expiação: Christus Victor (Nova Iorque: Macmillan. assim como Lutero não aceitava argumento algum para a existência de Deus. “eu”. a qual não pode salvar. Whale. um Deus cuja existência possa ser verificada na fria objetividade de um seminário. o Princípio Primeiro ou mesmo o Ser Necessário. pp. 19. p. o Deus soberano realmente é por nós. Cf. sensação de perdição. . WA 5. Ao simples farfalhar de uma folha seca. o morrer e o ser condenado fazem um teólogo. mas na verdade significa pavor. Watson. Numa famosa afirmação. p. a teologia é um processo vitalício de lutas. “nem há um só canto não preenchido pelo mais amargo sofrimento. Let God Be God! 21Cf. p. desespero.26 A boa nova é que. [. Lutero confessou: Não aprendi minha teologia toda de uma vez. 209. p. esta surpreendente declaração de Lutero: “Eu já disse muitas vezes que quem deseja ser salvo deve agir como se nenhum outro ser humano. O argumento de Lutero era que essa boa nova não podia ser conhecida in abstracto. Sua condição era tão desesperada que ele desejava poder esconder-se numa toca de ratos. p. mas tive de buscá-la mais a fundo. medo. Cf. não contra nós. ou melhor. The Righteousness o f God. existisse na terra. 146. Os cristãos diariamente devem ter por certos os 26A expressão “Velle deum esse deum” aparece na “Disputation against Scholastic Theology” [Debate sobre a Teologia Escolástica]. a leitura ou a especulação. horror.28 A experiência das Anfechtungen foi mais do que uma fase momentânea na peregrinação espiritual de Lutero. WA 16. e o peso de sua ruptura na Reforma estava na solene afirmação da soberania de Deus na salvação.. 163. p. dor. de forma que todos os seus ossos poderiam ser contados.27 Anfechtung Essa palavra é muitas vezes pobremente traduzida por “tentação” . 108-110.. Atkinson. conflitos e tentações. Ele dizia que sentia como se sua alma tivesse sido estendida com Cristo. WA 1. 433.ser D eus” . “ Gordon Rupp. 558. nas profundezas da experiência. 208. o universo inteiro parecia desabar sobre ele. de 1517. p. 5. Veja taijibém o clássico estudo de Philip S. 29WA TR I. mas o viver. mas apenas quando alguém a apreendesse pela fé. e todas essas coisas parecem eternas” . mas não havia saída.29 Portanto. Lutero usou o termo para descrever os intensos conflitos espirituais que afligiam sua consciência em sua torturante busca do Deus misericordioso. devemos estar sempre alertas contra uma securitas carnal. em Jesus Cristo. onde minhas tentações [Anfechtungen] me levavam.] Não a compreensão. Esse princípio recorrente em toda sua vida definiu sua abordagem da teologia. Enquanto a fé traz consigo uma segurança confiante. 267. além dele. e como se todo o consolo e promessa de Deus encontrados aqui e ali nas Escrituras dissessem respeito somente a ele e tivessem sido escritos apenas por causa dele” . O “vasto m undo” havia-se tornado estreito demais para ele. agressão e ansiedade. 32. Essa maneira de pensar aumentou a tensão na teologia de Lutero. quase que invariavelmente. encontra-se ali por implicação. carne e espírito. ele disse. já que nem a vida. p. 3. 283. Quase invariavelmente. veja Ernst B. nem a Bíblia prestamse a uma sistematização fácil. em vez de dissolver o paradoxo. p. a polaridade lei—evangelho é entendida conjuntamente: tanto a lei quanto o evangelho são essenciais à salvação. o pecado. 98-123. mais do que a maioria dos teólogos. Lutero. 1967). A tentação e a experiência. pp.33 Qualquer leitura das Escrituras e da experiência humana que ofereça mais do que uma análise superficial será até certo ponto dialética. Ele falava. . Accents in Luther’s Theology. LW 23. Ebeling. os mesmos termos são usados disjuntivamente: ou nos apegamos à lei e somos condenados. “Man: Simul Justus et Peccator".WA 33. e sua consciência luta quando a batalha é travada. (St. 179. Deus oculto e Deus revelado. Louis: Concordia. porque só a experientia faz um teólogo. Devemos ver agora como essa dialética é desenvolvida em sua doutrina da justificação. A verdade só pode ser alcançada quando confrontada com uma verdade contrastante. Kadai.31 A fé genuína e a verdadeira teologia são forjadas sobre a bigorna da tentação. como se o diabo estivesse longe de n ó s. Koenker. Lutero escolheu viver com a tensão. foi queimado] a sofrer essa angústia. p. o diabo e o mundo. 30W A 30/1. que revela nossa incapacidade de viver corretamente e assim aponta-nos para Cristo. p.32 A terceira marca da teologia de Lutero era seu caráter dialético . Outras vezes. em conjuntos de dois: lei e evangelho. entretanto. com respeito a Deus ou ao mundo (coram Deo/coram mundo). ouso dizer que você começará a suar frio e declarar: eu preferiria andar até Santiago de Compostella numa armadura [referência à cidade na Espanha onde se diz que o apóstolo Tiago. “Ninguém deve seguir seu caminho segura e despreocupadamente. liberdade e escravidão. 33Quanto a Lutero como teólogo “dialético”.”30 Lutero aborrecia-se com aqueles que transformavam sua ênfase no solafide (“somente pela fé”) numa crença fácil. ed. não poderíamos entender o evangelho não fosse pela lei. fé e obras. o qual enfatizava as obras em detrimento da fé. n Çf. Por exemplo. ira e graça.ataques incessantes. sem dúvida nos ensinam que a fé é “mesmo uma arte difícil” : Pois quando seus olhos contemplam a morte. Nesse caso. ou confiamos no evangelho e somos salvos. 209. Heino O. parecia regalar-se em paradoxos. Mesmo quando um dos lados desses pares não é expressamente desenvolvido. Nos Artigos de Smalcald. quando Lutero começou sua segunda exposição de Salmos. aquele Deus que punia os pecadores. Seu humor variava do desespero por todos os seus erros a uma ira fervente em relação a Deus: “Eu não amava. p. como está escrito: “Aquele que pela fé é justo. 36WA 54. meditando dia e noite em seu estudo na torre. muitos estudiosos da Reforma. de 1537. em Romanos 1. p. Todas as suas tentativas de satisfazer a Deus — orações. com um m urm urar monstruoso.35 Como Lutero chegou a essa doutrina e por que a considerou tão vital? Felizmente Lutero deixou-nos uma resposta a essas perguntas. a expressão “justiça de D eus” (iustitia Dei). quando monge. vigílias. jejuns. escreveu: “Nada nesse artigo pode ser abandonado ou transigido. enfureci-me contra D eus” . É isso o que significa: a justiça de Deus é revelada pelo evangelho. Ou. . boas obras — deixavam-no com uma consciência totalmente intranqüila. LW 34. 35WA 1. senti que estava nascendo completamente de novo e havia entrado no próprio paraíso através de portões abertos. até que comecei a entender que “a justiça de Deus” significava aquela justiça pela qual o homem justo vive mediante o dom de Deus.34 Ao mesmo tempo. silencioso. 179-187.17. ele admitiu que essa doutrina era difícil de ser mantida e que poucas pessoas estavam aptas a ensiná-la corretam ente. Perto do fim de sua vida. Aqui. p. isto é. 328. pela fé. no final de 1517. e as coisas temporais devem ser destruídas” . 225. O ponto de controvérsia é onde traçar a linha divisória entre “o jovem Lutero” e “o Lutero m aduro” . quando Lutero transformou-se interiormente de um monge agostiniano num reformador protestante? Quando eclodiu a Controvérsia das Indulgências. a semente 34WA 25. na verdade odiava. “o artigo pelo qual a igreja se mantém ou cai” . 50. e. encontrando uma compreensão evangélica do evangelho nos primeiros escritos de Lutero. 375. Entretanto. pp. mas “o resumo de toda a doutrina cristã” . 119.36 O contexto deixa claro que tal descoberta ocorreu em 1519. se não blasfemo. viverá”. atribuíram essa data tardia à memória falha de um homem velho. em outras palavras. ele “criticava persistentemente Paulo” . Além disso. essa não era simplesmente uma doutrina entre outras. lembrou como. Esta famosa passagem encontra-se no prefácio à edição de 1545 dos escritos de Lutero em latim. p. uma justiça passiva com a qual o Deus misericordioso nos justifica pela fé. Para Lutero. mesmo no céu e na terra. enchera de terror sua alma.De Simul a Semper: a Justificação pela Fé Somente O protestantismo nasceu da luta pela doutrina da justificação pela fé somente. Será que poderíamos distinguir duas experiências de Lutero: a prim eira. “iniciou a doutrina” . LW 48.. O entendimento da justificação que dominou tanto a teologia patrística quanto a medieval derivou. e a salvação tornou-se uma participação no esplendor do Ser. ocorrido em 1513 ou 1514. p. uma descoberta teológica que levou a um entendimento da justificação claro e diferente. veja John Lawson.39 O conceito grego secular da divinização foi cristianizado. datado por volta de 1518 ou 1519? Staupitz havia dirigido Lutero às “feridas do dulcíssimo Salvador” como uma saída para seu desespero. e Richard A. mas também nas feridas do mais doce Salvador”. God and World in Early Christian Theology (Nova Iorque: Seabury Press. um despertar evangélico inicial provocado pelos conselhos de Staupitz. do casamento entre a doutrina cristã e a filosofia grega. ..38 Staupitz plantou a semente ou. p. 1964). uma doença debilitante que carecia de cura. tal imagem mental subjazia um famoso dito de Atanásio — “Cristo tornou-se homem para que nos pudéssemos tornar deuses” — bem como toda a teologia da justificação de Agostinho. 202. Podemos entender melhor o desenvolvimento de Lutero com uma breve descrição da doutrina contra a qual ele reagiu. foi somente nas águas da grande batalha que ocorreu após a divulgação das Noventa e Cinco Teses que a forma madura da doutrina da justificação sustentada por Lutero tornou-se evidente. Por exemplo. Jr. Ainda assim. a segunda. 27. 38WA 58/1. 67. Ele rompera com a m etodologia escolástica a favor da teologia bíblica.. Se Staupitz não me tivesse ajudado. p. seria um asno condenável. papista [. 1948). que é Deus. em parte. The Biblical Theology o f St. mas muita germinação e muito crescimento foram necessários antes que a doutrina assumisse sua forma definitiva. 153-154. ingrato.37 Dessa maneira. Ele estava certo de que o perdão era dom de Deus. “um pertencer a Deus na ordem da existência” .40 Esse poder divino foi transmitido aos humanos em ondas sempre 37WA 1. 66: “Os mandamentos de Deus tornam-se suaves quando lidos não apenas em livros. porque ele me trouxe à luz.da teologia posterior de Lutero já havia criado raízes. A reconciliação era entendida como a realização de um novo relacionamento ontológico entre o divino e o humano. eu teria sido tragado e largado no inferno” . em Cristo.]. Irenaeus (Londres: Epworth Press. Ireneu observou os poderes curativos liberados na encarnação: o tornar-se carne do Logos significou o golpe de um poder divino e duradouro sobre o reino da fraca e não-redimida natureza. Justification: The Doctrine o f Karl Barth and a Catholic Response (Nova Iorque: Thomas Nelson and Sons. Norris. “Se eu não elogiasse Staupitz. seu confessor e superior na ordem agostiniana tornou-se verdadeiramente seu “pai em D eus” . Um corolário da salvação como deificação é o conceito de pecado como brecha na ordem do ser. ““Para uma abordagem mais completa do conceito de salvação defendido por Ireneu. 39Hans Küng. não resultado do mérito humano. conforme disse Lutero. 525. pp. p. que permanece suspenso entre a graça de Deus. 84. sempre questionando sua condição espiritual presente. . a doutrina da justificação foi ainda mais aperfeiçoada por meio da distinção entre “graça real” e “graça habitual” . foi levado ao próprio abismo do desespero. e o julgamento de Deus. p. Além disso. a questão básica de Lutero não consistia mais em ser ele uma ovelha ou um bode. ed. Na teologia escolástica. 41“ . Inácio de Antioquia já havia falado da eucaristia como “a medicina da imortalidade” . Mas a graça real não era suficientemente forte para remover a culpa do pecado original ou para transform ar o pecador ontologicamente. '" '“ Contudo. 42WA 18. pp. um caminhante. ia embora e depois voltava correndo com alguma pequena fraqueza que havia esquecido de mencionar. o antídoto para que não morramos.41 Para Agostinho. pela infusão de uma qualidade sobrenatural. Conforme Philip Watson adequadamente declarou. que é o remédio da imortalidade. Lutero foi assolado por outra dúvida: “Será que fui verdadeiramente contrito em minha confissão. O veredicto da justificação era o pronunciamento médico de recuperação. mas vivamos para sempre em Jesus Cristo. The Apostolic Fathers (Cambridge. capacitando a pessoa a realizar atos justos.. um Libertador ou um Destruidor. Se você vai confessar tanto assim. por que não faz algo digno de ser confessado? Mate sua mãe ou seu pai! Cometa adultério! Pare de vir aqui com tais tolices e pecados falsos!” . 71-98.2. A graça real concedia o perdão dos pecados reais. Então.novas. por intermédio dos sacramentos. Ele se confessava a Staupitz durante horas. p. disse: “Olhe aqui. Kirsopp Lake. também. Certa vez. alguém era declarado justo porque já havia sido feito justo. I. 1965). bastante exasperado.. Isso requeria a infusão da graça habitual. partir um pão. ou meu arrependimento foi motivado apenas pelo m edo?” .” Efésios 20. a infusão da graça pelo sistema sacramental-penitencial da igreja continuava o processo da justificação iniciado no batismo. pairando sobre sua cabeça como uma espada escatológica de Dâmocles. era exatamente esse o problema de Lutero. de forma que desejou “nunca ter sido criado como ser humano” . 195.: Harvard University PRess. p. LW 33. um certificado de saúde atestando a natureza transformada do paciente. desde que declarados na confissão. 719. mas se Deus era herbívoro ou carnívoro. A graça habitual era graça pura e não o resultado de méritos. 191. Nesta vida. 1912). Visto que apenas os pecados reais declarados na confissão podiam ser realmente perdoados. pelo menos até certo ponto. o cristão é sempre um viator. 43Watson. irmão Martinho. que conferia à alma uma qualidade divina. Lutero ficou atormentado com o medo de que pudesse ter deixado passar algum. A essa altura.43 Como vimos.42 Tal ódio transferiu-se de si mesmo para Deus. Staupitz. revelada em Cristo e mediada pelos sacramentos. Mass. p. o misticismo alemão e os escritos de Agostinho. mediante seu poder ordenado. de cujos discípulos havia aprendido em Erfurt. Um complexo de idéias e influências entrelaçadas moldou continuamente Lutero e seu pensamento sobre a justificação ao longo dos cinco anos seguintes (1513-1518). uma imoralidade. Jesus Cristo. Teoricamente. Deus havia entregue a si mesmo a fim de oferecer graça a todos os que fizessem o melhor que pudessem. a cruz de Cristo. suspenso entre a inescrutável ^Heiko A.. e fazer do adultério um pecado mortal. por exemplo. Na realidade.. Deus escolheu justificar-nos mediante canais estabelecidos. Era característica dessa tradição a famosa distinção entre o poder absoluto de Deus e seu poder ordenado. poderia ter decretado o adultério uma virtude e a fidelidade matrimonial. 166. Oberman. com base nas próprias habilidades naturais e nas boas obras.] Ele preparou o remédio ao instituir os sacramentos medicinais. fazer o que está em si) era possível merecer um semimérito 0meritum de congruó). porque ele salvará o seu povo dos pecados deles”. Contudo. esse destaque ao poder absoluto e ordenado de Deus nunca representou uma séria ameaça ao conceito agostiniano de justificação progressiva. de potentia ordinata. Continua a salvá-los diariamente expulsando a doença. p.. Mas esse foi apenas o primeiro passo no desenvolvimento de sua doutrina da justificação. Podemos ver como a figura nominalista do viator. Lutero deu os primeiros passos teológicos com os escritos do teólogo nominalista Gabriel Biel. ao pecador era possível ter algo a reivindicar a Deus. j . Por seu poder ordenado. Num sermão sobre o Advento (1460). “fazendo o melhor possível” (facere quod in se est: literalmente. a justificação podia ser efetuada sem a infusão da graça. Biel encontrava-se numa tradição bem-estabelecida. sabemos (por revelação) que.. Entretanto. mesmo para pedir algumas coisas a ele. Na verdade. dando-lhes uma saúde perfeita e preservando-os de toda doença. Por seu poder absoluto. por assim dizer. Assim. que incluía Guilherme de Occam e Duns Scotus. escolheu encarnar-se num homem. encarnar-se num rato ou mesmo numa pedra. ninguém poderia receber um mérito real (meritum de condigno). de potentia absoluta. Poderia. e lhe porás o nome de Jesus. Gabriel disse a José: “. Conforme expresso na teologia de Biel. ele já salvou seu povo preparando o remédio.44 Sem a infusão sacramental da graça. porém. Três das linhas de influência mais formativas foram o nominalismo. Deus podia fazer qualquer coisa que não violasse a lei da contradição. Ele os salvará no final.Staupitz guiou Lutero através dessas severas Anfechtungen apontando-lhe as feridas de Jesus. Forerunners o f the Reformation (Filadélfia: Fortress Press. [. Biel exortou seu rebanho a respeito da justificação: Para resumir. a fim de curar as doenças infligidas por nossos pecados. 1966). 48WA 56. abandonou “as rançosas regras dos lógicos” e a terminologia “daqueles vermes. ita nostra factio quantum in nobis est. Lutero também concordava em que a atitude apropriada do homem perante Deus era a de passividade total e submissão completa (Gelassenheit). Veja também Heiko A. assim como a lei era uma figura e uma preparação do povo para receber a Cristo.vontade de um Deus justo e a necessidade de fazer o melhor possível. 47“Ex parte autem hominis nihil nisi indispositio. The Background o f Luther’s Doctrine o f Justification in Late Medieval Theology (Filadélfia: Fortress Press. p. Entretanto. Lutero abraçou a doutrina mística da synteresis Gewissen. . Com base no famoso dito de Lutero — “o arrebatamento místico não é o caminho para D eus” — . disponit nos ad gratiam”.47 A ruptura de Lutero com os conceitos nominalistas de mérito e graça constituiu passo fundamental no desenvolvimento de sua doutrina da justificação. Oberman. Tal não era o caso. e isso pode ser confirmado pelo generoso elogio que Lutero proferiu a Tauler e aos outros místicos. pp. p. em 1515. consciência. Um bom resumo da erudição contemporânea acerca do relacionamento de Lutero com o misticismo encontra-se em Bengt Hägglund. Durante algum tempo. 9. 2-16. mas uma indisposição e um rebelião ativa. 225. 262: “Unde sicut lex figura fuit et preparatio populi ad Christum suscipiendum.” WA 1. “Portanto. 219-251. 29. p. o mais tardar. Num sermão proferido no dia de S. uma em parte (1516) e outra no todo (1518). também o fazer o que está em nós (factio quantum in nobis est) dispõe-nos para a graça. 288. que Tauler publicou duas vezes. poderia precipitar a angústia experimentada pelo jovem Lutero. em Ozment. 1971). 26. os filósofos” . exemplificada na paixão de Cristo. Lutero descreveu essa synteresis como brasas sob cinzas. Lutero continuava defendendo a necessidade de fazer o melhor possível como predisposição para a recepção da graça. “ WA 47. Ele havia experimentado a renúncia ao inferno como parte de sua “preparação” para a graça.48 poder-se-ia concluir que Lutero foi afetado apenas negativamente pelo misticismo.46 Veio a perceber que o que precedia a graça não era uma disposição. a essência básica da alma (Seelenabgrund). Estêvão (26 de dezembro de 1515). 300. Durante esses anos. p. Essa é uma das teses de Lutero em sua “Disputation Against Scholastic Theology” . Foi Staupitz quem primeiro apresentou a Lutero os escritos do místico dominicano Johannes Tauler. immo rebellio gratiae gratiam praecedit. pp. Lutero encontrou afinidade com a Theologia Germanica. que era a base antropológica da união mística. p. “Simul Gemitus et Raptus: Luther and Mysticism” . p. 11. mas que encontrou reiterados nos místicos. p. 45WA 4. em 1516. LW 31.”45 Lutero defendu uma forma da doutrina facere quoá até o fim de 1516 ou início de 1517. A perversidade do egoísmo humano e a necessidade de amoldar-se à humilhação e aos sofrimentos de Cristo eram temas que Lutero já havia desenvolvido. LW 25. ele passou a questionar a noção de synteresis. nem uma habilidade natural para auxiliar em sua própria salvação. tudo deve ter perecido” . Tornou-se muito mais uno com ele do que o ar com o brilho do sol quando este reluz em pleno dia” . despojado que estava de todos os recursos naturais.51 Esse pecado primitivo consistiu basicamente em falta de fé em relação a Deus. E num estalar de dedos ela estava diante deles. 13. aquilo que o médico chama de poderes naturais sem os quais nenhuma doença poderia ser curada. confiança mais no raciocínio humano do que na Palavra de Deus. Mais assustador que tudo é o fato de não estarmos conscientes da gravidade do nosso pecado: “Se 49WA 56. não meramente uma fraqueza passiva ou uma ausência de bem. e assim por diante. A situação do ser humano perante Deus (coram Deo) era de completa nudez. Todos os animais eram-lhes obedientes: até mesmo o sol e a lua sorriam para eles. É verdade que o Seelenabgrund não provia ao viator uma permanência inata perante Deus. já que fornecia a base para a união mística mediante o “nascimento de Deus” na alma.49 Lutero descreveu também a synteresis como a inerradicável centelha de consciência no homem natural. Eles pensaram: “Deus é paciente. Mesmo assim. p. O alienar-se de Deus teve origem na queda. 50Hagglund. 253. Tinham uma visão tão aguçada que podiam enxergar através de uma parede e ouvidos tão bons que podiam ouvir qualquer coisa a 3 km de distância. p. Isaías 1. p.50 À medida que tal processo ocorre no ser humano. matéria aguardando forma. 51WA 36. E isso ainda nos está pendurando a todos pelo pescoço. o eu é submerso em Deus “como uma gota d’água no mar profundo. além do Seelenabgrund. Aos poucos.. A atrocidade do pecado não era apenas que ele viciava todo o ser.semente enterrada. 300. Adão e Eva eram puros e saudáveis. Lutero passou a entender o pecado como uma rebelião fervente.9 — “Se o S e n h o r dos Exércitos não nos tivesse deixado alguns sobreviventes já nos teríamos tornado como Sodom a. Em tal união. ele é justificado: o homo viator é transformado no homo deiflcatus. .” — ele interpretou tropologicamente como “a menos que a synteresis e os sobreviventes da natureza tivessem sido mantidos. Que diferença faria uma maçã?”. mas que consistia numa energia incontrolável. à medida que aumentava a conscientização de Lutero acerca da completa incapacidade do pecador de salvar-se a si mesmo ou de manter qualquer postura justa perante Deus. Todavia. ela dava à pessoa natural pernas em que se apoiar. Mas depois o diabo veio e disse: “Vocês se tomarão como os deuses”. que Lutero descreveu com forte realismo: Assim. sem nada para recorrer.. que não podia ser dominada por meios comuns. o tratamento que Lutero faz desse versículo é bastante breve. “Patterns of Salvation in the First Age of the Reformation”. 153. Agostinho estão em bom andamento e.17. 53Luthers Briefwechsel.54 \ A ruptura de Lutero com Agostinho coincidiu com sua nova compreensão da “justiça de D eus” em Romanos 1.56 Esse é o limiar do novo entendimento de Lutero acerca da justificação.. sendo influenciada por várias correntes de pensamento da baixa Idade Média e passando por diversas mudanças fundamentais.53 Mais tarde. ed. p. assim. I. não seria capaz de continuar vivendo nenhum outro momento. No começo. 264-265. 100. p. pp. (Frankfurt. 56Bizer. Lutero escreveu: “Nossa teologia e S. 251-252. 52-66. claramente apresentado pela prim eira vez em dois sermões publicados no inverno. no fim de 1518 e início de 1519 — Da Justiça 52WA 39. Cf. graças a Deus. 210. um “crescer cada vez m ais” para a conquista da retidão. mas quando a porta para Paulo abriuse e entendi o que era realmente a justificação pela fé. 35LW 25. [. As mudanças de opinião de Lutero em relação a Agostinho durante esses anos são um indicador útil para traçar tal desenvolvimento. a última expressão é interpretada sob o aspecto da justificação progressiva. Archiv fü r Reformationsge schichte 57 (1966). mas não alcançou Paulo.17. mesmo na hora da m orte” . pp. Além disso. mas agora afirmou que a fé operava sem qualquer predisposição ou preparação anterior à justificação. é desconhecido dos homens em todo o imenso mundo. 97-105 . extrema e verdadeiramente mortal.. pp. 84: “O pecado radical. Sua doutrina desenvolveu-se ao longo de anos. 1884). Em seus Sermões sobre Romanos (1515). Lutero expôs novamente Romanos 1. 54Citado em Gordon Rupp.alguém quisesse sentir a grandeza do pecado. e encontramos a impressionante frase: só a fé justifica (Sola fides justificate). Enders.52 Mesmo tendo Lutero continuado a usar certos termos místicos em sermões e comentários posteriores.] Nenhum dentre todos os homens poderia pensar que era um pecado do mundo não crer em Cristo Jesus. Numa carta de 18 de maio de 1517 para seu amigo Johannes Lang.55 Em outubro de 1518. o Crucificado”. eu devorava Agostinho. 173. Rejeitamos a tese de que a doutrina da justificação sustentada por Lutero foi produzida de novo como resultado de uma percepção arrasadora. Lutero avaliou sua postura definitiva quanto àjustificação vis-à-vis Agostinho desta forma: “Agostinho chegou mais perto do sentido paulino do que todos os estudiosos. é sempre uma “busca e um esforço para se tornar justo. descartei-o” . WA 56. A mais importante dessas transformações envolveu a redefinição da justificação numa estrutura não-agostiniana. pp. sua rejeição da doutrina da synteresis foi um passo decisivo em direção a seu novo entendimento da justificação. A vida cristã. também WA 39. eles predominam em nossa universidade” . consistindo na exposição de duas expressões: “a justiça de Deus é revelada” (18 linhas com citações de Agostinho e Aristóteles) e “de fé em fé” (24 linhas com nova citação de Agostinho). tão grande é o poder do pecado” . p. I. 59LW 31. quod non fictos. deixam de ser denunciados contra nós. exatamente porque a cura havia começado. tomaste em ti mesmo o que não eras e deste­ me o que nao sou . Cf.1. Lutero falara de imputação antes de 1518. aprenda Cristo e o aprenda crucificado. antes de 1518. 441. 275. p. Lutero abandonou a figura médica da participação—infusão em favor da linguagem forense de imputação. Anteriormente. 263: “Ecclesia stabulum est et infirmaria egrotantium et sanandorum”: “a igreja é a hospedaria e a enfermaria para aqueles que estão doentes e necessitam ficar bem”. sed veros peccatores salvat. p. Pois ele mesmo é nossa única justiça até nos assemelharmos a ele. p. p. Embora nossos pecados não sejam realmente removidos. A fraqueza deles não era considerada pecado.59 57WA 56. “declarar ju sto ” . que é diferente de nossa natureza própria. és a minha justiça. a justificação era um julgamento proléptico baseado na erradicação dos pecados reais que já havia começado e na expectativa escatológica da completa remoção de todo pecado. LW 25. Senhor Jesus. 1913). Na verdade. meu querido irmão.. que ele nos sustenta em nossos pecados [. Lutero pôde escrever: Pois esta é a mais doce misericórdia de Deus. por ser nossa. Assim. mesmo da imputação da justiça alheia de Cristo. e diga: “Tu. sustinens nos in peccatis nostris et acceptans opera et vitam nostram omni abiectione digna. LW 25. não imaginários. 34. p.57 A linguagem da imputação deixa a metáfora da medicina para a da corte judicial. enquanto Lutero insistia em sua conotação legal. meio morto. p. era aquele que Deus colocava sob sua responsabilidade para aperfeiçoar e curar. 433.. antes. donee nos perficiat atque consummet” . 58Preserved Smith. WA 1. ele havia falado do progresso do cristão na graça como uma cura gradual das feridas do pecado. M «O Lutero acreditava ter recuperado o sentido original do verbo grego usado por Paulo em Romanos. 63. 2) seu caráter de pela-fé-somente. também. Agostinho e a tradição escolástica haviam-no interpretado como “tornar ju sto ” . Lutero descreveu essa transação como uma “doce troca” entre Cristo e o pecador: Portanto. Examinemos essa doutrina analisando três de seus aspectos essenciais: 1) imputação. perdendo toda esperança em si mesmo. Luther’s Correspondence and Other Contemporary Letters (Filadélfia: The Lutheran Publication Society. p. Entretanto. aprenda a orar a ele. 370: “Haec est dulcíssima Dei Patris misericórdia. 3) seu impacto sobre a expressão “a um só tempo pecador e ju sto ” . à enfermaria (a igreja) para ser cuidado e recuperar a saúde. também WA 56.Dupla e Da Justiça Tríplice — e que mais tarde recebeu uma exposição clássica no Grande Comentário sobre Gálatas (1535). de Romanos 14. e eu sou o teu pecado. meio vivo. Cristo é o bom samaritano que leva o viator. Ou. ed. Deus aceita a justiça de Cristo. O “débil na fé” .] até que nos toma perfeitos e nos conclui. A edição LW traduz incorretamente . que ele salva pecadores verdadeiros. tendo sido usado por Orígenes. 231: “Fides nisi sit sine ullis etiam minimis operibus. p. Lutero continuou a usar simul iustus et peccator depois de 1518­ 1519. A Bíblia alemã publicada em Nürnberg em 1483 traduziu Gálatas 2. mas na vitória completa de Cristo na cruz. 63WA 56. crença pessoal. Bernardo. mas justificados “na esperança da consumação futura” . 60WA 17. por assim dizer. Apenas depois de superar a visão da fé como virtude formada pelo amor Lutero pôde apreender o sentido absoluto de fiducia como uma relação com Deus. “Et hic statim implevit praecepta dei. Ademais. “Se a fé não é nada sem todas as obras. Lutero era cuidadoso em guardar-se contra a tentação de considerar a própria fé uma obra meritória. Agostinho.. contudo. Quem poderia ter previsto isso. 404.. imo non est fldes”. pp. pecadores na realidade empírica. mas ele o fez no sentido de semper (sempre) iustus et peccator.61 A fé é entendida aqui como fiducia. Falando corretamente. mas sem as nuanças particulares de Lutero. 269: “Peccatores in re. iusti autem in spe” . sob aquele indivíduo sujo?” . A pessoa que assim recebeu o dom da fé é descrita por Lutero como “ao mesmo tempo justa e pecadora” (símul iustus et peccator). ela é. dependência. Ela não faz a graça existir. non iustificat. enquanto mantinha o paradoxo da simultaneidade. juntamente com a esperança e o amor. o órgão receptor da justificação. pela f é somente.63 Agora. wher het sich des stuck versehen unter dem unflat?” 6lObviamente. até mesmo sem as menores delas. mas simplesmente torna-se cônscia de algo já em existência. Lutero não inventou tal expressão.”62 Ao mesmo tempo. então você a terá!” . em si mesma a fé não justifica. p. como Lutero deixou claro no sermão sobre o fariseu e o publicano (1521): “E o publicano cumpre todos os mandamentos de Deus sem demora.A nova percepção de Lutero era que a imputação da justiça alheia de Cristo baseava-se não na cura gradual do pecado. O cristão “misericórdia” por “justiça” . nem mesmo é fé . Ele foi imediatamente feito santo pela graça apenas. Aquino e outros. é dom do Espírito Santo. um agarrar-se ou segurar-se a Cristo. na verdade.60 Lutero insistia em que nos apropriamos da graça de Deus e daí somos declarados justos. o termo sola fide estava consolidado na tradição católica. Na tradição medieval. Também não há nenhuma correlação direta entre o estado de justificação e as obras visíveis de alguém. p. . 62WA 7. Hilário. Ter fé é aceitar a aceitação que é nossa em Jesus Cristo. a fé era considerada uma das três virtudes teológicas.16 como “gerechtfertigt [. Anteriormente. Kiing. Mas essa não é uma atividade humana autogerada. 249-250. ele havia entendido esse termo no sentido agostiniano de “em parte” pecador e “em parte” justo. ele aguçava cada um dos conceitos conflitantes num domínio soberano e total. ela não justifica. ibi mera gratia per sanctitatem.] nur durch den Glauben” . O caráter definitivo da justificação foi ressaltado: “Se você crê. Crisóstomo. Cf. mas é também sempre ou completamente justo e pecador ao mesmo tempo. O que isso significa? Com respeito à nossa condição humana caída. Em certo sentido. a narrativa de Jesus acerca do pai amoroso que dá as boas-vindas a seu filho cabeçudo.65 A doutrina da justificação de Lutero caiu como uma bomba na paisagem teológica do catolicismo medieval. Então. A implicação da mudança de Lutero de simul para semper foi notada por Paul Tillich: “Se Deus aceitasse aquele que é meio justo e meio pecador. mas não é nada boa para os que estão vivos” . m . e que tudo é pecado. “ Paul Tillich.64 Assim. Como pode Cristo ser unido assim a um pecador? Isso significa tornar a alma “uma prostituta e adúltera” e o próprio Cristo. nesta vida. Lutero expressou tal paradoxo assim: Somos verdadeira e totalmente pecadores. já que Cristo nos foi dado. também. seu julgamento ficaria condicionado pela meia bondade do homem. há inferno e há céu. Então. da própria igreja. Todavia. pecadores. Mas não há nada que Deus mais rejeite do que a meia bondade. somos considerados justos e pecadores ao mesmo tempo. considerasse blasfêmia Lutero descrever a união da alma com Cristo como um matrimônio espiritual baseado na fé somente. Systematic Theology (Chicago: University of Chicago Press. será que Lutero não tinha lugar algum para as boas obras? O Duque Jorge da Saxônia acreditava que não. e sempre seremos.não é apenas justo e pecador ao mesmo tempo. na verdade. . “ Ozment. Não é de surpreender que Jacob Hochstraten. a base penitencial-sacramental. 226. “um alcoviteiro e protetor covarde da desgraça dela” . somos também sempre justos. somos santos e justos. p. Inversamente. a vida neste mundo não é mais um período de candidatura duvidosa à aceitação de Deus. nem. p. somos. inquisidor dominicano de Colônia. quando observou: “A doutrina de Lutero é boa para os que estão morrendo. com respeito a nós mesmos e ao nosso primeiro nascimento. totalmente. Erasmo foi menos indulgente: “Os luteranos buscam apenas duas coisas — riqueza MWA 39. 150. e toda reivindicação humana baseava-se nisso” . 523. Mas ela não é menos chocante do que a afirmação de Paulo na qual estava embasada: “Deus justifica os ímpios" . já estivemos perante o trono de julgamento de Deus e fomos absolvidos — por conta de Cristo. Ela arrasou toda a teologia dos méritos e.66 Hochstraten estava justificadamente chocado com o significado da mensagem de Lutero. Lutero podia dizer que não há absolutamente pecado. para os cristãos. p. 1963). mesmo estando ele ainda salpicado da lama do chiqueiro. Então. de diferentes aspectos. 68LW 24.68 O fruto da justificação é a fé ativa no amor.° 1977] de 20 de março de 1528 a Willibald Pirckheimer: “Ubicunque regnat Luteranismus. será que Lutero abriu a porta ao antinomismo. Erasmi Roterodami (Oxford University Press. A liene H. foi quem primeiramente __________________ \_________ 67P. censum et uxorem. a partir de um amor espontâneo. pp. “mas a fé não justifica sem as obras da lei?” Sim.67 Ao ressaltar tão fortemente a iniciativa de Deus na salvação. inútil. Israel. por causa dele mesmo. . VH. certamente. em obediência a Deus por causa dos outros. 366. A tensão entre a livre eleição de Deus e a resposta humana genuína está presente já nos documentos do Novo Testamento. WA 45. Entretanto. Visto que não mais carregamos o insuportável peso da autojustificação. porque “o cristão vive não em si mesmo.69 Deixem Deus Ser Deus: a Predestinação O problema da predestinação é levantado pela especificidade da tradição judeucristã: o fato de que Deus revelou-se exclusivamente num povo. 69LW 31. Mas onde está a fé? Que acontece a ela? Onde ela se mostra? Porque. e supremamente num homem. o evangelho significa o direito de viverem como desejam ” . Jesus de Nazaré.e esposas [. que dê frutos. não como meio calculado para meus próprios objetos desejados. em sua luta clássica com Pelágio. 1928). cetera praestat illis Evangelium. p. carta [n. você diz. ela não pode ser uma coisa tão apática. pp. 264-265. Opus Epistolarum D es. hoc est potestatem vivenda ut velint” . falou dos “eleitos” e dos “poucos escolhidos” . Por outras palavras. et tarnen hoc genus hominum maxime litteris alitur. Agostinho. S. surda ou morta. Tal amor é dirigido em prim eiro lugar não a Deus. 368. para nos consumirmos em favor dos outros. a visão de que os cristãos são isentados pela graça da necessidade de observar qualquer lei moral? Lutero estava consciente da acusação e negou vigorosamente que fosse culpado disso. 702. como meu irmão ou irmã. Allen. deve ser uma árvore viva e produtiva. mas em Cristo e em seu próxim o” .] para eles. na esperança de conseguir algum mérito para a salvação. p. eds. mas ao próxim o. é verdade. 371. mesmo como Cristo também nos amou e deu a si mesmo por nós. M. Enquanto de maneira alguma somos justificados pelas obras. ibi litterarum est interitus. assim como Paulo... Jesus. Lutero incitava os cristãos a realizar boas obras. a justificação pela fé somente liberta-me para amar meu próximo desinteressadamente. estamos livres “para ser de Cristo uns para os outros” . elas devem seguir-se à fé como seu fruto característico: “Sim”. Duo tantum querunt. destinados à destruição. mas 70Agostinho. entretanto. Profundamente cônscio da impotência total de sua própria vontade em escolher corretamente. Confessions. porque dissolveste meus pecados como se fossem gelo” . a maioria dos teólgos tentou modificar a doutrina de Agostinho. mas somente no bom prazer de Deus. era resultado do livre-arbítrio. foi rejeitado pelo II Concílio de Orange (529). É verdade que Pelágio fora condenado no Concílio de Éfeso (431).71 Outros afirmavam que a predestinação era subordinada ao conhecimento prévio.desenvolveu uma doutrina madura da predestinação. Summa Theologica (Quaracchi. A graça não era algo diferente ou além da natureza. por que alguns reagem positivamente ao evangelho. Durante os mil anos transcorridos entre Agostinho e Lutero. que todos possuem. II. assim. Em outras palavras. Alexandre de Hales recorreu ao princípio da eqüidade divina: “Deus relaciona-se de igual para igual com todos” . a salvação era uma recompensa. de fazer a coisa certa. a graça era simplesmente a capacidade natural. a graça estava presente dentro da própria natureza. Ainda assim. via um grande abismo entre a natureza.™ Se. 71Alexandre de Hales. exposta em Romanos 9—11. ou seja. o prim eiro voltar-se para Deus. em lugar da livre e desacorrentada decisão de Deus de escolher quem desejasse. a visão de que ao menos o início da fé. ^ f\ w ~ Vimos como a doutrina da justificação sustentada por Lutero rompeu decisivamente com o jnodelou-agostiniano de distribuição progressiva da graça. Contudo. Para Pelágio. “puram ente” pelagiana. enfraquecendo a base da predestinação.. Somos justificados não porque Deus nos está tornando gradualmente justos. de obedecer aos mandamentos e assim obter a salvação>Agostinho. Aqui ele encontra a base para sua própria doutrina “cruel” da predestinação: da massa da humanidade decaída. enquanto outros o desprezam? Essa pergunta levou Agostinho à discussão paulina da eleição. e a graça. Deus elege aqueles que sabe com antecedência que receberão méritos de seu próprio livre-arbítrio. porque todas requeriam a assistência da graça divina. 320: “Deus se aequaliter habet ad omnes” . 1924) L. por outro lado. nem acima dela. em seu estado caído. a principal corrente da teologia medieval dedicou-se a dissolver o severo predestinacionismo daquele. Agostinho entendia a salvação como a livre e surpreendente dádiva de Deus: “Atribuo à tua graça e misericórdia. Nenhuma dessas teorias da salvação era. o fator crucial continuava sendo a decisão humana de responder positivamente a Deus. o resultado das boas obras livremente realizadas pelos seres humanos. a saber. e tal decisão é feita independentemente de obras ou méritos humanos. Deus escolhe alguns para a vida eterna e omite outros que estão. a fonte de nossa conversão a Deus reside não em nós mesmos. quod peccata mea tamquam gladiem solvisti”. e o semipelagianismo. 7: “Gratiae tuae deputo et misericordiae tuae. ' . mas a natureza coloca a si mesma no lugar de tudo. Lutero elogiou o humanista por não aborrecê-lo com questões insignificantes como o papado. na m elhor das hipóteses. Louis: Concordia Publishing House. The Structure o f Lutheranism. “atacou a questão verdadeira.77 Inclui-se essa formulação na bula Exsurge Domine.. ao fazer seu melhor. em 1520. ele disse. 220. e apontou para o alvo vital. Luther and Erasmus: Free Will and Salvation (Filadélfia: Westminster Press. Respondendo ao ataque de Erasmo a essa doutrina. “escravizada” e manchada com o mal em todas as suas ações. A essa avaliação otimista do potencial humano.”74 Uma das queixas de Lutero contra os “teólogos-porcos” era a tese deles de que a vontade humana. alguém poderia obter certa permanência perante Deus. trad. “A graça coloca a Deus no lugar de tudo o mais que ela vê. . mas sim o reino criado decaído e. Lutero — e Zuínglio e Calvino depois dele — permanece firme com Agostinho contra os “pelagianos” posteriores que exaltam o livre-arbítrio humano à custa da livre graça de Deus.73 Mas Lutero via o assunto de maneira diferente. particularmente. a questão essencial. ou que. a linha principal da Reforma protestante pode ser vista como uma “aguda agostinianização do cristianismo”!. mesmo à parte da graça. 786. será que Lutero era um determinista absoluto? Erasmo e alguns 72Agradeço ao Prof.incurvatus in se). “Apenas você” . 74WA 18.76 Na Disputa de Heidelberg. e busca apenas o que lhe é próprio e não o que é de Deus” .vo purgatório ou as indulgências. 75Rupp e Watson. eds. a vontade humana decaída. 1969). Watson. e. baseada na descrição de Harnack acerca do gnosticismo como uma “aguda helenização do cristianismo”.. Hensen (St. poderia realmente amar a Deus sobre todas as coisas. p. a partir do princípio anterior da sola gr atia.75 Com “natureza” Lutero não queria dizer simplesmente o reino criado. George H. Nesse aspecto.. em sua própria volição.72 Alguns historiadores consideram a doutrina da predestinação de Lutero uma aberração de seus temas principais ou. por Walter A. está cometendo um pecado m ortal” . [. p. p. isso é. o livre-arbítrio existe apenas nominalmente.porque fomos declarados justos com base no sacrifício expiatório de Cristo. Contudo. 1962) I: 123. 73Werner Elert. Então. 77Atkinson. p.] Apenas você percebeu o eixo ao redor do qual tudo gira. e o prefere a si mesma. As citações em inglês de De servo arbitrio foram tiradas de E. 16Ibid..!“um pensamento meramente auxiliar” . pela qual o Papa Leão x excomungou Lutero. Gordon Rupp e Philip S. Williams essa apropriada expressão. Lutero opôs um duro contraste entre natureza e graça. enquanto alguém ‘faz o que está em si’. e mesmo no lugar de Deus. que está “curvada sobre si m esm a” (. 287. Lutero defendeu a tese: “Depois da queda. em 1518. 252. 24-39. torna-se a “prostituta do diabo” .? Lutero descreveu a natureza dessa escravidão sob o aspecto de uma luta entre Deus e Satanás: Assim. mas os próprios cavaleiros brigam pela posse e controle dele. a razão é o mais elevado dom de Deus.. que é vosso pai. ele nunca negou que o livrearbítrio mantém seu poder em assuntos que não se relacionam com a salvação. aproximou-se perigosamente da linguagem necessitariana. É apenas com respeito àquilo que é “superior” a ela que a vontade é mantida presa em seus pecados e não pode escolher o bem de acordo com D eus. mas imputar-lhe um arbítrio que seja livre nas coisas de Deus é demais” . o livre-arbítrio permanence intacto. Continuamos querendo e desejando fazer o mal. Linwood Urban. ele quer ir e vai aonde Deus quer.estudiosos modernos pensavam assim. . O mesmo se dá com o livre-arbítrio. Assim. 113-139. pp. Nesse sentido. mas no momento em que excede para a teologia. 79Rupp e Watson.}Em sua esfera legítima.78 Lutero. Todavia. 170. McSorley.79 Lutero admitiu abertamente que mesmo uma vontade escravizada “não é um nada” . a despeito do fato de que em nossas próprias forças não podemos fazer nada para alterar essa condição.” (Jo 8. também Robert Shofner. Luther: Right or Wrong ? Cf.] Se Satanás o monta. Lectures on Romans. com respeito àquelas coisas “inferiores” a ela. e quereis satisfazer-lhe aos desejos. 80Pauck.80 Aqui. pp. p.. slRupp e Watson. ele não pode escolher correr para um deles ou seguir a um deles. A discussão mais útil acerca da questão inteira encontra-se em Harry J. para cumprir as responsabilidades no mundo. ele quer ir e vai aonde Satanás quer. todo o que comete pecado é escravo do pecado” e “Vós sois do diabo. 252. p. p. não somos com isso compelidos a pecar. o livre-arbítrio está totalmente corrompido pelo pecado e cativo a Satanás. Eis a 78C/. Lutero disse a Erasmo: “Sem dúvida você está certo em conferir ao homem algum tipo de arbítrio.. a vontade é como um animal entre dois cavaleiros. O que ele não pode fazer é realizar a própria salvação. seja determinado por Deus. Entendido como a capacidade vinda de Deus para tomar decisões ordinárias.. de fato. Embora nosso destino eterno. 44). Há outro ponto que Lutero desenvolveu com respeito à vontade escravizada. em certo sentido. Se Deus o monta. 140. encontramos um paralelo ao desprezo de Lutero para com a razão. Lutero estava meramente desenvolvendo uma imagem já apresentada por Jesus: “ . [. Pecamos espontânea e voluntariamente. que. “Luther on ‘The Bondage of the Will’: An Analytical-Critical Essay”.. a vontade mantém seu poder total.. in: Scottish Journal o f Theology 26 (1973). “Was Luther a Thoroughgoing Determinist?” Journal o f Theological Studies 22 (1971).34.81 Mesmo tendo alguns estudiosos encontrado traços de um dualismo maniqueísta nessa metáfora. . só quando Satanás é vencido por um cavaleiro mais forte. e você será salvo” . S5Ibid. replicava Lutero. mas serve a seus próprios interesses”. Lutero recusou-se a submeter Deus ao tribunal da justiça humana como se a “M ajestade. p.84 Ele até restringiu o alcance da expiação aos eleitos: “Cristo não morreu por todos absolutamente” . ™Ibid. “a única preparação infalível para a graça [. que é na verdade escravidão.. Só quando a vontade recebeu a graça. tivesse de curvar-se a uma das escórias de sua criação” . “é que o poder da decisão torna-se realmente livre. Deus é injusto pelos padrões humanos. Deus é apenas tão “ injusto” . m inha’. ‘Glória a Ti. 271. 82Pauck. o homem não possui nem uma razão sã nem uma vontade boa. 252. 253. p. 83Atkinson. mas censura-o por condenar os indignos. ao justificar os ímpios à parte de seus méritos. Senhor!’. porque o interesse pessoal está em jogo!87 Em ambos os casos. p. ela diz! Lance fora esse ‘m eu’ e diga. p. Lutero respondeu — com Paulo — “Deus assim o quer. 268. ela torna-se culpada porque não louva a Deus como Deus.. clamava Erasmo. 87Rupp e Watson.86 A postura da razão natural é sempre de egocentrismo. contudo.tragédia da existência humana sem a graça: estamos tão curvados sobre nós mesmos que. isso não é possível até que sejamos libertos de nosso cativeiro a Satanás e ao ego. e guiar-nos para a “gloriosa liberdade dos filhos de D eus” .83 Lutero não se esquivou de uma doutrina de predestinação absoluta e dupla.85 Contra a objeção de que tal visão transformava Deus num ogro arbitrário. portanto. para usar sua outra metáfora. p. Visto que. pensando estar livres. o teólogo.88 “Deixem Deus ser bom ” . quanto o é ao rejeitar outros à parte de seus deméritos. A “prudência da carne” diz que “é cruel e miserável Deus buscar sua glória em minha maldade.. mas justo e verdadeiro pelos seus. que é o criador de todas as coisas. 259: “Quando. isso não é perverso” . 258. em todos os aspectos concernentes à salvação” . Deus deseja que possamos ser verdadeiramente livres em nosso amor para com ele. mIbid. ninguém reclama da prim eira “injustiça” . falando estritamente. entregamo-nos exatamente àquelas coisas que apenas aumentam nossa escravidão. ainda que admitisse que “isso é um vinho muito forte e comida substancial para os fortes” . a Razão louva a Deus por salvar os indignos. O propósito da graça é libertar-nos da ilusão de liberdade.] é a eleição eterna e a predestinação de D eus” . fora da graça. p. p. “Deixem Deus ser D eus” . Ainda assim. em lugar disso. O eco de resposta à escravidão da vontade é a liberdade do cristão. 84Pauck.. e porque ele o quer. o moralista. Ouça a voz da carne! ‘Meu. ou. .82 A verdadeira intenção por trás do reforço de Lutero à vontade escravizada mostra-se óbvia agora. 252. Lutero dizia que Deus dispensava esse dom aos eleitos de maneira breve e escassa. como a justificação. Como um pastor poderia responder a alguém que estivesse atormentado por esse problema? Lutero deu duas respostas a essa questão. então. . ^Pauck. Lutero admitiu. Lutero. não dos réprobos. p. Lutero era chamado a aconselhar cristãos comuns que estavam atormentados pela questão da eleição. apelava para a reivindicação escatológica da decisão de Deus na eleição. a outra para o mais fraco ou para o novo convertido. na luz da glória. a luz da graça e a luz da glória. Foi típica sua resposta a Barbara Lisskirchen. tornamo-nos capazes de entender muitos problemas que pareciam insolúveis pela luz da natureza. ele de fato tentou estabelecer o mistério no contexto da eternidade. Mais comumente. Quando parecer que não há tal mandamento. 255. uma para o cristão forte. por trás e além de sua revelação. é também sola f l d e m Ninguém conhecia melhor do que Lutero a angústia que o duvidar da própria eleição podia provocar numa alma vacilante. aprenda a dizer: “Saia daqui. um total deixar-se perder (Gelassenheit) ante o abismo do ser de Deus. maldito diabo! Você está tentando fazer com que eu me preocupe 89Ibid. A resposta ao enigma da predestinação encontra-se no caráter oculto de Deus. em que mandamento está escrito que eu deva pensar sobre esse assunto e lidar com ele?” . os retos julgamentos de Deus — incompreensíveis para nós agora. Nesse ínterim. mas sim que somos incapazes de apreender o quanto são justos. quase sempre na hora da morte. Há. que estava aflita sentindo não se encontrar entre os eleitos: Quando tais pensamentos a assaltam. tremer em face dos desígnios ocultos de Deus. A mais alta posição entre os eleitos pertence àqueles que “se conformam com o inferno se Deus o deseja” . Mesmo assim. No final.90 A resignação com o inferno era tema popular na tradição mística e significava passividade absoluta. Lutero nunca admitiu que os inescrutáveis julgamentos de Deus eram realmente injustos. É característico dos eleitos.Embora Lutero nunca tenha suavizado sua doutrina da predestinação (como fizeram posteriormente os luteranos). 331-332. O conselho básico de Lutero era: “Agradeça a Deus por seus tormentos!” .. A predestinação. três luzes — a luz da natureza. o “Deus escondido” se mostrará um só com o Deus que está revelado em Jesus Cristo e proclamado no evangelho. podemos apenas acreditar nisso. mesmo pela luz da graça — serão abertamente manifestos. ele instava por um a completa refutação do diabo e uma contemplação de Cristo. quando tivermos prosseguido através das “luzes” da natureza e da graça para a luz da glória. pp. você deve aprender a perguntar a si mesma: “Por favor. Além disso. Pela luz da graça. segundo ele. e não menos. as Bíblias e outras obras muitas vezes eram acorrentadas a mesas de leitura. Luther: Letters o f Spiritual Counsel (Filadélfia: Westminster Press. em sua infinita bondade.. às quais Staupitz havia dirigido o jovem Lutero em suas prim eiras batalhas. no qual contemplamos o quanto Deus nos ama e quão bem. p. WA TR 3. Será evidente que você crê em Cristo.92 A história da “descoberta da Bíblia” por Lutero foi recontada com grande requinte pelos primeiros biógrafos dele. Era uma janela para a vontade graciosa de Deus. . invenção das estantes de livros. Cf. Então. ed. Comecei a ler. e de nenhum outro. G. Todos os dias ele deve ser nosso excelente espelho. a Reforma girou em 91T. sabemos que. Por exemplo. p. um homem de fato aprende a lidar adequadamente com a questão da predestinação. para torná-las mais. reler e ler novamente. Não deixe que esse espelho e trono de graça seja quebrado de diante de seus olhos. 116. uma versão observa que a Bíblia estava acorrentada de forma a evitar seu exame. que mantenhamos diante de nossos olhos a imagem de seu Filho querido.. nosso Senhor Jesus Cristo. Se você crê. Tappert. [. Essa prática continuou em Wittenberg muito depois do início da Reforma. Por fim. então será chamada. Por ser um movimento. Eu pensava que não havia nem evangelhos nem epístolas salvo aqueles escritos nos missais dominicais. então muito certamente está predestinada. se é chamada.comigo mesma. Ainda assim. só pode ser atingida mediante a cruz. que se ligou livremente à humanidade em Jesus Cristo. acessíveis. Cristo na Manjedoura: o Significado de Sola Scriptura Sentado à mesa. para grande espanto do Dr. 121. De fato. você se sentirá melhor”. 599. A predestinação.]”. E. antes da . há um quê de verdade na história. como a natureza do próprio Deus. ele cuidou de nós ao dar seu Filho amado por nós. eu digo. Desse modo. A mais sublime de todas as ordens de Deus é esta.91 A doutrina da predestinação defendida por Lutero não era motivada por interesses especulativos ou metafísicos. mediante as “feridas de Jesus” .] Contemple o Cristo dado por nós... Mas Deus declara em todos os lugares que eu devo deixá-lo tomar conta de mim [. encontrei uma Bíblia na biblioteca e imediatamente a levei comigo para o mosteiro. se Deus desejar. Lutero relembrava o seguinte incidente ocorrido quando jovem: Eu tinha 20 anos de idade e nunca havia visto uma Bíblia. 1955). “ Schweibert. Staupitz. p. . As Escrituras são a norma normans (norma determinadora). As Escrituras são “a pedra de toque apropriada” . da mesma forma como João Batista havia apontado para Cristo. 174. absolutamente. longe de ter prioridade sobre as Escrituras. Em seu tratado contra os anabatistas (1528). ao lado da tradição incluída nas Escrituras. Lutero estava eliminando a si mesmo da tradição da igreja? Não. a “pedra-da-lídia pela qual posso diferenciar o preto do branco e o mal do bem ” . é na verdade criação das Escrituras. “Pois quem gera seu próprio pai?” . extrabíblica. Ele de fato rejeitou a teoria de duas fontes da tradição. Ele manteve o Credo dos 95LW 36. p. pp. 622. credi non est necesse”. há outra. nascida no ventre das Escrituras. Nunca era simplesmente uma questão de Escritura ou tradição. reunida e guiada pelo Espírito Santo. Porque assim deveríamos rejeitar também a igreja cristã. Muito do patrimônio cristão pode-se encontrar no papado e dele descende. WA 26. como veremos). %LW 24. das unter dem Papstum viel Christliches gutes. p. p. desenvolvida mais tarde no Concílio de Trento. Ao colocar a Bíblia acima de papas e concílios. p. mas não precisamos crer nisso” . und auch deselbs herkomen sei an uns”. Escritura Sagrada ou igreja sagrada. que de fato tornou a Bíblia inferior à igreja. .95 O princípio da sola scriptura destinava-se a salvaguardar a autoridade das Escrituras daquela dependência servil à igreja. que. 97LW 36. Não rejeitamos tudo que esteja sob o domínio do papa. WA 6. oral. Ao mesmo tempo. Lutero não jogou fora simplesmente os 1 500 anos precedentes da história da igreja. a comunidade da fé. Lutero perguntava. Lutero expressou tal princípio negativamente: “O que for afirmado sem as Escrituras ou sem uma revelação comprovada pode ser considerado opinião. Obtemos uma melhor compreensão do que Lutero queria dizer com isso quando observamos o modo como usou a tradição da igreja. Em seu tratado intitulado O Cativeiro Babilónico da Igreja (1520). A suficiência das Escrituras funcionava no contexto em que a Bíblia era reconhecida como o Livro dado à igreja. isto é. 561. disse: Não agimos tão fanaticamente quanto os Schwärmer. 509: “Nam quod sine scripturis asseritur aut revelatione probata. derivada das instruções de Jesus aos apóstolos após a Páscoa e transmitida às gerações que se sucederam pelo magistério da igreja. 98LW 40. WA 6. 29. p. 107. 177. ia alles Christlich gut sei. p. opinari licet.sobre o fundamento da sola scriptura. p. não a norma normata (norma determinada) para todas as decisões da fé e da vida.96 A igreja. WA 45. 147: “Wir bekennen aber. “Quem primeiro dá à luz seu próprio criador?”97 Mesmo tendo a igreja aprovado os livros particulares incluídos no cânon (acerca dos quais Lutero tinha algumas reservas. 231.98 Sola scriptura não era nuda scriptura. estava assim meramente dando testemunho da autenticidade das Escrituras. Muitas vezes. Para ele. Watson. Captive to the Word (Grand Rapids: Eerdmans.m Esse é um termo infeliz. pp. não é nem vem de homens. a Sagrada Escritura e a santa igreja. p. J. Jack Rogers e Donald McKim. a Bíblia era o “livro do Espírito Santo” .Apóstolos. I. 43. Ele não divergia da tradição medieval em sua suprema consideração pela inspiração e pela validade da Bíblia. p. Contudo. então a interpretação está certa. 1979). The Authority and Interpretation o f the Bible (Nova Iorque: Harper and Row. 185-236. 1959). Todos os credos. não apenas suas palavras. protegiam a verdadeira intenção das Escrituras contra os desvios heréticos. Louis: Concordia. p. 166. 73-88. os historiadores referiram-se à doutrina da sola scriptura como o princípio form al da Reforma. as decisões conciliares. N à õ ~ lju eõ s credos fossem suplementos das Escrituras ou uma autoridade paralela à Bíblia. pp. A. 149-189." Assim. original: 1871). 1970. juntamente com as formulações de Nicéia e de Calcedônia. I00C/. pp. Quanto à defesa que Lutero fez aos credos antigos. Lutero só não faria concessões à qualidade de pedra de toque das Escrituras. Se não é esse o caso. Dorner. WA 14. veja Jaroslav Pelikan. 31. 1969). “o veículo do Espírito” . os ditos dos pais da igreja. os oponentes contemporâneos de Lutero estavam em perfeito acordo com ele nessa "L W 30. não devo acreditar nele. de fato. LW 30. 321. 101WA 48. ed. Quanto à doutrina de Lutero acerca das Escrituras. Luther the Expositor (St. deviam ser julgados pela “norma infalível da Palavra de D eus” — e nunca julgá-la: Ora. p. Skevington Wood. não revelam aos teólogos escolásticos (especialmente os nominalistas) nada de distintivo sobre a visão de Lutero acerca das Escrituras e. porque obscurece o sentido primário da Bíblia para Lutero. mesmo sendo escrita por homens. . nunca hesitando em seu comprometimento à prioridade da primeira. p. Na verdade. Lutero provou a inerência mútua entre as Escrituras e a tradição. A. que queria recorrer apenas a uma Tm guigèm estritamente biblica. 220. e se as Escrituras provarem que essa é a forma pela qual devem ser interpretadas. mas de D eus. se qualquer um dos santos pais pode mostrar que sua interpretação está baseada nas Escrituras. Mesmo pessoalmente não gostando de termos como homoousious e Trindade. 153. LW 35. defendeu seu uso contra reformadores como M artin Bucer. mas até suas frases são inspiradas. veja Elert. History o f Protestant Theology (Nova Iorque: AMS Press.101 As obras de Lutero estão repletas de afirmações sublimes como essas. p. em comparação ao princípio material da sola fid e . mas caro é o tesouro. isto é. in: Scottish Journal o f Theology 10 (1957). ele dizia. das ihr die äugen leutert und recht auff thut und also inn der Schrifft studivet. 194. !06LW 35. 280. a cruz de Cristo. G. p. 2: “Ich wil euch aber ein wunderliche glos und deutung der heiligen Schrifft geben. antes. nem tudo nas Escrituras fala de maneira igualmente clara sobre Cristo. WA DB 8. “Quase tenho vontade de jogar Tiago no forno.105 O desprezo de Lutero pela Epístola de Tiago é famoso e ilustra ainda mais sua fixação em Cristo como o centro verdadeiro e apropriado das Escrituras. WA TR 1. certamente acertará o alvo” . porque “enfatiza C risto” (Christum treibet). A. 12.106 Lutero. na Confissão de Augsburgo. que repousa nelas” . Lutero distinguiu a letra e forma das Escrituras de seu conteúdo: “Nas palavras das Escrituras. como o sacerdote em Kalenberg fez” (uma m C f a seguinte declaração de Guilherme de Occam: “Qui dicit aliquam partem novi vel veteris testamenti aliquod falsum asserere aut no esse recipiendum a Catholicis est haereticus et pertinax reputandus” . p. 332. de acordo com Lutero. “de forma que nelas você descubra a mim. p. Lutero estava enfatizando a cristocentricidade das Escrituras: “Aquele que ler a Bíblia deve simplesmente prestar atenção para não errar. 317. 103 A grande fraqueza da exegese alegórica era precisamente que ela obscurecia o testemunho cristocêntrico do sentido evidente e literal das Escrituras. Dialogue. The History o f Doctrines (Grand Rapids. das ihr Mich.102 Por essa razão. a m im ” . . Enquanto as Escrituras como um todo tratam de Cristo. 105LW 35. mas que ninguém as conduza de acordo com suas próprias inclinações. p. O que deu à doutrina de Lutero o caráter reformador único foi sua base cristocêntrica radical. “Fora com Tiago” . Esse é o sentido próprio e correto. você vai encontrar as faixas nas quais Cristo repousa. Simples e pequenas são as faixas. Citado em B. lendo Tiago pelos olhos de Paulo. das ihr die Schrifft recht lesen und nicht irren moget. a favor do que chamou de “sentido histórico-gramatical” . 1977). Então. m Ibid. 398. pp. Além disso. “Biblical Authority and the Continental Reformation”. Quanto às opiniões críticas de Lutero acerca das Escrituras. pois as Escrituras podem permitir que sejam estendidas e conduzidas. citado em H. Lutero abandonou o tradicional esquema quádruplo de interpretação.104 Cristo é ao mesmo tempo o centro e o Senhor das Escrituras. Em resposta. die ihr noch nicht wisset. Gerrish. que essa pessoa as leve para a fonte. veja Reinhold Seeberg. nemlich die: Sehet ihr nur zu. considerou insuficiente a teologia da graça esboçada de Tiago. Em conseqüência. 337-360. p. Lutero não elevou as Escrituras a um artigo de fé. o sentido cristocêntrico foi claramente expresso pelo próprio Cristo: estude as Escrituras. Cristo. Era “realmente uma epístola insignificante” . porque “nada havia da natureza do evangelho nela” . Mich drinnen findet” . p. p. Luther: An Experiment in Biography. 229. 104WA 51.: Baker Book House. II: 299-301. 236. p. Haile. Já em 1515. Mich.questão. “enletradas” . 3. 31n. poderíamos dizer. 109LW 35. p. 81. dessa maneira. 365. é encarnado na roupagem de sua humanidade” . não lia a Bíblia univocamente. enquanto ninguém pode julgar as Escrituras. p. so gehets dem schriftlichen Gottes wort auch“. Und gleich wie Christus in der Welt gehalten und gehandelt ist. muito mais do que apenas citar Cristo ou apresentá-lo como um exemplo válido. o evangelho. Pilatos e Herodes que o estejam fazendo. mas não um fim da fé.] repousa um belo garoto vivo. piche e coisas assim [.109 Mesmo assim.. então. “assim como Cristo. 394. mesmo quando é Pedro ou Paulo quem ensina. in: Review and Expositor 83 (1986). juntamente com Hebreus. 396. Lutero achava que os livros de Paulo. lnWA 48. WA DB 7. pelo qual todo o texto das Sagradas Escrituras devia ser avaliado. o que Lutero tinha em mente era a clara proclamação de Cristo como o Salvador dos pecadores. 385. p. LW 34. 31: “Die heilige Schrifft ist Gottes wort. WA DB 7. o que quer que pregue a Cristo deve ser apostólico. . Althaus.110 O resultado dessa discussão é óbvio: a visão que Lutero tinha da Bíblia possui vínculos muito mais próximos de sua doutrina da encarnação do que de qualquer teoria da inspiração. Por outras palavras. “O que quer que não ensine Cristo não é apostólico. “É terminantemente contra Paulo e contra todo o resto das Escrituras ao atribuir a justificação às obras” . claro. Cf. 362. Quanto a uma discussão mais completa acerca das idéias de Lutero sobre Tiago. ‘“ A Right Strawy Epistle’: Reformation Perspectives onJam es”. as boas novas de que Deus redimiu a humanidade decaída por meio da cruz de Cristo. e “os verdadeiros e certos livros principais que proclamavam a Cristo mais claramente” . Anás. p. Da mesma forma como “dentro daquele simples cesto de junco. É isso que Paulo fez tão constantemente e. 345. p.” 108 Com “ensinar Cristo” Lutero queria dizer. Lutero dizia. numa espécie de limbo entre os livros apócrifos. p. 385.111 Cristo sempre permanece o Senhor das Escrituras. veja Timothy George. geschrieben und (das ich so rede) gebuchstabet und in buchstaben gebildet. que ele rejeitava completamente. em certa ocasião. 369-382. um cânon dentro do cânon. Lutero não extirpou simplesmente Tiago de sua Bíblia. Tiago faz isso! Antes. in die menscheit verhüllet. as próprias Escrituras são sua crítica. WA DB 7. pp. WA DB 7. I10LW 35. Além disso. Judas e Apocalipse (Erasmo também tinha dúvidas sobre a canonicidade destes). eram “o pão diário da alma” . 396.. 317. que é um meio para a fé. especialmente Romanos. Gleich wie Christus ist das ewige Gottes wort. p. As Escrituras Sagradas são a Palavra de Deus revestida de palavras humanas. no fim de sua Bíblia. Ele encontrou. pp. p. a eterna Palavra de Deus. mesmo que sejam Judas. 108LW 35. usou as estátuas dos apóstolos como lenha). Ele o colocou.referência a um pastor local que. coberto de argila. p.107 Lutero. como M oisés.p. I07LW 35. 113 Lutero não sabia nada de um conhecimento da Bíblia puramente objetivo. LW 54. 46-47. pp. p. Isso significa que torna vivos os que crêem nela. desinteressado ou erudito. mesmo se possível. 53-58. como vemos em seu tratamento de Gideão: “Como era difícil que [Gideão] lutasse com o inimigo naquelas condições. p. Tal conhecimento. Não é meramente para ser repetida ou conhecida. .. 1I4B. WA TR 1. Aqui temos toda a série de emoções humanas. nem mesmo em uma teoria propriamente cristológica. Em nenhum outro lugar Lutero executou melhor esse tipo de exegese confrontadora do que em seu tratamento dos Salmos.115 A distância entre o antigo povo de Deus e o cristão contemporâneo desmorona perante a eterna Palavra de Deus. tinha em mente aquela qualidade das Escrituras na qual o Deus vivo e verdadeiro sempre confronta o leitor em juízo e graça. Gerrish desenvolve essa questão em The Old Protestantism and the New (Chicago: University of Chicago Press. 94. Quando dizia que as Escrituras devem “enfatizar” ou “inculcar” (trieben) Cristo. mas para ser vivida e sentida. “sentir” as palavras das Escrituras “no coração” . Lutero exigia participação imaginativa nos relatos bíblicos. aqui e agora. Se eu tivesse estado lá. A experiência é necessária para entender a Palavra. 340: “Non solum scriptura [. temos de correr para ela antes que pereçamos e m orram os” . Isso não significa diminuir a realidade histórica do evento bíblico — lembre-se da insistência de Lutero no sentido históricogramatical — mas sim confrontar cada leitor com a demanda existencial e a promessa das Escrituras. Da mesma forma como Deus não está simplesmente “lá ” {da) mas “lá para ti” (dir da).112 Dessa maneira. het ich für furcht in die hosen geschissen” . 1982). Esta citação do Table Talk vem no contexto da rejeição que Lutero fez da alegorização em favor de uma interpretação literal e histórica da Bíblia. assim também as narrativas da Bíblia não são apenas atos históricos. Lutero não estava absolutamente pensado em nenhuma teoria formal da Bíblia. envolvido por faixas” . Antes. pp. 115WA TR 1.] Habeo rem et experientiam cum Scriptura”.. que exige uma resposta presente. “A Palavra de Deus é viva. o princípio formal da Reforma é determinado pelo princípio material: a justificação pela fé somente. O Espírito vivifica! Devemos. seria apenas a letra morta que mata. mas eventos vivos.5). e a reação do cristão à mensagem de Deus fica explícita. Cf. teria sujado as calças de m edo” . baseada na graça e na obra de Cristo somente. é a chave para entender a revelação de Deus nas Escrituras somente. p. portanto. A. Num sermão sobre a expressão “invoquei o Senhor” (SI 118.. Lutero admoestou sua congregação: " 2WA 10/1..] sed etiam experientia [. 136: “Wenn ich da wer gewest. 113Atkinson. passados e distantes.assim também Cristo repousa na manjedoura. p. Portanto. 15.114 Esse caráter vivente da Palavra é percebido na maneira como Lutero tornava contemporâneo o texto bíblico. contra uma igreja corrupta pelo bem da “igreja verdadeira e primitiva. . Levante-se. Luther and the Papacy (Filadélfia: Fortress Press. 119LW 51. LW 26. “ A igreja cristã é tua m ãe” . p. p. e roendo suas unhas. mas um reformador. p.117 Esses foram atos radicais. 166. as Escrituras Sagradas lembram-nos de que tudo na vida é vivido na presença de Deus. Lutero podia ser lírico ao louvar a igreja. levantando a cabeça e balançando-a. seu tratante preguiçoso! Ajoelhe-se! Levante suas mãos e seus olhos para o céu! Use um salmo ou o pai-nosso a fim de clamar sua angústia ao Senhor.118 Longe de ser defensor do individualismo austero — cada macaco no seu galho — Lutero enfatizou o caráter comunal do cristianismo. com nada em sua mente a não ser como você se sente mal. 487. Cf. católica e apostólica. Provocaram um cisma na cristandade ocidental que ainda não foi sanado. a Digna Donzela” : Lutero e a Igreja A última coisa na vida que Lutero queria fazer era começar uma nova igreja. Ele disse. p. Você ouviu. WA 51. Não fique aí apenas sentado ou virado de lado. não foi um mero iconoclasta. Ele não era um inovador. Quanto aos passos que levaram a esse rompimento decisivo. 119. p. como neste hino de 1535. No decorrer dessa batalha. meu castelo. ecoando Cipriano. como também a bula papal que o havia excomungado. 219. Lutero. Elas são o testemunho inspirado da perfeita revelação de Deus em Jesus Cristo.116 Assim. que fora da igreja não havia salvação.Invocar é o que você precisa aprender. p. Citado em Haile. Ele nunca se considerou algo além de um membro verdadeiro e fiel da igreja una. 523. um corpo e uma comunhão dos santos com a igreja cristã. 118LW 41. meu aposento” . Hendrix. que coitado você é. 117LW 41. Lutero protestou contra o abuso das indulgências (as Noventa e Cinco Teses de 1517) e foi lançado a um grande confronto com a Igreja Romana de sua época. p.119 Ele também chamou a igreja de “minha fortaleza. santa e universal” . e o manual diário do cristão em suas lutas e vitórias na fé. que se parece muito com uma canção de amor secular: U6WA 31. santa. Na qualidade de doutor das Sagradas Escrituras e pastor de almas. 441. “que te faz nascer e te guia pela Palavra” . ele pronunciou um não decisivo a todo o sistema papal. 65. entretanto. p. preocupado e buscando uma saída. 1. veja o estudo conclusivo de Scott H. como você está ferido. WA 51. Ele se revoltou contra a igreja por causa da igreja. dizia Lutero. referiu-se à hierarquia romana como “ajgreia-prostituta do diabo” e queimou o tratado inteiro da lei canônica. “Ela Me É Querida. Denunciou o papa como anticristo. 1981). que descreve uma mulher a sofrer com as dores do parto. 1949). ou Versammlung. p. porque veio a significar a construção ou a instituição. 2. 12IT.120 Mas que é exatamente a igreja? Certa vez. Ecclesia in via: Ecclesiological Developments in the Medieval Psalms Exegesis and the Dictata super Psalterium o f Martin Luther (Leiden: E. 122Entre os muitos estudos acerca da eclesiologia de Lutero. Lutero interpretou-o como a igreja sob o ataque de Satanás. o celibato ou o papa. 288-325. baseada em seu estudo da Bíblia. como ele mesmo afirmou. Dela o louvor. a honra e a virtude se comentam. The Heritage o f the Reformation (Londres: Oxford University Press. pp. pronto para juntar lenha a fim de queimar qualquer herege que difamasse a missa.123 A desilusão de Lutero com o papado evoluiu de sua descoberta do evangelho. isto é. pp. 29-59. Eiert. “comunidade” . 293. 1950).1. “Die Entstehung von Luthers Kirchenbegriff” . Ele preferia Gemeine [hoje Gemeinde]. A terceira estrofe do hino termina assim: “Sobre a terra. Não me importo. C. Esse hino baseia-se no texto de Apocalipse 12. 179-180. 2) Palavra e sacramento e 3) o sacerdócio de todos os cristãos. 315.121 Temos nessa resposta um impulso básico da eclesiologia de Lutero: o caráter essencialmente espiritual e não-institucional da igreja. em inglês. Scott H. a comunidade de cristãos ou. cristãos santos e ovelhas que ouvem a voz de seu Pastor” . deriva do grego kuriakon . p. Com amor e verdade que não se esgotarão. E fará tudo o que eu desejar. todos enlouquecidos pelo assassinato/ A mãe agora sozinha está/ Mas Deus irá protegê-la vigilante/ E o Pai justo será”. 123LW 34. como diz o Credo dos Apóstolos. Hendrix. Tappert. Mohr.122 A Prioridade do Evangelho Outrora. ela vai me recompensar. uma criança de sete anos sabe o que é a igreja. pp. 328.Ela me é querida. pp. veja em especial os seguintes: Karl Holl. WA 54. O mais 120LW 53. Devemos examinar com mais minúcia as três facetas dessa doutrina: 1) a prioridade do evangelho. G. “um dos papistas mais entusiastas” . E não a posso esquecer. se eu quisesse endireitar os caminhos do mal. Brill. Para ele. “assembléia” . a casa do Senhor). B. Eu busco o bem dela e. 1974). Lutero não gostava da palavra alemã Kirche (que. a verdadeira igreja era o povo de Deus. The Book o f Concord (Filadélfia: Fortress Press. J. Que ela sempre me mostrará. p. como church. em latim. Wilhelm Pauck. Lutero havia sido. I. Lutero desenvolveu uma doutrina da igreja ricamente matizada. in: Gesammelte Aufsätze zur Kirchengeschichte (Tübingen: J. . Então meu amor ainda mais cresce. ed. a digna donzela. Com base nessa perspectiva. 255-402. Lutero respondeu impacientemente a essa pergunta: “Ora. 1948). a comunhão dos santos. ou curia. Esta é a sexagésima segunda das Noventa e Cinco Teses. mas é constituída pela Palavra” . não o contrário. 101. o fedor. as fezes. estúpido. . p. mas sim teológico. as úlceras e a sífilis são membros do corpo. p. Lutero sustentava que o evangelho constituía igreja. p. p. WA 47. que era de origem humana e não divina. o pus. Mas devemos lembrar que ele teve o mesmo tipo de invectiva lançada em seu rosto. LW 31. O papado era uma praga. vendida ou parcelada em indulgências. A graça de Deus era a graça de Deus. que é a igreja? Resposta: o papa e seus cardeais.124 A medida que envelhecia. O papado. querido papa. 778. 311. 31. a urina. e não está presa a nenhuma cidade. 145. Lutero insistia na prioridade do evangelho. WA 7. 236: “Verus thesaurus ecclesie est sacrosanctum evangelium glorie et gratie dei”. 127WA 8. A igreja tornara-se um fim em si mesma. você pode responder aos que gritam e cospem. Ao menos a partir de 1520. uma punição. 321. a varíola. 491. O papa e seus associados não eram pelo menos membros da igreja? Sim. ouça isso. Ele se referiu ao Papa Paulo in como “Vossa Diabolicíssima” .127 Sua invisibilidade deriva do fato de que 124LW 39. revelada em Jesus Cristo e atestada pelas Escrituras Sagradas: “A igreja não constitui a Palavra de Deus. pp. onde é que está escrito na Palavra de Deus que o Pai Papa e o Irmão Cardeal são a verdadeira igreja? Será que foi só porque o belo papagaio disse à gralha negra?125 O protesto de Lutero contra a Igreja Romana não foi fundamentalmente moral. Contra a concepção romana da igreja. perm itida pela “irada providência” de Deus. 125LW 51. p. Seu fundamento é a eleição graciosa de Deus. Oh. “O verdadeiro tesouro da igreja é o santo evangelho da glória e da graça de D eus. então. como o de Erasmo e de outros reformadores. Não podia ser comprada. que não têm nada em suas garras a não ser a “igreja!” : diga-me. embora já tivesse identificado o papa e seu sacerdócio com “o reino do demônio e o governo do anticristo” . o ranho. A Palavra passara a ser cativa aos caprichos de simples humanos. por que ele não abre os portões e as deixa sair?” .tardar em 1521. ele persistentemente se recusou a identificar a igreja verdadeira com a hierarquia papal. Wycliffe e Hus antes dele. havia-se apropriado indevidamente de uma prerrogativa que pertencia apenas a Deus. ainda assim insistia em que ninguém deveria se opor ao papa deliberadamente. ironizava Lutero. p. sua polêmica contra Roma tornava-se mais acirrada. p. 210. Lutero falava sobre a igreja invisível cujos membros reuniam todo o grupo dos predestinados. p. A igreja estende-se tanto no tempo quanto no espaço. Lutero nunca teve “papas na língua” . a cicatriz. 126WA 1. 6. pessoa ou época. Disso. LW 36. devia ser suportado com toda a paciência. tanto quanto o cuspe.” 126 Como Agostinho. “Se o papa tem controle sobre as almas no purgatório. 676. que traz diversas conotações. ut videt eam. 164. p. como dom absoluto de Deus. a igreja também não é uma assembléia física. pinget deformem et pauperculam puellam. luporum. composta apenas de s ^ to sjjisc e m ív e js. em meio a homens furiosos que usam espadas.a própria fé é invisível. Entre as sete “posses sagradas” da igreja. p. 132LW 35. Lutero também falou da igreja como “oculta” . 420. poderíamos identificar a igreja por suas características exteriores. sentada numa floresta perigosa em meio a leões. p. “Nossa santidade está nos céus. denique serpentum venenatorum. Se a fé fosse uma quantidade mensurável. então.129 Aos olhos da fé. porcorum. perante os olhos do homem. in medio famelicorum leonum. mesmo se às vezes seu número tivesse sido escasso — “apenas dois ou três. admoventium ferrum. não definível em termos externos. deve estar sempre disposta a enfrentar todo infortúnio e perseguição. . 129WA 17/2. nem depende das qualificações morais dos membros ou dos ministros. Lutero nunca defendeu a idéia de uma igreja pura. p. ignem. sedentem in infesto nemore.131 A igreja sempre existe em tensão com os poderes demoníacos deste éon presente e. 293: “Also das der Christenheit wesen.128 Além de “invisível” . embora clara a Deus. a igreja é unTcorpus permixTum. Por ser a fé. Ao contrário dos anabatistas. item in medio furiosorum hominum. Lutero incluiu a “cruz sagrada” . Lutero disse que Deus não quer que o mundo saiba quando ele dorme com sua noiva. WA 6. 315: “Itaque si. leben und natur sei nit leiplich vorsamlung. Numa metáfora audaciosa. Nesta era. WA 50. ursos. 501: “Denn Got wil die weit nichtt lassen wissen. m LW 41. hipócritas e cristãos devotos. em primeiro lugar. como seu Senhor.130 Como não pode haver nenhuma teologia da glória. “a convicção de fatos que não se vêem ” (Hb 11. WA DB 7. como um produto no m ercado. O caráter oculto da igreja também se estende à sua santidade. mas pelos padrões do mundo é uma pobre Cinderela cercada por muitos inimigos perigosos: Se. 130WA 40/3. mas “uma assembléia de corações em uma única fé” . 411. wenn er bei seiner braut schlafft” .1). onde Cristo está. aquam ad occidendam eam et tollendam de terra”. vai retratá-la como uma moça pobre e deformada. A pureza da igreja não está sujeita a exame. 642. está oculta do mundo. também não pode haver nenhuma eclesiologia da glória. 65. fogo e água corrente para matá-la e eliminá-la da face da terra. joio e trigo. Significa. p. lobos e javalis famintos. a igreja é uma “donzela digna” . alguém quer desenhar a igreja conforme a vê. ita pingere eam velit. que a igreja. sondern ein vorsamlung der hertzen in einem glauben”. contendo ãò mesmo tempo pecadores e santos. p. ursorum. e ainda serpentes mortais. Esse é um conceito mais complexo.” 132 Lutero estava certo de que a verdadeira igreia nunca havia deixado de existir. não no mundo. p. ou as 128LW 39. p. 627. Entretanto. a viva voz do evangelho (viva vox evangelii) é ouvida. mas numa sucessão de cristãos verdadeiros (successio fidelium ).136 Lutero recuperou a doutrina paulina da proclamação: a fé vem pelo ouvir. p. e a introdução de John Doberstein ao volume 51 de Luther’s Works. a igreja é subserviente ao evangelho: a Palavra de Deus não pode existir sem o povo de Deus. mas uma “casa da fala” : É a maneira do Novo Testamento e do evangelho que este seja pregado e realizado pela palavra da boca e de viva voz. p. em quem Cristo vive. 625. p. p. histórica. 147. 48. 135LW 41. Mesmo na apóstata Igreja de Roma. mas apenas alguns” .135 A Palavra e o Sacramento Pareceu a alguns que a ênfase de Lutero no caráter invisível e oculto da igreja poderia minar sua realidade tangível. não para vê-la. . p. Para Lutero.. Mas como ouvirão sem um pregador? (Rm 10.133 Ele estabelecia a continuidade da igreja não numa sucessão de bispos. I36WA 10/1.134 Além disso. mesmo que composta apenas de crianças pequenas. WA 50. nem ordenou que nada fosse escrito. . o ouvir pela Palavra de Deus. a igreja não era uma “casa da escrita” . 506. trabalha e governa” . voltando até Adão: “Sempre há um santo povo cristão na terra. Nas palavras do pregador. p. Onde quer que essas duas “observações” estejam evidentes. a verdadeira igreja existe. que no fim de suas vidas voltaram-se mais uma vez para C risto. Ele considerou significativo que mesmo o povo comum falava de ir à igreja para ouvir a missa. mas o evangelho num sentido particular. O sermão era a melhor e mais necessária parte da I33LW 41. conforme manifesto na Palavra corretamente pregada e nos sacramentos adequadamente administrados. Quanto a Lutero como pregador. O próprio Cristo não escreveu nada. Pelo menos o batismo e as Escrituras permaneceram. veja Wood. ' ‘ ~ " --------' “ ' ' A pregação pública da Palavra de Deus é um meio de graça indispensável e sinal infalível da verdadeira igreja. mas sim que se pregasse pela palavra falada.17). 210. 144. mas a elevou a um novo status dentro do culto cristão. pp. WA 50. O evangelho permanecia a única e infalível marca da igreja. nem seu povo sem sua Palavra. p. Lutero não pretendia desintegrar a igreja num castelo nas nuvens. e isso sustentou as crianças e “alguns idosos. Lutero reconheceu que o evangelho não havia sido completamente obliterado. 85-94.34LW 41. WA 51. Lutero não inventou a pregação.criancas!’. nem reduzi-la a uma associação frouxamente constituída de indivíduos de mesma opinião. 32.missa. honra ou amizades” .139 Alguns pregadores hesitam em proferir palavras duras de julgamento. p. 388. 304. WA 36. 51. 262. não uma casa da fala farinácea! Mais importante ainda. WA 51. p. 39. disse L utero. para ser ouvida por todos” . porque logo estarão dizendo para si mesmos: “Isso é o que você fez. p. esse é seu trabalho. ille non facile ’ . E isso não tem valor nem para ser jogado aos cães! Os pregadores fiéis devem ensinar apenas a Palavra de Deus e buscar apenas sua honra e louvor. com medo de ofender os “grandes” que se assentam em sua congregação. WA 32.140 Os pregadores devem tomar cuidado com os. O ofício da pregação era tão importante que até os membros banidos da igreja não deviam ser excluídos de seus benefícios: “A Palavra de Deus deve permanecer livre. Talvez a tentação mais enfraquecedora que um pregador enfrente é a da vanglória. desse modo. As três marcas de um bom pregador são estas: ele se levanta. você é um homem de primeira. p.141 Os escritos de Lutero estão repletos de conselhos para os pregadores aspirantes. 7. 191. p. 530. servir a D eus. 356: “Nam qui est solidus in fundamentis et bonus textualis. 354. p. porque amam seus ventres e a esta vida temporal mais do que a Cristo. A igreja é uma casa da fala. é esse que ele me m ostra’” .138 Aquele a quem é confiada a Palavra falada na comunidade de fé é assediado por muitas tentações. 28. TR 4. LW 21. “Ouvir a missa não é nada mais do que ouvir a Palavra de Deus e. “Cristo não estabeleceu nem instituiu o ministério da proclamação para prover-nos de dinheiro. mas ele me fala de outro Senhor cujo nome é Cristo. p. 22.143 Lutero denunciava aqueles pregadores “preguiçosos e ruins” . p. mas não proclamam a verdade. tornando-o o núcleo. Contudo. 21. “Do mesmo modo. aduladores que lisonjeiam sua vaidade. não como se tivesse algo tampando sua boca.LW 142WA I43WA impingit” . Lutero investiu-o de uma qualidade quase sacramental. p. que pegavam todo seu 137LW 138LW 139LW 140WA 14. “Deus nos proteja dos pregadores que agradam a todos e desfrutam de um bom testemunho de todos” . Que o pregador seja um bonus textualis — bom no texto — bem versado nas Escrituras. 302. o verdadeiro m estre” . com o pregador encarando a congregação. p. propriedades. fala e sabe quando se calar!142 Deixem-no falar vigorosa e claramente. 51. 75. da liturgia. WA 6. Muitos usam essa confiança sagrada para o autoengrandecimento. o pregador deve ter algo válido para dizer. p. popularidade. Tais pregadores são na realidade mercenários que “tagarelam no púlpito” . p. 9. não em volta de um altar com o sacerdote realizando um ritual semi-secreto.” 137 O culto protestante centrava-se ao redor do púlpito e da Bíblia aberta. os ouvintes também devem dizer: ‘Não creio em meu pastor. mas na linguagem clara e viva do povo. ela não tinha o sinal de acompanhamento necessário. Lutero atacou o sistema sacramental do catolicismo medieval. como a da 144WA 53. ler nem buscar as Escrituras para si m esm os. Portanto. que é Cristo. A santidade dos sacramentos. 310: “Ich wil Doctorem Pommeranum. “mas para meus pequenos Hans e Elizabeth” . isto é. . Apenas assim pode cumprir sua tarefa como parte central de todo o culto divino. Lutero sustentava que a fé. a idéia de que os sacramentos. “Não prego para os Doutores Pomerano.145 Acima de tudo. (Durante algum tempo. as ‘palavras visíveis de vDeus” \ Assim como o evangelho é anterior à igreja. sondern meinem Henslein und Eislein”. den sie Wissens vorkin dass den ich. Ich predige ihnen auch nicht. 142: “Es kan auch ainer glauben. 218. mas na fé que se tem neles e 3) são extensões ou \ instâncias separadas da Palavra de Deus e. ou seja. wenn er gleich nit getaufftt ist. Não. mesmo instituída por Cristo. em virtude de sua realização (ex opere operato). era suficiente para a salvação: “Você pode crer mesmo sem ser batizado. Essa idéia foi especificamente condenada no Concílio de Trento. mas depois a rejeitou porque. p. 145W A T R 3 . O batismo e a santa comunhão são garantias da promessa de Deus e. a eficácia dos sacramentos não depende da santidade do ministro que os preside. Ao lado da Palavra corretamente pregada estão os sacramentos adequadamente administrados. mesmo à parte dos sacramentos. p. dann der tauff ist nit meer dann ain eüsserlich zaichen” . há a “mais estreita relação possível entre a Palavra 1 pregada e a Palavra promulgada nos sacramentos.) Esses dois atos possuem em comum as seguintes características: 1) ambos proclamam o perdão dos pecados. Philippum in meiner predigt nicht wissen.p . 2) não são i eficazes em sua celebração. de auxílios homiléticos e de livros de sermão. porque o batismo não é nada mais do que um sinal externo que nos faz lembrar da promessa divina” . Ionam. ele mantinha em alta consideração o caráter objetivo dos sacramentos.material de outros. completamente independentes da disposição do receptor. os sacramentos são uma palavra dirigida por Deus. nesse sentido. ele conservou a penitência. disse Lutero. Contudo. assim. sustentando a autenticidade de apenas dois ' sacramentos: o batismo e a santa comunhão. cridos e apropriados pessoalmente.144 O sermão não devia ser expresso em jargões teológicos. As jóias de ouro não perdem nada de sua pureza quando usadas por uma prostituta! Da mesma maneira.146 Lutero fez essa declaração em resposta ao sacramentalismo católico romano. Lutero atacou a doutrina “mecânica” dos sacramentos. NO Cativeiro Babilónico da Igreja (1520). sem orar. os sacramentos são uma conseqüência da fé. 146WA 10/3. comunicam à igreja as promessas ' infalíveis de Deus. a pregação deve ser verdadeira em seu próprio conteúdo. concediam graça a todos os que não estivessem em estado de pecado mortal. Têm de ser recebidos. Jonas e Filipe” . sustentada por Lutero. os sacramentos eram. não naquele que administra. Caifás. WA 2. conforme Heinrich Bornkamm expressou. 1958). pp.. Em seu Pequeno Catecismo Lutero perguntou: “Que dá ou rende o batism o?” Resposta: “Ele efetua o perdão dos pecados. ainda assim eles receberiam o batismo verdadeiro e santo” . Foi Deus quem prometeu isso. Devemos apegar-nos a eles com uma fé sólida. [.. . 218. p. “altos postes indicadores ao longo de toda a estrada da vida” . como ao bom cajado que o patriarca Jacó usou ao atravessar o Jordão [Gn 32. 251.149 Discutiremos a teologia eucarística de Lutero no contexto de seu debate com Zuínglio. p.10]. p. que “Deus prometeu e em seus sacramentos deu-me um sinal infalível de sua graça. do pecado e do inferno.148 Para Lutero. 693.147 Mas por que precisamos de sacramentos. Bertram (St. nem me decepcionar. por Martin H. “mesmo que Judas. do pecado e do inferno. Deus anuncia sua aceitação graciosa do pecador.] Eles apontam para Cristo e sua imagem.150 Ele então explica que a água em si não tem esse poder. Deus é o Realizador no batismo. o papa ou o próprio diabo batizassem verdadeiramente.50WA 30/1. . afinal? Esta pergunta era constantemente levantada para Lutero pelos espiritualistas radicais. Devemos observar agora as características distintivas de sua doutrina do batismo. 149Heinrich Bornkamm. A melhor resposta de Lutero a essa questão vem de seu poderoso “Sermão da Preparação para a M orte” (1519). lembranças na vida e na morte da infalível promessa de Deus e de sua graça sustentadora. mas a Palavra de Deus que está com a água e nela. reside em Cristo. porque os que recebem o batismo na fé são apenas aqueles que foram banhados e purificados no “belo sangue 147LW 41. capacitando-o a dizer. de forma que.] Esse sinal e essa promessa de minha salvação não podem mentir para mim. Pilatos. 148LW 42.. p. Luther’s World o f Thought. simplesmente o agente de D eus^N o batismo. trad. 285. o livramento da morte e do diabo. quando abordado pela imagem da morte. e a fé que confia em tal palavra na água. 108-109. e dá a salvação eterna para todos os que crêem nisso” . no qual ele declarou que um sacramento é um sinal visível da intenção divina. Realizado em nome do Deus Trino. p.igreja. WA 51. [. e ele não mente”. ou como a uma lanterna pela qual devemos ser guiados.. Louis: Concordia Publishing House. O batismo é a representação litúrgica da doutrina da justificação somente pela fé. o ministro. que insistiam tanto na “palavra interior” que abandonaram todas as evidências externas da graça de Deus. 97. o batismo é um ato divino. e caminhar cuidadosamente com os olhos abertos ao longo da escura passagem da morte. p. Lutero rejeitava a idéia. (St. . Lutero declarou que “precisamos continuamente ser batizados mais e m ais” . até que na morte completemos“ realmente o sinal dò . e a essa condição devemos retornar constantemente. mas. contra os anabatistas.carniesim de Cristo” . Quanto a Lutero versus anabatistas.154 Há a mais estreita relação possível entre batismo e arrependimento. “Luther’s Defense of Infant Baptism”. 'Lutero acreditava na salvação das crianças não-nascidas e daquelas não-batizadas. a água não deveria ser aspergida no ventre da mãe. outrora iniciado e permanentemente vivido” . em caso de aborto.151 ------"" Lutero. Ela só pode recebê-la como uma dádiva pura. Carl S. 220: “Ein Christlich leben nichts anders ist denn ein tegliche Tauffe. mesmo não sendo um lugar de tormentos severos.” 152 A fé. Arrepender-se significa retornar ao poder de nosso batismo. visto que a criança é impotente para operar seu próprio batismo. Cf. 1964). defendia o batismo ( de crianças. mesmo que ela não esteja consciente de tal fato. de que os bebês não batizados iam para o limbo. pp. a saber. Assim. veja John S. in: Luther fo r an Ecumenical Age. seu efeito salvífico sustenta o cristão durante a vida inteira. temendo que o povo se tornasse negligente em trazer suas crianças à fonte batism al. também não o proíbem. p. WA 49.53WA 53. amplamente aceita na Idade Média. ambos são selos da promessa de Deus a seu povoKO problema mais complicado com o batismo infantil derivava da estreita correlação que Lutero fazia entre sacramento e fé. 203-207. ein mal angefangen und immer darin gegangen”. a criança ameaçada deveria ser entregue a Deus em oração. 325-326. por assim dizer. o nível superior do inferno que. que toda a vida do cristão é de arrependimento e retorno' a Deus. Recordamos a prim eira das Noventa g Cinco Teses. pp. é Cristo quem as abençoa e lhes concede fé e o reino dos céus. 83. Tanto nos “afogamos” quanto ganhamos nova vida no batismo. era seu lar eterno. 200-218. Isso é ainda mais uma confirmação da misericórdia gratuita de Deus. Como crianças sem compreensão podem crer? Lutero respondia a essa objeção com seu conceito singular da fé infantil. Oyer. Nesse sentido. é imputada à criança no batismo. ed. p. Lutheran Reformers Against Anabaptists (The Hague: Nijhoff. 154WA 30/1. Seus argumentos eram vários. A “vida cristã nada mais é do que um batismo diário.51LW 51. Como Deus poderia ter deixado a igreja ser enganada durante tanto tempo sobre um assunto tão vital? O batismo de crianças é análogo à circuncisão no Antigo Testamento. 1967). juntamente com todos os principais reformadores. Louis: Concordia. sola gr atia.I5T Embora o batismo seja um evento único. Embora as ^Escrituras não ordenam explicitamente o batismo de crianças. “É certo que as crianças são trazidas ao batismo pela fé e pela obra de outros. quando chegam ali e o pastor as batiza no lugar de Cristo. apesar de relutar em pregar isso publicamente. 131. pp. Em vez disso. 152WA 17/2. . Jaroslav Pelikan. Meyer. A essência de sua doutrina pode ser expressa numa única frase: todo cristão é sacerdote de alguém. as pessoas acreditam que o sacerdócio de todos os cristãos implica que cada cristão é seu próprio sacerdote e. Dessa premissa. nenhum outro elemento de seu ensino é tão mal compreendido. alguns grupos. possui o “direito do julgamento privado” em assuntos de fé e doutrina.] sois [. isso significa apenas que não há mais sacerdotes na igreja. WA 12. 20.“O fato de 155Tappert.9). é a secularização do clero. Certa vez. batizar. os bispos e os camponeses. Isso significa que os ofícios' sacerdotais são propriedade comum de todos os cristãos. 179. reis como ele é R ei” . fazer sacrifícios. defenderam a abolição do ministério como ordem distinta dentro da igreja. 134.6). filhos como ele é Filho. carregar “as chaves” . p. e no escuro mistério da vida entre os dois. pp. Lutero encontrava grande consolo no fato de que todos — o papa. e somos todos sacerdotes uns dos outros. diabo” . 180. assim. Deus fez-nos um corpo.] sacerdócio real” (1 Pe 2. O próprio Lutero faleceu na mesma cidade em que havia nascido e fora batizado. sacerdotes” (Ap 1. Lutero exclamou: “ Sou filho de Deus. Nossa unidade e igualdade em Cristo é demonstrada por nosso amor mútuo e nosso cuidado uns pelos outros. quando perturbado por dúvidas sobre a predestinação. Lutero rompeu decisivamente com a divisão tradicional da igreja em duas classes. O Sacerdócio de Todos os Cristãos A maior contribuição de Lutero à eclesiologia protestante foi sua doutrina do sacerdócio de todos os cristãos. Para alguns. I56LW 40. 155'\^ío nascimento e na morte. 21-32.. orar pelos outros. Todo cristão é um sacerdote em virtude de seu batismo.157 Lutero baseou sua afirmação de que todos os cristãos são sacerdotes no mesmo grau em dois textos do Novo Testamento: “Vós [. 157LW 40. e “nos constituiu reino. Deixe-me em paz.. p. Contudo. Fui batizado. celebrar a Santa Comunhão. Letters.batismo. não a~prerroganva especIãT de uma casta seleta de homens santosTLutero enumerou sete direitos que pertencem a toda a igreia: pregar a Palavra de Deus.. O sacerdócio de todos os cristãos é tanto uma responsabilidade quanto um privilégio. sem distinção — eram batizados nus e m orriam nus. .. cada membro da Gemeíne tem parte igual nesse sacerdócio. clero e laicato. um “bolo” (imagem favorita de Lutero). nosso batismo se põe como a garantia do grande amor e da graça de Deus. WA 12. p. Esse sacerdócio deriva diretamente de Cristo: “Somos sacerdotes como ele é Sacerdote. julgar a dõutríM . um serviço tanto quanto uma posição. notadamente os quacres. p.156 Mais ainda. Ambos os casos constituem perversões da intenção original de Lutero. Mais comumente. Há um só “estado” (Stand). em cujos “m éritos” podemos conseguir ajuda nos caminhos da vida. uma família em que as cargas são compartilhadas e suportadas mutuamente — essa é a communio sanctorum. Assim como não podemos nascer de nós mesmos. a discussão em Althaus. incluindo-se os sacramentos. O próprio título. volte sua atenção para os vivos. Todos os que crêem em Cristo são santos. o nu. conota um papel essencialmente funcional. Se eu notar que você não tem fé ou tem uma fé fraca. não se deve “chamar atenção sobre si m esm o” . I59Althaus. p. cristãos. pode ir perante Deus e interceder pelo outro. numa comunidade cristã. comece seu trabalho aqui. posso pedir a Deus que lhe dê uma fé sólida. Àntes. deve-se “deixar ser chamado e escolhido para pregar e ensinar no lugar de outros e sob o comando deles” . p. WA 11. Rigorosamente falando. 308-309.159 Quando desejar fazer alguma coisa pelos santos. Lutero chegou ao ponto de dizer: “O que lhe damos hoje. uma comunidade de santos. Dirija sua ajuda a eles. assumindo tal ofício por conta própria. 298. Conforme Paul Althaus disse: “Lutero trouxe a comunidade dos santos do céu para a terra” .161 O chamado é feito pela congregação. mas uma variedade de ofícios (Amte) e funções. um sacerdócio de amigos que se ajudam. p. p. Lutero considerava o ministério da Palavra o mais alto ofício da igreja. Lutero ensinou que todo cristão é ministro e tem o direito de pregar. 158WA 10/3. da mesma forma não podemos servir a Deus sozinhos. Como Lutero relacionava o sacerdócio de todos os cristãos ao ofício do ministério? Enquanto todos os cristãos têm parte igual nos tesouros da igreja. 160WA 10/3. 297-303.que somos todos sacerdotes e reis significa que cada um de nós. 310.160 Uma comunidade de intercessores. o pobre que tem esposa e filhos e sofre humilhações. não para os mortos. abordamos outra grande definição da igreja apresentada por Lutero: communio sanctorum. pp. e o ministro continua tendo de prestar contas a ela. Mas quem são os santos? Não são supercristãos que foram elevados à glória celeste. “servo da Palavra divina” (minister verbi divini). Entretanto. ou batizar a nós mesmos. nem todos podem ser pastores. mestres ou conselheiros. Aqui. 16ILW 39. pp. o faminto. O santo vivo é seu próximo. . 407. Cf. Esse direito pode ser livremente exercido se alguém estiver em meio a não-cristãos. 412.” 158 Tudo isso implica que ninguém pode ser um cristão sozinho. entre os turcos ou encalhado numa ilha pagã. o sedento. podemos tirar dele amanhã” .162 O rito da ordenação não confere nenhum caráter indelével à pessoa ordenada. É meramente a forma pública pela qual alguém é comissionado mediante a oração, as Escrituras e a imposição de mãos, a fim de servir à congregação. Argumentando curiosamente a partir da lei natural, Lutero excluía mulheres, crianças e pessoas incompetentes do ministério oficial da igreja, embora numa época de emergência ele pudesse chamá-los a exercer tal ofício, em virtude de sua parcela no sacerdócio de todos os cristãos. As exigências da Reforma não se conformavam ao congregacionalismo inicial de Lutero. Se a igreja tivesse de ser reformada, as autoridades governantes tinham de desempenhar um papel. Lutero referiu-se ao príncipe como um Notbischof, um bispo de emergência. Ao ser instituída a visitação, o príncipe territorial assumiu um papel maior nos negócios da igreja. Por fim, uma rede de igrejas estatais emergiu na Alemanha. Essa medida recebeu uma sanção legal pela Paz de Augsburgo (1555), que reconheceu que a religião do príncipe determinaria a de seus súditos. Lutero viu tanto os perigos quanto os benefícios do sistema de igrejas estatais. Na doutrina dos dois reinos, ele procurou esclarecer as funções próprias da igreja e da autoridade secular. “A Mão Esquerda de Deus” : Lutero e o Estado Lutero, Zuínglio, Calvio e Cranmer foram todos reformadores magisteriais. Esse termo, cunhado por George H. Williams, refere-se ao fato de que todos os principais reformadores fizeram seu trabalho reformador em aliança com o poder coercitivo do magistrado e sustentados por ele, seja um príncipe, seja o conselho da cidade, como no caso da Inglaterra, o próprio monarca. (Henrique vm , um simples leigo, reivindicava ser o “chefe” da Igreja da Inglaterra.) Os reformadores radicais, com poucas exceções, renunciaram a esse modus reformandi e, assim, romperam mais decisivamente com o conceito tradicional de cristandade como uma sociedade abrangente e unitária, definida pela inter-relação entre as autoridades temporais e as espirituais. Menno Simons, por exemplo, representa a rejeição anabati£la__ji_reto m ia “oficial” . Contudo, os principais reformadores naò ■cõn^rtilhavãnT^sTnesinas^délãs a respeito da natureza, dos propósitos e dos limites do poder civil. Uma diferença fundamental entre as tradições luterana e reformada emerge nesse ponto. Lutero desenvolveu sua teoria do estado em relação à sua doutrina dos dois reinos. 162WA 15, p. 721: “Item debent ministerium suum agere, sed non perpetuo: possumus ei hodie commendare, eras iterum adimere” . Cf. Elert, p. 347. Pois Deus estabeleceu dois tipos de governo entre os homens. Um é espiritual; não tem espada, mas tem a palavra, por meio da qual os homens devem tomar-se bons e justos, para que, mediante essa retidão, possam alcançar a vida eterna. Ele administra essa retidão mediante a palavra, que confiou aos pregadores. O outro tipo é o governo mundano, que opera por meio da espada, a fim de que os que não desejam tomar-se bons e justos para a vida eterna sejam forçados a tomar-se bons e justos aos olhos do mundo. Ele administra essa retidão mediante espada.163 A idéia de dois poderes correlatos, mediante os quais Deus governa o mundo, remonta a Agostinho, que dividiu a família humana em duas cidades: a Cidade de Deus, composta pelos eleitos, peregrinando em direção a seu destino celeste, e a Cidade da Terra, também chamada de Cidade do Diabo, cujos habitantes existem fora da esfera da graça. No éon presente, contudo, as duas cidades estão misturadas. O curso da história é assim determinado por sua coexistência e oposição. Lutero elaborou sua própria doutrina dos dois reinos em oposição a duas contrateorias: a do catolicismo medieval e a dos anabatistas. A supremacia papal sobre os governantes seculares foi afirmada já em 494 pelo Papa Gelásio i, numa carta ao Imperador Anastácio: “Há, augusto imperador, duas maneiras pelas quais este mundo é basicamente governado, a autoridade sagrada dos sacerdotes e o poder real. Dessas, a responsabilidade dos sacerdotes é mais s é ria ...” .164 O que foi chamado de “inflação galopante das exigências papais” durante o milênio que separou Lutero de Gelásio i pode ser traçada nos ditos de Gregório vn, Inocêncio III e Bonifácio V iu. Na bula Unam Sanctam (1302), Bonifácio afirmava que, visto que tanto a autoridade temporal quanto a espiritual residiam na igreja, o papa tinha o direito de depor governos seculares quando contrariassem sua vontade. Opondose a tal tradição, Lutero proclamou a independência do reino secular do controie clerical. A distinção entre os dois é crucial: “O próprio diabo nunca cessa de tramar e maquinar os dois reinos juntos” .165 A causa fundamental dos abusos na igreja era que o papa recusava-se a “abrir m ão” do senhorio temporal. O papa não l63LW 46, p. 99; WA 19, p. 629. Os escritos básicos de Lutero acerca do estado são: To the Christian Nobility o f the German Nation (1520), Temporal Authority: To What Extent It Should be Obeyed (1523) e Whether Soldiers, Too, Can be Saved (1526). Quanto à doutrina dos dois reinos, veja: Rupp, Righteousness, pp. 286-309; Paul Althaus, The Ethics o f Luther (Filadélfia: Fortress Press, 1972); F. Edward Cranz, An Essay on the Development o f Luther's Thought on Justice, Law, and Society (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1959); Marc Lienhard, “La ‘doctrine’ lutherienne des deux regnes et sa fonction critique” , in: Istina 17 (1972), pp. 157-172; John R. Stephenson, “The Two Governments and the Two Kingdoms in Luther’s Thought”, in: Scottish Journal o f Theology 34 (1981), pp. 321-337. 164Papa Gelásio I, numa carta ao Imperador Anastácio, citado em Brian Tierney, ed., The Crisis o f Church and State (Englewood Cliffs, N .J.: Prentice-Hall, 1964), p. 13. 165WA 51, p. 239; LW 13, p. 194. deveria ter exercido nenhuma autoridade sobre o imperador ou sobre outros governantes seculares. Ele não era vigário do Cristo glorificado, mas, sim, do Cristo crucificado; sua função não era reger nações, mas, sim, pregar o evangelho.166 Se os católicos confundiam os dois reinos na direção de uma teocracia papal, os anabatistas separavam muito precisamente os reinos em nome do separatismo religioso. Considerando literalmente a injunção de Cristo à não-resistência (Mt I 5.39), os anabatistas recusavam-se a participar dos poderes coercitivos do Estado. Em ^oposição~ãõs~fêformãdõres pacifistas, Lutero insistia na origem divina do Esta3õ71íõsnnínites~dFseu poder eTna base para a participação do cristão em sua atividade coercitiva. Baseando suas crenças em Romanos 13 e em 1 Pedro 2.13, 14, Lutero afirmava que o Estado era ordenado por Deus fundamentalmente para reprim ir os malfeitores e preservar a paz e a ordem no mundo. Se o mundo inteiro fosse composto de cristãos, não haveria necessidade de príncipes, reis, espadas ou leis. Entretanto, visto que “entre milhares mal há um único cristão verdadeiro” , o Estado é necessário para evitar que o mundo seja reduzido ao caos.167 Os governantes temporais seriam “carcereiros e executores de D eus” .168 Dessa perspectiva, a doutrina dos dois reinos representa não tanto um dualismo ético, o reino de Satanás versus o reino de Deus, quanto um meio duplo pelo qual a soberania de Deus é efetuada dentro da história. Lutero usou metáforas diferentes para descrever essas duas formas do governo de Deus. O reino de Cristo, a igreja, é “a mão direita de D eus” ; o reino do mundo, o Estado, é “a mão esquerda de D eus” .169 Além disso, o governante secular é uma “máscara de D eus” (larva Dei), mediante o qual Deus, disfarçado, por assim dizer, governa o mundo. Aliás, Lutero dizia que não eram os homens, mas Deus, quem enforcava, torturava, decapitava, matava e lutava! A partir dessas imagens, podemos obter duas conclusões importantes a respeito do Estado: 1) a origem do Estado não se encontra numa vontade autônoma de poder, nem no consenso dos governados, mas na vontade ordenada de Deus, 2) igreja e Estado, os reinos das mãos direita e esquerda, coexistem numa tensão necessária. A distinção entre eles não deve ser obscurecida, mas também não tem de ser tão precisamente traçada, a ponto de um não reforçar o outro. Os cristãos, portanto, encontram-se numa posição ambígua: percebem que são cidadãos dos dois reinos. Lutero instava os cristãos a aceitarem as responsabilidades cívicas (desde que não violassem as ordenanças de Cristo) pelo 166Martinho Lutero, Three Treatises (Filadélfia: Fortress Press, 1970), pp. 53-56. 167LW 45, p. 91; WA 11, p. 251. 168WA 11, p. 267; LW 45, p. 113. 169WA 1, p. 692; 36, p. 385. Cf. LW 46, p. 96. bem do próximo. Esse mandato estendia-se até mesmo àqueles ofícios da espada manifestamente violentos: “Se você vir que há falta de carrascos, policiais, juizes, senhores e príncipes e se achar qualificado, deve oferecer seus serviços e buscar o c a rg o ...” .170 Em Se os Soldados Também Podem Ser Salvos (1526), Lutero aplicou a mesma injunção à vocação militar. Entretanto, esse não era um conselho para a obediência servil. Caso o soldado soubesse que seu senhor estava errado em ir para a guerra, ele poderia conscientemente se abster de lutar. Se, tendo entrado na batalha, ele descobrisse que a causa era injusta, deveria “fugir do campo de batalha [...] e salvar sua alma” .171 Sempre que as ordens dos dois reinos se chocarem, o cristão deve dizer com Pedro: “Antes importa obedecer a Deus do que < aos hom ens” (At 5.29). Ao mesmo tempo, Lutero era extremamente relutante em apoiar uma rebelião ou resistência ativa, mesmo contra tiranos, pois os dois reinos haviam sido estabelecidos no ofício por Deus, e seriam depostos por ele quando tivessem servido a seus propósitos. No luteranismo posterior, a igreja tendeu a transformar-se num departamento do Estado; conseqüentemente, sua voz profética dentro da sociedade ficou bastante emudecida. Embora aprovasse o papel de custódia que o príncipe tinha no estabelecimento da igreja territorial, Lutero sustentava vigorosamente a independência do reino espiritual. Numa carta de 1543 enviada ao conselho da cidade de Cruezburgo, que tentou expulsar o pastor local, Lutero admoestou os magistrados: Vocês não são senhores sobre o ofício pastoral nem sobre os párocos. Vocês não instituíram o ofício, mas somente o Filho de Deus o fez. Vocês nem contribuíram em nada para isso. Vocês têm tanto direito a ele quanto o diabo tem direito ao Reino dos Céus. Conseqüentemente, vocês não devem govemá-lo, dar ordens a ele ou impedi-lo de repreendê-los. Pois quando os pastores os repreendem, não é uma censura de homens, mas de Deus. E Deus deseja que a repreensão seja manifesta, não suprimida. Mantenham-se em seu próprio ofício e deixem a lei de Deus com ele, a fim de que ele não ache necessário instruí-los.172 O reino da mão esquerda não devia intrometer-se nos negócios da igreja. Sua função específica era fornecer justiça, ordem e tranqüilidade à sociedade. No reino da mão direita, Deus “governa em pessoa” (i.e. , não oculto atrás de uma máscara, mas por meio de seus ministros, da Palavra e dos sacramentos). Não devemos confundir a distinção de Lutero entre os dois reinos com a separação moderna entre igreja e Estado. Para Lutero, os dois reinos pressupunham 170LW 45, p. 95; WA 11, pp. 254-255. 171WA BR 10, p. 36; LW 46, p. 130. Cf. Stephenson, p. 332. 172Tappert, Letters, p. 343. e reforçavam um ao outro: o pastor instava seu rebanho a obedecer à autoridade temporal, enquanto o príncipe protegia a igreja da violência da massa. (Daí as palavras terríveis de Lutero contra as “hordas de camponeses assaltantes e assassinos”, os quais ele admoestou os príncipes a “apunhalar, golpear e matar” aos olhos públicos.)173 Mesmo permitindo que um cristão atuasse como magistrado, Lutero não tinha nenhuma doutrina acerca de uma magistratura cristã. O Estado foi ordenado por Deus como concessão ao pecado humano. Não era o agente do propósito redentor de Deus para a humanidade. A escatologia apocalíptica de Lutero evitava que ele acolhesse muitas esperanças na melhoria das condições do mundo. “Pois o mundo é algo doente [...] como um hospital [...] ou é como uma estola de pele, onde nem o couro nem os pelos são úteis” .174 Na melhor das hipóteses, o Estado poderia apenas consertar a velha ordem, restringir a disseminação da anarquia, até que o julgamento final de Deus fosse desencadeado. Contudo, essa tarefa, a obra da mão esquerda de Deus, era extremamente importante, pois permitia que o evangelho fizesse seu trabalho adequado, mesmo em meio a uma sociedade pecaminosa. Últimas Palavras e Legado No princípio de janeiro de 1546, com 62 anos, Lutero retornou à cidade onde nasceu, Eisleben, para resolver uma disputa política (na verdade, uma briga de família) entre os príncipes de Mansfeld. A viagem de W ittenberg para Eisleben era de 130 km. Lutero, com a saúde extremamente debilitada, foi acompanhado por seus três filhos, Hans, Martinho e Paulo, e também por um amigo de confiança, Justus Jonas. Dois dias após a partida, ainda a caminho, Lutero escreveu para Kate, que estava em casa, falando dos riscos da viagem. Aparentemente, o tempo quente havia descongelado o rio, impedindo que se viajasse diretamente para Eisleben. I73LW 46, pp. 49-55. 174WA 51, p. 214; LW 13, p. 164. David C. Steinmetz, Luther in Context, p. 114, apresenta o seguinte resumo dos objetivos da teoria política de Lutero: “Os objetivos de Lutero, acredito, são claros. Lutero queria demonstrar que: 1) a ética cristã, embora não toda a moralidade humana, baseia-se na justificação pela fé somente; 2) todos os cristãos têm responsabilidade cívica e social a cumprir, e alguns podem executar esse dever assumindo um cargo público no Estado; 3) o Sermão do Monte não é meramente uma ética monástica ou uma ética para o Reino futuro de Deus, mas se aplica à vida de cada cristão, mesmo se suas exigências morais não forem aplicáveis a todas as decisões que os cristãos devem tomar como pessoas públicas; 4) o Estado foi estabelecido por Deus para alcançar fins divinamente pretendidos, que a igreja não pode e não deve tentar atingir e 5) Deus, que rege a igreja por meio do evangelho, governa este mundo desordenado mediante os instrumentos disponíveis ao Estado — a saber, a razão humana, a sabedoria, a lei natural e a aplicação da coerção violenta” . Querida Kate, chegamos a Halle hoje, às oito, mas não continuamos para Eisleben, porque um grande anabatista [o rio Saale] enfrentou-nos com ondas e pedaços de gelo. Ele inundou a terra e ameaçou rebatizar-nos. [...] Temos refrigério e conforto com a boa cerveja de Torgau e o vinho do Reno, esperando para ver se o Saale se acalmará. [...] O diabo está ressentido conosco, e ele está nas águas — assim, é melhor ser cauteloso do que se arrepender depois.175 Finalmente o rio baixou e a viagem pôde continuar. Em 14 de fevereiro, Lutero teve sucesso em efetuar uma reconciliação entre os príncipes feudais. Três dias depois, o acordo foi assinado e Lutero preparou-se para voltar para Kate e W ittenberg. De súbito, ficou doente e desfaleceu de estafa. Aparentemente, sabia que o fim estava próxim o, como as pessoas à porta da morte muitas vezes sabem. Ele comentou que os bebês morrem aos milhares, “mas quando eu, Dr. M artinus, m orro aos 63, não creio que haja mais do que 60 ou cem no mundo todo morrendo comigo. [...] Tudo bem, nós, os velhos, devemos viver tanto para ver o diabo na retaguarda” .176 Depois da refeição da noite, Lutero subiu as escadas e deitou-se para orar. A dor aumentava. Seus amigos esfregavam-no com toalhas quentes. Ele teve uma série de ataques, e os médicos foram chamados. Depois de algumas horas de sono, por volta de 1 hora Lutero acordou com dores. Ele repetiu em latim o quinto versículo do salmo 31: “In manus tuas commendo spiritum meum, redimisti me, domine Deus veritatis”. “Nas tuas mãos entrego o meu espírito; tu me remiste, Senhor, Deus da verdade” . Jonas perguntou-lhe: “Reverendo padre, você m orrerá firmemente em Cristo e na doutrina que você pregou?” . Lutero respondeu alto o suficiente para todos no quarto ouvirem: “Ja” . Ao amanhecer, estava morto. O corpo de Lutero foi posto num caixão de estanho e retornou a W ittenberg, onde o colocaram para descansar na catedral em cuja porta Lutero havia afixado as Noventa e Cinco Teses, aproximadamente trinta anos antes. Melanchthon proferiu a mensagem no funeral, estabelecendo o reformador morto no contexto mais amplo possível da história da igreja, até mesmo da história da salvação. Os patriarcas, juizes, reis e profetas do Antigo Testamento haviam sucedido a João Batista, o próprio Cristo e os apóstolos. O Dr. Martinus também deveria ser incluído “nessa bela ordem e sucessão de indivíduos supremos na T erra” .177 De fato, afirmou Melanchthon, o puro evangelho cristão fora mais claramente pregado por cinco homens: Isaías, João Batista, Paulo, Agostinho e o Dr. Lutero. Assim começou o que podemos chamar de adversão protestante da canonização de Lutero. 175WA BR 11, p. 269; LW 50, pp. 286-287. Segui a tradução em Haile, p. 342. m Ibid., p. 350; WA 54, pp. 988-989. ' 177Haile, p. 355. Os detalhes da morte de Lutero são relatados por completo em Schwiebert, pp. 745-752. 179 Depois de sua morte. 521. totalmente privados de recursos com os quais pudéssemos nos salvar. pp. nos apóstolos. que foram acompanhadas. 71-89. Oberman. por ataques igualmente difamatórios por parte dos detratores católicos. as teorias e a fé de toda a vida precedente” . Certa vez Walt W hitman perguntou: “Por que as pessoas insistem tão ternamente nas últimas palavras da partida?” .180 Metade em alemão. Bund und Gnade in der Theologie des Mittelalters und der Reformation”. Elias ultimi saeculi". WA TR 5. Ninguém suponha que provou das Escrituras Sagradas o suficiente até ter governado as igrejas com os profetas ao longo de cem anos. p. “Não coloques tuas mãos sobre essa divina Eneida. Luther. 1983). “Wir sein Pettier. os amigos de Lutero encontraram as seguintes palavras rabiscadas num pedaço de papel deixado sobre a mesa ao lado de sua cama: Ninguém pode entender Virgílio em suas Bucólicas e Geórgicas sem primeiro ter sido pastor ou fazendeiro durante cinco anos. Ninguém entende Cícero em suas cartas. foi cunhada na Saxônia uma medalha trazendo a seguinte inscrição: “M art. Portanto.: The Franklin Library. pp. metade em latim: “ Wir sein Pettler.. Timothy George. claro. I80LW 54. 178Rupp. Righteousness. terceiro. nada resume a vida e o legado de Lutero tão bem quanto as últimas palavras que dizem ter escrito antes de sua morte. em Cristo. Martin — God's Court Jester: Luther in Retrospect. em Jesus Cristo. in: Zeitschriftfü r Kirchengeschichte 78 (1967). Eric W. “Luther’s Last Words: ‘Wir Sein Pettler. in: Pulpit Digest 63 (set. p. os fatos. 317-318.] têm valor sem medida para confirmar e endossar a variada seqüência. há algo de maravilhoso. em João Batista. Ele então respondeu: “Essas últimas palavras [. 29-34. . 14. pp. Nenhum “terreno da alma” místico pode servir de base para nossa união com o divino. veja: Heiko A. “Martinho Lutero: o Elias da Última E ra . vulneráveis. 476. p. 1979). Penn. em Eisleben. Gritsch. Somos mendigos — carentes.-out. primeiro. pp.” 178 Muitos acreditavam que Lutero era o precursor moderno do M essias.” Somos mendigos. Leaves o f Grass (Franklin Center. Não podemos conseguir mérito algum que nos garanta uma permanência diante de Deus. Para Lutero.Em poucos anos.” Todo o enfoque de Lutero sobre a vida cristã está resumido nessas últimas palavras. as boas novas do evangelho eram que.. Não temos pernas próprias para nos firmar.. Hoc Est Verum’”. mas ajoelha-te diante dela e adora cada traço. A postura do ser humano vis-à-vis Deus é de total receptividade. que a vida e a carreira de Lutero assinalavam nada menos do que a proximidade do fim do mundo! Apesar dessas afirmações extremamente laudatórias. Hoc est Verum. 232-252. Essa é a verdade. Hoc est Verum”. segundo. 119Walt Whitman. essa é a verdade. a menos que tenha se engajado em negócios públicos de alguma importância por vinte anos. “Somos mendigos. Quanto äs ultimas palavras de Lutero. ' : KHi>se ao lado da cama dela e suplicou a Deus que a livrasse do sofrimento. \ m \ s i ü erfos aos ataques do diabo.smo tendo alguns estudiosos interpretado esse dito em termos do agud ra&imento de Lutero pela constipação. ?-if. I82WA T R 4 . 183WA TR 5. pp. quando seu corpo foi atacadaVò. Deus identificou-se conosco em nossa carência. p. mais facilmente embaraçados e. de sua luta com o diabo. 490-491. pois ão apren 'emos n a ’a pe’ i expei' ê icia. Lutero . àlíiisericórdia do outro — que o anseio pela graça é respondido. com a segih. pela heresia e pelo cisma em seu interior. 1 4 flQf vdeíMade. ” ' 01 Lutero também escreveu: “Quem nunca sofreu não pode entender o qué"é a esperança” . '»enças e dores. o diabo era tão real que podia ouvi-lo jogando castanhas no t ^ c Ç i jjoite. Lutero sentiu a graça de Deus mais sustentadora. Um dos piores n „ nt s n tia vida aconteceu quando sua amada filha Madalena.182 ^ \> Certa vez. Qkàndo ela morreu e os carpinteiros estavam pregando a tampa de seu caixão. Onde mais ncfs. quando ele foi perseguido pelo demônio da autodúvida e enfi -tou pçTgunta: “será que você é o único lúcido?” . pp. ela se levantará novamente ” . sabemos que a expressão in c l o a e â \ h ^ k na metáfora comum nos escritos espirituais medievais. literalmente. . Lutero gritou: “Fora com os martelos! No dia do juízo. mas tive de meditar cada vez mais profundamente. v -uJwartburg. quando a igreja foi afligida pela guerra e pela peste^e^éVipph^nte.183 Lutero realmente havia dito isso tudo muito antes. Deus “veio até onde estávamos” .. quando como mendigos podemos apenas noá\lánça. R e f e r i a ^ ( (u m \estad o de total impotência e dependência de Deus. foi atingida pela peste. em sua explicação da quarta das Noventa e Cinco Teses: “Se a vida inteira de uma pessoa é de arrependimento e uma cruz de Cristo [. r V reduzidos à humildade. dos ataques espirituais que o perseguiram durante toda a sua vida. é precisamente numa situação de tal vulnerabilidade — quando . Como o bom samaritano. Em tais momentos.. que mal tinha . Lutero afirmou que sua percepção do caráter gracioso de^DAj&fèií? a ele enquanto estava “a u ff diser cloaca". na mente de L u t ^ . 193-194. que se expôs aos perigos da estrada para cuidar do homem que estava morrendo na vala.e JAnífamMytão vulneráveis. Com o coração despedaçado.Deus tornou-se um mendigo também. desse 181WA TR 1. do que quando estamos — in cl ca Coritiiáo. fechadí. 146. “Não cheguei à minha teologia por acaso. Meus julgamentos •ouxeram-me a i'a.âír§â>da inevitável proximidade de Deus.] então é evidente que a cruz continua até a morte e. Lutero provou rep e tid a m en té ^ a\\ rdá( dessa afirmação em sua própria experiência: quando. “no ro?. Falamos das Anfechtungen de Lutero. “além de um professor da igreja cristã que não se pode celebrar de outra maneira senão ouvindo-o?” 185 Bibliografia Selecionada Além do conjunto de 54 volumes de Luther’s Works. publicada durante o qüingentésimo aniversário de seu nascimento. Luther: An Introduction to His Thought. Brian A. Jr. 1962. Althaus. Uma das melhores críticas da vida e do pensamento de Lutero. não se encontra na santidade de sua vida. “Que mais foi Lutero” . Filadélfia: Fortress Press. por fim. Paul. 1970. Eric W. Seu legado também independe. 4 livros da série Library of Christian Classics são dedicados aos escritos de Lutero. seus vícios. 1950. Gerhard. 1966.184 O legado de Lutero. Panorama abrangente da teologia de Lutero organizado em ordem sistemática. O verdadeiro legado de Lutero é sua percepção espiritual do caráter gracioso de Deus em Jesus Cristo. Estudo excelente acerca do uso e dos limites da razão na teologia de Lutero. 1975. o Deus que nos ama e nos sustenta até a morte e de novo até a vida. Here I Stand: A Life of Martin Luther. Leitura eminentemente agradável e belamente ilustrada com xilogravuras contemporâneas. p. Gerrish. Martin Luther: Selections from His Writings (Nova Iorque: Doubleday. Roland H. às vezes. Martin — God’s Court Jester: Luther in Retrospect. Um volume suplementar sobre The Ethics o f Martin Luther foi publicado pela mesma editora em 1972. Estudo cuidadoso das relações de Lutero com o Schwärmer. 1960). os escritos da Reforma do ano de 1520 foram publicados em volume separado: Martin Luther: Three Treatises (Filadélfia: Fortress Press. uma amostra selecionada da imensa variedade de literatura secundária.modo. The Theology of Martin Luther. 11. Grace and Reason: A Study in the Theology of Luther. mais visíveis do que suas virtudes. p. diferentemente do de Francisco. de suas vastas realizações como reformador e teólogo. Ebeling. “Lutherfeier”.. A seguir. perguntou Karl Barth. in: Theologische Existenz heute 4 (1933). Traduzido por Robert Schultz. Uma útil antologia dos textos de Lutero foi editada por John Dillenberger. Suas máculas foram muitas. Filadélfia: Fortress Press. Além disso. Bainton. Mark U. . Nashville: Abingdon Press. Gritsch. 184LW 31. 1961). Edwards. A mais popular biografia de Lutero no século xx. Nova Iorque: Oxford University Press. Luther and the False Brethren. 89. 1983. 185Karl Barth. Stanford: University Press. WA 1. até a entrada no reino” . Sumário perspicaz escrito por um mestre nos estudos de Lutero. Filadélfia: Fortress Press. p. 534. Harry J. Preus. St. 1964. H. Londres: Hodder and Stoughton. K. continua a ser um ponto de referência na interpretação da revolução copémica” de Lutero. Faz bom uso da correspondência e de Table Talk. Rupp.Haile. Loeschen. 1969. Nova Iorque: Doubleday. Ian D. Wicks. Wilmington: Michael Glazier. New Haven: Yale University Press. Filadélfia: Fortress Press. Um dos melhores livros sobre Lutero no período pós-guerra. . Watson. Gordon. 1970. Man Yearning for Grace. Especialmente bom quanto às polaridades e aos paradoxos no pensamento de Lutero. Luther: Right or Wrong? Nova Iorque: Newman Press. 1980. Luther: An Experiment in Biography. Acompanha a ruptura em desenvolvimento entre Lutero e a Igreja Romana com meticuloso cuidado. 1983. Jared. Let God Be God! Filadélfia: Fortress Press. David C. McSorley. Philip S. 1981. Wrestling with Luther. 1986. Luther and His Spiritual Legacy. Bloomington: Indiana University Press. 1953. From Shadow to Promise: Old Testament Interpretation from Augustine to the Young Luther. Siggins. G. Relato fascinante acerca de Lutero quando mais velho. The Righteousness of God. Estudo completamente documentado sobre a cristologia de Lutero. Gordon. Luther and the Papacy. Scott H. 1976. Luther’s Progress to the Diet of Worms. Pela primeira vez publicado em 1947. Narrativa breve mas brilhante sobre o desenvolvimento de Lutero até 1521. Washington: Corpus Books. Um dos melhores produtos da pesquisa ecumênica católica sobre Lutero na tradição da “escola de Lortz” . Louis: Concordia. Rupp. John R. Martin Luther’s Doctrine of Christ. Nova Iorque: Harper and Row. vários dos quais centrados em sua obra exegética. Luther in Context. Estudo das primeiras palestras de Lutero sobre os salmos à luz da hermenêutica medieval. 1969. 1970. ____. Steinmetz. Cambridge: Harvard University Press. Pesquisa ecumênica do debate Lutero-Erasmo acerca do livre-arbitrio. Coleção de ensaios sobre a teologia de Lutero. James Samuel. Hendrix. 1968. 75. Adventure o f Ideas (Nova Iorque: Mentor Books. apenas doces “campos numa planície adorável” . Quanto à viagem de Lutero a Roma. deixando a Reforma permanentemente dividida. uma descrição da paisagem saxônica!2 Enquanto Lutero estava-se arrastando pelas neves alpinas. 58-81. cruzando os Alpes no Paço Septimer. no cantão vizinho de Glarus. Seu primeiro biógrafo. Micônio. não havia montanhas salientes. p. Jackson. no alto dos Alpes. pp. Longe de impressionar-se favoravelmente com o terreno acidentado. A biografia de Zuínglio por Micônio foi escrita em 1532. em W ildhaus. 1957). ed. na vila de Toggenburg. 40. p. veja Heinrich Boehmer. 2. Aliados em potencial em suas lutas contra Roma. .ALGO CORAJOSO PARA DEUS Ulrich Zuínglio Essa religião vai conquistar aquilo que pode tomar clara à compreensão popular certa grandeza eterna encarnada na passagem do fato temporal. crescendo nas montanhas — tão perto dos céus —. 98-99. 1912). Ele e Lutero emergiriam como os dois protagonistas líderes no início do movimento protestante. Martin Luther: Road to Reformation (Cleveland: Meridian.. até mesmo os hábitos dos ratos alpinos ‘Alfred North Whitehead. The Latin Works o f Huldreich Zwingli (Nova Iorque: Knickerbocker Press. era de opinião que. Antes do dilúvio. o ano seguinte à morte do reformador. WA 42. ele supunha.3 Seus escritos estão repletos de alusões a esses prim eiros anos nos Alpes: as montanhas proclamam “o poder invencível de D eus” e a “vastidão de sua grandeza” . o jovem Ulrich ficou mais harmonizado com as coisas de Deus. Alfred North Whitehead} O Caminho da Reforma Durante o inverno de 1510. Ele atravessou a Suíça oriental. p. desentenderam-se na compreensão da ceia do Senhor. um vestígio da maldição deixada pelo dilúvio.° de janeiro de 1484. pp. Ulrich Zuínglio desempenhava suas tarefas como sacerdote paroquial. M artinho Lutero fez um a viagem a Roma. 2LW 1. considerou os Alpes Suíços imensas verrugas na face da terra. 1955). 3Samuel M. I. Zuínglio nasceu em 1. . sendo freqüentemente contratados pelos soberanos rivais da Europa. Potter.4 Embora as profundas diferenças entre Lutero e Zuínglio não possam ser reduzidas às suas respectivas opiniões sobre os Alpes. 99. Z 1. Ele aprendeu diretamente os horrores do comércio mercenário. Zuínglio acompanhava os soldados em suas campanhas. ele obteve favor. Ulrich Gäbler proporcionou uma útil introdução à pesquisa de Zuínglio em Huldrych Zwingli: His Life and Work. Oskar Farner. era corajoso e saía-se bem.. 6Gottfried W. Os mercenários suíços eram famosos por sua habilidade na luta. Mais tarde. 217. J. I.2 foram traduzidos como “um belo prado alpino” . assassinato! O que aconteceu à Confederação para que seus filhos e filhas devessem ser vendidos assim? Desespero. Zuínglio estava presente em Marignano. . H. gritando: “Os suíços estão chegando!” . Heinrich Bullingers Reformationsgeschichte (Frauenfeld. palavras e atos. p. Huldrych Zwingli: Seine Jugend.7 Em 1522. por Ruth C. Em 1515.5 Mesmo legalmente ainda fazendo parte do Império Romano. por volta do século XVI a Confederação Helvética havia adquirido certa independência. p. glória e uma boa reputação em meio a seus conterrâneos”.6 Como capelão das tropas de Glarus. e nas batalhas.] Ó Deus. J.] Assassinato. Muitas dessas batalhas aconteceram nas planícies da Itália setentrional.. II. Num de seus primeiros escritos como reformador. trad. Zwingli. Hottinger eH . com conselhos. O desenvolvimento inicial de Zuínglio foi moldado por dois fatores que continuaram a influenciar seu pensamento por toda a sua carreira: o patriotismo suíço e o humanismo erasmiano. especialmente o papa.. o caráter deles de fato reflete um contexto histórico e político único. 816. desespero! Desgraça. L. o imperador e o rei da França. 1981). p. p. Locher. Heinrich Bullinger apresentou o seguinte relato das atividades de Zuínglio no campo de batalha. quid opus erat me Helvetium et apud Helvetios Christum profitentem huius tumultus insimulare?”. ed. e especialmente G. Brill. 149-150. eds.. concede-nos a paz” . pp. quando os suíços sofreram uma derrota esmagadora nas mãos dos franceses e diz-se que dez mil homens morreram. I. 1964). 1943). Zwingli’s Thought: New Perspectives (Leiden: E. 1838­ 1840). Schulzeit and Studenjahre (Zurique: Zwingli-Verlag. embora deva-se consultar também Walther Köhler.. O estudo em quatro volumes de Farner permanece sendo a biografia padrão. pecado! [. desgraça! Pecado. 1Ibid. Z 13. Sua principal exportação consistia em soldados. Zwingli: Third Man o fth e Reformation (Filadélfia: Westminster Press. 270: “Principio igitur. R. Vogeli. 34. Zuínglio dirigiu ao cantão de Schwyz uma advertência solene contra a conexão mercenária. Zuínglio descreveu a si mesmo como “um suíço professando Cristo entre os suíços” . Gritsch. onde até hoje se diz que as mães às vezes ameaçam seus filhos com o bicho-papão. 1943). [. p. 5Jackson. Ele mostrou que as alianças estrangeiras colocariam os 4Ibid. p.. Assim. ele lamentou: “Se nossos filhos pudessem crescer e não ser mortos.. Uma abordagem mais popular é Jean Rilliet. o que sugere que talvez ele tenha realmente participado das lutas: “No acampamento. os “verdes pastos” de Salmos 23. 8.exemplificam a providência divina. J. ele pregava diligentemente. Huldrych Zwingli (Leipzig: Koehler e Amelang.. sua prontidão em unir as tarefas da igreja com as do Estado. empunhando um machado de duas cabeças. vocês vão preservar a Pátria” . Identificamos o modernismo como movimento de eruditos que almejava reformar a sociedade aplicando as percepções da antigüidade clássica à vida contemporânea. ut probemus Christi regnum etiam esse externum. Damit werdend ir üwer vatterland behalten”.8 Mesmo detestando a guerra.cantões uns contra os outros. p. malvasia. 9“Of the Education of Youth” .11 O despertar religioso implicava reforma política: “A Palavra de Deus vai torná-los companheiros piedosos e tementes a Deus. eumque imperat. ele aplicou a mensagem protestante diretamente às condições sócio-políticas de seu tempo. ovelhas.] Vult ergo Christus. etiam in externis modum teneri. p. Zuínglio não era absolutamente um pacifista radical. mas produz manteiga. p. Além disso. Ele acreditava que os homens jovens devessem passar pelo treinamento militar. ‘“Jacques Courvoisier. in: Zwingli and Bullinger. "Z 1. Em contraste com a ênfase de Lutero no paradoxo dos dois reinos. Bromiley. Importante entre os humanistas foi Desidério Erasmo. p. W. 15. non est igitur eius regnum non etiam externum”. . ameaçando a independência deles. laranjas.10 O ideal de Zuínglio para a Suíça era de um “Israel” alpino reformado.. as belas roupas e os fartos alimentos que o dinheiro estrangeiro fornecia eram influências corruptoras nos suíços. Zuínglio foi ao mesmo tempo pastor e patriota. a própria reforma zuingliana dividiu o país. vinho e cereais em abundância” . 113: “Denn das wirt üch fromm. ed. cujas origens podem ser remontadas às cidades da Suíça e da Alemanha meridional. publicavam novas edições dos clássicos antigos e buscavam uma renovação moralreligiosa por meio de um programa definido de educação e ação política. a fim de proteger seu país natal e “aqueles a quem Deus aprova” . Zuínglio insistiu em que “o reino de Cristo é também externo” . 106.9 O próprio Zuínglio morreu no campo de batalha. cavalos. 12Z 3. A d fontes — às fontes — era o mote dos estudiosos que examinavam atentamente os textos gregos e latinos. roupas feitas em casa. 394. gotzvörchtig lüt ziehen. seda e tais luxos femininos. p. o que se tem mantido até hoje. 454: “Sed nos hue solum properamus. A Suíça pode não produzir “canela. gado. No fim.12 O ativismo de Zuínglio. Zwingli: A Reformed Theologian. que. 113. p. foi igualmente decisivo seu treinamento completo nas disciplinas humanistas. aproximadamente entre 8Z 3. G. teólogo e político.. resultando na prim eira guerra de religião protestante-católica e na morte do reformador de Zurique. leite. cujos cantões corresponderiam às 12 tribos do antigo povo de Deus. Jacques Courvoisier observou que Zuínglio foi um dos prim eiros a defender uma política de neutralidade armada para a Suíça. des reiser ich bin). [. sua sensatez e sua flexibilidade política são marcas distintivas da tradição reformada.. Assim. Para o desenvolvimento intelectual de Zuínglio. Como o “mercenário de C risto” (Christus. 31. Tanto em Glarus quanto em Einsiedeln. Sua ênfase na espiritualidade de Deus. das ich gedacht — doch mit geschrifft und wort gottes ingfurt —. quando. p. jaren ein tröstlich gedieht gelesen des hochgelerten Erasmi von Roterdam. imergiu no texto das Sagradas Escrituras. p. 15Bromiley. seu desprezo pelo misterioso e pelo sacramental. du must das alles lassen Iiggen und die meinung gottes luter uss sinem eignen ein valtigen wort lernen”. p. no primeiro capítulo. VIII. a teologia madura de Zuínglio reflete sua exposição anterior ao humanismo. Z 1. 1910). começando com a genealogia. como diríamos. Ele mesmo estabeleceu a transição principal em 1516. so er doch ein brunn sye alles guten. a partir de seus estudos universitários em Viena e em Basiléia. 2n. 8. mit vil gar schönen worten”. Cf. darinn sich Jesus klagt. sua repugnância pelas aparências na religião. hoje se pode ler a seguinte inscrição: “A reforma de Ulrich Zuínglio começou aqui. “Lamento de Jesus à Humanidade” . vi a necessidade de deixar de lado todos esses [ensinamentos humanos] e aprender a doutrina de Deus diretamente de sua própria Palavra” . Philip Schaff. Zuínglio pregaria direto do Evangelho de Mateus. sua abertura à filosofia e à razão. Sobre o portal dessa igreja. Heinrich Bullinger. trost und schätz der seel. um poema de Erasmo. nas humanidades. 14Bullinger. 217: “Ich hab vor 8.15 Outro evento decisivo foi o chamado para atuar como “sacerdote do povo” na famosa Grande Catedral de Zurique. exerceu sobre Zuínglio uma influência crítica. A evolução de Zuínglio do humanismo para o protestantismo é assunto de debate entre os historiadores da Reforma.13 Mais importante ainda foi a edição de 1516 do Novo Testamento grego feita por Erasmo. tendo copiado cada uma delas palavra por palavra. an den heren Jesum geschriben. Um manuscrito preservado nos arquivos da cidade de Zurique contém trechos do Novo Testamento grego copiados com a caligrafia de Zuínglio. em 1. 239. Zuínglio ficou profundamente impressionado com a fusão de piedade e conhecimento que descobriu em Erasmo.14 Esse minucioso trabalho preliminar mais tarde daria frutos na poderosa pregação expositiva e na exegese bíblica de Zuínglio. Já bem versado no humanismo ou. mas veja Locher. Mateus 13Z 2. p. Em vez de sermões “enlatados” . o novo pastor chocou sua congregação anunciando sua intenção de dispensar o lecionário tradicional. no qual Cristo declara ser o condutor da salvação. Alguns eruditos têm duvidado da validade do relato de Bullinger. p.° de janeiro de 1519” . relatou que Zuínglio memorizou em grego todas as epístolas paulinas. que ressalta que Zuínglio estava simplesmente seguindo o conselho de Erasmo. . pp. ein heilmacher. Seu amigo e sucessor em Zurique. o único conforto e tesouro da alma. oder 9.1514 e 1519. I. 379: “Do kam ich zum letsten dahin. History o f the Christian Church (Nova Iorque: Charles Scribner’s Sons. das man nit alles guts by im sucht. Nessa data. Apesar de seu posterior rompimento com Erasmo. tudo isso demonstra afinidade com o universo de pensamento erasmiano. onde manteve um cargo de pregação de 1516 a 1518. 90-91. levou Zuínglio a abandonar sua crença na intercessão dos santos. De fato. “dirigido pela Palavra e pelo Espírito de Deus. Potter. Ele admirou a postura corajosa de Lutero contra Eck.17 Muitos eruditos modernos concordam com a reivindicação de independência feita por Zuínglio. Senhor. daí voltando-se ao Antigo. não depois de 1525. e trads. Essa primeira tradução completa em inglês do tratado está em E. p. que alguns biógrafos citaram como prova de profunda percepção teológica.foi seguido de Atos. sem dúvida. 61. W. na porta. em Leipzig e referiu-se a Lutero como um “Elias” . negando toda dependência ao reformador de Wittenberg: “Não aprendi minha doutrina com Lutero. Ergue teu braço. . Pipkin. Que venceu a morte. I. foi uma mudança importante. de cuja canonicidade ele duvidava.. havia percorrido o Novo Testamento. Durante esse período. depois. E. Cravado por mim antes. depois Gálatas. mas não derivavam delas. Instava sua congregação a comprar e ler os livros de Lutero. Mais tarde. Zuínglio não rompeu decisivamente com a Igreja de Roma até algum tempo depois de sua mudança para Zurique. Ouço da morte a batida. da Epístola a Timóteo. Sobre a terra l6Zuínglio nunca pregou sobre Apocalipse. E livrou-me. O irmão de Zuínglio pereceu na epidemia. Mais de 2 000 de seus 7 000 habitantes morreram. I8A mais completa investigação dessa polêmica questão é Arthur Rieh. p. ficou a par. até que. Força e rocha minha. suas percepções da Reforma eram freqüentemente paralelas às de Lutero. Die Anfänge der Theologie Huldrych Zwinglis (Zurique: Zwingli-Verlag. J. Eis que. Ajuda-me. A partir dessa experiência. 17Z 2. 149. Huldrych Zwingli: Writings. 1949). que jorravam das prensas de Zurique e de Basiléia. Zuínglio escreveu uma “Canção da Epidemia” . de Zuínglio. diversos anos depois.16 Essa. p. recusou-se a ser chamado “luterano” . Furcha e H. mas na própria Palavra de Deus” .18 Em 1519. Essa passagem encontra-se em Auslegung und Grunde der Schlussreden. e o próprio Zuínglio chegou perto da morte. Cf. eds. que preparou os cidadãos de Zurique para uma completa aceitação da Reforma. de Lutero e do que estava acontecendo na Alemanha. ao recobrar-se da doença: Meu Deus! Meu Senhor! Por Tua mão curado. e assim por diante. juntamente com o restante da Europa. 1 e 2 Pedro. uma epidemia devastou Zurique. 119. . 67-69. “ Farner. mais de 50 tornaram-se protestantes durante o século x v i. Imperial Cities and the Reformation. pp. Zuínglio considerou-a uma contenda entre os “trabalhadores” e os “desocupados” . Sua descoberta da doutrina paulina da justificação.20 Sua teologia desenvolveu-se lentamente. Lausanne. Erik Midelfort e Mark U. in: Bulletin o f the John Rylands Library 54 (1971-1972). das 85 cidades imperiais livres dentro do Sacro Império Romano. Em Zurique. aumentou o senso de uniformidade cívica e completou a revolução das classes médias dominadas pelas guildas contra oponentes tanto externos (bispos) quanto internos (patrícios). 103-148. em Lent. Zuínglio não pôde mais manter sua posição de sacerdote na Igreja Romana. o povo estava entre os primeiros e mais ardentes correligionários de Zuínglio. renunciou a seu cargo como “sacerdote do povo” de Zurique. pp. Zuínglio emergiu de sua terrível doença purificado e decidido. 21Bernd Moeller. No fim de 1520. C f também Steven E. Zuínglio observou: “O homem comum abraça o evangelho. Ulm. Os príncipes da Alemanha setentrional garantiram a Reforma Luterana. Estes 19Schaff. p.19 Lutero havia-se voltado para o mosteiro após um encontro de perto com a morte. Agora. conforme um biógrafo expressou. 1972). trads. p. Minha boca cantará Apenas de ti. Berna. Que o pecado não mais Reine sobre mim. 1975) e Basil Hall. obglych ire obren nit daran wellend”. Basiléia. . I. que primeiro colocou Zuínglio em desavença com as autoridades eclesiásticas. Na Alemanha meridional e na Suíça. Genebra. 56-57. bem como em Zurique. The Reformation in the Cities (New Haven: Yale University Press. 446: “Der gmein mann hangt dem evangelio an. Bernd Moeller mostrou que. Z 1. Em 1524. embora seus superiores não queiram nada disso” . VIII.Uma vez mais estou. 22Z 3. também Jackson. “The Reformation City” . Zuínglio estava em condições de pressionar uma reforma oficial em Zurique. 41-42. identificando-a com seus interesses dinásticos e territoriais. cf. em 10 de outubro de 1522. Dois eventos marcam sua ruptura com Roma e sua adesão pública à causa protestante. depois do que o conselho da cidade imediatamente o contratou como pregador para a cidade inteira. renunciou à pensão papal que havia recebido durante muito tempo. não veio “como um relâm pago” . 44-45. pp. A partir do princípio da década de 20. Edwards.22 A luta sobre a questão do jejum . 38. com uma nova compreensão de sua total dependência de Deus. Dois anos depois.21 Em Estrasburgo. que ele tinha em comum com Lutero. (Filadélfia: Fortress Press. em muitas horas de estudo e de púlpito.-pp. a Reforma coincidiu com uma mentalidade urbana crescente. também era em parte um problema de conflito de classes. ed. pp. Ozment. a Reforma reforçou a solidariedade política e social. e. Erasmo!). Z 1. Eles negaram 23Z 1. aconselhando-o a não traduzir o tratado para o alemão até que tivesse consultado “amigos mais instruídos” (i. 106. Havia em sua mente o medo do cisma quando ele admoestou os cidadãos de Zurique a manter “a unidade da igreja. «Jackson. 324: “Quamobrem dico edico vobis. non insidiis. 29 de janeiro de 1523. parecia quase irreverente. tinham de ter suas salsichas. quo scripturarum sequamini ducem ac magistram.23 Os pobres trabalhadores. por outro lado. 25Z 7. e não as invenções humanas. “ Jackson. p. Jackson. Ninguém presente ousou acusar Zuínglio de heresia. mas pelo combate aberto das Sagradas Escrituras e por um encontro público.25 A essa altura. e a igreja é um a” . Jackson. non blandiciis. Ulrich Zwingli: Selected Works. Em certas partes. Ele é acusado de não ouvir os bispos? “Nada mais fácil. seguindo as Escrituras como seu guia e mestre.24 Isso era demais para Erasmo. 247. nem por armadilhas ou recursos secretos. Zuínglio replicou com seu Apologeticus Archeteles (“minha prim eira e última defesa”). 213. o qual observava a estridente pregação de Zuínglio com alarme crescente. já que eles nada dizem . dentre as quais os 200 membros do conselho da cidade e todo o clero do cantão. I. p. e a delegação do bispo. p. Zuínglio conclamou seus próprios oponentes “a deixarem os asnos e se juntarem aos bois. Essa assembléia especial reuniu-se para uma “discussão pública em língua alemã” . encheram o tribunal da cidade de Zurique para o que tornou-se conhecido como a Prim eira Disputa de Zurique. Zuínglio encerrou o assunto em seu último desafio ao bispo: Se você deseja sustentar que não ensinei a doutrina do evangelho verdadeiramente. 217. Johannes Faber. A essa admoestação.” Quanto à acusação de haver abandonado a Santa Mãe. id non minus. que disparou uma réplica sucinta para seu antigo discípulo. 86-87. ed. ut si evangelicam doctrinam non recte nos docuisse velitis adserere. Erasmo escreveu essa carta depois de 1er apenas algumas páginas do tratado de Zuínglio — “no meio da noite” (ad multam noctem). non humana commenta”. 582. a sorte estava lançada. pp. entretanto.tinham condições de abster-se das comidas proibidas.. 25. Zurique ficava sob a jurisdição do bispo de Constança. sed sacrarum literarum aperto Marte publicoque congressu.27 Quando aconteceu. pp. 288. substituírem os bodes pelas ovelhas” . liderada pelo ex-amigo de Zuínglio. cerca de 600 pessoas. non cuniculis. sem a qual não pode haver evangelho. p. a fim de suportar o trabalho árduo. a disputa nem chegou a materializar-se. p. 27Samuel M.26 Na manhã de uma quinta-feira.. Eles haviam sido convocados pela câmara a pedido de Zuínglio. já que eram capazes de “encher-se de alimentos ainda mais fartos” . Cristo é um. recusou-se a debater os Sessenta e Sete Artigos que Zuínglio havia preparado para a ocasião. I. tente-o não por ameaças ou bajulações. . de acordo com suas capacidades” . Esse princípio havia sido formalmente reconhecido pelo conselho já em 1520. Evidentemente.. totalmente competente para pronunciar-se com autoridade sobre assuntos de fé e adoração. falar e decidir a verdade” . foi outro passo em direção a uma “bibliocracia” . numa universidade onde doutores letrados poderiam discuti-los imparcialmente e em bom latim. nem era a sede de um bispo. p. pelo menos. Ele instou a cada pastor que comprasse e lesse sua própria cópia do Novo Testamento grego. a supremacia cívica da reforma zuingliana repousou no . 31Moeller. do Antigo Testamento hebraico e da Vulgata latina.30 A ação do conselho foi comparada à asserção feita posteriormente por Henrique vm de ter autoridade suprema em assuntos religiosos. a qual nem mesmo possuía universidade.. proclamando o santo Evangelho e as corretas divinas Escrituras com o Espírito de Deus. como Zuínglio os chamava. não há nenhuma razão pela qual não possamos discutir esses assuntos. 54. declarou Zuínglio. 54.que uma cidade como Zurique fosse foro adequado para resolver questões teológicas importantes. 30Ibid. algum cidadão piedoso compraria para ele ou então lhe emprestaria o dinheiro. quando decretou'que to‘d a ai pregação no cantão de Zurique deveria estar em conformidade com a Bíblia. 26. p.. princípio anterior da sola scriptura. em 1522. os homens do conselho apresentaram seu veredicto: o M estre Zuínglio podia “continuar e manter-se como antes. 93. Zuínglio e seus colegas entraram na disputa carregando seus fólios do Novo Testamento grego. 55. não em alemão suíço! A essa tática evasiva. pp. Zurique tornou-se “o primeiro estado protestante por iniciativa magisterial" . mas um sínodo evangélico em igualdade de condições com um concílio geral da igreja universal.28 Essa foi uma reivindicação notável. O fato de as autoridades governantes de Zurique.-Tais assuntos seriam mais apropriados num concílio geral ou.29 Na sessão vespertina. In. os “coronéis” (grossen Hanseri). Os cidadãos de Zurique sentiam-se competentes para julgar os assuntos espirituais porque por quatro anos tiveram o puro evangelho pregado entre eles. 29Ibid. sentirem-se à vontade para apropriar-se indevidamente dessa prerrogativa levou Faber a acusar Zuínglio e sua corte de estarem “planejando revirar e perturbar todas as coisas” . Ao longo do debate recorreu repetidamente às Escrituras.31 E. Ele exigiu saber o capítulo e o versículo da doutrina de Faber sobre a intercessão dos santos. tentam 2SIbid. A retenção de Zuínglio como funcionário público depois de sua renúncia ao cargo de “sacerdote do povo. Se fosse pobre demais para custeá-lo. mais. p. . Zuínglio considerou essa assembléia não meramente uma sessão especial do conselho da cidade. Os bispos e sacerdotes. Zuínglio respondeu: “Digo que aqui neste lugar está sem dúvida uma assembléia cristã. ed. Sear (Nova Iorque: Archon Books. obtido uma vitória notável sobre seus oponentes. Vão em frente. ouçamos. p. que formaram a primeira confissão de fé reformada.. 34Oskar Farner. U m novo grupo. Faber. pp. como se os outros cristãos não tivessem nada a ver com o Espírito de Deus ou com sua Palavra. por D. Em outubro de 1523. trad. Oberman tentou estabelecer a Primeira Disputa de Zurique no contexto mais amplo das tradições cívicas de Zurique. a liturgia batismal já havia sido traduzida para o alemão. uma Segunda Disputa foi realizada. Cristo. Todavia. 58. As “imagens e ídolos” permaneceram nas igrejas até junho de 1524. Zuínglio lançou um último desafio a Faber: “Se você conseguir provar que um de meus artigos é falso mediante o evangelho. eu lhe darei um queijo de coelho. 94. 642-653. pp.afastar as Escrituras do povo comum. p. o conselho da cidade não ordenou uma reforma imediata. foram aceitos em princípio como base para reformas futuras. Zuínglio exclamou: “Deus seja louvado e agradecido. deu-nos isso apenas como alimento e memorial de seu sofrimento e de sua aliança” . Estou esperando” . 1981). Zuínglio foi levado a dizer: Não tenham medo. e a missa foi abolida somente durante a Semana Santa de 1525. Vocês de fato realizaram algo grandioso e encontrarão oposição por causa da pura Palavra de Deus. assim. formado na maior parte de jovens e ardentes correligionários de Zuínglio. exigia que as reformas 32Jackson. Duas razões causaram essa demora. uma verdadeira obra do anticristo. in: Theologische Literaturzeitung 100 (1975). nosso Redentor. manifestamente desconhecedor das sutis diferenças entre os excelentes queijos suíços. que é isso? Não preciso de queijo algum” . esta lidando com a questão das imagens e da missa.33 Na conclusão dessa disputa. 1952). pp. Perto do final do debate. Zuínglio foi publicamente desagravado da acusação de heresia. G. alegando que apenas eles tinham direito de expô-las. Zwingli the Reformer. veja Bernd Moeller. meus amigos! Deus está do nosso lado. Com a iniciativa de Leão Jud. Heiko A. em nome de Deus!34 Apesar da reação entusiasmada à pregação de Zuínglio. Então. cuja palavra reinará nos céus e sobre a terra” . 107-108. 187-239. 33Z 2. Quanto a uma opinião contrária sobre o significado da Disputa. sobre a qual apenas alguns se importam de pensar. replicou: “Um queijo de coelho. muito ainda precisava ser feito para que a igreja em Zurique pudesse ser considerada completamente reformada.32 A Prim eira Disputa de Zurique constituiu um momento decisivo na evolução da reforma zuingliana. e protegerá os que são seus. 733. . Tendo. Zuínglio agora atacava a missa como “um empreendimento blasfemo. Selected Works. 55. co-reformador com Zuínglio. Veja seu Masters o f the Reformation (Cambridge: Cambridge University Press. “Die Ursprünge der reformierten Kirche”. e seus Sessenta e Sete Artigos. Durante os últimos anos de sua vida. que abertamente romperam com ele em 1525. como Faber e Jonh Eck. History o f Theology (St. À medida que o processo da reforma se desenrolava. Desse grupo saíram os primeiros anabatistas. A fundação de uma escola teológica.fossem realizadas independentemente das diretivas do conselho. Alegando que sua contribuição à história da teologia “não exigiria mais que um breve relato” . “ Bengt Hãgglund. contrários às novas doutrinas de Zuínglio. o “pastor” ou “atalaia” (as palavras preferidas de Zuínglio para sacerdote) precisava vigiar zelosamente o rebanho contra os ataques do Maligno. Zuínglio compôs todos os seus escritos reformados apressadamente. A i5Ibid. que impeliu um estudioso a conferir-lhe o título de “terceiro hom em ” da Reforma. muitos dos quais. 1968). p. . e Lutero. Zuínglio nunca escreveu nada comparável às Instituías. Zuínglio como Teólogo O papel de Zuínglio na história do pensamento cristão nunca foi claramente avaliado. Como os profetas do Antigo Testamento. a expansão da Reforma a outros cantões. especialmente Berna e Basiléia. Foi ofuscado durante sua vida pelo grande Lutero e sucedido pelo mais eficaz Calvino. a fim de alertar o mundo pecaminoso” . estando pronto para m orrer na luta pela causa de Cristo. “O destemor é vossa armadura! Deveis vigiar e estar prontos para a batalha. um historiador moderno da teologia dedica apenas três páginas ao reformador de Zurique. Louis: Concordia. um tribunal de moralidades (originariamente uma corte para resolver disputas matrimoniais). os anabatistas radicais. 255. a tradução da Bíblia para o dialeto alemão da Suíça. Só com muita cautela é que Zurique decidiu-se pelo caminho que conduziria ao campo de batalha de Kappel. os escritos de Zuínglio tornaram-se mais explicitamente teológicos. em 1531.35 Zuínglio continuou a guiar a Reforma de Zurique até sua morte prematura. A Confederação estava-se dividindo em linhas religiosas. porque Deus manda seus profetas para todos os lugares. Além disso. tudo isso ajudou a consolidar os esforços reformadores de Zuínglio. Zuínglio e o conselho da cidade opuseram-se a esse clamor por uma reforma “sem esperar por ninguém” . 56.36 As razões dessa desatenção são óbvias.. em menos de uma década. p. o conselho estava preocupado com o isolamento de Zurique dos demais cantões suíços. à medida que ele lutava por definir sua postura distinta de Reforma contra os apologistas católicos romanos. Zuínglio via a si mesmo cada vez mais como um profeta para seu povo. que o considerava com suspeita e desconfiança cada vez maiores. temendo que uma ação precipitada causasse inquietação pública e que as consciências fracas pudessem sentir-se ofendidas. Z 1. Da mesma maneira. ed. J.38 Tentaremos esboçar o perfil da teologia de Zuínglio sob o aspecto de cinco tópicos básicos de seu pensamento. para todos os que já existiram. ein hussfrouw Christi: Ecclesia catholica”. a igreja é vista como o grupo daqueles que verdadeiramente pertencem a Deus pela fé: “Todos os que permanecem no cabeça são membros e filhos de Deus. Huldrych Zwingli. é o escopo da teologia de Zuínglio? Sua formação humanista e sua inclinação ao racionalismo levaram alguns estudiosos a vê-lo como precursor da teologia liberal moderna. Paul Tillich relacionou a teologia de Zuínglio com o ideal burguês da saúde: “Se você está psicologicamente saudável. também os artigos em E.maioria de seus sermões foi entregue improvisadamente. Entre as interpretações católicas romanas. a noiva de Cristo. 37Paul Tillich.39 Da mesma forma. p. in:Dictionnaire de Théologie catholique (Paris. XV. e tal é a igreja ou a comunhão dos santos. M. sola fi. 257. então você pode ter fé. Pollet permanece insuperado: “Zwinglianisme”. 459: “Uss dem volgt: Zu eim. Os motes de Lutero. 3745-3928. isso não deve obscurecer a concordância essencial entre os dois reformadores. 1484-1531: ALegacy o f Radical Reform (Montreal: McGill University Faculty of Religious Studies. ed. 1967). Christof Gestrich. Embora freqüentemente contrastemos as idéias de Zuínglio com as de Lutero. tanto na teologia da Contra-Reforma quanto na anabatista. 458. Zuínglio nunca obteve doutorado em teologia. V. Z 1. Ecclesia catholica”. glider und kinder gottes sind. 1952). veja nessa obra: “How the Image of Zwingli Has Changed in Recent Resarch”. cols. 1985). und das ist die kilch oder gemeinsame der heyligen. Gottfried W. o artigo de J.. ainda que tendo uma ênfase diferente. p. Zwingli als Theologe: Glaube und Geist beim Zürcher Reformator (Zurique: Zwingli-Verlag. 39Esse é o terceiro dos 6 7 Artigos: “Dannenher der enig weg zur säligkeit Christus ist aller. p. Selected Works. History o f Christian Thought. Jackson. pp. Tenho uma dívida em particular com a interpretação de Zuínglio feita por Locher. 1951). embora não idênticas.37 Pesquisas mais recentes acentuaram o foco cristológico e o tom espiritualista de seu pensamento. 38Veja. Zuínglio. Grande parte de sua pesquisa inovadora encontra-se agora disponível em inglês numa excelente coleção de ensaios. . Suas doutrinas da predestinação. suas conversas informais perderam-se para a posteridade. por falta de admiradores devotados que anotassem cada palavra sua. sola gr atia.40 É somente contra essa base comum de concordância que os padrões distintos da teologia de Zuínglio podem ser percebidos. 40O oitavo dos 67 Artigos. 42-71. so in dem houpt läbend. die ie warend. apenas alguns foram revisados mais tarde para a publicação. Zwingli's Thought. Cf. por exemplo. Furcha. sind und werdend” . Diferentemente de Lutero. Die TheologieHuldrych Zwinglis im Lichte seiner Christologie (Zurique: Zwingli-Verlag. 111. p. das alle. existem e existirão” . Quanto a uma avaliação dos estudos de Zuínglio. permanecem junto com as de Calvino contra a avaliação majs4 >Q&Íliva do livre-arbítrio. então.de e sola scriptura ecoam não menos fortemente em Zuínglio. Locher. proclamava a salvação apenas mediante Cristo: “Cristo é o único caminho para a salvação. e vice-versa” . não menos que Lutero e Calvino. Qual. mesmo sendo ele a fonte de todo bem. p. de fato. II... . 171. entretanto. Zuínglio publicou um grande comentário acerca dos Sessenta e Sete Artigos. 43Furcha e Pipkin. ele recordava o impacto de um belo poema de Erasmo. Mais tarde. 205-234. Zuínglio. O Criador em Vez das Criaturas Em julho de 1523. pp.Durante a Prim eira Disputa de Zurique. Warumb suchend wir denn hilff by der creatur?” ^ Z 8. pp. quando abandonei isso e aderi à pureza dos oráculos divinos. Z 2. ele escreveu a seu amigo Toggenburgers: Não foi uma grande cegueira o fato de que o Deus todo-poderoso.43 O ponto de partida fundamental da teologia de Zuínglio é a distinção absoluta entre o Criador e todas as criaturas. tantas vezes nos fez saber que é nosso Pai e finalmente até deu seu Filho por nós. seis meses antes. e pensamos que Deus é tão severo e cruel que não nos atrevemos a ir a ele. Latin Works. mas. 217: “Nun ist es ie also. pp. Huldrych Zwingli. Zuínglio confessou: “É sempre assim. sentia que essa ênfase havia sido abafada e mesmo negada na prática. e nós nos voltamos para a criatura. e eu vos aliviarei”. p. I. Furcha e Pipkin. a opinião [de Tomás] me satisfazia. I. Por que. Faber estava exasperado porque o “M estre” Ulrich ousava pronunciar-se em assuntos que deveriam ser deixados aos bispos e doutores letrados. especialmente na via antiqua. tivera uma influência decisiva em sua rejeição das indulgências. que havia preparado para a Primeira Disputa de Zurique. 207-208.44 41Z 2. Locher. Aqui. que ele mesmo continua ali e nos chama de pobres pecadores. cujas idéias sobre a eleição ele aceitou durante algum tempo. Contudo. Em 1524. Zuínglio era bem versado na tradição escolástica. 42Jackson. p. Zwingli’s Thought. eds. estava ainda mais profundamente imerso na teologia escolástica e numa tradição diferente — a via moderna. que nos criou. que havia estudado na Universidade de Basiléia. Cf. procuramos ajuda nas criaturas ?” . 106-161. p. Thomas W yttenbach. veja Farner. A doutrina de que Deus criou o universo a partir do nada (ex nihilo) havia sido um lugar-comum na teologia cristã desde a igreja primitiva. quem mais o impressionou foi Tomás de Aquino. no qual Jesus lamenta que nem tudo o que é bom é buscado nele. 117. Até certo ponto. alegou que um de seus professores. quando eu estava envolvido com o escolasticismo. dizendo: “Vinde a mim.42 Lutero. 146. desagradou-me imensamente”. eds. suas teologias distintas refletem essas bases intelectuais diferentes.41 Dos mestres escolásticos. Quanto ao treinamento de Zuínglio na via antiqua. entretanto. todos os que estais cansados e sobrecarregados. 184: “Outrora. p. era a idolatria. p. se “tudo o que ela é vem de D eus”?47 Muito do que Zuínglio escreveu nessa linha pode ser entendido como um comentário de Salmos 100. Zuínglio também estava consciente de outro conceito: a lealdade absoluta devida a Deus. der mitt gott.2 . Primeiro. Z 2.”48 Mas o Deus único e verdadeiro não aceita uma confiança indiferente. Não pode ser que uma pessoa deposite sua confiança em Deus e diga. o caráter derivado da existência humana. Como pode qualquer pessoa atribuir algo a si mesma. O perigo da idolatria era um tema ressoante na pregação de Zuínglio. E a criança responde: “Mas você é a mais querida. p. I. 317. por assim dizer. Furcha e Pipkin. “^Jackson. 148.. 1st ein ware abgottery” . a Reforma era essencialmente uma saída da idolatria para o culto ao Deus único e verdadeiro. Não podemos. definida como atribuir a uma criatura aquilo que é apenas de Deus. apostar dos dois lados. [. ed. claro. No fim das contas. Zuínglio perguntava..] Não terás outros deuses diante de m im ” (Êx 20 . eds. de depositar esperança em qualquer ser criado. I. p. também” .45 Para Zuínglio.. todos desapareceríamos no nada. Totalmente à parte da questão da queda. Zuínglio comparou essa atitude com a da criança para a qual se pergunta quem na família ela ama mais. então. 219. Z 1. 47Furcha e Pipkin. 184: “Denn wie kan der mensch im selbs et was zuschryben. levando-o ao Deus único e verdadeiro e a Jesus. Mas depois a mãe entra na sala e diz: “Eu gostaria de ser a mais querida” . Ela diz: “Eu amo meu pai” . se Deus desviasse Seus olhos de nós por um momento que fosse. os seres humanos subsistem. tanto quanto eu possa.3: “Foi Deus quem nos fez. 286.46 Duas considerações estão por trás da exortação decidida de Zuínglio. I. seu Unigénito” . p. E mais: “Chamo meu rebanho para o mais longe possível. p. Agostinho havia dito que. você fez dele um deus. e não nós” . so er alles. 239. eds. na medida em que somos criaturas. “Se você coloca sua confiança em um dos santos. Zuínglio. quando aceitamos o humano pelo divino” . 315. “Chamo de profundeza da impiedade.. para todos os efeitos e propósitos. pp. ávido leitor de Agostinho. das er ist. p. mesmo assim: “Confio tanto nas criaturas quanto nos santos” . Perguntar “Quem é o teu Deus?” é perguntar “Em quem você deposita sua confiança?” .. a criança dirá a mesma coisa até para a empregada! Deus. não tolera que a firmeza e a confiança sejam colocadas em outra pessoa 45Furcha e Pipkin. apenas sob o critério e pela boa vontade de Deus. 464: “Welicher solchs der creatur zugibt. faz ecoar o mesmo pensamento. 3). von got ist?” 48Z 2. entretanto. p. . 278. seu texto era o primeiro mandamento: “Eu sou o S enhor teu Deus. I. Z 1. 172. Aqui. ziicht got sin eer ab unnd gibt sy dem. quando deixamos Deus pelas coisas criadas. confiando em Deus e em alguma outra coisa também.. Latin Works. porque ‘D eus’ é o bem no qual depositamos nossa confiança para obter o bem de que precisam os. eds.O grande pecado da humanidade. 51 Antes. Latin Works.” Zuínglio não afirmava que os cristãos podiam compreender ou racionalizar as obras providenciais de Deus. nada é tão pequeno em nós. pp. conhecimento e presciência. mas também com as minúcias da vida diária. nem mesmo a menor das coisas. Deus. I. I. isto é. cujo poder não está separado de sua sabedoria. Z 2. eds. o marimbondo ou a vespa seria m ostrar “uma curiosidade feminina vã e inútil” .. O poder criador de Deus é intencional. as pessoas deviam contemplar com reverência o que Deus lhes / houvesse revelado. A declaração mais detalhada de Zuínglio sobre a providência vem de um sermão pregado no Colóquio de M arburgo. Conforme vimos. 51Jackson.50 Além disso. 50Furcha e Pipkin. afirmou a soberania de Deus na criação e na salvação. Não podemos deixar de admitir que nada. Z 2. Deus não é a vida e o movimento de todas as coisas de tal modo que “cegamente” coloque a respiração ou a ação nelas. eds. A providência de Deus não está relacionada apenas com os grandes eventos da história. que tudo sabe e tudo pode. 179. 192-193. Pois quem se importa tanto e é tão curioso assim para saber quantos fios de cabelo tem na cabeça? Ninguém. . a mosca. pp. D eprovidentia Dei.que não nele mesmo. Entretanto. que não seja comandado pela providência de Deus. acontece sem que seja ordenada por Deus. Zuínglio referiu-se a Deus como a prim eira causa e o bem supremo (summum bonum).. p. entretanto. Z 3. Deus é o Criador. De fato. 647. Usando a linguagem da teologia escolástica. então. p. De fato. Perguntar por que Deus criou a pulga. Deus. e posteriormente reelaborado num tratado filosófico. III. ed. ou em qualquer outra criatura. a fonte de tudo o que existe.. Aqui. a providência de Deus governa não apenas os aspectos bons e agradáveis da vida. mas o centro pessoal de toda a realidade. sabe quantos. e não desejar descaradamente tocar o que ele mantivera escondido. 145. pp. ele reuniu na maior 49Furcha e Pipkin. não é apenas um vasto reservatório de energia ilimitada. “Nem mesmo o mosquito teria sua picada precisa e seu zumbido musical sem a sabedoria de D eu s. como Lutero antes dele.49 A Providência em Vez do Acaso Zuínglio. a criatividade sem limites de Deus não trabalha ao acaso. em outubro de 1529. 66-67. p. teleológico. dirigido a um fim específico. suas doutrinas da providência e da predestinação foram quando muito ainda mais claramente delineadas do que as do reformador de W ittenberg. 154-155. mas também as partes mais sombrias e problemáticas. p. 56Jackson. 148. mas nunca teve um cavalo. pp. 650: “Nam ex providentiae loco praedestinationis. Zwingli’s Thought. Deus mesmo assim os “rejeite. mesmo entre aqueles que nunca tinham ouvido o evangelho. Zuínglio não se desviou da tradição escolástica nesse ponto. expulse e repudie” .harmonia possível as questões da providência divina e da salvação humana. Zuínglio. Protestant: The Work ofHuldrych Zwingli after Five Hundred Years. eds. 70. Writings. Jackson. 1984).54 Vista assim. é discutível. “Zwingli and the ‘Viri Multi et Excellentes’: The Christian Renaissance’s Repudiation of Neoterici and the Beginnings of Reformed Protestantism”. Z 2. 137-154. Zuínglio usou um exemplo tosco para enfatizar esse ponto.. até seus atos maus. Pipkin. III. livrearbítrio e mérito encontra-se na questão da providência” . p.. a predestinação é um exemplo especial (muito especial!) de providência divina.. 184. ed. Furcha e H.55 De acordo com Zuínglio.56 Outro aspecto da doutrina da eleição de Zuínglio merece atenção especial: seu postulado sobre a salvação dos chamados “pagãos piedosos” . entendia a predestinação como uma defesa contra a justificação pelas obras. um estúpido que nega o livre-arbítrio”. Pastor. p. (Pittsburg: Pickwick Press. “Veja quão elegantemente ficamos aqui e exibimos a aparência de um caipira. 53Z 3. p. 72. Latin Works. mas Deus as escolhe e seleciona. E. de fato. liberi arbitrii meritque universum negotium pendet”. I. conforme Calvino o fez mais tarde. 55Furcha e Pipkin. 54Zuínglio alega ter sido um seguidor da doutrina da predestinação apresentada por Tomás de Aquino. II. mas isso não acontece com os que são rejeitados. John Eck caracterizou Zuínglio como um “cabeça-dura. A epítome da arrogância humana é negar a gratuidade da graça de Deus. Zuínglio sustentava que. como parte da doutrina geral de Deus. os que viveram fora dos limites cronológicos ou geográficos da história da salvação. Latin Works.. in: Prophet. embora. Ele sempre quis ser um cavaleiro.53 Pedro Lombardo e Tomás de Aquino também haviam tratado da predestinação no contexto da providência. Se Zuínglio entendeu corretamente a doutrina desenvolvida de Tomás acerca da eleição. os cristãos não podem exigir nenhum crédito por sua própria salvação. Mesmo antes. como Lutero. 125. Latin Works. Zuínglio realmente ensinava uma doutrina de dupla predestinação. Cf. Ibid. Ili. ed .. havia alguns 52Jackson. 842. p. J. visto que com os eleitos Deus transforma tudo em bem. até que no fim tornou-se tão infeliz e doente que o levaram para o hospital numa carroça de esterco” . Zuínglio já havia escrito que “todo esse problema de predestinação. “a eleição” só deveria ser atribuída àqueles que Deus destinou para a salvação. conforme apresentada na Summa Theologica. Os réprobos não foram “eleitos” para a perdição.52 Ademais. 188. p. Locher. p. a qual ele mais tarde abandonou em favor de uma abordagem mais “agostiniana” . p. Visto que não são as pessoas que elegem Deus. ed. por assim dizer. 16n. eds. um tolo. Z 3. pois tanto a “eleição quanto a rejeição são obras do livre-arbítrio de D eus” . Stayer. afirmou que a providência é. p. W. 271. . a “mãe da predestinação” . Veja James M. Sócrates. pp. visto que a fé segue (e não precede) a eleição.58 Para Zuínglio. 14. existem ou existirão. Writings. 458: “Summa des evangelions ist. Erasmo havia escrito: “S.escolhidos por Deus. mas “Hércules também. “Pois. desde os princípios até o fim do mundo. Antígono.12. Numa. Cf. Era verdade que alguns desses eleitos fora da esfera visível do cristianismo poderiam nunca ter abraçado a fé nesta vida. (Certa vez.. a suposta salvação de tais “pagãos” não estava baseada na revelação universal de Deus na natureza. p. Portanto. apesar de esses pagãos não conhecerem a religião em seu sentido exato e no que se referia aos sacramentos. ore por m im ” . “ Furcha e Pipkin. Ninguém pregou solus Christus mais vigorosamente do que ele. • • • ~ 51Ibid. ed. eds. mesmo isso era uma consideração insignificante. de fato todo coração piedoso e toda alma crente desde o início do mundo. os Catões e os Cipiões” . Em vez disso. no que diz respeito ao que interessa. dependia da livre decisão de Deus para escolher quem ele deseja. tomou conhecida a nós a vontade de seu Pai celestial. Contudo. Aristides. 1952). Camilo.24. o verdadeiro Filho de Deus. . o estudo de Rudolf Pfister. das unser herr Christus Jhesus. digo que eram mais santos e mais religiosos do que todos os pequenos dominicanos e franciscanos que já viveram. e Teseu. p. 17. Z 1. p. que sentia que um dos sinais mais prováveis da reprovação era a falta de oportunidade de ouvir o evangelho.) A doutrina de Zuínglio também foi muito além daquela de Calvino. I.. sind und werdend”. Eles seriam futuros amigos no céu. assim como a flor surge de um botão. que via isso como uma presunção na graça de Deus e uma capitulação ao tipo de humanismo racionalista a que ele se opusera em Erasmo. Sócrates. não apenas os valorosos do Antigo Testamento. 59Jackson. die ie warend. redimiu-nos da morte e reconciliou-nos com Deus por sua inocência. Latin Works. entretanto. [. Die Seligkeit Erwählter Heiden bei Zwingli (Zurique: Evangelischer Verlag. ainda assim.] Dannenher der einig weeg zur säligkeit Christus ist aller. muito menos nas próprias obras meritórias deles.. warer gottes sun. conforme o segundo e o terceiro dos Sessenta e Sete Artigos demonstram: O resumo do evangelho é que nosso Senhor Cristo.. jamais existiu um homem bom e nunca haverá um coração santo ou uma alma fiel que não estará nos céus com Deus”. 58Instituías 3. Cristo é o único caminho para a salvação de todos os que existiram. uns den willen sines himmilischen vatters kundt gethon unnd mit siner unschuld vom tod erlöst and gott versunt hat.57 Tal ensino exasperou imensamente a Lutero. 201. II. 272: “Em suma. ”59 A extensão que Zuínglio fez do espectro da salvação aos pagãos eleitos não deve ser colocada contra seu compromisso evangélico básico. cheguei ao ponto em que. demonstravam que não eram eleitas.. 228. Num sermão sobre “a clareza e a certeza da Palavra de D eus” . Então comecei a pedir luz a Deus. p. Zuínglio relembra essa importante mudança em sua peregrinação teológica. Como Erasmo. Como pastor. Ele se recusava. também.De acordo com João 14. Sem dúvida. Zuínglio preferia os pais da igreja aos teólogos escolásticos (“sofistas” .61 Para o verdadeiro cristão. ed. temos muita segurança em saber que “por mais que clamemos e independentemente do que planejemos. Mesmo 61Jackson. dediquei-me demais ao ensinamento humano. Zuínglio respondia. quando há sete ou oito anos passei a devotar-me inteiramente às Escrituras. e. o “deixar de lado” as autoridades humanas foi um processo gradual para Zuínglio. Zuínglio insistia em que ninguém poderia chegar ao Pai a não ser por meio de Cristo. como outros de minha época. que é “o caminho. contudo. Tais pessoas. Finalmente. 90-91. pp. Esse era seu próprio modo de dizer: “Deixem Deus ser Deus” . “ Bromiley. 231. a limitar o escopo da atividade redentora de Cristo ao âmbito da igreja visível. Latin Works. ed. guiado pela Palavra e pelo Espírito de Deus. no entanto. era sempre impedido de fazê-lo pela filosofia e pela teologia. Alguns talvez tendessem a entregar-se a seus desejos e exclamar: “Se sou eleito. ou então que não tinham ainda adquirido a fé e o conhecimento de Deus. pregado diante de uma assembléia de freiras em 1522. Quando mais jovem. e as Escrituras tomaram-se muito mais claras para mim.62 As Escrituras Sagradas em Vez da Tradição Humana A Bíblia teve seu lugar no centro da reforma zuingliana. 61Ibid. alcançarei a felicidade independentemente do modo como viver” . os desígnios de Deus permanecem imutáveis” . e a vida” . a percepção adequada da providência de Deus era uma proteção contra as incertezas e os golpes da vida.63 Sem dúvida. Tanto em nossas vidas pessoais quanto no grande palco da história.. Zuínglio reconheceu o perigo inerente em sua severa doutrina da providência. II. que ele freqüentemente citava. O primeiro momento foi a decisiva “conversão” do próprio Zuínglio ao princípio bíblico. ele os chamava). porém. e a verdade.6. p. Isso é percebido claramente em quatro momentos fundamentais no processo da Reforma.. vi a necessidade de colocar de lado todas essas coisas e aprender a doutrina de Deus diretamente de sua própria Palavra. essa devoção às Escrituras foi motivada *em parte pela forte afinidade de Zuínglio com Erasmo. . especialmente Agostinho. França. . Zuínglio avisava: “Não se coloquem em desavença com a Palavra de Deus. em poucos anos. A audaz pregação de Zuínglio suscitou forte oposição em Zurique. no romper do ano de 1519.64 Mais tarde. p.. Z 2. 307. Itália e Espanha.67 Ele estava não apenas pregando da Bíblia. 448: “Tund umb gots willen sinem wort gheinem drang an. professor e guia. 116. Z 1. Z 2.. toda a Suíça abraçaria o evangelho. Contudo. não os pais. I. Zuínglio relembra que pregou “sem nenhum acréscimo humano e sem nenhuma hesitação ou vacilação por causa dos contra-argumentos” . aber nit gstellen” . não a igreja mal interpretada de certas pessoas” . aqui você tem as Escrituras como mestre.65 O segundo momento foi o novo padrão radical de pregação iniciado por Zuínglio ao chegar ao púlpito da Grande Catedral de Zurique.. 12. quando pregava em Einsiedeln. p. ele reivindicou apoio para o princípio da sola scriptura no próprio Agostinho: “Veja. contudo. 264-265. “ Bullinger. I. especialmente por parte das ordens monásticas. p. a Grande Catedral começou a encher-se com os que estavam ávidos por ouvir a Palavra de Deus. dann warlich es wirt als gewiiss sinen gang haben als der Ryn.tendo continuado a ser um ardente erudito patrístico. exceto as Escrituras somente” . Por exemplo. Latin Works. em verdade. já em 1520. Para os que se opunham à sua pregação. I. Porque. 67Furchä e Pipkin. o conselho da cidade publicou um mandato permitindo a liberdade de pregar as “divinas e “ Furcha e Pipkin. mesmo então ele ressaltou a um de seus colegas que “haverá um dia em que nem Jerônimo nem qualquer outro vai significar muito entre os cristãos. Ele abandonou o lecionário tradicional a favor de uma exposição das Escrituras capítulo por capítulo. 116. Aos poucos. Writings. ele ainda estava fascinado por Jerônimo (cujos trabalhos Erasmo também havia editado em 1516). pp. Writings. 145. 145. Heinrich Bullinger observou que Zuínglio recusava-se a “cortar em pequenos pedaços o evangelho do Senhor” . ela permanecerá tão certamente quanto o Reno segue seu curso. p.68 O terceiro momento foi a aceitação do princípio bíblico pelas autoridades da cidade. p. muito influenciado pelos pais da igreja. p. 65Jackson. eds. mas também permitindo que a Bíblia falasse diretamente a ele e à sua congregação. mas é impossível pará-la” . ele veio a distinguir com precisão a autoridade deles daquela devida às Escrituras Sagradas. p. A proclamação das Sagradas Escrituras foi só ela a mais importante provocadora da reforma na cidade de Zurique. ed.66 Embora não possamos reconstruir agora o conteúdo desses primeiros sermões. eds. Porque “a Palavra de Deus facilmente soprará todo pó para longe” . Zuínglio estava certo de que. Talvez alguém possa represá-la durante algum tempo. “ Z 3. seguida por Alemanha. den mag man ein zyt wol schwellen. Zuínglio confessou surpresa ante o número dos que vieram “correndo” para suas exposições. I. . Que Zuínglio entendia exatamente por “Palavra de D eus”? A Palavra de Deus é idêntica às Escrituras Sagradas? Embora ele certamente afirmasse que a Palavra englobava as Escrituras e expressava-se singularmente nelas. “A Palavra de Deus pode ser entendida por um homem sem nenhum guia hum ano. Por exemplo. 374. O mesmo Espírito que inspirou os profetas e apóstolos a escrever a Bíblia deve estar presente para confirmar e persuadir-nos de sua verdade. 75. mas sim as sustentava. os concílios. 32.71 Assim como a capacidade salvadora de Deus não estava confinada aos limites históricos da igreja visível.verdadeiras Escrituras do Antigo e do Novo Testamento” . Z 72Bromiley. Zuínglio também se referiu ao evangelho como a Palavra de Deus e definiu o evangelho como “não apenas o que Mateus. O Espírito Santo ilumina o texto da Bíblia de maneira tal que sabemos e confessamos ser ela a Palavra de Deus. Em outras palavras. p. pp. era o próprio Cristo. também. Portanto. Assim. Tomás e similares” . Seguiu-se uma ordem. obviamente. 86. 365. pois indicava a fonte principal da Bíblia.. pp. Por essa razão. 69Bromiley. Zuínglio uniu duas afirmações que seriam ainda mais intimamente associadas por Calvino: a supremacia das Escrituras Sagradas sobre a tradição humana e a iluminação interior de cada cristão pelo Espírito Santo. Bullinger. isso de maneira alguma diminuía a autoridade das Escrituras. o próprio Deus. p. ed. Na opinião de Zuínglio. em 1521. a palavra criadora de Deus gerou o mundo e tudo o que há nele antes que houvesse sido passada à escrita. Zuínglio pôde falar da “clareza preveniente” (für Kummende klarheif) das Escrituras Sagradas. Marcos. em outro sentido. Mas como alguém chega a reconhecer a Palavra de Deus nas Escrituras Sagradas? Zuínglio respondeu que havia uma única forma de receber essa percepção — do próprio Deus. mas tudo o que Deus já revelou aos hom ens” .70 A Palavra viva de Deus.”72 ' Assim. 1. pp. ed. 78. as Escrituras são autolegitimadoras. da mesma forma sua Palavra não estava restrita à sua expressão escrita.. Z 1. os estudiosos e os pais da igreja. ed. Cf. p. 70. com a exclusão de Scotus. Nesse sentido. requerendo que a pregação fosse “das Escrituras Sagradas. 26. 24. Zuínglio pôde dispensar os canais oficiais da interpretação aprovada — o papa. a palavra poderosa proferida à virgem M aria gerou em seu ventre o menino Jesus. Lucas e João escreveram. 38. “o curso inteiro da natureza deve ser alterado para que a Palavra de Deus possa permanecer e ser cumprida” . pp. I. Do mesmo modo. esse era um termo muito mais genérico.69 Essas ordens cívicas foram confirmadas na Prim eira Disputa de Zurique.. 362. em janeiro de 1523. 7'Ibid. 70Bromiley.. quando as Escrituras foram novamente reconhecidas como os “juizes infalíveis” no debate entre Zuínglio e seus oponentes romanos. “costumes” e “tradição” . no inverno). Nesse caso. bdarff keins menschlichen Urteils” . 74Fritz Schmidt-Clausing. Calcedônia. pp. 73Z 1. pregadores e professores recebiam uma instrução básica completa acerca das Escrituras. “Das Prophezeigebet”. e exerceu certa influência na fundação da Universidade de Harvard. O nome Profecia foi tirado de 1 Coríntios 14. entretanto. Amém. Seu ponto de vista — em nada diferente daquele de Lutero.73 Tal não significa. todos os dias exceto sextas-feiras e domingos. Zwingli's Thought. entretanto. grego e hebraico. Éfeso.Zuínglio pôde dizer: “Entendo a Escritura somente na maneira em que ela interpreta a si mesma pelo Espírito Santo. 28. Era uma espécie de seminário teológico onde ministros. eterno e misericordioso. missionários. Constantinopla. . na Nova Inglaterra. onde Paulo refere-se ao dom de profetizar ou proclamar a Palavra de Deus para a edificação da igreja. ele aceitava sem hesitação os quatro primeiros concílios gerais (Nicéia. 10-34. por Jesus Cristo. que em nada desagrademos tua majestade. Isso não requer nenhuma opinião hum ana” . que Zuínglio rejeitava a contragosto as decisões dos pais ou dos primeiros concílios. “do Espírito de D eus” . eram genuínos. 451) junto com os credos dos apóstolos. isso se tornou um modelo para as academias e para os seminários reformados através da Europa.74 Então o texto do dia era lido em latim. Zuínglio ou outro dos ministros apresentava em alemão um sermão sobre a passagem. p. abre e ilumina nossas mentes para que possamos entender tua Palavra pura e perfeitamente e para que nossas vidas possam estar de acordo com aquilo que tivermos entendido corretamente. cuja Palavra é lâmpada para nossos pés e luz em nosso caminho. 381. não havia necessidade de reivindicar serem “pais” . 431. às 7 horas no verão (às 8. Finalmente. “concílios” . A influência da Profecia em Zurique foi enorme. eles meramente refletiam a verdade contida nas Escrituras divinamente inspiradas e reveladas pelo Espírito Santo. Começando em julho de 1525. Zuínglio abria o encontro com esta oração: Deus todo-poderoso. aqui — era de que todos esses concílios e documentos tinham de ser submetidos à pedra de toque das Escrituras. De fato. todos os ministros e estudantes de teologia de Zurique reuniam-se no coro da Grande Catedral para dedicar-se a uma hora de aprofundada exegese e interpretação das Escrituras. de Nicéia e Atanasiano. O sermão era ouvido por muitos dos leigos que paravam na catedral a caminho do trabalho. seguido pelos comentários textuais ou exegéticos apropriados. Tradução em inglês de Locher. dann wie sy sich selbst durch den geist gottes usslagt. nosso Senhor. Por sua vez. houve o avanço do estudo bíblico na instituição da “Profecia” . Se eles apresentavam Cristo. em 1636. p. 559: “Ich verston die geschrifft nit anders. Zwingliana 12(1964). 321. Selected Works. agora. e de nenhum outro ser no céu ou na terra. A mesma imagem é encontrada numa canção popular de escola dominical: “Estamos subindo a escada de Jacó. numerosos comentários bíblicos. pela fé somente.] Cada degrau vai mais alto. . que falou pelo lado romano. ajuda e salvação. emergiram das sessões da Profecia. cuja virgindade perpétua ele defendia tão vigorosamente quanto qualquer teólogo romano. Parece-me que os queridos santos e a Virgem Maria não devem ser desprezados. salvador e mediador com Deus é Jesus Cristo. Zuínglio inventou uma fala e colocou-a nos lábios de Maria: 75Jackson. A escada para o céu foi bruscamente tombada. ed. A escada de Faber não estava cheia de anjos apenas. à verdadeira presença do próprio Deus (c f Hb 4.16).. pelo Antigo e pelo Novo Testamento de Deus. rosários e vestimentas. [. mais alto” .. Z u ín g l io : Faber: Sabemos. o cristão tinha acesso direto. em vez de no Deus único e verdadeiro. aconteceu um diálogo interessante entre Zuínglio e Johannes Faber. sem falar das imagens e relíquias. visto que há poucos que não tenham sentido a intercessão da Virgem e dos santos. mas também havia M aria e os santos. dentre os quais vários feitos pelo próprio Zuínglio. Sua questão era que o povo estava se apegando a essas “escoras” & confiando nelas para a salvação. A ênfase de Zuínglio na imediação da graça de Deus. Em certo texto. disponível somente por meio de Cristo e comunicada diretamente pelo Espírito Santo.Ademais. redentor. removeu as escoras de muito da religião medieval. pp. Esses eram os degraus da escada para o céu. como também a famosa Bíblia de Zurique. 79-80. somente em quem e por meio de quem podemos obter graça. vigário do bispo de Constança. Zuínglio não tinha a mínima intenção de denegrir nem os santos nem Maria. “escoras” divinamente sancionadas que auxiliavam os cristãos em sua jornada deste mundo para o vindouro.. Coloquei uma escada em direção ao Faber estava-se referindo à história bíblica da visão que Jacó teve de uma escada da terra para o céu. que nosso único consolador. com anjos indo e vindo. A Religião Verdadeira em Vez da Religiosidade Cerimonial Durante a Primeira Disputa de Zurique. Não me importa o que todos dizem ou em que acreditam. enriqueceu-me assim. Alexander Campbell resumiu esse princípio numa fórmula sucinta: no que a Bíblia fala.79 Em geral. eds. a não ser que estejam embasadas ou prescritas na Palavra de D eus” . 73. apesar de Zuínglio ser um músico competente que dominava vários instrumentos. em 1530. Writings. Latin Works. encontra-se num brutal contraste com os interiores tão profusamente adornados como os da Catedral de Notre Dame. 156-157. Creeds o f the Churches (Atlanta: John Knox Press. [. ela não é minha. a Grande Catedral. a aspersão de água benta... II. pp. a fala dos padres. ou desfiguradas. em sua graça.77 As autoridades católicas ficaram chocadas com o rigor com o qual Zuínglio buscou suas reformas.. pp. com suas paredes caiadas e seu interior simples. Não sou nem uma deusa nem a fonte da bondade. os capuzes brancos e as cabeças cuidadosamente raspadas dos monges. eds.. 129-130. Isso está claramente expresso na segunda das Dez Teses de Berna (1528): “A Igreja de Cristo não faz leis nem mandamentos à parte da Palavra de Deus. seguindo Zuínglio. Leith. todas as tradições humanas não nos podem sujeitar. o incenso. Z 2. ed. 66. Deus. . pp. no que a Bíblia cala. somente Deus é essa fonte. as imagens dos santos e as pinturas são queimadas. I. falamos.Ó gente ignorante. o princípio da autoridade bíblica relativizava todas as práticas extrabíblicas. nos calamos. de forma que sou uma criada e uma mãe de toda a raça humana. Por que Zuínglio opunha-se tão severamente às imagens e a outras formas de religiosidade cerimonial? Podemos m ostrar pelo menos três razões. o órgão da Grande Catedral foi desmantelado e removido. as vigílias. 90. tendeu a eliminar o que não é expressamente ordenado nas Escrituras. pp. as orações das freiras. em Paris.. ou quebradas. 70-71. os dias santos. 78Jackson. I..] Eles não têm mais igrejas. p. As orações sem sentido. as missas e as matinas — todo esse “monte de lixo cerimonial” nada significava. em carta ao Imperador Carlos v . os jejuns prescritos. Depender deles em absoluto para a salvação seria como “colocar blocos de gelo uns sobre os outros” . Z 2. A tradição reformada.] Eu sou apenas uma testemunha de meu filho.. Seja qual for a honra que eu tenha.78 Em 1527. para que vocês possam ver quão certamente a salvação está nele. Johann Eck.76 Zuínglio foi bem mais radical do que Lutero na tentativa de podar da vida da igreja aqueles ritos cerimoniais e aparatos religiosos que formavam o esteio da religiosidade medieval. um órgão foi restituído a essa igreja. descreveu o estado dilapidado das igrejas de Zurique: “Os altares são destruídos e postos abaixo. [. e sim estábulos” . pp. (Em 1874. 76Furcha e Pipkin. 195-196. 77Furcha e Pipkin. a não ser “bobagem” . portanto. No século xix. 86. a tradição luterana manteve voluntariamente em sua adoração aquelas práticas e aqueles costumes não proibidos de forma direta pelas Escrituras. 1982). Writings.) Ainda hoje. ed. 79John H. Em prim eiro lugar.. o acender das velas. 81 Por essa razão. Z 2. prevenia Zuínglio.. ed. Ele realmente instou para que as Escrituras fossem lidas e pregadas em alemão: “Aquele que transige nesse ponto comete pecado. já que como nominalista estabelecia apenas uma relação mental. g2Ibid. Zuínglio não insistia em que toda a “miscelânea de ordenanças humanas” fosse eliminada imediatamente ou em massa. Ele estava disposto a tolerar coisas como o sinal da cruz na oração ou as vestimentas sacerdotais até que a Palavra tivesse tempo para produzir seu efeito.83 80Furcha e Pipkin.Em segundo. p. Ele observava. não havia como voltar atrás. nem nada do que lá fora incluído poderia ser tirado. Lutero. não uma conexão real. as imagens tinham um poder real. Era difícil “purificar” o templo de excrescências tão queridas. é religião” . algumas das imagens de santos eram tão profusamente adornadas que as mulheres eram “movidas por grande devoção” apenas fitando-as. que eram capazes de atiçar a luxúria nos homens! Da mesma forma. p. Latin Works. de maneira tão refinada e colorida.. Para Zuínglio. 111. 348-349. entre uma imagem e aquilo que era retratado. como o único que tem a sabedoria e o poder para socorrer-nos em nossos problemas e desviar todos os males.. Contudo. eds. porque essa é a palavra da vida” . 218. 172. 1. I. se bem que um tipo destrutivo e demoníaco de poder. A via antiqua estabelecia uma relação ontológica real entre uma imagem e aquilo que a imagem retratava. 314.80 Finalmente. que foi treinado na via moderna. “Se você deixa os ninhos das cegonhas onde estão” . por exemplo. a missa não foi abolida até 1525. era menos sensível a essa questão. “ Potter. tornam-se “ídolos” que deviam ser removidos dos lugares de culto público. “elas certamente voltarão a eles” . mas era necessário para que a pura Palavra de Deus prevalecesse. ou voltá-los à sua própria glória e ao benefício de seu povo.82 Apenas com o tempo as imagens foram retiradas das igrejas. e com dependência filial nele como pai — isso é religiosidade. Zuínglio acreditava que nada deveria ser adicionado ao que Deus havia revelado em sua Palavra. . p p . com uma inabalável confiança nele como único bem. o treinamento de Zuínglio na via antiqua tornou-o ultra-sensível ao perigo de manter as imagens na adoração. para que não tirassem o lugar da adoração ao Deus único e verdadeiro. Assim. Zuínglio era contra a religiosidade cerimonial porque a via como substituto da religião verdadeira. 8'Jackson. que ele definiu como “apegar-se a Deus. ou direta. uma vez que a reforma começara. Writings. que as imagens de mulheres santas eram esculpidas tão atrativamente. p. p. Writings. Zuínglio não distinguia entre as mãos esquerda e direita de Deus. Em contraste. isso deleita aqueles que am am a D eus e. Embora concordasse prontamente com Lutero quanto ao fato de que somos justificados pela fé somente.. Cf. Para Zuínglio e os que o seguiam. uma espécie de justificação evangélica pelas obras enxertada na mensagem pura do solafide. Reformatorenbriefe (Neukirchen-Vluyn: Neukirchener Verlag. isso significava que o reino de Cristo. Tudo o que Deus revelou é um mandamento. etc. tentando responder à pergunta: como posso ser salvo? Desde o início. “Cristo não deixará que 84Hans-Ulrich Delius et cd. eds. assim . Zuínglio não sentia a necessidade de separar a lei e o evangelho em pólos opostos.e . 270: “Christus will also auch für die äusserlichen Dinge massgeblich sein and darüber gebieten. TL 9.85 Para os luteranos. ao m esm o tem po. p. esse obscurecimento da distinção entre lei e evangelho parecia abrir a porta para um novo legalismo. p o rq u e esse nom e é m ais adequado à com preensão dos cristãos. ele é a segura m anifestação d a salvação. A questão central de Zuínglio era: como meu povo pode ser salvo? Lutero gostava de citar a frase de Jesus de que seu reino não era deste mundo. Z 2. à parte de qualquer ato m eritório que tenhamos praticado. 64. Então: C ham o de “evangelho” tudo o que D eus abre aos seres hum anos e exige deles. eds. 79. 85Furcha e Pipkin. superam os a tensão entre lei e evangelho. preferindo tal term o à palavra “le i” . um a proibição ou uma promessa. A lém disso. edificam o cristão.). e não dos incrédulos. conforme manifesto na igreja visível. Quando Deus manda não cobiçar ou não cometer adultério. p. e. não deveria preocuparse com “aparências” (i. 1973).O Reino Externo em Vez da Moralidade Particularizada A reforma de Lutero nasceu de sua torturante busca por um Deus clemente. p o rq u e ele é salv ação. ele insistiu em que “o reino de Cristo é também completamente externo” . . I. até mesmo os mandamentos e as proibições. com política. Sein Reich ist also durchaus auch äusserlich” . mesmo as promessas de Deus são completa loucura para o incrédulo.. Numa carta a Ambrósio B laurer. economia. é para eles certas e boas novas. Todas essas formas de revelação. relações exteriores. sei m uito bem que C risto é o todo e a perfeição.84 A distinção de Lutero entre os dois domínios baseava-se em seu extremo contraste entre lei e evangelho. p. p. Zuínglio estava mais interessado nas implicações sociais e políticas da Reforma. da mão esquerda de Deus. Esse era assunto próprio do outro reino. 454. implicava um conceito intensamente ativista da vida cristã. P o rq u e sem pre que D eus m ostra sua vontade ao povo.. Para ele.. ele pretende que isso ensine e conforte o cristão. o reformador de Constança. P o r essa razão cham o de “ev an g elho” . Essa corte tentou impor um código moral rigoroso sobre todos os habitantes de Zurique. veja Robert C. ele declarou que “o homem cristão nada mais é do que um cidadão fiel e bom. declarou que Lutero e Zuínglio eram basicamente semelhantes quanto a seus pontos de vista sobre a igreja e o estado. mas também não devem ficar irados. Contudo. a igreja e a comunidade civil eram um corpo indivisível. talvez mais do que em qualquer outra das cidades reformadas. Numa famosa afirmação escrita pouco antes de sua morte. que era presidida tanto por teólogos quanto por membros do conselho da cidade. 108. evitar não apenas o adultério. in: Leaders o f the Reformation. Richard L. pp. . ed. governado por agentes espirituais que aceitavam o princípio da autoridade bíblica como a base de seu governo combinado. em 1523. Quanto às idéias de Zuínglio sobre o estado. um padrão de justiça humana. Na fronteira entre a justiça divina e a humana estava o magistrado. Não apenas não devem matar. Ecolampádio em Basiléia e. p. reprimir a idolatria e amparar a pregação da Palavra. Walton. 71n. pregado no dia de S. por seu Filho Jesus Cristo.87 Enquanto Zuínglio defendia a compatibilidade entre evangelho e lei como manifestação conjunta da vontade de Deus. Ozment. “pobre e débil” em comparação com a justiça de Deus. seu enteado. 69-98. Penn. Zwingli’s Theocracy (Toronto: University of Toronto Press. 1967). p. incorruptível” de Deus foi revelada nos preceitos do Sermão da Montanha. Walton. mais tarde. C f a proveitosa discussão de Robert C. Deus exige tal pureza e inocência. tal como o ministro. entretanto. ele realmente sofreu consideravelmente para distinguir entre a justiça humana e a divina. era servo do 86Bromiley. Zuínglio disse que restava. em 1525. Zuínglio escreveu a Gerold M eyer. visto que os cristãos eram incapazes de viver em tal padrão de justiça.”86 Os reformadores da Alemanha meridional e da Suíça — Zuínglio em Zurique. 282-310.seu povo seja indolente” . e a cidade cristã nada mais é do que a igreja cristã” . Calvino em Genebra — estavam muito ocupados em determinar a interdependência precisa entre a igreja e as estruturas da sociedade profana. (Selinsgrove. p. 216. “Aqueles que entenderam corretamente o mistério do evangelho vão-se esforçar por viver retam ente. mas também a luxúria. Zuínglio afirmou que a justiça “pura. The Theology ofHuldrych Zwingli. nomeado por Deus para manter a ordem. Isso foi expresso no sermão “Justiça Divina e Humana e como Se Relacionam” . antecipando em alguns aspectos o consistório na Genebra de Calvino. Em Zurique. Deus realizou isso por eles. genuína. 87Z 14. ainda que instituída por Deus devido à desobediência. “Zwingli: Founding Father of the Reformed Churches”.: Susquehanna University Press. Por exemplo. Os cristãos devem perdoar conforme desejam que Deus perdoe. 542: “Quisquis igitur evangelii mysterium capit. Bucer em Estrasburgo. Stephens. o conselho da cidade de Zurique estabeleceu a chamada “corte matrimonial” . recte vivere conatur”. Zuínglio não via problema algum nesse tipo de cooperação entre igreja e Estado. De Molen. O magistrado. e W. João Batista. 1984). Z 2. p. pp. ed. 424.. P. os sermões. Writings.Senhor. [. 101. Deus não os teria punido [com o cativeiro babilónico]” . Writings.] Se as autoridades ajudarem.90 Zuínglio sabia do que estava falando.. não encontraria nada além de uma batalha eterna contra os poderosos e contra os vícios deste m undo” . 89Z 2.88 Mesmo tendo Zuínglio razoável confiança na capacidade dos .. as palestras e os comentários de Zuínglio voltaram-se cada vez mais para o Antigo Testamento. Ele fora forçado a deixar seu pastorado em Glarus devido à sua declarada posição contra o comércio mercenário. II. mas. Latin Works. ed. se não ajudarem.. atalaia ou profeta. Nesse ano. 90Furcha e Pipkin. Não foi por coincidência que ele assumiu o papel de profeta na cidade de Zurique. eds. o mesmo em que a Profecia foi estabelecida. II. Zuínglio afirmou: “Se os judeus não tivessem permitido que a licenciosidade de seu rei ficasse impune. tanto quanto aliviar as ansiedades pessoais das consciências individuais. eds. Falando das atrocidades do Rei Manassés. p. 49. p. Deveriam trabalhar na mais íntima harmonia possível para assegurar a promoção do reino de Deus. p. mas “o mundo todo” havia-se tornado tão corrupto. III. p. Furcha e Pipkin. Z 3.. p. então o vício pode ser expelido com maior paz. Embora Zuínglio aconselhasse vigorosamente contra a resistência ou a rebelião popular (como Lutero. o pastor tem de arriscar a pele e esperar apenas a ajuda e a libertação de Deus. perverso e desavergonhado que “devia ser absolutamente reform ado” .91 A própria vocação “profética” de Zuínglio lançou-o diretamente na intrincada política de Zurique. 344. . Seu trabalho reformador buscava renovar as estruturas corporativas da sociedade e da política. Para Zuínglio. só em 1525 pôde contar com uma sólida maioria de partidários no conselho. “Se o pastor lesse os profetas. Writings. não apenas a igreja. que ele chamava de “o estado atual de coisas” .. eds. ficou chocado com o comportamento sedicioso dos camponeses que empunhavam armas contra seus senhores. No 88Jackson. estabeleceu pelo menos dois controles contra o abuso em potencial da autoridade magisterial. 279. Deus não quer que ninguém exerça o poder tão desqualificadamente que não se possam apontar a ele seus erros. I. 35. mas abominou a_réplica vingativa de Lutero contra os camponeses). que Zuínglio preferia chamar de pastor. p. ainda assim admitia que governantes persistentemente maus pudessem ser expulsos pela vontade de todo o povo. também. Z 3. 36. 91Furcha e Pipkin. Ele “arriscou a pele” várias vezes em Zurique. 102. Um era a possibilidade de depor um magistrado tirano. Deus colocou entre seu povo oficiais — os pastores — que devem vigiar o tempo todo.. p.89 O magistrado foi controlado também pelas admoestações fiéis do sacerdote.magistrados para a reforma da igreja. na Confederação Helvética e no império. os cristãos. essas encomendas foram convertidas num tipo de fundo de caridade para os pobres. distintos mas necessariamente conjuminados e interdependentes.93 O envolvimento de Zuínglio em atividades econômicas e políticas dirigia-se a uma reforma da comunidade inteira.92 Durante vários séculos. “pelo amor da glória de Deus. provocou sua trágica morte no campo de batalha. Zwingli’s Thought. os cristãos pobres.16) que os sacerdotes deviam estar sujeitos aos magistrados. p. Parte da polêmica contra as imagens ressaltava o fato de que tanto amor cristão estava sendo dispensado a objetos inanimados. 20. alguém deveria vestir as imagens viventes de Deus. Zuínglio afirmou que. Zuínglio acreditava. p. Para Zuínglio. que girava em torno de seu ideal de comunidade e. Zuínglio reagiu contra a supremacia clerical da igreja medieval. há mais do que um grão de verdade nessa caricatura. Mais do que qualquer outro reformador. especialmente. de sua atenção pelos membros pobres e marginalizados. 40. tanto quanto qualquer outra. o motivo real por trás da atividade política de Zuínglio. “O fato de que o reino de Deus é também externo” significava que nenhuma dimensão da existência humana poderia ser excluída das reivindicações e das promessas do evangelho. Zwingli’s Thought. Podemos facilmente ler Zuínglio como um tipo de Maquiavel protestante. na terra. as quais supostamente apressariam sua jornada pelo purgatório. cujas necessidades. A mensagem de Zuínglio exigia um nivelamento do sagrado e do secular. de toda a vida social. um estadista religioso decidido a dirigir o destino político de seu povo. Sem dúvida. 93Locher. Quando a missa foi abolida em território zuingliano. A igreja e o Estado encontravam-se relacionados como corpo e alma. porque ela tem de pagar aos monopólios duas vezes mais do que vale o medicamento” . e uma visão da reforma que abarcava tanto ministros' quanto magistrados como co-servidores da Palavra de Deus. 130. os cidadãos ricos haviam encomendado missas pelos mortos. embora tantas das verdadeiras “imagens de D eus” . Veja Locher. O erro do anticristo romano fora colocar-se acima de príncipes e reis. vai ter problemas. “Se uma pobre mãe de um bebê de colo precisa comprar algum remédio. eram mais urgentes do que as daqueles que já haviam partido. em 1531. . essa preocupação. definhavam necessitados. e não ídolos de madeira e pedra” . 6 ln. isto é. entretanto. a Bíblia ensinava (Ex 4. 92Z 3.final. p Zuínglio também foi um crítico perspicaz dos abusos econômicos do capitalismo emergente. p. Ela omite. Zuínglio concordou com essa decisão.. . entregaram-se ao nome de Jesus.: Herald Press. no supremo temor de Deus.de Felix Mantz. após um período de oração. acreditando que o povo de Zurique tinha de ser mais plenamente preparado para uma mudança tão abrangente. 1961). a atenção dos .dissidentes voltou-se para o outro sacramento que também não havia sido reformado em Zurique. Um de seus representantes. E quando ele se ajoelhou com aquele pedido e desejo. ai de ti. na Segunda Disputa. recusou-se a submeter seu filho ao batismo. Radical Reformation (Filadélfia: Westminster Press. 122. alguns dos camponeses de Zollikon entraram na cidade de Zurique e marcharam pelas ruas gritando: “Ai. Em 5 de janeiro de ^Citado em Fritz Blanke. pediu a Grebel que o batizasse. no espírito do profeta Jonas. Em junho de 1525. Eles apelidaram Zuínglio de “o velho dragão” e. surgiu um conventículo anabatista na vila de Zollikon. ai. entre outros. Zurique!” . os outros igualmente quiseram que George os batizasse. na_casa.. George Blaurock. Çonrad Grehel escreveu que. pois não encontrava no Novo Testamento justificativa para tal rito. Seguiram-se outros distúrbios batismais em Zurique e ao redor da cidade: o batismo era negado a crianças recém-nascidas. A ruptura decisiva com o ordenança oficial do batismo ocorreu em 21 de janeiro de 1525.95 Tal foi o princípio humilde mas descaradamente ilegal do movimento anabatista em Zurique. Williams. Grebel. próximo a um lago. calcando-a e reduzindo-a à escravidão” .94 Logo. [. outro dos seguidores descontentes de Zuínglio. Naquela ocasião. Brothers in Christ (Scottdale. as fontes—batismais.O Batismo como Evento Eclesiástico Pelo menos a partir da Segunda Disputa de Zurique. Assim. Ele lidava com a crise banindo os ofensores obstinados e decretando morte por afogamento como pena pelo rebatismo. p. o batismo. a apenas 6 km de Zurique. derrubadas e destruídas e as congregações separatistas de cristãos rebatizados reuniam-se em desafio à lei. interrompidos pelos pregadores anabatistas. um futuro evangelista anabatista. p. mas decidiu adiar sua reforma imediata. os sermões dos pastores oficiais. deram à cidade 40 dias para arrepender-se! O conselho considerou tais distúrbios um desafio direto à sua autoridade.] Depois disso. 95George H. de acordo com os pedidos. alguns das discípulos mais ardorosos de Zuínglio haviam-se desiludido com a lentidão das reformas na cidade. o conselho declarou que a doutrina romana da missa era infundada. 11. Penn. Naquela noite. o que ele fez. Quase da noite para o dia. 1962). os teólogos mais importantes de Zurique haviam atingido a Palavra de Deus “na cabeça. Conrad o batizou. Os dissidentes não podiam aceitar tais medidas contemporizadoras. juntos. ó Senhor. O limbo era. E le obteve tão com pletam ente todas as coisas do Pai. o pecado original era uma imperfeição que.batismo não podia ser a caus a i instrumental da regeneração. pp. as crianças que morressem sem o benefício do batismo eram consignadas ao limbo. desenvolvera-se o costume de sepultar as crianças não-batizadas em certo lugar no meio do cemitério. Feliz Mantz tornou-se o primeiro anabatista a ser afogado em Z urique. 27. Em Zurique. Ele negou ^ vigorosamente que o batismo tivesse a capacidade de remover a culpa do pecado original. // ^íbid. por assim dizer. entre o terreno profano e o sagrado — uma representação vívida do limboí Zuínglio opôs-se firmemente a essa prática.98 Na teologia medieval. Suas primeiras afirmações sobre o batismo convergem quase exclusivamente para a última questão. um compartimento do inferno com ar-condicionado. Havia pouco sofrimento no limbo mas. Para Zuínglio. de fato já havia sido alcançado pelo sacrifício de Cristo no Calvário. “não é em si mesmo pecaminoso para quem o tem. 129-175.] D e o u tra form a.. entrego meu espírito” . von der Wiedertaufe und von der Kindertaufe” encontra-se em Bromiley... diferentemente do purgatório. e / alguém só pode fazer isso se conhecer a lei” . Latin Works. II. que o que quer que peçam os em seu nom e está garantido. p o r m eio de sua m orte. Não se podia crer ao mesmo tempo em Cristo e na água benta. instando a que todas as crianças que morressem na primeira infância tivessem um enterro completo e cristão.1527. As últimas palavras que se ouviu dele foram: J “Em tuas mãos. Enquanto Zuínglio e os outros pastores observavam. Mantz foi forçado a imergirl nas águas geladas do rio Limmat. p. ao longo de toda a cristandade.97 O .96 J A doutrina do batismo de Zuínglio foi elaborada contra duas frentes: a destituição do batismo infantil pelos anabatistas e o objetivismo sacramental tanto da prática católico romana quanto da luterana. apesar de seus efeitos devastadores sobre a raça humana. pp. não havia nenhuma esperança de saída. 97Z 4.. 98Jackson. 146. Uma tradução em inglês de “Von der Taufe. 308. já que esta fora consumada de uma vez por todas na morte sacrificial de Cristo na cruz. O que supostamente era realizado pelo aspergir de um pouco de água em milhares de pias batismais. [ . . 30. batizados ou não. Esse defeito não pode condenar uma pessoa — não importa o que os teólogos digam — até que ela aja a parnF da imperfeição contra a lei de Deus. nenhum a coisa criada deve ser adorada ou colocada num patam ar com o se tivesse algum p oder p ara lim par nossas consciências ou p ara a salvação de nossas alm as. ed. Ele acreditava que os filhos de pais cristãos estavam salvos.. a m orte de C risto seria supérflua. ed. p. A ssim . visto que a aliança da graça estendia-se tanto a eles quanto a seus pais. O batismo nas águas. 1952). Examinaremos agora os aspectos positivos da teologia do batismo defendida por Zuínglio. A ordem batismal de Zuínglio é apresentada em colunas paralelas com as de Jud e Lutero. o óleo. era essencialmente uma ação humana realizada em resposta ao ato e à palavra anteriores de Deus. Leão Jud. mas uma indução a uma nova maneira de viver. para ele. O Espírito não estava preso a sinais externos: “Deus batiza com seu Espírito como. como Kaspèr~Schwênckfeld. Zuínglio apresentou sua própria ordem de batismo drasticamente revisada. A partir de 1525. não queria dizer simplesmente um “princípio” . comunicada diretamente pelo Espírito. o batismo com o Espírito. Zwingli ais Liturgiker (Gõttingen: Vandenhoeck e Ruprecht. o sopro sob os olhos. “poderiam a água. Ele comparou o batismo ao ato de vestir um hábito de monge: significava um processo vitalício de aprendizado das regras e dos estatutos da ordem. o sal e tais coisas primitivas abrir caminho até a mente?” Em maio de 1525. ele comparou o batismo à cruz branca costurada no uniforme de um confederado.99 ^ Para Zuínglio. até mesmo o sinal duplo da cruz. III.\Em 1523. Z 4.. era o meio pelo qual os indivíduos eram trazidos à órbita da salvação divina. o que o tornou cauteloso quanto aos ornamentos litúrgicos tradicionalmente associados com a cerimônia batismal. Se isso não aconteceu. Essa ênfase podia muito bem ter levado à abolição total do batismo externo. na qual. o leite. “acréscimos hum anos” sem valor. pp. A cada ano. o sal na boca e a saliva nos ouvidos e no nariz e a unção com óleo previamente consagrado por um bispo. “todos os acréscimos sem nenhum fundamento na Palavra de Deus foram abolidos” . Como veterano capelão de campo de batalha das tropas mercenárias suíças. não o batismo nas águas. um dos colaboradores de Zuínglio. a quem e * quando deseja” . Por iniciação. p. . o fogo. na primeira quarta-feira de abril vestidos mlbid. em Fritz Schmidt-Clausing. de conformidade a um padrão específico de comportamento. redigiu uma ordem de batismo na língua do povo para ser usada em Zurique. ele perguntava. Zuínglio rejeitou tais práticas como “forma de m agia” . pp. 334-337. ele conhecia bem o rito monástico de iniciação. conservou muitas das cerimônias do antigo rito latino. como dizia o título.v“Com o” . Entretanto. foi devido à forte percepção de "Zuínglio acerca da natureza corporativa da igreja visível.Zuínglio enfatizava a imediação da graça. conforme aconteceu com certo reformadores radicais. Iniciação e Identificação Zuínglio definiu sacramento como uma cerimônia de iniciação ou um voto pelo qual uma pessoa tornava-se publicamente responsável por cumprir as obrigações de certo cargo ou ordem. Como antigo noviço do mosteiro dominicano de Berna. 181. Zuínglio tirou da experiência própria duas metáforas para descrever a consignado publica do batismo nas águas. 143-165. 218. os soldados reuniam-se em Nãfels para celebrar uma vitória militar de seus antepassados e declarar sua identidade suíça.^ A partir do final de 1524. O Vínculo da Aliança A descrição feita por Züínglio do batismo nas águas como voto público implicava que çabia apenas a adultos que conscientemente pudessem assumir tal compromisso. Gunnar Westin e Torsten Bergsten. Quellen zur Geschichte der Taufer (Leipzig: s. acerca da fé que havia sido interiormente operada pelo batismo do Espírito Santo. Sem demora. um soldado do evangelho. V.. . sim.o acreditar que as crianças não deviam ser batizadas até chegarem à idade da razão. o batismo nas águas de fato garantia a quem o recebesse uma mortificação da carne durante toda a vida. Hubmaier. E ele não foi o único a sustentar essa opinião. Era um testemunho de que alguém estava agora incluído entre os que se arrependem. o batismo marcava uma pessoa como membro da militia Christi. Ele nunca a desenvolveu tão *clara ou minuciosamente quanto Lutero . 10. p. 934. eds. m Ibid.. col.102 . admitiu t e r . 244. 1930-) IX: 186.. Seu propósito era informar a igreja inteira. que lançou a questão para um nível totalmente diverso^Zuínglio compartilhou essas dúvidas com vários líderes reformadores. Erasmo também comparou o batismo ao alistamento militar: “Se alguém se torna soldado de Cristo por meio do batismo.com seu traje de cruzados. Desiderii Erasmi Roterodami opera omnia (Hildesheim. Assim também.Eram emblemas públicos que identificavam o indivíduo com determinada causa. era. Farei e Ecolampádio. pp. Do mesmo modo. Balthasar Hubmaier. por exemplo.s e ^ “enganado” a. lutando sob a direção de Cristo. p. é apenas para lutar com boa fé sob os padrões dele”. 228. dentre os quais Erasmo. é exatamente nisso que ele parece ter acreditado nos primeiros anos de sua carreira reformadora em Zurique. a conexão entre batismo e arrependimento é apenas de pouca importância na teologia batismal de Züínglio. 1962). . Mais tarde.Z 4. o Capitão.101 Ademais. 231. Züínglio publicou uma série de escritos em que se desfazia das antigas dúvidas sobre o batismo infantil e defendia a prática mediante l00Z 4.100 Nem o hábito nem a cruz branca doavam virtude ou caráter especial a quem os usasse. como fizeram alguns de seus discípulos “verdes” . e não a pessoa em si. no dia de Filipe e Jacó. sem experiência. Nos anos anteriores à crise anabatista. eu mesmo consultei-o na Rua Graben a respeito do ensino bíblico sobre o batismo. lembrou mais tarde a Züínglio que “no ano de 1523. Significantemente. Züínglio acreditava que o batismo não existia basicamente por causa de quem o recebia. Schriften. você disse que eu estava certo ao sustentar que as crianças não deveriam ser batizadas até que estivessem instruídas na fé”. Züínglio nunca chegou ao ponto de advogar a abolição do batismo infantil como obra do diabo. uma garantia para aqueles que o testemunhavam. e.KDe fato. Era a “entrad^ e o selo visíveis (sichtbarlich) em C risto” dos crentes. O catolicismo medieval. Lutero também se referiu a ela. o batismo cristão derivava não da ordem batismal de Mateus 28. que tira o pecado do mundo!” (Jo 1.um novo argum ento:"o vínculo da aliança entre o povo de Israel na antiga dispensação e a igreja visível na nova. Ele chegou ao ponto de dizer que. Jesus submeteu-se tanto à circuncisão quanto ao batismo de João (embora. a desenvolvera t|o minuciosamente quanto Zuínglio. “baptismus sit Cktistianorum circumcisio" . o batismo e-axeia.29). claro. porque o evangelho que ele pregava era exatamente aquele que os cristãos proclamavam: “Eis o Cordeiro de Deus. mas sim uma única aliança em duas dispensações. O batismo é mais ameno em outro aspecto também — estende-se a meninas e não apenas a meninos. Zuínglio citou o abraço dado por Cristo às criancinhas (Lc 18. se o Novo Testamento não ordena o batismo infantil expressis verbis. embora mesmo na antiga dispensação as meninas recebessem a figura do batismo na travessia do mar Vermelho. os batismos de famílias em m Z 8.103 Essa comparação. a analogia entre circuncisão e batism oinfantil: “o batismo é a circuncisão dos cristãos” . pode ser inferido a partir de várias passagens. Em terceiro. s mas do batismo de João Batista. com desenvolvimento posterior de Büllinger e Calvino. Ninguém. Zuínglio também havia acreditado anteriormente que os dois batismos eram bastante diversos. tornou-se um artigo padrão na doutrina reformada do batismo de recém-nascidos. como podemos negar-lhes o sinal dessa posse? A circuncisão não era apenas um sinal da fé de Abraão. se Esaú tivesse morrido quando ainda bebê. Em segundo. cada uma das quais. 271. Os sangrentos ritos do Antigo Testamento. Podemos identificar brevemente J r ê s tendências principais no argumento de Zuínglio. Seu novo entendimento baseava-se na convicção de que as Escrituras revelam não duas alianças nas quais Deus age diferentemente para a salvação. foi muito usada nos períodos patrístico e medieval. mas também de todo o conteúdo da aliança que Deus fizera com ele e sua descendência. a circuncisão e a Páscoa foram substituídos por dois sacramentos “mais suaves” . Essa frase é de uma carta escrita em dezembro de 1524 a Franz Lambert e “os outros irmãos de Estrasburgo”. teria sido eleito! Visto que as crianças cristãs pertencem tão obviamente a Deus. claro. Como indicações prováveis de que a igreja do Novo Testamento praticava o batismo infantil. Em prim eiro lugar. O batismo nas águas era o sinal externo e coletivo do novo Israel. não precisasse de nenhum deles). unindo assim os ritos das duas dispensações e mostrando que tinham valor igual. p. . os anabatistas e Lutero concordavam — ainda que por razões muito diferentes — em fazer uma distinção clara entre o batismo de J e su s e o de João. Já vimos que Zuínglio relacionava a eleição ao batismo infantil: a salvação é assegurada a todos os filhos de pais cristãos que morressem na primeira infância. contudo. Os batismos da igreja e de João eram precisamente os mesmos. a igreja.15-17). ele podia assegurar a objetividade do batismo infantil. ele citava copiosamente o Novo Testamento. Contudo. Quando e como o Espírito escolhia conceder fé à pessoa que estava batizando-se não era importante para o rito em si. mas. todas as doutrinas de batismo infantil têm de enfrentar a relação entre os dois. Cf.” 105 Na liturgia batismal de Züínglio apresentada em 1525. por meio do que ele pode ser incorporado no teu Filho” . 105Z 4. no momento em que começou a defender o batismo infantil. . 159. como em sua suposição de que João batizava crianças no Jordão. 245-246. Usteri observou que. em seu estudo acerca da doutrina batismal de Züínglio. pp. WA 26. 228. a fé é mencionada apenas uma vez. Apenas os genitores que participavam conscientemente da comunidade da aliança deveriam apresentar seus filhos ao batismo: “Não permitimos que as crianças sejam trazidas ao batismo se seus pais não tiverem sido 104LW 40. pois é sua Palavra. para Züínglio. no Novo Testamento o batismo nas águas é invariavelmente associado à fé. entretanto. na chamada “oração da torrente” . já que provavelmente a razão devassa não se intrometeria! X Züínglio não pensava assim. não tendo relação intrínseca com o batismo nas águas. caía no argumento da circuncisão. aliás. Há muito tempo. p. mas abandonou essa visão de fé vicária (fides viçaria) por uma doutrina completa da fé infantil. seu mandamento. absolutamente. não de água.XLutero brincou com a idéia de que a fé dos padrinhos bastava para a criança. era mais fácil que um bebê recebesse a fé. 649. Todo o conceito da aliança como manifestação visível do propósito de Deus na história dependia do fato de que fossem filhos de pais cristãos. e sua Palavra não pode existir sem frutos” . Züínglio. p. “O batismo não pode confirmar a fé nos bebês. porque eles não estão capacitados a c re r. realmente dava grande valor à fé pessoal dos pais que ofereciam os filhos ao batismo. parece que ele está patinando sobre finíssimo gelo exegético. Em certos pontos. Só no contexto da unidade da aliança. O Batismo e a Fé Vimos que. p. também Z 5. ou em sua alegação de que os discípulos de João que buscaram um novo batismo (At 19) receberam apenas um batismo de “instrução” .Atos e nas epístolas e o fato de que em nenhuma passagem Cristo ordenou que as crianças não fossem batizadas.104 O fato de que os processos intelectuais da criança estão em latência não é obstáculo ao recebimento da fé. “Uma criança torna-se crente se Cristo. sempre que Züínglio tinha em mente o batismo de adultos. onde o ministro dá nome ao batizando e ora a Deus para acender “a luz da fé no coração dele. sobre a fé infantil. no batismo. fala a ela por meio da boca de quem batiza. a fé era dom do Espírito Santo. Õ batismo infantil tornou-se o fulcro sobrélT qual tanto a unidade da igreja quanto a integridade da ordem civil eram reviradas. que adora seu Senhor em firmeza de fé e pureza de vida” . 48. de certo modo por procuração. junto com a decisão de expulsar aqueles cidadãos que se recusavam a s u b m e te r s s n s filh o s ao batism o. 46: “Omnia turbant inque pessimum status communtant” . e a igreja aceitava tal confissão supondo. Esse método adequou-se bem ao programa de reforma de Züínglio. mas o apelo de Züínglio ao apriorismo e à l06Z 4. que na melhor das hipótese desempenhou um papel adiáforo na soteriologia de Züínglio. II. para Züínglio. “O que recebe o batismo testifica que ele pertence à igreja de Deus. p.107 O batismo infantil. O tipo de fé que ele pressupunha não era a fé pessoal e subjetiva dos filhos ou dos pais (fides qua creditur). Eis por que ele franzia o cenho para os '^ batism os privados e insistia em que o batismo fosse administrado “na presença da igreja” . que apenas Deus pode diferenciar com certeza. Em 1526. O Batismo e a Ordem Social Em In Catabaptistarum Strophas Elenchus (1527). Züínglio resumiu numa só frase seu grande medo do movimento anabatista: “Eles subvertem tudo” . Esse recurso. O desenvolvimento da teologia batismal de Züínglio seguiu o curso de seu trabalho como reformador.vnão era tanto a heresia. p. voltou para sua defesa como símbolo indispensável. Latin Works. 238. mas não poderia ser uma sociedade de batizados e nãobatizados^para que a ordem social em si e a proclamação do evangelho que disso dependia não ficassem ameaçadas. que a criança era verdadeiramente eleita. contudo. Para Züínglio. se tornasse a base de sua defesa da igreja visível. p.108 Desde 1524. m as os cismas e a sedição. mas o conteúdo inteiro da mensagem cristã (fides quae creditur). que pressupunha a identidade da igreja visível com a população da cidade ou do estado cristão: “Uma cidade cristã não é nada mais do que uma igreja cristã”\ A civitas cristã poderia ser um corpus permixtum de ovelhas e bodes. por um ministro da Palavra devidamente nomeado. a fé dos pais era v secundária em relação à fé da igreja toda. ed.. Podemos aplaudir a tradição reformada posterior por recuperar uma teologia dossacramentos mais encarnacional. os magistrados fizessem do batismo infantil um instrumento para a conformidade política. 108Z 6. ele já havia percebido que o verdadeiro pengõ^dos~ãnabatista. Se pareceu subestimar o batismo nas águas como evento’ salvífico. era um fato essencialmente eclesial.106 Os pais faziam uma confissão a favor do filho. no julgamento do amor. 107Jackson. perm itiu que . É irônico que o batismo nas águas.ensinados” . Züínglio persuadiu o conselho de Zurique a estabelecer um registro batismal em cada paróquia. da unidade eclesial. Tanto para Lutero quanto para Zuínglio. Zwingli’s Thought. o sentido das Escrituras e o lugar da ceia do Senhor na vida da igreja. in: Scottish Journal o f Theology 36 (1983). Bertelssmann Verlag. Não estavam meramente discutindo acerca de palavras ou sendo teimosos. 220-228. temos dificuldades em apreciar a intensidade com a qual os reformadores do século xvi discutiam sobre as sutilezas da teologia eucarística. 447^61. quando levantamos tais problemas sobre justam ente aqueles sinais que nos deveriam unir” . 109Citado em Potter. David C. ser muito precipitados em nossa condenação dos ' reformadores. 218-259. pp. Potter apresenta uma das melhores discussões da controvérsia eucarística do ponto de vista da história política.. II: Gütersloh: C. John Stephenson. É ainda outra ironia que òs protestantes que romperam com Roma com base no princípio da sola scriptura não pudessem encontrar nesse princípio uma unidade suficiente para evitar sua separação por causa da ceia do Senhor. Stephens. . “The Positive Religious Values of Zwingli’s Eucharistic Writings”. pp. 287. pp. também. pp. 1953). Examinaremos essa controvérsia sob o aspecto de seus antecedentes medievais. das dimensões exegéticas e cristológicas e finalmente de suas conseqüências litúrgicas. apesar de serem culpados de ambas as coisas. Em 1525. in: Theologische Zeitschrift 35 (1979). um dos mais moderados participantes desses debates. “Der Abendmahlsstreit der Reformatoren und seine aktuellen Implikationen”. ed. vol. “Scripture and the Lord’s Supper in Luther’s Theology”. 303-339. entretanto. “Martin Luther and the Eucharist”. I: Leipzig: M. 253-265.10-í//Uma das grandes tragédias /da história da reforma é que tanta luta e tãntõs danos ocorreram em torno da [ refeição que Jesus pretendia que fosse uma ceia de paz. Furcha. p. 228-241. escreveu o seguinte a seu amigo Ambrósio Blaurer: “As gerações futuras rirão do prazer que nossa época tem em discutir. Não devemos. Cada um deles estava sendo guiado à sua maneira de ver por convicções profundamente sustentadas sobre a pessoa de Cristo. a própria essência do evangelho estava em jogo no debate sobre a ceia. O estudo padrão continua sendo a obra em dois volumes de Walther Köhler. Wayne Pipkin. pp. 107-143. do contexto político. Hensius Nachfolger. Peter Buhler. Entre a superabundância de estudos secundários. Wolfgang Capito. de Estrasburgo. Zwingli und Luther: Ihr Streit über das Abendmahl nach seinen politischen and religiösen Bezeiehungen (vol. in: Interpretation 37 (1983). recomendo as seguintes obras recentes: H. 1924. pp. Steinmetz. O Conflito em Tomo da Ceia Num mundo ameaçado pela guerra nuclear e pela fome universal. Locher.liberdade da graça de Deus permanece como um aviso necessário contra toda forma d eid o latria institucional. nas áreas rurais. davam-lhe apenas pão. sendo que o vinho ainda permanecia reservado para os . Intimamente relacionado com a dominação clerical da Eucaristia estava o fato de que isso tornara-se também comercializado. para proteção contra doenças ou mau tempo e. abençoa todo o que busca ser rico. na pregação. até mesmo para o parto seguro das vacas. Naquelas raras ocasiões em que o povo participava. Tappert. ovelhas e éguas. a celebração da ceia do Senhor era o ponto central da adoração cristã. Em vez de um ato de adoração com a participação de toda a igreja. entretanto. muitas vezes. The Lord’s Supper: Past and Present Practices (Filadélfia: Muhlenberg Press. p. Mesmo antes da reforma. inúmeros altares foram " “Extraído de Theodore G. Nas igrejas maiores e nas catedrais.. a não ser na Páscoa. em orações intercessórias e no compartilhar da ceia em si — a apresentação do pão. preserva o barco nos mares bravios. a troca da paz do Senhor. 41. sendo celebradas pelo sacerdote não publicamente. celebrado todo domingo por toda a comunidade de fé.. dá ao homem uma boa mulher e à mulher dá seu companheiro. Até a época da reforma. expressou em versos alguns dos benefícios que se acreditava que derivavam de tais missas votivas: A A A A A A missa missa missa missa missa missa defende o viajante do perigo e da doença. As liturgias mais antigas retratam um culto de louvor e ação de graças. Burnaby Googe.110 As missas vieram a ser oferecidas em casamentos e funerais. mas a congregação não mais participava. tornara-se “clericalizado” . um importante protesto contra essa prática J surgiu entre os utraquistas hussitas (do latim utra. Tais missas eram chamadas “votivas” (da palavra latina para prometida ou devotada). . esse rito sofrera um desenvolvimento tão drástico que dificilmente seria reconhecido como o mesmo evento. a missa passou a ser uma tarefa especial realizada pelo clero ordenado. poeta inglês do século xvi. o latim tornou-se a língua da liturgia em lugar da língua do povo. 1961). que significa “am bos”). que l insistiam em que tanto o vinho quanto o pão deviam ser dados ao laicato.sacerdotes. Em prim eiro lugar. dá provisão de grãos e ajuda a lavoura.Os Antecedentes Medievais Na igreja primitiva. Como a missa era função do sacerdote e não do povo. Muitos cristãos acreditavam que se podiam assegurar favores especiais de Deus com um “sacerdote de m issa” a oferecer a Eucaristia a favor de alguém. Esse culto consistia na leitura das Escrituras. a recepção dos elementos e. A Eucaristia continuava a ser celebrada a cada domingo. ajuda o capitão na batalha e favorece sua luta. p. Após o IV Con­ cílio Laterano. deriva da fusão das palavras latinas de instituição Hoc-estcorpus-meum. onde tais missas podiam ser rezadas muitas vezes durante o dia. 508. ao dizer: “Considero a maior de todas as abominações pregar e vender a missa como um sacrifício ou boa obra” . embora ainda parecesse e tivesse gosto de pão. A expressão inglesa hocus-pocus. enquanto os acidentes dos elementos permanecem os mesmos. vestida com as suntuosas vestes da baixa Idade Média.erigidos.111 A teologia eucarística tentou manter o ritmo da religiosidade eucarística. WA 26. Como as indulgências. enquanto o sacerdote veio a ser um tipo de mercenário espiritual. em conseqüência. com as chamas das velas tremulando e o doce perfume do incenso subindo. um milagre ocorre: a substância dos elementos é subitamente transformada (transubstanciada) no corpo e no sangue de Cristo. [a eucaristia] 1ULW 37. 370-371. Assim. visto que o sacerdote esperava uma taxa por serviços oferecidos — e às vezes até a cobrava. Realizada no esplêndido palco da enorme igreja gótica. Em outras palavras. estava realmente segurando nas mãos o próprio corpo de Cristo. em 1215. No momento da consagração. a hóstia consagrada seria solenemente levada em procissão através das ruas e das praças públicas. no momento da missa em que o sacerdote consagra o pão e o vinho. iluminada por janelas enfeitadas com vitrais. as missas também eram vendidas às pessoas que estavam dispostas a pagar pelos benefícios pessoais que acreditavam resultar disso. Para os reformadores. eles ensinavam que. Usando as categorias da filosofia aristotélica. Podemos ver facilmente como essa prática logo foi malbaratada. os sinos tocariam. quando o sacerdote erguia o pão do altar e dizia “Hoc est corpus meum”. A doutrina da transubstanciação deu crédito à magnífica pompa da Eucaristia do fim da era medieval. a ceia do Senhor também se tornou “escolastizada” . Essa doutrina levou a uma grande concentração no momento da consagração. a elevação da hóstia (da palavra latina hostia. “sacrifício”) na missa tornou-se o foco de devoção intensa no final da Idade Média. que se usa como uma espécie de apelido para algo mágico ou incrível. freqüentemente em capelas laterais pagas por famílias abastadas. A festa de Corpus Christi (o corpo de Cristo) espalhou-se da França por toda a Europa. para que as pessoas na congregação pudessem olhar com maravilha e adoração para a hóstia levantada. a ceia do Senhor transformou-se numa troca monetária vulgar. os teólogos católicos medievais explicavam a presença de Cristo na Eucaristia com referência ao dogma da transubstanciação. essa prática parecia ser outro esforço inútil por tentar comprar a graça de Deus. pp. com o povo curvando-se em reverência enquanto a hóstia passasse. Lutero falou por todos eles. Nessa ocasião. . Mesmo que a maioria das pessoas comungasse apenas anualmente. Queriam restaurar a participação total da congregação nesse ato central de adoração. que viam como uma explicação enganadoramente bela da Eucaristia completamente desconhecida da igreja primitiva. se lhes fosse ensinada. Em terceiro lugar. a poderiam apreender” . Assim. a Confissão de Augsburgo (1530) define a igreja verdadeira como o lugar onde “a Palavra é corretamente pregada e os sacramentos corretamente m inistrados” (art. Historical Theology (Middlesex: Penguin Books. Tanto Lutero quanto Zuínglio reconheceram que a missa estava no centro nervoso da religiosidade da baixa Idade Média. do cristão medieval. Em primeiro lugar. Assim. finalmente.112 Não admira que os esforços dos reformadores por mudar a missa encontrasse tãc 7 violenta reação. que poucos podiam entender. E. 1969). as leituras bíblicas eram freqüentemente proferidas em latim. cada um deles recomendou com insistência a comunhão de ambos os tipos (o pão e o cálice) para os leigos e clérigos. nem. MartinLuther: Selections from his Writings (Nova Iorque: Doubleday. destinadas a complementar a Palavra de Deus legível e audível. 267.apresentava um complexo de luz. resta ver a causa de todo o alvoroço. A Eucaristia não podia substituir o único e irrepetível sacrifício de Cristo na cruz.. Lutero e Zuínglio interpretavam os sacramentos como (emprestando uma expressão da tradição reformada posterior) “palavras visíveis” de Deus. e os dois desenvolveram um culto para a ceia do Senhor na língua alemã. decisivamente rejeitaram o caráter da missa como evento de espectadores.. 112Jean Danielou et al. cor e movimento que cativava o coração. ambos descartavam a doutrina escolástica da transubstanciação. 224. mJohnDillenberger. também. será bom neste ponto mencionar o que eles tinham em comum contra a missa medieval. Lutero queixava-se de que “os leigos nunca entenderam a rebuscada filosofia da substância e dos acidentes. ed. ambos os reformadores rejeitavam a missa como sacrifício oferecido a Deus a favor do povo. e o sermão era muitas vezes omitido. se não a mente. vil). 1961). Eles também sabiam que nenhuma reforma genuína da igreja podia ser efetuada sem que se desse séria atenção à sua reformulação. Como vamos observar de perto as diferenças entre Lutero e Zuínglio acerca da Eucaristia. p.113 Dado esse grande grau de concordância. e não competir com ela. . p. Até a época da Reforma. cada um deles insistiu na centralidade da Palavra na celebração da ceia. Em segundo lugar. Z 2. 147. A princípio. Zuínglio e seus aliados atacaram uns aos outros com tratado após tratado. o tratado de Lutero. 117. chamado Que as Palavras de Cristo [. Andreas Bodenstein von Karlstadt.. Depois. Nessa época. Writings. sejam quem forem.] Permaneçam Firmes contra os Fanáticos. Lutero. Zuínglio queria que Lutero tivesse mantido silêncio acerca do tópico.. 155.] Dirigida a Martinho Lutero (que na verdade não é tão amigável). . denominada Uma Exegese Amigável [. testamento referia-se ao fato de que a ceia do Senhor era um dom de Cristo à igreja — “este cálice é o Novo Testamento no meu sangue. A guerra começara! Entre 1526 e 1529. Para Zuínglio.115 Zuínglio via Lutero como que voltando ao romanismo. Lembrava a doutrina católica da transubstanciação e não podia de forma alguma ser alinhado com a visão avançada que Zuínglio abraçara.. Zuínglio ainda pôde referirse a Lutero como “um bom guerreiro de Deus. 115WA 54. ele logo (e injustamente) englobou Zuínglio com Karlstadt e os demais “sacramentalistas” : “Considero-os farinha do mesmo saco. Para Lutero. enquanto ele inclinava-se para memorial. veio a crer que o ensino luterano de que na Eucaristia “comemos o corpo de Cristo sob o pão” estava repleto de problemas sérios e mesmo perigosos.. p. I..O Contexto Político Já em 1523. memorial significava que a ceia era um culto de comemoração pelo qual a igreja proclamava sua aliança com Cristo. .] é ” nas palavras da instituição. todos os que não querem acreditar que o corpo do Senhor na ceia seja seu corpo verdadeiro e natural” .. enquanto Zuínglio ressaltava o “fazei isto” . Lutero já havia sido desafiado acerca da Eucaristia por um de seus primeiros colegas. Zuínglio mostrou que Lutero preferia a palavra testamento para a Eucaristia... ” (Lc 22.20. como não tivemos na terra durante mil anos” .... 114Furcha e Pipkin.. p. Quando Lutero ouviu que Zuínglio também havia lançado uma explicação revista da Eucaristia. Entretanto.. Zuínglio estava bastante consciente de que ele e Lutero divergiam nesse tópico vital. e a réplica de Zuínglio.. Em outras palavras/L utero enfatizava o “este [. que negava a presença real e objetiva de Cristo na ceia a favor de uma compreensão mais espiritualista.. foram colocados à venda lado a lado.. entretanto. a r c ). p. Zuínglio não via (ou alegava não ver) nenhuma diferença fundamental nessas duas formas de encarar a ceia. Na feira de livros de Frankfurt. na primavera de 1527. Lutero achava que Zuínglio havia-se unido aos sectários.. antes de ter desenvolvido opiniões maduras sobre a Eucaristia.. eds. o conflito posterior foi até certo ponto pressagiado nas duas palavras que Zuínglio mencionou.114 Ele certamente não previu que as diferentes nuanças de suas teologias eucarísticas poderiam levar a uma separação permanente.. Roma fora saqueada. acreditava Filipe. 342. devido à pressão dos eventos externos. Nessa época. apesar pol hicíiment^onquistado importantes aliados em Basiléia e em Berna. Os turcos estavam avançando para Viena. nem jamais serei ligado à doutrina de Zuínglio” . Landgrave Filipe de Hesse tentou negociar uma aliança militar entre seus colegas príncipes luteranos e as poderosas cidades-estados da Alemanha meridional e da Suíça.117 Essa disputa poderia muito bem ter-se encerrado como apenas outra tempestade teológica num copo d’água eclesiástico. Zuínglio. por causa de sua oposição ao imperador. . A maioria das cidades da Alemanha meridional. não fosse pelas profundas implicações políticas da controvérsia. 318.. entretanto. Carlos prometeu ação imediata contra os protestantes: “É bastante agradável à sua majestade imperial que um remédio adequado seja preparado para tratar dessa praga perigosa” . seu próprio príncipe. até mesmo o papa era abertamente hostil aos desígnios imperiais de Carlos. lU V m obstáculo fundamental estava no caminho de tal aliança pan-protestante: a controvérsia eucarística. travava guerra no Oeste. em 1521. estava isolada e ameaçada pelos cantões interiores da Suíça que nunca haviam iav aceitado a Reforma. LW 37. p. nsPotter. 231. enquanto Francisco I.de uma contra-reforma. Filipe de Hesse sabia que apenas um encontro de cúpula entre Lutero e Zuínglio poderia romper o impasse e estabelecer uma base teológica para uma aliança política. Se esse plano fosse realizado. 248. o papa capturado e.. p. 578. [. pensou-se que até França e Veneza poderiam ser persuadidas a juntar-se à aliança. p. especialmente Estrasburgo e Basiléia. Z 5. Nos anos imediatamente seguintes à condenação de Lutero na Dieta de W orms. Ele propôs uma conferência em seu castelo em M arburgo. de França. simpatizava com as opiniões de Zuínglio. diante de Deus e do mundo inteiro. 117WA 26.porque assim “não seríamos forçados a engolir sua bobagem asquerosa” .118 Nesse contexto.116 ’ Lutero declarou que Zuínglio “é sete vezes mais perigoso do que quando era um papista. Ecolampádio e Bucer eram os líderes principais da outra 116Furcha e Pipkin. Ele foi acompanhado por Melanchthon e diversos outros colegas. Lutero relutantemente concordou em comparecer. Zurique. Com a insistência de João da Saxônia. em outubro de 1529. Zuínglio deu muito mérito a esse esquema. II. no Leste. uma “zona amortecedora” estendendose do Báltico ao Adriático protegeria os territórios protestantes do perigo iminente . o rei da França chegara a um acordo com seu rival de Hapsburgo. eds. a situação mudou drasticamente a favor do imperador: os turcos haviam sido detidos. até 1529. Lutero era contra qualquer aliança com os “sacramentalistas” .] Afirmo publicamente. p.. que não sou. Até o final da década de 20. p. Writings. o Imperador Carlos v não foi capaz de suprim ir a “heresia” protestante em seus territórios germânicos. Você ainda não a tirou de nós. No decorrer do debate. como tenta fazer.” O pão significava ou representava o corpo de Cristo. Hoc est corpus meum. não posso verdadeiramente ignorá-las. M as. No dia seguinte. Lutero entrou na sala antes e. Zuínglio encontrou apoio a essa interpretação figurativa em muitas outras passagens das Escrituras. No final. neste momento. ensiná-la e defendê-la. Lutero havia se emparelhado na discussão com Ecolampádio. Contudo. quando Jesus disse “eu sou a videira” .119 Quando os dois lados partiram. pelo menos em parte. Durante quatro dias. O Problema Exegético No primeiro dia do Colóquio de M arburgo. afirmava que o “est” deveria ser entendido como “significai”. Zuínglio. concordaram em discordar. admitiram: “Não concordamos. Influenciado pelo humanista holandês Cornélio H oen. se os verdadeiros corpo e sangue de Cristo estão fisicamente presentes no pão e no vinho” . reconhecia as palavras familiares da instituição. esses cultos teólogos debateram pessoalmente todas as questões as quais eles já tinham apresentado várias vezes por escrito. não precisamos de nenhuma outra. Meus caríssimos senhores. escreveu com giz as palavras “Hoc est corpus meum” na mesa em frente a seu assento.. e ainda assim ser incapaz ou ter má vontade de citar uma única passagem das Escrituras que a provasse. p. 330. visto que as palavras de meu Senhor Jesus Cristo estão aqui. ninguém imaginou que ele se mIbid. os dois generais encontraram-se face a face num enfrentamento explosivo. 2n.delegação. mas devo confessar e acreditar que o corpo de Cristo encontra-se lá. sem que ninguém percebesse. não haveria nem uma aliança confessional. Por exemplo. Zuínglio. Então. aconteceu o seguinte diálogo: Z u ín g l io : Lutero Seria uma vergonha crer em tão importante doutrina. cobriu a inscrição com um pano de cetim. Em 14 pontos principais da fé. entretanto. Zuínglio clamou em lágrimas: “Não há ninguém na terra com quem eu mais gostaria de concordar do que com os wittenbergenses” . mas conferialhes sentido completamente diverso. “Este LpãoJ significa meu corpo. com Melanchthon. a ceia do Senhor. claro. para o sucesso da Contra-Reforma ao longo dos 150 anos que se seguiram. uma vez que levava os cristãos a recordar o evento da cruz. . eles estavam unidos. no décimo quinto. A derrota em M arburg preparou o caminho. (tirando a cobertura da inscrição na mesa): Este é meu corpo! Aqui está nossa passagem das Escrituras. nem uma aliança militar. tivesse tornado uma videira literal. Deu o seguinte exemplo: Pego uma rosa de madeira ou de prata e pergunto: que é isto? Você responde: é uma rosa. Ele admitia que a ceia do Senhor era um símbolo. p. Luther: An Experiment in Biography (Nova Iorque: Doubleday. mas sobre seu ser. não estava proclamando um Salvador feito ’ / pedra. Em M arburgo. Num diálogo acalorado. em seu modo peculiar e essencialmente. . pp. Haile. Zuínglio citou esse versículo repetidamente. aquilo que o pão significava. 120 Tanto Lutero quanto Zuínglio concordavam em que o pão na ceia era um símbolo. nada significa. p. Traduzido e m H . Há muitas rosas — de prata.121 Esse texto tornou-se o apoio de onde Zuínglio atacou a 120W A 26. Para Zuínglio. com e sob” o próprio símbolo. à sua própria maneira. está certo. o símbolo e a coisa simbolizada estavam separados por uma distância — a extensão entre o céu e a terra.4) que “a pedra era C risto” .G . de papel. de meu jardim. disse Zuínglio. estava presente “em.. é uma rosa em seu ser. de pano. entretanto. o corpo de Cristo. respondo. de ouro. orgânica. a carne para nada aproveita” . é no fundo uma rosa. Ainda assim. e ser como a outra coisa. de madeira. Mesmo que não seja uma rosa natural. Não há outra maneira de interpretá-lo. Porque não perguntei sobre seu significado. quando Paulo declarou (1 Co 10. [. no entanto. Cristo havia cortado o nó “com um machado tão afiado e sólido que ninguém podia ter qualquer esperança de que esses dois elementos — corpo e comida — pudessem juntar-se novamente” .] “É” sempre se relaciona com o ser. 1980). física! Igualmente. Mas ainda é uma rosa. a saber. O que quer que signifique tem de ser primeiro. 121Z 5. era inflexível em manter o sentido literal de “é ” . 616.. Zuínglio avisou Lutero de que esse texto quebraria o pescoço dele! Lutero replicou que os pescoços não eram tão facilmente quebrados na Hesse alemã quanto na Suíça! “A carne para nada aproveita. de pedra. Para Lutero. Bem. Não apenas um mero sinal. 383.63: “O espírito é o que vivifica. 126-127. Bem. mas um símbolo que continha aquilo que simbolizava. como poderia haver qualquer significado se não houvesse primeiro um ser? O que quer que seja nada. Lutero. Esse texto fundamentou a ênfase de Zuínglio na participação direta e não-mediada da salvação pelo Espírito Santo e sua depreciação dos “rudimentos externos” . Mas você diz: não é uma rosa. Zuínglio tinha o seu também — João 6. não o que significava.” Nesse versículo. logo você me disse o que era. Isso tornou-se o cerne de seu ataque à doutrina de Lutero sobre a presença corporal de Cristo na ceia. cada uma. é um pedaço de madeira. mas sim que Cristo era simbolizado pela pedra. porém. Se “este é meu corpo” era o texto favorito de Lutero. O objeto da fé era aquilo que não se vê (Hb 11. 244.. por um lado. disse Zuínglio: “Crer é comer” . A Divisão Cristológica No encontro de M arburgo. Antes. “Pois este é o sentido que carregam: este pão é o meu corpo que é dado por vós. “Credere est edere" . Ele foi dado por nós da maneira mais brutal. Ainda mais absurdo. à invocação de santos e à regeneração batismal estava presente também na luta quanto à ceia: o medo da idolatria. material. Lutero. se as palavras deviam ser consideradas em seu sentido literal. II. enfatizava consistentemente a unidade da pessoa (como os monofisitas na igreja primitiva). exceto num sentido não-literal. pois seu corpo estava sendo quebrado novamente — desta vez. porque ele ligava isso ao perdão de pecados. 338. eds. não mediante a fé e o pão. Z 5. entretanto. Seu fracasso em conseguir acordo nesse ponto. a diferença teológica básica entre os dois reformadores era cristológica. p. o corpo de Cristo teria de ser engolido. .” 122 De fato. por outro. deve ser o conteúdo da ceia. II. Como tal. segue-se que Cristo teria de sofrer dores novamente. Zuínglio replicou. digerido. enquanto Zuínglio ressaltava a distinção entre as duas naturezas (como os nestorianos). O fato de que nenhum deles caiu da corda bamba da ortodoxia cristológica é uma medida de sua argúcia teológica. de que Cristo era “uma pessoa em duas naturezas” . Writings. portanto. Furcha e Pipkin. e as religiões pagãs de mistério. Contudo. p. 704. porém. Lutero afirmava que o corpo de Cristo não era comido de maneira bruta. significava apenas ter o corpo e o sangue de Cristo presentes na mente. não era a irracionalidade nem a falácia exegética da visão de Lutero. não pode ser comido.interpretação literal de Lutero acerca das palavras da instituição.123 A mesma razão que movera tão vigorosamente Zuínglio a opor-se às imagens. Ambos afirmavam formalmente a definição do Concílio de Calcedônia (451). Writings. até mesmo eliminado pelos intestinos! Tais pensamentos eram repulsivos para Zuínglio. por meio da fé somente. A principal questão para Zuínglio. a fim de pressionar o sentido literal do texto ainda mais. exacerbou l22Furcha e Pipkin. A salvação era por meio de Cristo somente. p. além da imaginação humana.1) e que. mas sim de forma misteriosa. p. 572. sujeito a feridas. golpes e morte. então. 123Z V. o corpo tinha de ser comido da maneira mais brutalmente material. Comer o corpo e beber o sangue de Cristo na ceia.. Em seu cerne. porém. eds. portanto. figurado. pelos dentes dos comungantes. consistia em que Lutero colocava “o principal ponto da salvação no comer físico do corpo de C risto” . a discussão entre Lutero e Zuínglio mudou rapidamente de um conflito sobre o sentido correto de textos específicos para um debate acerca da localização do corpo de Cristo. Lembravam o canibalismo. as características peculiares de sua natureza humana eram atribuídas à sua divindade. da mesma maneira.” 124 124Jackson.6) A ascensão de Cristo foi um evento literal. Zuínglio observou que essa frase continha o mesmo verbo da famosa “Hoc est corpus m eum ”.. uma carpintaria. mas também o corpo de Cristo. Mas Lutero não limitou a troca de propriedades à vida terrena de Cristo. sofrendo ou morrendo. Latin Works. Falando de maneira mais simples. Na encarnação. até retornar para julgar os vivos e os m ortos. ele as estendeu à eternidade. A permanência finita de Cristo à direita do Pai garantia seu advogar contínuo a favor dos cristãos e sua volta certa. poderia estar presente corporalmente só pela contemplação e pela memória. foi circunscrito a lugares específicos: uma manjedoura. onde quer que Cristo estivesse espiritualmente presente. à direita do Pai... ^ Em tudo isso. . disse a seus discípulos: “Já não estou no m undo.11). p. ele se senta. sentado à direita de Deus. Esse era um modo de explicar como o Cristo encarnado podia ser ao mesmo tempo Deus e homem. Seu corpo. o corpo de Cristo era capaz de estar em mais de um lugar ao mesmo tempo.. podia estar corporalmente presente também. Quando pressionado por Zuínglio a explicar como Cristo podia estar corporalmente presente “em. Os discípulos não o viram subir? Estêvão não o viu lá? Agora. Os atributos de sua natureza divina eram também característicos de sua natureza humana. ed. saberemos que está presente. Zuínglio não tinha dificuldades em afirmar que Cristo estava presente na ceia de acordo com sua divindade.ainda mais suas outras diferenças eucarísticas. Zuínglio opôs as palavras do anjo à mulher que foi à sepultura na manhã de Páscoa: “Ele não está aqui: ressuscitou. 51. Na ceia. enquanto. II. ” (Mt 28. um corpo no céu à direita de Deus impossibilitava sua presença corporal na mesa da comunhão. com e sob” os elementos do vinho e do pão. Contudo. A ressurreição e a ascensão não tiraram de Cristo sua natureza humana finita. Dessa maneira. A afirmação de Lutero de que o corpo de Cristo estava presente em todos os lugares após a ressurreição. estradas empoeiradas. A ubiqüidade da natureza divina de Cristo era compartilhada com sua natureza humana. uma cruz. o que os cristãos comiam não era somente o pão. Lutero baseou esse ensino em seu entendimento particular daquilo que os teólogos da igreja primitiva chamavam de “troca de propriedades” (communicatio idiomatum). De outra forma. Antes de Cristo subir ao Pai. de acordo com sua natureza humana. Lutero respondeu com sua doutrina da ubiqüidade ou onipresença da humanidade de Cristo. a Segunda Pessoa da Trindade assumiu a natureza humana.” (Jo 17. “Quando o virmos retornar como partiu. de modo que. histórico.. Zuínglio procurou salvaguardar a integridade da humanidade de Cristo. era possível falar sobre o Filho de Deus nascendo. então. portanto. O corpo de Cristo ressurreto e glorificado permanece no céu. . ambas as conclusões parecem prematuras e imaturas. feito presente para a fé dos cristãos). eles não foram capazes de conciliar. a Eucaristia era o lugar onde Cristo estava concretamente presente. não por causa do chamado milagre da transubstanciação.e . a divindade de Cristo. concretizado (i. p. Writings. eds. mesmo na expiação. Contudo. 282. Zuínglio escreveu a Lutero: “Fazemos nossa inferência assim: você afirma que a carne é comida. ambos os reformadores enfatizaram dimensões do evangelho essenciais para uma compreensão total da mensagem cristã. e não quero nenhum outro!” Para Lutero. Zuínglio só conseguia ver Lutero levando a igreja de volta “para os alhos e cebolas do Egito” . enquanto Lutero menosprezava seu adversário suíço (a quem ele depreciativamente chamava de “Zuíngel”) como um fanático entusiasmado. esse evento decisivo é trazido à memória. assim. dizemos isso penitente e não arrogantemente. Podemos resumir nosso panorama da controvérsia observando as convicções subjacentes que. LW 37. da mesma forma os cristãos podiam ver e comer o corpo de Cristo 1 na ceia. a ceia não era tanto a extensão da encarnação quanto um sinal apontando para a singularidade histórica da encarnação. tanto corporal quanto espiritualmente. a morte de Cristo na cruz. Entretanto. mas sim elevar sua mente para a divindade de Cristo. não deixou de estar presente com os cristãos. e não sua humanidade. Não há meioterm o” .As Conseqüências Teológicas Em Exegese Amigável. Portanto. Na ceia. pp. em M arburgo. A encarnação. Zuínglio também estava vitalmente preocupado com a relação entre encarnação e Eucaristia. Lutero acreditava que. mas porque a Palavra de Deus prometera o corpo e o sangue de Cristo sob os elementos do pão e do vinho. II. era crucial para a salvação. 83-85. l25Furcha e Pipkin. Pode-se dizer com justiça que nenhum deles se esforçou para entender as motivações mais íntimas do outro. p. Quando. no fim. era “o único caminho” (der eynig Weg) para a salvação. porque Lutero e Zuínglio eram homens de convicção profunda e piedade genuína.^ Assim. contudo. Para Lutero a ceia era. Para Zuínglio. uma extensão da encarnação. nós negamos.26WA 23. Devemos confessar que a controvérsia eucarística foi um dos mais tristes episódios na história da igreja.125 Uma única vez Lutero concordou com seu adversário: “Um dos lados deve ser o demônio e inimigo de Deus. quando Cristo ascendeu. 27. de alguma forma.. relembrado e. Ecolampádio instou-o a não se apegar tão ardentemente à humanidade de Cristo. Lutero irrompeu: “Não conheço nenhum Deus exceto aquele que se tornou homem.126 Olhando do século XX. Em sua opinião. . e não um suposto mastigar do corpo de Cristo na Eucaristia. ou um ou o outro deve estar errado” .. Assim como João enxergou o Espírito Santo quando/* viu a pomba. p. E. II.. Apenas Deus deve ser adorado.128 Em geral. se Cristo estava verdadeiramente presente no pão. 53. não a carne nem o sangue. p. Ele afirmava que. pois Cristo não havia dado nenhum mandamento específico sobre isso.127 Em certa ocasião em que Lutero estava celebrando a comunhão. WA TR 5. a adoração de Cristo na ceia estava longe de ser uma questão de capricho pessoal — “não é algo superficial ensinar o que deve ser adorado” .] Dizemos que Cristo está em todos os lugares [por sua natureza divina] e. deve ser adorado em todos os lugares. Em seus primeiros escritos contra a doutrina romana da missa. Lutero manteve um grau considerável de reverência medieval em relação aos elementos consagrados. [. 308. 657. e considerava a adoração de Cristo na ceia uma atitude cristã adequada. Z 5. p. . ficou de joelhos e lambeu o vinho para evitar pisá-lo. Imediatamente. ainda assim não é de nenhuma ajuda para quem não o recebe em seu coração pela fé” . com as palavras da instituição. e declarou que o comer e o beber referiam-se ao fato de não haver . Lutero ajoelhava-se para receber a comunhão. você está evidentemente limitando sua divindade. 129Furcha e Pipkin. porque parecia chegar ao limite da adoração idólatra e também colocar restrições à divindade de Cristo: Você não fecha Deus num lugar? Pois se você impede a entrada dele ou o deixa livre num lugar e não em outro.A conduta adequada à mesa. Lutero insistiu na prioridade da fé na ceia: “Por mais que seja verdade que o sacramento é comida real.27WA 30/1. recusava-se a fazer de tal adoração uma lei obrigatória.129 O papel da fé . Writings. p.. Pois você o deixa livre ou não em relação a um lugar. 448. Ele a considerava uma questão facultativa e de escolha pessoal. mesmo quando a congregação não comungava. portanto. Zuínglio resistia ao tipo de reverência especial que Lutero mostrava para com os elementos consagrados. ele deixou cair um pouco do vinho consagrado no chão. Para Zuínglio. o pão deixava de ser apenas pão. ao contrário. “Luther and the Eucharist”. o pão consagrado “veste” o corpo de Cristo. em João 6. na baixa Idade Média. No entanto. a adoração da hóstia tornou-se o foco da piedade eucarística. A subjazer as diferentes teologias da Eucaristia estava um consenso talvez muito mais nevrálgico: o modo correto de reverência na comunhão. p. 128Stephenson.. Vimos como. e isso nada mais é do que prender Deus aos estreitos limites dos lugares. então “por que esse alimento não poderia ser manuseado com a mais alta reverência e ser adorado?” . eds. 305. Ele até mesmo citou o texto favorito de Zuínglio. Veja seu “Luther’s Doctrine of the Eucharist: Its Basis and Purpose”. 54. a concepção de Zuínglio sobre a Eucaristia sofreu o que um estudioso chamou de “uma transformação decisiva” . visível. Para Lutero. p. comestível.130 Todavia. 132WA 27. p. Cada um tinha uma preocupação pastoral distinta quanto à relação da Eucaristia com a vida da igreja. 134Pipkin. Lutero soou a nota que caracterizaria todo o seu enfoque aos sacramentos: “Não há aqui tarefa (ojficium). à medida que a controvérsia eucarística transformava-se numa questão fundamental.132 A ceia era o lugar em que Cristo concedia perdão e conforto a seu povo. mas benefício (beneficium). 341. In. pp. p. a ceia era essencialmente uma atitude de ação de graças e louvor pela obra da graça que já havia sido recebida por fé. Em 1520.“nada além da crença no Senhor Jesus Cristo” . mesmo que a ceia pudesse ser uma ocasião para o fortalecimento da fé. independentemente de suas condições espirituais. 1962). p. Perto do fim de sua vida. 52. 125.134 Sem abandonar nenhuma de suas advertências anteriores contra as doutrinas católica e luterana. Quando nos voltamos para Zuínglio. Para ele. passou a dar l30WA 15. Zuínglio citou essas mesmas passagens de volta para Lutero — para seu constrangimento. Posteriormente.29). Lutero insistia mais e mais na objetividade do dom de Deus na ceia. 343. 131 Ele acreditava que a presença de Cristo não estava ligada à fé dos que recebiam. ela não tinha efeito nos que participavam em descrença.133 A ceia era um dos meios de graça pelos quais Lutero evitava os ataques do diabo e assegurava a si mesmo o perdão gracioso de Deus em Cristo. não trabalho ou serviço. Esse chamado “comer dos incrédulos” (manducatio infidelium) não fazia sentido para Zuínglio. 82. Sem fé. Tanto Lutero quanto Zuínglio eram igualmente pastores e teólogos. estavam mais preparados para receber a ceia aqueles que sentiam mais profundamente seus defeitos e necessidades: “Este pão é conforto para os aflitos. pp. comida para os famintos e um rico tesouro para todos os pobres e necessitados” . a ceia era apenas um ritual vazio. 942. recebem o verdadeiro corpo de Cristo por suas bocas — “quem quer que mastigue esse pão com os dentes ou com a língua mastiga o corpo de Cristo com os dentes ou com a língua” . Os objetivos pastorais da ceia. 131WA 26. Era o lugar em que a Palavra de Deus tornava-se audível. E. 156. in: Theology and Church (Londres: SCM. isso significava que todos os que participam da comunhão. . 133WA 10/2. mas apenas prazer e proveito” . Por essa razão. embora os incrédulos que participassem “comiam e bebiam juízo” para si mesmos (1 Co 11. cura para os doentes. o foco da ceia muda do indivíduo e das ansiedades deste para a comunidade da fé que se reúne em torno da mesa. vida para os moribundos. Karl Barth observou corretamente que o próprio Lutero havia dito tudo o que era necessário contra sua posição pessoal muito antes de Zuínglio aparecer. 216. Nessa noite. Cristo está como que diante de nossos olhos. Z 3. Cf. o pão e o vinho. Os ministros.. sua fé” . podemos louvar e agradecer a Deus por salvar-nos pela morte de seu único Filho e por redimir-nos do inimigo. 127. Essa declaração encontra-se em Exposition o f the Faith (1536). e oraram em uníssono o painosso. p. p. Zwingli's Thought. 761.135 Tal visão sublime da Eucaristia não pode ser caracterizada justamente como “simples m em orial” . Assim como a cada ano. obra de Zuínglio publicada postumamente. louvai o nome do S e n h o r ” . vejamos e provemos aquele Cristo que a alma traz interiormente consigo e em quem ela se regozija. a liturgia reformada de Zuínglio foi celebrada pela prim eira vez numa quinta-feira santa. Zuínglio ofereceu uma definição muito mais completa da Eucaristia como celebração: Mediante essa celebração.136 A ceia era como um juram ento de aliança dos confederados. renovado periodicamente em lembrança solene de uma vitória passada.. p. apesar da concepção elevada de Zuínglio acerca da Eucaristia. e não a você mesmo. seu objetivo era “m ostrar à igreja inteira. “para proclamar a morte do Senhor [e] dar n5Ibid. os confederados dão louvor e graças a Deus pela vitória que ele nos concedeu em Murten. 137Locher. I36Z 3. vestidos com simples togas escuras. no Dia dos Dez Mil Cavaleiros. 534. aqueles que se reuniram na Grande Catedral encontraram uma mesa no meio da congregação. a fim de que não meramente com os ouvidos.um reconhecimento mais positivo da presença real de Cristo na ceia. neste sacramento. 326n. Quando todos haviam participado. p. em vez das vestes clericais. Em lugar de um sacerdote recitando uma liturgia arcana numa língua que eles não podiam entender. em vez de um altar no santuário. Locher. distribuíam o pão e a taça de vinho entre os adoradores. Os sacramentos eram mormente aqueles sinais pelos quais o cristão provava à igreja que era um soldado de Cristo. A igreja de Zurique celebrava essa refeição quatro vezes ao ano. dia 13 de abril de 1525. 317. o objetivo pastoral básico da ceia — assim como o do batismo — continuava a ser congregacional. um pregador lia e proclamava a Bíblia em seu dialeto alemão da Suíça. Louvai.137 Em Zurique. Zwingli’s Thought. e não individual. terminaram o culto cantando o salmo 113: " . p. todos os benefícios que Deus havia manifestado em seu Filho são evocados. mas com os olhos e o paladar.. 30n. Além disso. . E pelos próprios símbolos. Isso é proclamar a morte do Senhor. Homens e mulheres uniram-se responsivamente na recitação do Gloria in Excelsis e do Credo Niceno. da mesma forma. servos do S e n h o r . Em 11 de outubro de 1531. Os bons homens ficaram atônitos. veio a mim. Latin Works. completamente vestido de armadura militar e brandindo uma espada de dois gumes. Ulrich Zuínglio foi ferido e m orto em batalha. relatou a seguinte narrativa curiosa: Tendo-se retirado os inimigos depois do terceiro dia. eu também teria sido uma testemunha ocular disso. inteiro e perfeito. o coração de Zuínglio realmente escapou de sua brutal destruição no campo de batalha. . ed. p. ter-se tornado ele próprio uma delas! j A história do coração de Zuínglio. Seu legado foi mantido. Pipkin. p. Potter. um ano depois. Um homem que eu conhecia muito bem. pouco depois. Muito mais aparentemente digno de confiança é o relato das últimas palavras de Zuínglio. o prim eiro biógrafo de Zuínglio. a guerra fria entre os cantões protestantes e católicos da Suíça tornouse subitamente intensa. 208. reconhecendo o milagre.139 Assim. a fim de evitar que fossem recolhidas como relíquias. o mais j / firme oponente das relíquias. Osvaldo Micônio. mas não podem matar a alma” .testemunho por esse mesmo fato de que eles são membros de um único corpo..138 O Coração de Zuínglio Em 1531. o coração de Zuínglio. 139Jackson. Demonstra como eram poderosas as garras da superstição. Seja como for. Heinrich 138Z 3. proferidas quando caiu mortalmente ferido e ainda hoje preservadas num monumento de pedra em Kappel: “Vocês podem matar o corpo. recusei. claro. p. e eis que (por estranho que pareça) seu coração revelou-se em meio às cinzas. eles se regozijaram porque esse fato sobrenatural tomara mais certa a sinceridade do coração de Zuínglio. é uma lenda no cânon da hagiografia protestante. 807. foi miraculosamente preservado da destruição! Teria sido no mínimo irônico. Cf. Como uma espécie de horror devido a essa súbita observação invadiu meu corpo inteiro. de fato bem intimamente. Mesmo assim. mesmo nos seguidores de um reformador tão radical como Zuínglio. alguns amigos de Zuínglio foram ver se podiam porventura encontrar qualquer resto mortal dele. Quando os católicos vitoriosos descobriram que o arqui-herege havia caído na batalha. perguntando se eu queria ver um pedaço do coração de Zuínglio. enquanto a escuridão caía sobre os campos verdejantes ao redor do mosteiro de Kappel. I. atribuindo tudo a Deus. 122. De outra forma. misturaram as cinzas dele com estrume. 23. que ele carregava consigo num guarda-jóias. como o de Joana d’Arc. especialmente em Zurique. para Zuínglio. Nesse sentido. p. [de que eles] constituem um só pão” . mas sem entendê-lo. Zuínglio foi para a batalha como capelão das “tropas de Zurique. eds. ele tinha uma idéia fixa de defender a soberania de Deus e exterminar toda prática que encorajasse alguém a depositar a confiança na criatura. p. mesmo tendo os anabatistas^ feito mais nesse .140 Não é de admirar que. Mas Calvino deveu muito ao reformador de Zurique. 165: “Tund umb gotzwillen etwas dapfers. ejios puritanos radicais na Inglaterra.. levaram adiante o trabalho reformador que Zuínglio havia começado. em vez de m orrer num campo de batalha com as mãos sujas de sangue. para a época em que viveu. Do princípio ao fim. João Calvino. A influência de Zuínglio estendeu-se ainda mais através dos irmãos (anabatistas) suíços. p. ressaltou que. Zuínglio entendia mais literalmente do que Lutero o sola do sola scriptura. ainda devemos descrever o âmago da religião de Zuínglio.142 O ousado program a de reformas de Zuínglio incluía uma reordenação de toda a comunidade. pp. Ele foi logo ofuscado pelo reformador da Suíça de fala francesa. ele disse: “Deus os punirá como hipócritas e os cortará em pedaços como esquartejamse os espiões” . em Kappel. Em 1530. provavelmente mais do que estava disposto a admitir.40Furcha e Pipkin.111 De seus primeiros sermões.a Deus!” . a carreira de Zuínglio foi caracterizada por firmeza e coragem em face de grande oposição. se Deus tivesse salvado Zuínglio. 186. Locher. Sua invectiva contra os inimigos era às vezes cruel. que em 1531 ainda era fiel à igreja romana. não apenas da igreja. porém. I. tão impiedoso com Zuínglio em sua morte quanto em sua vida. Dito tudo isso. seu genro.Bullinger e mais tarde Rudolf Gwalter. I4IZ 10. quando precisamente esse mesmo destino derrubou Zuínglio. . Zuínglio escreveu ao conselho da cidade de Memmingen: “Na questão da religião e da fé cristãs. há muito tempo empenhamos nossas vidas e nos concentramos em agradar apenas nosso capitão celeste. 50-51.. em Zurique. Talvez seja mais bem resumida numa de suas últimas admoestações: “Faça algo corajoso por amor. p. ele sabia que sua vida não lhe pertencia. Cf. Lutero. ZwinglVs Thought. se não invulgar. sèus~~cfêscenaentes espirituais. em 1523. até seu último púlpito. Writings. mas sim a seu Senhor. 66. 83. em cuja tropa e companhia estamos alistados” . ich wil üch by minem leben nit verfeuren noch hälen” . p. Sua morte trágica aos 47 anos poderia talvez ter sido evitada se tivesse estado menos preocupado em defender o evangelho por meio de intrigas políticas. seus adversários tenham-se regozijado com a justa vingança de Deus contra um herege. Zuínglio tem sido o mais mal compreendido. Escrevendo contra seus opositores católicos. Z 2. que ele muitas vezes evitou. Como “mercenário de C risto” . qu^o n sid eT irãm T rèo lo g ia dele sim ilar1a sdoprópriõ ataque à atitude contem porizádorada Rãmhã~ÊÍIzã5ètirn ETe todos os principais reformadores. ele o teria feito acima e além das regras! Um biógrafo complacente observou que Zuínglio teria sido mais favoravelmente lembrado caso se houvesse disposto (como João Hus) a aceitar o m artírio. ~ain5ã qiie ilegítimos. 142Z 11. Zuínglio está com a Bíblia numa mão e a espada na outra. Esse trabalho foi reimpresso recentemente por Labyrinth Press. I43H. Curiosamente. E. como agora. Bibliografia Selecionada A edição crítica padrão das obras de Zuínglio (Z: Hudreich Zwinglis Samtliche Werke) encontra-se nos vols. 1984). indivíduo e comunidade. não era um racionalista completo.: Pickwick Publications. Vários dos escritos importantes de Zuínglio foram traduzidos por G. Protestant. A seguir. embora a edição mais antiga de Schuler e Schulthess (Zurique. hoje há mais escritos de Zuínglio publicados em inglês do que em alemão. Bromiley em Zwingli andBullinger (Filadélfia: Westminster Press. p. Wayne Pipkin. Um erudito caracterizou recentemente o enfoque de Zuínglio à teologia como “teocentrismo espiritual” . reimpresso em 1972). No início do século xx. W. Prophet. Potter editou uma breve antologia de textos de Zuínglio em Huldrych Zwingli (Londres: Edward Amold. o turista que vai a Zurique encontra uma estátua de Zuíngfio perto da W asserkirche. tanto quanto por suas idéias acerca da providência e da predestinação. 1953). 1910. 1978). Naquela época.143 Se ele tinha inclinação para o racional. eds. uma tradução em inglês das obras em latim de Zuínglio foi editada em três volumes por Samuel Macauley Jackson: The Latin Works of Huldreich Zwingli. à conformidade com a vontade de Deus. alguns dentre os mais importantes estudos secundários sobre Zuínglio. no rio Limmat. em 1519. Hoje. .. magistratura e ministério. 36n. W. G. Recentemente. mas também seu desejo de trazer todas as esferas da vida. 8 vols. Jackson também editou Ulrich Zwingli: Selected Works (Filadélfia: University of Pennsylvania Press. Pa. Essa pose simboliza notavelmente não apenas a tensão da carreira de Zuínglio que o levou à trágica morte. Pipkin editaram dois volumes de textos de Zuínglio até então não traduzidos: Huldrych Zwingli: Writings (Allison Park. R. J. 129. isso era na verdade tentar “algo corajoso por amor a D eus” . 1828-1842. teologia e ética. próximo ao lugar em que o reformador desembarcou quando foi assumir seu cargo de pregador na Grande Catedral pela prim eira vez. igreja e estado.) deva ser consultada em alguns textos. Pastor. Ele enfatizou vigorosamente o papel da fé na vida cristã e nunca perm itiu "quèlíobra do Espírito Santo fosse comprometida pela confiança em meios externos de graça. mas um teólogo bíblico cujos impulsos humanistas eram amenizados por seu cristocentrismo. Furcha e H. “In Search of True Religion: The Spirituality of Zwingli as Seen in Key Writings of 1523/24”. Furcha e Pipkin.sentido. 88-101 do Corpus Reformatorum. Traduzido por Ruth C. Huldrych Zwingli: His Life and Work. Zwingli and the Arts. 1966. Penn. Conjunto de onze ensaios de eruditos europeus e norte-americanos. e H. Oxford: Clarendon Press. Zwingli: A Reformed Theologian. P. Furcha. 1985. 1963. New Haven: Yale University Press. Charles. L. Conjunto de palestras apresentadas no Simpósio Internacional Zuínglio de 1984. Walton. Robert C. Jacques. Pastor. G. Allison Park. Filadélfia: Fortress Press. J. Toronto: University of Toronto Press. Gãbler. 1986. Zwingli the Reformer. Oskar. ed. Montreal: McGill University Faculty of Religious Studies. 1976. E. Destilação popular do estudo biográfico em quatro volumes de Famer. J. Famer. Estudo abrangente e completamente documentado da teologia de Zuínglio. Excelente estudo sobre a estética de Zuínglio. Traduzido por D. Nova Iorque: Archon Books.. Zwingli’s Theocracy. Ulrich. Gritsch. Garside. Breve mas útil levantamento da teologia de Zuínglio. Sear. Protestant: The Work ofHuldrych Zwingli After Five Hundred Years.: Pickwick Press. R. 1984.Courvoisier. 1952. Análise completa da teologia política de Zuínglio no contexto de seu ambiente cívico. 1986. G. Stephens. Prophet. eds. . E. Zwingli. Útil introdução aos estudos de Zuínglio. W. Wayne Pipkin. Furcha. Hydrych Zwingli. Richmond: John Knox Press. 1484-1531: A Legacy of Radical Reform. The Theology of Huldrych Zwingli. Cambridge: Cambridge University Press. Biografia moderna definitiva de Zuínglio. 1967. Potter. .2 ‘Traduzido em Thomas Torrance. O que recebo é apenas um pequeno e tênue jorro e o que posso dar em retomo. Eu poderia feliz e proveitosamente assentar-me e passar o resto de minha vida somente com Calvino. perco completamente o meio. algo vindo diretamente do Himalaia. na Alemanha. 88-139. certamente. K. E. 1954). Uma das primeiras tarefas de Barth foi preparar palestras acerca da teologia dos reformadores. SCM Press. as ventosas. Karl Barth deixou um pastorado campesino na Suíça rural para tornar-se professor de teologia reformada na Universidade de Gõttingen. pp. mesmo para assimilar esse fenômeno. Em junho de 1922. Revolutionary Theology in the Making.GLÓRIA A DEUS João Calvino Professor: Estudante: Professor: Estudante: Qual é o principal objetivo da vida humana? É conhecer a Deus. J. 15411 A Crise da Teologia Reformada Em 1921. é correto que dediquemos nossa vida à sua glória. estranho. mitológico. Reid (Londres. . Catecismo de Genebra. sem falar para apresentá-lo satisfatoriamente. um poder demoníaco. 1959). uma floresta primitiva. é apenas uma porção ainda menor desse pequeno jorro. pp. 5-6. absolutamente chinês. 1964). Por que você diz isso? Porque ele nos criou e nos colocou na terra para ser glorificado em nós. 101. S. ele escreveu a seu amigo Eduardo Thurneysen sobre suas lutas com Calvino: Calvino é uma catarata. ed. p. trad. já que ele é o princípio dela. The School o f Faith (Nova Iorque: Harper and Bros. então. por James D. 2Karl Barth. Outra tradução é dada em Calvin: Theological Treatises. Smart (Richmond: John Knox Press. . porém. longe de sucumbir ao novo evangelho. com seus três tratados de 1520). irmão de Karl. que em breve se tornaria o Rei Henrique viu. em Roma. Lutero já estava dando conferências na Universidade de Erfurt e Zuínglio estava-se ocupando de suas tarefas pastorais em Glarus. Calvino foi um reformador da segunda geração. que estava-se preparando para entrar em guerra contra os príncipes protestantes. assistido em seu leito de m orte por seu filho de 18 anos. Logo. ele até mesmo desmarcou uma aula porque não estava completamente preparado. conhecido como o “papa guerreiro” . devido a seu hábito de liderar seus próprios soldados nas batalhas — o que impeliu Erasmo a perguntar se ele não era mais o sucessor de Júlio César do que de Jesus Cristo! Logo ele promulgaria uma indulgência plenária para a reconstrução da Catedral de São Pedro. “Mais de uma vez o que eu apresentava às 7 horas não estava pronto antes das 3 ou 5 horas. o Rei Henrique vil m orria. em 1521 (“aqui permaneço”). na França setentrional. p. eles tinham avançado até os portões de Viena. era o pior dos tempos. . acreditava ele. o robusto e recém-casado “H arry” . A Tale o f Two Cities (Nova Iorque: Merill and Baker.3 Assim deve ter parecido a muitos dos cristãos sérios que seguiram o curso dos eventos desde a Dieta de W orms. em 1509. Dessas meditações emergiu uma verdadeira renascença no estudo de Calvino (no qual Peter Barth. íamos todos direto para o outro lado.Barth não podia deixar Calvino! Lutava com ele dia e noite. no início da década de 30. No trono papal. íamos todos direto para o céu. o otimismo apocalíptico de Lutero chegara perto do desespero. lutavam uma jih a d santa contra toda a Europa. no mesmo ano. Era a primavera da esperança. Quando o evangelho de Lutero veio a público pela prim eira vez (digamos. era o inverno do desespero.” Em certa ocasião. Cristo retornaria e o diabo seria derrotado para sempre! Até o final da década. Quando Calvino tornou-se protestante. o imperador convocaria um verdadeiro conselho reformador. até a Dieta de Speyer (onde o termo protestante foi cunhado). o papado cairia. desempenhou um papel importante) e um a nova avaliação da pertinência de Calvino para nossos tempos perturbados. Os judeus não haviam demonstrado mais interesse pelas tentativas de Lutero de evangelizá-los do que tiveram pelos outros incontáveis esforços através dos séculos. estava Júlio II. Os turcos. Ele encontrava-se excomungado pelo papa e banido pelo imperador. Na Inglaterra. herdou uma tradição e uma teologia já bem definidas por quase duas décadas de controvérsia. Era o melhor dos tempos. em 1529. ele estava confiante de que seria bem-sucedido. 1. os judeus e os turcos seriam convertidos. Ainda mais instável que as ameaças externas era o doloroso desenredar interno 3Charles Dickens. Já em 1525. 1962). Quando nasceu. para a Nova Inglaterra. Todos. sigo a tradução de B. “os papistas amaldiçoam os luteranos. por sua vez. chamou Lutero de seu “pai muito respeitável” e posteriormente declarou: “Nós o consideramos um extraordinário apóstolo de Calvino. não estava fundamentalmente de acordo com os interesses mais profundos de Lutero. Calvino. a reforma radical fragmentada e. “John Calvin on Luther”. 250. um dos reformadores espirituais. O desacordo dos zuinglianos com os luteranos sobre a Eucaristia aumentou. Mesmo assim. Jaroslav Pelikan. ao invés de diminuir. a pureza do evangelho foi restaurada em nossa época” . claro. Ainda assim. a maioria deles. com Zuínglio falecido e Erasmo morrendo. adaptando-os ao contexto civil de Genebra. ao imprimir e distribuir suas Noventa e Cinco Teses de um extremo a outro da Europa. como Erasmo. ainda mais desacreditada pelo espetáculo sangrento de M ünster. que nem Lutero nem Zuínglio jamais fizeram. por meio de cujo trabalho e ministério. não foi um simples imitador de Lutero. com Lutero aquiescente (se não quieto!). p.4 Ao contrário de Zuínglio. in: Interpreters o f Luther. para os Países Baixos. estendendo-se da Polônia e da Hungria. 6. depois do Colóquio de M arburgo. os luteranos amaldiçoam os zuinglianos. a Escócia. Léonard intitulou o último capítulo de sua History o f Protestantism de “Calvino: o Fundador de uma Civilização” . observou que. sola scriptura) e dar-lhes uma exposição clara e sistemática. 79. Para esta citação. com base na Bíblia. Calvino nunca declarou ser teologicamente independente de Lutero. Muitos dos que se haviam juntado a Lutero em suas primeiras batalhas agora desertavam do “papa de W ittenberg” . Por essa razão. . recorriam à Bíblia. no Oriente. Karl Holl. por fim. a igreja romana ressurgindo. Entretanto. os zuinglianos amaldiçoam os anabatistas e os anabatistas amaldiçoam todos os outros” . famoso estudioso de Lutero. (Filadélfia: Fortress Press. logo. Dessa cidade. Os dois reformadores nunca se encontraram pessoalmente. todos estes Lutero apelidou de Schwärmer. ed. acima de tudo. como Thomas M üntzer rudemente o chamava. anabatistas e sacramentalistas. Eles não o seguiriam até o cisma. tais conceitos assumiram vida própria e desenvolveram-se numa nova teologia internacional. 1968). a Inglaterra (puritanismo) e. A. so la fid e. Lutero elogiou alguns dos primeiros escritos de Calvino que lhe haviam sido enviados.da Reforma. João Calvino emergia como líder de um novo movimento e reformulador de uma nova teologia. A grande realização de Calvino foi tomar os conceitos clássicos da Reforma (sola gratia. certa vez referiu-se a Calvino como o maior discípulo de Lutero. o historiador francês E . no Ocidente. Gerrish. porque soavam como um confuso enxame de abelhas zumbindo ao redor de uma colmeia. Os espiritualistas. Os humanistas tinham feito do nome de Lutero uma palavra familiar. G . 4CO. col. Kasper Schwenckfeld. Nesse exato momento. p. Em 1556. uma pessoa glacial. Ainda teriam de suportar Calvino por mais treze anos! Em 1577. conhece apenas dois aspectos a respeito dele: acreditava na predestinação e ordenou que Serveto fosse queimado vivo. 123-177. Por exemplo. rancorosa e completamente desumana. Bolsec também afirmou que a doença crônica de Calvino era castigo de Deus.O Homem por Trás do Mito Poucas pessoas na história do cristianismo têm sido tão supremamente estimadas ou tão mesquinhamente desprezadas quanto João Calvino. um desses herdeiros desencantados da Reforma colocou-se diante da famosa estátua de Calvino em Genebra e começou a atirar ovos naquela aparência severa e com ar de desprezo. Os desprezadores modernos de Calvino não foram mais gentis. mas também como um bêbado. Num óbvio golpe baixo. p. publicou um ataque grosseiro ao caráter de Calvino.. comemoraram e deram graças a Deus por tirar aquele famoso herege de seu meio. Jerome Bolsec. insensível. No outro extremo da calvinofobia está a postura igualmente preconceituosa da calvinolatria. 1971). 1954). dentre a qual grande parte dos protestantes. 178. precipitada. . mas também como um guia 5Citado em Richard Stauffer. The Humanity o f John Calvin. Essa imagem distorcida origina-se em parte da própria época de Calvino.. Das Calvinbild bei Bolsec (Augsburg: F D L Verlag. veja Frank Pfeilschifter.] nada nele fala ao coração” . ex-protestante que tinha retornado à Igreja Romana. cidade natal de Calvino. A maioria dos cristãos.6 Outros chegaram a ponto de retratar Calvino não apenas como o maior professor de doutrina cristã desde Paulo. o que de fato ele pode ter sido. na qual não foi de maneira nenhuma universalmente apreciado. entretanto. adúltero e homossexual. pp. o tirano cruel de Genebra. O liberalismo do século xix viu Calvino como “o grande fantasma negro. ambos verdadeiros. quando descobriram que os boatos acerca de sua morte haviam sido prematuros. uma figura rabugenta. [. por George A. receberam a notícia da morte do reformador. Quanto à natureza espúria das alegações de Bolsec. 1983). o fato de “seu corpo inteiro estar sendo comido por piolhos e verm es” era a punição divina de sua heresia. A alegria durou pouco. trad. Desses dois fatos. Shriver (Nashville: Abingdon Press. sombria. The History and Character o f Calvinism (Nova Iorque: Oxford University Press.5 Para muitos cristãos contemporâneos. Bolsec retratou Calvino não apenas como arrogante e mal­ humorado. em certa ocasião. no ano de 1551. o que ele com certeza não era. McNeill. o reformador escocês John Knox descreveu a Genebra de Calvino como “a mais perfeita escola de Cristo que jamais houve na terra desde a época dos apóstolos” . emerge a caricatura usual de Calvino como o grande inquisidor do protestantismo. Calvino é um esqueleto embaraçoso que prefeririam manter cuidadosamente trancado nos arquivos históricos. quando os cônegos da Catedral de Noyon. 20. 6John T. Contaram-me que. [. Brill. pp. O Calvino de Doumergue é bom demais para ser verdadeiro.: Archon Books. A manutenção de um benefício requeria a entrada nas ordens menores — João tornou-se um clérigo e recebeu a tonsura — e o cumprimento de tarefas eclesiásticas. ao derivar desse evento traumático o suposto preconceito de Calvino contra a sexualidade e sua pretensa frieza em relação à esposa. Sem dúvida isso contribuiu para seu senso de ansiedade íntima e inquietação. declarando: “Devo a você tudo o que sou e tenho. Hugo (Leiden: E. Nós não servimos à verdade retratando Calvino como angelicamente bom ou como diabolicamente mau. Era um aristocrata de coração. . porém. Jeanne. Gérard Cauvin. um refugiado agradecido mas por demais entusiasmado chamou-o de “irmão Calvino” . eds.. movia-se com facilidade entre os altos escalões da sociedade. graças à influência prudente de seu pai. Com a idade de 12 anos. como Lutero declarou que todos os cristãos são. Conn. ao mesmo tempo santo e pecador. Na época da Reforma. Mas. devo à sua nobre família meu primeiro aprendizado na vida e nas letras” . Ford L. 85-88. a mais notável tentativa de apresentar um “Calvino sem protuberâncias” é a biografia clássica feita por Emile Doumergue. Calvino recebeu um benefício do bispo de Noyon. a despeito das virtudes desse impressionante trabalho. ele é essencialmente um exercício em hagiografia. 8Calvin's Commentary on Seneca’s De Clementia. pode-se dizer que Calvino nasceu na igreja. Calvin Against H im self (Hamden. o sistema de 7Esse argumento foi impingido por Suzanne Selinger em seu perspicaz estudo.quase infalível em cada aspecto da diligência humana. Certa vez. assim como o Calvino de Bolsec é demoníaco demais para ser humano. Ela vai longe demais. Calvino conheceu algo do fervor da vida social a partir de seus contatos com a família aristocrática M ontmor. era mulher muito bonita e piedosa. desde a arte e a arquitetura até a política e a economia. 12-13. Sem dúvida. nem deixava que os outros se esquecessem disso.8 Embora Calvino certa vez tenha descrito a si mesmo como “meramente um homem dentre o povo” . nas ruas de Genebra. seu pai. Diferentemente de Lutero. era o assistente administrativo do bispo de Noyon. Ele nunca esqueceu tal fato acerca de si mesmo. Apesar de seu pai ter-se casado logo depois.] Quando menino. Ele dedicou seu primeiro livro a um membro dessa família. seu quarto filho. Jeanne Cauvin morreu quando Jean.. Portanto. fui criado em sua casa e iniciado em meus estudos com você. o jovem Calvino deve ter sentido a falta da mãe de forma muito profunda. apenas para ser informado de que o título correto era “M onsieur Calvino” . filha de um dono de hospedaria. J. se não de linhagem. pp. Diz-se que sua mãe. 1969). Battles e André M. 1984). tinha apenas 5 ou 6 anos de idade. Doumergue produziu o que certamente permanecerá como o estudo mais completo e detalhado da vida de Calvino já escrito. publicada em sete fólios por volta da virada do século. Ele foi.7 Apesar disso. com quem viveu durante vários anos. muitas forças estavas agindo para fazer de Calvino o reformador. Ele foi o prim eiro m ártir da R e f n r n ã ã n a p r a n r . 331. . a fim de que eu pudesse continuar com m aior proveito. no caso de Calvino. ele recuaria horrorizado ao queimarem vivo seu amigo Etienne de la Forge. [ . quando definitivamente se instalou em Genebra. Anos depois. 10CO 13. um dos maiores mestres de latim de sua época. envolvia a responsabilidade por um dos altares da catedral) por uma soma insignificante. trad. m eu pai m andou-m e a P aris. Em agosto de 1523. “para vingar dos imerecidos insultos meus irmãos. 8. Commentary on the Book o f Psalms. Calvino publicou a prim eira edição de suas Instituías em parte. 1845). Calvinus) chegou a Paris para começar seu aprendizado formal na mais famosa universidade da Europa.. Doze anos mais tarde. cuja morte foi preciosa aos olhos do Senhor” . A Preparação de Calvino Calvino matriculou-se primeiro no Collège de la Marche. De fato. p ara ensinar-m e a verdadeira m aneira de aprender. foi capaz de continuar seus estudos. seja qual for o progresso que eu tenha feito desde então. L á.Tean Vallière foi queimado vivo por pertencer ao “partido do herético Lutero” .10 9John Calvin. cols. xlii. Ali. que. conversão e vocação. p. estudou com M athurin Cordier. João Calvino (da forma latinizada de seu nome.9 Que transformou o jovem e brilhante estudante de Noyon no eloqüente apologista da fé? De 1523 a 1541. enquanto o incumbente recebia a parte m aior do benefício. Calvino lembrava esse venerável professor e dedicava a ele seu comentário a respeito de 1 Tessalonicenses: Q uando eu e ra criança e tinha experim entado só os rudim entos do latim . cuja Grammatica Latina ainda estava em uso no século xix. já um estudante precoce. Podemos observar sua vida durante esses anos turbulentos sob o aspecto de sua preparação. De fato. um piedoso protestante com quem ele vivera durante algum tempo. I. p. a bondade de D eus deu-m e você com o precep to r durante algum tem po. então com apenas 14 anos de idade. por James Anderson (Edimburgo: Calvin Translation Society. por algum tempo. um monge agostiniano chamado . 525-526. No mesmo mês.] F u i tão auxiliado p o r você. CNTC. Um sacerdote semi-analfabeto seria usualmente contratado para cumprir as tarefas reais do ofício (que. onde aperfeiçoou seu conhecimento de gramática e sintaxe latina.. como disse.outorgar benefícios a parentes e amigos era um dos abusos mais comuns na igreja. a Não sabemos que impressão esse evento causou em Calvino. a renda desse benefício era um tipo de bolsa de estudo pela qual o jovem Calvino. atribuo-lhe com satisfação . queixou-se mais tarde dos ovos estragados que ele era obrigado a comer no refeitório. foi de Paris a Orléans para dedicar-se a uma nova disciplina. Ele permaneceu nesse cargo até m orrer (no mesmo ano de Calvino). 1958). cujas maneiras são rudes. I. trad. em desafio ao pai.° 64). durante esses anos.Posteriormente. Ele estava começando a mover-se nos círculos do humanismo francês e pode ter compartilhado a opinião de Erasmo. reconheceu que o jovem erudito era realmente “um rigoroso censor de tudo o que era vicioso em seus companheiros” . em sua respeitosa biografia. .. e sofística tão distorcida. Cordier foi chamado por Calvino para ensinar latim na academia de Genebra. tortuosa e enigmática. nTracts and Treatises. Gérard Cauvin não gozava mais das boas graças do capítulo da catedral de Noyon e. também percebeu que seu brilhante filho teria melhores possibilidades de obter maior renda como advogado do que como servo da igreja. Como era um estudante compulsivo. seus colegas apelidaram Calvino de “o caso acusativo” . 12EE 1. 40. mas descreveu um curso de teologia ministrado a jovens teólogos como “mera sofística.12 Calvino nunca expressou-se dessa maneira. p. pp.11 Enquanto seus colegas estavam brincando nas ruas ou iam a festas desregradas. cujas vidas são hipócritas. o estudo de Direito. cuja linguagem é bárbara. que a teologia escolástica poderia muito bem ser descrita como um tipo de magia esotérica. por Henry Beveridge (Grand Rapids: Eerdmans. lx. De qualquer forma.] cujos cérebros estão podres. O contraste com Lutero é surpreendente: Lutero. Erasmo. Calvino deixou tudo isso para trás quando.. Calvino saiu-se extremamente bem em seus estudos. CWE 1. 138. mas também adquiriu uma aversão pelo método escolástico de fazer teologia. cujo intelecto está entorpecido. Calvino ocupava-se das minúcias da lógica nominalista ou das quaestiones da teologia escolástica. que difamou os mestres de Paris chamando-os de “pseudoteólogos [. Os problemas crônicos de Calvino de indigestão e insônia provavelmente derivavam da alimentação severa e de sua tendência de estu3ãr até altas horas da noite em Montaigu. famosa escola conhecida pela disciplina severa e pela péssima comida. revirada. Embora isso não seja verdade. Beza. Quanto mais densa a escuridão em que alguém ocultava um assunto e quanto mais enigmaticamente envolvia a si mesmo e aos outros em raciocínios absurdos. aos 85 anos. maior sua fama como perspicaz e culto” . perdeu uma carreira no Direito u Calvin’s Tract and Treatises. p. Calvino logo transferiu-se para o Collège de Montaigu. cujas conversas estão cheias de veneno e cujos corações são tão negros quanto tinta” .13 Em 1528. 87-88 (n. p. Calvino concordou com a vontade de seu pai. I. enfrentando a velhice. por ordem de seu pai. que estudou ali poucos anos antes de Calvino. cujo ensino é uma cama de espinhos. Uma lenda posterior conta que. No entanto. e o próprio Calvino teve de pagá-la. que abriu caminho para seus amplos trabalhos literários.” (2 Co 4. p. primeiro em Orléans.. a literatura clássica. complementada com um aparato textual e um longo comentário.5) A glória pertencia a Deus. Calvino sentiu-se livre para deixar o estudo de Direito por sua verdadeira paixão. Contudo. Calvino. Ele mudou-se de volta para Paris e. Enquanto estava em Bourges. um erudito da Alemanha. mas a Cristo Jesus como S en h o r. foi uma tentativa impressionante. Calvino lançou-se entusiasticamente ao estudo de Direito. como um tipo de “m onitor” .. sendo tutelado por M elchior W olm ar. embora a conversão possa ter sido “súbita” . Calvino achou necessário desculpar-se pelo fato de que. porém. esse livro foi um fracasso total! Teve apenas uma edição. porque levou a sério a admoestação de Paulo: “Porque não nos pregamos a nós mesmos. Calvino era reticente quanto a si mesmo.para tornar-se monge. Calvino. em 1531. Em primeiro lugar. em parte. em obediência ao pai. isso acontecia por causa de sua tendência natural à timidez e à introspecção e. A Conversão de Calvino A transição de Calvino de humanista a reformador foi marcada pelo que ele certa vez descreveu como uma “conversão súbita” (conversio subita). abriu seus olhos para o mundo da antigüidade clássica e para o estudo de textos antigos. teve uma formação católica tradicional e deve ter conhecido a 14Battles and Hugo. publicou seu primeiro livro. providenciou uma base completa nos assuntos práticos que seria de enorme benefício em seus esforços para dar nova forma às instituições de Genebra. As suposições vão de 1527 a 1534. mesmo tendo somente 23 anos.14 Comercialmente falando. Em parte. ele preparou-se para ela com um período de lutas. tem sido notoriamente difícil para os estudiosos de Calvino concordar acerca de uma data provável para essa mudança. depois em Bourges. 4. Era uma obra-prima de erudição. No prefácio. uma edição do tratado de Sêneca intitulado Sobre a Clemência. e ele esperava que isso o firmasse como erudito notável nos círculos humanistas. o estudo de Direito teve duas influências importantes em seu trabalho futuro: prim eira. não a João Calvino. . Quando seu pai morreu. em 1532. não menos que Lutero e Zuínglio. Além disso. segunda. ele também se dedicou ao estudo do grego. Logo estava preparado o suficiente para dar palestras e substituir os professores nas aulas quando faltavam. deixou o estudo da teologia a fim de tornar-se advogado. inquietações e dúvidas. Há diversos motivos para essa dificuldade. aquele era apenas seu primeiro livro: “Eu preferiria não fazer nascer absolutamente nenhuma ‘criança’ a provocar abortos. Para Calvino. como muitas vezes acontece” . De um fato podemos estar certos: Calvino não abraçou o novo evangelho de maneira rápida ou fácil. C ontrariado com a novidade. Visto ser a mais explícita referência de Calvino a esse fato crucial. Mais tarde. Ana. p. Calvino recordou sua conversão e escreveu sobre ela no prefácio de seu Comentário sobre os Salmos. o dedo de S. no in ício . vamos citá-la aqui por inteiro: 15Tracts and Treatises. D aí. pp.15 Como Calvino teve seu primeiro contato com as novas idéias evangélicas. p o r to d a m inha vida. os primeiros biógrafos de Calvino. Beza e Colladon. Certa vez. fez uma peregrinação com sua mãe para a Abadia de Ourscamp. eu estivera n a ignorância e no e rro . inspirados pelo grande erudito Jacques Lefèvre d’Etaples. 62. confesso. E ntão. porque eras ju iz rigoroso e v in g ad o r severo d a iniqüidade. ao que parece. atribuíram um papel significativo em sua conversão a seu prim o Robert Olivétan.16 Em 1555. Calvino apresentou um quadro vívido do tipo de pregação que ele com freqüência deve ter ouvido. O m étodo p ara o b ter tu a m isericórdia era a com pensação dos delitos. com o propósito. até serem impedidos pelas forças mais poderosas da ortodoxia. I. 62. e até seu futuro colaborador Guillaume Farei.sensação de ansiedade e opressão que caracterizava a cultura da baixa Idade Média. I. resisti com energia e irritação. OS 1. 485. perto de Paris. isso não podemos saber com certeza. Alguns dos escritos de Lutero foram traduzidos para o francês logo no início de década de 20. p ara que p o r essa intercessão pudesses ser m ais facilm ente solicitado e propício a n ó s . e Calvino pode muito bem os ter lido. . 16Tracts and Treatises. eu ouvia com m uita m á vontade e. haviam tentado uma reforma experimental da igreja na diocese de Meaux. onde foi-lhe permitido beijar uma relíquia sagrada. a reconciliação v iria m ediante retidão das obras. m ostravam quão terrível tua presença deve ser. de produzir uma espiritualidade de culpa: D iziam -nos que éram os pecadores m iseráveis dependentes d a tu a m isericórdia. 484-485. p. eles nos m andavam buscar refúgio p rim eiro nos santos. Ele também tinha íntima ligação com o círculo de humanistas evangélicos franceses. porque (tal é a firm eza ou descaram ento com os quais é natural aos hom ens p ersistir no cam inho que o u tro ra tom aram ) foi com a m aior dificuldade que fui induzido a confessar que. em cujo Novo Testamento Francês (1535) Calvino escreveu um prefácio intitulado “A todos os que amam a Jesus Cristo e a seu evangelho” . OS 1. Esse foi seu prim eiro trabalho publicado como protestante. p. 20 anos depois do ocorrido. quando ainda bem novo. Alguns desses. apesar de sempre acalentar O objetivo de viver na privacidade. Todos os que ansiavam Pela pura doutrina Vinham vez após outra até mim Para aprendê-la. mesmo não abandonando Os outros estudos completamente. recebido Um pouco de experiência e conhecimento Da verdadeira piedade. a despeito de minha disposição natural. Que nunca me deixou em paz em lugar algum. Mesmo tendo eu mesmo mal começado A estudá-la. Mas fiquei completamente maravilhado Porque. Por uma súbita conversão. a despeito de minha juventude. Colocou-me no centro das atenções. Fui repentinamente inflamado Com tamanho desejo de prosseguir. Ainda assim dediquei-me a eles Mais negligentemente. portanto. incógnito. antes que um ano se passasse. Sempre desejava paz e tranqüilidade. Deus transformou-a e trouxe-a À docilidade. longe de atingirem o desejo de meu coração. De minha parte. Que. Agora estava preparada para uma atenção séria. Estivera por demais empedernida em tais assuntos. Tendo. Deus levou-me de tal forma e fez-me mudar De tais maneiras diversas. tendo uma natureza Um tanto indelicada e retraída. Todos os retiros e lugares de escape Tomaram-se como que escolas públicas para mim. . Mas. Até que. que. Em resumo. Então comecei a procurar Algum esconderijo E uma forma de afastar-me das pessoas.Minha mente. que teria sido muito difícil arrancar-me de tão profundo lamaçal” . também). Calvino não tinha ilusões de que poderia ter conseguido um a relação adequada com Deus sem uma prévia “mudança” da parte de Deus. “Quem 17Essa é uma tradução estrófica feita por Ford L. Cf. 56s. Aqui. 18CO 31. mas sim “num sentimento sincero que ama a Deus como Pai. poderia também ser traduzida por educabilidade. docilitas. educável diante do verdadeiro Deus. “Eu permanecia tão obstinadamente entregue às superstições do papado. quam ut facile esset e tam profundo luto me extrahi. mas tam bém ‘não-premeditado’” . impressa na introdução de sua tradução da Instituição da Religião Cristã de 1536 — Institution o f the Christian Religion (Atlanta: John Knox Press.18 “Eu não fiz nada. via sua conversão como o resultado da iniciativa divina: “Deus mudou meu coração” . Battles e Hugo. alguém que é capaz de ser ensinado. Como veremos. magis pertinaciter addictus essem. de Sêneca.Deixando minha França natal. discípulo em seu significado etimológico (do latim disco. xxiii-xxiv. A evidência de tal piedade era precisamente uma disposição para tom ar-se dócil.17 Três importantes tendências da piedade e da personalidade de Calvino são evidentes nessa recordação reveladora. Esse tema ressoa ao longo de seus escritos sobre a vida cristã. . As citações subseqüentes serão dessa última impressão. também. Como sempre desejei. a visão de Calvino sobre a eleição só pode ser entendida no contexto de uma apropriação particular da salvação por meio de Jesus Cristo. aprender) de aprendiz. pp. Battles. tanto quanto o reverencia como Senhor” . ele observou. a Palavra fez tudo. quum superstitionibus papatus. 22: “Ad primo quidem. Parti para a Alemanha Com o expresso propósito De poder viver Em paz em algum canto desconhecido. Para Calvino. Calvino observou que “subita significa não apenas ‘súbito’. Commentary on De Clementia. pp. Em seu comentário sobre De Clementia.” A experiência de Calvino ecoava a de Lutero. estão as raízes experimentais da tão discutida doutrina da predestinação. qui pro aetate nimis obduruerat subita conversione and docilitatem subegit”. A tradução de Battles foi reimpressa por Eerdmans (1986) como Institutes o f the Christian Religion: 1536 Edition. animum mèum. Talvez fosse essa a verdadeira intenção por trás de sua descrição da mudança como “repentina” — não tanto uma ocorrência rápida como um relâmpago (embora possa ter sido assim. col. 1975). Há um sentido em que Calvino aspirava a ser nada mais do que um discípulo fiel de Jesus Cristo. Um segundo tema no enfoque de Calvino à fé surge do comentário de que Deus sujeitou seu coração à docilidade. a verdadeira piedade não consistia num medo servil de um Deus todopoderoso. quanto uma sensação de ser completamente dominado pela graça de Deus. Essa palavra. Em primeiro lugar. Battles.. Lutero foi feito para o papel. 379: “Or la vraye piete [. por assim dizer. The Piety o f John Calvin (Grand Rapids: Baker Book House. Fuhrmann (Filadélfia: Westminster Press. antes. 249. como o nome discípulos indica. busca para si o conhecimento do Deus verdadeiro.. exatamente 16 anos depois que Lutero colocou as famosas teses contra as indulgências na porta da igreja de W ittenberg. Tímido a ponto de ser insociável.] Et tous ceulx qui ont ce zele ilz nentreprenent point de forger ung tel Dieu quilz veullent selon leur témérité. Ele teve de ser puxado. Mesmo não sendo o que chamaríamos de um sermão evangélico caloroso.”20 Ao longo de toda a descrição de sua conversão. No Dia de Todos os Santos. 20CO 32. p.. amigo de Calvino e reitor da Universidade de Paris. ele m orreu em batalha brandindo uma espada de dois gumes! Mas Calvino era diferente. essa relutância genuína em entrar na frente de batalha. 19. para as fileiras dos reformadores. 1949). ele dizia. por Paul T. Contudo. 142. afinal. col. mais ilz cherchent la cognoissance du vray Dieu de luy mesmes et ne le conçoivent point aultre que tel quil se manifeste et declare a eulx”. 13-26. Zuínglio também foi uma pessoa de ação. “A religião verdadeira e a adoração a D eus” .quer que tenha sido dotado dessa piedade não ousa modelar de sua própria imprudência qualquer deus para si mesmo. o mesmo Deus que submetera seu coração à educabilidade também firmou seus nervos para as importantíssimas tarefas que estavam diante dele. p. Nicolas Cop. Instruction in Faith. A Vocação de Calvino Em 1533. em seu Comentário de Atos (18. o desejo de viver em reclusão para estudos. proclamou a Cristo como o único mediador com Deus. de modo que ninguém serve devidamente a Deus senão aquele que foi educado em sua escola. CNTC 7. Cop foi obrigado a fugir para continuar vivo. fez um discurso numa assembléia que chocou os ouvintes. “em paz em algum canto desconhecido” . essa definição deriva do Catecismo apresentado por Calvino em 1537.19 Significativamente. Mais tarde. Não compreenderemos a pessoa de Calvino se não levarmos em conta essa reticência.22). “provêm da fé. [. 1978). tinha conteúdo evangélico suficiente para insultar os defensores da ortodoxia católica. ele diferia dos dois outros grandes reformadores que já examinamos. esperneando e gritando. ele não se sairia bem numa conversa fiada numa festa moderna.] consiste plustot en un pur et vray zele qui ayme Dieu tout ainsi comme Pere et le revere tout ainsi comme Seigneur. pp. um verdadeiro vulcão de personalidade explodindo em Worms: “Aqui permaneço!” . l9OS 1. Calvino declarou sua natureza tímida e retraída. Cf. no Dia de Todos os Santos. Antes. . e concebe-o apenas como ele se m ostra e declara ser” . Veja Ford L. Nesse sentido.. p. ele disse que não pode haver nenhuma pietas sem uma instrução verdadeira. trad. um documento destinado à instrução das crianças na fé. Cop não louvou aos santos. as velas. Erasmo faleceu em Basiléia. por assim dizer. em 1537. 339-342. Lutero havia lançado a Reforma atacando as indulgências. trad. suas esperanças de que um reavivamento das letras poderia iniciar uma “era de ouro” da Reforma. por David Gelzer (Richmond: John Knox Press. também foram declarados como fora dos limites para os bons cristãos. pp. 1954). significavam a intersecção de duas eras. aparecendo como “Apêndice I” em sua edição das Instituías de 1536. Erasmo também estava vivendo em Basiléia nessa época. do velho adversário de Erasmo em W ittenberg. O 21Emanuel Stickelberger. alguns dos protestantes mais maduros de Paris decidiram fazer uma demonstração surpreendente e radical de sua fé. em junho de 1536. Velho e doente. principalmente a estudar as Escrituras. Mas ele não estava desocupado. Erasmo e Calvino. Mas sua conversão e imersão nas fontes bíblicas e patrísticas conduziram-no por um caminho muito diferente daquele trilhado por Erasmo. na mesma cidade. . dentre os quais suas Instiíuías.22 Agora. em Paris. dá crédito a esse relato. os livros de João Calvino. que já se encontrava lá. misteriosamente. em 1542. na porta do quarto do Rei Francisco i. e pouquíssimas pessoas me conheciam” . três meses depois da publicação da primeira edição das Instituías de Calvino. como dizia o título dos cartazes. O caminho de Calvino estava bem mais próximo. Um deles até apareceu. morreram seus sonhos de paz e aprendizado universais. p. Calvino não causou grande furor em Basiléia: “Fiquei ali escondido. os véus e tais espécies de bufonarias” — foi imprimido num cartaz afixado por toda a cidade. num cesto!21 Os escritos de Calvino foram confiscados. o maior dos humanistas havia retornado à sua cidade favorita para passar seus últimos dias na terra. daí em diante. enquanto a polícia batia à porta — sombras da fuga apressada de Paulo de Damasco. Um ataque ardoroso à missa e seus adornos — “o toque dos sinos. os cerimoniais. o lar de Cop. as forças da perseguição estavam lançadas contra os evangélicos franceses. Calvino deixou o país apressado e encontrou refúgio na cidade reformada de Basiléia. sendo cerimoniosamente queimados diante da Catedral de Notre Dame. as unções. A reforma francesa começou com um ataque frontal aos “horríveis. os incensos. Logo no ano seguinte. um aspecto central do sacramento da penitência no final da Idade Média. Por volta de um ano depois do discurso de Cop.Calvino também estava envolvido nesse fato. Alguns anos depois. Calvino não deixou de ser humanista depois de transformar-se num reformador. a Inquisição espanhola proibiu a leitura das obras de Erasmo. em Basiléia. De acordo com uma antiga lenda. Battles. porém mesmo assim distinto. Com Erasmo. 22. ele tornou-sepersona non grata em Paris. Na Alemanha. 220 texto dos cartazes de 1534 foi traduzido por Ford L. com seus amigos baixando-o de uma janela. os cânticos. com lençóis. enormes e intoleráveis abusos da missa papal” . em Calvin: A Life. ele escapou de Paris no momento exato. Calvino havia aprendido muito desse grande estudioso. OS 1. . p.fruto de seu trabalho saiu das prensas do editor Thomas Platter em março de 1536. 1975). p. ele não pretendera dirigir esse trabalho ao rei. p. 34. Calvino planejara que o livro fosse um tipo de cartilha de teologia básica para “os camponeses da França. era miúda o bastante para ser escondida dentro do casaco ou secretamente ocultada entre os pertences de alguém. as Instituías tornaram-se um bestseller quase da noite para o dia.. H. Sua própria terra natal tornara-se “como um inferno” para ele. Ele tentou livrar os evangélicos franceses das acusações de sedição e cisma — não eram sectários inclinados a derrubar a ordem. mas cidadãos honestos que desejavam apenas restaurar a pureza do evangelho. oferecendo a ele este livro como u m a confissão de fé do autor. Jean Calvin de Noyon. na esperança de que ele pudesse adotar uma atitude mais moderada. p..24 Contudo. conforme expressou numa carta a um amigo. 1. muitos dos quais vi que tinham fome e sede de C risto” . Parker.25 Ao longo de toda a carta. Calvino foi educado e respeitoso para com o rei. era um poderoso tratado para aquele tempo. originariamente. A tradução é a de T. O que justifica o impressionante sucesso das Institutasl Podemos responder a essa pergunta em parte indicando duas funções distintas para as quais a obra serviu.] que muito merece ser lido” (lectu dignissimum opus) era uma publicidade modesta de um livro destinado a tornar-se o principal documento da teologia protestante do século xvi. A princípio. alguns anos depois. John Calvin: A Biography (Londres: Dent and Sons. Calvino lamentava que “a pobre e pequena igreja tenha sido devastada por cruel carnificina ou banida para o exílio” . Ulnstitutas de 1536. 1. Um trabalho recémpublicado que muito merece ser lido por todos os que estudam a piedade. Um prefácio ao mais cristão rei da França. Como Calvino disse na epístola preliminar a Francisco I. “apenas um pequeno livreto” . como Calvino certa vez a descreveu. Diferentemente do primeiro livro de Calvino sobre Sêneca. vendedores ambulantes e mercadores evangélicos levaram-na por toda a Europa.] como o reino de Cristo pode ser conservado em bom estado entre nós” . Em primeiro lugar. A prim eira edição. Assim. O que mais estava em jogo era — essa a idéia fundamental de toda a teologia de Calvino — “Como a glória de Deus pode ser mantida a salvo na terra [.23 “Um trabalho [.. a perseguição interveniente aos protestantes franceses movera Calvino a apresentar o caso dos companheiros cristãos ao rei.. L. 21. compreendendo quase a soma total da piedade e do que é necessário conhecer sobre a doutrina da salvação. Chamava-se. Mas a oração final está 23OS 1. para dar o título completo: O Ensino Básico da Religião Cristã. continha a prim eira exegese de Calvino sobre o painosso. No todo. no entanto. A seqüência dos tópicos é a mesma usada por Lutero em seus catecismos. Calvino devia hastante à discussão de M artin Bucer acerca do painosso. O propósito básico das Instituías. Calvino lançara a prim eira saraivada na batalha de palavras que. Farei havia até mesmo escrito um Sumário de teologia evangélica em francês. Outros reformadores haviam tentado fazer algo parecido. em Còrheníário dos Evangelhos (1530). com o que ele queria dizer o batismo e a ceia do Senhor. Talvez modestamente demais. era basicamente uma exposição dos dez mandamentos. O capítulo 4 abordava os sacramentos. a doutrina da predestinação era apresentada. Para o trecho sobre a oração. Retornaremos à história das Insíiíuías que cresceram. O capítulo 5 era a refutação dos “cinco sacramentos falsos” . O capítulo 3. que apresentasse os rudimentos de uma teologia bíblica e levasse os jovens cristãos a uma maior compreensão da fé. porém. de prim eira mão. publicado em 1534. na edição definitiva de 1559. porém. Calvino disse que. “avançando armado para libertar os pobres de sua aflição e também punir seus detratores” . mas com sucesso limitado. a política da igreja e o governo civil. Calvino apresentou mais claramente e de maneira mais magistral do que qualquer um antes dele os elementos essenciais da teologia protestante. que Calvino pode ter copiado deliberadamente. era catequético. O capítulo 1. daquele modesto “pequeno livreto” de 1536 a um enorme tomo e tesouro da dogmática protestante. levaria às sangrentas guerras religiosas na França. enquanto o capítulo 6 concentrava-se em três temas: a liberdade cristã. ninguém sabia que ele era o autor. Nesse contexto. Ainda hoje se pode ver uma caverna perto da cidade de Poitiers onde se diz que Calvino havia ministrado aos necessitados de uma congregação (literalmente!) subterrânea. a necessidade urgente de um manual de instrução claramente escrito. Calvino fora pressionado a atuar como professor daqueles que estavam famintos pela fé verdadeira. Zuínglio apresentou o Comentário sobre a Religião Verdadeira e a Falsa em 1525.26 Sem o saber. no fim. através de muitas revisões. Ele sabia. quando as Insíiíuías foram publicadas em Basiléia. Desde a época de sua conversão.repleta de todo o estrondo de Elias: se Francisco não emendasse seus caminhos. esgotou-se em apenas um ano. Melanchthon publicou pela prim eira vez Lugares Comuns em 1521. Era o tempo para tal livro. “Sobre a Lei” . sobre a oração. então no devido tempo o Senhor certamente apareceria. Seis breves capítulos constituíam a prim eira edição. O tímido e jovem erudito tornou-se cada . A prim eira edição. Cada um desses trabalhos tinha seus pontos fortes. O capítulo 2 tratava da fé e abrangia um comentário sobre o Credo dos Apóstolos. mas apenas numa forma superficial e não-polêmica. mas não conseguia suprir as necessidades que as Insíiíutas satisfizeram. “O ponto mais alto de meus desejos” . Farei. 225: “nempe ut otio literário cum honesta aliqua ingenuaque condidone fruerer” . depois da conversão. numa assembléia pública. irrompeu em seu quarto de hotel e implorou a ele que ficasse em Genebra e ajudasse a completar a recém-conquistada Reforma.”28 Dêem-me apenas um canto isolado na biblioteca e deixem o resto do mundo prosseguir! Farei. entretanto. não se intimidou com a pobre desculpa daquele jovem . os exércitos de Francisco I e do Imperador Carlos v estavam envolvidos em manobras militares que exigiram que a pequena caravana de Calvino desviasse para o sul. Calvino não teve boa impressão da cidade e planejou ficar apenas uma noite. 1967). com seu irmão Antoine e sua meia-irmã M arie. viajava de Paris para Estrasburgo. tendo sido informado de que Calvino estava na cidade. Guillaume Farei havia levado a cidade a abraçar a Reforma. . Pouco antes. Calvino ficou sinceramente chocado com a idéia e protestou dizendo não estar bem preparado para uma tarefa assim. onde esperava estabelecer-se para seu antigo desejo de descanso e estudo. Com seus olhos flamejantes e sua temível barba ruiva. p. Ele poderia edificar melhor a igreja estudando e escrevendo em paz. No verão de 1536. 461. foi o evento central da vida de Calvino. Farei trovejou a maldição de Deus sobre Calvino em palavras que ele nunca poderia esquecer: A essa altura. Calvino.vez mais conhecido como um ativo proponente da Reforma. Assim. p. 56. situada nas fronteiras entre França. Depois de ouvir Que eu estava decidido A prosseguir meus próprios estudos particulares — Quando percebeu Que não chegaria a lugar algum com súplicas — Chegou a ponto de amaldiçoar-me: 27Citado de William Monter. p.27 Ainda assim. com algo como um cargo livre e respeitável. em 25 de maio do mesmo ano. 2tCalvin: Theological Treatises. Calvin’s Geneva (Nova Iorque: John Wiley and Sons. Entretanto. Por sua vez. os moradores de Genebra haviam votado unanimemente por “viver de agora em diante de acordo com a lei do evangelho e com a Palavra de Deus e abolir todos os abusos papais” . chegaram à cidade de Genebra. isso levou ao que. Farei (Ardendo com um zelo assombroso Pela proclamação do evangelho) Repentinamente uniu todos os seus esforços Para manter-me ali. OS 1. o verdadeiro trabalho de reforma mal havia começado. Savóia e Suíça. “era aproveitar a tranqüilidade literária. ele escreveu mais tarde ao Cardeal Sadolet. os suíços são famosos por seu esnobismo e provincianismo. Ele realizou coisas importantes — seu primeiro catecismo e uma confissão de fé foram adotados — mas o conflito com o conselho sobre a disciplina adequada da igreja levou a uma crise. Em suas primeiras cartas depois de seu chamado. Observemos cinco dimensões de sua vida durante esse período crucial. Calvino foi persuadido a mudar-se para Estrasburgo. os quais procuravam asilo da perseguição em sua terra natal. Estrasburgo não pertencia à França. para onde havia sido conduzido antes de ser abordado. L ’Eglise protestante nacionale refere-se não ao corpo nacional da igreja da Suíça. principalmente os de Genebra. mas era uma cidade imperial livre do Sacro Império Romano. Após outra breve estada em Basiléia. Até hoje. Em abril de 1538. a Igreja Reformada Suíça. talvez.29 A partir daquele momento. os anos mais decisivos para seu desenvolvimento como reformador e teólogo.Que agradaria a Deus Amaldiçoar meu lazer E a tranqüilidade para meus estudos Que eu estava buscando. Calvino foi chamado como pastor da ecclesiola Gallicana. Por exemplo. A prim eira estadia de Calvino em Genebra durou menos de dois anos. Se em tão grave emergência Eu me retirasse e me recusasse A prestar auxílio e socorro? Essa palavra arrasou-me tanto. e sem dúvida aqueles dias foram os mais felizes de sua vida. o destino de Calvino estava ligado ao de Genebra. a pequena congregação francesa. Calvino é referido como “ille Gallus — aquele francês” ! Ele tornou-se cidadão de Genebra em 1559. ele se referia a si mesmo como “leitor das Sagradas Escrituras à igreja de Genebra” . Na prim eira menção feita a ele nos registros do conselho da cidade. Nicolau. Contudo. É importante ressaltar que Calvino nunca se sentiu à vontade em Genebra. sua vocação básica permaneceu a de pastor e de mestre. Que desisti da viagem Que havia começado. Naquela época. estava suficientemente perto da França para atrair um considerável número de refugiados franceses. Calvino era um pastor. Calvino . pelo inflamado Farei. que se reunia na igreja de S. Calvino passou três anos em Estrasburgo. por assim dizer. Calvino e Farei foram expulsos da cidade. mas sim à igreja do cantão de Genebra. Foram também. Mesmo tendo assumido diversas outras tarefas ao longo dos anos. Em primeiro lugar. apenas cinco anos antes de sua morte. Ali. 148.32 Em terceiro lugar. Ali. p. Ele complementava sua renda dando aulas particulares. Calvino era um professor.celebrava o sacramento da ceia do Senhor e ocupava-se dos vários pormenores de seu ministério pastoral. Calvino dava palestras três vezes por semana. recebendo pensionistas. No início. advogando nas horas vagas e. com sua forte ênfase na literatura clássica. a fim de invocar e louvar a Deus com zelo mais veemente e ardente” . John Sturm. tornou-se um modelo para a escola de Calvino. 33Ibid„ p.] Olhando para esse pequeno grupo de exilados.30 Calvino deve ter tido em mente cenas como essa quando declarou.. 31Esse trecho é do prefácio ao Saltério de Calvino de 1542. McNeill. [. por ouvi-los todos cantando tão sinceramente. enquanto cantavam agradecendo a Deus por tê-los levado a um lugar onde seu nome é glorificado. History and Character. pagavam a Calvino apenas um florim semanal por suas palestras. o que mais deve tê-lo feito sofrer. e é um belo espetáculo. 69. o que se tornou parte integrante do culto reformado francês. Ele refletiu seriamente acerca do papel da adoração na igreja e traduziu vários salmos para a métrica francesa. chorei. publicou-se a prim eira tradução francesa das Institutos. Ele também pregava quatro sermões por semana a sua congregação. mas de alegria.33 Em 1541. não de tristeza. Um refugiado que visitou a igreja de Calvino fez a seguinte descrição do culto: Todos cantam. p. a qual surgiu em agosto de 1539.. Foi 30Parker. também francês e erudito da Universidade de Paris. É impressionante como o dinheiro some em despesas adicionais” . que “nós sabemos por experiência que o canto tem grande poder e vigor para mover e inflamar os corações dos homens. vendendo algo de sua preciosa biblioteca. . a fim de que possam ter fácil acesso a ela e manter-se nela sem tropeçar” . Era aproximadamente três vezes mais longa que a versão de 1536. Seu propósito expresso era “preparar e treinar estudantes de teologia para o estudo da Palavra divina. OS 1. em Genebra. Assim começou o canto congregacional dos salmos. 69. Cf. homens e mulheres. havia organizado uma escola em Estrasburgo para a qual Calvino foi indicado como “conferencista das Sagradas Escrituras” . pp. O currículo da escola de Sturm. Ele se queixava do alto custo de vida em Estrasburgo: “Não consigo chamar de meu um único centavo. Cada um tem um livro de cânticos nas mãos.31 Em segundo lugar. posteriormente. p. oferecendo cursos exegéticos acerca do evangelho de João e das epístolas paulinas. Calvino era um escritor. 25-256. Sua publicação mais importante foi uma edição totalmente revisada das Institutos. 32Parker. 72. A unidade ainda parecia possível em 1540. Em quarto lugar. com quem iniciou uma amizade que duraria a vida inteira. 35Calvino para o Arcebispo Cranmer: CO 14. 313. Cf. in: John Calvin: A Collection o f Essays. O Pequeno Tratado sobre a Santa Ceia foi o primeiro esforço respeitado de Calvino por estabelecer uma posição intermediária entre os extremos luteranos e zuinglianos acerca da EucaristiàvSe Calvino tivesse falecido em 1541 na idade madura de 32 anos. L. talvez a melhor apologia da fé reformada escrita no século xvi. encontrou Philip Melanchthon. L. Eles também participaram de uma série de conferências com o objetivo de voltar a unir protestantes e católicos. Parker.34 Devemos mencionar três breves mas brilhantes trabalhos que Calvino escreveu durante esses anos.um marco no desenvolvimento da língua francesa. and T. Brill. Bucer e Wolfgang C apito. Ele também publicou um livro de liturgia. foi a visão universal da igreja que lhe foi confirmada. col. A Forma das Orações e Hinos Eclesiásticos. que teria um efeito duradouro sobre a adoração reformada. Parker. comparável em seu efeito à Bíblia de Lutero em alemão ou à Versão Autorizada em inglês. um prelado católico de mente reformadora que escrevera à igreja de Genebra tentando ganhá-la de volta para Roma. Também em 1539. reformadores de Estrasburgo. Duffield (Grand Rapids: Eerdmans. ed. lohannes Calvini Commentarius in Epistolam Pauli ad Romanos (Leiden: E. no final. Hagenau e W orms como um tipo de conselheiro das delegações protestantes em tais conferências interconfessionais. Jean Cadier. Numa delas. Um foi a resposta ao Cardeal Jacopo Sadoleto. exceto Apocalipse e 2 e 3 João. tentaram desesperadamente emendar o cismã~êntre os protestantes da Alemanha e os da Suíça. Calvino era um estadista da igreja. 1986). já que o Concílio de Trento não havia sido convocado nem as selvagens guerras religiosas tinham mostrado suas baixas. . J. H. A Réplica a Sadoleto de Calvino é um tour de force literário. para Calvino. uma abordagem magistral do que para ele. ele publicou comentários sobre a maioria dos livros do Antigo Testamento e acerca de cada livro do Novo Testamento. Ele lamentava o caráter fragmentado da cristandade: “Entre os maiores males de nosso século deve ser contado o fato de que as igrejas encontram-se tão divididas entre si e de que mal há um relacionamento humano entre nós” .35 Calvino não estava disposto a comprometer pontos essenciais em favor de uma paz 34A mais recente edição crítica do Comentário sobre Romanos foi publicada por T. Calvino esteve envolvido em muitas dessas discussões. H. Calvino publicou seu Comentário sobre Romanos. Clark. era o mais importante livro da Bíblia. Calvin’s New Testament Commentaries (Londres: SCM Press. Ele viajou para Frankfurt. E. ainda assim ele seria reverenciado hoje como um dos maiores teólogos e um dos mais hábeis escritores entre os reformadores. “Calvin and the Union of the Churches”. 1981). não menos do que para Lutero. Veja também T. A verdadeira importância desses encontros. 1971) e Calvin’s Old Testament Commentaries (Edimburgo: T. G. 118-130. 1966). Esse foi o primeiro dos comentários bíblicos de Calvino. pp. Numa carta a Farei. se é econômica. edição original. Mas também não foi o acordo estóico e sem relações sexuais muitas vezes retratado pelos detratores de Calvino.38 Quando a própria Idelette faleceu. p. teria sido minha companheira voluntária não só no exílio e na aflição. mas até na m orte” . ou melhor.36 Como observou uma de minhas alunas. em Estrasburgo Calvino tornou-se um marido. se há esperanças de que venha a interessar-se por minha saúde. a viúva de um anabatista francês convertida à fé reform ada pelo próprio Calvino. nem muito atraente nem muito desdenhosa. foi uma surpresa ele ter encontrado uma esposa! De fato. Obtemos um vislumbre da dor de Calvino numa carta que escreveu a -sen amigo Pierre Vi ml: “Certamente. 1858). se ela é casta. na morte de nosso filho amado o Senhor afligiu-nos com uma profunda e dolorosa ferida. Uma das pretendentes não falava nada de francês. [. Vin. Visto que Calvino não sabia alemão. Idelette de Bure. 1972. um menino de nome Jacques. Em quinto lugar. I. 230. p.. que realizou o casamento. ed. p. 285. VI. Citado parcialmente em Stauffer..39 Calvino viveu por mais 15 anos após a 36Jules Bonnet. que nasceu prematuramente e morreu quando ainda bebê. Idelette deu a Calvino apenas um filho. muito disso está oculto por trás do véu da reticência. 45. a qual. ao ver pela primeira vez uma bela figura.falsa. 141. Correspondence des Réformateurs dans les pays de langue française (Genebra e Paris: 1866-1897). 37A. se é paciente. aceita todos os defeitos de sua amada. o casamenteiro entre os reformadores. tentou várias vezes conseguir uma noiva adequada para o jovem pastor. Letters o f John Calvin (Nova Iorque: Burt Franklin. Sem dúvida Calvino era um bom partido na cidade.. p.. mais uma vez. como uma mulher “íntegra e honesta” e “até bonita” . Eis a única beleza que me seduz. ele desposou uma de suas próprias paroquianas.] A razão de minha tristeza não é comum. Ela foi descrita por Farei. Calvino novamente escreveu para Viret: “Você conhece a ternura. nem mesmo talvez uma satisfação jovial como o de Lutero e Katie. L. Calvino descreveu o que ele realmente desejava numa esposa: Eu não sou do tipo selvagem de amante que. se alguma desventura tivesse ocorrido.. "Ibid. concluiu-se que haveria um problema de comunicação. ed. Mas ele é nosso Pai: ele sabe o que é melhor para seus filhos” .37 Gostaríamos de saber mais acerca da vida familiar no lar de Calvino. col. Fui privado de minha excelente companhia na vida. Herminjard. contudo. Bucer. 109. com esse tipo de receita. . mas ele tentou chamar a igreja de volta à verdadeira base de sua unidade em Jesus Cristo. 39CO 13. a doçura de minha alma. Podemos supor que o relacionamento entre Calvino e Idelette não foi um ardoroso caso de amor como o de Abelardo e Heloísa. em 1549. irmão de Calvino.41 Mas não foi precisamente isso o que Jesus prometera a seus seguidores — uma cruz? O consenso entre os amigos de Calvino era de que ele deveria retornar. Ainda assim. 1909). onde as coisas tinham ido de mal a pior. lxxv. Parker. e lançando um inflamado sermão do tipo “eu-os-avisei” à assembléia 40T. O outro ato de Calvino também foi de importância decisiva. educação. . Tracts and Treatises. Mohr. não devemos imaginar que mesmo então sua vida ficou livre dos tumultos e aborrecimentos da vida doméstica diária. 41Herminjard. Além disso. Zucht. Calvin: A Portrait (Londres: SCM. Bucer levantou o tema do julgamento divino: se você se recusar a retomar seu ministério. ele contestou. assegurar sua execução. “aquela cruz na qual eu tinha de m orrer mil vezes a cada dia” . “sem dúvida as mulheres protegiam ele e as crianças uns dos outros” . No primeiro domingo após seu retorno. mas ele passou o resto de sua carreira tentando. doutor (professor). Jugendunterricht und soziale Fürsorge” . 12: “Wenn Calvin die vier Aemter der Pastoren. 1954). Calvino reentrou em Genebra em 13 de setembro de 1541. 42Assim Beza relatou em seu “Life of Calvin”. ancião e diácono. I. C. sendo que da prim eira ele se divorciou por causa de seu adultério com um servo — juntamente com vários outros amigos e parentes. que tentou fugir de Deus!42 Totalmente persuadido a voltar. ele subiu ao púlpito da Catedral de São Pedro. estará agindo como Jonas. Como um dos biógrafos sabiamente observou. contudo. que esperavam ouvir um Calvino exultante açoitando seus oponentes. mas contra um contexto tumultuado” . pp. Antonie. p. 199. é sensato perceber que as Instituías e os comentários de Calvino e seus muitos tratados e sermões não foram “escritos numa torre de marfim. Estas Ordenanças Eclesiásticas exigiam o estabelecimento dos quatro ofícios de pastor. L. A grande catedral gótica estava abarrotada de genebreses curiosos. die er für konstitutiv hielt: Lehre. Idelette deixou duas crianças de seu primeiro casamento. B. VI. em Genebra.43 O conselho aprovou o plano de Calvino. a casa de Calvino esteve cheia de crianças pequenas. Johannes Calvin (Tübingen: J. Um foi apresentar ao conselho da cidade um plano detalhado para a ordem e o governo da igreja. 72. partilhavam da modesta m oradia do reformador no número onze da Rue des Chanoines.morte de Idelette. p. 325-326. 43Karl Holl. Diakonen aus dem Neuen Testament übernahm. e sua família — ele tinha oito filhos de duas esposas. Na m aior parte de sua vida. os quais o haviam tirado da cidade. so fand er in ihnen zugleich die Frunktionen der Kirche ausgedrückt. O restante de sua carreira como reformador foi simbolizado pelos dois atos oficiais que ele realizou ao retornar. H. Calvino preferia a feliz situação em Estrasburgo ao perigoso “abismo e redemoinho” que ele havia deixado três anos antes. Lehrer. nunca com sucesso absoluto. que correspondiam a doutrina. Desta vez.40 Quando o povo de Genebra implorou a Calvino que voltasse à igreja deles. a quem Calvino continuou a propiciar um cuidado solícito. disciplina e serviço social. Aeltesten. p. conforme prometera à esposa em seu leito de morte. Esta passagem encontra-se no prefácio à edição francesa de 1560:Jean Calvin. com formato de aproximadamente 18 x 10 cm. xxxiii. com margens largas para as notas dos leitores.44 Nada poderia ter sido menos impressivo ou mais eficaz. As Institutas. 1955). A edição de Estrasburgo. continuei com a exposição de onde havia parado — com o que mostrei que havia interrompido meu ofício de pregador durante algum tempo. 5. Calvino simplesmente começou de onde tinha parado três anos antes. mas um testemunho responsável da Palavra de Deus. publicada em 1539. Calvino contou o que fez: “Depois de um prefácio.es do texto latino (1536. . no mesmo capítulo e versículo do livro da Bíblia (não sabemos qual era. ele produziu oito edicõ. ^ “John Calvin to the Reader”. 45“Subject Matter of the Present Work”. Jean Cadier. revisar e reorganizar as Instituías por toda sua vida. 3. p. 1545. contudo. 45. p. em Calvin: Institutes o f the Christian Religion. 1560). Calvino demonstrou que ele pretendia que sua vida e sua teologia não fossem um recurso de sua própria criação. 1545. 1553. Numa carta a Farei. aproximadamente igual em '“CO 3. Dessa forma. jam ais me satisfiz até que veio [ela] a ser arranjada nesta ordem que ora se propõe” . OS 3. e não que tinha desistido dele inteiramente” . L 'Institution Chretiene. foi significativamente ampliada para 346 páginas. eds. 1550. Calvino como Teólogo Os Escritos de Calvino Qualquer pessoa que deseje fazer um estudo completo da teologia de Calvino tem de consultar ao menos seis fontes distintas dentro de seu imenso corpus literário. Institutes. (Filadélfia: Westminster Press. Calvino continuou a ampliar. excetoquando registrado de outra forma. John T. 1960). 1543. Todas as outras citações das Instituías seguirão a tradução de McNeill-Battles. Freqüentemente se pensa em Calvino como um “homem de um só livro” . p.45 Já mencionamos a origem e o rápido sucesso desse trabalho. Também já esboçamos os seis capítulos da edição de 1536. ed. 1539. (Genebra: Labor et Fides. É possível — e tentador — limitar a investigação da teologia de Calvino àquele volume que ele esperava que fosse “uma chave abrindo caminho para todos os filhos de Deus num entendimento bom e correto das Escrituras Sagradas” . porém. Ao todo. 1559) e cinco traduções para o francês (1541. xix. p. 1553. nem isso importa) que estava pregando.46 As Insíiíuías de 1559 é uma obra imensa.inteira. não deplorava o labor então dispendido. 1551. que continha 520 páginas in-oitava. de 33 x 20 cm de tamanho. McNeill e Ford Lewis Battles. 1554. Não foi até a edição definitiva de 1559 que Calvino ficou satisfeito com a estrutura de sua magnum opus: “Se. p. que em geral seguem o padrão do Credo dos Apóstolos.erndito clássico. Calvino reportava os leitores a seus comentários bíblicos. Como complemento às Instituías. Sacerdote.tamanho ao Antigo Testamento mais os evangelhos sinóticos. m ostrar ao leitor “o que ele deveria buscar em especial nas Escrituras e a que fim deveria relacionar seu conteúdo” . que modificou diversos princípios da teologia de Calvino. Cometemos um erro se consideramos as Instituías uma teologia sistemática no sentido moderno desse termo. pois Calvino “é incomparável . Da mesma forma. Com base nesses comentários. Joseph Scalinger. Seus Benefícios e Efeitos — fé e regeneração — arrependimento — vida cristã — justificação — predestinação — a ressurreição final Volume IV: Os Meios Externos pelos quais Deus Convida-nos à Sociedade de Cristo — igreja — sacramentos — governo civil Comentários. Jacobus Arminius. Está organizada em quatro volumes. o Redentor — a queda. Rei) e obra (expiação) Volume m: O Modo pelo qual Recebemos a Graça de Cristo. o prande. o Criador — o conhecimento duplo de Deus — Escrituras — Trindade — Criação — providência Volume li: O Conhecimento de Deus. proclamou Calvino^ como “a maior inteligência que o mundo já conheceu desde os apóstolos” . A obra pretendia servir como guia para o estudo da Bíblia. Podemos ilustrar assim a forma final das Instituías: Volume I: O Conhecimento de Deus. recomendava os comentários junto à Bíblia. a pecaminosidade humana — a Lei — o Antigo e o Novo Testamento — Cristo. o Mediador: sua Pessoa (Profeta. 47 Recorrendo a seu excelente conhecimento de grego e hebraico e a seu treinamento profundo na filosofia humanista. 31n. Seus sermões eram anotados à mão por diversos fiéis franceses refugiados. usando as palavras de Agostinho. “é como se Deus em pessoa falasse. evitando demonstrações profusas de erudição e digressões a assuntos secundários. Calvino pregava duas vezes aos domingos e uma vez por dia em semanas alternadas. Jeremias. Todo o trabalho exegético de Calvino é marcado por um lado pela brevidade e. Miquéias. col.na interpretação das Escrituras” . 49Terceiro sermão de Calvino sobre Jacó e Esaú. “Quando o evangelho é pregado em nome de Deus” . praestat intactum relinquere” . pela modéstia. mas outros permanecem na forma manuscrita até hoje. Salmos. Seu objetivo era penetrar na mente do autor tão concisa e claramente quanto possível. mais tarde o bibliotecário conseguiu recuperar 13 volumes do conjunto original.48 “ Sermões. 36. Isaías. Leith. . Hunter. Felizmente. no qual havia sermões sobre Gênesis. 20. p. caminhava diretamente de seu quarto de estudos ao púlpito da Catedral de São Pedro. Os comentários de Calvino e seus sermões-conferências sobre o Antigo Testamento preenchem 45 volumes na tradução inglesa do século xix. Calvino foi um pregador mestre numa época em que o púlpito era o principal meio de comunicação para uma cultura inteira.”49 Seguindo o padrão que Zuínglio instituíra em Zurique. Calvino produziu comentários sobre todo o Novo Testamento. Ele também não hesitava em dizer que não entendia algumas passagens da Bíblia. Atos e 1 Coríntios. um reconhecimento franco de suas próprias limitações ante o mistério das Escrituras.50 Folhetos e tratados. Certa vez. p. 1950). tendo imergido a si mesmo no texto do dia. publicaram-se 872 sermões na edição Corpus Reformatorum dos escritos de Calvino (CO). Salmos e Isaías. Calvin Studies II: Presented at a Colloquium on Calvin Studies at Davidson College (janeiro de 1984). 50Até agora. M. a respeito da implicação de Atos 1 para a segunda vinda de Cristo. ele declarou: “É melhor deixar intocado o que eu não consigo explicar” . The Teaching o f Calvin (Londres: James Clarke. CO 48. sobre o Pentateuco. Cf. dizia Calvino. 62. Seu método era pregar sobre o Novo Testamento aos domingos e sobre o Antigo Testamento nos dias úteis. Alguns sermões foram publicados durante a vida de Calvino. No ano de 1805. o bibliotecário vendeu todos esses livros. exceto 2 e 3 João e Apocalipse. Calvino em geral pregava continuamente através dos livros da Bíblia. Quarenta e quatro volumes de sermões in-fólio foram guardados na Bibliothèque publique et universitaire de Genebra. Ele não seguia um manuscrito. Josué. p. por outro. Ezequiel. Os próprios manuscritos dos sermões passaram por uma curiosa experiência. Calvino disse 47Citado de A. “Calvin’s Doctrine of the Proclamation of the word and Its Significance for Today in the Light of Recent Research” . Mateus. Por exemplo. 48CNTC 6. foram editados cinco volumes dos sermões de Calvino na série Supplements Calviniana. mas. 14: “quod tamen explicare nequeo. à exceção de um — por peso! — visto que não foram escritos com a caligrafia de Calvino e eram muito difíceis de decifrar. publicada pela Sociedade de Tradução Calvinista. só agora estão sendo editados criticamente e publicados. John H. tarefa que estendeu a Genebra quando retornou. Já o vimos versificando salmos em francês para sua igreja em Estrasburgo. dos comentários e dos sermões. 1543. preenche quatro longos volumes. em escrevendo” . da Inglaterra. da Polônia. e aprendem. Almirante de Coligny. faremos uso desses seis gêneros de literatura. Além das Instituías. Cartas. 7. O alcance internacional da teologia de Calvino e a extensão de sua influência pessoal podem ser captados apenas observando suas cartas. Melanchthon. Calvino escreveu mais do que a maioria das pessoas é capaz de ler. et scribendo proficiunt”. Não mediu esforços para elaborar uma confissão de fé e um catecismo adequados para complementar a obra A Forma das Orações (1542). Instituías. 47. será dirigida às Instituías e aos comentários bíblicos. a reis e príncipes (Eduardo vi e Lady Jane Grey. A abrangência de sua correspondência é incrível. Contra os Libertinos. escrevem. p. como os reformadores radicais (Psychopannychia. Uma edição altamente seletiva de suas cartas. como A Necessidade da Reforma da Igreja (1544). . Outros são abordagens mais gerais sobre temas reformados. Ele estava extremamente consciente de que a única forma de recuperar a vida moral e religiosa do povo era instruindo-o na “escola da fé” . a pastores. 51“John Calvin to the Reader”. 1534. “Ego ex eorum numero me esse profiteor qui scribunt proficiendo. As cartas de Calvino revelam-no como teólogo contextuai tão atento às correntes políticas e sociais de sua época quanto a assuntos religiosos específicos. 1545). p. Bullinger). A maior parte de nossa atenção.a respeito de si mesmo: “Eu do número daqueles me professo ser que. Viret. OS 3. os católicos romanos (Um Inventário de Relíquias. a igrejas perseguidas e a protestantes presos. Calvino foi um correspondente prolífico. compiladas por Jules Bonnet. Escreveu para seus colegas refor­ madores (Farei. Em nossa abordagem dos temas-chave na teologia de Calvino. da França). Sigismundo Augusto. Acima de tudo. Pequeno Tratado sobre a Ceia do Senhor (1541) e o Tratado sobre a Predestinação Eterna de Deus (1552). em aprendendo.51 Durante sua vida. Escritos litúrgicos e catequéticos. Duquesa Renée de Ferrara. Heshusius). Calvino era um pastor. vendedores ambulantes de livros religiosos e mártires à espera da sentença. talvez. ele escreveu numerosos folhetos e tratados que lançaram uma luz considerável sobre o desenvolvimento de suas idéias. Antídoto para o Concílio de Trento. 1547) e os luteranos (Westphal. Alguns desses escritos eram dirigidos contra oponentes teológicos. entretanto. e ao outro origina” . mas também se revelara nas maravilhas da 52Institutas. aponta para a centralidade da revelação no pensamento de Calvino.A Perspectiva de Calvino “Negócios com D eus". “todavia. IV. 1984). é impossível para os seres humanos penetrar na essência de Deus. ele falava do conhecimento de Deus como Criador. que. em vez de seu “ser” ou “essência” . I. 135-148. I. Não é como se alguém pudesse obter um conhecimento completo de si. e do conhecimento de Deus como Redentor. e então se transferir para uma escola de teologia a fim de buscar o conhecimento de Deus. .” Assim Calvino abria o primeiro capítulo das Institutos. permanece. consta de duas partes: do conhecimento de Deus e [do conhecimento] de nós [mesmos]. mesmo a ponto de negar a própria existência de Deus. “o sentido da divindade” .. com um grau de doutorado em psicologia. Intimamente. manifesto na criação do universo. Em cada passo do caminho e em cada área da vida. Não há um conhecimento próprio de Deus que não envolva o autoconhecimento. essa semente que. O fato de que ele escolheu falar do “conhecimento” de Deus. 1. De acordo com Calvino. 4). De fato. e mesmo isso somente uma vez que Deus escolheu revelar-se primeiro. Ainda assim. ele não estava referindo-se à constante dualidade do encontro divinohumano. Ambos são simultaneamente verdadeiros. precede ao outro. Calvino acreditava que Deus não apenas colocara uma percepção inata de si mesmo dentro de todas as pessoas. de fato. independentemente de quanto alguém possa afastar-se de Deus. o conhecimento de Deus ou o de nós mesmos? Calvino reconheceu que não podemos discernir facilmente “qual. talvez. entretanto. Mas que vem antes. Wilhelm Neuser (Frankfurt: Peter Lang. Podemos apenas saber “de que tipo Deus é ” (qualis Deus sit). “A soma quase toda de nosso conhecimento. de modo nenhum. Ninguém está isento de fazer “negócios com D eus” (negotium cum Deo). Calvinus Ecclesiae Genevensis Custos. Entretanto. [como] verdadeiro e sólido conhecimento se deva julgar. II. dentro de cada pessoa. descobrir “o que Deus é ” (quid Deus sit) em si e de si mesmo.52 Todo ser humano é essencialmente uma criatura religiosa. ed. A. Deus fixou uma percepção dele. Calvino chamava essa percepção de “a semente da religião” . se nos depara uma aparente contradição: o conhecimento de nós mesmos leva-nos a olhar para Deus. Antes. pp. ninguém pode saber quem é realmente sem primeiro considerar a face de Deus. E. “o rem orso” . enquanto isso pressupõe que já o tenhamos contemplado. Dowey declarou que essa construção fornece um modelo para o entendimento da teologia de Calvino por completo: “The Structure of Calvin’s Thought as Influenced by the Two-fold Knowledge of God”. Não estamos lidando com dois níveis de conhecimento. se pode de todo erradicar” (Inst . visto apenas na face de C risto. quando Calvino falava do conhecimento duplo de Deus (duplex cognitio dei). o universo era “um tipo de espelho no qual podemos contemplar a Deus. Se a queda nunca tivesse ocorrido.. Tudo isso é um comentário do famoso dito de Agostinho no princípio de suas Confissões: “Oh. Calvino definiu a piedade como aquela “reverência associada com o amor de Deus que o conhecimento de Seus benefícios [nos] faculta” (Inst. Não havia algo como um conhecimento objetivo e desinteressado de Deus. 1). destarte. Perdidos no labirinto. Com base no que dissemos até agora. O conhecimento de Deus revelado na natureza exigia uma inevitável resposta humana. O conhecimento de Deus determinava existência humana. o objetivo final da piedade não era a salvação do indivíduo. n. era um “teatro deslumbrante” no qual a glória de Deus brilhava (Inst. Por um lado. mudando a metáfora. Num trecho surpreendente. de modo algum possam de si conduzir ao reto caminho [. 8). I.. poder-se-ia concluir que Calvino expunha uma teologia puramente natural. Calvino asseverou que “mesmo se não houvesse inferno” a pessoa verdadeiramente piedosa estremeceria só de pensar em ofender a glória de Deus. as quais de todos os lados nos cercam de sua efulgência em moldes tais que. nos resplendem na obra da criação do mundo tantas lâmpadas acesas para enaltecer a glória do Autor. I. ele aceitava que a ordem da natureza teria levado a uma compreensão correta de Deus — “se Adão se houvesse conservado íntegro” (Inst. que no mundo reta piedade nenhuma subsista” (Inst. Tu nos fizeste para Ti mesmo. e nossos corações não descansam até encontrar repouso em T i” . Devido ao pecado. Em vão. 1). Como estudante dos clássicos.. para Calvino. Ele via Deus como um Trabalhador (Opifex) que havia exposto “evidências inumeráveis” e “inconfundíveis marcas de Sua glória” na execução inteira do universo (Inst. O conhecimento de Deus no domínio natural tinha apenas uma função negativa — tornar os humanos inescusáveis de sua idolatria. I. quanto aos justos a mercê da vida eterna” (Inst..] não ir ela além de que se façam [eles (os homens)] inexcusáveis [j / c] (Inst. assim. Ainda assim. rv. pois.. teria sido possível mover-se dos vestígios da presença de Deus no íntimo e no mundo para uma relação apropriada com o Criador. I. l. . A “semente da religião” iria forçosamente produzir uma resposta dentre duas: piedade ou idolatria. nenhuma reação neutra era possível.. . 1). Ou. não obstante. Calvino teria conhecido a . II. Deus. “Resulta. Uma das imagens favoritas de Calvino para a alienação humana em relação a Deus era o labirinto. que de outra forma é invisível” . 14). i.criação externa.. 1). porém . v . A idolatria era a substituição do único Deus verdadeiro por divindades em forma de criaturas. 2). n. v . i... essa foi uma possibilidade irrealizável. Pois a mente piedosa “compreende não menos à glória pertencer-Lhe que nEle resida a punição aos ímpios e iníquos.] manifestação tal que [. De fato. v. Calvino tomou 5iCalvin: Commentaries. a mente humana era uma verdadeira “fábrica de ídolos” que manufaturava um deus falso após outro.”54 Assim. 55Ibid„ p. pp. 132. The Knowledge o f God in Calvin's Theology (Nova Iorque: Columbia University Press. MIbid. 5tComm. começou a exaltar a si mesmo. 196. que entrou no labirinto de Cnossos. p. a cada um a mente dir-se-lhe-á um labirinto. para Calvino.51 “Deus não pode ser compreendido por nós” . descendo até nós por meio da Palavra. 1 Co 2.56 Para descrever o processo da revelação. A. a revelação era o resultado de uma decisão livre de Deus. Ainda assim. de sorte que não é de admirar que nações. contra seu Criador e Autor de tudo o que é excelente nele.7: CO 49.. Veja também E. Todo conhecimento verdadeiro de Deus derivava de um fato: Deus.lenda grega de Teseu. p. 58. Ninguém compeliu Deus a revelar-se. . começou incontinentemente a esquecer e compreender de maneira errada a fonte de seu bem. senão que os seres humanos. 131. querendo ele mesmo ser alguém. De fato. i. E nem [ízc ] apenas isto. A humanidade estava completamente perdida num labirinto. ela fora completamente estragada e desfigurada. 12). dignara-se revelar a si mesmo. hajam sido arrastadas a múltiplas falsidades. Ora. uma a uma. pp. Calvino usou a palavra adaptação (attemperatio). matou o M inotauro e encontrou a saída por meio de uma corda que Ariadne lhe dera.58 Além disso. posto que a imagem prim itiva de Deus permanecia no humano. 337. Dowey. v. Joseph Haroutunian (Londres: SCM Press. 1958). disse Calvino. assim como ele não foi levado a criar o universo. “God Was Accommodating Himself to Human Capacity”. p. in: Interpretation 31 (1977). ele decidiu cobrir “a enorme distância entre nós e sua glória celestial” .59 Provavelmente. 4: CO 40. “a razão natural nunca poderia guiar os homens a C risto” . quase que um a um. Ez 9. têm tido seus próprios deuses (Inst.53 “O pobre homem. 57A melhor abordagem desse tema em Calvino é Ford L. em sua grande misericórdia. col. Mesmo se ele tivesse deixado a humanidade vagar sem rumo no labirinto do pecado. Deus teria permanecido justo. “Todos os labirintos de erro no m undo” vinham dessa fonte comum.3. “a não ser à medida que se ajusta a nosso padrão” . 53-54. 131.. Deus “adapta-se à nossa capacidade ao comunicar-se conosco” . 19-38.55 Revelação adaptada. por um ato de ultrajante ingratidão. Em sua condição decaída. Battles. pp. a partir de sua bondade soberana. ed. 1952). S9Comm. *lbid. 3-18.. e. Daqui esse imenso atascadeiro de erros de que se encheu e cobriu o orbe todo. col. CNTC 9. É importante reconhecer que. em orgulho. I. p. mas sim lançá-la adiante. X II. . adaptar. Numa passagem que poderia ter vindo de Francisco de Assis. 90. CNTC 4. cantam de Deus. Podemos aprender um pouco do método teológico de Calvino quando vemos como ele relatou o princípio da adaptação à sua doutrina das Escrituras.61 Calvino também comparou a Bíblia a um par de lentes: ®Commentaries. Somente por esses oracula Dei conseguimos chegar ao conhecimento adequado do Deus Redentor. mesmo que de bem parco entendimento.. a primeira para m ostrar como a Bíblia foi entregue e a segunda para ilustrar sua função na vida cristã. as montanhas o ecoam. pp. “enletrada” nas Escrituras Sagradas e visível e audivelmente mostrada no ministério dos sacramentos e na pregação.o princípio da adaptação da tradição da retórica clássica. Deus foi comparado a uma babá envolvida em balbucios com crianças! A Bíblia também era uma espécie de balbucio divino. a Palavra manifestou a si mesma nas opera Dei que serviram de “testemunhas e mensageiras da glória de D eus” . Isso também foi o que Deus fez ao tornar a Si mesmo conhecido. formas de expressão que tais não exprimem. Mesmo assim. quanto Lhe acomodam o conhecimento àpaucidade da compreensão nossa (Inst. não percebe que Deus assim conosco fala como que a balbuciar. de maneira clara e precisa. o efeito salvífico das obras de Deus na natureza foi nulo: elas podiam apenas deixar as pessoas sem desculpa ante o tribunal de julgamento. comunicar sua vontade a nós. p. Para cumprir isso. O primeiro movimento no processo de revelação era a decisão livre de Deus de não manter sua Palavra “calada em seu peito” . Aqui. os elementos o temem. a Palavra. Pois quem. adaptando-se à nossa pecaminosidade humana. Calvino exultou nessa “revelação natural” : “Pois os pequenos pássaros que cantam. A revelação adaptada de Deus continha dois movimentos. Calvino usou duas imagens para descrever a Bíblia. 60. 61Ibid. não devemos ficar ofendidos. como já vimos. que ele estudara como humanista. tornou-se corpo na encarnação.. por causa da pecaminosidade humana. tanto quê [ii'c] Deus seja. mas sim agradecidos. visto que é apenas por tal concessão que podemos conhecê-lo de verdade. 70-71. Quando vemos “Deus balbuciando conosco num estilo inculto e vulgar” . como as amas costumam [fazer] com as crianças? Por isso. Deus desejou “tornar-se próximo e familiar a nós” .60 Entretanto. os animais clamam por ele. Na ordem criada. O objetivo preciso da retórica era ajustar. as fontes e as águas correntes lançam seus olhares para ele e a relva e as flores sorriem perante ele” . conciliar ou encaixar certa linguagem de maneira que fosse apropriada para os ouvintes pretendidos. 1 ) . como Calvino havia dito. Cada elemento dessa definição requer um melhor desenvolvimento.Inst. já que sua fonte está nele e não há nada de origem humana misturado a elas. Podemos expressá-los sob o aspecto de um aviso positivo e negativo. mas são ditados pelo Espírito Santo. 1). que é absolutamente bastante (i.16: \ Todos os que desejam beneficiar-se das Escrituras devem primeiro aceitar isso como princípio determinado. mal poderão. começarão a ler de forma distinta. órgãos. que a lei e os profetas não são ensinamentos transmitidos pelo prazer dos homens ou produzidos pelas mentes humanas como sua fonte. 141: “Illi fuerunt certi et authentici Spiritus sancti amanuenses: et ideo eorum scripta pro Dei oraculis habenda sunt”. Seus escritores foram instrumentos. normativa. Assim a Escritura.. dissipada a escuridão. mas se fixar estritamente nas coisas que podemos saber com legitimidade. e quantos quer que sofram de visão embaçada. De forma positiva. balbucios e óculos inspirados. pela interposição de lentes.. apontam para dois importantes aspectos do enfoque de Calvino à tarefa especial da teologia. se puseres diante deles até mui vistoso volume. [. CO 52. 6iInstitutas. 9. col. ele afirmou claramente a origem divina da Bíblia. ou seja. coletando-nos na mente conhecimento de Deus de outra sorte confuso. Essas duas diferentes imagens da Bíblia. a teologia verdadeira é uma reflexão reverente sobre a revelação de Deus na Bíblia. p. cujos elementos essenciais podemos resumir numa frase: a Bíblia é a Palavra de Deus inspirada e revelada em linguagem humana e confirmada ao cristão pelo testemunho interior do Espírito Santo. IV . OS 5. O prim eiro princípio expõe-nos a doutrina das Sagradas Escrituras defendida por Calvino.63 Se a Bíblia era um tipo de “balbucio” .. Entretanto. . então Deus é o Balbuciador.] Devemos às Escrituras a mesma reverência que devemos a Deus.e. Exploremos ainda mais cada um desses princípios. I. isto é. v i i i .. De forma negativa. 383: “Hoc prius etmembrum: eandem scripturae reverentiam deberi quam Deo deferimus. ajuntar duas palavras. p.Exatamente como [se dá com] pessoas idosas. vi. nec quidquam humani habet admistum” . a teologia não deve vaguear em “vãs especulações” . 330. quia ab eo solo manavit. para a crença e a conduta). contudo. amanuenses do Espírito Santo. A Bíblia foi comparada a lentes divinas para os espiritualmente míopes. 1) A Bíblia é a Palavra inspirada de Deus.62 Calvino acreditava que a Bíblia era a “escola do Espírito Santo” . Calvino não gastou muito tempo tentando explicar precisamente como as Escrituras foram inspiradas. como em seu Comentário sobre 2 Timóteo 3. Era fácil “ CNTC 10. ajudadas. ainda que reconheçam ser algo escrito. ou enfermas dos olhos. mostra-nos em diáfana clareza o Deus verdadeiro (. porém. aos dados da revelação nas Escrituras. respiram um quê divino” (Inst. mesmo considerando ambos os textos canônicos. Holy Scripture (Grand Rapids: Eerdmans. 2-3. 65CNTC 5. Outro exemplo da exegese de Calvino também demonstra seu respeito pelo caráter humano das Escrituras.66 Calvino retratou Marcos como autor genuinamente humano. 1975). a última por razões estilísticas. 458: “Scimus enim ut se ad communem loquendi modum accommodet Deus ruditatis nostrae causa. às vezes. é a Palavra de Deus que “nos há defluído da propríssim a [í í c ] boca de Deus. vil. nem pom poso” (Inst. mas nunca perdeu de vista a humanidade e as personalidades distintas dos escritores evangélicos.64 Calvino explicou que “Deus adapta-se a nosso modo comum de falar por causa de nossa ignorância e. até gagueja” . CO 47. tais como o número de mulheres no túmulo vazio. Isso tudo faz parte do que G. Para usar as palavras exatas de Calvino.14. I. Sendo um humanista bem treinado. Eu os concilio dizendo que. Ele duvidava tanto da autoria paulina de Hebreus quanto da autoria de 2 Pedro por parte de Pedro. Em seu comentário de Atos 7. C. quando ele percebeu não haver falado da purificação do templo.perceber que as Escrituras. que Jesus presenciou a cena e coloca a expulsão real no dia seguinte. i. 2) A Bíblia é a Palavra de Deus revelada em linguagem humana. compondo uma narrativa. 195-212. pp. imo interdum quodammodo balbutiat”. 226. Berkouwer. Berkouwer chamou de ”a forma-serva das Escrituras Sagradas” . “que em tão ampla escala superam a todos os dotes e graças da humana indústria. ele concluiu. Marcos foi extraordinariamente inspirado pelo Espírito Santo ao longo desse processo. às vezes usa na Bíblia tanto a “eloqüência” quanto “um estilo não burilado. Calvino lidava com o texto de forma ao mesmo tempo reverente e crítica. p. mas não como um tipo de computador programado ou máquina de escrever automática. os cristãos descobrem exatamente as palavras da própria vida. ele abordou a contradição entre Estêvão e Moisés sobre o número exato de israelitas que MG. no “ensino rude e humilde do evangelho” . vm . col. colocou-a mais tarde. 1). Marcos satisfaz-se em dizer. O Espírito Santo. logo que Cristo entrou na cidade e no templo. Calvino reconhecia os diversos estilos literários encontrados na Bíblia. vm . . C. Na harmonia dos evangelhos sinóticos expressa por Calvino. “ CNTC 3. Ele lidava abertamente com as diferentes seqüências de tempo dadas para a purificação do templo: Mateus e Lucas declaram que. 5). Com certeza. por assim dizer. 2).. selecionando o material. “fora de lugar” . fora de lugar. . recordando uma “omissão” e depois inserindo-a em seu texto.. então. ele geralmente tentava conciliar discrepâncias aparentes. ele expulsou os que vendiam e compravam. mediante o ministério de hom ens” (Inst. I. pp.65 Ainda assim. “esse não é um assunto tão importante para que Lucas confundisse os gentios sobre isso. pp.27 traz apenas 70. Calvino dizia que. mas ao longo do processo de transmissão textual. in: Church History 28 (1959). Quanto ao texto de Atos 7.16. . quando eles estavam acostumados ao texto grego” . “Portanto. no mesmo contexto. Robert Godfrey. enquanto alguns exigiam “provas racionais” de que Moisés e os profetas eram inspirados. Duas recentes contribuições são: Jack Rogers e Donald McKim. Estêvão disse que foram 75. Gerrish. 181-182. Woodbridge aponta diversos pontos fracos no livro de Rogers e McKim. esse versículo deve ser corrigido de acordo!”67 Calvino mostrou uma liberdade impressionante em lidar com o texto das Escrituras. “Biblical Authority in the Sixteenth and Seventeeth Centuries: A Question of Transition”. O propósito da história é m ostrar o poder de Deus em formar um grande povo a partir de um grupo tão pequeno. 3) A Bíblia é confirmada ao cristão pelo testemunho interior do Espírito Santo. Pouco depois. 89-119. Biblical Authority: A Critique o f the Rogers/McKim Proposal (Grand Rapids: Zondervan. pela qual o número se altera” . in: Scripture and Truth. pp. “Biblical Authority and the Continental Reformation”. Dois estudos mais antigos dignos de nota são: Brian A. “The Significance of the Word of God for Calvin”. mas Gênesis 46. Calvino assinalou ser “óbvio que um erro foi cometido” ao trocar o nome de Jacó pelo de Abraão (At 7.acompanharam Jacó ao Egito. McNeill. 1979). Como alguém poderia saber que a Bíblia era a Palavra de Deus? Tal segurança só poderia existir se o mesmo Espírito Santo que inspirou os profetas e apóstolos estivesse presente para iluminar a mente da pessoa e confirmar dentro dela a verdade que fora revelada.16). pp. Depois de examinar várias soluções possíveis. Calvino concluiu que o erro provavelmente surgiu com o engano de um copista ao ler o texto da Septuaginta. já que. 56-67. precisamente porque tinha confiança implícita tanto na autoridade delas como um oráculo inspirado por Deus quanto na capacidade que tinham de cumprir seu propósito — “manifestar a Cristo” (Inst. I. John Woodbridge. “M as” . pp. The Authority and Interpretation of the Bible (São Francisco: Harper and Row. 1983). 67CNTC 6. A. Existe vasta e em geral não-edificante produção literária sobre a doutrina das Escrituras conforme apresentada por Calvino. . “É mais adequado que ponderemos sobre esse milagre que o Espírito nos confia do que ficar perturbados e ansiosos sobre uma única letra. conforme Calvino ressaltou. 131-146. 337-360. (Grand Rapids: Zondervan. pp. in: Scottish Journal o f Theology 10 (1957). mas ele é culpado da mesma defesa em especial que considera tão ofensiva em seus oponentes. Teria sido um erro fácil de ser cometido. eds. 1982). veja W. Calvino continua. Como sabemos que a Bíblia é a Palavra de Deus? Para Calvino. IX. D. Godfrey assinala que Calvino não atribuiu o “erro” desse texto ao autor bíblico. John T. não havia nenhuma plataforma epistemológica independente sobre a qual os cristãos pudessem postar-se e decidir objetivamente a favor ou contra a Bíblia. 3). os números em grego muitas vezes são indicados por letras. Carson e John Woodbridge. é necessário que penetre em nosso coração o mesmo Espírito Que falou pela boca dos Profetas. o testemunho da igreja e dos mártires. nem percepção obtida por pressuposições dogmáticas. Para o cristão. que o testemunho do Espírito é superior a toda razão. uma vez que os fiéis são iluminados pelo Espírito Santo e reconhecem apenas aquilo que Deus deseja em sua Palavra. era o livre dom do próprio Deus. as profecias. e ainda assim o resultado seria particular e deles próprios.68 Calvino. Por um lado. em erro. iluminado pelo Espírito Santo. para proibir qualquer manuseio individual da Bíblia e para “arrogar-se a seus concílios a autoridade imbatível de interpretação das Escrituras” .respondo. [isso] se não pode conhecer” (Inst. não era aptidão adquirida com estudo acadêmico. Eles recorriam às palavra de Pedro. como Lutero. 454. e muitas vezes estavam. os católicos subestimavam o papel do saber. I. vil. Nenhum deles era sem valor para o cristão. afirmava que as Escrituras eram o ventre de onde a igreja nascia. porém . nesse contexto. não obstante. a não ser pela fé. não significava “individual” . mas eram. as Escrituras autenticavam a si “ CNTC 12. comparados com “aquele testemunho principal e mais elevado” . A capacidade de “reconhecer” a Bíblia como Palavra de Deus. Obviamente. assim como só Deus é idônea testemunha de Si [Mesmo] em Sua Palavra. Calvino manteve a unidade da Palavra e do Espírito contra dois erros opostos. . antes. [aqueles] que desejam que se prove aos infiéis que a Escritura é a Palavra de Deus. 13).. também assim a Palavra não logrará fé nos corações humanos antes que seja [neles] selada pelo testemunho interior do Espírito. 2. Calvino deu pouco tempo para as várias provas da autenticidade da Bíblia se demonstrarem. Calvino conhecia muitos indícios da credibilidade da Bíblia: sua enorme antigüidade. V II. concílios. C f WA 3. 4). Ele declarou francamente que procedem “insipientemente. vm . e que todas as mentes dos homens sejam de uma única opinião. M ediante o testemunho interior do Espírito Santo. p. então. os milagres. i. apenas “auxílios secundários para nossa fraqueza” . Calvino argumentava que a palavra “particular” . pois que. 343. porque aqui o sujeito está sendo contrastado com a revelação divina. “nenhuma profecia das Escrituras provém de uma elucidação particular” . no máximo. p. subordinando as Escrituras à igreja. para que [nos] persuada de que [eles] hão proclamado fielmente [o] que [lhes] fora divinamente ordenado (Inst. mesmo os pais da igreja que Calvino freqüentemente citava. Portanto. mas “humanamente elaborada” : Que o mundo inteiro concorde unanimemente. mInstitutas. I. e não vice-versa. todos eles podiam estar. Ora.. havia correlação direta entre os momentos de inspiração e de saber.69 Papas. a fim de capacitar-nos a ver o que de outra forma seria indiscernível. então.mesmas e revelavam sua interpretação adequada ao cristão diligente.. O Espírito Santo não desviava das Escrituras. Deixemos os astrônomos com seu conhecimento mais elevado. com um brilho nos olhos. por meio do recém-inventado telescópio. ix.. respondia Calvino. mas relata as coisas que são observadas em todos os lugares. nesse ínterim. [. estava ocupado criando \ o inferno para aqueles teólogos com mentes curiosas demais (Inst. “são separados por estes biltres [estes dois elementos] que o Profeta uniu por um vínculo inviolável” (Inst. 3). “o menor [luzeiro] para governar a noite” . . estavam tão fascinados pelo Espírito que viam pouca necessidade da Palavra escrita. alguns dos contemporâneos de Calvino. Assim. . ele tinha mais respeito por nós do que pelas estrelas. mas era reconhecido em sua conformidade com elas. Toda a teologia de Calvino foi / ' desenvolvida dentro desses limites: a objetividade da revelação de Deus nas Escrituras Sagradas e o testemunho confirmador e iluminador do Espírito Santo no cristão.. mas também não permitia que estas desviassem o propósito central das Escrituras: Deve-se lembrar que Moisés não fala com perspicácia filosófica sobre mistérios ocultos. Ao comentar Gênesis 1.] A desonestidade daqueles homens é suficientemente repreensível. aqueles que percebem pela lua o esplendor da noite são condenados por seu uso de perversa ingratidão. entre os corpos celestes. a menos que reconheçam a beneficência de Deus. ele vai descobrir que a lua é menor que Saturno. “ .. como ele os chamava. Calvino não negava as descobertas da astronomia. 1)! Aqueles que se “aplicassem de forma dócil” à Palavra de Deus não se perderiam em tais inquirições frívolas. deparou-se a Calvino o fato de que a lua não era a segunda em tamanho. [. A teologia propriamente dita era uma teologia dentro dos limites da revelação apenas. afinal. Calvino estava sempre criticando aqueles teólogos que brincavam com “vãs especulações” . como se tomou um teólogo. “fanáticos” . Por outro lado. 1). que manifesta e patenteia Seu poder. ao censurarem Moisés por não falar com maior exatidão.. i. xiv. . que Saturno é realmente maior que a lua. o Espírito Santo de tal modo Se junge à Sua verdade que expressou nas Escrituras. IX. Um bom exemplo do caráter “oculístico” das Escrituras reflete-se na discussão de Calvino sobre uma descoberta astronômica.. onde se rende à Palavra a devida reverência e dignidade” (Inst.16. já que os astrônomos haviam provado. se comparada ao sol. Sem dúvida. Podemos agora retornar àquela metáfora favorita dos óculos para míopes. mas. i. Essa imagem aponta para a função central das Escrituras: é para nossa edificação. i. Calvino examinou a pergunta do que Deus estava fazendo antes de criar o mundo.] Se o astrônomo indaga a respeito da dimensão real das estrelas.. Porque. pp.70 Calvino entendia que a Bíblia não era um livro-fonte de ciência natural. naqueles que se expõem ao luar. Calvino também seguiu esse modelo. a própria palavra (sacra írinitas) é mencionada apenas duas vezes. p. por John King (Edimburgo: Calvin Translation Society. mas nenhum deles se sentiu compelido a aprim orar esse ensino. xiv. 86-87. ou oferecer uma oportunidade para invenções místicas e conversas tolas. Se um homem tivesse cem vidas.71 Assim. fazer-nos bem ” . trad. com argüir loquazmente. na verdade. 12Commentaries. No início de sua carreira. daí 70João Calvino. Conhecer a Deus era o propósito central do homem. O Deus que Age O Deus Trino Nem Lutero nem Zuínglio dedicaram muita atenção à doutrina da Trindade. o propósito das Escrituras consistia em revelar o que era proveitoso saber sobre Deus e sobre nós mesmos. em ensinando o verdadeiro.Aquele que deseja aprender astronomia [. nosso auxílio indispensável na adoração e no serviço de Deus. mas firmar as consciências. i. 125. I.. um dos ingredientes-chave da verdadeira piedade. A tarefa do teólogo. afirmava Calvino. .. “não pretendia satisfazer nossa curiosidade ou nosso desejo de ostentação. se a “m oderna” (latim: modus. a Bíblia torna-se nossos óculos para enxergar a realidade. 79-80. ao dar-nos as Escrituras. mas.72 Enquanto estávamos perdidos no labirinto do pecado. seu propósito é instilar gratidão. A prim eira edição das Instituías continha apenas uma escassa afirmação sobre a Trindade. Pierre Caroli acusou Calvino de arianismo. The First Book o f Moses Called Genesis. 7ICNTC 10. p. destinado a harmonizar-se com as últimas descobertas científicas. justificando sua existência. 330.. o proveitoso” (Inst. o certo. 4). esse único objetivo seria suficiente para todas. Com base nessas declarações esparsas. obediente e docilmente. agora mesmo) cosmovisão científica tem passado por múltiplas transformações desde Gênesis até o presente? Antes. Tratada reverente. Calvino dizia que o Senhor. ele pretendia. 1847).] deixe-o ir aonde quiser. De fato. o relato de Gênesis acerca da criação da lua não sugere uma comparação relativa com o tamanho de Saturno. Ambos aceitaram as formulações ortodoxas da unicidade e da trindade de Deus desenvolvidas pelos primeiros concílios. dizia Calvino. “não é deleitar os ouvidos. Calvino não teve dificuldades para desmentir a falsa acusação. Deus revelounos o conhecimento de si mesmo em sua Palavra. como isso seria possível. Mesmo concordando nesse ponto. Essa postura foi reforçada por seus encontros particulares com antitrinitários genuínos.” Era mera presunção para os crentes “investigar a Deus em qualquer outra parte que em Sua Sagrada Palavra. I. em Isaías 6. que conspiravam 73Rudolf Schwarz.. Calvino advertia contra uma incursão especulativa no mistério da essência de Deus.. Certa vez ele disse: “Prouvera que. xm . ele se tornou um defensor inflexível da doutrina da Trindade. porém. “Deixemos então de boa vontade para Deus o conhecimento de si m esm o. que são distintos [entre si] por determinada propriedade” {Inst.. Calvino -considerava provas fracas e espúrias para uma doutrina tão importante. e o Espírito. “certas pessoas frenéticas como Serveto e os seus” . Calvino recusava-se a deturpar as Escrituras a fim de sustentar a doutrina da Trindade. contanto que esta fé entre todos se patenteasse: que o Pai. Devemos perguntar se Calvino. [assim que] nem o Filho é o Pai [como tal].. III. 888. Devido a uma instigação de Calvino. Gentile e Gribaldi. 1962). Gribaldi foi banido da cidade em 1557. são um e único Deus. a tríplice manifestação de louvor dos serafins. I. 21). ou a afirmação de Jesus.. a não ser que [lhe] vá à frente a Sua palavra. foi necessário para Calvino refutar os erros deles empregando palavras como Trindade e Pessoas para tornar “a verdade clara e lúcida” (Inst.3. Calvino provou ser impecavelmente ortodoxo em suas próprias formulações da Trindade: “ .73 Quatro anos antes. pelo termo Deus entende-se uma essência única e simples.. Calvino era muito sensível a essa questão e buscou encará-la de frente. ou falar que não o tomado d[essa] mesma Palavra” (Inst. 5). não viola seu próprio princípio de fazer teologia dentro dos limites da revelação. tais como a forma plural de Deus (Elohim). apenas. Serveto. Assim. i. Gribaldi era um advogado paduano que disseminou livremente suas dúvidas sobre a Trindade entre os refugiados de fala italiana em Genebra. “gagos” . Os textos-prova muito usados para a Trindade. por “minar e perverter o principal artigo de nossa fé” . p..em diante. terem usado a linguagem bíblica para afirmar conceitos não-bíblicos de Deus. em que compreendemos três pessoas ou hipóstases. 3).” (Inst. persona e mesmo Trinitas eram termos não-bíblicos. como Ário. . xm . ou o Espírito o Filho. “velhacos” . como Serveto. ao adotar essa definição clássica de Deus. todavia. e o Filho.. hypostases.30). havia encontrado destino pior do que o exílio. 20). ed. Ele estava bem consciente de que palavras como ousia. ao contrário. pelo mesmo crime. quando professamos crer em um só e único Deus. em Gênesis 1. xm . fossem sepultados. precisamente por alguns heréticos. Contudo. Ele os chamou de “serpentes traiçoeiras” . ou a Seu respeito pensar qualquer cousa. Os que negavam a doutrina da Trindade certamente tocavam num nervo sensório de Calvino. realmente. Johannes Calvins Lebenswerk in seinen Briefen (Neukirchen: Neukirchener Verlag. i. xm .. “eu e o Pai somos um ” (Jo 10. Será que eles negarão que é uma só Divindade o fundamento dessa unidade sagrada e mística? Temos de admitir necessariamente que a ordenança do batismo prova as três Pessoas numa única essência de Deus.em “engodos” e “absurdos vis” . e. Contudo. como o de Atanásio. 22). Ele queria salvaguardar a mensagem bíblica de que “Deus é manifesto na carne” contra interpretações falsas. e do Filho. 74CNTC 11. Filho e Espírito Santo. xm . do Filho e do Espírito Santo testemunhava tanto a unidade como a trindade de Deus. A Criação Tendo extraído das Escrituras a natureza trina de Deus. para que ninguém pense que os cristãos adoram três deuses. nem estava ligado servilmente à terminologia tradicional.74 Em suma: as distinções dentro da Trindade (Calvino preferia chamá-las de “subsistências”) não deviam ser entendidas como divisões. O batismo no nome do Pai. tornando-nos partícipes dos benefícios do Filho. era soteriológico. que é santificado pelo nome trino. 191. O propósito do trinitarianismo de Calvino. As distinções dentro da divindade eram vistas nas características particularizadoras de cada “Pessoa” : a misericórdia gratuita do Pai mediante o sacrifício de sua morte. no batismo. . A Trindade era crucial porque era um testemunho da divindade de Jesus Cristo e. CO 51.. a própria unicidade do batismo apontava para a unidade essencial das três pessoas divinas. como a de Serveto. Na liturgia do batismo e na doxologia. Calvino não estava interessado nas minúcias metafísicas da teologia abstrata. Calvino descreveu em seguida a atividade de Deus em relação ao mundo na criação e na providência. na invocação do Deus Trino no batismo. porque apenas quem era verdadeiramente Deus podia redimir os que estavam totalmente perdidos. Assim. Calvino estabeleceu a confissão da Trindade num contexto litúrgico. a fé na Trindade era confessada não para definir completamente o ser de Deus — pois quem poderia fazê-lo — mas apenas (como Agostinho já havia dito) não ficar em silêncio diante do mistério de sua presença. p. ou seja. col. que “mistura [ele] com as criaturas todas tanto o Filho de Deus quanto o Espírito” (Insí. Havia um único Deus que conhece a si mesmo e que se revelou como Pai. da certeza de salvação obtida p o r ele. Pois é um único batismo. o nome do Pai. Que réplica os arianos ou sabelianos serão capazes de fazer a esse argumento? O batismo possui uma força tal para tomar-nos um. e do Espírito Santo é invocado. assim. 173. Por que a Trindade era questão tão importante para ele? Como vimos. i. da prim eira edição das Instituías em diante. A Trindade era o fundamento da salvação. o Espírito Santo purificando e regenerando. “Apenas com a natureza como guia. pp. o propósito para o intensificado conhecimento de Deus revelado na natureza era fortalecer a fé dos cristãos: “Destarte. uma vez que as pessoas fossem iluminadas pelo Espírito Santo. CO 48. col. (Genebra: Labor et Fides. 76CNTC 11. tão antiga quanto Platão e Aristóteles e tão usual quanto a filosofia do processo. que os deixava sem desculpas para sua idolatria e rebelião. Não é de surpreender. xiv. senão [Aquele] Que foi por Moisés proposto [como] o opífice e fundador do universo” (Inst. significa “criar” . 119. Mesmo tendo distinguido o conhecimento do Deus Criador daquele do Deus Redentor. mas também (e isso era mais danoso na opinião de Calvino) o privava de sua glória.77 Os maniqueus chegaram a ponto de atribuir a criação a duas deidades igualmente poderosas. Calvino via o mundo criado como um “teatro deslumbrante” da glória de Deus. Por causa das conseqüências noéticas da Queda.9. que pelo mesmo M ediador todos os gentios sejam agora restaurados ao todo” . na criação. Calvino não tinha dúvidas de que o Deus Trino único era o Sujeito de ambas as ações. Os seres humanos. esse conhecimento natural de Deus nunca poderia levar à salvação. também. 11Commentâmes de Jean Calvin sur l’Ancien Testament. em vez de formar ou moldar algo já feito. Rigorosamente falando. essa afirmação era a marca referencial da fé bíblica. p.uiTia massa material já existente. I. sendo uma um deus benevolente que criou o bem. CO 51. que Calvino discutiu nos volumes de II a IV das Institutos. I. 24-25. mas sim uma “teologia da natureza” . . não menos do que para Zuínglio. por si mesmo) e do senhorio de Deus. era uma negação descarada da aseidade (latim: a se. . 182. a partir do nada. Deus criou o mundo ex nihilo. ed. o Pai criou todas as coisas. Para a mente de Calvino. 162. e com a ajuda dos “óculos” das Escrituras. Para Calvino. p. a criação poderia gerar um conhecimento de Deus mais lúcido e espiritualmente edificante. Esse modo de ver não apenas tirava de Deus sua onipotência.76 Além disso. 416: “Sequitur sola natura duce non posse illuc penetrare mentes nostras” . Calvino opunha-se vigorosamente à idéia de que. André Malet. Deus estava meramante-jemodelando. traziam dentro de si um “sentido da divindade” inerradicável. ele afirmou: “Por Cristo como Deus. ele ressaltou. apoiada à qual da Igreja a fé não buscasse a outro Deus. essa idéia. então. quis [Ele] se fizesse patente a história da Criação. trazer à existência o que não existia. 75CNTC 7.Essas doutrinas classificam-se sob o título genérico de “conhecimento do Deus C riador” . e a outra um espírito sinistro que produziu o mal. em contraste com o “conhecimento do Deus Redentor” . Comentando Efésios 3. A palavra hebraica bara. col. nossas mentes não podem penetrar nele. esse conhecimento de Deus biblicamente instruído na criação não era uma “teologia natural” . 1).”75 Contudo. vivo com testemunhas múltiplas de seu poder e majestade. 1961). não fosse assim. Deus criou os anjos — não por causa de si mesmo. assumindo o cuidado de um chefe de família próvido e zeloso. 22).] Os ímpios são criados para o dia de sua perdição: pois isso não acontece a não ser que Deus deseje revelar sua glória por meio deles. 171. atentamos para [o fato de] haver Deus destinado todas [as cousas] para o bem e salvação nossa. . nem estudá-la para meramente satisfazer sua curiosidade caprichosa.. E. seja para elevar-nos o ânimo a boa esperança.. Calvin: The Origin and Development o f His Religious Thought (Londres: Collins. [. ao mesmo tempo Lhe sentimos o poder e a graça em nós próprios e nos benefícios tão grandes que tem conferido para conosco. o ar. Para sua mente. 11). Calvino não tentava provar a existência de Deus argumentado a partir dos efeitos da criação até uma Causa Primeira. ao louvor. adaptado das Instituías. os cristãos deviam contemplar a bondade de Deus em suas criaturas de tal forma que seus próprios corações se emocionassem. seja para firmá-lo em segurança” (Inst.. Eles não deviam explorar a natureza para seus próprios fins egoístas. mostrou [Deus] Sua mirífica bondade para conosco” (Inst. tal prova. o Criador. o que aconteceria a tantas evidências nas Escrituras que nos falam que o alvo soberano de nossa salvação é a glória de Deus?78 O mundo foi criado para a glória de Deus. I. xiv. I. Exatamente pela mesma razão. produziu fartura de todos os frutos que fornecessem alimentos. Antes. O seguinte “hino à criação” . por exemplo. p. xiv. xrv. quando [. que ele elevou Faraó a fim de que seu nome pudesse ser manifesto entre os povos. à invocação. Citado em François Wendel.antes de criá-lo. Calvino dizia: “ . 293s. mas não sem consideração pelo benefício da humanidade. encheu de seres vivos a terra. Deus levou seis dias para criar o mundo? Ele poderia ter feito tudo num instante.] a usos humanos dispôs os movimentos do sol e dos astros. visto que todas as pessoas tinham dentro de si uma percepção intuitiva de Deus. Mas a criação realmente tinha enorme significado para os cristãos. I. mesmo que possível. mas por nós. distribuindo “Sua obra em seis dias [. “para consolo de nossa fraqueza. 1963). 2). i. toda a criação foi designada para realçar a vida humana: Agora.Mesmo Deus de nada carecendo. XIV.. cols.. é um belo exemplo da 7SCO 8. era redundante...] para que molesto nos não fosse o sermos ocupados em sua consideração pelo curso todo da vida” (Inst. Diferentemente de alguns teólogos. como Tomás de Aquino. 2).. até como ele disse noutro lugar. . mas adaptou seu poder às aptidões humanas. para que de modo algum careçamos de algo que valha. as águas. ainda assim a meta principal que teve ao criar o homem foi que seu nome pudesse ser glorificado nele. ao amor para com E le” (Inst. donde nos estimulemos à confiança.. De fato. Por que. devemos Pedir-lhe e. Tudo o que quisermos. Mesmo nos seis dias ele mostra um cuidado de Pai Por seus filhos ainda nem nascidos. pp. Que mais podemos fazer. devemos estar cientes De que tudo o que ele nos dá está em suas mãos Para dar. . em nossos próprios Seres sentimos seu poder e graça. Calvino estava intensamente cônscio do caráter precário e totalmente incerto da vida humana. o invocar. Piety. então. Graciosamente dados a nós. para amá-lo e servi-lo De todo o coração. assim também Calvino reconheceu o conflito e a luta perpétuos na 79Battles. Seus grandes. Fora. esquecimento Dele! Fora com o medo covarde de que ele / Falte quando precisarmos! Pois ele } Já providenciou para que nada Falte para nosso próprio bem-estar. Da mesma forma que Lutero continuou a debater-se com o diabo depois de sua ruptura evangélica. Se Lutero preocupava-se com a ansiedade da culpa e Zuínglio foi levado a uma compreensão mais profunda do evangelho por ter roçado a morte. J Sempre que invocarmos a Deus. ingratidão.resposta apropriada à criação que Calvino prescrevia para o cristão: Deus dispôs todas as coisas para nosso bem E nossa salvação. 169-170. cada desejo e esperança que temos Depositemos nele somente. inúmeros benefícios. receber Cada benefício que vem a nós. louvar e amar? Pois toda a obra de Deus é feita para o homem. agradecidos. então Calvino era perseguido pelo espectro do curso aparentemente fortuito e sem sentido da existência. Esforcemo-nos. senão nos mover A nele crer. Criador Do céu e da terra.79 A Providência Mais que qualquer outro reformador do século xvi. III. tudo está bem com o m undo” . A quantos animais ferozes vês. “sobrepor nossa finitude” . Monta um cavalo: no tropeçar de uma pata a tua vida periclita. por exemplo.enquanto ensinamos que deve a fé ser certa e segura. sentir assaz miserável. a vida arraste entrelaçada com a morte. armados estão-te à destruição. Ou que te procures encerrar em bem cercado jardim. Em meio a estas dificuldades. o homem não pode [a si] próprio mover sem que leve consigo muitas formas de sua [própria] destruição e. pois. Ela surgiu de uma avaliação totalmente realista das vicissitudes da vida . 17). emboscadas. nem uma segurança que de nenhuma inquietude seja acatada. que antecipa o sentido de “abandono” tão evidente na literatura existencialista moderna. esterilidade te anuncia e. porventura. Se um instrumento cortante está em tua mão ou de um amigo. contenha inclusas e fomente as causas das doenças. xvii. nem sua. como esteja exposta ao granizo. a violência manifesta. Que outra [cousa]. não se deve o homem. como Calvino dizia. sem perigo? Agora. a tantos perigos estás expostos. manifesto é o detrimento. assaltos. durante a noite até mesmo sufocação. a incêndio constantemente sujeita. onde nada senão amenidade se mostre. não imaginamos alguma certeza que de nenhuma dúvida [jamais] seja tangida. Para que não saiamos fora [de nós mesmos]: como seja o corpo receptáculo de mil enfermidades [e] dentro [de si]. mas até se afiguram abertamente ameaçadoras e parecem intentar morte pronta. [as cousas] todas que a teu derredor estão não somente não se mostram dignas de confiança. aí não raro se esconderá uma serpente. parte nos acompanha ao largo. ou adorando no sacrário moderno de um spa é negar nossa humanidade ou. de certo modo. na verdade. Numa passagem surpreendente.. A [tua] terra de plantio. Calvino descreveu a fragilidade da condição humana: Incontáveis são os males que cercam a vida humana...] a fome. não menos que se tivesse uma espada perpetuamente a impender-lhe sobre o pescoço? (Inst. sustenha debilmente o sôfrego e lânguido alento. dela [a resultar. II. i.. 10) Fingir que estamos isentos de tais perigos. imaginar que podemos neutralizar seu impacto mantendo grandes apólices de seguro. Anda pelas ruas de uma cidade: quantas são as telhas nos telhados. à seca e a outros flagelos.” (Inst.80 A doutrina da providência sustentada por Calvino não refletia o otimismo piedoso de: “Deus está em seu céu.busca por sentido do cristão: “ . Embarca em um navio: um passo distas da morte. como quem na vida [apenas] semivivo. hajas de dizer. para onde quer que te voltes. [males] que outras tantas mortes ameaçam. dos quais parte nos assedia em casa... Deixo de referir envenenamentos. ameaça-te pobreza durante o dia. As fontes de ansiedade estavam presentes em toda situação humana concebível. quando nem se esfria. [Tua] casa. à geada. Trovões e relâmpagos também obedeciam à sua voz. que a presença do poder divino nos esplenda não menos no contínuo estado do mundo que em sua origem prim eira” (Inst. . CO 34. tendo criado o universo no princípio. o do fatalismo. por um lado. executa [o] que decretou” (Inst. col. Calvino foi acusado de ensinar precisamente essa doutrina. 4). Deus ocupava-se tanto da administração de todos os acontecimentos. Calvino declarava que a providência “às mãos. sendo em si mesma um tipo de continuação do processo criativo (creatio continuata): “ . Alguns dos que concordavam com essa maneira de ver afirmavam que Deus previu o que aconteceria. que procedem de seu plano estabelecido. Contra esse conceito de “mera previsão” . xvi.. mas ainda deficiente. . era a crença de que certos eventos aconteciam pela permissão de Deus. xvi. mas não eram sustentados por sua ação direta. que “nada acontece por acaso” . 8.81 “M era perm issão” não era melhor do que “mera previsão” . a não ser pela explícita determinação de D eus” (Inst. A providência. eficaz. “Que. “ . xvi. deixara-o então continuar seu curso mais ou menos sozinho.e da ansiedade que elas produzem. o Criador pessoal do universo.. diz[-Lhe ela] respeito” (Inst. a idéia de que Deus. por Seu poder. Não apenas os grandes eventos da história. . sim. estava inseparavelmente ligada à criação.. por outro. I. mas até as mais minúsculas ocorrências dentro da natureza estavam sujeitas à direção de Deus. na visão cristã. é certo que não cai uma gota de chuva [sequer]. i. agora. A doutrina estóica do destino pressupunha que todos os eventos eram governados pela inevitabilidade da natureza. mas não interveio nos desdobramentos concretos dos eventos em si. mostrando que. Ele negou a acusação. invocando uma deidade que repousa ociosamente numa torre de vigia. “o chefe e governante de todas as coisas” não era uma forca ou corrente impessoal de inevitabilidade. 302: “Ainsi donc cognoissons que Dieu ne se pourmene point là haut comme en des galleries: mais qu’il remplit tout le monde. X V I. incessante. não menos que aos olhos. ativo.. I. Um pouco melhor. I. Tal concepção imaginava Deus ociosamente observando do céu o que acontece na terra. que continha dentro de si mesma uma série intimamente relacionada de causa e efeito. ou seja. Calvino distinguia sua visão da providência de dois equívocos populares. 1). Mas essa concepção também limitava a onipotência de Deus. xvi. e o do (que se tornou conhecido mais tarde como) deísmo. distante e afastado das atividades diárias da vida cotidiana. Calvino gastou mais energia refutando o outro erro. A ênfase na atividade direta e imediata de Deus no mundo levou Calvino a rejeitar a teoria traducianista da origem da Ulnstitutas. mas. decretou desde a extrema eternidade [o] que haveria de fazer e. Ambas negavam a Deus o que as Escrituras continuamente lhe atribuíam — um compromisso vigilante.. et qu’ il faut que nous le contemplions tousjours prochain de nous” . então. 8). 5).. com o governo do mundo que ele havia criado. por Sua sabedoria. I. . ele criava milhares de almas. bem e convenientemente. Calvino descobriu que esse fato era de grande conforto para os cristãos sob coação do maldito: nComm. sempre a Ele volverá os olhos como à causa precípua das cousas. 160. não são [eles] excusáveis [y/c]. violam em sua [desregrada] cupidez” {Inst. o coração cristão. Claro. A questão que surge é se Deus não se torna cúmplice das más obras deles. De fato. que. . . a alma é transmitida de geração em geração por meio do processo da procriação humana. xvil. Calvino distinguiu entre a vontade e o preceito de Deus. visto que por meio da enfermidade Paulo obteve muito mais força espiritual! Minha resposta é que a única intenção de Satanás. a cada minuto. Ao comentar o “espinho na carne” de Paulo. a interação direta de Deus com o mundo não significa que ele não poderia usar também causas secundárias para efetuar sua vontade.7: CNTC 10.alma. p.. 4). elas desempenhavam um importante papel no desdobramento dos propósitos de Deus. de maneira que foi um ato especial de misericórdia Deus transformar num instrumento de cura o que por natureza era instrumento de morte. “ . que era um assassino desde o princípio. enquanto por instrumentalidade dos ímpios Deus leva a cabo [o] que decretou em Seu juízo absconso. Deus criava uma nova alma ex nihilo. mas os refreava em sua fúria e louca raiva. i. xvm . e o bem de que Paulo fala estava mergulhado em veneno mortal. de acordo com seu caráter e costumes. ?Calvino. era matar e destruir. Isso significava que Deus devia estar muito ocupado. pôde tornar-se assim um tipo de médico para o apóstolo. deliberadamente. “sabe [Ele]. que era infligido por “um mensageiro de Satanás” . de que nada acontece por acaso. i. 5).. xvil. por outro lado. Portanto. cada vez que uma criança nascia.. contudo. haverá de contemplar as causas inferiores em seu [devido] lugar (Inst. como se Lhe estejam a obedecer ao preceito. Deus não hesitava em usar até mesmo Satanás e suas hostes para alcançar seus objetivos divinos.82 Em sua grande e ilimitada sabedoria. Para Calvino. acreditava que. De acordo com essa concepção. sobre 2 Co 12. Calvino perguntava como Satanás. quando de absoluta certeza haja sido persuadido de que tudo ocorre pela dispensação de Deus. 6). que era afirmada por Lutero. i. usar dos instrumentos maus para efetuar o bem ” (Inst. porém. Para contornar essa dificuldade. Deus não dava simplesmente rédeas livres ao diabo e suas coortes demoníacas. porque todos os dias. Quando, porém, trazem à memória que o Diabo e toda a coorte dos ímpios são, de todos os lados, de tal maneira coibidos pela mão de Deus, como por um freio, que nem possam conceber qualquer malefício contra nós, nem [se] concebido, hajam de arquitetar planos, nem, se engendrem cabal planejamento, [consigam] mover um dedo para levá[-lo] a cabo, a não ser quanto Ele [o] haja permitido, aliás, a não ser quanto [o] haja [Ele] mandado... (Inst., i, xvn, l l ) . 83 Em seu livro M y Lady o fth e Chimney C om er [Minha Dama da Esquina Chimney], Alexander Irvine conta uma história que ilustra essa perspectiva distintivamente calvinista da providência. Uma família irlandesa esfomeada recebe uma boa refeição em decorrência de uma aposta feita durante um jogo de azar. Anna, a mãe piedosa, agradece a Deus o trazer-lhes alívio. Boyle, cuja atividade nefanda conseguiu-lhes o jantar, replica: “Anna, se alguém nos trouxe aqui nessa noite, foi o velho diabo do inferno” . “Engano seu” , Anna responde calmamente. “Quando Deus envia um homem a algum lugar, ele sempre chega lá, mesmo se tiver de ser levado pelo diabo.”84 Uma objeção comum à doutrina da providência sustentada por Calvino é a acusação de que, se Deus decreta cada evento, não há nenhuma base para a responsabilidade humana. Por que os cristãos não deveriam colocar-se tranqüilamente no caminho de um carro veloz ou pular exuberantemente de um alto edifício, certos de que serão protegidos de qualquer mal pela providência divina? Calvino, entretanto, que não tolerava de bom grado os tolos, rejeitava essa linha de raciocínio, argüindo que os cristãos não estão dispensados de usar a prudência devida, já que a precaução humana em si é um dos meios pelos quais Deus preserva a vida^ Assim, “se o Senhor nos confiou o proteger a nossa vida, que a cerquemos de cuidados; se oferece recursos, que os usemos; se nos previne dos perigos, [a eles] não nos arrojemos temerariamente; se fornece remédios, não [os] negligenciemos” (Inst. , I, x v n , 4). A providência de Deus não opera de modo a negar ou tornar desnecessário o esforço humano. Mesmo quando Deus age por meio de uma pessoa má para atingir um propósito divino, não o faz “como se tal indivíduo fosse uma pedra ou um pedaço de madeira, mas o usa como uma criatura racional, de acordo com a qualidade de sua natureza que ele lhe deu” .85 Ainda assim, continua a pergunta sobre a insistência de Calvino no governo divino de todos os eventos, no final (ou no começo, visto da perspetiva dos 83C/. também CO 34, col 15: “Si nous cognoissons que Dieu tiene la bride à Satan et à tous les siens, [...] alors nous pourrons recourir à lui hardiment” . “ Citado de Hunter, p. 144, lOOn. 85Joâo Calvino, Treatises Against the Anabaptists and Against the Libertines, Benjamin W. Farley, ed. (Grand Rapids: Baker Book House, 1982), p. 245; CO 7, col. 188: “Car il ne faut pas imaginer que Dieu besongne por un homme inique, comme par une pierre ou par un trône de bois: mais il en use comme d’une creature raisonnable, selon la qualité de sa nature qu’ il luy a donnée” . decretos eternos), tornar Deus ou não o autor do pecado. Essa é uma objeção séria, e Calvino não a considerou superficialmente. O último capítulo do prim eiro volume das Institutos tenta m ostrar como Deus realiza seus julgamentos, enquanto, ao mesmo tempo, “ele permanece limpo de qualquer mancha” . Calvino afirmou prim eiro que a “vontade de Deus” não é um termo universal, mas traz um sentido múltiplo. Lutero também havia falado da vontade revelada de Deus e de sua vontade oculta. A primeira, manifestou em sua Palavra, que inclui a lei com o m o t„ á c ” A líltim o Á n n lo n n SCCretO ™,a1 TV .,,0 U vo adiante seu propósito eterno e que inclui, por exemplo, a entrega de Jesus pará ser crucificado. Ao mandar Cristo para a cruz, a Bíblia diz que Herodes e Eilàtòs estavam cumprindo o que Deus, em seu conselho, havia determinado antericíçín V e) para ser feito (At 4.27, 28). Ao mesmo tempo, estavam ta m b é m /^ ^ riá w a expressa vontade de Deus revelada em sua lei. Isso não s i g n i f i c á ^ j w ^ p duas vontades contrárias em Deus, caso contrário sua unidadejsçra xMnpida. Não sabemos, na verdade não podemos, entender como D eu^es^a^qta, aconteça o que ele também proíbe que seja feito. “ ... todavia, embc a .íCleNima^mna só e indivisa [a verdade], a nós multíplice [nos] parece, já q u e ^ n ^ ^ ^ a <omusidade de nossa mente, não apreendemos como, de maneira dive(ráaJV^hèsmo não queira e queira aconteça” (Inst., I, xvm , 3). Calvino apelava repetidamente patí i'p r stérip e para a incompreensibilidade das ações de Deus: “ ... venha-nos à le m b ra r^ n o s s a obtusidade e, ao mesmo tempo, consideremos que a luz em que [Ele] habita não em vão se chama inacessível [1 Tm 6.16], por isso qi de.tr evasq)rpdeada” (Inst. , I, xvm , 3). O problema do mal é assim tão grave precisam ehtò^ofque não conseguimos entender como as tragédias da vida redun^arri- na g l^ ia maior de Deus. Ao comentar sobre o cego de nascença, cuja^.dpeH^a M uma oportunidade para a glória de Deus (Jo 9.1-4), Calvino a d v é rti eòntfa o julgar prematuramente as razões para tais condições: “Deus ;/ » v e s te m outro propósito que não punir os pecados dos homens quando lhes -mv - v a g õ e s . Conseqüentemente, quando as causas das aflições estão ocultas, f «idade deve ser refreada, para que nem injuriemos Deus nem sejamos d s o s para com nossos irm ãos” .86 'E m face do sofrimento e da tragédia, a tentação é negar a capacidade que Deus tem de evitar ^ desastre assim, um impotente ante « perversidade radical, ou, então, mais comumente, amaldiçoar Deus por não intervir. Um conhecido pastor tentou confortar um colega m inistro, cuja jovem filha m orrera de câncer, dizendo-lhe que “Deus terá muito o que explicar no céu” . Ninguém que tenha passado por tal crise pode negar a verdade de tais sentimentos. Na verdade, a própria Bíblia, especialmente os salmos, está repleta deles: quanto tempo ainda, Senhor? Por que tua misericórdia se foi para sempre? Por que os “ Comm. sobre Jo 9.3: CNTC 4, p. 239; CO 47, col. 218. maus triunfam e os retos sofrem? Calvino não negava a legitimidade de expressar tais questões a partir das agonias do sofrimento, mas ele também sabia que tal raiva contra Deus é como “vomitar contra o céu” (Inst., I, xvni, 3). É tolice, dizia, tentar fazer com que Deus “preste contas a nós” (Inst., i, xvn, 1). A piedade verdadeira perceberá que, por trás do sofrimento que experimentamos, que em si mesmo não é bom, mas mau, em sua justiça, sabedoria e amor Deus permanece o Pai que prometeu que nunca nos deixaria ou abandonaria. O erro básico dos que acusam Deus de cumplicidade no mal é sua crença fácil de que Deus e os humanos estão sujeitos aos mesmos padrões de julgamento. No entanto, há uma “diferença qualitativa infinita” entre os dois. Julgar os atos da providência de Deus por critérios de justiça e sabedoria aplicáveis somente a humanos é como comparar maçãs com laranjas; é como perguntar quantos centímetros há num grama. “Tanto importa quê [s/c] seja próprio ao homem querer, quê [o seja] a Deus, e a que fim se prolata a vontade de cada um, de sorte que ou seja aprovada ou seja reprovada” (Inst., i, xvm, 3). Finalmente, então, não há resposta para o problema do mal, ao menos nenhuma resposta que esteja à disposição da mente humana nesta vida. Calvino chamou o método de Deus governar o universo de “abism o” — um abismo que devemos reverentemente adorar, em vez de tentar curiosamente penetrá-lo (Inst. , I, XVII, 2). Com toda sua reputação de teólogo de lógica rigorosa, Calvino preferiu viver com o mistério e a incoerência de lógica a violar os limites da revelação ou imputar culpa ao Deus que as Escrituras retratam como infinitamente sábio, completamente amoroso e absolutamente justo. Em seu tratado Contra os Libertinos (1545), Calvino distingui três aspectos da providência. O primeiro é a providência geral, ou universal, que é manifestada na ordem da natureza. Por essa operação, Deus governa todas as criaturas de acordo com a qualidade e a inclinação que colocou nelas. O segundo nível de providência, a providência “especial” de Deus, diz respeito ao envolvimento de Deus com a comunidade humana, os atos de Deus pelos quais ajuda seus servos, pune os ímpios e testa ou castiga os fiéis. Nesse nível da providência, as boas dádivas de Deus são distribuídas sem discriminação entre todos os povos; ele envia a chuva e o sol sobre justos e injustos, indiferentemente. Deus distribui sua “graça comum” , como os teólogos posteriores a chamariam, à raça humana inteira, sem exceção. Calvino observou com um humor deturpado que “as pessoas mais malignas comem e bebem [...] às vezes são ainda mais gordas do que os fiéis” .87 S1Supple menta Calviniana, I, p. 709. Richard Stauffer mostrou como a abordagem de Calvino acerca da providência em seus sermões tanto reflete quanto expande sua exposição nas Instituías. Veja seu Dieu, la création et la Providence dans la prédication de Calvin (Berna: Peter Lang, 1978), esp. pp. 261-302. Cf. também a excelente discussão sobre a providência universal e particular em Calvino feita por Charles Partes, Calvin and Classical Philosophy (Leiden: E. J. Brill, 1977), pp. 126-145. Há também um terceiro nível de providência, entretanto, que pertence particularmente aos eleitos. É a forma da operação de Deus pela qual ele “governa seus fiéis, vivendo e reinando neles por seu Espírito Santo” .88 Calvino mencionou esse terceiro aspecto da providência no primeiro volume das Institutos — “um a vez que Deus para Si escolheu a Igreja por morada, não há dúvida de que evidencia, por singulares provas o paternal cuidado em governá-la” (I, x v n , 6) — mas postergou qualquer discussão mais profunda disso até que tivesse abordado prim eiro os grandes temas da redenção (volume II) e da regeneração (volume III). Aqui fazemos uma observação sobre o que teremos de examinar mais de perto um pouco adiante: a doutrina da predestinação, que logicamente se encaixaria melhor na discussão da providência, foi colocada por Calvino no contexto da soteriologia, em relação a seu tratamento da obra do Espírito Santo na vida do crente (Inst., m, XXI-XXIV). Nossa discussão da doutrina da providência exposta por Calvino não seria completa sem observar suas implicações pastorais. Como pastor em Genebra, e em sua correspondência com milhares de cristãos, em situações amplamente diversas, Calvino era um experimentado “diretor de almas” , ou, como diríamos, um conselheiro espiritual. Ele nunca tentou minimizar nem negar a realidade do sofrimento que o cristão enfrentava. A Madame de Budé, viúva recente e prestes a enfrentar o tumulto de ser desarraigada de sua família e enviada ao exílio, Calvino escreveu: “É verdade que não cessaremos de ser sujeitados a muitos problemas e aborrecimentos; mas peçamos a ele que, sendo fortalecidos por sua palavra, possamos ter meios para superá-los” .89 Quanto à Condessa de Seninghen, outra nobre francesa, Calvino comiserou-se de sua doença: Fui informado [...] de que você está fraca e afligida por muitas doenças, das quais também tenho minha porção para me atormentar da mesma maneira. Mas, seja como for, temos um grande motivo de satisfação, pois em nossa debilidade somos apoiados pelo poder do Espírito de Deus, e, mais, se esse tabernáculo corruptível se desfizer, sabemos que logo seremos restaurados, de uma vez e para sempre.90 Como pastor, Calvino reconhecia a legitimidade das emoções humanas e não aconselhava uma indiferença estóica em face do sofrimento. Ele interpretou a cena de Jesus chorando em frente ao túmulo de Lázaro como um exemplo do sofrimento de Cristo conosco: “Quando o Filho de Deus vestiu nossa carne, também concordou voluntariamente em vestir as emoções humanas. [...] Nisso, provou ser nosso irmão, para que pudéssemos saber que temos um M ediador que de boa ^Treatises Against Anabaptists, p. 247; CO 7, col. 190. 89Bonnet, ed., II, p. 92. ^Ibid., IV , p. 333. vontade perdoa e está pronto para socorrer as enfermidades que experimentou em si m esm o” .91 Além disso, somos “companheiros do Filho de D eus” , que “desceu à nossa condição para encorajar-nos com seu exemplo” .92 Assim, enquanto nada acontece ao cristão que não seja, de maneira final e incompreensível, dirigida pela providência divina, Deus não deixa seus filhos sofrerem sozinhos, mas compartilha com eles “os golpes e as flechadas do destino ultrajante” . Calvino era freqüentemente chamado para aconselhar os protestantes que tinham sido aprisionados devido à sua fé e que muitas vezes enfrentavam o martírio iminente. A aplicação prática de sua doutrina da providência é mais bem percebida nessas cartas. Em 1553, ele dirigiu as seguintes palavras aos “prisioneiros de L ião” , que esperavam a execução na França. Estejam então certos de que Deus, que se manifesta em tempos de necessidade e aperfeiçoa sua força em nossa fraqueza, não vos deixará desprovidos daquilo que poderosamente glorificará seu nome. [...] De fato, para a razão humana é estranho que os filhos de Deus sejam tão intensamente afligidos, enquanto os ímpios divertem-se em prazeres; porém, ainda mais, que os escravos de Satanás esmaguemnos sob seus pés, como diríamos, e triunfem sobre nós. Contudo, temos meios de confortar-nos em todas as nossas misérias, buscando aquela solução feliz que está prometida para nós, que ele não apenas nos libertará mediante seus anjos, mas pessoalmente enxugará as lágrimas de nossos olhos. E, assim, temos todo o direito de desprezar o orgulho desses pobres homens cegos, que para a própria ruína levantam seu ódio contra o céu; e, apesar de não estar neste momento em suas condições, nem por isso deixamos de lutar junto com vocês em oração, com ansiedade e suave compaixão, como companheiros, percebendo que agradou a nosso Pai celeste, em sua bondade infinita, unir-nos em um só corpo sob seu Filho, nossa cabeça. Pelo que eu lhe suplicarei que possa garantir a vocês essa graça, que, estando apoiados nele, de maneira alguma vacilem, mas sim cresçam em força; que ele os conserve sob sua proteção e lhes dê tal segurança disso que possam estar aptos a desprezar tudo o que é deste mundo. Meus irmãos os saúdam mui afetuosamente, e assim também muitos outros. — Seu irmão, João Calvino.93 Um dos prisioneiros escreveu em resposta a Calvino, mostrando como sua carta chegara à prisão e fora lida por “um dos irmãos que estavam numa cela abobadada acima de mim [...] porque eu não pude lê-la por mim mesmo, sendo incapaz de ver qualquer coisa em meu calabouço” . Ele expressou sua gratidão pelo consolo de Calvino, “pois isso nos convida a chorar e orar” .94 Dessa forma, a doutrina 9'Comm. sobre Jo 11.33; CNTC 5, p. 12; CO 47, col 265. n Comm. sobre Hb 12.3; CNTC 12, p. 189. 93Bonnet, ed., II, pp. 412-413. 94Ibid., p. 411, ln. da providência, longe de inspirar a resignação passiva em face do mal, sustentava incontáveis homens e mulheres em momentos de crise, perigo e morte. O Cristo que Salva Harmatologia: a Doutrina do Pecado Tendo apresentado o conhecimento do Deus Criador no primeiro volume das Instituías, Calvino passou então para o conhecimento do Deus Redentor, no segundo. Contudo, antes de desenvolver o grande tema da redenção, primeiramente discutiu a natureza e a extensão da pecaminosidade humana. Havia uma razão importante para essa ordem. Em seu comentário de Isaías 53.6, ele a expressou da seguinte forma: Pois, a menos que percebamos nossa própria miséria indefesa, nunca saberemos o quanto precisamos do remédio que Cristo traz, nem viremos a ele com o amor ardoroso que lhe devemos. [...] Para conhecer a verdadeira essência de Cristo, deve cada um de nós examinar-se cuidadosamente, e cada um deve saber-se condenado até ser vindicado por Cristo. Ninguém está isento. O profeta inclui a todos. Se Cristo não tivesse trazido ajuda, toda a raça humana pereceria.95 Assim, apenas vendo a nós mesmos como somos de fato, em nossa total perversidade e alienação, podemos gozar completamente dos benefícios da salvação. Calvino em geral é visto como autor de uma concepção da humanidade totalmente pessimista. Por certo, muitas passagens em Calvino podem ser citadas em apoio a tal posição. Considere, por exemplo, sua descrição do ser humano como um “vermezinho de cinco pés [de estatura]” (Inst. , i, v , 4) ou seu pronunciamento ainda mais extremo de que o homem é incapaz de figurar ao lado de “vermes, piolhos, pulgas e pragas” .96 Fora de seu contexto, afirmações como estas retratam Calvino como um triste misantropo, culpado, em termos psicológicos, de uma auto-aversão mórbida. Tal caricatura, porém, não se coaduna com a profunda apreciação de Calvino pelas realizações humanas na ciência, na medicina, na literatura, na arte e em outras disciplinas. “Vemos implantado na natureza humana algum tipo de desejo de buscar a verdade” , e este desejo só pode ser atribuído à graça comum de Deus. O Senhor deixara “muitos dons” para a natureza humana, mesmo em sua condição deteriorada e perdida (Inst., II, II, 15). 95Commentaries, p. 154; CO 37, col. 259. 96C f David Cairns, The Image o f God in Man (Londres: SCM Press, 1953), p. 139. impotente.. .. capaz de realizações verdadeiramente notáveis. especialmente por Paulo. os filósofos. Calvino comparou-os a um viajante atravessando um campo à noite. II.. 1). também produz em nós [aquelas] obras que a Escritura 97Wendel. incapaz de dar o menor passo em direção à sua salvação.” (Inst. num relâmpago instantâneo. a despeito das muitas virtudes e dos dons excelentes que adornam a natureza humana. Calvino concordava entusiasticamente com Agostinho. i. a imagem de Deus no homem. contudo. o qual. permanecera íntegra. Contudo. mas.. Calvino delineou a forma de sua corrupção. nem para nós mesmos. Antes de descrever como. a natureza humana. I. graças a seus dotes naturais. em segundo lugar. que ensinou que o pecado de Adão tivera conseqüências desastrosas para toda a espécie humana. O problema do pecado original. Para entendermos verdadeiramente a natureza humana. I. n. XV. II. quão grande seria a excelência de nossa natureza. 5). Cristo restaurou nossa natureza. II. Calvino apontava para Jesus Cristo. embora já exposto no Novo Testamento. se. Encontramos uma construção similar no início do segundo volume: “ . 4). antes de poder dar um único passo (Inst. p. 18). não devemos olhar nem para os filósofos. tornou-se grave na teologia cristã somente na contenda entre Agostinho e Pelágio. essa condição desejável mostrou-se contrária aos fatos (i.. perceptiva. era criativa. nem nossa excelência natural manteve-se sem m ácula). Calvino admitiu que os pais da igreja primitiva falaram muito obscuramente sobre o assunto. que... . De fato. Observamos como a discussão de Calvino acerca do conhecimento de Deus no prim eiro volume foi orientada por uma premissa hipotética — “se Adão se houvesse conservado íntegro” (Inst. “perante o trono do julgamento de Deus. [nos] faz condenáveis à ira de Deus. II. o Verdadeiro Humano. grifo nosso). Numa metáfora vívida. não foi — de fato não poderia ser — totalmente apagada. porventura. 1921. 1. não valerão nada para obter a justificação” . Adão não permaneceu ju sto . não se poderia entender a condição humana meramente examinando os seres humanos em seu estado degenerado atual.. mas então é subitamente mergulhado novamente na escuridão da noite. “pelo menos a que [o] explanassem menos lucidamente do que se fazia de m ister” (Inst. Visto que. consegue ver amplamente. em quem podemos ver a restauração de nossa natureza / corrompida completamente incorporada (Inst.e . I. Em vez disso. difundida por todas as partes da alma. eram de valor desprezível.Como já vimos.97 Em relação às “coisas de baixo” . em primeiro lugar. era corrupta. em relação com as “coisas do alto” . Ele definiu o pecado original como “a hereditária depravação e corrupção de nossa natureza. nem para Adão em sua condição pré-queda. Por essa razão. mesmo estando horrivelmente desfigurada. ' de fato. porque a essa altura ele ainda não era um “produto acabado” . mesmo havendo em seu trabalho “gotícuias de verdade” .. CO 47. agora nos encontramos enredados. H. antes. I.. é o orgulho. nossas vidas são marcadas por um “suspirar e gemer por essa dignidade perdida” . tudo quanto dele procede ao pecado é de imputar-se” (Inst. em conseqüência. “o homem inteiro.. n. repetido em graus diversos em todos os seus descendentes. n. da mesma forma também nele nos privou de seus dons” . . Calvino rejeitava a idéia traducionista de que a alma corrompida de Adão & é transmitida biologicamente de pai para filho. Comentando a afirmação de Jesus de que “o que é nascido da carne.” Além disso. Assim como num homem ele nos adornou a todos. 9). quanto a como esse pecado é disseminado de uma para outra x geração. de direito.g. Diferentemente de Zuínglio. I. “O homem inteiro. se deve punição” (Inst. . mas da ordenança de Deus. 57. humanos.. . col. .. então. Elas também não são culpadas da culpa de outrem.^ De acordo com Calvino. pois carrega. da cabeça aos pés.6.6). 7) — não podemos meramente culpar Adão por nossa condição pecadora. o pecado não é simplesmente o nome para os atos perversos que cometemos. sobre Jo 3.chama de ‘obras da carne’” {Inst. p. que parte nenhuma lhe seja isenta de pecado e. Em outras palavras.. a existência corporal ou a sexualidade). A essência do primeiro pecado de Adão.. Cometemos pecado porque somos pecadores. . uma capacidade para de alguma forma não esquecermos nossa “nobreza prim eira” (Inst. Calvino recusou-se a limitar o alcance do pecado original a uma dimensão da pessoa humana (e.. todos os quais resultam em ingratidão. Apesar da terrível perdição em que nós. 8). a descrença.. Observemos três aspectos da doutrina do pecado exposta por Calvino. é carne (Jo 3.. um contamínio reside em nós a que. Calvino não se esquivou "de impor as implicações dessa doutrina até mesmo a crianças.. visto que “dele instilado. mas de suas próprias. mesmo tendo a queda de Adão arrastado toda a raça humana para a depravação — “ . li. II. em si mesmo. 66... O pecado de Adão é nosso pecado também.de tal molde foi o princípio da corrupção em Adão que dos ancestrais se transfunda aos pósteros em uma corrente perpétua” (Inst.. I. Em segundo lugar. é a direção e a inclinação da própria natureza humana em sua condição decaída. . dentro de si a “semente do pecado” . . a r a iz jia natureza humana. mas o viu permeando a vida toda.. como por um dilúvio.. mas sim 9SComm. Os escritos de Calvino não nos arrastam para as profundezas de nossa própria perversidade a fim de deixar-nos lá. Adão não é apenas o progenitor da raça humana. I. de tal modo assolado. mas ainda. por assim dizer. 8). O pecado consiste tanto na perda da retidão original (privação) quanto na propensão poderosa de transbordar todo tipo de mal e delito específico (depravação). Em prim eiro lugar... 3). .98 Em terceiro lugar. CNTC 4. foi. i. Calvino observou: “A corrupção de toda a humanidade somente na pessoa de Adão não procedeu da geração.. nada mais é do que concupiscência. a desobediência. por essa razão. mesmo que o fruto da iniqüidade delas não tenha florescido ainda.. dá início a uma descrição completa de Cristo. ou de como ele age em relação a nós” . II. Cristologia: a Pessoa de Cristo Em nossa discussão sobre Lutero e Zuínglio. Ibid.g..] o Pai está em m im . mas em seu papel redentor como Mediador. é uma questão de poder. de sua qualidade. apontamos o caráter totalmente cristocêntrico de suas teologias. mas de nosso conhecimento dele. para que seu poder possa ser verdadeiramente percebido. . pois ele sabe que dessa forma o caminho está aberto para todo tipo de falsidade. o tema que domina a cristologia de Calvino não é o conhecimento de Cristo em sua essência.8.12. 142. Mesmo sobre um texto que poderia ser considerado como prova de uma cristologia mais especulativa (e. apesar das diferentes nuanças que atribuíam a esse importante destaque. p. p. Assim. com todas as suas bênçãos” . 306. o único meio de manter e também restaurar a doutrina pura é colocar Cristo diante de nossos olhos. cols. . Por outras palavras. Portanto..10). CNTC 11. nunca perdeu de vista esse fundamento cristológico. “ . 160. assim. Em seu Comentário sobre Colossenses. também seu comentário sobre Hebreus 13.100 Embora Calvino tivesse sido cuidadoso para "Comm.com o propósito de nos preparar para ouvir a boa palavra de nossa libertação do pecado através de Jesus Cristo. senão os que do senso de sua pobreza se consomem” (Inst. Pois o único remédio para os colossenses contra todas as ciladas pelas quais os falsos apóstolos esforçavam-se em enredá-los era apegar-se totalmente ao que Cristo era.... ele volta à ação de graças. p. Mas como acontece de sermos levados por tantas doutrinas. “exatamente como ele é. não de essência” . e. mas do que é em relação a nós. Cf. sobre Cl 1. Calvino. CO 52. 82-83. “Jesus Cristo ontem e hoje é o mesmo. senão porque o poder de Cristo não é percebido por nós? Pois Cristo sozinho faz todas as outras coisas subitamente desaparecerem. não menos do que os outros dois grandes expoentes da vertente principal da teologia protestante.. II. Calvino comentou: “Cristo está falando aqui não do que é em si mesmo.” — Jo 14. não há nada que Satanás mais tente fazer do que levantar névoas para obscurecer Cristo. com todas as suas bênçãos.. e o será para sempre” : “O apóstolo não está falando de Cristo como ele é na eternidade." Essa passagem é significativa. [. mas. exatamente como ele é.. porque aqui Calvino afirma que a tarefa da teologia verdadeira é restaurar a doutrina de Cristo.] Ele não está-se referindo ao ser de Cristo.. o Senhor: para receber as bênçãos de Deus nenhuns se admitem. como uma oportunidade de enumerar as bênçãos dadas a eles por meio de Cristo. 10). ele apresentou o que pode muito bem ser tomado como o foco orientador de todo o seu program a teológico: Novamente.eu estou no Pai e [. . por assim dizer. m Commentaries. n. a não ser que até nós descesse a própria majestade de Deus. . a não ser um Poder superior tanto ao mundo quanto ao ar? Ora. A trágica queda da raça humana dobrou.. “Inda que o homem houvesse permanecido livre de toda mancha. o Deus clementíssimo. ou a justiça. xn. senão no só Deus? Portanto. 2). De fato. De fato. Arrastados por sua ruína mortal para a morte e para o inferno. Adão e toda sua progénie não teriam tido esperanças de resgate se Deus não houvesse enviado seu Filho “familiarmente entre nós. xn. olham para Cristo como seu Cabeça e Mediador. Quem isto podia. conspurcados por sua própria corrupção e subjugados por todas as maldições. gerada do Pai antes de todas as eras” . a necessidade do Mediador. 1). Quem isto podia. . mas “a eterna Palavra de Deus. por causa de nossa finitude de criaturas. Podemos detectar essa idéia na palavra que Calvino mais usava em relação a Cristo: Mediador. Se fez nosso Redentor na pessoa do Unigénito (Inst. “Irremediável era. sua condição. li. Quem isto podia. quando nos quis redimidos. mesmo os anjos eleitos. por assim dizer. precisamos de um mediador com Deus.101 Cristo deve ter sido verdadeiramente Deus. sujos com tantas manchas.16). mas sim conhecer seus benefícios. em quem está a vida.. n.permanecer dentro dos limites da cristologia católica clássica. 158-159. que nunca caíram de sua pureza incorrupta. Mas o destaque de Calvino à deidade de Cristo de maneira nenhuma enfraqueceu sua insistência no outro pólo do dogma cristológico clássico: Cristo foi também homem verdadeiro. Mesmo sem o nosso pecado. Cristo obviamente não renunciou mIbid. a não ser a Vida? Impunha-seLhe vencer o pecado. porque Impunha-se-Lhe aniquilar a morte. a situação. pp. ele teria concordado prontamente com a afirmação de Melanchthon de que conhecer a Cristo não é estudar suas naturezas ou propriedades. A revelação de Deus em Cristo é também o exemplo supremo da acomodação de Deus às capacidades humanas. certamente. O Redentor em carne é um só com o eterno Filho de Deus. Cristo não era “um Deus arrogante e tem porário” . entretanto. ou o senhorio e poder do céu. 1). já que não estava ao nosso alcance o ascender [até Ele]” (Inst. como um de nós mesmos” . xn. Na encarnação. Calvino afirmou sem equívoco que Jesus Cristo como M ediador era tanto Deus verdadeiro quanto homem verdadeiro. . era abjeta demais para que se achegasse a Deus sem M ediador” (Inst. a não ser a própria Justiça? Impunha-se-Lhe desbaratar as potestades do mundo e do ar. Calvino rejeitava todo tipo de cristologia adocianista ou minimalista como sendo totalmente inadequadas. A designação favorita de Calvino para o Cristo encarnado era a expressão paulina “ [Deus] foi manifestado na carne” (1 Tm 3. pp. Por insistir tão fortemente na distinção entre a divindade e a humanidade do Redentor. p. Calvino descreveu as circunstâncias humildes do nascimento do Salvador: “Ele foi. todos os tipos de males nos pressionarem. mas sim porque não podia persuadir os homens de que era afável e pronto a ajudar até que fosse testado pelos infortúnios humanos. como se estivesse aflito ao nosso lado.102 No Getsêmani.] Ele encontrava-se em extrema pobreza.7: CNTC 12. devemos mencionar também outra formulação que levou alguns estudiosos a questionar o caráter ortodoxo da cristologia de Calvino. portanto. que. xiv. engendrava assim um duplo C risto .17: CNTC 12. de forma que ele pode compadecer-se de nós.. mas sim oeultou-a sob o “véu” de sua carne. sobre Hb 2. sem nenhuma honra. Calvino foi algumas vezes acusado de tender para uma visão nestoriana de Cristo. 36-37. cols. Calvino fez uma insinuação interessante acerca do motivo da encarnação. Sermons on the Saving Work o f Christ.”105 Jesus Cristo era Deus verdadeiro e homem verdadeiro. em querendo antes separar que distinguir as [duas] naturezas. 54. sem nenhuma reputação.. Contudo. '“ Calvin. A esse respeito..deve ser de nós enxotado o erro de Nestório. Saving Work. . Num sermão sobre “a natividade de Jesus C risto” . o Filho de Deus foi “mergulhado em tal extremo que parecia estar no fundo do abismo” .. elas não estavam por causa da união fundidas ou amalgamadas uma à outra.. trad. Esse termo foi inventado por dogmáticos luteranos do século x v n a fim de designar a doutrina reformada de que o Filho de Deus tinha uma existência “também além da carne” (etiam extra 102João Calvino. Não havia nada além de um estábulo e uma manjedoura para recebê-lo. ou seja. 1950). e orou ao Pai com toda a diligência para que lhe enviasse ajuda” . “Quando.103 Longe de estar representado uma simulação. que nada que nos sobrevêm deixou de ser experimentado pelo próprio Filho de Deus. banido de toda casa e amizade. p. 33.sua divindade. sobre Hb 5. Será que isso implica algum tipo de cristologia docética? Por acaso Cristo era uma espécie de fantasma que meramente fingia ser humano. por assim dizer. e não duvidemos de que ele está nisso conosco. Cf. m Comm. 955-956. sujeito à servidão” . Cristo foi “oprimido por tristezas reais. digamos.. mas. ou seja.104 Não há profundezas às quais Jesus não se tenha encurvado para tornar-se nosso Irmão. [. embora as duas naturezas se encontrassem unidas numa única pessoa. 4) — e dedicou um capítulo inteiro das Instituías para m ostrar “como as duas naturezas do M ediador constituem uma só pessoa” . m Comm. os chamados extra Calvinisticum. Cristo não precisava ser revestido de humanidade para tornar-se habituado à misericórdia.” (Inst. CO 46. P. 64. sem entrar completamente no patos da existência humana? Calvino insistentemente negava isso. ele refutou intensamente essa mesma heresia — “ .. II. que esse seja nosso consolo imediato. por Leroy Nixon (Grand Rapids: Baker Book House. para Calvino. Calvin’s Catholic Christology: The Function o f the So-Called Extra Calvinisticum in Calvin's Theology (Leiden: E. Church Dogmatics 1/2. não estamos lidando com a natureza humana elevada ao milésimo grau. veja Selinger. pp. esse argumento teria mais força. xm . _/W Cristologia: a Obra de Cristo Mesmo ficando dentro dos limites da ortodoxia calcedônia estrita em sua reafirmação da pessoa de Cristo. 180-181. andar pela terra e pender na cruz.106 A verdadeira preocupação de Calvino era m ostrar que. A mais clara afirmação de Calvino sobre o assunto encontra-se nas i Instituías. isso “funciona para apoiar uma doutrina completamente trinitária do conhecimento por parte do homem de Deus e de si mesmo” . J. não deixasse o céu. Será que isso significa. em n. Como está. de indulgências.") devemos admitir que essa formulação levou Calvino a minimizar a importância da presença corporal de Cristo durante seu ministério terreno (sem abrir espaço parai y o docetismo) e conferir um tipo de “divisão de trabalho” para a humanidade e a/y»f divindade de Cristo (sem sucumbir ao nestorianismo). David Willis. pensava ele. porque enquanto estão preocupados em apreender a mera essência. quis sofrer a gestação no útero da Virgem. 1966). também a discussão em Karl Barth. 4: V ' . Havia pouco proveito. negam seu reino. nenhum confinamento imaginamos. que consiste noV poder do serviço” . assim como de início^ Calvino não desenvolveu essa idéia de forma constante ou sistemática — tê-lo feito k violaria seu próprio princípio de “teologia dentro dos limites da revelação apenas” . p. Quanto a uma crítica moderna do extra-Calvinisticum. uma tendência a considerar a revelação de Deus na encarnação com menos do que seriedade total? Se Calvino houvesse sido menos comprometido com a humanidade absoluta de Cristo. Ele alegou que “os papistas não têm nada senão uma sombra de Cristo. pp. Brill. uma forma de salientar a identidade entre a Palavra Redentora na carne e a Palavra Eterna que. assim que. como alguns intérpretes alegam.carnem). mas com “Deus manifestado na carne” . no entanto.. com o Pai e o Espírito. Calvino reconheceu que uma adesão à doutrina correta não era suficiente para impedir os abusos que via a seu redor na dependência de relíquias. entretanto.. era a fonte da criação e da redenção. Cf. se bem que a infinita essência do Verbo se uniu com a natureza de um homem em uma pessoa única. uma reserva em sua cristologia. de modo maravilhoso. em saber quem era Cristo / \ 106E. no Cristo encarnado. IV/1. para que. Como David W illis mostrou. Ora. do rosário e da missa. . Ao mesmo tem po. sempre enchesse o mundo. pp. o exíra Calvinisíicum era. 153. 62-64. 168-169. de modo maravilhoso. do céu desceu o Filho de Deus. Deus Pai remove toda a causa de inimizade e reconcilia totalmente os cristãos corfjigo. xv. Assim. mas também na pregação contínua do evangelho. desprezo. carência de sustento. hão abraçado a imensidade toda das bênçãos celestes” (Inst. II.107 Calvino explicava a obra de Cristo sob o aspecto do ofício triplo de Cristo. “anteposta expiação na morte de Cristo. como Profeta. mesmo que vivam a vida inteira “sob a cruz” . Em seu ofício profético. II. Cristo foi ungido pelo Espírito para ser arauto e testemunha da graça do Pai. até que. Entretanto.109 Calvino admoestou 1 os cristãos a aprenderem desse contraste que. em sua condição de M ediador puro e imaculado. Cristo atua como vice-regente do Pai no governo do mundo.. o próprio Messias. sobre Lc 23. CO 45. Nesse ofício. Isso se parece muito com a teoria da expiação penal e substitutiva apresentada por Anselmo em seu famoso tratado Por que Deus Tornou-Se Homem. havendo desempenhado nossa militância.. apaziguou a ira de Deus e fez uma compensação perfeita pelos pecados humanos. a menos que “esta segunda coisa acontecesse. Não há dúvida de que Calvino foi influenciado por Anselmo. porquanto a natureza de [Seu] reinar é tal que compartilhe conosco tudo quanto recebeu do Pai (Inst. Cristo não proclamou simplesmente o reino de Deus como Profeta. Mesmo em meio à sua humilhação e morte. cada figura era levada ao ofício por uma unção com óleo santo. mas a formulação calvinista acerca da doutrina da expiação não é um mero eco da teoria anterior. 3). não se encontrava nas Instituías de 1536.e. col. n. Cf. Ele cumpriu esse ofício não apenas por seu ministério de ensino na terra. frio.49: CO 47. 225.e. para que passemos pacientemente por esta vida. que Cristo fosse conhecido como desejou ser por nós e para que propósito ele foi enviado pelo P ai” (i. Jansen. 202-203. Cf. cancela [Ele] tudo quanto de mau há em nós” (Inst. sobre Jo 1. 108Esse esquema. injúrias e outras inquietações. Rei e Sacerdote. sob tribulações. 4).42: CNTC 3. 36. 2). celebra seu reino na temerosa e indizível destruição.. que Calvino pode ter adaptado de ßucer. ele também o trouxe consigo como Rei.. Wendel. p.108 No Antigo Testamento. o que prenunciava um cumprimento no “ungido” . 774. XV. Calvin. 1956). sua pessoa). contentes com isto só: que o nosso Rei nunca nos haverá de deixar à míngua. sua obra).. também John F. Calvin's Doctrine o f the Work o f Christ (Londres: James Clarke.(i. o ladrão penitente “adora Cristo como Rei no cadafalso. x v i... assim que [nos] não venha em ajuda em nossas necessidades. Deus surgirá como o Vencedor final: . sejamos convocados ao triunfo. 125n. Reconhecer Cristo como Profeta também significa que fora dele “nada há proveitoso de conhecer-se e todos quantos por fé percebem qual seja [Ele]. Cristo cumpriu o ofício sacerdotal quando. pp. . iwComm. col. Mediante o ato redentor de Cristo. iwComm. e proclama-o autor da vida na hora da m orte” . 833: “Et défait il nous pouroit bien retirer des abysmes de mort d’une autre façon: mais il a voulu desployer les thresors de sa bonté infinie. para m ostrar como tanto o amor quanto a ira de Deus são mantidos em justaposição: Tinha [Ele]. Sua raison d ’être originava-se “do decreto celeste. mas também amar [o] que [Ele] havia feito (Inst.® Cristo morreu por nós porque Deus nos. como ser humano. Calvino afirmou que. Anselmo pressupôs uma necessidade quase ontológica para a encarnação: Deus quis resgatar a humanidade decaída. Louis: Concordia. col. ama. Mas 110CO 46. n. Williams mostrou. antes da reconciliação. Em terceiro. uma vida perfeita e sem pecado.110 A expiação. porque nossa iniqüidade não havia consumido de todo Sua obra [em nós]. Pois. podia resultar em mérito para a salvação humana. Calvino citou Agostinho. portanto. praticávamos a iniqüidade. é o f exemplo supremo da adaptação de Deus à nossa condição fraca e pecaminosa. . ambos ilustrados na obra de Cristo. Não há necessidade fora da graciosa vontade de Deus para conosco. a vida de Cristo não tinha nenhum valor salvífico. mas desejou m ostrar os tesouros de sua bondade infinita quando não poupou o Filho único” . exercendo inimizades para com Ele. ele não merecia. Em primeiro lugar. [Ele] nos amava. embora Anselmo estivesse preocupado basicamente em m ostrar como. Calvino declarou que “Deus era muito capaz de resgatar-nos das incomensuráveis profundezas da morte de outra maneira. na teoria de Anselmo. o foco de Calvino está mais na ira e no amor de Deus. visto que.. sabia. Num sermão sobre a paixão de Cristo. só poderia fazê-lo tornando-se homem.111 Ora. XII. então. Ao mesmo tempo. refletia a ênfase de Anselmo no caráter exclusivamente salvífico da morte de C risto. Seguindo Paulo (Rm 5.. entendida como a reencenação sacramental do sacrifício “passivo” de Cristo. Williams. 1). a obra de expiação / derivava do amor de Deus: Deus não nos ama porque Cristo morreu por nós. por não ter pecado. xvi. de que dependia a salvação dos homens” (Inst. de modo maravilhoso e divino.. ainda quando nos odiava. ‘"George H. a um só tempo. amor para conosco ainda quando. 4). Anselm: Communion and Atone ment (St. quand il n’a point espargné son Fils unique”. em cada um de nós não somente odiar [o] que fizéramos. todos os homens í eram considerados inimigos de Deus. n.Observemos brevemente cinco aspectos da doutrina de Calvino que trazem as marcas de seus conceitos teológicos únicos. II. por meio da expiação. 1962). Em segundo. Apenas a morte de Cristo. Destarte. E. Calvino negou qualquer necessidade simples ou absoluta para a encarnação. Conforme George H. o papel dominante da missa. que. ele até disse que “na morte de Cristo se nos depara a essência da vida” (Inst. Calvino certamente não minimizou a decisividade da morte de Jesus. Cristo devia ao Pai.10). a justiça de Deus foi retificada. xvi. de qualquer forma. odiava-nos quais Ele [nos] não fizera. 5). II. os ensinos e os milagres de Cristo. prova o contrário: “Sob a palavra ‘todos’ ele não inclui os condenados” . Ou resistamos sozinhos à força de seu ataque.— aqui está sua ênfase singular — a eficácia salvífica da expiação não estava limitada à morte de Cristo. O fruto da m orte de Cristo é sempre novo e duradouro para os cristãos. [. destroçou-lhe todo o poder. Jesus não guarda o prêmio da vitória para si mesmo. A ressurreição. Esses grandes triunfos de Cristo não constituem apenas um claro espelho de sua divindade. junto com seu ) sofrimento e morte. 244. o motivo da expiação como o triunfo de Cristo sobre o diabo: . pois “mediante sua intercessão ele propicia Deus para nós e santifica nossas orações pelo aroma de seu sacrifício..] abateu. essa passagem. p. xvi. Embora às vezes se diga que Calvino negava a doutrina da expiação limitada.2. . apesar de a linguagem legal da satisfação e da substituição penais predominar na discussão de Calvino acerca da expiação. o diabo. o nascimento.. XVI. que era plena de ignomínia.112 Em quarto lugar. II. 5). magnificentemente proclama Paulo o triunfo que Cristo para si alcançou na cruz. .] não sem causa. “Enfim. De outro modo. socorrendo-nos pelo beneplácito de sua advocacia” . ele não negligenciou o tema do Christus Victor.. como se a cruz. . não conhecem Seu feroz e bem equipado adversário. n2Comm. Preparam-se para o combate. entre outras.. sobre 1 Jo 2.. seria inútil Pedir a Deus o que já Temos em nós mesmos.. 6). pertencem à sua obra de expiação. a ascensão de Cristo e a promessa de sua Parousia são indício de sua vitória sobre as hostes do mal. a vida. mas partilha dele com os membros de seu corpo. autoconfiantes. mas também “o firme suporte de nossa fé” .. Assim. quebrantou.arrostado com esta maldição. começou a pagar o preço de [nossa] libertação a fim de redim ir-nos” (Inst. haja sido convertida em carro triunfal (Inst. Ela se estendeu por “todo o curso de sua obediência” . desde que Se revestiu da pessoa de servo. não há disjunção alguma entre a morte de Cristo na cruz e seu contínuo ministério de intercessão à direita do Pai. [. Isso é claramente expresso naquela petição do pai-nosso. CNTC 5. Aqueles que. em que os cristãos pedem que sejam libertos do maligno: Marque isso claramente: Não está em nosso poder Que nos engajemos no combate Àquele grande guerreiro. De fato. 114Entre os melhores estudos dedicados a esse tema estão os dois livros de Wilhelm Kolfhaus: Die Seelsorge Johannes Calvins (Neukirchen: Moers. A Vida no Espírito Pouquíssimos estudos têm sido escritos acerca da “espiritualidade de João Calvino” . veja. quer de nossa reação a seu sacrifício. pp. a não ser que queiram tornar inútil e infrutuosa [essa] própria m orte” (Inst. somos chamados a uma vida de obediência radical. 1974). Há uma eficácia inerente à morte de Cristo “que deve patentear-se em todos os cristãos. Calvino certamente pertence àquela família de teólogos que enfatizavam o caráter “objetivo” da obra expiatória de Cristo. 1949). e que frutos daí nos provenham. n. é suficiente Estar firmes. também John H.Como das mandíbulas de um leão louco e furioso. Cf. ser fortes No poder de Deus apenas. Procuramos agora ser libertados de seu poder. . De fato. Ph. Que os outros confiem em sua livre escolha. Mas ele não abandonou o aspecto subjetivo. “A Study o f John Calvin’s Doctrine of the Christian Life” (Yale University. quer da obra de Cristo em nosso favor. Wallace. 1941).113 Em quinto lugar. Lucien Richard. xvi. . Leith. Tragados por sua garganta. que Calvino intitulou “a maneira de ser recebida a graça de Cristo.114 Isso é surpreendente quando se considera quanta atenção o próprio Calvino dedicou a esse tema. Essa apropriação da obra de Cristo na vida do cristão é o tema do terceiro volume das Instituías. D. Vom Christlichen Leben nach Johannes Calvin (Neukirchen: Moers. 1949). Contudo sabemos Que. The Spirituality o f John Calvin (Atlanta: John Knox Press. Por nossa participação no trabalho redentor de Cristo. Se luta por nós enquanto nos mantemos quietos. Se o Senhor não nos arrebatasse Do meio da morte. Piety. Calvin's Doctrine o f the Christian Life (Londres: Oliver and Boyd. Em inglês. 109-110.. se o Senhor está conosco. Seríamos por suas presas e garras imediatamente Despedaçados. Nas próprias capacidades — Para nós. Ronald S. 1959). e que efeitos se sigam” . Em seu poder faremos coisas poderosas. a obra da vida de Calvino pode ser ll3Battles. 7). De acordo com Calvino. está plantada em cada pessoa uma “semente de religião” . a oração e a predestinação. meditação sobre a vida futura. justificação. Tg 2. tudo quanto [Ele] sofreu e fez para a salvação do gênero humano nos é improfícuo e de nenhuma relevância” (Inst. até 1559. que Calvino começa a revelar como os cristãos “chegam a usufruir de Cristo e de todos os seus benefícios” . . Calvino. fosse suficiente para a salvação.interpretada como um esforço por formular uma espiritualidade autêntica. como Lutero. voltado para si mesmo. Visto ser impossível abordar todas essas importantes doutrinas de maneira resumida. Calvino também desaprovava o termo f é implícita. Antes de apresentar sua definição positiva da fé.19). Ainda assim . Evidentemente. a fé de algumas pessoas não é mais profunda do que “certo assentimento comum à história do Evangelho” (Inst. Em primeiro lugar. Como se sabe. É nessa altura. até os demônios são capazes desse tipo de fé (cf. abnegação. O problema da existência humana é que esse imenso apetite pelo divino foi tragicamente mal direcionado. santificação. na concepção de Calvino.. Isso reflete a luta de Calvino durante toda a vida com esse grande tema do evangelho. 1). um modus vivendi de vida no Espírito. n. com 43 seções. com freqüência não se vê esses três temas de modo sinótico. Jesus Cristo. oração. um aceno de cabeça dizendo sim ao que a Bíblia declara ser verdade. vivido no contexto da igreja de Deus e voltado para o louvor e a glória de Deus: soli deo gloria! Já vimos que. focalizaremos três delas: a fé. isto é. o carregar da cruz. homem religiosus. nas Instituías. ele havia sido desenvolvido num longo capítulo. eleição e ressurreição final. Para redirecionar e redimir a humanidade decaída. 1). III. I. A Fé Calvino dedicou um breve capítulo à fé nas Insíiíuías de 1536. negou que essa mera fé histórica.. Ainda assim. baseado na Palavra de Deus revelada. conforme proposto pelos teólogos romanos para referir-se a um tipo de submissão piedosa ao julgamento coletivo da igreja. a produção e a adoração de deuses falsos. fé e regeneração. no qual Calvino desenvolveu sucessivamente os seguintes tópicos: a obra do Espírito Santo. O terceiro volume como um todo é um tratado maravilhoso acerca da vida cristã. mas no conhecimento. o ser humano é por natureza um ente adorador. uma “percepção de divindade” que inevitavelmente resulta em piedade. cada um deles está muito próximo do âmago da espiritualidade de Calvino. a qual consiste no amor misturado com a reverência a Deus. arrependimento. Não é suficiente aceitar o que alguém declarou ser verdade. A verdadeira fé não repousa na ignorância. m. ou então em idolatria. Deus tornou-se homem na pessoa de seu Filho. liberdade cristã.“por quanto tempo Cristo está fora de nós e [nós] estamos dEle separados. saciado com artigos transitórios. esclareçamos alguns mal-entendidos populares que ele rejeitou. 1). fundado na verdade da graciosa promessa em Cristo. 4). I. seu Filho. então. A partir dessa definição. porquanto [nela] o homem se achega a D eus” ( Inst . então. 8. pois. III. in: Review and Expositor 83 (1986).” (Inst. a fé estava longe de ser uma capacidade inata dentro da natureza humana corrompida. a estes [os] vivifica mediante o Espírito da regeneração.. 7). ela nos leva à posse de todos os seus benefícios. Zuínglio e Calvino sobre essa passagem. II. uma vez que a ambas [essas cousas]. Calvino estava pensando na fé como “uma percepção vívida” . mediante o Espírito Santo” (Inst. Para um estudo comparativo entre Lutero. que faz parte da regeneração. m. 21). veja Timothy George.. um dom sobrenatural que aqueles que de outra maneira permaneceriam na descrença recebem pela graça (Inst. Cf. Que é arrependimento? “. Há. é “mais do coração do que do cérebro e mais da sensibilidade do que do intelecto” (Inst.. isto é. in. pp. por outro. também a discussão de Calvino sobre essa distinção em seu Commentary sobre Tiago 2. Chamando-a de “conhecimento” . um aspecto dual da fé. .é [ele] a verdadeira conversão de nossa vida U5Institutas. pois que o [próprio] começo do crer já em si contém a reconciliação.14-17: CNTC 3. mas é também selado em [nosso] coração. m. III. a fim de que seja eficaz no processo de justificação... 282-285.. a fé? Calvino definiu-a como “o firm e e seguro conhecimento da divina benevolência para conosco.. não teria Calvino reduzido a salvação a um exercício intelectual? Absolutamente não. m. Repetidamente. Por um lado. li. Que é. a fé é “a obra principal do Espírito Santo” . “A todos quantos Deus quer arrebatar da perdição. “Agora. 369-82. embora a mente esteja envolvida no ato da fé. Finalmente. pp.devemos ir mais fundo no conhecimento pessoal de Deus Pai por meio de Jesus Cristo. Hl. n. II. que deve ser completado pela infusão do hábito do amor. De fato. assim como a novidade de vida e os outros dons do Espírito Santo. Crer ou não crer não está dentro do conjunto de possibilidades abertas àqueles que se encontram fora da órbita da atividade redentora de Deus.. . [conhecimento] que. novidade de vida e reconciliação graciosa. pela qual nós apreendemos a graça de nossa adoção. Esse ato de ser colocado em Cristo (insitio in Christo) ocorre na regeneração que.115 Calvino concordou com Lutero nesse conceito totalizador da fé: “ . é a conseqüência da fé. é a obra do Espírito Santo. Calvino nos confira e a ambas consigamos pela fé” (Inst. m. Calvino reiterava que a fé é o dom único do Espírito Santo. 8). é a resposta humana genuína pela qual os que Deus elegeu entram em sua nova vida em Cristo. “‘A Right Strawy Epistle’: Reformation Perspectives on James”. não só é revelado à nossa mente.. Ao referir-se à fé como conhecimento.. 8). segue-se à fé como seu resultado: como a fé recebe Cristo. sendo esta última um tipo de prim eiro estágio preliminar da fé. podemos ver que. Calvino não via nenhuma utilidade na distinção escolástica entre a fé “formada” e a “informe” . O arrependimento também. Calvino foi cuidadoso em ressaltar. para Calvino. m. . Calvino declarou que a fé é o dom do Espírito Santo. m . 10). De fato. pelo qual somos regenerados e levados a uma vida de arrependimento e renovação. carregam em si “uma acendalha de mal. e quanto ao fato existencial de que mesmo os cristãos. mas sim um conhecimento certo e seguro. m. enfatizou a necessidade duradoura de um arrependimento mntírum e. 26). 17).. há duas que desejamos mencionar aqui: a relação da fé com a prova e a dúvida. 2). n. 5). nem uma segurança que de nenhuma inquietude seja aqatada [. Entre as muitas outras dimensões da fé abordadas por Calvino.. de fato. que “deitou raízes no íntimo do coração” (Inst... Tão longe está de que lhes coloquemos a consciência em algum plácido repouso. procedente de um sincero e real temor de Deus. talvez especialmente os cristãos. voltamo-nos para Deus e. que consista da mortificação de nossa carne e do velho homem e da vivificação do Espírito" (Inst.. Assim. não estão limitados ao momento inicial da conversão.. Para Calvino.. a mortificação e a vivificação. M as. Calvino ofereceu um julgamento realístico dessa experiência: “. arrependimento era quase sinônimo de conversão. nunca superamos a necessidade das disciplinas da abnegação e do carregar da cruz. Embora podendo e devendo progredir na vida cristã. ainda mais do que o reformador alemão. um afastamento de e um direcionamento para: “Afastando-nos de nós mesmos. tendo abandonado nossa antiga mente. A fé não é m era conjectura que “no topo do cérebro voluteia” . e sua indefectibilidade. Ao referir-se à espiritualidade dos anabatistas e dos jesuítas. m. são freqüentemente tentados por dúvidas e abalados em sua resoluta confiança? Numa passagem que já citamos parcialmente. m. colocamos uma nova” . Calvino não teria gostado do tipo de evangelismo que prega uma credulidade fácil. III. [repouso] que de perturbações nenhumas seja absolutamente importunado” (Inst. . m . ou santificação. mas persistem como o padrão de toda a vida cristã. II. Calvino. Mesmo os regenerados. o processo que dura a vida inteira de crescimento gradual naA graça.. que Calvino englobou juntos. nunca atingimos tal perfeição. sendo ajustados cada vez mais à imagem de-ptlvifl®. não imaginamos alguma certeza que de nenhuma dúvida [jamais] seja tangida.a Deus. de onde brotem incessantemente desejos que a pecar o atraiam e excitem” (Inst. Isso se assemelha muito à prim eira das Noventa e Cinco Teses de Lutero. V “ conseqüentemente. que requer uma decisão por Cristo sem conseqüências radicais e de mudança de vida. m.. ele atacou aquele espírito de torvelinho que produz tais frutos e “limita a uns poucos diazinhos a ‘penitência’ que ao homem cristão se tem de prorrogar por toda a vida” (Inst. ele explicou que tanto o equivalente grego de arrependimento quanto o hebraico implicam numa mudança radical no arrependido. enquanto ensinamos que deve a fé ser certa e segura.] dizemos que os fiéis têm perpétuo embate com sua própria difidência. Os dois aspectos do arrependimento. a ponto de tornar o arrependimento desnecessário. enquantoX ” habitam em corpos mortais. m. assim. mas. sustentados pelo Espírito. eles não se perderiam total ou finalmente. não podendo ser circunscrita à fórmula reduzida “uma vez salvo.Às vezes.28: CNTC 4. 273.. mas. outras vezes dos ataques diretos de Satanás e em outras vezes ainda de eventos aparentemente fortuitos que nos engolfam. como se nossa vida estivesse em perigo. . a menos que lancemos nossa âncora no fundo do mar. não temos nada a temer.... as dúvidas surgem do conflito incessante entre carne e espírito no íntimo do crente. que é um afastamento completo e uma renúncia total do evangelho.. no fim. 249-250. estamos como que no meio do mar. Em seu comentário de Hebreus 6. [.. enquanto vagamos neste mundo. Tais incrédulos poderiam dar indícios de vida cristã. Calvino declarou: É o fruto incomparável da fé que Cristo nos ordena estarmos seguros e tranqüilos quando somos trazidos pela fé até seu redil.28. a qual [a esperança] temos por âncora da alma. segura e firme. p.” (Hb 6. Em qualquer direção a que m Comm. Entretanto.. Mas — aqui está o segundo ponto que Calvino queria m ostrar — no fim. e tão grande é nossa fraqueza que não estamos longe da morte a todo momento. O diabo não cessa de provocar inumeráveis tempestades. a fé verdadeira triunfará sobre as dificuldades que a assediam e parecem colocá-la em risco.19). É óbvio que. mesmo em pecados abomináveis. Por outro lado. Calvino deu sua mais clara e eloqüente descrição da indefectibilidade da fé em meio às tormentas da vida: “ .] Estamos cercados por inimigos poderosos. Mas aquele que guarda o que nos comprometemos com ele é maior e mais poderoso do que todos\ e. [. CO 47. Calvino não minimizou o pecado da apostasia. Assim Calvino afirmava a perseverança final dos santos. Nossos olhos não vêem ancoradouro algum. cols. provariam ser falsos santos. visto que “Deus certamente concede seu Espírito de regeneração apenas aos eleitos” . ao contrário. e até mesmo possuir o que Calvino chamou de “fé tem porária” . os cristãos verdadeiros poderiam cair em pecado. que quase viram e afundam nosso barco.116 Essa é uma doutrina rica e multifacetada. esse pecado só poderia ser cometido por aqueles que não haviam recebido a “semente incorruptível” do Espírito no novo nascimento. sobre Jo 10. não estamos em terreno seguro.. sacudidos por ondas turbulentas. sempre salvo” . Essa é uma comparação eloqüente entre uma âncora e a fé fundamentada na Palavra de Deus. muitas vezes citado como texto-prova para refutar a doutrina da perseverança.] Essa é uma passagem marcante. Em seu comentário de João 10. Aqueles que consideravam esse ensino uma justificativa para a frouxidão estavam abusando da graça de Deus e permaneciam em risco de julgamento divino. que nos ensina que a salvação de todos os eleitos é tão certa quanto o poder de Deus é invencível. A fé que nunca atravessou as chamas da dúvida e da tentação permanecerá fraca e débil. independentemente de nossas orações? Os que pensam dessa forma. permanecemos além do perigo de naufrágio. 193-194. mas sim a fim de alertar a si mesmos para buscá-lo.. No princípio. porque não encontra nada em que se segurar nesta terra.118 Os fiéis não oram para contar a Deus o que ele não sabe. n7Comm. e. sobre Mt 6. assim a verdade de Deus é um vínculo que nos conecta com ele. 80-81. ” 8Calvin.. Calvino condenava a hipocrisia daqueles que “acreditam no rompimento dos tímpanos de Deus [. e diferente a firmeza de sua Palavra. 68. sobre Hb 6. mesmo quando lutamos constantemente com tempestades. a primeira é lançada para dentro do mar. Saving Work.. pode ser que a violência das águas arranque a âncora. . e nenhuma distância.8: CMTC 1. Pois nossa fé não deve apegar-se à criatura. 86.] Mantenha esses dois pontos: nossas orações são previstas por ele em sua liberdade. pode impedir que nos atenhamos a ele. conseguimos pela 119 oraçao. diferente é a fortaleza da esperança. Mas há uma diferença entre a âncora e nossa esperança. vemos apenas água. é erguida e paira no alto. Assim como a âncora é lançada em meio às águas nalgum lugar escuro e secreto. e reduza a pedaços o barco açoitado. é dom de Deus. p. a última.. Obviamente. p.117 A Oração O capítulo mais longo das Instituías é dedicado à oração.] para persuadi-lo do que querem ” . e as ondas continuam a levantar-se com ameaças mortais. para pressioná-lo em suas tarefas ou apressá-lo quando demora. contudo. p. para exercitar a fé meditando em suas promessas. CO 45. quanto pela nossa” . porque a terra está no fundo dele. ou quebre o cabo. m Comm. o que pedimos. cols. Tal fato pode acontecer no mar. [.olhemos. 203. mediante a qual recebemos diariamente os benefícios de D eus” . CO 55. não entendem o propósito pelo qual Deus ordenou a oração — “não é tanto por sua causa. que Calvino chamou de “o principal exercício da fé. É por isso que ele diz que a âncora é segura e firme. Calvino enfrentou uma questão levantada por suas próprias pressuposições teológicas: se a vida cristã inteira. livrando-se de suas cargas ao se elevarem a seu íntimo. mas tem de encontrar sua quietude em Deus. Calvino dizia. protege o barco de ser despedaçado pelas ondas que o cercam — da mesma forma nossa esperança deve-se agarrar firme ao Deus invisível. por outro lado. cols. desde o primeiro passo até a perseverança final.19: CNTC 12. Quando estamos assim ligados a Deus. Mas o poder de Deus que nos sustenta é diferente. Como o cabo preso à âncora conecta o barco com a terra numa enorme distância através das águas escuras. enquanto permanece lá. nem escuridão nebulosa. por que orar então? Não podemos simplesmente continuar com nossas atividades no conhecimento seguro de que Deus tomará conta de tudo. non secus ac sagittas. Isso significa que devemos evitar o tipo de leviandade e frivolidade que recorre a Deus como uma espécie de amigo celeste. Piety.121 A terceira regra da oração segue a segunda: devemos abandonar toda a confiança em nós mesmos e humildemente suplicar perdão. pediremos tudo de acordo com sua vontade. E o elemento de arrependimento também não deve estar ausente de nossas orações. XX. 5). que elaboremos nossas orações “devida e corretamente” . desejamos. Todo o propósito da oração. m Comm. mas. mas. temos fome. o “homem lá de cima” .”120 Essa regra também significa que não exigiremos arrogantemente de Deus nada mais do que ele permite.. l21Battles. Os verbos que Calvino empregou para descrever a oração verdadeira frisam este princípio: na oração ansiamos. Deve vir do coração. enfim. incita-nos. A segunda regra de oração é que oremos com uma percepção sincera de necessidade. buscamos. p. . sim. e na verdade da vida cristã inteira. lamentarmos Nosso trágico estado. é a glória de Deus. Essa percepção do pecado estimula-nos. como as Escrituras ensinam. afastar-se de toda confiança de si [mesmo]. A oração é mais do que murmúrios piedosos. . Ill. qui in coelum penetrent”. A oração serve para confessarmos. pium cor emittit. ” (Inst. lingua non ante it pectus: deinde non captatur Dei gratia inani verborum fluxu. Isso significa que qualquer um que se põe diante de Deus para orar deve em verdadeira humildade abdicar “de todo pensamento da própria glória. Nem devemos usar palavras vãs ou ostentadoras. CO 45. A primeira é que nos aproximemos reverentemente de Deus. Assim é conosco diante de Deus. como disse o salmista. suplicamos. sobre Mt 6. clamamos. sed potius suos affectus. sentimos sede. Deus não estabeleceu a oração Para arrogantemente nos envaidecer perante ele Ou valorizar grandemente nossas próprias coisas. 193: “Nam ubi serio affectu concipitur precatio. e penitentemente. “das profundezas” . Achegar-se verdadeiramente à presença divina é ser “movido pela majestade de D eus” (Inst. a língua não ultrapassa o coração. p. p. Desperta-nos a orar. Como as crianças lançam seus problemas Sobre seus pais. 93. nem o favor de Deus é obtido por uma torrente vazia de palavras. “Quando oramos com uma intenção séria. os anseios que o coração devoto envia como setas são aqueles que chegam aos céus. 203.Calvino apresentou quatro regras de oração para guiar o cristão em suas “conversas com D eus” .7: CNTC 1. pedimos.. despir-se de toda noção de dignidade [própria]. XX.. 29). É apropriado. compreendida pela assembléia inteira. A base real de nossa esperança. embora^ ele advertisse que não devemos estar mais atentos à melodia do que ao sentido espiritual das palavras. não as “orações vazias” dos hipócritas. mas na língua cotidiana. suspiros. que comecemos nossa oração confessando nossos pecados e reivindicando a promessa de perdão. A glória de Deus deve brilhar Nas diversas partes de nosso corpo. Calvino já havia descrito o papel da oração na adoração a Deus: . oramos por meio de Jesus Cristo. Com uma voz comum. a conceber os quais de modo nenhum seriam suficientes as forças de [nossa] natureza (Inst. Ele não tinha paciência com aqueles que alegavam que podiam adorar tão bem em casa quanto na igreja. m. mas também se aplicam às orações comuns da igreja. declarar. traiçoeira. com segura esperança de alcançar resposta” (Inst. sejamos. em quem todas as promessas de Deus são confirmadas e cumpridas. não obstante. não em grego entre os latinos. proclamar. 11). Glorificar a Deus juntos. animados a orar. E a tarefa principal da língua é. m.. Criada para cantar. Essas quatro regras servem para guiar cada crente em sua oração íntima. O canto também pertence ao ministério da oração. Em 1536. Astuta. desejos. Com uma única boca. Calvino afirmava que a “parte principal de Seu culto é o múnus da oração” (Inst. XX. desatenta É a mente que pensa sobre Deus. nem em latim entre os franceses ou ingleses. Calvino chegou a ponto de dizer que a única oração aceitável a Deus nasce da “presunção da fé” . é o objeto para o qual nossas orações se dirigem: oramos a nosso Pai celeste. A oração pública deve ser simples. o Pai de todas as misericórdias. x x . . 5). então. De fato.m . Contar. oramos por meio do Espírito Santo.. direta. 8). assim prostrados e subjugados de verdadeira humildade.. seu Filho e nosso Senhor. Se não for exercitada por Fala e canto devotos. x x . A quarta regra é que oremos com esperança confiante: “ . obviamente. Nas orações públicas oferecidas Na assembléia dos crentes. a oração deve ser oferecida no vernáculo. E em especial na língua. obviamente. o Deus de todo o conforto.. E. m. O louvor de Deus. que é nosso mestre na oração e que “suscita em nós confiança. . é descrever brevemente o que Calvino ensinou sobre a predestinação e como isso funcionou em sua teologia. Ou zombaram apenas com a Graça da Perdição. a serva e o escravo dissecam o livre-arbítrio e confundem a predestinação. p. numa só fé. Essa opinião foi repetida por inúmeros eruditos e tornou-se parte da caricatura usual do reformador de Genebra. Retiraste-os de tua Face.” Até quando. descreveu nestes versos a atitude popular em relaçao à doutrina da eleição: O carregador. questionaram essa suposição. C- .Adorá-lo juntos Num só espírito. em sua forma m Ibid. No século xvm .123 O desprezo por essa doutrina é um tema recorrente na história da igreja. The Cheese and the Worms: The Cosmos o f a Sixteenth-Century Miller (Londres: Routledge and Kegan Paul. até quando Os ímpios Vermes tua Palavra refutarão. entretanto. Negarão tua Fidelidade e Amor.122 A Predestinação Pietro Nelli. Outros. A palavra predestinação. 99. exceto os que se afastaram. A outros salvaste.. 123Citado de Carlo Ginzburg. p. Ainda permanecerá a Doutrina Infernal? E solicitarás seu terrível Autor? Não — deixa-a afundar a teu Comando Na Fossa de onde veio. John Wesley. ciumento Deus. . um satirista italiano do século xvi.escreveu os seguintes versos de um hino em que o ensino calvinista é levado ao ridículo: “Compeliste os Perdidos a morrer. 20. W Nosso propósito. Em 1844. que devia mais a João Calvino do que estava disposto a admitir. Alexander Schweizer escreveu um livro no qual ele chamou a predestinação de o Zentraldogmen na teologia de Calvino. 1980). Tua justiça mancharão. tua Misericórdia ofenderão. nesta seção. à regeneração. Não queremos o céu abarrotado! Mais fiel à perspectiva de Calvino é o parecer de John Newton. ele não decidiu organizar seu programa teológico inteiro em torno dessa idéia. ele separou as duas. Assim como a providência. nem para se divertir com o jogo “eu estou dentro. colocou a providência e a predestinação uma após a outra. Gregório de Rimini e Thomas BradwardineÀ Calvino fez um movimento realmente original em seu estabelecimento da doutrina dentro de seu esquema teológico. quase no final do terceiro. Num exame mais aprofundado. Seu ensino acerca desse tópico é basicamente idêntico ao que já observamos em Lutero e Zuínglio. A predestinação é usualmente. Que todos os outros sejam condenados. porém. Zuínglio e os teólogos reformados posteriores. Por exemplo. esse é o lugar em que Tomás. e tinha afinidade com a tradição agostiniana radical da Idade Média. em certo sentido. e o mesmo poderia ser dito de Buçer também. Isso levou à presunção e a um exclusivismo ofensivo. na qual estavam teólogos como Jo m ás de Aquino (em seus últimos escritos).nominal. Certamente. Calvino freqüentemente recorria £ seu pai favorito. mantendo a providência sob a doutrina de Deus Pai no primeiro volume e colocando a predestinação sob o título geral da obra do Espírito Santo. a predestinação do princípio ao fim era um interesse pastoral. Calvino não começou com a predestinação. Não é um motivo para se gloriar na escolha de alguém. da mesma forma a predestinação é o clímax da doutrina do Deus Redentor. ele perguntou. como Beza e William Perkins. Para o cristão. completa a doutrina do Deus Criador. Calvino introduziu isso como um problema ocasionado pela pregação do evangelho. essa atitude tem sido por demais associada aos defensores da doutrina calvinista acerca da eleição. você está fora” . alguns atendem e outros não? Nessa diversidade. a graça de Deus invadiu. Por que. o fato da eleição é uma reflexão e x p o stfacto sobre como. ele próprio um grande calvinista: . De fato. fica-se impressionado com a falta de originalidade da doutrina da eleição apresentada por Calvino. à justificação e às outras doutrinas. em meio à escuridão e morte do pecado. tratada no contexto da doutrina de Deus como uma aplicação especial da doutrina da providência. quando o evangelho é proclamado. Na verdade. passando depois à expiação. a profundidade maravilhosa do julgamento de Deus torna-se conhecida. Há espaço suficiente para você no inferno. a colocaram. A predestinação tornou-se uma questão no contexto da história da salvação. Para Calvino. como no velho hino batista particular: Somos os poucos eleitos do Senhor. ele disse. e muito logicamente. Como todos esses. nas primeiras edições das Instituías. foi usada pela prim eira vez por Calvino somente nas Institutos de 1539. Calvino também. Na edição definitiva de 1559. Agostinho. xxm . isto é. mas baseia-se somente sna vontade imutável de Deus. Contudo. m . . Obviamente. Deus. A predestinação'é absoluta. isso significa que Cristo não morreu por to d o sr indiscriminadamente. que acreditgyam no ajcance iljmitado da obra *expiatória de Cristo. Ele não está “sujeito a prestar contas” . quando Deus [olha para o futuro e] observa toda a humanidade. e. os ímpios trazem sobre si mesmos a ju sta destruição a que estão destinados. particular e dupla. enviou outros para a condenação eterna. exceto se í estabelecida contra a reprovação” (Inst. como Paulo ressaltou (Rm 9. porque. para o louvor de sua misericórdia. Essa doutrina. Ill. para o louvor de sua justiça. Perdido e me buscou Podemos resumir a doutrina da predestinação exposta por Calvino em três palavras: absoluta.. “que. nem nós somos juizes idôneos. ordenou alguns indivíduos para a vida eterna. do primeiro ao último. vemos quão tolamente os frívolos balbuciam quando atribuem ao simples e puro conhecimento prévio o que deve estar fundamentado na boa vontade de D eus” . Calvino expressou tal fato claramente: “a eleição em si mesma não poderia permanecer. Se perguntado sobre a razão pela qual Deus escolheu este e rejeitou aquele. “O conhecimento prévio de Deus não pode ser o motivo de nossa eleição. Com v / respeito à expiação. . de próprio senso. ele encontra a todos. _em oposição aos batistas gerais. que Deus elegeu Israel como seu povo especial da aliança. e não a grupos de pessoas. a predestinação é particular no sentido de que pertence a indivíduos. Assim. o que não poderia ser encontrado.124 Em segundo lugar. em conseqüência do que eles foram chamados de batistas particulares. Calvino estava consciente de .A estranha graça de Jesus. xin. l-16)X j\ aliança da graça aplica-se a cada pessoa individualmente. 2). que se tornou uma das marcas da ortodoxia calvinista. [sentença] pronunciemos acerca desta causa” (Inst. deu-me luz. Visto que todos estão justamente condenados em virtude de sua deserção de Deus. Um infeliz salvou. debaixo da mesma maldição. Calvino rejeitava a noção escolástica de que a eleição dependia do conhecimento prévio de Deus acerca das realizações humanas (ante praevisa merita). Calvino replicava que quem indagou estava procurando algo maior e mais elevado do que a vontade de Deus. a predestinação ié dupla. Eu cego estava. Deus permanece tanto livre quanto perfeitamente justo em sua decisão. 31). no sentido de que não está condicionada a nenhuma contingência finita. mas apenas para os eleitos. nem todo membro individual da nação estava eleito para a salvação. Ambos os fatos mostram-se verdadeiros: os réprobos são escolhidos para a condenação pelo decreto eterno de Deus e. Finalmente. mesmo assim. foi adotada por muitos batistas na Inglaterra do século xvil. A predestinação. 1). durante o Grande Despertamento do século x v m . nem um travesseiro para dormir. não é nem uma torre de igreja de onde se vê a paisagem humana.a1vinista ganhou muito mais pessoas para Cristo do que John Wesley. conforme Calvino a entendia. muitas vezes esquecendo essas palavras. e não desejava dizer sobre a predestinação nada mais do que podia ser extraído da Bíblia: que [as cousas] que o Senhor deixou recônditas em secreto não perscrutemos. Ao longo da história da igreja. Gporge. é uma fortaleza em momentos de tentação e provação. Whitefield. alguns dos evangelistas e missionários mais eficazes foram firmes defensores de uma doutrina suprema da predestinação. e uma confissão de louvor à graça de Deus e à sua glória. ficou para Calvino.. mas porque. de uma parte. tendiam a enredarse em debates sem fim sobre a ordem precisa dos decretos de Deus. de outra” (Inst . reconhecível como verdadeira . o “estudioso pobre e tím ido” . ^ ^ ^ Os Meios Externos de Graça 4- As Pressuposições da Doutrina da Igreja Apresentada p o r Calvino A preocupação dominante de Lutero era com o núcleo evangélico da igreja. no próprio Cabeça da Igreja está o mais límpido espelho de eleição graciosa” (Inst. [as] que pôs a descoberto não negligenciemos. ou de ingratidão. seu amigo arminiano. Por exemplo. Ill. os reformadores posteriores encarregaram-se da difícil tarefa de determinar com alguma precisão sua circunferência. para que não sejamos condenados ou de excessiva curiosidade.. x x i i . III. confiando ao Espírito Santo seu uso como meio externo para o chamado efetivo daqueles mesmos que foram escolhidos em Cristo antes da fundação do mundo. Calvino desenvolveu uma teoria mais formal da relação entre a igreja invisível e a igreja como instituição externa. como descreveu a si mesmo. Assediado por um catolicismo ressurgente de um lado e por um sectarismo proliferante de outro. de modo certo ou errado. analisar completamente a teoria e a prática da congregação protestante. A doutrina de Calvino permaneceu cristocêntrica em seu foco: " . acreditava que ela se encontrava claramente nas Escrituras. Antes. Ele advertiu contra exibir a mensagem do “horrível decreto” perante novatos na fé. Bucer e Ecolampádio debateram-se com tal problema. Os calvinistas posteriores. Zuínglio. 4). r. os indícios da eleição na atividade de uma pessoa no mundo e assim por diante.Calvino não ensinou essa doutrina porque era um “déspota severo” ou um homem mesquinho. Ele também não permitiu que a doutrina da predestinação fosse usada como desculpa para não se proclamar o evangelho a todos: visto que apenas Deus sabe quem elegeu e quem não elegeu para a salvação. x x n .. nós pregamos o evangelho indiscriminadamente. contudo.. 1).125 Para Calvino. I. a importância da disciplina para o bem-estar da igreja. I. a catolicidade e a apostolicidade de toda congregação que alegue ser uma igreja. CO 1. pp. Significativamente. o local da santificação é a congregação. santa. Se a doutrina salvífica de Cristo era a alma da igreja. ele não depreciou. col. . apostólica). por essa razão. L. Assim. sujeit'am-na a uma investigação externa. nas confissões reformadas. não está separada da livre imputação de justiça” . censura e excomunhão. As duas são conectadas como “momentos” distintos. IV. exatamente porque não são apenas descritivas. A disciplina. na qual os eleitos participam dos benefícios de Cristo não como indivíduos isolados. Calvino esclareceu a função das “m arcas” : “Ora. 125Contudo. (Inst.por certas marcas distintivas.. de modo que “a verdadeira santidade de vida. The Church in the Theology o f the Reformers (Atlanta: John Knox Press. Calvino não seguiu Bucer. entre si. na graça de dupla purificação. 3). 11). Dessa forma. deve ser submetida toda congregação que pretende o nome de igreja” (Inst . compartilhem” (Inst. m. como para Lutero. no qual “todos e quaisquer benefícios que para com eles confere Deus. No princípio do quarto volume das Instituías. Pertencia ao âmbito da visibilidade. 48-50. a igreja visível torna-se uma “comunidade santa” . Em contraste com o aspecto unilateral da justificação nas confissões luteranas. mas como membros de um corpo. Entretanto. as observações são distinguidas dos atributos nicenos tradicionais (una. assim. as marcas mais certas (certeoribus) permaneciam na Palavra puramente pregada e nos sacramentos corretamente administrados. quanto corporativamente. veja P. para que sob o nome de igreja se nos não impinja impostura. elas se tornaram causativas. mas dinâmicas: elas questionam a unidade. nos procedimentos públicos da admoestação. mas inter-relacionados.. cada um em seu lugar próprio. Calvino deu precedência à santificação em seu arranjo sistemático dos “benefícios de Cristo” . 89. por assim dizer. Quanto a Bucer. se não à definição da congregação verdadeira. então a disciplina servia de tendões (pro nervis). 9). Cf. disse Calvino.. tanto individualmente. e. mediante os quais os membros do corpo eram mantidos juntos. Por associar tão diretamente as marcas com o ato de testar e verificar. Nesta vida. católica. “nos desponta e conspícua aos olhos nos emerge a face da Igreja” (Inst. O interesse de Calvino pela ordem e pela forma da congregação derivava de sua ênfase sobre a santificação como ao mesmo tempo o processo e o objetivo da vida cristã. “Daqui” . no auto-exame. mutuamente. elevando a disciplina eclesial ao status técnico de uma nota. constitutivas da igreja visível. dizia respeito à constituição e à organização. Calvino incluiu o “exemplo de vida” entre as “marcas seguras e certas” . como fez a tradição reformada em geral. a santidade. Calvino ultrapassou o conceito de Lutero das marcas como meros indicadores da igreja visível. xi. IV. empírica. a igreja visível. a essa prova. D. à medida que isso também era um critério de teste. IV. então. I. Avis.. 1981). na primeira edição das Instituías. De certa forma. como a uma pedra lídia. Ademais. ainda que a teologia de Calvino tenha começado “quase tão apolítica quanto a de Lutero” . que Tito tivera com Paulo: ele era seu sucessor. foi dedicado a Guillaume Farei e Pierre Viret. a saber. pp. Harro Hõpfl afirmou que. 34.127 É verdade que. p. até que sua ênfase anterior na igreja como comunhão dos santos foi quase inteiramente eclipsada. passamos agora a uma elucidação mais específica de tais concepções. 127Harro Hõpfl. refletem os intensos esforços de Calvino por estabelecer uma congregação santa em meio a perturbações exteriores e lutas interiores. O comentário sobre Tito. Calvino afirmou manter precisamente o mesmo relacionamento com esses colegas.5: CNTC 10. em 1555. continuava a sumir de vista inexoravelmente. de fato seu pensamento veio a centralizar-se cada vez mais na igreja visível. vemos Caivino como o episcopus de Genebra. sete a oito anos depois do retorno de Calvino de Estrasburgo. os comentários foram escritos no final da década de 1540. Cf. regente substituto da Inglaterra e tutor do rei Eduardo VI quando este era menor. que não é trabalho para um ou dois anos restaurar a um estado satisfatório uma igreja caída” . por experiência. publicado no ano seguinte (1549).uma agente de santificação na grande sociedade onde cada aspecto da vida deve ser trazido para dentro da órbita dos propósitos cristãos e das regras cristãs. a seguinte declaração: “A igreja universal. sobre Tt 1. pois “dificilmente há algo necessário para a edificação da igreja que não possa ser tirado delas [dessas epístolas]” . A escolha desses comentários é sugerida pelo conteúdo das epístolas. 1 e 2 Timóteo e Tito. A Eclesiologia Bipolar de Calvino Em seu livro The Christian Polity o f John Calvin. por assim dizer.. mas deixaram incompleta (M d. encarregado de dar os “toques finais” na edificação que eles haviam começado. prefaciados por uma epístola dedicatória ao Duque de Somerset. com a igreja visível recebendo uma atenção apenas escassa na edição de 1536 das Instituías. escritos na investida da batalha. Calvino admitiu que não havia obtido tanto progresso na reforma da igreja de Genebra quanto desejara: “Sabemos.126 Esses documentos. predecessores de Calvino na reforma da igreja genebrina — Calvino diz que veio a Genebra como “assistente” deles. Calvino recomendou as epístolas a Timóteo como fornecedoras de “um quadro vívido do verdadeiro governo da igreja”. The Christian Polity ofJohn Calvin (Cambridge: Uuiversity of Cambridge Press. 356. então. 1982). Aqui. que lidam explicitamente com a ordem e a organização da congregação. que na época estavam trabalhando em Neuchâtel e Lausanne. p. mas seis a sete anos antes da consolidação de seu poder no que foi chamado de segunda revolução de Genebra. a comunhão dos santos. A esse firme defensor da reforma. Ele o instou a seguir o padrão estabelecido por Paulo. 84-85. Os comentários sobre Timóteo foram publicados em 1548. tornando-se por fim não mais que um recurso para lidar . expostas em seus comentários de três das epístolas pastorais. 347). Tendo examinado as pressuposições da doutrina da igreja local conforme apresentada por Calvino. olhando para além dos limites nacionais e das particularidades de sua situação local para os interesses de uma reforma congregacional ecumênica. em edições sucessivas das m Comm. p.130 Para Calvino. Eclesia Externa como M ater et Schola Calvino começou sua discussão da igreja visível.19:CNTC 10. 314-315. poderíamos acrescentar. 12). porque “ele não apenas nos recebeu como filhos pela graça da adoção (eleição). m Comm. mas ele mesmo habita no meio de nós” (a congregação). um fundamento lógico convincente para não rebatizar papistas convertidos ao protestantismo.129 Ao mesmo tempo. ibid. a igreja aparece em perigo mortal. As imagens entrelaçadas da igreja como mãe e escola são também recorrentes nos comentários com a asserção do Credo acerca da unicidade da igreja. elas “destruirão completamente a igreja” .. m Comm. De fato. a construção da igreja é para o bem dos eleitos.. no quarto volume das Instituías. sobre 2 Tm 2. explicou Calvino. a inconstância e a infidelidade humana “não podem impedir que Deus preserve sua igreja até o fim ” . sub specie aeternitatis. amamentados em seu seio e registrados como pupilos em sua escola todos os dias de nossa vida (Insí . Isso fornecia. IV. Caso se permita que as doutrinas falsas proliferem. enquanto a última incluía os anjos eleitos. iv.128 Somente quando percebemos que Calvino nunca relaxou a tensão visível—invisível é que podemos entender suas diversas caracterizações da igreja.15:CNTC 10.Instituías. 231. Calvino disse que havia boa razão para temer que a luz recentemente acesa da reforma fosse logo apagada. p. sobre 1 Tm 3. De fato. de maneira que arrebate essa arma dos romanistas”. Por um lado. isso não foi feito à custa da ênfase na igreja invisível. a igreja visível não era uma aproximação progressiva da invisível.. a discussão de Calvino sobre a igreja visível foi grandemente expandida.17:CNTC 10. trigo e joio crescendo no mesmo campo. m Comm. I. A prim eira era um corpus permixtum. a inescrutabilidade da eleição e a objetividade da Palavra e do sacramento (mas não da disciplina!) escoram a extensão relutante de Calvino do título “igreja” a congregações selecionadas que ainda estavam em obediência a Roma — “digo serem [elas] igrejas na extensão em que o Senhor aí maravilhosamente conserva remanescentes de Seu povo” (Inst. alcançando por fim o síatus de um livro inteiro. honoráveis do Antigo Testamento e várias almas predestinadas que se encontram fora do “pom ar murado do Senhor” . freqüentemente na mesma frase. Somos concebidos no ventre da igreja mãe. pp. 84. Entretanto. são mantidos juntos na conexão mais próxima possível. . a eleição divina e a congregação local. 316. Os dois pólos da eclesiologia de Calvino. A igreja é chamada de casa de Deus. Além disso. aplicando a ela as desgastadas metáforas de M ater e Schola. p. XII. sobre 2 Tm 2. 4). educa-os e alimenta-os durante toda a sua vida.. conceba[-o] a fé: m Comm. 254. CO 52. \ Há bem pouco sobre a ceia do Senhor nas epístolas pastorais. sobre 1 Tm 4. e Calvino. Mas ele estava de acordo com Lutero em que a ceia não era um símbolo vazio — a verdade da coisa significada está certamente presente ali — mas um meio de “real participação” em Cristo (Inst.135 Juntamente com a predestinação. IV/4. o batismo tinha o propósito de confirmar a fé nos eleitos. Há. m Comm. mas consagramos o pão e o vinho na ceia sacramental de maneira mais solene. xvill. pp. col. CO 52.5. como diz o texto — que instrui seus estudantes no “estudo de uma vida santa e perfeita” .. p. uma referência à ceia que distingue a bênção do alimento comum na mesa da bênção da refeição sacramental.'1Calvino chamou de batismo “nossa entrada na igreja e o símbolo de nossa incorporação em C risto” . 288.7: CNTC 10. fortalece-os e. sobre 1 Tm 5.15: CNTC 10. 12). tinha pouquíssima consideração pelos sinais exteriores. 241-242. uma visão caracterizada por Karl Barth como “sacramentalismo cognitivo” . o que nos mostra pelo sinal externo” . . xvn. CO 52. para nós.134 Entretanto. que os enaltecia exageradamente. 10-11).5: CNTC 10. por seu próprio poder. Como Cristo pode estar ao mesmo tempo à direita de Deus e presente no “banquete espiritual” da comunhão? “ . em Tito 3. m Comm. “Abençoamos o alimento que vamos comer para nutrir o corpo a fim de recebê-lo legitimamente e sem impurezas. Calvino exigia que o batismo fosse aplicado indiscriminadamente a todos na igreja visível. mas cumpre interiormente. garantias do corpo e do sangue de Cristo” . mastigado pelos dentes e engolido pela boca (Inst .5: CNTC 10.131 A igreja é também “escola de D eus” — “coluna e baluarte da verdade” . 308. p. 134Barth. o exegeta. A igreja é a mãe de todos os cristãos “porque os traz ao novo nascimento pela Palavra de Deus. entretanto. 231. para que possam ser. como o batismo pela água. 130. ele sentia. m Comm. leva-os à completa perfeição” . iv. e Lutero. p. sobre 1 Tm 3. p.132 O caráter maternal da igreja é visto especialmente em sua dispensação dos sacramentos do batismo e da ceia do Senhor.[o] que nossa mente não compreende.133 Para Calvino.das epístolas pastorais. col. col. Ele interpretou a expressão “o lavar regenerador” . obscurecendo assim o próprio mistério. ele tentou estabelecer um caminho intermediário entre Zuínglio. 382. a doutrina da ceia do Senhor evocou escritos mais polêmicos de Calvino do que qualquer outro assunto.. oportunamente calou-se a esse respeito. sobre Tt 3. o qual. observando que “Deus não joga conosco em figuras vazias [talvez um golpe em Zuínglio?]. Sobre a presença de Cristo no pão e no vinho. finalmente. IV. para ser tocado pelas mãos. Calvino concordava com Zuínglio que Cristo estava localmente presente à direita do Pai nos céus e não devia ser imaginado como “encerrado no elemento do pão” .. Church Dogmatics. 296. verdadeiramente unir o Espírito [a cousas] que foram disjungidas por lugares” \ (Inst ., IV, XVII, 10). Para a igreja, a ceia era tão importante como nutrição^? espiritual que Calvino advogava sua celebração semanal. ^ Na visão de Calvino, a igreja não era apenas mãe, mas também escola. De fato, ele freqüentemente combinava as duas metáforas. Falando da educação de Timóteo, ele disse: “Tendo sido corretamente instruído na fé desde sua infância, e, por assim dizer, tendo sugado a sã doutrina com o leite de sua mãe, e tendo feito até agora um progresso nela, esforce-se, mediante um ministério fiel, para provar que você ainda é o mesmo” .136 Obviamente, a igreja é uma escola na qual nunca nos formamos (deste lado do céu, pelo menos!); daí a necessidade de uma instrução contínua. A igreja também é, no melhor sentido do termo, um “reform atório” completo com um código de vestimentas específico, material de leitura censurado, comparecimento obrigatório à capela e bedéis para lidar com alunos recalcitrantes! Calvino, de fato, insistia para que fossem tomados cuidados especiais na instrução dos rebeldes: “Visto que a conversão de um homem está nas mãos de Deus, quem sabe se aqueles que hoje parecem indóceis talvez sejam subitamente mudados, pelo poder de Deus, em homens diferentes?” 137 — uma afirmação notadamente semelhante à sua descrição da própria “conversão súbita” , pela qual Deus submeteu seu coração à docilitas, aprendizado. Ordem e Ofício O estabelecimento de um ofício quádruplo, a saber, de pastor, professor, presbítero e diácono, foi um componente essencial do acordo de religião de Genebra que levou Calvino de volta à sua cidade adotiva, em 1541. Alexandre Ganoczy, entre outros, afirmou que Calvino tomou emprestado esse esquema quádruplo de M artin Bucer, cujo Comentário de Mateus, de 1536, havia apresentado exatamente a mesma distribuição.138 De qualquer modo, até 1541 Calvino havia passado a acreditar que tal padrão era ordenado pelas Escrituras; de fato, essa foi a pedra fundamental da nova política encerrada nas Ordenanças Eclesiásticas. Poderíamos pensar que uma estrutura tão essencial a uma congregação “bem proporcionada” estaria amplamente exposta no Novo Testamento, em especial nas epístolas claramente planeadas como manuais da ordem da igreja. (Calvino, claro, nunca questionou a autoria paulina das pastorais; em harmonia com a erudição bíblica moderna, porém, ele as via como cartas públicas sobre a ordem da igreja, m Comm. sobre 1 Tm 4.6: CNTC 10, pp. 242-243; CO 52, col. 298. niCotntn. sobre 2 Tm 2.25: CNTC 10, p. 321; CO 52, col. 374. 138Alexandre Ganoczy, Calvin: Théologien de l’Eglise et du Ministère (Paris: Editions due Cerf, 1964), pp. 298-299. não como correspondência particular.) Mas isso não acontece. Dos quatro ofícios, a parte principal da atenção é dedicada ao pastorato. Absolutamente nada é dito acerca do ofício de ensino, e Calvino tendia a combiná-lo com o pastorato. Por outro lado, Calvino parecia quase embaraçado pelos extensos comentários de Paulo sobre o diaconato em oposição ao ofício de ancião, dando importância invertida a esses dois ofícios leigos em sua própria política. Calvino realmente tinha o diaconato em alta consideração. Os diáconos eram oficiais públicos da igreja a quem era confiado o cuidado dos pobres. Ele insistia em que fossem qualificados na fé cristã, pois, no decorrer de seu ministério, “eles freqüentemente deverão dar conselhos e consolo” . De fato, os diáconos na Genebra de Calvino devem ter sido especialistas no que hoje chamamos de ação social, tanto quanto no cuidado pastoral. Calvino admitiu que o diaconato podia servir às vezes de “berçário [novamente o tema maternal] de onde os presbíteros são escolhidos” ; contudo, ele se opôs ao costume romano de fazer do diácono o prim eiro passo para o sacerdócio. Essa prática era um solapamento ofensivo de “um ofício altamente honorável” .139 Quanto ao ofício de presbítero, Calvino notou que a palavra presbyteros não descrevia uma idade, mas um ofício. Timóteo, a quem Paulo estava escrevendo, era bastante jovem; Calvino tinha apenas 27 anos quando chamado a Genebra. Conforme aplicada a si mesmo e a Timóteo, porém, a palavra presbyteros era sinônimo de episcopus, ou pastor. Calvino descobriu que havia de fato dois tipos de presbíteros no Novo Testamento. A base textual para essa “descoberta” é o ^ seguinte versículo: “Devem ser considerados merecedores de dobrados honorários j\ os presbíteros que presidem bem, com especialidade os que se afadigam na palavra J e no ensino” (1 Tm 5.17). Ele explicou: O significado claro das palavras é que havia alguns que presidiam bem e honradamente, mas que não detinham um ofício de ensino. O povo elegia homens sérios e bem treinados, que, junto com os pastores, num concílio comum e com a autoridade da igreja, administrariam a disciplina e atuariam como censores para a correção da moralidade.140 Se isso parece surpreendentemente semelhante à instituição do consistório em Genebra, devemos admitir que nem mesmo Calvino estava livre de interpretar o Novo Testamento segundo o que ele próprio acreditava. ™Comm. sobre 1 Tm 3.9; 3.13: CNTC 10, pp. 229-230. m Comm. sobre 1 Tm 5.17: CNTC 10, p. 262; CO 52, col. 315. O outro “texto-prova” de Calvino para o presbiterato leigo é Romanos 12.8. C f Inst., iv, m, 8. Cf. também Hõpfl, pp. 94-95, 137-139. O Pastor Reformado Calvino acreditava que os ofícios de profeta, apóstolo e evangelista, tão proeminentes no Novo Testamento, eram temporários em natureza e tinham cessado no fim da era apostólica. Dos ofícios que subsistiram nessa dispensação, o de pastor é claramente o mais honorável e o menos dispensável para a ordem apropriada e para o bem-estar da igreja.141 Na edificação espiritual da congregação, a nomeação dos pastores era inferior em prioridade apenas à aceitação da doutrina pura. De fato, na concepção de Calvino, esses dois objetivos estavam tão intimamente entrelaçados que mal podiam ser separados. Os temas neotestamentários bispo, ancião (presbítero), ministro, pastor e, às vezes, mestre (doutor) referem-se todos ao mesmo ofício. Qual é o papel do pastor? Representar o Filho de Deus (em outro trecho, Calvino empregou o termo lugar-tenente no sentido etimológico de tenant lieu de — “que ocupa o lugar de”), erigir e estender o reino de Deus, ocupar-se da salvação das almas, governar a igreja, que é patrimônio de D eus.142 Calvino afirmava que deveria haver ao menos um pastor em cada cidade, apesar de, obviamente, algumas cidades, como Genebra, talvez necessitarem de vários pastores — no tempo devido, Genebra poderia ostentar uma “companhia” inteira de pastores. Como o pastor devia ser escolhido? Calvino refletia se, de fato, alguém deveria deliberadamente buscar o ofício. Embora certamente fosse errado que um indivíduo “apresentasse a si mesmo” com ambição egoísta, era apropriado que alguém movido por desejo santo se preparasse para o ofício. “Que são as escolas teológicas senão maternais para pastores?”143 Contudo, o indivíduo deveria ser chamado publicamente de acordo com a ordem que a igreja prescreveu. Em Genebra, isso requeria um exame e uma seleção prévios pela companhia de pastores (uma perspectiva intimidante!), a apresentação ao conselho da cidade e a aprovação pelo x consentimento comum da congregação. ^ Esse processo era seguido da ordenação, que Calvino descreveu como um “rito solene de instituição” ao ofício pastoral. Em outro trecho, Calvino referiu-se à V ordenação como um sacramento e admitiu que era conferida graça por meio desse N sinal externo. De fato, ele empregou uma linguagem impressionantemente similar à sua descrição do batismo. A ordenação não era um sinal vão ou inútil, mas uma marca fiel da graça recebida da própria mão de Deus. E mais, era um “ato legítimo m Cf. a observação de Ganoczy: “Le Pasteur est le ministres par excellence. Il peut assumer la fonction des autres ministres, mais les autres ministers ne peuvent pas assumer la fonction pastorale”, p. 300. U2Institutas, iv, iii, 1. Cf. Jacques Courvoisier, De La Réforme au Protestantisme: Essai d ’Ecclesiologie Réformée (Paris: Beauchesne, 1977), pp. 66-71. '*Comm. sobre 1 Tm 3.1: CNTC 10, p. 222; CO 52, col. 280. de consagração perante Deus, algo que podia ser feito somente pelo poder do Espírito Santo” .144 Devemos ser cuidadosos, contudo, para não impugnar a Calvino uma visão absolutista da política eclesiástica. Ele censurou a congregação de refugiados em Frankfurt por tentar depor seu pastor, yalérand Poullain. com o argumento de que ele não teria sido apropriadamente ordenado. A respeito de Poullain, Calvino escreveu: “Aqueles que primeiro trabalharam para plantar o j t evangelho devem ser aceitos como pastores, sem outras formalidades” .145 Calvino, então, estava disposto a permitir certa liberdade de ação no método de escolha dos ministros. O ofício pastoral, em si mesmo, nunca é adiáforo, mas os detalhes da nomeação podem ser. Foi precisamente esse tipo de flexibilidade que possibilitou a Calvino influenciar, quando não dirigir, um movimento internacional de reforma em contextos políticos tão diversos quanto da França, da Polônia, da Escócia, da Inglaterra e do Palatinado. Mas p o r que os pastores são tão importantes para a igreja? “Por acaso todos não têm a oportunidade de ler as Escrituras por si mesmos?” , perguntava Calvino. Sim, mas os pastores tinham de cinzelar ou dividir a Palavra, “como um pai /repartindo o pão em pequenos pedaços para alimentar seus filhos” .146 Os pastores í devem ser completamente ensinados nas Escrituras, para que possam instruir corretamente a congregação na doutrina celeste. A importância da pregação no pensamento de Calvino dificilmente pode ser exagerada. Calvino não queria ter relações com aqueles que alegavam para si o título de bispo, que circulavam vestidos em roupas teatrais, mas que de fato eram “fantoches que nunca pregam ” — um epíteto que ressoaria na escoriação puritana dos sacerdotes anglicanos como “cães emudecidos” que têm um ministério de “mera leitura” . Num pastor, o aprendizado profundo devia ser acompanhado de um talento para ensinar. Há muitos que, ou por causa de expressão defeituosa ou capacidade mental deficiente, ou porque não estão em contato suficiente com pessoas comuns, mantêm seu conhecimento encerrado em si mesmos. Tais pessoas deveriam, como dizem, cantar para si mesmas e para as musas — e ir fazer qualquer outra coisa. [...] O que se requer não é meramente uma língua volúvel, pois vemos muitos cuja fluência fácil não contém nada que possa edificar. Antes, Paulo está recomendando sabedoria na aplicação da Palavra de Deus para o proveito de seu povo.147 m Comm. sobre 2 Tm 1.6: CMTC 10, p. 293; CO 52, col. 350: “consecratio coram Deo legitima, quia non perficitur nisi spiritus sancti virtute” . 145Hunter, p. 203. ,46Comm. sobre 2 Tm 2.15:CNTC 10, p. 313; CO 52, col. 367. H1Comm. sobre 1 Tm 3.2: CNTC 10, p. 225; CO 52, col. 282. O propósito da pregação é a edificação. O pastor não deve “esvoaçar em torno das sutilezas da curiosidade frívola” ; ele não deve, para usar a encantadora palavra de Calvino, ser um “ questionariano” . A pregação não deve ser apenas sã doutrinariamente, mas precisa também buscar o “benefício concreto” da igreja, isto é, deve ser prática, aplicável, discriminativa. O pastor é incumbido da pregação e do governo. “Um pastor precisa de duas vozes” , disse Calvino, “uma para reunir o rebanho e outra para afugentar os lobos e os ladrões” .148 O papel disciplinador do pastor exige que sua própria conduta esteja acima de qualquer censura. Calvino não hesitou em advogar um padrão duplo para clero/laicato. Ao discutir a proibição que Paulo fez da poligamia para pastores (sua interpretação da exigência de “marido de uma só m ulher”), Calvino observou: “Ele poderia, até certo ponto, ter tolerado em outros algo que nos bispos era intoleravelmente desonroso” .149 Aqui, Calvino não havia recaído na moralidade dupla da cristandade medieval. Ao contrário, estava preocupado com a visibilidade da igreja, com a “face” da igreja. Um ministro indigno pode causar danos irreparáveis à congregação. Por essa razão, deve manter-se numa responsabilidade mais estrita. A Igreja e o Mundo x Ao rejeitar o conceito anabatista da congregação como um conventículo retirado da cultura ao redor, Calvino enraizou sua reforma no “cristianismo estabelecido” do corpus christianum medieval. Num artigo discernente sobre “a dimensão ‘extra’ na teologia de Calvino” , Heiko Oberman afirmou que o elemento relativamente mais progressista no conceito reformado de Estado podia ser remontado à visão de Calvino acerca de Deus como Legislador e Rei; disse ainda que a lei de Deus não estava limitada à congregação apenas, mas estendia-se também etiam extra ecclesiam: mesmo além da igreja.150 Os comentários de Calvino sobre as pastorais revelam um padrão tanto de interação quanto de tensão entre a igreja e o mundo. Às vezes, Calvino falava num tom manifestamente sectário sobre a exclusividade da igreja visível. Uma relação correta com Deus é um pré-requisito até mesmo para desfrutar as bênçãos naturais. Cada dom que tocamos é desfigurado por nossos pecados e impurezas “até que Deus graciosamente nos ajude e, incorporando-nos no corpo de seu Filho, nos torne novamente senhores da terra, para que possamos legitimamente gozar como nossa toda a riqueza que m Comm. sobre Tt 1.9: CNTC 10, p. 361; CO 52, col. 412. i49Comm. sobre 1 Tm 3.2: CNTC 10, p. 224; CO 52, col. 282. 150Heiko A. Oberman, “The ‘Extra’ Dimension in the Theology of Calvin”, in: Journal o f Ecclesiastical History, 21 (1970), pp. 43-64. ele supre” .151 Os incrédulos, de fato, são usurpadores e ladrões! Tudo o que elesL desfrutam podè ser considerado como “a propriedade de outrem que eles assaltam ! e roubam ” .152 Poderíamos esperar a retórica de um sectário comunitário, não de^ um teólogo conciliador como Calvino! Sua intenção, porém, não era desmerecer todos os não-cristãos, mas, sim, enfatizar a unidade entre redenção e criação, e afirmar a soberania de Cristo sobre todo o reino criado. Longe de advogar o afastamento do mundo, Calvino incitava os cristãos a estarem engajados nele. Suas orações devem ser de alcance universal; eles devem “incluir todos os homens em suas orações, e não restringi-las ao corpo da igreja” .153 Os cristãos não devem exaltar a si mesmos orgulhosamente acima dos outros, mas lidar com sympathea, sentimento de solidariedade em relação àqueles que são extra ecclesiam, na esperança de que amanhã possam ser acrescentados à igreja.154 A lei de Cristo deveria ser manifestada, idealmente, na instituição de uma m agistratura santa. Calvino enumerou três vantagens de um governo bem ordenado: tranqüilidade, gravidade ou modéstia e piedade. Nas palavras de Isaías, Calvino instou os magistrados a serem “aios” da reforma. Eles deveriam manter não apenas a ordem cívica, mas também a uniformidade religiosa. Contudo, a ius reformandi não era uma autoridade que os magistrados deveriam exercer independentemente da congregação. A relação apropriada entre os dois é ilustrada pelo exemplo de um herege pertinaz. Depois de um exame completo — Calvino advertiu os cristãos a não serem precipitados em rotular como hereges todos os que deles discordassem — e uma admoestação paciente, o herege obstinado pode ser, deve ser, expulso da congregação pela excomunhão. Além disso, a igreja não pode ir. Contudo, o magistrado estava bem dentro de seu dever obrigatório ao trazer o que Calvino chamou, de certa forma eufemisticamente, de “outras medidas de maior rigor” . Havia, Calvino observava, uma diferença entre o dever de um bispo e o de um magistrado. Na época em que Calvino escreveu essas palavras, a maioria dos magistrados da Europa era, claro, inveteradamente contrária à reforma que Calvino achava que eles deviam estar apoiando. Calvino, porém, aconselhou obediência a tais governantes, exatamente como Paulo havia feito a respeito dos magistrados de seu tempo, todos os quais eram “inimigos jurados de Cristo” . Em face da oposição e da perseguição, Calvino pedia perseverança e oração. A instituição do governo foi ordenada por Deus, não importando quanto um ocupante em particular abusasse dele. “É por isso que os crentes, seja qual for o país em que vivem, não só devem 151Co/n/n. i52Comm. '52Comm. l54Comm. sobre sobre sobre sobre 1 Tm 4.5: CNTC 10, 1 Tm 4.3: CNTC 10, 1 Tm 2.1: CNTC 10, Tt 3.3: CNTC 10, p. 241; CO 52, col. 297. p. 240; CO 52, col. 294. p. 205; CO 52, col. 265. pp. 278-379; CO 52, col. 427 p. 279. a Companhia de Pastores de Genebra foi tendendo cada vez mais para um apoio aberto ao partido protestante francês. em suas orações. confiar seu bem-estar a Deus” .obedecer às leis e às ordens dos magistrados. A impressão geral que emerge desses comentários é a de uma igreja em guerra. e de todos os furiosos ataques a nossos inimigos. hipócritas enraivecem-se conosco. 1884). II. Satanás [. i51Comm. Contudo. sobre Tm 2. porém. O único remédio para todas essas dificuldades é aguardar ansiosamente o aparecimento de Cristo e sempre depositar nossa confiança nisso. devem ser aguardados com paciência pelos fiéis como o ato escatológico de Deus. Quantas coisas piores do que essas existem aqui dentro! Homens ambiciosos atacam-nos abertamente. epicureus e lucianistas ridicularizam-nos. ed. ele aconselhou o Almirante de Coligny contra a revolta armada: “Seria melhor que todos morrêssemos cem vezes que expor o evangelho a tal desgraça” . 266. p. o mais tardar em 1561. A década seguinte à elaboração desses comentários. testemunhou uma perseguição acentuada às congregações protestantes na França. e somos atormentados de muitas formas diferentes por todos os lados. Não digo nada acerca de difamações e outros vexames similares.157 A consumação da congregação. homens insolentes insultamnos. muito menos o direito de tiranicídio desenvolvido pelos calvinistas posteriores. e dos exílios. ‘“ Jules Bonnet. os sábios segundo a carne ferem-nos. A reticência do próprio Calvino abriu caminho para um endosso completo aos esforços guerreiros dos huguenotes.14: CNTC 10. sendo sua própria sobrevivência um assunto de lutas intensas.. combatendo. Não digo nada acerca do fogo. pela razão de que uma magistratura legítima era representada por um príncipe de sangue. 207. mas devem também. Apesar dos avanços da reforma em Genebra.156 Entretanto. p. Calvino escreveu para uma congregação perseguida por inimigos tanto físicos quanto espirituais. i55Comm. e da espada. sobre 1 Tm 6. .. 382. o estabelecimento final da lei. col. Louis de Condé. col. Les Lettres de Jean Calvin (Paris. da ordem e da reforma. CO 52. 330. A doutrina de Calvino acerca da obediência passiva foi levada até o limite.2: CNTC 10. CO 52.155 Em nenhum lugar dos comentários sobre as pastorais há uma insinuação do conceito de resistência pelos magistrados inferiores.] mil vezes por dia nos tira do caminho certo. emissão de sangue em vez de urina. posso dizer. nem conscientemente as distorci. 358-360. Pregava-se o evangelho. Mas repito que tudo o que fiz não vale nada e que sou uma criatura miserável. e mantê-la-á. sempre fui. indigestão severa ( “qualquer alimento que eu tome. Nunca escrevi nada com ódio de 158Bonnet.” Assim será com vocês. Atravessei conflitos espantosos. Calvino fora frágil e com freqüência doente. “Matem-me. tratantes. adere-se como cola a meu estômago”). Imaginem como isso afetou um estudioso pobre e tímido como sou e.. Quando cheguei aqui pela primeira vez. confesso. A respeito de minha doutrina. cólicas.” 158 Dois dias antes de escrever essas palavras. se quiserem. Isso. e vocês experimentarão sua perversidade quando eu tiver ido.. resisti à tentação e sempre estudei a simplicidade. pedras nos rins. ele enumerou as doenças físicas que o afligiam: artrite. e preservá-la-á. expulsaram-me da cidade. e tentou colocar sua própria vida em perspectiva. e tudo o que fiz não valeu nada. Seus últimos anos foram marcados por um sofrimento ininterrupto. pp. Meu sangue testemunhará contra vocês. e o temor de Deus está arraigado em meu coração. pois estão em meio a um povo perverso e infeliz. e oro para que o mal me seja perdoado. ed. e em meu retomo de Estrasburgo tive tantas dificuldades quanto antes para realizar meu ofício. Ele relembrou o curso turbulento de sua carreira. porém. febre. Então. por assim dizer. atacam-me em bando. e eles agarravam minhas roupas e minhas pernas. Por mais pessoas de boa vontade que haja. ensinei fielmente e Deus me deu a graça de escrever. Cometi muitos erros com os quais vocês terão de se conformar. No início de 1564. hemorróides. meus irmãos. Mas sejam corajosos e fortaleçam-se. pois Deus fará uso desta igreja.. As pessoas lançavam seus cães em cima de mim. se tiver havido alguma coisa boa.Post Tenebras Lux! Desde seus dias de estudante em Paris. “Não vou fazer nada disso”. IV. e estes bancos exigirão isso de vocês. que sempre desejei fazer o bem e meus erros sempre me desagradaram.] Quando fui ao Conselho dos Duzentos para apaziguar um tumulto. e isso era tudo. que vocês se ajustem a ela e a sigam. numa carta a médicos franceses que lhe haviam enviado alguns remédios. quase não havia nenhuma organização. Os ímpios vão tirar proveito dessas palavras. Quando fui tentado a requintes. [. nefrite. e. Fiz isso do modo mais fiel possível e nunca corrompi uma só passagem das Escrituras. receberam-me com gritos para me retirar. “Todas essas enfermidades. úlceras. De modo que vocês podem dizer que minhas intenções foram boas. ele havia pregado o que mostrou ser seu último sermão. . Todas as coisas estavam transtornadas. carregado para o púlpito de São Pedro em sua cama. Fui saudado com zombarias à noite diante de minha própria porta com 50 ou 60 ataques. os ministros de Genebra aglomeraram-se em sua casa para ouvir sua mensagem de despedida. é um povo ímpio e perverso. Quando o fím estava bem próximo. repliquei. ] apenas aconteceu de eu estar no ponto certo. que esteve com ele até o fim. o fiz como parente do jumento que seguiu seu caminho carregando um importante fardo. em que Calvino se encontra como estátua. Fragments Grave and Gay. 116-117. parece inadequado para o homem a quem se pretendeu comemorar. 1971). cols. escreveu: “Nesse dia. parece que agradou a Deus ter-me usado nesse tempo. Martin Rumscheidt (Londres: Collins. seus sofrimentos tiveram fim.. Quando se visita Genebra hoje. e foi-me permitido ser o jumento que carregou essa teologia melhor ao longo de parte do caminho. pp. escreveu sua última carta. (Lutero e Zuínglio mereceram uma menção honrosa. um ganho tanto na vida quanto na m orte” . [. Cf. Devido a seu próprio pedido. E.. 160Bonnet. viva ciente de nossa intimidade. Os discípulos haviam dito a seu dono: “O Senhor precisa dele”. uma despedida final a seu velho amigo Farei: “Visto que é da vontade de Deus que você viva mais que eu no mundo. Assim fui usado [. Karl Barth comparou seu próprio trabalho como teólogo à mula que carregou Jesus para Jerusalém. tem seus frutos esperando-nos no céu.] É suficiente para mim viver e m orrer para Cristo. Calvino não buscou sua própria glória. Na ocasião de seu octagésimo aniversário. ed.. para todos os seus seguidores.161 O elogio emocionado de Beza parece reverter o mote do reformador de Genebra. pp.159 Em 2 de maio. por mais impressionante que seja.. tendo de ambos os lados estátuas de reformadores e estadistas famosos. ed. Monter.. History and Character. p. a mais brilhante luz que já houve no mundo para a orientação da igreja de Deus foi levada de volta para os céus” . mas nenhuma estátua!) De alguma forma. p o st tenebras lux — depois da escuridão. a despeito de todas as coisas. a qual. as trevas.. l<öKarI Barth. IV. as coisas desagradáveis. que muito corretamente são e serão ditas sobre mim. assim. que é. Se fiz alguma coisa nesta minha vida. vê-se o imponente Monumento da Reforma. 161McNeilI. tendo sido útil para a igreja de Deus. Beza. p.160 Em 27 de maio. maior do que o tamanho real. a luz — para p o st lucem tenebrae — depois da luz. esse monumento. mas sempre coloquei fielmente diante de mim o que julguei ser a glória de Deus.alguém. 94-97.] sou uma criatura miserável” . com o crepúsculo. 227. 364. Calvino foi enterrado no cemitério comum.. não se ergueu lápide alguma sobre o lugar de sua sepultura. 891-892. . mas morreu confessando que “tudo o que fiz não vale nada [.162 I59C 0 9. ou tentou carregá-la da melhor forma que pude. exatamente como eu era. Uma teologia um pouco diferente da teologia usual fazia-se claramente necessária em nossa época. A luz que emana de seu testemunho ainda brilha — po st tenebras lux! — não. 1982). já que estava certo de que o Senhor tinha ainda mais verdades e luz para irromper de sua santa Palavra. Talvez possamos todos concordar com as palavras de John Robinson. destruiu a população civil de duas cidades japonesas. Por outro lado. Sua insistência na iniciativa soberana de Deus na salvação seria um corretivo saudável ao neopelagianismo prevalecente no cristianismo americano contem­ porâneo. contém uma 163Quanto a uma avaliação da teologia de Robinson e de sua dívida para com Calvino. A antologia Barth-Niesel. precisamos apropriar-nos da visão de Calvino acerca da igreja como a criação especial do Espírito Santo. Contudo. Muitas de suas ênfases ainda são pertinentes hoje. . quando nós mesmos pertencemos a uma sociedade que. sua intolerância com dissidentes. Reuss et al.Calvino também foi um jumento assim. Ga. uma comunidade que pode levar homens e mulheres. como um reflexo de seu próprio brilho. Não podemos simplesmente retirar Calvino de seu contexto e venerá-lo como o teólogo e clérigo perfeito. Também precisamos ser lembrados de que a igreja não é uma instituição social com um mandato ligeiramente mais espiritualizado do que o Rotary Club. à fonte transcendente de suas vidas e da própria vida. podemos apenas lamentar a visão coercitiva de sociedade sustentada por Calvino. Em meio à nossa cultura secular. em Corpus Reformatorum: Ioannis Calvini Opera quae supersunt omnia. John Robinson and the English Separatist Tradition (Macon. um motivo nem um pouco melhor do que o de Calvino. apesar de sua súplica por brandura na forma de execução. E.. sua aquiescência na morte de Serveto. Opera Selecta. no momento certo. não podemos condená-lo hipocritamente. A meta de sua vida era ser um servo fiel da Palavra de Deus.: Mercer University Press. Hoje estamos separados da Genebra do século XVI por 500 anos e por um oceano. mesmo aqui. Baum. em 1945. cuja glória é revelada na face de Jesus Cristo. veja Timothy George. E. Cunitz. pastor dos Pais Peregrinos. um calvinista devoto e defensor do Sínodo de Dort. que observou aos peregrinos que partiam que ele estava determinado a seguir Calvino não mais do que havia seguido Jesus. que por acaso estava “no lugar certo” . mas como um meio de iluminação para orientar homens e mulheres à adoração do Deus verdadeiro. com toda a certeza. em nome da sobrevivência nacional.163 Bibliografia Selecionada A edição crítica padrão das obras de Calvino continua sendo a série de 59 volumes publicada por G. para além de si mesmos. Atlanta: John Knox Press. Farley traduziu dois escritos de Calvino: Sermons on íhe Ten Commandmenís (Grand Rapids: Baker Book House. and Calvin. 1977. Potter e M. Jane Dempsey. A série Supplementa Calviniana está expondo muitos dos sermões de Calvino até então não publicados. Willem. Excelente levantamento de uma tradição protestante fundamental. Londres: Oxford University Press. Readings in Calvin’s Theology. Douglass. McKee. Reid. . Abordagem indulgente e matizada de Calvino feita por um dos principais historiadores do Renascimento e da Reforma. Útil coleção de ensaios de proeminentes estudiosos de Calvino. John Calvin: A Sixteenth-Century Portrait. 1980) e Treatises Againsí íhe Anabapíisls andAgainsl iheLibertines (Grand Rapids: Baker Book House. escrito por um monge beneditino. Kilian. John Calvin (Nova Iorque: St. 1983). Benjamin W. Dois volumes adicionais dessa série são dedicados a Calvino: Calvin: Commentaries. Greengrass. ed. McKim. John Calvin. Martin’s Press. Torrance editaram uma tradução excelente dos comentários de Calvino sobre o Novo Testamento: Calvin’s New Testament Commentaries. Genebra: Droz. and the Eucharist. McNeill. 1981. foi publicada conjuntamente por Meeter Center for Calvin Studies e Eerdmans Publishing Company. 20-21 na Westminster Press’ Library of Christian Classics) é muito superior às versões inglesas anteriores. J. McDonnell. Uma antologia breve dos textos de Calvino é G. Estudo perspicaz e ecumenicamente orientado sobre a teologia eucarística de Calvino. publicada pela primeira vez no século XIX pela Calvin Translation Society. Bouwsma. John H.edição crítica das Instituías e diversos outros escritos importantes. uma série nova destinada a tomar acessíveis em inglês as obras de Calvino ainda não traduzidas. William J. 1984. John Calvin on theDiaconate and Liturgical Almsgiving. Donald K. 1984. (Grand Rapids: Eerdmans. M. Nova Iorque: Oxford University Press.. Elsie A. 1985. ed. assim como os principais estudos europeus sobre Calvino. Hall. Levantamento de certa forma obsoleto. A edição de 1536 das Instituías. K. Leith. R. 1967. Grand Rapids: Baker Book House. S. Estudo comnleto do relacionamento de Calvino com os anabatistas. Ensaio estimulante sobre a implicação da teologia de Calvino para as mulheres e sua luta por igualdade. mas em geral fidedigno. Charles A. 1954. e Calvin: Theological Treatises. The History and Character o f Calvininism. pelo “papa” da erudição sobre Calvino nos Estados Unidos. A Baker Book House reimprimiu a coleção inteira das obras de Calvino (comentários. Filadélfia: Westminster Press. Princeton: Princeton University Press. 1957-70). Grand Rapids: Eerdmans. Peter De Klerk publica uma abrangente bibliografia anual sobre a produção literária acerca de Calvino no Calvin Theological Journal. 1987. Freedom. 1982). folhetos e cartas). ed. Richmond: John Knox Press. the Church. eds. Estudo cuidadoso sobre um aspecto da eclesiologia de Calvino freqüentemente negligenciado. contendo tanto uma revisão cronológica quanto uma análise sistemática desse tópico. An Introduction to the Reformed Tradition. John T. 12 vols. Joseph Haroutunian. traduzida por Ford Lewis Battles. Women. With the Spirit’s Sword.. Examina o tema do combate espiritual na teologia de Calvino. Balke. 1968. como o primeiro volume da Bibliotheca Calviniana. David e Thomas F. Calvin and ihe Anabaptist Radicals. A edição McNeill-Battles das Instiíuías (vols. Hamdon. feito for um célebre teólogo católico. ainda que às vezes as conclusões excedam as provas. Originalmente uma tese de doutorado na Universidade de Toronto. Estudo da abordagem distintiva de Calvino sobre a vida espiritual. 1983. T. E. Christ in Our Place: The Substiíuíionary Characier of Calvin’s Docirine o f Reconciliaiion. 1974. Lucien J. Originariamente publicado em francês em 1950. Conn. Obra respeitável. François. Calvin’s New Testament Commentaries. 1984. H. Brill. Durham: Ladyrinth Press. John Calvin: A Biography. L. 1975. The Nature and Function of Faith in the Theology o f John Calvin. talvez este seja o melhor livro sobre Calvino. L. J. Livro que acompanha o estudo acima mencionado.Parker. 1966. Atlanta: John Knox Press. . Grand Rapids: Eerdmans. T. Grand Rapids: Eerdmans. Ga. Estudo da religião de Calvino. L. Calvin’s Caiholic Christology. Originariamente uma tese orientada por Karl Barth. 1971. Willis. Wendel. Parker. sua relação com Lutero e seu impacto sobre a história das idéias.: Mercer University Press. Selinger. David. Filadélfia: Westminster Press. Deve ser comparada às biografias anteriores de Walker (1906). Victor A. Hunt (1933) e MacKinnon (1936). Introdução indispensável ao estudo dos comentários de Calvino sobre o Novo Testamento. 1957. 1986. esse competente estudo baseia-se nos comentários e nas Instituías para apresentar a doutrina da fé segundo Calvino.: Archon Books. Richard. 1987. Suzanne. A mais recente biografia completa de Calvino em inglês. Exame cuidadoso do chamado tema “extra Calvinisticum” no pensamento de Calvino. Reybum (1914). Calvin: The Origins nad Developmení of His Religious Thought. Edimburgo: T. Paul. Calvin’s Old Testament Commentaries. Calvin Against Himself. H. Macon. The Spirituality o f John Calvin. Excelente exposição da doutrina da expiação segundo Calvino. Leiden: E. Obra criativa. embora não sem falhas. Van Buren. T. Shepherd. H. and T. Parker. Clark. que faz lembrar o zumbido incontrolável das abelhas em volta de uma colmeia e que o reformador alemão aplicou indiscriminadamente a uma ampla hoste de adversários. m f s tim s e racionalistas da baixa da Idade Média. por exemplo. apresentou uma crítica completa ao corpus chrístianum em suas principais mutações protestante e católica romana. Von dem unverschampten frafel (Zurique. Studies on the Reformation (Boston: Beacon Press. “iludidos” .2 O termo preferido de Lutero era Schwärmer. 2Heinrich Bullinger. considerada como uma entidade. Bainton. independentemente do que poderia ou não acontecer na história. .NENHUM OUTRO FUNDAMENTO Menno Simons Diga-se agora que o valor da tentativa [dos anabatistas] não deve ser julgado à luz de sua contribuição para a história. esse movimento não foi nem marginal nem periférico em seus direcionamentos básicos e vitalidades espirituais. tanto a xevolucão-vjolenta quanto o comunalismo pacifista. Heinrich Bullinger. Bainton1 A R eform a R adical A reforma radical foi um tremendo movimento de renovação espiritual e eclesiástica que ficou à margem das importantes igrejas territoriais. 1531). a católica e a protestante. Apenas nos últimos anos os reformadores radicais começaram a emergir da sombra do opróbrio lançada sobre eles por seus oponentes do século XVI. “desmiolados” . fol. chamou-os de “inimigos demoníacos e destruidores da igreja de D eus” . Entretanto. 206. p. 1963). 75r. sublimando os impulsos ascéticos. 'Roland H. Englobando tanto o ecumenismo quanto o sectarismo. a reforma radical. Os epítetos de Calvino não eram menos pejorativos: “fanáticos” . Eles assumiram sua postura à luz da eternidade. durante a grande convulsão religiosa do século xvi. Roland H. . “cães danados” . nem nas principais protestantes. Cf. 5George H. ed.3 O fato de interpretar os radicais em termos das negativas de dissidência e inconformidade desviou os esforços por entender suas próprias motivações espirituais. “Le non-conformisme religieux du XVIe siècle entre l’humanisme et les Eglises”. A tipologia de Williams acerca dos radicais é a mais abrangente e estável até hoje. 1957). pp. 30. especialmente o Novo Testamento. até chegar à raiz (radix) autêntica da fé e da ordem. in: Les Dissidents du X V Ie siècle entre l’Humanisme et le Catholicisme. p. Um conhecido historiador inglês contemporâneo reflete essa falha em sua descrição da “verdadeira natureza” do anabatismo como “um fenômeno violento que surgiu de sonhos irracionais è psicologicamente desequilibrados. Eles 3João Calvino. 1983). George H. Para os anabatistas. 103. Farley. nenhum deles permanecendo na trilha da verdadeira liberdade. p. pp. também o estudo de Willem Balke. . Treatises Against the Anabaptists and Against the Libertines. Williams desenvolveu sua tipologia num volume de quase mil págmâs T E s ^ e s tu dcTciássico foi ainpHadõeatualizado numa tradução espanholajLo^ggforma Radical (Mexico City' 1982)T C f também a resposta de Williams \ / à discussão erudita sobre seu livro em “The Radical Reformation Revisited”. R. estabelecendo os católicos à esquerda e os radicais à direita! Reconhecendo o uso anacrônico do termo “ala esquerda” quando aplicado a . ed. (Grand Rapids: Baker Book House.. contudo. dissidentes do século xvi. embasados numa negação da razão e na exaltação daquela crença na inspiração direta que permite aos homens fazerem o que quiserem ” .4 Às vezes. podemos ouvir um fraco eco da acusação do próprio Lutero de que tanto os papistas quanto os Schwärmer erravam “à esquerda e à direita” . Lutero. Reformation Europe. espiritualistas e racionalistas evangélicos. 1-28. todos queriam retroceder por meio dos acréscimos da tradição eclesiástica. Essas não são categorias inflexíveis. mas rubricas gerais para descrever afinidades comuns entre uma ampla gama de cristãos heterogêneos. Quanto à viabilidade do termo “reforma radical” . 1982). os reformadores radicais são agrupados juntos como a “ala esquerda da Reforma” .5 Williams dividiu . era a Bíblia. “tratantes” .“imbecis” . Benjamin W. pp. 1517-1559 (Nova Iorque: Harper and Row. 15-34. Spiritual and Anabaptist Writers (Filadélfia: Westminster Press. reverteu o posicionamento moderno. Nessa designação.ps radicais em três grupos principais: anabatistas. veja Roland Crahay. 4G. Williams e Angel Mergal. 1963). Marc Lienhard (Baden-Baden: Valentin Koerner. por meio do que Balthasar Hubmaier chamou de “as poças de lama e os charcos do dogma hum ano” . Calvin and the Anabaptists Radicals (Grand Rapids: Eerdmans. in: Union Seminary Quarterly Review 39 (1984). eds. Cada ramo da reforma radical ligou-se a uma “raiz” distinta. Elton. 1981). Apesar de suas muitas diferenças. Williams propôs “a reforma radical” comoß um termo coletivo para todos aqueles grupos de inovadores religiosos que não permaneciam nem nas igrejas católicas romanas. Em The Radical Reformation. a despeito de ter sido apresentada pela prim eira vez há trinta anos. 19-38. mas uma razão iluminada pelo Espírito e informada pelas Escrituras Sagradas. apostólica. deviam restaurar o verdadeiro batismo apenas dos cristãos. Alguns deles. Com seu estudo da Bíblia. junto com o fato de que a maior parte dos radicais viu-se forçada a desenvolver seu modelo de vida cristã fora dos confins das igrejas oficiais.: Conrad Press. Muitos deles aceitaram o exílio.desejavam não apenas reformar a igreja. Uma carta. descreve o que houve nesse encontro: “E aconteceu que eles estavam juntos. em 21 de janeiro de 1525. Cf. “The Reformation of the Reformation: Fundamentais of Anabaptist Theology’^ in: MQR 51 (1977). por outro lado. até mesmo o batismo nas águas e a ceia do Senhor. foi um movimento que gerou nova forma de fé e vida cristãs. que deu à espiritualidade e à vida eclesiástica deles uma aparência distintiva. A. mas restaurá-la à sua pureza anterior. p. do que com a experiência interior do Espírito. em vez de negar o Senhor que os chamara para tomar a cruz e segui-lo. Ont. Anabaptism: Neither Catholic nor Protestant (Waterloo. Conrad Grebel e Felix Mantz. um efeito colateral que revelou apenas uma forma mais extrema da Reforma. a tortura e a pena capital. Essa ênfase levou muitos deles a questionar o s j fogmas trinitários e cristológicos tradicionais da igreja antiga. não era uma razão autônoma no sentido posterior do Iluminismo. então. foi uma “reforma da Reforma” . Depois que o medo desceu intensamente sobre eles. como Kasper Schwenckfeld. Menno e o Anabatismo Menno Simons foi o líder mais importante do ramo anabatista da reforma radical. Os racionalistas evangélicos apelaram para a razão. “a palavra interior” . Oosterban. foram discípulos radicais de Zuínglio que sentiram estar apenas levando a conseqüencias lógicas as idéias que haviam aprendido do mestre Ulrich. o pequeno grupo encontrou-se na casa de Felix Mantz em Neustadtgasse. Na verdade. Zurique. eles oraram a Deus nos * 6J. chegaram a acreditar que todas as externalia. estavam menos preocupados com a igreja externa. Vimos como. os espiritualistas. 1973). visível. em desafio a Zuínglio. A reforma radical. . Conforme disse um erudito. ou uma “correção da correção do catolicismo” . escrita alguns anos depois do evento.6 Foi precisamente isso. mas não foi nem o primeiro nem o mai s original expoente dessa tradição^ »Já vimos como o anabãtTsmo suíço emergiu do berço da reforma zuingliãnarSeus primeiros líderes. não foi meramente uma “ala” . Os reformadores radicais viveram fora da ordem estabelecida. visto que ele não podia ser persuadido. convenceram-se de que o batismo que tinham recebido como crianças era inválido e de que. 176. também Walter Klaasen. podiam ser eliminados em favor do testemunho interior do Espírito. antes. sob a própria sombra da Grande Catedral. 124. declarando: “Não você. ed. Dyck.céus. 1910). Então. mas eu fui chamado a pregar” . Blaurock. George levantou-se e pediu a Conrad que o batizasse. ele impediu o ministro devidamente escalado de entrar no púlpito. batizando-os na testa com o sinal da cruz. Penn. 1979).8 Os magistrados de Zurique não demoraram a agir contra tais comoções. também” . Seu movimento logo se dividiu. e ele o fez. Suíça. . O corpo carbonizado de Hut (ele incendiara sua cela num esforço inútil para escapar) foi condenado postumamente. Apesar da perseguição. Ele morreu antes de 1528. ^ an s-Jü rg en Goertz. J. 1978). Mesmo tendo Hut e Hoftnann aconselhado seus seguidores a brandirem apenas a “espada embainhada” . pelo amor de Deus. e também comissionou pregadores leigos para levar sua mensagem a quase todo 1Bibliotheca Reformatioria Neerlandica (’s-Gravenhage: Martinus Nijhoff. 8Williams. Os anabatistas não se caracterizavam nem pela hom ogeneidade doutrinária.: Herald Press. 516. Em 1530.9 Mediante os esforços evangelizadores de Hofmann. o movimento estendeu-se por outros cantões suíços. Blaurock foi preso. que estabeleceu uma data (1534) e um lugar (Estrasburgo) diferentes para a segunda vinda — com resultados similares. Mantz foi afogado no rio Limmat. ele batizou os outros. suas drásticas predições e severas invectivas contra o imperador. embora sua mensagem apocalíptica tivesse sido tomada por outros profetas. Radikale Reformatoren (Munique: C. o anabatismo chegou aos Países Baixos. The Radical Reformation. escrita muitos anos após o evento. p. previu que Cristo haveria de retornar à terra no domingo do Pentecoste de 1528. Beck. como também pela Alemanha meridional e pela Áustria. A carta aqui citada foi escrita por volta de 1530 por irmãos suíços em Klettgau. foi a figura central do reavivamento anabatista em Zollikon. 1981). traduzido em C. mas não inflingi-la. nem p e k eficiência organizacional. Grebel foi enviado para o exílio. Depois disso. Melchior Hofmann: Soziale Unruhen and apokalyptische Visionem im Zeitalter der Reformation (Göttingen: Vandenhoeck and Ruprecht. absorver a violência.. Ele começou a reunir os 144 000 santos eleitos (Ap 7. para que mostrasse misericórdia para com eles. p. Hofmann referiu-se ao imperador. os quais ele “selou” . H. ed. ao papa e aos falsos mestres como os “höllische Dreieinigkeit” . An lntroduction to Mennonite History (Scottdale.4). Vários líderes deixaram sua própria marca distintiva no movimento. Certa vez. O relato mais conhecido dos batismos de 21 de janeiro deriva da Hutterite Chronicle. assim chamado porque usava um casaco azul (blaurer Rock). junto ao lago. Quanto à relação entre Hofmann e Menno. em resposta a uma indagação de um grupo em Colônia. veja Klaus Deppermann. o papa e “os pregadores sanguessugas anticristãos luteranos e zuinglianos” criaram uma atmosfera na qual o reino abertamente revolucionário de M ünster pôde florescer. Hans Hut7 ex-discípulo de Thnmqs M iint/er. VII. 163. ele batizou cerca de 300 convertidos na cidade de Emden. p. como M elchior Hoftnann. isto é. vila a apenas 8 km de Zurique. onde morreu devido à peste. sacerdote católico que se tornou ardente evangelista.7 O “George” mencionado aqui era George Blaurock. Jan de Leyden e dois de seus companheiros foram capturados e torturados até a morte com ferros em brasa. Ele passou a ordenar 12 apóstolos. as histórias de Menno Simons e do anabatismo holandês se mesclam. Quando Hofmann foi preso em Estrasburgo. declarou-se profeta enviado pelo Espírito Santo: como Hofmann era Elias. aqueles que se recusaram a ser batizados) deviam ser mortos. Obcecados pela urgência escatológica de Hofmann. que conquistaram numa tempestade de violência. Quando a matança term inou. Desenvolveu proficiência em latim e podia ler um pouco de grego. Nessa altura.canto dos Países Baixos. Ele permaneceu na cadeia até sua morte. A princípio. na rua principal de M ünster. cerca de dez anos depois. exatos 13 anos após o nascimento de Lutero e 13 antes do de Calvino. Os corpos foram expostos em jaulas de ferro na torre da igreja de Saint Lambert. Menno foi ordenado ao sacerdócio católico em março de 1524. Durante esse período. mas nada de hebraico. a menos de 16 km do m ar do Norte. Jan de Leyden assumiu a liderança. em 1531. Convencido de que era o Elias que Jesus havia dito que prepararia o caminho para sua segunda vinda. no Domingo de Páscoa de 1534. Sabemos pouco sobre a instrução prim ária de Menno. Menno nasceu em 1496. como Tertuliano. um padeiro de Haarlem chamado Jan Mathijs. a mudança para W itmarsum foi . e os fez muito bem. no dia 22 de janeiro de 1536. Essa experiência em teocracia acabou numa sangrenta hecatombe. em que Münster foi cercada por tropas protestantes e católicas. Ele coroou a si mesmo “rei da justiça sobre todos” e introduziu a* poligamia numa imitação literal da prática do Antigo Testamento. claro. antes de ser chamado para sua vila natal. Todos os “ímpios” (i. pateticamente esperando até o fim a descida da Nova Jerusalém. Menno também teve contato com certos pais da igreja. Quando o próprio Mathijs foi morto. Ele era filho de um fazendeiro de gado leiteiro na vila de W itmarsum. lembranças sinistras da tragédia de 1534-1535. em seus trajes reais. o Rei Jan aparecia no mercado. Menno desempenhou as tarefas usuais de um sacerdote do campo. quatro anos depois de Colombo ter descoberto a América. Ali serviu por sete anos. Cipriano e Eusébio. ele era Enoque. embora. entre eles Jan Beuckels. tenha tido algum contato com as Escrituras na liturgia romana. mudaram o local da Nova Jerusalém de Estrasburgo para M ünster. Três vezes por semana. perto de sua casa.. Essas jaulas podem ser vistas ainda hoje. onde esperou a Parousia. foi nomeado sacerdote paroquial na vila de Pingjum. Ele dizia nunca ter lido a Bíblia até dois anos após sua ordenação como sacerdote. de Leyden. aos 28 anos anos. Hoftnann retornou a Estrasburgo e apresentou-se pessoalmente à prisão. para receber a reverência de seus súditos. lutando lado a lado contra os violentos anabatistas dentro da cidade.e . a segunda das duas testemunhas profetizadas em Apocalipse 11. Provavelmente estudou na escola monástica de Bolsward. um de seus discípulos. no ano de 1533. W itmarsum. o berço de seu pai. Já vimos o importante papel que a eucaristia desempenhou no processo de ruptura de Calvino com Roma. esplendor. eles saíam. e não buscava nada além de lucro. favor dos homens. Quando o bon vivant tornou-se um cristão. Brandsma. Zuínglio e Calvino. agora.10 Notadamente.. Quando eu falava.um a promoção. mesmo entre os anciãos. mesmo depois de ter começado a ler a Bíblia. não conseguia livrar-me da idéia. Jan A. O mundo me amava e eu a ele. “ CWMS. Menno teve de debater-se com o evangelho.] Eu era preeminente entre os homens. suspirava e orava. “Todos me procuravam e me desejavam. H bid. . ele era algo como um líder nato. sou degradado. eles vinham. perdeu os antigos amigos. que ele poderia me separar de minha fé. sempre que eu tomava o pão e o vinho na missa. eles se calavam. conforto. Quando os mandava embora. como todos os que seguem essa linha geralmente fazem” . in. numa vida impura. sensual e vã.] Outrora eu era um amigo: agora. Outros registros biográficos incluem o artigo sobre “Menno Simons” de Cornelius Krahn em Mennonite Encyclopedia. 668. Há três grupos principais de acontecimentos e idéias na consciência desenvolvida de Menno sobre a verdadeira igreja e sua função nela. entretanto. Por outro lado. como dizia. D. passo por inimigo” . Eu pensava que o demônio estava sugerindo isso. Este volume contém uma breve biografia de Menno escrita por Harold S. Ele confessou mais tarde que. [. [. Quando eu chamava. 1955). Rüschlikon-Zurique: B.11 Como Lutero. p. mesmo sendo. 577-584. Bender.. que eles não eram a carne e o sangue do Senhor. A mesma questão surgiu no início da antiga carreira de Menno como sacerdote católico. Christoph Bornhauser. tais como beber e jogar cartas. Mais tarde.. Seus biógrafos têm estado intrigados quanto ao motivo pelo qual Menno demorou tanto tempo para romper com a igreja romana e abraçar totalmente a causa anabatista. p. 669. ele gastava muito tempo em atividades frívolas. Eu confessava isso freqüentemente. que todos esse encantos com efeito eram “vaidade” . Leben und Lehre Menno Simons' (Neukirchen: Neukirchener Verlag. Menno veio a perceber. “um senhor e príncipe na Babilônia” . Menno começou a ter dúvidas quanto ao dogma da transubstanciação. com o autor de Eclesiasces.12 10CWMS. “eu queria aquele conhecimento pelas luxúrias de minha juventude.. Todos me reverenciavam. p. O que eu desejava. “Até hoje eu era honrado. 71. nome e fama. no mesmo ano em que Grebel e Mantz estavam organizando as prim eiras congregações anabatistas da Suíça. Em 1525. eles faziam” . 1973). Ocorria-me. tanto quanto na disputa entre Lutero e Zuínglio. Podemos entender melhor a carreira posterior de Menno se observarmos um pouco mais atentamente o processo que o levou a essa decisão. “The Transition of Menno Simons from Roman Catholicism to Anabaptism as Reflected in His Writings” (Baptist Theological Seminary.. pp.. perecível. Menno comentou: “Soou muito estranhamente em meus ouvidos o fato de que alguém falasse sobre um segundo batismo” . Life and Thought. 14CWMS. que citou Cipriano como um advogado do batismo de adultos.. que ele descreveu. eu disse a uma criatura débil. Menno referiu-se a ele como “um herói devoto e piedoso” . Cornelius Hoen. da seguinte maneira: Sim. que veio da terra. 14 Essa última frase sobre “brincar com a [. brinquei com a prostituta da Babilônia por muitos anos. Mais tarde. Já em 1529. 7. p. não tivesse começado a questionar outro pilar da tradição estabelecida. pois a presença real de Cristo na ceia estava sendo questionada entre vários círculos nos Países Baixos. capital da província holandesa de Frísia. líder dos sacramentistas holandeses. assim eu.. p. Já em 1521.. pregador da Alemanha meridional. que foi cozida no fogo.] Babilônia por muitos anos” pode referir-se ao fato de que Menno continuou celebrando a missa durante ainda muito tempo depois de seu questionamento radical ter começado. nem na razão concreta.. Não sabemos se Menno teve acesso aos ensinos de Hoen.Que Menno pudesse ter tido idéias “heréticas” como essas não era tão incomum. 171. p. mas adotou uma mais próxima da de Zuínglio. a um bocado de pão: tu me salvaste. Em 20 de março de 1531. pecador miserável. porque havia sido batizado pela segunda vez. Menno poderia ter permanecido tranqüilamente dentro do redil romano. Lutero declarou que a transubstanciação era uma invenção da mente humana. que foi mastigada por meus dentes e digerida por meu estômago. [.15 Freerks fora rebatizado por um dos discípulos de Hofmann em Emden. Menno leu um livro de Theobald Billicanus. na cidade de Leeuwarden. . 'sIbid. Menno declarou que os escritos de Lutero o haviam ajudado a perceber que as “injunções humanas não podem restringir até a morte eterna” .. a saber.] Ó Deus. já que não estava baseada nem nas Escrituras. NO Cativeiro Babilónico da Igreja (1520). Mais tarde. Dutch Anabaptism: Origin. Contudo. Spread. depois. 76. havia ensinado que o pão e o vinho na Eucaristia eram meros símbolos do sofrimento e da morte de Cristo. A execução brutal de Freerk deve ter deixado uma impressão 13Cornelius Krahn. mas estamos certos de que lera alguns dos folhetos de Lutero. que foi quebrada num moinho. Entretanto.13 Ele não seguiu a explicação de Lutero sobre o sacramento do altar. a dúvida inicial de Menno sobre a doutrina da transubstanciação foi uma ruptura importante em sua antiga devoção à missa. o batismo infantil. um evento mais perto de sua casa foi realmente o catalisador da reflexão de Menno sobre tal assunto. um alfaiate itinerante de nome Sicke Freerks foi decapitado. se eu. não expuser os fundamentos da verdade. Refleti sobre minha vida impura e carnal. Depois que isso aconteceu. Ponderando essas coisas. leu os pais da igreja. Em 30 de março de 1535. Pedro Simons. a ceia do Senhor no falso culto a Deus que os letrados ensinam. Durante oito dias. caiu tão quente sobre meu coração que o não pude suportar. mas achou que em todos faltava algo. Esse acontecimento precipitou uma crise em sua vida. também sobre a doutrina hipócrita e sobre a idolatria que eu ainda praticava diariamente com aparência de santidade. Menno “pesquisou diligentemente as Escrituras e considerou seriamente a questão. e não viver em harmonia com a Palavra do Senhor. Ele examinou os argumentos de Lutero. um grupo de aproximadamente 300 anabatistas violentos capturaram o Velho Claustro perto de Bolsward. o batismo errado. algumas pessoas na área ao redor de W itmarsum haviam sido rebatizadas. resistiram aos ataques das autoridades. deram de boa vontade suas vidas e suas propriedades por sua doutrina e fé. Ele consultou seu colega sacerdote em Pingjum. mesmo errados. por medo físico. de acordo com o conhecimento da verdade que eu obtive. ainda assim Menno não rompeu com a igreja romana até ser profundamente incitado pelos eventos que cercaram a tragédia de M ünster. porque sua pregação nessa época era “sem espírito nem am or” . minha consciência atormentava-me tanto que eu não podia mais agüentar. embora. que alegremente . ele disse depois fosse indigno de tal designação. Já em 1532. E eu era um dos que revelava a alguns deles as abominações do sistema papal. se eu não censurar com o melhor de meu pequeno talento a hipocrisia. tanto que ganhou a reputação de “pregador evangélico” . Entre eles estava o irmão de Menno.marcante em Menno. em 7 de abril. a vida carnal e impenitente. mas não pôde encontrar nada sobre o batismo infantil” . Mas eu mesmo continuei em minha vida confortável e reconhecia as abominações simplesmente para poder gozar do conforto material e escapar da cruz de Cristo.16 A apelação de Menno às Escrituras foi um passo importantíssimo em sua peregrinação. mesmo mal conduzido. assassinados de forrna selvagem. Algumas delas também foram atraídas pelo vórtice do reino violento e revolucionário dos dois Jans em M ünster. De qualquer modo. nem encontrar descanso em minha alma. ele começou a investigar o fundamento do batismo infantil. Ele chegou à conclusão de que “todos estavam equivocados sobre o batismo infantil” . Pensei comigo mesmo — eu. dentre as quais o irmão do próprio Menno. mas sem entusiasmo. o claustro foi retomado e os radicais. e não produziu frutos positivos. Bucer. nem usar todos meus poderes para dirigir o rebanho perdido. homem miserável. Zuínglio e Bullinger. o sangue dessas pessoas. que estou fazendo? Se continuar nesse caminho. Com novas convicções sobre a ceia do Senhor e o batismo. Percebi que aqueles zelosos filhos. Ele começou a pregar a partir da Bíblia. Por fim. mas. Orei a Deus com suspiros e lágrimas para que desse a mim. Espírito. aos verdadeiros pastos de Cristo — ah. a fim de que eu pudesse pregar seu exaltado e adorável nome e sua Santa Palavra com pureza e fizesse conhecida sua verdade para sua glória. começou a “ensinar e batizar. a auxiliar na construção de sua cidade e de seu l7lbid„ pp. agora.] Apenas isso eu queria saber de vocês. falava claramente e sem hesitação. se levantará contra mim no julgamento do Altíssimo e pronunciará sentença contra minha pobre e miserável alma! Menno percebeu que não vivera à altura da luz que havia recebido. o dom de sua graça. como seu sangue derramado. enviando sobre mim sabedoria. que não são nada mais do que uma bela flor sob a qual se esconde uma serpente maligna que instilou seu veneno em muitos. 45. assim. 670-671. criasse dentro em mim um coração limpo e. Menno tentou. Antes. surge nesse período..17 De abril de 1535 a janeiro de 1536. na espada ou na cruz? Que cada um de vocês acautele-se contra toda doutrina estranha de espadas.18 No mesmo mês em que Jan de Leyden foi torturado até a morte. Aproximadamente um ano depois que ele deixou a confortável paróquia de W itmarsum para tornar-se evangelista alternativo itinerante. A Blasfêmia de Jan van Leyden. . graciosamente. jsete ou oitQJrm ãos anabatistas que viviam perto de Groningen rogaram-lhe que aceitasse o ofício de ancião ou pastor titular da irmandade. ele consentiu e. coragem e uma mentalidade valorosa. perdoasse meu andar impuro e minha frívola vida fácil. 49. Depois de algum tempo debatendo-se com essa decisão. pecador aflito. [. como sacerdote de W itmarsum. Ele sentia uma compaixão especial pelas “pobres ovelhas desgarradas” que vagavam sem pastor. ele havia dissimulado e transigido.. a trabalhar com meus talentos limitados nos campos de colheita do Senhor. Ele implorou a Deus por perdão e por uma nova vida em Cristo: Meu coração tremia dentro de mim. É um folheto instigante no qual Menno opõe o reinado de Cristo às falsas alegações do “Rei João” . pp. Menno fez sua ruptura decisiva com a igreja de Roma. em que vocês foram batizados.. realizar uma reforma evangélica.cumpriria seu dever se o conhecesse. Menno mostrou o caráter anticristão dos “proponentes da filosofia da espada” e conclamou a uma vida de não-resistência: É-nos proibido lutar com armas físicas. derramado em meio à transgressão. resistência e outras coisas parecidas. A prim eira obra de Menno. nIbid. pelos méritos do rubro sangue de Cristo. regente dos Países Baixos. The Radical Reformation. tornou-se não apenas um ízwízbatista. que nos últimos cinco ou seis anos tem mui vigorosamente prevalecido nesta terra de Frísia [. temos estudado a hipótese de oferecer e prometer perdão e misericórdia a alguns que foram desviados [. em vez de menistas ou. Em 1542. Menno. D irk Phillips não desertou da fé. Menno Symonsz [s/c]. aos 66 anos. e datada de 19 de maio de 1541. mais tarde. talvez mais criativo.19 Alguns anos depois de ter ordenado a Menno. em 1537.templo santos... não fosse um antigo sacerdote. ele levou a vida de um herege perseguido.20 Tais intrigas e tormentos perseguiam Menno por onde quer que ele fosse. W iniams ressaltou. mostra claramente os riscos que Menno corria: Mui graciosa Senhora. o Imperador Carlos V publicou um edito contra ele e ofereceu cem florins holandeses de ouro pela prisão de Menno. Uma carta endereçada a Maria. oferecemos grande quantia. havia emergido como o primeiro líder dos anabatistas holandeses não-münsteritas. abrindo igrejas e ordenando pastores. de Amsterdã a Colônia. os anabatistas poderiam muito bem ter sido chamados de “obenitas” .] teria sem dúvida sido extirpado e assim permaneceria. em 1561. ele lamentou que 1''Williams. Para capturar e prender esse homem. que é um dos principais líderes da seita supracitada e que. desviando muitas pessoas simples e inocentes. provavelmente por Obbe Phillips. Portanto. Conforme (jenrpp. cerca de três a quatro anos atrás. Menno foi então ordenado da maneira adequada. tomou-se fugitivo. batizando novos cristãos em córregos no campo e em lagos distantes. p. Sua esposa Gertrude e seus três filhos sofreram o mesmo destino. flhhe Phillips desiludiu-se com as divisões no movimento ajiabatista e abandonou completamente a irmandade. . mas tornou-se o grande colaborador de Menno. ficamos surpresos por ele ter conseguido sofrer uma morte natural. Menno exerceu influência marcante nos anabatistas dos Países Baixos e da Alemanha setentrional. o erro da maldita seita dos anabatistas. 392-393. mas também um rcordenacionista. Ele também foi um grande teólogo. pregando à noite em conventículos secretos de irmãos e irmãs. menonitas.] desde que propiciem o aprisionamento do dito Menno Symons. e no reparo dos muros arruinados” . Se ele tivesse permanecido firme em sua liderança.. com seu irmão D irk. De sua ordenação. mas até agora sem sucesso. 17. Este referia a si mesmo como “um homem sem lar” . até sua morte. tendo perambulado desde então uma ou duas vezes ao ano nesta região. e até Danzique. que. como muitos outros antigos sacerdotes católicos. Tendo sido batizado anteriormente. Mas ele não tinha de pensar apenas em si mesmo. pp. 20CWMS. embora menos influente que Menno.. Durante a maior parte desses anos. Em 1544. Quando examinamos os perigos que Menno enfrentou. envergonhar-se no grande e temível dia do Senhor. por causa de seu ofício. além de numerosas cartas.21 Gertrude e duas das crianças precederam Menno na morte. Esse versículo tornou-se o mote de sua vida e de sua teologia. Na página de rosto de todas as suas obras. emergiu no contexto de seu envolvimento ativo na vida da igreja. ele citava o texto paulino de 1 Coríntios 3. Contudo. tinham de resistir diariamente à espada tirânica de senhores e príncipes. por esposas e filhos. Em 1540.“não podia encontrar em país algum uma cabana ou choupana na qual minha pobre esposa e nossos pequenos filhos pudessem ser colocados em segurança por um ano ou mesmo seis m eses” . escreveu com vigor e percepção. eles também ansiavam por descanso e paz. e é certo que ele viveu seus últimos anos aleijado. “Se o Cabeça teve de sofrer tal tortura. Era ao mesmo tempo um tratado para a época e um tipo de instrução catequética para os novos cristãos. suplicando tolerância para os protestantes perseguidos na França. Contudo. esse tratado é comparável à prim eira edição das Instituías de Calvino. Menno também dirigiu-se aos príncipes e magistrados cujos agentes estavam caçando e perseguindo os anabatistas. Como os outros reformadores que estudamos. por natureza. sendo enterrado em seu próprio jardim . Os primeiros retratos de Menno mostram-no com muletas. assim não precisarão.herança dos prim eiros anabatistas quanto na mais ampla tradição cristã. a teologia de Menno era situacional. eles também eram. Dat Fundament des Christelycken Leers ou O Fundamento da Doutrina Cristã. mas sobretudo-em seu proprio engajamento intenso com as Escrituras. filhos e membros esperar paz e liberdade quanto à sua carne?”22 No vigésimo quinto aniversário de sua renúncia à igreja romana. De certa forma. Ezequias e Josias. Desde o início de sua carreira. angústia.”23 Ele rogou tolerância com base numa humanidade comum: os anabatistas também estavam revestidos da mesma natureza. Menno deixou claro que falava. o qual é Jesus C risto” . Menno escreveu aproximadamente 25 livros e folhetos. “Não sejam mais Jeroboão. Menno sabia não haver como o cristão verdadeiro evitar a cruz. miséria e sofrimento. meditações e hinos. mas defensores da retidão. como poderiam seus servos. mas Davi. Menno nunca teve tempo disponível para produzir tomos eruditos ou desenvolver uma teologia sistemática. Ele lhes rogou que não fossem exterminadores. em Wiistenfeld. tão temerosos da morte quanto qualquer outro povo.pelos anabatistas .11: “Porque ninguém pode lançar outro fundamento. Menno publicou o que viria a tornar-se seu mais influente trabalho. baseando-se tanto na . Calvino havia escrito uma epístola introdutória ao Rei Francisco I. Seus escritos revelam o curso de sua carreira tumultuada. Menno faleceu. Acabe e Manassés. além do que foi posto. obra publicada somente quatro anos antes. Confissão dos Cristãos Afligidos. um reino e um rei externos e outros erros semelhantes por conta dos quais os inocentes têm de sofrer m uito” . Menno dirigiu sua Confissão do Deus Trino (1550). Alguns de seus escritos foram dirigidos çontra colegas anabatistas. Adam Pastor. O livro de Menno teve pouquíssimo impacto sobre os governantes. acompanhada de uma conclamação insistente ao arrependimento e à regeneração. Meditação sobre o Salmo 25 (1537). M artin M icron e Gellius Faher. veio a duvidar da divindade de Jesus Cristo. Os últimos escritos de Menno tornaram-se mais polêmicos à medida que foi forçado a definir suas idéias contra vários oponentes. não-resistentes: ele condenou explicitamente as características dos münsteritas: “a espada. dos estatutos e dos comentários humanos” . que encontraram nesse livro um sumário conciso da teologia e do sacerdócio anabatista. Menno também participou de um grande diálogo com três ministros reformados. . 1554). livreto no qual Menno contrastou a ressurreição do / corpo no fim dos tempos com a ressurreição espiritual do pecado para “uma nova vida e uma mudança de coração” . que via a si mesmo como o “D avi” escatológico e que atraiu muitos dos münsteritas desiludidos. A Educação das Crianças. mas ele já havia publicado vários tratados para esclarecer a posição doutrinária dos anabatistas. Contra ele. incluindo-se A Res^ surreição Espiritual (1536). 1557. de Agostinho.24 Fundamento era uma apologia aos anabatistas que escolheram a via da cruz em vez daquela da espada. ex-sacerdote a quem Menno havia ordenado no ministério. Meditações e Orações para a Hora da Refeição. 1557) e aos sofrimentos (e. denúncia mordaz a “horríveis e podres imundícies das ordens. Sua influência real foi sobre os cristãos. à espiritualidade (e. A obra Fundamento foi traduzida e reeditada diversas vezes no século xvi. A Cruz dos Santos. 1552.g. a poligamia. Fundamento foi a obra-prima de Menno. como David Joris.g.pacifistas. Menno reconheceu a legitimidade das autoridades civis e jurou obediência a elas em todas as áreas que não violassem os requisitos da fé. John à Lasco.. Basear-nos-emos em todos esses escritos em nosso esboço dos principais temas da teologia de Menno. que continuaram seu inquebrantável ataque contra todos os anabatistas. O Novo Nascimento (1537). exegese pessoal do salmo 25 no estilo da obra Confissões. Tais^ discussões foram ensaiadas em vários e longos tratados? Os outros escritos de Menno eram na maior parte admoestações pastorais relacionadas à disciplina na igreja (ele escreveu três tratados acerca desse assunto). £ q 1o c o u a principal ênfase na^necessidade do novo^aascimento.28 Mesmo tendo Lutero descrito a si mesmo como “renascido” . p.M çnno. \ regeneração de cada cristão pelo Espírito Santo” . “Se você deseja agora ter sua natureza ím ^ a purificãc[a e_deseja ser livre da morte eterna e da maldição [. Geschichte des Christlichen Leben (Coblenz. Então. o batismo do próprio Menno foi precedido de um período similar de luta violenta.. de Deus Filho e de Deus Espírito Santo. experiencial e individual. e tanto Zuínglio quanto Calvino terem comentado as palavras de Jesus a Nicodemos. e ele disse sim. 1955). 37. 28Max Göbel. 219-234.A Nova Vida f Atravessando todos os ramos da reforma radical. Então. Quellen zur Geschichte der Täufer in der Schweiz (Zurique: S. . o verdadeiro cristianismo era / ipso fa cto pessoal. Tal parece ter sido o caso com os batismos administrados na antiga congregação anabatista de Zollikon. ele pegou uma caneca de água e batizou-o em nome de Deus Pai. p. Veja sua obra Bruder in Chisto (Zurique: Zwingi-Verlag. deu-me uma mente nova. Logo depois. mas eles insistiam ^claram ente que uma experiência do novo nascimento era um pré-requisito para o / batismo nas águas. 42-43.. de Zumingen. 1952).] tocou meu coração. eds. O batismo às vezes acontecia como o clímax da conversão. 29CWMS. Fritz Blanke interpreta essa fase inicial do anabatismo ■j como um “movimento avivamentista”. desviou-me do caminho da morte e graciosamente me chamou para o curso estreito da vida” . Mantz levantou-se e perguntou: “Quem vai impedir de batizar?”. pp.27 Já em 1848. prantos e orações.. de suspiros. 27CWMS. o ramo anabatista da reforma radical foi recentemente caracterizado como um “movimento carismático” .. um processo que freqüentemente envolvia uma intensa batalha emocional.25 Sua prática de batismo de adultos conquistou-lhe o nome anabatista.. Hinzel Verlag. Blaurock perguntou se ele desejava receber a graça de Deus. havia uma ênfase inegável no .] então você tem de nascer de novo” . ensinou-me em parte a conhecer a mim mesmo. até que o “Deus de misericórdia [. processo interior de salvação... “ Leonard von Muralt e Walter Schmid. MQR 53 (1979). 1848). levantou-se chorando e gritando que era um grande pecador e que eles deveriam orar a Deus por ele. Davis. De fato. 92. o i i historiador M ax Gõbel reconheceu que “a característica essencial e distintiva dessa v j igreja [anabatista] é sua grande ênfase na conversão pessoal concreta e na . “Anabaptism as a Charismatic Movement”.. E Blaurock respondeu: “Ninguém” . . p. humilhou-me em seu temor.26 Como vimos. Hans Bruggbach. Para todos os radicais.29 O processo de conversão envolvia os dois momentos inter-relacionados de fé e arrependim ento^A fé era a 25Kenneth R. pp. 671. 3x. o ladrão na cruz. não tinha nada que ver com práticas religiosas externas. O arrependimento. Não vai “ ajudar em nada” . convertido. “o coração é renovado. movido por uma fé sincera. ir a confessionários” . uma reverência unida ao amor a Deus a que o conhecimento de seus benefícios induzia (Inst.2. Aqui. Esses eram mandamentos de homens inúteis e vazios. descreveu o novo nascimento como uma experiência pela qual “o coração é penetrado e movido pelo Èspírito Santo com um poder regenerador. que produz em primeiro lugar o temor a D eus” . sua m orte. pacífico e alegre. uma vez que os cristãos não sejam genuinamente convertidos de suas vidas ímpias e pecadoras. Abraão. ele asseverou. então. Josias. a mulher pecadora de Lucas 7 e a mulher siro-fenícia de Mateus 15. sua graça e seu evangelho. Moisés abandonou as riquezas do Egito para libertar seu povo da escravidão.32 No tratado A Verdadeira Fé Cristã (1541). torna-se piedoso. a verdadeira penitência (ware penitencie). Zaqueu. peregrinações. a qual não dava nenhuma prova de vida transformada. M oisés. Todas essas pessoas tinham em comum uma fé viva que as levou a uma ação decisiva e ao serviço de Deus: Abraão deixou a terra de seus pais e obedientemente ofereceu seu filho Isaque. Quando o pecador se lança entusiasticamente sobre a graça e as promessas de Deus. estava apto a amar a Deus. Contudo. mas estaria incompleta sem o ato anterior de arrependimento ou. 1. cinco do Antigo Testamento e cinco do Novo. o crente. ouvir missas freqüentemente. justificado.A fé não cessou com o temor. Menno apresentou dez “estudos analíticos” da verdadeira fé tirados da Bíblia. ser chamados de cristãos ou ostentar o sangue do Senhor. mas levou ao amor.apropriação interior do evangelho. renovador e vivificador incomum. aproxima-se com total confiança do trono da graça e torna-se assim um co-herdeiro com Cristo e um possuidor da vida eterna” . Os exemplos de Menno foram Noé. a retribuir amor com amor.30 M enno não prescreveu um padrão de conversão preciso através do qual todo cristão deveria passar. como Menno a chamou. Tendo recebido as grandes riquezas da graça de Deus em Cristo. A verdadeira penitência é “repleta de poder e obras” . que Menno definiu como “o abençoado anúncio do favor e da graça de Deus por nós e do perdão dos pecados por Cristo Jesus” .1). envolvia uma mudança de vida. nasce um filho de Deus. orações e leituras de inúmeros pais-nossos e ave-marias. Ele censurou aqueles que se apegavam a uma “m era fé histórica” . o centurião de Cafarnaum. como “jejuns hipócritas. seus méritos. o ladrão da cruz confessou a Cristo perante todas as pessoas e reprovou a blasfêmia . A fé era a resposta positiva à graça de Deus. Josué e Calebe. a saber. Menno chegou perto da definição de Calvino da verdadeira piedade. taberneiros bêbados e clérigos corruptos.VEmbora todas as pessoas herdassem uma natureza \ corrompida que inevitavelmente leva a pecados concretos. mais evidente isso se torna! Por essa razão. poucos juizes e advogados em seus tribunais. já que “uma criança desregrada torna-se obstinada como um cavalo selvagem” . sua vida mudou radicalmente. “Logo haveria uma situação diferente e melhor porque. ele reformou sua vida. teimosas e egocêntricas. O primeiro tipo era a natureza corrompida e pecaminosa herdada no nascimento por todos os descendentes do Adão corrompido e pecador.”33 Para entender de maneira mais completa a doutrina da salvação de Menno. as crianças estavam universalmente num “estado de graça” .5: “Eu nasci na iniqüidade. o justo tem de viver sua fé. não mais andou em seus antigos caminhos ímpios” . tendiam a ser barulhentas. Se os cristãos tivessem a fé do penitente Zaqueu. Menno aceitava o termo teológico tradicional pecado original como uma designação adequada para essa corrupção. precisamos rever brevemente seu conceito de pecado. a morte de Cristo na \ cruz eliminou a culpa do pecado original para todos! Esse é um dos principais argumentos de Menno para não submeter as crianças ao batismo. Ele também citava como apoio a isso o texto-prova tradicional. num ponto decisivo Menno afastou-se da doutrina' ortodoxa do pecado original . sem dúvida alguma. Zaqueu. poucos mercadores em seus negócios injustos e poucos pregadores. rendas e claustros. “Ele creu e foi renovado. envenenados pela serpente. até que chegassem à idade da “vergonha” ou da “discriminação . parece bem tradicional. portadores de uma natureza pecaminosa sujeita à morte eterna. Zaqueu era um dos exemplos favoritos de Menno. as crianças eram rebeldes contra a Palavra de Deus. no Jardim do Éden. Assim que Zaqueu recebeu com alegria a Cristo em sua casa. quanto mais velhas ficam. inclinados para o mal e por natureza filhos do inferno. enquanto crescem. Adão e Eva haviam sido mordidos pela serpente satânica e então tornaram-se. Salmos 51. Menno distinguia quatro tipos ou níveis de pecado. também nascemos com uma natureza pecaminosa.34 De fato. Menno advertia os pais cristãos a não pouparem o castigo para corrigir seus filhos. fazia Menno lembrar-se de muitas pessoas com que ele tinha contato — mercadores e financiadores contrários à ética. o rico coletor de impostos. juizes e advogados ávidos por dinheiro. então poucos senhores continuariam em suas vidas violentas e luxuosas. Menno acreditava que.35 Por natureza. sacerdotes e monges em seus salários.do companheiro criminoso. “portanto nós. contudo. e em pecado me concebeu minha m ãe” . Apesar de não serem capazes nem da fé nem do batismo. Tudo isso. porém. por assim dizer. as crianças pequenas “muitas vezes mostram. a semente maligna de Adão” . seus descendentes. do diabo e da morte eterna” . Menno dizia. Esses eram pecados de incumbência da vontade e incorriam na justa condenação de Deus. O pecado original era a “raiz” dos pecados concretos. a natureza pecadora herdada permanece. Contudo.. 39Ibid. mas não o fazem da mesma maneira que os incrédulos (i.] Eles se revestem de Cristo e manifestam sua natureza. pecam contra o Senhor. o roubo.. Os regenerados “não vivem mais segundo a velha natureza corrompida do Adão terreno. o homicídio e a idolatria. The Development o f Dutch Anabaptist Thought and Practice from 1539-1564. ou seja. 93. e diariamente implorassem a Deus por perdão. 3SIbid.37 Será que isso significa que os verdadeiros cristãos são capazes de uma perfeição sem pecados? Menno negava tal fato. a inveja. pp. são inocentes e sem culpa. Incluem o adultério. mas elas são. se não houvesse arrependimento. não entendendo nem o bem nem o mal. Cristo Jesus” . Os pecados concretos eram o fruto da carne (G1 5). talvez um insulto ao conselho de Lutero para “pecar descaradamente”).36 Ninguém era condenado por causa do pecado original. 564. e isso à imagem daquele que os criou. p.38 A vida cristã era uma luta contínua em busca de santidade e santificação: “Sua pobre vida fraca é diariamente renovada cada vez mais. a fornicação. mas segundo a nova natureza reta do novo e celeste Adão. espírito e poder em toda a sua conduta” . Apenas aqueles que eram capazes de decisões morais e éticas responsáveis poderiam incorrer em culpa. como Adão e Eva antes da queda.. . de certa forma. por mais devastadores e duradouros que sejam seus efeitos. visto que. Apenas nascendo de novo pela fé e pelo verdadeiro arrependimento os cristãos poderiam “resistir” ao pecado original e m orrer para os pecados concretos.. uma quarta categoria de pecado pela qual um cristão poderia “cairda_graça 36Citado de William Keeney. tão logo cheguem ao conhecimento do bem e do mal. ainda que não devesse mais dominar. 507. de acordo com a segunda categoria de Menno. 37CWMS. e lamentassem seus erros. passam da ignorância inocente para a malignidade consciente e. o ódio. erros e tropeços humanos que ainda são encontrados diariamente entre os santos e regenerados. a avareza. Isso levou Menno a introduzir sua terceira categoria de pecados: fraquezas. Quem experimentasse o novo nascimento era “transferido de Adão para C risto” . 68-69. o pecado original (como os homens o chamam) não é imputado por Deus contra [as crianças] para a maldição. Os cristãos pecam. porém . [. p. Havia.do bem e do mal’y Pelo amor de Jesus Cristo. mesmo depois da conversão. pp. por sua própria desobediência.39 Os santos não eram rejeitados por Deus devido a seus lapsos pecaminosos se suspirassem. “com satisfação e descaramento” .e. 93.. foram incorporados em Cristo são “ramos frutíferos da videira verdadeira” . a maldição eterna. 99. *'Ibid. etc.40 Menno declarou isso não apenas como princípio positivo. (“a corda foi rompida. pp. o pecado contra o Espírito Santo. Qualquer um que mal saiba recitar isso. isso é tão claro quanto o sol do meio-dia. Repetidamente. a importante e séria epístola de Tiago é avaliada e tratada como “epístola insignificante” .. Eles começam a cantar um salmo. Menno estava perturbado com as tendências antinomistas que sentia estarem latentes na doutrina luterana da justificação. A atitude de Menno em relação a Tiago é reavaliada ao lado daquelas de Lutero. Menno reiterava o tema básico de sua soteriologia: a fé genuína e evangélica produz um fruto genuíno e evangélico. mas cuja fé era improdutiva e morta. 333-334. assim como os anabatistas enf^ geral. Menno. . Que tolice atrevida! Se a doutrina é insignificante. Der Strick ist entzwei und wir sindfrei. A fé e seu fruto são inseparáveis. santifica. 369-383. purifica. Zuínglio e Calvino em Timothy George.por vontade e impiedade” . que a fé é de uma natureza tal que não pode tolerar nenhuma obra a seu lado.41 mlbid. ‘“ A Right Strawy Epistle’: Reformation Perspectives on James”. não importa quão carnalmente viva. que a escreveu e ensinou. Era o pecado da apostasia. graça. que resulta numa vida santa. é um bom homem evangélico e um irmão precioso. o servo e testemunha fiel de Cristo. enquanto cerveja e vinho verdadeiramente escorrem de suas bocas e narizes bêbados. não aceitava a doutrina forense de Lutero acerca da justificação pela fé somente. Aquele que cometesse esse pecado. renova. justifica cada vez mais. Porque a doutrina mostra o caráter do homem. assim. receberia sua recompensa adequada. todos os que. creiam. então o apóstolo escolhido. p. Menno refutou explicitamente o famoso desprezo que Lutero mostrou por Tiago chamando-a de “epístola de palha” . Os luteranos ensinam e acreditam que a fé salva por si só. a despeito de sua profissão do iy/ contrário. sem nenhum acompanhamento de obras. porque via isso como um impedimento para a verdadeira doutrina de uma |fé “vívida” . a fé verdadeira não pode ser vã — ela muda. graça” . sim. agora somos livres”). ao menos no modo que essa doutrina fora apropriada por muitos luteranos com os quais ele teve contato. Eles enfatizam essa doutrina de modo que dão a impressão de que as obras não são nem mesmo necessárias. in: Review and Expositor 83 (1986). pelo novo nascimento.. isso prova que você não crê realmente nele. E. mas também expressou sua implicação negativa: se você não faz o que Cristo manda. M elchior Hofmann censurou os que clamavam “creiam. o qual envolvia a impiedade explícita e o menosprezo de Cristo. pp. também deve ter sido um homem insignificante. a espécie humana foi criada quando ainda não existia. vida e morte deixaste à nossa escolha. Menno referiu-se à doutrina de Zuínglio como “abominação das abominações” .O conceito anabatista de discipulado (Nachfolge) como repúdio deliberado à velha vida e compromisso radical com Jesus como Senhor não podia tolerar tal abuso indiferente da graça de Deus. As igrejas alemãs (i. que. eterna misericórdia e onipotente majestade nesse assunto! . ^ como já vimos. Cristo foi enviado à terra. não pelas obras. não com os decretos eternos ou com o desígnio secreto de Deus. ele também falava muito vigorosamente de Jesus Cristo como o objeto da predestinação. .44 Se tivesse conhecido a doutrina de Calvino. à obra da graça. como a Palavra de Deus eterna que se encarnou “no tempo e na cidade de Nazaré. Ele rejeitava vigorosamente a idéia da dupla predestinação: Posso dizer que ordenaste os ímpios à impiedade. tanto o bem como o m al” .. Num exame mais minucioso. Menno freqüentemente se dirigia a seus seguidores como “os eleitos” e “os escolhidos de D eus” . Pela graça. o movimento jansenista do século xvil). enquanto Zuínglio ensinava que “quando um ladrão rouba ou um assassino mata. luteranas) proclamavam “essa questão de [Deus] operando em nós.] Água. pela graça. recebemos o Espírito Santo e. pela graça. como alguns disseram? Deus me livre. de acordo com o decreto de D eus” . ligavam os principais reformadores aos agostinianos estritos na tradição católico-romana (cf. “Longe esteja de nós que nos devamos consolar com algo além da graça de Deus mediante Jesus C risto.”42 Menno atribuía toda a ordo salutis. pela graça. pela graça. obtemos a vida eterna. É significativo que Menno iniciou sua lista dos “momentos” na história da salvação _com a criação. Menno insistia em que a salvação era pela graça. ' M enno partilhava com todos os defensores da reforma radical uma av ersão ^ -' obstinada às doutrinas gêmeas da predestinação e da escravidão da vontade. é-nos dado crer. Ao mesmo tempo. da criação até a vida eterna.] Ó querido Senhor. porém.. a vontade de Deus compeliu-os a isso” .e. aprendemos a nos arrepender.. sem dúvida não lhe teria dado mais respeito. pela graça. [. fogo. percebemos que há uma diferença importante entre Menno e os protestantes magisteriais quanto à fonte derradeira e quanto ao modus operandi da graça. Tal linguagem poderia muito bem ter vindo de qualquer um dos principais reformadores que estudamos nesta obra. foi novamente aceita por Cristo quando estava ainda perdida.43 Mas claramente não apreciava o suposto fatalismo que pensou estar implícito na teologia da predestinação de Lutero e Zuínglio. quão tristemente blasfemaram tua inefável grande bondade. pela graça. [.. de acordo com a predestinação de Deus. deve ser dito que ele abordou o assunto sem a sofisticação sutil de um Calvino ou de um Lutero nem o refinamento escolástico de um Baltasar fíuhm aier. ao torná-lo autor do mal. podese justificar esse procedimento com referências a Menno. A salvação é pela graça. Podemos começar recordando o papel decisivo que a Bíblia desempenhou na conversão do próprio Menno e na ruptura com Roma. Robert F riedm annnão incluiu uma parte específica sobre a doutrina das Escrituras.Menno foi movido por duas preocupações em sua rejeição do predestinarismo rígido: prim eiro. C. não pelas obras. The Theology ofAnabaptism e J. como na versão luterana da justificação. Convém lembrar também que ele estava debatendo-se com questões que nem começaram nem terminaram com as controvérsias do século xvi. in: A Legacy o f Faith: A Sixtieth Anniversary Tribute to Cornelius Krahn. 75. ed. referências e alusões à Bíblia. só pela quantidade absoluta de citações.45 Em suma. de Graaf. ninguém pode ir muito longe nos escritos de Menno sem perceber que ele estava completamente saturado da linguagem e dos temas das Escrituras Sagradas. visto que em lugar algum ele desenvolveu explicitamente suas idéias sobre a autoridade. isso fornecia uma desculpa prática para as mentes carnais “continuar no caminho largo e ter um disfarce para seus pecados” . a natureza e o significado da Bíblia. Um-\ sggmento principal dos batistas ingleses no século xvil abraçou um entendimento t da salvação não muito distante do de Menno* ao mesmo tempo em que a ala j ^ arminiana do calvinismo holandês — para não dizer os metodistas. p. contudo. Oosterbaan. que escreveu um minucioso tratado Sobre o Livre-Arbítrio. que também V ecordam a teologia dos anabatistas. pp. The Concept o fG ra c ein the Radical Reformation (Niëüwkoop: B. Contudo.. Ao menos superficialmente. tamBemTTôbert Friedmann. . ' A Palavra Infalível Em seu livro A Teologia do Anabatismo. ele sentia que isso causava danos à bondade de Deus. Se a posição de Menno é menos satisfatória do que poderíamos esperar. Cf. é “de minha própria escolha” que eu aceito os meios da graça divina oferecidos. Beachy. Isso teve o efeito de relativizar todas as outras i5Ibid. Menno pode ter sido o mais bíblico dos reformadores radicais. Dyck.. Seu questionamento da transubstanciação e do batismo infantil foi por fim resolvido mediante uma profunda pesquisa nas Escrituras. podemos dizer que Menno tentou equilibrar as “obras de justiça” da soteriologia católica medieval e o determinismo teológico dos protestantes principais. ainda mais tarde ! — desenvolveu conceitos de “graça resistível” e “expiação ilimitada” . 1977). J. A. “Grace in Dutch Mennonite Theology” . O estudo mais detalhado da soteriokjgiaanaJbalista até hoje é Alvin J. 69-85. segundo. a filosofia humana. imperecível Palavra de Deus. O seguinte diálogo entre Frei Cornelis. esses cristãos sem estudo freqüentemente confundiam seus juizes por sua habilidade em citar as Escrituras e argumentar a partir delas. mas apenas na “Palavra infalível de D eus” . ali se encontra uma mente convertida. comparando a Igreja de Roma à meretriz da Babilônia. mais freqüentemente do que a leitura da Palavra. Lutero. mostra como a Bíblia tornara-se uma poderosa arma nas mãos do povo. pois sei que você era apenas um pobre tecelão e negociante antes de sair pregando e rebatizando aqui em Gruthuysbosch. anabatista belga. ora! Que entende você do Apocalipse de São João? Em qual universidade estudou? Na tecelagem. pp. Orígenes. 48CWMS.48 A severa eliminação que Menno fez '“’Henry Poettcker. a exclusão ou o assassinato nada significam. O Espírito Santo germina a semente e gera seu fruto em fé e arrependimento. o aprisionamento. 32. onde o evangelho é pregado com verdadeiro zelo. Cursei a universidade de Louvain e estudei teologia . 47Ibid. eram completa ou parcialmente / analfabetos. Entretanto.47 Muitos dos que ouviam e respondiam à mensagem anabatista e a ela atendiam eram fazendeiros pobres. Agostinho. as práticas tradicionais. Menno comparou as Escrituras a uma semente espiritual de onde a nova vida brota. e Jacob de Roore. pois é a eterna. p. Frei Cornelis interrompeu: — Ah. acredito. transformada e nova” . uma vez convertidos. “Menno Simons’ View of the Bible as Authority”. Quando convocados perante as autoridades civis. de modo que penetra nos corações dos ouvintes. Bucer. Baseando-se na analogia entre a Palavra e um a semente. 100. enquanto a do evangelho é apresentar o remédio da salvação mediante Jesus Cristo. Quando Jacob citou Apocalipse. Nos primeiros dias do movimento anabatista. 102. os concílios dos eruditos. e assim permanecerá para sempre.46 A importância fundam ental da Bíblia na teologia de Menno é seu papel crucial no processo de conversão. começavam a “esconder a Palavra ' em seus corações” . inquisidor franciscano.autoridades e tradições humanas: Eis que.. repito. aos sacramentos e à vida que acabamos de examinar. Menno usava a distinção entre lei e evangelho para m ostrar as várias maneiras em que a semente da Palavra produz a regeneração. produzia esse resultado. os decretos imperiais. trabalhadores nãoj^especializados e pessoas desalojadas. Ele instava seus leitores a não confiarem em tradições antigas. é a eterna Palavra de Deus. p. meus dignos irmãos. na parábola do semeador relatada por Jesus (Lc 8. Às vezes. as bulas papais. mandatos imperiais ou “na sabedoria e nas interpretações dos eruditos” . Muitas vezes. A função da lei é produzir o conhecimento e a convicção do pecado. Dyck. “Assim também. a pregação. decretos papais. comparados às doutrinas. 45. Menno baseou todo o seu programa de reforma num apelo urgente à autoridade da Bíblia.11). corretamente explicadas e entendidas de acordo com a intenção de Cristo e de seus apóstolos. Isso levou a práticas extremas. vocês conseguem ler e escrever. anabatistas.2-4). contudo. etc. p.radicais . cruzes. tudo isso tinha de ser eliminado da verdadeira adoração cristã. p. mas. Muitos dos anabatistas recorriam a um literalismo simplista. eclesiásticos que temos estudado dia e noite desde quando éramos jovens. o uso e o apelo às Escrituras por parte de Menno diferiam dos principais por muito tempo.”51 A compreensão das Escrituras por parte de Menno foi desenvolvida em diálogo com os principais reformadores. e a todos os tipos de gentalha. 49CWMS.27). 51CWMS. tais como a poligamia em M ünster e o fato de correrem nus ao longo das ruas de Amsterdã (com base em Isaías 20. certamente são excelentes para entender as Sagradas Escrituras. Vocês. capelas. p. 172. e com os gspiritualistas. música de coro. contou de certos anabatistas que pregavam em cima dos telhados porque Jesus havia dito que “o que se vos diz ao ouvido. 312. Menno afirmava. vocês não podem distinguir um A de um B. togas. aos amoladores de tesouras. E a nós. Se o diabo e a mãe dele não têm nenhuma parte nisso. “a respeito de suas unções. Sobre o pano de fundo de uma adesão comum ao princípio da sola scriptura.em sua interpretação da Bíblia.2-3). Seu princípio hermenêutico básico era (sombras de Lutero) cristocêntrico. missas. enquanto outros se disfarçavam de crianças pequenas porque Jesus dissera que a pessoa deve tornar-se como uma criancinha para entrar no reino dos céus (Mt 10. tanto do Antigo quanto do Novo Testamento. por outro. 33. essa é a verdade. não compreendo nada sobre vocês. capas. Veja só como estamos atormentados. proclamai-o dos eirados” (Mt 10. purificações imundas. ofertas. pois. usos antigos. aos que fazem vassouras. por um lado. e aos reparadores de foles e lanternas. antes de serem rebatizados. e.50 Menno não concordava com esses extremistas. são proveitosas para a doutrina e para a repreensão.”49 Daí. tão logo batizados. líder reformado da Bélgica. Guy de Brès.25. como está escrito em Mateus 11. “Não há sequer uma palavra que se possa encontrar nas Escrituras” . e aos indigentes pobres. aos que colocam as coberturas nos telhados. contudo. Deus revelou aos operários da tecelagem. ele insistia em que a proibição de Jesus sobre os juram entos e sua admoestação à não-resistência fossem seguidas literalmente. A sarcástica resposta de Frei Cornelis revela sua exasperação ao lidar com tais arrogantes teológicos: — Exatamente. ainda não compreendo nada absolutamente do Apocalipse de São João. sinos. sujos e repugnantes. 50Citado de Keeney. aos sapateiros em suas bancadas. ele ocultou essas coisas. Ao que Jacob respondeu: — Eis por que Cristo agradeceu seu Pai celestial. órgãos. por ter revelado e dado a conhecer aos pequeninos e ocultado aos sábios deste mundo. claustros. “Todas as doutrinas. .da tradição litúrgica da igreja baseava-se na aplicação estrita do princípio de que o que a Bíblia não ordenava explicitamente não deveria ser permitido. Lembramos que Menno foi “ajudado” pelos escritos de Lutero em suas primeiras lutas para livrar-se de seus antecedentes romanos. e assim por diante. essas são claramente exceções à prática usual de Menno. ele censurou os reformadores p o r adornarem seu apelo às Escrituras com tradições humanas e um aprendizado vão. por exemplo. deve ter sido letrado em latim e. Zuínglio e Calvino trouxeram para seu estudo das Escrituras uma imersão completa nas disciplinas humanistas. como os anabatistas. Ele descobriu. 514. Adam Pastor. “Essas simples Escrituras. Contudo. o batismo após a confissão de fé. mas depois ele acrescentava: “Aqui Lutero e M elanchthon expressam-se corretamente segundo as Escrituras.. e calar-se onde a Bíblia se cala. p. Como ex-sacerdote. 53Poettcker. Cristo e os apóstolos” . Ir além da linguagem simples da Bíblia em tais assuntos era “como tentar despejar o rio Reno ou o M osa numa garrafa de um litro” . por exemplo.52 Em seus debates com pastores reformados. Menno citava favoravelmente as observações de Lutero e Melanchthon com respeito ao caráter solto das tradições extrabíblicas.53 Já observamos anteriormente como surgiu um debate sobre a divindade de Cristo entre os menonitas holandeses. a saber. Ao mesmo tempo. Em primeiro lugar. Menno era diferente em ambos os aspectos. devemos admitir que Menno não era capaz de permanecer fiel à sua própria regra. Escrevendo para Gellius Faber. Menno tenta expor a doutrina tradicional e ortodoxa da Trindade recorrendo apenas à Bíblia. Quando ele deixava de meramente citar textos exemplares tradicionais passando a uma descrição da divindade de Cristo e do Espírito Santo. Menno freqüentemente os acusava de terem bases bíblicas insuficientes para suas oposições. Nem foi esse o único caso em que Menno apelou à tradição eclesiástica mais ampla. lembramos. Cristo foi chamado de “pessoa” pelos pais da igreja. . de 52Ibid. p. fazia valer seu ofício de ensino apelando para sua vocação como Doutor em Bíblia-. o Espírito Santo “procede do Pai pelo Filho. Ele não fez nenhuma menção aos Concílios de Nicéia ou de Constantinopla ou a nenhuma das controvérsias patrísticas que tomaram conta da igreja prim itiva durante os quatro primeiros séculos. testemunhos e referências” são muito suficientes! Ele declarou que por 15 anos fora contrário à “sofística e às interpretações humanas” . Menno mandou-o “ler as Escrituras inteiras — Moisés e os profetas.protestantes em pelo menos três aspectos. 33. Em sua Confissão do Deus Trino (1550). Ele afirmava que Faber poderia provar sua opinião “por uma única letra das Escrituras” . falar onde a Bíblia fala. mesmo permanecendo sempre com Deus e em D eus” . ele caía de volta na terminologia desenvolvida na história da teologia. que o “valoroso m ártir Cipriano” advogou. incentivado por um antigo seguidor de Menno. apesar de infelizmente não seguirem seu próprio conselho!” . Lutero. em Fundamento.fato. nem ensinada em faculdade. Menno preferiu escrever em sua língua. ele admitiu que nunca obteve proficiência em línguas. cumprida com a vinda do Messias. Na verdade. Contudo. mas também em suas lutas com os militantes apocalípticos. tanto romano quanto protestante. e a letra. a Bíblia como um todo tinha autoridade para Menno. o Novo Testameno tinha precedência sobre o Antigo em sua interpretação das Escrituras. em nossa discussão da defesa feita por Zuínglio do batismo infantil contra os irmãos suíços. Esse princípio possibilitava-lhes justificar o batismo infantil por analogia com seu correspondente no Antigo Testamento. a imagem. Mesmo sua Meditação sobre o Salmo 25 traz bem mais citações do Novo Testamento do que do Antigo. visto que o público a que se dirigia consistia em pessoas comuns. A antiga aliança foi substituída pela novidade radical do reino de Cristo. Menno insistia para que o cristão deixasse a armadura de Davi para os israelitas legítimos. De acordo com Menno. para Menno. o Espírito. Para Menno. É significativo que Menno citava mais o Novo Testamento do que o Antigo numa razão de 3 para 1. havia realmente apenas uma aliança em duas dispensações. Certamente. entenderemos facilmente com que tipo de armas os cristãos devem lutar. Deve ser concedida do alto e aprendida pelo Espírito Santo” . o ser. Jesus Cristo realmente trouxe algo novo.55 . que é uma espada de dois gumes. a circuncisão. essa não era apenas uma questão em seus debates com os principais reformadores. proporcionou resumos em latim de alguns de seus trabalhos. Já encontramos essa questão antes. a saber. Ora. ele havia declarado que a sabedoria que ensinamos “não é para ser trazida de longe. apontando para a condição normativa da nova aliança. Os anabatistas negavam a legitimidade desse recurso ao Antigo Testamento. apesar de tê-las “cobiçado” desde sua juventude. não devemos imaginar que a figura do Antigo Testamento seja tão aplicável à verdade do Novo Testamento. Jan justificava seu uso da espada. O impulso das Escrituras como um todo é dirigir-nos a Cristo. que não podiam acompanhar discursos eruditos em latim. que a carne seja entendida como referindo-se à carne. tais como Jan de Leyden. para eles. Os principais reformadores enfatizavam o vínculo entre os dois testamentos. Se tivermos tal visão. Também encontraram no Antigo Testamento um padrão para as relações entre a igreja e o estado. Menno estabeleceu-se contra o escolasticismo. pois a figura deve refletir a realidade. a Palavra de Deus.54 Em segundo lugar. A antiga aliança consiste num período de preparação e promessa. alegando ser o terceiro Davi nomeado por Deus para introduzir seu reino à força. 177. edições separadas. Visto que diversos ensinos católicos. No Concílio de Trento. Em certo momento. Após a derrocada do reino münsterita. seu recorrente lembrete de que “nenhum outro fimdamento pode ser lançado. A maioria dos principais teólogos protestantes rejeitava os apócrifos como espúrios. que “não pode ser torcida nem quebrada” . Observamos a vigorosa reação de Menno em face da avaliação depreciativa que Lutero fez de Tiago. como movimento popular que se baseava em diversas correntes da piedade medieval. . 51Ibid. considerava os apócrifos como literatura edificante. mas não no mesmo nível dos escritos canônicos incontestáveis. A reforma radical. senão este que já se encontra estabelecido. tais como o purgatório.apócrifos totalmente inspirados. Visto na perspectiva de sua teologia inteira.. sendo muito populares na pregação medieval e na iconografia. O princípio reformado da sola scriptura mais uma vez levantou a questão da canonicidade da Bíblia. A Igreja da Inglaterra. p. de valor inferior e desprezível.56 Na Idade Média. esse princípio é o corolário hermenêutico para. fiel a seu padrão de via media. Menno retratava a realidade do Novo Testamento em contraste com a do Antigo. os livros apócrifos circulavam em. os menonitas amish baseiam sua cerimonia matrimonial no Livro çteJEûbias. recorreu ao apóstolo Pedro e à personagem apócrifa Suzana na mesma frase: 3 “Concordamos com o santo Pedro que devemos obedecer a Deus e não aos í homens. como parte da Palavra proferida de Deus. como Jan de Leyden. quando muito. Menno aceitou os escritos apócrifos como canônicos. e com a querida e casta Suzana que é melhor cair nas mãos do homem do \ que nas mãos de Deus” . continuou a considerarjps. os protestantes ansiavam por menosprezar a autoridade deles. Menno foi forçado a enfatizar o sentido figurado e o caráter espiritual do Antigo Testamento contra os principais protestantes e os militantes apocalípticos. Em terceiro lugar. p. a Igreja Romana reconheceu o status inteiramente canônico dos apócrifos. os seguidores desiludidos do ex-Rei Jan de Leyden acharam-se 56Ibid. Outro ponto de diferença entre os principais reformadores e os radicais diz respeito ao uso dos livros apócrifos.. em todas as suas manifestações. ou. Menno citava livremente trechos de todos os livros apócrifos. eram confirmados recorrendo-se aos apócrifos. A reforma radical. chamando-a de “epístola insignificante” .• Dessa forma. 341. que podia ser lida apropriadam e n te ja -a d o ra sâ g .u ra cristocentrismo fundamental. estava muito mais próxima da posição católica nessa questão. não fazendo distinção 'entre~ã autoridade deles e a dos Escritos incontroversos. Ele também se viu defendendo a objetividade e a autoridade compulsória de toda a Bíblia contra os espiritualistas radicais.57 A influência prolongada dessa tradição é ilustrada pelo fato de que. que é Cristo Jesus” . até o dia de hoje. mas não podiam aceitar nem seu biblicismo ipositjvo. nem seu programa de organizar anabatistas pacíficos em_congregações ' vjsúteis. a cidade de Leyden preocupava-se com um ataque de batenburguenses. Menno enfrentou desafio mais sério da ala espiritualista do anabatisroo.àviolência.. . na 58SAW. Em 1552. Isso. o mais tardar. Ele chegou a lamentar sua participação nas origens no anabatismo holandês e. escrita perto do fim de sua vida. esses terroristas da reforma / radical saquearam igrejas e mataram inocentes por uma extensa área dos Países ) Baixos. o qual era liderado por Menno e por seu próprio irmão Dirk.e. p. os outros eram decapitados e colocados na roda. Em sua Confissão. Mesmo tendo Batenburg sido executado em 1538. Conhecidos | por Zwaardgeesten (com mentalidade de espada). ~ ■ Deve ter sido um grande golpe pessoal para Menno quando Obbe Phillips.. Contra os extremistas violentos. liderados por John of Batenburg. mesmo antes de unir-se à irmandade. quando as profecias os haviam enganado de todos os lados — uma referência às predições errôneas de Hofmann. seus seguidores continuaram a descarregar vingança sobre outros. os não-batenburguenses).59 Esse acontecimento deve ter penetrado indelevelmente na consciência de Obbe.| impelidos para várias direções. Menno lançou os mesmos argumentos que ihavia usado contra Jan de Leyden. porque estava curioso para saber quais daqueles no monte eram os três que nos tinham batizado e proclamado tal chamado e promessa a nós. nem diferenciar um do outro. que ele testemunhou em Haarlem no ano de 1534. também não pudemos reconhecer. e aqueles nas rodas. Mathijs e Jan de Leyden — então “a letra das Escrituras tornou-nos prisioneiros” — uma alusão à insistência de Menno em seguir literalmente o modelo da igreja do Novo Testamento. Obbe relatou sua desilusão com o movimento anabatista em surgimento. p. Alguns eram asfixiados e colocados na lança. 223. eu mesmo vi e estive entre os executados com alguns irmãos que haviam viajado comigo.! I outra oposição mais sutil surgiu em meio aos dissidentes que partilhavam da ■aversão de Menno . Mas não pudemos identificá-los. 59Ibid. Ele escreveu que. que o batizara e ordenara para o ministério. abandonou a comunidade anabatista em 1540. depois. 219.58 Obtemos uma impressão vívida da profunda reviravolta psíquica de Obbe mediante sua descrição da execução de “ 15 ou 16 mestres e irm ãos” . Alguns deles. por fim. ^ continuaram a acreditar que o segundo advento de Cristo só podia realizar-se com ( ataques violentos contra os “ímpios” (i. Contudo. terminou sua vida como um tipo de espiritualista solitário. de tão assustadoramente mudados que foram pelo fogo e pela fumaça. Joris viveu na Antuérpia. Jahrhundert (Leipzig. 80. 215-217. O direcionamento do Espírito deveria ter precedência sobre os aspectos objetivos e históricos da fé: A fé é revelada no poder do Espírito e no poder da verdade. V ajustou-se externamente à igreja reformada e viveu seus dias em relativa calma e tranqüilidade.. onde desenvolveu um tratamento totalmente espiritualista à fé cristã. Cf. [. em 1544. p. muitos tentaram disfarçar as verdadeiras crenças mediante a dissimulação e a anuência externa para com as ordens das igrejas oficiais. 1937). não na narrativa da história bíblica.. como ele próprio. Já na prim eira edição de Fundamento. que o proclamava profeta de Deus. nem na história dos milagres dos apóstolos e profetas. a davidiana” . . Menno havia percebido o perigo apresentado pelas “seitas corrom pidas” . que. Ele adotou um nome inventado. uma rica mulher chamada Anneken Jans.pessoa de David Joris. 350-361. p. nem em sua encarnação. pp. depois para a de Batenburg. in: MQR 59 (1985). onde há uma letra em toda a doutrina de Cristo e dos apóstolos [. Stayer. agora. Enquanto Menno insistia na Palavra escrita. The Radical Reformation. “Johann van Brugge” . Ele lamentava que muitos tinham sido “tão tristemente desviados de uma seita impura para outra: primeiro para a de Miinster. pp. Joris mudou-se para Basiléia com a esposa e os onze filhos. 61Citado de Roland Bainton. ele veio a rejeitar todas as “aparências exteriores” . em contraste com o desacreditado Jan de Leyden. por meio de sua fértil produção literária. A exemplo dele. até mesmo o batismo de adultos. Menno também atacou as alegações dos falsos mestres: Será que vocês querem dizer que a doutrina de Cristo e de seus apóstolos era incompleta e que seus mestres trazem a instrução perfeita? Respondo que ensinar isso e crer nisso é a mais horrível blasfêmia.. a “jo eira” nas mãos de Deus para peneirar e “preparar-lhe um povo aceitável para que pudesse vir rapidamente para seu tem plo” . «CWMS. De 1539 a 1544. Joris recebeu uma carta de uma correligionária admiradora.] Filhos enganados. 383. também o recente artigo de James M. Ele continuou a dirigir seus seguidores conhecidos como davidjoristas. sua morte ou sua ressurreição.] pela qual vocês podem provar e demonstrar como errado um só de seus artigos?62 '“Williams. Joris ressaltava a Palavra interior. “David Joris: A Prolegomenon to Further Research”. nem na prova corporal da cruz exterior de Cristo. David Joris: Wiedertäufer and Kämpfer fü r Toleranz im 16. Finalmente. nem em sua segunda vinda..61 Sendo perseguido nos Países Baixos. Em 1538.60 Joris logo começou a acreditar que era o “verdadeiro” Terceiro Davi. havia sido ordenado ao ministério por Obbe Phillips. .Desafiado pelo forte ataque de Menno. pp. digo-lhes a verdade e não minto. Não sou nenhum Enoque.63 Com essas palavras. Menno alegou. Menno respondeu numa “Réplica Contundente a David Joris”(1542). em 1556. Joris escreveu uma carta advertindo-o a preparar-se para uma grande batalha. evitando a linguagem especulativa e filosoficamente sobrecarregada dos debates patrísticos. Ele criticou a política davidjorista de duplicidade e conformidade à cultura religiosa dominante. Para percebermos quão contundente a réplica de Menno foi. suas idéias continuaram a persistir. não tenho visões nem inspirações angélicas. não sou profeta que possa ensinar e profetizar algo além do que esteja escrito na Palavra de Deus e seja compreendido no Espírito.. 64I b i d p. Menno apresentou o princípio que se tornaria a pedra de toque do restante de seu ministério. precisamos apenas ouvir sua caracterização de Joris como “um monturo de homem.] Mais uma vez. não sou ninguém que tenha visões. mais precisamente. com a qual pretendia-se refutar o erro dos monofisitas (que sustentavam que Cristo possuía uma única natureza). Essa era uma fórmula conciliatória. 64 • O Senhor Encarnado Observamos como Menno Simons tentou reformular a clássica doutrina da Trindade em termos puramente bíblicos. Num antigo trabalho. 310. Nem as desejo. A raiz da heresia de Joris. por si só. Questão similar surgiu com respeito à pessoa de Cristo ou. e dos nestorianos (que separavam de forma radical demais mIbid. Entretanto. [. chamando-a de mera covardia. ao modo da encarnação. Por que não Deixo de Ensinar e de Escrever (1539). as autoridades de Basiléia descobriram que aquele respeitável mercador que haviam conhecido como Johann van Brugge era na verdade o famigerado herege.. Menno solicitou a Joris que não mais lhe escrevesse até que se tivesse arrependido e estivesse disposto a submeter as próprias idéias à Palavra do Senhor revelada nas Escrituras Sagradas. O Concílio de Calcedônia (451) havia declarado o Cristo encarnado “uma pessoa em duas naturezas” . Fizeram seu corpo ser exumado e cremado postumamente. Pouco depois da morte de Joris. para não ser enganado. A Palavra de Cristo. não sou nenhum Elias. cinzas e vapor” . 1019-1020. por um lado. e Menno foi forçado a lidar com uma recorrente tendência espiritualista no anabatismo holandês ao longo de toda a sua carreira. . estava na substituição da Palavra de Cristo por sua própria palavra: “Você trata como obsoleta a doutrina de Cristo e a sua como perfeita e permanente” . Irmãos. é suficiente para mim. buscando o conselho de outros cristãos.^substância. Kasper. temendo que eu estivesse enganado sobre isso” . No mesmo documento. ele descreveu mais adiante como íl. compreendidas no Espírito.ve de M aria nada de . trouxe dos céus | consigo o próprio corpo. depois de muitos jejuns. foi com relutância que Menno entrou em polêmica com seus onositores da Reforma quanto à doutrina da encarnação.a humanidade e a divindade de Cristo). Finalmente. é o Senhor dos céus. extraíam “seus erros de nossa verdade. ele referiu-se a uma conferência em Emden na qual haviam discutido a encarnação. Menno jexpliçava a encarnação sob o aspecto do Cristo d i v in o J / I atravessando o ventre de M aria como um raio de sol atravessa um vidro. doutrina aos anahatistas dos Países Baixos e. onde se cristaliza formando uma pérola. Baseando-se nas imagens do misticismo medieval. “um assunto para o qual você sabe que eu tinha sido convidado e forçado contra minha vontade” . The Radical Reformation. pp. . antigo líder gnóstico. orando. anahqtistas e racionalistas evangélicos. Aparentemente. tais como Sebastian Franck e Melquior Hofm ann. Schwenckfeld defendia sua versão da cristologia da “carne celestial ” contra outros reformadores. para sempre bendito. Hofmann comparou a descida de Cristo até o ventre da virgem M aria a uma gota de orvalho caindo do céu e entrando numa ostra. “ CWMS. deu lugar a mais controvérsias sobre esse eterno dilema teológico. daí. transmitiu essa. Não nos devemos surpreender com o fato de que a Reforma Radical. escrita a pedido de John à Lasco.. a semente espiritual prometida da Eva nova e espiritual.SchwenckfelH. Menno passou muitos dias jejuando. Os cismas cristológicos continuaram a dividir a igreja após Calcedônia. p. com seu desejo de eliminar os acréscimos eclesiásticos e voltar às raízes do cristianismo. quando “foi mencionado pela prim eira vez pelos irmãos [hofmanitas?]. 422. j Em meio a certos espiritualistas. 427. como aranhas que sugam seu veneno de uma bela flor” . assegurado pelo testemunho infalivelmente certo das Escrituras. Em sua B rief and Clear Confession [Confissão Breve e Clara] (1544).. orações. alegava ter ' introduzido essa doutrina na Reforma e que a aprendera de sua leitura da Bíblia e dos pais da igreja. tribulações e ansiedade. princípio duvidara desse ensino. especialmente no Oriente. pela graça de Deus. 332. Empregando uma metáfora diferente. quando afirmava que Cristo nãa-johíe. fiquei. quando Cristo se encarnou. e não Schwenckfeld. os quais. mas simplesmente atravessou a virgem “como água por um tubo” . a Menno Simons. surgiu em diversas formas o ensino de que. que Cristo Jesus.65 Hofm ann. intimamente consolado e renovado.. por outro. ele alegava.. sem . tomar a si a carne pecaminosa. reconhecendo e crendo com firmeza.sua . prantos. Hofmann também fazia e m -aJ ^ a je n tin p . o espiritualista.66 “ Williams. Pois Cristo Jesus. pois teria sido contaminado pelo pecado adâmico.69 Menno tentou definir o processo da encarnação com o máximo cuidado possível. quanto à origem. Menno procurou resolver o problema apontando para a origem celestial do inteiro ser de Cristo: “O Cristo Jesus inteiro. de forma que Jesus/. Menno citava seu texto-prova básico. o Verbo de Deus. tomou-se carne e foi nutrida em seu corpo. Ele é fruto ou homem celestial. “e o Verbo se fez carne” (Jo 1. p. mIbid. mesmo depois de lhes ter sido explicada!” . 797-798.68 Repetidamente.M êhnõlíescartou ambas essas explicações: a prim eira elevava M aria à posição de uma deusa divina. não úfe Maria. sendo concebida nela pelo Espírito Santo. ^Ibid. 1 61Ibid. e. Menno evitava ensiná-la em público. a última dividia Cristo em duas partes.. como o primeiro Adão. “o Verbo tomou para si a carne hum ana” . que é comum a todos os seus descendentes.Embora nunca mais tivesse hesitado em sua adesão à doutrina.14). Conscientemente. por sua fé. foi capaz de gerar um Cristo sem pecado. assim. pois dedicou-lhe mais atenção do que a qualquer outro tópico doutrinário. Os católicos resolviam esse problema recorrendo à doutrina da imaculada conceição da Virgem Maria: M aria foi preservada do pecado original por uma concepção sobrenatural em sua mãe Ana e. Pois seu começo ou origem é do Pai. A tradição reformada geralmente sustentava que o Espírito Santo purificou m iraculiõiãm enEXsen i^ te corrupta~de~Ãdão. . pp. ^ estava livre do pecado originai. ele escolheu certas locuções prepositivasl para esclarecer essa questão: Jesus Cristo foi concebido em M aria p o r meio do f Espírito Santo ou do Espírito Santo.. p. homem e Deus. à exceção do pecado. fruto da carne e do sangue de Adão. a saber. mas nasceu a partir de M aria. será útil ouvir sua própria explicação disso: A Semente celestial. assim. foi semeada em Maria e. Menno não podia admitir que Cristo recebesse sua natureza humana de M aria. destruindo a unidade de sua pessoa. obviamente Menno achava que sua doutrina da encarnação merecia ser defendida em longos tratados. apesar do fato de que herdou uma natureza j-õtãimente humana. Ele rejeitou a expressão preferida de seus opositores. 437. 430. é chamada de fruto de seu ventre. e não na terra” .67 Contudo. em favor de uma interpretação literal da declaração joanina. sustentando que “há poucos que podem entender essa questão complexa. não é homem terreno. a fim de reconhecer tanto o nascimento natural de Jesus quanto sua origem sobrenatural. assim como um fruto ou filho natural é chamado de fruto de sua mãe natural. isto é. tem sua origem nos céus. Visto que^TTÓrmulação de Menno acerca da encarnação diferia ligeiramente daquela de Hofmann. Deus e homem.. e não um mero fantasma. baseava seu entendimento da encarnação: “ . subvertem os elementos. 70Cf.. sede. mas conhecia suas idéias mediante seu opositor M artiu M icron. 167. Ao mesmo tempo. teve fome. pp. capaz de oferecer um sacrifício perfeito na cruz pelos pecados do mundo. 91-92. Menno afirmava explicitamente que Jesus foi nutrido enquanto passava pelo desenvolvimento fetal normal no ventre de sua mãe. The Radical Reformation. p. pelo menos em parte. Nos dias de Menno. que era apenas nutrido e dado à luz pela mãe. Williams. refutou essa visão. isto é. ele declarava que Cristo “era verdadeiramente humano. 794. . a antiga heresia de que Cristo somente aparentava humano.eu modo de ver era a teoria científica~ dominante. xm . Menno insistia que M aria não contribuiu em nada para a ’origem da natureza humana de Jesus. pp. de acordo com a carne” . 207-209. Menno não tinha intenção alguma de negar a verdadeira humanidade de Cristo. nutrido e alimentado em M aria. da natureza” (Inst.72 Ele também criticou a teoria 'bloíógica na qual Menno. e destarte. l. que ele não podia imaginar nada “mais orgulhoso do que esse asno ou mais imprudente do que esse cachorro” . como vimos. esteve sujeito ao sofrimento e à morte. Seus opositores. acerca do anabatista holandês. 428. 71CWMS. n. que nunca se encontrou com Menno. no afã de mascarar seu erro. contudo.73 O interesse de Menno era mostrar como Cristo permaneceu imaculado do pecado original. 72CO 10.70 Ao contrário de Hofmann. O Verbo eterno “foi concebido e gerado do Espírito Santo. sobremodo altivamente contendem os novos/ marcionitas que as mulheres são sem semente. hoje sabemos que o homem e a mulher são iguais participantes no processo de procriação. Num retrospecto.] Ele foi afligido.Uma versão algo concisa dessa fórmula declarava que Jesus nasceu de Deus a partir de M aria. que provou. p. acusaram-no de ensinar uma cristologia docética. Calvino.. que uma criança tem sua origem em seu pai. 793. Menno também cria que esse padrão era confirmado pelo exemplo bíblico de Abraão e Sara. 73CWMS. disse. como uma criança natural o é por sua m ãe” . igualmente partilhada por médicos e filósofos. a excelente discussão em Keeney. para convencer que Cristoj haja assumido um corpo do nada.71 Menno acreditava que sua formulação havia preservado tanto o caráter sem pecado de Cristo quanto a realidade de sua natureza humana. Calvino possuía claramente o melhor argumento quanto ao papel da mulher na procriação. Acreditava-se que a semente masculina era a origem na natureza do recém-nascido. Contudo. Contra os gnósticos (dentre os quais M arcião). “sem dúvida. p.. A biolopia moderna obviamente. [. 487.. porém. A teoria de Menno foi confirmada pela teoria fisiológica "CÕrrênte nã época (derivada de Aristóteles) de que a mulher era um elemento completamente passivo na geração da descendência.. 31n. 3). e não em sua m ãe” . e. que ele deu para a vida do m undo” . banqueteando-se na comunhão com o “m aná” celeste que Jesus identificou com seu corpo (Jo 6. em vez do caráter distinto das naturêzãi~de7g ^ srP o rtã n to . A importância crucial do novo nascimento depende da encarnação pela qual os cristãos tornam-se participantes da natureza divina. um filho de homem. que ele mesmo é. ele tendia a enfatizar a unidade da pessoa do Deus-Homem. também está relacionado ao milagre da encarnação. posteriormente. pp. Mas o pão. os menonitas abandonaram-na também. Menno não hesitava em dizer o Deus Filho sofreu e morreu tanto em sua divindade quanto em sua humanidade. Contudo. p. o Filho de Deus.Assim. 243. durante os séculos XVI e xvn..). 784. Menno foi levado a explicar seu modo de ver por meio de analogia — como o Imperador Carlos v era filho da Áustria por parte de pai e filho da Espanha por parte de mãe. sem qualquer mãe e não sujeito ao sofrimento. o Filho de Deus e de M aria” . uma formulação que os teólogos reformados relutavam em admitir. O conceito de Menno sobre a igreja como comunidade sem mancha ou ruga. um. e dá de comer aos homens — isto é. 808.51 e s. um pouco confundidos pelas visões egtranhas de Menno acerca dessa questão” . mas um único e indiviso filho. Contra um Cristo assim esquizóide. por parte de seu Pai. portanto. a 3cmtnnã”de Menno teve significativas implicações soteriológicas e eclesiológicas para os anabatistas holandeses.76 Contudo. o Filho primogênito e unigénito do próprio D eus” . 15Ibid„ p. e o outro. p. .77 7AIbid. 16Ibid. Cristo Jesus era. O organizador da tradução em ingíês dos 'escritos de Mermõ^ n l l i ^ Lqüg^oslnenonitas modernos estão. da mesma forma. o filho de M aria. aos cristãos — é sua carne. Menno declarou que “o Senhor Jesus Cristo não é um Cristo impuro e dividido de duas pessoas ou filhos.74 Como todos os teólogos. e o que era o alimento dos anjos tornouse também o alimento dos homens (SI 78. o Filho de Deus e. mas um Cristo indiviso e puro. sem qualquer pai e sujeito ao sofrimento” . Menno interpretou o destaque reformado às propriedades distintivas das duas naturezas como que a produzir “dois filhos. por parte de sua mãe.75 Os irmãos suíços e os huteritas não seguiram os anabatistas holandeses em adotar a doutrina distintiva da encarnação sustentada por M enno.. 792-793. Dirk Phillips expressou o íntimo vínculo entre a cristologia e a piedade eucarística da seguinte maneira: “Cristo Jesus é o pão vivo que veio como orvalho ou maná dos céus. Cristo permanecia “não um filho a partir de dois filhos — mas um único e indiviso Filho. ^SAW. ainda assim não era dois filhos. uma pessoa singular.25). 16n. Grande parte dos escritos de Menno foram dedicados à exposição do caráter da igreja verdadeira contra as falsas igrejas anticristãs legalmente reconhecidas e sustentadas pelo Estado. 300. . era uma comunidade intencional. Com muita freqüência. passaram a obedecer-lhe e vivem de maneira inculpável em seus sagrados mandamentos e de acordo com sua santa vontade em todos os seus dias. ou desde o momento de seu chamado.. tornando-se a mais duradoura* manifestação da reforma radical. p. mediante a escuta da Palavra divina. Mas constituem a verdadeira congregação de Cristo os que foram verdadeiramente convertidos. Mediante o ministério de Menno e de seus co-obreiros. Durante 25 anos. p. os circunceliões e os münsteritas. Essa atitude era verdadeiramente revolucionária no século XVI. constituída de elementos regenerados que voluntariamente adotavam uma vida de discipulado. aos luteranos e aos zuinglianos como “as facções grandes e confortáveis” . Ele agrupou-os com os arianos. que possuem uma mente regenerada pela operação do Espírito Santo. De fato.78 A igreja verdadeira. sua fé e sua conduta usando a espada” . então. que são nascidos do alto. 19Ibid. e tomaram-se filhos de Deus. levando a represálias violentas contra os anabatistas não-conformistas. comprometidas umas com as outras e com sua missão no mundo. de Deus. Menno referiu-se aos católicos. o anabatismo holandês recuperou-se de sua desilusão em M ünster. sendo a religião envolvida pelo poder coercivo do Estado. Eles partilhavam um aspecto em comum: “É costume de todas as facções que se encontram longe de Cristo e de sua Palavra tornar válidas suas posições. ele trabalhou de um extremo ao outro dos Países Baixos e da Alemanha setentrional a fim de transformar comunidades de cristãos em congregações organizadas. pelo qual a igreja e a sociedade formavam uma unidade orgânica.A Igreja Verdadeira A Congregação Conta-se que Menno Simons disse em seu leito de enfermidade — o qual viria a tornar-se seu leito de morte — que nada na terra lhe era tão precioso quanto a igreja. eram os líderes das igrejas oficiais que instigavam as autoridades a 78CWMS. 175. não constituem a verdadeira congregação de Cristo aqueles que simplesmente ostentam seu nome.79 Menno e os anabatistas negavam a legitimidade dó corpus christianum. empenhando-se um para com o outro num amor e numa mutualidade convencionais. e nisso seremos pacientes. Conseqüentemente. Mas entendam. nobres senhores.] contra Deus. sabe ser essa a nossa intenção... que o abuso de suas posições ou ofícios. banidos ou expulsos e despojados de nossos bens. Não surpreende que Menno tivesse reservado alguns de seus epítetos favoritos para os líderes religiosos: “mentirosos hipócritas [. enfeitiçou e cegou seus olhos.. Even Unto Death (Richmond: John Knox Press. mediante a astúcia do diabo. mas do diabo. “a igreja do povo”). Em 1550. sim. não lhes obedeceremos.. Zuínglio e Calvino. eles acreditavam. se nos acharem desobedientes nessas coisas. burgomestres e juizes....] Sejam sensatos. . Wenger. a igreja do Novo Testamento devia ser restaurada “de acordo com a regra e o critério apostólicos verdadeiros” . abram os olhos de sua compreensão. de 1552. 71. Antes.] bocas caluniosas inúteis [. Deus. e que o anticristo. 180. tributos e ordenanças. que reconhecemos seus cargos como certos e bons. ou ser açoitados. como pode parecer-lhes bom. A Volkskirche (lit.. p. O vinho novo não podia ser deitado em odres velhos. [. um anabatista holandês chamado Hans van Overdam explicou a posição de seus colegas cristãos aos magistrados seculares: Fiquem sabendo. mediante a graça de Deus. a qual. a espada secular para a punição dos malfeitores e para a proteção dos bons. e desejamos obedecer-lhes em todas as taxas. 81Citado de John C. que queriam reformar a igreja com base na Palavra de Deus. que conhece todos os corações. Ele aceitavam a obediência à autoridade civil em todas as áreas que não violassem os requerimentos de sua fé.. permitir que nossos corpos temporais fossem queimados. confiando a vingança a Deus.] pregadores do diabo” . e fiquem atentos. desde que não sejam contrários a Deus. que é [. como ordenados e instituídos por Deus. era em si uma marca da condição decaída da igreja. 1961). portanto. isto é. p. conselheiros.81 Ao contrário de Lutero. dilacerados ou torturados. e vejam contra quem lutam. decapitados. Logo.. afogados. havia “caído” ou apostatado.. a mostrar-lhes qualquer obediência contrária à Palavra de Deus. não reconhecemos ser de Deus. que os reformadores principais mantinham.perseguir os reformadores radicais. pois é da vontade de Deus que sejamos tentados desse modo. Em sua Confession o f the Distressed Christians [Confissão dos Cristãos Aflitos]. E. os reformadores radicais estavam mais preocupados em restaurar a igreja primitiva. receberemos voluntariamente nosso castigo como malfeitores. preferiríamos.] essa tribo herodiana [.80 Os anabatistas não negavam que os magistrados eram ordenados por Deus para manter a lei e a ordem. Menno descreveu a restituição da igreja verdadeira que ele havia testemunhado em *>Ibid.. nobres senhores. no cânon] que nenhum homem. 236.. se o vigoroso Deus não manifestasse seu poder gracioso. abriu novamente as janelas do céu e deixou cair o orvalho de sua Palavra divina. 238. o Deus grande e gracioso. . 4) amor sincero e fraternal. p. The Radical Reformation. que produzem frutos para o Senhor e glorificam seu sublime e adorável nome.Resposta a Gellius Faber\. eles rugem e vociferam. de modo que mais uma vez. 2) uso bíblico dos sinais sacramentais.83 Em 1529. ™Ibid. somos tão miseravelmente injuriados. Gemeinde).82 O termo favorito de Menno para a igreja era Gemeente (cf. quero dizer. Contudo. 502-503. falsidade blasfema e tirania sangrenta tais que. a terra produza seus ramos verdes e plantas de justiça. e com falácia sutil. pelos ricos tesouros de seu amor. mediante os quais o engano e as abominações blasfemas dos doutos tomam-se manifestos. os riachos e as nascentes não fluem. Menno declarou que. a verdadeira comunhão dos santos. 6) opressão e tribulação por causa da Palavra do Senhor. pp. nem o orvalho cai do céu. nenhum homem poderia ser salvo.seus próprios dias: A luz do sol não brilha há muitos anos. o Imperador Carlos v expediu um mandato imperial que exigia a pena de morte a todos os rebatizados: Considerando que está ordenado e exposto na lei consuetudinária [i. o céu e a terra são como cobre e ferro. quatro dessas seis marcas da igreja dizem respeito à dimensão ética e moral da vida cristã. tendo sido batizado uma vez de acordo com a ordem cristã. A Palavra e os sacramentos santos do Senhor levantam-se de novo das cinzas. se deixará batizar novamente ou pela segunda vez. com o qual designava a fraternidade ou comunidade viva de cristãos. Portanto. difamados e perseguidos por todos os hom ens” . 3) obediência à Palavra.. todos os portões infernais despertam. 5) confissão corajosa de Deus e de Cristo. 84Citado de Williams. mediante as quais a igreja é conhecida: 1) doutrina não-adulterada e pura. as belas árvores e os campos verdejantes estão secos e murchos — espiritualmente. Em sua Reply to Gellius Faber [. nestes últimos dias. Menno enumerou as seguintes características. p. Mas jamais serão arrebatados dele aqueles que são seus. título que seus opositores lhes davam.84 82CWMS. como outrora. nem batizará ninguém assim. sob pena de morte.e. Significativamente. e sobretudo que é proibido pela lei imperial fazê-lo. “devido ao batismo. O Batismo A importância do batismo para os seguidores de Menno Simons é indicada pelo termo anabatista (Wiedertäufer). KIbid. na qual Jesus instruiu seus discípulos a ensinar primeiro e depois batizar. negavam s e r ^ rebatizadores. em água nem em palavras. Contudo. não podem crer e. postulou uma fé adormecida. Menno insistiu na fé pessoal de quem recebe o batismo.. não deviam ser submetidos ao batismo. a fé do bebê sendo batizado não estava em questão. Contra a visão do prim eiro. não havendo fé renovadora e regeneradora que leve à obediência. mas sim de seus pais ou da própria igreja. Menno insistia na obediência da ordem estrita da Grande Comissão. o batismo que haviam recebido na prim eira infância? Podemos resumir a doutrina do bãtismo defendida por Menno em três afirmações: 1) A f é não vem do batismo. assim. ensinado tanto pelos teólogos católicos quanto pela maioria dos protestantes. como não crêem. em nenhum sentido. obviamente. p. X)s anabatistas. Lutero reconhecia a relação intrínseca entre a fé e o que era batizado e. 265. ele se recusaria a administrá-lo se não houvesse provas de vida transformada. mesmo se o imperador ou o rei viessem desejando o batismo.Embora essa lei se baseasse nos antigos códigos contra os donatistas e outros cismáticos da igreja primitiva. nem em ser a fórmula batismal pronunciada por um sacerdote. renova. declarou: “Não lemos nas Escrituras que os apóstolos 85CWMS. Lutero e Zuínglio resolveram o problema da fé e do batismo infantil de maneiras diferentes. de modo que somos transformados e convertidos da incredulidade para a fé. “Visto que os bebês não têm a capacidade de ouvir. na verdade. [. não devendo ser batizados. O novo nascimento não consiste. não podem nascer de novo” . vivo e ressuscitador poder de Deus em nossos corações.86 Conforme observamos anteriormente. Ele sustentava que o batismo nas águas era um sinal exterior conseqüente à experiência interior da fé. mas é o celestial. ela claramente visava “o novo erro e seita do anabatismo. Para Zuínglio.85 Menno declarou que. Contra a concepção de Lutero. . mas o batismo procede da fé . O novo nascimento não consistia em ser imergido na água. penetra e converte nossos corações. “pequenos bebês sem a razão” não eram capazes de receber tal ensinamento e..] E é somente para esses regenerados que ele ensinou e ordenou o batismo santo e cristão como sinal de fé. recentemente surgidos” . mediante a pregação da Palavra divina. ^P ois.. assim. p. Menno opunha-se ao entendimento sacramental do batismo. 134. não há batism o” . visto que não reconheciam como válido. latente dentro do bebê. vivifica.^ 2) Os bebês não são suscetíveis de f é e arrependimento. que provém de Deus e que. se a aceitarmos pela fé. com suai ênfase na eficácia salvífica universal da morte de Cristo para todas as crianças que / não haviam atingido a idade da responsabilidade. depois. Menno refutava essa postura. antes de atingirem o período da compreensão e antes de terem fé. a saber. então somente os meninos deveriam ser batjzados! Sua principal alegação. e isso. Portanto. até poder entender o santo evangelho da graça e sinceramente confessá-lo. 272. de receber o batismo cristão. era a falta de qualquer ordem explícita. ou M elquior Hofmann. então moldamos um bezerro dourado e colocamo-lo no lugar de Cristo’j^ N ^ o mesmo tempo. p.87 A soteriologia anabatista. 126. só podia considerar tal prática uma cerimônia de invenção humana.batizaram um único cristão enquanto estivesse dormindo. Para Menno.. que exigiu uma suspensão temporária (Stillstand) do rito externo. não importando quão jovens ou velhos. “Se atribuirmos a remissão dos pecados ao batismo. se fosse seguida literalmente. uma imitação e uma iniciação literais experimentadas por um noviço ao entrar na ordem monástica. e somente depois. Na tradição monástica. que o eliminou completamente.89 3) O batismo é a iniciação pública do cristão numa vida de discipulado absoluto. .. e não ao sangue de Cristo. Entre os anabatistas. o batismo nas águas era uma ordenança muito significativa para Menno. Menno passou mais tempo refuntando os erros de seus opositores do que expondo sua própria teologia formal acerca do batismo dos cristãos. com respeito ao batismo de bebês. é o momento.] Se eles morrem antes de chegar à idade da razão. uIbid. Menno insistia que os pequenos devem aguardar. “um terrível mau cheiro e abominação perante o Senhor” .16. [. o batismo "Ibid. simbolizada pelo recebimento de um novo nome e pelo vestir novos trajes. de ser o sacramento para a remissão do pecado original. em contraste com os espiritualistas. p. seja de Jesus.. por nenhum outro meio senão pela generosa promessa de graça dada mediante Cristo Jesus. isto é. o batismo marcava uma atitude de obediência ao evangelho. anulava o argumento tradicional í em favor do batismo infantil.88 Outro conhecido argumento a favor do batismo infantil era a analogia com a circuncisão no Antigo Testamento.. Antes. tais como David Joris. na infância. Lucas 18. morrem sob a promessa de Deus. seja dos apóstolos. obviamente. tal voto implicava um rompimento radical com a vida passada do indivíduo e a aceitação de uma nova identidade dentro da comunidade. ressaltando que. e não os adormecidos” . mIbid. de acordo com a Palavra de Deus. Batizavam os que estavam despertos. Como ZuínglioA ele queria separar claramente o sinal da coisa significada. ^abandonados no frio inverno. amarrados apostes. atiraram em pântanos lamacentos. caluniados. outros. muitas vezes isso significava a perda do meio de subsistência.. miséria e desconforto. nos desertos. 753. um dos quais vi. ou o que você quiser” . Menno descreveu com uma linguagem vívida as conseqüências de tal batismo para muitos de seus seguidores: Pois quantos filhos piedosos de Deus não vimos. o batismo raramente envolve um sacrifício ou privação pessoal. Uns assaram e queimaram vivos. mas também na comunhão de seus sofrimentos. privados de pão [e] apontados com os dedos. Outros. É difícil que alguém que vive numa cultora moderna e secularizada avalie a reação profundamente arraigada dirigida contra aqueles que desafiavam o rito do batismo infantil. Certa vez..simbolizava uma semelhante mudança radical de identidade e de modo de vida. injuriados. Outros vagam sem rumo aqui e acolá em necessidade. privados de seus lares e posses pelo testemunho de Deus e de suas consciências. Em 1554. Para os anabatistas do século xvi. Stimme. da terra e da família e a adoção de um país estrangeiro. Uns. A aceitação do batismo significava um compartilhar com Cristo não apenas no poder de sua ressurreição. . durante o espaço de alguns anos. enforcaram. de uma cidade a outra — odiados por todos os homens. A seguir. Seus nomes são lidos do alto de púlpitos e prefeituras. 599-600. como diz Paulo.. p. 15 de dezembro de 1963. puniram com tirania desumana. chamados de “hereges” . difamados. Karl Barth caracterizou o batismo infantil como “uma parte da paisagem [. um trecho do diálogo entre essa irmã anabatista e seus inquiridores: 9'Ibid. ridicularizados. segurando nas mãos as próprias entranhas.. ainda confessavam vigorosamente a Palavra de Deus. Outros. Na cultura americana contemporânea. Envolvia o “livrar-se” do velho homem e o “levantar-se para caminhar na novidade de vida” . submeteram a troncos e torturas? Quantos pobres órfãos e crianças desalojaram sem sequer um vintém? Uns. menosprezados.91 / \ A Ceia do Senhor Em 1549. buracos e fendas da terra.] mais poderosa que o muro de Berlim e a catedral de Colônia. o confisco do lar. tendo com ele conversado. Cortaram os pés de alguns. Quanto eles traíram. jogaram aos peixes. Outros. de um país para outro. expulsaram da cidade e do país. nas montanhas. “Gespräch mit Karl Barth”. e depois estrangularam com cordas. são afastados de seu meio de subsistência. uma moça chamada Elizabeth Dirks foi presa na cidade de Leeuwarden e interrogada na prefeitura pelos membros do conselho da cidade. Demoliram as casas de uns. Eles devem sair correndo e fugir com suas esposas e crianças pequenas. pp.. sua pobreza e sustento anulados para os cofres insaciáveis do imperador. decapitaram e deram como alimento às aves do céu. Lordes — Cale-se. Quando a ceia do Senhor era repartida. tão logo fosse distribuído e todos tivessem um pedaço em suas mãos. . poderíamos comentar rapidamente a celebração da ceia observada entre os anabatistas do Baixo Reno. e. O ministro. os mártires anabatistas eram freqüentemente interrogados sobre sua teologia eucarística. o ministro tomava o pão e partia um pedaço para cada um. pp. contudo. mas sobre a ceia do Senhor. a congregação fazia o mesmo. essa [ordem] é uma questão insignificante. 76. The Bloody Theater or Martyrs' Mirror.Lordes — Quais são suas opiniões com relação ao sacramento mais adorável e sagrado? Elizabeth — Nunca em minha vida li nas Escrituras Sagradas sobre algum sacramento sagrado. Uma viúva chamada Weynken. E. teria comido a carne do Senhor?92 Ainda mais do que o batismo. Assim que o pão fosse comido.. pois o servo não é melhor que seu senhor. nem bênção. bebia e dava ^W enger. ao sacerdote que celebrara a missa aquele dia. Assim como Elizabeth. quando deu a seus discípulos a ceia? Elizabeth — Que lhes deu. 423. colocava-o em sua boca e o comia. então. nem cerimônias. o ministro tomava uma garrafa de vinho ou um cálice. Elizabeth — Não. meus senhores. Lordes — Você fala com espírito de orgulho. van Braght. foi condenada à morte por estrangulamento porque negava obstinadamente a eficácia sacramental da ceia. Lordes — Que disse o Senhor. que mais tarde foi executada por afogamento. Elizabeth — O Senhor não permaneceu sentado lá? Quem. p. Perguntou-se a um anabatista da Frísia ocidental: — Que afirma você com relação ao sacramento? Ele respondeu: — Eu não sei nada sobre seu Deus cozido. vendo isso.93 Antes de passar para a teologia eucarística de Menno. e imediatamente. de Haia.. meus senhores. falo com franqueza. 484. o ministro também tomava um pedaço para si. Ela disse: “Que Deus você me daria? Um que é perecível e vendido por uma ninharia?” . Weynken falou que ele havia “crucificado Deus novamente” . Elizabeth — Sim. a ceia do Senhor era uma preocupação fundamental para aqueles que viam no anabatismo uma ameaça ao sistema estado—igreja. 93Thielman J. pois o diabo fala por sua boca. Na manhã de sua execução. não empregava palavras. carne ou pão? Lordes — Deu-lhes pão. um frei dominicano ofereceu-se para administrar-lhe o sacramento. no final do século xvi. dele a cada um dos membros.ia I. a ceia era uma grande prova ou garantia do amor de Cristo por nós. Menno expôs uma base racional em quatro partes para a ceia. nos céus. era “um sinal de admoestação e m em orial” do sacrifício salvífico de Cristo na cruz. Menno descreveu o profundo fervor espiritual que reúne os cristãos em torno da mesa do Senhor: Seus corações são inundados de alegria e de paz. Em segundo lugar. “Communion”. Embora os anabatistas rejeitassem o ritual rebuscado e os equipamentos litúrgicos da missa. Menno repudiava o literalismo sacramental que considerava os elementos perecíveis do pão e do vinho como a carne e o sangue verdadeiros de Cristo. como dádiva e salvação eterna. cantos ou qualquer coisa que pudesse criar “uma falsa reverência” . Em primeiro lugar. 144. Mennonite En. “renovando progressivam ente” sua fé. Desse modo eles observam o partir do pão. 652. os cristãos não apenas recordam a morte de Jesus como um evento passado. A ceia. conforme celebrada entre eles. Na mesa do Senhor. O suco de uva tornou-se a norma entre muitos protestantes americanos do século xix. seu próprio e eterno Filho. eles irrompem com corações jubilosos em todas as formas de ação de graças. a ceia do Senhor. Esse amor é ativo nos participantes da comunhão. pobres e miseráveis pecadores. .94 A simplicidade dessa liturgia lembra a observância da ceia entre os primeiros irmãos suíços. que não permitiam vestes sacerdotais. creram e conheceram que o Pai nos amou tanto que ele deu a nós. juntamente com nossa libertação por ele para o reino de sua graça. porque com certeza absoluta apreenderam no espírito. Em seu Fundamento. p. Como Zuínglio e Calvino. O ato simultâneo de comer o pão e beber de um cálice comum são práticas que continuaram em algumas comunidades. Não há nenhuma indicação de que os primeiros anabatistas usassem algo que não fosse ^vinho verdadeiro na comunhão. 95CWMS. na verdade. louvam e glorificam a Deus sinceramente.95 94Cornelius Krahn. embora determinadas seitas gnósticas (e hoje os mórmons) preferissem a água. não era uma observância frívola e casual.cycloped. p. de acordo com o movimento moderno de abstinência. que ele designou como “este sacramento sagrado” . mas sim uma reconstituição vívida da última refeição de Jesus e uma antecipação do banquete messiânico escatológico. com todos os seus méritos. mas também trazem à lembrança “todos os frutos gloriosos do amor divino manifestado a nós em C risto” . ele insistia na presença corporal do Senhor ascendido à direita do Pai. . deviam estar prontos para sofrer e m orrer uns pelos outros e. paz e unidade. a ceia era a comunhão do corpo e do sangue de Cristo.. Menno declarou que. conforme a expressão sobre ser assados no fogo sugere.Em terceiro lugar.] onde as consciências famintas são alimentadas com o pão celestial da Palavra divina. da mesma forma a igreja de Cristo é constituída de cristãos verdadeiros. “ali Jesus Cristo está presente com sua graça.16. 85. carne. Em quarto lugar. 148.96 Assim. servir uns aos outros. de Graaf. também. Com conotações da carne celestial de Cristo. amassados com água e assados pelo calor do fogo. transformados num só corpo. os cristãos tornavam-se “carne de sua carne. Die Lieder der Wierdertäufer (Nieuwkoop: B. cruz e m orte” . por seu Senhor. se necessário. aflição. comunidade. batizados com a água do Espírito Santo e. participação) no corpo e no sangue de Cristo.. Menno tirou essa idéia diretamente da expressão de Paulo em 1 Coríntios 10. p. Um dos hinos anabatistas holandeses reflete o júbilo espiritual e a devoção cristocêntrica que devem ter caracterizado as primeiras celebrações menonitas da ceia: Dir Auontmael van Broot en wijne Is een ghenieten geestelijck Des Lichaems en Bloets Christi devijne Ais ghemeynschap keestelijck. despedaçados em seus corações pelo moinho da Palavra divina. censurar e exortar uns aos outros e. Voreent in een Lijf te zijne Dits Christi mitten feestelijck. juntos. 145. ossos de seus ossos” . Onde quer que a ceia fosse celebrada com amor. 1965. que identifica o cálice e o pão como uma koinonia (compartilhamento. Rudolk Wolkan. na comunhão. com o fogo do amor puro e sincero. Menno foi exaltado por sua descrição das bênçãos de tal refeição: “Ah. Já aludimos à renovação íntima que a ceia tem o propósito de realizar nos cristãos. pulverizados pelo moinho. sangue. Espírito e promessa. a ceia era um vínculo de unidade. Menno comparou a um pão a comunidade de cristãos reunidos em torno da mesa: Assim como o pão natural é feito de muitos grãos.97 Juntamente com a ceia do Senhor. Baseando-se numa antiga metáfora cristã que remonta ao D idaquê. Deviam perdoar uns aos outros. p.. e com os méritos de seus sofrimentos. p. amor e paz cristãos. com o vinho do Espírito Santo. e onde as almas pacíficas e jubilosas cantam e tocam perante o Senhor” . muitos anabatistas também observavam a 'X'Ibid. publicado originalmente em 1903). os cristãos que partilhavam da ceia juntos tinham de pôr de lado todas as desavenças e contendas. a assembléia encantadora e a festa do casamento cristão [. wIbid. . precisava ser repetido como símbolo de renovação e purgação contínuas. Assim como a igreja pré-constantiniana. aliás./ Enquanto o batismo (novamente como o voto monástico) era um sacramento. o lavar exterior dos pés significava a purificação interior de Cristo . em certo sentido. Zuínglio e Calvino concordavam em dois aspectos ou características (notae) essenciais da igreja verdadeira: a pregação correta da palavra e a ministração adequada dos sacramentos. mas ele também se recusava a elevar a disciplina ao nível da Palavra e dos sacramentos. enfatizava a importância da disciplina da igreja para a boa ordem da vida cristã. era o meio pelo qual membros da igreja indignos e corruptos eram excluídos da congregação. por outro lado. A Exclusão Apesar das diferenças entre si. preferindo. não deve ser negligenciado. foi ordenado por Cristo e. assim. era uma marca indispensável da igreja verdadeira. conforme Menno freqüentemente a designava.15-18. Segunda. Dirk ridicularizou os líderes religiosos que desprezavam o lavar de seus pés. O papel da excomunhão tornou-se tão proeminente na tradição anabatista holandesa que um historiador apelidou o movimento inteiro . Significativamente. A exclusão.ordenança do lava-pés. com seus próprios instrumentos de ordem e disciplina sancionados pelo evangelho. No pensamento anabatista. alistou “o lava-pés dos santos” como uma das sete ordenanças de Jesus para que a igreja praticasse. Ele deu três razões para a importância do lavapés. Menno falou pouco sobre esse rito. Ele simplesmente instruiu a igreja a lavar os pés dos irmãos e das irmãs que tivessem vindo até eles de muito longe. que existia num paralelismo polêmico com o Império Romano. paralela ao poder do magistrado. de fato. ser chamados de “Doutores. de iniciação feito de uma vez por todasV'© lava-pés. semelhantemente à ceia. os sectários radicais do século xvi recusavam-se a se adaptar à cultura a seu redor e entendiam a igreja como uma “sociedade alternativa” . apenas a exclusão é usada como advertência e para a excomunhão daquele que pecou. Primeira. Lutero. a autoridade do governo interno era. contudo. a Schleitheim Confession contrastava seu propósito no mundo com aquele da disciplina da igreja dentro da congregação: “Na perfeição de Cristo. Dirk Phillips. Terceira. insistiam que a disciplina. sem submeter a carne à m orte” . Tais orgulho e arrogância inflamados eram o oposto das virtudes cristãs de humildade e de amor. M estres e Senhores” . o lava-pés era uma ocasião para os cristãos representarem liturgicamente a verdadeira humildade que a ceia suscitava e também concretizava. efetivada de acordo com a instrução de Jesus em Mateus 18. Os anabatistas. ou separação evangélica. no próprio contexto da declaração do uso irrestrito da espada para os cristãos. Calvino. Vemos aqui o tema da restituição da igreja apostólica. entendida como modelo a ser restaurado o mais fielmente possível. pp. os filhos mansos. igreja. esposa. "CW M S. junto com suas doutrinas falsas e sacramentos “idólatras” . Além da preservação da pureza da igreja. assim. igreja e corpo santos de C risto” . O propósito corretivo da disciplina é percebido no desejo de Menno de que os que haviam sido excluídos “fiquem apavorados com essa exclusão e. i00Ibid. da mesma forma ele tem apenas uma Eva no Espírito. p. Tais membros pecadores eram semelhantes a um contágio. 962. Assim como Adão tinha apenas uma Eva. e permaneciam obstinados em seus erros. seja na vida. a exclusão formal era somente uma confirmação social de uma separação 98Williams. das ciladas satânicas de suas porfias. seríamos considerados e chamados por todo homem de associados à seita de Münster e a todas as seitas apóstatas” . ou de suas vidas perversas” . sejam levados ao arrependimento. e ossos de seus ossos. The Radical Reformation. com isso. pacíficos. humilhados. a saber. para buscar união e paz e.100 Os que falhavam. Ademais. misericordiosos. seja na doutrina. campo. m Ibid„ p. 969. que era celestial e dos céus. pelo menos em teoria. se não tivéssemos sido cuidadosos nesse assunto nestes dias. o exercício da exclusão visava recuperar o irmão ou a irmã obstinados.98 Deve-se lembrar que o movimento anabatista ev an g élico õ u pacifista nos PSíses Baixos surgiu no contexto de inquietações revolucionárias. só uma Rebeca. templo. e era justo e santo em todos os seus membros. tendo de ser eliminados como se fosse um corpo estranho dentro de um organismo vivo. que é seu corpo. perante o Senhor e sua igreja. e até como Cristo possuía somente um corpo. noiva espiritual.como “anabanismo” (de “banir”). que são de sua família divina e carne sagrada de sua carne. “não terão permissão para ocupar um lugar na casa. 485. almas santas. ser libertados. A incapacidade das igrejas oficiais de manter a disciplina adequada.. cidade. p. amorosos e obedientes no reino e no lar de sua paz.101 Os três estágios de admoestação fraternal ordenados em Mateus 18 eram seguidos pacientemente antes que o ato severo da exclusão fosse concretizado. aqueles que crêem. Quando mais idoso. era citada como motivo fundamental para a separação. os regenerados. justos. .99 A ênfase de Menno na pureza da igreja estava diretamente relacionada à sua cristologia da “carne celestial” e à sua concepção da ceia como banquete matrimonial ou refeição comunitária com o Cristo sem pecado. somente uma nova Rebeca. e Isaque. Menno considerou a prática estrita da disciplina como um dos aspectos que distinguiam os anabatistas pacíficos de seus rivais propensos à violência: “É mais do que evidente que. virgens puras e castas no espírito. 967-968. mesmo maridos e esposas e pais e filhos. continuaram a insistir na separação de cônjuges decaídos. o adultério. meu pão. Entre as ofensas punidas com exclusão estavam o alcoolismo. o ensino de doutrinas falsas. Muitas dessas questões diziam respeito à santidade pessoal ou ao interesse congregacional. Esse plano de ação exigia que se evitasse todo contato social com o impenitente. caso a exclusão fosse aplicada contra um dos dois. não abandonar. era freqüentemente traído pelas recriminações vingativas e ríspidas muitas vezes em jogo no afastamento de membros expulsos. Isso não significava. meu sal. surgiu uma contenda acerca de uma irmã. especialmente no caso de um cônjuge excomungado. no dia de seu casamento. nem exigia a recusa de obras de misericórdia e bondade em momentos de aflição. o tom pastoral dessa declaração. Alguns deles chegaram ao ponto de exigir que.*Swaen Rutgers. não angustiar. mas sim curar. não amputar. que se recusava a se abster de relações sexuais com seu marido apóstata.102 N a verdade. brigas constantes com o cônjuge e o desvio do dinheiro da congregação. etc. Por exemplo. etc. que não se deveria trocar um cumprimento comum “bom -dia” ou “boatarde” com o membro decaído. também. não condenar. e trocá-los por meus grãos. de acordo com M enno. seja mediante conduta inadequada. embora Menno tivesse aconselhado a leniência. mas sim receber. o prestar juram ento.. mas sim salvar. a preocupação mais ampla por apresentar um testemunho autêntico ao mundo não era considerada superficialmente. Anabatistas mais rigorosos. seja por doutrina falsa.de Cristo que já havia ocorrido no coração do membro impenitente: Ninguém é excomungado ou expulso por nós da comunhão dos irmãos. certo alfaiate foi excomungado de sua igreja por cobrar sete xelins para fazer “uma vestimenta . mas sim trazer de volta. Embora alguns na igreja defendessem a exclusão dela. porém.” 103 A exclusão devia ser aplicada sem discriminação entre os membros da família. porém. Tal ato significava. não há dúvida de que um relacionamento surgirá a partir disso. que não se devia iniciar nenhum relacionamento social ou negócio com os decaídos. mas sim consolar. senão aqueles que já se separaram e se excluíram da comunhão de Cristo. os noivos prometessem obedecer à lei da abstenção. na congregação de Emden. Pois. como diariamente tenho de tomar meu tecido. meus cereais. Pois não queremos excluir ninguém. extraída da Admonition on Church Discipline [Admoestação sobre a Disciplina da Igreja] de Menno (1541). Menno não permitiu tal ação. manteiga. o casamento com incrédulo. Contudo. “É óbvio que um cristão piedoso e temente a Deus não poderia aceitar um apóstata como comprador ou vendedor regular. Em 1550. os membros cujas vidas traíam sua profissão. e uma esquadra de tropas de choque espirituais separando de volta para o mundo. Em 1527. quando a taxa usual era cinco! O emprego enérgico da disciplina podia. por exemplo. as igrejas anabatistas estavam especialmente alertas contra a corrupção ou a complacência interiores.m asculina” . degenerar para um legalismo trivial. eles nos expulsaram com censuras e desonras para todos os países. tornaram-se um gênero fundamental da espiritualidade anabatista. O Teatro Sangrento O tema do sofrimento encontrou expressão concreta no exemplo dos mártires da reforma radical. nem pressuposta. 105A. A filiação a uma igreja anabatista não era nem casual. separados do mundo em sua constituição política autônoma e na abstenção de todas as ligações violentas.] Eles tornam o mundo pequeno demais para nós. o regime imperial em Speyer (abril de 1529) restabeleceu o antigo Código de Justiniano. Antes de ser decapitado. escreveu a seguinte carta ao governador da Morávia. Entretanto. pelos protestantes de Genebra. que determinava a pena de morte para quem praticasse o rebatismo. Os reformadores radicais foram cruelmente reprimidos por magistrados protestantes e católicos. A prim eira cerimônia de rebatismo em Zurique (21 de janeiro de 1525) foi realizada a despeito do mandato do conselho da cidade. em favor dos irmãos e irmãs aflitos que haviam sido afugentados de suas terras: m Z 6. “E agora que permanecemos como um rebanho diminuto. publicadas e cantadas. MQR 28 (1954). Zuínglio resumiu numa única frase seu grande medo do movimento anabatista: “Eles subvertem tudo” . 46: “Omnia turbant inque pessimum statum commutant”.Taknb—Rnttpr líder dos anabatistas morávios. 25. os anabatistas eram considerados sediciosos e heréticos. Serveto. cujas histórias.104 Como observamos. sustentava a duvidosa distinção de ser queimado em efígie..Sr(iipmpr lamentou os efeitos da perseguição.” 105 .. Enfrentando perseguições e hostilidades exteriores. e de verdade. Uma igreja verdadeira e visível era ao mesmo tempo uma comunidade rebatizada de santos reunidos. Desde o início. [. Orley Swartzentruber. p. . a participação era forçosamente entusiástica e vigorosa. e sem dúvida muitas vezes isso acontecia. em 1 S9K J fnnharH . havia também elementos de protesto social que iam além dos limites de uma congregação individual. p. “The Piety and Theology of the Anabaptist M artyrs”. mediante a disciplina congregacional. pelos católicos na França. que era ao mesmo tempo anabatista e antitrinitário. ] A coroa de espinhos deve perfurar sua cabeça. Seguindo a perseguição. Seu corpo deve ser flagelado. ó povo de Deus. mas apenas com uma confiança segura. como “soldados e conquistadores em C risto” .. como alguns dos primeiros mártires cristãos parecem ter feito. não com armas e couraças externas. deve parar e oferecer seu próprio sacrifício.. Então. Não há indícios de que os anabatistas provocassem deliberadamente suas próprias mortes ou se precipitassem com alegria à pira. suas mãos e seus pés. “bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça” .. As cinzas de Hans Hut foram ajuntadas e conservadas por seus discípulos como relíquia. cuspido. sob o céu aberto. 106Jacob Hutter.: Plough Publishing House. a tortura e o derramamento de sangue perversos e animalescos deste mundo ímpio contra os justos” . Seus pais e mães foram assassinados por aquele tirano Ferdinando. 107CWMS. pp. desenvolveu-se uma vasta produção literária acerca do m artírio. [. como o mundo sangüinário e insano está acostumado a fazer. pois Deus é seu capitão. agora nos encontramos no deserto. louvando a Deus porque ele nos tomou dignos de sofrer por seu nome. 67-68.. ele enumerou os exemplos bíblicos de m artírio. 595.. e seu rosto. p.. muitas pessoas doentes e crianças pequenas e desamparadas. Brotherly Faithfulness: Epistles from a Time o f Persecution (Riiiton. N. Y. [. a enfrentar com firmeza e coragem o sacrifício supremo: Portanto. 621.Assim. . equipe-se e fique pronto para a batalha. Tendo como tema a bem-aventurança.] Não desanime. [. inimigo da justiça divina!106 O próprio Hutter foi executado à espada em 1536.107 Começando com Abel. que são incapazes de caminhar ou viajar..108 Conforme ocorrera na igreja primitiva. p. e os pregos. após uma longa tortura no cavalete. numa região despovoada. uma paciência tranqüila e uma oração fervorosa.] Contudo. Menno exortou seus seguidores. temos entre nós viúvas e órfãos. e apelou para a História Eclesiástica de Eusébio de Cesaréia. refutou a acusação de sedição e os esforços espúrios por vincular todos os anabatistas aos violentos münsteritas. um tipo de “culto aos m ártires” surgiu em meio aos radicais do século xvi. No Gólgota. Ótimo exemplo disso foi o livreto de Menno a seus seguidores oprimidos. a fim de confirmar o vínculo entre os mártires da igreja primitiva e os de sua própria comunidade. The Cross o f the Saints [A Cruz dos Santos] (1554). Muitos tratados e sermões eram na verdade exortações ao martírio. Concluindo. m Ibid. Menno lembrou a seus leitores que não eram os primeiros a sofrer “a investida e a rendição iradas e ferozes. 1979). Aceitamos isso pacientemente. Um desses hinos. Ohio: The Christian Hymnary Publishers. Ao serem acesos os feixes. “W er Christo jetzt will folgen nach” . A cruz deve carregar sinceramente. Não ouse ser abalado pelo desprezo deste mundo. que. salguem-me bem !” . tendo enxofre e pólvora esfregados em seus cabelos e em sua longa barba. A cruz. que foi afogada no Danúbio com uma pedra amarrada no pescoço. 229. foi acusado de negar a mediação sacerdotal para o perdão e a eficácia salvífica do batismo nas águas. Diversas baladas de mártires foram incluídas no famoso Ausbund. p. o riso era terrível. seu teste e prova. Nenhum outro caminho leva aos céus. Ele os dispensou para seu claustro. Domine.Contudo. Agora.110 109Williams. A isso. Eles o queriam convertido. The Radical Reformers. 418. Jesus! Jesus! ele quatro vezes clamou do fogo em voz alta. celebra o martírio de George W agner. . salguem-me bem. ele evitaria. Como o ouro é testado na fornalha. repetiu em latim as palavras que Jesus havia pronunciado na cruz: “In manus tuas. Dois monges descalços em vestes cinzentas. 1972).109 Hubmaier e sua esposa.° 11. Apresentamos aqui quatro das 18 estrofes: Quem a Cristo seguir agora. também. Quando Baltasar Hubmaier estava sendo preparado para o fogo. Os homens amarraram-no firmemente à estaca A madeira e a palha fizeram queimar. Desde a infância sabemos claramente. commendo spiritum m eum ” . ele clamou: “Ah. eram lembrados e reverenciados como mártires. Ele foi para os céus em meio a fogo e fumaça. sabidamente não sendoi anabatista. se não estavam possuídos de uma ânsia pelo m artírio. Histórias como essa prestavam-se à narrativa dramática. p. Sua fala. O desejo de seu coração aprovando. O hino completo com o texto em alemão encontrase em The Christian Hymnary (Uniontown. aspirava. George Wagner. o hinário dos irmãos suíços que ainda hoje é usado pelos amish na América do Norte. ainda assim mostravam-se heróicos em seus últimos momentos de agonia. renascido. Os sofrimentos de George Wagner suavizariam. !10Esse hino aparece no Ausbund sob o n. publicada inicialmente em holandês. 411. Cornélio respondeu que. que Foram Batizados apenas sob a Confissão de Fé e que Sofreram e M orreram pelo Testemunho de Jesus. desconhecidos e errantes.. foi João Batista. “não duvido que ele seja o preservador de seu corpo. Agostinho. no ano de 1660. mas pessoas tais que. Augsburger. seu Salvador. testemunhos. O rastro de sangue continua através dos primeiros pais da igreja. Por sua influência modeladora sobre a espiritualidade anabatista.] Embora a igreja tenha sido exterminada em alguns países. A prim eira parte do Espelho dos Mártires narra as histórias de mártires cristãos heróicos até o século XVI. dos donatistas — “não espíritos estranhos. 198.Inferior apenas à Bíblia. supostamente por m inistrar o “verdadeiro batismo do arrependimento” e também por condenar a moralidade licenciosa da corte real. p. como Cristo prometera estar com sua igreja até o fim do mundo. com derramamento de sangue e perseguições. o \ Espelho dos Mártires passa então àqueles “que deram suas vidas pela verdade v. O primeiro mártir “anabatista” . disse ao burgomestre que o havia condenado: “Eu o intimo a comparecer. O propósito claramente era “unir os primeiros mártires ^ a o s últim os” . !13Myron S. também em nossos dias. p.113 As circunstâncias da morte dos mártires são descritas em detalhes que prendem a atenção: Felix Mantz foi afogado no Limmat. o documento singular mais importante da religiosidade. em 1498. recebeu três vezes uma proposta de casamento de um jovem que. com sua mãe e seu irmão na margem do rio encorajando-o a permanecer firme. Ottilia Goldschmidt. . provando assim a ligação da igreja sofredora através de todas as épocas. transcritos de tribunais de justiça e trechos de confissões e crônicas anabatistas.111 % Tendo abrangido 15 sangrentos séculos ao longo de sua prim eira metade. desde a grande Reforma” . o Espelho dos M ártires é comparável a Atos e Monumentos dos Mártires Cristãos. Essa obra notável. ria tradição puritana. dos diversos grupos sectários medievais. 13-14. segundo essa avaliação.112 Em 1552.. 1978). O juiz alegava que a igreja menonita existia havia apenas cerca de 30 anos. Faithful Unto Death (Waco: Word Books. de John Foxe. [. perante o tribunal de D eus” . dessa maneira. dentro de três dias."èornélio Aertsz de Man. em Zurique. como um fólio de 1 290 páginas. foi interrogado antes de sua execução. m Ibid. baseava-se em antigos livros de mártires holandeses e incluía uma imensa variedãáe de memórias. decapitado pelo Rei Herodes. um rapaz de 17 anos. um padeiro holandês. concluindo com a morte de Savonarola. pensou em salvar a vida dela. ela não foi aniquilada em todas as partes do m undo” . "'V an Braght. pp. anabatista era O Teatro S a n o r p n t n n u o Espelho dos Mártires dos Cristãos \ Indefesos. ao ser levado à fogueira. no local de sua execução.. são denominadas anabatistas” —. E desse modo eu me despeço. dei-a à luz aqui na cadeia. esperando a morte a cada manhã. pois buscávamos a salvação de nossas almas. mencionavam como era difícil deixá-los. A carta está endereçada como um testamento “a Janneken. carreguei-a sob meu coração com imensa tristeza durante nove meses e. Eles o tiraram de mim. Muitas das cartas publicadas no Espelho dos Mártires foram escritas na cadeia para amigos e parentes. enquanto sua mãe esperava a execução. mau. Deram-nos permissão de viver juntos apenas meio ano.Assim que a execução terminou. na prisão.C . grande e temível. minha querida Janneken Munstdorp. se temer a Deus. eles a tiraram de mim. pois ele será o Pai dos órfãos e o Protetor das viúvas. com um beijo eterno de paz. como também por esta carta. E eu. e foi um grande pesar para ele que eu tivesse de permanecer aqui. que o Senhor assim ordenou e predestinou. com muitas dores. meu doce cordeirinho. E agora que suportei o tempo. e logo seguirei seu querido pai. deixo-lhe esta carta. morreu. não posso ajudá-la de nenhuma outra forma. Janneken. tive de deixar seu pai por causa do Senhor. Elas mostram a humanidade dos mártires. enquanto viver. o burgomestre foi acometido por uma grave doença e. Muitas vezes. e não tenha vergonha de nos confessar perante o mundo. Um dos exemplos mais comoventes desse tipo é a carta de Janneken Munstdorp a sua filha. minha amada filha. não desprezavam os vínculos de intimidade que os ligavam a seus entes queridos. escrevo-lhe. sem saber de minha condição. sua querida mãe. minha amada filha. eu a entregarei ao Senhor. e só pude tê-lo durante algum tempo. e isso lhe deixo como despedida eterna e como testamento. pois nós não tivemos vergonha de confessar nossa fé ao . esse é o pedido de meu coração para o Senhor — você. Narrativas como essas espalhavam-se em meio aos fiéis e serviam para encorajar aqueles que provavelmente enfrentariam experiências similares. ainda tão pequena e jovem. eu a confio ao Deus todo-poderoso. na cadeia. e vê-lo ir antes de mim. e beijo-a afetuosamente. o único sábio. para que ele a guarde e a faça crescer em seu temor. E agora. Portanto. Leia-a. neste mundo cruel. Visto. e que eu devo deixar aqui. que com isso você possa lembrar-se de mim. em 1573 d . que ainda é tão pequena. mesmo em sua aflição. também chamada Janneken. Siga a mim e a seu pai. em memória de mim e de seu pai. que. para que assim você se recorde de seu querido pai e de sua querida mãe. Ele a governará e será um Pai para você. meu cordeirinho. ou que a leve para casa em sua juventude. que estou aprisionada e confinada aqui por amor ao Senhor. então. e você fique aqui desprovida de pai e mãe.” . aue eu deva deixá-la aqui. Aqui estou. quando puder compreender. em três dias. eu. e eu tive de permanecer encarcerada. junto com um anel de ouro que tinha comigo na prisão. Minha querida filhinha. de modo que nunca lhe falte nada aqui. e guarde-a. enquanto eu estava (imerecidamente) encarcerada por causa do Senhor. e depois disso fomos presos. meu doce cordeirinho. algo como lembrança. perverso. faça ele de você conforme sua santa vontade. na Antuérpia. O bebê havia nascido na cadeia. Eles confiavam ao cuidado amoroso da comunidade aqueles que tinham de abandonar. ensinar a justiça. Seu nome. conforme ele me ensinou. Assim eu prossigo em minha fraqueza. ele que comprou a mim. sobrevivem na comunidade universal dos menonitas e numa hoste de outros descendentes espirituais que ainda reverenciam sua memória e que continuam movidos por sua piedade. 1968). poder e graça. Jesus Cristo. buscar a paz e a seguir. por seu noivo. que não morremos por nenhum ato perverso. coragem e esperança. pois ninguém pode impedi-la de temer a Deus. desprezado. você receberá a coroa da vida eterna.114 Não sabemos o que aconteceu com a pequena Janneken. A carta foi reimpressa em Hans Hillerbrand. mas. embora eles devam tentar matá-la. despido. e o Jesus Cristo crucificado. pp. a sagacidade política de Zuínglio ou a amplitude intelectual de Calvino. também. The Protestant Reformation (Nova Iorque: Harper and Row. Em certo sentido. Faltava-lhe também a vantagem 114Van Braght. um pecador miserável. em Wüstenfeld. pp. eu lhe desejo. revelar a verdade. . rejeitado e assassinado. E de forma alguma cesse de amar a Deus sobre todas as coisas. sangrando. levar o rebanho desgarrado para o caminho certo e ganhar muitas almas para o Senhor por intermédio de seu Espírito. Se seguir aquilo que é bom. temos um comovente testemunho da teologia do m artírio que sustentava os homens e mulheres comuns da reforma radical.mundo e a essa geração adúltera. um monumento comemorativo simples encontra-se perto do local que se acredita ter sido o túmulo de Menno. e deu-me essa disposição mental pelo evangelho de sua graça. com seu sangue carmesim. Menno expôs o propósito e o objetivo da obra de sua vida nas seguintes palavras: Esta é minha única alegria e sincero desejo: estender o reino de Deus. em seus esforços para seguir o “Cristo doloroso” . essa coroa. U5CWMS.115 Durante longos e árduos anos de lutas e perseguições. Hoje. a saber. 189. 146-152. assim como seus ideais. O Modo Anabatista de Ver Em seu Livro de Fundamento. em meio à angústia pessoal de cuidar da família desalojada e de suportar uma doença que o aleijara fisicamente. Que isso seja sua glória. censurar o pecado. alimentar as almas famintas com a Palavra do Senhor. Menno é o “elemento estranho” em nosso perfil dos reformadores. e esforcese por fazer o mesmo. p. Menno nunca hesitou com relação a esse ideal. Ele não possuía o gênio teológico de Lutero. Holstein. 984-987. no belo testamento de sua mãe. seguir. p.: Herald Press. a sofrer as aflições junto ao povo de Deus. nenhum outro reformador incorporou tão fielmente aquilo que j jarold Render chamou de “o modo anabatista de v er” . Eu não busco nem ouro nem prata (o Senhor o sabe). 69. Menno teria concordado com a descrição de Ludwig fíaetzer da postura protestante clássica: Sim. diz o mundo. m o fé .. O diabo tramou-a. era a palavra fundamental da vida cristã. Tampouco outro anabatista foi tão bem-sucedido quanto Menno em transform ar esse modo de ver numa tradição duradoura. es ist ohn Not/Daso ich mit Christo leide. Pois Cristo sofreu a morte por mim Eu posso pecar por conta dele.do atril professoral de Lutero e dos púlpitos influentes de Zuínglio e de Calvino. a qual às vezes fere minha carne pobre e fraca de maneira bastante dolorosa. Entretanto. não há necessidade De que eu com Cristo sofra. assim. e assumi voluntariamente a pesada cruz de meu Senhor Jesus Cristo. à honra e ao conforto. Pilgram Marpeclc ou mesmo Dirk Phillips. 2) uma nova concepção da igreja como irmandade. rejeitava a doutrina de Lutero da justificação forense sola fid e. p.116 Outros líderes anabatistas. Menno. A tradução do original em inglês é a de Friedmann. 29. Para Menno. a questão está resolvida. com outros reformadores radicais. e tudo o mais. e também o conceito calvinista da predestinação dupla absoluta. talvez tenham superado Menno em profundidade e originalidade teológicas. é mesmo uma contrafação. nisso eu creio. Ambas essas formulações pareciam-lhe abstrações separadas da realidade da fé “viva” .117 '16Ibid. tais como Baltasar Hubmaier.. spricht die Welt. ele também não teve a tranqüilidade e as amenidades de um ministério estabelecido. com o fiel Moisés. 3) uma nova ética de amor e não-resistência. Ou. mas estou pronto. Penn. sendo perseguido de um lado para outro pelas autoridades tanto da igreja quanto do Estado. De 1535 a 1561.” Lieder der Hutterischen Bruder (Scottdale. E. a fé que não resultasse em seguir era ipso facto improdutiva e falsa. 1914). Qual era o modo de ver anabatista? Bender identificou-o com três aspectos principais: 1) uma nova concepção da essência do cristianismo como discipulado. em vez de desfrutar os prazeres do pecado durante algum tempo. I17“Ei. Ele paga por mim. Ele não estava exagerando quando declarou que renunciei ao nome e à fama. . Ó meus irmãos. talvez mais precisamente. divergindo em pontos cruciais tanto do modelo protestante quanto do católico. é difícil separar a eclesiologia dos anabatistas de sua J ética. obviamente. o fenômeno do anabatismo não foi simplesmente a forma mais radicalizada de queixa protestante contra a Igreja de Roma — protestantes com pressa. os anabatistas estavam dispostos a separar-se do império.118 A nova concepção da igreja. Ele criticou o “evangelho condescendente e o improdutivo partir-do-pão” do clero estabelecido. da cidade-estado e de todas as igrejas oficiais que estavam associadas a tais estruturas da autoridade civil... Vestem os nus. santos. da nação. p. não tinha por objetivo ser uma inovação. mediante seu batismo\ Visto que tanto a vida quanto a morte estavam nas mãos do Senhor. pois somente mediante essa única regra certa e imutável todas as ações cristãs devem ser avaliadas e julgadas” . por assim dizer —. in: Mennonite Encyclopedia I. . mas também uma busca bem definida por um novo sentido de comunidade cristã. Emprestam aos que precisam. nem se importam com seus membros e carne decrépitos. na ordenança do lava-pés. Menno sentiu que a compaixão sincera pelos pobres era uma das marcas que£> distinguia seu movimento daquele dos reformadores principais.119 . Não viram o rosto para os pobres. que vivia luxuosamente enquanto seus pobres membros imploravam por comida. Eles têm piedade das necessidadesdõ. aleijados. do território.” Menno aconselhou. na recusa de jurar ou portar armas e na disposição de aceitar o sofrimento e o martírio. Esse é o tipo de irmandade que ensinamos. Menno recusou o pedido dessa senhora.A imitação literal de Cristo refletia-se na prática do batismo de adultos e de crentes. Dividem seu pão com os famintos. o qual havia sido recentemente ordenado presbítero da igreja. “tente você mesma fazer a seu próximo o que Cristo mostrou ser para você. Em 1553. o que incluía a exclusão. o sofrimento e a tristeza de sua carne perfuram meu coração sempre que penso nisso” . e os velhos. pois ela temia pela vida dele. 659. Assim. 119Robert Friedmann. os cristãos verdadeiros "não possuem nenhum mendigo entre eles. devido à cruel perseguição aos anabatistas. Em sua resposta. embora ele admitisse: “ . “Em sum a. “Community of Goods”. cegos e sofredores eram desprezados.. Levam estranhos para dentro de suas casas. 1040. Menno recebeu uma carta da esposa de Leonard Bouwen. e não enfraquecer seu marido. Em contraste. Talvez mais ainda do que com a maioria dos outros grupos cristãos. \ 118CWMS. Recebem os infortunados. p. Ele a lembrou de que seu marido — e ela também — haviam-sè comprometido com a cruz. mas uma restauração da “velha face gloriosa do cristianismo prim itivo” . Consolam os tristes.. A fim de realizar esse programa com todo seu rigor. ela deveria fortalecer.. Ela suplicava a Menno que usasse sua influência para dissuadir o marido de assumir esse trabalho. und er entzündet das zögernde Reich”. foram enunciados sob grande risco pelos primeiros anabatistas.. Nem devemos subestimá-los. p. Até mesmo Erasmo. trad. e ela acende o reino que permanece. pois o preço da liberdade religiosa nada mais é que vigilância eterna. não devemos esquecer-nos de que. que todos os bens fossem desfrutados em comum e usados à medida da necessidade para o bem-estar de todo o grupo. ed. . a Palavra de Deus. nós as deixamos para aqueles que. e cujo legado é parte vital de nossa herança cristã comum: • • Apesar de seu sofrimento. O filósofo Ernst Bloch escreveu um epitáfio adequado para Menno e para todos os reformadores radicais que lutaram contra a corrente por causa da consciência. A nova ética de amor e não-resistência foi talvez a marca singular mais distintiva dos anabatistas evangélicos. por Walter Klaassen (Kitchener. 198. consideram o sangue humano e o sangue dos suínos quase 120 iguais . mas não infligia perseguição sobre ninguém. Menno repudiava todo recurso à coerção física por parte dos cristãos verdadeiros: “Cristo é nossa fortaleza. Ontário: Herald Press. encontramos numerosas e eloqüentes súplicas pela tolerância religiosa.Os huteritas foram ainda mais longe. soviel Furcht und Zittern auch gesetz sein mag. E as lanças e espadas de ferro e de metal. segundo o modelo da igreja do Novo Testamento. O evangelho tinha de ser pregado a todos. insistindo. 1982). nossa espada. que abominava a guerra e trabalhava pela paz. inicialmente. Ele acreditava que a verdadeira igreja de Cristo era caracterizada pelo fato de que sofria e suportava a perseguição. mas ninguém deveria ser compelido à força a aceitá-lo. Ressoando ao longo dos escritos de Menno. Esses princípios são aceitos como axiomáticos por amplos segmentos da sociedade moderna. infelizmente. Profiles o f Radical Reformers. seu medo e tremor. e nossa vitória. 9. firme e sincera em Jesus Cristo. nossa arma de defesa. so glüht in allen Seelen doch neu der Funke von drüben. em todas essas almas inflama-se a faísca do além. 121“Soviel Leid. uma fé corajosa. O autor seguiu a tradução em Hans Jürgen Goertz. a paciência. esteve disposto a aceitar uma cruzada contra os turcos. Contudo.121 120CWMS. p. Scottdale. George H.: Coronado Press. Dutch Anabaptism: Origin. Life and Thought (1450-1600) . The Radical Reformation. The Anabaptist Story. Robert. Friedmann. Williams. 1957). Embora superado em ^ alguns detalhes. 1956). Dutch Reformer (Nieuwkoop. J. . William R. Grand Rapids: Eerdmans. 1968. 1962). Brill. r Estudo revisionista básico das posturas anabatistas em relação à violência e à paz. Estudo histórico padrão sobre o contexto e o desenvolvimento do anabatismo nos Países Baixos. ca. ed. 1973. Church. John C. 1967). Williams e Angel M. essa obra clássica narra as historias dramaticas aos mártires anaoatistas do século xvi. Meihuizen publicou um texto crítico da primeira edição da magnum opus de Menno: Menno Simons. A maior parte deles consiste em fontes de arquivos relacionadas ao anabatismo holandês. Horst forneceu uma bibliografia muito útil de Menno. Apresentação sistemática dos principais temas na teologia anabatista holandesa. Scottdale: Mennonite Publishing House. George H. James M. van. Levantamento das correntes espirituais na reforma radical. de Graaf. Dyck. Loeschen. 1951. Levantamento abrangente da dissenção religiosa no século xvi. The Theology o f Anabaptism. D at Fundament des Christelycken Leers 1539-1540 (Haia: Martinus Nijhoff. Planeja-se uma nova edição crítica dos escritos de Menno nessa série. Contém uma seção principal sobre Menno. ed. é ainda o estudo padrão na área. aKrahn. R. 1987. George. Braght. Irvin B. O tratado de Menno sobre a exclusão e diversos outros documentos ligados aos anabatistas holandeses encontram-se traduzidos em Spiritual and Anabaptist Writers. Foram publicados quatro volumes na série Documenta Anabaptistica Neerlandica.. Wenger (Scottdale: Herald Press. 1981. II: Late M iddle Ages and Reformation. \ Estep. Thieleman J. eds. Kan. The Dutch Dissenters: A Critical Companion to Their History and Ideas. H. The Bloody Theater or M artyrs’ Mirror.: Herald Press. Penn. ed. Mo. baseado em fontes primárias. Nieuwkoop: B. Keeney. Jill Raitt et al. Cornelius. The Development o f Dutch Anabaptist Thought and Practice 1539-1564. Filadélfia: Westminster Press. Newton. Contém diversos ensaios proveitosos sobre Menno. W. Irvin B. The Divine Community: Trinity. and Ethics in Reformation Theologies. C. Um dos mais populares levantamentos do anabatismo. 1976. in: Christian Spirituality. Spread. Lawrence. Mergal (Filadélfia: Westminster Press. ed. J. William E. Uma das melhores avaliações do significado teológico do anabatismo.: Sixteenth Century Journal Publishers. Traz uma seção dedicada aos Países Baixos. “The Spirituality of the Radical Reformation”.. Publicado originalmente em holandês no ano de 1660. Stayer. Leiden: E. 1963. Haia: Martinus Nijhoff. Anabaptists and the Sword. Nova Iorque: Crossroad. Cansas: Faith and Life Press. Timothy. 1986. Contém 12 artigos sobre os primeiros anabatistas holandeses. A Legacy o f Faith: A Sixtieth Anniversary Tribute to Cornelius Krahn. 1968. 1496-1561. Horst. Bibliography o f Menno Simons. além de um sumário bibliográfico das pesquisas recentes na área. J. B. 1962. de Graaf. Kirksville. 1962.Bibliografia Selecionada A mais completa coleção dos escritos de Menno Simons é a tradução inglesa de Leonard Verduin: The Complete Writings o f Menno Simons. . 195. “Devem-se desfrutar as asserções. Por exemplo. “da 'Citado de Bainton. ou então não ser um cristão.” Apesar de todas as suas críticas das doutrinas oficiais do catolicismo medieval. Deus pode criar outro mundo. os quais pensa-se que caracterizaram a chamada “Idade das Trevas” . Muitas vezes. da mesma forma que Cristo foi o término da lei! Entretanto. os reformadores viam-se numa ligação básica com os dogmas fundamentais da igreja primitiva. acreditava que a história total do dogma cristão havia culminado e sido transcendida na teologia de Lutero: Lutero foi o fim do dogma. grande historiador da igreja. afirmação. no Concílio de Nicéia (325). Eles consideraram necessário estendê-los e aplicá-los ao âmbito da soteriologia e da eclesiologia.A VALIDADE PERMANENTE DA TEOLOGIA DA REFORMA Não se devem esconder os méritos. referimo-nos ao debate entre os historiadores sobre a questão de a Reforma ter sido primordialmente medieval ou moderna em seu impulso e perspectiva básicos. os reformadores não repetiram simplesmente os dogmas clássicos do período patrístico. p. Lutero respondia que as asserções. Ainda que o mundo inteiro se despedace. Martinho Lutero 1 No capítulo introdutório deste livro. sustentação e perseverança. confissão. Adolf von Harnack. pertenciam à própria essência do cristianismo. Contudo. Contra a ostentação de Erasmo de que ele não se deleitava com asserções. aqueles que defendem a segunda hipótese — que a Reforma assinalou o despertar de uma nova era — fazem-no com uma sensação de júbilo por ter sido libertados das algemas da superstição e do dogmatismo. que ele definiu como um a constante devoção. Erasmus. os teólogos da igreja primitiva confessaram Jesus Cristo como homoousios. qualquer tentativa de avaliar a importância da teologia da Reforma para a igreja de hoje deve reconhecer a absoluta impossibilidade de tal visão. ainda podemos aprender muito sobre suas causas e efeitos. quando Deus revelou-se em Jesus Cristo. “Jesus Cristo ontem e hoje é o mesmo. nem totalmente divino — com o ser e a natureza do Filho encarnado. a Reforma do século xvi encontra-se agora no passado. Obviamente. O espectro de hecatombes múltiplas tem abalado a sensibilidade dos humanistas mais otimistas. tais como a possibilidade de um genocídio pela auto-aniquilação nuclear. da mesma forma não podemos negligenciar os temas fundamentais da Reforma ao buscarmos proclamar a boa nova de Jesus Cristo em nossa época. mas a aplicaram à questão da salvação em Cristo. da morte e da falta de sentido afligem os homens e mulheres modernos tão severamente quanto acontecia com príncipes e camponeses na baixa Idade Média. e o será para sem pre” (Hb 13. em vez de no século XX. não é investigar os modos de sua encarnação.mesma essência” . foi revelado. Esse tem sido nosso interesse básico ao longo deste livro. De fato. A bem da verdade. Entretanto. com sua concepção mitológica de Jesus Cristo como nem inteiramente humano. a Reforma possui um significado permanente para a igreja de Jesus Cristo. em seu próprio ser divino. as ansiedades da culpa. Conhecer a Cristo. de fome em massa e de AIDS. mas também o que significa. políticos. e devemos enfocá-lo agora. Ademais. Isso não significa que podemos simplesmente repetir as fórmulas teológicas dos reformadores. Por outras palavras. as doutrinas reformadas da justificação e da eleição não apenas são inconcebíveis à parte da base do consenso trinitário e cristológico. estavam mais preocupados com a obra de Cristo do que com a pessoa de Cristo. Como a teologia dos reformadores pode desafiar. nestas páginas finais. Essas ênfases não são contraditórias. com o Pai. Os reformadores concordavam plenamente com essa introvisão. como se nós mesmos estivéssemos vivendo no século x v i ou x v n . Da mesma forma.8). além de Deus. Entretanto. dizia Melanchthon. corrigir e orientar nossos próprios esforços por teologizar fielmente com base na Palavra de Deus? Assim como os reformadores acharam necessário voltar à Bíblia e à igreja prim itiva a fim de abordar a crise espiritual de seus dias. mas também constituem o resultado e a aplicação necessários de tal consenso. próprio da igreja primitiva. Como movimento histórico. Eles estavam preocupados — em oposição ao arianismo. o cristão enfrenta a mesma pergunta que foi feita às . como movimento do Espírito de Deus. à medida que estudamos os fatores sociais. o próprio Deus estava operando em seus atos de graça salvífica. deparamo-nos com realidades novas e ainda mais temíveis. ninguém mais. o modo como sentimos essas ansiedades mudou. Temos de perguntar não apenas o que significou. econômicos e culturais que a tornaram uma época tão central na história da civilização ocidental. quando Deus resgatou os seres humanos decaídos de seu pecado e alienação. Os reformadores declararam que. Num mundo de campos de concentração e terrorism o. conhecer a Cristo é conhecer seus benefícios. mas complementares. A igreja primitiva havia enfatizado que. Eles viam os seres humanos tão 2Mark C. xi.. Hoje. A futilidade e ruína absoluta dessa perspectiva fica evidente no tipo de modismo teológico que resultou no que Thomas J. encontraram nesse ensino uma libertação formidável do insuportável fardo da autojustificação. Todos os nossos esforços por encontrar Deus dentro de nós mesmos resultam apenas em especulações e projeções infundadas. tornam-se idolatria. chegando a ponto de viver sem defesa numa sociedade violenta. e continuou a ser.2 Os reformadores lembram-nos de que Deus deve ser encontrado por nós somente onde lhe agrada buscar-nos. ela desafia a igreja a ouvir reverente e obedientemente aquilo que Deus disse de uma vez por todas (Deus dixit) e de uma vez por todas fez em Jesus Cristo. porém.] o momento derradeiro de colapso da tradição teológica no Ocidente” . É a decisão quanto ao fato de a igreja servir o Deus de Jesus Cristo verdadeiro e vivo. J. não famoso por seu tradicionalismo. apesar das muitas ênfases variadas que contém dentro de si. Pelo menos. Essa era. 1982). a doutrina reformada básica da eleição ou da predestinação sobressaía-se como uma testemunha inequívoca da soberania de Deus na salvação humana. com sua insistência na liberdade e na decisão eterna de Deus na eleição. É uma questão de vida ou morte. sua oposição às normas culturais da época e sua disposição de seguir Jesus. p. uma pedra de tropeço importante para aqueles que viam nisso uma restrição prejudicial da liberdade e da moralidade humanas. a seu modo. nossa filosofia ou cosmovisão. Entretanto. Os reformadores. que.. Taylor. Deconstructing Theology (Nova Iorque: Crossroad.crianças de Israel durante seu cativeiro na Babilônia: “Agora. . caso contrário sucumbirá à adoração de Baal. O modo como a igreja reagirá a esse desafio não diz respeito a especulações acadêmicas ou habilidades eclesiásticas. Menno e os anabatistas não eram menos enfáticos quanto ao governo absoluto de Deus sobre o mundo e a história. refletia uma confiança ainda mais firme na prioridade e na v itó ria ^ derradeira do comando de Deus. A validade permanente da teologia da Reforma é que. Soberania e Cristologia O tema da soberania de Deus ressoa inequivocamente ao longo dos escritos dos quatro reformadores que examinamos. Altizer. Contudo. À prim eira vista. somos tentados a responder a essa questão levando em conta as possibilidades inerentes à nossa própria condição humana. chamou de “um momento de profundo colapso teológico [. onde está o vosso D eus?” . a extrapolar nossa teologia para fora de nossa razão ou experiência. por fim. o Deus do Antigo e do Novo Testamento. poderia parecer que essa ênfase era peculiar aos reformadores principais. também não nos salva sem nós. De fato. Dois famosos tratados de Lutero. Os anabatistas estavam convencidos de que. De todos os reformadores. uma divindade distante e altiva que criou o mundo. evitaram o conceito daquilo que Calvino chamou de “o deus ocioso” (deus otiosus). e até ao “Deus oculto” . se é que o fazia. poderosa é essa fé” . pelo menos. Tal deus assemelhava-se às divindades da mitologia grega ou mesmo à noção estóica do destino impessoal. de 1520. A distinção absoluta entre Criador e criatura era fundamental para a teologia inteira de Zuínglio. seu tratado D e Providentia Dei. A eleição imerecida e incompreensível de Deus é a única base real para a liberdade humana! Nenhum dos reformadores tinha a menor intenção de denegrir a participação humana no processo da salvação.] ah. de alguma forma (embora não afirmassem saber quãl). A Liberdade do Cristão. Conforme Lutero expressou em seu prefácio à Epístola aos Romanos: “A fé é uma obra divina em nós.profundamente escravizados pelo pecado que somente a graça soberana de Deus poderia verdadeiramente libertá-los. mas que raramente. e A Escravidão da Vontade. embora Deus não nos salve por nós mesmos. e não ao Deus bíblico que atua em julgamento e libertação. Todos os reformadores. Preferiríamos um Deus que pudéssemos entender ou. “Não fique aí parado. um Deus que pudéssemos . Não conseguimos entender como um Deus soberano poderia perm itir o sofrimento inocente.liãquele imenso erro de justiça ocorrido no Calvário. A doutrina da justificação pela fé pressupõe a apropriação subjetiva do dom divino da salvação. de nossa ânsia desordenada por clareza. Calvino falou sobre a “providência nua” de Deus e Lutero referiu-se à “mão esquerda” de Deus. Agostinho dissera que. que coisa viva. 1529). mas também na criação. quem poderia ter imaginado que. Deus estava em ação. interferia em seus acontecimentos. inquieta. Todos os reformadores. porém. em si mesma. em parte.. rejeitavam as tendências panteístas de certas correntes do misticismo da baixa Idade Média. reconciliando o mundo consigo mesmo? Nossa inquietação moderna com a doutrina reformada da providência deriva. que nos transforma e nos faz renascer de Deus [. ele desenvolveu a mais elaborada e filosoficamente notificada doutrina da providência {cf. ativa. Deusüsaria~õssofrim entos e as perseguições deles em seu propósito redentor para a humanidade. de 1525.3 Deus é o Senhor soberano não somente na redenção.. semelhantemente um dom. Eles afirmaram a doutrina patrística da creatio ex nihilo. constituem dois lados da mesma moeda. Os reformadores estavam bastante dispostos a admitir que nem sempre (talvez nem mesmo com muita freqüência) entendemos como a providência de Deus opera nos trágicos sofrimentos e revéses de nossa existência terrena. gostar. Faça alguma coisa!” — é ao mesmo tempo oração e protesto. até Menno. mas também reconhece que mesmo aquela fé pela qual somos justificados é. 4 Essa “glória” . “O nosso Deus é fogo consumidor” (Hb 12.] por quê?” . na pessoa de seu Filho. assumiu em si mesmo nossa carne humana pecaminosa: O único Filho do Pai eterno Virá agora à manjedoura: Em nossa carne e sangue pobres e humanos Revestiu-se o bem eterno.. o Deus que permanece ao nosso lado e segue à nossa frente. 4WA 13. Kyrioleis. 570: “Unica Christianorum gloria est in solo Christo” . Não ignoravam — e qual o leitor dos salmos que ignora? — os protestos veementes contra uma providência inescrutável. “está aí” em sua compaixão soberana. conforme Calvino o expressou. Nas agonias de seu Anfechtungen. ou um Deus limitado que lutasse conosco contra o caos. Os reformadores sentiram a força de teodicéias semelhantes em seus próprios dias. o Deus que não apenas “faz alguma coisa” . nem em falar sobre o “poder absoluto” de Deus ou a respeito da onipotência cabal. Cada um dos reformadores possuía um modo próprio de expressar a centralidade de Jesus Cristo. era manifestada à medida que o “querido Senhor C risto” identificava-se com as profundezas da condição humana. Apesar de toda a sua ênfase na prioridade e na autoridade absoluta do Deus vivo. Lutero recusou-se a separar a inferioridade humana de Cristo de seu poder divino. Os reformadores não apresentam uma “resposta” mais adequada ao problema do mal do que os profetas ou os apóstolos. A quem o mundo inteiro não poderia confinar Veja no seio de Maria deitado. Lutero declarou que “a única glória dos cristãos estava apenas em Cristo” . Eles não estavam interessados em penetrar a essência de Deus. meu Deus [. porém. indicam-nos o Deus que subsiste em meio às provações. de fato. no fim. o próprio Lutero havia clamado: “Meu Deus.29). contudo. A soberania de Deus foi qualificada e concretizada na existência histórica de Jesus Cristo. O Deus com quem nos relacionamos não é um Deus que possamos explicar. Em vez disso. mesmo — especialmente — quando todos os indícios mostram o contrário. o qual. Os hinos de Natal de Lutero retratam vividamente a auto-humilhação do Deus todopoderoso. No final. fosse impotente demais para evitá-lo ou até mesmo dominá-lo.. manipular ou domesticar. mas que. as explosões iradas contra os céus são como cuspir para cima. que promete nunca nos abandonar. Calvino admitiu que não há iè r verdadeira que não seja tangida pela dúvida. p.considerar responsável. os reformadores não entendiam a soberania num sentido abstrato ou metafísico. o Filho encarnado de Deus. mas que. um espelho de duas. Com Calvino. Em seu papel como Meajadç.. Karl Barth (Church Dogmatics II/2) baseou-se na introvisão^dâ < . Conforme vimos. 6Z 1. da mesma lvino opôs-se à doutrina de Menno sobre a “carne celestial” de Cristo . Entretanto. colocando maior ênfase na última.p a de Lutero.Ele. Isso exigia que ele tivesse nascido não apenas “da” virgem M aria. da eleição da humanidade. ele é o espelho pelo qual Deus considera aqueles que são recoi^òiííados iüediante seu Filho. os 'são de subir que poderíamos encontrar entre nossos próximos nos céus. Embora tenhamos de concordar com a ênfase de Calvino aqui. mas são. o “espelho da eleição” . die ie warend. que o mundo sustenta. No terceiro dos Sessenta e Sete Artigos.íitre Deus e os seres humanos. A teologia de Zuínglio. cofisiderando-a perigosamente docética. eleitos por “algum outro caminho” .5 Zuínglio distinguiu a humanidade e a divindade de Cristo de forma mais precisa que Lutero. 434. que insistia na presença localizada do corpo ressurreto de CrisKxà direita do Pai. Jesus Cristo é também o espelho òs cristãos buscam encontrar a certeza de sua própria eleição. \ Srip^século. Uma pequenina criança se tomou. O entendimento de Calvino acerca da expiação pressupunha a participação total do Cristo encarnado na condição humana. Em nosfk) . de fato. porém.Jace& ^í™ primeiro lugar. <e^iátem e 10 supos existirão” . Zuínglio insistiu é o único caminho que leva à salvação para todos os que existiram. sifr( co ickZuínglio acreditava que a doutrina de Lutero acerca da ubiqüidade Cristo denegria a realidade de sua humanidade elevada.vino.. como o Eleito. A concepção de Lutero acerca da onipresença do corpo de Cristo era inconc lível para Zuínglio. assim como " e expiatória de mediante a graça de Deus e redimidos por inte Cristo. 5WA 35. essa diferença cristológica foi um fator básico na discordância desses dois reformadores sobre a eucaristia. que ele considerou como o elemento crucial na obtenção da salvação. p. p. não era menos cristocêntrica(® jtr. . a ligação entre a soberanpr-de D j 'S e a cristologia tornou-se manifesta quando ele designou Jesus<^ m to (ra im )o speculum electionis. o especialmente Escolhido e Prraestm ado. sind und werdend” . estendendo-a ainda mais em sua análise de Jesus Cristo como o p? ac a v .6 Nem mesmo os chamados gentios piedosos. mas também “como parte” dela. 458: “Dannenher der einig weeg zur säligkeit Christus ist aller. Cristo é. adores. devemos observar que a preocupação de Menno em salvaguardar o caráter sem pecado de Cristo não derivava de alguma depreciação gnóstica do reino criado. Kyrioleis. e preserva-me de tal forma que.7 Escrituras e Eclesiologia O princípio da sola scriptura tem sido tradicionalmente mencionado como o “princípio form al” da Reforma. mediante seu Espírito Santo.mas. doravante. de seu desejo de proteger a eficácia salvífica do sacrifício que Cristo fez de si mesmo na cruz. de nos receber para a participação e para a fraternidade com ele. que ele compartilhava com os outros reformadores. no tempo e no espaço. sim. Essa perspectiva encontra-se expressa de maneira harmoniosa na prim eira pergunta e resposta do Catecismo de Heidelberg (1563): P: Qual é seu único consolo na vida e na morte? R: Que eu. desde que verdadeira em si mesma. da decisão soberana que Deus tomou de ser nosso Deus. pois todas as coisas devem cooperar para minha salvação. ed.. e toma-me sinceramente disposto e preparado. tanto na vida quanto na morte. ele também assegura-me a vida eterna. Todos os reformadores concordam em que a teologia. . nenhum cabelo pode cair de minha cabeça. e. pp. de ser por nós. que. finalmente. mas o texto favorito de Menno (1 Co 3. Jesus Cristo é a concretização efetiva. encontra tanto seu ponto de partida quanto sua meta final no único fundamentum autêntico. o único critério obrigatório e exclusivo. seu Senhor. é ilusória. na medida em que leva a supor que os reformadores consideravam a Bíblia um axioma teológico ou um 7Philip Schaff. de corpo e alma. não pertenço a mim. Jesus Cristo. A partir dessa perspectiva. Creeds o f Christendom (Nova Iorque: Harper and Bros. 307­ 308. expiou completamente todos os meus pecados e redimiu-me de todo o poder do diabo. de nos salvar de nós mesmos e dos poderes que visam a nossa destruição. As diferentes nuanças cristológicas entre os reformadores eram substanciais e importantes. 1877). Menno apontou para a vida e para a morte de Cristo como um modelo de sofrimento e autoconsumo ao qual os cristãos devem-se adaptar. mas a meu fiel Salvador Jesus Cristo. Ao lado dessa insistência na objetividade da expiação. para a vida cristã e para a teologia cristã. em oposição ao “princípio m aterial” da justificação pela fé somente. e não contra nós. Pelo que. sem o desejo de meu Pai no céu. contudo. para viver para ele. Jesus Cristo não é simplesmente uma idéia religiosa. com seu sangue precioso. HI. nem mesmo a melhor idéia religiosa em meio a muitas entre as quais somos livres para escolher. sim. Essa distinção.11) poderia servir de tema básico para cada uma delas: a revelação de Deus em Jesus Cristo é o único fundamento. e não o vivo e poderoso oráculo de Deus. tais como Erasmo. um dos herdeiros dos reformadores mais espiritualmente X perceptivos. os reformadores protestantes insistiam em que ã Bíblia era autolegitimadora. John Bunyan. aceitavam a origem divina e o caráter infalível da Bíblia. digo. por recuperar o primeiro texto bíblico e submetê-lo a uma rigorosa análise filológica. por um lado. da casa de ordenha. No século x v n . O sola do sola scriptura não pretendia desprezar completamente o valor da tradição da igreja. . não tanto porque a igreja os receba e aprove como tais. Eles eram irrestritos em sua aceitação da Bíblia como a única e divinamente inspirada Palavra do Senhor.. III. ao perguntar: “Você nunca tem uma colina M izar para se lembrar? Você se esqueceu do pátio. O rompimento evangélico de Lutero só foi conseguido mediante um estudo persistente e esforçado das Escrituras Sagradas. de Zuínglio). exprimiu essa apropriação experimental da Bíblia.9 Ao insistir na correlação entre Palavra e Espírito. O Artigo v da Confissão Belga (1561) levanta a questão de como uma pessoa chega a aceitar a dignidade e a autoridade dos livros canônicos. A questão que surgiu na Reforma foi sobrtT o modõ ^como a autoridade divinamente comprovada das Escrituras Sagradas estava relacionada à autoridade da igreja e da tradição eclesiástica (católicos romanos). Enquanto a Igreja Romana recorria ao testemunho da igreja a fim de validar a autoridade das Escrituras canônicas. Todos os reformadores estavam convencidos daquilo que Zuínglio chamou de “a clareza e certeza da Palavra de D eus” . mas sim subordiná-la à primazia das Escrituras Sagradas.prolegômeno filosófico. a respeito do que trazem a prova em si mesmos” . os reformadores principais também distanciavam-se dos espiritualistas. do estábulo.. que colocavam sua própria experiência 8John Bunyan. pp. porém mais especialmente porque o Espírito Santo testifica em nossos corações que são de Deus. a inspiração e a autoridade das Escrituras Sagradas não era um ponto de debate entre católicos e protestantes. até mesmo os radicais. onde Deus visitou sua alma? Recorde também a Palavra — a Palavra. Klarheit. 1928)71^57------‘ 9Schaff. comprovada pelo testemunho íntimo do Espírito Santo.8 No século xvi. Todos os reformadores. do celeiro e coisas do gênero. mas sim no poder que a Bíblia tem de transmitir uma sensação de encontro com o divino e de evocar uma reação religiosa por parte do ouvinte. Ademais. pelo outro. sobre a qual o Senhor levou-o a ter esperanças” . A resposta apresentada é a seguinte: “ . eles não viam a Bíblia meramente como um livro entre muitos outros. 386-387. considerada fidedigna com base em sua própria perspicuidade {cf. isto é. Embora acolhessem entusiasticamente os esforços dos eruditos humanistas. Grace Abounding to the Chief o f Sinners (Londres: Oxford University Press. não estavam interessados numa teoria abstrata ou formal da v inspiração. e ao poder da experiência pessoal (espiritualistas). 129-130. Conforme Karl Barth disse. prestam testemunho dessa Palavra ao mundo. portanto. . Uma teologia que se baseia na doutrina reformada das Escrituras Sagradas não tem nada a temer com as descobertas precisas dos estudos bíblicos modernos.uto-elaborada. Suas obras teológicas mais incisivas encontram-se em seus sermões e comentários bíblicos. 1982). ainda que com resultados diferentes. uma igreja sempre necessitando de uma reforma a mais com base na Palavra de Deus. Nenhuma outra proclamação possui direito ou esperança na igreja. conservaram — mesmo enquanto se transmudavam — mais da tradição e da teologia dos pais é dos credos do que pensavam. A~sêgúndã das “ pez~~Conclusóesde Berna” (1528) expressa esse biblicismo evidente que dominava.10 Na perspectiva da Reforma._Até os anabatistas. Leith. Não poderia ser nada menos que uma interpretação das Escrituras. Creeds o f the Churches (Atlanta: John Knox Press. mas sim uma igreja a ser continuamente reformada. pp. mas como o repositório dos pensamentos de Deus sobre os seres humanos — e das exigências e promessas dele a eles. Calvino não via contradição alguma em afirmar simultaneamente a origem divina da Bíblia (“ditada pelo Espírito Santo”) e seu caráter adaptado (Deus “balbucia” como uma ama a um bebê). Os reformadores eram grandes exegetas das Escrituras Sagradas. Os reformadores pretendiam voltar à concepção neotestamentária de '^TgfejHTéxpurgar e purificar a igreja de seus dias segundo a norma das Escrituras Sagradas . Embora não devamos ser privados das difíceis vitórias conqüistadas” péTos reformadores no interesse de um ecumenismo simplificado. f^eysrnos lembrar-nos de que a igreja não começou com a Reforma. para quem a experiência da regeneração era fundamental à sua teologia inteira. com o serviço obediente a seu Senhor. tanto a eclesiologia reformada quanto a anabatista: “A igreja de Cristo não faz leis ou mandamentos à parte da Palavra de Deus. não estamos sujeitos às tradições humanas. porque as visões e revelações Í privatizadas deles iam contra a vontade manifesta de Deus em sua Palavra escrita. Eles estavam convencidos de que a proclamação da igreja cristã não poderia originar-se da filosofia ou de qualquer cosmovisão a. veremos a Bíblia não como o simples registro de pensamentos humanos acerca de Deus. então. ed. opôs-se a David Joris e outros radicais espiritualizadores. “[as Escrituras] declaram que. Até M enno. celebramos e participamos da busca pela unidade cristã justamente porque consideramos com seriedade o conceito reformado da igreja — ecclesia semper reformanda. exceto na medida em que fundamentam-se ou encontram-se prescritas na Palavra de D eus” . não simplesmente uma igreja reformada de uma vez por todas. Com tal perspectiva. os quais sentiam que um começo absolutamente novo era necessário. a igreja de Jesus Cristo é aquela comunhão de santos e congregação dos fiéis que ouviram a Palavra de Deus nas Escrituras Sagradas e que. após Deus ter nos buscado na maravilha 10John H.religiosa pessoal acima da revelação de Deus objetivamente dada. A intenção dos reformadores não era tanto secularizar o culto. C. na privacidade de seus quartos. N e século x v i. Heath. Lewis W. Sua reintrodução da língua do povo era em si mesma revolucionária. Eucaristia e M inistério. cujas testemunhas são os profetas e apóstolos. tem havido intensa correlação entre o desenvolvimento da doutrina cristã e a prática do culto cristão.11 Culto e Espiritualidade Ao longo da história da igreja. Spitz (Lexington. a ênfase renovada na graça soberana de Deus fez surgir a reação de gratidão que os reformadores procuravam incorporar em suas revisões da liturgia medieval. A Reforma lembra-nos de que tal processo é uma estrada em dois sentidos: não só o culto tem efeito moldador sobre a teologia. como um rito de iniciação de adultos significando uma participação comprometida na vida. . in: The Reformation: Basic Interpretations. da Comissão de_Eé-e Ordem do Conselho Mundial de Igrejas. todos nossos esforços por encontrá-lo dentro de nossos íntimos não apenas tornaram-se infundados. Q sentido ecumênico da doutrina anabatista do batismo é reconhecido na declaração Batismo. x x . mas também a renovação teológica pode levar a uma revisão litúrgica. p. 1962). o batismo e a ceia do Senhor. . A oração era “o principal exercício da fé” . as diferenças entre os reformadores tornaram-se um obstáculo fundamental para a unidade entre eles. afirma-se que “o batismo mediante profissão de fé pessoal é o padrão mais claramente “Karl Barth. mas provaram ser impossíveis em si mesm os” .^ sei a a fé pressuposta (Lutero). m. toda a vida cristã deveria ser inundada de preces e ações de graças a Deus. “Reformation as Decision”. ed. Observamos também como. paterna (Zuínglio) ou parcial (Calvino). 29). Como parte de seu protesto contra o domínio clerical da igreja. os reformadores visavam a uma participação total no culto. Embora admitindo a validade tanto do batismo infantil quanto daquele do crente. De acordo com um dito popular na igreja primitiva. assim. Vimos como os reformadores reduziram os sacramentos medievais de sete para dois. quanto santificar a vida comum. e por maridos e esposas. pois exigia que o culto divino fosse oferecido ao Deus^ Todo-Poderoso na língua usada por negociantes. no mercado. 161.: D. Mass. Os anabatista^—insistiam e m . Assim. eles voltaram para a prática do batismo da igreja primitiva. “a regra da oração deve estabelecer a regra da fé” .de sua condescendência em Jesus Cristo. em relação a esses dois.que o batismo era conseqüente à fé e negavam ainda que os bebês pudessem recebê-la adequadamente . Calvino advertiu que qualquer pessoa que negligenciasse orar particularmente engendraria apenas “preces cheias de vento” na assembléia pública (Inst. na morte e na ressurreição de Jesus Cristo. Assim. vida resoluto. A ênfase de Calvino no papel que o Espírito Santo desempenha no culto eucarístico. não só dizemos algo a Deus e à comunidade cristã.12 Por outro lado. havendo inúmeros batismos de crianças que tinham de cinco anos para baixo. ' Como corretivo para o papel casual atribuído ao batismo em grande parte da vida eclesiástica contemporânea.comprovado nos documentos do Novo Testamento” . precisamos recuperar uma teologia da presença. mesmo sendo imprópria sua linguagem sobre a mastigação do corpo de Cristo. Não é fácil evitar esse sério problema ecumênico. o rito em si tornou-se atenuado e separado do contexto de um compromisso de. Yoltaire ridicularizou muito os cristãos. enquanto os calvinistas declaravam que comiam o pão e Deus! “O ra” . No Iluminismo. e não Deus. “se alguém nos falasse de uma polêmica assim entre os hotentotes.e possível ignorar as cicatrizes que permanecem das controvérsias do século x v i sobre o significado de hoc est corpus meum. A prática de tal “batismo de criancinhas” não pode ser justificada nem com base na principal doutrina reformada do batismo infantil. mas Deus também \ fala e faz algo por nós. como um tipo de reflexão posterior — quanto na idade e na preparação adequadas dos candidatos ao batismo.^. nern. os luteranos afirmavam que comiam o pão. Por exemplo.utero estava certo ao insistir na presença real. podemos apropriar-nos de duas questões centrais nas tíoutrinas reformadas do batismo: çom os anabatistas. nem pelo fundamento lógico anabatista de gue o batismo é o voto público de discipulado dentro da congregação da aliança. pois o batismo é tanto o dom de Deus quanto nossa i resposta humana a esse dom. Isso reflete-se tanto na disposição litúrgica do batismo no culto — muitas vezes acrescentado no final. Para muitos protestantes. podemos aprender a ligação \ intrínseca entre batism o. podemos aprender-que. porque aquela ceia que deveria simbolizar sua unidade e amor uns pelos outros tornara-se a causa de disputas reciprocamente destrutivas. e na elevação de nossos corações (sursum corda) na adoração. com os reformadores principais | (jembora mais com Lutero e Calvino do qüècõm Zuínglio). e não o pão. j ao batismo. há diversos anos. na ação de graças e no . arrependimento e fé. Os católicos diziam que comiam Deus. Mesmo para muitas igrejas que são mutuamente capazes de reconhecer suas diversas práticas de batismo. disparava Voltaire. nós não acreditaríamos!” Que podemos aprender dos debates da Reforma sobre a ceia do Senhor? Em prim eiro lugar. a celebração da sagrada comunhão possui implicações diferentes de um culto fúnebre — uma observância solene respeitosamente realizada em memória de um Senhor ausente. em algumas tradições que declaram firmemente o batismo do crente como uma distinção denominacional. a idade média para o batismo na Convenção Batista do Sul (Estados Unidos) era oito. a participação total na Eucaristia só pode ser desejada como um alvo ainda não atingido. ed. na Segunda Confissão de Londres (1677) dos batistas ingleses. eles acreditavam que a Palavra de Deus ouvida na Bíblia deveria ser acompanhada pelas correspondentes “palavras visíveis” de Deus nos sacramentos. L. nós “espiritualmente recebemos e somos alimentados com o Cristo crucificado e todos os benefícios de sua morte: estando o corpo e o sangue de Cristo presentes para a fé dos cristãos. na baixa Idade Média. encontra-se. mas é um símbolo que transmite aquilo que significa. que faz eco à linguagem do Livro de Oração Comum. é um símbolo. mas espiritual” . Lutero advogou sua celebração diária. Talvez os primeiros cristãos celebrassem a ceia do Senhor diariamente (At 2. Ao longo dos séculos. Baptist Confessions o f Faith (Valley Forge: Judson Press. suscitado pela ameaça ) de perseguição iminenteXSe a ceia do Senhor nos é dada como “alimento e sustento diários para revigorar-nos e fortificar-nos” ('Lutero'). p. A princípio. Os conselhos municipais de Zurique e Genebra legislavam uma comunhão trimestral: Zuínglio satisfez-se com esse melhoramento modesto da prática medieval. 46) e. esperava-se do povo apenas a comunhão anual na Páscoa. l . de 1549. ministrados de acordo com a Palavra divina. precisamos voltar à prática da comunhão mais freqüente. de modo que. precisamos restabelecer o equilíbrio entm Palavra e sacramento no culto cristão. sobre “alimentar-se de Cristo em seu coração pela fé” .. para nosso empobrecimento espiritual. o compartilhar regular da ceia tornou-se prerrogativa exclusiva de monges e padres. se é um “banquete espiritual” (Calvino) e a “boda n a ^ qual Jesus Cristo está presente com sua graça.louvor. Os reformadores tentaram incentivar uma participação mais completa e uma celebração mais freqüente da ceia do Senhor.14 Nos 13W. se ela “sustenta e aumenta a fé” (Zuínglio). na verdade. A bem da verdade. toda semana. Ao mesmo tempo. Espírito e prom essa” (Menno). embora ele mais tarde se decidisse por uma observância semanal. p.13 Em segundo lugar. Os reformadores não inventaram o sermão. aponta para além da — também válida — dimensão memorialista ressaltada por Zuínglio. mas elevaram a pregação a um papel central no culto divino. 1959). A Confissão de Schleitheim refere-se ao “partir do pão” como uma das marcas distintivas da verdadeira igreja. não de forma corporal ou carnal. Á Em terceiro lugar. 14Leith. A leitura solene e bem articulada das Escrituras Sagradas também recebeu uma posição proeminente. embora a freqüência com que os anabatistas celebravam a ceia provavelmente 7 dependesse do caráter ad hoc e clandestino de seus cultos. Isso foi expresso sucintamente na Confissão de Ausburgo (1530): “Onde o evangelho é pregado em sua pureza e os sacramentos sagrados. 70. Lumpkin. Essa fórmula. com certeza. A ceia do Senhor não é “meramente” um símbolo. . 293.42. aí está a igreja verdadeira” . enquanto Calvino insistia sem êxito numa celebração semanal. então negligenciar seu compartilhar freqüente no contexto do culto é rejeitar o sinal externo da graça de Deus. Ao receber a Eucaristia. era a sensação de júbilo e liberdade com 0 perdão dos pecados. ed. diversas congregações protestantes recuperaram uma nova valorização do papel central da eucaristia no culto cristão. o louvor e os sacramentos eram expressões comuns de fé e da devoção. relações sociais e adesões políticas. mas deixa de discernir seu papel profético e seu impacto revolucionário na sociedade. sua fascinação estética. Ética e Escatologia Há um tipo de adulação dos reformadores do século xvi que separa sua teologia de sua ética. a de Menno enfocava 0 discipulado fiel.: The Liturgical Press. a oração. que significava seguir a Jesus compartilhando de seu sofrimento. 0 culto deve servir para 0 louvor do Deus vivo. talvez. a catequese. O culto cristão contemporâneo é motivado e julgado por padrões diversos: seu valor de entretenimento. muitas congregações católicas romanas têm enfatizado a importância decisiva da liturgia da Palavra no culto cristão . A pregação. 1975). Para cada um deles..15 Desde então. instintos.últimos anos. podemos resumir suas principais contribuições 15Austin Flannery. Retomando as quatro personagens que estudamos. reconheceu que “é especialmente necessário que haja íntimos elos entre a liturgia. Entretanto. A “Constituição a Respeito da Liturgia Sagrada” . Vatican Council II: The Conciliar and Post-conciliar Documents (Collegeville. . a vida em si era litúrgica. alma. seu rendimento econômico. até mesmo.>^0 mesmo tempo. a instrução religiosa e a pregação” . Essa perspectiva reconhece corretamente os reformadores como grandes heróis da fé. À medida que Cristo reúne seu povo em memória. V Cada um dos reformadores que estudamos incorporou um tema de espiritualidade diferente. A espiritualidade de Calvino estava centrada naquele senso de temor e de admiração perante a glória de Deus. do Concílio Vaticano n (1963). ao redor do púlpito e da mesa. A herança litúrgica da Reforma faz-nos recordar a convicção de que. 0 qual tanto moldou a expressão teológica particular adotada quanto foi por ela moldado. ocorreu uma inversão oportuna nos padrões do culto. 46. p. se não insólito. Minn. Isso era verdade porque o Deus soberano da Reforma estava interessado no ser humano inteiro. não simplesmente com 0 âmbito religioso ou espiritual. seremos realmente capazes de adorá-lo em espírito e em verdade. Cada uma dessas tendências é um sinal encorajador. corpo. a fé reformada preocupava-se com o todo da vida. acima de tudo. mente. essencial à piedade adequada. para Zuínglio. Para Lutero. era a religião pura e o serviço obediente ao único Deus verdadeiro. seu suposto apelo evangélico. originárias das vidas transformadas de homens e mulheres que haviam sido apanhados pela graça de Deus. conforme ele expressou. assegurar uma posição diante de Deus.à ética sob o aspecto de três temas que se sobrepõem. Contudo. Lutero foi capaz de libertar a ética do opressivo sistema de justiça pelas obras. a palavra secular passou a significar irreligioso e mesmo antiDeus. visando à recompensa pessoal (i. Zuínglio e Calvino procuravam conquistar o mundo. . antes. encontramos preocupações éticas expressas no que pode ser chamado de a santidade do secular. de acordo com as normas do evangelho. onde o governante humano. Em prim eiro lugar. O conceito reformado da santidade do secular exerceu uma influência importante no desenvolvimento da ética social cristã a partir da Reforma. pois o cônjuge. o mundo que. mas viva e ativa no amor. seja ele um monarca absoluto ou um conselho municipal. como Calvino o chamou. há a noção luterana da f é ativa no amor. “o teatro da glória de D eus” . para Zuínglio. ele nunca se esqueceu da responsabilidade que os cristãos tinham de se estender em amor. Embora a doutrina de Lutero acerca dos dois reinos o impedisse de ser muito otimista quanto à possibilidade de melhorar significativamente este atual mundo decaído. Para Calvino. tem de ser levado para os verdadeiros guetos e favelas de nosso mundo. quando exclamou: “O mundo é minha paróquia” . enquanto Lutero aceitava o mundo como um mal necessário. para seus próximos. W alter Rauschenbusch articulou essa questão em seu entusiasmo pelo “evangelho social” . isso envolvia a concepção de um magistrado piedoso. Isso aplicava-se especialmente à vida familiar. apesar de sua condição decaída. social e econômica. essa ênfase significava uma reestruturação da vida política. era o próximo mais íntimo de uma pessoa. à própria salvação). não sua causa ou condição. o termo latino saeculum significa apenas o mundo.e. mas simplesmente que esse evangelho não deve ser isolado em algum gueto religioso. John Wesley mostrou-se herdeiro dessa tradição. Hoje. Quando passamos de Lutero para a tradição reformada. Ao insistir com tanta firmeza na justificação somente pela fé. não estava adormecida. O amor de um indivíduo pelo próximo envolvia inevitavelmente uma manipulação odiosa e egoísta do outro. Nesse esquema. assim. e não vice-versa: as boas obras são uma conseqüência da iniciativa graciosa de Deus em Jesus Cristo. era considerado o vice-regente de Deus. Lutero nos lembra que a ética deve provir de um fundamento teológico adequado. a realização de boas obras era essencialmente um modo de acumular méritos e. A fé verdadeira. como em “humanismo secular” . no qual estivera emaranhada na teologia católica medieval. transformar e reformá-lo com base na Palavra de Deus. . ele disse. conforme representada por Zuínglio e Calvino. ainda assim é. A doutrina de Lutero solapou esse sistema e libertou o pecador justificado (ou santo) para amar o próximo desinteressadamente e sem reservas — pelo bem do próximo. que (conforme Rauschenbusch usou o termo) não significava outro evangelho separado do evangelho único e singular de Jesus Cristo. podemos dizer que. Observamos como. Lutero sustentava. Com apenas um pouco de exagero. de ser “pequenos C ristos” . Aos reformadores principais. mas não estamos presos a nenhuma delas. vividos numa forte tensão escatológica entre o “não m ais” da antiga dispensação e o “ainda não” do reino perfeito de Deus. Estamos presos apenas a Jesus Cristo. Mas Jesus chamou-nos para um plano de ação diferente” . Eles se recusavam a batizar seus bebês. em 1543. Apesar de toda a sua ênfase no retom o à igreja primitiva do Novo Testamento e da época patrística. Qual dessas orientações éticas é certa para a igreja hoje? Nenhuma delas é suficiente por si só. pois continuam sustentando a igreja com o Estado. Mas cada um deles estava convencido de que o reino de Deus irrompia na história nos eventos em que ele foi levado a desempenhar um papel. algo que. lagos e regatos da Europa. para eternamente enfrentar esse mundo em testemunho e serviço.. Menno Simons e a tradição anabatista apresentam-nos mais uma imposição ética: confronto com a cultura.porque ele era o teatro da glória de Deus. Eles se recusavam a se alistar. A ênfase reformada no envolvimento no mundo pode transform ar a igreja em pouco mais do que uma junta de ação política ou uma organização de serviço social. não o caminho da espada” . com as ordens absolutas de Cristo. porque Jesus disse: “Não jurareis” . a carregar a espada. Nenhum deles escreveu um comentário sobre o Livro do Apocalipse. eles se recusavam a prestar juram ento. no século xvi. a Reforma consistiu essencialmente num movimento visando ao futuro. Nenhum dos reformadores que estudamos esteve muito envolvido com as escatologias apocalípticas radicais que floresceram no século XVI. que esqueceu seu sentido de missão. Assim. mas também traidor. Temos muito a aprender com cada uma dessas tradições. pois uma doutrina pura sem um viver piedoso sempre resulta numa ortodoxia morta. milhares de anabatistas foram-giieirnados vivns nu afnpados nos lrios. sigam o caminho da cruz. Inundado por essa percepção de urgência escatológica. A insistência luterana na prioridade da fé sobre as obras pode degenerar para um mero formalismo. enviada ao mundo pelo qual Cristo m orreu. Ela lembra-nos de q u e lt santificação do secular nunca Irteve significar simplesmente aspersão de água santa no status mas sempre enfrentar a cultura com as ordensradícais de Jesus C risto. era não só herético. ou quanto qualquer obra . Foi um movimento dos “últimos dias” . sendo tão independente da vida e do pensamento humanos quanto a ressurreição dos mortos. A igreja é communio sanctorum. porque Jesus disse: “Amem seus inimigos. comunhão de pecadores salvos. os anabatistas disseram: “Vocês nos deram apenas uma reforma parcial. fundamentada no evangelho da livre graça de Deus em Jesus Cristo. A visão anabatista é uma correção da ética dos ireformadores. pois cada uma mostra-se suscetível à sua própria distorção.principais. Vocês ainda dão a César o que é de Deus. escreveu ao Santo Imperador Romano Carlos v: “A Reforma da igreja é obra de Deus. Conseqüentemente. enquanto a crítica anabatista da cultura pode decair para um separatismo improdutivo. Calvino. que estava morto e vive para todo o sempre. respondemos: “Não nos encontramos à frente de um deserto inexplorado de tempo não-cumprido. citado em JanM . Die Hoffnung fü r die Welt”. b r A tt: M a z i n h o R o d r ig u e s . 1979).] eu venci o mundo” .16 T o d o s q u e s ã o b e n e fic ia d o s p e lo q u e fa ç o .assim ” . muito embora também confessemos com John Robinson. e que reinará eternamente. com . respondemos: “Ele. C ritica s e a g r a d ecim en to s para: m azinhorodrigues(*)ya h o o . fitamos aquele que veio e virá. fiq u e m certos q u e sou con tra a v e n d a ou troca d e to d o m a teria l d isp o n ib iliz a d o p o r m im . respondemos: “Seu reino está chegando”. sim. Talvez encontremos aflições. Lochman. o Rei. nosso Juiz e Salvador. Aos que perguntam “Que podemos esperar?”. p. reconhecemos a verdade da declaração de Calvino e agradecemos a Deus o modo como sua glória e o poder de sua Palavra resplandeceram na teologia dos reformadores. 65. estamos fitando nosso Senhor vivo.. Hoje. Aos que perguntam “Que está diante de nós?”. 16“ Christus. está diante de nós” . Living Roots o fReformation (Minneapolis: Augsburg Publishing House.. com um objetivo que ninguém ousaria predizer. . se queremos participar dele. que “o Senhor ainda tem mais verdade e luz para irromper de sua santa Palavra” . sua palavra régia: “Não se turbe [. Um famoso documento de nossa época expressou o âmago da fé reformada e a esperança pela qual a igreja de Jesus Cristo presta testemunho: Aos que perguntam “Que acontecerá ao mundo?”. In felizm en te d e p o is d e p o sta r o m a teria l n a In ternet n ã o te n h o o p o d e r d e e v i t a r q u e “alguns aproveitadores” t i r e m v a n t a g e m d o m e u t r a b a lh o q u e é fe ito s e m fin s lu cra tiv o s e u n ic a m e n te p a r a e d ific a ç ã o d o p o v o d e D eus. Mas sabemos sua palavra. isso deve ocorrer. pastor dos imigrantes puritanos ingleses nos Estados Unidos. o leitor poderá consultar os respectivos índices das obras de cada reformador. Quanto às citações dos escritos de Lutero. Cada um dos verbetes seguintes pode remeter ao índice de assuntos desta obra. observou: “Se eu vivesse o bastante. Por exemplo. Certa vez. Calvino afirmou que Deus estava acostumado a “balbuciar” ( balbutit ). que ele chamou de Anfechtungen. Em 1520. Esta palavra é muito mais forte que seu sinônimo. adaptação • Metáfora retórica freqüentemente usada por Calvino para se referir à condescendência de Deus aos limites e às necessidades da condição humana. Calvino e Menno Simons. como uma ama conversando com um bebê ( Inst. com base na analogia da deportação dos judeus à Babilônia. no qual ele criticou o sistema sacramental do . pp. tentações. de Heiko A. tenho uma dívida para com “A Nominalistic Glossary” em The Harvest o f M edieval Theology. Zuínglio. eu escreveria um livro sobre Anfechtungen. muitas vezes caracterizados por batalhas contra o diabo. Oberman. Não é absolutamente uma lista completa. perplexidade. Cativeiro Babilónico • Termo usado por Petrarca e outros escritores medievais posteriores para descrever o “exílio” dos papas em Avinhão de 1309 a 1377. agressão. Mostra-se especialmente útil o volume-indice à t Luther’s Works (LW 55) e o índice de assuntos à edição de McNeill-Battles das Instituías de Calvino. Versuchung. Lutero publicou seu Cativeiro Babilónico da Igreja. sob Nabucodonosor.. medo. temas e expressões centrais pertinentes à teologia dos reformadores. sem o que ninguém pode entender as Escrituras ou conhecer o temor e o amor de Deus” (WA TR 4.GLOSSÁRIO Este glossário apresenta uma seleção de conceitos. até sua morte. pp. x i ii . Anfechtungen • Diversamente traduzida como provações. 459-476. dúvida. ad fon tes • Às fontes. mas sim um agrupamento escolhido de termos mais ou menos técnicos usados no decorrer deste livro. em relação às Escrituras. A busca de Lutero por um Deus gracioso foi marcada por freqüentes acessos de medo e angst. Expressão popular que resumia o plano entusiasta dos reformadores humanistas de voltar às fontes originais da antigüidade clássica. Quanto a alguns dos termos derivados da teologia escolástica da baixa Idade Média. 1). bíblica e patrística. i. Lutero continuou a experimentar esses conflitos espirituais. 490-491). não há nenhuma área da vida na qual não tenhamos negotium cum deo. cristologia da carne celestial • O ensino de Menno Simons e de outros reformadores radicais de que Jesus não recebeu nada de sua natureza humánãTíêMaria: ele nasceu a partir de Maria. Essa doutrina foi criticada por Calvino como docetismo dissimulado. conhecimento duplo de Deus • Tema que fornece a estrutura básica para a edição definitiva das Instituías de Calvino. 1429) e Pierre d’Ailly (m. communicatio idiomatum • Troca de propriedades. fides ex auditu • A fé pelo ouvir. Termo que Lutero usou repetidamente para expressar a dimensão pessoal e existencial do evangelho. p. extra Calvinisticum • A princípio. vis-à-vis os humanos. 224). em virtude da unidade de sua pessoa. conciliarismo • Movimento para reformar a igreja “na cabeça e nos membros”. . Christus pro me • Cristo por mim. fazer o que está no íntimo da pessoa. O uso da exclusão era um aspecto proeminente da eclesiologia anabatista. conforme Calvino o expressou. Em 1460. e o ouvir pela palavra de Deus”. toda a vida é transcorrida coram deo. do movimento conciliar foram os teólogos franceses Jean Gerson (m. em que ele condenou a prática de apelar ao papa um concílio geral. Calvino enfatizou a distinção entre as duas naturezas de Cristo. Uma das realizações significativas do conciliarismo foi o término do Grande Cisma do Concílio de Constância (1414-1417). termo polêmico criado pelos teólogos luteranos do século xvil para designar a doutrina reformada segundo a qual o Filho de Deus teve existência “também além da carne” (etiam extra carnem). dar o melhor de si.catolicismo medieval. 1420). baseada no procedimento disciplinador de Mateus 18. coram deo • Na presença de Deus.15-18. Enquanto Lutero começou com a unidade da pessoa de Cristo. De acordo com Lutero. O termo é freqüentemente contrastado com coram hominibus. perante Deus. A tradução da Vulgata de Romanos 10. Os papas do final do século xv opuseram-se vigorosamente às alegações conciliares. o indivíduo seria capaz de amar a Deus acima de tudo e. Dois apologetas importantes.17: “De sorte que a fé é pelo ouvir. De acordo com a teologia nominalista da baixa Idade Média. e não dela. sob a vigilância do Deus vivo. Usada pelos reformadores para ressaltar a importância do ofício da pregação e o significado salvífico de ouvir da Palavra. assim. facere quod in se est • Literalmente. ou. ao fazer o melhor que está dentro de seu poder natural. mediante um concílio geral. em 1559: o conhecimento de Deus como Criador e Redentor. A crença de Lutero na onipresença do corpo de Cristo originava-se de sua compreensão desse tema patrístico. obter a infusão da graça divina. isto é. Daí o comentário de Lutero de que “os ouvidos são o único órgão do cristão” (LW 29. exclusão • Prática de excluir da congregação um ofensor recalcitrante. nas presença dos homens. “negócios com Deus”. o Papa Pio II promulgou a bula Execrabilis. Foi elaborada por Menno para preservar a condição sem pecado de Cristo. A doutrina segundo a qual os atributos das naturezas divina e humana em Cristo podem ser mutuamente afirmados. a Palavra e os sacramentos são as duas características ou “notas” essenciais da igreja visível. influenciou muito os reformadores protestantes. Lutero criticou muitos abusos do comércio de indulgências. Gelassenheit • Deixar-se ir. &fiducia estava relacionada à aquisição de méritos. Entre esses. A teologia mística “alemã” desenvolvida por Meister Eckhart e seus discípulos ensinava a absorção da alma no ser de Deus (Wesenmystick). humildade e passividade perante Deus. Gemeinde • Comunidade. ~ ' ' ’ opera Dei • As obras de Deus. os loci únicos da revelação especial de Deus nas Escrituras. Baseava-se apenas na generosidade de Deus. Termo que recorda o conceito neotestamentário da koinonia e a doutrina luterana do sacerdócio de todos os crentes. nos sacramentos e na pregação. muitas confissões reformadas e os anabatistas acrescentaram a disciplina como terceira marca distintiva. . incluindo-se a concessão de indulgências como recompensa pelo apoio financeiro. embora eles discordassem dele quanto às doutrinas do não-livre-arbítrio e da eleição irrestrita. De acordo com a teologia nominalista. digno da aceitação divina. apesar de sua obliteração pela queda. tais como Erasmo. Termo da tradição mística alemã que significa uma postura de total dependência. A imputação é termo forense que enfatiza aquele aspecto do julgamento gracioso de Deus que se encontra extra nos. indulgência • A remissão da pena temporal devida a Deus por causa do pecado. após a culpa ter sido perdoada.fiducia • Segurança. O mérito “congruente” podia ser obtido até mesmo numa condição de pecado. Em suas Noventa e Cinco Teses. Os indícios do trabalho de Deus em sua revelação geral. humanismo • Movimento indefinido pela reforma e pela educação. a teologia mística “latina” de Boaventura e de outros insistia na união da vontade e na semelhança a Cristo. na encarnação. “exterior a nós” . daí. misticismo • Movimento popular de renovação espiritual que enfatizava a iluminação interior e a união imediata da alma com Deus. confiança. Na teologia de Calvino. meritum de condigno • Mérito baseado no padrão da justiça divina. Palavra preferida por Lutero (a Kirché) para a igreja. baseado na redescoberta da literatura da antigüidade clássica. na história da salvação. notae ecclesiae • Marcas da igreja. justiça imputada • A justiça “alheia” de Cristo. a qual. Martinho Bucer. Calvino identificou não só as maravilhas do mundo criado exteriormente. o meritum de condigno era um ato realizado em estado de graça e. mas “pela fé somente” . Usado por Lutero e pelos anabatistas. portanto. meritum de congruo • Mérito baseado na generosidade de Deus. mas também a imagem de Deus dentro de cada indivíduo. Na teologia medieval posterior. A produção erudita de humanistas bíblicos. um mérito genuíno ou “total” . ainda assim permanece intacta. o indivíduo poderia merecer a infusão de graça fazendo o melhor de que é capaz. congregação. que é atribuída ao cristão totalmente à parte de méritos ou boas obras. à parte do que era considerada vã presunção. Esperança firme na fidelidade de Deus. Sendo oposto ao meritum de congruo. apoio. oracula Dei • Os oráculos de Deus. Para Lutero e Calvino. por seu poder absoluto. Deus poderia ter-se encarnado num asno. Esse era um dos cinco pontos principais da doutrina defendida no Sínodo de Dort. até o fim. no avanço educacional e numa imitação piedosa de Cristo. Contém o programa de disciplina e constituição política da igreja elaborados por Calvino. Na Idade Média. surgiram muitos dos comentários bíblicos de Zuínglio e a famosa Bíblia de Zurique. Por exemplo. pelo qual Deus poderia fazer qualquer coisa que não violasse a lei da não-contradição. perseverança dos santos • Doutrina segundo a qual os verdadeiramente eleitos. reprovação • O “lado sombrio” da doutrina da dupla predestinação: o endurecimento de certos pecadores pela deliberação preordenada de Deus à sua justa condenação. o termo geralmente se restringia a um indivíduo que questionava o dogma eucarístico oficial. ou ter decretado o adultério como virtude. e não vício. com sua tendência à ruptura entre igreja e estado.Ordenanças Eclesiásticas • Documento básico da ordem eclesiástica de Genebra. professor. Palavra que faz lembrar o enxamear incontrolável das abelhas ao redor de uma colmeia. philosophia Christi • A filosofia de Cristo. seja no res sacramental ou no receptor. dentre os quais Zuínglio e os anabatistas. A ordem pela qual Deus escolheu agir em relação ao mundo criado. com base no desenvolvimento moral. em 1619. Reforma magisterial • Termo cunhado por George H. “Profecia” • Nome dado àquelas sessões quase diárias de estudo bíblico rigoroso estabelecidas por Zuínglio e pelos reformadores de Zurique. contudo. Schwärmer • Fanático. pela graça de Deus. Williams para designar aquele padrão de reforma eclesiástica oficialmente estabelecido e apoiado pela autoridade civil. Na época da Reforma. um sacramentarius era uma pessoa que sustentava teologicamente que qualquer um dos sacramentos era meramente um sinal. Sua aceitação pelo conselho municipal tomou-se uma condição para o retomo de Calvino a Genebra. os réprobos eram chamados de praesciti. sacramentário • Opositor da doutrina da presença objetiva do Cristo eucarístico no sacramento do altar. aqueles que sabe-se antecipadamente que não aceitarão a oferta de graça e. Freqüentemente contrastado com a reforma radical. em 1525. O poder que é regulado pelas leis reveladas e naturais estabelecidas por Deus. Usado de certa forma indiscriminadamente por Lutero para descrever aqueles reformadores. potentia Dei ordinata • O poder ordenado de Deus. associados a um desprezo capacitado pelos aspectos externos da religião. à custa da Palavra e dos sacramentos objetivamente dados. alguns teólogos especulavam que. não envolvendo mudança alguma. . morrerão numa condição de pecado. Expressão usada por Erasmo para resumir sua abordagem moderada à reforma da igreja. potentia Dei absoluta • O poder absoluto de Deus. sobre o ofício em quatro partes de pastor. assim. apesar de suas tentações e deslizes no pecado. Na teologia medieval. que espiritualizavam o evangelho ou que contavam muito com a experiência pessoal. Desses exercícios exegéticos intensos. presbítero e diácono. de 1531. em 1541. são fielmente preservados. enquanto Zuínglio ressoava mais a via antiqua. conseqüentemente. enquanto os “modernistas” seguiam Guilherme de Occam e seus discípulos. A crença na substanciação foi definida como de fide. pela consagração do pão e do vinho na eucaristia. de Romanos 3. Pessoa que ainda não completou a jornada para a Nova Jerusalém nem para a maldição eterna e que.Seelenabgrund • Território da alma. Os defensores do caminho antigo eram leais aos antigos doutores da alta Idade Média. Também chamado de scintilla animae. Conceito da teologia mística que se refere ao brilho inato do divino dentro de cada indivíduo.. sola gratia • Pela graça somente. Lutero usou essa expressão para indicar que a justificação do pecador é obra de Deus. Lema da soteriologia protestante que recorda a ênfase agostiniana radical na iniciativa divina da eleição e da justificação. “o brilho da alma”. via antiqua. a substância dos elementos é convertida na substância do corpo e do sangue de Cristo. transubstanciação • A doutrina segundo a qual. em 1521. peregrino. . sola scriptura • Pelas Escrituras somente. à parte da realização de boas obras... Termos usados para designar as escolas de pensamento rivais na teologia escolástica da baixa Idade Média. o ponto de contato da união com Deus.28: “. Lutero foi educado na via moderna. Expressão usada pelos reformadores para mostrar que a salvação era realizada por Deus unicamente. como Gabriel Biel. tais como Tomás de Aquino e Duns Scotus. solo Christo • Por Cristo somente. em oposição à opinião humana e a tradição eclesiástica. Os reformadores recorreram à autoridade única das Escrituras Sagradas. pelo que a “justiça alheia” de Cristo é imputada ao crente e recebida somente pela fé. Foi reafirmada como o ensino oficial da Igreja Católica no Concílio de Trento e contraposta por todos os reformadores protestantes e radicais. Baseado na seguinte tradução feita por Lutero. o homem é justificado [. O chamado princípio formal da Reforma. o caminho moderno. sola fide • Pela fé somente. alguém que está “a caminho” (in via). e de synteresis. viator • Caminhante. vive em suspensão entre o julgamento de Deus e sua misericórdia..] pela fé somente”. pela mediação de seu Filho. como a Palavra infalível de Deus. via modema • O caminho antigo. em 1215. no IV Concílio Laterano. “a consciência”. fé dos bebês. 80-81.2 7 6 . 258-259. 34n25. 321-322 B batismo: 314-315. Zuínglio. 178. Lutero. 296. 223-224. 62. 141-143. violência. 314.3 1 4 . 216. 270-271.2 7 6 . Marpeck.290. 197-198.141-142. 274. 270-271 relação com a ciência: Calvino. 285. veja Aristóteles arminianos. 322. 309. 274.314. 322. 313­ 314. 305-306 aristotelianismo. 255-256. 212-222. 44. 178. 139-140. 72. Menno. disciplina. 114nl6. 189s. importância da: 166.137-138. 218. 300-303.200. 285-286. 169 alma: teoria traducianista. 127. influência. 216 aflições. 163. 321 adocianismo. relação dos Testamentos: Menno. 311-312. 28. 79. Veja também profecia. valdenses. 73 amish. 323. 141-142. Hubmaier. 230-233. 253­ 254. huteritas. 35. 312. Agostinho. e a ordem social. 298-299. 26-27. 200. Lutero.2 9 6 . 87. 185-188. 166. 66-67. 223 -227. teologia de: dentro dos limites da revelação. Menno e os anabatistas. 319 apócrifos. batismo. 185-187. livro lexical de orações. Franck. 273-274. Calvino. 290-291. 198. 2 5 5 . 315. Hut. 310. Deus. espiritualistas. 268 anti-sacerdotalismo. 41. obras. 180-181. 258-259. 273. 253-254. 275 apostasia.92-93. Menno Simons. em Münster. 292. escatologia. Mathijs. 118-119. Cristo. Calvino. 295-296.258. Menno. moderna. 225. 321 anjos: Calvino. 181-182.254-255. 314. 177. 146. Veja também imortalidade.2 9 2 -2 9 3 . 289­ 290. Lutero. 114nl6. Veja também Anfechtungen anticristos. Hus. 26. 270. 167-168. 307-308. 273. 306. 18. 166. 258-259. tipos de.203-204. 95. 86. 275. 85. Cipriano. 48. 95. 140 Artigos de Smalcald. 257. 197. 90. 205-206. Zuínglio. 56-57. predestinação . limbo. 198-212. anabatistas. 182. 169. Zuínglio. 323 acomodação: Calvino. 43. 233. 233-244. 66. 57-59. 300-301. 229. 254. Espírito Santo. 273. 174. 302. 57. 70. 235-236. pena para o rebatismo: 138. veja Beuckels. Menno. 26-27. 240-241. 188. ênfase no Antigo ou no Novo Testamento: Menno. 245-247. 315. 311-312. Zuínglio. 192-193. 99. 259. 9 4-96 . eclesiologia. 274. 286-287. 226. sua grande realização. Veja também circuncisão. 292-295. 264-265. 295-296 batistas. 138-144. 34n25. 272. 194-198. como evento eclesiástico. 269-270 arrependimento: 49-50. Menno. 57. 113. cristologia. 264-265. 210-212. Blaurock. 246­ 248. 214. 176. 265. 283-284. 273. 292. 200. 321 a d fontes. 203-204. 25-33. 74. 88-89. nos Países Baixos. Calvino. Schiemer. 202.2 7 4 . 319. 82.A abusos eclesiásticos. morávios. 293-294 arianismo. 192. veja Pedro Lombardo C Calvino: vida de: 165-185. 158-160. 275. 180-181. Anfechtungen. 292. 251-304. e fé. 224-225. 50. nãoviolência.2 6 0 -2 6 1 . irmãos suíços. 194. como pastor. como rito de iniciação: Erasmo. 231. Cipriano. começo em Zurique. 141. Hofmann. 112-114. conversão experimental. No índice onomástico. Bullinger. pecado da: Calvino. 202.240-241. 176. 255-256. No índice onomástico. duplicidade. 267-268. 262-265. 177. avaliação. 171s. 118-121. Menno.296­ 297. Calvino. 270 Bíblia: definição: Calvino.125. 185-188. 171-172. 2 5 5 -2 5 6 .1 4 2 .2 5 8 -2 6 0 . 33. 66-67. Pastor. 283. 288n91. infantil. 64 Avinhão. 48. 258-259. 93-96. visão dos. estudo da: 50.276-277. Zuínglio. 218.237-238. morte. Menno. 275-276. 40. Hutter. imagensda: Calvino. 318.45. 271n48. 50. 301-303. 216. 141. Escrituras. eclesiologia. 143-144. 286-287. como teólogo. 65. 222-233. 84-86. 117. Seelenabgrund amor: 224. Lutero. pecado. os. Menno. 38-41. 129. 242. 295 Apocalipse. 182. 167. 140-143. 62-63. 199-200. Grebel. 211. Erasmo. 118. Zuínglio. 137-138m 258-259. 137. 314-315. 266-267. 33. 288n91. 212-215. e eleição. 283. 82. 273. 228-229. 136 antinomismo. ebatismo: Lutero. 112. ceia do Senhor. Lutero. Zuínglio. 230-232. 255. 163. sofrimento agostinianos. Veja também humanismo. canonicidade: Erasmo. Veja também amish. 171. 286. 137-144.2 7 4 . 297 anabatistas: 12.2 8 6 . Zuínglio. 191-195. Müntzer. 277. 42 antitrinitários. 236 ansiedade: era da. 203-204. 279-282. 126-127. 182. 194. 285-288. 314. 140nl00. 277s. 319. Phillips. . 118. fé. 261­ 262. 283-295. veja perseguição. 279. como professor.171-172. livro do. 140nl02. 105. 39. 41­ 42. 199. 103. 137-138. 135. Mantz. 115. 98-100. 85. 21. sola scriptura. 241. 168. 265. 302. No índice onomástico. Calvino. experimental: Menno. 242-243. 94. 178. 321 cativeiro babilónico. Calvino. Calvino. 63.128-129. 215-218. 83. 84. 266. 229-232. Heidelberg. Zuínglio. 316. 236. 134. duas naturezas de: 305-306. Eckhart. Vaticano u. C risto. espiritualidade. soberania de: 45. ofício triplo de: 219. Calvino. como criador: Calvino. 32. Lutero. 313 diabo: anabatistas. 78. 150-152. 90. 317 confissão. 205-206. Lutero. Veja também coram Deo. 217. 152 Credos: 129. 61-62. 322 corpus christianum. obra de: 308. 319 conciliarismo. 82. Lutero. n de Londres. 283 corpus permixtum. como renascimento ou novo nascimento: Lutero. 75. 292. 188. 211. Constantinopla. 37. 322. 321-322 ceia do Senhor. graça. 310. Calvino. 209. 264 coram Deo> 61. 278-283. 342-344. 35. Lutero. Veja também cristologia da carne celestial. 42. 258. 314. Sessenta e Sete Artigos. Calcedônia. 189-190. 232. 322 coram hominibus. 310. 122. 210-211. 149-150 controvérsia da indulgência. 322 conhecimento prévio. Veja eucaristia Christus pro me. 105. Calvino.201-202.309- 310. 279-282. 43-45. glória de. mistério de: 310-311. Calvino. canto curialismo (curia Romana). 283 circuncisão e batismo.116-117. 186. 202. 71. hino à. 123. 66-67. 84. 155-156. 322. 21. 99 deificação (homo deificatus). 209. 232-233. 234-235. 236 creatio continuata. 172. 286. 143. 175. 314. 274. 81. 203-212. C alvino.122. Zuínglio. 287 Cisma. 174­ 175. 209-210. ministério. 40. três níveis de. 65 controvérsia da investidura. 229 catequeses. Calvino. 123-126. 221. Zuínglio. 229. 192. 291n97. 297. 322 communio sanctorum. 191-192. 222-234. 152-155. Menno. 202-203 Cristo: centralidade de: 11. 120. 121. 310. Hofmann. Menno. 152-153. providência de creatio ex nihilo: 44. 66-67. 320. luterana. Veja também liturgia. Veja também salvação. 272. 209-210. Lutero. 154. igreja e sociedade. 65. 270. 308. 224-225.245-246. e o mal. iv Laterano. 44-45. 88. 64. temor de. 28. 75. 69 deísmo. 181. Execrabilis. 278-279. Veja também controvérsia eucarística communicatio idiomatum. 308-310. 301. 212. 163. hinos. 232. Melanchthon. Zuínglio. 29. provas da existência: Aquino e Anselmo. Menno. 208. Lutero. potentia Dei absoluta. 78-79. 215. 273. 309. 322 Código de Justiniano. Summis desiderantis. 157 criação. 220. 238-243. 198-212. 218.322. communicatio idiomatum. 325. 121-126. 215-216. 275.223. 125. 84.208. 95. 307-309. Trindade Dez Conclusões de Berna. 296-298. 251. unidade de: 200-201. 302. liberdade de. 229. 272-275. Zuínglio. 309­ 310. 36-38. 243. Unam Sanctam. 34. 152. 163. ira de. 308. 152-153. Menno. Calvino. 215. amor a. Zuínglio. Constança. 205. 322. Éfeso. 235. vitória de: Calvino. 308. Veja também Cristo. oração. 236-237.245-246. 275. 152. 191-198. 199-200. 36-37. dos Apóstolos. providência de: 310-311. Nicéia. 37. 322 Concílios: 36. 81. 218-222. diferença básica entre Lutero e Zuínglio. 207-209. 310-311. 64. papistas. Calcedônia. ii de Orange. 220. 93. 232 Contra-Reforma. . 65s. 59. Cop. 83. 134. Zuínglio. e predestinação. Menno. 76. 317. 100-102.215-216. Menno. 292-293. 278-279. 291. Trento. 146. 247 camponeses. 201-202 credere est edere. Exsurge Domini. Belga. 97. Calvino. Schleitheim.138. Calvino. ódio de: Lutero. justiça de: 134. 263 conhecimento duplo de Deus (duplex cognitio Dei). 310. conhecimento prévio. 80. 322 culpa: 26. 205. 322 Christus victor. Lutero.221. 314-317. 215. 130. 218. 310. 47-48. 232. Lutero. como imaculado: anabatistas.219. 279-282. 203-204. 141-142. 312. 188. sofrimentos de: Calvino. 83. 310. 114 decretos papais: Dictatus Papae. 123. 200-203. 264. 190­ 1 9 1 . 118 Confissões de Santo Agostinho. Menno. 311. 147. 205 Deus: mudança básica na teologia escolástica: 44-45. 208. 229. 58. 242-243. Calvino. 311. 58. 69. 147. Menno. 50. 309-312.172. 188. como oração. Exiit qui seminat. 242. 232. Calvino. racionalistas evangélicos. 82. creatio ex nihilo. Anselmo. extra Calvinisticum cristologia da carne celestial. 121-124. 153. 289. 237-238. 273. 310. 178. 185. 93nl46. 316. 215-216. 295 Colóquio de M arburgo. reformada. 35.318. 293. 215-222. e eucaristia. 178. 322. 309.182s. Calvino. 213. 75. Lutero. Bíblia como guia. Grande Ocidental. 325. 163. 131. Veja também Deus. conhecimento de: 44-46. de Calcedônia. Zuínglio. 310. 159-160. 181. Zuínglio. Lutero (duas mãos de Deus). 189. 266-267 culto: 181. 293. 316. de Nicéia. 307. 286­ 287. e oração. 245-246. 181. 56. 200-201. Menno. 35. Calvino. 200-20. 34-36 D debate de Leipzig. Calvino. 282. 279. 318 calvinistas. 267. Zuínglio. 182.189-203. 220. 211. 257. vontade de: Calvino. Veja sistema penitencial Confissões: de Augsburgo. 231. 279. Lutero. 135 canto: 114. 166. 221. vitória de circuncelíões. potentia Dei ordinata. como mediador: Calvino. salmos. Escrituras. 305. 35 conversão. 254. 205-206. 31. como humano verdadeiro: 213 cristologia: 33. 322. 206. 71-72. 221. 117. Veja também reforma radical Estado. Zuínglio. Calvino. W ycliffe e Hus. 192. e fé. Ireneu. 83. 308 ética. 270. missa. 253-254. 223.130.290. Lutero. 301. 61-62. 170. 295-300. 1 7 4 . 195-196. 223-227. 25. Menno. 166. Zuínglio. 233-244. 272-276. 276-277. 165. 157. Calvino. 142-143. 220. 301. Calvino. 92-94. 312-313. 146. 81-83. 42-45. 257-258. 317-320. 46­ 48. 182s. 232. Menno. 92. Lutero. 232-233. Lutero. 200-201. 310. Menno. Menno. 274. e júbilo. Zuínglio. Wesley. 322 fatalismo. 124. 145-14. Veja também conhecimento prévio. 147. 165.227. 147. 147. 80-81. 47. 121. 83. hoc est corpus meum. Zuínglio. 231. 205. e lava-pés. 257. 243. 144-157. 84-86. 126-127. 305 dominicanos. Aquino. 154. 264-270. 308 fé: e oração. 48. 221. Veja igreja e Estado estóicos. 77 . pregação. 203-204 diáconos: Calvino. 39. Palavra viva: 311-312. 73. 272.237. 231. como ação de graças. 80-87. reformadores radicais. 66.137 doação de Constantino. Zuínglio. e a Eucaristia. Veja também oração. Calvino. 194.2 1 0 . 225. 275. 140. como testamento. 74-80.2 2 6 . 256­ 257. conceitos da: com extensão da encarnação. 249. Menno. 232. 153. 314. como compromisso. 272. 192-194. e a Palavra.219-222. 292. 223-224. ministério da Didaquê. temas.239. 159 espiritualidade: formas medievais de. culto eleição (predestinação): 306-308. 128-129. alegoria. pregação a partir das: 90-9. 283. 287. franciscanos espirituais (Terceira Era). Lutero. 93 expiação: 310.1 7 8 . 253. 270-271. 226-227. obras eucaristia: 315-317. Menno. 47. 38-39. e culto. Lombardo. em Zurique. 287. 86-87. 179. 270. 89-90. 91-92. 112-114. 219-222. Calvino. Agostinho. 240-241. 257-259. Zuínglio. 121. 85. 258. anabatistas. 124n54. 286­ 287. apenas para os eleitos: Calvino. Lutero. 298 dúvidas. 155-156. 290-291. 128-129. 131-132. 241. 278-282. 41n46. 165. 72. freqüência da. 196-197. 233s. anabatistas (literal). 48-49. M enno. Espírito Santo. 244. como sacrifício. transubstanciação evangelho: Lutero. inspiração das: 312. Calvino. 56.128. valdenses. 218. 78 extra Calvinisticum. 118-119. 310. 292. 316. teorias da: Anselmo e Calvino. liturgia. 289-292. 270. 224-225. 166. 281. culto espiritualistas. 117. 121. 270-278. 142-143. e a vida cristã: Calvino. sacramentos. Veja também igreja. 102­ 103. Lutero. 255-256. 123-126. 58-60. 124. 232.323. interpretação das: 83. 292-295. 290. de bebês. Aquino. Zuínglio. 66. 308. 193­ 197. 123. 144-158. 75. Zuínglio. Zuínglio. Veja também Cristo. Lutero. 49 docetismo. 70. 239. em Genebra. 116-117. 56-59. como sinal.231. 128-129. 147. implícita. 291 disciplina eclesiástica: anabatistas. 128. eucaristia. 310. reprovação encarnação: 306. 95. 131.283. como fiducia . disciplina ex opere operado. 224. 72. 154. 263 discipulado (. 154. 322 F facere quod in se est. cristocêntrica. 137-143. 316-317. 145-147. 309 E eclesiologia: 311-314. como dom. Calvino. 273-274. 139­ 140. 40-41 escolasticismo. 105. 205. 322-323. Zuínglio. 43. anabatistas. 116­ 1 1 8 . Veja também Bíblia. 231. 86-87. 154. 156-157. 258. 269. 322. Veja também batismo. Erasmo. 312. 75. Zuínglio. 260-261. 316. autoridade das: 312. Zuínglio. 154. 155. 142. 83. cristologia escatologia: 319-320. Primeira de Zurique. 46. 300-303. 120. 133 exclusão. papel fundamental das: 313. soia scriptura. Palavra de Deus esperança. 230. controvérsia.216-217. sacramentários. formada e informe. 142. crise da baixa Idade Média. 314. pessoal. 156-157. Menno. 254. 109. 128. 274. 38-39. Veja também credere est edere. 286. Lutero. 313. 89. 155-156. 301. Calvino. Lutero. presença corporal. como conhecimento. espiritualistas. 279. 262. Lutero. Menno. 311-314.139. 42. 105. 277. 222-230. Calvino. como memorial. 275-279. 83-84.282-295. 322 dogma. e eclesiologia. 191-199. 188. 127. 321. reformadores radicais. 84. 139 donatistas.293. 274-275. Lutero. 254. 83. Segunda de Zurique. 133. 233. 325 Escrituras: 166. 62n27. W ycliffeeH us. 78. 127. celebração medieval. 275. conceitos medievais. Lutero. 264. 154. 76. igreja. 145-158. 33. 237. 61-62. 26. 210. 292-295. 151. e soberania de Deus. Calvino. 144-157. 228-229. Veja também igreja e Estado. 266-267. como banquete matrimonial. 259. 314. 224-225.316­ 317 disputas: de Heidelberg. 88n l2 0 . Menno. 32. 2 8 7 -2 8 8 . autolegitimadoras: 128. 125. 290. 224. Zuínglio. 41-42. 217-218. Veja Disciplina excomunhão. 117. 290. Veja exclusão. 61. imagens das: Calvino. 30. Aquino. 238 Espírito Santo: c Escrituras. 43. 236. 33­ 42. 104. 236-238. 272. 147. 56. Lutero. 314-315. 41-42. Inácio.121. Lutero.3 0 1 . 61. 154. 22 3 . 63 . 216-217. 118. 312-313. espiritualistas. 272. 64- .222-229.307. 310. 101-102. 290-292. 225-226.Nachfolge). 269-270. 316-317.126-129. 121. 67. 265. 230-233. 270-273. duplapredestinação. Calvino. 245. Lutero. 193-199. 128. Calvino. 310. 87-98. 310-311. 314. 72. Menno. Lutero. 219­ 222. Lutero (gramático-histórica e comparativa). 141. 88-90. 126-127. disciplina. 150-153. 93. Anselmo. definições da: necessidade da. 87. 48-50. 112-113. 186-187. 133. 33.1 8 6 . Menno. 135 G Gelassenheit. 292-293. 91s. 276. e Calvino. 153. 161.176. 308. 310 governo civil. Veja igreja e Estado. 302-303. Zuínglio. 16. 140­ 143. nominalistas.300-301. magistrados. 290. 203. Bucer. 34-36. 4 1 . reforma.242­ 243. Zuínglio. 276. 47. 323. 66. valdenses. 234. 95-98. 141-142. Menno. 283-284. anabatistas. e Zuínglio. 25. Calvino. imagens vivas de Deus. visível e invisível: Agos_tinho. 237. 274. 191-192. marcas da: 292. 285 gentio. No índice onomástico. Pelágio. 247. 254 imagens: 118. Menno.319. quacres. sete posses da: Lutero 90-91. 287-288 hoc est corpus meum. 81. 112-113. 159-160. valdenses. piedoso: Zuínglio. Hus. 182. Calvino. Gemeente. Veja também reforma magisterial. 292. 284-285. 47 Grande Catedral de Zurique. Calvino. 28. místicos. Calvino. católica romana. 302-303. 197 incurvatus in se.247. 118-119. 318. 191. 95. 224 huguenotes. Calvino. 72. Lutero. 323. 89. 254 gratidão: Calvino. 1 8 1 -1 8 2 . 223.143. 39. 159-160. Zuínglio. 233-234. 88-89. 158 feitiçaria. 238. 136 imitação de Cristo. 201. Calvino. 2 2 n l9 franciscanos. 318. 233-234.289. 122. 242-244.2 4 0 . 259. 136. Lutero.223. 204. Veja também exclusão. 233. 111. 179. 310 gnosticismo. 124-125. corpus permixtum. 157. Agostinho. 75. 40-41. 1 3 9. 322. 236-239. 254-255. unidade da: 3 4 . 130. 322 irmãos suíços. 120. conciliarismo. Zuínglio. 73. ministério da: Bucer. Calvino. 38-41. 98-100. 90-92. Menno. 273. 40. Melquior Wolmar humildade. 225 julgamento. reforma radical Iluminismo. Petrarca. 129.230­ 231. 282. pecado humanismo: 18. 302. 72 filosofia. 212­ 213. 132-136. Eckhart. 79. 323. ordenanças eclesiásticas. 243.o Novo Testamento como base da: 313. 40. 184-185. 89-91. 32.7 1 . 13. 233-235.1 9 8 . Zuínglio. 269-271. Menno (e fruto). 255n7. 102. corpus christianum. 291. 323 Gemeine: 88. 89. 233. 88-91. Menno. Lutero. 68. Zuínglio. 76-77. 313. 41-42. 176. escolásticos. católica romana (duas espadas). 177. 44 franciscanos espirituais. hoje. 264s. 76-77 indulgências: 28. 160. eclesiologia. 236-237. 268.2 2 3 . Wycliffe. graça comum: 209. 105. disciplina. 238-242. Biel.236-237. 278. magistrados graça: Aquino.190. meios externos de: Calvino. 199. 99. 284-285. universal. Cornélio Hoen.2 1 2 . 143-144. 209. 111.74.119-120. 56. Lutero. 132. 282. 113. 150. 163 . Calvino.104-105.2 0 2 . 147-148. 269 jesuítas. 142-143. 94. 120. 307 igreja: modelos da baixa Idade Média para a. 146. Jacques Lefèvre d’ Etaples.282-283. 43 fiducia. veja Mathurin Cordier. 65. 155. 68.1 9 8 . Lutero. 152. 292. 300-301. Seelenabgrund.1 8 4 . 167. 217. 274. 151. No índice onomástico. Agostinho (duas cidades).1 4 5 . 99. 260-261. 70 J jansenianos. 143. 228-229. 119. restituição vs. 68. 97-102. 74-75. 51. 28 Fórmula da Concórdia. 271n48 fid es ex auditu. 89-90. 146. 323 inferno.127. 192. 43. Lutero (dois reinos). 318­ 319. 30-31. Lorenzo Valla. 44-45 imputação (de justiça).131. Zuínglio. 50. 169. 2 1 2 .4 2 . 234-244. 66.96­ 98. 49-50. 307-308. católica romana. 125.Calvino. também. humanistas. 36-39. Menno.2 0 1 . local de santificação.2 2 6 . 31. 143. 150-152.139. Menno. 323.1 0 5 -1 0 6 . 47-48. Veja tam bém liv re-arb ítrio. e Lutero. condição da: 51. 315 homo religiosus. Calvino. 322 fides quaerens intellectum. 159. 71. 289. 58 n l2 . communio sanctorum. 198. Lutero. 262. 119-120. 290. 159. 64. 25. 66. 68. 233-239. 300. veja João Hus huteritas. Lutero. 214-215. 6 8 . 96.170­ 172. 96.2 0 8 . 95-96. liberdade. 133. 72. Desidério Eramos. Eckhard. Lutero. 274. 38. 18. 282. 32n22. 226. Zuínglio. sola fide Federação Suíça. 284-285. Veja também justificação. 282. 292 hussitas. Zuínglio. 301-302.141. Calvino. 48 imortalidade. Wycliffe e Hus.2 3 2 . 223­ 224. 271n48 Institutas da Religião Cristã. 166. 244 humanidade: principal fim da: Calvino. 314 H heresia e hereges: 32. 276. 47. anabatistas. curialismo. 297 iustitia Dei.212-213. 79. 89. 33-42. 189-193. 303 I idolatria: 122. 176-179. 18nl0. M enno. 39. Zuínglio. definição moderna. 89. 1 8 . Gemeine igreja e relações com o Estado: padrão do Antigo Testamento. 46. Zuínglio. Lutero.275. 232­ 233 . 315. 260. 218. 260­ 261.135 . 146 Inquisição. 316-317. sacramental: Agostinho. 32. 194. 307-318 humanistas. 98. 213 flagelantes. 18.7 8 . 56. 201. 200. 272. 145-157. 261 ordenanças eclesiásticas. 302. Menno.208. feita visível nos sacramentos: 94. pelagianos. 105. 259. 279. 38. 60-61. Calvino.134-136. 233-234.. 170. 38. 272. 178. Zuínglio. 76. 292. 243s. 322. 166.2 8 2 . escatologia. teologia de: Deus. 64. 55. 167. 272. Vejatambémpai-nosso oracula Dei. 1Í4. 127 liberdade. 319 justificação (somente pela fé): 301. 293 N negotium cum Deo. 213. Calvino. 67. 104. 16. Trutfetter norma normans. 26. 143. 73. 7 1-7 2 . 289 misticismo. 87. 95-96. condição humana. 323 oração: Calvino. 192. 139 monofisitas. 322 martírio: 21. compreensão patrística. 204. 295-300. 45. 200. Veja também mercenários. obras. 318. 137-138. 288-289. literatura anabatista. 118. 81. 258. agostiniana (progressiva). 158s. 322 nestorianos. 290. 64-74. 246 morávios. Veja feitiçaria opera Dei. o ouvir da: Lutero. violência Lutero: vida de: 53-63. morte. 101. 79. 88. 81. feitiçaria. 242-243. 112. 74. 225. 25 luta armada. 206-209. 287. 103. 317. eclesiologia. 142. 30. 40. Calvino. 68.2 1 7 . 99 militia Christi. igreja e estado. predestinação. 46-48.7 5 . 279. 132. Menno. 58. 255-256. 135. 303. 262-263 oculto. 323. 133. 58. 89. 50. Veja também sistema penitencial meritum de condigno. 29-30 marcionitas. 111. 273. Menno. o agente ativo: Lutero. desenvolvimento de Lutero. viva. 56-58.156. 296. 6 4 . 278-279 Monumento à Reforma (Genebra). M enno. 68. 97-102. 298 mercenários: 111-112. 91-93. Menno. 67. 72. 157 livre-arbítrio: Lutero e Erasmo. Pelágio. 95.8 7 -9 8 .316-317. 157. . 134-135. cristologia. 75 lollardos.2 3 3 . 127-128. 97-98. 302 M enno. 307-308. sacerdócio dos crentes. 67. 64. veja Gabriel Biel. 165 luteranos.152-155. batismo. 29. 104. 256. 323 milênio. como julgamento. 5 5 . 7 0 . 86. 47. ansiedade pela. ceia do Senhor. 115. Menno. 260-261. 309­ 310. 306. 53. 166. 284. 281 Maria. 38. marcas da Notbischof. 196. 319 pai-nosso.127. franciscanos espirituais.142. como pastor. 302 lecionário. 182. 142. 283. 201-202 manuais confessionais.2 7 3 . 3 1 n l9 . 323. 268-269. virgem. Gregório de Rimini. 314. 67. 80-87. 314.juramentos. Calvino. problema do: 309. 310. 79. 32-33. Zuínglio. 104. 38. 98 Noventa e Cinco Teses. 182. 28 Münster.74-80. 275. 26. de Cristo. misticismo. 82 notae ecclesia. 262. como professor. 223. 255. 165. quatro regras da. depressões. 101-102. 59. 102-106. Guilherme de Occam. humana: e eleição. 29. Veja também humanismo. Erasmo. 152. 136 mal. 267-271. e Hus. e o batismo. Veja igreja missa. 55-58. 86. 26-28. 308. 85. 279-281. 130-131. 77 limbo. 277. 283 magistrados: 102. 189-190. Zuínglio. 62-63. 139. Menno. 228-229. Zuínglio. 318. anabatistas.6 9 . 184. 244. Veja também sola fide L lava-pés. 121. 140 ministério.2 7 5 . 21. 138 liturgia: 145. 136-137. 218. 307. baseada nos dogmas clássicos. 323-324 P pacifismo: 112. 178. 136. Hegel. 87. 53-63. 221-222. 323 ordenação. 99nl63. 292. 269-270 maniqueus. 284 obras: Lutero.2 6 1 . 159. 60. como teólogo. 169. No índice onomástico. Veja conversão nudi nudum Christum sequentes.174. 92-93. anabatistas. 287-288. 323 novo nascimento. 292. Júlio II. 66-68. pacifismo. 220. Menno. 96-98. 262-263. 314. 75 _ obras catequéticas: 178. 295-296 morte. 323 meritum de congruo. 272. 59. pregação. espiritualidade. 65. Lutero. 79-80. Menno menonitas (menistas). 105. Lutero. 2 1 . nominalismo. 92-94. 211-212. 67-68. 26. 217-218. 271. 300­ 303. escolásticos. 132. 77. recusa de. 57. e o s sacramentos: Menno. 132. 77. Thomas Bradwardine. 103-106. 51­ 56. 41 O obediência: a Deus.7 9 . 26.2 6 8 . 258-259. 308. 39. Veja também igreja. 318. 176. 73-74. 78-79. 279 nominalistas. aos governantes. influência. 292. 66-67. 240-241. 243-244.45. 256. 323 monasticismo: 4 2 . 298 Palavra de Deus: Calvino. 68. 70-71. 67-68. 145-147. Escrituras. Zuínglio. 222 pais da igreja. 65-66. 113. 176. 105. justificação. 227-229. Veja Simons. 85. 83. 94. 89nl26. 64-75. 126-128. 128. 152. Veja também luta armada méritos. 47.291n97. 101. 192. 41. 166 . 92-96. 178.6 7 . 91-92. 60-61. anabatistas. 238. ilusão de. 259. original: Agostinho. 257. papel das Escrituras. 28. 200 sacerdócio dos crentes: Lutero. 172. 103s. eficáciados: 45. 115-116. 201. 266. puritanos — John Bunyan. 263. Veja conversão reprovação. Baltasar Hubmaier. 138. João Calvino. Veja também espiritualidade poligamia. 238. 236­ 238. 285-286. 218. Veja também sistema penitencial peregrinos. 91-96. 19. Richard Hooker. 225. 77. 272 potentia D ei absoluta.3 1 . Gelásio i. Thomas Cartwright. 40-41. 182 S sabeíianos. 241. 148-149. 286. 86. 18. 166. Aquino. 138. Jacques Lefèvre d’Etaples. infalibilidade do. racionalistas evangélicos. Miguel Serveto. 33s. 240. William Perkins. 131-132. 258 sacramentários. 232. 179. 93-94. Zuínglio. 158 Renascença. 230­ 231. Veja eleição pregação: 275. 251-254. Martinho v. 12. como absolvição. 38-39 papas. Menno. Lutero. Veja Iluminismo renascido. 47. Calvino. 47.233. 324 pragas. 31 n l9 . 31-32. 166. mais do que as Escrituras: Lutero. 271. 269. 174-175. anabatistas. Gribaldi. Calvino. iniciativa religiosa. John à Lasco. Conrad Grebel. 324 reforma radical: 21. 211-212. 122. historiografia. 324 ressurreição: Lutero. 21-22. Wolfgang Capito. 41-42.2 2 3 . Menno. 296. 264. 37. 83. Savonarola.292. epred estinação. 265-268. 319. 30-31. 69-71. Thomas Müntzer.156-157. Andreas Bodenstein von Karlstadt. João Wycliffe. 305s. 89. 27-28. 44-45. 97 sacramentalistas holandeses. como busca pela igreja verdadeira. 176-177 presbíteros: Calvino. Lutero. Anselmo. 324 piedade: 46. 238-242. Wycliffe. 66. 285­ 292. Pierre Viret. Lutero. 26-27. 79. 39s. 151-152. Veja também igreja. Heinrich Bullinger. Zuínglio. Fausto Socino. 39. valdenses. Adam Pastor. fatores econômicos e sociais. 112-116. 67. 213-215. Jan Mathijs. Ulrich Zuínglio. 85. 295-302. 324 reformatio in capite et in membris. 213-214. 324 philosophia Christi. 57. 324 professores. 40. Lutero. Hans Hut. Veja também queda pelagianos. Zuínglio. 19-20. 67. Menno Simons. Menno. 42-43. João xxii. 298. 135. David Joris. católicos romanos: Pierre Caroli. 114s. Aquino. Menno. Zuínglio. 216. John Eck. 241-242. 80-81 reformadores. Lutero. 69-70. 230-231. 316-317.2 6 5 . Inácio Loyola. 16-23. Calvino. Hus. 254-255. 94. 284. pregadores. 165 providência. 159. 263 revolução constantiniana. 124-125. providência de purgatório. escolástico. 38. 69. John Robinson. Leão xin.142. magisteriais. Inocêncio ui. Pilgram Marpeck. John Knox.127-128. Calvino. 269. 32 Romanos. 49. 149-150. 55. pregação pecado: definição. 41-42. 36 relíquias: 28n l0 . 41n46. 307. 258-259. 323. Veja no índice onomástico os precursores: João Hus. . Hus. 233-235. 275 puritanos. 117-118. 138. Veja no índice onomástico: Bonifácio viii. 34-35. Epístola aos. radicais: George Blaurock. 30. Gentile. de bebês. Pio n. 324 potentia Dei ordinata. Martin Bucer. Ecolampádio. Kasper Schwenckfeld. Lutero. 243-244. 268 perseguição: 176-178. 240-241. Menno. 213. Veja também igreja. 44-45. 261-262. anglicanos — Thomas Cranmer. 226-227. 42. 139­ 1 4 0 . 98. Zuínglio. Veja também igreja. 42. 156. espiritualistas. 136. ministério da. 214. Philip Melanchthon. 276. Zuínglio. ministério da profecia (em Zurique). 165. 50. 88. fatores políticos. 255 predestinação. Jan Beuckels de Leyden. 20s. Lutero. Calvino.1 9 8 . 127-128 papado: 253. 55. 147. Menno. John Fabri. 258-259. 59-60. 66. 298 Q quacres. Zuínglio. 35. 253-254. Guy de Brès. Sebastian Franck. Dirk Philips. Felix Mantz. 158-159. 187. Guillaume Farel. 254. 254 Reforma: princípios formal e material da. 139. 41-42 perseverança: Calvino. 306. 21. Lutero. Girolamo Seripando reforma magisterial.136. 98. 316-317. 117. Veja também jides ex auditu pregadores: Lutero. Cardeal Jacopo Sadoleto. 247 perdão: auxílios para o. 90. 91-94. 96 queda: Calvino. 166. e o ministério. 84-86. 212-216. 105. 34n25 revolução copernicana. 190.147. 275. Calvino. 279. Menno (quatro níveisde). Gregório vil. 269. anabatistas. luteranos — Martinho Lutero. Calvino. 122. 158­ 159. 80. 114. Veja também pecado original R racionalisías evangélicos. 30 perfeição: Calvino.2 0 9 . Calvino. Silvestre i pastores: Calvino. Martin Micron. 324 sacramentos: 314-317. 279. 105. 311. 184-185. 1 9 0 . definida. Veja também reforma radical razão e revelação: 42-45. Jakob Hutter. 230. Inocêncio viii. supremacia do. 91-92 prensa tipográfica. ministério da protestante: termo usado pela primeira vez usado. 96-98. 37. 129. Pedro Valdo. anabatistas. 87-89. 288-289. 233. 181. 308. 22. e batismo. e a ceia do Senhor. 69-70. 39. 289. 2 2 1 n ll2 . reformados — Teodoro Beza. Obbe Philips. Veja Deus. Johannes Cochlaeus. 265­ 266. 310-311. como a Palavra visível: Lutero. 44-45. 133. humanidade.274. 120.286-287. 185-198. 198-201. dos monges. Veja também livrearbítrio. 117. 237. 106. 200. natural.270.141. 96-97. intercessão dos. 39.282-295. 105-106. obras. como pregador. 225. 275 tolerância: defesa da. 118. 282. sacramentos. 69. 75. teoria das duas fontes. 2 6 6 . 264. 267-268. 93. 25. 247. 120. 75. 213. Agostinho. 46. sacramental. 272-275. 262. 132. 121. 124n54 T teologia: correntes da baixa Idade Média. 261-262. Veja também humanismo. 82-83. Menno. conversão. 292-295. 166. 215. Menno. 88 via antiqua. Veja também teologia teologia histórica. 325. 260. 278. 278. 325 vida contemplativa. 310 significado. 42-50. Lutero. 302-303 simul iustus et peccator. 324 sistema penitencial: 49-50. 189. Menno. 143. 324 “semente da religião” . 68. Veja também manuais confessionais. 325 Spira. 201-203. 82. condição da. Dieta de. Espírito Santo. 198. 251. veneração dos. 324 Seelenabgrund (synteresis). 265-266. 272. 131. livre-arbítrio. 260. 93. 96. como deificação. 225. 218. Wycliffe. 166. 127. 287-288. 233. 190. 125. 154. 66. Inácio. espiritualidade. 273. 264-271. 215. 113. 66. 79. 312-313 . humana: e a vontade de Deus. justificação. Scotus. 81. experiência pessoal. 122. disciplina. 311-312. 93. 316. 116. 294-295. caída e escravizada (Lutero). 300-302.272-273. 111. 265-266. 306-320. 310. Hus. Veja também aflições. 292. 210-211. 132. Menno. 196-197. 319. 264­ 270. Veja também Cristo. 56. 70. salvação. 45. reformada. misticismo. 269. Lutero. 287. 255-256. arrependimento sofrimento: anabatistas. 254. autoridade das tradição reformada. ceiado Senhor. 264-265. 42 violência. 45. 76-78. 82.276. 119-136. 159­ 160. 59. Menno. 120n40. 201. 311. 295-300. 33-34. 131. 22-23. 258. 121. 72. 147-148. mística. 237. 165. 83. 253. 112. 53-63. 66­ 67. 199. 300. Veja também batismo. não nuda scriptura. Calvino. 273. 152. 21. 270-271. 223 Sermão da Montanha. teologia da reforma. 26. 91 Summa Theologica. valdenses. católico romano. valdenses. 325 viator. 83. intolerância dos reformadores. 325 via moderna. 43. martírio. 261-263. 258­ 261. 76. 267 santos: definição (Lutero). 325. 75. igreja. 266-268. 121 n42. como dom.9 5 . 301-302.287-288. 66. 62n26 Versammlung. 43. 33. 26. liberdade W Worms.2 6 0 . 286. 248 tradição: eEscrituras. 38. 258-260. 218. Aquino. 46-47. 144. 80-87. 66. 120. 115.2 9 2 . por méritos. 112-113. 21-22 teólogos: Calvino como. 33. escolasticismo teologia da Reforma: baseada em Cristo. Veja alma Terceira Era. 43. 223 solo Christo. Ireneu. 208-209. 126. 130. Menno. Lutero. 194.69. 65-66. 258. luterana. 172. transubstanciação Sacro Império Romano. 117. dogmática. 72-73 Sínodo de Dort. Agostinho.266. 159 teoria traducianista. 268. 290. 325 sola gratia. 180 salvação: e Trindade. 258-259. Zuínglio. 155. 300-302. tarefas da. 93-94. relevância contemporânea da. ordenação. dentro dos limites da revelação apenas.197. reação à ansiedade. 287-288. 209. 193. Zuínglio. 258-259. 265. 134 Sessenta e Sete Artigos. 2 7 3 . racionalistas evangélicos. 217. 313. mudanças de métodos. 28-30. 254. extensão dos dogmas clássicos. igreja. Zuínglio. 43. 292. 41-43 velle deum esse deum.283-284. 83. Menno: vida de: 256-263. Dieta de. 45. 217. 166. 265-268. 128­ 1 2 9 . 63. 231. 21-22.285­ 2 8 8 . 131.218. 139-140. obra de. 46-47. 25 8-259. 146-147. 295 successio jidelium. discipulado. 11-12. 31. batismo. Biel. Escrituras. teologia de: Deus. 41­ 42. 165 . 235.300-303. 275. 305-306. culpa. igreja e estado. 41-42. 46. 289.130-132. fé e fruto. 203-204 Simons. 166. 84-85.43. 234 transubstanciação. pecado. 265-266. 147-148. 82. 25 9 . 43-44. 260-261. 271.302.45-46. 198 V valdenses. 149. 176. 150-151. Bucer. Veja também luta armada vontade. 295-300. 201. 264-265. Zuínglio. como teólogo. 325 sola scriptura: 59. 154-157. Lutero. perdão.276. 73. 94. 158. Aquino. 68 Tiago. 274. 121. 219.291. 270-278. 307. 39. fé. 66. novo nascimento. influência. Lutero como. Lutero. Epístola de: Lutero. 82-83. 302. 284. Calvino. 289-292.314-315. Veja também eucaristia Trindade: 33. d e b e b ê s .139. 264-265. 66. não-resistência. 45. 270.276. 2 7 4. 278-283. Menno. 240. 120. 46-48. Zuínglio. 301. eucaristia. como recompensa (Pelágio). 68-69. 190. escatologia. perda de (ansiedade). Zuínglio. pregação. como sinais: Lutero. cristologia. como compromisso: Menno. 199.292-293. 259. Veja escatologia Theologia Germanica. 45. 71s. perseguição sola fide. 45. 280 tradições: agostiniana. Veja também Escrituras. 312 soli Deo gloria. 28 Schwãrmerdos. sola fid e santificação: Calvino. 251. 22. Elizabeth. pecado. 135. Pedro. 270. 56. Louis de. 118. 42-43. 99 Bouwen. 167 Bonifácio vm . 4 2 .133-136. 129-132. 220. 25 Dietrich de Niem. 115. eleição. 131 Eckhart. 109-119. 302 Bradwardine. Gérard e Jeanne. Thomas. 98. 125. 172 Colombo. 42. E Eck. 42-47. Imperador. 200 Augusto. 124. 308 Ailly. Cornelius. Mathurin. Í59. 149. 298 Alberto M agno. 134. 43. Jerônimo. 323 Ecolampádio. cristologia. 270. 21 Carlos v Carlos viu Caroli.5 3 . 27-28. Scotus. 22. 171 César. 182n35 Crisóstomo. 323 Budé. como pastor. 290. Eustache. 112-116. 288-289 Duns. 70-71.4 3 -4 4 . Wolfgang. 156-157. 258. 251. 16 Coligny. 271 Cranmer. 98. 198 Cartwright. 22. 112-113. 127. 53. como capelão.140-144. Sigismundo. 57. 133. 27. 31 Cordier. 201. 256-257. 213. 182 Caracciolo. 314. 265 Brugge.175. 136. 233. 272 Bruggbach. 233 Eduardo vi. Jan. Almirante d e . como pregador. ceia do Senhor. 213 Bure. 298 A gostinhodeH ipona. 137-144. 21 Cauvin. 235nl26 .5 0 .188. 184. 121. 127. John. 231. Veja Scotus. culto. 121.2 6 8 . 31 Condé. 46. Veja Jan de Leyden Beza. teologia de: Deus. 313-320. 123-126. 81. 323 Bolsec. 16-18. 119-136. 123-124. Idelettede. 70. 231. 47-48. 274. Tomás de. 186 Atanásio. 188. Madame de. 34n25. 140. 46. morte. Espírito Santo. 63. Thomas. Escrituras. espiritualidade. 175 Copérnico. 72n61 Beuckel. 183 Agostinho. 284.143. 75 Anastácio. 259. Guy de. 281 Arminius. 308-310. 122. 179. 322 Aertez de Man. Thomas. 128. 16.158-160. 113. 34. 170. 22. 158­ 159. 292. 87. 273 Cochiaeus. 188 B Bernardo de Claraval. 210 Bullinger. 200. 168. 172. 191. 126-129. eescolasticismo. 37 Dirks.159. 116-117. Papa. 152-155. 157. John. família de. 43. 125. 154. 163-249. 131. 119. Teodoro. 35 De La Forge. 130-132. 72n61. 219-221 Aquino. 2 6 2 . Vejatambém humanismo. 178. 83. 238. 59. 270. 317 índice Onomástico A Abelardo. 165 Cipriano. Galaezzo. 72n61 D Dante. 183-184 Cauvin. 231 Brès. Johann van. 219nl08. 149. 75. 142-143. l l l n 7 . 231. Etienne. 103. 231. 136. 43. justificação. 183. 202. 76. 41 Cop. 33. igrejae Estado. 144-158. 138. 321­ 325 Capito. Antoine e Marie. batismo. 125. Júlio. 199 Aristóteles. Johannes. 40. 256. 281. Pierre d \ 37. 134. 139-140. 183 C Calvino. 183-184 Calvino. 169 Deschamps. 128-129. 99 Anselmo da Cantuária. obras. 259 Bunyan. l l l s . como teólogo. 188. 99. Leonard.244 Coiladon.273. 89. 128. 141. 119. ministério. 43 Alexandre de Hales. 34. 301. 134. João. Veja David Joris Bucer. 121-126. 121. 46. 144 Boaventura. 325 Ário.123. emisticismo. Hans. 244 Constantino. Nicholas. 47. sacramentos. 65-66.2 6 4 . Pierre. 34n25. 60. Frei. 50.z Zuínglío: vida de. 169-170 Comélio. Meister. Martin. 144. 127. 310. o anabatista. igreja. Ambrósio. 246 Blaurer. fé.318. 184n42. Jacobus. 215. 22. 140. 120. Heinrich. 262. 35. 141. 287. 122. 292. 114. 34. 118. 81 Hochstraten. 264-265. 199 Gwalter. Arquiduque da Áustria. 37. 172. o Sábio. 258 G Galileu. 301 Martinho v. 47. 259. Andreas Bodenstein von. 246 Ferdinando. 306 Menno Simons. Barbara. 149s Foxe. 13 Mathijs. 267-269. 89. Gellins. 32-34. Jean.Elizabete 1. 178-181. 257 Gregório v ii . 279 Frederico. 182. 134 Micônio. 296 Filipe. 32 J Jan de Leyden. 93. Hans. 31 Mantz.28.26.206. 257. 139 Júlio li. 21 . 18. 35. 149. 44 Le Fèrre d ’Etaples. 277 Jerônimo. 158 M icron.2 3 4 . 124 Luis de Paramo. 22. 33s. 140. 215. 22 Lombardo.170. 159 Erasmo. 50. 275. 99 Gregorio de Rimini. Jacob. 270. 1 1 9 -1 2 0 . Regente dos Países Baixos. 165 Hilário. 99 Gentílio. 46. 102-103 Joris. 298 Maquiavel. Martinho. John.1 3 5 .2 9 2 . 85. Sicke. 261. Pilgram. Ludwig. 20 Gerson. Jacques. 43. Martin. Papa. 256. John à. 79 Loiola. 258 Hofmann. 116. Desidério. 149 João de Batenburg. 127 Joana d'A rc. 35. 263. 296 Hutter.315-319. 165-166. 53-107. 73 Hoen. 196. Jan. 111. 285 Fabri.3 0 0 -3 0 1 . Duque da Saxônia. 159-160.2 3 1 . 77. 183-184 Henrique v i i . 301 Hus. Papa. 44.140. 256. 263. 38. 141nl03 Lang. 178.2 4 6 . João. Jakob. Inácio. 298 Googe. 255. 263. 188. 263 . 254. 76 Leão xiii. Guillaume. 70 Lasco. 208. 297. Sebastian. 121. 15. 295 I Inácio. Papa. 150-157. Thomas de. Leão. 158 João xxii. 116-117. 58 n l2 . Gerold. 188. 150. 22. 215-216. 255-256. 65 Inocêncio hi . Rudolph. 106.1 2 4 -1 2 5 . 287 Hooker. Felix. Papa. 2 8 7 . 312. 274. 20-22. 301 Heloise. 15. 2 2 3 -2 2 5 . 176-177. 263. 178. 136 Maria. 102. 279 Leão x. 73 George de Brandenburg. 11. 40s. 40. 117. Cornélio. 37 Mather.3 08s.3 0 5 . 192 Franck. 31 Gelásio I. 39. 57. 254-255. 261 Marpeck.2 3 6 . 30. Papa. 15nl Filipe de Hesse. 18. John.276. 296 F Faber.149. 111. Burnaby. 99 Inocêncio v iii . 183-185. 199 George. 305.16-18.2 5 1 . 66 Ireneu. 277-278. 262 Francisco de Assis.198. 188 Gribaldi. 22 Hubmaier. 35.321325 M Magellan. 46. 46. 322 Goldschmidt. 144-149. Ottilia. 48-50. 119-120. 47 Kepler. Anneken. 298 Francisco I .277 Jans. 253. 89. Conrad. 172. 313 Jud. 37. 235nl26.1 3 2 -1 3 3 . 148-149 Kempis. 47 João da Saxonia. 32n21 Lutero.256­ 258. 256. 137. 2 8 n l0 Freerks. 165 Henrique vin.2 3 7 . 323-324 Eusébio de Cesaréia. 125-126.311. Johannes. Papa. 18. 273. 272-273.1 2 3 . Richard. Justus. 165-166. Philip. 27 Joaquim de Fiore. Thomas. 93. 172 Lênin. Cotton. 182-184. 231 Grey. 42. 28. 109. 112.259. 284. 105. 159 H Haetzer. Lady Jane.279-281. 174­ 176. 167-168 L Lambert. 109. 22. 287. 50. 98. Veja Simons Meyer. 276 Melanchthon.1 3 0 . 281 Montaigne. M elquior. 276 João de Capistrano. 159 Hut.1 4 1 .16. 303. 81. família de. Pedro. 260. 31 Knox. 165 K Kalstadt. 183-184 Lutero. 92. 73. Franz. 141. Papa.2 5 3 . 103. John. Papa. 145 Grebel. 44. 40 Jonas.268. 272-273. 72n61 Hobbes. 56 Lisskirchen. 203. 114-115. 176-179. Baltasar. 137-138. David. 130 Farei. 230.44 Tertuliano. 80 Sturm. 41. 165-166. Robert. 56-57. 171 Wycliffe. Janneken. 301 Phillips. 44-45. 59nl4 V Valdo. Sir Thomas. 310. 213 Perkins. 168 M oore. 201. 21. Fausto. 199-200. família de Menno. 188 Ricardo de Paris. Duns. 270-271. William. U lrich. Duque de. Swaen. John. Johannes. Thomas. 178. 290. 41 Simons. 89 Wyttenbach. 98.231. 104 V oltaire. 210 T Tauler. 292. 259 Socino. 76. 41 Valentino. 89 Pedro de Blois. 279 Valla. 32 Sigismundo. Thomas. 47. Guilherme de. 33. 261. família. 255 N Nelli. Lorenzo. 167.264. 289 Whitefield. 36. Obbe. 310-311. 319 Roure. 16 Rutgers. 263. 183.2 3 7 . 166. Papa. 59. 182 Savonarola. 273-274. 22 Serveto. 21-22.3 0 7 -3 0 8 . Pedro. Pedro. 139. 31 Viret. 175. 286. 2 3 3 . 49 Vallière. 318 Weynken. 279 Scotus. 233 Wolmar. 292. 50. 38-39. 322 Simons. Menno.172. 284 Seripando. 269. 231 Petrarca. Pietro.214-215. Duquesa (de Ferrara). 75. 279.5 0 .4 8 . 203. 261-262 Simons. 172 OIíví. Stephan. 322 Platão. VaIérand. 295. George. 257.2 4 6 . Papa. 16 Renée. Miguel de. 300. 181 Suso. 295 Schwenckfeld. Dirk. 273 Paulo in. Heinrich. 298 Schiemer. 22 Sócrates. John. 72n61. George. Melquior.24I R Rauscher.182. 121 Z Zuinglio. 325 Sêneca. Pierre. 128. 56 Robinson. 201 Platter. 42. 247. 276. Peter John. 299 M üntzer. 94. 166. 177 Poullain. 247. 324-325 . 315-319. 188. 84 Olivétan. 68 Templer. Kasper. 258-259. Papa. 12.40 Origenes. 47. 65-67. 190-191 Trutfetter. 294 S Sadoleto. 67. Jean.16. 50s. 254. 235nl26 Virgílio. 155. João. 30 Mundstdorp. 254. 282. 109-161.Montmor. 294 Shakespeare. Jacob de. Condessa de. Leonhard.2 5 1 -3 0 4 . Jerönimo. 271n48 Rousseau. 67. 313. 297 Wesley. Imperador. 37 Silvestre I. 27 Robespierre.4 2 . 44. 198. 22. 270 Overdan. 187. 47 P Panormitano. 50. 125s Somerset. 315 W W agner. 231 O Occam. 318. 256 Teseu. Hans van. 23 Pelágio. 261. Johann von. Adam. 312.9 8 . 36n30 Pastor. 169 Vespúcio. 321 Phillips. 224. 317. 2 2 . 171 Seninghen. 284. 235nl26 Staupitz. John. 233.16-18. 308. Thomas. 276-277 Pio II. Cardeal Jacopo. Girolamo. 115 Hall. 53.. 238.. 144.. 119 Haile. 195 Gestrich. 224. 20. 147 Davis.. Raymond. 85. 165 Battles. 194 Bizer. 89. Alvin J. Heinrich. Jan A . 26. 277. W. 257 Bornkamm. Philip N . 304 Gerrish. D. 74. 98 Elton. 240 Garside. J. 17. 94 Bouswsma... 106. 305 Baird. 304 F Farner. 184 Höpfl. J. 300.. P. 229 Beachy. 144 C Cadier. 27 Hall. 191 Dyck. Alexander. Lorde. Heinrich. 87. Giles.. 106 Altizer. 83 Douglass. Willem. 264-265 Bloch.. 20. 106 Eiert. Fritz. 156. Jerry H . 251 Barth. 314 Barth. 36 Grisar. 161 Febvre. 304 Huizinga. 302. 300 Holl. Peter. 257 Brunner. 38. 46 Friedmann. M . 22. 15 D Daniélou. 191. Bengt.... E. 188 Bornhauser. 31 Gelder. J. 51 Cohn. 59. 248. 51 .. 203. 221-222. 83. 70 Blakney. L. 166. 29. Harold S. Eric W .. 17 Althaus. Norman. David. Ulrich.. J. 310. 15-16 Hendrix. 26. 249 Braght. 120 Ginzburg. Roland. Klaus. 264 De Molen. 84. R. 47 Blanke. 234 B Bainton. 104.. Jean. Adolph von. 96. 289. 270 Bebb.. 107. 33 Ferguson. 161 Ganoczy. 63. 255 Granfield.. 303 Boehmer. 30. John P . 137.. Thieleman J. 28 Balke. Basil. 298 Aulén. 253 Cranz. 218. 304 Furcha. R. Friedrich. Irvin B. Max. Karl. A. 304 Brandsma. 256 Dickens.. 264 Goertz. 115. W. 18. 166. A. Hans. 121. 106. J. Heinrich. William. 237. 18 George. 109 Bonnet. 174. Jane Dempsey. 118. 89. 212 Campbell. 301. 236. 57. 56. D.. 87. Christof. William R. C. 161 G Gabler. 189. 257.. 180. John. Henry. Christoph. 268. 248 Harnack. 301 Bentley. Alexandre. 27. Johan. 121. John. 56. 304 E Ebeling. 104. A. Ernst. 16. 134 Denifle. 111. 60. G.* índice de Autores Modernos A Acton. Robert. 34. Carlo. W erner. 28-30 Dorner. 20 Estep. Mark U . Paul. Harro.. 106 H Hägglund. 253 Engels. van. H. 68. 248. Jules. 85. Myron S.. William J. J. Peter. 288. 106. 175. 51 Berkouwer. 20 Buhler.. G . 182 Cairns... 16 Gritsch. Emile. 98. Jacques. Charles. 230 Godfrey. 85. Robert.. 16 Deppermann. Patrick. L. 103. J. G. Kenneth R. 28 Constable. A.. A. 61 Avis. 20 Bender. Timothy. Charles. G . Hans-Jürgen. Emil. 161 Geffken. H. 99 Cunningham. Enno van. 106 Edwards. 165 Doberstein. 21. Richard. 19. 30 Dickens. Johannes. H . 131 Cargill-Thompson. Brian A . Gerhard. 240 Crahay.. Hartman. Gustav. Ernst. 248 Doumergue. 41 Courvoisier. Scott. Charles. Ford L. 59. Edward. Karl. 112. 270. 163-165. E.. 18. 84. 246. Oscar. 307 Augsburger. 168 Dowey. 251. Roland H . Lucien. 239 Horst. 22. K. 107 Hillerbrand. Georg Wilhelm Friedrich. 298. Thomas.. 111. Jean. 161. 305 Hegel. 195 Göbel. 151 Hale. 91 Dolan. J. 19 Shepherd. 20. 95 Petry. 129.... 241 I Irvine. E. 51. 101. 179. 246 N Newton.. Victor A . Elsie. J. 181. Lewis W . John H . 28. 65 Nuttall. 78. 103 Seeberg. 101. 51 Pfeilschifter. 129. 17 Stauffer. J. 45. 55 Lortz. 99. 30.. Henry. 32 Moeller. 50. 209 Stayer. 242. Francis. 40 Rich. 79. William E. John. 155 Stickelberger. 161 Powicke. F. 65 Leclercq. Jack. Walter. Arthur. 107 Midelfort. 20. Jr. 63 Köhler. V. 120 Potter. A . 315. John T . Joseph. 99. 99 Tillich.. Theodore G . 107. 113. Jean. Jaroslav. J. 246. I l l . Jean.. 46. 73. 321 Oosterbaan. H. 26. 73. Orley.42. I l l . 68. 77. Walther. 12 Rupp. 207 K Keeney. 20 Preus. 144. 102. Wilhelm. 232 Nietzsche. 40. James Samuel. 111 Rogers. 111. Friedrich. 131. 295 O Oakley. G. 120 Todd.. 187. 29 S Scaliger. Frank. Fritz. Heiko A. Hans. 53 Spinka. M . Harry. 27 M McDonnell.. 27. 88. 16-17 Rauschenbusch. 107 Spengler. 83. 62. Ernest B.. 80. John M . 144. 157. Rudolf. Ray C . 115. 51.. L. H.. 39 Spitz. Walter. 222. 28. John S. 48. 29. 22. 96. 38. H. C. 115.. 167 . John R. Kyle C . A. Philip. Suzanne. 289. 34. 125 Pipkin. 128... John. F. Ian D.. E. 17-18 P Parker. 67. 320 Loeschen. L. 113. 29 Selinger. 26. Wayne. 249 Sessions. 19. 207. E. 99 Locher. 249 Rilliet. 257. M . 318 Reeves. Mark C . 156.. Amadeo. Gottfried W . Thomas.. A.. 83. Leopold van. 316 Leonard. Marjorie. 114 Richard.. A. 28. 184.. 248 McNeill. 83.. 248 McKim. 77 Siggins. 118. 167 Pfister. Reinhold. 249 Partes. 124. Gordon. 107 R Ranke. 137 Schweizer. 38 Klassen. 104. Erik. 136. 195 Rouse. 254. 45 Leith. 132. 258. 32. 18 Norris. G. G . 134. 45 Koenker.Hunter. 114. 271. 304 Kiing. 231 Schwiebert. 59. 195.. 77. 124. 176 Swartzentruber.. 168. 159. 33 Lienhard. R. Brian. 304 Kierkegaard. W. 145 Taylor. 107. 115. 166-167 Lerner.. K. 254 Knowles.. David C . 57. 313. Linwood. Matthew.. Jan M . 51 Oberman. 270 Oyer. J9. 117 Molvar.. 40. 267. 159 Lochman. 195. 144 Stephens. 161 Stephenson. 144. 37. 38 Troeltsch.. Robert.. 149. 144. Lucien J.. 134 T Tappert. 20. Alexander. 104.. 55. A. 248 McSorley. Richard. 20 Pastor. T. 50. 304 Steinmetz. 39. 42. 77 . Bernd. Donald K. Robert E. 121.. 51. 273 Pollet. 144 Kolfhaus. David. Marc. 168. 187. 144. Joseph. 48.. 281. 36 Pauck. 304 Lohse. Steven E. Emanuel. John. 72 L Lawson. 88 Pelikan. 157. Ernst. 158. 160 Poettcker. 30. 42 Leff. Richard.. 218. 31. Alexander. Bernhard. 177. John R. 41 Monter. Gordon. 209 U Urban. 181. 95 Ozment. 311 Schmidt-CIausing. G . M .. 47. 16. Oswald. 248 McKee. 186 Schaff. 80. 249 Shofner. 65. 22. Wilhelm. James M . 120. Paul. 107 Rymer.. 307 Tierney. 73. Kiiian. 222. Check L.. 277. 248. 222 Krahn. A. 61. Cornelius. 35.. Charles. 11. 32. 36. Michael. 84 Seidlmeyer. P . William. Robert C . J. 134. E. 55 Zschabitz. François. Gerhard. 222 Walton. 27 Whitehead. 42. 289 Whale. 107 Williams. 284. Walt. 62. 293. 253. 137.. 195 Z Zeeden. 107 Wendel. 291 Wood. John C . 279. 249 W Wallace. Lynn T. Philip S. A.. 83. 297.. Jared.V Van Buren. 61 White. 304. 104 Wicks. 218. 220. 202. Ernst Walter. 281. 91 Woodbridge. Skevington. 255. 261.. Alfred North.. 249 Wenger. 277. 161 Watson. S. 98. Ronald S . John. 66. 20 . George H . 249 Wolkan. 324 Willis.. 214. 109 Whitman. David. 76. 83. Rudolk. Paul. 285.. Documents Similar To Teologia Dos Reformadores - Timothy GeorgeSkip carouselcarousel previouscarousel nextFUNDAMENTOS DA TEOLOGIA DO ANTIGO TESTAMENTO COM THOMAS TRONCO.pdfRaízes Da Teologia ContemporâneaAlan Richardson - Apologética CristãComentário Mac Arthur Mateus Ate LucasEspiritualidade reformada.pdfTreinamento Dos Doze - a.b BruceRomanos D. Martyn Loyd-Jones ORIGINALUma Historia Do Pensamento Cristao - Vol. 2 - De Agostinho às vésperas da Reforma.pdfA Mensagem Do Novo Testamento Mark DeverAs Festas Judaicas Do Antigo Testamento - Dr. Grady SHannon McmurtryAutoridade e Poder - Russel SheddR. C. Sproul - Sola ScripturaFundamentos da Graça - Steven J. Lawson.pdfA. W. Pink - Outro Evangelho (PES)+Mapas, Gráficos, Cronologias e IlustraçõesUma Historia Do Pensamento Cristao-V-1 Justo-GonzalezO Pregador - Sua Vida e Obra - John Henry JowettIntroducao a Teologia - Justo-GonzalezPaul Tillich - História do Pensamento Cristão.Erwin W. Lutzer - A Serpente do Paraíso224711563 John Lafayette Girardeau Calvinismo e Arminianismo EvangelicoSantos No Mundo - Os Puritanos Como Realmente Eram de Leland RykenAtos - Série Estudos Bíblicos John Macarthur...Gênesis 1 e 2Do Shabbath Para o Dia Do Senhor D.a. CarsonCompreendendo as Escrituras - UnaspressResenha-_Cuidado_Pastoral_em_tempos_de_insegurança.pdfATLAS VIDA NOVA da Bíblia e da História do Cristianismo - Angus Hudson.epubIntrodução à Teologia Sistemática - Millard J. EricksonFundamentos Da Teologia Do Novo TestamentoMore From Oseias CostaSkip carouselcarousel previouscarousel nextModelo de Planejamento de EventosCanções Para a CantataCade Os LevitasA Arca Da Alianca e o CristaoProjeto Cantata de Natal 12 PatrocinadoresAs Grandes Doutrinas da Bíblia - Raimundo de OliveiraTipologiaA Historia Dos Hebreus - Flavio Josefo507571 Como Melhorar a Escola DominicalCOMENTÁRIO BÍBLICO ATRAVÉS DA BÍBLIA GÊNESIS - Itamir Neves de SouzaA Raza_o Para Crer - R.C.sproULGênesis (Moody)Anthony Hoekema - A Bíblia e o FuturoCharles H. Spurgeon - EleiçãoJuramento Dos Soldados de CristoArte InfluenciarTratamento da DepressãoABRAÃO - MISS.O - Lição 554-Estudo Panormico Da Biblia - o Livro de EsdrasA Vida Do Apostolo PauloCarta-modelo-portabilidadeMarias_Janaina_AzevedoEstudo Do Novo Test Amen To- Teatro EvangélicoA Igreja passará pela Grande TribulaçãocronologiageoadministrativasFooter MenuBack To TopAboutAbout ScribdPressOur blogJoin our team!Contact UsJoin todayInvite FriendsGiftsLegalTermsPrivacyCopyrightSupportHelp / FAQAccessibilityPurchase helpAdChoicesPublishersSocial MediaCopyright © 2018 Scribd Inc. .Browse Books.Site Directory.Site Language: English中文EspañolالعربيةPortuguês日本語DeutschFrançaisTurkceРусский языкTiếng việtJęzyk polskiBahasa indonesiaSign up to vote on this titleUsefulNot usefulYou're Reading a Free PreviewDownloadClose DialogAre you sure?This action might not be possible to undo. Are you sure you want to continue?CANCELOK
Copyright © 2024 DOKUMEN.SITE Inc.