Sérgio Costa Dois Atlanticos
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SÉncro CosreDOIS ATLÂNilCOS ÏEORIA SOCIAL, ANTI.RACISl\4O, COSi/1OPOLITISII4O UE^AG UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINÀS GERÀIS Reitor: Ronaldo T¿dêu Pena Vice-Reitora: Heloisa Maria Murgel Starling EDITORA UFMC Diretor: rllander Melo Miranda Vice-Diretora: Silvana Cóser CONSELHO EDITORIAL \ùfander Melo Miranda (presidetrte) Carlos Antônio Leite Brandão José Francisco Soares Juarez Rocha Guimarães Maria das Grâças San¡¿ Bárbara Maria Helena Damasceno e Silva Megale Paulo Sérgio Lacerda Beirão Silvana Cóser Belo Horizonte Editora UFMG 2006 l I O 2006, Sérgio Costa @ 2006, Editora UFMG I Este livro ou parte dele não pode ser reproduziclo ¡xrr qualquer meio sem autorizrçào escriu do Editor. Costa, Sérgio IlSlTm DoisAtlânticos:teoriasocial,anti-Íacismo,cosmopolitismo/ SUl\4Áil0 Sérgio Costa. - Belo Horizonte: Editor¿ UFMG,20O6. 267 p. (Huronitas) Traduçâo ligeiramente modificada da tese de livredocência defen dida no Depanamento de Ciências Polí¡icas e Sociais da Universidade Livre de Berlim, Alem¡nha. lnclui referências. ISBNr 85-7041-942-7 PREFÁCIO 1. I. Teoria 07 social. Título. lI. 2. Política transnacional. 3. .{ntiracismo. Série. INTRODUÇÃO Ent¡e o Atlântico Norte e o Atlântico Negro CDD:320.56 CDU:323.72 Elaborada pela Central de Controle de Qualidade da Caulogação da Biblioteca universitária da UFMG CAPfrurc I TÐffO Rn'ISÀO DE PROV,A.ST Eduardo Democmcia pós-nacional na Europa Cultum política e idenridade européia Esfera pública européia? E NORMAUZ¿,ÇÂO: Maria do Carmo Leite Ribeiro Manins, Priscilla Iacomini Felipe DTLEMA*S O Estado democ¡árico sob a pressão da globalizaçio EDITOR.açÀO DE TEXTO: Ana Maria de Moraes REYISÂO DE A CoNSTEI-{ÇÂo PóS-NACIoNAL E SEUS 11 CA.PfrtIlo Il PROJETO GR.{FIco, Glória Campos - Mangá FoRMå,TAçÃo E PRoDUçÀo GIU(F¡c,q: lfar¡en Marilac CAPA: Eduardo Feneira, a paftir de foto de Uli Muhl. trI Av. Antônio Cados,627 - Ala direita da Biblioteca Cenr¿l - Térreo Campus Pampulha - 31?70-n1- Belo Horizonte/MG ¿o 26 30 35 Conclusôes parciais e novos desafìos 45 RISCO, REFLÐC\'IDADE, COSMOPOI.TTISMO Ulrich Beck e a sociedade de risco Anthony Giddens. Esrrurur¿ção e rcflexividade Supenndo a dicotomia entre ator e estruntm Modemidade + reflexividade2 = alta modemidade EDIFFERANCE bina¡ismos As alremad s epistemológicas pós-coloniais Modemidade enuelaçada, histórias companilhaclas O lugar de enunciação pós-colonial: o elogio clo híbrido Da <Iiferença ao sujeito (lm-)possibilidades de uma sociokrgia pós-colonial PÓS-COLONIÁ.LISMO As ciências sociais e seus EDITORA UFMG ¿¿ Democr¡cia e dire¡los humanos em esala global Os direitos humanos na ordem cosmopolita Refl exividade e cosmopolitizåçào Cosmopolitismo ma non troÞþo. As promessas nào cumpridas da modemizaçåo reflexiva C,q,PfIrJr.O 21. 7) 49 51 59 59 63 73 77 83 g5 gg g9 92 9g 105 . etc. de ul sorte que aqueles a quem se atribui uma posição inferior na hierarquia racial imaginada são sistematicamente desfavorecidos na competição social. é assumida como urrut preocupação do conjunto da sociedade brasileira. pelo menos publicamente. através de formas de comportamento (escolhas matrimoniais.¿ t + "þ. Numa sociedade que conviveu quase 400 anos com a escravidão modema. recentemente. As primeiras dizem respeito ao surgimenlo de uma estrun¡ra de opornrnidades desigual. dificuldades de acesso ao sistema de formação escolar e profissional.iü' di.TNTRODUçAO ENTRE O ATLANTICO NORTE O ATLANTICO E NEGRO Este livro rursceu do interesse intelectual e político de melhor compreender as discussÕes contemporâneas em tomo do combate ao racismo no Brasil. . os quais são classificados em diferentes grupos imagirrários. . t¡atamento pessoal discricionrário). i I ! Os movimentos anti-racistas procuram enfrentår o racismo nos dois níveis dest¿cados. O r¿cismo corresponde à suposição de uma hierarquia qualitativa entre os seres humanos. salários proporcionalmente menores. os ternas do racismo e do anci-racismo revestiram-se de uma relevância especi:al. assim como através da marginalização social e espàciäI. Contudo. a qual logrou traduzir a promoção da igualdade efetiva de oporn:nidades para negros e brancos numa aspiração que. a partir de rnarcas corporais arbitrariamente selecionadas. rituais (insulto racista. . i&ü¿". Essa hierarquização apresenta tanto cotìs€qriências socioeconômicas quarÌto político-culturais. i . Do ponto de vjsta socioeconômico. ¡l 'å. A dimensão cultural do racismo se expressa no cotidiano. cabendo-lhes os piores postos I I I I I 1 I I i de trabalhos. f. humilhações). essa questão não é exatamente uma novidade. dada a consolidação de uma rede antlracista transnacional. Essas políticas sâo discutidas transnacionalmente. remetendo aos t¡abalhos no campo da sociologia da globalização.. constata_se uma polarização das discussöes em clois campos tratados como opostos: de um lado estão os estLldos raciais. tratadas em seu conjunto. 13 . de maneira concreta. A ambas as correntes faltam categorias que descrevam a mediação cultural e política entre fóruns transnacionais e os contextos nacional e local. implementadas as chamadas ações afirmativas. no Brasil. De forma geral. chamado por Paul Gilroy (1993) de Blacþ Atlantic.A. impondo-se a busca de fórmulas próprias para combater o r¿cismo que reflitam a diversicìade brasileira. como se houvesse uma única linha universal que levasse ao combate do racismo. contudo. visam favorecer o recrutamento preferencial de afro-descendentes para posiçÕes e postos socialmente valorizados. as quais. tratam a alen nacional como único contexto no qual a ação política rem lugar. entendenclo que se os negros brasileiros assumissem søa identidade racial. de medidas para combater o racismo. algumas a[eitas à teoria da democracia. Os críticos dos esrudos raciais. O ponto de partida é o esruclo crírico de tentativas recentes de recuperar o conceito . por sua vez. é no âmbito das reiações cotidianas que os padrões identitários e de sociabiliclade conflitantes são negociados e apropriados. corrente que vê uma correlação direta entre o racismo e a raka de consciência política por parte dos negros brasileiros. pelo menos desde 2001. é nacional. A discussão política da qual parte este livro confronta-nos com questões teóricas diversas. em sua dimensão sociocultural. seguindo modelos adotados nos Estados Unidos. No Brasil. constituídos historicamente. cujo processo de concepção não se restringe ao território brasileiro. ter-se-iam consriuído no Brasil modelos identirários que não podem ser reduzidos ao par de opostos negro_branco. ao mes¡no tempo. acreditam que. vem sendo combatido em diversas frentes: introdução de conteúdos anti-racistas nos currículos escolares. vêm sendo recomendadas e. Cabe primeiramente discutir. a saber.mo avançou muito nos últimos anos. cle que forma determinados padrões de sociabilidade. A legitimação cle aspirações políticas conformadas fora das fronteiras do Estado-nação constitui o cerne do debate no âmbito da teoria democrática. São precisamente essas mediações que o presente livro busca identificar e analisar. etc. Afinal. como cultura negra. Assim. na linguagem cotidiana.cosmopolitismo". Cabe.busca-se estabelecer uma igualdade real de oportunidades c^paz de neutralizar as conseqüências distributivas da discriminação racial. são os mecanismos de tradução necessários para que medidas anti-mcistas implementadas nos Estados Unidos prestem-se ao combate do r¿cismo no Brasil. se transnacionaliz^m no bojo das redes de movimentos sociais. o racismo e os racistas seriam derrotados. O que importa discutir. outras mais próximas da sociologia. . no âmbito local e nacional. a cultura negrabrasileira tomouse parte de um contexto cultural transnacional. sem que se achatem as diferenças diametrais nos padrões de convivência entre os grupos de cor no Brasil e nos t2 Esados unidos. da qual os negros e o patrimônio cultural afro-brasileiro são parte consritutiva. visto que o conceito abrange um conjunto mùito vasto e desigual de programas teóricos e políticos. onde quer que ele se manifeste. O racismo. pergunar: como se dão efetivamente essas negociaçôes? Como se alteram e se reconsLituem as construçÕes identirárias no âmbito local? O debate brasileiro em tomo do racismo e do anti_racis. sua natureza transnacional. rigor na apuração e punição de crimes de racismo. os esrudos raciais preconizam a simples transposição das políticas anti-racisras e dos modelos de identidade cultural a elas associados dos Estados Unidos para o Brasil. Já há aþm tempo. desenvolveu-se uma cultura nacional integradora. portanto. Trata-se. incorpora e inspira as manifestaçÕes que etllergem nas fronteiras geográficas brasileiras. Esse probrema abstrato apresenta desdobramentos microssociológicos óbvios. portanro. Os vínculos entre a revivificação da cultura negra no Brasil com aquele espaço imaginado. Os críticos dos esrudos raciais. sua implementaçào. que. diferenremente dos Estados Unidos. Trata-se aqui de um debate tão fascinante quanto difícil. As questões da ordem da sociologia são igualrnente abrangentes e afeitas a subcampos diversos da disciplina. Cabe destacar aqui a valortzaçào de manifestações culturais associadas à origem africana.ssim. assistência jurídica a vítimas de racismo. Tanto os defensores dos estudos raciais quanto seus críticos parecem não levar adequadamente em conta uma propriedade fundamental do tema em tela. por sua vez. s^o evidentes. o sonho de um mundo sem guerras nem fronteiras teria se transformado numa snostalgia da humanidade" que. de estabelecer uma ordem mundial que siga os ideais "cosmopo. o cosmopolitismo estóico preconizava o amâIgama dos diferentes povos como possibilidade de superação dos conflitos. Também o cosmopolitismo modemo. percebe-se um déficit comum a todas as concepções de cosmopolitisrno historicamente formuladas. Lppp. etc. A novidade da discussão sobre cosmopolitismo hoje consiste precisamente no fato de que muitas contribuições renunciam à hierarquização prévia das diferentes culturas. assiste-se hoje à busca de superação do nacianalßtnometdológïco que ainda domina as ciências sociais. 1990: 11. Para o autor. Não se trata. a despeito de refluxos. Ou seja. alguns passos básicos. sentindo-se como i¡mãos [e irmãs] numa única coletividade terrestre" (Coulmas. devem-se 15 . que tal devesse se dar pela adesão dos "diferentes" à "forma de vida helênica". contudo.). as ciências sociais passaram a estudar as diferentes sociedades nacionais a pattr de uma escala de modemidade. litas" de um grupo determinado (gregos. a hegemonia inconteste da teoñada modemização. 2OQ2. 2000: 50). Dessa forma. b) acompanhando a tr-adição dos esrudos locais. As categorias. um certo etnocentrismo. Spohn. ajnda. 2002). entretanto. portanto. as sociedades nacionais e o "modelo societário europeu".adequada para a investigação sociológica nurna época em que os processos soci. a saber: a) seguindo a ambição universaüsta que ma¡ca as ciências sociais desde seu nascimento. bem como aa$o política. Desde entào. dzda a subjacente idealização teórica de urna modemização ocidental homogênea. experiênci¿s de minorias e transformações ocorridas fora das sociedades tratadas como moderûas-e' ocidentais. 2004) busca superar o vínculo congênito entre as ciências sociais. ú Este ideal político difuso encontra coffespondência no debate em torno dos caminhos que as ciências sociais devem percorrer para se desfazerem de seu vínculo congênito com o modelo societário europeu.ais e culturais. cristãos. isto é. ígnorar visões contra-hegem& nicas.). Delanty. rnais modemas (Therbom. cujas graduações são definidas pelo nível de semelhança com as chamadas sociedades do Atlântico. mas de promover a coexistência das diferenças. sem. o estoicismo foi que cunhou o conceito de cosmopolitismo "que passa a valer desde o período helênico. partpassuà renovação dos ideais políticos cosmopolitas. refletindo. Conrudo. os sécuios do império rornano e até nossos dias" (Coulmas. iniludível (Tucker. europeus. 19Ð). vão perdendo sua ptausibilidade analiuca.Norte: quanto mais semelhantes.1 Trata-se aqui de uma convicçã<¡ cosmopolita associada ao desejo de "viver em contextos abrangentes. não encontram mais nas fronteiras nacionais seu limite. Seguindo esses moldes institucionais e teóricos. a pressuposição de que a rLrptura de fronteiras deve se dar sob a égide de uma "cultura determinada". Em face dessa hisrória institucional.Conforme Coulmas (1990). sugerindo. de sorte a fazer jus ao "desafio da diversidade" (\IØagner. garantindo ao mesmo tempo a preservação de di¡eitos e garantias individuais (Pollock et al. o "cosmopolitismo epistemológico" (Beck. adquiriram seu atual formato i¡rstitucional depois da Segunda Guerra Mundial como ciências nacionais.C. traødo assim. de modo a constatâr que as fronteiras nacionais nem sempre dema¡cam uma unidade arnlitiø. se baseava na premissa de que a "a cíviização européia" atingira um estágio de desenvolvimento do qual "outros povos" ainda estavam muito distantes (Mignolo. 1990: 115). fundado no humanismo renascentista e que assume contomos claros no século XVIII através dos trabalhos de pensadores como David Hume (1711-L776) e Immanuel Kant (1724-1804). como um horizonte de projeção de utopias. sempre retoma. a pala-wa cosmopolites foi utilizada pela primeira vez por Diógenes (412-323 a. As ciências sociais. contudo. 2006). Trata-se de levar em conta o caráter pós-nacional dos processos sociais contemporâneos. 1990:137).. 2006).. para tanto. acreditando. a saber.3). indicadores e métodos constituídos sob essa lente teórico-institucional. a 'nosulgia humanan do cosmopolitismo se pereniza apenas co¡no desiclerato. contudo. conforme reconstruída por Coulmas. Quando se toma a traietória do cosmopolitismo. isto é. considerada pelos estóicos como uma "civilização mais alta" (Coulmas. n¿ medida em que os processos sociais se desprendem mais e mais dos limites nacionais e a pluralidade dos padrões de modemização se toma. no singular. empiricamente. devem-se formular postulados generalizáveis. sem materialização concreta na história. é possír. De algum modo. A visão cosmopolita desenhada por Ànthony Giddens e. a teoria da modemização reflexiva de Ulrich Beck e Anthony Giddens e as concepções pós-coloniais. os ventos cosmopolitas não podem partir de um centro tlnico. por sua vez. o cosmopolitismo reflexivo de Giddens e Beck e as concepções pós_ coloniais. étnicas. 2O02:6) uma importância especial. Ulrich Beck. principalmente. O projero cosmopolita. Com efeito. uma ordem mundial orientada pelo respeito aos direitos humanos. fragmentadas.. a tensâo entre ideais universalistas e a história modema efetivamente conhecida. quais sejam.nacionais. a saber: o modelo desenvolvido porJürgen Habermas. O processo de globalização. uma transposição imediata das considerações dos autores estudados para o caso investigado. reconsiderar as muitas experiências modemas. op*içao às adscriçôes "^ de todas as ordens. Na medida em que a globalizaçâo confronta as "outras" regiões do mundo com a condição modema. tensa e difícil. colocadas umas ao lado das outras' mas de conferir destaque às experiências daqueles que vivem enffeas demarcações 16 adscritivas de gênero. para os estuclos . os contextos concretos nos quais se dão as relações sociais. Não obstante.de reconstituir a unidade desses dois Atlânticos. segundo o autor. O cosmopolitismo pós-colonial encontra-se associado à busca de uma perspectiuL desçentrøda. espere uma justificativa analítica para o interesse deste livro nas três concepções de cosmopolirismo desucadas anteriormente.considerar. com a univer_ saliz-a$o das "conquistas modemas. parcial e seletivo. Os discursos sobre o Adântico Negro e o Atlânrico Norre condensam. depreendendo-se de experiências de sociedades européias a categoria reflexividade. as ciências sociais contemporâneas encontram_se empenhadas na tarefa. produzindo sujeitos "mais astutos".. no entremeio dessas clemarcações. ao longo do livro. não se trata simplesmente'de considerar urna gama múltipla de visões de mundo.é. fundamentalmente. tomar as instituições concretas criadas naquele conjunto de sociedades de industrializaçVo pioneira como formato absoluto e parâmetro normativo de avaliação das transformações institucionais em todo o mundo. baseia-se. Para as abordagens pós-coloniais. contudo. nem tampouco de vários centros. promove a expansão da reflexividade para todas as partes do mundo. Isso não implica. O Atlântico Negro. contudo. igualmente. que se articula a di_ ferença móvel. muito provavelmente t¡realnâveI. isto é. O diagnóstico de Habermas sobre a dissociação 17 . adequadamente. o uso analíLico neste livro das categorias cunhadas pelos dferentes autores é crítico. pöe em evidência. etc. Essa é a perspectiva adotada tlnto porJ.. num modelo centrífugo. pós-coloniais portanto. a possibilidade da ordem social fundada em di¡eitos comuns. aptos a compreender os efeitos de suas próprias ações num mundo interdependente. muitos dos dilemas vividos tanto pelo cosmopolitismo político quanto pelas tentativas de construir uma ciência pós-nacional. Todavia. sem aboli¡ de seu horizonte narrativo e normativo. mas que culmina. na metáfora do Atlântico Norte' reproduz a imagem de uma sociedacre mundial monocêntrica. aberta e cosmopolita. a escolha teórica efetivada não é arbitrária e se justifica pela correspondência entre os focos de interesse das contribuições contempladas e as diferentes dimensões analíticas cobertas pelo presente liwo. buscar estender a fórmula européia dos direitos hurnanos por todo o globo. Ou seja. de forma mais amiúde. inseparável do colonialismo e da escravidão. no espaço de sentido entre âs Fronteiras. por sua vez. como aquelas simbolizadas pelo Atlântico Negro. Habermas quanro porAnthony Giddens e Ulrich Beck. O cosmopolitismo de que trata tlabermas visa. Assim. sem. paniculares e diversas. a qual confere às experiências modemas "minoritárias" (Pollock et al. Para além das metaforizações políticas. recoìrè':se às considerações de Habermas sobre a globalização da democracia e dos direitos humanos. todas elas muito influentes no debate contemporâneo. em contrapartida. é certo. a esta altura. Este livro estuda. para tratar das questÕes relacionadas aos problemas de legitimaçâo do antiracismo transnacional. A relação entre teoria e empiria peÍnanece. o interesse pelo particular deve se fazer acompanhar do esforço analógico e comparativo. O autor entende que os direitos humanos e o Estado de direito constituem a resposta exitosa encontrada pela Europa nos séculos XVIII e XD( para os desafios modemos representados pelos processos de secularização e de individualização. isto é. metaforicamente. c) deve-se levar em conta o papel das instiruiçÕes nacionais. aquela desenvolvida por Habermas. caberia. em seu dever ser.el que o leitor. três concepções de cosmopolitismo. mas na articuleçào c-ontirìgente de diferenças.s Capítulos I. arnb<¡s os autores estabelecenr. por sua vez. como. xismo as tensões sifuadas na zo|na de interseçào entre pretensÒes de validade que circulam transnacionalmente e os processos locais de- recepção e reinterpretação clestes. Faløm também ao debate. contextos transnøcionaß de ação. na medida em que o caminho indicado por Habermas pressupÕe a supremacia européia na história de difusão dos direitos humanos. ll. o qual não se apóia na exi. que o eixo central de análise dos processos de transformação global deve ser a reflexivização dos sujeitos e das instituiçÕes modemas. ropefüvamente. desenvol_ vida ao longo do Capítulo V]I. con_ ceitualmente. através da proposição de uma categoria própria de análise. no. o tema da legitimação das pretensões de validade anti-racistas é tratado a partir da articulação entre os contextos de açào transnacionais e a formação da opinião e da vontade no 18 19 . particularmente valioso para a presente análise é o conceito de cultura prevalecente entre os estudos pós-coloniais. A possibilidade de apro_ veitanrenro analítico das teses por eles defendidas é. as mediações entre os ânrbiros naci<>nais e transnacionais. mostra como a convicção importada da Europa de que os brancos são naturalmente superiores peneFa os djferentes projetos de construção nacional na América l¿tina. Jít a solução teórica e política. iluminam a análise sobre a maneira como diferenres modelos de sociabilidade e subjetividade se expandem transnacionalmente. a reconstruçào do debarc científico na virada do século XD( para o século )O(. Afìnal. Os Capítulos V. Essa preferência teórica não pode ser aplicacla no caso estuclado. como será visto. a ciência e <-r Estacio nacional. conforme os termos da época. O presente livro busca um posicionamento analítico e. sobretudo. por sua vez. as posiçÕes oscilam entre o elogio da culturarucional mestiça e o apelo por mais identidøde racial. por exen"rplo. serve-nos pouco. nas diferentes épocas. As consideraçÕes de Ulrich Beck e Ànthony Giddens sobre a modemidade reflexiva. lirrri¡ada. os primórdios do discurso racista cientÍfico na virada para o'século )o( e a explosão da sociologia anti-racista clesde finais do século )O(. entendid^ a partir da forma como os processos generalizados de transformação afetam os indivíduos e como estes respondem a essas mudanças. levam ao paro. ø priori. a partir das nìatrizes teóricas discutidas. Aqui interessa.entre os processos globais de integração sistêmica e o carâter nacional das arenas de formação da opinião e vontade política é particularmente imporrante para a análíse aqui desenvolvida. conferindo ainda ao racismo popular uma base de legitimação modema. As concepçÒes de cosmopolitisnro de Habe'rm:¡. VI e VII são dedicados ao esrudo do racis_ mo e do anti-racismo no Brasil. conhrdo. como mencionado. O processo concreto de circulação dos dogmas do racismo científìco nesse período evidencia que a reivindicada precedência européia nas questões vinculadas aos direitos humanos é clesprovida de sustentação empírica. apresentada pelo autor ao impasse der¡ocrático por ele constatado.stência prévia de unidades e identidades ct_rlturais. frìas nos discursos científicos sobre o racismo e o antiracismo. Já a reconstrução dos debates científicos recentes. II e IIL No Capítulo IV. buscando-se agrupar essas mediaçÕes. de certo modo.s. contraria ambas as premissas. nem os processos cle individualização reflexiva próprios a unìa suposra segunda m<¡dernidade que se encontram no centro das clinâr¡ricas investigadas. quais sejam.científica. estudam-se. Gi<Jclens c e dos esnrdos pós-coloniais são exarninadas. servem como ferra_ menta microssociológica para o estudo das múltiplas negociaçoes culturais e políticas observadas ao longo clo processo cle trans_ nacionalização do anti-racismo. a atenção pioneira de ambos os autores pela dimensão subjetiva da globalização. Desse modo. revela a inexistência de conceitos aptos a traduzir as complexas mediações enre os contextos de ação locais. além de uma sociedade mundial de cidadãos altruístas e distantes dos interesses políticos instrumentais. Os estudos pós-coloniais. tomados por seus extremos cronológicos. levacla a cabo no Capírulo VI. nào é o distanciamento das rradições (moclemas). valendo_ se' Para tanto. político fora destes dois pólos apresentados como antinômicos. instrumentos analíticos que permitam estudar a reconfìguração das corìstruçÒes identitárias no âmbito das lutas anti-racistas. Ainda que o Capírulo V trate da emergência das novas etnicidades e da politização da diferença. r¡acionais e transnacionais. O caso estudado.ck. das diversas reconstruções teóricas desenvolvidas nos diferentes capítulos. posto que. a investigação empírica não está focaLizada na descrição de iatos recentes. Assim. qual seja. Afinal. Os discursos científicos. A crítica social nasce aqui cla relaçào clescle sernpre arnbivalente entre o chamado Atlântico Negro e instituiçÒes basilares da modernidade. não seú respondida. neste capínrlo. As dificuldades impostas pela constelação pós-nacional à plena vigência da democracia são tratartas por Habermas de forma muito distinta. . sou grato a Luta.rãi"I.i". pelo apoio e encorajamento irrestritos. Apresentase. É preciso. aqui. submetendo_se às diferentes etapas dos processos nacionais de formação das decisôes políticas.i"i" só são legitimadas quando peneûam as esfe¡as públicas nacionais. NACIONAL caso específico estudado. }OOL>. na Alemanha. À Sabine. Myrian Sepúlveda S"r. o processo de unifìcação europeu 200L. também.i"". o autor conta com pos_ a sibilidade de exensão de algumas das conquist¿s democúricas ao conjunto das regiões da scrciedade mundial. aþrîori. inicialmente. passanclo.IAS aos estudos pós-coloniais procurar-se-á mostrar que a reconstrução das identidades e dos padrÕes de convivênciä social nao seiue nem o caminho da racialuação vislumbraclo pelos esrudos racäis nem a afìrrnação da identidade mestiça. quais são as novas reconfiglrraçÕes das relações etno-raciais que emergem. esposa .r. Josué Pereira da Silva.lobal sober¿na..rh. de todas as horas.r*. Recorrendo. no qual o Estado-nação percleu parte de sua capacidade de ação. p.t" Realpolitik mundial as gueffas . cabe muito mais que o agradecimento sincero e proñrndo. aos ex-colegas de Depanamenõ da universidade Federal de santa catarina. contudo. Em ambos os casos. yara å Iraê. da possibilidade de ampliação do processo de formação dos Estados nacionäis. a questão sociológiåa mais geral. Gosraria de agraclecer a toclas as instituições e pessoas que contribuíra. Trata-se. em particular a Marcos Nobre e a Omar Ribei¡o Thomaz. manifesto minha gratidão aos colegas do Insrituto cle Estudos latino-Americanos da universidade Livre de Berrim.m para que o trabalho pudesse ser concluído com êxito.r.. ora de intervenção e resposta aos novos desafios i*porto. fundamentalmente. especialmente a Marianne Braig. relativa à mediação entre diferentes modelos d""r*irbili: dade.m o caráter 'acionais. Em particuiar.. 2A04. . e aos meus fìlhos. 20 Com o conceito.o*p". Habermas busca descrever um conte)rto mundial. q. o que se observa é"o^ó uma óomplexa . na Europa.. dedico este livro. a partir da aposta._(Flabermas. . por outro lado. quando considerado unicamente o contexto europeu ou quando levado em conta o conjunto da sociedade *rr.constelação pós_nacional.humanirárias. No âmbito pessoal e familiar. sua teoria de dois níveis da sociedade apre_ sentada no clássico Teoria da øção cornunicatiua (19g1) e sua teoria discursiva da democracia (1992). Céli Pinto. Habermas. Gerda e Helmut. Uschi e Christoph. e também aos colegas do Grupo de Teoria Social da ANPOCS. como o fazem Anthony Giddens e Ul¡ich Beck. a direção episte_ mológica seguida apresenta conexões evidentes com o sistema teórico desenvolvido pelo autor a panir de finais dos anos 1970. se refere euando ao contexto mundial.. José Maurício Domingues e Leonardo Avritzer. Ligia Chiappini e a Renate Rort. veja..rrr" ãr"rrrrr. mostrando como os diferentes modelos de sociabilidade interagem ou.âmbito nacional..rn os inimigos dos estudos raciais. na expansão da refle¡<ividade. sem que se articule. . 2006). Ou seja. aprofundar até o nível microssociológico.. de sone a consdn¡ir_se uma comunidade política unificada em tomo do sentrmento comu¡n cle pertença e de uma esfera pública continental. no CAPíTULO A C0NSTTLAÇAO PóS. do surgimento e. Beiím. uerão de 2OO6. A ela.l"goä^_ ção das identificaçÕes etno-racias e a peÍnanente articuhção cle novas diferenças culturais. 9 diqgnósûco cle Habermas âcerca dos desafios impostos pela globalização à democracia./ou do agravamento de situaçöes-problema que exrapolam as fronteiras As reflexões do autor sobre o . em contrapartida.\. criticamente. especialmente. Matustik. ora de reflexão com interesse teórico explícito (7996. I SIUS DILE. as reivindicações políticas construídas nas redes transnacionais de movirnentor ro. Este livro é uma tradução ligeiramente modificada e resumida de minha tese de livre-docência defendida com êxito lunro ao Departamento de política e ciências sociais da universidacle Livre de Berlim. algo como uma comuniclade g. aos colegai clo centro Brasilei¡o de Análise e planejamento. é que o projeto de formação nacional se estenda pâr¿ os limites )4. percebe-se que o acúmulo de fatores extranacionais que causam problemas verificados nas fronteiras nacionais (da transnacionalização da economia ao surgimento de riscos ambientais globais) ame. Habermas busca responder às exigências de uma teoria social crítica. o processo de globalização teria minado as possibilidades de. no sentido administrativo. sob a rubrica da nação. No caso da Europa. Nesse contexto.de entendimento restiut os hços e as possibilidades entre os diferentes membros da comunidade política. à matriz de integração social em torno da qual se dará a reacomodação dos impulsos modemizanres da g\obaßaSo. é apresentirda por Habermas corno experiência histórica.nal" rcferem-se. quais sejam: a) a diferenciação de uma esfera especializada na implementação das decisÕes coletivas de caráter vinculante isto é. Por outro lado.àça a efetividade daação do Estado em sua dimensão adminisrrativa. ern sua climensão política. sociológica. o autor teûìe que a força integrativa e vinculante inerente ao próprio processo democrático o patriotismo não seja capaz de . A preocupação do autor com a integração social apresenta duas dimensÕes claras: a primeira. d) a consolidação de um Estado constitucional democrático que permite que os objetos do di¡eito sejam ao mesmo tempo os sujeitos de sua formulação. J. portanto. em sua capacidade de 22 implementar as decisões tomadas pelos membros da comunidade política nacior¡al. Essa perspectiva é depreendida dos processos de entendimento comunicativo numa sociedade determinada (Bonacker. é sua conexão com as expectativas morais produzidas e reproduzidas no âmbito da integração social não sistêmica. portanro. Conforme se detalhará mais adiante.o Estado-nação europeu seguir cumprinclo esses quatro reqtrisitos pan a consecução da soberania popular. o autor enxerga na própria experiência histórica do Estado-nação o modelo p^r^ a consrrução de novas forrnas de integração social. às suas consideraçöes sobre u¡na política cosmopolita de alcance amplo.em seguidâ. o grupo de cidadãos que compartilha uma ordem social regulada pelo direito positivo.r¡rria popular. Em face da crescente pluralização culruralt no interior da nação. relaciona-se com a prevenção da anomia e da fragmenøção social. No que diz respeito à identidade culn¡ral dos membros do Estadonação. A concretização da soberania popular. Habermas percebe problemas particularmente graves. b) a definição das fronteiras da comunidade que atua sobre si própria. isto é. cujo conceito de emancipação funda-se no solo societário. Com efeito. A expectativa de Habennas. de uma identidade cultural comum que permite que vínculos de solidariedade próprios aos círculos de conhecidos transponham-se para. o ponto de vista a partir do qual se pode decidir sobre a legitimidade das normas não é nem o apelo metafísico ao bem nem tampouco urna decisão prévia do filósofo moral. . Nessa articulação reside o núcleo normativo da teoria habermasiana da democr¿cia. já que nesse contexto teriam se constituído os quatro elementos fundamentais para uma comunidade política definir as regras que regulam a vida comum. Sob diversos pontos de vista. ao acoplar legitimação e expectativas morais de uma comunidade política soberana.a forma abstrata da solidariedade cívica entre os membros de uma mesma nação. A questão central a ser enfrentada diz respeito. a segunda dimensão é da ordem de sua teoria da democracia. os organismos intergovernamentais ou nãegovemamentais transnaciorais com competênci^ para úalar das siruaçÕes-problema que extrapolam os limites administrativos nacionais não dispõem das mesmas possibilidades de legitimação conferidas às instituiçÕes nacionais. 2001: i68). em seu sentido enfático. isto é. p ra o autor (L992). às dificuldades de rcelizaçào da sobc.de cooperação constitucional .. ao projeto habermasiano para a democracia pósnacional na Europa e. por fim. pois o que faz as norrnas vigentes legítimas. Tn¡z-se da articulação entre a comu- nicação voltada para o entendimento que tem lugar no mundo da vida e a legitimação política. um Estado. realizada no âmbito do Estadc>nação europeu. O ESTADO DEMOCRÁTiCO SOB A PRESSÃO DA GLOBALIZAÇAO Os problemas destacados por Habermas como dec<¡rrentes cla enrergência de "uma constelaçào pós-naci<. Em primeiro lugar. é precisamenre essa ambição epistemológica crítica que Habermas ioga por terra em suas consideraçÕes sobre a constelação pós-nacional. c) a emergência. vale dizer. Trata-se.r"iioäir. à nação. à sociedacle civil. orientadas pela lógica comunicativa da linguagem cotidiana. conforme : cla integra_ I o autor. Habermas descreveria a interaçâo entre essas diferentes esferas de forma dinâmica e propriamente porítica. Habermas postula que o projeto de uma democracia cosmopolita deve se apoiar nurna concepção normativamente menos rrgida. em alguma medida. 1981). automaticamente pela via sistêmica.colonizaçao sistêmi_ ca" (Habermas. no âmbito clo continente. no âmbito das sociedad. Enquanro nação. primeiramente. . o Estado nacional desempenhá um papel duplo. a partir ção econômica ou pela produção de uma carta magrâ européia desenhada na interconexão dos sistemas políticos nacionais. A segunda difìculdade rtiz ¡s5psi¡6 à inexistência de equivalentes funcionais no contexto mundial para a democracia nacional. A primeira dificuldaclã se refere ao conteKo europeu e à visão de que vêm se formanclo. F . no ámbito nacional. aqui. Quando transportadas para a constelação pós-nacional. fundamentalmente. portanto. evidenciando que a resposta de Habermas aos problemas globais levantados é r¡ibutária de urna teoria da sociedade e da democracia talhadas para as sociedades nacionais. L996: l4I). i::. trata das possibilidades da democracia no âmbito mundial.Não se da . no continente. de transpor para o contexto pós-nacional o entendimento de que a democracia compreende um conjunto de instituições e procedimentos que asseguram a coexistência e a articulação entre as esferas sistêmicas auto-referenciadas da economia e da política. Quando. ele oferece o contexto institucional para que a formação comunicativa da opiniâo e da vontade p"lítif tenha lugar. Trata-se de mostrar como nas democracias contemporâneas os impulsos normativos geraclos nas relações cotidlanas convertem_se. Recorde-se que. para alêm das fronteiras européias. Esse procedimento metodológico produz pelo menos duas inconsistências graves. segue-se. Ao diagnóstico contundente e acurado do autor. prescrições para a sociedade pósnacional pouco convincentes. etc. de uma teoria soci:rl pós-nacional.. '+ . É aificit discordar do diagnóstico de Habermas no que rtiz respeito às implicações sociais e políticas da configuração pósnacional e à necessidade de novas formas de integração societána capazes de recosturar. em sua obra. Enquanto Estado. atgo como uma naSo de cidadãos conscienres de sua história comum. para aqueles elementos-chave em sua teoria nacional (Habermas. em contrapartida.ã" u_" esfera pública porosa.da Europa e que. se forme. Nessa construção teórica. posteriormente. numa chave progressista.do_ mesticat''a política e. Um requisito adicional é a existência de medidas de política cultural que aglutinem em tomo de uma cultura po_ lítica comum as diferentes "forças de propulsão normativas que partem dos diferentes centros nacionais dispersos" (Habermas. no entanto. ofuscando os processos efetivamente em curso.Þ f t 24 It 25 . 1998: L5Ð. 1Ð2). como o estabelecimento de fronteiras que protegiam o mundo da vida racionalizada e pós-tradicional L .lo processo de modemização de seus horizontes locais.democracia ffata. referências normativas e nexos vinculantes obliterados pelo vigor dos saltos modemizantes recentes. à esfera pública.:. antes deles.. em forças que aruam no sentido de . na medida em que envolve a extensão para o conjunto da sociedade mundial de algumas das conquistas políticas obtidas pelas democracias maduras. essa articulação havia sido descrita pelo autor. as categorias utilizadas soarn estreitas e reducionistas. similarmente ao que se deu com o sujeito coletivo da nação. coordenadas pela lógica do dinheiro e do poder.t ¡ ¡ I 'þ * iI I * ì t?ì. ele constrói a referência para a reidentificação cukurar dos cidadãos arrancadoo p. Ál . e 1s esferas I . e partir cla qual se construirão os laços de pertença e a idenridade coletiva européia. O projeto de Habermas pare promover a integração social e política pós-nacional consiste. as funções que couberam e cabem no interior de um Estaclo nacional democrático particular. através do di¡eito.¡ I sociais. em buscar "equivalentes funcionais'. a economia (Habermas. Isso se concretizará com o concurso de um espaço público poroso apoiado em ONGs e meios de comunicação transnacionais e. A formação dessa cultura política comum não se dará.i t ) I '. o que leva o autor a identificar a democracia cosmopolita com um projeto patemalista de relações norte-sul. mas da indicação de estruturas e figuras que desempenherr\ no contexto pós_nacional. fundamentalmente. equivalentesfüncionais para aquelas peças-chave do modelo comunicativo da democracia. num sistema educacional que habilite os cidadãos ao multilingùísmo. no âmbito do Est¿do nacional. de uma concepção de povo cujo traço comum se define não pela ascendência ou vín_ culo de sangue. Trata-se. mas pela história compartilhada.2001: 108). assim. os europeus a abraçar uma identidade européia.. o equivalente funcional ao povo (Staaxuotþ). depreendendo-se delas o ceme da identidade européia. em linhas gerais. CULTURA POLÍTICA E IDENTIDADE ET]ROPÉIA O carâter atribuído por Habermas à cultura política comum. O fim da guerra frla most¡ou 26 27 . no ciclo de parcimônia política imposø pela Guerra Fria (Habermas. De um lado.{final. Do ponto de visu ideológico. ora como procluto furur<-r cla constituição democrática da vontade política. no interior da União Européia. muitas vezes através do uso aberto da violência. antes. coroado no pós-guera com a generalização da democracia. evocando-se.o mesmo tempo. mais recentemente. admite Quando aplicado. contudo. indica que Habermas. é ambivalente. uma yez que esse consenso é tido como dado. que entende ser requisito para superação do déficit democrático no interior da União Européia. obviamente. A ameaça a tal forma de vida e o desejo de sua preservação alimenøm a visão de uma Europa. As oscilaçÕes em torno dessa cultura ou identiciade polírica européia. mostra que a cultura política européia comum não está dada øpriori. as quais já existiriam no corpo de uma uforma de vida" e dc uma "cultur¿" européias. portanto.A. Na maior parte dos casos. A tentativa de encontrar experiências históricas comuns aos diversos países. construídas historicamente (pensþ. o autor busca desfazer qualquer vínculo entre seu projeto para uma cultura política comum e a atribuição de propriedades éticas substantivas âos europeus. Nesse sentido.). o teórico da democracia precisa assegurar que as condições para o entendimento discursivo sejam oferecidas. na experiência de construção do Estado democrático e. parece pouco plausível que As vant¿gens materiais contam como argumento pam â expansào da União Européia somenre quando ratadas no contexto de uma força de atração cultural que vai além da dimensão mer¿menre econômica. de fato. . Esse requisito do modelo proceduralista de democracia desenvolvido por Habermas dispensa ser explicitado. no âmbito continental. politicamente. possa mobilizar. a qual quer se como êxito político inequívoco. defìnir. como se tr¡¡asse de uma comunidade étnica predestinada e unida por laços de sangue ou ascendência. que a motivação dos europeus para participar do projeto de unificação não pode advir apenas das vantagens econômicas prometidas. Parece-me tratai aqui cle unra clificuldaclc a alusão ao processo de construção'dos Esødos nacionais europeus I das referências e lealdâdes locais sob a chave nacional ofusca a dinâmica histórica efetiva de construção dos Esødos-nações. Não se trata. 2000). uma cultura e uma identidade européiasmarcadas pela tolerância e pela autocrítica. de um conjunto arbitrário de manifesøções como baluartes de um¿ cultura nâcior¡al. a um contexto que envolve várias nações e Est¿dos-nações. na forma postulada por Habermas. contudo. Çonlntunities. parece fadada. ganhe plausibilidade é inevirável que algum tipo de consenso ético mínimo preexisø. lÐ6: 144 et seq. esse processo se fez cornlDase no subjugo de minorias e da imposição.DEMOCRACIA PÓS-NACIONAI NA EUROPA metodológica para a aplicação da teoria discursiva da democracia à constelação pós-nacional. são necessárias "orientações comuns de valores". para que o acordo discursivo enfático em tomo dos termos que devem regular a vida em comum. . quer. de um povo europeu preexistente e definido por um substrato pré-político. Trata-se. no próprio decorrer do processo de formação da opinião e da vontade. Âfinal. hoje ameaçadas pela globalização: ao fracasso. O autor partilha. A busca desse traço comum. seja ele tratado cor¡o dado empírico. de uma comunidade de cidadãos que se constinli ad boc. ora apresentada conto requisito preexisrente par:¡ a superação do déficit democrárico. revelam mais c¡ue urn desvio tautológico. no âmbito do Esudo nacional. por diversas razões. da visão consagrada por Benedict Anderson (1983) e gerreral:¿aða na teoria política de que as comunidades políticas são imøgined. a prosa filosófica que descreve a ampliação gloriosa dos horizontes existenciais como fenômeno que acompanha a reacomodação defronta¡ com os desafios atuais uma vez mais de forma inovaclora (Haberm¿s. por mais que insisø na idéia de uma nação européia. seja ele visto como proieto de extensão do processo de formação nacional por todo o continente europeu. traços que teriam raízes no esclarecimento. deve ser formada ao longo do processo de constituição da União Européia. com os riscos representados por seu eventual sucesso. a despeito de sua indiscutível eficâcia namriva e da mobilização eficiente dos símbolos e dos ícones culturais. como quer Habermas.identitária. parece inevi¡ável que passem a operar. corresponcle uma perda equivalente de sua concretude normativa. . por conseqüência. ao contrário. é bem possível que ela seja mais facilmente encontráver em cefios círculos.. mas.que a construção nacional na Europa. Do ponto de vista teórico. Conforme mostram autores tâo distintos como Gfüoy (2000) ou Benhabib (I99Ð.4. para esses. ao ganho de abstração no padrào iclentitário. ao que tudo indica equivocada. Ao mesmo tempo. no plano narrativo. Nos limites territoriais de um país ou cla Europa. as . mas fracamente ancoracla no seio societário. os [apelos a] sinais de semelhança (sammeness) degeneraram literalmente em emblemas de uma diferença supostamenre essencial e imurável" (Gilroy.cultura política européia" não encontra-se mais circunscrita à Europa. de que objetivos políticos comuns só podem ser constiruídos por aqueles que. boa parte deles conhecedores da história européia a parrir de uma perspectiva muito distinta daquele painel heróico traçado por Habermas e que culmina com a vitória da democracia. b) à construção. acompanhando os sakos de inregração sistêmica assistidos no bojo da globalização. da espoliação econômic¿ e da submissão política.comunidade européia imaginada". Com muita dificuldade.dariam à que esclarecido e plural desejadas por Habermas se custa de algum tipo de esmbelecimento de fronteiras simbólicas par o reconhecimento de membros e não membros e da recusa correspondente do igual valor no limite humano dos nâo europeus o outro da relação. a constiruição de identidades colerivas sempre desemboca em algum tipo de essencialização da pertença e em novas formas de chauvinismo e nacionalismo: "Mesmo em condições muito civilizadas. Com efeito. vi¡ a se constituir uma identidade cultural comum enfte os europeus. dentro da . reconstrua nexos normativos e vínculos de pertença societária. do Estadonação europeu apresentam-se diretamente associadâs à memória amarg da humilhação moral. sintam-se. uma tal .pelo menos igualmente pertencentes a urrvt mesma comunidade culrural. lsso implica que a constituição de uma identidade cultural européia e a decorrente formação de um povo europeu mesmo . poder-se-ia convencer esses irnigrantes e seus descentes de que a exigência ou sugestão de assumir as virtudes históricas do Estado-nação europeu como fundamento da pertença à pátria européia. 2000: 101). a proposta de que a consolidação e ampliação de uma idenridade culrural inclusiva corìstituam a ma¡¡iz para uma integraçâo social que.plano da integração homogêneas. não partilhando um mundo da vida comum. de fato. uma auto-evidência empírica.. A isso se sotna a evidência de que a Europa Ociclental. o que caracteriza a constelação pós-nacional é precisamente a inexistência de uma superposição autornática entre os processos culturais e sociais e as fronteiras geográficas dentro das quais eles for¿m tradicionalmente ordenados. por 28 majs abstrata que ela seja. segunda dificuldade política do projeto habermasiano de constifuiçâo de uma "rutÇãq" européia relaciona_se nâo mais com os problemas para sua implementação. Ou €1a. se transforma cada vez mais num continente de imigrantes. estará associada: a) a aþma forma de repressão das diferenças culturais que sejam divergentes da identidade européia a ser construída a plausibilidade de implementação desse projeto político -nos dias atuais é seguramente discutível. a integração social pós-nacional requer a afirmação ou construção de uma identidade comum abrangente. que entre a extensa massa de jovens conservadores de direiu de Dresden ou N{anchester. de fato. em São Paulo ou Maputo. Ou de outro modo. a quedtâo que interessa discuti¡ é se. no social e da constituição de vínculos voluntários de pertençã. os mecanismos inevitáveis de inclusão e exclusão que marcam os gn¡pos vinculados por uma idenridade comum. rnas também bélicos cle nacionalidades . se seguir o padrão da formação dos Estados e naçöes na Europa. tem-se que reconhecer que a construçâo da identidade pós-nacional. não é uma afronta. Com efeito. longe estava de representarr. de uma identidade abrangente. ape_ sar de todas as bameiras impostas à entracla de esrangeiros. Trata-se dos descendentes das gerações escravizacias ou exploradas pelos poderes coloniais europeus. convive uma multiplicidade de interpretações das diferentes trajetórias nacionais dificilmente traduzíveis na imagem de uma identidade cultural européia. os esnldos empíricos sobre as ransformações sociais que acompanharn o processo de integração econômica e 29 . Se.glórias'. parece apoiar-se na premissa. na qual escolheram ou foram levados pelas circunstâncias a viver. dos adeptos de determinadas tendências estético-culrurais. No espaço nacional. não convergem para a formação cle uma iclenticlacle cultural ou de uma cultura política européia comum (ver. 1961).. o que se nota é precisamente uma mukiplicidade de redes e espaços comunicativos transrucionais. Estas não se caracterizam pelo esforço de envolvimento direto de uma ampla base de participantes.) que. orig.2O0I:96). no lugar de uma identidade. como a dimensão instirucional do mundo da vida. Nesse processo.2004. etc. condiçâo necessária para conferir transparência proa"rro. em contraposição aos interesses particulares de grupos políticos e econômicos. enconüe_se em processo de formaçâo (Kaelble. na qual as decisòes necessitanr ser permanentemente fundamentadas e justificaclas. portanto' de uma caixa de ressonância das cJemandas sociais e de órbita intermediária que conecta os centro. transportando p^ra dentro dela os pontos de visras. 2000: 181). Algo semelhante se verifica com a sociedade civil: nada indica que um equivalente funcional a elas. 1Ð2) que pudessem ser. Avritzer. no âmbito europeu. 2005. entretanto. se comunicam e intercambiam experiências diversas. de empre_ sários. 2004). a existência de encontros comunicativos e mesmo de redes sistemáticas e duradouras de intercâmbio entre grupos sociais e indivíduos de origens diversas. dinamizar e vitarizar a esfera pública. o que se tem são contextos transnacionais múltiplos em que atores sociais. Ao contrário. Cosø. dessa forma. no plano cultural. contl¡do. "o. ZOOZ). 30 31 . a existência de uma esfera pública influente e porosa torna_se. Definida.. mostrando_ie que esse processo é.s de tolnacla de decisão política e o conjunto da socie<Jacle. portanto. decisórios e dinamis¡no à vida cívica (Hãbermas. analitica_ mente. de furistas.. No lugar de organizaçÕes ou de um "contorto de ação" (Re¡del. 2e01.cuja tarefa é a preservação e renovação das tradiçÕes. 1992J. ^público 1990. No caso europeu. portanto.t Generalizando e sintetizando as observações sobre a unifiõação européia reunidas até aqui. a democracia moclerna aparece representacla coino uma dominação consentida. à formação das esferas públicas nacircnais. os diferentes argumentos e posições representadas na sociedade civil circulam por umâ variedade de fóruns e arenas comunicativas que.fìca_se. ciepenclenclo sempre da anuência da comuniclade política pam (lue p()ssarn ser irnplementadas. Ao lado de eleições livres e do arcabouço institucional do lrstado democrático. Quando se extrapolam. os argumentos e as posições condensadas no plano das relações cotidianas (Costa..r"rrr_ portat para a esfera pública demandas e expectativas normativas que dizem respeito ao conjunto da sociedaäe. 2005). concomitanre com o surgimento dàs Estadäs_naçao modernos e com a formação das comunidades nacionais como um integrado lingüística e culturalmente (Habermas. nos âmbitos nacionais (frciz. tratados como dimensão insti¡¡cional de um mundo da vida europeu' o que se tem é uma multiplicidade de redes trar¡snacionais específicas que não apresentam a mesÍut densidade organizacional dos movimentos sociais. Avritzer. 2005). À sociedade civil caberia. efetivamente. solidariedades e identidades. O processo de construção insritucional do Estado-nação tem correspondência. a esfera públic:r se torna a arena na qual se dá tanto o amálgama da vontade coletiva quanto a justificação das decisÕes políúcas previamenre acertadâs. como já referido. não havendo indicações de que possam esur lurgindo estrun¡ras c pazes de canaltzar essa multiplicidade de fóruns comunicativos para uûra arena comum (Satahãm. independentemente de suas origens nacionais. no modelo habermasiano de democra"i". cãbe à sociedade civil. ESFERA PÚBLICA EUROPÉTAi' Na teoria discursiva. uma esfera pública e uma sociedade civil ãu_ ropéias. segundo os termos clesenvolviclos por Habermas.pclítica ûa Europa mosram que iá existem culturas transnacionais setorializadas (de empresários. no interior das quais são produzidos e reproduzidos os signos identitários que definem a nação (Cosra. no cotidiano de imigrantes. em geral. Eder. Veri. nem aludem à representação de um coletivo abstrato como uma sociedade civii européia. desconectados uns dos outros (Olesen. r¡ada indica que esses diferentes conrextos comu_ nicativos encontrem-se a caminho de convergir para um espaço público continental comum. t t _r. 2O02a: capiulo 2. em consonância com Cohen e Arato (I9g9:49Ð.20O4). Doucet. A constituição das esferas públicas contemporâneas foi ambém largamente esudada pelo autor. na ¡nedida em que reivindicam algum sentido político. Esses diversos contextos comunicativos _ que. a crescente pluraüzàçåo culrural produzuma segmentação e descentralização crescente dos flt¡xos comunicativos.. o que se pode afirmar é que. . O papel da sociedade civil no interior das esferas públicas nacionais foi igualmente destacado por Habermas.a convergem para a esfera pública compartilhada e acessível ao coniunto dos cidadãos. das comunidades científicas e dos movimentos sociais. as fronteiras de um Esado_ nação específico.. de fãs de tecbno ou bip_bop. por exemplo. em vista cle nossos objetivos. redefinindo a idêia de legitimação. conseqúências teóricas mais extensas. As exigências e critérios de legitimação política. às exigências procedurais próprias aos processos de comunicação e decisão" (Habermas. concebida como um conjunto concrero de organizações de caráter nâo estatal e ancoradas no mundo da vida. de ouro. de outra maneira. pode se tratar. as quais funcionam como "encenaçÕes públicas" paÍa teûìas que. 2A0i. Irar¿ os objetivos do presente livro. seu interesse para nossos propósitos no presente livro seria reduzido. Desse modo. conruclo. como fonte de 33 . funclacla na iciéi:¡ <Ie uml goterTutnce uitbout gouemm.. No intuito de encontrar. a sociedade mundial de cidadãos. apenas o status de ferramenta político-ideológica na luta contra o unilateralismo americano. como no caso da intervenção na ex-Iugoslávia. de urn lado. conrl¡clo. parece remeter ao conjunto heterogêneo de forças identificadas com uma . atos eleitorais.Organtzaçào do Tratado do .dinâmica esfera pública supranacional. no lugar de criar uma orde¡n global clernocútica. Essa concepção da ordem cosmopolita leva o autor a confrontar-se com pelo menos dois tipos de problernas.ent (Züm. a concepção discursiva da democracia busca se ajustar à dinâmica pós-nacional.. Se a alusão a uma sociedade mundial de cidadãos apresentasse. decorre do fato de que assume o caúter de categoria norrnativa. Sua relevância. grêmios e votos. nesses casos. contudo. e à viabilidade da construção de uma democracia cosmopolita em tdo o mundo. o equivalente funcio_ nal à sociedade civil articulada. Habermas alinha-se 32 a unìa corrente c. uma vez que a ênfase democrática tem que se deslocar "da incorporação da vontade soberana em pessoas. não podem ser aqueles que vigoram no âmbito do Estado nacional.nis cle peno.consciência cosmopolita". não integrariama agenda política.diga-se. Aqui. mas um guarda-chuva moral arbitrário de aplicaçào ad boc. agravam as assimetrias de poder nas relações intem:rcionais (Costa. 2003b). as diferentes avaliações feitas por Habermas em relação às possibilidades de superação do déficit democrático no interior da União Européia.6 DEMOCRACIA E DiREITOS HUMANOS EM ESCALA GLOBAT Para além das razões político-institucionais.¿d¡ vez lnais influente no câlltpo clisciplinar das relaçÒes internacionais e que busca <. interessa n. São rnuitas as críticas feitas a esses modelos que. em diversos contextos nacionais.política de poder'. contudo. 1Ð8. quanc. nâo implicarn un1 encontr() presencial entre os atores. nas formulações recentes de Habermas. de recles virtuais não conver¡1em para uma . é fundamenada com base no argumento da inexistência de uma cultura política comum. 1998:766). impulsionar a construção e. Trata-se aqui de insrâncias múltiplas de negociação e discussão que deveriam estar abertas tanto para a participação de ONGs quanto para^ a promoção periódica de conferências temáticas globais. a pàrtt do grau de transparência e acessibilidade das decisões políticas e nâo mais pela possibilidade de intervenção direta nos processos decisórios. 1Ð8: 168) ou aré nesmo a OTAN . Habermas evoca uma emergente sociedade mundial de cidadãos (VeltbUrgeryesetlscbafi).tlântico Norre. aqui.A.:3Ð. a "sociedade munclial cle cicladãos" não é mais um conceito sociológico. uma vez que este apresenta. confomre sintetiza Giesen (2000). E¡n sua clescentralizada. o segundo problema colocado pelo moclelo cosnropolita proposro por Habermas. conforme as conveniências e preferências políticas do momento. que lograra. Considerada essa limitação. promovem crescentemente a integração socieuiria para além das fronteiras nacionais.lo. aincia que não seja explicitamente definida por Habermas. a qual passa a ser concebida e afeÅda. Diferentemenre. cla sociedade civil nacional./ou aprofunclamento da democracia. podem compor a Veltbürgergesellsc b art tanto cidadãos cosmopolitas quanro govemos democráticos empurrados pelas virtudes cívicas de seus membros à ação cosmopolita (Habermas.o enfrentada pelo autor é cla ordem da sociologia do poder e diz respeito às forças sociais que poderâo promover a transição de uma . Esø segunda questã. Assim concebida. no plano mundial. A primeira questão diz respeito à legitimação de uma arqui_ tetura institucional descentr^lizada e que não rem a forma de urn Estado. a democracia cosmopolita deve ser pensada for¿ do projeto de um arcabouço de instiruiçôes que se aglutinem na forma de um Estado mundial. atuaria no sentido de antecipar "uma situação cosmopolita" (Habermas.lesenhar ins'roclelos titucionais par¿ urna de¡noc¡acia cosrnopolita. 172). (Macbtpolitikou pouter politics) p ra uma "política intema mundial'cosmopolita". o risco sério e evidente que corre um projeto de democracia cosrnopolita assente na suposta "sociedade mundial de cicladãos" é o de contribuir para disseminar mundo afor¿ as experiências. de recursos. autonomia individual quanto a autonomia pública se concretiz?m. de forma absrata. mosrando que os direitos humanos. no fato de que só a plena vigência dos direitos humanos pode garantir os requisitos cåmunicativos para o exercício da soberania popular e para a emergênç. De alguma maneira. ainda no começo dos anos 1990.. pedra angular de sua proposta para urna ordem cosmopolita. Afìnal. ao contrário. na teoria discursiva da democracia.r. Esse risco é tanto mais grave e real quando se leva em conta que. se a sociedade civil. contudo. rnas como complementares. ver. assim. poder. o qual garante que os destinatários do direito sejam também seus que tanto a ". Agora. não são representativírs do coniunto da socieclade mundial. O ancoramento normativo da ordem cosmopolita nas expectativas morais da Weltbúryeryesellscbafinão parece ser a solução teórica adequada para responder ao desafio da construção da democracia pós-nacional.final. a hegemonia dos atores sociais das sociedades do Atlântico Norte na definição dos temas. Habermas busca reconciliar a tradição liberal e a tradição repu_ blicana.. a identificação com as aspirações da "sociedade mundial de cidadãos" passa a ser utilizada como justificattva para as ações transnacionais dos movimentos sociais. que expectativas e problemas cristalizados nas esferas cotidianas sejam trazidos à discussão peros atores da sociedade civir. diferentemente de sua primeira teoria da democracia. na cooperação ransnacional entre ONGS e mesmo nas ONGs transnacionais. OS DIREITOS HUMANOS NA ORDEM COSMOPOLITA Ao estudar. a sociedade munclial de cidadãos. por .{qui. Klein e¡ al.). expectativas normativas e formas de percepção política predominantes naquelas sociedades que rêm maior poder para definir a agencla global. seu equivalente funcional.þ deum direito positivo democrático. nas experiências históricas particulares e nas formas de seleção e percepção de um número muito reduzido de sociedädes civis nacionais. que. identidades e solidariedades. é inconreste: O discurso que u:¡ta de redes e nós não pode encobrir o fato de que. Ora. 2001:9. Giesen. Os problemas do modelo Fatados aqui.. mas também para a quebra da soberania de Estados e até para* as "intervenções militares humanitárias". sem o qual. portanto. Rorh. arrt a ouoor. mas no conjunto de procedimentos que permitem. figura lapidar do pensamento republicano. uma vez que reproduz e congela as assimetrias de poder entre as diferentes sociedades. â. e a soberania popular. Ati a legi_ timação política não está ampanda na sociedade civil mesria. segundo os termos do di¡eito intemacional positivo.ocidenul.z. a respeito. as relaçòes en_ tre moral e direito no âmbito de um Esudo nacional particular. 2005.2Cf]Ð.ra v.Iegitimação prévia de todas as ações supostamente voltad^s p ra a construção de uma ordem cosmopolita.. Habermas toma as própriãs aspirações normativas da sociedade mundial de cidadãos como fonte imanente de legitimação (veja. estará igualmente associada à reprodução de tradiçÒes. a partir do esrudoda forma especíñca como Habermas fundamenta uma política mun. þsß uerbix "a substância dos direitos humanos encontra-se presente nos requisitos formais necessários 34 35 . é no interior do processo djscursivo de formulação das regras de convivência. no plano transnacional.tial dos di¡eitos humanos. A relação de reciprocidade enûe direitoJ humanos e soberania popular reside. as liberdades individuais não existem. do repertório de estratégias e das prioridades da "sociedade mundial de cidadãos". são lglofundados a segut. Habermas atribui uma legitimação imanente à sociedade mundial de cidadãos.. conforma a climensão insrirucional do mundo da vida. 2000). qualquer que seja a definição utilizada. tÀo cara aos liberais. . como esses procedimentos não esÉo regulam"rrt do. de pessoal e temas apresentâ um claro desnível norte-sul (. o autor aceita quem sabe até mesmo espera e lorce para que a dimeruão étjco-normativa que falta à cuin¡ra polírica da sociedade mundial encontre seu sucedâneo na forma ãe vida secularizada e destradicio nalizada.rtor. Apóiam-se. em vista das assimetrias de poder existentes. Isso vale não apenas para pessoal e esru[uras de decisão. não devem ser tratados como coflcorrentes. independentemente de sua legalidade. mas também para a escolha das campanhas que são feitas sob medida para atender ao gosro do público de filanrropos da OCDE (Ro¡h. na ordem pós-nacional. circunscrita à esfera nacional.. umbém. a distribuiçào de influência. entendidos como igualdade universal das possibilidades subjerivas de ação. na formulação de seu modelo para a transição a uÍra ordem cosmopo[ta. os di¡eitos humanos. A transição de uma o¡dem política e legal centrada nos Esta_ dos nacionais para uma ordem cosmopolita pós-nacional exige. Nessa autocrítica. de certa forma. Nas palavras do autor: Hole as oafrasculturas e religiôes do mundo estão exposras aos desafìos da modemidade societária de forma semelhante àquela que estcve a Europa. Essa forma de justi-ficar uma política rnunclial pelos direitos humanos apresenta. contudo.a^m. trabalhadores. Trauda nesses teffnos. no interior do qual o conjunto de membros da sociedade mundial pudesse se tomar suieito e destina¡ário de um direito cosmopolita. contudo.rró d" modernização pudessem ser recicladas nos diversos contextos.tamento plenamente igualitário" (Habermas. a expansão dos di¡eitos humanos como parte de sua missão nacional como potência hegemônica. na medida em que. conrudo. o desenvolvimento da modemidade se dá através de ciclos históricos que levam à expansão progressiva de um conjunto de esûun¡ras sociais. Assim. Habermas fundamenta a açào ofensiva dos países ocidentais em favor dos direitos humanos. segundo o autor. que se justifìca por sua inevirabilidade e que é autoconsciente de sua precariedade nolmativa e de sua transitoriedade. sua apologia do papel do'Ocidente" na defesa dos direitos hurnanos é entendida como decorrente da condi$o moderna que atinge todas as regiôes da sociedade mundial. "só depois de duras lutas políticas. judeus. em alguma medida. da relação entre direitos humanos e soberania popular. entendidos como a reação européia eos processos de individualizaçào e secularização vividos nos seculosXVlü e XD(. quando os direitos humanos e o Estado de direito democnáticå fo. se colocam como resposta aos dilemas vividos por países que se encontram hoje em estágio correspondente de desenvolvimento. receptor dos ideais universalistas europeus. Do ponto de vista analítico. Admite que se trata de um padrão paternalista de relações norte/sul. de três ordens ou níveis de objeções. permitindo que as respostas encontradas pelos europeus aos problemas colocados por seu próprio pro.. é necessário evocar uma política ofensiva pelos direitos humanos que faça com que os anseios difusos dos "cidadãos mundiais" ganhem materialidade. a saber: nível das relações intemacionais. na bistória européiarecente. ao menos temporária. de sorte que os di¡eitos humanos possam vigorar mesmo naquelas regiõLs. contudo. a rupfura. a panir das expectativas morais da "sociedade mundial de cidadãos". de um lado. Emrelação ao primeiro nível. Habermas mostra-se. o autor busca afastar-se da posição dos Estados Unidos que inrerpreta. ciganos. 2O0l: 36). nas quais não vigoram o Estado de direito e as condições cores_ pondentes paraaformação democrática da opinião e da vontade política.antecipação (Voryriff) de uma furura situaçâo cosmopolita que essa própria política ajuda a promover" (Habermas. consciente do risco eurocentrista subjacente à sua justificação da expansão dos direitos humanos. Tr¿ta-se aqui. orâ colno Europa e definido como precursor e difr:sor dos direitos humanos e. É como se a história européia se repetisse com atraso de décadas ou até séculos nas demais regiões. o descentramento da concepção de direitos humanos. O e><ercício da autocríticâ se restringe. mulheres. grifo acrescenødo). O proragonismo conferido ao "Ocidente" na condução desta estratégia de expansão dos direitos humanos é justificada pelo autor unto clo ponto cle vista político-normativo quanto analítico-teórico. um centro da sociedade mundial.. orâ tratado como Ocidente. 1ÐB: 1g1.. o plano drs relaçÕes intemacion:ris. segundo ele. inventados (Habermas.à institucionalização daquele tipo de formação discursiva da opi_ nião e da vontade na qual a soberania popular ganha sua feição legal" (Habe rmas.J5). politicamente. de outro.7 Diferentemenre de tal justificação. 1992: 1. Habermas não rompe com a representação antinômica entre. de determinados padrões modemos de sociabilidade e de um corpo de valores da Europa 36 para as demais regiôes. um patemalismo.orrrropálitæ que essa política busca afirmar. Âssim. o resto do mundo. basicamente. as quais dificultam a compreerìsão e legitimação dos arueios . parece que a idéia de que os direitos humanos correspondem a uma "linguagern universal" ecpressiva das aspiraçÕes morais clos cidadãos 37 . fragitidades diversas. questÕes históricas e problemas da ordem da teoria da democracia. a política transnacional pelos direitos humanos adquire o caráter cle . 2001:179). em seu devido tempo. na medida em que não e:. Segundo esse raciocínio. homossexuais e exilados passaram a ser reconhecidos como seres humanos com direito a t¡". a reconhecer.iste um Estado consti_ tucional mundial. O que se viu. Em outras palavras: para que as promessas cosmopolitas conridas na política dos di¡eitos humanos sejam plausíveis não é necessário que se dilua as contradições intemas dessa política em pseudo' conceitos ecumênicos e. À seu modo. Traø-se de uma teleologia da história que coloca aquele conjunto de sociedades que se industrializou pioneiramente como reservatório dos valores. como se mostrou. que a maquinaria de guerra apresenta uma dinâmica sistêmica própria e imperativa: não espera razões políticas para ser acionada. nas demais regiões. definindo-os como expressão das vi¡n¡des morais de seus emissores. rrras em oposição ao domínio colonial europeu. rrras como parte de um cirmpo conflitivo de disputas simbólicas e materiais. A segunda ordem de objeçÕes a uma defesa apologérica dos direitos humanos diz respeito à visão da história social modema nela contida. Essas sociedades viveram e vivem seu próprio "descer¡tramento" das possibitidades de inclusão conricl-s nãs direitos humanos.). além e acima das relaçöes de poder concretas no interior da política mundial. sistematicamente. de gênero. vazios de qualquer conteúdo sociológico. Diante dessas constrições. é histórica. deixa-nos analiticamente desarmados para entender os paradoxos que cercam os diferentes discursos sobre os direitos humanos e as tensÕes que acompanham as lutas por sua concretização nos diversos contexlos. Ao contrário. o papel da máquina bética na política mundial e na produção dos discursos morais de apoio às intervenções. Esse processo não acontece a reboque da Europa. 2mL. A história da modernização das ex-colônþs não representa a repetição retardatât'n da modemização européia. as diferengas de poder regionais.. agindo 38 através de lobbies. Os di¡eitos humanos devem servistos não como aiuda patemalista ao desenvolvimento. como espera Habermas (2001: 180 et seq. contudo. quando se abstrai dos mecanismos de poder que operam na produção dos discursos sobre os direitos humanos. nào se pode deixar o destino da política cosrnopolita depender da boa consciência de um "Ocidente judaico-greco-cristão" e de sua suposta "capacidade reflexiva" de "disunciar-se de suas próprias tradições". culturais e morais observadas em várlas regiões do mundo. como as chamadas "guerras humanitárias" recentes sobejamente mostraram. instituições e formas de vida que são. De fato. não é ontológica. a história de desenvolvimento dos di¡eitos humanos na Europa. A idéia de que história de construção dos di¡eitos humanos possa reproduzir. Muito pelo contrário. no interior dqs quais os desenvolvimen¡os que levaram os países do hemisfério norte a adquirir uma posiçã_o-privilegþdam defesa dos direiüos humanos. na verdade. refere-se a uma seqüência particular de eventos ocorridos em um coniunto reduzido de sociedades determinadas. que rnarcam o surgimento da política mundial dos di¡eitos humanos. no âmbito das empreiødas colonial e escravocrata. a parttr do século XVIII. Isto é. Têm-se. nurna escala imagirrária. independentemente de sua real inevitabilidade. essas regiões estiveram confrontaclas com a condição modema desde os tempos coloniais. Não representa. Ficou evidente. É indispensável ir além de qualquer antinomia essencialista que separe a história de modemização do "Ocidente" (West) e do "resto" (resr) do mundo (HaLl. fossem apresentadas como inescapáveis. por assim dizer. - 39 . 1997a). para que estâ construa os argumentos que legitimem a condução de mais uma "guerra iusø". Essa visão ignora a interdependência e simultaneidade entre a modemização material e moral da Europa e as transformações materiais. precisam servistos como circunstanciais e contingentes. Essa posiÉo não é necessariamente definitiva isto é. a dinâmica observada na Europa é equívoca. Randeria.2WÐ. recenternent€.mundiais. é que a influência do complexo industrial-militar nas relações intemacionais levou a que as "intervenções humanitárias". cobrar o cumprimento das promessas que enunciam. aliciamento e técnicas variadas de propaganda põe a política em ação. étnicas. não representa uma lei histórica de transformação de aplicação universal. histô rias de modemi¿ação entrelaçada s (entangled bìstoriÆ. desconsiderou-se. É na busca dos interesses diversos e das relações de poder ocultadas na intenção declarada de promover o bem comum da humanidade que se podem interpelar os discursos universalistas e. subomo. e os desafios que enfrentam na concretização dos di¡eitos humanos an¡almente não podem ser compreendidos sem que se recupere o nexo histórico que as vincula à modemidade européia. as possibilidades cosmopolitas nascem do esforço político e cognitivo de revelar as incompletudes e parcialidades contidas nos discursos universalistas. mais avançadas. cooptação. Nesses casos. perdem-se os iflstrumentos analíticos que permitem captar as tentâtivas de sua instrumentalização. em todos os casos. etc. nesse caso particular. vividas nas diversas regiões do mundo. ora à produção de colpos doutrinários que buscam conciliar os ideais de igualdade com as hierarquias estamentais efetivamente existentes. para que os di¡eitos humanos possam funcionar cognitiva e noffnativamente como força propulsora de uma ordem cosmopolita cabe evitar qualquer apologia da história européia. Os negros encontram-se mais abaixo e mais abaixo de todos encontra-se parte dos povos americanos (Kant. onde negros. na qual os países tecnologicamente mais avançados do Atlântico Norte representan¡ por desígnio ou por força dalógica intema de um ciclo evolutivo. indígenas. Assim. McCanhy. o reflexo momentâneo de um conjunto de injunçÕes políticas particulares. Quando tr¿nspostas para as Américas. Os indígenas amarelos rêm um alento limiado. Kant desenha a imagem de uma humanidade dividida em hirerarquias biológicas. Ventura. no mesmo momento em que a Europa "inventava" os direitos humanos e o Esado de direiO para seus próprios cidadãos. em todas as suas partes. da qual rraravam os di¡eitos humanos. esses autores estabelecem uma linha demarcatória entre o homem do iluminismo e aqueles que se constroem como seu oposto. Ao lado da história social. 1987). há que se reconstruk as múltiplas histórias das lutas sociais pelo descentramento e expansão desses direitos. entre outros. AIi. Quando se leva devidamente em conta a história colonial. desde seus primórdios. na quais o homem do iluminismo europeu despontava como superior a todos os demais: Nos países quentes o homem amadurece. A brevíssima pbysis_ cbe geograpbie (1988. Trata-se da articulação complexa e paradoxal entre propostas universais de reconhecimento e concepções restritivas de ser humano inscritas em muitas das definições dos di¡eitos humanos 40 dos primeiros universalistas. umâ certa vanguarda moral do mundo contemporârìeo perde sua plausibilidade empírica e política.. à essa época. levando. serve ao mesmo tempo de comprovação empírica da superioridade biológica dos brancos e de referência para que os diferentes graus de inépcia dos "não brancos" para a vida civilizada pudessem ser avaliados (ver.portanto. ora a novas formas de exclusão. nas Américas. pelo racismo científìco. brancos e os chamados mestiços povoavam os limites geográficos dos Estados nacionais que iam se formando. É nessas regiões que se encontravam os agentes da expansão do catálogo dos direitos humanos. lutando contra a opressão colonial européia. Com efeito. também a história das idéias nos fornece argumentos para sustentar que o descentramento das aspirações de reconhecimento contidas nos direitos humanos não esteve restrito às fronteiras geográficas da Europa. a complerude das zonas temperadas. é. à luz das constrições impostas pelo colonialismo e pela escravidão. O mesmo se constata ao longo dos processos mais recentes de emancipação colonial na África e na Ásia. 2002. raça e civilização são conceitos que se superpÒern: a assumida superioridade da t'cultura européia. defìnindo_se a partir de tal divisão quem efetivamente eram os destinarários dos direitos humanos (Brunkhorsr. orig. Em seu âmbito. cabe destacar que par¿ fundaclores da doutrina moderna de ígualdade universai. os propulsores da globali?zLçào dos direitos humanos estavam. 4t . na verdade. conrudo. cultura. orig. como veremos no Capítuio VI deste livro. a partir da segunda metade do sécuio XD(. os habitantes das demais regiÕes.s As luas pelos direitos humanos têm. um lugar definido numa linha de evolução inelutável e imutável da modemidade. 2001). os poderes coloniais que oprimiam e difundiam o ódio entre povos e etrrias. Aqui. a descrição da modemidade como traietória linear.802: 17).nsões entre idéias universais de inclusão e defìniçöes particùlarisras de ser humano produzem resultados diversos. A humanidade apresenta-se em sua maior completude na raça dos brancos. Nesses contextos. Na Europa encontravam-se. mais cedo. Por isso. uma origem múltipla. 1. 19gg. Com efeito. 1802) é particularmenre ilusrra[iva dos paradoxos contidos nas primeiras visões da igualdade universal. não parecia óbvio que a humanidade. o movimento concreto que caracterizou a recepção dos ideais igualitaristas ern muitas sociedades periféricas produziu. antes. as te. como Kant ou Hegel. as pretensões de validade universalistas revelam suas ambigüidades de origem.e Essa fronteira seria aprofundada. pudesse incluir povos não europeus. a reinvenção e a reconstrução desses. as diferenças enffe os graus de desenvolvimento tecnológico e material das diversas populações são congeladas e decodificadas na forma de categorias biológicas i¡redutíveis entre os membros de diferentes grupos humanos. não atinge. possivelmente. Uma nação menos fervorosarnente vinculada à democraci¡. mulherès ou homossexuais. grifos no original): enfrentados não mais apenas pela civilização ocidental. a "legitimação ocidental". quem sabe. protegendo-se em redes e mecanismos informais infensos à ação da lei.Em países como os Estados Unidos. dos di¡eitos humanos. como insúumento ideológico para forçar inclusão política e social de grande parte de suas populaçòes. Isso se verifica no caso br¿sileiro. mas da falta de efetividade do direito. efetivamente. sem qualquer conseqüência prâuca.justas em contextos secularizados e pós-tradicionais. De todos os modos. pñprio crcdo naciorøl e de seus ideais maß anaþados. Conforme as palavras de Myrdal (2000: 91. da sociedade preconceituosã que. nas novas nações independentes. parece perder sua consistência. quando transposta para a política mundial. acrediøndo menos intensamente na inferioridade biológica do grupo subaltemo. a contribuição do "Ocidente" à construção de uma ordem cosmopolita. funcionando como válvula discursiva que garante um mínimo de verossimilhança à retórica universalista numa sociedade (pós-)escravocrata. nos terrnos propostos por Habermas. A oferø do tipo de "legitimação ocidental" nada dtz sobre essas violaçÕes ilegais. o preconceito racial é uma função do igualitarismo: o primeiro é a perversão do segundo.construção de regras de ocidentåI" convivência. consolidadas no século XD(. O dogma racial foi talvez a única saída possível para um povo tão moralisticamenre igualiarista. contudo. a construção ideológica da inferioridade do negro vai forma de uma ordem constinlcional construída discursivamente conforma o "tipo de legitimação ocidental". a idéia dos direitos humanos como procedimento. Uma dificuldade adicional da proposta diz respeito às culturais para que o procedimento da negociação discursiva do di¡eito ganhe plena plausibilidade. Não obstante seu interesse como núcleo de uma teoria discursiva da democracia. Cabe.998: 192). discrirnina negros.. observa-se uûÌa correIação direta entre a difusão do ideal de igualdade e a produção e posterior recrudescimento do dogma da desigualdade racial. viver em paz num sistema de castas. para as quais o consenso nornntivo em tomo do respeito aos direitos humanos. corpos doutrinários distintos que buscam estender os di¡eitos humanos a todos os grupos demográficos. Conforme entende o autor. Tr¿ta-se aqui da polícia comrpta que desrespeita os di¡eiros civis. na qual vigorassem plenamente os direitos humanos. poderia. destacar os inconvenientes da ordem cla teoria democrática relacionados com a associação estabelecida por Habermas entre os direitos humanos e a forma iurídica particular 42 (Habermas. dado que a declaração é integracla à constituição brasiJeira. Assim. de uma humanos como procedimento. 1. o que se observa é que a história da difusão e recepção dos direitos humanos desautoriza a visão de que estes se expandem linearmente da Europa paru o resto do mundo. no interior de um Estado-nação específico. a história de formulação dos di¡eitos humanos precisou ser reescriþ e liberta de seu etnocentrismo para que tais direitos pudessem funcionar. A tþcæsidafu dolrrcconcetto racial cortø[tonde. à necæidafu de unø parte dos atnericanos de seu. parafraseando . No contexto das sociedades coloniais e escravocr¿ltas. rompendo com as ambigüidades presentes em formulaçÕes como a de Kant. rnas na esfera das relações sociais. mas como uma forma de negociação das regras que regulam a vida comum trata-se. Ora. por último. { Enr outros contextos. Isto é. A proposta tem o mérito de defìnir os di¡eitos humanos não por conteúdos prévios. que estes assumem no co{po das estruturas do Estado de di¡eito europeu. ainda que o país seguisse escravocrata. não 43 . só pode funciohar naquelas comunidades políticas habiruadas e habiliradas à discussão pública de seus conflitos e diferenças. na mesfira medida em que o ideal igualitarista se enraíza. Nesses casos. a adesão à declaração universal dos direitos humanos tem um sentido meramente formalista. Em outros terrnos. em suas práticas sociais.ianas. o qual "representa uma resposta encontrada pelo Ocidente aos desafios gerais a articulação entre direitos humanos e soberania popular na se intensificando.concepção dos direitos outro momento de Habermas. surgem. reside na oferta de uma forma histórica concreta e exitosa o (tipo de legirimaçào para enfrentar o desafio de. Em primeiro lugar há que se considerar que'boa parte das violações dos di¡eitos humanos observadas em muitas regiões decorre não da inexistência de mecanismos democráticos de processamento da opinião e da vontade. mas sistemáticas e cotid. quando este não pôde viver de acordo com suas crenças. desse ponþ de ûista. Não raro. a violação dos di¡eitos humanos tem lugar não no plano constirucional. discursivamente. no âmbito de uma política mundial. mais propriamente. Não possuem um corueúdo jurídico. Nesses tennos. mas que não podem nem devem ser decompostas discursivamente. que as relaçÕes de gênero.t ot interculturais que pemitam distinguir formas legítimaì. os di¡eitos humanos têm a forma de metåforizaçâo polissêmica. para além das disputas em tomo de sua interpretação. No âmbito da polírica mundial. A dificuldade principal do diálogcr intercultural em tomo dos di¡eitos humanos co'siste precisameñte em considerar adequadamente formas de autoridade. marcada por expectativas nomativas muito heterogêneas e relaçôes de poder fortemente assimétricas. os Estados Unidos où Canadá. contudo. Deve-se evitar a todo custo a tentação de transformar os progressos. ainda. práticas sociais e aspirações morais que podem ser reconhecidas como legítimas. os di¡eitos humanos não representam nem um conjunto predefinido de garantias legais.Para que seja efetivamente intercultural. As objeções não pretendem. os quais lograram construir. o desafio é precisamente construir p"oâ*. A democracia pressupõe. Trata-se. a qual fomece as condições de possibilidade da solidariedade entre esrranhos e provê o ceme ético-político compartilhado. ainda que soe provavelmente muito irnprecisa e frouxa. o objetivo de tra¡¡sferir formaros legais-instirucionais ne¡n a cultura política que os alimenu de uma região a outra. prévio ao processo político. no sentido enfático da teoria discursiva. socializados no âmbito de um mundo da vida secularizado e destradicionalizado. !997). A democracia requer. contudo. obviamente. por 45 . a qual não teria acompanhado os processos de irue_ graçao sistêmica. A ênfase no déficit de integração social se explica pelo nexo estabelecido pelo autor entre legitimação democútica e a possibilidade de fundamenação das normas em vigor. Constituem.m pleno senrido nos termos da grarnática moral de uma cultura determinada. nas condições presentes. a contribuição que pode ser prestada pelas açÕes transnacionais em flavor dos direitos humanos é eminentemente político-ideológica e tem o sentido de fortalecer as lutas 44 por reconhecimento. respeitadas as formas particulares que estas assumem nos diferentes contextos culturais. uma moldura político_diicursiva fìexível e aberta o sufìciente para abrigar lutas emancipatórias muito diversas e que só ganha. circunstanciais e contingentes obtidos por determinadas sociedades na implementação dos direitos humanos numa hierarquia moral entre formas de vida. conforme Habermas. encontram-se limiødas. formas de regulação das relações sociais mais próximas. racial ou étnica. observada em países como o Sudão. como entre as respectivas sociedades civis. a preexistência de uma cultura política comurn. CONCTUSÕES PARCIAIS E NOVOS DESAFIOS . a fundamentação racional das normas sociais.'base cognitiva e motivacional da negociação discursiva em tomo das normas que devem regular a vida comum. a democracia. de estruturas de poder meramente despóticas e opressoras. Essa descrição. parece expressar o grau possível de formalizaçáo p^"" pretensões de validade aptas a funcionar como instrumento do diálogo intercultur¿I. ranto no âmbito da União Européia. Essa ação não pode ter. Nesse sentido.{. .aos anseios morais de seus habitantes. político ou cultural imanente. só pode prosperar entre cidadãos que.ìequer modelos institucionais e legais específicos e adequados ãos desafios surgidos nos vários conrexros (Schubert. como se se tr¿Þsse de culturas com graus de desenvolvimento diversos.representa um problema. o diálogo em tomo de uma política mundial dos direitos humanos deve-se abstrair d"s experiências particulares de sua concretÞação histórica. de buscar superar a opressão de gênero. sem pretender. raciais ou étnicas nesses países se tomem semelhantes àquelas vigentes em países como a Suécia. mas que não são passíveis de inteçelação discursiva. um papel desucado na expansão do especuo geográfico de vigência desses di¡eitos. 199g). e a resposta a elas não pode repetir as fórmulas encontradas na Europa do século XVI[. quanto no âmbito mundial. não só entre os diferentes Estados nacionais. nas quais se obteve mais avanços. estejam habin¡ados e habiliudos a buscar.s possibilidades de vigência da democracia. o Brasil ou a Turquia. pela insufìciente integração soclal tr¿nsnacional. Afinal. As dificuldades imposas pela modemidade ao conjunto da sociedade mundial são inéditas. nem um padrão de legitimação política preestabelecido. expressiva de aspiraçÒes múltiplas e difusas de respeito e reconhecimento. o que a política dos direitos humanos deve promover é o combate aos particularismos e não às particularidades culrurais Çoas. há uma implementação desigual dos di¡eitos humanos nas diferentes regiões da sociedade mundial e que pode caber aos Estados e atores sociais oriundos daquelas regiões. porranro. ocultar a eviclência de que. sem definição elcrc:rlização sociológicas precisas. orafratzda como Ocidente. Most¡ou-se que as formulaçöes de Habermas acerca da inte_ gração na Europa são equívocas porque desconsideram que a constelação pós-nacional é marcada precisamente pelo desacoplamento entre fronteiras geográfìcas e fronteiras político-culturais. a sociedade mundial de cidadãos representa os reclamos normativos de uma parcela muito poüèo significativa da sociedade mundial. esse tipo de argumento ignora as interpenetrações e os processos simultâneos de transformação acontecidos nas diversas regiões do mundo. 1Ð2). Assim. Afinal. daqueles pré-requisitos cla democracia no interior de cada Esudo-nação particular. em de tomo de uma sociedade civil e uma esfera pública continental. Habermas busca relaxar o princípio da soberania popular. Trata-se. Isto é. a Vettbüryetgeselkcbafr. Tanto o argumento como a figura retórica utilizados por Haberrrus rompem com o projeto teórico da tradição crítica. desenvolvida numa ilha social. representa um padrão universal que pode (e deve) se repetir nas dernais regiões. de uma esfera pública dinâmica e cte um sistema jurí<tico e um sistema político porosos e transparentes. por toda a União Européia. O ar¡tor vale-se ainda de uma figura retórica. seriam recriadas as condições culturais e institucionais para que se reinstaurasse a solidariedade entre estranhos em toda a Europa e para que o processo de validação democútica das normas tenha lugar. para as cultur¿s políticas comuns. no movimento da história. O recurso à Weltbürgergesellscbøfi rño resolve o problema. os estudos empíricos mostram que a integração soõiat em curso. na medida em que não se pode encontrar em todas as regiões da sociedade mundial aquelas condiçoes necessárias para que as nomus possam ser negociadas e validadas discursivamente _ mundo da vida racionalizado. càpazes de assegurar a articulação adequada enüe as esferas sociais e sistêmicas. No plano mundial. M que se reconhecer que. os diferentes contextos comu_ nicativos transnacionais que vêm se constituindo. Cabe. nos terrnos de uma formação democrática da opinião e da vontade. reproduzirá a assimetria de poder norte/sul. Habermas transforma o próprio analisa social em lugar crítico. Assim. fundamenralmente. para se evitar que esta seja definida como um met¿físico espírito cosmopolita em formação. 47 . ora tratada como Europa. Conforme salientado. de urrul sociedade civil ativa. mecanismos de forinação d. a extensão. Como se mostrou. tem um caráter fragmentário e descentralizado. Para justificar o abrandamento do princípio discursivo da legitimação das normas. aglutina os esforços de transição de uma constelação munclial dominada pela política de poder para uma situação mundial cosmopolita. pelo menos temporariamente. Habermas mosûa-se o¡imista quanto às possibilidades de superação do déficit de integração social e de legitimidade democrática. aqui. Qualquer que seja a forma como se defina a cultura política européia. como o respeito aos direitos humanos. segrndo o qual o processo de modemização (europeu-)ocidental.entre as "sociedades ocidentais" democráticas relação patemalista e o "resto" do mundo. o qual inclui a "invenção" do Estado de direito e dos direitos humanos. instituiçoes e procedimentos. Habermas vale-se de um argumento histórico-filosófico. no plano continental. as condiçoes de vigência. reconsrituir. uma .último. apresentando a democracia como uma forma de vida particular. do processo de formação nacional. a saida emancipatória. em sua existência empírica. es esferas públicas e as sociedades civis nacionais. em toda a Europa. deveriam vigorar em todo o mundo. No caso europeu. Ademais. segundo o qual M uma congruên_ cia entre o contexto de legitimação e aplicação das normas. no âmbito europeu. deve permitir o surgimento de equivalentes funcionais. Nada indica que o projeto de uma identidade européia pudesse unificar. uma vez que indicam a renúncia ao propósito de corstruir a perspectiva crítico-normativa a partir das aspiraçÕes de emancipação social efetivamente existentes (Honneth. um conjunto de estruturas. quando deduz a sifuação cosmopolita de uma teleologia da história. Is¡a é. qualquer que seia sua definição. a sociedade munrlial de cidadãos que. verificar-se-á que esta não se restringe às frontei¡as geográficas européias e tampouco está presente em todos os espaços sociais que geograficamente fazem parle da Europa. diante da ausência de um núcleo ético_ político comum à sociedade mundial. de um proieto político coordenado. rìormas que definam garantlas mínimas. Dessa forma. através. é o analista que decifra o sentido das transformaçÕes modemas e reconhece. acontecido em cada Estado-naçào particular.iscursiva da opinião 46 e da vontade admite-se. independentemente das possibilidades de sua validação nos contextos locais. idéia quais a dos interior no e III dois outros campos teóricos. com suas categorias-metáfora. COSl\/1OPOLITISÀ. do po. que acumulou conhecimento específico no estudo das relações de rabalho e da famflia.se desenhando. efeito. Comparecem também com regularidade nos suplemen- tos culturais dos principais jornais do mundo. Afinal. implica discutir ts critérios para a validação de noffnas que devem ter vigência para além clas fronteiras cle um Estad<¡nação específico' Habermas nos oferece duas possibilidades: a primeira. RIFLEXIVIDADE. contudo. A desenvoltura no trato com a sociedade da informação vale a ambos posição e reputação an-rbivalentes. Ao mesmo tempo. admite que normas validaclas num contexto regional particular podem ser transfericlars para outras partes. o presente capítulo buscou contribuir para enunciar de maneira mais clara a questão que constitui o tb¡"to . simultaneamente. ainda. traduzindo em linguagem leiga.olugão é politiáamente desconfortável: implicaria reconhecer na história dramârica e tzrdia de construção da igualdade imperfeiø e inacabada ent¡e brancos e negros nos Estados Unidos um modelo válido para combater o racismo no Brasil' O Capítulo rV retomará extensão à buscã de uma solução menos obrusa para iustjficar a ao racismo de forma qualquer da norma universal clo combate a II Capítulos nos visitaremos contexto brasileiro. é a . A primeira solução. De um lado. qual seia a aliança anti-racista entre o Brasil e os Estados Unidos. como notam Lash e Urry.1O Ulrich Beck e Anthony Giddens vêm logrando difundir suas idéias para um público que cresce em tamanho e interesse. ISeck e Giddens. se confundem. e cuja marca particular é exatamente a auto-reflexão. que desperta a suspeita dos pares e. além dos problemas teóricos que apresenta. dois tipos muito distintos de sociólogos: Beck é em pane um ensaísta e em parte um sociólogo das instituiçöes intermediário. as experiências cotidianas e os processos contemporâneos. a admiração pública. entendida nos terrnos da sociedade que se vê confrontada com seus limites. conforme figurada em seus próprios escritos. de cosmopolitismo vem ganhando novas definições' qu" CAPíTULO tl RISCO.Longe. Suas últi¡nas incursÕes pelas sociologias da ciência e do meio ambiente foranr 48 . É verdade que. ou de outra maneira. corporificam. limiuda ao contexto europeu. é pouca adequada ao nosso caso empírico. Antes. atenuândo. A força e a vulnerabilidade do t¡abalho recenre dos dois aurores têm uma origem comum a rigor. a angústia geral diante da opacidade da sociedade mundial. despertando igualmente a atençào de políticos e tomadores de decisão.to de vista cle uma teoriâ da democracíã. no conjunto de sua obra.tol da invesrigação apresentada neste livro e que.so viva da condição humana na modernidade tardía. eles se tomam a mztenaliza. o prestígio público crescente de ambos é acompanhado com reserva pelos colegas de ofício."n. implica a expansão das condições político-culrurais <Je valiclacão clas normas clentro do Estado-nação' A segunda prescincle da validação clas normas.em explorar o limite doCom mes¡na faculdade dos autores cânone científfco. cle inclicar qualquer solução para o problema u". não parece plausível que a história póscolonial comum sirva de cimento para uma identidade e uma cultura política compartilhada nas Américas' A segunda s.. 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