Faculdade de Arquitectura e Artes Mestrado Integrado em Arquitectura
O edifício de rendimento em Lisboa de 1758 ao dealbar do Estado Novo: da Cotovia ao Rato
Vanda Pereira de Matos
Lisboa 2009
Vanda Pereira de Matos
O edifício de rendimento em Lisboa de 1758 ao dealbar do Estado Novo: da Cotovia ao Rato
Dissertação apresentada à Faculdade de Arquitectura e Artes da Universidade Lusíada de Lisboa, para obtenção do grau de Mestre em Arquitectura. Orientador: Prof. Doutor Arqt. Nuno Rui da Fonseca Santos Pinheiro Co-orientadora: Mestre Arqt.ª Maria de Fátima Lino Ferreira Fragoso
Lisboa 2009
Ficha Técnica Autora Orientador Co-orientadora
Vanda Pereira de Matos Prof. Doutor Arqt. Nuno Rui da Fonseca Santos Pinheiro Mestre Arqt.ª Maria de Fátima Lino Ferreira Fragoso
Título
O edifício de rendimento em Lisboa de 1758 ao dealbar do Estado Novo: da Cotovia ao Rato
Local
Lisboa
Ano
2009
Mediateca da Universidade Lusíada de Lisboa - Catalogação na Publicação MATOS, Vanda Pereira de, 1975O edifício de rendimento em Lisboa de 1758 ao dealbar do Estado Novo: da Cotovia ao Rato / Vanda Pereira de Matos ; orientado por Nuno Rui da Fonseca Santos Pinheiro, Maria de Fátima Lino Ferreira Fragoso. - Lisboa : [s.n.], 2009. - Dissertação de Mestrado Integrado em Arquitectura, Faculdade de Arquitectura e Artes da Universidade Lusíada de Lisboa. I – PINHEIRO, Nuno Rui da Fonseca Santos, 1937II - FRAGOSO, Maria de Fátima Lino Ferreira, 1967LCSH 1. Edifícios - Portugal - Lisboa - História 2. Edifícios Históricos - Portugal - Lisboa 3. Lisboa (Portugal) - Edifícios, Estruturas, Etc. 4. Universidade Lusíada de Lisboa. Faculdade de Arquitectura e Artes - Teses 5. Teses – Portugal - Lisboa 1. Buildings - Portugal - Lisboa - History 2. Historic Buildings - Portugal - Lisbon 3. Lisbon (Portugal) - Buildings, Structures, Etc. 4. Universidade Lusíada de Lisboa. Faculdade de Arquitectura e Artes - Dissertations 5. Dissertations, Academic – Portugal - Lisbon LCC - NA1306.M38 2009
APRESENTAÇÃO Título: Resumo:
O edifício de rendimento em Lisboa de 1758 ao dealbar do Estado Novo: da Cotovia ao Rato A arquitectura corrente da cidade é o tema desta dissertação de Mestrado em Património Edificado, em que nos centrámos no edifício de rendimento em Lisboa de 1758 ao dealbar do Estado Novo. Definimos como área de trabalho o território da Cotovia ao Rato, uma área urbana com um crescimento arquitectónico consistente, suficientemente vasta para exibir uma diversidade de unidades urbanas. O largo leque de situações que apresenta permitiu-nos perceber os padrões arquitectónicos e as suas variantes. Nesta malha urbana, o Bairro Pombal emerge como um núcleo urbano, constituindo um caso de estudo único do desenho interno e externo do edifício de rendimento em Lisboa neste período. Começamos por trazer à luz a figura legal do edifício de rendimento, as condições de aluguer de habitações e o mínimo de ocupação por edifício. A contextualização de Lisboa no panorama arquitectónico do universo urbanístico português abriu o caminho para a discussão de uma arquitectura regimentada com espeficidades regionais. Entre 1861 e 1865 um novo conjunto de políticas legislativas e arquitectónicas redefiniram o edifício de rendimento. No dealbar do século XX surge o projecto de autor, que estabelecerá a base para a criatividade individual nas fachadas dos edifícios. Estes factos conformaram a concepção interna e externa do edifício de rendimento gaioleiro, dentro dos limites impostos pelos materiais de construção. Isto levou-nos à caracterização do edifício gaioleiro durante a sua vigência, de 1861-1935, e da evolução das suas características morfológicas. A análise do território da Cotovia ao Rato e de edifícios referenciais fora deste território permitiu-nos construir um corpo de dados inédito. Este foi cruzado com a documentação já publicada, vista sob uma nova abordagem. Desenhámos a imagem planimétrica e altimétrica do edificado da Cotovia ao Rato por meio da legislação e da documentação. A comparação dos núcleos urbanos do Bairro Pombal (segunda metade do século XVIII até aos anos trinta do século XX), e do Postigo do Melo e Casas do Embaixador (século XVI à 1ª metade do século XVIII), estudado por Matos, Vanda Pereira (2003), permitiu-nos observar aspectos de continuidade e de ruptura nos modelos emergentes do edifício de rendimento. Em particular, a tripartição da fachada persiste desde 1758 a 1959, mas tende a desaparecer com o início do novo século. Por outro lado, a tripartição planimétrica dos edifícios do século XVI à 1ª metade do século XVIII, observada nalguns edifícios do Bairro Pombal, tende a desaparecer. A legislação e os registos notariais entre 1850 e 1871 por nós levantados permitiram-nos perceber a génese do edifício gaioleiro e a sua ruptura com o modelo pombalino: a legislação redefine os cunhais dos edifícios, a nova tipologia de caixa de escada, de entrada, de iluminação e de ventilação, depois reinterpretadas de uma forma mais depurada e inovadora pelo 1º movimento modernista português. A era dos gaioleiros terminaria com o uso massivo do betão na construção urbana e com o regulamento de 1935 conformando o seu uso.
Palavras-chave:
1. Edifícios - Portugal - Lisboa - História 2. Edifícios Históricos - Portugal - Lisboa 3. Lisboa (Portugal) - Edifícios, Estruturas, Etc. 4. Universidade Lusíada de Lisboa. Faculdade de Arquitectura e Artes - Teses 5. Teses – Portugal - Lisboa
PRESENTATION Title: Abstract:
The "building to let", in Lisbon, from 1758 until the early days of the Estado Novo's regime The subject of this dissertation for the Master degree in Architectural Heritage is The "building to let", in Lisbon, from 1758 until the early days of the Estado Novo's regime. We defined Cotovia ao Rato as the research area, an urban area presenting an architectural consistent growth, but wide enough to exhibit a diversity of urban units. The wide range of situations allowed us to understand the building patterns and their variations. In this urban mesh, Bairro de Pombal emerges as a historical site, which constitutes a unique case study of the external and internal layout of the Lisbon "building to let" in this period. As a first step, we brought to light the legal form referring the building to let, the conditions for letting dwellings and the minimum occupation per building. The integration of Lisbon within the architectural panorama of the Portuguese urbanistic universe allowed us to discuss a by-law architecture, presenting regional specificities. Between 1861 and 1865 a new set of legal and architectonic policies redefined the building to let. In the early years of the xxth century it is set a common basis for individual invention of the building façades. These facts regulated the internal and external layout of the gaioleiro building to let, within its building materials' limitations. This led to the characterisation of the gailoleiro building in its own life span, 1861-1935, and its morphologic evolution. The analysis of the Cotovia ao Rato area, as well as the study of referential buildings outside this urban mesh, allow us to build a corpus of unpublished data. This corpus has been confronted with the already published literature. Using the documental data we defined the planimetric and altimetric image of Cotovia ao Rato's buildings. The comparison of the historical sites of Bairro Pombal (2nd half of XVIIIth century - 1930s) and Postigo do Melo e Casas do Embaixador (XVIth century - 1st half of XVIIIth century), studied by Matos, Vanda Pereira (2003), permitted us to perceive the continuity and the shifting points in the emerging models of the building to let. In particular, the façade's tripartition persists from 1758 until 1869, but tends to disappear with the arrival of the new century. Furthermore, the planimetric tripartition of the buildings of the XVIth century to the 1st half of XVIIIth century is observed in some buildings of Bairro Pombal, but tends to disappear. The legislation and the unpublished notarial records of the period 1850-1871 provided a clear view of the emergence of the gaioleiro building to let and its discontinuity with the pombaline model: it redefines the corner of the buildings, their entrance and stairs, the ilumination and the ventilation of the vertical accesses to the upper floors. These aspects would receive a new approach in the 1920s-1930s, conducing to a new modernity. The gaioleiro's era will end with the massive use of concrete in the building construction and the 1935's regulation of its use.
Keywords:
1. Buildings - Portugal - Lisboa - History 2. Historic Buildings - Portugal - Lisbon 3. Lisbon (Portugal) - Buildings, Structures, Etc. 4. Universidade Lusíada de Lisboa. Faculdade de Arquitectura e Artes - Dissertations 5. Dissertations, Academic – Portugal - Lisbon
AGRADECIMENTOS
Esta dissertação não seria possível sem o percurso conjunto de muitos. Assim foi fundamental a orientação prestada pelo Professor Doutor Arquitecto Nuno Santos Pinheiro e pela Mestre Arquitecta FátimaLino cujas qualidades humanas e científicas me permitiram ir dando corpo a este trabalho. Foi essencial o apoio da minha família, bem como de todos os que me ajudaram no esclarecimento da realidade edificada fora de Lisboa: o Professor Doutor Gaspar Martins Pereira, o Professor Doutor Arquitecto Domingos Tavares, no Porto, e a historiadora Dra. Maria Antónia Lucas da Silva, em Coimbra. Na apresentação dos documentos gráficos muito devo à prontidão dos arquivos e bibliotecas. Imprescindível foi também a amabilidade dos habitantes da Cotovia ao Rato e Madragoa que me permitiram ver os interiores dos imóveis que analisei. Igualmente o silêncio de muitos permitiu que me chegasse o património edificado relativamente intocado. A todos eles os meus agradecimentos. Lisboa, Abril de 2009
A população em Lisboa ---------------------------------------------------------------------------19
1.3.
O êxodo das populações --------------------------------------------------------------------------22
1.4.
Emigração para o Brasil ---------------------------------------------------------------------------22
1.5.
A economia do País--------------------------------------------------------------------------------22
1.6.
A figura legal do edifício de rendimento e sua perspectivação--------------------------------------25 1.6.1. A figura legal ------------------------------------------------------------------------------25 1.6.2. Causa para a persistência da figura do edifício de rendimento no século XIX----------------26 1.6.3. A Lei do Inquilinato -------------------------------------------------------------------------27
1.7.
Formas de ocupação do solo e distribuição populacional ------------------------------------------29
1.8.
Uma possível sub e sobreavaliação dos efectivos residente em Lisboa -----------------------------31
1.9.
O número de indivíduos por fogo ------------------------------------------------------------------33
1.10. Da Cotovia ao Rato, perfil do território e dos seus habitantes ---------------------------------------35
Capítulo II ASPECTOS PARA A CONFORMAÇÃO DO EDIFICADO------------------------------------------------------45 2.1.
Permanência e fuga -------------------------------------------------------------------------------- 45
2.2.
O fim da almoçataria -------------------------------------------------------------------------------47
2.3.
Panorama urbanístico em que se insere Lisboa entre 1755 e o dealbar do século XX---------------48 2.3.1. Porto ---------------------------------------------------------------------------------------49 2.3.2. Coimbra ------------------------------------------------------------------------------------52 2.3.3. Vila Viçosa ---------------------------------------------------------------------------------55 2.3.4. Brasil ---------------------------------------------------------------------------------------56
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10 |SUMÁRIO
2.4.
Lisboa ---------------------------------------------------------------------------------------------57 2.4.1. Entre duas “idades de ouro” ----------------------------------------------------------------57 2.4.2. A problemática da Baixa-Chiado, reenquadramento da produção arquitectónica lisboeta pós 1758 -----------------------------------------------------------------------------------60 2.4.3. Sistemas construtivos do edifício de rendimento de 1758 ao 3º quartel de 1800 -----------66 2.4.4. Para além da Baixa-Chiado, áreas de construção pós terramoto 1755-----------------------69 2.4.5. A manutenção de uma prática até à chegada de Ressano Garcia ----------------------------72 2.4.6. A necessidade de um plano de Melhoramentos---------------------------------------------74 2.4.7. O edifício gaioleiro, entre o classicismo e o dealbar do Estado Novo -----------------------75 2.4.7.1. Enquadramento cronológico e características morfológicas -----------------------75 2.4.7.2. A continuidade dos 25 a 30 palmos de frente nos edifícios gaioleiros -------------76 2.4.7.3. Sistemas construtivos do gaioleiro, a ponte para a era do betão -------------------77 2.4.8. Anomalias construtivas como diagnóstico de uma forma de construir-----------------------81
Capítulo III DA COTOVIA AO RATO ─ ANÁLISE DO EDIFICADO --------------------------------------------------------87 3.1. O território de análise --------------------------------------------------------------------------------87 3.2. Aspectos de cariz evolutivo --------------------------------------------------------------------------87 3.2.1. Do edifício bipartido à unidade de quarteirão -------------------------------------------------87 3.2.2. Edifício da segunda metade do século XVIII, o legado à beira de 1755------------------------88 3.2.3. A fachada tripartida ---------------------------------------------------------------------------88 3.2.4. O fim de um sistema de vistas, a liberdade de moda de cércea e de fenestrar ----------------89 3.2.5. As métricas ----------------------------------------------------------------------------------89 3.2.6. Os escoadouros ------------------------------------------------------------------------------90 3.3. Edificado de 1758 a1859 ----------------------------------------------------------------------------90 3.3.1. A imagem do edificado ----------------------------------------------------------------------90 3.3.1.1. A permanência de balcões térreos e superiores -------------------------------------90 3.3.1.2. A construção de passeios -----------------------------------------------------------91 3.3.1.3. As placas foreiras e a divisão administrativa-----------------------------------------91 3.3.1.4. O revestimento azulejar das fachadas------------------------------------------------94 3.3.1.5. Janelas de rótula --------------------------------------------------------------------96
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SUMÁRIO | 11
3.3.2. Conformação altimétrica do edificado de 1758 a 1859 ---------------------------------------97 3.3.3. Organização do edifício de rendimento ------------------------------------------------------98 3.3.3.1.
No quarteirão------------------------------------------------------------------------98
3.3.3.2.
A caracterização do fogo interno tipo e planta distributiva de 1758 a 1830 ----------98
3.3.3.3.
Os interiores de 1758 a 1859 ----------------------------------------------------- 101
3.4. Edificado de 1859 a 1903 ------------------------------------------------------------------------- 103 3.4.1. A imagem do edificado de 1859 a 1903---------------------------------------------------- 103 3.4.1.1.
A resolução dos ângulos dos quarteirões e a relação da rua com o pátio ou saguão --------------------------------------------------------------- 103
3.4.1.2.
O aparecimento da platibanda, de uma moda da cércea, aspectos de ventilação e iluminação --------------------------------------------------------- 104
3.4.1.3.
O desuso do telhado mouriscado------------------------------------------------ 105
3.4.1.4.
Cunhais de chanfro curvo e recto------------------------------------------------ 106
Algerozes e tubos de queda ----------------------------------------------------- 109
3.4.1.9.
A conformação altimétrica de 1859/1903 --------------------------------------- 109 3.4.1.9.1.
A conformação altimétrica de 1864/1865 -------------------------- 109
3.4.1.9.2.
Conformação altimétrica sua evolução e continuação de 1867 a 1903 ----------------------- 110
3.4.2. Organização dos edifícios de rendimento 1867 a 1903 ------------------------------------- 112 3.4.2.1. No quarteirão---------------------------------------------------------------------- 112 3.4.2.2. Planimetricamente (Planta distributiva)-------------------------------------------- 112 3.4.2.3. A formulação de um espaço para uma casa de banho ----------------------------- 114 3.4.2.4. Interiores de 1851 a 1900--------------------------------------------------------- 114 3.4.2.5. Os interiores em 1903 ------------------------------------------------------------ 115 3.5. Edificado de 1930 a 1940 ------------------------------------------------------------------------- 116 3.5.1. O Regulamento Geral da Construção Urbana para Cidade de Lisboa de 1930 --------------- 116 3.5.2. Imagem do edificado regulamentado em 28 de Agosto de 1930---------------------------- 117 3.5.3. Conformação altimétrica do edificado regulamentado em 28 de Agosto de 1930 ----------- 118
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3.5.4. Organização dos edifícios regulamentado em 28 de Agosto de 1930 ----------------------- 119 3.5.4.1. No quarteirão---------------------------------------------------------------------- 119 3.5.4.2. Planimetricamente (planta distributiva)-------------------------------------------- 120 3.5.5. Interiores do edificado regulamentado em 28 de Agosto de 1930 -------------------------- 121 3.5.6. Bairro Pombal ------------------------------------------------------------------------------ 122 3.5.6.1.
Construção da planta distributiva e interiores e aspectos de alçado do Bairro Pombal ------------------------------------------- 124
3.5.6.2.
O edificado do Bairro Pombal --------------------------------------------------- 125
3.5.6.3.
O núcleo de génese do Bairro Pombal------------------------------------------- 131
3.5.6.4.
Os grandes conjuntos de edifício de rendimento -------------------------------- 132
3.5.6.5.
Os pequenos edifícios de rendimento ------------------------------------------- 135
3.5.6.6.
Os edifícios de frente de quarteirão---------------------------------------------- 135
3.5.6.7.
Os edifícios de topo de quarteirão ----------------------------------------------- 136
3.5.6.8.
A partição de alçado e planimétrica --------------------------------------------- 136
3.5.6.9.
Os últimos gaioleiros, o 1º movimento modernista português no Bairro Pombal ------------------------ 137
3.5.6.10. A intervenção Estado Novo no Bairro Pombal------------------------------------ 138
Capítulo IV CONCLUSÕES------------------------------------------------------------------------------------------- 141 4.1. Recapitulação dos dados da pesquisa ------------------------------------------------------------- 141 4.2. Reapreciação de alguns aspectos do período em estudo ------------------------------------------ 143
INTRODUÇÃO A arquitectura corrente da cidade continua a ser um assunto pouco estudado, contudo ela constitui a grande parte do tecido urbano. Por esse motivo, resolvemos elegê-la como tema da dissertação de mestrado em Recuperação do Património, centrando-nos no edifício de rendimento na Lisboa de 1758 ao dealbar do Estado Novo, no território da Cotovia a Rato. No dia em que o edifício é acabado, termina a primeira etapa e inicia-se o tempo de vida que encerrará com a sua morte, sua ruína. Dela apenas restarão a memória e os fragmentos erudidos pelo tempo, construindo uma outra arquitectura. Perante a impossibilidade de conservar tudo, resta-nos a leitura do passado e a premência de salvar do tempo o edificado adiando, uma morte prematura. A esses vazios urbanos que necessariamente surgirão, fica, espera-se, os registos de todos aqueles que trabalham sobre a mole da cidade. Esta é, necessariamente, sobretudo a massa anódina. Todavia, é por vezes excessivamente contemporânea para que os centros decisores consigam intervir e salvá-los da sua destruição. Muitos vão dar lugar a novos edifícios fruto da enorme pressão imobiliária que se vive dentro da cidade. Existe, no entanto, um tecido edificado, mais antigo, que subsiste construído com outra matéria, mais acarinhada, dos quais o edificado pombalino é um ex-libris. Estes ainda contêm em si a “medida velha” e um classicismo muito próprio, vicissitude do contexto cultural português. É este talvez, o problema mais gritante, dado que a memória — a nossa identidade —, é feita por uma mole que se move num lato espaço de tempo. Perante a impossibilidade de introduzir a lentidão, pondo termo a um fim inelutável, é necessário então escrever. …”Amanhã o mundo acaba mas eu hoje planto macieiras”…1
1
Ditado europeu, citado pelo político Marçalo Grilo na entrevista da jornalista Ana de Sousa ao mesmo no programa “Por outro lado”.
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14 |INTRODUÇÃO
A Capital e o País no contexto europeu O século XIX viria a ser um século de transformações. Em 1885 delineavam-se os planos para o Metropolitano de Lisboa, marcando a entrada no que seria o século da velocidade. Dentro em breve o automóvel poria fim à civilização do cavalo. Com ele a cidade, as suas ruas, os seus edifícios teriam de ser necessariamente repensadas. A arquitectura regimentada tinha padronizado um classicismo na arquitectura corrente da cidade. Contudo, o edifício gaioleiro afasta-se progressivamente desta linguagem à medida que ganha hibricidade e explora as potencialidades do betão. A substituição da medida velha pelo sistema métrico viria pôr fim a uma forma de pensar e desenhar. Ficou a memória de uma arquitectura igual feita por cordel e introduziu-se o projecto de autor. A internacionalização da arquitectura portuguesa apenas aconteceria com o segundo movimento moderno. O contexto português movia-se dentro de um regime ditatorial, primeiro emergente e depois “nobilitado” pela Exposição do Mundo Português de 1940. Propostas como a vencedora do Terceiro Concurso para o Monumento do Infante D. Henrique, dão mostras de uma enorme vitalidade e contemporaneidade da massa artística, contudo necessariamente cerceadas por aquilo que seria a marca do Regime. As intervenções no património não deixariam de exaltar os então considerados valores nacionais, dos quais toda a produção do século XVIII era expúrea. Assim, se iniciou o processo de descaracterização de muitos monumentos, incluindo os célebres casos da Sé de Lisboa e do Castelo de S. Jorge. Na Europa, entre as guerras, a nova arquitectura moderna cristalizava, produzindo o que viriam a ser ícones da arquitectura contemporânea. Os anos sessenta do século XX viriam trazer uma geração que os iria assimilar repensando a arquitectura moderna portuguesa. Contudo, eram liberdades impensáveis no dealbar do Estado Novo. Neste hiato estrutura-se e consolida-se a malha urbana do território da Cotovia ao Rato, já iniciada em 1513 com a urbanização do Bairro Alto de S. Roque. Por forma a abordarmos este território procedemos assim à segmentação do corpo do trabalho em três capítulos. O primeiro de contextualização aborda além dos aspectos históricos e políticos, a figura legal do edifício de rendimento e a sua perspectivação no tempo. Traça-se um perfil do território e dos seus habitantes. No segundo capítulo são apresentados os aspectos de permanência a fuga, com vicissitude da permanência de um modelo de alçado. De modo, a contextualizar Lisboa no panorama arquitectónico do universo urbanístico português são mencionados os casos do Porto,
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INTRODUÇÃO | 15
Coimbra, Vila Viçosa e Brasil — colónia portuguesa até 1822. Estes abrem o caminho para a discussão de uma arquitectura regimentada com carácter de espeficidades regionais. Tal não significa uma menor vitalidade do sistema que a implantou, nem o abandono de uma imagem padronizada, mas antes uma mostra de flexibilidade e grande inteligência de gestão de recursos económicos e materiais. São ainda definidos neste capítulo o enquadramento cronológico e características morfológicas do edifício gaioleiro Por outro lado, são apontadas ainda sucintamente anomalias construtivas como um diagnóstico de uma forma de construir. No terceiro capitulo desenha-se a imagem planimétrica e altimétrica do território da Cotovia ao Rato por meio da legislação e documentação. Por fim analisa-se o Bairro Pombal para o qual se analisa o edificado quanto á sua localização no quarteirão, relativamente à sua partição planimétrica e de alçado. Através de documentação inédita é construído os fogos tipo do edifício de rendimento durante a génese dos que se chamariam de gaioleiros. São definidos os grandes conjuntos de edifício de rendimento como também os que ocupam apenas um “chão” e a sua relação como os do período imediatamente anterior— século XVI à 1ª metade do século XVIII. São apresentadas as questões que enformam a construção de edifícios de frente e de topo de quarteirão. No quarto capítulo apresentam-se as conclusões, fazendo a reapreciação de alguns aspectos do período em estudo.
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CAPÍTULO I| 17
De seguro, posso apenas dizer que havia um muro E foi contra ele que arremeti A vida inteira Não, nunca o contornei Nunca tentei Ultrapassá-lo de qualquer maneira. Miguel Torga
Capítulo I - LISBOA DE 1758 AO DEALBAR DO ESTADO NOVO Entre 1758 e o dealbar do Estado Novo estrutura-se consolida-se a malha urbana do território da Cotovia ao Rato, já iniciada em 1513 com a urbanização do Bairro Alto de S. Roque. Por forma a abordarmos este território procedemos à sua contextualização na época. Abordámos assim os aspectos históricos e políticos ao tempo. Com base na Legislação das Posturas Antigas da cidade de Lisboa estabeleceu-se a figura legal do edifício de rendimento e analisa-se a sua continuidade no período em estudo. Apontam-se as causas para continuidade da tipologia do edifício de rendimento no hiato de tempo estudado. Estabelece-se o número de indivíduos por fogo. Para construir o perfil dos habitantes do território da Cotovia ao Rato, socorremo-nos das Décimas de Maneio das freguesias abrangidas por ele. 1.1. Contexto histórico De acordo com Joaquim Veríssimo Serrão a unidade lusa teve três épocas capitais: a primeira abrange o período que vai desde a formação do Estado na primeira metade do século XII até primórdios do século XV; a segunda abre com a chegada ao trono da dinastia de Avis — esta tem como marco inicial a conquista de Ceuta — e estende-se até ao ano de 1640, e a terceira compreende o hiato entre a Restauração e o Ultimato, em 1890 (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo;
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18 | CAPÍTULO I
1995, pp.14-15). É dentro desta última que se baliza parte do período histórico em análise. Com excepção dos reinados de D. João V e D. José I, entre 1640 e 1890, a posição da Casa dos Braganças deixou de ter um papel decisivo na política europeia. A posição dos Braganças persistiu na trajectória de nação repartida por outros continentes. Mesmo após a Revolução de 1820, a que se seguiu em 1822 a independência do Brasil, Portugal manteve o ideário liberal continuou fiel a uma concepção que se arraigava no sentido tradicional da nossa história. Foi a crise de 1890, quando a monarquia se viu acusada de não defender com vigor os direitos nacionais em África, que consolidou o sentimento republicano e que, justificou em grande parte a Revolução de 1910 (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo: vol. I, 1995, p.16). O século XIX não se desenrolaria sem o fim da Inquisição em 1821, organismo que vigorava em Portugal desde 1536. Contudo, esta abertura política e religiosa seria de pouca duração e por demais insuficiente para restabelecer o país das ideias, iniciativa privada forte que tinha caracterizado o tempo em que os sefarditas tinham movimentado capitais. Apesar das violências e desaires que acompanharam a implementação da primeira República, esta não quebrou o espírito da Pátria que vinha do período antecedente a 1910. Muito embora a Primeira República (1910-1926), tenha inundado de esperança muitos estratos da população não cumpriu o programa de progresso e de renovação que se tinha proposto. Tal prende-se com o facto de o regime ter fracassado em dois pontos, a saber: a falta de tolerância nos sectores religioso e ideológico, e a ausência de autoridade para se impor aos excessos de populismo que se adjudicava o direito de ser o único usufruidor da República. Refira-se ainda que os ódios pessoais mais do que as rivalidades ideológicas fomentaram expressões de extrema violência. Daí que as divisões do regime tenham sido mais fortes do que a unidade mental que a Primeira República quis manter nos seus aderentes e fundadores. A Primeira República daria lugar a um regime ditatorial que se estenderia entre 1926 e 1933 — Ditadura Nacional. A Segunda República teria lugar entre e 1933 e 1974 (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo; vol. XI, 1995, pp. 7-8). O dealbar do Estado Novo viria trazer a trilogia Deus Pátria Família e com ela um “Paraíso triste”, porta aberta para muitos europeus nos anos conturbados da 2ªa Guerra Mundial e a referência para um porto de abrigo em “Casablanca” 1. Este dealbar não terminaria sem que houvesse quem fosse convidado a passar umas “férias” no Tarrafal. Mas, esse seria um passo lento que apenas cessaria, como
1
Filme dirigido por Michael Curtis, com Humphrey Bogart, Ingrid Bergman e Paul Henreid nos principais papéis; produzido por Hall B. Walis argumento: Joan Alison; editor Owen Marks; Distribuidor: Waner Bros, Estados Unidos, 1942.
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sabemos, com o 25 de Abril de 1974. Na realidade, seria apenas verdadeiramente celebrado aquando do encerramento das cadeias políticas. 1.2. A população em Lisboa O terramoto de 1755 provocou uma descida enorme no total da população residente na cidade, mais pela fuga da zona atingida do que pelas mortes que provocou. O número de efectivos de populacionais existentes antes do terramoto apenas será reposto no fim do último quartel do século XVIII. Será então reiniciada a dinâmica de crescimento que se prolonga para além do final da centúria. Pese embora a existência de uma corrente migratória forte, Lisboa deixa de se poder equiparar às grandes metrópoles europeias. No início do século XIX, Lisboa encontra-se entre as dez maiores cidades europeias, ultrapassando os 150000 habitantes (cf. SANTANA, Francisco (dir.) & SUCENA, Eduardo (dir.); 1994; pp. 722-723). Em 1801 a capital tinha cerca de 169000 habitantes residentes. Ao longo de Oitocentos a cidade foi atingida por dezassete períodos de mortalidade elevada, observados em simultâneo em todas ou na maioria das freguesias. Em termos de mortalidade, 1857, é um momento de charneira, marcando o final das crises intensas. Crises essas de curta duração, maioritariamente de origem epidémica e frequentemente inseridas no âmbito de uma conjuntura internacional favorável à sua propagação (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira; 1993; p. 328). Desde 1807 a cidade perdeu população, dadas a emigração de parte desta para o Brasil e outros países estrangeiros, as guerras e a cólera-morbus que grassou na cidade em 1833 e 1856, o tifo que vitimou Lisboa em 1810-1811 e o surto de febre amarela em 1857 (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira; 1993; pp. 91-93, p. 430). Depois de 1857, Lisboa é submetida a sucessivos e frequentes anos de sobremortalidade, mas com um cariz distinto, mesmo quando a sua origem directa continua a ser de tipo epidémico (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira; 1993; pp. 326-328). Contudo no cômputo geral, mutações de ordem diversa esbatem a importância das crises gerais de Oitocentos, mesmo as calamitosas, não tendo qualquer impacto nos ritmos e direcções do crescimento urbano (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993, p. 433). Tal deve-se à curta durabilidade das mesmas, à reduzida percepção que os próprios têm da sua gravidade. Acresce que o número de vítimas só em 1833 representou 6 a 7 % da população lisboeta, tendo perdas de 1 ou 2 % nos restantes surtos. As consequências das mortes de 1857 foram em parte postas a nú devido ao surto se ter abatido sobre zonas abastadas e ter atingido camadas sociais por regra protegidos (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993,
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pp. 433-434). Na primeira metade de Oitocentos a evolução da população é quase nula, traduzindo as sucessivas conjunturas adversas que a cidade atravessava. Estas expressam-se em fases de diminuição do número de residentes, nomeadamente nos decénios de 1830 e 1840. No cômputo geral estas linhas são coincidentes com as tendências de crescimento do País. Contudo, a atractividade de Lisboa permitiu uma recuperação demográfica mais rápida (cf. SANTANA, Francisco (dir.) & SUCENA, Eduardo (dir.); 1994; p. 723). Depois de 1857, data em que é feita a ultima contagem em moldes tradicionais em que se verifica um grande surto epidémico em Lisboa, observa-se um crescimento da população moderado. O número de residentes é superior a 179000. A população lisboeta cresce a um ritmo progressivamente acelerado, verificando-se um período muito intenso entre 1878 e 1890. Dos 202000 indivíduos residentes no censo de 1878 passam a existir 302000 em 1890. Na década de 1880, em consequência da bula do Papa Leão XIII que mandava executar a reeestruturação dos bispados, procedeu-se a um censo nacional. O enunciado do enumeramento eclesiástico de 1882 apontava para Lisboa um total de 341 freguesias, 773237 almas e 171265 fogos (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo, vol. IX, 1995, p. 222). Na segunda metade do século XIX dá-se um incremento sem precedentes da indústria portuguesa. Esta chama às grandes cidades, nomeadamente a Lisboa2, um afluxo de massas rurais, sendo por isso responsável pelo aumento demográfico que se fez sentir na capital (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo; vol. IX, 1995, p. 272). Esta população rural fixava-se igualmente no comércio. A atractividade de Lisboa como capital do País também chama funcionários atraídos pela fascinação da grande cidade (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo, vol. X, 1995, p. 338). Estas gentes que chegavam sem cessar à grande capital compunham parte do quadro populacional lisboeta. A cidade de Lisboa participou com entusiasmo na vitória do liberalismo em 1833. O novo regime procedeu à divisão da cidade em seis bairros ou distritos. O ministro Silva Carvalho ordenou o numeramento por fogos tendo-se obtido os seguintes resultados: para a cidade 9795 fogos, para a Mouraria 9615 fogos, para o Rossio 9775 fogos, para o Bairro Alto e termo 9545 fogos, para Santa Catarina 9330 fogos e para Belém 9620 fogos. Desta forma se alcançaram os 46520 fogos para as 40 freguesias de Lisboa e mais de 10555 para as 32 freguesias do seu termo. Tudo perfazia um total de 57075 fogos. O mesmo é dizer uma 2
A este facto não é alheia a bicefalia do País em que Lisboa era a grande capital do Sul e o Porto a do Norte. Acresce que Lisboa era por tradição e direito a capital do País.
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população com cerca de 230000 indivíduos. Lisboa saía do quadro demográfico em que se entrara após as Invasões francesas, para, em breve, conhecer um aumento populacional que a faria romper o recinto muralhado e adquirir as dimensões de uma verdadeira capital. (cf. SERRÃO; Joaquim Veríssimo, vol. VIII, 1995, pp. 232-233). Em 1834 a Câmara Municipal de Lisboa procedia a uma correcção do número de habitantes, dada a necessidade de escolher 36 eleitores nos seis distritos da cidade e onze nos respectivos termos. Verificou-se a existência de um total de 61302 fogos — 50140 na cidade e 11162 nos termos —, o que podia corresponder a 250000 almas (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo, vol. VIII, 1995, p. 233). De 1880 a pelo menos 1910 verifica-se um crescimento populacional de Lisboa. Tal dever-se-á à descida dos níveis de mortalidade infantil e de crises de mortalidade fortes, com o compassado aumento da esperança de vida (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993, p. 166). No fim de Oitocentos habitavam na capital cerca de 7,1% dos portugueses, o que se traduz em números por 351000 habitantes. Esta percentagem aumentará até meados do século XX. Contudo há que referir que estes valores reflectem a incorporação de novas freguesias doutros conselhos na cidade, como sucedeu em 1919 (cf. SANTANA, Francisco (dir.) & SUCENA, Eduardo (dir.); 1994; p. 723). De 1911 a 1920 houve um crescimento populacional da cidade para 81214 habitantes (cf. SERRÃO, vol. XIII, 1995, p. 173). A capital recebeu desde 1910 um novo impulso para o seu desenvolvimento urbano, nomeadamente no que respeita ao aumento do número de residentes e da sua área populacional (cf. SERRÃO, vol. XIII, 1995, p. 175). Em 1911 a estatística atribuía a Lisboa 435359 habitantes, uma diferença significativa dos 301206 que apresentava em 1890 (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo, vol. XIII, 1995, p. 177). 1.3. O êxodo das populações Apesar da enorme emigração, o crescimento populacional de Portugal era na segunda metade de Oitocentos o dobro do da primeira metade da centúria — de 700 000 para 1584000. Entre 1920 e 1930 houve um acréscimo de população maior do que em qualquer outro decénio anterior. O aumento de população traduziu-se numa maior ocupação do País (cf. MATTOSO, José (dir.),vol. VI; 1994; p.34), consequentemente de Lisboa.
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Em 1890 32% da população lisboeta era oriunda de outros conselhos. Toda esta movimentação e pessoas trouxe alguns problemas urbanísticos e de saneamento básico (cf. MATTOSO, José (dir.),vol. VI; 1994; p. 35). 1.4. Emigração para o Brasil O regime vindo de 1820 não trouxe melhoras para as camadas mais desfavorecidas da população. Assim, esta tentava melhores condições de vida no Brasil. O fluxo migratório para a ex-colónia portuguesa não diminuiu com a abdicação do trono do imperador D: Pedro I e o seu regresso a Portugal. A imigração para o Brasil tinha-se tornado um negócio rentável para alguns. Aí chegados, os emigrantes viam-se a braços com condições de vida duríssimas. Na segunda metade do século XIX a situação dos emigrados no Brasil melhorou consideravelmente. Para alguns houve então o feliz regresso à pátria abonados de uma fortuna que nobilitava as suas existências (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo, vol. VIII, 1988, p. 253-256). 1.5. A economia do País Portugal sofre vários desaires no século XIX. A instabilidade política é enorme, marcada por conflitos armados como as invasões francesas, a Guerra das Laranjas ou a guerra civil, além de crises quase sempre ligadas à indefinição de poderes. Apenas tardiamente a afirmação do estado liberal adquiriu solidez suficiente para gerir com relativa segurança os “negócios do Reino”. As regulares crises internas traduziam a incapacidade de resposta de uma economia entravada pela irregular coordenação do mercado interno aos desafios que os novos tempos exigiam (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 22). No início de Oitocentos a economia nacional continuava assente numa agricultura arcaica. O século que entrava reflectia a estagnação da centúria anterior. As políticas de fomento do Conde da Ericeira do Marquês de Pombal em Setecentos não tinham vingado, pois tinha-lhes faltado a base agrícola e necessária revolução dos transportes internos que viabilizassem as alterações propostas. Por muito tempo o problema continuará a ser a desarticulação entre os vários sectores da economia, acentuada pelos efeitos da conjuntura politicamente instável. assim a primeira metade do século XIX será marcada por dificuldades económicas. Apenas a partir de meados do século se começam a delinear as condições necessárias à futura implantação da indústria moderna. Esta terá os seus grandes focos Lisboa, Porto e Covilhã, sendo os dois primeiros os mais importantes (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 24).
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A alteração visível na política económica portuguesa que se deu na década de 50 de Oitocentos e parte da seguinte fomenta o desenvolvimento das vias de comunicação internas. Embora a diversas escalas, esta política irá imprimir o prosperidade relativa a todos os sectores da economia. Assim, no período da Regeneração lançam-se as bases da estrutura capitalista moderna. Contudo, a crise mundial que grassa a década de 60 atinge também o País. Tal facto irá provocar uma descida do produto nacional per capita e das relações comerciais com o exterior. Simultaneamente verifica-se uma desaceleração do desenvolvimento industrial. A partir de 1870 inicia-se a nova fase de expansão económica. Esta é provocada pela convergência de uma conjuntura externa favorável com uma fase agrícola farta. A primeira traduz-se na diminuição dos preços de determinadas matérias-primas e bens intermédios. A conjuntura externa favorável transparece também na reorientação dos investimentos das economias industrializadas na Europa para a sua periferia. O facto de se atravessar uma fase agrícola próspera reflecte-se no aumento das exportações de matérias-primas, na procura interna consequente à subida do Produto Interno Bruto e no redimensionamento do mercado nacional (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; pp. 24-25). No fim do século XIX Portugal encontra-se a braços com uma crise provocada pelo Ultimato e pela redução das remessa do Brasil. A actividade que é mais lesada é a agricultura ligada à exportação. O decénio prossegue com um novo desenvolvimento industrial possibilitado pela canalização dos excedentes tradicionais do sector primário para a industria portuguesa, sustentada por uma política proteccionista. Este movimento de modernização tem reflexos vários na sociedade portuguesa, concretamente na estrutura populacional. O processo de industrialização no final da centúria é o aspecto marcante da mesma, modificando as formas de mobilidade geográfica e tendências de crescimento, de modo que os recursos humanos possam corresponder às solicitações do novo quadro socioeconómico (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 26). No iato subsequente à 1ª Grande Guerra o nervosismo dos mercados financeiros não deixa de gerar uma certa inflação. A recuperação da estabilidade monetária, do equilíbrio orçamental e da redução da dívida pública apenas começa alguns anos antes da pasta das Finanças ser entregue a Oliveira Salazar em Abril de 1928 — , nomeado em 1926 presidente da Comissão da Reforma Tributária. A ditadura militar, instaurada pelo golpe militar de 28 de Maio de 1926, não só irá colher os frutos das medidas tomadas pela República, como as aprofundará. O contexto internacional de crise e de estagnação que perdurará até meados da década de 30 justifica a facilidade com que os diversos
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sectores se submetem à estrita organização imposta pelo Estado (cf MADUREIRA, Nuno Luís; 2002 pp.15-16, p. 92). Tão importante como a intervenção do Estado é a realidade subsequente: o modo como as empresas reagem à nova conjuntura. O Estado por vezes faz uma regulação assimétrica ora fixando preços de venda, ora o preço das matérias primas, noutras quantidades de produção, ou ainda os salários. As margens de negócio são assim variáveis. a competição pode pois mover-se dos aspectos regulamentados para os não regulamentados, podendo, desta forma, tirar proveito das lacunas da fiscalização para maior benefício do Estado (cf MADUREIRA, Nuno Luís; 2002 pp.1718). Enfim a parábola do Banqueiro Anarquista (Fernando Pessoa, 1922) em pleno vigor e vitalidade. Verifica-se uma cartelização das indústrias para os diversos sectores de actividade. Os pequenos estabelecimentos não têm capacidade face à concorrência desigual de uma indústria municipalizada. Este quadro mantém-se por todo o 1º quartel do século XX. À beira do Estado Novo, o centramento do mercado interno e o exacerbar da concorrência são uma realidade indiscutível (cf MADUREIRA, Nuno Luís; 2002 p.54-55). Contudo, soluções promissoras e eficazes aguardam esta “jangada de pedra” com sede de atlantismo e de glórias de umas colónias ainda suas. Estas serão protagonizadas por Oliveira Salazar. É neste fiel que Portugal passa, sucessivamente, de 1918/22 um período de agravamento e descontrolo das contas correntes do Estado, para de 1922- 1928, uma etapa de recuperação de contenção do défice, de estabilização da moeda sem que haja suporte das políticas financeiras, e para 1928-1940 um momento de equilíbrio financeiro e de estabilidade cambial (cf MADUREIRA, Nuno Luís; 2002; p.74). Fruto das vontades económicas da Capital, em 1885 surge a primeira sugestão para construir um metropolitano na cidade. As propostas para esse “caminho de ferro subterraneo” vão ser diversas até à aprovação do “Plano Geral de Instalação e Exploração do Metropolitano de Lisboa” em 18 de Dezembro de 1948, sua inauguração, em 1959 (cf. ROLLO, Maria Fernanda; 1999; p. 26, 155 e 175). Eles são, contudo marca da nova forma de ocupação do subsolo da cidade e paradigma da velocidade que se vai instalando no quotidiano dos lisboetas.
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1.6. A figura legal do edifício de rendimento e sua perspectivação 1.6.1. A figura legal A necessidade de rentabilizar o espaço disponível na cidade está na origem da sua divisão em lotes e no aparecimento de um edifício plurifamiliar com grande densidade de ocupação vertical, o edifício de rendimento. A figura legal do edifício de rendimento parece-me estar definida nas expressões da época “casas de aluguer”, existente na consulta da câmara a el-rei em 25 de Agosto de 1745 (cf. OLIVEIRA, Eduardo Freie, 1906; vol. XIV, pp.434-445) e “alugadores de casas”, existente no Alvará Régio de 27 de Janeiro de 1548 (cf. OLIVEIRA, 1906; vol. I, p. 557). Para este edifício existe uma base legal constante nas Posturas antigas da cidade de Lisboa definindo os requisitos que determinam o aluguer das habitações e densidades ocupacionais mínimas: …”Ouujde mandado dos vereadores e procurador que nenhua pessoa nom seja tam ousada que aja de allugar nenhuas cassas nem tendas senom pera seu viuer e negoçio e nom pera Regatear e tornar a Reallugar e qualquer que o contrairo fezer E em ello for comprendido ou lhe for prouado pagar dez cruzados pera as obras da çidade E esto se nom entendera quando hua pessoa llugar (sic) hua Cassa em que aJa tres ou quatro cassas de hua portaas (sic) adentro./ porque cando assy for quem quer as podera allugar e tomar parte dellas que quiser pera seu viuer e as outras podera allugar sem pena algua E se alguas allugadas forem desta maneira de sam Joham pera qua que as deixem… a dita pena e sera meetade da dita pena pera quem ho acussar // foy apregoada a xxbiij Junho de bº xij Yoão ffogaça ffernão lopez correa”…in Livro das Posturas Antigas, Fl. 103v, p. 287 Contudo, as suas espeficidades não ficariam completas se não se referisse as suas formas de ocupação. Os registos dos arroladores do imposto predial — inserido em meados de seiscentos e reformulado em 1762 (cf. MATOS; Vanda Pereira de; 2003, p. 102) — permitem-nos perceber quatro situações distintas (cf. MADUREIRA, Nuno; 1992; pp.266- 267): a) O trabalhador vive no edifício em que trabalha Mesmo que ocupe vários pisos, apenas lhe é tributado o Maneio de um deles. b) O trabalhador que vive num local, mas trabalha noutro ponto da freguesia. Nesta situação os arroladores cobram o maneio no local de trabalho e quando chegados à residência anotam que este já foi cobrado na rua em questão. c) O trabalhador que vive num local e trabalha fora da freguesia. Os cobradores apenas apontam a freguesia em que o maneio deve ser pago
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d) O trabalhador que exerce o seu ofício na freguesia mas que vive fora dela. Neste caso o maneio é cobrado na freguesia não se de dando qualquer informação adicional sobre a residência. 1.6.2. Causa para a persistência da figura do edifício de rendimento no século XIX No século XIX, 5,5% do total da população portuguesa vivia em Lisboa, um espaço com poucos kms de superfície. A capital era a maior cidade do país. O seu número de residentes nunca deixará de aumentar, pese embora as conjunturas desfavoráveis que marcaram o início do século XIX. Em 1801 a cidade tem cerca de 200000 habitantes. A sua população aumenta moderadamente até à segunda metade da centúria, para atingir em 1900 mais de 350000 residentes3. Embora acompanhe as tendências globais, o crescimento de Lisboa foi sempre mais forte que o crescimento nacional (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; pp. 41-42). Embora no último quartel do século XIX se assista a um direccionamento claro da população para o interior da cidade, esta continua a concentrar-se junto ao rio (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 42). A necessidade de rentabilizar o espaço na cidade leva ao concentrar em altura. Assim sendo a figura do edifício de rendimento continua a moldar a imagem da capital. Quando a cidade não cresce fisicamente, cresce à custa do preenchimento de espaços vazios. As extensas barreiras da Lei de 1886, possibilitaram que o crescimento urbano tivesse lugar dentro da área já definida. Quer pela construção de novos bairros em áreas de quintas e campos, quer pela elevação dos edifícios já existentes em áreas já urbanizadas. Este processo traz consigo a degradação das condições de existência de uma parte da população de menores posses, muita da qual recém chegada à cidade. Esta será uma situação que se prolonga para lá da 1ª Grande Guerra e que, de acordo com , Teresa Maria Ferreira Rodrigues (1993), podemos definir como uma fase de relativa ruralização (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 138). Em 1890, existem cada vez mais homens maioritariamente solteiros, chegados à cidade à procura de melhores condições de vida (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; pp. 145-146). Este sector da comunidade procurará concerteza um tipo habitação em propriedade horizontal proporcionada pelo edifício de rendimento. A esperança média de vida dos residentes passa em Oitocentos de 27 para 36 anos, sendo maior no sexo feminino do que no masculino (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 273).
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Este número foi também atingido graças à anexação de novas freguesias na cidade.
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1.6.3. A lei do Inquilinato As condições do arrendamento de habitações, o seu preço e as acções decorrentes do desrespeito dos seus contratos estiveram na origem das diversas reformas que esta lei sofreu (cf. SERRÃO, Joel (dir.); 1990; vol. III p.327). Desta forma, não é estranho que esta lei tenha sido sucessivamente reformada ao longo do século XX. Depois do advento do constitucionalismo foram tomadas diversas medidas que surgiram como “leis especiais” (cf. SERRÃO, Joel (dir.); 1990; vol. III p.327). As estatísticas para a contribuição predial no último decénio da Monarquia afirmavam existir no Reino e nas Ilhas mais de 1400000 prédios urbanos. Contudo, as estatísticas eram enganadoras, visto que mesma a habitação situada no campo entrava nesta categoria, não se encontrando distinção entre casa do campo e casa da cidade (cf. MARQUES, A. H. de Oliveira (coord.); 1991; p. 61). A República, escorando-se nas classes média e inferior das cidades, procurou satisfazer, desde a sua fundação, os inquilinos dos prédios urbanos. A primeira lei do inquilinato foi feita por decreto ditatorial de 12 de Novembro de 1910, por iniciativa do ministro Afonso Costa. A maior inovação deste diploma estava no pagamento das rendas das habitações ao mês, em vez de ao trimestre ou ao semestre, como era uso até então. Esta lei teve a aprovação da população em geral. Contudo, ela permitia ao proprietário urbano — senhorio —, gozar muitas regalias, consideradas exploradoras e vexatórias por parte do inquilino. Se até à 1ª Guerra Mundial os senhorios não usufruíram destas regalias, dadas a relativa estabilização do custo de vida e a possibilidade de equilíbrio entre a oferta e a procura de casas para alugar, no período subsequente o quadro alterou-se. A desvalorização da moeda portuguesa, o afluxo cada vez maior de pessoas à cidade, o aumento gradual dos preços a partir de 1913, modificou esse equilíbrio na cidade. O aumento das rendas provocou o descontentamento das populações. As vantagens que os senhorios tinham alcançado, expressas nesta lei de forma velada, permitia-lhe entre outras coisas despedir o inquilino por não lhe convir a continuação do arrendamento Nesta circunstâncias se viveu até 1919. A nova lei do inquilinato de 1919 tentou solucionar as inquietudes que o decreto anterior levantava. Uma das suas mais importantes inovações, estabelecida com carácter permanente, foi a proibição da elevação das rendas e a liberdade de sublocação aos inquilinos (cf. MARQUES, A. H. de Oliveira (coord.); 1991; pp. 62-63). Uma das mais nefastas consequências da lei do inquilinato foi a diminuição da actividade construtora precisamente na época em que se verificava o maior afluxo de gentes à cidades num ritmo cada vez mais acelerado. O valor da propriedade urbana diminuiu, os senhorios foram-se
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tornado progressivamente mais afoitos para fazer as reparações indispensáveis para a manutenção das suas propriedades urbanas e os empresários diminuíram as edificações para inquilinos. A um período de intensa construção, em 1910-1911, seguiu-se-lhe uma baixa progressiva, quer na construção quer na ampliação. Quando em 1926 é redigido o relatório da Comissão nomeada no mesmo ano para propor as bases da Reforma Tributária, Lisboa tinha, nos fins de 1925, um défice, estimado em 25000 a 30000 de habitações para a população da cidade. Por forma a suprir essa falta, foram edificadas instalações provisórias nos arredores da capital e construíram-se habitações nos conselhos próximos de Lisboa (cf. MARQUES, A. H. de Oliveira (coord.); 1991; pp. 63-64) A lei do inquilinato, promulgada pelo decreto 15289 de 30/03/1928, permitiu dar um novo alento à construção de edifício de rendimento, a natural forma de vencer a escassez do espaço dentro da urbe, aliviando a crise económica e financeira que tinha obrigado à suspensão de praticamente de toda actividade da indústria da construção (cf. Fernandes, José Manuel; 1993 ; pp. 28-29). O congelamento das rendas, uma das medidas tomadas por Oliveira Salazar nos anos 40 do século XX, viria a favorecer a persistência dos edifícios de rendimento. Esta medida teve consequências bastante nefastas para os imóveis arrendados de Lisboa e Porto, como é do conhecimento geral. Procurando resolver o estado calamitoso em que se encontrava o edificado após décadas de rendas congeladas, surgirá, em 1985, a lei nº 46/85 de 20 de Setembro, respeitante ao regime de renda livre e condicionada e apoiada nos contratos de arrendamento para habitação. Contudo a sua resolução tomaria um passo lento. Diversos bairros surgiriam, contudo, nem todos com o mesmo padrão socioeconómico. Paralelamente também veremos surgir os bairros económicos. 1.7. Formas de ocupação do solo e distribuição populacional De acordo com Teresa Maria Ferreira Rodrigues (1993) a ruptura com novas formas de pensar, reflecte-se no pulsar urbano e nas suas expressões físicas. Esta resulta de um múltiplo movimento cujos agentes são não só as elites do poder, como também os habitantes da cidade, que vão lentamente condicionando e caracterizando os eixos de crescimento (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 43). Neste conjunto são visíveis três momentos de viragem: a reconstrução da baixa da cidade em 1755, a nova imagem de Lisboa dada pela abertura da circunvalação em 1852, e a abertura da Avenida secundada pelo projecto das Avenidas Novas. (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira; 1993; pp. 43-45).
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Ao destruir parte da Baixa o terramoto de 1755 acelerou o processo de expansão urbana para a área dos planaltos ao longo do rio, Santos e Belém, como também, e sobretudo, para o interior — Penha de França, Campo de Santa Clara, Rato, Campolide e Campo Grande (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; pp. 43). Em 1852 a cidade é rigorosamente delimitada com uma área escolhida em função do futuro crescimento. Contudo, a segunda metade de Oitocentos assenta ainda em moldes tradicionais de urbanismo. Este demonstra sinais de saturação dado a aumento muito rápido do número de residentes efectivos. A alteração do processo de desenvolvimento urbano tem o seu ponto paradigmático na substituição do Passeio Público pela Avenida da Liberdade, em 1879. Esta propicia a abertura de ruas perpendiculares que serão mais tarde ocupadas por bairros de classe média. O desenvolvimento dos transportes colectivos dilui alguns problemas postos à circulação interna. Ao facilitarem a circulação os “americanos” — carros eléctricos —, modificam a dinâmica do espaço. O crescimento urbano será realizado ao nível da fixação habitacional de acordo com a rede de estradas internas existentes e a construir (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 43). O ano de 1885 marca o apogeu físico da cidade. Contudo, Lisboa ainda é um espaço descontínuo, pontilhado de áreas e vazios de cariz rural, como as quintas e hortas, que são a imagem da Ameixoeira, Lumiar e Charneca. Muitas áreas são tradicionalmente zonas de veraneio e de lazer, como o Arco do Cego, Sete Rios, Campolide, Benfica ou Campo Grande, só tardiamente ligadas ao centro da capital por carreiras diárias de transportes públicos. Nos limites oriental e ocidental, as freguesias crescem graças à instalação de diversos empreendimentos em terrenos baratos e abundantes. A sua população residente já é significativa. Contudo, encontram-se ainda muito longe do centro de Lisboa, à qual permanecem ligados por barcos que partem de Pedrouços e de Belém. Ao terminar o século XIX a cidade emerge por novas formas de aproveitamento do solo. Embora com ajustes pontuais, até aos anos 50 do século XX a área urbana de Lisboa pouco será alterada. De acordo com as evolução das formas de ocupação do solo e o ritmo de crescimento populacional, evidenciam-se três espaços ou manchas territoriais distintas (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 45): A primeira corresponde à designada Baixa Pombalina. Esta é constituída pelas freguesias de S. Julião, Conceição, S. Nicolau, Sta. Justa e Mártires. Em Oitocentos esta área assiste a um decréscimo do número de residentes, reflectindo a mudança urbanística relativamente ao uso do solo. Iniciara-se a terciarização do centro da cidade, particularmente nos últimos anos do século.
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A segunda mancha territorial identifica-se com os bairros anteriores ao terramoto de 1755 e que a ele sobreviveram. Este espaço é constituído pelas freguesias do Castelo, Sé, Sto. Estevão, S. Miguel de Alfama, Santiago, Santo André e Sta. Marinha, na Graça, S, Cristovão e S. Lourenço, Madalena, Socorro, Pena, S. José e Sta. Catarina, no Bairro Alto, Mercês, Lapa, Encarnação, S. Paulo e Sacramento. O crescimento populacional desta área é moderado. O terceiro espaço, mais recente, faz a transição histórica entre o tecido urbano Setecentista e o de Oitocentos. As partes novas da cidade são zonas com um forte acréscimo populacional. Em termos geográficos correspondem ao direccionamento urbano ao longo do Tejo, embora incluam algumas freguesias para norte. Esta mancha territorial é constituída, a ocidente, pelas freguesias de S. Mamede, Santos, Sta. Isabel, Alcântara, Belém, Ajuda e Benfica, e, a oriente, por Sta. Engrácia, Beato, Olivais, Anjos, Charneca e Ameixoeira, Arroios e S. Sebastião da Pedreira. Esta duas últimas são duas áreas muito dinâmicas na última fase de Oitocentos (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 46). Ao longo de Oitocentos existem zonas da cidade com maior nível de ocupação: popularizam-se determinadas áreas do centro da cidade, degrada-se o nível de vida de zonas como Alfama, Alcântara, Sta. Isabel, Santo e S. Sebastião enquanto se esvazia a Baixa. Verificam-se igualmente dois eixos de crescimento da capital “fora de portas” apontando a futura evolução de Lisboa no século XX, Campo Grande e Lumiar, a ocidente e Olivais, a oriente (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 138). Em 1902 Lisboa ainda era definida por um termo que acabava na actual Rotunda de Marquês de Pombal, o Parque da Liberdade ainda existia. Nos 40 anos seguintes a cidade veria construídas as Avenidas Novas articuladas entre si por três rotundas, o Bairro Camões — no Conde Redondo —, o Bairro Barata Salgueiro que desceria o Vale Pereiro em direcção à Avenida da Liberdade. Foram construídos na zona oriental da cidade os bairros das Colónias, dos Actores, de Arroios; dos Arqueólogos — também conhecido por Penha de França —, e o bairro Lopes, e o da Picheleira. Avança-se com o preenchimento de outros iniciados como sejam os de Estefânia, Campo de Ourique e Calvário. Contudo este surto de construção na zona Oriental da cidade não seria inteiramente compreensível sem abertura de Avenida Dona Amélia — hoje Avenida Almirante Reis (cf. PERERA, Nuno Teotónio & BUARQUE, Irene; 1995; p. 398). Na Rua Nova de S. Mamede/ Rua do Salitre, o espaço arborizado, visível na planta de Filipe Folque de 1856-58, daria lugar a edifícios modernistas.
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O bairro “Maria Amália” constituído por três quarteirões, maciçamente modernista, inteiramente com edifícios da época, seria o único em Lisboa que respeitou o padrão urbano do anterior plano das Avenidas Novas — nas dimensões de ruas, na placa central com arborização (cf. JANEIRO, Maria de Lurdes & FERNANDES, José Manuel; 1991; p. 19) O quadro não ficaria completo sem referir a produção arquitectónica paralela aos edifícios de rendimento, os bairros operários, as vilas e os bairros constituídos por pequenas unidades unifamiliares. 1.8. Uma possível sub e sobreavaliação dos efectivos residentes em Lisboa Os numeramentos constituem uma fonte preciosa para avaliar o número de efectivos residentes em Lisboa. Contudo, existem alguns obstáculos à boa qualidade dos mesmos: o subregisto de menores, a incorrecta declaração de idades e a população flutuante que fugia a controlo dos religiosos. Acresce que as contínuas mudanças dos pais das freguesias originam que as crianças baptizadas não vivam no seu local de baptismo. Ao contrário do que seria de esperar, é possível encontrar uma possível sobreavaliação do número de efectivos residentes, dado que a mortalidade infantil é elevada. Muitos dos enterros de menores são efectuados sem que a morte seja declarada na área de residência. Só em 18014 foram a enterrar 844 crianças, abandonadas mortas à porta da Sé Patriarcal. No cômputo geral o número total de menores arrolados não diferirá muito da realidade, porém a nível pontual, a questão é mais problemática (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; pp. 84-85). Os registos nos livros da Sé dos menores abandonados à sua porta entre 1841 e 1855 dão-nos um balanço de 355 corpos por ano. Estes eram enviados então para a Misericórdia, que os reenviava para os cemitérios públicos (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira; 1993; p. 101). Quando da vitória liberal em 24 de Julho de 1833, Lisboa encontrava-se mais pobre e desmunida do que nunca. Em 1833, um surto de cólera tinha provocado 13600 mortos em Lisboa, particularmente em Belém, Bairro Alto e Alfama. A epidemia atingira o seu máximo em Junho. Em consequência de tal mortandade, fizeram-se provisoriamente mais dois cemitérios. e, como usual, fizeram-se procissões de penitência (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997; p. 243).
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O numeramento de 1801 pela sua qualidade constitui uma fonte óptima para a população existente.
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No que respeita à população flutuante, parte dela escapava ao numeramento feito, nomeadamente pelo facto de o numeramento partir dos fregueses confessados. Assim sendo o total da população corresponde à população estável e católica. Outra questão é o subregisto de óbitos, quando uns morrem no mar e outros no hospital. Acresce a esta situação, os homens e mulheres que falecem fora da freguesia. Existem ainda grupos populacionais contabilizados à parte, como sejam os soldados, os religiosos e outros residentes nos conventos, os homens de negócio que permanecem em estalagens e que por serem de fora não constam nos arrolamentos. No entanto, apesar de um menor rigor, e ao contrário do que acontece à escala nacional, são contabilizados os expostos, os presos, os doentes hospitalares — estes incluídos nos róis —, os marginais, e os indivíduos de outras religiões que habitam nas freguesias de Lisboa. Deste modo, reduz-se o número omitido de estantes eventuais na capital (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; pp. 85-86). Os indivíduos de diferente nacionalidade também são excluídos, em particular quando são de outra religião. Estes encontram-se presentes em quase toda a Lisboa. Trata-se de protestantes, residentes em pelo menos 11 freguesias, sendo referidos como gente de “comunham estranha”, de “diferente culto”, ou de “religião diversa”. São um total de 2344 indivíduos, constituindo mais de 51 % de recenseados de idade desconhecida. Existem outros grupos de indivíduos não arrolados: os irreligiosos ou desobedientes, os “rebeldes” e os que “não se costumam desobrigar”. Estes residem sobretudo nos bairros populares. Escapam ainda ao controlo dos eclesiásticos, os vadios que vivem à margem da comunidade, e os “privilegiados”, que se desobrigam na Corte ou na Sé (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 86). 1.9. O número de indivíduos por fogo No início do século XIX, a capital tinha pouco menos de 200 mil habitantes, distribuídos por cerca de 44000 fogos. Em 1900 Lisboa tinha cerca de 351000 habitantes por 78000 fogos. O crescimento global fora de 75,9% no que respeita ao número de habitante e de 76,6 quanto ao número de fogos. Trata-se de um aumento médio, contudo ligeiramente maior do que o verificado no País nesse século. Ressalve-se que estes valores devem ser medeatizados pelas modificações introduzidas nos limites urbanos a partir de 1852 (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira; 1993; p. 121).
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Os dados do numeramento de 1801 estudados por Teresa Maria Ferreira Rodrigues (1993) permitem obter uma dimensão média de habitante por fogo. Esta traduz um resultado de 4,1, com uma amplitude de 3,2 em todos os casos, com excepção da freguesia de Santo André, dada a distorção introduzida pelo quartel da Graça (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 87). O relatório de Comissão emitido em 1846, encarregado de propor uma nova divisão do território estima para o Continente e Ilhas quatro almas por fogo. Nas províncias do Minho, Porto, Estremadura e Algarve, esse número atinge os 4,3 indivíduos por fogo. Em 1855 a média de habitantes por fogo é de 3,7 indivíduos (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 90). No início de Oitocentos a dimensão média de habitantes por fogo é no total de 3,8 indivíduos e a partir de 1890 de 4,5 — em 1801, 3,8; em 1821, 3,8; em 1853, 3,7; em 1864, 4,2; em 1878, 4,5; e em 1900, 4,5 —, tendo em conta apenas as freguesias urbanas os resultados situam-se entre os 3.9 e os 4,0 habitantes por fogo — 3,9 em 1801, 4,1 em 1821, 3,7 em 1853, 3,6 em 1857, 4,2 em 1864, 4,1 em 1878 e 4,0 em 1900 5 (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 127). A estrutura interna dos fogos urbanos tende a privilegiar os núcleos de pequena dimensão, sendo porém, sujeita a diferenças internas consideráveis, consoante os níveis socioprofissionais dos habitantes. Estudos elaborados demonstram esta tendência global. Francisco Ximenez Chacón aponta, no seu estudo “História da família española: el exemplo de Murcia y Orihuela” para Murcia a média de 3,4 indivíduos por fogo em 1810 e de 3,5 em 1829. Em Orihuela a média era de 3,0 em 1810 e de 3,5 em 1829. Ao comparar estes resultados com os das outras cidades europeias, Chacón, infere que nos centros urbanos predomina a desde o século XVII a estrutura familiar simples e a família nuclear. na segunda metade do século XIX, dificuldades diversas fazem aumentar o seu peso e modificar a composição interna, traduzindo as novas condições políticas e económicas. Verifica-se que a concentração dos escalões de 1 a 4 indivíduos por fogo corresponde sempre a mais de 75% do total (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 127). O número de indivíduos por fogo depende da forma de utilizar os espaço, concretamente por neles predominarem determinadas actividades ou estarem instaladas certas instituições . É o caso das freguesias da Sé, de S. Tomé e S. Vicente onde se situavam conventos, ou ainda a situação das freguesia de Sto. André, de Santiago ou do Castelo onde se encontravam quartéis.
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Destes valores são excluídos a população sujeita a arrolamento próprio.
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O número de criados modifica também os valores obtidos em certas áreas. Estas explicam as médias relativamente elevadas verificadas em zonas onde residem as camadas sociais mais abastadas. Este facto é observável na Baixa. Contudo, esta situação tende a esbater-se nos últimos anos do século XIX, em consequência das mudanças aí operadas. Os aprendizes constituem outro grupo a observar, tendo um peso relativo nos bairros votados ao pequeno comércio e ao artesanato, como demonstram os registos paroquiais das zonas onde estas actividades tiveram lugar. De acordo com Teresa Maria Ferreira Rodrigues (1993), o número de fogos de pequenas dimensões aumenta à medida que descemos na escala social, com excepção das freguesias semirurais periféricas onde os valores são sempre superiores à média. Entre 1800 e 1900 apenas uma pequena camada da população urbana vive em núcleos familiares com menos de três indivíduos. Nas zonas em vias de industrialização ou rurais estes valores sobem para fogos com mais de seis habitantes. Os valores encontrados nestes zonas são responsáveis pelos valores médios referidos para Lisboa. O crescimento da população traduziu-se, em particular na segunda metade do século XIX, por um crescimento do número indivíduos por fogo. Tal facto foi condicionado pelo aumento ligeiro da esperança de vida, por um lado, e, por outro, pela redução de ocorrência de crises de mortalidade mesmo nas classes mais desfavorecidas. O aumento generalizado do número habitantes por fogo traduz também a degradação das condições de vida. (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira; 1993; pp. 127-129). Na segunda metade de Oitocentos o aumento progressivo da população implica um peso crescente dos fogos com mais de cinco indivíduos, já visível em 1864. Os fogos com este valor passam dos 11% de 1800 para 25% do total, diminuindo os restantes tipos, em particular os com dimensão média de quatro indivíduos por fogo. Entre 1864 e 1900 a percentagem dos núcleos com menos de quatro habitantes por fogo reduz-se acentuadamente até um mínimo de 2% em 1900. O mesmo sucede para o escalão superior: os grupos extremos esvaziam-se em favor do grupo com quatro a cinco residentes por fogo. No fim de Oitocentos a população da capital vive predominantemente em núcleos de média dimensão, esvaziando-se os outros intervalos, particularmente os mais reduzidos (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira, 1993; p. 129).
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1.10. Da Cotovia a Rato, perfil do território e dos seus habitantes O território de análise abrange a denominada zona da Cotovia ao Rato, compreendendo por isso toda a freguesia de Nossa Senhora das Mercês tal como estava conformada em 1770 e parte da freguesia da S. Mamede à mesma época. O limite do território abrange ainda o perímetro interno conformado pelas as actuais ruas da Imprensa Nacional, Rua da Escola Politécnica, Largo do Rato e Rua de S. Bento, que à época se denominavam respectivamente Travessa de Pombal, Rua da Fábrica da Seda; Praça do Rato e Rua de S. Bento. São estes os limites geográficos que vão definir o território de análise observado no capítulo 3. Assim, o território fica definido pelo perímetro urbano delimitado pelas, Rua de S. Bento, Rua dos Piais de S. Bento, Largo do Dr. António de Sousa Macedo; Largo do Calhariz, Calçada do Combro; Rua do Loreto; Largo de Camões; Rua da Misericórdia; Rua de S. Pedro de Alcântara; Rua D. Pedro V; Praça do Príncipe Real e Rua da Escola Politécnica. O topónimo Cotovia, usado até ao século XVIII para denominar a cumeada desde a Rua D. Pedro V até ao largo do Rato, terá ficado da ocupação muçulmana. O termo deriva do árabe “koutobia”, significando minarete (cf. CONSIGLIERI, Carlos; RIBEIRO, Filomena & ABEL, Marília; 1995; p. 105). As mais antigas referências conhecidas concernem as vinhas da Cotovia e Vale do Pereiro. Segundo Fernão Lopes, em 1363, as hostes de D. João de Castela passaram pela zona, fazendo muitos estragos num monte à altura chamado Monte Olivete. No século XVI, o caminho da Cotovia passa pelas quintas do Monte Olivete e dos Soares — que depois se uniram aos Noronhas. Este Caminho desembocava num largo — posteriormente denominado do Rato —, onde convergiam os caminhos do Salitre, dos Olivais de S. Bento e o para a Ribeira de Alcântara — Rua do Sol ao Rato (cf. CONSIGLIERI, Carlos; RIBEIRO, Filomena & ABEL, Marília; 1995; p. 106). Desde a sua origem a freguesia de Nossa Senhora das Mercês sofreu várias remodelações paroquiais e administrativas. Os limites geográficos que possuía não são os actuais. Santa Catarina viu ser-lhe restituída a área que lhe pertencia. Em 1770 foi efectuada uma nova divisão paroquial que se manterá durante dez anos (cf. SANTANA, Francisco; 1969, p. 5). Para o nosso estudo, o parte do território em análise corresponde aos limites da freguesia conformados em 1770. São esses limites que estão presentes no texto que passaremos a transcrever: …”O Destricto desta Fregª começarà no Cunhal das Cazas do Monterº Mor do Reino, athé a rua da Roza das Partilhas, e sobindo por toda esta de hum, e outro por outro lado athé chegar à rua que vem de S. Pedro de Alcantara, prossegirá também por ambos os lados desta até a traveça do Pombal, da qual lhe pertencerà som. e o lado Oriental até a rua de S. Bento; e dessendo por esta,
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levando só o lado Oriental àté a rua dos Piaes de S. Bento, nesta lhe pertencerà p lado Septemtrional e da Calsada do Combro athé chegar ao doto Cunhal, ou entrada da rua Formoza: pertencendo lhe tabem o seg e Rua Formoza, rua das Parreiras, rua da Vinha, rua se S. Boa-ventura, rua do Carvalho, rua da Paz, rua da Cruz, rua do Valle, rua nova de Jezu, rua da Quintinha, rua da Arrochella, rua de N. Snr.ª dos Prazere, rua da Madre de Deos, rua da Conceiçaõ, rua de N. Snr.ª da Penha de França, rua do Monte Olivete, rua dos Marcos, rua da Proçicáo do Corpo de Deos, Traveça dos Caetanos, traveça nova da Cotovia, traveça da Patriarchal, traveça das Merces, traveça dos Fieis de Deos, Beco Assençáo, beco da Roza, traveça de Pedro Dias, rua do Loureiro; e todas as mais ruas, e traveças projectadas no novo Plano das terras de Joseph Bruno de Quebedo, e nas que pertencem ao Real Collegio dos Nobres na p. e occidental da Cotovia.”… A freguesia de Nossa Senhora das Mercês foi fundada em 1632. A sua fundação representa o findar de um litígio entre a Irmandade do Templo de Santa Catarina e o Cabido da Sé e que durou entre 1625 e 1632. Em 1 de Dezembro de 1632 foram estabelecidos os seus limites. Esta retirava para o seu território partes das freguesias de Santa Catarina e do Loreto — hoje freguesia da Encarnação. Em 1652 a freguesia passou da Ermida da Ascenção de Cristo, construída em 1500, para a Igreja de Nossa Senhora das Mercês, situada na Rua da Formosa — denominada Rua do Século a partir de 1859. A construção do edifício deve-se à acção mecenática do Desembargador do Paço Paulo Carvalho (cf. FIGUEIREDO, Paulo; 2001, p. 33, 51, 93). No ano de 1755 Nossa Senhora das Mercês contava com 850 fogos (cf. FIGUEIREDO, Paulo; 2001, p. 35). A 12 de Abril de 1835, como consequência da extinção das ordens religiosas, a sede da freguesia transferiu-se para a Igreja do Convento de Nossa Senhora de Jesus, entretanto extinto. A antiga freguesia de S. Mamede existiu pelo menos desde 1190, na encosta do Castelo. A sua igreja paroquial, que ficava na actual Rua de S. Mamede, deixou de existir nesse território (cf. CONSIGLIERI, Carlos; RIBEIRO, Filomena & ABEL, Marília; 1995; p. 105). Em 1769, por carta régia de 18 de Dezembro desse ano a paróquia de S. Mamede foi transferida para o seu novo distrito no Vale Pereiro. A sua sede ficou provisoriamente na ermida de Nossa Senhora Mãe dos Homens — fundada em 1749. A remodelação das freguesias de Lisboa, oficializada em 1770, fez a primeira delimitação territorial da freguesia de S. Mamede. O seu perímetro urbano foi alterado em 1780, tendo-se mantido desde então com algumas actualizações (cf. CONSIGLIERI, Carlos; RIBEIRO, Filomena & ABEL, Marília; 1995; p. 111).
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O território que, hoje em dia, integra a freguesia S. Mamede foi povoado certamente muito antes da fundação da Nacionalidade. Assim o demonstram uma lápide epigrafada da época romana, encontrada na Rua da Escola Politécnica. Após a conquista de Lisboa em 1147, esta zona ficou integrada na paróquia dos Mártires (cf. CONSIGLIERI, Carlos; RIBEIRO, Filomena & ABEL, Marília; 1995; p. 11). A urbanização de Vila Nova de Andrade — Bairro Alto —, iniciada em 1513 tinha trazido uma nova dinâmica populacional aos arrabaldes fora das Portas de Santa Catarina — actual largo do Chiado. Criam-se assim novas freguesias. Em 1557, foi criada a freguesia de Santa Catarina, retirando território à freguesia dos Mártires. Em 1567, a freguesia de S. José é separada da freguesia de Santa Justa. Santa Catarina e S. José repartiam o território que conformará S. Mamede, segundo uma linha divisória que seguia o Caminho da Cotovia (cf. CONSIGLIERI, Carlos; RIBEIRO, Filomena & ABEL, Marília; 1995; p. 106). Após um dinâmico século XVIII, S. Mamede teve um período de estagnação que perdurou até meados da centúria seguinte. Com o advento da Regeneração em 1851, a freguesia conheceu uma dinâmica económica e urbana (cf. CONSIGLIERI, Carlos; RIBEIRO, Filomena & ABEL, Marília; 1995; p. 112). No início do século XX a freguesia perde os arrabaldes rústicos, quintas e azinhagas que ainda subsistiam a norte de S. Mamede. São Abertas as ruas Alexandre Herculano, Castilho, Rodrigo da Fonseca. Na década de 30 do século XX é aberta a rua da Artilharia Um, substituindo a estrada de Entremuros até então existente. Simultaneamente procedia-se a alterações no Largo do Rato, denominado à época Praça do Brasil. Nesse hiato tabém se construiu um conjunto de edifícios Art Deco e de modernismo radical no quarteirão entre a Rua Nova de S. Mamede e Rua do Salitre (cf. CONSIGLIERI, Carlos; RIBEIRO, Filomena & ABEL, Marília; 1995; p. 106). Em 1833, por forma a levar a bom termo uma boa administração de Lisboa esta foi dividida em seis bairros ou distritos, cada um sendo considerado simultaneamente como um conselho e cabeça de comarca. O Bairro alto e o seu termo foram considerados o 4º Bairro. Este 4º distrito incorporava as freguesias da Encarnação, Mercês, S. Mamede, Coração de Jesus, S. Sebastião da Pedreira Termo; Odivelas, Lumiar, Póvoa de Santo Adrião, Frielas, Unhos, Fanhões, Santo Estevão das Galés, e Lousa (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo; vol. XIII, 1995, pp. 232-234). Assim, a história escrita das freguesias de Nossa Senhora das Mercês e de S. Mamede se vai diluindo na hierarquia administrativa do bairro ou do distrito. No período que medeia a época em estudo vemos surgir duas manchas verdes que conformam as zonas limítrofes do território da Cotovia ao Rato: o jardim-miradouro de S. Pedro de Alcântara e o
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do Príncipe Real. Ambas foram zonas que só em pleno século XIX viram a sua conformação próxima da actual, dado que a topiária, e sua planta distributiva sofreram alterações, em particular no que concerne ao jardim-miradouro de S. Pedro de Alcântara (cf. AGUIAR, Ana Aguiar 1999 & FIGUEIREDO, Paula 2007; IHRU e cf. SIMÕES, Paula 1999 & LIMA, Pereira de, 2007; IHRU). Estas manchas verdes são enquadradas por alguns edifícios notáveis. Estes aliás vão pontuando o tecido consolidado da malha mais antiga, e nobilitando o tecido que se vai cosendo ao longo da Rua da Escola Politécnica durante a segunda metade de Setecentos e centúria seguinte. Ao longo da Rua da Escola Politécnica encontra-se no nº 100, o Palacete Fontalva de 1863, o edifício Gonzaga Rlbeiro (c. 1882) no 12-28. Encontramos ainda na mesma rua nos nº 119-143 o edifício Imprensa Nacional, iniciado em 1903 e concluído em1913, imóvel construído na parcela urbana ocupada pelo antigo Solar dos Soares e Noronha — edifício demolido em 1895. Neste instalara-se em 1769 a Impressão Régia. Na Rua da Escola Politécnica encontramos ainda o palácio Rebelo de Andrade Seia, erguido no, nº 141-147, no inicio da década de 50 de 1700; o palácio Cruz Alagoa construído em 1757, e a Real Fábrica das Sedas no nº 219-289, um edifício de arquitectura industrial, operacional entre 1735 e 1835. Na Praça do Príncipe Real podemos observar no nº 26 o palacete Ribeiro da Cunha construído em 1877. Nas suas confrontações a freguesia vê ser demolido o antigo palácio dos marqueses de Marialva, para se construir no seu lugar a Praça Luís de Camões. No tecido consolidado é possível observar: o Palacete Alenquer, na Rua do Século/ Praça do Principe Real; o Palacete sito Rua de S. Marçal nº10 - 10 A / Travessa da Palmeira nº 6; o palácio Ludovice (datado de 1747), o palácio Lumiares situado na Rua de S. Pedro de Alcântara 25-37 — cuja história remonta ao século XV; o palácio Brito Freire-Tomar, sito na Rua de S. Pedro de Alcântara 1-3; o palacete das Laranjeira, igualmente localizado na Rua S. Pedro de Alcântara no nº 71-77, edificado no início de Oitocentos; o palácio Marim Olhão, o edifício de gaveto na Calçada do Combro, nº 38-38J / Rua do Século / Travessa das Mercês, cuja construção é do século XVII, o Palácio Mendia e o Palácio Alcáçovas, ambos na Rua da Cruz dos Poais; na Rua de Poiais de S. Bento o Palacete Marquês Fontes Pereira de Melo e o Palácio dos Cabedos — antigo Colégio Caliponense —; o Palacete de meados do século XIX, actualmente Liga dos Amigos dos Hospitais localizado na Praça do Príncipe Real; e na Rua da Paz, o palácio seiscentista, onde viveu o Visconde de Santarém. É de referir o Palácio Ratton, hoje Tribunal Constitucional, sito na Rua do Século. Mencione-se ainda o Palacete na Rua Cecílio de Sousa, nº 34–38, datado do século XIX.
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Na rua da Misericórdia 35-39, surge, na segunda metade de Oitocentos o elegante restaurante Tavares Rico. O território de análise possui algumas vilas e pátios, alguns deles formaram-se por reconversão para esse fim de edifícios notáveis. Este é o caso do pátio dos Alagoas — Rua da Escola Politécnica nº 161-119 —, da Fábrica das Sedas ao Rato — Rua da Escola Politécnica nº 219287 —, e do palácio dos Castro Marim e Olhão — também conhecido como Pátio Batalha, na Calçada do Combro nº 38. Na Cotovia ao Rato existem igualmente outro pátios como o Pátio do Tijolo — na Rua D. Pedro V nº 99-119 —, o Alto do Longo — na Rua do Século nº 230-232. O quadro não ficaria completo sem mencionar o bairro operário do jornal “O Século” — na Rua do Século nº 41-63. Para reconstruir o tecido social do território socorremo-nos das Décima de Maneiro6 das três freguesias que englobam a área do Rato à Cotovia: Encarnação Nossa Senhora das Mercês e S Mamede. Contudo, não foi possível fazer uma aferição com a mesma periodicidade em todas as freguesias. A amostra recolhida é contudo suficiente para delinear o perfil dos ocupantes dos edifícios de rendimento da freguesia. Contudo, ele não estaria completo se não referíssemos os adelos e vendedores ambulantes, — que venderiam os seus produtos junto das populações —, as mulheres e os homens sem ofício. Em 1763 a freguesia de Nossa Senhora das Mercês possuía no respeita a artífices : 42 carpinteiros, 40 sapateiros, 23 alfaiates, 13 pedreiros, 12 barbeiros, 8 pintores 7 cabeleireiros, 7 ferreiros, 7 tecelões, 6 correeiros, 6 marceneiros, 5 entalhadores, 5 fabricantes de aletria, 5 ourives, 4 cerieiros, 4 serralheiros, 3 biscoiteiros, 3 escultores, 3 ferradores, 3 seleiros, 2 encrespadores, 2 esteireiros, 2 forneiros, 2 impressores, 2 lapidários, 2 sombreireiros, 1 albardeiro, 1 batefolha, 1 bordador, 1 caiador, 1 caldeireiro, 1 canteiro, 1 chocolateiro, 1 colchoeiro, 1 dourador, 1 fabricante de água de Inglaterra, 1 fabricante de galões, 1 farinheiro, 1 forno de telha, 1 fundidor, 1 funileiro, 1 ladrilhador, 1 mestre-de-obras, 1 padeiro, 1 passamaneiro, 1 pasteleiro, 1 picheleiro, 1 polieiro, 1 relojoeiro, 1 serrador, 1 tanoeiro, 1 tapeceiro, 1 tosador, 1 violeiro No que respeita a profissões liberais a freguesia possuía: 7 escreventes, 7 procuradores de causas, 6 médicos, 4 letrados, 3 boticários, 3 cirurgiões, 2 arquitectos, 2 cravistas, 2 mestres de dança, 2
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Existente a partir de 1762 (cf. SANTANA, Francisco; 1969, p. 5).
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oficiais de boticário, 2 tocadores de rabeca, 1 ajudante de arquitecto, 1 dentista, 1 despachante de alfândega, 1 mestre de meninos, 1 tocador de trompa. No que concerne a profissões relacionadas com os transportes, a freguesia apenas possuía um piloto (cf. MACEDO, Jorge Borges; 1963; pp. 299-318). No que respeita ao número de habitantes por fogo na freguesia, em 1767, 1770 e 1775 estes eram de respectivamente de 5.28, 3.71 e 3.88 (cf. FIGUEIREDO, Paulo; 2001, p. 59). Em 1800 o registo do imposto da Décima de Maneio da freguesia oferece-nos o seguinte panorama de ofícios: 29 tendeiros; 4 ferreiros; 3 médicos; 2 caleiros; 1 loja de couros; 2 lojas de bebidas; 2 sombreireiros; 2 barbeiros; 1 armazém de vinhos; 3 carpinteiros de sejes; 1 latoeiro; 1 boticário; 6 padeiros; 1 pasteleiro; 13 negociantes; 3 pintores; 1 confeiteiro; 15 marceneiros; 2 alugador de sejes; 2 escrivães; 2 livreiros; 1 pedreiro; 7 tabernas; 1 serrador de pedra; 4 sapateiros; 1 bainheiro; 1 inquisidor; 1 bordador, 2 relojoeiros; 1 fábrica e loja de bebidas; 4 alfaiates; 2 cravistas; 1 fábrica de chapéus; 1 tintureiro; 1 cerieiro; 1 procurador; 1 chocolateiro; 1 droguista; 1 serralheiro; 1 dourador (cf. Décima de Maneio dos Officios e Lojas da Superintendencia da Décima da Freguesia das Mercês pertencente ao ano de 1800, 1800). Em 1833 na Décima de Maneios registam-se os seguintes ofícios: 10 sapateiros; 7 barbeiros; 1 loja de chapéus; 1 loja de couro; 2 lojas de couro e sola; 19 tendeiros; 1 capelaria; 3 lugares de fruta; 1 casa de câmbio; 5 armadores de navios; 1 armador de navios e de couraças; 3 confeiteiros; 5 capelistas; 1 loja de bebidas; 8 padeiros; 1 botica; 1 fábrica de óleos; 1 capelão; 1 distribuidor; 1 taberna; 5 louceiros, 1 fábrica de marcas; 2 talhos, 1 professores de letras; 1 pasteleiro; 3 fornos; 5 padeiros; 4 estâncias de lenha, 1 fábrica de móveis; 1 cardador, 1 hortaliça; 1 cordoeiro; 1 loja de trastes; 1 alfaiate; 10 marceneiros; 1 courador de folha; 2 entalhadores; 1 fiador de algodão; 1 lavrador de pedra; 1 fábrica de capelão; 2 procuradores, 2 lojas de bebidas; 1 fogueteiro; 2 alugadores de sejes; 1 carpinteiro de sejes; 1 ferrador, 1 loja de arear açúcar; 1 chapeleiro (cf. Décima de Maneio dos Officios e Lojas da Superintendencia da Décima da Freguesia das Mercês pertencente ao ano de 1833, 1833). Em 1913-14, a cartografia industrial dá-nos um panorama das diversas instalações industrializadas na freguesia de Nossa Senhora das Mercês. Assim a freguesia apresenta no mapa das classes de Indústrias 14 metalomecânicas, 9 instalações para a alimentação, 3 para o vestuário, 3 de curtumes e peles, 1 de construção, 44 de madeira/ mobiliário, 1 de construção, 11 relacionadas com papel, 1 para as gráficas, 5 que se prendem com carroçaria, 1 relacionada com artes e precisão e 2 para as químicas (cf. FIGUEIREDO, Paulo; 2001, pp. 135-136).
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A freguesia de S. Mamede por seu turno, em 1764, possuía na sua décima de maneios as seguintes profissões: 8 criados, 1 advogado; 1 oficial de carpinteiro; 1 mestre de ourives da prata; 1 marinheiro; 1 oficial de barbeiro; 1 procurador; 2 mestres serralheiros; 2 oficiais de serralheiro; 2 trabalhadores de jornal; 3 mestres sapateiros; 1 cirurgião;1 mestre de meninos (cf. Livro que hade servir p.a o lancamento dos maneyos das freguesias de S. Cristovao, S. Lourenço, S. Mamede; 1764, Arquivo Histórico do Tribunal de Contas). Por seu lado a freguesia da Encarnação em 1763 tinha registados nos suas Décimas de Maneio as profissões seguintes: 64 sapateiros; 49 carpinteiros; 40 Alfaiates; 23 barbeiros; 16 cabeleireiros; 13 marceneiros; 13 pedreiros; 13 pintores; 12 serralheiros; 10 Correeiros; 8 alteiros; 7 forneiros; 6 confeiteiros; 6 torneiros; 5 esteireiros; 5 ferradores; 4 ferreiros; 4 livreiros; 4 penteeiros; 4 tanoeiros; 4 tecelões; 4 vidraceiros; 3 batefolhas; 3 brunidores de golandilhas; 3 douradores; 3 entalhadores; 3 lavrantes de prata; 3 ourives; 3 pasteleiros; 2 calafates; 2 canteiros; 2 cordoeiros; 2 cutileiros; 2 funileiros; 2 latoeiros; 2 seleiros; 2 sirgueiros; 2 vestimenteiros; 1 abridor de letras; 1 albardeiro; 1 aparelhador; 1 amassador; 1 bainheiro; 1 bordador; 1 caldeireiro; 1 cerieiro; 1 engomadeira; 1 impressor; 1 limpador de espingardas; 1 ourives da prata; 1 passamaneiro; 1 polieiro, 1 relejoeiro; 1 tintureiro; 1 violeiro. No rol ainda constavam 34 tendas; 21 homens de negócio; 20 aguadeiros; 19 tabernas; 14 caixeiros; 12 empresas de seges e animais de aluguer; 8 lojas de bebidas; 7 carvoeiros; 4 lojas de capela; 4 lojas de fancaria; 3 armazens de vinhos; 3 contadores; 3 lojas de quinquilharia; 2 armadores; 2 estâncias de lenha; 2 lojas de camurças; 2 lojas de retrós; 2 vendas de fruta; 1 adelo; 1 aluguer de seges e estalagem; 1 burra de leite; 1 casa das sortes; 1 celeiro de cevada; 1 celeiro de trigo; 1 corretor de pretos, 1 estância; 1cestância de madeira; 1 estanqueiro; 1 fornecedor de fardamento do exército; 1 loja de fitas; 1 negócio de cebola; 1 negócio de mantas; 1 venda de aguardente; 1 venda de estampas; 1 vendedor de farinha; 1 venda de ferragens; 1 venda de livros; 1 venda de olanda e de esquiões; 1 venda pelas ruas; 1 venda de sal; 1 venda de vidros (cf. MACEDO, Jorge Borges; 1963; pp. 302-303, 309, 313, 316). O imposto profissional, — existente de 1928, como parte das medidas financeiras tomadas por Oliveira Salazar —, está adstrito a um bairro fiscal o permite-nos construir o tecido social do território da Cotovia ao Rato, particularmente para os anos 60 do século XX e inicio da década seguinte. A amostra do maço consultado faz-nos calcorrear esse território. Muito embora não seja imediatamente contemporâneo, permite perspectivar as novas profissões que foram surgindo de 1900 ao dealbar do Estado Novo.
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Assim encontramos o seguinte quadro de profissionais: 46 sem profissão adstrita; 1 torneiro; 2 motoristas; 1 tipógrafo; 1 pedreiro; 2 assalariados; 2 electricistas; 28 empregados de escritório; 1 pintor; 1 encarregado de estação de serviço; 1 sub-chefe de mesa; 1 ajudante de serralheiro; 1 administrador; 5 empregados; 2 empregados no comércio; 2 serventes; 1 serrador; 1 batedor; 4 empregados por conta de outrém; 1 canalizador; 3 empregados bancários; 1 servente T. L. P.; 2 empregados no comércio e indústria; 1 mecânico; 1 trabalhador; 1 ajudante electricista; 2 ajudante de farmácias; 1 1º escriturário; 1 cobrador; 1 moço de expedição; 5 caixeiros; 4 profissionais de seguros; 1 2º escriturário; 1 criada; 1 médico; 1 indústria; 3 gerentes comerciais; 1 correspondente; 1 caixa de balcão; 3 empregados de quarto; 1 socio-gerente; 1 encarregado; 1 enfermeira chefe; 1 empregado no serviço de escritório, 3 dactilógrafos; 4 aspirantes; 1 servente auxiliar; 1 Bilheteira de 1ª; 1 auxiliar de enfermagem; 1 professor de instrução primária; 1 costureira; 1 escriturário; 1 encarregado de limpeza; 1 telefonista; 1 profissional de escritórios; 1 costureira de colchoeiro; 3 3º escriturários; 1 funcionário da Previdência; 2 gerentes; 1 caixa; 1 perfurador-verificador mecanográfico; 2 meios- caixeiros; 1 assistente de terra; 2 estenodactilógrafos. Esta descrição aturada das profissões existentes no território da Cotovia ao Rato demonstra que de 1758 ao deabar do Estado Novo, os edifícios de rendimento nele existentes vão ser ocupados por pessoas tão diversas como tendeiros, vendedores de fruta, alugadores de sejes, mestres de meninos, chocolateiros, cravistas; livreiros e por diversos vendedores ambulantes — estes últimos permitidos na cidade até proibição em 1859 —, servente da T. L. P., caixeiros, funcionários da Previdência e gerentes comerciais.
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CAPÍTULO II - ASPECTOS PARA A CONFORMAÇÃO DO EDIFICADO Por forma a contextualizar Lisboa no panorama do universo urbanístico português são apresentados aspectos de cariz. Estes conduziram à definição geral de aspectos de permanência a fuga na arquitectura corrente portuguesa. Para precisar a arquitectura produzida na cidade de Lisboa foram postos em contraponto os casos do Porto, Coimbra, Vila Viçosa e Brasil — colónia portuguesa até 1822. Estes abrem o caminho para a discussão de uma arquitectura regimentada com carácter de espeficidades regionais. Foram ainda definidos neste capítulo o enquadramento cronológico e características morfológicas do edifício gaioleiro. Por outro lado, são apontadas sucintamente as anomalias construtivas como um diagnóstico de uma forma de construir. 2.1. Permanência e fuga Uma da características das cidades portuguesas ou de origem portuguesa, ao longo dos séculos é a regularidade da estrutura de loteamento. Segundo Manuel Teixeira & Margarida Valla os lotes urbanos de Nisa, Estremoz, Monsaraz e Valença tem a mesma dimensão de 30 palmos de frente. Estas dimensões vão persistir ao longo dos séculos em muitas cidades construídas pelos portugueses, quer em Portugal quer nas colónias. É esta dimensão que está na origem de frentes de casas com três vãos, três portadas ou uma porta e duas janelas, características das cidades portuguesas. Estas dimensões para as frentes dos lotes existem também nas novas urbanizações promovidas pelos Almada no final de Setecentos para a cidade de Porto. Observamos ainda estes 30 palmos de lote de frente aplicados nas urbanizações privadas do século XIX (cf. TEIXEIRA, Manuel & VALLA, Margarida, 1999, p. 30). Deste modo, é possível encontrar lotes urbanos de 25 ou 30 palmos desde o século XIII ao século
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XVIII. Tal persistência deve-se a três factores principais: em primeiro lugar, os sistemas construtivos, que se mantiveram até ao século XIX: os 25 a 30 palmos de frente de lote correspondem às dimensões do vão máximo que uma viga de madeira pode vencer sem apoios intermédios; em segundo lugar, o peso da tradição na estruturação das cidades portuguesas, difundida por mestres pedreiros e pelos engenheiros militares que percorriam o espaço português disseminando as tipologias e formas arquitectónicas associadas a este tipo de loteamento; em terceiro lugar, à existência de um arquitecto-mor do reino que tudo supervisionava (conforme o delineamento do mestre das obras do senado). Refira-se que a figura de Arquitecto do Senado municipal é apenas a constatação oficial de um cargo camarário, que existia desde D. Manuel. Cremos que o mestre-de-obras de pedraria da cidade de Lisboa, novo cargo criado por D. Manuel I, permitia ao nomeado agir como arquitecto-mor. Esta figura persistiu, mas enquadrada noutra modelo organizativo. Os processos de obra passaram a dar entrada na câmara, sendo a sua salubridade e medidas regulamentares fiscalizadas pelo arquitecto da mesma. Contudo, a imagem de cada edifício distancia-se de uma “arquitectura igual feita por cordel”. Tal torna-se mais expressivo com o aparecimento as chamadas “obras de autor”, sem a qual o movimento modernista português seria incompreensível. Por outro lado, toda a produção arquitectónica definida desde o reinado de D. Manuel I (14951521) até à extinção das almoçarias só é lisível num quadro uniformizador, quantificador e sistematizador que dá forma a um corpo legislativo aplicado ao edificado. A este “envelope” que conforma cada edifício, está subjacente o método de realização de obras por empreitada, de pôr as obras em pregão. Só neste contexto é possível entender o nível de planeamento urbano a que está implícito num documento como o alvará régio de 27 de Janeiro de 1548 (cf. OLIVEIRA, Eduardo Freire, vol. I, pp. 548-560). As fugas a esta arquitectura padronizada como veremos existiram, sem que a imagem geral se alterasse. Algumas eram regulamentadas, outras, como esclareceu Raquel Henriques da Silva (1997), tiveram outros motes. A evocação da arquitectura monumental, pública e privada, construída entre 1850 e 1870 na Capital, localizou-nos numa prática eminentemente empírica. Nesta a par das marcações classicizantes de Pezerat, Domingos Parente da Silva ou Cinatti e Rambois, se observa em particular na arquitectura corrente, a permanência do modelo pombalino. Verifica-se a sua progressiva adulteração como modo de fugir à monotonia da composição das fachadas, usadas com o espaço de vagas marcações eclécticas que apenas a utilização do azulejo iria transfigurar. Para além dos arquitectos referidos, a Lisboa da Regeneração foi elaborada com a
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participação dos que exerciam cargos públicos, na Academia de Belas-Artes e na Intendência das Obras públicas de Lisboa e por diversos mestres e pedreiros. Estes últimos serão os principais produtores da continuidade estética de todo o período. As referências teóricas de toda esta prática continuavam a ser os compêndios clássicos franceses e italianos, não se encontrando uma defesa do “gosto ecléctico” que desse continuidade à reflexão de Ribeiro de Sá nas páginas do Panorama de 1843 (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, pp. 517518). Ao longo da série do Archivo vai sendo formulada alguma teoria, em particular nos escritos de Costa Sequeira. Este, promovendo os textos clássicos de Vignola, enuncia uma postura ecléctica, fazendo eco das críticas de Scamozzi ao venerando Vitruvio. Esta liberdade individual é logo cerceada ao admitir que a arquitectura não deve ser volúvel como a moda do vestuário (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, pp. 519-520). Há um curioso texto de A. A. Teixeira de Vasconcellos em que este, no ano de 1789, faz a apologia de uma arquitectura nova que há-de surgir sem que esta seja reflexo de eras remotas (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 522). Contudo, como sabemos, essa problemática apenas veria a sua resolução plena no século XX. A construção do conjunto as Avenidas Novas segundo um plano haussemaniano representou o fim de uma arquitectura regimentada, igual feita por cordel e abriu caminho para o projecto de autor. Houve, no entanto, uma base regulamentadora que atribuía ao edificado dimensões mínimas planimétricas e modas de cércea. Estas estavam condicionadas pelas larguras de ruas em que cada edifício se implantava. O quadro não estaria completo sem estabelecer algumas considerações que permitam perceber a precocidade do modernismo português. Se o envelope do edifício apenas ganharia a sua expressão de vanguarda nos anos vinte do século XX, como demonstram os estudos competentes elaborados pelos arquitectos José Manuel Fernandes e Maria de Lurdes Janeiro, aspectos inovadores foram conformando interiormente a edilícia, como demonstra a obra construída de Rosendo Carvalheira. Quase em simultaneidade, quando no início do século Santa-Rita Pintor pintava talvez o primeiro quadro abstracto do mundo, Portugal mostrava-se a par das sensibilidades mais avançadas da Europa no contexto arquitectónico. 2.2. O fim da almoçataria Pelo decreto de 14 de Maio de 1832 foram extintas as almoçatarias (cf. OLIVEIRA, Eduardo Freire, vol. I, p. 214). A entrada em vigor desse decreto dois anos depois significou o fim de uma forma
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de organizar e de gerir. Os almoçatéis estavam incumbidos, entre outra tarefas, de verificar se toda se as posturas da cidade eram cumpridas, se eram observadas as normas que se prendiam com as construções de paredes, e a abertura de portas. Esse corpo de funcionários tinha sido até então fundamental para a manutenção de uma arquitectura regimentada, isto é de uma arquitectura feita por regimentos. Sabemos pelo que foi referenciado por Raquel Henriques da Silva (1997) que em 1805 as obras estavam sobre o controlo do Intendente Geral das Obras públicas e que estas eram vistoriadas pela figura dos Inspectores do Bairro. Em 1865, no “plano de edificações e reedifcações em Lisboa: medidas geraes para se levar a effeito e prescrições de polícia” fala-se na figuras do arquitecto e do engenheiro empregados ao serviço das obras públicas, funcionários ao serviço da câmara de Lisboa (cf. Annaes do Municipio de Lisboa, 1865, p. 2182-2184) Até à aprovação de o plano de melhoramento da cidade de Lisboa, a câmara de Lisboa, através do director das obras públicas, continuará a definir alinhamentos e a dar cotas de nível para o edificado (cf. Annaes do Municipio de Lisboa, 1865, pp. 2182-2184). A partir data de aprovação do plano, as novas edificações, reedificações e jardins públicos ficarão sujeitas a esse regulamento. Este facto é demonstrativo de como ao longo do século XIX os edifícios se vão libertando de uma arquitectura regimentada e ficaram sujeitos a regulamentos mais latos. 2.3. Panorama urbanístico em que se insere Lisboa entre 1755 e o dealbar do século XX Para contextualizar o caso de Lisboa resolvemos enquadrá-lo no panorama arquitectónico nacional e estrangeiro. Para o primeiro escolhemos Porto e Coimbra. Para o segundo escolhemos o Brasil, colónia portuguesa até 1822. A análise dos dados permite perceber que, embora haja pontos de contacto, a partir da 2ª metade do século XVIII não podemos generalizar o que se passa em Lisboa para o restante do território português. É esta problemática que passaremos a abordar. Referiremos ainda o caso de Vila Viçosa, em Évora, de forma a ilustrar a diversidade de sistemas construtivos, mole que enforma o edificado caracterizador de uma época e por isso indissociável da carga patrimonial do edificado. A qual receberá uma pele com que se desenha a linguagem da arquitectura corrente portuguesa. Estes casos justificam por si só a originalidade de Lisboa, a necessidade do seu estudo, dado que ela corresponde aos requisitos ideais que estão na base da conformação de uma arquitectura padronizada.
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2.3.1. Porto A construção dos Almada veio modificar a extensão da cidade deixando uma estrutura urbana à qual se ancoraria o Porto futuro. Nem todo o plano foi concretizado. Os lotes urbanos inocupados da expansão almadina foram preenchidos por edifícios oitocentistas, à semelhança do que aconteceu aos lotes remanescentes da Baixa Lisboeta em data posterior à do desenho do seu plano e primeiro tempo de construção. Caso exemplar é o do Banco Tota e Açores, situado na Rua do Ouro, em Lisboa (Fig. CAP.II-1). Os prospectos desenhados para as novas ruas da Invicta demonstram que Pombal propõe à burguesia edificações semelhantes aos novos palácios da nobreza iluminada no respeitante à escala urbana e composição (cf. BARATA FERNANDES; Francisco p.143). A população menos abonada prefere habitar as “ilhas”, localizadas no Porto oriental, pelo seu preço mais acessível. Diferentemente do que sucedeu nos casos da Baixa Lisboeta e de Vila Real de Santo António da Arenilha, não se definiu um traçado regular ortogonal, desenhou-se antes um plano radioconcêntrico, aberto, passível de se expandir futuramente. A regularidade do plano almadino reflectia-se antes na unidade da arquitectura desenhada para cada uma das suas praças e ruas (cf. TEIXEIRA. Manuel & VALLA; Margarida 1999; p. 296). Para a realização das obras almadinas aplicou-se, em 1769, por ordenação régia, a legislação definida em Maio de 1758 para a reconstrução da cidade de Lisboa pós terramoto. Os prospectos de conjuntos de alçados definiam uma arquitectura de carácter programática não dando espaço para a iniciativa privada (cf. TEIXEIRA, Manuel & VALLA, Margarida; 1999; p. 296). Reflexo da guerra civil (1807 a 1813) e das invasões francesas (1832 a 1834), o Porto sofre uma estagnação nas primeiras décadas de Oitocentos. Nas ruas secundárias e nas grandes extensões de terreno abrangidas pelo plano dos Almada, ainda pouco tinha sido urbanizado (cf. TEIXEIRA, Manuel & VALLA; Margarida,1999; pp. 296-297). As frentes destas construções são mais largas e profundas do que as do período anterior aos Almada e existe sempre um logradouro. Esta tipologia mantém-se independentemente da relação dominante do lote com o relevo e com o traçado viário. Verifica-se a preocupação em controlar o conjunto, o que implicou pequenas adaptações parcela a parcela (cf. BARATA FERNANDES; Fernandes, p.143). Contudo, observa-se o cuidado de utilizar sempre que possível um eixo de simetria. Verifica-se um tratamento especial dos edifícios centrais de arruamento e dos edifícios de gaveto. Existe uma preocupação na regularização de cérceas e na sistematização dos principais elementos arquitectónicos de composição (cf. BARATA FERNANDES; Francisco, p.144).
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O logradouro não tem uma profundidade tipificável, consoante as características morfológicas do terreno em que se implanta. De acordo com Barata Fernandes, o facto de existir uma certa constância na profundidade dos edifícios e uma ausência de medida padrão dos logradouros, é demonstrativo de que o elemento base deste planeamento é a rua e não o quarteirão. De modo o controlar medidas de quarteirão e padrões de malha, toda a acção baseada no quarteirão tem que procurar controlar o conjunto da edificação-logradouro (cf. BARATA FERNANDES, Francisco; p.144). Nas novas urbanizações setecentistas portuenses, bem como ao longo do século XIX, vamos encontrar um parcelamento regular com lotes urbanos uniformes com 25 a 30 palmos de frente. Esta medida prende-se como vimos, com o vão máximo que uma viga de madeira pode suportar sem apoios intermédios. Esta característica é extensível a todos os núcleos urbanos de origem portuguesa que se construíram em Portugal, nas ilhas atlânticas e no Brasil (cf. TEIXEIRA, Manuel & VALLA; Margarida, 1999; p. 297). No século XIX vamos observar dois tipos de edifícios de habitação corrente para a burguesia portuense: o na continuidade da habitação polifuncional almadina e o da habitação monofuncional. Este segundo tipo entre em ruptura com o primeiro (cf. BARATA FERNANDES; 1999; Francisco, p.170). Deste segundo tipo, unicamente destinado à habitação, apenas nos interessam as casas urbanas portuenses com dois a quatro pisos De acordo com Barata Fernandes, apresentam duas frentes, paredes de meação. Este modelo é demonstrativo da sua capacidade para construir cidade (cf. BARATA FERNANDES; 1999; Francisco, p.171) No Porto setecentista, a influência da colónia britânica aí residente faz-se sentir no edificado. A forte influência observada na transformação portuense prende-se não só com a importância da contribuição da tratadística britânica, como também no papel desempenhado pelo então cônsul do Reino Unido e arquitecto amador, John Whitehead, na Invicta. Através de alguns trabalhos que executa no Porto, John Whitehead persuade Almada e Melo e a Junta das Obras Públicas das vantagens da linguagem neopalladiana. Esta constituía uma alternativa estilística digna, mais consentânea para expressar um ideal iluminado e um novo secularismo. Por outo lado, a linguagem neopalladiana tinha em si uma pureza clássica, bem distinta do hibrido pombalino lisboeta, e com custos de execução muito mais reduzidos que o barroco utilizado pela igreja. Apesar de o novo estilo não ser imediatamente adoptado, ele acabará por ser exaustivamente usado pelos arquitectos da Junta das Obras Públicas, até meados do século XIX. O neopalladianismo será assim vulgarizado no Porto. Nos círculos eclesiásticos onde se
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criticava a acção da Junta predominará o espírito do rococó. Contudo ,na Arquitectura civil em 1769, surgirá um modelo acabado do neopalladianismo inglês com o projecto do hospital de Santo António do risco de John Carr (cf. FERRÃO, Bernardo, 1997, pp. 192-193). É ainda exemplo a Feitoria Inglesa, de Whitehead (cf. FERRÃO, Bernardo, 1997, p. 85). Este neopalladianismo é acentuado pela utilização generalização de janelas de guilhotina, pelo emprego de mezaninos, pela utilização de aparelho rústico nos pisos térreos e de frontões no remate de coberturas. Estes últimos possibilitam a alguns autores encontrarem nas frentes urbanas almadinas reminiscências das “Georgian houses” (cf. FERRÃO, Bernardo, 1997, p. 221). Esta linguagem neopalladiana pode ser vista em edifícios de rendimento na rua de S. João do Porto (Fig. CAP.II-2). As fachadas almadinas elaboradas, embora num ou noutro caso procurassem imitar os estudos similares executados para a reconstrução da Baixa Lisboeta, apresentam uma riqueza e originalidade próprias. Expressão disso é a sua própria movimentação volumétrica, o emprego de fachadas de desenho diferentes, a quase sistemática utilização alternante de tipologias idênticas com vãos diferentes, o cuidadoso tratamento de situações de excepção de ressaltos de cércea, de transição de volumétrica ou até de remate urbano (cf. FERRÃO, Bernardo,1997, p. 222). Mais tarde, o gosto francês tomaria conta do edificado portuense. Nos edifícios oitocentistas do Porto verifica-se com alguma constância que o espaço útil da cobertura é ocupado por uma clarabóia que ilumina a caixa de escadas. Este facto torna as águas furtadas menos frequentes que nos edifícios congéneres lisboetas (informação dada pelo historiador Gaspar Martins Pereira). Acresce que, por influência da cultura do norte da Europa, a questão da luz adquire um importância fundamental na Invicta. Donde que as fachadas tem um maior número de vãos que o que a luminosidade natural do Porto exigiria. Contudo este último aspecto não seria entendível sem uma forma de construir permita maior liberdade à fachada portuense. As empenas dos edifícios eram paredes portantes. Modularmente os barrotes encaixavam nesses paramentos verticais. Nos primeiros assentavam os pavimentos. Assim sendo, alçados frontal e posterior funcionam com elementos de travamento do conjunto. Este facto possibilita que haja um maior número de vãos nas fachadas que o usual na cidade de Lisboa. A frente de lote que estes edifícios podem apresentar é variável, conquanto que sempre que seja ultrapassado o vão máximo que uma viga de madeira pode suportar, o sistema se repita. Contudo a unidade de propriedade tende a favorecer os vãos de 5 a 6 metros. Há que referir ainda que se a legislação anti-sísmica foi observada e cumprida em Lisboa, no Porto
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esta quase não se fez sentir. A estrutura de gaiola não teve assim a sua generalização no Porto dos Almada nem no período que lhe seguiu. Anni Gunther Nonell (2002) menciona que, relativamente ao caso do Porto, existem edifícios setecentistas que não foram construídos sobre estacas, por se considerar não haver necessidade. Até porque, nas palavras de Agustina Bessa-Luís, o Porto é uma fraga, ou seja, é uma cidade granítica. Na Invicta os edifícios de arquitectura corrente eram construídos em pedra até ao primeiro piso e deste para cima em taipa. Apenas com a generalização massiva do betão no Porto, particularmente nos anos 50 do século XX, é que estes edifícios deixaram de ser construídos em pedra. A partir desta década é possível observar paramentos verticais de pedra aparelhadas, mas contudo é um revestimento pétreo que se ergue “gateado” a uma parede de betão (informações fornecidas pelo arquitecto Domingos Tavares). Nos documentos apresentados para os edifícios da Rua Alvares Cabral — construída entre 1895 e 1940 —, é frequente, sobretudo na fase de 1895 a 1928, encontrarmos como massa construtiva do envelope dos imóveis, alvenaria de perpianho, ordinária ou de silhares (cf. PIRES, Maria do Carmo Marques, 2000, p. 159). Por outro lado, nos registos do edificado da Invicta de que são exemplo os dos edifícios sitos na Avenida Rodrigues de Freitas, nºs 192, 194, 200 e 204, na Rua da Alegria nº 653, e na na Rua D. Manuel II, nº 184-192, os técnicos mencionam-nos amiúde a alvenaria de granito rebocada. A observação do edificado em ruas como a de S. João fortalecem esses registos. Curiosamente, marca da espeficidades regionais que enformam a arquitectura corrente, é o uso do granito em Guimarães para a construção dos cascos do edificado. O centro histórico de Guimarães, património mundial pela UNESCO, é um caso demonstrativo de uma continuidade construtiva que medeia os séculos X a XIX, altura em que o casco ficou estabilizado. Essa continuidade deu molde a novas linguagens arquitectónicas vicissitude das sensibilidades dos tempos. Esta continuidade é porém ainda visível no próprio século XX, como demonstra o estudo feito para este núcleo urbano (cf. MORAIS, Margarida, Câmara Municipal de Guimarães, 2002). 2.3.2. Coimbra O domínio do consulado de Pombal também se fez sentir em Coimbra. A reforma Pombalina trouxe à Universidade de Coimbra um posto de primeiro plano como estaleiro construtivo. Dada a grande quantidade necessária de mão-de-obra à construção dos novos edifícios planeados e remodelação dos antigos, a cidade vai ser palco de uma dinamização artística local (cf. CRAVEIRO, Lurdes,
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1990, p. 7). É neste contexto que o britânico tenente-coronel Guilherme Elsden é chamado a Coimbra. Este será o grande mentor do ideário arquitectónico ligado aos esquemas neoclássicos. Contudo, estes últimos não teriam os níveis de aceitação desejados por parte dos artistas portugueses locais. Os esquemas barrocos continuavam a dominar as obras e as encomendas (cf. CRAVEIRO, Lurdes, 1990, p. 8). A figura de Manuel Alves Macomboa viria a ser muito importante dado o papel de relevo que teve nas obras da Universidade de Coimbra entre o último quartel do século XVIII e o início do século seguinte. Macomboa é retirado das obras públicas de Lisboa em 1773 e enviado por Pombal para as obras da Universidade. Nesta altura iniciavam-se as grandes obras de remodelação do Paço das Escolas, erguiam-se os novos edifícios do Laboratório Químico, do Observatório Astronómico, do Museu de História Natural, colocava-se no primeiro piso do claustro da Sé Velha e áreas anexas a Imprensa Universitária, arranjavam-se as casas de habitação para arrendar que a universidade possuía bem como as casas de açougue e de peixe, esboçava-se o Jardim Botânico, etc. De uma forma ou de outra, Macomboa é chamado a intervir em todas elas. E, se foi como mestre carpinteiro que tina saído de Lisboa, quando do desaparecimento de Elsden assume, em 1782, assume as funções de arquitecto (cf. CRAVEIRO, Lurdes, 1990, p. 9-11). Desta forma, torna-se responsável pela a execução dos riscos, desenhos e apontamentos necessários para a execução das obras de pedraria, carpintaria ou outras quaisquer. Cabia-lhe vigiar, emitir os pareceres, fazer apontamentos para concurso de empreitadas, entre outras coisas. É mestre arquitecto de todas as obras da Universidade, da área citadina, das obras do igreja do padroado de Coimbra, trabalha para o cabido e é o inspector das obras do Convento de Santa Clara (cf. CRAVEIRO, Lurdes, 1990, p. 53). É a Manuel Alves Macomboa que se deve a profusão em Coimbra da gramática estílistica introduzida por Elsden (cf. CRAVEIRO, Lurdes, 1990, p. 55). No que diz respeito às obras posteriores à Reforma Pombalina, e mais particularmente aos edifícios de habitação, Macomboa acompanhou a recuperação das casas de renda que a Universidade possuía e das quais tirava lucro. Estas situavam-se num perímetro que compreendia a Rua do Norte, a Couraça dos Apóstolos, a zona da portaria do Colégio de S. Jerónimo, junto ao colégio das Artes, a Rua da Pedreira, a Rua da Ilha e do Corpo de Deus, o Arco de Almedina (cf. CRAVEIRO, Lurdes, 1990, p. 39). Em 1783, Macomboa pede para proceder a obras na sua casa, localizada na Couraça dos Apóstolos, pedido que seria atendido em 1785. Nos anos que se seguiram o arquitecto dirigirá e orientará obras de remodelação das casas junto à Imprensa, na Rua do Norte, defronte para a
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portaria de S. Jerónimo, junto ao Colégio dos Militares, ao sítio da Pedreira. Ressalte-se destas obras as da Rua do Norte em que o registo tem um sabor neoclássico (cf. CRAVEIRO, Lurdes, 1990, p. 40). É na designada Baixa de Coimbra1 que fomos encontrar os exemplares mais significativos dos finais de Oitocentos e inícios da centúria seguinte. No decurso da promenade que se inicia na Rua da Sofia, largo de Sansão (actual Praça 8 de Maio), Rua Visconde da Luz, Rua Ferreira Borges e que se conclui no Largo da Portagem, fomos encontrar diversos edifícios de habitação corrente inseríveis no intervalo de tempo que atrás definimos. É de referir o imóvel neomanuelino da Rua de Corpo de Deus pela sua excepção (Fig. CAP.II-3). São de mencionar os edifícios de chanfro curvo situados na Praça Oito de Maio, particularmente o nº 2426 (Fig. CAP.II-4) e no Largo da Portagem o imóvel do Café Montanha (Fig. CAP.II-5). Estes três exemplares parecem prenunciar um gosto de chanfrar o cunhal que se estende Coimbra, a Lisboa e ao Porto. São também prova de um envelope urbano ainda padronizado na segunda metade de Oitocentos Contudo, ao longo da promenade, particularmente na Rua Ferreira Borges, os registos oitocentistas que se verificam são fundamentalmente pisos elevados sobre edificações já existentes e a inclusão de gradeamento de varandas com a gramática decorativa característica da época. No que respeita aos sistemas construtivos, os registos levantados pelos técnicos que trabalham no terreno permitem perceber que, para o intervalo que medeia a reforma pombalina e o dealbar do século XX se privilegia o uso da alvenaria de pedra a que lhe segue um envelope edilício conforme a gramática decorativa das diferentes épocas. Quando se ultrapassa o perímetro urbano da cidade e nos deslocamos para os arredores de Coimbra, os sistemas construtivos já não são necessariamente os mesmos que os observados na urbe. Este facto é evidente nos registos dos técnicos em imóveis, como a designada casa popular em Rua Dr. Alfredo Freitas, em Eiras (construída em alvenaria de pedra cujas a faces exteriores são rebocadas e caiadas), no solar da Quinta das Canas, em Santa Clara (construído em alvenaria de pedra cujas a faces exteriores são rebocadas) e na igreja Paroquial de Torre de Viela (Igreja de São Martinho), situada em Torre de Viela (cujas paredes exteriores são em alvenaria de pedra).
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O casco urbano de Coimbra é constituído por duas áreas morfologicamente distintas: a Alta e a Baixa. No primeiro encontram-se o núcleo primitivo da urbe e a universidade erguida nos anos de Salazar à custa de demolições do edificado. A Baixa, embora abranja essencialmente o arrabalde da Idade Média, tal como a Alta, contém alguns exemplos de edifícios de outras épocas.
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2.3.3. Vila Viçosa O núcleo urbano de Vila Viçosa teve o seu ensanche nos anos 40 do século XX. Para definir um contestável melhor enquadramento de áreas do núcleo urbano, foram destruídos alguns quarteirões do mesmo. Assim, a visão deficitária, hoje implantada como o conhecimento possível de Vila Viçosa, apenas pode ser compensada pelo que o Arquivo Fotográfico nos permite perceber. Se o caso do Porto é ilustrativo da diversidade de sistemas construtivos usados para dar corpo a uma imagem da arquitectura corrente portuguesa, Vila Viçosa confirma-a e lança um amplo debate da real expressão do edifício de pedra e cal. Abre o caminho para a discussão de uma arquitectura regimentada com carácter de espeficidades regionais. Tal não significa uma menor vitalidade do sistema que a implantou, nem o abandono de uma imagem padronizada, mas antes uma mostra de flexibilidade e grande inteligência de gestão de recursos económicos e materiais. A generalização do betão viria anular essas diferenças atribuindo a mesma metodologia construtiva a toda a produção arquitectónica, quer se tratasse de edifícios notáveis, quer de habitação corrente. A introdução do “projecto de autor” viria a colorir a imagem do edificado da cidade, com as vicissitudes consequentes para a conformação de padrões de qualidade urbanística. De acordo com Maria Fernandes (2007), no Alentejo interior encontram-se diversos tipos de taipa — militar, urbana, rural, do século XX e de centúrias anteriores. O uso da arquitectura de terra não é exclusivo dos edifícios de arquitectura corrente, os edifícios notáveis — até aos anos 40 do século XX — também fazem uso dos recursos da região. Caso paradigmático é o Paço Ducal de Vila Viçosa (Fig. CAP.II-6). Este imóvel, como apresenta Maria Fernandes em 2007, possui todo o piso térreo edificado em taipa. O envelope do edifício é posteriormente vestido com a linguagem arquitectónica consonante com a notabilidade do imóvel (cf. FERNANDES, Maria; 2007 in ALÇADA, Margarida (coord.); Monumentos nº 27, p.173). Embora em casos como na Rua dos Fidalgos a moda da cércea não seja elevada, pensamos que de alguma forma os edifícios de carácter plenamente urbano se cingem às normativas em vigor no que respeita à sua imagem, já que os aspectos construtivos são ditados pela especificidade da zona. Expressiva desta situação é a designada Casa, sita no concelho de Vila Viçosa, em Conceição, no Largo Mousinho de Albuquerque, nº 81-83 / Rua Sacadura Cabral / Avenida Duques de Bragança, nº 85. Esta, de acordo com Rosário Gordalina, é construída com alvenaria de tijolo burro disposto em fiadas regulares, intercaladas de terra e revestida com fortes rebocos caiados (cf. GORDALINA, Rosário, IHRU, 2008). Mais uma vez vicissitude das características geológicas do País, a região sul em particular o
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Algarve, também respira a taipa. Esperamos, assim, que alguns destes aspectos mencionados par Vila Viçosa também se verifiquem, se não de forma generalizada, pelo menos pontual, em núcleos urbanos como o de Caçela Velha. 2.3.4. Brasil Durante os cerca de trinta anos do seu governo Pombal cumpriu globalmente o seu projecto de planejamento e fundação de um grande número de aldeias de vilas no Brasil. No território brasileiro foram implantados com maior ou com menor sucesso alguns elementos da cultura portuguesa. Através deste programa urbanístico consolidou-se a presença portuguesa. Mazagão é, contudo, representativa das fragilidades deste processo, que frequentemente revelou uma expressão formal insuficientemente interiorizada (cf. TEXEIRA, Manuel & VALLA, Margarida; 1999; p. 265). Contudo este balanço não era novo. Todas as vilas tentavam aproximar-se das imagens ideais contidas nas cartas enviadas pelo rei de Portugal. Expressão disso é o caso de Mariana, uma vila setecentista de Minas Gerais. A urbe não é unicamente o resultado de uma reacção ou acomodação às condições do lugar ou uma mera aplicação de uma ordem régia ou de um plano de um engenheiro. Independentemente de existir ou não um projecto pré-concebido, a cidade só pode ser entendida como uma realização complexa e colectiva na qual entram em linha de conta variadas instâncias de interesses e poderes não raro antagónicos (cf. FONSECA, Cláudia in TEIXEIRA, Manuel (coord.), 2004, p.234). A aldeia de Gerú, elevada a vila Tomar, em Seripe d’ El Rey, na segunda metade de Setecentos, não possuía nenhuma casa de pedra e cal, tijolo, ou telha. Eram antes feitas de taipa de mão (cf. FLEXOR, Maria Helena, in TEIXEIRA, Manuel (coord.), 2004, pp.227-229). Em Oitocentos os revivalismos portugueses são apenas uma pequena parte do glossário ecléctico brasileiro. As outras importações europeias têm um muito sucesso muito maior. Num primeiro tempo, a própria historiografia chega a negligenciar os primeiros em favor das segundas (cf. MILHEIRO, 2005; p.148). No início de 1900 verificar-se-à uma aproximação entre a arquitectura tradicionalista brasileira, designada como neocolonial, e a produção arquitectónica portuguesa de cariz nacional. Posteriormente consagrar-se-á a primeira (cf. MILHEIRO, Ana, 2005; pp.168-169). Na década de 80 do século XIX, começa-se a exigir nas residências gás, água potável e sobretudo acessibilidade, simbolizada pelo transporte colectivo. Alguns pedidos de novas edificações baseiam-se precisamente em argumentos de higiene pública. Os empreendedores imobiliários
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urbanos procuram ir ao encontro das diversas faixas de mercado existentes. Reclamam novas classificações para os seus edifícios, tentando actualizar o quadro programático residencial. Procuram soluções construtivas e materiais que quebram com o passado colonial (cf. MILHEIRO, Ana, 2005; p.103). O caso de S. Paulo é expressão disso. No que respeita aos sistemas construtivos e, em particular ao emprego da taipa no edificado, apesar de ela ter sido introduzida em diversas regiões, apenas se consolidaria como técnica construtiva em S. Paulo Goiás e Minas Gerais. A taipa pilão foi assim usada para a construção de habitação, igrejas, mosteiros, muralhas, etc.(cf. FERNANDEZ, Maria Rosa in FERNANDES, Maria & CORREIA, Mariana; 2005, p. 92). Não é de espantar que, ainda em 1841, se falasse de S. Paulo como um caso de excepção relativamente à arquitectura brasileira. Contudo, devido ao surto do ciclo açucareiro, assiste-se em meados de Oitocentos ao abandono da “taipa paulista”. Neste período S. Paulo, urbaniza-se mais e é palco de uma febre modernizadora que populariza o uso do tijolo na construção (cf. FERNANDEZ, Maria Rosa in FERNANDES, Maria & CORREIA, Mariana (coord.); 2005, p. 93). 2.4. Lisboa 2.4.1. Entre duas “idades de ouro” O período histórico entre a Lisboa pombalina e a de Ressano Garcia pode ser considerado como um iato de tempo fraco, na medida em que não surgiram dele nem personalidades nem ideias estruturadas. Contudo, e de acordo com Raquel Henriques da Silva (1997), é um período em que não se pode representar por uma linha contínua e fatal de decadência. Antes pelo contrário. É um momento que viu as dinâmicas pombalinas transmutarem-se positivamente (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, pp. 9-10). Verifica-se o surto erudito da arquitectura neoclássica patentes em obras como o Teatro de S. Carlos, no projecto do Real Erário e na apropriação do projecto para o Palácio da Ajuda. Estes equipamentos renovavam não só a própria figura da arquitectura, como também o conceito de monumento que o pombalino mais radical eliminara da cidade, circunscrevendo-o à Praça do Comércio. Dessas intenções de desmultiplicar o centro de Lisboa, ficaria apenas o Chiado, uma vez que o lugar da Patriarcal da Queimada continuaria adiado até meio do século XIX, e o da Ajuda se manteve definitamente irresoluto. Observa-se um ritmo mais acelerado da construção da Baixa, beneficiando da medida política de unir os rendimentos do donativo dos 4% à gestão do Real Erário. Verificam-se os primeiros frutos da crítica erudita e empírica à monotonia do pombalino,
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por meio de subtis fugas ao modelo de edifícios de rendimento de Eugénio dos Santos (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 10). No que respeita a este último, surgem mísulas, uma maior riqueza de emolduramentos e diversidade de desenho das balaustradas. Ao mesmo tempo inicia-se o processo de aumento de um ou dois pisos. Este processo acentua-se depois de 1840. Este aumento de pisos possibilitava uma maior rentabilização dos investimentos e, simultaneamente, a apropriação social de um espaço muito determinado (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, pp. 1011). A exigência da reconstrução da Baixa como prioritária, em detrimento dos outros pólos da cidade, era uma impossibilidade. No pós terramoto de 1755 verificam-se aforamentos na zona da Lapa, na Cotovia, e de um lado e doutro do Colégio dos Nobres, em Santa Isabel e já em Campo de Ourique. Verifica-se uma dinâmica de edificação aristocrático-burguesa, elaborando então os mais antigos modelos da tipologia de palacetes, de que é expressão a Casa Farrobo na Rua do Alecrim. Através deste movimento, Lisboa enriquecia-se e diversificava-se, caldeando-se com as mutações civilizacionais em curso, dando modelos que iriam ser utilizados pela burguesia intelectual ou mercantil nos decénios seguintes. Observa-se um primeiro sinal de uma consciência das linhas futuras de crescimento da cidade. Estas têm expressão no ajardinamento do Campo Grande executado pensa-se por sugestão do arquitecto Carvalho Negreiros. Este tinha proposto uma extensão desta iniciativa também para o Campo Pequeno. A cidade não absorveu de imediato esse espaço de lazer. Este ficaria ali com ela de uma lógica urbanística que arrancava do Passeio Público e determinaria cem anos depois os traçados de Ressano Garcia (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 12). Estes factos datados entre o final do século XVIII e os primeiros anos de Oitocentos (o iluminismo mariano), vão dar lugar a um período conturbado marcado pelas invasões francesas e a partida da família real para o Brasil. Interrompeu-se quase tudo. No estaleiro da Ajuda instalou-se uma crise. Este deixou de conseguir assumir as funções de transição para uma prática de arquitectura moderna, de que antes parecia capaz. A Casa do Risco das Obras Públicas reforçou a sua importância. Esta estava fechada, desde morte dos últimos arquitectos pombalinos, atrasando por isso o confronto de ideias e ignorando a importância dos influxos culturais europeus (cf. SILVA, Raquel Henriques ,1997, pp. 12-13). Apenas em 1833, após a vitória liberal, Lisboa se confrontará com ela mesma. É nesta altura que o referido ciclo fraco se inicia. Consequência da instabilidade do regime político, o urbanismo
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ressente-se, demonstrando uma dramática incapacidade de orientação urbanística e arquitectónica. A casa do Risco da Ajuda é encerrada. O poder da Casa do Risco das Obras Públicas é questionado. E a gestão concreta da cidade foi assumida pela Câmara Municipal. Contudo, e de acordo com Raquel Henriques da Silva (2007), faltavam-lhe meios, tradições de discernimento político, técnico e cultural (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 13). A linha de actuação da Câmara Municipal até meio do século pauta-se pelo assumir da Lisboa pombalina como herança definitiva. Esta tornou-se objecto de maquilhagens sucessivas no intuito de na expressão da época, aformosear, procurando colocar-lhe os ritmos nervosos e ostentatórios do tempo presente. Entre outros, a liberdade crescente de alterar o “prospecto da cidade” mesmo na Baixa, o crescente número de palacetes de fachadas decoradas em que a gramática neoclássica não era contraditada, foram as formas de apropriação burguesa da Lisboa pós terramoto e cujas potencialidades de crescimento ainda eram plenamente operantes (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 14). O crescimento de Lisboa adquiriu outra consistência com a estabilização política da Regeneração e o programa estruturado das obras fontistas. A Câmara contratou um engenheiro-arquitecto José Pedro Pezerat para dirigir a Repartição Técnica, que, apesar dos vários constrangimentos políticos, financeiros e culturais, demonstrou ser capaz de assumir uma relativa operacionalização dos serviços. Pezerat foi autor inicial de vários traçados de extensão e normalização, funcionais no caso do alargamento da Calçada do Moinho de Vento, relativamente estruturados na futura Avenida das Cortes e da então aberta Avenida da Estefânia, enunciadores de futuro no projecto de prolongamento do Passeio Público com rotundas e avenidas adjacentes. Estes prenúncios seriam retomados posteriormente com Ressano Garcia. Este agarraria todas essas intenções dispersas com uma capacidade técnica modernizada (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 15). Pezerat foi autor de obras como o novo Matadouro da Cruz do Tabuado, os Banhos de S. Paulo e de um curioso prédio em frente para o Colégio dos Nobres, entretanto transmutado em Escola Politécnica. Actuação mais discreta tiveram os arquitectos da recente Academia de Belas-Artes e da Intendência das Obras Públicas de Lisboa. Ambos reunidos na Associação dos Architectos Civis, onde se salientava a figura de Possidónio da Silva. Embora exista na edificação privada sinais da permanência do seu gosto, herdado da sobriedade dos modelos pombalinos e pós-pombalinos, o que seduziu a cidade foi o génio elegante e cosmopolita dos cenógrafos do Teatro de S. Carlos,
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Cinatti e Rambois. Estes projectaram as principais edificações privadas, em S. Francisco, no Passeio Público, e no Príncipe Real, guiando o gosto da arquitectura corrente, de construtores civis, de pedreiros e numerosos amadores. Prolongaram-se os valores classicizantes, resistindo-se até à década de 1870 aos influxos epocais dos revivalismos, entretanto já implantados em Sintra (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 15). A grande novidade estética do fazer arquitectura foi o revestimento azulejar de fachadas inteiras. Estes revestimentos, de fabrico industrial, poderiam reproduzir padrões geométricos ou, menos frequentemente, padrões figurativos. Estes vão cobrir edifícios novos e simultaneamente modernizar a pele de muitos anteriores. Esta moda constituiu, a par da generalização dos calcetamentos decorativos de passeios e praças, uma das criações mais originais do período romântico (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 16). 2.4.2. A problemática da Baixa-Chiado, reenquadramento da produção arquitectónica lisboeta pós 1758 O período urbanístico da acção de Pombal com reflexos para o edificado começa a 12 de Maio de 1758 data de promulgação do plano de reconstrução da baixa lisboeta. Com o plano de reconstrução da Baixa Chiado procurou-se fazer o que se tinha executado dois séculos antes em Baçaim e Damão (cf. FERRÃO, Bernardo, 1997, p. 29). A construção da Baixa Chiado foi de acordo com João Appleton um processo penoso que nem mesmo chegou ao fim, como demonstram alguns edifício distintos construídos de raiz no final de Oitocentos, na malha desenhada por Eugénio dos Santos. O plano para a reconstrução de Lisboa demorou mais de um século a ser implementado (cf. APPLETON, João in MATEUS, João Mascarenhas, (coord.), p. 45). Acresce que no respeitante aos sistemas construtivos, muitas construções de Lisboa anteriores ao consulado pombalino, já usavam estacas. Refira-se a célebre referência de Damião de Góis ao uso de uma cerrada paliçada no seu Livro Descrição da cidade de Lisboa. Refira-se igualmente que, para a execução do parque de estacionamento localizado na Praça da Figueira foram expostas estacas de madeira anteriores ao terramoto de 1755 (cf. APPLETON, João in MATEUS, João Mascarenhas, (coord.), p. 46). Até 1833 persistiam arrematações de chãos de casas que tinham sido incendiadas pelo incêndio que se seguiu ao terramoto de 1755. (cf. SILVA, Raquel Henriques. in MATEUS, João Mascarenhas, (coord.), p. 53). A construção da Baixa dita pombalina arrasta-se por longos anos. Em 1777, quando o Marquês de
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Pombal é afastado compulsivamente do poder, a maior parte da Baixa encontrava-se por construir. Assim, e de acordo com Raquel Henriques da Silva (2001), a Baixa teve um momento de edificação mariana (cf. SILVA Raquel Henriques da. 2001; in ROSSA, ARAÚJO & CARITA, 2001; pp.879-881). No centro da cidade a Baixa ia sendo edificada com sistematicidade, embora lentamente. Esta morosidade leva a que aspectos significativos dos prospectos iniciais sejam alterados. De acordo com Raquel Henriques da Silva (2001), o caso mais interessante em termos de desenvolvimento do edifício pombalino encontra-se na Rua do Alecrim. Contudo, nos outros arruamentos os prospectos sofreram alterações significativas por exigência dos proprietários. Estes, para fugir à “monotonia que gela” exigem a liberdade de alteração da dimensão dos lotes, o ritmo das aberturas e das sacadas, a altura das cérceas e particularmente, os recursos decorativos. Verifica-se assim, um primeiro retorno a gramáticas barroquizantes, de que é expressão o Palácio do Manteigueiro (cf. SILVA, 2001; in ROSSA, ARAÚJO & CARITA, 2001; p.881). Os edifícios de habitação corrente misturavam-se com edifícios nobres de aluguer e com casas nobres, interrompendo e problematizando uma inexistente unidade (cf. SILVA, 2001; in ROSSA, ARAÚJO & CARITA, 2001; p.881). Em toda a área de reconstrução Lisboeta foram surgindo marcas eclécticas e dispersas de modernidade, assistiu-se ao azulejamento de algumas fachadas, à alteração da composição dos pisos térreos, de modo a que estes respondessem às novas necessidades do comércio, que passa a fazer uso das vitrines. Nos finais de Oitocentos tiveram lugar as primeiras demolições para construção de edifícios mais ostensivos, alterando mesmo, se necessário, o próprio loteamento (cf. SILVA, Raquel Henriques da in MATEUS, João Mascarenhas, (coord.), p. 54). Por outro lado a introdução de novos equipamentos no tecido da Baixa de Lisboa de que é expressão o Animatógrafo, introduziram outras linguagens que quebraram parcialmente aquela “monotonia que gela” constantes nos prospectos pombalinos (veja-se a título de exemplo o Cartulário Pombalino). No que respeita à solução da “gaiola pombalina”, em si mesma não é inovadora pois os romanos já conheciam este sistema construtivo (opus craticium); modernamente, com variantes próprias os espanhóis conheciam-no como “entramados”, os italianos como “barracata” e os franceses como “collombage” (cf. MATEUS, João Mascarenhas. in MATEUS, João Mascarenhas, (coord.), p. 112). A Baixa Chiado, é assim, um cumular de legados arquitectónicos que construíram a imagem de parte da cidade de Lisboa. Expressão disso são os casos que seguidamente se apresentam. O edifício da casa Grandella & Cª. (Fig. CAP.II-7), inaugurado em 1891, inteiramente remodelado
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pela traça do arquitecto Alfredo d’ Ascenção Machado, com frente para a Rua Aurea. Ao lado deste encontra-se a sede do Montepio Geral no nº 219-241 (Fig. CAP.II-8). Deste edifício consta um processo de licenciamento datado de 1894, submetido à Câmara três anos depois. O imóvel já tinha sofrido uma alteração em 1888, data em que tinha sido aumentado em um piso (cf. MARTINS, João Paulo, in ALÇADA, Margarida (dir.), p.142). A expansão da casa Grandella e Cª levaria à primeira substituição integral de um edifício na Baixa, com projecto datado de 1904, sito na rua do Carmo nº 26-38. Em 1917 o estabelecimento atingiria a sua expansão plena, contando com fachadas remodeladas na rua Áurea e da Assunção, e com ampliação na Rua do Carmo. A sede do Banco Lisboa & Açores, veio a ocupar um imóvel completamente reconstruído de raiz para esse efeito. Ventura Terra, executou o projecto em 1905. O edifício respira beauxartianismo parisiense (Fig. CAP.II-9). No ano de 1919 ainda corriam as obras na Praça do Rossio. A arquitectura ia-se construindo na Baixa da cidade. Nesse ano surgiu, na Rua Áurea, o novo edifício do Banco Colonial Português. A respeito deste imóvel, e criticando o estilo pombalino “pesado e arcaico, não já consentâneo com a época em que atravessamos”, o cronista da Ilustração Portugueza referia: “Construam-se muitos edifícios belos, deite-se abaixo o que houver para arrazar e Lisboa surgirá formosa, com uma estética moderna, de ruas lindas, transformada no seu aspecto sediço, de ambiente próprio de melhores e prometedoras gerações”(cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo, vol. XII, pp. 178). Mencione-se também o edifício António da Silva Cunha projectado em 1909, onde se instalaram a Camisaria Confiança e o Hotel Internacional, com risco de Ferrreira da Costa (Fig. CAP.II-10). Existe ainda o Hotel Metrópole (Fig. CAP.II-11) cujo projecto vingador é da autoria do construtor civil Frederico Augusto Ribeiro (cf. piso (cf. MARTINS, João Paulo, in ALÇADA, Margarida (dir.), p. 145). Refira-se ainda a antiga sede da Companhia de Seguros Luso Brasileira Sagres, cujo processo de licenciamento, datado de 1918, foi assinado por Vilaça & Coelho. Cite-se também o edifício Barros & Santos (Fig. CAP.II-12), primeira obra do arquitecto Carlos Ramos. (cf. MARTINS, João Paulo, in ALÇADA, Margarida (dir.), p. 147). É ainda elucidativo o tratamento dado ao edifício de topo de quarteirão com o nº 40-48 na já referida Rua Aurea. Tal como são demonstrativos os revestimentos feitos sobre a pedraria original dos vãos de modo a ter portais de entrada mais consonantes com o gosto da época (Fig. CAP.II-13 e Fig. CAP.II-14). Estes até eram consentidos pelos próprios regulamentadores, como é expressivo o documento de 14 de Maio de 1847: …“ Do que posso emformar a V. Exª a respeito do
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Requerimento junto d’ Eustaquio Antonio Seixas é elle pertende embelezar as hombreiras e membros das portas da loja que oucupa na Rua Aurea nº 3o e 31 foirando tudo de cantaria ou Marmores de coures para o que juntem licença do dono do predio, cuja obra não acho embarasso algum, com a condição de conservaro perfil externo das Portas e a altura do socco geral da cantaria do proprio do Predio, e desta forma muito se embeleza aquelle Rua, e como em nada prejudica o Publico esta circunstancias de merecer de V. Exª a licença que solicita,. Mas avista do exposto de V. Excª mandará o que for servido Lisboa 14 de Maior de 1847. O Arquitecto da Cidade Malaquias Ferreira Leal”(AHCML, SGO, Cx. 127, doc. 15 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp. 716-717) São várias as caixas de escadas que remetem para outras espacialidades que não as constantes nos prospectos pombalinos (Fig. CAP.II- 15 e Fig. CAP.II-16). São ainda de referir as que, já no século XX, foram substituídas por outras. É pelo ineditismo em toda a Baixa de referir o engradamento do acesso de umas escadas e pelo proliferar de canalizações transfigurando o aspecto original de uma caixa de escadas (Fig. CAP.II-17). É ainda de mencionar as caixas e de escadas que se vêem reformadas pela introdução de um elevador. É o caso do nº 53 da Rua dos Sapateiros. A Baixa é um cumular de legados, reflexo da morosidade com que foi construída e dos aformoseamentos que foi alvo. Intromissões como a da Papelaria Fernandes, na Rua Aurea não têm hoje cultura arquitectónica de projecto que a sustente. Esta intervenção contrasta largamente com as intervenções do Arquitecto Álvaro Siza na Rua do Carmo e na Rua Garrett — antiga Rua das Portas de Santa Catarina — (Fig. CAP.II-18), demonstrativas de que a cidade é espaço de memória e do respeito pelo património edificado — estratégia da memória. A pretensa marca de contemporaneidade introduzida com a intervenção da Papelaria Fernandes não se coaduna com a proposta vencedora feita por João Andresen, Barata Feyo e Júlio Resende, para o Concurso do Monumento ao Infante D. Henrique, de 1954 (Fig. CAP.II-19). Nesta última, a plasticidade total do desenho era viável por ser um espaço liberto de qualquer tipo de constrições. Contudo há indiscutivelmente um legado pombalino. Existe igualmente uma produção arquitectónica mariana, que não se pode obviar. Se A Baixa Chiado hoje é registo da história particularmente dinâmica de Lisboa, fora da sua área existem exemplos bastante preservados desse legado. Expressão disso é o edifício situado na rua de S. Bento/ Rua Correia Garção. Assim, e para
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fins sistémicos, defendemos que os edifícios se categorizam em 1ª metade de setecentos, charneira de 1758 (Trinas 1755), 2ª metade de setecentos durante a governação de Pombal, 2ª metade de setecentos posterior à governação de Pombal (Mariano), 2º quartel século XIX, 3º quartel século XIX, 4º quartel século XIX, 1º tricénio do século XX. Contudo a Baixa pelo seu conjunto e pelo que representa não deixa de poder ser considerada um monumento. Senão atente-se à definição constante na legislação. De acordo com os critérios de classificação de bens imóveis constantes na lei nº 13/85 de 6 de Julho, entende-se por monumento as obras de arquitectura, as composições importantes ou as criações mais modestas, notáveis pelo seu interesse histórico, arqueológico, artístico, científico, técnico ou social, incluindo as instalações ou elementos decorativos que fazem parte integrante destas obras bem como de obras de escultura ou de pintura monumental. Quer sejam enquadrados pela arquitectura civil, pela militar ou pela religiosa, os bens definidos como monumentos deverão exercer ou exemplificar uma influência considerável sobre: uma área cultural específica, o desenvolvimento de uma arquitectura ou gosto arquitectónico, um Tempo Longo, Médio ou Tempo Próximo, a organização do espaço, as “artes monumentais”, um tipo de construção ou conjunto arquitectónico que seja expressão de um determinado estádio sociocultural ou conjuntura histórica, um habitat humano tradicional ou representativo de uma cultura, a Arquitectura de concepção popular. Subsistem na Baixa edifícios herdeiros do plano promulgado em 1758. Todavia, e de acordo com os prospectos constantes no Ministério da Obras Públicas, nem todos eles apresentam a mais típica concepção planimétrica da caixa de escadas. Estes dados podem ser confirmados com o próprio edificado. Cite-se a título de exemplo o nº 94 da Rua da Vitória (Fig. CAP.II-20). Os seus alçados respondem ao padrão definido pelos arquitectos de Pombal, herdeiros directos da escola de urbanismo portuguesa. É essa imagem de alçado conformadora do envelope do edifício pombalino que seguidamente abordamos. O plano da Baixa de Lisboa para as arquitecturas das praças do Rossio e do Comércio, objecto de projectos de conjunto específico, serviram de referência para as ruas principais, sendo complementadas pela estrutura hierárquica definida para as ruas secundárias e travessas (cf. SANTOS, Maria Helena, 2007, in ARAÙJO, Ana Cristina, CARDOSO, José Luís, MONTEIRO, Nuno Gonçalves, ROSSA, Walter & SERRÃO, José Vicente, 2007, p. 447). O modelo da Rua Nova d’ El Rei, a actual Rua do Comércio servirá de matriz para as ruas nobres do plano pombalino. Para os edifícios da referida rua são definidas diversas regras no que respeita à volumetria e às características dos vãos a construir.
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A cidade de Lisboa foi moldada pela figura operativa do edifício de rendimento pombalino. Este muito embora sem o rigor dos prospectos iniciais, disseminou-se em zonas que ultrapassam a área da reconstrução da Baixa, numa mesclagem empírica com as tradições da corrente anterior (cf. SILVA, Raquel Henriques da, 1997; p.81). Nota da vontade de fugir da monotonia que gela é o plano nunca realizado de substituir a Rua travessa do Secretário de Guerra por outra até à muralha de S. Pedro de Alcântara, datado de 17 de julho de 1835. Para o efeito era necessário destruir uma série de edifícios. Estes seriam distribuídos interiormente à vontade do proprietário e aformoseados por fora. No envelope dos mesmos optar-se-ia por uma arquitectura diferente da habitual, de gramática simples, mas variada e elegante (cf. SILVA, Raquel Henriques da, 1997, p. 269). A mesma vontade é expressa, em 2 de junho de 1834, no plano para o mercado da Ribeira velha onde se pretendia substituir o plano pombalino por outro executado por “homens bons” (cf. SILVA, Raquel Henriques da, 1997, p. 287). A abertura da rua dos Duques de Bragança, prevista desde 1837, marcou mais uma frente de modestos edifícios de rendimento, em que o prospecto pombalino era discretamente enriquecido com molduras em segmento de circulo (cf. SILVA, Raquel Henriques da, 1997, pp. 327-328). Este conjunto de soluções demonstra que de ano a ano se vivia um frágil gestão da herança qualificada de um dinamismo pombalino e de um desejo de o substituir por uma arquitectura aformoseada que, não iludia a perda de anteriores referentes eruditos (cf. SILVA, Raquel Henriques da, 1997, p. 328). No O panorama em 1843, a propósito da 2ª Exposição da trienal da Academia de Belas- Artes S. J. Ribeiro lastima que os arquitectos portugueses continuassem fiéis a esse “typo antigo”, em desfavor de outros estilos diferentes. De acordo com o mesmo, o arquitecto tinha a obrigação de estudar as relações em que o edifício está com a sociedade actual e as em que estaria com as sociedades futuras. O arquitecto dispunha de três opções: adoptar algum dos tipos antigos, formar um tipo ecléctico ou criar um novo (cf. SILVA, Raquel Henriques da, 1997, p. 363). Contudo mesmo com o advento da Regeneração (1851) esse tipo antigo teimava em persistir. O aumento de pisos constituía uma forma expedita de, actualizando o módulo arquitectónico, potenciar o novo, sem o recurso a alternativas eclécticas mais elaboradas que não encontrariam eco nos operacionais portugueses (cf. SILVA, Raquel Henriques 1997, pp. 509-510)
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2.4.3. Sistemas construtivos do edifício de rendimento de 1758 ao 3º quartel de 1800 (1865) Como foi atrás referido, a permanência do pombalino e a sua revisão é um fenómeno que ultrapassa o período mariano, compreendendo vários reinados. Por toda a segunda metade do século XVIII e até à década de setenta do século. XIX a estrutura de madeira dita gaiola pombalina, é aplicada nos edifícios em construção. Contudo, a aplicação de uma estrutura de madeira na parede dos edifícios não é um facto novo. Como vimos em trabalho realizado por nós em 2003, essa estrutura de madeira (cf. MATOS, Vanda Pereira 2003, p.58) era aplicada nos grandes modelos de edifício de rendimento pré- pombalino, cujo vão fosse maior que 25 a 30 palmos. No que respeita aos sistemas construtivos baseamo-nos no trabalho efectuado por Vítor Lopes, uma mole densa e aturada (cf. SANTOS, Vítor Manuel Vieira Lopes, 1994 e LOPES, Vítor; 2005 in (coord.) MATEUS, João Mascarenhas; 2005). Perante a impossibilidade de descrever na totalidade o trabalho efectuado por este arquitecto, torna-se insubstituível a leitura dos trabalhos deste autor. Abordaremos então o envelope original do edifício pombalino e daremos uma perspectiva igualmente breve do que caracteriza o interior não adulterado destes imóveis. As paredes resistentes, de frontal, são construídas em taipa de saibro argiloso, cal e inertes, cofrados com taipais de madeira de ambos os lados. Estas ainda possuem uma estrutura de madeira autoportante solidária com os restantes elementos estruturais do mesmo tipo. A própria alvenaria faz o travamento do madeiramento do frontal. As madeira identificada, prova da criteriosa escolha de materiais, são o carvalho pendunclado, o sobreiro, o azinho em prumos e travessas cujas secções têm as dimensões aproximadas de 13 cm x 15 cm e de 10cm x 15cm respectivamente. Verifica-se a ainda a utilização de madeiras como a Láride da Europa e o pinheiro bravo do Norte da Europa, ambas inexistentes na topiária portuguesa. A percepção destas paredes ficaria incompleta sem referir a utilização dos escombros dos edifícios como inertes da taipa ( cf. LOPES, Vítor; 2005 in (coord.) MATEUS, João Mascarenhas ; 2005; pp. 122-124). O historiador José Augusto França, no seu trabalho pioneiro publicado em 1965 — em pleno Estado Novo, quando era subversivo falar abertamente do património edificado —, refere as mesmas dimensões, as dimensões dos prumos e travessas eram de 15 x 13 cm para os primeiros e de 10 x 13 para os segundos. O engenheiro Vítor Cóias e Silva refere também estas questões (cf. SILVA, Vítor Cóias, 1997, in ALÇADA, Margarida (dir.) 1997 p. 81). Contudo, estes trabalhos não analisam a mole do edifício pombalino com a mesma densidade informativa que o autor do estudo acima referenciado. De acordo com Vítor Lopes, a estrutura de madeira existente nestas paredes resistentes é
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constituída por unidades bidimensionais de modulação quadrada. A assemblagem dos seus elementos raramente era feita por cluagens ou recorrendo a união de peças terceiras. As travadeiras costaneiras impediam a mudança de posição do conjunto aquando do enchimento dos taipais. Por seu turno, os frontais eram travados às outras paredes estruturais recorrendo à interpenetração de alvenarias e assemblagem dos seus madeiramentos. Os negativos dos vãos interiores sem estrutura de madeira resolviam essa vicissitude com uma verga, designada por archete recto, em ladrilho de barro, sendo as ombreiras construídas com pedra melhor aparelhada (cf. LOPES, Vítor; 2005 in (coord.) MATEUS, João Mascarenhas; 2005; p. 124). Quando essa opção era tomada em paredes de frontal verifica-se a utilização de um pré-aro em madeira. Este funcionava como uma cadeia aplicada à estrutura da parede. Independentemente de a espessura da parede possibilitar um archete recto ou um lintel era necessária a verga do aro de madeira. Estes vãos eram rematados por alizares de duas faces. Porém, os trabalhos no terreno permitiram perceber, que em alguns casos, aros de pedraria de três ou duas faces ao nível do primeiro andar (cf. LOPES, Vítor; 2005 in (coord.) MATEUS, João Mascarenhas; 2005; p. 125). Nas paredes exteriores, a largura do negativo para o paramento interior correspondia à distância entre prumos da estrutura e a altura equivalia à distância entre o extradorso das vigas do pavimento assente no frechal e a verga de madeira sustentada pelos pendurais, a partir do frechal do piso superior. Esta cadeia aplicada à estrutura podia ser usada para pregar alizares, via de regra de duas faces. O negativo na alvenaria era formado na verga por um arco de ressalva. Este era aprumado com a verga do aro de cantaria e por um archete recto que assegurava o lintel do negativo na espessura da parede. Por seu turno as ombreiras do vão eram construídas com alvenaria ordinária melhor aparelhada do que a restante. O pano de peito nem sempre era figura presente. Este era conseguido por uma alvenaria de tijolo aparelhado com junta alternada. O conhecimento em obra permitiu perceber que alguns panos de peito são construídos em alvenaria a taipal (cf. LOPES, Vítor; 2005 in (coord.) MATEUS, João Mascarenhas; 2005; p. 125). Os vãos, rematados por aros de cantaria, apenas são aparelhados em três faces. A estrutura de madeira das paredes exteriores é impensável sem a existência de umas peças as mãos, que permitiam a estrutura aderir à alvenaria tornando-se solidária com esta. Por forma a evitar que a estrutura de madeira deixasse de estar equidistante do paramento interior eram colocados chincharéus na entrega dos vigamentos do piso à parede. A estrutura de madeira era assente com cumbadouros e cavilhas no embasamento de pedra ou nas fundações por meio de um
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frechal reforçado. Esta estrutura era também travada aos cunhais de alvenaria de pedra aparelhada através de ferrolhos em chapa de ferro na continuação dos frechais e travessanhos tendo uma entrega com comprimento dependente do número do respectivo piso empena (cf. LOPES, Vítor; 2005 in (coord.) MATEUS, João Mascarenhas; 2005; p. 126). As espessuras das paredes exteriores eram diferente de piso para piso, sendo adequadas às cargas que lhe eram transmitidas. As paredes de empena eram construída basicamente com se fossem paredes de frontal, contudo a mesma parede servia dois edifícios contíguos e raramente variavam de espessura com o piso. As paredes de empena eram construída com a mesma taipa que era usada nos restantes frontais. A estrutura da madeira da gaiola era colocada mais próxima do paramento interior da parede de alvenaria (cf. LOPES, Vítor; 2005 in (coord.) MATEUS, João Mascarenhas; 2005; p. 126). As paredes exteriores recebiam um acabamento de pintura de cal com a incorporação de sebo durante a sua extinção, à qual se adicionavam as terras sempre que se pretendia cor (cf. LOPES, Vítor; in MATEUS, João Mascarenhas; 2005; p. 126). A cobertura, elemento de fechamento do envelope do edifício pombalino, era pontuada por trapeiras que permitiam ocupar o lugar mais próximo do céu mas também o mais desconfortável. No que concerne ao revestimento e acabamento em paredes exteriores, os paramentos eram rebocados, não tendo sido detectado fasquiado para facilitar a aderência das massas de revestimento à superfície de madeira. Quanto aos paramentos das paredes interiores revestimento dos tabiques era feito com um tabuado de forro de madeira macheada ou emboçada e posteriormente esboçada e rebocada. Existem também situações em era aplicado um revestimento final de estuque de gesso ou de pó de pedra cor (cf. LOPES, Vítor; in MATEUS, João Mascarenhas; 2005; p. 127). Nas cozinhas, caixas de escadas ou outros lambris interiores eram utilizados de azulejos polícromos em panéis decorativos ou simplesmente brancos. Em guarda-chapins e rodapés era usual utilizar-se chacotas esponjadas ou vidradas. Quanto às madeiras quando empregues com revestimento recebiam uma tinta longa de base oleosa. Para além do aspecto estético o acabamento fornecia uma protecção a estes elementos (cf. LOPES, Vítor; in MATEUS, João Mascarenhas; 2005; p. 128).. Os variados contratos de obras existentes possibilitam circunscrever as regras construtivas desta arquitectura desornamentada e densa. De acordo com Raquel Henriques da Silva, o modelo
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tipificado desta arquitectura encontra-se no que foi celebrado em 1789 entre Pina Manique — representado por Francisco António Ferreira, Architecto da Reedificação da Cidade — e os mestres de obras S. A Neves, Feliciano dos Reys e Manuel Costa, respectivamente dos ofícios de Canteiro, de Pedreiro e de Carpinteiro (cf. SILVA, Raquel Henriques da, 1997; p.62). Estes pretendiam edificar uma propriedade de cazas no Arco na rua dos Remolares. Uma vez que as situações arquitectónicas estavam definidas no prospecto de rua, não era necessário de clarificá-las. Não é sequer mencionada uma planta. O contrato reduzia-se a um caderno de encargos que enumerava os deveres de cada um dos mestres nas respectivas especialidades, por meio de listagens minuciosas dos materiais a empregar e os seus preços. Este repositório de técnicas em presença tem interesse porque demonstra categoricamente o que o carácter estandartizado da arquitectura pombalina se baseava numa estardartização dos procedimentos construtivos, cujo fim exclusivo era a solidez e a durabilidade. A ausência de pormenores deve-se ao facto de eles não existirem. A pedra lavrada ou bastarda, utilitária ou decorativa usada par caboucos, chaminés, lancis ou cunhais; as madeiras de castanho, casquinha, de Leiria, da Flandres ou do Brasil, utilizada para soalhos, portas, janelas exteriores ou interiores; as alvenarias de pedra e cal, rijas ou menos rijas, de pano de tijolo ou fasqueadas; as ranhuras dos peitoris, os buracos dos parafusos nos caixilhos de vidraça, as ferragens para janelas e portas, os telhados mouriscados com as suas bordaduras; todos os elementos eram produzidos e aplicados em série, sem possibilidade ou vontade de os alterar, existindo preços precisos para cada um deles (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997; p. 62). 2.4.4. Para além da Baixa-Chiado, áreas de construção pós terramoto 1755 Após o terramoto de 1755 verificou-se um surto habitacional fora da área central da cidade, onde se construiria a Baixa. Apesar das directivas do Marquês de Pombal para a não edificação fora dos limites antigos da cidade, estas normas não foram cumpridas. Apesar dos constrangimentos da legislação, os proprietários dos chãos continuavam a demonstrar um enorme resistência ao seu cumprimento. Preferiam construir noutras áreas da cidade. Deste modo, paralelamente à Lisboa pombalina in stritu senso e à margem da ordenação urbanística da Casa do Risco, outra cidade se foi construindo nas freguesias de Santa Isabel, Lapa e Junqueira (cf. SILVA, Raquel Henriques, 2001; in ROSSA, Walter, ARAÚJO, Renata & CARITA, Helder, 2001; p.880). Os aforadores abrem rua, demarcam os lotes por iniciativa própria e constróem com a mesma liberdade. Edificando a ordem e simetria que se tinha já começado a fazer ao tempo de D. João V (cf. ROSSA, Walter,
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1998, p. 28 e seg. appud . SILVA, Raquel Henriques 2001; in ROSSA, Walter, ARAÚJO, Renata & CARITA, Hélder, 2001; p. 881) Os aforadores constróem “barracas” nobres, modestos edifícios de rendimento ou casas unifamiliares, geralmente envolvidos por quintais traseiros, que demonstram uma continuidade de opções construtivas tradicionais, onde o modelo despojado do pombalino quase não se faz sentir (cf. SILVA, Raquel Henriques, 2001; in ROSSA, Walter, ARAÚJO, Renata & CARITA, Helder, 2001; p. 881). Expressão disso é o crescimento do bairro da Lapa nos chãos das Trinas do Mocambo do Convento de Nossa Senhora da Soldade2 e das grandes propriedades da zona como sejam o Conde Redondo, D. Fernando Sousa Coutinho Castelo Branco Meneses. Tanto num como no outro caso, os aforamentos foram organizados em lotes de pequenas dimensões (cf. SILVA; Raquel Henriques; 1997; pp. 43-46). Cresce assim, fruto da actividade das Trinas, um conjunto de artérias, entre as quais as Ruas da Bela Vista — actual Rua do Quelhas — e de S. Domingos uma malha urbana a ocidente das Trinas. De acordo com Raquel Henriques da Silva (1997), o poder ver-se-ia obrigado a reconhecer este urbanismo empírico, que simultaneamente adoptava as normas tradicionais de loteamento e seguia os princípios eruditos em aplicação na Baixa. Esta situação demonstra o pouco alcance das intenções pombalinas fora da área de reconstrução da Baixa. A Casa do Risco apenas conseguiu concretizar pontualmente as intenções de Manuel da Maia. A cidade imaginada pelo referido arquitecto teria de ter tido para a sua execução um poder muito mais exclusivo e ditatorial do que o que na realidade existia. Desta forma, Inspecção das Obras Pública viu-se obrigada em aceitar os estes factos urbanísticos sucessivos, bem como os efectuados pela “Companhia Reedificadora”, entre S. Bento e a Cotovia, e pelos beneditinos e a sua vasta cerca (cf. SILVA, Raquel Henriques; 1997; pp. 46-47). Assim, nos anos de 1780 assiste-se na Cotovia à legalização dos aforamentos e edificações entretanto realizados. Dois elementos se afirmaram como dinamizadores da urbanização desta área: a casa de D. Rodrigo António de Noronha — numa enorme área definida pelas suas terras, entre a Praça da Alegria e Rua Direita da Fábrica das Sedas —, e, posteriormente, o Colégio dos Nobres. A actividade foreira na zona iniciara-se pelo menos desde 1753.
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Estas aproveitam a procura de chão seguros para edificação, característica da situação pós terramoto 1755 para iniciar em 1756, de acordo com Sarmento Matos, uma série de aforamentos de edifícios de pedra e cal. Prova dessa actividade é a placa foreira num edifício da Rua do Meio à Lapa, encimada pelo símbolo da cruz trinitária. Contudo a placa foreira do nº3 da Rua de S. Felix, datada de 1755, parece indicar que os aforamentos trinitários se iniciaram antes de 1756.
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O bairro articulava funcionalmente a Rua de S. Bento com a da Fábrica das Sedas e o sítio da Patriarcal da Queimada de acordo com um desenho que lembra o Bairro Alto. Desta forma e de acordo com Raquel Henriques da Silva (1997), não se vislumbrava nenhuma diferença entre as duas fases de construção desta zona — entre a Rua Nova da Piedade e a Rua do Arco — 3 e a envolvente descendente da Praça da Patriarcal da Queimada, quando do “Prospecto e alinhamento que para aquele Sítio Sua Magestade foi servida ordenar” (cf. SILVA, Raquel Henriques; 1997; pp. 47-49). A passagem da iniciativa privada para um maior controlo público não gerou nenhum corte no método de abertura de rua e no loteamento. Estes continuaram a executar-se num equilíbrio entre a a máxima racionalidade, as condicionantes das pré-existências e as possibilidades financeiras dos foreiros em relação à dimensão dos lotes. Neste caso, apenas existiram imposições de normalização relativas, o mesmo se observando no que concerne às soluções arquitectónicas, concretamente no que respeita à composição de fachadas. No decénio de 1780 a freguesia de Santa Isabel, onde se integrava a Cotovia, surge como uma área na sua maioria densamente construída e habitada. O século XIX apropriar-se-á enormemente deste bairro” (cf. SILVA; Raquel Henriques, 1997; p. 50). Um terceiro e activíssimo núcleo de edificação nos primeiros anos da regência de D. Maria é a envolvente da nova paroquial de Santa Isabel. Este bairro teve como génese o loteamento da Quinta de S. João dos Bem Casados, propriedade de Ayres de Sá e Mello, em 7 de Abril de 1780. Através da localização do lote sabe-se que a zona desanexada da Quinta já tinha como ruas designadas as de Santo Ambrósio, Sant’Ana, S. Joaquim e Santa Quitéria. A primeira desta ruas, e actual Rua D. Dinis, era o eixo fundamental de acesso à igreja e da sua articulação com a Rua direita do Rato, hoje a Rua do Sol ao Rato, e a Rua de Santa Quitéria, que marcava o limite entre a propriedade de Ayres de Sá e Mello e a dos Padres de S. Bento. Nesta última também se fizeram aforamentos e abertura de ruas ” (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997; p. 54). Noutras zonas de Lisboa surgiam novos focos de edificação seguindo a metodologia de aforar chãos rústicos. São disso exemplo as propriedades do Conde da Ega e Ayres de Saldanha de Albuquerque Coutinho Mattos e Noronha, localizadas na “Boa Hora”, a quinta de Nossa Senhora dos Prazeres pertencente a D. Izabel Francisca Xavier4, as terras do Convento da Visitação de Santa
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Quando a dinâmica imobiliária foi imprimida pelo morgado da Cotovia e pelo mestre pedreiro Luís António Seabra.
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Esta aforra para construção desde a rua de Nossa Sra. de Patrocínio à Quinta do Bauto. Posteriormente o seu neto continuará o aforamento até 1842, avançando através da Rua Nova dos Prazeres, até Campo de Ourique.
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Maria no lugar da Junqueira, as propriedades da Irmandade de Nossa Senhora da Ajuda de Belém situadas na estrada Real que vai de Alcantara até à Ajuda, as terras do Conde de S. Lourenço nas “Pedreiras de Alcântara” e no sítio de Alvito, com vias nomeadas de Cruz das Pedreiras, S. João Baptista, Rua de S. Jerónimo e da Pimenteira (cf. SILVA, Raquel Henriques ; 1997; pp. 56-57). Como é natural, dadas as diferentes características geológicas do solo em que se implanta este edificado, não é esperado o uso de estacaria, em virtude da inexistência de um lençol de água e de todas as questões que rodearam a construção na zona sinistrada que deu origem à Baixa pós 1758. Em 1862 procurava-se estabilizar o prospecto arquitectónico para a Rua Nova da Palma a partir de um edifício já lá existente, de fronte da Igreja do Socorro, com apenas dois andares. Pretendia-se que os edifícios edificados nessa rua não tivessem mais que três andares (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 422). A revolução de 1820 não teve repercussões imediatas na gestão da cidade. Todavia, acentuava-se a decadência das iniciativas cuja crise era notória desde a partida da Corte e da família real para o Brasil. Até 1833 a Intendência da Obras Públicas continua a funcionar mantendo as suas competências anteriores. Nas décadas de 1820 e 1830 as Obras Públicas procuram tomar uma posição contra as barracas edificadas nas ruas da cidade nova. Os autos de vistoria pedem a demolição das barracas que se tinham construído, alegando o facto dos seus prospectos serem reprováveis (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, pp. 223-224). A percepção de Lisboa ficaria incompleta sem referir que a cidade ainda não era metropolitana. Como permitem visionar as plantas de Filipe Folque (1856-1858), Lisboa ainda estava cercada de campo. Conforme alerta Raquel Henriques da Silva a civitas dimensionava o seu cosmopolitismo aos lugares determinados pela programação pombalina, ao aterro da Boavista — ao qual é inerente a Abertura da Avenida D. Calos I —, a S. João dos Bem Casados e ao elegante eixo do Chiado ao Rato (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, pp. 535-536). 2.4.5. A manutenção de uma prática até à chegada de Ressano Garcia Em 2 de Outubro de 1845, após o período vindo de 1834, com norma mas sem eficácia de obrigatoriedade, a Câmara Municipal vota a exigir a apresentação de prospectos de todas as obras particulares. Entre essa data e 1874, quando toda a repartição técnica foi enormemente alterada, por propostas de Frederico Ressano Garcia, existem de acordo com Raquel Henriques da Silva (1997) registados 2999 alçados, sendo que mais de dois terços respeitavam a ampliações, consistindo maioritariamente no acrescentamento de um ou dois pisos. Mesmo quando se trata
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das raras construções iniciais, os documentos gráficos apresentados são sumários. Consistem numa folha de cartão que inclui o desenho da fachada principal, uma pouco rigorosa escala em palmos e a literatura anexa. A memória descritiva restringe-se ao título do documento, nele constando o nome do proprietário, a localização e o objectivo da obra, “adicionamento” ou “edificação”. A autorização é expressa à margem com assinatura do técnico responsável, cargo. desempenhado por Malaquias Ferreira Leal, até 1854, por Pedro José Pezerat entre 1854 e 1867, por Domingos Parente da Silva de 1867 até 1874, data em que é substituído por Ressano Garcia. No referido cartão surge ainda a confirmação da vereação em exercício. Não existe rigor no uso das cores. Maioritariamente são o vermelho e o negro, que alternam o seu simbolismo, ora definindo anteriores existências ou alterações (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, pp. 490-491). Todo este empirismo se mantém entre 1777e 1874, fazendo supor uma atitude igual por parte da apreciação, fundamentada nas normas pombalinas, muito livremente interpretadas. A partir de 1852, com a chegada de Pezerat à Câmara, observa-se um desejo de tornar o processo mais rigoroso. Este dados coadjuvados pelo conturbado contexto político nacional são demonstrativos e justificativos da permanência de uma prática de fazer edificar que permanece até 1874. No quadro de um registo operativo dominado por uma certa rigidez a que estava implícita uma demorada reconstrução de parte da cidade, estes dados explicitam porque razão se procedia à edificação em palmos quando a legislação previa a entrada da unidade de medida metro em 1852, com prazo de aplicação dez anos depois. Desta forma, em 1859, o presidente Júlio Máximo Pimentel propõe que a “Comissão Técnica seja incumbida com premência de redigir as Bases de uma postura das construções civis, que procurava operacionalizar recomendações antes enunciadas pela Câmara dos Deputados, a partir do artigo 120, nº 7 do Código Administrativo sobre a edificação urbana. Estas iniciativas prendiamse não só com o aumento dos ritmos de construção e com a vontade de melhorar as condições de vida da cidade, mas também com o facto de o novo engenheiro, que passou a dividir com Malaquias Ferreira Leal a apreciação dos prospectos, Pezerat, não reconhecer ao “Arquitecto da Cidade” qualidade técnica e estética (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 491). O eminente confronto entre os dois técnicos seria resolvido pela morte de Malaquias Ferreira Leal no final do ano de 1854. Contudo, as alterações qualitativas mais significativas nesta matéria apenas se expressarão a partir da publicação do decreto lei de 1864 do Ministério das Obras
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Públicas. Este nas suas “Disposições relativas ás ruas e edificações no interior da cidades, vilas e povoações” definia um conjunto de normas técnicas gerais para a construção na cidade de Lisboa (SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 491). Embora sem carácter sistemático, sensivelmente a partir desta data, os prospectos passam a incluir plantas sumárias de distribuição interior e a sua aprovação a submeter-se à exigência, referenciada com formulário repetido na Câmara, de o proprietário mandar encanar as águas dos telhados para as manilhas das pias de despejo (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 492). O Intendente das Obras Públicas foi dividindo com a Câmara, até à chegada de Ressano Garcia a esta, a responsabilidade de edificação na cidade, opondo-se sistematicamente à alteração do prospecto da reconstrução pós-terramoto. A autoridade referida intimava o município por permitir aos construtores aumentar o número de pisos, após a aprovação dos prospectos, ou a sua edificação na cidade baixa, “com pé direito differente, cornijas e platibandas diversas” questionando-se se “não seria conveniente que a Ex.ma Camara adoptasse um typo para esses novos andares” (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 492). 2.4.6. A necessidade de um plano de Melhoramentos Sobretudo depois de 1850 o Governo e Câmara da cidade demostram, a par do empenhamento no aformoseamento de Lisboa, uma preocupação crescente pela sua mais profunda regeneração. Apesar de a capital manifestar um impulso demográfico significativo e de haver um progresso nas actividades industriais e comerciais, Lisboa continuava tolhida nas suas acessibilidades, sem redes de esgotos nem abastecimento de água suficiente. Havia ainda forte taxas de imigração cujos contigentes se aglomeravam nos bairros populares, degradadíssimos. Consequentemente surgiam quase anualmente surtos epidémicos concentrados, como acontecia em Alcântara devido à poluição da sua ribeira. Houve igualmente surtos generalizados nos anos de 1855-56 e 1857, marcados respectivamente pela cólera e pela febre amarela. A relativa rapidez com que se executou o aterro da Boavista deve-se ao choque provocado por esta expressiva conjuntura de morte. Esta fomentou também a discussão de um Plano de Melhoramentos. No entanto, o desenrolar do processo deste último seria bastante lento (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 422). Reflexo dessa morosidade é o facto de que desde 1864 até 1903 as “disposições relativas às ruas e edificações no interior de cidades, vilas e povoações” —constantes no decreto de 31 de Dezembro 1864 — e os regulamentos de salubridade das edificações fazerem alusão a esse Plano
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de Melhoramentos que há-de conformar o edificado, e simultaneamente estabelecem regras de uso imediato para suprir essa falta. 2.4.7. O edifício gaioleiro, entre o classicismo e o dealbar do Estado Novo 2.4.7.1. Enquadramento cronológico e características morfológicas De acordo com João Guilherme Appleton (2005), a designação gaioleiro refere-se à construção que se segue ao período pombalino e que subsiste até ao primeiro modernismo e à introdução do betão armado em Portugal. Isto é, o período abrangido entre a década de 70 de 1800 e os anos 30 do século XX (cf. APPLETON, João Guilherme, 2005, p. 10) Nós antecipamos no entanto a sua data inaugural para 1864. Data em que são promulgados o decretos de 31 de Dezembro que legisla o chanfro do cunhal dos edifícios, e o “plano de edificações e reedifcações em Lisboa: medidas geraes para se levar a effeito e prescrições de polícia”, “disposições relativas às ruas e edificações no interior de cidades, vilas e povoações” de 1864 — impresso em 1865 —, que regulamenta, entre outras coisas, as modas das cérceas dos imóveis de acordo com a largura da rua — ou ruas —, em que se implantam. O que define o gaioleiro é exactamente a sua hibricidade à medida que este caminha para o edifício de betão armado. Em termos de linguagem arquitectónica este edifício afasta-se progressivamente de uma arquitectura regimentada, igual que padronizou um classicismo na arquitectura corrente da cidade. Classicsimo não por que todos os edifícios tivessem pilastras, pois como sabemos nos edifícios de pequenas dimensões construídos durante a governação de Pombal e o período mariano por vezes elas não aparecem, mas porque eles se enquadram numa Idade Moderna e numa produção arquitectónica erudita feita para a mole da cidade. O aparecimento do edifício gaioleiro é lisível não só no que respeita aos aspectos construtivos, mas também na alteração das características morfológicas que ele comporta. Com a alteração da porporção entre os elementos de construção de alçado, em virtude das preocupações de salubridade que se vão sentindo, vemos surgir um edifício tendencialmente mais alto e de vãos mais esguios. Com a evolução das sensibilidades reguladoras vemos esses vãos alargarem-se. A regulamentação fixa alturas de pés direitos e de moda da cércea, padronizando essa esbelteza. O conformamento de uma linguagem beauxartiana dará aos alçados uma certa tectonicidade, particularmente visível nos panos de alçado que albergam as varandas, agora tornadas elementos bolbosos. A manutenção de um método construtivo num espaço de tempo tão prolongado e palco de mudanças tão vertiginosas, permitirá que essa mole receba o primeiro modernismo português.
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Nessa altura os vãos modificam-se e seu desenho torna-se mais subtil. A tripartição da fachada é uma figura que desaparece. Os últimos pisos, que aproveitam a cota habitável da cobertura e tiram a restante para dar lugar a uma pequena área aterraçada. Os gaioleiros surgem assim no tecido da cidade particularmente nas Avenidas Novas (1900-1930) nos bairros de cariz modernista como o Bairro Lopes — embora neste coexistam edifícios de modernismo radical com outros de estética Estado Novo — e, pontuando os tecidos já consolidados da urbe, como é visível no território de análise. No que respeita às Avenidas Novas, estas segmentam-se em três troços a saber: o conjunto Avenida Parque e quarteirões periféricos separado pelas ruas de S. José e S. Sebastião; o conjunto das Picoas tendo como eixo as Avenida Fontes, igualmente separado do troço seguinte pela Circunvalação (Duque de Ávila); o conjunto Avenida da República e quarteirões envolventes, terminando no seu prolongamento natural, o Campo Grande. O módulo base das Avenidas Novas é o edifício de rendimento. Contudo, a partir de 1910-15 generalizar-se-à, na expressão de José Manuel Fernandes, o “prédio para venda” (cf. FERNANDES, José Manuel in MOITA, Irisalva (coord.), 1994, pp.495-496). No que concerne ao Bairro Lopes (Fig. CAP.II-21), localizado no Alto de S. João. embora o loteamento inicial date dos anos 20 do século XX, a maioria dos edifícios deste bairro foi construída entre 1930 e 1958. Todavia, o parte do edificado do Bairro Lopes enquadra-se dentro do modernismo radical5.A planimetria dos seus 188 edifícios adapta-se à forma do terreno e do lote, mesmo que seja irregular. Os edifícios organizam-se em banda, por seis quarteirões paralelos à Rua Lopes, tendo uma forma rectangular a Sul e trapezoidal a Norte. A frente do lote é ocupada pelo edifício resultando um logradouro na traseira do lote. No miolo de cada quarteirão frequentemente existem passereles exteriores que fazem a ligação aos logradouros, construídos em socalco, onde os residentes têm pequenas hortas e árvores de fruto. Nas demais situações uma escada de ferro exterior ao edifício para todos os pisos dá acesso ao logradouro. 2.4.7.2. A continuidade dos 25 a 30 palmos de frente nos edifícios gaioleiros Por razões construtivas manteve-se durante o século XIX o loteamento regular de 25 a 30 palmos de frente de lote, correspondente às dimensões máximas que uma viga pode vencer sem apoios intermédios, apoiando-se unicamente em paredes mestras. Os gaioleiros que usam o mesmo sistema construtivo que o dito pombalino também mantêm os 25 a 30 palmos de frente. 5
A arquitectura modernista desenvolveu-se em Portugal entre a década de 20 e o início do anos 40, data em que se adoptou uma linguagem arquitectónica consentânea com os valores ideológicos nacionalistas e conservadores da época (cf. FERNANDES, José Manuel & JANEIRO, Maria de Lurdes, 1991; p. 10)
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2.4.7.3. Sistemas construtivos do gaioleiro, a ponte para a era do betão Em meados de Oitocentos surgem as primeiras experiências com o betão armado na construção europeia. São casos pontuais. Em Portugal o advento do betão armado dar-se-ia mais tarde. Os gaioleiros continuavam a ser os edifícios construídos entre os anos 80 de Oitocentos e os anos 30 do século XX. Contudo, desde finais de século o betão armado ía aparecendo em situações construtivas específicas e na execução de elementos decorativos, imitando os materiais nobres como a pedra (cf. FERNANDES José Manuel, 1993; pp. 25). O betão aparente na arquitectura portuguesa apenas apareceria no segundo ciclo do modernismo português, isto é, nos anos de 1950, época em o betão se banaliza. A partir da década de 20 do século XX, Portugal conseguiu assegurar a auto-suficiência do abastecimento de cimento no parque produtivo nacional. A produção de cimento iniciou-se em 1894 graças ao industrial António Teófilo de Araújo Rato. Este lançou as primeira amostras de cimento na fábrica de Alhandra. Entre 1912 e 1935 o engenheiro Francisco Xavier Esteves assumiu a gestão da empresa lançando-a numa fase de grande desenvolvimento. Entretanto a indústria belga já tinha obtido autorização para a fabricação do produto na Rasca, em terrenos da foz do Sado, com a produção garantida desde 1906. Pelo ano de 1920 Henrique Araújo de Sommer conseguiu fundar a Empresa de Cimentos de Leiria, em Macieira-Liz. O incremento dado a esta empresa possibilitou a construção da “Nova Fábrica” no ano de 1938. Esta seria o maior fornecedor de cimento do Centro e Norte do País (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo, vol. XIII; 1993; p. 577). Em 1918 surge o primeiro regulamento para a emprego do Beton Armado. liberdade de cálculo e de execução deste regulamento permitia usar espessuras de lajes mínimas de 8 cm, hoje esse mínimo situa-se nos 15 cm. No início da 1º década do século XX o uso de betão era restrito a partes da lajes, para suporte de modestas consolas, a cintas pontuais sobre os vãos. Progressivamente, o betão armado começa a ser usado em edifícios cada vez mais prestigiados, resolvendo aspectos estruturais na organização de espaços internos como o do cinema Tivoli, em Lisboa. Entre 1926 e 1928 pouco se construiu. Em 1928 a nova legislação protegia e isentava os construtores. Esta funcionou como um novo sopro na construção. Multiplicaram-se assim as construções de edifícios. Por esta altura o cimento nacional estava implementado no mercado português. Generaliza-se assim o uso do betão armado nos edifícios de habitação corrente,
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primeiro em Lisboa e depois no resto do país. O testemunho da época permite-nos ter uma noção mais correcta dessa mudança progressiva …“Correspondendo às vistas largas que o sábio legislador previu, os construtores lançaram-se com denodo aos novos empreendimentos, multiplicando-se as construções de prédios. Em reforço desse afã, veio ao seu encontro uma falange de bons engenheiros e arquitectos, de cujo conselho, orientado pelos conhecimentos adquiridos em cursos superiores, muito lucraram todos, isto é, construtores, operários e construções. Foi desta colaboração que se operou a mudança da antiga maneira de fazer, isto é do tosco de madeira e da pedra e cal, para a edificação de cimento armado. Aquando da publicação do decreto já referido, surgiu ocasionalmente, no mercado o cimento nacional, que rivalizava sem favor, com o importado do estrangeiro, sensivelmente mais caro. Tal facto constituiu um grande passo para o progresso…” (in POPULI, Filius, 1946 appud FERNANDES, José Manuel, 1993; p. 29) Por outro lado, o Regulamento Geral da Construção Urbana para a cidade de Lisboa de 1930 recomenda preferencialmente uso deste material na construção, embora tolerando a utilização da gaiola de madeira, comum nos edifícios de Lisboa da época. O mesmo regulamento adverte que, no entanto, as varandas, as coberturas, as escadas, os pavimentos de casas de banho, das cozinhas e dos respectivos anexos deveria, ser construídos em betão armado, por este ser um material impustrescível e não inflamável. Em 1935 um novo Regulamento do Betão Armado vem substituir o de 1918. O regulamento de 1935 só será rectificado em 1943 (cf. FERNANDES, José Manuel, 1993; p. 29). Estes factos permitem–nos inferir que no período abrangido pelos designados gaioleiros já há intromissões pontuais do betão. Há uma progressiva adulteração do modelo inicial do edifício gaioleiro. Segundo João Appleton, as paredes exteriores de fachada e de tardoz destes edifícios são ou de alvenaria ordinária de pedra irregular argamassada ou de tijolo maciço — caso das empenas e as paredes de saguões. No que concerne às paredes interiores estas são de dois tipos, a saber: a) paredes de alvenaria de tijolo precariamente confinada por uma malha ortogonal de montantes e travessas, estas últimas ao nível do pavimento e a uma cota intermédia e os primeiros no contorno de portas e nos topos; b) paredes de tabique de prancha ao alto fasquiado e rebocado. Verificam-se exemplares em que estas paredes, inclusivé as que recebem directamente os vigamentos dos pavimentos, são de tabique como os acima descritos (cf. APPLETON, João Guilherme; 2005; p.14).
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Os pavimentos são de madeira, usualmente de pinho ou de casquinha, orientados perpendicularmente à fachada. É frequente a utilização de vigamentos em peça única em toda a profundidade do imóvel. Os vigamentos apoiam simplesmente nas paredes alvenaria, é vulgar não haver o recurso a frechais, ou os vigamentos serem simplesmente pregados aos referidos frechais. Verifica-se o abandono sistemático das assembladuras características das construções pombalinas. As coberturas mantêm as estruturas de madeira que se adaptam às utilizações dos sotãos. Estas não respeitam a continuidade da estrutura subjacente. Adossadas ao tardoz, surgem normalmente varandas e marquises, para as quais se socorre de estruturas de ferro muito esbeltas. Os seus pavimentos são mistos, constituídos por vigas em I ou em T invertido e pequenas abóbadas de alvenaria de tijolo maciço interligadas por uma argamassa de cal e de cimento (cf. APPLETON, João Guilherme; 2005; p.14-15). É característico dos gaioleiros o adelgaçamento das paredes mestras à medida que progredimos do andar térreo para o último piso. Verificando-se situações em que as paredes de fachada deste último têm apenas 0.30m de espessura. Esta contrasta enormemente com os 0.90 a 0.80 m de espessura no piso térreo. Os revestimentos mantêm-se de reboco nas zonas correntes, verificando-se contudo, uma tendência para: o abandono do soco de pedra por fingimentos de argamassa e adopção de revestimento azulejar inclusivé nas fachadas (cf. APPLETON, João Guilherme; 2005; p.15). Esta última, como sabemos, já se tinha sentido como fuga a “monotonia que gela”. No que concerne aos revestimentos interiores de paredes e tectos o estuque leva a primazia, em soluções que vão desde a moldagem de formas e ornatos aos fingimentos dados por fresco, têmperas e escaiolas — estas últimas menos frequentemente (cf. APPLETON, João Guilherme; 2005; p.15). O estudo elaborado por João Guilherme Appleton sobre um quarteirão nas Avenidas Novas — compreendido pelas Avenidas da República, 5 de Outubro, Elias Garcia e Visconde Valmor — permite-nos perceber como eram lançadas as fundações dos gaioleiros. Estas eram construídas em alvenaria com argamassas constituídas por areia e cal na proporção aproximadamente de uma parte para o seu dobro. É usual encontrar-se a indicação de que os caboucos serão rasgados em terra firme. Jorge Segurado, no seu livro Edificações, recomenda que, sempre que o terreno firme está a grande profundidade, em vez de se optar por uma fundação com sapata a um lado para suporte das paredes de alvenaria, se levem os pilares ao firme — poços preenchidos com
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alvenaria — e sobre eles se construam arcarias que suportarão as paredes de alvenaria. (cf. APPLETON, João Guilherme; 2005; pp. 27-28). Nos edifícios dos primeiros 40 anos do século XX, tal como no século que o antecedeu verifica-se a utilização de tijolo maciço como material de construção das platibandas. O mesmo material é usado na construção das paredes, varandas e marquises. Os tectos, seguindo a tecnologia vinda de 1758 é composto por um fasquiado sobre qual são aplicadas as diferentes camadas até poder ser possível aplicar o estuque. adoptando a gramática decorativa consonante com o gosto vigente. No que diz respeito às fundações os dados encontrados para o edifício da Rua Sousa Viterbo, nº 11 (Fig. CAP.II-22) permitem percepcionar com estas eram resolvidas. Assim, a memória descritiva do primeiro projecto apresentado na Câmara Municipal de Lisboa refere a existência de fundações corridas em pedra rija e argamassa de cimento de traço 1:2.Todavia, um projecto de alterações posterior refere que se deveria proceder à demolição das ditas fundações sem apeamento das paredes e à sua consequente substituição por pilares de betão (argamassa de cimento de areia) de traço 1:3. Tais maciços funcionariam como verdadeiros pilares, aliados posteriormente às paredes resistentes. O número 11 da Rua Sousa Viterbo, antiga Rua B do Bairro Lopes, surge no final da década de trinta, datando o primeiro projecto de 1937. Este edifício pertence ao dito edifício tipo D do modernismo radical, com marcação da caixa de escadas através de superfícies de vidro em estrutura metálica. O imóvel tem um total de 8 fogos divididos ao longo de 4 pisos acima do solo. Implanta-se na parte dianteira do lote, como todos os outros do bairro, resultando na parte traseira um logradouro dividido entre os residentes do edifício. O edifício possui duas caixas de escadas que marcam tanto o alçado principal quanto o tardoz. A escada principal com estrutura em madeira, e a escada de salvação no alçado posterior, totalmente construída em ferro. A iluminação natural da escada principal é garantida por uma clarabóia e uma superfície vítrea que se adequa ao movimento da fachada. A organização interna do edifício respeita a uma tipologia esquerdo/direito e cada fogo dispõe de zonas húmidas localizadas na parte traseira. Cada módulo habitacional possui três assoalhadas sendo uma delas interior, sem ventilação nem iluminação natural. Para o período entre 1864 e 1920 admitimos duas fases distintas: a primeira de 1864 a 1900 e a segunda de 1900 a 1920. Entre elas separa-as a legislação — o Regulamento da Salubridade Urbana de 1902 —, e o fim das expropriações das Avenidas Novas e o início da sua construção em 1900. Para os anos subsequentes estabelecemos outras duas fases. Assim, e de acordo com Florbela Gomes Ferreira em termos construtivos no período que medeia os anos 20 e os anos 40 do século XX podem-se distinguir as seguintes fases construtivas do edificado de arquitectura
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corrente: o período do ferro e dos edifícios de cal e areia (1920-1930) e o dos edifícios mistos de alvenaria e betão armado (1930-1940). A primeira, de 1920 a 1930 trata-se de um período de transição no qual o edificado é construído por estruturas mistas de alvenaria e ferro. Os anos 20 a 30 do século XX caracterizam-se por um declínio geral da qualidade da construção gerado pela crise económica e financeira do pós guerra. pelo que os edifícios de rendimento desta época foram mimoseados com a designação de “prédios de cal e areia”. O decénio seguinte é marcado pela Lei do Inquilinato, promulgada pelo decreto 15289 de 30/03/1928, e pelo Regulamento Geral da Construção Urbana para a Cidade de Lisboa, de Agosto de 1930 — o qual viria a conhecer sucessivas edições e melhoramento até à edição do primeiro REGEU em 1951. A convergências destes dois permite uma rápida vulgarização do betão armado. Caminharemos assim progressivamente para uma laje de piso tipo integralmente em betão armado. Contudo, esta evolução construtiva marcaria já o período áureo da arquitectura Estado Novo pomposamente “inaugurada” com a Exposição do Mundo Português, em 1940, e posteriormente, os anos cinquenta, já com um vislumbre de uma primavera marcelista que afinal nunca vingaria. 2.4.8. Anomalias construtivas como diagnóstico de uma forma de construir As anomalias construtivas em edifícios habitacionais são inevitáveis. A sua lista tal como as causas que as provocam é extensa. O seu diagnóstico implica uma avaliação cuidada do objecto arquitectónico. Existem as anomalias que resultam do próprio envelhecimento natural do edifício, inerente ao seu ciclo de vida e dos materiais que o constituem, e as anomalias não naturais, isto é, as patologias estruturais e de fundações, provocadas por erros de projecto ou de construção ou com deficiências resultantes da escolha ou uso inadequado de materiais (cf. APPLETON, João, 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.103). As anomalias de carácter estrutural são hoje fundamentais pois funcionam como um diagnóstico da forma de construir. São estas que abordaremos a seguir. Contrariamente ao que sucedia aos construtores antigos, nem sempre a escolha do local de implantação foi a mais cuidadosa. A construção é feita por vezes neglicenciando a capacidade de carga do solo. Nos edifício antigos, as limitações e peso do próprio material usado tornava imprescindível que se atingisse o “firme” do terreno para fundear a construção, ou seja aera necessário atingir os estratos rochosos. Estas questão era particularmente premente quando se tratava de uma estrutura envolvendo arcarias assentes sobre pilares e colunas, sendo necessário encontrar estratos com resistência semelhante às alvenarias. Nestes edifícios as anomalias mais usuais são as que resultam de movimentos de assentamento por deformação vertical do solo, ou
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descalçamento do edifício provocado por lavagem e arrastamento dos finos do solo, descompressões — originadas por escavações ou escorregamentos e roturas de maciços terrosos (cf. APPLETON, João; 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.105). A visualização destas deficiências faz-se nas paredes, dado que, nestes casos elas se desaprumam, fendilham, abaulam e afundam. As causas mais comuns prendem-se com efeitos associados de alterações do escoamento de águas subterrâneas, não só das que provêm da infiltração e acumulação das águas da chuva, quer as provocadas por roturas das redes prediais de esgotos pluviais e domésticos, ou dos ramais das mesmas redes. Os assentamentos de fundações, provocam desaprumos de paredes exteriores, desnivelamento de pavimentos e fendilhações generalizadas em grau tanto maior quanto mais próximo estão de áreas de escavação terrosos (cf. APPLETON, João; 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.106). Nos edifícios antigos, as deficiências mais relevantes são as sentidas nas paredes e frontais tecidos, vigamentos de madeira de pavimentos, escadas, coberturas, elementos de ferro de vigamentos, tirantes gatos igualmente em ferro (cf. APPLETON, João; 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.106). Os impulsos horizontais induzidos pela estrutura das coberturas ou movimentos de origem sísmica então no cerne de desaprumos de paredes e sua fendilhação,. Esta separa paredes ortogonais. Decorrentes de situação deste tipo são o abaulamento de paredes em edifício muito antigos em que a rotação de uma parede não é constante ao longo do seu desenvolvimento. è necessário referir que uma parede pode manter-se indeformável nos cunhais — estando estes bem travados ou se form auxiliados por gatos e tirantes de ferro —, e mover-se na horizontal e, por rotação, noutras zonas não tão bem travadas(cf. APPLETON, João; 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.107). No caso particular dos edifícios designados de gaioleiros as paredes interiores, geralmente de tabiques de tijolo ou de prancha ao alto, tinham fundações muito precárias, pois a leveza das paredes assim parecia justificá-lo. Consequentemente, por negligência e falta de conhecimento dos construtores, essas fundações sofriam movimentos de assentamento desde o início da construção que se prolongavam por dezenas de anos. Estes danos eram agravados pelo amolecimento do solo, originado pela infiltração de águas provenientes de roturas das redes de esgotos. Esta deficiência dá origem a uma anomalia que se verifica no desnivelamento das vergas das portas e das suas bandeiras (cf. APPLETON, João; 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.106).
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Os problemas principais que se colocam nas paredes resistentes de alvenaria de tijolo maciço usadas na construção dos gaioleiros e nas estruturas de transição para betão armado prendem-se com o excesso de carga de estruturas muito esbeltas — sobretudo nas de meia vez —, e particularmente quando essa paredes suportam lajes pesadas de betão armado ou lajes mistas de ferro e alvenaria. É por isso comum verificarem-se fenómenos de esmagamento e de encurvatura destas paredes, com sinais mais evidentes de abaulamentos de rebocos e estuques (cf. APPLETON, João; 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.108). As platibandas, usuais na arquitectura corrente a partir de meados de Oitocentos como veremos no capítulo 3, são feitas em tijolo maciço que posteriormente é revestido. Os balaustres por sua vez são feitos em cerâmica vidrada. A aplicação do tijolo na construção das platibandas ainda é notada nos edifícios dos anos 30 do século XX, de que é expressão o Bairro Lopes. Característica das construções gaioleiras é o manterem- de os frontais de tipo pombalino em que, embora se mantenham aos prumos e travessas de madeira, se suprime as escoras diagonais. Consequentemente o efeito de humidificação destas paredes em áreas de instalação sanitárias e cozinhas origina frequentemente o apodrecimento e esmagamento das travessas de madeira e subsequente esmagamento das paredes, o empolamento de rebocos, o destacamento de azulejos, entre outros (cf. APPLETON, João; 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.108). Nestas paredes existe a possibilidade de roturas de ligações entre as paredes provocadas quer pela acção sísmica quer pelo assentamento, especialmente quando não há um embrincamento perfeito entre os panos de alvenaria. Nos edifícios antigos os pavimentos são de três grandes tipos, com variantes que dependem dos materiais estruturais e da sua organização. A solução mais comum são os pavimentos compostos por vigamentos de madeira colocados paralelamente uns aos outros. Nas soluções mais simples as vigas de madeira vencem o vão livre, são os vãos com dimensão não maior de que 6m. O afastamento entre as vigas é cerca de 0.40m, e com altura aproximada de 0.16m a 0.20 m e largura de entre 0.15m a 0.10m na construção (cf. APPLETON, João, 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.108). A anomalia mais comum nestes pavimentos é a deformação excessiva, por efeito da fluência do material ao longo tempo. Esta deficiência pode ser acentuada por diminuições de altura provocadas por ataques de fungos e insectos, ou ainda por cortes feitos para passagem e instalação de condutas de diversas redes. A destruição local de vigas de madeira na zona dos
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apoios, acentua este problema, criando desnivelamentos que põem em risco a segurança global do pavimento. A presença da água pode ser determinante. Esta ao ascender por capilaridade através do solo, ao infiltrar-se através das janelas e das coberturas ou através de zonas correntes das paredes exteriores, têm como consequência a anulação da função protectora destes elementos por degradação e perda dos pinturas e rebocos (cf. APPLETON, João, 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.108) Quando os vãos a vencer são superiores a 6 m, usualmente o que se encontra são pavimentos compostos. Nestas circunstâncias, o vão era dividido em dois ou mais tramos, realizando a estrutura com um conjunto de vigas primárias — de madeira de grande secção ou de ferro —, e vigas secundárias de madeira de secção corrente. Estes pavimentos apresentam problemas de deformabilidade excessiva com o grau consonante de complexidade que a sua estrutura tem (cf. APPLETON, João, 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.108). As abóbadas são elementos que podem constituir o suporte estrutural de pavimentos, nomeadamente em caves e pisos térreos, apresentando problemas muito específicos. As abóbadas são elementos pesados, que além do seu peso próprio suportam o de todo o edifício. Embora a sua geometria lhes permitam ter uma boa resistência à compressão, as abóbadas são particularmente sensíveis a esforços, situações que gerem nelas esforços de tracção. Deste modo, as anomalias mais frequentes nestes elementos são os fendilhamentos, a perda da sua geometria inicial, os movimentos estruturais, horizontais e verticais das estrutura de suporte, paredes e pilares, colunas e contrafortes tem (cf. APPLETON, João, 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.109). A acção da água em abóbadas pode ter duas consequências: o aumento de carga da estrutura por empapamento dos carregos, a deterioração das capacidades resistentes das abóbadas pela acção de desgaste e degradação dos materiais constituintes das abóbadas, nomeadamente por dissolução e arrastamento. Os tirantes podem funcionar com limitativos dos movimentos das paredes e consequentemente das abóbadas. A corrosão dos primeiros acentuaram a gravidade das anomalias já referidas. No que respeita às abóbadas, é necessário mencionar o cariz iteractivo das suas anomalias. Quando se verifica a fendilhação de paredes ou pilares as abóbadas fendilham e deformam-se. Subsequentemente transmitem-se novos esforços aos elementos de suporte e em função disso observam-se deslocamentos deste últimos. Deste modo agravam-se as deficiências
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das abóbadas. O périplo termina com o colapso da estrutura se houver operações de consolidação e de reforço (cf. APPLETON, João, 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.109). O uso de tirantes destinados a absorver as tracções é uma situação corrente em muito do edificado, visível mesmo em situações interiores, como observamos na “sala das plantas cartográficas” do Palácio Beau Séjour, onde funciona o Gabinete de Estudos Olisiponenses. Os pavimentos são construídos com base em estruturas de ferro, características do final de Oitocentos e primeiras décadas do século XX. Essas mesmas estruturas de ferro são usadas para construir colunas e escadas nos edifícios. Estes pavimentos, utilizados em piso de cozinhas, instalações sanitárias e marquizes normalmente adossadas à traseira dos edifícios, têm dois problemas fundamentais a corrosão do ferro, provocada pela água, que atinge a zona desses vigamentos e a corrosão do ferro atinge as ligações e apoios. Em ambos os casos a corrosão é acentuada pela presença de elementos como cloretos, por exemplo, que originam a delaminação do metal com consequente perda de secção e de resistência mecânica. Quando estes elementos metálicos estão chumbados à alvenaria ou à pedra, o volume provocado pela sua corrosão, origina esforços internos que se traduzem na fendilhação, fractura e maior exposição desses elementos aos elementos agressivos (cf. APPLETON, João, 1998; in COUCEIRO, João (coord.); pp.109-110). A água origina igualmente anomalias nos elementos de alvenaria, de argamassa ou de betão pobre que preenchem os espaços entre as vigas de ferro. A corrosão do aço, a fendilhação, o empolamento e delaminação do betão são os problemas fundamentais que se observam nas lajes de betão armado usadas em cozinhas e instalações sanitárias, quando o betão começou a ser utilizado. Estas situações são agravadas pela pouca espessura que estas lages apresentam, 0.080 a 0.10 m de espessura (cf. APPLETON, João, 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.110). No que concerne às coberturas os seus problemas estruturais são de dois tipos, usualmente interligados. A fluência da madeira, como o próprio termo indica levará à sua deformação progressiva e contínua, Esta originará movimentos de estruturas secundárias (madres, varas e ripas) e do revestimento das telhas. Estas últimas deslocam-se e partem-se ou perdem a pendente conveniente. Desta forma, as águas das chuvas encontram campo livre para entrar, sem que a cobertura tenha capacidade para as escoar. Esta fica necessariamente atreita a ataques de fungos e insectos, resultando na perda de secção, infiltrações e deformações, num ciclo que quando não é quebrado resulta, no colapso da cobertura (cf. APPLETON, João, 1998; in COUCEIRO, João (coord.); p.110).
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HOJE DESENHO-ME À TUA IMAGEM. APENAS PARA TI, LISBOA. VANDA PEREIRA DE MATOS
CAPÍTULO III - DA COTOVIA AO RATO - ANÁLISE DO EDIFICADO 3.1. O território de análise O território de análise escolhido é o da Cotovia ao Rato, tal como foi definido na segunda metade do século XVIII. Para estabelecimento de edifícios referenciais recorreu-se a edificações fora do território de estudo. Para a análise da legislação do edificado estabelecemos diferentes balizas cronológicas que se prendem com os sistemas construtivos usados e o desenho de proporção entre elementos inerente a cada um desses períodos. A partir do pós Guerra o hiato de tempo até 1940 é dividido por decénios. Para construir a imagem do edificado e sua planta distributiva, e em particular a do Bairro Pombal, recorremos a alguns documentos constantes na tese de doutoramento de Raquel Henriques da Silva (1997), agora vistos numa nova abordagem, para além de documentação inédita. 3.2. Aspectos de cariz evolutivo 3.2.1. Do edifício bipartido à unidade de quarteirão A parcela urbana que ocupa cada edifício condiciona a sua imagem. Durante o século XIX tal como anteriormente existem edifícios de alçado muito estreito, vicissitude do aforamento que foi feito e da sua divisão “em fatiota”. É exemplo disso o nº 37 A, sito na Rua do Meio à Lapa (Fig. CAP.III-1) e os bipartidos das Ruas Maestro Pedro de Freitas Branco nº 10-12 (Fig. CAP.III-2) e Cecílio de Sousa nº 77-79 (Fig. CAP.III-3). Por outro lado a figura do grande edifício de rendimento continua a tomar forma na cidade. Ele é visível dentro do tecido consolidado da Bica. É prenunciado, na forma como seria delineado durante a governação de Pombal, pelos alçados joaninos constantes . Livº 1 de Cons e Decr. de D. João V. Senado ocidental, fl. 22o (cota131). AHCML. — Rua dos
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Ourives do Ouro. Alçado dos novos edifícios (Fig. CAP.III-4). Podemos observar
a sua
apropriação, fora do tecido da Baixa-Chiado, no imóvel localizado na Calçada da Estrela/ Rua de S. Bento nº 53-101/ Rua Garção Correia (Fig. CAP.III-5). Esta figura do grande edifício de rendimento haveria de ter continuação no século XIX como é expressão o edifício em Santos Largo Vitorino Damásio, 1- 4/ Avenida D. Carlos I, 5–49/ Avenida 24 de Julho, 50–56 B/ Largo Santos, 13–15, que ocupa por completo o quarteirão (Fig. CAP.III-6). Curiosamente, na Lisboa protagonizada pelo plano de Ressano Garcia, essa figura desaparece. O movimento modernista português também não a constrói. Contudo, o “Português Suave”1 haveria de a retomar de que é expressão conjunto Praça do Areeiro (actual Praça Francisco Sá Carneiro)/ Avenida João XXI/ Avenida Almirante Gago Coutinho, obra de Estado (Fig. CAP.III-7). 3.2.2. Edifício da segunda metade do século XVIII, o legado à beira de 1755 O documento normativo de 1785 Bahia2 apresentado por nós em 2003 (cf. MATOS, Vanda Pereira, 2003) e apenso a este trabalho, refere dois tipos de edifício, um dos quais se identifica com a figura do edifício de rendimento. É-nos dada a imagem de um edifício de dois ou três pisos organizado em loges, primeiro e segundo andares. A designação loje ou loja refere-se ao piso térreo. O primeiro andar é o piso que se segue à sobreloja. No entanto como referido no mesmo trabalho, a sobreloja podia ser por vezes suprimida. Embora a data seja tardia ele reflecte o edifício de rendimento produzido no Reino, e mais particularmente em Lisboa à beira do terramoto de 1755. A organização vertical do edifício de rendimento parece-nos algo semelhante à dos edifícios de rendimento da Lisboa romântica. Contudo, nos primeiros, não existe uma hierarquização de fachadas. 3.2.3. A fachada tripartida Como referenciado por nós em 2003 a tripartição da fachada é uma característica que se verifica nos edifícios do século XVI à 1ª metade do século XVIII (cf. MATOS, Vanda Pereira, 2003). Persiste, contudo, nos edifícios do século XIX. A tripartição de fachada, confirmada no núcleo urbano por nós estudado em 2003 (Fig. CAP.III-8), é também observável no edifício nº 17/23 da Rua de S. João da João da Mata (Fig. CAP.III-9) referenciado por António Miranda em 1996 (cf. 1
Nome porque é conhecida a arquitectura do Estado Novo.
2
Apesar da data do documento bahiano, este não se encontra descontextualizado da realidade do território nacional beira de 1755 e mais concretamente de Lisboa, pois, como sabemos, a gestão de um território imenso fora da Metrópole tinha outras vicissitudes.
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MIRANDA; António in CARVALHO, José Silva (dir.), 1996). Este edifício integralmente revestido a forro azulejar, de fachada simétrica, apresenta um alçado visualmente tripartido. Esta tripartição da fachada é novamente mencionada por Raquel Henriques da Silva,. no entanto referente a palacetes (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, pp. 501-502 e p. 507). Estes dois dados, mencionados pelos acima referidos investigadores, permitem perceber a tripartição de fachada como um fenómeno extensível a todo o edificado urbano até à Lisboa de Ressano Garcia. Contudo, como se verá, nós atribuímos outro signifcado, à tripartição da fachada, para além da partição de alçado marcada por pilastras. 3.2.4. O fim de um sistema de vistas, a liberdade de moda de cércea e de fenestrar A traseiras dos edifícios modernistas não eram compreensíveis se a distância entre edifícios opostos não fosse tão grande pois estariam a tirar a privacidade do vizinho de fronte. As alturas totais dos edifícios não seriam compreensíveis sem o fim das zenonianas de que os alçados da Rua dos Ourives do Ouro já anunciam (Livº 1 de Cons e Decr. de D. João V. Senado ocidental, fl. 22o; AHCML.). Fica a liberdade de construir em altura no tecido consolidado da cidade primeiro de acordo com a regimentação vigente e depois, com fim da almoçataria, segundo a regulamentação para o edificado de Lisboa patente nos regulamentos de salubridade da edificação urbana e outras disposições ordenadoras. Os próprios quarteirões das Avenidas Novas já prenunciam características de lote que irão ser continuadas. É a distância longa entre edifícios de frentes opostas de quarteirão que torna viável as enormes superfícies envidraçadas das marquises sem as quais o edificado modernista e a sua luminosidade seriam inimagináveis. Reforçando este desafogamento de vista dos logradouros públicos, o artigo 97 do Regulamento Geral da Construção urbana para Cidade de Lisboa refere que não é permitida qualquer construção sobre cortinas ou parapeitos de logradouros públicos. Acresce ainda que as cortinas ou parapeitos referidos não podem ser erigidos mais de 1 m acima do solo. 3.2.5. As métricas Com a adopção do metro e as novas preocupações de salubridade das edificações, as proporções interiores das divisões modificaram-se. Por outro, lado a obrigatoriedade de pés direitos mínimos veio modificar as modas de cérceas e as relações de proporção entre os vários elementos constituintes de alçado. A obrigatoriedade de passeios libertou o piso térreo dos 16 palmos de altura para a passagem das carruagens. Estes tinham sido definidos pelo assento de vereação de
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14 de outubro de 1718 e persistido na legislação definida pelo decreto de 12 de Maio de 1758. Mais tarde, a introdução e generalização do automóvel tornou essa questão uma preocupação de outra época — a da civilização do cavalo. Por outro lado as próprias varandas das janelas de sacada, que antes tinham de ser recolhidas com a paredes para que as carruagens passassem, puderam ganhar outra liberdade e expressividade, assim que a vontade estética e a regulamentação o permitiram. A obrigatoriedade de arejamento e ventilação das divisões obriga a uma maior superfície de fachada livre para ser fenestrada, quer no que toca a fachadas expostas à via pública, quer às escondidas do transeunte. Tal é visível na legislação de 1903. Por outro lado, a própria medida de parcela urbana para cada edifício dentro do quarteirão é modificada. O Bairro Lopes é muito elucidativo nessa questão. O conjunto edifício/logradouro apresenta outras métricas, pois há a premência de obedecer a outro valores: o da salubridade das edificações, e o da nova qualidade de vida que cada habitante/ família deveria usufruir dentro da habitação. Dentro de tecidos consolidados, o edificado novo obedece a essas regras dentro da parcela urbana a que está confinado. 3.2.6. Os escoadouros Em parte do século XIX, aparecem escoadouros nas soleiras dos vãos de entrada. Esta figura desaparece ainda no século XIX, não sendo retomada posteriormente (Fig. CAP.III-10) 3.3. Edificado de 1758 a1859 3.3.1. A imagem do edificado 3.3.1.1. A permanência de balcões térreos e superiores A permanência de balcões térreos e superiores no edificado é alvo de atenção por parte da legislação camarária. Estes na opinião vigente na época desfeavam a estética de diversas ruas e habitações de Lisboa. Os pedidos são vários para a demolição dos balcões que saíam fora do nível das paredes, dado que da sua existência resultava prejuízos para a intimidade dos vizinhos. Acresce que os transeuntes também eram prejudicados, uma vez que os balcões cortavam o passeio. O mesmo prejuízo sucedia com as portas que abriam para fora. Assim, no Edital de 9 de Março de 1835 determinava-se que os guarda-pós e balcões fossem demolidos até 30 de Junho de 1835, proibindo-se igualmente daí em diante a construção de portas abertas para o exterior. (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo; vol. VIII, 1995, p. 235). Este edital conjuntamente com a documentação com data de 30 de Janeiro de 1791, que
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seguidamente apresentamos, demonstra bem que apesar da proibição dos balcões e balcoadas pelo Marquês de Pombal, após o seu afastamento, em 1777, estes elementos balançados sobre a via pública teimaram em persistir, pelo menos no que diz respeito aos guarda-pós e balcões. O contrato de obra e obrigação de 31 de Dezembro de 1791 é disso expressão: ”…Por elles partes foi dito (…) q. tendo elle Francisco Costa Chaves rematado na dita rua dos ourives do ouro hum chão do lado Nascente, defronte do quarteirão da Igr.a de N. Sra. da Vitória, com tres portas de frente (…) e querendo edeficar propriedade a fundamentis se ajustava com elles mestres em lhe dar de empreitada a carga serrada pelo preço e debaixo das condiçoens clausulas e obrig. es seguintes (…) Haverá seu coberto sobre o passeyo e balcoens sendo precizo (…) havera sottos sobre algumas cazas e se estes forem forrados seraõ a encher; toda a frontaria pintada de verde como hé estilo…” (cf. ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório 11. Cx. 153, livro 7120, pag. 623-625 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp.628-629). Em 1857 é novamente mencionado que são probidos os balcões (cf. Annaes do Município de Lisboa 1856-1859). Contudo, essa proibição parece não ter grande aceitação pois ainda em 1930, no artigo 95 do Regulamento Geral da Construção urbana para Cidade de Lisboa, se proíbe que as frontarias dos pavimentos sobre a via pública tenham, entre outros itens, balcões “saindo para fora das ombreiras”. 3.3.1.2. A construção de passeios Em 1840 são calcetadas as ruas de Lisboa (cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo; vol. VIII, 1995, p. 235). Esta modificação da cota de pavimento do passeio público vai alterar a cota de soleira dos edifícios construídos face ao nível do pavimento e consequentemente a sua leitura de alçado. 3.3.1.3. As placas foreiras e a divisão administrativa Com a extinção das ordens religiosas em 1834, terminou uma forma de divisão administrativa da cidade por paróquias. Este facto poderá estar na origem do desuso das placas foreiras. Estas demarcavam o território que pertencia a cada paróquia, sendo possível vê-las nalguns edifícios do século XV à 1ª metade do século XVIII e no pós 1755 Existem as placas foreiras que se poderiam designar como marcas de aforador, como a “ANDRADA F 600 RS” visível na Rua da Rosa nº 213217, ou a placa foreira com as letras inscritas C.R.N. no edifício da Rua da Escola Politécnica nº 43 tornejando para a Rua de S. Marçal (Fig. CAP.III-11), esta marcando aforamentos pertencente ao Real Colégio dos Nobres como esclarece o documento de 23 de Setembro de 1779 relativo a
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aforamentos na Cotovia de Cima: “…Que todos os Emfiteutas q. neste Prazo succederem seram obrigados a terem e conservarem no prospecto das mesma Cazas hum Padrão de pedra, em q. estejam gravadas as Letras Seguintes= C.R.N.= E extinguindose o d.o Padram logo o Foreiro q. o possuhir mandará pôr outro à sua custa, e isto tantas vezes quantas vezes os taes cazos succederem, para melhor conhecimento deste Prazo (…)”. (cf ANTT, Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 4, Cx. 10, Livro 50, p.86v-87v appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp. 597-598). Não deixa de ser elucidativa da vitalidade deste sistema a placa forreira datada de 1830, sita no nº 30 da Travessa da Palmeira. Expressão destas marcas de aforador é, igualmente, o excerto do documento datado de 27 de Maio de 1785, relativo a um aforamento de duas terras “misticas ao Arco do Carvalhão” no então surbúrbio de Lisboa: “…Porem no cazo das ditas Cazas perecerem por agoa, fogo, terremotos, ou outro qualquer acontecimento, as tornarão a re-edificar pondo-as no proprio, ou milhor estado em q. antes estavão; e na porta prinicipal das Cazas que fizerem porão um letreiro que diga - Peixoto- e não poderão os Subemfiteutas vender trespassar o Seu Domínio Util sem Licença dos Enfiteutas principais (…) e do preço por que assim se vender pagarão o primeiro Laudemio de vintena aos Senhorios Diurectos do Prazo principal por assim lhes tocar na forma do aforamento feito aos ditos Miguel Mendes da Costa e Sua mulher. (…)” (cf ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório nº1. Cx. 132, livro 627, pag. 61 v-62 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp.610-611). Por outro lado, existem as que poderíamos denominar de marcas de paróquia, visíveis em casos como a Rua da Bica de Duarte Belo dizendo “SEE”; na rua da Atalaia nº 185-188 dizendo igualmente “SEE”; ou na Rua de S. Felix nº 3 dizendo “TRINAS, Nº 339 1755”(Fig. CAP.III-12), ou ainda a placa foreira num edifício da Rua do meio à Lapa nº 16, encimada pelo símbolo da cruz trinitária (Fig. CAP.III-13). Ilustrativo disso é o excerto do documento que seguidamente apresentamos datado de 14 de Junho de 1784 relativo a aforamentos a realizar em “terras na estrada Real, que vay de Alcantara para a Ajuda no Cytio do Senhor Jezus do Cruzeiro”: “…E logo por elle Valentim dos Reys foi dito (…) que entre os bens de que a dita Irmandade (…) he Senhora e possuidora, e de que está de mança, e pacifica posse de tempo immemorial a esta parte, Saõ humas terras na estrada Real, que vay de Alcantara para a Ajuda no Cytio do Senhor Jezus do Cruzeiro, que por terem pouco rendimento, e muitas pessoas pertenderem nellas edificar cazas, se rezolvera a dita Irmandade a aforalas em Prazos divedidos, (…), Que o dito foreiro fechará o dito chaõ em Roda , tomando sobre Sy as agoas pelo modo q. lhe parecer, sem deitar as mesmas agoas, nem outra couza alguma para os predios mais vizinhos Enfiteutas das ditas terras,
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nem lhes poderá embarassar o edificarem, e levantarem as Suas propriedades como quiserem (…). Que sobre a porta principal das Cazas será elle foreiro obrigado a pôr um hum Letreiro esculpido em pedra que diga – Foreiras â Irmandade de Nossa Senhora da Ajuda – com o seu numaro que seguir aos mais Prazos (…)”.(cf. ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório nº1. Cx. 132, livro 624, pag. 23 v-24 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; p. 615). Outra possível causa para a definitiva extinção das placas foreiras prende-se com a posta domiciliária. Nos primeiros decénios de Oitocentos tentou-se por diversas vezes organizar a posta domiciliária em Lisboa. Nesse sentido, em 1801 é feito um primeiro regulamento. (cf. VIDAL, Fréderic; in CORDEIRO, Graça Índias & VIDAL, Fréderic, 2008, p.68). A Posta Domiciliária irá conduzir à divisão da cidade em distritos postais. A que correspondem placas de numeração colocadas no edificado. A esta divisão está subjacente a atribuição de números de polícia a toda a edilicia, vista como uma questão de serviço público tal como a organização de uma posta domiciliária, mencionada na portaria de 1843. Em 1801, a administração dos Correios tinha dividido a cidade em 17 distritos, em 1821 eram 18 (cf. VIDAL, Fréderic; in CORDEIRO, Graça Índias & VIDAL, Fréderic, 2008, pp.65-68). Em 1801 os Correios colocam no início de cada rua placas identificadoras do nome da mesma, introduzindo regras vinculativas para a descrição dos arruamentos (cf. MADUREIRA, Nuno Luís; 1992; p.51). Refira-se que, ainda em 1764 nas décimas de maneio de S. Mamede — Livro que hade servir p.a o lancamento dos maneyos das freguesias de S. Cristovao, S. Lourenço, S. Mamede —, ainda não eram mencionados os nomes das ruas. Em 1817 a subdirecção dos correios executa um documento denominado “Ruas, travessas, becos, classificados como tais e a identificação do número do districto a que pertencem” (cf. VIDAL, Fréderic; in CORDEIRO, Graça Índias & VIDAL, Fréderic, 2008, p. 71) Em 1855, o governador civil regulamentou de modo definitivo a forma de numeração das portas dos edifícios (cf. VIDAL, Fréderic; in CORDEIRO, Graça Índias & VIDAL, Fréderic, 2008, p.65). Corroborativo da actuação efectiva desta normativa é o facto de que, se em 1800 e em 1816, os registos notariais de Lisboa não mencionavam o número de porta dos notariantes, em 11 de Novembro de 1818, pela primeira vez o número de polícia é regra nos registos notariais de Lisboa (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1; caixa 132; Livro 610, Arquivo Nacional da Torre do Tombo) Na consulta relativamente aos anos de 1829 a 1831 o número de polícia é uma realidade efectiva. (cf. Registos Notariais de Lisboa, Livro de notas; Cartório 1, maço 57; caixa 123; Livro 561 a 565, Arquivo Nacional da Torre do Tombo e Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 64, Livro de notas; caixa 137; Livro
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631, folha 6, Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Em Agosto de 1859 ainda se pedia para regularizar a numeração dos “predios”, e alterar as inscrições das ruas, que conservavam dois ou mais nomes (cf. Annaes do Municipio de Lisboa 1856-1859; Agosto de 1959, pp.393-396). Existem caixas para recolha de cartas que são via de regra colocadas em lojas que “gozam de mais crédito”, usualmente a mercearia de bairro. Assim sendo, a intervenção dos habitantes de cada distrito postal é necessária (cf. VIDAL, Fréderic; in CORDEIRO, Graça Índias & VIDAL, Fréderic, 2008, p. 73). Por outro lado, verifica-se uma secularização dos espaços urbanos: diocese passa a ser referida como concelho, o que conduz a uma alteração considerável do valor da informação recolhida (cf. VIDAL, Fréderic; in CORDEIRO, Graça Índias & VIDAL, Fréderic, 2008, p. 75). Os indivíduos são conectados ao espaço urbano através da referência à rua e ao domicílio. A atribuição nome de rua/ nº de polícia/ fogo, estará completamente resolvida no início do século XX e assimilada pelos cidadãos, como comprovam a instalação de caixas de correio nas caixas de escadas dos edifícios das Avenidas Novas de Lisboa. Expressão da importância dos Correios é o uso do palácio Marim-Olhão, como sede dos mesmos entre 1801 e 1881, derivando daí a designação de Palácio dos Correios Velhos (cf. VALE, Teresa & FERREIRA, Maria; DGEMN, 2000). Este imóvel, inserido dentro do território de análise, chegando parcialmente construído às vésperas de 1755, danificado pelo terramoto, seria posteriormente reconstruído (cf. MIRANDA, António; OCTÁVIO, Clementino; MATOS, Rui; COELHO Teresa Campos; CARVALHO, José Silva; 2001) 3.3.1.4. O revestimento azulejar das fachadas O edifício da Rua S. João da Mata 17/23, edificado nos inícios de Oitocentos é uma peça que marca o início de uma atitude estética: o revestimento azulejar das fachadas do edificado, cuja tendência só se generaliza a partir de 1850 (cf. MIRANDA, António (1996), in CARVALHO, José da Silva (dir.), 1996). Além dos recursos de ornamentação escultórica e da diversificação do desenho dos vãos, utilizados em casas de qualidade, a vontade de particularizar as fachadas expressou-se na arquitectura corrente na moda de as azulejar na íntegra, de acordo com uma variedade inesgotável de modos compositivos. A fachadas azulejadas são a mais expressiva manifestação da Lisboa romântica, passando para o contacto com a rua uma tradição erudita de decoração de interiores e de jardins, democratizando-a e participando na sua industrialização (cf. SILVA, Raquel Henriques da, 1997, p. 509). Vemo-lo continuar como elemento decorativo de fachadas dos edifícios no
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nosso período Arte Nova. Significativo das mudanças das sensibilidades é o facto de no segundo período Avenidas Novas (1917 a 1920) — tendo em vista dois períodos (1913-14 e 1917-1920) em que se concentrou especialmente a construção das mesmas —, se abandonarem determinados elementos decorativos tradicionais. Desta forma, o azulejo que enriquecia as volumetrias mais pobres tende a desaparecer. As estreitas faixas de demarcação de pisos ou da linha de cimalha, é substituída por decorações em estuque e pelo maior dinamismo das cantarias (cf. SILVA, Maria Raquel Henriques da, 1985; pp.143-144). Tem-se atribuído a introdução do hábito de revestir as fachadas dos edifícios de azulejos de padrão nas fachadas dos edifício aos designados “brasileiros”. Este hábito característico da segunda metade do século XIX, trouxe para Lisboa azulejos de meio relevo e de relevo originário das fábricas portuenses de então. Estes, por determinarem um gosto de época e pela sua raridade em Lisboa, conformam parte da imagem do edificado. Servem igualmente como elementos de datação da vivência do mesmo. Através do inquérito Industrial elaborado em 1881, ficamos a saber quais as fábricas que produziam azulejos em Vila Nova de Gaia e no Porto. São referidas as de Desvezas, Santo António de Vale da Piedade, tidas como as mais preponderantes, mas também as de Senhor de Além e Massarelos. Esta última foi a primeira fábrica nortenha a produzir azulejos para fachada, e por sinal aqueles que são os mais típicos da produção portuense: os de padronagem relevada, feitos com um processo de fabrico pré-industrial em que o efeito de relevo era obtido pela pressão dos dedos (cf. MONTEIRO, João Pedro, 2001; p. 39). Posteriormente formatava-se a argila através da marcação de moldes com volume. Os azulejos de fachada de meio relevo foram produzidos pelas fábricas de Sacavém, Desterro e Devezas. Por seu turno, os de relevo mais pronunciados foram produzidos apenas no Norte do País, nas fábricas de Desvezas, Carvalhinho e Massarelos. Dai se justifica o seu carácter de excepção nas fachadas lisboetas (cf. MONTEIRO, João Pedro, 2001; p.41). A azulejaria semi-industrial teve o seu apogeu entre 1850 e 1920, data a partir da qual a sua produção entra em declínio dado o aparecimento de novos materiais de revestimento. Contudo, nalgumas fábricas do centro portuense de que é expressão a do Carvallhinho, a produção mantevese até mais tarde. Na década de 1870 surgem novos métodos para a produção em série de azulejos (cf. MELO, Manuela; VASCONCELOS, Maria João & SARSFIELD, Graça, 1997).
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Os azulejos meio relevados são visíveis na Rua do Poço dos Negros nº 105 A (Fig. CAP.III-14) e nº 149 (Fig. CAP.III-15). Por outro lado a presença de azulejos relevados na Rua do Quelhas nº 19 (Fig. CAP.III-16) — palácio do Machadinho —, faria supor a presença dos mesmos no território da Cotovia ao Rato e mais particularmente no Bairro Pombal. Contudo, tal não se verificou. Fica por isso a nota de uma presença pontual, embora visualmente muito rica no edificado em análise. Por norma, o revestimento azulejar na Cotovia ao Rato é bidimensional, salvaguarde-se o edifício de gaveto Travessa do Abarracamento de Peniche/ Travessa da Palmeira, cujos extremos dos azulejos são em bisel (Fig. CAP.III-17). 3.3.1.5. Janelas de rótula Uma das iniciativas tomadas pelo Marquês de Pombal foi a proibição do uso de balcões e balcoadas, contudo as janelas de gelosias, por funcionarem como persianas não foram proibidas. Assim não é de estranhar que em 1795 seja pedido que as janelas de um edifício a reedificar sejam de rótulas: “(…) Que as ditas Cazas q. de novo se edificarem ocuparão o ambito de trinta palmos de frente e trinta e nove de fundo, entrando o grosso das paredes, e constarão de duas Loges na frente q. he da parte do Poente, cada huma com o seu sobrado por sima., e sua escada ao meyo para serventia dos quatro moradores das loges, e escada tera tão bem seus umbrais de pedra e da parte Nascente terão duas portas e duas janelas tão bem com ombreiras de pedraria = Que quatro janelas serão de rótulas e duas de caixilhos de vidrassas, tudo madeira de flandres e as sete portas da mesma madeira; (…)” (cf. ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório 11. Cx. 136, livro 642, pag. 75v-76 appud
SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp.629-630)
Surpreendente, no contexto do dealbar do Estado Novo, é a persistência de janelas de gelosias na Rua de S. Bento na década de 40 do século XX. O seu desaparecimento, a sua não manutenção, é contudo vicissitude das sensibilidades da época. Assim se justifica a reforça o facto de terem subsistido, à data do seu registo fotográfico em 1900, as gelosias na Rua dos Caetanos nº 5-9, hoje desaparecidas. Esta coexistirão com os caixilhos de vidraças, como os que são pedidos para uma obra na Rua dos Ourives do Ouro a 30 de Dezembro de 1791. Curiosa também é a existência, em 1959, de gelosias em janelas do edifício na Rua de S. Bento nº 26 (Figs. CAP.III-18 e 19). O documento de 1791 para uma obra a efectuar na rua dos Ourives do ouro em 1791 fornece-nos ainda informações adicionais quanto à imagem do edificado desta época: ”…Que havera baranda geral sobre a simalha real com sua grade de risco, como tambem nas janelas de sacada do
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primeiro andar, e tambem grades de ferro de maxo e e femea nas janelas das Logeas do chaugaõ…” (cf. ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório 11. Cx. 153, livro 7120, pag. 623625 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp.628-629) Se, em 1791 as grades das varandas eram “de risco”, em 1859, as mesmas já tinham um desenho mais elaborado. O prospecto de aformoseamento do edifício da Travessa dos Inglesinhos nº 33-35 de 18 de Maio de 1864 mostra essa mudança de sensibilidades (Fig. CAP.III-20). 3.3.2. Conformação altimétrica do edificado de 1758 a 1859 O modelo da Rua Nova d’ El Rei, a actual Rua do Comércio servirá de matriz para as ruas nobres do plano pombalino. Para os edifícios da referida rua são definidas diversas regras a reter, no que respeita à volumetria e às características dos vãos a construir. No que concerne à volumetria dos edifícios é estipulado que: estes terão o “número de andares que couberem na sua altura”, “sendo as logens de dezasseis palmos de pé direito”, “os primeiros andares” idêntica “proporção” — isto é, dezasseis palmos, no pé direito necessário para a passagem dos coches no século e XVIII (cf. MATOS, Vanda Pereira; 2003, p. 125) —, e dividir-se-á “o que restar para encher a altura, com proporção pelos outros andares que couberem” — o mesmo é dizer, mais dois andares e águasfurtadas. No que respeita aos vãos são determinadas as seguintes normas: para o piso térreo especifica-se que “as portas das logens sejam iguais nas medidas”, para as janelas do primeiro andar ordena-se que sejam de sacada, impõe-se que janelas do segundo andar sejam de peitoril, embora um pouco mais pequenas, (cf. SANTOS, Maria Helena, 2007, in ARAÙJO, CARDOSO, MONTEIRO, ROSSA & SERRÃO, 2007, pp. 450-451). O edifício de rendimento tipo era um edifício de cinco pisos, dos quais o último de águas furtadas construídos na prumada dos outros vãos. No piso térreo encontravam-se as lojas e nos pisos superiores a habitação. Os edifícios situados nas ruas principais tinham no primeiro andar janelas de sacada e nos segundo e terceiro piso janelas de peitoril. Nos edifícios localizados em ruas secundárias todos os andares tinham janelas de peitoril. Contudo, dentro desta grande uniformidade de padrões, os edifícios variavam no que concerne às cérceas, ao tratamento das fachadas, às dimensões dos vãos e ao tipo e qualidade de materiais. Era possível distinguir distintos tipos de fachada que se construíam em cada uma das ruas consoante a sua importância hierárquica. Os projectos dos edifícios eram executados na Casa do Risco, obedecendo a uma norma de estandartização de composição, de pormenorização e de sistemas construtivos (cf. TEIXEIRA, 2007, in ARAÙJO, CARDOSO, MONTEIRO, ROSSA & SERRÃO, 2007, p. 422). José
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Augusto França, em 1965 apontava quatro de fachadas tipo. Estas mantêm-se durante o consulado de Pombal, de que é expressão, entre outros na Cotovia ao Rato; o edifício de grande extensão Rua do Loreto nº 22-32. Com o período Mariano estas fachadas tipo alteram-se de acordo com o risco da estética vigente è expressão disso o edifício da Rua S. João da Mata 17-23 (Fig. CAP.III-21). De acordo com J. B. Carrière, os edifícios em que os lisboetas viviam, em particular na Baixa, eram separados por faixas de cantaria, tendo todos o mesmos ornatos. Os edifícios possuem longas filas de janelas, a maioria emolduradas por cantarias. Os primeiros andares e por vezes o segundo piso eram embelezados com sacadas. De acordo com o mesmo autor, dada a uniformidade de tratamento de edifício para edifício, o aspecto dos mesmos acaba por ser monótono (cf. SILVA, Raquel Henriques,1997, p. 215). 3.3.3. Organização do edifício de rendimento 3.3.3.1.No quarteirão O inscrito no prospecto de corte tipo nas ruas das Baixa dá-nos uma perspectiva da relação edifício /logradouro. O saguão resulta um espaço central o dentro do quarteirão, que permite a iluminação do tardoz do edifícios e o despejo das águas: “Espacato que atraveça huma das ruas principaes mostrando a devizaõ que se faz com as culunelos nos caminhos para a Gente de pè, com largura e largura da cloaca do meyo da rua, a forma de madeyrar as cazas e cos patios que hade aver no meyo delas para luz e despejo das agoas, que por canos particulares dezagoaõ nas cloacas geraes” (cf. ROSSA, Walter, fig 12 in ALÇADA, Margarida (dir.); Monumentos nº 21; 2004; p. 89) 3.3.3.2. A caracterização do fogo interno tipo e planta distributiva de 1758 a 1830 A habitação colectiva destinada às classes médias emergentes, obtidas por sobreposições de planos horizontais de fogos individuais nãos tem lugar na “Jornada do Tejo”, (1792), de José Carvalho Negreiros (1751-1815), filho de Eugénio dos Santos. Apenas é mencionada a casa unifamiliar do “plebeu casado”, do artesão ou do nobre na vila ou julgado (cf. BARREIROS, Maria Helena in ALÇADA, Margarida (dir.); Monumentos nº 21; 2004; p. 89). Registe-se, no entanto, que a casa do primeiro, prescrita no referido documento, não deverá comportar mais do que seis divisões, nas quais se inclui a cozinha, com os “…commodos acessórios a esta
(…)
indispensaveis para hum, e outro sexo poderem viver com separação e decencia…” (cf. BARREIROS, Maria Helena in ALÇADA, Margarida (dir.); Monumentos nº 21; 2004; p. 89). O
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mesmo raciocínio levará o autor da Jornada do Tejo a atribuir metade dos compartimentos, ou ainda menos, para a habitação do plebeu celibatário (cf. BARREIROS, Maria Helena in ALÇADA, Margarida (dir.); Monumentos nº 21; 2004; p. 96, nota 17). Os levantamentos de interiores recentemente realizados para uma amostra razoável de edifícios da grelha da Baixa mostram uma diversidade explicável por razões da diacronia do processo como sejam: a lentidão da reconstrução pós 1755; as raras situações de substituição ou reedificação do lote — que terão decorrido até meados de Oitocentos —; por razões espaciais e construtivas, como a variabilidade do número de módulos por lote, situação no quarteirão. o tipo, a colocação da área destinada à caixa de escadas (cf. BARREIROS, Maria Helena in ALÇADA, Margarida (dir.); Monumentos nº 21; 2004; p. 94). O documento de um contrato de obra datado de 30 de Dezembro de 1791, referente a um chão de Francisco Costa Chaves na Rua Ourives do Ouro, permite-nos perceber algumas das divisões que faziam parte do fogo interno. Assim, é mencionado uma cozinha com os seus poiais para os potes, casas principais, casa de jantar e corredores, como elemento de percurso para as divisões (cf. ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório 11. Cx. 153, livro 7120, appud SILVA, Raquel Henriques pp. 623-625). A Baixa do finais do século XVIII pode ser vista como um laboratório experimental da organização de um tipo de casa que ainda não estava codificado na época (cf. BARREIROS, Maria Helena in ALÇADA, Margarida (dir.); Monumentos nº 21; 2004; p. 96). No contexto do universo observado, a habitação standard da Baixa estrutura em seis divisões inscritas num rectângulo, nas quais se inclui a cozinha com acesso directo pelas escadas. Este fogo interno tipo pode ser ainda acrescido por um o sétimo compartimento, com acesso directo a partir das escadas. Este parece surgir como o antecedente directo do “quarto independente” da época contemporânea (cf. BARREIROS, Maria Helena in ALÇADA, Margarida (dir.); Monumentos nº 21; 2004; p. 84). No entanto, o número de compartimentos por fogo pode ser ainda menor nos lotes mais estreitos. Estas “habitações mínimas” decorrentes da dimensões do lote, por vezes possuem escada de tiro para vencer o desnível do primeiro patim. A partir deste, a escada passa a desenvolver-se de acordo com o esquema habitual de lanços paralelos. A meio do lanço recto abrem-se as portas dos fogos esquerdo e direito, se o número de módulos o permitir (cf. BARREIROS, Maria Helena in ALÇADA, Margarida (dir.); Monumentos nº 21; 2004; p. 97, nota 48). Fora do território da Baixa-Chiado o edifício pombalino será obrigado adaptar-se à escala e das parcelas urbanas onde se implanta. Não conseguindo dispor de mais de dois ou três lotes
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primitivos, o edifício pombalino adapta-se à tipologia antiga ou recorre a situações mistas. As soluções encontradas trazem flutuações tipológicas que se distanciam significativamente dos modelos de Eugénio do Santos e Carlos Mardel (cf. CARITA, Helder; 1994; p. 121). A ausência de um regulamento de salubridade urbana exigindo determinados tipos de divisões na habitação levanos a que, para a definição da estrutura do fogo interno tipo nos baseemos, tal como fizemos em 2003 (cf. MATOS, Vanda Pereira; 2003), na definição do espaço privado. Verificámos que, e de acordo com Madureira, existem diversas velocidades sociais de reestruturação do espaço privado e células habitacionais mínimas. Através dos estudos desenvolvidos por este autor, observou-se que em freguesias como em Santa Isabel, freguesia sem homens insignes, havia na realidade pós terramoto de 1755, fogos que correspondiam a o que nós hoje designamos por uma única divisão. Sabemos, através das Décimas de Maneio estudadas por Nuno Luís Madureira, que o tecido social das freguesias era variado coexistindo num mesmo território diversas profissões. Atente-se as Décimas de Maneio das freguesias de Santa Isabel, S. Nicolau, S. Sebastião, estudadas no período que medeia 1740 e 1830. (cf. MADUREIRA, Nuno Luís, 1992). Fora da área da Baixa de Lisboa os pisos térreos, quer sejam na forma de quartos, de lojas ou de barracas, têm um papel importante na vida das camadas inferiores da população. Casos em que a casa inevitavelmente se prolonga para a rua e onde as possibilidades da emergência de um espaço privado se diluem (cf. MADUREIRA, Nuno Luís, 1992, p.102). Através do estudo dos inventários post mortem o referido autor enuncia tipos distintos de habitação. Para cada um estrutura-se um fogo interno tipo. O tipo de mobiliário prende-se directamente com o perfil socio-profissional do proprietário de cada habitação. Contudo, o delineamento de uma estrutura interna de fogo tipo pós 1755 não deveria andar desagregada dos dados que foram referidos anteriormente para o número de indivíduos por fogo para o período em análise. Uma vez que as modificações do habitar se produzem num tempo lento, os dados inferidos através dos post mortem de 1780-86 permitem–nos delinear com algum conforto a estrutura interna do fogo tipo de parte do período em estudo. Assim, e como refere Nuno Madureira (cf. MADUREIRA, Nuno, Luís 1992, pp. 203-204), delineam-se: a) habitações com infra-estruturas próprias para tomar refeições numa sala. encontram-se nesta categoria a habitações com bancas itenerantes de duas abas ou casas com bancas com seis pés torneados b) habitações com infra-estruturas adaptáveis a refeições numa sala; encontram-se nesta
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categorias as habitações que apesar de não ter todos os requisitos expostos na alínea anterior, possuem bancas com um comprimento mínimo de 5 palmos de comprimento, embora com função indeterminada; c) habitações sem infra-estruturas para tomar refeições; consideram-se aqui habitações cujo único móvel de apoio com 5 ou mais palmos de comprimento. d) habitações sem quaisquer dos móveis referidos nas alíneas anteriores Com a legislação de 12 de Maio de 1758 o saneamento básico, já expressivo em documentos como o alvará régio de 27 de Janeiro de 1548 (cf. OLIVEIRA, Eduardo Freire, vol. I, pp. 548-560), ganha passos para se instalar definitivamente à escala do edifício de arquitectura corrente, embora não com o grau de sistematicidade que ganharia no dealbar do século XX. Contudo, as pias de despejo seriam lentamente introduzidas na edilícia. Os esgotos estava previstos na legislação promulgada a 12 de Maio de 1758. Todavia, a forma como as canalizações foram executadas, desrespeitando aspectos previstos em projecto não permitia a resolução correcta do problema de saneamento. Por outro lado, o desenho quadrado das cloacas não permitia que o saneamento fosse feito eficazmente (cf. FRANÇA, José-Augusto, 1977, p.159). Nas revistas que proliferavam no século XIX focavam-se temas como os sistemas de esgotos, a construção de banhos públicos e a limpeza das ruas (cf. RODRIGUES, Teresa Maria Ferreira; 1993; p. 55). Durante o período que abrange a Lisboa romântica a câmara demonstrou o desejo de aproximar a cidade dos padrões internacionais, nomeadamente dos modelos de Paris e Londres. Este facto conduz a um reflexão sobre as questões de saneamento. A primeira preocupação é para com a necessidade de alargar a rede de esgotos. Contudo, com todos os problemas de modernização da cidade, as soluções só chegarão em 1870, data em que Lisboa teve o benefício do saber actualizado e pragmático de Frederico Ressano Garcia (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, pp. 336-339). 3.3.3.3. Os interiores de 1758 a 1859 O registo notarial de Dezembro de 1791, entre Francisco da Costa, ourives do ouro com loja na mesma Rua e José Antonio Duarte mestre do ofício de Carpinteiro morador a Cotovia junto à Madragoa e Manoel Loureiro, mestre do ofício de Canteiro, morador na Adissa, fornecem algumas
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pistas quanto aos interiores dos edifícios. O referido documento informa-nos de forma serão construídos os interiores do edifício e, simultaneamente apresenta-nos a sua paleta cromática. Desta forma, ficamos a a saber que o primeiro lance da escada geral terá os seus degraus em cantaria É referido que “…havera em todas as cozinhas poaes p.a potes…”. Além disso existirão “…Armarios e cravoeiras…”. Procede-se à descrição da hieraquização dos azulejos em todas “casas da frente” com azulejos da Fábrica Real, sendo que nas casas principaes a sete, alcobas a sinco, cozinhas e cazas de jantar a tres e corredores e cozinha a dois. Esta distribuição restringia-se do primeiro andar até ao terceiro …”q. dahi p. sima também levará azulejos tudo com as alturas a proporção da cazas” . No que respeita aos quartos o mesmo documento informa que estes “…serão assoalhados (…) de madeira de casquinha da melhor e da mais groça….”. É ainda referido que “…serao obrigados a fazer quasquer repartime.tos, acomodaçoens ou armarios que forem precisos aos quartos e tudo mais q. por esquecim.to se naõ declara…” São ainda precisadas construtivamente as tipologias de portas: “…das casas da frente, portas enteriores p.a vidraça, portaes grandes, portas das logeas de madeira do Brazil da melhor qualidade…” Especifica-se que todas as portas terão alizares de várias qualidades. No que respeita ao vidros precisa-se que estes serão brancos. Declara-se ainda que toda a frontaria será “…pintada de verde como hé estilo, que todas as pinturas das portas e janelas levaraõ tres de maos a olio …” (cf SILVA, Raquel Henriques da, 1997; pp. 66-67). Se este documento informa de forma normativa os interiores do último quartel do século XVIII, as preocupações higienistas patentes no Tratado para a Conservação da Saúde dos povos (1756), elaborado por António Ribeiro Sanches efectivam a necessidade de algumas dessas regras. Neste é recomendado por no caso de não se poder residir num primeiro andar— e por isso com ar limpo da nuvem de exhalações, podres e fétidas —, deve-se suprir essa vicissitude madeirando o soalho por forma a evitar poeiras e se disponha abundantemente de janelas e de chaminés para arejar a residência. Contribuindo largamente para efectivação destas e de outras medidas encontram-se além do referido autor, Jacob de Castro Sarmento e Sachetti Barbosa, que contribuíram para a divulgação de obra de Boerhave em Portugal. Esta viria a ser adoptada na reforma pombalina de 1772. Ilustrativo dessa adopção é o registo notarial de Dezembro de 1791, para um chão que Francisco da Costa, ourives do ouro, pretende edificar na Rua dos Ourives do Ouro. Nele é referido que
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“…seraõ assoalhados todos os quartos de madeira de casquinha da melhor e mais groça de folha fora…” (cf. ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório 11. Cx. 153, livro 7120, pag. 623-625, doc. 38 R. H. SILVA, 1997). 3.4. Edificado de 1859 a 1903 3.4.1. A imagem do edificado de 1859 a 1903 As alterações significativas no edificado expressar-se-ão a partir da publicação do decreto lei de 1864 do Ministério das Obras Públicas. Este, nas suas “Disposições relativas ás ruas e edificações no interior da cidades, vilas e povoações” definia um conjunto de normas técnicas gerais para a construção na cidade de Lisboa (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 491). Embora sem carácter sistemático, sensivelmente a partir desta data, os prospectos passam a incluir plantas sumárias de distribuição interior e a sua aprovação a submeter-se à exigência, referenciada com formulário repetido na Câmara, de o proprietário mandar encanar as águas dos telhados para as manilhas das pias de despejo (cf. SILVA, Raquel Henriques, 1997, p. 492). Contudo, algumas dessas modificações delinearam-se e efectivaram-se, como veremos, em 1859, rompendo com o modelo de edifício anterior. 3.4.1.1. A resolução dos ângulos dos quarteirões e a relação da rua com o pátio ou saguão Através do acto da Câmara de 3 de Junho de 1859 é proposta a redacção de bases para uma postura sobre as construções civis que incidam sobre a proibição absoluta de ângulos de encrusamento de ruas optando-se por chanfros curvos de raio determinado (cf. Annaes do Município de Lisboa, 1856-59; Junho de 1859, pp. 322-323). Tal facto permite-nos agora, confortavelmente, perceber porque razão os cunhais dos edifícios começam timidamente a arredondar prenunciando a sua expressão final no pós 1865.3 No território em análise é possível observar diversos exemplares ilustrativos desta normativa, como o do imóvel de gaveto da Rua da Rosa para a Rua da Atalaia. Por outro lado pretende-se estabelecer largos corredores que permitam a comunicação da rua com o pátio ou saguão. Como sabemos, esta medida foi também aplicada, sendo visível nos edificado das Avenidas Novas nomeadamente na Avenida da República.
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O arredontamento dos cunhais foi observado no trabalho de Helder Carita para o Bairro Alto, contudo sem o suporte legislativo que agora lhe damos.
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3.4.1.2. O aparecimento da platibanda, de uma moda da cércea, aspectos de ventilação e iluminação Através dos Annaes do Município de Lisboa faz-se saber, por acto da Câmara de 3 de Junho de 1859, a urgência de redigir uma base para uma postura sobre as construções civis que, proíba as vertentes dos telhados para as ruas, como também o apanhamento das águas das chuvas (cf. Annaes do Município de Lisboa, 1856-59; Junho de 1859; p. 322). Tal permite perceber o porquê da introdução do elemento arquitectónico platibanda na arquitectura corrente da cidade. Descritivo de como eram esses telhados é o excerto do documento que apresentamos, com data de 29 de Junho de 1791, relativo à redificação de umas “cazas” situadas na Rua da Parreiras, dentro do território de análise: “… o telhado sera mouriscado seg.do o coztume do das bem acabadas propriedades; a pintura será segura e farta, e a de fora verde. As agoas terão sahida de forma a q. pelo chagoão se naõ venhaõ introduzir nas logeas: sera mais obrigado o d.o m.e a deliniar a obra de maneira aq. tenha as precizas acomodaçoens seg.do o permitir do vaõ da propriedade, não lhe esquecendo Armarios, despensas e pois p.a Pottes de agoa: por tal forma q. as cazas fiquem clara, de modo q. de dia se naõ faça precizo usar Luz em alguns doas quartos fazendo tudo á carga serrada até entregar a elle Senhorio as chaves p.a se alugarem, ou as habitar, com seus caixilhos, e vidrassas; e isto tudo pela q.tia de nove centos e cincoenta mil reis…” (cf. ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório 11. Cx. 152, livro 712, pag. 66 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp.628-629) A confirmação da introdução da normativa de encanamento das águas dos telhados aparece-nos ainda em 1859, como ilustra o “…prospecto para reconstrução da Casa do Ex.mo Snr. José Maria Eugenio d’ Almeida no largo de s Sebastião da Pedreira…” Nele é escrito: “Approvado com a condição de mandar/ encanar as agoas dos telhados p.a as manilhas dos despejos Ca/mara 19 de Dezembro de 1859”. Em 17 de Agosto de 1860 a platibanda já fazia parte dos elementos de composição de alçado como ilustra o desenho de alçado do “prospecto de cazas que pretende construir Franc.co José Zacharias Guimarães na Rua da Procissão com fronte para o Poente”— actual Rua Cecílio de Sousa (cf. SILVA, Raquel Henriques; 1997; vol.2; fig. 180.1). O projecto de alteração para o edifício da Rua da Misericórdia nº 133-135, datado de 1862, já apresenta uma platibanda, o que nos permite confortavelmente delinear aspectos de transformação da imagem do edificado pré 1864 (Fig. CAP.III-22). Por outro lado as disposições relativas às ruas e edificações no interior de cidades, vilas e povoações de 1864, recomendam que se façam encanamentos
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interiores por forma a conduzir as águas dos telhados aos canos de esgoto (cf. Annaes do Municipio de Lisboa, 1865, p. 2182-2184). Esta aquisição da platibanda claramente definida no projecto de melhoramento, datado de 1866 para o edifício da rua da Barroca nº 60 /Travessa dos Fiéis de Deus nº 45-47 (Fig. CAP.III-23). A platibanda já aparece com algo solidamente implantado na arquitectura corrente da cidade em 1868, sendo o seu desenho variado É o que demonstra o excerto do documento de 23 de Setembro de 1868, que seguidamente apresentamos: “… Sobre outro assunto tenho igualmente a honra de pedir a consideração de V. Exª; Os quarteirões da cidade baixa teem os alçados regulares até á cornija que corôa os terceiros andares. Authoriza-se a construção de quartos andares e cada proprietario construe com um pé direito differente, cornijas e platibandas diversas. A uniformidade adoptada até aos terceiros andares deixa de existir nos quartos andares. Não seria conveniente que a Ex.ma Camara adoptasse um tipo para esses novos andares?…” Esta medida parece-me indispensavel, por que os alçados dos differentes predios de um mesmo quarteirão da cidade baixa formam uma única fachada de cunhal a cunhal. Deus Guarde a V. exª Lisboa 23 de Setembro de 1868” Ill.mo Ex.mo sr. Presidente da Camara Municipal de Lisboa O Intend. / Luís Victor leCocq” (cf. AHCML, SGO, Cx. 126; appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp. 728-729) São apontados pela postura de 3 de Junho de 1859 a existência de uma relação entre a altura dos edifícios e a largura das ruas em que se implantam, limites de dimensões de portas e janelas dos edifícios e normativas para a construção das escadas de edifícios com muitos inquilinos regulamentando as condições de iluminação e de ventilação (cf. Annaes do Município de Lisboa, 1856-59; pp. 322-323). Todas estas prédicas foram, como sabemos, regulamentadas posteriormente e aplicadas no edificado. 3.4.1.3. O desuso do telhado mouriscado Como comprovam os contratos de locação de obra, o uso da platibanda não determinou necessariamente o uso do telhado tipo mouriscado, pois a documentação datada entre 1850 e 1871 refere um telhado mourisco em paralelo com a construção de uma platibanda. Contudo, como sabemos, no último quartel de Oitocentos é introduzida em Portugal a telha marselha. Esta viria a ser a telha por excelência do edificado do primeiro movimento modernista português.
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3.4.1.4. Cunhais de chanfro curvo e recto De acordo com a Portaria de 20 de Outubro de 1865, os chanfros dos cunhais dos edifícios de Lisboa e do Porto podem ser curvos ou rectilíneos. A distância mínima entre os vivos das arestas limites dos chanfros é de 4.50 m. Quando os chanfros forem curvilíneos —gavetos, nome usual em Lisboa — a corda do arco de círculo de concordância entre os dois alinhamentos rectos que o constrói terá 4.50 m (cf. APPLETON, João Guilherme, 2005; p. 276). São expressivas deste desenho de chanfro curvo as plantas do imóvel sito no Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714 (Fig. CAP.III-89). Esta possibilidade de mudança marca uma outra forma de construção do cunhal do edifício, onde imóveis como o da Calçada Marquês de Abrantes nº 58-66 datado de 1853 — J.A.L.R. 1853 (Fig. CAP.III-24)—, com os cunhais ainda ao sabor de uma estética anterior, como o edifício de gaveto da Travessa do Jasmim/ Rua do Jasmim nº 21 (Fig. CAP.III-25)— cujo cunhal apenas arredonda na base, junto ao passeio até de meio corpo do cunhal — e como o edifício da Rua do Machadinho/ Travessa do Pasteleiro (Fig. CAP.III-26) — cujo o cunhal é completamente curvo, muito embora o seu raio de curvatura seja de reduzida dimensão —, marcam épocas diferentes de construção, sendo que os dois últimos são edifícios charneira. O cunhal de chanfro curvo persistirá nas Avenidas Novas de Lisboa, fenestrado e com o sabor da estética vigente, de que são exemplo alguns edifícios na Rua Rosa Araújo, na Avenida Defensores de Chaves e o edifício devoluto situado na Duque de Loulé, diante da Sociedade Portuguesa de Autores. Casos exemplares no território da Cotovia ao Rato é o edifício Art Deco Rua D. Pedro V/ Rua Luísa Todi (Fig. CAP.III-27), de chanfro igualmente curvo, processo para construção se iniciou em 1934. Curiosamente o “Português Suave” constrói na cidade edifícios de arquitectura corrente e equipamentos públicos retomando esta temática. Quer como desenho de continuação do edifício dentro da parcela urbana, como marcação e dignificação da entrada do edifício, quer como solução natural de resolução do gaveto de quarteirão. São expressão disso diversos edifícios da época no Dafundo, no termo de Algés, e em Lisboa, a título de exemplo, o edifício dos Correios no gaveto da Rua Alexandre Herculano para a Rua de S. Filipe de Neri (Fig. CAP.III-28). No que respeita a unidades urbanas em que o chanfro curvo é opção, é necessário referir o Quarteirão / Largo Vitorino Damásio nº 1-4/ Av. D. Carlos I, nº 5-45/ Av. 24 de Julho nº 50-56/ Largo Santos nº 13–15. A construção deste quarteirão, em frente para o actual Largo Vitorino Damásio, teve lugar entre 1875 e 1880. Este largo é fruto do assoreamento e terraplanagem do
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aterro de Santos ou da Boavista, concluídos no ano de 1867 e do processo de urbanização que lhes seguiu (cf. SANTOS, Maria João; 2006; p. 376). Este edifício é constituído por um robusto aparelho de alvenaria com alicerces fixos a 4 m de profundidade (cf. SANTOS, Maria João; 2006; p. 379). O seu cunhal de chanfro curvo é regulamentar de acordo com a de Portaria de 20 Outubro de 1865. Verifica-se a existência de grades de ferro nos tímpanos das portas com as iniciais dos construtores, assinalando as diferentes datas de construção: 1868, 1871, 1877 (cf. PEREIRA, NunoTeotónio & BUARQUE, Irene, 1995). Apesar do sua data tardia, 1944, o edifício de gaveto da Rua de S. Marçal nº 176 / Travessa do Monte do Carmo (Fig. CAP.III-29), da autoria do arquitecto Porfírio Pardal Monteiro, é um imóvel que parece querer recuperar um modernismo perdido. A sua resolução do chanfro do cunhal em curva é inusitada dentro dos exemplares observados até agora. Solução um pouco diferente parece ter sido utilizada no edifício de gaveto modernista na Rua da Rosa nº 35/ Travessa dos Fiéis de Deus nº 69 (Fig. CAP.III-30), tal como o anterior inserido dentro do território de análise. No que reporta ao cunhal de chanfro recto, existem quatro exemplares a realçar no território em análise, a saber: o gaveto Travessa do Abarracamento de Peniche/ Travessa da Palmeira (Fig. CAP.III-31), o gaveto Rua da Rosa/ Rua D. Pedro V (Fig. CAP.III-32), e os gavetos Rua Nova do Loureiro, lado par/Rua João Pereira Rosa (Fig. CAP.III-33), e Rua Nova do Loureiro, lado ímpar/Calçada do Tijolo (Fig. CAP.III-34). Curiosamente existe um exemplar com este tipo de chanfro, anterior ao decreto já referido na Rua de S. Marçal nº 13-19/ Travessa de S. José (Fig. CAP.III-35). Dado ser excepção na freguesia, o que faz prefigurar este gosto algo posteriormente regulamentado em 1865. Fora do território de análise, os cunhais de chanfro recto são visíveis no conjunto Rua Nova de S. Mamede/ Rua do Salitre (Fig. CAP.III-36), e em diversas situações nomeadamente no próprio Bairro Azul. Durante o Regime esta temática é abordada pelo edifício de chanfro recto de 1948, sito na Avenida da República 36-36 E/ Avenida Visconde Valmor 27-27E (Fig. CAP.III-37). 3.4.1.5. Campainhas A campainha eléctrica-telegráfica foi introduzida em Portugal na década de sessenta do século XIX. Em 1873 era anunciada no Almanaque, tendo sido introduzida pela firma José Maria da Mota, com sede na Rua dos Poiais de S. Bento nº 18 (cf. SERRÃO, Joel & MARQUES, A. H. Oliveira (dir.); vol. X, 2004; p.437). O interruptor eléctrico foi inventado em 1884. Em 1906 surge a torradeira eléctrica. No início de 1884 a Papelaria Progresso, localizada na esquina da Rua Aurea
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com a Travessa da Vitória iluminava a sua loja electricamente pelo sistema Jablochkoff (cf. MATOS, Ana Cardoso de, MENDES, Fátima, FARIA, Fernando & CRUZ, Luís; EDP, 2004; p. 104). Em 1885 funda-se em Lisboa a Companhia Portuguesa de Electricidade, de duração efémera, mas que proporcionaria iluminação eléctrica a alguns estabelecimentos e casas particulares. Em 1887 a Companhia de Gás de Lisboa obtém a concessão de exploração da iluminação pública e privada da cidade. Em 1891 esta central passou para a posse da Companhias Reunidas de Gás e Electricidade (cf. MATOS, Ana Cardoso de, MENDES, Fátima, FARIA, Fernando, CRUZ, Luís; EDP , 2004 p. 157). Em 1889 é posta iluminação eléctrica na Avenida da Liberdade. Em 1891 a electricidade já era assegurada com regularidade. Desde o início que a electricidade teve grande receptividade junto dos lisboetas, seja como força motriz, seja como fonte de iluminação. De tal forma que em 1896-1897 se pensou organizar um modelo de apólice para os consumidores privados e se considerou a hipótese de montar novas instalações que permitissem responder ao consumo crescente para as utilizações industriais e para as domésticas (cf. MATOS, Ana Cardoso de, MENDES, Fátima, FARIA, Fernando & CRUZ, Luís; EDP, 2004; p. 160). Em 1903 vemos surgir um Regulamento sobre instalações eléctricas. Desta forma podemos perceber porque começam a surgir campainhas eléctricas nos ombrais das portas de acesso ao edifício de rendimento. Nalguns casos verifica-se o moldar de raiz da ombreira do portal para receber o receptáculo da campainha (Fig. CAP.III-38).
3.4.1.6. Janelas As janelas, em 1902, deverão ser amplas por forma a iluminarem e arejarem os quartos, tendo pelo menos 0.10m da superfície do mesmo. Em 1903, as janelas devem ser amplas para permitir a entrada de luz, devendo ter pelo menos um décimo da superfície do pavimento do quarto. Nos quartos de dormir as janelas deverão ter pelo menos 0.80 m2 de área. Em 1902, o número de fenestrações nos pisos de habitação semi enterrados deverão ter uma ou mais janelas que permitam a iluminação e ventilação. Sendo regulamentado que as janelas deverão ter uma superfície de pelo menos 1/10 do aposento. 3.4.1.7. Respiradouros Em conformidade com a legislação de 1902 e 1903, os pisos térreos deverão ter, sempre que não possuam um pavimento coberto com uma camada impermeável, uma caixa de ar com aberturas nas paredes para comunicar com o exterior. Tal implica a existência de respiradouros ao nível do
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piso térreo. Estes elementos terão também expressão a diferentes cotas do alçado permitido uma melhor ventilação do edifício. Existem diversos edifícios no território da Cotovia ao Rato com estes elementos de composição de alçado. Contudo, nem sempre os respiradouros originais subsistem. Estes foram substituídos por outros de desenho mais actual que não possuem a densidade e expressividade dos originais — feitos em ferro fundido (Fig. CAP.III-39). Para permitir a extracção dos cheiros vindos das fossas construídas no interior dos edifícios a legislação obriga à existência de um respiradouro que se eleve à parte superior do edifício. Este terminará superiormente por um aparelho de ventilação adequado. Não deixa de ser curiosa a execução deste elemento em pedra como é o caso do respiradouro existente na Rua Nova da Piedade nº 7 (Fig. CAP.III-40).
3.4.1.8. Algerozes e tubos de queda Em 1903 a legislação conforma que os algerozes devem ser não só proporcionais ao tamanho do telhado, como também serem forrados de zinco ou chumbo, ou ainda serem bem cimentados para não causar infiltrações. Em todos os edifícios é necessário que hajam tubos de queda. Estes devem ser colocados na parte exterior das paredes por forma a serem visíveis e a sua reparação ser facilitada. O material usado na construção dos tubos de queda deverá ser o grês ou ferro fundido (Fig. CAP.III-41). 3.4.1.9. A conformação altimétrica de de 1859 a 1903 3.4.1.9. 1. A conformação altimétrica de 1864/1865 No “plano de edificações e reedifcações em Lisboa: medidas geraes para se levar a effeito e prescrições de polícia” nas “disposições relativas às ruas e edificações no interior de cidades, vilas e povoações” de 1864 (impresso em 1865), são referidas normativas regularizadoras da altura dos edifícios de arquitectura corrente (cf. documento 4, Apêndice Documental). Assim, quando a largura das ruas for inferior a 7 m a altura dos edifícios não poderá ser superior a 8 m. Se a largura da rua for na ordem dos 7 a 10 m, o edifício não poderá exceder os 12 m. Para larguras de ruas entre os 10 e os 18 m a altura dos imóveis não poderá ser superior a 16 m. Para larguras de rua superiores a 18 m o edifício não poderá exceder os 19 m de altura. Para os edifícios que tiverem fachadas sobre duas ruas — que na generalidade dos casos corresponderão a edifícios de gaveto — que se cruzem com diferentes larguras, a altura do edifício será determinada pela maior
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largura de rua. Para edifícios cujas fachadas estiverem sobre ruas abertas proximamente ou sobre abertas na mesma direcção mas com grande diferença de nível, a altura do imóvel será determinada por decisões especiais do governo. No que concerne aos edifícios construídos fora do alinhamento das ruas públicas, jardins interiores ou pátios, não poderão ter uma altura superior a 15 m, salvo autorização do governo. Acima da cornija e no plano da parede da fachada não se poderá construir, excepção feita para os aerotérios e seus acessórios. É proibido acrescentar novos pisos ou qualquer outra construção nos edifícios existentes, quando daí resulte o desrespeito da altura máxima do edifício que cada largura de rua implica. É regulamentada a existência de “encanamentos interiores” que conduzam as águas das chuvas (“águas dos tellhados”) aos canos de esgoto. 3.4.1.9. 2. Conformação altimétrica sua evolução e continuação de 1867 a 1903 A lei de 2 de Julho de 1867 vai estabelecer parâmetros para as alturas dos edifícios em consonância com a largura das ruas em que estes se implantam. Entre esta lei e a antecedente de 31 de Dezembro de 1864 vemos desenharem-se edifícios mais altos. Em 1867 são assim estabelecidas as seguintes normativas: quando a largura das ruas for inferior a 5 metros o imóvel não poderá ultrapassar os 12 m de altura; quando esta for entre 5 a 7 m a moda da cércea — definida pela legislação como o comprimento medido desde a calçada ou pavimento até à cornija —, dos edifícios não poderá exceder os 15 m; para larguras de rua superiores a 7 m a altura dos edifícios não poderá ultrapassar os 20 m. A legislação para a salubridade das edificações urbanas de 1903 apresenta aspectos novos. Juntamente com a conformação altimétrica do edificado é-nos dada uma nova perspectiva dos desenhos de ruas, característicos da herança francesa, desenhados para as Avenidas Novas de Lisboa. Destas foram para as ruas com largura inferior a 7 m: a altura das fachadas não poderá ser superior a 8 m, o que corresponde a um piso térreo e 1º andar. Para as larguras da rua entre 7 e 10 m, a fachada do edifício não poderá ultrapassar os 11 m de altura, o equivalente a dois andares. Em rua cuja largura seja entre os 14 e 18 m, a altura da fachada não poderá exceder os 17 m, o mesmo é dizer que o imóvel não poderá ultrapassar os quatro andares. Finalmente em rua com largura de 18 m ou mais ou nas grandes praças e boulevards a cércea das fachadas não poderá ser superior a 20 m, ou seja cinco andares. É ainda legislado que a largura das novas ruas não poderá ser inferior a 10 m. No que concerne a edifícios que tenham fachadas sobre duas ruas que se cruzem com diferentes
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larguras, a sua altura será determinada pela maior largura. No caso de o edifício ter fachadas sobre duas ruas abertas proximamente na mesma direcção, caberá ao Governo decidir qual a altura do edifício. Quando se construírem edifícios fora do alinhamento de ruas públicas, em jardins interiores ou pátios a sua altura não poderá ser superior a 15 m, salvo autorização do Governo. Estas três normativas mantêm-se desde 1867 a 1903, sem que haja qualquer outra especificação adicional. Para lá da moda da cércea, tal como regulamentado em 1867, em 1903 apenas podem ser construídos os acrotérios ou seus acessórios e um andar recolhido que rentabiliza a área e cota útil do madeiramento do telhado — as águas furtadas. Em 1903, na legislação sobre a salubridade das edificações urbanas, são estabelecidos mínimos de pé direito que hierarquizam altimetricamente os diferentes pisos. Se em 1902 apenas se referia que o pé direito de qualquer piso não poderia ser inferior a 3 m, em 1903, a legislação já vai mais longe. Desta forma, em 1903, são estabelecidos os seguintes pés direitos: 3.25 m para o rés-dochão e primeiro piso, 3 m para o segundo andar, 2.85 m para o 3º piso e 2.75 m para os 4º e 5º andares. A legislação de 1903 sobre a salubridade das edificações urbanas permite-nos perceber diversos factores que vão conformar não só a cércea do edifício urbano comum como o desenvolvimento do mesmo a partir da cota do passeio e as suas implicações para a estrutura vertical do edifício. Mais uma vez, a lei adoptada em 1902 mantém-se em 1903 nos regulamentos de salubridade das edificações para os pisos semi-enterrados. Para os alojamentos cujo pavimento estiver inferior à cota da rua ou do terreno a que encostam, devem ser observadas as seguintes normas: ter o pé direito mínimo de 3m e estarem 2 m acima da cota do nível da rua ou do terreno. As paredes destes pisos devem estar completamente enxutas e o pavimento livre de humidades. Para tal admite-se a possibilidade de entre este e os alicerces existir uma câmara ventilada. Vemos assim surgir, em 1902, a figura dos respiradouros. Contudo, o regulamento de 1903 introduz algumas novidades relativamente a estes pisos de habitação semi-enterrados. Assim, no caso de uma das faces ser completamente desafrontada e erguida acima do solo, o piso pode estar enterrado 2 m. É referido também que os pisos térreos deverão ter, no caso de não terem um pavimento coberto com uma camada impermeável, uma caixa de ar com uma cota mínima de 0.60 m, com aberturas nas paredes para comunicar com o exterior. O Regulamento de Salubridade das edificações Urbanas de 1902, refere que o pavimento dos pisos térreos deverá ser coberto com uma camada impermeável. Se isso não se verificar, deverá
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ter uma caixa de ar com uma cota mínima de 0.40 m e aberturas na parede para comunicar com o ar exterior. Em 1903 vemos essa cota de trabalho aumentar para uma mínima de 0.60 m. Por outro lado, dado que, de acordo com a legislação de 1903, os alicerces devem ser cobertos com uma camada impermeável que trabalhe até 0.15 m acima do solo para evitar que a humidade de pegue às paredes do edifício, esta normativa implicará necessariamente um alteamento da cota de pavimento do piso térreo, o que torna o edificado saído desta legislação distinto dos anteriores, até na própria leitura de alçado. 3.4.2. Organização dos edifícios de rendimento 1867 a 1903 3.4.2.1. No quarteirão A organização da parcela do edifício no quarteirão para o edificado construído de acordo com Regulamento de Salubridade Urbana de 1902, e posteriormente o de 1903, só é inteiramente compreensível se tivermos em consideração o papel do saguão ou do pátio. Estes são elementos que permitem iluminar e arejar as divisões. Para a primeira legislação, se forem destinados a arejar e iluminar as cozinhas, estes terão pelo menos 9 m2. No caso de estarem destinados a iluminar vestíbulos, antecâmaras ou escadas, a sua área mínima será de 4 m2. Seguramente mais tarde estes saguões terão como função garantir a iluminação natural das assoalhadas voltadas para as traseiras do edifício. Os saguões na regulamentação já referida de 1902 e 1903 para cumprirem as suas funções, têm de ter dimensões mínimas. Assim, para edifícios que tenham altura inferior a 18 m, estes devem ter pelo menos 30 m2 de superfície. No caso dos imóveis com altura superior a 18 m os saguões ou pátios deverão ter como área mínima 40 m2 de superfície e pelo menos 5 m de largura. Nos edifícios construídos nos anos 30/40 do século XX, contudo, a dimensão dos saguões ou pátios elementos é muito maior. Caso paradigmático disso é o Bairro Lopes, em Lisboa, situado na freguesia do Alto de S. João, junto à antiga estrada de Circunvalação. De acordo com o artigo 20º do referido Regulamento de Salubridade das Edificações Urbanas de 1902, os saguões ou pátios interiores não podem ser aproveitados para uma nova construção no rés-do-chão que os cobra à altura do primeiro piso. Desta forma evita-se que a poeira ou outros objectos ao caírem dos andares superiores, ali fiquem, fermentem e se tornem perigosos. 3.4.2.2. Planimetricamente (Planta distributiva) As legislações de 1902 e de 1903 sobre a salubridade das edificações urbanas permite-nos delinear alterações na planta distributiva do edifício de rendimento. Torna-se evidente uma tipologia de caixa de escadas dos edifício gaioleiros. que se distancia claramente do conjunto de
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normativas de 12 de Maio de 1758, pese embora a não aderência imediata da nova estética que enforme estas modificações. Existem, no entanto, aspectos que são de continuidade, em vigor a partir de D. João V que se prendem com o ornato e simetria e a formosura da cidade — a 13 de Novembro de 1751 é legislado que não deve haver “…vistoria alguma que não respeite ao ornato e simetria da cidade…”, estando nela incluídos edifícios em sítio em área do público (cf. Matos Vanda Pereira; 2003). Esta é continuada na regulamentação do pós 1755 que proíbe construções sem cordeamento nem simetria — decreto de 14 de abril de 1758. Desta forma, a iluminação da caixa de escadas é uma continuidade, mas o carácter de salubridade é uma espeficidade das novas sensibilidades. Assim, e no que concerne ao acesso vertical do edifício, é definido em 1902 e 1903 que as caixas de escadas deve ter no seu eixo um espaço vazio. Por este descerá a luz e subirá o ar que sairá nos ventiladores existentes nas clarabóias. Curiosamente, o prospecto datado de 1867, para o edifício da Rua Luz Soriano nº 75, já apresenta umas escadas com um vazio central. (Fig. CAP.III-42). Não é demais referir a necessidade que já se sentia, patente na postura 3 de Junho de 1859, de estabelecer normativas para a construção das escadas de edifícios com muitos inquilinos regulamentando as condições de iluminação e de ventilação (cf. Annaes do Município de Lisboa, 1856-59; pp. 322-323). É também regulado, em 1902, que as escadas de acesso aos diferentes piso deverão ser quanto possível amplas, bem iluminadas, com fácil ventilação e organizadas por forma a que a sua subida seja pouco fatigante (Fig. CAP.III-43). Este factos explicam o esforço em eliminar mesmo em lotes estreitos situações planimétricas análogas à dos edifícios com escadas de tiro, observáveis no núcleo urbano estudado por nós em 2003 — o Postigo do Melo e Casas do Embaixador — e nos imóveis referenciados pelos historiadores das Unidades de Projecto da Madragoa e do Bairro Alto e Bica para os séculos XVI e XVII, respectivamente Pedro Alexandre e António Miranda. Como sabemos estes requisitos mantém-se nos anos 30 do século XX. As cozinhas deverão estar próximas dos saguões, pois só desta forma poderão receber luz e arejamento proveniente dos primeiros. Senão atente-se no nº 1 do artigo 20º do Regulamento de Salubridade das Edificações Urbanas de 1903. Pelo mesmo artigo se infere a proximidade dos vestíbulos e antecâmaras do saguão. A legislação de 1902 prevê para os pisos de habitação semi-enterrados um lugar não só para latrinas como também um lugar para fogão e respectiva chaminé.
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3.4.2.3. A formulação de um espaço para uma casa de banho Através da postura municipal de 27 de Julho de 1889, publicada por Edital de 8 de Agosto do corrente ano é nos dada a informação da inclusão de um bloco sanitário nos edificado, embora restringido ao mínimo indispensável, a sanita. A este bloco sanitário estava adstrito todo um sistema de ventilação e tubagem que era incluído de raiz no edifício, “quarto”, ou loja, regulamentado pela legislação referida. A postura municipal de Novembro de 1893, publicada por Edital de 10 de Janeiro do ano seguinte, faz menção a toda uma tubagem e orifícios de comunicação entre a habitação e os canos relativos a lavatórios e banheiras, que fazem antever o desenhar progressivo de uma instalação sanitária mais dotada como um espaço de higiene pessoal. Lentamente, as peças de higiene pessoal vão libertando os quartos. Sobre a localização da instalação sanitária no espaço da habitação o mesmo edital é categórico. As pias, latrinas e urinóis deverão ser colocados contra as paredes exteriores das casas. Não devendo estar subjacentes a qualquer quarto habitual. Quanto for possível deverão estar na parte de fora das casas. O mesmo Edital de 10 de janeiro de 1894 refere ainda que todas as latrinas devem ter uma janela ou fresta próxima do tecto com pelo menos 0.30 m de comprimento por 0,05 de altura. Em 1903 a legislação já exige outras normativas. As pias de despejos e as latrinas deverão ser independentes uma da outra. A latrina poderá estar ou num espaço contíguo ao edifício, ou no interior da habitação. Neste último caso deverá estar ao fundo de um corredor, onde possa existir uma janela, ou fresta com a dimensão mínima de 0.30 m x 0.50 m, por forma a que haja comunicação com o ar exterior. Mesmo que a latrina seja construída fora do edifício estas condições têm que ser observadas. É de toda a conveniência que o local escolhido para colocar a latrina apresente uma corrente de ar cruzada que corte a comunicação de atmosferas. A questão dos cantos arredondados dos pavimentos mais especificamente nas casas de banho da habitação, é indiciador das novas preocupações higiénicas que enformam o edificado do início do século XX. Estes são elementos denunciadores de uma época, que podem auxiliar na datação de um edifício, ou pelo menos a data da sua intervenção. 3.4.2.4. Interiores de 1851 a 1900 Um elemento estrutural que se generalizou no edifício de rendimento foi o corredor como distribuidor das divisões dentro da habitação. Cada um dos apartamentos era constituído por um número flutuante de quartos para a família, de um a quatro, uma sala de jantar ampla, uma sala de estar, uma saleta, uma cozinha, uma despensa. Existiam igualmente um quarto de costura, quartos
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interiores para a criada e para as arrumações. Poderiam ainda existir um escritório e outras divisões com funções mais específicas. Estes apartamentos eram concebidos para famílias alargadas (cf. SERRÃO, Joel & MARQUES, A. H. Oliveira (dir.); vol. X, 2004; pp.435-436). 3.4.2.5.Os interiores em 1903 Os quartos de dormir não podem ter uma capacidade inferior a 25 metros cúbicos por pessoa. Esta normativa, definida pela legislação sobre a salubridade do edificado vem afastar por completo as métricas marcadas pela medida velha, o palmo. Por outro lado, o facto de serem proíbidos quartos de dormir sem janela vem pôr fim adiado aos quartos interiores, por norma situados entre zonas de passagem e que eram prática no edificado do século XVI à 1ª metade do século XVIII. Os quartos interiores, ainda se verificam no fogo tipo dos edifícios do Bairro Lopes — cujo loteamento se iniciou nos anos 20 do século XX, cite-se a título de exemplo o nº 11 na Rua Sousa Viterbo. André Brun em 1916, fornece-nos uma descrição de um terceiro andar na Rua de S. João dos Bem Casados, em campo de Ourique. A sua descrição corresponde ao protótipo de muitos edifícios à época: ”… à frente duas casas: a saleta que também goza a fama de ser escritório e sala. Interiores: a alcova de Praxedes que dá para a sala por uma porta envidraçada, o quarto da filha com luz para a casa de jantar, o dos filhos com frente para o saguão. À retaguarda: a cozinha e a casa de jantar que serve de casa da costura e de engomados. Em cima: o sotão onde dorme a criada. No corredor: um armário cheirando a ratos e a chouriço que passa por ser a dispensa.…”. in Praxedes mulher e filhos, cadastro de uma família lisboeta, 1916 appud SILVA, Maria Raquel Henriques da, 1985; pp.143-144). Desta forma toma forma a organização planimétrica dos diferentes espaços na habitação. Os dados fornecidos por Joel Serrão e A. H. Oliveira Marques para o hiato entre 1890 e 1910 parecem corroborá-la. A partir do corredor conseguia-se aceder a todas as divisões do apartamento, mesmo as interiores, proibidas a partir de 1903. A possível iluminação natural que os corredores apenas recebiam era coada pelas bandeira de vidro das portas de acesso às diferentes assoalhadas. A sala de jantar ficava por norma perto da cozinha, nas traseiras do edifício. Junto da porta de entrada da habitação ficavam as salas, cujos vãos permitiam ver a rua. A casa de banho ficava perto da cozinha e da sala de jantar. Na primeira podiam-se ver, como peças essenciais, uma tina, um lavatório, uma sanita com tampa e autoclismo, um esquentador (usualmente a gás), um bidé, um
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espelho e toalheiros, e a banheira, a peça sanitária mais cara (cf. SERRÃO, Joel & MARQUES, A. H. Oliveira (dir.); vol. XI, 2004; p. 640). O número de divisões por fogo oscilava entre seis a oito divisões; entre elas encontravam-se os quartos de dormir, as salas, a cozinha a casa de banho, as arrecadações, a despensa e o recanto com pia (cf. SERRÃO, Joel & MARQUES, A. H. Oliveira (dir.); vol. XI, 2004; pp. 636-637). O quadro não ficaria completo sem o quarto independente, compartimento com acesso directo para as escadas. 3.5. Edficado de 1930 a 1940 Não foi encontrado ao momento da pesquisa nenhuma documentação que demonstrasse que, entre 1903 e 1930 tenha deixado de não vigorar o Regulamento de Salubridade das edificações urbanas de 1903. É, contudo, notório que o Regulamento Geral da Construção Urbana para Cidade de Lisboa de 1930, baseia alguns dos seus pontos no Regulamento de 1903. 3.5.1. O Regulamento Geral da Construção Urbana para Cidade de Lisboa de 1930 O Regulamento Geral da Construção urbana para Cidade de Lisboa, aprovado na Sessão de 28 de Agosto de 1930 divide a cidade em 3 zonas de construção — 1ª Zona ou zona Principal, 2ª Zona ou zona Média, 3ª Zona ou zona Exterior —, para cada uma os requisitos a atingir variariam. Este regulamente conheceria uma 7ª edição em 1948. A sua vigência apenas terminaria com aprovação do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), em 1951. Para os edifícios de arquitectura corrente, de acordo com o artigo 32º, do referido regulamento, são estabelecidas espessuras mínimas das paredes e divisórias, excluindo desta os rebocos e guarnecimento. São atribuídas espessuras específicas para as paredes de fachadas e paredes que sirvam da apoio ao vigamento; para empenas, paredes de saguão e paredes que não recebam cargas dos pavimentos; para paredes de caves; para frontais suportando vigamentos e divisórias das escadas. Elucidativo do método construtivo é o facto de para as paredes de fachadas e paredes que sirvam da apoio ao vigamento, serem postas as seguintes normativas: a) alvenaria ordinária com 0.40 m no último andar, aumentando 0.10 m nos pisos inferiores em cada andar; b) alvenaria de tijolo, vez e meia no último piso, aumentando nos andares inferiores, meia vez em cada piso;
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c) blocos de cimento com 0.30 m no último piso, 0.40 m nos andares seguintes, aumentando nos pisos inferiores 0.10 m em cada piso. Reflexo da passagem do tempo e do ganhar terreno de novas opções construtivas, os frontais e os tabiques, tecidos ou construídos em madeira, ficam restringidos situações específicas. Assim, e de acordo com o artigo 35º do Regulamento Geral da Construção Urbana para Cidade de Lisboa, apenas podem ser utilizados em divisórias de sotãos, andares recolhidos ou mansardas, ou quando as circunstâncias inviabilizem a utilização de um material mais resistente. 3.5.2. Imagem do edificado regulamentado em 28 de Agosto de 1930 No que respeita às paredes de fachadas, assistimos a um remate inferior. Deste modo, e de acordo com o artigo 44º as paredes de fachada que dêem para a via pública serão sempre inferiormente revestidas com o soco, que permita a sua lavagem e limpeza fácil. No que concerne
às
mansardas, ou janelas de trapeira, de acordo com o artigo 45 do Regulamento Geral da Construção Urbana para Cidade de Lisboa, o seu revestimento exterior deverá ser impermeável, com reduzida conductibilidade calorífera, incombustível e com resistência à acção dos agentes atmosféricos. No que respeita aos pisos térreos e caves, estes deverão, como o regulamentado em 1903, apresentar um pavimento com uma camada impermeável, de 0.08 m de espessura, ou, em alternativa, uma caixa de ar com uma altura mínima de 0.60m. Esta deverá ter aberturas nas parede para comunicação com o ar exterior. Assim, assistimos à continuação dos respiradouros e de um lance de escadas que medeia entre o piso de soleira e o rés-do-chão. Poder-se-á justificar desta forma a razão pela qual esses primeiros lances de escadas, nalguns casos como na Rua Nova de S. Mamede apresentam respiradouros. Nos edifícios contíguos, ou confinantes, deverão, pelo regulamento de 1930, ter uma certa harmonia arquitectónica entre si. Esta normativa não deverá, no entanto, ser cumprida caso os edifícios adjacentes tenham “linhas que não convenha reproduzir”. Nestas circunstâncias poderia ser autorizada “uma fachada de diferente carácter arquitectónico”. As cores do paramento exterior das fachada deverão ser de acordo com o artigo 87º do Regulamento Geral da Construção urbana para Cidade de Lisboa, de tons suaves. Segundo o mesmo artigo não são permitidas pinturas parciais nas fachadas de edifícios já existentes, que perturbem a harmonia do conjunto. As frontarias dos pavimentos térreos sobre a via pública não poderiam ter grades de bojo nas janelas, janelas ou portas abrindo para via e balcões saindo para fora das ombreiras.
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A legislação prevê que os compartimentos da habitação tenham todos, pelo menos, uma janela ou porta que abra directamente para os exterior. Esta regra apenas pode ser quebrada caso o compartimento seja contíguo a outros dois que possuam frestas, janelas ou portas com bandeiras e não seja destinado a permanência diurna ou nocturna. Vemos assim, regulamentados em 1930, compartimentos interiores. De acordo com o artigo 177º, as escadas de salvação, a construir por norma nas traseiras do edifício são obrigatórias em todos os imóveis que tenham mais de dois pisos. Contam nesses dois pisos, para o efeito, mansardas, caves e sotãos destinados à habitação. É também obrigatória a escada de salvação quando o número de indivíduos por andar for superior a dois. Caso o edifício tenha, além da escada principal, uma escada de serviço, não é necessária a de salvação. Esta última, deverá ser constituída por lanços rectos, sendo proíbidos lanços circulares, ou em caracol, salvo casos muito especiais. Entre edifícios contíguos é necessária a existência de guarda-fogos, talhados em degraus, sempre que possível, para mais fácil acesso dos bombeiros. Para os edifícios com grande extensão, deverão existir guarda-fogos de 20 em 20 m. De acordo com o artigo 183º do referido regulamento, em todos os edifícios com mais de três pisos que não possuam platibanda ou em que a mesma tenha uma altura inferior a 0.50 m, deverão ser construídos fortes gradeamentos de resguardo. A primeira deverá
sempre que não for
construída com tijolo, não ser superior a 0.30 m. Os peitoris e panos de peito de janela, conforme normalizado pelo já referido Regulamento, não deverão, por regra, ter uma espessura superior a 0.30 m. 3.5.3. Conformação altimétrica do edificado regulamentado em 28 de Agosto de 1930 A moda da cércea do edificado situado num quarteirão é determinada de uma nova forma relativamente ao que se vinha legislando deste 1864. Esta passa a ser determinada pela largura da rua multiplicada por 1.5. Contudo, não se poderia exceder a cota máxima de 21 m, salvo casos especiais, em que os edifícios tivesse um cariz monumental ou fossem construídos por um sistema de construção ou materiais adequados. No que concerne aos edifícios de gaveto resultantes do cruzamento de grandes artérias, estes deverão elevar mais um piso acima dos 21 m de altura, embora não possam exceder os 25 m. Contudo, no que respeita a imóveis a construir entre outros já existentes de altura superior a 21 m que lhe são adjacentes, a cércea dos primeiros
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deverá ser a média dos confinantes. No caso de os edifícios terem “corredores” ou passagens laterais a sua cércea será 21 m, aos quais se retirará a altura de um piso. Acima da cornija apenas são permitidos, tal como em 1902 e 1903, andares recolhidos ,mas estes não poderão ocupar uma área superior a 1/10 da superfície total do imóvel. Para as construções recuadas no seu todo ou em parte da alinha marginal do arruamento a moda da cércea será uma vez e meia a soma da largura da rua acrescida da extensão do recuo, desde que não se exceda exceder os já referidos 21 m de altura. As alturas mínimas dos pisos dos edifícios mantêm-se como em 1903. Contudo agora são especificados pés direitos distintos: um para as 1 ª e a 2ª Zona de Construção, e outro a observar na 3ª Zona de Construção, a que abrange o território de análise. Assim, para a 3ª Zona de Construção são estipulados os seguintes pés direitos: 3.00 m para as caves; 2.50 m para as sobrelojas; 3.00 m para o rés-do-chão, lojas e 1º andar; 2.85 m para os 2º e 3º andares; 2.70 m para outros andares; e 2.50 m para mansardas, sotãos e águas furtadas — pé direito que neste último caso, se terá de manter em pelo menos metade da área, sem nunca descer em qualquer ponto para uma altura inferior a 2.70 m. A normativa para os pisos semi-enterrrados, agora mencionados pela legislação como cave, segue as regras definidas no Regulamento de Salubridade das Edificações Urbanas de 1903, aprofundando alguns detalhes. Assim, o pavimento das caves apenas poderá ficar a 1.00 m abaixo do nível da rua. Por outro lado, se a cave tiver uma das faces — usualmente o tardoz —, totalmente dasafrontada e erguida acima do solo, o pavimento da parte soterrada poderá ficar 1.50 m abaixo do nível da rua ou do terreno. As alterações a estas regras apenas se poderão fazer em casos muito especiais e com autorização da Câmara Municipal de Lisboa, sendo que as condições de salubridade, iluminação e arejamento deverão ser sempre preservadas. 3.5.4. Organização dos edifícios regulamentados em 28 de Agosto de 1930 3.5.4.1. No quarteirão A regulamentação para a cidade de Lisboa de 1930, reforça a obrigatoriedade de existir uma das fachadas edifício voltada para um quintal, logradouro ou terreno livre descoberto que facilite a circulação de ar e a iluminação nessa fachada. Simultaneamente introduz uma nova métrica entre a relação edifício/ logradouro na parcela urbana. Desta forma, o logradouro deverá ter uma profundidade mínima — medida na perpendicular a meio de qualquer dos vãos da fachada —, a medida de 1/3 da altura do edifício, desde que esta dimensão não seja inferior a 3m ou 6 m, no
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caso de edifícios com mais de quatro pisos. Outro elemento surge na relação edifício /parcela urbana/ confinante: o corredor de passagem lateral, deve ter a largura correspondente a 1/6 parte da maior altura da empena. Salvaguarda-se, no entanto, a medida mínima obrigatória de 2 m de largura, caso os vãos abertos nessa empena sirvam para iluminação para compartimentos de permanência nocturna e diurna. Se, pelo contrário, esses vãos se destinem a outro compartimentos com outras características, a largura do corredor de passagem poderá ser apenas de 1 m. Apesar de a legislação de 1903 ser omissa, relativamente a este aspecto, não deixa de curioso pela sua excepção, é edifício Rua Gustavo Matos Sequeira nº 33 com o seus corredores de passagem adjacentes e gradeamentos artísticos de acesso ao mesmos. Contudo, pelo decreto nº 902 de Setembro de 1914, artigo 3º, ficamos a saber que este cuidado aparentemente já vigorava em 1914: “…A Câmara municipal de Lisboa fica autorizada a impôr aos proprietários que pretendam construir nas ruas que para êsse efeito fôram designadas, a obrigação de deixarem entre a frente dos prédios e dos alinhamentos das ruas, jardins vedados, a largura mínima que fôr fixada por cada uma daquelas ruas…” (cf. CML; 1933; Regulamento Geral da Construção Urbana para a Cidade de Lisboa, pp. 143-1444). 3.5.4.2. Planimetricamente (planta distributiva) No que diz respeito às escadas dos edifícios a legislação de 1930 acentua as normativas regulamentadas em 1903 e aprofunda-os. Estas deverão ser constituídas por lanços rectos separados por patins cuja largura não deverá ser inferior à das escadas. São proibidas as escadas em leque ou caracol, salvo raras excepções. São conformadas medidas mínimas para largura dos lanços, não inferior a 0.80 m; para a altura geral dos degraus, entre os 0.14 m e os 0.18 m; e para a sua largura, não menos de 0.23 m. Como em 1903, observamos que as escadas continuam a ser constituídas por um vazio central, denominado pela legislação de 1930, como bomba de escada. Contudo, Regulamento Geral da Construção Urbana para Cidade de Lisboa, de 28 de Agosto de 1930, especifica agora medidas mínima para esta última. Assim, para edifício com um máximo de três andares, a bomba de escadas terá um mínimo de 0.40 m. Para edifícios com altura superior a três pisos, esta mínima subirá para 0.50 m. Para os edifícios que se construam em Avenidas ou Praças da 1ª Zona de construção e com mais de quatro pisos, há ainda outros requisitos a cumprir, a saber: uma escada de serviço e um elevador com capacidade para pelo menos duas pessoas; uma escada de salvação que poderá ser utilizada como escada de serviço conquanto tenha acesso fácil para a via pública; todos os
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edifícios de habitação da 1ª Zona de construção e nos arruamentos de largura superior a 20 m da 2ª Zona de construção, que tenham mais de seis inquilinos deverão ter uma habitação destinada ao porteiro. Esta será tão próxima da entrada do edifício quanto possível. O território em análise, da Cotovia ao Rato, não fica abrangido por estas normativas, uma vez que se encontra na chamada 3ª Zona ou Zona Exterior de Construção. Contudo, deixamo-las aqui apontadas como caracterizadoras de uma arquitectura corrente da cidade que não era feita igual para todos. As águas furtadas, caves e sotãos conquanto cumpram as normativas regulamentares podem ser acedidas pela escada geral. Este facto vem imprimir uma maior necessidade de cumprimento das postura, por forma a obter uma mais qualificada planta distributiva. Acresce que as latrinas e cozinhas apenas podem ser construídas nestes espaços, se estes forem destinados à habitação. Os quartos de dormir deverão, para o território em análise, ter uma superfície mínima de 8 m2. Sendo que, por cada grupo de três compartimentos com esta função, um deles poderá ter uma superfície mínima de 6 m2. As cozinhas, por seu turno, terão uma superfície mínima de 6 m2. Para os dois tipos de compartimentos referidos, na sua planta deverá poder inscrever-se um círculo com um diâmetro mínimo de 2 m. Pelo artigo 123º do Regulamento Geral da Construção Urbana para Cidade de Lisboa, é atribuída uma largura mínima aos corredores, de 1 m para a 2ª e 3ª Zonas de Construção. As latrinas, pias e casas de banho seguem as normativas da legislação de 1903, aprofundando alguns aspectos. Assim, é desejável que as latrinas que estejam no exterior do edifícios — em varandas ou em anexos nos logradouros —, tenham envidraçados e coberturas que abriguem a passagem para as mesmas. O artigo 128º do Regulamento Geral da Construção Urbana para Cidade de Lisboa legisla, ao contrário do que acontecia nos regulamentos antecedentes, um espaço claramente destinado à casa de banho. De acordo com este artigo este espaço deverá ter uma área mínima de 1,20 m2, quando construído no interior da habitação, e 1 m2 quando fora. 3.5.5. Interiores do edificado regulamentado em 28 de Agosto de 1930 O regulamento das construções urbanas para a cidade de Lisboa, comtempla novas divisões associadas à planta de uma habitação. Assim são claramente mencionadas casas de banho, copas e cozinhas. Pela primeira vez o espaço da cozinha adquire novas espeficidades. As cozinhas serão impermeabilizadas até à cota de 1.50 m acima do pavimento. Sendo para isso revestidas a azulejos ou outro material impermeável de fácil lavagem. Contudo, apenas para o edificado situado na 1ª Zona de construção é obrigatório um “lava-louças com esgoto munido de depósito de gorduras”. O
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pavimento da cozinha bem como os pavimentos de varandas que liguem à primeira, deverá ser em material imputrescível e incombustíveis. O mesmo tipo de material deverá ser empregue em copas e casas de banho e varandas que a estas liguem. Como normativa para todo o edificado é estabelecido que todos os edifícios deverão ter água canalizada e especificado como o seu encanamento deve ser feito. 3.5.6. Bairro Pombal A designação Bairro Pombal, hoje caída em desuso, abrangia toda a encosta entre a Rua da Escola Politécnica e a Rua de S. Bento. Zona em que a partir de da década de 1740 se empreendeu uma urbanização que se prolongou durante todo o século XIX (fig.3.44). Este Bairro devia o seu nome a um pombal existente na quinta dos Soares de Noronha (Fig. CAP.III-45), situado na parte rural da propriedade, no extremo do muro, na continuação da fachada nascente-sul (cf. SEQUEIRA, Gustavo Matos, vol. II 1918; pp. 2-4). Todo o terreno compreendido entre a Rua da Escola Politécnica, a Rua de S. Bento, desde Jesus ao Rato era, em 1650, propriedade das Quinta dos Soares da Cotovia. Esta vinha até à beira dos Olivais de S. Bento — nova Colónia, Estrela —, quase defronte do canto norte do Convento de S. Bento, a quinta do Cirurgião-mór, a dos Cardais, a da Palmeira e a quinta defronte dos convento Beneditinos. A rua de Monte Olivete e o lado nascente da Rua Nova da Piedade constituíam talvez a linha divisória da quinta dos Soares (cf. SEQUEIRA, Gustavo Matos, vol. I 1918; pp. 152-153). Em 1747, no Rol dos Confessados, é mencionado o Bairro Pombal, possuindo à data cinco fogos. No ano anterior, na mesma fonte, é referida a rua do Pombal de Monte-Olivete, onde residiam 22 famílias, em edifícios pontuando os dois lados da rua (cf. SEQUEIRA, Gustavo Matos, 1918; vol. I; pp. 2-3). No ano de 1750, Pombal do Monte-Olivete tinha dois arruamentos: o Pombal e a Rua de Nossa Senhora Monte-Olivete. No ano de 1755 as casas entre ambos os arruamentos tinham-se aproximado e formara-se uma nova rua, com o nome de rua da Penha de França. Outras tinham surgido em redor do Pombal, a meia encosta: Rua dos Prazeres, da Nossa Senhora da Conceição, da Madre Deus, de Santo António e do Cego (cf. SEQUEIRA, Gustavo Matos, 1918; vol. I; p. 3). Os terrenos a norte da quinta dos Soares Noronha foram povoados depois de 1760. Até 1770 a parte ocupada posteriormente pelas ruas do Arco, das Fábricas das Sedas, do Noronha e pela travessa do Noronha tinha, no dizer de Gustavo Matos Sequeira, uma feição rústica de arrabalde. Contudo, D. Rodrigo António de Melo e sua mulher facilitaram os aforamentos. Desta forma, a desagregação da parte norte da quinta fez-se rapidamente (cf. SEQUEIRA, Gustavo Matos, 1918; p.
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4-5). Demonstrativo da extensão desta quinta é um pequeno letreiro de pedra, referido por Gustavo Matos Sequeira, no edifício da Rua de S-. Bento nº 276-280 tornejando para a Rua Nova da Piedade, onde se podia lêr
Fº Aº Jº Pº SOARES.
Esta placa indicia que a quinta se prolongava para o sul, à medida que descaía para S. Bento, alcançando como ponto extremo esses ou outros chãos contíguos, defronte da cerca de S. Bento (cf. SEQUEIRA, Gustavo Matos, 1918; vol. I; pp. 5-6, em nota). Em 1774 D. Maria Antónia Soares solicitou a nomeação de administradores dado o deplorável estado em que se encontrava o morgado. Em 1819 o solar dos Soares, arrendado ao Estado desde 1768 para instalação da Imprensa Régia, passou para a posse definitiva deste. Assim, a fazenda torna-se cada vez mais bairro, nomeadamente por meio da Companhia Edificadora, organizada por António Rodrigues e Jorge Roiz de Carvalho, mestres de obras. O solar, edificado nos séculos XVII e XVIII, ocupando a Rua do Pombal — actualmente rua da Imprensa Nacional —, começaria a ser demolido em 1895, as campanhas de obras alongar-seiam-se até 1913. No seu lugar seria construído o actual edifício da Imprensa Nacional, nº 119-143 da Rua da Escola Politécnica (cf. COUCEIRO, Gonçalo in FRANÇA, José-Augusto (coord.); 1994; p.117). O crescimento do Bairro é-nos mostrado em 1762 pelo do livro 499 do Lançamento da Décima, Superintendência de Santa Isabel. Nesse ano o Bairro já possuía 35 propriedades na Rua do Pombal, 21 na Rua da Conceição, 38 na Rua da Madre de Deus, 45 na Rua dos Prazeres, 23 na Rua da Penha de França, 25 na Rua Monte-Olivete, 4 na Rua de Santo António, 7 na Rua do Noronha e 4 na Travessa do Monte do Carmo. Acresce a isto 31 barracas sem arruamento, sitas nuns terrenos à esquerda do Seminário da Patriarcal e noutros mais entre a Travessa do Monte do Carmo e a Rua da Patriarcal (cf. SEQUEIRA, Gustavo Matos, 1918; vol.I; p. 7). No que refere à toponímia, a Rua do Pombal de Monte-Olivete, nome com que aparece em 1746, é referida 3 anos depois como Rua do Pombal, e em 1751 engloba-se na Rua de Nossa Senhora Monte-Olivete, da qual apenas se separa em 1754. De 1758 em diante são-lhe atribuídos diversos nomes — Rua do Pombal, Rua Direita do Pombal e Travessa do Pombal. Em 1880 passa a ser referida como Rua da Imprensa, nome que ainda vigorava em 1918. A Travessa de Pombal teve entre 1759 e 1762 o nome de Rua de Santo António ao Pombal e, em 1763, a designação de Travessa de Santo António. Em 1918 era conhecida como Rua de Santo António. A Rua da Penha de França, arruamento que data de 1755, tinha, em 1778, o nome de Rua das Franças. A Rua do
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Monte-Olivete teve a designação de Rua de Nossa Senhora Monte-Olivete até 1754 e foi englobada na do Pombal, como se as duas formassem um único arruamento. Entre 1758 e 1761 esta rua era conhecida como de Nossa Senhora das Mães dos Homens e Cotovia, ou de Nossa Senhora das Mães dos Homens aos Apóstolos. Posteriormente voltou a ser designada por Rua de Nossa Senhora Monte-Olivete. A rua do Monte do Carmo, aberta em 1760, seria primeiro nomeada como Travessa do Monte do Carmo. Em meados da década de 1760 conheceria o nome de Rua dos Nobres. A “traveça de S. Marçal” viria a ser conhecida pelos nomes de Travessa do Hospício, do Seminário e de S. Francisco de Borja. A Rua de Marcos Portugal viria a ter a designação de Nossa Senhora da Conceição. A rua da Madre de Deus, aberta em 1755, em 1918 tinha o nome de Rua Manuel Bernardes. A Rua de Nossa Senhora dos Prazeres, em 1916, é conhecida como Rua dos Prazeres. A Travessa do Cego, aberta também em 1755, entre 1760 e 1762 é referida como Travessa da Boa-Hora (cf. SEQUEIRA, Gustavo Matos, 1918; vol. I pp. 8-27). 3.5.6.1. Construção da planta distributiva e interiores, e aspectos de alçado do Bairro Pombal A ausência de informação gráfica no que respeita à planta dos edifícios de rendimento balizados entre um período ainda pombalino e os anos de génese do edifício gaioleiro levou-nos a recolher a informação disponível nos contratos de locação de obra entre 1850 e 1871. A tal não é alheio que apenas em 1864, embora sem carácter sistemático, os prospectos passarem a incluir plantas sumárias de distribuição interior; contrariamente ao em 1836, mencionavam somente : “… apresentar risco á Camara Municipal, e obter desta a necessaria approvação…” para qualquer obra de edificação e reedificação (cf. Diário do Governo, nº 55, 4 de Março de 1836, p. 303 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp. 686-687). Os dados que vieram a lume permitiram, se não suprir totalmente a inexistência de plantas do edificado de arquitectura corrente — característica dos planos submetidos à Câmara de Lisboa pelo menos até 1868, data em que encontramos um o contrato de locação de obra de 23 de Março desse ano referindo conforme planta e alçado aprovados pela Ex ma Camara (cf. Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 69; caixa 147; Livro 683, fls. 43-45v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo)4 —, pelo menos, desenhar traços característicos da evolução da planta distributiva dos
4
Apenas em postura de 13 de Maio de 1913 são definidas as peças obrigatórias nos projectos submetidos à Câmara Municipal de Lisboa. Nele constam memórias descritivas suficientemente desenvolvidas, alçados principais, laterais e posteriores, cortes transversais e longitudinais à escala 1/100 de forma a obter uma perfeita compreensão do edifício e da sua estrutura. É exigida pormenorização à escala 1/20. assim a partir de 1913 os processos são bastante completos possuindo geralmente plantas (cortes horizontais) à escala 1/100 e por vezes pormenores à escala 1/5 e 1/2 (cf. APPLETON, João Guilherme; 2005; pp. 26-27).
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mesmos e as características da sua caixa de escadas. Possibilita igualmente delinear a nítida mudança que ocorre já no ano de 1861, no edificado, e inferir claramente a construção de um edifício gaioleiro. Em 1858 verificamos a atribuição do nome quarto esquerdo e quarto direito para fogo esquerdo e fogo direito. E ao longo da documentação encontrada a atribuição do nome caza ou casa para nomear a divisão de um fogo. Os poiais para potes, carvoeiras e armários é uma das facilidades que as cozinhas têm que dispensar aos seus utentes. Eles são presença nos registos notariais de 1791, em 1858 e em 1868. Contudo, nesse hiato, o espaço das cozinhas modifica-se. Se em 1858 o revestimento azulejar não fazia parte recorrente do interior da cozinha, em 1863 já aparece. Na amostra analisada apenas uma referência encontramos quanto ao pavimento das
cozinhas. Trata-se de um
documento de 1858, no qual é referido que este será “…assoalhado com madeira da terra…”, ainda num contexto claramente pombalino (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 67; caixa 143; Livro 631; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Fica por definir se em data anterior ao Regulamento das Construções Urbanas para a Cidade de Lisboa, de 1930 dado que os regulamentos de salubridade das edificações urbanas de 1902 e 1903 são omissos a esse respeito. Os dados levantados por Maria do Carmo Marques Pires para a Rua Álvares Cabral(18951940) no Porto, particularmente as memórias descritivas constantes nos processo de até ao início do século XX, não referem qual o pavimento a ser usado nas cozinhas. Apenas os processos já regidos pelo regulamento de 1930 referem que o paramento horizontal das cozinhas deverá ser forrado a mosaico, levando lambris de azulejo até a 1.50 m de altura. Por outro lado, o estudo de um quarteirão nas Avenidas Novas de Lisboa — Avenida da República/ Visconde Valmor/ Avenida 5 de Outubro/ Avenida Elias Garcia —, realizado por João Guilherme Appleton revela que o pavimento das cozinhas do edificado dessa unidade urbana é de mosaicos, revestimento igualmente usado nas casas de banho. Contudo, por dados expressos pelo mesmo autor sabemos que a expropriação para os lotes de terrenos, onde terá lugar esse quarteirão, se efectuará apenas em 1889 por decreto de 4 de outubro desse ano (cf. APPLETON, João Guilherme; 2005; p 33 e p. 7). Através de um registo notarial de 3 de Novembro de 1863, damo-nos conta de um cuidado até então não mencionado nos registos anteriores, o de forrar o interior das chaminés: “…Que as chaminés serão de cantaria forradas d’ azulejo por dentro…” (cf. Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 48; caixa 145; Livro 673, fls 67v- 68v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo).
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Numa nota referente ao tecto das cozinhas, datada de 5 de outubro de 1858, percebemos que é apenas forrado tal como o corredor, do mesmo edifício a ser reedificado. Em 24 de Março de 1865, já encontramos uma referência diferente: “…Que todos os tectos serão fasqueados de madeira de casquinha, e estucados, assim como as paredes, por bom estucador…” (cf. Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 68; caixa 146; Livro 677, fls. 52v-53v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). No que se refere ao ambiente interior das divisões de cada fogo, usualmente designadas por casas, em 1866 deparamo-nos com um dado novo: o forrar a papel os compartimentos. Este dado, constante no registo notarial de 27 de Março do referido ano (cf. Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 68; caixa 146; Livro 679, fls. 63-64v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo), situa-nos numa mudança de estética que claramente nos afasta dos interiores pombalinos. Muito embora não tenhamos encontrado dados que sejam aplicados a toda a arquitectura corrente, esta nova sensibilidade, contrasta grandemente com “… as paredes todas caiadas e todas em geral e as pinturas como as iniciadas…” (cf. Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 79; caixa 144; Livro 667, fls. 73v-75v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). No que se refere à caixa da escadas, à própria escada, e ao espaço que antecede o seu degrau de arranque observamos uma transformação enorme entre1758 e 1869. No ano de 1758, a 5 de outubro, o modelo de caixa de escadas prefigura o espaço caracteristicamente pombalino, sendo apenas referida a escada como único elemento de composição da primeira: “…sera aquella nova de madeira de casquinha, e os degraos feitos tambem novos de madeira da terra…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 79; caixa 143; Livro 631; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Em 1858 ,a escada surge associada a uma claraboia: “…escada com claraboia e serventia para o sotaõ pela mesma escada…” (cf. ANTT, Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 1, Cx. 144, Livro 667, fl. 73v-75v) Em 1861, esse modelo parece confirmado (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 79; caixa 144; Livro 667, fls. 73v-75v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Noutro registo percebemos outras mudanças: “… Que a escada (…) seguirá até ás agoas furtadas com engradamento de ferro e claraboia…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 68; caixa 146; Livro 667, fls. 52 v-53v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Por outro lado virtude das sensibilidades vemos descrito em registo notarial de 23 de Março de 1868 “…que o corrimão da escada levará huma grade de ferro…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 69; caixa 147; Livro 683, fls. 43v-45v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Pensamos que normativas como esta estão na origem do aparecimento do dito corrimão, como
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acima referido, ao nível do primeiro lanço de escada, quando o menor comprimento da caixa de escada aparentemente não justificaria tal medida. O quadro não ficaria contudo completo sem a sua comparação com o edifício da Rua S. João da Mata nº 17-23. Este imóvel datado do primeiro terço do século XIX, com um primeiro andar nobre não deixa de ser interessante . Não só apresenta um a sua escada com o seu vazio central e clarabóia (Figs. CAP.III-46 e 47), como um arco que antecede as escadas de acesso ao primeiro piso e seguintes (Fig. CAP.III-48). A solução em si não é diferente da que se encontra em edifícios pombalinos com algum aparato. O que é de registar é a evolução da sua caixa de escada; o modelo que encontramos já estabilizado em 1861 no comum edifício de rendimento e a novidade da sua clarabóia. Se, quanto á sua planta distributiva ela parece ser claramente conformada pela dignidade necessária a um piso nobre de tectos e paredes cuidadosamente trabalhados, o tratamento dos seus paramentos não é equalitário de fogo para fogo. Esta opção parece-nos clarificada pelo tratamento dos mesmos no último piso do imóvel. As paredes das escadas, de singelas paredes caiadas a branco— conforme nos faz saber o registo notarial de 5 de outubro de 1858 (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 67; caixa 143; Livro 631, Arquivo Nacional da Torre do Tombo) — surgem-nos pintadas a ”fingido de pedra” “nuns predios a reedificar na rua da Rosa das Partilhas” num registo notarial de 5 de agosto de 1861. No referido registo, damo-nos conta de uma nova leitura da entrada da escada não só no que respeita ao tratamento diferenciado do seu pavimento relativamente à escada, como também em termos o seu tratamento espacial: “… a entrada da escada terá um arco de cantaria com molduras nas impostas, sendo lageada a mesma escada até ao arco…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 79; caixa 144; Livro 667, fls. 73v-75v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Mostra da mudança de sensibilidades é o registo notarial de 9 de Janeiro de 1869: “…Que a escada será á moderna de gavetos: a entrada será lageada de pedra branca, a pedra digo branco, e preto de xadrez: o primeiro degráo será de cantaria igual á do arco: os pés da mesma escada que deve ser de dois lances serão de casquinha, e os cobertores serão de madeira do pinhal real e de trez centimetros de grossura: Os patins serão feitos de madeira da terra…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 69; caixa 147; Livro 685, fls. 62v-64v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). O revestimento azulejar das fachadas é como anteriormente se referiu um dado da sensibilidade de um gosto de época. Contudo, nos contratos de obra que vimos, apenas um registo ordena essa opção estética: “…Que as duas frentes para a rua de S. Bento, e largo dos carros, serão forradas
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de azulejo…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 69; caixa 147; Livro 685, fls. 62v-64v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Apesar da proibição dos balcões e guarda-pós, os últimos continuam a ser presença assídua no edificado como parecem comprovar os contratos de obra levantados nos registos notariais de Lisboa até 1868. Imprescindíveis no seu desenho parecem ser as suas ripas de madeira da terra: ou ”… de casquinha e ripa de Castanho ou madeira salgada…” (cf. ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório 11. Cx. 155, livro 732, pag. 55-59 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp.625-627). No que respeita ao desenho de alçado o documento de 3 de Novembro de 1863 fornece-nos alguma informação: “…e de frente cada andar cinco janellas, comprehendendo as trez do centro do primeiro andar, huma sacada de bacia, e as duas reentrantes serão de grade entalada, assim como todas as do segundo andar. 2ª Que as ombreiras de todas as ditas janellas, assim com de fôrro das lojas, socos das pilastras e pilastras, será tudo de cantaria abancada e escudada, batibanda fingindo pedra sendo a frente medida da area do seis sôcco…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 48; caixa 145; Livro 673, fls 67v- 68v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Contudo, em 1868, parece existir uma mudança de atitude, já não se procede ao capeamento dos extremos dos edifícios mas se finge os mesmos: “…os cunhais seraõ fingidos com huma agoada, e os competentes traços, e salientes conforme a planta…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 1, Cx. 147, maço 69; Livro 679; fl 43-45v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). O registo notarial de 9 de Janeiro de 1869 também é elucidativo quanto a essa mudança: “…Que os cunhais que deitaõ para o pateo e para o largo dos carros, seraõ d’ alvenaria fingindo pedra…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 1, Cx. 147, maço 69; Livro 685; fl 62-64v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo) No que concerne ao remate do edifício, a platibanda adquire um desenho mais elaborado como nos elucida o registo notarial de 9 de janeiro de 1869: “…Que as semalhas gerais, serão feitas d’ alvenaria, assim como a platibanda que levará quatro ou seis enfeites de louça vidrada. Que os balaustres das trez frentes serão redondos, e de louça vidrada…” O mesmo registo esclarece-nos quanto aos cunhais do edifício a reedificar: “…Que os cunhais que deitão para o pateo e para o largo dos carros, serão d’ alvenaria fingindo pedra…” (cf. Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 69; caixa 147; Livro 685, fls. 62v-64v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). As trapeiras vemo-las surgirem em zinco (Fig. CAP.III-49 e Fig. CAP.III-50) pela primeira vez em num registo notarial de 3 de Novembro de 1863: “…Que a escada levará huma grade de ferro até ao sótão, sendo este livre, e assoalhado de madeira da terra de cuja madeira será também o guarda-pó e
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ripa. Que o madeiramento será de castanho, e terá duas trapeiras de zinco…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 48; caixa 145; Livro 673, fls. 68-68v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). As trapeiras com este novo envelope aparecem igualmente no registo notarial de 24 de Março de 1865: “…o madeiramento do telhado será de castanho: levará quatro trapeiras forradas de zinco…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 68; caixa 146; Livro 677, fls. 52v-53v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). No que se refere ao espaço para a casa de banho, este aparece prefigurado pelo registo de 16 de Maio de 1862, ao localizá-lo no exterior, dando continuidade ao Regulamento de Salubridade das Edificações Urbanas de 1902 — “…tapumes nas sacadas das pias…” (cf. Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 79; caixa 144; Livro 669, fls. 90-91; Arquivo Nacional da Torre do Tombo) —, como é visível nas traseira de um edifício que dá para o Alto do Longo, no Bairro Alto. No que concerne aos compartimentos base de uma habitação, o registo notarial de 5 de agosto de 1861 é demonstrativo das divisões da mesma: “…Que cada hum dos referidos andares terá salla, salleta, trez quartos de cama, casa de jantar com uma janella de peitos para o lado do saguão, cosinha tambem com uma janella, porem de sacada para o mesmo saguão…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 79; caixa 144; Livro 667, fls. 73v-75v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Por outro lado, o mesmo registo mas relativo a um edifício com loja sito Rua do Carvalho (o registo de 5 de Agosto de 1861) é expressivo de uma mudança quanto à tipologia do fogo: “…Que cada andar terá salla, salleta, um quarto de cama, casa de jantar e cosinha, e a loja só terá quatro casas, em consequencia da arcada que serve a casa d’ entrada…” (cf. Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 79; caixa 144; Livro 667, fls. 73-75v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Através de um registo notarial de 3 de Novembro de 1863, de um edifício a ser aumentado em numero de pisos, sito na Rua Direita da Freguesia de Santa Isabel, apercebemo-nos de outra tipologia: “…sendo cada pavimento sete casas…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 48; caixa 145; Livro 673, fls 67v- 68v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Outro registo permite-nos esclarecer melhor o aproveitamento do telhado como piso de habitação: “…O primeiro, o segundo e terceiro andares devem levar as divisorias conforme está marcado na planta; levando uma escada de serventia em continuação do que está feito para serventia dos telhados, e vão do madeiramento, no qual se devem fazer trez quartos para môços, e uma trapeira para serventia do telhado de lado d’ um dos sagões d’ onde melhor convier…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 79; caixa 144; Livro 669, fls. 90-91; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Estes dados permitem justificar porque razão em determinados edifício as
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trapeiras comportam cinco vãos de janelas como é o caso na Rua de S. Marçal 13-21/ Travessa de S. José (Fig. CAP.III-51) — no qual julgamos ser fruto de um acrescento pós 1758. Por outro, lado vem ao encontro do documento de 25 de Janeiro de 1846 onde se menciona as trapeiras que se viram aumentadas, passando a comportar mais do que um vão de janela de peito ou de sacada: “…Pertende o Suplicante Jose Evaristo dos Santos Pinto que V: Exª conceda licença para alargar mais os membros, do lado d’uma Trapeira de janela de Sacada, que tem o seu predio que possue em a Rua Augusta Nº 139…” (cf. AHCML, SGO, Cx. 126 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp. 714-715) O contrato de locação de obra de 23 de Março de 1868 permite-nos ter uma melhor percepção dos interiores à época: “…Que as portas e janelas tanto interiores como exteriores serão de calha assentes com lemes, havendo nas portas exteriores ferraduras femeas, e tranquetas d’ argola: as portas interiores levarão a mesma ferragem de lemes, e muletas de ferro fundido…” O mesmo contrato de locação de obra esclarece ainda: “…os vidros serão todos postos pelo empreiteiro, incluindo os das bandeiras de todas as portas que as levam: as janellas do lado do quintal terão ombreiras de cantaria, e levarão caixilhos e portas d’ abrir…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 69; caixa 147; Livro 683, fls. 43-45v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Através do registo notarial de 9 de Janeiro de 1869 são precisados outros aspectos: “…Que as portas das sallas e salletas do primeiro e segundo andares, e casas de jantar, levarão ferraduras d’ trinco de recolher, e as mais portas inclusivé das lojas, e sótão levarão ferraduras magras: Que toda a ferragem nas portas das lojas será de lemes, e a da porta do primeiro e segundo andares serão de vidro, e as das outras portas inclusivé das lojas, e sótão serão de ferro…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 69; caixa 147; Livro 685, fls. 62 v-64v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Outra escritura para locação de obra, de 3 de Novembro de 1863, informa-nos: …” Que as portas, e alisares das sallas, e das saletas serão pintadas de branco, e envernizadas, e as portas para os corredores, e respectivos alisares serão de laranja, ou de qualquer outra côr, que o proprietario gostar…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 48; caixa 145; Livro 673, fls. 67v-68v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Reflexo de uma mudança relativamente á concepção do espaço doméstico é o registo notarial, de 9 de janeiro de 1869, relativo à reedificação de um edifício na Rua de S. Bento: “…As casas do primeiro e segundo andares, sallas saletas, e casas de jantar, levarão molduras nas sancas e no meio com florões, e bem assim as alcovas principais…” (cf. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 69; caixa 147; Livro 685, fls. 62v-64v; Arquivo Nacional da Torre do Tombo).
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3.5.6.2. O edificado do Bairro Pombal A dimensão urbana do Bairro Pombal, o sucessivo aforamento da propriedade que o originou num largo espaço de tempo, permitiu erguer um edificado hetrogéneo. Neste insere- se desde um edifício Arte Nova — único na zona, na Rua do Arco a S. Mamede nº 22 —, como também imóveis do anteriores pós 25 de Abril de 1974. Assim e contrariamente ao que sucedeu no núcleo urbano do Postigo do Melo e Casas do Embaixador, núcleo urbano do século XVI à 1ª metade do século XVIII por nós estudado em 2003, não foi possível identificar do mesmo modo edifícios de frente e de topo de quarteirão. Contudo, existem frentes urbanas deste núcleo urbano do Bairro Pombal, para ter moles claramente identificadas no tempo, sendo que a grande massa do edificado á anterior ao primeiro modernismo. 3.5.6.3. O núcleo de génese do Bairro Pombal O perímetro do núcleo urbano do Bairro Pombal é delimitado pelas rua da Escola Politécnica, Largo do Rato, Rua de S. Bento e Rua da Imprensa Nacional. A análise dessas zonas raianas permitiu-nos observar frentes urbanas presentes na génese do Bairro Pombal. Pela Rua da Escola Politécnica até ao largo do Rato — Praça do Rato como é referenciado em 1770 —, há uma sequência essencialmente de edifícios notáveis, entre os quais o Palácio Alagoas hoje convertido a condomínio privado (Fig. CAP.III-52). Ao tornejar o imóvel da Fábrica das Sedas ao Rato encontramos uma correnteza de edifícios de arquitectura corrente. Esta é fechada, neste largo, por um edifício de gaveto de chanfro curvo, posterior a 1859, dado o franco raio de curvatura do mesmo. Este, com frentes para o largo do Rato nº16-16B e Rua de S. Bento nº 174 (Fig. CAP.III-53), tem a particularidade de não resolver a porta de entrada e consequente caixa de escadas no chanfro do cunhal, como será apanágio de outros, também de gaveto, em data posterior a 1865, mas na proximidade do limite dos alçados dos confinantes que o antecedem em ambos os arruamentos. Entre a Fábrica das Sedas ao Rato e este imóvel de gaveto existem diversos edifícios de diferentes sensibilidades estéticas. À primeira seguem-se três edifícios de habitação divididos por pilastras (Fig. CAP.III-54). Os dois primeiros são não só anteriores à proibição de haver construções sem cordeamento nem simetria — decreto de 14 de abril de 1758 —, como também ao desenho de alçado joanino constante nos edifícios a erigir na Rua dos Ourives do Ouro —. Livº 1 de Cons e Decr. de D. João V. Senado ocidental, fl. 22o (cota131). AHCML.—, dada a não uniformidade de dimensões de todas as suas janelas de peito e pelo facto de deles ainda
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apresentar um pequeno óculo. Ao nível do segundo piso os três edifícios apresentam varanda geral. Ao nível da cobertura os mesmos apresentam uma trapeira, interrompendo o desenho do seu telhado mouriscado. O facto de o piso térreo de toda a frente urbana no largo de Rato ter sofrido alterações para albergar estabelecimentos comerciais não permite perceber aspectos como a bipartição, tripartição e quadripartição de alçado, observáveis no edificado deste núcleo urbano do Bairro Pombal. A estes três imóveis segue-se um pátio interior, cujas edificações vieram preencher parte do miolo de quarteirão, inocupado à data da carta topográfica de Filipe Folque, em 1856-1858. No interior do pátio encontram-se habitações pobres, cuja tipologia foge à do edifício de rendimento e uma oficina da Mercedes Benz. Seguindo-se ao arco que precede este pátio, encontra-se uma fiada ininterrupta de edifícios que fecha com o já referido edifício de cunhal de chanfro curvo Desta destaca-se o número 14 A-14 C com um curioso desenvolvimento de escadas. Estas apresentam um primeiro lance de escadas mais estreito — como seria o desenvolvimento de umas escadas de tiro —, para alargar no primeiro piso e dar lugar a uma caixa de escadas albergando um escada de dois lances rectos com seu vazio central. O arranque das escadas no piso térreo é marcado por um degrau pétreo, ao qual se seguem os restantes de madeira. Ao arranque do primeiro degrau de madeira são ancorados os gradeamentos dos corrimãos que ladeiam a escadas até ao 1º piso. As paredes que ladeiam este primeiro lance de escadas são revestidas por um lambril de azulejos, de época anterior à colocação dos corrimãos (Fig. CAP.III-55). 3.5.6.4. Os grandes conjuntos de edifício de rendimento O parcial da Rua de S. Bento até tornejar para a Rua da Imprensa Nacional é pontuado por alguns vazios urbanos. É neste parcial que se encontra um dos grandes conjuntos de edifício de rendimento. Contudo, como é marca no Bairro Pombal, não se encontram edifícios ocupando um quarteirão inteiro, visível noutros pontos da cidade. Mencionem-se os edifícios da Rua do Arco a S. Mamede nº 2/ Rua de S. Bento nº 520-502 (Fig. CAP.III-56) e da Rua de S. Bento e nº 502-486 (Fig. CAP.III-57), contíguo ao primeiro. Contudo, se o primeiro não denota tempos diferentes de construção, o mesmo não sucede com o segundo. A tal convivência não é alheio o facto de ser obrigatório por lei a reedificação de imóveis que estivessem em ruína. Estes edifícios constituem um estádio evolutivo que contrasta com os seus homólogos na Travessa do Abarracamento de Peniche/Rua do Século (Fig. CAP.III-58) — de chanfro curvo mas de raio pequeno —, nas Ruas do Loreto nº 22-30 (Fig. CAP.III-59) e de S. Marçal os nº 29-35 (Fig. CAP.III-60) — e de acordo
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com o regulamentado em 12 de Maio de 1758 —, na Rua do Século nº 6-22 (Fig. CAP.III-61) — já despido das formas de composição de alçado manuelinas mas contudo anterior a 1751 —, e o de gaveto na Rua de S. Marçal nº13-21/ Rua de S. José (Fig. CAP.III-62). O edifício de gaveto Arco de S. Mamede nº 2/ Rua de S. Bento nº 520-502, igualmente um grande conjunto, é susceptível de ter sido reedificado em data posterior à sua construção. Como denotam as métricas e proporção do alçado na Rua do Arco de S. Mamede com suas porta e janelas de volta e desenho do cunhal anterior a 1758 (Fig. CAP.III-63). Este edifício, tal como a da Rua do Século nº 6-22, tem uma frente de alçado que comporta mais de uma entrada distribuindo fogos esquerdo e direito. Os seis vãos de entrada deste edifício de gaveto sofreram modificações por forma a estarem mais de acordo com as opções da época. A caixa de escadas observada no nº 510 é consonante com a da descrição da reedificação de um edifício sito na Rua Direita da freguesia de Santa Isabel de 9 de Janeiro de 1869. A caixa de escada do nº 510 da Rua de S. Bento é assim lageada até arco. Contudo, o lagedo original foi substituído por outro perfeitamente anódino e incaracterístico (Fig. CAP.III-64). Do arco até ao arranque das escadas existe um amplo patim de madeira, que permite altear a cota de soleira da entrada dos fogos esquerdo e direito do piso térreo. Os outros dois fogos, esquerdo e direito, que têm entrada também ao nível do rés-do-chão, têm uma soleira que os coloca na mesma cota que os dois anteriores. Possivelmente o patim e as soleiras de madeira destinavam-se a impedir as exalações podres e fétidas. No tímpano da porta do nº 510, a inscrição da data de 1868, poderá, mais do que fornecer indicações de tempos de vivência do imóvel, permitir situar a data de reedificação do imóvel. A escada com o seu vazio central e clarabóia, nasce no piso térreo sendo a metade correspondente ao arranque do segundo dos dois lances rectos aproveitada para um pequeno compartimento ao qual se acede por uma porta devidamente contextualizada pelos aros cujo desenho exprime a complexidade da tratadística, que as características do edifício suportam (Fig. CAP.III-65). Nos piso superiores quatro vãos articulam-se simetricamente dando composição a cada chegada a piso. Contudo apenas os que nascem na continuação do maior comprimento das caixa de escadas é que dão acesso os fogos esquerdo e direito do primeiro e do segundo andares. Pensamos que os outros dois darão para os chamados “quartos independentes” (Fig. CAP.III-66). O facto de o edifício se implantar numa rua com algum declive obriga a que, por uma questão de uniformidade do alçado, as caixas de escadas mais afastadas do cunhal para vencer o diferencial de cotas, tenham um primeiro lance de degraus antes do arranque das escadas à cota do piso térreo no valor mais baixo.
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Por seu turno, o edifício imediatamente adjacente, na Rua de S. Bento nº 500-446, é constituído por três pisos e águas furtadas com duas trapeiras para a referida Rua. O seu alçado é rematado por uma cimalha e platibanda. Pensamos que o piso térreo e o 1º andar marcam o primeiro tempo de construção do imóvel e o 2º piso será um acrescento posterior. A fachada apresenta, ao nível do 1º piso, uma sequência de janela de peito/ janela de sacada, começada e acabada pelas primeiras, num total de onze vãos organizados regularmente pelo pano de alçado. No piso superior dominam as janelas de peito. Outro grande conjunto de edifício de rendimento é o de gaveto Travessa do Noronha nº 5-5 A/ Rua Gustavo Matos Sequeira nº 40, cuja construção data de 1882 (Fig. CAP.III-67). Este edifício é constituído por três portas de entrada, duas das quais para a Travessa do Noronha e a restante na outra frente de rua. Duas destas entradas dão acesso aos piso térreos extremos do conjunto — os números de polícia 5 A na travessa do Noronha e 40 na Rua Gustavo Matos Sequeira. O nº 5 da Travessa do Noronha corresponde a uma unidade de rendimento que distribui simetricamente os fogos em esquerdo e direito. Essa distribuição mantêm-se nos pisos superiores. De acordo com a documentação levantada, este é mais um edifício em que a entrada da caixa de escadas é precedida por uma entrada com o seu pavimento com pedra em xadrez preto e branco enquadrado por uma sanefa branca, com o seu arco anunciando a caixa de escada. Para lá do arco um patim de pedra, também em xadrez antecede o arranque das escadas. A escada apresenta o seu vazio central, existindo um pequeno compartimento que aproveita a cota útil permitida pelo lance de degraus de chegada a piso. A verificar-se a correspondência da data do tímpano com a data de construção do edifício, não deixa de ser curiosa a existência de um modelo já firmado em 1883 de caixa de escada e entrada de acesso para a mesma. Não só encontramos este modelo fora do território de análise — veja-se na Rua de Santos-o-Velho o edifício nº 32-22 (Fig. CAP.III-68)— como na própria a frente urbana na Rua do Monte-Olivete/ Rua Professor Branco Rodrigues/ Rua de S. Marçal (Fig. CAP.III-69). Do mesmo modo o edifício sito na Rua de S. Bento nº 286, com uma estreita frente de lote e único da sua época a albergar apenas um fogo por piso, apresenta uma entrada de escada de pavimento em xadrez preto e branco e caixa de escada, obedece também a este padrão. Não tem contudo, o compartimento aproveitando o lance de degraus de chegada ao 1º andar. Este espaço é tomado por outro lance de degraus que dá acesso à cave, com janela baixa no alçado na Rua de S. Bento. A única que o alçado permite já que o edifício apenas comporta neste arruamento dois vãos por piso.
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3.5.6.5. Os pequenos edifícios de rendimento No Bairro Pombal encontramos edifícios de com uma pequena frente de alçado. São maioritariamente imóveis com dois vãos por piso, percorrendo todo o intervalo de tempo em que decorre a estabilização do parque edificado do Bairro. Estes edifícios constituem carácter de excepção na mole do Bairro Pombal. Destacam-se dois edifícios modernistas, os nº 5 e nº 7, na Rua Maestro Pedro de Freitas Branco (Fig. CAP.III-70), e na mesma rua, relativo ao período entre 1758 e 1859 os imóveis nº 17 e nº 19 (Fig. CAP.III-71). Observam-se ainda para o período de 1959 a 1902, igualmente suportando apenas um fogo por piso, os edifícios da Rua Maestro Pedro de Freitas Branco nº 14 (Fig. CAP.III-72) e nº 22 (Fig. CAP.III-73), e na Travessa do Noronha os nº 8 e nº 10 (Fig. CAP.III-74). Contrariamente ao que sucedia no edifícios de lote estreito anteriores a 1859, verifica-se que a organização da caixa de escadas é feita em conformidade com a opção mais ao moderno. É o que se comprovam edifícios como, o nº 37 A da Rua do Meio à Lapa, com a sua caixa de escada com arco e escada com gradeamento e vazio central (Fig. CAP.III-75). Similarmente ao apresentado por Hélder Carita para o edificado dos séculos XVI e XVII (CARITA, Hélder; 1994), o lote estreito obriga a que as escadas se encostem a uma das empenas laterais, contudo, como referimos no início da década de 60 de 1800, estas já obedecem à nova tipologia de escadas e caixa de escadas. Não deixa contudo se ser curioso que o edifício modernista, nº 5 na Rua Maestro Pedro de Freitas Branco, se parece ancorar a uma tipologia de escadas não conforme com as normativas da legislação. Neste verifica-se um aproveitamento imediato da área da parcela urbana para construir o piso sem que quase haja um ádito que anteceda o acesso ao fogo e o arranque das escadas (Fig. CAP.III-76). 3.5.6.6. Os edifícios de frente de quarteirão No Regulamento de Salubridade das Construções de 1903, a legislação referia os cuidados a ter com os edifícios encostados a outros. Em 1914, por Decreto de Setembro desse ano fazia-se pressupor a existência de um corredor lateral de passagem “entre as frentes de prédios”. Em 1930 o Regulamento Geral da Construção urbana para Cidade de Lisboa conforma esse corredor de passagem. O período lato em que se processa a urbanização do Bairro Pombal, permite observar todas essas situações. Existe contudo o caso excepcional do edifício Art Deco, sito na Rua do Arco de S. Mamede nº 4-4 A (Fig. CAP.III-77), que se comporta com um mini condomínio fechado, muito embora não tendo as facilidades que um actual condomínio fechado pode apresentar.
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3.5.6.7. Os edifícios de topo de quarteirão Os edifícios de topo de quarteirão, e muito particularmente os de gaveto podem ou não ter portas de entrada nas duas frentes. Este é um fenómeno que abrange todo o Bairro Pombal indiferentemente do tempo de construção do edifício, com excepção do núcleo de génese do Bairro. Contudo, em virtude das regras de ornato e simetria os seus alçados apresentam-se com um desenho de alçado regular. Devido à organização, da planta distributiva de cada imóvel, as portas, usualmente para os fogos térreos, encontram-se a eixo do desenho de alçado ou pelo contrário na proximidade de um dos seus extremos. No entanto, em particular nos grandes conjuntos, a porta de entrada principal faz a distribuição dos fogos em esquerdo e direito. Dadas as dimensões de cada quarteirão estes englobam mais do que dois imóveis por topo, existindo uma correnteza de edifícios que, assim, têm as características de edifícios de frente de quarteirão. 3.5.6.8. A partição de alçado e planimétrica Entre o primeiro terço do século XIX — data do edifício “nobre de aluguer” o imóvel S. João da Mata 17-23 —, e 1874 a tripartição de fachada como um fenómeno extensível a todo o edificado urbano de Lisboa. À medida que avançamos para os dealbar do Estado Novo tal parece não verificar. Não só nos libertamos do módulos talhão base de parcela urbana, observados no Postigo do Melo e Casas do Embaixador, como nos deparamos com propostas de alçado que contraria a simetria do seu desenho, sem que o resultado seja uma fachada cuja composição é desequilibrada. Verifica-se a tendência a reduzir o número de entradas para a distribuição de fogos a uma única. Embora, no Bairro Pombal os edifícios pertencentes o primeiro modernismo português seja exclusivamente de habitação, noutro pontos da cidade houve os que tinham estabelecimentos comerciais no piso térreo. Estes necessariamente possuíam mais do que uma porta por frente de alçado. Na generalidade dos edifícios observados no Postigo do Melo e Casas de Embaixador existe uma tripartição de alçado, isto é, existe uma porta para cada piso térreo — esquerdo e direito —, e uma porta que dá acesso às escadas dão acesso aos pisos superiores. Esta organização de alçado reflecte-se numa tripartição planimétrica, na medida em que a estes vãos correspondem, no piso térreo, uma área para escadas e dois fogos. No Bairro Pombal, a tripartição de fachada é visível no edificado entre 1758 e 1859. Refiram-se a este respeito os edifícios da Rua da Imprensa Nacional nº 5-9 (Fig. CAP.III-78)e da Rua do Arco de S. Mamede os nº 35-39 (Fig. CAP.III-79), nº 41-45 (Fig. CAP.III-80) e nº 75-79 (Fig. CAP.III-81). Nos edifícios de grande extensão do Bairro Pombal
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verifica-se uma tripartição de fachada, contudo agrega-se um bloco de escadas e fogos esquerdos e direitos nos quais se incluem os pisos térreos. Ainda no que concerne á partição de alçado apenas encontramos um edifício bipartido, isto é ao qual correspondem duas portas de entrada para distribuição de fogos, sito na Rua Maestro Pedro de Freitas Branco nº 10-12. Encontramos depois alguns exemplares que apresentado apenas dois vãos por piso, apenas apresentam uma porta para acesso aos fogos, necessariamente um por andar. É frequente a existência de uma única entrada distribuindo fogos esquerdo e direito, servindo esta para os pisos térreos. Este facto é observável nos edifícios de topo de quarteirão. Excepção seja feita o topo de quarteirão Travessa do Noronha nº 5-5 A/ Rua Gustavo Matos Sequeira nº 40, cuja distribuição dos fogos apresenta duas portas independentes para ambos os pisos térreos — cada uma nas frentes disponíveis —, e uma outra para distribuição das habitações esquerdas e direitas dos pisos superiores. Correspondendo por isso a uma tripartição planimétrica. 3.5.6.9. Os últimos gaioleiros, o 1º movimento modernista português no Bairro Pombal No Bairro Pombal há um número considerável de edifícios do primeiro modernismo português, abrangendo não só um modernismo radical5, como a art deco. Deles se destaca o edifício modernista radical, sito na Rua da Imprensa Nacional nº 41-37 (Fig. CAP.III-82). Este edifício construído nos anos 30 do século XX, de acordo com o ensaio tipológico elaborado por José Manuel Fernandes em 1988, é em termos de alçado de tipo misto, por conciliar aspecto de tratamento de fechada de tipos A e E. Desta forma, o edifício apresenta um tratamento de fachadas baseado em elementos volumétricos contínuos que, por seu turno, rematam na superfície lisa da fachada com novas varandas criando um ritmo baseado na alternância de corpos abertos e fechados — tipo A. Por outro lado, o imóvel tem um tratamento decorativo linear, apresentado faixas de reboco salientes da fachada, definindo linhas horizontais paralelas que ligam vãos e varandas à superfície, ou a preenchem como o fito de valorizar conjuntos julgados mais pobres — tipo E. O edifício apresenta um corpo central balançado, nascendo ao nível do segundo piso que se estende para as varandas do mesmo. O imóvel apresenta duas fortes faixas horizontais que rematam o edifício como que desenhando uma cimalha. Faixas horizontais marcam momentos significativos de leitura do alçado e peitoris das janelas. Sendo particularmente significativas as 5
Pensamos que a designação modernismo radical não deriva da sua relação imediata com o movimento modernista internacional, mas com o seu aproximar-se a alguns aspectos do mesmo. Os edificios inseríveis nesta categoria apresentam um desenho mais depurado e um arrojo liberto de um certo academismo.
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extremas que marcam o 1º e 3 º andares e a da porta de entrada. Ainda na parcela urbana do imóvel tem lugar um corredor de passagem que permite ter acesso às traseiras do edifício. Se o exterior é notoriamente um modernismo radical existem contudo, particularidades que já o inserem num panorama pré Estado Novo. Refiram-se o coroamento dos limites do portão de acesso ao já mencionado corredor e o tratamento das guardas da própria escada, que se desenvolve paralela ao alçado. Por outro lado, o tratamento do tecto da entrada da caixa de escada é todo estucado com motivos art deco. Separando esta entrada do arranque das escadas há um franco vão de ângulos rectos. Curiosamente, verifica-se que o pavimento até esse vão é pétreo e deste até ao arranque das escadas é de madeira. Os painéis azulejares que decoram ambos os lados da entrada das escadas fazem referência ao património nacional. Aproveitando a cota útil de arranque do último lance de degraus de acesso ao 1º piso existe um pequeno compartimento ao qual se acede por uma porta de madeira trabalhada de uma forma art deco. Para lá do vão, resguardadas pelos respectivos nembos, encontram-se as portas do fogo direito e do fogo esquerdo. Nos pisos superiores a mesma distribuição. No lugar do vão que separa a entrada do edifício da caixa de escadas, uma porta de duas folhas, possivelmente correspondendo a um “quarto independente”. Uma clarabóia garante a iluminação de toda a caixa de escadas. Sabemos contudo pela análise de edifícios modernistas como os do Bairro Lopes que essa não é a situação de regra. Sabemos também pela observação, que em edifícios com cunhal de chanfro desta época, que a colocação das escada perpendicularmente ao alçado de rua não é também norma fixa. O edifício da Rua do Arco de S. Mamede nº 22 A (Fig. CAP.III-83), contrariamente ao edifício anterior encontra-se encostado aos confinantes. É um imóvel que obedece a critérios similares ao edifício Rua da Imprensa Nacional nº 41-37 e que por isso valerá apenas determo-nos um pouco nele. Sendo aproximadamente da mesma época que este último, o edifício da Rua do Arco de S. Mamede nº 22 A, não apresenta qualquer tipo de compartimento aproveitando o vão da escada. Tal como edifício Rua da Imprensa Nacional nº 41-37, possui uma zona de entrada e outra de arranque das suas escadas. Estas últimas, igualmente de madeira, ao contrário do Rua da Imprensa Nacional nº 41-37, não transpiram o ar pesado, sintomático de uma estética Estado Novo que haveria de aparecer. 3.5.6.10. A intervenção Estado Novo no Bairro Pombal Este capítulo não ficaria concluído sem mencionar a intevenção Estado Novo no Bairro Pombal, muito particularmente no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/Rua de S. Bento nº 712-714. Este
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edifício, cujo processo para construção se inicia em 1910, é sintomático de um conjunto de mudanças ocorridas no edificado. Em 1912 por meio da Companhia de Panificação Lisbonense inicia-se a construção do edifício albergando uma padaria e andares para a habitação. No decurso do processo de estabilização da planta definitiva, assitimos à localização da caixa de escadas de acesso aos superiores no extremo do edifício, no Largo do Rato, e ao seu desenho ainda de acordo com o modelo de 1861, mas respirando uma nova modernidade (Figs. CAP.III-89, 97, 98 e 99). A caixa de escadas subsistiu praticamente incolme. O seu chanfro curvo obedece claramente à portaria de 20 de Outubro de 1865. Neste edifício, é ainda visível a clara preocupação de reservar uma área para higiéne localizada na zona mais exterior do alçado tardoz. A intervenção de 1947 viria introduzir algumas modificações (Figs. CAP.III-90, 91, 92). Assim, as áreas no exterior do edifício ocupada pelas casas de banho veriam alterado o seu desenho original, para comportarem uma área de marquise. Verifica-se um aformoseamento da fachada ao nível do piso térreo consonante com a estética Estado Novo. A padaria de origem, cujo desenho do alçado era semelhante ao do piso térreo da papelaria Fernandes sita no largo do Rato (Figs. CAP.III-87), seria, em 1997, convertida numa leitaria restruturando para isso o espaço interior ocupado pela padaria (Figs. CAP.III-93, 94 e 95).
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Capítulo IV - CONCLUSÕES 4.1. Recapitulação dos dados da pesquisa No final da presente dissertação é possível delinear algumas conclusões e reperspectivar aspectos observados no percurso deste trabalho. Assim, este capítulo é composto por duas partes: uma de conclusões gerais, e outra em que se apresentam resultados inovadores decorrentes do cruzamento de dados da informação obtida no trabalho com o edificado. No primeiro capítulo, a análise da documentação anterior ao período em estudo permitiu-nos definir a figura legal do edifício de rendimento. Esta verificou-se fundamental para perceber as raízes de uma tipologia edificatória tão antiga na cidade e dominante no território da Cotovia ao Rato. O caminho percorrido ao longo desta dissertação levou-nos a perceber quem seriam os habitantes destes edifícios e a averiguar o número de indivíduos por fogo. Através das Décimas de Maneio verificámos que esta tipologia era ocupada por profissões tão diversas como tendeiros, vendedores de fruta, alugadores de sejes, mestres de meninos, chocolateiros, cravistas, livreiros e por diversos vendedores ambulantes — estes últimos permitidos na cidade até proibição em 1859. No segundo capítulo, observámos o fim de uma arquitectura regimentada com seus aspectos de permanência e fuga e a introdução do projecto de autor. Este viria a ser dominante no edificado gaioleiro, particularmente com a Construção das Avenidas Novas de Lisboa. Definimos e justificámos a originalidade do caso de Lisboa através do estudo dos casos do Porto, Coimbra, Vila Viçosa e Brasil. Verificámos que, dados os sistemas construtivos usados no século XIX, apesar da mudança do sistema de medidas, o loteamento regular de 30 a 25 palmos se manteve. É possível que esta medida base de frente de lote se mantenha como módulo padrão tanto para a subdivisão do chão aforado como para a sua união, estando presentes nos pequenos edifícios de rendimento e nos grandes conjuntos. Contudo a hibricidade dos gaioleiros, edifícios característicos da cidade de
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Lisboa, libertá-los-ía desta medida, embora sem a desenvoltura que posteriormente os edifícios integralmente de betão armado permitirão. No terceiro capítulo, a análise do território da Cotovia ao Rato, e de edifícios referenciais fora deste, permitiu-nos construir um corpo de dados inédito. Este foi cruzado com documentação já publicada, vista sob uma nova abordagem, e com elementos novos. A análise do Bairro Pombal permitiu-nos delinear aspectos comparativos com o Postigo do Melo e.as Casas do Embaixador, núcleo urbano do século XVI à 1ª metade do século XVIII. A generalidade dos edifícios deste núcleo urbano apresenta uma tripartição de alçado, a que corresponde uma tripartição planimétrica, na medida em que a estes vãos correspondem, no piso térreo, uma área para escadas e dois fogos. No Bairro Pombal a tripartição de fachada é um fenómeno extensível ao edificado entre 1758 e 1859. No entanto, a ela não corresponde necessariamente uma tripartição planimétrica. Quando caminhamos para o século XX estas são figuras que tendem a desaparecer. A generalidade do parque edificado apresenta uma porta para cada bloco de fogos esquerdo e direito, nos quais se incluem os do piso térreo. Tal como no Postigo de Melo e nas Casas de Embaixador, também existem edifícios de estreita frente de alçado, alguns apenas tendo um fogo por piso. A documentação constante na tese de doutoramento de Raquel Henriques da Silva possibilitou-nos construir os interiores dos edifícios até à afirmação do modelo do edifício gaioleiro, firmado pela documentação de 1861, que trouxemos a lume. Fundamental foi assim, o registo notarial de Dezembro de 1791 apresentado pela referida autora. São característicos os poiais para potes, os armários e as cravoeiras, e que permaneceriam longamente no edificado. O advento da electricidade e a obrigatoriedade de obediência a alguns requisitos do edificado de acordo com a categoria da Zona de Construção conduzirão ao seu desaparecimento. A documentação, corroborada com legislação, demonstrou que o revestimento azulejar, paradimático dos interiores pombalinos, viria a ser repensado de acordo com as novas exigências de salubridade. A documentação entre 1850 e 1871 por nós levantada permitiu-nos perceber a génese do edifício gaioleiro e a sua ruptura com o modelo pombalino. Assim, a resolução dos ângulos das ruas, a obrigatoriedade de estes terem os cunhais de chanfro curvo ou recto iriam introduzir uma alteração na imagem do edificado, o qual seria muito distinto do promulgado em 12 de maio de 1758. As novas sensibilidades alteraram a sua planta distributiva, o remate da fachada (que possibilita o encanamento das águas dos telhados), a moda da cércea e a relação entre as frentes dos edifícios num mesmo alinhamento de rua. Houve aspectos que teimaram persistir, como as janelas de reixa.
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No pós 1859, vemos surgir duas novidades a saleta e.a casa de jantar como.divisões perfeitamente estabilizadas. Através da documentação de 1850 e 1871 apercebemo-nos de que no que refere à nomeação, quartos designam fogos e confirma-se que cazas significam assoalhadas. Estas últimas não se restringem às acima tipificadas, mas que podem ser em maior número, em correspondência com a própria dimensão da parcela urbana aforada. Observámos que, na década de 60 de 1800, há o delinear de uma nova tipologia de caixa de escada e sua entrada, depois reinterpretada pelo 1º movimento modernista português, sempre com a inolvidável presença da clarabóia, indispensável para boa iluminação e ventilação. 4.2. Reapreciação de alguns aspectos do período em estudo A realidade edificada no Porto e em Coimbra permitiu-nos observar casos de excepção tanto nos tecidos consolidados dessas cidades, como na mole da Lisboa. São as belíssimas telhas de canudo pintadas, observáveis nas ruas de S. João e do Almada, no Porto (Fig. CAP. IV-1) e na Rua Ferreira Borges, em Coimbra (Fig. CAP. IV-2), e as telhas negras, nalguns imóveis de Lisboa imitando a moda portuense. Caso único no edificado lisboeta observado, é o edifício sito na Rua de Sant’ Ana à Lapa com as suas escadas obedecendo ao regulamento de 1902 (Fig. CAP. IV-3). A água furtada deste imóvel tem toda a sua frontaria revestida.de zinco lavrado, por forma a fingir os revestimentos dos alçados dos últimos pisos dos edifícios de rendimento portuenses (Fig. CAP. IV-4). A cobertura deste edifício apresenta, de acordo com a legislação de 28 de Agosto de 1930, os seus guarda-fogos, talhados em degraus. Imitando a moda portuense, fora do território da Cotovia ao Rato, é também possível ver a cobertura de um edifício de rendimento no gaveto da Rua dos Industriais com a Avenida D. Carlos I (Fig. CAP. IV-5). Neste, contudo, não se opta por um fingimento, mas pelo uso das telhas negras, numa apropriação de uma linguagem característica do Porto. As casas de banho, como último reduto no exterior da fachada, vão conhecer uma evolução, como comprovam, em diferentes tempos as traseiras dos edifício no Alto do Longo (Fig. CAP. IV-6), na Rua Álvaro Coutinho (Fig. CAP. IV-7) e na Rua de Santa Bárbara (Fig. CAP. IV-8). Pela clara inclusão do espaço de casa de banho no interior do edifício, o imóvel da Travessa do Noronha 5-5 A/ Rua Gustavo Matos Sequeira nº 40, de 1882, é paradigmático de uma mudança de sensibilidades, contudo ainda não sistematizada como comprova o edifício Largo do Rato nº 16-16 C / Rua de S. Bento 712-714, de 1910, cujo corte ainda nos apresenta o espaço da casa de banho numa “varanda de sacada”. As “varandas de sacada” nas traseiras do edifício no Alto do Longo, na
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Rua Álvaro Coutinho, na Rua de Santa Bárbara e no edifício Largo do Rato nº 16-16 C / Rua de S. Bento 712-714 contrastam com o edifício da Travessa do Noronha 5-5 A/ Rua Gustavo Matos Sequeira nº 40 onde é evidente um saneamento básico pensado de raiz. assim o demonstram a tubagem visível no tardoz e a pequena iluminação servindo um espaço já assumidamente de higiene intima (Fig. CAP. IV-9). Por outro, assertivo de uma maior atenção para com uma vida mais salubre é o registo num contrato de locação de obra de 23 de Março 1868: “… as pias teraõ tampas de madeira…” As dobradiças de leme parecem ser uma realidade bem firmada no hiato entre 1850 e 1871, bem como o sistema de fechamento das portadas dos vãos, como demonstram os registos notariais de 1868 e de 1869, que afirmam: “…Que as portas e janellas, tanto interiores como exteriores seraõ de calha assentas com lemes, levando as portas exteriores ferraduras femeas, e tranquetas d’ argola: as portas interiores levaraõ a mesma ferragem de lemes, e muletas de ferro fundido…” (ANTT, Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 1, Cx. 147, maço 69; Livro 683; fl 43-45v). No edifício com as duas frentes para a rua de S. Bento, e para o largo dos carros, em 9 de Janeiro 1869, é referido que : “…Que as portas das sallas, saletas do primeiro, e segundo andares, e casas de jantar, levaraõ fechaduras d’ trinco.de recolher, e as portas inclusivé das lojas e sótaõ levarão ferraduras magras: Que toda a ferragem nas portas das lojas e sotaõ será de lemes, e a porta.do primeiro e segundo andares seraõ de vidro, e as outras portas inclusivé das lojas, e sótaõ seraõ de ferro…”. Contudo estes elementos não são novidade dado que ambas aparecem no edifício nº 17-23 da Rua S. João da Mata — 1º terço do século XIX. No que concerne às dobradiças de leme deste imóvel, podemos observá-las nos seus diferentes perfis, soltas das portas (Fig. CAP. IV-10) ou pelo contrário encastradas nas mesmas (Fig. CAP. IV-11). No que diz respeito aos balaustres, a realidade edificada do território em análise elucida que nem todas as balaustradas.em Oitocentos eram constituídas por elementos de cerâmica vidrada. Encontramos igualmente exemplares cujos balaustres são feitos de pasta de tijolo, de que é ilustrativo o edifício sito na Praça das Flores nº 31 (Fig. CAP. IV-12). Este dado faz-nos a crer uma maior versatilidade de construção, no que toca aos remates de edifícios. A realidade observada no Bairro Lopes — sito no Alto de S. João —, revela-nos que.o tijolo será o material de preferência. Sabemos, contudo, que esta prática não subsistiu pois as varandas e consolas seriam dentro em breve de betão. Por outro lado, como é do conhecimento geral, actualmente os elementos de remate dos edifícios são desejavelmente construídos em betão.
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É curioso verificar, no território da Cotovia ao Rato, a interrupção da balaustrada para construir uma janela de sacada num elemento que nasce a partir de uma trapeira (Fig. CAP. IV-13). Este dado reforça a documentação encontrada para o período entre 1850 e 1871. É igualmente interessante observar, fora do edificado em análise, a introdução da “trapeira de zinco” ainda em telhados de tipo mouriscado, em particular em edifícios de arquitectura não corrente como é o caso do edifício sito no Largo do Conde de Pombeiro/ Rua de Francisco Lázaro, em Lisboa (Fig. CAP. IV-14). Não deixa de ser digno de nota a substituição da tradicional mansarda por uma superfície de zinco ondulada e a progressiva esbeltez das águas furtadas e seu diverso desenho de cobertura (Fig. CAP. IV-15). A observação do núcleo urbano do Bairro Pombal permite perceber que existiram aspectos de modernidade característicos das Avenidas Novas de Lisboa que marcaram este bairro. Se o projecto de autor não foi tão livre como nestas últimas, os seus interiores conseguiram ser glamorosos como bem ilustram os edifícios da Rua Gustavo Matos Sequeira nº 33 (Fig. CAP. IV16)e da Rua do Arco a São Mamede nº 22 (Fig. CAP. IV-17). Estes constituem igualmente uma nota de mecanização do edificado, como demonstram os seus ascensores com traços ainda dominantemente da época. A introdução caixas do correio no interior dos edifícios, observadas no quarteirão Avenida da República/ Visconde Valmor/ Avenida 5 de Outubro/ Avenida Elias Garcia, nas Avenidas Novas de Lisboa, no estudo feito por João Guilherme Appleton, também é uma realidade no território da Cotovia ao Rato. As caixas do correio originais são ainda em número suficiente para se poder traçar uma ténue evolução das mesmas (Fig. CAP. IV-18). Se não encontramos exemplares de edifícios gaioleiros no Bairro Pombal como o Rua do Meio à Lapa nº 37 A, temos de certeza apontamentos que permitem perceber uma vivência do edificado característica dessa época. São expressão disso a belíssimas varandas existentes no alçado posterior do edifício.de gaveto Rua Gustavo Matos Sequeira nº 25 / Travessa do Noronha (Fig. CAP. IV-19). Sem o mesmo estado de preservação encontramos a mesma tipologia de varandas nas traseiras de um edifício com vista para a Rua de S. Bento. Contudo o fechamento das mesmas com superfícies envidraçadas, maioritariamente modernistas, retira-lhes parte da sua esbelteza (Fig. CAP. IV-20). A realidade dos edifícios de rendimento de estreita frente de parcela urbana, tanto no espaço da Lapa como no tecido urbano em análise, abrange um período suficientemente lato para perceber que há um modelo, mas que este nem sempre é a regra. O caso do edifício tripartido da Rua Luz
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Soriano nº 75 — com prospecto de 1867 —, de frente de alçado ainda considerada estreita, permite perceber que a colocação das escadas nem sempre é feita encostada à empena (Fig. CAP. IV-21). A aparente planimetria do nosso 1º modernismo português, visível no Bairro Pombal, tem a tectonicidade possivel dado o seu sistema construtivo, o qual permaneceu, apesar das progressivas notas de modernidade introduzidas e cerceadas posteriormente pelo Regime do Estado Novo. Contudo, estas estão claramente distantes da Casa Schrõder 1923-1924 (Fig. CAP. IV-22) — de Gerrit Thomas Rietveld. E incontestavelmente longe da “Casa do meu tio” do cineasta Jaques Tati, parábola da “máquina de habitar”, de que só muito posteriormente se veriam vislumbres em Portugal. O edifício pombalino da Rua Correia Garção / Rua de S. Bento / Calçada da Estrela, constituindo um rasgo, dada a celeridade da sua construção, permitida pelo seu descentramento relativamente à mole da Baixa-Chiado, apresenta menos notas de adulteração que a última, sendo por isso um exemplar único em todo o território fronteiro à Cotovia ao Rato. As suas caixas de escadas dão mostras de uma versatilidade que não se coaduna com os desenhos mais paradigmáticos do edificado pombalino lisboeta. (Fig. CAP. IV-23) A organização dos seus fogos faz pressupor a existência do que seria conhecido como “sala de fora” ou “quarto independente” com acesso directo às escadas, já no legado decorrente de 12 de Maio de 1758. A postura de 3 de Junho de 1859 refere a necessidade de normativas para a construção das escadas de edifícios com muitos inquilinos regulamentando as condições de iluminação e de ventilação (cf. Annaes do Município de Lisboa, 1856-59; pp. 322-323). Pensamos que, a sua aplicação prática resulta não só da aplicação da clarabóia, como demonstra o registo notarial de 1861, mas também necessariamente do vazio central das escadas, regulamentado posteriormente em 1902. A realidade das caixas de escadas e seus áditos no período que medeia entre 1758 e o dealbar do Estado Novo, bem como todas as inovações colocadas no miolo dos edifícios de rendimento, demonstram como houve uma dignificação dos espaços e um novo pulsar do edifício de arquitectura corrente. Contudo, as elegantes linhas, características do fim de Oitocentos e do primeiro vinténio de 1900 haveriam de progressivamente dar lugar a uma imagem mais consonante com os valores mais altos da “nação”, muito embora esta navegasse numa jangada de pedra.
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SANTOS, Maria João; O largo Vitorino Damásio (Santos-o-Velho, Lisboa): contributo para a história da zona ribeirinha de Lisboa, Arqueologia, vol. 9;; p. 369-399, 2006 SANTOS, Vítor Manuel Vieira Lopes dos. Sistema (O) Pombalino em Lisboa em edifícios urbanos agrupados de habitação colectiva, estudo de um legado humanista da segunda metade do século XVIII. Contributo para uma abordagem a área de recuperação e restauro arquitectónico do património construído, Lisboa, 1994. Tese de doutoramento apresentada à Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa. SEQUEIRA, Gustavo Matos; Depois do terramoto: história dos bairros ocidentais de Lisboa SERRÃO, Joel & MARQUES, A. H. Oliveira (dir.); Nova história de Portugal, vol. X, 2004 SILVA, Raquel Henriques da, Lisboa mariana: adequação e crítica do pombalino; in ROSSA, Walter; ARAÚJO, Renata & CARITA, Hélder (eds.) Actas do Colóquio Internacional do Universo Urbanístico Português (1415-1822), Comissão Nacional para a Comemoração dos Descobrimentos Portugueses, 2001 SILVA, Raquel Henriques da, Lisboa Romântica, urbanismo e arquitectura, 1777-1874, Lisboa , FCSH-UNL,1997 SILVA, Maria Raquel Henriques da, As Avenida Novas de Lisboa (1900-1930), Tese de Mestrado em História de Arte, Universidade Nova de Lisboa, 1985 SILVA, Isabel Maria Rodrigues, Prédios de rendimento nas Avenidas Ressano Garcia, 18891926;caracterização técnica Universidade Técnica de Lisboa; 2000 SERÉN, Maria do Carmo & PEREIRA, Gaspar Martins; Porto Oitocentista in RAMOS, Luís A. de Oliveira (coord.), História do Porto; 3ª edição; Porto Editora; 2000 SERRÃO, Joaquim Veríssimo, História de Portugal, Editorial Verbo, 15 vols., Póvoa do Varzim, 1979 SEQUEIRA, Gustavo Matos; Depois do Terramoto, Subsídios para a história dos Bairros Ocidentais de Lisboa; 4 vols; Coimbra, Imprensa da Universidade 1918. TEIXEIRA, Manuel C. VALLA & Margarida Urbanismo Português, Séculos XIII - XVIII, Portugal — Brasil, Livros Horizonte, Lisboa, 1999. TEIXEIRA, O plano de reconstrução da Baixa de Lisboa: a expressão erudita do modo tradicional de planeamento da cidade portuguesa, in ARAÙJO, CARDOSO, MONTEIRO, ROSSA & SERRÃO, 2007, p. 419-426
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BIBLIOGRAFIA | 151
FONTES Livro das Posturas Antigas, transcrição e leitura paleográfica de Maria Teresa Campos Rodrigues; Câmara Municipal de Lisboa, 1974 Colecção da Legislação Portuguesa desde a última compliação das Ordenações, redigida pelo Desembargador António Delgado da Silva, Lisboa, 1830-1844 LISBOA. Direcção dos Serviços Tecnicos-Especiais (Câmara Municipal. - Posturas: 1939 / Direcção dos Serviços Tecnicos-Especificos da Câmara Municipal de Lisboa. Lisboa : C.M., 1939 LISBOA. Câmara Municipal, Codigo de posturas da Camara Municipal de Lisboa. - Lisboa : Typ. do Jornal do Commercio, 1869. LISBOA. Câmara Municipal, Codigo de posturas da Camara Municipal de Lisboa: de 17 de Junho de 1869, coord. e anot. João Antonio Pimentel de Novaes. - Lisboa : Typ. Universal, 1882 LISBOA. Câmara Municipal, Código de posturas do Município de Lisboa de 30 de Dezembro de 1885... LISBOA. Câmara Municipal, Código de posturas do Município de Lisboa approvado... 30 de Dezembro de 1886., Lisboa : Impr. Democrática, 1887. LISBOA. Câmara Municipal - Código de posturas do municipio de Lisboa de 30 de Dezembro de 1886 / devidamente ampliado e anotado por A. Morgado, 8" ed. - Lisboa : Empresa A Legislação, 1912. LISBOA. Câmara Municipal, Código de posturas do municipio de Lisboa de 30 de Dezembro de 1886, por A. Morgado, J. Marcelino Aleixo, 11" ed. - Lisboa : Empresa Nac. de Publicidade, 1929. Registos Notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 67; caixa 143, Arquivo Nacional da Torre do Tombo Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 79; caixa 144, Arquivo Nacional da Torre do Tombo Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 48; caixa 145, Arquivo Nacional da Torre do Tombo
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152 | BIBLIOGRAFIA
Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 68; caixa 146, Arquivo Nacional da Torre do Tombo Registos notariais de Lisboa, Cartório 1, maço 69; caixa 147, Arquivo Nacional da Torre do Tombo Décima de Maneio dos Officios e Lojas da Superintendencia da Décima da Freguesia das Mercês pertencente ao ano de 1800; 1800, Arquivo Histórico do Tribunal de Contas Décima de Maneio dos Officios e Lojas da Superintendencia da Décima da Freguesia das Mercês pertencente ao ano de 1833, 1833, Arquivo Histórico do Tribunal de Contas Livro que hade servir p.a o lancamento dos maneyos das freguesias de S. Cristovao, S. Lourenço, S. Mamede; 1764, Arquivo Histórico do Tribunal de Contas Imposto profissional; Lisboa, 444, Lx 2 e 3, MF 203; Arquivo Histórico Contemporâneo Imposto profissional; Lisboa, 438; maço 11; Lx 3 a 6; Arquivo Histórico Contemporâneo MORAIS, Margarida; Centro Histórico de Guimarães; Câmara Municipal de Guimarães, 2002 GORDALINA, Rosário, Largo Mousinho de Albuquerque, nº 81-83 / Rua Sacadura Cabral / Avenida Duques de Bragança, nº 85, (concelho de Vila Viçosa, em Conceição); Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana, 2008. Cristina Garcia, Miguel Costa (CCRAlg), Teresa Ferreira, IHRU; 2002 (actualização: COSTA, Anouk & FERREIRA, Teresa, 2003); Cacela Velha (conjunto) / Núcleo histórico de Cacela Velha / Fortaleza de Cacela Velha; Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana, 2002/2003. AGUIAR, Ana Aguiar 1999 & FIGUEIREDO, Paula 2007; Jardim Miradouro de São Pedro de Alcântara / Jardim António Nobre / Alameda Eduardo Coelho; Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana
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APÊNDICE DOCUMENTAL A - FIGURAS B - DOCUMENTOS
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Fig. CAP.I- 3 - planta actual do território da Cotovia ao Rato, à cor branca o e núcleo urbano do Bairro Pombal, à cor salmão, nele incluído
Fig. CAP.I-1 - Plantas cartográficas de Filipe Folque 1856-1858, território da Cotovia ao Rato
Fig. CAP.I-2 - Plantas cartográficas de 1904-1911, território da Cotovia ao Rato
Fig. CAP.I-4 - Ortofotomapa de englobando o território da Cotovia ao Rato, fotografia aérea, voo de 2004
FOLHA A-1
Fig. CAP. II-1. – Banco Tota e Açores, antigamente Banco Lisboa e Açores
Fig. CAP. II-4 – Edifício de chanfro curvo na Praça Oito de Maio, em Coimbra
Fig. CAP. II-7 - Edifício Grandela & Cª ,
Fig. CAP. II-10 - Edifício António Silva da Cunha (Camisaria Confiança e Hotel Internacional)i
Fig. CAP. II-13 capeamento de pedra feito sobre cantaria pombalina
Fig. CAP. II-16 escadas do nº 59 da Rua da Prata
Fig. CAP. II-19 proposta vencedora do 3º Concurso para o Monumento ao Infante D. Henrique, 1954
Fig. CAP. II-2 linguagem neopalladiana num edifício de rendimento na Rua de S. João, no Porto
Fig. CAP. II-5 - Edifício de chanfro curvo no Largo da Portagem, Café Montanha, em Coimbra, Coimbra
Fig. CAP. II-8- Edifício Sede do Montepio Geral
Fig. CAP. II-11 - Hotel Metrópole, alçado para a Praça D. Pedro IV
Fig. CAP. II-14 - capeamento de pedra feito sobre cantaria pombalina
); Fig. CAP. II-17 - caixa de escadas do nº 44 da Rua dos Fanqueiros
Fig. CAP. II-20 - escadas do nº 94 da Rua da Vitória
Fig. CAP. II-3 - Edifício neomanuelino na Rua de Corpo de Deus, em Coimbra
Fig. CAP. II-6 - Paço Ducal de Vila Viçosa
Fig. CAP. II-9 - Edifício Sede do Banco Lisboa e Açores
Fig. CAP. II-12 - edifício Barros & Santos IV
Fig. CAP. II-15 - ,escadas do nº 40 da Rua de São Julião
Fig. CAP. II-18 - intervenção de Álvaro Siza no Chiado
Fig. CAP. II-21 - Rua Sousa Viterbo, rua pertencente ao Bairro Lopes, com o seu edificado modernista
Fig. CAP. II-22 edifício na Rua Sousa Viterbo nº 11, Bairro Lopes, Lisboa
FOLHA A-2
Fig. CAP.III-1 -edifício na Rua do Meio à Lapa nº 37 A, a divisão em fatiota
Fig. CAP.III-.4 - Alçados joaninos para a Rua dos Ourives do Ouro.
Fig. CAP.III-7 - Conjunto Praça do Areeiro (actual Praça Francisco Sá Carneiro)/ Avenida João XXI/ Avenida Almirante Gago Coutinho
Fig. CAP.III-10 - Pormenor de escoadouro na Travessa da Peixeira nº 11; (cap. 3, p. 4)
Fig. CAP.III-12 - Pormenor de placa foreira na Rua de S.Felix nº 3;
Fig. CAP.III-15. – Azulejos meio relevados no edifício nº 19 da Rua do Poço dos Negros nº 149
Fig. CAP.III-18. – Gelosias em janelas do edifício na Rua de S. Bento nº 26, ainda existentes na década de 40 do século XX
Fig. CAP.III-21. – Edifício de grande extensão da Rua do Loreto nº 22-32
Fig. CAP.III-24. – platibanda definida no projecto de melhoramento, de 1866 para o edifício da rua da Barroca nº 60 /Travessa dos Fiéis de Deus nº 45-47
Fig. CAP.III-27 – Cunhal completamente curvo
Fig. CAP.III-2 - Edifício na bipartido Rua Maestro Pedro de Freitas Branco nº 10-12 A
Figura 3.5 edifício da Rua Correia Garção / Rua de S. Bento nº 53101 / Calçada da Estrela
Fig. CAP.III-9 - Rua S. João da Mata nº 17-23, fachada tripartida; pasta
Fig. CAP.III-.11 - Pormenor de placa foreira na Rua da Escola Politécnica nº 43; indicando propriedade do Colégio Real dos Nobres
Fig. CAP.III-13 - Placa foreira num edifício da Rua do Meio à Lapa nº 16, encimada pelo símbolo da cruz trinitária
Fig. CAP.III-16. – Azulejos relevados no edifício nº 19 da Rua do Quelhas, Palácio do Machadinho
Fig. CAP.III-19. – Pormenor de gelosias no edifício na Rua de S. Bento nº 26, em1959
Fig. CAP.III-22 – Pormenor da Rua S. João da Mata nº 17-23
Fig. CAP.III-25. – Cunhal do edifício, da Calçada Marquês de Abrantes datado de 1853, J.A.L.R. 1853
Fig. CAP.III-28. –edifício Art Deco Rua D. Pedro V nº 7/ Rua Luísa Todi, com cunhal de chanfro curvo
Fig. CAP.III-3 -edifício bipartido na Cecílio de Sousa nº 77-79
Fig. CAP.III-6 - Edifício em Santos Largo Vitorino Damásio, 1- 4/ Avenida D. Carlos I, 5–45/ Avenida 24 de Julho, 50–56/ Largo Santos, 13–15
Fig. CAP.III-.8 - Rua da Silva, lado ímpar, pertencente ao núcleo urbano do Postigo do Melo e Casas de Embaixador
Fig. CAP.III-.14 - Azulejos meio relevados no edifício da Rua do Poço dos Negros nº 105 A
Fig. CAP.III-17. – Edifício de gaveto Travessa do Abarracamento de Peniche/ Travessa da Palmeira nº 5; cujos extremos dos azulejos são em bisel
Fig. CAP.III-20 - Parcial do prospecto de aformoseamento do edifício da Travessa dos Inglesinhos nº 33-35 de 18 de Maio de 1864 mostrando uma mudança de sensibilidades
Fig. CAP.III-23. – Platibanda constante no prospecto de alteração do Rua da Misericórdia 133-135; com data de 1862
Fig. CAP.III-26. – arredondamento do cunhal na base junto ao pavimento no edifício de gaveto Travessa do Jasmim/ Rua do Jasmim nº 21
Fig. CAP.III-29. – chanfro curvo curvo do edifício dos Correios no Gaveto da Rua Alexandre Herculano para a Rua de S. Filipe de Neri FOLHA A-3
do edifício da Rua do Machadinho/ Travessa do Pasteleiro
Fig. CAP.III-30. – Edifício de gaveto Rua de S. Marçal nº 176 / Travessa do Monte do Carmo
Fig. CAP.III-33. – Edifício de chanfro recto do edifício de gaveto da Rua da Rosa/ Rua D. Pedro V
Fig. CAP.III-36. – Chanfro recto, anterior ao decreto no edifício de gaveto Rua de S. Marçal nº 13-19/ Travessa de S. José
Fig. CAP.III-39. – Pormenor de campainha no edifício nº 39 Rua de S. Bento
Fig. CAP.III-42 – Pormenor de tubo de queda de ferro fundido na Avenida Duque de Ávila
Fig. CAP.III-31. – Edifício de gaveto modernista na Rua da Rosa/ Travessa dos Fiéis de Deus
Fig. CAP.III-.34. – Chanfro recto do edifício de gaveto da Rua Nova do Loureiro nº2, /Rua João Pereira Rosa
Fig. CAP.III-37. – Cunhais de chanfro recto visíveis no conjunto Rua Nova de S. Mamede/ Rua do Salitre
Fig. CAP.III-40. – Pormenor de respiradouro na Rua Eduardo Coelho
Fig. CAP.III-43. – Parcial do prospecto datado de 1867, do edifício da Rua Luz Soriano nº 75, apresentando umas escadas com um vazio central.
Fig. CAP.III-32. – Edifício de chanfro recto do gaveto Travessa do Abarracamento de Peniche/ Travessa da Palmeira
Fig. CAP.III-35. – Chanfro recto do edifício de gaveto da Rua Nova do Loureiro, lado ímpar/Calçada do Tijolo
Fig. CAP.III-38. – Edifício de chanfro recto de 1948, sito na Avenida da República 36-36 E/ Avenida Visconde Valmor 27-27E
Fig. CAP.III-41 – Pormenor de respiradouro em pedra na Rua Nova da Piedade nº 7
Fig. CAP.III-44. – Bairro Pombal, ilustração constante no livro de Gustavo Matos Sequeira; Depois do Terramoto; vol.II
Fig. CAP.III-45. – Solar dos Soares de Noronha, onde se instalou a Impressão Régia, cuja demolição se iniciou em 1895
Fig. CAP.III-48. – Pormenor do arco que antecede as escadas do pisos superiores do S. João da Mata nº 17-23)
Fig. CAP.III-51. – Trapeiras comportando cinco vãos de janelas na Rua de S. Marçal 13-21/ Travessa de S. José
Fig. CAP.III-54 – Largo do Rato, Arquivo Municipal de Lisboa, Arquivo Fotográfico
Fig. CAP.III-46. – Pormenor da escadas dos pisos superiores do edifício da Rua S. João da Mata nº 17-23
Fig. CAP.III-49. – Pormenor trapeira forrada de zinco na Rua Cecílio de Sousa nº 3-5
Fig. CAP.III-52 – Palácio Alagoas, hoje convertido em condomínio privado
Fig. CAP.III-55 – Pormenor das escadas e seus corrimãos do edifício do Largo do Rato nº 14-14 C
Fig. CAP.III-47. – Pormenor da clarabóia do edifício da Rua S. João da Mata nº 17-23
Fig. CAP.III-50. – Pormenor trapeira forrada de zinco na Rua de S. Bento nº 426
Fig. CAP.III-53 – Edifício de chanfro curvo Largo do Rato 16-16C/ Rua de S. Bento 712-714
Fig. CAP.III-56 – Grande edifício de rendimento na Rua do Arco a S. Mamede nº 2/ Rua de FOLHA A-7 S. Bento nº 520-502 FOLHA A-4
Fig. CAP. III-57 – Grande edifício de rendimento na Rua de S. Bento e nº 502-486
Fig. CAP. III-I-60 – Grande edifício de rendimento na Rua de S. Marçal os nº 29-35
Fig. CAP. III-63 – Alçado na Rua do Arco a S. Mamede edifício da Rua do Arco a S. Mamede nº 2/ Rua de S. Bento nº 520-502
Fig. CAP. III-66 – Último piso do nº 510 do edifício da Rua do Arco a S. Mamede nº 2/ Rua de S. Bento nº 520-502; acesso aos fogos e as portas dos “quartos independentes”;
Fig. CAP. III-69 – Caixa de escadas e arco que antecede o arranque das mesmas na Rua Professor Branco Rodrigues nº 28
Fig. CAP. III-72 – Edifício nº 14 na Rua Maestro Pedro de Freitas Branco, relativo ao período de 1859 a 1902
Fig. CAP. III-75 – Caixa de escada do edifício nº 37 A da Rua do Meio à Lapa
Fig. CAP. III-78 – Edifício na Rua da Imprensa Nacional nº 5-9
Fig. CAP. III-81 –Edifício na Rua do Arco a S. Mamede nº 75-79
Fig. CAP. III-58 – Grande edifício de rendimento na Travessa do Abarracamento de Peniche/Rua do Século com chanfro curvo de raio pequeno
FFig. CAP. III-61 – Grande edifício de rendimento na Rua do Século nº 6-22 anterior a 1751
Fig. CAP. III-64 – Caixa de escada do nº 510 do edifício da Rua do Arco a S. Mamede nº 2/ Rua de S. Bento nº 520-502
Fig. CAP. III-67 – Grande conjunto de edifício de rendimento na Travessa do Noronha nº 5-5 A/ Rua Gustavo Matos Sequeira nº 40
Fig. CAP. III-70 – Edifícios modernistas nº 5 e nº 7 da Rua Maestro Pedro de Freitas Branco
Fig. CAP. III-73 – Edifício nº 22 Rua Maestro Pedro de Freitas Branco, relativo ao período de 1859 a 1902
Fig. CAP. III-76 – Tipologia de escadas do edifício modernista da Rua Maestro Pedro de Freitas Branco nº 5y
Fig. CAP. III-79 – Edifício na Rua do Arco a S. Mamede nº 35-39
Fig. CAP. III-82 – Edifício na Rua da Imprensa Nacional nº 37-41
Fig. CAP. III-59 – Grande edifício de rendimento na Rua do Loreto nº 22-30
Fig. CAP. III-62 – Grande edifício de rendimento na Rua de S. Marçal nº13-21/ Rua de S. José
Fig. CAP. III-65 – Arranque da escada e sua porta adjacente do nº 510 do edifício da Rua do Arco a S. Mamede nº 2/ Rua de S. Bento nº 520-502
Fig. CAP. III-68 – Caixa de escadas com o seu pavimento em xadrez e arco no edifício da Rua de Santos-o-Velho nº 22-32
Fig. CAP. III-71 – Edifícios nº 17 e nº 19 Rua Maestro Pedro de Freitas Branco, relativos ao período entre 1758 e 1859
Fig. CAP. III-74 – edifícios nº 8 e nº 10 na Travessa do Noronha relativos ao período de 1959 a 1902
Fig. CAP. III-77 – Edifício na Rua do Arco a S. Mamede nº 4
Fig. CAP. III-80 –Edifício na Rua do Arco a S. Mamede nº 41-45
Fig. CAP. III-83 – Edifício na Rua do Arco a S. Mamede nº 22 A
FOLHA A-5
Fig. CAP. III-84 - Planta de implantação do edifício de gaveto Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714, substituindo o que tinha ficando em ruína. Planta datada da década de 1910.
Fig. CAP. III-87- Plantas da loja, sobreloja e 1º andar alterados num projecto posterior a 1912 e anterior à intervenção de 1947.
Fig. CAP. III-88 - A intervenção Estado Novo,datada de 1947, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714
Fig. CAP. III-85 - Planta actual do
Largo do Rato, onde se encontra o edifício de gaveto do Largo do Rato 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714 A salmão o parcial do território do Bairro Pombal e a amarelo o território a ele fronteiro
Fig. CAP. III-86- Pormenor do Largo do Rato, Arquivo Municipal de Lisboa, Arquivo Fotográfico
Fig. CAP. III-89 - Projecto de construção do edifício do largo do Rato
16-16 C/ Rua de S. Bento 712-714 correspondente à primeira realidade construída do edifício
Fig. CAP.III-94 - A intervenção de 1997, no edifício do Largo do Rato nº
Fig. CAP. III-97 - Pormenor do nascimento da base do arco que ante-
16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714.
cede as escadas de acesso aos pisos de habitação no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714.
Fig. CAP. III-90 - A intervenção Estado Novo,datada de 1947, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714
Fig. CAP. III-92 - A intervenção Estado Novo,datada de 1947, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714
Fig. CAP. III-95 - A intervenção de 1997, no edifício do Largo do Rato
Fig. CAP. III-98 - Pormenor do ádito das escadas de acesso às habitações do edifício do edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714.
Fig. CAP. III-91 - A intervenção Estado Novo,datada de 1947, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714
Fig. CAP. III-93 - A intervenção de 1997, no edifício do Largo do Rato
Fig. CAP. III-96 - Pormenor da clarabóia e transição desenho de alçado
Fig. CAP. III-99 - Lambril de um desenho de padrão da composição azulejar que antece do arco que demarca limite do ádito das escadas do pisos habitacionais do edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714.
nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714. Restruturação do espaço da padaria original para albergar a Leitaria Brasil.
nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714. Restruturação do espaço da padaria original para albergar outros espaços comerciais para além da Leitaria Brasil.
com a platibanda, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714.
FOLHA A-6
figura 4.1 – Telhas de canudo pintadas observáveis nas Rua de S. João nº 5, no Porto
figura 4.4 –A água furtada edifício sito na Rua de Sant’ Ana à Lapa tem toda a sua frontaria revestida de zinco lavrado
figura 4.7 – As casas de banho, ultimo reduto no exterior da fachada na Rua Álvaro Coutinho
figura 4.10 – Dobradiças de leme soltas das portas visíveis no edifício n 17-23 da Rua S. João da Mata
figura 4.13 – Interrupção da balaustrada para construir uma janela de sacada na Rua do Noronha / Travessa do Noronha 1
figura 4.16 –interiores da Rua Gustavo Matos Sequeira nº 33
fig. 4.19 – Belíssimas varandas tipicamente gaioleiras existentes no alçado posterior do edifício de gaveto Rua Gustavo Matos Sequeira nº 25 / Travessa do Noronha
figura 4.22 – Casa Schrõder 1923-1924, da autoria de Gerrit Thomas Rietveld
figura 4.2 – Telhas de canudo pintadas visíveis na Rua Ferreira Borges, em Coimbra
figura 4.5 – Cobertura de um edifício de rendimento no gaveto da Rua dos Industriais com a Avenida D. Carlos I, Imitando a moda portuense
figura 4.8 – As casas de banho, ultimo reduto no exterior da fachada na Rua de Santa Bárbara
figura 4.11 – Dobradiças de leme encastradas nas portas do edifício neoclássico nº 17-23 da Rua S. João da Mata
figura 4.14 – “trapeira de zinco” ainda em telhados de tipo mouriscado no do edifício do Largo do Conde de Pombeiro/ Rua de Francisco Lázaro, em Lisboa
figura 4.17 – Edifício da Rua do Arco a São Mamede nº 22
figura 4.20 – Varandas tipicamente gaioleiras existentes nas traseiras de um edifício com vista para a Rua de S. Bento
figura 4.23 – Edifício da Rua Correia Garção / Rua de S. Bento / Calçada da Estrela, resolução das escadas do nº 101
fig. 4.3 – Edifício sito na Rua de Sant’ Ana à Lapa com as suas escadas obedecendo ao regulamento de 1902
figura 4. 6 – As casas de banho, ultimo reduto no exterior da fachada nas traseiras do edifício para o Alto do Longo
figura 4.9 – Tubagem visível no tardoz do edifício Travessa do Noronha 5-5 A/ Rua Gustavo Matos Sequeira nº 40, demonstrativo de um saneamento básico pensado de raiz
figura 4.12 – Balaustres feitos de pasta de tijolo, do edifício sito na Praça das Flores nº 31
figura 4.15 –Superfície de zinco ondulada de uma mansarda e as suas esbeltas águas furtadas, Rua Cecílio de Sousa nº 3-5
figura 4.18- Caixas de correio no ádito do edifício da Rua do Meio à Lapa nº 37 A
figura 4.21 – A colocação das escadas no edifício tripartido da Rua Luz Soriano nº 75, parcial do prospecto de 1867
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APÊNDICE DOCUMENTAL | B - 1
APÊNDICE DOCUMENTAL
Documento 1 Consulta da camara a el-rei em 25 d' agosto de 1745 ”Senhor- Por decreto de 15 de julho do anno presente foi V. Magestade servido que, vendo-se no senado da camara a copia inclusa da consulta do conselho da fazenda d' esta cidade, a respeito das obras que o senado mandou fazer no sitio da Ribeira, no chão em que succedeu o incendio da polvora, e prejuizo que com ellas se causava á repartição das sete casas, se consultasse o que parecesse; e por outro decreto de 16 de julho do mesmo anno é tambem V. Magestade servido que no mesmo senado se veja a petição inclusa do juiz do povo e Casa dos Vinte e Quatro, e com effeito se consulte o que o parecer, suspensa a obra até a resolução da consulta. Em observancia da real determinação de V. Magestade se mandou suspender na obra de que se trata, e, vendo-se em mesa a consulta do conselho da fazenda e súpplica do juiz do povo, parece ao vereador Duarte Salter de Mendonça que, acontecendo o incendio da Ribeira, por elle se destruiram as casas que o senado utilizava, foi elle, vereador, por ordem que têve o mesmo senado, com o procurador da cidade Claudio Gorgel do Amaral e officiaes da sua repartição, ao referido sitio da Ribeira, a examinar a fórma por que se devia acudir, assim é a utilidade do bem publico, como do rendimento da cidade; e, dando conta no tribunal do que se achou e entendia para a sua restauração e estabelecimento lhe passou o tribunal ordem, fs. I, em que lhe assignaram todos os ministros, por que se lhe mandou que continuasse em mandar fazer um armazem, para se
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recolherem todos os azeites que vinham á pedra e ao despacho da sete casas, e juntamente uma alpendrada para se medirem artigos que costumavam pôr-se á porta do Terreiro, antes que entrem, com detrimento grave do povo e de seus donos, por entenderem ser tudo util ao povo e á cidade, em que interessa mais de cinco mil cruzados por anno; certamente; o qual estando já principiado 900$00 réis (consta na certidão do mestre, f. 3), por o senado querer ir mais no segura das suas determinações resolveu ir todo fazer vistoria sobre o sitio, com mestres não só seus , mas de fóra, para que orçassem o que poderia importar á obra do armazem do azeite, que orçaram os do pedreiro, como se vê da sua certidão a fs. 6, em 3:000$000 réis, e os de carpinteiro em 1:200$000 réis que declara a certidão fs. 7; e, satisfeitos do que viram no terreno, que é o mesmo que mostra a planta junta, e da utilidade que com o accrescimo do rendimento que já ha, por render o que de novo se tem feito, 1:052$800 réis, pela certidão fs. 9, e cinco mil cruzados mais que sem duvida renderão os armazens por se poder medir n' elles o azeite, que sómente rendia este terreno, como declara a certidão fs. 11, 509$800 réis, custando tudo o que se acha feito, para este rendimento, 1: 902$327 réis, como declara a certidão fs. 13, em dois annos ficará desempenhado, passou a segunda ordem, fs. 15, mandando continuar o armazem do azeite com as quatro portas para quatro ruas principaes, com o que ficam capazes de por ellas rodarem todas as carruagens, como na planta se vê, e só reservar-se a alpendrada do trigo para se fazer depois de acabado o armazem do azeite, fundado no poder que tem para isso na fórma das resoluções de V. Magestade, por onde lhe concedeu o dito sitio, e manda que n' elle se faça o mesmo senado todas as obras que entender lhe serão uteis para a renda da cidade, por repetidas soluções que vão de fs. 17 até fs. 26. Mas, como este miseravel tribunal teve sempre mais quem cuidasse da sua deploração, do que do seu augmento, porque zelo d' este só se acha n' aquelles que servem a V. Magestade como devem, pôde mais a emulação e malignidade de quatro escrivães das sete casas, induzidos por causas particulares do que o bem publico, que, para cegos, da sua ambição, passaram a certidão junta, com que enganaram o contador da fazenda, para que com pretextos affectados puzesse na presença de V. Magestade, pelo conselho da fazenda, o que a na verdade assim não era. Em primeiro logar manda V. Magestade pelo decreto junto, fs. 29, de 13 de abril do anno presente, que as ruas principaes tenham 20 até 25 palmos de largo, em que póde voltar uma carruagem e irem duas desencontradas, e tendo o armazem de largo ás sete casas 40 palmos, como declara a certidão dos mestres a fs. 31, e se vê na planta junta, sendo o mais terreno que occupa o armazem, o d' antes era inutil por o cano de recolhimento da Misericordia estar arrebentado sempre, que todo
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aquelle sitio alagava e o fazia tão immundo, que nem se podia passar por elle, nem ali habitar gente, como se vê na certidão dos mestres, fs.31, e da justificação fs. 33, que tirado este obstaculo, e tirados só 25 palmos para serventia da rua, ainda ficam 18 para o serviço da cidade, e utilisado em bem publico, com o armazem, aqulle sitio até ali inutil e prejudicial com o seu fétido, ás mesmas sete casas. Diz mais a certidão d' aquelles escrivães , a fs. …, que no fim do armazem se faz uma casa que estreita a rua e quebra o cano das commuas sete casas. Primeiramente, esta casas, como mostra a planta da certidão junta, é no canto do armazem, já no fim da escada das sete casas, onde nunca chegou carruagem, porque sempre este sitio teve entulhado de de talhas, bateis podres e um lamaçal inutil, que por elle não havia serventia, como e vê da justificação fs. 33, ficando hoje com ella capaz de carruagem, por tudo limpar e pôr em estado de ter exercicio, porque tal ainda d' esta tal casa ás sete vão de largo 30 palmos e um quarto, como uma rua para o mar, na volta de 18 palmos e um quarto declarados na planta junta e certidão dos mestres, fs. 31, e justificação fs. 33; além que esta casa não a faz o senado, porque Manuel Gomes de Carvalho que, mostrando titulos legitimos, se lhe não impediu a factura d' ella, e é o que a mandava fazer; e, sendo este o maior obstaculo dos escrivães das sete casas, ainda que sem razão, com menos verdade affirmaram que o senado a mandava fazer. E, pelo que respeita ao cano, é tão limitada a ruina, que com menos de 20$000 réis o senado, como publico, sempre o fez tenção de o concertar, encostado á mesma casinha, ou por baixo, por onde vae bellamente, como diz a certidão dos mestres, fs. 31. Clama mais a mesma certidão dos escrivães, fs. …, que o armazem assombra as sete casas: da certidão do mestre, fs. 31, se vê o senado não mandou subir mais do que a altura em que se acha galgado, e como n' esta não assombra, por não exceder o pavimento da escada das sete casas, foi imaginaria a sua duvida, tanto ao assombramento, como á vista do mar que suppuzeram se lhe tirava; ainda que esta se lhe tirasse, poderia ser mais util ao serviço de V. Magestade, por não dverem os officiaes ás sete casas a divertirem-se, mas sim a trabalhar cada um na sua occupação. E semrazão, por ser tão leve a informação, mandou o comselho da fazenda embargar a obra, não tendo juridisção para tal, á vista das reaes resoluções, fs. 41, até fs. 44, por qu V. Magestade já tem determinado que semelhantes questões se não mettam nos tribunaes, sem primeiro lhe darem parte! Por cujos motivos o senado deferiu ao juizo do povo ter-se satisfeito ao requerimento, menos o verdadeiro, como mostra a planta junta, porque se manifesta tem serventias taes que a principal,
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que vae do mar á Ribeira, tem 33 palmos e 31 de largo, a que vae pelas sete casas tem 48 palmos de largo, as outras que são bastantes, têem a 18 e a 16 palmos de largo, tudo arruado por diferente modo que dantes não havia, como patenteia a planta que se próva da justificação fs. 33. E tão longe está de ser esconderijo de furtos, como diz o juiz do povo, que agora se acha desembaraçada para tal não haver. E fala sem experiencia no que respeita a se ursuparem os reaes direitos, porque antes com a nova obra é que se evitam os descaminhos dos direitos reaes e as novas travessias dos azeite, com tantas utilidades, quantas pondera, para a arrecadação dos reaes direitos, para o serviço de V. Magestade, para o bem publico e utilidade da cidade, a informação do juiz de Vêr-o-peso, fs. 45, certidão do escrivão, fs. 9, e o dirão todos os que V. Magestade se servir de mandar tirar sobre este particular uma devassa pra exemplar demonstração porque é sem duvida não viu o juiz do povo o decreto por que V. Magestade manda se façam ruas de 20 a 25 palmos, nem as viu as que ficam n' este sitio, sem embargo do real decreto que parece que não se entende para a Ribeira, por se ter sido meramente destinado para renda da cidade. E tambem é contra a verdade dizer o juiz do povo que se tirará o logar da alpendrada do Terreiro, porque além de, pela justificação fs. 33, se mostrar que a maior parte do terreno estava sempre inhabitavel com as imundicias do cano do recolhimento da Misericordia, acha-se sitio muito bastante, sem descommodar pessoa alguma com verdade, para a tal alpendrada de trigo, como moóstra a planta junta; tudo com boas serventias e com grande utilidade do povo, por se livrarem do tempo o seu pão, e poderem entregar medido ao Terreiro, e augmento da renda da cidade; porque é certo não fez o juiz do povo semelhante petição, mas sim foi induzido pelos interessados a fazer maior buhla n' este negocio, para que não se conclua a obra. V. Magestade mandará o que fôr mais do seu real agrado. Ao vereador Francisco da Cunha Rego e procurador da cidade Francisco de Mendonça Arraes e Almada parece o mesmo que o vereador Duarte Salter de Mendonça. ao verador Gaspar Ferreira Aranha sempre pareceu se não devia fazer o armazem para se recolher o azeite, no sitio em que está principiado, por ser aquella praça mui necessaria para a serventia da cidade, e ser conveniente que esteja desembaraçada para mais facil expedição do que se tira das embarcações, assim fructa que vem em grande abundancia, como todo o pão que entre para o Terreiro, succedendo muitas vezes, por falta de expedição prompta, o haver n' elle perigo, e por isso mui precisa para se pôr o pão antes que entre para o Terreiro; sendo certo que todo aquelle
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sitio se acha tão cheio de casinhas e tendas, que as serventias publicas experimentam já hoje grandes detrimentos; e ainda que estes não fossem tão notórios, nunca elle vereador, considera no dito armazem conveniencia tal que, atropellando-se as commomdidades publicas, se attendesse só ao accrescimo que a cidade póde ter no seu rendimento, por ser sem duvida que no tal armazem se não podem vender os azeites, porque só no Vêr-o-peso, onde se acham os medidores, juiz, escrivão e contrador, é que se deve medir; e fazerem-se as vendas d' elle em ambos os sitios, isto é, na pedra e no novo armazem é impracticavel; e se é para recolher sómente os azeites, não póde o seu rendimento avultar, porque, como é pertencente ao contratador, ou elle o ha de receber, ou pedir que se lhe leve em conta na sua rendam dando-se-lhe o abatimento do que se havia de lucrar se se não fizesse o tal armazem, e, estando este orçado na despesza, para sua factura, em 4:200$000 réis que o senado não tem, e que ha de pagar juros d' elles, nunca póde restar, pagos estes, a menor conveniencia á fazenda da cidade, ponderadas estas circumstancias que no sentir d'elle, vereador, se fazem attendiveis, julgando mais convenientemente aquelle sitio livre e desembaraçado do serviço da cidade e melhor expediente do que para ella vem de mantimentos, que devem experimentar á mais facil expedição, para maior commodidade do povo e dos donos dos ditos mantimentosma que primeiro tudo deve attender-se. V. Magestade, comtudo, mandará o que fôr servido. Ao vereador Manuel Martins Ferreira parece necessaria a obra do armazem que se faz para recolher os azeites, pela pouca commodidade que ha na casas do Vêr-o-peso, e ser muito pequena, sem embargo de que reconhece elle, vereador, não será tão grande a conveniencia que se entende o senado, levando-se sómente o mesmo que se leva na casa de Vêr-o-peso, porque tambem falta que n' ella ha de haver orecolhimento dos barris de azeite, que a ella vão, diminuirá o contrato da dita casa, e attendendo tambem ha despeza que ha de fazer o senado, supposto se poderá incluir no mesmo contrato o dito armazem, para que, em consideração da conveniencia que póde fazer ao contratador, possa crescer o preço d' elle, e virem do dito armazem os barris para o logar costumado da venda do dito azeite; e no que respeita ao prejuizo que se allega, de se impedir a serventia para as sete casas, parecce inattendivel, suposta a largura que fica a rua e se vê no mappa incluso,porque, não havendo armazem no dito sitio, ha varias tendas e cabanas, com que se fazia o mesmo e maior impedimento, porque não ficaria a rua com tanta largur e tão desimpedida; e é sem duviad que todo aquelle sitio é do senado, para n' elle augmentar as sua rendas com logares e casas, como V. Magestade, por suas reaes resoluções, tem determinado que o senado as faça, e é tambem certo que antes que as que seacham feitas, se fizessem, estavam as passagens
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mais apertadas e impedidas, como o mesmo senado reconheceu em uma ou duas vistorias que lá foi fazer, e se passou ordem pelo senado ao vereador Duarte Salter de Mendonça, para fazer tudo que entendesse, e sem duvida não houve n' elle vogal algum que contradissesse, supposto n' esta consulta vê elle, vereador, menos conformidade de parecer, do que quando se passou a ordem que e se fizeram as vistorias. V. Magestade mandará o que fôr servido. Aos procuradores dos mesteres parece justificado o requerimento do juiz so povo porque, sendo a praça da Ribeira uma das maiores e principaes d' esta cîorte, e um desmbarque universal de todos os viveres que veem para esta cidade, não é justo que se esteja impossibilitando ao povo o uso livre da mesma praça, sem a qual nem a cidade se póde provêr, nem o pvo ter onde faça seus promptos desembarques. E supposto o desembargador vereador do pelouro ds obras arbitre intempestivo o requerimento do juiz do povo, suppondo-o instruido por terceiras pessoas, é supposição affectada, porque sendo, como é, tão notorio o impedimento e pejo que faz n' aquelle logar o novo armazem e obras do senado, basta o universal sussurro dos que os que conhecem damno publico para o juioz do povo ser obrigado a recorrer a V. Magestade o evite, não obstante dos juramentos das testemunhas que se perguntaram pelo mesmo desembargador vereador, por que odito de quatro testemunhas, particularmente perguntadas, não ha de prevalecerá evidencia do que se está vendo e percebendo com os olhos, e melhor justifica pela attestação dos quatro escrivães das sete casas, que testeficam do estado a que se reduz aquella praça, com a nova obra, a qual tambem não se patrocina com certidão do juiz de Vêr-o-peso, porque , como este não é proprietário, mas sim um serventuario offficial e sujeito ao desembargador vereador do pelouro das obras, regulou a certidão pelo que arbitrou ser mais commodo das rendas do senado, sem attender o prejuizo do povo, circumstancias que bem persuadem não desvanecer o damno publico e inegavel com osdocumentos que se adquiriram depois de V. Magestade mandar consultar este negocio, cuja consulta parece que suspendia todas estas certidões e justificações. Além d' isto todas as cidades e villas d' este reino põem o seu maior empenho na grandeza das praças, fazendo-as tão desimpedidas como publicas, e se isto se pratica nas mais, não ha razão para que não se observe na côrte, onde o concurso é muito maior para os desembarques, vendas, despachos, cargas e descargas que pedem uma larga estação e desimpedida, tanto para se evitar a confusão do povo, como os descaminhos das fazendas que são mais communs em semelhantes apertos. E o dizer-se que o povo fica com a expedição das ruas para a praia, não salva o prejuizo, porque é
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constituir uma pequena rua, onde devia estar uma praça grande, e é obrigar o povo a servir-se por becos, em um sitio onde não seriam bastantes as maiores ruas; o que bem mostra mesma planta pelo senado offerecida, porque dá 9 palmos e meio a algumas das ruas, e a outras 16, tudo contrario ao real decreto de 13 de abril do anno presente, no qual, assignando V. Magestade a fórma que o senado deve determinar as novas ruas, lhe advertiu que as ruas tenham ao menos 5 vara ou 25 palmos de largo, e que as ruas e estradas principaes se observe maior largura; e, lembrando-se o alto conceito que V. Magestade que são precisas praças para os maiores concursos do povo, o recomenda no mesmo decreto por estas formaes palavras: - em distancias competentes e commodas se deixem praças com capacidade para as commodidades publicas. E parece estranho à observancia d' este real decreto, com a nova obra se destrua as praças publicas d' esta côrte. A utilidade da renda do senado, que tambem se pondera, não deve prevalecer á accommodação do povo, se bem que o senado com este novo armazem não faz benficio ao povo, mas sim destruição, porque tomando todo o campo da Ribeira, como não ha estação onde se façam desembarques, obriga-se o povo a que por força de recolha n' aquelle armazem tudo quanto se desembarcar, e que o rendeiro lhe vá destruindo tudo quanto se desmbarcar e appetecer á sua ambição. E tudo, se o desembargador vereador do pelouro das obras entende que o povo não póde passar sem este armazem, destine outro sitio, que não falta na Ribeira e se mostra na mesma planta, porque n' ella se mostra o campo de casinhas para alugar e d' estas casinhas alugadas não tem o povo necessidade, e póde o senado no mesmo sitio d' estas casas de aluguer fazer o armazem e alpendradas, pois não é justo que o povo padeça por semelhantes alugueres para casas que só servem de tabernas. Tambem ha outros sitios na mesma Ribeira que não servem de utilidade alguma ao povo, quaes são as casas dos barbeiros, linheiras e taberneiros e outras semelhantes, e como estes podem accommodar-se em ruas pelo centro da cidde, não é bem que estejam occupando a praça da Ribeira; e no mesmo sitio onde elles se acham, se podem fazer com maior commodidade os armazens que se pretendem, para recolher os trigos e os azeites, sem impedir o uso publico e os sitios mais proximos á praia; e dizerem o contrario os mestres das cidades, é quererem fazer bom o seu partido, lisonjeando ao mesmo o desembargador vereador do pelouro que os governa. Pelo que parece a elles, procuradores dos mesteres, que o prejuizo do povo é grande, fazendo-se o armazem no sitio onde a planta o dá; e que será mais conveniente fazer despejar d' aquelle sitio os
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barbeiros, linheiras, tabernas e outras casas que não servem de vendas publicas, para no sitio d' ellas se fazer o armazem e alpendrada, a cujo fim esperam elles, procuradores dos esteres, e requerem por parte do povo a V. Magestade se digne mandar plantear todo o sítio da Ribeira, para que, apartando d' ella o que é superfluo, se destine o sitio competente para os desembarques, vendas e armazens publicos, evitando deste modo o prejuizo que considera o tribunal do conselho da fazenda, a respeito das sete casas, sobre que V. Magestade poderá resolver com justiça que costuma administrar a seus vassallos. Ao tempo de se assignar esta consulta accescentou o desmbargador vereador Duarte Salter de Mendonça que elle punha na real de V. Magestade que, se os documentos que elle vereador, junta peccam em alguma coisa contra a verdde, merece castigo, mas como o crédito dos ministros que se prezam de servir V. Magestade com o zello de fieis vassallos, como elle, vereador, é inestimavel, sendo verdadeiros, merecem da real piedade de V. Magestade satisfação, informandose de tudo como fôr servido: o que prostado aos seus reaes pés implora. - Lisboa, etc.”… in OLIVEIRA, Eduardo Freire; vol. XIV, pp.434-445 livrº do regimº de cons. e dec. do sr. rei D. João V, fs. 107
Documento 2 ”Ouujde mandado dos vereadores e procurador que nenh~ua pessea nom seja tam ousada que aja de allugar nenhuas cassas nem tendas senom pera seu viuer e negoçio e nom pera Regatear e tornar a Reallugar e qualquer que o contrairo fezer E em ello for comprendido ou lhe for prouado pagar dez cruzados pera as obras da çidade E esto se nom entendera quando hua pessoa llugar (sic) hua Cassa em que aJa tres ou quatro cassas de hua portaas (sic) adentro./ porque cando assy for quem quer as podera allugar e tomar parte dellas que quiser pera seu viuer e as outras podera allugar sem pena algua E se alguas allugadas forem desta maneira de sam Joham pera qua que as deixem… a dita pena e sera meetade da dita pena pera quem ho acussar // foy apregoada a xxbiij Junho de bº xij Yoão ffogaça ffernão lopez correa”… in Livro das Posturas Antigas, Fl. 103v, p. 287
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Documento 3 Lei de 31 de Dezembro de 1864 A largura de ruas novas não deve ser inferior a 10 metros e o seu declive máximo não deverá exceder 7 por cento. (n. 4º do art. 35). Os chanfros de cunhal dos prédios urbanos e rústicos das ruas de Lisboa e do Porto, dodem ser rectilíneos ou curvilíneos, sendo a distância mínima de 4.50 m entre os vivos das arestas limites do chanfro. No caso de serem curvilíneos (denominados em Lisboa, gavetos) terá a corda do arco de concordância entre os dois alinhamentos rectos, o mesmo comprimento de 4.50 m (Portaria de 20 de Outubro de 1865) appud APPLETON, João guilherme Appleton, pp.275-276 Documento 4 Decreto de 31 de Dezembro de 1864 MINISTÉRIO DAS OBRAS PUBLICAS, COMMERCIO E INDUSTRIA Disposições relativas ás ruas e edificações no interior das cidades, villas e povações SECÇÃO 1ª ”Do plano de edificações e reedifcações em lisboa: medidas geraes para se levar a effeito e prescrições de polícia Art. 34º O governo mandará immediatamente proceder a um plano geral dos melhoramentos da capital, attendendo n’elle ao das ruas, praças, jardins e edificações existentes e á construção e abertura de novas ruas, praças, jardins e edificações existentes, com as condições de hygiene, decoração, commodo, alojamento e livre transito publico. Parag. unico. Este plano será elaborado por uma commissão composta de um engenheiro e de um architeto, empregados no serviço das obras publicas, de um engenheiro proposto pela camara municipal e de um vogal do conselho de saude publica do reino, indicado pelo mesmo conselho. Esta commisão terá ás suas ordens os necessarios empregados technicos. Art. 35º Nos projectos que se fizeram para execução do plano ordenado pelo artigo antecedente, alem das indispensaveis condições de luz, ventilação e abastecimento de aguas ,se atenderá o seguinte: 1º Ao melhor systema de deposito, desinfecção, esgoto, despejo, ou remoçao de liquidos e solidos;
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2º Á drenagem do solo, quando este forpaludoso ou carregado de substancias organicas; 3º Ao systema de esgoto geral, encanamento de agoas e tubagem de iluminação da cidade; 4º Á largura das novas ruas, que não deve ser inferior a 10 metros, nem sua declividade superior a 7 por cento 5º Aos encanementos interioires que conduzam aos canos de esgoto as aguas dos telhados; 6º Ao chanfrado dos angulos ou esquinas 7º Á altura das edificações determinada pela largura das ruas, observando as seguintes regras: 1ª Quando a largura das ruas for menor que 7 metros, a altura dos edificios não será superior a 8 metros; 2ª Quando a largura for de 7 metros a 10 metros exclusivamente, a altura não será superior a 12 metros; 3ª Quando a largura for de 10 metros a 18 metros, a altura dos edificios não será superior a 16 metros; 4ª Quando a largura for maior de 18 metros, a altura não excederá a 19 metros; 5ª Quando os edificios tiverem fachadas sobre duas ruas, que se cruzem com differentes larguras, a altura será determinada pela maior largura; 6ª Quando os edificios tiverem fachadas sobre duas ruas abertas proximamente na mesma direcção, mas com grande differença de nível, a altura será determinada por decisões especiais do governo; 7ª Quando os edificios forem construidos fóra do alinhamento das ruas publicas em pateos ou jardins interiores, a sua altura não excederá a 15 metros, eccepto se o governo autorizar maior elevação. Parag. unico. O disposto no nº 7 deste artigo não se applica aos templos, aos edificios destinados a serviço publico, nem aos monumentos, que sejam construidos pelo governo, quer pela camara municipal. Art. 36º as alturas determinadas no artigo antecedente serão medidas desde a calçada ou passeio até à parte superior da cornija. Parag. 1º As medidas são tomadas no centro da fachada. Parag. 2º Acima da cornija e no plano da parede da fachada não poderá ser elevad nenhuma construção, excepto aeroterios e seus acessorios. Art. 37º São declaradas de utilidade publica e urgentes todas as expropriações necessarias para a inteira execução do plano ordenado e feito em conformidade com os artigos antecedentes, e
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approvado pelo governo, observando-se no processo d’estas expropriações as leis em vigor. Art. 38º Logo que seja approvado pelo governo o plano de edificações e melhoramento da cidde de Lisboa, nos termos dos artigos antecedentes, ás condições d’esse plano ficam sujeitas as novas edificações, as reedificações, abertura de ruas, praças e jardins. Parag. unico Depois de feito e approvado este plano, o governo poderá approvar, por partes os projectos definitivos para sua execução. Art. 39º Enquanto o plano não for approvado, nos termos do artigo 38º, a camara municipal, de acordo com o director das obras publicas do districto de Lisboa, continuará a fixar os alinhamentos e a dar cotas do nível, com a declaração, porém, de que ficam desde já em vigor as disposições do artigo 35º, nºs 1º, 5º, 6º e 7º com regras n’elle estabelecidas, o parag. unico do mesmo artigo, e o artigo 36º com os seus parag.s. Parag. unico Se não hover accordo entre a cam ara eo director, decidirá o ministro das obras publicas. (…) Art. 42º Continuarão a ser feitas pela camara municipal de Lisboa e á custa do municipio, todas as obras para a conservação, salubridade e limpezadas ruas da cidade, e as de embelezamento nas praças, jardins e passeios publicos. Art. 43º Todos os proprietarios que pretendem construir edificios novos em Lisboa, ou reconstruir os antigos que por qualquer causa ou motivo foram demolidos, ficam obrigados a observar as disposições d’este decreto e do seu regulamento. Art. 44º É prohibido acrescentar novos andadres nas edificações existentes ou sobre ellas fazer qualquer outra construção, quando d’esse facto resulte o ficar o edificio com altura superior á fixada nas regras do nº 7, art. 35º Art. 45º Os proprietarios que pretenderem edificar, reedificar ou de qualquer modo alterar as suas edificações, são obrigados a submetter á approvação do governo, pelo misterio das obras publicas. commercio e industria, o respectivo projecto pelo modo que for prescripto no regulamento. (…) Art. 47º Os proprietarios de terrenos que confinem com as vias publicas existentes são obrigados a construir edificações n’esses terrenos, segundo projectos que forem approvados, devendo começara as obras dentro do praso de um anno, a contar da intimidação que para esse fim lhes deve ser feita pela camara municipal. (…)
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Art. 48º Todos os proprietarios de edificações que ameacem ruina são obrigados a demoli-las no praso fixado pela camara municipal. Se os proprietarios não obedecerem á intimidação que para este fim lhes deve ser feita pelos empregados da camara, orddenará esta que, sem mais aviso nem processo, aquellas edificações sejam demolidas á custa dos proprietariso, sob a direcção do engenheiro do municipio. Art. 49º É prohibido a todos os proprietarios que construam novas edificações ou reconstruam as antigas, por qualquer causa e motivo demolidas, alterar e por qualquer fôrma modificar o projecto approvado, sair do alinhamento ou não guardar as cotas de nivel. Se assim o fizerem, contra elles se procederá pelo modo prescripto no art. 48º.”… in Annaes do Municipio de Lisboa, 1865, p. 2182-2184
Documento 5 Bahia (1785)« Cazas ”qualquer pessoa, que quiser mandar edificar / nesta , e fora das suas / portas , qualquer edifício / o fará na forma seguinte: do plano da rua athe / o envigamento do primeiro sobrado terá/ altura quinze palmos e meio, e para a / a cornija dous palmos e meyo e querendo / fazer segundo andar ou sobrado , será / com altura proporcionada conforme / delinear o mestre de obras deste senado. / No primeiro andar não se faraõ sacadas, / mas sim janellas divididas de pulpitos , / estas naõ sahirão mais / de palmo, enquanto equando muito palmo e me / io com grades de ferro, ou de pau pin / tadas ou janelosias , não exceden / do a altura desta quatro palmos , / e sem postigos para sima; jane / llas do segundo andar serão de para / peito, não excedendo a altura destas de quatro pal / mos; as portas terão largura de sinco / palmos e meio , e da altura da hombreira , / ou pé direito de des palmos , / e serão de volta ou sem ella , fazendo aque /lla figurar no ornato que for da vontade , / e melhor gosto dos donos , de sorte que na / largura poderão exceder mais, ou menos / meio palmo, porém nada na altura , e / nas loges poderão fazer janellas para / peito, não excedendo sete ou quatro palmos / seguindo porem as vergas o mesmo ali / nhamento das portas : nas ladeiras quan / do o terreno declinar sinco palmos, se resaltará o prospecto fazendo a sua fa / chada em forma de redentes: Esta mês / ma formalidade se observara quando houverem de reedificar quaesquer propri / edades, e necessitando de alguma sacada das antigas de conserto
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consideravel se não / se poderá fazer na forma , mas / sim se reduzirá a sacada, as janellas di / vididas com grades, ou rotulas na forma determinada. Declarasse, que do palmo da rua the o vigamento the digo o vigam /to do primeiro sobrado, terá altura de quin / ze palmos, e hum para o vigamento, e o soalho fazem desasseis palmos, e deste at / he ao cornijamento, quinze palmos e meio, e para a cornija dous palmos e meio, co / mo já se declarou ao principio: e para / todas estas obras a forma a expres / sada o mestre de obras do senado remetendo / selhe esta deligencia para o delinea / mento. E quem quizer fazer al / guma propriedade nobre , e de maior / grandeza das ordinarias, aprezentará / neste mesmo senado o risco do prospecto , e da formalidade do edifício, conf / me o terreno para se averiguar se hé, ou / não conveniente afim de se lhe conceder /ou não faculdade. Toda e qualquer / pessoa que o contrario fizer sera punido / com trinta dias de cadêa, e seis mil reis / de condenação , alem de se demolir a sua / custa a obra que tiver feita: e nas aru / çõens que fizerem se mandará logo / observar o que fica determinado, o Mestre /das Obras que der o risco contrario ao que / se acha expressado nesta postura ficará / comprehendido nas mesmas penas e se / rá privado do officio1”… 1
Simith, Robert - Documentos Baianos, in Revista do Património Histórico e Artístico Nacional,
Rio de Janeiro, nº 26, 1997, p. 273, transcrito pelo autor do Livro nº 2 das Posturas da Câmara da Cidade da Bahia, fl. 135 e 135v
Documento 6 Decreto de 9 de maio de 1776 ”Sendo-me presente a grande necessidade que ha de se alargar a rua Nova da Palma, para o bem commum. que resulta de se desembaraçar a communicacáo da parte septentrional para a outra parte meridional da cidade de Lisboa, até agora impedida pela estreiteza da sobredita rua que, não dando logar mais do que ao transito de uma só carruagem, causava encontros de perniciosas consequencias e frequentes impedimentos ao serviço público, sou servido que o senado da camara faça logo comprar, no lado do norte da mesma rua, as propriedades descriptas na relaçáo que com este baixa, assignada pelo sargento-mór de infantaria, com exercicio de engenheiro, José Monteiro de Carvalho, pelo capitão Reynaldo Manuel dos Santos, architecto geral das obras públicas, por José Antonio Monteiro, mestre do officio de carpinteiro, e por Manuel da Silva Gaião mestre do officio de pedreiro, ambos com exercicio nas mesmas obras públicas; fazendo-se as
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compras pelos preços declarados na sobredita relação, pagando se com dinheiro à vista as importancias dos córtes que não excederem. a 400$000 reis, e lavrando-se padrões de retrò aberto, com o juro annual de cinco por cento, a favor dos donos das outras propriedades que excederem a sobredita quantia. 0 mesmo senado da camara o tenha assim entendido e faça executar com as ordens necessarias para a notificacão dos referidos donos, e para a prompta celebração dos seus respectivos contrátos. — Salvaterra de Magos, etc.» Relação que baixou com este decreto: «José Monteiro de Carvalho, sargentomór de infantaria, com exercício de engenheiro, e Reynaldo Manuel dos Santos, capitão do dito corpo e architecto geral das obras públicas, e José Antonio Monteiro, mestre do offizio de carpinteiro, e Manuel da Silva Gaião, mestre do officio de pedreiro, ambos das ditas obras, públicas, etc. — Certificâmos que nós fômos no dia 4 de janeiro de 1776 á rua Nova da Palma, para o fim de avaliarmos todas as propriedades comprehendidas no córte que, por ordem de Sua Magestade, se manda fazer no lado occidental da dita rua, e o que achâmos se deve cortar, príncipiando do lado meridiorial, e os precos por que avaliâmos são os seguintes:
1.ª propriedade que está reduzida a pardieiro e consta ser de Martinho Teixeira Chaves, e ,2.a dita que tambem está reduzida a pardieiro e consta ser do dito, ambas fazem de frente 68 palmos, os quaes dois distinctos pardieiros avaliâmos em ...................................................160$000 3.ª .a morada qua consta ser de Manuel Eleuterio, tem de frente 31 palmos, a qual avaliâmos em .........................................................................2:350$000 4.a morada que consta ser do hospital real, tem,de frente 30 palmos, a qual avaliâmos........................................................................................700$000 5.a morada que consta ser de Manuel Rebello, tem de frente 29 palmos, a qual avaliâmos em ..................................................................................350$000 6.a morada que consta ser de Margarida Rosa, tem de frente 29 palmos, a qual avaliâmos em .................................................................................650$000 7.a morada que consta ser de Francisco Epifanio Delgado, tem de
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fundo 29 palmos, a qual avaliâmos em ................................................................1:400$000 8.a propriedade que está reduzida a pardiciro e consta ser de João da Costa de Athayde, tem de frente 93 palmos e meio, a qual avaliâmos em ........................................................................................................400$000 9.a propriedade que está reduzida a pardieiro, a qual não houve quem declarasse o dono, tem de frente 29 palmos e avaliâmos, em .........................................................................................................................140$000 10.ª morada que consta ser.de André Corcino, tem de frente 22 palmos, e avaliâmos em ......................................................................................1:200$000 11.a morada, do dito André Corcino, a qual avaliâmos em .......................................350$000 12.a propriedade que está reduzida a pardieiro e não houve quem declarasse o dono, tem de frente 20 palmos, a qual avaliâmos em ................................................................................................................................60$000 13.a propriedade que consta ser de Antonio Couceiro, está reduzida a pardiciro, a qual avalimos em ..................................................................30$000 14.a propriedade que está reduzida a pardieiro e não houve quem declarasse o dono, tem frente 28 palmos, a qual avaliâmos em ..............................120$000 15.a morada que é do sr. D. João, a qual avaliâmos em ........................................4:000$000 16.a morada que é de D. Antonia, que não constou o sobrenome, tem de frente 45 palmos, a qual avaliâmos, por estar edificada de novo e com licenca, em ......................................................................................1:600$000 13:910$000 «As quaes ditas dezaseis propriedades avaliâmos pelo seu intrisico valor, ficando salvo a seus respectivos senhorios. todo o terreno que sobejar a cada um de per si, depois do alinhamento da rua, para nelle poderem edificar como seu proprio, e assim mais todos os materiaes que o dito desmancho produzir, desmanchando elles por sua conta, que, de contrário, devem ser de quem os demolir. E, por ser todo o referido verdade, passámos a presente. — Lisboa, 30 de março de
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1776. — Reynaldo Manuel dos Santos — José Monteiro de Carvalho — José Antonio Monteiro — Manuel da Silva Bayão.» in OLIVEIRA, Eduardo Freire; 1906; Vol. XVII, pp. 547-449
Documento 7 Se alguem pera ventura alguu muro cayr sobre que aJa alguem cassa feita aquelle que teuer hy a cassa ou que costar a elle faça muro aa ssua custa //. Se alguem quiser verter todallas agoas de ssua cassa a huu lugar da rrua devey o (sic) fazer per call que se venha agoa rroJando per sua parede E nam pode nenhuu verter agoa de ssua cassa per call longa sacando a fora em a rrua per que faça noJo nem malll a sseu vezinho ou aos que passarem pella rrua e sse hy alguem teuer call longa nam a pode mudar que ponha hy outra mayor nem doutra feitura era dante am aquelle mesmo lugar //. Se os almotaçees derem Juizo sobre alguua coussa de nenhuua das partes nam for agrauado E aquell comtra quem ho derem nam quiser conprir sseu Juizo deue peitar cada dia aos almotaçees çinco soldos atee nove dias e sse nam quiser conprir o Juizo ataa nove dias des entom adyante deue peitar cada dya sasenta soldos E esta pena deuem a leuar os almotaçees Eos almotaçees leuarom delle a pena que ssusi he dicta //. Se alguem ha cassa da outra parte da rrua e Outro sseu vizinho quer fazer cassa da outra parte da rrua E quer hy fazer portall ou sse avya ja cassa feita que quer abrir portall de nouo ou hi quer fazer Janellas nouas ou fresta nam no pode abrir nem fazer dereito do portall ou da Janella ou fresta daquell outro seu vizinho que mora da outra parte da rrua sse ho hy amte nam ouue mas o fazer desujado Ja quanto do outro sse quiser //. Outrossy nam pode fazer nenhuu fazer rramada nem alpendere nem poer escada nem outra coussa que seJa embargo nem estreitura da rrua e oque o fezer o deven a dirribar //. (E sendo o em terreiro ou rrua muito larga poderam pidir licenca (sic) aos veradores e elles hla daram quando a serventia publica nom fizer preJuijzo) / in Livro das Posturas Antigas, Fl. 40v, p. 110-111
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Documento 8 ”Em nome de Deos amen, Saibão quantos este instromento de Subenfiteutacação e aforamento à face do Prazo e Obrigação virem q. no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil, e setecentos, outenta e sinco, aos vinte e sete dias do mez de Mayo, nesta cidade de Lisboa na rua direita do Arsenal da Marinha e escritório de mim Tabelião, aparecendo prezentes a saber: de huma parte José Felix Venancio Coutinho, morador nesta cidade na rua direita da freguezia de Santa Izabel, por Sy, e como administrador dos bens do Cazal e Procurador dos mais herdeiros que ficarão de Seus Sogros Miguel Mendes da Costa e Sua mulher Patrícia Maria já falecidos, por bem de huma escritura outorgada com os mesmos herdeiros nesta cidade na nota do Tabelião José Rufino de Andrade em dous de Junho de do anno de mil e sete centos, e setenta: e de outra parte José da Serra, morador na rua do Cabo da dita freguesizia de Santa Izabel, em nome e como Procurador do Juiz, e mais Irmãos da Confraria do Senhor Jesus dos Terremotos, cita na mesma Parochial de Igreja, por virtude de huma Procuração q. apresentou se treslada ao diante. E logo por elle José Felix Venacio Coutinho foi dito (…) que entre os mais bens do Cazal que administra, se compre-ende o Prazo, de que elle e os mais herdeiros dos ditos Seus Sogros são enfiteutas principais, e Senhorio Directo o Provedor das Lezirias, em razão dos mesmos Seus Sogros o terem tomado de aforamento emfatiota a Filipe Peixoto da Sylva Couto e a sua mulher com a faculdade de poderem subenfiteutar, como consta de huma Escritura celebrada nas notas de Luiz de Souza Aranha Tabelião da Villa de Santarem em o primeiro de Abril do anno mil, e sete centose quarenta e tres; do qual Prazo trocara elle Administrador huma Pedreira com duas terras misticas citas ao Arco do Carvalhão Suburbio desta Cidade, por outra Pedreira e duas terras que no mesmo Citio possuhia o Illmo.o e o Ex.mo Sebastião José carvalho e Mello Conde de Oeyras e Marquez de Pombal, de cuja troca e subrogação se celebrou a Escritura nesta Cidade nas notas de Tabelião Ignacio Correa de Souza e Andrade aos onze de Julho do anno de mil, e sete centos e seis pelo que ficou a Pedreira e duas terras q. erão do dito Ex.mo Marquez pertencendo ao dito Prazo principal, e os mesmos herdeiros coma faculdade de as poder subem fiteuticar, como fazião de outras porções de terras do mesmo Prazo; e se tinha ajustado com o Juiz, e mais Irmãos da dita Confraria do Senhor Jesus dos Terremotos Hum terreno a lhes dar de subemfiteuticação hum terreno das terras referidas, cito onde chamão os Pouzos freguezia de Santa Izabel, o qual parte do Nortecom a estrada q. vai para a Ribeira de Alcantara, e que tem por esta banda que he frente cento, e setenta e sinco palmos, do Nascente parte com terras vulgarmente chamadas do Bauto, e tem por esta banda duzentos, e quinze palmos, do Poente parte com Olival da Quinta da Tinturaria
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e tem por esta banda duzentos e sincoenta palmos, e do Sul entesta as terras do Bauto e Casas de José Militão, e tem por esta banda os palmos que verdadeiramente comtar por se não poder agora fazer medição certa. E assim disse elle José Felix Venacio Coutinho que por esta Escitura na milhor forma de Direito nos nomes que representa, e à face do Prazo principal do cazal que administra dá de subemfiteuticação e aforamento emfatiota para semprte o terreno assima declarado, e confrontando à dita Confraria do Senhor Jesus dos Terremotos, para nelle edificarem huma Ermida do mesmo titulo e fazerem as mais bemfeitorias q. lhe convierem e isto por foro e penção0o em cada hum anno de duzentos rs. em dinheiro, livres da Decima para os Enfiteutas principais a quem serão satisfeitos por dia de Natal (…); declarando elle José Felix Venacio Coutinho que faz esta subemfiteuticação por tão diminuto foro não só em attenção a ser para edifficio do Culto Divino, mas a que o dito terreno he inculto de cascalheira que nada rendia; e com a condição de que os foreiros nelles edificarem cazaseas concervarão sempre levantadas, e reparadas em que suas Magestades o ouverem por bem e não se quizerem servir do referido terreno para edifficação do Seu Real Palacio, por q. a todo o tempo que o quizerem edificar as demulirão, e cessará então o correr do foro: Porem no cazo das ditas Cazas perecerem por agoa, fogo, terremotos, ou outro qualquer acontecimento, as tornarão a re-edificar pondo-as no proprio, ou milhor estado em q. antes estavão; e na porta prinicipal das Cazas que fizerem porão um letreiro que diga - Peixoto- e não poderão os Subemfiteutas vender trespassar o Seu Domínio Util sem Licença dos Enfiteutas principais (…) e do preço por que assim se vender pagarão o primeiro Laudemio de vintena aos Senhorios Diurectos do Prazo principal por assim lhes tocar na forma do aforamento feito aos ditos Miguel Mendes da Costa e Sua mulher. (…)”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório nº1. Cx. 132, livro 627, pag. 61 v-62 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp.610-611 Documento 9 “Em nome de Deos amen, Saibão quantos este Instromento de Aforamento emfatiota e Obrigação virem que o anno do Nascimento de Nosso senhor Jesus Christo de mil, e sete centos , outenta e quatro, aos quatorze dias do mez de Junho, nesta cidade de Lisboa (…) aparecerão os prezentes a saber: de huma parte Valentim dos Reys em nome. e com Procurador que he da Meza da Irmandade de Nossa Senhora da Ajuda de Bellem cita na Rela Capela, e Parochial Igreja da mesma invocaçaõ; e para este acto com Procuraçaõ especial dos Menzarios actuaes da mesma Irmandade (…); e de outra parte Joaõ Alves morador na dita freguezia de Nossa Senhora da Ajuda
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Suburbio desta Cidade. E logo por elle Valentim dos Reys foi dito (…) que entre os bens de que a dita Irmandade (…) he Senhora e possuidora, e de que está de mança, e pacifica posse de tempo immemorial a esta parte, Saõ humas terras na estrada Real, que vay de Alcantara para a Ajuda no Cytio do Senhor Jezus do Cruzeiro, que por terem pouco rendimento, e muitas pessoas pertenderem nellas edificar cazas, se rezolvera a dita Irmandade a aforalas em Przos divedidos, o que era mais util, e de maior rendimento para o culto de Nossa Senhora; e assim tinha feito varios aforamentos a diversas pessoas, e hum dos seus foreiros era o dito Joaõ Alves, ao qual faltava fazer a escitura de um chão em que está edificando cazas no dito Citio do Senhor Jezus do Cruzeiro junto a outras de que tem escritura; e sendo este dito chaõ medido, e confrontando, se achou ter da parte do Nascente dezasete varas,e partir com as outras cazas e Prazo do dito Joaõ Alves; e da parte Norte Treze varas e partir com o quintal de Francisco Teixeira; do Poente dezasete varas e partir com terra da dita Irmandade; e do Sul treze varas, e partir com travessa e cazas de Pedro Esprial; e em razaõ de Ser quarteira ao Reguengo da Fazenda Real foi por parte della avaliado o ficar sem Coltura com a factura das Cazas em huma quarta de trigo macho cada anno de pençaõ certa, que se lhe pós por encargo em Lugar do quarto, posto e entregue â Custa do foreiro por dia de Nossa Senhora de Agosto no Celeiro de Sua Magestade (…), Que o dito foreiro fechará o dito chaõ em Roda , tomando sobre Sy as agoas pelo modo q. lhe parecer, sem deitar as mesmas agoas, nem outra couza alguma par os predios mais vizinhos Enfiteutas das ditas terras, nem lhes poderá embarassar o edificarem, e levantarem as Suas propriedades como quiserem (…). Que sobre a porta principal das Cazas será elle foreiro obrigado a pôr um hum Letreiro esculpido em pedra que diga – Foreiras â Irmandade de Nossa Senhora da Ajuda – com o seu numaro que seguir aos mais Prazos (…)”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório nº1. Cx. 132, livro 624, pag. 23 v-24 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp.615 Documento 10 “Em nome de Deos Amen Saibaõ quantos este instrumento de Contrato de obra e obrigaçaõ virem q. no anno de Nosso Senhor Jesus Christo de mil sete centos noventa e hum em trinta dias do mez de Dezembro nesta cidade de Lisboa defronte da Igreja da Magdalena em o meu escritório apareceraõ presentes Francisco Costa Chaves ourives do ouro com logea na mesma Rua: e bem assim Joze Antonio Duarte mestre deo officio de Carpinteiro mor.or a Cotovia junto à Mai dagoa freg.a de S. Joze e Manoel Loureiro, m.e do off.o de Canteiro mor. or na Adissa. Por elles partes foi
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dito (…) q. tendo elle Francisco Costa Chaves rematado na dita rua dos ourives do ouro hum chão do lado Nascente, defronte do quarteirão da Igr.a de N. Sra. da Vitória, com tres portas de frente (…) e querendo edeficar propriedade a fundamentis se ajustava com elles mestres em lhe dar de empreitada a carga serrada pelo preço e debaixo das condiçoens clausulas e obrig. es seguintes – Que elles mestres executaraõ a planta q. lhes for entregue assinada por elle senhorio da obra fazendo o prospecto q. tambem se lhes entregar, pondo nas frontarias boas cantarias de pedra, rija, clara, e seraõ todas as cantarias tanto da frente, como no saugaõ gateadas na forma e estillo do officio, e os alicerces seraõ bem feitos perfurados até ao chaõ mais fixo com sete palmos de largo, e com bons fundamentos de cantaria (…) será toda a frente de perpianhos até sacadas, Lojas do chaugaõ será tudo lageado havendo dez agooadouros no chaugaõ p. as agoas dos Telhados: hum poço com bocal de cantaria. Seraõ as paredes de fronte da rua e chaugaõ de três palmos e meio de groço té o primeiro andar, e a devizoria de tres palmos. Seraõ mais as paredes alinhadas com linhotes de ferro aonde he costume. Todas as paredes forradas de Cantaria pelo chaõ: será a sobredita obra composta de tres portas de frente levando tres andares de altura, e agoas furtadas de pé direito e sobreagoa furtada de pé direito á p.te do chaugaõ com huma trapeira do melhor gosto. Tera a mesma propriedade cincoenta e tres palmos de fundo com sua coluaca de lagedo ranhurado e os canos seraõ encanados no cano Real q. tera tres palmos de Largo. Que havera baranda geral sobre a simalha real com sua grade de risco, como tambem nas janelas de sacada do primeiro andar, e tambem grades de ferro de maxo e e femea nas janelas das Logeas do chaugaõ (…) Sera o primeiro lance da escada geral degraos de cantaria e havera em todas as cozinhas poaes p.a potes: seraõas chaminés de cantaria degasto de picola como hé costume. Seraõ as cazas todas da frente azulejadas com azulejo da fábrica Real: nas cazas pricipais a sete, alcobas a cinco, cozinhas e caza de jantar a tres corredores e cozinhas anteriores a dois: isto se entende no primeiro andar até ao terceiro q, dahi p. sima tambem levará azulejos tudo com s alturas a proporção das alturas das cazas: tambem será azulejada a escada geral como hé costume e faraõ o passeyo na forma do arruamento – Dividirsehaõ tos os quatos na forma da Planta, fazendo em todas as cozinhas Armarios e cravoeiras. Seraõs os vigamentos do primeiro quartiados e todos os mais a seiztos a quartos, tudo de competente grossura e de boa qualidade ficando a distancia de huma viga a outra palmo e quarto: os paos de prumo do primeiro andar quartiados e todos os mais a seis e os alizares serrados a oito; os membros de palmo ate palmo e meio levaraõ meis vigas debaixo acima, tudo tambem de competente grossura (…) Todos os tabiques do prim.ro andar seraõ bem escorados, e todos os mais q. naõ forem nos prumos debaixo; seraõ assoalhados todos os quartos
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de madeira de casquinha da melhor e mais groça de folha fora; seraõ as Lojas forradas a encher e todas as cazas de fora forradas, encabeiradas com moldura de meia largura e todas as mais cazas e a escada tambem forradas e encabeiradas com sua moldura de sepo, sendo tudo de madeira de flandres: seraõ todas as portas das cazas da frente, guarneceidas com suas fasquias moldadas, e bandeiras em todos os portaes grandes, e portas enteriores p.a vidraça: seraõ todos os caixilhos de vidraças tanto na frente da rua como no chagaõ (…)Seraõ as portas das logeas de madeira do Brazil da melhor qualidade: os degraos da Escada geral de viga do Pinhal da Rainha (…) Haverá seu coberto sobre o passeyo e balcoens sendo precizo (…) havera sottos sobre algumas cazas e se estes forem forrados seraõ a encher; toda a frontaria pintada de verde como hé estilo (…) todas portas da propriedade e os alizares de varias qualidades de pedra, fazendo sempre diferença de humas a outras (…). Os telhados seraõ mouriscados com suas passadeiras; em o seg.do e terceiro andar levará linhotes de ferro em todos os mebros da frete e chagaõ. Os vidros seraõ brancos. Todas as pinturas das portas e janelas levaraõ tres de maos a olio. Que seraõ obrigados finalmente a fazer quaesquer repartim.tos, acomodaçoens ou armarios q. forem precizos aos quartos e o tudo q. por esquecim.to se naõ declara. ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório 11. Cx. 153, livro 7120, pag. 623-625 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp.628-629 Documento 11 …” Em Nome de Deos, Amen. Saibaõ quantos este instrumento de contrato de obras e obrigação virem q. o anno do nas cimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil sete centos noventa e tres, em dois dias do mez de Outubro nesta cidade de Lxª defronte da Igreja da Magdalena em meu escritorio apareceraõ presentes Bento Joze Pacheco, Negociante da Praça desta corte, mor.or as cruzes da Sé, e bem assim Manoel Loureiro, Mestre Canteiro, morador na rua do Feregial. Por elles parte foi ditto a mim Tabeliaõ perante testemunhas ao diante nomeadas, q. elle (…)Bento Joze Pacheco hé Snr. e possuidor de hum terreno, q. consta de dous vãos com cincoenta e sete palmos de frente e setenta e dois de fundo, sito na rua do Ferregial defronte da Igreja de S. Francisco, no qual pertende edeficar huma propriedade de Cazas, q. constade logeas, Armazens, cocheiras, entrefolhos, primeiro, seg.do, terceiro e quarto andar, e a este respeito contratou, com o d.o Mestre Manoel Loureiro p.a lha dar feita. e acabada de todo necessario, com todos os materiais singulares p. bem e segurança do mesmo predio; (…) debaixo de condiçoens e obrig.es = Que os caboucos seraõ abertos com dés palmos de fundo ou mais se precizo for, conforme os
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fundam.tos q. se acharem em os mesmo caboucos; teraõ sete palmos de largo ou mais se necessario for; levaraõ seus fundam.tos de pedras grandes compridas de cabeça q. apanharem o diametro da largura do d.o cabouco, tanto nas fronteiras, como por dentro, e o mesmo se entenderá nas paredes de toda a propriedad.e; e as paredes do cabouco do meyo teraõ quatro palmos de groço até o primeiro andar, levenado perpianhos até o d. o primeiro andar. Que levará huma Pilastra na rua direita, e o primeiro, e seg.do andar de sacadas, irmans das da proprie.de e q. já se acha feita na mesma rua pertencente a elle Pacheco, e só teraõ maior rebaixo por cauza das agoas da chuva, ou levaraõ boracos e ranhuras á moda antiga ou tambem levará ranhura com a sua chapa de ferro pregada aos fechos, como as q. tem Joaõ Gilardi (?) na sua propried.e, feito ficará a elleiçaõ delle dono como bem quizer, eo mesmo se entenderá no terceiro e quarto andar; sendo o terceiro de varandas pela mesma ordem q. se acha a propried.e contigua dele Pacheco, tanto pela frente da terra como pela frente do mar, eo quarto andar levará duas janelas tambem de sacads p.a a rua Direita, e o mesm o se entenderá p.a a parte do mar. e tanto para huma p.te como p.a a outra, seraõ executadas na forma do prospecto das frentes das cazas da rua direita, q. já se achaõ feitas dele Pacheco, e seg.do andar da p.te do mar, levará tambem a sua varanda geral ou na falta levará sacadas conforme as da frete da rua direita do prospecto do primeiro e seg.do andar como as plantas ou riscos q. seraõ assinados por elle e dono da obra. Que seraõs as logeas, coxeiras e Armazens lageadas, e forrradas em roda de enxelaria e a parte q. for precizo da escada até o primeiro patamal de pedra de escoda (…) e as duas partes das logeas, das coxeiras levaraõ dois gigantes cada huma. Seraõ os Arcos q. levarem os Armazens e logeas , de cantaria malhetada, lavrada de Picolla, e chumbados. Seraõ as coluacas de cantaria até o terceiro andar enranhoradas e gateadas com a sua pia pela parte do quintal, irmans em tudo das q. já tem elle dono na sua propriedade, e com sua porta de rotullas pela parte de fora do quintal p.a naõ ser devaçado; e a coluaca do quarto andar será de lages enranhoadas e gateadas com a sua pia pela parte do quintal Seraõ todas as chaminez de cantaria lavrada, gaspa de Picolla com seus cachorros groços, e vergas na forma do costume. Será o primeiro lanço de escada de cantaria lavrada de Escoda com seus arcos da mesma sem defeito. Seraõ todos os mais lances de escada, Patamares e corrimoens de Madeira do Brazil. Seraõ os tétos das logeas, e Armazens, entrefolhos, chegos de estuque, e da mesma sorte primeiro, seg.do e terceiro andar, levando as sallas principaes de fora e cozinha, a sua moldura com floraõ ao meyo e as alcovas lizas; e o quarto andar será forrado de madeira com alguma galantaria nas sallas principaes; bem entendido q. o terceiro andar terá uma varanda sobre a semalha real p.aa parte do mar e terra com as suas grades de risco, irmans sas q, já se achaõ na
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propriedade dele senhorio, e com todos os seguradoiros precizos e em todos os andares levar’ huma devizaõ p. se naõ poderm comunicar os vezinhos huns com os outros; e o quarto andar será de pé direito. assim como as janelas q. levar nos Armazens, á frente levaraõ grades de ferro de maxo e femea, conforme as da propriedade dele Pacheco, e as portas dele levaraõ suas chapas de ferro p. as naõ ofender as rodas das lages. Fará s paredes de bons materiais sem q. tenha mistura de ariolla nem caliça e a area sera quanto baste p.a ficar bem caldiada, e a cal será dos fornos de Alcantara, e naõ de outra parte alguma. Que as dvizoens dos panos das chaminés seraõ feitas de Tejolo mandado fazer proporcionado e naõ de tejolo posto ao alto hum sobre o outro; na entrada da Escada haverá huma pia com seu cano; as portas das logeas, Armazens e e postigos p.a a escada, e todos os caixilhos das vidraças das frentes, seraõ madeira do Brazil sem notta ou manxa, e as ferragens e fixaduras a proporçaõ da mesma madeira, (…) Seraõ todas as cazas na frente forradas e ancaveiradas com sua cornija e as cozinhas, alcobas e cazas enteriores tambem encaveiradas, com moldura de sepo, e corredores, eraõ tabem forrados a encher. Seraõ todos os portaes goarnecidos com fasquias moldadas nas cabeças. Todas aquelas cazas q. ficarem emmediatas ás cazas ou sallas da p. frentes com suas bandeiras de vidraças p.a quinze vidros. Seraõ todas as portas das sallas, e cazas do mesmo feitio; em todas as sallas principais levará huma cornija o mais bonito q. poder aformoziar as ditas sals, com toda a largura. Será o madeiramento de Castanho de boa grossura e proporcionado, com seo guarda pó de casquinha e ripa de Castanho ou madeira salgada. Todas as despenças levaraõ suas pratelleiras e tão bem levará os guarda fógoos q. forem precisos; Seraõ todos os vidros da Fabrica, sendo branco e limpos. Seraõ todas as cazas das frentes azulejadas, tendo altura de sete azoleijos, e as alcovas a cinco, as cozinhas (…) corredores e cazas interiores a tres; a escada a quatro, sendo todos da Fabrica e as cores a elleiçaõ delle dono, com tambem os feitios (…). A pintura será toda a das frentes dadas com duas maos de sizento, e huma de verde, e tudo a oleo; todos os alizares das cazas da frente seraõ tambem pintados a oleo, e depois fingidos a pinsel; todas as semalhas das ditas cazas da frente seraõ tambem fingidas a pinsel, sendo cada caza de diferentes tintas e gosto humas das outras, e as cores a elleicaõ dele dono. Todas as portas e janelas seraõ pintadas em duas de mão de oleo, e depois fingidas da mesma forma; e os tétos e corrimoens da escada tambem seraõ pintados e fingidos. Tanto os sobrados, como os forros, portas e janellas seraõ bem aplainados e os sobrados desempenados, e as taboas bem unidas, com todos os pregos necessarios p.a naõ empenarem ou alargarem, e o mesmo modo de pregar será feito em tudo o mais da obra p.a a boa segurança e q. por falta de pregos naõ experimente danno ou defeito (…) E neste entra tambem o acabar das
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paredes e todo o mais necessario ao quintalinho q, fica pela parte do mar, fazendo-lhe dois assentos p. a mesma parte do mar, forrados e lageados da mezma forma outros dois para a parte da travessa de José da Cruz Miranda, e o mai resto depois da parede chegar ao níveldo primeiro andar e fará em alegretes feitos de tejolo rebatido com seus boracos p.a escoadoiro das agoas, tudo com bom gosto e idea, e da mesma p.te da travessa de J.e da Cruz Mir.da ficará hum Armazem pequeno, coberto de abobada e lageado com sua porta de madeira do Barazil; cujo Armazem já se acha com o seu Portal de pedra e degraos de cantaria q. se haõ de tirar fora p.a ficar hum dos assentos apontados (…) Se obriga o mesmo senhoria a dar-lhe a q.tia de sete contos de reis por toda a referida obra (…) E declara mais elle senhorio q, a parede das cazas da parte do mar, e a maior parte do quintal já se acha feita quaze até o primeiro andar (…)”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório 11. Cx. 155, livro 732, pag. 55-59 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp.625-627 Documento 12 “Saibaõ quantos este instrumento de Contrato de Obra e obrigaçaõ virem que no anno deo Nascim.to de Snr. Jesus Christo de mil sette centos e noventa e um vinte e nove dias do mez de Junho nesta cidade de Lisboa defronte da Igreja da Magdalena em meu escritorio apareceraõ preszentes de huma parte Joze Luís Mouta de Gouvea e Vasconcelos, Escrivaõ do Civel da Cida.e mo.or na rua nova da Bitesga, freg.a de S. Nicolao, com adm.or da pessoa e bens de sua filha Getrudes Elena do Carmo Gouvea e Vasconcelos. De outra Manuel António das Neves, mestre do officio de Pedreiro Morador na Rua Direita do Arcenal, freg. de S. Julião. E por elle parte Joze Luís Mouta de Gouvea e Vasconcelos foi ditto (…) q. à dita sua filha pertencia huma propriedade de Cazas sita na Rua das Parreiras, perto do convento de Jesus, freg. de S.ta Catherina do Monte Sinai, por lhas ter deichado em testam.to Clamencia Thereza da Nazareth. Que a propriedade se achava justo danneficada e encapaz se subsistir sem os reparos necessarios. Que atendendo ao seu prezente estado se achava justo com elle d.o mestre a reidificar as mesmas cazas, demolindo delas a frontaria, e formando-a de novo, desde os seus alicerces até a altura do seg.do andar; e bem assim fazer-lhe a parede do fundo no chagoaõ deixando em caza o q. presentemente se acha baranda, demolindo a parede anterior até o prim.ro andar p.a sobre ella fundar ou formar os frontaes devizorios da Caza de fora, deichando essa caza e do seg.do andar com quatorze palmos novos de pé direiro, as Logeas ficara~0 com um pé direito de doze palmos vivos, e tudo o mais na conformidade de hum papel feito e assinado pela maõ deledito m.e (…); o telhado sera
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mouriscado seg.do o coztume do das bem acabadas propriedades; a pintura será segura e farta, e a de fora verde. As agoas terão sahida de forma a q. pelo chagoão se naõ venhaõ introduzir nas logeas: sera mais obrigado o d.o m.e a deliniar a obra de maneira aq. tenha as precizas acomodaçoens seg.do o permitir do vaõ da propriedade, não lhe esquecendo Armarios, despensas e pois p.a Pottes de agoa: por tal forma q. as cazas fiquem clara, de modo q. de dia se naõ faça precizo usar Luz em alguns doas quartos fazendo tudo á carga serrada até entregar a elle Senhorio as chaves p.a se alugarem, ou as habitar, com seus caixilhos, e vidrassas; e isto tudo pela q.tia de nove centos e cincoenta mil reis (…)”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório 11. Cx. 152, livro 712, pag. 66 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp.628-629 Documento 13 “Saibaõ quantos este instrumento de contrato e obrigaçaõ virem q. no anno do Nascime.to do Snr. Jesus Christo de mil stte centos e noventa, aos vinte e sinco dias do mez de Janeiro nesta cidade de Lisboa no Escritorio de mim Tabelião aparecerão prezentes, a saber: de uma parte Francisco José Beja, calafate da Ribeira das Naos, morador na Rua da Portugueza freguezia de Santa Catherina do Monte Sinay; e de outra parte José Joaquim Campos Mestre carpinteiro, morador juntoa À Parochial Igreja de Nossa Senhora da Ajuda suburbio desta Cidade. E logo por elles partes foy dito perante mim Tabelião e testemunhas diante nomeadas, estarem ajustadas em elle Mestre edificar humas casas q. se achão arruinadas em o chão q. elle parte Francisco José Beja tem e possue na dita freguezia de Nossa senhora da Ajuda na Rua da Paz, foreiro à Real Corroa de Sua magestade, por preço certo de quinhentos e quarenta mil reis, pondo elle Mestre todos os materiais, e pagando à sua propria custa todos os jornaes necessarios, tanto pelo que respeita ao seu officio de Carpinteiro, como ao de Pedreiro, ferragens vidros, pintura, e tudo o mais que precizo for athé ficarem completamente acabadas, debaixo das condições seguintes = Que as ditas Cazas q. de novo se edificarem ocuparão o ambito de trinta palmos de frente e trinta e nove de fundo, entrando o grosso das paredes, e constarão de duas Loges na frente q. he da parte do Poente, cada huma com o seu sobrado por sima, e sua escada ao meyo para serventia dos quatro moradores das loges, e escada tera tão bem seus umbrais de pedra e da parte Nascente terão duas portas e duas janelas tão bem com ombreiras de pedraria = Que quatro janelas serão de rótulas e duas de caixilhos de vidrassas, tudo madeira de flandres e as sete portas da mesma madeira; o vigamento do andar de sobrado será de vigas da terra serradas e o mais barrotado com barrotes da
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terra,e soalhados, forros, e portais de madeira da terra, assim como tão bem a escada os frontaes eregidos da mesma madeira, o madeiramento de castanho, frexaes de carvalho, ripa da terra, as paredes de pedra e cal de frontaes ceyos da mesma, os telhados mouriscados = Que elle Mestre dará a dita obra perfeitamente acabada de sorte q. se possa arrendar para o Natal proximo q. vem deste presente anno (…)”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa. Cartório 11. Cx. 136, livro 642, pag. 75v-76 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp.629-630 Documento 14 “O Supliante Joaquim Joze Pereira de Souza pertende acrecentar em seu Predio da Travessa da Vitoria que faz cunhal para a Rua Agusta, hum quarto andar de baranda garal, conforme o Prospecto juncto, e approvado pelo Arquitecto do novo Plano da Cidade, cujo acrescentamento Esta Ex.ma Camara tem proibido; a este respeito Ex.mo Snr. tenho a fazer as as reflexão e naotaçoens seguintes. Partindo debaixo de todo o respeito, esubmissão , Lembro a V. Exª que sempre respeitei, e heide respeitar as sabias determinaçoens da Antiga Camara, mas sejame licito o dizer que a respeito da nova deliberação e proibição dos quartos andares não fui ouvido, foime só mandado observar aquella Orde, o que sempre fiz; mas com bastantemente constrnagido pelos motivos que levo o sabio conhecimento de V. Exª. Primeiro aA maioria dos Predios que formão a Cidade nova estão edificados com quarto andar de baranda geral (…) na pospoção (sic) de sete para tres que não estão; e logo que V. Exª tenciona formar huma regularidade de Prospecto pareceme melhor seguir o maior numaro, e com toda a verdade o melhor gosto, e mais salutifro; e hoje se está edeficando hum quarto andar em quarteirão do extinto convento de e S. Domingos, que faz frente para a praça da Figueira (he verdade que foi approvado antes da nova determinação o cujo predio he de Domingos José de Almeida Lima, e approvado em Julho de 1836 “ mas isto Ex.mo Snr. he cauza de confuzão de ideias (…) Segundo em quanto a forteficação da construção da Cidade por que V. Exª tanto olha nem hum receio pode haver pois todos os predios da Cidade nova são construidos com bastante groçura de paredes para poderem com esta alteração (a que olho hoje como necessidade o seguilla) não obstante isso não emformo para V. Exª prospecto algum sem que va passar exame o seu estado de fortificação, e se pode o não com a Obra requirida e se lhe he propria.
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Terceiro Lembro mais s V. Exª que esta medida não seija estenciva a toda a Cidade pois ha Ruas ó Travessas que tenhão trinta palmos de largura para cima, que he a Largura da Rua dos Douradores, e a mais estreita da Cidade Nova. Quarto Para defeza de fogos hé melhor os madeiramentos Garaes como os tem os quartos andares, de frente a fundo com fileiras só o meio que vem fazer duas agoas do que serem interrompidos por trapeiras, o que dificulta muito a serventia dos homens na quella Inspecção. E por todos estes motivos afirmo a V. Exª segundo o meu entender que deve ser garal para todas as Ruas da Cidade que o admitirem o quarto andar de baranda garal. E por esta forma approvo o Prospecto do Suplicante, Mas V. Exª avista o exposto mandará achar de Justiça e Razão Lxª. 19 de Março de 1837 O Arquitecto da Cidade Malaquias Ferr.ª Leal”… AHCML, SGO, Cx. 127, doc. 4 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp. 713-714
Documento 15 “Pertende o Suplicante Jose Evaristo dos Santos Pinto que V: Exª conceda licença para alargar mais os membros, do lado d’uma Trapeira de janela de Sacada, que tem o seu predio que possue em a Rua Augusta Nº 139, alegando por exemplo o aver ja duas Trapeiras no mesmo quarteirão , e juntas á sua e que tem a mesma forma que o Suplicante quer dar a esta. Cumpre-me emformar a V. Exª, que o suplicante alega é que reconheço sêr um perfeito abuso da Ley cuja alteração de prospecto é sempre feita furtivamente e aparecendo de repente feita em dias immediatos aos dias notificados: Sendo egualmente verdade que á ja muitas deformidades destas em aquela Rua as quaeseu muito reprovo e acho indignas. E por isso me cumpre por esta ocazião levar a o conhecimento de V. Exª, o prospecto que esta Rua deveria ter ampliação geral geral, coma qual se evitarão todas estas deformidades de edificação e sssarião todos os abuzos a tal respeito. Determinando esta Ex.ma Camara de doutar para o fazer que em toda a Rua Augusta desde os Pavilhões que fazem frente á que em toda a Rua Augusta desde os Pavilhões da Prça de Dom Pedro athe ao Cunhal da Rua Nova d’ El Rey, todo e qualquer prpprietario poderá fazer a mudança das trapeiras, e Marçardas actuais em quarto andar de janelas de Sacada e Varanda de ferro fazendo o tornijamento dos Cunhais e travessa de cada um dos quarteirões. Sendo todo este augmento feito por um Prospecto determinado e aprovado por esta Ex.ma Camara.
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Sendo o resultado desta ideia o Embelezamento da cidade e augmento da décima para a Fazenda Nacional, e lucro da renda dos Proprietarios (e com suficientes juros da despesa que ouver de fazer) O emprego dos braço do desgraçado operário de Pedreiro, Carpinteiro, e mais outros officios que tanto precizão ser benificiados. Avendo mais Ex.mo Snr. uma vantagem muito útil e de defeza para os abitantes dos predios desta Rua tirada em resulatdo deste accrescentamento do quarto andar de Varanda geral em ozião de incêndio como á pouco tempo aconteceo nesta Cidade que sendo o incendio prencipiado em primeiro lance de escada do predio, ou no primeiro andar, que tomou o dito lance, aos Abitantes dos andares supriores que forão vitimas das chamas, o que não acontecerá se V. Exa. se dignar aprovar o dito augmento do Prospecto para aquella Rua. Levando egualmente em cocideração desta Ex.ma Camara que ja uma não pequena parte de Edeficação de predios está com gouzo desta tão útil providencia os quaes são os que edeficaram os Cidadães Gregorio Vaz Rãas, cujo predio faz frente para a Rua do Regedor, e Rua do Principe, de Jozé Maria Costa, e Antonio Joze da Silva, ambos com frente para a dita Rua do Principe de cujos eu tive satisfação de sêr autor, o que todos estes trez dignos Cidaãos de muito boa vontade concordarâo fazer uma Edeficação toda igual, e o último até seguio as mesmas alturas para o tornejamento da outra sua frente para a Praça Camões em cujas trez frentes da Rua se acha um terceiro andar uma varanda geral que servirá aos incendios de salvação de vidas, até de fazendas sobindo as escadas dos predios até ao quarto andar fazendo abrir n’ esta ocazião de perigo a vedada communicação aos inclinos de cada um dos predios de paredes meias (…) Lisboa , 25 de Janeiro de 1846 O Architecto da Cidade Malaquias Ferreira Leal”… AHCML, SGO, Cx. 126 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp. 714-715 Documento 16 “Do que posso emformar a V. Exª a respeito do Requerimento junto d’ Eustaquio Antonio Seixas é elle pertende embelezar as hombreiras e membros das portas da loja que oucupa na Rua Aurea nº 3o e 31 foirando tudo de cantaria ou Marmores de coures para o que juntem licença do dono do predio, cuja obra não acho embarasso algum, com a condição de conservaro perfil externo das Portas e a altura do socco geral da cantaria do proprio do Predio, e desta forma muito se embeleza aquelle Rua, e como em nada prejudica o Publico esta circunstancias de merecer de V. Exª a licença que solicita,. Mas avista do exposto de V. Excª mandará o que for servido Lisboa 14 de Maior de 1847.
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O Arquitecto da Cidade Malaquias Ferreira Leal”… AHCML, SGO, Cx. 127, doc. 15 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp. 716-717
Documento 17 “Para apropriar a Praça do Loreto, ao monumento que se tenciona elevar ao Poeta Luiz de Camoes, entendendo que o mais conveniente a adoptar é cercar uma grade assente num plintho, formando uma pequena cortina interior do lado da rua do Loreto, e uma cortina exterior do lado da Rua da Horta Seca: deste modo pode-se terraplanar a aria da Praça, desaterrando o lado da rua do Loreto até a letra A, e B. indicada na planta: o terreno desterrado marcará o declive que deve têr toda a Praça. As entradas da Praça são quatro, como indica a planta: a entrada do Largo das duas Igrejas, e a Travessa dos Gatos fica ao nivel da rua: na entrada da rua do Loreto, descer-se-há trees degraos, para dentro da Praçae na entrada da Rua da Horta Seca subir-se-há seis, ou sete degraos, para dentro da Praça. Deverá ser illuminada a Praça, como indica a planta, entre os candieiros e em sima do plintho, levará uma grade de ferro de outenta centimetros. Desejando que os candieiros tenham um desenho original desde já ofereço a Ex. ma Camara um modelo, para serem fundidos em férro, o que em tempo oportuno apresentarei. Lisboa 12 de Julho de 1860 Victor Bastos AHCML, SGO, Cx. 125, doc. 92 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp. 719 Documento 18 “Tendo acontecido frequentes vezes que os construtores de edifícios particulares não executam as obres segundo os prospectos approvados pela Ex.ma Camara e pela Intendeencia tenho a honra de pedir a V. Exªa as providencias precisas para que o decreto de 31 de Dezembro de tenha a devidade execução. Em um predio na esquina da Rua do Ouro e Rua dos Capellistas construio-se um quarto andar; approvou-se o prospecto com a condição de a varanda ser assente sobre misulas, entretanto o construtor não satisfez esta condição e conservou a antida cornija.
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N’um predio sito no campo das Cêbollas fez-se uma alteração sem prospecto approvado, e em addicionamento ao mesmo predio do lado do pateo do Marques do Lavradio se effectuou sem approvação alguma uma construção nova. Refiro-me de proposito a estas construções por que uma é na proximidade do Ministerio da Obras Publicas e a outra muito perto do edifficio onde funciona a Camara Municipal: exemplos bem frisantes. pois que facilmente se podem reconhecer. Ha predios com prospectos approvados cuja execução se acrescenta ad libitum mais um andar. Bem sei que a fiscalização da s construções particulares, cujos prospectos teem de ser sujeitos á approvação da Ex.ma Camara, não está dependente de V. Exª; com tudo parecia-me conveniente que se instasse como Commissario de Policia para intentar contra os donos das construções feitas em contravenção ao Decreto de 31 de Dezenbro de 1864, a acção judicial a que se refere o artigo 57 do mesmo Decreto. Sobre outro assunto tenho igualmente a honra de pedir a consideraçãde que pedir de V. Exª; Os quarteirões da cidade baixa teem os alçados regulares até á cornija que corôa os terceiros andares. Authoriza-se a construção de quartos andares e cada proprietario construe com um pé direito differente, cornijas e platibandas diversas. A uniformidade adoptada até aos terceiros andares deixa de existir nos quartos andares. Não seria conveniente que a Ex.ma Camara adoptasse um tipo para esses novos andares? Esta medida parece-me indispensavel, por que os alçados dos differentes predios de um mesmo quarteirão da cidade baixa formam uma única fachada de cunhal a cunhal. Deus Guarde a V. exª Lisboa 23 de Setembro de 1868 Ill.mo Ex.mo sr. Presidente da Camara Municipal de Lisboa O Intend. / Luís Victor leCocq”… AHCML, SGO, Cx. 126 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp. 728-729 Documento 19 “Em nome de Deos amen: Saibam quantos este instrumento de aforamento emfatiota de hoje para sempre, e obrigação virem, q. no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil settecentos settenta e nove, aos vinte e tres dias do mez de Setembro, nesta Cid.e de Lisboa na Rua direita do Poço novo, e cazas de morada do D.or Thomas Jose Ferreira da Veiga, cavaleiro profeço da Ordem de Christo, Advogado da Caza da Fid.ma Raynha Nossa Senhora, e Procurador da Fazenda do Real Colegio dos Nobres, estando elle ahy prezente de huma parte, em nome, e
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como Procurador bastante do Prezidente e Deputados da Junta da Administração da Fazenda do Real Colegio dos Nobres, por virtude da Comissão postaq no despacho q. ao diante será traladado, e de outra parte o Cappitão Manoel Caetano de Souza, Arquitecto do Tribunal da Meza da Consciência e Ordens, morador na rua nova dos Jasmins, freg.a de Nossa Senhora das Merces. Logo por elle D.or Thomas Jose Ferreira da Veiga foi d.o a mim Tabellião perante as testemunhas ao diante nomeadas q. o dito Real Colegio dos Nobres seu constituinte he senhor e possuidor de humas terras, no Cittio chamado da Cotovia de Cima pertencentes à Testamentaria do Grande Almirante de Castella Dom João Thomas Henrique de Cabrera, de cujos beñs he Administrador o dito Real Colegio dos Nobres, as quais terras foram do Ex.mo Marquez de Penalva, a quem se compraram por escritura outorgada nas notas do tabeliam q. foi nesta Cidade Joze Antonio de Barbuda Lobo em vinte e hum de Junho de mil settecentos quarenta e nove, nas quaes terras se tem edificado e andão edificando varias propriedades de Cazas, na forma do prospecto, e alinhamento, q. Sua Mag.e foi servida de mandar fazer para aquelle Cittio. E porquanto elle d.o Cappitam Manoel Caetano de Souza, queria edificar cazas na d.a rua nova dos jasmins, com frente para o Largo da Patrirchal incendiada, requerera ao d.o Real Colegio dos Nobres lhe quizerem aforar o d.o Terreno; e vendo a d.a Junta o Seu requerimento, depois de mandar informar o mestre das obras Joaquim Joze dos Reys e o Sargento mór Joze Monteiro de Carval ho, e à vista de Suas informações, e resposta por delle d.o D.or Procurador da Fazenda, se lhe deferio como consta do despacho posto no d.o requerimento, q. tudo abaixo sera trasladado; Portanto dice elle D.or Thomas Jose Ferreira da Veiga, q. por este Instrumento, e na melhor forma de direito, em nome d.o Real Collegio afora e dá de aforamento emfatiota de hoje p.a sempre a elle d.o Capitam (…) hum pedaço de terra, q. fica fazendo frente p.a rua nova dos Jasmins com cento e quatro palmos e virando para o lado da frente a buscar o fundo pelo lado Nascente pella rua q. vai sahir ao Abarracamento de Peniche com cento e trinta e hum palmos e meios, e virando a sahir à frente principal do lado do Sul, ficando huma travessa de vinte palmos de largo entre a propriedade de Francisco Jose Aguiar, com cento e vinte palmos, q. reduzidos a palmos superficiaes fazem cento e cinquenta pamos, e setenta e cinco centessimos; q. a cem reis o palmo com cem de fundo importa onze mil sttecentos e cincoenta reis: E o Segundo fundo p.a Quintal, q. fica fazendo a frente para o lado Nascente q. estroce aos quateis do Regimento de Peniche, tem trinta e quatro palmos, e trinta e quatro centessimos, q. a cincoenta reis o palmo importa mil e setecentos e tres reis, vindo a ser o foro no total q. o dito Foreiro deve pagar a quantia de treze mil e quatro centos e cincoenta e tres reis, os quaes (…) fica obrigado (…9 a pagar por dia de Natal de cada hum anno
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de foro do d.o cham, e pago na Caza da Administração da Fazenda do mesmo Collegio (…). Que elle Foreiro será obrigado a fazer Cazas no d.o terreno na forma do prospecto daquelle Cittio e as principairá dentro de seis mezes e as terá acabadas no decurso de quatro annos (…). Que todos os Emfiteutas q. neste Prazo succederem seram obrigados a terem e conservarem no prospecto das mesma Cazas hum Padrão de pedra , em q. estejam gravadas as Letras Seguintes= C.R.N.= E extinguindose o d.o Padram logo o Foreiro q. o possuhir mandará pôr outro à sua custa, e isto tantas vezes quantas vezes os ates cazos succederem, para melhor conhecimento deste Prazo (…)”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 4, Cx. 10, Livro 50, p.86v-87v appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp. 597-598 Documento 20 “A câmara Municipal de Lisboa authorizada pelo Regimento de Meza de Vereação desta Cidade, firmado pelo punho Real em 30 de Junho de 1591, que lhe cometeu a Inspecção de todas as obras respecticvas à edificação e reedificação da Cidade, comprehendendo-se nas atribuições deste encargo o jus de mandar proceder aos reparos necessarios , e de fazer demolir todas as construcç~ões que ameacem de perigo os moradores e viajantes, ou por qualquer outro modo prejudicassem as commodidaades do Publico: considerando, que
exercitou esse Direito
proveniente da natureza do Municipio no longo espaço de mais de seculo e meio, que tanto é o tempo que decorre desde a citada éphoca de 1591 até á do terramoto de 1755, em que as atribuições inherentes á Inspecção foram desannexadas da mesma Camara por Decreto de 12 de Junho de 1758, e transferidas para a outra Auctoridade: e reflectindo finalmente, que tenda Auctoridade sido novissimamente abolida por Sua Magestade; havenda a Camara consultado por este motivo em 20 de Junho de 1835, sobre a legalidade da reintegração no exercicio daquelle Direito; e tendo-se Sua Magestade dignado ordenar por Portaria de 28 de Julho do mesmo anno, que ella ficava provisoriamente auctorisada par inspeccionar as obras particulares que construisem na Cidade, a fim de prevenir pelos agentes e meios legaes que usurpem terrenos publicos, ou se fale aos alinhamentos e demais disposições legitimas, tem determinado o seguinte: Artigo 1º Os proprietarios de terrenos por edifcar, e bem assim os donos daquelles predios que carecem de ser reedificados, deverão dentro de um anno, contado da data deste, dar o principio á dita edificação ou reedificação, quanto á parte que diz respeito ao prospecto da Cidade, sob a pena de serem os terrenos ou os predios vendidos em Hasta Publica a quem se obrigue a assim o
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executar. Exceptuam-se os predios que ameaçarem ruina, os quaes serão immediatamente demolidos. Art 2º Ninguém poderá d’ora em diante dar cômeço á edificação ou reedificação, sem primeiro apresentar risco á Camara Municipal, e obter desta a necessaria approvação, e aquelle que o contrario fizer pagará a mulcta de 8$000 reis a beneficio do cofre da Cidade. Art 3º As obras que já se tiverem começado a construir, não poderão continuar, sem que o risco tenha sido approvado pela Camara (para o que se concedem quinze dias contados da affixação deste) e isto debaixo da mesma pena do artigo antecedente: e se alem disto a construcção começada for contraria ao prospecto da Cidade, será demolida á custa do seu dono. Art 4º As barracas, e outras semelhantes construcçãoes informes que existirem nos logares onde as Leis de Inspecção as prohibem serão tambem immediatamente demolidas á custa dos mesmos donos (…)”… Diário do Governo, nº 55, 4 de Março de 1836, pag. 303 appud SILVA, Raquel Henriques da; 1997; vol.1; pp. 686-687 Documento 21 “Saibam quantos esta Escriptura de contracto de locação d’ obra, quitação de parte do preço, fiança,e obrigação acima; que no anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo, de mil oito centos cincoenta e oito, aos cinco dias do mez de d’ Outubro, n’ esta cidade de Lisboa, e meu escriptorio na Rua de S. Paulo Nº 33, apareceraõ presentes; a saber: d’ uma parte Francisco Nicolao Gonçalves, Alfaiate morador na Rua da Palmeira, Nº 46; Freguesia das Mercês, na qualidade de Procurador Geral de Mesa da veneravel Ordem Terceira da comitencia de S. Francisco, esta junto ao extinto convento de Nossa Senhora de Jesus, como fez pela Procuração da mesma Meza que em sua apresentou por mim reduzida a publica forma e da qual para contar (…) num cartorio para ser inserta nos tralados que d’ esta esciptura se derem; e d outra parte o estaraõ Francisco José Gil, e Antonio Affonso mestres carpinteiros de casas, moradores na Rua da Cruz Nº 59 freguesia dita das Mercês e o seu fiador Joaquim José Teixeira, Mestre Fundidor da casa da moeda morador no respectivo edificio, Freguesia de S. Paulo, todos maiores, e que dam fé serem os próprios. E logo por elle Francoisco Nicoláo Gonçalves, foi dito em minha presença e das testemunhas ao diante nomeadas: Que acham-se adjudicados á Meza sua reprezentada, os rendimentos de duas propriedades de casas , sitas de os Prazeres numeros doze a quatorze; e quinze a dezoito, Freguezia de Santa Isabel n’esta cidade para o pagamento d’ avultada quantia de
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que se aremete (…) Orden Terceira devedora aos herdeiros de João Evangelista da Silveira, e estando as ditas propriedades de casas em estado de ruina, requerera a mesma Meza ao Juizo competente para authorizar a effectuar a obra precisa para as suas reedificações, visto naõ ter havido em praça quem a arrematasse; o que tendo-lhe sido defferido practicada a necessaria vistoria para se conhecer da mesma obra, e apreciacaõ (?) da sua importancia, e tendo-se aquella levado a effeito como conta da certidaõ (…) dos autos d’ execuçaõ de sentença em que é amelhorada a dita Ordem Terfeira, réos os referidos herdeiros, a requerimento da mencionada Mêza sua representada, por Joaquim da Silva Cordeiro escrivaõ d’um dos officios do Juizo de Direiro da quarta vara d’ esta Camara Judicial, em vinte e trez d’ agosto do corrente anno por elle inscipta, e assignada, e concertada com os escrivaõ competente (?) Aniceto Maria Pais Gago, que n’este acto apresentou, e a que se reffere, se contractara com os segundos outorgantes Francisco José Gil e Antonio Affonso, em estes tomarem d’ empreitada a referida obra na forma da dita vistoria, e pelo preço d’ elles constante, alem das masi clausulas e condições entre elles pactuadas e que é como se segue Propriedade numeros doze a quatorze: Na loja numero doze seraõ trez casas abarrotadas, e assoalhadas com barrotes, a madeira da terra, tres portas novas com madeira da terra ao meio, e as paredes concertada, e caiadas e os tectos, e portas pintadas completamente e os mais pequenos reparos que precisar incluindo a janela= esta loja numero quatorze, por que esta precise mais trez portas, e concertarem a porta da rua, assim fazerem um caixilho na janela da frente= Porta d’ escada numero treze, concertaraõ tanto a porta, como a escada toda e tudo de madeira de terra = Primeiro andar: o quarto do lado direito- a salla, cosinha, e corredor será tudo assoalhado de novo, com solho ao meio de madeira da terra, tres portas de madeira dita novas, as outras concertadas, e caiadas, o caixilho da sacada, portas e grade, novas, e as paredes concertadas, e caiadas. No quarto esquerdo faraõ o mesmo trabalho e concertos, alem de para a sacada da frente, que será nova = Segundo andar: tres vaõs de caixilhos de sacada novos de madeira de casquinha; os sôlhos concertados no que precisarem, e o da cosinha todo de novo, e de madeira da terra grossura dos anteriores, labor ao meio = Agoa furtada: quatro vaõs de caixilhos de peito e guarnições tudo de novo, e de madeira de casquinha; os telhados todos novos, e mouriscados levando o guarda pó, as ripas em todo o que precisar. Quanto a pinturas no referido predio seraõ a oleo na frente, e das portas interiores, e alizares, com duas de maõs e os tectos tambem pintados a oleo com duas de maõs do costume; devendo as paredes serem todas reparadas onde precisarem, a escada depois todas de novo, e em geral, devendo tambem porem todas as ferragens, e chaves precisas, e com declaraçaõ de todos os caixilhos e portas das janellas deveraõ ser todos
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arranjados com madeira da casquinha; e que deveraõ ser novas as grades das suas janellas de sacada do primeiro andar, e iguais as dos segundo. = Propriedade numeros quinze e dezoito = Loja numero dezeceis: concertarem os solhos, e assoalharem de novo a cosinha, e corredor, com madeira da terra, e o tecto da cosinha, corredor tambem forrado de novo; as paredes rebocadas, e caidadas, sendo primeiro guarnecidas de cal branca, eos muros do pateo reparados = Loja numero dezoito: os mesmos concertos que o seu antecedente = Porta d’ escada numero desacete, com dois andares para quatro inquilinos, e actualmente inhabitaveis pelas suas ruinas: pecticaraõ os empreiteiros nos referidos dois andares, ou quatro quartos, e seus sótaõs de novo os respectivos solhos, forros, portas, caixilhos com grades, e janellas algumas vigas nas partes que precisarem, abarrotados tambem novos, concertando o madeiramento: o guarda pó todo novo e a ripa que precisar toda nova, e o telhados mouriscados e as ferragens proprias e do costume todas novas, as paredes concertadas e guarnecidas, e caidaas todas em geral, e as pinturas como as iniciadas já para o outro predio numero doze a quatorze, e toda a escada, será aquella nova de madeira de casquinha, eos degraos tambem feitos novos de madeira da terra, devendo as portas levar uma ombreira de pedra nova em lugar da que existe comida; e que todas as grades d’ este predio, e que vem a ser quatro, irmaõs do predio antecedente, seraõ novas; e que todas as madeiras das portas d’ ambos os predios mandaraõ pôr vidros precisos. E finalmente faraõ os empreiteiros em cada uma das propriedades um canno parcial, a meter no canno geral da Rua, comesando o parcial na frente do fundo, feito todo de lagedo ordinario coberto de cascõrs de palmo e meio de largo, palmo e meio d’ alto, e piais de pedra em cada uma das lojas, e quartos dos andares, tendo todos condutores de manilhas de barro do costume, ou de cosinha, e vidradas que todas vaõ desagoar no canno parcial devendo fazerem nas lojas numeros quatorze e dezoito que saõ as que ficaõ à direita dos cannos nas partes supperiores, um canno de despejo, de cantaria que communique com os cannos das lojas numeros doze e dezaceis. Que depois de concluida a referida obra nas ditas duas propriedades de casas, será examinada por peritos competentes nomeados pelo respectivo Juizo, na forma da reposta dada nos alludidos autos d’ execuçaõ pelo competente Curador. Que por toda a dita obra assim feita e aprovada pelos referidos Peritos, pagará a Meza sua representada nos ditos empreiteiros, a quantia d’ um conto cento quarenta e quatro mil e quatro centos reis, em metal sonante, paga da seguinte forma a saber: oitenta mil reis, se este acto, e igual quantia de oitenta mil reis em cada um anno a começar no proximop Janeiro de mil oito centos cinquenta e nove pagendo o mez de Julho, e assim sucessivamente nos annos seguintes, e pagando, referido mez, e além disso mais haveraõ os
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empreiteiros todos os rendimentos das mesmas propriedades logo que estejaõ no caso de serem allugadas, seguidosforem de decimas, fóros, premeos de seguros, limpeza de chaminés, e quaesquer outros encargos ou tributos fiscaes, ou municipais digo tributos presentes, ou facturas que as (…) e tudo por tanto tempo quanto baste para integral pagamento dos smesmos empreiteiros, em rellaçaõ ao dito preço da alludida obra; sendo porem a administraçaõ das referidas propriedades por conta, e a cargo da dita Meza constituinte, de quem os mesmos empreiteiros receberaõ não só os mecionados rendimentos liquidos semestralmente, mas tambem as ditas prestações annuaes. E logo (…) na minha presença, e as ditas testemunhas, elle Francisco Nicoláo Gonçalves em dito nome que representa, pagou e entregou a elles empreiteiros Francisco José Gil, e Antonio Affonso, a referida quantia de oitenta mil reis por conta do preço total de toda a dita obra, que estes receberaõ contaraõ em miedas metalicas, sonantes, e correntes n’ este Reyno dizendo estar certa do que eu tabelliaõ dou minha fé, bem como dou de mais dizerem elles mesmos empreiteiros, que da dita quantia ora recebida por conta do dito preço total da referida obra daõ (…) e geral de quitaçaõ à dita Meza da veneravel Ordem Terceira da Penitencia de S. Francisco para mais lh’ a naõ repetirem, obrigando-se a dareme levarem-lhe em conta no mencionado preço, cujo resto se reservaraõ no direito de receber quando, e como fora estipulado. Em isto porem disseraõ mais elles ditos, Procurador da Meza da referida Ordem Terceira, empreiteiros, que assim havião por bem feito este digo que em ditos nomes que representaõ, assim haviaõ por bem feito este seu contracto de Locaçaõ de obras, que cada um pela parte que lhe toca por esta escriptura e pela milhor forma de direito, aceita, e obriga de cumprir pelos respectivos bens prescitos fucturos. E por elle Joaquim José Teixeira, foi dito, que muito de sua livre vontade se oferece, e pois por fiador, e principal pagador dos ditos empreiteiros Francisco José Gil, e Antonio Affonso, no cumprimento do presente contracto para tudo por elles cumprir, e pagar, como divida e obrigaçaõ em propria que (…) sobre si, a cujo Juiz se sugeita às luzes dos fiadores, e principais pagadores de tudo por seus bens, (…), e facturas. Outogaõ finalmente todas estas partes, cada uma pelo que (…), e em os ditos nomes que representaõ que responderaõ por todo o que contheudo n’ esta cidade de Lisboa perante as Justiças q que esta escriptura for apresentada, e em cumprimento reqerido, e cujo prinunciaraõ seus privilegios, domicilios, e tudo mais de direito dem se enunciar, e em seru fâvor allegar possaõ. Em testemunho de verdade, assim outorgaraõ pediraõ, e aceitaraõ, que eu tabelliaõ tabem acceito por parte de quem tocar auzente; e sendo-lhes por mim lida, acháram conforme; a que foraõ testemunhas presentes meu Irmaõ Jorge Felippe Cosmelli, e Julio Cezar Ferreira meus (…) que n’ esta minha nota fizeraõ com
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elles Partes, a quem tambem conhecem. Eu tabelliaõ Pedro Ricardo Cosmelli, a escrevi. d’esta, dois mil reis.”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 1, Cx. 143, Livro 631 Documento 22 “Saibam quantos esta escriptura de contracto de locaçaõ de obra, fiança e obrigaçaõ virem: Que no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo, de mil oito centos sesenta e um, aos cinco dias do mez d’ agosto, n’esta cidade de Lisboa, e meu escriptorio na Rua de S. Paulo nº 123, compareceram d’ uma parte Valeriano José Soares, Segundpo tenente d’ armada, morador na Rua direita do Livramento Nª 24, Freguesia de S. Pedro de Alcantara,e de outra parte Manoel Rodrigues, Mestre d’ obras do officio de Pedreiro, morador na Rua de S. Joaõ da Matta Nº 86 Freguesia de Santos-o- Velho, e seus fiador Justino Antonio Xavier, Proprietario, morador na Rua de Joaõ Braz Nº 37, Freguesia de Santa Catherina, todos elles Partes maiores em cada, e casados. E logo por elles Valeriano José Soares, e Manoel Rodrigues, foi dito em minhapresença, e das testemunhas a diante nomeadas: Que se acharam contractados em elle primeiro outorgante das d’ empreitada ao segundo e a edificaçaõ, e reedificaçaõ dos seus predios sitos na Rua da Rosa das Partilhas numeros cincoenta e sete e sessenta e um mdernos, a Rua do Carvalho numeros cento quarenta e oito, e cento e cincoenta tambem modernos, tudo na Freguesia de Nossa Senhora das Mercês, em conformidade das plantas assignadas por ambos se este acto, e por mim reconhecidos seus signais ficam em poder do referido mestre, sendo pelo que respeita ao predio da Rua da Rosa debaixo das seguintes condições: que elle mestre procederá á sua edificaçaõ em gôsto gothico, de lojas, primeiro, segundo andar, e sótaõ como mostra a respectiva planta, tendo cada andar tres janelas rasgadas de frente. Que cada um dos referidos andares terá salla, saleta, trez quartos de cama, casa de jantar com uma janella de peitos para o lado do saguaõ, cosinha tambem com uma janella, porem de sacada para o mesmo saguaõ, escada com claraboia e serventia para o sotaõ pela mesma escada, Que os materiais a empregar na dita construçaõ serão proprios, e de boa qualidade. Que o vigamento será todo de casquinha serrado a seis, assim como páos de madres, fileiras, e cadeias d’ escada, sendo somente serrado a oito o vigamento do ultimo andar, assim como freyáes, e contra freyáes. Que os intervalos d’ uma viga a outra seraõ regulares, e levaraõ uma ordem de tarugos nos centros das sallas, por serem os maiores vaõs d’ um frexal a outro. Que todos os prumos de frontais, tabiques, escóras, travessenhos, vergas, harpas, taboas de barbados, ditas de ponto, cuitas do madeiramento, guarda-pó, ripa, e solho do sotaõp, tudo será
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feito de madeira da terra. Que os solhos do primeiro e segundo andares assim como as portas de janellas, e interiores, caixilhos, guarnecimentos, roda-pés, regoas d’ encosto, e bases, será tudo de madeira de filandia ou de casquinha. Que as paredes que se fizerem de novo teraõ as grossuras necesarias para a solidez do predio. Que os telhados seraõ mouriscados, e as agoas encannadas para pias de despejo Que a portada principal do predio terá po digo terá boa pedra de cantaria aparelhada d’ escôda, e terá socos (…) no primeiro e segundo pavimento, e só terá socos leves nos portais do armazem e portas d’ escada que todo o armazem será lageado, e terá dois socos de cantaria para formar em cima d’ elles os frontais para a divisaõ dos andares: a entrada da escada terá um arco de cantaria com molduras nas impostas sendo lageada até ao arco. Que todas as portas serão engradadas, e teraõ bem como os caixilhos interiores, e exteriores, suas farpadeiras, ferros e moletas. Que todas as janells rasgadas, bem como a bandeira da porta da escada, teraõ grades de ferro entaladas. Qie o primeiro, e segundo andar, incluindo os tectos, serão estucados, e pintados completamente á vontade do proprietario: as sallas teraõ pinturas d’ ornato do melhor gôsto, porem as salletas, e quartos de cama posto que a pintura será tambem d’ ornato, com tudo será inferior ao das sallas: as casas de jantar seraõ pintadas a paisagem: a cosinha , corredôres de communicações, e escada, seraõ pintados de fingido de pedra. Que as frentes do predio, e armazem seraõ guarnecidas de cal branca, e teraõ suas pilastras fingindo pedra igual ás ombreiras, e mais cantarias que guarnecem as outras frentes. Que todas as portas, janellas interiores seraõ pintadas d’ azul, ou outra qualquer côr na vontade do proprietario: os alizares seraõ tambem pintados a branco, á excepçaõ dos das cozinhas, e corredôres, que seraõ pintados de cor de laraja, ou outra qualquer que o proprietario escolher. Em quanto ao predio da Rua do Carvalho, que se compõe de loja, primeiro, e segundo andar, e subterraneo, tendo duas janellas de frente cada andar, e é dividido do outro predio de que trata este contractopelo saguaõ que será feito para serviço d’ ambos os predios, e para onde terá tambem duas janellas de peitos, sendo uma cosinhae outra casa de jantar, procederá o Mestre empreiteiro á sua reeedificaçaõ em conformidade da mencioada respectiva planta, e debaixo das seguintes condições: Que cada andar terá salla, salleta, um quarto de cma, casa de jantar,e cosinha, e a loja terá só quatro casas, em consequencia da arcada que serve a csa d’ entrada. Que o subterraneoserá lageado, e terá uma janella, e uma porta para o saguaõ, e uma escada d communicaçaõ para a loja. Que em todas as commmunicações estipuladas para a edificaçaõ do outro predio, seraõ applicaveis para este na parte respectiva, á excepçaõ do que estiver em bom estado de conservaçaõ, q que o empreiteiro poderá aproveitar para esta reedificaçaõ. Que toda a referida obra nos dois predios deverá estar
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cabalmente concluida com toda a perfeiçaõ da arte, e as respectivas chaves entregues ao proprietario, impreterivelmente athe ao fim do mez de maio do anno proximo futuro de mil oito centos sessenta e dois sob a pena d’ o empreiteiro lhe pagar os prejuizoz que lhes resultarem da falha. Que por toda a mencionada obra bem acabada (…) o dito fica ppagara digo fica, e respectivos materiais, pagará o empreiteiro em quatro contos e quatro centos mil reis em metal sonante, e em quatro prestações e que por todo o mez d’ outubro do corrente anno, a segunda por todo o mez de Janeiro do dito anno proximoi e futuro de mil oito cento e sessenta e dois, a terceira por todo o mez de Março do mesmo anno; e a quarta e ultima depois d’ entregues as chaves ao proprietario, e verificado por todo este cumprimento do contracto. Em esta forma disserem mais ambos elles Partes que assim haviam por bem feito o contracto de locaçaõ d’ obra, que cada um pelo que lhe toca, por esta escriptura, e pela melhor forma de direito aceita, e se obriga de cumprir na forma estipulada por sua pessoa e bens presentes e futuros: cuja fiança aceitou o primmeiro outorgante, Disserem finalmente todos elles Partes, que se obrigam a responder por todo aqui contheudo, no foro d’este contracto, renunciando para isso os seus domicilios, e todos os mais privelegios em contrrio. Que testemunhos de verdade, assim outorgaram, pediram, e aceitram, que eu Tabelliaõ tambem aceito por parte de quem tocar ausente, e sendo elles por mim lida, acharam conforme; a que foram testemunhas presentes Rufino José d’ Oliveira, Mestre Barbeiro, morador na Rua do Poço dos Negros Nº 96, Freguesia de Santa Catharina e meu irmaõ Jorge Felippe Cosmelli, no meu (…) que se’ esta minnha nota assignam com elles partes a quem todos conhecemos Em o tabelliaõ Pedro Ricardo Cosmelli, a escrevi d’esta incluida a fiança que envolve dois mil quinhentos e sessenta reis.”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 1, Cx. 144, Livro 667; fl 73v-75v Documento 23 “Saibam quantos esta escriptura de contracto de locaçaõ d’ obra, e obrigaçaõ virem: Que no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo, de mil oito centos e sessenta e dois, aos dezaceis dias do mez de Maio, n’ esta cidade de Lisboa, e no meu escriptorio na Rua de S. Paulo Nº 123 apareceram d’ uma parte Eugenio Magaldi, viuvo, Proprietario morador no Largo de S. Roque Nº 12, Freguesia de Nossa Senhora da Encarnaçaõ; e de outra Joaquim digo Encarnaçaõ, na qualidade de procurador dos Irmaõs Joaõ Maria Bragaro, Domingos Chiappori, Miguel Jordani, Provedor Thesoureiro, e escrivaõ da Irmandade do Santissimo Sacramento da Igreja do Loreto de Maçaõ (…), cuja reprentaçaõ fez certa pelos poderes do alvará de procuraçaõ que seu apresentou e que
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fica em meu cartorio para ser copeado nos traslados d’ esta escriptura se derem; e de outra parare entrara Joaquim Felix da Costa, Mestre d’ obras do officio de carpinteiro, morador na Praça d’ Alegria Nº 58 freguesia de S. José, ambos elles partes maiores em idade, e conhecidos de mim tabelliaõ, do que por ambos elles partes nos nomes que representam, foi dito em minha presença e das testemunhs adiante nomeadas:Que se achaõ contractados em elle segundo outorgante tomar d’ empreitada a construçaõ de um predio sito na travessa do Secretario de Guerra onde oje está um barracaõ que confina com o predio da Irmandade representada pelos constituintes do primeiro outorgante, que faz frente para o largo fas dua Egrejas, e Cujo predio a construir é um terreno da mesma Irmandade e será feito em continuaçaõ pelo lado da dita travesssa, seguindo as mesmas alturas das lojas até á semalha, como está marcado no alçado approvado, e com as seguintes condições, 1ª A loja ficará toda livre em toda as sua extensão de largura e fundo, levando os arcos de cantaria como marca a planta terrea para instaurar as devizorias dos andare, sendo toda esta loja lageada e igualmente o saguaõ com pias de despejos, e chaminés na parte que melhor convier, levando tambem uma porta para o saguaõ, e janellas na prumada de cima as que se poderem meter, e este armazem será o tecto fasqueado para depois ser metido d’ estuque, sendo as paredes rebocadas, e guarnecidas de branco, prompto para se poder arredar. 2ª O primeiro, segundo e terceiro andares devem levar as divisorias conforme está marcado na planta, levando uma escada de serventia em continuaçaõ da que está feita para serventia dos telhados, e vaõ do madeiramento, no qual vaõ se devem fazer trez quartos para môços, e uma trapeira para serventia do telhado de lado d’ um dos sagões d’ onde melhor convier, e sendo só estes quartos assoalhados, eo vaõ da trapeira e o resto do madeiramento tapado em roda. 3ª As cantarias da frente seraõ d’ igual qualidade, e dimensões às do dito predio contiguo, e as das frentes dos sagões seraõ de lancil ordinario como é costume. 4ª O madeiramento do telhado será feito de madres, e fileiras de casquinha, e varas de castenho, e guarda pó e ripa de madeira da terra da (…) de boa qualidade. 5ª Os vigamentos d’ estes andares sseraõ feitos de vigas de casquinha, com as grossuras proprias do costume, e prumus gerais, e alizares e freyáes seraõ feitos d’ igual madeira, eos interiores dos frontais, escóras, e tabiques, seraõ feitos como é costume. 6ª As portas interiores, janellas, caixilhos de frentes, guarnecimentos, fasqueados dos tectos, sôlhos, será tudo feito de madeira de casquinha com as grossuras proprias do costume. 7ª Todos estes andares seraõ estucados e pintados conforme a applicaçaõ das casas, e igualmente portas e janellas a oleo, e com todas as ferragens e vidros pertencentes — carvoeiras nas cosinhas, tapumes nas sacadas das pias, e tudo prompto para apoder alugar. E por toda esta obra que acima fica dita, e debaixo d’ estas condições,
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pagaraõ os constituintes do primeiro outorgante digo condições, pagaraõ os constituintes do primeiro outurgante como representantes da dita Irmandade, ai segundo outorgante empreiteiro, a quantia de sete contos de reis em metal sonante /prata/ ou ouro/ sendo esta quantia divididaem trez pagamentos, o primeiro dois meses depois da obra começada, de dois contos e quinhentos mil reis, o segundo depois da obra coberta e assoalhada d’ igual quantia, o terceiro no fim da obra, ao entregar as chaves, de dois contos de reis, ficando o referido empreiteiro obrigado a fazer a refeida obra debaixo das mencionadas condições, e com a maio r regularidade possivel a fim que esteja completamentente acabada no dia trinta e um de Maio do anno p+roximo futuro de mil oito centos sessenta e trez. Fica sendo clausula (…) d’ este contracto a que a sobredita Irmandade ou seus representantes por circunstancias imprevistas seaõ se acharem habilitados a satisfazer o ultimo pagamento na épocha e esperar seu embolio um anno mais alem do vencimento estipulado, sem (…) digo sem direito a juros. Em’ esta forma disseram que assim haviam por bem feito este contracto que cada um pela parte que lhe toca por esta escriptura, e pela melhor forma fr direito aceita e se obriga como fica estipulado pelos respectivos pelos respectivos bens presentes e futuros. Em testemunho de verdade assim o outorgaram conforme; aqui foram testemunhas presentes meu Irmão Jorge Felippe Cosmeli e Julio Cezar, meis amanuenses, que esta nota assignam com elles Partes, a quem tambem conhecem. Eu tabelliaõ Pedro Ricardo Cosmelli, a escrevi. D’esta mil seis centos reis.”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 1, Cx. 144, Livro 669; fl 90-91 Documento 24 “Saibam quantos esta escripura de Locaçaõ d’ obra quitaçaõ de parte do preço. fiança e obrigaçaõ virem: Que no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo, de mil oito centos e sessenta e trez, aos trez dias do mez de Novembro, n’esta cidade de Lisboa, e meu escriptorio na Rua de S. Paulo Nº 123, compareceram; De Huma parte Antonio Joaquim de Feigueiredo Quatros, veuvo, proprietario morador na Rua do Cabo Nº 60, Freguesia de Santa Isabel; E de outra Manoel Rodrigues, Mestre d’ obras do offficio de Pedreiro, casado, morador na Rua S. Joaõ da Matta Freguesia de Santos o Velho; e seu fiador Manoel Soares de Castro proprietario e com estancia de cal e areia, casado, morador no Beco d’ Amoreira Nº 26, Freguesia de S. Paulo, todos maiores de edade, e conhecidos de mim tabelliaõ, do que dou de boa f+e. E logo por elles Antonio Joaquim de Feigueiredo Quatros, e Manoel Rodrigues foi dito em minha presença, e nas testemunhas adiante nomeadas: Que acham contractados em o segundo outorgante verificar de empreitada para
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o primeiro outorgante a reedificaçaõ do seu predio sito n’esta cidade na rua direita da Freguesia de Santa Isabel, nimeros trintae dois e trinta e oito modernos pelo preço e debaixo das condições diga preço e condiç~es seguintes. 1ª Que a reedificaçaõ das lojas e primeiro andar será praticada conforme a planta que se fez quando o primeiro outorgante propprietario tencionava naõ construir o predio alem do primeiro andar, e que existe assignada por ambos elles outorgantes, porem que augmentam cada pavimento sere casas, e de frente cada andar cinco janellas, comrehendendo as trez do centro do primeiro andar, huna sacada de bacia, e as duas reentrantes seraõ de grade entalada assim como todas as do segundo andar. 2ª Que as ombreiras de todas as ditas janellas, assim como o fôrro das lojas, socos das pilastras, e pilastras, será tudo de cantaria abancada e escodada, e batibanda fingindo pedra, sendo a medida a area do seis sôcco. 3ª Que as agoas de parte da frente seraõ encanadas para a rua, e as da parte do saguaõ seraõ encanadas para as pias, ficando a frente da parte de traz com está. 4ª Que os solhos do primeiro e segundo andar, guarniçaõ, interiores, feyais, vigamentos e pernas d’ escada, será tudo de madeira de casquinha, porem o sôlho das lojas, barrotado,e toscos em madeira da terra. 5ª Que as portas interiores e exteriores, e janelas seraõ de madeira de casquinha engradadas. 6ª Que a escada levará huma grade de ferro até ao sótaõ, sendo este livre e assoalhado de madeira da terra de cuja madeira tambem será o guarda-pó. 7ª Que o madeiramento será d’ castanho, e terá duas trapeiras de zinco. 8ª Que os tectos seraõ fasqueados, e as casas metidas de estuque e pintadas. 9ª Que as sallas seraõ pintadas de bom gosto, as salletas mais inferiores; as alcovas ao gosto moderno; e as cosinhas, corredores, e escada fingindo pedra. 10ª Que as portas e alisares das sallas, e salletas seraõ pintadas a branco, e envernizadas, e as portas e corredodres dos respectivos alisares, seraõ pintadas de cor de laranja, ou de outra qualquer côr que o proprietario mais gostar. 11ª Que as ferragens da s portas das sallas e salletas seraõ fixas, e teraõ muletas de vidro; e as de todas as mais portas e janellas, seraõ tambem fixas, porem teraõ muçletas de ferro. 12ª Que as chaminés serõ de cantaria forradas d’ azulejo por dentro. 13ª Que toda a referida obra complete tanto materiais com jornais, e acabada até ao fim do mez de Junho do anno proximo e futuro de mil oito centos sessenta e quatro, pagará o proprietario ao empreiteiro a quantia de tez contos duzentos mil reis em metal sonante, além de lhe facultar o pder de empregar na dita obra todas as madeira, e cantarias dos desmancho, que estiverem no caso de serem aproveitadas. 14ª Que o referido preço será pago em trez prestações eguais de hum conto e cem mil reis cada huma, sendo a primeira n’esteacto, a segunda quando a obra estiver no meio, e a terceira quando a mesma obra estiver completamente acabada com todas as regras da arte, e entregues as respectivas chaves ao
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proprietario. 15ª Que sendo n’ este acto apresentada e entregue pelo proprietario ao empreiteiro, a quantia de hum conto e cem mil reis da primeira prestaçaõ pactoada, elle a recebeu, contou em moedas sonantes e correntes, disse estar a certa em (…) do que tudo eu tabelliaõ edou a minha fé; bem como dou de mais dizer o mesmo empreiteiro que a dita quantia recebida n’este acto d’ plena e geral quitaçaõ ao refeido proprietario, por conta do total preço d’ este contracto para complemento do que se reserva no direito de receber as duas restantes prestações pela forma que fica estipulada. Em ‘ esta formza disseram mais ambos elles mesmos proprietario e empreiteiro, que assim haõ por bem feito este contracto que cada hum pelo que lhe toca, por esta escritura e pela melhor forma de direito aceita, e se obriga a cumprir como foi pactoado por sua pessoa e bens presentes e futuros, subjeitando-se a responder por todo o aqui contheudo pesando as injustiças d’ esta cidade, naõ obstante da futura mudança de domicílio. E por elle Manoel Soares de Castro foi acto. que muito de sua boa vontade fica por fiador, e principal pagador, do dito empreiteiro Manoel Rodrigues, a minha observancia d’esta escriptura, para tudo por elle cumprir, e pagar como obrigaçaõ sua propria que toma, e remove sobre si, a cujo fim se subjeita ás leis dos fiadores, e principais pagadores, tudo por seu pagar a bens presentes e futuros obrigando-se tambem a responder pelo cumprimento perante a justiça d’esta cidade. Em testemunho de verdade assim outorgaram, pediram, aceitaram que eu tabelliaõtambem aceito por parte de quem locar ausente; e sendo-lhes por mim lida se acharam conforme; a que foram testemhunhas presentes Joaquim Miguel d’ Oliveira Ferraz, e Jose Maria Gonçalves Carvalho, em amanuenses, que n’ esta nota assignaram com os outorgantes a quem tabem conhecem. Eu tabelliaõ Pedro Ricardo Cosmelli a escrevi. D’ esta, dois mil nove centos e sessenta reis. Interlinhas = a engradadas”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 1, Cx. 145, Livro 673; fl 68-68v Documento 25 “Saibam quantos esta escriptura de locaçaõ de obra, fiança e obrigaçaõ virem: Que no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de oitocentos e sessenta e cinco, aos vinte e quatro dias do mez de março, n’esta cidade de Lisboa, e em meu escriptorio na Rua de S. Paulo Nº 238, compareceram de huma parte José da Fonseca Cruz, proprietario, morador na rua e freguesia de S. Juliaõ Nº 90, E de outra Manoel Rodrigues, Mestre d’ obras do officio de pedreiro, morador na Rua de S. Joaõ da Matta Nº 68, Freguesia da Lapa, ambos casados. E bem assim mais foi presente Indro Soares da Silva Pereira, solheiro, que tem estancia de madeiras, morador na praia e freguesia de Santos-o- Velho Nº 30, todos maiores de edade (…) E logo por elles José da Fonseca Cruz, foi
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dito em minha presença e das testemunhas a diante nomeadas e assignadas: Que por esta escriptura, e pla melhor forma de direito da d’ empreitada ao segundo outorgante Manoel Rodrigues, a reedificaçaõ do seu predio sito na estrada do Campo Grande do lado oriental, numeros setenta e cinco a oitenta e hum, freguesia dos Santos Reis, concelho dos Olivais, debaixo das seguintes condições: Que terá primeiro, segundo andares, e agoas furtadas, e cada andar terá nove janellas de sacada sendo as do segundo andar com respectivas grades d’ entro. Que toda a cantaria da frente será nova, e só as pedras das sacadas antigas se aproveitaraõ se estiverem no caso de servir; toda a mais cantaria só servirá para toda a parte de traz: Que vigamento será todo de madeira de casquinha serrada a seis para o primeiro e segundo andar, e serrada a oito para as agoas furtadas: que os paos das madres, fileiras, frega digo fileira, freyaés, cadeias, e pernas de escada, será tudo de madeira de casquinha, e omadeiramento do telhado será de castanho: levará quatro trapeiras forradas de zinco: Que o guarda-pó, ripas, tabiques e frontais, seraõ de madeira da terra, assim como o barrotado e sôlhodas lojas, sendo as taboas de dezaceis palmos, ou três metros e concoenta e dois centimetros. Que os sôlhos do primeiro e segundo andares, e agoas furtadas seraõ de madeira de casquinha, e d’ esta mesma madeira seraõ tambem todas as portas, janellas e guarnecimenrtos d’ estas, e os caixilhos que seraõ todos de abrir para dentro; Que as janellas das lojas seraõ de meias portas de taboinhas á inglesa abrindo para fora, e os caixilhos para dentro como fica dito: que as velhas, janellas que estiverem em estado de poder aproveitar-se serviraõ só para o interiro assim como toda e qualquer madeira em estado de poder serrvir. Que as ferragens, e pinturas seraõ iguais ás da sobredita casa contigua á pouco tempo acabada: Que todos os tectos seraõ fasqueados de madeira de casquinha, e estucados, assim como as paredes, por bom estucador: Que o arco da escada será de cantaria. Que o primeiro e segundo andar teraõ as pias pela parte de fóra em janelas de sacada: que as agoas do telhado seraõ encanadas para areia, e sahiraõ sobre a estrada, porem as da parte de traz seraõ encandas para o cano geral das pias e saguaõ: este saguaõ será todo caçado e dividido por seus eixos para os quatro inquilinos das lojas, e as pias d’ estas seraõ da parte de fora no saguaõ: Que o canno geral de todo o despejo sahirá á entrada, e será feito com cascaés avançando da frente da casa na mesma estrada trinta palmos ou seis metros e sessenta centimetros: Que segundo o risco que apresenta a planta, augmentado todo o dito saegundo andar que o predio hade ter e que se o dito naõ acha na mesma planta, terá o mesmo predio sessenta e seis casas ao todo incluindo seis das agoas furtadas: Que a escada será ao meio commo se vê da mesma planta, e seguirá até ás agoas furtadas com engradamento de ferro e claraboia: Que as lojas seguiraõ quanto ás portas e janellas o risco da sobredita planta a
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qual para os convenientes effeitos fica em poder do segundo outorgante assignada por elle, proprietario digo outorgante empreiteiro, assignada por elle primeiro outorgante proprietario. Que da referida reedificaçaõ com planta assim como materiais como seraõ d’ obra, pagará elle proprietario ao empreiteiro, a quantia de sete contos de reis, em metal sonante com exclusaõ de qualquer representativo ainda mesmo, que possa vir a ter curso forçado: Que a referida quantia será paga em trez pagamentos, o primeiro de dois contos logo a obra seja começada, o segundo de outro dois contos de reis quando a mesma obra estiver a meio, e o terceiro de trez contos de reis quando a empreitada estiver concluida pela forma que fica pactoada e deverá ser no prefixo termo de onze mezes contados do dia de hoje em diante. E com tais condições e se mais elle primeiro outorgante proprietario se obriga a haver o presente contracto por firma e válido por digo valido na parte que lhe toca por sua pessoa e bens presentes e futuros. E pelo empreiteiro Manoel Rodrigues foi dito: Que aceita a referida empreitada na forma d’ esta escriptura, pela qual tambem se obriga, na parte do cumprimento por sua pessoa e bens presentese futuros. E pelo terceiro outorgante Pedro Soares da Silva Pereira foi dito: Que de sua livre vontade fica por fiador do dito empreiteiro Manoel Rodrigues, a minha observancia d’ este contracto para tudo elle cumprir e pagar como obrigaçaõ sua propria que toma e remove sobre si, a cujo fim se sujeita ás leis dos fiadores e princiapis pagadores tudo por pessoas e bens futuros. A (…) finalmente todos os outorgantes, que ficam de fóra d’ este contracto e por conta do proprietario, todos os materiais e maõ d’ obra para os respectivos estuques e pinturas do referido predio a reedificar,e naõ parem parte da empreitada com equivocadamente estavam se ella incluidos. Em testemunho de verdadee assim o outorgaram, e aceitaram, sendo testemunhas presentes Joaquim Miguel d’ Oliveira Ferraz, Eduardo Augusto Faria Picaõ, (…) que n’ esta nota assignam com os outorgantes depois de /(…) por mim tabelliaõ Pedro Ricardo Cosmelli, que a escrevi. D’esta trez mile quinhentos reis Entrelinha= sendo as do segundo andar”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 1, Cx. 145, Livro 7 fl 52v-53v Documento 26 “Saibam quantos esta escriptura de locaçaõ de obra, fiança e obrigaçaõ vorem : Que no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oitocentos e sessenta e seis, aos set dias do mez de março n’ esta cidade de Lisboa, e meu escriptorio da Rua de S. Paulo Nº 238, compareceram: De huma parte na qualidade de proprietario, Francisco dos Santos Silveira, morador na rua de Santo Ambrosio Nº 19, freguesia de Santa Isabel; E de outra na qualidade de
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empreiteiro Manoele Rodrigues, Mestre d’ obras, morador na rua da procissaõ digo na rua de S. Joaõ da Matta Nº 86, freguesia de Santos o Velho; E assim mais foi presente na qualidae de fiador do dito emptreiteiro Isidro Soares da Silva comerciante morador na rua nova da praia de Santos em Nº 28, da mesma freguesia de Santos; Todos os soutorgantes maiores em edade e meus comhecidos. E logo por elles Francisco dos Santos Silveira e Manoel Rodrigues, foi dito em minha presença, e das testemunhas em diante nomeadasm e assignadas. Que se acham contractados um segundo outorgante tomar de empreitada a obra de que carece o predio do primeiro outorgante sito na rua da procissaõ, numeros cento e trinta e seis a cento e quarenta e dois modernos, na freguesia das Mercês d’ esta cidade, segundo o risco que assignado por ambpos o segundo outorgante reserva em seu poder, e debaixo das seguintes condições: Que mudará a porta da loja para o centro ainda tem a janella, e porá a janella em logar na porta: Que a entrada será mais estreita, isto hé o corredor da entrada será lageado de pedra branca, e porta em quadrados, e a escada será nova conforme o dito risco, ou da melhor maneira possivel: Que o primeiro andra trá segundo o referido risco, sete casas, incluindo a cosinha nova que será feita no subterraeo que tem de ser desaterrado, tendo a chaminé para o lado direito: Que tirará a sacada do segundo andar e metrará em seu logar pedras novas de feitio de S com a maior3 largura que poder, rasgando as janellas de lado, e entalando-lhe grades de ferro d’ entro: Que este mesmo andar terá quinze palmos ou trez metros e trinta centimetros, de pé direito, seguindo os prumos do primeiro andar, e cosinha será toda feita debaixo, metendo-lhe huma janella para o quintal e a cosinha: Que o terceiro andar terá janellas rasgadas com grades entalladas á inglesa: Que mesmo andar será egual aos outros e, com os mesmos quinze palmos ou trez metros e trinta centimetros de pé direito. Que o sótaõ terá o maior pe direito que poder,e levará as competentes sahidas para o telhado, e para a luz da casa. Que a clara boa sera feito de cupola. Que o pateo sera lageado, e pias fóra da casa e com sifões. Que desmanchará huma pequena casa que há no quintal fazendo –lhe huma arcada de pedra que digo de pedra para o portaõ que dá serventia para o beco do erario, cujo portaõ será novo, e a portada de pedra: Que as madeiras seraõ de casquinha com as grossuras proprias, e tôscos egualmente bons: Que as madeiras dos frontáes, tabiques, ripa, e guarda-pó, seraõ da terra: Que poderá aproveitar os tijolos para as cosinhas e tudo o mais o que estiver em estado de servir. Que os tectos seraõ estucados; e o papel para forrar as casas será fornecido e mandadop apensar por conta do proprietario. Que as pinturas seraõ a branco no interior, e a amarelo torrrado nos caixilhos da frente: Que por conta digo por toda a referida obra bem acabada, e referidos materiais pagará o proprietario ao empreiteiro, a quantia de dois contos e oito centos
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mil, reis, em trez prestações, sendo as duas primeiras de novecentos e trinta mil reis cada huma, e a terceira de nove centos e quarenta mil reis, todas em metal sonante e seraõ satisfeitas pelo mesmo proprietario ao empreiteiro, a primeira ao começar da obra, a segunda quando a mesma estiver a meio; e a terceira no fim d’ ella. Em‘ esta forma disseram mais ambos os mesmos outorgantes Que haõ por bem feito este seu contracto, por que cada hum d’ elles pela parte que lhe toca por esta escriptura e pela melhor forma de direito aceita e se obriga a cumprir como fica pactoado por sua pessoa e bem presentes e futuros. E logo elle Isidro Soares da Silva Pereira disse: Que muito da sua livre vontade fica por fiador e principal pagador do referido empreiteiro Manoel Rodrigues, ao inteiro cumprimento d’ este contracto, para tudo por elle cumprir, e pagar como obrigaçaõ propria que toma e remve sobre si, a cujo fim se sugeita ás leis dos fiadores e principais pagadores, por tudo por sua pessoa e bens presentes e futuros Disseram finalmente todos outorgantes, cada hum pelo que lhe respeita; Que se obriga a responder pelo cumprimento d’ esta escriptura no fôro da sua outorga naõ obstante qualquer futura mudança de domicilio. Em testemunho de verdade assim outorgaram, e aceitaram; sendo testemunhas presentes Joaquim Miguel d’ Oliveira Ferraz e Joaõ Francisco Cordova, meus amanuenses, que n’ esta nota assignam como os outorgantes depois de lida a todos por mim tabelliaõ Pedro Ricardo Cosmelli, que a escrevi. D’ esta dois mil e quinhentos reis Entrelinhas = fiança = Silveira = (…)= Ferreira = Ferreira”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 1, Cx. 146, maço 68; Livro 679; fl 63-64v Documento 27 “Saibam quantos esta escriptura de contracto de locaçaõ de obraçaõ digo obra, quitaçaõ, hipoteca, fiança e obrigaçaõ: Que no anno ao Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oito cento sessenta e oito, aos vinte e trez dias do mez de Março, n’ esta cidade de Lisboa, e meu escriptorio na Rua de S. Paulo N º 238, compareceram: De huma parte Francisco Valladas, solteiro, proprietario, e official da Secretaria da Marinha, morador na Eschola Polytechinica Nº 35, freguesia das Mercês, E de outra Manoel Rodrigues mestre de obras, casado, morador na Rua de S. Joaõ da Matta Nº 86, freguesia de Santos-o –Velho; e seu fiador Isidro Soares da Silva Pereira, comerciante, viuvo, morador na rua da praia e freguesia de Santos-o –Velho Nº 32, todos maiores de edade, e meus conhecidos. E logo pelo primeiro outorgante Francisco Paula Valladas, foi dito em minha presença e das testemunhas adiante nomeadas e assignadas: Que por esta escriptura, e pela melhor forma de direito dá-se empreitada ao segundo outorgante Manoel Rodrigues, a
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reedificaçaõa reedificaçaõ do seu predio sito na rua de Santo Antonio da Praça do Convento do Coraçaõ de Jesus, com numeros quinze e dezaceis antigos, e cento e vinte e dois e cento e vinte e quatro modernos na freguesia de Santa Isabel d’ esta cidade, debaixo das seguintes condições: Que a reedificaçaõ do predio sobredito terá logar conforme a planta e alçado aprovados pela Ex ma. Camara Municipal d’ esta cidade em dezaceis de Janeiro do corrente anno, aproveitando para obra os materiais provenientes de demoliçaõ que fiser, e fornecendo a sua custa todos os que falharem os materiais resultantes da demoliçaõ que sobejarem, ficam sendo propriedade do empreiteiro. Que os materiais a empregar, como cal, areia, pedra, pedra, tijolo, telha, seraõ de boa qualidade; e pelo que respeita a madeiras empregará pinho da terra nos vigamentos, sôlhos, frontaes, tabiques, escadas, telhados, forros, barrotes, guarda-pó, ripas, e trapeiras; e só empregará casquinha nas portas, interiores, e exteriores, aros e caixilhos da frente. Que mais poderá o empreiteiro aproveitar como entender, a madeira que estiver em estado de servir, portas, janellas, ferro, sôlho, vigamentos, guarda-pó, ripas e barrotes, e dar-lhes aplicaçaõ mais adquada. Que as portas e janellas, tanto interiores como exteriores seraõ de calha assentas com lemes, levando as portas exteiores ferraduras femeas, e tranquetas d’ argola: as portas interiores levaraõ a mesma ferragem de lemes, e muletas de ferro fundido. As janellas levaraõ lemes, e dois ferros cada vão. Os caixilhos seraõ de abrir para os lados, assentes com lemes, com dois ferros cada par de caixilhos. Que nos fasquedos dos tabiques poderá o empreiteiro empregar arcos de madeira de castanho. Os guarnecimentos seraõ lisos: o forro será pregado a encher. Nas duas sallas, e saletas havera abas encabeceiradas. Qiue os lados de Leste, e Oeste do predio se aproveitaraõ as paredes existentes, e sobre ellas, do primeiro andar para cima, se levantaraõ frontais em toda a altura das empenas. A parede da frente será guarnecida a cal branca, e as paredes dos outros lados seraõ rebocadas, e branqueadas. Que a loja terá o fundo e larguras marcadas na mencionada planta, e dividida em trez casas como a mesma planta indica: o fôrro, e pintura será como nos andares: as pias teraõ tampas de madeira: em cada cosinha haverá logar para potes, carvoeiras e armario. A agoa furtada será dividida em quatro casas, levando duas trapeiras: a trapeira da frente levara huma grade de ferro para chegar á platibanda. Que o telhado será feito de mourisca inteira: levará claraboia na direcçaõ da escada, de hum metro e vinte centimetros por oitenta centimetros, ficando ao geito do telhado: O corrimaõ da escada levara huma grade de ferro. Que a cantaria existente será picada para ficar limpa: os cunhais seraõ fingidos com huma agoada, e os competentes traços, e salientes conforme a planta: os vidros seraõ todos postos por conta do empreiteiro, incluindo os das bandeiras de todas as portas que as levam: as janellas do lado do quintal, teraõ ombreiras de cantaria, e levaraõ
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caixilhos e portas d’ abrir. Que a barraca adejacente ao predio será demolida. Que as pinturas seraõ feitas por conta do empreiteiro. Que por toda a referida obra bem feita, e acabada com os preceitos da arte, pagará elle proprietario a quantia de reis hum conto e oito centos mil, da forma seguinte — quatro centos mil reis n’ este acto; e os restantes hum conto e quatrocentos mil reis, hum ano depois de concluidas as obras, com o acrecimento do juro annual de um digo de seis por cento, contado da mesma conclusaõ em diante. Que falhando ao pagamento que fica estipulado, no todo ou em parte, poderá o empreiteiro emboliar-sedo seu credito pelo producto do mesmo predio e venderá em publico leilaõ, para lhe (…) procuraçaõ em causa propria, a restituira, digo entregará a elle mesmo proprietario o resto do mesmo producto. Que todos os embaraços que suscitarem com os donos dos predios contiguos, quer seja sobre pope de janellas abastas, quer sobre outra qualquer circunstancia, seraõ removidas por elle proprietario, sem dependencia do empreiteiro. Que o inteiro cumprimento d’este contracto elle proprietario obriga em pessoa, e bens presentes e futuros em geral, e por especial hypotheca, sob as disposições da respectiva lei, o mencionado predio a reedificar, quelhe pertence por o ter comprado a D. Ricarda Maria Benedicta Justo, Viuv de Antonio Martim Lopes Justo, morador na rua dos cardaes de Jesus Nº 32, primeiro andar freguesia das Mercês por escriptura de dois de Março de mil oito centos sessenta e setelavrada a folhas trinta e seis do livro setecentos oitenta e seis, e nota do tabelliaõ desta cidade, Camillo José dos Santos: Que este predio constitui um prazo perpetuo, foreiro a D. Maria Augusta d’ Abreu Barros e Vasconcellos, em dois mil sete centos vinte e cinco reis, annuais com laudemio de auarentena nos casos de venda: Que o mesmo predio parte do Norte com predios de Joaõ Maria de Figueiredo Frisceta, e de D. Maria Adelaide Savedra; do Sul com a dita rua de Santo Antonio; Do Nascente com o predio de Candido Sergio Gonçalves Coutinho; e do poente com a sobredita D. Maria Adelaide Savedra. Que calcula o valor anual do mesmo predio na quantia de dois contos de reis, e o rendimento liquido na quantia de cem mil reis, depois de reedificado. Que a referida hypotheca especial naõ derrogará a geral obrigaçaõ dos mais seus bens, ou vice versa. Pelo empreiteiro Manoel Rodrigues, foi dito que aceita a dita empreitada, hypotheca e obrigaçaõ nos termos que ficam expostos: Que da quitaçaõ, ao primeiro outorgante da dita quantia de quatro centos mil reis, com principio de pagamento do preço da mencionada empreitada, e que d elle recebo n’este acto em moeda metalica sonante corrente n’ este Reino, que contou, disse que estava certa, e emboleou de tudoeu tabelliaõ dou de boa fé. Pelo outorgante Isidro Soares da Silva Pereira foi dito: que muito de sua livre vontade fica por fiador, e principal pagador do referido empreiteiro, Manoel Rodrigues, á minha observancia d’esta escriptura para por tudo por elle
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cumprir e pagar como obrigaçaõ propria que toma e remove sobre si, a cujo fim se sujeitaás leis dos fiadores, e principais pagadores, tudo por sua pessoa e bem presentes e futuros. Finalmente disse digo futuros. Pelo que o pimeiro outrogante foi mais dito, que aceita as sobreditas quitaçaõ, e fiança como ficam exaradas. Disseram finalmente todos os outorgantes cada hum pelo que lhes toca que se obrigam a responder por todo o aqui contheudo no fôra da sua outorga, naõ obstante qualquer futura mudança de domicilio. Para a outorga d’ esta escriptura, em que foi apresentado o documento do teor seguinte = Logar de hum carimbo branco com a seguinte legenda — Pedro Ricardo Cosmelli — tabelliaõ e Paleographo — Rua de S. Paulo Nº 238 — Lisboa = Manoel Rodrigues vai pagar o imposto de sello que for devido pela quitaçaõ de quantia de quatrocentos mil reis que dá a Francisco de Paula Valladas. Lisboa vinte de Março de nil oito centos sessenta e oito = tabelliaõ — Pedro Ricardo Cosmelli = Logar de huma estampilha de sello de sessenta seis por mim devidamente (…) D’ esta e sello duzentos e dez reis — Cosmelli: = Logar de duas estampilhas de sello de cincoenta reis cada huma (…) da forma seguinte = Numero trinta e quatro= Repartiçaõ da Fazenda do Bairro d’ Alcantara em vinte de Março de mil oito centos sessenta e oito = o Escrivaõ de Fazenda — (…)Cosmelli. E traslado o consertar com o dito documento a que me reporto, e fica em meu cartorio. Em testemunho de verdade, assim o outorgaram; sendo testemunhas presentes Francisco José Domingues, proprietario, morador na travessa de S. Placido Nº 50, Freguesia de Santa Isabel, e Pedro Augusto, Barbeiro, morador n'’esta rua e freguesia de S. Paulo Nº 208, que vaõ assignar com os outorgantes a quem tambem conhecem depois d’ esta escriptura ser lida a todos por mim. Declarou finalmente o primeiro outorgante, que para melhor segurança do empreiteiro, requereo e aproveitou n’ este acto a competente certidaõ que comprova naõ estar o dito seu predio hypothecado onerado com outro encargo depois que o comprou, e cuja certidaõ e requerimento do empreiteiro fica em meu cartorio para ser copeada nos tralados d’ esta escriptura: como o que concluiram perante as ditas testemunhas, depois de (…) ser a todos lida esta declaraçaõ por mim. Em o tabelliaõ. D’ esta trez mil e quatro centos reis Entrelinhas= fiança= casado = (…) = modernos = (…) = solteiro”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 1, Cx. 147, maço 69; Livro 683; fl 43-45v Documento 28 “Saibam quantos esta escriptura de contracto de empreitada, e obrigaçaõ virem: Que no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oito centos sessenta e nove, aos nove dias do mez de janeiro, n’esta cidade de Lisboa, e no meu escriptorio na rua a freguesia de S. Paulo Nº
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238 compareceram: De huma parte na qualidade de proprietario José Antaõ, comerciante, casado, morador na Rua de S. Bento Nº 201, freguesia de Santa Isabel; De outra na qualidade de empreiteiro Manoel Rodrigues Mestre de obras, tambem casado, morador na Rua de S. Joaõ da Matta Nº 68, na freguesia de Santos- o Velho. E de outra na qualidade de fiador do mesmo empreiteiro, Isidro Soares da Silva Pereira, comerciante veuvo, morador na rua nova de Jesus Nº 14, Freguesia de Santa Catharina; todos meus conhecidos. E logo pelo primeiro outorgante foi dito em minha presença, e das testemunhas adiante nomeadas,e assignadas: Que dá de empreitada ao segundo outorgante, a reedificaçaõ do seu predio sito na dita rua de S. Bento, numeros duzentos e hum e duzentos e trez modernos na dita freguesia de Santa Isabel, com frente para o largo dos carros, debaixo das seguintes condições: Que a reedificaçaõ será conforme a respectiva planta devidamente aprovada. Que os vigamentos do primeiro, segundo andar, sótaõ, frecháis, cadeiâs e pernas d’ escada, seraõ de madeira de Filandia ou casquinha, podendo aproveitar-se e empregarse nos mesmos, o vigamento velho que estiver em estado de servir: Que os caixilhos, portas, e janellas interiores, e exteriores, seraõ de casquinha com hum fio ao meio, e as portas das lojas seraõ de casquinha á banda: Que os soalhos do primeiro e do segundo andar, seraõ de madeira de casquinha de folha ao meio: Que o vigamento e soalho das lojas, seraõ feitos com madeira do pinhal real, sendo algumas casas terreas lageadas, ou calçadas: Que o madeiramento do telhado será feito com varado de castanho, podendo aproveitar-se, e empregar-se n’ elle o varado velho que estiver em estado de servir: o guarda pó, ripas, barbates, e taboas de ponto, seraõ feitos com madeira da terra, As guarnições das sallas, saletas, casas de jantar, levaraõ fasquias moldadas, e seraõ feitas com madeira de casquinha, assim como os roda-pés. Que ficam pertencendo ao empreiteiro todos os materiais que se encontrarem na demoliçaõ do predio, e podel-os-ha empregar na empreitada segundo o seu estado: Que as duas frentes da rua de S. Bento, largo dos carros, seraõ, ou demolidas até ao nivel da calçada, e depois seraõ edificadadas de novo, levando os vaõs marcados na planta: Que a cantaria das duas fentes será d’ abancada de boa qualidade, e escudada, sendo a frente da rua de S. Bento, com molduras nas sacadas, ombreiras, saimeis, em portas, freiyos, e tornejamento dos dois cunhais que seraõ tambem de cantaria d’ abancado, escudadas mas lisas; Que as semalhas gerais, seraõ feitas d’ alvenaria, assim como a platibanda que levará quatro ou seis enfeitos de louça vidrada: Que os balaustres das trez frentes seraõ redondos, e de louça vidrada: Que a parte do predio que faz frente para o pateo, e para a quinta, será demolida até ao vigamento do primeiro andar, conservando as empenas como estaõ para servirem o mesmo predio. Que os cunhais que deitaõ para o pateo e para o largo dos carros, seraõ
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d’ alvenaria fingindo pedra. Que as frentes que deitaõ para o pateo, empregar-se-ha toda a cantaria velha que estiver em estado de servir, e a que falhar, bem como para o interior do predio, será da de Paço d’ arcos e aparelhada de picóla: Que a casa de jantar do primeiro andar, com frente para o pateo levará huma janella de sacada com a sua competente grade de ferro; e na casa de jantar do segundo que tambem terá frente para o mesmo pateo, levará igualmente huma janella de sacada e competente grade de ferro: Que as duas frentes para a rua de S. Bento, e largo dos carros, seraõ forrados com azulejo: Que a telhado será mouriscado: Que os tectos das lojas, da escada, e do primeiro e segundo andares, seraõ fasqueados com casquinha, e todos eles estucados. As casas do primeiro, e segundo andares, sallas, saletas, e casas de jantar, levaraõ molduras nas sancas e no meio com florões., e bem assim como as alcovas principais: Que todas as casas do primeiro, e segundo andares seraõ pintadas, sendo do melhor gôsto as sallas e saletas. As casas de jantar seraõ pintadas com paisagem. Que as casas das lojas que deitaõ para o largo dos carros, seraõ pintadas á moderna: Que a loja do estabelecimento do padeyro, levará um arco de pedra de Paço d’ arcos, e a sua escada levará um arco de pedra digo hum outro arco de pdra abancada, escudado, e de boa qualidade: Que a escada será á moderna de gavetos: a entrada será lageada com pedra branca, a pedra digo branco, e preta de xadrez: o primeiro degráo será de cantaria igual á do arco: os pés da mesma escada que deve ser de dois lances seraõ de casquinha, e os cobertores seraõ de madeira do pinhal real de treza centimetros de grossura: Os patins seraõ feitos de madeira da terra. Haverá uma clara boia: Que os encanamentos da agoas para a rua e para o canno dos despejos, seraõ feitos com manilhas de barro vidradas. Que se fará hum canno para despejos do predio até ao canno real, que será lageado e cascões, sendo quarenta centimetros de largura por trinta e dois centimetro d’ altura: Que o pateo levará um siphaõ de ferro de rallo, e para o sumidouro. Que as portas das sallas, saletas do primeiro, e segundo andares, e casas de jantar, levaraõ fechaduras d’ trinco de recolher, e as portas inclusivé das lojas e sótaõ levarão ferraduras magras: Que toda a ferragem nas portas das lojas e sotaõ será de lemes, e a porta do primeiro e segundo andares seraõ de vidro, e as outras portas inclusivé das lojas, e sótaõ seraõ de ferro: Que fará um forno no fundo da casa, com dois poyáes juntos proprios para os alguidares, e taboleiros necessarios para o fabrico do paõ: Que a grossura dos frontaés depois de guarnecidos, será de vinte dois centimetros: Que as grades das janellas da frente da rua de Saõ Bento, seraõ iguais ás que o predio de Antonio Ferreira d’ Araujo no sitio do cais do Tojo n’ esta cidade: Que toda a referida obra estará completamente acabada segundo os preceitos da arte, no prefixo de onze mezes contados do dia de hoje em diante: Que toda a mesma obra, seus respectivos materiais, e
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jornais pagará ao empreiteiro a quantia de cinco contos e quinhentos mil reis em metal sonante moeda forte d ‘este Reino (…), em trez prestações, sendo a primeira de hum conto e quinhentos mil reis, no começo da referida obra; a segunda de dois contos de reis, quando a mesma obra estiver em meio; e a terceira quando a dita obra estiver acabada. Pelo segundo outorgante foi dito, que aceita a dita empreitada nos termos expostos. Pelo terceiro outorgante foi dito. Que muito de sua livre vontade fica por fiador, e principal pagador do refeirdo empreiteiro segundo outorgante ao inteiro cumprimento d’ este contracto na parte que lhe respeita, para tudo por elle cumprir com fica pactoado, compo obrigaçaõ sua propria que toma e remove sobre si, e a cujo fim se sujeita ás leis dos fiadores e principais pagadores. Disseram finalmente todos os outorgantes, que cada hum pelo que lhe toca, por esta escriptura, e pela melhor forma de direito, aceita, e se obriga ao respectivo, por sua pessoa e bens presentes e futuros, respondendo por todo o aqui contheudo no fôro da sua outorga, naõ obstante qualquer mudança de domicilio. Em testemunho de verdade assim outorgaram, e a aceitaram, sendo testemunhas presentes, que declararam ser cidadaõs portugueses, Joaquim Miguel d’ Oliveira Ferraz, caixeiro de commercio, solteiro, maior de edade, morador na dita rua de S. Bento e freguesia de Santa Isabel Nº 264, e José Rodrigues Vieir da Silva, e Ajudante de solicitador encartado, casado e morador no Beco do Bello Nº 16, freguesia de Santa Engracia que vaõ assignar com os outorgantes, a quem tambem conhecem, depois d’ esta escriptura ser lida a todos por mim tabelliaõ Pedro Ricardo Cosmelli; que a escrevi; subescrevi, e a assigno em Publico. D’ esta, trez mil e quinhentos reis.”… ANTT, Registos Notariais de Lisboa, Cartório nº 1, Cx. 147, maço 69; Livro 685; fl 62-64v
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ÍNDICE ICONOGRÁFICO | i
ÍNDICE ICONOGRÁFICO
CAPÍTULO I - A LISBOA DE 1758 AO DEALBAR DO ESTADO NOVO Folha A-1 do Apêndice Documental
Fig. CAP.I-1
Território da Cotovia ao Rato em 1756-1758; Atlas da Carta Topográfica de Lisboa; Filipe Folque (dir.): 1856-1858
Fig. CAP.I-2
Território da Cotovia ao Rato em 1904-1911; Levantamento Cartográfico de Lisboa; 1904-1911
Fig. CAP.I-3
Planta actual do território da Cotovia ao Rato; desenho da autora
Fig. CAP.I-4
Ortofotomapa do território da Cotovia ao Rato, voo de 2004
CAPÍTULO II - ASPECTOS PARA A CONFORMAÇÃO DO EDIFICADO Folha A-2 do Apêndice Documental
Fig. CAP.II-1.
Banco Tota e Açores, antigamente Banco Lisboa e Açores; Monumentos nº 21 p. 143
Fig. CAP.II-2.
Linguagem neopalladiana num edifício de rendimento na Rua de S. João, no Porto; fotografia da autora
Fig. CAP.II-3.
Edifício neomanuelino na Rua de Corpo de Deus, em Coimbra; fotografia da autora
Fig. CAP.II-4.
Edifício de chanfro curvo na Praça Oito de Maio, em Coimbra; fotografia da autora
Fig. CAP.II-5.
Edifício de chanfro curvo no Largo da Portagem, Café Montanha, em Coimbra; fotografia da autora
Fig. CAP.II-6.
Paço Ducal de Vila Viçosa, Monumentos nº 27 p. 169
Fig. CAP.II-7.
Edifício Grandela & Cª, Monumentos nº 21 p. 143
Fig. CAP.II-8.
Edifício Sede do Montepio Geral, Monumentos nº 21 p. 144, 2
Fig. CAP.II-9.
Edifício Sede do Banco Lisboa e Açores, Monumentos nº 21 p. 144, 4
Fig. CAP.II-10.
Edifício António Silva da Cunha (Camisaria Confiança e Hotel Internacional), Monumentos nº 21 p. 145, 7
Fig. CAP.II-11.
Hotel Metrópole, alçado para a Praça D. Pedro IV, Monumentos nº 21 p. 145, 8
Fig. CAP.II-12.
Edifício Barros & Santos IV, Monumentos nº 21 p. 147, 12
Fig. CAP.II-13.
Capeamento de pedra feito sobre cantaria pombalina
Fig. CAP.II-14.
Capeamento de pedra feito sobre cantaria pombalina
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ii | ÍNDICE ICONOGRÁFICO
Fig. CAP.II-15
Escadas do nº 40 da Rua de São Julião
Fig. CAP.II-16
Escadas do nº 59 da Rua da Prata
Fig. CAP.II-17
Caixa de escadas do nº 44 da Rua dos Fanqueiros
Fig. CAP.II-18
Intervenção de Álvaro Siza no Chiado; imagem livro estratégia da memória, p. 238
Fig. CAP.II-19
Proposta vencedora do 3º Concurso para o Monumento ao Infante D. Henrique, 1954; imagem do livro Portugal, arquitectura do século XX, p.95
Fig. CAP.II-20
Escadas do nº 94 da Rua da Vitória; fotografia da autora
Fig. CAP.II-21
Rua Sousa Viterbo, rua pertencente ao Bairro Lopes, com o seu edificado modernista; fotografia da autora
Fig. CAP.II-22
Edifício na Rua Sousa Viterbo nº 11, Bairro Lopes, Lisboa; fotografia da autora
CAPÍTULO III - DA COTOVIA AO RATO - ANÁLISE DO EDIFICADO Folha A-3 do Apêndice Documental
Fig. CAP.III-1.
Edifício na Rua do Meio à Lapa nº 37 A, a divisão em fatiota; fotografia da autora
Fig. CAP.III-2.
Edifício na bipartido Rua Maestro Pedro de Freitas Branco nº 10-12 A; fotografia da autora
Fig. CAP.III-3.
Edifício bipartido na Cecílio de Sousa nº 77-79; fotografia da autora
Fig. CAP.III-4.
Alçados joaninos para a Rua dos Ourives do Ouro; in MURTEIRA, Helena; Lisboa da Restauração às Luzes, p. 91
Fig. CAP.III-5.
Edifício da Rua Correia Garção / Rua de S. Bento nº 53-101 / Calçada da Estrela; fotografia da autora
Fig. CAP.III-6.
Edifício em Santos Largo Vitorino Damásio, 1- 4; Avenida D. Carlos I, 5–45/ Avenida 24 de Julho, 50–56/ Largo Santos, 13–15; fotografia da autora
Fig. CAP.III-7.
Conjunto Praça do Areeiro (actual Praça Francisco Sá Carneiro)/ Avenida João XXI/ Avenida Almirante Gago Coutinho, in FERNANDES José Manuel; Português Suave, arquitecturas do Estado Novo; p. 71, 4
Fig. CAP.III-8.
Rua da Silva, lado ímpar, pertencente ao núcleo urbano do Postigo do Melo e Casas de Embaixador, in Vanda Pereira de Matos 2003
Fig. CAP.III-9.
Rua S. João da Mata nº 17-23, fachada tripartida; pasta; fotografia da autora
Fig. CAP.III-10. Pormenor de escoadouro na Travessa da Peixeira nº 11; fotografia da autora Fig. CAP.III-11. Pormenor de placa foreira na Rua da Escola Politécnica nº 43, indicando propriedade do Colégio Real dos Nobres; fotografia da autora Fig. CAP.III-12. Pormenor de placa foreira na Rua de S.Felix nº 3; fotografia da autora Fig. CAP.III-13. Placa foreira num edifício da Rua do Meio à Lapa nº 16, encimada pelo símbolo da cruz trinitária; fotografia da autora
VANDA PEREIRA DE MATOS
ÍNDICE ICONOGRÁFICO | iii
Fig. CAP.III-14. Azulejos meio relevados no edifício da Rua do Poço dos Negros nº 105 A; fotografia da autora Fig. CAP.III-15. Azulejos meio relevados no edifício nº 19 da Rua do Poço dos Negros nº 149; fotografia da autora Fig. CAP.III-16. Azulejos relevados no edifício nº 19 da Rua do Quelhas, Palácio do Machadinho; fotografia da autora Fig. CAP.III-17. Edifício de gaveto Travessa do Abarracamento de Peniche / Travessa da Palmeira nº 5; cujos extremos dos azulejos são em bisel; fotografia da autora Fig. CAP.III-18. Gelosias em janelas do edifício na Rua de S. Bento nº 26, ainda existentes na década de 40 do século XX; imagem do Arquivo Municipal de Lisboa, Arquivo Fotográfico, A28286 Fig. CAP.III-19. Pormenor de gelosias no edifício na Rua de S. Bento nº 26, em1959; imagem do Arquivo Municipal de Lisboa, Arquivo Fotográfico, A10655 Fig. CAP.III-20 - O prospecto de aformoseamento do edifício da Travessa dos Inglesinhos nº 33-35 de 18 de Maio de 1864 mostrando uma mudança de sensibilidades; in CARITA, Hélder, Bairro Alto, Tipologias e Modos Arquitectónicos, Câmara Municipal de Lisboa, 2ª edição, 1994, p. 59. Fig. CAP.III-21. Edifício de grande extensão da Rua do Loreto nº 22-32; fotografia da autora Fig. CAP.III-22. Pormenor da Rua S. João da Mata nº 17-23; fotografia da autora Fig. CAP.III-23. Platibanda constante no prospecto de alteração do Rua da Misericórdia 133-135; com data de 1862; in CARITA, Hélder, Bairro Alto, Tipologias e Modos Arquitectónicos, Câmara Municipal de Lisboa, 2ª edição, 1994, p.132 Fig. CAP.III-24. Platibanda claramente definida no projecto de melhoramento, de 1866 para o edifício da rua da Barroca nº 60 /Travessa dos Fiéis de Deus nº 45-47 (IMAGEM CARITA BAIRRO ALTO, P.128); in CARITA, Hélder, Bairro Alto, Tipologias e Modos Arquitectónicos, Câmara Municipal de Lisboa, 2ª edição, 1994, p.132 Fig. CAP.III-25. Cunhal do edifício, da Calçada Marquês de Abrantes datado de 1853, J.A.L.R. 1853; fotografia da autora Fig. CAP.III-26. Arredondamento do cunhal na base junto ao pavimento no edifício de gaveto Travessa do Jasmim/ Rua do Jasmim nº 21; fotografia da autora Fig. CAP.III-27
Cunhal completamente curvo do edifício da Rua do Machadinho/ Travessa do Pasteleiro; fotografia da autora
Fig. CAP.III-28. Edifício Art Deco Rua D. Pedro V nº 7/ Rua Luísa Todi, com cunhal de chanfro curvo; fotografia da autora Fig. CAP.III-29. Chanfro curvo curvo do edifício dos Correios no Gaveto da Rua Alexandre Herculano para a Rua de S. Filipe de Neri; fotografia da autora
Folha A-4 do Apêndice Documental
Fig. CAP.III-30.
Edifício de gaveto Rua de S. Marçal nº 176 / Travessa do Monte do Carmo; in CALDAS, João Vieira; Porfírio Parda Monteiro – Arquitecto; 1997; p.79
Fig. CAP.III-31. Edifício de gaveto modernista na Rua da Rosa / Travessa dos Fiéis de Deus; fotografia da autora
VANDA PEREIRA DE MATOS
iv | ÍNDICE ICONOGRÁFICO
Fig. CAP.III-32. Edifício de chanfro recto do gaveto Travessa do Abarracamento de Peniche / Travessa da Palmeira; fotografia da autora Fig. CAP.III-33. Edifício de chanfro recto do edifício de gaveto da Rua da Rosa/ Rua D. Pedro V; fotografia da autora Fig. CAP.III-34. Chanfro recto do edifício de gaveto da Rua Nova do Loureiro nº2, /Rua João Pereira Rosa; fotografia da autora Fig. CAP.III-35. Chanfro recto do edifício de gaveto da Rua Nova do Loureiro, lado ímpar/Calçada do Tijolo; fotografia da autora Fig. CAP.III-36. Chanfro recto, anterior ao decreto no edifício de gaveto Rua de S. Marçal nº 13-19/ Travessa de S. José; fotografia da autora Fig. CAP.III-37. Cunhais de chanfro recto visíveis no conjunto Rua Nova de S. Mamede/ Rua do Salitre; in Monte Olivete minha aldeia; França, José-Augusto; p. 111. Fig. CAP.III-38. Edifício de chanfro recto de 1948, sito na Avenida da República 36-36 E/ Avenida Visconde Valmor 27-27E; fotografia da autora Fig. CAP.III-39. Pormenor de campainha no edifício nº 39 Rua de S. Bento; fotografia da autora Fig. CAP.III-40. Pormenor de respiradouro na Rua Eduardo Coelho; fotografia da autora Fig. CAP.III-41
Pormenor de respiradouro em pedra na Rua Nova da Piedade nº 7; fotografia da autora
Fig. CAP.III-42
Pormenor de tubo de queda de ferro fundido na Avenida Duque de Ávila; fotografia da autora
Fig. CAP.III-43. Prospecto datado de 1867, do edifício da Rua Luz Soriano nº 75, apresentando umas escadas com um vazio central; in CARITA, Hélder, Bairro Alto, Tipologias e Modos Arquitectónicos, Câmara Municipal de Lisboa, 2ª edição, 1994, p.130) Fig. CAP.III-44. Bairro Pombal, ilustração constante no livro de Gustavo Matos Sequeira; Depois do Terramoto; vol.II Fig. CAP.III-45. Solar dos Soares de Noronha, onde se instalou a Impressão Régia, cuja demolição se iniciou em 1895; in A Sétima Colina, roteiro historico-artístico; França, José-Augusto (coord.); p. 118. Fig. CAP.III-46. Pormenor da escadas dos pisos superiores do edifício da Rua S. João da Mata nº 17-23; fotografia da autora Fig. CAP.III-47. Pormenor da clarabóia do edifício da Rua S. João da Mata nº 17-23; fotografia da autora Fig. CAP.III-48. Pormenor do arco que antecede as escadas do pisos superiores do edifício da Rua de S. João da Mata nº 17-23; fotografia da autora Fig. CAP.III-49. Pormenor trapeira forrada de zinco na Rua Cecílio de Sousa nº 3-5; fotografia da autora Fig. CAP.III-50. Pormenor trapeira forrada de zinco na Rua de S. Bento nº 426; fotografia da autora Fig. CAP.III-51. Trapeiras comportando cinco vãos de janelas na Rua de S. Marçal 13-21 / Travessa de S. José; fotografia da autora Fig. CAP.III-52
Palácio Alagoas, hoje convertido em condomínio privado, in A Sétima Colina, roteiro historico-artístico; França, José-Augusto (coord.); p.124.
Fig. CAP.III-53
Edifício de chanfro curvo Largo do Rato 16-16C/ Rua de S. Bento 712-714; fotografia da autora
VANDA PEREIRA DE MATOS
ÍNDICE ICONOGRÁFICO | v
Fig. CAP.III-54
Largo do Rato, Arquivo Municipal de Lisboa, Arquivo Fotográfico; A. 9772.jpg Arquivo Fotográfico Municipal de Lisboa, Arquivo Fotográfico Municipal
Fig. CAP.III-55
pormenor das escadas e seus corrimãos do edifício do Largo do Rato nº 14-14 C; fotografia da autora
Fig. CAP.III-56
Grande edifício de rendimento na Rua do Arco a S. Mamede nº 2 / Rua de S. Bento nº 520-502; fotografia da autora
Folha A-5 do Apêndice Documental Fig. CAP.III-57
Grande edifício de rendimento na Rua de S. Bento e nº 502-486; fotografia da autora
Fig. CAP.III-58
Grande edifício de rendimento na Travessa do Abarracamento de Peniche/Rua do Século com chanfro curvo de raio pequeno; fotografia da autora
Fig. CAP.III-59
Grande edifício de rendimento na Rua do Loreto nº 22-30; fotografia da autora
Fig. CAP.III-60
Grande edifício de rendimento na Rua de S. Marçal os nº 29-35, fotografia da autora
Fig. CAP.III-61
Grande edifício de rendimento na Rua do Século nº 6-22 anterior a 1751; fotografia da autora
Fig. CAP.III-62
Grande edifício de rendimento na Rua de S. Marçal nº13-21/ Rua de S. José; fotografia da autora
Fig. CAP.III-63
Alçado na Rua do Arco a S. Mamede edifício da Rua do Arco a S. Mamede nº 2 / Rua de S. Bento nº 520-502; fotografia da autora
Fig. CAP.III-64
Caixa de escada do nº 510 do edifício da Rua do Arco a S. Mamede nº 2 / Rua de S. Bento nº 520-502; fotografia da autora
Fig. CAP.III-65
Arranque da escada e sua porta adjacente do nº 510 do edifício da Rua do Arco a S. Mamede nº 2 / Rua de S. Bento nº 520-502; fotografia da autora
Fig. CAP.III-66
Último piso do nº 510 do edifício da Rua do Arco a S. Mamede nº 2 / Rua de S. Bento nº 520-502; vendo-se o acesso aos fogos e as portas dos “quartos independentes”; fotografia da autora
Fig. CAP.III-67
Grande conjunto de edifício de rendimento na Travessa do Noronha nº 5-5 A / Rua Gustavo Matos Sequeira nº 40; fotografia da autora
Fig. CAP.III-68
Caixa de escadas com o seu pavimento em xadrez e arco no edifício da Rua de Santos-oVelho nº 22-32; fotografia da autora
Fig. CAP.III-69
Caixa de escadas e arco que antecede o arranque das mesmas na Rua Professor Branco Rodrigues nº 28; fotografia da autora
Fig. CAP.III-70
Edifícios modernistas nº 5 e nº 7 da Rua Maestro Pedro de Freitas Branco; fotografia da autora
Fig. CAP.III-71
Edifícios nº 17 e nº 19 Rua Maestro Pedro de Freitas Branco, relativos ao período entre 1758 e 1859; fotografia da autora
Fig. CAP.III-72
Edifício nº 14 na Rua Maestro Pedro de Freitas Branco, relativo ao período de 1859 a 1902; fotografia da autora
Fig. CAP.III-73
Edifício nº 22 Rua Maestro Pedro de Freitas Branco, relativo ao período de 1859 a 1902; fotografia da autora
VANDA PEREIRA DE MATOS
vi | ÍNDICE ICONOGRÁFICO
Fig. CAP.III-74
Edifícios nº 8 e nº 10 na Travessa do Noronha relativos ao período de 1959 a 1902; fotografia da autora
Fig. CAP.III-75
Caixa de escada do edifício nº 37 A da Rua do Meio à Lapa; fotografia da autora
Fig. CAP.III-76
Tipologia de escadas do edifício modernista da Rua Maestro Pedro de Freitas Branco nº 5; fotografia da autora
Fig. CAP.III-77
Edifício na Rua do Arco a S. Mamede nº 4; fotografia da autora
Fig. CAP.III-78
Edifício na Rua da Imprensa Nacional nº 5-9; fotografia da autora
Fig. CAP.III-79
Edifício na Rua do Arco a S. Mamede nº 35-39; fotografia da autora
Fig. CAP.III-80
Edifício na Rua do Arco a S. Mamede nº 41-45; fotografia da autora
Fig. CAP.III-81
Edifício na Rua do Arco a S. Mamede nº 75-79; fotografia da autora
Fig. CAP.III-82
Edifício na Rua da Imprensa Nacional nº 37-41; fotografia da autora
Fig. CAP.III-83
Edifício na Rua do Arco a S. Mamede nº 22 A; fotografia da autora
Folha A-6 do Apêndice Documental Fig. CAP.III-84
Planta de implantação do edifício de gaveto Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714, substituindo o que tinha ficando em ruína. Planta datada da década de 1910, Arquivo Histórico da Câmara de Lisboa
Fig. CAP.III-85
Planta actual do Largo do Rato, onde se encontra o edifício de gaveto do Largo do Rato 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714
Fig. CAP.III-86
Pormenor do Largo do Rato, Largo do Rato; A. 9772.jpg Arquivo Fotográfico Municipal de Lisboa, Arquivo Fotográfico Municipal
Fig. CAP.III-87
Edifício do Largo do Rato nº16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714 Plantas da loja, sobreloja e 1º andar alterados num projecto posterior a 1912 e anterior à intervenção de 1947; Arquivo Histórico da Câmara de Lisboa.
Fig. CAP.III-88
A intervenção Estado Novo,datada de 1947, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714; Arquivo Histórico da Câmara de Lisboa
Fig. CAP.III-89
Projecto de construção do edifício do largo do Rato 16-16 C/ Rua de S. Bento 712-714 correspondente à primeira realidade construída do edifício ; Arquivo Histórico da Câmara de Lisboa
Fig. CAP.III-90
A intervenção Estado Novo,datada de 1947, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714; Arquivo Histórico da Câmara de Lisboa
Fig. CAP.III-91
A intervenção Estado Novo,datada de 1947, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714; Arquivo Histórico da Câmara de Lisboa
Fig. CAP.III-92
A intervenção Estado Novo,datada de 1947, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714; Arquivo Histórico da Câmara de Lisboa
Fig. CAP.III-93
A intervenção de 1997, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712714. Restruturação do espaço da padaria original para albergar a Leitaria Brasil; Arquivo Histórico da Câmara de Lisboa
Fig. CAP.III-94
A intervenção de 1997, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 71271; Arquivo Histórico da Câmara de Lisboa
VANDA PEREIRA DE MATOS
ÍNDICE ICONOGRÁFICO | vii
Fig. CAP.III-95
A intervenção de 1997, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712714. Restruturação do espaço da padaria original para albergar outros espaços comerciais para além da Leitaria Brasi; Arquivo Histórico da Câmara de Lisboa
Fig. CAP.III-96
Pormenor da clarabóia e transição desenho de alçado com a platibanda, no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714; fotografia da autora
Fig. CAP.III-97
Pormenor do nascimento da base do arco que antecede as escadas de acesso aos pisos de habitação no edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714; fotografia da autora
Fig. CAP.III-98
Pormenor do ádito das escadas de acesso às habitações do edifício do edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714; fotografia da autora
Fig. CAP.III-99 Lambril de um desenho de padrão da composição azulejar que antece do arco que demarca limite do ádito das escadas do pisos habitacionais do edifício do Largo do Rato nº 16-16 C/ Rua de S. Bento nº 712-714; fotografia da autora
CAPÍTULO IV - CONCLUSÕES
Folha A-7 do Apêndice Documental
Fig. CAP.IV-1
Telhas de canudo pintadas observáveis nas Rua de S. João nº 5, no Porto; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-2
Telhas de canudo pintadas visíveis na Rua Ferreira Borges, em Coimbra; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-3
Edifício sito na Rua de Sant’ Ana à Lapa com as suas escadas obedecendo ao regulamento de 1902; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-4 –A água furtada edifício sito na Rua de Sant’ Ana à Lapa tem toda a sua frontaria revestida de zinco lavrado; fotografia da autora Fig. CAP.IV-5
Cobertura de um edifício de rendimento no gaveto da Rua dos Industriais com a Avenida D. Carlos I, Imitando a moda portuense; fotografia da autora
Fig. CAP.IV- 6
As casas de banho, ultimo reduto no exterior da fachada nas traseiras do edifício para o Alto do Longo; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-7
As casas de banho, ultimo reduto no exterior da fachada na Rua Álvaro Coutinho, fotografia da autora
Fig. CAP.IV-8
As casas de banho, ultimo reduto no exterior da fachada na Rua de Santa Bárbara; pasta fotografia da autora
Fig. CAP.IV-9
Tubagem visível no tardoz do edifício Travessa do Noronha 5-5 A/ Rua Gustavo Matos Sequeira nº 40, demonstrativo de um saneamento básico pensado de raiz; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-10
Dobradiças de leme soltas das portas visíveis no edifício n 17-23 da Rua S. João da Mata; fotografia da autora
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viii | ÍNDICE ICONOGRÁFICO
Fig. CAP.IV-11
Dobradiças de leme encastradas nas portas do edifício neoclássico nº 17-23 da Rua S. João da Mata, fotografia da autora
Fig. CAP.IV-12
Balaustres feitos de pasta de tijolo, do edifício sito na Praça das Flores nº 31; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-13
Interrupção da balaustrada para construir uma janela de sacada na Rua do Noronha / Travessa do Noronha 1; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-14
“Trapeira de zinco” ainda em telhados de tipo mouriscado no do edifício do Largo do Conde de Pombeiro/ Rua de Francisco Lázaro, em Lisboa; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-15
Superfície de zinco ondulada de uma mansarda e as suas esbeltas águas furtadas, Rua Cecílio de Sousa nº 3-5; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-16
Interiores da Rua Gustavo Matos Sequeira nº 33; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-17
Edifício da Rua do Arco a São Mamede nº 22; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-18
Caixas de correio no ádito do edifício da Rua do Meio à Lapa nº 37 A; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-19
Belíssimas varandas tipicamente gaioleiras existentes no alçado posterior do edifício de gaveto Rua Gustavo Matos Sequeira nº 25 / Travessa do Noronha; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-20
Varandas tipicamente gaioleiras existentes nas traseiras de um edifício com vista para a Rua de S. Bento; fotografia da autora
Fig. CAP.IV-21
A colocação das escadas no edifício tripartido da Rua Luz Soriano nº 75, prospecto de 1867; in CARITA, Hélder, Bairro Alto, Tipologias e Modos Arquitectónicos, Câmara Municipal de Lisboa, 2ª edição, 1994; p.130)
Fig. CAP.IV-22
Casa Schrõder 1923-1924, da autoria de Gerrit Thomas Rietveld; in CURTIS, William J. R.; Modern Architecture since 1900; Phaidon; 3rd. edition; 1996; p. 157
Fig. CAP.IV-23
Edifício da Rua Correia Garção / Rua de S. Bento / Calçada da Estrela, resolução das escadas do nº 101; desenho da autora
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Report "O edifício de rendimento em Lisboa de 1758 ao dealbar do Estado Novo: da Cotovia ao Rato"