Letramento e Alfabetização

March 22, 2018 | Author: JuliaJJ_jatobA | Category: Literacy, Thought, Learning, Writing, Knowledge


Comments



Description

Grupo iPED – Curso de AlfabetizaçãoProibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 1 Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 2 iPED – Instituto Politécnico de Ensino à Distância. Todos os Direitos Reservados. iPED é marca registrada pela Empresa Brasileira de Comunicação LTDA. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 3 Sumário Conceitos ............................................................................................................. Pág. 6 Introdução ............................................................................................................ Pág. 8 A natureza política da educação .......................................................................... Pág. 14 O desenvolvimento humano – fatores e aspectos ............................................... Pág. 15 Piaget e Vygotsky – Diferenças e semelhanças .................................................. Pág. 16 Etapas do processo de alfabetização, no método Paulo Freire ........................... Pág. 21 Avaliação .............................................................................................................. Pág. 23 Métodos de Alfabetização .................................................................................... Pág. 25 Método da linguagem total ................................................................................... Pág. 27 Aquisição da língua escrita como processo sociocultural .................................... Pág. 27 EJA – Educação de Jovens e Adultos ................................................................. Pág. 33 Alfabetização a partir de situações - problema .................................................... Pág. 34 Entrevista ............................................................................................................. Pág. 38 Tecnologia na educação ...................................................................................... Pág. 40 O desenvolvimento da escrita na criança............................................................. Pág. 43 Brincadeira e desenvolvimento, na perspectiva histórico-cultural ........................ Pág. 48 Alfabetizar Letrando ............................................................................................. Pág. 51 Algumas propostas didáticas brasileiras inspiradas na psicogênese ................... Pág. 55 Planejamento – procedimento ensino sistemático do SEA .................................. Pág. 56 Diagnóstico na alfabetização para conhecer a nova turma .................................. Pág. 59 Tipos de metodologias e suas implicações no cotidiano escolar ......................... Pág. 64 Diagnosticando .................................................................................................... Pág. 68 O trabalho em grupo ............................................................................................ Pág. 69 Os distúrbios que afetam o desenvolvimento ....................................................... Pág. 70 Modalidades de aprendizagem ............................................................................ Pág. 72 TDAH ................................................................................................................... Pág. 77 A família, a escola e a aprendizagem .................................................................. Pág. 78 Encerramento ....................................................................................................... Pág. 79 Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 4 Institucional O iPED, Instituto Politécnico de Ensino a Distância, é um centro de educação on-line que oferece informação, conhecimento e treinamento para profissionais, educadores e qualquer um que queira evoluir profissionalmente e culturalmente. Nosso objetivo é torná-lo uma base forte de conhecimento e expandir cada vez mais o seu nível intelectual e cultural. Oferecemos uma quantidade enorme de informação, além de diversos cursos on-line, onde você se mantém atualizado em qualquer lugar e a qualquer hora. Educação à Distância Aulas online ou a prática de aprendizagem à distância, através de ambientes virtuais e redes de computadores interligadas para fins educacionais e culturais, nada mais é do que o meio mais prático e inteligente de proliferação de conhecimento. Através de ambientes virtuais e sistemas inteligentes, é possível adquirir conhecimento de forma total ou gradativa. Esse é nosso conceito de educação, em tempo real, total ou gradativo, quando quiser e onde quiser e acima de tudo, da forma que quiser! Nossa Missão O Grupo iPED foi lançado com o intuito de aprimorar e disseminar o conceito de ensino a distância. Com a implantação do ensino a distância, pesquisas recentes registram que as pessoas alavancam os resultados dos módulos de treinamento em até 70%, eliminando as distâncias geográficas e proporcionando a melhoria da gestão do conhecimento e dos recursos humanos por competências. Pensando nisso o iPED presta esse serviço a todos, para que a exclusão digital seja cada vez menor e com o passar do tempo ela desapareça completamente. Esse é nosso objetivo, essa é nossa missão, e esteja certo que vamos conseguir! Fabio Neves de Sousa Diretor Geral - Grupo iPED Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 5 Certificação O conceito de reconhecimento virtual é concedido através de avaliação feita pelo sistema inteligente, que do inicio até o fim do curso está avaliando cada aluno em suas atitudes individuais e em comparação as atitudes do coletivo. Ao termino do conteúdo avaliado o aluno é submetido a uma avaliação final que nada mais serve do que comprovar a avaliação do desempenho dele ao longo de toda a trajetória do curso.  Nosso sistema garante 100% de segurança.  Empresas poderão confirmar a autenticidade do certificado, pois temos o que existe de melhor em tecnologia disponível no mercado.  Confira o grande diferencial de nosso certificado: Certificado Especial - Tramas em linhas personalizadas - Tarja de Segurança - Tinta Luminescente - Selo de Segurança - Numeração Intransferível Detalhes sobre o selo Ao término do curso solicite o seu! Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 6 CAPÍTULO I - CONCEITOS O ato de ler e escrever deve começar a partir de uma compreensão muito abrangente do ato de ler o mundo, coisa que os seres humanos fazem antes de ler a palavra. Até mesmo historicamente, os seres humanos primeiro mudaram o mundo, depois revelaram o mundo e, a seguir, escreveram as palavras. Paulo Freire LETRAMENTO Processo de aprendizado do uso da tecnologia da língua escrita. Isto é, a criança pode utilizar recursos da língua escrita em momentos de fala, mesmo antes de ser alfabetizada. Esse aprendizado se dá, a partir da convivência dos indivíduos (crianças/adultos, crianças/crianças), com materiais escritos disponíveis - livros, revistas, cartazes, rótulos de embalagens, entre outros -, e com as práticas de leitura e de escrita da sociedade em que se inscrevem. Esse processo acontece pela mediação de uma pessoa mais experiente, através dos bens materiais e simbólicos criados em sociedade. ALFABETIZAÇÃO O processo de descoberta do código escrito pela criança letrada é mediado pelas significações que os diversos tipos de discursos têm para ela, ampliando seu campo de leitura, através da alfabetização. Antigamente, acreditava-se que a criança era iniciada no mundo da leitura somente ao ser alfabetizada, pensamento este ultrapassado pela concepção de letramento, que leva em conta toda a experiência que a criança tem com leitura, antes mesmo de ser capaz de ler os signos escritos. Atualmente, não se considera mais como alfabetizado quem apenas consegue ler e escrever seu nome, mas quem sabe escrever um bilhete simples. Letramento: Práticas sociais que leituras e escritas exigem, nos diferentes contextos, que envolvem a compreensão e expressão lógica e verbal. É a função social da escrita. Alfabetização: Desenvolvimento de habilidades da leitura e escrita. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 7 ANALFABETO FUNCIONAL Ao contrário do analfabeto, que é a pessoa que não sabe ler, o analfabeto funcional consegue reconhecer as letras. O problema é que o analfabeto funcional, um conceito difundido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), não consegue entender o que lê e nem elaborar um enunciado, por mais curto que seja, sobre um assunto genérico. ANALFABETOS DIGITAIS O termo analfabeto digital já não é novo, mas é um novo problema que se apresenta para nossa população pouca letrada. Não se pode negar que o avanço rápido da tecnologia pode causar exclusão social e, também, não adianta ser contra esta tecnologia, que afinal é irreversível e agrega tantos pontos positivos. A verdade é que toda mudança gera conflito, causa desacomodação e tende a impulsionar o ser humano para frente. ANALFABETOS POLÍTICOS Tanta disparidade, tantas pessoas necessitando de tantas ferramentas de cidadania, só pode resultar em uma triste realidade: um outro tanto de analfabetos – os analfabetos políticos. O impedimento de ler e escrever ou o de compreender realmente um texto de propaganda, um artigo, um parágrafo de lei, um manifesto, uma citação, uma carta, um boletim escolar, ou qualquer outra forma de comunicação escrita, limita a participação ativa nas decisões da vida pessoal, da família, da rua, do bairro, do município, do estado e da nação. Se a cidadania é o direito de ter direitos, o analfabeto político nem sabe direito o que pode e o que não pode. O grande escritor e dramaturgo alemão Berthold Brecht, assim definiu esta categoria de analfabetos: O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito, dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, o assaltante e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e o lacaio das empresas nacionais e multinacionais (BERTHOLD BRECHT). Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 8 CAPÍTULO II – INTRODUÇÃO Ao longo dos anos, a alfabetização escolar tem sido alvo de inúmeras controvérsias teóricas e metodológicas, exigindo que a escola e, sobretudo, aqueles profissionais, que lidam com o desafio de alfabetizar, posicionem-se em relação às mesmas, o que, certamente, terá consequências para as práticas pedagógicas que irão adotar. No Brasil, durante décadas, predominou a discussão acerca da eficácia dos métodos de alfabetização, gerando-se confrontos entre os chamados métodos sintéticos e analíticos,chegando-se a uma combinação de ambos, nos chamados métodos analítico- sintéticos, como é o caso da palavração. Para prevenir as inevitáveis diferenças individuais na aprendizagem inicial da leitura e da escrita e evitar os eventuais fracassos que os métodos em si não eram capazes de contornar, elegeu-se um conjunto de pré-requisitos para uma alfabetização bem sucedida, privilegiando-se, principalmente, uma maturidade dos aspectos perceptuais e motores, aliada a um domínio da linguagem oral. Toda esta tradição estava vinculada a uma concepção de alfabetização, segundo a qual, a aprendizagem inicial da leitura e da escrita tinha como foco fazer o aluno chegar ao reconhecimento das palavras, garantindo-lhe o domínio das correspondências fonográficas. No máximo, buscou-se assegurar, de acordo com algumas abordagens, que este saber se desenvolvesse em um universo de palavras que fossem significativas para o aluno no seu meio cultural, como nas famosas cartilhas regionais. Mas, de uma maneira geral, tratava-se de uma visão comportamental da aprendizagem que era considerada de natureza cumulativa, baseada na cópia, na repetição e no reforço. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 9 A grande ênfase era nas associações e na memorização das correspondências fonográficas, pois se desconhecia a importância da criança desenvolver a sua compreensão do funcionamento do sistema de escrita alfabética e de saber usá-lo, desde o início em situações reais de comunicação. A partir de 1980, a alfabetização escolar no Brasil começou a passar por novos questionamentos, porém, desta feita, o foco das discussões era a emergência de novas concepções de alfabetização, baseadas em resultados de pesquisas na área da psicologia cognitiva e da psicolingüística, que apontavam para a necessidade de se compreender o funcionamento dos sistemas alfabéticos de escrita e de se saber utilizá-lo em situações reais de comunicação escrita, prevenindo-se, desde o início da alfabetização, o chamado analfabetismo funcional. Com a divulgação das pesquisas sobre a psicogênese da língua escrita (Ferreiro eTeberosky 1986), o enfoque construtivista tornou-se, sem dúvida, um dos mais influentes na elaboração de novas propostas de alfabetização, pois, além de revelar a evolução conceitual por que passam as crianças até compreenderem como funciona o nosso sistema de escrita,incorporou a ideia defendida por Goodmann (1967) e Smith (1971), de que ler e escrever são atividades comunicativas e que devem, portanto, ocorrer através de textos reais, onde o leitor ou escritor lança mão de seus conhecimentos da língua, por se tratar de uma estrutura integrada, na qual os aspectos sintáticos, semânticos e fonológicos interagem,para que se possa atribuir significado ao que está graficamente representado nos textos escritos. A importância das práticas sociais de leitura e escrita também teve o suporte dos estudos que, no âmbito da linguística, da sócio linguística e da psicolingüística, enfatizaram as diferenças entre as modalidades língua oral e língua escrita e demonstraram como muitas crianças se apropriavam da linguagem escrita, através do contato com diferentes gêneros textuais, explorando,por meio de suas interações com adultos alfabetizados, a leitura e a produção de textos, mesmo antes de estarem alfabetizadas de forma convencional, enquanto que outras, apesar de alfabetizadas, apresentavam uma ausência de domínio da linguagem utilizada nas formas escritas de comunicação (Rego 1986, 1988; Abaurre 1986; Kato1987). Um estudo longitudinal conduzido em Bristol (Wells 1986) mostrou, de forma contundente, a importância das experiências com a leitura de histórias para crianças de pré-escolar, para o posterior sucesso escolar das crianças com a leitura e a escrita. Aquelas crianças, cujos pais liam regularmente e exploravam conjuntamente com elas os textos narrativos, não só aprenderam a ler com mais facilidade como se revelaram excelentes escritores no término do ensino fundamental. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 10 Neste período, emergiu, também, um vasto corpo de pesquisas que investigavam a relação entre o desenvolvimento de uma capacidade para refletir sobre as unidades sonoras das palavras e as diferenças individuais na aprendizagem inicial da leitura e da escrita em sistemas alfabéticos de escrita (Carraher e Rego 1980, 1984, Cardoso- Martins 1990). No entanto, na literatura científica internacional, as relações entre esta capacidade, denominada de consciência fonológica, e a aprendizagem da leitura e da escrita, têm sido objeto de muitas controvérsias. Para alguns pesquisadores, a capacidade de refletir sobre fonemas é uma consequência da exposição à aprendizagem de sistemas alfabéticos de escrita, pois, sendo o fonema uma unidade abstrata, as escritas alfabéticas só poderiam será prendidas através do ensino explícito sobre essas unidades e sua relação com as letras do alfabeto. Entre os defensores desta posição, estão os pesquisadores do grupo de Bruxelas, cujas investigações focaram principalmente em comparações entre adultos alfabetizados e analfabetos (Morais, Cary, Alegria e Bertelson 1979; Morais, Cluytens, Alegria e Content1989) e em estudos de treinamento (Content , Kolinsky, Morais e Bertelson (1986), para ensinar crianças de 4 a 5 anos a segmentar fonemas. Estes estudos tiveram resultados pouco consistentes, em relação às crianças mais novas, uma vez que em tais treinamentos, se partia do pressuposto de que seria possível ensinar sobre fonemas, independentemente do nível evolutivo do aprendiz. O argumento do grupo de Bruxelas está centrado no fonema, mas há outras dimensões da consciência fonológica como, por exemplo, as segmentações intrassilábicas,envolvendo o fonema inicial e a rima e a segmentação silábica. A capacidade para segmentar e, sobretudo, para categorizar essas unidades, percebendo semelhanças e diferenças entre as mesmas, se desenvolve antes da criança se tornar alfabetizada e seria preditora do sucesso na aprendizagem posterior da leitura e da escrita (Bradley e Bryant1987, Goswami e Bryant 1990). Os resultados emergentes destas pesquisas foram, até certo ponto, desconsiderados pelos defensores da abordagem psicogenética, pois estes pesquisadores, embora reconheçam que as crianças desenvolvem capacidades metafonológicas, isto é, se tornam capazes de refletir sobre os segmentos sonoros das palavras (Ferreiro 2004), argumentam que a grande maioria dos estudos, que investigaram a consciência fonológica e a sua conexão com a aquisição da língua escrita, ignoraram o processo evolutivo descrito na psicogênese da língua escrita e que seria, através da atividade de escrita e da busca por fazer corresponder a segmentação oral com a segmentação gráfica, que ocorreria a tomada de consciência dos Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 11 elementos sonoros da palavra e o desenvolvimento da consciência fonológica. Embora haja evidências para a existência de uma conexão entre o desenvolvimento da consciência fonológica e a psicogênese da escrita, em crianças falantes do inglês (Rego1991), do espanhol (Vernon Calderón e Alvorado 2001) e, recentemente, do português(Morais e Leite 2005), não podemos ignorar os resultados de dois estudos clássicos de intervenção, que demonstraram os benefícios de uma estimulação precoce da consciência fonológica na aprendizagem da leitura e da escrita. O primeiro deles foi conduzido por Bradley e Bryant (1983) e envolveu um grupo de 65 crianças inglesas, cujo desempenho em tarefas que exigiam reflexão sobre as diferenças e semelhanças entre os sons iniciais e finais das palavras, aos cinco anos deidade, era muito precário. As crianças foram divididas em quatro grupos: dois experimentais e dois de controle. Entre os 6 e 7 anos, as crianças dos grupos experimentais participaram de atividades de estímulo à consciência fonológica. No primeiro grupo experimental, as crianças foram apenas ensinadas a categorizar os sons iniciais e finais das palavras quanto à sua semelhança, enquanto que no segundo grupo, além desse tipo de estímulo, elas foram ensinadas acerca das relações entre esses sons e as letras. Nos grupos controle, não houve estimulação à consciência fonológica: um deles seguiu a metodologia normal da escola, enquanto que o segundo recebeu um treinamento que consistia em classificar palavras em famílias semânticas. Os resultados demonstraram que as crianças que participaram das atividades de estímulo à consciência fonológica tiveram desempenho superior em leitura e escrita, comparativamente aos demais grupos e que esta diferença foi significativa para o grupo que foi ensinado sobre as relações entre os sons e a escrita das palavras alvo. O segundo tipo de evidência vem de um estudo conduzido na Dinamarca porLundberg, Frost e Petersen (1988). O estudo envolveu crianças de pré- escolar, que foram submetidas a um amplo programa de estímulo à consciência fonológica, através de jogos e brincadeiras que se iniciavam com unidades maiores, como rimas e sílabas e desciam até o nível do fonema. Este grupo de intervenção, após um ano de participação no programa,demonstrou desempenho significativamente superior, não só em tarefas de consciência fonológica como em leitura e escrita, comparativamente a outro grupo de pré-escolares que,embora no início do estudo, tivesse demonstrado capacidades metafonológicas mais desenvolvidas, não foram submetidos ao programa de intervenção pedagógica em apreço. Os pesquisadores avaliaram, também, os conhecimentos de matemática de ambos os grupos,não tendo sido constatadas diferenças entre os mesmos quanto a esta área de conhecimento. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 12 Se concebermos que o desenvolvimento da consciência fonológica é mera consequência da aprendizagem da leitura e da escrita ou da evolução psicogenética da criança, a nossa postura pedagógica será a de que não necessitaremos de atividades específicas que estimulem esse tipo de reflexão, porém, se considerarmos que o desenvolvimento da consciência fonológica é um facilitador da evolução psicogenética e da aprendizagem da leitura e da escrita, transformaremos este tipo de reflexão em um alvo pedagógico durante o processo de alfabetização. Portanto, as pesquisas emergentes a partir de 1980, e as concepções teóricas adotadas, deram margem à proposição de modelos pedagógicos diferenciados de alfabetização: alguns com ênfase muito forte no processo de letramento - uso de práticas de leitura e escrita na sala de aula - e outros que consideraram a necessidade de atividades específicas de alfabetização e que reconheceram a importância de acatar os resultados oriundos da literatura que investigou o impacto do estímulo à consciência fonológica sobre a aprendizagem de escritas alfabéticas. A proposta construtivista, influenciada pelas pesquisas de Ferreiro e Teberosky (1986) e pelos modelos de leitura propostos por Goodmann (1967) e Smith (1971), defende uma alfabetização contextualizada e significativa, através da transposição didática das práticas sociais da leitura e da escrita para a sala de aula, e considera a descoberta do princípio alfabético como uma consequência da exposição aos usos da leitura e da escrita que devem ocorrer de uma forma reflexiva, a partir da apresentação de situações problema, nas quais os alunos revelem espontaneamente as suas hipóteses e sejam levados a pensar sobre a escrita, cabendo ao professor o papel de intervir de forma a tornar mais efetiva esta reflexão. Nesta perspectiva, a alfabetização dar-se-ia, através de uma profunda imersão das crianças nas práticas sociais de leitura e escrita, descartando- se qualquer tipo de atividade didática que não estivessem vinculadas a essas práticas. Para Teberosky (1994), a formação de um vocabulário estável de palavras, a partir dessas práticas, seria o principal referencial da criança para a descoberta do sistema alfabético, uma vez que esta se daria, a partir dos conflitos vivenciados pela criança entre a sua concepção original de escrita e a escrita convencional dos nomes. Para os adeptos desta corrente, não haveria necessidade de estudo sistemático das correspondências som-grafia, nem de atividades de estímulo à consciência fonológica, uma vez que esta seria uma consequência da própria evolução conceitual da criança, em face de uma aprendizagem reflexiva da leitura e da escrita. Esta foi a proposta que se incorporou aos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e aos Referenciais Curriculares para a Educação Infantil. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 13 Recentemente, Morais e Kolinsky (2004) e um grupo de pesquisadores brasileiros,contestaram a proposta construtivista, retirando do foco inicial da alfabetização a importância das práticas sociais de leitura e escrita e definindo como objetivo inicial da alfabetização o domínio do sistema alfabético, mediante uma metodologia voltada para o ensino explícito das correspondências entre fonemas e grafemas, inclusive de regras ortográficas contextuais. A proposta se baseia em modelos cognitivistas de processamento da informação na leitura de orientação ascendente, segundo os quais o reconhecimento automático de palavras é o fator que melhor explica a compreensão na leitura. Este modelo tem sido defendido por autores, como Gough e Tunmer 1980, Perfetti ( 1985), Stanovich(1980), entre outros, para os quais o uso de pistas contextuais na leitura é uma estratégia compensatória característica dos leitores ineficientes. Subjacente a esta proposta, há um retorno explícito ao método fônico e a um modelo de alfabetização restrito ao reconhecimento de palavras, onde prevalece o ensino direto,independentemente dos níveis conceituais da criança, ou seja, da sua compreensão acercado sistema alfabético de escrita. Para esta proposta, as diferenças entre língua oral e línguaescrita e os usos que fazemos da comunicação escrita também são irrelevantes. No entanto, temos que ter cautela com a polêmica estabelecida entre alfabetização e letramento, a partir das propostas que descrevemos sumariamente acima. Poderíamos de certa forma, antecipar que uma prática pedagógica focada principalmente no estudo das correspondências fonográficas não seria suficiente para produzir uma alfabetização de qualidade, uma vez que a leitura e a escrita são ferramentas culturais praticamente inexistentes nas famílias de uma considerável maioria das crianças que frequentam muitas das nossas escolas públicas, dado o nível de escolaridade dos seus familiares. Portanto, as práticas sociais de leitura e escrita teriam que ser enfocadas do ponto de vista pedagógico, sob pena de tornar a aprendizagem da leitura e da escrita pouco significativa para a criança,privando-a do acesso a formas de comunicação que só aparecem nos textos escritos. Se por um lado, não podemos descartar a importância das práticas sócio- culturais da leitura e a apropriação da língua escrita, enquanto forma de comunicação, temos que considerar que também é um fato incontestável, que só a partir da descoberta do princípio alfabético e das convenções ortográficas, formamos um leitor e escritor autônomo. É preciso ter em mente que a grande maioria das nossas crianças só ingressam na escola, após os seis anos de idade. Portanto, não há porque protelar o desenvolvimento de um leitor mais autônomo, em nome de um prolongado processo de letramento, se há evidências na literatura científica de que atividades que estimulam de forma mais sistemática o desenvolvimento da consciência fonológica afetam, positivamente,a aprendizagem da leitura e da escrita, sobretudo quando esta estimulação Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 14 vem associada à palavra escrita através de jogos e atividades especificamente dirigidas para tal. Soares (2004) afirma que: “Alfabetizar letrando ou letrar alfabetizando, pela integração e pela articulação das várias facetas do processo de aprendizagem inicial da língua escrita, é sem dúvida, o caminho para superação dos problemas que vimos enfrentando nesta etapa da escolarização; descaminhos serão tentativas de voltar a privilegiar esta ou aquela faceta como se fez no passado, como se faz hoje, sempre resultando no reiterado fracasso da escola brasileira, em dar às crianças acesso efetivo ao mundo da escrita.” CAPÍTULO III - A NATUREZA POLÍTICA DA EDUCAÇÃO Texto de Paulo Freire Para que educadores e educadoras possam refletir sobre a favor de quem se colocam, é necessário que respondam questões do tipo: Quais sociedades querem construir? De que homem e mulher essa sociedade necessita? Que concepção de educação pode sustentar essas opções? As respostas a estes questionamentos apontarão, sobretudo, para duas possibilidades: para a Educação Bancária e tradicional ou para a Educação Popular e Libertadora. A educação básica tradicional considera os educandos como pessoas isoladas do mundo, como recipientes que devem ser “preenchidos” de conteúdos repassados por quem sabe mais. Esse modelo de educação tem, em síntese, o papel de reproduzir e de manter a lógica do sistema, pois adapta os indivíduos ao modelo político-econômico existente. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 15 Em Pedagogia da Autonomia, Freire diz que “ensinar exige a convicção de que a mudança é possível”, pois, caso contrário, a Educação Popular perderia o sentido de futuro. Não somos educadores e educandos, objetos da história, mas sujeitos capazes de, ao refletir sobre a realidade, buscar a mudança. Para tanto, educadores têm como tarefa criar condições pedagógicas para que os educandos pensem sobre suas condições de vida façam a leitura de mundo e reescrevam a história. CAPÍTULO IV - O DESENVOLVIMENTO HUMANO - FATORES E ASPECTOS Exemplo: na sala de aula, é fácil observar que algumas crianças procuram outras para a realização de suas tarefas, enquanto outras permanecem sozinhas. OS FATORES QUE INFLUENCIAM O DESENVOLVIMENTO HUMANO SÃO:  HEREDITARIEDADE;  CRESCIMENTO ORGÂNICO;  MATURAÇÃO NEUROFISIOLÓGICA;e  MEIO. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 16 CAPÍTULO V - PIAGET E VYGOTSKY - DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS PIAGET - A TEORIA DO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO Uma terminologia própria foi utilizada por Piaget (1896-1980) para explicar o que acontece em cada estágio do desenvolvimento. Dentre os termos utilizados, os principais são: assimilação, acomodação e esquema. De acordo com Bee (1984),assimilação significa incorporar as experiências ou objetos às estratégias ou conceitos já existentes, ou seja, construir a realidade; já a acomodação seria a modificação e ajustamento das estratégias ou conceitos em função de novas experiências ou informações; e, finalmente, entende-se por esquema, a ação ou estratégia interna ou externa, à qual a criança ou adulto assimila alguma experiência e que se acomoda à nova experiência. VIGOTSKI - A TEORIA DO DESENVOLVIMENTO INTERACIONISTA Vigotski (1896-1934) dedicou-se, dentre outros tópicos, à construção da crítica à noção de que se poderia construir conhecimento, sobre as funções psicológicas superiores humanas, a partir de experiências com animais. Ele criticou, também, as concepções que afirmavam serem as propriedades intelectuais dos homens resultado da maturação do organismo. Vigotski buscou as origens sociais destas capacidades humanas. Do que foi visto, é possível afirmar que tanto Piaget como Vygotsky, concebem a criança como um ser ativo, atento, que constantemente cria hipóteses sobre o seu ambiente. Há, no entanto, grandes diferenças na maneira de conceber o processo de desenvolvimento. As principais delas, em resumo, são as seguintes: Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 17 A) QUANTO AO PAPEL DOS FATORES INTERNOS E EXTERNOS NO DESENVOLVIMENTO Piaget privilegia a maturação biológica; Vygotsky, o ambiente social. Piaget, por aceitar que os fatores internos preponderam sobre os externos, postula que o desenvolvimento segue uma seqUência fixa e universal de estágios. Vygotsky, ao salientar o ambiente social em que a criança nasceu, reconhece que, em se variando esse ambiente, o desenvolvimento também variará. Neste sentido, não se pode aceitar uma visão única, universal, de desenvolvimento humano. B) QUANTO À CONSTRUÇÃO REAL Piaget acredita que os conhecimentos são elaborados espontaneamente pela criança, de acordo com o estágio de desenvolvimento em que esta se encontra. A visão particular e peculiar (egocêntrica) que as crianças mantêm sobre o mundo, vai, progressivamente, aproximando-se da concepção dos adultos: torna-se socializada e objetiva. Vygotsky discorda de que a construção do conhecimento proceda do individual para o social. Em seu entender, a criança já nasce em um mundo social e, desde o nascimento, vai formando uma visão desse mundo, através da interação com adultos ou crianças mais experientes. A construção do real é, então, mediada pelo interpessoal antes de ser internalizada pela criança. Desta forma, procede- se do social para o individual, ao longo do desenvolvimento. C) QUANTO AO PAPEL DA APRENDIZAGEM Piaget acredita que a aprendizagem subordina-se ao desenvolvimento e tem pouco impacto sobre ele. Com isso, ele minimiza o papel da interação social. Vygotsky, ao contrário, postula que desenvolvimento e aprendizagem são processos que se influenciam reciprocamente, de modo que, quanto mais aprendizagem, mais desenvolvimento. D) QUANTO AO PAPEL DA LINGUAGEM NO DESENVOLVIMENTO E Á RELAÇÃO ENTRE LINGUAGEM E PENSAMENTO Segundo Piaget, o pensamento aparece antes da linguagem, que apenas é uma das suas formas de expressão. A formação do pensamento depende, basicamente, da coordenação dos esquemas sensorimotores e não da linguagem.Esta só pode ocorrer depois que a criança já alcançou um determinado nível de habilidades mentais, subordinando-se, pois, aos processos de pensamento. A linguagem possibilita à criança evocar um objeto ou acontecimento ausente na comunicação de conceitos.Piaget, todavia, estabeleceu uma clara separação entre as informações que podem ser passadas por meio da linguagem e os processos que não parecem sofrer qualquer influência dela. Este é o caso das operações cognitivas, que não podem ser trabalhadas por meio de treinamento específico feito com o auxílio da linguagem. Por exemplo, não se pode ensinar, apenas usando palavras, a classificar, a seriar, a pensar com responsabilidade. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 18 Já para Vygotsky, pensamento e linguagem são processos interdependentes, desde o início da vida. A aquisição da linguagem pela criança modifica suas funções mentais superiores: ela dá uma forma definida ao pensamento, possibilita o aparecimento da imaginação, o uso da memória e o planejamento da ação. Neste sentido, a linguagem, diferentemente daquilo que Piaget postula, sistematiza a experiência direta das crianças e por isso adquire uma função central no desenvolvimento cognitivo, reorganizando os processos que nele estão em andamento. 1 - A inteligência, para Piaget, é o mecanismo de adaptação do organismo a uma situação nova e, como tal, implica na construção contínua de novas estruturas. Esta adaptação refere-se ao mundo exterior, como toda adaptação biológica. Desta forma, os indivíduos se desenvolvem intelectualmente a partir de exercícios e estímulos oferecidos pelo meio que os cercam. O que vale também dizer que a inteligência humana pode ser exercitada, buscando um aperfeiçoamento de potencialidades, que evolui "desde o nível mais primitivo da existência, caracterizado por trocas bioquímicas até o nível das trocas simbólicas" (RAMOZZI-CHIAROTTINO apud CHIABAI, 1990, p. 3). 2 - Para Piaget, o comportamento dos seres vivos não é inato, nem resultado de condicionamentos. Para ele, o comportamento é construído em uma interação entre o meio e o indivíduo. Esta teoria epistemológica (epistemo = conhecimento e logia = estudo) é caracterizada como interacionista. A inteligência do indivíduo, como adaptação a situações novas, portanto, está relacionada com a complexidade desta interação do indivíduo com o meio. Em outras palavras, quanto mais complexa for esta interação, mais “inteligente” será o indivíduo. As teorias piagetianas abrem campo de estudo não somente para a psicologia do desenvolvimento, mas, também, para a sociologia e para a antropologia, além de permitir que os pedagogos tracem uma metodologia baseada em suas descobertas. 3 - “Não existe estrutura sem gênese, nem gênese sem estrutura” (Piaget). Ou seja, a estrutura de maturação do indivíduo sofre um processo genético e a gênese depende de uma estrutura de maturação. Sua teoria nos mostra que o indivíduo só recebe um determinado conhecimento se estiver preparado para recebê-lo. Ou seja, se puder agir sobre o objeto de conhecimento para inserí-lo em um sistema de relações. Não existe um novo conhecimento sem que o organismo tenha já um conhecimento anterior para poder assimilá-lo e transformá- lo. O que implica os dois polos da atividade inteligente: assimilação e acomodação. É assimilação, na medida em que incorpora a seus quadros todo o dado da experiência ou estruturação por incorporação da realidade exterior, a formas devidas à atividade do sujeito (Piaget, 1982). É acomodação na medida em que a estrutura se modifica em função do meio, de suas variações. A adaptação intelectual constitui- Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 19 se, então, em um "equilíbrio progressivo entre um mecanismo assimilador e uma acomodação complementar" (Piaget, 1982). Piaget situa, segundo Dolle, o problema epistemológico, o do conhecimento, ao nível de uma interação entre o sujeito e o objeto. E "essa dialética resolve todos os conflitos nascidos das teorias, associacionistas, empiristas, genéticas sem estrutura, estruturalistas sem gênese, etc... e permite seguir fases sucessivas da construção progressiva do conhecimento" (1974, p. 52). 4 - O desenvolvimento do indivíduo inicia-se no período intrauterino e vai até aos 15 ou 16 anos. Piaget diz que a embriologia humana evolui, também, após o nascimento, criando estruturas cada vez mais complexas. A construção da inteligência dá-se, portanto, em etapas sucessivas, com complexidades crescentes, encadeadas umas às outras. A isto, Piaget chamou de “construtivismo sequencial”. A seguir, os períodos em que se dá este desenvolvimento motor, verbal e mental: A. Período Sensório-Motor - do nascimento aos 2 anos, aproximadamente. A ausência da função semiótica é a principal característica deste período. A inteligência trabalha através das percepções (simbólico) e das ações (motor),por meio dos deslocamentos do próprio corpo. É uma inteligência iminentemente prática. Sua linguagem vai da ecolalia (repetição de sílabas) à palavra-frase ("água" para dizer que quer beber água), já que não representa mentalmente o objeto e as ações. Sua conduta social, neste período, é de isolamento e indiferenciação (o mundo é ele). B. Período Simbólico - dos 2 anos aos 4 anos, aproximadamente. Neste período, surge a função semiótica, que permite o surgimento da linguagem, do desenho, da imitação, da dramatização, etc.. Podendo criar imagens mentais na ausência do objeto ou da ação é o período da fantasia, do faz de conta, do jogo simbólico. Com a capacidade de formar imagens mentais pode transformar o objeto em uma satisfação de seu prazer (uma caixa de fósforos em carrinho, por exemplo). É, também, o período em que o indivíduo “dá alma” (animismo) aos objetos ("o carro do papai foi 'dormir' na garagem"). A linguagem está em nível de monólogo coletivo, ou seja, todos falam ao mesmo tempo sem que respondam as argumentações dos outros. Duas crianças “conversando”, dizem frases que não têm relação com a frase que o outro está dizendo. Sua socialização é vivida de forma isolada, mas dentro do coletivo. Não há liderança e os pares são constantemente trocados. Existem outras características do pensamento simbólico que não estão sendo mencionadas aqui, uma vez que a proposta é de sintetizar as ideias de Jean Piaget, como, por exemplo, o nominalismo (dar nomes às coisas das quais não sabe o nome ainda), superdeterminação (“teimosia”), egocentrismo (tudo é “meu”), etc. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 20 C. Período Intuitivo - dos 4 anos aos 7 anos, aproximadamente. Neste período, já existe um desejo de explicação dos fenômenos. É a “idade dos porquês”, pois o indivíduo pergunta o tempo todo. Distingue a fantasia do real, podendo dramatizar a fantasia, sem que acredite nela. Seu pensamento continua centrado no seu próprio ponto de vista. Já é capaz de organizar coleções e conjuntos sem, no entanto, incluir conjuntos menores em conjuntos maiores (rosas no conjunto de flores, por exemplo). Quanto à linguagem não mantém uma conversação longa, mas já é capaz de adaptar sua resposta às palavras do companheiro. Os Períodos Simbólico e Intuitivo são também comumente apresentados como Período Pré-Operatório. D. Período Operatório Concreto - dos 7 anos aos 11 anos, aproximadamente. É o período em que o indivíduo consolida as conservações de número, substância, volume e peso. Já é capaz de ordenar elementos por seu tamanho (grandeza), incluindo conjuntos, organizando então o mundo de forma lógica ou operatória. Sua organização social é a de bando, podendo participar de grupos maiores, chefiando e admitindo a chefia. Já podem compreender regras, sendo fiéis a ela, e estabelecer compromissos. A conversação torna-se possível (já é uma linguagem socializada), sem que, no entanto, possam discutir diferentes pontos de vista, para que cheguem a uma conclusão comum. E. Período Operatório Abstrato - dos 11 anos em diante. É o ápice do desenvolvimento da inteligência e corresponde ao nível de pensamento hipotético-dedutivo ou lógico-matemático. É quando o indivíduo está apto para calcular uma probabilidade, libertando-se do concreto, em proveito de interesses orientados para o futuro. É, finalmente, a “abertura para todos os possíveis”. A partir desta estrutura de pensamento é possível a dialética, que permite que a linguagem se dê em nível de discussão, para se chegar a uma conclusão. Sua organização grupal pode estabelecer relações de cooperação e reciprocidade. 5 - A importância de se definir os períodos de desenvolvimento da inteligência reside no fato de que, em cada um, o indivíduo adquire novos conhecimentos ou estratégias de sobrevivência, de compreensão e interpretação da realidade. A compreensão deste processo é fundamental para que os professores possam, também, compreender com quem estão trabalhando. A obra de Jean Piaget não oferece aos educadores uma didática específica sobre como desenvolver a inteligência do aluno ou da criança. Piaget nos mostra que cada fase de desenvolvimento apresenta características e possibilidades de crescimento da maturação ou de aquisições. O conhecimento destas possibilidades faz com que os professores possam oferecer estímulos adequados a um maior desenvolvimento do indivíduo. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 21 “Aceitar o ponto de vista de Piaget, portanto, provocará turbulenta revolução no processo escolar (o professor transforma-se numa espécie de „técnico do time de futebol‟, perdendo seu ar de ator no palco). (...) Quem quiser segui-lo tem de modificar, fundamentalmente, comportamentos consagrados, milenarmente (aliás, é assim que age a ciência e a pedagogia começa a tornar-se uma arte apoiada, estritamente, nas ciências biológicas, psicológicas e sociológicas). Onde houver um professor „ensinando‟... aí não está havendo uma escola piagetiana!” (Lima, 1980, p. 131). O lema “o professor não ensina, ajuda o aluno a aprender”, do Método Psicogenético, criado por Lauro de Oliveira Lima, tem suas bases nestas teorias epistemológicas de J ean Piaget. CAPÍTULO VI - ETAPAS DO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO, NO MÉTODO PAULO FREIRE Codificação – círculo de cultura, Decodificação e descodificação (próprio do método PauloFreire); Análise e síntese; Fixação da leitura; e Problematização. 1.Experiência de PauloFreire na alfabetização de trabalhadores que trabalhavam na construção de Brasília -no círculo de cultura, os educandos respondem às questões provocadas pelo coordenador do grupo, aprofundando suas leituras do mundo. Quê? Por quê? Como? Para quê? Por quem? Para quem? Contra quê? Contra quem? A favor de quem? A favor de quê? As atividades de alfabetização exigem a pesquisa do que Freire chama "universo vocabular mínimo" entre os alfabetizandos. É trabalhando este universo que se escolhem as palavras que farão parte do programa. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 22 Estas palavras, mais ou menos dezessete, chamadas "palavras geradoras", devem ser palavras de grande riqueza fonêmica e colocadas, necessariamente, em ordem crescente, das menores para as maiores dificuldades fonéticas, lidas dentro do contexto mais amplo da vida dos alfabetizandos e da linguagem local, que por isso mesmo é, também, nacional. A decodificação da palavra escrita, que vem em seguida à decodificação da situação existencial codificada, compreende alguns passos, que devem, rigorosamente, se suceder. Exemplo - A palavra SAPATO Temos a palavra: SAPATO. Escreve-se: SAPATO. Escrevemos a mesma palavra com sílabas separadas: SA – PA – TO Apresentamos a família fonética das sílabas: SA – SE – SI – SO - SU PA – PE – PI – PO – PU TA - TE – TI – TO – TU Este conjunto das "famílias fonêmicas" da palavra geradora é denominado de "ficha de descoberta", pois ele propicia ao alfabetizando juntar os "pedaços", isto é, fazer dessas sílabas novas combinações fonêmicas, que, necessariamente, devem formar palavras da língua portuguesa. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 23 APRESENTAM-SE AS VOGAIS: A - E - I - O - U. Em síntese, no momento em que o(a) alfabetizando(a) consegue, articulando as sílabas, formar palavras, ele ou ela, está alfabetizado (a). O processo requer, evidentemente, aprofundamento, ou seja, a pós- alfabetização. A eficácia e validade do "método" consistem em partir da realidade do alfabetizando, do que ele já conhece do valor pragmático das coisas e fatos de sua vida cotidiana, de suas situações existenciais. Respeitando o senso comum e dele partindo, freire propõe a sua superação. CAPÍTULO VI – AVALIAÇÃO O Brasil não possui testes padronizados para avaliar a alfabetização.Isso se aplica tanto às etapas mais básicas quanto mais avançadas da aquisição da leitura e escrita. Diversas Secretarias Municipais de Educação utilizam testes para avaliar competências de alfabetização em suas redes de ensino. As competências da alfabetização Os avanços da Psicologia Cognitiva da Leitura vêm permitindo um mapeamento bastante detalhado das competências que precedem, acompanham e se tornam possíveis com a alfabetização. Não cabe discutir aqui a forma, momento ou método de ensino dessas competências, trata-se apenas de descrevê-las. Uma apresentação sistemática dessas competências encontra-se no National Reading Panel Report: Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 24 A- Competências que viabilizam– e, portanto, antecedem a alfabetização:  A capacidade de lidar com livros e textos impressos;  A consciência fonológica, isto é a capacidade de discriminar sons; e  A familiaridade com a metalinguagem da aprendizagem e da escola, incluindo capacidades relativas ao entendimento de comandos e instruções usuais no ambiente escolar. B- Competências centrais ao processo de alfabetização: 1. Na leitura:  A consciência fonológica - a ideia de que diferentes letras produzem diferentes sons;  O princípio alfabético - a ideia de que há uma relação entre a presença e posição de um grafema e o som que ela tem na palavra;  A decodificação – a capacidade de pronunciar o som de uma palavra escrita ou transformar em escrita uma palavra ouvida; e  A fluência – que inclui a correção e ritmo de leitura de textos. 2. Na escrita  Capacidade de escrever de forma legível e com fluência (caligrafia);  Capacidade de escrever de forma ortográfica; e  Capacidade de escrever frases sintática e semanticamente corretas. C - Competências que precedem -acompanham e sucedem o processode alfabetização – mas são independentes do mesmo:  Desenvolvimento do léxico – quanto maior o léxico, maior a capacidade de leitura e de compreensão; e  Desenvolvimento de competências - compreensão de texto, que incluem competências sobre a estrutura e estrutura, estrutura, lógica e usos sociais dos diferentes tipos de texto, bem como estratégias gerais de compreensão e produção de textos. Esta lista de competências constitui o currículo dos programas de alfabetização da maioria dos países do mundo, que adotam o sistema alfabético. INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO Definida a alfabetização e as competências que a possibilitam, cabe identificar os instrumentos mais adequados para avaliar se o aluno está alfabetizado. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 25 Nas escolas tradicionais, a avaliação se dá quando o diretor “toma a leitura” dos alunos para verificar se estão alfabetizados. O ditado continua sendo um instrumento prático e eficaz para verificar a capacidade de transcrição escrita do código alfabético. Professores da série seguinte à alfabetização são os melhores juízes para avaliar se o aluno está ou não alfabetizado: o aluno que não lê o texto do livro, não copia o que precisa copiar no tempo adequado e se não toma notas de forma defina, não tem funcionalidade. Portanto, é um analfabeto funcional escolarizado. Embora não sejam tecnicamente robustas, essas práticas contêm os elementos essenciais de uma boa avaliação das competências centrais da avaliação. PARA AVALIAR A FLUÊNCIA DE LEITURA Instrumentos mais robustos e sofisticados devem incluir:  Um texto que o aluno não tenha lido, de estrutura morfossintática, compatível com a idade e nível de desenvolvimento do aluno;  Uma leitura cronometrada;  Contagem de erros (gaguejar, parar, silabar, decodificar). CAPÍTULO VIII - MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO São muitas as formas de alfabetizar e, cada uma delas, destaca um aspecto no aprendizado. Desde o método fônico, adotado na maioria dos países do mundo, que faz associação entre as letras e sons, passando pelo método da linguagem total, que não utiliza cartilhas, e o alfabético, que trabalha com o soletramento, todos contribuem, de uma forma ou de outra, para o processo de alfabetização. MÉTODOS SINTÉTICOS OU ANALÍTICOS Existem duas opções para o ensino da leitura: ou parte-se da parte para o todo, que são os métodos sintéticos, ou parte-se do todo para as partes, os chamados métodos analíticos. A partir desses métodos, é possível delinear, também, como funcionam os métodos de alfabetização. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 26 O método sintético estabelece uma correspondência entre o som e a grafia, entre o oral e o escrito, através do aprendizado por letra por letra, ou sílaba por sílaba e palavra por palavra. Os métodos sintéticos podem ser divididos em três tipos: o alfabético, o fônico e o silábico. No alfabético, o estudante aprende inicialmente as letras, depois forma as sílabas juntando as consoantes com as vogais, para, depois, formar as palavras que constroem o texto. No fônico, também conhecido como fonético, o aluno parte do som das letras, unindo o som da consoante com o som da vogal, pronunciando a sílaba formada. Já no silábico, ou silabação, o estudante aprende primeiro as sílabas para formar as palavras. Por este método, a aprendizagem é feita primeiro através de uma leitura mecânica do texto, através da decifração das palavras, vindo posteriormente a sua leitura com compreensão. Neste método, as cartilhas são utilizadas para orientar os alunos e professores no aprendizado, apresentando um fonema e seu grafema correspondente por vez, evitando confusões auditivas e visuais. Como este aprendizado é feito de forma mecânica, através da repetição, o método sintético é tido pelos críticos como mais cansativo e enfadonho para as crianças, pois é baseado apenas na repetição e é fora da realidade da criança, que não cria nada, apenas age sem autonomia. MÉTODO ANALÍTICO O método analítico, também conhecido como “método olhar-e-dizer”, defende que a leitura é um ato global e audiovisual. Partindo deste princípio, os seguidores do método começam a trabalhar a partir de unidades completas de linguagem, para depois dividi-las em partes menores. Por exemplo, a criança parte da frase para extrair as palavras e, depois, dividi- las em unidades mais simples, as sílabas. Este método pode ser divido em palavração, setenciação ou global. Na palavração, como o próprio nome diz, parte-se da palavra. Primeiro, existe o contato com os vocábulos, em uma sequência que engloba todos os sons da língua e, depois da aquisição de um certo número de palavras, inicia-se a formação das frases. Na setenciação, a unidade inicial do aprendizado é a frase, que é depois dividida em palavras, de onde são extraídos os elementos mais simples: as sílabas. Já no global, também conhecido como conto e estória, o método é composto por várias unidades de leitura que têm começo, meio e fim, sendo ligadas por frases com sentido para formar um enredo de interesse da criança. Os críticos deste método dizem que a criança não aprende a ler, apenas decora. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 27 CAPÍTULO IX - MÉTODO DA LINGUAGEM TOTAL Também conhecido como “whole language”, a Linguagem Total, criada pelos lingUistas Keneth e Yetta Goodman, tem como principal tese a ideia de que se “aprende lendo”, e que, portanto, a utilização de imagens e sons deve ser evitada. Por este método, o professor apresenta textos para os alunos e os lê em voz alta, fazendo com que os estudantes acompanhem. A partir daí, a criança começa a conhecer a linguagem escrita, aprendendo as palavras, as sílabas e as letras. Sem utilizar cartilhas, este método, que foi bastante disseminado nos Estados Unidos, teve como principal crítica a falta de questões relacionadas à compreensão da natureza alfabética do sistema de escrita e à aprendizagem do valor sonoro do alfabeto. Embora em menor escala, este método ainda é utilizado em estabelecimentos alternativos no Brasil. CAPÍTULO X - A AQUISIÇÃO DA LÍNGUA ESCRITA COMO PROCESSO SOCIOCULTURAL Os pressupostos teóricos de Vigotski (1998), cuja contribuição tem sido valiosa no campo educacional, iluminam a discussão sobre o aprendizado Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 28 da escrita (considerada como um sistema de signos socialmente construídos), descrevendo o processo de apropriação da escrita como processo cultural, de caráter histórico, envolvendo práticas interativas. A aprendizagem da escrita refere-se, pois, à aquisição de um sistema de signos que, assim como os instrumentos, foram produzidos pelo homem em resposta às suas necessidades socioculturais concretas. A escrita, então, não deve ser considerada como mero instrumento de aprendizagem escolar, mas como produto cultural. Assim entendida, possibilita a exploração, no contexto da sala de aula, de diferentes portadores de textos, explicitando os variados usos e funções que lhes são inerentes numa sociedade letrada. Apesar dos avanços significativos dos estudos sobre o processo de alfabetização, observa-se, em alguns casos, que a prática da escola parece distanciada da funcionalidade da escrita no contexto da sociedade, limitando-se aos usos mecânicos e descontextualizados. Corroborando esse pensamento Vigotski afirma: “Até agora, a escrita ocupou um lugar muito estreito na prática escolar, em relação ao papel fundamental que ela desempenha no desenvolvimento cultural da criança. Ensina-se as crianças a desenhar letras e a construir palavras com elas, mas não se ensina a linguagem escrita. Enfatiza-se de tal forma a mecânica de ler o que está escrito, que acaba-se obscurecendo a linguagem como tal (1998, p. 139). Portanto, o que se entende é que a alfabetização transcende a mecânica do ler e do escrever (codificação/decodificação), ou seja, a alfabetização é um processo histórico-social multifacetado, envolvendo a natureza da língua escrita e as práticas culturais de seus usos. “Alfabetizar não é só ler, escrever, falar sem uma prática cultural e comunicativa, uma política cultural determinada” (Frago, 1993, p. 27). Observa-se, assim, que a concepção de alfabetização tem se ampliado no cenário sócio-educacional, estimulando práticas escolares diferenciadas uma vez que tais questões, de uma forma ou de outra, chegam à escola. É importante registrar que a criança, no transcurso do dia a dia, vivencia usos de escrita, percebendo que se escreve para comunicar alguma coisa, para auxiliar a memória, para registrar informações. E que, da mesma forma, recorremos à escrita, através da leitura, para, também, obter-se informações, e buscar entretenimento. É hora, então, de a escola parar de simplesmente ensinar a escrita, para dar espaço a uma escrita dinâmica, explorando as idéias, as emoções, as inquietações, escrevendo e deixando escrever. (Kramer, 2000). Consequentemente, a escola precisa pensar a alfabetização como processo dinâmico, como construção social, fundada nos diferentes modos de participação das crianças nas práticas culturais de uso da escrita, transcendendo a visão linear, fragmentada e descontextualizante presente nas salas de aula,onde se ensina/aprende a ler e a escrever. Oliveira, acerca desta questão, reconhece que:por isso, é de fundamental importância que, desde o início, a alfabetização se dê em um contexto de interação pela escrita. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 29 Por razões idênticas, deveria ser banido da prática alfabetizadora todo e qualquer discurso (texto, frase, palavra, “exercício”) que não esteja relacionado com a vida real ou o imaginário das crianças, ou, em outras palavras, que não esteja por elas carregado de sentido. (Oliveira, 1998, pp. 70-71). O processo de alfabetização, ao longo do tempo, tem sido organizado e orientado por metodologias propostas nas cartilhas. Essas metodologias supõem que os alfabetizandos detêm os mesmos conhecimentos e as mesmas experiências com a escrita, melhor dizendo, presumem que as crianças chegam à escola sem construções teórico- práticas, a respeito do ler e do escrever. Por essa razão, a proposta escolar de alfabetização tem o mesmo ponto de partida sem considerar os diferentes níveis ou graus de inserção da criança no mundo letrado. Percebemos, ainda, que o desenvolvimento da escrita na criança está relacionado às práticas cotidianas (socioculturais) de participação em eventos de leitura e escrita. Nesta direção, os estudos sobre letramento (Tfouni, 1997; Soares, 1999; Rojo, 1998; Kleiman, 1995) focalizam as dimensões sócio-históricas na aquisição da língua escrita, mostrando que indivíduos não-alfabetizados, mas partícipes das sociedades letradas (da cultura, dos modos de produção e dos valores sociais) constroem concepções a respeito do sistema de escrita e identificam seus diferentes usos e funções. Por um lado, essa questão dá conta de que as práticas de alfabetização possuem uma dimensão histórica e um significado ideológico, em que podem estar presentes as relações de poder e de dominação. A língua escrita, desde sua origem, está ligada aos processos de dominação/poder, participação/exclusão inerentes às relações sociais, no entanto, pode estar ligada, também, ao desenvolvimento sociocultural e cognitivo dos povos, provocando mudanças significativas nas práticas comunicativas (Tfouni, 1997). Por outro lado, vale lembrar que dentro do contexto social e do contexto familiar da criança, ocorrem práticas e usos da escrita, de forma natural e espontânea, das quais ela participa direta ou indiretamente. O letramento decorre dessa participação, da vivência de situações em que o ler e o escrever possuem uma funcionalidade, uma significação. Os atos cotidianos, corriqueiros, de ler um jornal, redigir um bilhete, ler umlivro, fazer anotações, ou seja, usar textos escritos como fonte, seja de informação, seja de entretenimento, contribuem para que as crianças percebam as diferentes formas de apresentação do texto escrito, bem como para que identifiquem seus diferentes sentidos e funções. Assim, nesse contexto, o letramento é desenvolvido mediante a participação da criança em eventos que pressupõem o conhecimento da escrita e o valor do livro como fonte fidedigna de informação e transmissão de valores, aspectos estes que subjazem ao processo de escolarização com vistas ao letramento acadêmico. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 30 Note-se que para a criança cujo letramento se inicia no lar, no processo de socialização primária, não procede a preocupação sobre se ela aprenderá ou não, muito presente, entretanto, nos pais de grupos marginalizados(Kleiman, 1998, p. 183). A família é, contudo, apenas um dos espaços de letramento e fora dela, estão os inúmeros escritos urbanos, carregados de sentido e de funcionalidade. Estão, também, os escritos escolares, cujo uso institucionalizado e burocratizado bloqueia as ideias da criança, propondo-lhe como formas de ler e escrever atividades mecânicas e repetitivas. Sabe-se que dentro da sala de aula, as atividades de escrita são constantes, todavia, não dão conta da gama de usos e funções desse objeto cultural no contexto da sociedade mais ampla. Neste ponto, indagamos: como tornar letrada a criança, destituindo a escrita escolar das marcas socioculturais? A prática alfabetizadora deve levar a criança ao mundo letrado através do acesso a diferentes formas de leitura e de escrita, ampliando seus saberes lingüísticos a partir do uso reflexivo da língua nas variadas situações de seu funcionamento. Outra consideração a ser feita é que “há diferentes tipos e níveis de letramento, dependendo das necessidades, das demandas do indivíduo e do seu meio, do contexto cultural” (Soares, 1998, p. 49). Portanto, o grau de letramento pode variar em decorrência da variação das oportunidades de participação em práticas sociais de usos efetivos da leitura e da escrita. A aprendizagem da escrita é, portanto, processual e se constrói em ritmo diferente em cada indivíduo. Assim, é natural que, em uma situação de alfabetização, as crianças estejam em níveis diferentes de alfabetismo, considerando que: “O ponto de partida dessa discussão é o fato de que o aprendizado das crianças começa muito antes de elas frequentarem a escola. Qualquer situação de aprendizagem com a qual a criança se defronta na escola tem sempre uma história prévia.” Por exemplo, as crianças começam a estudar aritmética na escola, mas muito antes tiveram alguma experiência com quantidades – tiveram que lidar com operações de divisão, adição, subtração e determinação de tamanho. Conseqüentemente, as crianças têm sua própria aritmética pré-escolar, que somente os psicólogos míopes podem ignorar (Vigotski, 1998, p. 110). O pensamento vigotskiano, nessa perspectiva, dando conta de que a criança chega à escola com conhecimentos socialmente construídos, corrobora as ideias sobre letramento, segundo as quais, na aprendizagem da escrita, a criança não parte do zero. Em um processo essencialmente social e interativo, ela se apropria da língua escrita em virtude de sua imersão no mundo letrado. À luz dessas reflexões, convém lembrar que o aprendizado da escrita, na escola, coloca a criança diante de alguns dilemas referentes à natureza desse objeto cultural (a própria escrita). Como exemplo, citamos a arbitrariedade presente na representação gráfica de palavras, a segmentação da escrita e, ainda, a organização espacial da grafia. Quanto à representação gráfica das palavras, a criança, a partir de hipóteses construídas na escola sobre a relação fala/ escrita, principalmente Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 31 no início da escolarização, tende a escrever como fala, fazendo uma transcrição fonética. A esse respeito Cagliari comenta: Desde os primeiros contatos com a escrita, o aluno ouve o professor dizer que o nosso sistema é alfabético e que isso significa que escrevemos uma letra para cada som falado nas palavras. Nosso sistema usa letras, às quais são atribuídos valores fonéticos. Mas o uso prático desse sistema não se reduz a uma transcrição fonética. Portanto, o professor não pode dizer simplesmente para o aluno observar os sons da fala, as vogais, as consoantes, e representá-las na escrita por letras. Esse é o primeiro passo, mas não é tudo. Feito isso, o aluno precisa aprender que, se cada um escrevesse do jeito que fala, seria um caos. (1998, p. 354). Desse modo, é preciso lembrar a existência da ortografia, orientando e padronizando a forma de escrever. As regras ortográficas, a natureza da ortografia, devem ser socializadas com os alunos, a fim de permitir a compreensão da natureza das relações entre fala e escrita. Algumas orientações iniciais, no processo de alfabetização, poderão ajudar o aluno a perceber regras que orientam a grafia das palavras. Essas orientações, aliadas a usos funcionais da escrita, constituem-se mais eficazes que os tradicionais ditados e tarefas de cópias intermináveis. A aquisição da escrita ortográfica, no entanto, constitui-se campo fértil em dificuldades para a criança. Comumente, no processo de alfabetização, as normas da convenção ortográfica não são socializadas, prevalecendo como mecanismo importante na aprendizagem da ortografia as atividades de cópias e de ditados. É fundamental, então, a compreensão de que a aquisição da escrita ortográfica não ocorre passivamente, não se constitui em armazenamento/memorização de formas corretas de grafar palavras, mas pressupõe e requer um processo ativo de aprendizagem (Morais, 1997, 2000). Tratando, agora, da segmentação da escrita, é bom lembrar que as crianças, notadamente no processo de aquisição, encontram-se em constante conflito quanto às relações entre as pausas na fala e as pausas na escrita: “As pausas da fala nem sempre têm correspondência fixa com as pausas ou sinais de pausas (vírgulas, pontos) da escrita. A segmentação das palavras na escrita, indicada pelo espaço em branco, corresponde menos ainda a pausas ou segmentações na fala (Cagliari, 1998, p. 127).” Ou seja, não se escreve como se fala, considerando que existe uma normalização ortográfica. Escreve-se da esquerda para a direita, e de cima para baixo. Parece óbvio. Mas não é, tendo em vista que a descoberta da escrita pelas crianças não ocorre homogeneamente, elas não aprendem no mesmo ritmo e, como foi afirmado anteriormente nesse estudo, possuem diferentes níveis e graus de letramento. Esses aspectos, portanto, devem ser enfatizados na alfabetização de forma que os alunos possam construir concepções de escrita, coerentes com a natureza desse objeto cultural. No que concerne à atitude do professor perante as “dificuldades” das crianças na aquisição da escrita, via de regra, essas dificuldades Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 32 relacionam-se à escrita ortográfica (trocas de letras, supressão de letras, hipercorreção) e costumam deixar o alfabetizador em estado de ansiedade por não saber como agir e, em determinados casos, lançando mão daquilo que a intuição lhe diz. Na medida em que a turma vai se tornando mais heterogênea, muitas são as indagações que o professor se suscita. Indagações que vão ao encontro da necessidade de um trabalho de alfabetização que se configure homogêneo e mecânico. Em uma alfabetização dessa natureza (mecânica), todos os alunos são submetidos ao mesmo processo linear de alfabetização, apesar de se encontrarem em níveis diferentes de letramento e de alfabetização. Essa prática contribui para a perpetuação da desigualdade na escola, considerando que os alunos que encontram “dificuldades” permanecem no mesmo ponto, sem muitas chances de avançar, para angústia de quem alfabetiza. Entretanto, as supostas dificuldades representam, na verdade, o nível de compreensão da criança em relação à escrita, constituindo-se, na vertente vigotskiana, o conhecimento potencial do aluno, perspectivando um conhecimento real a ser construído. Assim, as interpretações da criança na apropriação da leitura e da escrita representam, de fato, o prenúncio de um conhecimento futuro. Decorrendo, daí, a importância de se considerar as experiências que os alunos possuem, melhor dizendo, é imprescindível que a escola perceba e aproveite os saberes que o educando construiu fora da escola, nos campos da cultura, do social e do linguístico. Na sua idealização, o professor espera um aluno atento, interessado, sequioso por aprender a ler. Tal criança imaginária já conhece as letras do seu nome e de seus familiares, tem, a sua volta, variados materiais de leitura e de escrita e observa como essas atividades fazem parte do social e do profissional de seus pais. Essa criança, naturalmente, existe, mas só é encontrada numa pequena camada da população e aprende a ler e a escrever antes e fora dela, tanto quanto dentro dela (Golbert, 1988, p. 10). Na verdade, as crianças que chegam às classes de alfabetização, na escola pública, são crianças reais, capazes de aprender a ler e a escrever. Resta que a escola identifique o seu percurso no processo de aquisição da língua escrita, organizando suas atividades de modo que a vivência do ler e do escrever, na sala de aula, seja rica, útil, podendo informar, transmitir conhecimentos, entreter e, enfim, tenha a gama de usos e funções socioculturais, que a caracterizam na sociedade. Nesta percepção, estão implícitas concepções de língua e de linguagem, pressupondo ambas na condição de artefatos culturais e de instrumentos de mediação do indivíduo com o outro e com o mundo. Língua e linguagem constituem-se sistemas simbólicos, de natureza histórico-social, permeando as interações sociais, tendo, portanto, como propósitos situações lingüísticas significativas. (Oliveira, 1992; Matêncio, 1998; Geraldi, 1997; entre outros). Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 33 O pensamento vigotskiano, no que concerne a essa questão, concebe a linguagem como intercâmbio social, instrumento importante na formação de conceitos e na compreensão do real. Por conseguinte, a linguagem é fundamental no desenvolvimento das funções psicológicas superiores, estando estreitamente ligada ao pensamento. Em resumo, língua e linguagem cumprem diferentes funções,enquanto práticas sociais contextualizadas (comunicam, transmitem informações, favorecem a interação homem/mulher/mundo, dentre outros). CAPÍTULO XI - EJA – EDUAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de ensino que acolhe jovens e adultos que, por várias razões, não tiveram a devida escolarização necessária durante a idade apropriada, é uma oportunidade para que esses cidadãos possam se alfabetizar e se tornar letrados, atuando na rede escolar pública. Conforme o Plano Estadual de Educação (2008-2017, p. 54), a demanda de alunos da EJA é caracterizada por dois grupos distintos: a população de jovens, na faixa etária de 15 a 24 anos, em que o aluno tem idade suficiente para exercer direitos políticos, civis e sociais e também apresenta especificidade pelas quais passam os interesses, motivações e experiências de vida. O outro grupo, formado por adultos na faixa etária de 24 anos em diante, tem, além dos direitos políticos, uma capacidade cognitiva de maior reflexão sobre o conhecimento e sobre os seus próprios processos de aprendizagem, tendo em vista a sua experiência vivencial, suas responsabilidades, limites e seus objetivos diante dos desafios da vida. A Lei de Diretrizes e Bases 9.394/96 da Educação Nacional, em seu artigo 37, revela a preocupação com aquelas pessoas que não tiveram a possibilidade de estudar na idade apropriada, garantindo-lhes a oportunidade de continuidade aos estudos. Os jovens e adultos sentem necessidade de voltar ou começar a frequentar a escola, querem aprender a ler e a escrever, querem se alfabetizar. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 34 Segundo Solé (1998), para que um indivíduo possa ler é necessário que ele domine as habilidades de decodificação da escrita e compreender o que está lendo, é isso que os estudantes almejam. “O comando da leitura e da escrita se dá a partir de palavras e de temas significativos à experiência comum dos alfabetizados e não de palavras e de temas apenas ligado à experiência do educador (FREIRE, 1989, p. 18).” Os temas a serem discutidos e estudados devem ser os que estão presente no dia a dia dos estudantes, que são significativos à sua aprendizagem, de modo a facilitar a compreensão dos conteúdos e, ao mesmo tempo, facilitar o processo de assimilação do que estão lendo que, por conseguinte, se sentirão mais motivados a estudar porque vêem sentido no que aprendem na escola. CAPÍTULO XI - ALFABETIZAÇÃO A PARTIR DE SITUAÇÕES – PROBLEMA SITUAÇÕES-PROBLEMA A PARTIR DE CANTIGAS Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 35 O TREM DE FERRO QUANDO SAI DO PERNANBUCO VAI FAZENDO CHIC-CHIC ATÉ CHEGAR NO CEARÁ. QUE VIAGEM DEMORADA, VOCÊ NÃO PODE IMAGINAR. FORAM TRINTA HORAS SÓ PRA IR. QUANTOS DIAS SERIAM PARA IR E VOLTAR? Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 36 FUI NO ITORORÓ BEBER ÁGUA E NÃO ACHEI. SÓ TINHA PARA COMPRAR E CARO COMO NEM SEI. CADA LITRO TRÊS REAIS. AI MEU DEUS, QUANTO VOU PAGAR, SE PRECISO LEVAR SEIS? E ISTO É SÓ PARA UM DIA. QUANTO VOU GASTAR EM UM MÊS? Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 37 SE ESTA RUA, SE ESTA RUA FOSSE MINHA EU MANDAVA, EU MANDAVA LADRILHAR COM PEDRINHAS, COM PEDRINHAS DE BRILHANTE PARA O MEU, PARA O MEU AMOR PASSAR... COMO O BRILHANTE É CARO, O LADRILHO VOU MUDAR. USAREI PÉTALAS DE ROSAS, PARA O CAMINHO PERFUMAR. COMPRAREI 10.000 VERMELHAS PARA NENHUM ESPAÇO SOBRAR. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 38 EM CADA 10 METROS DE RUA, 1000 PÉTALAS VOU USAR. A RUA MEDE 100 METROS. SERÁ QUE PÉTALAS VÃO FALTAR? De acordo com Marx, Engels, Vygotsky, Bakhtin e outros autores da perspectiva histórico-cultural, a espécie humana aprendeu e aprende, desenvolveu-se e se desenvolve, à medida que enfrenta e busca superar os obstáculos à sua existência e sobrevivência. A referência político-metodológica-pedagógica do processo alfabetizador é a escolha, por alfabetizandas e alfabetizandos, da SituaçãoProblema-Desafio. E, é fundamental que não só escolham, mas que também problematizem a própria situação concreta de vida. Situação Problema-Desafio: o dizer de cada uma e de cada um sobre o próprio sentimento-pensamento e pensamento-sentimento, daquilo que mais incomoda no dia a dia. CAPÍTULO XII - ENTREVISTA Doutora em psicologia pela Universidade de São Paulo, Telma Weisz criou o Programa de Formação de Professores Alfabetizadores (Profa), lançado em 2001, pelo Ministério da Educação. Hoje, coordena um programa semelhante, o Letra e Vida, na Secretaria de Estado da Educação de São Paulo. Nesta entrevista, ela destaca que a alfabetização é um processo contínuo e fala da responsabilidade da escola para combater o analfabetismo funcional. O que é ser alfabetizado? Vejo a aquisição do sistema de escrita - popularmente conhecida como alfabetização e que chamamos de alfabetização inicial - como parte de um processo. Mesmo os adultos nunca dominam todos os tipos de texto e estão sempre se alfabetizando. Ser alfabetizado é mais do que fazer junções de letras, como B com A, BA. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 39 Qual a diferença entre alfabetização e letramento? No passado, era considerado alfabetizado quem sabia fazer barulho com a boca diante de palavras escritas. Só, então, estudava-se Língua Portuguesa e gramática. Para quem acredita no letramento, a criança primeiro aprende o sistema da escrita e só depois faz uso social da língua. Assim como antes, isso dissocia a aquisição do sistema das práticas sociais de leitura e escrita. Para evitar essa divisão, passamos a usar o termo cultura escrita. Qual a importância do professor como leitor-modelo? A leitura é uma prática e para ensinar você precisa aprender com quem faz. Porém, este é um nó: como formar leitores se você não lê bem? E como ler bem se você saiu de uma escola que não forma leitores? A solução é de longo prazo e requer programas de educação continuada que tenham um trabalho sistemático nessa área. Nas reuniões do Profa, eram dados três textos ao formador. Ele escolhia um e lia para os professores, que recebiam os três. Ao fim do ano, eles haviam lido 150 textos de vários gêneros. Como os pais podem colaborar na alfabetização? Lendo todos os dias para as crianças. Quem passa a primeira infância ouvindo leituras interessantes se apropria da linguagem escrita. Assim, na hora em que lê e escreve de forma autônoma, já sabe o que e como produzir. Isso também possibilita à criança entender os textos que lê. Por que saem das escolas tantos analfabetos funcionais? Porque a escola só reconhece como alfabetização a aquisição do sistema. Em vez de investir na competência leitora, concentra-se no ensino de gramática. Por isso há analfabetos funcionais com muitos anos de escolaridade. Formar leitores e gente capaz de escrever é uma tarefa de coordenadores, gestores e professores de todas as séries e disciplinas. Eu diria que leitura e escrita são o conteúdo central da escola e têm a função de incorporar a criança à cultura do grupo em que ela vive. Isso significa dar ao filho do analfabeto, oportunidades iguais às do filho do professor universitário. Como reverter esse quadro? Lendo, discutindo, trocando ideias, vendo o que cada um entendeu e pesquisando em fontes diversas. É preciso tornar o texto familiar, conhecer suas características e trazer para a sala práticas de leitura do mundo real. Se a função da escola é dar instrumentos para o indivíduo exercer sua cidadania, é preciso ensinar a ler jornal, literatura, textos científicos, de história, geografia, biologia. Consegue ler bem quem teve algum tipo de Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 40 oportunidade fora da escola. Os que dependem só dela, são os analfabetos funcionais. E a escola faz isso porque não compreende claramente a sua função. CAPÍTULO XIII - TECNOLOGIA NA EDUCAÇÃO PORQUE INTRODUZIR A TECNOLOGIA NA ALFABETIZAÇÃO? Com a implementação no Brasil, como na maioria dos países do mundo, de um novo modelo econômico, ocorreu uma mudança em todos os setores da sociedade – economia, política, relações de trabalho, valores. Para o país poder adequar-se a esse novo modelo e concorrer de igual para igual com os países desenvolvidos no mercado internacional, é fundamental empregar os avanços científicos e tecnológicos no processo de desenvolvimento econômico. Para tanto, é necessário preparar a população para fazer uso da tecnologia de ponta, ao mesmo tempo em que a mesma é disseminada pelo país. Entretanto, o computador tem chegado à escola, na maioria dos casos, sem o respaldo de uma proposta pedagógica gerada a partir de um estudo sistemático da comunidade escolar envolvida; a maioria dos projetos, envolvendo Educação e Informática, desenvolvidos pelas escolas, são elaborados por grupos externos a elas, o que sujeita os poucos professores que se envolvem nesses projetos ao papel de meros discípulos, receptores de conhecimentos alheios e os tornam alienados das reais necessidades e interesses de sua comunidade. Muitas vezes, as direções das escolas usam a tecnologia como marketing, como forma de atrair maior número de alunos; e os demais professores, os que deveriam ser os principais responsáveis pelo uso desses recursos em sala de aula, não sabem como lidar com eles nem como usá-los em suas aulas, o que mantém a grande maioria dos professores das escolas à margem do processo; também não lhes são fornecidas condições de tempo e estudo para inserir-se no processo. O momento que passamos de renovação sócio-técnico-cultural (uma revolução organizacional da informação, da cultura, da ciência) requer muita atenção na forma como deve ser feita esta alfabetização digital, pois deve ser feita com conhecimento, gradualidade e muitas verificações. Para que se possa atingir a tão falada "qualidade da educação", é imprescindível que todos os membros da comunidade escolar, em especial Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 41 os professores, sejam envolvidos no processo e na discussão sobre os objetivos e as possibilidades da introdução do computador e das redes de computadores na escola, revisando e renovando conteúdos e procedimentos, de forma que uma nova lógica, que realmente beneficie a todos, possa instaurar-se na escola. Um modelo pedagógico ideal seria aquele que deixa de ser voltado ao nocionismo, solicitando a inteligência da criança. Muito se discute de que forma a informatização nas escolas ou a alfabetização digital pode ajudar no emprego deste modelo. INSTRUMENTOS DIGITAIS O COMPUTADOR No modelo pedagógico atual a criança não tem tempo de errar. Deve fazer rapidamente e não se auto corrige. O computador permite o ensaio e o erro em um tempo ágil. Sendo assim, a criança que trabalha no computador é atenta e pesquisadora de erros, pois ela está aberta para isso, diferente de ter seu texto todo rasurado pelo professor, o que a desmotiva ao invés de motivar. Outro ponto importante é a forma que a criança encara os problemas a serem resolvidos. Utilizando o computador ela transforma o problema em subproblemas, tornando-os mais fáceis de serem resolvidos. No computador, a criança tem a sensação de estar no domínio da situação, pois é ela quem está no comando, diferente da TV, onde ela é passiva. A criança se desafia e ao mesmo tempo estimula sua coordenação motor- visual, desenvolve a lógica e o aprendizado. Cada aluno possui um ritmo de aprendizado. Se cada criança possui um computador, ela vai aprender em seu ritmo e, ao mesmo tempo, é estimulada a buscar caminhos diversos para o aprendizado. Além do computador em si, a introdução das novas tecnologias da comunicação (internet) na escola pode, também, significar uma possibilidade de transformar o processo de cópia, transmissão e imposição de conhecimentos prontos, próprios do modelo tradicional de educação (ou seja, livros), num processo dinâmico de estruturação e fortalecimento de novas idéias; idéias que podem transformar a escola num espaço vivo de produção, recepção e socialização de conhecimentos. O computador e as redes de computadores na escola possibilitam que tanto alunos quanto professores percebam que a verdade e a universalidade próprias do modelo tradicional não são mais questões fundamentais; com a informática pode-se perceber que as informações veiculadas são sempre transitórias, e refletem o estado atual de uma determinada situação; o conhecimento não é mais estático, ele encontra-se em metamorfose permanente. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 42 Um aspecto negativo é que a criança acaba se tornando dependente do computador para realização de suas tarefas. Sua utilização deve ser cuidadosamente monitorada para que não haja dependência. OS JOGOS DIGITAIS Um conceito interessante é o edutainment, que seria a junção das palavras education (educação) e entertainment (entretenimento, diversão). O lado positivo dessa união é que os jogos predispõem um ambiente privilegiado para a aprendizagem, com isso não é criado um abismo entre a escola e os jovens, crianças. O vídeo-game permite aos alunos a análise, reflexão e a formalização das estratégias para vencer. Os jogos de simulação apresentam a realidade em base a um novo modelo de regras precisas, a serem descobertas ou utilizadas, para produzir determinados efeitos. Essa representação, além de conter um modelo de mundo, contém um modelo de conhecimento baseado na descoberta. OS JOGOS FAVORECEM O DESENVOLVIMENTO Da orientação espacial; Dos modelos de espaços diferentes; Da automatização da habilidade; Da reflexão; Da formalização da estratégia para vencer; Cooperação; Competição; Desafio; Curiosidade; e Fantasia. INSTRUMENTOS ANALÓGICOS OS BRINQUEDOS Na pesquisa de ferramentas analógicas, a grande maioria de artefatos que encontrei foram brinquedos. Os brinquedos são considerados por muitos como sendo os instrumentos mais eficazes para a estimulação do desenvolvimento infantil, sendo, portanto, utilizados em larga escala na alfabetização. O brinquedo desafia e motiva a aprendizagem porque propicia ludicidade; e o lúdico pressupõe liberdade para agir e para experimentar, sem medo de errar. Jean Piaget (1998) acredita que a brincadeira/jogo é essencial na vida da criança. Para ele, o jogo constitui-se em expressão e condição para o Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 43 desenvolvimento infantil, já que as crianças, quando jogam, assimilam e podem transformar a realidade. Ele entende que a atividade lúdica é o berço obrigatório das atividades intelectuais da criança, sendo, por isso, indispensável à prática educativa. Vygotsky (1998) considera que as maiores aquisições de uma criança são conseguidas no brinquedo, aquisições que no futuro tornar-se-ão seu nível básico de ação real e moralidade. Para ele, é enorme a influência do brinquedo no desenvolvimento de uma criança. É no brinquedo que a criança aprende a agir numa esfera cognitiva, ao invés de em uma esfera visual externa, dependendo das motivações e tendências internas, e não por incentivos fornecidos por objetos externos. CAPÍTULO XIV - O DESENVOLVIMENTO DA ESCRITA NA CRIANÇA Para compreendermos a história do desenvolvimento da escrita na criança, abordaremos um estudo de Vigotski (1991), que ele denominou de “a pré- história da linguagem escrita”, a fim de mostrar o que leva as crianças a escreverem, quais os aspectos importantes desse desenvolvimento anterior à entrada da criança na escola e qual a sua relação com o aprendizado escolar. Para tanto, o autor delineia um percurso do simbolismo que se inicia com o gesto, depois passa pela brincadeira, pelo desenho, até chegar ao ponto em que a criança consegue perceber que poderá representar a sua fala por meio do desenho, apreendendo a escrita com função interacional e pessoal. Segundo Vigotski, o gesto é o signo visual inicial no qual está contida a futura escrita. É como se os gestos fossem a escrita no ar e os signos fossem os gestos que foram fixados. Os gestos estão ligados à origem dos signos escritos por meio de outros dois domínios. O primeiro refere-se aos rabiscos das crianças, em que, em geral, desenhos e rabiscos são vistos mais como gestos do que como desenho propriamente dito. Isso ocorre porque a criança, ao ser solicitada a fazer um desenho, primeiramente, demonstra por meio de gestos aquilo que deveria ser representado no desenho. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 44 O outro domínio refere-se aos jogos das crianças em que alguns objetos podem denotar outros, substituindo-os e tornando-se seus signos, já que não importa a similaridade do objeto com que se brinca com o objeto denotado. O mais importante é utilizar um objeto como brinquedo e a possibilidade que o mesmo oferece de executar com ele um gesto representativo, revelando, assim, a função simbólica do brinquedo. Os objetos que não apresentam essa possibilidade são, de imediato, rejeitados pelas crianças. O gesto é, na realidade, a primeira representação do significado. Quanto ao desenho, o teórico russo constatou que ele é uma linguagem gráfica que surge, tendo por base a linguagem verbal. Num estágio inicial, a criança, apesar de perceber a similaridade do desenho com um objeto, ainda não o percebe como representação do objeto ou símbolo. As crianças acabam, nesse momento, se relacionando com os desenhos como se estes fossem objetos. Num experimento realizado por Vigotski com crianças em idade escolar, foi proposta uma atividade em que deveriam representar simbolicamente algumas frases mais ou menos complexas. A partir desse experimento, ficou constatado que há uma tendência de a criança mudar de uma escrita pictográfica para uma escrita ideográfica, na qual as relações e os significados são representados por meio de sinais simbólicos abstratos. Podemos destacar: a observação feita a uma criança que escreveu cada palavra da frase: “Eu não vejo as ovelhas, mas elas estão ali”, por meio de desenhos individuais. Constatou-se que o desenho acompanhou fielmente a frase e que a linguagem falada estava presente no desenho da criança. A criança teve que fazer descobertas originais para representar, apropriadamente, por meio de desenhos a frase, o que revelou oquanto esse processo é decisivo no desenvolvimento do desenho e da escrita na criança. Dentre as pesquisas realizadas pelo grupo de Vigotski, Luria, como um dos integrantes, foi quem desenvolveu um estudo mais aprofundado sobre o processo de simbolização na escrita. Na realização desse estudo, Luria (1988) solicitava às crianças que não sabiam ainda escrever que memorizassem certo número de sentenças ditas por ele, que, certamente, eram além da capacidade das crianças de recordá- las. Como as crianças logo demonstravam a sua incapacidade de memorizá- las, era entregue a elas um papel para que anotassem as palavras que estavam sendo apresentadas. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 45 As crianças, mais uma vez, revelaram-se incapazes de realizar tal atividade. Por meio desse experimento, constatou-se que as crianças pequenas, de um modo geral, não viam a escrita como um instrumento ou meio. Nesse momento, as crianças imitavam apenas o formato da escrita dos adultos ao produzirem rabiscos, sem relação com o que estava sendo apresentado, mas como se fosse um brinquedo. A escrita não funcionava como um instrumento para recordar e representar algum significado. Essa fase foi denominada pelo autor como a “fase da pré- escrita” ou “fase pré-instrumental”, fase em que não existia na escrita da criança uma função mnemônica. Em outra fase, algumas crianças, de forma surpreendente, reproduziram as frases ditadas, utilizando alguns rabiscos, e mostravam a que sentença cada rabisco representava. Apesar de continuarem a fazer rabiscos sem sentido, os sinais topográficos, como foi denominado por Luria, apresentavam pistas, ainda que rudimentares, que valiam como instrumentos de auxílio à memória. As crianças distribuíam sinais específicos em lugares distintos da folha, que lhes possibilitavam lembrar-se das sentenças ou palavras ditadas por sua localização. Segundo Luria, essa é uma das primeiras formas de escrita. Para a criança passar de um estágio de escrita não-diferenciada, conforme foi descrito até aqui, para um nível de signos com sentido e que expressam um conteúdo, Luria apresentou dois caminhos pelos quais pode ocorrer essa transição. Primeiro, a criançaretrata o conteúdo dado por meio de rabiscos imitativos para depois passar a apresentar uma escrita que revela um conteúdo que registra uma idéia por meio de pictogramas (desenhos). Primeiramente, essa diferenciação foi observada quando a criança começou a refletir o ritmo da frase ou palavra que era ditada: palavras simples eram escritas com simples linhas, sentenças longas eram escritas com rabiscos longos. No passo seguinte, a escrita da criança passa a refletir não somente o ritmo da sentença, mas também o seu conteúdo, ou seja, o recurso gráfico utilizado pela criança para representar o que lhe foi solicitado a escrever adquire um significado, torna-se um signo. De acordo com Luria (1988), há fatores que contribuem para que a criança altere a sua atividade gráfica, permitindo-lhe descobrir os princípios da escrita, quais sejam: número, forma e cor. Nessa fase, ao ser solicitada a escrever algumas sentenças, a criança escreve umas com rabiscos não- diferenciados e outras como: “Uma fumaça muito preta está saindo da chaminé” e “Carvão muito preto” são registradas com linhas pretas de modo destacado. Ao ler as sentenças, a criança se recorda logo de ambas, pois estão diferentes das demais em função da forma que fora utilizada na escrita Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 46 que serviu como recurso mnemônico. Na sentença “O homem tem duas pernas”, a criança desenhou duas linhas; depois, a sentença “A garça com uma perna” foi retratada com uma linha. Nessa etapa, a criança leu aquilo que estava escrito, não agindo apenas por meio da memória. A partir desse ponto, a criança descobre a natureza instrumental da escrita, saindo do estágio da brincadeira para a escrita pictográfica, ou seja, os desenhos. No entanto, o desenho não é utilizado como desenho em si mesmo, mas como um instrumento que representa determinado conteúdo. No caminho que vai da escrita pictográfica em direção à escrita simbólica, ou seja, à escrita propriamente dita, a criança cria formas de representar alguma coisa difícil de ser expressa por meio de desenhos. A criança, nessa fase, precisa criar sinais escritos que representem os símbolos falados. É nesse sentido que Vigotski afirma que a criança precisa descobrir que, além de desenhar coisas, ela pode desenhar a sua fala. É, nesse deslocamento, que ocorre o desenvolvimento da linguagem escrita na criança. A escola e o ensino proporcionarão oportunidades para que a criança chegue à escrita simbólica, o que revela que o domínio da escrita demanda aprendizagem e mediação. Se essa pesquisa fosse realizada nos dias atuais, certamente, apresentaria resultados diferentes, uma vez que as crianças de hoje são diferentes das crianças dos anos em que esse estudo foi realizado. As crianças do século XXI vivem imersas numa sociedade letrada, em que a presença da escrita é extremamente marcante. De um modo geral, desde cedo, passam por experiências diversas com a linguagem escrita: vivem com adultos que utilizam a escrita com diferentes funções, frequentam a escola desde muito pequenas, são alfabetizadas mais cedo, enfim, o contato com a escrita se dá desde que nascem. Apesar disso, podemos afirmar que, ainda hoje, muitas escolas vêm incorrendo em muitos equívocos no processo inicial de ensino-aprendizagem da escrita. A esse respeito, Vigotski (1991) faz uma crítica às formas de intervenção no processo de alfabetização escolar, afirmando que:até agora, a escrita ocupou um lugar muito estreito na prática escolar, em relação ao papel fundamental que ela desempenha no desenvolvimento cultural da criança. Ensina-se as crianças a desenhar letras e construir palavras com elas, mas não se ensina a linguagem escrita. Enfatiza-se de tal forma a mecânica de ler o que está escrito, que se acaba obscurecendo a linguagem escrita como tal (p. 119). Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 47 Concordamos com essa afirmativa, pois reconhecemos que, em muitas escolas, a função atribuída à escrita não é a mesma atribuída pela sociedade, pelas pessoas na sua vida cotidiana, por desconsiderar-se o conhecimento que a criança já possui acerca da escrita antes de iniciar o seu processo de alfabetização escolar. Ao contrário, a escola toma a escrita como se esta fosse um bem particular e, por sua vez, independente da vida e da prática social das crianças. Na realidade, a escola faz com que o aluno incorpore em seus escritos o discurso próprio da instituição escolar, destituindo dessa escrita a marca da sua pessoalidade. Vigotski salienta ainda que a escrita acaba sendo imposta de fora, vinda das mãos dos professores, em vez de estar fundamentada nas necessidades desenvolvidas pelas crianças e na sua própria atividade. Em oposição à artificialidade presente na prática de ensino da escrita na escola, o que de fato determinará as relações dos indivíduos com esse objeto do conhecimento serão as necessidades de interação surgidas no seu cotidiano. Portanto, se procurarmos entender como vem ocorrendo o desenvolvimento da escrita ao longo da história da humanidade, constataremos que o seu surgimento decorre das necessidades da vida. Como destaca Luria (1988), talvez seja possível que a origem da escrita seja encontrada na necessidade do homem de registrar quantidades. Desde cedo, as crianças já têm oportunidade de observar e participar de atos de leitura e escrita que são praticados à sua volta, em situações cotidianas de interação social, embora com intensidades e valores diferenciados. É comum que crianças bem pequenas vivenciem, por exemplo, a escrita de bilhetes, listas, e-mails, leitura de jornais, folhetos de propaganda e letreiros, entre outros. Assim, por meio do compartilhamento de instâncias de uso da escrita, a criança vai construindo o significado para a sua aprendizagem, percebendo quando precisamos escrever, seja para nos comunicarmos à distância, nos informarmos, nos orientarmos ou, seja, apenas, como auxílio à memória. Dessa forma, a construção da escrita pela criança se desenvolve em situações de uso real dessa língua, e não por meio do ensino da escrita apenas como habilidade motora. Conforme explica Vigotski, o ensino da escrita e da leitura deve ser organizado de forma que tais práticas se tornem necessárias às crianças, ou ainda, a escrita deve ser relevante à vida. Sendo assim, aprender a escrever implica não apenas aprender a associação entre letras e sons, mas também a capacidade de usar a escrita nas diferentes práticas sociais que irão requerer o seu uso. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 48 No entanto, a escrita veiculada em sala de aula, dentro dos princípios de uma abordagem tradicional de ensino da língua escrita, é vista, geralmente, como um código de transcrição que converte unidades sonoras em unidades gráficas. Nesse sentido, podemos dizer que são oferecidos poucos recursos para os alunos se aventurarem no mundo da escrita, pois o seu ensino está reduzido a atividades estereotipadas: cópia, ditados e exercícios gramaticais, entre outros, o que a destitui de significados, dissociando a prática social da escrita da prática de escrita escolar. Como ressalta Vigotski (1991), o exercício da escrita é puramente mecânico e logo entedia as crianças, pois “suas atividades não se expressarão em sua escrita e suas personalidades não desabrocharão” (p. 133). Em face do exposto, torna-se necessário pensar a escola “como um tempo dado ao aluno para ele escrever mesmo, para ele começar a se formar na cidadania como autor daquilo que diz, e pensarmos na sala de aula como uma oficina de produção, de dizer coisas” (Geraldi, 1984, p. 19). É preciso rever as condições de produção da escrita na escola, essa escrita sem vida, que permite à criança escrever apenas o que o seu conhecimento ortográfico possibilita. Precisamos propor aos nossos alunos uma escrita significativa. “As crianças são desde muito cedo leitoras e produtoras de texto! Este é o ponto de partida”, como nos adverte Goulart (2005). Só resta à escola aprender essa lição. CAPÍTULO XV - BRINCADEIRA E DESENVOLVIMENTO, NA PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL Como já abordado, Vigotski (1991) entende o desenvolvimento psicológico da criança como um processo de natureza cultural. Ao abordar a questão do desenvolvimento, o autor considera que a criança desenvolve-se essencialmente por meio da atividade do brinquedo Transformações internas no desenvolvimento da criança, como o simbolismo e a capacidade de representar e de abstrair, surgem a partir das situações de brincadeiras. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 49 Para compreendermos a singularidade da brincadeira como uma forma de atividade da criança, Vigotski (1991) pontua que é preciso entender o caráter essencial dessa atividade. As crianças bem pequenas tendem a querer satisfazer seus desejos imediatamente, enquanto crianças na idade pré-escolar, apresentam desejos que não são possíveis de serem realizados imediatamente. Para resolver essa tensão entre querer realizar os desejos imediatamente e não poder fazê-lo, a criança envolve-se em um mundo ilusório e imaginário: a brincadeira. A imaginação é um processo psicológico novo para a criança; representa uma forma especificamente humana de atividade consciente, não está presente na consciência de crianças muito pequenas e está totalmente ausente em animais. Como todas as funções da consciência, ela surge originalmente da ação. O velho adágio de que o brincar da criança é imaginação em ação deve ser invertido; podemos dizer que a imaginação, nos adolescentes e nas crianças em idade pré-escolar, é o brinquedo em ação (Vigotski, 1991, p. 106). De acordo com Vigotski (1991), nem todos os desejos não satisfeitos dão origem às brincadeiras. Crianças pequenas podem fazer coincidir a situação de brinquedo e a realidade. “O que na vida real passa despercebido pela criança, torna-se uma regra de comportamento no brinquedo” (p. 108). Na situação imaginária, as crianças se comportam pelas regras que têm sua origem na própria brincadeira. Ao discutir sobre a ação e o significado da brincadeira, Vigotski (1991) ressalta que, para as crianças bem pequenas, é impossível envolver-se em uma situação imaginária, já que ela se encontra ainda muito restrita ao ambiente imediato. Seu comportamento é determinado pelas condições em que a atividade ocorre, sendo que, nesse caso, os objetos se apresentam como uma força motivadora inerente. “É no brinquedo que a criança aprende a agir numa esfera cognitiva, ao invés de numa esfera visual externa, dependendo das motivações e tendências internas, e não dos incentivos fornecidos pelos objetos externos” (p. 109-110). Segundo Vigotski (1991), na idade pré-escolar ocorre uma divergência entre os campos do significado e da visão: no brinquedo, o pensamento está separado dos objetos e a ação surge das ideias, e não das coisas: um pedaço de madeira torna-se um boneco e um cabo de vassoura torna-se um cavalo. A ação regida por regras começa a ser determinada pelas ideias, e não pelos objetos. Isso representa uma tamanha inversão da relação da criança com a situação concreta, real e imediata, que é difícil subestimar seu pleno significado. A criança não realiza toda esta transformação de uma só vez porque é extremamente difícil para ela separar o pensamento (o significado de uma palavra) dos objetos (p. 111). Desse modo, na brincadeira altera-se a relação da criança com a realidade porque muda a estrutura da sua percepção e a criança passa a significar um determinado objeto. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 50 “No brinquedo, o significado torna-se o ponto central e os objetos são deslocados de uma posição dominante para uma posição subordinada” (Vigotski, 1991, p. 112). Para Vigotski, a natureza da brincadeira consiste na transição entre as restrições puramente situacionais da primeira infância e o pensamento adulto, que pode ser totalmente desvinculado de situações reais. No brinquedo, espontaneamente, a criança usa sua capacidade de separar significado do objeto sem saber que o está fazendo. Por meio do brinquedo, a criança atinge uma definição funcional de conceitos ou de objetos e as palavras passam a se tornar parte de algo concreto. O brinquedo cria na criança uma nova forma de desejos. Ensina a desejar, relacionando seus desejos a um “eu” fictício, ao seu papel no jogo e suas regras. Dessa maneira, as maiores aquisições de uma criança são conseguidas no brinquedo, aquisições que no futuro tornar-se-ão seu nível básico de ação real e moralidade (Vigotski, 1991, p. 114). Vigotski (1991) não concorda que a criança aja de forma puramente simbólica no brinquedo e nem que essa atividade seja o outro mundo da criança. Ao brincar, acriança opera no campo do significado, porém sua ação ocorre como na realidade. Logo, essa contradição se apresenta como um aspecto importante para o desenvolvimento da criança. As situações de brincadeira propiciam uma estrutura básica para mudanças das necessidades e da consciência, sendo uma atividade condutora no desenvolvimento da mesma. Para o autor, seria incorreto considerar a brincadeira como uma atividade sem propósito e puramente imaginária, pois o “brinquedo é muito mais a lembrança de alguma coisa que realmente aconteceu do que imaginação. É mais a memória em ação do que uma situação imaginária nova” (p. 117). A partir das discussões de Vigotski envolvendo a Zona de Desenvolvimento Proximal, o autor aborda que: o brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal da criança. No brinquedo, a criança sempre se comporta, além do comportamento habitual de sua idade, além de seu comportamento diário; no brinquedo, é como se ela fosse maior do que é na realidade. Como no foco de uma lente de aumento, o brinquedo contém todas as tendências do desenvolvimento sob forma condensada, sendo, ele mesmo, uma grande fonte de desenvolvimento (Vigotski, 1991, p. 117). A brincadeira contribui para o desenvolvimento na medida em que é capaz de impulsionar a criança a realizar coisas que ainda não é capaz de fazer, envolvendo-se em graus maiores de consciência das regras de conduta, antecipando e elaborando situações que ainda não está preparada para realizar na vida real. Baquero (1998) contribui para a discussão da Zona de Desenvolvimento Proximal relacionada ao brincar, destacando que, em Vigotski, o brincar é uma das maneiras de a criança participar na cultura, sendo sua atividade cultural típica, assim como para o adulto é o trabalho. Nessa perspectiva, o brincar é uma atividade cultural. Tanto situações de brincadeiras como as de aprendizagem escolar operam como geradoras de Zona de Desenvolvimento Proximal. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 51 De acordo com Kozulin (2002), Vigotski considerou o simbolismo e a convencionalidade dos signos – instrumentos psicológicos – como importantes características da atividade humana que são impostas ao comportamento do indivíduo,moldando-o e reconstruindo-o segundo as linhas da matriz sociocultural. Kozulin (2002) considera que “o jogo infantil é uma fonte poderosa de controle do simbolismo e do caráter convencional da relação entre significante e significado, que é uma das bases cognitivas da escrita” (p. 12). A chave para a função simbólica da brincadeira infantil é a possibilidade de representar. Dada a importância da atividade de brincadeira para o desenvolvimento global dos processos psíquicos da criança, entendemos que ela deve fazer parte das práticas pedagógicas com crianças nos anos iniciais da educação básica. O papel desempenhado pelo adulto na mediação dessa atividade social da criança é imprescindível. Não há como negar o potencial formativo da brincadeira de faz de conta. Portanto, cabe aos educadores compreenderem o significado que essa atividade tem para o desenvolvimento da criança, superando o entendimento naturalizante que, muitas vezes, subsidia a ação de brincar nos contextos escolares, entendendo, inclusive, que a brincadeira é parte constituinte do processo de construção da escrita da criança, CAPÍTULO XVI - ALFABETIZAR LETRANDO As metodologias de alfabetização precisam garantir ao alfabetizando a apropriação de 2 domínios de conhecimento:  Aprendizagem da LINGUAGEM QUE SE USA AO ESCREVER (compreensão e produção dos diferentes gêneros textuais). Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 52 LETRAMENTO Aprendizagem da NOTAÇÃO ESCRITA: (SISTEMA DE ESCRITA ALFABÉTICA 1. Vem sendo negligenciado (“ênfase no domínio do letramento”); 2. Envolve processos específicos (diferentes dos processos envolvidos no letramento); 3. Requer ensino sistemático (nem todos aprendem o SEA espontaneamente); e 4. Requer uma metodologia de trabalho. É preciso ter uma metodologia para o ensino X É preciso usar um método tradicional de alfabetização.  É necessário buscar abandonar os antigos métodos (globais, alfabéticos, silábicos ou fônicos) de alfabetização. Por quê? A DESTRUIÇÃO DA FORMAÇÃO PARA O LETRAMENTO  Métodos tradicionais adiam o contato com textos, usam pseudotextos;  Promovem leitura só para fins de localização de informações e cópias;  Retardam a produção de textos: crianças aprendem a escrever “textos cartilhados” ou, no máximo, “redações escolares”;  Desconsideração de que o aprendizado do SEA envolve processos específicos:  Expectativas de aprendizagem sem ensino sistemático, só “no contato com textos”; Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 53  Ditadura do texto: proibição velada ou explícita de promover-se reflexão sobre palavras, sílabas, letras, etc. DUAS VERTENTES TEÓRICAS 1- Perspectiva psicogenética (Ferreiro e Teberosky e outros): concepções da criança sobre como a língua oral é notada na escrita e a evolução daquelas hipóteses; e 2- Estudos sobre relações entre a capacidade de reflexão metalinguística da criança, em especial a capacidade de analisar fonologicamente as palavras, e seu sucesso/insucesso na alfabetização. “Entendo que estas duas linhas paralelas de pesquisa têm um ponto de interseção: o sujeito que desenvolve “habilidades” de analisar fonologicamente as palavras da sua língua, lança mão de tais habilidades para compreender como funciona o sistema de escritaalfabética.” Assim: 1- Compreender como a reflexão metalinguística sobre segmentos orais das palavras atua no aprendizado da escrita alfabética. 2- Fazer o ensino do SEA, em uma perspectiva de letramento:  Papel das Habilidades de Análise Fonológica na Alfabetização:O que é reflexão metalinguística?  Níveis fonológico, morfológico, sintático e textual; e  Análise fonológica não é discriminação auditiva. 1972: Savin – alunos com fraco aproveitamento em leitura tinham, também, dificuldades em jogos com palavras e eram insensíveis a rimas. 1981 – Brasil – Carraher & Rego observam “realismo nominal”entre crianças com dificuldades na alfabetização. 1975 – 2005 - inúmeros estudos posteriores: alunos com atraso na aquisição das habilidades de leitura e escrita revelam desempenho inferior em tarefas que pressupõem a capacidade de analisar fonologicamente.  Controvérsia: análise fonológica / sucesso na alfabetização Papel causal? (confusões entre fator necessário e pré-requisito temporal)  “Facilitador”?  As habilidades de leitura e análise fonológica emergiriam independentemente, sob a determinação de alguma outra variável do desenvolvimento cognitivo? Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 54  Consequência da alfabetização bem sucedida?  Bryant e Bradley (1985): Acompanhamento Longitudinal + Treinamento em AF produziu avanços Estudos como o de Bryant e Bradley (1985) apontaram para uma ligação causal entre a consciência fonológica e habilidade de leitura.  Os efeitos do treino em análise fonológica foram mais acentuados no grupo de crianças que realizava as tarefas (de reflexão sobre sons parecidos) ao mesmo tempo em que construía a escrita das palavras com letras de um alfabeto móvel.  Seguindo certa mentalidade anglo-saxã, os autores não consideram o papel da escrita. QUESTÕES IMPORTANTES Se as várias pesquisas sobre o problema têm investigado:  Habilidades diferentes (contar, segmentar, adicionar, ou subtrair, identificar e produzir rimas ou aliterações);  Sobre distintas unidades da palavra (fonemas, sílabas, segmentos como rimas, que podem ser maiores que a sílaba); e  Em diferentes posições (início, meio e fim) das palavras. PRECISAMOS TER CLAREZA SOBRE: 1- Que tipo de habilidade(s) de análise fonológica é necessário para aprender a ler e escrever? 2- A capacidade de analisar fonologicamente as palavras é suficiente para a criança se alfabetizar? 3- As habilidades de análise fonológica podem se desenvolver durante a alfabetização? CRÍTICAS AOS ESTUDOS SOBRE CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA 1- Estudos de CF tendem a não fazer qualquer análise teórica sobre as propriedades de um sistema notacional como a escrita. Continuam tratando a escrita como um “código”; 2- Não se propõem a investigar o processo evolutivo vivido pela criança até desenvolver uma concepção alfabética de escrita; 3- “Treinamento” em CF e Método Fônico seriam solução adequada para inovar o ensino na alfabetização. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 55  Psicogênese da Escrita Aprendizado do SNA não se reduz a um processo de “associação” entre grafemas e fonemas, no qual a criança evoluiria por receber e “fixar” informações transmitidas pelos adultos.  SISTEMA DE ESCRITA ALFABÉTICA é em si um objeto de conhecimento. Não é código e sim um sistema notacional. Tem propriedades: o que nota, como nota. No percurso evolutivo, o aluno constrói respostas para duas perguntas básicas: 1. O que a escrita representa?(O que se nota/registra no papel tem a ver com características físicas ou funcionais dos objetos ou tem a ver com a seqüência de sons que formam os nomes dos objetos?); e 2. Como a escrita cria representações? (cada letra substitui o quê? uma sílaba? um segmento sonoro menor que a sílaba?).  O SEA possui restrições a se respeitar (ex: combinações possíveis de grafemas e valores sonoros que podem assumir).  Psicogênese = avanço para que psicólogos e pedagogos compreendam melhor o processo de alfabetização (Construtivismo= conhecimento do objeto + conhecimento do percurso de re- construção + decisões didáticas).Entende-se que uma criança só poderá conceber a escrita como uma notação no nível silábico ou fonêmico, se ela for capaz de analisar (de forma mais ou menos intuitiva, mais ou menos “consciente”) as partes faladas das palavras da língua naqueles níveis (silábico, fonêmico). CAPÍTULO XVII - ALGUMAS PROPOSTAS DIDÁTICAS BRASILEIRAS INSPIRADAS NA PSICOGÊNESE  GEEMPA (1986): parecia desconsiderar completamente a importância de reflexão fonológica para a alfabetização. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 56  PROFA (MEC, 2001): não inclui atividades de reflexão explícita sobre semelhanças sonoras. Observação:  É uma condição necessária para o sucesso na alfabetização.  Não constitui condição suficiente para que o sujeito aprenda o SEA.  Pode ocorrer antes e durante a experiência escolar da alfabetização.  É um processo cultural, não “endogenamente programado”, (deve ser estimulado pela escola) (Ex: estudo com chineses). Aprender o SEA não garante alfabetizar-se em uma perspectiva de letramento. CAPÍTULO XVIII - PLANEJAMENTO - PROCEDIMENTOS ENSINO SISTEMÁTICO DO SEA Promovendo a reflexão explícita sobre as palavras, observar com os alunos as propriedades do SEA, e discutir: 1- A natureza dos caracteres (letras, outros símbolos): a estabilidade, a ordem, as repetições, a variação, as combinações de letras possíveis, etc. 2- As quantidades: quantas letras e sílabas orais as palavras têm, quantas palavras as frases têm. 3- As semelhanças entre partes orais e escritas: palavras compartilham letras (ou pedaços maiores) e... não, por acaso, certos pedaços escritos de forma idêntica equivalem a pedaços iguais ou parecidos quando falamos. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 57  MONTAR E DESMONTAR PALAVRAS para analisar (1) e (2);  COMPARAR/CLASSIFICAR PALAVRAS para analisar (2) e (3); e  PRODUZIR PALAVRAS para analisar (3).  Jogos com palavras podem SAIR OU NÃO de textos lidos e escritos com uma finalidade comunicativa real e imediata. As palavras usadas nos jogos é que precisam ser significativas.  Não perder oportunidade de aliar a leitura e a escrita de textos ao trabalho de reflexão sobre a notação das palavras neles contidas. O RATO ROEU A ROUPA DO REI DE ROMA CAPELINHA DE MELÃO É DE SÃO JOÃO É DE CRAVO, É DE ROSA É DE MANJERICÃO  Trabalhar com escritas que os meninos possam ver como estáveis;  FACILITAR O TRABALHO MOTOR E A REFLEXÃO Tratar palavras como unidades: contar, observar segmentação;  Comparar palavras quanto à identidade de segmentos, ao tamanho, às letras e sílabas compartilhadas;  Analisar especificamente rimas e aliterações; e  IDENTIFICAR e PRODUZIR novas rimas e aliterações, discutindo em que se parecem as palavras; PROMOVENDO LEITURAS O QUE LER?  Tenho escolhido textos com:diversidade de gênero/tipo?  Diversidade de contextos sociais de uso (imprensa, literatura, ciência, etc.)?  Variedade de dialetos e registros linguísticos?  Diversidade temática?  Universos de referência, além do infantil?  Diversidade de contexto cultural (regional, local, urbano, rural, etc.)? Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 58  Diversidade de autoria quanto à época, região, nacionalidade? Tem textos da tradição oral?  Condições de produção de leitura nas atividades que se propõe aos alunos, explorando textos: 1. Recuperar o contexto em que o texto foi produzido; 2. Saber para que está lendo, o que será feito após a leitura; e 3. Ter informação sobre o autor e sobre o suporte de onde o texto foi extraído.  Promover o desenvolvimento de ESTRATÉGIAS DE LEITURA;  Que diversidade de textos escritos os alunos produzem? Explicitação das condições de produção e de circulação do texto. É PRECISO DISCUTIR:  Os objetivos da produção;  O(s) destinatário(s) para o texto;  O contexto social de circulação do texto;  O veículo ou suporte;  O gênero/tipo de texto; e  O dialeto e/ou registro. Contribuir para a construção da textualidade pelo aluno:  Elaboração temática, construção da forma composicional do texto, uso das convenções da escrita; e  Planejamento, revisão e reelaboração do texto. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 59 CAPÍTULO XIX - DIAGNÓSTICO NA ALFABETIZAÇÃO PARA CONHECER A NOVA TURMA Mesmo antes de saber ler e escrever convencionalmente, a criança elabora hipóteses sobre o sistema de escrita. Descobrir em qual nível cada uma está é um importante passo para os professores alfabetizadores levarem todas a aprender Nos primeiros dias de aula, o professor alfabetizador tem uma tarefa imprescindível: descobrir o que cada aluno sabe sobre o sistema de escrita É a chamada sondagem inicial (ou diagnóstico da turma), que permite identificar quais hipóteses sobre a língua escrita as crianças têm e com isso adequar o planejamento das aulas de acordo com as necessidades de aprendizagem. Ela permite uma avaliação e um acompanhamento dos avanços na aquisição da base alfabética e a definição das parcerias de trabalho entre os alunos. Além disso, representa um momento no qual as crianças têm a oportunidade de refletir, com a ajuda do professor, sobre aquilo que escrevem. As pesquisas sobre a psicogênese da língua escrita, realizadas por Emilia Ferreiro e Ana Teberosky, no fim dos anos 1970, e publicadas no Brasil, em 1984, mostraram que as crianças constroem diferentes ideias sobre a escrita, resolvem problemas e elaboram conceituações. Aí entra o que pode ser considerado uma palavra, com quantas letras ela é escrita e em qual ordem as letras devem ser colocadas. "Essas hipóteses se desenvolvem quando a criança interage com o material escrito e com leitores e escritores que dão informações e interpretam esse material", conta Regina Câmara, membro da equipe responsável pela elaboração do material do Programa Ler e Escrever e formadora de professores. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 60 No livro Aprender a Ler e a Escrever, Ana Teberosky e Teresa Colomer ressaltam que as "hipóteses que as crianças desenvolvem constituem respostas a verdadeiros problemas conceituais, semelhantes aos que os seres humanos se colocaram ao longo da história da escrita". E completam: o desenvolvimento "ocorre por reconstruções de conhecimentos anteriores, dando lugar a novas construções". Diagnosticar o que os alunos sabem, quais hipóteses têm sobre a língua escrita e qual o caminho que vão percorrer até compreender o sistema e estar alfabetizados permite ao professor organizar intervenções adequadas à diversidade de saberes da turma. O desafio é propor atividades que não sejam tão fáceis a ponto de não darem nada a aprender, nem tão difíceis que se torne impossível para as crianças realizá-las. QUATRO HIPÓTESES Ferreiro e Teberosky observaram que, na tentativa de compreender o funcionamento da escrita, as crianças elaboram verdadeiras "teorias" explicativas que assim se desenvolvem: a pré-silábica, a silábica, a silábico- alfabética e a alfabética. São as chamadas hipóteses. As conclusões desse estudo são importantes do ponto de vista da prática pedagógica, pois revelam que os pequenos já começaram a pensar sobre a escrita antes mesmo de ingressar na escola e que não dependem da autorização do professor para iniciar esse processo. "Todos eles precisam de oportunidades para pôr em jogo o que sabem para se aproximar pouco a pouco desse objeto importante da cultura", ressalta Regina. Aqueles que não percebem a escrita ainda como uma representação do falado têm a hipótese pré-silábica. Ela se caracteriza em dois níveis. No primeiro, as crianças procuram diferenciar o desenho da escrita, identificando o que é possível ler. Já no segundo nível, elas constroem dois princípios organizadores básicos que vão acompanhá-las por algum tempo durante o processo de alfabetização: o de que é preciso uma quantidade mínima de letras para que alguma coisa esteja escrita (em torno de três) e o Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 61 de que haja uma variedade interna de caracteres para que se possa ler. Para escrever, a criança utiliza letras aleatórias (geralmente presentes em seu próprio nome) e sem uma quantidade definida. Quando a escrita representa uma relação de correspondência termo a termo entre a grafia e as partes do falado, a criança se encontra na hipótese silábica. O aluno começa a atribuir a cada parte do falado (a sílaba oral) uma grafia, ou seja, uma letra escrita. Essa etapa também pode ser dividida em dois níveis: no primeiro, chamado silábico sem valor sonoro, ela representa cada sílaba por uma única letra qualquer, sem relação com os sons que ela representa. No segundo, o silábico com valor sonoro, há um avanço e cada sílaba é representada por uma vogal ou consoante que expressa o seu som correspondente. A hipótese silábico-alfabética corresponde a um período de transição no qual a criança trabalha simultaneamente com duas hipóteses: a silábica e a alfabética. Ora ela escreve atribuindo a cada sílaba uma letra, ora representando as unidades sonoras menores, os fonemas. Quando a escrita representa cada fonema com uma letra, diz-se que a criança se encontra na hipótese alfabética. "Nesse estágio, os alunos ainda apresentam erros ortográficos, mas já conseguem entender a lógica do funcionamento do sistema de escrita alfabético", explica Regina. O professor deve realizar a primeira sondagem no início do período letivo e, depois, ao fim de cada bimestre, mantendo um registro criterioso do processo de evolução das hipóteses de escrita das crianças. Ao mesmo tempo, é fundamental uma observação cotidiana e atenta do percurso dos alunos. "A atividade de sondagem representa uma espécie de retrato do processo naquele momento. “E como esse processo é dinâmico, e, na maioria das vezes, evolui muito rapidamente, pode acontecer de apenas alguns dias depois da sondagem, um ou vários alunos terem dado um salto", ressalta Regina. "As sondagens bimestrais são importantes também por representarem dispositivos de acompanhamento das aprendizagens para os pais, bem como um retrato da qualidade do ensino para as redes, que podem ajustar seus programas de formação continuada de professores em regiões onde os resultados mostram que os estudantes não estão evoluindo da maneira desejada." INVESTIGAÇÃO INDIVIDUAL O melhor é que a atividade seja feita individualmente, com o professor chamando um aluno por vez, que deve tentar escrever algumas palavras e Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 62 uma frase ditada. Enquanto isso, o resto da turma precisa estar envolvido em uma atividade diversificada em que não seja necessária a ajuda do professor (a cópia de uma cantiga, a produção de um desenho, um jogo, etc.). Essa é a estratégia usada por Eduardo Araújo, na EMEB Helena Zanfelici da Silva, em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo. Alguns dias após o retorno às aulas, ele deixa as crianças envolvidas com jogos e brincadeiras, sob a supervisão da estagiária que o acompanha em sala. Alfabetizador há mais de sete anos, Araújo sabe bem o valor da sondagem inicial. "Conhecendo a situação de cada aluno, consigo pensar melhor como será a rotina do bimestre e quais as intervenções devo fazer para ajudar os menos avançados a entender a lógica do sistema de escrita." O ditado deve ser iniciado por uma palavra polissílaba, seguida de uma trissílaba, de uma dissílaba e, por último, de uma monossílaba - sem que o professor, ao ditar, marque a separação das sílabas (leia no quadro abaixo como preparar a lista de palavras). Após a lista, é preciso ditar uma frase que envolva pelo menos uma das palavras já mencionadas, para poder observar se o aluno volta a escrevê-la de forma semelhante, ou seja, se a escrita da palavra permanece estável mesmo num contexto diferente. No começo de 2008, a escola onde Araújo leciona passava por grande reforma. Aproveitando a curiosidade das crianças, ele resolveu trabalhar com uma lista de objetos usados na obra do prédio. As palavras ditadas foram ferramenta, martelo, ferro e pá. E a frase escolhida foi: usei a pá na reforma. LISTA BEM FEITA Na sondagem, a escolha certa das palavras e da frase (e da ordem em que elas serão ditadas) é essencial. "O ideal é preparar uma lista de termos de um mesmo campo semântico, ou seja, agregados por uma unidade de sentido, e uma frase adequada ao contexto desse grupo", recomenda a formadora de professores Regina Câmara, do Programa Ler e Escrever. Deve-se evitar que as palavras tenham vogais repetidas em sílabas próximas, como ABACAXI, por exemplo, por causar um grande conflito para as crianças que estão entrando no Ensino Fundamental, cuja hipótese de escrita talvez faça com que creiam ser impossível escrever algo com duas ou mais letras iguais. Por exemplo: um aluno com hipótese silábica com valor sonoro convencional, que utiliza vogais, precisaria escrever AAAI. Os monossílabos ficam para o fim do ditado. Esse cuidado deve ser tomado porque, no caso de as crianças escreverem segundo a hipótese do número mínimo de letras, poderão se recusar a escrever se tiverem de começar por ele.Observação e registro Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 63 Ficar atento às reações dos alunos enquanto escrevem também é fundamental. Anotar o que eles falam, sobretudo de forma espontânea, pode ajudar a perceber quais as ideias deles sobre o sistema de escrita. Na sondagem inicial feita com a lista de palavras relacionadas à reforma da escola, um aluno comentou: - Ferro começa com "fe", de Felipe, não é? E termina com "o". Essa é fácil. - Agora eu quero que você escreva "pá" - disse o professor. O aluno parou um instante, tentou contar "as partes" da palavra com os dedos e ficou um pouco incomodado. Demorou bastante até se manifestar: - Mas essa não dá para escrever. Fica só uma letra e isso não pode. Com o comentário, o professor conseguiu perceber que a criança entrou em conflito, pois pensava que só se pode ler ou escrever palavras com três ou mais letras e, ao mesmo tempo, tinha construído a hipótese de que para cada emissão sonora, uma letra basta. Terminado o ditado, é imprescindível pedir que a criança leia o que escreveu. Por meio da interpretação dela sobre a própria escrita, durante a leitura, é que se pode observar se ela estabelece ou não relações entre o que escreveu e o que lê em voz alta - ou seja, entre o falado e o escrito - ou se lê aleatoriamente. O professor pode anotar em uma folha à parte como ela faz a leitura, se aponta com o dedo cada uma das letras, se associa aquilo que fala à escrita etc. "Uma lista de palavras produzida pelo aluno, em situação de sondagem, sem a respectiva leitura, não permite analisar essa produção e identificar sua hipótese de escrita", afirma Regina. Se o aluno escreveu LGA para o ditado da palavra martelo e associou cada uma das sílabas dessa palavra a uma das letras, é necessário registrar abaixo a relação de cada letra com uma sílaba. Há duas maneiras de fazer esse registro, usando marcação com sinais que indique quais as associações feitas pela criança: É possível que o aluno utilize muitas e variadas letras, sem que o critério de escolha desses caracteres tenha alguma relação com a palavra falada. Nesse caso, se ele ler sem se deter em cada uma das letras, é necessário anotar o sentido que ele usou nessa leitura. Esse tipo de marcação é importante, pois permite observar com mais clareza a hipótese que a criança tem e, posteriormente, os avanços que ela obtém ao longo do ano. Para que os alunos atinjam o objetivo previsto para o 1º ano - escrever alfabeticamente, ainda que com erros de ortografia, o professor precisa Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 64 acompanhar a evolução de todos, conhecendo os que demandam mais atenção, quantos têm hipóteses mais avançadas e os que estão alfabetizados. Esses últimos, particularmente, necessitam de outros conteúdos de ensino, como a ortografia. O ideal é que seja construída uma tabela que contenha a evolução das hipóteses de cada um, comparando quanto evoluiu ao longo do ano. Com frequência, essa comparação traz agradáveis surpresas em relação aos que, apesar de não escreverem convencionalmente, realizaram avanços significativos em comparação com sua escrita do início do ano. Com base nessa tabela, é possível também fazer uma análise crítica da rotina e das atividades que estão sendo contempladas. Será que todos interagem com outras fontes de texto e, nessa interação, refletem sobre a escrita e seu uso? Recebem informações de colegas mais experientes, que os ajudam a compreender o que está envolvido na leitura e na escrita? Têm a oportunidade de tentar ler por si mesmos? Contam com o apoio do professor, que oferece novas informações sobre a escrita e orienta seu olhar para os materiais escritos disponíveis na sala de aula, que podem ajudar no momento de decidir pelo uso de uma determinada letra? Encontram na escola um ambiente favorável à pesquisa, sendo encorajados a se arriscar e escrever segundo suas hipóteses? É por meio das sondagens e da observação cuidadosa e constante das produções dos estudantes durante o ano que se pode saber em que momento se encontra cada um, se sua abordagem e rotina estão funcionando, qual a expectativa razoável de evolução para os que ainda se encontram em hipóteses mais primitivas e como ajustar o planejamento do trabalho para que, ao fim do ano letivo, todos estejam alfabetizados. CAPÍTULO XX - TIPOS DE METODOLOGIAS E SUAS IMPLICAÇÕES NO COTIDIANO ESCOLAR Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 65 As escolas adotam métodos pedagógicos diversificados, mas subjacentes a eles, há sempre uma visão de aprendizagem. Comentaremos agora três linhas epistemológicas mais comuns nas escolas, que são: Empirismo; Apriorismo; e Interacionismo. a) Empirismo O método empirista considera o aluno como uma tábula rasa, uma folha em branco, onde a proposta de educação é centrada no professor, o professor fala, e os alunos ouvem, não questionam e nem opinam, são passivos, esperam que venha tudo pronto do professor. O conteúdo é desenvolvido com todos da mesma maneira, como se todos aprendessem da mesma forma e ao mesmo tempo, dando a ideia de que todos os alunos são iguais. Segundo Cagliari (1998, p. 43): Nesse caso, a situação inicial do aprendiz é interpretada como um começo absoluto de tudo, o marco zero de uma caminhada uma página em branco onde se vai começar a sua vida escolar. No começo do ano, o professor vai programar o que vai ensinar, sem querer conhecer seus alunos, porque o que vai ensinar é um começo absoluto que não precisa de pré-requisitos, é um ponto de partida considerada ideal para todos os alunos, independentemente da maneira de ser e de saber de cada um. A tendência empirista revela-se com o enfoque pedagógico tradicional. Esse enfoque persiste ainda em muitas escolas. Nessa concepção de ensino o professor é considerado um transmissor, ele fala e os alunos escutam, ele traz suas atividades e conteúdos prontos de casa, o educando recebe tendo somente que memorizar. Nesse caso o conhecimento do aluno é cumulativo, no qual a criança tem o papel de armazenar as informações dadas pelo professor. Aqui o educador considera os alunos todos iguais, na sua forma de aprender, no ritmo de aprendizagem e até em suas histórias de vida. De acordo com Moll (1996, p. 79): O professor “funciona” como o controlador que, monopolizando o saber, o repassa a partir de uma ordem curricular, independente do contexto Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 66 sociocultural do aluno e da sua lógica de aprendizagem. Enfim, o processo alfabetizador desenvolve-se a partir da sua concepção etimológica,desligada sociais e ritmos individuais dos sujeitos envolvidos. A avaliação é a medida do conhecimento do aluno. O professor avalia se todas as informações fornecidas por ele, o aluno aprendeu ou não. Se ele não conseguiu a chegar a uma média de avaliação, o aluno precisa rever os conteúdos tudo de novo, para ser memorizado. O instrumento de avaliação é a prova, teste ou trabalho é passado para todos os alunos, não importando suas diferenças e seus ritmos de aprendizagem. Conforme Cagliari (1998, p. 69) diz: Passar a mesma prova para todos os alunos de uma classe, sobretudo nas primeiras séries, é desconhecer a realidade de cada aluno. Somente aquele tipo de ensino massificante, uniformizante, em que o professor manda e os alunos obedecem leva um professor a aplicar a mesma prova para toda a classe. O empirismo também parte do comportamento condicionado, onde ele controla e dirige as atitudes e atividades das crianças. O conhecimento é caracterizado por situações de estímulo-resposta, isto é, o professor explica, passa a matéria e os alunos dão a resposta. O conhecimento provém do meio para o educando, na relação sujeito-objeto e, com isso, o aluno fica somente esperando que venha tudo para ele, sem ter que refletir e pesquisar. B) APRIORISMO A concepção apriorista defende a ideia que o saber está no sujeito, e o meio vai fazer desabrochar o conhecimento no aluno. Segundo o pensamento de Moll (1996, p. 80), nesta tendência, também denominada racionalismo ou inativismo, o primado é do sujeito, ou seja, as formas de conhecimento estão nele pré-determinadas. O homem não nasce com fins determinados, ele é livre, está sempre aprendendo com o meio e suas vivências. A aprendizagem é uma ação internalizada do aluno, ele que tem que deixar fluir seu saber, pois é o centro das atividades escolares e com seu interesse e curiosidade, vai descobrindo a sua aprendizagem. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 67 E o papel do professor é de facilitador, ele acredita que o aluno tem sua vivência e sua história, então ele organiza o material da maneira que os alunos aprendem ajudando, assim os alunos a desenvolver sua inteligência. A avaliação, nessa concepção tem o papel de auto-avaliação, pelo fato de o aluno ser o protagonista de sua aprendizagem a avaliação tem sentido sendo para ele se auto-avaliar, ver seus pontos positivos e negativos, ver no que precisa melhorar. Nessa tendência, com o ensino centrado no interesse dos alunos, a educação tem como prioridade criar condições para que os alunos se tornem capazes de desenvolver sua própria aprendizagem. C) INTERACIONISMO No interacionismo o conhecimento ocorre na relação entre sujeito e o objeto, em um processo mental. O conhecimento está na ação entre o homem (aluno) e o objeto estudado.Conforme o pensamento de Moll (1996, p. 84): O conhecimento humano é construído na relação do sujeito com a Realidade. Esse processo é construído pelas interações estabelecidas entre o sujeito e o objeto do conhecimento, portanto entre o homem e o mundo. A ultrapassagem de um nível de compreensão é sempre caracterizada pela construção de novas estruturas, de novos esquemas de compreensão que antes não existiam no sujeito. Não se privilegia nem o sujeito, nem o objeto, mas as trocas que os dois estabelecem entre si, reestruturando- semutuamente. O interacionismo piagetiano é baseado no conhecimento, conhecimento esse construído na interação do aluno com o objeto (estudado). Nessa concepção epistemológica o professor tem o papel problematizador, ele problematiza situações de investigação, de descoberta que levará o aluno a interagir com o objeto e com o meio, chegando assim à construção de sua aprendizagem. De acordo com Franco (1995, p. 56): Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 68 Isto significa que o professor está ali para organizar as interações do aluno com o meio e problematizar as situações de modo a fazer do aluno, ele próprio, construir o conhecimento sobre o tema que está sendo abordado. Os educadores nessa concepção precisam conhecer os alunos para poder trabalhar respeitando suas diferenças e individualidades. O construtivismo deve ser entendido como uma concepção epistemológica que vai ajudar o professor a entender e a conhecer seus alunos, e partindo desse entendimento ele vai criar técnicas e maneiras diferentes para trabalhar em sala de aula, que levará o aluno à construção de sua aprendizagem CAPÍTULO XXI – DIAGNOSTICANDO Conhecer o nível em que está a turma é essencial durante a alfabetização – e no decorrer de toda a escolaridade. Percebendo os avanços e as dificuldades dos pequenos, você consegue planejar uma boa aula e propor atividades adequadas para levar cada um a se desenvolver ainda mais e chegar ao fim do ano lendo e escrevendo. Essa avaliação deve ser feita logo no início do ano e repetida, no mínimo, uma vez por bimestre. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 69 CAPÍTULO XXII - O TRABALHO EM GRUPO Para toda criança, confrontar suas ideias com as dos colegas e oferecer e receber informações é essencial. Essa troca, que leva ao avanço na aprendizagem, precisa ser bem planejada. É essencial conhecer quanto os alunos já sabem sobre o desafio que será proposto, já que a organização da turma não pode ser aleatória. “Se o objetivo é que eles decidam conjuntamente sobre a escrita de um texto, é importante juntar os que apresentam níveis diferentes, mas próximos entre si, para que haja uma verdadeira troca”, afirma Beatriz Gouveia. Quando se reúnem crianças de níveis muito diferentes, acaba-se reproduzindo a situação escolar de “alguém que „sabe‟ mais que os demais, obrigando os outros a uma atitude passiva de recepção”, como explica Ana Teberosky no livro Os Processos de Leitura e Escrita. O sucesso no trabalho com agrupamentos produtivos depende do tipo de tarefa: ela deve ser sempre desafiadora para que a turma use tudo o que sabe na sua resolução e, assim, possa evoluir. Atuar em duplas pressupõe, também, que as crianças já conheçam o conteúdo para fazer alguns progressos sem a intervenção direta e constante do professor (mesmo porque é impossível acompanhar todos, o tempo todo, em suas carteiras). Lembre: se os grupos têm níveis diferentes, deve-se levar isso em conta também na hora de fazer suas intervenções para que eles estabeleçam novas relações. Isso vale para as perguntas que se fizer e também para as informações que der. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 70 CAPÍTULO XXIII - OS DISTÚRBIOS QUE AFETAM O DESENVOLVIMENTO Por desenvolvimento atípico, entendemos que é todo o desenvolvimento desviado daquilo que é esperado. Para compreender as patologias, devemos constatar que há uma diferença de graus de desenvolvimento patológico em cada indivíduo. Realizar um bom diagnóstico é fundamental para que possamos estabelecer os programas de intervenção, a origem dos problemas e os programas de prevenção. De acordo com Rappaport (1981), é fundamental ao educador ter noções de como ocorreu à fecundação e o crescimento da criança no útero materno, pois muitos dos problemas de comportamento, deformidades físicas e distúrbios de personalidade têm origem nesta fase. Sabe-se que a placenta da mãe passa inúmeras substâncias ao bebê e que as alterações na fisiologia da mãe podem provocar mudanças no feto, bem como nos seus estados emocionais. No entanto, nos ateremos a outros fatores que podem influenciar o desenvolvimento do bebê, no que se referem os cuidados da mãe e do ambiente que ela participa, tais como: idade da mãe, drogas, radiações, doenças infecciosas, fator RH, dieta e stress materno. a) Idade da mãe É comum ocorrerem algumas deformidades nos bebês de mães muito jovens, com menos de 20 anos, pois o aparelho reprodutor ainda está em formação, ou em mães com mais de 35 anos. Mussen et. al. (1995) comenta que os bebês de mães muito jovens têm maior probabilidade de nascer abaixo do peso, como também com defeitos Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 71 neurológicos e com maior probabilidade de contrair doenças infantis. Já as mães com mais de 30 anos, têm maior probabilidade de adoecer durante a gravidez e ter um trabalho de parto mais longo e difícil. As mulheres com mais de 35 anos têm maior possibilidade de aborto espontâneo e filhos abaixo de peso ou natimortos. Após os 40 anos, há um risco maior de ter filho com uma anormalidade cromossômica, principalmente a Síndrome de Down. b) Drogas O uso destas substâncias pela mãe, principalmente no início da gestação, pode causar má formação física ou mental de diversos tipos. O uso de álcool pela mãe pode gerar no bebê retardo no crescimento pré e pós-natal, nascimento prematuro, retardo mental, malformação física, distúrbios de sono e doença cardíaca congênita. Segundo Mussen et. al. (1995), quanto maior for a ingestão de álcool, maior é o risco da Síndrome Alcoólica Fetal. Fumar retarda o crescimento fetal e diminui o peso do recém-nascido, bem como a resistência às doenças, aumenta a chance de aborto espontâneo e nascimento prematuro, além de poder afetar em longo prazo, o desenvolvimento físico e intelectual. Bebês de mães dependentes de outras drogas têm mais probabilidade de apresentar problemas neurocomportamentais severos e permanentes, além de irritarem-se com facilidade, serem tensos, muito agitados e barulhentos, não se acalmarem no colo, ter sono irregular e chorar muito alto. c) Radiações Exposição à radiação pode gerar morte no bebê, malformação, lesão cerebral, maior suscetibilidade a certas formas de câncer, diminuição do período de vida e mutações em genes cujos efeitos podem não ser percebidos durante muitas gerações. d) Doenças infecciosas Abortos (fetos com má-formação, eliminados espontaneamente), Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 72 anormalidades físicas (cegueira, surdez, má-formação nos membros) ou mentais (retardo mental) podem ser causadas por sífilis, rubéola e caxumba. e) Fator RH Se há incompatibilidade entre os fatores sanguíneos da mãe com o do bebê, podem acontecer abortos, natimortos, morte logo após o nascimento, paralisias parciais, surdez ou deficiências mentais. f) Dieta Uma alimentação pobre predispõe complicações durante a gestação e o parto, a prematuridades, a maior suscetibilidade a certas doenças e ao atraso no desenvolvimento físico e mental do bebê. Os filhos de mães com dietas nutricionalmente deficientes são mais propensos a baixo peso, a um desenvolvimento cerebral com ondas cerebrais anormais, são menos resistentes a doenças como pneumonia e bronquite e apresentam índice de mortalidade mais elevado no primeiro ano de vida. A desnutrição grave pode prejudicar o desenvolvimento intelectual, além de produzir efeitos adversos no desenvolvimento físico. g) Stress materno “Os bebês nascidos de mães deprimidas, infelizes, têm mais probabilidade de nascerem prematuros ou de ter pesos baixos ao nascer; de ser hiperativos, irritáveis, e ainda de manifestar dificuldades tais como alimentação irregular, evacuação excessiva, gases, distúrbios do sono, choro excessivo e necessidades incomuns de ficar no colo.” (MUSSEN, et. al., 1995. p. 70) CAPÍTULO XXIV- MODALIDADES DE APRENDIZAGEM As modalidades de aprendizagem são as maneiras particulares de cada um se aproximar do conhecimento, bem como o ato de dar forma ao seu saber. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 73 Trata-se de uma matriz que vai sendo utilizada nas diferentes situações de aprendizagem. Entendemos por modalidades de aprendizagem sintomática, as dificuldades de aprendizagem. Para o surgimento de uma dificuldade, faz-se necessário compreender o processo adaptação, descrito por Piaget. O processo de adaptação, conforme Piaget se desenvolve graças a um duplo movimento complementar de assimilação e acomodação. De acordo com Paín (1989), é através da assimilação que o sujeito transforma a realidade para integrá-la às suas possibilidades de ação, e através da acomodação, transforma e coordena seus próprios esquemas ativos, para adequá-los às exigências da realidade. A Psicopedagogia se interessa pela forma como o sujeito aprende, portanto, aprofunda o estudo do processo de adaptação formulado por Piaget. A modalidade de aprendizagem, segundo Fernández (2001), é “um molde relacional que cada sujeito utiliza para aprender” (p. 79). A modalidade de aprendizagem, quando saudável, se caracteriza por uma alternância entre os mecanismos de assimilação e acomodação. A doentia seria aquela que, ainda segundo a autora, “constitui empobrecimentos do idioma do sujeito, na medida em que o obrigam a repetir-se, acorrentando-o no sofrimento da não-mudança” (p. 80). Paín (1989) descreve as modalidades de aprendizagem sintomática tomando por base o postulado piagetiano. Descreve como a assimilação e a acomodação atua no modo como o sujeito aprende e como isso pode ser sintomatizado, tendo assim características de um excesso ou escassez de um desses movimentos, afetando o resultado final. Na abordagem de Piaget, o sujeito está em constante equilíbrio. Paín (1989) parte desse pressuposto e afirma que as dificuldades de aprendizagem podem estar relacionadas a uma hiperatuação de uma dessas formas, somada a uma hipoatuação da outra. Existem tipos de modalidades de aprendizagem não-saudáveis, que são as combinações possíveis entre o excesso ou escassez da assimilação e da acomodação: Hipoassimilação; Hipoacomodação; Hiperassimilação; Hipoacomodação; Hipoassimilação; e Hiperacomodação. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 74 a) Hiperassimilação Sendo a assimilação o movimento do processo de adaptação, pelo quais os elementos do meio são alterados para serem incorporados pelo sujeito, numa aprendizagem sintomatizada pode ocorrer uma exacerbação desse movimento, de modo que o aprendiz não se resigna ao aprender. Há o predomínio dos aspectos subjetivos sobre os objetivos. Esta sintomatização vem acompanhada da hipoacomodação. b) Hipoacomodação A acomodação consiste em adaptar-se para que ocorra a internalização. A sintomatização, segundo Fernández (1991), da acomodação pode dar-se pela resistência em acomodar, ou seja, pela dificuldade do sujeito de internalizar os objetos do ambiente. c) Hiperacomodação Se acomodar-se é abrir-se para a internalização, o exagero disto pode levar a uma pobreza de contato com a subjetividade, levando à submissão e à obediência acrítica. Essa sintomatização está associada à hipoassimilação. d) Hipoassimilação Nesta sintomatização ocorre uma assimilação pobre, o que resulta na pobreza de contato com o objeto, de modo a não transformá-lo, não assimilá-lo de todo, apenas acomodá-lo. A aprendizagem normal pressupõe que os movimentos de assimilação e acomodação estejam em equilíbrio. Fernández (2001) sustenta que: uma modalidade de aprendizagem saudável e viva terá a possibilidade de descobrir quando a obra que quer fazer é distinta, ou quando os materiais são diferentes e mudar, ou melhor, escolher entre as ferramentas que tenham guardadas, outras que não costuma usar, embora não estejam tão disponíveis (p. 79). O que caracteriza a sintomatização no aprender é predomínio de um movimento sobre o outro. Quando há o predomínio da assimilação, as dificuldades de aprendizagem são da ordem da não resignação, o que leva o sujeito a interpretar os objetos de modo subjetivo, não internalizando suas características próprias. Quando a acomodação predomina, o sujeito não empresta sentido subjetivo aos objetos, antes, resigna-se sem criticidade. O sistema educativo pode produzir sujeitos muito acomodativos se a reprodução dos padrões for mais valorizada que o desenvolvimento da autonomia e da criatividade. Um sujeito que apresente uma sintomatização Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 75 na modalidade hiperacomodativa - hipoassimilativa pode não ser visto como tendo “problemas de aprendizagem”, pois consegue reproduzir os modelos com precisão. Por isso, consideramos algumas formas de manifestação de comportamentos para cada uma das formas das dificuldades de aprendizagem, de acordo com Paín (1986), o sujeito pode manifestar as seguintes características: a) Hipoacomodação  Dificuldade para a construção de novos esquemas;  Repetição continuada e anormalmente persistente na exposição de uma ideia;  Existe uma aderência persistente de um determinado pensamento numa espécie de ruminação mental, como se faltasse ao paciente a formação de novas representações na consciência;  Há uma grande dificuldade em desenvolver um raciocínio, seja por simples falta de palavras, por escassez de ideias ou dificuldade de coordenação mental;  Presença de repetição automática e frequente de representações, predominantemente verbais e motoras;  A hiperacomodação está incluída nos distúrbios do curso do pensamento por sugerir que a temática em pauta se encontra limitada a um curso circular, que não tem fim e repete-se seguidamente. b) Hipoassimilação  Transformação da realidade, que para o sujeito é percebida como ameaçadora e perigosa;  Inibição da capacidade lúdica do sujeito;  Desenvolvimento de esquemas de ações reativos, num movimento contrário à realidade ameaçadora, como tentativa de, anular as emoções ou excitações percebidas como penosas;  Ações estereotipadas impeditivas da capacidade criadora;  Rigidez de pensamento fruto da dificuldade de coordenar os esquemas disponíveis;  A inibição do pensamento é um sintoma que se manifesta por lentidão de todos os processos psíquicos;  Dificuldade na percepção dos estímulos sensoriais, limitação do número de representações e lentidão no processo e evocação das lembranças;  Apatia;  O sujeito não fala espontaneamente nem responde às perguntas com vivacidade, responde lentamente ou com dificuldade;  Presença de um sentimento subjetivo de incapacidade; Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 76  Há um sentimento de pouco interesse, de imprecisão a respeito das opiniões, dificuldades para a escrita e lentidão para andar;  Dificuldade de compreensão, de iniciar uma conversação, de escolher palavras, enfim, eles pensam com grande esforço; e  Falta de curiosidade provocada pela percepção de que conhecer é proibido, perigoso, conhecer é perder, sofrer. c) Hiperassimilação  O sujeito projeta excessivamente os conteúdos internos considerados dolorosos, transformando a realidade de tal forma que prejudica a diferenciação mundo interno e mundo externo;  Não há uma separação entre o sujeito e o objeto, eles se confundem e se misturam;  O objeto não é percebido como perturbador;  Há uma internalização prematura dos esquemas com um predomínio lúdico, que ao invés de permitir a antecipação de transformações possíveis, desrealiza o pensamento;  Ficam comprometidos o pensamento lógico e a objetividade uma vez que, ao assimilar os conteúdos subjetivos projetados e confundidos com essa realidade tal qual um espelho que só reflete a imagem do sujeito promoverá o predomínio da fantasia e da subjetivização;  A desrealização do pensamento é uma alteração da expressão do pensamento caracterizada por uma variação incessante do tema e dificuldade para se chegar a uma conclusão;  A progressão do pensamento encontra-se seriamente comprometida por uma aceleração associativa, a tal ponto que, a ideia em curso é sempre perturbada por uma nova idéia que se forma;  Na desrealização do pensamento os doentes geralmente são desviados da representação do objetivo através de quaisquer ideias secundárias;  O que há não é uma carência de objetivos, mas uma mudança constante do objetivo devido à extraordinária velocidade no fluxo das idéias;  A sucessão de novas idéias, sem que haja conclusão da primeira, torna o discurso pouco ou nada inteligível;  Costuma-se observar quatro características na desrealização do pensamento: desordem e falta aparente de finalidade das operações intelectuais, predomínio de associações disparatadas, distração, facilidade de se desviar do curso do pensamento sob a influência dos estímulos exteriores, freqüente aceleração do ritmo da expressão verbal;  A desrealização do pensamento normalmente está associada à aceleração do psiquismo num estado afetivo comumente encontrado na euforia, seria como se a eloquência na produção de ideias superasse a capacidade de verbalizá-las; e  É comum a dificuldade deste sujeito em lidar com regras e limites, podendo ser considerado, muitas vezes, hiperativo. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 77 d) Hiperacomodação  O sujeito modifica o menos possível o objeto do conhecimento para aprendê-lo;  Há uma pobreza de contato com a subjetividade;  Presença de super estimulação da imitação;  Falta de iniciativa;  Obediência acrítica; e  Submissão. Para aprender é preciso que os educadores saibam, simultaneamente, mostrar e guardar o conhecimento, pois só assim o aprendiz vai entrar em contato com o desejo de aprender, escolhendo e selecionando os conhecimentos, que ele pode articular com o seu saber. CAPÍTULO XXV - TDAH Estima-se que cerca de 3 a 6% das nossas crianças e adolescentes apresentem o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH), que está associado a prejuízos no âmbito familiar, escolar e das relações com os pares. A tríade sintomatológica clássica do transtorno caracteriza-se por desatenção, hiperatividade e impulsividade. Ele é chamado, às vezes de DDA, (Distúrbio do Déficit de Atenção). Em inglês, também é chamado de ADD, ADHD ou de AD/HD. O transtorno é reconhecido oficialmente por vários países e pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Independentemente do sistema classificatório utilizado (DSM-IV ou CID-10), as crianças com TDAH são facilmente reconhecidas nas clínicas, nas escolas e em casa. Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 78 CAPÍTULO XXVI - A FAMÍLIA, A ESCOLA E A APRENDIZAGEM A família é uma instituição normalizada por uma série de regulamentos de afiliação e aliança, aceitos pelos seus membros. Entre suas funções, podemos citar:  Gerar afeto aos membros;  Proporcionar segurança e aceitação pessoal aos membros;  Proporcionar satisfação e sentimento de utilidade aos membros;  Assegurar a continuidade das relações entre seus membros;  Proporcionar estabilidade e socialização de seus membros;  Impor autoridade e o sentimento do que é correto para os membros; e  Proporcionar a saúde aos membros. Como lidar com a criança portadora de TDAH na escola: De acordo com Belli (2008), seguem algumas dicas para o professor enfrentar a realidade escolar com crianças e adolescentes portadores do diagnóstico do TDAH: use todos os recursos disponíveis para descobrir o estilo de aprendizagem da criança. Dentre os inúmeros recursos podemos citar:  Uso de retroprojetor. Utilize pequenas frases, palavras chaves, imagens e figuras coloridas e a apresentação deve utilizar no máximo 30 minutos;  Aulas apresentadas em PowerPoint.Utilize o mesmo modo do retroprojetor;  Filmes com curta duração;  Desenhos;  Histórias - fatos históricos, contos, histórias em quadrinhos, etc.  Slides;  Computadores. Pesquisas na Internet, jogos, programas de aulas já prontos sobre determinados assuntos; e  Músicas. . Grupo iPED – Curso de Alfabetização Proibida a reprodução por qualquer meio eletrônico ou impresso. Grupo iPED - Todos os direitos reservados - www.iped.com.br 79 Encerramento Olá, Encerramos aqui o curso de Alfabetização. Nosso desejo é que tenhamos conseguido transmitir informações importantes que deverão servir de base para a alfabetização de jovens e adultos. De qualquer forma, é importante ressaltar que esse curso não capacita ou habilita seus alunos ao exercício da profissão. Trata-se apenas de um apanhado geral sobre os principais aspectos que envolvem esse tipo de trabalho. Sucesso e Boa Sorte.
Copyright © 2024 DOKUMEN.SITE Inc.