Psicologia Transpessoal - Livro Texto

March 17, 2018 | Author: EmBuscaDaVerdade | Category: Sigmund Freud, Behaviorism, Immanuel Kant, Phenomenology (Philosophy), Psychology & Cognitive Science


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Psicologia TranspessoalLivro Texto 2010 Capa e Diagramação: Cláudio Azevedo Arte-finalização da Capa: Revisão e Edição: Cláudio Azevedo e Marlos Alves R: Cláudio Azevedo Copyright © 2008 Impresso no Brasil / Printed in Brazil A994 Alves, Marlos ) ISBN: 85–60091–??–? 1. Vedānta. 2. Filosofia hindu. 3. Hinduísmo I. Título. CDU 294.527 Capa: Contato com os organizadores e pedidos por reembolso postal E-mail: [email protected] ou [email protected] Visite: http://www.editoraorion.com.br 2 Psicologia Transpessoal Livro Texto Alves, Marlos; Azevedo, Cláudio; Tavares, Fátima Organizadores 2010 3 Conselho Editorial Alexandre Simão de Freitas – (Programa de Pós-Graduação em Educação UFPE-BRA) David Lukoff – USA Edgard Carvalho (PUC-SP) Esdras Vanconcelos Guerreiro (USP - PUC) Geórgia Sibele Nogueira da Silva (DEPSI-UFRN-BRA) Harbans Lal Arora (Índia) Jean Yves Leloup – UNIPAZ (FRA) Jean-Claude Regnier - Université de Lyon - Université Lumière Lyon2 (FRA) José Policarpo Júnior – (Programa de Pós-Graduação em Educação UFPE-BRA) José Ramos Coelho (DEPFIL-UFRN-BRA) Nadja Maria Acioly-Régnier - Institut Universitaire de Formation Des Maitres (FRA) Stanislav Grof – (USA) 4 M. Paulo Coelho Castelo Branco Psicólogo (CRP-11/05321). dentre outras publicações científicas. Psicoterapeuta sob o referencial da Abordagem Centrada na Pessoa. Mestrando em Psicologia – UNIFOR. colaborador na “Liga Maria Villas-Bôas de Estudos em Abordagem Centrada na Pessoa”.br Ricardo Lincoln Laranjeira Barrocas. Professor da Graduação e da Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Ceará (UFC). da Psicoeducação (Salutogênese) e da Psicologia do Trabalho. Vice-diretor de ensino da FACEN e INAES. Integrante da equipe gestora do Projeto Social “O Outro Brasil que Vêm Aí: Comunidades em Transição para uma Sociedade Pós-Carbono”.D. Contato: pauloccb@terra. Formador da Abordagem Centrada na Pessoa. Centre for Urban Health Initiatives/University of Toronto – Programme des Futurs Leaders dans les Amériques 2009 (PFLA Canadá). Professor no curso de Psicologia das Faculdades Nordeste (FANOR). É autor dos livros "Matrix e a Administração Transpessoal". Colaborador na “Liga Maria Villas-Bôas de Estudos em Abordagem Centrada na Pessoa”. Académie Européenne D‟Informatisation e World Information Distributed University .Ed. Visiting Scholar. membro da “Nordic Pragmatism Network” e da “Red Iberoamericana de Centrada em las Personas”.com Julio Francisco Dantas de Rezende. membro do Círculo de Pesquisas em Lógica e Epistemologias das Psicologias da Universidade Federal do Ceará (CPLEP/UFC).D. Contato: yurisnobrega@yahoo. Dr.com Francisco Di Biase. Francisco Silva Cavalcante Junior.com. formador e supervisor vinculado à “Confraria de Estudos Avançados em Carl Rogers e na Abordagem Centrada na Pessoa (CearACP)”. sustentabilidade e psicologia. "Crônicas da Virtualidade" e "Transpersonal Management: Lessons from The Matrix trilogy". Psicólogo (CRP-11/0746). MS É presidente do Instituto de Inovação e Sustentabilidade.br 5 . Grand PhD. Sócio efetivo da “World Association for Person-Centered Approach and Experiential Psychotherapy” e da “Associação Paulista da Abordagem Centrada na Pessoa”. administrador. Mestre em Psicanálise pela Université de Paris VIII e Doutor em Psicologia pela Université de Paris XIII. mestre e doutorando em administração pela UFRN. Mestrando em Psicologia – UFC com bolsa pela CAPES. Editora Alinea). Coordenador do Círculo de Pesquisas sobre Lógica e Epistemologia das Psicologias (CPLEP/UFC). PhD and Full Professor. Atualmente prepara novos livros e realiza palestras sobre inovação.br ou pelo telefone: 84 9981-8160.juliorezende. com formação na Abordagem Centrada na Pessoa e no Método (Con)texto de Letramentos Múltiplos.com. Blog: www. no SPA/NAMI/UNIFOR). assessor da Secretaria de Estado da Administração e dos Recursos Humanos (SEARH). desenvolvendo trabalhos nas áreas da Psicoterapia. e Ph. Contato: andre_feitosa@msn. pela University of New Hampshire (EUA). com formação em Abordagem Centrada na Pessoa. professor da UERN e FACEX. Ph. Psicoterapeuta sob o referencial desta mesma abordagem.com. psicólogo. O contato com o professor Julio Rezende pode ser feito diretamente através do e-mail: [email protected]. idealizador da CearACP e do Projeto Florescer (Projeto Integrado de Ensino-Pesquisa-Extensão nas áreas da Clínica-Educacional-Organizacional. Contato: rbarrocas@uol. Sócio efetivo da “World Association for Person-Centered Approach and Experiential Psychotherapy” e da “Associação Paulista da Abordagem Centrada na Pessoa”. Professor adjunto no setor de Psicologia da Educação na Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará (UFC). Contato: [email protected]. Co-organizador do livro “Humanismo de Funcionamento Pleno” (2008. Grand PhD Neurocirurgião e pesquisador da consciência. Colaborador na “Liga Maria VillasBôas de Estudos em Abordagem Centrada na Pessoa”. De 1998 a 2009 foi professor titular do Mestrado em Psicologia da UNIFOR.Bélgica. coordenador da Rede Lusófona de Estudos da Felicidade (RELUS).br Yuri de Nóbrega Sales Psicólogo (CRP-11/05070).com. Professor Honorário da Albert Schweitzer International University Suiça. pesquisador associado à “Rede Lusófona de Estudos da Felicidade (RELUS)”. Integrante da equipe gestora do Projeto Social “O Outro Brasil que Vêm Aí: Comunidades em Transição para uma Sociedade Pós-Carbono”.AUTORES André Feitosa de Sousa Psicólogo (CRP-11/05064). Graduado em Ciências Sociais e em Psicologia. 6 . ................. 96 II ................................ Espiritualidade e os pioneiros do desenvolvimento humano ...................................................................................................................................................................... Tradições de Sabedoria do Oriente ..................................... 23 3............................................................................................................................................................................................................................ 13 APRESENTAÇÃO .................. 93 CONCEITOS EM PSICOLOGIA TRANSPESSOAL ........................ 63 TRANS-FORMAÇÕES HUMANISTAS: HÁ TERRAS PARA ALÉM DOS HORIZONTES HUMANOS? ............................................................................................ 93 Transdisciplinaridade ........................................................................................................................................................................................................................ 17 Matrizes Conceituais ........................... 62 REDIMENSIONANDO OS CONCEITOS E OS TERRITÓRIOS CONTEMPORÂNEOS ENTRE DUAS FORÇAS DA PSICOLOGIA ........................ 15 PARTE I .... 17 FUNDAMENTOS EM PSICOLOGIA TRANSPESSOAL .......................... 96 I .............................................................................................. 75 Método .......................................................................................................................................................................................................... 63 NO CENTRO E NAS FRONTEIRAS DO HUMANO E SUAS PSICOLOGIAS ................................................................. Espiritualidade: um olhar psicológico ............................................................. 11 INTRODUÇÃO................................................. 19 1................ 46 Histórico ............................................................... 36 4.................................. 92 PARTE II ...................................................................................................................................................... 103 7 .......................... 70 SOBRE UMA MESMA SEMENTE GERMINADA EM SOLOS DIVERSOS: A EXPERIÊNCIA DO “HUMANO” E DO “TRANSHUMANO”? .............................................................. 91 Pesquisas em Consciência ................................................................................................................................................................................................Sumário PREFÁCIO .......................................................................................................................................................................... 19 2.............................. 95 Unidade .......... Transcendência .............................................................................................................................................................................................................. 94 Espiritualidade ....................................................................... .............................................................................................................................................................................................................................................................. 147 Terapia de Memória Profunda ................................................. 152 Um Abraço Integral ................................................................................................III ............................................................................................................................................ 133 A Dinâmica Quântica Cerebral ...................................................... 128 O Modelo Holoinformacional da Consciência ................... 126 O Código Cósmico .................... 146 PARTE III .......................................................................................................................................... 109 V ......................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................... 117 VIII ................................................................................... 152 EXTENSÕES EM PSICOLOGIA TRANSPESSOAL ................................ Microtúbulos e Superradiância ................................................................................ 135 Os correlatos neurais da consciência ......................................................................................... 151 PARTE IV ........................................... 124 Consciência ............................................................................... 153 8 ............................................................ 129 O universo holográfico ........ 112 VI ............................................................................................................................................ 120 IX ............................................................................... 150 A Dinâmica Energética do Psiquismo ...................................................................................................................................................................................................................................................................................................... 147 PRÁTICAS CLÍNICAS EM PSICOLOGIA TRANSPESSOAL ........................................ 149 Morte e Renascimento Psicológico ................................................................................................. 148 Respiração Holotrópica ................................................................................................................................. 114 VII .................................. 108 IV ............................................................................................................................................................................ 125 Consciência Transpessoal ....... 134 Biofótons............................................................................................................................. 122 Referências:................................................................................ 127 O Reencontro da Ciência com a Consciência .................................... 122 O Ser Quântico .................................... 138 Vida e Morte ............... . 172 Transcendência: um segundo objeto da psicologia transpessoal .................................................................... 180 A consciência dos arquétipos no contexto organizacional .............................................................................................. 180 Motivação: a alma da organização ........................................................................................................ 166 Psiquiatria Transpessoal .......................... 169 Abordagem Organizacional Transpessoal ........................................ 167 Teorias Sistêmicas em Família (Constelações familiares) ..................................................................... 168 Psicologia Social Transpessoal ...... 170 A psicologia transpessoal: uma base para um novo modelo gerencial ...................... 183 Integração com a totalidade e o desenvolvimento da responsabilidade universal e a sustentabilidade........... 195 APÊNDICE .................................................................................................. 170 Introdução .............................Modelo de desenvolvimento da consciência ................................................................................................................................ 196 9 ................................................. 194 Cosmoeducação .. 159 Educação para a Paz .................. 170 Consciência: um primeiro objeto da psicologia transpessoal e uma possível aplicabilidade à administração ..................................................................................................................................................................................................... 153 Saúde nos quatro quadrantes do Kosmos ................................................................................................................................................................................................................. 186 Considerações finais ............................................................. 181 A espiritualidade no trabalho ................................................................................................... 175 Aspectos metodológicos ..................................................................... 178 A busca por uma suprema satisfação dos clientes ................................................................................................................................................................................................................................................................. 177 A prática da gestão transpessoal .................................................................. 192 Trabalho Transpessoal com Crianças ..................... 189 A Temporalidade no Existir Subjetivo ..................................................................... 181 Criando um espaço psicológico saudável ............................................................................................................................................................................................ 174 Desafios da gestão transpessoal ....................................................... 193 Trabalho com a Morte ...................................................................................................... ........................................CARTA AOS TERAPEUTAS ............................ 196 10 ....................... PREFÁCIO Roberto Crema 11 . 12 . INTRODUÇÃO Marlos Alves e Cláudio Azevedo 13 . 14 . APRESENTAÇÃO Márcia Tabone 15 . 16 . PARTE I FUNDAMENTOS EM PSICOLOGIA TRANSPESSOAL 17 . 18 . Além disso. o prefixo “trans” tem incorporado esta diversidade. assim como a palavra transcendência está carregada de múltiplos sentidos. incapaz de incluir os aspectos imanentes do ser. geralmente são as visões de senso comum ou tentativas de desqualificar a abordagem com não cientifica. as diferenças eram tão significativas que levaram inevitavelmente à conclusão de que uma área nova e de características próprias da pesquisa psicológica estava se manifestando.. Espiritualidade e Tradições de Sabedoria no Oriente 1. Era uma área de pesquisa “pessoal”. manifestando uma relação dialética permanente. 1978. O „principio da transcendência‟ envolve a natureza psicológica. A interpretação mais antiga dada ao conceito transcendência deriva da relação dos homens com a idéia de divindade. 1 O principio da transcendência “indicaria um impulso em direção ao despertar espiritual que perpassa a humanidade do ser. como podemos perceber na colocação de Sutich (apud WEIL. 29): Entretanto.Capítulo 1 Matrizes Conceituais Transcendência. 1957) pelo fato de enfatizar principalmente o indivíduo experienciador mais do que a raça humana como um todo. a própria pulsão de vida. a nova área diferia de maneira significativa do trans-humanismo (Huxley. requerendo uma explicitação que nos ajude a melhor definir em que sentido está sendo utilizado. 109) 19 . p. 2006.] a nova área recebesse o título de „Psicologia Transpessoal‟. em um sentido teológico. mas que ia além dos limites usuais da investigação científica.” (SALDANHA. pois de acordo com o seu uso poderá conduzir-nos a sentidos diversos. Transcendência Em seu sentido original o “trans” foi agregado ao pessoal na palavra “transpessoal” para situar uma ampla gama de pesquisas que indicavam a dimensão de transcendência humana ou o 1 “principio da transcendência” .. p. morte e para além delas. ampliada por Maslow e por Weil. As definições do transpessoal que usam este referencial de transcendência. Assim. Contudo. Por isso foi bastante natural que [. se considera o divino como inacessível às coisas terrenas. com implicações diretas para a Psicologia Transpessoal. pois seriam esferas totalmente distintas. descrita por Freud. Tal visão se opõe claramente as idéias dos principais fundadores da psicologia transpessoal. pois colocam o “trans” como um “além de” trancendental. Hegel combateu. e assim. contudo permanece irremediavelmente ligado ao ser par irmão. também. com a evolução e com a história. p. bem como nas múltiplas 20 . mas acessível pela capacidade intelectual em captar sua essência. O aspecto integrativo do transcendente/imanente do prefixo “trans” é apontado por Wilber (1996. Nesta concebe-se a possibilidade de um “entre-deux” nestes aspectos. logicamente. a possibilidade para emergência de novas dimensões do ser. de forma que este termo não se refere apenas ao “ir além”. O transcendente estaria fora de nós. mas. difundidos na idade média por São Tomás de Aquino. Assim se quisermos alcançar um status pós-metafísico será necessário percebermos que o trans não pode ser concebido como uma categoria que é dada eternamente – ele não é um arquétipo. O conceito de transcendência na transpessoal se aproxima mais do pensamento hegeliano. ao tornar-se MAIS PESSOA. nem imagens eidéticas atemporais. Assim. verdade e bondade. O trans. temos transcendência e imanência como fenômenos que se dão a perceber ao ser. põe-se como uma essência permanentemente fixa e imutável quer seja ela platônica. assumindo-se radicalmente toda a abertura e amplitude do Ser Humano. pois argumentava que é preciso ultrapassar a fronteira entre o conceitual e o experimental para sabermos ao certo onde este limite se encontra. num jogo dialógico que avança em complexidade até alcançar uma dimensão translógica. neste sentido. perdendo o trans a sua historicidade como um dos modos de interpretar a realidade. excluindo assim. as diversas divisões tomadas pelo senso comum como auto-existentes. O conceito de transpessoal que emerge desta definição permanece preso na armadilha da idéia da essência imutável da metafísica. assim como. já se constitui uma transcendência o fato de deter o conhecimento. nem idéias eternas na mente de Deus. havendo assim uma complexa interconexão entre a capacidade de estar consciente de certo conceito e a habilidade de experimentar-se o universo das coisas. kantiana. O hiato entre transcendência e imanência. transcendental é tudo aquilo que nossa mente constitui a priori. em parte. O trans deve ser concebido como uma forma que se desenvolveu com o tempo. xviii) para marcar uma compreensão total do ser humano. independentemente de qualquer ação posterior. que definiam como transcendente tudo que se enquadra nas categorias de unidade. a imanência. hegeliana ou husserliana. são profundamente questionadas pela psicologia transpessoal. nem formas coletivas fora da história. este conceito kantiano. Para Hume e Kant. antes mesmo de qualquer experimentação.Outro sentido de transcendência se refere aos conceitos aristotélicos. uma tomada de posição deliberada. Esse espaço não era um abismo ou divisor: ele englobava a distinção entre homem e mundo e. conforme destacado por Varela.. no entanto. 3 Esta visão de um sujeito “inseparável do mundo”. p. um entre-deux. que. o nível emo- cional-sexual). foi desenvolvida e integrada pelas tradições não-duais do oriente. pois o mundo é preexistente à reflexão mas não separado de nós.. Para o filósofo francês Merleau-Ponty. Mais adiante. 27) destaca cinco dimensões básicas: “matéria. 21 . ainda. Sua abertura revela-se como um caminho do meio. concepções e lógica). sendo um golpe nas idéias do “trans” como um simples “além de” abstrato e teológico. o mundo que é dado ao sujeito. e o sujeito é inseparável do mundo. 3 Merleau-Ponty (1999. mas de um mundo que ele mesmo projeta. logo ela se manifesta como uma verdadeira criação. 21): 2 Wilber (2000. alma (a fonte da identidade supra-individual) e espírito (tanto o fundamento sem forma como a união não-dual de todos os outros níveis)”. p. Assim. minha reflexão é sobre um irrefletido. corpo (no sentido de corpos vivos e vitais. no prefácio de sua Fenomenologia da Percepção. ela não pode ignorar-se a si mesma como acontecimento. e cabe-lhe reconhecer aquém de suas próprias operações. a identificação desse círculo abriu um espaço entre o homem e o mundo. ele escreve: Comecei a refletir.2 interfaces humana . sem. Para psicologia transpessoal essa forma de refletir marca radicalmente a virada do pensamento fenomenológico como uma busca de retorno ao mundo existencial. p. bipartir a concepção de existência. como também é marco do referencial teórico da fenomenologia e da abordagem transpessoal. e defendem a tese de que a dualidade mente/corpo surgiu da ignorância sobre a natureza das relações do organismo humano com o ambiente. porque o sujeito é dado a si mesmo. mente (incluindo imaginação. no final dessa mesma obra. 576). (MERLEAU-PONTY. ela é o fundo sobre o qual todos os atos se destacam e ela é pressuposta por eles. 1999. neste trabalho denominamos de trancendente/imanente. entre o interno e o externo. Thompson e Rosch (2003. não havendo sustentação para a tese cartesiana que postula um corpo que é pura matéria extensa e nem se cogita uma mente que é mera substância pensante. A percepção não é uma ciência do mundo. mas de um sujeito que não é senão projeto do mundo. 5-6). p. provia a continuidade entre eles. ele é o meio natural e o campo de todos os meus pensamentos e de todas as minhas percepções explícitas. como uma mudança de estrutura da consciência. ele acrescenta: O mundo é inseparável do sujeito. não é nem mesmo um ato. O mundo não é um objeto do qual possuo comigo a lei de constituição. 2006. não saberá onde vai. incluindo nossa abertura para o mundo e desafiando a idéia de que a verdade “habita apenas o „homem interior‟. pois revela o inacabamento do humano. 4 Ibid. 1999. Nós simplesmente nos descobrimos com ele. como diz Husserl.. aproximando-se do pensamento de Merleau-Ponty (1999. e é também nossa estrutura que nos possibilita refletir sobre esse mundo. Tese (Doutorado em Educação). A psicologia transpessoal como um estilo de pensamento que revela o “mistério” do inacabamento do humano. é como um pensamento aberto à interrogação permanente e que trabalha para não se fechar nos dogmatismos e absolutismos. O trans “mais pessoal” trata a transcendência como a possibilidade de Ser expressa no mundo. Vimos a refletir sobre esse mundo à medida que crescemos e vivemos. 22 . sua impossibilidade de fechar-se. Nós refletimos sobre um mundo que não é feito. SP: [s/n]. que se caracteriza a psicologia transpessoal. desafiando-nos a percebermos este mundo vivido como solo primeiro dos meus sentidos. ou antes não há homem interior.[. e. Didática transpessoal: perspectivas inovadoras para uma educação integral. na medida em que permanecer fiel à sua intenção. Pós-graduação em Educação. ela será.] as mentes despertam em um mundo. V. nós nos encontramos em um círculo: estamos em um mundo que parece que já existia antes da reflexão ter-se iniciado. Então. Fenomenologia da percepção.. M. p. Não projetamos nosso mundo. ela se desdobrará então indefinidamente.20) quando afirma: Será preciso que a fenomenologia dirija a si mesma a interrogação que dirige a todos os conhecimentos. cit. ao refletirmos. SALDANHA. sendo a transcendência reveladora de um projeto de formação humana que não cessa de ampliar. um diálogo ou uma meditação infinita. São Paulo: Martins Fontes. mas esse mundo não é separado de nós. loc. P. O inacabamento da fenomenologia e o seu andar incoativo não são signo de um fracasso. mas que conserva sua abertura. assume a sua própria incapacidade de dizer tudo o que há para ser dito.. eles eram inevitáveis porque a fenomenologia tem como tarefa revelar o mistério do mundo e o mistério da razão. mas encontrado. seu “ir além”. Referências bibliográficas MERLEAU-PONTY. o homem está 4 no mundo e é no mundo que ele se conhece” . Assim. nós despertamos tanto para nós mesmos quanto para o mundo que habitamos. A transcendência é posta como um convite permanente para olharmos de maneira interdependente o aqui-e-agora do mundo vivido. Campinas. F. therapy. havendo um aumento de mais de 600% em 30 anos. dança. foram identificados 1. BATTISTA. 1996. ROSCH. spirit.3 milhões de pesquisas e artigos acadêmicos de 49 países em 27 idiomas). místico ou mítico. em seu trabalho sobre “Os estágios da fé". usando as palavras-chave “religion”. Textbook of transpersonal psychiatry and psychology. no campo psicológico. marcada por textos. 2003. B. profecias. 1902). In: SCOTTON. rituais e símbolos delineados para facilitar a proximidade com o sagrado e o transcendente e espiritualidade como a busca pessoal por respostas compreensíveis para questões existenciais sobre a vida. Todavia. sendo a forma como a pessoa ou o grupo responde ao valor transcendente. seu significado e a relação com o sagrado ou transcendente. WILBER. tradições orais. 2. “religious beliefs” e “spirituality”. J.(2001) definem religião como um sistema organizado de crenças. Espiritualidade: um olhar psicológico A resistência a introdução da dimensão espiritual no campo acadêmico da psicologia devese. e portando descartada. E. As pesquisas na área da espiritualidade e psicologia ampliaram-se nos últimos anos.. R. New York: BasicBooks. por exemplo. 2000. Vozes. CHINEN. 5-6) destaca que: De fato.113 artigos. mitos. narrativas. sendo a “espiritualidade” humana incluída nesta categoria. escrituras. K.. 1978 VARELA. Koenig et al. obtive 6. em parte. símbolos visuais. “religiosity”. credos. A.. A “era das trevas” medieval acionou um intenso mecanismo de resistência a tudo que pudesse relacionarse com o religioso. Enquanto a fé (espiritualidade) é mais profunda e pessoal. podendo ou não estar atrelada a rituais religiosos ou a uma comunidade. p. Foreword. B. arquitetura. J. Petrópolis: Ed. relatos de revelações. revela algumas tendências interessantes. tem sido melhor estabelecidas. coloca a religião como uma “tradição cumulativa”. psychology. Seguindo esta linha de raciocínio. teologias. uma pesquisa on-line na PsycINFO (uma base de dados que contém 2. Quando restringi os anos da busca de 1971 a 1975. ao ranço adquirido. Koenig (2007. parece ocorrer um rápido incremento na pesquisa e discussão acadêmicas relacionadas à relação entre reli23 . ensinamentos éticos.. Assim. música. Fawler. Kohlberg (1992) e Fowler (1992) as diferenciações entre religião e espiritualidade. A medida da consciência cósmica. mas ao repetir a pesquisa restringindo-a aos anos entre 2001 e 2005. Boston: Shambhala Publications. ______. ritos. contra a religião desde o iluminismo. P. Integral psychology: consciousness.437 artigos. E. leis.W. São Paulo: Artes Médicas. THOMPSON. (Eds). práticas. liturgias. em nossa cultura. Mente incorporada. contribuindo para a superação deste complexo de exclusão.WEIL. desde os trabalhos pioneiros de James (1890. da minha identificação com eles. não causa surpresa que haja interesse na ligação entre envolvimento religioso e saúde mental. [. espiritualidade e saúde de brasileiros. Posso viver nas demais dimensões sem ser comprometido com nenhum aspecto delas.. 20 envolveram artigos sobre religião. A idéia da dimensão espiritual como um dos aspectos constitutivos do 5 humano está presente na forma da “Grande Cadeia do Ser” desde as culturas xamânicas (TRUNGPA. emocional. Entro na dimensão espiritual no momento em que me identifico com algo. não alcançou ainda a dimensão espiritual.gião..] a dimensão espiritual. Trata-se de uma identificação na totalidade. concepções e lógica). esta última alvo da nossa reflexão.437 artigos sobre religião/espiritualidade publicados entre 2001 e 2005. Um saber que não se expressa na minha vida prática. incluindo necessariamente um agir correspondente. e de fato eles só existem na medida em que me comprometo com eles. Estas dimensões são a dimensão física. mas que contém algumas características como as da revelação como intervenção direta de Deus e de um tipo de organização social que dessa forma são estranhas ou não necessárias à dimensão espiritual. o nível emocional-sexual). corpo (no sentido de corpos vivos e vitais. mas onipresentes na nossa vida como a liberdade e a crença no sentido da vida como elementos da dimensão espiritual. Refletindo sobre as idéias centrais da “Grande Cadeia do Ser”. Seis desses 20 artigos relatavam resultados de estudos quantitativos e quatro dessas pesquisas eram focadas em saúde mental. 27). Não se trata na dimensão espiritual de uma identificação somente ao nível do pensamento e do discurso. por exemplo. p. Podemos incluir na dimensão espiritual todos os princípios éticos e filosóficos que precisam. 24 . e definida como. Uma convicção com que 5 Wilber (2000. Podemos nos aproximar à dimensão espiritual identificando uma insuficiência das outras dimensões em relação ao homem nas suas possibilidades humanas. Identificamos. para se tornarem verdadeiros. destaca que a “Grande Cadeia do Ser” reflete a espinha dorsal da filosofia perene e apresenta uma síntese de concordância quase unânime e intercultural quanto às dimensões gerais básicas do ser. Dos 6. mental e espiritual. 15-16) destaca cinco dimensões básicas do humano. alma (a fonte da identidade supra-individual) e espírito (tanto o fundamento sem forma como a união não-dual de todos os outros níveis)”. sintetizando e atualizando os conhecimentos produzidos nesta área. fenômenos humanos. 1992) até o seu ápice com a cultura Grega (Plotino). freqüentemente pouco refletidos. em que eu sinto que esse se torna apelo incondicional para mim. que em parte pode incluir a espiritual. Não se confunde essa dimensão com a religiosa. mente (incluindo imaginação. spiritualidade e saúde mental. mas foi praticamente excluída com o advento do cientificismo da modernidade. assim expressas: “matéria. seja ela pública ou particular. p. Dado que religião é importante para a maioria dos brasileiros e outros sul-americanos. Röhr (2006. nem imagens eidéticas atemporais. As certezas sobre a própria identidade não são de natureza racional.] teriam de ser concebidos como formas que se desenvolveram com o tempo. Utilizaremos a idéia de “forças” (MASLOW.não me identifico por inteiro serve para camuflar lados de mim que não consigo ou não quero enxergar. Por isso chamo essa dimensão também de intuitivo-espiritual. e leva fatalmente a desequilíbrios internos e externos. Em uma visão fenomenológica essas cinco dimensões apresentadas por Röhr. A espiritualidade nos domínios do saber psicológico Se retornarmos brevemente a história do movimento das abordagens terapêuticas em psicologia. mas sim planos de significação ou formas de unidade. mas como três planos de significações ou três formas de unidades” (MERLEAU-PONTY. perceberemos como a dimensão espiritual foi foco da atenção dos pesquisadores das quatro principais forças do movimento “psi”. nem que fosse operando por contra-ponto. vida. nas quais “matéria. [. mas intuitiva. mas em parte estruturas de consciência humana. Essas estruturas de consciência “não podem ser concebidas como as que são dadas eternamente – elas não são arquétipos. p. com a evolução e com a história” (WILBER. 1942. nem formas coletivas fora da história. p. eles envolverão alguma versão tanto da exigência da modernidade por indícios objetivos quanto da exigência da pós-modernidade por embasamento intersubjetivo” (WILBER. abre-se a possibilidade para emergência de novas dimensões no futuro. 2006.. No mínimo. não constituem realidades ontológicas distintas e separadas. espírito não poderiam ser definidos como três ordens de realidades ou três espécies de ser. hegelianas ou husserlianas. Assim. 25 . nem idéias eternas na mente de Deus. 2006. tais como:  compreensão de que essas dimensões não são estruturas preexistentes. 14).  “os métodos de verificação de existência dessas estruturas de consciência não mais envolvem a mera afirmação de sua existência apenas porque a tradição assim o quer. 1962) para situar as abordagens terapêuticas e suas reflexões sobre espiritualidade. Essas dimensões ou estruturas básicas são percebidas como hólons potenciais e não como essências permanentemente fixas e imutáveis quer sejam elas platônicas. 292). 293). transcendem a cultura). p.. Wilber (2006) destaca que essa visão da “Grande Cadeia do Ser” é um dos modos de interpretar a realidade. nem baseiam sua existência apenas na introspecção ou na meditação (ou outras asserções e alegações que. supostamente. kantianas. contudo para que alcance um status pós-metafísico é necessário realizar algumas revisões e acréscimos. O trabalho de Skinner foi considerado um avanço em relação ao behaviorismo de Watson. que focava-se exclusivamente no condicionamento e alteração de comportamentos indesejáveis. Pierre Weil em seu livro “Mística e ciência” já antevia esta aproximação. mas dá maior enfoque para mudar pensamentos prejudiciais. considerado o pai desta abordagem. que ampliou o leque de técnicas já desenvolvidas nos movimentos anteriores. ao contrário do movimento anterior. 1991.  O segundo movimento foi encampado pela Psicologia Cognitivo-Comportamental. representada pela Análise Experimental do Comportamento de B. F.Primeira Força – Behaviorismo A primeira grande força do movimento psicológico foi o Behaviorismo que se organizou nos EUA a partir do início do século XX e conjugou várias tradições filosóficas e científicas que se opunham a qualquer idéia de subjetividade ou interioridade. Na década de setenta.  O terceiro movimento. No trabalho de Steven Haynes temos uma aproximação da primeira força com a espiritualidade através do uso da meditação. por atender ao ideal de ciência positivista e mecanicista da época. um psicólogo da Universidade de Nevada em Reno. sendo destaque a Psicologia Cognitiva de Aaron Beck. sendo destaque o uso da meditação da plena atenção do Budismo (Mindfulness) como prática terapêutica. que se apoiando no positivismo e no pragmatismo. não sendo dado nenhum interesse a significados ou simbolos. que mantêm o foco em alterar comportamentos indesejáveis. Skinner. pois a partir do estudo do controle de funções orgânicas involuntárias. contudo permanece fiel ao ideal de que o comportamento observável deve ser o objeto de estudo da psicologia. pondo o comportamento do organismo como um todo como objeto de estudo (FIGUEIREDO. quando sugere que estudos na área do “behaviorismo” poderiam trazer grandes contribuições para o desenvolvimento da psicologia transpessoal. Nesta força merece destaque o “Behaviorismo Metodológico” de Watson. atacou a introspecção e tudo no humano que sugerisse uma “vida interior”. Outra grande influencia neste movimento foi “bahaviorismo radical” de Skinner que dominou durante muitos anos o cenário do mundo psicológico. 82). que considerava que pensamentos e emoções não afetavam os comportamentos externos. por não negar a existência dos estados internos. representada pela Terapia de Compromisso pela Aceitação (ACT) de Steven Hayes. Poderíamos dividir o behaviorismo em três grandes movimentos:  O primeiro foi a Psicologia Comportamental clássica. p. mas as variáveis que afetam o comportamento. tais como circulação sangüínea e ondas 26 . sendo seu trabalho referência nos estudos nesta área. meio circenses) liberava. No meio transpessoal.ideólogo.. Ele escreverá em “O mal-estar na cultura”: 6 7 27 Dessensibilização e Reprocessamento Através de Movimentos Oculares Consciência cósmica ou mais modernamente consciência transpessoal. Trata-se da sensação simples e direta do Eterno (. Tart (1972. pacifista. oferecendo assim uma teoria acerca do inconsciente e sua dinâmica. em palestra em 2008 sobre “A essência do EMDR” destaca o seu aspecto espiritual. denominado na época de “sentimento oceânico” . ego e superego). ganhador do Prêmio Nobel da Paz e autor de “Ghandi”como uma das possíveis causas para “o sentimento oceânico” ter ganho um espaço na teoria freudiana. na França. 2 . p.eletroencefalográficas. os trabalhos pioneiros de C. de todo credo. desenvolveu o “método catártico”. Esse sentimento é . . termo tomado de empréstimo dos místicos hindus. Depois de ler “O futuro de uma ilusão”. realizado em iogues ou meditantes treinados poderíamos ter acesso a uma melhor compreensão de fenômenos estudados na transpessoal. Tópica: consciente.. Romain Rolland censura Freud por não ter colocado na base do sentimento religioso aquilo que ele denomina “sentimento oceânico”. os pacientes de seus sintomas. com a a suas tópicas (1 . A. Apesar de ter o dualismo como marca fundante (spaltung) e não ter dado a atenção devida 7 ao fenômeno de consciência cósmica. Rodrigué (1995) destaca a relação entre Freud. Tópica: id. que juntamente com Breuer. coerente com as conjeturas de Maslow [. Freud veio a aperfeiçoá-lo. de todo livro santo. a partir de exaustivo estudo sobre histeria. a psicanálise resguardou para si um estatuto metapsicológico. “completamente independente de todo dogma. um dos principais representantes do EMDR. bem como do papel da sexualidade na etiologia das neuroses. O trabalho pioneiro de Fracine Shapiro (2007. por sugestão. pré-consciente.43) com EMDR6 faz uso regular da meditação e segundo sua autora “é. 2000) foram uma das primeiras tentativas bem sucedidas de estudo dos estados alterados de consciência usando o arsenal metodológico comportamental.. O método da “livre associação” permitiu a Freud a construção de sua metapsicologia. Jean-Martin Charcot.)”. nascendo daí “a livre associação”. inconsciente. “o animal humano” e seu “amigo oceânico”. de toda esperança de sobrevida pessoal etc. Este “rei” atraiu para a corte parisiense outro grande pesquisador.. David Grand. Freud. que com suas impressionantes demonstrações hipnóticas (meio clínicas. Freud não se sente à vontade nessa frente.]”. Segunda Força – Psicanálise e derivadas O mundo da Salpêtrière. Romain Rolland . de toda igreja constituída. rendia-se ao rei das histéricas. para ele. com certeza. pode-se ressaltar estudos de Freud (1963) sobre telepatia e parapsicologia. vol. referências acerca de fenômenos que se aproximem da espiritualidade. apud Scotton.. Apesar da interpretação limitada deste fenômeno como uma regressão à união fusional com a mãe ter influenciado uma imensa gama de pesquisas reducionistas. e Battista. Daremos um destaque especial a Carl Jung por ser considerado um de seus precursores. Se ele não experimentou o sentimento oceânico. Chinen. Não consigo descobrir em mim esse sentimento „oceânico‟.. Sigmund Freud Quando buscamos.em graus que influenciam sobretudo e .” (RODRIGUÉ. e a tradução para ela é “alma”.W. como se vê a seguir: Psique é uma palavra grega. com seus pensamentos voltados para a ciência e a medicina e o segundo o do “Velho Freud”.“As opiniões expressas por um amigo muito admirado (. apesar de em muitos momentos ter usado estes termos indistintamente..B. Além de seu interesse por temas como “alma”.86). bem como seu vínculo com a Sociedade de Estudos Psíquicos. (1996). mais maduro. Não é fácil lidar cientificamente com sentimentos” (. O tratamento psicológico pretende ter um significado muito maior. 28 . deparamo-nos com dois momentos: o primeiro é do “Jovem Freud”. assim. outorgar-lhe. Sendo relevante pontuar o conflito com Romain Rolland acerca do “sentimento oceânico”. o tratamento que tem origem na alma. interessado em problemas culturais e humanos amplamente concebidos. no Professor de Bergasse. a saber.03. a alma do homem.) causaram-me muita dificuldades. 162) Destacaremos a seguir alguns dos pioneiros do estudo do psiquismo e seus interesses por alguns tópicos que estão na meta de pesquisa da Psicologia Transpessoal. p. 1995.) Podemos considerar o primeiro capítulo de “o mal-estar” uma carta aberta a seu amigo francês. Uma pessoa poderia. pensar que o sentido disso é: tratamento dos fenômenos mórbidos da vida da alma.R. O tratamento psíquico significa. um estatuto metapsicológico”. e em assuntos relativos à alma. p. identifica três grandes contribuições do pensamento freudiano para a Psicologia Transpessoal:  a descrição do sentimento oceânico como a apoteose da experiência religiosa. M. “pode. o tratamento dos distúrbios psíquicos ou corporais . de modo imediato. Para Freud a alma se referia à psique como um todo. Epstein. Bettelheim (1982. Mas tal não é o sentido desse termo. B. A. pelo menos. escreveu que Freud por várias vezes falou sobre a alma.. instituição de pesquisa de temas parapsicológicos e “ocultos”. “o tratamento da alma”. J. pois. mas estas referências foram retiradas da tradução inglesa que se centralizou no “jovem Freud”.. Trata-se do retorno ao estado de fusão do ego primitivo do bebê a uma simbiose primordial com a mãe.. 162. p. para se encontrar com Jung e Bleuler em Munique. “o vizir da psicanálise. nas palavras de Rodrigué (1995. pois antecipa os interesses de pesquisadores futuros. expressando a ambivalência vivida no meio científico em relação a fenômenos que ainda não podiam ser explicados. o que segundo Rodrigué (1995. com a atenção flutuante. de quem se tornou discípulo fiel. uma forma de pensar. primeiramente com a hipnose. Ferenczi publicou em 1898. por isso buscamos entre antigos “mestres” referências a uma dimensão além do pessoal. em 1873. p. sua genialidade não passou despercebida para Freud. Nesta busca deparamo-nos com Ferenczi.Freud oferece-lhe um estatuto metapsicológico. na revista Gyógiászat. Motivo da expedição? Visitar Frau Arnold. no qual o autor 29 . XXXI).2) Segundo Rodrigué (1995). Suas contribuições à teoria psicanalítica são inúmeras. Sandor Ferenczi A psicanálise durante um longo período ocupou um lugar de destaque nas pesquisas voltadas ao psiquismo humano. talvez um dos poucos das primeiras gerações de grandes analistas a não romper com o professor. Freud partiu. A atenção flutuante se aproxima a estados descritos a partir dos treinamentos em meditação propostos pela transpessoal. vol. aqui registramos o Ferenczi “Astrólogo da Corte dos Psicanalistas”. sigilosamente. indicando uma imensa gama de possibilidades de investigação. o interlocutor de Freud em Siracusa”. ou grande gênio.não conseguiu lembrar o nome da astróloga”. grande figura paterna de sua vida. o Heráclito da psiquiatria húngura. assim apontado por Rodrigué (1995 vol 02. vamos supor. o ensaio intitulado “Espiritismo”. grifo nosso): Numa manhã de dezembro de 1910. vol 02. O lapso freudiano marca um tempo. vol. (Ibid. editada por Miksa Schacter. p.. depois com a associação livre e por fim.  a noção de além do princípio do prazer e a tentativa de rompimento do sofrimento neurótico a partir da sublimação. Ao mesmo tempo traz a marca antecipadora de todo visionário.  suas experiências com manejo da atenção.conta-nos Jones . não é pouco para alguém que não havia experimentado este fenômeno. p.162). uma renomada astróloga. o oitavo de uma família de onze filhos. O desencontro de Freud com fenômenos que fugiam ao paradigma dominante à sua época foi expresso no seu lapso de memória. Mas a visita não teve lugar porque Freud . Nascido em Budapeste.162.03. em qualquer caso. embora se mostrasse mais reticente. isto é. ele participou de uma reunião mediúnica organizada por um velho amigo espírita. “entusiasma-se com revelações da médium sobre a pessoa do professor”. haja vista envolver um dos focos de pesquisa da Psicologia Transpessoal que são os estados alterados de consciência. Otto Rank Ainda no meio psicanalítico.3) 30 .. na hora. é o mais importante progresso desde a descoberta da psicanálise”. Ibid. Ferenczi estava à frente de Jung”. devido a esta experiência. em geral. Ferenczi em carta revela ao professor: Admitindo que ela possui capacidades realmente fora do comum.narra um episódio que merece destaque. A maioria das declarações a respeito do senhor correspondem a processos mentais que eu realmente tive. contudo. mostra-se cauteloso: Quero assegurar-lhe que não há perigo de que eu sucumba ao ocultismo. Nessa procura pelo “espiritual”. O que não é pouco na boca de Freud” (RODRIGUÉ.. podemos contemplar a possibilidade de uma hiperestesia extática‟ . temos o “O Trauma de Nascimento” de Otto Rank. Ferenczi perguntou: “Em quem estou pensando neste momento?”.1995. entre as marcas do câncer de Freud. (.88.160) No que diz respeito à telepatia. transferência de pensamento na linguagem freudiana. p. p. uma reação de franca e quase total aceitação. surgido no ano de 1923.” (Ibid. Além da teoria da “indução psíquica”. A auto-análise profunda que realizei depois da sessão. A médium respondeu: “A pessoa na qual você está pensando. ainda obscura. Ferenczi procurou em Berlim a médium e clarividente famosa. Na sessão. Vejamo-lo: Certo dia. inicialmente.2. O discípulo. o assunto operava como contra-ponto. lembrou que tinha marcado uma consulta médica. levou-me à dita hipótese. ocupasse pouco espaço nos encontros das quartas-feiras do grupo freudiano. vol. vol. Afirma-se que Freud teria comentado com Ferenczi: Não sei se 66% ou 33% do livro é verdadeiro mas. acaba de levantar-se da cama para logo pedir um copo de água e cair morta”. Foi às pressas à casa do paciente onde pôde constatar a veracidade do que a médium dissera. Sra. p. Vol 02. Ferenczi. leitura de meus pensamentos.162) Embora seja pouco provável que conforme pontua Rodrigué “o tema do oculto e das ciências parapsicológicas. O escrito rankiano despertou no meio analítico. talvez elas se devam a uma espécie de “leitura de pensamento”. mas também a processos mentais que posso ter recalcado. De posse de uma carta de Freud. Seidler. 2000). Repito em minha própria linguagem: o trauma de nascimento deve estar associado a alguma pulsão que visa a felicidade. A citação de trechos desta circular depõe acerca da maturidade do “velho Freud”. mas o movimento psicanalítico talvez pela inércia inerente às instituições não lhe permitiu outra escolha senão o caminho da separação. uma contradição de nosso conhecimento assegurado. ao passo que os neuróticos poupam-se desse problemas ao tomar o caminho mais curto de fantasiar o retorno ao útero. O trauma do nascimento de Rank. 91). atingido pelo câncer.” As reações a esta circular foram exacerbadas. Naturalmente. elas alcançaram uma significação muito maior e revelam de imediato o fundo biológico do Complexo de Édipo. como é o caso das matrizes perinatais de Grof (1988. O clima estava alterado e Freud nesta altura da vida reflete: “Meus discípulos são mais ortodoxos do que eu” (ibid. então. Rank. que ela me deu muito o que pensar e que ainda não cheguei a ter um juízo significativo sobre ela.. 89-91) a seguir transcrita: [.então pela primeira vez temos uma derivação do instinto sexual normal em que se encaixa nossa concepção do mundo. Ernest Jones afirma que Freud foi “por demais tolerante”.o trauma de nascimento despertou uma verdadeira guerra no meio psicanalitico.. mas devido ao realce que Rank lhes deu. assim. Freud enviou uma circular aos membros do Comitê com o objetivo de aplacar os ânimos acirrados. uma revolução. vol. mas com um interessante acréscimo que nós e outros analistas temos de reconhecer.Além de considerar o nascimento como um dos eventos importantes na vida do indivíduo 8 em "A Interpretação dos Sonhos" (segunda edição). Freud assinalou que “o ato de nascimento é a primeira experiência de ansiedade e. Poder-se-ia arriscar a hipótese de que ele estivesse preste a continuar seu relacionamento com Rank.] incomparavelmente mais interessante. bem como abriu margens para que pesquisadores desenvolvessem uma teoria mais ampla a partir deste fato.3. compreendendo-se aí que o conceito de felicidade é usado. Há muito estamos familiarizados com fantasias relativas ao útero e reconhecemos sua importância. Como se pode conferir em citação de Rodrigué (1995. passa a ser a fonte e o protótipo do entendimento da ansiedade” . 8 Nota de rodapé da 2a Edição 31 . p. Deparamo-nos aqui não com uma revolta. bem mais poderia ser dito sobre isso e espero que os pensamentos despertados por Rank tornem-se objeto de muitas discussões frutíferas. Não hesito em dizer que considero essa obra altamente significativa. Se à concepção de Rank acrescentarmos a de Ferenczi . p. vai além da psciopatologia e mostra como os homens alteram o mundo externo a serviço desse instinto. sobretudo.a de que o homem pode ser representado por seus genitais . em sentido erótico. vol. que distanciou discípulo e mestre. 9 32 “Ancestral de Carl Gustav. Neste estado produziu um excelente ensaio e foi acusado de plágio pelo professor.de que o afeto da angustia é conseqüência do ato do nascimento e uma repetição da experiência original. somando um total de quatro situações de perda a serem iniciadas pela chamada “perda do nirvana intra-uterino”. Jung escreveu acerca do contato com um „ser invisível‟ que o teria ajudado a fazer o texto. descendente do mítico Sigmund Jung. e sofrendo por alguns dias. nasceu em 26 de julho de 1875 em Kesswil. isso significa que Freud admite o mérito de Rank quanto a travessia traumática do feto pelo canal estreito da bacia. alquimista de Mainz . talvez um dos primeiros a indicar uma amplitude da consciência para além dos limites impostos pela teoria psicanalítica dominante. conhecedor de Paracelso. em homenagem a Rank.102) Ora. ativo na primeira metade do século XVII. Para além dessa situação inicial de perigo. A família de Jung parece ter estimulado amplamente seu mundo imaginário.Assim “O Trauma do Nascimento”. a revisar o problema da angústia”. denomina de nível rankiano do processo terapêutico a fase da terapia na qual emergem conteúdos perinatais de forma mais condensada. (Ibid. bem como suas ricas contribuições ao desenvolvimento de uma psicologia do sagrado. levou Freud a revisar sua teoria referindo-se a posição de Rank “que originariamente era a minha . como por exemplo: sendo solicitado a produzir um ensaio. construindo a partir do mesmo um arcabouço teórico para dar conta das experiências que envolvem a gravidez e o nascimento. pequeno povoado à beira do lago Constanza. Jung ficou bastante sobrecitado (estado alterado de consciência). Carl Jung 9 Carl Gustav Jung. temos na seqüência (ameaça de): perda da simbiose materna. referindo-se ao evento como protótipo de angústia primeva para o indivíduo à medida que se constitui em inevitável situação de ameaça à vida e ao mesmo tempo um caminho único a ser percorrido. uma vez mais. Sem conseguir convencêlo. no cantão de Thurgovia. forçou-me. frente a outras fontes geradoras de traumas.3. as contribuições de Rank acerca do trauma de nascimento o colocam entre os precursores da Psicologia Transpessoal.” . põem este autor como um dos precursores da Psicologia Transpessoal. Desse modo. O interesse por fenômenos que estavam fora do âmbito de estudo da psiquiatria de sua época. Este autor elabora a teoria das matrizes perinatais e. Sua teoria indicanos a possibilidade de mergulharmos em níveis mais profundos da psique. Grof (1988) destaca o intenso trabalho de Rank. Durante a sua infância experiências transpessoais podem ser assinaladas. perda do pênis e perda do amor do superego. p.. Jung escreveu sua tese sobre transe e estados dissociativos. que serviram de base para a fundamentação da Psicologia Transpessoal no Ocidente. Em Viena. espiritualidade dos nativos americanos. yoga.  o conceito de transcendência é útil para cada indivíduo. da abordagem simbólica.Na escola Médica de Zurich. mas um segundo barulho ocorreu. alquimia e gnosticismo. fenômenos como transes mediúnicos ou não. no Hospital de Burgholzh em Zurique. (Memórias. 33 .  a prontidão para explorar visões de outras culturas multicentenárias bem como de levantar insights dentro da cultura ocidental mostraram-se relevantes para o trabalho clínico atual. Estas contribuições se expressam nos estudos junguianos acerca dos arquétipos e mitos. O encontro de Freud e Jung propiciou ao primeiro um suporte acerca da visão psicanalítica do inconsciente. figura posteriormente encontrada por Jung na cultura egípcia. Jung disse que tal fenômeno refletia um dos tópicos que estavam discutindo e predisse um novo barulho. sonhos. e das dimensões espirituais da psique. quando ocorreu um barulho na estante de livros do escritório de Freud. por exemplo um dos seus casos em que um paciente falou de um sol fálico. Freud discordou desta possibilidade. um dos maiores mestres da psiquiatria. Depois de sua graduação trabalhou com Eugen Bleuler. xamanismo africano. a partir das experiências com sua prima e médium Helene Preiswerk. Uma das possíveis causas para o rompimento entre Freud e Jung deveu-se ao fato de este último insistir em destacar temas espirituais em seu foco de pesquisa. Freud depois escreveu para Jung dizendo que após sua partida os barulhos continuaram. numa perspectiva psicológica. Freud e Jung discutiram sobre fenômenos parapsicológicos. inconsciente coletivo. Jung também pode ser visto como um dos primeiros teóricos a estudar.  o reconhecimento de que cura e crescimento freqüentemente resulta de experiências simbólicas ou de estados alterados de consciência. o que lhe deu uma vasta experiência com psicóticos e colocou-o em contato com o campo do simbolismo tendo-se. Pode-se considerar as contribuições de Jung para Psicologia Transpessoal em quatro pontos:  a noção que desenvolvimento psicológico poderia incluir o crescimento de altos níveis de consciência e continuar ao longo da vida. No entanto as divergências entre ambos não tardariam em aparecer. os quais não podem ser reduzidos à racionalização. porém os considerava sem importância. o I Ching. da sincronicidade. Sonhos e Reflexões). tipos psicológicos. Nesse sentido assim se expressa: 34 . 26) valoriza àquelas que dizem respeito ao espaço interno – o chamado reino dos poderes psicológicos e das habilidades psíquicas da pessoa humana. eu sei que ele existe”. Carl Rogers Considerado um dos principais representantes da Terceira Força em Psicologia. (1998). a consciência cósmica constitui o meio e o objetivo final da terapia. 2002). Para autores como Laing e Maslow. teria passado por um processo de transformação transpessoal e. 1995) marcaram o início promissor das pesquisas nesta área. quando questionado acerca da existência de Deus: “Eu não penso que ele existe. na década final de sua vida. destaca que Carl Rogers. Rogers foi um dos primeiros autores que forneceu informações acerca das possibilidades de ampliação do campo de pesquisa na área psicológica. Neste terreno também há problemas a levantar e a solucionar. É possível perceber a ousadia de Jung frente ao meio acadêmico a partir de sua declaração a BBC. Memórias. Sendo possível encontrar nas obras finais de Carl Rogers (1983) indícios de sua abertura para os estudos transpessoais. p. Existe uma necessidade pulsional de se chegar à consciência cósmica? Os valores ligados a ela são „instintóides”? Como chegar à consciência cósmica sem riscos de descompensação? Por que a experiência cósmica tem o valor terapêutico que se lhe tem atribuído? Quais as relações entre a realidade da experiência cósmica e a realidade da vida quotidiana?” Os trabalhos pioneiros de Maslow (apud Walsh e Vaughan. Este livro resgata o momento de passagem do humanismo para o transpessoal. tais como a beleza. Sonhos e Reflexões (JUNG. ultrapassando os modelos tradicionais da psicologia humanista. Tornando relevante a possibilidade de abertura para novas idéias Rogers (1983.As publicações que mais destacam o aspecto transpessoal na obra de Jung são: Sete Sermões para um Morto. a verdade e o amor. 14-15) chama a atenção para o fato de que a terapia e a psicologia existencial têm focalizado já há muito tempo a importância da dimensão fenomenológica do “aqui e agora” para emergência do “encontro existencial” e das suas relações com os valores superiores da humanidade. Em “Tornar-se Transpessoal” Boainain Jr. p. teria oferecido fundamentos para criação de uma “Abordagem Transpessoal Rogeriana”. Terceira Força – Humanismo/Existencialismo Weil (1978b. Uma Resposta a Jó. à premonição. Importante ressaltar que em “Reflexões sobre a Morte”. e considero esta experiência agradável e empolgante. regida por outros tipos de leis. p. Rogers (1983. Interesso-me pelos trabalhos de Elisabeth Kübler-Ross e por suas conclusões sobre a vida após a morte. Agora considero possível que cada um de nós seja uma essência espiritual contínua. pois mostra o interesse dos psicólogos humanistas por uma nova dimensão em psicologia. É como se o eu se dissolvesse nu35 .31). mas talvez estejamos no caminho da descoberta de uma nova ordem. que apontam a capacidade das pessoas ultrapassarem o nível comum de consciência. afirmando a nova visão quando destaca: “contrastam frontalmente com algumas passagens deste capítulo. Estes fenômenos podem não corresponder às leis científicas conhecidas. conforme transcrito a seguir: Seus estudos parecem revelar que em estados alterados de consciência. Esta abertura de Rogers marca uma passagem importante dentro do movimento psicológico. e até mesmo às experiências que se dão fora do corpo. às auras humanas. 29) nos ensina um dos pontos considerados centrais da Psicologia Transpessoal: a morte. A minha crença de que a morte é o fim foi modificada. embora eu considere uma bênção muito duvidosa.Estou aberto a fenômenos ainda mais misteriosos . p. escrito há apenas dois anos atrás” (ibid. que se mantém através dos tempos e que ocasionalmente se encarna num corpo humano. Nele busca reorganizar suas considerações sobre o processo da morte. p. às fotografias kirlianas. Sinto que estou aprendendo muito com uma nova área de conhecimentos. Modificaram completamente minha concepção do processo da morte. 31) Em “Estados Alterados de Consciência” Rogers (1983) destaca os trabalhos de Grof e Grof (1977) e Lilly. Fiquei impressionado com os relatos de Raymond Moody (1975) sobre as experiências com pessoas que estiveram próximas da morte a ponto de serem declaradas mortas. à clarividência. as pessoas entram em contato com o fluxo da evolução e apreendem seu significado. e apontava novos rumos para a pesquisa. por coisas que aprendi na década passada. à telepatia.” (Ibid. mas que voltaram à vida. Em atualização a estas afirmações o autor escreve: “Vivendo o Processo de Morrrer”. que mais tarde passou a denominar-se Psicologia Transpessoal. e marca a transformação operada em sua mente flexível e disponível ao novo. A experiência de falecimento de sua esposa traça um bonito percurso na reorganização do conceito de morte. Impressionam-me alguns relatos sobre reencarnação. no entanto. Este contato é vivenciado como um movimento que os aproxima de uma experiência transcendente de unidade. Baldwin. percebe-se que Rogers revela o contato com as produções científicas da então nascente área de Psicologia Transpessoal. p. 1983. p.47) Diante desse cenário. um de seus expoentes. como um dos primeiros a esboçar modelos integrais de desenvolvimento. No campo da psicologia. em dissociação. p. 3. além de apresentar a primeira versão de estágios do desenvolvimento religioso. 2002. os estudos sobre o desenvolvimento emergiram no final do século XIX. pedagogos. citando os trabalhos Grof. fragmentação e alienação. e médicos cujas idéias e observações indubitavelmente têm tido um impacto acumulativo sobre esta ciência do comportamento infantil e do desenvolvimento no século dezenove. da ética e da ciência que passam a seguir seus próprios caminhos. responsável por valorosa construção cartográfica da consciência nesta área. livres das pressões e imposições das outras esferas. especialmente de beleza. contemporâneo de William James e de Peirce. Seu esquema de desenvolvimento cognitivo foi adotado por Piaget e por Kohlberg. harmonia e amor. p. vários psicólogos humanistas passaram a se interessar por uma série de estudos até então negligenciados pela Psicologia Humanista. “diferenciações das esferas de valores culturais” 10 (WILBER.” (ROGERS. graças ao predomínio do behaviorismo americano. Espiritualidade e os pioneiros do desenvolvimento humano Apesar de a modernidade ter transformado a sua grande contribuição. é um nome central na psicologia moderna. contudo foi relegado ao esquecimento. tendo sofrido diversas as influências. ela também apresentou sua contribuição ao modelo de desenvolvimento que inclui a dimensão espiritual. Mas um conjunto tão vasto de perspectivas ao longo dos séculos tornou difícil identificar ancestrais diretos da psicologia do desenvolvimento.5): Como é habitualmente reconhecido.ma região de valores superiores. Como destaca Charlesworth (1992. 36 . 2002. A importância de Baldwin pode ser vista nas palavras Kohlberg (apud WILBER. sendo o primeiro a definir de forma precisa o que é um estágio de desenvolvimento. a psicologia do desenvolvimento tem uma rica história. A realização obstinada de pesquisas parece que vem confirmando as experiências de união dos místicos com o universo. 76). 98) a seguir: 10 Diferenciação sobretudo da arte. Cairns (1992) aponta que as primeiras tentativas de compreensão científica do desenvolvimento surgiram com as contribuições de James Mark Baldwin. Com o desenvolvimento de pesquisas que incluíam a dimensão espiritual da vida humana. Seus precursores incluem eminentes filósofos. A pessoa sente-se como se ela e o cosmos fossem um só. considerado por Wilber (2002). A própria obra de arte existe no mundo objetivo. Baldwin reconhecia que o desenvolvimento da consciência levava a. que unia simultaneamente tanto a moral como a ciência mais elevadas. ou seja. pode ser estudada pela investigação científica. „é da natureza de tal experiência sintética ir além de objetos estéticos específicos de contemplação até a própria realidade como um todo. a criação de uma epistemologia genética de uma ética que utilizariam a epistemologia para apresentar problemas para a psicologia do desenvolvimento e que utilizariam a observação desenvolvimentalista para ajudar a questões epistemológicas. como destaca Wilber (2002. „egocentrismo‟ ou o caráter indiferenciado da mente da criança. palavra que significa que a consciência cósmica é „totalmente abrangente. pré-convencional. p. direitos naturais e respeito à pessoas. também tiveram origem em Baldwin” Kohlberg (apud WILBER. uma versão do idealismo estético (derivado de Kant... sendo que “o self identifica-se com. Também reconheci que a obra global de Piaget. de Schelling e de Schiller). Essa é. 2002. convencional e pós-convencional) 11 também derivam das idéias deste autor. destacando que estes não poderiam ser reduzidos a interesses econômicos.. u internaliza. exterior. “diferencia o self das regras e expectativas dos outros e define os valores morais em termos de princípios próprios”.. Porém. naturalmente. raça. p. Neste campo suas idéias são extremamente atuais. 11 37 . Essa experiência sintética inclui a idéia de Biaggio (2002.24) destaca que no nível pré-convencional. acomodação. trazido à arte por aquele que a contempla (embora esteja fundamentado nas características objetivamente reais da obra). denominando pancalismo. um estado subjetivo. convencional e pós-convencional (autônoma-ética)” Baldwin também é reconhecido como um dos primeiros a oferecer explicações sobre os estágios do desenvolvimento espirituais. científicos ou morais. e no pósconvencional há uma construção pessoal do sujeito que define moral em termos universais de justiça. mas que Baldwin retrabalhou em seu próprio sistema. e. sem referência alguma fora de si mesma‟. as regras e expectativas dos outros. Essa experiência da unidade é prefigurada na contemplação de uma bela obra de arte. enquanto objeto. p.. predominando atitudes pragmática e hedonista. dualista e ética] definiam „estágios‟ (ou subníveis) na série básica. a beleza e o valor da obra de arte é um estado interior.. uma experiência estética num grau supremo. No nível convencional há uma concentração nos sentimentos coletivos dos demais. 98) reconhece que seu modelo dos seis estágios de desenvolvimento moral é fruto das contribuições de Baldwin. e culminava em. crença e ou religião. independentemente de sexo. esquema e adualismo. 99): “.“Quando eu li Baldwin mais profundamente. compreendi que Piaget derivou de Baldwin todas as idéias básicas com as quais começou na década de 20: assimilação. especialmetne das autoridades. Nossos dados sugeriram que as distinções em três níveis de Baldwin [adualista. como podemos ver na citação a seguir: “. “os indivíduos ainda não chegaram a entender e respeitar normas morais e expectativas compartilhadas”. . e aponta que os níveis básicos de desenvolvimento (pré-convencional. decorrente de uma infecção intestinal contraída quando realizava pesquisas em Belize. é simples e quase duro. com a vida. que culmina na experiência consumada da consciência cósmica. a psicossexualidade. p. 40) e destaca o estóico Marco Aurélio como exemplo deste último estágio. ordenador. Kohlberg aponta a necessidade do estágio sete como um caminho para resolver o impasse presente no “relativismo colocado pela distinção entre princípios éticos e preocupações egoístas ou hedonistas que existem no estágio 6” (Ibid. 29). 38). 38 . que vão além de sua concepção de justiça. indica que apenas “3% a 5% das pessoas” apresentam o raciocínio do estágio pós-convencional seis. ou com Deus” (Ibid. “no sentido lato. Assim como. p. nas últimas décadas. contudo Kohlberg. O sétimo estágio envolve a construção de um senso de identidade ou unidade com o ser. tendo convivido os últimos 16 anos de sua vida com extrema dor. racional e evolutivo do universo. os afetos. “Espiritual universal”.Deus. gradativamente se desdobraram e revelaram. sobre os “Estágios da Fé”. que vão do primeiro. às vezes de natureza. mas agora se vê que ela se refere a essa totalidade orgânica ou espiritual em cujo âmbito o eu e o mundo podem finalmente ser conhecidos‟. sinceridade. Ao referir-se ao princípio último. a auto-identidade. apresentando seis estágios. fé religiosa e estágios meditativos. uma gama de estudos sobre o imenso arco-íris de linhas de desenvolvimento que incluem a moral. na América central. Desta crença ele deriva uma visão de lei natural que lhe dá força de agir em termos de princípios universais de justiça em um mundo injusto. relacionado com orienta- ções éticas e religiosas. Marco Aurélio não tenta separar Deus da natureza. contudo o trabalho de James Fawler (1992). p. fé mágico-projetiva. o que levou muitos teóricos a questionar sua validade. “O conteúdo da fé de Marco Aurélio. O sétimo estágio. Essa corrente estética também passa por um desenvolvimento em etapas. a cognição. Às vezes ele chama esse princípio de Deus. seguiu as pistas deixadas por Kohlberg e se destacou como uma linha de estudos no campo da espiritualidade. Estes pesquisadores deixaram enormes contribuições para o estudo do desenvolvimento humano e iniciaram pesquisas que contribuíram para o estabelecimento de uma linha de desenvolvimento “espiritual” que englobam trabalhos na área de solicitude. como realidade empírica e teórica. raramente aparece nas citações quando da apresentação da teoria dos estágios do desenvolvimento moral. além de defender o estágio 6. postula nos últimos anos de sua vida 12 a existência de um sétimo estágio. começa com a crença de que o universo é ordenado. isso também lhe dá a paz que vem de sentir-se a si mesmo como parte finita de um universo infinito”. como o de todos os estóicos.” Biaggio (2002. cognoscível e em evolução. as idéias a respeito 12 Kohlberg morreu em 19 de janeiro de 1987. até o sexto a “fé universalizante”. preocupação. que se desdobra do corpo (sensório-motor) para a mente (convencional e pós-convencional) e dai para o espírito (pós-pós-convencional). o desenvolvimento global – a soma total de todas essas diferentes linhas – não mostra nenhum tipo de desenvolvimento linear ou seqüencial. em parte. integral e não-exclusivista. As contribuições da pós-modernidade devem ser incluídas numa agenda integral de estudo da espiritualidade. em diferentes proporções. na qual. em sua maior parte. holárquica: os estágios superiores de cada linha tendem a se desenvolver sobre estágios anteriores ou incorporá-los. a identidade sexual e a empatia. Wilber (2002. o altruísmo. como espaço de desenvolvimento geral ou potencial. 2002. A pós-modernidade trouxe imensos desafios para os estudos na área da espiritualidade.. a competência lógico-matemática. pois enquanto a modernidade diferenciou os Três Grandes (Arte. as necessidades. inferior em algumas outras – e tudo ao mesmo tempo. Eis o retorno de uma versão resumida do Grande Ninho do Ser. p. Desse modo. competência para se comunicar. a capacidade sócio-emocional.. com dinâmicas diferentes e sob cronogramas diferentes. Moral e Ciência). 44) e os estágios “pós-pós-convencionais” ou transpessoais. negando-se. os modos de espaço e tempo. não se pode pular nenhum estágio.do bem. inclusive as pesquisas na área de desenvolvimento por incluírem hierarquias. elas podem se desenvolver independente umas das outras. formal. além de independentes. entre outras que contam com suporte de pesquisas empíricas. as habilidades cinestésicas. Mas se devemos ter todas as posturas como igualitárias. uma construção e uma interpretação. pois a compreensão de que o mundo é. nenhuma postura é melhor que a outra e as hierarquias são vistas como marginalizantes. e que todo significado depende do contexto e estes são interminavelmente holônicos são fundamentais para ampliarmos a visão da integralidade e superarmos o reducionismo de leituras 39 . a tomada pela morte. razoável em outras. e estes aparecem numa orem que não pode ser alterada por condicionamento ambiental nem por reforço social. pós-convencional” (WILBER. elas se desdobram de forma hololárquica através de um conjunto de ondas que incluem “um estágio físico/sensório-motor/pré-convencional. um estágio de ações concretas/regras convencionais. . mas com freqüência abraçou a loucura aperspectiva. significando que. Uma pessoa pode ser muito avançada em algumas linhas. alegria. No entanto.. a pósmodernidade prometeu integrá-los numa abrangência inclusiva. a adoção de papéis. a criatividade. por que então rejeitar o nazismo ou o racismo? Eis uma questão de difícil resposta para o aperspectivismo pós-moderno.” Assim. a visão de mundo. p. assim. 43-44) destaca que essas linhas são “relativamente independentes”: “. um estágio mais abstrato.. as distinções qualitativas de qualquer tipo. a maior parte das pesquisas continuou a constatar que cada linha de desenvolvimento tende a se desdobrar de uma maneira seqüencial. termos uma perspectiva mais abrangente do fenômeno humano. e não estágios. dentro de um modelo integral.precipitadas da “Grande Cadeia do Ser”. 147) destaca cinco definições de espiritualidade que apresentam interesse a um olhar psicológico transpessoal:  A espiritualidade envolve os níveis mais elevados de qualquer uma das linhas de desenvolvimento. a “espiritualidade” significa basicamente os níveis transpessoal. basicamente. neste sentido iremos abordá-las a seguir: 1. transracional. como podemos perceber no exemplo abaixo: 40 .  A espiritualidade é a soma total dos níveis mais elevados das linhas de desenvolvimento. uma linha de desenvolvimento separada. buscamos destacar a seguir algumas definições de espiritualidade formuladas a partir do referencial da psicologia do desenvolvimento e que englobam as contribuições da prémodernidade. modernidade e pós-modernidade. envolve experiências de pico.  A espiritualidade. A espiritualidade envolve os níveis mais elevados de qualquer uma das linhas de desenvolvimento. pós-pós-convencional de qualquer uma das linhas de desenvolvimento. contudo precisamos definir com mais clareza em que sentido este termo esta sendo utilizado.  A espiritualidade é uma atitude (tal como a sinceridade ou o amor) que você pode ter em qualquer estágio em que esteja.  A espiritualidade é. Espiritualidade: algumas definições De forma geral. e assim. p. Percebe-se claramente o avanço dos estudos na área da espiritualidade e psicologia. Wilber (2002. Estas cinco definições congregam aspectos importantes do fenômeno “espiritualidade” que nos parece importantes para sua compreensão. ela mesma. Com este objetivo. Nessa perspectiva. No gráfico. a ponta de lança – todo o que aponta para os níveis mais elevados de cada uma das linhas. Como o “desenvolvimento total” e o desenvolvimento do “eu total”. Essa definição enfatiza o fato de que. pois apresentam os níveis mais elevados de desenvolvimento. A espiritualidade é a soma total dos níveis mais elevados das linhas de desenvolvimento. 148) é muito comum e: “.Neste exemplo. a extremidade crescente. por definição. o caminho espiritual de cada pessoa é radicalmente individual e único. os mais altamente evoluídos. Em outras palavras. logo abaixo.. mesmo que as próprias aptidões particulares possam seguir um caminho bem-definido. mas com uma ênfase ligeiramente diferente (porém importante). 41 . os “alcances maiores” da natureza humana. o somatório das linhas interpessoal. 2. conforme destaca Wilber (2002. reflete os aspetos da espiritualidade que incorporam as capacidades mais elevadas.. Esta definição é semelhante à definição anterior. as melhores aspirações. as linhas de desenvolvimento interpessoal e afetivo seriam consideradas espirituais. a soma total dos estágios mais elevados dessas linhas não apresentaria um tal desenvolvimento em estágios. Esta visão. embora as linhas individuais se desdobram de maneira hierárquica. p. tendo evoluído do nível pré-convencional ao convencional e deste ao pós-convencional até alcançar a sua dimensão mais ampla no pós-pós-convencional. os estágios pós-pósconvencionais em qualquer uma das correntes de desenvolvimento. os motivos mais nobres. pois ela compreende. espiritual e afetivo representam esta definição de espiritualidade total vivida pelo individuo. o “desenvolvimento espiritual total” não ocorreria em estágios.” Assim. a espiritualidade ou um dos seus aspectos particulares seguiria definitivamente um curso seqüencial ou em estágios. uma linha de desenvolvimento separada. Nesta definição o desenvolvimento espiritual apresentaria algum tipo de desdobramento em estágios. A espiritualidade é. embora. Contudo. as pessoas. 229 e 231). mostra desenvolvimento. raramente experimentam qualquer coisa que lhes dê a sensação de um estágio ou que se pareça cm um estágio. 2002. Uma comparação intercultural destes mapas do desenvolvimento espiritual aponta para a perplexidade diante da “enorme semelhança dos campos morfogenéticos ou espaços de desenvolvimento sobre os quais migram os estágios dos seus desenvolvimentos espirituais” (WILBER. apresentam em algum nível um desenvolvimento seqüencial holárquico. mais uma vez isso não evite regressões. Um exemplo clássico disto está na dificuldade de crianças filmadas resolvendo questões quando estavam em um estágio préoperatório aceitarem as respostas como suas quando vêem este filme em um estágio posterior. p. Modelos de desenvolvimento espiritual. em sua maior parte.3. A seguir apresentamos uma adaptação dos mapas de desenvolvimento da espiritualidade adaptados de Wilber (2002. oriental e ocidental.149). por definição. mesmo que estejam de fato progredindo através de estágios de competência. ela mesma. avanços temporários para frente ou experiências de pico de qualquer um dos principais estados. p. 42 . espirais. uma vez que uma linha de desenvolvimento. uma das principais dificuldades em se chegar a um acordo a respeito de uma concepção de estágios é que. . Experiências de pico não requerem a noção de estágios e apontam para o acesso a níveis transpessoais. Esta é a definição mais comum de espiritualidade. diferentemente das estruturas. tem maior capacidade de sinceridade. A visão romântica presente nos que usam esta definição indica que as crianças. p. contudo as experiências acessadas são geralmente interpretadas por meio de estruturas arcaicas.. 2002. por isso denominadas de “estados de consciência”. independentemente do quanto seja maravilhosamente fluido e fluente o seu egocentrismo”. Neste sentido Wilber (2002. de acordo com a maior parte das pesquisas.. porém. cada uma delas marcada por estágios. eles se tornam estruturas que mostram desenvolvimento” (WILBER. p. o cuidado e o altruísmo. essa atitude não está completamente presente em todos os níveis. A espiritualidade é uma atitude (tal como a sinceridade ou o amor) que você pode ter em qualquer estágio em que esteja. por exemplo. e não estágios. como destaca Wilber (2002. 5. transformar estados em estruturas. tende (assim como acontece com outros sentimentos de afeto) a se desdobrar do modo egocêntrico para o sociocêntrico e daí para o mundicêntrico. pois o amor. 151-152): “. mágicas. então a infância poderia ser o Éden. transitórias. que são mais estáveis. 159) destaca: “Se a sua idéia de espiritualidade é se sentir bem. p. mas se desenvolve a si mesma”. míticas ou racionais. 152). dada a fluidez com que a usam. desenvolvimento ou desdobramento em estágios.. basicamente. ou mesmo experiências de expansão da consciência na dimensão não-dual em qualquer momento do desenvolvimento humano. As experiências de pico (ou estados alterados de consciência) indicam o acesso às dimensões da alma ou do espírito. Não apresentando. não obstante. então a infância é um domínio de expectativas reduzidas. Não podemos simplesmente dizer que a atitude necessária é o amor. à medida que esses estados temporários são convertidos em características duradouras.4. Elas são temporárias. adotando o papel de outras pessoas. A espiritualidade. portanto. em geral. passageiras. contudo como se pode ser sincera sem ainda conseguir adotar o papel do outro? Atribuir o termo espiritual a uma criança vivendo o egocentrismo equivaleria transformar o espiritual em narcisismo. de modo a incluir a compaixão. envolve experiências de pico. e a projeção da sua consciência mediante muitas perspectivas e panoramas pluralistas. se a sua idéia também envolve fazer o bem. pois “. 43 . e. sendo a meta do trabalho formativo. isso tem se comprovado muito difícil de definir ou mesmo de se enunciar de uma maneira coerente. B. e não meramente a crenças ou idéias a respeito do Espírito. The New Yorker. The Making of a Developmental Science: The Contributions and Intellectual Heritage of James Mark Baldwin. ela mesma. BRANDÃO. Lawrence Kohlberg: ética e educação moral. 5-16. Referências bibliográficas BETTELHEIM. E. Matrizes do pensamento psicológico. E. W. São Paulo: Moderna. a prática. CAIRNS. do humano que vive o processo humanização. Summus. BOAINAIN Jr. A. envolver um ou mais linhas de desenvolvimento [Definição 1 e 2]. A. 1992. 2001. 1992. 2007. 17-24. 2002. Freud and the Soul. No entanto. C. que objetivam “a busca. B. “Não obstante. S. assim como buscar explicitar o seu modelo de desenvolvimento. L. quer se inclua ou não a presença da espiritualidade como uma dimensão humana fundamental. MENEZES. 2005. 1998. FIGUEREDO.Uma análise destas cinco definições nos aponta que a resposta para pergunta: a espiritualidade se desenvolve ou não em estágios. Developmental Psychology. muitos aspectos da espiritualidade parecem. Darwin and developmental psychology. Uma abordagem psicológica mais ampla deveria contemplar algumas destas perspectivas de espiritualidade.. R. por conseguinte. numa inspeção mais minuciosa. M. Petrópolis. 28(1). Recife: Comunigraf. B. que ajudam a pessoa a tornar-se receptiva a uma experiência direta da dimensão do Espírito. RJ: Vozes. a experiência mediante as quais o sujeito opera sobre si próprio as transformações necessárias para ter acesso à verdade” (FOUCAULT. Past and present. Developmental Psychology. p. como uma linha separada [Definição 3]. BIAGGIO. embora tanto as estruturas que têm experiências de pico quanto os domínios onde essas experiências ingressam mostrem desenvolvimento se houver realizações permanentes” (Ibid. bem como a espiritualidade considerada. feita no início deste trabalho. pois nem tudo que chamamos de “espiritualidade” envolve estágios de desenvolvimento. Psicologia e psicoterapia transpessoal: caminhos de transformação. L. 1982. FERREIRA. 2006). depende de que definição estamos utilizando. experiência de pico [Definição 5] não apresentam desenvolvimento em estágios.R. as pesquisas apontam que o processo de humanização é mais complexo de que supúnhamos. CHARLESWORTH. e. 28 (1).. 153). requerendo a vivência de “exercícios espirituais” (HADOT. Tornar-se transpessoal: transcendência e espiritualidade na obra de Carl Rogers. p16). São Paulo: Ed. Todavia. 44 . FOUCAULT, M. L'Herméneutique du sujet. Cours au Collège de France, 1981-1982. Édition établie par François Ewald et Alessandro Fontana, par Frédéric Gros, Paris: Seuil/Gallimard, 2001 (Coll. Hautes études). ______. Tecnologías del yo y otros textos afines. Barcelona: Piados Ibérica, 1990. FOWLER, James W. Estágios da fé. A psicologia do desenvolvimento humano e a busca de sentido. São Leopoldo: Sinodal, 1992. FREUD, S. Studies in Parapsychology. New York: Collier Books, 1963. GROF, S. Além do cérebro: nascimento, morte e transcendência em psicoterapia. 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Tradições de Sabedoria do Oriente Tornou-se lugar comum associar a Psicologia Transpessoal com as tradições de sabedoria do Oriente; associação usada, ora para desqualificá-la, atribuindo-lhe um estatuto “místico” e estranho as formas de pensar Ocidental, ora para realçar seu caráter integrador e crítico, quando aponta para o etnocentrismo que governa nosso olhar, através do desvelamento do alto nível de desconhecimento que temos acerca de outras formas de existir, no caso em reflexão, os sistemas de conhecimento e de cuidado desenvolvido nas Culturas Orientais. Com a resolução 005/2002 do Conselho Federal de Psicologia que dispõe sobre a prática da acupuntura pelo psicólogo tivemos oficialmente o reconhecimento das contribuições dos modelos de cura, posto em prática no Oriente, pelo órgão de regulação da psicologia no Brasil. Esta decisão vem ratificar os debates sobre a ampliação da visão de saúde elaboradas nas Declarações 46 de Alma-Ata (Conferência das Nações Unidas, realizada em 1978, na URSS) e de Veneza (Patrocínio da UNESCO), que sinalizavam a necessidade de considerarem-se as contribuições de outras visões de homem e mundo além da tradicional. Refletindo sobre esta situação, Silva (2007, p. 420), destaca a importância da contribuição de mais de 5 mil anos de experiência em processos de cura desenvolvidos pela cultura chinesa para ampliar os horizontes da ciência Ocidental. Essa proposta de aproximação entre os conhecimentos advindos das ciências e os conhecimentos contidos no que os orientais chamam de As Tradições abre uma nova possibilidade, pois coloca, a serviço do homem, "conhecimentos" que podem ser utilizados para resolver ou aliviar o sofrimento humano, quer seja ele físico ou mental, independentemente do país, sistema político, raça ou região do planeta. As críticas de que o contato com as contribuições orientais fazem parte das estratégias de suturar a angustia cartesiana das incertezas ou como diz Zizek (2001, p. 12), uma última ironia pós-moderna, tem sido duramente rebatidos. Revel; Ricard (1998), por exemplo, comparam a entrada do Budismo no Ocidente como uma revolução semelhante ao Renascimento ocorrido na Europa. Já Costa (2004, p. 210) aponta que o diálogo com estas visões de homem e mundo podem contribuir para resignificarmos o próprio existir dentro da nossa cultura, pois: Uma das características fundamentais das espiritualidades asiáticas é o tratamento dado ao físico na condução moral do sujeito. A corporeidade física, em oposição às religiões judaico-cristãs, não é vista apenas como obstáculo ao aperfeiçoamento espiritual. [...] Aprender a respirar, a se sentar, a se alimentar, a dormir ou a acordar corretamente são etapas que se devem seguir para superar o sofrimento e chegar à serenidade e à sabedoria. Uma longa tradição de filósofos e mestres orientais debruçou-se sobre a mente, produzindo uma longa literatura. No ocidente, Carl Jung, com a realização do prefácio do “Livros tibetano dos mortos”, deu início ao reconhecimento do potencial presente nas formas de saber do oriente, contudo o etnocentrismo, aliado à dificuldade de acesso à literatura oriental, tem nos conduzido a uma visão limitada das contribuições orientais. No entanto, os modelos de desenvolvimento e as teorias da mente produzidas nos meios transpessoais apontam para riqueza deste contato, que precisa ser revista de forma autêntica e livre de preconceitos. Na Psicologia Transpessoal, quando da transposição ou adaptação dos modelos da sabedoria oriental para a nossa cultura, alguns pontos norteadores são considerados, de forma que o processo de inclusão, não mutile as múltiplas variáveis que compõem os modos de ser destas culturas. A seguir, destacaremos os pontos centrais que tem sido considerados quando do uso dos modelos de cura de inspiração oriental: 47  Os sistemas de cura oriental baseiam-se em sua grande maioria em conceitos de 13 energia sutil, no qual “sutil” , significa que a energia não é necessariamente mensurável, mas plausível, pois mudanças ocorridas após o emprego da energia hipotética em questão podem ser previstas e observadas, como no caso do uso da energia dos meridianos da acumputura;  Eficazes ou efetivos: estudos de caso ou evidências científicas devem demonstrar resultados benéficos ao paciente ou cliente;  Resultados estáveis: os benefícios produzidos devem, em geral, se manter ao longo do tempo sem a necessidade de qualquer tratamento adicional, ou por possibilitar que o cliente realize a auto-cura;  Seguras: os riscos de efeitos colaterais relacionados ao uso das técnicas devem ser insignificantes ou totalmente ausentes;  Verificáveis: as técnicas devem prestarem-se a estudos sob condições científicas;  Teoricamente econômicas: os conceitos subjacentes às práticas devem adequarse à definição de uma teoria boa e parcimoniosa, além de guardar coerência com as teorias da psicologia moderna, da nova biologia e da física quântica;  Validade de conteúdo: a técnica deve ser admissível por pessoas de diferentes etnias e orientações religiosas, educacionais, filosóficas ou culturais;  Empoderamento: a grande maioria das práticas promoverá a auto-aplicação, o empoderamento e a cura natural através do emprego do sistema energético do corpo da própria pessoa. Estes norteadores ajudam a superar a idéia de que qualquer prática oriental é validade por si mesmo, incentivando o diálogo e rompendo com a hegemonia de qualquer uma das formas de saber. A idéia é conseguirmos oferecer as melhores contribuições das duas culturas para o crescimento do ser humano integral. Exemplificando esta idéia com a acupuntura, Silva (2007, p. 428) destaca: A acupuntura propõe ao psicólogo intervir, através de estímulos em determinados pontos, na causa primeira dos sofrimentos que, segundo a MTC, estão na desarmonia do homem consigo mesmo, ou deste em relação ao meio exterior ou do meio em relação ao homem. Propõe ao psicólogo, como cientista que é, o estudo, a busca das interfaces existentes entre o melhor do pensamento ocidental e o melhor do pensamento oriental. Cabe ao psicólogo fazê-lo. (p. 428 Algumas contribuições das sabedorias orientais à psicologia São inúmeras as contribuições das sabedorias orientais à psicologia, neste texto destacaremos a meditação, como recurso complementar na psicoterapia transpessoal, e apresentaremos alguns elementos do Abhidharma, um dos primeiros tratados de psicologia oriental. A apresentação da meditação se justifica por seu extenso uso na psicologia transpesssoal, como também pelo 13 Sobre a noção de “energia suil” sugerimos a leitura de Goswami (2006) e “Rumo a Uma Teoria Completa de Energias Sutis” de Ken Wilber (http://www.ariray.com.br/saladeleitura.htm). 48 . a utilização sistemática de estratégias de meditação que sensibilizassem a dimensão espiritual poderia ajudar na promoção da superação das inúmeras divisões que nos marcam ao longo do processo de individuação.. sendo esta pala15 vra derivada etimologicamente da “raiz yuj.. senão de uma totalidade psíquica do indivíduo que. WILBER.. „ligar‟. assim como englobava tanto o pensamento.. 2006) e novos modelos da psicologia (VARELA. de ampliação da consciência e êxtase estão presentes em várias culturas desde as épocas mais remotas da humanidade. 2008. 1999a. uma compreensão que exige a transformação.]” . p. como um “exercício espiritual” encontra terreno de sustentação desde a antiga Grécia. THOMPSON. nosso modo de estar no mundo. em especial. pois [. 2003. 2008. [. formam parte integral de uma nova compreensão do mundo. loc.] “O vocábulo yoga serve em geral para designar toda técnica de ascese e todo método de meditação” (ELIADE. A ressonância das temáticas desenvolvidas no abhidharma com a física quântica (GOSWAMI. 2003. o seu sentido original de transformação de si através da “união” das dualidades e que permite “[. „atrelar‟. Contudo. „manter unido‟. 24). na qual fazia parte do aprender a viver do filósofo. 2006). revela o autêntico alcance de tais práticas: graças a elas o indivíduo acessa o círculo do espírito objetivo. Nesse sentido. GOLEMAN. cit. 11)... 1996. a meditação.] consiste em „uma prática destinada a operar uma mudança radical do ser‟ (HADOT. a meditação estava ligada à prática da Yoga . 2002) destacam sua atualidade.] permite compreender com maior facilidade que exercícios como estes não são produtos apenas do pensamento. 2006. Sendo o espiritual posto em uma categoria que se distinguia da ética e da moral por ser uma forma mais abrangente e inclusiva. E em muitos casos negamos ou desconhecemos sua presença nos primórdios da construção da civilização ocidental com o “cuidado de si” dos gregos. a imaginação e a sensibilidade.20) 15 Eliade. Meditação “Yogás citta-vrtti-nirodhah” (Sutra I-2 de Patañjali) Segundo Eliade (1998) as práticas de concentração. HADOT. 2001. p. 2006. 1996. 1999b). e que possui um valor existencial que afeta a nossa maneira de viver. 14 49 . p. A filosofia antiga „supõe o exercício espiritual como uma forma de viver. a metamorfose de mim mesmo. contudo a prática da meditação nos remete irremediavelmente ao imaginário oriental. o que significa que volta a situar-se na perspectiva do todo (HADOT. uma forma de vida.. Dentro da tradição filosófica ocidental. 14 Em sua origem no oriente. ROSCH. (FOUCAULT. GOLEMAN. „jungir‟ [. de acesso ao divino. BEGLEY. uma eleição vital‟.grande número de pesquisas que destacam seus mecanismos e benefícios (EKMAN. Thompson e Rosch (2003. (3) um estado dissociado no qual o fenômeno do transe pode ocorrer. a idéia de afastamento da realidade. Então. para estar aberto e consciente no aqui e agora do mundo vivido. não relaxado. (4) um estado místico no qual realidades superiores e objetos religiosos são experienciados. psicológicos e a longo prazo um rompimento com as visões separativas. mas conservado. p.] o que a mente está fazendo enquanto ela o faz. a meditação ressurgiu e difundiu-se na década de 60. no qual Nal significa normalidade e Jor significa riqueza. Em tibetano Yoga é traduzido como Naljor. Mas na realidade a meditação é uma técnica para o despertar. idealmente. Os textos orientais tradicionais apontam dois estágios neste despertar: a) acalmar ou suavizar a mente (em Sânscrito.. Uma boa metáfora para situar a dinâmica da meditação é colocá-la como o despertar de um sono. no auge do movimento hippie. estar junto com a própria mente” (Varela. A meditação conduz a processos de crescimento da consciência. p. shamata) e b) desenvolvimento do insight (em Sânscrito. acordando para percepção da natureza interdepende da realidade e para o fluir constante da impermanência. No ocidente. (2) um estado de relaxamento que é psicológica e medicamente benéfico. 50 . o que supostamente estamos fazendo é cultivar a riqueza da normalidade presente em tornamo-nos atentos. trazendo.. p. vipashyana). de forma geral. quando praticamos meditação. experienciando “[. prevalecendo a busca por um estado alterado de consciência que conduza a um afastamento da realidade. um estado em que a pessoa que medita está fazendo algo para se afastar de seu estado habitual de realidade mundano.uma morte seguida de um renascimento para outro modo de ser” 16 parece que se perdeu no conta- to com o mundo Ocidental. 16 Ibid. conforme poder ser visto nas categorias populares proeminentes apresentadas por Varela. inferior. Thompson e Rosch (2003. ainda. não-dissociado. Estando aberto para experimentar os fenômenos a nossa volta com o olhar de lucidez e suspensão de prejulgamentos. Todas estas definições guardam entre si. Nas práticas meditativas estes dois estágios são utilizados em conjunto. mantendo uma série de diferentes significados. benefícios secundários como: benefícios físicos. a idéia de meditação como um estado alterado de consciência. ou seja. 40). 40): (1) um estado de concentração no qual a consciência enfoca um objeto apenas. sendo o acalmar colocado para tornar a mente capaz de estar presente em si mesma o tempo suficiente para obter insights sobre sua própria natureza e funcionamento. não-concentrado. 21. o crescimento e o desenvolvimento de estruturas superiores da consciência” (ibid. fobias.Na prática clínica transpessoal a meditação é incluída geralmente como um recurso complementar da psicoterapia. desenvolvidas pela psicologia ocidental. tensão muscular. o ponto central da meditação em Psicoterapia Transpessoal é permitir a pessoa permanecer no presente. estresse e dependências de drogas levando a acentuada mudança no comportamento. livros e teses acadêmicas. mas a prática é contra-indicada para esquizóides porque podem piorar a apreensão da realidade. ao cérebro e ao metabolismo. Análises detalhadas destas técnicas mostraram importantes benefícios ao trato cardiovascular. tomografias cerebrais. Wilber (1999) aponta que a meditação de um modo geral parece contra-indicada nas patologias mais primitivas do nível pré-pessoal (F-1 e F-2) porque.124). No âmbito psicológico favorece o aumento da percepção diminuindo as distorções perceptuais. para os obsessivos compulsivos por estarem fechados demais a novas experiências ou por exacerbar a obsessão nos esforços. contribui para o autoconhecimeno. são bastante rápidas e eficazes. dosagens de hormônios e inúmeros outros métodos de pesquisa oferecem evidências dos benefícios da meditação. A meditação seria então “uma forma de facilitar a emergência. afasta emoções inadequadas e incômodas como medo. a meditação é eficaz em casos de ansiedade. e outras. ainda não temos um 51 . “não é um meio de escavar as estruturas inferiores e reprimidas do inconsciente”. p. desenvolve a sensibilidade perceptiva e introspectiva. em psicoterapia transpessoal. visando a flexibilização da mente e facilitando estados de consciência mais claros e profundos. p. insônia. p. Contudo. Chinen e Battista (1996) apontam que mais de mil estudos sobre meditação feitos em laboratórios foram citados em revistas científicas. incorporada em mente/corpo e aberta para o fluxo de todas as manifestações possíveis de contato com o mundo fenomenal. a uma “regressão a serviço do ego”. para isso as técnicas de construção de estrutura. raiva. no mínimo. As pesquisas cientificas sobre meditação aumentaram muito nas últimas três décadas. favorecendo o despertar do discernimento. Scotton. na percepção e na imagem que temos de nós mesmos.123). no aspecto terapêutico. também na depressão profunda porque acentua o estado de apatia e inação nesses casos. na experiência interior. reduz o diálogo interno predispondo à serenidade mental e à tranqüilidade emocional. nesses níveis. as técnicas de revelação. Este autor aponta que a confusão entre estes objetivos reduz a meditação. de anáslise de scrip e a técnica do diálogo socrático. As pesquisas revelam que. quando na realidade sua verdadeira meta é favorecer uma “progressão a serviço da transcendência do ego” (ibid. Testes feitos através de eletroencefalogramas. além de provocar alterações benéficas no comportamento. Wilber (1999. da alegria e do amor universal. 123) aponta que a meditação. ombros sem tensão. observando o fluxo dos pensamentos sem criar nenhum vínculo com eles. contudo. semelhante à manejada pela acupuntura.os teóricos que reinvindicam que a meditação é narcisista imaginam que os meditadores estão indo para dentro da mente. prana. corpo imóvel. Outro caminho de colocar a mente em meditação é deixando-a em uma atitude aberta. como por exemplo analisar um tema específico.Self suficientemente estabilizado para suportar as experiências mobilizadas pela meditação. No oriente esta prática é conhecida como Vipassana. portanto. Também de acordo com a abordagem. com os procedimentos terapêuticos nesses níveis (WILBER. F-6) se beneficia da meditação. Diferentes tradições espirituais colocam objetivos os mais variados e profundos na meditação. 1999. Jack Engler. nos seguintes requisitos:  postura corporal: sentar com pernas cruzadas na posição oriental. destacado por Wilber. na verdade indo até o seu interior e. dependendo da tradição. Em psicologia poderíamos associar com o orgônio de Reich ou a pulsão freudiana.. menos subjetivas. mais universais. relaxado e confortável. abertos ou semi-abertos. evitando o excesso de salivação. Não obstante. Wilber (1999. apresentando diversas formas. Olhos fechados. No meio psicológico. A maioria das patologias do nível pessoal (F-4. buscando compreendê-lo nos mínimos detalhes. “tanto por causa de seus próprios méritos e benefícios intrínsecos como por causa de sua tendência a “descontrair a psique e a facilitar a desrepressão nos níveis inferiores. de uma forma auxiliar. É uma atitude semelhante a do observador transpessoal. mais compassivos”. coluna ereta. menos egocêntricos. quando possível. que podem passar a usá-la como uma defesa para as vivências de estados de “não-ego”.  postura de mente: aqui se pode realizar reflexões analíticas. indica. sendo clássica a afirmação de Franz Alexander que a meditação seria uma regressão narcisista. transcendendo-a: menos narcisistas. mais abrangentes e. p. o fascínio exercido pela meditação budista para os indivíduos limítrofes (F-2). Abhidharma: tratado de psicologia oriental 52 .  postura da fala: fala aqui tem o sentido de energia sutil. contribuindo.. apenas seguir o ritmo natural da respiração é a recomendação básica. certas particularidades estão presentes em toda orientação prática. em última análise. peito aberto. assim.129) se opõe a esta visão afirmando: “. desde as mais comuns às mais complexas dependendo dos propósitos auferidos. F-5. p.  O controle da energia é feito a partir da respiração calma e abdominal. mas eles estão. 126-127). assim. bioenergia. a psicanálise parece ser uma das escolas que mais veementemente se opõe ao uso da meditação atrelada à terapia. a língua fica voltada para a abóbada palatina. pois é ele que nos impede de reconhecermos nossa natureza ilimitada. que motiva (2) uma ação. o desenvolvimento do embrião. podemos superar essas situações. o encadeamento no qual cada elo condiciona e é condicionado pelos demais –. 18 Neste texto trataremos do primeiro elo da “roda da vida”. pelo exercício de antídotos. Avydia = perda da visão. 2003. Motivados pela ignorância das múltiplas separatividades realizamos ações virtuosas e nãovirtuosas. que constitui o padrão da vida humana como uma busca circular interminável na tentativa de ancorar a experiência em um self fixo e permanente” (VARELA. Nele os níveis transpessoais de desenvolvimento da consciência são delineados. p. é chamado de (5) esfera dos sentidos. um mapa de um processo interno e seus efeitos externos. do desejo. a roda da vida revela como. que é chamado de (3b) consciência resultante. 18 Vidya = sabedoria. (9) o apego. lucidez. esboça uma cosmologia psicológica interior. 121-122). da sensação. (7) a sensação. servindo de guia norteador para entender os desafios apresentados no caminho de individuação. O referido diagrama. Depois da formação do corpo. é estabelecida uma predisposição dentro da consciência. o que conduz a estados mentais diversos. O começo de uma nova vida é chamado de (4) nome e forma. Avydia . desenvolve-se (6) o contato. ou seja “a estrutura circular dos padrões habituais. chamado de “A Roda da Vida”. que são os seus efeitos. THOMPSON. do contato. 53 . As doze partes do aro externo da roda da vida apresentam em detalhe os estágios de causa e efeito que levam às situações aflitivas da nossa vida. como esse processo pode ser revertido e como os budistas se colocam num universo sempre cambiante de causa e efeito. a nova vida começa com (11) o nascimento e continua com (12) o envelhecimento e a morte.O Abhidharma é um conjunto de textos que trata daquilo que no ocidente temos como psicologia. Isto leva – depois de um tempo que pode ser longo – ao renascimento. Ao final da ação. desenvolve-se no fim da vida um estágio chamado de (10) existência. O estágio seguinte. (8) o desejo. visão. O surgimento dependente da existência cíclica começa com (1) a ignorância. que é de fato o momento imediatamente anterior a uma nova vida. chamada de (3a) consciência causal. ROSCH. A “roda da vida” é um famoso quadro budista de uma roda com vinte e uma partes que esboçam o processo de surgimento das identidades mediante os renascimentos causais. assim como nos põem no ciclo existencial de 17 Vale salientar que a formação acadêmica no Tibete era realizada nos templos. Ao iluminar as causas das situações de limitação e dor. Esse quadro está praticamente na entrada de todos os templos 17 no Tibete e naqueles que foram construídos no Ocidente. Ele descreve vivamente como ficamos presos em um redemoinho contraproducente de sofrimento. do apego. oferecendo uma visão das emoções destrutivas e o percurso da formação da noção de identidade através da “roda da vida”. O cubo surge e temos a experiência de que ele está fora do nosso alcance. Segundo Padma Santem (2004. é necessário reconhecer que ela não é uma separatividade verdadeira mas uma experiência de separatividade. se não há cubo no papel. parece surgir uma separatividade. Curiosamente. observar que temos a experiência de separatividade. ele não está separado. descreve assim este exemplo: Vemos que o cubo está na folha de papel. a separatividade surge pelo poder da inseparatividade. aponta a sua natureza de experiência. 25-29) para explicar uma análise descritiva da consciência. o próprio cubo surge porque há uma inseparatividade. não teríamos esse poder. Tudo que temos aqui são riscos em uma folha de papel. experiência de trancamento e perda da visão espiritual. Partindo das idéias de Padma Santem (2002). separado. ao fato deste ser um exemplo comum na fenomenologia (SOKOLOWSKI. com o intuito percebermos as contribuições que as tradições orientais tem oferecido para o Ocidente através da psicologia transpessoal. Por outro lado. Por que? Porque podemos rapidamente transformar o cubo em um hexágono novamente. ao mesmo tempo em que apresenta a separatividade. criação. No entanto ele parece se formar no papel e.insatisfação. também. Se acreditarmos que a separatividade é verdadeira. no entanto. com essa palavra “separatividade” conseguimos introduzir a expressão “experiência de cubo”. podemos transformar esse cubo em outro cubo. Para que possamos perceber a separatividade e para que possamos acusá-la de separatividade. perdemos a nossa liberdade. Por que? Porque. Podemos observar ainda que nós estamos em um certo lugar e o cubo sobre a folha de papel está em outro. não ocorra. pelo poder da inseparatividade. ainda que ela. na verdade. ou seja. Nós podemos. Assim. nós ficamos presos a ela. o exemplo do cubo. sendo o fenômeno antes de tudo interdependente. iremos apresentar a seguir as seis características básicas de avydia: separatividade. A experiência de separatividade Utilizaremos o exemplo do “cubo” para introduzir a noção de separatividade conforme destacado por Padma Santem (2002. experiência de mundo. Padma Santem (2002. desta forma. Assim. vemos o cubo na folha. nesse momento. cegueira. p. Essa escolha deve-se. s/p). temos a 54 . É muito fácil ver que esse não é o caso. 2004. O cubo não se forma no papel. s/p). Mas essa separatividade não é experimental. pois. Temos a experiência de cubo sobre a folha de papel. s/p). Nós fazemos surgir o cubo no papel. Se o cubo estivesse em uma folha de papel. Como podemos perceber a inseparatividade aqui? Porque não há um cubo propriamente. quando olhamos. há uma ausência de uma identidade auto-existente e fixa. Se alguém nos perguntar “Onde está o observador?”. No entanto. assim. Na verdade. É muito importante contemplarmos isso.experiência separativa. (Op. em uma interdependência. Sem observador. precisamos ter a experiência de uma mente livre. Dessa forma. Nós estamos automatizados a nos ver como observadores. não há observador. a experiência da criação. s/p).. geralmente apoiados no gosto ou não-gosto. Padma Santem destaca que a criação da experiência apresenta vários aspectos.. Sempre que utilizarmos o processo de separatividade. se trata de uma ação não-causal. o observador surge junto com o objeto. Ele surge numa inseparatividade que está operando. o surgimento do sujeito. “sem objeto. Nessa perspectiva. o que conduz a uma desincorporação da realidade vivencial e leva a uma abstração que poderíamos caracterizar de “sobrevôo do pensamento”. nos encontramos presos à causalidade da “roda da vida”. pelo processo de separatividade. Nesse ponto. estaremos atuando de forma causal. construídas a partir de referenciais limitados. apontaremos para o nosso corpo e diremos “Aqui estou eu”. inseparável do mundo. Experiência de Criação A segunda característica ou atributo de avydia é a criação. como destacam Varela. pois esse item nos conecta com a noção „Quem sou eu? Como eu surjo? Como a minha identidade surge? Como a operação dela surge?‟ Nós surgimos no mesmo fenômeno dos objetos contemplados. não há objeto”. cit. Atribui esta dificuldade ao automatismo de nos percebermos continuadamente como observadores separados do mundo.. sendo mais fácil a percepção do surgimento do objeto do que do observador. um dos primeiros desafios no processo de crescimento psicológico está na superação da visão de separatividade que nos limita e governa. Padma Santem aponta que. Sempre que usarmos o processo de inseparatividade para produzir os efeitos. o observador surge ou co-emerge. essa separatividade não ocorre realmente. (Op. [. mas ela não é abrangente. sujeito e objeto surgem inseparáveis. Para percebermos a mente operando no papel de observador. Essa dinâmica de separatividade nos conduz a uma rede de causalidades. ele não pode ser explicado pelo desenho. Assim. o cubo não está em causas externas. s/p). cit. Thompson e Rosch (2003). não é segura. contudo: O próprio surgimento do cubo é não-causal. estaremos operando de forma não-causal. o surgimento da localização das coisas e o surgimento da localização espacial de posição 55 .] Temos o surgimento do objeto. Indicando que o “sujeito”. podemos recriá-la. à experiência de localização. s/p). ainda. “Nós temos uma experiência de paisagem onde contém tudo. Temos. uma jibóia. Tudo isso são „experiências de‟ (PADMA SANTEM. temos a experiência de criação com esses itens vários e. e assim nos diz que: 56 . Padma Santem (Op. então. Como vimos. cit. sua matriz mudaria. avaliamos a distância e vemos as nossas possibilidades de fugir. temos três experiências de fechamento.de objeto e de sujeito.] Quando a criação se dá.. [. surge o impulso natural de ação. em que esse reconhecimento acontece. o aspecto de localização. já estamos saindo pela outra porta da sala. Quando analisamos o processo de criação presente no surgimento de sujeito e objeto. mental. Se ela fosse atacada pela sua jibóia. vamos reconhecer uma paisagem mental atuando. Nós olhamos para a jibóia. à experiência de paisagem e. 2002. A noção de “experiência de” é fundamental para flexibilizar os padrões de rigidez identitários encontrados ao longo do processo de individuação. 2002. Quando sutilizamos essa paisagem. Antes de raciocinarmos propriamente. Uma pessoa que tem uma jibóia domesticada em casa. não pode ser visto como uma entidade distinta dos processos presentes em seu surgimento. aí surge o impulso. entrando na sala. Para exemplificar esse processo do surgimento da localização espacial. Padma Santem (2002. é plástica. vemos que isto ocorre em uma paisagem. No entanto. pode ser que desenvolvamos um outro tipo de relação. Todas as outras experiências são a contemplação de como a cegueira se estabelece. mas essa experiência de jibóia não diz respeito propriamente à cobra que está entrando. Olhamos para a cobra e temos uma „experiência de jibóia‟.. à experiência de sujeito. Agora. temos o aspecto de paisagem e ainda o aspecto de impulso de ação. ao mesmo tempo. Por que chamamos isso de experiência? Porque ela é móvel. s/p). neste autor essa paisagem é a paisagem física e. podemos refazê-la. paisagem e ação de impulso. cita o exemplo a seguir: Estamos aqui sentados e vemos uma cobra. o “background” na linguagem de Varela.” (PADMA SANTEM. s/p). estaremos sempre sob o efeito de algo que é uma experiência.. teria uma reação diferente da nossa. Nós temos uma experiência de acordo com a nossa matriz de jibóia. Temos uma experiência separativa. s/p) introduz as letras “A” e “B” para indicar a experiência de percepção de dois cubos. Experiência de Cegueira A experiência de cegueira também pode ser percebida por meio do exemplo do cubo. Por que? A matriz de jibóia dela seria diferente. Por quê? O impulso de ação surgiu! Mais tarde. Ele está ligado à experiência de objeto. Quando olhamos sensorialmente ao redor.. Enquanto atuando separativamente. Portanto. Um sujeito seria mais integral. definem o grau de educação que a pessoa teve. seja a cognição ou o afeto. porém.Quando vemos um cubo. não vemos o outro. Sempre vamos atuar segundo essas matrizes. LOKA) A quarta característica de avydia é a experiência de surgimento de mundo. de forma que seria cada vez mais inclusivo em todas as dimensões. existe uma estrutura sutil que me permite ter experiências de cubo. a experiência de Loka produz uma cegueira que nos aprisiona dentro de uma percepção natural. por exemplo. Quando vemos um. quanto menos cegueira apresentasse. Esta é a primeira cegueira convencional. O conjunto de todos esses objetos e situações chamamos de Loka. s/p). (PADMA SANTEM. Quando vemos algo e temos o impulso de ação correspondente ao que vemos. nos ocupamos com ele A e não nos damos conta que perdemos o outro. a um processo mental sutil que nos permite. Só podemos ter as experiências separativas que correspondem a uma Matriz sutil. Transpondo isto para a noção de sujeito que aqui estamos tematizando. no qual as nossas possibilidades de percepção ficam estreitadas por uma “matriz sutil” que só nos permite pensar o que pode ser pensado e ver o que pode ser visto dentro de um determinado contexto. definem a cultura de uma família. estaremos sempre na dependência dessas matrizes. acabamos por criar uma cegueira semelhante. não vemos o outro. mas esse processo fica oculto. Neste desenho. a cultura e a educação são processos de construir. temos um universo de possibilidades de experiências. Estamos frente a uma cegueira convencional: porque vemos com o „A‟ na frente. Experiência de Mundo (sânsc. Assim. um com vértice „A‟ na frente e outro com o vértice „B‟ na frente. presos dentro dele. que indica um surgimento condicionado efeito direto da separatividade. Essas matrizes ainda se ampliam. 2002. Quando vemos um. Elas definem a cultura de um povo. por exemplo. elas seguem além de vida e morte. nós vemos os objetos nos diversos lugares com o conteúdo que nós experimentamos. pode-se B ver dois cubos. Essas estruturas. não vemos mais com o „B‟ na frente. o Loka. vamos nos movimentar segundo aquela cegueira e vamos seguir assim. fica claro que quando priorizamos um dos aspectos do desenvolvimento humano. de manipular alguns itens dentro dessas estruturas. No Loka. é o mesmo que nos permite fazer surgir a experiência do cubo. Esse processo mental sutil.. O conjunto de experiências de surgimento de “objetos” tal como explicado acima faz surgir para nós a experiência de um “mundo inteiro”. [. Por que vemos um não vemos o outro. porque temos uma matriz que nos possibilita coisas.] Me refiro a Loka 57 . em sânscrito LOKA. A família. ultrapassam vida e morte. a nossa mente atua a partir dos sentidos físicos e nós localizamos todas as experiências separativas. Nós estamos fechados. s/p). perdemos a percepção do outro. Tem um processo. s/p). dificultando o processo de compreensão. no mesmo Loka. cit. [. segundo exemplo mencionado por Padma Santem (2002. sabemos que existe um outro. discursivo ou mental.. requerendo um processo de aprendizagem e também de abandono de padrões de visões já estabelecidos. Os dois cubos estão no mesmo universo. Tanha) Quando se estabelece uma visão qualquer. Então tentamos voltar e temos dificuldade. A experiência de mundo é uma experiência que vem de um nível muito mais profundo. Experiência de trancamento. Tentamos passar para o outro lado mas não temos a experiência. Loka é uma experiência que brota livre do raciocínio.] Nós temos cinco sentidos físicos e um sentido mental. quando vemos um não vemos o outro. Ele é uma impossibilidade sutil. Nessa primeira cegueira.] Quando observamos o desenho do cubo. [. Não é uma opinião de cubo que se manifesta. surge uma energia de defesa frente a essa visão. Porém. É muito difícil. uma defesa que ajuda a preservar nossa visão de mundo. selamento. Recorrendo ao exemplo do cubo.. essa experiência está se manifestando em um nível muito sutil. Loka define as possibilidades das experiências sensoriais. vemos que os dois são possíveis. como as diferenças de alimentação entre culturas e o diálogo entre médicos tradicionais e acupunturistas. inteligível. É um processo de trancamento.. Enfim. Nesse sentido. Loka funciona como filtros que impedem a percepção. Quando reconhecemos o cubo. O mesmo Loka tem os dois cubos. tentamos vê-lo. uma miopia. Loka domina as mentes que atuam junto com os sentidos físicos. mas uma visão de cubo. um processo que pode produzir uma vontade de trancamento. é um processo de perda de mobilidade do referencial da mente que produz a experiência. 58 . conseguimos. apresenta-se como um caminho de superação desta cegueira. De repente. há uma “matriz sutil” que impede a percepção. ela se estabelece em um nível mais sutil do que o próprio acesso convencional. quando focalizamos um cubo específico.. mas essa experiência não é dominada pelo raciocínio. há um trancamento na percepção que impede o deslocamento da visão. Quando uma cultura se estabelece. o uso da meditação e de outros ampliadores da consciência como um recurso terapêutico. por mais justificativas que os últimos apresentem a respeito da fisiologia de canais sutis de energia do corpo humano.. por exemplo. Nós não percebemos que a experiência sensorial está filtrada por uma mente específica. Em sânscrito esse trancamento denomina-se Tanha. A experiência de mundo brota de níveis mais sutis. mesmo sabendo da possibilidade da existência do outro. fechamento (sânscr. Assim. mas não conseguimos.em um sentido muito sutil. e ela se solidifica na forma de uma identidade. (Op. nos quais o raciocínio lógico não interfere. como defesa. s/p).. Cada vez que olhamos para o cubo o reconstruímos. vemos apenas lâmpadas. Isso é Avydia. a perda da lucidez referente a todo o processo ocorrido nos cinco itens anteriores.. sincronizadas em forma de linhas. Quando as palavras estão andando nem estamos mais vendo letras. o que por sua vez impede os deslocamentos das experiências de mundo e de objeto. Essa é a perda mais grave.] Quando vemos isso acontecendo. que apenas apontam Avydia. nos movemos dentro dos universos específicos e simplesmente não tomamos conta do que está realmente acontecendo. as palavras andam e têm significados correndo ali. [.] Para que possamos compreender melhor como Avydia age. No início.. Precisamos reconhecer que nós criamos todas as circunstâncias. mas linhas. precisamos perceber que a inseparatividade está atuando incessantemente. nos ajuda à movimentação no mundo. Essa experiência. a fixação gera aprisionamentos. [. A Perda da Visão Espiritual A sexta característica de avydia é a perda da “visão espiritual”. já existe uma certa dificuldade de deixar de ver as palavras e olhar as letras.Um exemplo claro desse processo em andamento pode ser percebido no exemplo a seguir: Vamos supor que estejamos olhando painéis de lâmpadas. não estamos mais vendo lâmpadas. Quando temos a compreensão e nos damos conta disso acontecendo. Ele não vê isso acontecer. de se mover no meio desses fenômenos. Com mais luzes sincronizadas. Mais tarde. andamos para lá e para cá. as letras formam palavras. a idéia terapêutica transpessoal busca romper com este processo de trancamento por meio da incorporação gradativa do sujeito no mundo vivido. Alegremente. podemos reconstruí-lo diferente. saímos correndo atrás dos objetos.. Depois. pensamos que o cubo é a experiência de cubo. contudo. s/p). podemos andar no meio dessas experiências e só vamos encontrar mais exemplos. Segundo Padma Santem (2002. outras ali. separado de nós. ou seja. não vemos acontecer. pois não permite a mobilidade da visão. quando algumas lâmpadas acendem. O processo de ensino funciona nessa perspectiva. estaremos vendo letras se formando. contudo. favorecendo a visão para alguns aspectos e o trancamento para outros. Nesse momento. Quando começamos a olhar de um certo jeito. que ele está na frente. (Op. pois permite o foco. Como não nos damos conta disso. quando o re- 59 . umas aqui. Também não conseguimos deixar de olhar as letras e ver as lâmpadas. temos uma proteção para conseguir seguir olhando daquele jeito. mais lâmpadas acendem. De repente. aí vem Rigpa. Por esse motivo. O processo de trancamento.. esses 5 itens são explicados pelo cego – cego da visão espiritual. Cit. Todos os cinco itens anteriores operam de forma oculta. F. FOUCAULT. M. PE. O médico quântico: orientações de um físico para a saúde e a cura. O xamanismo e as técnicas arcaicas do êxtase. ______. A meditação e as visões de homem e mundo presentes no Abhidharma são contribuições que foram adaptadas da sabedoria Oriental pela psicologia transpessoal. Paris: Seuil/Gallimard. O vestígio e a aura: corpo e consumismo na moral do espetáculo. GOLEMAN. 1996. ______. dizemos “ele não é mais o mesmo!”. Rio de Janeiro: Campus. São Paulo: Ed. Emoções que Curam: conversas com o Dalai Lama sobre mente alerta. In: Transperesonal Psychotherapy. J. 1999a. Édition établie par François Ewald et Alessandro Fontana. Eliade. e estão cada vez mais ampliando as possibilidades de diálogo e alargando as contribuições para concretização de uma vida mais humanamente vivida. A. 2004. na cidade de Recife. 2008. Treine a mente. (Ensinamentos orais transmitidos em agosto de 2004. par Frédéric Gros. São Paulo: Cultrix. L. São Paulo: Palas Athenas.construímos diferente. Objetiva Ltda. São Paulo: Prumo. Hautes études). M. Meditation and consciousness: an Asian approach to mental Health. Ejercicios espirituales y filosofía antigua. Cours au Collège de France. 1981-1982. Rio de Janeiro: Ed. Consciência emocional: uma conversa entre Dalai Lama e Paul Ekman. 2004. Martins Fontes. Rio de Janeiro: Objetiva. emoções e saúde. Atribuímos a função a ele. A inteligência emocional: a teroria revolucionária que redefiniu o que é ser inteligente. GOSWAMI. Rio de Janeiro: Ed. S. 2001 (Coll. Recife: mimeo. 1999b. mude o cérebro. Referências bibliográficas BEGLEY. 60 . Como lidar com emoções destrutivas – para viver em paz com você e os outros: diálogo com a contribuição do Dalai Lama. transcritos por Floridalva Cavalcante). P. Madri: Ediciones Siruela. Yoga: imortalidade e liberdade. 2003. P. Albany: State University of New York. Psicologia budista: ensinamento sobre os doze elos da originação interdependente. 2006. 2006. D. 2004. 2008. PADMA SAMTEN. L'Herméneutique du sujet. ______. COSTA. ______. EKMAN. Rio de Janeiro: Garamond. HADOT. Edited by Seymour Boorstein –2 nd ed. Rocco. 1988. terapia. SOKOLOWSKI. D. PSICOLOGIA CIÊNCIA E PROFISSÃO. WILBER. O projeto Atman: uma visão transpessoal do desenvolvimento humano. 61 . As Seis Formas de Avidia. 2001. REVEL. O monge e o filósofo: o budismo hoje. M. SILVA. [online]. RICARD. no. Psicol. F. cienc. Tradução de Joana Angélica d‟Ávila Mello. 1999. Introdução à fenomenologia. Disponível na World Wide Web: <http://pepsic. da.18 de fevereiro de 2002 . Londres e Nova York: Routledge. São Paulo: Ed. 2002. p. (Ensinamentos orais transmitidos no Retiro em Viamão.25. J. Cultrix. (2002). prof.266-285. VECTORE. São Paulo. Psicologia e Acupuntura: Aspectos Históricos. São Paulo: Edições Loyola. ______. Políticos e Teóricos.______. jun. psicologia.2 [citado 15 Janeiro 2009]. espírito. On Belief.br/scielo. 10 . São Paulo: Ed.php?script=sci_arttext&pid=S1414- 98932005000200009&lng=pt&nrm=iso>.org. ISSN 1414-9893. 27 (3). Psicologia integral – consciência. ZIZEK. 1998. K. S. F. Celia. Psicologia e acupuntura: primeiras aproximações. 418-429. Cultrix. 2004. 2005. vol..bvs-psi. 2007. Mandarim.transcrito por Eliane Steingruber). R. Capítulo 2 Histórico 62 . tradução nossa). pesquisa. 1972. incluem perspectivas em desenvolvimento de psicologias fenomenológicas. administração. A Psicologia Humanista é uma perspectiva de Psicologia que passou. dinamicamente ativo no momento presente (MASLOW apud MILHOLAN. A associação busca contribuir a psicoterapia. reconhece a riqueza completa da experiência humana. de capilaridade científica nos gran63 . organização. 2009. enquanto associação e perspectiva psicológica. a Psicologia Humanista. à época. 2009. construtivistas. FORISHA. como também. diversidade cultural. Abraham Maslow (s/d) foi uma figura de destaque na organização e no desenvolvimento da Psicologia Humanista. estabelecida no âmbito da APA. teoria/filosofia. educação. tradução nossa). o existencialismo e a fenomenologia. Essa divisão busca contribuir com a psicoterapia. administração. a mesma Divisão reconhece a si mesma enquanto. Suas fundações incluem o humanismo filosófico. grifo nosso. educação. grifo nosso. pesquisa. embrionariamente e com outras denominações. p. Dessa constelação de autores. Segundo a Division of Humanistic Psychology. diversidade epistemológica. hermenêuticas.21). responsabilidade social e mudança (AMERICAN PSYCHOLOGICAL ASSOCIATION. feministas e pós-modernas (construcionismo social). NO CENTRO E NAS FRONTEIRAS DO HUMANO E SUAS PSICOLOGIAS Acho justo dizer que jamais será completa uma teoria de psicologia que não incorpore centralmente o conceito de que o homem tem seu futuro dentro de si. No entanto. mais recentemente. teoria. Ainda que suas pesquisas sobre Motivação e Personalidades Auto-realizadas não gozassem. uma constelação de ´psicologias humanistas´ que incluem previamente a abordagem rogeriana e as orientações existenciais. organização. a existir enquanto um Movimento na década de 1950 e firmou-se nas convenções da Associação Americana de Psicologia (APA) no decorrer das décadas de 1960 e de 1970.Capítulo 3 REDIMENSIONANDO OS CONCEITOS E OS TERRITÓRIOS CONTEMPORÂNEOS ENTRE DUAS FORÇAS DA PSICOLOGIA AS FRONTEIRAS ATUAIS QUE DISTINGUEM EXPERIÊNCIAS NO HUMANISMO E NO TRANSHUMANISMO . responsabilidade social e mudança (AMERICAN PSYCHOLOGICAL ASSOCIATION FOR HUMANISTIC PSYCHOLOGY. a Psicologia da Gestalt (SCHULTZ. e as reflexões de cunho Existencial promovidas por Rollo May no campo da Psicoterapia. Até então. Aliadas a tal empreendimento científico de fundação. 64 . ao enfocar estudos e teorizações sobre personalidades sadias e orientadas para uma perspectiva positiva e menos patológica (FRICK. fato que o impulsionou na criação de uma Rede Eupsiquiana para contornar estas dificuldades.des círculos acadêmicos. Tardiamente acostada à cultura americana. enfocando o indivíduo em seu dinamismo pessoal de relação orgânica e subjetiva ao ambiente. A Psicologia “Personológica” ou da Personalidade (HALL. não se vinculara diretamente à elaboração do Movimento de Psicologia Humanista. 19 Rogers apenas se filiou à Associação de Psicologia Humanista em 1964. Destarte. não tardou para que grupos de psicólogos formulassem pesquisas e teorias sobre a estruturação e desestruturação da personalidade. acerca dos Processos de Mudança de Personalidade em Psicoterapia. Maslow (1970) e uma plêiade de outros psicólogos conseguiram firmar e legitimar a Psicologia Humanista na APA. numa crítica ao reducionismo do Estruturalismo e da Reflexologia (DEWEY. JAMES. além de desenvolver contribuições específicas nas vertentes de estudos organísmicos (GOLDSTEIN. 1995) e investigações motivacionais e comportamentais no contexto social (LEWIN. Nessa vertente. As pesquisas ditas “gestalticas” centraram-se nos princípios da organização perceptual e outros processos cognitivos. encontramos as pesquisas de Carl 19 Rogers . houve um aumento do status acadêmico e científico dessa nova proposta em Psicologia. Esta concepção funcionalista de Organismo. 2007) somou-se à crítica funcionalista dirigida ao pensamento então corrente. a identificamos a presença do Funcionalismo Norte-Americano em sua vertente advinda das Ciências Naturais. o criador da Terapia Centrada no Cliente e da Abordagem Centrada na Pessoa. 1975). ao contrário de Maslow e May. através de estudos empíricos e positivistas. SCHULTZ. LINDZEY. 1984) investigou os processos motivacionais adjacentes aos processos organísmicos e psicológicos ligados entre si funcionalmente. 1971). faz-se presente na maioria das Teorias do Humanismo Americano. 1971. Com a entrada de Rogers. no bojo da recém-criada Escola Humanista. permanecia como um Movimento Humanista. Henry Murray e Gardner Murphy. a partir da Psicologia. podemos localizar as seguintes pilastras de fundamentação. devido as suas pesquisas reconhecidas e sua antiga presidência na APA. a exceção de May. Filosofia e Psicoterapia: A) No campo da Psicologia. Dessa convergência laborativa. 1975). então. a Psicologia Humanista apropria-se e inova com estes aportes. auto-regulação e comportamento do Organismo em relação ao ambiente. foram lançadas as bases teórico-metodológicas em Psicologia e Psicoterapia daquilo que. desenvolvimento. que nos ajudou a investigar os processos de auto-conservação. Utilizando das pesquisas de Gordon Allport. Muitos estudos advindos da Psicologia da Gestalt serviram-se como fundamentação para teorizações sobre personalidade, elaboradas por expoentes humanistas do calibre de Kurt Goldstein, Fritz Perls, além de Maslow e do próprio Rogers. B) No campo da Filosofia, para abalizar insights e reflexões humanistas, essencialmente oriundas dos contextos e das experiências clínicas, dialogou-se com as perspectivas: existencialis20 tas de Soren Kierkggard e Martin Buber ; fenomenológicas de Edmund Husserl e Martin Heidegger; e pragmatistas de William James e John Dewey. Em comum, um enfoque na experiência humana e em suas formas de compreensão verdadeira e não dual. C) No campo da Psicoterapia, muitas teorias neo-freudianas influenciaram a Psicologia Humanista. Apenas para mencionar algumas: a Psicologia Analítica em sua noção de selbstverwirklichhung, culturalmente traduzida como Self-Actualization em inglês ou individuationis em latim, influenciou as noções humanistas de “realização do Si-Mesmo”, a Psicologia Individual de Alfred Adler (SCHULTZ; SCHULTZ, 2007) em sua teoria sobre o poder criativo do Self, auto-imagem idealizada e interesse social; e a Terapia Relacional de Otto Rank, em suas atitudes compreensivas e focadas no momento presente da relação (ROGERS, 1992), dentre outras. Ainda nesse campo, a Psicologia Existencial, encabeçada por May (1974), configurou-se como uma perspectiva psicoterapêutica fundamentada diretamente pelas filosofias existenciais e fenomenológicas para elaborar, nos Estados Unidos, uma nova atitude no relacionamento psicoterapêutico. Essa última perspectiva distanciou-se das fundamentações organicistas presentes nas psicologias norte-americanas para radicalizar a experiência interior e resguarda suas origens na daseinanalyse européia. Contudo, seu vocabulário, suas reflexões e atitudes, tendo se firmado em solo norte-americano e havendo “impregnado-se” de numa nova tendência à psicologia e à psicanálise ortodoxas, findou por alinhar-se, em seus ramos de Psicoterapia, ao campo maior das Psicologias Humanistas. Por fim, como alguns desdobramentos do campo psicoterapêutico, surgiram, ainda, novas abordagens de trabalhos corporais, grupais, experienciais e de desbloqueio de tensões psíquicas, muitas tomando como fundamentação os trabalhos de Wilhelm Reich e sua Bioenergética, o Sociodrama de Jacob Moreno e os T-Groups de Kurt Lewin (BOAINAIN, 1998). Observamos, deste modo, que essas três concentrações de estudo (Psicologia, Filosofia e Psicoterapia) estão no âmago da Psicologia Humanista. Todavia, muitas dessas incursões apresentadas são equivocadamente apresentadas como sinônimas de “Psicologia Humanista”. 20 O pensamento de Buber foi enquadrado como existencialista pelos Humanistas. Porém, este situa-se mais como um Filósofo Hassidista em que os temas sobre a Dialogicidade interessaram à Psicologia. 65 Ainda que, de fato, tenham servido como influências e fundamentações, podemos argüir o que difere a Psicologia Humanista dessas respectivas perspectivas, ao ponto da APA estabelecer uma nova Divisão, com um novo objeto de estudo (a experiência humana) legítimo ao conhecimento Psicológico? Qual seria a inovação conceitual e metodológica que confere, ao Humanismo, uma matriz própria e o distingue dessas perspectivas gerais, anteriores e posteriores? A Psicologia Humanista consolidou-se como uma construção autônoma de proposta científica que valoriza a diversidade da experiência humana, num programa ético-político de transformação no modo de vida das pessoas. Nas palavras de Maslow (s/d), “tenciono prosseguir esse empreendimento, no sentido de ampliar os métodos e a jurisdição da ciência, de modo a torná-la mais capaz de assumir as tarefas das novas psicologias pessoais e experienciais” (p.17). No campo restrito da Psicologia, os estudos de personalidade foram essenciais à caracterização dessa Psicologia Humanista emergente, em termos da possibilidade de ponderarem-se aspectos mais positivos dos potenciais humanos, até então desconsiderados, e que seriam críticos na adaptação, modificação e transcendência de limites pessoais e ambientais. Nesse prisma, as pesquisas empíricas de Rogers (1992), correlacionando Psicoterapia, Mudança de Personalidade e comportamento, bem como as pesquisas de Maslow (1954), sobre hierarquias de Motivação e funcionamento da Personalidade, foram nevrálgicas para cumprir essa intenção. Muito embora aos campos das Filosofias, não tenhamos, fundamentalmente, inovado a partir da Psicologia Humanista, sem dúvida trouxemos, por outro lado, uma elaboração e desdobramento críticos, voltados para a Ciência ortodoxa e para a Psicoterapia de vertentes positivistas, expandindo suas reflexões para outros campos. Entretanto, na Psicoterapia Humanista, não há como negar-se o predomínio de releituras filosóficas para repensar suas intervenções. Para fundamentar essa opção teórica, muitas pesquisas empíricas deram-se a desenvolver metodologias fenomenológicas consistentes e aplicadas às pesquisas em Psicologia, porém, essa recriação configurou-se mais no âmbito metodológico da pesquisa do que como extensão de um saber filosófico (GOMES, 1998). Se pudermos, contudo, falar de uma grande inovação, tal faceta deu-se predominantemente no campo da Psicoterapia, seja como teoria, método, prática, pesquisa e ética. Em seu desenvolvimento e suas aplicações, a Psicoterapia e os Psicoterapeutas (sobretudo, Psicoterapeutas de formação científica na Psicologia), graças às pesquisas e aos embates políticos de Rogers, deixaram de ser exclusividade da medicina e da psicanálise, e passou a tornar-se parte do exercício, domínio e reflexão da Psicologia, permitindo, ulteriormente, uma abertura explosiva para o desenvolvimento de novas Abordagens. Sobre essa nova prática e concepção galgadas, Maslow e Mittlemann (1965) frisam que as metas dinâmicas da psicoterapia focam-se: no aumento dos sentimentos de auto-estima e segu- 66 rança, na libertação das inclinações para se manifestar, maiores insights, maior aceitação de si, integração e tendência para metas positivas. Tais características estão combinadas à percepção que a relação cliente-psicoterapeuta é ampliada mediante (MASLOW; MITTLEMANN, 1965): o desenvolvimento da personalidade e formação, teórica e pessoal, do psicoterapeuta, estabelecimento de rapport, manejo de atitudes compreensivas e respeitosas ao paciente, interesse em uma relação horizontal sem submissão de poder e capacidade para lidar com as atitudes do paciente. De tal modo, Posto que o homem é um organismo que ocupa um lugar mais elevado na escala de desenvolvimento intelectual, uma das finalidades de toda psicoterapia é liberar as funções intelectuais até suas mais plenas potencialidades, ou seja, lograr que o indivíduo integre suas atividades emocionais e intelectuais numa unidade harmoniosa (MASLOW; MITTLEMANN, 1965, p.46, grifo nosso). Muito embora estes avanços tenham legitimado um lugar acadêmico e clínico para a geração inicial da Psicologia Humanista, foi o mesmo Maslow (s/d), ainda na década de 1950, que também aludiu que essa nova Psicologia, ainda recém-criada e buscando oferecer respostas sistematizadas a uma série de desafios culturais, já continha, em si mesma, o prenúncio ou o embrião para desenvolver-se através de uma nova proposta para além dos aportes Humanistas já ressaltados. Em seu pensamento, explica-nos Maslow (s/d): considero a Psicologia Humanista, ou Terceira Força da Psicologia, apenas transitória, uma preparação para uma Quarta Psicologia ainda ´mais elevada´, transpessoal, transumana, centrada mais no cosmo do que nas necessidades e interesses humanos, indo além do humanismo, da identidade, da individuação e quejandos [...] Essas Psicologias comportam a promessa de desenvolvimento de uma filosofia de vida, de um substituto da religião, de um sistema de valores e de um programa de vida cuja falta essas pessoas estão sentindo [...] Necessitamos de ´algo maior do que somos´, que seja respeitado por nós próprios e a que nos entreguemos num novo sentido, naturalista, empírico, nãoeclesiástico talvez como Thoreau e Whitman, Willian James e John Dewey fizeram (p.12, grifo nosso). Nessa perspectiva, Maslow (s/d) construiu um cenário de propósito onde figura o desenvolvimento de um novo campo fronteiriço à própria Psicologia Humanista, um campo que ele projeta intuitivamente como além de uma Psicologia que ele mesmo ajudou a construir (Humanista) e que, à época, dado o frescor recente de sua concepção, não se tinha clareza a respeito de suas delimitações. 67 Como superar e consolidar um novo campo, que não se contrapõe ao anterior mas avança em relação aos seus escopos, quando este campo originário ainda não poderia ser apreendido em sua robustez e arquitetura de intervenções? Maslow, nesse contexto escasso de respostas, inscreve a Psicologia Humanista como uma Psicologia das Transições, enquanto que a sua nova filha, uma Psicologia denominada TransHumanista, possibilitar-nos-ia satisfazer nossa “necessidade” de “algo maior do que somos”. Tomando que a Psicologia Humanista admite uma variedade de investigações e compreensões acerca das experiências humanas, podemos inferir que, ainda no curso dos seus estudos de Personalidade e Psicoterapia, consoante às exigências científicas da APA e da cultura acadêmica, Maslow anteviu que essa robustez Humanista não era o suficiente para dar conta de uma proposta mais radical de Psicologia e Psicoterapia. Maslow prestou-nos um ajuda de via dupla: autorizou o Humanismo como uma ferramenta própria das Travessias e das Transições, cabível aos Tempos das Mudanças, a partir de um lugar inclusivo das experiências humanas, que não era, por isso mesmo, dada sua abertura irretorquível, suficiente para impor-se como uma resposta razoável à “promessa de desenvolvimento de uma filosofia de vida, de um substituto da religião” (Maslow, s/d, p.12). Caberia ao Humanismo, em seu processo de desenvolvimento e maturação, servir-se, também, como ponte (teórica, metodológica, operacional, ética, científica etc) para ligar o Céu à Terra, na construção de um novo campo terceiro, a ele diferenciado, ainda que dependente do anterior para sua manifestação e realização. Em seus estudos, Maslow percebeu que alguns indivíduos auto-realizados conseguiam transcender-se indo além de ocasiões extemporâneas de experiências culminantes, chegando a um contato não apenas significativo como equilibrado com uma dimensão transcendente da vida. Essas experiências tidas como místicas foram definidas por Maslow como experiências platô, ao qual ocorre, no indivíduo, uma mudança de atitude e uma nova consciência intensificada do mundo. Assim sendo, os focos experienciais de espiritualidade, de auto-transcendência e da ampliação da consciência começaram, progressivamente, a distinguir-se de outras vertentes experienciais de estudo em Psicologia Humanista. Nesse aspecto, Maslow e outros psicólogos começaram a voltar-se para novas perspectivas, de fato fronteiriças a Psicologia Humanista, muito embora ainda presentes em seus limites. Humanismo e TransHumanismo nascem, a partir de Maslow, como gêmeos univitelinos, com a mesma ancestralidade e aspirações, mesmos pais, genética, concepção e barriga histórica, mesma cultura, transgressão política, contestações espirituais. Gêmeos com almas e propósitos de 68 então. essa nova Abordagem para os fenômenos e potenciais transhumanos virá a destacar-se pelo desenvolvimento de seu campo. conceitos e ferramentas psicoterápicas. mas. representada por um grupo de psicólogos e profissionais de outras áreas. um campo de Psicologia que rompe. grifo nosso). por completo. efetivamente rompendo com o cenário “maslowiano” do caminhar conjunto às metodologias da Psicologia e Psicoterapia Humanista cientificista. adentra. o repertório de experiências “centrada mais no cosmo do que nas necessidades e interesses humanos” (MASLOW. e que inclusive pode estar fora do organismo (BOAINAIN. desloca a ênfase aos aspectos circunstancias da personalidade. muito embora permanecendo ligados. incluindo-a em sua ampliação e expansão próprias. que a Psicologia Transpessoal é um desenvolvimento lógico-conceitual e histórico da Psicologia Humanista. espirituais e a estados alterados de consciência. Ainda que essa nova perspectiva não buscasse opor-se à Psicologia Humanista. Nessa auto-transcendência ou reivindicação dos potenciais últimos da experiência humana integrada. que estão interessados naquelas capacidades e potencialidades últimas. 1998. p. Antony Sutich. indelevelmente. logo de início. de ambos os sexos. uma proposta de Psicoterapia Transpessoal orientar-se-ia para uma auto-transcendência. Enquanto. a busca pelas “capacidades e potencialidades últimas”. Percebe-se. por conseguinte. que não possuem um lugar sistemático na teoria positivista ou behaviorista (“Primeira Força”). Essa perspectiva reconhece uma retomada de estudos e intervenções sobre a consciência. dedicando uma atenção sistemática às experiências ditas religiosas. existências que vão assumindo caminhos e contornos diferenciados. s/d.12). com a denominação do “TransHumanístico” para intitular-se “Psicologia Transpessoal”. dela valer-se. Em seu desenvolvimento. inclusive. na prática. à semelhança da Psicologia Humanista. na verdade. por exemplo. ou na psicologia humanista (“Terceira Força”) (apud BOAINAIN. por seus pontos comuns de nascença. Segundo. uma Psicoterapia Humanista trabalha com orientações que visam uma auto-realização do organismo e atribuem uma importância central à personalidade. Ampliou-se. muito rápido e dramaticamente. na teoria psicanalítica clássica (“Segunda Força”). como uma dimensão holográfica que contém o todo em sua complexidade. a Psicoterapia Transpessoal amplia a concepção do humano para além de seus aspectos individuais e biográficos de sua consciência e personalidade. tradicionalmente. o que.vida diferenciados. o desenvolvimento paralelo de uma nova visão de Psicologia com outra leitura de Ciência. Surge. mas que reivindica uma coerência própria ao que não coube nas demais forças. 69 . p. 1998). Uma Força que. 47. de Mundo e de Humano. concebendo-a. Psicologia Transpessoal (ou “Quarta Força”) é o título dado a uma força emergente no campo da psicologia. seguiram-se. assim. (2) A sua profícua produção científica. Devido à complexidade que reside nessa constelação de forças que atuaram na construção de uma nova perspectiva científica em Psicologia (culturais. especificamente. Este conceito. pode ser desdobrado de várias formas. aspectos conceituais do Humanismo que dialogam com as fronteiras do TransHumanismo. 2006). SEEMAN. de acordo com a história particular de cada uma das abordagens presentes nesta categoria. uma nuvem do que seria a prática e a visão de mundo Humanista. nos Estados Unidos. possuem uma tendência inata a desenvolver seus potenciais latentes (CAIN. históricas. tendemos a não localizar um núcleo identitário de características específicas. congrega. no próximo tópico. Essa escolha se faz justificada por uma série de fatores. mas. mesmo após a sua morte. congregador de muitas das inúmeras escolas atuais em Psicologia Humanista. ao contrário. buscando delinear conceitos e perspectivas-chaves que registram a singularidade deste Movimento. em seu trabalho. Neste sentido. lê e debate. discutíamos que a Psicologia Humanista surge no arremate de múltiplos fatores e condições que se apresentavam nas primeiras décadas do século XX. freqüentemente citado como um dos pesquisadores mais relevantes no trabalho em Psicoterapia. juntamente com a vasta literatura produzida por colaboradores diretos. denominada de Abordagem Centrada na Pessoa (ACP). ou seja. Apesar disso.Vejamos. científicas. bem sistematizado. sendo que três deles merecem destaque: (1) Carl Rogers é legitimado pelos inúmeros representantes deste Movimento como um dos mais importantes expoentes da Psicologia Humanista. dentre outras). as suas idéias e teorias. oferece-nos um amplo material teórico e prático. TRANS-FORMAÇÕES HUMANISTAS: HÁ TERRAS PARA ALÉM DOS HORIZONTES HUMANOS? No recorte anterior. Nesta seção. uma fronteira conceitual e experiencial da Psicologia Humanista que dialoga com uma perspectiva TransHumanista. a partir do fundamento da Tendência Formativa. seguidores e atualizadores do seu pensamento. distribuída nas mais diversas áreas de atuação. como podemos encontrar. que nos possibilita utilizar essa perspectiva como uma distinta representante da Psicologia Humanis- 70 . Nossa adesão segue uma vertente em Psicologia Humanista desenvolvida por Carl Rogers. além de ser reconhecido e respeitado pelas outras diversas abordagens em Psicologia. podemos afirmar que sua premissa básica reside na afirmação de que os seres humanos são dotados de uma capacidade de auto-realização. iremos aprofundar. um amplo público que conhece. ainda que difusamente. utilizando o exemplo de Carl Rogers. iremos desenvolver sobre a relação entre Psicologia Humanista e Psicologia TransHumanista. principalmente o conceito de Tendência Formativa com o qual este autor fundamenta sua Abordagem Centrada na Pessoa.ta de uma forma precisa e coerente. Seguindo nosso intento de produzir um panorama geral dessa Abordagem Humanista de Carl Rogers. e. É nesta mesma Universidade que ele finaliza seu Doutorado. 1980. e. Não sem razão. influenciado por sua experiência na fazenda. portanto. Rogers transfere-se para o Teacher´s College. (3) As formulações conceituais e metodológicas. sobre as conexões umbilicais nas demarcações seminais do Humanismo e do TransHumanismo. [a]o indescritível. a partir da inclusão nesta Abordagem de manejos experienciais relacionados ao “transcendente. 1999). John Dewey. contados após a obtenção do seu título acadêmico máximo. Neste ínterim. Rogers segue realizando práticas e pesquisas no Centro de Observação e Orientação Infantil da Sociedade para a Prevenção da Crueldade Sobre as Crianças. oficialmente. sendo talvez o ponto mais importante. no curso de Agronomia na Universidade de Wisconsin. habilita-nos a ponderar. nos dez anos que antecedem a finalização dos seus estudos de Doutoramento. 1980). da Universidade de Colúmbia. posteriormente. desenvolvidas por Carl Rogers nos anos 80. do renomado filósofo da Universidade de Chicago. iniciando. p. Rogers com doze anos se muda com a família para uma fazenda. [a]o espiritual” (ROGERS. Durante doze anos. iremos perfazer um percurso biográfico-conceitual em Rogers. o jovem Rogers decide mudar-se para o curso de História. Já nesta época. Este caminho parece ser justificado porquanto a sua história de vida e a formação de conceitos básicos da ACP corroboram às teses que. Rogers matricula-se no Seminário da União Teológica. sua formação como Counsellor e Psicoterapeuta. 131). em 1919. discípulo. Uma primeira década onde sua vida irá migrar por várias experiências. por sua vez. Rogers iniciava sua relação empírica com a ciência através de pesquisas noturnas para investigar e sistematizar a vida dos vaga-lumes (ROGERS. Nascido em 1902. onde freqüenta cursos relacionados à Psicologia. 71 . conhece a Filosofia Pragmatista e Teoria Experiencial da Educação. Após graduar-se nesta área do saber científico. por último. Rogers matricula-se. Estamos. William Kilpatrick. através do seu professor. expor articulações com o TransHumanismo. numa cidade nos arredores de Chicago. em 1928/29. mais adiante. já que seus pais tinham a “intenção oficial de fazer uma agricultura „científica´” (HIPÓLITO. Posteriormente à entrada na Universidade. Da sua experiência com uma educação libertadora. em Nova York. ao retirar-se da profissão de docência-acadêmica. Esta dinâmica relacional entre Self e Organismo – que irá derivar conceitos. 1984. 1940 até 1950/60. na Universidade de Minnesota. aprofundando na Abordagem que. Rogers já está construindo seu pensamento por quase três décadas de trabalho acadêmico. procedimentos de investigação e refinamento metodológico que irão ter influências marcantes em seu pensamento e na Psicologia Americana em geral. Rogers inicia uma série de pesquisas. dentre outros colaboradores 72 . considerado como campo integrado de experiências e funcionamentos singulares. uma ênfase emergente tem aumentado o foco na intersubjetividade e nos aspectos relacionais da psicoterapia” (p. posteriormente. um ex-engenheiro da NASA. LINDZEY. É importante observar que. Entretanto. estava mais intimamente correlacionado ao conceito de Organismo do que ao Self. como um aspecto ou manifestação do Organismo. tornado referência para a sua experiência. Rogers (1997) denominou de Tendência Atualizante. “contêm dentro de si as potencialidades para a saúde e o crescimento criativo” (HALL. grifo nosso). uma bióloga. Este postulado de um Organismo. de adaptação e atualização dos potenciais latentes. A partir daí. p. apesar da relevância destas formulações.41. inicialmente. Rogers e seus colaboradores utilizaram o conceito de Self para caracterizar essa experiência de coerência de Si.Este período foi de extrema importância na elaboração de uma prática e perspectiva singular no campo da Psicologia. o constructo básico de sua abordagem. recorrentemente. com o surgimento do Movimento Humanista. caracterizando-a. Todavia. por exemplo. como processos de Congruência e de Incongruência – será mantido como um aspecto preponderante até o momento teórico em que o Self passa a ser compreendido não enquanto estrutura substancial. e auxiliado por Maureen O´Hara. mas um fluxo relacional simbólico. “enquanto a ênfase inicial na teoria humanista tendia em direção ao desenvolvimento do Self como uma entidade. em 1940. a experiência. Posteriormente. foi denominada de Não-Diretiva. afirmando neste conceito que o Self possui uma tendência inerente para se auto-regular. É através da contribuição de Eugene Gendlin (IKEMI. dos anos de 1929/30. e John Wood. Como afirma Seeman (2008). A esta Tendência.57). Uma das importantes descobertas destas pesquisas foi a constatação de que os clientes em psicoterapia remetiam-se. enquanto um processo experiencial ao invés de uma conjuntura estrutural. Carl Rogers apenas percebeu que havia criado uma nova abordagem quando proferiu a palestra “Novos Conceitos em Psicoterapia”. a um “Si Mesmo” aparentemente substancializado. 2005) e sua críticas filosóficas à concepção do Self enquanto entidade/estrutura que Rogers irá alterar a visão geral sobre a personalidade. Rogers passa a delinear com maior precisão conceitual uma qualidade de experiência que já se fazia observável desde o início da sua prática enquanto terapeuta. desde o menor floco de neve. perpassando essas Tendências.5. realizadas num tempo bem mais prolongado do que apenas um final de semana (ROGERS. muitas vezes. 134). como também não existe apenas uma Tendência para a atualização dos potenciais inerentes em todos os seres orgânicos. foi capaz de precipitar um acontecimento significativo. provindos de diferentes áreas do saber científico. acho que sinto um pouco daquilo que o cientista sente quando é capaz de dividir o átomo. colocou-se na fila com as forças significantes do universo e. 1978). Rogers utiliza múltiplos referenciais teóricos. 73 . Explicitamente Rogers (1978) faz referência à contribuição de Lancelot Whyte. dessa forma. bem como o conceito de Morfogênese de Michael Polanyi. outras influências podem ser consideradas neste percurso de criação. da modesta ameba a mais sensível e talentosa das pessoas” (ROGERS.próximos. principalmente no que tange a trabalhos com novos grupos por meio de novos enfoques. são semelhantes. 2008. a partir do conceito criado por este. 2006). Porém. 1977). um “historiador das idéias”. existe outra convergência de forças. por vezes. 1980. afinado com as forças do universo ou que as forças estão operando através de mim nesse relacionamento de ajuda que – bem. Rogers irá. até a maior galáxia. p. contando com mais de 500 pessoas. que deu origem ao nosso universo. elucidada como uma Tendência Formativa presente nos níveis orgânicos e não-orgânicos. que quando estou realmente ajudando um cliente meu. Rogers não demorou em aplicar as idéias e conceitos vislumbrados nesta prática em metodologias terapêuticas inovadoras. Ele afirma: Eu sinto. quando realmente estou sendo útil (ROGERS. p. Na constatação deste fenômeno e posterior desenvolvimento do conceito. e quando sinto que algo significante está acontecendo. A partir da sua atividade nestes grupos. mas existe. um químico e filósofo da ciência. se adaptar e se tornar mais complexo. Rogers passa a desenvolver diversas outras práticas. frequentemente desconsiderada no trabalho terapêutico. ao lidar com um cliente. dente outros (ELLINGHAM. grifo nosso). em um daqueles raros momentos quando existe uma aproximação da relação Eu-Tu entre nós. como postulado na Tendência à Auto-regulação. mas ele. então sinto que estou de alguma forma. como afirmado na Tendência a Atualização. formular que não existe apenas uma Tendência inerente ao ser humano para se modificar. como os chamados Grandes Grupos. então. como a concepção de Tendência Holística de Jan Smuts e as práticas de Alfred Adler (ANSBACHER. Acredito que meus sentimentos. “uma tendência criativa poderosa. Ele não o criou com suas pequenas mãos. não obstante. Noosfera de Teilhard de Chardin. em grande parte a partir de um Self autoorganizado. denominado de Tendência Mórfica. e experiências de formação de Comunidades Centradas na Pessoa. Filosofia. enquanto uma faceta ou tendência desta. no contexto das múltiplas relações concretas do organismo – ou seja. Devido à conjunção dessas disciplinas. nas formulações de seus principais conceitos. Neste sentido. Química. Engenharia. por assim dizer. da expansão cósmica. Psicoterapia. fica evidente que estes métodos e conceitos foram transpostos resguardando suas particularidades. entretanto. conforme o legado “maslowiano”. Psicologia etc. que se fazem observar. 74 . por exemplo. em outras palavras. 1998). na medida em que o que caracteriza seu modelo particular de conhecimento “é a transferência de métodos de uma disciplina para outra” (NICOLESCU. É necessário ressaltar a importância de um amálgama de disciplinas (Agronomia. em maior ou menor grau. as tendências ou os ganchos com os quais se operam os loops experienciais em uma Psicoterapia das Transições e das Travessias. do fluxo indiferenciado da Vida. Tomando o conceito de Tendência Formativa. a base da Abordagem Centrada na Pessoa inclui indispensáveis elementos da Interdisciplinaridade. são admitidos e manejados para uma matriz Psicoterápica (NICOLESCU. mantendo uma coerência interna interdisciplinar. Trânsito livre entre as disciplinas. Química etc. convoca ao diálogo entre estes diferentes atores teóricos. promovida no âmbito da ACP. Significa essa compreensão aludir que estas influências plurais foram incluídas. direta ou indiretamente. trocas abertas e complexas. a partir de uma perspectiva consolidada em Psicologia. interfaces de diálogos robustos com outras disciplinas.) que perfazem a formação acadêmica de Rogers. Neste mesmo exemplo.Destes conceitos. exercendo sua função de absorver esta experiência em contornos de manutenção. desdobra-se o substrato teórico mais importante da Abordagem Centrada na Pessoa: uma compreensão das relações organísmicas entre as três tendências da vida que se manifestam no indivíduo humano. Biologia. uma Psicoterapia Humanista. No geral. Implica dizer. sobretudo. enquanto cientista. 1999). a Tendência a Auto-Regulação. existe neste caso uma interdisciplinaridade epistemológica na Abordagem Centrada na Pessoa na medida em que métodos e. inclusive o de Tendência Formativa. que a Psicoterapia Humanista. da Filosofia. se é cabível afirmar que a Tendência Formativa nos traz aspectos qualitativos experienciais do Mistério. 1999). História. numa perspectiva de justaposição de áreas de conhecimentos diversas entre si. o do conceito de Tendência Formativa. poderíamos afirmar que Rogers mantém. Apesar disto. na sua função de singularizar e diferenciar – necessariamente está atuando na experiência. teórico e clínico. metáforas e racionabilidades da História. não pressupõe a dissolução das fronteiras entre estes diversos saberes. podemos afirmar que a ACP sustenta-se num território multidisciplinar (PIRES. São estas. interligadas e “digeridas” a partir de uma territorialidade psicológica da Abordagem Centrada na Pessoa. iremos. em seu bojo.e um paradigma genuinamente científico (p. simultaneamente. as abordagens de conhecimento que possuem uma base Transdisciplinar dizem “respeito àquilo que está ao mesmo tempo entre as disciplinas. grifo nosso). mais ou menos pré-determinados. uma movimentação holográfica de realidades. 2. jovem adulto. 2002. sem a presença de um princípio organizador central. através das diferentes disciplinas e além de qualquer disciplina” (NICOLESCU. 1999. Na verdade. SOBRE UMA MESMA SEMENTE GERMINADA EM SOLOS DIVERSOS: A EXPERIÊNCIA DO “HUMANO” E DO “TRANSHUMANO”? Joachim (nome fictício). É trans no sentido de incluir múltiplas referências sem a existência de um território-base único. circulando em níveis de realidade diversos. e a exigência de um saber TransDisciplinar para o TransHumanismo e seus propósitos e potenciais “últimos”. eminentemente. encontra-se na seguinte afirmação de Ellingham (2002): Eu não estou apenas afirmando que a noção de Tendência Formativa de Rogers „forme a base da Abordagem Centrada na Pessoa‟. profissional liberal. Ao contrário. com uma perspectiva da Psicologia TransHumanista. que partem de uma lógica de funcionamento interna.A evidência de que este conceito foi incluído de tal maneira nas fronteiras da Psicoterapia e da Psicologia. cidadão em uma metrópole brasileira. a seguir. a partir de uma perspectiva eminentemente científica e de um grau particular de sofisticação conceitual.26). estaremos metaforicamente a percorrera como que os caminhos de um “otorrinolaringologista experiencial”. é um desses clientes em busca de crescimento e de 75 . p. aproximarmo-nos um pouco mais dos conteúdos familiares a uma Psicoterapia Humanista e uma Psicotetrapia TransHumanista. possibilitando “perceber que existem diferentes tipos de níveis de consciência” (REICHOW. uma base de conhecimento Transdisciplinar parece estar relacionada. o melhor acesso para ilustrar a necessidade de um território interdisciplinar para a Psicologia Humanista e sua experiência humana. sistemático e excludente. mas que esta noção constitui a base sobre a qual nós podemos construir uma teoria para a Psicologia como um todo. i. contendo níveis de organização e rigor. Desse lugar de navegante nas especificidades de compreensões para os fenômenos observados. já que inclui. pós-graduação concluída. possa ser contemplado em visualizações diretas situadas em questões vivenciadas por clientes. Talvez. na medida em que nos movimentamos por entre o fluxo dos possíveis canais vitais. p.31). 30 anos. e nem mesmo que „poderia ser a base sobre a qual nós poderíamos construir uma teoria para a Psicologia Humanista‟. sem diluir os contornos que separam os diferentes saberes. Neste passo seguinte de contextualização crítica. breve e gentilmente. estrelas e mar. outros poucos mais ou menos familiarizados às remexidas vertiginosas de grupos terapêuticos. Maravilhada com o lugar e a beleza abundante do horizonte. tão grandes e tão moventes na copa estrelada que nos faziam também sentir. uma mulher. Ambiente terapêutico de grupo. Ainda desconhecidos. descrita pela Sra. presenças. Duas luas. Jocélia (nome fictício).realização humana. Nada de extraordinário. que parecia também incluir árvores grandes e velhas. com suas cinqüenta e pouca. A 21 Vinhetas são retratos antropológicos. da simpatia. desafios e inesperados. freqüentemente empregados para honrar aos detalhes de uma cena cultural com- plexa apreendida através de observações de campo e outras técnicas da metodologia etnográfica. dois sois. Não se quer dizer que não há correntezas. Não há um ordenamento para. as velhas montanhas. externando o suficiente para somente localizar. Não há testemunho de compreensões. Árvores gigantes. tão largas são as proporções de suas existências. que se tratavam de animadas pelo vento. sensível e estética daquele que se insere no contexto pesquisado. ´Quim em distintos quadriláteros terapêuticos: Cena 1. Com sua variedade de recursos para as Ciências Humanas. os contornos de suas descrições foram ampliados no trabalho de Harry Wolcott e de Ruth Behar em suas distintas propostas de Antropologias em Primeira Pessoa. indiferença travestida. fez-se escutar imagens recém chegadas de um lugar estranho. redemoinhos. daqueles intangíveis pelo abraço de um homem. pois. Cliente atípico para o universo dos diagnósticos e demandas convencionais. alternados entre movimentos espontâneos que ocupam a grande sala principal e os diferentes espaços que a mobilidade individual alcança. Rubores. 76 . Facilitadores. audiência. Joachim está sondando as camadas ainda obscuras de si. talvez. Não há currículos nem programas. ou talvez sessenta primaveras. Joachim. como que através da retração acurada de um pintor impressionista. risos de incompreensão e de impossibilidade de sustentação. não se via dentro ou fora daquele grupo – estavam ali. Uma ansiedade zombeteira. como espíritos antigos encravados nos sulcos de sais e líquidos da terra. apresentam-se. com suas provocações. que o “não há” antecipado seja mantido como um processo duradouro. situando-a em um território de Reserva Ecológica. a madura senhora. Traremos duas vinhetas . no grupo. no litoral tropical nordestino. reunidos em um salão de hotel. ´Célia. da generosidade. Paisagem agradável. Uma escuta que oscila com os sussurros e ressonâncias da experiência terceira em si mesmo. quarenta e poucas horas de convivência. quer mesmo. para descobrir suas próprias expectativas que pareciam diluídas e difusas. espaço de workshop intensivo e residencial. impaciência. menciona algumas pedras grandes. Não há o silêncio como instituição. Deslocamentos físicos e lingüísticos vão se dando – tímidos e exíguos. mantém-se numa sintonia mista de curiosidade e interesse cordiais. palavras que transmitissem sua disponibilidade e alegria comedida. adultos com idades e formações variadas (estudantes e profissionais de nível superior). Algo se emaranha nos pensamentos do Sr. Tratam-se. suscitando uma fala de conexão e alusão à experiência anterior. como outros. Escutávamos. Dia seguinte. Algumas trinta e cinco pessoas. do diálogo. Na voz irrompida do rapaz. nós. nem jornadas. os movimentos de pedras e pássaros que o passar da história impunha o nascer e o morrer. ou dois recortes para ilustrar as experiências do jovem Sr. no seu corpo de memórias. psicólogos. as lembranças de sua casa e dos entornos no seu lugarejo. Alguns marinheiros de primeira viagem. Silêncio. Não há uma agenda. muito embora confortável para ele. aparentemente nada de proposital. não há o requisito do registro. Fala de uma Floresta. de vinhetas que permitem a implicação analítica. de gerações diferentes. externa sua necessidade de relembrar e compartilhar as paisagens saudosas que ficaram para trás. nem destinos. Uma larga parcela de gente que. ao certo. ´Quim. entregue ao que ele definiu como um 21 exercício de espiritualidade arqueológica. lá e cá. Jovens e velhos. exclama Joachim. A distância entre os corpos esvanece. talvez. o relato não é interrompido em nenhum momento. também se encontra impactada por um calor proximal de natureza muito singular. parecem caminhar sobre um mesmo solo. quem sabe. meio que acolhe um vínculo lançado de interesse e de cumplicidade. atenta ao diálogo emergente de suas palavras originais. sem que para isso fosse hipoteticamente necessário impor um controle arbitrário à expressão viva das ondas e das águas que vertem dos seus dois mundos. referindo-se ao nome e à experiência ancestral do lugar: é o “Vale das Feridas” (nome fictício). A mulher. por não se tratar de um movimento focado na mudança de questões próprias da Personalidade (v. situações de unidade e de comunhão incomuns). para além de uma mera recon77 . intervalo para almoço. Diz. que não mais se fazem observáveis em seu fenótipo. todas as noites. de irmandades entre sangues e raças. entregue à força desse encontro entre experiências e situações não antes descritas.g. Facilitadores emudecidos. E o mesmo participante consolida sua observação articulando que. E por alguns breves minutos a tempestade de fatos e ocorrências mentais provocam inundações de sentimentos e imagens pessoais. recita poesias. no ambiente do Grupo é também possível um florescer cuja qualidade é propriedade de uma Mudança Formativa. remanescentes de aborígenes. Pedidos mútuos e amiúdes de paz. por uma reserva gasosa que não se localiza em crateras tão profundas. de um fluxo represado. do outro lado de uma sala cumprida. nas experiências Formativas. E como um símbalo cuja melodia atravessa realidades espessas. Ambos. de momentos incríveis. Os olhos afinam-se entre si. em um processo de trinta minutos. seus dois globos (oculares). “Eu vejo os Povos da sua Terra”. As sombras no olhar aprofundam-se? Os facilitadores morrem para as distintas realidades abertas – não sabem mais onde todos estão. ´Célia e ´Quim. súplicas de redenção pela dor infringida pelos corpos de colonizadores são formuladas sob a descarga de uma emoção aguda e torrencial. grupo e facilitadores. Ela confirma: de fato. ela própria. Participantes tomados por silhuetas de não conformidade. e qualquer coisa da ordem de uma temporalidade suspende-se. um participante relembra que. em vão. utilizando-se de uma língua nativa ao coração e à cultura de Jocélia. Vários conteúdos. O diálogo precipita-se em gotejos de intensidades que adentram a sala. de fato ocorrem mudanças e ressonâncias entre os diferentes processos. Joachim compartilha do sentimento. O ar parece também mais denso. distintos personagens aprochegam-se em suas almofadas azuladas que se tornaram abrigos insulares nesse oceano desconhecido. impondo respirações mais curtas – buscas. as falas salteiam entre pontes intuitivas e ampliadas. menciona a sincronicidade do fato de. lá existem tribos sagradas. com lágrimas que frouxamente banham sua pele e suavemente incandescem suas palavras. descender de parentes remotos daquela “Floresta de Feridas”. alguns participantes observam-nas como relatos de pico. imersos. ela mesma. E prossegue a narrativa.. implora o descanso e a cura pelas dores daquelas gentes. em gerações passadas. Do lado de fora. outros afluentes de lágrimas aportam nesse mar comum. A mulher complementa. em seus caminhos próprios. visivelmente mobilizado em seu corpo. muito embora resguardada pelo barulho do ar-condicionado. semelhantes. de pertencimento conjunto e de efetiva relocalização em território-outro impossível de ser delimitado. à invasão de mensagens cristalizadas de um passado estacando. e longe de qualquer possibilidade de apreensão linear. a genealogia da mulher que. Rearranjos nos corpos. É uma Reserva onde criaturas mágicas também habitam os mitos indígenas. Como uma locomotiva passante e extensa. em vista de promover a Atualização de situações conflituosas. são abordados e demarcados nessa experiência de partilha: falam-se de todos que foram extintos na Floresta. paralisados? Processo reacomodado nos respectivos corações e experiências. Entretanto. aproximados pela força de um mesmo cajado. do rufar de folhas e de espingardas. dores que ela própria e sua ascendência perpetuaram. de um encontro transdimensional. que superam a possibilidade de uma terapêutica semanal e da pontuação localizada. afinal. uma dificuldade específica). informou-nos. e os canais de lírios e cristais dos seus olhos não cessam. A mulher. (Posteriormente retomado. nos espaços de Grandes Grupos (Humanistas).mulher. questionado sobre a posição teórica que nos abalize o ocorrido. dos quais. Está coberta com um lençol fino. anuncia a terapeuta. Mulher de olhos profundos. Escuta-se o lavar das mãos da mulher não alta. um convite de preparo. Corpo como zona costeira onde colidem as ondas e freqüências da eternidade. um rito como símbolo de início. de um amarelo delicado. não sabiam se quer existir. Jamais saberemos ao certo: estamos imersos. “Você hoje está aqui ou ali?”. naquela relação possibilitada entre Joachim e Jocélia. das suas escolhas e da personalidade como um todo. cedo de uma manhã convencional. em um pequeno banheiro. cheiro de uma essência de carvalho. participante de várias associações e contextos de formação profissional de novos terapeutas. E mais do que isso. nem ritmos identificáveis. Alguns sons foram formulados. É um corpo que se torna anteparo. articuladora de vários Movimentos Sociais. nos silêncios e nos espaços dilatados entre ruídos mais e mais escassos. mobilizando atores e recursos. do lado direito. Estamos. um painel que recobre toda uma parede e paisagens de Floresta. Duas poltronas. os desdobramentos e os contextos experienciais que foram suscitados. temas prévios que estavam disponibilizados pela personalidade para o contexto do trabalho terapêutico. Parece alguma coisa da ordem de um convite sonoro. acessíveis às suas consciências. ensaiam padrões ou sincronias. perfilando uma amorosidade que não se torna invasiva. portanto. quinta-feira. que recebe o calor direcional invisível de mãos que jamais o viram na intimidade sensorial. enquanto Joachim dobra sua camisa. viajada. Não há palavras e talvez poucas letras. executam uma sinfonia completa de marcações 78 . Com um leve sorriso. espasmos. se quer. livros. direito e esquerdo por vez. processos de intensidades profundas podem surgir e manifestar seus orbitais. após as saudações e acolhidas habituais. Deitado. infiltrando-se os corredores externos e assépticos daquele condomínio. Existiam. pergunta a terapeuta. Horário que antecede início do trabalho. Cena 2. laços ampliados entre as expressões e fluxos organísmicos ressoam entre si. “Joachim. sim. Não há melodia prévia. laterados por quadros e paisagens arquetípicas. janela e almofadas recostadas. aspectos. Nestes casos. celular. Um convite para Joachim adentrar o seu espaço terapêutico. Porta branca cruzada. Um único dedo realiza acrobacias e com esse mesmo dedo. abrir. A terapia já começou. na vertigem de uma mão que despenca lentamente sobre um mesmo eixo vertical dessa reta percorrida no invisível de um dedo. de peito nu e com pelos. reajustes. calibrados com exímia maestria para ocupar a sala inteira e não atravessar o pórtico. as correntes elétricas do espaço são reduzidas (ar-condicionado. móvel. as mãos de Joachim tocam a maca. que acompanhavam o círculo da conversa. vamos começar”. sem que isso seja catalisado por uma travessia convencional da identidade. Criatura dinâmica. Há três anos esse é o seu domicílio semanal de realinhamentos experienciais. indicador. o processo transcorreu-se por meio de um formato ou qualidade de movimento que parecia “não ter a ver” com a capacidade de controle ou intervenção de ambos – sendo. numa zona de penumbra e de confiança. e a mão guiada pelas direções e pontos firmes de um dedo. espaços de cuidado e atenção em saúde. afinal. todos desligados). motor do aquário. Os dedos da terapeuta movimentam-se no ar. um convite para abandonar a rua. melhor descrito como um mergulho ou a participação de um fluxo. retirar ou empurrar algo nesse espaço intangível e não identificável que plaina sobre as vizinhanças do corpo de Joachim. Sorriso de saudade. Joachim. por assim dizer.figuração de objetos do manejo da Personalidade (com suas prioridades e refrações). tangencialmente às captações e produções de significados imediatos da personalidade. Direção sem esforço para a sala de psicoterapia. sobre a maca. água e aquário. parecem tocar. talvez. deixando-a sobre a cadeira. É um som também doce. resgatou e movimentou dimensões que não estavam. com uma manta) ou uma maca (como que a de trabalhos de acupuntura). a mão estaciona a alguns poucos centímetros de um corpo que se mantém intocável. luzes. para a surpresa de ambos. Alguns. Contudo. Contrações involuntárias no corpo. seguindo a confirmação atenta de Joachim e Jocélia. com a mão a sinalizar o sofá (largo. na observação de Joachim. pontos de travessia. “Beba água. embalada por uma sonata cósmica de mãos invisíveis. muito embora aberto para mundos. do bailar de um corpo que parece exercitar sintonias sutis. Estrelas de referência. As luzes foram reacesas. Ela. um sonho lúcido que se projeta sobre um corpo absolutamente mergulhado em calafrios e dormências. Quem o tocou. pernas. como num ballet de oscilações e vórtices. do tórax. miragens dissolvem-se. a passagem realizada por uma fenda glacial ou o prenúncio de um cenário possível na visada da luneta. um exaurimento de convivências que não podem ser marginalizadas? Com quem. “Joachim. não para aqueles do além-mar. enquanto ouve “existe alguma coisa desse processo. A camisa retorna para o corpo. aninhados em um centro ou plexo que não é. Assinatura no prontuário. uma vez não realizada pelas mãos e comportamentos de homens. às vezes também na cabeça. a consciência que. muito embora inaudíveis. quando não há presenças visíveis e línguas distinguíveis? É preciso dar nomes para isso? A intervenção parece transcorrer no espaço-tempo outro. outras vezes horas inteiras. quando muito.no espaço. vivenciados como jornadas facilitadas por aquilo que apenas com olhos fechados Joachim descreveu. A terapêutica funciona a despeito do entendimento sobre a mesma? Que descrição de vida e de homem comportaria uma intervenção e uma forma de cuidado que. partiu por si mesma. no seu tempo. no corpo ileso. inevitável. Joachim não se recorda de ter dirigido qual79 . sonhos chegam. e apenas o corpo acolhe os registros. desse momento. que você gostaria de compartilhar?”. como super-cordas e espirais. Às vezes. aos poucos e vagarosamente. às vezes tempo dilatado a ponto de ancoragens completas. as formas e as direções há pouco deixadas para trás. e ele precisa comer. comunica a terapeuta. De longe. distendidas entre o sutil das aberturas e a densidade das localizações corpóreas. intacto pela realidade física. recebe um copo de água. ou. Às vezes. às vezes insights. O corpo. que pendem da eternidade sobre pontos de unificação à vida do corpo. guianças. apenas. vai te ajudar a integrar o processo”. adormece em uma transição que não o desabilita da percepção – é como se transcorresse. pescoço. respostas. também não marca e não transita pelo humano – mas a eles. às vezes suficientes para uma demarcação. uma vez estabelecidas. Mãos que fazem parir estrelas-guia no corpo de um cliente. e o quê resgata Joachim de lá? Nestes meses de terapêutica. outrora. Parece uma longa viagem. no discurso. você pode ir se levantando”. descrição do procedimento a parte. ademais. mensagens e encontros? Quem o acompanha. aos ritmos impronunciáveis que vão ganhando um sentido e uma melodia somática. mas foram apenas degraus. Joachim reencontra-se com as escadas que o trouxeram. mas já houve dias e noites completos. ou os sintomas tardios de alhures. duas ou três vezes são anunciadas. desembarques realizarem-se no mundo ampliado que se abre na tela da consciência e na experiência direta do cliente. do céu e da terra. mãos. foi desligado? As forças das pedras. como proteção e mortalha de algo que parece ter-se ido. como registro de uma presença: data. aos poucos. paisagens e visualizações. Cordas de uma harpa que. ancoradas. terapeuta e cliente. acabou. tornam possível o percorrer tácito de um dedilhar suave que se acopla. e aterrissagens. “Até a próxima semana”. do próprio granito que asfalta o chão da sala? O quê impõe o estado intermediário de sonâmbulo. O cliente senta-se. e uma modesta escada que o separa do intangível de uma mão. Vários pontos nesse corpo. mas para uma consciência concreta que. as naus cósmicas parecem seguir o destino de estrelas criadas pela explosão de calor dessas mãos de luz. uma a uma. sinalizadores dérmicos. levam minutos. vai retornando. dessa vez. Em cinqüenta minutos. mas Joachim vai levar um tempo considerável para retomar as cores. parece deixar um rastro inalienável. além dos peixes de um aquário. Palavras de ordem. intervalo médio dessas jornadas semanais. como um velejador experiente que anuncia ou registra. quando não há toques? Quem o visitou. Aos poucos. Outra sinalização lançada. uma cartografia visual para caravelas distantes. os dois humanos. quando não há portas. poucos degraus e a ascese para um mundo de relações profissionais. e escuta-se o eco distante de um “não”. Joachim. a terapêutica transcorrida parece demarcar. quando tudo. ao longo da sessão. de equilíbrio corporal. além de um painel para as Florestas? Com o quê. procedimentos. nome. Ainda consciente. uma por uma. pés. optamos por restringirmo-nos às discussões no campo de duas das Forças/Correntes tradicionais nessa grande arena das Psicoterapias Americanas do século XX. Joachim procurou. com sua complexidade ex22 periencial . E com estas marcas e localizadores tenta construir interações e transições entre realidades tomadas como paralelas. provoca rachaduras e fissões. às argüições de fundo mais genérico (e não menos legítimas) acerca da compatibilidade dos relatos acima transcritos enquanto categorias válidas de um tipo específico de modelo vigente de “ciência”. somente e radicalmente. como se nas estações apropriadas de seus movimentos organísmicos. Abordagens ou Modalidades de serviço terapêutico. e o que de verdadeiro subsiste e regenera-se no verão. enquanto que o excesso ao simples liquefez-se. profissionais gabaritados e consistentes em suas formações técnicas. realmente mais modesto. por entendermos que tais enquadramentos vivenciais melhor testemunhariam acerca das teses com as quais estaríamos discorrendo. 22 O objetivo dessa subseção não é. inserindo-se. considerando que também a estrutura de páginas não comportaria. madura e criativa de não se precipitar banalmente em busca de perfazer substratos intelectuais que. eventualmente. Questionado a esse respeito. detalhar cada modelo terapêutico. Desde os respectivos inícios da primeira e da segunda vinheta. já podemos observar alguns percalços nas distinções habituais que localizam na “experiência ampliada” o critério mesmo para solvência de uma proposta e decorrente inoperação da segunda. Na Primavera. ou. Registra-se. onde a morte visita. 80 . Tais empreendimentos. e a segunda.quer solicitação de explicações e fundamentações à terapeuta. Mas há também o frio. a nosso ver. tragado pelos córregos. Não obstante. em momentos diferentes de um mesmo semestre. Racionalidades e desdobramentos conceituais só acontecem no Outono Organísmico. existe apenas. para inebriá-lo de fortaleza e nutrir de confiança. Joachim. ou. realizar diagnósti- cos epistêmicos mais duradouros para horizontes do conhecimento mais amplos. Comentários sobre as Cenas Ambas as experiências sumarizadas nas Cenas 1 e 2 tratam de um mesmo cliente. Joachim descobriu. Em ambas. foi o de instigar a curiosidade do leitor. por não termos a motivação de realizar um estudo comparativo mais denso e específico entre Escolas. bem como na avaliação positiva de seus pares locais. no que viria a concernir. explica-me ele que os mapas do seu corpo são mais reais e visíveis que suas tatuagens imaginárias e feridas de qualquer passado recente. por exemplo. mais particularmente. Nesta oportunidade. nossa seleção buscou conceder voz ao relato pós-colonialista de duas experiências terapêuticas não-hegemônicas em seus contextos nativos. eminentemente articulada e facilitada como uma proposta atual de TransHumanismo. na realidade metodológica de duas propostas psicoterapêuticas. Sua experiência. deliberadamente. exigiram peritos de uma e de outra Força/Corrente cujas expertises avalizassem uma caracterização delongada e minimamente adequada. Não iremos. tanto menos contrastá-los entre si. problematizar sua validação como metodologia “psicoterápica”. conforme as impressões e vicissitudes de um colaborador (Joachim). Esse texto também assume a vocação de permanecer suas raízes na ciência da Psicologia e derivar sua racionalidade do campo da Psicoterapia. de cunho e de procedimentos Humanistas. já constatou amadurecem em ciclos próprios. numa adesão iconoclasta que refrata o tratamento preponderante da experiência terapêutica alheia às suas teorias de origem. A primeira. para efeito do recorte proposto. ao contrário. Nosso objetivo. ainda. portanto. beleza farta e abundante. deslocando-o de um olhar convencional a partir dos relatos nos respectivos dois campos. que às vezes não formula um caráter de inteligibilidade para tais travessias. demonstra uma capacidade resiliente. contextualizá-los nos debates a respeito das “psicologias” e suas pretensões nacionais. eventualmente. das quais em uma delas se foi capaz de desdobrar-se nos espaços atuais da Psicologia Humanista – por exemplo. Nessa ótica. impõe-se como mais razoável asseverar que longe de redutos experienciais equivocadamente projetados numa e noutra. como. que se trata de cenários que viabilizaram a oferta de uma continência psicoterápica para o funcionamento de redes ampliadas no circuito experiencial do cliente. sob um conceito de ampliações e acoplamentos formativos. 2008). tornou-se insuficiente para corretamente localizá-la em um ou outro território. mais do que novos adjetivos (“ampliadas”. derivativos ou complementos dos primeiros. que as exigências de rigor e consistência. “há um déficit de comunhão e de presença no modo como a ciência moderna nos interpela e se nos apresenta. também. Quer isso sugerir. gostaríamos de propor que. “incomuns”. e também se restringindo à argumentação franca. obturadas no âmbito das cercanias estritamente Disciplinares.nestes recortes. infinitos deles) adotamos. por uma obrigação de reconhecimento à evolução e à expansão das Correntes em Psicoterapia. um inventário antecipado de experiências não fosse bem-vinda ao catálogo de possibilidades de trabalho para Teorias posteriormente advindas. não estão investidas de qualquer propósito e utilidade operacional no contexto de práticas e teorias que. inclusive. obrigatoriamente para resguardar sua coerência e propósito internos. Ao contrário da cristalização de quadriláteros compreensivos. ou que. por exemplo. a diferença não está na experiên- 81 . requisitam uma matriz de análise não-linear e não reducionista. Ou seja. dito de outra forma. sendo moralmente impeditivas de figurar em outra. Se for verdade que a mera qualificação de uma experiência. a partir de seus adjetivos (“ampliada” ou não). Nos comentários desse analista. que as identifiquem e localizem não apenas a realidade vivencial dos clientes. uma margem política em conformidade às ilações de Santos (2008) para que os nossos saberes críticos não aquiesçam à imposição ideológica que reduz suas propostas nãohegemônicas a meros apensos. não parece coerente o postulado de que “tais” agrupamentos de experiências (classificados mediante padrões de comportamentos aproximados entre si) estariam sob a privaticidade de certa Escola de Psicoterapia e Psicologia. o traço primordial que as distinguem dá-se no âmbito do tratamento realizado às experiências que nos chegam como psicoterapeutas. Ela embrenha-se num auto-exílio arrogante para não ter de enfrentar o que nela não cabe e é valioso” (SANTOS. que busca não solapar as diferenças e oportunidades de enxergar além dos mundos e experiências de realidade incognoscíveis para muitos dos saberes instituídos. Foram tessituras. precisamos de substantivos próprios que margeiem os percursos de uma e de outra proposta. Em outras palavras. entretanto. segundo a teoria de Carl Rogers. a materialidade experiencial dos psicoterapeutas e das suas formações específicas. “espirituais” etc). por sabermos que vários nomes e conceitos seriam possíveis (na verdade. que algo de novo também surgiu do ponto de vista Paradigmático. eminentemente. Diríamos. à época. seguiu parâmetros e desdobramentos distintos no Humanismo e no TransHumanismo. ou. mesmo. ou. intransigências e hipóteses particulares). fenômenos dramaticamente inseridos nas pautas sociais atuais – não estão localizadas nesta ou naquela Teoria a partir dos conteúdos em si mesmos que elas aparentemente sugerem-nos (sob pena dessas Teorias serem consideradas lesivas e discriminatórias para um rol extenso de possibilidades de subjetivação que não estavam previstas). Aqui. metodológico e operacional. queremos propor que: as Psicologias Humanistas (e suas propostas de Psicoterapia) tratam. enquanto que as Psicologias TransHumanistas (necessariamente) são de ordem TransDisciplinar. vigentes na primeira parte do século XX. mas. Cumpre-nos oportunamente registrar que um dos elementos preponderantes nestas rupturas paradigmáticas (se não a maior razão de ser para tais contestações) ensejadas pelo Humanismo e pelo TransHumanismo disseram respeito às formulações de alternativas disciplinares. se farão uso de plataformas conceituais eminentemente Intra/Inter/multireferenciais ou TransDisciplinares. parece-nos claro que a estratégia de reinvenção das relações e dos potenciais humanos. artes. de modo particular. o diálogo cortez entre duas ou três Disciplinas (cada uma resguardando suas especificidades. experiências da virtualidade. estas duas últimas. ao retratarmos a sofisticação experiencial possível em trajetos terapêuticos contemporâneos. no diálogo travado entre as novas Psicologias Humanistas e TransHumanistas junto a campos fronteiriços do saber (antropologia. de uma articulação de grandeza InterDisciplinar (geralmente) e multireferencial (em termos de saberes e processos concomitantes de ordem Intra e InterDisciplinares). nova química.cia com a qual se trabalha. segundo a percepção daqueles precursores. justamente em vista de traçar novas rotas e diretrizes amplificadas para entender o funcionamento humano que. teórico-conceitual. nos anos de 1950-60. mas com as plataformas Intra/Inter/multireferenciais e Transdisciplinares que se utiliza em seus manejos. de maneira inversa. os quais se deixam constatar. sociologia. Historicamente influenciados por Movimentos Sociais semelhantes. as ditas experiências de “ampliação de consciência”. Estas bifurcações históricas podem ser vislumbradas nos excertos acima transcritos. certamente. a modalidade de compreensão que 82 . ou experiências da ecologia profunda – que são. no máximo. nova física. que não se esgotaram em seus aspectos ético. Tratou-se de elaborar caminhos à margem das opções disciplinares monolíticas. na Cena 2. espiritualidades etc). encontrava-se deverasmente limitado. Dessa forma. Enquanto na apreensão da Cena 1 é suficiente a racionalidade de uma Disciplina. por exemplo. uma das facetas da singularidade da Psicologia Humanista é sua adesão política Intra-Inter/multireferenciais. NICOLESCU apud WEIL. finalmente. qual seja. 83 . captar o humano situado em sua experiência. em suas diferentes variações e acepções. p. MORIN. “contraditórias” – camadas e movimentos do real. Essa é a caracterização. 2002. numa mesma espiral de consciência. grifo nosso). todas as vezes que se reduziu a compreensão a um modelo fixo de qualquer Disciplina. às vezes. são inócuas. em sintonia. mesmo. a possibilidade de acompanhar a complexidade de interações e interfaces que alcançam esse humano e o superam. a opção por um terceiro incluído. traria. (ou) ego. A flexibilidade TransDisciplinar desse TransHumanismo contribui para o alcance e adequações criativas que perseguem seus objetivos “últimos”. (ou) mamífero. para essa abordagem psicológica de cunho eminentemente TransDisciplinar. de uma matriz TransHumanista que agrupa em seu território. retomado da exposição anterior. é incompatível com a visão transdisciplinar” (FREITAS. a produção de um conhecimento inclusivo e complexo. em suas nuances e especificidades. Será possível satisfazer parcialmente tais requisitos. (ou) matéria. quer o autor explicitar. A esse respeito. de contornos por múltiplas realidades e. organizações e estruturações diversas (v. ou. na Carta da Transdisciplinaridade. atender a um e não a outro? Intrincadas entre si. por excelência. uma vez que a regência complexa de terceiro incluído. portanto. elenca que. em seu artigo primeiro: “Toda e qualquer tentativa de reduzir o ser humano a uma definição e de dissolvê-lo no meio de estruturas formais. enquanto que na Psicologia TransHumanista. exige um plano de referência TransDisciplinar. enquanto que a estabilidade fixa Intra/InterDisciplinar do Humanismo faculta-o a serenidade para apreender uma categoria fenomênica única. abriga diferentes – e. Nicolescu (1999). que a superação de um princípio (aristotélico) de terceiro excluído. Destarte. 112. perdeu-se. Cada uma dessas propostas de Psicoterapia. sejam quais foram.g. também. as tentativas de conceituar o homem como persona. decorrentemente. Sob esse prisma. para si e seu conjunto de ferramentas.seria capaz de decodificá-la. (ou) constelação de arquétipos. no rol dos posicionamentos TransDisciplinares. dimensões pré e trans-pessoais. podemos observar. permite-nos também contemplar a face de realidades e objetos múltiplos e. WILBER. pela direção inversa. verifica-se a compleição dos três seguintes requisitos: uma prática complexa. o compromisso ético-científico de traduzir sua Epistemologia dentro de uma referência duplamente coerente aos postulados tanto de sua Escola como de seu Movimento. mais do que um conjunto de autores ou teorias específicas. com as suas especificidades.1982). 2009). necessariamente. ademais. inferir que todo saber TransDisciplinar requisite. por uma exigência mesma de acolhimento congruente das vozes emergentes de saberes plurais e das perspectivas múltiplas de conhecimentos. atitudes. por vezes. de uma magnitude excessiva aos crivos de razoabilidade da Ciência. conforme a denominou Boaventura de Sousa Santos (SANTOS. em vários aspectos. uma formulação TransDisciplinar implica. Não quer essa constatação sugerir que todo o saber TransDisciplinar baseie-se. Entretanto. e que todo processo de conhecimento Intra/InterDisciplinar fundamente-se. Boaventura observa que as tradições científicas de Saberes do Norte asseveraram imperativos e mecanismos de controle rígidos (e parciais à manutenção de colonialismos e pós-colonialismos mentais) na fabricação de conhecimentos insinuosos às suas formas ideologicamente legitimadas do que poderia ser tomado como um procedimento hegemonicamente “verdadeiro”. só é possível. mais do que qualquer outro Saber Psicológico em Psicoterapia. é necessário também explicitar que. É verdade que a experiência comporta inúmeras qualidades. convocam-nos às diagramações dissipativas. na superposição de aportes e conceitos de projetos distintos do conhecimento.. convergidos numa base comum interdisciplinar. a formulação de saberes contra-hegemônicos ainda que sob o escopo reduzido disciplinar ou intradisciplinar.. além de interpretações técnicas diferenciadas – entretanto. uma base teórica TransHumanista – ainda que o inverso seja correto. em uma Epistemologia do Norte – é possível. Fora dessa permissão operativa. aquela da experiência humana – ainda que esse objeto. seu objeto permanece afiançado a uma única realidade. Longe de assertivas geográficas. percepções. todas sob a referência de um mesmo objeto comum de trabalho. Não se quer. necessariamente. em uma Epistemologia do Sul. às interrelações que forçam a ruptura sistemática de paredes. restar-nos-ia argüir não apenas a incompatibilidade entre inclusão-complexidade e adesão de um objeto restrito. Entretanto. as práticas da Psicologia TransHumanista e seu Campo histórico de Quarta Força. temos evidências para qualificar sua prática. como sendo de base complexa e de terceiro incluído – um exemplo disso seriam experiências de sintonia e ressonância aos campos formativos do universo. E caso estejamos a considerar as implicações epistêmicas dessas afirmações. MENESES.) Toda tentativa de 84 . a adesão de uma Epistemologia do Sul. diferentemente das modulações promovidas no bojo da Psicologia Humanista. exatamente. mas não permite variabilidades do seu objeto e enfoque. a “experiência” seja. que se postula enquanto complexa e inclusiva. Esta aparente contradição.Do ponto de vista de uma corrente tipificada como Humanista. qual seja. bem como a impossibilidade de uma manifestação de terceiro incluído. em absoluto. das fronteiras e das vizinhanças – sem as quais não alcança sua natureza metodológica de existir: “(Artigo 2) (. obrigatoriamente. sim. p. parecem extravazar de um vazio para outro ainda maior (SANTOS. Nas palavras do sociólogo crítico. as Vozes decorrentes das práticas múltiplas dos Povos. as disciplinas das disciplinas. por exemplo. que nos assegurariam a legitimidade possível de uma base TransDisciplinar? Como verificar sua correição ou adequação às nossas demandas? Ora. 112-13. 2008. tradicionalmente tomadas como não-superpostas.. a arte da ciência.. uma escassez abissal feita de abundâncias que. contrário à superficialidade privatista da vida industrial e hiperindividualizada. p.) A transdisciplinaridade não procura a maestria de várias disciplinas. se é que haveriam. Esse quid.) O reconhecimento da Terra como pátria é um dos imperativos da transdisciplinaridade” (FREITAS. as matizes Conhecimento do Sul emprestam-se como metáfora para: . as estacas nessa demarcação. de repente. por vezes. regido por uma lógica única. E quais seriam. MORIN. 114).) cientes de que são diferentes maneiras de dizer o que só é dizível de maneira diversa. grifo nosso). de uma única disciplina validada. essencialmente. Linearidade ou complexidade não são. Os grandes eixos da 85 . também nos Humanismos recentes. refratário do imperialismo tecnicista. 2002. fala-se de Universo e de crescimento. conspirar no sentido de uma matriz de conhecimento potencialmente mais diversa e robusta. “critérios” objetivos. observa-se educação pela paz. p. um encontro de perspectivas apostadas em unir tudo o que a ciência moderna separou. grifo nosso). Qualquer interpretação de fundo TransHumanista. é razoável entender os TransHumanistas trazem um novo estatuto transdisciplinar de vida possível. de redes e de Organismos interligados. Porém. NICOLESCU apud WEIL. avessos ao desencantamento sistemático alavancado nos séculos XVII-XXI. em sendo as Vozes do Sul. de acompanhar e categorizar alguns dos movimentos terapêuticos que estão descritos na Cena 2. é a perplexidade perante uma perda aparentemente apenas feita de ganhos. em sendo originário de uma Epistemologia do Sul. 2002. mas a abertura de todas as disciplinas ao que as une e as ultrapassa” (FREITAS. 2002. no lastro desse argumento exposto. ainda. os saberes TransHumanistas devam apresentar-se. Também não se trata. NICOLESCU. que seja capaz. Sendo. a ciência dos outros saberes. MORIN...reduzir a realidade a um só nível. invariavelmente. o conhecimento da sabedoria (. Argumentar-se-ia que: “(Artigo 8) a dignidade do ser humano também é de ordem cósmica e planetária (. só diversamente dizível. como Saberes Complexos – é possível formular saberes contra-hegemônicos que não tenham uma matriz de complexidade. 113. parecem.. 7. o sujeito do objecto. de afirmar que. NICOLESCU apud WEIL. ativismo ecológico e compromisso transcendente. portanto. concomitantemente inspirada em várias disciplinas outras. MORIN. p. a natureza da sociedade... apud WEIL. grifo nosso). não se situa no campo da transdisciplinaridade” (FREITAS.. de tal modo interdependente de um leque de conhecimentos cujas raízes são não-coincidentes – e. podemos observar que: “(Artigo 3) (. presenciais etc). diferente. mas. das Pessoas do Amanhã são questões absolutamente legítimas. a interferência de campos orgânicos e inorgânicos (cósmicos. mas. Qual seja. 2008)? A noção de Tendência Formativa. uma língua fora das violências de homogeneização impostas – em ambos. a partir de um prisma Intra/InterDisciplinar. o Humano foi desterritorializado de um Antropocentrismo Cognitivo e Racional. uma voz de emancipatória. em ambos. Se for verdade. Talvez não em todos os ditos Humanismos que se popularizaram. a diferença marcante. que a Psicologia Humanista foi capaz de trabalhar com o Organismo e os Fluxos da Organicidade Humana. é também verídico sublinhar que a Psicologia TransHumanista inaugurou uma reflexão singular em termos de Estações Organísmicas. a experiência humana é conduzida e desdobrada na relação dialógica entre gradis de uma ou de outra disciplina. numa formação em Abordagem Centrada na Pessoa. em nossos sinais de nascença psicodélicos e contraculturais – para ambos. a Psicologia Humanista mergulhou-se nas redes e facetas dessa Organicidade que está inserida na Vida. por exemplo. então. por exemplo. enquanto que a Psicologia TransHumanista apresentou-se os Ciclos mesmos dessa Ecologia de Movimentos Cósmicos mais largos. também. centrar-se na experiência humana quer dizer compreende-la (os circuitos e expressões da vida que nos perfazem humanos) a partir de conhecimentos (estabelecidos ou não) 86 . através de Tendências Atualizante e Formativa. s/d) reconhecem a influência difusa não apenas de processos não-conscientes de fundo pessoal e coletivo-arquetípico. neste segundo. Em outras palavras. porém. SOUSA. distingue-se nem tanto pelo (mesmo) objetoirmão/aproximado de sua reflexão. sutis. do Funcionamento Pleno. na Psicologia Humanista. por um lado. telúricos. desde sua origem históricoumbilical. em suas origens gêmeas.Inteireza. em um solo californiano do passado e nas investiduras do presente originárias daquelas raízes. no Humanismo e no TransHumanismo. e sobretudo. portanto. ao considerarmos que também os Humanistas dos Tempos de Hoje (CAVALCANTE JR. pelo efeito ou pelo encaminhamento que imprime às experiências humanas. que fecundam os processos individuais e grupais (CAVALCANTE JR. enquanto que no primeiro. da Vida-Boa. Se. esse foi um traço marcante.. SOUSA. por exemplo. são os conhecimentos que são dissolvidos nos aspectos mesmos da experiência humana. um saber TransHumanista. uma Epistemologia do Sul. ou pelo (mesmo) contexto histórico de sua origem. Onde residiria. de processos que não foram “humanistas” ainda que os impliquem em suas contingências. é igualmente uma Epistemologia do Sul de base Humanista.. de uma formulação do Humanista. Em sendo confiável a hipótese argumentada nesse ensaio. bem como não em todos os ditos TransHumanismos que se multiplicaram. fundamentalmente. no primeiro. no além e naquilo que não é mais humano – ainda que a ele. por exemplo). Fundamentalmente. a Psicologia Humanista parece desacelerar os movimentos de ampliação TransHumanista em vista de acompanhar os procedimentos e registros metodológicos – categorias importantes. Para que Maslow (s/d) permaneça correto em sua observação de que a Psicologia Humanista é uma fase ou uma etapa que estaria inclusa no TransHumanismo. entretanto. relacione-se. o desenvolvimento de uma capacidade de suportar o movimento e o desequilíbrio para suas certezas e vocações consolidadas. Campos Regulatórios. tradicionalmente. precisaríamos de hercúleas adequações de mão-dupla: para o Humanismo. por sua vez. para o TransHumanismo. sobretudo. as quinas experiênciais. no diálogo com as instituições e as sociedades ocidentais vigentes – enquanto que a Psicologia TransHumanista parece instigar o Humanismo a considerar semprenovas acepções para o traduzir e comunicar os orbitais da experiência humana. na medida em que recaem sobre os conhecimentos e as instituições o exercício de uma permanente flexibilização e recriação). da consistência e da coerência como categorias a serem consideradas no mar aberto de inovações experienciais. Atualizantes e Formativos etc) obrigam-nos. seja na Psicoterapia Humanista ou na Psicoterapia TransHumanista.que a ela sejam compatíveis (entretanto. Na Psicologia TransHumanista. sob uma perspectiva eminentemente TransDisciplinar. como psicoterapeutas e pesquisadores. Ambos os fluxos experienciais. presente desde as origens da Psicologia Humanista e TransHumanista. estão inseridos no aquém. Em um Saber TransHumano. são os conhecimentos que são magnetizados e imantam-se na seiva e na variedade de experiências (portanto. o humano. os conhecimentos não estão suscetíveis a fusões ou implosões). A respeito do estatuto não-sintético dessa aproximação. a adaptar-se e dialogar com os diferentes saberes disponíveis em um dado contexto cultural e histórico acerca desse “Humano” instituído. de uma forma geral. as adjacências desse conceito do “Humano” (em suas acepções de Organismo. a partir de um Saber TransDisciplinar com suas finalidades e a pertinência do mesmo para o enfrentamento de questões da urgência social e planetária. do rigor. não são deixadas de lado. os diferentes Saberes tutelados por esse guardachuva epistêmico usufruem da possibilidade de conceber feixes experienciais em recortes que. a sabedoria e o desafio de conseguir acolher e desdobrar-se junto às facetas dos conhecimentos de base Humanistas que apontam silhuetas disciplinares da técnica. Fluxo Experiencial. dada a oportunidade de não se restringir a um objeto antecipado (somente ao “Humano”. talvez seja emblemático registrar que nos contextos mundiais da Regulação/Reconhecimento e da Regulamentação/Classificação da Psicoterapia – inclusive 87 . podem alargar-se para muito-além do óbvio plasmado nas categorias sociais disponíveis. 2006. SEEMAN. concreta e institucional. que a Psicologia Humanista e seu legado com as Teorias do Pragmatismo Americano pode estender a Psicologia TransHumanista. p. Essa é.org/divisions/div32/>. outrossim. 2009. Washington. longe de expectativas rígidas de validade. a Psicologia Humanista pode resgatar o milagre da experiência humana de um lugar interno aos dramas e colapsos institucionais.18. a rescisão brusca desses vínculos históricos contribui apenas à marginalização da Psicologia TransHumana no Brasil. no que concerne a Regulamentação em outros países nestas duas áreas. AMERICAN PSYCHOLOGICAL ASSOCIATION FOR HUMANISTIC PSYCHOLOGY. do equilíbrio e da gentileza de suas fusões. São Paulo: Summus. produção de indicadores e monitoramento para “boas práticas”. D. Division 32 – Society for Humanistic Psychology. Journal of Humanistic Psychology. 2009. uma contribuição importante. sem dúvida. estivesse certo na irmandade entre a Psicologia Humanista e TransHumanista. do ponto de vista paradigmático e disciplinar. v.org/about/division. foram legadas aos guetos periféricos de protocolos “caducos” no reconhecimento de ambas as idiossincrasias. As exigências de um Saber TransDisciplinar. os critérios de formação e de fiscalização da qualidade na formação.html>. 1978.no Brasil – é importante que os instrumentos de avaliação. BIBLIOGRAFIA AMERICAN PSYCHOLOGICAL ASSOCIATION. BOAINAIN. n.). referência e consistência. Maslow. talvez. de alguma maneira. Disponível em: <http://www. Portanto. Division 32 . H. podem atestar acerca de beleza. Tornar-se transpessoal: transcendência e espiritualidade na obra de Carl Rogers. CAIN. confrontados à exigência de formatar plataformas substitutivas de análise. J (Orgs.87-92. estamos. Sem deixar de sublinhar o fato de que a Psicologia e o exercício profissional do Psicólogo são regulamentados pela República Democrática Brasileira (através do Sistema Conselhos de Psicologia).Humanistic Psychology. 88 .apa. Smuts and Adler: A humanistic consensus. Acesso em: 15 ago. Rogers´ “Formative Tendency”. Acesso em: 15 ago. da proporção. e o enfraquecimento mútuo e gradual dos esforços Humanísticos que se tornam predileção nos confrontos pelas demais disciplinas. Disponível em: <http://www.3. capazes de satisfazer os postulados e práticas Humanistas e TransHumanistas. ANSBACHER. 1998.apa. E. levem também em consideração o conjunto de diferenças explicitadas. e que estava. imbutida na transição teórico e metodológica que Maslow imaginou. Nesse sentido. As demarcações e as referências profissionais. e não por acaso. operações e intervenções. DC: American Psychological Association. Humanístic psychotherapies : Handobook of research and practice. F. C. Disponível em <http://www. 1971. K. ______. Carta da Transdisciplinaridade. Biografia de Carl Rogers.F.politanismo na teoria de Carl Rogers. W (Org. R. FRICK. MASLOW. 1998. Spirituality and Counseling.. amp. Sob avaliação (s/d). L. Teoria dinâmica da personalidade. FREITAS.). W. Rio de Janeiro: Eldorado.). ______. J. DEWEY. MORIN. K. rev.). B.. IKEMI.m. F. A.4. Porto Alegre: Editora da UFRGS. I Congresso Mundial de Transdisciplinaridade. Nova York: Zone Books. 394-399. 2 v. 2002. JAMES. A. In WATSON.htm>. São Paulo: Editora Pedagógica.. Acesso em: 14. J. HIPÓLITO. São Paulo: Editora Herder. 1975. Motivation and Personality. Textos básicos de história da psicologia. Fenomenologia e pesquisa em psicologia. p. p. 1984. Rio de Janeiro: Zahar Edições. 2005. A.com/biografia. 89 . 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Minessota: AuthorHouse. São Paulo: EPU.br/leptrans/link/conhecimento. Saúde. Odyssey: a personal inquiry into humanistic and transpersonal psychology. São Paulo: Martins Fontes. 1982.MAY.ufrrj. 1980. 1992.pdf>. B.. Revista Interface – Comunicação. Botucatu. São Paulo: Thomsom Learning. Capítulo 4 Método 91 . Capítulo 5 Pesquisas em Consciência 92 . PARTE II CONCEITOS EM PSICOLOGIA TRANSPESSOAL 93 . Capítulo 6 Transdisciplinaridade 94 . Capítulo 7 Espiritualidade 95 . para as nuvens altas e bem delineadas. com muitos medos se sobrepondo. ou à nuvem. J. Pode o ser humano conhecer a Unidade? O que é a Unidade? É a união de todos os fragmentos? Não. inteiro. amiga generosa e profunda. E terminamos com a Unidade. a mente completamente quieta. medo de não ser reconhecido e respeitado. medo de não conseguir realizar-se. ou àquelas colinas arrebatadoras. A totalidade não é uma coisa. À Theda Basso. Unidade não é a junção de fragmentos. À Vida. A totalidade. Que abrange tudo que existe. A totalidade é onde tudo acontece. minha filha e inspiração afetuosa para a vida . familiares. E a totalidade nunca se desfaz.. tudo que existiu e tudo que venha a existir. É um vasto movimento. À Luciana. para as colinas verdes bem desenhadas contra o céu. para o capim viçoso e a flor murcha – olhar sem nenhuma palavra de ontem. cada um a puxá-lo em uma direção diferente. Começamos com a Unidade. e não existe nada que esteja fora dela. como um vaso que contém todas as coisas. não perturbada por nenhum pensamento. e À Lara Nandini. silenciosa. cada um com sua pressão. É maior que a soma das partes. emocionais. entre o que é e o que imagina que os outros gostariam que ele fosse. profissionais. Um campo de infinitas possibilidades. o observador completamente ausente –. minha mulher e companheira querida. medo de não ser amado. fragmentando sua vida em múltiplos interesses? Com seus muitos gostos. O um. Olhar para o céu azul. Potencial criador sem limites. Não é que você está unido à flor. muitas vezes contraditórios e excludentes? Ele mesmo dividido entre o que é e o que gostaria de ser. é um completo não-ser. assim como é.Capítulo 8 Unidade Gratidão. financeiros.. O que é a Unidade? Pode o ser humano. muitas desejos.Krishnamurti I Unidade. assim é unidade. no qual toda divisão cessa. Unidade não é o fim de um processo de unificação. sem começo 96 . envolvido nas múltiplas demandas da vida moderna conhecer a Unidade? Cheio de compromissos. é o vôo sem o pássaro. Vida é substantiva. É a respiração e circulação do sangue: é a Vida que respira na respiração. Gerando formas e mais formas. e que a consciência destrói a vitalidade. ele mesmo um deus. o campo substancial é também chamado de mundo físico. para sofrer uma tortura eterna: durante o dia uma águia vinha e comia seu fígado. como o pássaro no vôo. A Vida não está nas formas que gera. Como na tragédia de Prometeu. Vida é Mãe criadora de toda variedade. E depois de tudo acontecer. Antes do próprio tempo e do espaço. ou campo material. É o fluxo de transformação que é desmembrado pela consciência observadora em um campo informacional e um campo de substancia formada. Fluindo. Energia que se apresenta em um só fluxo com dois aspectos: consciência e vitalidade. Unidade é o que veio antes e permanece depois. fluindo sempre. Incriada. Onde a Vida acontece. mas onde uma aparece a outra desaparece. sempre presente. Fora ele mortal e teria sido condenado à morte. Nunca morre. onde tudo aparece e desaparece. Vida é o nome do Ser. O sangue circulando e a respiração aparecem na Vida. A variedade da Vida acontece na Unidade. Um campo informacional e inteligente e um campo substancial. não são muitos. Unidade e totalidade. plástico e inteligente. Mas não são dois. 97 . com correntes de ferro. Mente e matéria atuam como pólos. Imutável. roubou o fogo dos deuses no Olimpo e deu-o aos seres humanos na Terra. Um movimento perene de transformação. Vida aparece como mente e matéria. Com nome é criadora de tudo. é a Vida que circula na circulação do sangue. Consciência e vitalidade estão sempre juntas. ou mundo espiritual. por trás ou por dentro de tudo. Inteiro. e essa polaridade é geradora de energia. abandonando-as e destruindo-as. O imortal Prometeu. ensinando-os a forjar o ferro e fazer armas e ferramentas. e por esse crime Prometeu foi punido severamente. embora sejam um só campo. ou formas. e é sempre a mesma totalidade. onde toda mudança acontece. repetindo-se dia após dia esse sofrimento que parecia não ter fim. Ser é Pai desconhecido. É o que é. por isso podemos dizer que a vitalidade traz a inconsciência. que reconto livremente. A Vida nunca pára. como na imagem comunicada por um amigo muito querido e distante. O campo mental é também chamado de campo espiritual. à noite o fígado se refazia. e incognoscível. é apenas Um.e sem fim. Ser é verbo infinitivo. A Vida veio antes. Ambos os campos gerados pelo fluxo de transformação perene que é a Vida. Ser é o movimento sem nome e sem forma da Vida. destruição e criação incessante. Sem nome é o princípio de tudo. cria tudo o que aparece e que desaparece. a base de tudo. Criando e destruindo tudo que existe. Nunca deixa de Ser. Para tornar a criar e destruir. Os deuses não gostaram nada disso. onde tudo se forma e se dissolve. renovando-se e inovando. e o inteiro permanece. as formas é que aparecem na Vida. mas sendo um deus e imortal foi agrilhoado ao Cáucaso. Vida que aparece como um movimento perene de transformação. ensinando-os a plantar e a colher. A Vida não é o pássaro voando. A consciência de si mesmo. O “Si mesmo” junguiano. na inconsciência. proteínas e minerais. e onde o corpo espiritualizado é capaz realizar a Unidade. percebendo um animalzinho. Espírito e corpo não são dois. ordenadora e 98 . a outra desaparece.Essa é uma linda imagem para o drama do fluxo consciência e do fluxo de vitalidade. A consciência circunscreve-se na mente ao dar-se conta de si mesmo. construindo um plasma sanguíneo que pode nos alimentar e renovar. corpo é sempre vivo. A vitalidade aperfeiçoa o sistema digestivo e produz esse fluído tão especial que é o sangue humano. pois quando a vitalidade o abandona não é mais corpo e sim. animais e seres humanos são instrumentos vivos criados pela Vida em seu movimento perene. assim individualizando-se. Espírito é mente corporificada. ainda que inconsciente. As correntes da Vida. A águia é uma excelente imagem do fluxo de consciência. separando o tóxico do nutritivo. Por isso se diz que o espírito é o princípio da individualidade humana. Um instrumento onde o espírito corporificado é capaz de conhecer e criar. Minerais. A consciência aperfeiçoa o sistema nervoso e produz esse instrumento inigualável em sua capacidade cognitiva. Parecem forças contrárias. A consciência que se dá conta de si mesma identifica-se consigo mesma e se percebe como um Eu sendo. com seus olhos agudos e seu bico poderoso. A vitalidade circunscreve-se na matéria pelo mesmo impulso. Aliás. com essa estranha característica. seu alimento. fundamentais à preservação do organismo. o organismo humano é fruto desse aperfeiçoamento. Mas nem a consciência nem a vitalidade circunscrevem-se de fato. cadáver. ao cairmos no sono e nos desligarmos dos acontecimentos externos: o fígado se refaz a noite. individualiza-se na mente como espírito. mas apenas um que aparece como dois. aquele que diz: “Eu sou”. Um só movimento que é Vida. aperfeiçoam os instrumentos vivos. processando açucares e gorduras. o corpo se renova no sono profundo. plantas. Corpo vivo é matéria espiritualizada. Estão sempre juntas. Consciência parece fluir da mente em direção à matéria. A Vida acontecendo cria seus instrumentos vivos. A consciência circunscreve-se. aproveitando as substâncias que vêm da alimentação. mantendo a nutrição e o calor circulante em uma temperatura precisa. vitalidade parece fluir da matéria em direção à mente. no impulso de preservação diante do fluxo incessante de transformação. mas parece que onde uma está. individualiza-se na matéria como corpo. e a vitalidade circunscreve-se. a consciência desgasta a vitalidade. a águia come o fígado. Apenas formam essa circunscrição. a noite é uma imagem da inconsciência. assim como a luz do dia é imagem da luz da consciência. Esse impulso em direção à si mesmo está presente no movimento da Vida. é o campo espiritual corporificado. Talvez faça mais sentido se dissermos que a consciência é o movimento perceptivo da mente. Fígado é o órgão da vitalidade por excelência. como um impulso à preservação em meio à transformação perene. e a vitalidade é o movimento substancioso da matéria. individualizado. Mas é um único fluxo. à quilômetros de distância enquanto voa nas alturas. O organismo humano se mostra o mais refinado dos instrumentos da Vida. consciência e vitalidade. E o tempo aparecendo como movimento que a tudo transforma. conceitos e idéias. o pulmão respondendo às necessidades gasosas do sangue. influenciando e condicionando o movimento da Vida. Ritmo. Onde existe a paralisação. morta. crenças e impregnações duradouras. O espaço inanimado tendendo à conservação e à inércia. e deixando informações inscritas na mente como registro inanimado. como memória no espaço. a fixação e o enrijecimento. criando e destruindo. A saúde orgânica é palpável no ritmo cardio-respiratório. traduzem as memórias em imagens. as formas abandonadas e inanimadas aparecem como mortas.operacional que. onde existe a dissolução e a deformação e o movimento e expansão aleatória aí a consciência não circula. Um campo de memórias influenciando o espaço e o próprio tempo. sua capacidade como processador de informações e sua capacidade cognitiva. que assim inanimada. Um campo material se distingue de um campo de memórias. É a própria matéria inanimada que se acumula e cria na consciência observadora a noção de espaço. aí a vitalidade não circula. deixando na matéria a matéria inanimada e sem vida. Aparentemente separada no acontecer da Vida. Ambos campos inanimados de resíduos. a memória de seu acontecimento passado. criam no organismo o seu sistema rítmico. onde a morte se dá quando o movimento da Vida abandona sua forma. O movimento da Vida deixa rastros: resíduos materiais e registros mentais. A memória do acontecido fica guardada. A Vida nunca abandona. A consciência se serve do cérebro humano e com ele se identifica. relação. em especial. aspectos corporal e funcional dos campos material e mental. rastros do movimento da Vida. cria limites à expansão e dissolução promovidas pela vitalidade. palavras. A Vida não morre. como memória e tempo. palco de lembranças e do esquecimento. tende ao repouso. As duas correntes juntas. Tempo e espaço e seus movimentos aparentes. registrada no tempo. deixando formas materiais. é a vitalidade que abandona a transformação perene. símbolos informativos com os quais se envol- 99 . O corpo inteiro e. no espaço. que são instrumentos de acesso e memória simultaneamente. O que é apenas um novamente aparece com dois. sangue e nervo cooperando para que coração e pulmão estabeleçam a pulsação da Vida. à serviço do organismo e da totalidade da Vida. alternância e pulsação são a dinâmica da saúde e da Vida. determinando o pulsar cardio-respiratório. pensamentos. Cria formas e mais formas e as abandona. e que reagem ao movimento da própria Vida. O coração certamente não é uma bomba a impulsionar a circulação sanguínea. Influenciando o acontecer da Vida. em seu movimento contraente e desgastante. e a memória acumulada na mente cria na consciência observadora a noção de tempo. Saúde é a harmonia das correntes da Vida. como padrões que tendem a se repetir. aparecendo como base de tudo. A Vida acontecendo aparece à consciência como um movimento no tempo. e como substância. percebendo-se como sujeito das ações e atividades corporais. o cérebro humano. mas é criado na circulação sanguínea como órgão perceptor e regulador da sua relação com o pulmão e mundo externo. sem que uma prevaleça sobre a outra. in-formando o organismo. Trabalho de consciência é a simultânea mobilização da atenção no fluxo de consciência e da intenção no fluxo da vitalidade. neurotransmissores. como estrutura geodésica. aliado a um “trabalho de consciência” em si mesma. liberando-a de cargas que as vezes se mostram muito antigas. O campo de memória não é pessoal. com diversos níveis vibratórios.vem e se desenvolvem. Padrões ancorados em crenças impensáveis revelam-se à consciência assim ativada. abre-a à possibilidade transpessoal. É o processo de maturação do organismo e em especial do sistema nervoso e cérebro. que permite à consciência humana o seu aparente desenvolvimento. vindas tanto do passado quanto do futuro.. onde se encontram as memórias e informações de tudo que existiu e possivelmente existirá. seus aminoácidos e catecolaminas. movendo expandindo o fluxo de consciência por outras regiões da mente – mente que está em tudo o que existe. Assim como os padrões mórficos. peptídeos e proteínas fazem do organismo todo uma rede comunicadora de primeira linha. Atenção e intenção mobilizadas organizam a consciência de maneira semelhante ao que acontece com a luz no raio laser: transforma-a em um poderoso instrumento de percepção e penetração no inconsciente. O corpo humano. assim como as crenças e os padrões. e perinervoso. Dá os símbolos à consciência. transferem informação com precisão e eficiência. Não nasce pronto. e resignificações acontecem. isso a amplia a estados que a pessoa experimenta como não-usuais de consciência onde muitos segredos se desvelam. velhice e morte: é o seu ciclo vital. O impulso elétrico e eletrônico nervoso. adolescência. e é o arcabouço informacional de tudo o que existe. O desenvolvimento cognitivo e da capacidade de observação da pessoa. junto com a matéria. Conexões transpessoais podem acontecer. A consciência contraída. infância. processador de informações e comunicação simultaneamente. no tempo que se mostra finito e circular. Mas nada disso é individual ou pessoal. tem características vibratórias peculiares que a sintoniza com faixas específicas do campo de memória. hormônios. que podem ser chamados de padrões kármicos. ou organismo humano é todo ele memória. nascimento. idade adulta. criando uma ilusão de linhas de continuidades e de que uma mesma individualidade espiritual continua a existir através de muitos nascimentos e muitas mortes. hemisfério direito e esquerdo e pré-frontal. se presta à circulação e transferência de informação. Essa rede comunicadora é expressão da inteligência e sabedoria universal. e a “fecha” para o restante desse campo mórfico mental. como uma forma de operar e se comunicar. como campos dentro de campos dentro de campos. Sua própria forma corporal mecânica. centrada em si mesma. Como todos organismos vivos. Os padrões kármicos são campos específicos dentro do campo 100 . o corpo humano passa por um processo de maturação no tempo. também não são individuais e pessoais. Embora a isso se dê o nome de natureza transpessoal da individualidade. O corpo é instrumento e expressão do campo de sabedoria universal.. formando um só campo mórfico. em seus aspectos reptiliano. límbico. passando de uma fase prépessoal à uma fase pessoal. Concepção. Uma forma de operar e se comunicar entre muitas outras. desde que vibre sintonicamente com eles. O trabalho de consciência permite que esses padrões se revelem e percam sua carga condicionadora do fluxo de consciência e vitalidade. mas não podemos fazê-lo beber”. atingindo a sociedade e suas instituições. assim expresso em seu poema “A Busca”. senão estaremos vendendo. como o estamos chamando aqui. segundo bom senso popular. morre o espírito. o ego e o egoísmo. não pode por fim à resistência”. Morre o eu. a morte de si mesma. portanto. de ser um eu. não como consciência. está fora da roda de nascimentos e mortes. gato por lebre. com enredos específicos. Essa a vivência de Jiddu Krishnamurti (2005). produzindo uma vida aparentemente muito mais confortável e eficiente. A desidentificação da “consciência identificada consigo mesma” de si mesma é a morte da identificação. sejam do organismo. Só a Unidade existe. Em geral se encontram impregnados em cada nível da manifestação humana. O trabalho de consciência que é um trabalho simultâneo de vitalidade e consciência. está fora da roda do karma. apenas acreditamos que estamos fora dela. e representa apenas mais resistência e mais separação. “podemos levar o cavalo à beira dágua. ela sofre a influência e cumpre esse karma. Morre a individualidade e o individualismo. Nenhum trabalho nos levará à Unidade. sem ninguém vivendo ali: Ser essencial (lembre-se: verbo infinitivo). de 1927. não existe ninguém ali. pode levar a consciência a se desidentificar de todos os objetos e crenças. pela consciência identificada consigo mesma e com o corpo. pela circunscrição corporal e espiritual. ali não há nenhum sentimento. distorcendo a vitalidade e a consciência.maior. levando às mais diversas patologias. alma e corpo. Iluminado pela Unidade. como num círculo vicioso. A Vida vive ali. condicionando e limitando o fluxo da Vida. Seu eu é resistência e. ou não fazer. e tudo acaba. uma vez que é realizado pela própria consciência identificada consigo mesma. É a morte do eu. Tudo que o indivíduo faz é enganoso porque ele o está fazendo. Ninguém alcançou a iluminação. cada vez que a consciência se sintoniza com esses enredos. mas como si mesma. “morre” o corpo como instrumento do espírito. Unidade. simplesmente porque nunca saímos da Unidade. nem crença. Ainda que se continue usando a palavra “eu” para referir-se aos atos da “pessoa”. Mas é preciso entender os limites desse trabalho. mas não pode ajudá-la a desidentificar-se de si mesma. nosso contemporâneo. espírito. sejam nos grupos. é enganoso. pois o que ali vive. em plenitude e graça. Toda e qualquer pessoa está sujeita a cumprir esses padrões kármicos. O trabalho de consciência. Até que um dia o corpo morre. aos 32 anos de idade: Desde a própria fundação da Terra. O corpo continua vivo como instrumento da própria Unidade. fora do tempo e do espaço. ou comprando. permite a interrupção desses círculos viciosos e até a instalação de círculos virtuosos. Além do que. 101 . Como Ken Wilber falou em seu “A Consciência sem Fronteiras” (1991): “É por isso que tudo que se tenta fazer. o que por sua vez atua sobre a consciência e sobre a vitalidade intensificando as distorções e patologias. assim como o todo da cultura. Além do sonho dos deuses eu sou. Eu sempre soube. Assim como a gota de orvalho é parte do mar. encontros e diálogos que ofereceu durante esses anos. Assim como o rio misterioso Entra no mar aberto Assim eu entrei No mundo da libertação. E continuou vivendo por mais 60 anos até morrer em 1986. Olha! Chegou a hora. Em mim estão muitos invernos e muitas primaveras. assim eu nasci no oceano da libertação. a hora que eu sempre soube. falando sempre o mesmo essencialmente. Aquilo que ficou conhecido como “seus ensinamentos” aconteceram nas inúmeras palestras. livros. Liberto eu sou. Simples como a folha tenra eu sou. 2001) 102 . Este é o fim que eu sempre soube.O fim de todas as coisas. que “a verdade é uma terra sem caminho” e preconizando o que entendia como “única revolução” (Krishnamurti. Livre da vida e da morte. Dor e prazer não me pegam mais Desapegado sou em afeição. ao se dar conta de si mesma. uma bolha de consciência no fluxo da Vida. busca a Unidade. consciência e vitalidade simultaneamente. com todas suas criaturas. mas apenas como função. para os hindus. Consciência é o movimento que separa. Imagina. e sua capacidade de circunscrever-se em si mesma. Busca sua origem. a consciência aparece como sujeito de ações sobre objetos. É claro que não aconteceu assim. produzindo consequências. Não existe por si mesma. aparece como ação limitada de um sujeito sobre um objeto. projetamos e encontramos a grandiosa imagem do vasto movimento da totalidade aparecendo como mente e matéria simultaneamente. A consciência busca a Unidade perdida. E julga. Quando nos perguntamos pela Origem de tudo. para os gregos. Méritos e créditos se contrapõem à dívidas e culpas. Função de percepção e experimentação e registro. A Origem é a consciência observadora que imagina ao contemplar a imensidão sem começo e sem fim. O sujeito consciente de si mesmo.com uma paciência infinita. criando a noção de “si mesma” e aparecer como consciência de si mesma. Tam- 103 . para a cultura judaico-cristã. Ela própria a cisão. Unidade aparece dividida. assim como faz tudo o que faz: para não desaparecer imediatamente. faz surgir a Vida no Ser. dando-se conta de si mesmo. Nada começou. que é uma só. Um gesto autocriador magnificente que faz surgir Brahman em Parabrahman. A busca se inicia. a Fonte! Fonte de tudo é a Unidade. um fluxo só que aparece simultaneamente como onda e partícula. Viver se torna um problema. Onde temos um só. ação. como um Deus criador que aparece no movimento indistinto da totalidade criando uma bolha de consciência de Si mesmo onde todo universo aparece. o vasto movimento circunscrevendo-se sobre si mesmo. Contemplamos o vasto movimento da totalidade. tornando-se consciente de si mesmo. faz surgir o Cosmos no Caos. identificando-se e isolando-se na mente e na matéria. A consciência se recorta no fluxo da Vida contraindo-se. para os taoístas. é fácil projetarmos a gênese como gênese pela consciência. ao cindir o acontecer com sua luz distintiva. II A consciência é uma função da mente na matéria. distante no tempo. e por isso separado. Crime e castigo aparecem concomitantemente. e uma delicadeza e atenção para com todos os seres vivos e inanimados. O sujeito observa suas ações e suas consequências. aparecem três distinções: sujeito. sem sujeito e sem objeto. semelhante à luz. e esse é seu pecado original. pois não houve um começo lá atrás. sem começo e sem fim. infinitiva e eterna. e a multiplicidade se apresenta à consciência observadora identificada como sujeito. Ação pura. faz surgir o Tai Chi no Tao. e julga-se também. faz surgir o Deus criador em Deus sem nome e sem forma. e objeto. essencialmente falando. Tudo se torna uma questão pessoal. Ao circunscrever-se em si mesma. sempre presente. Parecido com uma bolha de ar que se forma dentro da água. Desconhecendo-se a si mesma. Quer conhecer. Intocável. Quer ser a totalidade. com momentos fugazes de contentamento e sensação de plenitude. Presa de condicionamentos genéticos. e respira o perfume disso que anseia profundamente. É o fator divisivo e separatista. mentais e econômicos. sua religação. entre crenças e fantasias. Nunca encontra. ou arrancamos um peixe da água. Sofremos. com suas exigências e necessidades. Desejos e medos norteiam e desnorteiam seu estar no mundo. ambientais. Sem palavras a consciência escuta o sussurro. A consciência enxerga mundos no Universo. aparentemente fragmentando-a. Sempre a sensação de insuficiência. “E quando vou tirar o papel de prata. quer ser a solução final. Acreditamos que não vivemos na Unidade porque vivemos isolados na consciência de nós mesmos. a separação se tornará Unidade. estabelecendo começos e meios e fins. cria níveis de expressão de si mesma. nossa mística. Aponta para algo intangível e incognoscível. Por mais que nos esforcemos e empreguemos nossos recursos materiais. deito tudo ao chão. A consciência pessoal se sente separada do Todo. O olhar da consciência identificada consigo mesma se separa no Universo. aponta para o desconhecido na esperança de capturá-lo. Brahman em busca de Parabrahman. sociais e culturais. Tai Chi em busca do Tao. vive em insatisfação permanente. E perdendo-a. nossa ciência e tecnologia: o desconhecido permanece. Mal estar. algo sempre permanece desconhecido. querendo ser o que não é. a Vida em busca do Ser. Com as palavras. acredita que sabendo chegará lá. quer saber. aí sim. que não cabe nas palavras. seria feliz. a busca da religação com o Todo ou Deus. por mais que um avanço tecnológico 104 . E o início de toda busca. Cria complexidades e se embriaga de si mesma. Por mais que nessa busca muita coisa se revele. o Cosmos em busca do Caos. algo sempre falta acontecer. a consciência tateia o absoluto. Como compreender uma árvore sem a terra onde está plantada e sem o ambiente que a envolve? Como entender um peixe fora dágua? A consciência recorta os fenômenos. separando-o do fluxo vivo onde acontece. nossa religião. em conflitos e lutas internas e externas. mas que acredita que deveria ser. como quando arrancamos uma árvore da terra. na esperança de torná-lo visível. que é de folha de estanho. A busca humana de felicidade e completude. separa-se na Unidade. nosso tempo e disposição investigativa. Algo nunca acontece. e nesse jogo nos enredamos entre dores e prazeres. Achando que se fosse outro. A culpa atávica que carrega desde a sua origem. Não é. Na consciência buscamos a Unidade “perdida”. que não é senão a busca da Unidade. do ser essencial. e o poder de controlar fenômenos e eventos aparentemente se amplie. a busca de Deus. A busca da consciência que se separou é a busca da Unidade perdida. Ouve a voz do Silêncio. E busca sua reintegração. como tenho deitado a vida” canta Fernando Pessoa pela voz de Álvaro de Campos em seu poema “A Tabacaria”. Mas as mãos continuam vazias. Aponta para o invisível.bém recorta o fluxo da Vida ao se deter em algum fenômeno em especial. Sem saber o que é. e sobretudo o medo. ou de três dimensões: corpo. Deus é o supremo espírito ou “Anima Mundi”. Psique é a palavra grega para alma. Mas é Deus a Unidade? Não. Desvendamos segredos que se mostram apenas parciais. E a vida na terra é a sua escola de aprendizado e evolução. gerando confortos e ameaças sem precedentes. o "Eu sou". surgia. no que se chama a involução do espírito. o Bem e o Mal. os desejos mais abjetos e as aspirações mais nobres. as simpatias e as antipatias. como que entre os dois. Falava-se então que imortal era o espírito. A consciência centrada em si mesma e sua projeção linear: primeiro um movimento 105 . consciente da separação. A alma. a consciência individualizada. fendendo a unidade em dois. Alma do Mundo. A totalidade caiu e se espedaçou em níveis dentro de níveis. sendo que as palavras "alma" e "espírito" passaram a ser como que sinônimas. Criando o observador e a coisa observada. Depois disso. passando a vê-lo apenas como alma e corpo. sendo vista como a parte imortal e imaterial do ser humano e também onde vivem as sensações e emoções. o certo e o errado. o mistério permanece. o supremo Ser substantivo. Separando espírito e alma e corpo em uma aparente multidimensionalidade. Mistério é o abismo intransponível para a consciência que apareceu e se separou em si mesma. onde se reconheciam todos as sensações e emoções. alma e espírito. criando-se e criando o criador e a criatura. e o espírito. Alma vem do latim anima. a “coisa” chamada alma. ou espírito e corpo. Criando mundos dentro de mundos. e o espírito habitava um corpo mortal. A chamada evolução da alma é seu encontro com Deus. idéias e ideais. os sentimentos e pensamentos. os sentimentos e pensamentos. alma e espírito. Pois o Deus é visto e entendido como supremo Bem. sempre certo. ou causação descendente. No que discorremos acima temos um esboço do que corpo e espírito significam. os medos e os desejos. a Igreja deixou de ver o ser humano como trimembrado. Separando mente e matéria. Mas o que é isso que os gregos chamam psique e os latinos anima? O que é esta "coisa"? Até o século IX a Igreja Católica reconhecia o ser humano como um ser trimembrado. mas e a alma? O que é alma? Psicologia é a ciência da alma.se estabeleça. Entre o certo e o errado ela busca o certo. compondo-se de corpo. que orienta a evolução da alma em sua direção. A Unidade inclui tudo. O mistério permanece. as idéias. Evolução ascendente é o caminho da alma na sua peregrinação à Deus. estrutura física como a conhecemos. designando uma mistura de espírito e alma. Entre o Bem e o Mal ela busca o Bem. criando o tempo e o espaço. visto como a Unidade. Desse encontro entre o imortal e o mortal. busca sua integração com Deus. A entidade humana tem sido compreendida desde tempos muito antigos como cidadã de três mundos. nunca abarcam a coisa toda. Por "alma" entendia aquilo que existia entre o corpo. Certo e errado são gêmeos univitelíneos. O que nunca vai acontecer. cuja expressão é o amor e a paz. e perdoar dívidas e devedores. Às vezes a alma é mais racional. para prevalecer só o pólo “bom”. por isso menos evoluído. ou seja. se um é o certo. A Alma flutua entre pólos. é o “aniquilamento da alma” (Porete. aceitar o pão de cada dia como nos é dado.descendente e depois outro movimento. Sonhando ser espírito e negando o corpo. de acordo com o ponto de vista que julga. pois já entendemos que o que é chamado de espírito é uma circunscrição de consciência na mente. Um aparece como bem e o outro aparece como mal. e o que vemos é o ser humano cometendo sempre os mesmos crimes. chegando no fim ao ponto de partida. e julga um mais importante do que o outro. quando predominam as sensações. O verdadeiro “estado evoluído da alma” é o desaparecimento simultâneo de ambos os opostos. como gostaria a alma. orienta-se para o “Eu sou” espiritual que considera o supremo bem. por isso mais evoluída. a percepção e vivência – que não é o mero entendimento intelectual – de que são apenas dois aspectos do Mesmo. Evolução da alma é o que reza o Pai Nosso: fazer segundo a vontade de Deus – infinitivo –. e entendendo corpo como espírito decaído. a alma é tida como menos evoluída. 1993). às vezes é mais sentimental. e o sentimento tendendo às sensações e ao corpo. é o engano que assegura a permanência da divisão e separação entre espírito e corpo. mais próximo do corpo. o mais próximo do espírito. uma vez que consciência é a “substância” do espírito. e isso muitas vezes é também avaliado como mais ou menos evoluído: a razão tendendo à consciência e ao espírito. com sua existência entre espírito e corpo tidos como opostos. da Vida. e coloca para si mesma. já que sensações são bastante terrenas e carnais. realizando assim a Unidade. A alma existe entre opostos. não se dá conta que espírito e corpo são Um só. o outro deve ser o errado. para o predomínio final e definitivo do pólo superior. ou Unidade. o desaparecimento do seu pólo inferior. entendendo o espírito como a evolução do corpo: o corpo evoluído se torna espírito. pois toma o espírito como o essencial e mais alto que pode chegar. na percepção da verdade sobre espírito e corpo. complementam-se uns aos outros. quando predomina a consciência a alma é tida como mais evoluída. ou melhor: Unidade. A alma não é senão “um corpo” de reações. contra si 106 . Pois ela existe entre espírito e corpo. Assim. que longe de se excluírem. entre o corpo e o espírito. desta vez ascendente. involuído. O fato é que a alma nunca evolui. e conseqüente permanência da guerra de opostos – a própria alma. mais do que complementos. Opostos cujos pólos não existem um sem o outro. acredita e identifica o espírito como se ele fosse a unidade. é uma individualização da consciência. como meta da evolução. Além do que. Essa realização é o fim da contradição interna e o desaparecimento da própria alma. parecendo dois. Mas bem e mal são irmãos siameses. isso é impossível de acontecer. A busca do desaparecimento de apenas um dos pólos. Ou seja: não separação. vivendo a separação. vive da tensão entre os opostos. a compaixão e a paz. Identificará o Bem e o Mal. “O impossível tão estúpido como o real”. violência e destruição. pareço uma unidade. medo. mim mesmo. guerras! Cujo resultado é sempre expressão de desentendimento. em busca da complementação. da satisfação plena de completar-se no tempo. Tentará de tudo. Um pólo prevalecendo sobre o outro. Estabelecerá regras e dogmas. hegemonia e poder. compreensivo. seja porque nossa oferenda não foi aceita. mas ansiando por um mundo melhor. 107 . Jogo das paixões humanas. terras. ressentimento. que a alma enxerga como possível no dia futuro em que todos enxergarão a verdade e o certo prevalecerá sobre o errado e o Bem prevalecerá sobre o Mal. e continuamos matando do mesmo jeito. ódio. Criará leis e procurará organizar tudo. Um pólo querendo a extinção do outro. guerras conquistadoras. guerras profanas. O jogo dramático da comédia de erros e enganos. tudo para prevalecer o bem e o certo. seja para conquistar o que queremos do outro. a sombra que se iluminará! Cada vida terrena vista como uma experiência da alma para superar seus erros e enganos. Que também nos levam a idolatrar as oposições e a buscar o pólo oposto em busca da Unidade perdida. contra o ambiente e contra a sociedade.mesmo e contra seus irmãos. não existe Unidade. o seu. do gozo assegurado da companhia certa. Criará normas sociais de convivência e punirá os infratores. corromperá se achar necessário. mas certamente levando à destruição mútua. Assim. ou pelo “bem” dos nossos protegidos. mas nunca a Unidade. intolerância. Caim matou Abel nos tempos Bíblicos de antanho. como diria o mesmo Fernando Pessoa novamente pela escrita de Álvaro de Campos. com sorte. Expressão disso é o fato de nunca deixarmos de guerrear uns com os outros. o dele! Desde que o mundo é mundo fazemos guerras. inaugurando uma era de ouro que durará eternamente. Onde estou eu. em toda a extensão da História conhecida. consciência de mim mesmo. por exemplo. embora eu. encontramos conforto e contentamento. não poupará esforços nem recursos. a solidariedade. no mesmo “A Tabacaria”. pelos mesmos motivos: o meu. guerras punitivas. Os motivos variam mas as guerras são sempre iguais. pedindo a exterminação do outro. e viverá entre crenças e prescrições do que é certo e do que é errado. solidário. que aparentemente faz de “mim” um inteiro. cooperativo e até compassivo. o certo e o errado. do casamento ideal. Isso só me faz aparentemente mais tolerante. um mundo onde predomine a cooperação. expressão de uma convivência tornada impossível. mas contrarie-me e você verá do que sou capaz! A consciência individualizada existe nessa guerra ou brincadeira de opostos. consciência envolta em si mesma. Espírito e corpo. Coisa da alma por excelência. Sempre em guerra e competição. a consciência de si mesmo intolerante para com o que não é si mesmo. guerras santas. Nunca a extinção mútua. Hitler e Bush. Mesmo que eu esteja feliz. do que não é eu. Luz e Trevas. matança e destruição para nada. riquezas. para exterminar o mal e o errado. e legislará e fará acordos. como nos casos históricos de Napoleão. competindo por tudo que enxergue como importante. como no caso bíblico de Caim e Abel. A matéria a caminho do espírito. Um campo imenso onde tudo pareci existir. para nunca mais ser o mesmo. tudo. sem que eu tivesse feito alguma coisa para isso. nem no sentimento de separação que a “consciência de mim mesmo” produz. havia distinções no campo. o terreno baldio ao lado cheio de mato crescendo viçoso. individual. era uma única força por trás de tudo. quando desapareci completamente. por exemplo. havia apenas o movimento e a consciência era o próprio movimento. na verdade tudo era Um só. A Realidade que não aparecia para a consciência identificada consigo mesma. o viaduto. como um eu que se percebe como que separado do resto. como pessoa observando esse movimento. o eu. animadas e inanimadas. Unidade. Havia o corpo. que a tudo abarcava. o fusca. Embora eu tenha reaparecido. ou que tudo fosse eu. estava em tudo. todas as coisas nessa força. o rio Pinheiros. onde tudo acontecia e nada estava acontecendo de fato. Não é preciso dizer que minha vida deu uma guinada de 360º. o mundo mi108 . como a luz. era um corpo vivo. muitas coisas diferentes. e tenha sentimentos pessoais em muitas ocasiões. Desde então compreendi a Unidade como a Realidade comum a todos nós. um único movimento aparecendo como a infinidade de coisas diferentes. ou melhor. Para a consciência de mim mesmo. nem me deixar enganar pelas sutilezas e armadilhas dessa ilusão de ser a mim mesmo. mas é uma “única” luz. na cabeça. o céu poluído. e sempre fora assim. era apenas movimento. o mim. Tinha dezoito anos. Consciência e vitalidade eram apenas aspectos. não mais havia eu separado. Um vasto movimento sem causa. Era uma coisa só. embora fale de mim como de uma pessoa. Havia consciência. inclusive no corpo. vivificava tudo o mais. entre tudo o mais igualmente vivo. Não existiam coisas separadas. O tempo desapareceu. sem eira nem beira. A mesma força que o vivificava. E plenitude. embora a compreensão tenha sido imediata. sendo o que sou desde então. tudo era apenas Presença. mas isso não fazia daquilo multiplicidade. era um único campo. os carros que passavam. apareciam na Presença.III Unidade se mostrou uma vez. as palavras vieram com os anos. como sub-campos por assim dizer. o espelhinho. que não pertenciam a ninguém. Nada era pessoal. mas por dentro era totalmente outro. A consciência não estava no corpo. a realidade eram os objetos do mundo. e uma única força que impulsionava tudo. eu é que nunca tinha visto. Eu não tinha palavras para descrever o que ocorrera então. ou seja. ou melhor. Não que “eu” fosse tudo. estava guiando meu fusca na marginal Pinheiros em São Paulo. que estava por dentro e por fora de tudo. continuei o mesmo e fazendo as mesmas coisas por fora. Mas não era “uma coisa”. que “contém” todas as cores. os animais. Esse movimento era uma Presença que abarcava a totalidade. nunca mais pude acreditar na separação como realidade. mas não consciência de mim mesmo como entidade separada. não era eu. e faziam parte. mas não era o “meu” corpo. eu era tudo. o canteiro central. os edifícios e além. talvez dezenove. as plantas. os pássaros. e todo movimento desapareceu com ele. ficando só Presença. vi que o que considerava realidade não era senão aparência e efemeridade. É. pois estados são passageiros. Estamos sempre aquém. Isso é o que é. como se sempre nos faltasse algo a ser adquirido: seja experiência. Presença é isso. Ser. filosofias profundas. mas não tem jeito. a cultura. com uma prática. é Unidade. os negócios. falta alguma 109 . com um mestre. seja conhecimento. dinheiro. sem me cansar de repetir. que é a única Realidade. nem no tempo nem fora do tempo. encontrar o mestre. ou melhor do que somos agora. É a Totalidade. no desaparecimento da consciência de mim mesmo. A melhor palavra para descrever isso que não é um estado. ou Ilusão. é “ser”. a busca incessante de felicidade e prazer. nos tornarmos mais. madrugar. em um curso. Quando o eu desaparece. as religiões. trabalhar duro. Nem vazio nem cheio. as profissões. Simplesmente Amor. títulos. isso “é”. e entendi o que os hindus queriam dizer quando diziam que o mundo e as coisas do mundo eram Maya. A melhor palavra para apontar para isso é mesmo o verbo no infinitivo “Ser”. Ser é essa palavra. como verbo infinitivo. Presença não é experiência. os relacionamentos. os bens de consumo. eu. bens. ou uma graça. conta bancária polpuda. os pensamentos e idéias. e isso não é uma experiência. O “completo não-ser” da nossa epígrafe krishnamurtiana. Ninguém vivencia Presença. Sentindo-nos incompletos. os valores. muito reconhecimento social. e não é nem divina nem individual ou pessoal. um estudo. Um movimento sem começo e sem fim. o que surge é o que sempre esteve presente. E nunca chegamos lá. que esperamos conseguir em uma escola. Infinitivo. alguém consciente e experimentando algo acontecendo. Nenhum eu. por isso podemos chamar de “Presença”. propriedades. Assim como somos não serve. boa formação. Não é que alguém esteja presente. os seres humanos. e ainda assim. Sem ninguém presente praticando ou experimentando a ação. os relacionamentos. filhos maravilhosos. Presença é a própria Vida. Presença não é um estado que se vivencia. Com a revelação da Unidade. seja habilidade. Presença não é “estar”. Ser é a palavra que aponta para essa realidade essencial. um bom casamento. posições. sempre falta alguma coisa.neral. IV Unidade é anseio mais profundo de todos nós. É Presença que percebe e age. ser perseverantes. são experiências temporais. o conhecimento. E para isso precisamos nos esforçar. ou um indivíduo. de fato. conhecimento. Podemos ter muito sucesso na nossa profissão. pois não tem quem experimente e acumule a memória como experiência. Sempre a espera de alguém que nos diga quando estaremos prontos e finalmente nos sentiremos inteiros. Um movimento sem objetos se movendo e sem sujeito a produzir o movimento. as emoções e sentimentos. um Ser divino. repito. pensar positivo. insuficientes. temos que ser outra coisa. rezar por ajuda. não é o bastante. educação e cultura. e a própria consciência de mim mesmo. as escolas. Presença é o que é. um aprendizado. Assim. sem ingresso para o espetáculo da vida. idéias e ideais. Sempre querendo parar a Vida para compreendê-la. a consciência quer circunscrever e tornar igual a si mesma. busca a Unidade perdida. a consciência. sentimentos. a corrente quente da vitalidade. Conscientes de nós mesmos sentimo-nos separados de tudo. a luz da percepção. ou sujeito. no entanto. A vitalidade expande a substância e diminui a consciência. isolada em si mesma. ou fazer para ser diferentes e nos sentirmos incluídos. Quer ser o caminho. e a consciência. estrangeiros. diminuindo a in110 . Sempre do lado de fora. Presa na roda do tempo e do espaço. enredada em crenças. uma fraude. Conscientes de nós mesmos nos sentimos separados do todo. só é inconsciência para a consciência circunscrita em si mesma. somos parte do Todo. A consciência paralisa e limita a vitalidade. Vida é movimento e transformação constante. mudamos de cidade. Vemos que aparece em formas e mais formas. ou narrador. sofre. por favor! A inconsciência não é a solução. Busca para curar a dor da separação. assim aparece como duas correntes de energia.coisa. e o que é inconsciência. Quer ser o Ser infinitivo. isolada e identificada consigo mesma está sempre um passo atrás. a verdade e a Vida. Ao circunscrever-se. relação –. quer ser a totalidade. Todos parecem fazer parte e nós não. de profissão. funcionando na inconsciência. Continuamos nos sentindo de fora. outro mestre. mesmo que nada aconteça. Falamos isso. sem a carteirinha do clube. presa na cadeia de causas e consequências. torna-se em substantivo. O que é fluxo – alternância. ritmo. fora da Unidade. portanto forma e informação. Vivemos na Unidade. outra escola. mil vozes de todos os medos e todos os desejos da nossa natureza humana multifacetada. Busca a totalidade. trocamos de emprego. Mil vozes de toda a humanidade e todos os campos de conhecimento humano. o fogo da vida. E nada. E age como substantivo. buscamos outros grupos. Vitalidade e consciência constituem o mundo como o conhecemos. Busca ser o que não é. Não vivemos em um mundo fragmentado. Busca é o movimento da consciência identificada consigo mesma querendo resolver o problema da separação. Buscamos outros companheiros ou companheiras. Não sabemos como começou e não sabemos se terminará. A consciência. mas não sabemos o que é isso. E. charlatões. a Unidade nunca foi desfeita. mas não sabemos disso. ser protagonistas e não só figurantes clandestinos. existimos no Todo. Sentimo-nos separados do Todo. Sofremos. Tentamos de tudo. Vida é tudo que acontece. Substância é matéria. sempre cortando-a em pedaços para encontrar o todo. mas não vemos a Vida. tentamos outra religião. criamos outra família. A Vida flui na Unidade. Estão sempre juntas embora tenham características opostas. Queremos participar e estamos como observador. informação é da mente. que é fluxo – verbo –. Dentro de nós mil vozes falam o que deveríamos ter feito. pensamentos. vemos a transformação e reconhecemos nela a substância formada e um princípio informacional modelando a forma a partir de dentro. presa no espírito e na alma e no corpo. Não estamos advogando a inconsciência. e a corrente fria da consciência. pois consciência e inconsciência fazem parte da mesma bolha de consciência que se circunscreveu em si mesma. O mundo é uma totalidade que não compreendemos. de país. como substância inanimada que se deposita na terra. ou corporal e espiritual. sentimentos de posse. O campo mental. em pedaços e mais pedaços. a transformação cessa e as formas quedam abandonadas. seja o olhar do espírito. exploração da natureza. ou consciência pessoal que divide o Universo em dois: eu e o resto! E nesse estado de consciência. nosso olhar sempre centrado em si mesmo. Consciência e vitalidade substancializam. Forma é o que aparece quando na transformação que é a Vida a corrente da vitalidade se interrompe naquele local. É o nosso olhar que secciona e fragmenta o mundo. E assim nos enganamos e nos confundimos. outra palavra para Unidade é a palavra Universo. ou mundo espiritual. seja o olhar da alma. e na inconsciência não existe visão alguma. É a “consciência de si mesmo”. seguindo. É o nosso olhar que secciona a experiência viva em material ou mental. Vivemos em transformação. mais verdadeiro parece.consciência. sem dorso. Assim nasce o sofrimento humano. o tédio e o medo só existem nesse estado de separação. em fluir – verbo no infinitivo. A insatisfação. Mente é também conhecida como campo espiritual. Assim as formas são criadas no fluxo da transformação que é a Vida. olhar da “nossa” consciência pessoal. Em fluxo. Problemas de comunicação só aparecem nesse estado de separação. a vitalidade se retira. existem nesse estado de separação. aparentemente fragmenta a Unidade. que flui como consciência. destruição da terra. ou “campo Ponto Zero. o verso único. com sua inteligência universal e impessoal. os abusos e perversões sociais e pessoais 111 . É o nosso olhar. Nosso olhar fraciona a Vida em segmentos no tempo localizados no espaço. junto da vitalidade – fluxo do campo material. aparece como se fosse dois. 2008). Nosso olhar é um olhar com ponto de vista e ponto de fuga. toda a dor e fragmentação aparente do mundo. movem e informam a transformação e. Vínculos e pertencimentos. se em determinado momento. sensível e perceptiva. plantas e animais vivem na consciência e estão perfeitamente integrados no Todo. Sem consciência de si mesmo não existe o ponto de referência para a visão. o campo dos campos” (Laszlo. É na consciência de mim mesmo que a multiplicidade se cria. em mim. um estado de ser que parece fora do Ser. É o nosso olhar que secciona a transformação em forma e informação. que secciona a transformação perene que é a Vida em formas e mais formas. separada e identificada consigo mesma. A exploração do homem pelo homem. Propriedade das coisas. A Vida nunca abandona o Universo. o que é só um. Tampouco é a consciência que fragmenta o viver. Seja o olhar do corpo. seguindo sempre. Nasce de sentir-se um eu separado do resto. Mente e matéria são face e dorso do Mesmo. Aliás. ou falta de vínculos e sentimentos de exclusão só são questões nesse estado de separação. Mente é o vasto campo informacional do fluxo da Vida e matéria é o vasto campo substancial do fluxo da Vida. quanto menor o pedaço mais interessante a explicação. e como memória e informação que se deposita na mente. É a consciência de mim mesmo que. Não é a mente que fragmenta o Universo. Aliás. Ao nosso olhar. Minerais. isolado no Universo. chamada busca espiritual. uma dentro da outra. uma ascendente e outra descendente. não é primeiro uma e depois a outra. como uma coisa só. aprimorando-o como instrumento vivo. Metamorfoseando-se e trazendo uma variedade infinita. escura e pesada. Religiões e a busca da Unidade. também representaríamos o espírito como círculo. Experimentamos. rígida e fixa ao nosso olhar. são o coroamento desse estado de separação. embora à nossa visão possa parecer assim. Se os tivéssemos que representar geometricamente. e criam todas as coisas e seres vivos. a figura toda simbolizando as duas correntes de energia yin e yang. A corrente da vitalidade. 112 . na preta um ponto branco. cheio de movimento e plasticidade. Para fins didáticos podemos dizer que uma vai da mente para a matéria e a outra vai da matéria para a mente. repetindo-se e sendo sempre diferente. e o céu é leve. Lembrando mais uma vez que as duas vão sempre juntas. conhecido de todos. Mente e matéria aparecem na Vida ao olhar observador da consciência individualizada. luminoso. V Vida.são expressões desse estado de separação. em seu fluir. uma preta e a outra branca. ou consciência pessoal: a pessoa. a terra está embaixo dos nossos pés. escolheríamos o quadrado para representação da terra. como uma só energia. Repetindo: as duas correntes são simultâneas. ou ainda mais profundo: do espírito ao corpo. sólida. e o círculo para representação do céu. Devido a essa predominância. a terra é material. Consciência e vitalidade aparecem juntas. Consciência e vitalidade são o yin e o yang da Vida. e parece que predomina a consciência na corrente energética que vai da mente em direção à matéria. estando sempre juntas. e o céu está acima de nossas cabeças. Uma não existe sem a outra em si. quase imaterial. pois tomamos como referência a cabeça e as pernas com os pés. e na branca um ponto preto. Como o símbolo chinês do Tai Chi. que em seu fluir constroem o universo e todos os seres. assim. mas vistas como diferentes por apresentarem diferentes dinâmicas no fluir. é um movimento criador infinito. assim aparecendo como duas correntes diferentes de energia manifesta. ilimitado à nossa visão. a noção espacial de um eixo vertical da cabeça aos pés. A corrente da consciência sensível à matéria e à vitalidade que vive nela carrega e substancializa o espírito permeando-o de matéria formando corpos e aprimorando-os como instrumento para a consciência. dizemos que são duas correntes. sensível à mente e à consciência que vive nela carrega e organiza a matéria em direção ao espírito. Os pés na terra e a cabeça no céu. mas parece que predomina a vitalidade na corrente energética que vai da matéria em direção à mente. transparente. seguindo o mesmo raciocínio. onde um círculo apresenta-se com duas “baleias se acasalando”. criando formas e mais formas. como já mencionamos acima. À propósito. Essa informação nos será muito útil abaixo. e o corpo como quadrado. sempre com o mesmo princípio. fluindo a partir do corpo e do espírito coloca cada ente humano em relação uns com os outros. como algo individual e separado dos outros corpos. e um corpo físico. um caroço de pensamento. reconhecemos o corpo. A vitalidade e a consciência.Ao observarmo-nos e observarmos outros seres humanos. com suas leis e padrões de relacionamento. coroando de si mesma a experiência da pessoa. Seguindo o fluxo ascendente. influência do campo de memórias. Seguindo o fluxo descendente. se apresentando como a Unidade. em liberdade. Isso caracteriza um novo nível de experiência para cada um. que o leva a reconhecer-se como distinto e separado dos outros e dizer “Eu sou” para si mesmo. apontando para um princípio que a individualiza e distingue de todas as outras histórias pessoais. Continuando a acompanhar o fluxo ascendente podemos reconhecer um quarto nível de experiência para a pessoa onde. que pode ser identificada e reconhecida pelos outros. a consciência permeada pela vitalidade. oito níveis estão presentes. em seus aspectos espiritual e corporal dependendo da 113 . Ao mesmo tempo que no fluxo descendente se configura também um quarto nível. cuja gama de reações se apresentam como as distintas emoções. 2000). Na corrente ascendente cria-se o vínculo emocional e todas suas mazelas. a criarem normas e leis que regulam os relacionamentos. a vitalidade permeada pela consciência leva as pessoas a buscarem uma ordem para as relações. Podemos numerá-los aos pares. incluindo a si mesmo. Na corrente descendente cria-se o vínculo espiritual ou kármico. onde aparece o ego. Assim. aparecem os ideais de comportamento e relacionamento. ou espírito que já falamos. procurando regular o fluxo do poder e da autoridade. a se organizarem socialmente. confiança e amor. leva cada entidade a buscar sua expressão singular. mas também reconhecemos que a biografia de cada um é algo único e singular. A relação estabelece um diferente nível de experiência para a cada um. diante das dificuldades relacionais. cada par expressando um mesmo nível. como a cooperação e a solidariedade. e conter o abuso que surge por uns usarem o poder sobre os outros. como aceitação e abandono. essa pérola da consciência de si mesmo. e querendo Ser. Vemos assim que onde se configura o ser humano. ser autor de seus dias e assumir a responsabilidade pela sua expressão e suas consequências para todos os outros. segundo os fluxos descendente e ascendente. como a compaixão e a paz. O “Eu sou” no ser humano. a Dinâmica Energética do Psiquismo (Basso e Pustilnik. acolhimento e rejeição. ou princípio material que lhe dá substância e corporalidade. podemos dizer que em todo ente humano vemos sempre esses dois aspectos que o identificam e o individualizam: uma consciência de si mesmo. em quatro pares simultâneos. Esse é o princípio espiritual. Um “núcleo individualizado de consciência” – termo cunhado por Theda Basso e Aidda Pustilnik nas aulas da escola iniciática que fundaram. ou princípio espiritual. Fica assim evidente a presença de um princípio individualizante que se expressa no corpo como um “Eu” ao longo de toda sua biografia. Compreender esse fluxos é compreender a natureza da saúde e da doença. Assim como reconhecemos cada um desses pares – níveis. no ser humano e nas instituições humanas. podemos reconhecer cada um deles em qualquer entidade institucional criada pelo ser humano. Ordem. dimensões – no ser humano. segundo par. alma e corpo acontecendo no fluir da vitalidade e da consciência. o terceiro par. Visto de forma esquemática. como um todo. como princípios informativos não-locais impregnados em cada região do 114 . VI No nosso livro “Triângulos – Estruturas de Compreensão do Ser Humano” (Basso e Amaral. apresentamos esses níveis como triângulos. ou em um de seus aspectos. e “egoidade” e “ideais” como quarto par. “vínculos kármicos” e “vínculos emocionais”. 2007). solidariedade e paz 3 – Autoridade. Eu sou 2 – Vínculos Kármicos 3 – Expressão Individual. Compreender esses níveis é compreender todas as entidades que se individualizam e aparecem no mundo. pois cada um desses níveis aparece como uma dimensão diferente da experiência humana. Autoria e Responsabilidade 4 – Egoidade querendo ser a Unidade. Compreender esses níveis é compreender a entidade humana em toda extensão de seu drama e comédia. Espírito. “expressão individual e responsabilidade” e “ordem e leis sociais”. teríamos o seguinte: 1 – Identidade espiritual. bloqueando e interrompendo o que aparentemente seria um fluxo saudável. identidade física Todos esses pares aparecem simultaneamente constituindo e estruturando o ser humano e sua manifestação caracterizando-o como uma entidade multidimensional. que hora se localiza como que se fixando em um dos níveis. como locais de expressão de padrões estruturadores. que reconheceu em seu próprio corpo esses níveis. de acordo com a percepção interior de Theda Basso. e ora abarca todas essas dimensões. no que aparentemente seria um fluxo saudável. a liberdade e o amor 4 – Ideais de compaixão.orientação do olhar: “Identidade espiritual” e “corpo” como primeiro par. Poder e Leis Sociais 2 – Vínculos Emocionais e Sentimentais 1 – Corpo. fluindo livremente. cooperação. condicionando e condicionados pelas vivências do ser humano como consciência individualizada corporificada. Representando cada triângulo isósceles com uma base horizontal onde estão adjacentes seus dois ângulos iguais (visíveis ou virtuais) e seu ângulo oposto apontando para cima ou para baixo. estamos ampliando seu poder simbólico. experimentamos representá-los sobrepostos ao “Homem Vitruviano” de Leonardo da Vinci. Já vimos um pouco do simbolismo por trás do quadrado e do círculo. em si mesmo.corpo. aparecendo com braços e pernas abertos. Ao percebê-los localizados no corpo. foi uma representação acurada de cada um desses níveis. pois apresenta o ser humano apoiado simultaneamente em um quadrado e em um círculo. acrescentando informações às informações já expressas. Representamos esses níveis como triângulos porque assim apareceram em seu corpo. um tratado simbólico e humano profundo. de acordo com o fluxo que queiramos representar. Temos então quatro triângulos “ascendentes” e quatro triângulos “descendentes” (cuja base e ângulos iguais são virtuais. intencionalmente apoiados no círculo). quando isósceles. são figuras geométricas que provocam a impressão de movimento. Ao sobrepormos nossos triângulos à essa imagem poderosa. diferente. Vejamos: 115 . criou-se assim uma nova expressão simbólica cujo poder informacional se revela graficamente ao olhar. aparecendo como que “abertos”. com os pés juntos e os braços estendidos. No quadrado. no círculo parece estar em movimento. obedecendo o mesmo eixo vertical. o ser humano aparece parado. e indicam movimento em uma direção ao apontar na direção de seu ângulo diferente – triângulo isósceles é aquele que tem dois ângulos iguais e o terceiro. formando uma cruz. pudemos criar assim a imagem de um fluxo ascendente e de um fluxo descendente. formando uma estrela de cinco pontas. A bem da verdade. na percepção interior de Theda. Triângulos. o que nos ajudou a descobrir seus ângulos e aprimorar suas relações. indo diretamente ao corpo e à vitalidade e diretamente à mente e à consciência. o Homem Vitruviano de Leonardo é. E de fato. representa a base que é o próprio corpo e as forças da vitalidade. não vive no âmbito desses níveis ou quatro pares de triângulos. representando o impulso para a expressão individual. e o terceiro triângulo ascendente com sua base também paralela à base do quadrado. que se encontram na região cardíaca. a autoria. a cooperação. cujo ângulo descendente repousa na região frontal. com suas leis. abarcando a região do baixo ventre. não-condicionados. incondicionais. 116 . O quarto descendente representando a coroação do princípio individualizante no aparecimento do eu. por mínima que seja. paralela à base do quadrado repousando sobre o ápice do primeiro triângulo ascendente. São absolutos. Os ideais humanos mais elevados são realidades na Unidade. abarcando a região do plexo solar e os princípios da autoridade e da ordem organizadora da esfera social. o “Eu sou”. além do tempo e do espaço. repousando sobre o vértice ascendente do segundo triângulo. e a tomada de responsabilidade pelos próprios atos. não é amor. a solidariedade e a paz. fluindo em transformação perene. não é liberdade. como a Unidade. a solidariedade e a cooperação verdadeiras. normas e poder. enquanto o quarto ascendente representa os ideais humanos buscados pelo ego como a compaixão. estruturas de compreensão do ser humano. na Vida que acontece. a compaixão. sem motivo e sem finalidade posto que só acontecem em liberdade. a confiança e o amor. Os ideais humanos mais elevados não são atributos da consciência que se individualizou. O segundo triângulo descendente. O primeiro triângulo descendente. O terceiro triângulo descendente.Triângulos. sem começo e sem fim. o ego centralizador da consciência e responsável pelo egoísmo humano. Os ideais humanos mais elevados não são ideais. cujo ângulo descendente repousa na garganta. representando os vínculos relacionais emocionais e toda sua carga condicionadora do ser humano em seus relacionamentos. querendo Ser. assim como nosso corpo nos situa no mundo. pernas que nos carregam pela vida afora. representando os vínculos kármicos e as influências mórficas e padronizantes do Campo de memória universal. enquanto o segundo triângulo ascendente tem sua base. a consciência que se circunscreve. o amor. cujo ângulo descendente repousa acima da coroa cefálica e se abre para o círculo. Os ideais humanos mais elevados. ser a Unidade. Enquanto o primeiro triângulo ascendente cuja base repousa no quadrado e sobe pelas pernas até a base do períneo. a liberdade. representando o princípio identificador e individualizador do espírito. a confiança. também aberto para o círculo. a paz. e nunca alcançados pela consciência identificada consigo mesma. e onde há qualquer condição. E os quartos triângulos. indivisa e inteira. só são ideais para a consciência que se separou ao isolar-se em si mesma identificando-se onde deveria estar ausente. se abrindo para o círculo. no Ser infinitivo e Presente. a liberdade. a confiança. trazem as coisas da alma. Os segundos e terceiros e quartos triângulos. onde toda manifestação aparece e parece acontecer. o primeiro ascendente traz as coisas do corpo. e que nenhuma ação no tempo irá produzir. O que buscamos. 117 . pois não existe caminho para o que é. jamais estarão no âmbito do corpo. Buscamos Ser. O primeiro descendente traz as coisas do espírito. ou seja. nem na inconsciência. Devemos dar aos quatro pares de triângulos o que é do tempo e do espaço. a Unidade. pois representa o que não pode ser representado: o campo de infinitas possibilidades do Tao. entre causas e conseqüências. Isso é Ser. não é um determinado estado especial entre estados. o amor e a paz. como o Um que aparece como dois. a ser alcançado através de uma prática. saindo de um estado prépessoal. diz-se que ela começa a entrar no estado pessoal de consciência. a Unidade e seus absolutos. Buscamos o que é. nem vender. O quinto triângulo é um paradoxo. Quando por volta do terceiro ano de idade a consciência na criança se dá conta de si mesma e a criança passa a falar “Eu” ao referir-se a si mesma. fluxo perene de transformação. em nenhum estado de consciência. o que é condicionado e preso na roda de causa e efeito. VII É no âmbito dos quatro pares de triângulos que a pessoa se forma. descendentes e ascendentes. O que é. e a psique ganha maior estabilidade e consistência. sem depender de pré-requisitos ou pré-condições. A Unidade. como reflexo do que é chamado de “desenvolvimento da consciência”.Para nomear o inominável e representá-lo no âmbito dos triângulos percebemos um quinto triângulo descendente e ímpar. e dar ao quinto triângulo o que é da Totalidade. o que sempre é. verbo infinitivo. Como disse Jesus. aquele que não tem nome nem forma. Esse passo tem a ver com a maturação cerebral. Assim podemos entender o que fica óbvio: o que buscamos nunca iremos encontrar no âmbito dos quatro pares de triângulos. Ser essencial da própria Vida. como a liberdade. o que sempre foi e sempre será. incognoscível e imanifesto. alma e espírito representados nos triângulos. Não devemos comprar. ou Deus. nem de um processo no tempo. e os anseios da alma pela Unidade. nem na consciência autoidentificada nem na consciência corporificada. já é. mascarados pelo ego e pelos ideais. quando se diz que o jovem entrou na idade adulta. no âmbito de corpo. sendo que os quartos triângulos trazem o perfume da Unidade à alma. chamado Cristo. alma e espírito. “a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. O ser humano inteiro representado nos triângulos. O que buscamos não é um estado de espírito tampouco. corpo. cujo ângulo descendente e seus lados adjacentes tocam o quadrado e o redondo simultaneamente. ou Unidade. Nesse novo estado ela passa a ser uma referência para si mesma. nos pontos em que estes se cruzam. da alma ou do espírito. gato por lebre. ou de um método. e se prolongam ao infinito. o fim da ilusão de separação. que se prolonga até o fim do desenvolvimento do lobo pré-frontal por volta dos 21 anos de idade. como seu igual. Unidade não é do tempo. Temporal é tudo aquilo que começa e acaba. por se confundir com a busca da Totalidade –. seja a educação laica ou religiosa. ganhar uma profissão e encontrar o seu lugar na sociedade em que vive. que é o “Eu sou”. 118 . Um tempo infinito não faz o atemporal. A consciência pessoal é sempre condicionada. entre seres puramente espirituais.A consciência pessoal passa por um longo treinamento para se adequar às normas sociais. do que vai além da pessoa. Quando estamos sonhando. é o fim do sonho. Que pode então encarnar livremente. desenvolver seus dons em talentos e habilidades. impregnada que é pelas coisas da cultura. 2008) –. para ajudar os outros no caminho. a pessoa morre. em um mundo puramente espiritual. É um acordar. para algumas correntes de conhecimento. a confiança e o amor. a astrofísica contemporânea sugere ser o mesmo campo Ponto Zero (Laszlo. Atemporal é o fim do tempo. mas o espírito continua. Semelhante ao autoconhecimento. e é visto na terra como indivíduo pleno. acordar não é um processo no tempo. em um processo contínuo. tantas reencarnações quanto necessárias até atingir a plenitude do espírito realizado. e a tão sonhada Unidade. como realidade transpessoal. formativa ou profissionalizante. que é imortal e eterno. Cada acontecimento da vida como desafios e exercícios para o desenvolvimento de novas capacidades e novos estados de ser. Crença que nos prende na armadilha do tempo e da continuidade. Acredita-se que o espírito imortal guia a pessoa em sua vida terrena para o desenvolvimento da alma. assim como a liberdade. posto que traz a felicidade eterna. que está no corpo. Ao lado do seu condicionamento genético (primeiro triângulo ascendente) e seu condicionamento espiritual que o impulsiona para a individuação (primeiro triângulo descendente) – sendo que o processo de individuação é entendido como o ápice do desenvolvimento humano. passa por experiências no pós-morte. a consciência pessoal recebe um condicionamento social pela educação. que aparece como uma série de reencarnações. em um processo de desenvolvimento que nunca se completa. num tempo que continua sempre. a reencarnar seguidamente. mas é além do corpo. Espírito que é visto como a essência da pessoa e que sobrevive à pessoa. A roda de causa e efeito se prolongando indefinidamente. Prometendo gato e entregando lebre. mas é desse processo que surge a noção do transpessoal. pelas normas sociais. acenando com a imortalidade no fim de um processo de desenvolvimento contínuo. imortalidade que é vista como o fim da busca. em um processo que não se interrompe com a morte do corpo e a morte da pessoa. Todo processo ocorre no tempo. é a morte do tempo. é um ato súbito e descontínuo. um Deus encarnado. até atingir a Unidade como espírito pleno. voltando a reencarnar para completar suas lições inacabadas. Tempo é o conhecido. indo além do corpo. pelo campo de memórias universais – o hindu fala em Akasha. vivendo ao lado de Deus. pelas limitações genéticas e espirituais – sua individualidade. que já completaram seu desenvolvimento e vivem na Unidade do mundo espiritual. a aprender e realizar seus ideais. Acordar é ver o que é. De fato. O verdadeiro des-envolvimento não é um processo no tempo. enfrentar novas lições vindas do futuro. Não é um processo no âmbito dos quatro pares de triângulos descendentes e ascendentes. Mas isso não é autoconhecimento. É reconhecer os condicionamentos e impregnações que iludem a consciência. nem pessoal. Um processo nesse âmbito dos triângulos é um caminho de conhecimento. permite um melhor trânsito social. torna a vida mais confortável. Só acontece no momento presente. é o fim da consciência pessoal. enfim. da religião e da ciência. a busca de prazer e o evitar a dor. na esperança de que um dia eu vou encontrar o que estou buscando. A Unidade não se relaciona com a pessoa de forma alguma. O que quer que seja. Ama. Conhecer-se a si mesmo. sair-se bem no cotidiano. isto é o que você é. qualquer motivo ou finalidade. Autoconhecimento não é pensar em si mesmo nem sobre si mesmo. “Homem: conhece-te a ti mesmo” exortam os sábios de todas as eras. É um ato livre de qualquer condição. Conhecer-se a si mesmo e reconhecer a ilusão de si mesmo. reconhecer os desejos e os medos. nem com o espírito transpessoal. absoluta Unidade. a roda da sorte e do azar. É além do corpo. todo trabalho de consciência. Autoconhecimento não é um caminho de conhecimento. Não é pré-pessoal. “Penso. 119 . e saiba que não existe. e não tomar um pelo outro. não está interessado em tornar-se o que não é. aperfeiçoar-se em seus talentos. O autoconhecimento não produz tudo isso também? Pode produzir. não é um trabalho de consciência. Nenhum processo no tempo pode realizar. nem com o corpo. É além da arte. logo existo” e Descartes pensou que estava a conhecer-se a si mesmo. nem transpessoal. absoluto Amor. diz em seu site na Internet (2009).Autoconhecimento é ver o que se é. desenvolve habilidades. conquistando o sucesso. é um trabalho de consciência.. a busca de segurança e permanência na identificação consigo mesma e prisão na roda da fortuna. traduzido livremente por mim: Reconheça quem você é. Isso é Ser. é claro! Mas essa não é a meta do autoconhecimento. nem antes nem depois. Ainda assim. buscar é um jogo dramático que a vida joga consigo mesma. Buscar preencher aquele vazio na minha vida que parece ser tão doloroso. A arte de distinguir o gato da lebre. Autoconhecimento é a realização da verdade acerca de si mesmo. É ver-se como pessoa insatisfeita e incompleta em busca da Unidade. Absoluta Totalidade. nem nunca existiu nenhuma separação. O ser humano livre é o que é.. ser melhor na sua área de atuação. da causa e do efeito. Autoconhecimento não é pensar. É Presença. A arte de distinguir o verdadeiro do falso e o falso do verdadeiro. realizando sonhos e desejos. prepara para enfrentar certos desafios. que é além do pessoal e do transpessoal. e a verdade de si mesmo. Unmani Liza Hyde. É ver o que é. o que está acontecendo agora nunca parece ser suficiente. da alma e do espírito. E como todo caminho de conhecimento. está em paz. Buscar algum tipo de segurança ou satisfação permanente. Educação verdadeira é o autoconhecimento. É acordar para o que é. Embora seja uma arte. durante um momento de silêncio. nem alma. um momento fugaz. nos trabalhos de consciência. nos caminhos de conhecimento. e se percebe nos recônditos da mente e da matéria. durante uma prática meditativa. E adormecemos em nós mesmos. Está sempre aqui. da Verdade eterna de Ser. Nunca foi embora. singular. Ah!. que se desidentifica de si mesma temporariamente. os eleitos. Então o que resta é o que sempre esteve presente. Deixa aquela saudade impossível. que venha em nossa direção. Nós é que aparentemente nos encolhemos. É o desaparecimento da consciência de si mesmo. aquele anseio profundo. nem corpo. expressando a Realidade. Confiança é total. O que acontece é o desaparecimento do experimentador e da consciência de si mesmo.. Presença é mais próxima de nós do que nós mesmos. mas nunca vai alcançá-la. Momentos súbitos depois de um esforço intenso ou dedicação profunda a uma determinada atividade. praticar? Para que observar. que nos marcam fundo. aprender? Para que fazer um caminho de conhecimento. Um corpo aberto à Presença. Até o dia em que desaparece também o corpo. nunca vai ser Presença. Simultaneamente. com alteração e expansão da consciência. ou alguém. Quer dizer que é só para os escolhidos. que é o que aconteceu com o Buda. É a jóia da humanidade. todos experimentamos isso. É a morte do eu. durante um exercício físico. para que viajar? A consciência identificada consigo mesma tem muitas perguntas e nenhuma resposta. Um campo aberto ao amor. Com certeza. momento por momento. O perfume da Presença é sentido e experimentado. nem é algo. Presença caminhando pela terra. A consciência de si mesmo pode experimentar um gostinho disso. O corpo continua vivo. pode sentir o perfume da Presença. entre outros. Em Presença não existe ninguém presente experimentando. sempre nova. durante o tráfego intenso. em momentos de inteireza. investigar. pessoal e transpessoal. Esse desaparecimento é o que Tony Parsons (2003) e Richard Sylvester (2008) chamam de "acordar" e de “liberação”. com Krishnamurti. VIII Como é isso? Então o que estamos fazendo aqui? Para que estudar. uma tristeza sem pé nem cabeça. em meio à uma grande dor ou um grande prazer. Momentos numinosos. O fim da ilusão de ser um indivíduo. e com “eles” mesmos. os que nasceram para isso? Tão bem expresso na Tabacaria: “O mundo é para aquele que nasce para o conquistar. durante uma caminhada na natureza. Sentir o perfume da Presença é algo acontece no cotidiano. a Unidade. Nem existimos de fato.. não para os 120 . conhecer. do primeiro ao quarto triângulo descendente e do primeiro ao quarto triângulo ascendente. Expressão única. experimentar. um trabalho de consciência? Tem sentido isso? Se nenhum caminho leva a Roma.Autoconhecimento é acordar para o quinto triângulo. uma pessoa. em momentos inesperados. nunca vai se tornar Presença. Presença não é espírito. O que todos buscam e ninguém encontra. Se a mente vive a partir do outro lado. o lado que você não conhece? Da outra margem. não é memória. Mas. não pergunte isto. "Parece uma coisa interminável esta busca inglória. E estamos dizendo: comece daquilo que você não conhece. Se você diz: "Como vou viver a partir desse lugar?" – então você está convidando o padrão do passado. não pode apreender. Em verdade. é ou não é possível a Unidade? O que devemos fazer então? Reconto aqui. muitos sistemas de meditação – você sabe. estamos juntos como dois amigos. investigando nossos problemas. não compreendo essa asserção vaga. não posso vê-lo”. por mais astuto que seja. livremente. pois esse constante exame e análise somente fortalecem e condicionam ainda mais o conhecido. todos os ensinamentos de muitas escolas. você está vivendo em liberdade. vazio por dentro". comece de outra dimensão. então esses problemas não existem. nem a lembrança de um prazer. é amor. não fazendo suposições sobre a vida de outras pessoas. Você só conhece o passado. porque sentimos. uma conversa de Krishnamurti com um amigo. de seu livro “A Única Revolução” (2001). Somos sérios. se você vive a partir do desconhecido. que nós somos o mundo e o mundo é o que nós somos. Já tentei de tudo. e viva a partir daí. Portanto. então viva daquilo que você não conhece. como vou começar do outro lado? Eu não o conheço. esta vigilância. É assim: Estamos conversando sobre nossa própria vida. como duas pessoas. a qual você não tem possibilidade de ver desta margem? Comece do desconhecido. E como não é uma memória. não sei onde está.que pensam que podem fazer isso. Se você diz: "Eu sei o que é o amor" – então você não sabe. "Mas. do lado que você não conhece nada. não tem significado nenhum. interessados e comprometidos com a solução dos problemas humanos. "Não posso imaginar como começar de outro lado. agindo a partir da liberdade e isso. Continuo incompleto. Quando você pergunta: “Como vou começar do outro lado?” – você está ainda perguntando a partir deste lado. ao invés de começar do conhecido. afinal. concluído. Pois o amor não é conhecimento. nem uma lembrança. esta constante introspecção e análise. 121 . o que é que você conhece? Você só conhece o que já está acabado. Só posso ir onde conheço”. De fato. neste lugar tranqüilo. Por que você não começa pelo outro lado. Mas. essa afirmação que. que o pensamento. Você está tornando as coisas ainda mais difíceis". para mim. mas comece do outro lado. “Realmente não sei do que você está falando. ainda que tenham razão” – é verdade isso que Fernando Pessoa escreve? Afinal. todas as promessas disponíveis. Sua barriga está solta e seus ombros descansados. como quem respira profunda e silenciosamente: Os pássaros desaparecem na amplidão do céu. . Ambas as mãos segurando a xícara com delicadeza e respeito. e Amaral. ao mesmo tempo. conta-me. Só a montanha permanece. São Paulo.“Corporificando a Consciência”. você não sabe o que tal dimensão é. e cada passo constrói um caminho que não leva a parte alguma. 2007. a montanha e eu. Olha para mim sem nenhuma pergunta. a paz irradia sem nenhum esforço. o que parece acontecer. sábio sem idade. quanto mais você procura. 122 . firme e segura. Se você sabe. querendo “saber como” para depois “fazer certo”. Mas. e não há um fim para o "como". seu olhar inocente é o de uma criança sorrindo. IX Sento-me com Li Po. e você vai descobrir.“Triângulos – Estruturas de Compreensão do Ser Humano”. ICDEP. 2000. pág. Está sério. . mais você tem para procurar. O próprio procurar é o condicionamento. São Paulo. Sentamos juntos. e seu rosto é tranqüilo como uma lagoa ao entardecer. A última nuvem se derrama e desaparece. T. sem nenhuma intenção. Aí está você de novo perguntando "como". levam-na à boca. você já está morto. antes de cair: Eu sou? Referências: Basso. Sua fala é mansa e. O velho poeta chinês. largue tudo isso e comece do outro lado. E estou dizendo que. Edição do Autor. Pergunto-me. T. ou você quer dar seus próprios passos esperando que o levem a uma dimensão totalmente diferente. Ser não é saber. Basso. A. 18. só poderão levá-lo àquilo que já é conhecido. os olhos brilham como diamantes. Fique em silêncio. então sejam quais forem os passos que você dê.Estou propondo uma coisa muito simples. A cadeira desaparece. Você quer que novos passos sejam dados para você. Assim. "Mas eu não sei como ficar em silêncio". Tomamos chá. M. e Pustilnik. Estou na minha cadeira em frente ao computador. Todo saber está do lado errado. de fato. L.„The Experience of No-self”. . USA. 2008. Leituras Complementares: Balsekar. Open Secret. . Inglaterra. Hay House. Inglaterra.“Ciência e Campo Akáshico”. USA. . Porete. Inglaterra. Renard. 2000. Terra sem Caminho. Krishnamurti. Sylvester. 2002.“The Mirror of Simple Souls”. Haisch. Non-Duality. pág. T. Cultrix. 2006. State University of New YorK. Terra sem Caminho. 2003. . Paulist.“A Consciência sem Fronteiras”. K. 2003. pág 145. M. . 2004. . RJ. .“The Disappearance of the Universe”. U. pág. Wilber. B. KFA. Red Wheel / Weiser.not-knowing.com – 2009.“All There Is”. J. USA. Non-Duality. 123 . Foster. 143.L. 2008. 108. R.www. 104-109.R. Krishnamurti. 2008. Watkins. G. .“The Ultimate Understanding”. J. págs. Inglaterra. Cultrix. 1992. pagina de rosto. Churchill Livingstone.“A Única Revolução”. Oschman. J. USA. São Paulo.“The God Theory”. B.Hyde. “The Revelation of Oneness”. 2001. USA. . São Paulo. Laszlo. 1991. Roberts. Krishnamurti. Inglaterra. “A Busca”. J. Parsons. São Paulo. . R.“Energy Medicine”. 1993.“The Book of No One”. J. .“Krishnamurti‟s Notebook – full text”. 2005. .S. . E. o ‘eu’ (persona) e o Ser (Self).Capítulo 9 O Ser Quântico Multidimensionalidade quântica. o corpo na visão da Psicologia Transpessoal 124 . Cartografias.Capítulo 10 Consciência Ego. Não-localidade. Campos Morfogenéticos 125 . Inteligência Artificial. e espiritualidade. e de nosso lugar no universo. pois é por meio de nossa consciência que nos situamos no mundo. possuem significados distintos. ou é o cérebro que é um fenômeno emergente da consciência? Como pode a consciência surgir no universo? Desde o século XVII. mas uma questão que nos interessa muito de perto. A compreensão de sua natureza pode nos conduzir a uma nova concepção de nós mesmos. Graças às modernas pesquisas no campo das Neurociências. de origem latina. Awareness poderia ser traduzido aproximadamente. Psicologia Transpessoal e Filosofia da Mente. ou estado de alerta. com os significado de alerta.Capítulo 11 Consciência Transpessoal Fundamentos Quântico-Holográficos O que é a consciência? Pela primeira vez na história humana temos condições científicas para entender a natureza da consciência. Desenvolvemos neste ensaio. e consciousness significa algo próximo ao termo espírito. Física Quântico-Holográfica. no sentido mais amplo de consciousness. conscience e consciousness. e sua relação com as práticas de educação saúde. a questão da consciência foi sendo relegada a um plano secundário. permitem compreendermos o universo como um processo-evento informacional quantum-holográfico inteligente e gerador de consciência. engloba o significado de diferentes palavras em inglês. um modelo acerca da natureza da consciência. É a consciência um fenômeno emergente dos processos cerebrais. Teoria da Informação Quântica. 126 . Conscience como o conteúdo ( por vezes moral ) da mente. Neste trabalho estarei sempre me referindo à consciência. awareness. do qual a mente humana é parte integrante. A consciência não é um problema científico qualquer. participativa e interativa. Teorias da Auto-Organização. Um alerta inicial: A palavra consciência em línguas latinas como o português e o francês. Em inglês. a consciência tornou-se na atualidade um dos principais temas de estudo e discussão da ciência. fundamentado em recentes conquistas da ciência moderna que. vida e consciência. com códigos informacionais específicos. e se auto-organizou em alguns bilhões de anos em energia. a partir do Big Bang ou o que tenha iniciado esta imensa cosmogênese. Minha visão desta imensa embriogênese cósmica. há aproximadamente 13 bilhões de anos. cada um deles gerando um domínio cósmico específico: os reinos da evolução cósmica. uma ordem informacional significativa fundamental.O Código Cósmico A evolução cósmica se processa por meio da emergência no espaço-tempo de um código informacional quântico-holográfico que auto-organiza os padrões básicos da estrutura do universo. 3. Corresponde ao nível biológico e biossocial. o terceiro nível de complexificação cósmica. Este código cósmico é constituído por patamares que correspondem cada um ao surgimento de um novo mecanismo de memória mais complexo.A Cosmosfera Neste primeiro nível de complexificação cósmica observamos a emergência de um processo auto-organizador baseado no código atômico-nuclear. matéria. Corresponde ao nível físico. os ácidos nucléicos (DNA e RNA). que é dependente também do DNA e do RNA. Este Código Cósmico constitui um vasto reservatório de informação. acrescido dos neurotransmissores.A Biosfera É o segundo nível de complexificação do universo. é que cada um destes códigos informacionais corresponde ao surgimento de um processo inteligente de memória auto-organizadora no universo. Reinos que na verdade representam os níveis de organização da consciência no universo. e funcionais ou enzimas). Essa linguagem cósmica se complexificou progressivamente.A Noosfera É o domínio das idéias. onde observamos a emergência de um processo auto-organizador baseado na interação de dois tipos de macromoléculas. e de íons como sódio. Os Reinos da Evolução Cósmica 1. 2. que emerge na evolução da vida como um processo auto-organizador baseado no código neural. e as proteínas (estruturais. potássio. a matéria. que parece estar chocando este universo. e do qual somos a parte consciente. É uma propriedade primária e irredutível tão básica e incorporada à organização do universo quanto a energia. controlado por um tipo de memória ou código genético que estrutura e mantém a vida. que é um processo de memóriainformação de natureza quântico-holográfica que estrutura e mantém a energia e a matéria no universo. e o espaço-tempo. 127 . que transformaram esta filosofia e suas variantes em um linguajar complexo. com a moderna tecnologia de neuroimagem (tomografia com emissão de pósitrons. é potencialmente capaz de resolver o antigo dualismo mente/matéria. dividiu o homem em corpo mental e corpo material. Corresponde ao nível neuropsicológico. e que devemos estar alertas para o 128 . clamaram que o substrato neural da consciência não é a mesma coisa que a consciência em si. ressonância magnética funcional. . a Teoria Holoinformacional da Consciência. Este processo organiza e mantém o funcionamento do cérebro e da mente. Todo este fluxo universal de holoinformação (local + não-local). ou seja. local (newtoniana clássica). esta ordem transmitida de modo significativo e inteligente através de todos os níveis de complexidade do universo. no século XIX. modela os processos auto-organizadores inteligentes geradores de consciência e espiritualidade na mente humana. ao permitir que visualisássemos . isolando-nos de nossa fonte cósmica. subindo nos ombros de três gigantes da ciência moderna. 4. Estes campos são os responsáveis pela interconectividade informacional. filósofos da mente como David Chalmers. e subjaz ainda hoje nas produções científicas e culturais de nossas universidades e instituições acadêmicas e culturais. e não-local (quântica holística). criando uma visão de mundo dogmática. que se acelerou imensamente nos anos 90. o hard problem. magnetoencefalografia ). O Reencontro da Ciência com a Consciência Desde os anos 70 do século XX vem ocorrendo um renascimento do interesse científico sobre a natureza da consciência. Esta dicotomia penetrou de forma surpreendente e subrepticia. Com esta dicotomia Descartes desencadeou um movimento filosófico-cultural esquizofrênico. o “fluxo da consciência”. histórico e sociocultural. que é dependente da dinâmica espectral pré-espaço-temporal descrita por Karl Pribram. É um processo auto-organizador gerador de consciência. descrito por William James. que nos separou da espiritualida- de. em todos os meandros de nossa civilização tecnológica ocidental. entre a mente humana e a mente-universo. Como veremos. No entanto. nos mesmos anos 90. que propomos neste ensaio. semelhante ao paradigma teológico. (res cogitans e res extensa).cálcio e magnésio que permitem a interconectividade neuronal. descrito pelo filósofo David Chalmers que vem se arrastando na cultura ocidental. SPECT. desde quando Descartes no século XVII. Corresponde ao nível espiritual. mapeamento cerebral computadorizado.A Conscienciosfera O mais elevado e complexo nível de evolução alcançado pelo universo. em sua maioria sem dados experimentais. baseado em campos quântico-holográficos constituídos por fibras finas. e do monismo ontológico desenvolvido por Karl Pribram. com uma ordem superior superimplícita. esse modelo fundamenta cientificamente uma nova cosmovisão transdisciplinar holística da consciência. Nesta nova visão paradigmática. parapsicológicos. – que não é tão fácil assim como pensam os filósofos – refere-se ao que compreendemos sobre o funcionamento do cérebro e a experiência consciente com o uso da moderna ciência e tecnologia. paranormais. A “vermelhitude” da rosa não são os comprimentos de onda que correspondem à cor vermelha que nossos modernos computadores estão descrevendo!! No modelo holoinformacional da consciência que desenvolvemos aqui. Fundamenta-se em três pilares da ciência moderna : 1. mas de modo diferente ao proposto pelo panpsiquismo. tal como descrito por Kuhn.O modelo dos campos neurais quântico-holográficos de Karl Pribram 129 . O “hard problem” seria a experiência interior. na qual cada consciência contém a informação do todo. e ir além explicando o fenômeno da consciência . e a consciência e a espiritualidade passam a ser compreendidas como o fluxo de informação quântico- holográfica de natureza espectral que religa o cérebro e o Cosmos. A rosa vermelha que admiramos e cheiramos não é o mesmo que o substrato neural desta experiência. ou seja. Ao ser capaz de explicar todas as aquisições da antiga visão de mundo.que ele denomina hard problem (o problema difícil) e easy problem (o problema fácil). tal como o objeto real que gera o holograma! Ao unificar as neurociências e as abordagens psicoterapêuticas transpessoais. os fenômenos transpessoais. que experienciamos ao olhar uma rosa vermelha. O “easy problem”. e pode acessá-la por meio de estados elevados de consciência que otimizam o tratamento holográfico da informação neuronal. Nestes estados alterados de consciência podemos interagir com a ordem espectral “oculta” . nossa e dos outros. “implícita”. nosso cérebro é ainda compreendido como parte de uma vasta mente espectral quântico-holográfica que assemelha-se à própria organização do cosmo. É uma interpretação da natureza da consciência baseada em um modelo quântico-informacional holográfico da interação cérebro-consciência-universo. a qualidade da nossa experiência consciente ou qualia. podemos estar vivenciando uma mudança de paradigma na história da Ciência. nossa fonte primordial. da qual somos feitos “à imagem e semelhança”. com as tradições espirituais. descrita na teoria quântico-holográfica de David Bohm. Somos muito mais vastos do que nossas consciências individuais. e partes ativas de uma complexa holoarquia. mais abrangente do que o paradigma cartesiano-newtoniano ainda predominante na ciência do século XXI. O Modelo Holoinformacional da Consciência Considero este modelo de consciência como uma extensão do dualismo interativo desenvolvido por Sir John Eccles. recentemente ampliado por mim e Richard Amoroso. e mais além. talvez o objeto final de nossa busca. mediúnicos e religiosos são entendidos como processos normais da própria estrutura quantum-informacional-holográfica do universo. e mais recentemente em nosso universo macroscópico. oração e outros estados de consciência ampliada. como se todas as freqüências de todos os neurônios de todos os centros cerebrais tocassem a mesma sinfonia ( Montecucco/ Di Biase). como preconizado por eles. Este estado cerebral altamente coerente. Para uma melhor compreensão de nossas idéias é importante compreendermos o fenômeno da não-localidade. Este fluxo auto-organizador quântico- informacional é gerado pelo modo holográfico de tratamento da informação neuronal. descritos por Eccles e Beck. comprovada experimentalmente no mundo quântico.2. por meio de microsítios quânticos denominados por ele dendrons. É uma consequência da Teoria do Campo Quântico. por meio de práticas de meditação profunda. que demonstra a existência de interações instantâneas entre todos os fenômenos do universo. que formam ondas harmônicas únicas. O conceito desenvolvido aqui é um conceito dinâmico de consciência baseado em um fluxo holoinformacional (informação não-local quântico-holográfica + informação local clássica newtoniana) interconectando a dinâmica quântica cerebral informacional holográfica com a natureza quântico-informacional holográfica do universo. demonstram um estado altamente sincronizado e perfeitamente ordenado das ondas cerebrais. desenvolvida por Umesawa que conseguiu unificar 130 . não são limitados à fenda sináptica. quando ainda estudante de medicina. que pode ser otimizado e harmonizado. Esse estado informacional holográfico altamente ordenado é distribuído por todo o cérebro. e os sistemas holográficos que expomos resumidamente a seguir. o que demonstra que os processos quânticos de interação entre dendrons e psychons.As propriedades não-locais do campo quântico primeiramente desenvolvidas por Hiroomi Umesawa A idéia desenvolvida por Eccles de uma interconexão entre o cérebro e o espírito.( redes de dendritos ondulatórios) que se conectariam com os psychons ( os construtos filosóficos da mente propostos por ele). gera o campo informacional e holográfico cortical não-local de consciência que interconecta o cérebro humano ao cosmos quântico-holográfico descrito na teoria quântica de David Bohm.A interpretação causal holográfica da teoria quântica desenvolvida por David Bohm 3. Estudos de mapeamento cerebral realizados durante a ocorrência desses estados elevados de consciência. mas como uma extensão natural das idéias seminais de Eccles. Como Pribram. Não-localidade A não-localidade é uma propriedade fundamental do universo. vejo isto não como uma contradição. pela primeira vez entrei em contato com as idéias de Eccles. influenciou profundamente o desenvolvimento deste modelo desde os anos 70 do século XX. mas são muito mais amplos e holograficamente estendidos a todo o cérebro. em que Einstein e seus colaboradores demonstraram com um experimento de pensamento que. igual a 300. Science. seria impossível existir a nãolocalidade. O golpe de misericórdia foi dado em 1982 pelo físico francês Alain Aspect . Informação quântico-holográfica não-local De acordo com Bohm. no qual a atividade é dependente do conteúdo informacional que é conduzido a todo o campo experimental. Adicionando às equações deste campo um Potencial Quântico que satisfaz à equação de Schrödinger. na 5ª Conferência Solvay. Bohm desenvolveu um modelo quântico-holográfico. Esta controvérsia acabou originando o célebre Paradoxo Einstein-Podolski-Rosen. que comprovou experimentalmente e definitivamente a existência de ações não-locais entre dois fótons emitidos por um átomo. como os campos gravitacional e eletromagnético da física newtoniana clássica. e o laser. ele instantaneamente influencia o que ocorre em qualquer outra região do espaço-tempo. vol. apesar de ser matematicamente similar a eles. o que gerou a famosa controvérsia entre Einstein e Bohr. tendo em vista que em sua Teoria Especial da Relatividade. a velocidade da luz c. e não da amplitude da função de onda. De Broglie descreve um novo tipo de campo. se o spin de uma delas for alterado. em julho de 1997 (cf. o qual depende da forma. a existência da não-localidade têm sido dramática e convincentemente comprovada nos experimentos da física moderna. Mais recentemente. microscópicos e os macroscópicos. devido à impossibilidade uma partícula viajar mais rápido que a luz. em seu modelo da mecânica quântica. nuclear e gravitacional. Segundo a física clássica. no qual este potencial quântico conduz 131 . que Einstein estava errado. e que após um átomo emitir duas partículas com spins opostos. até então considerados independentes e interpretados de forma isolada. o spin da outra se modifica instantaneamente. publicada em 1905. comprovaram a existência desta ação quântica nãolocal instantânea em escala macroscópica entre duas localidades na Europa. Quando um fenômeno não-local acontece. a física quântica estaria incompleta. Desde então. e é considerada a mais fundamental teoria física do universo. e o nosso bom senso. na Bélgica. e a existência de uma unidade cósmica universal subjacente. Isto lhe dá um caráter peculiar não-local. sem que para isso seja necessário nenhuma troca de energia ou informação entre essas regiões. em uma totalidade indivisível subjacente. Einstein não podia admitir a existência de fenômenos não-locais. como a supercondutividade. A teoria do campo quântico explica os fenômenos subatômicos. revelando uma interação não-local entre elas. Postularam ainda a existência de „variáveis ocultas‟ que seriam propriedades desconhecidas dos sistemas que explicariam esta discrepância. em 1927. contrariamente ao esperado. foi demonstrado matematicamente por John Bell em 1964.000 km/s.277. que não pode ser ultrapassada. é considerada uma constante universal. pg 481) Nicolas Gisin e col. Mas.os campos eletromagnético. ou seja. mesmo que elas estejam separadas por anos-luz de distância. não se localiza em nenhuma região do espaço-tempo. O campo quântico não existe fisicamente no espaço-tempo. A mistura das frequências sonoras é o que cria a harmonia. Se sobre essa placa incidir um segundo laser. gerando uma imagem tridimensional do objeto. O relevante é que nos sistemas holográficos cada parte do sistema contém a informação do todo completa sobre o objeto. produzindo uma mistura das ondas do primeiro laser com as do segundo. que ganhou o Prêmio Nobel pela criação matemática do holograma.informação ativa que guia a partícula ao longo de seu trajeto. Quando tocamos as teclas de um piano. simultaneamente. a música que ouvimos. se quebrarmos a placa em pedaços. e este o reflete sobre uma placa ( como se fosse um filme). gerando um campo harmônico de frequências eletromagnéticas. É um campo distribuído holograficamente. O potencial quântico é descrito por Bohm como um novo tipo de campo sutil em sua forma e que não decai com a distância. por meio da interpenetração dos campos eletromagnéticos dos neurônios adjacentes. em que a imagem virtual. codificando e armazenando em 132 . estas percutem as cordas provocando vibrações sonoras que se misturam. e são sobretudo responsáveis pelas conexões horizontais das camadas do tecido neural. é criada quando. o padrão de interferência de ondas resultante. um laser incide sobre um objeto. e será refletido pela placa no espaço. Os campos neurais holográficos O neurocientista Karl Pribram vem dedicando sua vida à comprovação experimental de que o funcionamento cerebral é também de natureza holográfica. por exemplo. dependente dos neurônios de circuitos locais. demonstrando que o todo está nas partes. não transmitem impulsos nervosos comuns. Pribram descreveu uma “equação de onda neural”. resultante do funcionamento das redes neurais holográficas. Esta propriedade fundamental dos sistemas holográficos. foi descrita por Dennis Gabor. por todo o cérebro. que não apresentam fibras longas e cujos finos prolongamentos denominados teledendrons. ou holograma. e funciona tal como o holograma descrito pela matemática de Gabor. “São neurônios que funcionam no modo ondulatório. tal como no exemplo do piano descrito acima. de modo similar ao que ocorre durante a interação das ondas sonoras no piano. Sua teoria holonômica do funcionamento cerebral demonstrou a existência de um processo de tratamento holográfico da informação no córtex cerebral. Este holograma neural é construído pela interação dos campos eletromagnéticos dos teledendrons e dos dendritos dos neurônios. pode ser calculado pelas transformações de Fourier. cada pedaço refletirá a imagem tridimensional do objeto no espaço. Este campo constituído por padrões de interferência de ondas harmônicas. assim como cada parte está no todo. conexões nas quais padrões de interferência holograficóides podem ser construídos”. Sistemas holográficos São sistemas geradores de imagens tridimensionais. Pribram demonstrou que um processo similar ocorre continuamente no córtex cerebral. similar à equação de onda de Schrödinger que é a equação fundamental da teoria quântica. gerando um padrão de interferência de ondas. armazenará a informação acerca da forma e do volume do objeto. denominado holograma neural multiplex. sua in-formação. No modelo de universo de Bohm. o espaço e o tempo são misturados. concentrada) Por contraste. são uma bela metáfora deste processo universal! Matéria e Mente As formulações matemáticas que descrevem a curva harmônica resultante das interferências das ondas. uma forma de fluxo externalizada (extrusa. sendo assim responsável pela emergência dos fenômenos espirituais de religação com o cosmos (lembramos que a palavra religião tem origem no latim religare). definida em um contexto mental específico. Como Pribram demonstra de forma brilhante neste livro: “Um modo de interpretar o diagrama de Fourier é olhar a matéria como sendo uma “ex-formação”. Os conceitos orientais de arquivos akáshicos e consciência cósmica das tradições espirituais orientais. uma conceitualização espaço-temporal. é também o que David Bohm aplicou à teoria quântica.” E mais adiante: “Existem duas importantes vantagens conceituais nesta formulação: 1) mente inefável se transforma em in-formação definida pelas descrições quantitativas de Gabor e Shanonn . "embrulhados" em uma dimensão espectral de freqüências. a partir da dimensão espectral de frequências. o objeto na dimensão espaço-temporal. e a consciência no plano biológico. mas também no campo de informação holográfica que o envolve. sem relações espaço- temporais. uma ordem explícita. “ondulações” mais intensas. e experimentalmente. enriquecendo estas transformações com um modelo em que o padrão de interferência reconstrói a imagem virtual do objeto. Este campo é capaz de nos interconectar ao campo quântico-holográfico subatômico da própria estrutura do universo. as quais Denis Gabor aplicou na criação do holograma. a memória. se interconectando instantaneamente de modo não-local ao campo holográfico universal.” O universo holográfico Este modo de organização holográfica. que se relacionam à termodinâmica. Tal como no piano a harmonia. as memórias de um indivíduo não estão localizadas somente no cérebro. implícita. a música que ouvimos não está localizada no piano. palpável. que corresponderia ao nosso universo manifesto. padrões semelhantes aos holográficos estruturam uma dimensão espaço-temporal.um vastíssimo campo de informação. são as transformações de Fourier. e 2) a compreensão que a matéria como a experienciamos é uma ex-formação. pode-se reconstruir matematicamente. Ou seja. uma ordem oculta. o pensamento e sua comunicação (mentalização) são a conseqüência de uma forma “internalizada” (negentropica) de fluxo. pela aplicação do processo inverso. Quando neste campo de freqüências surgem flutuações. 133 . mas no campo ressonante que o circunda. internamente relacionada em suas atividades básicas ao todo. as jóias são em número infinito. ou talvez.” É também não- teleológico. Os condensados Bose-Einstein consistem de partículas atômicas. e “Assim na terra como no céu” . e como a rede é infinita em todas as dimensões. sem hierarquia: “Não tem centro.Bohm afirma que “na ordem implícita tudo está introjetado em tudo. “não existe um início do tempo. confirmaram a existência de uma dinâmica cerebral quântica. nem um conceito de criador. existe uma maravilhosa rede de jóias preciosas dispostas de tal modo que se estendem infinitamente em todas as direções. e concepções como “o todo no tudo e o tudo no todo” . e que cada uma das jóias refletida nela. assim como o simbolismo das afirmações judaico-cristãs do tipo “O pai está dentro de nós”. segundo Francis Cook. e a todas as outras partes. de um sistema bootstrap) na história humana.. O cosmos é um organismo auto-referente. cada uma definindo e mantendo todas as outras.. desvelando a possibilidade de formação de condensados Bose-Einstein. que parece ser a primeira descrição de um sistema holográfico ( ou como Capra coloca. nem um questionamento sobre o propósito de tudo”. A metáfora da Rede de Indra. se existe um. tal como ocorre nos lasers e na supercondutividade. que assumem um elevado grau de alinhamento. e cada parte está num sentido fundamental. No distante castelo celeste do grande deus Indra. Todo o universo está em princípio introjetado em cada parte ativamente. O universo é concebido como uma dádiva. ele está em todo lugar” A Dinâmica Quântica Cerebral Estudos experimentais desenvolvidos por Pribram e outros pesquisadores como Hameroff. por meio do holomovimento. são exemplos de que essa concepção holográfica está enraizada nos arquétipos da consciência humana desde os mais antigos pensamentos registrados. de Hermes Trimegistus descritas no Cabaillon. num infinito processo de reflexão. nas sinapses. Cada jóia é um “ôlho” brilhante da rede. são uma visão maravilhosa para os olhos. pois. feita há cerca de 2500 anos. está refletindo também todas as outras jóias. O processo de introjeção não é meramente superficial ou passivo. ou no caso do Efeito Frohlich. veremos em sua superfície o reflexo de todas as outras jóias. funcionando como um estado altamente unificado e ordenado. Penrose. e a ocorrência do Efeito Frohlich nestes sistemas. Jibu. de moléculas biológicas. “simboliza um cosmos em que existe uma infinita interrelação entre todas as partes . nos microtúbulos neurais. Se olharmos de perto uma das jóias. Suspensas como estrêlas brilhantes de primeira magnitude. Yassue. e auto-criador. e na organização molecular do líquido céfalorraquidiano. auto-mantenedor. 134 . Transcrevo abaixo a metáfora budista da Rede de Indra. Metáforas alquímicas como “tudo o que está em cima é igual a tudo o que está embaixo”. por meio do fluxo holoinformacional em um processo dinâmico infinito distribuído e auto-referencial. Nessa concepção o universo e a própria estrutura quântico-holográfica da consciência. no que Bohm denomina Ordem Implícita. Back to Leibnitz). incorporando todas as relações de fase. Pribram afirma que além de cada organismo refletir o universo é possível que o universo esteja refletindo cada organismo que o observa. Hameroff descobriu ainda que existe um elevado grau de coerência quântica entre microtubulos vizinhos. como vemos em sua afirmação : " Esse espelhamento é melhor compreendido como um paralelismo. A estrutura do microcosmos corre paralela àquela do macrocosmo (Wiener. 135 . Acredito que o imenso padrão de interferência de todo o universo. são concebidos como uma unidade tal como na concepção de mônadas de Leibnitz. e nas transformações de Fourier. Leibnitz afirma que cada mônada . e o todo está refletindo cada consciência. É uma teoria imunológica noética com características auto-organizadoras e quântico holísticas.Jibu. Este processo poderia organizar ou informar moléculas em um processo do tipo Efeito Frölich e agir sobre as moléculas dos sistemas do organismo humano de modo a energisá-los de modo positivo ou negativo. e que esses biofótons são capazes de serem transmitidos através dos tecidos humanos por meio de um processo denominado superradiância. Em sua Monadologia. reflete sua própria imagem do universo. ie. incompleto é verdade. na função (wavelets) de Gabor. enviando essas ondas de uma célula a outra através do cérebro sem perda de energia. Sabemos que os microtúbulos estudados por Hameroff e Penrose . no qual não ocorre nenhuma perda de energia ou informação. com base nesta possibilidade. exatamente como na superradiância. Portanto cada consciência está continuamente refletindo o todo. Yasue and Pribram desenvolveram uma dinâmica quântica cerebral que é de natureza holonômica. faça com que cada organismo seja um reflexo de todo o universo tal como uma mônada leibnitziana . Norbert Wiener também acreditava nessa maneira holográfica de se compreender o universo. estamos propondo uma nova teoria das doenças autoimunes. Biofótons. são excepcionais condutores de pulsos de energia. Esses pulsos são transmitidos por túbulos que possuem as paredes constituídas pelas proteinas MAP2s que são modeladas de tal modo que os pulsos chegam inalterados ao outro extremo do microtúbulo. baseada no conceito de logon. Microtúbulos e Superradiância Fritz Popp demonstrou que o corpo humano emite fótons de luz por ele denominados biofótons. tal como um pequeno espelho. Richard Amoroso e eu. . perfeitamente compatível com a teoria clonal que deu o Premio Nobel a Jerne. entre a organização interna da mônada e a organização do mundo como um todo. e que eles poderiam funcionar como “dutos de luz” e “guias de ondas” para os fótons. 1994. os circuitos MAP2 dos microtúbulos dendríticos são ideais para redes de processamento informacional. afirma Lyne McTaggart. de modo não-local (entanglement). e não somente no cérebro. 136 . em seu livro The Field. Jibu e Hameroff chegaram à mesma conclusão demonstrando que os diâmetros internos de 15 nanômetros dos microtúbulos são perfeitos para guiar a luz. e o processamento instantâneo do nosso cérebro. que seria distribuída por todo o sistema nervoso e provavelmente por todas as células do nosso corpo. Os fótons poderiam assim ser transmitidos ao longo dos microtúbulos como se fossem transparentes. criando uma coerência global das ondas por todo o cérebro. Hameroff e Scott Hagan do Dept of Physics da McGill University desenvolveram uma teoria sobre a consciência na qual os microtubulos e os dendritos podem ser vistos como a internet do corpo humano ( ver Quantum optical coherence in cytoskeletal microtubules: implications for brain function. Pribram. herética mesmo. Este processo poderia explicar a unidade de pensamentos e da consciência. com polaridades misturadas.BioSystems. por um processo físico conhecido como transparência auto-induzida. Del Giudice and Preparata demonstraram que as moléculas de água no cérebro são campos de energia coerentes e se estendem até 3 nanometros. Segundo Hameroff. de modo livre. a proteína associada aos microtúbulos. comunicando-se com todos os outros fótons do nosso corpo de modo instantâneo e não-local. específica dos dendritos. Os físicos italianos. Por meio desse processamento quântico cada neurônio poderia fazer login e ao mesmo tempo falar com outros neurônios simultaneamente. Talvez a consciência seja luz coerente em sua essência. 32: 95-209 ). gerando o processo de superradiância.Yasue and Jibu também demonstraram que a mensagem quântica deve se processar por meio de campos vibracionais e coerência quântica através dos microtúbulos. Yasue. Os microtúbulos dos dendritos são bem diferentes dos microtúbulos dos axônios. o que nos leva a pensar que a água no interior dos microtúbulos possam estar ordenadas. Esses experimentos levaram Del Giudice and Preparata a propor uma conclusão paradigmática. e são contínuos. ou mais. enquanto os microtúbulos axonais unipolares são ideais para transferência de informação. Estes autores demonstraram que essa focalização e coerência de ondas pode produzir feixes de 15 nanometros de diâmetros que é precisamente o diâmetro interno dos microtúbulos. Nos axônios os microtúbulos têm todos a mesma polaridade. Já os microtúbulos dendríticos são curtos e interrompidos. para fora do citoesqueleto ( microtúbulos ). e interconectados pela MAP2. sem perdas termais. Isso geraria uma cooperação coletiva das partículas subatômicas nos microtúbulos. que já ocorrera a Fritz Popp de que a consciência é um fenômeno global ocorrendo em todo o organismo. ou campo akhashico. e assim concebermos o uni137 .Kauffman. afirma segundo McTaggart. relata que as pesquisas com moléculas envolvidas no processo de fotossíntese. Parece que a proteína antena suprime a decoerência. reinduzindo coerência em partes decoerentes da molécula de clorofila. de modo similar mas não idêntico ao holomovimento de Bohm. esses resultados sugerem muito fortemente que a seleção natural atuou sobre a proteína antena para melhorar sua habilidade de sustentar o estado de coerência quântica” Esses processos quânticos distribuídos por todo o organismo. Kauffman afirma que “ desde que a super elevada eficiência na transferência de energia luminosa para energia química é crítica para a vida. um vastíssimo campo de energia preconizado por Puthoff. Schemp e Marcer acreditam que nossas memórias estão no Campo do Ponto. Walter Schemp . Como diz Mc Taggart. 2008. recuperar e reestruturar essas informações codificadas no campo holoinformacional em forma de imagens. conforme a terminologia de Laszlo. Isso poderia explicar a instantaneidade deste tipo de memórias. co-autor comigo de diversos livros e trabalhos. energia e matéria. em seu mais recente livro Reinventing the Sacred. que hoje é a base do processamento de imagens por ressonância magnética. Schempp conseguiu calcular. dependem de flutuações que ocorrem no chamado Campo de Energia do Ponto Zero. inclusive suas formas tridimensionais. a matemática holográfica de Gabor e uma complicada matemática que ele denomina simpletic spinor vector . que todas as informações sobre os objetos em nosso universo. o criador da holografia quântica. que em minha proposta holoinformacional quântico-holográfica seriam o fluxo dinâmico holoinformacional entre o cérebro e o cosmos. Pribram e Yasue poderiam perfeitamente ter proposto que nossas memórias poderiam ser simplesmente. Posteriormente com a colaboração de Marcer desenvolveu um mapa matemático de como a informação é processada no cérebro que é na verdade uma demonstração matemática da teoria de Pribram. nos permitem conceber uma teoria unificada da mente e da matéria tal como a totalidade cósmica indivisível de David Bohm.Zero. nas máquinas de ressonância magnética utilizando as transformações de Fourier. O exposto acima nos permite vislumbrar e conceber uma teoria unificada da mente e da matéria tal como a totalidade indivisível proposta por David Bohm. Em minha Teoria Holoinformacional esse campo de memória-informação corresponde ao campo quântico-holográfico universal. e conceber o universo o corpo e a consciência como uma vasta e dinâmica rede holoinformacional inteligente de troca de informações. e que as memórias a longo prazo seriam grupos estruturados de ondas de informação. demonstraram que a molécula de clorofila que captura o fóton. suportam um estado de coerência quântica por um tempo muito longo. uma emissão coerente de ondas vindas desse Campo. que não necessitam de nenhum mecanismo de rastreamento que procure informações através de anos de memórias. e a proteína antena que a mantém. que em uma elaboração mais complexa e mais abrangente corresponderia ao Campo Noético de Richard Amoroso. 1979).1995) no “limite do caos”(Lewin. O Homem Holístico. e local (mecanicística-newtoniana). é necessário aquietarmos nosso cérebro. Descrições das comprovações eletroencefalográficas e clínicas. ele está continuamente acessando o que denominamos Campo Holoinformacional Universal. até a “emergência de conjuntos. Para que esta conexão cérebro-universo possa se processar. propusemos. que como demonstrou Pribram. A interação cérebro-universo tem que ser obrigatoriamente uma conexão não-local. relaxamento e oração que comprovadamente sincronizam as ondas elétricas dos hemisférios cerebrais. holoinformacional. gerando um estado ampliado de consciência. e aos dados experimentais da teoria holográfica de Pribram. cada cérebro-consciência. Isto se consegue facilmente por meio das práticas de meditação. energia e matéria. faz com que cada parte. um vírus). em que cada parte do sistema contem a informação de todo o sistema. ou seja.1992). por meio de hiperciclos catalíticos( e. Os ciclos autocatalíticos se autoorganizam em níveis superiores. contenha a informação do todo. Os correlatos neurais da consciência As redes cibernéticas de reações cíclicas hierárquicas por meio das quais procuramos caracterizar a consciência. com a respectiva bibliografia desses fenômeno podem ser encontradas em meu livro. se auto-organizando em ciclos “autocatalíticos” (Prigogine1979. gerando uma interconexão informacional simultaneamente não-local (quântico-holística). Aplicando a propriedade matemática básica dos sistemas holográficos. e permitindo que o modo de tratamento holográfico da informação neuronal se otimize. nos permitiria acessar toda a informação codificada nos padrões de interferência de ondas existentes no universo desde sua origem. sincronizando o funcionamento dos hemisférios cerebrais. na qual os padrões dinâmicos quânticos cerebrais com suas redes neurais e campos holográficos são parte ativa do campo informacional quântico-holográfico cósmico. Kauffman. de conjuntos de. tal como nas mônadas de Lebnitz. pois a natureza holográfica distribuída do universo.verso como uma vasta e dinâmica rede holoinformacional inteligente de troca de informações. aos dados matemáticos da física quântica de Bohm.1995). e otimizam o tratamento holográfico da informação cortical. o que nos levou a expandimos nossa idéia em direção à essa proposta holoinformacional. tal como propomos nesse paper Seja qual for o mecanismo de recepção no cérebro. que esta interconectividade universal.. baseada nos campos quânticos não-locais de Umezawa. Deste modo a rede gera “„loops‟ 138 . Editora Vozes. capazes de evoluirem para estruturas mais complexas e mais eficientes..g. tem sido estudadas de forma analítica e mecanicistica como podemos ver nas descrições a seguir: que demonstram neurônios se interrelacionando em uma dinâmica multinível de “hiperciclos” (Eigen and Schuster. de conjuntos de neurônios” (Alwin Scott. está distribuído por todo o cérebro por meio da função holográfica de Gabor. a unidade mente-natureza. São dimensões. 139 . O campo unificado da consciência O cosmos é constituído por matéria vida e consciência. estes “correlatos neurais” da consciência. No capítulo 1 deste livro. como ordem significativa que se auto-organiza e se complexifica. consciência e inteligência são compreendidos como informação. palpável. Um universo auto-organizado como um campo quântico-holográfico. processos informacionais com significados. que é o nosso universo material manifesto. que é parte desta realidade manifesta. e o “Extended Reticular-Talamic Activation System”-ERTAS de James Newman (1997). pleno de informação significativa local e não-local (holoinformacional). O cérebro. porque na realidade experienciada de cada momento navegamos no espaço-tempo”. sua “informação”. como demonstrei. do que com uma grande máquina". gera sua própria realidade espectral a partir de campos quântico-holográficos. gerados pelo campo quântico-holoinformacional inteligente auto-organizador universal. capazes de se integrarem em sistemas com padrões de conectividade distribuídos e paralelos.1993) e “hiperestruturas” (Nils Baas. o pensamento e sua comunicação (mentalização) são a conseqüência de uma forma “internalizada” ( negentrópica) de fluxo.1995). ordem transmitida através da evolução cósmica. concentrada) Por contraste.1993). é um universo inteligente que funciona como uma mente. não são estruturados somente por complexificações das relações locais mecanicísticas da matéria. e mais adiante mostra que “um modo de interpretar o diagrama de Fourier é olhar a matéria como sendo uma “ex-formação”. em sistemas auto-organizadores como o cérebro humano. Este campo quântico-holográfico universal pode ser compreendido como uma rede cósmica inteligente? Uma mente cósmica ? Uma Consciência Holográfica Universal como a Consciência Cósmica das tradições espirituais da humanidade? Nesta concepção holoinformacional do cérebro e do universo. isto é. níveis de complexidade que apesar de não serem idênticas. denominada por Bohm de realidade implícita.criativos” (Erich Harth. uma forma de fluxo externalizada ( extrusa. Pribram denomina esta realidade espectral de “domínio pré-espaço-temporal de realidade potencial. como o astrônomo inglês Sir James Jeans já tinha observado: "O universo começa a se parecer cada vez mais com uma grande mente . que são atividades significativas. A partir dessa dimensão oculta. se forma (ex-forma) a realidade explícita. que se formam nos padrões de interferência de ondas nas interseções das flutuações nas finas fibras telesinaptodendriticas descritas por Pribram. espectral. como o “Global Workspace” (Newman and Baars. mas são primordialmente. se superpõem. No entanto. ).L. S. 24-32. em lhe dar suporte. o resto são detalhes”. Sheldrake.K. The Noetic J 2:1. Noetic Journal 4:3.H. Grof. (2000b) Consciousness. analítico-reducionista.. (ed) (2000) Pribram. 28-37. imerso neste todo holoinformacional gerador de vida e consciência. Prêmio Nobel da Paz Bibliografia Amoroso.. A. R. F. In Amoroso. Matéria. Amoroso. Albert Schweitzer. 140 . Orinda: Noetic Press. K. (2003b) The Fundamental Limit and Origin of Biological Systems.. Di Biase. Pribram. R. são os verdadeiros pensamentos de Deus. pp.. panel discussion in Science and the Primacy of Consciousness: Intimation of a 21 Century Revolution. The Noetic J 2:1. R... O mal consiste em destruir a vida. Noetic Journal 4:1. Goswami. em ferí-la ou destruí-la em plena florescência. R.A.. Amoroso.L (1999) An introduction to noetic field theory: The quantization of mind. vida e consciência não são entidades separadas. capazes de serem analisadas em um arcabouço conceitual cartesiano. Estes códigos informacionais que in-formam o Universo. (2003c) The physical basis of qualia:overcoming the 1 person 3 person barrier. R.L. S...L. Goswami.. st rd Amoroso. em procurar levá-la ao seu mais alto valor. deve eticamente estar direcionada para a preservação desta linguagem universal. a radical definition: Substance dualism solves the hard problem.L. a nossa grande responsabilidade moral! O bem consiste em preservar a vida. mas uma unidade holística indivisível. et all (eds. (1999) An introduction to noetic field theory: The quantization of mind. 212-213. 28-37. e capaz de acessar esse todo.. um campo quântico holoinformacional inteligente auto-organizador que vem se desdobrando há bilhões de anos em uma infinita e dinâmica holoarquia cósmica. por meio de uma ética de reverência pela Vida! Esta.L. Oakland: Noetic Press. Einstein gostava de dizer “quero conhecer os pensamentos de Deus. R.. Amoroso.al. Science and the Primacy of Consciousness.sendo possível afirmar que a dimensão inteligência-informação sempre esteve presente em todos os níveis de organização da natureza. aquilo que verdadeiramente nos religa à nossa fonte! Foram colocados à nossa disposição. pp. et. Amoroso. Sheldrake R. oferecidos como uma dádiva que não temos como compreender! Sua utilização correta pelo homem. pp. R. Grof. Di Biase.. Bohm. 311-14. 339: 1155-1159. (1987) Speakable and Unspeakable in Quantum Mechanics. Medical Hypothesis.D. (1979) Mind and Nature: a necessary unity.. 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Seu modelo do “espectro da consciência”, produzido aos 23 anos de idade, é uma das cartografias mais completas da consciência humana e visa integrar os conhecimentos das diversas escolas psicológicas convencionais com as principais abordagens dadas à consciência nas culturas ocidental e oriental. Sua produção teórica tem se desdobrado ao longo do tempo (pelo menos cinco revisões), alcançando uma extrema complexidade e influenciando diretamente uma ampla geração de terapeutas transpessoais. Wilber desenvolveu uma metodologia integrativa, e não eclética, no estudo da consciência humana, conseguindo integrar em uma cartografia harmônica as principais contribuições dos teóricos de diversas áreas do saber humano; sendo dado destaque a sua incrível capacidade de integrar as visões espirituais (orientais e ocidentais) no estudo do ser humano. Neste texto inicialmente oferecemos uma visão geral do modelo de desenvolvimento da consciência na teoria de Ken Wilber, seguido da apresentação dos “Quatro quadrantes do Kos23 mos ” e sua contribuição para pensarmos práticas de saúde integral. Modelo de desenvolvimento da consciência Um modelo de desenvolvimento da consciência é fundamental para estruturarmos uma visão abrangente do ser humano, pois aponta metáforas dos percursos do seu crescimento, bem como destaca entraves e desafios a serem superados na busca/construção de saúde integral. No modelo de integralidade apontado por Wilber (1986, 2000), as estruturas básicas da 24 consciência correspondem à grande cadeia do ser da filosofia perene . A metáfora utilizada por esse autor para apresentar a estrutura básica da consciência é a imagem de uma escada 23 25 (figura “Kosmos, que significa o Todo padronizado de toda a existÊnica, incluindo os reinos fisico, emocional, mental e espiritual. A realidade suprema não era meramente o cosmos, ou a dimensão física, mas o Kosmos, as dimensões física, emocional, mental e espiritual, todas juntas” (WILBER, 2003, p. 10). 24 Filosofia perene é um termo utilizado por Huxley (2002) e Wilber (2000) para designar os pontos de convergência presen- tes entre as principais tradições espirituais do mundo. 25 Pense nesta escada como uma espiral holográfica. 153 abaixo), que se inicia no degrau zero (matrizes perinatais) e se desdobra até o degrau 10 (nível último). O conhecimento de um percurso do desenvolvimento da consciência através desta escada holográfica é apresentado a seguir com o intuito de ajudar o leitor a navegar na imensa vastidão e complexidade do Ser. Contudo o fenômeno humano não é esgotado nos modelos, pois o humano continua seu desdobramento, sempre se apresentando resistente aos processos de categorizações. Assim, o modelo de Wilber, como ele mesmo destaca, deve ser tomado como uma grande metáfora, sempre aberta a novas integrações. Modelo da estrutura da consciência Os quatro degraus iniciais formam a base do ser no seu movimento de evolução e apresentam a característica de serem pré-pessoais, ou seja, a noção de um “eu separado” ainda não emergiu, sendo o “degrau zero”, matrizes perinatais, foco de estudo de psicanalistas pioneiros como Otto Rank, Françoise Dolto e Maud Monnoni e do transpessoal Stanislav Grof. Neste momento os aspectos que envolvem a gestação e nascimento são destacados como relevantes para organização do psiquismo. Os trabalhos transpessoais de Grof (1988, 1994, 1997a, 1997b, 2000) reafirmam as descobertas freudianas e rankianas, e ampliam a cartografia do psiquismo através da introdução da noção das matrizes perinatais. 154 O primeiro degrau corresponde ao nível da matéria, da sensação e da percepção, ou dos três primeiros skandhas budistas, bem como engloba o nível sensório-motor de Piaget. Este primeiro degrau ou nível é o do eu físico, o qual, primeiramente, encontra-se em unidade indiferenciada com o meio-ambiente material. Esse tipo de eu ainda não está em condições de se distinguir do meio-ambiente material, instaurando uma relação diferenciada com ele, bem como não sabe ainda separar-se de um outro eu. O momento final dessa etapa sinaliza, entretanto, a saída da unidade indiferenciada, de tal forma que o eu físico começa gradativamente a afirmar-se diante da realidade objetiva. Isto lhe permite, então, separar-se do outro subjetivo ou objetivo a fim de poder lidar com ele, sem sentir-se perdido e, por assim dizer, “totalmente atolado” no outro. Se, no entanto, uma primeira dissociação tem lugar, então o eu se vê diante de uma outra tarefa, a saber, construir seu mundo emocional. À primeira dissociação tem de seguir uma segunda, a fim de que a consciência possa afirmar seus sentimentos frente a outros objetos e outros seres humanos, ao invés de confundir seus sentimentos com sentimentos alheios. Assim como ocorreu anteriormente uma diferenciação na fisioesfera, o mundo do eu físico, assim também há uma diferenciação na bioesfera, o mundo do eu emocional. Em ambos os mundos, o eu transcende, de um lado, a sua completa assimilação pelo outro, sem, no entanto, eliminá-lo. Se o outro fosse totalmente negado, então o eu se relacionaria apenas consigo mesmo. Se o eu fosse totalmente assimilado, então não haveria uma subjetividade relativamente independente. A afirmação físico-impulsiva e biológico-emocional do eu pressupõe a relação entre sujeito e objeto e a entre sujeito e um outro sujeito, nas quais sujeito e objeto mantenham suas respectivas posições, sem que um seja reduzido ao outro. A deficiência, a qual consiste tanto em não saber distinguir os elementos existentes nessas relações quanto em não saber interligá-los em sua múltipla unidade ou multiplicidade una, conduz a patologias. O segundo degrau ou nível corresponde na abordagem budista ao quarto Skandha, ao nível emocional-sexual, sendo o nome fantasmagórico cunhado por Arieti (1967) para indicar a mente inferior ou de imagem, a forma mais simples de visualização mental, usando apenas imagens. No terceiro nível de seu desenvolvimento o eu encontra um outro desafio, a saber, avançando para além da bioesfera e, simultaneamente, conservando-a, ele estabelece-se em sua faculdade mental, a nooesfera. No mundo mental a linguagem desempenha um papel muito importante, pois ela capacita o eu a distanciar-se da imediatez das pulsões e emoções e, com isso, controlá-las e, em casos mais graves, reprimi-las. A consciência está, portanto, em condições de se separar delas, mas também de integrá-las. A diferença entre corpo e nooesfera é apenas o início de um movimento no qual a consciência individual progride em direção ao mundo coletivo e social. Graças ao incipiente domínio da linguagem o eu pode tomar sobre si uma virtude fundamental para a convivência social e, portanto, distanciar-se de um mundo centrado exclusivamente no eu. Trata-se do fato de colocar-se no lugar 155 do outro, desempenhar o papel do outro, entender e praticar o intercâmbio de papéis. Assim, temos no terceiro degrau, a mente representacional que pode ser associada ao estágio préoperatório de Piaget, e subdivide-se em estágio de símbolos e estágio de conceitos. Os degraus 4, 5 e 6 formam o nível pessoal, aqui emerge a noção de um “eu separado”, enquanto os quatro últimos formam o nível transpessoal, ou seja vão além do pessoal, da separação mente e corpo imposta pelo congelamento nos níveis pessoais. A quarta etapa da evolução da consciência consiste na consciência e nas vivências de seus papéis. A identidade concentrada no corpo, em suas pulsões, emoções e desejos, portanto centrada na natureza, é substituída pela identidade relacionada com o intercâmbio de papéis. O indivíduo que se encontra nessa fase aprende tanto a representar seu próprio papel quanto a distingui-lo dos papéis de outros seres humanos. Ao eu que alcançou essa etapa de sua evolução surge a esfera social, na qual sua identidade determinada por normas e leis de seu contexto está entrelaçada e interligada com as identidades de outros sujeitos. A consciência individual permanece ainda, por assim dizer, fundida ao ethos coletivo, de tal forma que ela assume uma identidade e um papel atribuídos pelo eu coletivo, o “nós”. Isto caracteriza o nível convencional de moralidade, segundo o qual o eu se adapta ao padrão de valores conjuntamente vivenciados em uma determinada sociedade. Trata-se de internalizar leis, prescrições e normas, mediante as quais ele faz o que ele deve fazer. Na próxima (quinta) fase de desenvolvimento as leis e normas que até então regiam as vivências da consciência são questionadas. Não se trata mais de saber o que é bom para minha família, o grupo social ou o povo, aos quais alguém está ligado. Antes de mais nada, trata-se de determinar o que é justo para todos os povos, apesar e levando em conta as suas diferenças. A identidade da consciência centrada em um círculo social acanhado é abandonada em favor de uma identidade focada em todo o planeta. Um horizonte de novas possibilidades é aberto, na medida em que a totalidade das normas e leis está em questão e torna-se problemática. Assim, pela primeira vez, surgiu um nível de consciência no qual ela, liberta do seu narcisismo, egocentrismo e etnocentrismo, toma como seu próprio interesse o mundo como tal, justiça e condições materiais de vida dignas para todos. Com isso, uma moralidade pós-convencional surgiu, graças à qual o indivíduo se orienta pelo bem-estar da humanidade. No sexto degrau, que aprofunda ainda mais a integração entre corpo e faculdade mental, o eu inicia a objetivação do corpo e da faculdade mental, a sua tematização, bem como o progressivo distanciamento do corpo e da mente. Ela é denominada a estação da lógica sistêmica, visto que ela considera os objetos como um todo formado por uma multiplicidade de sistemas, dentro do qual, e em relação a outras totalidades, os objetos ganham sentido. Na medida em que a consciência torna-se testemunha do corpo e da faculdade mental, também sua faculdade reflexiva tornase mais ativa, de tal forma que ela começa a transcender corpo e nooesfera. 156 Isto acarreta o aprofundamento do ponto de vista pós-convencional, de tal modo que as posições com base em normas e leis de determinada sociedade não encontram mais legitimação para esse nível. Há, pois, um grande risco de que o eu sistêmico perca-se nas múltiplas perspectivas que lhe são abertas, afundando-se em um completo relativismo. A pluralidade das perspectivas não significa, contudo, que todas são igualmente corretas, já que valores orientados segundo uma perspectiva global são melhores do que aqueles orientados de acordo com uma perspectiva centrada apenas no indivíduo ou em apenas um povo. Aqui, portanto, reside o perigo de uma “doença existencial”, em que a consciência, insatisfeita com todas as razões capazes de dar sentido à vida, não consegue mais coordenar as diversas perspectivas. A superação dessa dificuldade é viabilizada pela passagem do eu à próxima (sétima) estação de sua evolução: o nível psíquico de desenvolvimento. Essa nova estação é aquela em que a identidade da consciência não repousa mais na união com o próprio eu, a sociedade ou o planeta. O novum nessa estação reside no fato de que a consciência se sente una com todos os seres, humanos e não-humanos, com toda a natureza cósmica interpretada como manifestação do Absoluto. O eu transcende as limitações de seu geocentrismo, a fim de considerar o cosmo como uma comunidade formando uma só irmandade. Todos os seres são penetrados pela supra-alma, a qual, como uma luz, irradia-se através dele. A consciência individual, ao participar da vida dessa supraalma, mostra-se como superando todas as suas identificações. À supra-alma está associada a um novo tipo de moralidade, a saber, a compaixão com todos seres. A compaixão não é uma coação para a ação, mas uma ação espontânea e gratuita. Ao levar a cabo a integração da fisioesfera, bioesfera e nooesfera, o nível psíquico leva a efeito a experiência consciencial supramental da unidade dessas três esferas. Não é por acaso que esse nível tanto transcende quanto inclui a última estação. A oitava estação da evolução consciencial é a internalização e refinamento das aquisições da última etapa. E justamente em virtude disto provem a dificuldade de descrevê-la. Como exemplo do que se passa nessa fase, Wilber vê as experiências místicas de Tereza de Ávila. Há sentido de falar em refinamento da experiência da consciência, já que a consciência está diante de um mundo que extrapola toda a natureza cósmica do nível psíquico. A realidade com a qual ela se defronta é, então, chamada nível sutil, posto que ela tem a experiência de fenômenos tão sutis que parecem desvanecer. Há sentido também em falar de internalização, porque a consciência aprofunda o seu avançar para dentro de si mesma, movimento que, por sua vez, a conduz a um amigável abraço com toda a natureza cósmica e sua origem. Ao universo físico é acrescido o mundo sutil que, enquanto fonte desse próprio universo físico, se manifesta, como matéria densa, no cosmo físico. Comparando com a filosofia de Plotino, o plano sutil corresponde ao da alma, pois essa é a raiz da esfera material. Em consonância com a sutileza dessa etapa, a oposição entre sujeito e objeto torna-se cada vez menor, extremamente pequena, enfim, sutil. 157 A evolução da consciência ainda não alcançou seu estágio final. A nona estação eleva-a ao plano causal. Ele é o plano das formas, a partir das quais os níveis inferiores são moldados. Na tradição filosófica ocidental esse nível encontra sua correspondência no mundo das Idéias de Platão e na hipóstase do Espírito, de acordo com a filosofia plotiniana. Ela sinaliza tanto a identidade do pensamento com o ser quanto a totalidade do ser e, nessa medida, contém as Formas (Idéias) que estruturam toda “a grande cadeia do ser”. Aqui estão as condições “formais” que conferem a todos os seres sua figura ontológica específica. Finalmente, a consciência faz a sua experiência decisiva que a leva a transcender todas as formas em direção ao sem-forma, acima de toda discursividade e dualidade: o Uno em Plotino, o nirguna (ausência de qualidade) na tradição do vedanta, o shunyata (vacuidade) na tradição budista. O sem-forma não pode mais entrar no jogo dos atributos, já que, enquanto incondicionado, ele tem de ser privado de toda forma, a fim ser a fonte de todas as formas. Nesse específico sentido, ele é a vacuidade simples ou o puramente negativo: nem isto, nem aquilo. O sem-forma não pertence mais a um plano consciencial específico. Ele é simplesmente aquilo em que a consciência e seu objeto se encontram, também aquilo do qual eles surgem e também aquilo para o qual eles retornam. Ele é “simultaneamente” imanente e transcendente a todos os níveis de desenvolvimento consciencial. Nenhum desses níveis é capaz de exauri-lo, pois o sem-forma constantemente os põe e transpõe. A abordagem transpessoal estuda o amplo espectro da fenomenologia que se desdobra no conjunto da escada holográfica, sejam eles os degraus pré-pessoais, pessoais ou transpessoais. As visões tradicionais de saúde põem o quinto degrau ou nível como a última instância a ser desenvolvida, já que as operações formais seriam as últimas habilidades a serem trabalhadas; contudo, a abordagem transpessoal oferece uma ampliação desse modelo, mediante a inclusão dos outros degraus. O sexto degrau é apresentado como a estrutura mais desenvolvida do nível pes26 soal, representando uma ponte de transição para os níveis transpessoais . A perspectiva transpessoal busca, portanto, incluir uma visão global da experiência humana, daí trabalhar com o modelo do espectro total da consciência e propor uma intervenção que abranja todos os níveis e todos os quadrantes. A expressão “todos os níveis” refere-se às ondas da existência que vão da matéria ao corpo, do corpo à mente, da mente à alma e desta ao espírito; “todos os quadrantes” refere-se às dimensões do eu, do nós e do isto (ou eu, cultura e natureza). De forma geral, uma saúde integral do tipo “todos os níveis e todos os quadrantes” levará a exerci- 26 Psicólogos como Bruner, Flavell e Arieti (1967) observaram que existem muitas evidências sobre uma estrutura cognitiva além da “operacional formal” de Piaget ou superior a ela. Esta estrutura tem sido denominada de “dialética”, “integrativa” e “sintético-criativa”, contudo Wilber prefere “visio-lógico”, pois enquanto a mente formal estabelece relações, a visio-lógico “estabelece redes de relações”, uma visão abrangente e panorâmica aliada a uma alta capacidade de síntese altamente integradora. 158 tar as ondas físicas, emocionais, mentais e espirituais, no eu, na cultura e na natureza, ou seja deve contemplar os quatro quadrantes do Kosmos. Saúde nos quatro quadrantes do Kosmos Wilber (2001a, 2002, 2006), propõe que para compreensão do fenômeno humano é fundamental uma visão interdependente das quatro áreas do Kosmos: as áreas do intencional e cultural com características de serem hermenêuticas e abordarem a consciência, formando o bloco do interior, e as áreas comportamental e social marcando o exterior e tornado-se reconhecidas por serem monológicas, empíricas, positivistas e formais Wilber empreende a pesquisa sobre os níveis de desenvolvimento da consciência, considerando a constelação teórica moderna e pós-moderna. Seu propósito consiste em formular uma teoria integral capaz não só de reconstruir as etapas da evolução consciencial, mas também coordená-las com os âmbitos da cultura, organização social, política e tecnológica. Daí resulta sua teoria dos quatro quadrantes e dos níveis de desenvolvimento em cada um desses quadrantes. Essa idéia ajuda a compor a visão das práticas para saúde integral e pode ser vista na figura a seguir. Os Quatro quadrantes do Kosmos SUPERIOR ESQUERDO(SE) INTERIOR- INDIVIDUAL EXTERIOR-INDIVIDUAL SUBJETIVO OBJETIVO Intencional Comportamental EU 159 SUPERIOR DIREITO (SD) ISTO O nível emocional .INFERIOR ESQUERDO (IE) INFERIOR DIREITO (ID) INTERIOR-COLETIVO EXTERIOR-COLETIVO INTERSUBJETIVO INTER-OBJETIVO Cultural Social NÓS “ISTOS” O quadrante superior esquerdo diz respeito aos aspectos individuais e interiores do individuo. bhakti ioga (práticas devocionais). Esse quadrante faz uso da linguagem da primeira pessoa do singular (EU) para relatar e interpretar as vivências internas do fluxo interior da consciência de cada indivíduo. p.engloba uma série de práticas que visam o manejo das emoções através da respiração e do uso consciente da sexualidade. 2006. Busca-se a “Transmutação de Emoções”. p. sobretudo usando os quadrantes SE e IE como ponto para o despertar. A saúde integral neste quadrante engloba o cuidado com os níveis emocionais. 160 . 28 Wilber. este trabalho visa acessar e integrar aspectos negligenciados ao 27 Wilber. qi gong” 27 e “transmutação de emoções. mentais e espirituais. treinamen- to de inteligência emocional.” Neste nível também se inclui as práticas que visam o trabalho com a sombra. diz respeito a todo o aspecto subjetivo e intencional do ser. p. 130. tal como ela é estudada pela psicologia do desenvolvimento. prática emocional cautelosa. 261) destaca que o trabalho com o “Sexo (ou Ioga sexual) se concentra nos aspectos tântricos do relacionamento. 2002. 260. É o aspecto subjetivo da consciência e contém todo o espectro do desenvolvimento consciencial. ioga. 78) a “sede da estética. enfim. circulação do prana ou energia do sentimento. bioenergética. p. É segundo Wilber (2002. De forma geral. ou a beleza que está no „eu‟ do observador”. principalmente das emoções negativas através de práticas como o “t‟ai chi. ton28 glen (meditação de troca compassiva). ou inconsciente reprimido. tanto em suas formas de manifestação convencionais como também contemplativas. Wilber (2006. arte e expressão criativa” . p. Nível do Espíritual – aqui são incluídos as práticas e conteúdos voltados para o desenvolvimento de estados meditativos ou contemplativos. Podemos incluir na dimensão espiritual todos os princípios éticos e filosóficos que precisam. assim como as psicoterapias. 259. da minha identificação com eles. As certezas sobre a 29 Wilber. como fundamental para “criar um espaço de perspectivas múltiplas na psique” . por exemplo. Uma convicção com que não me identifico por inteiro serve para camuflar lados de mim que não consigo ou não quero enxergar. que buscam favorecer uma ampliação da consciência 31 que permita incluir o máximo possível as várias dimensões do humano. mas onipresente na nossa vida como a liberdade e a crença no sentido da vida como elementos da dimensão espiritual. Identificamos.longo do desenvolvimento com o objetivo de favorecer uma maior integração do ser consigo. seja ela pública ou particular. Não se trata na dimensão espiritual de uma identificação somente ao nível do pensamento e do discurso. Podemos nos aproximar à dimensão espiritual identificando uma insuficiência das outras dimensões em relação ao homem nas suas possibilidades humanas. Não se confunde essa dimensão com a religiosa. com o outro e com o mundo. as terapias cognitivas e o trabalho com a sombra. cit. e leva fatalmente a desequilíbrios internos e externos. Wilber sugere como recurso para o trabalho com a sombra a “terapia Gestalt. e de fato eles só existem na medida em que me comprometo com eles. Wilber destaca que práticas que ajudem a ampliar a visão de homem e realidade podem ser extremamente úteis. em que eu sinto que esse se torna apelo incondicional para mim. psicanálise. 15-16). processo 3-2-1. trabalho com os sonhos. fenômenos humanos. sobretudo. incluindo necessariamente um agir correspondente. Entro na dimensão espiritual no momento em que me identifico com algo. mas que contém algumas características como as da revelação como intervenção direta de Deus e de um tipo de organização social que dessa forma são estranhas ou não necessárias à dimensão espiritual. 30 Ibid. para se tornarem verdadeiros. p. terapia cognitiva. Trata-se de uma identificação na totalidade. interpessoal. não alcançou ainda a dimensão espiritual. O “espiritual” tem a mesma conotação atribuída por Röhr (2006. pois ajudam a flexibilizar os padrões mentais através do descentramento do eu. 161 . Posso viver nas demais dimensões sem ser comprometido com nenhum aspecto delas. que em parte pode incluir a espiritual. a capacidade de adotar perspecti30 vas. Um saber que não se expressa na minha vida prática. arte e musicoterapia” 29 Nível da Mente – considerando a cognição. freqüentemente pouco refletidos. loc. 31 Por ampliação da consciência queremos sugerir o desenvolvimento da plena atenção para o momento vivido. . ou “ele”.própria identidade não são de natureza racional. p. Por isso chamo essa dimensão também de intuitivo-espiritual. 162 . sutil e causal”. 260. como você e eu nos arranjamos para nos relacionarmos harmoniosamente. o sutil e o causal. A linguagem correspondente a esse quadrante relata os fatos científicos do organismo individual. Isso inclui. Já as práticas que tratam do Neurológico buscam corrigir os possíveis desequilíbrios bioquímicos com tratamento farmacológico. O “eu” coletivo vivencia também uma evolução que expressa a contraparte intersubjetiva do desenvolvimento da consciência individual. Rolfing”). a matéria e a energia e o corpo físico – porque todos esses itens aos quais podemos nos referir de modo objetivo. o que qualquer evento individual parece ser de fora. 2006. biológica e corpórea. O quadrante inferior esquerdo tematiza a pluralidade dos sujeitos. “A linguagem desse quadrante é a linguagem do nós: linguagem de segunda pessoa ou linguagem do eu-tu. eqüidade e bondade. que envolve entendimento mútuo. 33 O corpo tem uma perspectiva de “denso. Trata-se da base atômica. Em resumo. grande mente. englobando os aspectos físico e neurológicos. a esfera subjetivo-coletiva. Wilber (2006.” (WILBER. As práticas que tratam do físico incluem o manejo da dieta e o trabalho estrutural (“levantamento de peso. 36-37) indica que a dimensão objetiva é [. Esse é o quadrante cultural. 35 Wilber. objetiva com a qual a experiência intencional da consciência interage e se expressa na forma comportamental. mas intuitiva. 2002. cabala. visualizações até prece centrada. longas caminhas. Qi Gong para trabalhar com o corpo sutil e o “exercício para os três corpos” 35 que trabalha simultaneamente o físico. meditação transcendental (TM). o comportamento físico. 260. os componentes materiais.] portanto. Wilber também não negligenciou a passagem do “eu” para o “nós” no tratamento da experiência fenomenológica do “ser no mundo”. 130. 79) 32 Wilber. 32 questionamento integral e 1-2-3 de Deus” . p. O quadrante superior direito expressa a contraparte objetiva e externa ao quadrante superior esquerdo. na 3ª pessoa. 2002. aeróbica. molecular.. 34 Wilber. sobretudo. Wilber destaca que as práticas neste nível vão do treinamento meditativo. p. 33 O trabalho neste quadrante envolve o cuidado com o corpo . Wilber ainda destaca a prática do Tai chi chuan. o mundo dos valores. as visões de mundo. 2006. Ele inclui práticas do “zen. enfim. orgânica. o ethos compartilhado pelos indivíduos. bem como estimula o uso de máquinas para o cérebro/mente que ajudem “a induzir estados de 34 consciência teta e delta” . p. 260. esportes. O Belo. Ou a estética do „eu‟. 2002. Assim. p. 2002. As práticas indicadas para sensibilizar “Os quatro quadrantes de Kosmos” retomam o percurso de desenvolvimento da consciência apresentado no início do texto. p. cultura e natureza. políticos e cívicos para a família. de forma que passamos a algo semelhante aos “„Três Grandes‟ do eu. o Bom e o Verdadeiro. a nação e o mundo Analisando os quadrantes com maior atenção. p. de segunda pessoa e de terceira pessoa. autodisciplina ética integral. ética e ciência” (WILBER. etc” 36 possibilitam o deslocamento do olhar do eu para uma visão mais abrangente. Wilber destaca a ética como “empenho com o mundo intersubjetivo do bem. asilos. 79). com os amigos e com os seres sencientes em geral são fundamentais para potencializar o crescimento pessoal e favorecer a descentralização do eu. com sua linguagem dos “Istos”. a cidade. do nós e do isto. percebe-se que os quadrantes direitos (Superior e Inferior) são eminentemente objetivos. abrigos para moradores de rua. institucional e tecnológica. ativismo ecológico e social. relatos de primeira pessoa. ética profissional. 130) destaca assim estas práticas: Sistemas – exercício de responsabilidade com relação a Gaia. institucional e tecnológica construídas pela humanidade ao longo de sua história. Sendo. 163 . Wilber (2002. e inclusiva. tem por meta refletir sobre a evolução das várias formas de organização social. As práticas para saúde integral neste quadrante englobam o trabalho com as visões de sistemas. eu. a moral do „nós‟ e os „istos‟ da ciência. dos serviços comunitários e da ética. retomando assim suas raízes terapêuticas gregas. Com este mesmo objetivo os “Serviços Comunitários”. portanto a contraparte externacoletiva do quadrante inferior esquerdo.131. tais como “trabalho voluntário. p. prática da compaixão com relação a todos os seres sencientes” 37 e aponta os “códigos de ética. votos e juramentos” 38 como práticas a serem realizadas para a melhoria da saúde integral. o quadrante inferior direito. A vivência cultural da humanidade não está obviamente dissociada de sua base social. assim como o trabalho institucional. à natureza. buscando ajudar o Ser a 36 Wilber.Neste quadrante se destaca as práticas que buscam ativar a saúde através dos relacionamentos. A ética é posta como um exercício fundamental de cuidado neste quadrante. podendo ser colocados sobre a rubrica da linguagem do “Isto”. 2006. o Estado .cit. 38 Wilber. Wilber destaca que os relacionamentos com a família. 37 Wilber. arte. à biosfera e às infra-estruturas geopolíticas em todos os níveis Institucional – exercícios de deveres educacionais. loc. maiores serão também as possibilidades de uma saúde mais abrangente. Bonston: New Science Library/Shambhala. 39 Wilber. de forma que quanto mais abrangente for nossa capacidade de estender um abraço integral a todas as áreas do seu ser. (2001). Heresis. Transformações da consciência: o espectro do desenvolvimento humano.109. Cultrix. (1994). Referências bibliográficas ARIETI. RJ: Ed. In Caminhos além do ego: uma visão transpessoal. São Paulo: Ed. São Paulo: Ed. K. São Paulo: Ed. Walsh. (1967). ______. Os domínios do inconsciente humano: observações acerca da pesquisa com o LSD. São Paulo. Summus. GROF. Além do cérebro: nascimento. Pensar em saúde dentro de um modelo integral indica uma abertura para sensibilizar e e39 xercitar “o corpo. ______. Psicologia integral – consciência. The intrapsychic self. Huxley. até alcançar os níveis mais elevados de consciência. Rio de Janeiro: Ed. Rocco. Cultrix. Psicologia do futuro. (1997a). (1988). São Paulo: Ed. na cultura e na natureza” . ENGLER. (2000). Integral spirituality. a alma e o espírito no eu. terapia. therapy. K. A aventura da autodescoberta. Globo. (1997b).. pp. (2003). ______. Boston: Shambhala Publications. New York: Basic Books. (2002). p. E BROWN. 1997. D. psicologia. (2006). (2000). Niterói. A. (2002). 99. S. ______. (1986). S. Cultrix. São Paulo: Ed. São Paulo: Ed. Integral psychology: consciousness. possa colaborar na expansão do mundo vivido. F. a mente. 164 . 131. (1999). ______. ______. WILBER. ______. São Paulo: Ed. O olho do espírito. ______. De forma que uma vez expandido. Transformations of consciousness: Conventional and contemplative perspectives on development. R. As portas da percepção. Ed. lições das pesquisas modernas da consciência. espírito. Cultrix. e Vaughan. WILBER. Uma teoria de tudo. McGraw-Hill. et al. A mente holotrópica: novos conhecimentos sobre psicologia e pesquisa da consciência. Cultrix. J. Boston: Shambhala Publications. ______. 2002. spirit. psychology. morte e transcendência em psicoterapia.se desdobrar ao longo da escada holográfica. 165 . Capítulo 18 Educação para a Paz 166 . Capítulo 19 Psiquiatria Transpessoal 167 . Capítulo 20 Teorias Sistêmicas em Família (Constelações familiares) 168 . Capítulo 21 Psicologia Social Transpessoal 169 . realidade essa que tem demandado um comportamento que lide com um número cada vez maior de desafios e perigos. É a experiência do conhecimento. buscamos sermos felizes. a gestão transpessoal colhe elementos da psicologia transpessoal que seria um enfoque desenvolvido a partir da década de 1960 interessado no estudo dos estados de consciência. É possível uma gestão transpessoal? O que é uma gestão transpessoal? Em que medida ela se desacopla de outros campos teóricos e definidos na administração? Fundamentalmente. a integração com a saúde. a comunhão com Deus. A ação humana tem sido construída com base na busca de modelos e ferramentas transcendentes. expressa através da arte. identificaríamos: ou conhecimento das próprias emoções e dos estados de consciência. A administração transpessoal reflete valores universais como um desejo de segurança.Capítulo 22 Abordagem Organizacional Transpessoal Introdução O cenário atual é de cada vez maior incerteza induzido por profundas modificações transcorridas no meio ambiente. esses recursos são apenas meios para se identificar aquilo que é mais essencial ao seu humano: o auto-conhecimento de sua psique. o 170 . Como recursos utilizados pelo homem para compreender tão profundas transformações e encontrar a felicidade. do sonho e do devaneio e a religião. filosófico. paz e amor. as oportunidades do universo. econômico. Desse modo. A psicologia transpessoal: uma base para um novo modelo gerencial O objeto da psicologia transpessoal é a consciência e transcendência. do amor e da compaixão. Contudo. Fundamentalmente. isto é: constructos e modelos mentais que torne suportável e saudável a vida. A administração transpessoal está interessada em educar as pessoas para a descoberta do seu potencial pessoal para o contato com a transcendência. da sua existência. de seus estados de consciência. da fantasia e da religião em diferentes graus que encoraja os indivíduos a empreender uma jornada fantástica e desafiadora nesta vida. É sobre a aplicação de alguns conceitos da psicologia a um modelo gerencial que se desenvolve este texto. a fantasia. Administração transpessoal seria um modelo gerencial influenciado pela psicologia transpessoal. a infinitude do ser. o conhecimento científico. a qualidade de vida no trabalho e a experiência da paz. cultural. social e ambiental. Na verdade a psicologia humanista foi a base para o desenvolvimento desse enfoque. mitos. A grande inovação da psicologia transpessoal está em acreditar que as raízes dos traumas humanos poderiam residir muito além dos processos psicodinâmicos. para que. domínios perinatais e transpessoais e dos eventos biográficos na vida humana. onde se encontram as raízes das experiências humanas. A psicologia transpessoal também usa elementos de outras escolas de psicologia. teve profunda influência no desenvolvimento da psicologia transpessoal. que estaria no topo da hierarquia das necessidades envolvendo 171 . tais como behaviorismo. psicologia humanista e a psicologia analítica de Jung (Matos: 1994). Um dos elementos-chaves da psicologia humanista seria a auto-realização. religiões. A psicologia transpessoal seria entendida como a quarta força da psicologia. símbolos. (2) observar os movimentos progressivos da consciência. classificação que destaca a psicologia contemporânea dividida em quatro grandes correntes ou forças congregadoras cuja a primeira força corresponde ao Behaviorismo. Abraham Maslow. a segunda. e a terceira à Psicologia Humanista. Uma compreensão da totalidade do homem envolveria perceber as influências dos sonhos. apresentando importantes tendências comuns. que emergiu nos anos de 1960. Para Matos (1994). estava interessado em estudar a experiência humana como um fenômeno determinado por aspectos como sentimentos. segundo as preferências e predisposições individuais. Assim não se pode esperar que o mesmo caminho seja apropriado a todas as pessoas.que seria a psicologia transpessoal e o que esse modelo gerencial importaria da psicologia transpessoal? A psicologia transpessoal busca compreender. dos arquétipos. do inconsciente coletivo. podendo se encontrar em regimes das dimensões perinatais e transpessoais. desejos e esperanças. Também seriam objetivos da psicologia transpessoal: desenvolver a capacidade de assumir a responsabilidade por si mesmo no mundo e nos relacionamentos pessoais e possibilitar a cada pessoa o atendimento adequado de necessidades físicas. E por considerar que o cliente tem o seu saber interno. (4) na prática se possa incentivar e catalisar. (3) e as tendências de cada nível. o objetivo da psicologia transpessoal é (1) discriminar os estados superiores dos estados inferiores de consciência. ao invés de estudar comportamentos de animais. através das cartografias da consciência humana que variam de autor par autor. mentais e espirituais. emocionais. na investigação dos estados de consciência. A psicologia humanista. a psicologia transpessoal é vista como uma abordagem que estuda estados de consciência que transcendem o ego e a auto-imagem. psicanálise. a auto-exploração é estimulada com o objetivo de levá-lo ao conhecimento completo da própria personalidade e ao controle dos seus elementos para atingir um centro unificador e construir uma nova personalidade em torno deste novo centro. à Psicanálise. favorecer esse movimento progressivo em direção à consciência em seus estados superiores. Segundo Bertolucci (1991). 124). No que se refere ao estudo da experiência subjetiva na geração de conhecimento. Entretanto. De acordo com a abordagem psicossomática. comprometidos com circunstâncias isoladas e singulares. é pertinente estudar “como os eventos psíquicos. Consciência: um primeiro objeto da psicologia transpessoal e uma possível aplicabilidade à administração Nota-se que existe uma grande dificuldade de as pessoas compreenderem o que seja a consciência. De acordo com Habermas (1987.aspecto esse de interesse da psicologia – a consciência poderia ser definida como a experiência de contato do ser humano com a realidade interna (emoções. É interessante observar no pensamento de Pierce o interesse dado à consciência. expectativas em relação a resultados futuros. 123). “os estados de consciência não possuem conteúdo cognitivo. em diferentes tempos. Nesse sentido. comportam-se frente às sensações generalizadas pelos símbolos” (p. 123). auxiliaram a conceituar então a terminologia “psicologia transpessoal” como um campo de saber que busca compreender a influência dessas dimensões na vida humana (Rezende. Pierce teria estabelecido uma distinção entre “sentimento” (feelings) e as cadências imediatas do sentir (emoções). 2007). Já as sensações seriam eventos psíquicos singulares incorporados aos processos da vida. enquanto que os conteúdos cognitivos fariam “parte do processo de inferência mediatizada pelos signos” (HABERMAS. p. prazos a serem cumpridos. as sensações seriam determinadas com base em conhecimentos precedentes. o estudo do que seja a experiência de um estado de consciência na organização ganha implicações ainda mais desafiadoras. místicos ou transcendentais.aspectos espirituais. Enquanto que os estados de consciência envolvem uma percepção mais ampla que considera o ambiente. a experiência de Estados de Consciência Organizacionais (ECOs) se referiria ao modo como o indivíduo exerce a sua atribuição de ente-consciente a partir da mediação da consciência que examinará tanto as realidades interna (indivíduo) e externa (organização). No que se refere à experiência da consciência pelo indivíduo . Talvez isso ocorra pela própria dificuldade de conceituação da terminologia. Eles constituem eventos psíquicos. Isto é: em que medida os indivíduos estão presentes ao momento do aqui-e-agora? É comum se observar nas organizações um indivíduo preocupado com tarefas a serem desempenhadas. Observar a manifestação de estados de consciência nas organizações. Os pesquisadores Abraham Maslow e Stanislav Grof. Nesse sentido. condição física) e externa (a realidade do mundo em si). Emoção se distingue de estado de consciência por apresentar uma característica eminentemente biológica. através dos quais um organismo reage a seu meio ambiente”. as preocupações e o estresse podem ser importantes fontes de patologias físicas e 172 . p. 1980. O que significa isso em termos práticos? Significa identificar em que medida os indivíduos estão auto-conscientes. conceito este discutido por Carlos Castaneda (1997). Esse tipo de discussão conceitual pode ser visto como detentor de uma grande similaridade com a proposta da administração substantiva desenvolvida por Guerreiro Ramos (1981). falar de comportamento organizacional é um tanto restritivo. Pois. 2007). aquilo que é racional. 2007). havendo muitos profissionais internalizando-as muito bem. inovadoras. Dessa forma. Esses inúmeros benefícios seriam possíveis. Na verdade. buscar entender a experiência dos estados de consciência. A administração transpessoal das organizações é uma nova forma de se perceber as dimensões do indivíduo. “gestor” e “colaboradores” passam a ser vistas de uma maneira integrada (REZENDE.mentais. mas fundamentalmente. Torna-se necessário. Os indivíduos são. visto que tanto as organizações quanto os indivíduos. no qual desaparecem as barreiras do ego e no qual as dimensões “organização”. e desafiadoramente. do grupo. a administração já está muito avançada em suas técnicas. “ambiente”. conforme o budismo costuma defender. na medida em que se tem a percepção do mundo como um sentimento. não poderiam ser definidos apenas através de um conceito de estímulo e resposta. conceitualmente. que as pessoas sejam educadas a se desconectarem do universo organizacional do trabalho quando estão em seu momento de lazer (REZENDE. 2007). muitos dos problemas organizacionais fundamentais enfrentados originam-se de o pensamento humano não atender à complexidade e à sofisticação das realidades 173 . enfoque este que tenta objetivar uma categorização de um estereótipo de comportamento. De maneira geral. Seria importante existir um enfoque que privilegiasse a auto-consciência para que assim exista um estado de maior saúde do indivíduo. complexos. Uma das principais contribuições da administração transpessoal é proporcionar aos atores envolvidos nas dinâmicas organizacionais a tomada de consciência dos estados mentais experienciados em suas ações identificando estas como universais. clientes e fornecedores. flexíveis. até mesmo. adaptativas. uma melhor tentativa de compreensão das organizações passa por buscar perceber os estados de consciência existentes internamente (REZENDE. arquetípicas e possuidoras de um sentido individual e universal ao mesmo tempo. 2007). isto é. éticas. Essa perspectiva contribui para a geração de organizações mais intuitivas. Propõe-se então a emergência de uma Era da Experiência nas Organizações (REZENDE. do sistema organizacional e da dinâmica organizacional. eventos muito mais amplos. Experienciar o estado de consciência da organização é emergente para a administração. Nesta perspectiva. Agora é então chegada a hora de se investir na compreensão dos estados de consciência e não simplesmente nos processos mentais e no conhecimento. O desafio da psicologia moderna e de suas aplicações em campos como o da administração seria o de não apenas compreender o comportamento. Essencialmente: seres de experiências. criativas. sim. de uma maneira geral. com maior respeito aos colaboradores. a mente pode ser o pior inimigo de alguém. Dessa forma. A teoria organizacional deveria compreender como são feitas essas simplificações e identificar os meios possíveis através dos quais se tornaria viável enfrentar e gerir a contradição e o paradoxo. Segundo Grof (1994) esses nove meses de grandes transformações biológicas teriam uma grande influência no desenvolvimento futuro da criança. A psicologia transpessoal busca compreender. da raça. sendo essa percepção um dos motivos de alienação e doença. capaz de expandir-se além dos limites do corpo. pois essa seria a condição da matéria que se propaga e integra no universo em um contexto de um continuum atômico. onde se encontram as raízes das experiências humanas. acompanhando-o por toda a vida. Para os céticos. por isso transcendente. grandiosa e capaz de identificar-se com outros seres humanos. podendo se encontrar em regimes das dimensões perinatais e transpessoais (REZENDE. Contudo. na investigação dos estados de consciência. em suas pesquisas com o LSD na década de 1960 que os indivíduos poderiam guardar memórias do período em que estavam no ventre materno (período perinatal). isto é. Por que estudar a transcendência? Estuda-se a transcendência porque ao se compreender a consciência com maior profundidade se percebe que ela é ilimitável. Entre as grandes descobertas de Grof. O ser humano é que possui um comportamento irresistível de perceber-se isolado do universo. da espécie. O psiquiatra Tcheco Stanislav Grof (1987) percebeu. do cosmos. A consciência é por natureza trancendente. 2007). como explicar as seguintes três evidencias simples do que seja a transcendência: a mãe que apresenta um pressentimento em relação a um filho que saiu para a balada. nota-se que essas “experiências” vivenciadas no ventre materno podem ser fonte de trauma para a vida humana. uma intuição que influencia favoravelmente uma tomada de decisão. conforme comprova e demonstra a física quântica. Alguns desses elementos colaboram para se perceber que o humano é muito mais que um ser de comportamentos. é um ser transcendente. no lugar de fingir que estes não existem. A grande inovação da psicologia transpessoal está em acreditar que as raízes dos traumas humanos poderiam residir muito além dos processos psicodinâmicos. está a de a consciência humana ser vasta. transpessoal.com as quais é necessário lidar. enorme. o sonho que revela um evento do futuro. 174 . A consciência humana é complexa. Isso teria como resultado ações freqüentemente simplistas e que algumas vezes causam prejuízos. do planeta. Transcendência: um segundo objeto da psicologia transpessoal O que é a transcendência? A transcendência reflete uma incapacidade de explicar a realidade por fenômenos físicos e a ciência atual. a transcendência é algo esotérico. Ao se aproximar da compreensão de aspectos tão subjetivos estaríamos procurando avançar quanto à uma nova administração. . De acordo com o filme as pessoas estariam acomodadas... percebo fundamentalmente que a gestão transpessoal envolve um forte interesse pelo ser humano. Para Guerreiro Ramos... resíduos orgânicos. o ser humano tem uma profunda dimensão transcendente e precisa de uma atenção especial na forma como a comunicação se apresenta. Essas experiências de natureza diversa foram intituladas de “transpessoais”. com o Universo inteiro e com a Mente Superior que gerou esse Universo.. A partir do momento que apresento esses conceitos. que trazem sofrimento ao indivíduo e aos outros. ao estarem ignorantes das oportunidades no mundo. essa também era uma preocupação de Guerreiro Ramos (1981). Desse modo escolhem profissões erradas e padecem em carreiras que não gratificam psicologicamente. pedras preciosas.  .. De certo modo. plantas. Desafios da gestão transpessoal O filme “Matrix” apresentou em 1999 uma crítica a como a sociedade está constituída. encontrando-se com uma dimensão maior do que ele realmente é: o Todo (SOUEK. sonhos. da própria condição física. isto é um capacitar para o indivíduo “libertar a mente”. as organizações seriam sistemas cognitivos nos quais seus participes assumiriam os valores organizacionais sem se aperceberem.. o controle... seres de outros continentes. desejos e imaginação. ao destacar que as organizações e o pensamento administrativo engendra um domínio físico e mental dos participes organizacionais. das próprias motivações.. tendo em vista o indivíduo romper as barreiras do seu ego.. Desse modo. animais diversos.. dos pensamentos. 1997). do cuidado. 175 .. Cônscio disso.. muitas pessoas estão adormecidas. pois está implícito uma libertação... melancólicas sem se aperceber. das próprias emoções.da mesma família e desconhecidos. São agressivas.. do amor ao próximo.. o objeto da psicologia transpessoal se distingue de outras abordagens.  . Contudo. ao estarem presas a comportamentos inadequados.  .  .  . Nesse sentido.. planetas. Talvez a administração transpessoal é muito mais ampla do que abarca esse próprio conceito. como definiria Morfeu no filme “Matrix”.. Utilizando a mente acanhadamente. Como gerenciar seres transcendentes? O que faz de um humano um ser transcendente? O ser humano é guiado por fantasias. seja pela preguiça ou devido à ignorância. PARIZI. invejosas.  . está implícito na palavra “gestão‟. com toda a Terra. Isto é estão em processo de adoecimento sem que saibam.  . estrelas. a gestão demanda enfoques alternativos voltados à criatividade. o símbolo do Yin Yang tem elevado poder explicativo para o entendimento do que seja a gestão transpessoal. o enfoque transpessoal não desencoraja outras diferentes dimensões operacionais na organização. de gestão de pessoas e por essa natureza é um enfoque subjetivo. Assim. Portanto. Contudo. tem o firme propósito de tornar-se um Buda. 176 . O bodisatva é aquele que. à subjetividade. alguém que interessa-se pelo bem-estar humano. poderia-se dizer que uma gestão transpessoal se volta a um diálogo entre aspectos subjetivos e operacionais. isto é alguém detentor de uma consciência clara. Nesse sentido. saúde e sustentabilidade. um educar para a gestão transpessoal é um movimento de emancipação. os ganhos do capital deveriam se submeter a essa lógica. Cabe à educação transpessoal o cultivo de uma visão crítica que torne o indivíduo consciente de possíveis mecanismos organizacionais de exploração. o enfoque da transpessoal aplicado às organizações é muito mais um educar para os indivíduos encontrarem a potencialidade de suas existências. esse é um indivíduo que se paga à medida que está preocupado com criatividade. A partir dessas afirmações. acreditando que é necessário despertar o potencial humano. O compromisso da gestão transpessoal é com o indivíduo. mas que.Muito mais que uma administração. a gestão transpessoal é. isto é. De acordo com Rezende (2007: p. elevada e ampliada. muitas vezes o interesse da gestão transpessoal pode vir a ser contrários ao propósito da organização. O conceito de bodisatva é útil. uma tecnologia. opta por auxiliar seus semelhantes em um processo de ascensão espiritual. fundamentalmente. Necessariamente. Desse modo. sendo essa a principal força norteadora do trabalho nas organizações. pois apresenta indicativos para pensar que os enfoques mecanicistas e quantitativos da administração sejam insuficientes para uma visão ampliada dos negócios. o horário flexível. A atuação de um profissional imbuído do receituário da gestão transpessoal apresentaria semelhanças a um bodisatva. uma abordagem. 225): No caminho do bodisatva o indivíduo segue as orientações budistas para chegar mais rápido num estágio de “desperto”. a elevada participação de pessoas nas decisões. inovação. O caminho do Boditatva pode ser visto como uma integração entre o auto-aprimoramento e o zelo para com a sociedade. Pois se percebe em grande freqüência que muitas organizações não estão interessadas em uma autonomia dos indivíduos. característica essa que se torna fundamental para o desenvolvimento de pessoas que realmente realizem importantes mudanças organizacionais. em vez de perpertuar-se em um estado de nirvana. em seu coração. à inovação. opressão. pois um profissional adepto às práticas da gestão transpessoal é como um “desperto”. Desse modo. Portanto. poder. o conhecimento científico”. compreender o que seria uma gestão transpessoal não abandona a necessidade de se estudar temas como qualidade. Observa-se que o que está em debate é um modelo epistemológico. p. qualidade. logística. operações. Aspectos metodológicos A administração transpessoal é tanto um modelo de análise dos processos organizacionais quanto um enfoque prescritivo para a proposição de políticas para o funcionamento das organizações. processos de grupo. a administração transpessoal implica tanto em observar elementos subjetivos e aspectos relativos ao comportamento organizacional (cargos. 16-17). p. responder a questão da gênese e da estrutura do conhecimento científico. 16) contribui quanto ao que seja o objeto de estudo da epistemologia: “a epistemologia estuda. aprendizagem. desempenho humano e gerenciamento. estrutura. produtividade. absenteísmo. Köche (2005. um pulo em direção a uma nova gestão. finanças. processos de mudanças) quanto a dimensão operacional relativa a temas como logística. sem querer ser uma sistema a priori que dite autoritariamente e de forma dogmática o que deve ser o conhecimento científico. Desse modo. analisando como se constitui uma teoria científica e explicando qual é o papel que exerce na prática científica e o contexto ideológico. a investigação científica e seu produto. talvez nem psicólogos nem administradores e engenheiros tenham uma explicação integral para o funcionamento das organizações caso não mantenham um diálogo. 2005. Huillier (apud KÖCHE. rotatividade no emprego. motivação. 177 . em sua obra La manipulación de La ciência: “a epistemologia tenta. pois em quase toda a totalidade dos processos organizacionais seja importante algum nível de atividade de planejamento e controle. o histórico. É na verdade uma construção de um pensamento gerencial ampliado e integral. o lógico e o social”. De certo modo. liderança.Figura 1 – Símbolo Yin Yang É importante enfatizar que uma gestão subjetiva pode incorrer em riscos. planejamento estratégico. gestão da produção. Não se trata de uma ruptura epistemológica. portanto. comunicação interpessoal. entre outros. Portanto. são elas que perfazem o conteúdo da lógica. A prática da gestão transpessoal Sobre a prática de uma gestão transpessoal. como o desenvolvimento de toda vida natural e espiritual. De maneira geral. A consciência enquanto espírito que se mostra. p. espírito e a lógica seria possível identificar a relação que se segue. mas o contínuo avanço desse objeto repousa exclusivamente. se tornam mais possíveis de serem operacionalizadas e posto em uso para o estudo das dinâmicas organizacionais. O desenvolvimento de uma nova educação nas organizações Uma prática de administração transpessoal avançada envolveria não apenas a criação de espaços para a educação transpessoal de pessoas. clarear a lógica do método com ajuda do qual nos apossamos de teorias científicas” (HABERMAS. em seu caminho. mas a criação de condições para colocar o 178 . liberta-se de sua imediatez e da concreção exterior. “A consciência é o espírito como saber concreto e preso à exterioridade. Hegel (apud HABERMAS. Hegel referia-se o cerne da consciência. pode se identificar que exista uma utilidade para pensar fenômenos relativos ao desenvolvimento de uma nova educação no contexto organizacional. Braud e Anderson (1998). ou melhor epistemologias. De acordo com Pierce “a tarefa da metodologia não é de esclarecer a construção lógica das teorias científicas mas. metodologias. é esse o desafio que deve existir na construção da administração transpessoal. passa a ser puro saber. Vermersch (2000). Nesse sentido. pode se perceber que o enfoque de investigação transpessoal está sustentado em grande parte no enfoque fenomenológico de MerleauPonty (2003). sim. 41) no estudo sobre as relações entre fenomenologia. É possível observar no pensamento de Habermas a ênfase que é dada ao pensamento de Pierce. que. o espírito. assim como elas são em e para si”. 110). Depraz (2000). Esse seria o sentimento de alguns aspectos interessantes de uma agenda de contribuições da gestão transpessoal a ser discutido a seguir. o cultivo de um profundo interesse pela suprema satisfação dos clientes. o enfoque metodológico proposto tem encontrado sustentação no empreendimento investigativo de diferentes pesquisadores como Varela (2003). este saber toma então. De certo modo. 1980. como objeto aquelas essências puras. p. a tomada de consciência da influência dos arquétipos no contexto organizacional. o encorajamento ao trabalho motivado e a valorização da experiência da espiritualidade e a busca por um ambiente saudável de trabalho.Alguns pesquisadores como Fineman (2001) e Goleman (1995) já apresentaram indicativos da necessidade de estudar as emoções nos contextos das teorias organizacionais. Desse modo. sobre a natureza das puras essências. ele próprio. 1980. Portanto. tendo em vista que os problemas abordados são coletivos e não individuais. tanto o treinamento em gestão transpessoal como a própria prática da gestão transpessoal não devem ser uma prática teórica. a prática de dinâmicas organizacionais grupais com fins transpessoais não são em absoluto. talvez quando existem grupos nos quais os membros mantém uma confiança mutua entre si. Em definitivo. uma terapia. Através do conhecimento se saberia se alguns são infelizes por ser ignorantes de seu desconhecimento. É interessante caracterizar para os participantes de dinâmicas grupais para facilitar o contato com um nível de consciência mais profundo que existem outros fóruns e lócus para se realizar um trabalho de aprofundamento mais adequados. Ao mesmo tempo. mas uma metaterapia. Está também no conhecimento a fonte da compreensão da infelicidade dos outros e do mundo. mas sim prática e vivencial. O conhecimento permitiria também o fortalecimento de uma visão altruísta e reconhecimento dos caminhos para ajudar o próximo. O contato com o que é a psicologia transpessoal e suas associações para a construção de um novo modelo de gestão é uma oportunidade para se perceber novas perspectivas de desenvolvimento psicológico e espiritual para o indivíduo e a organização. o conhecimento auxilia a dizer se está ou não feliz e a entender o sofrimento próprio e o dos outros. Isso seria o que Morfeu defende na trilogia “Matrix” (REZENDE. exista uma possibilidade de explorar a consciência de modo mais profundo. O filósofo Platão sustenta uma tese de a verdadeira liberdade e a felicidade dependerem do conhecimento do real. Desse modo.indivíduo em contato com suas experiências pessoais mais profundas. De certa maneira. É pertinente considerar quanto a que nível de profundidade de experiência deve ocorrer em contextos organizacionais. A partir dessa visão se poderia dizer que uma pessoa pode ter uma experiência subjetiva de ser livre e feliz. conforme enfatizado por Rezende (2007). o facilitador desse tipo de dinâmica deve ter muito cuidado para não expor inadequadamente um indivíduo. gerando assim uma dinâmica de transformação. 2007). o conhecimento pode ajudar alguém a construir a felicidade na medida em que ele tem mais possibilidades de encontrá-la. mas na verdade seja escravo e infeliz. 179 . pois muitas vezes em dinâmicas que venham a ser realizadas em um contexto organizacional pode vir a expor elementos muitos pessoais que quando divulgados a uma platéia generalizada pode ocorrer que algumas dessas informações sejam utilizadas em contextos diferentes daquele do contexto terapêutico-grupal. Nesse sentido. 180 . A busca por uma suprema satisfação do cliente envolve a dedicar elevada atenção nos processos organizacionais para que a prática de contato com o cliente expresse cuidado. Os mitos seriam mais uma expressão de medos pessoais. Desse modo. O arquétipo pode ser visto como comportamentos que refletem ou reproduzem comportamentos imbricados ao inconsciente coletivo. entre outros. o qual se modifica através de sua conscientização e percepção. A consciência dos arquétipos no contexto organizacional É possível observar que em muitas situações se manifestam a presença de diferentes arquétipos. Contudo. como os clientes externos. “O arquétipo representa essencialmente um conteúdo inconsciente. esse se torna mais consciente da experiência dos arquétipos que se aderem a práxis de algumas experiências. À medida que o líder se torna mais consciente de seus estados de consciência pessoais. 17). ocorrerá a conquista da excelência na organização. é importante questionar: como desenvolver essa percepção ampliada? É necessário que os participantes das dinâmicas organizacionais desenvolvam uma atenção concentrada às atividades que estão sendo desempenhadas. possuindo sempre a curiosidade e o interesse pela melhoria contínua.A busca por uma suprema satisfação dos clientes Falar em uma suprema satisfação dos clientes não significa dizer que uma empresa praticará descontos de 90% em seus produtos tendo assim prejuízo em suas atividades. como o do herói. Somente assim. Muitas vezes quando as organizações não se dedicam em melhorar a forma como realizam suas operações seqüelas acabam sendo sentidas tanto pelos clientes internos. interesse e amor pelo cliente. o salvador. percebe-se que faz todo sentido perceber como a experiência arquetípica se manifesta na prática dos líderes. ainda. Os arquétipos representariam um modelo hipotético abstrato que se utilizaria dos mitos experienciados em toda a história humana. compaixão e estados elevados de consciência. Percebendo-se. um grande desafio seria perceber os processos organizacionais como uma prática de compaixão. a influência dos arquétipos na prática das organizações. 2000: p. este poderia desenvolver uma prática de mais responsabilidade. aspirações e entendimentos simbólicos da vida e do mundo (Ford: 2003). À medida que os líderes tomam consciência que em sua trajetória pessoal existe a influência de arquétipos. assumindo matizes que variam de acordo com a consciência individual na qual se manifesta” (JUNG. são incapazes de manifestar um poder. Desse modo. Esses colaboradores empreendedores ou intrapreneurs podem perceber em suas jornadas um encontro com as suas essências heróicas adormecidas e que podem ser despertadas. Motivação: a alma da organização Como desenvolver organizações com pessoas motivadas? Organização sem vontade. o impossível que se apresenta no trabalho nas organizações? De acordo com Grof (1987: 265): 181 . Em contramedida. é uma importante contribuição apresentada pela administração transpessoal a partir da conscientização da importância do conceito do arquétipo na experiência individual e coletiva nas organizações. Contudo. Seria possível identificar que muitas vezes existem por trás dessas expressões uma conexão com a experiência de um arquétipo inquisidor. Cabe a cada um mergulhar numa jornada de autodescoberta para encontrar o significado da vida pessoal. Cada colaborador pode ser um empreendedor interno. são organizações sem alma. 2007). ao passo que os objetivos da organização estão sendo atingidos. para ser o melhor. a incompreensão. prazer em infligir a dor. como um processo de autodescoberta. sem pessoas motivadas. O empreendedorismo. Estar consciente de grandes forças arquetípicas e que talvez exista uma influência transcendente no governo das práticas emocionais no trabalho. Está na ação do empreendedor a transcendência da sua dimensão comum e o encontro de um status de alguém que mudou a realidade na qual está inserido (REZENDE. A espiritualidade no trabalho Como a espiritualidade pode ser útil ao desenvolvimento de uma capacidade de lidar com as dificuldades. pede-lhe para vencer. os desafios. Imagina-se a alegoria “inquisidor” ao memoriar ao período da inquisição no qual muitas pessoas foram perseguidas e mortas a partir da não compactuação com um ponto de vista totalitário. maltratos. muitas organizações podem ser lócus de sofrimento. os gestores devem incentivar em seus colaboradores o desenvolvimento de um processo de adoção de responsabilidade. é uma iniciativa de se descobrir as motivações mais profundas para empreender algo.Cada empreendedor busca ser uma espécie de herói na sua forma de atuação. Estimula-se no indivíduo a superação através da carreira. conforme enfatiza Frankl (1978. Acredita-se que muitas pessoas tenham prazer em fazer as outras pessoas sofrerem. percebe-se que esse discurso deve ser compreendido de maneira crítica. pois a organização propõe aos seus funcionários um objetivo mais nobre. 1991). . A abordagem transpessoal no estudo das organizações é uma nova forma de se perceber as dimensões do indivíduo.  a intuição. De qualquer modo. Nesse sentido.  Deus. Uma confrontação experiencial direta com os níveis perinatais e transpessoais do inconsciente é associada a um despertar espontâneo de uma espiritualidade bastante independente das experiências (associadas) a determinada religião. quando o processo de auto-exploração alcança profundidade suficiente. eventos muito mais amplos. não poderiam ser definidos apenas através de um conceito de estímulo e resposta. de acordo com Guerreiro Ramos (1981). sim. Nessa perspectiva.  a sabedoria. de uma maneira geral. Esse conceito é de grande impor182 .  o cosmo. quase espontaneamente. todos os aspectos supracitados seriam entendidos por alguns como a mesma coisa. nota-se que a dita “experiência espiritual” proporcionaria uma percepção mais ampliada da realidade permitindo que também se experienciasse uma vivência de maior saúde física. enfoque este que tenta objetivar uma categorização de um estereótipo de comportamento.  um estado de Buda. do grupo. Os indivíduos são. Essencialmente: seres de experiências (Rezende. do sistema organizacional e da dinâmica organizacional. falar de comportamento organizacional é um tanto restritivo.” Um dos objetivos da psicologia transpessoal é buscar realizar a aproximação do sujeito com a sua espiritualidade pessoal. De certo modo.  um estado de consciência elevado. complexos. 236). p.“a espiritualidade é uma propriedade intrínseca da psique que emerge. A experiência da espiritualidade seria para alguns o exercício de estabelecer a ligação ou a integração do indivíduo com dimensões que poderiam ser identificáveis como:  o Todo. 2007.  a claridade. visto que tanto as organizações quanto os indivíduos. pois esse seria conduzido em direção a uma situação de tensão anterior ocorrendo então de uma perspectiva de socialização organizacional. quais são as motivações humanas mais profundas? Como esse questionamento pode ser útil em atividades como gestão de pessoas ou marketing? Contudo. a organização moderna não estaria interessada na auto-atualização de seu funcionário.. a constituição de novos seres destituídos de subjetividade. p. os processos de socialização organizacional possuiriam o poder de afastar o indivíduo do contato com as suas motivações pessoais. 3) autoconhecimento. 2007. destaca-se o uso de orações como o “Pai Nosso” (REZENDE. 100) sobre o funcionário da organização moderna. a indiana e a budista. Entretanto. 2007). Criando um espaço psicológico saudável Um presente de incomensurável valor que pode ser transmitido aos colaboradores. Quando você começa a relaxar. de acordo com Laing (apud GUERREIRO RAMOS. 6) melhoria da comunicação. De modo prescritivo.tância. 10) Incorporação da meditação no dia-a-dia. 2007). 4) contato com a dimensão do herói pessoal. A busca por esse conhecimento interior passa fundamentalmente pela prática de uma quietude que pode ser encontrada através da meditação. O personagem Neo é o exemplo de alguém que apresenta em sua jornada uma preocupação cada vez maior com o silêncio. pois de acordo com o pensamento de Guerreiro Ramos. é como se naturalmente seu corpo e a consciência começassem a expandir juntamente com a respiração (REZENDE. o que o enfoque transpessoal apregoa já está sendo praticado quando se observa a valorização de treinamentos voltados à inteligência emocional e à enfatização da importância do conhecimento e controle das emoções. 2) ampliação e elevação do estado de consciência. 7) valorização dos relacionamentos. mas perdeu a consciência de sua individualidade. 2007). Existem muitos tipos de meditação. “ele é provido de ego. Na religião católica. onde estão adormecidas realidades imencionáveis”. O silêncio é uma das técnicas mais simples e poderosas para aprofundar e tornar mais claras as percepções (REZENDE. engendrando-se. Alguns tipos de meditação estão associados a práticas religiosas como a cristã. 9) desenvolvimento de uma visão de compaixão e respeito. arquetípicas e possuidoras de um sentido individual e universal ao mesmo tempo (Rezende. 1981: p. assim. Uma das principais contribuições da administração transpessoal é proporcionar aos atores envolvidos nas dinâmicas organizacionais a tomada de consciência dos estados mentais experienciados em suas ações identificando estas como universais. 5) desenvolvimento da responsabilidade. Entre as principais meditações utilizadas nos treinamentos de psicologia transpessoal destacam-se dois tipos: a de atenção concentrada e a desenvolvida com o auxílio de mantras. 11) valorização dos sonhos e 12) maior contato do indivíduo com a motivação pessoal. 8) Melhor processo de aprendizagem. 183 . 237). gerentes e líderes de uma organização é a transmissão do que seja a prática da meditação. De certo modo. Talvez um dos principais benefícios da meditação seja o controle do estresse e da ansiedade. o enfoque transpessoal pode contribuir para: 1) atenção ao momento presente. integrando-a automaticamente na concentração. a sílaba Om representa a presença física de todos os buddhas. jóia. eles são efetivos porque ajudam a manter a mente quieta e pacífica. representando a mente iluminada. Para Kalu Rimpoche (2007): Recitamos e meditamos sobre o mantra. a fala da divindade. De acordo com Viver Natural (2007): O mantra mais conhecido do budismo tibetano é Om Mani Padme Hum (os tibetanos pronunciam Om Mani Peme Hum). Através do mantra. sendo também uma orientação importante a ser levada ao contexto organizacional.A psicologia transpessoal em seu interesse em estuda a experiência essencial da consciência. Avalokiteshvara. De acordo com Zopa Rinpoche (2007): Os mantras nem sempre possuem um significado claro e muitos deles são compostos por sílabas aparentemente ininteligíveis. De acordo com Tulku (2007): 184 . não nos apegamos mais à realidade da fala e do som encontrados no cotidiano. O budismo tibetano possui diversas técnicas que possibilitam que o indivíduo empreenda uma vigilância mais próxima dos estados de consciência que está experienciando. aumentam sua percepção. devemos superar o lodo das negatividades e desabrochar as qualidades positivas. portanto. Mesmo assim. Eles fazem a mente ser receptiva às vibrações muito sutis e. é simplesmente a manifestação do som puro.) Ele não possui uma realidade intrínseca. do mesmo modo. No budismo tibetano muitos mantras favorecem se estar em contato mais profundo com uma experiência de quietude. a bela flor que nasce no lodo. em muito se aproxima do budismo tibetano. (. capaz de realizar todos os desejos. experienciado simultaneamente com sua vacuidade. associado ao bodhisattva da compaixão. São interessantes os mantras tibetanos da Tara Verde “Om Tare Tuttare Ture Svaha” (pronuncia: Om Tare Tuttare Ture Soha) e de Avalokiteshvara “Om Mani Padme Hum” (pronuncia: Om Mani Peme Hum). Esses ensinamentos são valiosos para pessoas de diferentes classes sociais e formações acadêmicas. a confusão do aspecto da fala de nosso ser é transformada na consciência iluminada. A palavra Padme significa lótus. mas os experienciamos como sendo vazios. Então. Sua recitação erradica as negatividades grosseiras e a verdadeira natureza das coisas pode ser refletida na claridade resultante em sua mente. A palavra sânscrita Mani. encerra o mantra. que é o som iluminado. a união do som com a vacuidade. Índia e Finlândia a proposição de aproximações entre esses dois enfoques teóricos que são primos. Nesse mantra.. simboliza a jóia da compaixão de Avalokiteshvara. O psicólogo e pensador brasileiro Léo Matos durante mais de duas décadas empreende em seus cursos no Brasil.. A sílaba Hum. como aquela executada pela jazzista Diana Krall. 5º passo – despreocupar-se de qualquer pensamento. sendo uma experiência incompatível para os modelos culturais ocidentais. O som do mantra pode tranqüilizar a mente e os sentidos. quais as possibilidades de aplicar algumas dessas tecnologias experienciais ao contexto ocidental e corporativo? De certo modo. um dos propósitos de recursos como os mantras seria manter a mente distante de motivos de preocupação. 3º passo – Inspirar profundamente e soltar o ar de forma gradual ou de modo espontâneo. relaxar o corpo e ligar-nos com uma energia natural e curativa. Visto que os mantras não têm sentido conceitual. 14º passo – tentar dar continuidade à experiência do estado de consciência por um período de tempo 185 . considero que uma música agradável. Quando entoamos um mantra. O mantra é ainda mais poderoso do que um som comum: é como uma porta que se abre para a profundidade da experiencia. em um ambiente de trabalho pode ser um recurso atencioso à saúde mental das pessoas e à manifestação de estados elevados de consciência. gerando uma sensação sutil de irritação. Quadro 1 – Passos para a experiência de relaxamento 1º passo – Sentar-se em posição confortável. 8º passo – Imaginar que está se revitalizando-se. Desse modo. 2º passo – procurar relaxar musculatura. que existe um pulmão neste ser. luz. 6º passo – focar a atenção apenas na respiração. E pode acalmar-nos e dar-nos prazer ou ter influência desarmoniosa. cantarolar uma música. como se refere o budismo tibetano. O propósito é esvaziar todo o pulmão. como escutá-la em um MP3 Player pode ser um recurso interessante para manter a mente conectada a um universo conscienciológico “positivo”. 13º passo – retornar à consciência do aqui e agora. mesmo que mentalmente. Aplicar algumas idéias a contextos corporativos pode ser ainda mais desafiador. não evocam respostas predeterminadas. ficamos livres para transcender os reflexos habituais. aspectos positivo ao praticante do relaxamento. No contexto ocidental a cultura do budismo tibetano pode se encontrar distante não apenas fisicamente. Algo importante a ser utilizado seria a meditação. De forma geral. algo substituto seria o uso de orações. dos demais afazeres diários. 4º passo – conscientizar-se que está respirando. 11º passo . como se o próprio praticante não existisse. 7º passo – Imaginar que o ar inspirado traz energia. isto é emoções aflitivas. 12º passo -examinar a motivação quanto a parar a prática meditativa. 10º passo – abstrair-se de qualquer pensamento. mas a partir de uma barreira mental.experienciar a prática meditativa no silêncio do ser. 9º passo – imaginar-se como a própria respiração. Assim. desde que operadas com o propósito de ser um objeto de atenção concentrada. A seguir seguem algumas instruções a serem ministradas para a aplicação de uma técnica de relaxamento.Como atuam os mantras? O som exerce um poderoso efeito sobre nosso corpo e nossa mente. Poderia-se utilizar a música como um recurso ao qual a nossa mente dedica uma atenção. Nesse contexto. nada é mais recomendável que criar uma estrutura de conforto aos seus praticantes. permitindo assim uma maior disposição e atenção ao trabalho. O que foi acumulado há de se esgotar. Como já foi dito.postar as costas retas. Integração com a totalidade e o desenvolvimento da responsabilidade universal e a sustentabilidade Estamos preparados para a crise.praticar. pois. pensamentos e emoções aflitivas que o conduzem a estarem distantes psicologicamente do ambiente laboral. O que foi construído há de ruir. como já foi lembrado anteriormente.posicionar o pescoço inclinado um pouco para a frente. trazendo-as ao contexto do aquie-agora. que permitiria a equalização dos estados de consciência fazendo ambos entrar em contato com uma experiência de integração.  . a meditação permitiria “aterrissar” essas pessoas.sustentar a ponta da língua tocando o céu da boca. tanto no contexto terapêutico entre cliente e terapeuta. sentado. Nas organizações. Nesse ínterim. O que foi reunido se dispersará.  . deve-se construir ou adaptar um local para a prática meditativa. e  . De maneira geral. permitindo a entrada de um pouco de luz. de preferência. 186 .  .manter o maxilar relaxado.  . sintonia e equilíbrio.  . E o que foi elevado há de se abaixar.maior aplicado em outras circunstâncias do dia-a-dia.  . Dessa forma. a perda e a morte? O que nasceu há de morrer. existem algumas orientações básicas para a realização da prática meditativa:  .deixar ombros e braços relaxados. Por isso é tão importante a técnica de relaxamento. quanto no contexto organizacional no qual cada pessoa chega ao trabalho com muitas preocupações.apresentar as mãos soltas sobre o colo. a “transpessoal” é a abordagem da psicologia de contato com o estado de consciência.permanecer com os olhos ligeiramente abertos. esse local deve ser um espaço para se experienciar estados elevados de consciência. Parte das reflexões aqui apresentadas foram extraídas do livro “Matrix e a Administração Transpessoal” de Julio Rezende. expresso nas antigas reflexões mencionadas. Mahaparinirvana Sutra Um pouco do pensamento tibetano. 187 . De acordo com Léo Matos (1996: p. Assim. “você é capaz de perceber o universo não como sendo composto de uma quantidade infinita de objetos separados. onde não existe objeto. que é a presença humana na Terra em comparação ao tempo geológico. em realidade são UM SÓ”. o que você faria de diferente na sua existência? Esse tipo de reflexão serve para algumas pessoas como um ponto de mutação.7). como foi discutido por Rezende (2007). De todas as meditações da mente A da morte é a maior. Caso você tomasse uma profunda consciência da sua finitude. indica que o tempo urge quanto ao que se refere ao desenvolvimento de ações estratégicas e de responsabilidade com o meio-ambiente e o convívio humano no planeta. a física moderna. para o melhor convívio com a natureza.Sogyal Rimpoche De todas as pegadas A do elefante é a maior. o budismo tibetano e a psicologia transpessoal encontram um ponto de convergência ao perceberem a realidade como uma unicidade. com o meio-ambiente e quanto aos hábitos de consumo. Tomar consciência das lógicas de mudança e transformação no mundo deve servir como um processo de tomada de responsabilidade pela construção de um mundo melhor. só existe sujeito no universo e nesse universo todo só existe um sujeito que é o próprio universo e que você e esse universo. para o melhor relacionamento com as outras pessoas. Parece que essas reflexões possuem uma sintonia com o universo das organizações a partir do momento que percebe-se que as organizações são instrumentos multiplicadores ou amplificadores de temas com elevado impacto social. a partir do qual algumas pessoas mudam a forma como se relacionam com parentes. é útil para auxiliar no processo de se tomar consciência da finitude humana e sobre como a compreensão e prática da psicologia transpessoal pode ser útil para compreender a dinâmica da impermanência e sobre o que podemos aprender para realizar uma ação de mais responsabilidade em relação às pessoas e o meio-ambiente. mas você experiencia o universo como uma unidade dinâmica. quando se entra em contato com um nível de realidade mais profundo. O sopro da existência. Assim. 2ª .A percepção da existência humana como una com o universo permite os indivíduos se perceberem como responsáveis não apenas por si próprios. O resultado do desenvolvimento dessas ações responsáveis seria a possibilidade de se conseguir um maior comprometimento ético dos colaboradores aos objetivos organizacionais. como polidez. de defesa pela qualidade de produtos e serviços. encontrar-se-ão as Oito Virtudes para o exercício de um comportamento ético: 1ª. Observando-se o Budismo. Uma forma de expressar uma visão ampliada da realidade seria as organizações empreenderem ações responsáveis com o objetivo de ganhar legitimidade. O trabalho. pureza.Pensamento correto . boa-fé e amor. Os colaboradores necessitam perceber que suas ações possuem um sentido. coragem. justiça. Cada ato possui um reflexo no universo e cada ação desse universo tem um reflexo sobre ações pessoais. uma política e prática organizacional de sustentabilidade. deveria ser uma expressão da responsabilidade pelos clientes em favor dos objetivos da organização. Talvez um dos conceitos mais úteis às organizações seja convocar a existir uma responsabilidade maior em relação ao meio ambiente e à sociedade. humor. prudência. simplicidade.Fala correta . as boas condições de trabalho. para perceberem as suas ações sob uma ótica mais profunda. na verdade. temperança. Essa é uma das importantes mensagens: a responsabilidade das ações pessoais na construção de um mundo melhor. realizando esse tipo de política organizacional sempre que necessário. É interessante observar que em diferentes linhas de pensamento a ética sempre está presente enquanto um valor a ser preservado e instrumento para garantir a ordem humana.gentil e verdadeira.para pôr a vida num caminho correto. que consiste em: • não mentir. mas por um contexto mais amplo.Compreensão correta – para livrar-se da superstição e desilusão. Do mesmo modo que a ética é compreendida nas sociedades ocidentais também o é nas sociedades orientais. generosidade. É imperativo se refletir sobre a necessidade de as organizações apresentarem em seus modelos de negócio uma preocupação com os seus funcionários. indo depois a outros locais. compaixão. Pois convida-se à responsabilidade dos colaboradores em um outro nível. Algumas organizações poderiam ser vistas como espécies de vírus que se instalam em determinados lugares e países e sugam todos os recursos. misericórdia. • não criticar os outros injustamente. Esse seria um comportamento ético que exige algumas virtudes. fidelidade. maior visibilidade e adquirir vantagem competitiva no mercado. Isto é. A ética é um tema que une a humanidade. boa imagem corporativa. gratidão. a avaliação quanto ao que seja a ética não deve ficar presa apenas a uma explicação da filosofia ocidental. 188 . que são muito mais do que simplesmente uma atividade laboral. o meio ambiente. 3ª . respeitando a legislação e os consumidores. em meditação profunda das realidades da vida. 6ª .Ações corretas . tornando-se inteiramente consciente de todos os estados corporais. emocionais e mentais. e ao se buscar autoconhecer o homem poderia então melhor se relacionar com o meio ambiente. não ser desonesto. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade. honestas e puras. 5ª . Considerações finais A administração transpessoal é um conceito continuamente em construção. 4ª . como posso perceber a partir de minha formação profissional em administração e psicologia. à liberdade e à segurança pessoal. 8ª . Artigo 3º .• não usar linguagem grosseira.Esforço correto . 4.pacíficas. De modo geral.Toda pessoa tem direito à vida. os sucessos e insucessos quanto ao que seja ter um ambiente agradável de trabalho. Artigo 4º . não roubar. pois. muitas seriam as idéias possíveis de aplicar no contexto do trabalho e das organizações e vou percebendo isso dia-a-dia observando o meu próprio comportamento e de meus colegas. 7ª . seguindo os "Cinco Preceitos": 1.Ninguém será mantido em escravidão ou servidão.em autotreinamento e autocontrole. não matar. e • não comentar sobre a vida alheia. não consumir drogas ou beber intoxicantes. merecendo destaque os seguintes artigos: Artigo 1º . e 5. A descoberta da importância do cuidado e do amor influenciaria para existir a criação de um estado de consciência de compaixão e um ambiente ético no qual se percebem uma realidade de interconectividade entre todas as coisas. Parte da argumentação dessa idéias apresentam uma consonância com a Declaração Universal dos Direitos Humanos.Concentração Correta . a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas.Comprometimento Correto .não trazendo injúria ou perigo para qualquer ser vivo. As Oito Virtudes propostas por Buda são importantes características associadas à prudência. pensar em a administração transpessoal como um enfoque gerencial interessado em promover uma maior qua- 189 .Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. seria possível existir uma consciência de que ao se cuidar do meio ambiente se estaria cuidando do próprio homem. não mentir. A partir dessa visão. através da: • conquista dos pensamentos maléficos. • esforço para se manter os bons pensamentos.Vida correta . 3.tendo uma mente ativa e alerta. 2. Muitas vezes não se é prudente porque não está se prestando atenção como a mente está trabalhando. compreendida como um estado de consciência que o indivíduo mantém. Dallas: Ben Bella Books. Natalie. 1991. 190 . Viagem a Ixtlan. Tendo em vista que uma das grandes barreiras ao desenvolvimento de práticas de sustentabilidade estão associadas a não apenas a falta de informações. James L.lidade de vida no trabalho. GOLEMAN. Thousand Oaks: Sage Publications. Nord. São Paulo: Agora. Por fim considero que o conhecimento sobre o que seja uma administração transpessoal pode ser útil ao desenvolvimento de uma experiência ecológica. Referências BERTOLUCCI. UK: Imprint Academic. philosophy and the religion in the Matrix. interessada na transcendência humana. Cabe à organização interessada em alguns elementos do enfoque proposto proporcionar espaços para que os indivíduos entrem em contato com a possibilidade de transformar a consciência pessoal de modo a se tornarem pessoas mais ativas. In Clegg. Psicologia do sagrado: psicoterapia transpessoal. William. FRANKL.. Francisco e Shear. Rosemarie. Rio de Janeiro: Objetiva. 2001 (volume 2). DEPRAZ. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração. FINEMAN. 2003 FRANKL. Stewart R. Jonathan (eds. CASTANEDA. FORD. Hardy. nesse campo está aberto um convite a outros pensadores e envolvidos com as práticas organizacionais a pensarem contribuições sobre uma administração renovada. 1997. Edited by Yeffeth. A partir do que o que coloco. Petrópolis: Vozes. Eliana. Carlos. o enfoque transpessoal pode apresentar indicativos quanto a inseparatividade do indivíduo e o cosmo. mas também de um sentido sensível por parte das pessoas. tão necessária ao contexto organizacional.) The View from Within: first-person approaches to the study of consciousness. é que identifico a administração transpessoal como uma trajetória em construção. na saúde e na incomensurabilidade quanto ao que é o humano. Inteligência emocional. Rio de Janeiro: Zahar Editores. Assim. necessariamente. felizes e saudáveis. Handbook de estudos organizacionais. Victor.Buddhism. Assim sendo é pertinente uma transformação da consciência pessoal. Mithology. BRAUD.. 1978. A emoção e o processo de organizar. 15ª ed. – Rio de Janeiro: Record: Nova Era. 1991. and The Matrix In Taking the red pill: science. Fundamentos antropológicos da psicoterapia.1998. 1995. Thorverton. The phenomenological reduction as praxis. Victor. São Paulo: Atlas. Cynthia. Transpersonal research methods for social sciences. Stephen. 2000. envolve em transformar a percepção de cada um envolvido nas dinâmicas laborais. In Varela. Daniel. ANDERSON. VIVER NATURAL.vivernatural. trad. Rio de Janeiro: Vozes. págs 11-13) VARELA. HABERMAS. GUERREIRO RAMOS. 2003.vivernatural.GROF. Consultado no dia 24/10/2007 no endereço eletrônico http://www.br/filosofias/mantras. morte e transcendência em psicoterapia. Rio Grande do Sul: EDUCS. Consultado em Mantras. UK: Imprint Academic. REZENDE.htm> Acesso em: 24 out. Rio de Janeiro: E-Papers. São Paulo: Summus. 1994. os sons da iluminação. Doucy & PARIZI.com. Lama Zopa. Corpo e mente: práticas para atingir o equilíbrio psicológico perfeito. Jürgen. Pierre. In GROF. 2000. Julio Francisco Dantas de Rezende. Léo. Rio de Janeiro. Maurice. Introspection as Practice. 1987.br/filosofias/mantras. Alberto. Stanislav. Vicente Galvão. RINPOCHE. Fenomenologia da percepção. 2007. 1987. Francisco e Shear.uma reconceitualização das riquezas das nações. José Carlos. Petrópolis: Vozes. Pesquisa Científica: critérios epistemológicos. Stanislav. Wisdom Energy. Jonathan (eds.htm. Rio de Janeiro: Guanabara. KÖCHE. Matrix e a administração transpessoal. Porto Alegre: Artmed. MERLEAU PONTY. <http://www. SOUEK. São Paulo: McGraw Hill. 2000. A aventura da autodescoberta. Heck. FGV. RJ: Vozes. 2005. Petrópolis. VERMERSCH. A mente incorporada: ciências cognitivas e experiência humana. (J.com. Conhecimento e interesse.). 191 Disponível em . Thorverton. São Paulo: Martins Fontes. MATOS. 1997(Prefácio à edição brasileira. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. (1981) A nova ciência das organizações . Francisco. os sons da iluminação”. In Varela. nascimento. 2003. Além do cérebro. JUNG.) The View from Within: first-person approaches to the study of consciousness. Consultado em “Mantras. Carl Gustav. 2007. Capítulo 23 A Temporalidade no Existir Subjetivo 192 . Capítulo 24 Trabalho Transpessoal com Crianças 193 . Capítulo 25 Trabalho com a Morte 194 . Capítulo 26 Cosmoeducação 195 . Você me diz que a “doença mental” ou psíquica é “estar separado do Real” . não é o estabelecimento da sua identidade como vítima. Jean-Yves Leloup. “Mas. senão não estaríamos aqui para sofrermos. enquanto Terapeuta..” Você acredita realmente que podemos estar “separados” do Real? Estamos sempre no Real.. Quando pretendemos “cuidar” de alguém ou se quisermos estar ao seu lado “para ajudá-lo a realizar-se”. pode.. é aquilo que assinala uma saída do sofrimento ou da interpretação e da percepção dolorosas daquilo que é. Jean-Yves Leloup e Leonardo Boff.. segundo Fílon de Alexandria. nos alegrarmos ou falarmos a respeito..APÊNDICE CARTA AOS TERAPEUTAS Jean-Yves Leloup Meu caro T. interrogar-se acerca do Real me parece ser um sinal ou um sintoma de humanidade e de saúde mental. outras menos. com o acompanhamento do Terapeuta. “o que podemos fazer para ajudar alguém que sofre desse afastamento ou dessa separação do Real?.. pelo contrário. Eu preferiria dizer que estamos “fechados” em uma percepção ou uma interpretação da realidade que tomamos pelo Real. Suas questões não são “metafísicas” demais para um Terapeuta? É verdade que. antes de ser um médico ou um psicólogo. sem dúvida algumas vezes mais. Editora Vozes. 1993 e “Terapeutas do Deserto”..definição clássica da esquizofrenia – mas. da sua doença. mas sempre. deve ser um 40 “filósofo ”. Fílon e os Terapeutas de Alexandria em « Cuidar do Ser ». o que é? O que é o Real?” você me pergunta.. Editora Vozes. “Sentido” não significa complacência para com a dor. mas. Aquele que padece com aquilo que lhe acontece (essa é a própria definição de paciente) ao encontrar-se face à realidade de seus sintomas.. devemos saber que sentido colocamos sob as palavras: Real – Realização – Realidade. 40 Cf. você pergunta. o Terapeuta. ter acesso a uma percepção e uma interpretação “outras” que o ajudarão a passar de uma dor “insensata” a uma dor “que faz sentido”.. Jamais estamos “separados”. do seu “mal-estar”. 1997 196 . do seu sofrimento. “o que é o Real?” e... . percepções). Que eu busque compreendê-lo “fisicamente”.. sem confrontá-las ou opôlas. psíquicas ou espirituais. impossível de ser produzida ou injetada em corpos destinados. A Realidade do nascimento ou a Realidade da morte são duas manifestações do Real. mas. estão identificadas ao Real. capaz de integrar ou mesmo de ultrapassar esses diferentes níveis de realidades ou essas diferentes “experiências do Real” que são o prazer. à degenerescência e à morte. que eu busque compreendê-lo “afetivamente” ou “psicologicamente” através das 41 Não confundir com a gnose. que justamente não identifica o Real com um dos seus elementos. De um ponto de vista mais moral ou mais psicológico.mas os considera como duas realidades “relativas” uma à outra.. “Les Profondeurs oubliées du Christianisme”. felicidade ou infelicidade . assim como a realidade do Espírito. a Realidade dos vírus ou do “terreno” como únicas causas da dor. tanto mais ele me escapa.. Isso deu nascimento a muitas escolas de filosofias. a doença não passaria de uma deficiência transitória da saúde. o “Realismo” é afirmar a realidade das idéias. a morte. através dos meus sentidos (sensações.. O Real está em todas as realidades.. pelo contrário. o Absurdo. a afirmação de que apenas a matéria existe. ao passo que a matéria ou o espírito são apenas dois níveis dentre outros do Real. teremos tendência a tomar pelo Real a realidade do Bem ou a realidade do Mal. o Não Sentido no qual estamos 41 “jogados aqui” (cf... De um ponto de vista médico ou terapêutico. o mal é apenas a ausência ou a falta do bem (privatio Boni).. por exemplo. pelo contrário.Acredito que identificamos rápido demais uma realidade ao Real. 2007 197 . Uma terapia que não levasse em consideração essas duas realidades.. correria o risco de não levar em consideração um Ser Real.. Cf. o nascimento. certas formas de gnosticismo ).. do sofrimento ou do mal estar – “a saúde” (assim como a felicidade) não passa de uma idéia quimérica. de toda maneira. positivos ou negativos- bem ou mal. Editions du Relié. ao passo que o Real está presente nas realidades mais contraditórias ou opostas. que ele é o único Real. para Platão. ou seja. “mais reais” do que os seres individuais que são apenas o seu reflexo – para os materialistas. a degenerescência. Jean-Yves Leloup e Karin Andrea de Guise. outros dirão que o mal existe realmente. o “Realismo” é. alguns dirão que apenas o bem existe. A realidade da Matéria. que ele é o próprio Real. alguns considerarão a saúde como sendo a Realidade..... mais uma vez. duas manifestações relativas do Real. a dor. o que é o Real? Quanto mais busco compreender. quer elas sejam materiais. Isso seria novamente identificar o Real a apenas uma das realidades que o manifestam. as idéias não passam de epifenômenos ou de explicações ilusórias. Outros afirmarão. a tudo aquilo que é... intelectual e espiritual com relação a tudo aquilo que foi. de nossas identificações a essa ou aquela polari- 198 . mas à uma escuta. A função do Terapeuta é cuidar desse “entre dois” ou dessa relação entre o Ser e “aquilo que é” ou entre “aquilo que eu sou” e “Eu Sou”. “um ídolo do Real”. mas a “identidade do ”Eu Sou” sempre me escapa. rejeitá-las.. que eu busque compreendê-lo intuitivamente ou espiritualmente através das orações. o encarnam ou o representam. “Eu Sou”.. ainda. uma representação do Real. ao incompreensível. Na busca da minha “identidade Real”. é permanecer em uma abertura corporal. ao inapropriável.. sentir o distanciamento entre aquilo que eu sou e Eu Sou: eis a fonte de um sentimento de culpa. ou seja. de falta ou de carência que é também patologia.sensoriais. no entanto... afetiva. que eu busque compreendê-lo intelectualmente ou “cientificamente” através das minhas análises. O Real não é uma realidade. meus desejos. Tomar “aquilo que eu sou” por “Eu Sou”: eis minha inflação ou minha patologia.. contudo. Uma Escuta que permanece aberta ao imperceptível. é o início da saúde. mas é.. ou seja. ao inominável. Permanecer nesse estado de Escuta e de abertura em todas as circunstâncias. meus sentimentos. uma Escuta que deve permanecer livre de todas as apreensões . “aquilo que eu sou” – “Eu Sou” – e o “entre dois”. A perda do sentido do Real que surge no “entre duas” realidades está na fonte de nossos infernos ou de nossos fechamentos. manifestado. intelectuais ou espirituais . o aprendizado do “entre dois” que me situa no coração de um ternário. mas no sentido de uma maturidade que é incessantemente informada pelo Real e livre (libertada) das realidades que o manifestam. Aceitar esse “distanciamento” entre “aquilo que eu sou” e “Eu Sou”. uma manifestação.. O Real não está oferto à uma “compreensão”. Permanecer à Escuta do Real.. etc) e a realidade absoluta. a tudo aquilo que virá. é permanecer na presença do Real..minhas emoções. “Aquilo que” eu sou não é “Eu Sou”. meditações ou contemplações. minha realidade não é o Real. O Real se manifesta entre duas realidades: a realidade relativa: aquilo que eu sou (feliz – infeliz – sofredor – mortal – neurótico – psicótico.. racionalizações ou sínteses. afetivas. encarnado ou representado em todas realidades.sem. uma encarnação. é estar em vias de “Realização”. eu descubro um certo número de realidades das quais eu participo.. não no sentido de terminar algo. sua representação última. sequer uma Realidade absoluta.. entre “aquilo que é” e “o Ser” ou. entre a realidade e o Real. essa liberação de uma leveza no coração do mais espesso e do mais pesado das matérias que nos constituem. através da prática da anamnese essencial. quem. mesmo a mais obstrutiva ou a mais dolorosa. ele ajuda o paciente a tomar consciência de que aquilo que ele percebe como sendo “a realidade”. 199 . eu não a terei para sempre. A consciência de que ele vai morrer é maior do que a morte que arrebata seu corpo e seu psiquismo. O Real é “Ele” e nenhuma realidade. é o que alguns chamam de despertar. mas também uma interpretação. tenta “tornar presente” em si.dade do Real.. Essa liberação de um espaço no coração dos tecidos demasiadamente comprimidos dos nossos sintomas.. um momento do Real. a realidade que geralmente lhe faz mal. “A doença da morte” não é incurável. pois a Vida é o movimento incessante entre “aquilo que eu sou” e “Eu Sou”. Ajudar alguém a permanecer nesse espaço do entre dois é mantê-lo em vida. o manifestam ou o representam. O Terapeuta o ajuda a recolocar seus sintomas no interior de um processo onde ele não se identifica à realidade da sua doença. da aids ou de outras patologias (físicas ou psíquicas). da aids ou de outra patologia (física ou psíquica). movimento que une minha realidade relativa à realidade absoluta.. saúde ou Salvação. essa recordação pode ser efetiva: alívio e liberação. mas o “Sujeito” de um câncer. nem o meu ser infinito (absoluto). O Real é aquilo que nos faz sair dos fechamentos ou das alienações referentes ao relativo ou ao absoluto. Cuidar do Real é desimpedi-lo. que poderemos qualificar de depressiva (se eu me identificar “àquilo que eu sou”) ou de histérica (se eu me identificar a “Eu Sou” que eu poderia ser). presente”. “entre os dois” e “além dos dois”. O que é ser Terapeuta se não for participar através da sua própria vigilância ao despertar dessa consciência? Consciência do Real que “eu sou”.. permitir que ele não se “petrifique” ou se “fixe” em uma postura do Real. A vida que eu sou. no outro e entre os dois. A vida que eu tenho.. mas uma etapa. realização do Real não identificado às realidades sublimes ou triviais que o encarnam. além da minha recusa e do meu esquecimento. realidade relativa que “eu não sou” e realidade absoluta que “eu não sou”. “o Real que está sempre aqui. colocá-lo ao largo no coração das realidades às quais o ser humano se identifica. poderá tirá-la de mim? O Terapeuta. no coração da realidade que “eu tenho”. O Terapeuta é um hermeneuta. Aquilo que ele percebe dessa maneira não é o Real.. não é apenas uma percepção.. ele não é o “objeto” de um câncer. O Real não é nem o meu ser finito (relativo). já que ele descobre ser o “sujeito” dessa doença. ele é “os dois”. pode aniquilá-lo. O Real é a liberdade do Espaço que não é atingido ou maculado por aquilo que nele se agita ou passa. somos libertados de toda amargura. da mais inerte à mais vivaz ou vivificante. essa Vida é movimento. apreciar e amar na sua justa medida. o encarnam ou o representam nos permitem conhecê-lo. condição mesmo da nossa “presença real” no mundo. esse Amor é capacidade de Dom. O Real é a luz que ilumina todas as realidades...Carta II Meu caro T. a alegria é uma experiência.. é a visão ou a intuição do Real que está em todo lugar e está sempre presente que nos torna não dependentes das realidades transitórias que podemos. nas realidades finitas. creio que existe um Real infinito. de generosidade. a matéria não pode retê-la ou contê-la. nós conhecemos a Vida Bem-Aventurada. assim como no universo que o envolve. É uma luz.. vir a ser... Fazer apenas um com essa liberdade é viver em um infinito respeito por tudo aquilo que vive e respira. dizemos que “Tudo “vai” bem. ele é o próprio movimento da vida que se dá e que perdoa. de compaixão. invisível.. 200 .” O Real é o Amor que anima a vida... visíveis. tanto a mais rica quanto a mais miserável. uma vida... temporais e dolorosas que conhecemos. O Real. A cura consiste no restabelecimento da relação com o Real. Ela é uma Energia. Você pede que eu “indique com exatidão quais são os meus pressupostos antropológicos ou meus “a priori” com relação ao Ser humano.. Quando fazemos apenas um com a realidade do Amor.” Como eu disse anteriormente. uma “Força que vai”. então. “ninguém jamais o viu”. um amor que não julga nem se apega àquilo que vai. eterno.. na consciência de que não podemos estar separados “daquilo que está em todos os lugares e sempre presente”. da mais opaca à mais transparente... O Real é a Vida que anima todas as realidades. quando fazemos apenas um com ela. Creio que há um Real invencível no ser humano frágil e impermanente. mas as realidades que o manifestam. A luz está na matéria.. bem-aventurado. essa luz é Consciência que responde à nossa consciência e a torna possível. Quando eu estou na compaixão (aberto à alteridade) e no amor: “Eu Sou”. de “circular” e de ir “cada vez melhor” em um corpo “libertado” daquilo que ele não é. tanto mais “Eu Sou” – presença real. feliz-mente. Vida (Força – Energia). dissolver os nós. Quando eu estou cada vez mais consciente. o que pode muito rapidamente conduzir a impasses. desembaraçar. Quando eu não estou consciente: “Eu não sou”. os bloqueios que impedem que o Real se dê ou que impedem a consciência. “entregue” 42 (aberto – ofertado) ao Ser que Ele é.O Real é a nossa verdadeira natureza. tratase de uma falta de consciência (confusão – obscuridade). do meu a-priori – mas também da minha experiência. Se sentirmos uma “carência de realidade”. a carência. Amor (Alegria – Beatitude). Se sentirmos uma carência de realidade (Consciência – Amor – Vida – Liberdade) é porque alguma coisa impede nossa verdadeira natureza de se expressar ou de se dar. afirmação da realidade do amor. eu sou cada vez mais uma presença real consciente. ele é Luz (Espírito – Consciência). Liberdade (Espaço – Vastidão). irritam. eu não estou realmente “presente”. quer dizer “dissolver” (lyse) para o alto (ana). de uma falta de força (fraqueza – cansaço) ou de uma falta de liberdade (alienação – dependência).. São as barreiras.. Quando eu estou consciente: “Eu Sou”.T. os bloqueios.. literal e etimologicamente. Podemos conhecer algumas satisfações ou contentamentos fugazes. que é considerado como “patologia”. Pensamos que podemos preencher essa falta. eu não estou em relação com aquilo que é.. de uma falta de amor (tristeza – fechamento). O trabalho de “análise”. os obstáculos (Shatan/Satã em hebraico) que o Terapeuta leva em consideração.. Sim. são mais reais do que realidades como o absurdo – o ódio – o medo – a morte. mas a falta. “eu não sou”.. (N. o Amor. realmente trata-se do meu pressuposto antropológico. Quando eu não estou na compaixão e no amor. a Vida. essa carência com realidades externas.) 201 . a Liberdade. 42 Jogo de palavras intraduzível em português entre as palavras “délivré” – “libertado” – e “livré” – “entregue”. Você me pergunta como posso afirmar que o Real é a verdadeira natureza do ser humano e que realidades como a Consciência – o Amor – a Vida – a Liberdade.. desfazer. aumentam. Quanto mais eu estou na compaixão e no amor.. mas a forma onde ele se manifesta. Quando estou cansado.Quando eu estou vivo. onde ele se encarna.. Sinto-me mal na vida que tenho. “Eu Sou” é livre. recolocá-lo no seu eixo? 202 . eu amo aquilo que eu sou: “Eu Sou”. Essas são evidências por vezes difíceis de compartilhar. que sofrem. logo eu não a terei mais. eu não estou bem. a função do Terapeuta não seria. Permanece “a vida que eu sou”.. mas continuo sendo “Eu Sou” em um corpo. doente... deprimido. difíceis também de compreender aquilo que em nós e no outro resistem a essas evidências. Não é “Eu Sou” quem vai morrer.. ainda um pouco mais de tempo. Contudo.. cheio de energia. de re-centrar o outro na “identidade que ele é” e de libertá-lo das “identificações que ele possui”? Não seria isso torná-lo presente a essa “presença real”. um psiquismo. ao dar testemunho da sua experiência do Real. eu estou consciente daquilo que eu sou.
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