PERRONE-MOISÉS, Leyla. a Criação Do Texto Literário. in Flores Da Escrivaninha. Companhia Das Letras,2006
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Lf~l(\ç rrD . Ir L~ C'f' ~~ e VliX) - rtO( se::; Poderíamos substituir a palavra criaçiio por outras, quase sinônimas, (Existirão realmente sinônil~lOs. isto é. palavras que Se ~ubstituíssemos a tenham exatamente o_l1lcsmo significado'!) palavra criaçiio pela palavra ill\·cllçiio. por exemplo. j,Í seria outra teoria da literatura que estaria por detr,ís. "A i;1venção do é lambém a criaç;)o de lima coisa notexto litenírio." Invenção é usar o enva. mas não de modo divino e al1soluto. Inventar . \ YC7'-' v-l_ ~ \. \ t~~ ( 8 A CRIAÇÃO DO TEXTO LITERÁRIO genho humano. é interferir localizada.mente artefatos de que o homem dispüe para tornar e mais interessante. Dentro de um sistema o título que me propuscram. e que aceitei. é extremamente ambicioso. Quercr sintetizar. numa breve comunicação, as questões que esse título anuncia. seria urna pretcnsão ou uma ingenuidade. Fique. pois. desde logo claro que pretcndo apenas levantar aqui alguns pontos quc me parecem ftilldamentais. deixando (1 campo aberto para os dcpoimentos·dos escritores e as intervençücs dos ouvintes que se seguirão 8S minhas colocações. ., A criação do texto litenírio." Embora pareça bastante neutro, em sua generalidade. esse título j<Í implica uma determinada teoria !\ palavra criaçtlo supüc o tirar do nada, o tornar exda literatura. istente aquilo que não existia antes. É urna palavra teológica. Assim como Dcus criou o mundo a partir do Verbo. a~;sim o autor literário instauraria um munuo novo. nascido de sua vontade e de sua palavra. Para o leitor. esse mundo seria suas maravilhosas novidades. como o jardim doado. com todas do Éden a Adão. as A palavra criaçiiIJ, aplicada ao razcr artístico, pertcnce ao vocabulário uo idealismo romântico: presume que o artista não imita a natureza. mas cria uma outra natureZ<1. gerada por um c,:.;cesso de car:íter divino c destinada a uma completude autúnoma. Entretanto, o título proposto aeopla criaçt70 a outra palavra que aponta para outras teorias. mais recentes. I~ a palavra texto. Ao introduzir-se a palavra (exlO. remete-se para a matcrialidadc du escrito, e atenua-se o incf<Ívcl da palavra criaçt7o, Forma-se assim um título de compromisso. de conciliação entre o "divino" da !!Cnese e o "humano. demasiadamentc hUlTlano" do objeto criado. Como. porém. as alianças contaminam. o pniprio texto. aqui resultante de uma criação. torna-se um objeto algo miraculoso, como uma pomba surgida dc uma cartola. fOI) no conjunto dos sua vida mais rica de Verdade. ifl- VCIIÇÜO tem até algo de pejorativo. Diz-se de uma mentira: isso é uma invenção. Daí havcr algo de provocador n() uso da palavra illFCIIÇÜO para designar o fazer artísticQ. O e~erilor que diz "eu invento" recusa as verdades ab~olutas e os I'alo"res e~l<Íveis. ressalta sua não acredita O inVl:nlor habilidade mais do que SU<linspiração. necessariamente em Deus: Irah,lIll<I no mundo dos recursos humanos. Cham,lda de ill\·CflÇilo. a ohra de arte é comparável ;\ pülvora ou ao <I\·ião. ;\ceila-~e assim (Iue um,i invenção também é circunscrita no templi: 01a ~er<Í suhstituída por outra. mais engenhosa. llIais llIoderna. Ess;\ é ln11,\ 1),11,1\'1';1 C<lra às vanguardas uo século XX. que ddendem o constantc prnduzir cio novo como Ulll valor. Outra palavra quase sinllllim;1 das du,ls ;lIllL'riorcs é a p,lIana produç;)o do texto liler;íri(l." 1:,,;\ é uma pal;I\'1a materialista. Fm ccollollli;l. IJ/'IIdll('cllI é ;1 <:ri;u,:;)o de bens e de serviços C<lP;lICS de suprir as Ilccessitl:ides m;llc.ri;lis do homcm. Produção implica quantidadc de o\ljC!OS c wlclivielade de produtores e consumidores. Não telll, portanto, qualquer é ainda mais tern:na do que a p,1I;I\'1'a illconotação sobrenatural: vCJlçiio. E, das três p,llavras "qui apreselll<ld,IS COIllO p()ssí\Tis. l; <I que se liga ele nH)do mais homo!!êne(1 COIll a palavra (C.rlO, COIllpreendido este como objeto nl<ltcri;d l' COIIClC[O. Inserido IllIlll processo de produç;10. o lc.\!o fica cquil';lr,ldo ,I um produto dI) mundo industrial. como um guarda-chuva ou uma m,íquinil dc costura. "A marcadamcnte pmdllçiio. Outras duas palanas poderi;lm ainda substituir. lH:sse universo vocabular. ,IS três anteriores: scri;lIn as pal,lvr;ls rt'{JU',I'('II(({(:C;Ol' expresstlIJ. Mas. para uS<Í-las. dcvcríamos rclirar ,I 1,;1I,IH<I (CX(O e deixar ,lpenas ";] representaç:io liter;:ri;l" ou "a cxpress;lo lill'r,íria", E esse fato ilOS mostra que j<Í eSI;lIlIO$ (:1\1outras C<lte,l!ori;ls discursivas e enl outr,lS \'isadas ll'(íric;ls. {Ii{ .lo de conjunto.\mbas as palavTas estão atualmente postas sob suspeita. pelo contrário.literária alual. com sua personalidade e seus afetos. paradoxalde chegar a uma vis.I conla: "Em quc arrematar século e em qlle IlIgl/r me fizestes nélscer!". Supõe uma visão do real e uma determinada imitação que. impedindo-nos éa maior complexidade de dados de quc dis- nossa capacidade lIe conhecer c. S.~. Expressão pertence ao vocabulário da psicologia e foi valorizada pelo romantismo tardio. - 102 \_. lIesde as amcaças de guerra nuclear até os problemas gritantes de nossa realidadc brasileira.. A literatura. Osrnan Lins essa citação de Policlrpo/Flauberl.. felizmente.._----~. . A literatura parte d~l)}. pensa-se logo (concordando) no mundo atual.\~»)... ~) . algo de preexistente. A primeira falta é experimentada por todos. desde lO3 () mun-.. a primazia do sentido sobre o dito.\.SLd~s g.9!L~retende dizer.1 rcspcito de .!. ela própria ef!l seguida com falta. \h -. mesmo sendo uma transformação. um (no caso da exmundo (no caso da representação). um indivíduo pressão). inventar ou produzir um objeto que seja auto-suficiente ou. com as qUals se tenta captar o fazer lIterárIO. Esse descontenlamento plimiíril1 que nos traz o estar no l11undo só faz acentuar-se pela vida . entretanto. criar. A literatura * nasce de uma dupla fa!t<l: uma falIa sentida mundo._--" _.IO modos de reagir à insatisfação que o mundo nos causa: pela religião. dizendo . ou de quc seu corpo mio está em permamellle bem-estar. como ele o desejaria.?s- t:rl/as.c.~?'PJe~Jiio-:--q u ai q uc ~'~~sKU2~I~~'~rjã produçã(?2. aquelas . falha sempre ao-JízTiu--:-iiúls--âüTiliwr lIiz outra cOlSã. mais confortadoras para o homem.-er.u~ce_ill. \)\)J .d~uL. no mundo no senlid.•. . -~ .f\~G\\ . na existência. como a todos.lo social. pode ser por nós agora retomada. tvlas "~'o seria ilusório pensar um real insatisfatório. aumentando mente.':. Q.lva essas palavras como suas. e já houve em doses. que dizia: "tvleu Deus.'1 Quando digo qúe o mtindo não é satisfalório.\0 nascermos. O mundo em que vivenlos. eu comcntci O escritor com bra- sileiro concordou C()~llela. élcrcsccntando por SU. porque a filosofia contempor<1nea duvida da possibilillade de se captar o mundo como uma totalidade representável e a lingüística questiona a anterioridade da idéia à palavra. continua existindo. tem o mundo como ponto lIe partilla. O que há. mais desconfiada dc scus pressupostos filosóficos e mais cética a respeito de suas possibilid<ldes "científicas".ilU]l ~)~nUõ'maIsr~alllo que . . que privilegia. "a E agora.. FSS.i~x~o. Dezessete séculos mais ta rde. de modo forçosamente sumário. apesar de não acreditarmos mais na possibilidade de a linguagem representar ou expressar um real prévio.\j. Cem anos lIepois. que é característica de um certo mal-estar da teoria. Nos dias e meses seguintes o bebê percebe (reclamando) o hlo de que a m.lm as espLCU" lações racionais sobre como as coisas deveriam ser c n.IO.lç:io a que se chega bem cedo.. que se pretende suprir pela linguagem. o sujeito emissor..m: "Coube-lhe. que chamamos real. invenção. medida que à simples sensação da falta sc acrcseen[.di~·di.-- o '_. que nos c<lbe o doloroso privilégio de vivcr Todos os momentos da história do homelll foram vividos como insatisfal<Írios ou mcsmo insuporl<íl'eis.f.-<~j··· . maus tcmpos p. não é satisfatôrio.lIora.\:' l-.i el'idellciam a falta do conforto 1I0 útero materno._ rep'!:esen- JiPJ~iilli!. ~~5~~ .ql'ieJe qa-eprete. como ficamos? O que faz o escritor? Cria? Inventa? Produz? Representa? Exprime? A respeito de cada um desses verbos manifestei urna margem de reserV<l.l 0 uma conslal. no ato de escrever. Esse mal-estar terminológico não deve.. E essa foi minha intenção ao examiná-Ias aqui.l físico a . reexaminadas e exploradas. aceitando os desígnios da providência c remctendo do sem falhas para o além-morte: pela aç. Representação é a palavra mais antiga em nossa teoria literária. em que século me lileslL's nascer!". Flaubert gostava de lembrar S<lO Policarpo. As palavras lIevcl11 ser revisitadas. diferentemente das três palavras previamente sugeridas. o escri lor Ira ncês rc lom.. O que torna o real de nosso momento histórico mais agullamente insatisfatório pomos. . um rwírtir do século 11 de nossa era. contanto que explicitel110s o modo como as estamos retomando.lra l'i\Tr". reabsorvido e utilizado pelo real concreto. Podemos com 130rges em sua fina ironia."ÕeSVen---. o primeiro esforço para respirar e o choro emitido cm Cllnseqii0ncia j.. remetem para algo anterior ao texto. na teoria literária. /.} ~() - . pouco propensa às definições categóricas e totalizantes.IO S. é a mimese de Aristóteles.je 11. desencorajar-nos. elas nos ajudam na aproximação 1I0 saber que buscamos na medida mcsma em que conhecemos seus pressupostos e seus limites.~ -J. o rilllndo em qUL' tropeçamos diariamente.._. y Por que fica impróprio "a representação do texto literário" ou expressão do texto literáriÇ>"? Porque representação e expressão.:.10 está sempre presente. Mas aí chcgamos ao grande p'lrado..lIlos.I. a (lrdcn. . ele d. No cntanto. e p(xlemos f<l7:~-lo'quando Fernando Pess'o1: "/\ literatUJ:.~~· pessoas nunca contam o Illcsmo fal.t ceptível e generalizado até o insuporlúvel.lgem tem uma funçiio rdercnciaJ c uma prclenstlO ."J.~i.í criando..li I'ielmenle. _que se apli- no rcal: pcla imaginação.•• _ ..(..l é l..í . Narr<lr uma histúria. num vasto cam a fazer pequenos projeto consertos político até as isoladas. .H1SOl.. . Us signos verbais s<1o substitutos das coisas. ü primeinL visla. :.inguio de quc eles si'io cllcar'ldos.~_r~os compensa~ po~_alg. Nãu nos importa. - - \ 1-·· ' - pcrdc-Ias.._ ~.\o quc funda o fazer lilcr<Írio.o da mesnlil forma: a simples cscolha dos pnrmclllires.-:. (udo isso l'Iia a possibilidade dc mil e uma hislúrias.rcspondência: c~)isa ser..10 c de compensar o que falta no mundo.~í~lcL~~Ea':" Essa ~~" é qll'e pode Cllmpensar a falta.a infelicidade não pelo que ela cria ou representa..lI.1 falIa por um sistcma quc funciona em falta. ein-'(jlIé'sC. Cllnfiss.~Õnl~) dc-conta. Ela emprcende dIzer as " \:I 7'.lI concreto. algo quc f._'lL!.. ela estéí sempre dizendo " -- . gênese e na sua realizaçüo.' ')-' .~~.••• nós.l. mas por scu modo dc ser.scu uso rcpousa numa nler. PCllJ tem:l.'-ll-'a-~-(~-_~~~~-.í <I "rcal".I ~ pará'o 'ue c. quc nos cerca? E daqueles poemas que manifcstam urna dor ou um pavor ainda maiores do que os quotidianamente nos assaltam? E csse é o modo de ser histórico da literatura '\l ! j ração causada pela falta. Entrcl'lnl(). " !__ : - --- =. completas.gatlvas Te-se . indire. das quais Ilcnhum. mais prazeroso do que o mundo real.. Tentar dar uma forma concrcla ao imaginado é.• '.s n'esse lÍitimo rccurso... . /\ linguagcm ni'io podc subslituir o Illundo. t\""m'Mi- imaginaç. A felicidadc n.. ncssàs-í.a sc./ As obras estão aí para desmenti-Io.. A literatura cmpreendc suprir. . Trágica ou epifânica.l:..1 sl'r. /\Iguns. /\ isso voitnremos mais adianlc.10 . a quc aqui nos ocupa é a co~lp()r'inca'. :~ . ~ Escrever um poem. é cxcrciUdct jj(JI' todós os st:res hum.ls dc rcclamar da l'all. represcntaliv. positivamentc.ldcquado ao rc. Na sua . algo que.1 no rcal._.imbcm. integradas I' . Ill_esnll'.lç.lr as lacullas . •. ou como deveriam scr. como desvincul"das ratura nasce da inrclicidade.-sempre • .lIla\'.. na hisl(íria.1 forma. negativa ou positiva. por enquanto.represcnlad. A literatura seria cntão aquele famoso "sorriso da sociedade".IS Lihulas podem parcdo rcal. dIstanCIa-bis c alc Illcsmo anulá-Ias.ivl'i fal~l~1no real. ljue ( . nl'nhum d()s d(jis es'crevcu ul11a obra que se possa C<lracterizar conlll uma fuga para um Illundo mais alegrc do que o rc'll..' coisas como são. as falhas do real kvar-nos-ia a uma vis<1o idílica da literatura: supor quc todas as n. o IllUllLio l'Ii"Lil! pcl<l linguagcm nuncl esl<Í tolalmcntc .sl~~I. como prêmio de pn!~er.'i !!/"• . se o objeto produzido realiza ou n<1o o objctivo de substituir um real insatisfatôrio. l'mle apenas cv(icá~li). o q uc devcria sc r e não é . elesse em que vivcmos s. A I fatôrio. encontrar um mundo preferível àquele em que vivemos: el11 certos poemas podemos Clll.:ontrar os dados do rcal harmonizados dc modo mais satis- l11alS claramente ii~ a partir da . Na mônada do pocma. COI11 a ajuda da imaginação. \ A lingu. .~.un~ ~l~f!1<::IJtos~ºá iiisütisfaçiio causada peiõrc~t1.llTati\'as e todos os poemas apresentam um mundo mais belo.1u horrível que st'> seyod~ IO.no mundo ~em __.nnda ~ão os escritores quc defincm a literatura "A vida é 1..dcsprczando outros: l'cl. eventlwlmente.c cor. pelo faz- evitan~lo-a. '". 2 rea!JwQ. ". faltantes.~ --'-~--\. 011la-.í t<1o insatisfatório. o valor dessc razer.1.?up(~rt<í-Ia de que a vida não basta".í faltando.. a rcconstrução histórias in\'cnladas podemos. <l1~(l dl! rc..10 cntre_ C! .10 duas mancir. __falta.•••. o da imaginaçãà. ncm ao mcnos represenl<í-Io .rte:-Cllma CiUal e queC~~Ji?Xljj~~ã'"filt'(jlI.•' . de qualquer modo.l ..por tal aludir si~no. isto é. tamentc. Sempre cslar.. Esse é o modo artístico de exercer a imaginaç. E !3(lI'ges) l'llj.lITados. q 1~1~'U:. Ill<lgnlilcar um llU v. Áccntuar o quc estú mal.. j. rcvel<l.locxi 'e nada.-'~:~~-J.Irirm<t: "A litecer.. transfo'lli'í7í.. -.--~~-'''"''-.ll)"I7çúÜ:Y]íiÚ""h~_J2U.i1. a AS_/' através ele um pacto que implica a perda do rc...S-)_ -Ura.10 como fuga ou compcnsaç<1o.!. ' " Det~nhiliiló:il'l. e o escritor uma incorrigívd Poliana ou UIlI inofensivo sonhador.~onl e o SCIltido". eriirelanto.lI: c 1ll1lil. . a literatura a. 1\las dizer que a ohra liteníria compensa assim.~-:..IS vezcs se cs(ar.uma illlpcrdo. ao se produzir na hislúria.:rcm n. do mundo pelas palavras. dIZer as cOisas e 'aceitar COE=~e:r~ a IIlSatls- se vive mundo loda . criar harmonias de f som c de sentido que n<1ose percehclll na linguagem correnle: instaurar o que Valéry define COIllO a "hcsilaç. Uu mclllllr. uma atividadc dc tipo artístico. rilmar as palavras como um convitc a rilmar o mundo. Invcntar um outro Illllildo mais plenl! ou e\'illenci.1 cOJl\'cnção sIm. Que dizer daquelas narrativas que nos mostram Urll mundo ainda mais terrível do que esse. em falso: cssc sisiCnia é <l lingu'lgclll. o mundo fica momentancamcilic 1 10·1 Ç) -'- da arlc". inscrcvem-se em objetos expostos à perccpção de outras pessoas.lo dos fatos e o .. isto é. 'Nas literária. exteriorizam sua imaginação.írius aspectos dl! 1'C.. na histlÍria. torná-Io per.. . Inúmeros faltaJFlaubcrlf. De todas as prMicas de que podcmos valer-nos para refazer o rcal..~ é ainda sugerir. . aquele quc sabe que seu caminho é o indireto. {{V . . a obra literária dcmonstra que o hOlllcm é capaz de unl<l harmonia maior. Teriafiaade do Iscurso-maso aõ"mesrno f'enipo.'~~..~ ~_ •.o~ ---_ . aparentemente realIsta: ~uando se m=rgulh.. que consiste em colocar as r'alanas cm determinada ordem.5?. ._~I. A..:.rp'or -ii'ii~~giress.<"''''''. Escrever é o modo de qucm tem a palavra como iSC1:a )ala ._.:._ •.:~~~!~j~!l~!!.!lt. só alcança a verdade através de uma técnica.valõ.ls coisas. pela linguagcm. Em nossa civilização.\.-n7t-'cxriõr..Ias. a literatura nunca pode ser realista.ua que -~ . ~ . o mito é a história verdadeira ror excelência.~_~_s.f. Muito diverso de um devaneio fantasioso. ou o poema e são suas linhas de força invisíveis...-.ação'efirrí ~~-. po."-.~~~. .1 é a dcsordem c a falta.~~.' tifício e de ilusão.~11ge~.m._ _ __ •• _'_.-oTõril1a seexerce "em-iodos oÇ'níveis da obra . Para se pensar essa relação da literatura com a verdade.".rcid. mundo é de~ejável e possível. '" veruades . fl't•.'--'. "'.o.i!-'(er(~~:~~l~J}~o Saber que o escritor só atinge o "dcveras" como um "fingidor" (Fernando Pessoa).' }'.• não >. são os relatos do quotidiano que são chamados de "históri<JS falsas'o.-_ Só poJ'êser-.0 ~~s._ _.. men-' são dois modos diferentes de buscá-l<í.u.:'dl : ).{(nº~) ahre ..oY_9~. assume decididamente seu estatuto de ar- .ão na ágUa.''''''.~12~aJeorclenaç~:?~?... Para os povos primitivos.~~larZJi'ma nau e um mero obJclO ornameHtal.~.. Dizia Clarice Lis[Jector: 1. ·~)\-tnra5aITll)uã. O chamado realismo nada mais f é do que um conjunto de efeitos.--.""'''' no ••real.!.ls éOrl~(aç()~s.~~ . .CritZ.ág.o verd..lde o n:al se dá a ver.) j . por ser linguagem.r'C'õiíl~undo I~.. a captação do particular insinuando que uma plenitude do . E " ) por esse art1llcl0 da_toj'IDa que a literatura atinge uma verdade do ".. ~ ~ morder -...•. ._.lção alienante do real.'}~ 106 - .~~e_(: n~.ítica do mundo real" (Sorges). 'colher.1 tomou oMais tirosa.:. ao contrário.~I<Í. contra[JoSta ú "desordem asi."... vale a pena lembrar os vari.riveis sentidos da palavra miro.•__rara que ele volte a -----.---~'. l1]as Ulll objillLQ. __ - •• _ •• - __ . O compromisso do CSCril(..~~.Um.lo positiva.. I'ois. Clllnprclll uma funç. justa.':!.~. quando esse Illullllo é se Ulll [Joderoso que accil<ív.:. .devcria eslar. Já dizia Words\Vorth: "A [Joesia é 'lm11\:. .. ··'iteníria.• ~._ dia-se com aliVIO Jogar a palavra lora. em muitos desses [JOvos. o quc falta no mundo e aquilo que ncle.0~:. ao a isca. Daí a importância da forma e sua relação com a verdade.': ~C_~l rdLi~)~. é ter consciência da gravidade de seu ofício: um fazer que {) .•..I cl1lrclinh.\\11OS COIllOreal..]'JJStz. o mito é um sistema simbólico rigorosamente formalizado.p. í !J. inventar edaquele arresenLHr (1 illl'xistl'nte é só apaj 107 ..-c'..t~'i<~has]2' ~.~.~~~. Jalavra.- . quando possuem essa i'orça da forma.. ao rneslllo lempo. ele outro invenlado erg._••'_'. nõ arranjo )LIsta' as'rcfêrg-nci. Nietzsche dizia: "Todas . se qUIsermos que ' ele pareça reto. O hurizonte da literatura é sempre o real que se pretende representar-em sua dolorosa condiç.)' ~ssa obriga •. até o lavor minu~Ti..~ •••.__que ••.!ll] ad ãj)7lra 1~~irrCo'§là-~r. mito ll~~~ uma ce.~ -realmente era. Céline assim explicava f sua experiência.''-.•• .. _ _. - .in~disp~nsá- I ~~!J}5!JJ... n<llitera~n...an Q~.'::-Qualq uer linguagem dCfo)-niii-ã"SColsas:'e a ling~prénaaocscritor.~~: () que se COrl(lffm'f.. baseados el11 convenções que t variam historicamente.l.11 ccssa a analogia: a nao.ue com arival perturbadora celtoa quc lhe dü a for\11a Por lado.~~-.__ ~_~_ •. para dar verdade. Os artifícios do escritor revelam.•••a~ entortar _ o real.-" •.-'.~~~~~SI.0'" 'QP.1.•.a In<. __ ...r~~t~r .~q.1 articulação._.ílic.aso do estilo..~ --1~'1i\lhtt~ laz:~_u. do que vai mal no mundo. ."-''~:'': . Contrariamente ao quc pensam os que têm uma concepção meramente instrulllental da linguagem~ a fonnQiizQÇào ejorativamcnte chamada de artifício).s. 0l)g_~~h. A simples denúncia.~~_<9iec li} -e~~ç~ií~~~iz~1:!Fiaube'iJ 'd~ia que nunc'a cõ fundo que escandaliza mas a formü:"-""':-:-::-:-:. lemos de quebr.. se vêem ~-..h!.~ um bast.. pesando como numa balança os sons c os ritmos. verdade.-cz quc SCPL'SCOU .... FeI.\ .ís o caso dc t(ld(l~!I_ ~ rentemente uma .( cifrado..-\ ••.JL. ( ..nc'(.o~_.~ 6:11í"ê.r:)r 'li.S q~l_c 'obri am a reformular o'prórrio real.!--ilguçada que.r..'/íiigüilgcj. L!~lr5)Elll~~.~~':.é~i~j~ . Mas.~~:..S. . O modo literária de buscar a verdade continua sendo o modo simbólico do mito.r-... desde as grandes estruturas.~i.'. .is'. que sustentam a narrativa .~""" ". incorporou-a.ária. na literatura.vistas.í-lo antes de mergulhá-Io na água..-.-i~!.. é a IlIlguagem li~!.e t ~. a forma do sentido.j: nqucl~-(íue ~onhecc c aceita esse pcrcurso enviesado do real às palavras e das palavras ao real.' " •.~_~ __ .IS cois<ts hoas siio fortes estimulantes em favor da vida: é a!i.•..~:.-misso com a forma: é o que Roland Barthes chamou de "responsabilidade da forma". não tem a eficácia conscguida pelo trabalho da forma na literatura.daportanto. a ulho I . ( rC~.'~I:.1.!. sentido do que de coisa duas [Juramente concepções imaginária diferentes e.-~t cando o quc niio é pal'1\'fa.. A forma buscada pelo escri. ele parcce torto pelo deito da rclraçao: entao.lç~o-d...1 força de SU.lo de falta ou reapresentar numa proposta alternativa de cOlllplelude. ser Q.t9r'é"'não apenas essa forma sensívcl íiãõíã: ..":.l. Mesmo as obras cuja tern..• ~_:. <5ampliar piiIj dizêJg. •. c a gente reconhece" ( A criaçüo liter<Íria é um processo que tem dois p.lo c Representnr bem O comum de autoresassim. também Aleilara nüo pode ler a prelensão de ser sober. Pretendendo subslituir o real ou. aliás. f. nunca se efetuam tol<J1lllcnte na liter:llur:1. 0.ff >"lf de imprimir . a literatura IlllI 1 C:l cst.í-Io e a ITin\'cnt:í-lo.ou II tr:Jnsforma".. . 'mas tamb<5m o funda .! Cega com outra luz a luz do din. a question..ldo I)elo imagin:írio. É o que diz Miguel Torga.í-lo.a~. sãoa proposta pli'a ato e asdeintenções cio autor superadas..•. a obra liter:íria é construç. n<lo S. emadminíveis versos: "Canta. representado.. o escritor é o deseneadendor.expectativas ocorrem coisas há um saber inconsciente circulando na linguagem.l(ks do re. inicial Entre se oam-l di- Não é ofício do poeta narrar o que aconteceu.-nesse sentido que a htemtura pode ser e c rcvoluclOnana: por . objdos se nsÍ\'l:is e ..s~Ívél~m'a~' co- (por melhores que sejam). canta!! Violenta o silêncio conformado. O que a literatura pode.. - J o poética. em sua teorra da_ representação não a veracidade mas a verossimilhança: "/.... n obra aquele impulso poderoso e aquela ahcrtura estimulante que convide o leitor a prosseguir sua criação.írio.em n.. () nHÍliTer'V'íva aú(opià: nãõ' cônio 'o irrí~lgini{rio"<illlP.! Desnssossega o mundo sossegado. Tanto a fuga CllnlO o mergulho· obrigam-nos aTcr esse rcal. ou scu oposto.1/._--.-formar·se C(. o real é apenas C'IOS. como certo romantismo remancscentc quer fazer crer. pelo contnírio. Paulo.J1 que n. entrede oum escrever ler. nossa com· " j ao mesmo tempo. . que o ullrapassa. que lhe foi moslrndo.. scmpre a ele que a literatura se refere. mas em levantar.IO as intcnçCles o que poderia ter acontecido é sugerir .~~do:e.. Fora da ordem da lingua~em.J1. Assim. ·l-'-!(. em si. pois as duas atitudes têm o real como hori/onle e a ling. ° o que autor r. Comentando um filme sobre o garimpo. "a palaHa não S(l diz o mundo. §e do ue nunca existiu". ofício que deve ser tão ali'vo quanto o do escritor.lJ:1S é também possibilidade de fund:í-Io.111() mUlldo e suas histlÍrias.. 11\1C:lminl1o do real.! Ensina a cada alma a sua rebeldia". defendia No recriação primitivas da obra pela leitura.m'ls _. como o inelut.~~~r"e. não considerar o real . sim.[e~êàrlJoSS-íbliLd·. mas caplurar.serporquc nela estão ins-{ gadas .. por suas reordenações e invenções.í afaslada do rc. tamb<5m não age diretamente sobre ele.. enquanto recriada pela leitura. ".\ IU~:J do re.s é .\"): )'i. sobre o determinismo da histlÍria. alribuindo-Ihe valores que. de sensihilidade e dc in.ile~Er. mas não o dono bsoiuto. ~9JS~12!i~. Todavi. o de representar o que podia acontecer. \'erd.ólos:..0"-'-- o ". Lembrm::::~e do que nuncn existiu é não 'cOl'.alfZã'd. ~:::. 108 que se opera cm nossa mente como em nosso corpo...  obra literária só cXlste. Como lembra Oct:l\'jo 1'. ~~ ser -. cri tas ciquela~ linhas subjetividade de força quc do podem moduladas c prolon.IO é scr C:lplur.J do .l e da filosofia: é uma inteligC'ncia scnsí\'el.•. por um processo que consiste em destruÍ-lo e reconstrUÍ-Ia.. Assim COlllO a literaturn não representa fielmente o real.não ".1 tê-Io. pr~eal.. l'Slll'lh. a genle já conhece: mas no filme ludo transpareee (U Estado de S. ao ( é afirmar que as coisas poderiam ter sido outras. Ainda Flaubert: "S~. Trabalh:lr o imagilHírio pela lingu:g!.lo seu ultrapassamento. o realismo. ele não lemo Como loJa arte "representativa". poderão ser outras.~-..uagem como mediação. A função revolucionária da literatura não consiste em emitir mensagens revolucionárias. venção. assim como o leilor o autor nüo é o dono absoluto da obra. que emissor e eo as de ummaiores receptor:do zer eos propósitos ouvir. e faz. uma dúvida radical sobre a fatalidade do real.'. quer dizer. eslerilor c o Ieilor.( de mnio de IlJ7K). . . mensageiras e sim sua cap:lcidadc ) .. o que é possível segundo a verossimilhança e a necessidade... A grande obra não pode ser lida de qualquer maneira.•. 1M <5 o . Essa comprecnsão permitida pela obra !ileníria é diversa da compreensão racional. um velho garimrciro observou: "Tudo o que está lá.110 meSnlll sel)suais..~ di Ia.(.:2·~s' fcil'lis nüo par.-t'iXricc~Lispector observava: "Escrever é tnntas vS?~~~r. é. do rcal e convite reiler:Hlo ao Assim.0~.llravés uo illlagin.-. .\) T1TGõ~lsna-gíiiáverpósSível..1. bel-prazer da pura leilor. Nesse processo. . instiluiç. mas nao anuladas.A falta p(~de.ívet. / <5um aprendizado de alenç:lo.J1. poeta.-.-_.Já Arist6teles.lo se dão a ver fora de uma ordem silllb<ilica. mas SÜO. e leitores. pelo podcr de uma linguagem e111que as palavras eVOC:lI11ohjetos. visada pelos discursos instrumcntais da eiênci. e sim uma vis:lo valorativa do mundo em que vivcmos. de falo (' IIldeflnlda\mente. Na circulação entre a proposta que é a ohra e sua recepção pe'lo leitor cria-se não propriamcnle um mundo paralelo. que importa.lIlO em sua leilur:l. A linguagem é obsuículo. pode dar._. O mundo deixa a desejar. O que ela .'. Essa compJetude. insistente e plenamente.[ IS184] i J r ~..Como todas as atividades humanas (a partir da própria fala). isso sim. ali-teratura nasce da vivência da falta e da aspiraçãc à completud:e. as palavras estão sempre em falta: a literatura o diz. mas Ullla verdade corporificada e em obra. a literatura não nos pode dar.I _ ~ •.' nos . 110 . Cls inúmeros saberes carreados pela literatura são meros pretextos para um saber maior: o saber lia falta.. é uma forma de conhecimento que satisfaz: não )uma verdade abstrata e dada.·. e a permanente manute nçào do desejo de supri-Ia. Documents Similar To PERRONE-MOISÉS, Leyla. a Criação Do Texto Literário. in Flores Da Escrivaninha. 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