João Mohana - Não Basta Amar Paraser Feliz No Casamento(1)

April 2, 2018 | Author: Renata Montoro | Category: Sexual Intercourse, Love, Marriage, Family, Individualism


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NÃO BASTA AMARPARA SER FELIZ NO CASAMENTO JOAO MOHANA ODBO 6ª Edição SUMÁRIO INFRA-ESTRUTURA DA ESTABILIDADE CONJUGAL 0 amor não é tudo A crise conjugal no laboratório Pistas de solução para a crise Orgulho e destruição conjugal Respeito e amor conjugal Admiração e beleza conjugal Consciência e crescimento conjugal Ascese e harmonia conjugal 3 7 35 55 73 83 93 104 Eutrapelia e respiração conjugal Criatividade verbal e comunicação conjugal Preparação para crescer a dois Realização conjugal 119 134 171 178 INFRA-ESTRUTURA DA ESTABILIDADE CONJUGAL O AMOR NÃO É TUDO Não existe relacionamento humano mais complexo do que aquele que aparece com o casamento. Devido aos numerosos fatores oriundos de ambas as partes, defrontadas na mais exposta das intimidades. Temperamento, cultura, idade, passado, ambições, objetivos, receios, gostos, defeitos, qualidades, QI, doenças, espiritualidade, circunstâncias imprevistas, terceiros, quartos e quintos, etc. etc. Bastaria lembrar um desses dados, o passado, para avaliarmos as dificuldades enfrentadas pelo amor durante os anos de vida em comum. Que automatismos trazem os dois? Que preconceitos? Que problemas? Afinal, os que se amam não se defrontam vazios. Carregam uma bagagem existencial, e despejam essa bagagem no mesmo armazém. Que acontece quando no estoque de um vem pólvora e no do outro, fósforo? Afinal de contas, nada impede que dois incompetentes venham a se amar. Quando um deles tocar a campainha na porta do outro, quem caminhará sobre os dois pés? Um recalcado? Uma complexada? Um imaturo? Uma neurastênica? Um vingativo? Uma inexperiente? Um extrovertido? Uma fleumática? Um ressentido? Uma hedonista? Um glutão? Uma inconstante? Um pervertido? Uma ignorante? Um mal-educado? Uma medíocre? etc. etc. No casamento não basta amar, porque o coração está enraizado numa personalidade, e a personalidade é complexa. No casamento não basta amar, porque não é fácil ao ser humano subtrair-se aos condicionamentos, tanto aos condicionamentos subliminares como aos ostensivos. No casamento não basta amar, porque são dois estômagos que se casam, não apenas dois corações. E conhecemos os quotidianos imperativos estomacais. No casamento não basta amar, porque dois estômagos e dois corações que se amam, precisam de casa, e sabemos o preço de uma casa, preço a pagar numa multiforme diversificação de moedas. No casamento não basta amar, porque o verdadeiro amor aspira ser fecundo, e a fecundidade traz os filhos, um ou mais, e os filhos exigem medidas, atitudes, opções, que devem ser assumidas por ambos, não apenas por um. No casamento não basta amar, porque todo casamento sincero tem de resistir aos testes da vida, e para resistir a esse tipo de teste, sobretudo quando são testes mais fortes que a força do amor, terminam fazendo dos amantes as primeiras vítimas. No casamento não basta amar, porque um ou ambos podem estar equivocados acerca do que seja o amor, e então o casamento passa a ser o itinerário fatal do desamor. E nesse penhasco a embarcação conjugal vai se espatifar. Apenas por algum tempo o amor parece ser tudo e bastar para conseguir tudo. Passada a excitação da mútua descoberta, vem o defrontar-se com a realidade, com a verdade concreta de cada um. Então ambos descobrem (muitas vezes, de modo amargo) que o amor não é suficiente para se sustentar a si mesmo por bastante tempo. E muito menos, para sempre. No casamento o amor parece ser tudo só para os românticos da linda canção Love is ali. Na realidade, Love is not ali. O casamento feito simplesmente com amor é um edifício levantado com tijolos, sem cimento. Ventanias, mesmo distantes, são capazes de derrubá-lo. Por inaceitável que pareça, o cimento de um casal não é o amor. Já é hora de redescobrirmos as limitações do amor, precisamente para garantirmos a eficiência dele no casamento. Já é hora de sabermos, meus caros, que no casamento o amor é indispensável mas não suficiente; que o amor só se torna eficaz, se reúne todas as forças pessoais e extra pessoais, visando viabilizar suas próprias aspirações. Ora, no casamento esta empresa se torna duplamente mais difícil, porque tem de ser levada a cabo por dois e em dois. Soou a hora de saber que o amor, sozinho, é até perigoso, porque compromete a objetividade do olhar, incapacitando o parceiro para desprender-se da própria subjetividade. Precisamente porque ama. Se o outro possui um defeito, o amor não olha, ou age como se não olhasse, iludindo-se, e ingressa assim mesmo no casamento. Depois de certo tempo, o gotejar termina perfurando a laje, de tanto bater do mesmo modo, no mesmo lugar. No mesmo coração. É hora de sabermos que quando não há condições (além do amor), quando não há uma infraestrutura psicológica, moral e espiritual na personalidade de cada um, a vida conjugal resvala no desfiladeiro da incompatibilidade, tanto mais depressa quanto mais os dois se amam, pois acabam cegos para a verdade de cada um. E, cegos, como evitar os choques por deficiência de visão? Já é hora de nos preocuparmos com o amor maturado, e não simplesmente com "o amor". Hora de preocupar-nos em constatar se nós dois sabemos o que é o amor verdadeiro, entre as dezenas de concepções equívocas, comerciais, suspeitas, falsificadas, deturpadas do amor. É hora de preocupar-nos em descobrir se o nosso não é um dos falsos amores hoje balconeados no mercado dos corações, ou se, ao contrário, é mesmo um amor genuíno. Este ano, entrevistado por um jornalista carioca, surpreendi-me com o espanto daquele rosto quando me ouviu dizer que não basta o amor para um casamento vingar. Dentro dele o noivo suplantou o repórter, e partiu para uma sabatina de perguntas desviadas do objetivo da entrevista. Esta ocorrência foi a gota que faltava para fazer transbordar minha decisão de escrever este livro. Seja ele, meu amigo, minha amiga, uma lanterna em suas mãos; uma bênção para o casamento de vocês. A CRISE CONJUGAL NO LABORATÓRIO. Há anos fui convidado para oficiar um casamento e propus aos noivos uma palestra. Pretendia verificar o termômetro da preparação de ambos, não apenas saber se se amavam. não apenas suaves tons portinarianos. inclusive da vida conjugai. Os filhos intuem que na crise conjugal a cumeeira da família está abalada. pois os garotos passam a enfrentar uma estabilidade ameaçada. o roxo. — e sim na quimera. receiam fracassar nas tentativas de impedir aquilo que sentem como sinistra ameaça. no sonho. estressante. uma comunicação insegura. corroída. mesmo. Para os filhos a crise conjugal cria problemas difíceis. que passam a se olhar com desconfiança. perguntei-lhes sobre o tema que gostariam que eu abordasse na homilia. com suspeita. No meio da entrevista. para combinar com a decoração da igreja. fonte de esperanças vãs. Conflito de duzentos graus Não resta dúvida que a crise conjugal é o pior dos conflitos entre marido e mulher. por teimarem em sonhar com um romantismo desencarnado. e algumas vezes com ódio. Pe. algumas vezes. E me pediu: Por favor. É. Não — insistiu ela. suave. Mohana. Muitos homens e muitas mulheres que se casaram comunicando-se satisfatoriamente. mas outras cores. sacudida. Em não se preparar para o tecnicolor da vida. Este é um perigo para a estabilidade conjugal. e . campanulado. Mas — retruquei — há uma maneira delicada de se abordar um tema realista. o obstáculo mais espinhoso para a comunicação entre ambos. quando passamos a falar da celebração. chegam a emparedar-se numa total incomunicação. Ela quer que tudo seja cor-de-rosa. na fantasia subjetiva. duvidosa. até o negro. morbigênicos. receiam aborrecê-los. Parte de uma mentalidade obsessionada em decorar toda de róseo a vida conjugal. A igreja vai ser toda decorada em rosa. nesse dia eu quero tudo cor-de-rosa. da vida familiar. distante do sadio idealismo de quem possui a cabeça no céu mas os pés na terra. e. essa visceral repulsa em olhar com realismo o casamento é o móvel inicial de muitos obstáculos à estabilidade de um amor desejoso de ultrapassar a fugacidade das corolas.Vieram. porque é a vivência mais próxima da ruptura. — Não escureça meu sonho. minada. acham que o quotidiano conjugal de vocês vai ser cor-de-rosa? Mesmo que não seja. E com essa concessão. A essa altura o noivo entrou em favor da companheira: Faça a vontade dela. Tome um assunto leve. Assim terminei fazendo um sermão cor-de-rosa. Pe. Pois o romantismo desencarnado não tem cabeça e pés na terra. tornando-se. Tentando restabelecer os laços entre os pais. nas imaginosidades inexistentes. por isso mesmo. Assim tudo ficará cor-de-rosa no meu casamento. Mohana. inclusive o pardo. Até o sermão. tecnicolor que inclui não apenas o rosa. por isso mesmo. nem no céu. Notei que o coração da noiva se sobressaltou com uma das idéias. Transportinarianos Aí está. Ora. romântico. de qualquer vida. Embora assim. Aqui. tão apocalíptico para a família como o . 36 não se preocupavam com o fósforo no tapete. na segunda parte. recebeu também o nome de inevitável. lei que os psicólogos matrimoniais rotulam de a lei da crise. Antes de mais nada. seja grave. As crises graves justificam esta denominação porque desde o início comprometem o âmago da opção feita pelo casal. Sabemos que esta máxima é verdadeira: um casal prevenido tem mais chance de permanecer unido. Temos de estar preparados para enfrentá-la. — a infidelidade. As exceções a esta inevitabilidade não passam de exceções. não apenas a comunicação de papai e mamãe entre si. Insistindo. avolumando-se depois. desaparecendo ou agravando-se. uns com os outros. como também dos filhos com eles. forneço dezesseis medidas profiláticas e terapêuticas da mais freqüente causa de crises graves. A crise inevitável pode fermentar já antes do casamento. ou podem decorrer do agravamento de uma crise leve. ou involuindo. no meu livro Céu e Carne no Casamento (edição Agir).concluem que se encontram sob a iminência de um desabamento. para não deixar dúvida: as crises conjugais podem ser: leves ou inevitáveis. e graves. por ser generalizada. não resta dúvida que estaremos defendendo-nos contra o pior. "crisezinhas" inevitáveis. Porque. O que constitui um alto índice de periculosidade conjugal. Quantas são. de tão freqüente. Em cada 100 casais. individualizado. mas tudo mais. Por isso. injetando em nós anticorpos psicológicos. — esmagando não apenas o processo comunicativo. sob pena de sermos devorados. Confirmam a lei. e a crise que rotulamos de grave. como é o caso de infidelidades consumadas. Não há receituário padronizado para elas. Sobretudo quando é verdade que o fenômeno da crise conjugal. que o outro descobre e recusa aceitar. passou a ser encarado hoje como uma lei da vida conjugal. dedicada aos problemas da carne. ficou constatado que 36% deles não se preocupavam com crises leves. A crise que qualificamos de leve. veremos alguns aspectos práticos cujo conhecimento será extremamente útil para evitar ou superar qualquer espécie de crise. conforme o projeto deste livro. e deles. Num questionário aplicado entre 530 casais de um curso ministrado por mim em São Paulo. Isto prepara-nos para barrar o medonho cogumelo conjugal. o fenômeno generalizado que justifica falarmos na "lei da crise". que pode vacinarnos. Não é de estranhar que sejam numerosas as dunas de cinza e as pilhas de divórcio. é preciso sabermos que há duas espécies de crise. em matéria de crise conjugal. continua válido o provérbio: "É melhor prevenir do que remediar". Podem já nascer graves. não se preocupavam que a casa começasse a arder. Bastariam estes dados para convencer-nos da importância desta abordagem. A crise leve é que constitui a matéria. Se nos aparelharmos para enfrentar esses boqueirões. esclarecendo-nos para pilotar o barco em qualquer situação. Qualquer crise grave exige estudo casuístico. Seja leve. na verdade. Sabemos como as idéias acionam atitudes. Não podemos dizer que conhecemos satisfatoriamente nenhum fenômeno. Essa força que clama alto. atávico. podemos atingir o problema na raiz e golpeá-lo antes que se torne árvore maldita. Sem casal não existe casamento. Pois. Basta que um dos dois pense que casamento é um meio de aumentar a velha família. Mentalidade descentrada do casamento. Nós dois é que Deus olha como marido e mulher. se entro no casamento com idéias incompatíveis com o próprio casamento. Mas o centro do casamento são os dois. mas todo casamento é rigorosamente o nascimento de uma nova família. Nós dois é que nos tornamos "uma só carne". com celofane e lacinho de fita. nós dois. euvocê. sobretudo quando os pais impedem o casal de deixá-los. sejam os pais. Os dois é que estão em primeiro plano. a primeira causa de crise a abordar é precisamente uma concepção descentrada da própria realidade matrimonial. sem ofender a família do companheiro. Esta colocação tem de estar bem clara na cabeça e no coração do casal e dos pais do casal. se desconhecemos as causas desse fenômeno. Ora. elementar: a voz do sangue. Mais que a voz. nem mesmo sociologicamente o casamento é um processo de ampliação da velha família. do que o conhecimento pelas causas. sem se fecharem para outros nós. Conhecendo bem as causas. Esse "deixar pai e mãe" não é fácil. Quanto mais correm. sejam outros. Nada tão útil. tanto mais distanciam-se da solução.cogumelo atômico foi para Hiroxima. E quando se injeta soda . Causas das crises. Nós-dois. que caracterizava o relacionamento nuclear de cada um até o noivado. cheios de boa vontade comovente. O que faz um casamento é uma maneira de ver e viver centrada no casal. para que o alicerce do amor não venha a tremer. genético. Alguns julgam que é fácil viver aquele preceito bíblico: "Deixarão ambos pai e mãe e serão os dois uma só carne" (Gn 2. sejam os amigos. Quantas vezes tenho encontrado casais em crise. Essa voz que brada forte. Marido e mulher. e laços íntimos. correndo fora do caminho. A bomba vai embrulhada. — a força. como diria Santo Agostinho. Não resta dúvida que muitas das crises originadas nesse motivo nasceram porque um dos dois não soube levar o processo com o necessário e justo respeito à família do outro. ao pretender formar a nova família. O casal é o tronco do casamento. Este é agora o relacionamento nuclear. tão seguro. Basta isto. Esqueceu aquele dado primordial. — do casamento em diante deixa de ser central. Não possuir do casamento esta concepção tão claramente meridiana pode ser uma das causas desencadeadoras de crise. Vejamos então as causas mais freqüentes de crises conjugais. não teve tato e firmeza. mas atirando fora do alvo. O vínculo papai-eu-mamãe. Nós dois é que nos casamos. cedendo lugar a outro: você-eu. Os dois. é evidente que os problemas surgirão. Tratando-se de casamento.24). Claro que permanecem os laços. palavras. ou trabalha fora do lar. meu bem. porque a futura sogra queria impor ao futuro genro um tipo de terno para a celebração. se é que acertaram os passos. então essa ameaça pode gerar descargas elétricas no convívio do casal. O marido implicou ainda mais com esta palavra. Só depois que todos os personagens desse drama se certificaram da realidade e do rumo em que deviam conduzi-lo. Só um. Pospor o parceiro à profissão. "Afinidade? Então você quer que essa afinidade com seu pai se interponha entre nós dois?" Todos os apelos de compreensão foram inúteis. aos olhos dos filhos. como sogros. É verdade que a expressão da mulher fora infeliz. pode ser uma outra causa de crise. pospor o parceiro à profissão. Virou-se pra mim. aos olhos do próprio preterido. E até reforçaram um misto de aversão e ciúme. pioraram as reações quando ela confessou que não havia mais dependência.cáustica no sangue do parceiro. menos que um outro ideal. Ele implicava com a amizade da esposa com o pai. Se ele não estava disposto a aceitar o tipo de relacionamento afinado entre filha e pai. Alguns pais criam problemas difíceis. Porque tal descaso borra a imagem pessoal. nenhum parceiro que ama." A mulher dizia. O que resta é afinidade". só então aquele casamento se afastou da implosão. aparecia em visitas assíduas. ao trabalho. Nunca mais tive notícias desse casal. . Sobretudo se carregam frustrações. não é um simples registro que vai funcionar como antídoto. "Acabou-se a dependência de seu pai. que começou a se apossar do coração do rapaz. Agora você está ligada é a mim. como se fosse a rainha da Inglaterra: meu marido é meu emprego. contra o gosto do rapaz. Quando chegam os netos. levando chocolates. pois também a mulher pode incorrer nela. Agora não só o marido pode colocar a profissão antes da mulher. procurando amenizar o problema: "A dependência acabou. podem amar a profissão mais que o parceiro. 2. No mundo competitivo de hoje. Lembro um casal que serenei durante uma crise. aos olhos dos inimigos. Nem mesmo seu pai. é muito freqüente tentarem transformar a casa da filha ou o apartamento do filho num avarandado paterno ou num alpendre materno. Sei de um casamento que quase entrou no forno crematório antes de entrar na igreja. suporta ser amado menos que um emprego. Levados por mil circunstâncias. ainda que se amem. ou se arrastam uma extroversão indiscreta. perde o status conjugal para despertar no parceiro diálogos periódicos. instalada pouco tempo depois da inauguração da vida conjugal. optar prioritariamente pelo trabalho. para os filhos. e ninguém suporta tranqüilo tal preterição. Ora. aos olhos do agressor. esplêndido profilático de crises. pela profissão. Também a esposa pode colocar a profissão antes do marido. presentes que funcionavam como lenha na fogueira invisível. sorrisos. aos olhos dos conhecidos. E entre tantos inconvenientes. porque duplicada. já que se tornou igualmente uma profissional. E o pai. que ignorava a fermentação da crise. O que havia era um laço mais profundo. Penúltima queixa de um marido a meus ouvidos: — Veja a última dela. indestrutível: afinidade. deixando o parceiro visivelmente em plano secundário. Não pode haver dois homens em sua vida. se com quatro pés ou com oito. Não sei como caminham. ou quase. Esta causa torna-se cada vez mais assídua. quem foi refugado. janta com o prato defronte da novela". É freqüente este desabafo de tantas esposas: "Esse colega me ouve. o terceiro propõe um passeio aparentemente inócuo. me valoriza. ou uma colega. negando a viabilidade do convite (é o recuo). geradores de crise. . há crescimento. antes de ouvir qualquer palavra. acrescenta: — Nada. ocupando o lugar do parceiro. Daí é fatal surgir o terceiro ou a terceira. à profissão. cada parceiro faz a experiência: "agora não fui posto no banco de trás. Meu marido engole a comida e sai pro trabalho". no escritório. Agora estou antes da profissão".Confirmo esta constatação nas centenas de cursos por mim ministrados a casais. de norte a sul do país. Além do mais. ou seja. A transferência afetiva instala junto dos oportunistas a ocasião para a tática do avanço-erecuo. É certo que o terceiro pode aparecer de mil maneiras imprevistas. Porque aquela lacuna deixada no coração do outro. oferece o ouvido amoroso que o parceiro recusa. referindo-se a companheiras de trabalho que recusam a fatídica inversão: "Ela me entende. sinceramente ingênuo. É evidente. . por culpa nossa. muitas vezes um colega de trabalho. — Porque pospõe a mulher ao trabalho. tende instintivamente a ser preenchida. fatalmente surgirão figuras de destaque no trabalho. Vamos falar de outra coisa. Então há entrosagem. Daí por diante será o outro que tomará as iniciativas de aludir à proposta. — A gente bem que podia dar um passeio. Por causa daquilo que se chama em Psicologia Profunda: transferi. Deixa pra lá. transferência. "uma volta para um relax" (é o avanço) mas logo. Durante o curso. antes do outro reagir. Muitas vezes na carteira vizinha um colega (ou uma colega) podem dar a sensação de não colocarem o trabalho antes do problema da esposa do desconhecido. Esse retrocesso imediato faz parte da tática. Num dos muitos diálogos ocorridos no local de trabalho. logo ou em ocasião posterior. O outro reage. mesmo em casa. canalização da afetividade barrada. Me ajuda mais que minha mulher. mas inegavelmente a oferta do ouvido amoroso é uma das mais comuns. Na repartição. Mas quando não há comunicação. Como se processa essa tática do avanço-e-recuo? É conhecida. ele mesmo se desdiz. há diálogo. Não. falando diretamente ou itinerando rodeios. ou em outro local que não a casa. Eu não quero te expor. . Daí podem surgir laços crisigênicos. ou apenas aparentemente: — O que era? Quem propôs e despropôs. Surgem comparações inevitáveis. E é claro que na balança desse confronto o parceiro sai (quase) sempre perdendo para o colega ou para a colega de trabalho. É diferente de meu marido. Minha mulher só vive às voltas com os interesses dela no trabalho. E alguns maridos freqüentemente confessam. me compreende. Pospondo o parceiro ao trabalho. para um outro. e não apenas baniu crises. Para alguns homens. e deixou com a vítima a decisão de mover-se. Conviver é viver unido nas manifestações de vida. duas carnes. A noiva era um imóvel. entrarão dois. Felizmente mudou. mas não convivem. mas terminou concordando. em nível de total intimidade. um terreno. Inicialmente resistiu em aceitar a observação. Chegou ao ponto que o terceiro queria. e. tanto quanto possível. Ora. não conseguia (eu) ver boa fé naquele ardor. o agente fatal de crise.— Eu aceito aquele passeio que você me propôs na semana passada. mormente quando a personalidade. Um outro desencadeador de crise conjugal pode vir dentro de cada parceiro. constituem um homem e uma mulher que vivem juntos. no casamento. . o modo de agir. quem pode garantir que a casa resistirá? Nem a casa nem o casal. 3. e manter-se nutrido para quem ocupava o primeiro lugar: a profissão. E comentei com ele: "Sua noiva me parece mais um investimento empresarial seu". não cultivada na juventude. Este é um fator de crise que precisa ser encarado com coragem. porque não vivem unidos. E se não superaram o individualismo. diagnosticado antes do casamento. o modo de viver. Ele condicionou os passos. Ou ambos. Pode ser que apenas um seja individualista. É o modo de ser. do qual ele pretendia auferir lucro. sentindo-se antecipadamente armado para defender-se de qualquer acusação. Pronto. Muitas vezes no namoro e no noivado cada um fechou os olhos para o estilo individualista do outro. Parecia-me poluído por interesses comerciais. Porque é o tipo de micróbio que ataca em qualquer tempo. porque a profissão dele nunca perdeu para nenhuma das pretensões dela. Assim as vítimas de crises preparadas pela tática do avanço-e-recuo vão constituindo uma patética coleção. oferece menos atrativos do que a profissão (e do que alguns colegas de profissão). Pôs a chave na fechadura e esperou a vítima cair na tentação de girar. Por isso ele é a matéria-prima. inclusive contra os estilhaços da crise de mais um casal. Retificou a hierarquia suspeita. Lembro-me de que. prazer. como passou a descobrir na companheira valores que de outro modo jamais descortinaria. Nesse novo quadro sociológico onde a estrutura do trabalho traz problemas para a vida do casal. Daí a necessidade de estarmos prevenidos contra todas essas cascas de banana carinhosamente e maquiavelicamente postas no caminho de quem coloca o parceiro na retaguarda da profissão. observando o entusiasmo com que um rapaz falava da noiva. jamais se afinam a ponto de formarem (psicologicamente ao menos) um casal unido. nem o romantismo do período pré-nupcial consegue dar prioridade à noiva em relação à profissão. Quando muito. Estilo individualista de viver. um individualista jamais fará em profundidade a experiência do convívio conjugal. Concorda tranqüilo em atender o desejo. Hoje estou precisando. mesmo justas. Casar é o começo de um convívio em regime de full time. ou mais de dois. Sente-se pior do que em solteira. mas todo individualista tem mentalidade de solteiro. impedirá. não dá passos certos ao encontro do outro. Como não há crises individuais no casamento. Como qualquer crise conjugal envolve sempre dois. vítima de um desses. Todo individualista vive como se fosse uma ilha. era o antípoda do individualista. Como plantas — perguntou o individualista — se sabes que não vais colher frutos delas? Planto para agradecer aos que plantaram antes de mim. ou aquela. É verdade que nem todo solteiro é individualista. o comodista pode tornar-se um marido ou uma esposa negligente. Aquele agricultor que plantava oliveiras. Usada. do parceiro. Por isso é que o individualista casou e não fez descer. o individualista dificilmente acerta a saída do labirinto. . com possibilidade de êxito. que deixa toda a problemática doméstica nos ombros da mulher. Se é o marido. das crianças. da cabeça para a vida. de sentir. termina por empurrá-la num nevoeiro de solidão insuportável. Tratando-se de um marido negligente. . Claro que um tal ser humano é considerado tolo por qualquer individualista. que todo aquele. manifesta duas tendências que. Tudo fica sob a responsabilidade do outro. Como o individualista é cego para as perspectivas do outro. de viver como se eu existisse sozinho. quando se é uma península. os habilitados para levantar diques contra as crises matrimoniais. em vez de negligente. os dois estarão no boqueirão da crise. É a "burra de carga". A negligência pode ser um dos erros do individualista. etc. como se eu não estivesse vinculado a ninguém. sem saber de onde saiu o dinheiro para comida. que não deixa lá fora o estilo solteiro de viver. Logo mais. supondo que todos existam para rodeá-lo de préstimos. porque contava com um companheiro e está percebendo que é uma contratada para prestar folha de serviço não partilhada. Porque só quando se tem um estilo de vida vinculativo. não uma ilha. janta. uma mulher assim centrífuga. para si e para o outro. e ele sabe que o outro fabricará as soluções. e para oferecer aos que vierem depois de mim. O romantismo típico do período de noivado embala a esperança: vai passar. esse tipo de convívio conjugal. almoça. água. em seu próprio bem-estar. em seu comodismo. E no entanto é um homem assim aberto. por individualismo. embora opostas. luz. criam atmosfera favorável à crise: Pelo fato de só pensar em si. as conseqüências desse fato. A sensação é estranha. um braço serviçal. como diz uma conhecida minha. Quando o individualista entra no casamento. da família. vai melhorar.O casamento é de tal modo tecido de vivências bilaterais. vai mudar. Chega em casa. levados por ele. torna-se desligado dos problemas do lar. — Esperança! Individualismo quer dizer precisamente estilo de pensar. uma crise que não é um fenômeno individual. Mas pode ocorrer que o individualista assuma na vida conjugal um comportamento absorvente. como se eu não tivesse assumido o compromisso de me unir a uma outra vida. pode-se enfrentar. . Pela cabeça do individualista custa a passar um pensamento interessado na perspectiva do outro. o individualista facilmente se atola na crise. nunca para merecer uma atitude peninsular. de reagir. roupa dele. por razões de temperamento. para garantir essa prioridade do eu em tudo. Não me casei pra botar você em vitrina". com pratos de sua preferência pessoal. obstáculos contra a vida social do casal. para um aniversário. e a exuberância típica do extrovertido levava-as a participar com muita verbosidade. não está interessada em conservas. Mas. dos gostos. Cada um dos maridos. o carimbador de preços. Conhecer as qualidades é também indispensável. mais cultos. indefectível: "Garanto que você adoraria ir lá para se mostrar. Então surgem logo as famosas desconfianças. sente-se agredida. com muito destaque. que entraram em crise porque cada uma das esposas era extrovertida. Tudo mais fora abolido. Recordo-me de quatro casais. Desconhecimento do temperamento de ambos. está registrado em meu fichário o caso da esposa que levou anos impondo ao marido seu gosto de mesa.Como individualista. Repare que não digo: desconhecimento do temperamento do parceiro. Em casa o vesuviozinho vai lançar lavas incandescentes. Sobretudo quando o outro decide não dançar no ritmo de sempre. uma vez que as atitudes oriundas do temperamento não ficam no ar. A mulher já não se sente sozinha. Um deles forçou essa abstenção de modo até grosseiro. o humor e a saúde do companheiro. qualquer outra pessoa. de reuniões sociais. a resposta vinha logo. em concreto. Esse casal só se livrou do naufrágio quando sugeri um sincero estudo dos defeitos e qualidades do temperamento de cada um. mas chegam fatalmente até aquele com quem convivemos dia e noite. Se a mulher demora um pouco. tachando de "assanhu-me" as atitudes da mulher. Pouco a pouco passaram a manifestar motivos. aos piqueniques. não apresentava o mesmo estilo sociável. A asfixia começara e avançava. impedindo a assinatura do tratado de paz. Nem o parceiro. dos desejos. 4." Pronto. psicologicamente violentada. antes de si. não basta conhecer o temperamento. até os figurinos dela! No reverso da medalha. Digo: desconhecimento do temperamento de ambos. superadas as inconveniências. harmonizados os . mesmo quando afogada em plumas. Já fui procurado por uma esposa cujo marido. São pessoas que facilmente descambam para o ciúme inconveniente. do temperamento pessoal e do outro. uma assanhada. infundado. Dificilmente enxerga. Se a esposa comunicava que tinham sido convidados para uma reunião de grupo. dos propósitos. habituando-o ao convívio conjugal e social. Isto é. de tão centralizador e absorvente (por individualismo). à casa dos pais. empregada. precisamos saber. inoportuno. com muito envolvimento. racionalizações. Pois não se vai. ele é limitado de todos os lados por si mesmo. para evitar crise. estragando. pelo menos. todos. e sim no rapaz. Porque se conhecemos apenas o temperamento de uma metade do casal. com as respectivas medidas para educar cada temperamento. quais são os defeitos e as qualidades do meu temperamento e do dela. Que adianta dizer: "eu sou extrovertido e minha mulher também"? Como cada temperamento apresenta defeitos e qualidades. Estava lavrado o decreto de clausura. embora fossem. Há crises desencadeadas precisamente por uma qualidade. espiando os produtos do supermercado. "Você é uma exibida. Só assim ele começou a perceber o fascínio da variedade tempera mental. e que. Então. era quem escolhia mobília. das intenções. tenta assumir o controle de tudo quanto ocorre dentro de casa. ignoramos as reações suscitadas ao nosso lado. Agora os convites restríngiam-se ao cinema. cor de parede. de ambos. o que só conseguirão. duas cabeças pensam melhor do que uma. em matéria de educação dos filhos. E muito mais simpático. minha filha. de lado a lado? Claro que chega um dia em que vão querer acenar o lenço branco. lendo o livro que a mãe lhe pôs na mão. inclusive. dentro do quadro educacional discordante. a respeito de pontos básicos. Depois. explorando o coração paterno. O mais ficava com a mãe. por temperamento. O caladão pode ser muito mais inteligente que a esposa superloquaz. a garota faz o rosto triste. e como a mulher também é imprudente. de modo geral. como pai. Muita coisa poderia ser escrita acerca dos temperamentos na vida conjugal." Eis a mãe desmoralizada. como os métodos educacionais. pode tentar. o contributo educativo sob modalidades bem mais versáteis. paro aqui. Pouco depois o pai passa por ela. Como é possível crescerem. Porém acontece que sendo a tarefa educativa assumida pelos dois. Discordância na educação dos filhos. . os guris podem querer tirar partido em proveito próprio. que facilmente pode varar a cerca da antipatia. Sei de separações remotamente iniciadas pela discordância diante de um biquíni comprado . o que se obtém é uma vida a dois gostosa. É comum esta cena em certos lares: A filha está de castigo. eis o marido inimizando-se com ela. Dentro de casa passaram a existir dois educadores. inconscientemente ou conscientemente. jogando um pai contra o outro. tais maridos confundem extroversão com superioridade intelectual. Do contrário vai às brecas. não sabem quem está certo. Do contrário os filhos não sabem com quem está a razão. sentada. não amarga. No entanto é imprudente. Quem desejar. leia um detalhado capítulo em meu livro Ajustamento Conjuga (Edição Globo). . recusando os novos papéis pessoais. 5. utilizar os filhos para o boicote daquilo que os incomoda. até estourar. vai brincar. sobretudo quando comparado com uma extrovertida indiscreta. Mas como já falei per longum et per /atum sobre o assunto. tornando-se incapazes de assimilar qualquer transmissão de valores humanos. de elaborar uma consciência capaz de transformá-la numa personalidade urbanizada. impossibilitada. nem insossa. e hoje cada um vive a atirar a culpa no outro. De modo geral. Mas não pedindo paz. portanto. Embora sendo mais difícil. eis o ventre da crise inchando. eis a filha impossibilitada de saber se errou ou não. Hoje tudo precisa ser compartilhado. queimou-o para sempre. em vez de um. Um dos benefícios da promoção da mulher fora de casa é ter trazido o homem para fazer equipe com ela na educação dos filhos. o comportamento educacional. "Levanta. batidos por vendavais freqüentes. a filosofia educacional. Essa mútua compensação é um dos bons frutos do movimento feminista. porque antigamente ele. inchando. e sim dizendo adeus. é preferível. O próprio casal. Mais. só interferia na hora de fecundar e de puxar o cinturão. Conheço um homem com todas as qualidades para ser um político brilhante e útil à comunidade. é imprescindível que ambos pensem do mesmo modo. Não deixou de ser uma humanização do homem. Não é preciso muito tempo para ambos perceberem o lado funesto das discordâncias. pois.exageros. Assim os filhos têm oportunidade de receber. Um problema cultural novo. A ponto de Garrincha se sentir envergonhado de sair com ela. Por cultura entendemos. O desnível entre ambos crescia a olhos vistos. de novos horizontes. Quantos casais se têm vacinado. a passos lentos mas firmes. hoje. e Nair continuou dentro dos mesmos limites. na moldura social. Portanto. no que respeita a hábitos. a costumes. Quando comecei no Brasil meu trabalho com casais. Felizmente hoje muitos noivos já fazem da educação dos filhos assunto de conversas freqüentes. Nair morreu de paixão. assumindo a mesma responsabilidade perante problemas que. mas tudo indica que houve erro também da parte dela. Veio a promoção cultural de Garrincha. O caso público de Garrincha e Nair (a esposa) ilustra o problema. antes de se separarem. noivos e noivas (até namorados e namoradas!) participando. de acertos mútuos. que é um direito da mulher. . a paladares profissionais. a limitações psicológicas. tem suscitado valores culturais novos. Disparidade cultural Pode haver uma crise desencadeada pelo desnível cultural. de cursos participados em comum. de começar a estranhar as horas passadas ao lado dela. a preferências domésticas. afinal. Recusei vários convites porque as promotoras me diziam: "É impossível. Nair continuou estoicamente estática. avançou é pressionou o botão do estopim. Até que a crise. . Há vinte anos atrás. de assimilação de costumes. sem ter indagado a opinião do marido. as mesmas companhias. existentes num homem ou numa mulher. o mesmo alheamento de tudo quanto emoldurava o marido. a pontos de vista. inclusive por jornalistas. um auditório misto era literalmente impossível. o mesmo desinteresse por ler. O movimento feminista. Esses valores podem influenciá-los. por causa das filhas. através das viagens. alheamento dos novos valores que ele assimilava. A disparidade tornava-se flagrante. por informar-se. enquanto o marido mudava rápido. e queriam que eu falasse apenas a auditórios de mães. E só não se separaram antes. por exemplo. para a filha de onze anos. as conversas com ela.pela mãe. etc. a reações sociais. tanto na . Felizmente hoje muitos maridos já estão presentes em cursos programados para casais. Os homens não virão". Maridos e mulheres. culturalmente. estão descobrindo não pertencerem a um sozinho. quando sadio. até. não apenas o acúmulo de dados de ordem intelectual memorizados por alguém. lado a lado. do convívio com pessoas de nível mais alto. Ao que consta. Ambos começaram no mesmo nível cultural. o quintalzinho dela. Advertida por amigos. Porque uma das condições que eu impunha para ministrar cursos era a presença do casal. era árdua a luta. de encontros diversificados. mas o conjunto de valores diversificados. Hoje os promotores são elas e eles. mutuamente ajustados. E os participantes também. das palestras a que assistia. quando autêntico. e provocado inúmeros casos de crise conjugal. Ambos atravessaram alguns anos de inferno familiar. de estágios. introjetados neles ou circundantes a eles. e quantos estouros familiares evitados! 6. todo o dia. não apenas sua realização profissional. faço dele o que quero!" Essa frase é uma peixeira no coração do homem impregnado da multimilenar tradição que o fazia responsável. em vingança. Golpes sucessivos! E o homem.Europa como na América. Se existe essa mentalidade. Outro detalhe gerador de crise conjugal proveniente da promoção feminina pode ser o salário superior da mulher. por outros obstáculos. da autoridade que seu pai desfrutava em casa. será bem mais fácil corrigir calmamente os abusos de um ou de ambos. seja porque muitos homens não estão preparados para conviver com uma mulher em tempo de autopromoção fora do lar. Na semana passada um amigo me dizia. compartido. em guerra conjugal. petulando. mas ele já sentindo o desgaste provocado por uma situação que arrebentara inúmeros fios da antiga dependência. por falta de ideal. dois companheiros com valor próprio. obriga-o moralmente a fazer o mesmo. sozinho. sofrendo com os contratempos profissionais dele. os imponderáveis das correntes cruzadas da vida. de também contribuir para o alicerce financeiro do lar. agora os filhos passam a comentar os sucessos de mamãe também fora de casa. Sinal dos tempos! Estou esperando minha mulher. chegadas até o tímpano do marido. para o marido indagar pelo trabalho dela. da sorte. e se a mulher não encara com flexibilidade. querendo adiantar o processo. sentindo a corrosão diária. uma reestruturação. Felizmente alguns maridos já estão compreendendo esse direito e esse dever da esposa. os dois terminarão atritando-se. Sobretudo quando ele não cultiva o mesmo elã de evoluir. por mais sensata e mais discreta que a mulher seja. Companheiros. É natural que algumas chances corram mais fácil na direção dela. ou não se coloca. Passam a ser dois entes humanos paralelos. A mulher agora oferece motivos. de sobra. Seja porque muitas mulheres se apresentam desprovidas de maturidade para não transformar o movimento em revanchismo. . à altura de participar desta mútua empresa. favorecem crises. porque ambos sabem que a nova realidade é direito e dever de ambos. Mas se o homem não compreende. que ora rumam na direção de um. Ainda não chegou do trabalho". Um plano de reclassificação. a nova condição da mulher pode tornar-se um tormento. pelas dificuldades que tem enfrentado. vai percebendo o tumor crescendo sem parar. Pe. "O dinheiro é meu. não há dúvida. por idade. por cansaço. A mulher que leva a sério. ora na de outro. quando não encaradas com sabedoria. aceitando que ela não viva apenas gravitando em torno dele. Somemos tudo isso e teremos um balaio de vivências que. uma crise é inevitável. é tumor. também a caixa comum não resolve.) Tenho visto torrentes de sofrimento desencadeado por notícias relativas à esposa. não com o seu". Tudo agora tem de ser repartido. pelo telefone: "Sinal dos tempos. pelas despesas dos filhos. Benigno ou maligno? De qualquer forma. às vinte horas. por preguiça. quando ambos não aceitam e não assumem o novo estilo de responsabilidade financeira partilhada. um reajuste salarial. apenas os dele. Todo problema na administração das finanças será tema de diálogos serenos. uma dedicação oportuna. E alguns filhos. os concursos que ela faz e vence bem classificada. acrescentam soda cáustica na chaga: "Comprei foi com o dinheiro de mamãe. E contém pus. um talento mais bem utilizado. cuidando apenas da realização social dele. pela admiração que passou a aureolá-la. pelos gastos da mulher. mas quando não há maturidade de ambas as partes. as horas em que leva estudando. Mohana. — tudo isso pode acontecer. noite e dia. depois de cortado o cordão umbilical. A caixa comum é a solução. a intimidade com eles. em competição contra o homem. mas também a do companheiro. De qualquer maneira. (Antes ela sempre estava em casa esperando-o. pelos momentos de estudo juntos. e quando um não está. Se o constrangido é o homem. E depois de certo tempo. Se o homem não toma o comprimido ou a injeção. pelas suspeitas que alimenta. tem condenado peremptoriamente o abuso implantado pelo pornocomércio condicionante dessa avassaladora problemática sexual. Entretanto o que agrava a situação é sobretudo o desinteresse em procurar solucioná-lo. E muitos já começam a não reagir nem a essas soluções químicas. tendo de levar para dentro do lar um sistema psicossexual adoecido. Por que ele não se preocupa com o caso? Por que não se mexe? Por que não toma medidas? Por que não procura um médico? Muitas vezes pode ser que haja realmente o terceiro. Muitos casais. desesperadas. até quando beiram a ineficácia. obrigando a doses progressivas. porém: nem tudo é descaso e libertinagem. isto é. ou a terceira. Só mesmo a escalada da libertinagem e da desorientação conseguiu mostrar que o sistema sexual humano funciona dentro de um estilo diferente do esquema dos animais. dentro e fora do lar. Claro que o ser humano não foi estruturado para cultivar uma mentalidade de cio. Pois as superexcitações freqüentes terminam por habituar os reatores. fronteirada pelo regulamento do cio. Os ginecologistas e os sexólogos portadores de interesses humanísticos mostram-se hoje assustados com o avassalador aumento de orgasmos químicos. que muitos se vêm impelidos a acumular toneladas de excitantes sexuais. porque o limiar fisiológico da libido foi ultrapassado. a disparidade são flagrantes. Por que ela não está gozando comigo? Haverá alguém? Haverá outro? A culpa é minha? Se é a mulher a perturbada. do sexo mercantilizado. a própria vida sexual animal. E começam as análises inferiorizantes. precisando descer ao mais degradado nível de táticas artificialíssimas para sentirem uma grama de prazer.Ora. logo concorrentes aparecem no painel da imaginação. Mas nem sempre a inaptidão sexual decorre da existência do numero 3. as fadigas. ou revoltadas. vêm mergulhando os casais num processo tão galopante de excitação. 7. Então o desajuste sexual pode levar a uma crise grave. mas a experiência. descaso da parte do outro. é bom dizer. os policiamentos indiscretos. não deixa de demonstrar uma rígida disciplina. as crises tornam-se inevitáveis. tanto antropológica como zoológica. Os condicionamentos do comércio erótico. industrializado. tanto o masculino quanto o feminino. Diga-se. pelo que insinua. mas pelo que sugere. de orgasmos que só são conseguidos pela ingestão de remédios. cada vez mais progressivas. Não tanto pelo que ele seja. Já começam a recorrer a pornogravações. Aliás. é ojeriza de suportar em comum às dificuldades. revela-se impotente. e quando nele o desnível. esses recursos já não funcionam. logo fervilham mil indagações íntimas. têm sabido apontar galhardamente na boca do túnel. Foi um tremendo golpe sofrido pelos casais. A falta de ajustamento sexual também pode abrir a porta da crise para um casal. não vence a frigidez. durante a laboriosa cópula. as obsessões tormentosas. Se a mulher não ingere outra drágea. Muitas vezes há mesmo é má vontade incontestável. a pornofilmes projetados na parede do quarto. todo esse polimorfismo faz parte do universo cultural do casal. por isso mesmo favorável à manutenção de uma atividade sexual fisiológica nos animais. Se um dos dois nota acomodação. Desajuste sexual com desinteresse em solucioná-lo. isto é suficiente para gerar suspeitas. o problema sexual . quando não o excluem por completo". Isto magoa demais. nem o principal. tanto mais tem que ser 'apaziguado' o seu instinto". à recíproca monotonia das obrigações cobradas e pagas (quando pagas) num clima com odor de tédio. o fator incompatível com o sonho de um homem e uma mulher incapacitados para a estabilidade conjugal. adeus felicidade. adeus amor. escancara o portão às candidatas ou candidatos extranupciais. "onde a quantidade de felicidade amorosa falta. como é atualmente praticado por grande número de equivocados. mas autênticos charlatães. Esta é a maneira de enriquecer tanto o sexo quanto o casamento. arrasta o casal. Na crise irão aprender. Quando esquecemos a bela responsabilidade desse dom. amargando. dado o clima de impune comercialização desenfreada desse maravilhoso instinto com que o Criador quis comunicar-nos um pouco de seu amoroso poder. E a experiência prova que as tentativas mais freqüentes são feitas fora de casa. que a felicidade do ser humano é muito mais complexa do que a propaganda apregoa. a mais sábia filosofia para prevenir as crises conjugais desencadeadas por ele. nosso casamento correrá perigo. A excessiva ênfase que atualmente tantos estão dando a técnicas e táticas sexuais é um dos caminhos para transformar em mecanismo aquilo que deve ser relacionamento. há aí uma falta que tem de ser compensada pela quantidade dos prazeres sexuais. porque nossa vida sexual fatalmente terminará reduzida a um pugilato que nos amarra a uma exaustiva tirania cada vez mais insaciável. meus amigos. Não é só o consumo. . 8. valorizemos o sexo sem jamais torná-lo o valor exclusivo. Priorizar o amor físico ao espiritual. estabilidade inconciliável com certos hábitos trazidos da etapa pré-nupcial da vida ou assimilados posteriormente. Enquanto não nos convencermos de que sexismo é o terremoto da estabilidade matrimonial. o que passa a existir em nosso quarto não é a cama. e não para o prazer esvaziado de vínculos verdadeiramente humanos. Como diz o eminente neuropsiquiatra Viktor Frankl. São estatísticas hoje conhecidas: 60% das mulheres casadas são frígidas. outros ousados. Tudo isto num mundo que erigiu o sexo à fictícia condição de superdivindade.de um dos parceiros. E essa despótica insaciabilidade. em casa ou fora de casa. despótica e opressiva. adeus paz. sequer — que a sexologia é hoje um campo vastamente povoado de charlatães. alguns solenes. adeus alegria do amor. Não esqueçamos — um só dia. É um balcão. mas o rápido consumo em que tantos rapazes e moças se automatizaram. No casamento. mesmo antes dos quarenta anos. Então. pois na verdade quanto menos 'feliz' se faz um homem. ao mútuo desinteresse. e 100% dos homens já apresentaram crises ocasionais de impotência. e assim condenar à despersonalização aquilo que se pretendia salvar. Banindo todas as chances de um mínimo de mistério emocional. o sexo. e muitas vezes à vingança. levando à revolta. Não se brinca impunemente com o que foi feito para a felicidade responsável. Palco da crise. ou pelo menos de descaso. 70% dos homens são rápidos no ato sexual. reduzindo o parceiro a um entre os muitos objetos do "apaziguamento mercantil. não é respeitada. por vários fatores. Há pouco tempo 25 norte-americanos especialistas em Psicologia. pois é imperativo específico do casamento. não pode sustentar duradouramente nada. que é o cimento. Em qualquer das hipóteses. Não quero gastar o meu e o tempo de vocês. o concreto armado da estabilidade emocional. Cada vez que esta dimensão não é atendida. Por que não? Também pode acontecer que a neurose se instale. Não somente no homem. e ele ou ela encontram. E se consegue. Este erro tanto pode ser encontrado no homem como na mulher. não é alimentada. para desgraça de ambos. depois do casamento. segundo julgam alguns. claro que seguirei qualquer corpo que me atraia mais que o corpo do meu parceiro. evoluída em amor físico. Como poderão enfrentar os complexos problemas de uma vida a dois. as flutuações. analisando o óbvio. o que flutua. Motivações neuróticas do casamento e manifestações neuróticas em casa. Ou os dois. quem leva vantagem ao olhar biológico é o jovem atleta. Mostrando as manifestações neuróticas como desencadeadoras de crises conjugais. Haja inferno. precisamos estar advertidos para esta dramática possibilidade. não havia atração física. o casal reduz-se a um par de seres meramente biológicos. Se o que eu mais valorizo é o corpo. Sem o amor espiritual. o que procuram na rua. Psiquiatria e Antropologia reuniram-se para divulgar algumas descobertas sobre "as motivações neuróticas no casamento". raramente perdura. é precisamente a atração física. específica do ser humano. Por que Francisco de Sales e Joana de Chantal não se tornaram um casal? Porque entre eles não havia amor físico. Na verdade neuróticos também se casam. Sobretudo quando a impiedosa concorrência de produtos mais frescos põe em perigo a mercadoria de casa. Hoje basta passar de carro na frente de alguns colégios. se não colocarmos o amor espiritual antes dele e na base dele. Pode acontecer que o neurótico seja apenas um dos dois. o casal terminará rolando no abismo. O resultado desse trabalho foi um livro notável (lançado em nosso país pela Vozes) cujo título é precisamente este: Motivações Neuróticas no Casamento. as precariedades do amor físico. 9. Entre o jovem atleta e o quarentão. então. Pode acontecer que dois neuróticos venham a se amar e decidam casar-se. . Nem o alicerce.Ninguém ignora que o amor oriundo da atração física é também um sustentáculo do casal. Evidente. dificilmente um casal consegue entrosamento durável. Esta é outra causa freqüentíssima de crise conjugal: dar prioridade ao amor físico sobre o amor espiritual. Mas como todos conhecemos as limitações. Por causa da dimensão extra biológica. O amor físico é importante no casamento. crescimento em todos os níveis? Como? São esses os casais que cometem o erro de confundir conjugal com sexual. A cópula jamais pode tornar-se a cúpula de nenhum casal. ele ou ela. A experiência tem mostrado que só evitam esta crise ou só saem dela aqueles que põem o amor espiritual como coroamento do amor carnal. Aquilo é um meteoro. de graça. Haja pílulas. cujo objetivo é proporcionar o crescimento integral de ambos. O que murcha. O que faz duas pessoas de sexo diferente tornarem-se um casal. ou um passado problemático não resolvido. oxigenado. que exprimam polidez. Não. enquanto estão perto do forno. matéria-prima de crises. abertura amistosa. Deus meu. Vejamos agora algumas pistas que desviam o casal do forno crematório. quer quando eclode ex abrupto. entre ela e ele durante o período crítico. Claro que devem perdurar laços estreitos. entrosamento carinhoso. Adeus. a intromissões. alguns casais passam a caminhar pertinho do barranco da crise. qualquer maleducado. a impertinências. A primeira é sustentar. mesmo sem adendos neuróticos. Mormente quando não conseguiram saciar frustrações pessoais. de certos sogros. Quando chegam os netos. e cada qual sabe que o outro sabe. apagando a responsabilidade com a esponja de uma doença fictícia. provoca situações indesejáveis. reduzindo-a afinal de contas a um apêndice dos que recusam conter-se. Se associada a um dínamo mórbido. então.Contudo é preciso uma precaução: não rotular de neurótico qualquer grosseiro. tudo pode levar a indiscrições. difícil. Essa mentalidade. Desde o momento em que ambos tomam consciência do que está ocorrendo. Durante a crise Existem várias medidas para favorecer a comunicação durante a crise. qualquer individualista. ou mesmo que um ainda ignore que o outro já não ignora. onde ambos inspiram com prazer a paz que o outro traz. toda palavra torna-se penosa. solução! Nesse âmbito é de suma utilidade a contribuição do psicoterapeuta ou do psiquiatra competentes. frustração. algumas vezes insuportável. empurrados pelas táticas de certos avós. genros e noras quando carregam o motor de uma neurose acionando atitudes. de eriçagens. buscando compensarse nos laços familiares. imaturidade. PISTAS DE SOLUÇÃO PARA A CRISE Em qualquer crise conjugal existem sempre dois problemas: O primeiro é a comunicação entre o marido e a mulher. Período delicado. Seria piorar o problema. delicadeza de palavras e atitudes. funcionam como abafadores de raiva. . O outro problema é a solução da própria crise. de qualquer tipo. doloroso. mas não medo. Neurose. custe quanto custar. qualquer luxurioso. quer quando avança em ritmo crônico. Chegar ao estágio respiratório. Formulações hábeis. mas não uma integração de tal modo anulante da nova comunidade familiar. constrangedor. torna-se insuportável. Não é fácil sustentar a comunicação durante a crise. Alguns sogros podem trazer problemas para filhos. outros tão impacientes. — Eu e Júlio decidimos comprar esta casa no ano passado. Esses pronomezinhos são vocábulos traiçoeiros. Outro detalhe que pode favorecer ou dificultar o relacionamento durante a crise é o uso dos diminutivos costumeiros. MINHA. pois expressam os pólos da crise. O "planeta" julgou. MINHAS. Colocar o pronome pessoal EU antes ou depois do nome do parceiro não é irrelevante. Pode manifestar a verdadeira posição do outro aos nossos olhos. em dúvida se "Jaiminho" era o filho ou o marido. Uma pernambucana conversando comigo: — Jaiminho não gosta de pinha. Reduz o outro à condição de satélite. quase sempre hostil ao outro. sem exceção. O marido vai sair com o filho. que o cérebro torna-se cego. precisam agir com delicadeza. outros tão bloqueados. os generais da batalha. o período de uma crise não é propício a autopromoções depreciativas do outro. outros tão mesquinhos. São palavras sérias. por minimizar o parceiro. sinceramente.Há alguns parceiros tão inexperientes. E eu. Não se preocupe. NÓS. imagine. Wilson replica: Nosso filho. todos. periculosos. Ou: Nós dois decidimos. Mais sábio seria dizer: Júlio e eu decidimos. É antipsicológico. Ora. Sobretudo há um detalhe que derrota claramente essa delicadeza tão preciosa ao amor espinhoso. MEUS. . Outra formulação periculosa: — Neste assunto tu pensas como eu. Gota de ácido pingada por ela na tarde daquele passeio. MEU. à bandeira vermelha drapeja na recomendação da mulher: Cuidado com meu filho. No entanto. dá a entender aos interlocutores que a decisão coube mais a mim. Trata-se do uso dos pronomes pessoais e possessivos EU. Se o pronome EU se antepõe a Júlio. TU. Nestas formulações a deferência aparece e distende um pouco a tensão. porque denunciam um julgamento inconsciente. Devemos superar os bloqueios suscitados pelos sentimentos vesuviais. — É meu marido. Certas mulheres fazem esta cena com um talento de Sara Bernard. Quando estou com raiva é Jaime.— Quem é Jaiminho? — perguntei. CARTA QUE CORTA Outra medida capaz de favorecer o relacionamento durante a crise é uma página escrita. às vezes. o expediente da carta pode funcionar. Os orgulhosos podem zombar intimamente de nossa boa fé. Terapêutica . Em demasia desmoralizam-se. Por ser ouvida em silêncio. que costumam recear escândalos. E eles podem ouvir o que. Com tipos calmos. Zoada oportuna Contudo. e oportuna. no bate-boca. pelo menos por algum tempo. Não mais de duas. mesmo firmes. Condiciona-os no trampolim para as verdadeiras soluções. A não ser que o autor tenha talento para combinar dignidade e delicadeza. Abre o tímpano masculino. Contudo. Não falo baixo. coisa nenhuma! Não estou roubando! Você que se cuide. Você pensa que eu vou ficar caladinha. não quero esquecer de lembrar que um tipo psicológico não suporta esse recurso. curta e violenta. Muitas vezes quando a palavra pronunciada com a boca não percute no tímpano. de outro modo. que eu abro a boca no mundo! Fala baixo. numa moldura diferente. que os vizinhos podem escutar. Sobretudo quando toda tentativa de conversa resvalou sempre na discussão. geralmente traz excelente resultado. Ou então uma carta longa. uma zoada bem planejada e bem executada. pensa? Não toma jeito. a palavra pronunciada com a mão pode tocar o coração. porque nessas horas espumantes é que esse inho é importante. para a repreensão não sair sem uma pitada de açúcar. Mas insisto: Não precisam ser inflacionárias. pode surtir bom efeito. não ouviriam. Até voltam por algum tempo aos trilhos do compromisso conjugal. senão vai ver! Naturalmente com alguns homens a medida pode ser contraproducente. Despejam aquele vulcão de ameaças (não de palavrões!) que impactam e intimidam. preparando o terreno para outras medidas. mas uma única. seja homem ou mulher: o orgulhoso. a captação das conseqüências. que desejei dedicar a ela um capítulo destacado. Temos já pistas para examinar em que chave uma crise concreta se encaixa. que elasteçamos ao máximo o tempo das medidas. Sem paciência ficam reduzidíssimas as chances de todos. É tão importante a paciência antes. e ela . Ora. e ela já mostrava sinais de cansaço. Deus e o tempo. Em todos os casos a paciência é a atmosfera mais favorável à recuperação. Quanto mais tempo dermos a nós mesmos. úteis a todos os casos. a ponderação. A precipitação impede o amadurecimento das medidas. perdendo em força didática. E a casuística é imensa. rumar na direção da harmonia desejada. durante e depois da crise. É a paciência que nos permite lançar todas as âncoras. para os nervosos. Sempre lhe lembrara a frase de Newman: "Deus e o tempo!". Mas teria o inconveniente de desprender-se do contexto. Quatro meses após a separação. não se consegue essa ponderação sem um requisito difícil para os precipitados. mais chance haverá de serenar a ebulição. e sem paciência não chegaremos a ele. para os intempestivos. e a partir daí. As sugestões dadas aqui estarão sempre sujeitas a adaptações que cada interessado deverá fazer. Leia então este tópico com tanta veemência quanta está sendo posta ao escrevê-lo. sob pena de se frustrar. É verdade que algumas medidas são medidas comuns.É preciso deixar claro: Cada caso é um caso. discernir equívocos. é absolutamente indispensável. Diagnosticar detalhes concretos. As circunstâncias variam ao infinito. Portanto. precisamente aqueles que mais necessitam dele. O que quer dizer: paciência redobrada. Não existem medidas estandardizadas. mesmo que isso seja feito por cada um isolado. Um dos grandes pesares de minha experiência de aconselhamento foi ter ouvido a confissão de uma esposa a quem eu recomendara paciência. meio e fim Em qualquer tipo de crise. — Já esgotei minha paciência — retrucava ela. ■ Início. manda o bom-senso que não precipitemos o desfecho. Sobretudo porque o recurso definitivo supõe recursos anteriores. Não apenas seu esforço. a fim de viabilizar a reflexão. E separou-se. distinguir situações. tudo é imprescindível. minha cara. Não caminhamos às cegas. a terapêutica não pode ser padronizada. Esse requisito é a paciência. procurando expandir e aprofundar o conhecimento da personalidade própria e do parceiro (não apenas a do parceiro). O simples conhecimento das causas de crise conjugal já é um passo na linha da solução. o quadro assumiu inesperadamente outra fisionomia. — Deus e o tempo. Proceder a um check-up conjugal. Coerência. significa condicionar-se positivamente. favoráveis ou comprometedoras de seu casamento. O coração sofre um processo de desgaste. Já estava com um outro. E na paciência podemos tomar medidas com presteza mas sem agitação. decorrente dessa e de outras tentações. televisão. existenciais. É melhor porque evita tiroteios. como árvores estrumadas em putrefações nutritivas. agente ou reagente. com relação a seu casamento. o espectador de qualquer circunstância (você) não é neutro. A experiência ensina que a paciência é sempre melhor. personalizados. pois não existe o marido-no-vácuo. A circunstância neutra não existe. E eu lhe fiz ver: O que vai acontecer é que você se definirá na linha de outros condicionamentos. audiovisuais. O "vigiai" aconselhado no Evangelho possui um acento também conjugal. colegas de trabalho. hoje. afastando-se de casa. mesmo quando cresce. lazeres. Você está sempre rodeado de estímulos. Podem ser condicionamentos visuais. pelo simples fato de que. o que tem a fazer. Não há existência humana incondicionável. em qualquer área. outros condicionamentos. o próprio tipo de trabalho. queira ou não. revistas. Publicidade. . na prática. acústicos. quando os condicionamentos são incompatíveis com o estilo de vida a dois. Ora. os condicionamentos corrosivos da autenticidade conjugal. de situações. Ainda que venha apenas de um lado. Era tarde. Focarei o refletor apenas em alguns condicionamentos. Chega a ser mesmo à custa de certos desgastes que alguns casais mais crescem. São inúmeros. novelas. porém. Se você é coerente. rádio. é condicionar-se em função da redescoberta de seu casamento periclitante e de uma maturidade conjugal crescente. E se poupam os filhos. tudo isto pode transformar um casal em dois estranhos. Condicionamentos concretos Conhecemos hoje a influência exercida pelos condicionamentos no comportamento humano. Dizia-me um marido: "Vou me afastar de casa para me definir". Já que você quer.reconheceu: — Se eu tivesse tido um pouco mais de paciência. é natural que a crise bata à porta. Torna-se. cinema. tem de condicionar-se. a quem aceitara precipitadamente. nossa vida teria se arrumado agora. Também da vida domiciliar. vivos. É o paradoxo da vida. leia um pouco adiante o capítulo intitulado: Respeito e amor conjugal. auxiliares imediatos. Desrespeitos agravam Se não tiver paciência de esperar. até humilhar ostensivamente. recentemente. Concluíram que a sabotagem vinha da TV. gostará. Esta é a realidade. que os condicionava nessa linha anticonjugal. outras vezes. de tanta adulação (tinha-se a impressão nítida de adulação. Bem vivo. por um parceiro transformado em condicionamento problematizante. provavelmente. Se não assumissem uma atitude enérgica perante esse condicionamento. Outra ótica do mesmo condicionamento: Quantas vezes a novela faz com que o noveleiro troque o parceiro pela TV! Tenho um casal amigo que se mudou para o Rio. Claro que esse tipo de condicionamento depende diretamente do estilo de ser. Ocupavam-se em assistir calados os programas de TV. de dependência). quadros cômicos. ao passo que a violência e a insensibilidade projetadas torna-os "insensíveis". Multifacetado. Ubíquo. quando surgem problemas entre si. Condicionamento da TV Bom número de psicólogos norte-americanos vem demonstrando progressiva hostilidade à TV. Um deles. 16). Na verdade o parceiro não deixa de ser um condicionamento. por atirarem aquele . 2. Como é necessário agasalhar no eu a pomba e a serpente! É imprescindível. Daí o realismo de outra palavra de Cristo. São raras as pessoas suficientemente maturadas para constatar muito amor num parceiro e não sucumbir à tentação de explorá-lo. Certo cunhado até tornou-se um tanto agressivo. a culpa seria deles. Marido sem prudência (apenas pomba) já levou a esposa a odiar inesperadamente os cunhados. juntos mas emparedados. temperava de tanto carinho. de tanto elogio. Afirma que ver TV em excesso torna o casal passivo e seu casamento perde o viço. precavenha-se para não manifestar tão nítida diferença. sugeriu que se marcasse todo aparelho de televisão com o aviso: "Perigo: ver televisão pode ser perigoso para seu casamento". para a criatura não se supor rainha no trono. Lá o trabalho de ambos vinha impedindo conversas que antes estavam habituados a entabular à noite. Logo que o outro descobrir esse fato. Condicionamento vivo. além das duas. a fazer charminho. em certos casos. vivendo sem conviver. Polivalente.1. um para com o outro. seriados (novelas) de que é OK divertir-se escondido da esposa". Ele saturava de tanto melaço o relacionamento com ela. Vejam a complexidade de reações desencadeadas em tantas vidas. começará a abusar. "para neutralizar a palermice do bobo". que os irmãos se sentiam impossibilitados de acrescentar mais cortesias. perfeitamente aplicável à parceria conjugal: "Sede prudentes como as serpentes e simples como as pombas" (Mt 10. Um outro conselheiro matrimonial relaciona o aumento de casos de adultério com a "aceitação do conceito de relações conjugais subentendido na TV mediante piadas. parentesco de vassalagem. Onipresente. mas depois. a "botar banca". Por exemplo: Se seu amor por ele é muito maior que o amor dele por você. da maneira de agir do outro. O condicionamento do outro. Evidentemente não pretendo propor a atitude de M e R para modelo. cada noite. Para todos conversarem. Os dois vivem maravilhosamente entrosados. não há a menor dúvida. A. evitando um mal imensamente maior. Essa meia hora seria utilizada para o casal se encontrar em nível humanizante. ou mais. É ser realista. A. Dois obtiveram o silêncio como resposta. com os filhos. por indecisão na machadada. Só se pisa em casa para comer e dormir. a natureza humana não tem condições de resistir ao que J. Porque a verdade é que. 27). Não defendo tal atitude radical perante a TV. Uma família liberta da crise.. continuam conquistando um crescente entrosamento sem preço. trocar experiências. Foi uma batalha de ambos. Há um ano fez vestibular para engenharia e passou. 3.casamento nas rodas do trem. Vetar a entrada de tais pessoas no nosso carro não é bancar o covarde. J. Nenhum deles conseguiu. para a família permutar valores. e outras candidatas semelhantes. E foi mesmo. Mas que precisamos tomar medida corajosa perante o tempo dedicado em casa à TV. O marido que ama o perigo. com a TV sempre ligada. Em situações semelhantes à dele. um bem maior. seja professora. a TV ficará desligada durante meia hora. ou falta de fraternidade. para a desconhecida que freqüentemente está naquele estacionamento. Como está hoje urbanamente condicionada. E em vez do inferno que outros conhecem. Nem é indelicadeza. tem 35 anos. Sensato. nenhum marido deveria dar carona a mulher (e viceversa): para companheiras de repartição. Isso é o lar de um casal. Pedi a quatro maridos que tentassem dialogar com a mulher durante as novelas. para vizinha que não possui viatura. É sábio. É preservar um amor maior. A. Amizades são condicionamentos poderosos. Autêntico. A. É ter olhos. A crise que apontava foi afugentada. para amigas da esposa que adorariam uma cortesia semanal." Da atitude de J. nele perecerá. Seria uma linda história a divulgar. E o último pegou um carão para adolescente. prometeu a si próprio não dar carona a mulher nenhuma. Tanto as amizades do parceiro quanto as próprias. de alguma leitora. a casa virou hotel. No mínimo. Ao contrário. para essa vitória que todos encaravam como de todos. nele perecerá" (Eclo 3. . Condicionamento da carona. grosseria. corajosamente recusou. A Bíblia está pontilhada de advertências relativas aos condicionamentos. Porque vivos e envolventes. sim. Aqui está outra: "Quem ama o perigo. Um recebeu palavras de má vontade. Em casos semelhantes ao dele. digamos. Minha mulher e meus filhos continuarão a ter os mesmos direitos. Hoje não têm TV em casa. o relato dessa aventura. "Posso encher o carro de homens. combinar que. 4. seja colega. Vejo o semblante contestatório de algum leitor. podemos deduzir que um homem nunca deva dar carona a mulher? Não. E a mulher também. Condicionamentos das amizades. foi lindo. Para todos ouvirem as vozes uns dos outros. Desde então J. a esposa. mas nenhuma mulher que possa criar qualquer tipo de inconveniência à estabilidade do meu casamento. É não botar a caixa de fósforo junto do litro de gasolina. é casado. dele e da mulher. Venderam a TV. O que M. A. Em compensação entabulam conversas suculentas. fez. vigilante contra a poluição psicológica de certos condicionamentos. tua mulher parece que te governa. Com essa tática. Não devia ser preciso que o parceiro nos advertisse. Do contrário o casal se esfacela. E assumam com valentia as atitudes sugeridas pelas descobertas. depois de terem atravessado crises amargas. sincero interesse em ajudar.Vigiar as amizades é uma necessidade. Às vezes uma frasezinha macia de um desses amigos põe a panela no fogo. enquanto ela . Mas não basta ser amigo para ter capacidade de lançar âncoras.. Sei de uma senhora que bateu na casa de uma amiga. acolheu-a durante dois dias. para deixar claro que ele não é manobrado por ela. É preciso muita maturidade para perceber que o que foi venenosamente rotulado de "governo da mulher" era um belo entrosamento entre ambos. só porque o parceiro não abandonou uma amizade nociva. Não." Pronto. Tato. como porque não é fácil a solução dos problemas caseiros. o "amigo" fica com o trânsito livre para manter mais um prosélito na roda da bebida. qualificado. Muitos outros. A amiga ouviu. e muita coragem para agir de acordo com as descobertas. ela não bancará o psicoterapeuta. Sim. Daí ser preciso muita sagacidade para captar o intuito dessas pessoas. A experiência prova que a imensa maioria é influenciada e se deixa assimilar pelo hábito do qual o outro já não pode libertar-se. com a maleta na mão. Mas infelizmente a afetividade tapa os olhos. Aliviam-se com o fracasso de outros. mas de zelar pelo que merece zelo. "Vou para o Recife". Possuir bom senso. para que o indesejável não insinue que o parceiro é encabrestado por nós. "Rapaz. Quererá preencher o vazio às custas do nosso parceiro. Pesquisem. Conheço vários casais separados. Cuidado com as amizades que procuram esquecer a falta de convivência no próprio lar. não só devido ao automatismo. quando descobrimos que são amizades funestas ao casamento. Recorrer a amigos capazes Esta é uma outra medida prodigiosa na solução de uma crise conjugal. Quando meu marido (ou minha mulher) faz amizade com uma tal pessoa. é preciso tato e firmeza. conversaram as duas. pois há os profissionais da liquidação de lares. Estaria perdida a batalha. Existem outros condicionamentos. Firmeza. Não nos iludamos. — entrou dizendo — "vou pra casa de minha gente. Não quero mais viver com aquele patife". É preciso ser habilitado. No caso de amizades do parceiro. É preciso saber que muitos se excedem na bebida para esquecer a falta de convivência com o próprio parceiro e com os filhos. Pelo contrário. para conseguirmos realmente afastá-lo da companhia perniciosa. Tato e firmeza. E então presenciamos um pernicioso conduzindo um cego. longe da mulher. pelo puro fato de poderem ser benfazejas ou nefastas. Não se trata de bancar o policial. Uma só.. através do excesso de bebida. Por isso tentam inconscientemente empurrar gente feliz no abismo da ruptura. objetividade. Virão atitudes infernalizantes. madrugada a dentro. Muito cuidado com o proselitismo de certos frustrados nesse setor. serenidade. E terminou resolvido de modo admirável. devido à unidade da pessoa. Refiro-me . permitindo ao casal autopreservar-se ou auto-recuperar-se. não mais para ir para Recife. No dia oportuno a criatura agarrou a maleta. nele e na mulher. A boa leitura é um dos recursos mais eficazes para preenchê-los. Ingressar num movimento que nos abasteça periodicamente. existe o que quer ser. para depois se destruir. A leitura mantém o zênite do clima construtivo. E as trevas fugiram. de vez. à medida que as páginas passarem. Esses erros foram analisados por eles. torna-se muito mais fácil descobrir esses amigos sinceros e capazes. Considerem as lâmpadas que vocês já acenderam dentro de si. e sim de volta ao lar. vem preencher as lacunas em geral existentes por falta de preparo para o casamento e pelo natural desgaste do próprio viver. Aí ficamos sabendo que não existe o casal perfeito. tendo pensado até em destruir a mulher e os filhos. até este ponto desta leitura. O problema não foi solucionado logo. Se participarmos de um grupo de casais interessados em crescer conjugalmente. conforme o caso. familiarmente. o que só uma farta sementeira de idéias restauradoras é capaz de operar.e o marido contatavam-se com "o patife". Comumente são tais lacunas e tais desgastes que deixam brecha para os corrosivos do amor. Às vezes basta uma página e nela vem a idéia luminosa. encontrou a serenidade impossível. especialmente a espiritual. por graça de uma leitura construtiva. Imaginem quantas irão ainda brilhar. com especialistas. Havia erros de parte a parte. Também o psicólogo. Um advogado que esteve à beira do abismo conjugal. E o ministro religioso. Não era tão patife assim. com humildade e franqueza. pois a leitura continuou a operar. o sistema de iluminação naquele espírito. e se esforça honestamente. podem oferecer boas alternativas. com esta única frase de Louis Veuillot. sobretudo quando aceito pelos protagonistas do drama. a inspiração de atitudes decisivas. o psicoterapeuta. A companhia desses é sumamente estimulante. Bons livros de orientação conjugal constituem uma série de entrevistas mantidas. Estas palavras acenderam. Só te peço que não me prives de tua força". a boa leitura beneficia o eu inteiro. não te peço que me livres do sofrimento. onde convivamos com casais que lutem lealmente pela estabilidade do amor. Espiritualidade Quero encerrar este capítulo com uma medida que reputo de altíssima importância. Continuaram os dois a se encontrar com aquele casal amigo. em nossa própria casa. sendo competentes. Mas ele estava preparado para enfrentá-lo. Atingindo as principais áreas da personalidade. ou o psiquiatra. Leituras construtivas Felizmente um número cada vez maior de casais está descobrindo o papel da leitura construtiva na terapêutica das crises. lida em meu livro Sofrer e Amar: "Meu Deus. Não acredito em duradoura solução de uma crise conjugal sem uma inteligente programação de leituras funcionais. E a crise foi superada. Além disso. Sem Deus. Claro que. Deus não deixa nenhum casal aberto a ele. E ninguém pode prever o rumo que a mão de Deus . Tudo. novos propósitos. Porque dentro de nós vão conosco todas essas forças cegas. Durante a crise. como diz o apóstolo Paulo. na melhor das companhias. E jamais aparecerá. Sobretudo é praticamente impossível crescer continuamente. Porém jamais sentiremos alguém como ele mesmo. alegria. santificação. puxadas pelos problemas não solucionados. Mas será esse encontro solitário com Deus. a oração estabelece uma separação temporária. pois tudo contribui para o bem daqueles que amam Deus. maturidade. coroamento de toda comunhão terrena. qualquer crise nos deixa humanamente melhores. que nunca ofende. Podemos conhecer o outro mais do que ele próprio. Esta certeza não tem preço. novo estoque de coragem — e voltamos diferentes para o outro. viagens. Quando falo em espiritualidade. A separação temporária para conversas sinceras. Tarefa da oração Na prática a amizade com Deus se estabelece através da oração. O amor faz o casamento. profundas. das oscilações a que está sujeito o amor humano. que levará cada um a procurar o outro. certo de que em Deus. porque Deus é a primeira origem e o último fim do casal. o resultado será crescimento. Sabemos das flutuações. e por amor a Deus. Deus proporciona ao casal aberto a ele. manancial inesgotável de amor. a fortaleza de Deus. diversões. Somente Deus possui essa capacidade. mesmo sendo marido e mulher. pois nenhum marido.à espiritualidade. tudo sabe (sobre aquele casal e aquela crise) e tudo pode. novos enfoques. que dá um rumo seguro ao caos da crise. calmamente. porque ninguém pode pagar a alguém que nunca desaponta. Esse alguém não pode ser nenhum ser humano. até uma crise conjugal. Se é enfrentada com o amor de Deus. que jamais desmerece. Seja amante alucinado. eles reencontrarão o amor. Deus põe à disposição do casal aberto a ele. seja amigo devotado. Portanto. na companhia que tudo conhece. O amor garante o calor do relacionamento. Além disso. novas descobertas. despojadas. Sem espiritualidade é dificílimo um casal sustentar-se unido por muito tempo. Mas a duração quem conserva é a espiritualidade. Porque todo casal está destinado a ultrapassar-se na fraternidade da filiação divina. Na pior das hipóteses. tanto pelos amigos como pelos inimigos de Deus: Plena comunicação conjugal é impossível. e tanto o homem quanto a mulher sentem que só Deus chega lá. traz novas luzes. a fonte do próprio amor. uma nova tentativa será feita. ajustamento. pouco adiantam férias. Permanece sempre um ponto além do qual nenhum dos dois avança. refiro-me a Deus vivenciado pelo casal. como autor do homem. Ainda está por aparecer o casal totalmente intercomunicado. boa vontade e confiança na solução da crise. ainda que desnude totalmente o coração. e apenas aparente. Ninguém sente totalmente ninguém. nenhuma esposa conseguem passar incólumes pelos testes que os anos de vida conjugal lançam a cada um. Com Deus. paz. cada um chegará sozinho com sua sede até à Fonte. inclusive a conjugal. O Salmista lavrou uma observação correta. Nem pode sentir. solitário e sincero. com a própria Foz do amor. mas quem leva avante o crescimento é a espiritualidade. a eternidade de Deus no âmago do casal. como princípio de sua própria subsistência. Este limite veta a comunicação total entre dois seres humanos. Porque não é o amor que proporciona estabilidade ao casal. Esse ponto só Deus atinge. durante a crise. o espírito. há uma verdade raramente abordada. sem o remédio próprio da crise. por ser a espiritualidade quem infiltra em ambos a solidez de Deus. ao sentenciar que só Deus vê o íntimo do coração humano. abordados com humildade. Convidando-nos a passar pelo Calvário. no volante. porque na cruz encontramos Aquele que ressuscitou depois de ter passado por ela. eficazmente aceita. ao lado de outras medidas. E essa contribuição de Deus deve ser insistentemente pedida. valentia. Muitos casais não conseguem sair do atoleiro porque recusam usar o guindaste da oração. Ao passo que aquilo que Cristo nos pede. PARA CONVERSA CONJUGAL 1 — Já passaram por alguma crise conjugal? (Examinem fatos. condescendência. que reverdeje. caso surja nuvem escura no céu de vocês? 4 — Houve alguma ofensa entre ambos. isto é. porque aí — só aí — ouviremos alguém dizer que jamais devemos perder a esperança. para ser suficientemente valorizada. humildade. visando testar o grau de maturidade conjugal de vocês. fornecendo a munição necessária para a luta. perdão. definitivamente transformante. pois só a graça divina carreia para a intimidade humana os sentimentos que não dependem diretamente de nossa vontade ferida. com a nossa. Muito freqüentemente recusamos aquilo que o parceiro nos pede durante a crise. É possibilidade existencial. perseverança. por amar Deus mais. podem encontrar dados de descoberta e orientação em meu livro Amor e Responsabilidade [ed.) 6 — Precisariam introduzir elementos novos no relacionamento com parentes e amigos . mesmo se tudo parecer perdido. Pelo contrário. para que possam começar um relacionamento mais autêntico? 5 — Conhecem as qualidades e defeitos de cada um? (Caso desconheçam. Quando Cristo é convidado para ficar. paciência. Agir]. como? 3 — Acham que "cresceram" com a crise. nem deixar de fazer tudo quanto dependa de nós. particularmente necessitada de um generoso perdão. Crise e Cruz A experiência mostra sobejamente que nenhum casal tem se amado menos. tomando-a como caminho de ressurreição. que refloresça. confiança. Os grandes gestos heróicos do amor conjugal. Aquele que se levantou depois de ter sido esmagado. De ninguém mais. Crise e cruz — parece trocadilho fonético. E o que é que Cristo nos pede? Pede complacência. abertura. não resistimos em dizer-lhe NÃO. vê-lo na cruz é a melhor medicina para nossa crise. nobreza. temos visto mais freqüentemente em homens e mulheres para quem Deus é mais que um mero nome.) 2 — Se passaram por alguma crise. e sentem disposição de "crescer". que revivesça.imprimirá. Nas crises. portanto. Em toda crise há uma contribuição que é de Deus. Não esqueçamos isto. Somente Deus conosco pode ajudar-nos a olhar uma crise como uma cruz. não temos coragem de negar. capítulo: Nossos defeitos e o Amor. acham que as atitudes tomadas foram as mais acertadas? Hoje agiriam diferente? Sendo o caso. o melhor tem mais chance de acontecer. orar pedindo que volte o amor. mas não é. helenística. como farão a interferência aludida no item anterior? 8 — Estaria faltando. a espiritualidade possui o condão de invadir-nos e nutrir o âmago de nossa personalidade. venho constatando que. um pouco mais de espiritualidade na vida de cada um como pessoa e de ambos como casal? (Fatos) 9 — Caso não participem de algum movimento de casais. ou com ambas. Hoje temos motivos para dizer: psiquismo e espírito. pois no casamento jamais chegamos a um porto. ora outro. em apoio de ambos. uma galeria de renomados especialistas. E é por isso que tantos casais que mantinham uma comunicação epidérmica. lubrificando os motores fundamentais. e poderia trazer. estejam comprometendo a harmonia entre vocês? (Fatos) 7 — Se for o caso. ou não. em vez da visão binária. ao ritmo da psicologia. usando ora um. O que se consegue — e o que é mesmo desejável . Cresce hoje o número de psicólogos que propõem uma concepção ternária da natureza humana. A palavra saiu. e esse fato tem privado de luzes e recursos propriamente espirituais um vasto contingente de casais. sem me trancar em nenhum dos dois quintais. nunca se chega a um porto. em inúmeros casos. julgariam útil ingressar em um? Possuem amigos participantes de tais grupos. depois de abertos aos páramos do espírito. É curioso como tantos casais abarrotados de bagagem exclusivamente psicológica não atingem um nível profundo de harmonia. ao mesmo tempo em que se transformam em porto para o outro. A concepção binária olha o homem como um todo formado de soma ou corpo e psique ou psiquismo. Sobretudo porque muitos orientadores ainda confundem psicológico e espiritual. Mas a observação isenta de preconceitos mostra que a diferença entre psiquismo e espírito é essencial.que. por acaso. a inspiração espiritual prossegue. . e esses mesmos. Não podemos dizer: psiquismo ou espírito. em qualquer casal constatamos: soma vida corporal ou somática psiquismo vida psíquica espírito vida espiritual Tanto no marido como na mulher a vida manifesta-se sob essas três modalidades. Com psicologia ou com espiritualidade. Vivemos numa época sensível ao psicológico. conseguem ancorar-se no outro. A experiência mostra que onde a motivação psicológica esbarra. O convívio com casais convenceu-me de que precisamos capacitar-nos espiritualmente para atingir uma qualidade de vida conjugal compatível com o desenvolvimento integral. Enfatizo esta distinção porque pretendo conduzir este capítulo sob ambos os enfoques. capazes de colaborar nesse sentido? 10 — Acham conveniente abordar algum ponto omitido. mesmo em se tratando do amor. útil para prevenir ou superar crises? ORGULHO E DESTRUIÇÃO CONJUGAL Depois de tantos anos de aconselhamento psicológico. Ambos são úteis a qualquer casal. mas não é correta. Ora. ampliam e aprofundam o processo intercomunicativo quando descobrem os caminhos da espiritualidade. a Psicologia não esgota o arsenal capaz de garantir uma vida conjugal satisfatória. Então.é aprender um modo pacífico de navegar. O segredo para um amor conjugal com frutos fartos. nosso mundo afetivo não seria tão complexo. no desfiar do dia-a-dia doméstico. bloqueadores da comunicação conjugal. os dois companheiros vão constatando a existência de muitas realidades. as possibilidades e precariedades estão elevadas ao cubo. pavão misterioso. Sem essa circunstância talvez não germinassem. uma definição que qualquer psicólogo assinaria: "O orgulho é a excessiva estima de si. muitos maridos eruditos. É precisamente esta a primeira advertência que devemos fazer a nós mesmos. Precariedade empavonada Já que no casamento não há apenas dois corpos vivendo juntos. nem apenas dois psiquismos. qualidades. concretizada no homem e na mulher. 0 orgulho é um problema do coração humano. Apresenta deficiências. Sei de uma senhora que. Junto de um orgulhoso ou de uma orgulhosa é impossível luz verde permanente nos cruzamentos da vida conjugal. não possui apenas aptidões. E quando o sinal se abre. que o interesse e o próprio amor conseguem maquilar durante o noivado. Se não as domamos. o coração. realidades disfuncionais para o entrosamento conjugal. nem apenas dois espíritos. Às vezes a impertinência de uma pessoa ligada ao casal pelos novos laços matrimoniais pode fazer germinar as sementes de orgulho. 3 . potências. Se não fosse o orgulho.Pode permanecer em estado latente. não sabemos por quanto tempo podemos transitar na urbanidade do outro. um sentimento trifacetado. Por isso. Muitos fatores podem contribuir para isto. Quem agora vai ficar na berlinda é o orgulhoso. num dia de luz verde no coração do marido. meio ano depois. nele ou nela. Porque ele é. a orgulhosa. em situação de semente. nossa estabilidade de casal. desabafou tantas intimidades com as quais. ou mesmo impedida. muitas mulheres cultas podem ser orgulhosos. do orgulho. Se o terreno conjugal adubar o orgulho em semente. A natureza humana.Uma respeitável casuística me tem mostrado o espantoso poder da espiritualidade para superar globalmente certos obstáculos da faixa afetiva. ele preparou bombas incendiárias. Santo Agostinho deu. postas no próprio leito nupcial. ele germinará e subirá.Pode existir ostensivamente. psicologicamente. carentes de domesticação. dentro de cada um. Esses dois dados — excessiva estima de si e descaso pelos outros — mostram-nos a faixa do eu em que o orgulho se move: a afetividade. Este é o segredo potencializador de análises psicológicas com colocações espirituais. Pode existir sob três modalidades diferentes: 1 .Pode perdurar mascarado. na rotina do casamento. fica comprometida. lacunas. 2 . com o simultâneo descaso pelos outros". no quotidiano conjugal. obstáculos à estabilidade do amor. isto é. . dando impressão de que tais precariedades não existem. Mas depois. Acompanhei uma esposa que manifestou sinais de orgulho depois que se casou com o filho de uma mulher exuberante. é escrito pelo escritor. Ora. Aí reside outra face do pecado do orgulho. Mais. Condenado porque junto de um orgulhoso. . precisamente porque a etapa pré-nupcial do amor enfeitava de querubins todos os lobisomens. Mas além desse tipo latente ou potencial. amainado o êxtase. chegado o quotidiano caseiro. Precisamente a ignorância ou o descaso desse dinamismo é que faz com que muitos noivos não percebam o que vão enxergar no casamento. suplanta os cogumelos atômicos. mas o orgulhoso vive como se não dependesse de ninguém. O pão que o orgulhoso come. E em vez da ladainha de ex-esperanças. a cama em que o orgulhoso dorme. para o casal. se percebe que nada significa. o sapato que o orgulhoso calça. mesmo assim. Sabemos que o período pré-nupcial do amor é geralmente caracterizado por uma boa taxa de romantismo. E o orgulhoso pretende viver ignorando toda essa legião. desmancham a maquilagem. como dizia. de defeitos. indiferente a todos os tus. Pecado do pavão Do pavão ou da pavoa. muitos casais tornam-se capazes de lamuriar uma ladainha diferente. o orgulho. centrado em si. o remédio que o orgulhoso toma. o orgulho é condenado por Cristo. Deixa de ser pavão mascarado. mostra-se realmente como é. o orgulho pode assumir uma presença camuflada. num mimetismo de boa vontade. então o orgulhoso. de uma orgulhosa. É a subordinação de todos os valores à expectativa do êxtase matrimonial. É pecado porque o orgulho procura negar a verdade existencial de todo ser humano. Na vida conjugal a lista de débitos aumenta ladainhamente e. Consumado o casamento. a roupa que o orgulhoso veste. é feita pelo alfaiate. que não deixa um cantinho para o outro. o ego do orgulhoso está tão inchado de egoíte. o estéreo que o orgulhoso elimina. é feito pelo sapateiro. conforme as circunstâncias concretas. vencida a oficialização dos laços unitivos. defeitos que antes não enxergavam. que é desnecessário. é muito difícil a fraternidade do amor. agressivo ou matreiro. é fabricada pelo marceneiro. para ser pavão descarado. é preparado pelo cientista. a comida que o orgulhoso come. violento. é levado pelo encanador. ou cessado. o encontro totalizado. "O estampadão de minha sogra". mais mil outros vínculos podiam ser enfileirados. culminando no cogumelo conjugal. Todo ser humano tem mil e uma dependências. encegueirado no seu próprio ego. Porém. irritavaa. aparece. Daí o pecado. no casamento o amor só pode subsistir se cada um aceitar que precisa do outro. No coração do orgulhoso não há lugar para ninguém além dele. e o obstáculo. é preparada pelo cozinheiro. é canalizada pelo engenheiro. já não vendo motivos para comportar-se com habilidade. Numa palavra: o casamento. e que essa modalidade de amor predispõe-se a despistar. sem os quais ele morreria em 72 horas. Se um deixa de reconhecer essa necessidade. então os corrosivos do amor atingem a máscara. de interesse. tudo quanto possa comprometer a consumação do objetivo. as pétalas do amor caem. que. Ninguém suporta entregar-se a ninguém. incomodava-a. é feito pelo padeiro. o livro que o orgulhoso lê. a água que o orgulhoso bebe. mascarada. Depende de outros e pretende ignorar os outros. como preferem dizer os psicólogos. Fora ou dentro de casa Que um bolo de chocolate é gostoso. importante é saber como ela se torna anticonjugal. um dos dois tem de recorrer ao disfarce para sustentar o insustentável. No caso do orgulho o importante é saber como ele destrói um casal. como dizia São Francisco de Sales. a tentação do orgulho só morre em nós.Como o orgulhoso oferece esse tipo de resistência. só porque o marido. não há dúvida. gera calúnia. gera vingança. pretendendo esquecer que é um ser humano. o orgulho é pai de muitos pecados. é um imperativo. expressões práticas de amor. Depois eu soube que foi um inferno noturno para ambos. À custa de me estragarem três dias de férias. Sempre que pode. gera estupidez. e terrível. Mas importante é saber como se faz um bolo de chocolate. Mas como o disfarce interminável cansa. bombardeando violenta o marido. Precariedade humana grave. visando humilhar quem estiver na mira de suas intenções. no refeitório. porque não deixa brecha a manifestações necessárias de fraternidade. O mesmo ocorre com qualquer precariedade humana. Pode encerrar o jogo mais tarde ou mais cedo. — Seu cafajeste! — O que foi. Anos atrás. um dia o cansaço mostra a cara. duas horas depois de termos morrido. opondo-se a tantas virtudes. Na verdade é o orgulhoso que resiste a Deus. tive a desagradável oportunidade de apartar a briga pública de um casal.5). Para nós. gera ódio. um ser dependente. meu bem? — É isso mesmo! Cafajeste! Está cego pra não enxergar minha cadeira? Perdeu os braços? Se em público ela se fechou daquele jeito. um ser criado. tenta usurpar a glória de Deus. conseguiram permanecer com relativa calma — mas . no segundo dia da lua-de-mel. gera indiferença. gera mentira. Compreende-se por que a Bíblia diz que Deus resiste ao orgulhoso (1Pe 5. imaginemos o que não ocorreu no quarto. Logo na lua-de-mel. um ser feito para partilhar e compartilhar. resistindo ao amor. Porque Deus é amor. não afastou a cadeira para a recente esposa se sentar. O orgulhoso sente dificuldade de mostrar-se reconhecido até para com o próprio Deus. gera uma multidão de outros herdeiros. Entrar no casamento prevenido contra essa possibilidade e preparado para lhe dizer um categórico NÃO. o orgulho tem uma maneira peculiar de comprometer o intercâmbio entre marido e mulher. gera exploração. gera frieza. Além de pecado. Gera ingratidão. É pecado. pois. até. veraneando na colônia de férias de Iparana. Não vê defeito no relacionamento que mantém qualquer que seja a tonalidade dos diálogos. que não são orgulhosos no coração.. Máscara penosa. Deixou-nos conselhos magistrais nesse terreno. Chegou a um ponto em que a mulher não podia emitir uma opinião divergente. roupagem. conheceu a experiência de centenas de casais. Sim. Devemos cuidar em não tratá-lo como orgulhoso. esconder fraquezas subterrâneas. por causa do irmão favorito dos pais. Há parceiros orgulhosos de fachada. "orgulhoso" a problematizado. ou de algum problematizado na área do inconsciente. Não era. por não se ter formado como idealizara. Esse é apenas um manequim de orgulhoso. descoberto como recalcado. o homem prefere ser considerado "duro" a mole. Faz bem radiografar Uma distinção útil no convívio com um orgulhoso. de modo geral. Ilude o impulso de auto-afirmação. Não é. embora sem se ter casado. o timbre das atitudes. Apenas assumem atitudes orgulhosas para ocultar deficiências. tornou-se duro com a mulher. Todos diziam: "é um orgulhoso".incomunicados — durante o resto da lua-de-fel. . buscando impor-se. é verificar se se trata de orgulhoso medular. O outro ou os outros que se danem. Num excelente estudo publicado na revista Concilium (nº 76) sobre "Algumas reflexões pósmarxistas e pós-freudianas sobre a religião e a religiosidade". solene com os filhos. cuide para que não venha a cair". O apóstolo Paulo. abrindo o leque da cauda com imponência. Provavelmente a recém-casada de Iparana era desse tipo. Comum também um recalcado esconder o recalque detrás do biombo do orgulho. Está fechado para vender e comprar. assumiu a pavonice da solenidade. R. F. indumentária. Assim um orgulhoso está "fechado". temendo ser rejeitado outra vez. que sofrerá demais na infância e na juventude. camuflar insegurança. Tática. Realismo admirável desse grande amigo dos casais. Um desses conselhos é formulado assim: "Quem está de pé. Defesa de ferro e louça. do contrário o chão do lar ficava coalhado de penas arrancadas a bicadas! É freqüente um frustrado mascarar a frustração com atitudes de orgulho. Ou então como narcisista. botando sobre si a plumagem da distância. percebido como frustrado. para não se deixar flagrar como imaturo. essencial. "forte" a fraco. Fechado porque não pretende mudar. para não sofrer. Porque o orgulho pode ser também conseqüência do narcisismo. Era um recalcado de coração frágil. Quando casou. porque. Por isso é que o débil se orgulha de "ser" orgulhoso. É evidente que um orgulhoso sempre julga não precisar cuidar de si. Já contemplei lágrimas profusas no rosto de um homem tido por todos como orgulhoso. Não era. visava pontificar. Sabe que o smoking não é dele. mas não "para balanço". porque supõe de aço o pedestal em que se coloca. cujo pavonismo seja apenas pericarpo. Erich Fromm mostra o fundo narcisista de alguns orgulhosos aparentes. Pelo que me parece. Vocês não mais dependerão de um Criador. por que possui tanta força e exige um contínuo esforço para ser superado ou pelo menos reduzido. nem o mundo. mas não se pode dizer simplesmente que ele se ama a si mesmo. o que atinge o corpo dele. 'ensimesmado'. talvez. e o único capaz de ser assumido por uma natureza em condições privilegiadas. Como um tal estudo repercutiria na vivência conjugal! De sorte que quando descobrimos que estamos dormindo. porque elaborado na base da teoria do libido e porque aplicado sobretudo aos problemas de pessoas psiquicamente doentes. Para entender este narcisismo 'normal'. então. porém. essa inchação de si próprio. seja Deus esse outro. tanto ao budismo. originando a responsabilidade moral. o famoso catedrático de Neuropsiquiatria da Universidade de Viena. conversando. os pensamentos dele. mas permanece cinzento ou nada. levanta uma muralha chinesa." E aqui está o orgulho. Por esta razão ele não pode também conhecer-se a si mesmo." (Na vida conjugal. torna-se impensável o convívio prolongado. proferiu . Dedicou pouca atenção ao 'narcisismo' do homem 'normal'. pode ser que se trate de um narcisista que não levou avante o processo de maturação da personalidade. Em Freud o conceito de narcisismo era muito restrito. e dela falaram sob diversas denominações. sejam os demais. antes que de um orgulhoso. 'cheio de si'. O antiorgulho Viktor Frankl. pois. comendo. em vez de orgulhoso. Não poder existir sem o outro. porque se coloca como obstáculo no seu próprio caminho. é de suma importância para a compreensão do conceito e para a práxis da humildade". os desejos dele. O que diz a Tentação no coração do primeiro casal? "Vocês serão como deuses. além das bases legadas por Freud. ele admite que. em estados patológicos. O orgulhoso pretende ter direitos exclusivos num mundo de bilhões de pessoas como ele. a libido se orienta para objetos externos. (O diagnóstico de orgulhoso supõe sempre uma consciência do processo. que não deixa lugar para nenhum outro. mas acrescenta que. e querer rupturar o vínculo. e buscar um modo de viver de costas voltadas para aquele que nos sustenta. e é a nossa central comum. pretendendo continuar a existir. É o orgulho que se manifesta soberbo com Deus e arrogante com os homens. então. desvincula-se novamente desses objetos e retorna ao sujeito (narcisismo secundário). Ser vinculado a Deus na existência. O orgulho supõe. liberdade e recusa de superá-lo. que se deseja a si mesmo. achamos oportuno libertá-lo do conceito freudiano de libido. quanto ao judaísmo e ao cristianismo. seja o parceiro. do ponto de vista da autoconservação parece obrigatório considerar a nossa própria vida mais importante que a dos outros. Sem dúvida o narcisismo tem suas bases biológicas. Continua Fromm: "Essa redução do narcisismo é uma premissa indispensável para o amor e para o conhecimento. Vocês dispensarão Deus. muito mais."Por 'narcisismo primário' Freud entende o fenômeno pelo qual toda a libido do lactente se orienta unicamente para si mesmo. Se são os dois. vivendo e convivendo ao lado de um orgulhoso. Para o homem narcisista é real e importante somente o que o atinge. O homem narcisista não pode amar. como 'objeto de pensar'. é tão cheio de si mesmo que nem ele próprio. no processo de maturação. que ele é egoísta. e descrevê-lo do seguinte modo.) O rótulo que o impulsionará à mudança será. um estudo mais aprofundado do narcisismo. Pode tratar-se de um imaturo. o de narcisista e imaturo. Isso esclarece. sejam os filhos. tudo o que é 'exterior' vem carregado de sentido e pensamento. É precisamente o pecado que a Bíblia revela como tendo sido o primeiro pecado cometido na face deste planeta. Depender absolutamente e querer desprender-se sem razão. nem Deus podem ser objeto de seu conhecimento. não vemos orgulho nenhum. Onde está o orgulhoso? Na cruz não está. Nas duas primeiras propostas quer chumbar Jesus Cristo ao pedestal do orgulho. Hoje. Basta vê-lo cercado de crianças. seja ela. Basta vê-lo no Calvário. apenas nele.) Basta vê-lo no Horto das Oliveiras. eu. Pelo menos. eu. esse palácio é planejado mais ou menos em silêncio. Não é um orgulhoso. Na vida conjugal o orgulhoso não ouve. Deus e os outros eram molduras. nadando em dinheiro." Nada consegue. nada mais nada menos. se tanto. O marido. Pontifica. Compreendemos agora porque o orgulhoso quer sempre dominar. Ordena. Pode ser que. personalidade madura modelar. para mostrares que não morrerás.recentemente uma conferência sobre quem ele chama "a personalidade madura padrão". . É incompetente para compreender. Deus em Jesus Cristo pode dar-nos a lição: "Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração" (Mt 11. Basta vê-lo recebendo o beijo de Judas. Procura dominar sempre. "Transforma estas pedras em pães. que Jesus Cristo. Jesus Cristo. Porque será presente do amor de dominação. antes de todo esse itinerário posterior. Na terceira proposta o Tentador não esconde o orgulhoso que é. eu. orgulhoso crônico. se retornasse ao antigo status. Não é um orgulhoso. O orgulhoso na vida conjugal 1. Não é um orgulhoso. mas é tarde. Seja ele. vomitava o eu. cada qual com uma pedra na mão. Nele a comunicação era um dos fios com que tecia a maturidade. se fosse orgulhoso? Como? Nunca. ele acredita no que a mulher diz. E escolheu. na gruta de Belém. jamais de cortesia. somente o eu. Porque Jesus Cristo era totalmente aberto a Deus e aos outros. É presente do amor que apenas imagina amar.". E Jesus Cristo afugenta-o de vez. Basta vê-lo traçando o perfil daquele orgulhoso orando no templo." "Atira-te desta torre abaixo. como mostram os Evangelhos. Pensa em silêncio e em silêncio executa. em Jesus Cristo. morando em subúrbio. Anos atrás. Ora. um casal conhecido meu foi à falência. O mundo interior de Jesus Cristo está banindo este monstro antropofágico. pois não comporta oblação. (Orgulhosos são os fariseus. O que pretende dele. interessado nele apenas. suando. não consulta. pois não passa nos testes principais. É um amor de domínio. Quem sabe? 2. ressurgisse o mesmo orgulho. de um amor que não sabe ouvir. De um amor que não é verdadeiro amor. não dialoga. é a personalidade modelar. J. Vejam o que o Tentador diz a Jesus Cristo em outra ocasião. aborrecia-se sempre que a mulher advertia: "Lembra-te que tu és homem.29). Tenta ouvi-la. Basta ver Jesus Cristo chorando com saudade de Lázaro. Deus se tornaria um menino. Não é um orgulhoso. Basta vê-lo logo que aparece. Por isso. Mesmo quando pensa conceder um palácio ao outro. para a finalidade comercial. Basta vê-lo tomando a defesa da adúltera. Inchado de egocentrismo. Não pede desculpa. Quando o parceiro cai em atitude condenável. ela levaria o arroz. E quando conjuga. Ele era fraco. mesmo se pensa amar. pelo concorrente vitorioso. 3. Compreender. por ocasião da visita de um deputado situacionista. incapaz de uma atitude apta a iniciar um diálogo adulto. Isto tudo é fingimento. E projetava o próprio feitio no marido. É também burrice. É outro obstáculo do orgulhoso. tentava acariciá-la. Como se abraçarão. porque não sabia arrepender-se. casualmente. . é no lar. O orgulho é o senhor feudal do nosso condado afetivo. alegrando-se com a idéia. ela se descontrolou: "Não. Ele levaria a galinha. a mulher perguntou. Mas ela não sabia perdoar. Se não sabe falar e ouvir quando julga agir certo. Percebemos como é difícil alguém ser feliz junto de um orgulhoso. E nem abriu a marmita. Quando o noivo lhe mostrou o arroz." Eu sabia que eram gestos sinceros. É assim o orgulhoso. Aliás. o ímpeto inicial é para fechar-se e deixar o orgulho agir. Difícil de perdoar. Fecha a porta e joga a chave no poço. Vivem à mercê de ocorrências excepcionais. e combinaram o farnel. Quanto tempo um amor pode respirar junto de um orgulhoso? Para não termos de enfrentar este inferno. orgulhosa. Não sabe pedir desculpas porque não se dobra perante ninguém. Aí está um verbo que esse senhor não sabe conjugar. a felicidade é literalmente impossível. . quis recuperar-se de uma aventura extraconjugal. Sei de dois que se falaram pela última vez. Isto não é só orgulho. Eu disse que traria o arroz. E vice-versa. se o casamento não se sustenta sem o abraço das raízes? 4. Se ambos são orgulhosos. Toda chance de análise visando restaurar a estabilidade abalada é impensável. está cavada a desgraça. Ela (conheço-a bem) é uma orgulhosa quase selvagem. A mãe dele. Peixeira do orgulho Se há uma área onde o orgulho deve ser varonilmente combatido. é preciso não esquecer a sábia observação de Lacordaire: "o amor cresce no sacrifício. um dia. com a flexibilidade. Tendo perdido as eleições. não se preocupa com a habilidade no relacionamento. o orgulhoso também não acerta pronunciar uma palavra para desculpar-se. Por não saber compreender. preparou a galinha e o arroz. com a tolerância. Lembro-me de um político nordestino. Há poucos meses eu soube deste episódio. 0 primeiro movimento é de revanche. . mas a orgulhosa recusava. "Vai pra lá. Um casal de noivos teve a idéia de passar fora um domingo. ela. é a contragosto. Na época em que o marido de M.Não é do feitio do orgulhoso a tendência ao esforço de compreensão. O de tua mãe fica". Passou-lhe uma tapona. muitas vezes o orgulhoso torna-se burro. L. São. — "Fala. este é o casal qualificado para construir a maturidade conjugal através dos anos de vida em comum. (. A mística árabe Miriam de Abelline teve intuições geniais sobre a humildade e o orgulho. o diálogo. recomendo a leitura do .sobretudo no sacrifício do próprio orgulho". o perdão. porque a humilhação foi para elas como um monte de estrume ao redor dum tronco". Na famosa parábola. diálogo. o reconhecimento de erros pessoais. no momento em que o outro aponta uma falta real. . se tudo isso é indispensável à felicidade conjugal. viável apenas para o humilde. modos de ser da humildade. intuições que ajudam a extirpar da vida conjugal os horrores do orgulho. Eis porque Cristo colocou no templo um humilde ao lado de um orgulhoso. Entre outros motivos. se houver mútua tolerância. todos. pode conviver com alguém sem comprometer a paz de ambos. cada vez com menos dificuldade. dispõe-se a analisar se tem razão ou não. Ele quer mostrar: aí está a solução. silêncio oportuno. firmeza serena. com exceção da humildade. compreensão. Para mostrar que esse é o remédio do orgulho. o silêncio oportuno. porque ambos são humildes. a paciência. a felicidade não virá enquanto o outro não ouvir este verbo conjugado por quem errou. Este é um dos segredos da vida a dois. Muitas vezes minha reação pode ser esta: "Lá vem a sabichona! O sabichão!". Escreveu ela: "podemos encontrar no inferno todas as virtudes. Cristo veio trazer chance de felicidade também para o orgulhoso. Já sabemos por quê. Quem reconhece. No céu encontraremos todos os pecados. Sem humildade. Reconhecer — este é o verbo mais difícil de ser conjugado na vida conjugal." Se realmente houve erro. Combatemos o orgulho procurando reconhecer (sem resistência) nossos defeitos ao lado de nossas qualidades. condição indispensável da felicidade a dois. Que ele se torne humilde! Afinal de contas. (Aos que precisarem esclarecer-se como Cristo concebe a humildade. Se a tolerância. No céu. aos cinqüenta anos.) Deus perdoa todos os deslizes de uma alma humilde. a felicidade conjugal é inviável. Nunca brigaram. quando um dos parceiros é orgulhoso. perdão. do crescimento a dois. é intencional.) Há santos que se santificaram através do orgulho. quando Cristo põe ao lado do orgulhoso um humilde. Lembro-me de José Carvalho Branco e D. se houver reconhecimento dos erros pessoais. pois sem humildade não haverá tolerância. Isto é a humildade na prática. porque lutaram corajosamente durante toda a sua vida. paciência. . dizendo um ao outro: "Vamos brincar de brigar?". menos o orgulho. "Reconheço que errei. pois. de um amor durável para os dois. reconhecimento de erros pessoais. — Orgulho! Peixeira nele! A peixeira da humildade. da construção a dois. as mais belas árvores são as que mais pecaram. Miloca. Só a mulher humilde saberá calar com oportunidade. Que queres me dizer?" Marido humilde e mulher humilde. . impossível ao orgulhoso. a compreensão. Só o marido humilde é capaz de dizer sem cinismo: "Reconheço que errei". equivale a dizer que indispensável à felicidade conjugal é a humildade. . (. Porque só haverá maturidade conjugal. os próprios defeitos. a firmeza serena. A humildade é o remédio para o orgulho. ) PARA CONVERSA CONJUGAL 1. o amor frustra. E o resultado é venenoso para ambos e para quem esteja perto.) 6 .0 que pesa mais na personalidade de vocês: o orgulho ou a humildade? (Análise delicada.Vocês têm demonstrado suficiente interesse em promover a educação emocional e afetiva de seus filhos? (Analisem concretamente e distintamente cada um.Querem revelar qual a qualidade que mais admiram no outro? 8 . o amor perde a alegria. A abusiva descontração de nossa época leva a misturar freqüentemente amor com desrespeito. sem respeito bilateral. em muitos casos. em número cada vez maior. os obstáculos emocionais e afetivos têm dificultado a comunicação entre ambos? (Fatos) 3 . mas realista. o prazer. sem respeito bilateral. o amor perde a confiança. não satisfaz.Qual uma outra qualidade que gostariam de ver incorporada à personalidade do parceiro? 9 . insistem na necessidade do respeito como clima indispensável ao florescimento do amor entre um homem e uma mulher que pretendam viver unidos.Durante o noivado. analisados com humildade. com fatos.capítulo intitulado "Humildade cristã e qualificação humana". não compensa. Na teoria os que se amam deveriam respeitar-se. sem respeito bilateral.) 2 . qual o fato mais custoso de compreender e perdoar (embora sem justificálo)? 7 . sem respeito bilateral. a dignidade. o amor perde a beleza.Os mesmos obstáculos emocionais têm criado problemas para os filhos? (Fatos) 4 . Ainda está por aparecer à união resistível ao desrespeito. Sem respeito mútuo o casamento vira bas fond. Sempre humilde. . A vida conjugal de milhões ensina que a saúde do amor é o respeito. comprometedor da saúde psíquica e até da orgânica.) 5 . Sem respeito bilateral. que passam a oferecer aquele quadro deplorável. em conseqüência da fatal desorientação dos figurantes.Haveria outros pontos a analisar? RESPEITO E AMOR CONJUGAL Psicólogos. editado pela Agir. adeus perenidade do amor.Na vida conjugal.Para cada um. a construtividade. qual foi o obstáculo de ordem emocional que mais embaraçou ou está ainda embaraçando o amor de vocês? (Citar fatos. Na verdade o desrespeito é o cupim do amor. adeus paz dos que se amam. mas na prática isso nem sempre acontece. a começar pelos filhos. em meu livro Amor e Responsabilidade. Ensina que se só existe amor sem existir respeito, podemos assinar o atestado de óbito desse casamento. O respeito mútuo, ou melhor dizendo, o amor com respeito, impede que o casamento se transforme numa trincheira. A primeira atitude desrespeitosa sempre causa no outro — seja ele, seja ela — certa estranheza, se o atingido, por considerar o respeito um valor necessário à união duradoura (embora não revide com a mesma moeda) passa a vislumbrar nuvem escura na sombra daquela atitude. E mesmo que não estivesse habituado a um ambiente de respeito, por motivos culturais, não deixaria de recusar, ao menos internamente, a dentada, porque ninguém gosta de ser golpeado, ainda que de leve. A própria natureza humana, tanto quanto a natureza do amor, clama por respeito. Quem aprecia ser desrespeitado? Só um masoquista, um doente. Então quando o desrespeito provém de alguém que afirma amar-nos, trai uma contradição decepcionante. E a esses dois clamores acrescente-se um terceiro: o imperativo da comunicação. Sem respeito, deixa de haver comunicação. Ora, se não existe comunicação, há crise. Já que a falta de amor com respeito arrasta os dois para a crise, o indicado é que, durante a crise, uma das primeiras medidas, ao menos por parte de um dos parceiros, seja restaurar o que desapareceu, ou introduzir o que nunca existiu. Seria um passo para trazer de volta o amor efetivo, não apenas afetivo, ou seja, amor com respeito. Em que consiste Ao ouvirem este vocábulo — respeito — alguns são levados a associá-lo com circunspecção, com rigorismo, com frieza, com distância, com misantropia (!), com sorumbatismo, com mutismo, com farisaísmo. Sendo isto inconcebível entre um casal, nada disto é respeito. Respeito é tratar o outro com atenção. Respeito é honrar o outro. Respeito é conviver com o outro, sem esquecer que o outro merece deferência. Respeito é levar o outro em conta. Respeito é considerar o outro digno de ser tratado com o acato que merece uma pessoa humana. Respeito é não danificar a reputação do outro, a paz do outro, o nome do outro. Respeito é satisfazer o outro, ou recusar sabendo que há uma maneira respeitosa de recusar. Vejam quanta beleza existe nos sinônimos do respeito. Como dignifica, como ilumina, como constrói, como restaura, como pacifica, como defende, como enaltece, como humaniza, como diviniza o casal e o casamento. Sem respeito o casal se caniniza, em vez de se canonizar, pois o respeito é vacina geradora de anticorpos defensivos do amor. Como o respeito aproxima, em profundidade, marido e mulher! A falta de respeito põe o outro em permanente receio do inesperado. A qualquer momento um golpe pode ser desfechado. Seja no quarto, seja na sala. Seja entre os dois, seja na presença de terceiros. Como o marido que no domingo combinou ir à praia com a mulher, às nove horas, e diz que vai à esquina comprar cigarro. Lá encontra dois amigos e fica tomando cerveja até às três da tarde! A mulher que se dane, esperando, desrespeitada. "Você é um grandessíssimo besta!", foi o último desrespeito conjugal que presenciei. Último? Minto. Penúltimo. O último foi um buquê de galanteios atirado por um marido para a vizinha, na presença da esposa. Compreende-se a insegurança, a ansiedade inconsciente em que vivem parceiros que não se respeitam. Perderam aquela tranqüilidade emocional, que só possui quem sabe que não será desrespeitado pelo outro. Este sossego é valor inestimável. Bastaria ele, para levar-nos a lutar por uma tal garantia de paz conjugal. Sobre estas razões naturais há várias razões sobrenaturais, das quais lembro apenas uma. Posso amar um diamante, por ser criatura de Deus. Mas não preciso respeitar o diamante, porque não é imagem de Deus. Só meu marido é imagem de Deus. Só minha mulher é imagem de Deus. Essa dignidade, exclusiva da pessoa humana, não dispensa que ela seja respeitada, onde quer que esteja, qualquer que seja a condição em que se encontre. Esteja junto de mim como esposa ou como empregada; como marido ou como jardineiro. Imagem de Deus — se tenho fé — não posso tratá-la sem respeito. E se nos unimos pelos laços do amor conjugal, mais uma razão para reforçar de respeito esse amor, pois assumo ser para ela aquilo que Deus é, por criá-la: amor. Grandes casais do povo de Deus, conhecedores dessa suprema dignidade da pessoa humana, souberam nivelar-se, pelo amor com respeito, à altitude do plano matrimonial de Deus. Entre o homem e a mulher não pode existir amor sem respeito, pois o que cada um ama é a imagem do próprio Deus no parceiro. Mais beleza Vejam a beleza do amor respeitoso, por exemplo, em Abraão e Sara. Viajaram os dois, deslocaram-se com todo o seu patrimônio; mudaram de cidade e até de país; enfrentaram tribulações, e no entanto não vimos, da parte de Abraão, uma única atitude de desrespeito para com Sara. Do mesmo modo, em Sara não flagramos um só gesto desrespeitoso para com Abraão. E tiveram oportunidades de sobra, pois viveram uma longa vida de casados, na Caldéia, em Canaã, no Egito, mas, mesmo variando as circunstâncias (e os atropelos), não variava essa marca respeitosa do imenso amor que os unia. Outro casal. Ana e Elcana. São os pais do profeta Samuel. Antes de nascer Samuel, passaram muitos anos sem filhos; sofrimento atroz. Sobretudo Ana, que se considerava abandonada, e até amaldiçoada por Deus, pois em Israel a mulher estéril acreditava carregar a maldição divina, já que estava excluída da possibilidade de ser mãe do Messias. Ana se sentia assim. Tanto que passava dias inteiros a chorar. Numa tal situação, o marido poderia desprezá-la, humilhá-la, maltratá-la, mas não encontramos em Elcana, como marido, um deslize, sequer, contra o respeito conjugal. Pelo contrário. Ele procura confortá-la com argumentos deste teor: "Por que choras, Ana? Eu não valho para ti como dez filhos?" (1Sm 1.8). No amor de ambos não há uma pedra, uma pedrinha de desrespeito, atirada por Elcana contra o coração da companheira. Mas existe um casal em quem constatamos amor respeitoso vivenciado ao nível sublime. De parte a parte, amor sem um pingo desse tipo de poluição. Dois episódios mostram nitidamente o respeito de um pelo outro, embelezando entre todos os amores o amor de José e Maria. Logo que Maria se torna o relicário onde está em gestação o Filho de Deus, José percebe que se trata de uma gravidez real, mas sabia não ser ele o pai. Amava demais Maria, mas precisamente por amá-la e respeitá-la, não teve coragem de fazer a denúncia que, por lei, qualquer marido israelita poderia consumar, em tais casos. Preferiu fugir, a assumir uma atitude destoante do amor e do respeito que ele devotava a Maria. Quando Jesus atinge a adolescência, naquela ida ao Templo, por ocasião da festa da Páscoa, é a vez de constatarmos o amor com respeito de Maria por José. Ao encontrarem Jesus, perdido há três dias, Maria repreende-o. Estava angustiada, sofrendo, mas nem por isso deixa de demonstrar o quanto o marido merece amor e respeito. Vejam os termos em que ela se refere a José, dirigindo-se a Jesus: "— Meu filho, por que procedeste assim conosco? Não sabias que teu pai e eu, aflitos, te procurávamos?" (Lc 2.48). É um detalhe. Mas um detalhe altamente expressivo. "Teu pai e eu." Ela poderia ter dito: eu e teu pai. E não disse, porque a fórmula preferida exprimia melhor o amor e respeito que devotava ao marido. Vendo o amor com respeito entre essas duas criaturas, santas entre as mais santas, concluímos que o respeito mútuo entra necessariamente no tecido da santidade conjugal. Todo casal que ambiciona santificar-se, não pode deixar de cultivar o respeito bilateral, como nos mostram todos esses notáveis casais do povo de Deus. Não precisamos aludir a outros fundamentos do respeito conjugal, que outros há, e fortes, e eloqüentes. Bastam os citados, para mostrar por que a Igreja de Cristo, mestra do amor, pergunta quatro vezes, na liturgia do casamento, acerca das íntimas disposições do novo casal. Duas vezes indaga se ambos se respeitam e se amam. (Põe o respeito antes do amor, destacando-o.) E duas vezes convida o novo casal a prometer que se hão de respeitar e amar por toda a vida. Quando? "Por toda a vida" é uma fórmula solene, mas não deixa de ser um tanto vaga. "Por toda a pela antena da TV. Por outro lado. nos furacões? Não sucumbamos a essa fraqueza. No quarto e na rua. —Na presença dos filhos e também na ausência. que é uma forma vulcânica de desrespeito. Quem bebe sabe por quê. Funesta capitulação de quem julga poder transformar mil erros em uma verdade. mas em que ocasiões? Em linguagem concreta. é um estímulo feiticeiro. Marlene?" Ora. por mecanismo reflexo. abraçado. Se não treinamos a respeitar o outro quando estamos com o controle de nossos nervos. Esse equívoco tem levado muitos maridos no rumo da amante. porque penetra pelo telhado. Atmosfera favorável Mesmo que encontre as portas fechadas. Com tanta violência saturando o ar de seu apartamento cor-de-rosa. — Outra ocasião em que o desrespeito tenta atirar o amor pela janela: nos dias de bebida forte. "Que olhar atrevido é esse.vida". É o óbvio ululante." — Não. E para certos casais. senhor. Hoje a praxe quotidiana da bebida forte põe o marido e a mulher na tangente do desrespeito. isto é todo dia. de nossas emoções. Hoje uma concepção materialista do amor cria tantas ocasiões de desrespeito. testemunhado. você vai agredir o coração de Marlene com a violência avolumada no telejornal e reforçada pelos pontapés de Kung Fu. que olhar! Não era assim que a Dina Sfat olhava o astro da novela? — "Mas isso é uma novela. Na sua sala de estar. junto ao quarto de vocês. a essa tentação. Nossas comportas se abrem e demonstramos que as lições têm sido bem assimiladas. pelo fato de serem mil. E a violência. Se nos acostumamos a desrespeitar o parceiro quando estamos sozinhos. sustentado. muitos psicólogos estão cansando de recomendar atitudes pacíficas aos casais. a crescer. não é de admirar que. como iremos respeitá-lo nos ciclones. praticado. Foi facílimo o olhar da Dina Sfat entrar nos olhos de Marlene. a violência entra em nossa casa. Diante de tantos condicionamentos violentos agredindo nosso sistema nervoso. Foi aí mesmo onde vocês estão. Ainda que fossem duzentos mil! Um casal deve aprender é a amadurecer. porque na casa dela não há briga. ele pareça cor de sangue. O mesmo drama leva tantos filhos a compararem . ninguém nos fará enxergar os filhos quando estiverem presentes. não a desintegrar-se. a esse flagelo. não a brigar. que faz rolar abaixo precisamente aquilo que pensa exprimir: o amor. e passaram a ensinar "como devem brigar". muitas esposas a sonharem com o marido pacífico que nenhum devaneio traz. e depois rasgar os seus. O mesmo erro estimula. tanto na intimidade como em público. é bom ficar claro que o respeito bilateral deve ser vigorosamente vivenciado. em certas horas. nada comentou. De sorte que aquela queda serviu para acertarem os passos ao ritmo do mútuo amor com respeito. desaprovando aquela atitude: — Meu bem. ou escolhemos a briga. como que fazendo eco ao dicionário da roda. Vieram às desculpas. Aguardou a noite. Outro episódio. — Eu também . Hoje você faltou com o respeito para comigo. aguda: — Eu sempre tenho esperado você terminar de almoçar. excelente casal. muito retalho podre. do contrário a catarata de palavrões atravessaria a porta. . Dali a um mês seria para mim. delicada e firme. Por favor. Foi uma atitude de mestra. não experimentem. Se lhes oferecerem "regras para a boa briga". Comentando o fato comigo. saiu de uma roda de conhecidos que não causaram boa impressão à esposa. se nós abrirmos esta brecha. disse-me ela depois: "Naquele dia o insulto foi para a fechadura. e o marido. O marido almoçou e levantou-se. depois virão as fendas. Me deixou sozinha na mesa. Embora não fosse endereçado à esposa. para o marido. No mês passado uma jovem esposa telefonou-me. — Eu? — Sim. Antes que chegue Há pouco tempo um casal amigo. muita piada suja. E antes de se deitarem. Chegando em casa. E quem garante que eu não revidaria?". mas nenhuma razão. senhor. Muita boca porca. — Não. O que é isso? Você nunca me fez ouvir um palavrão desses. a chave enguiçou na fechadura.seus pais com outros pais. Ou escolhemos o respeito. desmoralizados para evitar que a vida matrimonial se tornasse trincheira conjugal. fez atravessar pelo tímpano do marido esta frase fina.retrucou ele. . Agradeçam e mandem o ilustre tolo passear. Hoje esses dois casais poderiam estar desgastados. nada falou no momento. Nunca deixei você sozinho na mesa. por favor. Não há opção a fazer. soltou um nomão que não estava acostumado a usar. Na mesma hora virou-se ela. recém ingressado na vida matrimonial. os motivos. Embora sentisse desrespeitosa essa atitude. macia. ela logo viu a necessidade de barrar a investida. deixando-a sozinha na mesa. Assim como em tonel ninguém pode misturar azeite e água. De quem não ignora que o desrespeito é o cupim do amor. Felizmente ambos desejam acertar. em casamento ninguém consegue misturar briga e respeito. . Eu gosto demais do respeito que sempre tivemos um para com o outro. Ora." Como borrifa o coração. Existe o amor que nasce da piedade. saber isso. e muitas vezes conscientemente. que oferece mil ângulos de análise. Beltoldo. Existe o amor que nasce do convívio. ADMIRAÇÃO E BELEZA CONJUGAL Existe o amor que nasce da atração. Despeja concreto na união do casal. qualquer que seja a faixa social a que pertençamos. golpes. todo casado conhece. o amor de atração. podem vir às rugas. a admiração nutre mais a personalidade de cada parceiro do que o próprio amor. como invade até o fundo mais recôndito de qualquer coração. Além disso. E existe o amor que nasce da admiração. Fruir e construir A admiração contém tanta riqueza intrínseca. Existe o amor que nasce da identificação. Daí por que nenhuma outra circunstância proporciona tão sólida sensação de dignidade pessoal. pois os valores admiráveis geralmente provêm de uma zona do eu imune a cascas de banana. Mais do que borrifar. deixa de pé o amor de admiração. inconscientemente. logo sentiu desejo de levá-lo para a cama. privações. "Mamãe. O que admiramos apela sinceramente para as nossas melhores energias. O valor ou os valores que admiramos. destacam o parceiro aos nossos olhos. o mais forte. O que admiramos se impõe a nossos olhos. a admiração continua defendendo o amor. Pode vir à idade. ou logo que possam. como se infiltra. do que o fato de nos sabermos (e nos sentirmos) realmente admirados pelo parceiro. Pode vir doença. Aquela que alimenta o uso (ou o desejo de uso) da pessoa em quem admiramos algo. por exemplo. Porque muito facilmente nós desejamos tornar-nos. Torna-se muito mais fácil atingir o nível da beleza conjugal. os achaques. pois são mais fortes que quaisquer outros. dando ao vínculo conjugal uma infra-estrutura capaz de competir vantajosamente com audaciosos agressores do amor. Neste sentido. podem vir cruzes. Se admiro a cordialidade de minha mulher. naquilo que admiramos. que admira muito sua perseverança em tudo que você faz. pois o que é digno de admiração independe de oscilações humorais. independentes de circunstâncias psicológicas. por experiência. E conseguiu usá-lo por algum tempo. papai estava dizendo para o Dr. nada melhor para dignificar-nos do que sentir-nos merecidamente admirados por nosso mais íntimo companheiro de existência. Eis o tipo fruitivo de . uma análise do clima atual de respeito ou desrespeito existente no lar de vocês. a quinta plástica. Mais do que se infiltrar. a importância de se sentir dignificado em casa. esse fato me estimula a superar as injustiças do meu nervosismo. este fato me anima a sorver diariamente um pouco desse oxigênio. o mais seguro e o mais belo parece ser o amor nascido da admiração. Existe o amor que nasce da gratidão. Nem bem Elisabeth Taylor conviveu durante vinte dias com Richard Burton. De todos. Se eu admiro a paciência de meu marido.Façam agora. O que derruba. nada compromete os motivos de admiração por nós inspirados ao companheiro. união que fica livre de flutuações. Existe a admiração fruitiva. de tal modo a admiração oferece razões objetivas. Sem valores mútuos para admirar. de fato. Essa admiração é moral. Conquistando valores não inatos. da admiração construtiva. traz admiração em favor de qualquer obeso. tornou-se incapaz de sustar o processo que a mulher. tudo isso torna alguém admirável aos olhos do parceiro. ou o marido que trouxe de berço um tronco bem talhado. Antes era "minha pipa". cabelos de cetim.admiração. Nariz de duquesa. Não é uma herança. as duas crianças. A saúde reconquistada. e o processo construtivo não surgiu. Ao passo que todos os valores conquistados denotam mérito. sedentos de "curtir outra experiência". Pelo simples fato de ter valores admiráveis. Agora é "meu querido". pois. são elementos geradores de admiração psicológica. no qual ela passara a ser a garçonete do marido e dos amigos dele. porque. A mulher nascida com um rosto bem-afeiçoado. em vez de um desastroso episódio. da qualidade que carregamos sem mérito. passou a desencadear. Ninguém aprovava a precocidade do enlace. Logo cedo começou a inundação. terrível. se quiser fazer do casamento uma aventura admirável. cada qual continua vagando. Em Groenlândias antípodas. No final do primeiro trimestre tinham transformado o apartamento em bar. mas não desperta admiração moral. todos deixaram. Psicológica e moral O processo de admiração mostra uma face psicológica e uma face moral. Por exemplo. à custa de medidas de fogo. É uma conquista. Queriam brincar de casamento. Mas existe a admiração que aciona a construção do outro. com uma fileira de adjetivos bonitos. Quando Felix Laseur descobriu o valor humano e espiritual de Elisabeth. Sobretudo inexistia uma vontade de maturação. Mostra a marca de pessoas moralmente valorosas. Acompanhei o acidentado itinerário de um casal quase saído da creche. o parceiro desencadeia o processo. desacreditando da cafonice do casamento. um exame no qual fomos bem sucedidos. tudo isso pode ser atraente. Sem se preocupar. porque supõem um lutador. bem diferente. porque nenhum oferecia motivos respeitáveis de admiração (construtiva) para o outro. sem impor. um regime dietético que assumimos heroicamente. É diferente. . Mas eles quiseram. muito mais. E vice-versa. havia poucos valores maturados ou maturando. Não emplacaram um semestre. porque não nos poupamos. O amor se alimenta mais. e nada como o mérito constatado para gerar admiração. Eis. cujos resultados são visíveis. E lá embarcaram os dois na canoa furada. valores que não nasceram com ele. Porque é o mérito que comprova o valor. Em pouco tempo a admiração fruitiva perdeu a magia. É a admiração construtiva. É óbvio. uma batalhadora. cada qual voltou a seu galho. "minha querida". A admiração moral depende sempre do mérito pessoal. mas um deles já começa a perceber que tem de levar consigo outro tipo de bagagem. Admiráveis. olhos de esmeralda. não mais pôde barrar a indiferença. a melhor pedagogia para um parceiro tornar-se honestamente admirado. a vitória é da coragem. Caroço que garante ter sempre a fruta conosco. de janeiro a . Mas entre a coragem e o colar. E um belo vestido. o que está dentro. ao contrário do que ocorre com o parceiro que sabe sustentar. Planta-me e verás". Ao passo que a mulher covarde pode merecer coleira em vez de colar. a casca do eu: vestido. Passa o tempo. cooperar. É aconselhável ser corajosa e ter um colar. mesmo. E o eu do outro não permite que o amor murche. sapato. é o caroço. etc. É pena que grande número de parceiros. mesmo que não tenha colar. cada vez mais sentida. resolver. Afinal um belo penteado nada mais é do que um belo penteado. Se adotarmos uma metáfora vegetal. o visível. pagam caro essa inversão de valores. desgastam-se. atrai. o exterior. Desnutrem o amor. Mesocarpo. Como é bonita aquela manga-rosa. tem valor. bonitos. Tudo quanto constitui o Fruto. estejam interessados em que o companheiro admire mais o pericarpo. cada vez mais admirada. Como a natureza humana dificilmente disfarça por muito tempo. 24 meses depois. à polpa do eu: tomar iniciativa. enfeitados. Desbotam-se. Pericarpo (aquilo que a gente exibe). Aqueles que elegeram o cabeleireiro e a dona da butique como seus melhores cireneus de casamento. resiste aos vendavais. peruca. Porque a mulher corajosa é sempre admirável. Esta é uma diferença essencial entre os valores endocárpicos e os pericárpicos. Endocarpo. o caroço que garante a qualidade do mesocarpo. Mas o que é útil realmente é o mesocarpo e o endocarpo. etc. Se a polpa se esvai. o caroço exclama: "aqui estou". que suplanta a beleza da casca. manipulados pela sociedade de consumo. à medida que o tempo passa. valor espiritual. mais cedo ou mais tarde ela denuncia a fragilidade do que foi feito pericarpicamente. adverte. terno. Quanto mais passa o tempo. a polpa e o caroço. Como a personalidade humana possui três camadas. etc. A casca avisa. em decorrência daquilo que ele é. o que está na superfície. Mesocarpo (aquilo que a gente faz). mas vazios. jóias. mas insossos. menos admiráveis se tornam. Mas o que realmente compõe a fruta é o mesocarpo e o endocarpo.Fruto e fruta Daí a necessidade de acordarmos para a preciosidade dos valores morais. podemos compará-la a um fruto. tanto mais os valores endocárpicos se tornam admirados. 24 horas depois nem é sequer penteado. Pericarpo. Terminam tornando-se casais de casca. Como é formidável aquele mamão. o caroço do eu: qualidades. Ao passo que a delicadeza. Polpa que é útil. comunicarei melhor o que desejo ver cristalinamente assimilado. competência profissional. o que está no meio. nada é além de um belo vestido. a Fruta. some o espaço. será sempre admirada e sentida. providenciar. Ao passo que os valores pericárpicos. por não oferecerem valores realmente admiráveis na convivência conjugal. Mas o que sustenta. Impedem que faça. virtudes. O caroço que diz: "Eu sou o que tu acreditas que sou. Bendito caroço. quando é virtude (endocarpo) e não apenas etiqueta (pericarpo). Tudo. Endocarpo (aquilo que a gente é). Por quê? Porque o mesocarpo e o endocarpo não deixam. a uma fruta. maquilagem. nem vestido é mais. os . convida a ser amada. para que glorifiquem vosso Pai que está nos céus" (Mt 5. Este fato em si já é admirável. pela maravilhosa fúria desse invisível casal no casal de carne e osso — admiração e respeito. Não é privilégio de ninguém. A admiração é sem dúvida a mais ampla porta para a chegada do respeito. qualquer muralha conjugal. Isto não é vaidade. todo mérito incontestável derruba qualquer obstáculo. mas deixou-nos o encargo de colocarmos em nós mesmos muitos motivos de admiração. Quais são esses constituintes? Os principais são: vontade. E ainda bem que pode vir! Sempre será bem-vinda. caráter. Como tornar-nos Deus pos muitas razões para admirarmos a natureza. Esta é uma constatação realista. Uma mulher que amou como poucas esposas. Nem sempre a admiração vem antes do amor. que é denodado nas piores circunstâncias da vida. inteligência. afetividade. Daí a necessidade de nos tarimbarmos nessa pedagogia: como nos tornarmos admiráveis aos olhos do parceiro. qualquer preconceito. Onde não morre a admiração. ARA A experiência ensina que quando só existe amor. Por isso a virtude é o mais democrático caminho para a admiração. Porque o outro haveria de ser excluído do número dos "outros"? Não é ele o próximo mais próximo? Aquele que tem mais direito de descobrir o amor do Pai celeste através da admiração de um de seus filhos? A primeira medida para dominarmos a pedagogia da valorização pessoal é conhecer os constituintes do endocarpo do eu. imaginação. E se não há muralhas. não morre também o respeito. dificilmente existe respeito. a uma tal fulgurante constatação. Mais cedo ou mais tarde. Seja banqueiro ou bancário. sem haver admiração. é um mandamento de Cristo: "Vejam os outros as vossas boas obras. Santa Teresa d'Ávila. aí está um caminho de ampliação do amor. menor que ele. torna-se irresistivelmente admirado pela mulher. não merecemos louvor. por muito tempo. Ninguém pode manter-se cego. aquela valente cordialidade. Mas se nos desinteressamos dele. Aliás. Pense ela o que pensar. para o respeito e para o amor. ache o que achar. Pode vir depois do amor. e aí não murcha o amor. mostrou de forma encantadora o óbvio dã virtude. como diria São Paulo. embora pareça um postulado romântico. No fundo sente necessidade dele. "A virtude por si convida a ser admirada. numa palavra. mesmo passando os encantos físicos.) Como é próprio da admiração e do respeito resistirem ao tempo (caso formem um casal dentro do casal). a invasão de amor é avassaladora." Por ser admirada. pelo fato de nem sempre o amor começar admirando. que está sempre incendiado de confiança. ajudada por ele. crescendo com ele. (Já sabemos o que o respeito faz surgir na vida conjugal.dezembro. (O marido que nunca desespera. e muitas vezes vem.16). A vontade é outro valor endocárpico. O espírito é o caroço do eu. nossa caminhada continuará por entre flores e verdes campos. se quisermos oferecer motivos de admiração ao parceiro. à medida que nosso amor cresce e nunca diminui. faz parte do endocarpo do eu. à erosão. elaborando com ela uma cultura. respeito. à concorrência. é preciso reconhecer que vivemos numa sociedade estimulante da mentalidade de fachada. ao cansaço. enquanto conosco estiverem. amor. junto à xícara. ao descompasso conjugal. Porque os alicerces é que formam a infra-estrutura. beneficiando o homem e a mulher que estão casados. Quando correspondem a valores endocárpicos reais. encontrou na mesa do café o presente deste bilhete: "Atingimos outro marco da estrada. O casal Twain. Teu marido. Mas só suscitará admiração e respeito. e a luz do crepúsculo será tão agradável como o suave resplendor daquela distante manhã. Sempre que Mark Twain viajava. Ou melhor: o espírito. Se queremos oferecer e ter valores para nossa mútua admiração. é produto do meu esforço. meus caros. Nem o passar dos anos conseguiu erodir essa admiração. ARA. A cultura será mais admirável do que a própria inteligência. devemos combater a mentalidade de fachada. às fissuras. se em mim eles formarem um casal. leva à irritação. Personalidade de fachada é precisamente a de alguém que só se interessa pela casca da manga. mas eles estão conosco para segurar nossas mãos e dar firmeza a nossos passos e. a ponto de. Concluo trazendo para a contemplação de vocês dois um casal onde a admiração era um fato bilateral. A inteligência. Minha cultura merecerá admiração e respeito do parceiro. mesmo quando estava em casa. E aqui temos companheiros em nossa jornada — ah. Ao passo que os valores do espírito são o melhor suporte da estabilidade. tornando admiráveis também os valores pericárpicos. dia em que também completavam 17 anos do noivado (não do casamento!).24-27). quando ela festejava os 40 anos. minha querida. Aliás. Volvendo o olhar. o mérito será meu. No dia 27 de novembro de 1885.valores espirituais. às brigas. Logo. por exemplo. A recomendação de Cristo é oposta. alicerce de todo amor estável. já bem longe do lugar onde começamos. se com ela eu construir um caráter em mim. escrever bilhetes que colocava no lugar dela. "Cuidai dos alicerces" (Mt 7. escrevia à esposa exprimindo a admiração que sentia por ela. pôde escrever à mulher esta expressão: "à medida que nosso amor cresce e nunca diminui"? Por quê? . Ao passo que a inteligência merecerá. E é o espírito que deve ser trabalhado. E para combatê-la com eficiência. porém. devo trabalhar essa inteligência." Por que esse marido. só admiração. vemos atrás de nós linda paisagem. já de cabelos grisalhos. só assim os valores pericárpicos não traem uma personalidade de fachada. E a infra-estrutura é que sustenta profundamente admiração. Nossos rostos estão agora voltados para o poente. algumas vezes. Fachada sem valores endocárpicos. Assim aqueles valores que são o alicerce de uma personalidade levantam-se. à leviandade. Como inteligência e caráter nem sempre se casam. pois a cultura é mérito meu. um chantagista social (já que dificilmente pode perdurar o chantagista conjugal). tão inspiradores e lindos! E como tornam suave a caminhada. que companheiros preciosos. os problemas anoitecidos.E era verdade. da imaginação. o sistema nervoso desorientado. patas de ferro. o egoísmo. sem rédeas. É a consciência moral que ilumina o amor para agir rumo ao norte da estabilidade construtiva. e o que fica dentro do eu? Ficam todas as formas de violência. Por que é necessário que no íntimo dos amantes exista uma coisa chamada consciência? Por quê? Porque quando não existe consciência. as aversões. de todas as encruzilhadas ciclônicas. mesmo sob o comando do amor. Qual das duas terá mais chance de reagir conforme a autenticidade conjugal? Qual das duas merecerá mais confiança como esposa? Claro que é aquela em cujo interior se encontra a lâmpada da consciência moral. toda a sedução. Para onde essas forças levarão o marido? Para onde arrastarão a mulher? No rumo de todos os apelos contraditórios. que ele denominou instintos fanáticos. Por quê? Porque cada um dos dois sempre ofereceu valores espirituais para o outro admirar. Duas mulheres casadas estão perante o mesmo conquistador. os ressentimentos. alucinados. o passado. CONSCIÊNCIA E CRESCIMENTO CONJUGAL Realmente o casamento é belo demais para ser vivido num mundo babelizado. as quais o amor se mostra incapaz de controlar. para a gula do instinto-semconsciência mostrar a incapacidade de construir algo perene. Ficarão soltos. instintos destruidores. Por mais atraente. instintos de morte. por mais sedutora que seja. Só por ela o amor não age às escuras. . Basta aparecer um prato mais apetitoso. tudo formando um periculosíssimo esquadrão de poderes imprevisíveis. por dependerem de fatores volúveis. Esta frase "eu te amo" só merece confiança. todas as modalidades de exploração nos territórios da afetividade. se sai da corola de uma consciência moral. Sem consciência. esta é a realidade. toda a profundidade serão fugazes. não há relação conjugal duradoura. Mas só os que possuem uma consciência iluminadora poderão tornar-se os sortudos dessa loteria. e não apenas dos lábios de uma sensação psicológica. o que resta dentro do homem e da mulher são forças negativas. É ela quem acende a lâmpada nas horas de opção do amor. Toda a atração. Tirem à consciência moral de dentro de um casal. não. os recalques. da inteligência. Uma tem consciência moral dentro de si. e o que resta? Restam os instintos desgovernados. do sexo. Tirem à consciência. as glândulas animalizadas. A outra. pisando os direitos do parceiro. sobretudo quando açulados por uma moldura social desvairada. as preferências subjetivas. ignorando a dignidade dele. agressivas. Freud enxergou esse lote de cavalos desenfreados. Por mais profunda que pareça. tudo isso solto. mas se não brota de uma consciência inspirada em Deus (Alguém. No hotel da cidade.Quando a consciência perde a direção dos sentimentos. . iluminado pela consciência inspirada em Deus. no momento oportuno a voz desta lei lhe soa nos ouvidos do coração: faze isto. Obedecer a ela é a própria dignidade do homem. os cristãos se unem aos outros homens na busca da verdade e na solução justa de inúmeros problemas morais que se apresentam. evita aquilo. Conheço um casal que de vez em quando tinha de enfrentar uma viagem do marido. Jamais. não pretendo escrever o elogio do moralismo. Pela fidelidade à consciência." E na vida conjugal também. é a consciência despovoada de alguém. Quando no centro do eu está à consciência. Mas a ela deve obedecer. não algo). Faltam a ela os olhos da consciência. e quando no núcleo da consciência está Deus. a constituição Alegria e Esperança (do Concilio Vaticano II) descreve a origem divina da consciência humana. Pela consciência se descobre. Assim as forças destrutivas que ele. O casamento só se torna uma instituição falida para aqueles cuja consciência faliu ou nunca teve direito de desfraldar sua bandeira no mastro do amor. o casamento levantado sobre o binômio amor-consciência. Mas sabia que estava sendo visto por Deus. e consciência inspirada nos mesmos valores. ou visitar conhecidos. De fato o homem tem uma lei escrita por Deus em seu coração. Ei-lo: "Na intimidade da consciência. O fato de Deus valer. optando por uma fidelidade construtiva. é que chamamos consciência. traz em si. Consciência desmedulada Ao louvar a consciência moral. Ele não a dá a si mesmo. muito mais. Porque o moralismo é a consciência sem inspiração personalizada. se queremos uma vida conjugal livre do caos. os colegas insistiam para que ele os acompanhasse aos programas noturnos com garrafas e mulheres. nada enxergam. aquela lei que se cumpre no amor de Deus e do próximo. e sobram as ilusões dos instintos desenfreados. que será julgada de acordo com esta lei. ficam ao sabor das impressões. Sem consciência. incontáveis problemas a consciência evita ou soluciona. Ao passo que a moral autêntica é o apelo de uma consciência em nome de uma amizade. Deus fonte e destino final de todo amor. o homem descobre uma lei. Daí merecer mais crédito. do que o acalorado na fogueira da paixão. de Deus contar. A consciência é o núcleo secretíssimo e o sacrário do homem. ficavam impedidas de destruir. e recebendo de Deus a força para ser coerente com o amor conjugal. não pode haver critérios viáveis para avaliação madura da vida em comum. de modo admirável. Chamando-o sempre a amar e fazer o bem e a evitar o mal. tanto na vida individual quanto social. Não podemos deixar Deus de fora. Termina assado. é a ditadura de princípios abstratos. de Deus pesar. Aquele homem não estava sendo visto pela esposa nem pelos filhos. Recusando o convite dos colegas. como todo ser humano. Amo a moral do amor. Compreende-se por que a paixão facilmente se espatifa nas pedras da realidade. por motivos profissionais. mesmo essa moral do amor (apenas) termina um vaporoso moralismo estéril. fica aberto o rumo e acesa a luz. preferia ler seu exemplar de Seleções. onde ele está sozinho com Deus e onde ressoa sua voz. consciência ética. Por isso é que os apaixonados tornam-se cegos. Num belo trecho. o amor vira paixão. ou um bom livro. Mas o casal cristão é simultaneamente realista. pois a ética é incompatível com os relaxados. de incoerências. almoçando sem o marido. de irresponsabilidades. Em vez de orientar. nasce de Deus. não valeria a pena ter vindo. por exemplo. porque tem origem religiosa. e adeus casamento. e sua própria luz. Quando Deus está presente como pistilo da consciência. não a empregada. ele e a mulher se atirariam a toda sorte de arbitrariedades. Uma consciência merece nossa tranqüila confiança quando enterra as raízes em Deus. e quando ele chegava às dez da noite. Os parceiros laxistas terminam sem ética conjugal. pode adoecer. para sair de um impasse econômico. Há poucos dias. que geram "obrigações". inteirinho. Lembro aqui o primeiro ano de dois amigos. inflexível. Os tabus podem ser incinerados. Ao lado dos rigoristas. Entrechocam-se de tal modo. senhor. ele médico e ela assistente social. Por isso a moral da consciência não pode ser dinamitada. e esses. Há desvios da consciência. Mas Deus não pode ser dinamitado. ela mesma tinha de estrelar ovos e aquecer a comida. de volubilidades. Antes de se casarem. e em vez delas o que passa a existir é a responsabilidade de ser fiel ao Amigo Absoluto. O passado pode ser pulverizado. Essa mulher ajuda-nos a enxergar a dimensão idealista do casamento cristão. Tudo que gera a chamada "moral social" pode ser queimado. Estava dando duro. É minha missão. e o que Cristo espera de mim é isto. então desaparecem as "obrigações". São os individualistas da consciência. Julgam-se donos da consciência. que terminam resvalando em arbitrariedades . não pode ser dinamitado. bitolada. problematiza. Ele não estava brincando. O criador do cosmo e do homem. Nem toda consciência é correta. Ela pode tornar-se mórbida. assim ocorre com a consciência. As tradições podem ser espinafradas. ambos portadores de uma primorosa consciência cristã. ela sonhava com uma vida conjugal enluarada. para agir firme. estreita.Se não tivessem consciência inspirada em Deus. criador do casal. são portadores de uma consciência rígida. não acertam a resolver os desacertos da vida a dois. e o seu amor depende de ambas". em Cristo." Por que teve essa reação notável? É que possuía uma consciência nutrida em Deus. Em vez de esclarecer. que tinha de emendar o expediente. pois quem se casara fora ela. "Não estou fazendo favor a este homem. E não se permitia lamentações. Se o Cristo não tivesse trazido um ideal para os casais. há os laxistas. dizia eu a um noivo emaranhado num conflito: "Não sufoque a capacidade de crer que Deus escondeu em você. Desvios dela Como tudo que se torna peregrino participa da neblina da peregrinação. naturalmente. Pois passou o primeiro ano. Morta de sono. Deus nos uniu com uma vocação complementar. instala o purgatório. perturba. não social. Não em "princípios". Em vez de trazer paz. Por outras palavras: quando faz da luz da Fé a sua seiva. E é a consciência oriunda de Deus que orienta o casal nesse estilo realista de ser casal. Sim. de degradação. não ia deixar a empregada esperando até essa hora. quando crê. pincelada docemente de azul. Os rigoristas. de extravagâncias. não da sociedade. a opção de corresponder ao Amor que jamais desaponta. Jantava sem ele. O casal cristão é idealista quanto ao fim do casamento. quanto aos meios para atingir esse ideal. Ela ilumina sua consciência. Se não há consciência. Pode dar perdão e cobrar vingança. Quantas famílias têm sido dizimadas por causa de uma programista bonitinha." Daí o erro daqueles que entram no casamento levando no enxoval o falso pressuposto de que a liberdade só age no sentido do bem." Mas os estilhaços não deixam de atingir quem estiver perto. nem a empregada. Chegará o trecho do atoleiro. pelo mais funcional no casamento. "A liberdade ou trabalha para o bem ou para o mal. A inconstância do próprio coração humano. ninguém é capaz de levar a liberdade a optar sempre pelo melhor. em que a viagem amorosa vira ruína conjugal. Porque é muito difícil. Repreendeu de dia." Lamento de uma criatura referindo-se à falência de seu próprio casamento. se faltar aos olhos de cada casal uma consciência defensiva do amor? Se não há consciência. deixando para trás a lanterna da consciência. Paulo e Virgínia só puderam viver unidos durante . em vez de destruir. Precisamente porque tinha amor à esposa. Quando o casal chega aos quarenta. E o parceiro. Destruidora daquilo que o casamento pretendia construir nos dois. Porque a liberdade fica privada das luzes fortes que somente a consciência fornece. introduzindo a mutação veloz como automatismo na vida conjugal hodierna. ambivalente. Pode construir e destruir. Uma delas é a consciência. Nos equívocos da liberdade Alceu Amoroso Lima formulou de modo direto uma constatação milenar. Falência por ignorar dois fatos. nunca se livra deles. pelo crescimento a dois. E a rapidação. hoje. Muitas vezes o amor erra. se aparece mais enfeitado aos nossos olhos.imprevisíveis. Que é que faz a liberdade optar sempre por construir. Sem consciência. várias forças norteadoras. Pode abraçar e estrangular. Não. pedindo que a repreendesse. a consciência autêntica. mostrando os desenhos eróticos da babá. que não está longe. Como aquela ingênua senhora. vingar? Vários fatores. só uma consciência iluminada por Deus defende o casamento da investida das lolitas e dos malandros. por abraçar. "Liberdade sem consciência é uma bomba que explode na mão de quem a carrega. que sabe ser compreensiva sem deixar de ser coerente. Por isso a consciência relaxada termina sendo auto-destrutiva e alter-destrutiva. Sobretudo quando a experiência prova que muitas vezes o amor cega a liberdade em vez de iluminá-la. Nem ele. por causa de um conquistador charmoso. Faz tudo para que todos queiram consumir mais esposas e mais maridos. por natureza. Como resistir? Como conduzir as próprias opções. estrangular. mas à noite foi concluir a repreensão no quarto dela. Na verdade a consciência sadia. Nas inconstâncias do coração "Eu pensei que aquele amor nunca acabaria. sobretudo quando dá a mão à liberdade. como estilo de vida urbano. Por isso. A sociedade hedonista estende as garras do consumo até dentro do lar. que quis advertir o marido. é a consciência que sabe ser flexível sem deixar de ser fiel. por perdoar. mesmo amando. destrutiva do outro. A consciência nas ciladas Muitas vezes terminamos amando o pior. um casamento não ser abalado a partir dos 35 anos. A liberdade é. a dois. não adianta mandar a empregada dormir na casa da amiga. medidas óbvias podem tornar-se funestas. mas não tinha consciência. essa capacidade de decidir amar e de recusar o amor. do querer do homem e da mulher que livremente se amam. desvelo. acatamento. proveniente da sensibilidade. é opção. Suponhamos que um casal esteja em fase de desamor. Que quer isto dizer? Quer dizer que há amor ali dentro do coração de ambos. ajuda. Pode haver causas e mesmo condicionamentos. de falta de amor.000 dias porque tinham uma sólida consciência. no coração de cada homem e de cada mulher. delicadeza. mas também do sentimento. sem sair. podendo. E isto o torna diferente de todos e superior a todos os sentimentos terrestres. amor. Significa que cada um dos dois corações ainda possui capacidade de amar. E quando não quer. Essa componente é psicológica. Esta ultrapassa o nível biológico e psicológico. o amor permanece trancado. etc. Sem sair. É o ápice evolutivo não apenas da sensação. A importância de saber que existe. bane. Alguns se perguntam sobre o porquê das variantes. da liberdade. Mas a causa essencial vem da própria natureza do amor humano. porque falta. É um fenômeno hoje amplamente estudado pelos especialistas em vida conjugal: a importância de querer amar. Pode-se observar este fenômeno fora do laboratório de análise dos sentimentos humanos. E como só o dono tem a chave. — Não. circunstâncias exteriores desencadeadoras da flutuação. É sensação. volta às costas ao amor. em cada um. porque ambos fecharam o coração. até. Apenas a porta do coração está fechada. sob quaisquer de suas formas: atenção. Assim (o amor humano) tem duas componentes: 1) Uma sensorial. que dirigia o barco nos períodos de oscilação do amor. e teriam passado o facão naquele enlace antes do milésimo dia. foge. carinho. O amor humano ocupa uma posição pinacular na escala zoológica. . cordialidade. o querer amar. tranca o amor. Com ele não quero mais nada. e quando decide amar. Lembro-me de "uma chance" por mim solicitada a uma pernambucana rancorosa: — Dê mais uma chance a seu marido. minha cara. e brota do plano especificamente espiritual. e biológica. recusa. interesse. a decisão de amar. 2) E uma outra: a componente espiritual. No entanto. com a coluna do amor reduzida a zero.15. com outras pessoas esse mesmo casal é capaz das mais efusivas manifestações de amor. É decisão. Somente o amor humano possui esta componente espiritual. Só o homem ama porque quer amar e quando quer amar. Não fora isto. Entre ambos não se observa mais nenhuma manifestação de cordialidade. das flutuações no dinamismo do amor. Ele queria amá-la. não deixarei de amá-lo. e quer que todo casal cultive a consciência. que só o parceiro portador de consciência merece confiança. é traição. Outro foi um casal que vem atravessando uma terrível crise financeira." O que está salvando esses dois casais? Querer amar. Na mulher o termômetro sensorial do amor caíra muito. mais uma vez. a amar. comerciante. Eu já decidi que. Tornou-se áspero. desta decisão”. é o grande trunfo para sustentar o leme na travessia. Ele decidira amar a mulher e salvar aquele amor. seco. reconhecemos que Deus não deixou o homem e a mulher sozinhos. é a sentinela do amor. chato. Muitos fracassam porque julgam que no amor humano só existe o sentir amor. porque seria impotente para querer amar. a consciência continua vigilante. foi à falência. Nessa maré de altos e baixos. entregues ao perigo do fracasso no amor. preserva a compreensão bilateral. Deus sabia que a consciência salva a ajuda mútua.Alguns casais fracassam no amor precisamente por ignorarem esta psicologia do amor humano. que defende da inconstância. ele. E julgam que quando deixam de sentir amor. o decidir amar. E voltou. Demonstrou. Dentre eles. rude. A inconstância é infidelidade. E por isso deu uma consciência a todo homem e a toda mulher. correspondente ao minguante da lua. Há poucos meses. ASCESE E HARMONIA CONJUGAL . e diz: Não! É preciso continuar a compreender. verificava (em face das reações negativas dela) que a componente sensitiva do amor diminuía. Passou a não ser o mesmo homem. taciturno. Meditando nesta possibilidade. impulsionado pela consciência de que é isto que todo coração verdadeiramente humano tem a fazer. mantinha-se. E o amor entrou nessa etapa de dinamismo negativo. advogado + arquiteta. mas a componente volitiva aumentava. de amar. Não! Pode estar apenas anestesiado pelas circunstâncias. mesmo não sentindo vontade. E a consciência. Porque quando o coração está cansado de compreender. Esse amor podia voltar a florescer. no Rio. grosseiro. Deus sabia que a consciência pode salvar o amor. a ajudar. haja o que houver. dois foram salvos da derrota pela consciência. O simples conhecimento da psicologia. que a consciência garante a perseverança no amor. e por lhes faltar uma consciência suficientemente sólida para levá-los a agir de acordo com ela. descobriu que a mulher se iniciara no uso de tóxicos. sobretudo a consciência oriunda de Deus. de ajudar. específica do amor humano. E a consciência. "Eu quero amar meu marido. pessimista. Mas a componente espiritual. morreu o amor. Irritado. facilmente. decidir amar. não levaria a reverdejar o amor. e não o querer amar. “Eu quero amar minha mulher e não vou abrir mão. À proporção que lutava por libertá-la. Um deles. tive de ajudar vários casais. injusto. sem uma consciência eficaz para acionar a decisão de amar. porque era um objetivo procurado pela filosofia grega. mas de um realista reconhecimento das imensas possibilidades de uma pedagogia corporal e espiritual para o homem. É tarefa da ascese buscar e conseguir a afinação. mas integrativo de todo o meu arsenal energético ao nível do amor (iluminado pela Fé. então. Esse esforço faz-se em todos os níveis da vida. ou com motivação bi-focal: antropológica e teológica. pessoal ou conjugal. Somos espíritos carnais. Daí a necessidade de fatores biológicos para colhermos frutos espirituais. no caso do par cristão). Nenhum ideal humano. a vontade. toda ascese nada mais é do que uma pedagogia apenas antropologicamente motivada. Essa integração harmonizante é necessária porque na verdade existem sons desafinados emitidos pela orquestra de nossas faculdades* pessoais. Numa palavra: o espírito. Muito antes de Freud. como a visão ascética da autodisciplina (esforço de harmonia plenificante entre todas as forças existentes no meu eu e no eu do parceiro). Não visa apenas às manifestações sensoriais (a vida dos cinco sentidos). Recusa-se o dualismo platônico. forças que o . Como entender. nem de uma errônea aversão maniquéia. como o enfoque corpo-e-alma. Paulo de Tarso notara a presença de forças conflitantes.André Maurois confessou que "um casamento feliz é uma longa conversa que sempre nos parece curta demais". ao contrário da de Maurois. a casa vira mercado. a ascese? Como? Ascese é o esforço de harmonia interior e exterior. a conversa curta parece longa. Nesse sentido a ascese não é tanto um estilo frenador. na Bíblia encontramos tanto o enfoque unitário do "homem". Mas só se chega a essa conclusão quando se tem um parceiro autodisciplinado e quando se é auto-disciplinado. Enxergar os conflitos criados pelo corpo para a alma humana. como ideal pagão. Depois de ter metido o vestido e posto o véu. eis aí uma magistral sabedoria natural. O Evangelho nos dá não somente uma visão metanoica da autodisciplina (esforço de conversão humana. que serve de suporte para a edificação da comunidade conjugal. É que há sobejas razões pedagógicas e teológicas para não nos enterrarmos numa posição excludente. vira-se a noiva para a mãe: — Estou pronta para o casamento. o amplexo das harmonias. mamãe? Pronta! Só porque estava vestida de noiva? Se não levasse dentro da pele uma boa experiência de ascese pessoal. em nome da unidade bíblica. nenhum. não preparada. Ora. Aliás. Desde o biológico até o espiritual. pois sem auto-disciplina a vida conjugal descamba para a balbúrdia. a inteligência. Mas. incontestavelmente lúcida. Há quem critique o esforço ascético em busca da harmonia pessoal. corpo-e-alma do homem. Não se trata de uma visão pejorativa do corpo. animado pela graça divina). funciona no vazio. mas também a afetividade. na verdade. sem ascese é impossível autodisciplina. e com razão. o casal termina descasado. estaria simplesmente vestida para o casamento. Satisfazer indistintamente as aspirações do homem é destruir o que se pretende construir. é a moral do amor. qualquer casal já terá recolhido um magote de fatos comprovantes desta verdade lembrada por Gilbert Cesbron: "Em toda parte se consegue introduzir uma desordem. sem ascese nenhuma promessa do coração humano merece ser levada a sério. Experiência também nossa. Quantas vezes! A grande literatura e a Bíblia mostram as paixões dilacerantes da natureza humana. Dentro do homem e da mulher existem tendências contraditórias. e veja se ficará um pingo de salada de fruta para o parceiro. físsurado. E por isso treina. tornando efetivo aquilo que é simplesmente afetivo. É este projeto colossal que todo parceiro promete ao outro quando toma Cristo por testemunha e colaborador. Sem ascese o ser humano não descobre a beleza da verdadeira liberdade. . Que tenha apenas este fim. de cada um de nós. Amor que não quer recuar diante de nenhum esforço. porque se torna freqüentemente intraguiado (e teleguiado) por forças sub-humanas ou desumanas.18). a ascese cristã é toda tentativa realista para disciplinar essas forças existentes dentro do homem. Ou seja. Diz ele: "Todo ato de renúncia tem apenas um fim: a escalada para outro nível". Por isso o homem não pode abandonar-se às suas próprias forças". Acontece que estamos unidos no amor e estamos unidos no pecado. porque não escapa ao egoísmo. a constatar a realidade de um eu dividido. é atolar-se num "humanismo egoísta". No casamento a ascese não apenas sustenta a escalada de um parceiro para um nível mais alto. Podar-se para florir O amor não cresce automaticamente. como por qualquer bom observador. Além disso. antes de ser a moral do esforço. qualquer força pode virar a mesa. A ascese é indispensável para que o eu do homem e da mulher se torne cosmo.empurravam a fazer o que não queria e a deixar de fazer o que pretendia (Rom 7. Henry Miller formulou uma das muitas justificativas para qualquer medida de ascese. não resta a menor dúvida. Por isso é indispensável o esforço ascético. Somente a ascese abre um crédito sólido ao amor. tanto de Wilson como de Neusa. meus caros. qualquer humanismo que barre a ascese não é cristão. constatadas por grandes filósofos. Sobretudo o amor diariamente articulado a um outro. simultaneamente. até atingir o nível do amor de Deus — ainda que se saiba impossível — esse ideal deve ser procurado na humilde ousadia. por notáveis romancistas. Porém. por eminentes psicólogos. Quantas vezes sentimos em nosso íntimo essas duas hidras em luta: vontade de serenar e vontade de vesuviar. Como o treino capacita o ser humano a agir planejadamente. O egoísmo é a fonte psicológica do pecado. Aqui vemos como a ascese cristã. e veja se o outro vai suportar por muito tempo a cafua do ciúme. Nesse sentido. a ascese pode ser definida como a disciplina para a liberdade. Em todo compartimento humano. não é verdade. Mas que este fim é rigorosamente exato e engloba uma multidão de bons efeitos. para que o pecado não comprometa o amor. não caos. livrando-nos do egoísmo. incoerentes. Deixe seu apetite solto. Deixe a imaginação entregue a seus próprios vôos. Falando a propósito de Rimbaud. Depois de um ano de vida em comum. E quando sabemos que há um amor — o amor do casal cristão — que deve crescer continuamente. para usar a feliz expressão de Paulo VI. do cerne. Olhando o Cristo crucificado e ressuscitado. O amor a Cristo evita. Assim a ascese permite que o saber de cada um se transforme em ser. não dos dois. uma. Olha a cruz na parede. Quem casa nunca está terminado. Ora. um sorriso desabrochado naquele encontro. que a disciplina ascética seja imposta. E sabe que a ascese completa na carne dele o que falta ali. E a ascese é um dos recursos de poda para essa florescência fecunda. Não. podemos perdurar amando na alegria de uma ascese que faz bater as asas em vôos de ressurreição.. onde estivera o Cristo ressuscitado. em ossos. ao gesto cuja intenção é não deixar o amor pifar. como o jóquei impõe a rédea ao cavalo. não se impõe a ninguém um sacrifício naquela tarde. Por isso é que. coisas úteis. o amor a esse Alguém em quem descobrimos a Resposta maiúscula para nossas interrogações profundas. por amor. Sempre. em carne. já encontro um sentido para o meu cansaço". e outras dentaduras. um homem e sua mulher descobriram que a ascese cristã tem por finalidade. Esse Alguém é . No clima criado por este amor e nas graças concedidas por este amor. Nunca serão coisa de dentro. Podem exclamar o desabafo de um amigo depois de ter descoberto a motivação cristã da ascese: "Agora. para que o por amor nunca falte ao gesto de ascese. Descobriram como a ascese abre caminho para o sacramento do matrimônio se infiltrar no nós conjugal através do duplo eu pessoal. Um segredo Um dos segredos de sustentar a alegria na ascese é o amor à pessoa de Cristo. um filme trocado naquele domingo. deve ser fruto de uma escolha consciente. um silêncio naquela noite.como tenta tornar do outro esse privilégio. ainda quando pareça ter sido? É vigiando para que não falte aquele amor por Quem jamais possamos ter alguma queixa de amor. outra. intransformável em sangue. não estaremos concluídos. um passeio supresso naquele feriado. Nunca deixam de ser peças coladas ao cavalo e ao cliente. um sorvete abandonado naquela manhã. porque se casa em plena peregrinação. Pois toda atitude ascética é uma busca de amor. um perdão manifesto naquele diálogo. a partir de dentro e de antes. Enquanto formos peregrinos. às vezes. e sim por terminarse. de um coração. o único capaz de identificar qualquer amor sincero com a vida eterna. radical (proveniente das raízes do ser). tornando-o capaz de oferecer ressonância à santidade operativa dos dons de Deus em nós. Esse amor pela cruz quotidiana é uma opção. de um espírito. fazendo com que ambos se tornem autênticos. A dentadura e a rédea são algo externo. Ambas. querida.. Só por meio da ascese ele e ela podem ser o que sabem. aceitas. Nenhum dos dois deve dar-se por terminado. tanto a rédea como a dentadura. endógena. para o amor. Este é um segredo do casal ambicioso de florir. Deve ser uma decisão brotada do núcleo. como seu fígado é de você. nunca serão do cavalo ou do paciente. medular. burocrático. Como fazer. Descobriram que a ascese é o modo de cooperarmos destocando o terreno para que Deus germine semeaduras. Ainda quando a poda é efetuada em ramos só de um. é que consiste o crescimento conjugal harmonioso. Não pode ser reduzido a um gesto mecânico. deliberadamente. em vida própria. mesmo dolorindo. Descobriram a necessidade da ascese para que a vida conjugal se transfigure em vida divinizada. a ascese sempre perfuma o amor. porém. ou como o dentista impõe a dentadura ao paciente. quando chego em casa. pessoais e conjugais. permanecendo externo. à força. entregar o espírito humano à ação do Espírito divino. Nesse paralelismo valorizante. mas postiças. preferida. além de tantas. por saber indispensável para inspirar firme adesão aos imperativos do amor. uma recalcada. De dentro para fora. um real amigo —jamais um recalcado. para conhecê-lo cada vez melhor? para meter a mão nas chagas dele. mas virtuoso. e mais conhecemos de fato. em seus pés. das "chagas". ressuscitou e continua vivo. da lança em seu peito. porque queria que descobríssemos o valor transfigurante da ascese. não parecerá aos homens que jejuas. porque nos leva do conhecimento ao amor. do nosso casamento. glorificado e chagado. e como prova de que nele só havia amor. Cristo podia ter restaurado anatomicamente as chagas dos cravos em suas mãos. para manifestar aos homens que jejuam. E como o amor. o amor de quem quer amar sem medida. abriu os braços na cruz. tende a realizar-se. descortinamos a dimensão luminosa da renúncia. quando podia ter permanecido indiferente. neste caso o amor levará a realizar o que o amado ama. Quem disse que não pode? Esses FF (fatalistas por fraqueza) já contemplaram suficientemente as chagas glorificadas de Jesus Cristo? Já procuraram conhecer na intimidade tudo quanto se relaciona com ele. Eis por que junto de Cristo. mais queremos conhecer. por cada um de nós. "Tome. e isto é a melhor garantia de floração frutuosa para nossas podas conjugais. contemplando o Cristo glorificado com as chagas. à nossa disposição. da cruz. e assim qualificar-nos como "bemaventurados" por crermos sem ver? É assim que se estabelece o círculo.Aquele que desafiou os adversários a encontrarem pecado nele. Quando jejuares.27). Essa é a ascese condutora até à plenitude do amor. Chagado e glorificado. não posso mudar". do esforço. A não recuar diante das dificuldades do amor. armados com a couraça da Fé. do esforço. o Evangelho escrito pelas testemunhas oculares do Cristo glorificado e chagado. como restaurou os outros ferimentos. não tomeis um ar triste como os hipócritas. vivo e glorificado. Quanto mais amamos. por natureza. Não será dentadura nem rédea. Nenhum terá mais direito de dizer. Sem cessar. perfuma tua cabeça e lava teu rosto. "Quando jejuardes. um autêntico amante. Quanto mais conhecemos. os quatro Evangelhos? Já meditaram. Cristo está tapando a boca de tantos fatalistas da fraqueza. por Alguém que descobrimos que nos amou desmedidamente. mas somente a teu Pai que está . "crendo sem ter visto". que mostram um semblante abatido. dos cravos. tudo quanto diz respeito à garantia do nosso amor. Essa é a ascese que fabricará. Mateus e João? Quantas reflexões já entabulamos sobre ele? Quantas conversas já mantivemos acerca dele? Quantos abastecimentos já fizemos. É Cristo quem pede alegria na ascese. não vicioso. com carne e sangue e amor. um genuíno parceiro. e não a uma inconsciente frustração. o que ele pede. Na luz da alegria Creio ter usado pouco antes o advérbio alegremente. ou seja. o que ele aprecia. E para mostrar que esse amor continua a existir nele. Relativo a quê? Relativo à vivência ascética. pelo menos. mas acreditando no testemunho honesto dos que viram. Só assim podíamos olhar o amor que ele fez questão de nos mostrar. mais amamos. por exemplo: "Eu sou agressivo. introduz aqui teus dedos" (Jo 20. ou seja. Isto só podíamos enxergar. Para a impressionante estabilidade do amor entre um cristão e uma cristã. Aqui começará então a ascese cristã autêntica. Porque o dínamo oculto dos gestos laboriosos dessa vida é o amor. e do amor ao conhecimento. Mas conservou-as. da nossa transfiguração como pessoas e como casal? Não sabem que não se ama aquilo que não se conhece? Quantos livros já leram sobre Jesus Cristo? Quantos artigos? Já conhecem na intimidade os relatos fundamentais sobre ele. assim. Em verdade eu vos digo: já receberam sua recompensa. porque os pensamentos sobre Deus em Cristo são sempre pensamentos do coração. por nos sentirmos. Razão de alegria. acompanhados por ele no terrestre peregrinar. à conversão pessoal. eu os levarei comigo até o jardim da Ressurreição. segundo a vontade do Pai. Há ou não há razão para Cristo pedir: alegrem-se no esforço. sujeitos e objetos de uma páscoa real. nessa experiência absolutamente única na face deste mundo. por nos sentirmos. operando progressivamente a passagem para uma vida matrimonial melhor. Razão de alegria. Francisco de Assis formulou de modo rigorosamente correto a páscoalização de toda renúncia crista: "é dando que se recebe". de sintonizar essas mesmas forças com o sacramento do amor humano. levados e elevados à mudança de mentalidade. Veja. há sempre razão ou razões de alegria. descoisificados. Por isso ele não dispensa a alegria do espírito. abrangendo corpo e espírito. atingindo em cheio o parceiro e os filhos. Porque ao pé do altar. Ao redor do altar Na ascese o amor conjugal cresce sentado à sombra da liturgia. pela ascese. em permanente processo de maturação. progressivamente qualificados para digerir os abacaxis inevitáveis da vida conjugal. Sustentar a alegria interior expressa externamente é uma forma de ascese total — espiritual e corporal. Mas o estado de espírito com que nos exercitamos asceticamente é importante. Esses dois tempos são o advento e a quaresma. assim qualquer "morte" de qualquer cristão fiel a Cristo torna-se inseparável da "ressurreição".16-18). tão sincera e tão difusiva. Este fato comunica dignidade ao nosso relacionamento conjugal. pela ascese. na unidade do homem. agentes de uma vida a dois plena de sentido. pela ascese. a morte e ressurreição de Cristo são inseparáveis. interior e exterior. Razão de alegria. a ponto de transparecer na face. por nos sentirmos. introduzidos no mais eficaz caminho de metanóia. com o ideal da vida conjugal. Cristo está interessado em que jejuemos. por nos sentirmos. Razão de alegria. te recompensará" (Mt 6. maquilem o rosto nas renúncias. pela ascese. se nos aproximarmos. e teu Pai. pela ascese. no próprio corpo. com a vocação do casamento. faixa vinculada ao restante da vida. por nos sentirmos. qualquer casal cristão tem oportunidade de ordenar as forças desordenadas da natureza humana. a nosso alcance. Razão de alegria. Aqui está uma das esperanças fundamentais de nossas opções ascéticas no dia-a-dia do nosso casamento. no rosto. diferenciados das coisas. perfumem os cabelos quando escolherem passar por perto do Calvário? Porque se acontecer subirem até a Cruz. . ligados ao Pai celeste. por nos sentirmos. Mas isto acontecerá da melhor maneira. por nos sentirmos. libertos da mediocridade auto-destrutiva e da incoerência heterodestrutiva. pela ascese. atingindo o núcleo do eu. A liturgia torna presente. pela ascese. por nos sentirmos. por nos sentirmos. E ainda que renunciemos a algum prazer. o mistério pascal de Cristo. do altar onde participamos das manifestações litúrgicas de Cristo. pela ascese. Razão de alegria. garantia de perenidade de qualquer amor. como pessoas e como casal. Como. em que pratiquemos as várias formas válidas de disciplina corporal. Aí. preparando-nos para o encontro definitivo. todo casal pode desfrutar da companhia litúrgica do mesmo Cristo chagado-glorificado.presente no oculto. Razão de alegria. É pelo amoroso poder de Cristo que todo esforço ascético participa desse mistério transfigurativo. pela ascese. à transformação do comportamento. Razão de alegria. que vê no lugar oculto. transbordando na periferia dos gestos. Há dois tempos litúrgicos especialmente reservados para tal trabalho. simultaneamente vacinados contra obsessões neuróticas e contra aversões maniqueístas. ou seja. Razão de alegria. tão profunda. pelo mistério pascal. Com esse realismo ele ensina que domando a gula do estômago podemos amansar a fúria do coração. não é construtiva. inúmeros casais sentem crescer as alegrias da vida sexual (não apenas o prazer) quando chega a páscoa. Teve a idéia de aproveitar uma quaresma "para fazer um jejum de televisão". sempre que desejarem. Sabem que. por experiência pessoal e alheia. Tanto é assim. Claro que a vida é inabarcavel por qualquer chave. ou vai voltar pela ascese. É uma praxe altamente fecunda. instalada pelo pecado. São períodos tanto mais abençoados para nosso amor conjugal. Haverá infinitas variantes que encheriam volumes. Ascese no território do corpo: Uma ou outra vez. cujo fraco da esposa era novela. comer o que não gosto. já que foram criadas pelo próprio Deus.Insisto. pela ascese generosa. que a Igreja prescreve. É tempo em que o amor vai crescer na ascese. a Liturgia pede que não nos privemos dos benefícios deles durante os dois tempos fortes de ascese cristã. Assim. Se a Psicologia recomenda ao menos um esforço cada dia. por exemplo. Privar-me do que aprecio. Deixo aqui algumas sugestões práticas. Tênue maquete da ressurreição definitiva. a ascese livremente procurada robustece o espírito para avançar com as inevitáveis. pelo simples fato de custar". E como é maravilhoso ver casais que. compromete fundamentalmente tudo quanto de bom vocês dois esperam como marido e mulher. Foi genial recurso para dar asas ao amor. quanto mais nos abrimos para o abraço das renúncias generosas. querendo evitar qualquer equívoco: não se trata de destruir nenhuma força de nossa natureza. Não esqueçam: é tempo de alegria. se quiséssemos registrá-las sem omissões. como pela ascese do espírito. É neste sentido que o eminente psicólogo William James aconselhava "fazer todos os dias algo que nos custe. duas celebrações nas quais o sacerdote se apresenta com vestes cor-de-rosa! Para que os casais participantes se sintam penetrados também através dos olhos. além das renúncias inevitáveis que abraçam. Como aquele casal. submetendo os dois a uma espécie de divórcio noturno. mas nunca de tristeza. na metade do advento e na metade da quaresma. depois de terem livremente renunciado a ela durante a quaresma. Optar tanto pela ascese do corpo. ampliam o buquê com outras que espontaneamente acrescentam. e não praticou um tipo apenas. Nosso Modelo enfrentou voluntariamente o deserto da ascese. Da lista abaixo cada um de vocês pode escolher um ou outro alvitre. Como uma corrente não possui senão a força de seu elo mais fraco. Durante o advento e durante a quaresma todo casal cristão impregnado do espírito litúrgico leva para o altar a bagagem de empenhos ascéticos realizados de segunda a sábado. Beber água somente nas . associando ao ofertório do pão e do vinho os cravos e espinhos da semana. Apenas a desarmonia. São tempos de penitência. das penitências magnânimas. pois todas as nossas forças são boas. devemos aproveitar os tempos litúrgicos penitenciais para fortalecer o elo mais fraco. Sugestões práticas Devemos abranger em nossa práxis ascética as fronteiras abarcadas pela unidade do todo humano. com o convite inicial dirigido a todos: “Ale-grai-vos no Senhor”. Telefonar aos humildes. E não recuar. Garrotear a soberba. Além disso. ir ajudar a mulher a lavar a louça. Aumentar a leitura de formação. à rebeldia à penitência.) Levantar da cama pontualmente. (Na cruz Jesus passou sem cigarro. Não propalar aquela novidade.. Recordar os pecados passados. E não há melhor tônico para você superar os desafios do amor. U. ser pouco homem.) Sorrir para conhecidos antipáticos. Ajudar os outros em trabalhos físicos.) Doar aquela esmola. a esperança de que a ressurreição do Cristo é sua herança também. se a gripe está a ameaçá-la. a última palavra em assuntos que me dizem respeito. perder propositalmente a discussão. mesmo havendo dor (que é diferente de tristeza). Trocá-la por quem precisa de atenção. as experiências do Prof. por falta de uma espiritualidade . esta é a regra inspiradora na encruzilhada do Calvário: preferir sempre o mais difícil ao mais fácil. o materialismo que está transformando este século no século dos estofados.refeições. porque seu espírito está cheio de esperança. Ceder o lugar melhor na reunião. Evitar pratos sofisticados. (Renunciando a comprar tantas coisas supérfluas e mesmo algumas necessárias mas não indispensáveis. advogados. (A propósito: homem que julga comprometer sua masculinidade por tão pouco — lavando ou enxugando louça — está demonstrando ter pouca masculinidade. Orar um pouco mais naquela noite. o ar refrigerado. Dizer "não" à inflação. (Depois da TV a leitura virou opção ascética. Desligar de vez em quando o ventilador. e outros profissionais que liam à noite. Usar aquela roupa bem simples. ou lavar por ela. Ordenar posição de "sentido!" à susceptibilidade ferida. por causa da TV. lembrando o amor de Deus para comigo. Banir a ostentação naquele aniversário. Quando preferir ficar lendo o jornal. Você enfrenta com alegria (que é diferente de prazer). Hoje pode ser melhor A vida tem sido terrivelmente irônica com o materialismo. Rezar pelos inimigos. Na quarta-feira meu telefone vai "pifar". Como evitar esse mal sem ascese?) Enfrentar doenças sem reclamar (minhas e dos meus). Diminuir os telefonemas.) Etc. receando ser taxado de masoquista. Ouvir um pouco mais de música erudita. o menos agradável ao mais agradável. não estão mais lendo. O masoquista gosta de sofrer. Ascese no território do espírito: Privar-me da companhia agradável. mesmo que não deseje. Domingo pela manhã passar pelo hospital em visita a doentes esquecidos dos parentes. Médicos. Não gritar com os meninos. etc. Simplificar o cardápio. "quais são as últimas?" e outras semelhantes. Retirar a almofada da cadeira. Cancelar as indagações: "o que há de novo?". Etc. uma vez ou outra. Deixar ao companheiro. Refrear a curiosidade indiscreta. Você não gosta. Perder aquele filme. A. Evitar merendas dispendiosas. da Universidade de Shefield. Uma vez ou outra. concluíram que as mulheres que fumam durante a gravidez dão à luz filhos menores. Pois não encerra uma amarga lição o fato de que o século dos estofados seja o século do recorde de casamentos estourados? Em grande parte devido à aversão à renúncia. Dormir um pouco menos (se durmo bem). etc. Querendo fazer uma opção ascética. Suprimir revistas levianas. Não me queixar do calor. E. Existe até uma pesquisa realizada no Rio sobre o assunto. dizendo "sim" à ascese. Charles Russel. Seu destino. Renunciar a seis cigarros na sexta-feira. "quais são as novidades?". (Qualquer que seja a opinião de alguns assistentes sociais. Privar-me da praia naquela manhã. aberta à ascese. Embora não seja fácil. já sabemos por que é indispensável. Como somos hoje condicionados a tornar-nos comodistas. precisamos descobrir um lugar — pequeno que seja — para a ascese em nossa ética do conforto. . em si. E mais uma vez São Paulo dedilha insistente a mesma tecla: "Alegrai-vos sempre no Senhor" (Fp 4. A alegria de um fato inesperado (chegada do viajante. Porque a alegria é do espírito e nem todo prazer é do espírito. teria adjetivado no superlativo. existe a alegria decorrente do lazer. ou fósforo aceso pelas circunstâncias. Os . Se falasse da ressurreição. Nasceu-vos o Salvador" (Lc 2. porém. Deus não seria virtude. Sublinhando a observação com um trocadilho: Um cristão triste é um traste. Há prazeres do espírito. pode exprimir fé e amor. sem aludir à ressurreição.12). É virtude toda alegria que nasce de Deus.10). Assim se distingue da alegria meramente psicológica. E muitos. põe na saudação angélica aos pastores este ramo de oliveira baloiçante: "Anuncio-vos uma grande alegria. A alegria de uma calamidade terminada (epidemia). Essa alegria também pode ser virtude cristã. prazeres psicossomáticos. indubitavelmente.22). sim Se não houvesse virtude na felicidade (em todas as suas manifestações).EUTRAPELIA E RESPIRAÇÃO CONJUGAL A alegria pertence à mensagem cristã. complementava Nietzsche: "Um cristão triste é um triste cristão". Alegria no lazer Dentre todas. O Salmista insiste que nos alegremos no Senhor (Sl 97." E São Francisco de Sales. Quando o Evangelho anuncia o nascimento de Cristo. constatando a falta de alegria em tantos corações que se proclamam crentes. Na carta aos gálatas (5. A alegria de um sacrifício consumado (Alceu Amoroso Lima chorando de dor e alegria na consagração monástica da filha). muitos outros. Há. Nietzsche se escandalizava com os cristãos que não eram alegres. Grande alegria. Noticiava o nascimento. muitos motivos de nos alegrarmos no Senhor. segundo dizem.4). Virtude. oriunda da diversão. São Paulo mostra a alegria como um dos frutos do Espírito Santo. É certo que todo prazer. e se comporta como órfão. parecendo abandonado. ao sistema nervoso e ao psiquismo. associada ao prazer. não traz necessariamente alegria. Daí Santo Honorato lembrar aos esquecidos: "Quem é virtuoso não deve estar triste". "Não parece que Cristo ressuscitou. por exemplo). A alegria de uma vitória depois de uma luta (vestibular de um filho. pois é a infinita felicidade. simples qualidade do temperamento extrovertido. Por quê? Porque tem razões de sobra para ser alegre. A alegria de uma provocação suportada com dignidade (uma perseguição extinta). por exemplo). Mas há prazeres restritos aos sentidos. Daí também a concepção paga de virtude. muitas vezes. foi santificado por Cristo. A matéria é má e maléfica. deliciando-se com as flores. A eutrapelia é uma virtude pouco conhecida. por serem dotados de sentidos. com os lírios ("nem Salomão se vestia como eles").animais podem sentir esse tipo de prazer psicossomático. Há alguns anos confirmei esta conclusão indagando quem incluía a eutrapelia como ponto do exame de consciência no início da missa. Tanto o que desagrada. "É meu Pai que cuida delas. o maniqueísmo continuou a fazer mal aos cristãos.26). mesmo entre cristãos eruditos. e a matéria — para os maniqueístas — origina-se do mal. mesmo o prazer proveniente da matéria pode ser matéria-prima de virtude. nem sentem alegria. juntamente com sua prole (jansenistas.14. na peregrinação terrestre de Cristo. que proporciona esse prazer" (6. Para os maniqueístas o prazer psicossomático jamais pode ser objeto de virtude. provém da matéria. relacionar-se com a virtude. gerando a alegria. Cada vez que a alegria decorre do lazer procurado segundo o espírito de Cristo. Devido à velha catalise maniqueísta. E vibrava eutrapelicamente. Entretanto. . Virtude é aquilo que. quer por atos. Ora. Não só o prazer espiritual pode inundar o espírito. ainda depois de ter sido condenado. Sentia um prazer imenso. "Virtude é tudo aquilo que custa. o lazer é o vasto mundo do prazer. quer por palavras. como o que agrada. Ninguém. Mas não sentem prazer espiritual. pois a virtude é possibilidade do espírito. inacessível aos seres sem chance espiritual." Nem sempre! Pode ser e pode não ser. angelistas. Vê-se que a vivência do prazer pode tornar-se virtude. E o Filho de Deus "se fez carne". Satanizada. A alegria é um dinamismo rigorosamente espiritual. quietistas). O maniqueísmo foi condenado como heresia. matéria. porque não deixou de ter namorados na Igreja. por ser expressão de amor. mas o prazer psicossomático pode repercutir no espírito. nos campos de Nazaré.26). porque o prazer psicossomático é biológico. vetada ao animal. estamos perante a virtude cristã que a Teologia Moral denomina eutrapelia. Portanto. pietistas. Por isso é que o prazer psicossomático sem alegria é simplesmente uma experiência existencial. porque lhes falta o espírito. na praia de Tiberíades. Encantava-se com os pássaros: "Contemplai as aves do céu" (Mt 6. Temos comprovantes de que alegria e prazer apareceram juntos. A visível alegria de Deus Basta lembrar o prazer e a alegria que o Cristo sentia em contato com a natureza. Sabemos disto pela revelação bíblica: Jo 1. pois na verdade quem criou a matéria é o mesmo criador do espírito: Deus. tanto do prazer psicossomático como do prazer espiritual. sistema nervoso e psiquismo (em graus diversos de evolução). não necessariamente virtude. de alegria no prazer. menos o vestido. "Por que deixaste o melhor vinho para o fim?". Outra ocorrência eutrapélica na peregrinação de Jesus Cristo deu-se em Caná. Uma semana de festa! Convidavam à parentela. caso não fosse o melhor. E nós sabemos hoje como eram os festejos nupciais na Palestina daquele tempo. Porque Jesus Cristo sentia genuína alegria. hospedando-se em casa de parentes. E nelas ele se mostrava normal em suas reações biológicas. antes de entregar o vestido. Permaneceram até o fim da festa. conservas.. um beberrão" (Mt 11.) Traziam trigo. Um dia chegou mesmo a confessar quando insistiam para que almoçasse: "Tenho outra comida.32-34). Era praticamente o único elemento religioso do casamento israelita no tempo de Jesus. uma vela acesa. Ninguém chegava de mão vazia. O Evangelho está pontilhado de refeições de Jesus. azeitonas. e a futura cunhada dançava. precisando privar-se dele. e o Talmude afirma que as moças iam dançar nos parreirais. jamais opor resistência. Tanto que os fariseus deturpavam o comportamento dele: "É um glutão. e partiam todos para a casa que seria dos dois. exprimindo votos pela felicidade do casal. Naquela festa de casamento. sonhando dentro do vestido. iam direto ao quarto. Chegando à casa da noiva. queijo. Durante a meia dúzia de noites. cada uma. segurando as moças. Foi à falta de vinho que comoveu a mãe de Cristo. Nessa hora todos cantavam acompanhando a dança.19). Os parentes do noivo iam à casa dele. a ponto de. No dia seguinte à tardinha (dia do casamento). . Vinha gente de outras aldeias. associado à alegria de estar sempre fazendo o que o Pai queria. dançando. Ia acompanhada pelo pai e pelo cortejo de amigos. carne viva ou abatida. Calúnia. O noivo não vinha. todos tinham encontro marcado com esse tipo intenso de lazer. tão desarmado e tão fiel ao Pai.. de conhecidos. É fazer a vontade de meu Pai" (Jo 4.10). Atravessavam então uma semana de festas. pegavam o vestido embrulhado em fina toalha. O noivo a recebia na porta. Sabemos que Maria e Jesus não assistiram apenas ao casamento. O cortejo era acompanhado por cítaras e tambores. bebendo. para arranjarem marido. recreandose. é claro. até. tâmaras. presente do noivo. Mas não sozinha. a noiva ia para a casa do noivo. O vestido era trazido numa cerimônia encantadora. e uma irmã do noivo levava-o nos braços. os amigos já sabiam: dali mesmo ou de outras localidades. todo um supermercado da época. Os rapazes organizavam jogos. E assim permanecia no quarto. Por sinal. (No Médio Oriente há um provérbio tranqüilizante de anfitriões: "Mão vazia fede". vinho. os amigos e os amigos dos amigos. divertindo-se.Outras ocasiões em que flagramos o Cristo canonizando o prazer é na mesa. Aí é que os pais do rapaz e da moça pronunciavam sobre ambos uma bênção. Desfrutava aquele prazer perspectivado na vontade do Pai naquele momento. esperando o vestido. que a assistência repetia. nesse tipo de prazer. O prazer de Jesus à mesa era verdadeira virtude. Na primeira noite a noiva vestia todas as peças da toalete. concursos de destreza. perguntou o cerimoniário (Jo 2. cantando. foi essa a virtude que ele escolheu para inaugurar sua pública manifestação. Então a noiva recebia o presente e a festa prosseguia noite adentro. mas sempre disposto a renunciá-lo. pensando no constrangimento do casal. bailando. comendo. não resvalou nesse equívoco. ("Graças a Deus. vendo o próprio Deus divertindo-se e alegrando-se em Jesus Cristo. esse jovem que (a despeito da impressão contrária!) procurava imitar Jesus Cristo também na virtude da eutrapelia. em Jerusalém. E Jesus Cristo? Dar vinho como o primeiro presente aos homens. Este "casamento" é virtuoso. a vigilância. resposta de amor eutrapélico a esse pedido. alegrem-se por amor ao Deus que lhes concedeu uma grande alegria".. Sabia que a alegria daquele prazer. não apenas casados. José não aparece aqui. eles não têm mais vinho" (Jo 2. a humildade. indiferentes. foi-se essa festa. o prazer daquela alegria.") Mas ela. não teria proposto uma festa (e que festa!) para comemorar a volta do filho pródigo. mesmo boas. pois àquela altura tudo indica que já era viúva. Na festa de Caná a mãe de Cristo está mostrando a todos que não é uma puritana. Jesus Cristo não estaria dando a seus discípulos um tal exemplo. A corruptela popular estrepolia não preservou a dimensão cristológica da eutrapelia. repugnados com aquela alegria. como apareceu na festa da Páscoa. porque acham que divertir-se é pecado. Antes de morrer. Provavelmente um jansenista teria barrado o diálogo de Maria com Jesus. a perseverança. com aquela diversão. Mas São Luís de Gonzaga.. E é o que muito freqüentemente acontece. Henri Caffarei reduz a eutrapelia ao mero "bom humor". que teriam feito. A reação de ambos indica claramente que não ficaram isolados num canto. Acabada a cerimônia. O bom humor é clima interior para a eutrapelia. Porque sabia que estava numa vivência santificante. outro espírito. corresponde a mandar: "Brinquem. e vinho da melhor qualidade. E isso mostra a visão pejorativa que muitos tinham dessa virtude. a justiça.Uma maniqueísta teria ficado satisfeita. Nas horas de recreio sempre estava no recreio. A eutrapelia é uma virtude tão virtuosa quanto a paciência.3). em Belém. divirtam-se. A mãe de Jesus Cristo não procedeu como certos cristãos "do contra" com respeito a festas. e tem um nome: eutrapelia. saem logo. no instante do eutrapélico pedido: "Meu filho. esqueceram o testemunho eutrapélico de Jesus Cristo. Eutrapelia é diversão real. Está mostrando que encarava a recreação sadia. mostrando que dali em diante ninguém poderia taxar de pecado o lazer. As seis talhas de vinho. Se Jesus não adotasse este ponto de vista. Teve início naquela semana de festa a educação dos Apóstolos e da humanidade na virtude da eutrapelia. e tantas outras. Infelizmente muitos cristãos. são uma solene consagração do "casamento" entre a alegria e o lazer. não. além da solidariedade e da recreação. Se não tivesse faltado vinho. São Luís de Gonzaga foi o único que deu a resposta que Cristo daria: "Continuaria no recreio". Teriam simplesmente confirmado a necessidade da eutrapelia na peregrinação terrestre. Não. Nem seu divino Filho. já que ele não teria realizado nem o milagre nem o sermão? A resposta é óbvia. morreria fazendo a vontade de Deus. Se não fosse santificante. pois divertir-se era o que Deus queria vê-lo . do jansenismo. Não esqueçamos. a castidade. e santificante. Diversão e alegria misturam-se à Mãe e à divindade do Filho. era virtude. Mais: a eutrapelia pode trazer o bom humor desaparecido. mas não em Caná. Podia morrer ali. do angelismo. digna de qualquer pessoa. É outra mentalidade. E quando um colega perguntou ao grupo o que cada um faria se tivesse de morrer naquele recreio. até de uma viúva. Bem diferente do maniqueísmo. ele sempre aparece ao lado dela: em Nazaré. no Egito. Assim como prolongamos em nós os gestos do Cristo manso.31). paraninfando o prazer que o vinho traz. é também uma manifestação de fé. senão arrebenta. dolorosas ou gloriosas. nem o estrangeiro que se acha dentro de teus muros" (Ex 20. não farás trabalho algum. brincando todo o tempo diante dele. Vocês afinal resolveram se distrair! Ao que o marido respondeu: — — Claro. Eutrapelia conjugal Há algum tempo um casal virou-se para outro na minha presença: — Parabéns. sejam manifestações gozosas. que também eles estão convidados a se santificarem para glória de Deus. "No sétimo dia. que é um repouso em honra do Senhor. por que não prolongar os gestos do Cristo eutrapélico? Só por isto já vemos por que a eutrapelia faz-nos crescer espiritualmente. nem tua serva. e no entanto é admirável constatar a maneira eutrapélica como a Bíblia olha a própria criação divina.29-31).15). como ele A eutrapelia é uma face de nossa identificação com Cristo. É para nos santificarmos. "Dei-vos o exemplo para que como eu fiz. Cremos que a recreação. brincando sobre o globo de sua terra. A primeira razão de ser da eutrapelia é teológica. que nos divertimos. A recomendação é de São Paulo. divertiu-se. do Cristo casto. teu Deus. como que para "forçá-lo" à prática da eutrapelia. padre? É verdade. A eutrapelia. nem tu. Pois ninguém mais forte nem mais sábio do que Deus. nem o primeiro fundamento dela para um cristão. do Cristo justo. assim também vós façais" (Jo 13. inspirada pelo Espírito Santo. do Cristo generoso. junto a ele estava eu (a sabedoria) como criança. nem tua filha. Mas não é esta a primeira perspectiva pela qual devemos olhar a recreação. quer bebais ou façais qualquer outra coisa. nem teu servo. sim. portanto. Se Cristo vive em nós. deve também viver em nós o Cristo eutrapélico. E é a mesma sabedoria divina que prescreve ao homem o repouso semanal. a diversão podem dar-nos um pouco da santidade de Deus. achando minhas delícias junto aos filhos dos homens" (Pv 8. o Cristo que sabia participar de uma festa. do Cristo humilde. do Cristo asceta. . Cremos que Jesus Cristo é a expressão histórica da santidade de Deus. É uma faceta de nossa cristificação. não é mesmo. O ascetismo que dispensasse a prática da eutrapelia para as naturezas hercúleas seria falso ascetismo. Buscar a perfeição do Pai é imitar o Cristo em todas as manifestações de amor vistas nele. do Cristo lutador. "Quando (Deus) assentou os fundamentos da terra. fazei tudo para a glória de Deus" (1Co 10. A gente precisa relaxar os nervos. Nele. É uma solene prescrição do próprio Deus a seu Povo. porque Deus em Jesus Cristo se recreou. nem teu animal. visando inclusive os que gozam saúde de aço. do Cristo penitente. é moral. nem teu filho.10-11). "Quer comais.fazendo naquela hora. E voltando-se para mim: — De vez em quando uma higienezinha mental não faz mal a ninguém. Na praia. o equilíbrio que a eutrapelia proporciona à personalidade reforça a fundamentação bíblica e evangélica que a Escritura nos oferece. Sendo virtude. A eutrapelia protege contra a tristeza. A eutrapelia revigora a saúde psíquica. não ato isolado. a eutrapelia insufla oxigênio na personalidade. a definição . não ocasionalmente. na serra. A eutrapelia reflete em nós a felicidade de Deus. na sela do cavalo. Aí melhora a respiração do amor conjugal. para a autenticidade não se tornar violência. é partir da definição. devemos praticá-la periodicamente. na Suma Teológica. sem se prejudicar e sem prejudicar o outro (ou outros). em seus hábitos familiares. na pelada. Bastam estes lembretes para mostrar a asfixia rondando o casal que não inclui a eutrapelia em seus projetos conjugais. de uma recreação. Eutrapelia é a virtude reguladora das atitudes externas e internas quando alguém se diverte. A eutrapelia defende da neurastenia. Logo. (Quem desejar ver o que diz Santo Tomás de Aquino sobre a eutrapelia. que procure alcançar a santa alegria de seu coração por meio de todos os divertimentos que lhe forem possíveis". São Vicente de Paulo inseriu esta recomendação: "Procure viver contente entre os seus motivos de descontentamento. de tal modo a vontade dela andava atrelada na locomotiva da vontade de Deus. quando a recreação nos invade. no assento do carro. contudo. esta formulação: Eutrapelia é a virtude que consiste em divertir-se e contribuir para a diversão do outro (ou de outros). é hábito. Necessidade de definir Numa carta a Santa Luísa de Marillac.) Prefiro. os artigos 2. A eutrapelia combate o mau humor. além disso. 3 e 4 da questão 168 da 2ª Seção da 2ª Parte. Mas nós precisamos.. A destinatária dispensava do missivista qualquer discriminação acerca dos requisitos para um divertimento tornar-se eutrapélico. de um lazer. para a castidade não se tornar orgulho. Ordeno-lhe. procure. A eutrapelia consolida a saúde física. Assim como são necessárias condições para a humildade não se tornar complexo. E uma boa didática para detectarmos as con¬dições de eutrapelização de um divertimento.Embora não tenha preocupação psicológica direta. num aniversário. no campo.. A eutrapelia infiltra alegria até o íntimo de nosso espírito. pecado. é distrapelia. são ambos antibíblicos e antievangélicos. como o trabalho. ou descaridade. tempo para dançar e tempo para plantar" (Ec 3. é tão imoral como não ser paciente quando necessário.enumera as condições que evitam a eutrapelia de se tornar preguiça ou luxuria. Tanto minha alma e meu corpo. Não pode ser eutrapelia essa diversão. Qualquer que seja o prejuízo. que nos dá "tempo para falar e tempo para calar. Se estou ouvindo música a uma altura incompatível com a concentração do outro no estudo. A essa festa o Cristo de Caná não iria. Igualmente trocar o tempo de trabalho por tempo de lazer não é divertir-se segundo o tempo de Deus. por exemplo. dos outros. quando o organismo está precisando de sono. antes de tudo. como não trabalhar quando necessário. Ciladas distrapélicas Como toda virtude. poderia tornar-se ocasião próxima de pecado. Na festinha de aniversário do meu filho. como a alma e o corpo do outro. — Vigilância. Ficar numa festa até o amanhecer. 1 — Diversão que não me prejudique. o fim de semana termina sendo o fim da alegria humana. é distrapelia. Se nos descuidamos da vigilância recomendada pelo Cristo para toda forma de amor. não eutrapelia. a eutrapelia encontra obstáculos a combater ou driblar. E ainda que não levasse ao pecado. Na festa aproveito para usar e abusar do corpo alheio. A recreação eutrapélica é um dever de estado. não bebida de teor alcoólico incompatível com o controle seguro dos próprios atos. Prejudica o sujeito. pois o mapa da eutrapelia não se circunscreve ao lar.1-8). não se restringe à família. pois não se autocriou nem se autoconserva fora do nada). No dia do exame o outro entraria no crematório por minha culpa. pelo prejuízo causado a meu parceiro e ao terceiro (embora algumas vezes ele se oponha consciente ou inconscientemente à vontade de Deus.28). é distrapelia. Porque em Caná ele ofereceu vinho. É distrapelia. Ir jogar futebol carregando uma otite no ouvido. Não se recrear quando necessário. comprometendo o amor que Cristo nos pede em todas as ocasiões. com aqueles que podem ou querem comprometer nossa . ponho um copo de uísque na mão de cada adolescente. Prejuízo de saúde. como não guardar a castidade quando necessário. Tanto o prejuízo por excesso quanto o prejuízo por carência. Vários deles podem aparecer em casa ou fora de casa. sem direito. e culposa. Como pode ser virtude uma diversão que inicia um cortejo de tantos males? Concluindo: em todos os tipos de lazer vale a advertência de Jesus: "Temei antes o que pode fazer perecer na geena a alma e o corpo" (Mt 10. 2 — Diversão que não prejudique o outro (ou outros). não eutrapelia. . Porém com uma agressividade ausente no peru. A Intrusa. não esporte". nosso crescimento conjugal. aqueles que querem deliberadamente pecar. nem agarra a inflação. arrastando outros ao mesmo estilo nocivo de recreação. aprendemos mais esta lição: Para um casal ser bem sucedido na vida conjugal e familiar. sem se importarem se depois dali começa o desabamento. de cadeiras. muitas vezes sem se darem conta da tática. como garante o João Saldanha. Assim os casais se tornam dopados para denunciar o crematório nacional da família. eles não apreciam quem esteja ali interessado em crescer: em geral esses não gastam demais.). A baderna é incompatível com a eutrapelia (festas que terminam em quebra-quebra de garrafas. seja uma hora de baralho ou um passeio de carro. não basta amar. para fazer prosélitos. para anestesiar complexos. E assim ninguém segura este país. ou castrá-lo para todo tipo de reação humanizante. Esses não querem saber se a diversão é eutrapélica ou não. Um bom índice da população assídua às boates está dentro deste círculo. — Os indiferentes a Deus. para ficar com o caminho livre. antes de ser preciso usar o tanque. Divertir-nos de tal modo. seja um show ou um piquenique. Se "o que sustenta governo é tanque. é o esporte. ou sobre a falta dela. que ele nos identifique como discípulos seus. o lazer distrapélico é aquele no qual o Cristo de Caná não poderia permanecer. o que distrai o povo para calar ou aplaudir os erros do Governo. para multiplicar vítimas. à custa do nosso casamento. vibrando com o centésimo jogo da copa. 3 — Os insaciáveis por dinheiro. ao olhar-nos brincando. de copos. por isso. lembram-se de Evelyne. Impedem de olharmos muitas causas de nossos problemas e de levarmos nossa ajuda a irmãos açoitados pelas mesmas necessidades ou por outras. Entram e saem fazendo apenas o que querem. O pai tinha uma amante e não hesitou em envenenar aos poucos a esposa. Sabem que essa moça vivia atormentada por um problema familiar. Alguns chegam em casa como peru antes da morte. o que o amor de Deus pede. Só lhes preocupa uma coisa: faturar à nossa custa. CRIATIVIDADE VERBAL E COMUNICAÇÃO CONJUGAL Os que leram o livro de Henri Bordeaux. para despejar recalques. aqueles que buscam o prazer por fuga. esporte de janeiro a dezembro. dançando e batendo palmas. onde tantos casais continuam ligados na TV. filha do Prof. . impedindo uma verdadeira eutrapelia onde estivermos nos divertindo: os problematizados de todo tipo.santificação. é preciso ser eutrapélico. pulando. distrapélicas. no lar de vocês. para esquecer desajustamentos. resistindo ao intuito dos insaciáveis. Com Cristo. O excesso de futebol e o carnaval como está conduzido são as diversões mais corrosivas do casal brasileiro e dos candidatos a casal. de "cristãos". se comparecesse. Seja no clube ou na praia. soltando o egoísmo desenfreado. E em nosso país há uma cadeia de festas especialmente incrementadas para impedir o brasileiro de enxergar os erros do Governo. o maior amigo do homem e da mulher. mas também a alienação traz no bojo a mesma incompatibilidade. Aliás. . e. para não enxergar a desintegração dos filhos ou não lembrar os desencantos pessoais. de bancos. Lubert. do casamento e da juventude. Conversem agora sobre essa virtude. de gente. Enfim. para reduzir o povo à massa. e ele. sem conseguir. o rapaz. por não ter sido capaz de dar a palavra esperada. Sentindo-se envergonhada de revelar a situação do pai e o intuito dela. Como foi possível? Então ela estava sofrendo tanto? Como não percebi? Como fiquei cego? Ela estava querendo se matar e eu não enxerguei? Ela esperava que eu lhe arrancasse da mão o copo de veneno. Esse rapaz também não lhe disse a palavra exata. E o instinto fez com que Evelyne procurasse junto de quatro pessoas que lhe eram caras. Procurou depois o vigário de Saint Sévérin. nos gestos dela. Também esse não captou a solidão na voz de Evelyne. e sai aliviada. E chegou a esta conclusão: "Só uma grande desgraça será capaz de afastar meu pai dessa mulher. estimulada. colega do pai. o instinto de autoconservação debateu-se desesperado dentro dela. Esse Prof. nenhuma das quatro percebeu que Evelyne escondia a morte nos olhos. Lavenay até gracejou quando ela lhe declarou. como os outros. Ninguém nasceu para morrer. o doente. o Prof. certa vez. aturdida. .Isto tornou-se o suplício de Evelyne. restaurada. Quis ela a todo custo separar o pai da amante. cada um ficou impactado. Courtelain não lhe disse a palavra adequada. A primeira pessoa que ela procurou foi um velho amigo da família. e fui incapaz? Cada um deles passou a se acusar. O que opera essa transformação? O poder da palavra. de consumar o plano. o padre. Evelyne ingeriu o copo de veneno. Uma conhecida declarou-me certa vez: "Eu sei quando o Zeca" — o marido — "conversa com o senhor. Chega encurvada e sai vertical. Cada um se sentiu parcialmente responsável por aquele suicídio. o socorro salvador. Quando tiveram notícia do suicídio. Chega outro em casa". porém. também não deu a palavra que ela precisava. O professor. Lavenay. Depois de tudo. triste: "E eu que vinha me colocar sob tua proteção". Lembrou-se por fim de um hospitalizado que. O poder da palavra Quem tem experiência de aconselhamento percebe o efeito da palavra no espírito humano. e. Courtelain. E a grande desgraça é o meu suicídio". deprimida. não disse a palavra almejada. lhe oferecera uma laranjada. Procurou depois um rapaz. A pessoa chega abatida. palavra que lançasse um raio de luz naquela escuridão. Antes. depois de tentar inutilmente refugiar-se nessas quatro esperanças. Era natural que o inconsciente desejasse outra solução. na pressa de ir ver os velhos do Asilo. as repercussões da palavra no organismo humano. angina pectoris. Palavras de paz induzem atitudes de calma. Cannon. obtinham uma taxa de aglutinação relativa a bacilos do tifo incomparavelmente mais alta do que quando durante a tristeza. na Clínica Neurológica de Viena. taquicardía (batidas aceleradas do coração). chocantes. animadoras. a vivências tristes. sob a orientação do Dr. corajosos. desse modo. injustas. dosando de novo a adrenalina. etc. Palavras de confiança provocam reações estimulantes. homens e mulheres colocados sob a ação de palavras que exprimiam sentimentos diferentes manifestaram reações psicológicas diferentes. afinadas com a qualidade dos estímulos verbais. Mas não pararam aí as experiências com a palavra e o organismo. Esse tipo de pesquisa veio deixar clara a influência de palavras agressivas. que todos os métodos de psicoterapia utilizam a palavra. E um deles. e a influência benéfica de palavras positivas. confiantes. Alterações no endocrinismo e na química sangüínea. injustas. uma série de distúrbios orgânicos aparece. eutônicas. E com o aumento da adrenalina circulante na corrente sangüínea. para. a logoterapia. estimulantes. Em dado momento submetiam os pacientes a vivências prazerosas. alegres. Reações até no funcionamento das glândulas e do sistema neurovascular. Está. Palavras de carinho suscitam atitudes de bem-estar espiritual. submetendo a pessoa a hipertermia (calor corporal elevado). palavras geradoras de sentimentos negativos sobre a resistência do próprio organismo físico às infecções. além de perturbações cardíacas mais sérias. Palavras de ansiedade desencadeiam reações ansiosas. Depois da agressão verbal. Outro cientista — Grace — estudou a repercussão de palavras desdenhosas. médico pesquisador norte-americano. Sabem qual foi o resultado? Se o sangue era extraído durante os momentos de alegria. provado que palavras irritantes. Rhine. proferidas por pessoas antipatizadas pelos pacientes. distúrbios vasculares. sudorese. desencadeiam descarga de adrenalina na corrente sangüínea (devido à intensificação da atividade das glândulas supra-renais). odientas. enfarte.O poder da palavra no espírito humano é tal. chega a valer-se exclusivamente da palavra como instrumento de recuperação do ser humano. frias. deprimentes. . a resistência orgânica ao bacilo da febre tifóide torna-se bem menor que nos momentos alegres. o pesquisador austríaco Hoff e seus colaboradores. fizeram também experiências surpreendentes. confirmou e ampliou as conclusões de Bykov. deprimentes. Cannon retirava idêntica quantidade de sangue. rubor facial. Retirou o sangue de pacientes antes de serem submetidos a um bombardeio de palavras ferinas. e analisado. serenos. a depressão. grosseiras. Na Duke University. Resultado: a taxa de adrenalina aumentava muito com o bombardeio verbal enraivecedor. dosando a adrenalina. O cientista Bykov efetuou uma série de experiências para constatar os efeitos biológicos da palavra. portanto. pacíficos. nas tensões do sistema neuro-vegetativo. de sossego. encolerizantes. produzirem nelas uma espécie de "cristalização afetiva". caluniosas. Depois de Cannon. Quer dizer: nos momentos de depressão psicológica. Puseram em estado hipnótico algumas pessoas. de tranqüilidade. tais como derrame e paralisias de diversos graus e tipos. Noutra ocasião. Pois. a vascularização sangüínea e a inervação vegetativa puderam ser flagradas até a olho nu. em condições satisfatórias. quando o paciente ouve palavras que o magoam. As conclusões de Rhine. Poderosa. Mons. pelo que pode desencadear.As experiências de Grace são tão completas. E repetiu a pergunta. Quando as palavras passam a ser agradáveis. Grace constatou que os vasos sangüíneos se dilatam de tal modo. túrgidas. reforçam-se. Se se insiste com o bombardeio de palavras hostis. nobre. que o ofendem. palavras de amor. Tanto que a conclusão de Grace foi esta: "uma palavra pode produzir profundas mudanças no organismo inteiro". A palavra é bela porque enfeita. afinam. por exemplo. que o ultrajam. Porque foi com a palavra que vocês prometeram viver o amor como Deus quer. enriquece. Ambivalência da palavra A palavra é uma realidade poderosa e bela. Nela a palavra também foi essencial. seja ele masculino ou feminino. somam-se. a ponto de as paredes intestinais tornarem-se hiperemiadas (mais carregadas de sangue). Fenômenos semelhantes foram observados em outras áreas do organismo. mostrando a prodigiosa influência da palavra no ser humano inteiro. na evolução cósmica. Isto porque o nosso organismo foi estruturado de tal modo que não pode deixar de reagir à palavra. Bela. Bykov. Com a palavra o sacerdote perguntou: — Marcos. inclusive na área genital. sinal de que o sangue passou a circular fisiologicamente. Hoff e Grace concordam. no Rio. dignifica tudo quanto o homem faz. Cannon. Poderosa e bela. no sistema útero-ovariano. devido ao sistema nervoso regulado e regulando. — as alças intestinais voltam à coloração normal. Lira imaginou não ter sido claro. Lira perguntou à noiva na grande hora: É de livre e espontânea vontade que você recebe Fulano por seu marido? Não — respondeu ela. valoriza. afáveis. Mons. — Quero. que o humilham. as alças intestinais). Foi concebido para reagir à palavra. envolventes. Recordem a celebração do casamento de vocês. a vasodilatação aumenta e as paredes intestinais tornam-se congestionadas. queres receber Eliane por tua mulher pelo vínculo sagrado do matrimônio? E Marcos pronunciou a palavra que mudou para sempre a vida dele e a de Eliane. que o enraivecem. por ser um ponto alto. que utilizaram pacientes nos quais foi exposta uma parte do aparelho digestivo (o intestino grosso. E a noiva repetiu a palavra fulminante: . acolhedoras. Recordo-me de um fato ocorrido em Botafogo. O que deixa de ouvir. para alegria e para calúnia. Por causa do poder da palavra. Mons. E ela culmina o abalo: — Estou casando forçada por meu pai. Suponho o que aconteceu no organismo. Celestializante. para o bem e para o mal. gerador de condições de bem viver. (Eubiótica ou Eubiótida: a arte de bem viver. 75% da vida conjugal jogam com a palavra. vinte. A palavra pode ser usada para o erro e para o acerto. trinta. para amargurar e para adoçar a vida. Essas quatro palavras: "Vem logo. nem casada. Tudo isso pode marcar. Mais que as galerias. cinqüenta anos! Todos os dias. Lira convida-os a chegar até a sacristia. num dos momentos da conversa fonada. O que o parceiro diz. A palavra boa. esta frase: "Vem logo. não perdem esse estupendo dom de falar. E a moça volta vestida de noiva — nem noiva. Pelo menos. isto é. levar a rumos opostos. Isto durante dez. para a cortesia e para a ofensa. Esta metáfora é uma correspondente vocabular que me parece bem mais didática do que a terminologia técnica. O que não diz. para construir e para destruir.— Não. Todos os dias! Até de madrugada. A mãe desmaia no banco.) Digo. como psicológica. para traduzir mais expressivamente esta função eubiótica da palavra. É exatamente este ponto que pretendo enfatizar: a palavra é uma realidade ambivalente. O que o parceiro ouve. capaz de conduzir a portos distantes. Não perdem o poder de pronunciar e ouvir palavras. para manifestar simpatia e para vomitar ódio. pode repercutir na qualidade da vida conjugal. tanto em sua dimensão orgânica. pacífica. Celestialização Há poucos dias estava eu na casa de um amigo cuja esposa viajara para Belo Horizonte. os corações dos presentes ameaçaram rachar. pelo uso da palavra. Imaginemos a responsabilidade de cada parceiro durante os anos de vida em comum. no psiquismo e no espírito daquela esposa privilegiada. meu amor". Então ouvi. Que beleza quando uma mulher pode dizer do marido: "Este é o meu melhor amigo". como espiritual. construtiva da vida conjugal harmoniosa. Acontece que quando um homem e uma mulher se casam. a palavra . A palavra pode enriquecer ou problematizar a vida conjugal. Impacto geral. Aos ouvidos de um homem sensível haverá presente melhor? Felizmente a palavra tem um papel eubiótico. O noivo sofre impassível. A responsabilidade de fazer crescer ou asfixiar o amor. para bênção e para maldição. Precisamente por causa da ambivalência. meu amor". como social. para semear trigo e para espalhar joio. que ela possui um poder celestializante. dependem da palavra. As galerias do templo tremeram. O pai espuma de ódio. como . com palavras." Palavras eubióticas. com o que disseram na repartição: "Você está ficando careca! Por que não compra uma peruca?". a palavra oportuna. Uma palavra de explicação em dia de suspeita." Apesar de alguém ter dito que "amar é não ter jamais que pedir desculpas". — celestializante. Você não está careca. situações constrangedoras. O que acontece é que você rompeu o equilíbrio entre os cabelos que caem e os que nascem. Estava estendida a ponte verbal do amor. Seria fabuloso se tais arquitetos fossem mais numerosos. Nem são palavras. E como têm! Atravessar o oitavo ano de casamento e naquela noite ouvir estas palavras inesperadas: "Foi muito bom eu ter te encontrado na vida. miraculosa. Não pensei que fosse um erro o que fiz. entre os dois: Tu me amas? Amo. Você simplesmente rompeu esse equilíbrio". Uma palavra de ânimo em momento de depressão. Uma palavra de conforto em dia de tristeza. corpo mo ido. Uma palavra divina em dia de precariedade humana. embora não sejam tão poucos. a palavra jeitosa. "Desculpa-me. a palavra amorosa. Uma palavra de encorajamento em dia de fossa. desabafando. Ele se encontra contando o fato durante o jantar. o senhor sabe de uma coisa? Até gosto de entrar na fossa. "E eu também tenho agradecido diariamente a Deus o presente de você. Uma palavra de estímulo em dia de desânimo. Eu queria que o senhor ouvisse as palavras que meu marido me diz". Certa vez ele chegou mal-humorado em casa. porque a palavra sustenta a ponte que ela mesma lançou. nervos tensos. Uma palavra peninsular em dia de solidão. São sons ocos. as palavras pouco valem. como diziam os latinos. Flatus voeis. Fazem ou não fazem bem? Nunca esquecerei a arte com que a esposa de um meu conhecido sabe adoçar. Dizia-me uma senhora cearense: "Padre. Sim. a fraqueza humana não pode sustentar esse heroísmo compatível apenas com a fortaleza divina. a palavra sensata. Mormente quando se chega suado do trabalho. Esse homem é um arquiteto do paraíso conjugal. Podem até irritar. A palavra ajuda a perpetuar o amor consolidado. Palavras assim espalham em casa o odor do paraíso. careca coisa nenhuma. Dirá alguém: "Jogo de palavras!". Mas quem está ameaçado de calvície gosta de ouvir esse sedativo jogo de palavras. Claro que quando há palavras sem haver atitudes. Fiz sem querer. sobretudo se parte da esposa e é dito por amor. Mas as palavras sinceras têm o seu valor. Foi muito bom". quando a esposa aparteia: "Meu bem. Uma palavra de confiança em dia de provação.amiga. sim. a palavra algumas vezes firme (mas sempre educada). Como a esposa do calvo. Celestializantes. um dia. Infernalização Eu não seria objetivo se deixasse de enfatizar que a palavra pode assumir também uma dimensão patogênica. quando o marido a acordou e disse: — Você está fedendo. Durante dezoito anos eu digo isso e só hoje é que você me diz que não gosta. nervoso. Transformadora do lar num inferno. Acordou num pesadelo criado por essas palavras. Conta ela que estava dormindo. entre marido e mulher.) E naquele dia ele explodiu. Tudo. Mas durante tantos anos. relatando tranqüilamente um caso pessoal. geradora de um patos conjugal. e as palavras eram totalmente infelizes. ignorando a arte da comunicação conjugal. evidencia seus desastrosos malefícios. Era a verbalização do motivo. Quase tudo. registro de um sofrimento no qual a palavra instaladora do inferno conjugal tem sua quota de participação. que quase todo casal trabalha fora. ainda precisa de virtude para praticar o que tem aprendido. Tanto isso é verdade. porque tem boa vontade e gosta do marido. Hoje. Outro incidente. ocorrido com um casal que tem tudo para não comprometer a ecologia familiar. despencou-se das nuvens: — Vem cá. Amanhã vou comprar duas camas de solteiro. Imaginei o que aconteceu ocultamente nos aparelhos circulatório. Já nem era tanto a previsão das camas separadas. inclusive. Usando outra metáfora: assim como existe a palavra celestializante. digestivo. quando o marido. Palavra terrível. Ela. Este capítulo pretende multiplicá-los. existe a palavra capaz de criar o inferno conjugal. neurovegetativo. de um clima mórbido. certa noite. surpreendida. glandular. digo mal. foi bruscamente interrompido pela mulher: — Isso é porque você é um besta! O rosto do homem virou um tomate de três quilos. ambos chegam em casa .supõem os pessimistas. isto é. Conservo no meu arquivo uma carta que é um depoimento doloroso. é carta de uma esposa vítima desse tipo de inferno gerado pela palavra. doentio. Incompetente no uso da palavra. Certa vez presenciei a infernalização de uma sala. que a esposa repetia freqüentemente: — Você é um mineirão caladão e quadradão. segundo ela. podendo ter evitado. Não havia motivo. A palavra infernogenica. mau. Francamente! Deixou de dizer. Quando a gente analisa a palavra infeliz inserida no contexto familiar atual. por mais fundamento que pudessem ter. (Dizia isto na presença de amigos. vascular. quanto sofrimento causou. é? E ela: — Se você acha que é merda. O marido: — Bonito! — Vibrando outro golpe: — é esse o valor que você dá para este cagamento? Ela: — Para um sujo como você. dos últimos afazeres. Esta equação é fatal: B . tempo e amor. Palavras infelizes infelicitam o ambiente familiar e o relacionamento conjugal. Foi um duelo verbal horripilante. desgasta e distancia. É terrível. é o mesmo que dizer patogênica. pois termina afetando a saúde de todos. tendo competência para orientação. não foram orientados por quem os surpreendeu em erros. O marido. Precisamos despertar para este problema: o problema da verbalização infernogênica. Então quando a criatividade verbal descamba para o bate-boca. palavras geradoras ou agravantes de uma atmosfera infernal no lar.) A poluição verbal rompe o equilíbrio da ecologia doméstica. Competência. humilhado pelo que a mulher dissera referindo-se à aliança. você ainda está com a merda no dedo? Ele se levantou e foi terminar de almoçar lá fora. estressados. Porque se há palavras.B = D + D Bate . Não quero reproduzir todos os golpes desfechados de parte a parte. não apenas a vida moral. não passa disso mesmo. Tem todos os inconvenientes da poluição sonora e mais os da poluição ética. Enervados. não quero sujar minha mão. ou são convencionais. quando ela se vira inesperadamente para ele.boca = desgaste + distância Vem-me à memória um bate-boca ocorrido há anos entre um casal que conheci posteriormente. — Tirou a dela e atirou na direção da porta. ainda têm de cuidar do jantar. Os filhos não conversaram com ambos durante o dia. ou são rotineiras. narradas pelos próprios filhos. passou nela a navalha desta frase: — É por causa desta merda. Já tenho escutado descrições de muitas dessas noites de certas famílias.cansados. ou decepcionantes por outros motivos. Na semana seguinte estão os dois almoçando. querendo reiniciar o bate-boca: — Ah. (Dizendo infernogênica. . dos compromissos sociais. ou estúpidas. é inqualificável. "Você sempre foi assim mesmo. humilhantes. recorre ao impacto da raiva. Ainda que não houvesse filhos. o coração não se contém. desesperado. dizendo: — Quando terminar. de amor que tenta. que se sentou à mesa e logo em seguida se levantou. ou a raiva amorosa. Quando o amor lançou mão. filhos. Havendo. Não gostava de se sentar sozinho à mesa. porque o outro está anestesiado ou míope para perceber o amor raivoso. ofensivas. não posso deixar de aludir à raiva. vomita palavrões ofensivos. me diga. sem resultado. no qual as palavras mais contraditórias. prejudicaram um sem-número de casais e uma multidão de filhos. Em outra ocasião ele deixou a mesa quando ela se sentou: . de amor não correspondido. Então. Jantava antes dele e ia correndo para a sala da TV. Porque a raiva é a locomotiva do bate-boca. para forçar o outro a soltar um ai de amor.Aquele casamento começava a feder. Locomotiva espumante Ao estudar o papel da palavra na infernalização caseira. Muitas vezes são contraproducentes. sofrendo pelo amor que sentimos na indiferença ou na incompreensão. devido à verbalização infernogênica. e por isso valorizava a companhia dela durante o jantar. O relacionamento de certos casais é um verdadeiro campo de batalha. A batalha verbal é um dos espetáculos deprimentes e periculosos. Ou. Poucos sabem que a raiva pode ser expressão de amor." O casal que entra na vida conjugal sem estar consciente do poder infernogênico ou infernalizante da palavra dificilmente se livrará de entrar nele. de vários recursos. Costumo dizer que a raiva e o amor são vizinhos de apartamento no edifício do coração. Mas ela se mostrava negligente. Sob nenhum pretexto é justificável. já estava bastante fétido. oferecidos pela palavra no lar. dardejando palavras vexatórias. Sua presença atrapalha minha digestão. da catarsis. Chegaram a destruir famílias inteiras. por causa da novela. em nome da ab-reação. Inchado de raiva. Já constatei a coexistência desses sentimentos contraditórios nas palavras de um marido que amava muito a esposa. mais propriamente. de mistura com gestos ferinos. De amor ferido. Cabeça dura que nem poste. dos quais iremos arrepender-nos mais cedo ou mais tarde. Queria que isso tivesse acontecido durante o noivado. mais comercializadas são atiradas no tiroteio da competição. uma reação favorável. Psicólogos que tentaram justificar o bate-boca. lançamos mão do chicote verbal. Um dia ele sentiu tanta raiva vendo-a jantando antes. até. Ao contrário. pela palavra construtiva que não pronunciamos. dois corações que parecem unidos quando estão juntos. cadáveres de palavras. Ou quando há. De qualquer forma lembro agora. A interminável ladainha das queixas. Vivem juntos. e temendo. sons sem alma. É uma traição ao companheiro. dormem juntos. Nenhum dos recursos adotados trouxe a mulher para a mesa. Queixas poluentes Nem sempre o termômetro atinge os 200 graus do inferno conjugal. pela palavra verdejante que precisava ser ouvida e não demos oportunidade. pela palavra esperada e não chegada. pela palavra que não nasceu. surge o ambiente ansiogênico — gerador de ansiedade — entre dois corações que se fecharam. Nenhum dos dois fala. que devia ser dita e não foi. Nesses casos os . Há parceiros que se automatizaram em queixar-se. Mas falava assim para ofendê-la e provocar a atitude que lhe fazia falta. é constituída de monossílabos extraídos a fórceps. As queixas formam a ladainha. já é uma situação indesejável. Terminam desmoralizados por esse uso errôneo da palavra. mas não existe entre ambos nenhuma verbalização unitiva. maltrata-o. Mas um casal deve encontrar outra saída mais inteligente para o amontoado de problemas. devagarzinho. pias. O Instituto Gallup realizou uma pesquisa entre casais através dos Estados Unidos. Mas chegando a 70. O mutismo rodeia ambos e entre ambos se interpõe. foi apontado tanto pelos maridos como pelas mulheres: queixas. Porque leva-nos a substituir o companheiro por coisas imensamente inferiores a um ser humano. Sim. choro de criança. Se falta essa palavra venturosa. Tanto nas esposas como nos maridos. fraldas. Porque o purgatório conjugal não é montado apenas pela ladainha de queixas imaturas. A ausência da ponte da palavra na vida conjugal faz a gente trocar o companheiro pela revista. comem juntos. deitam juntos. Não era. as portas da comunicação entre marido e mulher. Que vão fechando pouco a pouco. etc. segundo os depoimentos de ambas as partes. Muitas vezes as queixas tornam-se inevitáveis. Julgou que alguns pontapés verbais abririam à porta da comunicação. Mutismo tensionante Não sei se devia ter aludido antes a um tipo de purgatório conjugal. mas é possível que o outro fuja.— Você é indigesta. ofendido. Às vezes arromba-se realmente a porta. que ficou enterrada. Reclamam por tudo. para forçar a correspondência de amor. Um defeito mútuo. que não deixamos sair. porque no noivado não havia ferrolhos. e em alto percentual. Isto é o que se ouve no purgatório conjugal. torneiras. pois se não mata o amor. Esse purgatório sem palavras também é uma verdadeira traição ao amor conjugal. Muitas vezes os meios de comunicação servem de pretexto para evitar conversas entre casais com problemas de comunicação. com vontade de voltar. As reclamações constantes constituem o defeito mais freqüente nos casais. É instalado pela palavra boa que calamos. pelo jornal. Ela era o melhor digestivo para ele. soltou esta palavra: — É por isso que eu não gosto de conversar certos assuntos com uma pessoa anormal como você. E a palavra detonou imprevisível. Conquista algumas vezes laboriosa. ela revidou: — Você tivesse casado com pneu. Tudo chegou a esse ponto por quê? Porque trancamos a boca a cadeado. Diante da TV ninguém conversa. ou se cultivamos a sovinice verbal. Se esbanjamos palavras. Se falamos demais. Se as empregamos impropriamente. Quando quis consertar a avaria.meios de comunicação impedem a comunicação. Já repararam? E o teste infalível para o casal problematizado nessa e em outras áreas. exigentes de atenção. de . que são todos iguais. essa condição presta-se para tornar a TV um refúgio seguro dos incomunicados. sorumbáticos. Ora. O maior benefício que podemos prestar a nós mesmos como marido e mulher é manter abertos os canais da comunicação.. Devemos examinar. se somos excessivamente loquazes. Quantos roncam quando deviam estar oferecendo aquela palavra. Se somos casmurros. Comprometeu inteiramente o sentido. Se desconhecemos o significado exato de muitas palavras. Mas para que nosso esforço não se desvie. muitas vezes troca pelo sono. o melhor caminho é termos sempre presentes em nós alguns princípios inspiradores do sábio uso da palavra na vida conjugal. Ele queria dizer que ela era uma pessoa diferente da maioria. para que não atiremos fora do alvo tantas energias. estimulando uma criatividade verbal satisfatória. a palavra que salvaria o amor. é que ele e ela não conversam nem durante os comerciais. Comecemos pelo primeiro princípio: Conhecer o vínculo existente entre palavra e personalidade. E quase ninguém casa perfeito no uso da palavra. paciência. Princípios inspiradores Ninguém nasce sabendo usar corretamente a palavra. que exige esforço. por exemplo. E aquele que não troca o companheiro pela TV ou pela revista. Buscapé verbal. é indispensável conhecermos as habituais inabilidades verbalizantes de nossa personalidade. Sei de uma mulher que passou semanas emproada com o marido porque ele. querendo dizer que não via nela um comportamento parecido com o de outras. e não deixamos sair a palavra que refrigeraria o purgatório da solidão conjugal. é uma arte e uma virtude que temos de conquistar progressivamente.. e disse anormal. Percebemos que são uma arte e uma virtude laboriosas. É outra traição ao companheiro. Se temos dificuldade de exprimir-nos. Como nossas palavras brotam sempre da tessitura que é nossa personalidade concreta. irrepreensível. perseverança. Numa entrevista pré-nupcial perguntei ao noivo qual era a qualidade que ele mais admirava na noiva. de preparo. a uma outra ou a um outro. Apesar de algumas pessoas subestimarem palavras de amor. É bastante comum essa tática. Ou qualquer outra palavra de carinho. a também crescerem e se realizarem. e juntos se realizarem. Cifra catastrófica. rubra de alegria e surpresa: — Mas como você nunca me disse isso? Nas vésperas do casamento! É sempre assim. Um dos destinos mais belos da palavra na vida conjugal é usá-la para confirmar que o coração ainda está engajado no processo de valorização a dois. Quase nunca nos lembramos de injetar no coração do parceiro esses “issos" cardiotônicos.sensibilidade. De anti-amor. de elogio. Sem dificuldade ele confessou: — A inteligência dela. estas palavras mágicas: "Eu te amo". Pena haver muita deficiência neste ponto. expressões exclamativas são dirigidas apenas a outros. de admiração. revelou que "os maridos deixam de cortejar as esposas muito depressa". E que de fato exprima amor na prática. ajudando aqueles que vocês trouxeram ao mundo. Falar para dominar. . oitenta são frustradas por falta de palavras carinhosas. é preciso que saiba exprimir amor. "Seu penteado está um encanto!" "Essa camisa está maravilhosa!" E para o parceiro nada de encantos maravilhosos. de cortesia. E ela. Alguns psicólogos têm chamado a atenção dos casais para se cuidarem de não transformar a palavra em instrumento de domínio do outro. Bem sabemos por quê. quer através da formulação (malabaristas e sofistas da palavra). Segundo princípio: Que a palavra seja sempre um instrumento de amor entre marido e mulher. que é a prova mais evidente de amor. Pretendendo dominar. Nenhum casal cresce e se realiza sem preocupação pelo amor mútuo. Mais de 80% das esposas entrevistadas queixaram-se disso. O inquérito Gallup. Pior é quando palavras afáveis. Em cada cem esposas. é um erro e um mal não usar palavras de amor. Para que se casaram? — Para crescerem juntos. não sabem amar também com palavras. Detalhe precioso: Que nossa palavra de marido e de esposa saiba exprimir especialmente aquela manifestação de amor que é o carinho verbalizado. quer através do tom das palavras. Para que a palavra conjugal possa contribuir nesse amplo processo de crescimento e realização. Por que vocês se casaram? — Porque se amavam. a que já me referi. ou não ouvir nunca mais. Muitos que se amam. preocupado com o bem de ambos. Casar e pouco depois passar anos sem ouvir. meus amigos. de maturidade. falando de minhas preocupações". pode voltar pra casa de seus pais. Amanhã vamos ao cinema". 6 — Não diga: "Está certo. que precisa de descanso. talvez pudesse admitir que sua amiga Maria Lúcia não é feia". Diga: "Está certo. Diga: "Este desgosto não merece que. com ele. 3 — Não diga: "Sua amiga Maria Lúcia é muito bonita".) Diga: "Não quero aborrecê-la. uma para os maridos. que sua vida com tantos afazeres abafou o amor que você tinha por mim". Diga: "Meu bem. mas não esqueça de dizer a eles que eu sou o melhor dos maridos". você trabalha tanto. se quiser". querida.Este é um item necessitado de afoita revisão. (Mesmo porque não é verdade. outra para as esposas. Diga: "Se eu não fosse seu fã. Adotados criteriosamente. ao lado de outras medidas indispensáveis. Você não me liga mais". sobretudo nas causas. podem favorecer a comunicação conjugal. feito uma criança". você canse seus olhos". Diga: "Por acaso você não gostaria que eu alguma vez ajudasse a fazer o cardápio?". 5 — Não diga: "É a terceira vez em sete dias que você me faz comer peixe". Por que deixei de dizer que te amo. Diga: "Vejo você tão atarefado. Vejam agora os "diga" e "não diga" da esposa: 1 — Não diga: "Passou o amor que você tinha por mim. 2 — Não diga: "Você nunca acha tempo pra me levar ao cinema". Pode ir pra casa de seus pais. 4 — Não diga: "As mulheres nunca percebem o essencial em matéria de negócio". Veja os "diga" e "não diga" do marido: 1 — Não diga: "Você está chorando por uma ninharia. Esta meia dúzia de formulações é apenas uma pequena mostra do estilo da cordialidade conjugal verbalizável. que te admiro? Por quê? Falta de jeito? Influência do passado? Desconfiança? Dificuldade de expressão? Receio de não ser correspondido? Medo de sofrer? Frieza real? Necessidade de lenha na fogueira? Anos atrás os conselheiros matrimoniais da publicação Familial Digest ofereceram aos casais norte-americanos uma pequena lista dos "diga" e "não diga" da vida conjugal. 2 — Não diga: "Que blusa cafona! Com ela você me lembra a tia Carlota". . A lista é paralela. Diga: "Não acha que esta blusa lhe dá um tom de austeridade excessiva?". ) Outra razão que alarga a dimensão conjugal da sinceridade é o fato de ela alimentar a mútua confiança. muito mais meritório e transformante. nada constrói. Este é outro princípio inspirador do uso da palavra na vida conjugal. Muita gente gostaria de ter casado comigo". que desejaríamos interminável. Pelo menos. E o que é falso. O parceiro que sistematicamente oculta do outro os projetos profissionais. trapaceando na balança do casamento. apenas viveriam na mesma área. Onde existe confiança. para sigilos impostos pela ética profissional. e nem quer precipitar suspeitas. Colocar tudo em comum implica em ser sincero. mas o certo é que não confia. sigilos que são confiados não ao marido nem à esposa. está escondendo. Diga: "Nunca aceitei o pensamento que se eu tivesse casado com outro. pois quem não é sincero está subtraindo. trabalhar para encontrar a fórmula satisfatória em cada ocasião. Mas hoje está super". O que não é sincero. lambanceando. contudo. é fazer uma experiência inesquecível. Todos os psicólogos sabem que quem não confia. nada sustenta." 5 — Não diga: "Minhas amigas dizem que não suportariam o que suporto". educar-se.3 — Não diga: "Como hoje você está melhorado! Por que não me trata sempre assim?". está subtraindo da vida conjugal uma parte preciosa. Todo casal não deve colocar tudo em comum? É este colocar tudo em comum que caracteriza o casal. naquele momento. Terceiro princípio: Que a palavra seja veículo de sinceridade. está furtando algo da vida em comum. existe sinceridade. é óbvio.) "Mas você não pode imaginar minha tristeza quando me vejo obrigada a esperar tanto tempo. 6 —Não diga: "Não me faltavam pretendentes. Cada qual saberá treinar. a sinceridade termina longe de certas faixas da vida desse casal. Além disso. Do contrário não seria um casal. não é sincero. Quem esconde é porque não confia. Ser um tal companheiro ou uma tal companheira é. Diga: "Você é sempre gentil. Daí a beleza . bancando a ingênua. Diga: "Estou certa de que nenhuma mulher casada procura compreender o marido como eu". é falso. por exemplo. está ocultando. Haveria mil outras sugestões na inextinguível mina da criatividade verbal da mulher para o marido. só agora é que você chega em casa?". Viver ao lado de um companheiro ou de uma companheira assim. a dimensão conjugal da sinceridade amplia-se quando verificamos que ela ajuda o casal a ser mais casal. e subtrai porque não é sincero. (Nesse caso faz-se exceção. Diga: "Deus me livre de fazer mau juízo de você". Pode ser que tenha razões para não confiar. (Não está afastando a possibilidade. e sim ao profissional. 4 — Não diga: "Então. teria sido mais feliz". sabemos que há fogo. Só em ocasiões extremamente raras a franqueza pode ser tolerada na vida conjugal. do que a falta de sinceridade. Sinceridade que muitos denominam franqueza. nem sempre a sinceridade é fácil. que terminam arrebentando todos os laços criados pelo amor. grosseira. indiscreta. denunciadora de falta de confiança. para não vender uma imagem de inibidos ou de dominados. franqueza que no fundo pode ser fraqueza. E se opõe a um dos pecados mais repelentes — a hipocrisia. Ora. Sinceridade áspera. Há uma sinceridade que também deixa de comunicar. — depois de toda esta apologia — a verdade é que nem toda sinceridade é virtude. no dia-a-dia conjugal. é a sinceridade de porco-espinho. para infidelidades.da sinceridade no uso da palavra: por revelar e ao mesmo tempo alimentar confiança. Alguns casais indagam se devem dizer tudo ao outro. Sentiu-se menos esposa. Parece acaciano recomendar (fazendo a apologia) sinceridade a quem foi escolhido por amor e por amor escolheu. Onde há sinceridade. porque não possui o tom próprio do amor. comprometedoras do próprio objetivo do casamento. irrestrita comunicação. Há uma sinceridade que se manifesta precisamente porque não nos incomodamos em magoar o outro. no casamento. Muitas vezes há casados que são sinceros por tática de abrir caminho. Para não parecerem satélites. sabemos que há confiança. A sinceridade é para a confiança o que a fumaça é para o fogo. há uma sinceridade que pode ser irresponsabilidade. Para serem tidos como avançados. para incoerências. Há uma sinceridade que pode ser desrespeito para com o outro. Há aqueles que são sinceros por vaidade. porque prefere que ela faça o mesmo e assim o deixe livre para enganá-la como quiser. pois o uso da palavra na vida conjugal depende muito de nossos pontos de vista acerca da sinceridade. de desimpedir a estrada para leviandades. É o caso do marido que conta todas as aventuras para a mulher. No fundo são inseguros. . transformando a sinceridade num apocalipse devastador. É necessário que isto fique bem claro. contra o qual todos os tranqüilizantes são impotentes. Por revelar ausência de confiança no outro. não nos toca o que o outro pense ou venha a pensar de nós. porém. Franqueza não é sinceridade de quem assegura amar. inconveniente. Claro que a sinceridade é uma virtude esplêndida. Já tive de amenizar um purgatório conjugal porque o marido estava pretendendo apresentar-se a um concurso e a mulher veio a saber somente depois de um casal amigo. Por isto é que poucas constatações ofendem mais. Há parceiro pior do que uma mulher hipócrita. Porque comporta angulações sutis. por causa do modo como se manifesta. rude. Onde há fumaça. para clandestinidades. Mas a experiência ensina que. menos casal com o marido. do que um marido falso? A verdade. além de ser um teste de confiança conjugal. É interessante que essa indagação brote muitas vezes do desejo de alcançar plena harmonia conjugal. Ela se considerou ultrajada pela falta de sinceridade. cinismo. para não se incomodar nem ser incomodado com os imperativos do compromisso matrimonial. seria pior. Foi o caso daquela senhora tão sincera. a mútua comunicação. É em nome do amor. disse que ele podia colaborar um pouco mais. Sinceridade dura. a ponto de revelar ao marido a inclinação que sentia por um certo Fulano. Esses julgam assim por romantismo ingênuo. Ser insincero só a contragosto. mas nem em pensamento consentira alguma vez. aquele marido perdia a espontaneidade. Isto é. que nenhum casal encontra perto de si. . ser insincero só porque às vezes é preciso. não deve gostar de não ser. embora com naturalidade e até com arte. que algumas vezes não devemos ser sinceros. quando a sinceridade é necessária e faz-se o jogo da malícia. sempre que vier minar o amor de vocês. Esses esperam contar com uma natureza humana ideal. sem ser grosseiro. ao comunicar à esposa que ia vender o carro para saldar um compromisso. Ou mesmo por confundirem o silêncio sábio e a mentira prudente como sinônimos de hipocrisia. A sinceridade imatura da mulher transformara o marido num tensionado. Mas primeiro perguntou se ela seria capaz de fazer um grande sacrifício para que ele se livrasse de um vexame social. Eis algumas ocasiões em que vocês. Como quem engole o remédio amargo. para que ela não arcasse sozinha com a responsabilidade da educação dos meninos. Nem deve. Punha-se disfarçado a observar os dois. Resultado: a união de ambos deixou de ser união serena. Há hipocrisia quando existe falsa intenção. por não se interessar pela vida escolar dos filhos. Porque se ela ajuda o casal a ser casal. ela põe o casal a tremer nos alicerces. rude. para salvarem a comunicação e defenderem o amor. porque onde eles iam e encontravam o tal Fulano. que não existe em concreto. há momentos em que o casal não pode ser sincero no que diz. comprometendo legítimos momentos de lazer conjugal. há circunstâncias em que. Há psicólogos que aconselham a sinceridade sempre. É um erro. Mas não do amor infiel. a quietude. sem rodeios. em vez de chamar o marido de irresponsável. Sempre que a sinceridade vier comprometer o casal como casal. não devem ser sinceros: 1. a propósito de tudo. Ou como se o ser humano fosse uma divindade que justificasse confiança ilimitada. Não. precisamente. independente das circunstâncias. para ser união armada. Assim também deve acontecer com a falta de sinceridade. paradoxalmente. Assim foi sincero. porque se não tomasse ou não fizesse. sequer. Mas quando não puder ser sincero. Ser insincero não é hipocrisia quando o que se pretende é evitar um mal maior e sofrimento para o outro.Em geral existe sempre uma forma de sinceridade eficaz que substitui com vantagem a franqueza-fraqueza. Ou como aquela mulher que. Toma o remédio e faz a operação. a descontração. como se a sinceridade fosse um valor absoluto. Ou como quem se submete à operação. tentando flagrar o possível e o impossível. Como aquele comerciante que podia simplesmente ser franco. Sinal vermelho Apesar de toda a pujança conjugal da sinceridade. há. e da qual. a qualquer raio X. do que na verdade desalentadora. Extremo cuidado. inacessível a todo olhar. 2. E fala mesmo. romper. que o parceiro não aceita violar. Não existe autenticidade sem sinceridade. minha cara. com a aptidão de deixar invisíveis certos fatos. para estimulá-lo a prosseguir esforçando-se. O que se pensa do sogro. 'autêntica'. para não desanimar o garoto. mais firmemente devem ser evitadas. uma área inconsciente. Sobretudo se são palavras sinceras. Apunhalariam mais fundo. mesmo havendo motivos. O inconsciente familiar é poderoso por ser genético. a sinceridade deve atravessar o sinal. Não queiramos ser mais sábios do que a Divina Sabedoria que assim nos fez." Repliquei: "Quando seu filho lhe pergunta se o desenho que acabou de fazer está bonito. antes mesmo de aparecer à luz verde. Eis outra circunstância em que não devemos ser sinceros: Quando a sinceridade dilacera laços de sangue. Ainda quando conscientemente um filho adulto guarda queixas da mãe. sua verdade íntima? Claro que você mentirá. Faço questão de me revelar como sou. essa que leva o parceiro a sofrer desnecessariamente. sim. atrai o filho aos pais e aos irmãos. Pe. A sabedoria popular diz: "a voz do sangue fala alto". Será que essa atitude é autêntica ou inautêntica? Digo mais. ela argumentou em nome da autenticidade. todos os detalhes. dita ao filho. você pode ser mais esposa. mesmo quando pareça ocorrer o contrário. mentindo. no marido que ele é agora. se não pensamos lisonjas. Precisamente para evitar desastres maiores é que possuímos uma zona invisível em nosso eu. em certas ocasiões. Você é tapado como seu pai! Tua mãe não era diferente! Tira o nome de minha mãe dessa latrina! . O inconsciente familiar é magnético. Já não é o mesmo caso da esposa ou do marido com quem aconteceu algo passível de ser deturpado por terceiros. Haverá mais autenticidade na mentira construtiva. vinculada à mãe ideal que ele gostaria de ter visto na mãe real.Quando indaguei por que revelara aquele sentimento ao marido. portanto. é sinal de que na vida conjugal não precisamos revelar todos os fatos. de mostrar minha verdade pessoal. com palavras ofensivas a familiares do parceiro. mesmo estando feio? Você lhe revelará sua impressão real. mas não viu. O bom senso dirá quando". Mentindo. profunda. Quanto mais sinceras. tão bem estudado pelo psicólogo Szondi. você nega que tenha ficado bonito. afinal. Aí. é existencialmente a imagem. O mesmo ocorre em certas circunstâncias conjugais. Se somos feitos dessa maneira. É uma sinceridade sádica. certos detalhes. "Sou uma autêntica. Porque você terá amado mais. Mohana. Há laços biológicos extremamente fortes. por exemplo. Devido ao inconsciente familiar. Não tenho. para defender você dessa exploração. perante o parceiro. Um engenheiro participante. Durante um mês de férias do sogro em casa deles. Por quê? Por causa do inconsciente familiar. reagiu com estas palavras: Eu nunca pensei que você tivesse tanto ódio de meu pai. casou-se.confessou-me ele — "mas aquelas palavras nunca deixam . e vai piorar. para tecer este comentário: — Você não tem dinheiro pra me dar uma enceradeira. contou-me que teve de visitar a mãe enferma no Ceará. E o marido. Mesmo que o outro carregue mágoa dos próprios pais. a querer usá-lo. "Tenho hoje momentos amistosos com minha mulher. A mulher de um amigo meu cometeu esse erro. E a mulher usou o poder de falar. um curso para casais. A esposa que por acaso pensa sobrepor-se à imagem da mãe incrustada. em Belém. toda a delicadeza não é jamais. Por fim o rapaz teve de procurar uma pensão de quarta categoria. sem nenhuma ajuda paterna. para surpresa dela. Todo autocontrole aqui é pouco. No dia seguinte ela atirou no tímpano do marido alguns insultos contra "o velho". O mesmo diga-se de um marido semelhante. demasiada. desde a infância. pai e filho. Há alguns anos atrás ministrei. e o pai começou a se aproximar. regressaram às três da madrugada. A mulher não suportava "essa exploração". a bomba estourou. O filho notava essa tática. é por sua causa. Estas palavras nunca mais saíram da memória dele. fuja. sem se importar com ele quando jovem. porque gosto dela" . é uma inexperiente e uma ignorante da estrutura de qualquer personalidade. queixas dos irmãos. aqui. mas recusava que alguém. Daí em diante aquele marido passou a tratar mal a mulher. Ele aceitava condenar o pai. saíram para tomar uma cerveja. e tem pra ir ver sua mãe. Mesmo que tenha sido prejudicado pelos próprios familiares.Tu não serves nem pra papel higiênico da minha! Seu filho da puta! Quem estiver por perto. no consciente e no inconsciente ele já se sente humilhado por essa realidade. Numa noite em que ambos. enquanto fazia o curso de Direito. fizesse o mesmo. E disse à mulher: — Vou ver minha mãe. além dele. e comentava com a mulher. numa entrevista particular. deixando-a sozinha nas freqüentes crises de fígado. porque ambos estão estraçalhando a medula genética de ambos. no âmago inconsciente do marido. Enfrentando as maiores dificuldades. que a fedentina é insuportável. formou-se. O sogro abandonara o filho. Venceu na profissão. quando vou me soltando. que é mentira. Um dia a vida mostrará que é. Se se trata de uma praxe. Saber. em flexibilidade. Oportuna ainda quanto à ocasião. prerrogativa não apenas das mulheres. provavelmente terá pouca chance de eficácia. Seria uma atitude na qual o uso da palavra careceria de oportunidade. Há maridos e mulheres que vomitam tudo. essa aversão é epidérmica. com aquela consideração que. oportuna quanto ao local. nunca permitem que me alegre de todo. essa palavra termina sendo geralmente aceita. Mesmo que o parceiro não goste dos pais e dos irmãos. Faz parte do promocionismo de certos temperamentos. Quarto princípio inspirador do uso da palavra na vida conjugal: Que a palavra seja oportuna. Logo depois daquela bruta discussão. embora não precisemos traze-los para interferir em nossa copa. quanto ao momento. Embora o incriminado diga que o juiz está exagerando. por exemplo. mãe e irmãos. lá vem uma palavra de exigência. No fundo mais íntimo do eu. Há casais que querem falar de qualquer maneira.) De modo geral. É bastante freqüente que a psicologia masculina exagere numa roda de amigos o relato de acontecimentos presenciados também pela esposa. não está em condições de saber tudo quanto o outro pensa da família dele. se não é oportuna. quanto a outras circunstâncias. E mesmo sendo oportuna quanto ao local. quando o parceiro não amadurece em compreensão. Nem bem terminaram de discutir. em nossos móveis. As exceções só fazem confirmar a regra. o que ela disse volta aos meus ouvidos. Mesmo que se amem. São balõezinhos de vaidade. A panela ainda está fervendo. Até mesmo na cama não sou mais o mesmo. lá onde se aninha o miolo familiar do inconsciente. Não devemos ministrar doses para elefante. mesmo quando o parceiro os agrida. a despeito da aparência. como se a vida dos dois fosse terminar amanhã. em nosso armário. Não pode haver sapiência na criatividade verbal. e abrem mais o gás. O parceiro presente não vai alardear que é bazófia. ele se sentirá confortado com aquele sopro perfumado na chaga viva. conter em público certas palavras toleráveis em casa. A regra da comunicação adulta é defender pai. Por ter sido oportuna. Procurar falar deles sob um ângulo positivo (sempre existe um ângulo positivo em todo ser humano). envolta no celofane da delicadeza. Uma das marcas mais eficazes da palavra oportuna é a medida. a palavra oportuna será dada na intimidade do quarto. afinal de contas. repreendendo o outro na presença de terceiros. sem levar em conta se o outro está ou não em condições de aproveitar aquelas palavras. Se for oportuna e desmedida. é por ele.que eu me descontraia inteiramente. Receio até me tornar impotente com ela". deve ser oportuna quanto à dose. porque. (E não era infundado esse receio. em capacidade de perdoar. ela se vira para ele: — E não tem mais refrigerante na geladeira! . hoje que sabemos da alta percentagem de impotência masculina e frigidez feminina desencadeadas por causas psicológicas. cabotinismo. É um diálogo de dois estômagos casados. pelo menos. — Dialogamos — respondem. Quem desconhece as diferenças. carne. Podia ser até que ela quisesse agradá-lo aludindo ao refrigerante. Não quero me estender sobre o diálogo conjugal. sobre o preço do arroz. Porventura a necessidade de comida esgota as dimensões de um homem e de uma mulher? Os problemas da casa coincidem quantitativamente e qualitativamente com os problemas de um casal? Jamais. Jamais de dois seres humanos. Não de duas pessoas. praxe em que a palavra ganha grandeza construtiva. irrelevante falar em diálogo sem a preocupação com o conteúdo. desmoraliza-se. casando-se. Desgasta-se pela inautenticidade de ser tão badalada e tão pouco vivenciada. . É inconseqüente. Tal diálogo é de um leitão com uma leitoa. Ou. Todo o mundo interior de cada um fica de fora.Ele não espera dois segundos: — Mete o refrigerante no rabo! Claro. como se no interior dele e dela só existisse um tubo digestivo. Levo adiante a indagação: — Dialogam sobre quê? — Sobre as necessidades da casa. para um auditório de 317 casais. Só sobre a mercearia. — Vocês dialogam? — pergunto a muitos casais problematizados. e tenho quase certeza de não ser ele estranho para quem me lê. da carne. . Lembro apenas dois pontos fundamentais: 1º — O conteúdo.. Quinto princípio: Que a palavra saiba dialogar. E tudo que rola na inflação. . — E sobre as necessidades profundas de vocês? — Não. Num curso por mim ministrado em Macapá. desgasta-se. Muito se tem insistido sobre o assunto. 2º — Saber ouvir. Arroz. feijão. do feijão. O termo diálogo está inflacionado. lancei esta indagação num volante mimeografado: — Vocês têm o hábito de se sentar de vez em quando para dialogar? Apenas 32 casais responderam sim. não estava preparado para o casamento e se precipitou. Mas ignorou o princípio da oportunidade.. Se a inoportuna do refrigerante tivesse posto em prática a lei da oportunidade da palavra e acolhido o princípio do silêncio oportuno. serenidade. Só o fato de ter existido "um ouvido amoroso". ninguém melhor que o psicanalista Ivan Ribeiro definiu essa arte de saber escutar. mesmo quando a palavra da vitória não fique conosco. Nessas horas só há uma atitude comunicativa: calar. Muitas vezes é preciso que o amor perca a língua. acalma. boa intenção. ao entrosamento. Quero chamar a atenção para a necessidade de sabermos calar. significa levar a panela a despejar água quente. Quando o outro não está em condições de ouvir. atiram monólogos paralelos.Tem sido sobejamente repetido que certos casais nunca chegam a se comunicar porque não sabem ouvir. abrir o gás da verbalização. Nesses momentos o silêncio serena. Não. É através dessa atitude que certas janelas do eu permanecem abertas à comunicação. a mãe de uma jovem esposa perguntou-lhe a propósito de uma notícia que a empregada veiculara sobre o genro. Quando o outro está com a palavra. Sexto princípio: Que a palavra saiba silenciar. É verdade que às vezes o outro tem de ouvir o que não gosta. Há situações em que todos os níveis da personalidade de um dos parceiros estão excitados. estamos garantindo o êxito de qualquer diálogo. A melhor conduta é fechar o gás. diz ele. Em vez de um diálogo. Não estou. Contudo. Ter um ouvido amoroso. autocontrole. Ah. sobretudo se as energias que Freud denominou fanáticas (agressivas) estão no comando do eu. referindo-me à necessidade de saber ouvir. prova de discrição. E há sogras e sogros e cunhados e amigos e conhecidos que adoram botar lenha na fogueira! Na semana passada. mas é precisamente esse conteúdo verbal incômodo que devemos servir-lhe no momento indicado. se maior número de casais acreditasse que ouvir é também um meio certeiro de comunicar-se! Certeiro porque cativante. respeito por ele e pelo quadro familiar. por terem os dinamismos emocionais alterado a maneira habitual de reagir. minha filha? E a filha respondeu: . ou se a afetividade entra em ebulição. eriçados. é "ter um ouvido amoroso". Cada qual fala sem se preocupar em ouvir o que o companheiro tem a dizer. é o silêncio mais sábio. — Onde está o teu amor-próprio. não teria obrigado o marido a soltar palavras cuja função foi agravar o fosso entre ambos. a razão parcialmente ou completamente tomada pelos vapores da alta temperatura. Nessas horas. sede de paz. quando se tem desejo de falar. na panela do coração fervendo. já proporcionou magnitude conjugal à tentativa de comunicação. agora. quando a palavra é totalmente contra-indicada. condicionando o parceiro pela brisa do silêncio. Saber escutar. Do contrário vomitará. a conveniência de calar. Vivenciando esse cuidado. de qualquer tipo que seja. Diz tudo. Como está bem dito! Dispensa explicações. tranqüiliza. Há situações nas quais melhor que a palavra sábia. temos de deixá-lo sem ouvir. Há casais que ignoram o valor do silêncio. em vez de digeri-lo. ouvi-lo como se aquela voz fosse à única realidade no universo. Posteriormente também demonstrou que conhecia o princípio da palavra oportuna.) E a mulher. porque contamos com ela quando ela termina falhando. querendo evitar o estopim dentro da noite. E vice-versa. Sim. calado. sensibilidade. mamãe. Parar convictamente. A experiência prova fartamente esta verdade. é que vim lembrara medida-chave na hora de um bate-boca: Parar bruscamente. deitada. sabe que algumas vezes é muito mais difícil calar do que falar. Há milagres conjugais que a palavra não realiza. e ele soube usar o silêncio. virtude. É piorar a situação. São três da madrugada. mas termina também fechando a boca. se são oportunas. É sobretudo quando nos lembramos das brigas. O outro ainda continua falando.. Parar violentamente.— Felizmente. Aquela criatura não soube usar a palavra. . Porque a criatividade silenciosa e o silêncio criativo supõem energia. Seria encará-la como panacéia. Muitas vezes o silêncio é a mais eloqüente maneira de falar. Parar com a solidez de uma rocha. Porque existe uma criatividade silenciosa tão construtiva quanto à criatividade verbal. Parar e perguntar: Estou discutindo por vaidade? Por susceptibilidade ferida? Por capricho? Nossa sinceridade geralmente responde. Ele trocou de roupa. porque não dispõem de energia e tarimba para calar ou falar. Cada um tomara rumo diferente naquela noite de quarta-feira. autocontrole. é conferir-lhe um poder acima de suas próprias possibilidades. das discussões. dos bate-bocas. fortaleza. eu tenho mais bom senso do que amor-próprio. (. e o silêncio consegue. Muitos casais se amam e a comunicação fica bloqueada. mas acordada: — Chegou o primeiro degenerado. Para o caso. Depois de ter mostrado o fulgor do silêncio em certas ocasiões da vida conjugal. que avaliamos o benefício de um silêncio acertado. das rixas. nada disse. Não falar quando um dos dois (eu ou o outro) quer utilizar a palavra como metralhadora. Julgar que ela é sempre superior ao silêncio. Outro episódio. conforme as necessidades objetivas. pisando em pluma para não acordar os outros. Comunica melhor. humildade. que conheço de perto. Quem já viveu um ano de casado. Não mitizemos a palavra.. deitou-se e só conversou quando julgou oportuno. a resposta mereceu nota dez. Até que aparece o marido. de olhos fechados. e então calamos. Marido e filho sem chegar. antes do filho. É precisamente em nome da sinceridade pessoal que a paz é comprometida. 10 — Teriam algum outro ponto cuja reflexão e análise aumentasse a comunicação entre vocês e de ambos com os filhos? PREPARAÇÃO PARA CRESCER A DOIS Creio que se havia algum romântico contestador folheando as primeiras páginas deste livro. E se falta essa preparação. mais alvejadas serão as disparidades. Só aqueles que se empenharem numa competente preparação pré-nupcial estarão defendidos para evitar a patada de tantos despreparados. nem a sinceridade resolve. Antes da batalha verbal ponha um gole de água na boca e deixe aí. pois cada um julga honestamente oferecer o melhor para os filhos. não sintamos constrangimento de adotar um curioso recurso sugerido por São Francisco de Sales a uma vitrola casada. na presença ou na ausência dos filhos? (Fatos) 3 — Quando se zangam. Um exemplo: A disparidade ideológica com respeito à educação dos filhos. E para enluarar-mos certos momentos de fogo. AGORA USEM A PALAVRA 1 — Alguma vez já trocaram idéias sobre o poder corrosivo e construtivo da palavra no lar? (Fatos) 2 — Preocupam-se com o que vocês dizem entre si. Água na boquinha impede que a casa vire furacão. pois mais expostas ficarão as chagas. Quantas vezes existem razões . costumam dizer o que não devem? (Fatos) 4 — Com bastante lealdade e boa vontade conversam avaliando qual dos dois tem comprometido o ambiente do lar com palavras descabidas e descontroladas? (Fatos) 5 — Chegaram ao ponto de discutir por qualquer bagatela? (Fatos) 6 — Qual de seus filhos precisaria de mais assistência educacional com respeito ao uso da palavra? (Fatos) Que medidas práticas seriam indicadas? 7 — Reconhecem e têm utilizado o valor do silêncio em certas situações conjugais? (Fatos) 8 — Suprimiram palavras de carinho e admiração no relacionamento mútuo? (Fatos) 9 — Gostariam de usar agora esta oportunidade privilegiada para dar alguma explicação sobre fatos acumulados ao correr da vida de ambos?. legitimamente ambicionada. mesmo quando o amor bilateral continua existindo. Quanto mais sinceridade houver. enquanto o parceiro estiver metralhando. tanto pior para a afinidade. Por falta de preparo adequado. muitos casais têm começado a caminhada já em descompasso conjugal.Os franceses têm razão. ignorando que viajavam rumo ao inferno. No casamento muitas vezes o silêncio é de ouro e a palavra é de prata. Pelo contrário. seria privá-los da harmonia de duas mentalidades. terá refletido naquilo que pretendi mostrar: o relacionamento conjugal é uma empreita bastante complexa para depender de uma condição única. Recurso curioso e eficientíssimo. Ceder às pretensões do outro seria comprometer os meninos para a vida. que tomaram o barco do amor. um outro amor se alevantava: o amor pelo filho. Poderia ter sido por causa de uma certa amizade da filha. que tinha um fraco pelo rapaz. já que hoje se usa a mesma palavra para designar tantos sentimentos e mesmo tantas sensações. Preparem-se melhor. Brigas homéricas agitavam as refeições. Quantos casaram assim mesmo. pai e filho. e de madrugada a motoca desaparece. — Por que não desconfiou do coração sozinho? Porque é menos constrangedor ser divorciada do que coroa? — Não. Ou por causa dos móveis da copa trocados sem consultar a opinião da mulher ("achei tão baratos"). porque ao lado do amor pelo marido. Nem à noite havia paz naquela casa. Não.de divergência muito mais gritantes que o amor. Deve-se dispor de muitos recursos. amor imenso daquela mãe. bem mais. visando o marido: "Deus permita que tu raches a cara no asfalto!". o vazio. é isto que você quer que esse menino seja?" E o marido a dizer que ela se apavorava com moinho de vento. ao sair das cinzas. O pai inventou de dar uma motoca para o rapaz e a mãe logo discordou. antes tranqüila. A motivação está feita. ninguém sabe para onde. Mas como o plano ia tomando corpo. Inútil. Ou por causa de mil outros motivos. Seria olhar . — "Bem-feito! Esse ladrão adivinhou meu pensamento. e meses depois estavam na minha porta. o último episódio a fissurar um amor. carregada. "Bem-feito" — dizia a mãe. torpedeando fúria. vitoriosa. não apenas dois: mãe. Sobretudo quando não se conhece o tipo do amor. De meu conhecimento. Jamais contentar-se com aquelas cinco palestras dos agradáveis "cursos de preparação para o casamento". mas ele mudou. A motoca evaporou-se. — O coração não deixava. com a trouxa de queixas. O noivado e o namoro nupciáveis são os tempos indicados para essa preparação. esse amor é cego. como Fênix não fez. A guerra culminou com o praguejar da mãe contra o filho. no lugar do sonho. suspeita e raiva. Mas na mesma semana a empregada da vizinha. grande amor conjugal. na batalha já eram três os contendores. "Motoqueiro transportador de programistas. E veio. — Mudou. Combina sigilosamente com a vizinha. fura o mistério e a motoca reaparece. Quando só há amor em você. De qualquer maneira a motoca viria. Por causa de uma motoca. emergindo da promessa à realidade. E no coração do marido. que os sentimentos do coração. É a vida." Dão queixa à polícia. nada. Mas não terminou aí. Não foi a um nem a dois pares de noivos que aconselhei: "Esperem mais um pouco. — Não lhe avisei? — Ah. É que só agora você abriu os olhos. Eu amava realmente. De manhã. foi o perigo a que o marido expôs o filho. — Você amava cegamente. E por muito tempo não houve aragem celeste naquele amor. como Henrique IV em Canossa. mais ampla. Vocês estão com pouca ferramenta para enfrentar a vida a dois". simploriamente uma realidade que não é simples nem simplória. Leituras individuais e paralelas ou conjuntas (no século da imprensa é indispensável ler, ou melhor, saber ler, isto é, ler não apenas bons livros, mas os melhores, tantos são os bons, que roubariam tempo precioso, se não soubéssemos selecionar), audição de cassetes e discos especializados (venho lançando com o selo Paulinas uma série sobre espiritualidade matrimonial, — SEM), conversas programadas, entrevistas com casais experimentados, abastecimentos, visitas intencionais, consultas com conselheiros matrimoniais competentes, participação em um grupo de casais interessados na qualidade da vida conjugal e familiar, ingresso em movimentos específicos, estudo do inconsciente de cada um (bom roteiro para esse trabalho pode ser encontrado em meu livro Ajustamento Conjugal, edição Globo) e outras medidas. Para ajudá-los a avaliar o grau de harmonia ou de disparidade ideológica existente entre vocês, forneço aqui um "teste" de fácil aplicação e real proveito, sobretudo quan¬do feito logo no início do noivado, ou um pouco antes; e se tomarem medidas práticas, visando solucionar divergências descobertas através dele. Resolvam, isolados, cada situação proposta no teste. Escrevam (mesmo sucintamente) as respostas, a fim de que a posterior comparação não fique sujeita a distorções e subterfúgios. Escrevam apenas a opinião pessoal relativa a cada questão. As razões de cada ponto de vista não devem ser redigidas, para que constituam matéria de conversas espontâneas. Precisamente devido aos comentários que suscita, a avaliação pode ocupar vários encontros, o que se torna um excelente treino para o diálogo conjugal construtivo. Se todas as soluções propostas para cada problema coincidirem, este resultado revela um ajustamento ótimo. Até três soluções divergentes — podem considerar-se satisfatoriamente ajustados. Mais de cinco soluções divergentes denotam sério desajustamento. Divergência em mais da metade das soluções propostas deve levá-los a perguntar o que vocês estão fazendo durante o noivado e o que pretendem do casamento. Eis o teste, ou seja, dezesseis situações problemáticas a serem resolvidas a sós, comparandose depois os resultados. 1 — A sala de um casal vive arrumada, mas os filhos conseguiram uma mesa de pinguepongue e colocaram na sala para jogar à noite, onde está a TV, a cujos programas os pais costumam assistir. Há possibilidade de pôr a mesa de pingue-pongue na garagem, mas os meninos recusam. Como solucionar o problema? 2 — O marido é ciumento. A mulher arranjou um emprego no qual passa a ganhar mais do que no anterior e mais do que o marido. Na sua opinião, ela deve aceitar, ou não, o novo emprego? (Não esqueça: na hora de comparar os pontos de vista, justificá-los, debatê-los.) 3 — A sogra ficou viúva um mês depois do casamento da filha. Os outros filhos estão casados, mas ela gostaria de morar com o caçula, também casado. Como resolver a situação? 4 — A mulher é tímida e o marido é extrovertido, falante, bem informado. São convidados a participar de um grupo de casais que se reúne quinzenalmente, mas ela resiste, enquanto o marido logo se entusiasmou pela idéia. Que deverão fazer? Aceitar? Recusar? Outra decisão? 5 — A mulher soube da presença de uma outra na vida do marido, e um segundo marido descobriu que a esposa anda com outro homem. Que atitudes vocês aconselhariam aos quatro? 6 — O chefe da seção manifestou desejo de comprar um terno de tergal. Uma das funcionárias, jovem e casada, prontificou-se a colaborar na escolha. Quando o irmão soube, desaconselhou-a de fazer isso. Podia ser mal interpretada não apenas por ele. Na opinião de vocês, qual deve ser a atitude dessa criatura? 7 — Carlos Alberto recebeu proposta de uma gerência melhor remunerada no Norte (ele e a mulher são do Sul, onde reside a família dela). O casal tem quatro filhos no ginásio. Escrevam a opinião que dariam a eles, se consultados. (Justificativas, só na hora das conversas!) 8 — O marido está atravessando certas dificuldades financeiras e a mulher decidiu, às escondidas, ouvir um macumbeiro. Quando o marido soube, ficou preocupado, por discordar de tais expedientes, e ofendido, por suspeitar de que a mulher perdera a confiança nele. Ela prometeu deixar, mas continua freqüentando sigilosamente o terreiro. Se vocês fossem convidados a ajudar esse casal, o que fariam? 9 — Na presença do filho de nove anos, o pai disse que não concordava com a maneira da mulher tratar a empregada. Como vocês levariam adiante esse incidente? 10 — Há suspeitas de que a empregada está tratando Wilson com estranha solicitude. Cármen, mulher de Wilson, acha excelente o trabalho da empregada. Ela deve ficar ou sair? 11 — Todas as noites ele janta, veste o pijama, abre o jornal defronte da TV e daí a instantes está ressonando. Ela fica acompanhando programa após programa, entediada, costumando resistir às solicitações sexuais do marido quando vão para o quarto. Solução para este quadro? 12 — Sandra, filha de Rui e Judite, menina boa, delicada, estudiosa, enturmou-se num grupo avançado, composto por cinco moças e três rapazes. A atitude de Sandra para com os pais não tem mudado. Rui e Judite têm necessidade de buscar orientação com alguém. Que diria você? 13 — Aquele casal tem vivido oito anos de satisfatória harmonia. Ele é médico, ela é professora. Mas acontece que um amigo influente quer levá-lo a candidatar-se, prometendo elegê-lo deputado pelo partido governista. A tentação ronda forte o marido, ao contrário da mulher. Ajudem esses dois a sair do impasse. 14 — Numa festa de aniversário o casal encontrou o antigo noivo da esposa, que ainda não se casou e lança olhares indiscretos para ela, cada vez que sorve um gole de uísque. Se você fosse uma mosca, o que segredaria no ouvido de ambos? 15 — A filha de dez anos chegou em casa com um biquíni-tanga, pretendendo usá-lo de qualquer modo, na praia. A mãe não vê problema. O pai sente o mundo desabar. Qual seria o ponto de vista de vocês? 16 — Maria Amélia está gastando além das possibilidades do casal, e o marido não se sente à vontade para confessar a preocupação. Que caminho hão de tomar? A utilização deste "teste" pode ser também feita a prestações. Não precisam resolver de vez todos os problemas. Podem dividi-los em dois ou três grupos. Ou então reservar duas situações-problema para cada encontro. Ou ainda uma última possibilidade: em cada encontro comparar apenas as soluções propostas para um problema; não mais de um. Naturalmente as conversas serão mais detalhadas, minuciosas, mais profundas. E a iniciativa, mais gratificante. REALIZAÇÃO CONJUGAL É espantoso o número de jovens que ultimamente me têm procurado, às escondidas, para ajudá-los a impedir o desastre dos pais como marido e mulher. São súplicas patéticas, muitas vezes regadas a lágrimas. Quando se saiu de casa para o casamento, levando apenas o enxoval do amor, não é raro que um dos impasses da aventura seja essa chocante desventura. Claro que o casamento deve contribuir para a realização dos que estão dentro dele. Mas é preciso entender com lucidez e sapiência o conteúdo desse vocábulo: realização. No casamento a realização implica em duas, porque são duas as pessoas, e ambas têm o mesmo direito à realização. Se a realização pessoal não for encarada conjugalmente, um dos parceiros terminará comprometido, ou ambos. Ambos podem arrastar-se rumo ao atoleiro da frustração. Nada mais funcional que a concepção cristã de perfeição humana, para inspirar a realização conjugal. Porque a perfeição cristã é aberta, já que a meta é o amor infinito vislumbrado no próprio Deus. "Sede perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito" (Mt 5.48). Tive oportunidade de ler uma carta recebida pela jovem esposa de um executivo, na qual um dos trechos refletia admiravelmente essa ótica aberta do ideal de realização humana segundo o Evangelho: "Nós temos sempre o que melhorar" — escrevia ele — "o que aperfeiçoar, o que crescer. Há uma subida constante que não acaba nunca. Pode haver sempre maior perfeição, até o Ideal, — sede perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito". A síntese de tudo foi expressa nesta fórmula: "Há uma subida constante que não acaba nunca". Como está bem dito, e como é verdade! Este é o espírito, a concepção da realização conjugal autêntica, humana e cristã. Aberta e dinâmica. Porque não existe homem nem mulher concluídos. Nem casal concluído, portanto. Concluído, aqui, é sinônimo de perfeito. Casal perfeito é aquele que quer ser. Não o que é; pois nenhum consegue atingir a perfeição proposta como meta. E é neste dinamismo, nesta tensão construtiva, neste avanço rumo ao Ideal, que ambos se vão realizando. Daí a necessidade de reconsiderar o nosso conceito de estabilidade conjugal. Estabilidade conjugal, condição para que a realização conjugal se torne realidade, é um dinamismo incessante, "equilíbrio no movimento", para usar a feliz expressão do sábio e santo papa João Que saibamos caminhar para ti em nossos passos diários. Que não haja rancor. está contribuindo para a construção familiar e social. porque tu nos perdoas. com o egoísmo. Nenhum deles esquece que tudo na humanidade começa onde dois seres humanos estão empenhados em não falhar como marido e mulher. Que quando amanhecer o grande dia de partir ao teu encontro. Que cada noite nos encontre sempre mais unidos no amor. concede-nos estarmos unidos para sempre em Ti. pois quando um casal cristão pensa realizar-se pessoalmente e conjugalmente. Que não haja egoísmo. Que demos o melhor de nós mesmos para sermos felizes no lar. Que não haja abandono. como irmãos dos outros homens." . Que não haja amarguras. faz de nosso lar um ninho do teu amor. como filhos do mesmo Pai. Que façamos do amor um motivo para amar-te mais. E só esses filhos. Que cada manhã seja o início de mais um dia de entrega. porque tu nos animas. com a imaturidade. Esta concepção é incompatível com o orgulho. porque tu nos abençoas. porque tu estás conosco. só eles dois. podem falar ao Pai celeste nestes termos: "Senhor.XXIII.
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