Nota de Aula de Lógica - Alaor Caffé [TEXTO]

March 20, 2018 | Author: Wagner Amorim Madoz | Category: Contradiction, Logic, Reason, Science, Time


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DE TERCEIRO EXCLUÍDO E DE RAZÃO SUFICIENTE Bi*'* . DE CONTRADIÇÃO.Os PRINCÍPIOS LÓGICOS DE IDENTIDADE. Os princípios lógicos. é aquilo que nos dá a conhecer os conceitos. como lei geral do ser. é aquilo pelo que alguma coisa existe ou é conhecida. 2) princípio de causalidade. Princípio. a par de sua natureza estruturadora do pensamento formal.com 3 formas derivadas (principais): 1 ] princípio de substância. como na ontológica. segundo Aristóteles. [ b ] princípio de razão suficiente. 4. são dirigentes do conhecimento. 4] princípio de capacidade. e. 3) princípio das leis. necessárias. numa articulação ideal correta ou válida. é aquilo pelo que a coisa existe.Alaôr Caffé Alves 4. a priori.também chamado de não-contradição.1.1. Segundo Leibniz. os princípios racionais fundamentais são: (a) Princípio de identidade. bem refletidos. o princípio de identidade formula-se assim: "toda coisa (ser) é idênti150 . que se formulam com base num certo número de princípios. Os princípios estruturais da razão e dirigentes do conhecimento são verdades evidentes por si mesmas. no sentido ontológico. tanto na ordem lógica. 3) princípio do terceiro equivalente. absolutamente primeiras e indemonstráveis.com 4 formas derivadas: 1) princípio de contradição. portanto. de alcance universal.1. PRINCÍPIO DE IDENTIDADE (a) Sob o ponto de vista ontológico. as proposições e as inferências de modo coerente. 2) princípio do terceiro excluído. "Princípio. no sentido lógico. PRINCÍPIOS DA RAZÃO A razão é a faculdade de descobrir as relações necessárias das coisas [leis]. que são a condição de qualquer verdade e até de qualquer afirmação. Segundo esse princípio. duas proposições contraditórias não podem ser verdadeiras nem falsas ao mesmo tempo. Há sempre identidade entre o todo e a soma de suas partes. Derivados Imediatos do Princípio de Identidade 4. como ainda iremos ven dá-se entre proposições universais opostas: "todo homem é sábio" e "todo homem não é sábio". (b) Sob o ponto de vista lógico. é ela mesma.Alaôr Ca/fé Alves ca a si mesma". e enquanto é não pode ser outra I11P que não ela mesma. Exemplo: o homem é animal racional (homem = animal racional) 4. ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto ou relação. De outro modo: o conceito-sujeito é total ou parcialmente idêntico ao conceitopredicado. Uma coisa é o que é. Esta relação. simultaneamente e sob o mesmo aspecto ou relação".1. Entretanto. Isto quer dizer que se uma é verdadeira a outra é necessariamente falsa. o que não é.existe necessariamente uma identidade. Esse l||ff princípio decorre imediatamente do princípio de identidade. falso. Exemplo que fere o princípio: "o homem é animal e algum homem não é animal" (afirmação de uma conjunção de duas proposições opostas contraditórias). Exemplo: uma árvore é uma árvore (é idêntica a si mesma). e vice-versa.0 Princípio de Contradição O princípio de contradição-também chamado "não-contradição".1. O que é.1. a Lógica das oposições apresenta uma forma "média"de aplicação. para os objetos lógicos.1.1. Ela não pode ser e não ser ela mesma. Ou ainda: uma mesma proposição não pode ser simultaneamente verdadeira e falsa. como lei geral do pensamento. o princípio formula-se assim: entre uma ideia e todos os seus constituintes .1. "a" é "a". (b) do ponto de vista lógico: o mesmo predicado não pode ser afirmado e negado do mesmo sujeito.elementos de sua compreensão . O que é verdadeiro não pode ser. pois dado o fJ*'V fato de que uma coisa é. não é. numa relação de oposição cujo nome é "contrariedade" (entre proposições contrárias e não contraditórias). é.1. ao mesmo tempo.formulase assim: (a) do ponto de vista ontológico: "nenhuma coisa é e não é. Vê-se claramente que estas duas 151 . Isto porque esta outra pode ser também falsa. acima aduzidas. podemos concluir logicamente. cuja relação de oposição é "máxima". mas também pela guan-tidade (universais e particulares]. Quer dizer: as duas proposições (contrárias] podem coincidir na falsidade. quando tratarmos das regras das oposições]. não temos certeza lógica de que a outra seja verdadeira.1.1. que as duas não podem ser falsas ao mesmo tempo. na relação de oposição "mínima" de subcontrariedade. mas não na verdade. visto que existem homens sábios. E mais. não podemos tirar que seja necessariamente verdadeiro que "todo homem não é sábio" (como de fato é falso. isto é. a outra é necessariamente falsa. entre proposições opostas particulares (subcontrárias]. Exemplo: "todo homem é sábio" e "algum homem não é sábio". De duas proposições subcontrárias. mas podem ser simultaneamente verdadeiras. embora nem todos o sejam]. sendo uma verdadeira. do ponto de vista lógico. embora utilizada acima para exemplificar intuitivamente a relação de contradição. a outra é necessariamente falsa. De fato. do ponto de vista formal. que não podem ser verdadeiras. as duas não podem ser falsas ao mesmo tempo (veremos isso com mais clareza mais adiante.1. 4. além das proposições contrárias. Se uma verdadeira. existem as proposições subcontrárias . A incompatibilidade é total. Note-se. não pode ser 152 .oposição entre duas proposições particulares: "algum homem é justo" e "algum homem não é justo".Alaôr Caffé Alves proposições não podem ser verdadeiras simultaneamente. sendo uma falsa. a outra é necessariamente verdadeira: quer dizer. Neste caso. para proposições que são opostas não só pela qualidade (afirmativas e negativas]. nem todos os homens são efetivamente sábios].1. tira-se que a outra é necessa-riamente verdadeira. Neste caso. mas podem ser falsas ao mesmo tempo. que o princípio de contradição é inteiramente válido para proposições contraditórias.1. como mais adiante vamos ver. Limites do Princípio de Contradição É também preciso notar que esta questão deverá ficar estritamente no nível formal. Mas. se podemos entender que é falso que "todo homem é sábio" (do ponto de vista material. se partirmos da falsidade de uma. se uma é falsa. pois a materialidade. A Lógica não alcança a materialidade do mundo. pergunta-se: qual é a verdadeira e qual é a falsa? Louvados simplesmente no princípio lógico de contradição não poderemos definir essa questão. no caso a Astronomia.1. pela aplicação do princípio de contradição. se enunciamos as proposições "os planetas não são habitados" e "alguns planetas são habitados". por impensável. que uma delas é verdadeira e a outra é falsa. De modo contrário. Mas. mas não nos permite saber sobre a realidade mesma. podemos saber que de duas proposições contraditórias (não meramente contrárias). a respeito de uma determinada proposição. podemos dizer que ela é verdadeira ou falsa. indo para além do pensamento. Para obtermos a definição de qual é a verdadeira e qual é a falsa. saber qual é efetivamente a verdadeira e qual é a falsa. a hipótese de que seja ao mesmo tempo verdadeira e falsa. Princípio do Terceiro Excluído O princípio do terceiro excluído. estaremos indo além dos limites da Lógica. do ponto de vista (a) ontológico formula-se assim: "uma coisa é ou não é. portanto é um absurdo. Se assim fizermos. Por isso. sem podermos aventurar-nos a dizer qual delas é efetivamente a verdadeira ou a falsa. excluindo. Assim. ferindo o princípio de contradição. sabemos de antemão. somente pela força do pensamento. uma é verdadeira e a outra é falsa e vice-versa. Por exemplo. Quer dizer: se for verdade que "os planetas não são habitados". Ou uma coisa existe ou não existe. isto é. considerado em si mesmo. será necessariamente falso que "os planetas não são habitados". Isto é impensável.Pensamento Formal e Argumenta considerada logicamente. a qual trata do pensamento em sua coerência interna e não em sua adequação com os objetos do mundo. exclui-se a possibilidade de que possa existir e ao mesmo tempo não existir. se for verdadeiro que "alguns planetas são habitados".2.1. Porém. Do ponto de vista da 153 . tão só com a força do pensamento lógico.1. não há termo médio". é necessariamente falso que "alguns planetas são habitados". 4.LÓGICA . uma vez que a Lógica trata do pensamento ern sua relação de coerência consigo mesmo e não na sua relação de adequação com a realidade. devemos nos socorrer da ciência que estuda os objetos pertinentes.princípio de alternativa lógica . podemos apenas chegar àquela conclusão puramente formal. não podemos. necessariamente.complementar do princípio de contradição. Do ponto de vista (b] lógico. que seja e ao mesmo tempo não seja. A Lógica permite-nos conhecer até o meio do caminho. o sangue humano pode í ser vermelho (1. então uma sendo verdadeira. e vice-versa. a excluída necessariamente]. isto é. então. existem as hipóteses de duas proposições opostas poderem ser simultaneamente verdadeiras [subcontrariedade] ou falsas (contrariedade]. O princípio do terceiro excluído completa. Pelo princípio do terceiro excluído. por isso. Exclui-se esta terceira hipótese. visto que é também excluída a terceira hipótese. mas não pode ser ao mesmo tempo vermelho e não vermelho. se uma é verdadeira. Assim.hipótese. Quando examinarmos o quadro das oposições. temos que duas proposições opostas não podem ser verdadeiras ao mesmos tempo. as subcontrárias são as de menor força opositiva e. não sabemos se podem ser falsas ao mesmo tempo. Assim. Assim. é impossível logicamente. isto é. por exemplo: "o sangue humano ou é vermelho ou não é. estas questões ficarão bem mais claras. excluímos também a possibilidade de que duas proposi ções opostas possam ser falsas ao mesmo tempo. Mediante o princípio do tercei ro excluído. temos. a última hipótese é impensável.na relação de contradição (máxima) . nem na falsidade. Com a aplicação do princí pio de contradição. a outra é falsa. que. as contrárias são de média força. o princí pio de contradição.Alaôr Caffé Alves predicação lógica. Convidamos o leitor a voltar a este ponto após o exame daquele quadro. são sempre incompatíveis tanto na verdade quanto na falsidade. de certo modo. mais à frente. como veremos com maior detalhe mais adiante. somente. tornando-o absoluto. se não |j|í| podem ser verdadeiras e falsas ao mesmo tempo. duas proposições opostas . não podem ser simultaneamente verdadeiras ou falsas. Não podem coincidir na verdade. por isso. são sempre incompatíveis apenas na falsidade. as proposições contraditórias são mais fortes e.hipótese]. posto que são sempre incompatíveis apenas na verdade e. sob a mes-' ma relação (3. porém. finalmente. não pode ele ao mesmo tempo e sob a mesma relação ser vermelho e não ser vermelho". Nesse sentido. 154 «l .hipótese]. não existe tal hipótese. e vice-versa. ou seja. serem coincidentes na verdade ou na falsidade. pêlos princípios de contradição e do terceiro excluído.não podem ser verdadeiras e falsas ao mesmo tempo. a outra é necessariamente falsa. exclui-se apenas a hipótese de que duas proposições opostas possam ser simultaneamente verdadeiras ou falsas. ou não ser vermelho (2. Entretanto. Vê-se. por isso mesmo. são as duas principais di|. Princípio de Capacidade O princípio de capacidade formula-se assim: "tudo o que contém uma coisa contém o seu conteúdo". 155 .1. Extensão e compreensão. Paulo é amigo de Maria" (!). visto que ele é homem (Sócrates é um ser racional). se a nota de racional está contida na ideia de homem |i(o homem é animal racional). está contida na ideia geral de homem (ele é um homem). Entretanto.1.2.1. PRINCÍPIO DE RAZÃO SUFICIENTE Formula-se assim: "tudo tem sua razão (suficiente) de ser". Ou. está contida. como por exemplo: "Paulo é amigo de João.1.Pensamento Formal e Argumentação 4. uma razão determinante". É a identidade percebida mediante o discurso. Exemplo: A ideia de Sócrates que.1. 4. de modo mediato.LÓGICA . então A = B). pelo lado da compreensão.4.1.1. e C = B. É óbvio que esta relação não é transitiva. então. pelo menos. Princípio do Terceiro Equivalente O princípio do terceiro equivalente formula-se assim: "duas coisas idênticas a uma terceira são idênticas entre si". esta relação tem de ser de identidade plena e transitiva. Não será válida em determinadas relações diádicas. então. já abordadas antes. Maria é amiga de João. então "A" e "B" são idênticos entre si (se A = C. ela estará também contida na ideia de jfSócrates. Se "A" é idêntico a "C" e "B" é idêntico a "C". 4.. como por exemplo: "Mário é irmão de Paulo e Paulo é irmão de Joana.mensões lógico-estruturais do conceito que deverão ser analisadas fteom maior verticalidade mais adiante.3. pois duas pessoas amigas de uma terceira não significa que sejam amigas entre si. g sob o ponto de vista da extensão. na ideia mais geral ainda de animal (o homem é um dos animais). Mário é irmão de Joana". "Nada acontece que não tenha uma causa ou.. indo indefinidamente até a causa primeira que. de certo modo. sua explicação seria encontrada em si mesma. visto que. Ora. Ele se lança à pesquisa para saber sobre a causa do fenómeno precisamente porque sabe. coexistem umas nas outras. Se não se concede a essa argumentação. contigente. diante de um fenómeno desconhecido. Por esse motivo. "b" já estava.1. Com estas outras por sua vez repete-se o mesmo processo. Se uma coisa. nesse sentido.2. fatalmente ele decorre de outro fenómeno. Derivados Imediatos do Princípio de Razão Suficiente 4. 156 . é importantíssimo para a investigação científica. de antemão. pois o cientista. um princípio. Princípio de Causalidade Toda coisa existente poderia não existir. então teremos que admitir que "b" não tem antecedente algum. Se um fenómeno ocorre. teríamos de conceber que o fenómeno vem do nada.1. tem em si a razão de ser: Deus. que dito fenómeno deve necessariamente ter uma causa que determinou seu aparecimento. o nada. Mas do nada. é porque alguma coisa de "a" persiste em "b!!. Todas as coisas. em "a". aprioristicamente. sendo. isto é. um antecedente que explica o fenómeno.2. embora possa não conhecê-la ainda. Não é concebível pela razão que algo ocorra a partir do nada. Isto decorre do fato de não podermos pensar o vazio. quando aplicado aos dados de experiência (segundo Kant). A razão tem horror ao vazio.1.Alaôr Caffé Alves 4. de alguma forma. portanto. por si mesma. move-se a explicá-lo em virtude de saber. se assim não fosse. ainda que não a conheça especificamente. Se o vermelho do fruto maduro ocorre. de algum modo.1. porque tem sua razão de ser fora de si mesma. ele teria vindo do nada. os filósofos gregos clássicos consideravam que as coisas tinham sempre um antecedente. nada se tira. existisse absolutamente (necessariamente). Se "b" é o resultado da transformação de "a". segundo a ontologia clássica. que há uma causa determinante. é porque já estava. Este princípio. Há sempre uma razão. todas as coisas no mundo não se explicam por si mesmas e sim por outras que são sua razão suficiente [causa] de ser. no fruto verde. ao nada. isto é. o que repugna à razão.1. LÓGICA . Todo adjetivo supõe um substantivo que o suporte. não há movimento sem objeto movido". em circunstâncias determinadas. Essa qualidade não pode ser ituída senão na forma de uma certa extensão do espaço.2. agora de caráter racionalista. mas sim que. temos a certeza (nacionalismo) ou. não se pode dizer que a regularidade de determinada relação leva-nos apenas a crer na probabilidade de que novamente possa acontecer (como na formulação meramente psicológica]. Princípio de Substância Seu enunciado é: "toda qualidade (todo atributo). o atributo (qualidade) "vermelho" supõe sempre uma substância (que sub-está]. Neste caso. visto que não podemos intuir o "vermelho". se plantamos sementes de milho. Sua formulação pode assumir a perspectiva psicologista. outra perspectiva. mesmo que seja uma mancha indefinida no espaço.1. O princípio das leis fundamenta-se na regularidade do universo. todo predicado supõe um sujeito. Do ponto de vista estritamente lógico. pela qual temos a crença (algo psicológico) de que as coisas que acontecem regularmente têm uma grande probabilidade de novamente acontecerem [Hume]. então. ou. Logo: "não há qualidade sem objeto qualifica-do. Seu enunciado é: "nas mesmas circunstâncias. isto é. o princípio refere-se à essência do fenómeno. "toda mudança supõe algo durável (algo que muda]". as mesmas causas produzem sempre os mesmos efeitos". 157 . Essa subs-ância é a razão suficiente para a existência do vermelho. algo (sujeito) que suporta o vermelho. não há ação sem agente.1. de origem empirista. Assim.2. sem que "algo" (a substância] seja vermelho.Pensamento Formal e Argumentação 41. efeti-vamente e por natureza própria. Este princípio decorre do determinismo e da regularidade da natureza e é a condição de todo raciocínio indutivo. Princípio das Leis Este princípio está diretamente ligado ao de causalidade. permitindo aos cientistas um razoável espaço de certeza quanto aos fenómenos que ocorrem regularmente no mundo. ela sempre ocorrerá.2. não há modificação sem objeto modificado. Se enunciamos que "isto é vermelho". toda maneira de ser supõe uma substância".3. algo que é vermelho. 41. [b] No plano ob/etivo: concebemo-los como aplicáveis a todo os fenómenos existentes ou apenas possíveis. já implica. Há. uma compreensão da contradição como tal. NECESSIDADE (a) No plano subjetivcr. e por isso não pode existir no mundo um objeto dessa natureza. do ponto de vista da Filosofia clássica. Disto resulta a concordância necessária entre o ser e o pensar. uma aporia evidente. têm três caracteres que os distinguem nitidamente: >/ 4.2. que faz com que não possamos admitir como possível no ser aquilo que reconhecemos como contraditório no pensar.2. 158 l . Sem eles a própria faculdade de conhecer inexiste. contudo. "O círculo quadrado" é impensável porque implica uma contradição evidente.2. não deve existir na realidade.1. •f • • " 4. no que respeita a este exemplo. neste caso. São uma exigência absoluta da inteligência e são indispensáveis a qualquer operação intelectual. pois constituem o fundamento da razão mesma. de certo modo. são leis do pensamento. Se algo é absurdo [impensável] para o pensamento. (b) No plano objetivo: são leis do pensamento porque são primeiramente leis do ser. CARACTERES DOS PRINCÍPIOS RACIONAIS Os princípios racionais.2. qual seja a de que tal objeto não pode ser pensado.Alaôr Caffé Alves ao menos. um pensamento a respeito e uma determinação mínima. e que por isso mesmo já é entendida como impossível de ser pensada no seu conteúdo. uma grande probabilidade (empirismo) de colhermos milho e não outro cereal. 4. UNIVERSALIDADE (a) No plano subjetivo: existem em todas as inteligências humanas. Há. filósofos que entendem que o simples fato de existir. LÓGICA DIALÉTICA Aqui precisamos destacar algo importante. não há contradição. A unidade de tempo chamada "momento" é como o ponto no espaço da geometria. algo intemporal. Ora. em certo sentido. e 159 . Quando dizemos que algo não pode ser e não-ser .LÓGICA . depois é que deduzimos as suas propriedades. segue-se que são. embora no plano da demonstração tenhamos que utilizar o tempo para deduzi-las.e sob a mesma relação. Exemplo: as propriedades do triângulo têm. CARÁTER "A PRIORI" Sendo a base necessária. Ele é construído como P um todo. A anterioridade lógica é uma anterioridade transcendental [Q não transcendente. perfazendo uma forma de aplicação ideal. Viu-se que o princípio de contradição depura. fora da experiência possível]. Assim. anteriores (lo-ÏËE qicamente] a todo conhecimento propriamente dito. f -4.3. a Filosofia clássica. Se não há contradição. não há movimento e se não há movimento. mas elas são dadas logicamente a um só tempo. iiú no tempo. Neste caso. não existe história. no seu interior não corre o tempo. excluímos a variável tempo. Por isso.Pensamento Formal e Argumentação i 4. no caso. a própria condição de toda afirmação e de todo conhecimento. pode-se dizer que o momento indica algo fora do tempo. em ' relação a esse polígono. é dizer "no mesmo momento". se não há tempo. não existe dinâmica. o tempo. demonstrativamente. vale dizer anterio-ÏÏ|l rés a toda experiência. isto é. O momento também não constitui dentro de s/um tempo.2. A palavra "tempo" é aqui enunciada precisamente para excluí-lo. Como este ponto não tem (idealmente concebido] espessura ou qualquer outra dimensão.ao mesmo tempo. isto é. os princípios lógicos da Lógica Clássica estão fora do tempo Q devem ser aplicados a coisas ideais que são igualmente intem-porais. é uma eternidade pontual. ele está num espaço ideal. de sua noção intuitiva. como os conceitos pensados por nós. ele não está propriamente no espaço real. de uma só vez.3. uma "anterioridade lógica"[fora do tempo]. onde o tempo não comparece. Não construímos o triângulo a par^: tir da soma ou acréscimo de suas propriedades. Dizer "ao mesmo tempo". indispensável para que -111 o triângulo seja triângulo. especialmente no que respeita à Lógica Dialética. quando. expulsa o movimento das coisas pensadas. até certo ponto. Segundo a maioria desses pensadores dialéticos. estão prenhes de movimento e de historicidade. Nesse sentido. a qual pressupõe a existência da contradição no âmago mesmo do pensamento. de irracionalidade.. dinâmico e processual '. numa relação dialética racional/irracional. isto é. se ela não estiver de algum modo polarizada com o conteúdo. sua aplicação será bastante res-trita e funcionalmente ligada apenas às expressões linguísticas. dimensionadas e construí- . ou. É o que se denominou de "salto dialético"da quantidade em qualidade. Esse pulsar é dialé-tico e ascendente. repudiada pelo pensador que propugna pela Lógica Dialética. a contradição. prescindindo de referências com o mundo material (conteúdo) para alcançar a coerência consigo mesmo. que o concretizam. se assim for.Alaôr Caffé Alves * por essa razão. 160 . Ora. do pensamento só pode ser obtido mediante a sua polarização com of mundo da realidade material. Eis porque essa lógica (formal) é. levando o espírito a avançar os seus diferentes momentos. a Lógica não pode ser puramente formal. a pura forma (lógica) não nos pode dar. Exemplo: uma via expressa é construída. temos a racionalidade reaf. entrando em contradição com a forma que é mais estática e conservadora. as proposições e as inferências. segundo a perspectiva dialética. o pensamento segundo sua natureza "pura"será sempre considerado sob a forma estrutural. estática e sincrônica. Nesse plano. O enfoque diacrônico. de modo rápido e cómodo. é obrigado a trabalhar sem contradições. Por isso. no meio urbano. onde o conteúdo (a matéria do pensamento) se expande com o tempo e com a história. excluindo. porém. abre-se um tempo de crise. para facilitar o fluxo do tráfego de veículos. em última instância. sem história. o pensamento trabalha. No plano formal. o conteúdo entra em contradição com a forma tentando ultrapassá-la. Daí vem o choque entre o lógico e o histórico. o pensamento joga somente com suas próprias forças. com o mundo real. ou melhor. naquele processo. Aqui. a Lógica somente será fecunda se polarizar a forma e o conteúdo do pensamento numa relação dinâmica e dialética. a história e a evolução do pensamento e do conhecimento. os conceitos. Quando temos o relativo ajuste entre forma e conteúdo. por si mesma. a forma (via expressa) e o conteúdo (o fluxo do tráfego) são concebidos. conforme o seu conteúdo e processo de j ' formação e desenvolvimento. que deverá ser solucionada com uma nova forma que dê conta desse novo conteúdo expandido. Aquela relação histórica "capital e trabalho". que não mais dá conta da referida situação produtiva (conteúdo). alcançamos uma nova racionalidade. 161 . telecomunicações. robótica. abre-se uma crise e a irracionalidade toma conta do processo. exigindo novas formas qualitativas de transportes para devolver. Os meios de produção da vida material e espiritual dos homens (conteúdo) ficaram tão avançados e sofisticados (informática.) que a estrutura e organização sócio-política (forma) do sistema. etc. em razão do desemprego estrutural [ n ã o meramente conjuntural) que assola o mundo inteiro. es-sencial para a manutenção da lógica do sistema capitalista. Nesse momento. desta vez da história: as estruturas medievais de organização social e política [forma] suportam determinado conteúdo representado pelo nível alcançado pelas forças produtivas daquela época. divisão social do trabalho. dando passo ao sistema mercantil-manufatureiro de produção. também nos encontramos com uma situação de crise.Pensamento Formal e Argumentação dos para racionalmente dar conta dessa situação. no limiar do novo milénio. Com : o desenvolvimento dessas forças produtivas (conteúdo). satélites artificiais. isto é. mediante a introdução de novas técnicas produtivas (novos processos de produção da vida material. Nesse momento. Novo exemplo histórico: nos dias de hoje. especialmente no processo chamado "globalização". num momento superior. Com o tempo. pautado na relação "capital e trabalho". O sistema capitalista de produção está vendo as suas bases organizacionais (forma) fugir-lhes dos pés. abre-se uma profunda contradição com aquela organização social e política (forma). passa a ficar profundamente abalada e comprometida. há o aumento do tráfego (conteúdo) pela entrada de grande quantidade de novos veículos na referida via expressa (forma). Passa a haver uma fase de irracionalidade e grande luta para alterar a forma social e política medieval no sentido de instaurar novo regime de organização entre os homens. não está mais respondendo às exigências do mercado de trabalho. Nesse novo patamar histórico. devendo haver.LÓGICA . dentro de um certo tempo histórico. profundas alterações que vão descaracterizar o referido sistema. impõe-se um novo patamar de racionalidade organizativa entre os homens. Outro exemplo. a racionalidade ao fluxo de veículos urbanos. Aí tivemos uma nova forma de organização sócio-política para um novo conteúdo econômico-social. etc. o sistema burguês de produção. dando passo a uma nova organização entre os homens. a uma nova "forma" para atender a um novo "conteúdo".). de irracionalidade. por isso.algumas linhas definidas para qualificar uma pessoa como "velha". não há outra forma mais adequada senão exercer a vontade para estipular. Não existe. que. é postulado pela decisão a respeito. Por exemplo: quando podemos dizer que uma pessoa é velha? O homem idoso. não há dúvida que é velho. Diríamos. Aquilo que não fosse demonstrável.especialmente a partir do nacionalismo de Descartes.4. nenhuma referência "natural" ou ontológica que nos dê uma certeza apodítica em relação ao conceito de "velho". existe uma zona de penumbra em que não temos certeza da aplicação do termo "velho". cheio de energia e vida. as condições de uma lógica da argumentação. a deliberação e a discussão ou as manifestações de dúvidas ou incertezas foram vistas com desconfiança. Nesta zona. e. baseava-se em ideias claras e distintas capazes de impor-seao intelecto com a força incoercível da evidência. a exemplo do raciocínio matemático. porém em outra dimensão. LÓGICA DA ARGUMENTAÇÃO Por outro lado. 162 . à decisão. muito usada na teoria das decisões. então. entre esses dois extremos claros e distintos. Nesse sentido. não há dúvida que não é velho. Neste caso. uma nítida contraposição entre a Teoria da Demonstração. como produtos de um conhecimento imperfeito. não se pode oferecer critérios lógicos que nos permitam fazer distinções claras e distintas. A razão sob essa concepção. vinculada à vontade. carecia da evidência imposta pelo raciocínio formal. e a Teoria da Argumentação. dando-nos a impressão de atingir verdades absolutas e eternas. por exemplo. pois. portanto. que velho para tais i ou tais efeitos será aquele que tiver mais de 75 anos. Um jovem viçoso. passam a ser o modelo desse tipo de lógica.. nos termos desse modelo. especialmente das decisões jurídicas. do ponto de vista subjetivo. que deveria ser evitado ou não valorizado. aquele mesmo fundamento dialético perfor-ma. conforme o modelo da geometria. continuando a nossa preocupação com a dialética. ficaria a mercê da necessidade de ser permanentemente corrigido ou da convenção estipulatória a respeito dos limites significativos possíveis. A matemática fornecia o modelo do co-nhecimento legítimo e verdadeiro. Contudo.4. ao final. vinculada à inteligência forma/(Lógica Formal). Há. O critério da idade.decidir. arcado pelo peso da idade. A Teoria da Demonstração desenvolveu-se sob a influência da matemática do século XVII. de cará-ter analítico. reduzia-se a noção de prova à prova formal. Esta prova seria capaz de se impor a todos. de maneira coercitiva. levando-se em conta não só o caráter e as habilidades dos retores ou emissores dos discursos.especialmente pêlos neo-positivistas. A própria Filosofia que não pudesse justificar suas reflexões com demonstrações exaustivas e indiscutíveis. na Filosofia. buscando-se outros critérios práticos ou irracionais de avaliação do mundo e das coisas da cultura. uma lógica científica. neutro.grandes setores da cultura humana das formas de raciocínio tidas por legítimas. Em meados do presente século. Reformulam-se as concepções da retórica clássica desenvolvida pêlos antigos gregos. no Direito. O que não podia ser demonstrado conforme a razão analítica. ou se adotavam as formas de conhecimento não demonstrado segundo a razão formalizada. ou se aderia ao racionalis-mo. foram séculos de nacionalismo fortalecido pela ideia de que a prova demonstrativa e o cálculo eram as únicas manifestações legítimas da razão. ao 163 . Nesse sentido. expressado com uma linguagem lógica formalizada. Nessa direcão seguiu o desenvolvimento da Lógica Formal moderna. passou a ser condenada pêlos partidários do formalismo lógico. Fazia-se uma dupla emergência na abordagem do mundo: ou se adotava uma linguagem lógico-formal rigorosa. de modo impessoal. uma vez que aqueles setores não cabiam no modo de demonstração do tipo matemático. ou se aderia ao ir-racionalismo. era rejeitado simplesmente como irracional. ou. por Chaim Perelman. dentre os quais se destaca especialmente Aristóteles que. com base nas formas de raciocínio utilizadas pela Matemática. O dualismo racional/irracional demarcava nitidamente os segmentos da cultura humana. que permitisse certezas absolutas. cujos modelos paradigmáticos eram as matemáticas e as ciências físicas. como nas Ciências Sociais. pelo modo formal do pensamento. mas também e principalmente as características dos receptores desses discursos.Pensamento Formal e Argumentação Assim. configurado dentro de um quadro de imprecisões onde a irracionalidade e a corre-cão seriam constantes. essa maneira de conceber a prova levou a serem excluídos. demonstradas apoditicamente. no dizer técnico. Assim. etc. da qual não se poderia divergir pela vontade. investigações levadas a efeito no Centro Nacional Belga de Pesquisas de Lógica. mergulhada nas controvérsias"ë incertezas do pensamento provável.LÓGICA . sob novas bases. iniciaram um movimento de revalorização do significado e do uso da retórica. dos diferentes auditórios a quem tais discursos se endereçam. Naturalmente. escapando da razão absoluta. na História. a linguagem literária. O âmbito da argumentação retórica seria o domínio do provável. podendo ser pesquisada em sua regular produção material. do razoável e do pre164 . ï. eivada de ambiguidade e de vagueza. f suas Está.claro que a evidência ou a clareza e a distinção dos conceitos não são as únicas características da razão. nas partes finais deste livro. como faz a Retórica. para obter bases verossímeis. adequada à apreensão do concreto. onde o homem concreto não comparece. de outro. segundo formas conotativas. com seus interesses e deliberações. do plausível. defendendo a necessidade de uma Teoria da Argumentação fundada em novas bases. mesmo antecipadamente. A linguagem formal. A linguagem ordinária. Vamos. com ênfase na caracterização do auditório. do circunstancial e do histórico. como algo rebelde à completa formalização. denominada nova retórica.Alaôr Caffé Alves lado das provas analíticas fundadas em demonstrações lógicas para obter a certeza. linha. como inteiramente formalizada nos termos da matemática ou da lógica contemporânea. é rigorosamente lógica. podemos. A partir dessa c o l o c a ç ã o . A linguagem é compreendida. bem como a linguagem das ciências sociais e da Filosofia. aparece o homem histórico e concreto. e. no estilo retórico. abordar mais detalhadamente esse tipo aberto de argumentação. A argumentação retórica e a díalética são instrumentos destinados a obter a persuasão. mediante argumentações e discursos dialéticos. É a linguagem lógica do possível. do verossímil. caracterizados por oposição dinâmica de opiniões divergentes. posto que existem outros graus de adesão da mente às diferentes teses que se apresentam sob a forma de opiniões razoáveis. É a linguagem da argumentação. caracterizar alguns pontos comparativos entre aquelas duas posições: a demonstrativa e a argumentativa. de um lado. visto ser de grande valia para a compreensão das ciências humanas e particularmente do processo operativo do direito. ou "verdades contingentes". A escola de Perelman e seus seguidores desenvolvem e atualizam as posturas de Aristóteles. por outro lado. abstratos e denotativos. estruturada com elementos simples sob a forma de signos convencionais. voltada para as dimensões sintéticas. como a linguagem ordinária comum. propugnava por outras formas de apresentar provas. Nessa . é voltada para as dimensões da semântica. da justificação ou da legitimação pelo valor e pelo peso das razões postas sob a forma de opiniões verossímeis ou prováveis. caracterizada por ser universal e. a Lógica Formal jamais poderá orientar a ação ética dos homens. Como já dissemos. a teoria da argumentação retórica. a única forma de justificar os valores e os atos morais dos homens. da História e da filosofia. neutra e monológica . pressupondo sempre a multiplicidade dos sujeitos envolvidos num processo essencialmente dialógico. voltaremos a essa questão para abordá-la de forma rnais extensa e mais profunda. portanto. precisamente o que escapa à certeza do cálculo lógico e da prova indiscutível ou formal. E é isso exatamente o que caracteriza e constitui o discurso das ciências humanas e sociais. impessoal. devendo ser. o que induz a não deixar margem para fundamentar a responsabilidade. não deixa espaço para o exercício da liberdade. por isso. Vê-se claro que a Lógica Formal. por isso. ao contrário da Lógica Simbólica ou Matemática .supõe sempre o embate (dialético) de opiniões ou o confronto das ideologias e consciências no interior de situações e circunstâncias históricas determinadas e particulares. A Teoria da Argumentação.Pensamento Formal e Argumentação ferível. cuja natureza pressupõe a possibilidade de tomada de decisão racional e justificável. ao impor suas conclusões de modo necessário e impessoal.LÓGICA . ela não pode ser a lógica dominante nos assunto humanos. A argumentação retórica. 165 . Por consequência. é uma reflexão e uma formulação sistemática sobre a regularidade dos discursos concretos destinados à persuasão.
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