Reprodução e evolução
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Carlos AguiarBotânica para Ciências Agrárias e do Ambiente V o l u m e I I $Reprodução e evolução Instituto Politécnico de Bragança 2013 Publicado pelo Instituto Politécnico de Bragança Imagem da capa: Helianthus tuberosus (Asteraceae). Versão de 23-‐IV-‐2013 © Carlos Aguiar ISBN 978-‐972-‐745-‐124-‐1 1 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Índice 1. Ciclos de vida e biologia da reprodução das plantas-‐com-‐semente ..................... 5 1.1. Ciclo de vida das plantas ............................................................................................. 5 Conceitos fundamentais e tipologia ................................................................................... 5 Contextualização taxonómica do ciclo de vida das plantas-‐terrestres ............................... 6 1.2. Biologia da reprodução de espermatófitas .................................................................. 8 1.2.1. Funções e vantagens da reprodução sexual .......................................................... 8 1.2.2. Biologia da reprodução sexual das gimnospérmicas ........................................... 9 1.2.3. Biologia da reprodução sexual das angiospérmicas ........................................... 10 1.2.3.1. Etapas da reprodução sexual nas angiospérmicas ....................................... 10 1.2.3.1. Esporogénese e gametogénese .................................................................... 10 Microsporogénese e microgametogénese ....................................................................... 10 Megasporogénese e megagametogénese ........................................................................ 11 1.2.3.2. Polinização .................................................................................................. 12 1.2.3.2.1. Definição ........................................................................................................... 12 1.2.3.2.2. Sistemas de reprodução .................................................................................... 12 Sistemas sexuais ............................................................................................................... 12 Sistemas de cruzamento .................................................................................................. 13 Definição de autopolinização e de polinização cruzada ............................................... 13 Vantagens e mecanismos de promoção da polinização cruzada ................................. 13 Vantagens, desvantagens e mecanismos de promoção da autopolinização ............... 14 1.2.3.2.1. Cleistogamia e casmogamia .............................................................................. 14 1.2.3.2.2. Sistemas de auto-‐incompatibilidade ................................................................. 15 1.2.3.2.3. Sistemas de polinização .................................................................................... 16 Vetores e sistemas de polinização .................................................................................... 16 Síndromes de polinização ................................................................................................. 17 Polinização por engano .................................................................................................... 21 Importância económica da polinização entomófila ......................................................... 22 1.2.3.3. Germinação do grão de pólen, formação do tubo polínico e fecundação ... 23 1.2.3.4. Desenvolvimento da semente ...................................................................... 24 1.2.3.5. Formação do fruto ....................................................................................... 25 1.2.3.6. Dispersão ..................................................................................................... 25 Vantagens da dispersão ................................................................................................... 25 Unidades e agentes de dispersão ..................................................................................... 26 2 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Mecanismos de dispersão de diásporos ........................................................................... 26 1.2.3.7. Dormência da semente ................................................................................ 28 Tipos e vantagens da dormência ...................................................................................... 28 Quebra de dormência ...................................................................................................... 29 1.2.3.8. Germinação da semente .............................................................................. 29 Semente e germinação de Zea mays (Poaceae) «milho-‐graúdo» .................................... 30 Semente e germinação de Phaseolus vulgaris (Fabaceae) «feijão-‐vulgar» ..................... 32 1.2.4. Reprodução assexuada ....................................................................................... 33 Grandes tipos de reprodução assexuada ......................................................................... 33 Agamospermia ................................................................................................................. 34 Multiplicação vegetativa .................................................................................................. 34 1.3. Ciclos de vida das gimnospérmicas e angiospérmicas .............................................. 37 1.3.1. Ciclo de vida das gimnospérmicas: Pinus pinaster «pinheiro-bravo» ............... 37 1.3.2. Ciclo de vida das angiospérmicas: Prunus avium «cerejeira» ........................... 37 2. Introdução à biologia da evolução das plantas-‐terrestres .................................. 38 2.1. Noções básicas de evolução biológica ...................................................................... 39 Fixismo, criacionismo, essencialismo e evolucionismo .................................................... 39 A síntese evolucionária moderna ..................................................................................... 40 Síntese evolucionária estendida ....................................................................................... 42 Algumas características do processo evolutivo ................................................................ 42 A evolução da vida é real? A teoria da evolução é uma teoria científica? ....................... 44 2.2. Noções básicas de especiação ................................................................................... 44 Evolução por anagénese e por cladogénese .................................................................... 44 Conceito de espécie ......................................................................................................... 44 Conceitos de subespécie e outras categorias taxonómicas ............................................. 46 Mecanismos e processos de especiação .......................................................................... 46 3. Evolução das plantas-‐terrestres ......................................................................... 48 3.1. Do nascimento da vida às algas ancestrais das plantas-terrestres ............................. 48 Primeiras etapas ............................................................................................................... 48 A pluricelularidade ........................................................................................................... 50 As algas ............................................................................................................................. 50 3.2. As primeiras plantas-terrestres .................................................................................. 51 A ‘alga-‐verde’ ancestral .................................................................................................... 51 Estádios iniciais da evolução das plantas-‐terrestres ........................................................ 52 ...... 70 A origem da flor ........................... Os grandes grupos de angiospérmicas ....................................................... 69 3................... 68 Relações evolutivas entre as gimnospérmicas e as angiospérmicas ............................ 63 3... A flor ............................................................................................... 62 Subclasse Equisetidae .............................. As angiospérmicas ................................................................................................................................ x79 ................................................... As plantas-vasculares ....... 62 Subclasse Ophioglossidae ....2........................... Os grandes grupos atuais de gimnospérmicas ........................................................2............................................................................. 70 A flor primitiva .............................4.................... 56 Evolução ....................................... Primeira etapas evolutivas e principais características .................. 67 3.......1....................... 66 3........................................... 63 Subclasse Polypodiidae ....................................................3 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente As plantas-‐terrestres não vasculares ......4.... 63 Evolução das plantas-‐terrestres do Devónico à extinção cretácico-‐paleogénica ....................... Os grandes grupos de ‘pteridófitas’ ..... 75 Extinções em massa............................................4..................................4...................................... 76 3.....1............................................. 67 Principais características das angiospérmicas ................................... As plantas-com-semente sem flor ...................................................................3.......................... 75 Evolução das angiospérmicas no Neogénico ................................................ As plantas-com-semente ..............5...............1.................................... Relações filogenéticas entre as plantas-com-flor................... 54 3................................................................................................................ 72 3................................ 72 3........................................1.........4............. 63 Principais características das plantas-‐com-‐semente ................................................................................................................................................................................................................. 77 4.......................1................................................................................................................. 61 As plantas-‐vasculares-‐sem-‐semente............................ 62 3..... 65 As plantas-‐com-‐semente-‐sem flor........................................ Evolução terciária das plantas-com-flor........4............... 61 Subclasse Lycopodiidae ........... 67 Contextualização evolutiva .....................4.......2..................... 70 Polinização e evolução da flor ....... 56 Principais características das plantas-‐vasculares ..............2........... Referências ................................................................................................... Evolução das angiospérmicas no Paleogénico ..................................................... 71 Tendências evolutivas entre as plantas-‐com-‐flor ............................... Paleo-história recente da flora de Portugal .............2........................ 4 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente . Na reprodução sexuada alternam dois eventos fundamentais à escala celular. entre as quais as Charophyta. Este tipo de ciclo de vida é característico dos 1 Qualquer estrutura que permita a reprodução vegetativa de uma planta. gâmetas (e. Nas plantas menos evoluídas e nos animais envolve a fusão de duas células sexuais haploides (gâmetas ♂ e ♀) e a consequente formação de uma célula diploide (zigoto). animais) ou esporos (e. um ♂. consoante os grupos taxonómicos mais ou menos afastados no tempo: a meiose e a fecundação. Nas plantas-‐com-‐flor a fecundação é substancialmente mais complexa (v. numerosos Ascomycota) e da maioria das algas-‐verdes. A meiose é um processo celular durante o qual uma célula parental diploide (com 2n cromossomas) origina quatro células haploides (com n cromossomas). logo após a Figura 2.i. em qualquer um dos três tipos de ciclo de vida explanados no texto. plantas-‐terrestres). diplonte e haplodiplonte. Representação esquemática do ciclo de meiose: possuem uma meiose pré-‐gamética (= meiose vida diplonte gametogénica ou gamética) (Figura 2). fungos (e. por via sexuada e/ou assexuada. Nas espécies haplontes pluricelulares. de imediato. No ciclo 2 de vida haplonte (= haplôntico ou haplobiôntico-‐haploide) a meiose sucede a fecundação e a formação do zigoto.g. Durante a primeira divisão celular.5 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente 1. e outro ♀.g. Este tipo de ciclo de vida é característico de muitos protozoários.g. 3 Alguns autores são se coíbem de apelidar por esporo as células haploides formadas por meiose do zigoto nos seres de ciclo haplonte. diz-‐ se que é pós-‐zigótica (= meiose zigótica) (Figura 1). A meiose compreende 2 divisões celulares sequenciais: a divisão reducional e a divisão equacional. ou de dois indivíduos distintos. Nas espécies diplontes pluricelulares – a grande maioria dos seres com ciclo de via diplonte – os zigotos multiplicam-‐se por mitose reconstruindo-‐se. as demais células são diploides (eventualmente. Ciclo de vida das plantas Conceitos fundamentais e tipologia 1 O ciclo de vida (= ciclo biológico de vida) de um organismo estende-‐se do zigoto.1. A extensão e complexidade das fases diploide e haploide permite distinguir três tipos fundamentais de ciclo de vida nos eucariotas: haplonte. ou do propágulo . por essa via. embora de uso corrente. Em alternativa servem as designações ciclo de vida haplofásico. Após a divisão equacional diferenciam-‐se.). a divisão reducional. A fecundação é um processo celular simétrico da meiose. as células haploides produzidas por meiose podem sofrer várias mitoses antes de se diferenciarem os gâmetas). 2 . O zigoto é diploide. Ciclos de vida e biologia da reprodução das plantas-‐com-‐semente 1. diplofásico e haplodiplofásico. as células haploides 3 produzidas por meiose a partir do zigoto multiplicam-‐se por mitose dando origem a indivíduos pluricelulares haploides. de forma genérica. até à produção de descendentes (= reprodução). dá-‐se uma redução para metade do número de cromossomas. de forma sequencial. As designações “ciclo de vida haplonte” e “ciclo de vida diplonte”. todas as restantes células são haploides. os ancestrais diretos das plantas-‐terrestres (Equisetopsida). indivíduos pluricelulares diploides. A reprodução sexuada implica duas células especializadas – gâmetas ♂ e ♀ – provenientes de um mesmo indivíduo nas espécies monoicas. A reprodução assexuada envolve partes vegetativas de um único indivíduo. nas espécies dioicas. Os gâmetas são haploides. Representação esquemática do ciclo de vida haplonte No ciclo de vida diplonte (= diplôntico ou haplobiôntico-‐ diploide) a diferenciação dos gâmetas e a fecundação geralmente ocorrem. em alguns grupos taxonómicos. são imprecisas porque os termos haplonte e diplonte são também usados para designar. Figura 1. os indivíduos haploides ou diploides. de alguns fungos (e. e a meiose – meiose pré-‐espórica (= meiose esporogénica) – é imediatamente sucedida pela formação de esporos. respectivamente haploide ou diploide. O termo esporo também é aplicado a células reprodutoras não resultantes de meiose. Os esporos formam-‐se no interior dos esporângios. que a alternância gerações é uma característica comum e unificadora do ciclo de vida de todos os grupos de plantas. “planta que produz gâmetas” e haplodiplonte “planta que produz esporos”. ii) após um período vegetativo mais ou menos longo. A oogamia é um caso extremo de anisogamia no qual os gâmetas ♀ são desproporcionalmente maiores do que os gâmetas ♂. os seres heterospóricos produzem esporos ♂ (= micrósporos) e ♀ (= megásporos). Duas ordens de razões sustentam a aplicação do conceito de alternância de gerações aos seres haplodiplontes: i) os gametófitos e os esporófitos descendem de células reprodutoras especializadas distintas. pelo contrário. Contextualização taxonómica do ciclo de vida das plantas-‐terrestres A teoria da alternância de gerações de Wilhelm Hofmeister [1824-‐1877] e a formulação darwiniana da evolução são as duas teorias unificadoras mais importantes da biologia da evolução de plantas. das ‘briófitas’ e das ‘pteridófitas’. no tempo. com um importante papel na reprodução assexuada quer de gametófitos quer de esporófitos. nos taxa anisogâmicos (= heterogâmicos) os gâmetas ♂ e ♀ são distintos na forma e na função.i. de distinta morfologia.6 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente animais (Metazoa). Nos seres haplodiplontes heteromórficos gametófitos e os esporófitos são morfologicamente muito distintos. Figura 3.g. as estruturas – 4 As células não reprodutoras de um ser multicelular designam-‐se células somáticas (= células vegetativas).g. Para os distinguir muitos autores designam estes esporos por esporos directos e os esporos procedentes de meiose por meiósporos. tanto os gametófitos como os esporófitos geram novas células reprodutoras diferentes das que lhes deram origem. Hofmeister percebeu. de dois tipos de organismos. e apenas é produzido um tipo de células reprodutoras. esporos e gâmetas. Representação esquemática do ciclo de vida respectivamente. Nos ciclos haplodiplontes a meiose e a fecundação apresentam-‐se mais ou menos afastadas no tempo. plantas-‐terrestres atuais. 2004). O ciclo de vida haplodiplonte (= haplodiplôntico ou diplobiôntico) é substancialmente mais complexo (Figura 3). e. como referi. ainda antes da publicação da Origem das Espécies de Charles Darwin. Com a revolução darwiniana. 5 .g. et al. Chromalveolata) e de muitas algas-‐castanhas (Phaeophyceae. durante o qual as suas células se multiplicam por mitose. vários Ascomycota). Gametófito e esporófitas são duas palavras compostas de raiz grega que significam. de zigoto a zigoto. tal é o caso dos Charales. Os órgãos especializados na formação de gâmetas designam-‐se por gametângios. Os taxa isogâmicos produzem gâmetas ♂ e ♀ iguais. componentes essenciais no processo de fecundação. e. Os seres homospóricos produzem esporos iguais. dos oomicetas (Oomycota. Os dois eventos fundamentais dos ciclos haplodiplontes – fecundação e meiose – envolvem. respectivamente. A produção de esporos é um tipo de reprodução assexuada. dois 4 tipos particulares células reprodutoras (= células reprodutivas) haploides: gâmetas e esporos. os gâmetas. respectivamente em microsporângios e em megasporângio. Chromalveolata).). vários grupos de algas-‐vermelhas [Rhodophyta] e algas-‐verdes do género Ulva [Chlorophyta]). Díaz Gonzalez. Nos ciclos de vida haplonte e diplonte. Envolve dois tipos de células reprodutoras – esporos e gâmetas – e a alternância. Os gâmetas são células reprodutoras sexuais unicelulares.. confinada por uma parede de esporopolenina quimicamente muito resistente. Nos seres haplodiplontes homomórficos (= isomórficos) os gametófitos e os esporófitos são morfologicamente iguais. existe uma única geração. uns produtores de gâmetas – os gametófitos – e outros produtores de esporos – os esporófitos. Os seres haplodiplontes gozam de duas características fundamentais: alternância de gerações e alternância de fases nucleares. É importante desde já vincar que todas as plantas-‐terrestres (Equisetopsida) são haplodiplontes heteromórficas (v. O esporo é uma célula reprodutora unicelular produzida 5 após meiose (meiose pré-‐espórica). Salvo raríssimas exceções que não cabe aqui desenvolver (vd. a alternância das gerações gametofítica e esporofítica coincide com uma alternância de duas fases nucleares: a fase haploide (= haplófase) com n cromossomas e a fase diploide (= diplófase) com 2n cromossomas. g. As espermatófitas [gimnospérmicas + angiospérmicas] e quatro pequenas famílias de ‘pteridófitas’ atuais – Marsileaceae. e mais ricos em reservas do que os gâmetas ♂ (v.). As plantas-‐com-‐semente [angiospérmicas + gimnospérmicas] são heterospóricas: produzem esporos ♂ (= micrósporos) e esporos ♀ (= megásporos). Enquanto nas ‘briófitas’ o esporófito “parasita” permanentemente o gametófito. vive soterrado no solo.g. esporângios e gametângios – e os processos à escala celular – e.g. Em ambos os grupos o movimento dos gâmetas ♂ e. designado por oogamia. apresentam um caso extremo de anisogamia.). assim como algumas de ‘algas-‐verdes’ (e. pelo contrário. Nas ‘pteridófitas’ sucede o inverso: o gametófito – o protalo – é pequeno.7 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente e.g.s. se dispersam os esporos. ou alimentar-‐se saprofiticamente de matéria orgânica em decomposição com a colaboração de simbiontes fúngicos. preferem designar esta condição por anisosporia. imóveis e permanecem retidos no interior do gametófito ♀. 1984). por regra. As oosferas aguardam pelos gâmetas ♂ retidos no interior do gametófito. diminuta. os ♀. Em condições naturais. As ‘briófitas’ e as ‘pteridófitas’. Breeding systems in bryophytes. retenção dos gâmetas. Pode ser clorofilado e desempenhar a função fotossintética. inconspícuo e. os gametângios ♀ – os arquegónios – têm a forma de uma garrafa. Os gametângios ♂ – os anterídeos – são globosas. As ‘pteridófitas’ também possuem esporângios. origem a gametófitos ♀ e ♂. gametogénese e esporogénese – envolvidos na alternância de gerações.i. Nas ‘briófitas’ e nas ‘pteridófitas’. as plantas-‐terrestres (Equisetopsida) possuem um ciclo de vida haplodiplonte. sob o controlo da meiose e da fecundação. esporófito. dependem da presença de água. após maturação. Azollaceae) e Selaginellaceae – são heterospóricas: produzem micrósporos e megásporos. de maior diâmetro – um gâmeta ♀. maioria das Polypodiidae). Salviniaceae (inc. o desenvolvimento de novos conceitos essenciais para a descrição detalhada da estrutura e da evolução dos ciclos de vida das plantas-‐terrestres. esporos. Nas plantas-‐com-‐semente os micrósporos diferenciam-‐se em sacos polínicos. alternam duas gerações – gerações gametofítica (= gametófito) e esporofítica (= esporófito) – coincidentes com duas fases nucleares – fase haploide (n cromossomas) e fase diploide (2n cromossomas). a biomassa das ‘briófitas’ é largamente dominada pelo gametófito: o esporófito resume-‐ se a um esporângio e ao “pé” que o suporta. e comparados entre os grupos taxonómicos que compõem o reino Plantae. Os megásporos formam-‐se no interior de primórdios seminais. e. o estudo das relações evolutivas ao nível dos grandes grupos de plantas continua a repousar no estudo comparativo dos ciclos de vida e das estruturas reprodutivas. Isoetes) ou na página inferior das folhas (e. frequentemente. a oosfera. os briólogos. bissexuais nos grupos homospóricos. Admite-‐se que a distância percorrida pelos gâmetas ♂ das ‘briófitas’ e das ‘pteridófitas’ é. gâmetas. O zigoto forma-‐se no interior do arquegónio após o encontro dos gâmetas. descritos ao pormenor pelos botânicos alemães na segunda metade do séc.s. caracterizado pela presença de gâmetas ♀ muito maiores. ainda. implicitamente. meiose. Algumas Equisetaceae são também heterospóricas. Charales). A geração esporofítica começa no zigoto e termina nas 6 células-‐mãe dos esporos.g. nas plantas-‐vasculares [‘pteridófitas’ + plantas-‐com-‐semente]. Ao invés das ‘briófitas’ e das 6 Os especialistas em ‘briófitas’. O gametófito prepondera no ciclo de vida das ‘briófitas’. Todas as plantas-‐terrestres são anisogâmicas: os gâmetas ♂ ou ♀ são distintos entre si. os anterozoides. interpretáveis como microsporângios. Nas ‘briófitas’ a meiose ocorre numa cápsula a partir da qual. XIX. no qual. Os arquegónios guardam no ventre – parte basal. nos gametângios ♂ e ♀. Pese embora os extraordinários avanços da filogenia molecular. domina a geração esporofítica. maiores. Os gâmetas ♂ são pequenos e móveis. Como foi anteriormente referido. 7 . geralmente localizados na base (e. respectivamente. naturalmente identificados com megasporângios. As duas gerações alternantes são heteromórficas porque o gametófito e o esporófito são morfologicamente distintos (v. foram entendidos como homólogos. Os anterídeos produzem gâmetas ♂ flagelados e móveis. A percepção de uma origem evolutiva comum das estruturas e processos implicados na alternância de gerações permitiu. gametófito. regra geral. a fecundação. As ‘briófitas’ são homospóricas a ligeiramente heterospóricas (vd. após meiose (meiose pré-‐espórica). Embora as ‘briófitas’ sejam homospóricas. Nas ‘pteridófitas’ heterospóricas os esporos de maior (megásporos) e menor dimensão (micrósporos) dão. nas ‘pteridófitas’ o esporófito torna-‐se rapidamente independente.). A geração gametofítica inicia-‐ se com um esporo e cessa na formação dos gâmetas. mais de 50% dos musgos e cerca de 2/3 das hepáticas produzem gametófitos unissexuais (Wyatt & Anderson. As plantas-‐terrestres 7 não vasculares).g. Os gametófitos são. Isoetaceae. retenção dos esporos e redução do gametófito (v. as gimnospérmicas mais avançadas (coníferas e Gnetidae) e todas as angiospérmicas produzem num tubo polínico pluricelular que conduz o gâmeta ♂. depois. são substancialmente mais simples. sob a forma de gâmetas ♂ (mobilidade gamética). nas plantas-‐com-‐semente verifica-‐se uma retenção dos esporos. na semente. o gametófito ♂ antes da deiscência é sustentado pelos tecidos esporofíticos do saco polínico paternal. Os gametófitos das espermatófitas desenvolvem-‐se à custa do esporófito: o gametófito ♀ é alimentado pela nucela. ao encontro da célula gamética ♀ (oosfera). O gametófito ♀ – o saco embrionário – não tem vida livre. permanece retido no interior do primórdio seminal circundado por tecidos esporofíticos maternais (nucela e tegumentos). como mais adiante se discute (vd. o gametófito ♂ é ainda alimentado pelas células. são mais simples do que as das angiospérmicas. do que nas ‘briófitas’ e nas ‘pteridófitas’.2. complexas e sujeitas a erros. sendo alimentado pelo esporófito materno até à maturação da semente.e. As reservas nutritivas injetadas pelo esporófito materno na semente garantirão a sobrevivência do embrião até que este. Funções e vantagens da reprodução sexual Os procariotas (= Bacteria + Archaea) reproduzem-‐se. As espermatófitas dispersam-‐se em dois momentos muito precisos do seu ciclo de vida: enquanto pólen (mobilidade do gametófito ♂) ou semente (mobilidade do esporófito imaturo).2. por via assexuada. Nas angiospérmicas todos os fenómenos relacionados com reprodução decorrem na flor. um custo. “folha”) que suportam esporos (do grego spérma. “semen”). A fecundação determina a síntese do esporófito. o volume celular dos gâmetas ♂ e ♀ nas espermatófitas é menos desproporcionado do que nos grupos oogâmicos (‘pteridófitas’ e ‘briófitas’). Após a polinização. depois da polinização. Por isso. porque envolve uma maquinaria bioquímica e estruturas energeticamente muito caras. também esporofíticos. . “semente”. Os gametófitos das espermatófitas. os estames são interpretados como microsporofilos e os carpelos como megasporofilos. Nas gimnospérmicas as estruturas reprodutivas. megásporos ou micrósporos. embora produzam um tubo polínico. os gâmetas ♂ são flagelados (anterozoides) e parcialmente autónomos na sua deslocação ao encontro da oosfera. i. Biologia da reprodução de espermatófitas 1. A complexificação das sexualidade é uma característica básica dos eucariotas. Nas angiospérmicas.8 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente ‘pteridófitas’. 1. no corpo do esporófito (vd. Biologia da reprodução de angiospérmicas). primeiro no primórdio seminal e. Dois processos incipientes de sexualidade permitem alguma troca de informação genética neste grupo de organismos: (i) conjugação – transferência de informação genética através do contacto direto entre células. geralmente rodeados por pétalas e sépalas (vd.e. i. A formação de sementes. nas angiospérmicas nos tecidos do estilete. maioritariamente. sobretudo das angiospérmicas. Nas gimnospérmicas o tubo polínico progride no tecido nucelar. Este processo de reprodução designa-‐se por sifonogamia. respectivamente. Os microsporângios (sacos polínicos) e megasporângios (primórdio seminal. demora tempo e envolve a concentração de grandes quantidades de nutrientes. (ii) transdução – transferência de informação genética por intermédio de vírus bacterianos (bacteriófagos). dê origem a uma plântula autotrófica autónoma. tanto ♂ como ♀. por seu turno.1. excluindo os tegumentos) localizam-‐se na parte mais interna da flor. de forma muito limitada. Os grupos mais primitivos de plantas-‐ terrestres (‘briófitas’ e ‘pteridófitas’) deslocam-‐se sob a forma de esporos (mobilidade dos esporos) e. do estilete do indivíduo polinizado. Nas plantas-‐com-‐semente a produção de gâmetas ♂ tem um custo energético elevadíssimo cara porque a maior parte do pólen perde-‐se na polinização. A ‘alga-‐verde’ ancestral). A raiz grega destas duas palavras clarifica o seu significado: os esporofilos são folhas (do grego filos. Biologia da reprodução de gimnospérmicas). desenvolve-‐se encapsulado no primórdio seminal fecundado. embora os gametófitos se apresentem menos reduzidos. porém. o embrião. após a germinação e emergência. Os grupos mais primitivos de gimnospérmicas – Ginkgoidae e Cycadidae – seguem um modelo de reprodução intermédio entre a oogamia e a sifonogamia (sifonogamia imperfeita) porque. Os sacos polínicos inserem-‐se nos estames e os primórdios seminais estão protegidos no interior de carpelos. Nas espermatófitas o esporófito recém-‐diferenciado. A reprodução sexual tem. O gametófito ♂ – grão de pólen polinucleado – é móvel. a células espermática. Embora sejam anisogâmicas. Vantagens da reprodução sexuada Vantagem Comentários Eliminação de genes deletérios A purga de genes deletérios corre ao nível do indivíduo e da população. um dos quais (o mais próximo da base do primórdio) germina e dá origem ao gametófito ♀. sem possibilidade de serem reforçadas através da recombinação com outras mutações vantajosas. A meiose e a subsequente diferenciação dos gametófitos ♂ e ♀ está sujeita a erros frequentes que se expressam na produção de pólen e primórdios seminais estéreis. Quadro 4). como as Cycadidae e as Gnetidae. Os grãos de pólen são transportados pelo vento (polinização anemófila) sendo diretamente capturado pelos primórdios seminais. Após meiose origina 4 megásporos. apenas se diferencia um embrião. este efeito é mais pronunciado nos seres haplodiplontes do que nos diplontes porque a longevidade da geração gametofítica possibilita a expressão e a eliminação. implicitamente. Biologia da reprodução sexual das gimnospérmicas Nas gimnospérmicas a diferenciação do megasporócito (= célula mãe do saco embrionário) é posterior à polinização. regra geral. 1. de genes deletérios recessivos que na geração esporofítica não se expressariam. O gametófito ♀ das gimnospérmicas tem centenas de células e múltiplos arquegónios. porém. Não cabe neste texto explicar ao pormenor os argumentos evolutivos e biológicos envolvidos nesta “descida da seleção natural à escala do gene” (Dawkins. as células do gametófito ♀ das Ginkgoidae são ricas em clorofila. O pólen germina diretamente no micrópilo ou numa câmara imediatamente abaixo do micrópilo (câmara micropilar). Criação de novas combinações génicas por recombinação sobre as quais atua a seleção natural Na reprodução assexuada a “inovação genética” depende. Alguns grupos. Curiosamente. a sexualidade fomenta o sucesso reprodutivo dos indivíduos e reduz os riscos de extinção de populações e espécies. são secundariamente polinizados por insectos.2. por abortamento dos gametófitos. Geralmente.9 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente apetecidos por todo o tipo de predadores e parasitas. Combinação de mutações vantajosas acumuladas em diferentes indivíduos Sem sexualidade as mutuações vantajosas ficariam irremediavelmente insuladas nos indivíduos portadores. Na bibliografia estão relatadas espécies que se reproduzem sexuada e assexuadamente em função das condições ambientais. a velocidade e a qualidade das soluções adaptativas para lidar com a variabilidade ambiental e as elevadas taxas evolutivas dos microrganismos patogénicos.2. 1976). de mutações fortuitas e estas. os mecanismos de recombinação sexual (segregação dos cromossomas) e de recombinação genética (crossing-‐over) permitem que a seleção natural desça à escala do gene nos indivíduos sexuados. Uma argumentação análogo pode ser aplicada aos demais grupos de eucariotas. Quadro 1. são deletérias. em grande medida. geralmente em maior número nas Ginkgoidae e Cycadidae. é lícito admitir que a persistência e a importância da reprodução sexual nas plantas se devem às vantagens que apresenta frente à reprodução assexuada. Consequentemente. A sexualidade é vantajosa porque incrementa extraordinariamente as trocas génicas entre indivíduos. Descida da seleção natural à escala do gene Enquanto na reprodução assexuada os genótipos são selecionados como um todo. as restantes oosferas abortam. Nas Ginkgoidae . A sexualidade foi um promotor determinante da diversidade de formas e funções prevalente nos eucariotas. um trade-‐off: a potencial “ruptura de combinações vantajosas”. Cada arquegónio tem à sua custódia uma oosfera. Nas Ginkgoidae e nas Cycadidae o tubo polínico rompe-‐se na proximidade dos arquegónios e liberta dois ou mais gâmetas flagelados (anterozoides) que nadam na gota de polinização ao encontro das oosferas (sifonogamia imperfeita). Nas Pinidae e nas Gnetidae desenvolve-‐se um tubo polínico que põe os núcleos espermáticos em contacto direto com as oosferas (sifonogamia). Quando os custos (reprodutivos) da sexualidade são superiores aos da reprodução assexuada – por exemplo em condições de grande estabilidade ambiental – a reprodução assexuada pode-‐se tornar dominante. A gota de polinização ao ser reabsorvida transporta para o interior os grãos de pólen. que para o efeito segregam para o exterior do micrópilo uma gota de polinização. A “combinação de mutações vantajosas” tem. Geralmente o primeiro membro desta equação mais do que compensa o segundo (vd. Portanto. O Quadro 1 resume os fundamentos de uma complexa cadeia causal que explica o sucesso evolutivo da sexualidade. e. 2 nas coníferas (Pinidae). Teoricamente. respectivamente. As sementes de gimnospérmicas maturam em 2-‐3 anos e geralmente são ricas em lípidos e proteínas. Nas Ginkgoidae e nas Cycadidae. por mitose. ao contrário das Pinidae. inicialmente organizados em tétradas (grupos de 4). esta de muito maior dimensão. Protegido no interior dos sacos polínicos o micrósporo.10 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente a fecundação ocorre com os primórdios já tombados no solo e as sementes estão maduras um ano após a fecundação. 1. Nas Cycadidae entre a fecundação e polinização medeiam até 6 meses. Este investimento envolve grandes riscos porque o primórdio pode abortar.3. reunidas as condições ecológicas apropriadas. Etapas da reprodução sexual nas angiospérmicas Nas angiospérmicas a reprodução sexual envolve sete etapas descritas no Quadro 2 e explicitadas na Figura 4.3. não demonstrada. As Pinidae são mais eficientes neste processo porque o crescimento dos primórdios ocorre após a fecundação. a dessecação e. O tecido de reserva das sementes das gimnospérmicas – o endosperma primário – tem origem em células haploides do saco embrionário e forma-‐se antes da fecundação.3. Em 70 % das 8 Também conhecida por célula anteridial. sendo capazes de realocar parte da energia dos primórdios não fecundados.2. Por meiose cada célula-‐mãe dos grãos de pólen (= microsporócito) dá origem a 4 micrósporos. Quadro 2. a emergência do tubo polínico e a penetração do tubo polínico ao longo do estilete Fecundação (= fertilização) Inclui a penetração do micrópilo pelo tubo polínico e a fusão gamética de duas células espermáticas (gâmetas ♂). .1. Nas Pinidae a fertilização ocorre 4-‐6 meses após a polinização. Biologia da reprodução sexual das angiospérmicas 1.2. Esporogénese e gametogénese Microsporogénese e microgametogénese A formação dos micrósporos (microsporogénese) sobrevém nos sacos polínicos. 1995). Etapas da reprodução sexual nas angiospérmicas Etapa Descrição Esporogénese Formação dos micrósporos e dos megásporos Gametogénese Desenvolvimento dos gametófitos ♂ e ♀ a partir. A microgametogénese consiste no desenvolvimento do microgametófito a partir de um micrósporo. com a oosfera (gâmeta ♀) e com a célula central onde residem os dois núcleos polares Embriogénese Desenvolvimento do embrião Formação da semente Envolve a diferenciação e a acumulação de reservas em tecidos especializados.2. Nas Ginkgoidae e nas Cycadidae o primórdio seminal atinge a dimensão da semente depois da polinização mas ainda antes da fecundação. frequentemente. A dupla fecundação características das angiospérmicas apenas se verifica num pequeno grupo de gimnospérmicas – na subclasse Gnetidae – no entanto o endosperma permanece haploide como nos restantes grupos de gimnospérmicas (Carmichael & Friedman. cinde-‐se em duas células também 8 haploides: a célula generativa e a célula vegetativa (= célula do tubo). Este termo deve ser evitado porque pressupõe uma homologia. a entrada em dormência da semente 1.1. respectivamente. dos micrósporos e dos megásporos Polinização Transporte do pólen (gametófito ♂) entre os estames e o estigma de um pistilo Germinação do grão de pólen e desenvolvimento do tubo polínico Envolve a hidratação do pólen. a semente não se desidrata e. todos eles férteis. a germinação ocorre imediatamente após a fertilização. Com referi no ponto dedicado ao primórdio seminal. regra geral apenas sobrevive o megásporo calazal (situado no polo oposto ao micrópilo). formado a partir de um único megásporo. Algo semelhante sucede com a interpretação evolutiva do saco embrionário. 2004). Nos restantes 30%. mais de 70 % das angiospérmicas têm um saco embrionário tipo Polygonum.b. N. Estas células. Representação esquemática do ciclo de vida das angiospérmicas. ainda na antera. Figura 4. a célula generativa dá origem a duas células espermáticas (= gâmetas ♂).11 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente angiospérmicas o pólen é libertado com apenas duas células. uma condição interpretada como primitiva (Friedman & Williams. 2 sinergídeas.e. origina 4 megásporos. aquando do alongamento do tubo polínico no estilete da planta polinizada. uma célula central cenocítica com 2 núcleos (núcleos polares) e 3 antípodas. entre esta célula e um anterídeo reduzido. por mitose. o pólen é libertado com três células porque. são integralmente incorporadas no citoplasma da célula vegetativa. O destino dos quatro megásporos é variável. Nas angiospérmicas basais o megagametófito tem quatro células e quatro núcleos. Estão descritas para cima de dez sequências de desenvolvimento do gametófito ♀. e constituído por 8 núcleos haploides e 7 células: a oosfera. Nos grãos de pólen bicelulares a divisão da célula generativa verifica-‐se mais tarde. de tipos de megagametogénese. . Outras variantes descritas na bibliografia são tipos derivados do saco embrionário tipo Polygonum. geração esporofítica (parte inferior da figura) da geração gametofítica (parte superior da figura) Megasporogénese e megagametogénese No interior do primórdio seminal imaturo encontra-‐se o megasporócito (= célula mãe do saco embrionário) que. após meiose. i. pouco depois. ♂] + [f.] ginomonoicia [f. sexual systems) e os “sistemas de cruzamento” (ing.♂ + f. ou entre um saco polínico e a abertura micropilar nas gimnospérmicas.♂] + [f. uma condição muito frequente na natureza (Quadro 3). agora.♂ + f. hermaf. A formação de embriões não sexuais – embriões partenogenéticos ou adventícios – por vezes também necessita do estímulo provido pela captura do pólen pelas anteras (vd.♂] + [f. Outras formas de expressão sexual reduzem os custos da monoicia e da dioicia estrita mantendo níveis intermédios de alogamia. Definição A polinização consiste na transferência de pólen entre uma antera e um estigma nas angiospérmicas. a “expressão da sexualidade” (= sistemas sexuais.]homoicia [f.12 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente 1.3. hermaf.♀] androdioicia [f. de forma independente.] andromonoicia [f.2. mating systems).♂] + [f.♀] + [f. infelizmente.2. Prefixo Homoicia Monoicia Dioicia Sem prefixo [f. – flor.♂ + f. A monoicia e a dioicia são pouco frequentes na natureza (ca.♀] monoicia* [f.] ou [f.♂ + f.2. de uma dada espécie.♀] tridioicia Andro-‐ Gino-‐ Tri-‐ Legenda: [ ] – indivíduo.♀] + [f.♀] + [f. pouco consistente. f.2. para evitar a endogamia em muitos grupos de plantas primitivamente homoicas.♀ + f.hermaf. Sistemas sexuais das plantas-‐terrestres (Cruden & Lloyd.3. 2005) Quadro 3.Sistemas de reprodução Sob a designação comum de “sistema de reprodução” (ing. A monoicia e a dioicia evoluíram.♂ + f. O Citrullus lanatus «melancia» e muitas Cucurbita cultivadas são monoicas.hermaf. – hermafrodita.♀ + f.2. A monoicia e a dioicia são mais comuns em regiões áridas e noutros ambientes extremos onde parecem atribuir mais vantagens adaptativas do que nos climas mas benignos para a vida vegetal.3.2. 1. 70% das angiospérmicas são homoicas) porque envolvem custos energéticos muito elevados. Polinização 1. uma vez que nestas plantas uma parte significativa das flores (plantas monoicas). ou dos indivíduos (plantas dioicas).♀] ginodioicia [f.1. 2005) no grande clado das plantas-‐terrestres.hermaf. A polinização deficiente é a maior causa de insucesso reprodutivo nas plantas-‐com-‐flor. em última instância. breeding systems) discutem-‐se. não produz semente.] trimonoicia [f.♂ + f. Será fácil na literatura encontrar termos e conceitos alternativos aos utilizados nas secções que se seguem. ing. * em agronomia é frequente designar por ginoicas as cultivares apenas com flores femininas. a flor seja interpretada como adaptação à polinização.g.hermaf. Reprodução assexuada). diversas variantes de poligamia (indivíduos com flores hermafroditas e de flores unissexuais).] ou [f.] ou [f.2.hermaf. No Quadro 3 estão resumidos os sistemas sexuais identificados por Cruden & Lloyd (Cruden & Lloyd. e.hermaf. A polinização é indispensável na reprodução sexual. ou da população. Os sistemas sexuais são particularmente diversos nas cucurbitáceas.♀] dioicia [f. As cultivares de Cucumis sativus «pepino» podem ser monoicas ou . Sistemas sexuais O sistema sexual expressa a distribuição dos órgãos sexuais ao nível do indivíduo.♂] + [f.♀] + [f. O papel chave deste processo na evolução da estrutura da flor e na biologia da reprodução de plantas-‐com-‐semente permite que. Na bibliografia os sistemas de reprodução são abordados com vários níveis de detalhe e explicitados através de uma nomenclatura especializada e. Asteraceae e a maioria das Lamiaceae. (ii) autogamia – os primórdios seminais e o pólen envolvidos na fecundação procedem da mesma flor. 9 Num sentido clássico a hercogamia refere-‐se à presença de dispositivos especiais que impedem a autopolinização. Cleistogamia e casmogamia). Na bibliografia reconhecem-‐se dois tipos principais destes mecanismos espaciais: (i) alteração ontogénica de sexo. (v) sistema misto – populações com taxas intermédias de autopolinização e de polinização cruzada (de 5 a 95 %). não estão totalmente esclarecidos. A promoção da variabilidade genética acelera as taxas evolutivas por adaptação dos indivíduos (vd.). implicitamente. estames e pistilos de diferente tamanho (vd. III). Lilium [Liliaceae] «lírios e açucenas»). e (ii) promove a variabilidade genética à escala do indivíduo (heterozigotia) e da população (diversidade em alelos). Vários mecanismos promovem esta separação. implicitamente. ing. e. (iv) os sistemas de polinização (vd. (iii) polinização cruzada perfeita – taxa de polinização cruzada de 100%. No Cucumis melo (Cucurbitaceae) «meloeiro» a maioria das cultivares são andromonoicas ou trimonoicas. presença de estruturas especiais (e. O ramo primário geralmente é podado acima da segunda folha verdadeira para acelerar a ramificação e o aparecimento de flores femininas ou hermafroditas. Entende-‐se por depressão endogâmica a redução do sucesso reprodutivo (= fitness) causada pela autopolinização. fecundação cruzada) – transferência de pólen entre dois indivíduos distintos. exemplos na secção Sistemas de auto-‐incompatibilidade) ou anteras deiscentes para o exterior (anteras extrorsas. Noções básicas de evolução) e aumenta o potencial evolutivo de populações e espécies.g. e a (ii) dicogamia. Vantagens e mecanismos de promoção da polinização cruzada A polinização cruzada aumenta o sucesso reprodutivo dos indivíduos e. reduz os riscos de extinção de populações e espécies porque (i) evita os efeitos deletérios de depressão endogâmica. Sistemas de 9 polinização). (iii) os sistemas de auto-‐ incompatibilidade (vd. e dessa forma antecipar a produção de frutos. self-‐pollination) – transferência de pólen entre flores ou no interior de uma flor de um mesmo indivíduo. e (vi) os mecanismos temporais. A autopolinização tem duas variantes: (i) gneitogamia – plantas polinizadas pelo pólen oriundo de outras flores do mesmo indivíduo. A protandria é mais frequente do que a protoginia. Sistemas de auto-‐incompatibilidade). A hercogamia consiste na separação espacial de estigmas e estames. e a sua importância relativa. (v) a hercogamia (mecanismos espaciais). As vantagens adaptativas associadas à polinização cruzada impulsionaram a evolução de um conjunto muito alargado de mecanismos de promoção da alogamia.s.g.g. O termo dicogamia refere-‐se ao desfasamento temporal na maturação dos órgãos sexuais ♀ e ♂ em flores hermafroditas. (ii) autopolinização predominante – taxa de autopolinização de 95% a 100%. Na Natureza correm dois tipos de dicogamia: (i) protandria – ântese anterior à maturação dos estigmas.i. Para ser eficaz é necessário que todas as flores de uma mesma planta libertem pólen (= ântese) em simultâneo. . Os dois tipos fundamentais de sistemas de cruzamento reconhecidos raramente são perfeitos. rostelo nas flor das Orchidaceae «orquídeas». vol. Os mecanismos envolvidos na depressão endogâmica. (iv) polinização cruzada predominante – taxa de polinização cruzada de 95% a 100%. Sistemas sexuais). (ii) polinização cruzada (= alogamia. e. entre os quais a dicogamia (v. Por essa razão é conveniente considerar as seguintes variantes: (i) autopolinização perfeita – taxa de autopolinização de 100% e.g. Plantago (Plantaginaceae). tanto ao nível do indivíduo como da população. Os suprarreferidos mecanismo temporais atuam separando. Sistemas de cruzamento Definição de autopolinização e de polinização cruzada Reconhecem-‐se dois tipos fundamentais de sistemas de cruzamento: (i) autopolinização (= autofecundação. A alteração ontogénica de sexo consiste na produção de flores unissexuais de sexo distinto ao longo do ciclo fenológico. agora no tempo.g. (ii) protoginia – estigmas receptivos antes da ântese. supõe-‐se que a manifestação de genes deletérios recessivos será um dos mais importantes . a ântese dos estigmas receptivos (que permitem a germinação do pólen). iniciação do ciclo fenológico com flores ♀ mais tarde substituídas por flores ♂. (ii) a casmogamia (vd. A polinização cruzada é francamente mais frequente nas angiospérmicas do que a autopolinização.13 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente exclusivamente femininas (ginoicas) de frutos partenocárpicos. entre os quais se destacam: (i) a expressão sexual (v. xenogamia.g. e. As flores femininas e/ou hermafroditas diferenciam-‐se nos ramos laterais secundários ou terciários. taxa de polinização cruzada de 0%. vd. e. e. As primeiras flores são masculinas. Os mecanismos que promovem a autopolinização são simétricos dos anteriormente referidos a respeito da polinização cruzada. . a autopolinização é eventualmente proveitosa nas condições descritas no Quadro 5. a terofitia (ciclo de vida anual) incrementa a insegurança reprodutiva da alogamia. deiscência introrsa. cleistogamia. e.g. Perante estas desvantagens. uma sequência de anos maus pode por em causa a sobrevivência de populações ou espécies Espécies de floração precoce Estas espécies enfrentam. em ilhas oceânicas) porque uma planta é suficiente para despoletar um evento de colonização Espécies adaptadas a ocupar rápida de habitats com grandes quantidades de recursos disponíveis Produzir descendentes rapidamente é uma estratégia vantajosa na captura recursos em habitats livres ricos em recursos e livres de competidores diretos Populações pequenas com indivíduos muito dispersos Nestas condições a autopolinização reduz a insegurança reprodutiva Quando os polinizadores animais são escassos Nestas condições a autopolinização reduz a insegurança reprodutiva Diversos mecanismos favorecem a autopolinização: flores hermafroditas. Desvantagens da alogamia Desvantagem Comentários/exemplos Insegurança reprodutiva Os mecanismos de promoção da alogamia inibem a capacidade das plantas se fecundarem com o próprio pólen incrementando os riscos de insucesso reprodutivo em populações muito pequenas Desmembramento de combinações génicas favoráveis Particularmente prejudicial em ambientes extremos que exigem adaptações. No entanto. habitats sujeitos fogos ou condições meteorológicas) Habitats muito seletivos para as plantas que exigem adaptações muito especializadas A alogamia pode acarretar a um desmembramento de combinações génicas favoráveis Espécies com ciclos de vida muito curtos Por exemplo. solos tóxicos derivados de rochas ultrabásicas Investimento em mecanismos energeticamente caros Um bom exemplo são os sistemas de incompatibilidade Ineficiente eliminação de genes deletérios Como refiro no ponto Vantagens e mecanismos de promoção da polinização cruzada a manifestação de genes deletérios é uma causa maior da depressão endogâmica Quadro 5. ausência de mecanismos de incompatibilidade e a ausência de estruturas que isolem os estigmas das anteras. e combinações génicas.14 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Vantagens. a alogamia acarreta várias desvantagens (Quadro 4). desvantagens e mecanismos de promoção da autopolinização Uma vez que a evolução parece favorecer a variabilidade genética.g. a polinização cruzada é mais frequente entre as plantas silvestres do que a autopolinização. geralmente. uma elevada escassez de agentes polinizadores animais e condições meteorológicas desfavoráveis para a fecundação Espécies com sistemas de dispersão a longa distância Teoricamente as plantas autogâmicas são melhores dispersores a longa distância (e. Condições eventualmente favoráveis à autogamia Condição Comentários/exemplos Habitats muito estáveis Nestas condições a inovação genética não é determinante Habitats muito imprevisíveis A alogamia pode atrasar excessivamente a polinização incrementando os riscos de insucesso reprodutivo. proximidade entre as anteras e o pistilo. muito particulares. Quadro 4. maturação simultânea dos órgãos sexuais ♀ e ♂. Nas angiospérmicas são muito frequentes dois sistemas de auto-‐incompatibilidade homomórfica.) (Quadro 6. portanto com gâmetas ♂ e ♀ funcionais.2. Os sistemas auto-‐incompatibilidade repartem-‐ se por dois tipos: (i) os sistemas de auto-‐ incompatibilidade heteromórfica aliam um mecanismo fisiológico a um mecanismo morfológico de prevenção da autopolinização.e. geralmente. as plantas autogâmicas e gneitogâmicas são. Nas gramíneas casmogâmicas as lodículas separam as glumelas na ântese. As flores cleistogâmicas são obrigatoriamente autogâmicas. A distilia ocorre. Figura 5) ou três (tristilia) Figura 5. Figura 6) . 1974) e que as características genéticas das cultivares comerciais se mantêm após a sementeira.3. auto-‐ compatíveis (= auto-‐férteis). 1. 2000). o crescimento do tubo polínico. Viola odorata (Violaceae) «violeta-‐de-‐cheiro» e Catananche lutea (Asteraceae). Lithodora (Boraginaceae) «primaveras» e Linum usitatissimum (Linaceae) «linho».2.1. e. nas espécies cleistogâmicas a morfologia das lodículas inviabiliza esta função. (Oxalidaceae). em Primula (Primulaceae). Algumas espécies produzem flores cleistogâmicas e casmogâmicas em diferentes fases do seu desenvolvimento. Os indivíduos portadores de combinações genéticas incompatíveis não produzem sementes porque a germinação estigmática do pólen. i. A 10 As gramíneas apresentam um sistemas de incompatibilidade gametofítica com dois loci (Baumann U. pode ocorrer antes (nas flores cleistogâmicas) ou depois da abertura das flores ao exterior (nas flores casmogâmicas). de produzirem sementes por autopolinização ou quando fecundadas por outros indivíduos geneticamente semelhantes. subterraneum implica que as suas populações naturais sejam constituídas por linhas puras (Katznelson. Juttner.pl. A tristilia.2. Bian. regulados por 10 genes situados num único locus (locus S) polimórfico (alelos S1. . e indivíduos com flores de estames curtos e pistilos longos. S3. quase todas as plantas heterostílicas são auto-‐incompatíveis. A maioria das flores da Portulaca oleracea (Portulacaceae) «beldroega» e do Triticum aestivum (Poaceae) «trigo-‐mole» é cleistogâmica. Nas plantas distílicas coexistem indivíduos com flores de estames longos e pistilo curto.g. .2.3. Geralmente são pequenas. Na auto-‐ incompatibilidade gametofítica apenas um dos alelos da planta-‐mãe dos gâmetas masculinos é expresso no pólen. & Langridge.15 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente 1. (ii) nos sistemas de auto-‐incompatibilidade homomórfica o mecanismo fisiológico não tem uma expressão morfológica. não discutida neste texto. A heterostilia é de longe o mecanismo morfológico com mais frequência associado à auto-‐incompatibilidade heteromórfica. Distilia em Primula acaulis (Primulaceae) tipos morfológicos de flor. permanecem fechadas ao exterior durante a polinização e as suas anteras situam-‐se na proximidade dos estigmas. S2. As plantas hermafroditas auto-‐ incompatíveis dizem-‐se também autoestéreis. Cleistogamia e casmogamia Nas angiospérmicas a libertação do pólen. a abertura das anteras e a concomitante libertação do pólen. pouco coloridas e sem odor nem néctar. A cleistogamia obrigatória característica do T. os riscos de introgressão (cruzamento e troca genética) das populações indígenas com as cultivares melhoradas (e vice-‐versa) é diminuto. necessariamente. etc.2. Nas populações de plantas heterostílicas. coabitam dois (distilia. Pela mesma razão. por exemplo. que condicionam as trocas de gâmetas entre indivíduos. As polinizações compatíveis verificam-‐se apenas entre flores com anteras e estigmas do mesmo comprimento. observa-‐se em Lythrum salicaria (Lythraceae) «salgueirinha» e Oxalis sp. a fertilização dos primórdios seminais ou o desenvolvimento do embrião são neutralizados pela planta receptora.Sistemas de auto-‐incompatibilidade Os sistemas de auto-‐incompatibilidade incapacitam as plantas hermafroditas. Sistemas de auto-‐incompatibilidade. A polinização ativa envolve uma relação mutualista no âmbito da qual.g.3. S2S3 e S2S4. um vetor animal executa um serviço polinização. descendentes da mesma célula-‐mãe dos grãos de pólen.3. Como explico no 11 Grupos coesos com 4 grãos de pólen. S1S2 (planta receptora de pólen) x S1S3 (planta dadora de pólen) → grãos de pólen S1 ou S3 mas com expressão simultânea dos dois alelos → tubos polínicos bloqueados → não ocorre formação de semente. S1S4. A) Auto-‐incompatibilidade gametofítica. . Quadro 6. pelo vento ou por insectos. Embora o gametófito ♂ seja haploide.Sistemas de polinização Vetores e sistemas de polinização 11 Depois de maturados. A polinização pelo vento e pela água desenrola-‐se de forma passiva (polinização passiva). S1 bloqueado → descendência S1S3 e S2S3. B) Auto-‐incompatibilidade esporofítica 1. Este sistema é frequente nas Asteraceae. A) B) Figura 6. neste sistema ambos os alelos (caso a planta seja heterozigótica) do esporófito que cede o pólen estão expressos no pólen.16 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente produção de sementes é preciso que o alelo presente no grão de pólen esteja ausente da planta que o acolhe. S2S3 e S2S4. S1S2 (planta receptora de pólen) x S3S4 (planta dadora de pólen) → grãos de pólen S3 ou S4 → todos os tubos polínicos potencialmente viáveis → descendência S1S3. Este tipo de incompatibilidade é frequente nas famílias Fabaceae. Brassicaceae e Convolvulaceae. pelo contacto direto das anteras com os estigmas ou é transportado. polinídias das orquidáceas) ou isoladamente (condição mais frequente). Poaceae. Exemplos de auto-‐incompatibilidade gametofítica e esporofítica Tipo Exemplo 1 Exemplo 2 Exemplo 3 Auto-‐ incompatibilidade gametofítica S1S2 (planta receptora de pólen) x S1S2 (planta dadora de pólen) → grãos de pólen S1 ou S2 → tubos polínicos bloqueados → não ocorre formação de semente. os grãos de pólen podem disseminar-‐se em tétradas . Auto-‐ incompatibilidade esporofítica S1S2 (planta receptora de pólen) x S1S2 (planta dadora de pólen) → grãos de pólen S1 ou S2 mas com expressão simultânea dos dois alelos → tubos polínicos bloqueados → não ocorre formação de semente. em troca de uma recompensa alimentar. Rosaceae e Solanaceae.2.2. A polinização cruzada exige a ação de vetores polínicos (= agentes polínicos). no interior da flor. Nas flores autogâmicas o pólen acede ao estigma por gravidade (condição mais frequente). S1S2 (planta receptora de pólen) x S1S3 (planta dadora de pólen) → grãos de pólen S1 ou S3 → S3 formação de tubos polínicos. Betulaceae. Na auto-‐incompatibilidade esporofítica a produção de sementes é barrada quando qualquer um dos genes presentes no dador de pólen está presente na planta polinizada. Papaveraceae. aglomerados em número variável (e. S1S2 (planta receptora de pólen) x S3S4 (planta dadora de pólen) → grãos de pólen S3 ou S4 mas com expressão simultânea dos dois alelos → todos os tubos polínicos potencialmente viáveis → descendência S1S3. S1S4. ou num grupo reduzido de vetores embora assegure a chegada de pólen de boa qualidade (i. De forma muito resumida descrevem-‐se no Quadro 7 as adaptações florais mais frequentes aos vetores de polinização de maior relevância na natureza. a concentração em açúcar do néctar está correlacionada com o tipo de polinizador. A dependência excessiva num único vetor polínico.i. polinização quiropterófila – externas. produzida nos nectários. pétalas com marcas e pêlos nos Iris. algumas espécies produzem dois tipos de pólen. Os sinais visuais expressam-‐se no perianto (e. e polinização malacófila – polinização por nos pêlos e seguem as guias nectaríferas que apontam o centro da flor caracóis. frequentemente rica em compostos aromáticos. desse modo.g. em maior ou menor grau. que fazem uma sinalização de proximidade da localização das recompensas em néctar e. e polinização zoófila – Figura 7 Guias nectaríferas. para atrair moscas). Iris subbiflora polinização por animais. ou a proteínas em decomposição [carne podre]. Para tal as plantas servem-‐se de sinais visuais. Síndromes de polinização Os vetores polínicos exercem uma grande pressão de seleção nas estruturas reprodutivas das plantas-‐com-‐ semente. sediados no perianto (e. Por exemplo. encaminham os insectos na sua direção (Figura 7). odores doces para atrair abelhas. os estames são as peças mais consumidas. As recompensas alimentar repartem-‐se por três tipos: Néctar – solução açucarada. olfativos ou tácteis. 1979) designaram por síndrome de polinização o conjunto de adaptações partilhadas. endemismo calcícola lusitano: os zoófila: polinização entomófila – polinização por insectos. Reconhecem-‐se quatro tipos de polinização (Iridaceae). Faegri & van der Pijl (Faegri & van der Pijl. ainda que evolutivamente pouco aparentadas. proveniente de outras plantas da mesma espécie) incrementa os riscos de insucesso reprodutivo.g. Por essa razão muitas espécies servem-‐se de mais de um vetor polínico ou autopolinizam-‐ se perante um atraso excessivo da chegada de um vetor com pólen compatível do exterior. sendo os primeiros dominantes. A polinização ativa tem publicitada na comunidade de vetores animais. polinização insectos aterram numa das três tépalas ornitófila – polinização por aves. um tipo viável e um segundo tipo estéril mais agradável para os polinizadores. as flores Cistus (Cistaceae) «estevas» são visitadas por um espectro muito alargado de insectos. estames (e.e.g.). pelas plantas com um mesmo vetor de polinização. a mentira permeia a polinização ativa. . o néctar é essencialmente uma fonte de energia para os polinizadores. apresentam estruturas reprodutivas de forma e função semelhantes por convergência evolutiva. Pólen – o pólen fornece proteínas aos polinizadores. guias ultravioletas em Potentilla [Rosaceae]). normalmente. O conceito de sistema de polinização (= mecanismo de polinização. Os osmóforos. na coroa dos Narcissus) libertam odores – sinais olfativos – de composição química variável consoante as espécies polinizadoras (e. dípteros (moscas) e coleópteros (escaravelhos). Os sistemas de polinização são classificados em função do vetor polínico: polinização anemófila – polinização pelo vento. visuais ou tácteis.g. polination systems) expressa a estratégia de polinização evolutivamente adquirida pela planta polinizada. que compreende himenópteros (vespas). plantas com o mesmo vetor de polinização. pétalas coloridas dos das Liliaceae. estames coloridos das Myrtaceae e Mimosoideae e estaminódios de Zingiberaceae e Cannaceae) ou na inflorescência (e.17 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente ponto Polinização por engano (v. para não escorregarem apoiam-‐se polinização por morcegos. As chamadas guias nectaríferas são sinais periânticos. inflorescências comosas de Lavandula (Lamiaceae) «rosmaninhos»]. ing.g. Frequentemente.g. polinização cantarófila de muitas magnoliidas). polinização hidrófila – água como vetor de polinização. Peças da flor – o consumo de peças da flor está associado a relações mutualistas pouco evoluídas (e. labelo das Orchidaceae). Strelitzia «estrelícias». estames com filetes longos. leves e isolados.g. Hidrofilia – polinização pela água Flores pequenas e inconspícuas (submersas ou flutuantes). por vezes flutuantes. Flores sem odor nem néctar. longamente pedunculadas. Musa sp. em forma de penacho. Fraxinus (Oleaceae) «freixos» ou Sanguisorba (Rosaceae). Cada flor comporta três tépalas exteriores.pl. e. Adansonia digitata (Malvaceae. Localização das recompensas de modo a obrigar ao contacto entre inseto e estames e/ou estigma. por vezes flutuantes.e. por debaixo da qual se situa um nectário que recompensa. odor e néctar Exemplos Anemofilia – polinização pelo vento Flores numerosas. e. em Zostera (Zosteraceae) e em outras plantas marinhas flutua no interior na massa de água Ornitofilia – polinização por aves Flores de cores vivas. por um estilete filiforme. desenvolveu-‐se em linhagens primitivamente entomófilas. muito apreciada nos jardins de regiões tropicais ou de Invernos moderados. Quercus. Produção de pouco pólen. geralmente vermelhas. Nesta espécie. Salix «salgueiros». Quadro 7. constituída por duas tépalas livres azuis.18 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente A polinização anemófila é secundária nas angiospérmicas. frequentemente unissexuais e com poucos primórdios seminais (uniovuladas em muitas espécies). tubulosas e com pétalas distalmente recurvadas. Odor mais ou menos intenso. estigmas de grande superfície. O néctar é a recompensa mais importante. e forçam a separação das duas tépalas e extrusão de estames e estigmas. por vezes simulando formas ♀ (e. Pólen produzido em grande quantidade. grãos de pólen grandes. Produção de muito pólen. cheiro a ranço). estigmas de grande superfície. uma ou duas flores emergem de uma bráctea alongada e aguda. ântese noturna. nuas. Uma tépala interior azulada está reduzida a uma escama. pressionam-‐na. e culminada. Entomofilia – polinização por insectos. Uma estrutura semelhante a uma seta.g. ornamentados e aglomerados em massas. Em alguns clados anemófilos verificou-‐se um retorno à entomofilia. Enquanto se alimentam de néctar. As aves apoiam-‐se nesta estrutura. em néctar. Sem odor ou pouco odoríferas. Vd. os estames roçam e depositam pólen nas patas e nas penas do ventre das aves. Flores sem odor nem néctar Em Vallisneria (Hydrocharitaceae) o pólen navega na superfície da água. acampanuladas e estames e estigmas excertos ou então flores pequenas e agrupadas em inflorescências densas. etc. os ancestrais de Castanea (Fagaceae) «castanheiros» e de Buxus (Buxaceae) «buxos» eram polinizados pelo vento. Aloe (Asphodelaceae) «aloés». e. A migração para a polinização anemófila é óbvia em alguns grupos de plantas predominantemente entomófilas. actinomórficas. grãos de pólen pequenos. Flores de cores mortas (brancas. . pequenas. variável com o grupo de insectos polinizadores. com o seu peso. uma planta ornamental rizomatosa sul-‐africana.g. robustas. Bombacoideae) «embondeiro». Perianto bem diferenciado e colorido. Néctar abundante.g. Neste ato o estigma também toca nas aves podendo capturar pólen proveniente de outros indivíduos da mesma espécie. Ântese diurna. cor-‐de-‐laranja. encerra no seu interior cinco estames férteis e é atravessada. frequentemente pegajosos. nectários quase ocultos no fundo da flor. Betula «bidoeiros». com a função de atrair as aves polinizadoras. as aves polinizadoras. exibe um mecanismo singular de polinização por aves (Figura 8). (Musaceae) «bananeiras». contra a bráctea. grandes. Síndromes de polinização Sistema de polinização Morfologia da flor Pólen.g. A Strelitzia reginae (Strelitziaceae) «estrelícia». quadro seguinte. acastanhadas. i. Néctar produzido em maior quantidade do que nas flores entomófilas Fuchsia (Onagraceae) «fúchsias». Odor desagradável (e. Quiropterofilia – polinização por morcegos. grãos de pólen pequenos.). ovário frequentemente lenhoso. separam-‐se. Ação mecânica dos insectos vetores é igualmente necessária na polinização das giestas dos géneros Cytisus e Genista. o atual declínio das populações de abelhas e outros polinizadores está a pôr em risco a sobrevivência de muitas espécies de plantas. Enquanto nas plantas evoluíram sistemas de atracão e de recompensa de polinizadores. Polinização ornitófila e entomófila. do S. Nas flores destas espécies os estames e o estilete estão enrolados como a mola de um relógio-‐de-‐pulso. nos trópicos nem tanto (e. espécie polinizada por abelhas e insectos afins (melitofilia). pêlos nas patas e armaduras bocais singulares – e comportamentos especializados. melongena «beringela». Se os polinizadores conseguem varrer o pólen do corpo.19 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente A) B) Figura 8. captura pólen trazido pela abelha de outra planta. tanto nas flores como nos insectos. sem proveitos. a compra do serviço polinização resume-‐se a uma oferta. muitas fabáceas caesalpinioideas como as Bauhinia). Cerca de 65% das angiospérmicas atuais são entomófilas e mais de 20% das espécies de insectos dependem das flores para se alimentarem. Os estames depositam pólen. pelo menos em potência. entre outras leguminosas. os animais adquiriram morfologias – e. se verifique uma intervenção direta de um agente transportador de pólen. depende da ação mecânica do vento ou de insectos. As orquídeas inserem massas de pólen com um pé viscoso na cabeça dos polinizadores. A coevolução entre plantas polinizadas e insectos polinizadores originou muitos casos de estreita dependência. Os hábitos de limpeza dos insectos polinizadores são um risco para as plantas entomófilas. e a cabeça do vetor é repentinamente fustigada pelos estames e estilete. necessitam de ser agitadas pelo vento ou por insectos para libertarem o pólen. No Quadro 8. Consequentemente. importantes na dieta alimentar dos insectos. muitas vezes. de um produto energeticamente caro -‐ o néctar. espécie de polinização ornitófila. conhecido por polinização-‐por-‐ vibração (ing. esfregam as anteras no dorso dos insectos que visitam as suas flores. entre muitas outras espécies (8% das angiospérmicas) (Buchmann. sem que. de forma muito resumida. descrevem-‐se as síndromes de polinização associadas aos tipos mais comuns de entomofilia. As plantas que inserem pólen no ventre dos polinizadores são raras nas latitudes temperadas. As pressões de seleção favorecem a emergência de adaptações. eventualmente. contidos pela quilha. Consequentemente. tuberosum «batateira» ou do S. ou na Medicago sativa «luzerna». As anteras do Solanum lycopersicum (Solanaceae) «tomateiro». a flor da imagem é funcionalmente ♂ As interações entre as plantas-‐com-‐flor e os insectos polinizadores geram forças seletivas recíprocas – inseto vrs. Este mecanismo de polinização. o estilete. B) Rosmarinus officinalis (Lamiaceae) «alecrim». As labiadas (Lamiaceae) de flores zigomórficas (com um plano de simetria).g. Quando um abelhão ou uma abelha inserem a sua armadura bucal na flor. buzz-‐pollination). 1983). sobretudo nas regiões tropicais.g. planta e planta vrs. inseto – porque a polinização é um passo essencial na reprodução das angiospérmicas e as flores são. A) Strelitzia reginae (Strelitziaceae) «strelícia». . a evolução forçou as plantas a colocarem o pólen numa parte do corpo dos insectos que estes tenham dificuldade em limpar. as pétalas que constituem a quilha são pressionadas para baixo. A Capparis spinosa (Capparaceae) «alcaparra» coloca o pólen no ventre dos polinizadores. Flores esverdeadas ou de cores escuras. frequentemente com odores fortes (pela tardinha ou noite). néctar geralmente pouco abundante e de difícil acesso. Flores frequentemente coloridas (azuis. N.g. com os órgãos sexuais muito expostos. Flores de cores vivas. Lantana camara (Verbenaceae). Datura «figueiras-‐do-‐inferno». odor pouco intenso embora agradável. frequentemente amarelas ou azuis. são monoicas e polinizadas por uma única espécie de vespa. actinomórficas.g. 2008). odor forte. Magnolia «magnólias». libertação do pólen estimulada pelas vibrações produzidas pelos insectos. néctar geralmente pouco abundante e de difícil acesso. flores frequentemente organizadas em inflorescências e/ou com uma plataforma de apoio aos insectos. ântese diurna. O interior do sícono dos caprifigos está revestido por flores ♀ de estilete curto. a Blastophaga psenes. regra geral com uma plataforma de apoio aos insectos (e. muitas pétalas e estames). Como exemplo deste sistema exploro. frequentemente tubulosas. de boa visão e pouco olfato. Miofilia – polinização por moscas Atraídos por carne em decomposição (sapromiofilia). Numerosas Araceae (Figura 9) e Apiaceae. Síndromes de polinização associados à entomofilia Sistema de polinização Características do insecto Síndrome (mais frequente) Exemplos Melitofilia – polinização por abelhas (Apis mellifera) e espécies afins (e. Lavandula «rosmaninhos» (Lamiaceae).g. As plantas selvagens de Ficus carica. armadura bucal longa e tubulosa. zigomórficas ou actinomórficas. conhecidas por «caprifigos» ou «figueiras-‐selvagens». Numerosas Lamiaceae – e. sem néctar. Flores frequentemente claras. em contrapartida veem o ultravioleta (UV). horizontais ou pendentes. não tubulosas.g. adaptada à aspiração de líquidos. Thymus «tomilhos». adaptada à aspiração de líquidos. O Ficus carica tem origem no Mediterrânico Oriental. & Stover. se vermelhas então com cor UV. Finda a fase larvar e de pupa os adultos rompem as paredes do ovário e abandonam as flores. por vezes com capacidade de voo imobilizado (família Sphingidae). Oenothera. odor desagradável (a proteínas em decomposição). abelhões [gén. Os ♂ são ápteros. de tubo da corola ou garganta (nas flores dialipétalas) curtos. Nymphaeaceae. as flores ♂ concentram-‐se na vizinhança do ostíolo. alaranjadas ou de cores mortas. odor adocicado e suave. armadura bucal longa e tubulosa. Trifolium «trevos» (Fabaceae). Salvia «sálvias». Rosmarinus officinalis «alecrim» (Figura 8). emergem antes das ♀. Brugmansia «brugmânsias». sem guias nectaríferas. presença de guias nectaríferas UV na superfície das pétalas a indicar posição dos nectários. fecundam-‐nas de imediato ainda no interior dos ovários das flores ♀ dos caprifigos. facto com reflexos na estrutura das flores polinizadas. moráceas e lamiáceas. abelhas solitárias. a vulgar «figueira». e. zigomórficas ou actinomórficas e de pétalas distalmente recurvadas para apoio dos insectos. geralmente grandes. por vezes a carne podre (coprofilia). A polinização entomófila é particularmente complexa e evoluída em três famílias da flora Portuguesa: orquidáceas. As larvas de B. Polinização por engano). um lábio). Bombus]) As abelhas não veem o vermelho. com partes numerosas e carnudas (e. bom sentido do olfato.b. amarelas ou vermelhas). Falaenofilia – polinização por borboletas noturnas Noturno. armadura bucal de média dimensão capaz de lidar com alimentos sólidos e líquidos. as pétalas e os estames atuam como recompensa e são consumidos pelos polinizadores. sem guias nectaríferas. e morrem pouco depois . armadura bucal curta preparada para absorver líquidos ou sólidos previamente liquefeitos. por vezes providas de esporões. Psicofilia – polinização por borboletas diurnas Diurno. O género Ficus (Moraceae) apresenta um engenhoso sistema de polinização que envolve uma simbiose com pequenas vespas sem ferrão da família Agaonidae (classe Hymenoptera). psenes alimentam-‐se dos tecidos ovariais das flores ♀. as flores polinizadas por moscas da família Syrphidae apresentam síndromes de polinização semelhantes às flores polinizadas por abelhas. amarelas. perfuram com um ovopositor especializado o estigma das flores ♀ e depositam um ovo no seu interior. flores mecanicamente fortes. néctar de fácil acesso. (Flaishman. Viola «violetas» (Violaceae). As ♀ de B. alimentam-‐se indiscriminadamente de várias partes da flor.g. as borboletas veem o vermelho. flores grandes ou pequenas e então agrupadas em inflorescências densas. um pequeno poro situado na extremidade distal do sícono. com desenhos quadriculados e actinomórficas. sem néctar. baseado em Flaishman et al. Rodov. geralmente visitam repetidamente a mesma espécie de planta. actinomórficas e de tubo comprido e estreito. polinizadores pouco especializados. Flores de cores pálidas.20 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Quadro 8. psenes penetram nos síconos imaturos dos «caprifigos» pelo ostíolo. Cantarofilia – polinização por coleópteros Armadura bucal pouco especializada de tipo triturador. A polinização das orquidáceas é examinada mais adiante (vd. nem todos os grupos de moscas polinizadoras são atraídos por carne em decomposição. produção de grandes quantidades de pólen. ântese noturna. a biologia da polinização do Ficus carica. desse modo. titanum). do mundo (A. as espécies que seguem esta estratégia imitam a forma e os odores de espécies que oferecem recompensas. C) Aceras anthropophorum (Orchidaceae) «orquídea-‐do-‐ homem-‐enforcado». psenes ao nível do pomar. As figueiras domesticadas são unissexuais: todas as suas flores são ♀ e de estilete longo. i. se apoiem no lábio inferior. como o embuste mais descarado. Visitam então mais do que um sícono para depositar ovos e polinizam. a inflorescência desta arácea proveniente do E da Ásia liberta um odor desagradável que atrai moscas polinizadoras. A evolução tanto facilita a cooperação mutualista. Nas Labiadas evoluíram vários sistemas mecânicos muito elaborados de polinização. por isso. “produzem” mais vespas do que frutos. engana-‐as mimetizando o odor e a forma de outras espécies falaenófilas com recompensas (Figura 9) (Haber. compelem o movimento do estilete que roçará. Os síconos dos caprifigos não são edíveis porque. Para tal são cultivados caprifigos na sua vizinhança de modo a garantir a presença de B. Não surpreende. por isso. Uma vez no exterior. qualquer das flores destes síconos pode evoluir para fruto porque o ovopositor da B. não oferece recompensas às borboletas noturnas polinizadoras. e.g. A) B) C) Figura 9. caprifigos como figueiras-‐comuns. Consequentemente. para atrair insectos polinizadores. em busca de néctar. uma árvore centro-‐americana. o ovário das flores de estiletes longos. As vespas ♀ emergem dos caprifigos no início da Primavera (Abril). a partir do estigma. Polinização por engano. a Plumeria rubra (Apocynaceae). Os insectos que. 1984). . também. não ramificada. pelo contrário. espécie falaenófila com uma polinização por engano alimentar (Haber. Existem dois tipos de polinização por engano: Polinização por engano alimentar (ing. a maioria das flores ♀ é parasitadas pela B.21 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente sem ver a luz do dia. officinalis são protândras. exibam sinais visuais. Potencialmente. As flores das cultivares conhecidas por «figos-‐de-‐esmirna». Por exemplo. precisam de ser polinizadas. psenes. as flores mais jovens são funcionalmente ♂ e as mais velhas funcionalmente ♀. entretanto. A maioria das cultivares comerciais de «figueira» são partenocárpicas não necessitando. e polinizar. o engano é uma aposta vantajosa. no seu dorso. pertence ao género Amorphophallus a planta com a maior inflorescência. assim designada porque o labelo tem a forma de um homem. nas flores mais velhas os estames deixam de reagir à pressão e o estilete encurva-‐se. já fecundadas. A) Amorphophallus rivieri (= A. as flores ♀ das figueiras-‐ selvagens. como muitas outras orquídeas segue uma estratégia de polinização por engano Polinização por engano A oferta de recompensas em troca do serviço polinização é energeticamente muito cara. As flores de R. psenes. tanto podem visitar. Enquanto o polinizador não evolui novos sistemas de detecção de mentiras. Polinização miófila. psenes é demasiado curto para atingir. food deceit) – as flores assinalam a presença de recompensas alimentares inexistentes. B) Plumeria rubra (Apocynaceae). em Rosmarinus officinalis (Lamiaceae) «alecrim» – uma espécie melitófila – a pressão realizada pelos apídeos polinizadores na base dos estames força as anteras a roçarem e a depositarem pólen no dorso do inseto. uma região do corpo de difícil limpeza. por regra. embora só consigam parasitar as flores de estiletes curtos. de ser polinizadas. tácteis ou odoríferos sem oferecerem qualquer tipo de recompensa. konjac) (Araceae). As vespas ♀. Os caprifigos produzem três gerações por ano coincidentes com outras tantas gerações de B. 1984).e. que muitas espécies de plantas. ao abandonarem o figo são “carregadas” de pólen pelas flores ♂. cor e pilosidade. Os machos atraídos pelas flores pousam no labelo e. distílica. Nestas orquídeas as flores libertam odores quimicamente próximos às feromonas femininas de determinadas espécies de vespas (Hymenoptera) e exibem labelos semelhantes a fêmeas. relacionada com a precipitação e a temperatura do ar. Abelhas (Apis mellifera). Ao pseudocopular com outra flor existe uma grande probabilidade inserir as polinídias. (Klein. tem um pico de eficiência a transportar pólen a 20-‐22°C. 2007) exploraram as características da polinização em 105 plantas alimentares cultivadas: das plantas estudadas 87 eram entomófilas. 2007) Cultura Sistema de reprodução Sistema de reprodução Citrullus lanatus «melancia» Monoica auto-‐compatível. Fagopyrum esculentum «trigo-‐ sarraceno» Hermafrodita. et al. a muito dependentes da polinização por insectos (Klein. A polinização é realizada pelas vespas macho quando tentam copular com a flor (pseudocópula). Abelhas (Apis mellifera) e abelhas solitárias. Importância económica da polinização entomófila Klein et al. entre as quais se destacam os cereais (os cereais são todos anemófilos). Esta estratégia de polinização embora dispense a produção de néctar estabelece uma dependência absoluta da planta em relação ao seu polinizador: o risco do polinizador “aprender” que está a ser enganado. Admite-‐se que a polinização por engano é uma das chaves para explicar a enorme diversidade específica das orquidáceas.. A polinização por engano está particularmente desenvolvida na família das orquídeas (Figura 9).. A eficiência dos insectos polinizadores está. A natureza viscosa do retináculo permite que as polinídias se colem à cabeça ou ao abdómen do inseto macho. Abelhas (Apis mellifera). A impossibilidade de realizar a cópula obriga o inseto macho a procurar novamente uma fêmea. Abelhas (Apis mellifera). abelhas solitárias e abelhões (Bombus). duas cavidades onde se alojam duas polinídias (uma por bursícula). As polinídias são massas de pólen suportadas por um pequeno pé. A precipitação inibe o voo dos insectos. A polinização entomófila perde relevância quando a análise é efetuada em volume de produção. auto-‐ compatível. abelhas solitárias e abelhões (Bombus). auto-‐incompatível. o mais importante polinizador das plantas entomófilas com interesse económico das regiões de clima temperado e mediterrânico. Cucumis melo «melão» Monoica ou andromonoica.pepo «abóboras» Monoica auto-‐compatível. sexual deceit) – as flores mimetizam as feromonas sexuais e/ou os sinais visuais e tácteis de insectos fêmeas. C. et al.pl. Algumas plantas cultivadas estritamente. Nitidulidae). As abelhas raramente voam com temperaturas inferiores a 12°C. Quadro 9.). abelhas solitárias e abelhões (Bombus). Cucumis sativus «pepino» Monoica ou andromonoica. e não em número de espécies. polinização nas orquidáceas). com a flor (v.22 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Polinização por engano sexual (ing. por engano. As orquídeas são entomófilas. moschata. 28 espécies não dependiam de polinização animal (Quadro 9). Averrhoa carambola «caramboleira» Hermafrodita. Cucurbita maxima. em larga medida. Actinidia chinensis «kiwi» Dioica. distílica. na forma. os insectos machos são usados como veículo de pólen quando visitam e tentam copular (pseudocópula). assim como as temperaturas excessivas. Abelhas (Apis mellifera). Annona squamosa «anoneira» Hermafrodita. A abelha. o retináculo. Abelhas (Apis sp. . Cerca de 1/3 das espécies segue uma estratégia de polinização por engano sexual. auto-‐incompatível. Escaravelhos (fam.i. Abelhas (Apis mellifera). sejam elas altas ou baixas. contactam com as bursículas. inadvertidamente. completas ou não. 60% da produção global de alimentos em volume provém de culturas que não dependem da polinização animal. ou extinguir-‐se é real. auto-‐ compatível. C. abelhas solitárias e abelhões (Bombus). com uma massa viscosa na base. no estigma de uma flor não polinizada. 23 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Eriobotrya japonica «nespereira» Hermafrodita, auto-‐incompatível. Abelhas (Apis mellifera) e abelhões (Bombus). Malus domestica «macieira» Hermafrodita, geralmente auto-‐ incompatível. Abelhas (Apis mellifera), abelhas solitárias, abelhões (Bombus) e sirfídeos. Mangifera indica «mangueira» Andromonoica, auto-‐compatibilidade variável consoante as cultivares. Abelhas (Apis mellifera), abelhas sem ferrão (Trigona), dípteros, formigas e vespas. Passiflora edulis «maracujazeiro» Hermafrodita, maioria das cultivares auto-‐ incompatíveis. Abelhas solitárias, abelhões (Bombus) e beija-‐flores. Persea americana «abacateiro» Hermafrodita, auto-‐incompatível, dicogâmica. Abelhas (Apis mellifera), abelhas sem ferrão e abelhas solitárias. Prunus sp.pl. «prunoideas» Hermafrodita, geralmente auto-‐ compatíveis. Abelhas (Apis mellifera), abelhas solitárias, abelhões (Bombus) e dípteros. Pyrus communis «pereira» Hermafrodita, auto-‐incompatível. Abelhas (Apis mellifera), abelhões (Bombus) e abelhas solitárias. Rubus sp.pl. «silvas» Hermafrodita, auto-‐compatível. Abelhas (Apis mellifera), abelhas solitárias, abelhões (Bombus) e sirfídeos. Theobroma cacao «cacaueiro» Hermafrodita, auto-‐incompatibilidade variável consoante as cultivares. Abelhas (Apis), dípteros das fam. Cecidomyiidae e Ceratopogonidae. Legenda: andromonoicia – indivíduos com flores hermafroditas e flores unissexuais masculinas; dicogamia – desfasamento temporal na maturação dos órgãos sexuais ♀ e ♂; dípteros (lat. Diptera) – ordem de insectos à qual pertencem todas as moscas; sirfídeos (lat. Syrphidae) – moscas comuns nas flores, sobretudo nas flores das umbelíferas, fáceis de identificar pelo abdómen listado (como o das vespas) e pela capacidade de pairar no ar. 1.2.3.3. Germinação do grão de pólen, formação do tubo polínico e fecundação A capacidade do pólen cumprir a sua função reprodutiva designa-‐se por viabilidade. A duração da viabilidade do pólen depende (i) das características genéticas da planta (por vezes comuns à escala do género e da família), (ii) do estádio de desenvolvimento do microgametófito e (iii) de variáveis ambientais, sobretudo da temperatura e da humidade relativa. O pólen das Poaceae é viável durante poucas horas; noutras espécies, particularmente entre as espécies entomófilas, a viabilidade pode prolongar-‐se por várias semanas. O pólen binucleado, por regra, é viável durante mais tempo do que o pólen trinucleado. A perda de água reduz acentuadamente a viabilidade do pólen, por isso, temperaturas elevadas e humidades relativas baixas podem prejudicar a polinização. Logo após a abertura das flores os estigmas estão, geralmente, sujeitos a uma intensa e permanente chuva de pólenes estranhos. As plantas-‐com-‐flor desenvolveram mecanismos eficazes, ainda não completamente esclarecidos, que apenas autorizam a germinação de pólenes coespecíficos. Desde que os estigmas estejam 12 receptivos (permitam a germinação do pólen), menos de uma hora após a captura pelo estigma, o grão de pólen hidrata-‐se e germina. Este processo depende da viabilidade do pólen recém-‐chegado e da compatibilidade entre o pólen e o estigma. Iniciada a germinação, o tubo polínico irrompe por uma abertura da esporoderme e invade os tecidos estigma. Nos estiletes sólidos o tubo polínico cresce em direção aos primórdios seminais pelos espaços intercelulares do tecido de transmissão; nos estiletes fistulosos mergulha numa mucilagem. Nos grãos de pólen binucleados a divisão da célula generativa em duas células espermáticas decorre durante a formação do tubo polínico. Durante todo o processo reprodutivo o tubo polínico é alimentado pelos tecidos do estigma e do estilete; o seu metabolismo e alongamento são controlados pelo núcleo da célula vegetativa. A célula vegetativa do tubo polínico desce pelo estilete contida no interior do tubo polínico arrastando consigo duas células espermáticas (= gâmetas ♂) que permanecem incorporadas no seu citoplasma. A chuva ou humidades relativas muito altas prejudicam a deiscência das anteras e a aderência do pólen aos pistilos. Temperaturas muito altas podem induzir a formação de grãos estéreis de pólen e prejudicar a aderência do pólen aos pistilos. A velocidade de crescimento do tubo polínico é determinante no sucesso da fecundação porque 12 Receptividade ou maturação dos estigmas. 24 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente os primórdios seminais têm uma viabilidade limitada. Designa-‐se por período de polinização efetiva a diferença entre a longevidade dos primórdios seminais pós a ântese, em dias, menos o tempo, novamente em dias, que o tubo polínico necessita para percorrer o estilete e atingir os primórdios seminais. A viabilidade dos primórdios é variável de espécie para espécie; e.g. 10-‐15 dias na macieira e 4-‐5 dias na cerejeira. Em regra o tubo polínico demora 1 a 7 dias a atingir os primórdios. Portanto, a polinização tardia e os fatores que atrasam a germinação dos tubos polínicos (e.g. frio) aumentam o risco de insucesso na formação de frutos e sementes. A penetração do primórdio seminal pelo tubo polínico faz-‐se, geralmente, pelo micrópilo. Nas Cucurbitaceae o tubo polínico perfura os tegumentos. A fusão dos gâmetas inclui, numa primeira etapa, a libertação dos núcleos espermáticos: um no interior da oosfera e outro na célula central. Pouco depois realiza-‐se a fusão do material genético (singamia) maternal e paternal. Este complexo processo com dois gâmetas ♂ e duas singamias designa-‐se por dupla fecundação e é exclusivo das angiospérmicas. A fusão de um núcleo espermático com a oosfera dá origem ao zigoto. O zigoto é a primeira célula da geração esporofítica seguinte, cujo desenvolvimento gera o embrião. A 13 célula triploide resultante do encontro do segundo núcleo espermático com os dois núcleos polares é o ponto de 14 partida da diferenciação do endosperma . O endosperma é diploide nas angiospérmicas mais primitivas (angiospérmicas basais), por esta razão Friedman & Williams (2004) admitem que o endosperma triploide foi adquirido por um antepassado comum das magnoliidas, monocotiledóneas e eudicotiledóneas. 1.2.3.4. Desenvolvimento da semente Concluída a fertilização o primórdio seminal sofre um conjunto de modificações que desembocam na formação da semente. O desenvolvimento da semente comporta três etapas, as duas primeiras mais ou menos sobrepostas no tempo: (i) embriogénese; (ii) acumulação de reservas; (iii) maturação das sementes (nas sementes ortodoxas). O embrião diferencia-‐se a partir do zigoto sendo para tal nutrido pela nucela, tecido que na grande maioria das espécies de angiospérmicas acaba por desaparecer (excepto nas sementes perispérmicas, vd. Vol I, Fasc.II). O primeiro passo da embriogénese envolve a divisão do zigoto em duas células-‐filha: a célula-‐basal e a célula-‐apical, a primeira voltada para o polo micropilar, e a segunda para o polo calazal. A célula-‐basal dará origem ao suspensor, nas angiospérmicas uma estrutura haustorial encarregue da transferência de nutrientes e de hormonas vegetais da planta-‐mãe para o embrião em formação (nas ‘pteridófitas’ e nas gimnospérmicas o suspensor tem um metabolismo pouco ativo). As células do suspensor degeneram naturalmente ou por efeito da compressão do embrião em crescimento. Da célula apical diferencia-‐se, num primeiro estádio, o pró-‐embrião que, por sua vez, evolui num embrião. O pró-‐embrião tem inicialmente uma forma globular (estado globular) e tecidos não diferenciados. Nas eudicotiledóneas o pró-‐embrião toma, de seguida, a forma de coração estilizado (estado cordiforme) que evidência a diferenciação de dois cotilédones. Nas monocotiledóneas o embrião progride para uma forma cilíndrica porque dispõe de apenas um cotilédone. O embrião cordiforme ou cilíndrico dispõe já de tecidos meristemáticos especializados. A marcar o final da embriogénese o embrião alonga-‐se significativamente completando-‐se a diferenciação dos meristemas primários, apical radicular e apical caulinar. No embrião identifica-‐se um polo caulinar e outro radicular; a polaridade é definida num estágio inicial do desenvolvimento embrionário e, durante todo o ciclo de vida, não mais abandona as plantas. Como referi anteriormente o endosperma é o tecido de reserva mais frequente nas plantas-‐com-‐semente; a sua diferenciação decorre paralelamente com a do embrião. O endosperma das gimnospérmicas diz-‐se primário e o das angiospérmicas secundário ou albúmen. O endosperma pode (sementes albuminosas) ou não (sementes exalbuminosas) permanecer na semente. A formação de cotilédones de grande dimensão com abundantes reservas faz-‐se, em grande parte, à custa da desmobilização das reservas acumuladas no endosperma no início da formação da semente. As reservas energéticas cotiledonares são desmobilizadas mais rapidamente em Direcção aos meristemas do embrião do que as reservas sob a forma de endosperma. Por isso, as sementes cotiledonares tendem 13 Na heterofecundação os dois núcleos espermáticos têm origem em dois tubos polínicos distintos, um evento raro na biologia reprodutiva das angiospérmicas. 14 Nas angiospérmicas poder-‐se-‐ão utilizar os termos zigoto primário e zigoto secundário para designar, respectivamente, as células resultantes da fusão do primeiro núcleo espermático com a oosfera e do segundo núcleo espermático com os dois núcleos polares. 25 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente a germinar mais rapidamente do que as sementes albuminosas. As sementes muito grandes geralmente têm reservas endospérmicas. Os tegumentos do primórdio seminal dão origem ao perisperma que envolve e protege a semente. As sementes ortodoxas perdem água (e peso) e sofrem uma acentuada redução da atividade metabólica à medida que amadurecem adquirindo, deste modo, tolerância ao à dessecação e a temperaturas extremas. Finda a maturação, as sementes ortodoxas entram em quiescência. Recordo que este termo significa “suspensão do crescimento”, qualquer que seja a causa e a duração. Nas sementes ortodoxas dormentes – a dormência é um subtipo de quiescência – o embrião é incapaz de prosseguir, de imediato, o seu desenvolvimento e dar origem a uma nova planta, mesmo sob condições ambientais ótimas para a germinação. As sementes recalcitrantes não entram em quiescência, e mantêm elevados teores em água na maturação, o que as torna sensíveis à dessecação e a temperaturas baixas (geralmente abaixo dos 10°C). Produzem sementes recalcitrantes os Quercus e Castanea (Fagaceae), a Theobroma cacao (Malvaceae, Sterculioideae) «cacaueiro» e a Persea americana (Lauraceae) «abacateiro». Ao contrário das sementes ortodoxas, não podem ser conservadas congeladas e permanecem viáveis durante um curto período de tempo. 1.2.3.5. Formação do fruto A diferenciação do fruto a partir das paredes do ovário normalmente depende do estímulo da fecundação e consequente formação de sementes. Regra geral as flores não fecundadas abortam: o ovário pára de crescer e a flor senesce (= morre). A transição entre a fase de flor e a formação do fruto designa-‐se por vingamento. Os frutos ditos partenocárpicos formam-‐se sem fecundação e distinguem-‐se dos frutos “normais” por não possuírem sementes. Produzem frutos partenocárpicos, por exemplo, a bananeira, o ananaseiro, muitos citrinos e algumas cultivares de macieira ou de videira-‐europeia, como a ‘Uva Preta de Corinto’ e a ‘Dona Maria’. Algumas espécies necessitam do estímulo da germinação do pólen para produzir frutos partenocárpicos; outras dispensam estímulos externos para iniciar a formação do fruto. Distinguem-‐se três fases na formação do fruto: (i) na fase I ocorre uma intensa divisão celular; (ii) durante a fase II dá-‐se um incremento da dimensão das células e um abrandamento da divisão celular; (iii) na fase III a divisão celular e a expansão das células cessam, a cor, a estrutura e a composição química do fruto mudam, e este amadurece. A duração das três fases varia de espécie para espécie, e entre cultivares. Nas prunoideas – fruteiras da subfamília Prunoideae (Rosaceae) – o caroço resulta da lenhificação do endocarpo que ocorre no início da fase II. Os frutos carnudos acumulam grande quantidade de açúcares na fase III (amadurecimento); os frutos secos perdem água e as suas células senescem. Os frutos maduros, frequentemente, destacam-‐se da planta-‐mãe por uma zona de abcisão, situada na base do pedúnculo do fruto, identificável através de uma pequena articulação. O desenvolvimento dos frutos tem uma forte regulação hormonal extensamente discutida nos livros texto de fisiologia vegetal. 1.2.3.6. Dispersão Vantagens da dispersão A dispersão é um momento chave na biologia das plantas. Os mecanismos de dispersão são muito frequentes, especializados e diversos nas angiospérmicas. Esta constatação é, por si só, uma evidência forte de que a dispersão eficiente de diásporos, ou propágulos, é evolutivamente vantajosa. A dispersão para longe da vizinhança dos indivíduos parentais incrementa o sucesso reprodutivo das plantas através de três mecanismos maiores: (i) aumento da probabilidade de colonização de micro-‐habitats adequados à germinação das sementes e ao estabelecimento das plântulas; (ii) incremento da distância das plantas germinantes a indivíduos coespecíficos hospedeiros de doenças e pragas; (iii) redução dos riscos de endogamia nas plantas alogâmicas. Por outras palavras, nascer e crescer na vizinhança dos pais é um risco porque a taxa de mortalidade das plântulas está correlacionada com a densidade, a dimensão (tamanho) dos indivíduos condiciona a sua capacidade competitiva e, frequentemente, longe dos 26 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente indivíduos parentais, há micro-‐habitats ainda não preenchidos salubres (livres de doenças, pragas e competidores) e ricos em recursos, onde gerar filhos geneticamente saudáveis, i.e., um “mundo” de oportunidades reprodutivas. Unidades e agentes de dispersão A unidade de dispersão, i.e. o que se dispersa, varia de espécie para espécie. Nos Cytisus (Fabaceae) «giestas» e nos Ulex (Fabaceae) «tojos» dispersam-‐se as sementes, em Quercus (Fagaceae) um fruto com uma semente inclusa, em Coronilla (Fabaceae) pedaços (mericarpos) de uma vagem esquizocárpica com uma semente inclusa, em muitos Allium (Alliaceae) «alhos» bolbilhos formados na inflorescência, em Cynodon dactylon (Poaceae) «grama» sementes ou fragmentos de rizoma e em Hydrangea (Hydrangeaceae) «hidrângea» sementes ou fragmentos do caule (estacas). Em casos extremos a planta, como um todo, atua como unidade de dispersão; e.g. Lemna minor (Araceae) «lentilha-‐de-‐água». Reconhecem-‐se dois tipos de unidades de dispersão: 15 Diásporo – embrião mais o conjunto das estruturas que o acompanham, e.g. restantes estruturas da semente e tecidos do fruto; a semente é o diásporo das plantas com frutos deiscentes e o fruto, ou parte do fruto com sementes inclusas, é o diásporo dos frutos indeiscentes; são também diásporos os esporos das ‘briófitas’ e ‘pteridófitas’; Propágulo – qualquer estrutura que permita a reprodução vegetativa de uma planta; e.g. fragmentos de estolhos e rizomas. As unidades de dispersão podem dispersar-‐se por gravidade ou serem transportadas por agentes de dispersão, e.g. animais, vento e água. Mecanismos de dispersão de diásporos Os mecanismos de dispersão de diásporos mais frequentes na natureza, e os agentes e adaptações que geralmente lhes estão associados foram resumidos no Quadro 10. Quadro 10. Mecanismos de dispersão de diásporos Tipo Estrutura dos diásporos Exemplos Autocoria – dispersão por gravidade (barocoria) ou presença de mecanismos autónomos de dispersão. Diásporos barocóricos são estruturalmente muito variáveis. Os mecanismos autónomos de dispersão de diásporos incluem a queda não assistida por gravidade, o enterramento ativo ou sistemas de projeção. Por gravidade sem mecanismos especiais, e.g. Quercus (Fagaceae) (carvalhos); enterramento ativo de diásporos, e.g. Arachis hypogaea (Fabaceae) «amendoim» e Trifolium subterraneum (Fabaceae) «trevo-‐subterrâneo»; projeção de sementes, e.g. Ecballium elaterium (Cucurbitaceae) «pepino-‐ de-‐são-‐gregório» (Figura 10) e diversas Balsaminaceae. Anemocoria – dispersão pelo vento. Diásporos pequenos, leves e com estruturas aerodinâmicas para facilitar o transporte pelo vento; e.g. asas, pelos, estruturas em forma de balão. Frutos alados em Ailanthus altissima (Simaroubaceae) «ailanto») e Ulmus (Ulmaceae) «ulmeiros» (Figura 10); sementes com pelos em Chorisia speciosa (Malvaceae, Bombacoideae) e Salix (Salicaceae) «salgueiros»; cálice em forma de balão em alguns Trifolium «trevos». Na maior das Asteraceae cálice reduzido a um papilho de pelos que funciona como uma paraquedas. Hidrocoria – dispersão pela água. Diásporos capazes de resistir à submersão em água doce ou marinha; por vezes com capacidade de flutuação. Frequente entre a vegetação litoral, aquática e anfíbia; e.g. Pancratium maritimum (Amaryllidaceae) «narciso-‐das-‐ areias», disperso pela água do mar. Zoocoria – dispersão apoiada em vetores de dispersão animais. As plantas endozoocóricas produzem diásporos com cores, odores agradáveis e/ou “oferecem” recompensas aos seus vetores de dispersão, e.g. polpa de um fruto carnudo, sarcotesta ou excrescências carnudas várias na superfície do episperma. As espécies ectozoocóricas dispõem de diásporos viscosos ou providos de espinhos ou ganchos. Sementes com excrescências nutritivas (Figura 10), e.g. Ricinus communis (Euphorbiaceae) «rícino»; plantas com frutos carnudos, e.g. muitas Rosaceae e Solanaceae; plantas com diásporos viscosos, espinhosos ou com ganchos, e.g. numerosas espécies de Apiaceae «umbelíferas». 15 Muitos autores usam um conceito lato de diásporo que engloba o conceito de propágulo. subterraneum tem. envoltas numa pilha de estrume. Os glomérulos são exteriormente revestidos por flores estéreis reduzidas ao cálice. Por exemplo. os B) Osyris alba (Santalaceae): pseudofrutos elefantes vergam com o seu peso as plantas adultas de carnudos (pseudobagas) de dispersão zoocórica. Os glomérulos maduros com facilidade ficam retidos entre as unhas ou pendurados no pelo dos ungulados (e. A ectozoocoria (= epizoocoria) envolve o transporte de diásporos suspensos na superfície do corpo ou no aparelho bucal de animais. Finda a ântese os pedúnculos infletem em direção ao solo na tentativa de enterrar as sementes retidas no interior das infrutescências. com a quadrupla função de amortecer agressões físicas. Mecanismos de dispersão dos frutos. subterraneum. no bico uma ave ou nas maxilas de uma formiga. são dispersos por aves. e.b. é particularmente interessante. Ulmus minor (Ulmaceae) «ulmeiro»: frutos ser escarificadas pelo sistema digestivo dos agentes de dispersão alados (sâmaras) de dispersão anemocórica . e por mamíferos. Os dispersores animais podem ainda melhorar as condições ambientais usufruídas pelas plantas germinantes. Uma parte das sementes eventualmente ingeridas pelos animais é devolvida inteira ao solo. fletidas para trás. Os terrenos localizados na vizinhança de indústrias de lanifícios são dos melhores locais para encontrar plantas novas alóctones (neófitas) em Inglaterra.g. a mais importante planta pratense de ambientes mediterrânicos. ovelhas e vacas). que os dispersam a longa distância. Por exemplo. Hyphaene petersiana «palmeira-‐marfim» – uma palmeira n. Muitas sementes zoocóricas desenvolveram tegumentos duros e necessitam de Figura 10. pronta a germinar com as primeiras águas do Outono. ancoragem ao solo e enterramento dos glomérulos (com frutos e sementes inclusos). O mecanismo de dispersão do T. Os diásporos zoocóricos podem ser transportados. O T. simultaneamente. A zoocoria pode também ser classificada em função do grupo taxonómico agente de dispersão (Quadro 11). por regra acumuladas nos frutos. C) Ecballium elaterim talhadas como se de marfim se tratasse – consomem os seus (Cucurbitaceae) «pepino-‐de-‐são-‐gregório»: frutos.g. Apodemus sylvaticus «rato-‐do-‐campo». suspensos no corpo de um mamífero ou no interior aparelho digestivo de uma ave. entretanto redistribuídas ectozoocoricamente no velo das ovelhas (Cope. e de facilitar a dispersão. & Tebbs. A) B) A endozoocoria frequentemente envolve uma relação mutualista: as plantas pagam a dispersores animais o “serviço dispersão” com recompensas alimentares. e. Gray. cicatriz circular resultante da queda do perianto em torno da cicatriz que marca a comum no sul de África cujas sementes são comercialmente inserção do estilete. deu-‐se o caso de se terem descrito espécies novas para ciência que mais tarde se constatou serem plantas conhecidas e comuns noutras regiões do mundo. 2009).g. antes de adquirirem capacidade germinativa. uma dispersão autocórica (por mecanismos próprios). prontas a germinar. digerem o pericarpo e expelem as sementes pepónio espermabólico escarificadas. escarificada (com a dureza atenuada). conhecidas por glomérulos. pela deposição C) simultânea de sementes e excrementos. . os Quercus além de autocóricos. por exemplo. Esta melhoria é obtida através do enterramento das sementes e/ou do aumento tópico da fertilidade do solo. Ashton. Corvus corone «gralha-‐preta» e Garrulus glandarius «gaio».27 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente A maior parte das plantas combina mais que um mecanismo de dispersão porque é demasiado arriscado “apostar” num único mecanismo eventualmente falível. Estes exemplos permitem identificar dois tipos importantes de zoocoria: ectozoocoria e endozoocoria (Quadro 10). com endocarpo lenhoso (para evitar a digestão das sementes) e coloridos e nutritivos (para promover a ingestão) quando maduros (e.g. (ii) na expressão de determinados genes. de inibidores químicos acumulados nas estruturas embrionares. muitas Polygalaceae Quiropterocoria – dispersão por morcegos Importante em áreas tropicais. A dormência aporta três grandes vantagens: (i) evita a germinação da semente em períodos climaticamente desfavoráveis (e. A dormência tegumentar é imposta pelo tegumento. Saldaña Rojas. Neste tipo de sementes – sementes duras – o tegumento impede a absorção da água.g.g. e. (ii) secundária – dormência adquirida por exposição a condições ambientais desfavoráveis. Muitas leguminosas.3. a dormência embrionar geralmente não é influenciada pela permeabilidade do tegumento e só inibe a germinação das sementes num pequeno período de tempo. Mamalocoria – dispersão por mamíferos Sobretudo mamíferos ungulados (Artiodactyla). mais raramente. produzem uma percentagem significativa de sementes com dormência tegumentar. ou (iv) na imaturidade do embrião. As causas da dormência embrionária causas residem na estrutura ou fisiologia do embrião. territórios . Classificação da zoocoria em função dos agentes de dispersão Tipo Importância. Ao contrário da dormência tegumentar. espécies com sementes ornamentadas com ganchos ou espinho dos géneros Daucus (Apiaceae) «cenouras-‐ bravas» ou Medicago (Fabaceae) «luzernas». (iii) do constrangimento mecânico da semente (impedindo a extrusão da radícula e caulículo).g. drupas e nuculânio). verdes e ácidos enquanto imaturos (para evitar ingestão antes da maturidade das sementes). Consoante o momento em que se inicia a dormência esta pode ser: (i) primária – sementes disseminadas já dormentes. A evidência experimental sugere que existem dois tipos fundamentais de dormência primária. aumentando a probabilidade do sucesso da dispersão a longa distância. e (iii) alarga a janela temporal disponível para a dispersão das sementes. (iv) da inibição da perda. Ornitocoria – dispersão por aves Muito abundante . Dormência da semente Tipos e vantagens da dormência A redução do teor em água no final da ontogénese das sementes ortodoxas força a entrada em quiescência do embrião. & Flecker. por exemplo por lixiviação. e.g. e. um peixe indígena da bacia do Amazonas muito apreciado na culinária brasileira. Pendergast. após a maturação das sementes. e. demasiado frios ou demasiado secos).g. concretamente: (i) na presença de inibidores químicos (e. e inibe a germinação. sobretudo pratenses. Piper (Piperaceae) e Ficus (Moraceae) (Lobova & Mori.28 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente ectozoocórica (sementes no exterior do corpo dos animais) e endozoocórica (por ingestão e posterior expulsão pelas fezes animais). 2011). pode dispersar sementes a mais de 5 km de distância (Anderson. (ii) da inibição da absorção de água. pelo endosperma. Rubus (Rosaceae) «silvas» e Rhamnus (Rhamnaceae) Mirmecoria – dispersão por formigas Muitas sementes mirmecóricas possuem excrescências nutritivas na superfície do tegumento da semente que atuam como de recompensa. (ii) permite a manutenção de um banco de sementes viáveis no solo quando as plantas germinadas no período favorável forem incapazes por razões climáticas. Nuttle. Estas estruturas atuam através (i) da produção de inibidores químicos. após a disseminação. consoante as espécies. Characidae). espécies tropicais com frutos carnudos dos géneros Cecropia (Cecropiaceae). o tambaqui (Colossoma macropomum. Nos casos em que uma combinação apropriada de fatores ambientais não chega para iniciar a germinação diz-‐se então que as sementes são dormentes. giberelinas). É um mecanismo particularmente apropriado para evitar que em territórios com uma estação seca pronunciada (e.g. Quadro 11. (iii) na ausência de promotores da germinação (e. frutos com frequência carnudos. adaptações muito variáveis consoante os grupos taxonómicos. ácido abcísico). e (v) da inibição das trocas gasosas com o exterior.g. adaptações e exemplos Ictiocoria– dispersão por peixes Com alguma expressão em florestas tropicais húmidas. pelo pericarpo ou. de poucas semanas a muitos anos. 2005) 1.7.g.2. por doença ou herbivoria de se reproduzir. A quebra da dormência (redução da percentagem de sementes duras) é favorecida por variações acentuadas da temperatura diária. mecanismo frequente em espécies temperadas. pericarpo. Por conseguinte. apresentam uma acentuada dormência. e. a remoção mecânica ou o pastoreio da biomassa pratense seca no estio. Quadro 12. subterraneum produzem uma elevada percentagem de sementes duras (com dormência tegumentar).29 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente mediterrânicos. sementes de Malus domestica (Rosaceae) «macieira». as sementes de Cistus (Cistaceae) «estevas» germinam mais rapidamente após uma queimada porque o tegumento fendilha pela ação do fogo. nestas espécies as sementes entram em dormência quando enterradas no solo. e. . lavouras – arrasta-‐as para superfície e a exposição à luz quebra-‐lhes a dormência. chuvas prolongadas lixiviam mais eficazmente os inibidores e. ou tropicais com estação seca) as sementes enterradas no solo germinem com uma chuvada estival ocasional. por um pequeno período ou a exposição a um fotoperíodo determinado. no caso da dormência se dever à imaturidade do embrião (dormência embrionar) este apenas precisa de tempo para maturar no interior da semente. Exposição a concentração de CO2 superiores ao valores normais da atmosfera As plantas enterradas no solo têm maior probabilidade de serem sujeitas a teores mais elevados de CO2 do que as sementes depositadas na sua superfície. em algumas plantas estas taxas são superiores a temperaturas baixas. em algumas Poaceae (e. por si só. insuficiente para o sustento das plântulas. chilling) Exposição ao frio (0 a 10°C). Flutuação diária da temperatura A flutuação térmica diária pode afetar as taxas e a velocidade de germinação de algumas espécies. A exposição a temperaturas o diurnas elevadas. O enterramento profundo das sementes tem um efeito inverso.g. início do Outono. simultaneamente. O fator tempo. em condições de elevada humidade. As cultivares comerciais de T. em condições naturais a escarificação pode resultar da travessia do sistema digestivo ou do efeito do fogo. A maior parte das plantas cultivadas propagadas por semente não produz sementes dormentes porque foram artificialmente selecionadas para germinarem rapidamente e em sincronia. no entanto. Algumas plantas pratenses melhoradas. As taxas de germinação das sementes variam com a temperatura. sobretudo leguminosas. O T. Quebra de dormência Os mecanismos de quebra de dormência são muito variados. geralmente superior a 80% no início do Verão. Os ciclos diários de contração e expansão dos tecidos da semente geram fendas no tegumento. Por exemplo. Mecanismos de quebra da dormência das sementes Mecanismo Descrição e exemplos Vernalização (ing. através da redução do ensombramento do solo. Escarificação ou remoção de estruturas que envolvem o embrião Esta escarificação (do tegumento.g. Lixiviação de inibidores químicos A infiltração e movimento da água no solo pode arrastar (lixiviar) eventuais inibidores químicos do tegumento das sementes. de espécie para espécie. Avena fatua) a remoção das peças bracteolares que envolvem a semente (glumelas) favorece a germinação. enfraquece todos os tipos de dormência. areia ou lixa). subterraneum «trevo-‐subterrâneo» reúne muitos dos mecanismos de dormência e quebra de dormência anteriormente referidos (Smetham. Mecanismo frequente em infestantes com sementes pequenas. endosperma ou glumelas) pode ser artificialmente realizada com um abrasivo (e.g. é particularmente eficiente na quebra da dormência tegumentar. 2003). reduz o número de sementes duras no final do Verão. ou mesmo entre cultivares da mesma espécie. que por sua vez permitem a embebição da semente em água e a sua germinação.g. Redução da humidade Algumas espécies adquirem a capacidade de germinar quando o seu teor em água desce abaixo de um determinado nível. acima dos 50-‐60 C. garantem maiores taxas de sobrevivência dos germinantes. Exposição à luz Consoante as espécies pode envolver a exposição intermitente.g. durante um período variável de tempo. do que a temperaturas altas. a perturbação do solo – e. Os mais comuns estão listados no Quadro 12. Neste caso os melhoradores de plantas retiveram esta caraterística porque a dormência favorece a sua persistência no ecossistema pastagem. dormentes ou não. com grande probabilidade. em particular pelo tegumento. O embrião ao aumentar de volume pressiona o perisperma e este rompe-‐se. (iii) a ativação dos meristemas embrionários e (iv) a mobilização em direção ao embrião das reservas acumuladas nos cotilédones ou nos tecidos de reserva.8.g. Não surpreende. os patogéneos ou a herbivoria podem causar taxas de mortalidade muito elevadas. A manifestação das plântulas à superfície do solo designa-‐se por emergência. A germinação principia com a (i) embebição em água (= humectação) da semente. 1. Semente e germinação de Zea mays (Poaceae) «milho-‐graúdo» A cariopse – o fruto das gramíneas – compreende (Figura 11): (i) uma única semente. por exemplo em resultado de trovoadas intensas. Guiada por um geotropismo positivo a raiz primária emerge da semente. Chegado o período húmido outonal. preenchidas com amido. Caso existam.2. Nas sementes de germinação hipógea o entrenó hipocotilar alonga-‐se muito pouco e o(s) cotilédone(s) permanecem enterrados ou à superfície do solo. (ii) camada de aleurona. (ii) segue-‐se o aumento do volume do embrião. a camada celular mais externa da semente. que a produção de sementes duras seja uma característica positivamente selecionada pelos melhoradores. situada entre o perisperma+pericarpo e o endosperma. O tipo de condições ambientais admitida para a germinação é controlada pelo genótipo. As sementes quiescentes (vd. de grande complexidade. o meristema caulinar tem um geotropismo positivo e produz caule e folhas. temperatura e oxigénio para germinar. um longo período quente e seco. Desenvolvimento da semente). pela temperatura e pela presença de substâncias inibitórias no o tegumento. governada pelos teores de dióxido de carbono no solo. O alongamento dos primeiros entrenós caulinares encaminha a plúmula para a superfície do solo. necessitam apenas de uma combinação apropriada de água. A dormência tegumentar serve ainda para lidar com as flutuações climáticas interanuais porque o seu efeito prolonga-‐se por mais de um ano. (iv) embrião. As dormências tegumentar e embrionária desempenham um papel essencial na regulação do ciclo biológico desta espécie pratense porque reduzem o risco de germinações estivais. situado numa posição lateral (v. um período particularmente sensível do ciclo de vidas plantas: a competição com as plantas vizinhas. subterraneum somam à dormência tegumentar uma dormência de tipo embrionar. Como referi no ponto anterior as sementes dormentes só germinam se a sua dormência for quebrada. . subterraneum podem germinar em massa. e as sementes de T. bem diferenciado. Muitos autores defendem que a germinação da semente termina com a emergência da radícula.i). e afunda-‐se no solo. constituído por células não vivas. por vezes com inclusões proteicas. A morte em massa de plântulas no Verão prejudica as emergência no Outono e compromete a persistência do trevo-‐subterrâneo no longo prazo. verifica-‐se uma diminuição da concentração de substâncias químicas para deter a herbivoria (e. por isso. No extremo oposto do embrião. concrescente com o fruto (nas gramíneas o perisperma e pericarpo estão intimamente unidos sendo difíceis de distinguir). outros alargam este período até à emergência de folhas acima do solo. quer nos agroecossistemas. constituída por células ricas em aleurona (uma proteína). A germinação implica a desorganização da proteção conferida ao embrião pelas estruturas da semente. alcaloides quinolizidínicos das sementes de Lupinus (Fabaceae) «tremoceiros». A germinação estival das sementes – as chamadas falsas partidas – representa um enorme risco porque nesta altura do ano as plântulas terão pela frente. quer em populações naturais de plantas. As condições exigidas para a germinação das sementes são análogas às requeridas pelos gomos quiescentes. (iii) endosperma. A reativação do catabolismo aumenta o consumo de energia e reduz a relação C/N (relação carbono-‐azoto) na semente. A temperatura desce. Nas espécies de germinação epígea o(s) cotilédone(s) são arrastados para fora do solo pelo alongamento do hipocótilo. A germinação das sementes é.30 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente As sementes de T. portanto.3. Baixos teores de CO2 na atmosfera do solo e temperaturas superiores a 20 C têm um efeito particularmente favorável na persistência deste tipo de dormência. a água da chuva arrasta os inibidores acumulados no tegumento. não dormentes. Germinação da semente A germinação pode ser entendida como a retoma do crescimento do embrião de uma semente madura. geralmente pelo micrópilo. a atividade biológica do solo aumenta e o teor de CO2 na atmosfera do solo sobe. muito volumoso. As poáceas com interesse económico propagadas por semente. então. . & Yeo. por sua vez. mediada pelo escutelo. o endosperma. posicionada entre o endosperma e as restantes partes do embrião. (iii) coleóptilo.). a 85 %. mays é um modelo adequado para explorar a estrutura e a germinação da semente das gramíneas (= Poaceae) (Figura 12). excetuando as gramíneas pratenses. A) Estrutura da semente de Zea mays (adaptado de www. mays. stress ambiental. como as restantes sementes de cereais.jpg). A germinação de sementes de populações naturais é assincrónica. (iv) radícula. e o coleóptilo o limbo. Estrutura da semente de Poaceae. 1985). contém 12-‐14 % de água. a mobilização dos nutrientes do endosperma para o embrião. Nas sementes espécies silvestres quanto mais longo e quente o período de armazenamento em laboratório ou de quiescência no solo por falta de humidade para germinar. Dahlgren et al. entre outros fatores. composta por um esboço de raiz primária mais o meristema apical radicular.31 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente No embrião das gramíneas. B) Estrutura de uma semente de Triticum aestivum (Poaceae) «trigo-‐mole» (adaptado de www. 2008). a olho nú de cor mais escura do que o endosperma. constituída pelo meristema caulinar e esboços foliares. A germinação no milho-‐graúdo principia com uma rápida embebição de água. 10 % e 5% do peso seco da cariopse de Z. uma folha especializada. A semente do milho-‐graúdo.seedbiology. A semente endospérmica de Z. Muitas Poaceae produzem sementes dormentes.esu. Após um sinal hormonal emitido pelo embrião a camada de aleurona produz enzimas capazes de desdobrar o amido. Clifford. Embora sujeito a algumas variações. entre outros autores. As sementes de milho-‐graúdo têm de absorver pelo menos 30% do seu peso em água para que a germinação possa prosseguir (Nielsen.edu/~milewski/intro_biol_two/lab_4_seeds_fruits/images/Corn_Grain_ls. A) B) Figura 11. Menos apoio tem a hipótese de que o escutelo é a parte basal do cotilédone. defendem um antigo conceito de que o escutelo corresponde à primeira folha embrionar (cotilédone) e o coleóptilo à segunda.s. o embrião e o tegumento da semente+pericarpo correspondem. tamanha é a sua originalidade morfológica. (ii) plúmula. mais enérgica a quebra de dormência. e a divisão e alongamento das células com capacidade meristemática.de) As homologias entre as estruturas do embrião das Poaceae e as estruturas embrionares das restantes monocotiledóneas são objeto de uma acesa discussões entre especialistas. identificam-‐se as seguintes estruturas (Figura 11): (i) escutelo. temperatura. A intensidade da dormência e o número de sementes dormentes varia com as espécies. posição das sementes nas inflorescências. (v) coleorriza. geralmente não têm sementes dormentes e a germinação é sincrónica (v. (Dalhgren. inserida imediatamente acima do escutelo e que envolve a plúmula. Começa. respectivamente. uma estrutura de origem radicular em forma de bolsa que cinge e protege a radícula. uma camada espessa. um embrião onde se identificam radícula. A) B) C) Figura 12. A raiz primária morre pouco depois da germinação. sendo substituída por raízes adventícias de início diferenciadas no nó do escutelo (raízes seminais laterais). Em condições ideais a coleorriza emerge da base da semente 2-‐3 dias depois da embebição da semente protegendo. e um tegumento (Figura 13). Feldman cit. A) Plântulas recém-‐germinadas de Z. 2001). As raízes escora. A semente de Ph. O comprimento do coleóptilo e do mesocótilo. emerge a raiz primária. nos restantes nós subterrâneos.32 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente O milho-‐graúdo é uma espécie hipógea: a semente permanece inumada no solo. ou seja depende do peso da semente. Park. 16 Os Triticum e demais Poaceae da subfamília Pooideae não alongam o mesocótilo. temporariamente. & Woll. O tegumento tem duas camadas com origem nos dois tegumentos do primórdio seminal. 2004). pouco depois. e a profundidade a partir da qual uma semente é capaz de germinar. raiz primária acidentalmente cortada Semente e germinação de Phaseolus vulgaris (Fabaceae) «feijão-‐vulgar» O Phaseolus vulgaris é um modelo corrente da germinação das leguminosas (Figura 12). 2008). . O milho pode ser semeado até 7 cm de profundidade. e logo a seguir um número variável de raízes seminais laterais (geralmente duas) e o coleóptilo. Cerca de dez dias depois da germinação despontam raízes adventícias no nó do coleóptilo e. B) Plântula de Z. formam-‐se cerca de 6 semanas após a germinação (L. hipocótilo. C) Plântula de Ph. Sauer. sendo a camada mais externa a que imprime maior resistência ao perisperma. está relacionada com a quantidade de reservas da semente. no interior do solo. Em condições ótimas o intervalo entre a sementeira e a emergência ronda 1 semana (Nielsen. Esgotadas as reservas do endosperma o que resta da semente senesce e acaba por se destacar da planta. mays (Poaceae). a radícula no seu interior. vulgaris (Fabaceae). e estão ausentes da maioria das gramíneas. O coleóptilo protege a plúmula durante o 16 seu percurso no solo. mays. O entrenó que liga o coleóptilo à semente – o mesocótilo – alonga-‐se nas sementes muito enterradas e empurra o coleóptilo em direção à superfície do solo. mays.b. (Hochholdinger. inseridas em nós aéreos. Atingida a superfície do solo o coleóptilo cessa de se alongar. rompe-‐se e do seu interior emerge a primeira folha. vulgaris tem uma morfologia mais simples que a da Z. epicótilo e plúmula. n. Esta capacidade é exclusiva das plantas das subfamílias Chloridoideae e Panicoideae (Grass Phylogeny Working Group. Segue a estrutura característica das sementes cotiledonares: dois cotilédones com a maior parte da massa da semente. No mesmo dia. Germinação em mono e dicotiledóneas. ou vários dias depois em solos frios. As raízes seminais laterais têm uma origem adventícia no nó do escutelo. apruma-‐se transportando os cotilédones e a plúmula para fora do solo. . raiz ou folhas) e efetua-‐se a partir do abrolhamento de gemas de diferentes tipos. nas hortas tradicionais semeiam-‐se 2-‐4 sementes por covacho. N. Para obviar este problema. é irregular. Quando atinge a superfície do solo. Este processo salvaguarda a plúmula de eventuais danos mecânicos causados pelas partículas do solo. e da formação de novas raízes. O alongamento do hipocótilo sucede a emergência da raiz. Atingida a superfície do solo os cotilédones desempenham. com frequência os cotilédones soltam-‐se no trajecto a caminho da superfície do solo. Numa fase inicial o hipocótilo alonga-‐se e arqueia-‐se acentuadamente. formando-‐se um arco hipocotilar. o feijão tem origem no primórdio seminal campilotrópico por isso o micrópilo situa-‐se na vizinhança do hilo 1. As raízes secundárias são pós embrionárias: diferenciam-‐se da raiz primária. Micropropagação – produção de clones de uma planta a partir de uma única célula vegetal somática (= não reprodutiva) ou de uma porção de tecido vegetal (= explante). temporariamente. Conceitos fundamentais e tipologia. redução de ploidia nem fertilização porque se desenrola sem a fusão de gâmetas. Reprodução assexuada Grandes tipos de reprodução assexuada A reprodução assexuada (= reprodução assexual) não envolve meiose.2. por conseguinte.b. sobretudo nos solos de textura fina. regra geral adventícias. O sistema radicular é de tipo aprumado. Multiplicação vegetativa – envolve apenas estruturas vegetativas (caule. vd. E a embebição é mais lenta do que a das gramíneas. muitas outras leguminosas são hipógeas (e.4. estando a raiz principal já diferenciada na semente. a função fotossintética antes de senescerem. Pisum sativum «ervilheira»). as técnicas de micropropagação são similares às técnicas de cultura de tecidos vegetais in vitro.33 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente As leguminosas exigem mais água no solo do que as gramíneas para germinar. os clones são indivíduos geneticamente idênticos obtidos assexuadamente a partir de uma planta-‐mãe.g. Estrutura da semente de Phaseolus vulgaris (Fabaceae) «feijão-‐vulgar». A germinação do feijoeiro. A) B) Figura 13. Agamospermia (= reprodução vegetativa) – produção de embriões sem fusão gamética no interior do primórdio seminal e. O feijão tem uma germinação epígea. Nos Lupinus «tremoceiros» os cotilédones continuam funcionais e fotossintéticos até ao princípio da Primavera. de sementes viáveis sem fecundação. sob a influência da luz. Os tipos mais importantes de reprodução assexuada entre as plantas-‐ terrestres são os seguintes: Produção de esporos – fundamental nas ‘briófitas’ e ‘pteridófitas’. g. Leontodon (Asteraceae) «dentes-‐de-‐leão» e numerosas Poaceae «gramíneas». de embriões agamospérmicos: apomixia (= agamospermia gametofítica ou partenogénese) e embrionia adventícia (= poliembrionia ou embrionia somática).g. Dioscorea alata (Dioscoreaceae) «inhame-‐da-‐costa» e Ipomoea batatas (Convolvulaceae) «batata-‐doce». Não existe um termo em língua portuguesa. após o enraizamento e pegamento as estacas são transplantadas em raiz nua ou com torrão para local definitivo. Rosa (Rosaceae) «roseiras».g. e respectivos subtipos. castinçais e eucaliptais) (Figura 14). multiplicam-‐se por intermédio de fragmentos de raiz que. Iris (Iridaceae) «lírios» Divisão de estolhos e. Figuras 14 e 15).g. carvalhais de Quercus pyrenaica [Fagaceae] «carvalho-‐negral») e na propagação de algumas espécies (e. do tronco das espécies lenhosas com regeneração vegetativa. não destacados da planta-‐ mãe. ou ainda o Rumex acetosella (Polygonaceae). sinónimo de agamospermia ou mesmo de reprodução assexual. após enraizamento os caules são destacados da planta-‐mãe (“desmamados”) e transplantados para local definitivo. Rubus (Rosaceae) «silvas».g. é independente da megasporogénese. Fragaria x ananassa (Rosaceae) «morangueiro» e Chlorophytum comosum (Agavaceae) «clorofito». implicitamente. para este tipo de multiplicação vegetativa.34 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Agamospermia 17 Existem dois tipos fundamentais de agamospermia e. os mais relevantes. ao contrário da apomixia. Pôlas (= rebentões. Estes embriões são diploides e também de origem exclusivamente maternal. Enxertia Consiste em fazer desenvolver sobre uma parte de uma planta (cavalo) uma outra (enxerto) da mesma espécie (e. domestica) ou de outra espécie 17 Alguns autores usam um conceito de mais alargado de apomixia. caule ou raiz deixando uma porção variável acima e abaixo da superfície do solo. comentários e exemplos Divisão de rizomas e. excluindo as células do saco embrionário. em contacto com o solo ou com um substrato adequado. . Estaca Neste tipo de propagação destacam-‐se das plantas-‐mãe e enterram-‐se fragmentos (estacas) de folha. A oosfera não reduzida desempenha uma função similar ao zigoto na reprodução sexuada e origina a um embrião diploide de origem exclusivamente maternal. Mergulhia Na mergulhia promove-‐se a formação de raízes adventícias colocando caules jovens. Processo identificado em cerca de 250 espécies de mais de 50 famílias. carvalhais. pontualmente utilizada na perpetuação de povoamentos florestais explorados em talhadia (e.g. pôlas caulinares) Pressupõe a utilização de caules (pôlas) resultantes do abrolhamento de gomos dormentes ou adventícios localizados no colo ou na touça de plantas lenhosas. A embrionia adventícia envolve o desenvolvimento de um ou mais embriões (embriões adventícios) por semente. as pôlas de touça (= rebentos de touça ou rebentões de touça) são muito utilizadas na perpetuação de povoamentos florestais explorados em talhadia (e. e. conhecido em francês por drageon e em inglês por root shot. regra geral coincidente com a região do colo. Malus domestica [Rosaceae] «macieira» em cavalos de M. A embrionia adventícia. Acacia melanoxylon [Fabaceae] «acácia-‐austrália» e Cordyline australis [Laxmanniaceae] «fiteira»). em substituição ou complementares ao embrião sexual. Nas plantas apomíticas o embrião (embrião apomítico ou partenogenético) desenvolve-‐se a partir da oosfera de um saco embrionário não reduzido (com 2n cromossomas). foram concentrados no Quadro 13 (vd. as touças (ou toiças) são a porção remanescente após corte. Pôlas radiculares (= rebentões de raiz Envolve a utilização de caules (pôlas) resultantes do abrolhamento de gomos dormentes ou adventícios localizados nas raízes de plantas lenhosas. e. Tipos de multiplicação vegetativa Tipo Descrição. Quadro 13. Salix [Salicaceae] «salgueiros». a partir de células somáticas situadas em qualquer ponto do primórdio seminal. Solanum tuberosum (Solanaceae) «batateira».g.g. na época apropriada. Tubérculos Com tubérculos inteiros ou divididos. rebento de raiz ou rebento radicular são opções razoáveis. duas importantes infestantes em Portugal. originam lançamentos caulinares. de uso estabelecido. Rebentos de raiz (= rebentos radiculares) Espécies herbáceas vivazes como o Cirsium arvense (Asteraceae) e o Convolvulus arvensis (Convolvulaceae). A apomixia é muito frequente tanto em mono como em eudicotiledóneas. Multiplicação vegetativa Existem numerosos tipos de multiplicação vegetativa. muito frequente em Citrus (Rutaceae) «citrinos» e em Mangifera indica (Anacardiaceae) «mangueira». Amontoa Caules (e. Ulmus (Ulmaceae) «ulmeiros» e Taxus baccata (Taxaceae) «teixo».g. e. e. . após o pegamento uma delas é destacada. Flauta ou canudo Inserção de um fragmento de casca tubuloso com um gomo num porta-‐enxerto. Prunus avium (Rosaceae) «cerejeira». a enxertia é fácil de realizar em muitas dicotiledóneas através do contacto câmbio-‐câmbio mas muito difícil nas monocotiledóneas (somente através do contacto entre meristemas intercalares). usado na propagação de trepadeiras. adequada para todas as espécies que se propaguem por garfo ou por borbulha. porta-‐enxertos de Malus domestica (Rosaceae) «macieira» e Corylus avellana (Betulaceae) «aveleira». Garfo (= ramo destacado) Uma porção de caule (garfo). mantendo acima do solo alguns gomos na extremidade distal. Ficus (Moraceae) «figueiras». (ii) semilenhosas – ramos do ano colhidos no final do Verão início do Outono. Quercus suber (Fagaceae) «sobreiro». e.g. de uso pouco frequente. sistema por vezes usado em Castanea sativa (Fagaceae) «castanheiro». a enxertia natural (sem intervenção humana) de raízes é muito frequente em muitas espécies lenhosas.g. Tilia (Malvaceae) «tílias». e. videira. enxerto de Pistacia vera [Anacardiaceae] «pistácio» sobre P. Hibiscus (Malvaceae) «hibiscos». é retirado de uma planta-‐mãe.g.g. e.g. Olea europaea var. varas de uma touça) amontoados (cobertos de solo) sem torção artificial dos ramos. com um pequeno número de gomos.g. de fenda dupla e de coroa ou cabeça). terebinthus «cornalheira» ou Pyrus communis [Rosaceae] «pereira» sobre Crataegus monogyna [Rosaceae] «pilriteiro»). geralmente. (b) Quanto ao atempamento: (i) herbáceas – ramos do ano colhidos durante o período de crescimento vegetativo.g.35 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente filogeneticamente próxima (e. em grande medida. e. Camellia japonica (Theaceae) «cameleira» e Dracaena draco (Ruscaceae) «dragoeiro».g. as gemas voltadas para cima dão origem a caules aéreos formando-‐se raízes na face oposta. a extremidade proximal é. Tipos mais importantes de propagação por estaca Estacas foliares E. de fenda inglesa. técnica aplicada a plantas difíceis de propagar por estaca. Olea europaea var. de fenda cheia. Magnolia grandiflora (Magnoliaceae) «magnólia». divisão de raízes de Dahlia (Asteraceae) «dálias». o enxerto é posteriormente envolvido por ráfia ou um substituto equivalente. método mais usado na propagação da Vitis vinifera «videira» na Idade Média. o sucesso da enxertia depende. Total. e. Neste último caso distinguem-‐se: (i) estacas-‐caule – segmento de ramo da mesma ordem. de grande dimensão.g. Alporquia (= mergulhia aérea) Formação de raízes induzida através da colocação de solo sustido por plástico. acerifolia (Platanaceae) «plátano».g. e. de um bom contacto entre os câmbios do enxerto e do cavalo. menos noutras espécies. nas plantas enxertadas o sistema radicular pertence ao cavalo e a parte aérea ao enxerto ou é partilhada entre este e o cavalo. Malus domestica (Rosaceae) «macieira».g. (iii) lenhosas – colhidas no período de dormência. e. Dianthus caryophyllus (Caryophyllaceae) «cravo». Borbulha (= gomo destacado) Inserção de um fragmento de casca com uma gema (borbulha) numa incisão efetuada na casca do porta-‐ enxerto. e. tanto cultivadas como silvestres. macieira. mergulhado por mais uma vez no solo.g. marmeleiro.g. Tipos mais importantes de propagação por mergulhia Simples caules dobrados e enterrados. Platanus orientalis var. (ii) estacas-‐talão – segmento de ramo com a casca ou parte do ramo de ordem superior onde se insere. cortada em forma de bisel e inserida num porta-‐enxerto. Tipos mais importantes de propagação por enxertia Encosto União lateral de duas plantas com sistemas radiculares independentes. europaea (Oleaceae) «oliveira» e Theobroma cacao (Malvaceae) «cacaueiro».g. Invertida Ao contrario mergulhia simples é enterrada no solo a extremidade distal do caule. Múltipla ou em serpentina Um único caule. Chrysanthemum (Asteraceae) «crisântemos». Estacas radiculares e. em torno de um caule aéreo. Peperomia caperata (Piperaceae) «peperómia» e Saintpaulia ionantha (Gesneriaceae) «saintpaulia».g. chinesa ou cameação Caules enterrados a todo o comprimento ficando emersa a extremidade distal. Estacas caulinares O número de gomos enterrado ou emerso acima do solo varia com a espécie e cultivar. existem muitos subtipos de enxertia por garfo que não cabe aqui desenvolver (e. Euphorbia pulcherrima (Euphorbiaceae) «poinsétia» e Dianthus caryophyllus (Caryophyllaceae) «cravo». europaea (Oleaceae) «oliveira». Salix (Salicaceae) «salgueiros». Pyrus communis (Rosaceae) «pereira» e Vitis vinifera (Vitaceae) «videira-‐europeia). pano ou vidro. mandioca. Dois critérios maiores de classificação: (a) Quanto ao tipo: as estacas caulinares podem envolver ramos inteiros (tanchões) ou fragmentos de caule. e. Clematis (Ranunculaceae) «clemátides» e Wisteria (Fabaceae) «glicínias». Citrus (Rutaceae) «citrinos». enxertia de fenda simples. praticada em Cucumis melo (Cucurbitaceae) «meloeiro». Populus alba (Salicaceae) «choupo-‐branco». uso pouco frequente. Rosaceae) espraiam-‐se nas clareiras dos bosques em busca da luz com a ajuda de estolhos enraizantes nos nós. 5. Mergulhia simples. 3. Apocynaceae). Figura 15. Salicaceae). 1998) . a Hydrangea macrophylla (Hydrangeaceae). É um padrão recorrente as plantas invasoras disporem de sistemas eficientes de multiplicação vegetativa.g. Os morangueiros-‐silvestres (Fragaria vesca. A Ammophila arenaria repete a mesma façanha nas dunas primária. Cirsium arvense. Estas plantas servem-‐se da turbulência da água para produzir e disseminar propágulos. Talhadias de Castanea sativa (Fagaceae) «castanheiro» propagada por pôlas de touça A multiplicação vegetativa é muito frequente em ecossistemas naturais e seminaturais. Vinca major.g. rizomatosas (e. Salix e Populus. Cynodon dactylon). 2. fragmenta-‐se pela acção do vento em pequenas estacas de fácil enraizamento.g. Asteraceae) e/ou que regeneram a partir de fragmentos de raiz (e.g. Convolvulus arvensis.36 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Figura 14. Enxertia de garfo de fenda dupla.g. Alguns tipos de propagação vegetativa: 1. Enxertia de encosto (Coutinho. Pela mesma razão muitas árvores e arbustos ripícolas (que habitam a margem dos rios) pegam facilmente por estaca (e. 4. Os sedimentos que marginam as linhas de água rios são um habitat de excelência para gramíneas estolhosas e rizomatosas (e. Uma das mais perigosas invasoras do arquipélago dos Açores. Estaca. Enxertia de borbulha. Convolvulaceae). Rosaceae) e o Rhododendron ponticum (Ericaceae) fazem o mesmo por mergulhia. As silvas (Rubus. ou de eudicotiledóneas estolhosas (e. No interior dos sacos polínicos (2 por megasporofilo i. Ciclo de vida de uma gimnospérmica (Pinus) (adaptado de Diaz et al. A polinização é anemogâmica sendo o pólen capturado por uma gota polínica gerada na proximidade do micrópilo. Nas Pinidae desenvolve-‐se um tubo polínico que põe os núcleos espermáticos em contacto direto com a oosfera (sifonogamia)..e. tétradas de micrósporos. contido pelas paredes do grão de pólen. A fertilização acontece 4-‐6 meses após a polinização.3. O núcleo haploide do micrósporo divide-‐se dando origem ao gametófito ♂ (microgametófito). cada um com uma oosfera.3.37 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente 1. por meiose. por escama polínica) formam-‐ se. diferenciam-‐se arquegónios (2 nas coníferas embora apenas se diferencie um embrião). No interior dos primórdios seminais (= megasporângio + tegumento) forma-‐se um gametófito ♀ multicelular a partir de um dos 4 megásporos iniciais. Em dado momento. Ciclo de vida das gimnospérmicas: Pinus pinaster «pinheiro-‐bravo» Figura 16. Os estróbilos amadurecem um ano e . no gametófito ♀. 2004) O pinheiro-‐bravo tem uma floração precoce: entre o estádio de plântula recém-‐germinada e o início da produção de estruturas reprodutivas medeiam cerca de dez anos.1. A produção de células reprodutoras tem início no Inverno ou nos princípios da Primavera. Ciclos de vida das gimnospérmicas e angiospérmicas 1. Aplicados na superfície distal das escamas férteis dos estróbilos maduros (pinhas) encontram-‐se duas sementes de tegumento duro prolongado numa longa asa. Se as condições de humidade forem propícias dão origem a uma plântula de germinação epígea. com uma pequena roseta de cotilédones verdes e aciculares. As flores emergem de gomos florais .38 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente meio após a polinização.3. A floração ocorre em Março-‐Abril. Ciclo de vida de uma angiospérmica (Prunus avium) (adaptado de Diaz et al.. As cerejeiras cultivadas são enxertadas: o cavalo é propagado por semente ou por mergulhia. ainda na árvore. 2004) As cerejeiras-‐bravas propagam-‐se naturalmente por semente. uma adaptação à dispersão anemocórica. A germinação é epígea. 1. na axila de uma escama estéril que facilmente passa desapercebida. As sementes soltam-‐se dos estróbilos. Ciclo de vida das angiospérmicas: Prunus avium «cerejeira» Figura 17. Os estróbilos ♀ são constituídos pela repetição ao longo de um eixo de duas escamas: uma escama fértil. no final do Verão-‐início do Outono. os garfos são retirados dos pés-‐mãe e enxertados nos cavalos durante o repouso vegetativo.2. “As espécies são tantas como as que foram criadas no início pelo Infinito”. um sistema filosófico com mais de 2000 anos.e. a esporogénese – i. tinha por fim último a identificação das propriedades essenciais atribuídas pelo Criador às coisas vivas.1. por meiose.39 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente concentrados em esporões. Durante a viagem de circunavegação a bordo do navio Beagle (1831-‐1836). submetido a pressões seletivas que condicionam a sua história evolutiva. que evoluem (vd. e amigo próximo. a formação dos micrósporos e dos megásporos – rapidamente se diferenciam grãos de pólen (microgametófito) nos sacos polínicos (microsporângios) e o gametófito feminino no interior dos primórdios seminais (= megasporângio + tegumento). a rejeição do essencialismo. uma designação abreviada do título original “Sobre a Origem das Espécies Através da Seleção Natural ou a Preservação de Raças Favorecidas na Luta pela Vida”. implicou. A polinização é anemófila. Lineu e os demais naturalistas pré-‐darwinianos. na dupla função de naturalista e de companheiro de viagem do capitão FitzRoy. 2. O criacionismo é uma reformulação do fixismo pela religião. A noção de que as plantas e os animais não são imutáveis. Carolus Linnaeus [1707-‐1778. estames indefinidos e um ovário súpero monocarpelar com um único primórdio seminal. a prática da sistemática biológica. A doutrina filosófica que aceita que as espécies de hoje são as mesmas do passado. com características fenotípicas (Quadro 14) espacial e temporalmente instáveis. As sementes são dormentes e para germinarem têm que ser vernalizadas. resumida por Platão [428/427-‐348/347 a.e. Charles Lyell [1797-‐1875]. Embora carecendo de uma definição precisa até à emergência da síntese evolucionária moderna (vd. a estrutura e a função dos seres vivos era perfeita e a necessária para um adequado e permanente (infinito) funcionamento da vida na Terra. neste caso de um ser vivo. A evolução da vida é real? A teoria da evolução é uma teoria científica?). e que a sua forma e número eram constantes. Cada flor é constituída por 5 sépalas livres. Noções básicas de evolução biológica Fixismo. como nas demais angiospérmicas. é conhecida por fixismo. Após a publicação da “A Origem das Espécies” por Charles Darwin. 5 pétalas livres. Carlos Lineu. Os gomos folheares abrolham depois dos gomos florais. Se o Criador era perfeito então. Uma propriedade essencial – uma essência – era entendida como um elemento básico. A dispersão dos indivíduos selvagens é barocórica ou ornitocórica. a espécie deixou de ser considerada como um tipo caracterizado por um conjunto constante e imutável de propriedades essenciais. a muito custo. A essência seria a causa direta da sua perfeição e intemporalidade.] na conhecida Alegoria da Caverna. além de definitiva. Charles Darwin [1809-‐1882] foi um exímio observador dos fenómenos naturais. Introdução à biologia da evolução das plantas-‐terrestres 2. a espécie passou a ser interpretada como um aglomerado de indivíduos similares. supunham que a descrição dos produtos da criação. Finda a fecundação diferencia-‐se uma semente cotiledonar protegida por um fruto tipo drupa. escreveu Lineu em 1758. O ciclo floral desenrola-‐se num único ano. Influenciados pela filosofia essencialista. essencialismo e evolucionismo Nos meados do séc. Para os essencialistas as propriedades não essenciais são meramente acidentais. e nas . em 1859. criacionismo. Cumprida. Darwin deparou-‐se com duas questões fundamentais que absorviam a atenção dos seus contemporâneos: (i) como se explica e qual a história da diversidade biológica que povoa o planeta? (ii) por que razão a forma (= estrutura) e a função estão tão estreitamente correlacionadas nos seres vivos? Para explicar estas duas questões Darwin inspirou-‐se no uniformitarismo do geólogo. i. sem o qual ele não pode ser o que é.C. em português] e os seus contemporâneos presumiam que as espécies haviam sido criadas por um ente superior. A síntese evolucionária moderna). XVIII. Esta ideia simples – cunhada por uniformitarismo – foi posteriormente generalizada a outras ciências. Quadro 14). gene. No entanto. em 1900. Charles Lyell foi o fundador da geologia moderna. A ação da seleção natural sobre a variabilidade explica a correlação entre a forma e a função dos organismos. alelo.40 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente ideias de Thomas Malthus [1776-‐1834]. eventualmente. designa-‐se este mecanismo por seleção natural (vd. Os biógrafos admitem que estas aprendizagens. o fermento do evolucionismo darwiniano é anterior (Kohn. Para explicar as características geológicas atuais da Terra admitiu que estas se deviam à ação lenta de forças que ainda hoje atuam no planeta. Malthus percebeu que nas sociedades humanas pré-‐industriais (= sociedades orgânicas) – os efeitos da revolução industrial eram ainda incipientes no seu tempo – a taxas de natalidade e de mortalidade tendem a igualar-‐se e que o rendimento das pessoas. pelos botânicos Hugo de Vries e Carl Correns. A síntese evolucionária moderna (= neodarwinismo) resume-‐se nas seguintes etapas: a) Os seres vivos mantêm um conjunto de características (ing. b) Por mutação. Parker. a luta pela sobrevivência num mundo de recursos escassos é a causa direta da seleção natural. pelo contrário. i. estas variações surgem na natureza por processos estocásticos (ao acaso) e são a matéria-‐prima da evolução. mutação ou frequência genética. são negativamente selecionadas. Entre 1828 e 1831. As descobertas da genética foram incorporadas na teoria da evolução darwinista a partir das décadas de 1930-‐1940. Murrell. Nas visitas de campo organizadas por este distinto mineralogista e professor de botânica inglês. d) A pressão de seleção é temporalmente instável porque os recursos e as condições ambientais variam ao longo do tempo e as taxas de evolução dos parasitas e comensais são por regra elevadas. Darwin leu os livros de Lyell e de Malthus e rompeu com o criacionismo no decurso da viagem de circum-‐ navegação do Beagle. novos genes. A síntese evolucionária moderna A biologia contemporânea de Darwin não dispunha de conceitos tão importantes como hereditariedade. recombinação genética (= crossing-‐over). se aumentarem a fitness dos indivíduos portadores. a par da sua experiência como naturalista na viagem da Beagle. Darwin aprendeu a colher espécimes e a observar a variação da forma das plantas. Darwin foi aluno e usufruiu da amizade do padre anglicano John Henslow [1796-‐1861]. . a seleção natural moldou os seres vivos aos seus habitats no passado e continua ativa no presente porque a evolução é um processo lento e sempre inacabado. Para Malthus a escassez de recursos era uma inevitabilidade comum a todas as sociedades humanas e a causa eficiente da guerra. assim. 2005). transmissível dos indivíduos parentais para os seus descendentes. assim como o número de filhos sobreviventes por mulher. a fitness conferida por um alelo (ou por um gene) é também inconstante. recombinação sexual (= segregação dos cromossomas) e transferência de informação genética entre populações (= migração) ou espécies (por hibridação) – e outros mecanismos menos frequentes que não cabe aqui mencionar – surgem continuamente novas características estruturais e funcionais. foram essenciais no processo de aceitação da ideia de evolução e na descoberta do mecanismo da seleção natural. as modificações que deprimem o sucesso reprodutivo dos indivíduos. em dois conjuntos essenciais de ideias: As gerações vão-‐se sucedendo com pequenas modificações. & Whitehorn. codificadas por novos alelos. consequentemente. As leis da hereditariedade seriam formuladas depois da publicação da “A Origem das Espécies” em 1866. c) Caso as novas características sejam favoráveis. um minucioso investigador da natureza das espécies vegetais e da variabilidade das suas formas.e. Thomas Malthus foi um demógrafo inglês conhecido por defender que as populações humanas crescem mais depressa do que a disponibilidade de recursos. traits) estruturais e funcionais geneticamente controlado. são fixadas e a sua frequência (à escala da população) cresce ao longo do tempo. entre muitos outros (vd. Quadro 14). a acumulação gradual de pequenas modificações abriu caminho à diversificação dos seres vivos ao longo do tempo. da fome e das epidemias. combinações de alelos ou. A teoria evolucionária Darwin assenta. sofreu poucas variações ao longo do tempo. por Gregor Mendel [1822-‐1884]. e permaneceriam esquecidas até à sua redescoberta. resultar na divergência morfológica e/ou funcional de populações de organismos sendo. dos alelos) relativa (i. f) Embora. em consequência do efeito do ambiente no sucesso reprodutivo (fitness) dos indivíduos. por vezes em genes ou grupos familiares. i) Uma parte significativa das lentas aquisições morfológicas e funcionais ocorridas ao longo do tempo pode ser lida a partir do estudo do biota atual. de uns alelos em relação aos outros) numa população ou espécie. evolução de grandes linhagens de seres vivos como as plantas-‐com-‐flor).g. Constitui microevolução qualquer alteração da frequência alélica (i. pontos c e h) – a evolução e a especiação são processos populacionais –. deriva genética. de características (ing. a regulação de um ou mais genes ou a cor de uma corola. Com o neodarwinismo a evolução passou a ser entendida como a alteração. População Grupo de indivíduos de uma determinada espécie que evidencia algum grau de isolamento reprodutivo.e. de geração para geração e à escala da população. é incrementada a frequência de determinadas características sob controlo génico em detrimento de outras. Embora os mecanismos evolutivos (ing. evolutionary mechanisms) subjacentes sejam comuns (e. . Este conceito pode ser aplicado à escala do gene. eventualmente. Com a síntese evolucionária moderna o pensamento tipológico ou essencialista lineano foi definitivamente substituído pelo chamado pensamento populacional. Deriva genética Alterações aleatória da estrutura genética de pequenas populações. As mutações dão origem a novos alelos de genes preexistentes (a formação ad novo de genes envolve mecanismos que não cabe aqui descrever). uma componente essencial na especiação e na diversificação da vida. pertencentes ou não ao mesmo alelo. usualmente gradual. traits) geneticamente transmissíveis.e. e raramente em populações: o indivíduo é a principal unidade de seleção. A macroevolução desenrola-‐se. numa população. e. de geração para geração. h) A acumulação de novas características pode. nos seres diploides os indivíduos herdam um exemplar maternal e outro paternal 18 de cada gene . Genótipo Termo coletivo de designa todos os genes de um indivíduo. g) Para além da seleção natural outros mecanismos podem condicionar a história evolutiva de uma população (e.g. por isso. Gene Porção de DNA (ácido desoxirribonucleico) que codifica uma determinada característica. morfológicas ou comportamentais (nos animais). necessariamente. Conceitos chave de biologia da evolução Conceito Definição Adaptação Dois conceitos. A macroevolução engloba modificações evolutivas ocorridas à escala da espécie. 18 De cada gene nuclear (sediado no núcleo). ou a escalas superiores (e. a seleção é um processo essencialmente individualístico. Quadro 14. Quadro 14). Mutação Alteração acidental (ao acaso) da sequência dos nucleotídeos que compõem o DNA. Fenótipo Conjunto de características. em períodos tempo superiores aos processos microevolucionários.41 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente e) A seleção natural introduz no genoma informação sobre os recursos e condições ambientais exteriores ao corpo dos indivíduos. porque os genes mitocondriais e cloroplastos são herdados por via maternal. Fitness Sucesso reprodutivo dos indivíduos: um indivíduo de elevada fitness tem mais descendentes do que os indivíduos de menor fitness. fisiológico ou comportamental (nos animais) que incremente a fitness. Alelo Formas alternativas de um mesmo gene. a seleção atua sobre indivíduos. muito distintos: (i) processo de ajustamento dos indivíduos ao ambiente acompanhado de um incremento da fitness. a evolução e a especiação se desenrolem à escala da população (vd. fisiológicas. e sobre os microrganismos comensais ou patogénicos.g. (ii) qualquer carácter morfológico.g. deriva e seleção) é útil distinguir micro de macroevolução. Seleção natural Mecanismo fundamental da evolução mediante o qual. mutação. neste caso o sucesso de um alelo é medido pelo aumento da sua frequência ao longo do tempo. que resultam da interação genótipo-‐ambiente. há algo de lamarquiano de evolução. ricos em caracteres derivados (recentes). mais concretamente de alelos. que os grupos mais antigos são sempre estruturalmente mais simples e que essa simplicidade incrementa os riscos de extinção perante a inexorável evolução de linhagens de corpo mais complexo. Mecanismos e processos de especiação). porque a transmissão de caracteres adquiridos por influência ambiental é limitada. Afinal. Pollination mechanisms.g. por sua vez. Por outro lado. mutação e recombinação) e forças que tendem. 2007). da migração. reflete-‐se na performance zootécnica dos seus descendentes.g. 1970) (vd. I. stabilizing selection) (Stebbins. a desrepressão génica. Algumas algas-‐verdes unicelulares têm origem em formas mais complexas (e. um pequeno grupo de indivíduos de uma espécie migra de um continente para uma ilha. um papel na evolução análogo às mutações genéticas. sobretudo no que diz respeito à qualidade da alimentação. em algas-‐verdes filamentosas ramificadas) as quais. Os sistemas de regulação génica sensíveis a fatores ambientais têm. no gado bovino as condições ambientais vividas pelas mães. nem um sinónimo de sucesso evolutivo. A síntese evolucionária moderna). Eventualmente promove a fixação de características. por exemplo. “as raças melhoram-‐se pela boca”. Os Psilotum (Ophioglossidae) não dispõem nem de raízes nem de megafilos embora provenham de uma linhagem de plantas-‐vasculares com raízes e folhas verdadeiras. e que o silenciamento e o seu inverso. porém. uma amostra empobrecida e enviesada da diversidade genética da população original. A deriva genética origina perdas assinaláveis de diversidade genética. haviam evoluído a partir de formas unicelulares. Os microrganismos são uma prova disso mesmo: têm uma estrutura e uma fisiologia simples. Variações muito acentuadas nas características morfológicas das flores criam dificuldades na reprodução sexual – sobretudo através da redução da eficiência dos agentes polinizadores – consequentemente a flor fica submetida a uma pressão seletiva de estabilização (ing. embora nem sempre. De facto. Por exemplo. ou de qualquer outro grupo de seres vivos. que as condições ambientais influenciam os sistemas de silenciamento génico. a deriva genética fixa alelos ao acaso. Um segundo mecanismo – a deriva genética – tem uma enorme importância em populações pequenas. Algumas características do processo evolutivo Nos livro-‐texto de biologia ou botânica a exposição da evolução das plantas. É mais ou menos consensual que a seleção natural é um mecanismo chave da evolução. por isso mesmo. Síntese evolucionária estendida A atividade dos genes está sujeita a complexos sistemas de regulação. extended evolutionary synthesis) é feliz. A importância da seleção natural é um dos temas mais discutidos na bibliografia de biologia da evolução. aparentemente. são extraordinariamente abundantes. A designação “síntese evolucionária estendida” (ing. recentemente. Nas plantas as forças de estabilização da forma e da função estão particularmente presentes na estrutura da flor. A importância da mutação. Em populações muito pequenas chega a contrariar o efeito adaptativo da seleção natural. raros nas populações originais. um novo paradigma (Pigliucci. As minúsculas e bem sucedidas «lentilhas-‐de-‐água» . o mesmo acontecendo com as angiospérmicas nos estudos de evolução de plantas.42 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Os seres vivos submetidos a seleção natural evoluem por adaptação. Esta nova síntese evolucionista não representa. nos diagramas filogenéticos do reino animal com frequência a espécie humana é ressaltada. tanto à escala do indivíduo como da população. permanecem essenciais nos ciclos biogeoquímicos e foram cruciais nas pressões seletivas que conduziram à emergência dos metazoários e das plantas. da recombinação. muitos grupos de seres vivos evoluíram de formas mais complexas.g. Ocorre deriva genética quando. surgiram em etapas recuadas da vida na terra. em si. seleção natural). Este mecanismo introduz menor variação nas características da flor do que no corpo vegetativo das plantas. inicia-‐se nas formas mais simples e termina nos grupos mais recentes e avançados. são transmissíveis entre gerações. a estabilizar as características dos organismos (e. existe o risco de menorizar a história evolutiva dos grupos ditos mais primitivos e de veicular as noções teleológicas de que a evolução é unidirecional. uma ruptura com o Darwinismo. A complexidade não é uma inevitabilidade. O scala naturae aristotélico (a grande cadeia da vida) de acordo com o qual os seres vivos estão organizados numa escala de perfeição encimada pelo homem continua a condicionar a explanação do processo evolutivo. porém. Nos processos evolutivos coexistem forças que induzem mudanças (e. transportando. Adaptive radiation of reproductive characteristics in angiosperms. Constatou-‐se. dizem os zootécnicos. A exposição diacrónica (ao longo do tempo) dos produtos da evolução é a melhor forma de ensinar evolução. e é uma das explicações da taxonomia de angiospérmicas ser baseada em caracteres florais. da seleção natural e da deriva genética não está em causa (vd. proveitosos ou não do ponto de vista adaptativo. Enquanto a seleção fixa alelos vantajosos. pelo contrário. Muitas características geneticamente determinadas resultam de elaborações evolutivas de características mais antigas. As plantas-‐vasculares). que desapareceram sem deixar rasto. com maior número de espécies e biomassa) e o grupo morfológica e fisiologicamente mais complexo e diverso. A ilusão de que a evolução é motivada pela necessidade emerge da concatenação da forma e da fisiologia no corpo dos seres vivos. A macroevolução é uma disciplina histórico-‐descritiva e um terreno fértil para a epistemologia. por isso. Os seres vivos atuais são um cúmulo de acasos (e. Se a complexidade não é um sinónimo de sucesso evolutivo. A flexibilidade evolutiva dos estádios de carácter (vd. de insectos. incrementar a probabilidade de representação na geração seguinte (a deriva genética pode. e tão vastos que a nossa mente. III) ajuda a explicar por que nas plantas é tão frequente linhagens sem relações diretas de parentesco partilharem caracteres por convergência evolutiva. à escala da população e da espécie foram um agente de extinção. lodículas das gramíneas). ‘briófitas’ ou algas. Nas plantas a redução de caracteres é óbvia nas brácteas escamiformes das inflorescências ou na simplificação do perianto das flores anemófilas (e. Embora a complexidade não seja uma inevitabilidade evolutiva é um facto que a fisiologia. subordinada a intrínsecas limitações epistémicas. Nas plantas. O sucesso evolutivo num dado período geológico não implicou um sucesso acrescido nos períodos geológicos seguintes. outras permaneceram em estase evolutiva e outras. o ovário ínfero surgiu de forma independente em muitos grupos de plantas e admite-‐se que a inversão de ovário ínfero em súpero possa ter acontecido mais de uma vez em numerosos grupos de plantas (inclusivamente no mesmo género). O sucesso . Na história da vida na Terra extinguiram-‐se vastamente mais linhagens de seres vivos do que aquelas que hoje existem. Os acasos infelizes. a lenhina evoluiu a partir de substâncias mais simples que conferiam resistência às radiações UV nas primeiras plantas-‐terrestres (vd. opor-‐se a este processo). de plantas-‐com-‐flor. Um alelo é positivamente selecionado se. o mais bem-‐sucedido (i. No reino animal existem evidências que os ancestrais dos «ouriços-‐do-‐mar» eram dotados de um sistema nervoso mais complexo. ainda. A macroevolução é. A serendipidade evolutiva – as descobertas ou achados. A redução ou a perda de caracteres complexos são muito frequentes na natureza. aleatória e. Na extensa história da vida algumas linhagens de seres vivos complexificaram-‐se. tão ou mais complexas do que as angiospérmicas.e. A microevolução. Vol. impossível de modelar. mas úteis – não pode ser confundida com necessidade evolutiva. lê como infinitas. Por exemplo. funcionalmente muito distintas. No entanto. então.g. temporariamente. que retornam a uma condição primitiva. muito mais do que nos animais. de fetos. os órgãos vegetativos e reprodutivos e os mecanismos de reprodução de algumas plantas se complexificaram e diversificaram ao longo do tempo. A Terra está povoada de mamíferos. nos indivíduos que o detêm. simultaneamente. Uma pequena alteração na trajetória geológica da Terra. ou dos indivíduos e espécies nos ecossistemas. à escala do indivíduo. A principal característica da evolução talvez seja. Os exemplos mais conhecidos serão talvez a redução das asas em algumas aves insulares (e. são frequentes inversões de caracteres (ing.g. A vestigialização de caracteres é geralmente interpretada como consequência da perda de funções. certamente sem homens e sem flores. muitas alternativas evolutivas se esboçaram entre as gimnospérmicas. As primeiras plantas-‐com-‐semente). i. extinguiram-‐se. a sua imprevisibilidade. Lemna e Wolfia. por uma qualquer razão desconhecida persistiu. então não tem sentido o uso do conceito de progresso em evolução. na paleoquímica da atmosfera ou no historial de catástrofes planetárias e o biota e os ecossistemas atuais seriam outros.43 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente (e. Por exemplo. A cada momento os mundos possíveis e os caminhos da evolução são vastos. Um erro no funcionamento do esporângio do ancestral de todas as plantas-‐com-‐semente.e. condenaram os seus portadores ao desastre reprodutivo. Crê-‐se que nestas condições a manutenção de caracteres não funcionais terá custos energéticos que pressionam a sua redução. está aberta à matematização. intrinsecamente. abrindo o caminho a uma nova e bem-‐sucedida linhagem de plantas-‐terrestres. de mutações e recombinações) felizes. impropriamente aceites como mais evoluídos.g. inesperados. produzida pela evolução por adaptação. caracteres derivados. surpreendentes. o extinto dodó das ilhas Maurícias) e o desaparecimento dos olhos em alguns peixes e insectos cavernícolas. character reversal).g. Algo semelhante ocorreu na evolução da semente (vd. de aves. Araceae) descendem de plantas de muito maior dimensão com inflorescências complexas. Nas plantas sucedeu ainda que o último grande grupo a diferenciar-‐se – as angiospérmicas – é. por enquanto evolutivamente bem-‐sucedidos. Alguns autores questionam. depende de combinações génicas adaptativas. o leitor encontra uma argumentação sobre os riscos que envolvem o uso do conceito de verdade em ciência. Consequentemente. 2. O sucesso evolutivo (ing. em biomassa ou pelo número de indivíduos. A evolução da vida é real? A teoria da evolução é uma teoria científica? No livro Why Evolution Is True. inclusivamente. .g. irrepetido. e continuarão a evoluir. Embora de uso generalizado não existe um conceito unificado de espécie: estão publicados mais de 26 conceitos distintos. enquanto conta uma história do passado. depende. Num mundo em permanente mudança qualquer população ou espécie está irremediavelmente desatualizada do ponto de vista evolutivo. biologia molecular. A teoria da evolução nunca foi falsificada. evolução.g. O termo espécie deriva da palavra latina species que significa tipo. Coyne (Coyne. As espécies tipificadas pelos taxonomistas – os especialistas na segmentação do biota que povoa o planeta Terra em espécies e outro taxa – são uma das “unidades” fundamentais de experimentação e comparação em todos os campos da biologia e da ecologia. por exemplo. espécie ou mesmo de um clado. Coyne: “A evolução da vida é um facto”. 19 A teoria da evolução darwiniana é inquestionavelmente uma teoria científica. medido. A evolução pode ser decomposta em dois processos distintos: anagénese e cladogénese. DNA). fisiologia. da qual irradiam hipóteses explicativas para todos os domínios da biologia. simultaneamente. explica melhor do que um ato único. geneticamente codificadas. Pese embora as dificuldades teóricas associadas à noção de espécie. Como qualquer teoria científica. descreveu este processo por “descendência com modificações”. e das hipóteses que a instituem continuarem a resistir aos mais ácidos testes experimentais da biologia moderna. estão a evoluir. 20 Não confundir teoria científica com hipótese científica. objeto da biologia molecular. uma das pedras angulares da biologia. que os capacitam a reproduzir-‐se num mundo em permanente mudança. ecologia das populações e das comunidades e paleontologia. A eminência de ser verdadeira emerge do facto de ser corroborada por um cada vez mais vasto corpo de observações. da fitness dos indivíduos que os constituem. A anagénese é a evolução de uma espécie sem especiação.44 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente reprodutivo (fitness) de cada individuo embora marcado pelas contingências do acaso. explica um aspeto chave do mundo natural sustentando-‐se num corpo de 20 observações meticulosas em permanente expansão. por sua vez. um dos mais importantes e um dos mais obscuros e discutidos conceitos de biologia. porém. por que razão as formas de vida que povoam a terra são tão variadas e funcionalmente ajustadas. aos restos fósseis investigados pela paleontologia. Noções básicas de especiação Evolução por anagénese e por cladogénese Os organismos modificam-‐se ao longo do tempo porque a interação da seleção natural com o genoma permite a contínua acumulação de novas soluções morfológicas e funcionais. o conceito biológico de espécie de Ernest Mayr [1904-‐2005] é. evolutionary success) de uma população. As hipóteses são declarações explicativas sobre aspectos muito específicos do funcionamento do mundo natural. Mayr definiu espécie do seguinte 19 Na Introdução. Na evolução por cladogénese ocorre a formação de novas espécies a partir de espécies ancestrais. genética. trabalha o presente. cladogénese é então um sinónimo de especiação. de criação. Limito-‐me a transcrever uma frase de algum modo condensa a argumentação de J. no ponto “Breve reflexão epistemológicas”. Conceito de espécie O conceito de espécie é. rejeitadas caso as suas predições se revelem erradas. É curioso que C. garantia de êxito no futuro. e de hipóteses sistematicamente testadas por via experimental. Darwin nunca utilizou o termo evolução.2. 2010) oferece um formidável e eclético rol de evidências de que os seres vivos evoluíram. A evolução é incapaz de prever o futuro. anatomia. eminentemente verdadeira. que se estende desde a escala das moléculas guardiãs da informação genética (e. J. de cúpula. desde os anos 40. A teoria da evolução está para a biologia como a tectónica de placas para a geologia: é uma teoria unificadora. e. Gozar de um grande sucesso evolutivo no presente não é. se essa tarefa é possível. e em risco. 21 Genericamente. os Quercus (Fagaceae) e os Cistus (Cistaceae). a espécie passa a ser o produto de um argumento de autoridade. A biologia da especiação de plantas corrobora assim duas importantes hipóteses: (i) as espécies não são um artefacto da razão. Os estudos moleculares indiciam que mesmo nas espécies ditas autogâmicas os indivíduos trocam. parte da área de distribuição de uma espécie onde as populações são mais densas e contínuas. The nature of plant species. dois dos mais importantes géneros da flora continental portuguesa. distinta da morfologia dos indivíduos das demais espécies descritas. na vulgaríssima Poa annua. sobretudo das regiões de clima temperado.45 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente modo: "species are groups of interbreeding natural populations that are reproductively isolated from other such groups" (Mayr. Porém. e é muito provável que muitos dos endemismos europeus. A troca de informação genética entre indivíduos pertencentes. Por outro lado. Continua a ser difícil de aplicar a grupos apomíticos – e. ainda que geograficamente isolados. sem dúvida uma forma eficiente. 23 Assim acontece com o género Rubus (Rosaceae). hibridam com facilidade nas áreas de simpatria (onde as espécies se sobrepõem). e que a hibridação não é a causa maior dos casos de espécies de morfologia sobreposta. Plant speciation. Pertencem. ocasionalmente. com os parcos recursos financeiros e humanos disponibilizados para a investigação taxonómica. autorizando. a especiação. de preferência em mais de um carácter. evolutivamente isoladas por barreiras reprodutivas pré ou pós-‐zigóticas (vd. e o isolamento reprodutivo interespecífico são as duas forças de coesão fundamentais na manutenção da integridade genética e morfológica das espécies. para estes autores as espécies são clusters (grupos) de indivíduos de morfologia discreta. Wood. implicitamente. simpátricas ou não. Mecanismos e processos de especiação). deste modo. assim. A generalização do uso do conceito biológico de espécie às plantas esbarra. sejam elas animais ou vegetais. frequentemente partilhando a mesma ecologia. & Baack. Rieseberg et al. com um significativo isolamento genético. Este conceito prático de espécie – o conceito morfológico de espécie – é talvez o mais adequado para apreender e descrever a enorme diversidade biológica do biota terreno. circunstância frequente em complexos de espécies recentemente diferenciados e em plantas com ciclos de vida muito longos (Rieseberg & Willis. como é possível testar à escala global. e o seu reconhecimento depende da demonstração de correlações estáveis e consistentes de caracteres nos indivíduos que a constituem. morfologicamente idênticas. Além de real. 2007). A sua aplicação reduz a espécie à opinião do melhor especialista. pelo menos nas 21 populações situadas no “core ” da espécie. 1993). e não uma exceção”.g. i. à mesma espécie indivíduos naturalmente interférteis. hibrid swarm). “a especiação das plantas [com flor] é uma regra. Consequentemente. Foram detectadas espécies irmãs. 2007). 2006) demonstraram num universo de 200 géneros de plantas que é possível identificar grupos de indivíduos morfologicamente semelhantes entre si. ou não. porém menos saudável de fazer ciência. Levin (Levin. como deslindar as espécies 22 crípticas que constituem algumas das espécies correntemente aceites pelos taxonomistas? A maioria dos taxonomistas permanece indiferente às acesas discussões que animam os especialistas em evolução e especiação. Por exemplo. Local speciation in plants: the rule. Taraxacum (Asteraceae) e Rubus (Rosaceae) – e nas situações em que o isolamento reprodutivo é imperfeito. sejam de especiação recente (do final do Pleistocénico ou holocénicos). o que impede a sua dissolução num “enxame de híbridos” (ing. os taxonomistas admitem. Por exemplo. 1996). 22 . a aplicação do conceito biológico de espécie a este grupo crítico de plantas (Rieseberg & Willis. que pertencem à espécie indivíduos que partilham uma morfologia similar. Os híbridos nestes géneros são pouco competitivos frente às espécies parentais. not the exception. por exemplo. de modo a evitar uma multiplicação descontrolada de nomes que acabaria 23 por esvaziar a sua utilidade . em algumas dificuldades. o isolamento reprodutivo de centenas de milhar de putativas espécies de plantas? E. particularmente em territórios sujeitos a alterações climáticas cíclicas e profundas. à mesma população. informação genética entre si. pelos mesmos motivos. a diferenciação de espécies. Como defende D. Mais: os taxonomistas clássicos não atribuem nomes lineanos a espécies irmãs ou a linhagem de plantas apomíticas fortuitas de distribuição muito restrita. são entidades reais. de plantas-‐com-‐flor é um evento frequente e que se pode desenrolar com uma rapidez assinalável. (ii) o conceito biológico de espécie de Ernest Mayr é útil tanto no reino animal com entre as plantas. Nas Floras e na restante bibliografia de sistemática vegetal. as características genéticas e morfológicas das espécies de Quercus e Cistus persistem inalteradas. Plant speciation. (Rieseberg. Estão descritos eventos contemporâneos de especiação. contudo. é impraticável em fósseis. sibling species) são espécies sensu Mayr.e. As espécies irmãs ou crípticas (ing. em pequenas populações geralmente submetidas a pressões seletivas peculiares (e. A variedade e a 24 forma estão a cair em desuso na Europa e na América do Norte embora sejam habituais nas Floras tropicais . condições ambientais muito distintas do “core” da espécie parental). The Origin. e temporariamente. As categorias supra-‐específicas (e. Para abreviar a discussão importa referir que muitos taxonomistas defendem que as subespécies são espécies nascentes. Não cabe neste texto uma análise mais aprofundada do tema e uma discussão das alternativas aos conceitos biológico e morfológico de espécie. (ii) após reduções drásticas da área de ocupação da espécie parental. ou podem ser localmente. a similaridade interpopulacional é devida a uma ascendência comum e a síndromes adaptativos que permitem respostas paralelas (similares entre si) dessas populações às influências ambientais.g. Ainda assim vale a pena transcrever o conceito de G. Admite-‐se que a maior parte das espécies de plantas-‐terrestres se formou através um dos seguintes seis mecanismos de especiação: (i) a partir de pequenas populações situadas na margem da área de distribuição da espécie parental. Conceitos de subespécie e outras categorias taxonómicas A subespécie. Como se depreende dos mecanismos de especiação enunciados – excetuando a poliploidia – a especiação não é um evento. O número de conceitos de espécie soma. excecionalmente. Se a espécie é difícil de definir que dizer então das categorias que antecedem.g. van den Berg. (iii) através da colonização de novos territórios muito afastados das populações da espécie ancestral. Cistus ladanifer f. 2002). as subespécies seriam maioritariamente alopátricas e as variedades. na opinião do melhor especialista. enfraquecidos em consequência de um relaxamento parcial das barreiras interespecíficas”. mas sim um processo. and Demise of Plant Species.g. são muito diversos. provavelmente. As fronteiras interespecíficas podem ser bem definidas desenvolvendo-‐se um isolamento genético e fisiológico completo de outras espécies.L. mais do que uma espécie ancestral. A circunscrição de categorias fundamentais como o género ou a família repousa.e. 2000): (i) descendem de uma ou.46 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente A bibliografia sobre o conceito de espécie é insuportavelmente extensa. mais de duas dezenas. a vulgar esteva de pétalas com uma mancha escura na base) ou a isolados geográficos de morfologia inconsistente. os mecanismos de especiação. i. & Brandenburg. em contrapartida. Concepts of species and genera. em si. Expansion. uma formulação de compromisso proposta para obviar algumas das dificuldades operacionais do conceito biológico de espécie de Mayr: “Espécies são as unidades básicas da sistemática e da evolução. principalmente pelo fluxo de genes ou. género e família) são. (iv) por seleção disruptiva em ambientes seletivos particulares. a ascendência comum e a partilha de resposta evolucionárias. 24 O conceito de variedade nas Floras tropicais aproxima-‐se do conceito de subespécie usado nas floras mais modernas das regiões não tropicais do hemisfério norte. a variedade e a forma são as categorias taxonómicas infra-‐específicas mais utilizadas na bibliografia. Este enviesamento. Foram tentadas sem sucesso medidas de distância genética para as objectivar. Mecanismos e processos de especiação Por mais distinta que seja a sua morfologia ou ecologia. Nestes três mecanismos o isolamento reprodutivo é essencial e. Esta interpretação não é universal. em argumentos de autoridade. à escala local. (vi) por poliploidia. acelera a especiação. a similaridade morfológica. e que na sua demarcação devem entrar argumentos de ordem geográfica. como referi anteriormente. Os três primeiros mecanismos (i a iii) atuam lentamente (especiação lenta). Stebbins (Stebbins. maculatus. indefiníveis. nem sempre bem caracterizadas morfologicamente. todas as espécies de seres vivos partilham um padrão histórico-‐evolutivo comum (Levin. ecológicas e genéticas. Assim sendo. As pequenas populações em especiação transportam. Consistem em sistemas de populações que se assemelham entre si nas suas características morfológicas.e. (ii) persistem durante um período variável de tempo e. Estas populações estão sujeitas a várias forças coesivas. inevitavelmente. Hetterscheid. Para Stebbins o isolamento reprodutivo total não é uma condição sine qua non de uma espécie. em alguns casos por autopolinização parcial. Os mecanismos de formação de novas espécies a partir de outras pré-‐existentes. (v) por hibridação entre espécies seguida de estabilização dos híbridos. sim. . A “forma” aplica-‐se indiferentemente a variações exuberantes intrapopulacionais (e. conhecido por deriva genética. e repousará. Nestas Floras a variedade é muitas vezes usada com o sentido de subespécie. simpátricas (Spooner. 1993). uma subamostra enviesada da diversidade genética do “core” das populações parentais. (iii) acabam por se extinguir. i. A “especiação simpátrica” e a “especiação híbrida” – a especiação híbrida é geralmente simpátrica – envolvem vários mecanismos de isolamento reprodutivo. As barreiras reprodutivas pré-‐zigóticas derivam de um ou mais dos seguintes mecanismos de isolamento reprodutivo (ing. sendo designada por especiação simpátrica (mecanismo iv). phyletic gradualism) postula que a especiação é um processo lento durante o qual uma população acumula.e. Teoricamente. evidenciam grandes hiatos evolutivos. O isolamento espacial é o mecanismo de referência no modelo de especiação alopátrico.e. A alopoliploidia envolve mais que uma espécie. Embora as relações evolutivas entre os grandes grupos de plantas verdes tenda para um consenso. Em ambientes seletivos muito particulares (e. ou da (ii) inviabilidade dos híbridos. de forma gradual e quase constante. por exemplo.e. punctuated equilibrium) para responder e acomodar estas constatações no âmbito da teoria evolutiva neodarwinista (Gould & Eldredge. Os taxa atuais de plantas. desenrola-‐se numa única geração ou num número reduzido de gerações. das etapas da evolução do ciclo de vida haplodiplonte das plantas-‐terrestres ou da semente nas espermatófitas. i. Armeria (Plumbaginaceae)]. escoadas lávicas. diferenças morfológicas no aparelho reprodutor suficientes para impedir a partilha de polinizadores animais. Não existe um registo fóssil nem taxa atuais com características intermédias que facilitem uma explicação inequívoca. A especiação por poliploidia (= especiação rápida. Reconhecem-‐se dois tipos fundamentais de barreiras reprodutivas: (i) pré-‐zigóticas e (ii) pós-‐zigóticas. ou de qualquer outro grande grupo de seres vivos. As barreiras reprodutivas pós-‐zigóticas resultam da (i) esterilidade dos híbridos. com períodos de muito lenta alteração na forma dos seres vivos e na composição das biocenoses. (iv) incompatibilidade gamética. Porém. períodos de floração da espécie parental e da espécie emergente desfasados no tempo. cabem no conceito de especiação alopátrica. A mudança evolucionária faz-‐se pela substituição das espécies mãe pelas espécies filhas. o gradualismo implica taxas quase constantes de especiação. supõe-‐se que seja importante em alguns grupos de plantas [e. inicia-‐se com uma hibridação seguida de uma duplicação do número dos cromossomas (poliploidia). A ocorrência de alterações climáticas e de outras alterações ambientais súbitas a grande escala foram os mais importantes motores dos fenómenos de especiação em larga escala (i.e. O “gradualismo filético” (ing. quando a fitness dos híbridos é inferior à fitness das espécies parentais. A eficácia dos mecanismos de especiação depende da ocorrência de barreiras reprodutivas que impeçam a dissolução das espécies emergentes no seio da. gén. alterações genéticas que culminam num isolamento reprodutivo frente às restantes populações das espécie-‐mãe. i.g. emergência de cratões graníticos por efeito da erosão geológica e as alterações climáticas) estimulam a especiação. consoante atuem antes ou após o encontro dos gâmetas. i. i. em estase evolutiva. alterações climáticas) ou levem ao desenvolvimento de novos habitats (e. e menos pela mudança das características adaptativas das espécies-‐mãe. & Cozzolino.g. 2009). localização desfasada no espaço. O Triticum aestivum «trigo-‐mole» é um conhecido alopoliploide. De acordo com estes autores. as diferenças morfológicas. Stephen Jay Gould e Niles Eldredge propuseram a teoria do “equilíbrio pontuado” (ing. Lexer. mecanismo vi) é muito frequente nas plantas e rara nos animais. e.g. bem como dos processos de contração da área de distribuição ou de extinção. (ii) isolamento espacial. . e. porém o registo fóssil evidencia que períodos de intensa alteração na forma dos seres vivos e nas espécies fossilizadas alternaram com extensos períodos de estase evolutiva. fisiológicas e de ciclo de vida entre eles é assinalável e de explicação evolutiva conflituosa. (iii) isolamento mecânico. A importância da especiação híbrida (mecanismo v) não está clarificada. rochas com metais pesados e dunas litorais) a especiação pode ocorrer sem isolamento reprodutivo. geralmente. através da ação dos 5 primeiros dos 6 mecanismos de especiação anteriormente enunciados.g. Duas causas explicam o enviesamento da informação evolucionária. O isolamento reprodutivo nas plantas geralmente deve-‐se à convergência de mais de um dos mecanismos supracitados (Widmer. da incapacidade dos híbridos produzirem gâmetas funcionais. reproductive isolation mechanisms): (i) isolamento temporal.g. Em primeiro lugar a natureza saltacional da evolução reduz a probabilidade de taxa com características intermédias terem fossilizado. ou das espécies parentais.e. 1977). Sob estas condições a seleção natural é uma força conservativa: a sua ação dirige-‐se mais à manutenção da integridade das espécies do que à sua mudança. radiação adaptativa).47 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente por isso. todos os fatores que fragmentem populações (e. as populações muito grandes em habitats homogéneos e em períodos de grande estabilidade climática encontram-‐ se. A abertura de vias de migração que ponham em contacto taxa evolutivamente próximos estimulam os fenómenos de especiação híbrida.g. incluem-‐se neste mecanismo o não reconhecimento do pólen pelos estigmas e os sistemas de incompatibilidade. ainda que a espécie parental e a espécie emergente possam viver em habitats distintos relativamente próximos. 25 A clorofila oxidada é um oxidante ainda mais poderoso que o oxigénio. sobretudo se tiverem uma baixa relação carbono/azoto. um ancestral comum. Schaefer. se bem que a sua natureza não esteja clarificada.500 M.a. 2009). embora superiores à fermentação. e a não vida. Saunders. de Bacteria e Archaea. ou noutro qualquer planeta. ambos de muito menor poder oxidante do que o oxigénio molecular. a atmosfera manteve-‐se fortemente redutora.a. Sem um controlo bioquímico o oxigénio destruiria as estruturas celulares. Esta argumentação é sistematicamente.a. Os ambientes redutores sustentam apenas formas simples de vida. 4.a. Do nascimento da vida às algas ancestrais das plantas-‐terrestres Primeiras etapas O facto de a vida ocorrer na Terra e de apenas uma espécie terráquea. O planeta Terra tem cerca de 4.500-‐541 M. por si só. Por exemplo. mas longe da funcionalidade das sementes evoluídas.700-‐4. muito inferiores à respiração aeróbia. Por outras palavras. 2006). 2010). procarióticas. incita a ideia de que a existência é. A precipitação do ferro ferroso e do manganês. Tipo de respiração celular em que o aceitador final nas cadeias de transporte de electrões não é o oxigénio. as leis físicas que explicam a emergência e a retenção da vida na Terra são as mesmas que explicam a sua não presença. A atmosfera volveu oxidante há cerca de 2. associado à acumulação de oxigénio da atmosfera terrestre. como frequentemente acontece nas estruturas reprodutivas.] e no Arcaico [ca. de distribuição muito localizada. em última instância. o CO2 e o vapor de H2O. No Hádico [>4. conhecido por “Grande Oxidação”. & Fegley.a. Durante pelo menos 1. (Olson. aliás poucas substâncias são mais oxidantes do que o 25 oxigénio .400 milhões de anos.1. secundados por resquícios de CO e H2 (Zahnle. os dois éons anteriores ao Proterozoico [ca. As regras que justificam a vida.300 M.000 M.500 M. produzidas em ambientes marinhos de pouca profundidade por biofilmes bacterianos dominados por cianobactérias – com 2. as primeiras sementes poderão ter sido esporângios disfuncionais. Podem ser. em Vénus e Marte. com um enorme potencial evolutivo. 2006). Com mais energia as plantas e os animais podem ser maiores (as despesas energéticas são proporcionais à dimensão) e complexificar-‐se. de vida. Evolução das plantas-‐terrestres 3.] (Figura 18). 26 . olvidada pelos criacionistas. & Brasier.] (Figura 18). 2011). sem uma evidência direta definitiva. supõe-‐se. Admite-‐se que a vida evoluiu uma única vez: todos os seres vivos têm. o efeito mais evidente de um evento geológico complexo. em extensos depósitos de ferro ferroso e de manganês de elevado valor económico é. por exemplo. Por outro lado. o que reduz ainda mais a probabilidade de fossilização. pela ação das bactérias azul-‐esverdeadas (Morton. A maquinaria fotossintética das cianobactérias produz um temível subproduto: o oxigénio. cianofíceas ou filo Cyanobacteria) surgiu num estádio muito recuado da vida na Terra. Cliff. o mecanismo inverso da fotossíntese.500 milhões de anos prevaleceram formas unicelulares simples. ser capaz de a conceptualizar e explorar. A intensa atividade vulcânica mantinha a atmosfera redutora. o ião sulfato ou o ião nitrato. domado pela respiração. 2. o que implica rendimentos energéticos. Nas plantas a fossilização é ainda dificultada pela natureza perecível de muitos dos tecidos vegetais.000-‐2. que não cabe a este livro investigar. estão na Terra e fora dela. um argumento suficiente da necessidade de ser. Na África do Sul e na Austrália foram descobertos estromatólitos – rochas sedimentares estruturadas em camadas. Este gás tem uma importante propriedade química: é um fortíssimo oxidante. a nossa. talvez.800 M.a.200 M. e a vida habita-‐o há 3. (Olson. A atmosfera era então muito distinta da atual. no início do Proterozoico. A fotossíntese realizada por cianobactérias (= algas azuis-‐esverdeadas.48 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Este taxa representam soluções evolutivas “imperfeitas” e transientes. Kilburn. são os mais antigos de que há conhecimento (Wacey. Restos fósseis de bactérias metabolizadoras de enxofre com perto de 3. localizados na Austrália em 2011.a. Se há vida na Terra então a vida pode acontecer em qualquer outro local do universo. dissolvidos nos oceanos arqueanos. e com propósito. qualquer grupo taxonómico principia a sua história evolutiva com um escasso número de indivíduos. permite extrair mais energia da matéria orgânica do que a fermentação ou a 26 respiração anaeróbia . carregada de N2 e de dois gases com forte efeito de estufa. ou extinção. 3. e diversificaram-‐se intensamente ca. Um erro evitou que a cianobactéria ancestral dos 27 Os eventos “Terra bola de neve” são recorrentes. & Bhattacharya. & Katza.a. A sexualidade é exclusiva dos eucariotas.200 M.]. as mitocôndrias. por sua vez. o aumento da concentração de oxigénio na atmosfera abriu o caminho à complexificação da vida através da respiração celular. A sexualidade apresenta importantes vantagens frente à reprodução assexuada (vd. A primeira alga provavelmente nutria-‐se por fagocitose. 28 Ou glaciação Huroniana. Ciniglia.000 M. proposta e popularizada na década de 1980 pela bióloga americana Lynn Margulis [1938-‐2011]. 1992). Lahr. assim como os plastos (= plastídios) que desempenham a função fotossintética nos eucariotas. Kirschvink.a. interferiu na evolução da vida. 2. 2011). A vida interage com a atmosfera. 1. Entre outras diferenças – exploradas até à exaustão nos livros-‐texto de biologia – as células eucariotas possuem um núcleo e mitocôndrias. ca. um dos mais poderosos gases com efeito de estufa.a.]. Knoll. (Butterfield. embora de leitura geológica mais difícil.a. A Grypania. a “Terra-‐bola-‐de-‐ 27 28 neve ” de Makganyene (ing. um estranho fóssil tubular-‐encurvado com dois milímetros de largura e dez centímetros de comprimento.200 M. a partir de uma cianobactéria endossimbionte retida no interior da alga primordial (Yoon. Hilburn.49 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente O incremento paleoproterozoico do teor atmosférico de oxigénio teve um efeito muito mais dramático do que a “Grande Oxidação”. 2004). Os primeiros seres eucariotas provavelmente metabolizavam os produtos da fotossíntese de cianobactérias. excetuando os vírus. adaptando-‐se. . Alguns autores. alternando a fecundação com a meiose.300-‐2. 800 M.300-‐2. a atmosfera. & Nash.. é o mais antigo fóssil atribuído a um eucariota (ca.a.a. todos os organismos se reproduzem com regularidade por via sexual. um organito celular determinante na respiração celular. Primeiro complexificou-‐se a célula. Os cloroplastos de todos os grupos de algas e das plantas-‐terrestres evoluíram há ca.200 M.a. Em simultâneo.a. limitaram-‐se a obedecer às plantas. Makganyene earth snowball. Pinto. 2013) reprodutivo e das taxas de evolução dos seres sexuados. A maior parte dos clados atuais de eucariotas divergiram antes de 1. quando os oceanos primitivos começaram a convergir nas propriedades químicas que hoje os caracterizam (Parfrey. sturtiano [715-‐680 M. O oxigénio injetado na atmosfera pelas bactérias azul-‐esverdeadas reagiu com o metano. As células eucariotas são substancialmente mais complexas do que as procariotas. Uma prova paleontológica – a alga-‐vermelha fóssil Bangiomorpha pubescens – coloca a evolução da reprodução sexual em 1. 2005). Três deles estão bem documentados: de Makganeyene [2. Por intermédio da atmosfera as plantas marcaram indelevelmente a evolução da vida na Terra.) (Han & Runnegar. 2000). As bactérias fotossintéticas e as plantas verdes foram determinantes na composição química da atmosfera.. Hackett. 1. possivelmente o maior evento de extinção jamais enfrentado pela vida terrestre (Kopp.500 M. são bactérias endossimbiontes profundamente modificadas por uma história evolutiva em comum com a célula eucariótica hospedeira. associam a “Terra-‐bola-‐de-‐neve” de Makganyene com a emergência dos eucariotas.a. Por isso. os animais tiveram um papel por regra passivo. inclusivamente. De acordo com a teoria endossimbiótica. Funções e vantagens da reprodução sexual) que se resumem num incremento do sucesso Figura 18. Por essa via despoletou um episódio glaciar à escala planetária.).850 M. Periodização da história da Terra (International Commission on Stratigraphy. os procariotas e um punhado de eucariotas.] e marinoano [680-‐635 M. Marinoan snowball earth). É muito provável que as algas se tenham diferenciado em ambientes 29 dulçaquícolas porque as algas mais primitivas – as glaucófitas – habitam águas doces. Chromalveolata) e as diatomáceas (Bacillariophyta. por mais de uma vez. Algumas algas do litoral de Portugal continental. Numa primeira fase algumas células (células vegetativas. A fotossíntese disseminou-‐se novamente nos eucariotas via endossimbiose. 30 Está descrito um segundo evento de endossimbiose primária – retenção de uma cianobactéria – nos eucariotas ameboides do género Paulinella (Rhizaria. as ‘algas-‐ verdes’ e as algas-‐vermelhas (Rhodophyta). é posterior à dos animais. as algas-‐vermelhas e as diatomáceas têm um papel fundamental no ciclo do carbono: as algas-‐vermelhas e algas-‐castanhas as dominam as comunidades de algas marinhas litorais (= intertidais) e sublitorais (= neríticas). A complexificação da vida no Neoproterozoico [1. O advento dos animais multicelulares de grande dimensão tem sido associado com a Terra-‐bola-‐de-‐ neve Marinoana [680-‐635 M. os seres fotossintéticos não. as ‘algas-‐verdes’ e as algas-‐vermelhas são 30 plantas.] (ing. A) B) C) Figura 19. Phaeophyceae): Bifurcaria bifurcata (Sargassaceae) com algas-‐verdes Ulva lactuca «alface-‐do-‐mar» em fundo. Dois conhecidos grupos de algas.000-‐541 M. desta feita envolvendo a captura quer de ‘algas-‐verdes’. A pluricelularidade Nos mares proterozoicos. As algas A importância ecológica maior das algas atuais está nos oceanos. . organismos originalmente unicelulares falharam a separação dos indivíduos após mitose (citocinese). 2006). (Cladophoraceae) com bolhas de oxigénio produzidas pela fotossíntese Do primitivo eucariota com um plastídio fotossintético evoluíram numa primeira fase as glaucófitas. primeiro pelas plantas e logo a seguir pelos animais. C) Algas-‐verdes (Chlorophyta s. As algas-‐castanhas.] culminou numa explosão da vida animal nos mares câmbricos [541-‐ ca.e. Chromalveolata). por protistas não fotossintéticos (Keeling.a. quer de algas-‐ vermelhas. B) Algas-‐vermelhas (Rodophyta): Corallina elongata (Corallinaceae). 485 M.): Cladophora sp. sendo-‐lhe permitido replicar-‐se no interior da célula hospedeira. e as diatomáceas são determinantes 29 As glaucófitas são um pequeno grupo de algas dulçaquícolas com um tipo primitivo de cloroplastos que mantem uma delgada parede de peptidoglicano (um constituinte fundamental da parede celular das eubactérias). de células similares e totipotentes. ocorreu no final do Câmbrico ou no início do Ordovícico. A retenção de uma alga-‐verde ou vermelha é um evento de endossimbiose secundária. Os cloroplastos são monofiléticos . as algas-‐castanhas e as diatomáceas não. Várias destas linhas de indivíduos multicelulares organizaram-‐se em colónias. as algas-‐castanhas (Phaeophyceae. que conduziu à emergência de um grupo filogeneticamente heterogéneo de grande sucesso evolutivo: os eucariotas autotróficos (Figura 19). 2010). A partir de organismo coloniais simples evoluíram formas com múltiplos tipos celulares estruturados em tecidos e órgãos especializados.str. A evolução metamorfoseou uma convivência acidental numa relação simbiótica eficiente. A) Algas-‐castanhas (Heterokontophyta.a.. um resíduo evolutivo da bactéria azul-‐esverdeada endossimbionte. i. As Glaucophyta. A diversificação das plantas. Parfrey et al.a. como mais adiante refiro. A invasão da terra emersa. não reprodutoras) deixaram de se reproduzir em benefício de outras (células sexuais).50 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente cloroplastos atuais fosse digerida. escassamente integradas. herdaram os seus cloroplastos de uma alga-‐ vermelha ancestral por endossimbiose secundária.]. 2010). O ancestral de todas as plantas-‐terrestres radica nas ‘algas-‐verdes’: as plantas-‐terrestres podem ser interpretadas como ‘algas-‐verdes’ adaptadas aos ambientes terrestres. 2008). folhas (megafilos) e raízes. de clorofila a e b. Volume I). em ambientes hipersalinos ou na superfície do solo. verificou-‐se um atraso na meiose. com exceção das plantas-‐ terrestres [Equisetopsida] e.e. Existem ‘algas-‐verdes’ unicelulares e pluricelulares. Algumas espécies atuais de carófitas suportam uma exposição periódica à dissecação. A teoria antitética F. As apomorfias das Streptophyta (= Charophyta + plantas-‐terrestres) foram reunidas no Quadro 15. Ainda de acordo com Bower a amplificação do esporófito e. com caule. A regeneração do gametófito fez-‐se pela germinação do esporo. dispõem de rizoides (estruturas análogas mas menos eficientes do que as raízes). 32 Entende-‐se por talo o corpo vegetativo das plantas que não diferenciam um eixo polarizado. Como mais adiante refiro. As ‘algas-‐verdes’ habitam preferencialmente águas doces mas também podem ser encontradas nos oceanos. ainda. atingiu uma assinalável complexidade (Estádios iniciais da evolução das plantas-‐terrestres). Nas primeiras etapas da história evolutiva das plantas-‐terrestres até à emergência das plantas-‐vasculares. A diferenciação de uma fase diploide – i. Bower. geralmente um ascomiceta: os líquenes não são plantas. São o elemento autotrófico das simbioses liquénicas. 33 Razão pela qual as plantas-‐terrestres são também designadas por embriófitas. Os talos podem ser filamentosos ou laminares. Celakovsky. 3. Concluída a retenção do gametófito o zigoto adquiriu a capacidade de se dividir por mitose (divisões mitóticas pós-‐zigóticas). O gametófito promove a diversidade genética por intermédio da reprodução sexual. As plantas-‐terrestres compartilham com as ‘algas-‐verdes’ (apomorfias das Chlorobionta. o corpo das ‘algas-‐verdes carófitas’. As mitoses pós-‐zigóticas mudaram a meiose de uma posição pós-‐zigótica para uma posição pré-‐espórica. vd. O. o desenvolvimento de um ciclo haplodiplonte. com áreas especializadas na produção de células sexuais. O esporófito fomenta a proliferação e a disseminação dos organismos. As primeiras plantas-‐terrestres A ‘alga-‐verde’ ancestral A proveniência algal das plantas-‐terrestres foi teorizada pela primeira vez por L. através dos esporos.51 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente no funcionamento de muitas das comunidades fitoplanctónicas. por via assexual. Por conseguinte. no final do séc. se desenvolveu num esporófito pluricelular (fase diploide). implicitamente ausentes das glaucófitas e das algas-‐vermelhas) a presença de um tipo comum de cloroplasto com tilacoides organizados em grana. O corpo das formas pluricelulares designa-‐se por 32 talo (vd. e tal como acontece nas ‘briófitas’ atuais.). uma 33 amplificação do zigoto num embrião que. simples ou ramificadas. XIX. de reservas de amido e de paredes celulares celulósicas (Simpson. no início do séc. opõem às cormófitas (v. de um esporófito – possibilitou a evolução de um novo tipo de célula reprodutora: o esporo. e possuem áreas especializadas na produção de células sexuais. o esporófito teria sido nutrido pelo gametófito. o elemento heterotrófico é um fungo. teria precedido ou imediatamente sucedido a adaptação aos habitats terrestres. coloniais ou filamentosas. necessariamente sem raízes. . genericamente. Bowers é suportada pelas evidências mais recentes (Haig. As diatomáceas estão. Quadro 15). Bower sugeriu que numa primeira fase da evolução das plantas-‐terrestres o zigoto teria ficado retido no gametófito (fase haploide).i. 31 Embora não sejam o grupo de algas mais diverso em espécies. 2008). implicitamente. aplicado a todos os eucariotas com capacidade fotossintética. para além de possuírem polímeros que conferem 31 O termo alga é. as plantas-‐terrestres são um resultado direto da intercalação de uma fase multicelular diploide num ciclo de vida haplonte. caules ou folhas. na origem da maior parte dos depósitos de petróleo e gás-‐natural. Nestas plantas o talo é uma estrutura mais ou menos complexa. muito provavelmente. XX (Bennici. às cianobactérias (algas-‐azuis-‐esverdeadas). O desenvolvimento do ciclo haplodiplonte implicou a alternância de dois tipos de organismos (vd. As plantas com talo dizem-‐se talófitas.O.2. Ciclo de vida das plantas): o gametófito e o esporófito. Consequentemente. Bower propôs que as plantas-‐ terrestres tiveram origem em ‘algas-‐verdes’ de ciclo de vida haplonte semelhante ao dos Charales (uma ordem de Charophyta. e aprofundada na Teoria Antitética de F. as ‘algas-‐verdes’ (= Chlorophyta + Charophyta) apresentam uma imensa variedade de formas e níveis de complexidade. O gametófito é evolutivamente anterior ao esporófito. por sua vez. Sistemas complexos de reprodução Onde se destaca a formação de zigósporos resistentes à dissecação. As carales produzem um talo (corpo) tridimensional e ramificado. um grupo internacional de biólogos pôs em causa a hipótese da Charales ancestral. um sistema complexo de microtúbulos e outras estruturas celulares em torno do local por onde se separarão as duas células filhas. Delwiche. ao ataque pelos microrganismos e aos raios UV. Como referi no início do Vol I. inicialmente revestia o zigoto das Charophyta. em gametângios ♂ (anterídeos). Plasmodesmos* Canais microscópicos que conectam células vizinhas. Neste grupo de ‘algas-‐verdes’ o gametófito produz grandes gâmetas ♀ (oosferas) imóveis no interior de gametângios especializados (arquegónios) – ao contrário das plantas-‐terrestres. É possível.e. que a carófita ancestral de todas as plantas-‐terrestres estivesse já preadaptada a habitats terrestres. as plantas abundantes. uma ordem de Charophyta. complexo. Timme. resistente à secura e ao frio.g. 2012) Aquisição evolutiva Descrição e comentários Talo complexo* Talo ramificado. com nós (onde se inserem as ramificações) e entrenós. Os Zygnematales são isogâmicos. (Finet.. & Marlétaz. . são consideradas o grupo irmão. Estádios iniciais da evolução das plantas-‐terrestres A datação dos grandes eventos evolutivos é tradicionalmente baseada em fósseis. durante largos milhões de anos. Esporopolenina A esporopolenina é o polímero biológico mais resistente à degradação físico-‐química e biológica de que se tem conhecimento. 2010) propõem ainda outro grupo de ‘carófitas’ atuais para a categoria de ancestral direto das plantas-‐ terrestres: as Coleochaetophyceae. que abandonam a planta mãe e reiniciam o ciclo de vida com a formação de novos gametófitos (Bennici. Principais aquisições evolutivas (apomorfias) das Streptophyta (Leliaert.. a despeito de dificuldades metodológicas diversas. A escassez e o enviesamento da informação fóssil – e. com base em dados moleculares. i. com mais do que uma oosfera por arquegónio. Finet et al. et al. dada a sua complexidade química não é claro se a esporopolenina das carófitas é a mesma das plantas-‐terrestres. Depois de um período de tempo variável o zigoto sofre meiose e dá origem a 4 -‐8 células haploides. 2008). As técnicas de relógio molecular servem-‐se desta constatação para datar eventos de divergência evolutiva. Quadro 15). 2011).52 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente resistência aos raios UV e à dissecação (esporopolenina. uma ordem de ‘carófitas’ à qual pertencem as conhecidas algas do género Spirogyra.e. de há muito tempo que as Charales. * Características não partilhadas com os grupos mais primitivos de Streptophyta. Os fósseis oferecem datas mínimas de 34 emergência de um grupo. sendo o registo fóssil usado para calibrar as distâncias moleculares (dissimilaridade molecular) com o tempo geológico. alongam-‐se pelas extremidades e possuem um ciclo de vida haplonte oogâmico (vd. Quadro 15). Placenta Células especializadas na transferência de nutrientes entre a planta mãe e a oosfera ou o zigoto. de zonas húmidas e de elevada relação C/N fossilizam mais e melhor – representam uma importante fonte de erro em história evolutiva: a data de ocorrência do primeiro fóssil é sempre uma aproximação grosseira da origem temporal de uma linhagem. Sistema citocinético com fragmoplasto* A citocinese corresponde à divisão do citoplasma ocorrida no final da telófase (última etapa da mitose). nas streptófitas forma-‐se um fragmoplasto. ciliados e móveis (anterozoides). Algumas características do processo evolutivo). por isso é provável que em algum momento da sua história evolutiva tenha ocorrido uma simplificação da sua biologia reprodutiva. das plantas-‐terrestres. propôs que os Zygnematales. e mais tarde para o pólen das plantas-‐com-‐semente. confere proteção à dessecação. concretamente o género Coleochaete. e. por isso. Quadro 15. Após a singamia forma-‐se um zigoto diploide com uma parede de esporopolenina (vd. Recentemente. com células especializadas e tecidos com arranjos tridimensionais de células. Mais uma evidência de que a complexidade não é uma inevitabilidade em biologia (vd. primitivamente oogâmica. i. – e gâmetas ♂ pequenos. Ciclo de vida das plantas). só os relógios moleculares . o grupo filogeneticamente mais próximo. podem 34 Alguns segmentos de DNA estiveram sujeitos a taxas de mutação lentas e constantes. são o grupo irmão das embriófitas (Wodniok. et al. depois foi deslocalizada para a parede dos esporos das plantas-‐terrestres. Com base em relógios moleculares Clarke et al. (no início do Silúrico). (Clarke. Colocam no Neoproterozoico a colonização da Terra emersa pelas plantas-‐terrestres e centram a divergência das estomatófitas em 670 M. no Devónico [ca. do grupo que reúne as gimnospérmicas actuais em 316 (Pensilvânico. ainda no Neoproterozoico). Vários caracteres exclusivos distinguem-‐nas das ‘algas-‐verdes’ (Quadro 16). a concentração do dióxido de carbono e oxigénio no ar. Figura 20.a. 2004). em terra são esmagadas pelo seu próprio peso – e a lenhina estava ainda por evoluir. Warnock. Nomenclatura de acordo com (Chase & Reveal. Neste texto. de 476 M. 2001) e (Goffinet & Buck. Filogenia baseada em (Allen. As plantas-‐terrestres são monofiléticas: surgiram uma única vez na história da vida terrestre.53 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente oferecer datas máximas. 2008). Algumas evidências fósseis antecipam estas datas para o Câmbrico médio (Gensel. a ineficiência da água como vetor de dispersão em meio terrestre.]. Como adiante explícito. a história evolutiva das primeiras plantas-‐terrestres é pouco conhecida porque a colonização das terras emersas ocorreu num período muito recuado do Paleozoico. recentemente. com datações surpreendentes para as divergências resumidas na Figura 20. 2011) avançaram. Com propriedade pode falar-‐se de uma explosão devónica das Equisetopsida. envolvidas na resolução dos desafios evolutivos criados pelos habitats terrestres. à semelhança de tantos outros. com ca. Fila como os moluscos ou os vertebrados emergiram a partir de grupos animais mais simples e radiaram intensamente durante o Câmbrico [541-‐ ca. 1996). A importância deste período na diversificação dos animais é tão grande que é corrente a designação de explosão câmbrica.a. não colonizadas por seres pluricelulares. as primeiras plantas-‐terrestres diversificaram-‐se bastante depois dos animais.a. & Watts. Relações evolutivas entre as plantas-‐terrestres actuais. Tal como os seus antepassados algais mais diretos colonizavam ambientes dulçaquícolas. das traqueófitas em 446 M. Admite-‐se que as primeiras plantas-‐terrestres se assemelhavam às hepáticas atuais (Marchantiidae). (Doyle. 485 M. e as angiospérmicas entre 229-‐170 M.a. Mesmo assim.a. 2009) Os animais diversificaram-‐se muito antes do aparecimento das plantas-‐terrestres. Huntley. supostamente de hepáticas. intensas flutuações da temperatura. é dada primazia às datações fósseis. Estas características estão direta.a. (Criogénico. entre os quais sobressaem: a escassez cíclica de água. Os grupos basais de Equisetopsida que . 2008). Carbónico). As paisagens terrestres mantiveram-‐se nuas.a. 419-‐359 M. Carbónico) M. (Ordovícico inferior) (Gensel. de uma forma evolucionariamente titubeante. (no Triássico Superior-‐Início do Jurássico). a exposição a radiações mutagénicas (raios UV).a. um novo de meio de suporte que implicou uma sujeição aos efeitos da gravidade (a água que suportava as algas foi substituído por um substrato rochoso em contacto direto com o ar). e dos nutrientes minerais no substrato rochoso ou no solo (as algas consomem gases e nutrientes dissolvidos na água). e a instabilidade espacial e temporal das características dos habitats terrestres.]. ou indiretamente. & Donoghue. As primeiras provas fósseis de plantas-‐terrestres são esporos. O ar não oferece o mesmo tipo de suporte que a água às algas – submersas na água as algas podem ultrapassar a dezena de metros sem tecidos de suporte. (Ordovícico Superior). das espermatófitas em 351 (Mississípico. durante sete oitavos da história da Terra. por organismos prostrados de pequena dimensão e de estrutura pouco favorável à fossilização. das eufilófitas em 434 M. . plantas-‐com-‐flor).i. estabilizaram e promoveram meandrização dos cursos de água. Quadro 16. a cutina. Johnson. um novo tipo de célula reprodutora revestida por esporopolenina. 2012). são os remanescentes vivos das primeiras etapas da colonização das imensas e vazias terras emersas paleozoicas. e em particular as hepáticas. A fotossíntese removeu grandes quantidades de CO2 da atmosfera e reduziu o efeito de estufa. Phaeophyceae). As primeiras plantas não vasculares fomentaram a meteorização das rochas e extraíram nutrientes suficientes do solo. mecanismos geoquímicos em detalhe em As plantas-‐vasculares). Mais tarde. tegumento das sementes. A evolução das plantas-‐vasculares no final do Ordovícico acelerou esta dinâmica (vd. Principais aquisições evolutivas (apomorfias) das primeiras plantas-‐terrestres Aquisição evolutiva Descrição e comentários Novos mecanismos bioquímicos e genéticos Acumulação de substâncias protetoras contras os efeitos dos raios UV (e. Crouch. Complexificação do sistema reprodutivo Anterídeos (órgãos produtores de gâmetas ♂) e de arquegónios (órgãos produtores de gâmetas ♀) complexos (secundariamente reduzidos nos grupos mais evoluídos. Novas adaptações ecofisiológicas Osmoregulação mais avançada. nas plantas com semente no interior dos primórdios seminais. e. esporopolenina e cutina).g. As plantas-‐terrestres não vasculares 35 Para evitar equívocos. Ainda mais complexo nas plantas-‐vasculares (vd. ainda ausentes nas hepáticas (Marchantiidae) (v. = mugos e ‘briófitas s. Um polímero lipídico. et al.. vasculares e com raiz. Esporo Evolução do esporo (vd. 2011).g. sistemas de reparação do DNA mais avançados. Meristemas apicais de maior complexidade Presença de meristemas apicais tridimensionais constituídos por pequenas células. ciclo de 36 vida haplodiplonte e alternância de gerações Envolveu a retenção do zigoto pelo gametófito (haploide). cauloides e filídios.). Pires. O ciclo haplodiplonte é frequente nas algas-‐castanhas (Heterokontophyta. a segunda maior da história da vida terrestre depois da mega-‐extinção pérmica (Finnegan. Esporófito. Cladophora) não homólogo do ciclo de vida haplodiplonte das plantas-‐terrestres.str. Os sedimentos acumulados nos sistemas ribeirinhos serviram mais tarde de habitat a plantas de maior dimensão. e. É uma evidente adaptação ao meio terrestre.54 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente 35 constituem as ‘briófitas’ . e resistente à dessecação e às radiações UV. O efeito das primeiras plantas na superfície emersa terrestre condicionou a sua própria evolução (Gibling & Davies. Esta sequência de eventos poderá explicar o curto mas intenso período glaciar que marca o final Ordovícico (Lenton. Nas ‘briófitas” e ‘fetos’ forma-‐se nos arquegónios. A diferenciação do esporo trouxe consigo um novo tipo de órgão reprodutor: o esporângio.l. Estomas Poros complexos por onde se realizam todas gasosas com o exterior. e incrementar a produtividade das algas e outros microrganismos fotossintéticos marinhos. ainda no Ordovícico. As primeiras plantas-‐terrestres.g. Ulva. Embrião O embrião é um esboço de esporófito. Ciclo de vida das plantas). tolerância ou prevenção da dessecação. neste texto o termo ‘briófita’ designa o grupo parafilético hepáticas+musgos+antóceros. ocorre uma troca de papéis. é o mais conhecido constituinte da cutícula. Outra alternativa seria considerar ‘briófitas’ s. também não homólogo das plantas-‐terrestres. 2012) e a extinção ordovícico-‐silúrica (= extinção ordovícica). & Dolan. As plantas-‐ vasculares). passando o gametófito a estar retido pelo esporófito (vd. depois com rizoides. Revestimento por uma cutícula mais ou menos espessa Ainda fina e incompleta nas ‘briófitas’ ‘briófitas’. nas plantas-‐com-‐semente. Ciclo de vida das plantas). Os embriões são protegidos estruturas especializadas. com ou sem rizoides (estruturas análogas a raízes). 36 Algumas ‘algas-‐verdes’ têm um ciclo haplodiplonte (e. Corpo de maior complexidade Inicialmente prostrado e rente ao solo (talo).’ = hepáticas+musgos+antóceros. para serem transportados pelos rios para o mar. tolerância ao congelamento e resistência ao calor.g. ereto ou prostrado. a sua multiplicação por mitose e a diferenciação de um esporófito (diploide). em particular o fósforo. e limita o seu crescimento em altura. B) Antitrichia curtipendula (Bryidae). Renner. Estima-‐se que existam 7000 – 9000 espécies de hepáticas (von Konrat. As ‘briófitas’ resolveram o problema da indisponibilidade cíclica de água na terra emersa tolerando a sua escassez. O gametófito das hepáticas e das antóceras não tem sistema vascular. FCUL). Briófitas actuais. desenvolveram mecanismos que previnem a dessecação dos seus tecidos. n. Este facto obriga-‐as a cumprir todo ou grande parte do ciclo de vida na água. 2010). As ‘briófitas’ são poiquilo-‐hídricas: o seu teor em água depende do contacto directo com a água ou da humidade do ar. por isso não interpretáveis como estomas). Briscoe. uma hepática talosa. e de estomas. as plantas-‐vasculares.b. ou em condições de humidade relativa muito elevada. um musgo folhoso pleurocárpico. 2010) e 200 – 240 espécies de antóceras (Villarreal. 11000 – 13000 de musgos (Magill. A inexistência de um verdadeiro sistema vascular e de raízes explica o pequeno tamanho das ‘briófitas’. turfeiras) e de montanha. a) Metzgeria furcata (Marchantiidae). nem estomas (as hepáticas apresentam pequenos poros sem células-‐guarda. as cápsulas cor de laranja do esporófito. Hagborg. D) Phymatoceros bulbiculosus (Anthocerotidae). Cargill. hidratam-‐ se rapidamente na presença de água e secam e entram em dormência na sua ausência. & Engel. & Renzaglia. como verá mais adiante. A A B C D Figura 21. Os gametófitos dos musgos dispõem de um sistema vascular muito incipiente não homólogo das plantas-‐vasculares (nas plantas-‐vasculares o sistema vascular desenvolve-‐se no esporófito). 2010).55 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente As plantas-‐terrestres não vasculares (‘briófitas’) dividem-‐se em três grandes grupos monofiléticos (Figura 21): Marchantiidae (hepáticas). Söderström. César Garcia. Hagborg. .g. C) Geração esporofítica do musgo folhoso Funaria higrometrica (Bryidae). das tundras e dos ecossistemas de zonas húmidas (e. n.b. o talo do gametófito do qual emergem os esporófitos (fotografias amavelmente cedidas pelo Dr. Bryidae (musgos) e Anthocerotidae (antóceras). Söderström. As ‘briófitas’ são determinantes na estrutura e funcionamento das florestas húmidas. como os cauloides e os filídios absorvem água e nutrientes.l. Tanto os pouco eficientes rizoides. O passo evolutivo fundamental do sistema vascular que conduziu à emergências das traqueófitas foi relativamente simples: consistiu na morte programada. O esporófito é mais duradoiro nas antóceras e nos musgos do que nas hepáticas. As ‘briófitas’ são homospóricas a ligeiramente heterospóricas (i. As antóceras não produzem um protonema. (como as sementes das plantas-‐com-‐semente) necessitam de se embeber em água para germinarem. a oosfera nunca abandona o arquegónio e origina. As hepáticas estão na base das plantas-‐terrestres. O gametófito das antóceras e da maioria das hepáticas (hepáticas talosas) é taloso. Esta estrutura é. de dimensão variável (de microscópico a mais de um metro) e expande-‐se na horizontal com ramificações mais ou menos regulares. os esporos maiores gametófitos ♀ e os menores gametófitos ♂. geralmente verde (fotossintético). por meiose. Figura 20). um zigoto (primeira célula do esporófito). . As plantas-‐vasculares Evolução A carência de um sistema vascular condiciona a biologia das ‘briófitas’. As relações evolutivas entre as plantas-‐terrestres não vasculares e as plantas-‐vasculares atuais parecem convergir para um consenso. o esporófito acaba por diferenciar um esporângio no interior do qual. caules (cauloides) e folhas (filídios). antóceras e hepáticas talosas). depois de fertilizada por um gâmeta (anterozoide).e. grande parte delas fotossintéticas. produzindo. Dados recentes indiciam que as antóceras são o grupo irmão das plantas-‐ vasculares (Goffinet & Buck. Os esporos das ‘briófitas’ s. Se o xilema é um sistema de transporte ascendente de solutos. Em algumas espécies de antóceras os esporófitos têm rizoides e chegam a ter uma vida independente dos gametófitos. por conseguinte o encontro dos gâmetas só é possível em biótopos permanentemente ou sazonalmente húmidos. À semelhança dos fetos as antóceras apresentam os gametângios imersos nos talos. tem uma forma laminar dorsiventral. Portanto. um resíduo evolutivo da alga ancestral. e em muitas hepáticas. se formam os esporos. neste último caso. restringe-‐se aos estádios iniciais do desenvolvimento do gametófito. de uma parte subterrânea devotada à captura de água e nutrientes. Nas espécies pleurocárpicas os arquegónios e as cápsulas desenvolvem-‐ se em pequenos cauloides laterais muito curtos. O corpo gametofítico das ‘briófitas’ é frágil. i. os anterozoides navegam num filme de água auxiliados por flagelos. 3. prostrada.56 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente O número de espécies dioicas de ‘briófitas’ é invulgarmente elevado: 60% são dioicas (com gametófitos unissexuais) e 40% monoicas (Wyatt & Anderson. conhecida por protonema. Estes dois grupos de plantas-‐terrestres têm em comum os esporófitos verdes com estomas. 2005). Alimentado pelo gametófito. O sistema vascular facilitou o aumento do tamanho e a especialização do corpo das plantas. anisospóricas). um carácter definitivamente fixado nas plantas-‐vasculares (Simpson. 2010). As ‘briófitas’ e todos os grupos subsequentes constituem o clado das estomatófitas. assim como nas demais plantas-‐terrestres. 2004. Nas ‘briófitas’. que penetram nas fissuras das rochas e fixam as plantas ao substrato. As ‘briófitas’ terrestres são pequenas têm células pouco especializadas. No gametófito das hepáticas folhosas e dos musgos diferenciam-‐se estruturas análogas a raízes (rizoides. o floema é um sistema de transporte descendente (pontualmente ascendente) dos produtos da fotossíntese. no esvaziamento e no engrossamento das células que vieram a constituir o xilema (Sperry. não ramificado e mais ou menos vertical. verticais nos musgos 37 acrocárpicos . um pronuncio da estrutura do esporófito que domina o ciclo de vida das traqueófitas.e. provavelmente. 1984). através da segregação espacial de uma parte aérea fotossintética. individualizados ou agregados em tufos densos. se presente. 37 Nos musgos (Bryidae) acrocárpicos os arquegónios e as cápsulas inserem-‐se na extremidade de cauloides mais ou menos erectos. Nas ‘briófitas’. também presentes em algumas carófitas. as antóceras e as plantas-‐vasculares actuais compartem um antepassado comum. Nas ‘briófitas’ folhosas o talo. os esporos dão origem a uma estrutura filamentosa semelhante a uma alga pluricelular. É constituído por uma cápsula localizada no topo de eixo polarizado (com parte distal e proximal de distinta morfologia) de comprimento variável. inseridos em cauloides mais longos e prostrados.3. Nos musgos. Da base do caule destas plantas emergiam pêlos radiculares que contactavam com as partículas do solo. agora sujeito a forças de sucção mais intensas.creaweb. 443-‐ ca. Dois grupos irmãos. embora sua origem muito provavelmente recue ao Ordovícico Superior (Clarke. ainda sem lenhina. Além de alguma resistência ao ataque por parasitas. sem raízes e com esporângios apicais de parede espessa. Supõe-‐se que estas substâncias funcionavam como protetores químicos contra os raios UV nas primeiras plantas-‐terrestres (Weng & Chapple. pelo menos algumas espécies de Cooksonia dispunham de traqueídos (Edwards. 428-‐398 M. constitui um momento chave da conquista da dimensão altura pelas plantas-‐terrestres. xilema). uma das primeiras plantas-‐vasculares com registo fóssil. autónomos e heteromórficos (distintos entre si) (Taylor. As primeiras plantas heterospóricas surgiram também neste grupo. Nas primeiras plantas-‐vasculares o esporófito tornou-‐se fisiologicamente autónomo. sem folhas.]. respectivamente. 433 M. Os esporófitos de Cooksonia (Rhyniophyta) [ca. O registo fóssil da vida vegetal terrestre adensa-‐se no final do Silúrico [ca. & Donoghue.57 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Os mais antigos restos fósseis de plantas-‐ vasculares foram detetados em estratos do Llandovery [ca. evoluíram. tem em si um enorme potencial para aumentar de tamanho e complexificar-‐se. a dominância do esporófito acelerou as taxas evolutivas porque a diplófase aumenta a diversidade genética (duplica o genoma) submetida a seleção. ao contrário da celulose. mais prováveis em ambientes directamente expostos às radiações ultravioletas. sem risco de colapso do xilema.]. & Axe. Por outro lado. As plantas-‐vasculares diversificaram-‐se logo no início do Devónico. Davies. provavelmente. 2010). rentes ao solo mais de 50 milhões de anos. no gametófito. A síntese da lenhina evoluiu numa planta vascular posterior às riniófitas e anterior à divergência das licófitas (Lycopodiidae) (Weng & Chapple. Para se manterem eretas possuíam espessamentos em espiral no xilema. a primeira época do Silúrico (Cleal & Thomas. Senão todas. Kerp. 1992). 2005). sem a protecção da sombra ou de massas de água livre. 2009). a geração gametofítica domina o ciclo de vida das ‘briófitas’. As plantas-‐terrestres mantiveram-‐se pequenas. as licófitas e as eufilófitas (Euphyllophyta).a. A dominância da diplófase nas plantas-‐vasculares pós-‐licófitas possivelmente está relacionada com a vascularização do esporófito e com a impossibilidade do mesmo acontecer. A duplicação da guarnição genética também oferece uma protecção contra eventuais mutações deletérias.a. a lenhina conferiu rigidez mecânica ao corpo das plantas e aumentou a eficiência do seu sistema vascular. Cooksonia (Rhyniophyta).e. A preponderância da fase esporofítica foi definitivamente fixada nas licófitas (Lycopodiidae) ou nos seus ancestrais diretos. 2010). Algumas características do processo evolutivo). Um aumento da espessura da cutícula é. Os percursores do anabolismo da lenhina ocorrem nas ‘briófitas’. eram constituídos por caules de poucos centímetros de altura. um grupo que abrange os fetos e as plantas-‐com-‐semente. As http://www. no início e .a. Os fósseis de Rhyniophyta sugerem que se desenvolveram relações simbióticas entre plantas e fungos logo no início do Devónico e que este facto é essencial para explicar o sucesso evolutivo das plantas-‐vasculares. a lenhina é hidrofóbica. O xilema engrossado com lenhina é mais estanque e menos resistente ao fluxo da seiva porque. A história evolutiva das plantas mostra que o esporófito. ao contrário do gametófito. A deposição de lenhina nas paredes celulares (inc. Warnock. o desenvolvimento de paredes celulares secundárias.] (os gametófitos não foram ainda descobertos). uma das mais antigas plantas-‐vasculares fósseis evitar a dessecação dos esporos (Figura 22). Como referi no ponto anterior. de forma eficiente. para Figura 22. Admite-‐se que a perda de água pelos estomas – transpiração – gerava uma força de sucção suficiente para erguer a água absorvida do solo até ao topo destas plantas. 420–425 M. é uma elaboração evolutiva de características primitivas com outras funções (vd.fr/bv/banque/cormo-‐cooksonia. A evolução da lenhina. Está provado que em algumas Rhyniophyta tanto os esporófitos como os gametófitos eram autotróficos. Plantas cada vez mais altas puderam ser abastecidas a grande distância por solutos. como tantas outras características do vivo. i. & Hass. simples ou ramificados.html Cooksonia era homospóricas. uma das novidades evolutivas trazidas pelas Cooksonia. 2011). Os ácidos orgânicos libertados pelas raízes para desmobilizar os nutrientes minerais. A conjugação de um corpo rígido e de um sistema vascular eficiente com um órgão especializado na busca e captura de água. 50 M. períodos de penúria de precipitação.a. As primeiras plantas-‐vasculares ocuparam. caules e folhas verdadeiras. de forma independente dos microfilos característicos das licófitas. A água das chuvas naturalmente retida em profundidade nos substratos porosos ficou. vastas áreas da terra emersa até aí colonizadas por ‘briófitas’ ou desprovidas de coberto vegetal. Alongamento e ramificação da raiz). e. Asteroxylon e Lepidodendron). Os primeiros tetrápodes herbívoros datam do Carbonífero Superior-‐Pérmico Inferior (Sues & Reisz. O primeiro vertebrado fóssil adaptado à locomoção terrestre. Hernick.g. do Carbonífero Inferior. com o aparecimento das raízes.a. Hernick. As primeiras florestas.) (Stein. 391 M. O nome eufilófitas alude ao facto dos megafilos se terem diferenciado neste grupo. 2012). Esta água tem a enorme vantagem de estar protegida da evaporação e de poder compensar total. ainda sem câmbio vascular. Tiveram um pico de diversidade e de abundância no Carbónico [359-‐299 M.g. As licófitas (Lycopodiidae) são extraordinariamente antigas. A meteorização química dos silicatos . ou moderou. Com o aumento da superfície terrestre coberta com plantas vieram os primeiros fogos. e nas primeiras florestas. supõe-‐se de forma independente. Recentemente descobriu-‐se que a rede de regulação genética que controla o desenvolvimento dos rizoides nos gametófitos das ‘briófitas’. no final do Devónico havia árvores com mais de 30 m de altura. As eufilófitas podem ser consideradas as primeiras cormófitas por terem um corpo vegetativo com raízes. com um tronco encimado por uma coroa de ramos possivelmente caducos. é bastante mais tardio. ou por algum dos seus ancestrais mais diretos. Berry. a zona pilosa é a parte das raízes mas eficiente na absorção de água e nutrientes. As raízes foram a grande novidade evolutiva trazida. talvez ancestral das eufilófitas. o sistema radicular pode ser entendido como um sistema tubular que conecta os pelos radiculares absorventes com a parte área das plantas. pelas licófitas e pelas eufilófitas. aumentou a tolerância à escassez de água e evitou. no Devónico médio. & Mannolini. Deste modo. A evolução de plantas cada vez maiores culminou nas primeiras árvores. Muitos autores defendem que folhas verdadeiras surgiram uma única vez na história evolutiva das plantas. No início do Devónico as plantas-‐ terrestres não um ultrapassavam os 30 cm de altura.]. & Mannolini. Aparecem no Devónico Inferior. As plantas-‐vasculares são homo-‐hídricas: o teor em água do seu corpo. 2012). A expansão espacial de ecossistemas com cada vez mais biomassa vegetal aumentou a produção de resíduos e forçou a acumulação de matéria orgânica no solo. depois das primeiras plantas-‐vasculares e dominaram a flora terrestre a partir do final do Devónico. Este grupo de plantas caracteriza-‐se ainda por se ramificar lateralmente e pela inserção helicoidal dos ramos. não está em equilíbrio com a humidade ambiental (vd. soil carbon burial). v. de fisionomia semelhante às palmeiras (Stein. antes das restantes ‘pteridófitas’. A maioria das jazidas de carvão provém do lenho de licófitas lenhosas. ao contrário do que acontece nas ‘briófitas’. Uma vez que a lenhina se degrada lentamente. 1998). 2007). com os cladoxylópsidos (Cladoxylopsida. testemunhado pelos primeiros estragos de artrópodes herbívoros (Labandeira. disponível para as plantas. o tetrápode (animais de 4 membros) Pederpes finneyae. Plantas de porte arbóreo. A diversificação trófica dos primeiros ecossistemas terrestres desenvolveu-‐se a partir do Silúrico Superior-‐Devónico Inferior. aceleraram a meteorização das rochas. Berry.a. 2012). Como referi no primeiro volume (vd.a. logo no Devónico Inferior. Watiezza). A sua importância declinou a partir do Carbónico Superior. e penetra e percorre o solo numa busca incessante de água e nutrientes. As plantas-‐vasculares com megafilos evoluíram 40-‐50 M. O solo tal como o conhecemos hoje é uma criação devónica. por sua vez. amalgamavam licófitas. 2012). de plantas enraizadas ainda sem folhas. ou parcialmente. cladoxylópsidos e aneurofitales (progimnospérmicas. Na transição Silúrico-‐Devónico verificou-‐se um acentuado aumento do coberto vegetal terrestre. evidenciam-‐se no registo fóssil a partir do Devónico Médio [ca. é o mesmo que controla os pelos radiculares nos esporófitos das plantas-‐vasculares (Jones & Dolan. um grupo obscuro. tendo alguns géneros desempenhado um importante papel nos ecossistemas terrestres deste período (e. retomado na passagem do Devónico Médio para o Superior (Gibling & Davies. a interrupção do crescimento nos territórios com precipitações sazonais.i.].58 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente a meio do Devónico. com biomassas aéreas e subterrâneas crescentes. As plantas-‐terrestres não vasculares). grandes quantidades de carbono proveniente de CO2 atmosférico foram sequestradas no solo (ing. As vantagens adaptativas do crescimento em altura são autoevidentes nos organismos fototróficos: as plantas mais altas deprimem pela sombra os seus competidores. The evolution of root hairs and rhizoids. entre 400 M. Calamites. Os fósseis mostram que a interação entre a composição da atmosfera e as plantas-‐ terrestres produziu de forma cíclica surtos de inovação adaptativa. A Terra-‐estufa (i. As alterações da composição química da atmosfera explicam ainda a emergência de novas soluções evolutivas no clado das plantas-‐vasculares.a. Ainda no Devónico as eufilófitas basais estiveram na génese de dois novos grupos de plantas-‐ vasculares: as monilófitas (Monilophyta) e as lignófitas (Lignophyta).].a. altura e complexidade (Beerling. Os grandes grupos de ‘pteridófitas’). A redução do CO2 na atmosfera está então relacionada com a explosão devónica das plantas-‐vasculares.a. com abundantes formas arbóreas (e. Figura 24). As monilófitas estão representadas nas floras atuais pelos fetos (vd. The Emerald Planet: How Plants Changed Earth's History. como sejam as folhas verdadeiras (megafilos) e cormos de maior massa. na transição Triássico-‐Jurássico [ca. Figura 23.]. fomentaram o soterramento de uma gigantesca massa de carbono que fossilizou sob a forma de carvão.a.a. Necessariamente. greenhouse earth) ante-‐carbónica deu lugar à Terra-‐casa-‐de-‐gelo (i. e 360 M.]. despoletou um episódio glaciar e uma extinção global. 201 M. Atingiram uma diversidade significativa no Carbónico. Metade das espécies carbónicas conhecidas de plantas-‐vasculares pertence às subclasses Lycopodiidae e Equisetidae (Kenrick & Davis. 2007) que não cabe a este texto desenvolver em pormenor.59 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente consome CO2. promoveram explosões de plâncton e o “soterramento de carbono” em sedimentos costeiros e marinhos (e. Evolução do número de espécies de plantas vasculares ao longo do tempo (Willis & McElwain. Os nutrientes lixiviados pela água das chuvas para mares pouco profundos. sem calotes glaciares. A origem das Polypodiidae é um mistério. 2004). no Cretácico [ca.a.].g. porém os teores atmosféricos deste gás-‐de-‐estufa não mais foram os mesmos. por sua vez. 2007). a expansão das plantas-‐vasculares causou uma descida acentuada da concentração de CO2 no Devónico Médio.a.a.] e novamente no Eocénico [56-‐34 M. em calcário e margas calcárias). abundantes neste período. Estes processos causaram uma descida assinalável do teor atmosférico de CO2 e a correspondente subida da concentração de O2 no final do Paleozoico para valores similares aos actuais. a extinção do Devónico Superior. The Emerald Planet: How Plants Changed Earth's History.. com calotes glaciares. As equisetas recuam ao Devónico. 2004). icehouse earth) que se prolongou do Carbónico até ao Pérmico. ing. Em consequência da libertação de CO2 pela actividade vulcânica o clima reaqueceu significativamente no Mesozoico [252-‐66 M.]. 145-‐66 M.]. Alterações da composição química da atmosfera são particularmente evidentes no final do Pérmico [260-‐252 M. cada um destes períodos está associado a modificações significativas na composição da flora terrestre (Beerling. ing. que. Consequentemente.g. 2005) (Beerling.a. Leaf evolution: gases. Os primeiros fósseis reconhecíveis como tal datam do Carbónico. As ‘pteridófitas [licófitas + fetos] dominaram a vegetação terrestre do Carbónico ao Triássico (Figura 23). As plantas-‐vasculares-‐sem-‐semente.e. o período geológico que sucede o Devónico [ca.a. mas sua origem é certamente devónica (Kenrick & Davis. As condições anóxicas dos ecossistemas pantanosos e turfosos do Carbónico [359-‐299 M. 2002) .] e na transição Paleocénico-‐Eocénico [56 M.e. 419-‐359 M. genes and geochemistry. 2009). B) Calamites aproximatus (Equisetidae) (Carbonífero?). a reiteração de períodos húmidos muito curtos selecionou positivamente os mecanismos de reprodução sexual rápida associados à heterosporia (Willis & McElwain. D) Pecopteris miltoni (Polypodiidae) (Carbonífero?) (fósseis expostos no Museu Botânico da Universidade de Coimbra) As lignófitas datam do Devónico superior [ca. de progimnospérmicas heterospóricas. 38 Refira-‐se que o crescimento secundário surgiu de forma independente das lignófitas nas licófitas e equisetófitas. A substituição da homosporia (= isosporia. A heterosporia. monofiléticas (Mathews. teoricamente. esporos idênticos) pela heterosporia (esporos ♂ e ♀ distintos) ocorreu de forma independente. ou não. 1996). Progymnospermopsida) e Aneurophyton (Aneurophytales. Por exemplo. originalmente. Exemplos fósseis dos grandes grupos actuais de ‘pteridófitas’. poderá ser uma adaptação a climas pouco pluviosos ou de precipitações sazonais. em várias linhagens de plantas-‐vasculares.]. Os fetos homospóricos produzem protalos fotossintéticos de maior dimensão do que as espécies heterospóricas. . As lignófitas partilham a presença de um meristema secundário especializado – o câmbio – que produz xilema para o interior e floema para o exterior (Pryer. já 38 extintos. A heterosporia precedeu e foi essencial para a evolução da semente. As progimnospérmicas possuíam um lenho semelhante ao das gimnospérmicas atuais. as licófitas heterospóricas e as progimnospérmicas heterospóricas descendem de espécies homospóricas distintas. dois grupos muito antigos de plantas-‐vasculares. géneros Archaeopteris (Archaeopteridales. Não é claro se as espermatófitas são. Uma vez que os fetos dependem da presença de água livre para concretizar a sua sexualidade. B) Lycopodites selaginioides (Lycopodiidae) (Carbonífero ?). Progymnospermopsida). A) Lepidodendron dichotomum (Lycopodiidae) (Carbonífero ?). & Skog. Desempenharam um importante papel nas florestas do Pérmico. 380 M. A origem das plantas-‐com-‐ semente radica num ou mais grupos extintos. 2002).g. e.60 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente A) C) B) D) Figura 24. que os precederam: as progimnospérmicas (Progymnospermopsida). Smith. não identificado. englobam as plantas-‐com-‐semente e os fetos.a. . A deslocação dos anterozoides em direção à oosfera. Embora tenham introduzido um número significativo de inovações evolutivas vantajosas. as ‘pteridófitas’ partilham com as ‘briófitas’ a necessidade da presença ininterrupta de água para cumprirem o ciclo sexual. de plantas-‐vasculares (Rhyniophyta). Esporófito complexo e autónomo do gametófito De grande duração. Neste sentido as ‘briófitas’ e as ‘pteridófitas’ são seres anfíbios. Schneider. retida num arquegónio. onde se diferenciam anterídeos e arquegónios (Walker. Pryer. 2006). Equisetidae. Concluída a fecundação o crescimento vegetativo do esporófito – como aliás ocorre nas ‘briófitas’ – pode decorrer com potenciais de água mais baixos no solo. Alongamento liderado por meristemas apicais A divisão celular envolvida no alongamento rameal está restringida a uma ou poucas células localizadas na superfície dos meristemas apicais. Sob esta designação são abrangidos dois grupos supostamente monofiléticos: licopódios e monilófitas (= fetos). Equisetophyta. . Ophioglossidae. 39 Outros autores modernos tratam estes grupos ao nível da Divisão: Psilotophyta. depende da presença de um filme contínuo de água. Zhang. desenvolvidos. já extintos. Marattiidae e Polypodiidae. de forma independente. (Smith. ramificado e com folhas (exceto Rhyniophyta) associadas com os caules em sistemas caulinares. & Schneider. & Wolf. Schuettpelz. Schuettpelz. A linear sequence of extant families and genera of lycophytes and ferns. Principais aquisições evolutivas (apomorfias) das traqueófitas Aquisição evolutiva Descrição e comentários Produção de lenhina Deposição de lenhina nos elementos do sistema vascular num ancestral comum às licófitas e eufilófitas. das licófitas e as eufilófitas. posterior às riniófitas. Folhas De dois tipos. Smith et al. Cutícula e estomas mais evoluídos Detectável nas riniófitas. As plantas-‐vasculares-‐sem-‐semente. no âmbito das monilófitas. Equisetidae e Polypodiidae. Schneider. respectivamente. Quadro 17. raramente com mais de 10 mm de comprimento. Os traqueídos aparecem pela primeira vez nas riniófitas e o lenho secundário no clado das lignófitas. & Wolf. Christenhusz et al. Ausentes nos grupos mais primitivos. Pryer. Os grandes grupos de ‘pteridófitas’ As ‘pteridófitas’ são os descendentes mais diretos das primeiras plantas-‐vasculares na flora vascular atual. identificaram quatro grandes clados com a categoria de 39 classe . nas Gnetidae e nas angiospérmicas. Os vasos lenhosos surgiram. 2011) despromoveram-‐nos à categoria de subclasse: Ophioglossidae. As ‘pteridófitas’ são um grupo parafilético (não compreendem todos os descendentes de um ancestral comum) razão pela qual este termo deve ser usado forma coloquial. Marattiophyta e Polypodiophyta. Sistema vascular Com floema e xilema. Secundariamente ausentes nas Psilotales (Ophioglossidae). em algumas ‘pteridófitas’. Na flora portuguesa estão representados quatro dos cinco clados de ‘pteridófitas’ reconhecidos por Smith et al. 2006) (Figura 25): as subclasses Lycopodiidae. (Christenhusz. O ciclo de vida das ‘pteridófitas’ principia com a germinação dos esporos e a formação de um protalo haploide (= gametófito das ‘pteridófitas’). Paredes celulares com espessamento secundário A partir do clado das lignófitas [progimnospérmicas + plantas-‐com-‐semente]. (Smith.61 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Principais características das plantas-‐vasculares As traqueófitas manifestam várias inovações morfológicas e funcionais que lhes conferem assinaláveis vantagens competitivas frente às ‘briófitas’ na maior parte dos habitats terrestres (quadro 17). 2012). Raízes verdadeiras Exceto nos grupos mais primitivos já extintos (Rhyniophyta). microfilos e megafilos. provido de rizoides e semelhante ao talo de algumas hepáticas. Korall. Korall. licopódios» são plantas-‐terrestres rizomatosas de ramificação 40 41 dicotómica. A) Diphasiastrum maderense (Lycopodiaceae. Grandes grupos de ‘pteridófitas’. lycófitas. As licófitas são o grupo irmão das Monilophyta. Os esporofilos de Lycopodiidae surgem organizados em estróbilos localizados na extremidade dos caules. Lycopodiidae). e. Selaginella). Polypodiidae). e. Subclasse Ophioglossidae As plantas da subclasse Ophioglossidae «ophioglossidas. com microfilos (sem megafilos). Ophioglossidae). a sua semelhança com as folhas dos trevos (Trifolium. D) Folhas do endemismo ibérico Masilea batardae (Marsiliaceae. quando maduros os estróbilos tombam no solo e libertam os esporos. Os gametófitos são monoicos (i. n. Lycopodium) ou dioicos (i. F) Página inferior de uma fronde de Blechnum spicant (Blechnaceae.g. escassa representação em Portugal continental mas com algum significado no arquipélago dos Açores. e. licófitas.g. fetos-‐ophioglossidos» pertencentes ao género Psilotum (Psilotales) apresentam uma estrutura simplificada do corpo vegetativo (ausência de megafilos e de raízes) aparentemente em resultado da simplificação evolutiva de um ancestral estruturalmente mais complexo.e. A 40 Microfilos onde se inserem os esporângios. Produzem esporos iguais entre si (homosporia. 41 . Polypodiidae). C) Equisetum arvense (Equisetaceae.g. 1200 espécies). ordens Selaginellales e Isoetales).b. Estruturas reprodutivas semelhantes a pequenos cones ou cilindros.62 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente C B A D E F Figura 25. Equisetidae). Polypodiidae). B) Ophioglossum lusitanicum (Ophioglossaceae. Têm uma moderada relevância na flora atual (ca. E) Diplazium caudatum (Athyriaceae. esporos de cor acastanhada. n. estróbilos localizados na extremidade dos caules. com gametófitos ♀ e gametófitos ♂. gametófitos bissexuados.e. n. Lycopodiales) ou desiguais (heterosporia.b.b. Fabaceae). Subclasse Lycopodiidae As Lycopodiidae «lycopodiidas. porém as suas relações evolutivas e ancestralidade de modo algum estão resolvidas (Rothwell & Nixon. com ramificações verticiladas e folhas verdadeiras (megafilos) muito reduzidas. equisetófitas ou equisetas» inclui fetos terrestres. Os esporófitos apresentam folhas de grande dimensão (frondes). de caules articulados. Estes dois últimos géneros. fetos-‐equisetídos. fetos-‐verdadeiros. O grão de pólen e o primórdio seminal. herbáceos e rizomatosos. a flora terrestre foi ininterruptamente dominada pelas plantas-‐com-‐semente.a. são a evidência fóssil mais antigas de plantas-‐com-‐semente. Grupo de escasso registo fóssil. As espermatófitas radiaram intensamente no final do Paleozoico e novamente no Triássico [252-‐201 M. As Ophioglossidae são homospóricas e consideradas o grupo basal de todos os fetos (Monilophyta) atuais. com esporângios com uma única célula de espessura (fetos leptoesporangiados) localizados na página inferior. estriados e ocos. 2006). As primeiras espermatófitas – os chamados fetos-‐com-‐semente (pteridospérmicas. a absorção de nutrientes do solo depende de associações micorrízicas. As equisetidas são homospóricas.g. polipodiófitas. escamiformes e verticiladas. 90 espécies).63 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente proximidade evolutiva entre os Psilotum e os Ophioglossum e Botrychium (Ophioglossales) foi recentemente descoberta.4. A retenção do(s) megásporo(s). ambos indígenas Portugal. início do Jurássico. Apresentam uma morfologia muito diversa. As plantas-‐com-‐semente sem flor Evolução das plantas-‐terrestres do Devónico à extinção cretácico-‐paleogénica Uma explicação plausível para o aparecimento do primórdio seminal poderia ser a que se segue. por seu turno. algumas espécies têm uma fisionomia arbórea (e. O megasporângio com um a poucos esporos retidos no seu interior foi em seguida envolvido por um tegumento de origem foliar. 4 das quais presentes em Portugal. As plantas-‐com-‐semente 3. solitários ou agrupados em soros protegidos por uma escama (indúsio). com primórdios seminais cujo micrópilo não selava a semente . assim como a raiz e a folha. à semelhança dos Psilotum. Num momento inicial da história evolutiva das plantas-‐vasculares é possível que tenha ocorrido um atraso. pobre em espécies (ca. Os gametófitos geralmente têm uma forma de um coração estilizado. A polipodiidas são homospóricas exceptuando duas pequenas famílias. são “invenções” devónicas. Este atraso poderá ter tido origem numa pequena anomalia no sistema de deiscência das paredes de um megasporângio. fetos-‐ leptoesporangiados» é o grupo mais evoluído e recente de fetos. Estava. Cyathea cooperi. Subclasse Equisetidae A subclasse Equisetidae (= Sphenopsida) «equisetidas.g. produzem gametófitos bissexuados ou masculinos.a.]. 15 espécies. Azollaceae). As frondes férteis e as frontes estéreis são morfologicamente distintas em algumas espécies (e. A maior parte dos géneros atuais de polipodiidas data do Mesozoico [251-‐66 M.a] ou do Cenozoico [66-‐0 M. importante invasora nos Açores). diferenciado o primórdio seminal primitivo. fetos-‐polipodiidos. 3.]. 9000 espécies). então. na libertação dos megásporos na progimnospérmica ancestral de todas as espermatófitas. Um pequeno e fortuito “defeito” no sistema de deiscência dos esporos desembocou numa nova linhagem de plantas-‐vasculares – as plantas-‐com-‐semente – de enormes possibilidades evolutivas. Os chamados esporangióforos (estrutura onde se inserem os esporângios) estão organizados em estróbilos localizados na extremidade dos caules. Marsileaceae e Salviniaceae (inc. implicou o desenvolvimento. de 370 M. Osmunda regalis e Blechnum spicant). Grãos de pólen com ca. Atualmente estão reduzidas a ca. com um a poucos megásporos. total ou parcial. A hipótese de que as plantas-‐com-‐semente atuais e os fetos atuais são grupos irmãos parece ser consensual.1. têm raízes verdadeiras e megafilos mas. Desde o final do Triássico. A subclasse Polypodiidae é de longe o grupo mais diverso grupo de fetos atuais (ca. do gametófito ♀ no interior do megasporângio. geneticamente determinado.a. Pteridospermatophyta) – combinavam folhas semelhantes às de muitos fetos. Subclasse Polypodiidae A subclasse Polypodiidae «polipodiidas.4. abundavam nas florestas do final do Devónico e do Carbónico Inferior. e diferenciaram-‐se extensas áreas semi-‐desérticas a desérticas de clima continental no interior do Pangea. gnetófitas e angiospérmicas. a mãe de todas as extinções em massa (vd. 2009). 237 M. 145 M.]. As gimnospérmicas modernas dominaram a vegetação terrestre até à transição do Cretácico Inferior para o Cretácico Superior. as Lyginopteridales. Muitos autores admitem que o conceito de extinção catastrófica. Reconhecem-‐se 5 grandes linhagens nas plantas-‐com-‐semente atuais: cicas. A extinção P-‐Tr foi seguida por uma recuperação temporária. muito frios ou com substratos muito seletivos (e.a.a.] e. respetivamente. possivelmente. verificou-‐se uma paulatina subida da temperatura. 2003).a. No Pérmico. sobretudo de licófitas afins das atuais isoetáceas (gén. início do Jurássico (Figura 22 e 26). povoadas por flora xeromórfica entre a qual despontavam algumas das primeiras coníferas.a. 2005). com o aparecimento de novos grupos. as Gnetidae diferenciaram-‐se no Triássico [252-‐201 M. As famílias coníferas representadas na flora atual são triássicas (e. o mais importante grupo atual de gimnospérmicas. As mais antigas pteridospérmicas. talvez. & Shi-Jun. No Triássico médio reaparecem os grupos de gimnospérmicas que sobreviveram à extinção P-‐Tr (e. A informação fóssil das coníferas (Pinidae). As plantas deste último grupo já possuíam folhas inteiras. A recuperação da flora terrestre demorou mais de 10 milhões de anos! No Triássico Médio [247-‐ca. as gimnospérmicas actuais para “habitats extremos”. 318-‐299 M. as Glossopteridales (Cleal & Thomas.64 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente após a polinização (Pryer. foram. As Bennettitales enxameavam as florestas do Jurássico [201-‐ca. Uma tamanha massa continental rodeada por um único oceano – oceano Panthalassa – teve um forte efeito na circulação geral da atmosfera e no clima. Em muitas espécies o tegumento estava incompletamente formado observando-‐se lobos (telomas) coalescentes em grau variável. momento a partir do qual a dominância ecológica das angiospérmicas se tornou inequívoca. e pouco depois desapareceram os Gigantopteridales (Rees. persistiam no Triássico (Grauvogel-Stamm & Ash. o último período da Era Paleozoica e que sucede o Carbónico. Podocarpaceae e Taxaceae) (Cleal & Thomas.).]. o grupo mais avançado de gimnospérmicas paleozoicas. A agregação de placas continentais que comandou a formação do supercontinente de Pangea estava concluída no Carbónico final. no biota vegetal terrestre é disputada entre os especialistas. Dois importantes grupos de gimnospérmicas modernas nasceram e extinguiram-‐se no Mesozoico [252-‐66M. são um forte candidato a grupo ancestral das plantas-‐com-‐flor.a. da importância das ‘pteridófitas’.g. O efeito da grande extinção pérmico-‐triássica (P-‐Tr). 2002). As gimnospérmicas modernas tornaram-‐se dominantes nos ecossistemas terrestres.a. . as Peltaspermales e. sendo o intervalo Pérmico-‐Triássico um longo período de turnover da flora.] ocorreu uma nova e intensa radiação das gimnospérmicas. A origem das Cycadidae é pérmica. 2009). As florestas tropicais húmidas que cobriam de lés a lés a Terra emersa carbónica regrediram acentuadamente. no final do Triássico. recua ao final do Carbónico. progressivamente. durante o Triássico Inferior. Rees. e um agravamento da irregularidade espacial e da sazonalidade da precipitação (Ziegler. primeiro as Medullosales no Pensilvânico (última época do Carbónico.]: as Caytoniales e as Bennettitales. dominaram as florestas do sul da grande área continental correspondente ao antigo continente de Gondwana durante o Pérmico. A evidência fóssil mostra. em massa. depois. Por exemplo. Collinson. coníferas. muito quentes.g.] e Superior [ca. Araucariaceae. que das 20 famílias de ‘pteridófitas’ e de gimnospérmicas presentes no Pérmico. no Pérmico [299-‐252 M. 1996). Evolução das angiospérmicas no Paleogénico). As Gigantopteridales. As suas afinidades evolutivas não estão clarificadas (Glasspol. ainda assim.g. Pinaceae. 237-‐201 M. Pleuromeia). Ginkgo.a. Hilton. apenas 6 e 4. O sucesso evolutivo das angiospérmicas “empurrou”. em detrimento das formações de ‘pteridófitas’ arbóreas. Extinções em massa. Cupressaceae. não pode ser alargado às plantas-‐ terrestres. finalmente. 2004). cicas). & Skog. Rothfus. As Ginkgoidae e. solos derivados de rochas ultrabásicas e sistemas dunares). como refiro mais adiante. os suprarreferidos Glossopteridales extinguiram-‐se na transição entre o Pérmico e o Triássico. Eshel. Smith. As Lyginopteridales perderam importância para outras pteridospérmicas mais avançadas. Rowley. & Sunderlin. muito secos. ramificados em Ginkgo). Esporofilos geralmente inseridos em braquiblastos Os braquiblastos correspondem ao eixo das estruturas reprodutivas das gimnospérmicas estrobiladas (com estróbilos. A) Pterophyllum lipoldii (Cycadopsida) (Triássico ?). . Redução do número de megásporos por megasporócito e retenção dos megásporos Dos 4 megásporos formados após meiose do megasporócito (= célula-‐mãe do saco embrionário ou células-‐mãe dos megásporos) apenas um sobrevive. (Pinaceae). Simplificação dos gametófitos Redução acentuada da complexidade dos gametófitos e dominância absoluta da geração esporofítica. Esporângios inseridos. afastado do solo (os gametófitos das ‘pteridófitas’.65 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente A) B) Figura 26. os arquegónios (gametângios ♀) persistiram nos grupos mais primitivos de gimnospérmicas. aos gametófitos ♀ e ♂. solitários em forma de leque (algumas Cycadidae) e carpelos (angiospérmicas). vd.g. Fósseis de gimnospérmicas. Primórdio seminal Estrutura constituída pelo(s) tegumento(s) + nucela (= megasporângio) com uma abertura (o micrópilo). Quadro 18. isolados ou em grupos. Heterosporia Esporos de dois tipos: megásporos e micrósporos que dão origem. e. são subterrâneos). Pinaceae). sendo nutrido pelo esporófito materno. (fósseis expostos no Museu Botânico da Universidade de Coimbra) Principais características das plantas-‐com-‐semente O sucesso evolutivo das espermatófitas frente às ‘pteridófitas’ é explicado pela aquisição de um conjunto alargado de características (Quadro 18). Carácter herdado da progimnospérmica ancestral de todas as espermatófitas. Principais aquisições evolutivas (apomorfias) das plantas-‐com-‐semente Aquisição evolutiva Descrição e comentários Câmbio vascular e crescimento secundário Na realidade surgiu nas progimnospérmicas devónicas. nucela protegida por 1 (gimnospérmicas e angiospérmicas) ou 2 (angiospérmicas) tegumentos. consequentemente é uma apomorfia das lignófitas. pelo contrário. Retenção do gametófito ♀ (endoprotalia) O megásporo funcional dá origem por mitose a um saco embrionário haploide (o megagametófito ou gametófito ♀) envolvido pela parede do megásporo (endosporia).g. pequenos caules (simples em Taxus . em suportes simples ou ramificados (esporofilos) Nas plantas-‐com-‐semente atuais ocorrem quatro tipos de megasporofilos: escamas seminíferas (próprias das gimnospérmicas estrobiladas. respectivamente. eixo das pinhas e dos gálbulos. Dois tipos de microsporofilos: escamas polínicas (nas gimnospérmicas) e estames (nas angiospérmicas). B) Fóssil jurássico de Pinus sp. retido e envolvido pelos tecidos megasporângio. o gametófito ♀ permanece retido no interior do primórdio seminal (endoprotalia). e. Redução da complexidade dos gametângios As espermatófitas actuais não possuem anterídeos (gametângios ♂). I volume) e ao receptáculo da flor nas angiospérmicas. Relações filogenéticas entre as linhagens actuais de plantas-‐com-‐semente. os grandes grupos de espermatófitas partilham. protegidos da ação de muitos parasitas e predadores. (ii) simplificação dos esporângios. Embora as relações evolutivas das 5 grandes linhagens nas plantas-‐com-‐semente atuais sejam obscuras (Figura 27). iii) uma proteção (tegumento) construída a partir do(s) tegumento(s) do primórdio seminal. A) “Hipótese do antófito” (suportada pela informação fóssil). tubo polínico e alimentação do gametófito ♂ pelo esporófito polinizado As primeiras plantas-‐com-‐semente eram anemófilas. (Mathews. al. Pinidae e Gnetidae (Figura 28) – conforme propõem Christenhusz et. Nas angiospérmicas o gametófito ♂ é alimentado pelo estilete da planta polinizada. As plantas-‐com-‐semente-‐sem flor. . de eventuais danos mecânicos e da predação. estas duas condições são provavelmente ancestrais. (iii) deslocamento mais eficiente dos gâmetas ♂ ao encontro gâmetas ♀ porque total. Semente A semente é constituída por: i) um eixo com um polo radicular e outro caulinar (embrião). Os grandes grupos atuais de gimnospérmicas As 4 linhagens atuais de gimnospérmicas são tratadas neste texto com a categoria de subclasse – Cycadidae. Geralmente a semente desidrata-‐se com mais ou menos intensidade (exceto Cycadidae. e (vii) taxas evolutivas mais elevadas e consequente incremento da velocidade de adaptação a novos habitats. Ginkgo e angiospérmicas de sementes recalcitrantes) e entra num estado de vida suspenso (quiescência). Gota de polinização. (vi) abertura de novas possibilidades evolutivas à dispersão de sementes e de pólen. os grãos de pólen germinam na vizinhança do micrópilo e produzem um tubo polínico que se alimenta do megasporângio (nucela) e transporta os gâmetas ♂ até à proximidade dos gâmetas ♀. independente da água. (Christenhusz. Reveal. e (iii) complexificação dos esporófitos. algumas tendências evolutivas: (i) redução da duração e da complexidade da geração gametofítica. Gametófito ♂ adaptado à dispersão Grãos de pólen transportados durante a polinização dos microsporângios (= sacos polínicos) até à proximidade dos megasporângios. 2009) As inovações trazidas pelas primeiras plantas-‐com-‐semente tiveram oito grandes consequências evolutivas: (i) possibilidade de desenvolver sistemas radiculares mais profundantes e de atingir maiores crescimentos em altura. (ii) maior proteção dos gametófitos ♂ e ♀ por se encontrarem fora do solo. Ginkgoidae. ou parcialmente.66 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Pólen Os micrósporos (= grãos de pólen unicelulares) diferenciam-‐se logo após a meiose dos microsporócitos (= células-‐mãe dos micrósporos) organizados em tétradas (grupos de quatro). A) B) Figura 27. total ou parcialmente. Martin. ii) órgãos anexos de reserva. (iv) maior proteção do esporófito imaturo (embrião incluso na semente) da dissecação. nas ‘pteridófitas’ os gametófitos estão imobilizados no solo. (v) facilitação do estabelecimento do esporófito imaturo através da energia e dos nutrientes concentrados na semente. e à polinização cruzada através do vento ou de agentes animais. O grão de pólen maduro é constituído pelo gametófito ♂ envolvido pela parede do esporo (endosporia) e protegido por um invólucro (esporoderme). Nas gimnospérmicas atuais o pólen é capturado por gotas de polinização segregadas pelo primórdio seminal para o exterior através do micrópilo. B) “Hipótese das gimnospérmicas” (sustentada pelos métodos moleculares de inferência filogenética). Neste volume. A) Cycas revoluta (subclasse Cycadidae).a. C) Pinus nigra subsp. & Chase. 3. 2010).4. Estudos moleculares fazem recuar a emergência das angiospérmicas para o intervalo 199-‐167 M. n. A taxonomia das gimnospérmicas é desenvolvida no Vol. Clarke et al. Reveal. Soltis.67 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Robert. da transição Triássico-‐ Jurássico ao Jurássico Médio (Bell. Cretácico Inferior) foram detetados em Israel por (Brenner & Bickoff. As angiospérmicas são também colocadas numa subclasse: Magnoliidae. Endress. Martin.2. o fóssil mais bem preservado e completo mais antigo atribuído a uma angiospérmica (ca. A B Figura 28. A dominância ecológica das angiospérmicas iniciou-‐se há 90-‐100 M. Gimnospérmicas atuais. repartidas por 84 géneros e 12 famílias (Christenhusz. 2003) reconheceram no Archaefructus.4.] adentro. Friis et al..a. na passagem do Cretácico Inferior para o Cretácico Superior.. foram discutidos alguns aspetos da biologia reprodutiva das gimnospérmicas. 2011). A radiação das angiospérmicas é muito precoce. Correntemente são aceites cerca de 1026 espécies de gimnospérmicas. laricio (subclasse Pinidae).b. Robert. III (“Sistemática de plantas-‐com-‐semente”). & Chase.a.b. (Idade Valingiana.1. Triássico [252-‐201 M.2. Doyle.a. primórdios seminais aos pares na extremidade de um megasporófilo. de 124 . D) Ephedra fragilis (subclasse Gnetidae). (Clarke. (Friis.a. & Donoghue. ramos articulados. 2011) antecipam estas datas para 170–229 M.]: grãos de pólen com cerca de 135 M. & Leng. 2011) embora as categorias de classe ou de ordem sejam mais frequentes na bibliografia. As angiospérmicas 3. & Soltis. B) Ginkgo biloba (subclasse Ginkgoidae). 1992).a. n.. Warnock. Primeira etapas evolutivas e principais características Contextualização evolutiva Todas angiospérmicas têm um ancestral comum entre as gimnospérmicas: constituem um taxon monofilético. no ponto Biologia da reprodução de gimnospérmicas. 145-‐101 M. O registo fóssil das angiospérmicas remonta ao Cretácico Inferior [ca. O encurtamento do período juvenil acelerou as taxas evolutivas das plantas-‐com-‐flor frente às gimnospérmicas (o número de gerações por unidade de tempo aumentou). Nas gimnospérmicas os primórdios seminais estão sujeitos à predação por insectos. Por outro lado. As angiospérmicas apresentam cinco grandes inovações evolutivas que explicam. em detrimento da produção de pólen.000 espécies. A maior eficácia e eficiência reprodutiva é uma consequência direta das novidades estruturais e funcionais reprodutivas resumidas no Quadro 19. A rapidez da fecundação e a formação das sementes nas angiospérmicas é notável. As plantas com flores zigomórficas simpétalas com um tubo bem diferenciado só ganham importância no Terciário. i. ao efeito mecânico do vento e da chuva e à dessecação. Ao mesmo tempo que se diferenciaram os grandes clados das angiospérmicas verificou-‐se uma diversificação em larga escala das estruturas da flor e a generalização das flores actinomórficas com cálice e corola. (iv) sistema vascular mais eficiente e especializado no transporte de solutos. Praticamente todas as ordens evidenciadas na Figura 31 Filogenia das angiospérmicas estavam diferenciadas na transição entre o Cretácico e o Cenozoico. o carpelo. enquadradas em mais de 450 famílias (o número oscila entre ca. depois de amadurecido e transformado em fruto. consoante os autores). sistemas dulçaquícolas (hidrofitia).a. As angiospérmicas são francamente mais diversas do que os restantes grandes grupos de plantas-‐vasculares. (iii) elevadas taxas evolutivas.g. 500. depois da primeira flor (Stevens. . representam ca. Diferenças anatómicas sugerem que a sua origem seja independente dos vasos lenhosos das angiospérmicas. 42 Ausente nos grupos mais primitivos de angiospérmicas. nas gimnospérmicas o endosperma é diferenciado antes da fecundação. e perturbação intensa pela herbivoria ou fogo. Embora sejam o mais recente grande grupo de plantas. excetuando as florestas boreais de gimnospérmicas (taiga) e as formações árticas de musgos e líquenes (tundra). o investimento parental pôde ser concentrado na formação do embrião. desertos (xeromorfia).a. e. Os benefícios da plasticidade morfológica foram pormenorizados no início do primeiro volume.. através da oferta de recompensas. Principais características das angiospérmicas O sucesso evolutivo das angiospérmicas é inquestionável.e. Com cerca de 300. o que implica um investimento energético parental significativo e de alto risco (a fecundação pode ou não acontecer). alargou as soluções evolutivas para a dispersão das sementes. 65-‐70 M. capaz de evoluir para formas muito variadas. há 66 M. atuais ou fósseis. Cretácico Superior). sistemas de auto-‐incompatibilidade). Um megagametófito de menor dimensão implicou um menor investimento parental antes da fertilização. 2001+). Sendo necessário menos pólen as plantas com flor puderam desviar mais recursos para a produção de sementes. o seu sucesso evolutivo e a regressão das gimnospérmicas: (i) corpo vegetativo de grande plasticidade morfológica. a dispersão é geralmente autocórica ou anemocórica. 150 e ca. (ii) corpo vegetativo “evolutivamente flexível”.g. o desenvolvimento relações mutualistas com insectos polinizadores. Um sistema vascular mais eficiente acelera as taxas de crescimento e o poder competitivo das plantas. dominam a maioria dos grandes tipos de ecossistemas terrestres. 80 % das espécies de plantas-‐ terrestres atuais. (v) reprodução mais rápida. O segundo tegumento aumentou a proteção do gametófito ♀. em grande parte. copa das árvores (epifitia). A germinação estigmática do pólen favoreceu a evolução de sistemas eficientes de promoção da alogamia (e. a doenças. A flexibilidade evolutiva do corpo vegetativo conjugada com elevadas taxas evolutivas permitiram a rápida adaptação das angiospérmicas a uma multidão de habitats e tipos de perturbação. A flor permitiu a evolução de novos sistemas de polinização energeticamente mais eficientes do que a polinização anemófila característica das gimnospérmicas porque os riscos de desencontro entre o pólen e as estruturas reprodutivas femininas diminuíram. A eficiência acrescida do sistema vascular deve-‐se à presença de elementos de vaso xilémico (tipo celular quase exclusivo das 42 angiospérmicas ) e elementos de tubo crivoso e células companheiras mais eficientes. características próprias de Nymphaeales (angiospérmicas basais). Alguns fetos e as Gnetidae têm vasos lenhosos.a.68 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente M. Nas angiospérmicas lenhosas o xilema é coadjuvado fibras xilémicas que têm um papel fundamental no equilíbrio mecânico da parte aérea.. nas gimnospérmicas prolonga-‐se por mais de um ano enquanto uma angiospérmica pode florir e produzir semente e disseminar-‐se em poucos dias. A maior parte da produtividade primária terrestre é de sua responsabilidade. eficaz e eficiente. Além da função de proteção. acelerou as taxas evolutivas. A formação do endosperma após a fecundação reduziu o desperdício de energia. Crane. provavelmente. germina e diferencia um tubo polínico que progride pelo estilete ao encontro dos primórdios seminais protegidos no ovário (vd. a maioria dos estudos moleculares dá as gimnospérmicas como monofiléticas. respectivamente. nem a origem das angiospérmicas estão clarificadas (Friis.. Germinação estigmática do pólen Nas gimnospérmicas o pólen germina diretamente no micrópilo (vd. Carpelo Megasporofilo ♀. numa gimnospérmica ancestral não identificada. 2011). à semelhança do primeiro tegumento. A inconsistência entre os cladogramas que expressam as relações filogenéticas das linhagens atuais de plantas-‐com-‐semente com base em informação fóssil ou molecular deve-‐se. A génese da flor envolveu. Entre outros contam-‐ se os fetos-‐com-‐semente (pteridospérmicas). as Caytoniales e as Bennettitales. a oosfera e a célula central (vd. seis grupos já relacionados. A descoberta de frutos fósseis em Portugal que associam as Gnetidae às Bennettitales veio recuperar a importância das Gnetidae na evolução das angiospérmicas (Friis. a que mais tarde se juntou um envelope de apêndices estéreis (perianto). 2011). Megagametófito de menor dimensão Megagametófito reduzido a oito células. & Pedersen. constituindo um clado irmão das angiospérmicas. No entanto. 2007). Biologia da reprodução de gimnospérmicas).69 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Quadro 19. ao facto das gimnospérmicas atuais serem um subconjunto demasiado pequeno e enviesado da enorme diversidade de gimnospérmicas que povoaram o planeta Terra no final do Paleozoico e no Mesozoico. Phase-contrast X-ray microtomography links Cretaceous seeds with Gnetales and Bennettitales. Fecundação e formação mais rápida das sementes Intervalo de tempo muito curto entre a polinização e fecundação. as Gigantopteridales. coadjuvados por alguns estudos de base molecular. a condensação de estruturas reprodutivas unissexuais numa estrutura bissexual com os órgãos femininos no centro (carpelos) rodeados por órgãos masculinos (estames). . com a origem das angiospérmicas. hipótese do euanto em A origem da flor). Os estudos cladísticos baseados na morfologia dos grupos atuais e fósseis de plantas-‐com-‐ semente. Early Flowers and Angiosperm Evolution. Cycadidae. um número substancialmente inferior ao megagametófito das gimnospérmicas. Nem a origem da flor. Dupla fecundação Envolve dois núcleos espermático que fertilizam. Relações evolutivas entre as gimnospérmicas e as angiospérmicas A flor evoluiu uma única vez: todas as flores são homólogas: todas as plantas com flor partilham um ancestral comum. as Cordaitales. também permanece em aberto qual dos quatros grandes grupos de gimnospérmicas atuais – Ginkgoidae. nas angiospérmicas o pólen é capturado pelo estigma. Entrada precoce na fase reprodutiva Transição rápida entre as fases juvenil e adulta. Etapas da reprodução sexual nas angiospérmicas). Pinidae e Gnetidae – é filogeneticamente mais próximo das plantas-‐com-‐flor. Duas hipóteses estão em confronto. Segundo tegumento De origem foliar. indiciam que as Gnetidae são evolutivamente próximas das angiospérmicas. A complicar ainda mais a situação os estudos de filogenia molecular colocam as Gnetidae na vizinhança das Pinaceae (hipótese das gnepina) (Zhong. Os grupos de gimnospérmicas extintos são muito numerosos e morfologicamente diversos.. os métodos moleculares de inferência filogenética só podem ser utilizados em plantas atuais. em alternativa. et al. Uma vez que as relações evolutivas entre as cinco grandes linhagens atuais das plantas-‐com-‐semente continuam por resolver. e entre esta e a disseminação da semente. et al. O consenso dos especialistas termina aqui. formação do tubo polínico e fecundação). Principais aquisições evolutivas (apomorfias) das plantas-‐com-‐flor a nível reprodutivo Característica Descrição Flor Estrutura chave das angiospérmicas geralmente interpretada como sendo um braquiblasto com folhas muito modificadas (vd. Por outro lado. Germinação do grão de pólen. Pentoxylales. 70 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente 3. De acordo com a recém-‐proposta teoria da combinação-‐transição (Stuessy. De acordo com Meyen (Meyen. A flor co-‐evoluiu com os animais polinizadores. A hipótese do euanto ou euantial aceita que a flor evoluiu a partir de uma estrutura simples. Em muitas espécies os carpelos soldaram-‐se num único pistilo pluricarpelar (gineceu sincárpico). a sutura foi preenchida com tecido. 1983). 1988) de algum modo os megasporofilos das Bennettitales tomaram a forma plana dos microsporofilos. N. A semelhança com as flores das angiospérmicas é notável! Outra questão relevante é se os órgãos e os processos característicos da flor evoluíram lentamente ou a sua agregação foi mais ou menos rápida. A flor A origem da flor Nos últimos 125 anos digladiaram-‐se. A relação das plantas-‐com-‐semente com os insectos é muito antiga. como as estruturas reprodutivas de um importante grupo mesozoico extinto de gimnospérmicas. de fora para dentro: brácteas. Polinização e evolução da flor No capítulo Polinização defendeu-‐se que a polinização teve um papel chave na e volução da flor. enrolaram-‐se e ao soldarem-‐se pela margem encerraram no seu interior os primórdios seminais. De acordo com a teoria da origem filospórica. o carpelo é uma folha com funções reprodutivas femininas (megasporofilo) dobrada para a página superior. e toda a sutura carpelar funciona como uma superfície estigmática. Os primeiros insectos polinizadores terão sido atraídos pelo valor alimentar do pólen e da gota de polinização. i. 1969).. com microsporofilos proximais e megasporofilos distais. nas liliáceas os carpelos são concrescentes até ao estigma. Reconstrução da estrutura reprodutiva de Williamsoniella (Bennettitales) (Harris. Biologia da reprodução de gimnospérmicas). microsporofilos e um receptáculo alargado onde alternam escamas interseminais e sementes. através do micrópilo. angiospérmicas basais) os carpelos são livres (gineceu apocárpico). diferenciando-‐ se um ovário. A gimnospérmica ancestral provavelmente segregava para o exterior. No âmbito desta teoria as gimnospérmicas são consideradas um grupo evolutivamente independente das angiospérmicas e a origem destas últimas encontra-‐se nos fetos-‐com-‐semente (Stuessy. uma gota de polinização para capturar pólen arrastado pelo vento (vd. A hipótese pseudanto ou pseudantial propõe que as flores são uma inflorescência composta condensada. ou para a página inferior. que as flores evoluíram de um sistema ramificado de caules que suportavam micro e megasporofilos.b. depois a dupla fecundação e finalmente a flor. Nas plantas basais (e. um estilete e um estigma. Originalmente esta hipótese apontava as Gnetidae como o elemento de conexão entre as gimnospérmicas e as angiospérmicas. gonophyll theory) propõe que o carpelo é uma bráctea que envolveu um ramo curto onde primitivamente se inseriam os primórdios seminais (Melville. 2004).g. Duas teorias competem para explicar a origem do carpelo. As Bennettitales tinham um hábito semelhante às Cycadaceae atuais. Nos grupos mais avançados. sem um resultado conclusivo. as Bennettitales. 2004) primeiro diferenciou-‐se o carpelo. a evolução concentrou a superfície estigmática no topo do carpelo e os primórdios na sua base. constituída por um único eixo. selados por secreções ou pelo entrelaçamento de pêlos. duas hipóteses em torno da origem da flor.2. A teoria do gonofilo (ing. anterior às angiospérmicas. A . Estes três passos evolutivos fundamentais terão demorado mais de 100 milhões de anos a ocorrer. Algumas das suas espécies produziam estruturas reprodutivas análogas a flores (Figura 29): hermafroditas. com microsporofilos planos com sacos polínicos marginais e megasporofilos curtos com primórdios seminais terminais. envolvidas por brácteas.1. Além dos Bennettitales foram propostos outros putativos ancestrais no âmbito da teoria euantial que não cabe aqui explorar.4.e. Figura 29. Esta fusão é variável: nas apocináceas é frequente os estiletes serem concrescentes e os ovários livres. as cariofiláceas têm os estiletes e os estigmas livres. com os primórdios seminais originalmente dispostos ao longo da sutura carpelar. bons reprodutores. Também para evitar a herbivoria a superfície estigmática afastou-‐se da porção do carpelo preenchida com primórdios seminais (ovário). se as tépalas eram diferenciadas em sépalas e pétalas. As primeiras flores. à custa da diferenciação de um estilete. com menos de 1 cm de diâmetro. indiciam que a flor primitiva. As flores dos grupos basais (“mais primitivos”) ao que parece resultam da simplificação de flores mais complexas quando há pouco tempo se admitia serem primitivamente simples. Em muitas espécies os carpelos soldaram-‐se num único pistilo pluricarpelar (gineceu sincárpico). com as peças do perianto semelhantes entre si (i. a discussão em torno da estrutura das primeiras flores enriqueceu-‐se com a descoberta. 2009) fazem um ponto da situação e (re)discutem em profundidade a questão. As angiospérmicas basais (e. Se as sementes eram mais pequenas podiam ser produzidas em maior número. Dominavam na altura as ideias de dois grandes filogenistas. XX admitiu-‐se que a mais primitiva planta com flor se encontraria entre o então denominado “complexo magnolioide”. Nas plantas basais (e. possuía: (i) mais de dois verticilos de tépalas e de estames. a riqueza em espécies (diversidade específica) está positivamente correlacionada com os seguintes caracteres (Rieseberg & Willis. Sistemas de cruzamento). e (iii) carpelos livres e fechados por secreções (sem um tecido a conectar as margens do carpelo). que por sua vez forçam o isolamento reprodutivo. Amborella e nenúfares) e o registo fóssil. publicados a partir de 1999 puseram em causa um paradigma com mais de 100 anos. O aumento da visitação por insectos poderá ter impulsionado a emergência de flores hermafroditas de modo a acelerar as trocas de pólen. mesmo. se a filotaxia das peças florais era verticilada ou alterna em espiral ou. provenientes de Portugal e da América do Norte. Num artigo recente Endress & Doyle (Endress & Doyle. fisionomia herbácea. A polinização selecionou positivamente flores vistosas. família Magnoliaceae) e de outras famílias afins (e. Plant speciation. de grande simplicidade genética e probabilidade de ocorrência.71 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente consequente melhoria da polinização aportada por estes visitantes. Winteraceae) eram um modelo apropriado da flor ancestral das angiospérmicas. tratados com as ferramentas conceptuais e estatísticas apropriadas. com tépalas). flores zigomórficas. ambos influenciados por um outro botânico americano. pólen rico em proteínas e nectários. eram grandes. Não é claro se esta flor era unissexual ou hermafrodita. A polinização por insectos apareceu num momento muito recuada da evolução das . Bessey [1845–1915].e. A diversidade genética. com partes edíveis. Um dos mecanismos capazes de explicar esta constatação é o seguinte: pequenas alterações na morfologia da flor. em suma. diferenciando-‐se um ovário. estames pouco diferenciados e carpelos livres. Entretanto. podem redundar na selecção novos polinizadores. entre outros caracteres. a evolução concentrou a superfície estigmática no topo do carpelo e os primórdios na sua base. À escala das plantas-‐com-‐flor. A flor primitiva Durante o séc. com dados moleculares e morfológicos. entre outros fósseis. Uma série de estudos de filogenia. um passo determinante na especiação (Especiação). estruturas reprodutivas mais atrativas para os insectos. Esta fusão é variável: nas apocináceas é frequente os estiletes serem concrescentes e os ovários livres.g. as cariofiláceas têm os estiletes e os estigmas livres. do Archaefructus na China e de pequenos fósseis carbonizados cretácicos. a sutura foi preenchida com tecido. por sua vez. nas liliáceas os carpelos são concrescentes até ao estigma. De acordo com esta hipótese a flor das magnólias (género Magnolia. o soviético/arménio Armen Takhtajan [1910-‐2009] e o norte-‐americano Arthur Cronquist [1919–1992]. com muitas peças inseridas em espiral num eixo alongado. acresce o sucesso reprodutivo (fitness) dos indivíduos num mundo heterogéneo e em permanente mudança: os indivíduos mais diversos produzem mais sementes viáveis e têm filhos mais saudáveis. selados por secreções ou pelo entrelaçamento de pêlos. Esta hipótese pressupunha que as primeiras angiospérmicas seriam provavelmente árvores ou arbustos. polinização mediada por seres vivos. 2007): presença de canais resinosos e de esporões.g. C. A coevolução planta-‐animal polinizador parece então ser uma das causas determinantes da elevada diversidade das angiospérmicas atuais. no mundo vivo com paralelo apenas na classe dos insectos.g. epifitia e poliploidia. angiospérmicas basais) os carpelos são livres (gineceu apocárpico). A exposição à herbivoria dos primórdios seminais foi resolvida com o aparecimento de carpelos fechados. reduziu os riscos de depressão endogâmica nas populações pouco densas e forçou um aumento da heterozigotia (vd. um estilete e um estigma. A proteção das sementes facilitou a produção de sementes mais pequenas. Nos grupos mais avançados. e toda a sutura carpelar funciona como uma superfície estigmática. defendiam estes autores. (ii) um número moderado de estames. Sem esgotar o tema.. 2011). inteiros. com a colocação de um significativo número de taxa na base da árvore. entre os quais se destacam pela diversidade em espécies as magnoliidas. Crane. Tendências evolutivas entre as plantas-‐com-‐flor As tendências evolutivas nas várias linhagens de angiospérmicas são muito díspares. de corola simpétala. solitárias. et al. zigomórfico Estames numerosos.72 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente angiospérmicas. por vários grupos angiospérmicas atuais baseadas na publicação de (Friis. A fisionomia das primeiras angiospérmicas também não está clarificada.2. 1979) postularam que as flores mais primitivas eram polinizadas por coleópteros enquanto atabalhoadamente percorriam a flor e consumiam pólen. concrescentes Carpelos numerosos. com um tegumento Folículo → Cápsula.1. Sementes grandes. Quadro 20. Relações filogenéticas entre as plantas-‐com-‐flor. atualmente na sua terceira versão (APG III. culminou numa revolução da taxonomia das plantas-‐com-‐flor. no Quadro 20 reuniram-‐se algumas tendências evolutivas partilhadas. Stebbins. Atualmente os dípteros (moscas) são os mais sérios candidatos a polinizadores da flor primitiva (Thien. instituída no sistema de classificação do Angiosperm Phylogeny Group (APG). A novidade mais surpreendente é a pulverização das dicotiledóneas em vários clados (grupos monofiléticos). e a título indicativo. livres → Poucos carpelos. de tépalas livres. unidos (sincarpia) Primórdios seminais numerosos. Early Flowers and Angiosperm Evolution. resultante da colaboração de uma vasta equipa internacional de taxonomistas moleculares. Cronquist. drupa. etc. de forma (evolutivamente) independente. A estrutura desta árvore difere assinalavelmente das relações filogenéticas estabelecidas por botânicos evolucionistas clássicos como G. baga. actinomórfico → Perianto duplo (com cálice e corola).L. peninérveos e alternos. acíclicas ou hemicíclicas → Flores pequenas. organizadas em inflorescências e cíclicas Perianto indiferenciado. . Faegri e van der Pijl (Faegri & van der Pijl. embrião pequeno e endosperma abundante → Sementes pequenas. O aprofundamento deste cladograma. Os grandes grupos de angiospérmicas A Figura 30 faz um ponto da situação das relações filogenéticas entre os principais grupos atuais de plantas-‐com-‐ flor. de nervação fechada. Takhtajan ou A. com base em estudos de filogenia molecular.4. Geralmente admite-‐se que as primeiras plantas com flor tinham nomofilos simples. embrião mais desenvolvido e pouco endosperma Números cromossomáticos baixos → Elevado número de cromossomas 3. Tendências evolutivas entre as plantas-‐com-‐flor atuais Características primitivas (plesiomórficas) mais frequentes em taxa basais atuais Características avançadas (apomórficas ) mais frequentes em taxa derivados Clima tropical → Temperado Arbóreas → Trepadeiras ou herbáceas Traqueídos → Traqueídos + vasos lenhosos Perenes → Anuais ou bienais Perenifolia → Caducifolia Folhas simples → Folhas compostas Flores grandes. & Pedersen. livres → Poucos estames. 2009). De facto. 2009). este tipo de nomofilo é o mais comum nos grupos mais antigos de plantas com flor (angiospérmicas basais e magnoliidas). com dois tegumentos → Poucos primórdios seminais. A. 2001+. Filogenia das angiospérmicas (adaptado de Stevens. 2001+). versão de Março de 2013) . Relações filogenéticas dos mais importantes clados de angiospérmicas (adaptado de Stevens.73 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Figura 30. Figura 31. Os triângulos assinalam os clados mais diversos. Orchidaceae) 2 cotilédones (raramente 1. as anonáceas «família da anoneira» e as piperáceas «família da pimenta». dificultam a sua divulgação e a produção de textos atualizados. em grupos de 5. Se por um lado estes resultados são cientificamente excitantes. são publicadas novas contribuições que somadas se traduzem numa visão cada vez clara das relações evolutivas entre as plantas-‐ com-‐flor atuais. quando de inserção cíclica. Os nenúfares (Nymphaeaceae) e uma outra pequena família de plantas aquáticas – fam. as miristicáceas «família da noz-‐moscada». expressos no Quadro 21. Antes de 1990 as plantas-‐com-‐flor eram cindidas em dois grupos – monocotiledóneas e dicotiledóneas.g. administrada pela França. localizada a NE da Austrália. Constituem um clado muito antigo. ao nível da ordem e categorias inferiores. As magnoliidas incluem famílias com alguma importância económica como as lauráceas «família do loureiro».e. do taxon atual localizado na base da árvore filogenética das angiospérmicas. ou o embrião indiferenciado) Folhas normalmente paralelinérveas Folhas normalmente peninérveas ou palminérveas Câmbio vascular ausente. então. por angiospérmicas basais – somam menos de 1% das plantas-‐com-‐flor. encerradas. um pequeno arbusto florestal da Nova-‐Caledónia. Em Portugal estão exclusivamente representadas pela família dos nenúfares (Nymphaeaceae). anterior às monocotiledóneas e às eudicotiledóneas.l. a ordem que inclui os catos (Cactaceae) e a importante família das Amaranthaceae. não estão. e. com o objetivo incorporar no sistema APG as novidades científicas entretanto publicadas. simplesmente. o Dr. normalmente intrafascicular (feixes vasculares abertos) Feixes vasculares distribuídos irregularmente ou formando 2 ou mais círculos concêntricos Feixes vasculares no caule em anel (colaterais) «exceto Piperaceae» Flores com verticilos normalmente trímeros Peças florais. Continuamente.74 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente A taxonomia e as relações filogenéticas no interior do grande clado das angiospérmicas. dicotiledóneas s. foi recentemente identificado. com menos frequência 4. todavia. Quadro 21. – segregados com base num leque variado de caracteres. por outro. Os métodos de filogenia molecular cedo demonstraram que as monocotiledóneas . i.3 ou 4. foram transferidos da base das eudicotiledóneas para a proximidade das asteridas. Estudos de cladística molecular e morfológica apontam para esse lugar a Amborella trichopoda (Amborellaceae). caracterizado por uma grande diversidade de alcaloides e por flores geralmente acíclicas ou trímeras (verticilos com 3 peças). As magnoliidas correspondem a menos de 5% das espécies atuais de angiospérmicas. Ainda recentemente. A Figura 31 contém a árvore filogenética das ordens de angiospérmicas disponibilizada em Março de 2013. raramente 3 (carpelos muitas vezes menos numerosos) Pólen com uma abertura Pólen tipicamente com três aberturas (poros ou fendas) ou tipos derivados Sistema radicular das plantas maduras de tipo fascicular adventício Sistema radicular nas plantas adultas primário. Peter Stevens mantém uma página web informada e atualizada sobre filogenia das plantas-‐com-‐semente. dominado por plantas lenhosas. uma ilha de média dimensão. Hydatellaceae – são. Felizmente. quando presente (plantas com crescimento secundário).e. Monocotiledóneas vrs. 1 cotilédone (por vezes embrião não diferenciado. – geralmente reconhecidos com a categoria de classe – Magnoliopsida e Liliopsida. os Caryophyllales. considerada a divergência mais importante da história das angiospérmicas e teria ocorrido muito próximo da base da grande árvore filogenética das plantas-‐com-‐flor.l. adventício ou de ambos os tipos As monocotiledóneas compreendem cerca de 20 % das angiospérmicas. outros dois fortes candidatos ao estatuto de grupo-‐irmão das restantes angiospérmicas atuais. O grupo mais basal de todas as angiospérmicas atuais. Monocotiledóneas Dicotiledóneas s. i. de modo algum. logo no início da sua história evolutiva. desde 2001. preferentemente tropicais. e a grande ritmo. Engrossamentos efetuados pelos “meristemas de engrossamento primário” e “meristemas de engrossamento secundário” Câmbio. As famílias basais das angiospérmicas – também conhecido por grado ANA ou. A dicotomia monocotiledóneas-‐dicotiledóneas era. 4. K-‐T) ou extinção C-‐Pg (ing. N. Evolução terciária das plantas-‐com-‐flor Extinções em massa. Soltis. A explicação das extinções em massa envolve causas tão variadas como o impacto de corpos celestes. ou tipos derivados (Soltis. Asaro. mas que a sua divergência se situava acima de alguns grupos atuais de plantas-‐com-‐flor. 3. As flores das rosidas são maioritariamente cíclicas. As eudicotiledóneas representam cerca de 75% das plantas-‐com-‐flor. As asteridas reúnem quase 80. apresentam flores simpétalas e primórdios seminais simplificados. 1982). conhecida na literatura como extinção C-‐T (ing. & Michel. Soltis. com mais pormenor. discutida anteriormente (vd.1. Pérmico (P)-‐Triássico (Tr). Ordovícico (O)-‐Silúrico (S).b.g. metabolismo ácido das crassuláceas e suculência (Soltis. concretamente das angiospérmicas basais e das magnoliidas. Consequentemente. A ordem dos Caryophyllales situa-‐se próximo da base do clado das asteridas.g. A fauna marinha é particularmente adequada para estudar as extinções em massa. A transição do cretácico-‐paleogénica (66 M. & Chase. de facto. Trássico-‐Jurássico arrefecimento da atmosfera (alterações climáticas). & Chase. Alvarez et al. Evolução das angiospérmicas no Paleogénico História da vida é ciclicamente interrompida por extinções em massa. no III volume deste livro.g. o conceito tradicional de dicotiledóneas faz destas um grupo parafilético (ao contrário das monocotiledóneas não incluem todos os descendentes de um ancestral comum). solos salinos e ambientes desérticos – com adaptações morfológicas e fisiológicas particulares. Alvarez. Cretácico (Kr)-‐Terciário (T) das grandes cinco extinções” entrou de tal maneira no imaginário científico que a atual crise da biodiversidade é citada como a sexta.4. 2005).000 espécies. A capacidade de estabelecer simbioses com bactérias fixadoras de azoto é quase exclusiva (excepto Gunneraceae) das famílias deste clado. um grupo monofilético. e a extinção cretácico-‐paleogénica (C-‐Pg). os cinco fundos oceânicos (o metano tem um efeito de estufa 25 vezes grandes eventos de extinção nas trasições 1. tendo proposto uma origem alóctone para esta descontinuidade: o impacto de um corpo celeste de grande 43 Alguns autores traduzem core eudicots por eudicotiledóneas nucleares. A maioria das eudicotiledóneas enquadra-‐se nas eudicotiledóneas superiores (ing. e. As plantas-‐com-‐semente sem flor). Endress. (Alvarez. e o aquecimento ou (C). Endress. Nas eudicotiledóneas sobressaem pela diversidade morfológica e número de espécies dois clados: rosidas e asteridas.) coincide uma das cinco grandes extinções de vida marinha.75 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente eram. 3. Dois destes eventos têm uma forte tradução na flora terrestre: a extinção permo-‐triássica (P-‐Tr). heteroclamídeas e dialipétalas. 1982) reconheceram cinco grandes eventos de extinção em massa (Figura 32). Curva de Sepkoski: variação da vulcânicas (e.a. trapps siberianos [Federação Russa] na diversidade à escala da família no registo fóssil de extinção P-‐Tr e os trapps do Decão [Índia] na extinção C-‐Pg). 2. A Figura 31 mostra um grupo de pequenas ordens morfologicamente muito diversas – eudicotiledóneas basais – que incluem famílias de escassa importância económica e/ou ecológica.2. a extrusão catastrófica de lavas Figura 32. K-‐Pg). Devónico (D)-‐Câmbrico superior ao dióxido de carbono). Papaveraceae «família da papoila» e Buxaceae «família do 43 buxo». 1980) detetaram grandes concentrações e irídio na transição C-‐Pg. Partilham uma única apomorfia: a presença de grãos de pólen com três aberturas. um elemento raro na Terra. core eudicots). .g. 2005). e. a invertebrados marinhos em função do tempo libertação massiva de hidratos de metano armazenados nos geológico (Raup & Sepkoski. A “teoria e 5. A partir do estudo de fósseis marinhos Raup & Sepkoski (Raup & Sepkoski. A discussão das características dos principais clados das angiospérmicas é retomada. Nesta ordem são frequentes plantas adaptadas a ambientes extremos – e. no início do Eocénico.a. sob a copa dos bosques tropicais paleogénicos. As plantas-‐vasculares. Evolução das angiospérmicas no Neogénico As Poaceae diversificaram-‐se no final do Cretácico: os dinossauros comiam de gramíneas (Prasad. em regiões de clima tropical e só depois colonizaram áreas mais frias. libertou uma quantidade imensa de energia. sobretudo em condições de elevada radiação. conhecidos por períodos hipertérmicos paleogénicos superiores (ing. 1995). A fotossíntese C4 é particularmente frequente nas monocotiledóneas. ao nível da fauna terrestre. & Kocacinar. Early Palaeogene hyperthermal events) foram relacionados com injecções massivas e súbitas de metano da atmosfera provenientes de depósitos de marinhos de hitratos de metano (Gu. da destruição da parte aérea por exemplo pelo fogo. & Kocacinar. acelerado pela gravidade terrestre. no Oligocénico (Osborne & Beerling. México: o evento de Chicxulub. então. 2010). Paleocene–Eocene Thermal Maximum) florestas tropicais cobriam a Antártida. Sage.. Por causas fisiológicas que não cabe aqui desenvolver a fotossíntese C4 é vantajosa sob duas condições ambientais: baixas concentrações de CO2 e/ou elevadas temperaturas. conduziram à extinção dos dinossáurios (excepto Aves). e 50 M. Os efeitos desta sequência de eventos propagaram-‐se em cascata nos ecossistemas e.a. fogos florestais. & Lerbekmo. Entende-‐se por sucessão ecológica o processo de substituição de ecossistemas num espaço concreto. O clima quente e húmido é o óptimo climático das florestas tropicais húmidas. o maior maciço montanhoso do planeta. & Hickey. estádios sucessionais a partir de comunidades vegetais concretas. entre 6-‐8 M. as Anomochlooideae. as cinzas acumuladas projectadas na atmosfera velaram o sol e arrefeceram o planeta. As plantas C4 evoluíram. Estudos realizados na América do Norte mostram que se extinguiu 45% da flora terrestre.76 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente dimensão. & Chapman. 1999). i.) levantou os Himalaias. Sage. Numa fase inicial da catástrofe geraram-‐se gigantescos tsunamis. & Sahni. tremores de terras e erupções vulcânicas massivas. que desde a ruptura do grande continente de Pangea no Jurássico inferior. et al. foi a causa eficiente do desenvolvimento do metabolismo fotossintético tipo C4. A exposição dos vastos territórios soerguidos pela Orogenia Himalaiana à ação dos agentes da meteorização provocou uma acentuada descida do teor de CO2 na atmosfera terrestre na segunda metade do Eocénico-‐início do Oligocénico. 2001+). que ocupavam o sub-‐bosque dos bosques mistos de gimnospérmicas e angiospérmicas do Cretácico Superior (Sweet. Bhatnagar. À escala espacial a que se estudam os processos sucessionais. Strömberg. Evolução). ao longo do tempo. se manteve numa geográfica posição similar à de hoje. Braman. Como mais adiante se explicita. e que a diversidade específica vegetal só alcançou os níveis do final do Cretácico quando a temperatura terrestre voltou a subir no Paleoceno Final-‐Eocénico inferior (Wing. A meteorização química dos silicatos consome CO2 (vd. por . 2012). 2012). Durante milhões de anos as gramíneas viveram na sombra das grandes árvores angiospérmicas. definindo-‐se. de 25% da produção primária terrestres (Sage. Após um brutal e repentino aquecimento da atmosfera. no extremo sul do hemisfério austral. As gramíneas C4 representam 50% de todas as espécies de gramíneas e são responsáveis por ca.. Na década de 1990 a extinção C-‐Pg foi associada a queda de um meteorito ao largo do Iucatão. Alimohammadian. 2011). Dickens.a. ocorreu uma expansão global das plantas C4 que persistiu até ao presente. Colwell.e. espécies adaptadas à sombra e capazes de regenerar vegetativamente. assim. nas Américas Central e do Sul (Stevens. A colisão da Terra com um asteroide com cerca de 10 km de diâmetro. 50 M. 2011). 2005). as fronteiras dos ecossistemas são geralmente reconhecidas pela sua componente vegetal. 2006). Períodos abruptos de aquecimento global entre 57 M. criando uma oportunidade evolutiva para os mamíferos (Schulte & al. Os dados paleopalinológicos mostram um súbito e breve pico de ‘briófitas’ e de fetos. A fotossíntese C4 evoluiu de forma independente a partir de ancestrais mais de sessentas vezes C3 (Sage. Alroy. Durante o designado Máximo Térmico Paleocénico-‐Eocénico (ing. O início do Oligocénico é marcado pela descida da temperatura do globo e pela glaciação da Antártida eventos definitivamente correlacionados com a descida da concentração atmosférica de CO2 por Pagani et al. Supõe-‐se que o prolongado arrefecimento planetário que sucedeu evento de Chicxulub seja a causa maior da extinção em massa então ocorrida. A sucessão ecológica retomou o seu curso a partir das sementes e propágulos enterrados no solo. Hirasaki. (Pagani. A fome de carbono teve um fortíssimo impacto nas plantas vasculares.a. habitam ainda o sub-‐bosque de florestas tropicais. chuvas de rocha incandescente. As gramíneas mais primitivas. Na ausência de perturbações. A colisão da placa tectónica Indiana com a placa Euroasiática próximo do início do Eocénico (ca.. sobretudo nas Poaceae e nas Cyperaceae das pastagens tropicais. 3. Mendell. com uma estação fria amena e sem geadas. & Richter. o clima oscilou entre os frios glaciares e os calores tropicais. 1995) num artigo com o sugestivo títutlo Kill thy neighbour (port. o clima degradou-‐se no interior dos continentes. Erica sp. Johnson. persistentes. à semelhança das florestas. 1984). A produção de biomassa na estação húmida seguida de um longo período seco.pl. Uma vez mais as plantas condicionaram a evolução dos animais e ecossistemas do planeta. As gramíneas ardem com facilidade libertando grande quantidade de calor agredindo pelo fogo os seus competidores mais diretos: as plantas lenhosas. na ausência de perturbação cíclicas de alguma ordem as formações herbáceas dominadas por gramíneas – as pastagens – são incompatíveis com a floresta. o clímax é de natureza florestal. evolutionary arm race). No início da época Miocénica grande parte da Península Ibérica estava submetida a um macrobioclima de tipo tropical. A disponibilidade de sílica estimulou a evolução e aumento da importância das diatomáceas marítimas. ou numerosas Lamiaceae arbustivas). mostraram que a inflamabilidade pode evoluir em ambientes propensos ao fogo se aumentar a mortalidade dos competidores vizinhos e aumentar a fitness dos seus portadores. À escala geológica. lisas e brilhantes. manipularem a sucessão ecológica e construírem o seu habitat (Keeley & Rundel. Em condições naturais. por exemplo criando lugares seguros para a germinação de sementes e propágulos. promoveu os fogos florestais. largas. Paleo-‐história recente da flora de Portugal A estabilidade macroclimática é uma ilusão transmitida pela nossa curta esperança de vida. exceptuando as montanhas mais altas. 2008). O fogo e a estacionalidade climática fragilizou as florestas. Na Europa. dunas secundárias e lagos). Os fitólitos produzidos pelas gramíneas incrementaram o transporte de sílica amorfa pelos rios até ao mar. Uma parte significativa da terra emersa atual tem potencialidade florestal. passando pelos macroclimas de tipo temperado e mediterrânico (Suc. e a emergência dos macacos antropoides. A instabilidade climática. nos terrenos que hoje constituem o território português. as gramíneas responderam à ameaça acumulando silício nas folhas em corpos siliciosos (fitólitos).5. 2002). ca. As gramíneas aproveitaram esta oportunidade evolutiva para. em particular pelas alterações climáticas que culminaram na transição do macrobioclima tropical para o mediterrânico no Pliocénico e pelos numerosos ciclos glaciar-‐interglaciar pleistocénicos. A imolação pelo fogo pode ser adaptativa. florestas dominadas por espécies de folhas grandes. 8 M. Cistus sp. com um aumento significativo da sazonalidade climática. com chuvas bem distribuídas ao longo do ano e. As adaptações forçam a evolução de contra-‐adaptações em grupos de seres vivos em competição.e... mediterraneidade) e da temperatura iniciados no Miocénico Médio provocaram uma regressão da área de distribuição ou a extinção das espécies características dos bosques tropicais e subtropicais . e alguns habitats especiais (e. rijas. Mata o teu vizinho). o progressivo arrefecimento e continentalização do clima e a crescente sazonalidade da precipitação (i. à exceção das montanhas. assistida por abundantes ignições naturais (relâmpagos). i. A expansão das gramíneas possibilitou a evolução de grandes mamíferos herbívoros. No Miocénico médio o planeta era ainda densamente arborizado (Williams. A produtividade dos ecossistemas marinhos aumentou com a radiação deste importante grupo de microorganismos fototróficos. os mamíferos herbívoros desenvolveram novos tipos de dentição mais resistentes ao desgaste. Murphy.g.77 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente tempestades ou pela herbivoria. A partir do Miocénico Médio a flora e a vegetação ibéricas foram profundamente marcadas por uma sucessão de convulsões geológicas e macroclimáticas.e. desde tempos geológicos remotos. Cobriam a Península Ibérica amplas florestas tropicais e subtropicais. Por sua vez o recuo das florestas e a formação de grandes áreas de pastagem de gramíneas C4 no final do Miocénico tiveram um grande impacto nas zoocenoses de grandes herbívoros. a sucessão ecológica progride até ao estádio de maior complexidade estrutural – o clímax – cuja fisionomia em larga medida depende das condições macroclimáticas. No final do Miocénico. Court. O Miocénico marca a evolução das grandes linhagens de mamíferos herbívoros que hoje povoam o planeta. Instalada uma corrida às armas evolutiva (ing. por norma inteiras (não recortadas). 2005).a. As florestas são muito seletivas para a flora: eliminam as espécies heliófilas não epífitas. Bond & Migdley (Bond & Midgley. as áreas de clima polar ou mediterrânico xérico. sem pelos.g.pl. entre as quais sobressaiam pela sua abundância as florestas laurifólias (laurissilva). conforme o demonstram muitas espécies arbustivas mediterrânicas (e. o baixo nível de CO2 atmosférico e a elevadas temperaturas que prevaleceram no Miocénico promoveu as gramíneas C4 em detrimento das C3 (Ehleringer & Cerling. Betula «bidoeiros». concentrando-‐ se. Kadereit. todos eles já extintos. Avicennia (fam. Malvaceae). comunidades de Thymus «tomilhos». Salix «salgueiros». a glaciação de Würm. Fraxinus «freixos» e Ulmus «ulmeiros» (Sitte.a. Próximo da transição entre o Terciário e o Quaternário.) antes do presente (BP.) (Allen. comunidades de plantas dominadas por gramíneas estavam a expandir-‐se e a apoderar-‐se dos espaços primitivamente habitados pelos bosques t ropicais e subtropicais. Nos bosques caducifólios temperados atuais a maior parte das espécies arbóreas descendem dos elementos arctoterciários.g. & Kadereit.g. muitas outras espécies de famílias tropicais (e. e. & Watts. Alnus «amieiros». Nyssaceae ou Rhoipteleaceae). Pistacia e Rhamnus. carvalho-‐roble. ocorrida ainda durante o Pleistocénico. extensivamente pastados por grandes herbívoros. é no final do Terciário que se diversificam os géneros tipicamente mediterrânicos da flora atual da Bacia Mediterrânica. Clethraceae). de que são exemplos os bosques de folha persistente (perenifólios) de Quercus.g. A flora e a vegetação dos arquipélagos dos Açores e da Madeira evoluíram livre da pressão e seleção liderada pela herbivoria. uma vegetação dominante de tipo estepe com árvores dispersas foi tomada por densos bosques de árvores do género Quercus (e. em conjugação 44 Anos calibrados (cal. Cistus «estevas». Apollonias «barbujano». A expansão da floresta foi facilitada pelo recuo para norte de muitos animais de manada e pela extinção antrópica de várias espécies de grandes mamíferos. Andes. Olea «azambujeiros». os estevais e. Weiller. A flora atual das ilhas Macaronésicas. terminou há cerca de 10 000 anos (ca. 1996). pela primeira vez. As plantas dos prados atuais descendem diretamente das espécies de plantas que especiaram sob a pressão de pastoreio dos grandes herbívoros terciários e pleistocénicos. É também neste período que se organizam. A generalização do regime climático mediterrânico no Pliocénico (ca. As espécies mais exigentes em temperatura e água foram as primeiras a extinguir-‐se. largas e lustrosas. azinheira.700 cal. tem uma origem euroasiática. Populus «choupos». tanto do hemisfério norte como do hemisfério sul. e os géneros Sideroxylon «marmulano» (fam. e não há argumentos em contrário na Península Ibérica.g. como é o caso das fagáceas de folha larga e caduca dos géneros Quercus «carvalhos». Corylus «aveleiras». e. Sapotaceae) ou de famílias hoje refugiadas em áreas temperadas não europeias com Invernos benignos (e. Portanto. 44 11. é o repositório mais completo da flora tropical e subtropical europeia e norte-‐africana do Miocénico. Num curto espaço de tempo o clima aqueceu e.a. Seguiram-‐se. . Lavandula «rosmaninhos» e Rosmarinus «alecrim». Admite-‐se que ocupavam trechos significativos da Península Ibérica.6 M. Laurus «loureiro» e Persea «vinhático». savanas ou mosaicos de prado e floresta. dos géneros arbóreos Acer «bordos».g.2 M. Sapotaceae). A última glaciação. existem evidências muito fortes na Europa central. de que os mamíferos herbívoros.-‐11. A flora arctoterciária. os bosques tropicais e subtropicais que tinham dominado a vegetação terrestre da Península Ibérica durante mais de 50 M.g. Alguns dos géneros mais frequentes de árvores dos atuais bosques sempreverdes dos arquipélagos dos Açores e da Madeira estavam certamente presentes nos bosques ibéricos do final do Terciário – e. as comunidades de plantas aromáticas de calcários. no Pliocénico ou na primeira metade do Pleistocénico. os tipos de comunidades vegetais mais importantes da vegetação mediterrânica atual da Península Ibérica. Taxodiaceae. 3. BP ). pelo menos na metade Norte do país. ainda no Miocénico Médio – e.78 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente terciários. provavelmente. os matos-‐altos com espécies de folhas rijas. possivelmente. Huntley.g. a paisagem vegetal ibérica era muito mais diversa no Pliocénico do que nas épocas geológicas precedentes. encontravam-‐se francamente empobrecidos. Oleaceae) ou Clethra «folhado» (fam. em áreas litorais e sublitorais de baixa latitude e altitude. etc. before present). Picconia «pau-‐branco» (fam. Este grupo de plantas migrou posteriormente para a região Neártica (territórios de macroclima temperado e mediterrânico da América do Norte) e daí para as regiões não tropicais do hemisfério sul (e. em particular a da ilha da Madeira.700 anos] a longos períodos glaciares secos sucederam-‐se curtos períodos interglaciares húmidos e amenos. Acanthaceae) e Bombacoideae (fam. Bresinsky. Todavia.g. os géneros de lauráceas Ocotea «til». 2003). Este facto explica a sensibilidade da flora autóctone insular à herbivoria e o poder invasivo da flora pratense sob o efeito da pastorícia. O arrefecimento do clima no Pliocénico promoveu a imigração de plantas adaptadas a climas temperados (elementos arctoterciários) de regiões próximas do polo norte. Fagus «faias» e Castanea «castanheiros». Porém. em grande parte da área de ocupação atual de pastagens nos arquipélagos dos Açores e da Madeira não existe uma única espécie indígena.) despoletou a formação de um grande número de novas espécies de plantas (radiação adaptativa). a partir de linhagens pré-‐existentes.a. Durante o Pleistocénico [2. sul da Argentina e do Chile e Nova Zelândia) (Takhtajan). muitas das quais adaptadas ao fogo. Além da vegetação lenhosa de cariz mediterrânico ou temperado. sobreiro. De facto. C. Oxford: Oxford University Press. Martin. New Phytologist . Little. Soc. Quaternary Sci. 105–121. (1995). Buzz pollination in angiosperms. J. Pendergast. Robert. Establishing a time-‐scale for plant evolution. 1296–1303. Extremely long-‐distance seed dispersal by an overfished Amazonian frugivore. 278. Referências Allen. Am. Baumann. F. (2000).. J. P. B . D. mantiveram um mosaico fluído (itinerante) de bosque e distintas comunidades herbáceas e arbustivas. 161. & R. Alvarez. 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