Física Ambiental Fasc22v1-reduzido
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Miguel Jorge Neto ha Patrick Siqueira da Roc de Arruda Paulo Henrique Zanella s Marcelo Paes de BarroI ntrodução à FísIca a mbIental LICENCIATURA PLENA EM CIÊNCIAS NATURAIS E MATEMÁTICA - UAB - UFMT Cuiabá, MT 2012 Instituto de Física Av. Fernando Correa da Costa, s/nº Campus Universitário Cuiabá, MT - CEP.: 78060-900 Tel.: (65) 3615-8737 www.fisica.ufmt.br/ead I ntrodução à FísIca a mbIental Autores M igue l Jorge Ne to Instituto de Física /UFMT Pat rick Siqueira de Rocha Programa de Pós- Graduação em Física Ambiental Instituto de Física /UFMT Paulo He nrique Z ane lla de Arruda Instituto de Física /UFMT M arce lo Paes de Barros Instituto de Física /UFMT C o P y R I g h T © 2 0 1 2 UA B Corpo Editorial • • • • Denise Vargas Carlos Rinaldi Iramaia Jorge Cabral de Paulo Maria Lucia Cavalli Neder Projeto Gráfico: PauLo H. Z. Arruda / Eduardo H. Z. Arruda Revisão: Denise Vargas Secretária(o): Neuza Maria Jorge Cabral / Felipe Fortes FICHA CATALOGRÁFICA sumárIo 1. 2. 3. 4. I ntrodução c onceItos a FundamentaIs da teorIda de Fenômenos de 11 13 b IosFera-atmosFera 19 35 47 transporte Interação b alanço de energIa b IblIograFIa b ásIca UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introduçao à Física Ambiental | IX I ntro duç ão 1 “Es muy evidente que las leyes Físicas están presentes y rigen muchos aspectos del comportamiento del medio ambiente considerado que esta formado por la Atmosfera y la Tierra, ambos bajo la influencia de la Radiación solar. Así si consideramos la Atmósfera, nos adentramos en la Física de Fluidos. (...) Y para conocer la Mecánica de Fluidos tienes que conocer, a su vez, las bases fundamentales de la Física: las leyes de la Mecánica; de la Conservación de la Cantidad de movimiento, Momento angular, de la Energía así como otros procesos físicos como la propagación de Ondas sonoras y electromagnéticas, etc., etc.” “A presença de um organismo modifica o ambiente ao qual é exposto, de modo que o estímulo físico recebido do ambiente é, em parte, determinada pela resposta fisiológica ao ambiente”. (MONTEITH, 1973). (RECHEA, 2011). sse foi um bom começo. Os autores acima, expoentes no que se refere à Física Ambiental, conseguiram, em poucas palavras, expressar duas ideias muito importantes que norteiam os trabalhos dessa ciência: 1. Vivemos num mundo (e num Universo) regido por leis físicas, o que torna necessário conhecê-las (pelo menos algumas), se quisermos compreender de fato o ambiente em que vivemos; 2. Nos relacionamos com o nosso planeta, numa interação contínua, de forma profunda mesmo que não consciente. Fazemos parte de um sistema ambiental dinâmico, complexo e maravilhoso, apesar de, por vezes, parecer sensível. Não é raro sermos bombardeados com campanhas ambientais bem (ou mal) intencionadas, convocando-nos à “conscientização”, preservação, reciclagem e inúmeras outras ações cujos objetivos e consequências são tão pouco esclarecidas, tão redundantes, que acabamos aderindo mais por um “instinto” de que estamos a fazer o que é certo do que por uma real (e necessária) mudança de postura. Não nos entendam mal, não estamos a dizer que devamos desmatar, sujar e consumir como uns desvairados e inconsequentes mas, se é verdade que há momentos em que ações devam ser tomadas na urgência, também é fato que não devemos nos comprometer em práticas de cunho ambiental por puro modismo. Devemos fazer o que UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | E 11 é certo para o nosso planeta mas por questões racionais, em última instância, por que estamos atrelados, irremediavelmente ao ambiente no qual estamos inseridos, mas buscando compreender como se dá essa relação, cujos efeitos e dimensões nem sempre são medidos no tempo de vidas humanas, mas em gerações ou até em eras. Mais do que uma nova especificidade para uma ciência antiga, a Física Ambiental é um cruzamento de saberes numa tentativa de compreender o ambiente, respeitando a sua complexidade. Seu escopo é amplo. Seu corpo de conteúdos se mistura com a Fisiologia, Geologia, Hidrologia, Meteorologia, Climatologia e Agronomia, dentre outras. E isso é ótimo, pois os fenômenos ambientais não fazem fila para os cientistas nem se revelam apenas para esse ou aquele mais especializado. Cada vez mais vemos pessoas com formações nas várias ciências naturais tendo de unir esforços para resolver, ou mesmo entender, os problemas da contemporaneidade. Ficamos contentes em ajudar! 12 | Ciências Naturais e Matemática | UAB te o r I a c o n c e I t o s F u n d a m e n ta I s d a d e F e n ô m e n o s d e tr a n s p o r t e 2 odos os seres vivos que habitam a Terra juntamente com os seus habitats formam a Biosfera1. Esses ecossistemas2 interagem com a Atmosfera (camada de gases que envolve o planeta), enviando e recebendo energia e matéria. Esses fluxos, ou fenômenos de transporte, tem especial destaque na Física Ambiental. O monitoramento da emissão e absorção de gás carbônico (CO2), vapor d’água e energia (calor, principalmente) é ponto de partida para uma infinidade de pesquisas que buscam compreender a dinâmica de interação entre esses sistemas - em especial o conjunto solo-plantas-atmosfera. Neste capítulo, apresentaremos alguns conceitos fundamentais de fenômenos de transporte que são necessários ao estudo das interações entre a biosfera e a atmosfera. T FluXos O conceito de fluxo é imprescindível ao estudo da interação biosfera-atmosfera. Entretanto, precisamos ir além da simples ideia de “algo sendo trocado”. Em Física falamos de fluxo de uma grandeza quando uma quantidade desta atravessa uma superfície dita de referência e nos preocupamos com a taxa com que isso ocorre. Por isso as medidas de fluxo são dadas em “unidade da propriedade” por metro quadrado por segundo. Por exemplo: medimos o fluxo de energia em J/m2s (joule por metro quadrado por segundo)3, 1. Termo criado em 1875 pelo geólogo austríaco Eduard Suess (Wikipédia). 2. Conjunto dos componentes físicos, químicos e biológicos, interdependentes entre si (REICHARDT e TIMM, 2004). 3. Como há uma potência implícita ( J/s), o fluxo de energia acaba sendo comumente expresso em watt por metro quadrado (W/m2). UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 13 ao passo que o fluxo de CO2 deve ser apresentado em kg/ m2s (quilograma por metro quadrado por segundo) já que se trata de um fluxo de matéria. Muitas coisas ocorrem com a energia que recebemos de nossa fonte primária: o Sol. Para início de conversa, de forma quase absoluta, a vida na Terra depende da luz e calor que recebemos dessa estrela: desde a base da cadeia alimentar, com as plantas que sintetizam o seu próprio alimento por meio da energia luminosa visível (juntamente com a água e o gás carbônico), até os fenômenos atmosféricos, que têm forte dependência com o calor a temperatura (dentre outros fatores tamFIguRA 1: A NOITE EsTRElAdA, uMA dAs MAIs FAMObém observados pela física ambiental). A temperatura média sAs pINTuRAs dE VICENT VAN gOgH. TAlVEz O ARTIsTA NãO dOMINAssE A dINâMICA dOs FluIdOs, MAs sEus da atmosfera e sua manutenção são elementos fundamentais TRAçOs NOs REMETEM A uM INEgáVEl MOVIMENTO para a conservação da vida e dos processos físicos e químicos TuRbulENTO NOs Céus dE uMA CIdAdEzINHA. hoje vigentes (que, por sua vez, também estão vinculados à biosfera). Não deve ser difícil perceber, então, como é importante acompanhar e entender os fluxos de calor no solo e a partir da superfície, além das trocas de matéria entre esta e a atmosfera. Uma introdução a esse estudo será apresentada adiante mas, primeiro, precisamos retomar alguns conceitos no que se refere à propagação do calor. a p r o pa g a ç ã o d o c a l o r Lembra-se das três formas pelas quais o calor se propaga: condução, convecção e irradiação? Opa! Como assim “o que é calor”? ATENÇÃO! Lembre-se que calor é energia em trânsito entre um corpo (ou sistema) e outro devido a uma diferença de temperatura entre os dois. Não é correto, portanto, se falar sobre o “calor de um corpo” (ao invés disso devemos nos referir à energia interna). Agora vejamos... conduç ão De forma geral: é o fenômeno associado ao transporte de certa propriedade em um meio material devido à diferença desta propriedade ao longo de um gradiente4. Não é necessária que ocorram movimentos de “partes” da substância (a condução está associada a movimentos microscópicos das partículas que constituem a matéria). 4. O equivalente à variação de uma propriedade ao longo do espaço (uma “variação com direção e sentido”). 14 | Ciências Naturais e Matemática | UAB Quando falamos da propagação do calor por condução nos referimos à transferência de energia entre as moléculas de um meio material sem que partes macroscópicas da substância se desloquem. A proximidade entre as partículas vibrantes do material favorece a condução, de modo que ela é a forma de propagação de calor predominante nos sólidos (apesar de também ocorrer nos outros estados físicos). Em Física Ambiental, a condução é importante pela transferência de calor no solo e através das peles dos animais, mas seus efeitos na atmosfera são pouco significativos se comparados à outras formas de propagação do calor como a convecção turbulenta (Monteith, 1973). convecç ão É o fenômeno de transporte associado ao deslocamento de quantidades macroscópicas da substância (ocorrendo apenas em fluidos, ou seja, nos líquidos e nos gases). Por exemplo: estamos acostumados a presenciar o fenômeno da convecção em nossas cozinhas. Quando fervemos leite numa panela ou quando aquecemos água para um café, vemos que o fluído (água ou leite) se aquece primeiramente na região próxima à chama (fundo da panela) e ai sobe (enquanto as partes de cima descem). Temos que lembrar que gases (como o CO2) e o ar (que é uma mistura gasosa) são fluidos e, portanto, sujeitos a convecção. Temos que chamar a sua atenção para o fato de que a convecção pode ser: a) Forçada: acontece pelo movimento do fluido devido a agentes externos (como um ventilador ou uma bomba); e b) Natural: se, ao contrário, nenhum fluxo é induzido externamente, a convecção poderá ocorrer apenas em função de uma diferença de densidades (causada, por sua vez, por uma diferença de temperaturas ou de concentrações): as partes do fluido próximas à fonte de calor se aquecem, dilatam-se (tornando-se menos densas) e sobem5, ao passo que as partes não aquecidas (mais densas) descem ocupando o espaço deixado pela parcela que havia se deslocado, numa espécie de corrente de convecção (JALURIA, 1980). Ir r adIaç ão A radiação (não, você não leu errado – no final do parágrafo a gente te explica) é um fenômeno de transporte bastante peculiar. Neste mecanismo não se faz necessário a existência de matéria (todos os outros citados até então necessitam de um meio material para ocorrer), porque se trata da propagação (transporte) de energia eletromagnética6. Quando falamos da transferência de energia térmica, também é comum nos referirmos a esse processo como irradiação (viu?). 5. Vale a pena pesquisar um pouquinho sobre o empuxo, uma força importante nesse processo de deslocamento. 6. Forma de energia derivada da oscilação de campos elétricos e magnéticos. UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 15 pa r a d I n h a pa r a a p r o F u n d a r o c o n c e I t o . . . Todos os corpos emitem (ou irradiam) calor sob a forma de ondas eletromagnéticas, basta que estejam a uma temperatura absoluta T maior que o zero absoluto (0 K, ou zero kelvin). Você deve imaginar como é fácil entender isso para o Sol, mas o caso é que isso ocorre segundo os mesmos princípios para a Terra ou você. Essa emissão é proporcional à temperatura absoluta do corpo (isto é, a temperatura em kelvin) à quarta potência. A representação matemática disso é conhecida como Lei de Stephan-Boltzmann: E = ε . σ . T4 (ε) é uMA pROpRIEdAdE CHAMAdA EMIssIVIdAdE E dEpENdE dA supERFíCIE. ApREsENTA VAlOREs NuMA FAIxA quE VAI dE zERO (0) A uM (1) E REpREsENTA A RElAçãO ENTRE A RAdIAçãO EMITIdA pOR uMA supERFíCIE REAl E AquElA EMITIdA pOR uM CORpO IdEAl, dENOMINAdO CORpO NEgRO, à MEsMA TEMpERATuRA. (σ) é A CONsTANTE dE sTEFAN-bOlTzMANN, E VAlE 5,67 . 10-8 W/M2K4. tr a n s p o r t e d e m at é r I a Reparou como é interessante a convecção? A matéria aquecida se desloca e, com isso, torna-se “responsável” pelo calor (energia térmica em trânsito..., lembra?). É lógico que, com a massa de fluido se deslocando, matéria está sendo transportada. Dessa forma, começamos a perceber como o transporte de energia pode estar associado ao de matéria. Ah, não se esqueça que quando falamos de fluidos, nos referimos à gases e/ ou líquidos. Vejamos um pouco mais essa tal convecção, agora do ponto de vista do transporte de matéria. FluXo lamInar e turbulêncIa FIguRA 2: FluxO lAMINAR. FIguRA 3: FluxO TuRbulENTO. Você já deve ter lido a seguinte definição de fluidos: “são substâncias capazes de escoar e cujo volume toma a forma do recipiente que ocupam”. Se nos atermos à essa capacidade de escoar (ou fluir) encontraremos duas possibilidades: Fluxo (ou escoamento) Laminar: as partículas do fluido percorrem trajetórias paralelas, como se tivéssemos várias camadas superpostas dentro do fluido, que não se misturam e têm um mesmo vetor velocidade (imagine essas camadas em movimento ao longo de linhas paralelas e no mesmo sentido). Fluxo (ou escoamento) Turbulento: no regime turbulento, as partes do fluído (substância) se misturam de maneira não linear. Geralmente formando pequenos redemoinhos (turbilhões) dentro do fluído. Neste caso, se fosse possível acompanhar o movimento de uma pequena parcela que compõe esse fluxo (vamos chamá-la de elemento de fluxo), a veríamos se mover ao longo de uma complexa trajetória, bem diferente do que ocorre no escoamento laminar. FONTE: dECIFRANdO A TERRA / TEIxEIRA, TOlEdO, FAIRCHIld E TAIOlI - sãO pAulO: OFICINA dE TExTOs, 2000 16 | Ciências Naturais e Matemática | UAB Contextualizando... Lembre-se que calor é energia em trânsito entre um corpo (ou sistema) e outro devido a uma diferença de temperatura entre os dois. Não é correto, portanto, se falar sobre o “calor de um corpo” (ao invés disso devemos nos referir à energia interna). Veja que a velocidade do fluido próxima à superfície é menor que a dos níveis superiores (na verdade, ela tende à zero, de modo que o fluido junto à superfície pode ser considerado aderido à ela). Esse amortecimento por atrito entre o fluido e a superfície é transmitido às camadas superiores em função da viscosidade do fluido. Vento geostrófico Z0 Superfície Velocidade do vento FIguRA 4: pERFIl VERTICAl dA VElOCIdAdE dO VENTO dEsdE A supERFíCIE ATé O VENTO gEOsTRóFICO (CONdIçãO TEóRICA NA quAl As FORçAs quE ATuAM NO MOVIMENTO dO AR sE EquIlIbRARIAM). O COMpRIMENTO dA RugOsIdAdE (z0) é A AlTuRA ONdE A VElOCIdAdE é NulA. FONTE: MARTINs ET Al. (2008). pa r a d I n h a pa r a a p r o F u n d a r o c o n c e I t o . . . A viscosidade é a propriedade dos fluidos que indica a sua resistência ao escoamento7. Um fluido com alta viscosidade adere muito às superfícies em que está em contato, de modo que sua velocidade de escoamento, por sua vez, seria baixa. Podemos então associá-la à maneira como o fluido “gruda”. É importante perceber que a viscosidade só se manifesta em fluidos que se encontram em movimento (quando é possível perceber sua resistência às forças que tentam deformá-lo). Óleos são conhecidos por serem muito “grudentos” (alta viscosidade), mas mesmo estes podem sofrer alterações em sua viscosidade com a temperatura: o óleo de um motor, por exemplo, é muito menos viscoso a temperaturas mais altas do que quando o motor está frio (Bertulani, 1999). d IFusão A difusão molecular (ou simplesmente difusão) é um fenômeno de transporte de massa em que partículas de uma substância que se encontre dissolvida (soluto) em outra (solvente) deslocam-se de regiões onde sua concentração é maior para regiões de menor concentração (ou seja, quando há um gradiente de concentração). Esses 7. A viscosidade é uma medida da resistência de um fluido que está sendo deformado por qualquer tensão de cisalhamento ou tensão de tração (ambas forças tangenciais). Camada limite 17 UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | movimentos (de origem termo-moleculares) tendem a provocar, ao longo do tempo, uma distribuição uniforme de partículas (e, portanto, a uma mistura completa das duas substâncias). Alguns experimentos didáticos são exemplos clássicos de difusão: por exemplo, quando se pinga uma gota de corante em água (nunca fez?) e a abertura de um vidro de perfume em um ambiente fechado (essa você conhece...). Muitos casos de dispersão de poluentes (como os gases que saem das chaminés das fábricas ou dos escapamentos dos carros) são, pelo que vimos, processos de difusão. Transportes moleculares importantes que ocorrem no interior de organismos também tem características difusivas (sendo um assunto a ser estudado também em biologia e biofísica). 18 | Ciências Naturais e Matemática | UAB a I n t e r a ç ã o b I o s F e r a -a t m o s F e r a 3 maior parte da energia que recebemos do Sol atinge a superfície da Terra como luz visível. Essa radiação atravessa a atmosfera até o solo praticamente sem ser absorvida. No solo, há absorção e transformação dessa energia, de modo que a superfície se aquece e emite radiação na forma de calor - costumeiramente como infravermelho (LANDULFO, 2005). Vários autores, como Saha (2008) chamam a atenção para o fato que na atmosfera, a transferência de calor por condução ou difusão molecular pode ser descartada, já que, neste caso, são processos extremamente lentos e ineficientes se comparados aos demais transportes. Dessa forma, assumimos que o calor é transferido da superfície à atmosfera principalmente por radiação, movimentos turbulentos e convecção. Realizaremos a seguir uma abordagem inicial de como são os fluxos de calor no solo e (deste) para a atmosfera, seguindo de perto as primeiras transformações de energia que ocorrem em função disso, além do transporte de matéria a partir da biosfera, processo que tem vinculação importante com o aproveitamento e conversão de energia. A maneira como todos esses fluxos estão relacionados será explicada ao final, no capítulo sobre o balanço de energia. A FluXo de calor no solo O solo como componente da biosfera tem papel vital na manutenção dos mais diversos ecossistemas. Podemos pensar no solo como um grande reservatório para água e energia, além de nutrientes e outros elementos importantes para o equilíbrio deste sensível aglomerado que conhecemos por Terra. É nele que crescem as plantas que nos alimentam diretamente ou servem de alimento para outros animais, além de UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 19 inúmeras outras funções que colaboram para o equilíbrio do planeta. Uma das mais importantes propriedades do solo é a sua temperatura, pois dela depende o desenvolvimento vegetal. Observamos diversos esforços no campo da agricultura para estabelecer controle sobre esta propriedade. Controlar a temperatura do solo equivaleria a controlar, de certo modo, os processos de germinação de sementes, crescimento de raízes, difusão de gases e outros fenômenos que são regulados direta ou indiretamente pela temperatura. Neste sentido, este capítulo ira auxiliar o estudante a compreender os principais mecanismos que regulam a temperatura no solo afinal, conhecer é a melhor maneira para respeitar e planejar. Ações que possam garantir subsistência e melhor integração do homem e seu entorno. proprIedades térmIcas do solo Quando pensamos no estudo termodinâmico do solo, devemos nos ater a duas propriedades extremamente importantes: calor específico e condutividade térmica. Estas estão ligadas a como o solo armazena e conduz energia respectivamente. Como vimos anteriormente, calor específico é a quantidade de energia térmica fornecida a um corpo cuja única função é o aumento da temperatura deste. Portanto, solos com grandes valores do calor específico são capazes de absorver muito mais energia térmica do que solos com calores específicos menores, em termos práticos isso garantiria um maior armazenamento de energia. No entanto esta relação não fica limitada ao próprio solo, dependendo de outros fatores como textura, estrutura e quantidade de água. A condutividade térmica está ligada a capacidade que o solo tem de transportar calor através de suas camadas, lembrando que a energia flui ao longo de um gradiente (de onde está mais quente para onde esta mais frio). Então solos mais condutores levariam a energia térmica recebida durante o dia para camadas mais profundas mais facilmente que solos menos condutores, da mesma maneira o calor perdido durante a noite seria afetado por esta propriedade. Para compreender melhor o exposto acima, vamos pensar em um solo composto por alguns materiais diferentes (ferro, argila, areia e outros compostos). A energia térmica inicialmente fornecida ao solo chega por radiação, onde as ondas eletromagnéticas provenientes do Sol atingem a superfície do solo aquecendo-a. A partir deste ponto, o calor se propaga dentro do solo por condução, é nesta etapa que as características desempenham papel importante, pois, como vimos anteriormente, materiais diferentes transferem calor com intensidades e velocidades diferentes. Percebemos então que os mecanismos envolvidos nos fluxos de calor no solo dependem direta e indiretamente de propriedades físico-geoquímicas presentes nas parcelas que compõem o fenômeno. A seguir, estudaremos estes fluxos, e os processos que o compõem de maneira mais detalhada. 20 | Ciências Naturais e Matemática | UAB c a pa c I d a d e térmIca e tIpos de solo Alguns fatores estão ligados a capacidade que os corpos têm de absorver e reter energia térmica. Percebemos em nosso cotidiano que, após o por do sol, algumas coisas em nossa casa esfriam mais rapidamente que as outras. Em geral observamos que as paredes demoram mais para esfriar do que objetos metálicos como maçanetas, corrimãos entre outros. Da mesma maneira, alguns objetos se aquecem mais rápido quando expostos a fontes de calor. Este fenômeno tem origem em uma propriedade que todo corpo possui, a capacidade térmica. No solo está capacidade irá influenciar na velocidade de aquecimento e resfriamento das diversas camadas. Grandes capacidades caloríficas farão com que o solo aqueça mais devagar, mas também faz com que ele resfrie mais lentamente, tendo efeito direto no fluxo de calor. Em termos de grandezas físicas, podemos definir a capacidade térmica como sendo a energia necessária para aquecer uma quantidade de substância. Nas unidades do sistema internacional temos: Joule/(quilograma*grau Celsius). Outra característica importante para o aquecimento do solo é a coloração da superfície. Em geral, objetos mais escuros absorvem mais energia eletromagnética, enquanto objetos mais claros refletem mais, absorvendo menos. Estas duas parcelas juntas compõem parte do fenômeno de transporte de energia térmica. Portanto, analisar os diversos tipos de solo nos permite entender estas duas componentes no processo. No entanto, somente estas características são insuficientes, precisamos ainda entender como se da a condução desta energia através das diversas camadas que compõe o solo. FluXos calor s u p e r F í c I e - at m o s F e r a s e n s í v e l e o c a l o r e s p e c í F I c o d a s s u b s tâ n c I a s Anteriormente discutimos o fluxo de calor no solo e as propriedades térmicas deste. É evidente que o solo e as estruturas que se encontram na superfície não são as únicas partes do nosso planeta que absorvem o calor. A atmosfera também recebe calor e apresenta diferentes comportamentos em função das variações de temperatura decorrentes disso. Aliás, como deve saber, um dos efeitos mais comuns do calor é modificar a temperatura dos corpos ou sistemas. Quando o calor faz exatamente isso, ele até recebe um nome especial: calor sensível. Se quiser, é possível calcular a quantidade de calor (Q) que provoca uma dada modificação de temperatura (∆T) em uma quantidade qualquer de uma substância: Q = m . c . ∆T Ah, é bem provável que você já conheça essa expressão (e também não deve ser muito fã dela, não é?8). Nesse momento, queremos chamar a sua atenção para um detalhezinho que possa ter passado despercebido. Reparou naquele “c” escondido ali, no meio da equação? Ele representa uma propriedade que varia de substância para 8. Existem outras “piores”, você verá! UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 21 substância, chamada calor específico. Não se confunda, apesar do nome, ele não é uma (outra) forma de energia, mas uma informação muito importante a respeito do material (ou substância) qual a qual lidamos, pois nos diz qual deve ser a quantidade de calor a ser fornecida à substância para lhe alterar a temperatura em uma unidade (kelvin ou grau Celsius). É melhor mostrar... Tabela 1: calor específico de algumas substâncias Substância Calor Específico (cal/g 0C) pa r a d I n h a pa r a a p r o F u n d a r o c o n c e I t o . . . água álcool alumínio ar carbono chumbo cobre ferro gelo hélio hidrogênio nitrogênio ouro oxigênio 1,0 0,58 0,22 0,24 0,12 0,031 0,094 0,11 0,5 1,25 3,4 0,25 0,032 0,22 Recordar é preciso! Lembra-se do que foi dito anteriormente sobre a capacidade calorífica? Você já deve ter percebido que há alguma relação entre ela e o calor específico, não é? Se a sua resposta foi “não”, volte à seção anterior e releia o que foi apresentado – a gente te espera. Já? Bem, como é possível perceber, ao falar de corpos nos referimos à capacidade calorífica (C) e ao lidarmos com substâncias tratamos de observar o calor específico (c). A primeira depende da quantidade de massa presente no corpo, já a segunda é quase um “cartão de identidade” da substância e, sendo assim, independe da quantidade de matéria. Se tivermos um objeto composto por uma única substância podemos escrever a seguinte relação: c= C m Sabe agora por que um balde d’água a 60 °C e um copo d’água à mesma temperatura possuem quantidades diferentes de energia térmica? Pelas informações apresentadas podemos perceber, por exemplo, que se tivermos exatamente 1 g de água e quisermos provocar uma variação de temperatura equivalente a 1 °C, devemos fornecer uma quantidade de calor correspondente a 1 caloria. O interessante, no caso da água, não é só a proporção “1/1/1/”, mas o fato de que seu calor específico é relativamente alto (nesse conjunto, “perde” apenas para o hélio e o hidrogênio). Ok, você deve estar se perguntando: “e o que há de tão “interessante” no alto calor específico da água?” A água é sabidamente uma substância fundamental para a vida, mas sua importância vai muito além da sua participação direta nos processos químicos e biológicos de animais e vegetais. Ela faz parte do ambiente em que vivemos e tem grande destaque nos fenômenos termodinâmicos de regulação da temperatura e transferência de calor. Tente se lembrar da última vez que foi à praia ou de quando passou um dia à beira da piscina. Você se recorda de como a água estava fria pela manhã e de como você ficou 22 | Ciências Naturais e Matemática | UAB tentado a dar um último mergulho ao final da tarde (já que a água agora estava bem quentinha)? Por ter um calor específico tão mais alto que da maioria das substâncias comuns do nosso dia a dia, a água é capaz de absorver grandes quantidades de energia térmica. Veja, ela demora mais para atingir a mesma temperatura que a areia da praia, por exemplo, já que (pela equação que vimos antes...) ela necessita de uma quantidade maior de calor para sofrer a mesma variação de temperatura. Do mesmo modo, demorará mais tempo para esfriar. o va p o r d ’á g u a Mas o que isso tem a ver com a atmosfera? Antes de dar a resposta, pedimos que leia o texto “Umidade do ar”, no site Brasil Escola9: http://www.brasilescola.com/geografia/umidade-ar.htm (acesso em 30/09/2011). Se não consegue ler o texto e está ansioso(a), vamos lhe adiantar o seguinte: já ouviu falar em “umidade relativa”? Provavelmente sim. Deve estar se lembrando agora de que há água, sob a forma de vapor, no ar à nossa volta. Essa quantidade de água no ar atmosférico pode ser medida em termos absolutos (como a massa de água por volume de ar) ou em termos percentuais - neste caso, a umidade relativa (UR). r apIdInho... UR = quantidade de água presente no ar num dado instante10 quantidade total de vapor d’água que essa porção da atmosfera pode suportar11 (para uma dada temperatura) x 100% Ar. Água. Ar mais água... Vamos continuar ligando os pontos (garantimos que vale a pena)! Há muito tempo você já sabe que o que chamamos de “ar” não é uma única substância, mas um conjunto de diferentes gases misturados e mais algumas coisas: como poluentes, partículas sólidas em suspensão e... água. Faça o seguinte: verifique na tabela 1 qual o calor específico do ar. Agora, busque na tabela 2 quais os componentes que mais contribuem para o peso de uma parcela (volume) de ar. É fácil perceber que os maiores responsáveis pela massa “básica” de ar, segundo a tabela 2, são o N2, o O2, o Ar e o CO2. O calor específico do ar, citado anteriormente, é de 0,24 cal/g.°C (o que não deixa de ser estranho, já que o calor específico é propriedade das substâncias e o ar, como vemos, é uma mistura). 9. Provavelmente também há um link para esse site em nossa página. 10. Chamada de pressão parcial de vapor (pois o vapor d’água, como todos os gases, exerce pressão em todas as direções). 11. A quantidade de vapor d’água no ar é limitada a uma certa concentração (que exerce a pressão de saturação) - acima deste valor a água se condensa. UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 23 Tabela 2: composi;’ao do ar (seco) ao nível do mar. Constituinte (representação química) Nitrogênio (N2) Oxigênio (O2) Argônio (Ar) Dióxido de carbono (CO2) Neônio (Ne) Hélio (He) Criptônio (Kr) Hidrogênio (H2) Xenônio (Xe) Outros (Metano – CH4, Óxido nitroso – N2O, Monóxido de carbono – CO, Dióxido de nitrogênio – NO2, Iodo – I, Amônio – NH3) % do volume 78,08 20,95 0,93 0,038 0,0018 0,0005 0,0001 0,00005 0,000009 ~ 0,0002 % por peso 75,47 23,20 1,28 0,0590 0,0012 0,00007 0,0003 Negligenciável 0,00004 - Como esse valor foi obtido então? Veja um palpite: Tabela 3: estimativa do calor específico do ar seco Substância N2 O2 Ar CO2 c (cal/g.C) 0,25 0,22 0,12 0,20 c x % do peso do ar 0,2 x 0,75475 = 0,1887 0,22 x 0,232 = 0,051 0,12 x 0,0128 = 0,0015 0,19 x 0,0006= 0,0001 c total = 0,2413 Eis uma informação que poderia ter sido dita bem antes, não acha? O que ocorre é que o conteúdo de água no ar (vapor d’água) é variável, mas a composição do ar “seco” praticamente não varia12. Apesar de sua concentração no ar ter um limite próximo aos 4% (em volume), o vapor d’água é um constituinte atmosférico de grande relevância nas trocas de calor entre a superfície e a atmosfera (VAREJÃO-SILVA, 2006), tanto pela absorção de calor sensível quanto por sua emissão (veja o próximo quadro), além 12. Varia pouco na verdade. Muda em função da localização geográfica e da altitude. 24 | Ciências Naturais e Matemática | UAB do que, ainda teremos que considerar que durante a evaporação e condensação (mudanças de fase) há calor latente envolvido, como veremos nas seções seguintes. pa r a d I n h a pa r a a p r o F u n d a r o c o n c e I t o . . . O vapor d’água é o que se conhece por absorvedor seletivo. Segundo Ahrens (1998), assim como o CO2, o vapor d’água tem grande capacidade de absorver radiação infravermelha (calor), mas baixa capacidade para fazê-lo com a radiação solar visível. Não se assuste, portanto, se encontrar textos em que os autores o tratam como um dos gases de efeito estufa. FluXo d e c a l o r s e n s í v e l pa r a a at m o s F e r a Em contraste com a transferência de energia térmica por radiação (infravermelho vindo do Sol ou emitido pela Terra) e com o calor latente (que é uma energia potencial armazenada, já que a água está no estado de vapor e liberará calor ao se condensar), o fluxo de calor sensível inclui o transporte de energia através de condução (por difusão molecular bem próximo à superfície) e convecção (correntes de ar em movimento). Movimentos atmosféricos turbulentos são dominantes na troca de calor sensível, exceto numa altura de cerca de alguns milímetros a partir da superfície (OLIVER, 2005). Sendo mais enfáticos, isso significa que o fluxo de calor sensível13 entre a superfície e o ar atmosférico se dá pelo aquecimento das camadas inferiores da atmosfera, próximas ao solo, que passam a redistribuir o ar aquecido para as camadas mais altas num movimento convectivo turbulento. FluXo d e c a l o r l at e n t e O calor latente é a energia que deve ser liberada ou absorvida por uma substância para que possa mudar de fase, ou seja, para que passe de sólido a líquido, de líquido a gasoso e vice versa. Em Física Ambiental, o fluxo de calor latente é o fluxo de calor da superfície da Terra para a atmosfera que está associado à evaporação ou transpiração na superfície (e posterior condensação do vapor d’água na troposfera). É um componente importante do balanço de energia junto à superfície terrestre (como veremos depois). O fluxo de calor latente era comumente medido com o método da razão de Bowen, técnica muito usada até meados de 1990, desde então é medido principalmente pelo método da covariância de vórtices turbulentos (eddy covariance em inglês). 13. O fluxo de calor sensível recebe este nome porque está relacionado à temperatura do ar, que pode ser “sentida” (HORNBERGER et al., 1998, apud COLLISCHONN, 2009). UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 25 pa r a d I n h a pa r a a p r o F u n d a r o c o n c e I t o . . . Latente, em latim significa escondido. Esse termo foi escolhido por que não há mudança na temperatura da substância enquanto ocorre a mudança de fase, apesar de se continuar fornecendo (ou retirando) calor, de que modo que este “se esconde”. Veja que essa ideia surgiu na época14 em que se acreditava que o calor era uma substância, um fluido, chamado calórico. e va p o r a ç ã o e e va p o t r a n s p I r a ç ã o Enquanto a superfície da Terra perde calor sensível através de trocas verticais com a atmosfera acima e com o solo (ou com a água) abaixo, nas superfícies líquidas uma quantidade considerável de calor é perdida por evaporação. O processo de perda de água na forma de vapor por uma superfície de terra molhada ou a partir de uma superfície de água (como lagoas, rios, lagos ou oceanos), sempre que a pressão de vapor no ar acima da superfície está abaixo de seu valor de saturação15, é chamado de evaporação natural (OLIVER, 2005; SAHA, 2008). pa r a d I n h a pa r a a p r o F u n d a r o c o n c e I t o . . . Manson e Hughes (2002) nos ajudam a recordar o conceito geral de evaporação: Trata-se do processo pelo qual um líquido pode ser transformado em vapor. Isso implica uma mudança de fase (ou mudança de estado), sendo, portanto, uma situação regida pela troca de calor latente (L). A perda de energia (Q ) por evaporação depende da massa do líquido e da energia por unidade de massa (L) necessária (o calor latente) para vaporizar o líquido: Q = mL Entre culturas vegetais, as principais trocas de calor latente envolvem a evaporação da água das folhas (transpiração) e do solo, e a condensação (formação de orvalho). A evaporação conjunta de água pelas folhas e pelo solo é chamada evapotranspiração. Enquanto as superfícies permanecerem úmidas (solo úmido ou transpiração livre pelas folhas), a evapotranspiração será dominante sobre o fluxo de calor sensível (CONNOR et al., ). Em outras palavras: 14. O termo foi introduzido em 1750 por Joseph Black (1728 - 1799), medico escocês que apresentou contribuições importantes para a Química e a Física, principalmente no campo da Termodinâmica. 15. Depende da temperatura na qual o ar se encontra. 26 | Ciências Naturais e Matemática | UAB (água de solos úmidos, reservatórios, barragens, lagos, etc) a E VA POR AÇ ÃO + T R A NSPIR AÇ ÃO = E VA PO T R A NSPIR AÇ ÃO (plantas) d I n â m I c a h í d r I c a v e g e ta l e a t r a n s p I r a ç ã o Como é de se imaginar, toda a água que passa pela planta provém do solo. Carbono entra 16 Entretanto, a demanda evaporativa da atmosfera provoca uma perda de água pelo vegetal que cria uma necessidade contínua de reposição da água perdida. Uma dinâmica que envolve as raízes o xilema e as folhas surge em função dessa necessidade (DaMATTA, 2007). Grande parte da água absorvida pelas raízes chega às folhas, mas somente uma parte é utilizada na fotossíntese. É por meio da transpiração que o restante dessa água passa ao exterior, sob a forma de vapor d’água. Água e minerais 17 vindos das raizes Além de servir para a regulação da temperatura da planta , essa liberação Oxigênio e vapor de vapor favorece o transporte da água absorvida pelas raízes para as partes d’água saem superiores pela diminuição da pressão hidrostática (ocasionando um fluxo FIguRA 5: EsquEMA básICO dO FluxO de massa)18. Dióxido de dE NuTRIENTEs E gAsEs NAs FOlHAs. pa r a d I n h a pa r a a p r o F u n d a r o c o n c e I t o . . . O fluxo de massa ocorre quando um agente externo é aplicado (em geral trata-se da gravidade ou de uma diferença de pressão). Como resultado, todas as moléculas da substância se movem como uma massa única. Um exemplo clássico é a água que recebemos nas torneiras de nossas casas: ela flui em resposta a uma pressão hidrostática estabelecida pela gravidade (LACERDA et al., 2007). A b FIguRA 6: A EVApORAçãO dAs MOléCulAs dE águA sE dá pElAs FOlHAs (A); O FluxO AsCENdENTE dE MOléCulAs dE águA (FluxO dE MAssA) dEsdE As RAízEs ATé As FOlHAs (b) ENVOlVE VáRIOs dIspOsITIVOs dE TRANspORTE: dIFERENçAs NA CONCENTRAçãO dE VApOR d’águA (FOlHA), pREssãO HIdROsTáTICA (NO sOlO E NO xIlEMA) E O pOTENCIAl HídRICO19. 16. Enquanto a pressão de saturação não é alcançada, há uma perda natural de água para a atmosfera a partir do solo e da vegetação. A demanda evaporativa também é chamada de evapotranspiração potencial. 17. Ao passar para o estado de vapor, a água absorve calor. 18. A água evaporada no topo das árvores gera uma força de tensão (em função da pressão hidrostática negativa) que puxa a água pelo xilema (tecido das plantas vasculares por onde circula a água com sais minerais dissolvidos - a seiva bruta - desde a raiz até às folhas). 19. O potencial hídrico quantifica a tendência da água para se deslocar de uma área para outra, devido à osmose, gravidade, pressão mecânica, ou efeitos de matriz, tais como tensão superficial. UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 27 o c o n F l I t o v I ta l d a s p l a n ta s e o s e s t ô m at o s Você deve se lembrar que por meio da fotossíntese as plantas utilizam a energia luminosa captada nas folhas20 para transformar quimicamente o CO2 da atmosfera em substâncias ricas em energia, os açúcares. Estes açúcares são vitais ao metabolismo alimentar e consequentemente ao crescimento das plantas (PACHECO e HELENE, 1990). As plantas captam o gás carbônico (CO2) da atmosfera por meio de estruturas chamadas estômatos (majoritariamente presentes na epiderme foliar). Quando essas estruturas estão abertas, flui CO2 em direção aos cloroplastos, onde se processa a fotossíntese. Existe, entretanto um grande desafio: como a atmosfera é relativamente “seca”, a entrada de CO2 implica na perda de água. Para minimizar as perdas de água e, ao mesmo tempo, maximizar a captura de dióxido de carbono, as plantas desenvolveram um sofisticado controle da abertura estomática (GAIO, 2011). Estômatos FIguRA 7: A dENsIdAdE dOs EsTôMATOs VARIA dE EspéCIE pARA EspéCIE (pOdE, INClusIVE, VARIAR EM uMA MEsMA plANTA pARA dIFERENTEs CONdIçõEs AMbIENTAIs). Os estômatos apresentam duas células chamadas guardas (estomáticas) que regulam a abertura de um poro (ou ostíolo), por onde se dão as trocas gasosas com a atmosfera (CO2, oxigênio e vapor d’água). Célula anexa Como é praticamente impossível a captação de CO2 sem a perda Células estomáticas de água para a atmosfera (transpiração), a abertura e o fechamento dos Núcleo estômatos está associada a fatores ambientais, como a concentração de CO2, a disponibilidade de água (e a demanda evaporativa) e, claro, a intensidade luminosa (já que a ideia é a realização de fotossíntese). Diferentes tipos de planta desenvolveram adaptações na quantidade, disposição e até elementos acessórios (como pequenos pelos e tricomas), para minimizar a perda excessiva de água para o meio externo. Cloroplastos Ostíolo As pesquisas em Física Ambiental que acompanham os fluxos de FIguRA 8: O COMplExO EsTOMáTICO. calor latente e de CO2 (bem como suas influências no ambiente) observam com frequência a dinâmica estomática das culturas vegetais. É dessa forma, por exemplo, que se pode verificar a participação da biosfera no clima e microclima de regiões nas quais a cobertura vegetal é relevante em função de sua extensão e diversidade. 20. Pelos cloroplastos. 28 | Ciências Naturais e Matemática | UAB r eco r dar é vIver: Fotossí ntese e r espIr aç ão A captura e uso de energia nos sistemas vivos é dominada por dois processos: fotossíntese e respiração. Através destes dois processos os organismos vivos são capazes de capturar e utilizar toda a energia que necessitam para suas atividades. “A frequente oposição entre fotossíntese e respiração tem conduzido à ideia de que os animais respiram e plantas não, uma vez que elas realizam fotossíntese e os animais não, quando na verdade ambos respiram – de dia e à noite – mas apenas as plantas realizam fotossíntese, que depende da luz do dia” (KAWASAKI, 2000). Fotossíntese As plantas podem captar a energia eletromagnética do Sol por um processo químico chamado fotossíntese. Esta reação química pode ser descrita pela equação a seguir: 6CO2 + 6H2O + energia eletromagnética C6H12O6 + 6O2 O termo fotossíntese significa, literalmente, “síntese usando a luz”. Os organismos fotossintéticos captam e utilizam a energia solar para oxidar H 2O, liberando O2, e para reduzir CO2, produzindo compostos orgânicos, primariamente açúcares. Esta energia estocada nas moléculas orgânicas é utilizada nos processos celulares da planta (LACERDA et al., 2007) Sobre o ensino desse processo, Kawasaki (2000) nos alerta que a representação acima, em que se apresenta a equação geral da fotossíntese, pode-se conduzir o aluno a pensar (equivocadamente) que parte do oxigênio sai do gás carbônico, quando se sabe que todo o oxigênio produzido vem da água e em processos bem distintos, pois para produzir 6 O2 são necessárias 12 H2O. Analisando o fenômeno, é interessante notar que, se toda a energia fixada por uma planta é usada na produção de açúcar (glicose), teoricamente é possível determinar a absorção de energia por uma planta através da medição da quantidade de açúcar produzido. Essa quantidade é chamada produtividade primária bruta. Medidas do acúmulo de açúcar na planta refletem a produtividade primária bruta menos a respiração, ou a produtividade primária líquida. Em geral, os animais não podem produzir sua própria energia através da fotossíntese. Em vez disso, eles capturam sua energia através do consumo e assimilação da biomassa de plantas ou outros animais. Assim, os animais conseguem a energia que necessitam para a manutenção dos tecidos seus corpos, crescimento e reprodução indiretamente a partir de organismos fotossintéticos. r espIr aç ão A oxidação do açúcar por organismos é chamada de respiração. Esse processo UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 29 ocorre tanto em plantas quanto em animais. Na maioria dos organismos, a respiração libera a energia necessária para todos os processos metabólicos. Esta reação química pode ser descrita pela seguinte equação: C6H12O6 + 6O2 6CO2 + 6H2O + energia liberada Como se percebe, um dos produtos da respiração é a energia, que é libertado através da decomposição química da glicose. Outros produtos da reação química são o dióxido de carbono (CO2) e água (H2O). AdApTAdO dE pIdWIRNY (2006). FluXo de co2 Um dos mais complexos e interessantes fenômenos de transporte que iremos abordar é o fluxo de CO2 (ou dióxido de carbono). Você já percebeu pelo que discutimos anteriormente, que as plantas têm um papel fundamental na transferência desse gás entre a atmosfera e a biosfera. Não que agora venhamos a discordar desse destaque dado aos vegetais, no entanto, acreditamos ser justo apresentar a você todas (ou pelo menos a maioria) das peças que compõem esse intrincado quebra-cabeças que envolve os fluxos de carbono (você não leu errado, é plural mesmo). Pretendemos discutir a relevância dada ao CO2 e sua relação com o efeito estufa (até porque você já deve ter ouvido algo a respeito na mídia), mas o fato é que o gás carbônico (outro nome para o dióxido de carbono) é apenas parte de um ciclo maior. Vejamos... o cIclo do carbono Supondo nosso conhecimento acerca da dinâmica hidrológica (evaporação, precipitação, infiltração, escoamento...) que, em geral, é bem conhecida, Sussman (2000) inicia uma abordagem sobre o ciclo do carbono nos preparando para algo que pode ser (a princípio) um pouco mais “complicado”: “É mais difícil entender o ciclo do carbono do que o ciclo da água”. Será isso verdade? Afinal, qual é o problema do carbono? Apesar de transitar por três estados físicos diferentes e alterar inclusive sua localização espacial (solo – atmosfera, ou vice-versa), temos, durante todo o ciclo da água, a mesma molécula de H2O. No carbono isso não é assim. “No ciclo do carbono, os átomos de carbono sofrem alterações não somente em sua condição física, mas também em sua química”. Na atmosfera, o carbono está presente principalmente como dióxido de carbono 30 | Ciências Naturais e Matemática | UAB (CO2), isso significa que, em cada molécula de gás carbônico, há um átomo de carbono combinado com dois de oxigênio. Noutros “lugares”, como na matéria viva (ou mesmo naquela em decomposição), o carbono pode-se unir ainda com o hidrogênio e outros elementos, em diferentes combinações ou substâncias, dando forma a carboidratos e proteínas. E, é claro, não podemos deixar de considerar o carbono que está presente nos oceanos, como gás dissolvido ou na forma de sais, como o carbonato de cálcio: CaCO3, e o bicarbonato de cálcio: Ca(HCO3)2 (SUSSMAN, 2000). Tudo isso nos sugere que, para traçar o ciclo completo do carbono é preciso rastrear os átomos de carbono em vez das moléculas de dióxido de carbono (LANDULFO, 2005). Você entendeu? Então, se quisermos saber por onde transita o carbono, temos que olhar para... A ATMOSFERA A BIOSFERA O SISTEMA OCEÂNICO Ainda segundo Landulfo (2005), para mediar a concentração de dióxido de carbono na atmosfera utiliza-se a unidade “partes por milhão” (ppm). Veja: se considerarmos que essa concentração seja algo em torno de 360 ppm, isso equivale, em massa, a cerca de 756 gigatons21 de carbono (ou seja: 756 . 1012 kg)22. É um valor bem alto, mas na verdade, está longe do total. Os principais reservatórios de carbono23 são as rochas sedimentares (formadas por carbonatos) e os sedimentos oceânicos, agregando 99,94% de todo o carbono estimado em nosso planeta (os 0,06% restantes encontram-se distribuídos na atmosfera, nos animais, nas plantas e dissolvidos nos oceanos), de acordo com Berner e Lasaga (apud. PACHECO e HELENE, 1990). No passado24 a dinâmica de absorção do carbono era muito mais complexa e fundamentalmente acoplada à vida no planeta: envolvia os processos biológicos de produção de carbono, petróleo, gás natural, os hidratos de metano e o calcário. Atualmente, o carbono “desaparece” da atmosfera somente25 pelos processos de absorção que ocorrem na biosfera e nos oceanos. pa r a d I n h a pa r a a p r o F u n d a r o c o n c e I t o . . . Aproveitamos o texto de Pacheco e Helene (1990) para lembrar que: As quantidades de carbono transferidas de um reservatório para outro por unidade de tempo, devido a processos físico-bio-geo-químicos, são conhecidas como FLUXOS de carbono. 21. 1 gigaton = 1 bilhão de toneladas 22. Esse foi o valor apurado no final da década de 1990. 23. Um reservatório de carbono é algo que remove significativamente o carbono da atmosfera. 24. Em eras geológicas anteriores. 25. Em uma primeira aproximação, as trocas diretas entre biomassa continental e oceanos são negligenciáveis e todas as trocas entre esses dois reservatórios se produzem pelo intermédio da atmosfera. UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 31 Entre as fontes de CO2 temos as naturais e aquelas atribuídas ao homem. Tabela 4: Fontes emissoras de dióxido de carbono Naturais Processos vulcânicos, combustão de matéria orgânica, respiração de organismos vivos aeróbicos. Queima de combustíveis fósseis (principalmente para aquecimento, geração de energia e transporte), alguns processos industriais (como a fabricação de cimento), queimadas (para desflorestamento e na agricultura), em hidroelétricas (pela decomposição da vegetação pré-existente na construção dos reservatórios; a ação de algas primárias nos lagos das usinas; e o acúmulo nas barragens de nutrientes orgânicos trazidos por rios e pela chuva). Decorrentes da ação humana Apesar do que possa parecer pela leitura da tabela acima, a maioria das emissões de CO2 provêm de fontes naturais. Repare que, apesar de termos detalhado mais a ação humana, não apresentamos ainda as quantidades de CO2 emitidas, o que lhe impossibilita estabelecer tal comparação. Na verdade, pretendemos manter o “suspense” no que diz respeito a esses valores por mais algumas linhas ainda (ou dê uma olhada na figura 6, se não quiser esperar...). Não que essas quantidades não sejam significativas, pelo contrário! Mas é preciso compreender algo mais importante para que se realmente entenda a complexidade do ciclo do carbono e, posteriormente, podermos fixar nossa análise sobre as tão faladas concentrações de CO2 na atmosfera, seus efeitos e a influência humana nessa história (evidente que, como diz o ditado: “onde há fumaça há fogo”...). As fontes naturais estão quase equilibradas por sumidouros naturais, processos físicos e biológicos que removem o dióxido de carbono da atmosfera. Um claro exemplo é a quantidade de CO2 removida diretamente da atmosfera por plantas terrestres para a fotossíntese. Uma imagem (acompanhada de dados mensuráveis) pode ser bastante elucidativa. Veja a figura 9: Evidente que o diagrama não abrange todos os processo anteriormente citados26, mas ilustra relativamente bem o balanço de carbono entre os diferentes reservatórios (atmosfera, biosfera e oceanos). Podemos subdividir o ciclo do carbono em pelo menos dois ciclos internos: o biológico e o biogeoquímico. 26. Na figura não se encontram representadas, por exemplo, as erupções vulcânicas: processos relevantes no retorno à atmosfera do carbono armazenado no manto terrestre, mas que necessita de uma escala lenta (em termos geológicos) para ser devidamente analisada. Embora o CO2 na atmosfera inicial da Terra tenha sua origem devida à atividade vulcânica, o vulcanismo moderno libera apenas 130-230 megatoneladas de CO2 a cada ano (Gerlach, 1991), que é menos de 1% do valor liberado pelas atividades humanas, de acordo com o Serviço Geológico dos EUA. 32 | Ciências Naturais e Matemática | UAB queima de combustível fóssil u so d troca de gases na O ciclo biológico superfície do mar compreende as trocas de carbono entre os seres vivos e a atmosfera. Nele estão presentes a fotossíntese das plantas (que retira CO2 da atmosfera), a respiração dos animais e plantas e a decomposição orgânica por bactérias e absorção oceânica líquida fungos (ambos proces1,6 - 2,4 sos que restituem CO2 à atmosfera). extração reservatório geológico O ciclo biogeobiológica químico transcorre em circulação escala geológica (de Concentração de carbono em gigatons milhões de anos), o (bilhões de toneladas) ao ano (GtC/ano) que significa que, para FIguRA 9: dIAgRAMA pARA O CIClO dO CARbONO. acompanhá-lo precisamos retroceder ao início da formação da Terra até os dias de hoje. O CO2 da atmosfera se dissolve na água e forma o ácido carbônico, que ataca as rochas da crosta terrestre formando carbonatos (com o cálcio e o magnésio dessas rochas). Através dos processos de erosão (chuva), estes carbonatos são arrastados para os oceanos, onde se acumulam no seu leito em camadas, ou são assimilados por organismos marinhos para formar seus tecidos27 (numa etapa do ciclo do carbono denominada bomba biológica 28). Eventualmente, depois de morrerem, os carbonatos que haviam sido assimilados por esses organismos também se depositam no fundo do mar e, ao longo de milhares de anos, esses resíduos formam as rochas sedimentares (como as rochas calcárias). O ciclo continua quando as rochas sedimentares do leito marinho são arrastadas para o manto da Terra e, por meio de processos geológicos que envolvem grandes pressões e temperaturas, derretem e reagem com outros minerais, libertando o CO2. As atividades vulcânicas completam então esse ciclo devolvendo o CO2 à atmosfera. Esse detalhamento a respeito do ciclo do carbono talvez tenha lhe feito esquecer o questionamento que levantamos quanto à contribuição humana. Se sua própria análise da figura 9 ainda não deixou claro o que temos feito, talvez a abordagem a seguir o faça: 5,3 -2 20 ,6 e tes sín os fot 0 -6 olo os respiração das plantas decomposição de resíduos -1 0,6 -6 0 10 0 -1 15 10 0 40 50 O ciclo natural adiciona e remove CO2 da atmosfera, mantendo um certo equilíbrio; nós, humanos, temos adicionado CO2 à atmosfera sem a preocupação de removê-lo29. 27. Como conchas e carapaças. 28. Um ótimo texto sobre a bomba biológica e a participação dos mares e oceanos no ciclo do carbono é o artigo “O mar de amanhã, com as mudanças climáticas de hoje” (CASTRO et al, 2010), disponível na web. 29. Baseado em “How do human CO2 emissions compare to natural CO2 emissions?”, disponível em http://www.skepticalscience. com/human-co2-smaller-than-natural-emissions-basic.htm (acesso em 01/02/2012). UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 100 33 - 11 5 Desde a Revolução Industrial a humanidade tem aumentado con6 sideravelmente a quantidade de CO2 5 na atmosfera terrestre e nos oceanos. A queima de combustíveis fósseis e 4 a modificação na cobertura vegetal das florestas são, respectivamente, 3 as ações humanas que mais tem con2 tribuído nesse processo. A figura 10 mostra um gráfico bastante conheci1 do sobre como tem evoluído as emissões globais de carbono nos últimos 0 200 anos (BODEN et al., 2009): De acordo com Sussman 1800 1850 1900 1950 2000 (2000), a queima de combustíveis fósseis30 (óleo, carvão e gás natural) FIguRA 10: EMIssõEs glObAIs dE dIóxIdO dE CARbONO pOR COMbusTíVEIs responde pela maior quantidade de FóssEIs ATé 2007, EM bIlHõEs dE TONElAdAs pOR ANO (gT/ANO). carbono que o homem vem acrescentando à atmosfera. Esse carbono dos depósitos de óleo, carvão e gás estiveram armazenados nas profundezas do subsolo por milhões de anos. Atualmente, com a queima de florestas e o uso intenso dessas formas de combustível, o ciclo global do carbono está em desequilíbrio. Como a Terra é essencialmente um sistema fechado para a matéria, o carbono extra acrescentado à atmosfera não desaparece, mesmo que outros reservatórios passem a absorver mais, como parece ser o caso dos oceanos. As consequências desse aumento na emissão de CO2 para atmosfera ainda não são totalmente claras, mas as possibilidades podem incluir a acidificação31 dos oceanos e mudanças climáticas decorrentes de um incremento no efeito estufa, fenômeno que discutiremos no próximo capítulo. Toneladas de Carbono/Ano (Bilh’oes) Total Petróleo Carvão Gás natural Produção de cimento Queima de gás 8 7 30. Têm esse nome pois supõe-se, segundo a teoria mais aceita, que tenham origem na decomposição e transformação dos restos de organismos vivos (matéria orgânica) enterrados há milhões de anos. 31. Lembra que o CO2 dissolvido na água forma ácido carbônico? A contrapartida dessa reação é a diminuição do pH do oceano, podendo alterar drasticamente esse ecossistema. Há uma boa animação sobre o tema em: http://www.greenpeace.org/portugal/pt/ Multimedia/ videos/Acidificacao-dos-oceanos/ (acesso em 01/02/2012). 34 | Ciências Naturais e Matemática | UAB bal an ço de energIa 4 té o momento já lhe apresentamos pistas suficientes para você pudesse perceber que os processos físicos e biológicos que ocorrem em nosso planeta dependem, e muito, da energia que o Sol nos fornece. Há, é claro, questões sob as quais gostaríamos que você refletisse e que cuja análise fazem parte do escopo da Física Ambiental. Por exemplo: que energia é essa que essa nossa estrela nos envia, como ela chega até nós e que lhe acontece quando ela finalmente atinge a superfície da Terra? Como nos lembra VIEIRA (2009), o Sol pode ser considerado, para efeitos didáticos, uma esfera com 697.000 km de raio. Levando em conta esse formato e em função das reações termonucleares32 que lá ocorrem, o Sol emite uma grande quantidade de energia radiante (ondas eletromagnéticas) em todas as direções33. A c o n s ta n t e solar Será que é possível estimar ou medir a quantidade de energia que o Sol nos fornece? Bem, sim. Os dois procedimentos são possíveis e nos dão o que chamamos de constante solar34 . Se imaginar uma superfície perpendicular aos raios solares, a quantidade de energia recebida por unidade de área por unidade de tempo (fluxo!) é de, aproximadamente35, 1400 W/m2 no “topo” da atmosfera36. Um dos textos mais lidos pelos pesquisadores brasileiros, Varejão-Silva (2006), sintetiza essa informação da seguinte maneira: 32. A fusão de núcleos de hidrogênio para a formação de hélio. 33. Essa irradiância solar (ou densidade de fluxo de radiação solar) obedece a Lei do inverso do quadrado da distância, de modo que a energia recebida em uma superfície é inversamente proporcional ao quadrado da distância entre a fonte emissora e a superfície receptora. 34. A escolha desse nome não é muito feliz, já que a irradiância solar não é exatamente constante, sofrendo algumas variações periódicas (ciclos de atividade) e outras totalmente caóticas. UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 35 “A constante solar é definida em função da distância média Terra-Sol e traduz a irradiância normal acima da atmosfera quando essa distância é atingida”. É claro que é perfeitamente possível calcular a constante solar mesmo em situações nas quais a nossa distância ao Sol não corresponde àquela citada, mas achamos melhor lhe poupar dessa demonstração. Também é comum se realizarem medições da constante solar (de modo a obter valores mais precisos). Não deve lhe surpreender que, para obter os melhores resultados, os pesquisadores foram ao alto de montanhas, além de lançarem balões, foguetes e satélites. A primeira medida direta foi feita acima da camada de ozônio, em 1967 por um foguete X-15 em Nevada, EUA: 1360,67 W/m2 (VIEIRA, 2009). Caso se queira saber a quantidade média de energia solar que chega ao nosso planeta por metro quadrado de superfície, basta multiplicar o valor da constante solar pela área da circunferência terrestre e dividir pelo valor de toda a sua superfície, o que dá, aproximadamente, 342 W/m2 (que é chamado de constante solar média)37. Vale destacar que a constante solar é composta por todos os “tipos” de radiação emitidas pelo Sol. Antes que você possa perguntar, vamos esclarecer... composIç ão da r adIaç ão sol ar Ok, primeiro lembre-se que estamos falando de “energia radiante”, ou seja, de ondas eletromagnéticas! Como qualquer onda, estas também possuem características relevantes e que as definem, como velocidade de propagação, frequência e comprimento de onda. pa r a d I n h a pa r a a p r o F u n d a r o c o n c e I t o . . . y λ x λ λ FIguRA 11 – COMpRIMENTO dE ONdA λ. O comprimento de onda (λ) é, em termos práticos, a distância de pulso para pulso. Normalmente para isso consideramos dois pontos consecutivos que tenham a mesma fase, como dois máximos (cristas) ou dois mínimos (vales). Por exemplo, a distância percorrida pela luz azul (que viaja a 299.792.458 m/s no vácuo) durante o tempo entre dois valores máximos consecutivos do seu campo elétrico (ou magnético) é o comprimento de onda da luz azul. A luz vermelha viaja à mesma velocidade, mas o seu campo elétrico aumenta e diminui (“pulsa”) mais lentamente do que a luz azul. Portanto, a luz vermelha terá uma frequência mais baixa, o que torna seu comprimento de onda (distância entre pontos análogos da onda) maior. Por conseguinte, o comprimento de onda de luz vermelha é maior do que o comprimento de onda da luz azul. 35. Varia de 1353 a 1370 W/m2, dependendo do autor. 36. Alguns autores adotam essa expressão para indicar que essa energia ainda não sofreu nenhuma absorção pela atmosfera, embora se saiba que, a rigor, a atmosfera não tem qualquer limite superior (VAREJÃO-SILVA, 2006). 37. Desafiamos você a fazer esse cálculo! 36 | Ciências Naturais e Matemática | UAB A energia que chega à parte mais alta da atmosfera é uma mescla de radiações de diferentes comprimentos de onda, agrupadas em um espectro, ou seja, uma espécie de conjunto no qual os “componentes” não são fisicamente independentes. Se achar mais fácil, imagine a radiação eletromagnética emitida pelo Sol como uma onda composta por um agrupamento de várias outras combinadas (cada uma com características próprias, como comprimentos de onda e frequências, mas que, como já foi dito, viajam juntas, à mesma velocidade). Segundo Monteinth (1973), grande referência no campo da Física Ambiental, o espectro da radiação solar pode ser dividida (em termos didáticos) em três bandas principais de comprimentos de onda capazes de interferir nos processos biológicos: ultravioleta, luz visível/PAR e infravermelho. Tabela 5: distribuição de energia no espectro da radiação emitida pelo Sol (MONTEITH, 1973) Banda de λ (nm) 0 – 300 300 – 400 (ultravioleta) 400 – 700 (visível/radiação fotossinteticamente ativa – PAR) 700 – 1500 (infravermelho próximo) 1500 – ∞ Fração de energia (constante solar) (%) 1,2 7,8 39,8 38,8 12,4 100,0 O espectro ultravioleta pode ser subdividido em UVA (400 - 320 nm), que produz o bronzeamento da pele; UVB (320 a 290 nm), responsável tanto pela síntese da vitamina D quanto pelo aparecimento de câncer de pele; e UVC (290 a 200 nm), potencialmente nocivo mas completamente absorvido pelo ozônio na estratosfera. A radiação eletromagnética visível ao olho humano encontra-se na faixa que vai de 400 a 550 nm. Como essa também é a faixa capaz de estimular a fotossíntese nas plantas, acaba sendo citada como Radiação Fotossinteticamente Ativa, ou Photosynthetically Active Radiation - PAR, em inglês (MONTEITH, 1973). Os vertebrados não enxergam a radiação infravermelha como luz, mas são capazes de percebê-la como calor por meio de células especializadas na pele. Provavelmente por isso seja considerada frequentemente como a “radiação térmica”, apesar de que a luz e outros comprimentos de onda, quando absorvidos, podem estimular um aumento da agitação molecular e correspondente incremento da temperatura. Para além dos efeitos que a radiação solar tem sobre os processos biológicos, cabe destacar que, de forma mais geral, a matéria interage de formas diferentes com certas “partes” ou, melhor, certos comprimentos de onda, do espectro solar. UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 37 I nteração da atmosFera com a radIação solar Os raios solares ao atravessarem a atmosfera terrestre interagem com seus componentes, podendo sofrer modificações em termos quantitativos, qualitativos e em sua direção de propagação. O que ocorre em cada caso depende de como a matéria reflete, refrata ou absorve os comprimentos de onda que compõem essa radiação. Em condições ideais, ou seja, num dia perfeitamente claro e com os raios solares incidindo de forma praticamente perpendicular, teremos não mais que 3/4 da irradiância solar que chega no topo da atmosfera atingindo à superfície da Terra. Quase toda a radiação ultravioleta e grande parte da infravermelha são absorvidas pelo ozônio e outros gases na alta atmosfera (ECHARRI PRIM, s.d.). Como já vimos, o vapor d’água, além de outros componentes atmosféricos, absorvem em maior ou menor intensidade o infravermelho e a luz visível. Dessa forma, a quantidade de energia que chega ao nível do mar acaba por ser significativamente menor do que a constante solar. IRRADIÂNCIA ESPECTRAL (Wm-2/μm) 2100 1800 1500 1200 900 600 300 0 200 O3 469 555 645 O3 IRRADIÂNCIA SOLAR DIRETA AO NÍVEL DO MAR IRRADIÂNCIA SOLAR ACIMA DA ATMOSFERA H 2 O O2 H2O H2O 936 905 940 H 2O & CO2 H 2O & CO2 H 2O & CO2 1240 1640 1000 1500 2000 2130 1375 858 2500 2700 COMPRIMENTO DE ONDA (nm) FIguRA 12: EspECTRO dA IRRAdIâNCIA sOlAR ACIMA dA ATMOsFERA (VERdE) E AO NíVEl dO MAR (VERMElHO). dEsTAquE pARA A AbsORçãO sElETIVA dE dETERMINAdOs COMpRIMENTOs dE ONdA pElOs COMpONENTEs ATMOsFéRICOs. Essa diminuição, também chamada de atenuação, ocorre em função do espalhamento dos raios solares e da absorção seletiva, tal como pode ser percebida no gráfico do espectro da irradiância solar (figura 12), em que determinadas faixas de comprimentos de onda são absorvidas pelo oxigênio (O2), ozônio (O3), gás carbônico (CO2) e vapor d’água (H2O). 38 | Ciências Naturais e Matemática | UAB Com isso chegamos a um ponto muito importante de nossa abordagem. Como dito, determinados componentes da atmosfera absorvem certos comprimentos de onda da radiação solar. A questão é: você se lembra o que pode ocorrer quando a matéria absorve energia radiante? saldo de r adIaç ão Outra forma interessante de “divisão” do espectro da radiação solar se dá em função do valor de 400 nm (4 µm ou 4 . 10-6 m). Os comprimentos de onda “abaixo” dessa marca são classificados como radiações de ondas curtas e, a partir dessa medida, temos as radiações de ondas longas. Mais de 99% da quantidade de energia emitida pelo Sol encontra-se no intervalo entre 0,15 e 4,0 µm (VIEIRA, 2009), de modo que podemos dizer, de forma tranquila, que nossa “estrela-mãe” nos envia energia sob a forma de ondas curtas. A energia recebida pela Terra sob a forma de ondas curtas é balanceada por uma quantidade equivalente de radiação de ondas longas emitidas para o espaço, dado que todo corpo acima da temperatura absoluta irradia energia. O que nos leva à questão mais importante desse fascículo: todos os processos físicos e biológicos que estudamos dependem do que ocorre com a energia nesse balanço de “entradas” e “saídas” de radiação. Assim sendo, acompanhamos a radiação solar que chega no topo da atmosfera (Q0), a quantidade de ondas curtas que chega à superfície (Qs) e a parcela que é refletida por ela (αQs), além da radiação de ondas longas emitida pela atmosfera (Ratm) e pela superfície (Rs). O saldo de radiação (R n)38 que é colocado à disposição da superfície (e usado no aquecimento, na fotossíntese e como calor latente) se deve à diferença entre os ganhos (fluxos descendentes) e as perdas (fluxos ascendentes) radiativa Saldo de radiação = Balanço de ondas curtas + Balanço de ondas longas Ou, de forma sintética: Rn = (Qs - αQs) + (Ratm - R s) Sendo mais “elegantemente” apresentado como: Rn = Q (1 -α) + (Ratm - R s) 38. De “net radiation”ou “radiação líquida disponível”, como também é chamada. UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 39 pa r a d I n h a pa r a a p r o F u n d a r o c o n c e I t o . . . α é denominado de albedo ou coeficiente de reflexão da superfície. É definido como a razão entre a radiação refletida pela superfície e a radiação incidente sobre ela. Sendo uma fração adimensional (não possui unidades), pode também ser expressa como uma porcentagem, e é medido numa escala de 0 (quando não há nenhuma reflexão - superfície perfeitamente preta) a 1 (quando toda a radiação é refletida - superfície perfeitamente branca). Sentelhas e Angelocci (2009) chamam a atenção para o fato de que o valor do albedo varia com as características ópticas da superfície, e citam exemplos: água (α = 5%) e florestas (α = 10 a 15%) tem um albedo baixo, enquanto que as culturas tem albedo mais elevado (α ≈ 20%). Neve e areia têm os maiores albedos (entre 40 e 90%). O balanço de radiação sofre variações ao longo do dia e do ano. As variações diárias do balanço de radiação da superfície do solo ocorrem em função da trajetória diária do sol acima do horizonte, enquanto as variações sazonais39, em função da variação da declinação do sol ao longo do ano. pa r t I ç ã o (ba l a n ço do saldo de r adIaç ão de e n e rg Ia) Sabendo como a energia radiante chega e sai do nosso planeta, uma análise mais específica, mas não menos importante, trata das transformações que ocorrem com a energia decorrente do saldo de radiação junto à superfície e suas relações com os processos físicos e biológicos anteriormente citados. Na verdade, trata-se de um exercício de aplicação do princípio de conservação da energia. De forma objetiva: Rn = H + G + LE + F Em que: R n é o saldo de radiação disponível no sistema solo-planta-atmosfera, após descontadas as perdas inerentes à reflexão, à emissão e à condução de energia. H corresponde ao fluxo de calor sensível destinado às trocas de calor, por turbulência, entre a superfície e o ar, responsável pelo aquecimento e resfriamento do ar. LE representa o fluxo de calor latente, fração da energia utilizada nos processos de evaporação, transpiração e ou evapotranspiração. G é a parcela referente ao fluxo de calor sensível decorrente das trocas com o solo subjacente. F engloba a energia utilizada nos processos biológicos, tal como a fotossíntese, 39. Sazonal: relativo à estação do ano 40 | Ciências Naturais e Matemática | UAB correspondendo a cerca de 3-4% do saldo de radiação. Eis um bom esquema, algo quantitativo, do que temos ao fim: Radiação solar refletida 101,9 W/m2 Radiação solar 341,3 W/m2 239 Radiação terrestre (ondas longas) 238,5 W/m2 102 Reflexão por nuvens, aerossóis e gases atmosféricos 79 W/m2 341 79 Radiação emitida pela atmosfera 169 78 Radiação absorvida pela atmosfera Calor latente 30 40 Janela atmosférica Gases do efeito estufa Reflexão pela superfície 23 W/m2 333 356 Radiação retornada Absorção pela superfície 17 80 396 Convecção EvapoRadiação emitida Absorção pela transpiração pela superfície Superfície 161 333 FIguRA 13: bAlANçO dE ENERgIA RAdIATIVO TERREsTRE o eFeIto estuFa natural e a ação antropogênIca Diante do que acabamos de discutir, principalmente no que se refere ao balanço de radiação e às reemissões de ondas longas, não podemos mais nos furtar à questão do efeito estufa. Acreditamos que esse tópico encerra muito bem nossa jornada nesse fascículo e, considerando todas as informações acerca dos fenômenos e processos apresentados, você poderá, a seguir, dar prosseguimento não só aos seus estudos do ambiente natural, mas fazê-lo de forma crítica, analisando as situações relativas ao tema sob a lente de um conhecimento que se alicerça na pesquisa científica atual. No conjunto dos textos que buscamos para a elaboração desse material, percebemos que a abordagem de MARTÍNEZ & FERNÁNDEZ (2004) nos parece ser a mais didática, de modo que, apesar de seguiremos seus passos nos parágrafos seguintes. Recomendamos, fortemente, que tente superar a barreira linguística e vá em busca do texto original, aproveitando que boa parte da obra encontra-se atualmente disponível por meio do serviço “Google Livros” (acesso em 24/12/2011). Primeiro passo: lembre-se que todos os corpos emitem radiação e que, essa radiação, sob a forma de ondas eletromagnéticas, não necessita de nenhum meio material para se propagar, ao contrário, a matéria dificulta seu avanço. Como vimos, pela UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 41 Lei de Stephan-Boltzmann, a radiação emitida depende da temperatura do corpo emissor em dois aspectos: por um lado, a quantidade de radiação emitida aumenta tremendamente conforme sobe a temperatura (pois é proporcional à T4) e, por outro, seu comprimento de onda diminui quando a temperatura sobe (já que a frequência da fonte emissora aumenta). A segunda peça fundamental foi acrescentada na seção em que discutimos o balanço de radiação. Constatamos, após esse estudo, que na atmosfera, e consequentemente no clima, atuam dois tipos de radiação claramente distintas: as ondas curtas, originadas no Sol, e as ondas longas, emitidas pela Terra. Podemos perceber como são diferentes ao levarmos em conta a absurda diferença de temperaturas de suas fontes. O efeito estufa ocorre porque o ar é (muto) transparente para a radiação de ondas curtas e (muito) opaco para a de ondas longas. Dessa forma, a atmosfera é um filtro para a radiação, deixa passar os raios solares; alguns desses são absorvidos pela superfície terrestre (e pelos demais componentes da Terra), aquecendo-se em consequência e então emitindo radiação de ondas longas, que é bloqueada (absorvida) pela atmosfera e pelas nuvens. As camadas atmosféricas (e as nuvens) vão sucessivamente absorvendo radiação, aquecendo-se e reemitindo (tanto para o alto como para a superfície) radiação térmica (ondas longas) que se originou de baixo. O Efeito Estufa Radiação solar: 343 W/m2 Radiação solar Refletida: 103 W/m2 Parte da radiação solar é refletida pela atmosfera e pela superfície da Terra Radiação infravermelha enviada ao espaço: 240 W/m2 Parte da radiação infravermelha passa através da atomosfera e perde-se no espaço A radiação solar atravessa a atmosfera Radiação solar incidente: 240 W/m2 Atmosfera Parte da radiação infravermelha é absorvida pelas moléculas dos gases de efeito estufa Gases de Efeito Estufa Radiação solar absorvida: 168 W/m2 Cerca de metade da radiação solar é absorvida pela superfície da Terra Essa radiação é convertida em energia térmica, provocando a emissão de radiação de ondas longas (infravermelho) de volta para a atmosfera Terra FIguRA 14: O EFEITO EsTuFA NA ATMOsFERA 42 | Ciências Naturais e Matemática | UAB pa r a d I n h a pa r a a p r o F u n d a r o c o n c e I t o . . . Por estar a uma certa distância do Sol e por ter um determinado albedo, a Terra deveria apresentar uma temperatura característica de equilíbrio chamada de efetiva. Se o planeta encontra-se mais distante do Sol será mais frio, e se for mais escuro, será mais quente. Naturalmente, à maior distância da fonte se recebe menos radiação, e um corpo mais escuro absorve mais radiação. A temperatura efetiva é o resultado do balanço entre a radiação solar de ondas curtas absorvida pela Terra e a emitida sob a forma de ondas longas por ela. Considerando os valores do albedo planetário e da distância do planeta ao Sol, a Terra deveria apresentar uma temperatura efetiva de -18 °C, um valor muito diferente da temperatura real que temos à superfície, cujo valor típico (médio anual e global) é de 15 °C, o que dá uma diferença de 33 °C acima do previsto! Essa grande diferença entre a temperatura efetiva e a real se deve ao efeito estufa, que ocorre em qualquer planeta ou satélite natural que tenha atmosfera. Isso significa que se a Terra não tivesse atmosfera seria 33 °C mais fria (MARTÍNEZ & FERNÁNDEZ, 2004). os g a s e s d e e F e I t o e s t u Fa A atmosfera é uma mescla de gases e aerossóis (partículas sólidas e líquidas) em suspensão. Os aerossóis, de forma geral, aumentam o albedo planetário, pois refletem a radiação solar e reduzem a quantidade desta que penetraria nas camadas inferiores até a superfície. Dos gases que compõem a atmosfera, somente uma minoria (normalmente os mais complexos) colabora para o efeito estufa. O oxigênio (O2) e o nitrogênio (N2) são, indiscutivelmente, os principais componentes da atmosfera, contribuindo com 21% e 78%, respectivamente, de sua constituição. Ambos não são gases de efeito estufa, o que significa que, se a atmosfera fosse composta apenas de N2 e O2, seria tão respirável quanto é agora, mas a temperatura típica da Terra seria de -18 °C, a mesma que teríamos se não houvesse atmosfera. Assim sendo, os gases de efeito estufa fazem parte do 1% restante da composição atmosférica. Em geral, são constituídos por três ou mais átomos; aqueles que formam moléculas diatômicas (como o O2 e o N2) ou monoatômicas são transparentes à radiação terrestre. Os mais importantes são o vapor d'água (H 2O) e o dióxido de carbono (CO2); os demais gases (CH4, NOX, CFCS, etc) são chamados de gases traço por sua ínfima presença na atmosfera (MARTÍNEZ & FERNÁNDEZ, 2004). UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 43 concluIndo. . . O efeito estufa sempre existiu. É uma consequência natural da composição da atmosfera e graças a ele temos na Terra uma temperatura relativamente alta, o que permitiu o surgimento e evolução da vida. A grande discussão é de que forma esse fenômeno natural tem sido alterado pelo homem, principalmente em função de seu desenvolvimento industrial e o uso de combustíveis fósseis que acrescentam CO2 e outros gases à atmosfera, além do desflorestamento, que modifica a dinâmica de interação da biosfera com a atmosfera. 44 | Ciências Naturais e Matemática | UAB UAB| Ciências Naturais e Matemática | Introdução à Física Ambiental | 45 46 | Ciências Naturais e Matemática | UAB reFerêncIas bIblIográFIcas A H R ENS , C . D. E s s e nt i a l s of M e te o r olo g y : A n I n v it a t ion to t he A t mo s p he r e . 3rd E d it ion . T hom s on B o ok s /C ole , B e l mont , CA , 2 0 01. BER T U L A N I , C . C u r s o d e Fí s i c a 2 I nte r a t i v o. U F R J , 19 9 9. D i s p on í v e l em : ht t p: //om n i s . i f.u f r j. br /~b e r t u /f i s 2 / i nd e x . ht m l BODEN , T. A .; M A R L A N D, G.; A N DR E S , R . J. G lo b a l , R e g ion a l , a nd N a t ion a l Fo s s i l-Fu e l C O2 E m i s s ion s . Ca r b on D iox id e I n for m at ion A n a l y s i s C e nte r O a k R id g e Nat ion a l L a b or ator y US A O a k R id g e T N D e p a r t me nt of Ene r g y (2 0 0 9): U. S . D e p a r t me nt of Ene r g y, O a k R id g e , Te n ne s s e e . CA S T RO, B . M .; BR A N DI N I , F. P.; WA I N ER , I . E . K . C .; D O T T OR I , M . O m a r d e a m a n h ã , c o m a s mu d a nç a s c l i m á t i c a s d e ho j e . Ciê nc i a e Cu lt u r a , S ã o Pau lo, v ol . 62 , n . 3 , 2 010 , p p. 4 0 - 42 . COL L I S CHON N , W. TA S SI , R . I nt r o du z i ndo H i d r olo g i a . 2 0 0 9. (A p o s t i l a do c u r s o d e H id ro log i a). D i s p on í v e l em : ht t p: //g a l i le u . iph .u f r g s .br /c ol l i s c hon n /ap o s t i l a _ h id rolog i a /ap o s t i l a . ht m l CON NOR , D. J. L O OM I S , R . S . CA S SM A N , K . G. C r o p E c olo g y : P r o du c t i v it y a nd M a n a g e me nt i n A g r i c u lt u r a l S y s te m s . D a M AT TA , F. M .; P OM PE L L I , M . F. R e l a ç õ e s H íd r i c a s d e P l a nt a s . Un i v e r s id a d e Fe de r a l d e Viço s a (ap o s t i l a). D i s p on í v e l em : ht t p: //w w w.e b a h .c om .br /c onte nt /A BA A A AT 7wA D/ r e l a c o e s-h id r ic a s-pl a nt a s E CH A R R I PR I M , L .. C i e nc i a s d e l a T i e r r a y d e l M e d io A m b i e nte - L i b r o E le c t r ón i c o, D i sp on í v e l em : ht t p: //w w w1.c eit .e s /A s i g n at u r a s / E c olog i a / H ip e r te x to /0 0 G e ne r a l / I nd ic e Gr a l . ht m l . A c e s s o em 01 /1 2 /2 01 2 . GA IO, D.C . 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