Mitologia Suméria

March 23, 2018 | Author: Jonas Leandro | Category: Sumer, Greek Mythology, Mesopotamia, Immortality, Flood Myth


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Mitologia SumériaA religião na Mesopotâmia Quando no alto o céu ainda não tinha nome, E em baixo a terra firme não tinha nome, Apsu, o primeiro, o progenitor, E Tiamat, a progenitora que todos concebeu, Juntaram numa só todas as suas águas [...]» (A Epopeia da Criação) Enuma Elish Os mitos da Mesopotâmia desempenham um papel fundador em todas as mitologias ocidentais. O primeiro relato do Dilúvio, na epopeia de Gilgamesh, assemelha-se muito à narrativa bíblica do mesmo acontecimento, e o Jardim do Éden foi muitas vezes situado na foz do Tigre e do Eufrates, a leste da Mesopotâmia, no lado em que o Sol nasce, no fim do mundo... Em acadiano, o termo edinu significa «planície» e, em sumério, edin significa a «terra fértil». Algumas tabuinhas sumérias mencionam um lugar paradisíaco perto de Dolimun, habitado pelos deuses e por um só homem, Utanapishtim, salvo, tal como Noé, do Dilúvio. Nas narrativas sobre os deuses e os heróis mesopotâmios, encontramos em forma germinal muitos dos acontecimentos relatados nos grandes textos da Grécia antiga. Tal como o seu nome indica, a Mesopotâmia é a terra «entre dois rios», e a água, elemento primordial, está sempre presente nos mitos da Suméria, da Babilônia e de Assur, as primeiras grandes civilizações do Ocidente. A civilização que nasce na Suméria, a mais antiga do mundo, forma-se sob a influência de um fator determinante: o caráter imprevisível do Tigre e do Eufrates, que ora enriquecem a planície com a sua lama fértil, ora a devastam, com as inundações terríveis que dizimam a população. Quando Adad, o deus da Tempestade, decide «abrir as comportas do céu», os estragos causados pelas águas podem adquirir um carácter dramático. A precariedade da vida dos povos instalados no vale explica porque desde cedo sentiram uma necessidade profunda de religiosidade. Ainda antes do aparecimento da civilização suméria, por volta de 5000 a.e.c., o centro de culto de Eridu era um local importante de peregrinação, e a maioria das cidades da Suméria desenvolveu-se em redor dos centros religiosos implantados entre os dois rios. Compreende-se assim que os mitos da Mesopotâmia sejam frequentemente marcados por esse ambiente aquático e por que razão, na cosmogonia suméria, tudo começa com a fusão entre as águas doces e a água do mar. Quase todos os deuses da Mesopotâmia são de origem suméria, à exceção de Marduk. No entanto, quando a Suméria é invadida, por volta de 2330 a.e.c., por Sargão I, soberano da cidade semita de Acádia, a nova civilização que se implanta conserva os deuses sumérios, mas dá-lhes outros nomes. Assim, Inanna torna-se Ishtar, An torna-se Anu e Enki passa a chamar-se Ea. Quanto a Marduk, a sua importância não pára de aumentar e, na Babilônia, o seu culto irá suplantar e, depois, englobar os grandes deuses da antiga Suméria e de Acádia. Os mitos sumérios mais antigos começaram a ser transmitidos pela tradição oral. Os três grandes textos cosmogónicos - o Poema de Atrahasis, a Epopeia da Criação (Enuma Elish) e o Mito de Erra - foram redigidos entre 1700 e 850 a.e.c. Quanto à Epopeia de Gilgamesh, ainda que a versão mais completa que possuímos date apenas do século VII a.e.c., os textos mais toma uma decisão terrível: «Tudo o que fizemos será destruído. «fonte de sabedoria.» É com estas palavras. «separando a nuvem do lodo». tal como Oceano e Cronos na mitologia grega. numa grande algazarra. e. a extensão infinita das águas doces. parecido com ele. furacões. a fértil e a infértil. um dos . a Mãe original.c.o mar -.c. sobre o corpo de Apsu.» Em seguida. o mais aterradores que se possa imaginar: águias e dragões. mas mais sábio e mais forte. um petrel. a inteligência luminosa». que marcam os limites entre o céu e a terra.antigos em sumério que relatam a sua história remontam a 2100 a. engendra Enki.. com a esposa Damkina.e. resolve suprimi-los. que começa o relato babilônico da Criação. um leão gigante e serpentes hediondas com dentes venenosos. Estes primeiros deuses assim criados representavam os diversos aspectos do mundo físico. Em seguida. A Criação: «Enuma Elish. Quando estas duas águas. Então. Mas quando Enki. quando abria os olhos saíam deles grandes luzes. conspira com os outros deuses e molda-lhes armas. era poderoso desde o início.» Esta é constituída monstros. que evocava a vitalidade da natureza. e o relato baseia-se num rei histórico que reinou em Uruk por volta de 2650 a. ao conjunto dos deuses menores: os Igigi e os Anunnaki. serpentes gigantescas que dão origem a Anshar (o princípio masculino) e a Kishar (o princípio feminino). Dão então origem a An. se uniram. enquanto que a velha feiticeira. deus da Luz Solar e do Trovão. cães furiosos.e.» A conspiração Tiamat. É então que Demkina dá origem ao divino Marduk. Em primeiro lugar. que o seu destino seja repleto de miséria. Mas estes filhos de deuses começam a guerrear-se. dava à luz uma nova ninhada.. «Eles gritaram e rosnaram furiosamente. os seus passos eram majestosos. mata Apsu e apodera-se da sua coroa. «Altiva era a sua forma.. O caos No princípio era Apsu. estabelece a sua morada. prontos para a batalha. que. sabe desse projeto. que representava o caos e o perigo. nascem Lahmu e Lahamu. a água salgada . deus do Céu. e Tiamat. que significam «quando no alto». por sua vez. furiosa com o assassínio do seu esposo. «Agitam o Céu com as suas danças» e Apsu perde o sono. depois. a primeira Mãe. com cujo apoio Tiamat espera exercer a sua vingança. nasceu toda uma série de deuses bárbaros e criaturas monstruosas. Promove Kingu. Em seguida.» Marduk aceita lutar contra Tiamat. exijo que a assembleia me dê a primazia. o vento Atroz. prestaram-lhe homenagem: «Marduk é rei!» O combate Marduk fabrica um arco e uma rede. Lança-se ao ataque a Tiamat. grita. quando Marduk falou. ao estatuto de general do seu exército. derrotando Tiamat e salvando as vossas vidas. Todo o bando de demônios que havia marchado ao seu lado. e Tiamat. Marduk pô-los a ferros e atou-lhes as mãos. e quando se reunirem para votar os decretos. que estava atrás de si. O vento entrou-lhe nas entranhas. o traje reapareceu. Os deuses. tirou-lhe a vida. és o primeiro entre os deuses! Fala e assim será: abre a boca e o traje desaparecerá. Como utilizar esta carcaça horrível? . ao rosto dela. o Sábio.» Quanto aos seus acólitos. e a minha criação suportará as extremidades do mundo. Enki vai falar com Anshar e pede-lhe que intervenha. sobe para o carro-tempestade e faz surgirem o Dilúvio. Os meus decretos nunca serão alterados nem anulados. Os Igigi reúnem-se em conselho para encontrarem uma solução. Com um golpe. pois Tiamat ergueu contra si os terríveis Anunnaki. os 11 monstros que engendrara para a apoiarem no seu combate. o seu vingador. propõe que alguém vá ter com Tiamat e que a enfrente: «Entre nós. atirou o vento feroz. deixem-me fazer a lei. desposa-o e confia-lhe as tábuas do Destino. começaram a gritar e. o Turbilhão. e já não vós. Serei eu. fixaram o destino. espetou-lhe a lança no ventre. «O Senhor lançou sobre ela a sua rede e. volta a falar e o traje reaparecerá intacto!» Com efeito. Marduk repousa e medita em cima do corpo da Mãe monstruosa. «Quando beberam a bebida forte. tendo verificado a eficácia da sua fala. o mais inteligente dos deuses. a Tempestade. prendido os 11 monstros e retirado de Kingu as tábuas do Destino. os seus corpos incharam. Enki.» Anshar organiza um banquete para todos os deuses. Depois de ter matado Tiamat. lança desafios e diz com os seus lábios amargos: «Serás assim tão importante para te ergueres acima de mim como deus supremo?» Os dois combatentes enfrentam-se: Marduk. Fortemente cercados. quem é impetuoso na batalha? O herói Marduk! Só ele é suficientemente forte para nos vingar.deuses que engendrara para a servir. que tem nas mãos uma planta venenosa. quem decidirá sobre a natureza do mundo e das coisas vindouras. Tiamat abriu então a sua enorme boca e Marduk atirou-lhe o vento antes de ela ter tempo de a fechar. quando Voltou a falar. à sós. o Vento Quádruplo e o Vento Séptuplo. «ficaram presos na rede. mas exige o poder supremo: «Se vou ser o vosso vingador.» A entronização de Marduk é selada por um milagre: os deuses colocaram um traje no meio deles e dirigiram-se a Marduk: «Senhor. o Furacão. cortou-lhe as tripas e trespassou-lhe o coração. a coragem abandonou-a e ela abriu a boca. quando os seus corações se exaltaram por Marduk. Tendo-a derrotado. numa luta singular. apodera-se de uma maça e do relâmpago. Depois atirou o corpo à terra e pôs-se em cima dela. não conseguiram fugir». o traje desapareceu e. redigida em acadiano. faz surgir a terra da extensão das águas. Mas a raça dos homens não terá uma vida longa. no sentido do comprimento. mas Enki sugere que se sacrifique um dos deuses vencidos. com a sua natureza dupla constituída por um corpo e uma alma. numa terceira. bem como um casal de todos os animais da criação. que sucede ao caos e às lutas que presidiram à Criação. Quando An e os seus irmãos se unem contra Apsu e Tiamat. Adad. «como um peixe seco». Dos três grandes relatos mesopotâmios do dilúvio. do qual apenas um homem escapará. Depois. os deuses não conseguiam dormir. o protagonista chama-se Atrahasis. o Criador Marduk olha fixamente para a enorme massa. O homem. com a outra. a Lua. Com a aprovação da assembleia. Seiscentos anos depois. Resolve então cortar ao meio o corpo monstruoso. numa segunda narrativa suméria. depois. An. No entanto. O Sol. senhor das Tempestades. a senhora do Nascimento. Por último. as montanhas. Kingu é executado e Nintu. a terra. Da cabeça de Tiamat. edifica no Céu um palácio para os grandes deuses. o que criar a partir dessa. a incarnação do Destino e. dá-se uma guerra de gerações. chegando ao ponto de devorar os seus filhos. e dá-lhes as estrelas como luminárias. A sua vinda ao mundo marca o princípio da ordem. edifica Babilônia e o seu alto templo no meio da terra. Enlil e Enki. a grande tríade primitiva. Passarão a ser os guardiães do mundo. faz correrem o Tigres e o Eufrates. a mesma personagem salva do dilúvio chama-se Ziusudra e. um faz parte da Epopeia de Gilgamesh e tem por herói Utanapishtim. embora os acontecimentos descritos sejam exatamente os mesmos. de reinar sobre o dia. Unânimes. e organiza as fases lunares. Enki e Enlil. avisados por Enki. para aí reproduzir a morada divina. de se desembaraçarem dos homens provocando uma enorme seca. Por fim. Marduk distribui os 600 deuses entre o Céu e os Infernos: 300 Igigi no mundo celeste e 300 Anunnaki nos Infernos. os deuses apontam para Kingu. Por último. Em seguida. Marduk pede que lhe tragam os prisioneiros Anunnaki e pergunta quem é o responsável pela conspiração contra si. Marduk «mede o ano». mais uma vez. Com uma metade. nascido para servir Agora. incumbe Shamash. dá-lhe um princípio e um fim e fixa a sua divisão em 12 meses. os homens conseguem sobreviver. 0 «Supersábio». os deuses decidem então provocar um imenso dilúvio. faz a abóbada celeste e. uma luta pela afirmação do seu poder contra o dos deuses primitivos.Marduk. faz as colinas e. Enlil encarrega Namtar. era necessário criar a humanidade. e Sin. emergida do Apsu. tarefa que era outrora realizada pelos Igigi. dos seus seios. Em seguida. matéria original. de velar sobre a noite. para distrair e servir os grandes deuses. criando assim o homem. mistura argila com o sangue do deus. são os descendentes de Anshar e de Kishar. Reunidos em assembleia. e escava fontes em todo o seu corpo. dos seus olhos. incapazes de . Deuses da Suméria e de Acádia An. pensando como usá-la. multiplicaram-se de tal maneira que produziam um barulho infernal. Marduk propõe criar o homem a partir do seu próprio sangue. Do segundo. que também provocou um dilúvio. A partir do II milênio. para libertar os deuses da tarefa cansativa de escavarem canais de irrigação. é ele quem rege os conflitos entre os deuses. Adad a tua força. Castigado pelos deuses. Enki. reina sobre o Apsu e gere as questões terrestres. que faz lembrar o combate entre Zeus e Tifeu. vai lançar o Touro celeste contra Gilgamesh e Enkidu. o ritual das cerimônias em honra de Marduk. e Ninmah. deus do Céu. Inteligente e astuto. Tomando a defesa de Inanna. Com o nome de Baal.assegurarem a ordem do mundo. Um hino em honra de Marduk evoca esta simbiose dos grandes deuses: «Sin é a tua natureza divina. que. tem vários traços em comum com Zeus. o Esagil. é um vasto complexo que engloba. com o auxílio de Ninmah. Ninlil segue o amante e. adquirirá entre os Fenícios um carácter muito mais temível. e um homem privado de órgãos sexuais torna-se guardião do harém real. No entanto. que não pode ser suspeito de roubo. Marduk é um deus babilônio. Deus das águas doces e fertilizadoras.» O templo de Marduk na Babilônia. deus sábio. um enorme zigurate . Enki cura-o. O Cavalgador das Nuvens» enfrenta um terrível dragão numa luta cósmica. um cego. Inanna e Ereshkigal. tendo ocultado mais ou menos An e Enlil. As suas duas filhas. a dama do Vento. Juiz supremo. soberano dos infernos. ergue o seu templo. na cidade da Babilônia. Enki terá criado o homem. o sábio. o . A sua companheira Ninlil ou Ninursag amamenta aqueles que Enlil nomeou como reis da Terra. Ninlil. ou simplesmente como um dragão com cornos. Ao terceiro. como divindade aterradora que exige incessantes sacrifícios humanos. Os deuses fundadores An. onde se passaram a realizar as assembleias dos grandes deuses. ébria. depois de ter criado o mundo. com uma tiara com cornos. Enki. a tua inteligência. sobre os Infernos. Enlil seduz uma jovem. Os deuses celebram esta ideia com um banquete. An é geralmente representado sentado num trono. Enki. que evoca a força viril do touro. De um homem que não era capaz de agarrar os objetos com as mãos. que previra o que iria acontecer. é por excelência o civilizador. e intervir a favor da humanidade quando Enlil desencadeia o seu terrível dilúvio. que foi identificada com a torre de Babel . no reino subterrâneo. esposa de Nergal. engendrará também Nergal. Uma mulher estéril é colocada ao serviço da rainha. reina sobre a terra e tem como armas principais o amaru (o dilúvio) e o furacão. Com ela. bem como com Javé. faz um músico com a missão de divertir o rei. Na Babilônia. aquele que resolve os problemas e que ensina os homens a resolvê-los. dando-lhe um banho purificador. Estabeleceram a sua morada no palácio celeste. representa a ordem do cosmos. afirma ser capaz de fabricar esses futuros servidores dos deuses. arranja então um papel para cada uma dessas criaturas defeituosas. dá à luz Sin. o deus dos Hebreus. De resto. torna-se o soberano incontestado do universo e da vida. faz um servidor do rei.construção de vários pisos. reinam uma sobre o Amor (é a Afrodite mesopotâmica. An o teu carácter real. é enviado para os Infernos. que mais tarde será denominado Bei (Senhor) pelos Babilônios. Segundo o poema intitulado Enki e Ninmah. incapaz de reter a urina. Enlil. o Esagil. a tarefa não corre bem e os primeiros homens criados são muito imperfeitos. é representado com dois fios de água que se escapam das suas mãos. assimilada a Ishtar) e a outra.e muitos outros templos consagrados a divindades. além da residência do deus e da sua companheira. No mito da descida de Inanna aos Infernos. Esposo de Ningal. porque. viagem dos deuses numa barca e vários sacrifícios. os Anunnaki têm a função de juizes dos Infernos. engendra Inanna. é um bom presságio. tal como sucede na Epopeia de Gilgamesh. especialmente. No Enuma Elish. Shamash. fisicamente maltratado pelo sumo-sacerdote. durante os eclipses. As festas desenrolam-se no início do ano babilônio. as decisões eram tomadas pelo conselho de Anunnaki. O deus Sin é representado como um velho barbudo. pelas estrelas cadentes e pelos cometas.» Sin dispõe de numerosos poderes e influencia o destino dos homens. supervisionado por An e. banquete. pelas fases da Lua. o deus Lua. A mãe conseguiu salvá-lo substituindo-o por um espírito. mostrarás cornos para fixar seis dias. desempenha um papel muito importante como guia de caravanas. Governa o ciclo menstrual das mulheres e. colocar-te-ás de frente. que desaparece. para renovar a vassalagem do rei a Marduk. Marduk perdooulhe as faltas e a Cidade gozará de um ano de prosperidade. e Inanna. Marduk atribuiu-lhe a sua tarefa logo nos primeiros tempos da Criação: «No início do mês. a deusa do Céu. que revelam a sua inteligência e a qualidade da sua audição. em certas narrativas. Marduk fixa em 600 o número de deuses. serve para fortalecer a relação entre os deuses e a comunidade dos homens e. durante os quais alternam desfiles. armado com uma espada com a qual abate um dragão. desaparece e esconde-se debaixo da terra durante uma noite. Sin. para brilhares sobre a terra. assiste aos partos. Marduk é representado com grandes orelhas. do Amor e da Guerra. ao décimo quarto. administrador do tempo e senhor do calendário. o deus da Lua começou por se chamar Nannar. Shamash . Nascido nos Infernos. por volta do mês de março ou de abril. Divindades siderais Os Mesopotâmios eram apaixonados pela observação do movimento dos astros. muito naturalmente. dividirás em duas a coroa. por Enlil. As três grandes divindades siderais são: Sin. os Igigi são os deuses inferiores e os Anunnaki são os grandes deuses. sentado num trono e com um crescente na cabeça. Se o rei verter lágrimas. depois. Seja como for. todos os meses. orações. protetor da Cidade. divide-os em dois grupos: os 300 Igigi reinam nos céus e os 300 Anunnaki sobre a terra. as festividades terminam com a leitura pública do Enuma Elish em frente à estátua do deus. Filho de Enlil e de Ninlil. deusa dos Juncos. No quarto dia do ritual. Shamash e Adad. purificação do templo. divinizaram as luminárias do palácio dos deuses. As mulheres estão encarregadas do seu culto. o deus Sol. ou de pé. cativo. o rei é arrastado pelas orelhas diante da estátua do deus e. A distribuição dos papéis entre os Anunnaki e os Igigi é muito complexa. numa barca em forma de crescente. os demônios voltam à carga e atacam Sin. oferendas.Akitu. pelos meteoros. por isso. recordando a sua vitória sobre Tiamat. Sin foi atacado por uma horda de demônios quando era ainda muito jovem. Duram pelo menos 13 dias. ao sétimo dia. Depois. mais tarde. De vez em quando. mas Sin guarda ainda memória dessa passagem e. corta as cabeças e enumera. o orgulho. bem irrigado». concedo o dom da verdade. despojando-se. que se tornou deus da Vegetação. descobre o inverso das coisas e reaparece de manhã. da descida aos Infernos. podemos ver o rei a oferecer o seu Código a Marduk/Shamash. O ciclo de poemas dedicado à deusa do Amor mostra o caráter erótico e. da arte de fazer amor. A fertilidade das terras e a fecundidade das fêmeas animais ficava assim assegurada nesse ano. descrevendo-a como um «terreno em pousio. gravada em tabuinhas de argila) que descrevem como o pastor Dumuzi foi elevado ao estatuto de rei e de deus graças ao seu matrimónio com Inanna. autênticas odes ao amor físico que podem ter inspirado o Cântico dos Cânticos. o seu homólogo egípcio. do regresso dos Infernos. cerrou os dentes no seu ventre. Durante a sua travessia noturna. com uma tiara e chamas que se elevam dos seus ombros. arrancou as árvores e fez desaparecer o monte sob fumos densos. narram essas bodas divinas. trouxe a prosperidade aos meus súditos. um monstro capaz de matar os seus amigos e amantes. Quando sobrevoa a terra. do Amor. onde o esperam os homens-escorpiões para lhe abrirem a porta do Mundo Subterrâneo. Shamash é representado ora sentado num trono. assim.» Tal como Rá. submersa pelo desejo. É também capaz de prever o futuro e de revelar o seu conteúdo aos sacerdotes que leem as entranhas dos animais sacrificados. a ambição e o desejo de vingança. todos os anos. do amor com o falo. tem de transpor as sete portas do inferno. A sua principal função consiste em inspirar os reis e ditar-lhes leis justas. no ano novo. o soberano «desposava» uma das sacerdotisas de Inanna durante alegres festividades. À noite. Contudo. Desenfreada no campo de batalha. instalei nela o direito e a ordem e. declarou-lhe guerra e precipitou-se sobre ele. Shamash. pois pode ver tudo o que se passa sobre a terra e debaixo dela. ora por um disco dentro de uma estrela com quatro pontas separadas por raios. Inanna «A Dançarina» Deusa do Céu. Vários relatos sumérios. A maioria dos mitos em que figura mostra-a como uma deusa cruel. Mas o amor profundo que une Inanna e Dumuzi está condenado a ser anulado pelo outro aspecto da personalidade da deusa. a jovem. «Quando Marduk me deu a missão de pôr em ordem o meu povo e pôr no bom caminho a minha terra. filho de Sin. Existem numerosos textos cuneiformes (a escrita suméria. «entoa um hino de louvor à sua vulva». secou a terra. Kittu e Mesharu. Inanna vai aos Infernos visitar a irmã Ereshkigal.» A deusa. que ela pretende destronar. identificada depois à deusa fenícia Astarte e a Afrodite. sagrado dessa união. segundo o ritual da passagem para o Além. justiça e força são os três atributos de Shamash. Os seus filhos. e dirigindo-se a Dumuzi: «Por mim. Inanna inspira o terror tanto aos deuses como aos homens. mergulha no Ocidente. ao mesmo tempo. quem será o seu lavrador?» O sexo de Dumuzi torna-se o próprio símbolo da fertilização do terreno em pousio. minha filha. personificarão a Justiça e o Direito. abre-me a vulva. em . Certo dia. as armas afiadas com que massacrará o inimigo. nas Montanhas do Oriente. estrangulou-o. em que o monte Ebih lhe recusou essa homenagem. a narrativa mais famosa sobre Inanna é a história do seu casamento com o pastor Dumuzi. da Fertilidade e da Guerra. Em primeiro lugar. Na estela onde estão inscritas as leis de Hamurabi.Verdade. o deus Sol. por mim! Por mim. O juízo de Shamash é infalível. O próprio Enki evoca os poderes misteriosos do Amor: «A Inanna. atravessa todas as noites o Mundo Subterrâneo. Era para celebrar esse acontecimento que. as montanhas prestam-lhe homenagem e inclinam-se diante do seu poder. nos seus cantos de guerra. tomará o seu lugar. Os grandes deuses. que haviam erguido muralhas contra ele. Inanna volta então à terra e começa a procurar quem aceite tomar o seu lugar. todos os anos. Ninurta consegue juntar dois terços das pedras da montanha e acaba por derrotar Asakku. mas os gallu acabam por encurralá-lo na tapada da sua irmã Geshtinanna. que a prende no seu palácio e lhe lança doenças que rapidamente lhe provocam a morte. na condição de que a irmã arranje alguém que queira ocupar o seu lugar nos Infernos. Pouco tempo depois. Dumuzi ficará nos Infernos e. e condena o calcário. todos os protagonistas da história começam a lamentar o desaparecimento de Dumuzi: a sua mãe Ninsun. deus da Agricultura e da Guerra. Este ciclo de morte invernal e de ressurreição primaveril evoca claramente os mitos de Deméter e Perséfone nos Gregos e de ísis e Osíris nos Egípcios. de lava e de deslizamentos de terras. a irmã Geshtinanna. Em cada porta.» Nua e impotente. Esta parte da narrativa é dedicada à explicação da utilização técnica de numerosos minérios trazidos da montanha para as cidades da Mesopotâmia. Capturam Dumuzi e levam-no para os Infernos.cada porta. Ninurta ilustra-se pela sua vitória contra o pássaro Anzu. e serão reduzidos ao papel modesto de moldes para os ourives. Durante os seis meses em que Dumuzi volta à terra e em que Geshtinanna ocupa o seu lugar nos Infernos. A rainha dos Infernos pendura então o cadáver da irmã num gancho. fica furiosa e decide escolhê-lo. a terra seca e nada cresce. «sozinho. É por isso que. Escolhe algumas frágeis. de uma peça de roupa ou de uma joia. Dumuzi recusa energicamente e tenta fugir do exército dos gallu. reúnem-se em conselho e pedem a Ereshkigal que deixe Inanna regressar à terra. A terra treme e Ninurta é obrigado a recuar. mas é sobretudo aquele que. surge armado com uma maça em torno da qual se enrolam duas serpentes. alarmados por verem a terra a fenecer. sujeitas à erosão. os soldados de Inanna. que se ofereceu como voluntária. Por fim. devastou a montanha». Campeão dos deuses. por que me despojas desta roupa? . Outras podem ser esculpidas. Ninurta castiga a lava e o basalto. conforme tenham estado ou não do seu lado. Com o auxílio de Shamash. a ser . estas são as ordens da rainha do Inferno. Em seguida. Dumuzi muda cem vezes de aspecto. que conspirara contra ele. a vegetação volta a crescer. As tropas de Asakku tentam soterrar Ninurta num dilúvio de pedras. Quando encontra o marido Dumuzi a festejar alegremente à sombra das árvores em vez de estar a chorar o seu desaparecimento. durante seis meses. a Mesopotâmia está em luta permanente com os seus vizinhos e tem de reagir a um ataque dos povos da montanha. No antigo poema (III milênio) do Lugal-e. faz a mesma pergunta e recebe sempre a mesma resposta: «Guardião. deusa do Vinho. comandados pelo demônio Asakku. e a própria Inanna! Os deuses tomam então uma decisão excecional: durante seis meses. durante os outros seis meses. polidas e trabalhadas de muitas maneiras. e outras tão duras que poderão ser utilizadas para fabricar as mós que esmagarão as pedras mais friáveis.Entre. que ela lançou em sua perseguição. senhora. é finalmente levada diante de Ereshkigal. Numa segunda fase da batalha. a sua irmã Geshtinanna. dedica-se à organização do ambiente selvagem: constrói canais de irrigação e diques para regar as culturas e desvia os cursos dos riachos da montanha para irrigarem as planícies. A deusa aceita. Ninurta seleciona os minérios em função do papel que as pedras desempenharam na batalha. Ninurta «Senhor da Terra Cultivável» Ninurta é o equivalente do Marte dos Romanos. começa a examinar as pedras. Por vezes. Ora benévolo. garras e um pênis em forma de serpente. Assim Pazuzu. senhora da Grande Terra. O domínio infernal «Terra sem retorno». monstros hediondos vindos dos Infernos. ataca as mulheres grávidas e as mães e bebe o sangue dos homens. As rochas que a ele se aliaram. são demônios estéreis que atacam as mulheres grávidas e matam os bebês. é representado em vários amuletos (um dos quais exposto no museu do Louvre) destinados a conjurar a doença. Os edimmu. Uns são gênios protetores. que reina com o esposo Nergal sobre os Infernos. em contrapartida. assegura a prosperidade da agricultura. o senhor da Tempestade. provocou a seca que não conseguiu fazer desaparecer a humanidade. asas. assolam a região. Adad está na origem da chuva e das secas que. Adad O maior dos deuses da natureza é Adad. perseguem os homens. Pazuzu é. Mas Adad é também o deus que. então. é difícil distinguir os demônios malévolos dos gênios protetores recrutados para os combaterem. Quanto a Lamashtu (talvez antepassada de Lilith. é uma deusa sombria e violenta. os deuses do Céu decidem partilhar um banquete. Os lamastu. antes de desencadear o Dilúvio. Imagens dos gênios protetores eram expostas nas casas e nos edifícios oficiais ou colocados nas fundações das habitações. Assim. Certo dia. Os gênios Existem muitos gênios mediadores entre os deuses e os homens que influenciam a vida do povo.utilizado para construir as fundações dos edifícios implantados nos terrenos pantanosos. Em certos casos. ainda que o seu aspecto seja particularmente aterrador: cabeça de leão. que rapta e massacra as crianças. ora destruidor. e o poder deles deve ser dominado por meio de rituais conjuratórios e pela magia. almas dos mortos não sepultados que erram eternamente. um demônio benévolo. de iras terríveis. e propagam as doenças entre os homens e os animais. abandonando o corpo do doente de que ela havia tomado posse. com patas de ave de rapina e cabeça de leoa ou de abutre. corpo coberto de escamas. têm um destino mais nobre. A placa representa Pazuzu a conduzir o demónio Lamashtu de volta aos Infernos. o Inferno mesopotâmico é rodeado por sete muralhas intransponíveis. Os gênios malévolos são frequentemente considerados responsáveis pela doença e pela morte. graças às cheias fertilizantes dos rios. com cabeça de homem e corpo de leão ou de touro. por vezes. providos de corpo de homem e cabeça de leão. Quanto aos gallu. pelo contrário. demônio feminino que aparece na bíblia e no Talmude). por ordem de Enlil. introduzem-se no quarto dos jovens casados para neles semearem a discórdia. é um demônio estéril. os lamassu. o demônio do Vento do Sul. o lápis-lazúli e outras pedras preciosas serão consagrados aos deuses. Mas o . É representada nua. Ereshkigal. é representado em cima de um touro ou a abater um monstro marinho. Assim. nas epopeias. segundo a Lista Real da Suméria. ergueu-a do seu trono e agarrou-a pelas tranças. Os deuses recebem-no respeitosamente e todos se inclinam diante dele. certo dia. A desgraça e o sofrimento são o castigo por faltas anteriores. No entanto. Os seus deveres para com os deuses consistem em construir-lhes templos sumptuosos. Nergal e Ereshkigal amaram-se apaixonadamente. deus da Peste. Todos menos Nergal. considerada infalível. . Os Sumérios confiam também muito na justiça divina. que lhe sugere que vá à morada dos deuses pedir a Inanna a erva da procriação. Mas. Após a chegada de Nergal aos Infernos. Nergal é geralmente representado como um leão. quer ir ainda mais alto e alcançar o palácio de Inanna. o deus supremo. que sobe a «grande escada do Céu». Etana é um justo que deve a sua posição a Enlil e a Inanna. Etana Rei da cidade de Kish. Envia-lhe um mensageiro para exigir que Nergal lhe seja reenviado e se torne o seu esposo. Mandam então um mensageiro a Ereshkigal. multiplicam as demonstrações de respeito. segundo regras compreensíveis e aceitáveis. a deusa. mas. e Nergal decide ficar junto da rainha dos Infernos. que o apanha mesmo antes de tocar no solo. agarrou-a pelos cabelos. As lendas mesopotâmicas Na Mesopotâmia. venerá-los em grandes procissões e honrá-los através de grandes festas. sabemos que Etana teve um filho que lhe sucedeu. cânticos e danças. parte as sete portas do domínio dos mortos e cai nos braços de Ereshkigal: «Aproximou-se dela a rir. de acordar os mortos e de os enviar à terra para devorarem os vivos. cai do dorso da águia.código divino impede-os de descerem ao Mundo Subterrâneo. e que governa pacificamente o seu reino. chegado ao palácio de An. A águia promete então dar-lhe tudo o que ele desejar. e a sua cabeça colossal serve de guardião das portas dos templos e dos palácios babilônicos. Quando ele tem de ir embora. observa-se um questionamento deste juízo divino e. desafiar a morte e ao quais a imortalidade será recusada. que recusa saudar Namtar. Podemos então concluir que Etana terá tido sucesso no seu empreendimento. pelo menos. Nergal corre então para os Infernos com 14 demônios. O povo espera assim conciliar-se com os deuses e obter deles a paz e a prosperidade. que tentam. os homens. E os dois abraçaram-se e deitaram-se na cama. sem sucesso. obediência e temor. Ereshkigal envia então o seu fiel ministro Namtar (o Destino). o juiz supremo. No decurso da viagem. que estava presa no fundo de um fosso. tal como um deus dos Infernos não pode subir aos Céus. O fim da narrativa nunca foi encontrado. para que envie um dos seus servos para lhe levar a sua «porção» de alimentos divinos. Três grandes relatos épicos narram a busca da imortalidade de reis ou heróis lendários ou semilendários: Etana. com banquetes. criados para servirem os deuses.» Mais uma vez. ameaça An. começa a preocupar-se com o fato de não ter descendência: a quem deixará o poder após a sua morte? Dirige-se a Shamash. os homens começam a pôr em dúvida a justiça divina. que nem sempre é bem exercida ou. No entanto. junto ao Eufrates. Adapa e Gilgamesh. esculpir as suas imagens. por volta do II milênio. Os deuses condenam-no então a apresentar as suas desculpas a Ereshkigal. em lágrimas. salva uma águia de asas cortadas. durante seis dias. da Destruição e da Guerra. Ereshkigal apaixona-se por ele e os dois amam-se perdidamente durante seis dias e seis noites. Etana pede-lhe que o leve ao céu de An para ir buscar a erva da procriação. Sofrendo de uma vertigem. Depois. Enki aconselha-o a vestir roupas de luto e avisa-o de que não deve comer nenhum dos alimentos nem beber a água que An lhe oferecerá. Na minha fúria. na realidade. Os deuses guardiães da porta. a sua barca afunda-se e ele mergulha na «casa dos peixes». eram. dois terços deus e um terço homem. o Vento do Sul não sopra em direção da terra. Gilgamesh terá sido rei de Uruk. Antes de iniciar a viagem. Tamuz e Gizzida. An chama então Adapa.» O homem-deus e o homem-anima! Aruru. Esta amizade. doravante. Mas um temporal levantou-se do mar. acima de tudo. espantam-se ao vê-lo usar roupas de luto. porque era eu. talvez. eu estava a pescar no meio do mar para a casa do meu amo [Enki]. Adapa diz-lhes que está de luto pelos dois deuses do seu país. Durante sete dias. Gilgamesh. assegurando assim o apoio e a simpatia destes deuses. é capaz de ouvir a mais pequena queixa dos humanos. amaldiçoei o Vento do Sul. deusa da Criação. An diz a Adapa que. An ordena então que lhe sirvam pratos de aspecto delicioso. os dois guardiães do palácio dos deuses. Adapa recusa os alimentos oferecidos por An. e que exprime em termos tão simples quanto fortes: «Porque era ele.Adapa O herói Adapa. A partir de .» Tamuz e Gizzida. A narrativa tem como tema principal a condição mortal do homem e a incompreensão dos deuses. só a deusa da Cura. Aruru decide então dar a Gilgamesh um companheiro capaz de o chamar à razão. Ninkrak. tão próxima do amor.c. é análoga àquela que une Aquiles e Pátroclo. o pão e a água da vida eterna. primeiro dos sábios. antes do esposo. poderá aliviar os sofrimentos dos homens e permitir-lhes lutarem contra algumas doenças. desempenha na mitologia mesopotâmica um papel semelhante ao de Prometeu entre os Gregos. uma das cidades-Estado da Mesopotâmia. um hino à amizade amorosa que une dois seres semelhantes e diferentes. ou à que Montaigne sentia pelo seu amigo La Boétie. quebra as asas do Vento do Sul. cujos pontos de vista sobre a morte vão sempre evoluindo ao longo de uma história repleta de aventuras temíveis. perdeu a imortalidade e que fez cair sobre toda a humanidade o luto e a doença. não há jovem da cidade que não seja desafiado por ele para uma luta e depois morto. apesar de grande e magnífico. Mas é. ouviu as queixas das gentes de Uruk. abusa dos seus súditos: não há noiva que não seja por ele tomada. o texto mais profundamente comovente da literatura mítica.. Tamuz e Gizzida. Provido de uma orelha gigante. A sua missão é ensinar aos homens as diferentes técnicas que lhes serão indispensáveis para sobreviverem. intercedem junto de An a favor de Adapa.e. pois são a água da morte e o pão da morte. Seguindo as recomendações de Enki. causa da sua humilhação. Adapa explica então ao rei do Céu o que aconteceu: «Senhor. Adapa sobe ao Céu e chega à entrada do palácio de An. por volta de 2650 a. que. certo dia em que estava no rio. na noite de núpcias. Mas. o Vento do Sul soprou e afundou-me! Fui obrigado a ir para a casa dos peixes.. furioso. o rei. «A Epopeia de Gilgamesh» Este texto com 5000 anos é a primeira obra literária da humanidade e é. por ter seguido os conselhos de Enki. não poderá transpô-la. o seu rei. voltam a cair. mas Enkidu interpõe-se e o rei. lembra-lhe os seus crimes anteriores e chama-lhe «sandália que magoa os pés». pelo qual é atraído como que por uma mulher. Gilgamesh opõe-se. inconstante e malévola. Mas Enkidu aprendeu a lição dura dos homens e explica ao amigo as leis da guerra. Vento do Norte. ileso. semelhante ao cabelo dos saddhus indianos ou às rastas jamaicanas). De repente. envia-lhe uma cortesã. Gilgamesh apieda-se e pede a Enkidu que poupe Humbaba. chamando-lhe «filho de peixe» e «idiota que nunca mamou da sua mãe». O rei diz-lhe: «Nunca ninguém rivalizou comigo. Vento da Tormenta. tão forte e belo quanto Gilgamesh.» Enkidu segue Gilgamesh. a deusa cria Enkidu. lutam como campeões. Com a sua tiara na cabeça. Gilgamesh repele a deusa. deus do Céu e amigo dos heróis. Enkidu é um selvagem que semeia o pânico entre os caçadores e os pastores.uma bola de argila. Durante seis dias e sete noites. caem na rua. Doravante. Gilgamesh teve dois sonhos. Gilgamesh. Em seguida. Gilgamesh não acredita no que vê: finalmente. Enkidu é derrotado. pela qual se sente atraído como que por uma mulher. a assembleia de Uruk confiou-lhe Gilgamesh.» No entanto. gigante com cabeça de intestinos. Encontrei finalmente um companheiro digno de mim. Tem a essência de An. e admoesta Gilgamesh sobre o seu comportamento. Os dois amigos encontram-se face a Humbaba. Será teu amigo.» Na cidade de Uruk «de belas muralhas». Humbaba compreendeu a natureza selvagem de Enkidu.» Enkidu não compreende. derrubando as bancas do mercado. Gilgamesh diz que não tem medo e discorre sobre a imortalidade: «Quem pode chegar ao Céu. Quando se levanta. corta a cabeça de Humbaba com um golpe de machado. é necessário concluir a missão. levantam-se. indignado com essa renegação. -Humbaba é o inimigo dos homens. Gilgamesh apresta-se a fazer valer o seu «direito» sobre uma jovem noiva. Agora. os heróis lavam-se e ataviam-se com os seus belos ornamentos. da floresta dos Cedros. Gilgamesh e Enkidu enfrentam-se. Enkidu ama-a selvaticamente. Vento Gelado. Vento da Tempestade. já não se parece com os animais selvagens. Juntos. Enkidu. e os dias dos mortais estão aprazados. promete-lhe cabras férteis e precioso lápis-lazúli. Enkidu era feliz. só os deuses são imortais. curioso em relação a tudo. meu amigo? Sob o Sol. Ninsun explica os sonhos ao filho Gilgamesh: «É um amigo que vai chegar. A cortesã diz-lhe: «Agora. Em seguida. Shamash. coberto de pelos e com cabelos «lanosos» (imaginamos a sua cabeleira com tranças enredadas. empurram-se. Os dois heróis lutam no vão da porta da noiva. um amigo tão forte como tu. onde reside o terrível Humbaba? Gilgamesh explica: é o seu sonho mais antigo. Enkidu já fez metade do trabalho. enfrenta Enkidu e chama mercenário ao amigo. Exaustos. poderemos ir à floresta dos Cedros. ouve falar dele e interessa-se por essa estranha criatura. que agora o temem. lança os ventos sobre Humbaba para o enfraquecer: Grande Vento. livrar a cidade do mal. que insulta Enkidu. Mas Enkidu tem medo de morrer. Vento do Sul. «pedra friável que mina as muralhas». Gilgamesh é tão belo que a deusa Inanna se apaixona por ele. tem de comer os alimentos amargos dos homens. . Desce na sua direção uma estrela. Agora. mas por pouco. E a cortesã leva-o para a cidade. sofrer os sofrimentos dos homens. Enkidu é homem e tem uma missão: trazer Gilgamesh. Vento Rodopiante. encontra um campeão à sua altura. mulher instável. pela primeira vez. inocente de humanidade. tem de morrer. Na noite anterior à chegada de Enkidu. desce do céu na sua direção um machado. quer torná-lo seu amante. «odre de pele rugosa». dantes. domando o tirano. Para o humanizar. Porquê a floresta dos cedros. Mais uma vez. és um homem. Gilgamesh chega ao rio das Águas Mortais e encontra Urshanabi. a sua «pantera da estepe». «uma enorme nuvem negra elevou-se no céu. «Seja qual for a dificuldade.» As Águas Mortais Gilgamesh erra pela estepe: «Deverei morrer como Enkidu? Tenho medo da morte. Inanna ruge de raiva impotente. resistente ao destempero e à arbitrariedade dos deuses. de onde não voltará a levantar-se. Enkidu cai numa das fendas. porque duas vezes nascido. um verme saiu-lhe do nariz. a pantera. que conduz às Águas Mortais. Nenhum homem havia alguma vez entrado na noite escura da montanha. A embarcação lança-se sobre as vagas das Águas Mortais e. Depois. Pede ao pai que mande o touro do Céu combater e matar Gilgamesh. Duplamente vítima. seja qual for o sofrimento. os dois viajantes alcançam a outra margem. As mortes de Humbaba e do touro do Céu devem ser punidas. Orgulhoso. Velei-o durante seis dias e sete noites. Os deuses reúnem-se então em conselho. famílias de artesãos e um casal de todos os animais da Criação. o Sol divino. ainda que tenha obtido a imortalidade. rebelde. o boi. Avisado em sonhos por Ea. Se ele recusar. Os mugidos do touro do Céu abrem abismos profundos. pois é um homem. Este compreende a sua dor. Quando Utanapishtim estava preparado. seu pai. Por fim. como se se tratasse do rosto de uma noiva. construiu um barco de juncos em forma de cubo perfeito e embarcou a sua família. o Justo. Gilgamesh invoca para o seu amigo Enkidu as lamentações do mundo inteiro. agarra na cauda do Touro e espeta-lhe uma espada na nuca. a dor de ter perdido o seu «macho vagabundo». ela abrirá as portas dos Infernos e os mortos sairão para devorar a comida dos vivos.» Resolve então ir falar com Utanapishtim. onde caem às centenas os homens de Uruk. An cede à exigência da filha. responde a Enlil: «Não foi como resposta às tuas ordens que estes atos fatalmente se produziram? A morte do Touro Celeste e de Humbaba? E hoje dizes que Enkidu deve morrer!» Enkidu é deitado no seu leito. A chorar por causa do vexame. a descobrir os costumes dos homens? Para chegar a este estado? Ao fim de sete dias. o gamo. e ruge «como uma leoa a quem tivessem retirado as crias. Gilgamesh avança e conta a sua infelicidade a quem o queira ouvir: «Aquele com quem combati. aquele a quem tanto amei. «Que o urso. No meio . o lobo. com um salto. Já não há vida para mim. pela passagem noturna. irei!». «Enkidu deve morrer». o sobrevivente do Dilúvio que conquistou a imortalidade. o barqueiro.» Utanapishtim ou a imortalidade negociada Gilgamesh quer saber como Utanapishtim se tornou imortal. diz Gilgamesh. vestido com peles de animais e alimentado com bagas selvagens. Utanapishtim narra o Dilúvio. sai da fenda. Retesa os músculos e.» Incansavelmente. o amigo a quem tanto amava. Gilgamesh encontra-se finalmente com Utanapishtim. Um dos dois deve morrer. Porque o obrigaram a deixar a vida selvagem. Enkidu atira-lhe à cabeça uma perna do Touro. com medo de que ele não despertasse. Gilgamesh repete as suas lamentações. em seguida.Inanna vai queixar-se a An. o deus do Céu. Enkidu morre. Enlil declarou insuportável essa algazarra e os deuses concordaram em aniquilar a humanidade. estende o lençol por cima do rosto de Enkidu. a grande invasão das águas. Na escuridão profunda. o cervo. após três dias de uma travessia que equivalem a 15 dias no mar. no calor extremo e no frio gélido. diz Enlil. o tigre. lamenta-se. que todos os animais da estepe chorem por ti!» Em seguida. O idoso fala-lhe de uma época em que os homens se multiplicavam como moscas e em que o mundo mugia como um touro selvagem. Diz a Gilgamesh: «Não devem todas as pessoas morrer? Construímos as nossas casas para que durem eternamente? Os nossos compromissos são eternos? Será o ódio eternamente inextirpável? Desde o princípio dos tempos que nada é permanente. o seu «ónagro do deserto». Não queria que o enterrassem. exige vingança. «Gilgamesh não morrerá!» E Shamash. conhece hoje a sorte que a todos nos espera. a hiena. pelo caminho. Gilgamesh está limitado a louvar os prodígios da sua própria criação e mostra ao barqueiro Urshanabi os esplendores de Uruk de belas muralhas: «Vem. responde Utanapishtim. «Não». empreende a viagem de regresso. Nergal. Gilgamesh chora a sua esperança perdida. revela a Gilgamesh o local aquático onde cresce a planta espinhosa que. magníficos. que regressaram exaustas à arca. Por fim. é tudo isto. Dá-me imortalidade. Os deuses infernais inflamaram-se e incendiaram toda a terra». rompeu as barragens do Oceano profundo e Ninurta abriu as comportas do céu.da nuvem. Vê esta cidade. cheio de compaixão. o herói deve ficar acocorado sem dormir. libertando-se assim da sua pele velha. desiludido. não regressou: as águas haviam começado a recuar. Tal como todos os homens. os terrenos em redor. «Agora que fiz todo este caminho. toca neste trabalho da pedra. Gilgamesh falhou.» . devastando montes e vales. Gilgamesh mergulha. decide que Utanapishtim e a sua mulher viverão à distância. avançaram. vem até às muralhas. Quem lhe dará a vida eterna? Impõe-lhe uma prova: durante seis dias e sete noites. «nunca terás a vida eterna. E farás feliz a tua esposa. passado esse tempo. os deuses rejeitam a culpa. despeitado e mortal. Depois adormece junto de uma nascente. pois conhecem o segredo dos deuses e essa e a única maneira de garantirem que o guardarão. vê este terraço. deverei morrer e deixar a terra cobrir-me a cabeça para sempre? Não pode ser. Utanapishtim aflige-se por Gilgamesh. Tal como Orfeu. tendo encontrado alimento. Uruk. ainda que não conceda a imortalidade.» Em seguida. que aceita entrar na arca. Festas e alegrias. Jurara que não haveria sobreviventes. lavar-te-ás na água fresca e cuidarás da criança que te dará a mão. a minha cidade. Adad trovejava. Terás roupas limpas. Mas. não terá uma segunda oportunidade e. É o destino do homem e deves limitar-te a isso. encontra a planta. Urshanabi. deuses gêmeos da destruição. Mas logo o sono sopra sobre ele como uma bruma sob a chuva. Mais uma vez. Enlil fica furioso. criaram a morte. Vencido. O Dilúvio desejado por Enlil e Inanna durou seis dias e sete noites. nestes tijolos recozidos. o barco encalhou no cume do monte Nisir. encherás a barriga de boa carne. Utanapishtim libertou uma pomba e uma andorinha. devolve a juventude. Inanna começava a lamentar-se e a arrepender-se. Quando os deuses criaram a humanidade. Era preciso parar tudo isso. deus da pestilência. Dançarás e serás feliz dia e noite. e uma serpente engole a planta de um trago. colhe-a e regressa à superfície. depois. abençoar Utanapishtim e conceder-lhe o dom da imortalidade. que. não a imortalidade. suplica Gilgamesh. Enki consegue apaziguar Enlil. os seus jardins. libertou um corvo. Siullat e Hanish. Os sete sábios edificaram as fundações destas paredes. Mas Enki.
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