entrevista.qxd 1/6/2007 16:11 Page 20 ENTREVISTA Fundação prática O estágio na Themag Engenharia, iniciado em 1980, foi encerrado na mesma época da formatura pela Escola de Engenharia da Universidade Mackenzie, em 1982. De lá, Joppert foi para a MAG Projesolos Engenheiros Associados, onde ficou até 1986. Na Geostática Engenharia assumiu a direção técnica, mesmo cargo exercido na MG&A Consultores de Solos, até 2002. A partir daí dedica-se à Infraestrutura Engenharia, da qual é sócio-fundador e diretor presidente e comercial. Na área acadêmica, leciona fundações aos engenheiros formados pelo Mackenzie desde 1985. Até 2005 ensinava mecânica dos solos para os arquitetos da mesma universidade. É autor de artigos técnicos, entre eles "Método de Cálculo para Estimativa de Carga de Ruptura de Tirantes Autoperfurantes Tipo Tubular". 20 Marcelo Scandaroli IVAN DE OLIVEIRA JOPPERT JR. as palavras de Ivan de Oliveira Joppert Jr., entrevistado deste mês da Téchne, uma das conclusões possíveis afirma que, quanto mais avança em técnicas e tecnologias, mais a engenharia sente faltar seus princípios básicos. Se considerarmos que a prática – e mesmo a existência – dessa área do conhecimento humano só se justifica em virtude da existência de problemas ou da ânsia de evoluir, parece lógico e interessante evitar a ocorrência de novas dificuldades. É imperativo, portanto, resgatar o tripé sobre o qual se sustenta a disciplina, até mesmo para que a incessante busca por resultados financeiros não seja afetada por colapsos ou outros eventos inesperados que acarretem em prejuízos. O entrevistado defende uma alteração na forma de construir dos empreendedores, atualmente D montada apenas na velocidade, e mesmo na postura de fornecedores, principalmente os de concreto. Nada de diminuir o ritmo das obras, garante, mas sim investir em conhecimento e tecnologias que permitam trabalhar melhor com prazos impostos e não incorrer em riscos demasiados, como eventualmente vem ocorrendo. A formação dos profissionais nos bancos das faculdades também foi alvo de críticas do professor da Escola de Engenharia do Mackenzie. Para ele, se é amplo o campo de visão do recém-formado, por outro lado não há aprofundamento suficiente para facilitar a iniciação prática. Joppert é autor do livro recém-lançado pela Editora PINI "Fundações e Contenções de Edifícios – Qualidade Total na Gestão do Projeto e Execução". TÉCHNE 123 | JUNHO DE 2007 sem demérito nenhum. tira de letra porque já fez muito daquilo e sabe o que dá certo.entrevista. No entanto. o que é feito sem planta de cargas. Na prática. e como sempre se quer andar mais rápido nas fundações. Temos que seguir um raciocínio lógico. o fator de segurança diminui. Ao tentar economizar. Por vezes escapam detalhes. afeta a obra? Um exemplo típico de patologia decorre da eliminação de tirantes durante uma escavação de subsolo para acelerar a execução. as obras estão muito rápidas e o cliente exige respostas e ritmo rápidos. Irresponsabilidades desse tipo são comuns? Esse exemplo não é inventado. se for demais. pelos materiais utilizados e pelo controle da qualidade da execução. como é o caso de hipermercados. é lá que estão as maiores patologias. pois engenheiro não gosta de ler. No entanto. há tirantes em determinada altura. afirmou que a maior parte dos sinistros que ocorrem durante a obra concentra-se na fase de escavações. Por que esses problemas são tão recorrentes? Uma obra sustenta-se num tripé formado pelo projeto. mas escava-se totalmente a prumo. Como acontece de começar a construção sem projeto. Ou seja. Não adianta falar para o cliente ir mais devagar se existem prazos. . A obra começa mesmo que seja necessário mudar fundações. mas é questão de organização e de colocar limites. pois obra rápida sai mais barato. A parede não está dimensionada para isso e a obra cai.qxd 1/6/2007 16:11 Page 21 O entrevistado da edição passada (Téchne 122). que ninguém vê. principalmente quando há um projeto básico. o engenheiro e perito Mauricio Marcelli. por exemplo. mas principalmente de execução. É uma decisão tomada na obra para diminuir custos e prazos. maior a possibilidade de errar. e a única forma é lhe dar elementos tabelados. não tem experiência está muito mais sujeito a errar. é necessário conduzir o profissional para que não erre. É como se trabalha hoje em dia e é necessário se adaptar. É possível conciliar qualidade e rapidez tanto de projeto quanto de execução ou a saída é desacelerar? Quanto mais rápido. o que a velocidade. com verificações e decisões a tomar em cada passo. Quando o engenheiro tem experiência. com multas decorrentes do não-cumprimento deles. acontece realmente. com a obra andando. Daí. A principal meta do livro é estimular o controle de projeto e materiais. quem. compra um programa. Pede-se uma determinada resistência e quando se aplica descobre-se que não tem aquela resistência. Se for bem executado. E daí. com cimentos especiais de alto desempenho. exigirá reforços e travamentos. mas. os equipamentos expostos eram os mesmos que temos para fundações especiais aqui. está entre as principais afetadas pela velocidade imposta às obras atuais Dentre as patologias que costumam ocorrer numa obra de fundações. Justamente por isso o pessoal de estruturas reclama de profissionais menos experientes. Hoje marca um monte de piquetes no chão. Marcelo Scandaroli Mas a boa engenharia não deveria minimizar os riscos. Então. Onde foi o erro? Na escolha do tipo de locação. com 30 m de profundidade. por exemplo. checava de novo. A pressa é o fator preponderante para orientar os projetos. nem sempre é isso que é entregue. Por que erros de projeto são poucos comuns? O computador ajuda muito hoje em dia. Antigamente lançava-se uma tábua em torno da obra. o pessoal acaba optando pela segunda. o que fazer? No dia seguinte o concreto já endureceu. Se alguém dá um toque e ele sai do lugar. Acho que houve um aquecimento e as concreteiras não dão conta de atender bem a todos. Se destinar mais. Estamos passando por uma má fase em termos de concreto. A fundação será executada 20 cm longe de onde era para ser. O cálculo é rápido e com menor possibilidade de erro. por motivos que não sei quais são. quando dez estavam concluídos.entrevista. Dentro desse valor existe a porcentagem destinada a cada etapa. Basta estar ciente e carregar os dados no computador de forma correta. sobrando aquele quinhão para as fundações. por que economizar tanto? Vou raciocinar como o empreendedor. os erros mais comuns estão no cálculo ou na execução? Concreto com resistência abaixo do especificado e execução malfeita são maioria. 22 Fazer locação é um exemplo bem claro. para um vão de 3 m. (veja cobertura também nesta edição). haverá excentricidades. uma ferramenta excelente. mesmo que mais caras. entra com os dados e obtém. Vejo muitas obras com problemas de resistência no traço do concreto. No Brasil temos tecnologia e equipamentos adequados para executar fundação? Sem dúvida.qxd 1/6/2007 16:11 Page 22 ENTREVISTA Há métodos de fundação tecnicamente eficientes que sejam deixados de lado por serem lentos? Parece estranho o concreto apresentar problemas. Inclusive interrupção do fornecimento durante a concretagem de uma parede-diafragma. com fiscalização. É difícil definir a probabilidade de haver patologias no caso de usar um ou outro tipo de fundação ou contenção. pois gasta mais do que a verba destinada para aquilo. Antes de executar. Se na TÉCHNE 123 | JUNHO DE 2007 . Projeto dificilmente apresenta erros. Chegam a 5 ou 7% do total da obra. a engenharia de fundações. Não tem sensibilidade para saber se está certo. entre fazer três ou quatro estacas Frank por dia ou fazer até 12 estacas hélice. Já na área de fundações e mecânica dos solos temos um mix de projeto e obra. quais os erros? Relativamente. descia um prumo e locava a estaca. esticava um arame. E na execução. O concreto realmente tem altíssimo controle tecnológico.5 m de altura. sabendo que ele tem que respeitar um custo máximo por metro quadrado. principalmente para os terceiros? Com equipamentos tão atuais quanto os europeus. No caso de estruturas. Na Bauma [feira alemã de construção]. com experiência. como as estacas tipo Frank. Tem muita coisa caindo em desuso por conta de velocidade. o engenheiro sai da faculdade. o topógrafo marcava com prego cada eixo dos pilares. também por ser uma etapa pouco visível. Os empreiteiros brasileiros têm equipamentos de primeira qualidade. o profissional tem sensibilidade para saber o que está errado ou certo. projetos de fundação e contenção são caros para uma construtora? Não absurdamente. uma viga de 1. com um ferro de uma polegada embaixo. empregando material de boa qualidade. E por que os recém-formados não se aventuram nesse campo? Porque não têm experiência. No ramo de fundações e contenções é difícil ter engenheiros recém-formados. Nunca acredito em má-fé. dificilmente são adotadas porque. a filosofia fica errada. não tem por que ocorrem patologias. que custam dinheiro e tempo. Para começar a bater bola nessa área tem que ter no mínimo dez anos de experiência. O computador faz o cálculo. pois as concreteiras costumam alardear o alto controle tecnológico sobre o produto que oferecem. Independentemente de haver problemas com vibração. mas. conforme especificado em projeto. mas acho que tínhamos que passar por isso. É falta de experiência. como os engenheiros de obras. foi sempre muito ruim e o pes- Arquivo pessoal Ivan de Oliveira Joppert Jr. formavam-se 300 alunos por ano. Na primeira vez que acontecer.1/6/2007 16:11 Page 23 sondagem a estaca deveria ter 12 m. Depois disso. o programa dá armadura de flexão. na obra. quando os preços foram congelados e começou-se a comprar imóveis. Naquele ano fiz muitas obras. o mercado cresceu. Como assim? A construção está em crise há 25 anos. Muita gente saiu do ramo e o mercado está absorvendo esse pessoal mais novo. ser bem prático para que o engenheiro de qualquer lugar do Brasil tenha as soluções. Hoje tenho 30 por semestre. Para o engenheiro que não trabalha diretamente com isso. nem sabe o quão rápido tem que ser uma obra. O objetivo do meu livro é desmistificar. mas em fundações. de cisalhamento. Quando me formei no Mackenzie. é complicado lidar com mecânica dos solos? O pessoal vê como um bicho de sete cabeças desde a faculdade. o próprio nome assusta. é complicado. mas na obra ficou com 8 m. mas que. com controle de riscos à obra e à vizinhança . liga pra alguém com mais experiência para saber o que faz. o que fazer? Como saber se está boa? Por que aconteceu? Por isso o recém-formado não se aventura. Como é física pura e tem muita experimentação de campo. Em estruturas. A pressa em concluir a etapa de fundações decorre também desse desconhecimento do tema? Um pouco da desvalorização se deve ao desconhecimento. tem que adaptar o projeto à realidade. Enquanto isso. por não ter vivência.qxd Alguns critérios e limites técnicos devem ser observados para a adequação do sistema de contenções e fundações à velocidade exigida pelo contratante. Teve um boom em 1985. detalhes e tudo o mais. Acaba reservando duas semanas do cronograma para as fundações quando vai precisar de três meses. entrevista. mas não se aprofunda em nada. principalmente para materiais que trabalham com base na resistência. por exemplo em Brasília. sabemos que algumas construtoras deixam de realizar sondagem por considerar que o solo da região é homogêneo. Há novidades em termos de segurança para a execução de tubulões? Continua sendo uma execução que incorre em alguns riscos. por exemplo. Isso principalmente nas escolas com nível técnico melhor. Bruno Loturco LIVRO Fundações e Contenções de Edifícios – Qualidade Total na Gestão do Projeto e Execução Ivan Joppert Jr. Em meu escritório só executamos tubulão se tiver 100% de segurança. O que falta na formação para dar mais experiência prática aos profissionais e para abrir os olhos para esses campos que estão carentes? Haver uma integração maior entre escolas e empresas para que os estágios fossem levados mais a sério. A grade é a mesma desde sempre. Se os três estiverem bons. Qual é a cota de apoio. Para cada um desses critérios o livro tem um checklist.piniweb. fazemos um poço de inspeção pra ver como se comporta a escavação. Fora de São Paulo. como aprofundar? A faculdade de engenharia deveria ter seis anos. mas sem especialização. Afinal. o empreiteiro vai brigar com o empreendedor. e se é tecnicamente viável o material a utilizar. e o objetivo do livro é realmente esse. verificar desde locação até se as condições do solo condizem com a sondagem. O pessoal quer ir para a área de planejamento e gerenciamento. Acompanhar a fundação in loco é fundamental para o sucesso. não importando se vai gastar mais ou se vai dar algum problema. É por isso que só projetamos e executamos se houver sondagem.entrevista. nós também vamos descer no tubulão para verificar se o operário abriu a base. Quais os itens a controlar durante a execução? Se o projeto condiz com a obra. O livro fala de qualidade total. uma prova de carga dinâmica para saber qual é a carga de ruptura. O que é isso? É o tripé formado por projeto. mas há muita informação nova. Com cinco ou seis obras na mesma região. O sujeito sai com uma visão maravilhosa. as contenções definidas. Nas escolas técnicas federais os alunos são obrigados a fazer estágio para se formar. No resto do País. que desenvolve o projeto. Como é feito até agora? Vou lhe dar dois panoramas. Mesmo que seja mais barato.Ainda assim. Antes de executar. exceto quando definimos um tipo de aço para cravar perfil e o cliente compra outro para economizar. como concreto e aço. Mesmo o que foi brilhantemente editado pela PINI. O controle de materiais também é fonte de problemas? É complicadíssimo. com as mesmas cadeiras. É a fundação mais barata e a mais segura em termos de desempenho que existe. Daí as escolas viram a necessidade dos cursos de pós-graduação. São itens a cobrar do escritório contratado para que o engenheiro responsável controle a execução. Em São Paulo ou Rio de Janeiro há um pouco mais de consciência. as fundações são encomendadas para um empreiteiro.com ou pelos telefones 4001-6400 (regiões metropolitanas) ou 0800-5966400 (demais regiões) TÉCHNE 123 | JUNHO DE 2007 . eis a qualidade total. durante a cravação de uma estaca pré-moldada. como estruturas. Durante a execução. não há profissionais de projeto pra contratar. Com tanta informação a ser passada. Quais as ferramentas disponíveis para controlar a qualidade? São bem poucas. Num ponto é de um jeito e 20 m para o lado pode ser completamente diferente. levantamento planoaltimétrico do terreno. Ou seja. E ao final? Verificar o desempenho ao ser carregada. executa e faz o controle 24 da qualidade. Quais informações um projeto tem que apresentar para poder controlar a execução? Tem que ter sondagem. com a participação dos melhores profissionais do mercado. a qualquer aquecida do mercado. Têm que ser mais acessíveis.qxd 1/6/2007 16:11 Page 24 ENTREVISTA soal saiu do ramo. pois os livros que temos de mecânica dos solos e fundações são muito teóricos. o maior problema é a resistência do concreto. se houver patologias. execução e o material empregado e que garante a segurança. As condições são que o solo seja coesivo. É possível fazer. coloca-se o lobo pra cuidar dos cordeiros. Não adianta especificar um tipo de aço e comprar um que não atinge a resistência. Por isso. mas isso é ruim. Este tem controle melhor. O aluno tinha que sair já para trabalhar. O solo não tem regra nenhuma. pois o responsável técnico pela obra não tem como controlar. vamos até determinado limite e dali pra frente é outra metodologia. 224 páginas Editora PINI Vendas pelo portal www. Empurra-se a responsabilidade para o empreiteiro. Agora. não dá pra fazer ou vai matar alguém. Contrata-se um escritório especializado em fundações para desenvolver o projeto. mais simples. e para encaixá-las diminui-se a carga horária de matérias que eram vistas com mais profundidade. que absorve o aluno a ponto de ele ficar o dia todo na faculdade. o lençol freático não esteja muito alto e não haja presença de areia. O estudante tem um monte de informação. a tensão ou carga unitária? Isso tudo tem que estar definido no projeto de fundações para ser controlado depois. entrevista.qxd 1/6/2007 16:11 Page 25 .