ORTIZ, Renato - Mundialização e cultura - FICHAMENTO

March 24, 2018 | Author: Vólmír Pereira | Category: Globalization, Geography, Economics, Capitalism, Anthropology


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MUNDIALIZAÇÃO E CULTURAORTIZ, Renato. Mundialização e cultura. 3ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. Fichamento Equipe: Gustavo Delfino, José Cavalcanti, Mariana Borges, Rômulo Alcoforado, Thiago Vasconcelos e Yuri de Lira. Capítulo I – Cultura e Sociedade Global Segundo Renato Ortiz, as pessoas que escrevem sobre “mundialização” são, geralmente, otimistas quanto ao futuro ou ligadas a certos interesses (de países, multinacionais, etc.). O uso de metáforas permeia essa literatura por conta de o tema estar ainda fora do alcance das Ciências Sociais. A Economia seria aquela que mais teria subsídios acerca dessa nova realidade. Os economistas, por sinal, estabelecem uma importante distinção entre “mundialização” e “globalização”. O primeiro conceito está relacionado ao aumento das atividades econômicas no tocante à extensão geográfica, o que já existe há algum tempo na história. Já o outro é uma prática mais complexa, voltada, estreitamente, ao mercado e às estratégias mundiais – que trabalham como mosaicos de peças interdependentes, porém, concomitantemente, interligadas. Ainda de acordo com o autor, a cultura mundializada corresponde às mudanças estruturais dentro da sociedade – que, inclusive, não são feitas imediatamente. Essa tipo de cultura também não causaria uma homogenização social, tampouco acabaria com as outras manifestações. Pelo contrário. Ela se muniria delas. (cap I. Cultura e sociedade global) Já não seria mais a produção em massa que orientaria a estratégia comercial das grandes empresas, mas a exploração de mercados segmentados (customized productos).” (p. 14) A sociedade global seria um “macrocosmo dos macrocosmos sociais”.. O mesmo pode ser dito quando falamos da multinacionalização de empresas nacionais que operam em escala internacional. 15) A demonstração da hipótese. em especial. implicando um certo grau de integração funcional entre as atividades econômicas dispersas. distribuição e consumo de bens e de serviços organizados a partir de uma estratégia mundial. Esta última diferencia-se da primeira porque “se aplica à produção.). A construção do quadro da globalização.. evidentemente não estamos diante de um fato original. Os impérios (Roma.Se entendermos por globalização da tecnologia e da economia a internacionalização das trocas. A observação crítica quanto às ciências sociais contemporâneas e. O pensamento hesita em conferir um estatuto científico a essa entidade que deveria ser considerada como uma espécie de “mega -sociedade “. a antropologia. 15) Internacionalização se refere simplesmente ao aumento da extensão geográfica das atividades econômicos através das fronteiras nacionais. Gurvith considera assim diversos tipos de sociedades globais: a nação. China. As diferenças sutis entre internacionalização – “o aumento da extensão geográfica das atividades econômicas” – e globalização. 17) . Por isso as economias começam a estabelecer uma distinção entre internacionalização e globalização. um processo ainda em construção [. (p.] se choca com boa parte da tradição intelectual existente” (pp. A história da lanchonete McDonalds e até o invento do microcomputador utilizado para mostrar a ruptura dos marcos espaciais que caracterizaram o período pré-sociedade-mundo.15 -21). de produtos e de conhecimento. e as civilizações (Islão). etc. e complexa. Sendo a globalização “um fenômeno emergente. possuindo uma originalidade e uma vida própria. Ela é uma forma mais avançada. da internacionalização. e voltados para um mercado mundial”.” (p. isso não é um fenômeno novo. modificando as relações políticas. econômicas e culturais entre as partes que a constituem” (pp. A globalização da atividade econômica é qualitativamente diferente.16-17).” (p. (p. Extremo Oriente. Herder. reduzida antes às sociedades nacionais. composto por elementos interligados. 20) Cada “povo” é uma entidade.] dimensão pluralista [que] permanece e permeia toda a tradição antropológica” (p. Decifradores de uma linguagem oculta.Seu livro O mundo atual: história e civilizações nos apresenta a Terra como um conjunto de civilizações geograficamente dispersas: Islão. Essa nova maneira de pensar será completamente oposta ao iluminismo universalista. Cada espaço é marcado por valores particulares e por uma mentalidade coletiva modal. vai considerá-la como a “totalidade de um modo de vida”. os antropólogos se vêem como estudiosos das . a ideia de uma soberania absoluta dos governos é. 20). (p. Tudo se passa como se cada “cultura” tivesse um núcleo específico. Coerente com suas premissas. em tamanho e complexidade. A extensão territorial. cujos interesses atravessam as linhas nacionais. uma aproximação da verdade”. 17) O que Parsons em princípio reconhece: “Da mesma maneira que existem grupos internos. uma somatória de identidades particulares. 18) A elaboração de uma Sociologia abrangendo o globo terrestre. A herança intelectual tende a ressaltar aspectos específicos de cada cultura. um “mundo” diverso dos outros. pode assim se prolongar no interior de um espaço mais amplo. na melhor das hipóteses. o raciocínio do autor caminha no sentido de explicitar a existência de alguns elementos normativos de caráter internacional. mas independentes um dos outros. continente negro. o “espírito de um povo. 18) O processo de ocidentalização não conheceria fronteiras. (p. que inaugura uma maneira de pensar. pois uma civilização é uma continuidade no tempo da larga duração. (p. nacionais. 19) Herder. etc. (p. América. permanecendo intacto até hoje.. enfoque antôgonico à visão abrangente do iluminismo [. Europa.. já que a “cultura existiria apenas no plural. O mundo seja um mosaico. O mundo torna-se um “superestima” englobando outros “sistemas” menores. o romântico alemão que “inaugura uma maneira de pensar” que permitirá compreender a humanidade como um conjunto. a conseqüência de nossas tentativas. Isso significa que a história cultural das sociedades capitalistas não se confunde com as estruturas permanentes do capitalismo. em nos relacionarmos com as contradições. inglês. (p. 22) Hábitos alimentares. (p. Como observa Claude Truchot. A categoria cultura lhes permite das conta desta pluralidade dos modos de vida e de pensamento. pelo menos numa primeira fase evolutiva. (p. Um exemplo: A língua… Kautsky lembrava que o desenvolvimento das relações mundiais impunha cada vez mais a necessidade de uma língua unitária… O mundo caminharia assim. Como base econômica constitui a unidade privilegiada de análise. ela coabita e se alimenta delas. na . 27) Para existir enquanto língua mundial o inglês deve se nativizar. enfim. e a complexidade da realidade sócio-política desse sistema particular. francês. para a seleção de algumas línguas universais (árabe. os costumes fazem um contrapeso à modalidade mercantil. portanto. mas apenas esses usos. 31) Uma sociedade é um conjunto de subgrupos cujos modos particulares se distinguem no interior de um modelo comum. o inglês se caracteriza pela sua transversalidade. Mas em nenhum momento. as manifestações políticas e culturais surgem como seu reflexo imediato. confinada ao domínio das trocas internacionais. 26) Uma cultura mundializada não implica o aniquilamento das outras manifestações culturais. Ele “engloba todos os usos de caráter extranacional. crenças. 21) A história do sistema mundial se confunde inteiramente com a evolução do capitalismo. maneiras de se vestir. de maneira imediata. adaptando-se aos padrões das culturas particulares. (p. 24) Cultura é o sistema-ideia desta economia capitalista mundial.diferenças. espanhol e russo) cobrindo determinadas áreas geográficas.(p. coletivas e histórias. (p. (p. 28) Uma cultura mundializada corresponde a uma civilização cuja territorialidade se globalizou. A correlação entre cultura e economia não se faz. ele atua no interior de um “espaço transglóssico” no qual outras expressões lingüísticas se manifestam. as ambigüidades. a idéia de integração. a imprensa e . 33) A explicação para o termo “a linha de meu raciocínio”. significando com isso uma homogeneização dos costumes. uma crítica à antropologia. novamente. é. Capítulo II – Advento de uma civilização Economias interdependentes entre si começaram a se tornar uma só no inicio do século XV. meados do século XIX. definem a “especificid ade da época que atravessamos” (p. (p. Para isso. “a divisão de trabalho e a pluralidade funcional dos papeis requer de seus membros uma maior mobilidade. (p. de progresso e mundialidade) passa a ser concebido pelos cidadãos em uma “consciência coletiva”. Japão e dos países do Islã.análise das sociedades primitivas. todavia. enquanto um ideal comum (de nação. 67). As Grandes Navegações aceleraram o processo. Entretanto. ainda que a uma economia internacionalizada começasse a florescer. modernidade e. 49) “Modernidade radicalizada”. fala-se de “estandardização” da cultura (não faria sentido descrever a vida dos aborígenes das ilhas de Trobriand utilizando a categoria padronização). A escola. ou seja. É apenas na discussão das sociedades modernas que pattern se identifica a standard. eram predominantes as “economias mundo”. Para o autor. basicamente. “os antropólogos se vêem como estudiosos das diferenças” (p. após esse processo. uma nova organização social é estabelecida no século XIX. Vale salientar que só recentemente. ou “alta modernidade”. Até o final dos anos de 1800. símbolos nacionais foram criados e uma língua única teria que predominar. A coerção administrativa do poder do Estado é deixada de lado. uma capacidade de se adaptar às diferentes ocupações que possam exercer”. Assim. que se estabeleceu uma economia global única. época do desenvolvimento do capitalismo. o mundo pré-Revolução Industrial conserva a pluralidade e a autonomia dos povos. era prematuro tratar isso como “globalização”. 32) Uma civilização promove um padrão cultural sem com isso implicar a uniformização de todos. especialmente a um dos seus fundadores: Marcel Mauss. À época. Crescendo em um círculo de trocas que envolvia determ inada área geográfica. ela teria um centro que se estendia até os limites de sua influência – a exemplo da China. O que se encontrava fora do círculo central é assimilado à barbárie. (p. em escala ampliada. do que é controlado material e simbolicamente pelos homens. tratava-se de instituições com funções e origens distintas. em seguida.(p. um produto do Ocidente. 39) Como afirma Carlo Cipolla. promove seus valores universais. (p. (p. uma economia-mundo evoluiria no interior de um círculo de trocas envolvendo uma área geográfica delimitada.os meios de transporte tiveram importante participação nesse processo junto ao surgimento da modernidade entendida como organização social – potencializada. (p. independentes entre si. tornam-se uma só? A resposta. pelas técnicas informatizadas. a luz brilha apenas no domínio do conhecido. mas não sua exploração. alguns autores procuram no desenvolvimento do capitalismo entre os séculos XV e XVIII. (cap II. continuou confiando principalmente nas plantas. animais e outros homens (…) foi limitado. que até a Revolução Industrial o homem. espaços impermeáveis aos valores modais desta cultura. sem medo de se equivocar. Vinha primeiro a China. em seguida os países achinesados (Japão e Coréia). depois os povos longínquos. o capitalismo evoluía apenas na esfera internacional. as estradas de ferro . Dinamizado pelas descobertas marítimas (o planeta torna-se geograficamente unificado). o capitalismo. no fluxo do intercâmbio entre mercado interno e externo não era apenas de tamanho. Ainda na fase inicial de seu desenvolvimento. 41) O meio de transporte é visto como um sistema de engrenagem. Advento de uma civilização) Uma maneira de ilustrar essa autonomia das culturas é retomando-se o conceito de economia-mundo cunhado por Braudel. para obter energia. 36) A pergunta que nos interessa é a seguinte: em que momento essas economias. Para ele. (p.36) O mapa-mundi era concebido como uma sucessão de círculos concêntricos. 38) O mundo anterior à Revolução Industrial conserva portanto as pluralidade e a autonomia das civilizações. Mas eu diria que mesmo no interior das sociedades ocidentais existem defasagens. 40) Como demonstra Polanyi. “pode-se dizer. e etnocêntricos. Este é o momento de sua expansão. matemáticas. eles pautavam suas vidas cotidianas pelo tempo mensurado por esses mecanismos. Isso ocorre em todos os níveis da sociedade. das noites e das tardes. tem que ajudar a maneira de se contabilizar o fluir do tempo. como em vários países em desenvolvimento. (p. irão assim transformar-se em símbolos nacionais. 51) No Brasil. (p. levando ao público uma auto-imagem moldada pelas grandes redes televisivas. Na Índia. pela primeira vez. (p. sem o que sua racionalidade não encontraria meios para se concretizar. e o veículo de uma identidade urbana pan-étnica. esta compreensão é ilusória. Esta ideia de um encolhimento do espaço é generalizada. (p. momento no qual toda sua estrutura. que não mais se encontra em consonância com o clarear e o escurecer. se adéqua às exigências de uma civilização urbano-industrial. que mantinha o mundo coeso. 47) Embora os homens tenham construído as clepsidras e os relógios em épocas mais remotas. No entanto. (p. 46) O Vapor suprime as distâncias. a música popular tornouse uma expressão importante. Uma estrutura de poder radicalmente diferente está emergindo. produtos de expressão local. 59) Um autor como Alvin Toffler não hesita em dizer: “[Vivemos] na aurora de uma nova era do Poder. Dentro da nova ordem social o espaço é representado como algo que se desagrega. um denominador comum. O dia torna-se assim um conceito abstrato. 50) O mundo no qual os homens agora circulam. podem ser veiculadas em todo o país. As telenovelas.eram concebidas como algo intermediário entre os caminhos terrestres e os canais de navegação. (p. para se unificar. Espaço e tempo são categorias sociais (como diria Durkheim) e não entidades abstratas. mas segundo o movimento do Sol em relação à Terra. representação social por excelência. a emergência de um sistema de telecomunicação (meados dos anos 60) favorece a integração do mercado e da consciência nacional. dirão os homens do século XIX. para a música popular. Peter Manuel observa que apesar da variedade de tipos de música indiana existe uma relativa homogeneidade. está se desintegrando. as imagens televisivas. O tempo. 67) . impõe a sua coerção a todos. Um exemplo disso acontece na culinária. caracteriza o período em que vivemos como sendo de uma “alta modernidade”. mas dinâmicas entre si. leva a taylorização às cozinhas por conta da “aceleração da vida” das pessoas. se dá no seio de um território. dois movimentos dão força ao processo de mundialização: a diversificação dos produtos e a produção em escala industrial. Giddens. que daria legitimidade à nação e fortaleceria o mercado. Esse “choque cultural”. uma configuração social que se projeta para “além” da anterior. Todo seu esforço coniste em apreender a gênese e o declínio das formações sociais. No século XX. “Toynbee considera a evolução da humanidade como um organismo.Talvez fosse mais correto dizer que nos encontramos diante de uma “sobremodernidade”. 69) Capítulo III – Cultura e modernidade-mundo O autor lança a seguinte problemática: como entender o contato entre as civilizações? A partir daí.” p. Renato Ortiz fala também dá unicidade linguística. (p. na esperança de descobrir uma lógica na sequência de surgimentos e desaparecimentos das culturas humanas. sugestivamente. por sua vez. dinamizadas pelo movimento de cada uma dessas partes) e salienta que as sociedades não são estáticas. inclusive. Ele revela um tipo de concepção subjacente a um conjunto de estudos. crescimento e morte. Afinal o que é mapa cultural? Trata-se de . mas que se constrói a partir dela. nem “italianidade” nas pizzas Hut. O capitalismo ianque. materializado nessas multinacionais. em que os alimentos perdem a fixidez dos seus territórios e de adaptam ao contexto em que estão inseridos. Ortiz ressalta ainda que uma cultura tem a capacidade de reinterpretar os elementos forâneos. A McDonalds. cujo ciclo da vida passaria por momentos distintos: nascimento. Não há “mexicanidade” nos tacos da Bell. As suas culturas entram em contato através dos próprios homens – por via da memória coletiva. ele trabalha os conceitos de mapa cultural (espaço ocupado por unidades distintas. 71 O problema levantado por Toynbee é sugestivo. naqueles que têm uma variedade de línguas conflitantes). Uma língua “estrangeira” torna-se “secundária” com a mundialização – o que o ocorre com o inglês em vários países (sobretudo. (p. Mas o que devemnos entender por difusão cultural? A difusão é processo pelo qual os elementos ou sistemas de cultura se espalham.um espaço ocupado por unidades diferenciadas. na medida em que a cultura material passa de uma geração para outra.” (p. prato principal. (p. o barateamento e transporte. 85) A evidência dos balanços estatísticos ( cultura importada x cultura exportada) pertence ao reino da quantidade. (p. Obviamente está ligado a tradição. 74) O choque ou assimilação cultural se faz sempre no seio de um território. no qual a dinâmica global se faz a partir do movimento de cada uma das partes. Contrariamente à refeição tradicional. daí a necessidade de se conseguir uma boa alimentação a preços módicos. hoje. 79) Com o advento das técnicas de conservação. Os primeiros drive-in já exprimem uma adequação da alimentares. (p 75) A comida representa simbolicamente os modos dominantes de uma sociedade. (p. . 82) A refeição estruturada (entrada. (p. que se fazia em horários fixos. A modernidade impõe refeição ao movimento dos automóveis. 77) (…) os hábitos alimentares se moldam no espaço. (p. a invenção da comida insdustrial transformaram radicalmente esse quadro. Por isso alguns estudiosos começam a falar de internacionalização de comportamentos (p. come-se agora em horas variadas. cada um tende a coordenar seu tempo em função de suas próprias atividades. a nação. a cidade. sobremesa) cede lugar a uma alimentação fragmentada. 81) Não há tempo para se comer em casa. 94) seu ritmo aos costumes arraigados. (…) Cultura e economia seriam assi dimensões equivalentes. (p. 79) A comida insdustrial não possui nenhum vínculo territorial. o bairro. 72) A problemática da transmissão cultural se impõe assim com capítulo importante para a compreensão das influências mútuas. Se antes os membros da família se sentavam regularmente à mesa partilhando um momento em comum. se torna protagonista da identidade nacional. alvo do mercado consumidor – em que a nacionalidade pouco conta. a nos situar em outro patamar da história. que “as relações sociais mundializa das [. A civilização mundial. identificando modernidade com american way of life. ao se tornarem descentralizadas. Esses lugares. Multinacionais fazem parte do local. Capítulo IV – Uma Cultura internacional-popular A desterritorialização é abordada através da história de um viajante alemão que vai até o fechado regime da China. ocorrem em diferentes cantos antes da produto-final ser finalizado. traz com ela desafios. capaz de receber qualquer pessoa do planeta sem que ela tome um choque cultural. assim como os free-shops dos aerportos. Fala-se em memória nacional. Mas. o que vale mesmo é a distinção social (e não utilidade do produto) que ele causa em quem o consome. ela se constrói através do esquecimento (amnésia seletiva) das contradições da história. também na Ásia. Pelo contrário. Entendê-la é refletir sobre as raízes de nossa contemporaneidade” (p. (p. um universo simbólico de rememorização das vivências compartilhadas por todos.. 104). não significa ausência de poder. esse tipo de pensamento capta apenas as aparências das coisas.Na verdade. para os norteamericanos. algumas cidades turísticas e hoteis internacionais são o que podemos chamar de “não -lugares”.. porém. e os processos industriais. as relações de autoridade. por exemplo. talvez. A publicidade. o quadro se reverte e ele passa a conviver em um cenário familiar europeu. em Hong Kong. onde se sente um “peixe fora d’água”. No entanto. ou seja. Hollywood e Coca-Cola. ou a sua partilha em termos democráticos. cheio de vários outros conteúdos). utopias. observando. . 95) A McDonalds assume um papel de protagonista da história na americanização da cultura mundial. esperanças. mas engendra também novas formas de dominação. trabalhando na perspectiva do homem universal. adquirem outra abrangência. A desterritorialização acontece ainda na chamada cultura internacional popular. e os símbolos ganham origem no mercado – a exemplo da Disneylândia. O segundo país é como um lugar sem conteúdos próprios (ou.] na qual fica difícil localizar a centralidade das coisas. no entanto.Para Jean Chesnaux o “hors-sol” constitui uma categoria geral da modernidade. mesmo que não seja de forma absoluta. (p. social. racional. Há portanto. (p. 108) Temos apenas uma série de referências simbólicas que funcionam como sinais de distinção social no mercado consumidor. o produto é percebido apenas como algo funcional. televisores. McDonald’s. A flexibilidade das tecnologias lhes permite descentralizar a produção e acelerar a produtividade. o espaço. (…) Sua utilidade é o elemento predominante prepoderante na sua definição. 117) Até o final do século XIXI. Coca-Cola. 121) . um choque de valores. As mercadorias tem de ser adquiridas independentemente de seu ” valor de uso”. Sua nacionalidade conta po uco. fazendo com que os lugares se globalizem. A sociedade emergente requer. (p. (p. A ética do consumo privilegia sua “inutilidade”. Porém. O primeiro é o da desterritorialização. 106) O movimento da mundialização percorre dois caminhos. à idéia de cultura nacional” (p. (p. e toca -discos. não pode existir. categoria social por excelência. 105) A velocidade das técnicas leva a uma unificação do espaço. (p. (p. histórico e cultural. calças jeans. deslocalizado. definindo desta forma a identidade do grupo como um todo. unicamente à memória coletiva nacional integrar a diversidade das populações e das classes sociais . 107) O movimento de deslocalização da produção (…) A competição internacional faz com que as grandes empresas tenham interesse em diminuir o custo de seus produtos. 119) Através da publicidade o consumo adquiriu um tom nitidamente cultural. 107) Temos a tendência em detectar mundialização por meio de seus sinais exteriores. 116) Caberia.” (p. (p. um outro entendimento das coisas. uma situação de dissociação em relação ao meio natural. enquanto pura abstração. 112) “refletir sobre a mundialização da cultura é de alguma maneira se contrapor. pois. constituindo um tipo de espaço abstrato. os managers globais. (p. na EPCOT (Experimental Prototype Community of Tomorrow) dos anos 80. habitualmente. os executivos globais. segundo. que. É ressaltado. Se a antiga Disneylandia – na Califórnia dos anos 50 – foi a representação territorializada da sociedade americana. O autor conta que essas pessoas são praticamente forçadas a perder toda a relação com as antigas culturas da nação. se trata de “leitura cínica e sugestiva” (p.148). homens de negócios e marketing. Por meio de referências culturais comuns. Ortiz fala que o que é local não se contradiz ao global. novamente. cede lugar a uma preocupação global” O mundo se faz segundo a Mc Donalds e Walt Disney. administradores e managers globais. que mantêm relações feitas de forma direta – sem a mediação de uma referência nacional. Por isso os diversos símbolos de identidade têm origem na esfera do mercado. e não pela . os grandes responsáveis pela cultura-mundo.O universo do consumo surge assim no lugar privilegiado da cidadania . ou seja. Desta vez o protagonista do argumento não será a Mc Donalds. os administradores globais.(p. Disneyland. diferentemente dos seus antecessores pré-globais (as ditas antigas multinacionais).Cola constituem o espelho autêntico american way of life. Capítulo V – Os artífices mundiais de cultura Renato Ortiz tenta desvendar quem são os “artífices mundiais da cultura”. Eles são. os homens de marketing. se dá pela diferenciação. Um se interliga ao outro. 129) A dimensão global supera o aspecto nacional. “intelectuais das grandes corporações”. Uma série de leituras sobre o marketing e a administração global. Armand Mattlear. (p. Hollywood e Coca. ela estabelece a conivência entre as pessoas. mas Walt Disney. 143). 122) A memória internacional-popular funciona como um sistema de comunicação. que a globalização homogeinização. ela se metamorfoseia em representação do mundo em Orlando. Os grandes responsáveis por essa cultura-mundo são os homens de negócios. executivos. (p.O local não está necessariamente em contradição com o global. onde as produções culturais tradicionais (o estilo de vida europeu. o modernismo ocorreu sem modernização. manifestando um hiato entre sua expressão e a sociedade que lhe dá sustentação (p. político ou de ornamentação. a autonomia das artes acontece já no seu aparecimento. as manifestações artísticas peculiares à época) são modificadas enquanto formas de legitimação. As tradições populares são deslocadas pelo impacto da modernidade ao entrarem em conflito com as sociedades industrializadas. sem um momento histórico que possa ser dito como um marco deste processo. 187-188) Na América Latina e nos Estados Unidos o universo artístico encontra dificuldades para emergir enquanto fonte legítima da vida cultural. já que o pólo . uma reorganização da esfera cultural. que escolhe os seus temas e linguagens com poucas interferências externas. mas mesmo assim a crise da legitimidade das culturas populares é visível. (p. Esse fato possibilitou a criação de uma nova legitimidade cultural – associadas às classes sociais (cultura erudita e cultura popular). 181). pelo contrário. Surge uma hierarquia cultural que se dá pelos consumo das classes. 184) A modernização da sociedade tem. Capítulo VI – Legitimidade e estilos de vida A sociologia pressupõe a cultura em duas referências: tradição e artes. sobretudo com a consolidação. encontram-se interligados. Em contrapartida. Ambas orientariam a conduta dos homens. das indústrias culturais (Televisa. Nos Países europeus o impacto da modernização foi sentido durante a Revolução Industrial. no entanto é tempo de entender que a globalização se realiza através da diferenciação (p. Rede Globo) No Brasil. surge o artista livre. como contrapartida. O que acontece também é um mecanismo de discriminação da primeira sobre a segunda. nos anos 60 e 70.183) Já na America Latina a constituição da modernidade é vista como um processo mais complexo de difícil. Logo após. Até o século XVIII as obras de arte cumpriam apenas um papel religioso. Ortiz pergunta-se se elas seriam concepções de mundo válidas (ou socialmente dominantes) no contexto de uma cultura mundializada. 219). perde sua territorialidade americana ou britânica. a tradição da modernidade. as culturas populares da América Latina. em seu lugar seu injetados valores que independem das peculiaridades de cada lugar. . O primeiro seria a permanência do passado distante. superando os anteiores. resultado de um “desencaixe” do tempo e do espaço e que “secreta inclusive uma memória internacional” (p. pois o padrão britânico/americano encontra-se distante (p. que caracterizada como mundial. 217) As nações deixam de se constituir em espaços hegemônicos de coesão social. estariam ligados a essas duas formas – sem contar com a mediação nacional. que teria se dissolvido diante das instâncias internacionais. Além disso. Ortiz também faz uma reflexão sobre algumas nuances apocalípticas da sua obra e acrescenta que a mundialidade começa a superar as nações. Um refere-se à permanência de um passado longínquo – a exemplo das culturas populares do continente latino-americano. ou seja a oposição entre artista e mercado. 213). O inglês falado em outros locais do mundo na realidade é uma variedade lingüística. Os “artífices mundiais”.de produção restrita se contradiz com a ideologia da produção ampliada. Elucida-se os dois entendimentos para o conceito de “tradição”. Um exemplo disse é a língua inglesa. diz não vivemos em um mundo sem fronteiras – posto que o fundamentalismo islâmico e algumas regiões pobres do planeta causariam um tipo de etnocentrismo ao contrário. A mundialidade começa a superá-las (p. O fim do Estado. é retomado o capítulo anterior. 192-191) Junto com o conceito de tradição há dois entendimentos possíveis. 190-191) A Tradição e as artes não se configuram mais como padrões mundiais de legitimidade. Capítulo VII – Digressão final Na derradeira parte do livro. que é se relaciona com uma memória internacional. por exemplo. denominada de “Digressão Final”. exatamente por possuírem um grau de impacto maior. (p. e vão além das nações e povos. do espaço. (p. Já o outro diz respeito à tradição da modernidade. O segundo. portanto. que se anularia pelo movimento da desterritorialização.
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