SÓCRATES E O MÉTODO MAIÊUTICO TADA, Elton V. S.(
[email protected])- Cesumari CAZAVECHIA, William R. (
[email protected]) - Cesumarii Resumo Sócrates, antigo filósofo grego, mesmo sem nada escrever, nos deixou um interessante legado filosófico. Mediante a pesquisa bibliográfica e leitura de textos da obra platônica (Teeteto) procuramos estabelecer o que Sócrates chamou de Maiêutica. Podemos datar a vida de Sócrates de 470 a.C. à 399 a.C., período no qual se deram diversas mudanças no seu modo de pensar e a construção de sua filosofia. Será no final de sua vida que focaremos nosso trabalho. Visto sem novas perspectivas de pensamento afirmativo, Sócrates mostra sua nova fase, que tem como finalidade o “parir do saber”, a maiêutica, ou a arte da velha parteira. Sócrates narra a Teeteto que as velhas parteiras que um dia engendraram, foram ativas na sua juventude e capazes de parir. Quando velhas, a única coisa que a mulher pode fazer é ajudar outras que, estando ainda jovens, podem engendrar. Sócrates se considera um parteiro, no entanto, não alguém que fizesse o parto do corpo, mas sim da alma. Podemos perceber nesse momento, que Sócrates cria um método de ensino, o qual se dá de forma a buscar retirar da própria pessoa que está aprendendo, a resposta para seus questionamentos. Dessa forma, o antigo filósofo não ensina como fruto de exaustiva pesquisa e trabalho. Antes, ele mesmo não transmite conhecimento, e sim gera o mesmo. Sócrates não se posiciona diante seus discípulos como o detentor do conhecimento, mas como um facilitador que proporcionava a eles alcançar o conhecimento que, segundo ele, já estava no seu interior. Portanto, vemos na maiêutica socrática um método de ensino no qual o educador não é visto como a “fonte” a ser bebida pelo aluno, pelo contrário, ele é aquele que ajuda o aluno a gerar sua autonomia enquanto homem, cidadão e discente. Palavras-chaves: Sócrates – Maiêutica – Método Pedagógico objetivamos entender a maiêutica socrática como exemplo de educação e de relacionamento entre educador e aluno. lendo a filosofia socrática de modo descontextualizada. a base para a dialética socrática. A vida de Sócrates Podemos datar a vida de Sócrates de 470 a. p. período conhecido como o século de “ouro” na cidade de Atenas (VICENTINO. não estamos. o método de ensino que Sócrates se utilizava. e o desenvolvimento de suas idéias se dá de modo contínuo. Além disso. p.C. 2002. De fato. como encontros e desencontros. que ajuda com que as idéias concernentes aos aluno venham à tona. Podemos compreender nesse momento de democracia ateniense. o que fez com que Sócrates e sua dialética estivessem bem localizados (CHAUÍ. e muito ligado com fatos da vida do filósofo. que geram a diferenciação e desenvolvimento das teorias que o tornaram respeitado. um intermediário. Para entendermos a maiêutica socrática. para que não façamos. se torna essencial conhecermos sua vida. a 399 a. justamente nesse período deu-se a valorização do diálogo. Sócrates passa por diversas mudanças em sua vida. já no final de sua vida. uma leitura incorreta do mesmo. desde sua juventude até sua morte. chega a conclusão que ele não deve ser mais que facilitador. foi justamente nesse período que surgiram os grandes oradores e a exaltação da retórica. e. pois sabemos qual era seu contexto histórico e como se configurava esse processo pedagógico narrado nesse trabalho. 2001. é estritamente necessário que saibamos um pouco sobre sua história. Entretanto. Ele valoriza o aluno e sua capacidade. Sócrates. ou seja. pois. Ao fazermos isso. da opinião do outro. que não é de modo algum simples. há muito que se cuidar nesse processo. . fato tal que faz muito sentido com relação a como se deu a vida desse grande filósofo. no entanto. desprevenidamente. e que será melhor detalhado posteriormente.C. por respeitar a dignidade e capacidade do ser humano.. não o faz por conhecer o potencial de seus seguidores.57).). de modo precipitado. por isso. antes. ou seja.136 ss. a teoria maiêutica de Sócrates é como que um resultado das diversas experiências que ele viveu.2443 Introdução Através dessa pesquisa. p. foi o maior apologéta de Sócrates. podemos citar sua brilhante participação nas campanhas bélicas atenienses.. e representou Sócrates na sua obra “as nuvens” que data de 423 a. Segundo Benoit (2006. Platão. Aristófanes. De fato. De Xenofonte podemos extrair um Sócrates histórico e bom. nunca aceitou dinheiro de seus seguidores e admiradores e era extremamente simples quanto ao viver e vestir. Xenofonte e Platão. e trata. Andava pelas ruas de Atenas descalço. nas quais ele ficou muito conhecido por sua destreza e lealdade. p. Finalmente podemos ver como foi a visão platônica de Sócrates. mas posteriormente foi casado também com Mirto. nem com intenções sarcásticas. comicamente. p. Quanto a isso. inicialmente. 2006. Menexeno e Sofronisco. e assim se manteve durante toda sua vida. tanto no frio quanto no calor (BENOIT. p. pois é nele que podemos ver os relatos mais fiéis sobre o antigo filósofo (BENOIT. Platão considerava Sócrates como sendo o homem mais justo que ele conhecera.178). 2002. Todavia.c. Ele escreveu muito sobre Sócrates. como fez Aristófanes. Como prova disso. como fez platão. Antes se resguardava a contar histórias sobre Sócrates. considerar Sócrates pela visão de Aristófanes é como conhecer sua história através daqueles que o condenaram à morte. a saber. é a partir de Platão que chegaremos ao nosso conceito de Sócrates.183). Através de Xenofonte podemos conhecer um Sócrates totalmente diferente. Por isso. para nós é de complicado teor a análise de Sócrates pela ausência de obras de sua autoria. 2006. 32). e ressaltava a integridade de sua vida como cidadão e sua moral exemplar. Portanto. Aristófanes era escritor de comédia. mesmo com suas severas queixas quanto às leis que regiam a democracia ateniense. Sócrates teve três filhos. p. Dos 29 diálogos de Platão 27 falam de Sócrates e em quase todos ele é o personagem condutor da discussão.21). Lamprocles.c. Como logo se percebe. sem dúvidas. a saber. 2002. e o faz de maneira simples. Inicialmente foi casado com a indócil Xantipa.. de Sócrates como um falso sábio seguido por muitos. o teor da narração de Aristófanes é semelhante às acusações daqueles que julgavam a Sócrates em 399 a. com boas ações e bons ideais.22) Sócrates foi um cidadão exemplar. a validade do estudo de Sócrates. e isso se comprova no diálogo Fédon no qual ele se despede de suas “mulheres” (gunaikas) (CHAUÍ. devemos a três personagens. Sócrates nada escreveu. sem entrar em pormenores quanto às teorias Socráticas. Xenofonte narra isso em vários de seus trabalhos. . Xenofonte não acompanhou os últimos dias de Sócrates e por isso fica uma lacuna importante em sua obra (CHAUÍ. Primeiramente Xenofonte foi discípulo e admirador de Sócrates e não escrevia nem com intenções filosóficas.2444 Sócrates teve berço pobre. O que acontecia era que nenhum outro homem sabia verdadeiramente de algo. havia perguntado a Pythia (Pu[tia. as revelações délficas tiraram Sócrates do porão silencioso que Parmênides havia o condenado. cujo. A princípio. 131b-131e. Somente mais tarde durante a narração da Apologia por Platão é que se torna conhecido o que aconteceu nesse período. a inteligência ou o espírito (nous) teria sido o ordenador e causa de todas as coisas. pois ele não entendia qual era o sentido da palavra da profetiza.2445 Para iniciarmos nossa análise do Sócrates platônico devemos entender que. tinha a convicção de que nada sabia. logo começou a ir contra a mesma. e assim se aproximava muito do fisiólogosiv. apesar da preponderância dos escritos platônicos tais obras foram recheadas com informações sensíveis. o que iria contra a tese do mundo das idéias. Parmênides encurrala Sócrates que se reconhece incapaz de explicar todos os conceitos relacionados ao mundo das idéias (Parmênides. sabia. No final do diálogo. algo acontece que influi em toda sua vida futura. Chega a Sócrates a notícia de que um velho amigo. e o jovem de aproximadamente 20 anos apresenta aos experientes filósofos sua teoria. se havia algum homem mais sábio do que Sócrates e que sua resposta havia sido negativa. segundo o diálogo Fédon. Nesse momento eles começam a interrogá-lo sobre diversas coisas. pois estava convencido que nada. pois sempre se lembraria de tal feito. Somente após longa reflexão conseguiu entender o que significavam aquelas palavras. a partir daí surge um período no qual Sócrates vive sua aporia.Sócrates. ao menos. o que o tornava o homem mais sábio de todos. sobretudo sobre a impossibilidade da unificação da idéia do ser. pois dizia que não podia ser um “espírito exterior” a causa de tudo. durante dez anos não participa de diálogos e permanece em silêncio. entrou em crise ao saber que quanto mais estudava tais assuntos mais aumentavam suas dúvidas e as teorias da fisiologia não o satisfazia. Portanto. no entanto. no entanto se julgavam sábios. Nesse período lhe chegou ao conhecimento a teoria de Anaxágoras. de fato. Por ocasião de visita à Atenas. A partir de então aumentou para Sócrates a sua confusão. sacerdotisa que falava pelos deuses). No entanto. Inicialmente. Parmênides de Eléia e seu discípulo Zenão conhecem Sócrates. portanto devemos seguir as palavras que de fato constroem os diálogos e não a tradição posterior de suas interpretações. Depois dessa decepção e ainda muito jovem Sócrates inicia sua formulação da tese do mundo das idéias. Desse modo. enquanto isso. No entanto. in Diálogos). com ocasiões e fatos. Querofonte. . Sócrates se entusiasmou com tal teoria. Sócrates possuía um grande interesse em investigar a “causa” (aitia)iii. Depois de tão chocante experiência Sócrates não podia fazer nada além de silenciar. Diotima lhe diz que Eros. os seduz e ensina os jovens algo sobre a sedução como no diálogo Lysis.23). p. Um bom exemplo de jovem belo seduzido por Sócrates é Alcebíades. 1992. Ele procura corpos belos. e com isso ganhou muitos inimigos (REALE. A partir de agora os diálogos de Sócrates não são mais como antes. in Diálogos). Iniciam-se os diálogos com os Sofistas e com os Jovens que o admiram por sua sabedoria e muitas vezes se apaixonam por ele (JERPHAGNON. a partir dessa busca o indivíduo culminará no conhecer sobre o que é de fato o “ser em si do homem”. o “conhece-te a si mesmo” (O primeiro Alcebíades. Eros se apresenta como um intermediário entre o mundo divino e o mundo dos mortais. o que fez com que Sócrates tivesse nova vontade de dialogar e mostrar sua teoria do mundo das idéias. recomeça a revelar seu saber. pois seus diálogos tinham intenção apenas de confrontar os sofistas. p. No diálogo com Alcebíades. Só a partir desse encontro Sócrates entende o conteúdo afirmativo do saber que não se sabe. Mais do que isso.2446 Com a descoberta do “saber que não se sabe”.45). Nesse período. Só que para Sócrates destruir o pensamento daqueles que se diziam sábios e colocá-los contradições ele também abriu mão de seu conteúdo positivo. 1990. Agora Sócrates já sabe o que sabe e caminha na direção da disseminação dessa idéia e na busca de “belos corpos”. assim como o saber que não se sabe é um intermediário. 2006. que é como um manual de sedução (BENOIT. Por isso. 132d-133c. que mais tarde se destacou na história grega. Os sofistas ficaram desconcertados diante de tão complexa construção socrática e muito se contradiziam na tentativa de refutá-lo. O seu contato com a sacerdotisa Diotima vem ajudar no amadurecimento da seu discurso. na tentativa de vencer dentro de si o fantasma do velho Parmênides. Sócrates julga necessário a busca pelo auto-conhecimento pois. filho da aristocracia ateniense muito corajoso e talentoso. p. que era considerado por muitos um sofista. Sócrates. a saber. foi de encontro aos mesmos criticando a superficialidade de sua retórica sem conteúdo. e lhe ensina “as coisas do amor”. Assim. no entanto paulatinamente. quando ele se apresentava como um menino em busca de razões e causas.101). Diotima fala a Sócrates revelações de Eros (o amor). Essa fase também é marcada pela sedução de Sócrates. Sócrates introduz um novo elemento no seu discurso. podemos . podemos entender que o saber que não se sabe é um intermediário entre o mundo tangível e o mundo das idéias. Sócrates tinha cerca de 36 anos e. Sócrates recomeça a falar. Pois. Além disso. Diz ele. Podemos comprovar isso nos próximos diálogos de Sócrates como “Górgias”. que a alma é imortal e que o homem pode se recordar de fatos e saberes de outra vida. agora ele compartilha de um saber afirmativo que lhe dá subsídios para diálogos que desconstroem uma idéia mas tratam de afirmar outra. Agora nos resta uma dúvida. Surge para Sócrates outro grande problema quando ele tenta buscar as verdades além do próprio saber-desi. Ainda outra questão faz-nos refletir muito sobre a ascensão do saber socrático. que não pode ser considerado nem episteme (episte/me) nem mesmo uma arte tékne (te[kne).2447 chegar à compreensão de “alma” de Sócrates.. que apesar do seu caráter mítico faz sentido no contexto (CHAUÍ. na verdade ele considera a retórica como sendo uma adulação (kolakei?a). e para tal explicação ele recorre a saberes míticos. ele vai além. pois é necessário algo externo a si próprio para que reflita aquilo que é de fato o seu ser. nitidamente. Não irá Sócrates criticar a política que era tão influenciada pela sofística e pela retórica? Podemos entender que era cedo ainda para um dever-ser político. p. 195). Essa é a teoria da reminiscência. em podemos. o que é. aquele que teve o conhecimento de algo exterior deve proporcionar a quem não teve a oportunidade de conhece-lo por via dialética. A alegoria da caverna narrada no diálogo “A República” vem de encontro com essa fase e nos leva a entendermos que Sócrates propõe ao filósofo uma ação participativa na elaboração de sua dialética objetivando a libertação daqueles que ainda não tiveram a compreensão do mundo das idéias. Mais adiante. a princípio . o que faz com que a verdade não se destrua e acabe no nada da morte.C. notar um “novo Sócrates”. 2002. algo sem rigor. dizendo que a retórica é uma empeiria (empeiria). pois ele considera que tudo que não possui um “um saber de si mesmo”não tem razão de ser. provavelmente em 427 a. e não apenas o “saber que não se sabe”. assim como narra o mito. um Sócrates que não se importa mais apenas com a negação do saber externo a ele. Poderiam outros homens participar desse saber? Com essa questão surgi uma nova crise para Sócrates que se sente sem testemunhas para o seu saber e tenta refletir sobre quais tem sido as conseqüências do mesmo. que seria o homem fora de seus atributos acidentais e sua hombridade material. Como outra conseqüência desse momento conheceremos um Sócrates intolerante com seus interlocutores. pois há a inserção de um saber afirmativo em sua temática. após delongada analogia. Nesse momento podemos perceber um grande salto na filosofia socrática. Sócrates conclui que uma alma deve estar em contato com outra alma para que possa se conhecer. podemos ver que. Após tão bela reflexão Sócrates chega a propor um modelo de “cidade padrão”. verificamos que apesar de toda evolução do pensamento socrático. conceber tal idéia. e diz a Sócrates que só pode dizer algo sobre aquilo que sente. já tangendo o conceito do “mundo das idéias” socrático. e faz isso porque afirma que algo dentro da alma do jovem Teeteto está querendo vir à luz. 1990. ele volta a uma indeterminação. assim como sua mãe fora uma famosa parteira ele também praticava semelhante arte. e é isso que ele pretende fazer. A Maiêutica Visto sem novas perspectivas de pensamento afirmativo. Sócrates começa então a explicar o que afirmava ele estar acontecendo com o jovem Teeteto. Logo no começo do diálogo Teeteto Sócrates dá sua definição de maiêutica. que seria íntegra em moral e grandiosa em beleza e saber (Platão. longe disso. mas que tende a ser boa e aproveitável. trazer a tona aquilo que já pertence ao indivíduo desde de sua “vida” extra corporal. De modo .23). ou a arte da velha parteira. que tem como finalidade o “parir do saber”. a arte de “parir o saber”. Não que ele queria dizer que havia um nascer constante de novas almas a partir de outras. A diferença principal que Sócrates expõe é que. Novamente.2448 uma trabalhosa investida. segundo Sócrates é na alma que reside todo o saber pertinente ao ser humano (REALE. No entanto. ainda no livro “A República” podemos ver Glauco suplicando a Sócrates que lhe diga o que é de fato sua Idéia de Bem. o saber que há no ser humano já existe em sua alma desde antes do seu nascimento. o parir do saber não é mais do que o relembrar. ou seja. que é conhecido pelo nome do rapaz. Sócrates mostra sua nova fase. E essa indeterminação o acompanhará Sócrates em seus últimos dias. para ele. a maiêutica. 1992. ele apenas vem a memória através da maiêutica (JERPHAGNOM. afirmando assim não sentir nada em sua alma que pareça querer nascer. Além disso. já lhe é certo e completo. os frutos da alma são o saber. Nesse momento Teeteto faz um gracejo. o saber já é pertencente ao homem. cabe dizer que. podemos ver a bela narração que Sócrates faz ao jovem Teeteto no famoso diálogo narrado por Platão. ajudar jovens a parir o saber que sai de sua alma. p. sua mãe praticava o parir do corpo. o da alma. ainda que com muito esforço. Sobre a maiêutica. Segundo Sócrates. ao passo que ele. e isso nos leva a entender uma nova frustração da parte de Sócrates que não consegue. Com isso. p. pois. A República in Pensadores).99). para o filósofo. Sobre as parteiras. Apolo. Sócrates explanou sobre a arte das parteiras. Um próximo ponto importante da analogia Sócrates apresenta através de uma pergunta que possui resposta negativa de Teeteto. Ártemis. 2006. pois é necessário que quem esteja realizando o parto saiba mais sobre isso. como o ser humano é muito fraco. Sócrates disse que cabe às mulheres que um dia conceberam.2449 nenhum. Entretanto. Diante da ignorância do rapaz ele o ensina que são. Já nesse aspecto. pois. segundo nos mostra o antigo filósofo. se sente muito mais orgulhosa de tê-lo plantado. e nem mesmo a medida de todas as coisas. é necessário que já tenha superado esta fase. que é a criança. Segundo ele. Todavia. voltando ao tema principal da maiêutica. Para que o Jovem entendesse o que ele queria dizer. para que. por ter também plantado a semente na alma fértil. o que ele faz é colocar o homem em seu devido lugar. somente as mulheres que já haviam um dia parido poderiam ajudar no parto de outra. Isso também se compara com a alma e o saber. As semelhanças entre a arte da velha parteira e do parir do saber não acabam por aí. . seja mais experiente do que a grávida. 92). Esse é. há apenas uma arte encarregada do plantar. era quem concedia às mulheres a capacidade de executar a arte de parteira. quem ajuda no parir do saber deve ter mais experiência do que quem está parindo. Sócrates afirma que. pois. podemos ver os primeiros pontos da analogia socrática. que nunca havia parido. que era o saber de algo. ou seja. Isso se dá porque. todavia hoje não mais possuem tal capacidade a arte de parir. cuidar e colher os frutos. e ainda acresce dizendo que o que elas se orgulham mais de fazer é arranjar o casório do que cortar o cordão umbilical. se uma parteira colhe o fruto. o que ele quer dizer. Não há duas artes nas quais cabe a uma plantar e a outra colher. Por isso. é que. 1990. O homem não é Deus. uma das partes essenciais da arte que ele tenta explicar ao jovem. quanto mais se sentiria ele honrado por ser responsável pela arte completa. segundo o filósofo. Ou seja. isso se dá sobre ordenança da deusa Ártemis. segundo seu modo de pensar. segundo Sócrates nos narra. com certeza daquilo que já fez possa ajudar quem ainda está em tal atividade (BENOIT. com a experiência de quem já pariu pode se ter melhores possibilidades de procriação a partir de um casamento bem feito. Se pode-se dizer que. o homem era apenas uma parte do todo. p. p. ou seja. Sócrates pergunta se o rapaz sabe que as parteiras são famosas por serem também casamenteiras. e era subordinado ao Deus que era a inteligência ordenadora (REALE. através da maiêutica o filósofo colhia o fruto da alma de alguém. ou melhor. e que. reflitamos sobre o diálogo Teeteto.75). podemos afirmar Sócrates como sendo um místico. que ainda no momento de seu parto ajudou sua mãe a parir seu irmão. Ou seja. o professor não tivesse papel maior do que o . e por isso. Ou seja. que dizia que aquilo não passava de uma falsidade. após todas as semelhanças. Por isso. outro saliente detalhe nos resta. e. Nesse saber separar entre o que é ou não o verdadeiro fruto da alma que Sócrates conclui estar à parte mais árdua do trabalho de sua arte. Diante dessa grande dificuldade da arte de parir o saber. podemos entender como se deu o método de ensino socrático.. há muitas dificuldades e não poucos detalhes a serem vistos ante um parto. pois cada novo parto gera uma nova experiência e reflexão. ele afirma ser ela superior a arte de sua mãe. seria como que. muitas vezes jovens se frustraram com ele. segundo Sócrates um ser humano que nunca engendrou é ignorante demais para ajudar e presidir outros partos. e não permite que haja contradições em momentos cruciais do parto. Sobre isso. e por isso. que não pode ser de modo algum aqui omitido. as atitudes do homem que vive em sociedade devem ser ponderadas. todavia o seu conceito é terminado. quem nunca engendrou. de difícil distinção. somente quem já encerrou suas atividades férteis é que pode ajudar outros em suas atividades. diante do parir do seu saber ouve a desilusão e a repreensão do parteiro. ora você pode pensar algo e depois defini-lo de modo diferente.2450 Todavia. o filósofo. e não era verdadeiramente o fruto esperado da alma.24). Essa diferença consiste no seguinte: a parteira não precisa distinguir se o fruto do parto é realmente uma criança. ou se é alguma outra coisa.porém. enquanto você está na atividade de engendrar. tem que saber separar os conhecimentos verdadeiros dos falsos.. logo afirma-se que. Por que Sócrates afirma que apenas quem não pari mais tem a capacidade de presidir outros partos? Pelo simples fato de que: somente quem não engendra mais tem suas idéias fixas. p.8 in Diálogos): Eis aí a função das parteiras. Essa diferença faz com que ele afirme que a arte que ele exerce é em muito superior a da parteira. muito inferior à minha. Contextualizando-o. A partir dessas breves diretrizes já traçadas. especialmente nesse caso. pois. não pode também ajudar no parte de outras pessoas. Em verdade não acontece às mulheres parirem algumas vezes falsos filhos e outras vezes verdadeiros. Não que sua idéia seja completa e perfeita. Sócrates afirma que. Agora. 1992. daqueles que não são mais do que um engano. Sócrates aponta uma diferença notável entre a parteira e ele. Nas palavras do próprio filósofo (Teeteto VII p. a grande superioridade da minha arte consiste na arte de conhecer de pronto se o que a alma dos jovens está na iminência de conceber é alguma quimera e falsidade ou fruto legítimo e verdadeiro. é necessário a cautela de alguém que saiba muito para presidir o parto (JERPHAGNOM. uma ilusão. pois somente eles já terminaram sua experiência e já sabem o que fazer em determinada situação. Pelo contrário. de modo que. por ele possuir a arte de casamenteiro. pode auxiliar o mesmo. Isso não pelo fato de ser o próprio professor o “pai” daquele saber. Considerações finais A educação. e é justamente nisso que deve consistir o papel elementar do educar ao modelo socrático. Desse modo. Não é suficiente o saber que se transmite nesse caso. Não que desconsideremos a teoria do saber que Sócrates ensina ao jovem Teeteto. Devemos lembrar que Sócrates trabalhava com “definições de essências”. faz-nos pensar principalmente sobre o real papel do educador. pelo contrário. de dar as coordenadas corretas para que houvesse a concepção de algum saber. É evidente que essa relação “Parteiro versus Partuinte” não se dá apenas na relação “Mestre versus Aluno”. deve obedecer a métodos que o auxiliem. segundo Sócrates. Além disso. Sabemos que o ato de educar não pode se dar de maneira desnorteada. ao passo que. pois foi ele quem o acompanhou desde a concepção até o parto. é necessária grande experiência. refletida sob o olhar da maiêutica. ninguém ainda esteja em atividade reprodutiva.62). essa relação assemelha-se mais com a relação “mestre versus aluno” do que com qualquer outro tipo de relação.2451 de ajudar o aluno na concepção do saber. somente alguém muito bem qualificado pode exercê-lo. Além do mais. o filósofo grego já nos legal tal contribuição há mais de vinte séculos. ou seja. . quem nunca construiu um saber dessa forma também não pode auxiliar outras pessoas. pois. julgamos mais interessante para esse trabalho entender o método utilizado para tanto. ou sejas. ninguém que ainda esteja incerto sobre o que é de fato um parto. p. o ser humano é fraco demais para fazer algo que não tenha vivido. o momento exato do “parto” do saber é importantíssimo. É necessário que quem ajuda outra pessoa no engendrar do saber tenha vivido aquela experiência. Mesmo não sendo o professor “pai” daquele saber ele exerce grande responsabilidade sobre o mesmo. Exatamente por isso. para discernir aquilo que é de fato um saber positivo. Sócrates narra a Teeteto como se dá a maiêutica num caso bem definido: Teeteto está prestes a formular seu conceito de conhecimento. 1987. e esse é o momento específico do parir (MARÍAS. Todavia. mas antes. e aquilo que não é mais do que falsidade. Por isso. antes. ele é aquele que ajuda o aluno a gerar sua autonomia enquanto homem. 2. pluralistas)” (REALE. Introdução à história da filosofia. 2. Após a sua morte foram muito que lhe deram atenção e analisaram cuidadosamente sua filosofia. vemos na maiêutica socrática um método de ensino no qual o educador não é visto como a “fonte” a ser bebida pelo aluno. caracterizado.. O que é certo é que a cada desconstrução através da dialética negativa podemos lembrar da bela filosofia Socrática e de sua morte como conseqüência da mesma. pelo problema da physis. seleção de texto de José Américo Motta Pessanha – 5. História da filosofia antiga. Julián. Derradeiramente podemos entender que as narrativas de Platão nos levam ao conhecimento de Sócrates. Referências bibliográficas: CHAUÍ. História da filosofia. Marilena. 1991. 1992. p. Diálogos. São Paulo: Companhia das letras.1.493). História geral e do Brasil – 1 ed.ed. Lucien. Mito e Pensamento entre os gregos. Aquilo que de fato Sócrates foi pode ser muito discutido. MARIÁS. – São Paulo: Nova cultural. História das grandes filosofias.2452 Portanto. assim poderemos criticá-lo ou admirá-lo. PLATÃO. 1990 VERNANT. 2003. mas sem dúvidas a história sempre será justa em lembrar de tão grandiosa personagem. São Paulo: Paulus. Jean Pierre. e. Talvez há quem ainda o considere um sofista. G. sentido físico: “a origem a um efeito”. C. Porto: Souza & Almeida. – (Os Pensadores) REALE. Geovane. o jurídico: “ser causa é responder por alguma coisa”. pelo problema cosmo-ontológico (jônicos. sentido lógico: “ a razão ou explicação de alguma conseqüência ou de uma conclusão”. eleátas. ii Acadêmico do terceiro ano do curso de teologia no Cesumar e realiza pesquisa pelo programa de bolsa para iniciação científica (PROBIC) iii De acordo com Chauí (2002. ed. 2002 JERPHAGNON. São Paulo: Paz e terra. São Paulo: Martins Fontes.ed. VICENTINO. i . 1987. ou seja.ed. pelo contrário. A saber. cidadão e discente. causa pode ser entendida em quatro sentidos. 1990. 8. DORIGO. iv Referimos-nos fisiólogos aos filósofos que pertenceram ao “período chamado naturalista. de sua história e de como se deu a construção de sua filosofia. Acadêmico do segundo ano do curso de teologia do Cesumar e realiza pesquisa pelo programa de iniciação científica (ICC). tanto para construí-la quanto para criticá-la. pitagóricos. – São Paulo: Scipione.35). sentido ético/político: “motivo pelo qual uma ação é realizada”.ed. p.