Novo institucionalismo e institucionalismo histórico: evolução e
características
Agosto-2014
Novo institucionalismo e institucionalismo histórico: evolução e
características
Introdução: antes do novo, o velho
A proposta desse estudo é fazer uma síntese, a partir de um trabalho de
revisão de alguns autores, da evolução e características do novo
institucionalismo e, particularmente, de sua vertente histórica.
Paralelamente, objetiva também apresentar os limites e desafios apontados
pelos autores revisitados para a pesquisa institucionalista na ciência
política. Antes de concentrar nessa especificidade, entretanto, é feita uma
rápida retrospectiva do contexto dos estudos em ciência política
anteriormente ao novo institucionalismo.
Thelen e Steinmo (1994) apresentam sua discussão sobre o novo
institucionalismo colocando que a Ciência Política é o estudo das
instituições e, portanto, é institucionalista. Como questionam os autores,
"So what's new about the new institucionalism("
Em sua introdução ao tema Immergut (2006) afirma que "as instituições,
certamente, tem sido foco das ciências políticas desde seu nascimento".
Amenta (2005) afirma que atualmente o Estado e outras instituições são
colocados no centro da política e que, se o Estado e a política são
centrais na sociologia política – considerando a compreensão que se tem
desses conceitos –, "we political sociologists are now all
institucionalists". Respondendo à própria provocação, esse autor ressalta
que mesmo que nem todos os cientistas políticos sejam proponentes de
teorias centradas no Estado, certamente estão mais atentos hoje aos
impactos das instituições políticas do que no passado recente.
Voltando um pouco na história, em busca do entendimento da questão colocada
acima por Thelen e Steinmo (1994), no século XIX a ciência política começa
a diferenciar-se como disciplina acadêmica e as principais questões que
coloca são institucionais e normativas, relacionando-se aos aspectos
formais dos governos, especialmente com sua engenharia e mecanismos de
ação. A tradição americana deu um papel pouco significante ao Estado,
embora houvesse uma preocupação com suas instituições formais, como nos
trabalhos de Woodrow Wilson ao final do século XIX, citados por Peters
(1999). Posteriormente a esse período o Estado foi colocado à parte na
ciência política americana, até o trabalho de Theda Skocpol[1], em 1985,
ajudar a trazê-lo de volta aos estudos.
Na Europa, considerando que a ciência política esteve mais associada a
outras áreas de estudo, sua emergência como área independente foi mais
lenta. Esse fato, segundo Peters (1999), reforçou a natureza institucional
e formal da pesquisa. O governo era referido a partir de seu papel na
formulação e aplicação de leis por meio das instituições públicas e a
política era parte desse exercício. Dada a natureza menos participativa da
maioria dos governos europeus a essa época, a dependência na análise de
leis e instituições foi reforçada, o que significou, por outro lado, o
estudo do Estado. Nessa tradição o Estado é vinculado à sociedade e
influenciado por ela.
Apesar de, segundo Peters (1999), a ciência política ter estado
caracterizada como ateórica e discursiva, são identificadas teorias
"escondidas" na pesquisa desse campo. No que chama de "proto-teoria" do
velho institucionalismo, o autor identifica como características o
legalismo, o estruturalismo, o holismo, o historicismo e a análise
fortemente normativa.
O legalismo ressalta a preocupação com a lei e seu papel central no
governo: é o arcabouço para o setor público e a principal forma pela qual o
governo afeta o comportamento dos indivíduos. Essa característica reconhece
o fato de que podem existir várias versões para a forma como a lei figura
nos relatos políticos do velho institucionalismo, em função de diferentes
perspectivas nacionais da lei e do governo. O estruturalismo enfatizou a
importância das estruturas e de sua determinação do comportamento dos
indivíduos. O foco é nas principais características institucionais dos
sistemas políticos (por exemplo: presidencial ou parlamentar, federal ou
unitário). Essa tradição, apesar de ter produzido trabalhos cujas teorias
fundamentaram análises empíricas do governo, foi criticada por sua
concentração nos aspectos formais dos sistemas políticos, por não
desenvolver conceitos que capturassem outros aspectos estruturais dos
sistemas (por exemplo, o corporativismo) e por sua tendência a fazer a
Ciência Política mais etnocêntrica do que era: não funcionaria em países
menos desenvolvidos ou que não tivessem estruturas constitucionais comuns
aos países continentais.
O velho institucionalismo foi frequentemente comparativista, dado que a
ênfase nos aspectos formais-legais requeria o uso de outros sistemas para
que fosse obtida alguma variação. A tendência era de comparar sistemas
inteiros, ao invés de instituições individuais, o que tendia a tornar a
generalização e a construção de teoria mais difíceis, exatamente pela
dificuldade de comparar sem que se confrontasse a realidade política dos
países. Outra tendência era de uma pronunciada fundamentação histórica nas
análises. Ou seja, para entender a forma pela qual a política era praticada
tornava-se necessário conhecer o padrão de desenvolvimento que produziu o
sistema. O comportamento individual era função da história coletiva e da
compreensão do significado das políticas, por sua vez influenciado pela
história. Para alguns estudiosos, segundo aponta Peters (1999), essa
compreensão é controversa, dado que consideravam a história desnecessária
para entender o comportamento político. Por último, as análises do velho
institucionalismo tendiam a ter elementos fortemente normativos, o que
expunha a crítica de que o trabalho poderia não ser científico.
Entre os anos 1950 e 1960 a chamada revolução behaviorista serviu de ponte
para uma mudança ainda mais fundamental: a abordagem da escolha racional.
Primeiramente, essa revolução trazia o desejo de eliminar os elementos
normativos da pesquisa, como consequência de sua ênfase no desenvolvimento
da ciência na ciência política. Criticou-se o favorecimento das democracias
industrializadas, cujos estudos apresentavam um modelo de como os governos
deveriam ser. Também, a ênfase nas instituições formais-legais, que tendeu
a excluir países com arranjos menos formalizados. Segundo, a partir do
pressuposto de que os atores políticos são indivíduos, o foco apropriado da
pesquisa passou a ser os indivíduos e seu comportamento. No behaviorismo, o
individualismo é importante não apenas metodologicamente mas, também,
porque o foco da pesquisa é o indivíduo. Na abordagem da escolha racional o
pressuposto da maximização da utilidade tende a dirigir a abordagem e dar a
ela o poder analítico.
Outro aspecto comum aos dois movimentos, apresentado por Peters (1999) como
"inputism", foi a crítica à tendência do velho institucionalismo de
concentrar-se nas instituições formais do governo e nas constituições que
produziam essas estruturas. Nesse sentido, o behaviorismo concentrou-se nas
demandas da sociedade ao sistema político enquanto a abordagem da escolha
racional se fixou no entendimento das instituições como meios para agregar
as preferências dos indivíduos. Essa última nega o fato de as instituições
moldarem as preferências – isso tende a ser exógeno e determinado
previamente à participação nelas – mas credita às instituições alguma
influência sobre os participantes, mesmo que seja pelo fato de que as
regras estabelecem padrões para o comportamento individual.
O sucesso alcançado por esses dois movimentos é o pano de fundo contra o
qual o novo institucionalismo se coloca. Não é o caso de um retorno ao
status quo anterior, mas apontou-se a necessidade de reafirmar algumas
características da velha análise institucional.
Ao mesmo tempo em que ocorria o choque da revolução behaviorista,
desenrolava-se nos domínios da ciência política o processo de recepção das
ideias de função, estrutura e de sistema, principalmente a partir de
teorias gerais da antropologia e da sociologia. De origem positivista, o
enfoque funcionalista leva a admitir que toda atividade social e cultural é
funcional ou desempenha funções e, portanto, é indispensável. A função de
toda atividade recorrente é seu papel na vida social e sua contribuição
para sustentar as estruturas. O fato isolado, enquanto tal, não possui
significado.
As críticas e a abertura para o novo institucionalismo
Para Immergut (2006) os novos institucionalistas rejeitam o comportamento
observado como base da análise política e não acreditam que este seja
suficiente para explicar os fenômenos do governo. Como o comportamento
ocorre no contexto das instituições, somente nele poderá ser compreendido.
Para a autora, a crítica institucionalista questiona a premissa de que o
comportamento político revela preferências – ou seja, de que as
preferências manifestas são as verdadeiras preferências do indivíduo. Os
institucionalistas acreditam e estão interessados na distinção entre
preferências expressas e reais, e em explicar as razões pelas quais os
atores escolhem uma específica manifestação de seus interesses. Uma segunda
crítica institucionalista rejeita a ideia de as decisões políticas serem
baseadas na agregação de preferências individuais. Os mecanismos pelos
quais as decisões são agregadas não as somam, mas as remodelam por meio de
discussões e redefinição de prioridades e preferências. Ou seja, esses
mecanismos permitem a tomada de decisões mesmo quando não existe um
consenso aparente. Por último, ainda segundo a autora, se os processos
políticos são assumidos como decisivos – interesses não são vistos como
avaliações subjetivas, e decisões não mais vistas como o somatório dos
interesses individuais – os desvios na atuação imparcial das instituições
devem ser analisados e devem ser sugeridas formas de melhorar os resultados
institucionais, na direção de maior justiça.
March e Olsen (1984), também apresentam uma crítica à perspectiva
behaviorista predominante na ciência política nos anos 1950 e 1960, que
tendia a retratar a política
"as a reflection of society, political phenomena as the
aggregate consequences of individual behaviour, action as
the result of choices based on calculated self-interest,
(….) and decision making and the allocation of resources as
the central foci of political life (March e Olsen 1984:
734).
Para esses autores, a ciência política pode ser caracterizada nas palavras-
chave: contextualista, reducionista, funcionalista, instrumentalista e
utilitária. A ideia do contextualismo é muito similar ao "inputismo"
cunhado por Peters (1999): uma tendência de subordinar o fenômeno político
a um fenômeno contextual, como o crescimento econômico ou a estrutura de
classes. Mais importante ainda, a política depende da sociedade, em
contraste à dependência do Estado e das leis ou à existência de mútua
dependência entre Estado e sociedade. Como reducionista, os autores
referiam-se à tendência de reduzir o comportamento coletivo ao individual e
creditar os resultados ao nível coletivo às interações entre os indivíduos.
O funcionalismo, representado na perspectiva estruturo-funcionalista,
assumiu que as sociedades se desenvolvem em direção a altas formas de
organização política e ao equilíbrio: a história como processo eficiente
que leva ao equilíbrio. O domínio dos resultados sobre os processos,
identidades e outros valores sócio-políticos deu o caráter instrumentalista
da ciência política. E, finalmente, o fato de valorizar as decisões pelo
que produzem para o indivíduo, mais do que pelo fato de terem um valor
intrínseco, deu a esse campo seu caráter utilitarista.
Em que pesem todas as críticas com relação às características das
abordagens behaviorista e da escolha racional, especialmente aquela
referente ao contextualismo permitiu aos teóricos falar em "trazer o Estado
de volta", como um principal evento teórico na ciência política à época.
Segundo Marsh e Olsen (1984) o maior significado teórico das ideias
contidas no contextualismo é sua tendência de ver as relações causais entre
a sociedade e a política indo no sentido da primeira para a última, e não
no sentido inverso. "It is assumed that class, geography, climate,
ethnicity, language, culture, economic condictions, demography, technology,
ideology and religion all affect politics but are not significantly
affected by politics" (MARSH e OLSEN, 1984:735).
Os debates em torno do Estado capitalista, especialmente aqueles colocados
por neomarxistas, a partir de meados dos anos 1960, forneceram compreensões
alternativas de suas funções: alguns o viam como instrumento de dominação
de classe, outros como garantia objetiva das relações de produção ou
acumulação econômica, outros como arena de lutas políticas de classe. No
nível teórico, Amenta (2005) ressalta que praticamente todos os estudiosos
neomarxistas, nesse contexto, mantiveram enraizadas premissas centradas na
sociedade, considerando os Estados como moldados pelas lutas de classes e
funcionando para preservar e expandir modos de produção. Descartavam,
portanto, a ação autônoma dos Estados e buscavam generalizações acerca de
suas características e funções dentro de um modo de produção, uma fase de
acumulação capitalista ou uma posição no sistema mundial, dificultando
colocar um peso causal nas variações das estruturas e atividades do Estado
entre diferentes países.
O autor aponta acerca da centralidade do Estado em algumas análises nos
primeiros 30 anos após a II Guerra: por exemplo, estudos ancorados em
teorias pluralistas estiveram interessados em decisões legislativas tomadas
por atores políticos, especialmente aqueles eleitos. Contudo, ressalta que
o Estado permaneceu conceitualmente e teoricamente periférico nas análises.
No final dos anos 1960 e início dos anos 1970, neomarxistas referiam-se a
um Estado capitalista, relativamente autônomo e com ações influenciadas
principalmente por determinantes de classe, como as elites econômicas.
Na avaliação de Skocpol (1985), as mudanças ocorridas após a II Guerra
Mundial tornaram menos plausível a visão centrada na sociedade. A revolução
keynesiana (entre os anos 1930 e 1950), o desmantelamento dos impérios
coloniais e as incertezas da competição econômica internacional, a partir
dos anos 1970 – pressionando EUA e Reino Unido –, teriam trazido a
discussão do Estado como ator e definidor das estruturas institucionais.
Nesse ponto, a autora enfatiza que a centralidade política adquirida pelo
setor público e o fato de EUA e Reino Unido tornarem-se "mais parecidos com
sociedades de Estado particulares" em um mundo mais competitivo e
independente, abriram caminho para uma mudança paradigmática nas ciências
sociais, envolvendo fundamentalmente o papel do Estado em relação às
economias e à sociedade.
Como relatado anteriormente, desde o século XIX países continentais da
Europa pensavam a realidade institucional do Estado e seu impacto na
sociedade. Principalmente na Alemanha, Weber o via como um sistema
administrativo, legal, burocrático e coercitivo, com variações nos
diferentes países, que objetivava estruturar as relações entre a sociedade
e a autoridade, bem como aquelas dentro da sociedade. Hintze, como citado
por Skocpol (1985), analisa as formas pelas quais as estruturas e ações do
Estado são condicionadas por contextos transnacionais, historicamente em
mudança. Portanto, como afirmado pela autora, o Estado moderno, como
conhecemos e como Weber e Hintze conceituaram sempre foi, desde seu
nascimento na história europeia, parte de um "sistema de Estados em
competição e mutuamente envolvidos" (tradução própria).
Na concepção weberiana o Estado é um conjunto de organizações políticas que
exercem controle sobre o território e as pessoas e se empenha em atividades
legislativas, executivas, militares e políticas. Dentro de seus territórios
tem o monopólio da força e buscam manter a ordem e, frequentemente, almejam
a expansão territorial e competem com outros Estados. Em sua função de
manter a ordem e exercer a autoridade legítima os Estados estruturam
relações entre autoridades políticas e cidadãos, e relações sociais entre
diferentes grupos de cidadãos (AMENTA, 2005).
A mudança conceitual do Estado a partir dos anos 1980 critica o foco
empírico do pluralismo – centrado em quem participa e prevalece nos
processos decisórios – e o foco elitista, pautado na influência dos grupos
de elite. Também critica a abordagem marxista, que sugere que todos os
Estados nas sociedades capitalistas agem de forma similar. A mais ampla
ruptura com outras perspectivas teóricas, como apontado anteriormente,
refere-se à influência causal do Estado na vida política. Na concepção
Tocqueviliana – cunhada por Skocpol (SKOCPOL apud AMENTA) –, as
instituições do Estado podem ser configuradas de diferentes formas, por
razões diversas, e a extensão desses arranjos por um longo tempo pode
influenciar os padrões e processos políticos. Esse argumento sugere que o
poder político seria estruturalmente determinado e a conformação do Estado
poderia influenciar quais lutas políticas são prováveis de acontecer e
quais grupos podem ganhar. Esse papel causal atribuído ao Estado implicou
em diferenças fundamentais com outras teorias: as instituições políticas
tem impactos nas identidades políticas, interesses, preferências e
estratégias dos grupos; e estruturas macro do Estado, como
centralização/descentralização da autoridade, autonomia dos poderes, ritmos
e níveis de democratização, dentre outros, podem moldar padrões de
políticas. Os Estados importam como atores: enquanto organizações podem ter
maiores ou menores graus de autonomia para definir políticas e capacidades
para executá-las (AMENTA, 2005).
Nesses pressupostos, March e Olsen argumentam pela criação de um novo
institucionalismo, que mistura elementos do velho institucionalismo e
coloca desafios ao pensamento teórico (PETERS, 1999). Retira-se a ênfase na
dependência da política na sociedade em favor de uma interpendência entre
instituições políticas e sociais relativamente autônomas; da primazia dos
micro-processos e da eficência da história em favor de processo mais
complexos e da ineficiência da história; e de metáforas da escolha e
alocação de resultados em favor de outras lógicas de ação e da centralidade
dos significados e ações simbólicas. À concepção tradicional de que os
resultados são função da distribuição de preferências entre os atores, da
distribuição de recursos e das restrições impostas pelas regras do jogo, o
novo institucionalismo argumenta que: i- as preferências e os significados
se desenvolvem na política, por meio da combinação da educação, doutrinação
e experiência, não sendo, portanto, endógenos nem estáveis; ii- a
distribuição de recursos políticos é afetada pelas instituições políticas e
afeta o poder dos atores políticos que, por sua vez, afetam as
instituições; e, iii- as regras do jogo não são completamente impostas por
um sistema externo – exógenas: são também desenvolvidas dentro do contexto
das instituições políticas (MARSH e OLSEN apud PETERS, 1999).
Immergut (2006), considerando que as premissas básicas do novo
institucionalismo – preferências ou interesses expressos em ações não devem
ser confundidos com "verdadeiras preferências"; métodos de agregação de
interesses trazem distorções; e que configurações institucionais podem
privilegiar alguns interesses e podem necessitar de reformas – são parte de
uma "tradição muito mais antiga na teoria social e política", sugere,
então, a ideia de que seria melhor considerar a abordagem de uma tradição
institucional, sem ressaltar diferenças entre o "velho" e o "novo"
institucionalismo.
A teoria institucionalista
Para March e Olsen (1984) o institucionalismo é frequentemente expresso em
termos de um contraste entre a complexidade da realidade e as
simplificações fornecidas pelas teorias existentes. A pesquisa teórica é
limitada pela capacidade humana de lidar com a complexidade e, embora
pareça expandir com o tempo, essa é modesta em relação às demandas de uma
teoria completamente contextual e institucional. Do ponto de vista da
pesquisa teórica, (…)"the new institucionalism is probably better viewed as
a search for alternative ideas that simplify the subtleties of empirical
wisdom in a theoretically useful way" (March e Olsen, 1984, p 747).
O trabalho de Skocpol (1985), no desenho de uma referência conceitual e de
hipóteses de médio alcance para informar a pesquisa institucionalista,
apresentou duas tendências: o exame de argumentos sobre a autonomia do
Estado e suas capacidades como ator político, e o exame de argumentos
acerca dos impactos no conteúdo e funcionamento das políticas. Segundo a
autora, o conceito de autonomia considera o Estado como ator que formula e
persegue seus próprios objetivos, que não são o simples reflexo das
demandas de grupos de interesse, classes ou da sociedade. A ação autônoma
pode ser explicada pela existência de orientações extranacionais, de
desafios para manter a ordem doméstica e pelos recursos que
funcionários/burocratas possam organizar e utilizar em dadas situações.
Ressalta que a autonomia não é uma característica estrutural fixa: ações
autônomas de formulação de estratégias e políticas, seja pelas elites ou
burocracias, podem se dar a partir de crises em contextos que, de outra
forma, não precipitariam essas ações, e o potencial para a ação autônoma
pode mudar com o tempo, assim como também as organizações do Estado podem
se transformar internamente e em relação aos grupos da sociedade.
Um outro aspecto da autonomia das ações do Estado é sua racionalidade.
Skocpol (1985) discute a capacidade dessas ações alcançarem interesses não
esperados pelas decisões governamentais, influenciadas por demandas de
grupos de interesse. Nessa perspectiva, espera-se que os funcionários sejam
capazes de formular estratégias de longo prazo que transcendam demandas
parciais, o que leva a críticas, especialmente relacionadas à capacidade de
conhecimento dos problemas reais e de suas soluções. De acordo com a
autora, por mais apropriada que seja a ação do Estado ela nunca será
realmente desinteressada: toda ação beneficia mais a algum interesse social
e as ações assumem formas que buscam reforçar a autoridade, longevidade e
controle social das organizações que as realizaram. Skocpol (1985) discute
também, como componente da autonomia do Estado, a capacidade de implementar
as políticas formuladas. Aqui estão envolvidas a integridade do Estado, o
controle administrativo-militar do território, a existência de funcionários
leais e capacitados e recursos financeiros suficientes. A autora ressalta
que esses recursos devem estar enraizados "em relações institucionais
lentas para mudanças e relativamente imunes a manobras de curto prazo". Do
ponto de vista endógeno, o Estado tem diferentes capacidades para cumprir
seus objetivos dependendo da área sobre a qual pretende intervir e essas
capacidades também são afetadas por tipos particulares de ambientes
socioeconômicos e políticos, constituídos de atores com interesses e
recursos próprios.
Em relação ao impacto no conteúdo e nos padrões de políticas, Skocpol
(1985) aponta que a configuração do Estado, combinada com seus padrões de
atividades, afeta sua cultura política, reforça algumas formações de grupos
e ações políticas coletivas (e não outras) e torna possível o surgimento de
certas questões políticas (e não outras). Conforme a autora, aqui tem-se
uma estrutura alternativa de referência, talvez mais importante do que a
visão do Estado como ator. O olhar é mais macroscópico, direcionado às
formas pelas quais as estruturas e atividades influenciam, não
intencionalmente, a formação de grupos e as capacidades políticas, ideias e
demandas da sociedade. Considera-se que a força ou fragilidade do Estado
como local de ações mais ou menos independentes de funcionários constituem
um aspecto chave da configuração organizacional e dos padrões de
atividades.
Para Amenta os argumentos propostos por Skocpol (1985) formam mais um
arcabouço teórico e um desenvolvimento conceitual do que uma teoria.
Posteriormente, outros estudos especificaram argumentos causais utilizando
esse arcabouço: o programa teórico inicial Estado-centrado – que o trata
como importante força causal – evoluiu, nas últimas décadas, para um
programa político-institucional. Ao argumento "Tocqueviliano" foram
adicionados argumentos relativos à construção de outras instituições,
incluindo partidos políticos. Para alguns teóricos os argumentos tornaram-
se mais estruturais e sistêmicos e instituições mais permanentes são vistas
como influência para todos os grupos e primordiais para os resultados de
interesse. Para outros, o institucionalismo foca-se mais em processos
históricos e é dada maior atenção à interação de atores em um nível médio,
interorganizacional. Assume-se que as instituições de nível macro moldam as
políticas e os atores, que podem impactar nos Estados e nas políticas,
remodelando as instituições nesse processo, e assim por diante.
A partir do início dos anos 1990 a teorização institucionalista esteve mais
focada no impacto dos contextos políticos do que no papel dos atores
burocráticos do Estado. A argumentação comparativa teórica busca explicar
mudanças nos resultados dos processos políticos e preencher algumas lacunas
do projeto teórico inicial, afirmando que as mudanças nas políticas do
Estado tem o potencial de reconfigurar os contextos e, com eles, as
identidades, interesses e ações. Além disso, argumenta-se que a forma que
um determinado programa assume pode influenciar seu futuro político,
determinando se os grupos irão se mobilizar em seu suporte. Aqui, a
teorização foca-se não em estruturas e processos de grande escala, mas
naqueles de pequena escala.
Amenta (2005) ressalta que a argumentação neo-institucionalista tem sido
mais coerente em sua forma estrutural-sistêmica, embora as implicações dos
processos políticos e resultados sejam delimitadas tanto no grau em que
explicam quanto em termos das situações às quais podem ser aplicadas.
Ressalta também que as teorias tem se tornado históricas, por natureza: o
processo político é moldado na medida em que o Estado influencia a ação
política, que influencia o Estado em um ponto posterior no tempo. No
entanto, o autor adverte quanto aos desafios ao projeto teórico: não tem
sido frequentemente estendido a vários casos e processos. Para garantir
maior contribuição e evitar tornar-se um arcabouço, necessita fazer
afirmações teóricas mais abrangentes acerca das possíveis consequências de
diferentes configurações de instituições e atores nos resultados e
processos de interesse. Ou seja, desenvolver configurações teóricas nas
quais se conectem instituições políticas no nível sistêmico a atores e
relações entre eles no nível médio, e a processos e resultados. A
teorização deve ir além dos casos em estudo.
Abordagens do novo institucionalismo
O institucionalismo contém diferentes abordagens do fenômeno institucional.
No entanto, para Peters (1999) existem alguns vínculos fundamentais entre
elas que as tornam particularmente institucionais. Para esse autor, o
elemento mais importante é que as instituições são características
estruturais de uma sociedade ou política, que podem ser formais –
legislaturas, arcabouço legal, burocracia pública, por exemplo –, ou
informais – conjunto de normas compartilhadas ou uma rede de organizações
interagindo. Assim, transcendem os indivíduos para envolver grupos, em
alguma forma de interações padronizadas. Segundo, existe alguma
estabilidade nas instituições ao longo do tempo, embora algumas vertentes
do institucionalismo considerem a existência de características muito
estáveis das instituições – que, portanto, predizem e tornam arraigados
alguns comportamentos –, e outras que as tornam mais mutáveis. Terceiro,
uma instituição deve afetar o comportamento individual, o que pode se dar
formal ou informalmente. Por último, devem existir valores e significados
compartilhados entre os membros da instituição. Cabe ressaltar, no entanto,
que é possível encontrar, no âmbito do novo institucionalismo, diferentes
definições de instituição. Como ressalta Menicucci (2007), "o termo
"instituição" assume significados diversos em contextos analíticos
distintos, com base em uma concepção genérica de instituição como um padrão
de comportamento estável, recorrente e valorizado." (MENICUCCI, 2007: 24).
Tradicionalmente distinguem-se três tipos de institucionalismo –
institucionalismo sociológico, institucionalismo da escolha racional e o
institucionalismo histórico – que, apesar de diferirem em sua abordagem, se
vinculam pelos aspectos relacionados acima e concordam em um ponto: as
instituições importam. As instituições políticas, sociais e econômicas
tornaram-se maiores, mais complexas, detêm mais recursos e, portanto, tem
mais importância na vida coletiva. Para Thelen e Steinmo (1992) duas dessas
abordagens emergiram no novo institucionalismo: o institucionalismo
histórico e o institucionalismo da escolha racional.
O institucionalismo sociológico, originado da teoria organizacional, retoma
a preocupação clássica com as instituições: o velho institucionalismo
sociológico preocupava-se em ver como as entidades coletivas criavam as
instituições que modelavam as condutas; o novo se preocupa em compreender e
explicar a forma como os atores, enraizados dentro de estruturas sociais,
moldam suas crenças e preferências, bem como em explicar o que confere
legitimidade aos arranjos institucionais. Indivíduos e organizações estão
em busca de definir ou exprimir identidades conforme modelos e normas
socialmente aceitos. A identidade dos atores é exógena e a racionalidade
dos indivíduos é socialmente construída. As instituições são definidas em
termos de normas, valores, culturas e ideias, e moldam a percepção dos
atores, condicionando seu comportamento a favor de sua reprodução.
O institucionalismo sociológico fornece, principalmente, uma perspectiva
cultural ampla da política, argumentando que muitos dos procedimentos e
estruturas institucionais respondem a práticas culturais específicas de
determinada sociedade. Parte da convicção de que existe um vínculo direto
entre os valores culturais de uma sociedade ou organização e as estruturas
formais que se constroem nesse contexto. Em proximidade com o
institucionalismo histórico – e em contraste com o institucionalismo da
escolha racional – essa perspectiva foca mais no processo de criação e
configuração das instituições do que na análise dos produtos e resultados
de sua ação. Considera, também, os processos de mudança institucional como
variáveis dinâmicas e cumulativas no tempo: valores existentes previamente
conformam o substrato sobre o qual serão enraizados os novos valores. Por
outro lado, considerando as possíveis dificuldades de fusão entre distintos
valores, esses substratos atuarão como limites às opções de mudança.
De acordo com Thelen e Steinmo (1992) as abordagens do institucionalismo
histórico e da escolha racional compartilham a questão de como as
instituições moldam as estratégias políticas e influenciam os desfechos. No
entanto, para a escolha racional as instituições tem importância enquanto
componentes de um contexto estratégico, impondo constrangimentos ao
comportamento individual. Ou seja, as instituições são importantes porque
definem as estratégias que os atores podem adotar.
Considerando que a teoria da escolha racional depende de sua força
analítica em relação à maximização da utilidade das decisões individuais,
pode parecer contraditório e inapropriado relacionar essa teoria às
instituições. No entanto, os institucionalistas da escolha racional
entendem que a maior parte da vida política ocorre nas instituições e que
para fazer uma análise abrangente da política as teorias devem incorporar o
papel das instituições. Nas abordagens teóricas da escolha racional as
instituições são entendidas como o conjunto de regras e incentivos que
estabelecem as condições para a racionalidade e um "espaço político",
dentro do qual atores políticos interdependentes podem atuar (PETERS,
1999). Nessa abordagem claramente existem os atores, e não apenas um
conjunto de regras e normas.
Uma questão central ao institucionalismo da escolha racional é como os
indivíduos e instituições interagem para criar as preferências. O argumento
é de que indivíduos envolvidos em uma instituição devem assimilar
rapidamente as normas às quais se acomodam mais facilmente e aceitar
valores institucionais para que sejam bem sucedidos. À medida que as
instituições tornam-se mais bem sucedidas, os indivíduos são mais capazes
de moldar as preferências individuais, o que, algumas vezes, pode acontecer
mesmo antes de eles juntaram-se formalmente a uma instituição. De acordo
com Peters (1999), algumas preferências parecem ser exógenas, enquanto
outras podem ser endógenas às instituições.
Na avaliação de Peters (1999) a abordagem institucionalista da escolha
racional parece interessada principalmente na manipulação do desenho das
instituições, mais do que tornar-se um mecanismo para entender sua
natureza. Assume a existência de um elemento comportamental – a maximização
individual – e destaca a produção de comportamentos diferenciados, como
free-riding e fuga. A abordagem passa, então, a projetar instituições que
utilizarão o comportamento dos indivíduos para produzir alguns resultados
socialmente desejáveis. Ou seja, o reconhecimento da capacidade das
instituições de moldar o comportamento dos indivíduos leva ao
desenvolvimento de instituições que possuem determinados incentivos que
poderão produzir os resultados desejáveis. Aqui as instituições são
entendidas como um conjunto de motivações positivas – os incentivos –, ou
negativas – as regras –, sendo que a maximização da utilidade individual
fornece a dinâmica para o comportamento dentro dos modelos dados.
O institucionalismo da escolha racional, portanto, tem como assumido: i –
os indivíduos são atores centrais do processo político e agem racionalmente
aos incentivos e restrições das instituições, para maximizar a utilidade
individual; ii- espera-se que a maioria dos indivíduos respondam da mesma
forma a esses incentivos e restrições; iii- a abordagem tenta resolver o
"dilema de Arrow" de como os grupos podem tomar decisões que satisfazem as
condições de uma função social sem ter essas decisões impostas por uma
autoridade; iv- as instituições criam uma "estrutura de equilíbrio
induzido" (SHEPSLE apud PETERS, 1999:46) por meio de suas regras, o que
torna certos tipos de resultados mais possíveis; v- as instituições
desenvolvem configurações que irão garantir a conformidade de seus membros
com o desejo dos principais; vi- os resultados são determinados pela
natureza dos incentivos construídos nas instituições.
Em contraste com o institucionalismo histórico, e também com o sociológico
– que assume a persistência dos valores aprendidos e internalizados pelos
indivíduos – parece que a história tem pouca relevância no
institucionalismo da escolha racional e que um novo conjunto de incentivos
pode facilmente produzir mudanças no comportamento dos indivíduos.
Já os institucionalistas históricos compartilham com as outras abordagens a
ideia de que as instituições definem ou constrangem as estratégias adotadas
pelos atores, mas argumentam que o papel das instituições é maior do que
aquele sugerido pela escolha racional (THELEN e STEINMO, 1992). Tendem a
ver os atores políticos não como conhecedores e maximizadores racionais,
mas como seguidores de regras societárias definidas, mesmo isso não sendo
diretamente do interesse individual. Segundo Thelen e Steinmo (1992) as
duas abordagens, de forma mais central, diferem quanto à formação de
preferências. A escolha racional lida com as preferências no nível de
premissas; para os institucionalistas históricos, dada a complexidade da
matriz de instituições, nas quais os indivíduos se movimentam, eles são
motivados por um mix de preferências, algumas vezes conflitantes. Os
institucionalistas históricos entendem que é necessária uma análise pautada
historicamente para avaliar o que os atores tentam maximizar e porque
enfatizam certas metas em relação a outras. No institucionalismo histórico
as preferências são tratadas como endógenas. As instituições moldam não
apenas as estratégias dos atores, mas também suas metas e, mediando as
relações entre esses, estruturam situações e deixam sua marca nos desfechos
políticos.
O institucionalismo histórico, como dito, emprega estratégias de pesquisa
histórica para fazer teorias gerais. Nessas explicações todo tipo de
estrutura institucional importa. Sua abordagem tem afinidade com a
teorização político-institucional – que se baseia na estrutura do Estado e
de outras instituições políticas como sistemas eleitorais e partidos –, mas
a sobreposição não é completa. Segundo Amenta (2005), os institucionalistas
históricos podem não atribuir papel causal central às instituições
políticas, em determinada análise e, ao invés, basear-se em instituições
econômicas e sociais.
O institucionalismo histórico
A abordagem histórico-institucional, segundo Thelen e Steinmo (1994), tem
sido amplamente aplicada empiricamente e o que a torna tão atrativa "is the
theoretical leverage it has provided for understanding policy continuities
over time within countries and policy variations across countries" (THELEN
e STEINMO, 1994: 10). Para esses autores o institucionalismo histórico
propiciou a construção de importantes pontes ao nível teórico de médio
alcance: por exemplo, entre as análises centradas no Estado e aquelas
centradas na sociedade, por meio do estudo dos arranjos institucionais que
estruturam a relação entre essas instituições; e entre grandes teorias, que
mostram a regularidade entre países, e relatos mais concisos sobre casos
nacionais específicos, por meio da focalização em variáveis de nível
intermediário que identificam fontes comuns de variação entre eles.
O foco principal do institucionalismo histórico são os processos de
formulação e implementação de decisões políticas, considerando sua evolução
e sequências históricas, buscando explicar distintos processos a partir da
premissa de que as instituições condicionam e determinam, em grande medida,
o comportamento dos atores políticos, delimitando sua possibilidade de ação
e distribuindo os recursos existentes.
Mais especificamente, Immergut (2006) considera que o objeto comum entre as
vertentes do novo institucionalismo é o estudo dos efeitos institucionais,
ou seja, "a caixa-preta entre as potenciais demandas políticas e os
resultados finais". Nesse sentido, o institucionalismo histórico, ao tratar
de interesses que mudam com o tempo e entre culturas, permite que a
disparidade entre preferências "potenciais" e "expressas" seja abordada sem
a necessidade de "inventar uma teoria sobre os "reais" interesses dos
atores" (IMMERGUT, 2006:184). Nesta visão apresentada pela autora, no
institucionalismo histórico as decisões políticas são o complexo resultado
da combinação de fatores, como características dos regimes políticos ou
resultantes de lutas pelo poder e, como não existe o pressuposto de que as
instituições alcancem o equilíbrio, a explicação para as mudanças
institucionais não fica difícil. As instituições não determinam o
comportamento, mas oferecem o contexto para a ação, ajudando a entender
porque são feitas as escolhas; as instituições não moldam as percepções dos
indivíduos tornando-os incapazes de diferenciar identidades e interesses.
Uma questão do institucionalismo histórico é a forma como as instituições
moldam os objetivos que dos atores institucionais e como estruturam as
relações de poder entre eles, privilegiando alguns em detrimento de outros.
Peter Hall, citado por Thelen e Steinmo (1994), considera que, por um lado,
a organização do processo de decisão política afeta o grau de poder dos
atores sobre os resultados e, por outro, a posição dos atores no processo
influencia a definição de seus interesses. Ou seja, fatores organizacionais
afetam tanto o grau de influência de ator na política quanto a direção
dessa influência. Mas, para os autores, o que está implícito em qualquer
definição do institucionalismo histórico é que as instituições constrangem
e mudam a direção das políticas, mas não são a única causa desse processo.
"Institutional analyses do not deny the broad political forces that animate
various theories of politics: class structure in Marxism, group dynamics in
pluralismo. Instead, they point to the ways that instituctions structure
these battles and in so doing, influence their outcomes" (THELEN e STEINMO,
1994:3). No entanto, a análise está focada em esclarecer como as variáveis
se inter-relacionam.
De acordo com Pierson e Skocpol (2008) três aspectos caracterizam os
estudos contemporâneos do institucionalismo histórico: i- abordam questões
amplas, frequentemente originadas da identificação de variações do mundo
real ainda não explicadas, ou da constatação de padrões empíricos
contrários ao conhecimento acadêmico ou à sabedoria popular; ii- dão muita
importância à questão temporal, o que dá originalidade ao projeto, no
sentido de rastrear as sequências de origem e transformação de determinado
fenômeno; e, iii- analisam contextos macro em busca de efeitos entre as
instituições e os processos analisados, fornecendo uma alternativa aos
enfoques estruturalistas que partem da premissa de que um conjunto de
condições socioeconômicas ou políticas determinaria resultados similares em
distintas regiões. Para esses autores provavelmente a característica mais
distinta do enfoque histórico do institucionalismo seja o fato de tomar
seriamente a história, "mucho más que eventos situados en el pasado"
(PIERSON e SKOCPOL, 2008:12). Os processos são analisados ao longo do
tempo, o que amplia o campo da experiência examinada, permite a obtenção de
mais dados e uma maior variação nos resultados. Por outro lado, a
investigação informada historicamente permite a observação dos limites ou
efeitos temporais das questões relativas às relações causais: possibilidade
de que efeitos supostamente universais sejam devidos, na verdade, a
circunstâncias particulares. Ou seja, como afirmam Pierson e Skocpol
(2008), os esforços para rastrear sistematicamente processos sociais podem
trazer uma contribuição essencial às afirmações acerca da causalidade.
Para Hall e Taylor (2003) quatro características do institucionalismo
histórico são relativamente originais em relação às outras abordagens do
institucionalismo: i- tende a conceituar a relação entre as instituições e
o comportamento individual em termos gerais; ii- enfatiza as assimetrias de
poder associadas ao funcionamento e desenvolvimento das instituições; iii-
privilegia as trajetórias, situações críticas e as consequências
imprevistas na formação da concepção de desenvolvimento institucional; e,
iv- na explicação das situações políticas busca combinar a contribuição das
instituições com uma avaliação da contribuição de outros fatores, como as
ideias.
A análise da relação entre as instituições e os indivíduos, para esses
autores, apresenta dois tipos de resposta – "calculadora" e "cultural" – a
três questões básicas: Como os atores se comportam? O que fazem as
instituições? Porque as instituições se mantém?
Na resposta à questão de como os atores se comportam, a perspectiva
"calculadora" dá ênfase aos aspectos instrumentais e orientados a um
cálculo estratégico do comportamento dos indivíduos: traz a ideia da
maximização da utilidade individual e os objetivos são definidos geralmente
de forma exógena. A perspectiva "cultural" reconhece o comportamento
racional os indivíduos, mas enfatiza que recorrem a protocolos
estabelecidos ou modelos de comportamento conhecidos.
As instituições, na perspectiva "calculadora", afetam o comportamento dos
indivíduos oferecendo informações quanto ao comportamento presente e futuro
de outros atores, e incidindo sobre as expectativas de um ator quanto às
ações que outros atores possam realizar como reação ou concomitantes às
suas. Na perspectiva "cultural" as instituições não apenas fornecem
informações estrategicamente úteis, mas também afetam a identidade e as
preferências por meio de "filtros de interpretação" (HALL e TAYLOR, 2003).
Por outro lado, na perspectiva "calculadora" as instituições se mantem
porque os indivíduos aderem a modelos de comportamento, avaliando que
perderão mais ao rechaça-los (equilíbrio de Nash); e, na perspectiva
"cultural", porque estruturam suas próprias decisões relativas a uma
possível reforma que o indivíduo possa desejar.
Com relação à distribuição do poder, os institucionalistas históricos,
segundo Hall e Taylor (2003), tendem a focar sua atenção no modo como esse
poder é desigualmente repartido e insistir no fato de que alguns grupos
sociais são perdedores, enquanto outros são ganhadores.
Os institucionalistas históricos defendem uma causalidade social dependente
da trajetória – path dependent – e recusam o argumento tradicional de que
os mesmos estímulos produzem os mesmos resultados em todos os lugares.
Nesse sentido, os estímulos são modificados pelo contexto local e são,
principalmente, institucionais (HALL e TAYLOR, 2003). As instituições são
integrantes da história e um dos principais fatores de manutenção do
desenvolvimento histórico em relação a um conjunto de trajetos. O
institucionalismo histórico busca explicar como as instituições produzem os
trajetos: alguns institucionalistas dão ênfase às capacidades do Estado e
das políticas herdadas de estruturarem as decisões; outros, ao modo pelo
qual políticas adotadas no passado condicionam políticas posteriores.
Muitos institucionalistas históricos distinguem, no fluxo dos eventos
históricos, períodos de continuidade e situações críticas nas quais ocorrem
mudanças institucionais que levam a um novo trajeto do desenvolvimento. Uma
questão que se coloca é o que provoca as situações críticas (em geral, os
institucionalistas históricos apontam as crises econômicas e os conflitos
militares).
Por último, segundo Hall e Taylor (2003), os institucionalistas históricos
procuram situar as instituições em uma cadeia causal que comporta outros
fatores explicativos, especialmente o desenvolvimento econômico e a difusão
de ideias.
O processo histórico como estratégia da investigação
Da caracterização do institucionalismo histórico apresentada no início
dessa sessão há que se destacar alguns aspectos que justificam o fato de a
história ser tomada tão seriamente nessa abordagem. Um deles, mais
explícito, é o fato de que a extensão temporal da investigação amplia a
investigação, possibilitando maior quantidade de dados e maiores variações
nos resultados. É consenso entre os autores as possibilidades oferecidas
por este fator, dado que muitos dos objetos de análise são fenômenos que
ocorrem com pouca frequência, como, dentre outros, as revoluções e a
construção de estados de bem estar. Por outro lado, essa investigação tem
a possibilidade de revelar situações cujos efeitos supostamente universais
ocorram somente em circunstâncias particulares. Para Pierson e Skocpol
(2008) os esforços sistemáticos de rastreamento de processos sociais ao
longo do tempo – que comumente envolvem estudos com pequeno número de casos
– podem contribuir para afirmar ou desafiar afirmações causais. Ainda, a
atenção e a fundamentação teórica acerca das relações causais entre
variáveis no rastreamento de um processo podem revelar importantes
resultados cujas análises e explicação passariam desapercebidas em outros
formatos de investigação.
A dependência de trajetória – path dependence – é um exemplo central de
como a história pode ser crucial do ponto de vista da causalidade. Refere-
se à dinâmica dos processos de retroalimentação positiva, entendendo que
qualquer mudança ou reforma institucional é determinada pelos desenhos e
opções institucionais anteriores a ela. Ou, como no dizer de Pierson e
Skocpol (PIERSON e SKOCPOL, 2008:13), os processos de dependência de
trajetória "involucran uma lógica clara: los resultados de uma "coyuntura
crítica" desatan mecanismos de retroalimentacíon que refuerzan la
recurrencia de um patrón particular em el futuro". De acordo com os
autores, os processos path dependent podem ser influenciados por pequenas
perturbações no início, mas, uma vez que tenha ocorrido determinada
mudança, é provável que seja difícil reverter seu curso. Por outro lado, as
alternativas políticas que no início eram possíveis, podem tornar-se
irrecuperáveis. Daí se entende que os processos ou eventos e as conjunturas
críticas que os sucedem são cruciais.
A conjuntura crítica pode ser conceituada como um período de mudanças
significantes que produzem distintos legados. O elemento que produz essas
mudanças provem, em linhas gerais, do entorno político e social e,
geralmente, como citado anteriormente, consiste de processos excepcionais
como crises econômicas, conflitos militares ou, ainda, revoluções ou golpes
de Estado. Nesses momentos seriam produzidos os tipos de decisões que
condicionarão de forma determinante os desenvolvimentos posteriores. Nessa
perspectiva, é essencial reconhecer a sequência das decisões ou
configurações institucionais, que se deve, entre outras razões, ao fato de
que as opções foram, em cada caso, restringindo as alternativas existentes
para o passo posterior. Essa noção está estritamente vinculada ao conceito
de increasing return effect. A persistência institucional é produto de dois
fatores: a retroalimentação da própria política, por um lado, e a geração
de um funcionamento auto-referido, existente em qualquer processo de
desenvolvimento institucional.
O conceito de increasing return effects alude basicamente às causas da
reprodução institucional, fazendo referência aos mecanismos que as
instituições tem para reforçar seu funcionamento e continuar cumprindo seus
papéis. Para a compreensão dessa ideia, são identificados pelo menos quatro
processos. Primeiramente, a ideia de que os custos associados à criação e
consolidação de uma instituição são importantes, tornando complicada sua
substituição por outra. Segundo, a noção de "efeito de aprendizagem", que
enfatiza o fato de que após um tempo de funcionamento estável de uma
instituição, os atores a ela relacionados terão internalizado uma série de
procedimentos e fortalecido determinadas relações com outros atores
tornando, nessa lógica, complicadas as mudanças radicais. Aqui, é colocada
ênfase nos custos crescentes de passar de uma opção a outra, quanto maior
seja o tempo transcorrido desde a decisão inicial (PIERSON e SKOCPOL,
2008). Terceiro, inserem-se os problemas de coordenação: toda instituição
ou ator tem suas funções intimamente relacionadas com outros atores, o que
determina que qualquer mudança que ocorra irá alterar as relações entre
eles. Assim, quanto maior for a dificuldade para que o entorno se adapte às
mudanças na instituição, maiores serão os custos e as pressões que a mesma
deverá enfrentar. Por último, o conceito de retornos crescentes é explicado
em parte pelas expectativas de outras instituições em relação às mudanças.
As características desse conceito são a imprevisibilidade – os eventos tem
efeitos de longo prazo e ocorrem ao acaso; a não flexibilidade – quanto
mais avançado o processo, mais difícil a mudança para outro caminho; que
"tudo conta" – ou seja, mesmo eventos acidentais não devem ser ignorados,
visto poderem intervir no futuro; e, a ineficiência potencial do caminho –
ou seja, ao longo prazo o resultado final acaba gerando um rendimento menor
do que outras alternativas possíveis.
As inércias próprias de um caminho já iniciado e, portanto, as dificuldades
que os atores teriam para modificar esse caminho aludem ao efeito lock in.
Esse seria, de alguma forma, o efeito da noção de path dependence. Pierson
(PIERSON apud AMENTA, 2005) ressalta que programas maduros teriam efeito
lock in: dado que os indivíduos organizaram suas vidas em torno deles e, em
muitos casos, grupos de interesse se formaram, esses ganham "apoio" contra
seu corte.
Nas críticas ao modelo de path dependence questiona-se que seu enfoque
define que os grupos com maiores recursos de poder político ou econômico
sairiam vitoriosos das lutas pelo poder. Nesse sentido, argumenta-se que
não seria considerada a relevância das estratégias discursivas para
influenciar a tomada de decisões, o que muitas vezes não está
correlacionado ao tamanho do grupo. Na mesma linha, questiona-se que,
embora se suponha que os atores que se beneficiam das instituições tendam a
utilizar seus recursos para reforçar essa situação, nada impede que outros
grupos com capacidade de mobilizar recursos não desejem e sejam capazes de
promover a mudança. Isso fragilizaria a noção do efeito lock in. Quanto ao
efeito de aprendizagem, ao mesmo tempo em que pode reforçar o enraizamento
das instituições, pode implicar na importação de estratégias que impliquem
em mudanças substantivas no cenário existente.
Essa crítica ressalta que o enfoque analítico do institucionalismo
histórico está centrado na estabilidade e resistência institucional, mas
falha ao tentar explicar fenômenos associados à mudança. No entender de
Pierson e Skocpol (2008), talvez o modelo mais explícito de mudança
institucional seja o de "equilíbrio pontuado", que produz uma clara
distinção entre momentos de inovação institucional, determinados por
conjunturas críticas e aqueles de reprodução institucional, nos quais as
mudanças podem não passar de ajustes. Nesse modelo, as instituições são
caracterizadas por longos períodos de estabilidade, periodicamente rompidos
por crises, que trazem mudanças relativamente abruptas, após as quais
retorna-se à estagnação. Os arranjos institucionais ajudam a explicar os
desfechos durante os períodos de estabilidade. A crítica a esse modelo,
como apresentada pelos autores, é o fato de que "as instituições explicam
tudo, até não explicarem nada" (tradução própria). E, no momento da quebra
da situação vigente, a lógica do argumento é revertida de "instituições
moldam políticas" para "políticas moldam instituições". Portanto, segundo
os autores, seria necessário um modelo mais dinâmico para capturar a
interrelação das duas variáveis ao longo do tempo.
Em contraposição a essa tendência determinista, Thelen e Steinmo (1994)
apresentam a análise institucional proposta pelo caminho do "dinamismo
institucional": ir além da comparação estática para explorar as condições
políticas sobre as quais determinadas instituições tem consequências
específicas. Os autores apresentam quatro fontes de dinamismo
institucional, situações nas quais são identificadas variações no impacto
das instituições ao longo do tempo, dentro dos países. Primeiramente,
mudanças amplas no contexto socioeconômico e político, podem fazer com que
instituições latentes se desenvolvam. Segundo, mudanças no contexto
socioeconômico ou no balanço de poder podem fazer com que velhas
instituições sejam colocadas a serviço de diferentes finalidades, à medida
em que novos atores entram no jogo, perseguindo novas metas. Terceiro,
mudanças exógenas podem produzir uma alteração nas metas ou estratégias
dentro das instituições existentes (mudanças nos desfechos, por exemplo
quanto velhos atores adotam novas estratégias dentro de velhas
instituições). E, por último, as mudanças podem ocorrer quando os atores
ajustam suas estratégias para acomodar-se a mudanças nas próprias
instituições, o que pode ocorrer em momentos de quebras dramáticas (modelo
do equilíbrio pontuado) ou como resultado gradual de lutas políticas ou
movimentos contínuos dentro das instituições.
Uma segunda justificativa para o foco no processo histórico – central ao
institucionalismo histórico – é chamar a atenção para processos sociais
prolongados, de lenta evolução. Alguns processos são incrementais, levando
tempo para que os mecanismos causais e os desfechos venham a se produzir.
Outros podem necessitar uma "massa crítica" (PIERSON e SKOCPOL, 2008:16)
para que desencadeiem uma mudança – ou seja, tem efeitos menores até que
essa massa crítica seja alcançada. Outros podem envolver transformações que
ocorrem a qualquer tempo e, portanto, necessitam ser analisados em períodos
diversos para que seja constatada a transformação. Ainda, alguns processos
causais podem envolver cadeias com conexões variadas, que necessitam ser
investigadas por um período maior.
A análise das instituições no institucionalismo histórico
As questões no institucionalismo histórico abrangem, no dizer de Amenta e
Ramsey (2010), tanto seus aspectos teóricos quanto comparativos, no sentido
de que na análise e explicação do desenvolvimento político em mais de um
país, essas questões frequentemente tem motivações e implicações
comparativas. E, as questões abordadas são geralmente construídas a partir
da observação de falhas de conhecidas teorias em respondê-las.
O institucionalismo histórico, em grande parte, concentra a investigação no
desenvolvimento de políticas em uma área específica ou nas mudanças
organizacionais, adotando um enfoque de nível meso. Entretanto, seus
estudos podem alcançar desenvolvimentos de níveis macro, como ilustrado por
Pierson e Skocpol (2008): transformações intelectuais modernizadoras ou a
formação do Estado. Contudo, de acordo com esses autores, as análises
tendem a destacar as causas que operam nos níveis interorganizacionais ou
interinstitucionais e, diferentemente do institucionalismo da escolha
racional, analisam como as organizações e instituições se relacionam umas
com as outras e moldam os processos e resultados de interesse. Em resposta
ao questionamento quanto ao poder das afirmações dos efeitos institucionais
produzidos na análise de uma única instituição, geralmente o
institucionalismo histórico analisa efeitos das interações entre
instituições ou entre instituições e organizações.
O desenvolvimento institucional também é uma questão central para as
investigações no institucionalismo histórico, vinculada às teorizações
relativas à relevância causal ou sua origem, seguimento e processos
temporais. Esse foco assume que os efeitos das decisões institucionais são
produtos dos processos sociais, mais do que resultados das metas
estabelecidas por atores específicos. Por outro lado, ainda que os atores,
no desenho das instituições, objetivem metas no futuro, o cenário no qual
atuam é complexo e cheio de incertezas. Nesse sentido, as instituições
podem não cumprir as funções esperadas, mesmo quando atores tenham uma
visão de longo prazo. Em sentido contrário à prática de tratar
consequências não esperadas como erro, o institucionalismo histórico
destaca essas consequências no desenvolvimento das instituições. Ao mesmo
tempo, está atento aos efeitos da path dependence, demonstrando as formas
pelas quais as instituições são alteradas ao longo do tempo. Pierson e
Skocpol (2008) destacam que as instituições não são facilmente descartadas,
mas assumem uma qualidade de "níveis": as demandas novas são agregadas às
formas institucionais preexistentes. Ou, as antigas instituições
permanecem, mas adquirem novas funções.
Diferentemente do institucionalismo sociológico, como ressaltam Amenta e
Ramsey (2010), o institucionalismo histórico comumente não enfatiza a
convergência nos processos e resultados políticos, argumentando que
instituições políticas ou econômicas no nível dos países colocam diferenças
persistentes nesses países e ao longo do tempo.
Também crucial nessa abordagem, o "timing" no qual ocorre um evento ou uma
sequência de eventos é frequentemente um fator-chave para sua influência no
processo político (AMENTA e RAMSEY, 2010). Além disso, os investigadores no
institucionalismo histórico frequentemente limitam, temporalmente ou
espacialmente, a aplicabilidade dos argumentos causais e explicitam os
motivos e formas pelas quais as variáveis surgem e se combinam nesse
contexto definido. Além disso, usam justapor contextos diversos para
demonstrar como se comportam de forma diferente as variáveis, quando o
contexto relevante muda (PIERSON e SKOCPOL, 2003).
Considerações
A seguir são feitas algumas considerações acerca do novo institucionalismo
e, mais especificamente do instituicionalismo histórico que, no entanto,
não se propõem a abranger todas as possibilidades de debate e nem alcancá-
las com a possível e devida profundidade. Trata-se de algumas questões que,
ao longo dos trabalhos revisados nesses estudo, foram identificadas como
pontos comuns de discussão e que, portanto, valem o destaque.
Um dos focos de debate no novo institucionalismo recai na explicação sobre
a origem e as modificações institucionais. Sem intenção de esgotar essa
discussão específica, são apresentados aqui os argumentos de Hall e Taylor
(2003). Os autores consideram que as três abordagens compartilham pontos
comuns e entendem que essas afinidades teóricas contribuem para que o novo
institucionalismo constitua uma escola de pensamento mais completa, visto
integrar compreensões complementares sobre os processos sociais e
políticos.
De modo geral, as três abordagens do novo institucionalismo concebem o
processo de origem e mudança institucional de acordo com a posição, ou
peso, da ação humana. Assim, deve-se atentar para a forma como cada uma
considera o lugar das intenções e escolhas dos grupos de indivíduos no
processo de mudança institucional. O ponto central consiste no caráter
"macro" ou "micro" que as diferentes análises do novo institucionalismo
imputam às forças que atuam nesse processo.
O institucionalismo histórico reconhece que características herdadas do
passado influenciam fortemente o processo de criação e reforma
institucional. Essa perspectiva considera que cada contexto herda
determinadas propriedades institucionais que definem e estruturam as
escolhas posteriores dos grupos sociais. Vale lembrar que essa abordagem
destaca as relações de poder resultantes do desenvolvimento histórico das
instituições, que geram um acesso desigual dos grupos ao processo de
decisão. Aos grupos melhor posicionados na distribuição do poder caberia
também a capacidade de interferir e liderar os processos de mudança. Neste
sentido, o institucionalismo histórico combina a dimensão macro e micro em
suas análises, pois tanto processos históricos como iniciativas de grupos
detentores de poder podem explicar as transformações institucionais. No
enfoque sociológico bem como no da escolha racional verifica-se uma
divergência em relação à origem dos processos que alteram as estruturas
institucionais. Enfatizando o aspecto macro das forças sociais que atuam
sobre as instituições, o institucionalismo sociológico leva em consideração
como os próprios esquemas mentais dos atores estão repletos de significados
determinados pelas instituições, que estruturam suas intenções e
possibilidades de escolhas. Considerando extremos alguns postulados dessa
abordagem, Hall e Taylor (2003) afirmam que, em certos casos, o
institucionalismo sociológico parece privilegiar de tal modo os processos
macro-sociológicos que os atores em jogo parecem desvanecer-se ao longe,
tornando o resultado semelhante a uma "ação sem atores".
A perspectiva da escolha racional, por seu turno, reserva um grande espaço
à intencionalidade humana na determinação das mudanças institucionais Nessa
perspectiva, a existência de uma instituição é explicada pelo seu
desempenho aos olhos dos atores. Essa formulação pressupõe que a existência
de uma instituição depende da maneira como atende aos valores que os atores
consideram primordiais. As instituições devem sua sobrevivência ao fato de
oferecerem aos atores os benefícios decorrentes da realização daquele valor
considerado essencial que lhes originou. Os agentes da transformação
institucional são, portanto, os atores, que julgam o desempenho das
instituições e a partir disso determinam a sua sobrevivência.
Em relação ao institucionalismo histórico as críticas afirmam que é uma
tarefa difícil determinar a maneira pela qual essa abordagem define como as
instituições interferem nas ações dos indivíduos. Embora exista o
pressuposto de que o arcabouço institucional de uma comunidade seja um dos
principais fatores que estruturam o comportamento dos grupos e indivíduos,
a abordagem não define precisamente de que forma as instituições podem
afetar seu modo de agir, e concebe essa relação em termos muito gerais. No
entanto, um aspecto sugere como os institucionalistas históricos entendem a
influência das instituições sobre o comportamento humano: focalizam,
sobretudo, o modo pelo qual as instituições repartem o poder de maneira
desigual entre os grupos sociais, enfatizando o percurso histórico mediante
o qual as instituições conferem a certos grupos, e seus respectivos
interesses, uma posição diferenciada no processo político de decisão. Sendo
assim, os indivíduos formulariam suas ações a partir dessa referência, que
tende a privilegiar certos grupos em detrimento de outros.
Uma segunda crítica refere-se ao fato de que o foco do institucionalismo
histórico em como as instituições moldam as políticas tem produzido relatos
de continuidades políticas entre países ao longo do tempo (THELEN e
STEINMO, 1994). Segundo os autores, o institucionalismo histórico tem sido
útil em determinar as diferenças entre países e a persistência de padrões.
No entanto, os estudos tendem a comparações estáticas que explicam os
desfechos com referência às respectivas configurações institucionais
(estáveis) dos países, o que convida a um tipo de determinismo
institucional. O pouco desenvolvimento de uma teorização explícita acerca
da influência recíproca das instituições e políticas é também claro,
segundo esses autores, quando se considera a questão da formação e mudança
institucional, o que tem recebido pouca atenção da literatura (pelo fato de
os institucionalistas focarem mais nas restrições do que nas mudanças).
Segundo Immergut (2006) as questões preocupantes do institucionalismo
histórico são três: o problema da falsificabilidade; o fato de que
institucionalistas históricos tiram proveito dos modelos positivos que
criticam; e, que ao evitarem a sistematização, diminuem o impacto
cumulativo de seu trabalho. Com relação à primeira questão, a autora advoga
que deve existir uma perspectiva comparativa ampla, no sentido de evitar a
ênfase em argumentos singulares. Por outro lado, existe a dificuldade de
falsear essas narrativas históricas. Na segunda questão, o argumento é que
ao mirar o questionamento das teorias dominantes, como a ascensão do
capitalismo ou a teoria marxista da revolução, não consideram que, em
muitas vezes, as interpretações estão embricadas em seu contexto original
que criticam. Terceiro, a ênfase historicista na interpretação e na
singularidade prejudica a construção de teorias. A autora considera que não
atentar para essas questões contribui para uma bifurcação, que já ocorre,
na análise institucionalista: de um lado a escolha racional (ou abordagem
de "cálculo") e, de outro, a da interpretação (ou "cultural"), como
apresentado acima, na análise de Hall e Taylor (2003). Ainda, em sua
avaliação, afirma o potencial da combinação nos estudos de elementos da
escolha racional, do institucionalismo sociológico e do institucionalismo
histórico. Esse ponto é compartilhado por outros autores, como Hall e
Taylor (2003). Por outro lado, Immergut (2006) enfatiza a necessidade de
aprofundar o espaço analítico e normativo das questões de poder e justiça e
afirma que a visão do poder deve ser tomada como as interpretações cultural
ou de cálculo.
Thelen e Steinmo (1994) sugerem dois temas para a discussão do papel do
institucionalismo na agenda teórica e metodológica dos estudos comparativos
e de sua contribuição para a construção de um arcabouço para compreender a
escolha e as restrições na vida política. Ao tempo em que o campo da
ciência política incentivou a busca de regularidades e padrões entre os
países e a delimitação de um número reduzido de proposições a serem
sistematicamente testadas, agora os cientistas políticos podem se deter,
sem perder o interesse nas regularidades, nos momentos de mudanças e
escolhas institucionais.
Os autores justificam essa alternativa considerando o fato de que os homens
moldam os limites de suas interações por meio do desenho e da escolha
institucional, o que torna atraente olhar para os momentos de mudanças nas
instituições. Por um lado, os conflitos revelam interesses e relações de
poder e reforçam os interesses dos ganhadores. Por outro lado, as escolhas
institucionais podem moldar as ideias, atitudes e preferências dos atores.
Trata-se de um caminho com ramificações e o estudo de cada um desses pontos
torna-se essencial à compreensão da história política. Tomando como
referência o fato de que a evolução política é influenciada pelos objetivos
de seus sujeitos, olhar para a mudança institucional é importante para
compreensão de como ela altera os limites nos quais os atores fazem suas
escolhas e como moldam as ideias e metas que animam a ação política.
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[1] SKOCPOL, T. Bringing the state back in: strategies of analysis in
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Bringing the state back in. Cambridge: Cambridge University Press, pg 347-
368. 1985.