O Inspetor Geral - Nicolai Gogol

April 2, 2018 | Author: Danilo Pestana | Category: Nikolai Gogol, Devil, Love, God, Saint


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Description

A UNESCO anunciou o ano de 2009 como “o ano de Gógol” e inúmeras exposições e eventos estão previstos para este ano na Rússia e no mundo todo em comemoração ao bicentenário do nascimento deste gigante da literatura russa. Personalidade bastante singular, altamente enigmática, Gógol deixa-se revelar em mutiso de seus escritos. A obra de Gógol como um todo tem sido considerada por uma parcela da crítica como expressão satírica da realidade russa na primeira metade do século 19, detectando-se uma maneira peculiar de “ver” o mundo e as coisas, isto é, sua “óptica desautomatizante”. O traço da obra gogoliana se revela por meio de uma espécie de acumulação absurda de detalhes que fazem da realidade um aglomerado de elementos contraditórios, mas que revelam na sua mais profunda essência, tornando esse caos fantástico e desconexo a sua mais fiel expressão. Nos textos de Gógol o sobrenatural e o inusitado surgem naturalmente do real e o absurdo que daí resulta se destaca do cotidiano mais comezinho no qual todos os opostos se tocam e onde o trágico e o cômico se mesclam a elementos de terror e humor. Os textos de Gógol são, portanto, poesia em ação e, como tal, podem desvelar os mistérios do irracional, mesmo que, muitas vezes, sob as máscaras da racionalidade. Sumário Personagens ......................................................................... 11 Ato 1 ........................................................................................ 13 Ato 2 ....................................................................................... 41 Ato 3 ........................................................................................ 69 Ato 4 .......................................................................................105 Ato 5 ...................................................................................... 157 O Inspetor Geral Comédia em 5 atos (1836) A culpa não é do espelho se a cara é torta. Provérbio popular Personagens Antón Antónovitch Skvozník-Dmukhanóvski: prefeito Ana Andréievna: sua esposa Mária Antónovna: sua filha Luká Lukítch Khlópov: inspetor de escolas Sua Esposa Amós Fiódorovitch Liápkin-Tiapkin: juiz Artémi Filípovitch Zemlianíka: encarregado da assitência social Ivan Kuzmítch Chpékin: chefe dos correios Piótr Ivánovitch Dóbtchinski: pequeno proprietário de terras Piótr Ivánovitch Bóbtchinski: pequeno proprietário de terras Ivan Aleksándrovitch Khlestakóv: funcionário de Petersburgo Óssip: seu criado Khristian Ivánovitch Guíbner: médico da província Fiódor Andreiévitch Liuliukóv: aposentado, cidadão respeitado Ivan Lázarevitch Rastakóvski: aposentado, cidadão respeitado Stepan Ivánovitch Koróbkin: aposentado, cidadão respeitado Stepan Ilitch Ukhoviórtov: comissário de polícia Svistunóv: policial Púgovitsin: policial Derjimórda: policial Abdúlin: comerciante Fevrônia Petróvna Pochliópkina: a mulher do serralheiro Michka: criado do prefeito Um criado de hotel Convidados e convidadas, comerciantes, pequenos burgueses e solicitantes Amós Fiódorovitch Essa não!! Artémi Filípovitch Era só isso que faltava!! Luká Lukítch Santo Deus! E ainda por cima em missão secreta! Prefeito Eu bem que pressentia: sonhei durante toda a noite com duas ratazanas impressionantes. o comissário de polícia. conhece bem. o juiz. (Levanta um dedo de forma significativa. Cena 1 O prefeito.em informá-lo.) “. o médico e dois policiais. Vou ler para os senhores a carta que recebi de Andrei Ivánovitch Tchmykhov. meus senhores.Ato 1 Sala na casa do prefeito. para lhes dar uma notícia bem desagradável.. Amós Fiódorovitch Como? Um inspetor?!! Artémi Filípovitch Como? Um inspetor?!! Prefeito Um inspetor de Petersburgo. apresso-me em informá-lo de que chegou um funcionário autorizado a inspecionar todo o estado e principalmente o nosso distrito. aquele que o senhor.. Olha o que ele escreve: “Meu caro amigo.. ainda por cima. em missão secreta. o encarregado da assistência social. (Balbucia palavras a meia-voz. o inspetor de escolas.) Soube disso por meio de gente de confiança. Está a caminho um inspetor geral. incógnito.” Ah! Aqui: “A propósito. Prefeito Chamei-os aqui. Palavra de honra. cheiraram e foram embora. apesar de o ditocujo se apresentar ... compadre e benfeitor”. de tamanho sobrenatural! Chegaram bem perto. Artémi Filípovitch. nunca vi nada parecido: pretas. E. correndo os olhos com rapidez.. etc. Prefeito Estejam ou não de olho. os senhores já estão avisados. Amós Fiódorovitch Eu acho. graças a Deus. o tal funcionário vai querer. E seria ainda melhor se tivéssemos menos pacientes: podem até achar . não é bem assim..) Bem. averiguar as instituições da assistência social sob sua responsabilidade. antes de mais nada. vejam só. nem viajando três anos seguidos você pode chegar a algum lugar. muito extraordinária! E não deve ser à toa.” Bem... É o seguinte: a Rússia. que isso aí tem uma razão mais sutil e bem política.. quando o sujeito adoeceu. mesmo porque ele pode chegar a qualquer momento. Luká Lukitch Mas para quê. Ivan Kirílovitch engordou muito e continua tocando violino. Artémi Filípovitch! Sem dúvida nenhuma. Prefeito Mas que asneira! Um homem inteligente como você! Traição numa cidadezinha dessas! Por acaso estamos numa fronteira? Daqui desta cidade.. Como sei que você. faça tudo ficar bem decente: os gorros devem estar limpos para que os doentes não pareçam ferreiros como sempre. Ontem eu.. Antón Antónovitch. eu quero dizer.) Até hoje.. Khristian Ivánovitch -... já que estamos entre nós. Até que dá pra eles ficarem limpos. por isso. aqui já vêm assuntos de família: “Minha irmã Ana Kirílovna veio nos visitar com seu marido. “... hora.. em latim ou em qualquer outra língua — isto já é com o senhor.. Antón Antónovitch. E também em cada cama deve-se escrever... agora chegou a nossa vez. já dei algumas ordens e os aconselho a fazer o mesmo.” (Interrompe.. só se meteram com outras cidades. Vejam só que situação.” e etc. estão sempre de olho vivo. se é que já não chegou e está hospedado incógnito em algum canto. Principalmente o senhor. Prefeito Isso mesmo.. é isso mesmo. o nome de cada doença.. Artémi Filípovitch Isso é o de menos. a Rússia deseja fazer a guerra e aí... tem lá os seus pecadilhos. Amós Fiódorovitch É verdade. Também não é bom que os seus pacientes fumem um tabaco tão forte. para que isso? O que vem fazer aqui um inspetor? Prefeito Por quê?! Só pode ser coisa do destino! (Suspira. data. Prestem atenção: de minha parte..então aconselho-o a tomar precauções. Esses superiores são bem espertos: mesmo longe. Que situação extraordinária. Amós Fiódorovitch Não. o ministério manda um funcionário espionar se há traição em algum lugar.como um indivíduo qualquer. pois você é um homem inteligente e não gosta de deixar passar o que lhe cai nas mãos. o senhor não. como todo mundo.. que faz a gente espirrar. logo ao entrar. . desde então. Gente pobre é simples: se tem de morrer.. um contratempo qualquer. Vamos aconselhá-lo a comer cebola.) Prefeito E ao senhor. sei lá. não dá. ou qualquer coisa que o valha. Nesse caso. mas tem um cheiro. é digno de louvor.) Amós Fiódorovitch Não. E até estranho falar disso. o seu cheiro lhe é inato. Artémi Filípovitch Ah! Quanto à questão clínica. (Khristian Ivánovitch deixa escapar um som meio parecido com a. Se. eu não tenho nada a dizer. quando criança. de fato. até pode vir almoçar. ou alho. é competente. num lugar desses. me esqueci. Se quiser. e por que um contínuo não poderia fazê-lo? Só que. No que diz respeito à organização interna e àquilo que Andréi Ivánovitch em sua carta chama de pecadilhos. pelo menos por um tempo. tirá-lo dali. letra “i” e um pouco com a letra “e”. a ama-de-leite o derrubou e. mas. sem dúvida. o seu juiz-assistente. E natural cuidar de animais domésticos. então há remédio contra isso. já não é mais possível remediar: ele diz que. E também é muito difícil para Khristian Ivánovitch se fazer entender: ele não sabe uma palavra de russo. sai dele esse cheirinho de vodca. quando o inspetor for embora. Amos Fiódorovitch. Prefeito Bem.isso também não é bom.que são mal assistidos ou que o médico não sabe nada de seu ofício. . morre mesmo. Prefeito Além do mais. Lá nas ante-salas. Amós Fiódorovitch Pois hoje mesmo vou mandá-los todos para a cozinha. onde normalmente ficam os solicitantes. mas que tipo de propina? Filhotinhos de cachorro. mas é melhor. Eu sei que o senhor gosta de caçar. ele. Posso falar abertamente para todo mundo que recebo propinas. Foi assim que o próprio Deus determinou e não adianta os voltairianos protestarem contra.. você sabe. se tem de sarar. não me lembro bem. Agora. Antón Antónovitch. e seus gansinhos ficam se enfiando entre as nossas pernas sem parar. entende por pecadilhos? Há pecados e pecados. Mas isso já é outra coisa. Não há uma pessoa que não tenha lá seus pecados. eu só queria lembrá-lo. então o senhor pode pôr tudo de novo no lugar. Sempre quis chamar sua atenção para isso. não é bom que ponham para secar em sua repartição toda espécie de porcarias e que sobre a papelada Kc veja um chicote de caça. melhor. como ele diz. Khristian Ivánovitch pode ajudá-lo com diversos medicamentos.. os contínuos criam gansos. Amós Fiódorovitch O que é que o senhor. eu e Khristian Ivánovitch já tomamos providências: quanto mais próximo da natureza. eu aconselharia a prestar mais atenção nas repartições públicas. como se tivesse acabado de sair de uma destilaria . mas houve. E. Não usamos remédios caros. Há limito tempo que eu queria lhe falar sobre isso. então sara mesmo. (Khristian Ivánovitch deixa escapar aquele mesmo ruído. é pouco provável que alguém vá lá algum dia xeretar: é um lugar tão formidável. Não posso dizer nada a respeito. pelo menos. um poço de conhecimentos. Um deles.. ou seja lá quem for. e aí. talvez tenha que ser assim mesmo. Mas. Luká Lukitch Mas o que é que eu posso fazer? Já lhe falei várias vezes.. e daí se o senhor recebe cachorros como propina? Em compensação. mas para que quebrar as cadeiras? Para dar prejuízo ao erário! Luká Lukitch Ele é mesmo muito esquentado! Várias vezes já lhe chamei a atenção. pela ciência dou a própria vida”. poderia tomar a ofensa para si. Ah!.. não me lembro o nome dele. começa a passar a mão na barba. pra dizer a verdade.. toda vez que sobe ao púlpito. só o diabo sabe como tudo poderia acabar. Ele fez aquilo com as melhores das intenções.) e depois. mas eu é que recebi o sermão: para que incutir na juventude ideias tão liberais? Prefeito Também tenho que lhe falar a respeito do professor de história.. com formação superior e tudo. Ë claro que. aquele que tem uma cara gorda. Ele sabe muita coisa. se ele faz a tal careta diante de um aluno. por debaixo da gravata. eu conheço o senhor muito bem: é só começar a falar da criação do mundo e os cabelos se põem em pé.. tudo bem. tenho uma fé inabalável e todos os domingos vou à igreja. Quanto ao senhor. coisa igual eu nunca tinha visto. eu apenas falei no tribunal de Justiça por falar. Enquanto falava sobre os assírios e os babilónios. à sua condição de conceituadas. Prefeito Bem. por exemplo. tudo é suborno. está protegido por Deus.. fui ouvi-lo. Há alguns dias. São pessoas bern cultivadas. quando nosso conselheiro entrou na classe. deve cuidar em particular dos professores. Amós Fiódorovitch E olha que tudo isso com minha própria inteligência. ele desceu correndo do púlpito. até pensei que a escola estava pegando fogo. mas têm condutas muito esquisitas. Aliás. o que se deve. se ele fizesse isso diante de um visitante. Deus me livre. ainda vai. porque. Certa vez. e ele diz: “Seja como for. Mas o senhor. mas eu. o senhor não acredita em Deus e nunca vai à igreja. como diretor de um estabelecimento de ensino. ou o xale para a esposa.. Prefeito Mas veja que em alguns casos é pior ter muita inteligência do que não ter nenhuma. Pois veja. mas quando chegou em Alexandre Magno. Antón Antónovitch. Luká Lukítch. mas explica tudo com tamanho ardor que fica fora de si. não pode deixar de fazer uma ca reta assim (Faz a careta.. se o casaco de peles de certas pessoas custa quinhentos rublos.. tal foi a força com que ele jogou uma cadeira no chão! E verdade que Alexandre Magno é um herói.Prefeito Ora. é evidente. ele fez uma tal careta. certamente. pensem bem. . por exemplo. nem posso descrever o que aconteceu. pegaria mal: o senhor inspetor. Amós Fiódorovitch Não senhor. sem dúvida alguma. filhotinhos ou outra coisa qualquer. Prefeito .Prefeito É. Chefe dos Correios Meus senhores. Piótr Ivánovitch Bóbtchinski acabou de me contar lá na agência.. . Qualquer um mete o nariz para mostrar que também é inteligente. O problema é esse incógnito maldito! De repente ele aparece: “Ah. a gente tem medo de tudo. Amós Fiódorovitch E isso mesmo! É isso que eu também acho. meus pombinhos! Quem aqui é o juiz?” . . mas que fora deram esses dois! Chefe dos Correios É guerra com os turcos. ou faz cada careta de que até Deus duvida. que funcionário é esse que está vindo para cá? Prefeito Por acaso o senhor não ouviu nada a respeito? Chefe dos Correios Ouvi sim.“Zemlianíka”. Prefeito É. Luká Lukitch Deus nos livre de mexer com o ensino público. sim. Prefeito Isso ainda não é nada. vocês estão aí.“Pois que tragam aqui Zemlianíka!” Isso é que é o pior! Cena 2 Os mesmos e o chefe dos correios. Prefeito E então? O que acha de tudo isso? Chefe dos Correios O que eu acho? Que vai haver guerra com os turcos. Tudo sujeira dos franceses.“LiápkinTiápkin”.“Pois que tragam aqui Liápkin Tiápkin! E quem é o diretor da assistência social?” .. é uma lei inexplicável do destino: todo homem inteligente ou é bêbado. . ver se não se trata de alguma denúncia ou se apenas são correspondências? Se nada houver. então não vai haver mais guerra com os turcos. até estou achando que houve uma denúncia contra mim. para o nosso bem geral. nem tanto por precaução. Amós Fiódorovitch Cuidado. Eu até quis ficar com a carta. Chefe dos Correios Já sei. quer dizer.). mas só por curiosidade: sou louco pra saber o que há de novo no mundo. já sei.. assim.. um pouquinho. corre às mil maravilhas: mulheres.... isso eu já faço. Há trechos maravilhosos! Não faz muito tempo.. então que se feche novamente a carta. Olha.. entregue-a aberta assim mesmo. descrevendo um baile de maneira tão frívola. Então. se por acaso cair nas suas mãos alguma queixa ou denúncia. Os comerciantes e a população estão me causando alguns aborrecimentos. se tomei algo de alguém.Mas que guerra com os turcos que nada! Nós é que vamos entrar bem. Que pena que o senhor não leia essas cartas. faça-me a gentileza. Chefe dos Correios Com o maior prazer. o momento não é para isso. o que diz? Chefe dos Correios Eu? Sei lá! E o senhor. Bem melhores do que as do Correio de Moscou! Prefeito Está bem. meu querido amigo. afinal de contas. ou. mas não encontrou nada sobre algum funcionário de Petersburgo? Chefe dos Correios Não. Prefeito Bem. mas eu. Chefe dos Correios Se é assim. bandeiras galopando.” E com que emoção descreveu tudo isso. Quer que eu a leia? Prefeito Essa agora.. foi sem nenhuma maldade. é uma leitura superinteressante. Algumas cartas a gente lê com tal deleite. Dizem que lhes enfio a faca. Ivan Kuzmítch. mas de funcionários de Kostroma e Sarátov há muita coisa. Não precisa me ensinar. Ivan Kuzmítch. muitas mulheres.. um tenente escreveu a um amigo. pois isso ainda pode lhe custar caro. música. mas. Isso eu já sei: recebi uma carta. tem que vir aqui um inspetor? Ouça. muito bom mesmo: “Minha vida. pelo amor de Deus. não é que sinta medo. algumas tão edificantes. juro mesmo. não os turcos. vou lhe dizer. e aí. abrir e dar uma lidinha nas cartas que entram e saem da sua repartição. Ivan Kuzmítch. Antón Antónovitch? Prefeito Eu? Bem. Eu até estou achando (Segura-o pelo braço e o conduz para um canto. Chefe dos Correios . Por que. não seria possível. De Petersburgo não há nada. pensando bem. há passagens tão variadas. retenhaa sem a menor hesitação. ambos entram ofegantes. eu vou contar. por favor. Bóbtchinski Ah. santo Deus! Prefeito Ora. os seus coelhos agora não me dão o menor prazer: esse maldito incógnito não me sai da cabeça. Cena 3 Os mesmos... quer dizer. Bóbtchinski Um acontecimento extraordinário! Dóbtchinski Uma notícia inesperada! Todos O quê? Mas o que foi? Dóbtchinski Uma coisa imprevista! Estávamos chegando ao hotel. A gente fica esperando que. não tem lá muito estilo. Antón Antónovitch. E o senhor soube que Tcheptovitch e Varkhovinski estão em litígio. Dóbtchinski (Interrompendo.. não.... mas na realidade é um assunto familiar. pronto. nada. mas o que eu acho é que estamos numa bela encrenca! Confesso que queria vir aqui. Seria outra coisa se você tornasse isso público. não é nada.Ai.. Piótr Ivánovitch...) Desculpe. me desculpe. Dóbtchinski e Bóbtchinski. a porta se abra e.. Bóbtchinski (Interrompendo. assim. você.) Eu e Piótr Ivánovitch estávamos chegando ao hotel. Irmã de sangue daquele cachorro que o senhor conhece. . Amós Fiódorovitch Sim senhor. o que para mim é a maior maravilha: caço coelhos nas terras de um e de outro. só para lhe dar uma cadelinha. me desculpe.. eu é que. Prefeito Deus do céu. de repente. mas não me atrapalhe! Senhores. que não sei por que tinha sido mandada à casa de Filipe Antónovitch Potchetchúiev.. resolvi entrar na casa de Rastakóvski. Bóbtchinski Palavra de honra que eu vou me lembrar..) Buscar um barrilzinho para a vodca francesa. senhores! Peguem as cadeiras! Piótr Ivánovitch.) Bem-apessoado e à paisana. espera aí.) Foi buscar um barrilzinho para a vodca francesa. “Na hospedaria”.) Então. Piótr Ivánovitch.. não comi nada desde cedo. . Sentem-se. .” É sim..) Perto da barraquinha onde se vendem pastéis. façam a gentileza de não deixar que Piótr Ivánovitch me atrapalhe.. Bóbtchinski . não me interrompa.. de repente.Dóbtchinski E você.Então... vou contar tudo pela ordem. pelo amor de Deus! O que aconteceu? Meu coração não vai aguentar. o estômago de Piótr Ivánovitch estava mesmo. vai se confundir todo e não vai se lembrar de nada. Piótr Ivánovitch diz: “Vamos dar uma passadinha na hospedaria. o meu estômago está tremendo. um jovem. Bóbtchinski (Desviando a mão dele. passei então pela casa de Ivan Kuzmítch para contar a novidade. Aí. Sabe. Bóbtchinski Perto da barraquinha onde se vendem pastéis. por favor.” Nem bem entramos no hotel e. Então não me atrapalhe que eu vou contar tudo. saindo de lá me encontrei com Piótr Ivánovitch. não me interrompa!. Como o tal Koróbkin não se encontrava. Dóbtchinski (Interrompendo. Não.... Vou me lembrar. ao encontrar Piótr Ivánovitch. tudinho. mas...“agora deve ter um salmão fresquinho e podemos também tomar umas e outras. Pois fomos à casa de Potchetchúiev.. Avdótia. Piótr Ivánovitch. Nem bem eu tive o prazer de sair daqui. pelo caminho... tudo. fui com Piótr Ivánovitch à casa de Potchetchúiev. dei um pulo até a casa de Koróbkin. pois bem. mas como Rastakóvski também não estava. o que foi que aconteceu? Bóbtchinski Espera aí. então dei um pulo lá. logo depois que o senhor se dignou a ficar bastante desconcertado com o recebimento da carta.. que o senhor tinha recebido. então. Daí. Dóbtchinski (Interrompendo. por favor. bem.disse ele .. tudo. Dóbtchinski (Interrompendo. digo-lhe: “Por acaso já sabe da última? Que Antón Antónovitch recebeu por carta fidedigna?” Mas Piótr Ivánovitch já tinha ouvido falar disso pela sua despenseira. Prefeito Pois falem logo... não. não me interrompa! Sei tudo.. é isso. o meu estômago. aqui está uma cadeira! (Todos se sentam ao redor dos dois Piótrs Ivánovitchs.. não. . Quem poderia ser? Só pode ser ele. logo me bateu uma ideia.) Pelo amor de Deus. sabem quem é? Há três semanas a mulher dele teve um menino tão espertinho. mas depois fui eu. Piótr Ivánovitch.. diz ele. não me interrompa.. o inspetor geral. Vai para Sarátov. compra tudo fiado e não paga um tostão. Piótr Ivánovitch logo estalou os dedos para chamar o dono da hospedaria. Bóbtchinski No mesmo quarto onde brigaram aqueles oficiais no ano passado.Bem-apessoado e à paisana. não me interrompa... O senhor não consegue contar. Prefeito Quem.. Me deu um medo! Prefeito Que Deus nos perdoe. é ele. por favor. Piótr Ivánovitch. é. o Vlass. não pode! O senhor fala assobiando! Eu sei que o seu dente tem um buraco. disse então. E o seu nome é Ivan Aleksándrovitch Khlestakóv. dono de hospedaria. Dóbtchinski É ele sim! Não paga e não vai embora. vem de São Petersburgo. pobres pecadores! Onde é que ele está hospedado? Dóbtchinski No quarto número cinco. dissemos Piótr Ivánovitch e eu. fui eu quem disse “Hum!” Bóbtchinski Primeiro foi o senhor. disse. “é um jovem funcionário sim senhor. “Hum!”.) muita.. E tem reações estranhas: já está hospedado aqui há quase duas semanas e não vai embora. Bóbtchinski É ele... ele mesmo. Então. estava andando de um lado para o outro e com um tal raciocínio no rosto. um jeito. e até ficou espiando o nosso prato. perguntou baixinho: “Quem é aquele moço?”. E que observador... . meu Deus.. Tudo por causa do estômago de Piótr Ivánovitch. e Vlass respondeu: “Aquele”. Tive logo um pressentimento e disse a Piótr Ivánovitch: “Aqui tem coisa”. e aqui (Aponta a testa. Nem bem Piótr Ivánovitch chamou Vlass.” Assim que ele me contou isso. Viu até que eu e Piótr Ivánovitch comíamos salmão. ah. Tem sim.“Aquele”. o que está dizendo! Não pode ser ele. debaixo da escada. na certa vai ser tal qual o pai. uma cara.. e eu disse a Piótr Ivánovitch: “Hum!” Dóbtchinski Não senhor. Prefeito (Em pânico. mas muita coisa. santo Deus.. que funcionário? Bóbtchinski Aquele funcionário sobre o qual fala a notificação que o senhor recebeu.. observa tudo. No documento consta que vai para Sarátov. Prefeito E faz tempo que ele está aqui? .. Mas por que diabo ele está aqui quando o seu destino é Sarátov? É isso mesmo! É ele o tal funcionário. que nada! Mandaram dar uma sopa de aveia aos doentes. Antón Antónovitch? Pois vamos todos ao hotel em missão oficial. de jeito nenhum! Em primeiro lugar. Prefeito Duas semanas! (À parte. quem sabe Deus me ajude agora também. os comerciantes. Mande alguém trazer. Meus senhores. quem vai querer se meter num tribunal de província? E se alguém der uma espiada em qualquer . Chegou no dia de São Nunca. dar um passeio não oficial para ver se os viajantes não estão tendo aborrecimentos. com Piótr Ivánovitch para. Na verdade. Não mais que vinte e três ou vinte e quatro anos.) Meu Deus! Valham-me todos os santos! Nessas duas semanas espancaram a mulher do subtenente! Não alimentaram os presos! As ruas viraram uma zona. vamos. (O soldado corre às pressas. preciso de você. (Dirige-se a Bóbtchinski.) O senhor disse que ele é um jovem homem? Bóbtchinski Jovem. espere. Amos Fiódorovitch! Ainda pode acontecer uma desgraça. ou sei lá. é assim que mandam os dez mandamentos. estou tranquilo. Prefeito Vá depressa buscar o comissário d.) Artémi Filípovitch O que fazer. Svistunóv! Svistunóv Às suas ordens. um jovem é claro como a água. Prefeito Melhor ainda: é mais fácil sondar um jovem. com relação a isso. Amós Fiódorovitch Não.e polícia. Um velho diabo é que seria uma desgraça. Prefeito Não senhores. uma imundície! Uma vergonha! Uma calamidade! (Põe as mãos na cabeça. Amós Fiódorovitch Mas eu. Ei. o quanto antes. mas nos corredores há um cheiro de repolho que a gente até tapa o nariz. Artémi Filípovitch Que gorros. enquanto eu vou em pessoa. de vossa parte. não! Por favor. Amós Fiódorovitch Mas você tem medo de quê? Ponha uns gorros limpos nos doentes e acabou a história. Já passei por maus momentos na vida e consegui escapar e até me agradeceram. o comissário de polícia e volte logo.Dóbtchinski Umas duas semanas. digamos assim.) Artémi Filípovitch Vamos. Não. tem que ir o conselheiro-chefe. preparem-se. o clero. eu mesmo vou resolver. ) Cena 4 O prefeito. Piótr Ivánovitch! Bóbtchinski E eu? E eu?. fico só sentado e quando me ocorre dar uma olhadinha nos processos .. E. vai se arrepender de ter nascido..ah! Deixo pra lá.. não faz mal. chocam-se com o soldado que está de volta. Vou correndo como um pintinho atrás de vocês. Prefeito A carruagem está pronta? Soldado Está. está ouvindo.. Vamos embora. ou não. (O juiz.) Ai. E onde está Prókhorov? Soldado Está na delegacia de polícia.papel. Prefeito (Pondo as mãos na cabeça.. Mas onde é que estão os outros? Será possível que você está sozinho? Eu já ordenei que também Prókhorov estivesse aqui. Só que não pode ser útil no caso. o encarregado da assistência social. Prefeito Vá para a rua. Eu só quero dar uma espiadinha. e me traga a espada e meu novo chapéu. sim senhor. espere! Vá e me traga. Prefeito Como assim? Soldado Explico: trouxeram o dito-cujo de madrugada. não vamos caber todos na carruagem.. Impossível! Não é conveniente. Permita que eu vá também. o inspetor de escolas e o chefe dos correios saem e. Nem o próprio Salomão pode resolver onde começa a verdade e acaba a mentira.. Antón Antónovitch! Prefeito Não senhor. Pois eu. Bóbtchimki. Dóbtchinski e o soldado. Piótr Ivánovitch... Jogaram dois baldes de água em cima dele e até agora nada. não. à porta. Bóbtchinski Não faz mal.. olhar pela fresta da porta e observar como ele se comporta. bêbado de cair. há quinze anos no cargo de juiz. meu Deus! Vá depressa lá para a rua. meu Deus. Prefeito . Vá correndo ao meu quarto. além do mais. Que cada um desses sargentos pegue na mão uma rua. onde você se meteu? Como é que é isso? Comissário de Polícia Estava bem pertinho daqui.71 metro. Gente malandra! Esses vigaristas.(Pega a espada do soldado e diz a ele. mandei o soldado Púgovitsin com os sargentos varrerem as calçadas. que diabo.. uma vassoura! Que varram toda a rua que leva à hospedaria. Prefeito Então. ouça. está bêbado? Comissário de Polícia Bêbado.vê que o prefeito está usando uma espada velha e não lhe manda uma nova. Prefeito E Prókhorov. Está ouvindo? Olhe aqui: eu te conheço! Conheço muito bem! Faz os seus trambiques e ainda por cima esconde colheres de prata nas botinas. Estou de olho em você!! O que você fez com o comerciante Tcherniaiev. . Prefeito Ah! Stepan Ilitch! Pelo amor de Deus. Prefeito Como você permitiu uma coisa dessas? Comissário de Polícia Só Deus sabe. hein? Ele te deu dois archins* de tecido para a farda e você lhe roubou a peça toda. Que providências você já tomou? Comissário de Polícia Conforme o senhor ordenou. Stepan Ilitch! O tal funcionário de Petersburgo já chegou. a espada está toda arranhada! Esse maldito comerciantezinho Abdúlin . Cena 5 Os mesmos e o comissário de polícia. reúna alguns sargentos e que cada um traga..) Agora vá correndo. E que deixem tudo muito bem limpo. Prefeito E onde está Derjimórda? Comissário de Polícia Derjimórda foi sentado em cima das mangueiras dos bombeiros. Ele foi lá só pró forma e voltou bêbado. aposto que já estão com suas petições no bolso do colete. Ontem houve uma briga fora da cidade. Você que se cuide! A sua posição não é para tanto! Vá! * Archim: medida russa equivalente a 0. Diabo. ) Ah. Quanto mais tudo estiver quebrado.... pega a caixa. tenta vestir a caixa de papelão. para a qual há cinco anos recebemos uma boa soma. isso aí é uma caixa. e pronto — só o diabo sabe de onde trazem tanta porcaria! (Suspira. (Em vez ao chapéu.Respondam: “Muito contentes. que nem chegamos a começar a obra.) E por que não a caixa? Que me importa a caixa! Ah. E aquele que não estiver contente vai ver depois comigo o que é estar descontente. e por baixo mais nada. não esqueçam de dizer que. Então vamos embora. Mande retirar imediatamente aquela velha cerca ao lado do sapateiro e coloque lá algumas placas de palha.. Que cidade horrível! Basta a gente colocar em algum lugar um monumento qualquer ou uma simples cerca. pode alguém dizer por esquecimento. deve ficar na ponte. sou culpado. Prefeito (Joga fora a caixa. vamos. Porque. equivalente a 13. ele deixa todo mundo com o olho roxo. meu Deus! Vamos embora. (Saem todos.) * Pud: medida antiga. que é bastante alto.Prefeito Pois veja o que você tem a fazer: o soldado Púgovitsin. Piótr Ivánovitch. Piótr Ivánovitch! (Sai e volta. que começamos a construir. senão. excelência”. e não deixem os soldados saírem à rua sem roupa: esses miseráveis vestem só a parte de cima do uniforme por cima da camisa. mais se denota a atividade do dirigente. Já apresentei um relatório sobre isso. Ah. mas que pegou fogo. E diga a Derjimórda que contenha um pouco os seus punhos. e se perguntarem por que ainda não foi construída a igreja junto à Casa de Misericórdia. culpado ou inocente.3 quilos. meu Deus.) Queira Deus que eu saia são e salvo de tudo isso o mais rápido possível e então vou acender uma vela tão grande como ninguém jamais fez e vou exigir de cada um desses comerciantes espertinhos três puds* de cera. ou por bobeira mesmo.) E se o tal funcionário perguntar aos policiais: “Estão todos satisfeitos?” . Ufa! Culpado. para dar a impressão de um certo planejamento urbano. dando uma olhada. Ah! Santo Deus! Já ia me esquecendo de que ao lado dessa mesma cerca estão amontoadas quarenta carroças com toda espécie de lixo. e não o seu chapéu. para manter a ordem. (Em vez do chapéu...) . Comissário de Polícia Antón Antónovitch. Saber alguma coisa! Mas nessa cabeça só tem besteira. mais tarde! Ana Andréievna Como. Mária Antónovna O que se há de fazer.) . se são pretos ou não. depressa... você sabe se chegou alguém. é coronel? Hein? (Aborrecida. estou prendendo o lencinho na cabeça.. mãezinha? De todo modo. procure saber direitinho. só pensa em namorados. e do outro.) Tudo por sua causa. Ana Andréievna Onde é que eles estão? Onde? Ah. santo Deus!. já estou indo”. O pano esconde as duas. Não sabe? Sua estúpida! Alguém está acenando? Pois que acene.Cena 6 Ana Andréievna e Mária Antónovna entram correndo.. espere... O quê? Saíram depressa? E você não correu atrás? Então vá. um lencinho”.. está entendendo? Olhe pela frestra e veja tudo. que tal esse forasteiro. para onde você vai. daqui a duas horas vamos saber tudo. Só quero saber uma coisa: quem é ele. (Corre até a janela.. Que bela resposta! E que tal dizer que só daqui a um mês saberemos tudo ainda melhor? (Curva-se na janela. Você pensa que ele arrasta uma asinha por você. E volte bem rapidinho. maezinha. como é ele. por sua causa! Que moleza: “Um alfinetinho. benzinho. mas é só você virar as costas para ele logo lhe fazer uma careta. vá agora mesmo! Corra e descubra para onde eles foram. (Abrindo aporta. Viu o que você fez? Agora não sabemos nada de nada! Tudo por causa desse seu maldito coquetismo! Foi só ouvir que o chefe dos correios estava aqui e se pôs toda faceira diante do espelho: olha de um lado.. que olhos ele tem. Você bem que poderia ter perguntado. mais tarde! Não quero saber de mais tarde. para onde? O quê? Já chegou? O inspetor? Tem bigodes? Que tipo de bigodes? Voz do Prefeito Mais tarde. Isso mesmo. e grita. Ana Andréievna Daqui a duas horas! Muito obrigada.) — Foi embora! Você vai ver só! E tudo por sua causa: “Maezinha.) Antón.) Eh! Avdótia! O quê? Avdótia.) E meu marido? Antocha! Antón! (Fala muito rápido. mais tarde? Essa agora.. está me ouvindo? Vá depressa. enquanto cai o pano. depressa! (Fica gritando junto à janela. depressa. A esposa velhusca do oficial passa por lá e também alguma criada pode aparecer. com o rabo entre as pernas. mas. então vai a uma lojinha: ali um velho veterano se põe a contar a vida militar e até vai explicar o significado de cada estrela no céu. E se. Uma cama. vida de cidade: teatros. E até que a gente tinha um bom dinheirinho. Duvido que cheguemos em casa! O que é que se há de fazer? Já faz mais de um mês que saímos de Peter! Esbanjou o dinheiro todo pelo caminho e. até parecem nobres. Todo mundo fala com finura. é um funcionariozinho de quinta categoria! Nem bem conhece um viajante. dança de cachorros. vê se acha o melhor quarto. ele tem que se bacanear em cada cidade. desanimado. de modo que tudo fica tão claro como se estivesse na palma de sua mão. Mas tem que ter dinheiro.qual nada! se põe a farrear: só anda de carruagem. qual nada. mas. Se a gente se cansa de ir a pé. aí sim. tudo o que a gente quiser. Às vezes se livra até da última camisa e fica só com o terno e o capote. agora. feito um nobre. fica deitado a vida inteira no quentinho. depois de uma semana. uma garrafa vazia. outras vezes. e já vai logo para a mesa de jogo. mas também tem menos preocupação. Só uma coisa é que não presta: às vezes a gente quase explode de tanto comer. E a vida. Você se casa com uma mulherona. Juro por . preciso do bom e do melhor. todos os dias compra um bilhete para o teatro e.) Que diabo. Bem feito! Tomou na cabeça! Ah! Estou farto dessa vida! Lá no campo é bem melhor: não tem tanta animação. o meu anjinho fica aí.. escova de roupas etc. fiu. perto do forno.) “Eh. não tem problema: em cada casa há sempre duas saídas e você pode se safar de tal maneira que nem mesmo o diabo vai conseguir alcançar.) Que diabo! Estou com uma fome! E minha barriga está fazendo um barulho como se um regimento inteiro estivesse tocando cornetas. por acaso. botas. fiu! (Sorri e balança a cabeça. Mas quem duvida? E bem verdade que a vida em Peter é melhor. Você vai ao mercado e os comerciantes gritam: “Ilustríssimo!” Quando a gente pega a barca. (Imita. pode se sentar ao lado de um alto funcionário público. quanto galanteio! Nunca se ouve uma palavra grosseira.” Ainda se fosse alguém que se preze. mas em lugar de poupar . comendo bolos e tortas. peça a melhor que houver: refeições ruins. é coisa fina. mesa. E todo mundo trata a gente por “senhor”. uma mala. é só tomar uma carruagem e vai sentado.. Óssip! Vá lá.Ato 2 Quarto pequeno de hotel. E a culpa é todinha dele. não. manda vender o seu novo fraque na feira. Cena 1 Óssip (Deitado na cama do patrão. se quer companhia. O que é que a gente vai fazer? O papaizinho manda dinheiro. morre de fome como agora. e a comida também. é duro de suportar. você não quer pagar. ) Cena 2 Óssip e Khlestakóv. E tudo isso por quê? Porque ele não quer saber de nada. mas menos decidido.uma ninharia. Ossip! Óssip O que deseja? Khlestakóv (Em voz alta. Estão batendo. posso muito bem ficar de pé! Pra que é que preciso da sua cama? Khlestakóv (Passeia pelo quarto.) Vá lá ver no saquinho. Óssip Lá embaixo onde? Khlestakóv (Com voz já nada decidida. deve ser ele. (Pula da cama apressadamente. Por fim. então.) Vá lá embaixo. Em vez de ir para a repartição. está toda desarrumada! Óssip Pra que me serve a sua cama? Por acaso eu não sei o que é uma cama? Tenho pernas. bem menos alta e semelhante a uma súplica. Khlestakóv Pegue isso! (Dá-lhe o chapéu e a bengala. E se a gente não pagar? (Suspira. diz em voz alta e decidido. Se tem que trabalhar.) Escute aqui. no mercado.) E de novo jogado na minha cama? Óssip E pra que eu preciso ficar jogado na sua cama? Por acaso nunca vi uma cama? Khlestakóv Mentiroso! Ficou na minha cama sim! Olha lá. mas.) Lá . não tem mais tabaco? Óssip E como é que vai ter tabaco? O senhor fumou o último já faz quatro dias! Khlestakóv (Caminha mordendo os lábios de diferentes formas. Ah! Se o meu velho patrão soubesse disso tudo! Não se importaria nem um pouco de ser ele um funcionário e levantaria a sua roupinha para lhe cobrir tanto de palmadas que lhe deixariam coceiras por mais de quatro dias. nem se fale . vão arrematá-lo por uns vinte rublos.Deus que é verdade! E o tecido é tão caro! Pura lã inglesa! Só o fraque deve ter custado cento e cinquenta rublos. E agora o dono do hotel disse que não vai lhe dar mais nada de comer enquanto não pagar o que deve. jogar cartas. vai passear pelas ruas. As calças. então trabalhe.) Ah! Meu Deus do céu! Pelo menos uma sopinha qualquer! Acho que seria capaz de comer o mundo inteirinho. Khlestakóv Mas para que o dono vir aqui? Vá lá e fale com ele. Óssip Mas... (Óssip sai.. que o senhor há quase três semanas não paga. de me contar tudo isso? Óssip E disse mais: “Dessa maneira. se instala. Khlestakóv Já chega. seu idiota! Vá. na copa. Óssip Ah.. disse ele. Eu não brinco em serviço.) Cena 3 Khlestakóv . Khlestakóv Então vá se danar! Chame o dono. O dono já disse que não vai dar mais nada pra gente comer. Vá lá e diga que me dêem de comer. vá já falar com ele. Conhecemos muito bem vagabundos e patifes dessa laia”. qualquer um chega aqui. Khlestakóv E você ainda fica feliz. não! Não quero ir não! Khlestakóv Como é que se atreve. e o seu patrão é um trapaceiro. senhor. seu idiota? Óssip E também tanto faz. Não vai adiantar nada. vou direto dar queixa para que o levem logo para a cadeia”. Que porco! Óssip E melhor que eu chame o dono para que ele mesmo venha aqui falar com o senhor. ele disse. “são dois vigaristas. Khlestakóv Como se atreve. será que. ir ou não ir. não vai dar? E um absurdo! Óssip E ainda disse mais. animal. fica endividado e depois não há como enxotá-lo. “Você e seu patrão”. Disse que vai ao prefeito.embaixo. Óssip e o Criado da hospedaria. pelo jeito. porque depois do almoço tenho mais o que fazer. como é que pode? Pois eu preciso comer. O Criado O patrão mandou perguntar o que é que o senhor deseja. Não estou brincando. depois cantarola uma canção popular e por fim qualquer coisa sem sentido. meu querido. Apesar disso. Tenho muita fome.) Estou morrendo de fome! Fui dar uma voltinha para ver se perdia o apetite. até agora não me trouxeram o almoço.. mas o patrão disse que não vai lhe dar mais nada para comer. O Criado . Então. Khlestakóv Mas se queixar por quê? Pense bem. peça que se apressem. Mas que cidadezinha horrível! Nem nas quitandas querem vender fiado! E uma verdadeira infâmia! (Começa a assobiar o início da ópera Roberto.. Ainda não tive ocasião de me encontrar com ele. Khlestakóv Muitos hóspedes? O Criado Bastante.(Sozinho. graças a Deus. diabos. meu querido. O Criado E. Khlestakóv Como vai? Boa saúde? O Criado Graças a Deus! Khlestakóv E aí? Como é que vão indo as coisas na hospedaria? Tudo em ordem? O Criado Tudo bem. mas que nada. E.. se não fosse aquela farra em Penza. até queria ir hoje se queixar para o prefeito. Ele. Para tudo é preciso a ocasião. Senão posso até ficar fraco. até que o dinheiro daria para chegar em casa. Aquele capitão de infantaria me limpou mesmo. por favor. bem que eu queria jogar mais uma vez. Khlestakóv Escute aqui. está me entendendo.) Ninguém quer vir para cá! Cena 4 Khlestakóv. a fome não passa. Que lances impressionantes! Em um quarto de hora me depenou. que diabo. com os faróis acesos e o Óssip atrás. passar pela entrada de um vizinho qualquer.. Khlestakóv E então? Óssip O almoço vem vindo! . é melhor passar fome do que chegar em casa sem a minha roupa de Petersburgo.. Foi assim que ele falou.. Khlestakóv Se por acaso ele não me der nada pra comer. E quando a gente se aproxima da filha. feito um diabo. então se atira feito um urso na sala de visitas. de Petersburgo. Cena 5 Khlestakóv sozinho..Está bem. vestido de libré? Posso imaginar.) Tenho enjoo de tanta fome. Já pensou. O Criado O que é que eu posso dizer? Khlestakóv Você apenas lhe explique muito seriamente que eu preciso comer. chegar em casa de carruagem. tem que convencê-lo. Óssip e depois o Criado. é preciso dizer: “Senhorita. Mas ele disse: “Não vou lhe dar comida até que me pague os atrasados”. os outros também podem! Essa é muito boa! O Criado Está bem. como eu.) “Ivan Aleksándrovitch Khlestakóv.” (Esfrega as mãos e faz uma reverência. uma gracinha.) Arre! (Cospe. o dinheiro é outra coisa. todo mundo em alvoroço: “Mas quem é ele. Khlestakóv Mas você tem que lhe explicar. E se eu fizesse um negócio com alguma peça de roupa? Que tal vender as minhas calças? Ah não. Agora. Cena 6 Khlestakóv. imitando o lacaio. Vou falar com ele. Ele pensa que só porque pode passar um dia sem comer nada. quem é esse aí?” E o lacaio entra: (Ergue-se. pode ser recebido?” Esses ignorantes nem sabem o que quer dizer “pode ser recebido”! Se chega algum ricaço proprietário de terras. Pena que lokhín não me alugou a carruagem. a coisa vai ficar feia. o patrão. Khlestakóv Como não? O Criado Não. Khlestakóv Ah! Seu idiota! O Criado Sim senhor! . Khlestakóv E o salmão.. E hoje pela manhã bem que vi no restaurante dois baixinhos comendo salmão e muitas outras coisinhas. as almôndegas? O Criado Isso é só para pessoas dignas. pode ser que tenha e pode ser que não tenha.) Oba! Oba! Oba! O Criado (Com pratos e um guardanapo. Khlestakóv E cadê o molho? O Criado Molho não tem.. Khlestakóv E daí. Khlestakóv Mas como não? Eu mesmo.) O patrão disse que é a última vez. vi que estavam cozinhando um monte de coisas. o peixe. Khlestakóv Mas é um absurdo! Só isso aí não vai dar! Diga ao seu patrão que isso aí é muito pouco.Khlestakóv (Batendo palmas e pulando da cadeira. porque não. sim senhor. O Criado Bem. Khlestakóv O quê? Só dois pratos? O Criado Só. o patrão. Que ele se dane! O que é que tem aí? O Criado Sopa e carne assada. ao passar pela cozinha. o patrão acha que está bom demais. O Criado Não senhor. Traga outra. meu irmão.) Está bem. idiota. Khlestakóv E como são eles? O Criado Ora. Deixa aí.) Acho que ninguém nesse mundo já comeu uma sopa dessas! Só tem penas nadando. seu tonto. acompanhado por Ossip. não quer. tá bom.) Patifes! Parece madeira.. (Come.) Mas que raio de assado é este? Isto não é assado. Vigaristas! (Limpa a boca com o guardanapo.) Vigaristas! Canalhas! Isso é comida?! Até dói o maxilar quando a gente mastiga um pedacinho. Óssip.. Não quero essa sopa. (Come... mas comigo é diferente. ai. leva os pratos. O Criado E o que é então? Khlestakóv Só o diabo é que sabe o que é isto. E os dentes até ficam escuros com uma coisa dessas. está bem. Parece um machado frito e não carne. eu também não posso comer? Será que não são hóspedes como eu? O Criado A gente sabe que não.. Khlestakóv Canalhas! Miseráveis! Se ainda tivesse um molhozinho ou um pastel. assado é que não é. Está acostumado a tratar os outros assim. ai! Mas que galinha é essa? Me dá aqui o assado! Sobrou um pouco de sopa.) Santo Deus! Mas que sopa! (Continua a comer.) Mas que porcaria de sopa é essa? Você despejou água no prato ou o quê? Não tem gosto de nada e ainda por cima fede. pega pra você.. O Criado Posso levar. senhor.Khlestakóv Seu porco! E como pode: eles comem e eu não? Por que. Vagabundos! Só querem esfolar os hóspedes.) Não tem mais nada? O Criado Não. Khlestakóv Chega de conversa. (Despeja a sopa e come. O patrão disse: quer. não quer. (Palita os dentes com o dedo. Vou avisando que comigo. Nem dá para tirar. em vez de azeite! (Corta a galinha. (O Criado tira a mesa e. diabos. quer. como são eles! Todo mundo sabe: gente que paga.) Cena 7 . Khlestakóv (Defendendo o prato com a mão.) Ai. (Corta o assado. ..” (A maçaneta da porta se move. Prefeito É meu dever. não quero. assim..) Cena 8 Khlestakóv. Ambos. Mas quem ele pensa que é? Que arrogância! Pensa que sou um negociante ou um artesão qualquer? (Cria coragem e se levanta. Khlestakóv Sério mesmo. Prefeito Desculpe.) Saudações respeitosas! Khlestakóv (Saudando. Se for por bem. me jogarem na cadeia? Não faz mal. não sei por quê.. depois.. e eu..) Eu vou dizer bem na cara dele: “Como ousa. parece que não comi nada! Aumentou ainda mais a vontade de comer. não quero. eu. Esta cidade está cheia de oficiais e de gente. Ossip. A .) Meus respeitos!. ainda.) Não sei por que chegou aí o prefeito pedindo informações e perguntando pelo senhor. Khlestakóv Não há de quê. Se pelo menos eu tivesse um trocado. Khlestakóv empalidece e se encolhe... o prefeito e Dóbtchinski.. ainda por cima. O prefeito entra e fica parado.. Prefeito (Recompondo-se um pouco. olham apavorados um para o outro por alguns minutos. e depois fala em voz alta.) Mas o que fazer?.. como. Khlestakóv (Gagueja um pouco. já dei uma de gostosão e dei uma piscadinha para a filha de um negociante. Óssip (Entra. Khlestakóv (Assustado.. cuidar para que os viajantes e todas as pessoas de bem não tenham nenhum aborrecimento. de olhos arregalados. não..) Ainda mais essa! Só falta esse infeliz do patrão ter se queixado de mim! E se eles.. de início. Não.Khlestakóv e. braços em posição de sentido. mandava já comprar um pão-doce no mercado. como cidadão responsável que zela por esta cidade. não. Mas com que direito? Como se atreve? Pois saiba que eu.) Ele é que é o culpado. eu. Permita que o convide a ir comigo para outro domicílio. Essa é boa! E por que eu deveria. tremendo da cabeça aos pés. (Bate com os punhos na mesa.. não. Por favor..) Mas eu não sei por que o senhor está me falando desses malvados ou da viúva do suboficial. não me desgrace! Tenho mulher.. Khlestakóv Não.. mas a mini o senhor não vai açoitar. aquela que faz negócios escusos e a quem eu teria mandado espancar. de boa conduta. (Cria coragem..) Ora. muito obrigado. Prefeito (Tremendo. Vão me enviar lá da minha casa. ora bolas? Eu vou pagar. A mulher do suboficial.. Prefeito (A parte. esconde-se. um cortezinho para uma roupa. E se. meu Deus... É justamente por isso que estou aqui. não quero. A carne que me dá é dura como pedra. E o chá. eu não irei! Vou diretamente ao ministro. Khlestakóv E daí? Não tenho nada a ver com isso. tente compreender.. E quanto à viúva do suboficial. eu não quero! Onde é que já se viu uma coisa dessas! Só porque o senhor tem mulher e filhos.) Ai. (Pensativo. como é severo! Já está sabendo de tudo.. falta de experiência. assim. Não quero. não acabe com a vida de um homem. então.. coisa esquisita: tem cheiro de peixe. gente que não bebe. eu sou um alto funcionário de São Petersburgo. Khlestakóv Não.culpa não é minha.. por acaso. Não tenho a menor ideia de onde vem essa tal carne. não senhor! Já se viu uma coisa dessas. A situação é precária.. é calúnia. (Bóbtchinski mostra a cara na porta. mas a culpa também não é minha. não tenho como.. é tudo calúnia. foi por falta de experiência. nem o diabo sabe o que tem dentro.. assustado. Mas se alguma coisa está. no momento. Tudo invenção daqueles malvados.) Eu.. eu tenho que ir para a cadeia? Essa é muito boa! (Bóbtchinski espia pela porta e. Ele me faz passar fome durante dias. Tive que jogar pela janela. Sei muito bem o que significa outro domicílio: quer dizer cadeia. Vou pagar tudo. . eu. Mas.. porque não tenho um tostão.. Aqueles malditos negociantes contaram tudo. tudo bem. A sopa. Sempre tenho carne boa no mercado. essa gente que quer atentar contra a minha vida. olhe aqui. Juro que vou pagar. foi uma ninharia: uma coisinha à toa para comer. houve subornos. então.) E. filhos pequenos. Prefeito (Intimidado..) Quem o senhor pensa que é? Prefeito (Perfila-se..) Pelo amor de Deus. mesmo que venha com todo o seu regimento.) Por piedade. então. pelo amor de Deus. A verba não dá nem para o chá e para o açúcar. Khlestakóv (Com mais coragem.) O senhor me perdoe. Os negociantes de Kholmogóry é que trazem. . Em vez de duzentos. Temos a honra de ficar em pé. estou inteiramente às suas ordens.Prefeito (À parte.) Sente-se! (O prefeito e Dóbtchinski sentam-se. E eis que o acaso me recompensou com esse encontro tão agradável. francamente. O que tiver que ser será. A coisa agora vai melhorar. Vou lhe devolver logo que chegar em casa. até menos.) Ora. Khlestakóv Óssip! (Óssip entra. Agora sim. por ossos do ofício. por favor. proprietário de terras local. Khlestakóv Quero sim.) Sente-se. (Em voz alta. nem precisa contar.) É preciso ser mais atrevido. assim. Prefeito (À parte. Sem o senhor. e mais ainda por amor cristão à humanidade.) Ai. Meu dever é ajudar os nossos visitantes.. (A Dóbtchinski. Khlestakóv Façam-me o favor. não me venha com essa! Não tinha ideia como pagar! (Em voz . Eu não. dei-lhe quatrocentos. assim de propósito. mas confesso que cheguei a pensar que os senhores tinham vindo aqui para me. Khlestakóv Eu também estou muito feliz. (Em voz alta.) Mas por que estão em pé? Tenham a bondade de sentar-se. Ele quer se passar por incógnito.) Mande vir aqui o criado da hospedaria. vou me fazer de bobo: vou fazer de conta que não sei quem ele é. Não preciso mais do que uns duzentos rublos. graças a Deus! Aceitou o dinheiro. e passamos no hotel. além do dever. Khlestakóv (Pegando o dinheiro.. Prefeito (Entregando o dinheiro.) Mas que situação danada! Como se vira bem! Que embrulhão! A gente não sabe nem de que lado pegar. (A Dóbtchinski.) Prefeito (À parte. é outra coisa. Agora sim. eu aqui com Piótr Ivánovitch Dóbtchinski. quero que cada mortal receba boa acolhida. quero sim um empréstimo e vou acertar agora mesmo a conta com o patrão. Vejo que o senhor é um homem de bem.. não vou demorar muito. basta arriscar.) Duzentos certinhos. Prefeito Não se preocupe. Prefeito (Aparte. vamos tentar.) Nós estávamos dando uma volta. Seja o que Deus quiser. para saber se os viajantes estavam sendo bem tratados.) Se o senhor realmente está precisando de dinheiro ou de qualquer outra coisa. sentem-se. Pois não sou como outros prefeitos que não se importam com nada. eu iria ficar aqui um tempão: não teria a menor ideia de como pagar a conta. (Ao prefeito e a Dóbtchinski. Está bem. Bóbtchinski espia pela porta e tenta ouvir. eu.) Muito agradecido. posso ver como o senhor é cordial e sincero. sofrendo por causa de quem? Por causa desses percevejos imprestáveis que nem deveriam ter nascido.) Mas olhem só como ele dá bolas à imaginação. (Passa os olhos pelo quarto. e tem cada percevejo que nunca vi igual: mordem como cachorros. Ele acha que.. Vou obrigá-lo a contar tudo! (Em voz alta. não sei. Às vezes. O velho está zangado porque. não? Khlestakóv É sim. Por que raios eu devo acabar com a minha vida no meio de mujiques? Agora minhas aspirações são outras. Prefeito (À parte. pretende o senhor se dirigir? Khlestakóv Vou para a província de Sarátov. hein? Está bem! E nem fica vermelho! Com esse aí a gente tem que ficar de orelha em pé! (Em voz alta. é muito escuro. nem bem a gente chega lá. Agora inventou essa história do velho pai! (Em voz alta. para onde. o senhor está viajando por puro prazer. balança.) Acho que este quarto é um pouco úmido. a demora dos cavalos é uma coisa bem desagradável. Prefeito Não me diga isso! Um hóspede tão instruído. eu poderia esmagá-lo com um dedo. ou a fantasia quer escrever alguma coisa. até agora. é uma distração para o espírito.) O senhor notou com muita justeza. Minha alma anseia por ilustração. O que é que se pode fazer neste fim de mundo? Veja só o que acontece aqui: à noite a gente não dorme. com relação às estradas. é meu pai que me obriga a voltar. não? Khlestakóv Não.. ler um pouquinho. mas não cai! E que sujeitinho sem-graça. sem poupar esforços. . Pelo visto este quarto também é escuro. não posso .) Se me permite perguntar. Um velho de cabeça dura. O proprietário tem o hábito de não fornecer as velas. para as minhas propriedades.) Província de Sarátov. meu pai é tolo e teimoso. mas sabe-se lá quando virá a recompensa. dizem que.) Mas que enrolador! Balança. para que lugares. Mas veja. com expressão irónica. a gente quer fazer alguma coisa.é escuro.) E o senhor pensa em viajar por muito tempo? Khlestakóv Para ser franco. Vou logo dizer a ele: queira o senhor ou não. Prefeito (À parte. Um filho-da-mãe. não fiz carreira em Petersburgo. Mas. se por um lado. Eu queria só ver se fosse ele zanzando pelas repartições. tudo pelo bem da pátria. não? Khlestakóv E um quarto deplorável. um nada de nada. por outro lado. Espera aí que você não me escapa. Prefeito (À parte. ao que parece.alta.) O bom Deus o proteja no caminho de volta. muito escuro. Sabe. já nos dão uma medalha de condecoração. não posso viver em Petersburgo. Mas não. Não pense o senhor que falo isso para adulá-lo. sobretudo quando o hóspede é uma pessoa culta. não! Não sou digno. acompanhado de Óssip. tranquilo.. como ficará feliz! Eu sou assim: hospitaleiro desde criança. De minha parte.. não sou digno! Khlestakóv Mas diga lá. . confesso que não exijo nada. Não tenho esse vício. Bóbtchinski espia pela porta. a não ser lealdade e respeito. Cena 9 Os mesmos e o Criado. Ficarei muito mais satisfeito numa casa particular do que nesta bodega. eu não sou digno... Juro por Deus. Eu também não gosto de gente de duas caras. Falo de todo o coração. não. respeito e lealdade. sinto que isso já seria uma honra demasiada para mim. há para o senhor um quarto maravilhoso.. Criado O senhor chamou? Khlestakóv Chamei. Prefeito Se me atrevesse. ofereço de coração... Traga a conta. Khlestakóv E por que não? Com imenso prazer. Prefeito Eu é que vou ficar contente! E minha mulher. Não se zangue.. Khlestakóv Muito obrigado.Prefeito Será que posso tomar a liberdade de lhe pedir. Aprecio muito sua franqueza e hospitalidade. Em minha casa. então. iluminado. Khlestakóv Mas o quê? Prefeito Não. Khlestakóv Por que não? Por que não? Prefeito E depois. o senhor pediu o almoço. logo depois poderá ver a escola e a disciplina no ensino de nossas ciências.) Prefeito E também. por exemplo.) Fora! Vão pagar. assim está bom. podemos dar uma passadinha na casa de detenção e nas prisões da cidade para que veja como tratamos os criminosos. ele vai esperar.. Prefeito O senhor não gostaria agora de visitar algumas instituições de nossa cidade. Khlestakóv .. Quanto é tudo? Prefeito Por favor. se for de sua vontade. para os viajantes talvez fosse. estou à sua disposição. Fale logo: quanto é que eu devo? Criado No primeiro dia.Criado Não faz muito tempo trouxe para o senhor uma conta.. como. Khlestakóv. se o senhor assim desejar. Khlestakóv Com todo prazer. no dia seguin-te. (Ao Criado... como está tudo em ordem. (Bóbtchinski enfia a cabeça pela porta. (Guarda o dinheiro. Khlestakóv Não me lembro mais de suas contas idiotas.) (O Criado sai. Bóbtchimki espia pela porta.. salmão e daí em diante comeu fiado. Khlestakóv Isso mesmo. Khlestakóv Idiota! Agora vai ficar fazendo continhas. não se preocupe. Dóbtchinski. a assistência social e outras? Khlestakóv Mas para quê? Prefeito Para que o senhor veja como andam as coisas.) Cena 10 O prefeito. ) Escute aqui: corra a todo vapor e leve esses dois bilhetes: um para Zernlianíka. não foi nada. mas é capaz de derrubar um elefante. Prefeito (Fazendo um sinal de desaprovação a Bóbtchinski. se desejar.) Meu querido. (A Óssip. que se dirige à porta. (Dá passagem a Khlestakóv e o segue. que esta escutando por detrás. vou escrever aqui mesmo. Prefeito (Para Dóbtchinski. sei lá. Prefeito (Em voz baixa para Dóbtchinski.) . mas. O que o senhor prefere. mas papel. A Khlestakóv. Todos soltam exclamações. a porta cai sobre o palco e sobre ela Bóbtchinski. Bóbtchinski se levanta. fala para si mesmo.. dou um jeito. é melhor passarmos só pela assistência social.) Bem. leve tudo à minha casa. agora não sobrou lugar para você. com Bóbtchinski atrás dele. Prefeito Como quiser. duas palavrinhas para que minha mulher se prepare para receber tão honorável visitante? Khlestakóv Mas para quê? Bem. Tenha a bondade. Nada que me tire do sério.) (Cai o pano. (Enquanto escreve.) Khlestakóv E então? Não se machucou? Dóbtchinski Não foi nada. (A Khlestakóv. ir com sua própria carruagem ou com a minha? Khlestakóv Prefiro ir com o senhor. Ele tem um bendito emplastro que logo vai me deixar bom. Que tal escrever nesta conta mesmo? Prefeito Pois não. Piótr Ivánovitch. e o outro para minha mulher. Só quero saber quem ele é e até que ponto devo me preocupar. Dóbtchinski Não tem importância. a tinta está aqui. em sua presença.) Não é nada. mas volta-se para Bóbtchinski e o repreende. por favor! Vou dizer ao seu criado que leve sua mala. (Acaba de escrever. entrega a Dóbtchinski. Tenha a bondade.. Só vou ganhar um bom remendo bem aqui.) Permita-me escrever.) E você! Não tinha outro lugar para cair! Se esborrachou feito um diabo no chão! (Sai. à casa do prefeito.) Então vamos ver como a coisa vai rolar depois de uma boa bóia e de uma boa garrafa! E temos um bom Madeira daqui mesmo: a gente não dá nada por ele.Prisões? Mas para quê? Não. nesse momento. onde começa o nariz! Vou dar uma passadinha em Khristian Ivánovitch. Todo mundo sabe onde é. na assistência social. Não deveria ter dado ouvidos a ela. só pra me contrariar! Já falei que não é Dóbtchinski? Mária Antónovna . você aí. (Olha pela janela e exclama. Ana Andréivna Mas onde? Você sempre com suas fantasias. já faz uma hora que estamos esperando e você fazendo fita: já está pronta e ainda fica fazendo hora. Como se não houvesse mais ninguém na face da Terra. que nada! Você está sempre imaginando coisas! Não é Dóbtchinski de jeito nenhum! ‘Acena com o lenço. Ana Andréivna Veja só.) Ah! Mãezinha. dentro de uns minutinhos vamos ficar sabendo de tudo. Cena 1 Ana Andréievna e Mária Antónovna estão junto à janela. venha aqui. depressa! Mária Antónovna E Dóbtchinski...Ato 3 O mesmo cenário do Ato 1. Que moleza!. Mária Antónovna Calma. mãezinha! Vem vindo alguém lá no final da rua... sim. querida mãe. Avdótia deve chegar logo. Que droga! Não tem viva alma! Até parece de propósito. Mas quem será? É mesmo uma chateação! Quem é que pode ser? Mária Antónovna É Dóbtchinski.) Ei.. Ana Andréivna Mas que coisa! Faz de propósito. de fraque.. as duas na mesma pose de antes. mãezinha. Pois é verdade! Quem será? Baixinho. logo. minha mãe! Ana Andréivna Mas que Dóbtchinski. Não falei, não falei, mãe? Viu como é Dóbtchinski? Ana Andréivna Ah! Agora vejo, é Dóbtchinski sim! E daí? E por que é que você tem sempre que teimar comigo? (Grita pela janela.) Depressa! Depressa! Como anda devagar! E então, onde eles estão? Vai logo, fala daí mesmo, tanto fax. Hein? Ë muito severo? O quê? E o meu marido? Como está meu marido? (Afasta-se um pouco da janela, aborrecida.) Mas que imbecil, não conta nada até chegar aqui! Cena 2 As mesmas e Dóbtchinski. Ana Andréievna Agora fale, faça-me o favor! Não tem vergonha? E eu, que confiava só em você, achando que você era honesto! E, de repente, todos desapareceram, e o senhor com eles! E eu até agora não sei nada de nada! Não tem vergonha? Eu que sou madrinha de seu Vânia e de sua Lisa, e o senhor me apronta uma dessas! Dóbtchinski Palavra de honra, comadre. Corri tanto para render-lhe minhas homenagens que nem tenho mais fôlego. Minhas homenagens, Mária Antónovna! Mária Antónovna Meus cumprimentos, Piótr Ivánovitch! Ana Andréievna E então? Agora me conte: o que se passa? Dóbtchinski Antón Antónovitch mandou-lhe um bilhetinho. Ana Andréievna Está bem, está bem. Mas, enfim, quem é ele? Um general? Dóbtchinski Não, não é general, mas fica nada a dever a um general, tal a sua educação, e que finura! Mária Antónovna Ah! Então é o mesmo sobre o qual escreveram ao meu marido? Dóbtchinski O próprio. Fui o primeiro a descobrir com Piótr Ivánovitch. Ana Andréievna Então, conte tudo, tudo. Dóbtchinski Graças a Deus, tudo em ordem. A princípio, ele recebeu Antón Antónovitch com certa aspereza. É, sim senhora. Ficou zangado e disse que no hotel tudo estava mal, que não iria se hospedar na casa dele e que não queria ser preso por causa disso. Mas, depois, quando percebeu a generosidade de Antón Antónovitch e conversou um pouco melhor com ele, a sua cabeça virou e, graças a Deus, tudo começou a correr bem. Agora foram visitar as instituições da assistência social... Para dizer a verdade, Antón Antónovitch chegou a pensar em alguma denúncia secreta e até eu fiquei assim com medo. Ana Andréievna Mas assustado por quê? O senhor não é funcionário público! Dóbtchinski A senhora sabe, quando um homem importante fala, a gente morre de medo. Ana Andréievna Mas o que é isso? Bobagem sua! Conte, conte tudo. Como ele é? Velho ou moço? Dóbtchinski Moço, bem moço: uns vinte e três anos, mas fala como um velho: “Por que não”, ele diz, “vou com os senhores num e noutro lugar?”... (Agita as mãos.) Tão simpático! “Gosto”, diz ele, “de ler e escrever um pouquinho, mas este quarto não ajuda nada, é um tanto escuro.” Ana Andréievna E como ele é? Loiro ou moreno? Dóbtchinski Mais para o castanho e os olhos, então, tão agitados, parecem bichinhos. Chegam a nos perturbar. Ana Andréievna O que está escrito aqui no bilhete? (Lê.) “Apresso-me a informá-la, coração, que a minha situação era lamentável, mas, graças à misericórdia divina, dois pepinos salgados e meia porção de caviar, por um rublo e vite e cinco copeques...” (Interrompe.) Não estou entendendo nada. Que história é essa de pepinos e caviar? Dóbtchinski Ah! É que Antón Antónovitch escreveu rapidinho, num papel qualquer, sobre uma conta do hotel. Ana Andréievna Ah! Então é isso. (Continua lendo.) “Mas, graças à misericórdia divina, parece que, no final, tudo vai dar certo. Prepare depressa um quarto para o ilustre hóspede, aquele forrado com pedacinhos de papel amarelo. Quanto ao almoço, não se preocupe com nada especial, pois vamos comer alguma coisa lá na assitência social com Artémi Filípovitch. Agora, vinho sim, muito vinho. Diga ao negociante Abdúlin para mandar o que tiver de melhor, senão vou eu mesmo lá fuçar na adega dele. Beijo suas mãos, meu coração, do sempre seu, Antón Skvozník-Dmukhanóvski...” Ai, santo Deus! E preciso andar depressa! Ei, tem alguém aí? Michka! Dóbtchinski (Corre até a porta e grita.) Michka! Michka! Michka! (Entra Michka.) Ana Andréievna Escute aqui: vá depressa até o negociante Abdúlin... espere aí, vou escrever um bilhetinho. (Senta-se à mesa, escreve um bilhete e, enquanto isso, continua falando.) Entrege este bilhete ao cocheiro Sídor para que ele o leve correndo a Abdúlin e traga, de lá, o vinho. E venha já arrumar o quarto de hóspede bem arrumadinho. Ponha lá a cama, o lavatório e tudo o mais... Dóbtchinski Está bem, Ana Andréievna. Agora vou correndo ver como é que o inspetor inspeciona. Ana Andréievna Vá, vá, ninguém o está segurando! Cena 3 Ana Andréievna e Mária Antónovna. Ana Andréivna Bem, Máchenka, agora precisamos cuidar da toilete. E jóia da capital. Deus nos livre se ele achar alguma coisa ridícula em nós. O que fica mais decente em você é aquele vestido azul com babadinhos. Mária Antónovna Ah!, não, mãezinha, o azul não! Não gosto nada dele. A filha de Liápkin-Tiápkin está sempre de azul e a filha de Zemlianíka também. É melhor eu vestir o estampado. Ana Andréivna O estampado!... Só para me contrariar. O outro vai ficar muito melhor, agora eu quero botar o vestido cor de palha. Adoro o cor de palha. Mária Antónovna Ah!, mãezinha, mas a senhora não fica bem de cor de palha. Ana Andréivna Como não fico bem? Mária Antónovna Não fica. Aposto o que quiser, não fica bem. Para usá-lo, é preciso ter olhos bem escuros. Ana Andréivna Era só o que faltava! E por acaso não tenho olhos escuros? O mais escuro possível. Cada absurdo! Como é que não são escuros se, quando tiro a sorte nas cartas, sempre me vejo na dama de paus? Mária Antónovna Ah!, mãezinha, a senhora está mais para dama de copas. Ana Andréivna Que bobagens, só bobagens! Que dama de copas qual nada. (Sai, apressada, com Mária Antónovna e fala atrás do palco.) Agora essa, imagine só, dama de copas! Só porque você quer! (Depois que elas saem, abrem-se as portas e aparece Michka varrendo a sujeira para fora. De outra porta, sai Óssip com uma mala na cabeça.) Cena 4 Michka e Óssip. Óssip Para onde vou agora? Michka Por aqui, por aqui, amigo. Óssip Espere aí. Deixe-me respirar um pouco. Ah!, que vida desgraçada! Com a barriga vazia, qualquer coisa parece pesada. Michka Diga, amigo: o general vem logo? Óssip Que general? Michka Seu patrão, ora essa! Óssip Meu patrão? Mas que general que nada! Michka Então não é general? Óssip General, sim, de meia-tigela. Michka Mas isso é mais ou menos general de verdade? Óssip Mais. Michka Que coisa! É por isso que armaram toda essa confusão. Óssip Escute aqui, meu querido: vejo que você é um rapaz bem esperto. Veja se prepara alguma coisa pra gente comer! Michka Para o senhor, meu amigo, ainda não tem nada preparado. O senhor não vai querer comer qualquer coisa, vai? Mas deixa o seu patrão sentar pra comer; aí, sim, vai ver que refeição vai ter para o senhor também. Óssip Bem, mas o que você tem? Como qualquer coisa. Michka Sopa, mingau e pastéis. Óssip Então me dá logo tudo, sopa, mingau e pastéis! Não se preocupe: como de tudo. Bem, vamos levar a mala! Há outra saída por aqui? Michka Há sim. (Ambos levam a mala. para o quarto ao lado.) Cena 5 Dois soldados abrem as duas folhas da porta principal. Entram Khlestakóv, atrás dele o prefeito, depois o encarregado da assistência social, o inspetor de escolas, Dóbtchinski e Bóbtchinski com um emplastro no nariz; o prefeito mostra aos soldados um papel que está no chão. Eles correm para apanhá-lo, chocando-se na pressa. Khlestakóv Que belas instituições! Fico contente que os senhores mostrem aos viajantes tudo o que a cidade possui. Não me mostraram nada nas outras cidades. Prefeito Nas outras cidades, se o senhor me permite dizê-lo, os dirigentes e funcionários, por assim dizer, pensam apenas em tirar vantagem de tudo. Mas aqui, não; em princípio, não temos outra aspiração que não, com devoção e zelo, ganhar a estima de nossos superiores. Khlestakóv O almoço estave excelente: comi até não poder mais. Aqui se come assim todos os dias? Prefeito Foi exclusivo para tão honrado hóspede. Khlestakóv Eu gosto de comer. Afinal, para que é que a gente vive? Para colher as flores do prazer. Como se chama mesmo aquele peixe? Artémi Filípovitch (Aproxima-se, correndo.) Bacalhau, senhor. Khlestakóv Piótr Ivánovitch. prosa. fiz uma casinha de cartas de baralho e depois sonhei a noite toda com as ditas-cujas. Nossa organização funciona assim. Bóbtchinski (Para Dóbtchinski. os presos em boas condições e há poucos bêbados. senhor. Desde que fui nomeado para esse cargo . é a limpeza aqui. Quantos problemas diferentes. sararam? Achei que não havia muitos. será que poderiam me dizer se vocês não têm por aqui algum entretenimento. mas sim pela honestidade e pela ordem. Tinha um monte de camas lá. vê-se logo que tem muita instrução. meu queridinho. Os outros todos ficaram bons. Prefeito E. não quero mesmo. Khlestakóv Ah. pode acreditar.. pelo menos.Muito saboroso. Que observações.) Que bom. a ordem é essa.. se me permite dizer-lhe.. Khlestakóv Por favor. fica pensando: “Queira Deus que tudo seja feito para que os superiores reconheçam o meu zelo e fiquem satisfeitos.) Deus nos livre e guarde! Aqui não temos a menor ideia desse tipo de sociedade. Numa palavra.isso talvez lhe pareça incrível -. diante da virtude. assim.) Mas que malandrão.. tudo isso são cinzas e vaidades. não? Artémi Filípovitch Exatamente. as honrarias. mas.. o que se pode querer mais? Palavra de honra. se contentaria apenas em agir em proveito próprio. mas. agora me lembro. E onde foi mesmo que nós almoçamos. Um outro prefeito. uma boa sociedade onde se possam.. Artémi Filípovitch (À parte. por acaso.) Ah.. tudo corre na santa paz. Quando tudo está em ordem na cidade. apenas para divertir as crianças. jogar cartas? Prefeito (À parte. O doente nem bem entra no hospital já fica bom. é claro. Também não posso ficar indiferente diante delas. só Deus sabe. outras. confesso que também gosto de ficar matutando: às vezes. Certa vez. assim por exemplo. se. todo esse quebra-cabeça é de responsabilidade do prefeito. no hospital. as ruas varridas. Artémi Filípovitch Sobraram mais ou menos uns dez. fico com tamanho nojo que até tenho vontade de cuspir. até mesmo quando vai para cama dormir. o homem mais inteligente se veria em apuros. até me lanço em versinhos.” Se serei recompensado ou não.. vejo algum rei de ouros ou outra coisa qualquer.. muito bom mesmo. todos ficam logo curados como moscas. um reparo acolá. mas. sei bem aonde você quer chegar! (Em voz alta. como enrola! Que dom Deus lhe deu! Khlestakóv E verdade. um concerto ali. tenho a consciência tranquila. Eu nunca tive uma carta nas mãos e muito menos sei como se jogam cartas. sim. na assistência social. mas. E não é tanto por causa dos remédios. . graças a Deus. Claro que são sedutoras.. a gente. E os doentes. confesso.) E esse bandido me levou ontem cem rublos. o meu prazer é maior ainda. Se. deter o prazer sui generis de conhecê-la. Khlestakóv Bem. Estou acostumado a viver em sociedade. Ana Andréievna e Mária Antónovna. Cena 6 Os mesmos. também não é assim. Como estou feliz de me sentar. veja bem. Khlestakóv (Afetado. Prefeito É bem melhor dedicar nosso tempo em favor do Estado. Ana Andréivna . de repente.. se o seu desejo é mesmo inevitável. aí.. vou me sentar.) Imagine. ao seu lado. Khlestakóv (Faz reverência. por exemplo. mas jogar às vezes é bem sedutor. Ana Andréivna O prazer é todo nosso de ter entre nós personalidade de tal ordem. Tudo depende do ponto de vista de que a gente olha pra coisa. enfim. mas não me atrevo a crer que esteja falando sério.Que Deus nos livre.) Quão feliz estou. comprenez vous. depois da capital. como se pode matar o nosso precioso tempo com isso? Luká Lukítch (À parte..... Faça o favor de sentar-se. (Lança um olhar para Ana Andréievna e se exibe diante dela.. muito pelo contrário. Mas. Mas. minha senhora.. Ana Andréivna Queira desculpar-me... minha cara senhora. é claro que. e.. esta voyage seja muito desagradável para o senhor.. Não. Imagino que. me desculpem. se não fosse.) me recompensou de tudo. Khlestakóv Extremamente desagradável. tenho que pôr o pé na estrada: hospedarias imundas.. Ana Andréivna Não diga isso! O senhor tem demasiada gentileza de falar assim só por cortesia. Prefeito Tomo a liberdade de apresentar-lhe minha família: minha esposa e minha filha. você deixa de dobrar a aposta em vez de triplicar. Khlestakóv Estar de pé a seu lado já é uma felicidade. as trevas da ignorância. o acaso que me. diz ele. tomamos você pelo comandante-chefe”. Depois. Khlestakóv Vamos esquecer a hierarquia. Até alguns vaudevillezinhos. é Ivan Aleksándrovitch!” Certa vez. até me tomaram pelo comandante-chefe. simplesmente impossível..Realmente. Ao contrário. Khlestakóv Como. por favor. Artémi Filípovitch Estamos bem em pé. sentem-se. Ivan Aleksándrovitch. pega a pena e se põe a escrever tr.) Não gosto de cerimónias.. Eles até queriam me nomear assessor de colegiatura.. neste exato minuto. mas. tr. Os soldados saíram correndo dos quartéis e se perfilaram diante de mim. (Todos ao mesmo tempo. Ana Andréivna Mas o que é isso? O senhor me faz tantas honrarias! Não mereço tanto. Ana Andréivna Vivo no campo. senhores? Tenham a bondade de sentar-se. meu irmão. Mas é claro.. Khlestakóv Mas. minha senhora. pensando bem. não se pode compará-lo a Petersburgo! Ah! Petersburgo! Aquilo sim que é vida! Talvez a senhora imagine que eu seja um simples escrevente. também tem suas colinas..) Mas por que estão em pé. logo. um oficial que é muito meu amigo me disse: “Pois é. pensei. Sempre me .. tudo me agrada. meu velho!” Dou uma passadinha de dois minutos na repartição só para dizer: “Isto tem que ser assim. eu até faço todo o esforço para não ser notado. aquela ratazana.) Prefeito Com um status como o meu. Luká Lukítch Não se preocupe. isto tem que ser assado!” E. vou engraxar suas botas”. como deve ter sido desagradável. Ele me dá uns tapinhas no ombro: “Venha almoçar comigo. (O prefeito e todos os outros se sentam. minha senhora. Ana Andréivna Ah! Não me diga! Khlestakóv Também conheço atrizes lindíssimas.. senhora. Khlestakóv E verdade.. Ë só eu sair para ir a qualquer lugar e pronto. um funcionário. mas o campo. (Ao prefeito. seus riachos.. pelo menos agora. pra quê? E o contínuo corre sempre atrás de mim pelas escadas com uma escova: “Com licença. o chefe da seção é assim comigo. devo ficar em pé. não merece? Claro que merece. não.. já começam a falar: “Olha quem vai lá. Mas é absolutamente impossível a gente se esconder. como que por acaso: eu nem queria escrever. escreva alguma coisa. Ana Andréivna Então quer dizer que Brambeus é o senhor? Khlestakóv Perfeitamente. nas revistas também. ‡ O Telégrafo de Moscou: revista progressista editada por N. Senkovski. Roberto. Smírdin* me paga por isso quarenta mil rublos. o diabo. participante da rebelião contra o czar Nicolau I. A.. As bodas de Fígaro. Aliás. mano” . meu caro. É de Zagóskin. Khlestakóv Sim senhora. Tudo que apareceu sob o nome do barão Brambeus. Mária Antónovna Mas. Púchkin é meu amigo do peito. Ana Andréivna Quer dizer que o senhor também escreve? Como deve ser agradável! Certamente também publica nas revistas? Khlestakóv Claro.* A fragata esperança. meu irmão. jornalista. De fato. há muita coisa minha escrita. mas há um outro Iúrí Misloslávski que é meu. Sempre digo a ele: “E aí. Bestujev (1797-1837). Ana Andréivna Outra vez! Sabia que você iria teimar comigo de novo. pseudónimo do dezembrista A. mamãe. é isso mesmo. Norma.‡ fui eu que escrevi tudo isso. redator da revista Biblioteca para leitura. * Barão Brambeus: pseudónimo de O. Polevy a partir de 1825 e fechada em 1834 por decreto de Nicolau I. † O Telégrafo de Moscou.às vezes responde -. ocorrida em dezembro de 1825. Ana Andréivna Logo adivinhei. mas a direção do teatro me pediu: “Por favor. e muito conhecido nos anos 30-40 do século XIX. Khlestakóv Ah! sim. vai”.. E também corrijo os artigos de todo mundo. obra minha. Pensei comigo mesmo: “Por que não? Toma lá. . escritor. meu amigo!” E acho ainda que escrevi tudo numa noite só e deixei todos maravilhados. Ana Andréivna Então. A. certamente. “vamos indo. lá está escrito que é do senhor Zagóskin.” Muito original. I. Tenho uma cabeça ágil como o vento.“Vamos levando. quer dizer. † A fragata esperança: novela de Marlínski. Até nem me lembro mais dos nomes. E tudo assim.encontro com literatos. como vai?” . Iúrí Miloslávski ** também é obra sua. . Mas o mais interessante é dar uma olhada na minha ante-sala antes de me levantar.) Façamme a gentileza. Está bem. mas pensei: “Isto vai acabar chegando aos ouvidos do soberano. publicado em 1829 e que.. fez muito sucesso. aceito o cargo. Lá a gente organiza também um bom whist: o ministro das Relações Exteriores.. no quarto andar. mas vou logo avisando. na época. eles se dão conta. começou um “diz-que-diz-que” como? o quê? quem vai ocupar o lugar? -..para onde.. vão ver só. Foi muito estranho: o diretor foi embora . F. Condes e príncipes conversam e zumbem como abelhas e só se escuta zzz. venham mesmo à minha casa. mensageiros. Aí. senhores. E conhecida como a casa de Ivan Aleksándrovitch. vou logo dizendo a todo mundo: “Me conheço muito bem”.. A sopa. À primeira vista.. E no mesmo instante pelas ruas surgem mensageiros. ninguém sabia. ** Iúrí Miloslávski: romance histórico de M. Khlestakóv se inflama ainda mais. só o diabo é que sabe.. muitos generais apareceram e toparam a parada. As vezes também o ministro. A gente joga até não poder mais. o embaixador alemão e eu. mal consigo dizer à cozinheira: “Mávruchka.” Ah! não! Que bobagem! Ksqueci que moro no primeiro.” E foi dito e feito: era só eu entrar na repartição . não têm saída e vêm para cima de mini. “Então vá lá”. (Voltando-se a todos.) Ah! Não! Brincadeira comigo não. digo. Todos os dias vou a bailes. o embaixador inglês. o embaixador francês.. Só a escada me custou.. até cheguei a dirigir uma repartição. A gente levanta a tampa e sente um tal cheiro. li n tão. . e vem de navio. (O prefeito e os demais tremem de medo. mas a coisa não era nada fácil não. E ao subir correndo as escadas de minha casa. digo. quis recusar.. mas olhando bem. e também à minha folha de serviço. mas um melão que custa setecentos rublos. numa sopeira. Passei um sabão em todo mundo! Até o Conselho de Estado tem medo de mim. se forem a Petersburgo. zzzz. “eu aceito. trinta e cinco mil só de mensageiros! Como é que está indo a coisa. o meu capote. Sirvo. Recebi-os em robe de chambre.era aquele terremoto.. Imaginem. Em Petersburgo. meus senhores. Zagóskin.. mensageiros.. Todos se agitavam e tremiam como folhas. eu pergunto? “Ivan Aleksándrovitch. (O prefeito e os outros erguem-se de suas cadeiras atemorizados. melão. Ana Andréivna Imagino com que bom gosto e que bailes maravilhosos devem ser! Khlestakóv A senhora nem queira imaginar. direto de Paris. por exemplo.. Certa vez. Smirdín: livreiro muito conhecido de São Petersburgo e editor da revista Biblioteca para leitura. vá dirigir a repartição!” Para dizer a verdade.. impossível de se encontrar igual na natureza. também dou bailes.* A. minha casa é de primeira. parece fácil. O que se pode fazer? Eu sou assim! Não poupo ninguém. naturalmente..) Até nas correspondências vem escrito: “Para sua excelência”.. fiquei um pouco constrangido. olha lá! Estou por dentro de tudo. Como está bem escrito! Khlestakóv Confesso que vivo de literatura. aceito”. por favor. Sabem. Ana Andréivna Eu acho que li foi o seu. muito satisfeito. Bóbtchinski (Para Dóbtchinski.. Piótr Ivánovitch.. senhores.. Tudo isso é um absurdo. Khlestakóv Que absurdo! Descansar? Está bem. Khlestakóv (Com voz rápida e cortando.) Mas vovo-vo-vo.. seguido pelo prefeito. Piótr Ivánovitch. (Declama. O almoço.. no mínimo é um generalíssimo. Prefeito Vo-vo-vo. Até logo.) Cena 7 Os mesmos.. Vou descansar.) Bacalhau! Bacalhau! (Entra no quarto ao lado. quem é ele... Ana Andréievna. Khlestakóv (Com a mesma voz.) Prefeito (Aproxima-se tremendo dos pés à cabeça e faz um esforço para falar.. E se de fato for general. (Escorrega e por pouco não cai no chão. vo. menos Khlestakóv e o prefeito. Dóbtchinski .Estou em toda parte. mas os funcionários o seguram com respeito. Quase morri de medo! O que você acha.) Mas o que é isso agora? Prefeito Vo-vo-vo. Vou todos os dias ao palácio. vossa excelência não ordenaria descansar um pouco? Ali está o quarto e tudo o mais que for preciso. no que diz respeito ao status? Dóbtchinski Acho que ele é quase general.. Isto é que significa ser homem! Nunca na vida estive diante de uma persona tão importante.) Isto é que é homem. E logo vou ser nomeado marech. muito. Você escutou como tratou o Conselho de Estado? Vamos logo contar tudo a Amos Fiódorovitch e a Koróbkin. bom mesmo.. em toda parte.. Bóbtchinski Eu já acho que um general não lhe chega nem aos pés. Estou satisfeito.) Não estou entendendo nada. pode até ser que uma vez ou outra. Mária Antónovna Mas.) Artémi Filípovitch (A Luká Lukítch. (Ambos saem. Mária Antónovna Ah! Mamãe. minha senhora! Cena 8 Ana Andréievna e Mária Antónovna. pensativo. olhou o tempo todo. vamos dar uma olhadinha nela também!” . tudo o mais. não vive sem isso. E se. chega de tolices! Isso está fora de qualquer propósito. depois.) Adeus.Até logo. Olhou quando começou a falar de literatura e. comadre.) Que medo horrível! E a gente nem sabe por quê. olhou outra vez. Ana Andréivna Que homem agradável! Mária Antónovna Que encanto! Ana Andréivna Que maneiras refinadas! Vê-se logo que é jóia da capital. mãezinha. mamãe. quando contou que jogou whist com os embaixadores. sempre quer discutir. em companhia de Luká.. é verdade mesmo! Ana Andréivna Lá vem ela de novo! Meu Deus. Perco completamente a cabeça. assim só por olhar. Quem você pensa que é para ele te olhar? E por que cargas d’água ele iria olhar para você? Mária Antónovna É verdade. ele olhou foi pra mim! Ana Andréivna Por favor. As atitudes e tudo. E nós nem estamos de uniforme. Ah! Que maravilha! Adoro essa gente jovem. Notei que era olhos só para mim. Ana Andréivna Bem. Acho até que ele gostou bem de mim. ainda por cima.. depois de voltar a si ele mandar um relatório para Petersburgo? (Sai. ele tenha pensado consigo mesmo: “Está bem. .) E por que não haveria de ser verdade? Um homem meio tocado sempre desabafa tudo. mais parece uma mosca de asas cortadas. Ana Andréivna Pois eu não senti o menor temor..) Cada uma que acontece agora no mundo! Ainda se fosse alguém de porte. Mas. Todos correm ao seu encontro fazendo sinais. deixam escapar uma ou outra tolicezinha e só vão se dar mal. fininho . Tudo o que vai no coração. um magrinho. da porta. mas o marido é que vai entrar bem.) Psiu!. mas não..Cena 9 Os mesmos e o prefeito. Aí é que está. Simplesmente vi nele um homem do mundo culto e de bom tom. Mas.vai a gente saber quem ele é.. Você.) Michka! Vá chamar os soldados Svistunóv e Derjimórda.. Eles devem estar aqui ao lado da entrada. mas esse aí. lá na hospedaria. Até falou mais do que devia. Mas que coisa! Até agora não consigo me recuperar do susto.. só o diabo sabe o que passa pela cabeça. afinal.) Para que perder tempo com vocês?.. coraçãozinho. Se fosse um militar. Cena 10 Os mesmos e Óssip. sai pela língua. E há pouco. Parece que estou a um passo do abismo ou da forca. (Depois de uma breve pausa. entregou-se. não precisa se incomodar. Seu status não me interessa nem um pouco. Prefeito (Entra na ponta dos pés. como se fez de durão! Despejava tantas alegorias. mulheres! Basta pronunciar essa palavra e pronto! Para vocês. logo se veria. Bem se vê que é jovem... Joga cartas com ministros e vai ao palácio. se pelo menos a metade do que ele disse é verdade? (Fica pensativo. Até pensei que eu não conseguiria nada nem mesmo em um século.. (Olha para a filha. Mas sem mentira não pode haver uma boa conversa. (Abre aporta e fala. É claro que mentiu um pouco. se comportou com ele tão à vontade. vestido com esse fraquezinho. Psiu! Ana Andréivna O que é? Prefeito Não estou nada contente de ter lhe dado tanto de beber. Prefeito Ah! Vocês. .. Ana Andréivna Quanto a isso. Nós duas sabemos muito bem.) Prefeito (Sozinho. quanto mais a gente pensa.. como se fosse algum Dóbtchinski. tudo é brincadeira! De repente. tantos rodeios. como seu patrão é atraente! Ana Andréievna Diga. Tudo tem que estar direito. comeu bem? Óssip Muito bem. os condes também aparecem por lá.Ana Andréievna Venha cá.. então. queridinho. sim. Então. ainda pode ser melhor. Ana Andréievna Escute aqui. por favor! Vocês me atrapalham com toda essa conversa idiota. Prefeito .) Agora chega. (Em voz alta.. como é o seu patrão? Duro? Gosta de passar sermão ou não? Óssip Gosta. santo Deus. de tudo em ordem. Prefeito (Para a mulher e a filha. não? Óssip (À parte. estou muito agradecido ao senhor. minha senhora. Prefeito Ai. Comi muito bem. Óssip. Bem. corno é que você se chama? Óssip Óssip. Prefeito Agora chega. depois. Mária Antónovna Óssip. amigo. uai. Ana Andréievna Agora me diga. meu caro! Prefeito Psiu! E aí? Ele já dormiu? Óssip Ainda não! Está se espreguiçando. imagino que são muitos os condes e os príncipes que visitam o seu patrão. e então amigo? Ana Andréievna Qual status do seu patão? Óssip O dele.) Com certeza. meu amigo. como é que ele. já chega! (Para Óssip.) O que dizer? Se a comida agora foi boa. vocês com essas perguntas estúpidas! Não me deixam falar de negócios.) E então. Óssip. lá o seu patrão usa uniforme? Prefeito Chega! Mas que matracas! Estamos falando de coisas sérias.. ele pergunta: “E aí. então. gosto muito de você. Lembre-me disso quando eu chegar” “Ah”. meu amigo. então agora dou-lhe para umas rosquinhas. que narizinho bonitinho tem o seu patrão! Prefeito Esperem um pouco. aí depende.. Pegue uns rublozinhos para um chá. E de mim também.. excelência!” . Óssip (Pegando o dinheiro. Prefeito Está bem.. Prefeito Está bem. que não passo de um servo. comida boa. Olhe. me responda o que mais chama a atenção do seu patrão. (A Óssip. está bem. Mária Antónovna .) Muito obrigado. Óssip O que fiz para merecer. Quando se está em viagem. está bem.. amigo. eu também estou contente. Óssip.“deixa pra lá! Sou um homem simples”.Simpatizo muito com você. e também vai ganhar. quer dizer. então esse anfitrião não presta. Dei-lhe um dinheirinho para o chá. é sempre bom tomar mais uma xícara de chá. senhor! Que Deus o abençoe por ajudar um homem pobre. ele cuida muito bem..penso comigo mesmo (Faz um gesto com a mão. por favor. Óssip. Óssip. Mas o que ele gosta mesmo é de ser bem recebido e que a comida seja boa. Óssip. excelência? (Guarda o dinheiro. Ana Andréievna Escute aqui. bem. amigo. tem razão.) Então vou beber à sua saúde.“Ah!. o que mais o agrada quando viaja? Óssip Ele gosta. Você deve ser um bom sujeito.) É verdade. te acolheram bem?” “Muito mal. . Prefeito Comida boa? Óssip Isso mesmo. Juro por Deus! Em qualquer lugar por onde passamos. que cor de olhos o seu patrão prefere? Mária Antónovna Óssip. Ana Andréievna Escute aqui.) .. Trata-se da vida de um homem. Agora faz bastante frio. deixem-me falar! (A Óssip.. Ana Andréievna Venha me ver. Mas.. meu querido.) Bem. já chega.. (A Óssip. ou mesmo sem petição alguma. se formos lá ouvir. Prefeito Lá vão elas fofocar. amigo.) E vocês.. teremos que tapar os ouvidos..) Pelo amor de Deus. (Óssip sai. E se vocês perceberem alguém chegando com uma petição. Prefeito Psiu! Mas que ursos desajeitados . fiquem aí na entrada e não saiam do lugar! E não deixem nenhum estranho passar. é só pedir. vá lá ver tudo o que é necessário para o seu patrão. Mas que diabo aconteceu com vocês? Derjimórda Cumprindo ordens.. mas alguém com cara de quem vai se queixar de mim.. Prefeito Psiu! (Tapa-lhea boca. Máchenka! Vou dizer-lhe o que reparei em nosso hóspede.. mas só podemos falar entre nós. vão ver só. Psiu!. Ana Andréievna Vamos.) E você.como batem essas botas! Entram de uma forma que parecem descarregar uma tonelada da carruagem.) Corveja como um urubu (Imitando.) Prefeito Psiu! (Fica na ponta dos pés e fala em voz baixa.) Então. amigo..) Estão entendendo? Psiu!.. não façam barulho. Vão com Deus. O que não tiver na casa. Acho que.. Cena 11 Os mesmos. expulsem o dito-cujo e lhe dêem um belo pontapé! (Mostra com o pé.) Ato 4 .. (Sai na ponta dos pés e atras dele os soldados.Óssip. dê um beijo em seu patrão! (Ouve-se no outro quarto a tosse de Khlestakóv. Se um único deles passar. principalmente comerciantes.. meu querido..) Cumprindo ordens! Parece rugir dentro de um barril! (Para Óssip. Derjimórda e Svistunóv. e por que não? Amós Fiódorovitch E perigoso. O senhor. Toda a cena se desenrola a meia-voz. na ponta dos pés. rápido. Artémi Filípovitch. Escutem aqui: não é assim que se fazem essas coisas em um Estado bem organizado. quase na ponta dos pés.A mesma sala na casa do prefeito. dizem que chegou ao correio um dinheiro não se sabe bem para quem”. o senhor será o primeiro.. mas é preciso tomar alguma providência. em círculo e na mais perfeita ordem! Santo Deus! Ele vai ao palácio e ainda por cima passa um sermão no Conselho de Estado! Sentido! Postura de militares. Amos Fiódorovitch. o chefe dos correios. Amós Fiódorovitch O quê. Luká Lukítch. ele pode se ofender. nem sequer os ouvidos possam ouvir! E assim que se faz numa sociedade bem organizada! Pois bem. o senhor sabe o quê. Por que estamos nós aqui como um batalhão? A gente tem que se apresentar um de cada vez. Amós Fiódorovitch . tem que ser assim.) Pelo amor de Deus. E será que não seria melhor na forma de um presente por parte da nobreza para a construção de algum monumento? Chefe dos Correios Ou então dizer assim: “Sabe. Piótr Ivánovitch. Amós Fiódorovitch.) Artémi Filípovitch Como quiser. tudo só entre quatro olhos e de tal forma que. rápido. um alto funcionário. por exemplo? Artémi Filípovitch Ora. (Ambos os Piótrs Ivánovitchs correm. Cena 1 Entram com cuidado. Amós Fiódorovitch Adulá-lo? Artémi Filípovitch Isso mesmo.. deste lado. todos como militares. fique deste outro lado. e o senhor. Dóbtchinski e Bóbtchinski. Artémi Filípovitch Olha lá se ele não vai é mandar o senhor pelo correio para algum lugar bem distante. Amós Fiódorovitch (Reúne todos em semicírculo. Deus nos livre. em trajes de gala e uniformes. Amos Fiódorovitch. senhores. Piótr Ivánovitch. Todos (Rodeando-o. finalmente. deixem-me em paz .. senhores! (Neste momento. e a língua fica como que atolada em lama. seja o nosso pai!. Pois foi em sua instituição que o ilustre visitante fez uma boquinha. Por favor.Vamos. Ouvem-se exclamações a meia-voz. Amos Fiódorovitch. como provedor espiritual da juventude. é verdade.) Que nada. todos saem empurrando-se e a sala fica vazia. Amos Fiódorovitch! Amós Fiódorovitch Deixem-me em paz. mas também sobre aTorre de Babel.É melhor o senhor.. aglomerando-se e empurrando-se para sair.) Voz de Bóbtchinski Ai! Piótr Ivánovitch.. Amós Fiódorovitch Nem pensar! Que Cícero que nada! Imaginem só! Então. Todos se precipitam para a porta. se uma vez ou outra. o que acontece com certo atropelo. Artémi Filípovitch Então é melhor Luká Lukítch. Piótr Ivánovitch! Você pisou no meu pé! Voz de Zemlianíka Soltem-me. Em seu discurso parece que é o próprio Cícero que baixa... a gente se anima ao falar de cães de caça. Amos Fiódorovitch. Não. então. senhores.estão me apertando! (Soltam várias exclamações: “Ai! Ai!” e. meus senhores. ouvem-se passos e pigarros no quarto de Khlestakóv. por favor! Artémi Filípovitch Bem.) Cena 2 Khlestakóv . você sabe falar não apenas de cachorros.. não posso! Confesso que tenho uma educação tal que conversar com alguém que tenha um grauzinho a mais me põe num estado em que minha alma simplesmente evapora. meus senhores. você e ninguém mais. não nos abandone. Luká Lukítch Não posso. por favor. . é bem verdade. e não por interesse. fui condecorado com a ordem de São Vladimir do 4° grau com a aprovação das altas autoridades. só sei que.) Meu Deus! Não sei onde fui me meter. gosto ainda mais que me agradem de todo o coração. Eu acho que ontem eles me meteram não sei o que goela abaixo.. confesso. gosto desta vida. pára e diz para si próprio. aqui a gente pode passar o tempo muito bem. Já a ordem de Sant’Ana de 3° grau.. Sei lá. assessor de colegiatura Liápkin-Tiápkin. não. (A parte.) Tenho a honra de me apresentar: juiz do tribunal local. por acaso. Khlestakóv Como nada? Eu vi o dinheiro cair. não senhor. À parte. Até agora a cabeça está martelando. Pelo que vejo.) Nada.) Santo Deus! Santo Deus! Faça com que tudo corra bem! Os meus joelhos até estão tremendo. Amós Fiódorovitch (Avançando um pouco com a mão fechada. Cena 3 Khlestakóv e Amos Fiódorovitch. E a filha do prefeito não é nada mal. perfilandose e colocando a mão na espada. é vantajoso ser juiz? Amós Fiódorovitch Por esses nove anos. fui eleito por três anos pela vontade da nobreza e continuo no cargo até hoje.) Pelo visto. Khlestakóv Tenha a bondade de sentar-se. não gosto muito. De onde essa gente tirou esses colchões e esses edredons? Cheguei até a suar.) E o dinheiro aqui na minha mão. Khlestakóv E. até que ainda se poderia. deixa cair os bilhetes no chão. Gosto de hospitalidade e. Khlestakóv Gosto muito da ordem de São Vladimir. Parece que estou em cima de brasas. Então o senhor é o juiz daqui? Amós Fiódorovitch Desde 1816. tirei uma boa soneca. e a mãezinha também. (Em voz alta. e a mão parece em chamas.(Entra com olhos sonolentos. Amós Fiódorovitch (Ao entrar. Khlestakóv O que é que o senhor tem na mão? Amós Fiódorovitch (Desconcertado. ) De jeito nenhum. senhor. esforço-me para bem servir os meus superiores. Amós Fiódorovitch (Despede-se e sai.. Amós Fiódorovitch Ora! O que é isso! Além disso..) Agora é o fim . nada. Ao entrar. É claro que com minhas poucas forças.) Coragem.. Mas devolvo logo que chegar em casa. é uma honra para mim. quer dizer. coragem! Me salve. perdido! Khlestakóv Sabe de uma coisa? Me empresta aqui esse dinheiro.. com zelo e dedicação.) E um bom sujeito esse juiz. com muito prazer. senhor. Virgem Santíssima! Khlestakóv O senhor sabe..estou perdido.. perfila-se . Alguma ordem.) Ai. (À pane. meu Deus! Já me vejo diante do tribunal! Já chegou o carro para me prender! Khlestakóv (Pegando.. senhor? Khlestakóv Que ordem? Amós Fiódorovitch Não teria o senhor alguma ordem ao tribunal local? Khlestakóv Mas pra quê? Olha aqui. à parte. Amós Fiódorovitch (À parte.) Mas que lugar esse aqui! Khlestakóv (Depois da saída de Amós. gastei muito na viagem: uma coisa e outra. (Levanta-se da cadeira e perfila-se em posição de sentido. Muito agradecido.) Não ouso importuná-lo mais com minha presença. Nada. sim. pois não. não tenho a menor necessidade dele....) Pois não. Amós Fiódorovitch (Apressadamente. Cena 4 Khlestakóv e o chefe dos correios de uniforme..Amós Fiódorovitch (Tremendo todo. (À parte..) É dinheiro. ) Mas que coisa estranha aconteceu comigo: durante a viagem gastei tudo o que tinha. senhor. senhor. (Olha bem nos olhos dele e diz para si mesmo.e segura a espada. mas e daí? Não é a capital. Está aqui. não é verdade? Chefe dos Correios Justamente. Concorda comigo? Chefe dos Correios Isso mesmo. Faço-o de todo o coração. senhor. o senhor viveu sempre aqui. Khlestakóv E do que a gente precisa? Na minha opinião. Não é verdade que não é a capital? Chefe dos Correios Isso mesmo.) Vou mais é pedir um dinheirinho emprestado a esse chefe dos correios. conselheiro Chpékin. Khlestakóv Ah! Muito prazer! Gosto muito de gente agradável. (À parte. Khlestakóv Muito obrigado. Chefe dos Correios Tenho a honra de me apresentar: chefe dos correios. e para . Khlestakóv Gosto muito desta cidadezinha. Khlestakóv E só na capital existe gente de bom-tom e não esses gansos provincianos. seja franco. sabe? Claro que não tem muita gente aqui. senhor. Confesso que não gosto de passar privações em viagem. Então. Sente-se. não? Chefe dos Correios Isso mesmo. Acham que sou um pouco estranho. numa cidadezinha destas. não é mesmo? Chefe dos Correios Isso mesmo. pode-se viver muito bem. (Em voz alta. senhor. mas o meu caráter é assim mesmo. Khlestakóv Confesso que estou muito contente por termos a mesma opinião. Khlestakóv Então. O senhor não poderia me emprestar trezentos rublos? Chefe dos Correios Por que não? Com o maior prazer.) Pelo menos não é nada orgulhoso: pergunta sobre tudo. a gente só precisa ser respeitado e amado com sinceridade. (O chefe dos correios faz uma reverência e sai. Khlestakóv Ah! Muito prazer! Sente-se. eu fumava uns charutinhos por vinte e cinco rublos o cento. Lá.) Luká Lukítch (Consigo mesmo. e segura a espada. indeciso. meu caro. E o senhor? O que prefere. Aqui está o fogo.) (Luká tenta fumar e está todo trémulo. conselheiro titular Khlópov. também o sexo feminino. É um bom charuto. Gosto desse tipo de gente. sente-se! Aceita um charutinho? (Dá-lhe um charuto. (Passa a vela.. as loiras ou as morenas? Luká Lukítch Não sei não senhor. É claro que não é como os de Petersburgo.) Acho que também o chefe dos correios é um sujeito muito bom.) Não ouso importuná-lo mais com minha presença. Pelo menos é servil.. deixa cair o charuto. de verdade.) Não é desse lado! Luká Lukítch (Assustado.quê? Não é verdade? Chefe dos Correios Isso mesmo.) Tenho a honra de me apresentar: inspetor de escolas. Cena 5 Khlestakóv e Luká Lukítch.) (Khlestakóv acende um charuto. Eu. Não sou nem um pouco indiferente. confesso que é a minha perdição. Aliás.) Diz aí. perfila-se e segura a espada.) O diabo que a carregue! Essa minha maldita timidez! Khlestakóv Pelo visto. Atrás dele ouve-se quase alto: “Está com medo do quê?” Luká Lukítch (Perfila-se. pegue. fume. Depois de fumar. senhor. Khlestakóv . a gente até quer lamber as mãos. empurrado com força porta adentro. pelo contrário.) Veja só! Por essa eu não esperava. as loiras ou as morenas? (Luká Lukítch fica completamente perplexo e não sabe o que dizer. Aceito ou não aceito? Khlestakóv Pegue. cospe e faz com a mão um gesto de desalento − à parte. Alguma recomendação para a administração dos correios? Khlestakóv Nenhuma. o senhor não é lá muito chegado a um charuto. (Levanta-se. tremendo. Durante a viagem. sua Excel..) Graças a Deus! Quem sabe agora não queira passar lá na escola! Cena 6 Khlestakóv eArtémi Filípovitch. (À parte. Pelo menos.. que se perfila e segura a espada..) Khlestakóv Muito agradecido. Artémi Filípovitch Tenho a honra de me apresentar: encarregado da assistência social.. alguma morena já lhe deu bola. Luká Lukítch (Perfila-se e segura a espada. ilustrí..) Não ouso importuná-lo mais com minha presença. não. hein? Na certa. senhor. à parte. Khlestakóv Veja só que coisa estranha me aconteceu. Faço questão de saber o seu gosto.) A maldita língua me traiu! Khlestakóv Vergonha? É bem verdade que nos meus olhos há qualquer coisa que provoca timidez. não é verdade? Luká Lukítch Isso mesmo... (À parte..) Nem sei mais o que dizer. gastei tudo o que tinha.) Só faltava não achar! Aqui! Aqui! (Tira do bolso e entrega o dinheiro. não há mulher que resista. Deu ou não deu? (Luká Lukítch fica calado.. vossa alte. tremendo.Não disfarce.. Luká Lukítch Tomo a liberdade de informar-lhe. Khlestakóv Passe bem! Luká Lukítch (Sai correndo e diz aparte.. conselheiro .. Khlestakóv Ah! Não quer falar.) Olha lá! Ficou todo vermelho! Vermelhinho! Por que não responde? Luká Lukítch Fiquei com vergonha. O senhor não poderia me emprestar trezentos rublos? Luká Lukítch (Apalpando os bolsos. até a menorzinha.. Tudo na maior confusão: as correspondências.) Posso lhe afirmar que não desejo outra coisa a não ser cumprir o meu dever com zelo. Artémi Filípovitch Tive a honra de acompanhá-lo e de recebê-lo pessoalmente na assistência social.. para ser franco . Vive incutindo na juventude princípios tão mal-intencionados que até fica difícil expressar.) Mas veja só.. que o senhor houve por bem conhecer. são a cara do juiz. Só vive atrás de lebres e deixa os cachorros nas repartições públicas. Como é que o senhor se chama? Esqueço sempre. Ele é pior do que um jacobino. Khlestakóv Bom dia! Tenha a bondade de sentar-se. tudo no papel. mal ele põe o pé na rua. esse não faz absolutamente nada. (Depois de um breve silêncio. o senhor tem filhos? . me lembro bem.. O juiz é outro. E me diga também. A sua conduta. não é mesmo? Artémi Filípovitch É bem possível. Por favor. Temos aqui um pequeno proprietário de terras. todas atrasadas. Todos. Khlestakóv Ah! Sim. Artémi Filípovitch Zemlianíka. por obséquio. Sabe. O senhor mesmo faça o obséquio de verificar.. tive a impressão de que ontem o senhor era um pouco mais baixo. o chefe dos correios.. Terei muito prazer. Khlestakóv E eu vou lhe confessar o meu ponto fraco: gosto de uma boa comida. (Aproxima-se com a cadeira e diz a meia-voz. O senhor não gostaria de ordenar que eu ponha tudo isso no papel? Khlestakóv Acho bom sim. o tal juiz já se mete em sua casa para ficar com sua mulher. Pois bem. esse aí que acabou de sair. faço isso pelo bem da pátria. Basta olhar para os filhos: nenhum deles se parece com Dóbtchinski. que está sob minha responsabilidade. gosto tanto de ler alguma coisa engraçada quando estou aborrecido.Zemlianíka. Khlestakóv Ah! Isso mesmo! Zemlianíka.. Dóbtchinski. Khlestakóv Não me diga! Quem diria! Artémi Filípovitch E o inspetor de escolas então? Não entendo como lhe confiaram um cargo desses. Artémi Filípovitch Fico feliz de bem servir a pátria. o senhor poderia me dizer uma coisa.. O senhor me ofereceu um excelente almoço. embora ele seja meu amigo e parente -.é claro. sua conduta é das mais repreensíveis. posso até jurar. Cena 7 Khlestakóv. gastei tudo o que tinha. Khlestakóv Que coincidência! Muito agradecido. Tudo o que me contou foi muito divertido. (Volta. Khlestakóv Que coisa! Grandinhos! E como eles. Elizaveta. como se chamam? Artémi Filípovitch Nikolai. Artémi Filípovitch. Dóbtchinski Proprietário de terras.. Gosto muito disso tudo.) Ei. aconteceu uma coisa estranha. Bóbtchinski e Dóbtchinski. Dois já grandinhos.. Piótr Ivánov. Piótr Ivánov.Artémi Filípovitch Claro. você! Como é mesmo o seu nome? Sempre me esqueço. Khlestakóv Muito interessante. Mária e Perepetuia. (Faz uma reverência antes de sair.. O senhor não teria uns quatrocentos rublos para me emprestar? Artémi Filípovitch Tenho. da família Bóbtchinski. da família Dóbtchinski.. Bóbtchinski Tenho a honra de me apresentar: habitante desta cidade. Artémi Filípovitch Não ouso importuná-lo mais com minha presença.) Khlestakóv (Acompanhando-o. senhor! Cinco. Durante a viagem. Artémi Filípovitch Por acaso o senhor não gostaria de perguntar como eles se chamam? Khlestakóv E isso.. . reabre aporta e grita. Ivan.) Não tem importância. nem tomar o seu tempo destinado aos deveres sagrados. Khlestakóv Por gentileza. como é que eles.. Artémi Filípovitch Artémi Filípovitch. Volte sempre. os sessenta rublos mesmo. se o senhor quer saber.) Tem dinheiro? Dóbtchinski Dinheiro? Como assim? Khlestakóv Mil rublos para me emprestar. serve cem. se não têm mil. Bóbtchinski Vê se procura um pouco melhor. O meu filho mais vdlio. não tenho nada. Khlestakóv Que bom. Bóbtchinski Tinto assim. Falei por falar. não.. Quem sabe se não caiu por ali. Khlestakóv Bem. vinte e cinco.) Dóbtchinski Tomo a liberdade de lhe pedir uma coisa referente a urna circunstância muito delicada. juro por Deus! E você. não? Como está o seu nariz? Bóbtchinski Graças a Deus! Não se preocupe. está todo aplicado na caixa da beneficência pública. Piótr Ivánoritcli.Khlestakóv Ah. Khlestakóv O que é? Bóbtchinski Algo de caráter muito delicado.. já está completamente grudado no seu devido lugar. não tem importância. então. (De repente e com voz entrecortada. Dóbtchinski Não.. não tem? Dóbtchinski Aqui comigo. senhor. Khlestakóv Bem. palavra que não caiu nada. Foi o senhor que caiu. permita que lhe . Tanto faz. não tenho. então.) Piótr Ivánovitch. Estou feliz.) Ao todo. Dóbtchinski (Olhando na carteira. Piótr Ivánovitch! Eu sei que tem um buraco no seu bolso direito.. senhor. você não teria cem rublos? Eu só tenho quarenta em bilhetes. claro. Bóbtchinski (Procurando nos bolsos. (Pega o dinheiro. pois o meu dinheiro. Aceito. já conhecia os senhores. se o senhor me permitir. Dóbtchinski Queira desculpar. já o incomodamos muito com nossa presença. Dóbtchinski Eu não me atreveria a importuná-lo. vai sim. E um garoto que promete muito: sabe de cor muitos versos e. em tal cidade. o senhor diga a todos os figurões. quero que ele seja completamente meu filho. pois que seja! Acho que pode. tudo vai ser resolvido. por obra do acaso. quer dizer. vive Piótr Ivánovitch Bóbtchinski. senhor.. pois logo depois fiz tudo direitinho..diga. Bóbtchinski E verdade. é um modo de falar. Khlestakóv Perfeitamente.. como eu.. pois ele nasceu como se fosse dentro do casamento. senhor. tem muitas habilidades. nasceu antes do meu casamento.. Dóbtchinski. Que o diga Piótr Ivánovitch. pois é. perante a lei. em tal cidade vive Piótr Ivánovitch Bóbtchinski. Diga assim mesmo: lá vive Piótr Ivánovitch Bóbtchinski. que. se lhe cai nas mãos uma faca. se não fosse pela capacidade dele. o senhor estiver diante do soberano. (Voltando-se para Bóbtchinski. Khlestakóv O que é? Bóbtchinski Peço-lhe encarecidamente que. Vou cuidar disso. está bem. Assim. espero que. tenho um pedido muito importante... Vossa Majestade.) E o senhor. Khlestakóv Tá bom. Khlestakóv Está bem. Bóbtchinski E se. quando chegar a Petersburgo. Falarei com. não quer me dizer nada? Bóbtchinski Justamente.. Khlestakóv Perfeitamente. senhor. pois diga também ao soberano. Khlestakóv É mesmo? Dóbtchinski Quer dizer. tal qual um prestidigitador. como mandam as leis do sagrado matrimónio. põe-se logo a esculpir trenozinhos com tanta arte. Bóbtchinski . “Vossa Excelência ou Vossa Magnificência”. aos diferentes senadores e almirantes. e que se chame. E gosta também de um bom dinheirinho. Vou contar o dinheiro só pra ver quanto eu tenho. Na certa. Vamos ver quem é quem! Cena 9 Khlestakóv e Óssip com tinta e papel. Belo gesto esse de me emprestar dinheiro. que papelada engordurada! Oitocentos. ijiie se divirta com todos esses aí. já o incomodamos muito com nossa presença.) Coitado daquele que cai nas garras de Triapítchkin. setecentos. (Ossip olha pela porta e diz: “Já vai”. Ele perde o pai.. Khlestakóv O que é isso.. Que idiotas! Vou escrever a Triapítchkin em Petersburgo contando tudo. Tive muito prazer. oitocentos. Estes outros trezentos do chefe dos correios..) Aqui há muitos funcionários.Queira desculpar. Veja só! Mais de mil.) Cena 8 Khlestakóv (Sozinho. seu imbecil. Khlestakóv Está vendo. São seiscentos. Óssip! Traga aqui papel e tinta. Acho que eles estão me tomando por um alto funcionário. Ah! E aí. esses funcionários são boa gente. mas não perde a piada. Ei.. como me recebem e me tratam? (Começa a escrever. quero só ver se eu te pego agora. Apesar de tudo. Ele escreve lá os seus artiguinhos.) Óssip . novecentos. não tem importância. Estes trezentos são do juiz. ontem fiz muito farol. capitão. (Acompanha-os. E verifique se os cavalos são bons mesmo. é melhor a gente se mandar antes que. Para que ficar mais tempo com eles? Que vão para o inferno! De repente aparece um outro.) Escuta aqui.. Diga que é tudo por conta do erário. Tenho vontade de ficar aqui mais um pouco. Espera. me traga uma vela. Khlestakóv (Escreve.. Pois é claro que o tomaram por outro. Khlestakóv (Escreve. (Contínua a escrever. o senhor sabe. Khlestakóv (Escreve. já é hora.) Só estou imaginando como Triapítchkin vai morrer de rir..) Está bem.. vamos embora. antes.) (Óssip traz uma vela e Khlestakóv sela a carta. Ivan Aleksándrovitch! Os cavalos aqui são de primeira. Mas antes leve esta carta e pegue também a documentação. ouve-se a voz . Vamos amanhã. Nesse momento. Diga aos cocheiros que darei uma gorjetinha se voarem como mensageiros do imperador e que cantem canções!. Óssip Vou mandar a carta. agora chega. Óssip Que amanhã que nada! Pelo amor de Deus. Que bom seria ir embora! E que cavalos poderiam nos dar aqui.. enquanto eu mesmo preparo tudo para não perdermos tempo.) Que absurdo! Por quê? Óssip Porque sim. a carta ainda não está pronta. (Dobra e sobrescreve. Khlestakóv (Escreve. é missão oficial. meu irmão. Vou chutar Iochtámtskaia. senão o patrão vai ficar muito bravo. Como vão desembestar!. mas.. Tudo sem pagar.. Leve esta carta ao correio e diga lá ao chefão que vai sem pagar mesmo.Graças a Deus! Mas sabe de uma coisa. Pelo amor de Deus.. Ivan Aleksándrovitch! E verdade que foi recebido com grande pompa e tudo o mais.. senhor.) Então está bem.) Estou curioso para saber onde ele mora agora: na Pochtámtskaia ou na Gorókhovaia? Pois ele vive mudando de uma casa para outra sem pagar. Ivan Aleksándrovitch? Khlestakóv O quê? Óssip Vamos embora daqui! Por Deus.. Seu pai vai ficar uma fera com sua demora. Óssip (Sai e fala fora do palco. Que fiquem com Deus! Já se divertiu aqui por dois dias. Mas. E diga também que tem que ser muito rápido. por alguém daqui. Khlestakóv (Continua a escrever. Ah! E diga também que arranjem para o patrão a melhor tróica.) Nada disso. está dormindo.de Derjimórda: “Aonde é que você pensa que vai. Óssip. Vozes de Comerciantes Deixe-nos passar.” Que diabo é isto? Nunca vi esse título! Cena 10 Khlestakóv e os comerciantes.) O que desejam. mas o guarda não deixa. barbudo? Já não lhe disseram que é proibido passar?”) Khlestakóv (Entrega a carta para Óssip. Óssip? Que barulho é esse? Óssip (Olha pela janela. (O barulho aumenta.. Estão agitando uns papéis. senhor! Fazem ofensas sem motivos. Temos assuntos importantes.) Khlestakóv O que há.) (Recebe pela janela as petições. desenrola uma delas e lê. que trazem cestos de vinho e pães de açúcar. Khlestakóv Deixe entrar. Ordene. deixe entrar! Que passem.) São os comerciantes que querem entrar. da parte do comerciante Abdúlin. (Óssip sai.. diga que os deixem passar. que apresentemos nossa petição. Khlestakóv O que desejam. Khlestakóv Em que posso servi-los? Comerciantes Não nos desampare.) Toma. meus queridos? Vozes de Comerciantes Rogamos vossa clemência. Pode levar. Ministro dos Negócios das Finanças da Fazenda. .) “A Sua Altíssima Excelência. Khlestakóv (Aproxima-se da janela. Voz de Derjimórda Fora. meus queridos? Comerciantes Suplicar a vossa misericórdia. fora! Não pode receber. Na certa. Excelência. querem falar com o senhor. paizinho! Não pode impedir. meu caro. Não recuse. Negociantes Como não. diz que santo Onofre também é seu santo. Dá vontade de pôr a corda no pescoço. conhuiin que seja para bem longe de nós. Khlestakóv Mas será possível? Que vigarista! Comerciantes Por Deus! Nunca se viu um prefeito assim. posso. Oferecemos também açúcar e vinho. Mas. Mas. Comete tantas injustiças que nem se podem descrever. não. E proibido por lei. mas sempre nos comportamos bem! Vestidos para a esposa e a filhinha. No dia do seu santo. mas a tal peça mede no mínimo cinquenta metros. aceitar. O que é que se há de fazer? A gente lhe presenteia no dia de santo Onofre também. para ele é sempre pouco! É sim! Chega na loja e tudo o que lhe cai nas mãos. Ele manda todo um regimento de soldados pra dentro da sua casa. a gente leva pra ele do bom e do melhor.) Mas por que só trezentos? Melhor ainda quinhentos. nem pensar. ele carrega. aí sim. E não é por falar. senhores. seu tártaro!” Juro por Deus! Se ao menos a gente lhe faltasse com o respeito. contanto que nos ajude. já é outra coisa. por exemplo. Então a gente leva. Só que ele ainda quer mais. Segura a gente pela barba e diz: “Ah. Leve lá pra minha casa”. diz assim: “Ah. Comerciantes Para onde Vossa Excelência decidir mandá-lo será bom. sim. Khlestakóv Não. Não costumo aceitar suborno de espécie alguma. Agora. Logo que vê uma peça de lã. mas não é só coisa boa que ele leva. A gente tem que esconder tudo lá na loja quando vê que ele vem vindo. meu caro. Um prefeito como esse. Khlestakóv Mas é simplesmente um bandido! Comerciantes Isso não é nada! E vai a gente dizer alguma coisa. se preferirem me emprestar trezentos rublos. Ou então manda trancar as portas.Khlestakóv Quem? Um dos Comerciantes Sempre o prefeito. paizinho. nosso pão e nosso sal. Faz a gente alimentar todos os regimentos que passam por aqui. santo António. que coisa. Um empréstimo. nunca tivemos. paizinho! (Tiram o dinheiro. Até numas ameixas que estavam no barril há sete anos. Faz cada uma. senhor. Diz ele: “Não vou te castigar fisicamente nem vou te torturar. ele passa a mão aos montes. é mesmo um bom tecido. Khlestakóv Mas que vigarista! E o caso de mandá-lo para a Sibéria. você vai comer o pão que o diabo amassou”. Ele leva toda e qualquer porcaria. e que nem mesmo o meu criado quer comer. nunca lhe negamos. . ) Peço vossa misericórdia.) Deixem-nas passar. Ouve-se uma voz de mulher: “Não se atreva a me proibir de entrar! Vou me queixar de você diretamente a ele. que nos ouça. Khlestakóv De jeito nenhum. Passem pra cá o açúcar e o vinho! Passem tudo pra cá. Só nos resta a forca. Comerciantes Faça essa caridade. Khlestakóv (Na janela.. sim. Comerciantes (Fazendo uma reverência. Khlestakóv Sem falta. Vai que a carruagem ou qualquer outra coisa quebre. Mulher do Serralheiro (Curvando-se até o chão.) O que deseja. tudo vai ser útil. Cena 11 Khlestakóv. Mulher do Subtenente Peço vossa misericórdia. sem falta! Farei todo o possível. (Os comerciantes saem. Um empréstimo. por favor. nunca. Khlestakóv Por que não? A bandejinha também. Nada contra.. mãezinha? Vozes de Duas Mulheres Vossa misericórdia. Óssip Vossa Excelência! Por que não pega? Pegue sim! Para a viagem. então. a mulher do serralheiro e a mulher do subtenente. por favor! Rogamos. Comerciantes (Entregam-lhe o dinheiro numa bandeja de prata. . tudo serve.) Aceite também. a gente pode amarrar. suborno.Khlestakóv De acordo. Não me empurre que machuca”.. paizinho.) Então. senhor. O que é aquilo? Uma cordinha? Passem pra cá também a cordinha! Uma cordinha pode servir na viagem. Vossa Alteza! Se não nos atender.) Quem é que está aí? (Aproxima-se da janela. então não saberemos mais o que fazer.. aceite também o açúcar. a bandejinha. estique as canelas ou fique estropiado para todo o sempre. Khlestakóv O que foi? Fale. paizinho. porque vai acabar roubando mesmo e de qualquer maneira vai ser recrutado no ano que vem”. então que caia sobre ela a maior desgraça. como é que fico sem marido? Sou uma mulher fraca.. e aí é que ele veio pra cima de mim. E eu. Era casado. seus filhos. esse vigarista! O filho do alfaiate. o prefeito caiu em cima da comerciante Panteléieva. neste e no outro mundo! E se ele tiver uma tia. Que Deus o castigue. é proibido por lei. Mas os pais mandaram um belo presente e. Você. E se o pai ainda estiver vivo. Fevrônia Petróvna Pochliópkina. está bem. Khlestakóv Esperem aí. Khlestakóv Está bem. tinham que ter levado. tanto faz.. Seja breve. Fale uma de cada vez. Mulher do Serralheiro Sou a mulher do serralheiro. Isso é da minha conta. aquele bêbado. esse vigarista! Ainda por cima. patife! Que toda sua família pereça sem a luz do sol. então. este sim. E se tem sogra.. esse vigarista. se não roubou nada até agora.Khlestakóv Quem são as senhoras? Mulher do Subtenente Sou a mulher do tenente Ivánov. paizinho.. E você? Mulher do Serralheiro (Saindo. “Pra que é que você precisa de marido? Ele não presta pra nada”. o vigarista. que a sogra também.. nunca tenham nada que se preze! Khlestakóv E por quê? Mulher do Serralheiro Ordenou que meu marido fosse recrutado pelo exército. Nem tinha chegado a vez dele. tios e tias. tenha piedade! Mulher do Subtenente Também por causa do prefeito. seu vigarista! E disse mais: “Ele é um ladrão. vossa graça contra o prefeito! Que toda a maldição recaia sobre ele! Que ele.. Eu é que sei se ele presta ou não presta pra nada.) Não se esqueça de mim. que também ele. o que deseja? Mulher do Serralheiro Suplicar vossa misericórdia. Khlestakóv Como é que ele pôde fazer uma coisa dessas? Mulher do Serralheiro Fez porque fez. Mulher do Subtenente . o canalha. paizinho. Mas a Panteléieva também mandou para a mulher dele três peças de tecido. . Khlestakóv E o que é que podemos fazer agora? Mulher do Subtenente Claro que agora não se pode fazer nada. Tomo a liberdade de lhe perguntar: para onde tinha a intenção de ir? .) Estou farto. Não seria nada mal. vai junto para a ante-sala e fecha a porta atrás de si.) Saia já daqai! Saia! Aonde pensa que vai? (Empurra a barriga dele com às mãos. paizinho! Duas comadres brigaram na feira. mais algumas pessoas. não quero! Já chega... já chega! (Afastando-se. pois um dinheirinho agora me cairia muito bem.) Não quero. não.Me deu uma surra. fiquei dois dias sem poder sentar. Mas obrigue-o a pagar uma multa pelo seu erro. podem ir! Vou dar as ordens! (Pela janela surgem mãos com petições. em perspectiva. Khlestakóv Está bem. Mária Antónovna Ah! Khlestakóv Por que se assustou.) Quem mais está aí? (Aproxima-se da janela. então me pegaram. que vão Por detrás.. Me bateram tanto. senhorita? Mária Antónovna Não me assustei.) Perdão. senhorita.) Cena 12 Khlestakóv e Mária Antónovna. Khlestakóv (Afetado. paizinho! Khlestakóv Como assim? Mulher do Oficial Por engano. muito me agrada que me tenha tomado por uma pessoa que. está bem! Podem ir embora. a polícia não chegou a tempo. . Mária Antónovna O senhor fala como gente da capital. Khlestakóv E por que.) Seus olhos são mais importantes do que assuntos importantes. pra lugar nenhum.. Basta exigir qual tipo de versos. por assim dizer. pra lugar nenhum? Mária Antónovna Pensei que. como direi. Khlestakóv (Afetado. (Senta.. Khlestakóv Como eu desejaria.. valem mais do que qualquer tempo. ser o seu lencinho para poder envolver esse colo macio. só pode me dar prazer.. Gostaria de saber por que iria a senhorita pra lugar nenhum. Mária Antónovna O senhor diz cada coisa. Khlestakóv Não é isso. O senhor estava ocupado com assuntos importantes.. bonitos. Gostaria de pedir-lhe que escrevesse alguns versinhos em meu álbum de recordação. Mária Antónovna Não estou entendendo nada. Certamente deve saber muitos.. De maneira nenhuma poderia me incomodar. A senhorita jamais poderia me incomodar. novos. não sei.Mária Antónovna Pra dizer a verdade... Pelo contrário. Que tempo esquisito faz hoje! Khlestakóv Os seus lábios. Mária Antónovna Eu o incomodei. Será que eu poderia tomar a liberdade de ter a felicidade de lhe oferecer uma cadeira? Mas não! O que a senhorita merece é um trono.... senhorita.. senhorita. a minha mãezinha estivesse aqui. Mária Antónovna Na verdade. Khlestakóv Faço tudo o que a senhorita quiser.) Khlestakóv Que lindo lencinho! Mária Antónovna Que zombador que o senhor é. quer apenas ridicularizar as provincianas.. .. Mas que lencinho. e não uma cadeira. Mária Antónovna Alguns assim. precisava tanto ir andando. Khlestakóv Para uma pessoa tão encantadora como a senhorita.. talvez. Pensando bem... isso já é demais! Que descaramento!.Khlestakóv Versos.) E uma pega.) Khlestakóv (Aproxima a cadeira.. não. imagine! Sei tantos. não tem importância..) E por que afastou a cadeira? É bem melhor ficarmos perto um do outro. Mária Antónovna O senhor me considera uma dessas provincianas. Mária Antónovna (Afastando-se. Mária Antónovna Então me diga.) Perdoe-me. E bem melhor descrever o meu amor que pelo seu olhar. senhorita.) E por que tudo isso? Khlestakóv (Aproximando-se..) Ah.. Khlestakóv E por que longe? De perto dá na mesma.. que na amargura.” E muitos outros.. (Afasta a cadeira. por exemplo. (Aproxima a cadeira. se pudesse envolvê-la em meus braços! Mária Antónovna (Olha pela janela.) . homem.) Mária Antónovna O amor? Não compreendo o amor. Mária Antónovna (Levanta-se.. Khlestakóv Tenho todo e qualquer tipo de verso. só por amor. Mária Antónovna Gosto muito de versos... (Tenta sair. indignada.. fiz isso por amor. senhorita. em vão te queixas de Deus. Para a senhorita.) E por que perto? De longe dá na mesma. eu nunca soube o que é o amor..) O que foi aquilo que parecia voar? Uma pega ou outro pássaro qualquer? Khlestakóv (Beija-lhe o ombro e olha pela janela. Mária Antónovna (Afastando-se. Como eu ficaria feliz. mas é só imaginar que estamos longe. quais os senhor vai escrever para mim? Khlestakóv E para que dizer? Eu sei muito bem o que eu sei... estes aqui: “Oh! Tu. agora não consigo me lembrar. Khlestakóv (Retendo-a..) Pois para a senhorita pode parecer perto. Minha vida está por um fio. Khlestakóv Não.. senhor. Khlestakóv (À parte..) Diabo! Ana Andréievna (A filha.) Ah! Que cena! Khlestakóv (Levantando-se. (Cai de joelhos. Ana Andréievna Mas como? O senhor de joelhos? Ora.. juro. então não sou digno de existir na face da Terra. por amor.) Minha senhora. Se não me engano. Se a senhora não corresponder ao meu fiel amor..Khlestakóv (Continua a retê-la. confesso que fiquei estupefata. Khlestakóv .) Perdão! Perdão! Está vendo? Estou de joelhos.. Com o coração em chamas. mas não compreendo bem o sentido de suas palavras. não se zangue! Estou disposto a lhe pedir perdão de joelhos. levante-se. (Põe-se de joelhos. Khlestakóv Nada disso. peço sua mão.) E esta também é bem apetitosa.. Ana Andréievna (Ao ver Khlestakóv de joelhos. eu. sou casada. levante-se. de joelhos. Ana Andréievna Mas me permita observar que eu.. Cena 13 Os mesmos e Ana Andréievna. Foi apenas uma brincadeira. o senhor acaba de se declarar para a minha filha.. não é de se jogar fora. tem que ser de joelhos. Mária Antónovna.) Me desculpe. até certo ponto.) O que significa isso. Estou apaixonado é pela senhora. aos prantos. Está tudo sujo aqui. (Mária Antónovna sai. Ana Andréievna Queira perdoar. não está vendo? Estou ardendo de amor.) Foi por amor. Quero saber qual a minha sorte. senhorita? Que comportamento é esse? Mária Antónovna Maezinha. Ana Andréievna Fora daqui! Está me ouvindo? Fora! Fora! E não se atreva a aparecer mais diante de mim. a vida ou a morte. não se oponha à nossa felicidade. E você entra aqui correndo como uma louca! Pois palavra que você bem merecia que eu dissesse não. sua porca. o papai mandou dizer para a senhora. Este é o exemplo que você deve seguir.) Ah! Que cena! Ana Andréievna Mas o que é isso? O que veio fazer? O que quer aqui? Que leviandade! De repente.. Você não é digna dessa felicidade. mas ninguém diz mesmo. quando é que você vai se comportar como uma mocinha bem educada. está vendo? Por sua causa. que entra subitamente. sua boba.) Ana Andréievna.. Khlestakóv Decida: vida ou morte? Ana Andréievna Está vendo. mãezinha. Mária Antónovna Juro que não faço mais.. Quando é que vai entender o que são as boas maneiras e a seriedade de princípios. (Vendo Khlestakóv de joelhos.. isso não faz diferença. Para o amor.) Então é ela?. eu não sabia.. isto sim. abençoe nosso eterno amor! Ana Andréievna (Estupefata. peço sua mão. juro. juro. Ana Andréievna Você tem uma cabeça de vento! Está seguindo o exemplo das filhas de LiápkinTiápkin. Mária Antónovna Mãezinha. Cena 14 Os mesmos e Mária Antónovna. Mária Antónovna (Chorando. Não sei quando é que você vai ser mais ajuizada. mãezinha. . Sua mão. Ninguém diz. o nosso hóspede teve de ficar de joelhos. Khlestakóv (Segurando a mão da filha. O que você viu de tão extraordinário? O que inventou agora? Parece uma criança de três anos. entra correndo feito uma louca.Pouco importa.. Karamzin disse: “As leis condenam”... O que você vê nelas? Não tem que querer imitá-las. Partiremos sob a sombra do ímpeto.) Juro. que essa menina tem dezoito anos. Os seus exemplos têm que ser outros: a sua mãe. nem uma criança pode acreditar neles. Ela mesma se surrou. Khlestakóv É isso mesmo. dizendo que a surrei.. Khlestakóv E se o senhor não concordar em me conceder a mão de Mária Antónovna.Cena 15 Os mesmos e o prefeito. Excelência. E.. tomo a liberdade de informar que malandros como esses nunca se viram no mundo.. Sou capaz de enlouquecer de amor. juro por Deus que é mentira.. É mentira. A mulher do subtenente mentiu. Ela é meio tonta mesmo. não se aborreça.. Estou apaixonado. querida? Por gentileza. Palavra de honra que nem metade do que eles falaram é verdade.. Peço a mão de sua filha. Prefeito Não posso acreditar! Vossa Excelência está brincando comigo! . não sou digno de tanta honra. Excelência! Ana Andréievna Mas se ele mesmo está dizendo! Khlestakóv Não estou brincando. Mária Antónovna Sabe com que honra nos brindou Ivan Aleksándrovitch? Ele acaba de pedir a mão de nossa filha. apressado. Khlestakóv Que o diabo a carregue! Não estou preocupado com ela! Prefeito Não acredite! Não acredite! São todos uns mentirosos. Prefeito Não posso acreditar. Eles é que enganam e roubam o povo. Prefeito Não me atrevo a acreditar. Prefeito Vossa Excelência! Não me desgrace! Não me desgrace! Khlestakóv O que aconteceu? Prefeito Os comerciantes vieram se queixar a Vossa Excelência. saiu à mãe. no que diz respeito à malandragem. Prefeito Que bobagem! Que bobagem! Ficou maluca. só o diabo sabe o que sou capaz de fazer. Toda a cidade sabe que são uns mentirosos. .) Mas que diabo! É verdade mesmo! (Esfrega os olhos. dê sua bênção! (Khlestakóv se aproxima com Mária Antónovna. Sou inocente de corpo e alma! Por frtvm.. O prefeito olha para eles. senhor? Vai partir? Khlestakóv Vou sim. Já vou indo.xi flcncia achar melhor! Juro que minha cabeça. não? Khlestakóv Vou e volto num minuto. Prefeito Ai.) Ah! Antón! Antón! Ah! Senhor prefeito! Veja só aonde chegamos. não se zangue! Faça o obséquio de proceder como Vossa |’. ai. o senhor será julgado.. Prefeito Como. Óssip Os cavalos estão prontos. então. me parece. Vou passar apenas um dia com um tio. Prefeito Mas quando.. quer dizer. Ana Andréievna Então vá. um velho muito rico. estão se beijando! É mesmo um noivo de verdade! (Grita e pula de alegria. não sei o ijuc está acontecendo. Estou ficando tonto como nunca. Sou capaz de tudo! Se der um tiro nos miolos. ai. dignou-se a mencionar um casamento. meu Deus! Ai.) Prefeito Que Deus os abençoe. Khlestakóv Muito bem. mas eu não tenho culpa! (Khlestakóv beija Mária Antónovna..) Estão se beijando! Ah! Meu Deus. Mas amanhã estarei de volta. O senhor. Cena 16 Os mesmos e Óssip.Ana Andréievna Ah! Mas que cabeça-dura! Quando é que você vai entender? Prefeito Não posso acreditar! Khlestakóv Concorde! Concorde! Estou desesperado. . nem tenho palavras. talvez um tapetinho. Voz do Prefeito Mas como pode ser isto? O senhor vai viajar assim. com a mesma quantia.) Prefeito Não precisaria de alguma coisa para a viagem? Parece-me que o senhor já teve a fineza de precisar de algum dinheiro. ficam oitocentos justos. Dizem que notas novas dão sorte. Khlestakóv É mesmo! (Pega e olha o dinheiro.. quatrocentos. Voz do Cocheiro Ooo.) Muito bem. meu coração! (Beija as mãos dela. Khlestakóv Ora! Claro! Volto logo.. Não quero abusar de seu equívoco. por quê? (Pensando um pouco. Prefeito Agora mesmo! (Tira da carteira. senhor. Antón Antónovitch! Muito obrigado por sua hospitalidade. Confesso de todo o coração que em lugar algum fui tão bem recebido. quer dizer.Prefeito Não nos atrevemos a retê-lo e ficamos na esperança de um feliz regresso.) Parece até de propósito: notas novinhas. da outra vez o senhor me deu duzentos. anjo da minha alma. duzentos não. Voz do Prefeito Então. por gentileza. neste coche tão duro? Voz de Khlestakóv Já estou acostumado. As molas me dão dor de cabeça. Adeus. de modo que. agora. Ana Andréievna! Adeus.) Pensando bem... Com . meu amor. meu anjinho! (Saem. Adeus. pelo menos.) (Atrás do palco. Khlestakóv Adeus..) Voz de Khlestakóv Adeus. Mária Antónovna. vamos cobrir com alguma coisa. Mária Antónovna. não? Khlestakóv Não. Prefeito Exatamente. por que não? Prefeito Quanto deseja? Khlestakóv Bem. Adeus. de jeito nenhum. ) Agora pode se sentar. Voz de Óssip Deste lado de cá! Aqui! Mais um pouco! Isso! Vai ser bem confortável! (Bate no tapete. mãezinha! Voz do Cocheiro Eia. Vá depressa! Voz do Cocheiro Ooo.sua licença. Voz do Cocheiro Ooo. o feno.. Cai o pano. aquele persa de fundo azul.) . devemos esperá-lo? Voz de Khlestakóv Amanhã ou depois. vamos lá. Voz de Óssip Ah! Esse é o tapete? Aqui. Voz de Khlestakóv Adeus. por que não? Que me tragam o tapete. Voz do Prefeito Para quando.... posso mandar vir um tapete? Voz de Khlestakóv Para quê? Não precisa. Ivan Aleksándrovitch! Voz de Khlestakóv Adeus. isso! E agora. Antón Antónovitch! Voz do Prefeito Adeus. pensando bem. ordena o senhor. ponha assim. Voz do Prefeito Avdótia! Vá lá buscar no depósito o melhor tapete. Vossa Nobreza. deste lado de cá. Vossa Excelência! Vozes das Mulheres Adeus. Bem. apressadinhos! (O sininho toca. de repente.) Pois é. hein? Ana Andréievna Nada disso.) Ah! E você. com os diabos! Espere aí que agora eu vou dar uma boa lição a toda essa gentalha que gosta de petições e denúncias. nem mesmo em sonho poderia imaginar que uma simples mulher de prefeito poderia. meus pombinhos! Se antes eu levava vocês à força. Eles vão ver só.. Ei.. Saia gritando aos quatro cantos. hein? Que tal Ana Andréievna? Que voo alto. Tudo. ser. Prefeito E então. tudo. essa cambada de canalhas! Queixaram-se de mim. mande chamar aqui os comerciantes. Ana Andréievna? Hein? Alguma vez isso lhe passou pela cabeça? Olha só que prémio magnífico. que diabo! Uma festa. minha querida. e sim alguém que ainda não apareceu na face da Terra e que pode tudo. pois é uma festa! (O policial sai. Quem diria! Que pacto você tem com o diabo. Tome nota de todos aqueles que vieram apenas fazer solicitações em meu nome e. Sim senhora. Ana Andréievna. Cena 1 O prefeito. Ana Andréievna e Mária Antónovna. E que toda a gente fique sabendo a honra que Deus concedeu ao prefeito: deu a sua filha um marido. não é? Judas malditos! Esperem só pra ver. principalmente. quem está aí? (Entra um policial. O que te parece? E agora. Ivan Kárpovitch! Meu caro. tudo! Diga pra todo mundo saber. com os diabos! Diga francamente. Ana Andréievna. Tudo lhe parece inesperado porque você é um homem simples. mas não um homem qualquer. onde é que nós vamos morar? Aqui ou em Peter? . pense bem: em que figurões nos transformamos. agora vou levar a ferro e fogo. aqueles que escreveram petições contra mim. Eu já sabia há muito tempo. E que toquem os sinos.Ato 5 A mesma sala. que nunca viu gente distinta. Prefeito Eu também sou gente distinta. até que é bom.. Não senhor. Ou então. não é. isso é que é o máximo! Ana Andréievna Você sempre com suas grosserias. . se é em Peter. que se dane o prefeito! Ah. Como é que a gente pode ficar aqui? Prefeito Então. com o tempo. Ana Andréievna. Prefeito . Ana Andréievna? Agora posso até pretender um alto grau.. ainda vá lá.) Pois é isso. Às vezes. naturalmente. que posso chegar a general? Ana Andréievna E por que não? Claro que sim! Prefeito Com os diabos! Que glória ser general. Mas aqui. suas relações serão agora com pessoas de comportamento refinado: condes e gente da alta sociedade. ah! (Morre de rir. A gente almoça em algum lugar na casa do governador e o prefeito. pensando bem. o que você acha. Ana Andréievna. Penduram no ombro da gente umas condecorações. o que importa o cargo de prefeito? Prefeito Na verdade.. Mas agora a vida vai ser completamente diferente. os secretários e assistentes sempre se põem a galopar na frente gritando: “Os cavalos!” E lá eles não dão nada pra ninguém e todos esses titulares. ou com um Zemlianíka qualquer. De que cor você acha melhor. E por que será que todo mundo quer ser general? Porque acontece que. você solta cada uma. ah. capitães e prefeitos têm de esperar. Tem que se lembrar de que agora vai ter que mudar de vida completamente e de que suas novas relações não serão mais com qualquer juiz-canino com quem você vai caçar lebres. amigo de todos os ministros e até frequenta a corte. Prefeito E daí? Uma palavrinha ou outra não faz mal a ninguém. coisas que jamais se dizem na alta sociedade. chegar até a general. Ana Andréievna Como prefeito. seus canalhas. dão tudo na bandeja. estou muito preocupada com você.que o meu cargo de prefeito vá pró inferno. pois ele é assim. vermelhas ou azuis? Ana Andréievna Mas é claro que as azuis são as melhores.Ana Andréievna Em Petersburgo. Pra dizer a verdade. é? Veja só o que ela prefere! Mas as vermelhas também servem. não. a gente pode conseguir uma boa promoção e. que seja em Peter. Você não acha. olha. Ana Andréievna? Ana Andréievna Naturalmente. Prefeito Ah. mas pra gente. quando a gente chega a qualquer lugar. Por isso mesmo. E verdade. ainda querem recompensa? Se ele soubesse disso. estufam a barriga e enchem os bolsos e se julgam muito importantes! Credo! Bela porcaria! Só porque engolem dezesseis samovares por dia.. aí é que vocês. Mal sabem rezar o padre-nosso. acham que são muita coisa? Eu cuspo na cabeça de vocês e na sua importância! Comerciantes (Fazendo reverências... já aprendem logo a ludibriar.. E vocês. ouviram? Como vocês enganam o povo. Prefeito Ah! Sejam bem-vindos. é para o seu próprio bem. hein? Achavam que eu ia parar na cadeia. Até o patrão lhes dá uma boa sova se vocês não souberem enganar direito. sua corja. E depois... não mexam com ele. Ana Andréievna Ele só pensa em peixes! O que eu quero é que a nossa casa seja a melhor da capital e que tenha um tal cheiro que. Fazem um negócio com o governo e conseguem tapeá-lo em cem rublos.) Somos culpados. E ainda se dão ares de importância: é um comerciante.) Desejamos muita saúde. mas que palavras. meus queridos. vendendo uma porcaria de tecido.) Ah! Que maravilha! Cena 2 Os mesmos e os comerciantes. paquidermes! Reclamaram.. quinquilheiros. Antón Antónovitch! . E. que sete diabos e uma bruxa os carreguem. seus muambeiros.. ao entrar. que só de olhar. meus pombinhos! Comerciantes (Fazendo uma reverência. (Fecha os olhos e cheira. “Os nobres não são melhores do que nós”. não é? Seus protozoários.) Agora não é hora de palavras! Por acaso vocês sabiam que esse mesmo funcionário para quem vocês se queixaram vai se casar com minha filha? Sabiam? Hein? O que é que vocês me dizem agora? Pois agora vocês me pagam. como vão indo as coisas? E os negócios? Então... hein? Desde criança já começam com malandragem. um nobre tem que se ilustrar. só porque dão pra gente uns vin te metros. a gente tenha até que fechar os olhos. Mas um nobre. dizem que lá servem cada peixe. dá água na boca. assim. Ana Andréievna Ai. Antocha! Prefeito (Zangado. não? Pois olhem aqui. E aí. dizem. queixaram-se de mim. protobestas quadradas. meu Deus. hein? Eucraram muito. paizinho! Prefeito E então. se apanha na escola. .) Mária Antónovna! (Aproxima-se da mão de Mária Antónovna. né? Mas e antes. Comerciantes (Curvando-se até o chão.) Deus que os perdoe! Já chega! Não sou rancoroso. Amos Fiódorovitch. fiquei contente de todo o coração! (Aproxima-se da mão de Ana Andréievna. E por quê? Porque estou por cima? Mas se fossem vocês que estivessem no meu lugar. Antón Antónovitch! Prefeito “Não arruine a gente!” Agora “Não arruine a gente”. seu barba-de-bode.Prefeito E ainda se queixam? E quem o ajudou a trapacear quando você construiu aquela ponte e cobrou vinte mil rublos pela madeira quando não custou nem cem rublos? Fui eu que te ajudei. seus canalhas.. Já se esqueceu? Se eu tivesse denunciado tudo isso. Foi obra do diabo. Antón Antónovitch! Que Deus lhe dê uma longa vida e também ao novo casal. poderia ter te mandado pra Sibéria. Nunca mais vamos nos queixar. (Faz um gesto com a mão. mas não se aborreça! Prefeito Não se aborreça! Agora vocês rastejam aos meus pés. me arrastariam na lama e ainda me cobririam com um tronco.) Ana Andréievna! (Aproxima-se da mão de Mária Antónovna. Quando soube.) Não arruine a gente. Amós Fiódorovitch (Ainda na porta..) Felicidades.) Mária Antónovna! Rastakóvski (Entrando. vão com Deus! (Os comerciantes saem. O que é que me diz disso? Hein? Um dos Comerciantes Somos culpados perante Deus. hein? Sou capaz de pegar vocês e. Mas agora prestem bem atenção! Não vou casar minha filha com um nobre qualquer.) Cena 3 Os mesmos..) . Que as congratulações sejam. Antón Antónovitch? Aconteceu-lhe mesmo essa ex¬traordinária felicidade? Artémi Filípovitch Tenho a honra de cumprimentá-la por toda essa felicidade. E que lhe dê uma numerosa descendência de netos e bisnetos! Ana Andréievna! (Aproxima-se da mão de Ana Andréievna..) Será que podemos acreditar no que estão dizendo. Peça o que quiser. Antón Antónovitch. estão me entendendo? Não me venham com peixinhos secos e pãezinhos doces. Agora. Artémi Filípovitch e depois Rastakóvski.. muito feliz. Antón Antonovitch! Ana Andréievna! (Aproxima-se da mão de Ana Andréievna.) Dóbtchinski Mária Antónovna! (Beija a mão dela. Koróbkin com a mulher e Liuliukóv. . Vai passear em um vestido dourado e vai provar diferentes e refinadas sopas.. Ana Andréievna. Vai passar o seu tempo de modo muito divertido. Koróbkin Tenho a honra de cumprimentá-lo. Ana Andréievna! (Aproxima-se da mão dela e depois..) Mulher de Koróbkin Felicito-a de todo o coração. Liuliukóv Tenho a honra de cumprimentá-la.Cena 4 Os mesmos. e depois a de Mária Antónovna. por essa sorte. estala a língua com ar de ousadia. Bóbtchinski Tenho a honra de cumprimentá-lo! Dóbtchinski Antón Antónovitch! Tenho a honra de cumprimentá-lo! Bóbtchinski Por esse feliz acontecimento! Dóbtchinski Ana Andréievna! Bóbtchinski Ana Andréievna! (Ambos se aproximam ao mesmo tempo e suas testas se chocam com Liuliukóv.) Cena 5 Muitos convidados vestidos de sobrecasaca e fraque se aproximam e beijam a mão de Ana Andréievna.) Que honra tenho em felicitá-la.) Mária Antónovna! Tenho a honra de cumprimentá-la (Aproxima-se de sua mão e vira-se para os espectadores com o mesmo ar de ousadia. virando-se para os espectadores. dizendo: “Ana Andréievna!”.) Mária Antónovna! (Aproxima-se da mão de Mária Antónovna. A senhorita será muito. dizendo: “Mária Antónovna!” Bóbtchinski e Dóbtchinski abrem passagem aos cotovelos. . exatamente o que ela sempre quis”. nem eu mesma sei. Michka! Traga mais cadeiras! (Os convidados se sentam.pensei comigo e fiquei tão contente que disse ao meu marido: “Escuta aqui.” “Ah! Meu Deus!” . juro mesmo.E eu respondi: “Luká. tenham a bondade de sentar-se. Prefeito Obrigado. um bom partido para sua filha.) que a gente até possa pôr na palma da mão.) Fiquei tão contente! Disseram-me assim: “Ana Andréievna vai casar sua filha”.) Cena 7 Os mesmos... Ana Andréievna! (Beijam-se. “era exatamente o que desejava Ana Andréievna. obrigado! Tenha a bondade de sentar-se. Prefeito Senhores. o chefe de polícia e soldados. isso mesmo! E ele vai chorar assim: uá! uá! uá! Cena 6 Mais alguns convidados beijam-lhes a mão. Ei.. Luká. por que você está soluçando?” . “Ah! Meu Deus!” . até soluçar.) Mária Antónovna. meu querido. tenho a honra de felicitá-la! Que Deus lhe dê toda a riqueza do mundo: moedas de ouro e um filhinho deste tamanhinho. que até perdi a fala. “graças a Deus!” E disse assim ao meu marido: “Estou tão empolgada que não vejo a hora de falar pessoalmente com Ana Andréievna. Mulher de Luká (Correndo à frente. E olha só o que o destino preparou. E fiquei tão contente. (Os convidados se sentam. Luká Lukítch e a sua mulher.) Felicidades. Luká Lukítch Tenho a honra. E aí. As lágrimas correm assim como um rio”. veja só que felicidade teve Ana Andréievna! Pois é”. Chorei. chorei. assim pequenininho (Mostra com as mãos.. Luká Lukítch me disse: “Nástenka.Bóbtchinski (Interrompe.pensei comigo mesma -.pensei assim -. Chefe de Polícia Tenho a honra de cumprimentar Vossa Excelência e desejar-lhe prosperidade por muitos e muitos anos.) . Falou de forma tão expressiva: “Eu. pode acreditar. estou maravilhado. Disse que ia se matar. Antón Antónovitch. foi coisa do destino. Prefeito Ele até chegou a nos assustar. do contrário a morte vai dar cabo de minha vida”.” E se desmanchou em lisonjas.) Esse porco sempre tem uma sorte! Amós Fiódorovitch Se quiser. Ana Andréievna. tudo faço em consideração às suas qualidades”. Que homem maravilhoso. Ana Andréievna De uma forma muito respeitosa e elegante. que foi para mim que ele disse isso. não posso negar. Ana Andréievna. ele imediatamente caiu de joelhos e com aquela mesma nobreza disse: “Ana Andréievna! Não me faça infeliz! Corresponda aos meus sentimentos... Ana Andréievna É claro. estou pronto a lhe vender aquele cachorro que o senhor queria. Artémi Filípovitch Nada de destino. São os méritos.. Tudo isso é apenas em homenagem às suas raras virtudes”. Ana Andréievna Cale a boca. mãezinha! Mas foi pra mini que ele disse isso.Amós Fiódorovitch Então nos conte. um tiro nos miolos!”. Ana Andréievna. Ele mesmo se dignou a fazer o pedido. como começou tudo isso? Como se desenrolou o sucedido? Prefeito Foi tudo muito extraordinário... Você não sabe nada de nada. mãezinha. também para você. “Vou me dar um tiro nos miolos. que educação e que nobre/a! “Para mim. Prefeito Nem pensar! Agora não tenho cabeça para cachorros. a merecer tal honra”. a vida não vale um níquel. dizia. Muitos dos Convidados Que coisa! Amós Fiódorovitch Essa é boa! Luká Lukítch Realmente. Mária Antónovna Juro. de forma alguma. então não se meta nisso! “Eu. e quando eu quis lhe dizer: “Não nos atrevemos. Mária Antónovna Ah não.. (À parte. Amós Fiódorovitch . por favor Antón Antónovitch.. O destino nada tem a ver. meu caro.. E muito desagradável.. Desejo o mesmo para vocês. Para dizer a verdade. é tudo provinciano demais!. devo confessar. Murmuro conjunto. Amós Fiódorovitch Para uma grande embarcação.. Ana Andréievna Foi visitar o tio para pedir a sua bênção. se Deus quiser.. Koróbkin Mas onde se encontra agora.) Muito obrigado! Mas amanhã mesmo estará de volta. se quiser. no qual se destacam algumas vozes.. Prefeito E sim. Além disso. meus senhores.. Luká Lukítch Se Deus quiser. . Ana Andréievna Temos agora a intenção de morar em Petersburgo. se me permitem perguntar. lá o meu marido será promovido a general.) O diabo que te carregue! Prefeito Sou imensamente grato. quero muito ser general. vai conseguir. como estou contente com a sua felicidade! Nem pode imaginar.. o nosso ilustre hóspede? Ouvi dizer que foi embora por um motivo qualquer.Bem. confesso que. Partiu por um dia para tratar de um assunto importante. Mulher de Koróbkin Ah! Ana Andréievna.. Prefeito É isso. Prefeito E verdade. podemos chegar a um acordo sobre um outro.. Rastakóvski O homem põe e Deus dispõe. Bóbtchinski Cem anos de vida e um saco de dinheiro! Dóbtchinski Que Deus lhe dê mil anos de boa gestão! Artémi Filípovitch (À parte. (Espirra e se ouvem num só murmuro as exclamações de “Saúde”.) Chefe de Polícia Desejo-lhe saúde.) Quero que você morra! Mulher de Koróbkin (À parte. grandes travessias. para pedir a bênção.. Vossa Excelência. o ar aqui.. (Espirra. Mas amanhã mesmo. Tome o lugar do pai como se ele fosse um órfão. Em primeiro lugar. estou pronto a não poupar esforços.) Ora. isso ainda está bem longe. ela quer toda a. Amós Fiódorovitch E se por acaso acontecer alguma coisa. é bem capaz de ser mesmo. já quer se meter a ser general! E sabe-se lá. um acontecimento extraordinário! O funcionário que tomamos por um . por exemplo. Artémi Filípovitch (À parte.) E então. Você dá um dedinho. O chefe dos correios entra correndo com uma carta aberta nas mãos. Sempre foi assim.. Gente bem melhor que você ainda não chegou a general. Chefe dos Correios Senhores. Antón Antónovitch. você está sempre pronto a prometer. Pois ele dá uma de tão importante que vá pró diabo que o carregue! (Dirigindo-se ao prefeito.) Só falta ele conseguir ser mesmo general! Vai lhe cair tão bem quanto uma sela numa vaca! Ah! não. Mulher de Koróbkin Está vendo como ela nos trata? Uma das Convidadas Conheço essa mulher. mas não vai querer dar proteção a qualquer gentalha. Assim. levarei meu filho para a capital para servir no Estado. E como é possível e por que diabo vai se encarregar de tantas promessas? Prefeito E por que não. Cena 8 Os mesmos. Ana Andréievna É claro que é possível. Ana Andréievna Antocha. uma necessidade qualquer.. tenha a bondade de oferecer-lhe a sua proteção. não se esqueça da gente. não nos deixe sem a sua proteção! Koróbkin No ano que vem. benzinho? Quem sabe até será possível. que diabo. não vai ter tempo de pensar nisso. Prefeito De minha parte. vejam só.Artémi Filípovitch Honra ao mérito! Amós Fiódorovitch (À parte. Chefe dos Correios Eu mesmo não sei dizer. então? Chefe dos Correios Nem isso nem aquilo. ouço assim: “Olha lá.inspetor não é um inspetor! Todos Como não é um inspetor? Chefe dos Correios Não é inspetor.) Como nem isso nem aquilo? Como ousa chamá-lo de nem isso nem aquilo e ainda por cima dizer que só o diabo sabe o que ele é? Vou mandar o senhor para a prisão. não abra! É o teu fim!” Mas no outro era como se o demónio sussurrasse: “Abra. Trouxeram-me uma carta nos correios. Então peguei e abri. que frio! Minhas mãos tremiam e tudo se turvou. não posso resistir! Num dos ouvidos.. Prefeito E como pôde?.. meu Deus. Chefe dos Correios Quem? O senhor? Prefeito Isso mesmo. Fiquei estupefato. Só o diabo sabe o que ele é! Prefeito (Irritado. senti um frio. Ele não é nem autoridade nem importante coisa nenhuma! Prefeito O que o senhor acha que ele é. correu-me um fogo pelas veias. Não posso.. Fui movido por uma força sobrenatural.. eu! Chefe dos Correios Aqui pra você! . abra!” Quando rompi o lacre. Pensei comigo mesmo: “Ai. sinto que não posso! Não posso resistir. Prefeito E como é que o senhor se atreveu a abrir a carta de uma autoridade tão importante? Chefe dos Correios Pois aí é que está o negócio. Já tinha até mandado a carta ao seu destino por um portador. não posso. Prefeito Como? O que está dizendo? Que carta é essa? Chefe dos Correios Uma carta dele mesmo. de jeito nenhum. abra. quem sabe encontrou alguma irregularidade nos correios e quer notificar o diretor”. E quando abri. Soube por esta carta. mas senti uma tal curiosidade como nunca senti antes. Olho o endereço e vejo: “Rua dos Correios”. . então. O chefe dos correios também é uma boa pessoa... aqui ele diz coisas inconvenientes a meu respeito. o senhor mesmo. por causa da minha cara e dos meus trajes petersburgueses. meu caro Triapítchkin. hum.) Hum..” Prefeito Mas que diabo! Precisa repetir? Como se estivesse escrito só isso. hum. Acho que pela mamãezinha. Prefeito (Lê.. pois me parece que ela já está disposta a todos os favores.” Não pode ser! Foi o senhor mesmo que escreveu isso. que eu mesmo serei um magnata e que poderei despachá-lo para a Sibéria? Chefe dos Correios Ah. Chefe dos Correios (Mostra a carta. Apenas não decidi ainda por qual delas devo começar... Chefe dos Correios (Continua a ler. “asno perfeito. o prefeito. Todos me emprestam dinheiro ao meu bel-prazer. leia! Chefe dos Correios (Lê. Coloque essa gente em seus textos. Que gente pitoresca! Você iria morrer de rir. .) “O prefeito é um asno perfeito.. Chefe dos Correios Como é que eu poderia escrever? Artémi Filípovitch Leia! Chefe dos Correios (Continua a ler. o dono de uma confeitaria me agarrou pelo colarinho por causa de uns pasteizinhos que ficaram por conta do vigário? Agora a vida mudou completamente. certa vez. E agora estou hospedado na casa do prefeito. Mas.) Leia. hum. É melhor eu ler a carta.) Bem. que nada! A Sibéria está bem longe. tanto para a mulher como para a filha.) “Um asno perfeito. eis que de repente.) “Apresso-me a informá-lo. É um asno perfeito. Você se lembra da miséria que passamos juntos? Quando dividíamos o almoço? E como. toda a cidade me tomou por um governador-general.” Prefeito Não pode ser! Isso não está escrito. sem mais aquela.Prefeito Por acaso você sabe que ele vai se casar com minha filha. Prefeito . Antón Antónovitch! Que Sibéria.. Em primeiro lugar.e estou arrastando uma asinha. permitam que eu leia a carta? Todos Leia. Senhores... um capitão-de-infantaria me limpou de tal maneira que o dono da hospedaria queria me mandar para a cadeia. Sei que você escreve pequenos arti gos.” (Pára de ler.. sobre algumas coisas incríveis que me aconteceram... Durante a viagem. ) Leia a partir daqui.Não senhor. (Todos se aproximam dele.) “O encarregado da assistência social..) “O chefe dos correios é a cara do Mikheiev. então leia tudo. acho que eu consigo. (Cobre com o dedo. e” (Gagueja. (Entrega a carta. para que? Prefeito Já que está lendo.) Não. Artémi Filípovitch (Continua a ler.). Zemlianíka. (Põe os óculos e lê.. e..) Koróbkin Por que parou? Artémi Filípovitch É que está meio ilegível. Artémi Filípovitch Ler pra quê? Eu mesmo posso ler. Koróbkin Com licença.) É um malcriado que deveria levar uma boa surra. devolva a carta! (A Koróbkin.. Além do mais. é evidente que é um canalha. Chefe dos Correios Nada disso! Tem que ler tudo! Até agora lemos tudo.. é um verdadeiro ..) ‘’O encarregado da assistência social.. o contínuo do nosso departamento. Chefe dos Correios (Aos espectadores. juro. Koróbkin (Lendo. Koróbkin Dê-me aqui! Acho que a minha vista é melhor.) Artémi Filípovitch (Não dá a carta. e. Artémi Filípovitch.) Leia.. E mais nada. Todos Devolva a carta. pois já está legível.. Que diabo! Artémi Filípovitch Dêem-me licença que eu leio.) Chefe dos Correios Leia! Leia! Que absurdo! Leia tudo. Esse canalha deve ser também um beberrão como ele”. Podemos pular esta parte. leia! Chefe dos Correios Mas.. (Pega a carta. Artémi Filípovitch É pra já. Com licença. Mais adiante estará legível. casa n° 97.) Graças a Deus que. à direita.) “De resto. mano. São Petersburgo. completamente morto! Não consigo ver nada. ainda vai.porco com gorro. o povo aqui é hospitaleiro e bonachão. é muito chata. mas vai ver que é coisa ainda pior. terceiro andar.) Deve ser urna palavra francesa. Compreendo agora que a gente tem que se preocupar com algo mais elevado.) Ao ilustríssimo senhor Ivan Vassílievitch Triapítchkin.) “O inspetor de escola parece encharcado de cebola. A vida assim.. Amós Fiódorovitch Só o diabo sabe o que isso significa! Se for vigarista.) Meus senhores. pelo menos. não fala nada de mim. Adeus. Koróbkin (Lê.) Juro por Deus que eu nunca pus um pedaço de cebola na boca. Nada mais. Tragam-no de volta! De volta! (Gesticula. Que vá pró inferno! Para que ler toda essa porcaria? Luká Lukítch Nada disso! Chefe dos Correios Não senhor! Leia! Koróbkin (Continua. aldeia de Podkatílovka”.” Artémi Filípovitch (Aos espectadores. (Vira a carta e lê o endereço. entrando no pátio. Afinal a gente precisa de um alimento para a alma. acho que a carta é muito longa. Só vejo focinhos de porcos em lugar de caras. Amós Fiódorovitch (Á parte. Eu também. Escreva para a província de Sarátov. Uma das Damas Que chose desagradável! Prefeito Apunhalou-me pelas costas! Estou morto. meu caro Triapítchkin..” Luká Lukítch (Aos espectadores.. Koróbkin (Continuando a ler.) “O juiz.) Não tem a menor graça! Porco com gorro! Onde já se viu um porco com gorro? Koróbkin (Continua a ler. morto.” Amós Fiódorovitch Essa não! (Em voz alta.) Chefe dos Correios . vou começar a fazer literatura. como você.) “O juiz Liápkin-Tiápkin é a quinta-essência do mauvais ton” (Interrompe.. Rua do Correio. .. Ana Andréievna Mas não pode ser. Prefeito (Num repente de cólera. Enganei três governadores!. É assim mesmo.) Todos esses rabiscadores de papel. primeiro nos tira a razão. velho idiota! (Ameaça a si com o próprio punho. que lhe emprestei trezentos rublos? Que vá pró inferno! Artémi Filípovitch Eu também morri com trezentos rublos. que vai nos meter numa comédia! Isso é que é duro! Não vai levar em consideração nem o meu cargo.) Só governadores não. Ele está comprometido com Máchenka. reduzir todos a pó e mandar vocês pró fundo do inferno! Bem juntinho do demo!. Chefe dos Correios (Suspirando... arrasei com todos eles. nenhum negociante foi capaz de me passar a perna. vai cair nas mãos de um escrevinhador qualquer. por uma personalidade importante! Agora lá vai ele pêlos caminhos fazendo alarde! Vai contar pra todo mundo essa história. foram sessenta e cinco em papel..) E eu também! Trezentos rublos! Bóbtchinski Da gente. senhores? Como é que fomos cair nessa? Prefeito (Batendo na testa. sim senhor..) Mas como pode. é mesmo uma confusão sem igual! Amós Fiódorovitch E eu então.) Ah! Seu narigudo! Tomou aquele nadinha.) Vejam só! Vejam todos! Todos os cristãos! Vejam como o prefeito passou por idiota! Foi feito de bobo. Mulher de Koróbkin Isso é demais. malditos liberais! Filhos do diabo! Queria dar um nó em vocês todos.... Amós Fiódorovitch (Abre os braços em gesto de perplexidade. Os maiores espertalhões e os maiores trapaceiros. (Gesticula. até parece de propósito. E ainda por cima. Consegui enganar vigaristas e mais vigaristas.) Comprometido! Comprometido uma ova! Que comprometido que nada! Está me jogando na cara o compromisso! (Fora de si. Piótr Ivánovitch e eu.) E eu? Comigo? Velho bobo! Como pude perder a razão. esses escrevinhadores de nada. quando Deus quer nos castigar. aquele trapo. além da gente passar por palhaço. Antocha. Depois de uma breve pausa.) Ainda não consigo me acalmar.. sou burro como um porta!. Mas o que . de bobo.. Do que estão rindo? Estão rindo de si mesmos!. Governadores. mandei que lhe dessem a melhor tróica e o diabo ainda me fez lhe dar toda a papelada para poder seguir em frente..Que trazer de volta nada! Eu mesmo. (Furioso. um rabiscador de papéis. meus senhores. Ah! Vocês!. muito mais do que isso. desses que roubam meio mundo. Trinta anos de serviço e nenhum comerciante. nem minha posição e todos vão rir às gargalhadas e bater palmas.. bate com os pés no chão. (Mexe os punhos e bate com um tacão no chão.. Dóbtchinski Ah! Não.. sim senhores! Luká Lukítch Claro que sim. E de repente.) Bóbtchinski Ei.) Bóbtchinski Juro por Deus que não fui eu! Foi Piótr Ivánovitch... ele chegou e não quer pagar. Nem um tiquinho de nada.. inspetor pra cá! Quem foi o primeiro a espalhar que ele era um inspetor? Respondam! Artémi Filípovitch (Abrindo os braços. Vieram correndo como uns loucos da hospedaria. seus tagarelas desgraçados! Amós Fiódorovitch Porcalhões malditos! Luká Lukítch Seus patetas! Artémi Filípovitch Seus barrigudos miseráveis! (Todos os cercam.. Dóbtchinski Eu não fiz nada. Prefeito Só sabem zanzar pela cidade para encher a paciência de todo mundo. todos começaram: inspetor pra lá. Artémi Filípovitch Foram vocês. nem pensei.” Encontraram o figurão! Prefeito É óbvio que foram vocês! Seus fofoqueiros! Mentirosos de uma figa! Artémi Filípovitch O diabo que os carregue com o seu inspetor e suas histórias. nada. .) Nem que me matem consigo entender como foi que tudo isso aconteceu. Parece coisa do demónio. não senhor. Bóbtchinski Ora.. pois foi você que primeiro. o primeiro foi você.tinha de inspetor naquele espertinho? Nada.. Amós Fiódorovitch Pois sabem quem foi que espalhou? Está aqui quem espalhou: esses dois espertinhos! (Aponta para Dóbtchinski e Bóbtchinski. nada. E como uma neblina que nos cega. Piótr Ivánovitch.. matracas malditas! Só fazem mexericos. “Ele chegou. espere aí! Eu não. Luká Lukítch. vejam só. Oficial Acaba de chegar de São Petersburgo um funcionário por ordem do czar. À sua direita estão sua esposa e sua filha. bocas abertas e olhos arregalados. Atrás dele. Ele está hospedado no hotel. (As palavras pronunciadas atingem todos como um trovão. . estão Dóbtchinski e Bóbtchisnki com os braços estendidos um para o outro. Ele ordena que o senhor se apresente agora mesmo. que pisca um olho para os espectadores numa alusão sarcástica ao prefeito. O projeto deste livro foi realizado utilizando-se as famílias tipográficas The Serif. dirigida à família do prefeito. com um movimento de corpo em direção a ele. desnorteado. atrás dele. como se estivesse ouvindo alguma coisa. é o fim do mundo!” Atrás dele. atrás dele. o juiz com os braços abertos. com a cabeça um pouco inclinada para o lado. com aspecto um tanto ingénuo. estão três senhoras convidadas. bem na extremidade. De repente. Uma exclamação de assombro ecoa de uma só vez da boca das mulheres. com a mais satírica expressão no rosto. Atrás dele. todo o grupo muda de posição e fica como que petrificado. Cai o pano. permanece nessa posição por quase um minuto e meio. petrificado. no centro. À esquerda do prefeito. Os demais convidados ficam imóveis como postes. Koróbkin. agachado quase até o chão e com um movimento nos lábios como se quisesse assobiar ou exclamar: “Ora. A impressão digital ficou a cargo da Áster Graf. Zemlianíka.Última Cena Os mesmos e um oficial. Gagarin e Justus. que utilizou papel Old Natural 89 e 176 g/m2 fabricado pela Finepapers. apoiadas umas nas outras. como um poste. O grupo. o chefe dos correios como que transformado num ponto de interrogação dirigido aos espectadores. na extremidade do palco. os braços abertos e a cabeça inclinada para trás.) Cena Muda O prefeito fica parado. Atrás delas.
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