PREVENÇÃO E CONTROLE DA CRIMINALIDADE POR VIA DO PROJETO ARQUITETÔNICO DE ESPAÇOS PÚBLICOS

March 22, 2018 | Author: Valter E Roberta Padulla | Category: Interdisciplinarity, Citizenship, Semiotics, State (Polity), Crimes


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PREVENÇÃO E CONTROLE DA CRIMINALIDADE POR VIA DO PROJETO DE ESPAÇOS PÚBLICOS À LUZ DA SEMIÓTICA VISUALRosália Maria Netto Prados1 Valter Padulla2 RESUMO O presente texto tem por objetivo trazer à baila as questões: “A sensação de segurança dos cidadãos pode ser afetada pelas características arquitetônicas e ambientais de uma praça pública?” e, consequente a anterior, “Como o aspecto visual de uma praça pública provoca medo e insegurança no munícipe?” Neste sentido, o artigo visa lançar um olhar interdisciplinar sobre políticas públicas de segurança, e também descortinar a possibilidade de elucidação de aspectos atinentes ao percursos de sentido e análise de discursos a partir dos estudos da Semiótica dita greimasiana. Os autores também abordam o problema sobre os alicerces providos pela tese segundo a qual o homem é um animal auto-eco-dependente, discussão contemporânea de relevância para a psicologia, antropologia, filosofia, pedagogia, direito. INTRODUÇÃO La garantie des droits de l'homme et du citoyen nécessite une force publique; cette force est donc instituée pour l'avantage de tous, et non pour l'utilité particulière de ceux à qui elle est confiée.3 O texto acima é parte da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (artigo 12), elaborado, votado e aprovado durante a Revolução Francesa, em 1789, evento de tamanha relevância no estudo da História a ponto de marcar o fim da Idade Moderna e o início da Idade Contemporânea. Além do aspecto histórico a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão é fundamental para o estudo dos temas relativos à segurança pública, ou seja, a garantia de LIBERDADE, IGUALDADE e FRATERNIDADE indistintamente a todos os cidadãos foi uma 1 Docente no Programa de Mestrado da Universidade Braz Cubas. Pós-doutora em Ciências da Comunicação, pela Escola de Comunicação e Artes, da Universidade de São Paulo; doutora em Semiótica e Lingüística Geral, pela Universidade de São Paulo; especialista em Lingüística Aplicada ao Ensino de Língua, pela Universidade de Mogi das Cruzes; e graduada em Letras e em Pedagogia, também, pela Universidade de Mogi das Cruzes. 2 Aluno do Programa de Mestrado da Universidade Braz Cubas, “Semiótica, Educação e Tecnologia da Informação” – e-mail: [email protected]. 3 Tradução: “A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública; esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada.” um sistema onde as pessoas que. portanto. ações que não observem a preservação dos direitos humanos. o que perpetuará um estado de insegurança e privilégio àqueles mais próximos do poder público e. calcado em princípios de prevenção. ou seja. PREVENÇÃO OU REPRESSÃO? Um estado de segurança pública numa determinada comunidade pode ser obtido. a presença do Estado a garantir a tranquilidade e segurança de todos e. . A prevenção à violência e ao crime pode ser entendida em três momentos distintos. mesmo os infratores da lei. isto é. com transparência e honestidade de propósitos. Segundo Santos (2006): Numa sociedade em que se exerce democracia plena. ocorre numa parceria decisória4 com a sociedade. no sentido de que há participação da comunidade num sistema de policiamento comunitário que. 4 Os autores entendem como parceria decisória. que uma saiba o que a outra faz. Neste sentido. e é mais cidadã. entre seus agentes. que estejam irmanadas na busca de soluções palatáveis às duas. A estratégia da repressão traz consigo algumas desvantagens. fazendo parte de uma das inúmeras e complexas vias por onde trafega a qualidade de vida dos cidadãos. o momento em que as duas partes sintam-se como sendo uma só. é fazer com que o criminoso em potencial seja desestimulado da prática delituosa. Um Estado democrático não deve tolerar. por dois caminhos. sobretudo. Outra situação gerada por um sistema de combate ao crime que seja repressivo se dá no fato de que a ação ocorrerá sempre após o delito ter acontecido.preocupação central e geradora da REVOLUÇÃO FRANCESA e aponta para a manutenção e salvaguarda dos DIREITOS HUMANOS. que é o objetivo final daquilo que se convencionou tratar por SEGURANÇA PÚBLICA. a cadeia. Em relação à prevenção e controle da criminalidade as vantagens são evidentes. in tese. é mais duradoura. com maior possibilidade de serem atendidos mais rapidamente. a mais significativa é a atuação dos “órgãos repressores” por meio de métodos violentos. sendo duradouras e. a prevenção ou a repressão ao crime. a segurança pública garante a proteção dos direitos individuais e assegura o pleno exercício da cidadania. uma vez que o sucesso de um sistema de segurança pública. quais sejam. basicamente. mesmo com suas necessidades satisfeitas e tendo diante de si a presença do Estado apontando que haverá repressão em caso de cometimento de delitos. é o método menos dispendioso visto que não há reparos financeiros em razão dos prejuízos causados por um crime perpetrado. a satisfação às necessidades das pessoas. que devem assistir a todos os cidadãos. por fim. o Estado sempre chegará atrasado (levando em consideração que se há repressão é porque tal fato já ocorreu). a segurança não se contrapõe à liberdade e é condição para o seu exercício. entre órgãos policiais e comunidade. perpetram ilícitos são recolhidas para reeducação ou para isolamento da sociedade. motivado para praticar um delito. pessoas vulneráveis e ambientes propícios a ações criminosas. quais sejam. num mesmo local. significa que o crime. what this means is that crime. O transeunte de uma praça pública sentir-se-á inseguro em qual tipo de ambiente? Como o aspecto visual de uma praça pública provoca medo e insegurança no munícipe? As respostas a estes questionamentos são relevantes para compor o conjunto dos conhecimentos necessários à formação daqueles que projetam espaços públicos. quanto maior a prevenção menos oportunidades para práticas delituosas. In 5 other words. ocorre quando alguém. encontra ou cria uma oportunidade para cometer o crime. ou ainda. Os ambientes são propícios ao crime quando apresentam facilidade em agir de forma inesperada. em vias públicas. Juntando os conceitos da prevenção e oportunidade emerge o entendimento de que quanto menos oportunidades maior a prevenção. por exemplo. É importante conhecer e analisar as relações existentes entre a oportunidade para ação criminosa e o ambiente. como as praças públicas com uso predominantemente comercial. A oportunidade para ocorrência do crime se faz presente quando há. Uma questão que se destaca é a de que o sujeito. mesmo vulneráveis.” When translated into criminological language. que é uma forma de comportamento. não observam as condições do ambiente em que transitam tendem a se tornar presas para os malfeitores. motivação e oportunidade são necessárias para que um crime ocorra. A partir desta conclusão nasce a idéia de minimizar as oportunidades para 5 Tradução: “Uma das disciplinas que geraram a criminologia é a psicologia e eu quero começar minha fala revisitando uma lei amplamente aceita pela psicologia: „Comportamento é o produto da interação entre o sujeito e o meio. dentre outras características. procura afastar-se de um local onde vislumbre oportunidades para o criminoso. both motivation and opportunity are needed for crime to occur.” . As grandes cidades possuem muitos locais onde há esse jogo de “caça e caçador”. which is a form of behavior. como afirma Clarke (1980): One of Criminology‟s parent disciplines is Psychology and I want to begin my talk by revisiting a well-established law of that discipline: “Behavior is a product of the interaction between person and setting. são locais onde há grande incidência de crimes. todavia não somente pelos olhos de quem quer cometer o ilícito. Em outras palavras.TEORIA DA OPORTUNIDADE E AMBIENTE Outro fator importante a ser analisado é a questão da oportunidade para eclosão do crime. em locais com pontos de baixa visibilidade que sirvam de esconderijos e também quando há caminhos disponíveis para a fuga do criminoso. occurs when someone who is criminally motivated finds or creates a criminal opportunity. cônscio de sua situação de vulnerabilidade. evitando passar por locais onde se sintam inseguros. mas principalmente daqueles que são afetados em sua vulnerabilidade pelo ambiente. o que pode ser verificado pela observação de transeuntes. o encontro entre dois fatores. Aqueles incautos que.‟ Traduzindo para a linguagem da criminologia. dos elementos construtivos. como segue: Ações voltadas para a inibição do cometimento de crimes contra o patrimônio e a pessoa têm de estar baseadas em critérios mensuráveis da infra-estrutura do local.gerar maior prevenção. entre ensino e produção de conhecimento científico. apontar os discursos relativos à segurança pública e as significações encontradas nos espaços públicos das praças com uso predominantemente comercial. da permeabilidade visual. pedagogia e epistemologia. 2005) A semiótica possibilita identificar os significantes e símbolos. A organização do pensar os problemas de segurança pública não pode ser ditada por uma única disciplina e atesta essa idéia o número de ciências que se prestam a explicar os fenômenos da segurança pública (psicologia. político. em vista de que. (Salles 2007. em seu trajeto por este espaço público. p. p.20) A MANEIRA DE ENXERGAR O PROBLEMA É PARTE DA SOLUÇÃO Postos os ditames norteadores do presente texto chega-se à fase de encontrar as ferramentas mais adequadas ao melhor andamento do trabalho e obtenção das conclusões mais acertadas. das edificações. pois. um caminho para obter este objetivo é o desenho de um ambiente que comunique mais segurança ao transeunte.9). buscamos. 2005. se tornam concebíveis. ferramentas para entender os percursos gerativos de sentido em relação à segurança pública. com a utilização de várias disciplinas em complementação e a união da teoria à prática com a maneira interdisciplinar de compreensão. criminologia. as coisas. que permite observar o crime como um fenômeno complexo (social. contra especialidades que se fecham (Francischett. . A questão interdisciplinar tem como propósito superar a dicotomia entre: teoria e prática.6 ( Lubachevski e Sahar. O estudo semiótico da fotografia de uma determinada Praça Pública revelará o entendimento vivenciado pelos usuários destas praças públicas e a significação destes 6 Negrito acrescido pelo autor. Adotamos a visão interdisciplinar para a condução do pensamento. nos estudos semióticos. antropologia. psicológico). Ou seja. das condições de iluminação e das características dos elementos escolhidos. dentre outras). arquitetura. Além do olhar interdisciplinar. Falar de interdisciplinaridade é falar de interação de disciplinas. Pela metodologia da semiótica. traduzidos e de sentido através da semiótica com sua específica linguagem de interpretação dos fenômenos inerentes ao ser humano. objetos materiais e não-materiais. em migalhas. engenharias. que auxilia na identificação e compreensão da transmissão de mensagens. o desenho arquitetônico de uma praça pública pode conter elementos que tranqüilizem o cidadão. apresenta-se contra um saber fragmentado. Seu objeto (da Semiótica) é estudar e compreender fenômenos provenientes de uma produção de significados e de sentidos. em primeiro lugar se observa o que acontece (por meio dos registros nos Boletins de Ocorrência). no dia a dia das donas de casa. temendo pelo que lhes possa acontecer. o Estado. a semiótica desenvolve uma tecnologia de análise de texto que contribui bastante para responder à conhecida questão a respeito do que um texto quer dizer. na adoção de hábitos prevencionistas. entende-se mais nitidamente esta formação revelada no cotidiano. isto é. Ao lado dessa questão. nas respostas caseiras ao crime e finalmente no entendimento coletivo de que certos locais (bairros. que a prevenção e pró-atividade sejam os pontos fortes das políticas públicas de segurança. As questões afetas ao tema SEGURANÇA PÚBLICA estão na pauta da mídia. Urge que mais técnicos compreendam a situação e proponham soluções exeqüíveis e duradouras. 66) temos que: Ao definir a significação como seu objeto de estudos. sempre com soluções mágicas e prometendo mais efetivo e viaturas policiais. efetivo policial para REAGIR à prática de delitos. por exemplo) são perigosos e mais. esta prática tende a empregar o efetivo policial como bombeiros a apagar incêndios. A semiótica plástica e a teoria dos sistemas semi-simbólicos. que sempre espera dias melhores sem saber exatamente como proceder para abreviar a . a semiótica responde também como ele diz aquilo que diz. No dizer de Pietroforte (2010. que alguns estereótipos humanos trazem consigo a marca do perigo. são parte dessa tecnologia. da prática de infrações à legalidade. na visão que se tem a respeito dos agentes de segurança pública que são transmitidos por tradição oral de geração em geração. na preocupação das mães com os filhos que ainda estão “na rua”. é importantíssimo que se encontrem remédios onde ocorra o contrário a esta prática. A questão da formação do sujeito. portanto. e após esse mapeamento por via dos índices criminais. pag. nas conversas de botequim. está em destaque nesta pesquisa. que a Universidade aplique tempo e talentos com mais intensidade na busca de respostas acessíveis à população brasileira. portanto.ambientes em relação à segurança física dos mesmos. o que ele significa. dispõe. sempre correndo “após” as ações criminosas. está capilarizado em todas as partes da sociedade e merece ser tratado com seriedade e disposição científica. ou seja. Aliando interdisciplinaridade (o olhar) e semiótica (instrumento) tem-se como resultado uma visão mais clara de como se dá a formação cultural de nossa sociedade. CONCLUSÃO Historicamente o Estado tem contribuído com a segurança pública de forma reativa. permitindo estudar o plano da expressão e suas relações com o plano de conteúdo. caso contrário continuará eternamente como um dos itens das plataformas de candidatos a cargos eletivos. chegada destes dias. . desde simplesmente caminhar até assentar-se sob o céu para contemplar outras pessoas caminhando e desenvolvendo suas performances. Esta relação é pautada pelo uso de um caminho que une ponto A a ponto B. que passa a ser uma personagem. fundamentalmente nesta pesquisa. da cidade que recepciona atenção. revela traços de convívio (uso contínuo) e relações de afeto com o espaço. emoções e outras manifestações a humanizá-la e a hipotecar-lhe atributos/características aprazíveis ou não. mas também. estabelece-se uma relação usuário-ambiente. ainda que arquitetônica. Num determinado espaço onde actantes (em específico neste texto os transeuntes/usuários) realizam sua performance com/por via do ambiente. 55. ANDRADE. GREIMAS. Office of Policy Development and Research. n. Dicionário de Semiótica. n. COURTÉS. A. v. Conceito de segurança pública..REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEATO FILHO. Creating Defensible Space. . 2010.pdf>.monografias . acesso em 24/02/10 às 11:18h. São Paulo: Contexto. Emerson Clayton Rosa.S.br /pag/francishett-mafalda-entendimento-dainterdisciplinaridade. Washington. 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