Direito Penal Especial

March 22, 2018 | Author: Anonymous z85AEPb | Category: Homicide, Crime & Justice, Crimes, Battery (Crime), Suicide


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DIREITO PENAL ESPECIALIntensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 PARTICIPAÇÃO EM SUICÍDIO – Art. 122, do CP Vocês vão ver cada pergunta que cai em concurso envolvendo o art. 122, que vocês vão ficar bestas. Induzimento, Instigação ou Auxílio a Suicídio Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave. Para entendermos o art. 122, sabendo que ele pune participação no suicídio, eu tenho que explicar o que é suicídio. Tem um conceito que, se você lembrar, você não erra em concurso, porque há muitas perguntas que você resolve com o simples conceito. Conceito de suicídio – “Eliminação voluntária e direta da própria vida.” Erra em concurso quem fala em eliminação da própria vida, porque ela tem que ser voluntária. Erra quem fala em eliminação voluntária porque ela tem que ser também direta. Guardem isso. Olha a pergunta que caiu em concurso. A resposta você encontra em Cezar Roberto Bittencourt. Olha que importante: qual foi a teoria adotada no Código Penal para punir o partícipe? Para a punibilidade do partícipe? Nós temos que trabalhar com a bagagem do Penal Geral. A punibilidade do partícipe é norteada pela Teoria da Acessoriedade Limitada. Isso significa que para punir o partícipe, o fato principal tem que ser típico e antijurídico. Pergunto: suicídio é típico? Nós estamos punindo a participação no suicídio, só que suicídio não é crime. Quem tentou se matar e não conseguiu, não vai preso. Se não é sequer típico, como é que eu posso punir aquele que induz, instiga ou auxilia? É que aqui, a participação não é um mero acessório, mas elementar do tipo. Aqui, os núcleos da participação são elementares do tipo. Significa que o art. 122 não está punindo uma atividade acessória, mas principal. Ele não está punindo uma participação acessória. Cezar Roberto Bittencourt. Caiu em concurso: por que punir quem induz alguém a se suicidar, se suicídio não é crime? Se você não pune o principal, por que punir o acessório? Ele não é acessório. Ele é principal. A participação aqui é atividade principal. Sujeito ativo – Quem pode participar em suicídio de alguém. O tipo exige alguma qualidade ou condição especial do agente? Não. O crime é comum. Pode ser praticado por qualquer pessoa. MP/MG (2004) – Nessa prova, de dez questões, 6 envolveram crimes contra a vida. A induz B a auxiliar C a praticar suicídio. C morreu. Que crime pratica B, que auxiliou C a se suicidar? O do art. 122, mas não foi essa a pergunta deles. Eles queriam saber que crime praticou A. Uma das alternativas apontava fato atípico. A é partícipe Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 do crime do art. 122. Ele, sim é o partícipe estricto sensu de um ator principal. A conduta dele é acessória de uma principal. Ele responde nos termos do art. 29, do CP. Ele vai responder pelo art. 122 também, mas na condição de partícipe. Então, cuidado! O crime admite concurso de agentes. Em nenhum momento eu quis dizer que não admite. Quanto ao sujeito ativo, isso é o que tem de mais difícil. Sujeito passivo – Quem pode ser vítima do crime de participação em suicídio? Cuidado com a resposta porque é qualquer pessoa capaz. Por isso vocês colocaram no conceito “eliminação voluntária.” Quando eu digo capaz, é capacidade de entendimento. E se eu induzir a suicidar um incapaz? Qual é o crime? Art. 121. A incapacidade é um instrumento de que se vale o agente. A incapacidade passa a ser um instrumento de que se vale o agente. Se a vítima é incapaz, art. 121. A incapacidade passa a ser um instrumento na mão do agente. Observação importante: A vitima deve ser determinada. Não haverá o crime se a vítima for indeterminada. Só tem crime se você instiga pessoa certa e determinada a se suicidar. Já foi objeto de reportagem jornalística no Brasil: um grupo de rock numa de suas músicas, incentiva ao suicido. Um fã dessa banda coloca a música e se joga da janela. A polícia chega e vê que o disco estava tocando incessantemente na faixa que induz ao suicídio. A banda respondeu pelo art. 122? Não. Qual crime praticou a banda? Apologia ao crime? Não, suicídio não é crime. Nesse caso, é fato atípico. Cuidado que muitos colocam apologia ao crime. Vítimas incertas e indeterminadas, fato atípico. Repara que é um crime plurinuclear. Tem três núcleos. Você, na sua denúncia, obviamente, tem que dizer qual foi o núcleo praticado. Vamos colocar o que significa cada um deles:  Induzir – Fazer nascer a ideia mórbida: “você já pensou em se matar?”  Instigar – Reforçar ideia já existente. A pessoa te conta um problema e diz que está pensando em se matar: “demorou pra tomar essa postura nobre!”.  Auxiliar – Dar assistência material. Você empresta a corda, o veneno, etc. Nós temos, nas duas primeiras hipóteses, o que a doutrina chama de participação moral ao e na última hipótese, participação material. O sujeito está no alto de um prédio e o povo embaixo: “pula, pula!” É crime? Sim. É instigar. Vejam que se tiver mais de três pessoas lá embaixo, associadas de forma estável e permanente, pega quadrilha também. É possível auxílio por omissão? 1ª Corrente: O art. 122 é claro ao falar em “prestar-lhe auxílio”. A expressão indica somente conduta “ação” e nunca uma omissão. Frederico Marques (já morreu). Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 2ª Corrente: é perfeitamente possível o auxílio por omissão, desde que o omitente tenha o dever jurídico de agir. Hipótese de garante ou garantidor. Pai com filho, por exemplo. Nelson Hungria (já morreu). É a que prevalece. “O auxílio deve ser sempre acessório, não podendo intervir diretamente nos atos executórios.” MP/MS – Caiu um exemplo que eu dou desde 1999: a pessoa quer morrer, você empresta a corda e depois ela pede para você chutar o banquinho. Você emprestar a corda, vai ficar no art. 122. Agora, chutar o banquinho, vai para o art. 121 porque, nesse caso, você matou. Você interveio nos atos executórios. Você auxilia alguém a se matar. Você ajuda. Essa pessoa começa a sofrer e se arrepende. Pede para você ajudá-la a viver. E você: “agora não. Não sou palhaço! Você pediu para morrer, eu te ajudei. Agora morre, ora!” Que crime você pratica? Cuidado. Se você auxiliou a pessoa a se matar, ela se arrepende e você não socorre, você responde pelo art. 121. Você passou a ser garantidor também. Todo arrependido que pede auxílio para aquele que o assessorou, que o assistiu, se não tiver socorro, a pessoa responde por homicídio. Você auxiliou alguém a se suicidar. O suicida se arrepende, você tem que socorrer, sob pena de responder pelo art. 121. Só para finalizar o tipo objetivo, quero fazer um alerta que está no art. 146, § 3º: Art. 146, § 3º - Não se compreendem na disposição (constrangimento ilegal): II - a coação exercida para impedir suicídio. deste artigo Se você trancou um suicida no quarto, você não vai responder por constrangimento ilegal. A coação exercida para impedir o suicídio não é crime. Esse é só um alerta porque o texto é autoexplicativo. Não preciso nem perder tempo. O crime somente é punido a título de dolo, direto ou eventual. Não se pune a modalidade culposa. Que crime comete alguém que deixou veneno de rato perto de um suicida? Você sabe que ele é suicida e, negligentemente, deixou veneno de rato perto dele. Por que crime você responder? 1ª Corrente: Homicídio culposo. 2ª Corrente: Fato atípico (no máximo omissão de socorro, a depender do caso). As perguntas mais importantes vêm agora. São duas. É a parte mais importante do art. 122: Quando que o crime do art. 122 se consuma? Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Vamos ao preceito secundário: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave. Quando que o crime do art. 122 se consuma? São três correntes 1ª Corrente: Adotada pela doutrina clássica. Dou como exemplo Nélson Hungria. Para a doutrina clássica, o núcleo induzir, instigar ou auxiliar, quando praticado, eu já estou diante da consumação. O crime se consuma com o simples fato de induzir, auxiliar ou instigar. Porém, a punibilidade fica condicionada à morte, onde a pena de 2 a 6; ou lesão grave, onde a pena é de 1 a 3. Para essa corrente, os resultados morte ou a lesão grave, na verdade, configuram condições objetivas de punibilidade. Olha que importante, vocês vão responder: ´  1ª Hipótese: O agente induz e a vítima morre. o que eu tenho para a primeira corrente? Art. 122 consumado e punível.  2ª Hipótese: Você induz, a vítima não morre, mas sofre lesão grave. Induziu, já tem o art. 122 consumado. A vítima sofre lesão grave. Punível. Pena de 1 a 3.  3ª Hipótese: Você induz. A vítima não morre e nem sofre lesão grave. O que você tem? Você tem o art. 122 consumado. Ela morreu? Não. Sofreu lesão grave? Não. Então, é o art. 122 consumado não punível. Já caiu isso em concurso: exemplo de crime consumado não punível. Olha o exemplo clássico! Detalhe: não admite tentativa! 2ª Corrente: Adotada pela doutrina moderna. Mirabete. Olha o que Mirabete diz: induzir, instigar e auxiliar, na verdade, é execução do crime. Já deu para ver a diferença. A morte (2 a 6) e a lesão grave (1 a 3) configuram consumação. Esta corrente discorda da primeira. Naquilo que a primeira entendia como consumação, como condição objetiva de punibilidade, para esta corrente é execução. E, realmente, a primeira corrente erra. Por que jamais a morte ou a lesão grave poderia ser condição objetiva de punibilidade? Por que isso está errado? Porque ela não pode fazer parte do dolo do agente. E aqui a morte e a lesão grave fazem parte do dolo do agente. A condição objetiva de punibilidade não é alcançada pelo dolo do agente. Por exemplo, encerramento da instancia administrativa no caso dos crimes de sonegação. Isso não faz parte do dolo do agente, mas condiciona a punibilidade. Como é que você quer colocar a morte e a lesão grave, que fazem parte do dolo do agente, numa mera condição objetiva de punibilidade? Isso está errado. Correta a doutrina moderna que etiquetou como consumação. Agora eu vou repetir as três hipóteses e vocês vão me dizer o que é:  1ª Hipótese: O agente induz e a vítima morre. O que eu tenho para a doutrina moderna? Art. 122 consumado e eu posso dizer punível com 2 a 6 anos. Aqui, por caminhos diversos, as duas correntes chegaram no mesmo lugar. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  2ª Hipótese: Você induz, a vítima não morre, mas sofre lesão grave. Induziu, já tem o art. 122 consumado, punível com 1 a 3 anos. Também reparem que, por caminhos diversos, chegaram no mesmo resultado.  3ª Hipótese: Você induz. A vítima sofre lesão leve. O que você tem para a doutrina moderna? Para a clássica, você tem o art. 122 consumado, porém não punível. E para a doutrina moderna? Fato atípico! Também a doutrina moderna não admite tentativa. Já caiu isso em concurso. Caiu no MP/SP. O examinador perguntou: “me dê exemplo de um crime material, plurissubsistente que não admite tentativa.” Está aqui. Comparem as duas doutrinas, moderna e clássica. 3ª Corrente: Cezar Roberto Bittencourt – Ele concorda em quase tudo com a doutrina moderna. Ele também concorda que induzir/instigar/auxiliar configuram execução. Ele concorda que o resultado morte com pena de 2 a 6 é consumação. Onde ele discorda? Na lesão grave. Para ele, a lesão grave é tentativa. Para ele, ocorrendo lesão grave, eu estou diante de tentativa. É uma tentativa punida deforma sui generis, que não precisa do art. 14, II. O legislador já diminuiu a pena. Então, para Cezar Roberto Bittencourt o crime está sendo executado (induzir, auxiliar ou instigar), realmente, só se consuma com a morte. E se a vítima sofre lesão grave, é uma tentativa e é uma tentativa punida de forma sui generis. Induzimento, Instigação ou Auxílio a Suicídio Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave. Cezar Roberto Bittencout diz: está aqui, é tentativa. Só que o legislador falou em tentativa de crime? Não. Falou em tentativa de suicídio e suicídio não é crime. Então quando Cesar Roberto defende a tese dele, lembrando que o próprio legislador admite tentativa de crime, ele está errado porque o legislador não fala em tentativa de crime. Fala em tentativa de suicídio e suicídio não é crime. O equívoco é você entender que ele falou em tentativa de suicídio como tentativa de crime. Não é isso. Hoje, prevalece a doutrina moderna, inclusive nos concursos. Na primeira fase, vocês vão ficar com ela. Na prova escrita, tem que colocar todas as correntes. Parágrafo único - A pena é duplicada: I - se o crime é praticado por motivo egoístico; II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência. Primeira coisa: falou em pena duplicada, o candidato fica em dúvida: eu estou diante de uma qualificadora, e se for qualificadora será o norte do critério trifásico, ou é uma causa de aumento, que eu vou dobrar só na terceira fase? Depois que aplicou agravantes e atenuantes, você dobra a pena ou você vai dobrar o preceito secundário e sobre ele aplicar o critério trifásico, ou seja, ao invés de aplicar o critério Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 trifásico em cima de 2 a 6, vai aplicar em cima de 4 a 12? De 1 a 3 você vai aplicar o critério trifásico em cima de 2 a 6? Acho que está claro porque o que fala depois dos dois pontos? Aumento de pena. Nós estamos diante de majorante a ser considerada pelo juiz na terceira fase. Causa de aumento de pena a ser considerada pelo juiz na terceira fase. 1ª Causa de aumento – Se o crime é praticado por motivo egoístico (para satisfazer interesses pessoais do agente) – Induzir uma pessoa a se matar para ficar com a herança. Estou dando um exemplo besta. 2ª Causa de aumento – Se a vítima é menor, a pena também é dobrada. Pergunto: o que é menor? Prevalece (e isso é tranquilo) que menor é quem ainda não atingiu 18 anos. E para baixo de 18 anos, há algum limite para a aplicação dessa causa de aumento? 1ª Corrente: Faz uma analogia com o art. 224-A, do CP e diz que menor vai até 14 anos. Abaixo de 14 anos, já é incapaz e sendo incapaz, art. 121, do CP. Diz que esse menor tem que ter um limite e esse limite emprestou do 224-A. Se a pessoa abaixo de 14 não tem capacidade para consentir num ato sexual, o que dirá no ato que vai eliminar a própria vida. Se vocês concordam com essa corrente, que quer limitar o menor, ao menor nos crimes sexuais, vocês só tem que mudar o artigo. Tem que ser o art. 217-A. E agora não é mais não maior. Agora é menor de 14 anos. Menor de 14 anos não é menor, é incapaz. Então, por essa corrente, induzir um menino de 13 anos a se matar, que crime você pratica? Art. 121. Você fez analogia in malam partem. Você está aplicando o crime mais grave. 2ª Corrente: Diz que vai depender do caso concreto. O menor é aquele absolutamente incapaz de entendimento. É alguém sem capacidade de entendimento. E o caso concreto dirá. Vai depender do grau de instrução. “Menor, para efeito do art. 122, § único, é todo aquele com idade inferior a 18 anos, que não tenha suprimida, por completo, a sua capacidade de resistência, devendo o juiz analisar o caso concreto.” Então, vejam que para a segunda corrente, um menino de 13 anos, não necessariamente é incapaz. Pode ser só um menor. Olha o que vai cair na sua prova: você induziu uma vítima de 19 anos a se matar. Qual é o crime? Art. 122, caput. E se a vítima tem 17 anos, qual é o crime? Mesma coisa: se não incapaz, art. 122, § único; se incapaz, art. 121. Vítima tem 13 anos. As três situações possíveis e imagináveis estão aí. Não tem como errar. Agora vocês vão ter que lembrar da divergência:  1ª Corrente: Presume a incapacidade. Logo, art. 121. Guilherme de Souza Nucci e Luiz Régis Prado.  2ª Corrente: Se não incapaz, será o art. 122, § único e, se for capaz, art. 121. Mirabete e Nélson Hungria. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 3ª Causa de aumento – Se a vítima tem, por qualquer causa, diminuída a sua resistência. Se estiver eliminada, é o art. 121 (enfermo, ébrio, senil). Mas não está eliminada a capacidade de resistência. Duelo Americano, Roleta Russa e Pacto de Morte Na continuação do art. 122, eu fiquei de analisar nessa aula duelo americano, roleta russa e pacto de morte. São três assuntos que despencam em concurso, principalmente em prova-teste. Normalmente o examinador dá um exemplo envolvendo uma dessas três práticas e pergunta qual o crime praticado pelos envolvidos. Duelo Americano – O examinador em concurso vai perguntar: que crime praticam os participantes de um duelo americano? Você tem que saber o que é isso. Cuidado! Não fique pensando que duelo americano é aquela história de um ficar de costas para o outro, dão dez passos (tem sempre um que dá nove), viram e atiram. Isso não é duelo americano. Isso é art. 121. um matou o outro. O que é o duelo americano, então? É outra brincadeira saudável também. Temos duas armas: A e B. Cada um escolhe uma arma e atira contra a própria cabeça, pois só uma está municiada. Nós temos duas armas, só uma tem munição. Nós não sabemos qual é. As duas estão em cima da mesa. Na hora que tocar o sino, cada um pega a arma e cada um atira na sua própria cabeça. Quem ganha é quem sobrevive. Vocês entenderam, né? O objetivo é não se apoderar da arma municiada. Quem ganha o jogo responde por qual crime? Art. 122. Ele participou do suicídio daquele que se apoderou da arma municiada. O vencedor do duelo americano responde pelo art. 122. Ele participou do suicídio daquele seu adversário. Roleta Russa – Só tem uma arma que tem um tambor e esse tambor está municiado com um projétil. O que fazemos? Nós rolamos o tambor e atiramos contra própria nossa própria cabeça. Rola o tambor e passa para o outro. Acaba a brincadeira quando a cabeça explode. O vencedor na roleta russa também responde pelo art. 122. Ele participou do suicídio do adversário. Seja duelo americano, seja roleta russa, o vencedor responde pelo art. 122. O que mais cai em concurso não é nem roleta russa e nem duelo americano. É o pacto de morte. Pacto de Morte ou Ambicídio – Quando duas pessoas combinam a morte, tem um nome especial. Em concurso não cai “pacto de morte”, cai ambicídio: duas pessoas combinarem a própria morte. O examinador perguntou: “o que é ambicídio”. Teve gente que ficou imaginando crime ambiental. Duas pessoas ou mais combinando a própria morte. Vamos imaginar um casal de namorados que combinam despedir da vida. Eles resolvem morrer asfixiados juntos para alcançar o amor eterno. Eles entram no cômodo fechado, ele percebe que não vai entrar gás se não ligar a torneira. Ele sai para ligar a torneira.  Primeira situação: Ele não morre. Ela morre. Que crime ele, namoradinho praticou? Art. 121, porque ele praticou atos executórios de homicídio. Apesar de haver Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 combinado a morte, ele executou a namorada. Ele ligou a torneira. Responde pelos atos executórios do homicídio. Responde pelo art. 121. Essa é a primeira situação.  Segunda situação: Ele morre. Ela não morre. E agora? Ela praticou atos executórios? Não. Ela participou do suicídio dele? Então, ela responde pelo art. 122.  Terceira situação: Ninguém morre (é essa que vai cair). Que crime ele pratica? Ele praticou atos executórios. Tentativa de homicídio. E ela? Cuidado com a resposta porque depende. Se o namoradinho sofreu lesão grave ela responde pelo art. 122, com pena de 1 a 3. Se ele sofreu lesão leve, ou se sequer lesão sofreu, fato atípico. INFANTICÍDIO – Art. 123, do CP Infanticídio Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: Pena - detenção, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. Presta atenção. O crime de infanticídio nada mais é do que um homicídio privilegiado, em razão do estado fisiopsíquico da autora. Eu vou provar que o infanticídio nada mais é do que uma forma especial de homicídio. O art. 121, do CP, que pune o homicídio, prevê que é crime matar alguém. O art. 123, do CP, que pune o infanticídio também prevê como crime matar alguém. A diferença entre os dois é que no infanticídio você tem um sujeito ativo especial, um sujeito passivo também especial, você tem um elemento cronológico e você tem um elemento psíquico. Pronto. O infanticídio nada mais é do que o homicídio acrescido de elementos especiais:     Sujeito ativo especial Sujeito passivo especial Elemento cronológico Elemento psíquico. Quando eu digo que o infanticídio nada mais é do que o homicídio acrescido de elementos especiais, significa que a relação entre os dois é uma relação de gênero-espécie. É aqui que vocês enxergam muito bem o Princípio da Especialidade. A relação do infanticídio para o homicídio é de norma especial derrogando norma geral. Compreenderam? O que eu quero saber é o seguinte: como chamam esses elementos que tornam o infanticídio especial quando comparados ao homicídio? Isto que está listado são elementos que acrescidos ao matar alguém torna o infanticídio especial em relação ao homicídio. Como chamam essas elementares especiais que tornam o infanticídio especial quando comparadas ao homicídio? Já caiu em concurso: “quais são as especializantes do art. 123?” quando ele perguntou isso, ele queria saber o quê, no art. 123, é especial em relação ao art. 121. Duas observações óbvias, que caem em concurso: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 1. Infanticídio não é crime hediondo, por mais hedionda que seja a forma que a mãe matou o próprio filho. Mesmo que praticado com crueldade, não é hediondo. 2. É também, a exemplo dos arts. 122 e 121, o infanticídio é crime doloso contra a vida: vai a júri. Voltando ao art. 123: Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: Pena - detenção, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. Sujeito ativo – Não é um crime comum. É um crime próprio. Quem pode praticálo? Somente a parturiente. Quem é o sujeito ativo? A parturiente sob a influência do estado puerperal. Só ela pode praticar esse crime. Concurso de agentes – O que cai em concurso é isso. Admite concurso ou não? 1ª Corrente: O estado puerperal é elemento personalíssimo, incomunicável. Não admite concurso de agentes. Conclusão: não admite concurso de agentes. Sabe quem inventou isso? Nélson Hungria. Por que você diz que ele inventou? Primeiro porque não existe elemento personalíssimo. O CP reconhece ou o emento objetivo ou o subjetivo. Elemento personalíssimo não existe. Invenção dele. Por isso que hoje prevalece a segunda corrente. 2ª Corrente: O estado puerperal é elemento subjetivo do tipo comunicável nos termos do art. 30, do CP. Conclusão: admite concurso de agentes. Essa corrente viu bem: o elemento não é personalíssimo. É subjetivo. Sabe quem adota? Nélson Hungria. Nas últimas edições do seu livro, ele reconhece que inventou e abandonou a primeira corrente. Hoje prevalece que é perfeitamente possível concurso de agentes. Olha o que vai cair no seu concurso. São três situações:  1ª Situação – Parturiente e médico executam o verbo matar. Por qual crime respondem? Eu preciso dizer que ela está no estado puerperal? Não. Eu estou falando do art. 123, não vou ficar falando estado puerperal a vida inteira. Vocês já sabem que ela está sob a influência desse estado. A mulher pratica infanticídio. E o médico? Infanticídio. Pelo art. 123, na condição de coautor. Se você entende que ele reponde por homicídio, vocês estão adotando a primeira corrente, que entende que o estado puerperal é incomunicável e aqui é comunicável. Essa primeira situação não cai em concurso.  2ª Situação – A parturiente auxiliada pelo médico pratica, sozinha, o verbo matar. Por que crime respondem? Ela responde por infanticídio. O médico, que de qualquer modo concorreu para o resultado, responde pelo art. 123, agora na condição de partícipe. Isso também não cai na sua prova. O que vai cair é a terceira situação. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  3ª Situação – Médico, auxiliado pela parturiente pratica, sozinho, o verbo matar. E agora? Por que crimes respondem? O médico responde por homicídio porque quem matou não estava sob influencia do estado puerperal. E ela? Ela concorreu de qualquer modo para o homicídio, e também deveria responder por homicídio, porém, na condição de partícipe. Comparem a segunda situação com terceira. Se ela mata, responde por homicídio privilegiado, se ela só auxilia, responde por homicídio. Então, é melhor, ao invés de auxiliar, matar logo. Isso que eu acabei de colocar é o que está tecnicamente correto, mas gera uma incoerência. Você punir o mais com menos e o menos com mais. Isso é o que está tecnicamente correto, mas para evitar essa incoerência, temos duas correntes: 1ª Corrente: Para que não haja esta incoerência, os dois respondem pelo art. 123. Eu fico puto com essa primeira corrente porque a incoerência não era com relação ao médico. Era só com relação à parturiente. Ele acabou se beneficiando. 2ª Corrente: O médico responde pelo art. 121. ela responde pelo art. 123 por razões de política criminal. Se a incoerência é só com relação a ela, vamos corrigir com relação a ela. O médico continua respondendo pelo art. 121. Vejam que eles criaram uma exceção pluralista à teoria monista aqui. A primeira corrente trabalha com o monismo. A segunda corrente trabalha com a exceção pluralista à teoria monista. qual prevalece? É a primeira corrente. E foi a resposta certa na polícia civil em SP. Sujeito passivo – Quem é a vítima do art. 123? o próprio filho. Quando eu falo o próprio filho, não é o filho de 18 anos dormindo. É o próprio filho que acabou de nascer ou que está nascendo. É o filho nascendo ou neonato. Matar outro filho que já nasceu, homicídio. Não vai chegar em casa e matar o filho que está dormindo. Pergunta de concurso: vamos imaginar uma mulher num hospital e o filho vai para o berçário. Na madrugada ela acorda, sob influência do estado puerperal e esfaqueia aquele que pensava ser seu filho. Ela acorda com o escândalo da colega de quarto. Aí ela descobriu que esfaqueou o filho errado. Por que crime vai responder? O crime é matar o próprio filho e não qualquer filho. Aqui é erro de tipo acidental sobre a pessoa. Art. 20, § 3º, do CP. Você vai levar em consideração as qualidades da vítima querida e não as qualidades da vítima atingida: Erro sobre a Pessoa § 3º - O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime. Então, ela vai responder por infanticídio, mesmo que seu filho esteja vivo. Tudo porque eu considero as qualidades da vítima virtual. Erro de tipo acidental sobre a pessoa. Art. 20, § 3º. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Rogério, se ela matou o filho da outra que era dela, mas o filho dela já estava morto e ela não sabia. Ela foi lá matar o filho dela que já estava morto e matou o outro. Crime impossível? Como é que vocês respondem que não é crime impossível? O art. 20, § 3º, trabalha no campo da hipótese. Ele analisa a situação hipotética. Se você matou alguém vai responder pelo crime. Agora, qual é a vítima? Aí nós saímos da realidade e vamos para o campo da hipótese. E o campo da hipótese não trabalha com crime impossível porque o crime já aconteceu. E se o filho dela fosse atingido e estivesse vivo? Você vai trabalhar no campo da hipótese porque, na verdade, o crime já aconteceu. Saia da realidade e vai para o campo da hipótese. O § 3º trabalha com o campo hipotético: “e se tivesse atingido o próprio filho (obviamente, se tivesse vivo)?” Vou repetir: se ela matou o filho da outra, você não tem que falar em crime impossível porque uma criança morreu. Qual é a vítima? Aí você sai da realidade e vai para a hipótese: e se ela tivesse atingido o próprio filho, e mais, considerando que ele tivesse vivo. Vamos ver novamente o art. 123: Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: Pena - detenção, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. Elementos do art. 123: Observações importantes: Matar o próprio filho é um crime de execução livre. Ou seja, pode ser praticado por ação ou omissão. Por meios diretos ou indiretos. Ação ou omissão, meios diretos ou indiretos. Circunstância elementar de tempo – Você tem que matar o próprio filho durante ou logo após o parto. Agora, preste atenção. Se for antes do parto, o crime é de aborto. Se for muito depois do parto, o crime é o do art. 121. Então, para que você tenha o delito de infanticídio é imprescindível que você obedeça essa baliza: durante ou logo após o parto. Para que seja infanticídio tem que ser durante ou logo após. Olha que importante que eu vou falar: durante o parto, todo mundo sabe reconhecer. Mas até quando dura o logo após? Enquanto perdurar o “logo após”, você tem o art. 123. Para que não haja dúvida a doutrina e a jurisprudência dizem o seguinte: o logo após perdura enquanto perdurar o estado puerperal. Varia conforme o caso. O caso concreto dirá. Vai depender de perícia. Os peritos vão dizer se ela estava ou não sob estado puerperal. Sob influência do estado puerperal – é outra elementar importantíssima. O que é estado puerperal? E olha a pergunta do MP/RJ (1ª fase): o que é estado puerperal e no que se diferencia no puerpério? Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 “Estado puerperal: é o estado que envolve a parturiente durante a expulsão da criança do ventre materno, trazendo profundas alterações psíquicas e físicas, transformando a mãe (deixando-a sem plenas condições de entender o que está fazendo.” Mirabete chega a dizer que o estado puerperal não é nem uma frieza de espírito, espírito cruel, nem uma imputabilidade. É um meio termo. “Puerpério: é o período que se estende do início do parto até a volta da mulher às condições pré-gravidez.” Vocês anotaram que a terceira elementar é “sob influência do estado puerperal”. Isso significa que: “É imprescindível o nexo entre o estado puerperal e a morte, porque nem sempre esse estado gera vontade mórbida. Para configurar o art. 123, é imprescindível a relação de causa e efeito entre o estado puerperal e o crime, pois nem sempre tal estado produz perturbações psíquicas na parturiente. Essa necessária relação de causa e efeito está na exposição de motivos do Código Penal. “O Brasil adotou o critério fisiopsicológico.” MP/SP (fase oral): Antepenúltimo concurso. O estado puerperal não é um caso de inimputabilidade ou semi-imputabilidade? A parturiente não mereceria medida de segurança? Resposta: dependendo do grau de desequilíbrio fisiopsíquico ela pode ser equiparada a inimputável ou semi-imputável. Nucci diz que ela, pelo menos, semiimputável é. O estado dela é, pelo menos, de semi-imputabilidade. Dependendo do grau de desequilíbrio fisiopsíquico ela pode ser tratada como inimputável. Olha outra pergunta boa que caiu em concurso: qual é a diferente do art. 123 (infanticídio) para o 134, § 2º, do CP, que é o abando no de recém-nascido com resultado morte? Exposição ou Abandono de Recém-Nascido Art. 134 - Expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. § 2º - Se resulta a morte: Pena - detenção, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. Paga cesta básica. Uma mãe que abandona seu filho recém nascido paga cesta básica. É mais grave você chamar um senhor de idade de velho babão. Você, mãe, que abandonou seu filho recém nascido, por causa de desonra própria (para ocultar uma gravidez), terá direito a sursis. Qual a diferença do art. 123 para o art. 134? Isso caiu no MP/MG (2ª fase)  Infanticídio é crime contra a vida. O art. 134, § 2º é periclitação da vida ou saúde. Isso significa que o art. 123 vai a júri. O art. 134, § 2º, não vai a júri porque não é crime doloso contra a vida.  No infanticídio o agente age com dolo de dano. No art. 134, § 2º, o agente age com dolo de perigo. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  No infanticídio, portanto, a morte é dolosa. Já no art. 134, § 2º, a morte é culposa. O infanticídio é punido a título de dolo, direto ou eventual. Vocês já sabem que o crime do art. 123 é punido a título de dolo. Não se pune a modalidade culposa. Se é assim, que crime pratica a parturiente que, sob a influencia do estado puerperal sufocou o filho durante a amamentação, matando o recém-nascido. Tem jurisprudência sobre isso. Diferente dos irmãos xifópagos. Que crime pratica essa mãe que, culposamente, sufocou o filho? Pode ser o art. 123? não, porque o art. 123 não pune a modalidade culposa. 1ª Corrente: “O fato é atípico, vez que inviável, na hipótese, atestar a ausência da prudência normal em mulher desequilibrada psiquicamente.” Então, não tem como você atentar a falta de diligência normal de uma mulher que está em franco desequilíbrio fisiopsíquico. Damásio adota essa corrente. Essa corrente é minoritária. 2ª Corrente: “Suprimir a vida de alguém, independentemente do momento cronológico, com manifesta negligência, tipifica homicídio culposo.” Ou seja, ela vai responder por homicídio culposo, pouco importa se durante ou logo após o parto, pouco importa se houve desequilíbrio fisiopsíquico. Bittencourt, Hungria, Magalhães Noronha. Quando que este crime se consuma, sabendo que é forma especial de homicídio? Com a morte do nascente ou neonato, sendo perfeitamente possível a tentativa. ABORTO – Art. 124 a 128 do CP 1. CONCEITO Eu começo perguntando uma coisa: o certo é aborto ou abortamento? Tem gente que não vê diferença alguma. Porém, corretamente, a medicina legal diz: não é aborto, é abortamento. Abortamento é a conduta. O aborto é o resultado da conduta. O resultado de um abortamento é o aborto. Para essa corrente, é tão errado chamar abortamento de aborto como chamar homicídio de um crime de cadáver. O cadáver não é crime. É o resultado do crime que se chama homicídio. Então, você falar em aborto ao invés de abortamento, está trocando a ação pelo seu produto. Conceito: “É a interrupção da gravidez com a destruição do produto da concepção.” O que protegemos aqui? Protege-se a vida intrauterina e vai a júri, por ser crime doloso contra a vida. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Pergunto: quando a mulher já se considera grávida? É aqui que a coisa pega. Caiu não MP/MG. Com a fecundação, ela já está grávida ou é imprescindível a nidação? São conceitos de biologia. O que é fecundação? É o encontro do espermatozóide com o óvulo. Isso é fecundação. O óvulo fecundado depositado na parede do útero é nidação. Se você interromper a fecundação para a nidação você praticou abortamento? Se você evitar que da fecundação venha a nidação, você praticou abortamento? São duas opões: nidação ou fecundação. Se você acha que é com a fecundação, vocês conhecem a pílula do dia seguinte? Essa pílula você tomou e espera que a medicina faça a parte dela. Se você acha que é com a fecundação, essa pílula passa a ser abortiva. No direito (eu não vou falar da medicina porque esses aí batem na tecla da fecundação), prevalece que a gravidez se dá com a nidação. Se você olha do ponto de vista técnico não está correto. A religião, por exemplo, bate na tecla fecundação. Para fins de direito penal, é com a nidação. Tem uma contravenção penal que a gente não imagina que existe que é anunciar meios abortivos. Isso é contravenção. Art. 20, do DL 3688/41: Anúncio de meio abortivo Art. 20 - Anunciar processo, substância ou objeto destinado a provocar aborto: Pena - multa. A Lei das Contravenções tinha que ser revogada! Totalmente m*. Tem gente que diz que essa lei fere o princípio da ofensividade porque é tudo ridículo. Os fatos são ridículos e as penas mais ridículas ainda. 2. CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA DE ABORTO 2.1. Abortamento natural – A doutrina fala do aborto natural. É a interrupção espontânea da gravidez, normalmente causada por problemas de saúde da gestante. Obviamente que o aborto natural é fato atípico. 2.2. Abortamento acidental – Vejam que estou falando abortamento, mas estou escrevendo aborto porque estou sendo fiel ao código que fala em aborto. Vocês, na prova, coloquem aborto e entre parêntesis, abortamento. “Decorrente de quedas, traumatismos e acidentes em geral.” Também é um fato atípico. 2.3. Abortamento criminoso – Está nos arts. 124 a 127, do CP. 2.4. Abortamento legal ou permitido – Está nos art. 128 e vai cair em concurso. Ele vai sofrer reflexo da reforma penal de 2009. A Lei 12015 traz uma repercussão importante no art. 128 e vamos estudar. 2.5. Abortamento miserável ou econômico-social – Praticados por razões de miséria, incapacidade financeira para sustentar vida futura. No Brasil, esse aborto é permitido? Não. É crime. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 2.6. Abortamento honoris causae – Realizado para interromper gravidez adulterina. É crime. 2.7. Abortamento eugênico ou eugenésico – Muito importante esse tipo de aborto. “Praticado em face dos comprovados riscos de que o feto nasça com graves anomalias psíquicas ou físicas.” Este é crime? Deixa o ponto de interrogação. Vamos explicar isso no final da aula, em especial o abortamento do feto anencefálico (aliás, foi dissertação da magistratura em SP). 3. FORMAS DE ABORTAMENTO CRIMINOSAS Aborto Provocado pela Gestante ou com Seu Consentimento Art. 124 - Provocar Aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. Aborto Provocado por Terceiro Art. 125 - Provocar Aborto, sem o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos. Art. 126 - Provocar Aborto com o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. Parágrafo único - Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.  O art. 124 pune o auto-aborto ou o consentimento para que outro lho provoque.  O art. 125 pune o aborto praticado por terceiro SEM consentimento válido da gestante – forma mais grave, única inafiançável.  O art. 126 pune o aborto praticado por terceiro COM consentimento válido da gestante – Se o consentimento for inválido, cai no art. 125o Vocês têm a topografia do aborto no caderno. Vamos analisar cada uma das três figuras, mas, pelo menos, o geral, vocês já tem na cabeça. 3.1. Aborto Provocado pela Gestante ou com Seu Consentimento – art. 124 Aborto Provocado pela Gestante ou com Seu Consentimento Art. 124 - Provocar Aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. Nós temos duas condutas punidas no art. 124. Quem é o sujeito ativo? Quem pode praticar o art. 124? Somente a gestante. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Se é somente a gestante, estou diante de um crime próprio ou de mão própria (comum, não é, exige condição pessoal do agente). Qual a diferença do próprio e o de mão própria? Os dois exigem qualidade especial, mas qual a diferença entre eles? Vamos ver a diferença: Crime comum Não exige qualidade especial do agente Admite coautoria e participação Crime próprio Exige qualidade especial do agente Admite coautoria e participação Crime de mão própria Exige qualidade especial do agente Só admite participação Eu perguntei se o crime do art. 124 é próprio ou de mão própria. A resposta vai depender se ele admite coautoria ou somente participação. Vamos anotar porque há divergência. 1ª Corrente: Cezar Roberto Bittencourt – O crime é de mão própria. Só admite participação. O terceiro potencial coautor responde pelo art. 126 e não pelo art. 124. Então, não tem como ter coautoria no art. 124. 2ª Corrente: Luiz Régis Prado – O crime é próprio. Admite coautoria, mas pune cada autor por tipo diverso. Cada autor responde por um crime. Isso é exceção pluralista à teoria monista. E exceção pluralista à teoria monista é exceção de concurso de agentes ou não é? Então, a segunda corrente diz: é claro que admite coautoria. É que o tipo penal é que vai ser diferente para cada um dos autores. É a exceção pluralista à teoria monista. Caiu exatamente isso no TJ/PR. Era exatamente essa a resposta que vocês tinham que dar. Foi segunda fase e vocês tinham que colocar as duas correntes. Mas prevalece a primeira corrente. Quem é a vítima do autoaborto ou do consentimento da gestante para que outro lho provoque? Duas correntes: 1ª Corrente: “Não sendo o feto titular de direitos (salvo aquele expressamente previstos na lei civil), a vítima do art. 124 é o próprio Estado.” 2ª Corrente: Sujeito passivo é o feto. Quando eu falo feto, falo feto em sentido amplo. Tem algum interesse prático saber se o Estado é vítima ou se o feto é vítima? Gravidez de gêmeos. Se você adota a primeira corrente, na interrupção da gravidez de gêmeos, o crime é um só. Se você adota a segunda corrente, concurso formal de delitos. E é exatamente a segunda corrente que prevalece. Então, essa discussão tem interesse prático na gravidez de gêmeos. E quais são as condutas punidas no art. 124, do CP? Ele pune duas condutas: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  Autoaborto – Aqui a gestante pratica nela mesma manobras abortivas, seja de maneira física, química. Interessa que ela interrompe sua própria gravidez.  Consente para que outro lho provoque – O terceiro que prova esse abortamento vai responder pelo art. 126. Exceção pluralista à teoria monista. Não tem muita coisa para comentar aqui. Isso é muito tranquilo. Eu apenas quero saber de vocês agora: o art. 124 é punido a título de dolo ou culpa? O Brasil só pune o aborto doloso. Não importa a forma. Não se pune modalidade culposa. O art. 124 só é punido a título de dolo, direto ou eventual. Exemplo de dolo eventual no aborto: tem um exemplo famoso de Nelson Hungria que despenca em prova: gestante suicida. Ela não morre, mas interrompe a gravidez. Para Nelson Hungria, ela agiu com dolo eventual no abortamento do feto. Se a conduta é praticada, não para interromper a gravidez, mas para acelerar, antecipar o nascimento, não existe aborto. A pessoa agride a gestante visando a antecipação do nascimento. Não é aborto. É lesão corporal. Nós vamos estudar isso. É uma lesão corporal, inclusive, qualificada pela antecipação do parto. Consumação - Quando o crime se consuma? A maioria responde assim: o crime se consuma com a morte do feto, com a destruição do produto da concepção. Cuidado porque essa resposta é incompleta. O crime se consuma com a morte da vida intrauterina, mesmo que ocorra fora, desde que decorrente das manobras abortivas. O crime se consuma com a morte do feto, mesmo que fora do ventre materno. “O crime se consuma com a morte do feto, pouco importando se esta ocorre dentro ou fora do ventre materno, desde que decorrente das manobras abortivas. Trata-se de crime plurissubsistente, admitindo a tentativa.” Prestem atenção. Três situações:  1ª Situação – A gestante praticou manobra abortiva e destruiu a vida ainda no seu ventre. Que crime ela praticou? Aborto. Com manobras especiais, ela consegue interromper a gravidez, matando o feto no interior do seu ventre. Aborto.  2ª Situação – Ela praticou manobras abortivas, o feto é expulso com vida, mas morre logo depois, em razão das manobras anteriores. Que crime ela praticou? Aborto.  3ª Situação (que é a que cai) – Ela pratica manobras abortivas, o feto nasce com vida, ela renova a execução e tira a vida daquele feto que nasceu com vida. Que crime ela praticou? Não é mais aborto porque quando nasceu com vida, só seria aborto se ele morresse em razão das manobras abortivas. Se ela renovou a execução, a exceção dela agora está recaindo sobre vida extrauterina. Se é assim, o crime é de Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 homicídio ou infanticídio. Depende do caso concreto. Nesse caso, absorve a tentativa de abortamento? Prevalece que sim. 3.2. Aborto Provocado por Terceiro – art. 125 Aborto Provocado por Terceiro Art. 125 - Provocar Aborto, sem o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos. Prestem atenção: o art. 125 já não está punindo mais a gestante. O art. 125 está punindo o terceiro provocador. A gestante é punida no art. 124. Cuidado! Quem pode praticar o art. 125? Quem pode provocar aborto sem o consentimento da gestante? O tipo exige alguma qualidade ou condição especial do agente? Não. Trata-se de crime comum. Não precisa ser médico, nada! Qualquer pessoa pode praticar. Quem é a vítima? É a gestante? A gestante (que não consentiu) e o feto são vítimas. Estou diante de um crime de dupla subjetividade passiva. O que se está punindo? Estamos punindo aqui, um tipo objetivo: a interrupção da gravidez sem consentimento da gestante. Esse não consentimento. Esse dissentimento da gestante pode ser um dissenso real, onde ela, efetivamente não consente ou então, um dissenso presumido, art. 126, §único do Código Penal. Não consentimento da gestante pode ser real (ela efetivamente não consentiu) ou presumido, hipótese em que ela até consente, mas é um consentimento que a lei ignora. Hipótese do art. 126, § único: Parágrafo único - Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência. Nessas hipóteses você aplica a pena do art. 125: dissenso presumido. Jurisprudência que despenca em concurso: “quem desfere violento pontapé no ventre de mulher sabidamente grávida pratica o crime do aborto (art. 125).” Isso é tranquilo na jurisprudência. Gestante menor de 14, gestante alienada, consentimento obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência – São as hipóteses do dissenso presumido. Essas circunstâncias têm que fazer parte do dolo do agente. Ele tem que saber que a menor tinha menos de 14 anos para responder pelo art. 125. Se ele não sabia que ela tinha menos de 14 anos, ele não vai responder. Para responder pelo art. 125, com o dissenso presumido ele tem que conhecer as qualidades da vítima ou das condições do consentimento. O crime do art. 125 é punido a título de dolo, apenas e tão-somente. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Que crime pratica alguém que atira para matar mulher grávida? Ele sabe que está grávida. Atira para matar mulher que sabe que está grávida. A mulher o traiu, engravidou, ele quer se vingar matando a mulher que sabe que está grávida. Ele pratica dois crimes em concurso formal: homicídio e aborto. Momento consumativo: não precisa nem perder tempo. O crime se consuma com a destruição do produto da concepção e admite tentativa. 3.3. Aborto Provocado por Terceiro com Consentimento da Gestante Art. 126 - Provocar Aborto com o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. O art. 126 pune a mesma coisa do art. 125, com a diferença que aqui ele tem o consentimento válido da gestante. Quem é o sujeito ativo? Qualquer pessoa (crime comum). Quem é o sujeito passivo? A gestante não é. Ela consentiu. Ela vai responder pelo art. 124. Ela não é vítima. A única vítima do art. 126 é o feto. Conduta – Interrupção da gravidez. O que o artigo pune? Interrupção da gravidez com o consentimento válido da gestante. A gestante consentiu e, durante as manobras, ela se arrepende. Você não dá ouvidos ao arrependimento dela e prossegue. Que crime você pratica? Ela consentiu. Ela vai até uma clínica para realizar o abortamento. Durante as manobras, ela fala: para, não quero mais. E ele não para. Que crime ele praticou? Ele praticou o art. 125 (sem o consentimento da gestante). A partir do momento que ela se arrepende, você prosseguir, art. 125. E a gestante que se arrependeu? Quase nenhuma doutrina fala disso, mas você não pode esquecer que o arrependimento só lhe beneficia se eficaz. Mas eu, particularmente, acho que você tem que tomar cuidado com o momento do arrependimento porque eu vejo isso mais como desistência voluntária. Mas é discutível. O crime só é punido a título de dolo. Não se pune a modalidade culposa. E quando se consuma? Mesma coisa: é crime material, se consuma com a morte do feto, admitindo a tentativa. O aborto é um crime fácil. Até aqui, nenhuma novidade. Antes de partirmos para os arts. 127 e 128, um apitada de jurisprudência: O aborto criminoso pode ser o art. 124, o art. 125 e o art. 126.  1ª Situação – Namorado que leva namorada para praticar o abortamento – Ele é partícipe de qual crime? Ele é partícipe do art.124. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  2ª Situação – Namorado convence namorada a praticar o abortamento. Que crime ele praticou? Partícipe do art. 124.  3ª Situação – É a que cai. Namorado paga médico para realizar abortamento com consentimento da namorada. Que crime ele praticou? Aqui a jurisprudência diz: se ele pagou o médico, ele é partícipe do art. 126. Ele está pagando o terceiro provocador. Ele está induzindo o terceiro provocador. Ele está realizando conduta sem a qual o abortamento não ocorreria. Ele está pagando terceiro provocador. Na verdade, ele participou do dois: arts. 124 e 126. Como não pode responder pelos dois, responde pelo mais grave. Parágrafo único - Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência. 3.4. Aborto Provocado por Terceiro com Consentimento da Gestante – art. 127 Caiu para delegado/DF (2ª fase) Forma Qualificada Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em conseqüência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte. O aborto será majorado quando? Aborto majorado quando a gestante sofre lesões graves ou lhe sobrevém a morte. Vamos a alguns detalhes: O art. 127 só se aplica aos arts. 125 e 126, aos dois anteriores. E por que as majorantes do art. 127 não se aplicam no caso do art. 124? O aborto majorado só ocorre se ocorrer ao RT. 125 ou 126. Das duas uma: ou ela sofreu lesões graves e o direito penal não pune a autolesão. Então, o art. 127 jamais se aplica ao art. 124. Por quê? Ou ela morreu e não tem 124 ou se sobreviveu, sofrendo lesões graves, o direito brasileiro não pune a autolesão. Detalhe importante: se eu falei que o art. 127 não se aplica ao art. 124, não se aplica nem à gestante e nem aos partícipes da gestante. Não aumenta a pena nem da gestante e nem do namoradinho que convenceu a gestante. Se não se aplica para o principal, também não se aplica para o acessório. Detalhe importante: nessas duas hipóteses, haja lesão grave ou morte, estamos diante da figura do preterdolo. São resultados culposos. Dolo no abortamento, culpa na lesão grave. Dolo no abortamento, culpa na morte. Crime preterdoloso ou preterintencional. O aborto qualificado é crime preterdoloso ou preterintencional. O aborto majorado é crime preterdoloso ou preterintencional. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Pergunto: para incidir a majorante do art. 127 é dispensável ou indispensável a interrupção da gravidez? Tem que ocorrer a morte do feto ou não, ele pode incidir sem a morte do feto, basta, por exemplo, que a gestante sofra lesão grave? É dispensável a morte do feto ou indispensável. A resposta está no próprio art. 127: “se em consequência do aborto”, opa, aí ocorreu a morte do feto. “Ou dos meios empregados para provocá-lo”. Aqui não ocorreu a morte do feto, mas os meios geraram a morte da gestante ou sua lesão grave. Em resumo: a morte do feto é dispensável. Caiu para Delegado/DF: Provoca-se dolosamente as manobras abortivas. A gestante morre culposamente, mas o feto não. Que crime praticou o terceiro provocador? O terceiro provocador, negligentemente, provoca a morte da gestante sem lograr interromper a gravidez. O feto nasce com vida. Qual crime ele pratica? Você já sabe que o art. 127 se aplica independentemente do abortamento, basta a gestante sofrer lesão grave ou morte. Aqui ela morreu. E agora? 1ª Corrente: Capez. Tratando-se de crime preterdoloso, não se admite tentativa. Conclusão: ele vai responder por aborto majorado consumado. Sabe o que essa corrente faz? Ela usa o mesmo raciocínio da súmula 610 do Supremo para o latrocínio. A súmula diz que o latrocínio é consumado mesmo que a subtração seja tentada. Aqui, essa corrente está falando: o aborto é consumado mesmo que a morte do feto seja tentada. Seria dizer: há crime de aborto, quando o homicídio se consuma, ainda que não realize o agente o abortamento. Olha o que diz a súmula: STF Súmula nº 610 - DJ de 31/10/ - Há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que não se realize o agente a subtração de bens da vítima. 2ª Corrente: Rogério Greco. Mesmo se tratando de delito preterdoloso, admite a tentativa quando a parte frustrada do crime é dolosa. Vocês não podem esquecer que o aborto majorado é um crime preterdoloso. Há o aborto que é doloso seguido de morte que é culposa. Jamais haverá tentativa quanto à morte culposa, mas é perfeitamente possível a tentativa quando o que fica frustrado é a parte dolosa. Então ele responde por aborto majorado, porém, tentado. Essa segunda corrente foi a resposta correta pra delegado/DF. Questão boa. Prevalece a segunda corrente. 3.5. Aborto Legal ou Permitido – art. 128 Art. 128 - Não se pune o Aborto praticado por médico: Aborto Necessário I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante; Aborto no Caso de Gravidez Resultante de Estupro II - se a gravidez resulta de estupro e o Aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 É isso que vai cair na sua prova. O art. 128 traz o aborto legal ou permitido e tem duas hipóteses:   Inciso I – Aborto necessário ou terapêutico Inciso II – Aborto sentimental, humanitário ou ético. Para a maioria da doutrina (eu não falei que é unânime), hipóteses especiais de exclusão da ilicitude. Por quê? O necessário é uma forma de estado de necessidade e o sentimental, uma forma especial de exercício regular de direito. Luiz Flávio Gomes diz que se no inciso I é hipótese de estado de necessidade e o inciso II é hipótese de exercício regular de direito, esse inciso II, na verdade, exclui a tipicidade, porque ele trabalha com tipicidade conglobante. LFG fala: o inciso I, sim, é forma especial de exclusão da ilicitude. O inciso II não porque eu já tirei o exercício regular de direito da ilicitude há muito tempo. Exclui a tipicidade. Essa tese do LFG, se vocês tiverem que comentar o art. 128 é importante colocar. Vocês estão demonstrando que dominam tipicidade conglobante. a) Abortamento Necessário  1º Requisito – Praticado por médico.  2º Requisito – Perigo de vida da gestante.  3º Requisito – Inevitabilidade do meio. Impossibilidade do uso de outro meio para salvá-la. Que crime pratica se o abortamento necessário foi realizado por enfermeiro ou farmacêutico? Tem crime? Eu não vou aplicar o art. 128 porque o art. 128 é só para médico. Mas vou aplicar o art. 124 (estado de necessidade). Cuidado! O fato de não ser médico não significa que responde pelo crime. Eu não aplico ao RT. 128, mas ele tem como estudo o próprio art. 24, estado de necessidade. Cuidado! Tem que haver perigo de vida da gestante. Não basta risco à sua saúde. O comportamento abortivo tem que ser inevitável. Não basta ser o meio mais prático, mais eficaz. Tem que ser eficaz e inevitável. Se o médico utilizou o abortamento por ser o mais cômodo, vai responder pelo crime. Detalhes importantes:  Dispensa consentimento da gestante. Ela não precisa consentir. Mesmo diante do dissentimento dela, o médico tem que salvar a sua vida.  Dispensa autorização judicial – Acreditem: o juiz não sabe mais que o médico. Se o médico diz que a vida dela corre risco, não é o médico que tem que dizer se o Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 juiz acertou ou não acertou. Não existe interesse e necessidade. Ele não tem que pedir autorização. b)    Abortamento Sentimental, Humanitário ou Ético 1º Requisito – Praticado por médico. 2º Requisito – Gravidez resultante de estupro. 3º Requisito – Consentimento da gestante ou do seu representante legal. E se foi praticado por enfermeiro ou profissional de enfermagem? Tem crime? Aqui tem crime porque a vida dela não corria risco. Não havia exercício regular de direito porque o direito é do médico, não dele. Qualquer pessoa que não seja médico, responde pelo crime. Não é direito de ninguém mais realizar esse abortamento. Não adianta falar em estrito cumprimento porque a lei não impõe esse dever. É só para médico! A gravidez tem que ser resultante de estupro. Antes se discutia se abrangia também o atentado violento ao pudor. Hoje se discute isso? Não porque hoje, estupro e atentado violento ao pudor é tudo estupro em sentido amplo: abrange atos libidinosos diversos da conjunção carnal. Agora, eu estou falando do art. 213, do CP, que abrange o antigo atentado violento ao pudor. Detalhe importante: abrange o estupro de vulnerável. Abrange o art. 217-A. O próprio artigo diz: quando incapaz, consentimento do representante legal. Então, abrange também o estupro de incapaz. É o estupro do 213, que abrange o atentado violento ao pudor e o estupro de vulnerável todos admitem o abortamento permitido. Dispensa autorização judicial. Você não controla a jurisprudência do STF exigindo, pelo menos o B.O. Absurdo. Onde que a lei exige B.O.? Autorização judicial já seria absurdo. Imagina! O MP discorda e recorre. Acabou! Autorização judicial não se exige mesmo, mas onde que o Supremo arrumou B.O.? Vocês vão encontrar julgados do Supremo exigindo B.O. para o médico praticar isso. Isso já caiu 4 vezes em concursos públicos. Todas as bancas negaram posição do Supremo. O médico que exija alguma formalidade que não necessariamente um B.O. Pede uma declaração firmada em cartório, alguma coisa. Mas exigir B.O. é ridículo. c) Abortamento de Feto Anencefálico A dissertação da magistratura/SP (último concurso) foi abortamento anencefálico. Aliás, tem sido uma constante. Os concursos públicos que têm dissertação, a tendência é explorar penal especial e legislação penal especial. Penal especial tem sido a tendência porque não há mais o que perguntar. Para vocês entenderem bem este aborto, o que precisam conceituar em primeiro lugar? O que vem a ser anencéfalo? Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 “Anencéfalo é embrião, feto ou recém-nascido que, por malformação congênita não possui uma parte do sistema nervoso central, faltando-lhe os hemisférios cerebrais e tem uma parcela do tronco encefálico.” Quando estou falando em abortamento do feto anencefálico estou falando do abortamento de um feto que apresenta essas características físicas. Esse abortamento é crime, não é crime, é permitido não é permitido, e aí? É isso o que o examinador queria saber. Essa dissertação eu começaria pelo conceito e depois desenvolveria do jeito que vou fazer com vocês, sob o ponto de vista legal, sob o ponto de vista doutrinário e jurisprudencial. *Sob o ponto de vista legal: O que diz a lei sobre o abortamento do feto anencefálico? Analisando nosso direito posto, este abortamento não é permitido. Vocês não podem esquecer que as hipóteses de abortamento permitido estão no art. 128, do Código Penal. Dentre as hipóteses, vocês não vão encontrar o abortamento do feto anencefálico. Observação, para não vir pergunta nesse sentido: “Rogério, mas e se a gestante corre risco de vida?” Aí tudo bem, você está praticando o abortamento porque ela corre risco de vida. Uma coisa não necessariamente implica na outra. “Logo, no Brasil, é crime. A exposição de motivos expressamente proíbe o abortamento do feto anencefálico.” Se você tem alguma dúvida, você vai lá ver. Existe projeto de lei autorizando, no entanto, ainda está em fase de projeto de lei. Então, um juiz legalista (que trabalha com o direito posto e mais nada), jamais vai autorizar o abortamento do feto anencefálico, ele vai dizer: “esse abortamento não está permitido e é crime. A exposição de motivos claramente proíbe apesar de haver projeto de lei e projeto de lei não tem eficácia jurídica e nem social.” *Sob o ponto de vista doutrinário: Você vai encontrar doutrina dizendo que o abortamento do feto anencefálico é hipótese de exclusão da culpabilidade para a gestante. Inexigibilidade de conduta diversa. É inexigível de uma gestante de feto anencefálico conduta diversa. Quando percebe que vai dar à luz um recém-nascido com vida extrauterina inviável é inexigível dela conduta diversa. Quem adota essa corrente? Cezar Roberto Bittencourt. A doutrina, com base em estudos da medicina chega a dizer que feto anencefálico não tem vida intrauterina. Logo, não morre juridicamente. Por quê? Ela está ligando vida à atividade encefálica. Por conta da anencefalia, a doutrina diz: não tem vida intrauterina, logo, você não pode matar aquilo que já está morto. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Um terceiro argumento da doutrina diz que a questão diz respeito à saúde e direito da mulher. Isso significa, em apertada síntese que, quem tem que decidir é a gestante e não o legislador, e não a coletividade e o Estado. A questão diz respeito à saúde e direito da mulher. Então, a doutrina quando fala do abortamento do feto anencefálico busca excluir a culpabilidade da gestante com a inexigibilidade de conduta diversa, diz que o feto anencefálico não tem vida intrauterina, logo, não morre juridicamente e a questão diz respeito à saúde e ao direito da mulher, não da coletividade e do Estado. *Sob o ponto de vista jurisprudencial: A jurisprudência admite, desde que: 1. Somente para as anomalias que inviabilizem a vida extrauterina. 2. Deve estar a anomalia devidamente atestada em perícia médica 3. Prova do dano psicológico da gestante. Na defensoria pública já caiu isso. O candidato teve que falar quais os argumentos para possibilitar a interrupção de um feto anencéfalo. Somente nesses três casos. São três requisitos cumulativos, que a jurisprudência tem autorizado a interrupção da gravidez. O Supremo foi chamado a se manifestar e está analisando a arguição de descumprimento de preceito fundamental n.º 54. E nesta ADPF o Supremo já fez algumas audiências públicas para colacionar argumentos pro e contra. Então, o STF tem no seu colo uma ADPF para autorizar ou não o abortamento do feto anencefálico. O Ministro Marco Aurélio tem uma decisão emblemática nessa ADPF, em sede liminar. Ele, liminarmente autorizou, mandou suspender todo e qualquer processo crime que envolva esse tipo de abortamento, detonou. E tem uma expressão dele que chamou a atenção de todos, inclusive, das bancas de concurso. E vocês vão anotar e vão ver que o ministro mais ou menos lançou esses requisitos da jurisprudência: “Diante de uma deformação irreversível do feto, há de se lançar mão dos avanços médico-tecnológicos postos à disposição da humanidade, não para simples inserção, no dia a dia, de sentimentos mórbidos, mas justamente, para fazê-los cessar.” Essa expressão do Ministro Marco Aurélio foi explorada por todos os jornais e também por bancas de concurso. Ele está dizendo que a medicina não vai trazer o sentimento mórbido “matar”. Ela vai evitar o sofrimento maior. Em nenhum momento, em sala de aula eu vou me posicionar a favor ou contra, mesmo porque envolve Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 sentimentos religiosos. Mas, na audiência pública, teve uma mulher que usou uma expressão que me fez refletir. Não estou dizendo que eu concordo, nem que discordo, não estou dizendo nada. Mas ela, por questões pessoais, quis seguir com a gravidez e deu à luz ao feto anencefálico que viveu minutos. E ela falou. Eu, ao contrário das outras mães, não preparei um berço. Eu já preparei o caixão. Eu escutei aquilo e começo a perceber que é algo muito mais particular, da gestante, da família, do que do próprio Estado. Cada um com a sua consciência. A audiência pública é riquíssima em doutrina, em conhecimentos técnicos. Se vocês puderem acessar a TV Justiça. Acho que ela disponibilizou as principais discussões dessa audiência pública. Se vocês puderem, adquiram, acessem e assistam. Vocês têm vários argumentos para se posicionar a favor ou contra o abortamento do feto anencefálico. Eu vou dar a matéria como encerrada. LESÃO CORPORAL – Art. 129, do CP Pessoal, o art. 129, além de ser o artigo que mais parágrafos tem no Código Penal, ele é um artigo muito rico em detalhes. Vocês vão ver quantas questões importantes caem em concurso. Eu começo perguntando, só para vocês verem como a questão não é simples: qual é o bem jurídico tutelado no art. 129? Pensou em incolumidade física? O examinador fala assim para o candidato: não. E você pensa que o código dele não é o mesmo que o seu. Bem jurídico tutelado – O bem jurídico tutelado no art. 129 é a incolumidade pessoal do indivíduo. Isso significa que o bem jurídico é muito mais amplo do que a incolumidade física. Protege o indivíduo na sua:  Saúde física ou corporal, também protege o indivíduo na sua  Saúde fisiológica (correto funcionamento do organismo), também protege o indivíduo na sua  Saúde mental. Guardem isso! o art. 129 não protege somente a integridade física. Também, a fisiológica, correto funcionamento do organismo e a saúde mental. Vocês vão ver que o desmaio é lesão corporal e não traz ofensa à sua saúde física, mas principalmente à fisiológica e mental. Presta atenção! Isso que eu acabei de colocar está também na exposição de motivos, rica fonte de doutrina. Essa abrangência gigante do bem jurídico está estampada na exposição de motivos do Código Penal. 1. TOPOGRAFIA DO ART. 129 Guardem essa topografia! Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  Art. 129, caput: Lesão dolosa leve.  Art. 129, § 1º: Lesão dolosa grave – Cuidado que aqui temos a primeira pegadinha em concurso porque o § 1º não traz somente a lesão dolosa grave. Vocês vão ver que ele também tem lesão preterdolosa grave. O candidato tem o vício de imaginar que o preterdolo só está no § 3º, na lesão seguida de morte. Não! O § 1º também tem o preterdolo.  Art. 129, § 2º: Lesão dolosa gravíssima – É a segunda pegadinha em concurso. Também no § 2º tem preterdolo. Ela também pode ser preterdolosa. Vocês vão ver daqui a alguns minutos que algumas modalidades dos §§ 1ºe 2º, necessariamente são preterdolosas.  Art. 129, § 3º: Lesão seguida de morte (esta genuinamente preterdolosa, é onde o crime preterdoloso melhor se explica).  Art. 129, §§ 4º e 5º: Lesão dolosa privilegiada  Art. 129, §6º: Lesão culposa  Art. 129, §7º: Majorantes  Art. 129, §8º: Perdão judicial  Art. 129, §§ 9º, 10 e 11: Violência doméstica e familiar (aqui não é só contra a mulher) Assim está a topografia da lesão corporal no nosso código. Depois que eu fizer uma análise geral da lesão corporal, aí eu enfrento cada um dos dispositivos. 2. ART. 129: GENERALIDADES Sujeito ativo – Quem é o potencial sujeito ativo? Quem pode praticar lesão corporal? Exige-se alguma qualidade ou condição especial do agente? “Trata-se de crime comum, não se exigindo qualidade especial do agente.” Qualquer pessoa pode praticar lesão corporal em outra. Isso vai cair? Eles vão perguntar para vocês que crime pratica o policial militar que agride uma pessoa. A jurisprudência majoritária diz que o policial militar, sujeito ativo, pratica dois crimes: abuso de autoridade + lesão corporal. Então, se o sujeito ativo for policial militar, ele pratica dois crimes. Olha o detalhe: sujeito ativo, policial militar, pratica abuso + lesão corporal. Pergunto: quem vai julgá-lo? Justiça militar ou justiça comum?   O abuso será julgado na justiça comum A lesão corporal será julgada na justiça militar. Súmula 172, do STJ. Haverá separação de processos? Sim. O abuso de autoridade vai para a justiça comum e a lesão corporal vai para a justiça militar. Por quê? Porque a lesão corporal é crime militar impróprio. Está previsto no CPM. O abuso não está previsto no CPM. Vamos ver o que diz a súmula: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 STJ Súmula nº 172 - DJ 31.10.1996 - Compete à Justiça Federal processar e julgar militar por crime de abuso de autoridade, ainda que praticado em serviço. O abuso não vai para a justiça castrense. Fica na justiça comum. Sujeito passivo – Quem pode ser sujeito passivo da lesão corporal? Olha a resposta do seu concorrente: “qualquer pessoa”. Vocês vão dizer o seguinte: “em regra, qualquer pessoa pode ser vítima de lesão corporal porque nós temos duas hipóteses claras de vítimas especiais.” Cuidado! Nós temos duas hipóteses de sujeitos especiais. Primeira hipótese? Art. 129, § 1º, IV, onde a vítima, necessariamente é gestante. E o art. 129, § 2º, V, onde a vítima, também, necessariamente é gestante. O inciso IV fala da aceleração do parto, quando a lesão provoca a aceleração do parto. E o inciso V fala da lesão que resulta aborto. Nessas duas hipóteses, a vítima é personagem principal. Nessas duas hipóteses, a vítima deve ser gestante. Só vocês vão anotar isso. A maioria vai colocar que qualquer pessoa pode ser vítima de lesão corporal. Concordo, mas em regra porque há duas hipóteses de lesão em que a vítima é especial. Vocês já estão cansados de saber que o direito penal não pune a autolesão. Você não tem como ser sujeito ativo e passivo ao mesmo tempo. Eu quero saber: que crime pratica uma pessoa que convence um inimputável (seja um doente mental, seja um ébrio) a praticar lesão corporal em si mesmo? Eu Rogério, convenci um doente mental a ferir o braço. Que crime eu pratiquei? Respondo por algum crime? Qual é a resposta? Já caiu isso em concurso. Que crime pratiquei eu, que me vali da sua incapacidade para feri-lo? Eu respondo por lesão corporal na condição de autor mediato. O meu instrumento? A incapacidade dele. Mais uma questão interessante: imaginem uma pessoa se dirigindo para dar um soco em outra. Essa vítima desvia do soco, porém, se desequilibra, cai e fratura o braço. Quem deu o soco vai responder pela fratura do braço ou vai responder por tentativa de lesão? O examinador perguntou a resposta e mandou fundamentar. Ele vai responder pela fratura do braço. Por quê? Porque a queda da vítima é uma concausa relativamente independente superveniente que não por si só produziu o resultado. Logo, quem começou responde pelo resultado final. “O agressor responde pela fratura do braço da vítima pois a sua queda é uma concausa relativamente independente superveniente que não por si só produziu o resultado. Embasamento legal: art. 13. § 1º, do CP, a contrario sensu.” Eis o fundamento para ele responder pela fratura do braço. O que pune o art. 129, de modo geral? Pune “ofender a incolumidade pessoal de outrem.” Vão acostumando: não falem em incolumidade física porque não é o único bem jurídico. É ofender a incolumidade pessoal de outrem. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Agora, prestem atenção: trata-se de crime de execução livre. Pode ser praticado por ação ou omissão. O crime pode ser causar a enfermidade ou agravar a enfermidade que já existe. Responde por lesão corporal aquele que causa a enfermidade, bem como aquele que agravou uma enfermidade que já existe. Pratica lesão quem cria ferimento ou quem agrava o ferimento que já existe. Tudo isso é lesão. Vocês acham dispensável ou indispensável a dor? A vítima tem que sentir dor? Não. A dor é dispensável. É circunstancia que será analisada pelo juiz na fixação da pena. Cuidado! Esse crime não precisa produzir dor. Desmaio pode ser lesão corporal. Cortar cabelos da vítima, sem autorização dela, é lesão corporal? É crime ou não é crime? 1ª Corrente: Pode configurar lesão corporal se a conduta provocar uma alteração desfavorável no aspecto exterior do indivíduo. 2ª Corrente: Pode configurar injúria real. 3ª Corrente (minoritária): Pode configurar vias de fato. Vocês vão até encontrar jurisprudência dizendo que o cabelo pode ser objeto de furto. Particularmente, eu fico com as duas primeiras correntes porque elas se complementam. Tudo depende do dolo do agente. Pode ser um ou outro, a depender do dolo do agente. Eu quero saber o seguinte: num abriga, a pluralidade de ferimentos na vítima, gera pluralidade de crimes? A vítima fica com hematomas no corpo, perna esfolada, maxilar quebrado, cada um gera um crime? Anotem: “A pluralidade de ferimentos no mesmo contexto fático não desnatura a unidade do crime, isto é, o crime continua um só. Porém, será considerada na fixação da pena.” Eu quero saber o seguinte: a incolumidade pessoal é um bem disponível ou indisponível? A vítima consente que você ofenda o corpo dela, você praticou algum crime? Para você saber se o consentimento da vítima exclui ou não a ilicitude, você tem que saber, primeiro, se o bem jurídico lesado é disponível ou indisponível. A incolumidade pessoal do indivíduo é bem disponível ou indisponível? Você pode me pedir para te dar um soco? Se eu dou, eu dou o soco, eu pratiquei algum crime? Se você acha que é indisponível (e é o que pensa a doutrina tradicional), imaginem só aquela jovem que vai até o local adequado e pede para colocar um piercing no umbigo. O homem perfura e na hora que ele vai cobrar, ela diz: “ah, não. Você está preso em flagrante, lesão corporal”. “Ah, mas a senhora concordou.” “F*-se, incolumidade é indisponível, o senhor está preso. Vou chamar a polícia.” É isso? Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Por isso, a doutrina moderna vem dizendo o seguinte: a incolumidade pessoal é um bem relativamente disponível. “Será disponível quando se tratar de lesão leve e não contrariar a moral e os bons costumes.” Cezar Roberto Bittencourt. E o legislador seguiu essa tendência. Quem me dá uma prova de que a lei seguiu essa tendência? É só lembrar da Lei 9.099/95 que diz que nessas hipóteses, a ação penal fica condicionada à representação da vítima. É a maior prova de que a lei também acha que a incolumidade pessoal é um bem disponível quando leve e não contrariar a moral e os bons costumes. E o transexual que realiza a ablação do órgão, construindo outro de conformidade feminina? O médico vai responder por lesão corporal? Reparem que não se trata de lesão leve. Logo, o consentimento da vítima, não interessa. O médico vai estar escudado pelo exercício regular de um direito. Só locais autorizados a realizar essa cirurgia é que podem realizá-la. O médico, na ablação do órgão de um transexual pode alegar exercício regular de um direito. Conduta médica e cirurgia de emergência ou reparadora – Por que o médico não responde pelo crime de lesão? Eu sei que ele não responde. Mas eu quero saber a razão. Eu estava preparando os alunos da segunda fase da magistratura/BA em 2004. Esse médico, quando corta a sua carne de maneira drástica não responde por lesão por quê? Adivinha a pergunta da prova no domingo? Intervenção médica sob a luz da teoria geral do delito. Vocês acreditam nisso? Foi a única vez na minha vida. Nunca mais se repetiu. Por que o médico não responde por lesão corporal? 1. É hipótese de atipicidade – Bento de Faria defende isso. não defende ajuste do comportamento dele ao tipo penal. 2. Ausência de dolo – Francisco de Assis Toledo. Ele diz que quando o médico intervém, ele não tem o dolo de ofender, mas o dolo de curar, o que é diferente. 3. No caso de lesão leve, não podemos esquecer do consentimento do ofendido nos termos da lição de Bittencourt. 4. Exercício regular de um direito. 5. Tipicidade Conglobante – se você adota a tipicidade conglobante, vocês sabem que exercício regular de direito é hipótese de atipicidade. E, para excluir o comportamento criminoso do médico, é possível aplicar ainda: 6. Imputação objetiva. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Era isso que o examinador queria na segunda fase. Ele queria que você explicasse, principalmente essas correntes modernas: tipicidade conglobante e imputação objetiva. Não há criação de risco proibido. Então, o médico não responde pelo crime, diante de qualquer um desses ângulos. Vocês tem seis maneiras de justificar o comportamento médico nessas hipóteses. Consumação – O crime de lesão corporal se consuma com a efetiva ofensa à incolumidade pessoal. Trata-se de crime material. Tentativa – Admite tentativa nas modalidades dolosas. Essa foi a visão geral que eu quis dar ao delito de lesão corporal. Agora vamos analisar cada um dos itens. 3. ART. 129: caput – LESAO DOLOSA LEVE Lesão Corporal Art. 129 - Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano. Vamos a alguns detalhes: aqui eu tenho exclusivamente a lesão leve. Nenhuma outra se encaixa aqui. E o que é lesão leve? Quando que uma lesão é leve? O conceito é dado por exclusão: ela é leve quando não for grave, gravíssima ou seguida de morte. O conceito de “leve” nos é dado por exclusão. Trata-se de infração penal de menor potencial ofensivo – detenção de 3 meses a 1 ano – cuja ação penal depende de representação da vítima. Art. 88, da Lei 9.099. Vocês escreveram que o art. 129, caput traz uma lesão dolosa leve. Quero saber, admite flagrante? Sim ou não? Pergunta de concurso. Infração penal de menor potencial ofensivo admite flagrante? Claro que admite! O autor dos fatos escapa do auto de prisão em flagrante se ele se compromete a comparecer no juizado. Isso significa que se ele não se compromete, instaura-se, inclusive, o auto de prisão em flagrante. Cuidado com isso! O candidato desavisado tem a mania de pensar que infração de menor potencial ofensivo não admite flagrante. Admite captura, admite condução à delegacia e admite auto de prisão em flagrante se ele não se comprometer a comparecer no Juizado. Se ele se compromete a comparecer, ele só evita o auto de prisão em flagrante. Eu já ouvi policial falar: “é doutor, bateu nela e eu não posso prender em flagrante.” E eu falei: “e eu não posso prender o senhor em flagrante porque não existe prevaricação culposa ou por ignorância.” Que absurdo! Claro que admite flagrante, condução à delegacia e, na delegacia, se ele se compromete a comparecer no Juizado, evita a terceira fase do flagrante, que é a lavratura do auto. Só isso. Idem para o desacato, etc. O policial fala: “me xingou, não posso fazer nada.” Como não?? Prende em flagrante. O art. 129, caput, traz a lesão leve. Aplica-se o princípio da insignificância? É aplicável o princípio da insignificância? A jurisprudência e a doutrina admitem o Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 princípio da insignificância mesmo na lesão leve, excluindo a tipicidade: pequenas arranhaduras, passageira dor de cabeça, etc. Heleno Fragoso e Pierangeli, admitem o princípio da insignificância excluindo a tipicidade. 4. ART. 129: § 1º – LESAO CORPORAL DE NATUREZA GRAVE Lesão Corporal de Natureza Grave § 1º - Se resulta: I - incapacidade para as ocupações habituais, por mais de 30 (trinta) dias; II - perigo de vida; III - debilidade permanente; IV - aceleração de parto: Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos. O § 1º traz quatro incisos indicadores de lesão corporal de natureza grave. Eu vou analisar cada um deles separadamente. Só para vocês perceberem, pela pena significa que estou diante de qualificadora. O § 1º é qualificadora. Não é causa de aumento. Deixa de ser de menor potencial ofensivo (1 a 5 anos), mas continua admitindo suspensão condicional do processo. 1ª Qualificadora: habituais, por Inciso I: Se resulta: I - incapacidade para as ocupações mais de 30 (trinta) dias; Qualifica-se o crime de lesão corporal de natureza grave se resulta na vítima incapacidade para ocupação habitual por mais de 30 dias. Não tem como explicar o inciso I sem, primeiro, conceituar ocupação habitual: “Ocupação habitual é qualquer atividade corporal rotineira, não necessariamente ligada a trabalho ou ocupação lucrativa, devendo ser lícita, ainda que imoral.” Se você ficar incapacitado por mais de trinta dias para qualquer atividade desse tipo, você sofreu lesão corporal de natureza grave, reclusão de 1 a 5 anos. Prostituta não pode exercer o comércio carnal por mais de trinta dias por conta da lesão que sofreu. É grave? Sim. A prostituição é lícita? Sim, ainda que imoral. Então, ela pode ser vítima. Olha que caiu no MP/SP quando a 1ª fase era escrita (era o que hoje é a segunda): bebê de 2 meses pode ser vítima de lesão corporal de natureza grave pelo inciso I? Ele só mama e dorme. Se ele não conseguir mamar por mais de 30 dias, que é a atividade rotineira dele, lesão corporal de natureza grave. “Rogério, mas se ele não mamar por mais de 30 dias, ele morre.” Não, vai ser alimentado por outros modos, ignorante! Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Pergunta que vai cair no seu concurso: a mulher ficou com o olho roxo e falou: “enquanto esse olho não voltar ao normal, eu não saio de casa.” Ela ficou por mais de 30 dias, por vergonha, sem sair de casa, logo, sem exercer suas ocupações habituais. Incide esta qualificadora ou não? Se ela, por vergonha, ficar em casa por mais de trinta dias? Cuidado! A lesão tem que incapacitá-la, não a vergonha da lesão. Então, a simples vergonha não autoriza esta qualificadora. Ela tem que ficar incapacitada em face da lesão. Tem jurisprudência nesse sentido. o que tem que incapacitar é a lesão, não a vergonha da lesão. A incapacitação é por mais de 30 dias. Isso significa o quê? Significa que eu tenho o dia da lesão. Nesse dia, você faz uma perícia. Para saber se você ficou ou não incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias, quando chegar o 30º dia você tem que fazer nova perícia. No dia da lesão, nós atestamos a materialidade com uma primeira perícia que não tem poderes divinatórios. Ela não tem como adivinhar se você vai ficar mais de 30 dias incapacitado. Então, o que o médico legista faz? Determina o retorno decorridos trinta dias e vai fazer nova perícia para saber se está ou não apto a voltar para as ocupações habituais. Então, vou precisar de duas perícias. A primeira e a segunda, chamada de complementar. Isso está onde? Art. 168, §2º do CPP: CPP, art. 168, § 2º - Se o exame tiver por fim precisar a classificação do delito no Art. 129, § 1º, I, do Código Penal, deverá ser feito logo que decorra o prazo de 30 (trinta) dias, contado da data do crime. Respondam se o laudo complementar é válido ou inválido: vamos supor que no dia 10/10/08, a pessoa sofreu uma lesão. O médico já percebe que essa lesão aparenta ser grave. Então, ele vai determinar o retorno para o exame complementar. A partir de que dia esse exame complementar pode ser realizado? O prazo é penal? Se o prazo é penal, você computa o dia do início e exclui o dia do fim. Então, o 30º dia, se o prazo é penal, é o dia 09/11, significando que o exame complementar só pode ser realizado no dia 10 e seguintes. Agora, se você entende que o prazo é processual penal, aí você exclui o dia do início e inclui o dia do fim. O 30º dia será o dia 10/11. Isso significa que o exame complementar só pode ser realizado a partir do dia 11. Quando eu posso realizar o exame complementar? Esses 30 dias configuram prazo penal ou processual penal? É só você pensar: o prazo está ligado ao direito de perseguir, ou ao direito de punir e tipificar o delito? Está ligado à tipificação do delito? Então é um prazo penal. O exame complementar já pode ser realizado dia 10. Isso está escrito no art. 168, do CPP (“contado da data do crime” – o prazo é penal). 2ª Qualificadora: Inciso II: Se resulta: II – perigo de vida; Também será grave, com pena de 1 a 5 anos, se a lesão resulta na vítima perigo de vida. Vamos entender o que significa esse perigo de vida para compreender quando que ocorre essa qualificadora. “Perigo de vida é probabilidade séria, concreta e imediata do êxito letal, devidamente comprovado por perícia.” Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Isso é perigo de vida! Isto gera a qualificadora. Extremamente importante o que vou falar agora. Já dá para perceber que o simples local da lesão não presume essa qualificadora. Ela tem que ser comprovada por perícia. Não é porque a pessoa sofreu uma lesão no pescoço que você vai concluir por perigo de vida. Tem que haver perícia nesse sentido. Não é porque uma pessoa sofreu lesão perto do coração que você vai presumir essa qualificadora. Não. Tem que ter uma perícia que vai avaliar, inclusive, a probabilidade séria dessa lesão ocasionar o êxito letal. Então, cuidado! Tem que haver perícia. A simples região da lesão não permite presunções. Vocês estão lembrados que bem no comecinho da aula eu falei que o § 1º é doloso, mas também pode ser preterdoloso? O inciso I pode ser doloso se você agride, querendo incapacitar a pessoa por mais de trinta dias e pode ser preterdoloso: você agride e, culposamente, deixou a pessoa incapacidade por mais de trinta dias para as suas ocupações. O inciso II, necessariamente, é preterdoloso. E agora vocês nunca mais vão pensar que o preterdolo só está no § 3º. Vou repetir porque é importante: o preterdolo na lesão corporal não está só no § 3º. Você tem preterdolo no § 1º e no § 2º. O § 1º, inciso I, por exemplo, pode ser preterdoloso. Você, dolosamente, quer incapacitar a pessoa por mais de 30 dias para as suas ocupações habituais ou, culposamente, você provoca esse resultado. Agora, o inciso II, não. O inciso II, necessariamente, é preterdoloso. O inciso II não pode ser doloso! Você não pode assumir o risco de vida, pois, do contrário, você responderá por tentativa de homicídio. Então, no inciso II você age com dolo na lesão e culpa no perigo de vida. Se você assume o risco de ceifar a vida da pessoa, você vai responder por tentativa de homicídio. Então, cuidado! O inciso II, necessariamente, é preterdoloso. 3ª Qualificadora: Inciso II: Se resulta: III – debilidade permanente; O inciso III traz a qualificadora da debilidade permanente de membro, sentido ou função. Eu preciso explicar o que é membro, sentido e função? Não. Aliás, bastava colocar só função, que é gênero, e já abrange membro e sentido. O que importa é o seguinte: no inciso III, a sua lesão provocou o quê na vítima? Uma debilidade permanente nesse membro, nesse sentido, ou nessa função. Dolosa ou culposamente. Rogério, o que significa debilidade e o que significa permanente? “Debilidade significa enfraquecimento, diminuição da capacidade funcional.” A pessoa fica diminuída na sua capacidade funcional, permanentemente, para o resto da vida? NÃO! Permanente não significa perpétuo: “Permanente significa recuperação incerta e por tempo indeterminado.” Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Isto é permanente. Ninguém está falando em perpetuidade. Essa jurisprudência sempre cai em concurso: vamos supor que uma pessoa ficou debilitada na sua capacidade motora, mas essa capacidade motora pode ser, atenuada ou mesmo suprida com o auxílio de próteses. Incide essa qualificadora? Isso é jurisprudência tranquila. Anotem: “Não importa que o enfraquecimento possa se atenuar ou se reduzir com o aparelho de prótese.” Vejam que aparelhos de prótese não excluem essa qualificadora. A perda de um dente gera essa qualificadora? O que vocês acham? Você levou um soco e perdeu um dente. O que acha? Gera ou não gera a qualificadora? Ou depende? Você levou um soco, pulou o dente do siso. Gera essa qualificadora? Para quê serve o dente do siso? E se você perdesse o dente da frente? A resposta é: depende do dente. Só vai gerar esta qualificadora aquele dente que, perdido, compromete o órgão de mastigação. O que a perícia vai fazer? Vai relacionar o dente perdido com o órgão de mastigação e vai falar: qual era a função desse dente? Sem esse dente há uma redução no órgão? Se houver, gera qualificadora. Se não houver interferência alguma, não gera qualificadora. E a perda do dedo? Concurso cai bastante isso. você perdeu o dedão do pé. Não fiquem pensando na parte estética! Vamos pensar na sua capacidade motora, na função que desempenha o dedão do pé. E aí? É lesão grave? A mesma coisa: vai depender de perícia. A perícia vai analisar a função daquele dedo no órgão a que ele está ligado. 4ª Qualificadora: Inciso IV: Se resulta: IV – aceleração do parto; O inciso IV qualifica o crime de lesão corporal se da conduta do agente advém na vítima aceleração de parto. Pode ser uma qualificadora dolosa ou preterdolosa. Ele pode querer acelerar o parto ou, culposamente, acelerar o parto na vítima. Vejam! Eu falei em aceleração de parto. Não falei em aborto. O feto nasce com vida. Aqui se quer agredir a vítima, aceitando ou querendo a aceleração do parto. Eu agredi a vítima culposamente, acelerando o parto, jamais assumindo o risco do aborto. É imprescindível que o agente saiba ou pudesse saber que a vítima é gestante. Por quê? Porque pode ser preterdoloso. Com isso, você evita a responsabilidade penal objetiva. 5. ART. 129: § 2º – LESAO CORPORAL DE NATUREZA GRAVÍSSIMA § 2º - Se resulta: I - incapacidade permanente para o trabalho; Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 II - enfermidade incurável; III - perda ou inutilização de membro, sentido ou função; IV - deformidade permanente; V - aborto. Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos. O § 2º também traz qualificadoras. Olha o que diz o final: reclusão de 2 a 8 anos. Significa o quê? Não admite mais suspensão condicional do processo. Mas admite só sursis. Então, o § 2º também é qualificadora, a pena mínima de 1 foi para 2, a máxima de 5 foi para 8, não admite mais suspensão condicional do processo, mas agora admite o sursis. Agora prestem atenção: eu falei para vocês que o § 2º trazia lesão corporal de natureza gravíssima. Onde está escrito isso? Vejam que o § 1º o CP chamou de lesão de natureza grave. E no § 2º não disse nada sobre lesão corporal de natureza gravíssima. É criação doutrinária que a jurisprudência aceitou. A expressão lesão corporal de natureza gravíssima é criação doutrinária. O Código Penal, quando fala em lesão grave está se referindo ao § 1º e ao § 2º. Ele não conhece a expressão “gravíssima”. Caiu para delegado de polícia em SP essa questão. Agora, a doutrina é que diferencia. Diz: lesão grave é o § 1º. Lesão gravíssima é o § 2º. Vejam, então, que há uma criação da doutrina que a jurisprudência aceitou. Quando o CP fala em lesão grave, abrange os dois parágrafos. A doutrina, não. Quando ela fala em lesão grave, só quer o parágrafo 1º. Quando ela quer o parágrafo 2º, ela fala em lesão gravíssima. Vocês já viram isso comigo: tem uma lei que, finalmente, adotou a expressão da doutrina e hoje é uma expressão legal: lei de tortura. Cuidado! Observação: “A lei de tortura adotou essa expressão.” 1ª Qualificadora: trabalho. Inciso I: Se resulta: I - incapacidade permanente para o Comparando o inciso I do § 1º, com o inciso I do § 2º, dá para ver que este aqui é mais grave. Lá você fica incapacitado para as atividades habituais por mais de 30 dias. Aqui você fica incapacitado para o trabalho! E de forma permanente. O que se entende por permanente? “Permanente é duradouro no tempo e sem previsibilidade de cessação.” Você fica incapacitado permanentemente para o trabalho. Não mais para meras ocupações habituais. Pergunto: qual trabalho? Para qualquer trabalho ou só para o trabalho que você exercia anteriormente à lesão? O que gera essa qualificadora? Você ficar incapacitado para jogar futebol (se é jogador de futebol) ou você ficar incapacitado para exercer qualquer outra espécie de profissão? Prevalece que só incide essa qualificadora se você ficar incapacitado para todo e qualquer tipo de trabalho, o que eu acho um puta de um absurdo. Prevalece Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 que esta qualificadora só incide quando você fica incapacitado para todo e qualquer tipo de trabalho!! Você fica um inútil. Agora eu pergunto: quem me dá exemplo de uma lesão que não seja o estado vegetativo que te deixe afastado para todo e qualquer trabalho. O Christopher Reeve, depois do acidente, não ficou incapacitado para o trabalho. Ele atuou, virou diretor. Eu estou aqui apenas e tãosomente demonstrando que se essa qualificadora depende da pessoa fica incapacitada para todo e qualquer tipo de trabalho, está relegada à total inaplicabilidade. Por isso, eu fico com a minoria, com Mirabete, que diz que basta você ficar incapacitado para o trabalho que anteriormente exercia. Mas Mirabete é minoria. Acho mais razoável. 2ª Qualificadora: Inciso II: Se resulta: II – enfermidade incurável. O inciso II qualifica a lesão corporal como sendo de natureza gravíssima, se resulta na vítima enfermidade incurável. “Enfermidade incurável é alteração permanente da saúde em geral por processo patológico, ou seja, a transmissão intencional de uma doença para a qual não existe cura no estágio atual da medicina.” A jurisprudência já entendeu como exemplo a vítima ficar manca. Vejam, o fato de ela ter ficado manca não é uma debilidade de função. Ela continua se movimentando, mas o fato de ficar manca, é uma enfermidade que a medicina não cura. Já temos jurisprudência nesse sentido. Cuidado! Não pode ser uma doença letal, como a AIDS. Se for uma doença letal, o STJ já decidiu: tentativa de homicídio. Transmissão intencional do vírus da AIDS é tentativa de homicídio. E por quê? Porque você está transmitindo uma doença de natureza letal. Você sabe que tem projeto de lei no Congresso criando o crime de transmissão intencional do vírus da AIDS. 3ª Qualificadora: sentido Inciso III: Se resulta: III – perda ou inutilização de membro, ou função. O § 1º falava em perda ou inutilização de membro sentido ou função? Não. Falava em debilidade. No §1º, o seu membro, o seu sentido, a sua função ficou enfraquecida. Aqui, não. Você perdeu ou foi inutilizada. É situação bem mais grave.   Perda: amputação ou mutilação. Inutilização: membro, sentido ou função inoperante. Você sabe a diferença entre amputação e mutilação? Caiu para delegado de polícia. Quem amputa? O médico? Quem mutila? O agressor. Se na agressão, ele arrancou o seu braço, ele mutilou o seu braço. Se o médico, na cirurgia, teve que tirar o seu braço para salvar a sua vida, ele amputou. Caiu isso em concurso! Na inutilização, o seu membro continua no corpo, mas sem utilidade alguma. São situações bem mais graves do que a do § 1º, que já era grave. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 TJ/RS: em razão da lesão corporal, a vítima perdeu um rim. Foi vítima de qual crime? Lesão corporal gravíssima ou não? Vocês não podem esquecer que, para ser gravíssima, tratando de órgãos duplos, os dois têm que ficar inutilizados ou perdidos. Não basta perder ou inutilizar um. Tratando-se de órgãos duplos tem que perder os dois. Essa pergunta também caiu em concurso falando de testículo. Para ser gravíssima, você tem que perder os dois testículos. Dois rins, perdeu um? Debilidade, parágrafo 1º! Para ser parágrafo 2º tem que perder os dois. Perdeu um rim? Debilidade e não inutilização. E se em razão da lesão, você ficou impotente para gerar vida. Impotência instrumental ou não? É lesão gravíssima? Impotência generandi é lesão gravíssima? Sim. E tem até um exemplo. O médico, sem avisar a paciente, realizou a laqueadura. Sem avisar o paciente, realizou vasectomia. São exemplos de lesão corporal de natureza gravíssima. 4ª Qualificadora: Inciso IV: Se resulta: IV – deformidade permanente O inciso IV fala da deformidade permanente como hipótese de lesão gravíssima. O que é sofrer deformidade permanente? “Deformidade permanente é dano estético, aparente, considerável, irreparável pela própria força da natureza e capaz de provocar impressão vexatória.” O que é impressão vexatória? “Desconforto para quem olha, humilhação para a vítima.” Pergunta que caiu em concurso: “o que é vitriolagem?” “É lesão corporal gravíssima em razão do emprego de ácidos.” Você provoca na vítima uma deformidade permanente. A idade da vítima é considerada pelo juiz no momento de analisar se há ou não deformidade permanente? A idade, o sexo e a condição social são circunstâncias a serem consideradas para se concluir se houve ou não deformidade permanente? A idade, o sexo e a condição social são circunstâncias consideradas para concluir pela deformidade ou não. Idade, sexo e condição social interferem na conclusão sobre se há ou não deformidade. Olha como é legal estudar por Nelson Hungria (você lê um parágrafo e demora 5 horas para entender o que ele fala)! Olha o que ele diz: “ninguém pode duvidar que devem ser diversamente apreciadas uma cicatriz no rosto de uma bela mulher e outra na carantonha de um quasímodo; uma funda marca torneado pescoço feminino e outra no perigalho de um septuagenário; um sinuoso gilvaz no braço roliço de uma jovem e outro no braço cabeludo de um cavouqueiro.” Em síntese, ele quis dizer o seguinte: a idade, o sexo, a condição social interferem na deformidade. Pronto. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Cuidado! Nós temos países, como Itália e Argentina que só consideram a deformidade permanente se ela estiver no rosto da vítima. No Brasil, não. Não importa a região. Abrange todo o corpo, desde que passível de exposição, ainda que essa exposição seja num momento mais íntimo. 5ª Qualificadora: Inciso V: Se resulta: V – aborto. Aqui também, é uma qualificadora necessariamente preterdolosa. Dolo na lesão, culpa no aborto. Se ele assumiu o risco do aborto, vai responder pelos dois crimes. Esta qualificadora é, necessariamente, preterdolosa. E, a exemplo do inciso IV do §1º, ele aqui também tem que saber ou ter condições de saber que a vítima é gestante, para evitar a responsabilidade penal objetiva. Cuidado! Vocês já viram isso comigo, mas vamos ver novamente! É possível a coexistência de qualificadoras do § 1º com qualificadoras do § 2º? É perfeitamente possível. Você ficar com debilidade permanente + deformidade permanente. Então, é perfeitamente o art. 129, § 1º + o art. 129, § 2º. E aí? Você juiz faz o quê? Lembrando que no § 1º a pena é de 1 a 5 e no § 2º a pena é de 2 a 8? O que você, juiz, faz? Você vai usar o § 2º como qualificadora e o § 1º como circunstancia judicial desfavorável. A circunstância do § 2º vai qualificar o crime e a do §1º vai servir na pena-base. 6. ART. 129: § 3º – LESAO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE Lesão Corporal Seguida de Morte § 3º - Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos. O art. 129, § 3º tem um sinônimo que já vimos aqui: homicídio preterdoloso ou preterintencional. Aqui, em nenhum momento se quis ou se assumiu o risco de produzir a morte. Aqui, em nenhum momento ele quis (ou seja, exclui-se o dolo direto) ou assumiu o risco (esquece o dolo eventual), no que diz respeito à morte. Homicídio preterdoloso ou preterintencional. É a lesão corporal seguida de morte. Por isso, não vai a júri. Pelo amor de Deus! Não é crime doloso contra a vida! Lesão corporal seguida de morte não vai a júri! “Rogério, então estamos diante de um crime preterdoloso?” Genuinamente preterdoloso. Quais são os elementos do crime preterdoloso? Quais são os elementos do dolo (isso todo mundo sabe, são dois)?   Consciência e Vontade. A culpa tem seis elementos. Quais são os elementos da culpa? Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010       Conduta Resultado Nexo Previsibilidade Objetiva Previsibilidade Subjetiva Tipicidade E quais são os elementos do preterdolo? A doutrina não costuma tratar o preterdolo em elementos, o que é um absurdo, porque a culpa tem elementos, o dolo tem elementos, por que o preterdolo não tem? Então, vamos para os elementos: art. 129, § 3º, crime preterdoloso. Vamos para os elementos do crime preterdoloso:  1º Elemento do preterdolo: incolumidade pessoal de outrem.  2º Elemento do preterdolo:  3º Elemento do preterdolo: Conduta dolosa, dirigida a ofensa à Resultado culposo mais grave (morte) Nexo causal Agora, cuidado! O resultado mais grave tem que ser culposo. Se proveniente de caso fortuito ou força maior, a pessoa responde somente pela lesão. Se o resultado morte for proveniente de caso fortuito ou força maior, o agressor responde somente pela lesão. Agora eu quero saber qual crime eu tenho: eu dou um empurrão numa pessoa, essa pessoa cai, torce o pé na sarjeta, escorrega, bate a cabeça e morre. Ou eu estou numa boate, dou um empurrão numa pessoa que se desequilibra, cai, bate a cabeça numa mesa e morre. Primeira coisa: o resultado morte era previsível ou imprevisível? Eu não estou falando em resultado previsto. Quando eu falo em previsível é: havia possibilidade de se prever que em uma boate onde tem mesas ele pudesse cair bater a cabeça e morrer? Era potencialmente previsto? Era. Então, era previsível. Eu que empurrei, tendo previsibilidade (não previsão) que ele poderia bater a cabeça e morrer, que crime eu pratiquei? Lesão corporal seguida de morte? Não. Não por quê? Porque empurrão não é lesão. Empurrão é vias de fato. Cuidado com essa pegadinha em concurso! Você tem aqui: vias de fato seguida de morte. E tem algum crime “vias de fato seguida de morte?” Não! Isso configura homicídio culposo. Vai configurar homicídio culposo. Vias de fato seguida de morte não tem um tipo específico. Então, a vias de fato fica absorvida pelo homicídio culposo. Eu só estou recordando e caiu exatamente esse exemplo no concurso. O agente empurrou a vítima, que tropeçou, caiu, bateu a cabeça e morreu. Primeira coisa: o resultado era previsível? Sim! Que crime ele praticou? Vias de fato seguida de morte culposa? Isso é homicídio culposo! Obviamente, tratando-se de crime preterdoloso não admite a tentativa. Em geral. 7. ART. 129: § 4º – CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 O parágrafo 4º traz hipótese de diminuição de pena. Eu quero que vocês leiam com cuidado porque ele despenca em primeira fase de concurso. Nós, praticamente, não conhecemos os parágrafos 4º e 5º. De rara aplicação prática, mas cai. Diminuição de Pena § 4º - Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Pergunto: vocês já viram alguma coisa parecida em algum lugar? Já! Onde? homicídio privilegiado. Pode anotar: o § 4º traz a lesão privilegiada. Significa que tudo o que nós falamos no art. 121, § 1º, vale para cá. Eu preciso ficar redundante aqui, repetindo tudo? Não, né? Então, vamos para o que interessa: O privilegio alcança qualquer uma das modalidades anteriores. O privilégio se aplica ao caput, o privilégio se aplica ao § 1º, o privilégio se aplica ao § 2º e ao § 2º. Se aplica a qualquer uma das lesões dos §§ anteriores. Você pode ter lesão leve privilegiada, lesão grave privilegiada, lesão gravíssima privilegiada e lesão seguida de morte privilegiada. Só para que não haja dúvida, trata-se de direito subjetivo do réu, não faculdade do juiz. A discricionariedade do juiz diz respeito somente ao quantum da redução. 8. ART. 129: § 5º – SUBSTITUIÇÃO DA PENA Substituição da Pena § 5º - O juiz, não sendo graves as lesões, pode ainda substituir a pena de detenção pela de multa: I - se ocorre qualquer das hipóteses do parágrafo anterior; II - se as lesões são recíprocas. Vocês já anotaram que o § 4º se aplica a todas as figuras anteriores. O § 5º, não. O § 5º só se aplica no caso de lesão leve (só se aplica ao caput)! E mesmo assim, basta ser leve? Não! Tem que ser: I. II. Lesão leve privilegiada ou Lesão leve recíproca. Então, se for lesão leve privilegiada cabe substituição por mera multa. Se for lesão leve recíproca, cabe também substituição de multa. 9. ART. 129: § 6º – LESÃO CORPORAL CULPOSA Lesão Corporal Culposa § 6º - Se a lesão é culposa: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Pena - detenção, de 2 (dois) meses a 1 (um) ano. Voltamos a falar de uma infração penal de menor potencial ofensivo cuja ação penal depende de representação da vítima. Se a lesão é dolosa, o fato de ser leve incide o caput com pena de 3 meses a 1 ano. O fato de ser grave incide no § 1º, com pena de 1 a 5 anos. o fato de ser gravíssima, incide no §2º, 2 8 anos. Agora, no caso da lesão culposa, pouco importa se é leve, se é grave ou se é gravíssima, tratando-se de lesão culposa, as três hipóteses vão desembocar no § 6º, com pena de 2 meses a 1 ano. Cuidado! A gravidade da lesão interfere na tipificação, se dolosa. Se culposa, a gravidade da lesão vai desembocar sempre no § 6º, com pena de 2 meses a 1 ano. É o juiz que vai considerar a gravidade da lesão na fixação da pena-base. Então, cuidado com isso. Então, o § 6º traz a lesão culposa leve, grave ou gravíssima e o grau de gravidade vai repercutir na fixação da pena-base. Vocês estão lembrados daquele velejador brasileiro, Lars Grael? A pessoa acabou mutilando as pernas dele, não foi isso? Respondeu pelo art. 129, § 6º. Pronto. E o Jô Soares dizia que isso era um absurdo, que tinha mutilado e, por isso, tinha que ser na gravíssima. Mas ele esqueceu que não foi na dolosa. Só isso ele esqueceu! Vocês não podem esquecer que lesão culposa no transito não é mais no Código Penal. Lesão culposa na direção de veículo automotor é o art. 303, do CTB: CTB, Art. 303. Praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor: Penas - detenção, de seis meses a dois anos e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. Continua sendo de menor potencial ofensivo, mas tem um detalhe importante. O art. 129, § 6º, do CP, traz a lesão culposa, com pena de 2 meses a 1 ano. O art. 303, do CTB também traz a lesão culposa na direção de veículo automotor. Qual é a pena? 6 meses a 2 anos. E agora? Nós já vimos isso no homicídio. No homicídio aconteceu uma coisa parecida, ou seja, 2 resultados idênticos com penas claramente desiguais. Isso é inconstitucional? Lá no homicídio, como nós defendemos a constitucionalidade? Fizemos o seguinte: o crime tem o desvalor da conduta e tem o desvalor do resultado. Apesar do resultado ser o mesmo (lesão culposa e lesão culposa), a conduta no trânsito é mais perigosa, merecendo uma pena maior. Estão lembrados disso? Então, aqueles que limitarem o ângulo do desvalor do resultado vão dizer que isso é inconstitucional. Agora, aqueles que lembrarem que crime é conduta e resultado e lembrarem do desvalor da conduta vão defender a constitucionalidade. Mas aqui tem um problema. Aqui fica difícil defender a constitucionalidade mesmo assim. Por quê? Porque se ele tivesse agindo dolosamente no transito, a pena dele seria de 3 meses a 1 ano. Se ele tivesse com o carro, agindo dolosamente e praticado uma lesão leve, por exemplo, a pena da lesão culposa é o dobro. Por isso, fica difícil não reconhecer a desproporcionalidade. Olha: eu, com meu carro, dei marcha-ré e, sem querer, acertei a sua coxa, ferindo-a. A minha pena é de 6 meses a 2 anos. Mas se eu tivesse feito de propósito, a minha pena seria de 3 meses a 1 ano. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Então, aqui fica difícil defender a constitucionalidade. Quando você lembra que a lesão dolosa leve tem a metade da pena na lesão culposa no trânsito fica difícil não reconhecer a desproporcionalidade. É punir o mais com o menos e o menos com o mais. Perde o sentido. Então, na lesão corporal, fica difícil defender a constitucionalidade. 10. ART. 129: § 7º – CAUSAS DE AUMENTO DE PENA Aumento de Pena § 7º - Aumenta-se a pena de um terço, se ocorrer qualquer das hipóteses do Art. 121, § 4º. Tudo o que eu falei no art. 121, § 4º, vocês aplicam aqui. Na verdade, só para refrescar a memória, o art. 121, § 4º é aquele dispositivo que prevê majorantes para o homicídio culposo e majorantes para o homicídio doloso. 11. ART. 129: § 8º – PERDÃO JUDICIAL § 8º - Aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º do Art. 121. O que significa isso? O art. 129, § 8º está permitindo o perdão judicial para a lesão culposa. O § 8º está permitindo o perdão judicial para a lesão culposa! Guardem o que eu vou falar! Só para a lesão culposa. Não se aplica para a preterdolosa, muito menos para a dolosa. Então, o perdão judicial é só para a lesão culposa, abrangendo o Código de Trânsito Brasileiro. 12. ART. 129: §§ 9º, 10 e 11 Vamos ler os parágrafos 9º, 10 e 11. Vocês agora não vão anotar nada. Vamos analisar como eles surgiram no Código Penal Violência Doméstica § 9º Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: (Acrescentado pela L-010.886-2004) (Alterado pela L-011.340-2006) Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. § 10. Nos casos previstos nos §§ 1º a 3º deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9º deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço). (Acrescentado pela L-010.886-2004) § 11. Na hipótese do § 9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência. (Acrescentado pela L011.340-2006). Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Prestem atenção. Vamos analisar isso com calma. Só tem sentido estudar esses parágrafos (e o § 9º e o § 11 foram acrescentados pela Lei Maria da Penha), se você acha que a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) é constitucional. Se você acha que é inconstitucional, não temos que estudar isso. Nesta aula, eu sempre gosto de fazer o seguinte esquema que vocês não podem esquecer:  Até 1990 – a violência no Brasil era tratada num mesmo caldo. Qualquer violência era tratada no caldo comum do Código Penal.  A partir da década de 90 – Começa a onda de especialização da violência (guardem o que vou falar!), com base em estatísticas. Te dou exemplos de especialização da violência. Por exemplo, em 1990, vem a Lei 8069 (ECA) que, nada mais nada menos, especializou a violência contra o menor. Também em 1990, não podemos esquecer da Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), especializando as violências mais graves contra o ser humano. Olha só, a onda de especialização chegou também no consumidor. A Lei 8.078/90 CDC), nada mais fez, do que especializar a violência contra o consumidor (sempre com base em estatísticas).  Em 1995 – Veio a Lei 9.099/95, especializando as violências de menor potencial ofensivo.  Em 1997 – Veio a Lei 9.455/97, especializando a tortura. Veio a Lei 9.503/97, o CTB, que especializou a violência no trânsito.  Em 1998 – Veio a Lei 9.605/98, especializando a violência contra o meio ambiente. Tudo isso é especialização da violência. E eu posso chegar no Estatuto do Idoso, especializando a violência do idoso para, finalmente, observa o quê? Observar a Lei 11.340/06, Lei Maria da Penha, violência doméstica e familiar contra a mulher. Então, o que esta lei fez nada mais foi fazer o que as outras já vinham fazendo desde 1990, que é a especialização da violência. O problema é que a Lei Maria da Penha tocou numa questão delicada: sexo. Cuidado! “Rogério, você falou que a Lei Maria da Penha nasceu para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Será que ela não reconhece que o homem pode ser vítima dessa espécie de violência?” Reconhece, claro que reconhece! A lei Maria da Penha sabe que o homem pode ser vítima dessa espécie de violência. “Como, Rogério?” basta lermos outra vez os parágrafos 9º, 10 e 11: § 9º Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: (Acrescentado pela L-010.886-2004) (Alterado pela L-011.340-2006) Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Quando se usa irmão como se utilizou aqui é porque quer abranger homem. E também o cônjuge ou companheiro (gênero), abrangendo homem ou mulher. O § 9º tem como vítima homem ou mulher no ambiente doméstico ou familiar. § 10. Nos casos previstos nos §§ 1º a 3º deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9º deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço). (Acrescentado pela L-010.886-2004) § 9º? Epa! Homem ou mulher. § 11. Na hipótese do § 9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência. (Acrescentado pela L011.340-2006). Pessoa: homem ou mulher! Com isso, o que estou querendo esclarecer? Que a Lei Maria da Penha, apesar de só buscar agasalhar a mulher, reconhece que o homem pode ser vítima. Tanto que os parágrafos 9º, 10 e 11 não limitam vítima mulher e sim, membros da família ou agregados. Eu vou analisar com calma esses parágrafos a partir da próxima aula, sabendo que eles não estão protegendo só a mulher, apesar de incluídos pela Lei Maria da Penha. Eu já alertei. Não vamos estudar omissão de socorre e rixa porque são crimes fáceis que vocês conseguem apreender em casa tranquilamente. Isso porque eu preciso de espaço no meu horário para analisar com vocês todas as mudanças nos crimes contra a dignidade sexual. Se, no final do curso, eu perceber que sobra espaço, eu volto. Eu só vou pular, praticamente, a omissão de socorro e a rixa. Sobre lesão corporal, a gente viu praticamente tudo, só ficou faltando terminar a análise dos parágrafos 9º, 10 e 11, do art. 129, do CP. Vamos ao §9º: § 9º Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. Então, vamos entender. O § 9º nada mais é do que uma qualificadora. Qualifica o quê? Lesão corporal. O art. 129, caput, traz lesão dolosa leve com pena de 3 meses a 1 ano. Agora, o art. 129, § 9º, traz a lesão dolosa leve qualificada com pena de 3 meses a 3 anos. O § 9º nada mais é do que uma qualificadora do caput. O § 9º trata da lesão leve, porém, qualificada porque praticada no ambiente doméstico e familiar. Com isso, vocês já perceberam o seguinte: a lesão leve é de menor potencial ofensivo, salvo se praticada no ambiente doméstico e familiar. Aqui, ela não é de Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 menor potencial ofensivo. Olha que importante. A lesão leve é de menor potencial ofensivo, salvo se praticada no ambiente doméstico ou familiar. Aí ela deixa de ser de menor potencial ofensivo. Eu vou insistir nisso e vocês vão entender por quê. Ela continua leve, só não é de menor potencial ofensivo porque a pena máxima suplantou 2 anos. Reparem que a natureza da lesão não tem nada a ver com a natureza do crime. Já caiu isso em concurso. O examinador perguntou: “tem algum caso em que a lesão leve deixa de ser de menor potencial ofensivo?” O candidato esqueceu do parágrafo 9º. Quem é o sujeito ativo, quem é o sujeito passivo? Vocês estão lembrando que eu alertei o seguinte: a Lei Maria da Penha protege a mulher, mas no § 9º, pode ser homem ou mulher. Quando a vítima é homem, eu aplico o art. 129, § 9º, quando a vítima é mulher, eu aplico o art. 129, § 9º + Lei Maria da Penha. É exatamente nesse “+” que a lei tem a sua constitucionalidade questionada. Por que “+” só para a mulher e não para o homem? O art. 129, § 9º é crime comum ou é crime próprio? A doutrina diz que é um crime bicomum, mas se vocês analisarem com cautela verão que é bipróprio e não bicomum. Olha só: se a lesão for praticada contra ascendente ou descendente ou irmão ou cônjuge ou companheiros ou convivente. Já deu para perceber que o tipo penal exige uma relação entre os personagens. Não pode qualquer pessoa ser sujeito ativo, muito menos sujeito passivo, logo, crime bipróprio. Exige-se uma relação especial unindo os dois sujeitos. Essa relação especial deixa claro que não será qualquer pessoa sujeito ativo e não será qualquer pessoa sujeito passivo. Mas vocês vão encontrar farta doutrina dizendo que o crime é bicomum, mas atentem que o crime é bipróprio. E quem são esses personagens? O art. 129, § 9º tem como envolvidos: a) b) c) Lesão praticada contra ascendente, descendente, irmão. Lesão praticada contra cônjuge ou companheiro Lesão praticada contra quem o agente conviva ou tenha convivido. Eu quero saber o seguinte: este terceiro grupo (letra c) é um terceiro grupo de vítimas ou, na verdade, é um complemento dos dois anteriores, exigindo uma convivência presente ou pretérita? Guilherme de Souza Nucci entende que não se trata de um terceiro grupo, mas um complemento dos grupos anteriores. Isso significa que Nucci exige que ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro convivam ou tenham convivido. Se você jamais conviveu com seu ascendente, com o seu descendente, não incide o parágrafo 9º. Então, Nucci não enxerga esse “com quem convida ou tenha convivido” como um 3º grupo. Para ele, estamos diante de um complemento indispensável para configurar os outros dois. Não dá para concordar com ele porque existe a expressão “ou com quem conviva ou tenha convivido” demonstrando que se trata sim, de um terceiro grupo Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 não relacionado à ascendência, descendência, cônjuge, companheiro, irmão. É um terceiro grupo, de pessoa que você convive ou tenha convivido. Exemplo: namorado, amantes, república de estudantes. Sabe o que significa isso? Que o § 9º dispensa coabitação. Se você concorda com a maioria, e não com Nucci, é assim. Dispensa coabitação presente ou pretérita. O § 9º relaciona ainda, “prevalecendo-se o agente das relações domésticas de coabitação ou hospitalidade.” Na relação de hospitalidade, o que o legislador olhou? Olhou para a visita. Alguém aqui já bateu numa visita? Hospitalidade abrange visita. Esse rol é taxativo ou exemplificativo? É taxativo. Então, não abrange os parentes colaterais, a não ser que entrem “conviva ou tenha convivido”. Eu comentei que a sogra está protegida pela LMP mas vejam que o espectro de proteção da Lei Maria da Penha é bem maior do que o do § 9º. Ela abrange os parentes por afinidade. O § 9º, não, a não ser que se encaixem no “convivam ou tenham convivido”, a não ser que a sogra esteja visitando. Mas o simples fato de ser afim não está abrangido pelo § 9º. Agora, o § 10. Vocês viram que o § 9º é uma qualificadora exclusiva do quê? Da lesão leve. Mas eu tenho outras espécies de lesão: grave, gravíssima ou seguida de morte, que estão no art. 129, § 10: § 10. Nos casos previstos nos §§ 1º a 3º deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9º deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço). (Acrescentado pela L-010.886-2004) O que ele está dizendo? Se a lesão é grave, a pena é de 1 a 5 anos. Mas, se estiver nas circunstancias do parágrafo 9º (ambiente doméstico e familiar) aí a pena é aumentada de 1/3. a lesão grave tem uma segunda forma, que é a do § 2º, que é a chamada lesão gravíssima. Se a lesão é gravíssima, a pena passa a ser de 2 a 8 anos. Quando praticada no ambiente doméstico e familiar, aumenta de um terço. E, por fim, a lesão seguida de morte, que está no § 3º, a pena é de 4 a 12 anos. Porém, quando praticada no ambiente doméstico e familiar, a pena aumenta de 1/3. Então:  § 1º - a lesão grave, pena de 1 a 5; quando praticada nos termos do § 9º aumenta 1/3  § 2º - a lesão gravíssima, pena de 2 a 8; quando praticada nos termos do § 9º aumenta 1/3  § 3º - a lesão seguida de morte, pena de 4 a 12; quando praticada nos termos do §9º aumenta 1/3 Isso significa que o § 10 não traz qualificadora, mas majorante de pena, traz causa de aumento de pena. O § 10 traz alguma outra consequência que não somente o mero aumento de 1/3? Não fiquem pensando que ele só aumentou a pena de 1/3! Vejam o que aconteceu: o § 1º, quando praticado fora do ambiente Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 doméstico, admite suspensão do processo. Se praticado no ambiente doméstico e familiar, não admite. Quando você pratica lesão grave em alguém, tem direito, preenchidos os requisitos, à suspensão do processo. Praticada no ambiente doméstico e familiar, não cabe a suspensão. Já caiu isso em concurso. O § 2º, traz a pena mínima de 2 anos. Se condenado à pena mínima, cabe sursis. No ambiente doméstico e familiar, não mais admite sursis. Lesão gravíssima admite, em tese, sursis, salvo se praticada no ambiente doméstico e familiar. Lesão seguida de morte tem pena mínima de 4 anos. Em tese, regime aberto, salvo se praticada no ambiente doméstico e familiar. Aqui, apena vai suplantar 4 anos e não admite regime aberto. Então, quando enxergamos o aumento de 1/3, não percebemos das consequências com relação aos benefícios penais e processuais penais. Vejam que aumentar de 1/3 você retira desses três crimes os benefícios que essas lesões ordinárias admitem. E o que vem a ser o § 11? § 11. Na hipótese do § 9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência. (Acrescentado pela L011.340-2006). Primeira pergunta que eu quero que vocês me respondam: esse § 11 é um aumento que se aplica para o § 10 e para o § 9º, ou é um aumento exclusivo do § 9º? Vocês viram que haverá o aumento de 1/3 se a vítima, além de ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro ou prevalecendo-se das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, além desses predicados é ainda portadora de deficiência. Eu quero saber: esse aumento é só para o § 9º, quando a lesão é leve, ou esse aumento é para qualquer um dos parágrafos anteriores, 9º e 10? Só para o 9º!! Ele fala em “na hipótese do § 9º” e só haverá o aumento no caso de lesão cometida contra pessoa portadora de deficiência se a lesão for leve. “Rogério, e se a lesão for grave, gravíssima ou seguida de morte?” o juiz que considere isso na pena-base. Então, cuidado! O art. 129, § 11, trata da vítima portadora de deficiência. Nesse caso, a pena é aumentada de 1/3 nas hipóteses do § 9º e o fato de ela ser portadora de deficiência é circunstância judicial a ser considerada nos demais parágrafos. O fato da vítima ser portadora de deficiência é aumento de 1/3 só para o § 9º. Nos demais parágrafos, é mera circunstância judicial. Agora eu pergunto: o que significa pessoa portadora de deficiência? “Eu bati no meu irmão e ele usa óculos. Eu tô ferrado?” Aqui nós vamos analisar o Decreto 3298/99, nos seus arts. 3º e 4º. Esse decreto relaciona quais os casos em que a pessoa é portadora de deficiência. Seja física, seja mental. Então, temos que analisar com base no Decreto 3298/99. Cezar Roberto Bittencourt discorda. Ele entende que tem que ser analisado o caso concreto. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Agora, é óbvio que tratando-se de crime doloso, o agente tem que saber que a vítima é portadora de deficiência. Um assunto que eu já analisei, em parte, e que agora vamos analisar de forma global: 13. A AÇÃO PENAL NA LESÃO CORPORAL Pergunto: qual é a ação penal na lesão corporal? A pena na lesão corporal é perseguida mediante qual ação penal? Aqui, nós temos que analisar o seguinte: Até 1995 – Até 1995, a lesão corporal só tinha como ação penal a pública incondicionada. Só tinha sua pena perseguida mediante ação penal pública incondicionada. Por mais que a vítima se arrependesse ou perdoasse, o promotor tinha que oferecer a denúncia, pouco importando a gravidade da lesão. Aí veio a Lei 9009/95 que ditou uma regra: lesão corporal tem uma regra.  Qual é a regra? Ação penal pública incondicionada.  Porém, previu exceções. Quais são elas? Lesão leve e lesão culposa. Nestes dois casos, a ação penal é pública condicionada. Depende o MP de autorização da vítima. Em 2006 - Veio a Lei Maria da Penha: violência doméstica e familiar contra a mulher: não se aplica a Lei 9.099/95. Eu pergunto: lesão corporal dos §§ 9º, 10 e 11, qual a espécie de ação penal? É a pergunta que vai cair na sua prova. Qual é a resposta? Primeira coisa que vocês têm que diferenciar: É vítima homem ou mulher? E esses parágrafos podem ter como vítima homem ou mulher. Vítima homem – nada mudou. A regra: ação penal pública incondicionada e há duas exceções: no caso de lesão leve e lesão culposa – ação penal pública condicionada. Então, quando a vítima é homem, nada mudou. Aí um aluno me fez a seguinte pergunta: “Mas Rogério, se o § 9º tem como vítima homem, a pena máxima passou a ser de 2 anos, deixando de ser de menor potencial ofensivo. Como é que você está aplicando a Lei 9.099 para tornar a ação penal dele pública condicionada? Como é que você está usando a Lei 9.099/95 para o § 9º cuja pena máxima suplantou 2 anos? ” Entenderam o raciocínio dele? Como é que você sai dessa? Vamos ao art. 88, da Lei 9.099/95 Art. 88 - Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá de representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas. Ou seja, o art. 88 está preocupado, não com a pena, mas com a natureza da lesão, o que é diferente. Ele tornou pública condicionada a lesão leve, não importando a pena. O que importa para o art. 88 é a natureza da lesão, e não a Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 pena. Então, o art. 88 diz: se a lesão é leve (não estou preocupado com a pena), depende de representação. E no § 9º a lesão é leve. Aí vocês devem estar pensando: “Rogério, mas está implícito que o art. 88 só está se referindo à infração de menor potencial ofensivo?” Não está não! Porque o art. 89 traz a suspensão do processo para crimes que não são de menor potencial ofensivo. Os arts. 88 e 89 são maiores do que a própria Lei 9.099. eles atingem crimes que não são necessariamente de menor potencial ofensivo. Então, olha o raciocínio que vocês vão ter que imprimir na prova: o art. 88 não está preocupado com a pena, e sim com a lesão. Os arts. 88 e 89 são maiores do que o conceito de menor potencial ofensivo, já que se aplicam a crimes que, não necessariamente são de menor potencial ofensivo. Questão boa para cair. Art. 89 - Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (Art. 77 do Código Penal). E no caso de vítima mulher? Aí, não há dúvida de que a regra é ação penal pública incondicionada. Mas e quando a lesão é leve? Nós já vimos essa discussão, mas vamos ver novamente. Eu estou analisando a lesão leve contra mulher no ambiente doméstico e familiar (§ 9º, do art. 129). Duas correntes: 1ª Corrente: “A ação penal é pública incondicionada, pois o art. 41 da Lei 11.340/06 (LMP) proíbe aplicação da Lei 9.099/95. Não bastasse, trata-se de grave violação aos direitos humanos da mulher, incompatível com a ação pública condicionada.” LFG e STJ. Eu já comentei que essa parte final é um absurdo porque o estupro, que é uma das formas mais graves de violar os direitos humanos da mulher, tem como regra hoje a ação pública condicionada. 2ª Corrente: “A ação é pública condicionada. O art. 41, da Lei Maria da Penha proíbe somente as medidas despenalizadoras exteriores à vontade da vítima, preservando o seu direito de representar.” Damásio e STJ A lei 9.099/95 trouxe 4 medidas despenalizadoras: composição civil, transação penal, suspensão condicional do processo (não chama isso de sursis processual. Sursis não tem nada a ver com esse benefício) e representação na lesão corporal leve e na culposa. O raciocínio da segunda corrente (e que vocês lembram do sábado) é o seguinte: o que o art. 41, da Lei Maria da Penha proíbe são essas três primeiras medidas despenalizadoras exteriores à vontade da vítima. Essas três medidas despenalizadoras não aplicamos. A representação permanece, pois é uma medida inerente à vontade da vítima. Então, na verdade, o que o art. 41 quer impedir são as medidas despenalizadoras exteriores à vontade da vítima. Aquela que depende da Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 vontade da vítima permanece. É ela que vai escolher. O que não queremos é despenalizar contra a vontade dela, mas se ela quer a medida despenalizadora, ela é capaz de escolher. Por isso, permanece a representação na lesão leve contra a mulher mesmo no ambiente doméstico e familiar. É óbvio que mesmo quando a vítima é mulher, independentemente dessa discussão, se a lesão é culposa, depende de representação. Se a lesão é culposa, depende de representação. A discussão é só com relação à lesão leve. Lesão culposa continua a depender de representação. Só faltava alguém dizer que a lesão culposa é pública incondicionada com regime fechado, etc. Só faltava! Se a lesão é culposa, é claro que eu continuo na exceção. Ação penal na lesão corporal – essa foi a questão pedida em prova. E nós acabamos de responder. Terminamos lesão corporal. Vamos para os delitos contra a honra. DELITOS CONTRA A HONRA Arts. 138 e ss., do CP + Leis Extravagantes Quando nós falamos em delitos contra a honra, nós estamos no Capítulo V e esses delitos são, basicamente, três:    Calúnia Injúria Difamação Quando falamos dos crimes contra a honra, é claro que temos uma lei geral, que é o Código Penal. Se você foi caluniado, difamado ou injuriado (“eu fui desacatado. Por isso dei uma facada nele” Tem gente que entende que desacato é sinônimo de injúria e não é), o Código Penal é a lei geral. Mas não é somente o Código Penal que protege a honra da pessoa. Eu tenho leis especiais também assim fazendo. Por exemplo:  Código Brasileiro de Telecomunicações também protege a honra contra esses tipos de crime.  Código Eleitoral que também protege a honra contra calúnia, difamação e injúria. E com uma observação importante: no Código Eleitoral, os crimes contra a honra são de ação pública incondicionada.  Código Penal Militar – também protege a honra. Lá vocês vão encontrar calunia, difamação, injúria.  Lei de Segurança Nacional – Também protege a honra.  Lei de Imprensa A Lei de Imprensa Era a lei mais famosa que tínhamos. O que aconteceu com ela? Foi considerada não recepcionada pela Constituição. ADPF 130. E agora? A minha honra não está mais protegida quando se trata de imprensa? Está. Mas apenas e tão-somente partimos para a regra geral. O que a Lei de Imprensa trazia e o Código Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Penal traz, continua sendo punido. Não vai extinguir processo nenhum, o jornalista continuará cumprindo pena. Não houve abolitio criminis. Quanto aos crimes da Lei de Imprensa que há correspondência no Código Penal, não há abolitio criminis. Já os crimes da Lei de Imprensa que não encontrarem correspondência em nenhuma outra lei, abolitio criminis. Repetindo: os crimes da lei de imprensa que encontrarem correspondência no CP, não há abolitio criminis. Agora, tem crimes na lei de imprensa que não encontram correspondência em nenhuma outra lei. Aí, sim, abolitio criminis. Eu nem gosto muito desse “abolitio criminis” porque não veio uma lei revogando. Ela apenas foi considerada não recepcionada. Mas tudo bem. Como eu comentei, basicamente, nós temos três crimes contra a honra: calúnia, difamação e injúria. Vocês sabem, com segurança, a diferença entre os três? Eu vou dar o exemplo e vocês vão dizer se é calúnia difamação ou injúria. “Fulano é ladrão!” e eu sei que fulano não é ladrão – Calúnia, difamação ou injúria? Vou fazer um esquema. É para não errar mais em concurso porque aqui na sala só três acertaram.  Calúnia (art. 138) – “Imputação de determinado fato previsto como crime sabidamente falso.”  Difamação (art. 139) – “Imputação de determinado fato desonroso, em regra não importando se verdadeiro ou falso.”  Injúria (art. 140) - “Atribuição de qualidade negativa.” A calúnia ofende a honra objetiva. O que vem a ser honra objetiva, bem resumidamente? Reputação. É o seu conceito perante a sociedade. O que terceiros pensam de você. A difamação também ofende a honra objetiva, isto é, reputação. Já a injúria, ofende a honra subjetiva. E o que é a honra subjetiva? Se a objetiva é o que os terceiros pensam de você, a subjetiva é o que você pensa de você mesmo. É a sua autoestima, sua dignidade ou decoro. E já vou dar uma dica: a depender da honra ferida, o delito se consuma num determinado momento. É a dica. Vou repetir a pergunta: “Fulano é ladrão”, é calúnia, difamação ou injúria? Olha o raciocínio que vocês vão ter que fazer: eu disse que fulano é ladrão, mas eu imputei determinado fato em dia, hora ou local? Não. Se eu não imputei determinado fato não é nem calúnia, nem difamação. Pronto! É injúria. É uma qualidade negativa que ofende a honra subjetiva. Exemplo seguinte: Eu digo “fulano assaltou o Banco do Brasil no mês passado”, sabendo que não fez isso. Eu imputei determinado fato (então, não pode ser injúria). Aí eu tenho que analisar se este fato está previsto como crime ou não. Se está previsto como crime é calúnia. Se não, mas é desonroso, difamação. Assalto a banco é crime. Portanto, calúnia. Agora vamos às questões de concurso. Vamos começar facinho até chegar uma questão da magistratura aqui de SP que rodou galeras. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Eu estou conversando e digo: “sabe fulana? Ela roda bolsinha, tanto que o apelido dela é ventilador.” Calúnia, difamação ou injúria? Eu imputei determinado fato a essa menina ventilador? Sim. Então, injúria não pode ser. Rodar bolsinha na esquina é fato desonroso ou criminoso? Desonroso. Então é difamação. “Fulano sustenta banca de jogo do bicho.” Calúnia, difamação ou injúria? É fato determinado ou qualidade? É fato determinado, então, vocês já podem esquecer a injúria. Agora ficou a calúnia e ficou a difamação. E aí, é fato criminoso? Não. Contravenção penal cai na difamação. É fato desonroso. Fato desonroso abrange contravenção penal. Então, imputação de contravenção penal é difamação. Sabe qual é o problema disso? É que se é difamação, pouco importa se é verdadeiro ou falso. Se fosse crime, só pune o sabidamente falso. Entenderam a questão? Mas vamos explorar isso daqui a pouco. Tudo isso vamos explorar durante a análise dos três tipos penais. Só mais duas observações e começo calúnia. “Tá vendo aquele policial militar? Eu encontrei ele tendo relações homossexuais com seu colega de farda no quartel.” eu imputei determinado fato. Calúnia ou difamação? Calúnia! É que relação homossexual ou não, é crime no CPM. Sendo a relação homossexual ou não, se é feita nas dependências da instituição militar, é crime. Agora olha o que caiu na magistratura/SP, 2ª fase. Olha como o examinador é cruel: “A imputou a B, sabendo que era falso, a prática de jogo do bicho. B, ofendido na sua honra, entrou com uma queixa-crime e descreveu que lhe foi imputada uma contravenção penal mentirosa, mas capitulou como calúnia. Você, juiz, receberia ou rejeitaria a queixa?” entenderam o problema? Fulano pratica jogo do bicho. Isso é contravenção penal. A vítima entrou com uma queixa-crime. Descreveu certinho, mas na hora de capitular, ao invés de colocar difamação (porque contravenção penal é só fato desonroso), capitulou como calúnia. Você rejeita ou recebe? Você recebe, inclusive, você diz o quê? Ao juiz você narra os fatos. Se aquela capitulação está errada, lá na frente, eu corrijo, no momento da emendatio libelli. Era o que vocês iam responder? Pois bem: resposta: rejeita a queixa-crime. Qual era a posição do examinador? Ele era adepto da Teoria Social da Ação. Ele entendia que o jogo do bicho tinha sido revogado pelo costume e não era mais ofensivo à honra. Olha que loucura! Todo mundo que se deparou com essa questão, fez o quê? Falou que ao juiz se narra os fatos e que no momento oportuno ele corrige o libelo, art. 383, e teve gente que diferenciou emendatio de mutatio. “Arrebentei!” não! Você se f*!! Você tinha que ter rejeitado a queixa porque o fato é atípico. Você não está imputando um fato desonroso porque a contravenção penal do jogo do bicho não existe mais. Foi revogada pelo costume. Acho que uns três acertaram. E esse examinador foi questionado: “eu não coloquei minha posição. A questão foi discursiva. Eu queria que eles colocassem todas as posições e eles não colocaram. É ou não é sabido que existe discussão sobre se a contravenção penal jogo do bicho foi ou não revogada pelo costume? É posição reconhecida e que queria que eles explorassem isso também.” Mas por que você deu ZERO??? 1. CALÚNIA – Art. 138 Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 No art. 138 você vai acrescentar e quem tem o código acrescenta também a seguinte expressão: Calúnia Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente DETERMINADO fato definido como crime: Pena - detenção, de seis (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. Você vai ver que é importante, ao ler o art. 138, enxergar essa expressão “DETERMINADO”. Esse “determinado” é importante vocês enxergarem e daqui a pouco vão entender porquê. Pergunto: quem é o sujeito ativo? Quem é o sujeito ativo da calúnia? Exige alguma qualidade ou condição especial do agente? Não. Mas cuidado com a resposta! Porque o sujeito ativo é “qualquer pessoa, salvo as pessoas detentoras de inviolabilidade.” Quem são elas? Parlamentares: deputados, senadores, vereadores no limite do município. Advogado tem inviolabilidade para calúnia? Tem ou não tem? Advogado no exercício da função é imune à calúnia, sim ou não? Art. 7.º, § 2º, do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil. Esse dispositivo diz o seguinte: § 2º O advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria, difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos que cometer. Vejam que esta imunidade não abrange a calúnia. Então, o advogado tem imunidade profissional para difamação e injúria. Não abrange calúnia. Quem é a vítima de calúnia? Quem é o sujeito passivo da calúnia? Também qualquer pessoa. Perguntas de concurso: Menor inimputável pode ser vítima? 1ª Corrente: “Calúnia nada mais é do que imputar crime. Conclusão: como menor não pratica crime, não podendo ser vítima de calúnia, mas de difamação.” 2ª Corrente: “Calúnia é imputar fato previsto como crime. Conclusão: menor pratica fato previsto como crime chamado ato infracional, podendo ser vítima de calúnia.” Prevalece a segunda corrente. “Pessoa jurídica pode ser vítima de calúnia?” O STF já decidiu isso. Diz o quê? Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 “STF – Não pode ser vítima de calúnia, pois pessoa jurídica não pratica crime, só podendo ser responsabilizada penalmente em caso de infrações ambientais.” Vejam, ser responsabilizada penalmente, não significa que ela possa praticar crime. Pessoa jurídica não pratica crime, n em mesmo os ambientais. Ela é responsável penalmente por eles no sistema da dupla imputação. Tudo isso vocês viram com o Sílvio Maciel. Ela não pratica crime, nem mesmo os ambientais. Só pode ser responsabilizada penalmente neste caso, logo, não pode ser vítima de calúnia. Agora, cuidado! Dependendo do que você falou, você pode ter atingido a pessoa do dirigente da pessoa jurídica, aí ele é vítima da calúnia. Dependendo de como tenha sido colocada a calúnia, você atinge a honra dos diretores da pessoa jurídica. Eles podem ser vítimas. Claro! A próxima pergunta que eu faço é a seguinte: “morto pode ser vítima de calúnia?” Cuidado! Se você responder que pode, é o morto que vai ter que entrar com a queixa-crime e eu não quero ser promotor nesse caso. Morto pode ser vítima?? Não! Leiam o art. 138, § 2º e cuidado com pegadinha em concurso: § 2º - É punível a calúnia contra os mortos. Uma coisa é a calúnia contra os mortos ser punível, outra coisa é dizer que o morto é a vítima. É punível a calúnia contra os mortos, mas a família do morto figura como vítima. “É punível a calúnia contra o morto, figurando como vítima sua família, interessada na manutenção do seu bom nome.” Esse, inclusive, é um crime vago, aquele crime cujo sujeito passivo é um ente sem personalidade jurídica (in casu, a família). Pergunta que só tem no meu livro: “é punível a autocalúnia?” Só tem no meu livro isso! Como assim, autocalúnia? É punível, não no crime contra a honra, mas contra a administração da Justiça. É o tipo 341, do CP. A autocalúnia pode configurar crime contra Administração da Justiça. Autoacusação falsa: Auto-Acusação Falsa Art. 341 - Acusar-se, perante a autoridade, de crime inexistente ou praticado por outrem: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, ou multa. Você assume a paternidade de um crime que não é seu, ou de um crime que não existe. Caiu no MP em SP no concurso em 2005, salvo engano. Isso é uma autocalúnia. Não é punida como crime contra a honra, mas é crime contra a Administração da Justiça. Questão boa que vai cair em concurso. Calúnia contra Presidente da República, Presidente do Senado, Presidente da Câmara, Presidente do Supremo – crime contra honra desses personagens pode ser crime contra a segurança nacional. Quando FHC assumiu, surgiu um dossiê nas Ilhas Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Caiman. Criaram um dossiê dizendo que FHC tinha contas em paraísos fiscais. Aí a PF descobriu que aquele dossiê era mentiroso, que foi só para divulgar a calúnia. Pergunto: foi crime contra a segurança nacional? Sim, mas só se tiver motivação política. Se não tiver motivação política, é crime contra a honra comum. Então, crime contra a honra desses personagens pode ser contra a honra nacional se tiver motivação política. Se não tiver motivação política é crime comum. O que pune o art. 138? Vejamos rapidamente. Vocês já têm isso no caderno, mas eu preciso partir desse ponto. O art. 138 pune “imputar fato determinado previsto como crime sabidamente falso”. O “imputar” pode ocorrer de forma explícita ou implícita. Nós temos que lembrar também que nós estamos diante de um delito de execução livre. Isto é, pode ser praticado por palavras, escritos, gestos, etc. Quando eu digo “fato previsto como crime” não abrange contravenção penal. Contravenção penal configura difamação. Vou insistir muito nisso! Então, essa parte introdutória é só para ter certeza que vocês entenderam o básico do delito. Essa questão caiu em concurso: calúnia é você imputar a alguém um crime inexistente sabendo que é inexistente ou é imputar a alguém um crime que existe, mas você sabe que aquela pessoa não foi autora? É somente a imputação subjetiva ou as duas hipóteses? E aí? As duas formas configuram calúnia. “Haverá calúnia quando o fato imputado jamais ocorreu (falsidade que recai sobre o fato) ou, quando real o acontecimento, não foi a pessoa apontada (falsidade que recai sobre a autoria do fato).” As duas hipóteses configuram calúnia! Agora, vocês acham que a honra é um bem disponível ou indisponível? A pessoa consente em ser ofendida na sua reputação. Exclui o crime? Se você for ler em livros muito antigos, de Nelson Hungria, no começo, doutrinadores muito clássicos, diziam que a honra é um bem indisponível. Esqueça! Hoje prevalece que a honra é um bem disponível. Agora, vejam o art. 138, §1º, que pune: § 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga. Quem estou punindo no §1º? O fofoqueiro. O caput pune quem cria a calúnia. O § 1º pune o divulgador. Você, MP, tem que analisar se está diante do criador da calúnia, ainda que ele esteja divulgando (caput) ou se está diante de um divulgador (aí é § 1º). os dois têm a mesma pena, mas vai ter um reflexo importante daqui a pouco. Criador, caput; divulgador; § 1º. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 O crime é punido a título de dolo, sendo indispensável a vontade de ofender a honra. Agora, vejam: no caso do caput, do criador, o dolo é direto ou eventual. Já no caso do §1º, de quem só divulga, a doutrina diz: o dolo só é direto. Não se pune o dolo eventual do mero divulgador. Taí a importância de você saber se está diante do caput ou do § 1º. Vejam que no § 1º o dolo eventual é impunível. É imprescindível a vontade de ofender a honra. Isso significa que animus jocandi não há crime. O que é animus jocandi? Brincadeira. Vontade só de brincar. Brincadeira de mal-gosto não é crime porque não há dolo necessário para sua configuração. A mesma coisa aplica-se para o animus narrandi. Esse é o animus da testemunha. Também não há crime. Se ela está com o espírito de apenas narrar o fato, sem intenção de ofender a honra, não há crime. Também não há crime no animus criticandi. E não há crime no animus consulendi. Vontade de só aconselhar. Também não há crime. Animus corrigendi. Vontade de corrigir. E, por fim, não há crime no animus defendendi. De autodefesa. Em nenhuma dessas hipóteses há dolo caracterizador do delito. Quando que o crime se consuma? O momento consumativo está umbilicalmente ligado ao tipo de honra. A calúnia ofende a honra objetiva, o que terceiros pensam de mim. Então, quando se consuma? Quando terceiros tomarem conhecimento do que eu disse. “A calúnia se consuma no momento em que terceiro toma conhecimento da imputação criminosa, independentemente do efetivo dano à reputação ofendido.” Se eu estou dizendo isso, estou afirmando que o crime é formal. Estou diante de um crime formal. Admite tentativa? Calúnia admite tentativa? Em regra, não, salvo quando praticada por escrito e for interceptada pela própria vítima. Quando o bilhete ou a carta for interceptada por terceiro que ler o seu conteúdo, é óbvio que está consumado. Se interceptada pela própria vítima, tentativa de calúnia. Carta caluniosa interceptada por terceiro que não a vítima, crime consumado. Vamos imaginar que eu vou caluniar alguém por escrito e me valho de um telegrama. Você liga para a telefônica, você dita a mensagem, a pessoa lá materializa a mensagem e manda o telegrama. Pergunto: esse telegrama foi interceptado pela própria vítima. Tentativa? Não, porque terceira pessoa já tomou conhecimento quando materializou. Então, no caso do telegrama e no fonograma, a consumação ocorre no momento em que o funcionário está recebendo a mensagem. “Ah, Rogério, mas eles têm que manter sigilo.” Não importa! Importa é que, para ele, a sua reputação já foi para o beleléu. Vocês anotaram que o crime de calúnia é imputar fato criminoso sabidamente falso. Você toma uma queixa-crime. Uma pessoa entra com uma queixa-crime imputando a você uma calúnia, mas você pensa: “puxa, mas esse fato é verdadeiro.” você tem como provar a verdade nesse caso? É possível fazer prova da verdade do que você está falando? É. O § 3º, do art. 138, diz o seguinte: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 § 3º - Admite-se a prova da verdade, salvo: Vamos colocar o que vem a ser essa exceção da verdade que nada mais é do que o expediente para provar a verdade: “Incidente processual, forma de defesa indireta através da qual o acusado pretende provar a veracidade do que alegou.” Olha que interessante: então, A ingressa com uma queixa imputando calúnia a B. B entra com uma exceção da verdade para provar a veracidade do fato. Agora, vejam: a procedência da exceção da verdade gera o quê? O que acontece com B? Vai ser absolvido por fato atípico. E por que é absolvição por atipicidade? Porque a falsidade é elementar do tipo. Se você prova que é verdade, o tipo perde uma elementar. Agora, vejam, excepcionalmente em três hipóteses não se permite a prova da verdade. Quais são esses casos em que não se permite a prova da verdade? São os incisos I, II e III do mesmo parágrafo: I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível; II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do Art. 141; III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível. Nestas hipóteses, você não pode alegar exceção da verdade. “Então, Rogério, o que eu faço pra me defender?” Diga que não foi você, diga que não teve a intenção, diga que está prescrito, menos buscar provar a verdade que a lei não deixa. Vamos compreender essas três hipóteses que são difíceis de se compreender. Inciso I – Vamos imaginar um crime de ação privada. Quem me lembra de um crime bobo, comum? Antigamente eu dava o exemplo do estupro (imaginando que o estupro seja ainda de ação privada). A imputou a B o estupro de C. O que B faz? Entra com uma queixa por calúnia contra A. B se sentiu caluniado por ter A imputado-lhe o estupro. Pode A provar a verdade desse estupro? Não, porque somente C, vítima do estupro, pode discutir esse fato. Se C preferir o silêncio, você não pode deixar A fazer o trabalho que a lei diz que é só de C. Se C prefere o silêncio, A não pode revelar o que C não quer revelar. “Rogério, mas hoje estupro não é mais de ação privada. Então, dá para você arrumar um crime que seja de ação privada?” Então, hoje, ao invés de estupro, trabalhem, por exemplo, com exercício arbitrário das próprias razões. Eu coloquei estupro para você enxergar melhor. Agora, substitui. Então, A imputou a B o exercício arbitrário das próprias razões contra C. B, sentindo-se caluniado, entrou com a queixa. A pode provar esse exercício arbitrário das próprias razões? Não! Só C pode. Se C quer o silêncio, A não pode desrespeitar. Inciso II – “Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido: I - contra o Presidente da República, ou Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 contra chefe de governo estrangeiro.” Calúnia contra Presidente da República não admite exceção da verdade. Calúnia contra chefe de governo estrangeiro não admite exceção da verdade. Por quê? Razões políticas e diplomáticas ditam a vedação. Inciso III – Vamos entender isso. Olha que interessante. Vamos supor que A imputou a B o homicídio de C. Por este homicídio B foi absolvido definitivamente. Então, A imputou a B o homicídio de C. B já foi processado e absolvido. B ingressa com uma queixa contra A. A pode provar a verdade desse homicídio? Não. Se eu permitir a A provar a verdade desse homicídio eu estou afrontando a coisa julgada, eu estou exumando fato acobertado pelo manto coisa julgada, gerando insegurança jurídica. Não pode! Agora, vejam, vocês escreveram que a exceção da verdade é uma espécie de defesa indireta. Olha um argumento. O Código Penal de 1940 traz vedações ao direito de provar a verdade. A CF/88 garante a ampla defesa, ou seja, já estão alegando que o § 3º, I, II e III não foram recepcionados pela Constituição Federal porque estão limitando defesa. Se a exceção da verdade é defesa indireta, vedar a exceção da verade nessas três hipóteses é restringir a defesa. Então, tem gente dizendo que esses incisos não foram recepcionados pela Constituição Federal. Para esta corrente, é possível exceção da verdade, sempre, na calúnia. Tem julgados nesse sentido no TJ/MG, mas não é o que prevalece. Me ajudem no seguinte: qual é a segunda hipótese que não se admite exceção da verdade? Crime contra a honra do Presidente da República. Vamos supor que eu chegue em casa e diga para minha mãe em 1991: “mãe, o que está acontecendo no Governo Collor? Parece que loteou o governo, parece que é um governo de corrupção.” Falo isso para minha mãe e Colllor fica sabendo. Ingressa com uma queixa-crime contra mim dizendo que eu o caluniei. Eu, naquela época poderia entrar com exceção da verdade? Não. Mas a minha mãe, quando eu falei isso, sabe o que ela falou? “Rogério, tem 15 milhões de jovens fazendo passeata para retirá-lo do Governo. Isso que você falou é público e notório.” Ele entra com uma queixa-crime contra mim, eu não posso fazer prova da verdade, sendo que é público e notório? Entenderam? O que vocês fariam? O que vocês alegariam? Tem algum expediente? Pessoal, o art. 523, do CPP, traz dois expedientes: Art. 523 - Quando for oferecida a exceção da verdade ou da notoriedade do fato imputado, o querelante poderá contestar a exceção no prazo de 2 (dois) dias, podendo ser inquiridas as testemunhas arroladas na queixa, ou outras indicadas naquele prazo, em substituição às primeiras, ou para completar o máximo legal. Tem uma exceção para esse caso. Chama-se exceção da notoriedade! Isso caiu para defensor público/ES. Qual é a finalidade da exceção da verdade? Provar a verdade. E se você conseguir provar a verdade, resultado: absolvição por atipicidade. Mas o art. 523, do CPP prevê também a exceção de notoriedade. Se você consegue Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 provar que o fato não é verdadeiro, mas que é público e notório, o que eu tenho aqui? Absolvição por crime impossível. Se a reputação dele já estava mais por baixo que cu de foca, que era público e notório, aqui também gera absolvição por crime impossível. Não foi você que deu conhecimento a terceiros. Terceiros já conheciam aquilo. Então, eu não vou provar que era verdade porque a lei não me permite, mas eu vou provar que é público e notório. Se chegou ao conhecimento de terceiros, não foi por intermédio do que falei. Terceiros já conheciam. A reputação dele já estava ofendida suficientemente. Importante isso! Exceção de notoriedade. Caiu para defensor/ES. 2. DIFAMAÇÃO – Art. 139, do CP Difamação Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe (DETERMINADO) fato ofensivo à sua reputação: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa. Não se esqueçam do “DETERMINADO”. Na próxima aula, vocês vão entender por que eu insisto no determinado. Quem pode ser sujeito ativo? A resposta é praticamente a mesma da calúnia. Mas aqui tem um detalhe importante. É qualquer pessoa, mas cuidado com os invioláveis. Cuidado com imunidades, lembrando dos Parlamentares. E aqui eu pergunto: advogado tem imunidade na difamação? Tem. Só não tem na calúnia. Difamação e injúria tem: art. 7º, § 2º, do Estatuto da OAB. Advogado só não tem imunidade na calúnia, mas tem na difamação e na injúria. Sujeito passivo: qualquer pessoa. Pessoa jurídica pode ser vítima de difamação? Posição do STF: pode ser vítima, pois tem honra objetiva, isto é, tem reputação a ser preservada. Então, o STF entende que pessoa jurídica pode ser vítima, sim, de crime de difamação porque tem honra objetiva, tem reputação a ser preservada na sociedade. Mirabete diz que não. Ele diz que não pode ser vítima de nenhum crime contra a honra. E por que entende que não pode? Porque o Capítulo V só protege honra de pessoa física. O Supremo já pacificou essa questão. Para o STF, pessoa jurídica pode ser vítima de difamação,s im! Para Mirabete não pode ser vítima de nenhum crime contra a honra porque o Capítulo V só protege honra de pessoa física. Não lembrou da pessoa jurídica. Conduta punida – O art. 139 pune imputar fato desonroso. Aqui é a mesma coisa: o imputar pode ocorrer de forma implícita ou explícita e eu estou diante de delito de execução livre. Até aqui, sem novidades. Também sem novidades o que vou falar agora. Quando eu digo fato desonroso, abrange contravenção penal. Lá na calúnia, vimos que o caput pune o criador e o § 1º pune quem propaga ou divulga. E na difamação, existe algum parágrafo específico para quem propala ou divulga? Pergunto: pune-se o fofoqueiro? A maioria entende que o fofoqueiro também difama e isso está no caput. Criador e divulgador estão no mesmo dispositivo: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 art. 139 caput. A maioria diz: quem cria difama e quem divulga também difama. Então, o caput pune o criador e o divulgador. Questão boa para concurso. Quem divulga acaba difamando novamente. O crime é punido a título de dolo, direto ou eventual, também sendo imprescindível a vontade de ofender a honra. Ou seja, todos aqueles ânimos: jocandi, narrandi, consulendi, etc, excluem o dolo. E quando se consuma? Tem novidade na consumação? Não, porque vimos que a consumação vive da honra ofendida, que é a mesma honra da calúnia. A difamação se consuma quando terceiros tomam conhecimento da imputação desonrosa. Admite tentativa? Admite, na forma escrita. Carta desonrosa interceptada pela própria vítima. É possível exceção da verdade? Nós vimos que no crime de calúnia, a regra é que se admite. E com uma observação: sua procedência gera absolvição por atipicidade. Excepcionalmente, não se admite. Isso foi o que vimos na calúnia. Agora, estou na difamação e fica mais fácil para compararmos. É possível exceção da verdade (fazer prova da verdade que se alegou) na difamação? Vamos ao §único: Parágrafo único - A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções. Então, é possível a exceção da verdade? Sim, mas em regra não é cabível. Na difamação, em regra, não se admite. Excepcionalmente se admite. Quando? Quando há ofensa contra funcionário público e é uma ofensa relativa à função. São dois requisitos para permitir a exceção da verdade. Ofensa contra funcionário público tem que ser ofensa relativa à função: ofensa propter oficio. Só nesta hipótese é que se admite exceção da verdade na difamação. Não basta ofender funcionário público para poder provar a verdade. Você tem que ofender funcionário público e essa ofensa tem que ter relação com a função. Aí, sim, será permitido a você provar a verdade porque a Administração tem interesse em saber se é verdade ou não o que você falou. É a única hipótese. Sua procedência gera o quê? Vocês viram que na calúnia a procedência gera absolvição por atipicidade. E por que gera absolvição por atipicidade na calúnia? Porque a falsidade é elementar do tipo. E na difamação, a falsidade é elementar do tipo? Não é! Pouco importa se o fato é verdadeiro ou falso. Tanto pouco importa se o fato é verdadeiro ou falso, que não se admite exceção da verdade em regra. Então, se você conseguir provar a verdade sobre o que você falou a respeito desse funcionário público em razão da função, você vai ser absolvido. Sem dúvida gera absolvição. Mas qual o fundamento dessa absolvição? Não pode ser a atipicidade porque é a falsidade ou não da elementar do tipo. Então, gera absolvição por quê? É uma hipótese especial de exercício regular de direito. Sua procedência geral absolvição, sendo hipótese especial de exercício regular de direito. Então, seu fato é Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 típico, mas não é ilícito, salvo se você adotar a tipicidade conglobante de Zaffaroni que LFG adaptou. Aí nem é típico. Agora, presta atenção: pergunta mega thunder: qual é o único caso que cabe exceção da verdade na difamação? Crime contra a honra de funcionário público. Existe funcionário público na Constituição Federal? Qual é o termo correto? Servidor público. Cabe exceção da verdade quando a difamação é contra Presidente da República? Calúnia contra Presidente não cabe exceção da verdade. Tem proibição expressa. E difamação contra Presidente da República, cabe exceção da verdade? EU andei dizendo que o Presidente anda trabalhando bêbado e ele entra com uma queixa-crime contra mim. Eu posso provar a exceção da verdade, provando que ele trabalha bêbado? A lei diz que se for funcionário público, eu posso entrar com a exceção da verdade. Mas e sendo Presidente da República, eu posso ou não? Não posso. “A exposição de motivos do Código Penal, no seu item 49, alerta que a exceção da verdade na difamação não alcança Presidente da República pelas mesmas razões do art. 138, § 3º, II, do CP.” O problema é que a exposição de motivos do Código Penal não é lei. É uma interpretação doutrinária. Por isso tem gente que discute. Isso no CP. A exposição de motivos no CPP é lei. Cabe exceção de notoriedade na difamação? Cabe também. Então, essa história de você falar que a menina fica rodando bolsinha na esquina. Se ela entrar com uma queixa-crime contra você, não adianta você querer provar que o fato é verdadeiro. Não te socorre em nada. Ajuda se você comprovar que o fato era público e notório. Vamos supor que eu diga que uma artista global fez filme pornô. Ela entra com uma queixa-crime contra mim. Mas o filme está entre os mais vendidos. Isso é público e notório. 3. INJÚRIA – Art. 140, do CP Injúria Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade (honra subjetiva) ou o decoro: Pena - detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa. Eu quero perguntar o seguinte: quem pode ser sujeito ativo do delito? Ele exige alguma condição especial do agente? Não. Logo, o crime é comum. Mas eu ensinei vocês a responder essa pergunta. Se te perguntarem quem é sujeito ativo na injúria, vocês vão dizer que o sujeito ativo é qualquer pessoa, mas cuidado com as imunidades. Quem detém imunidade nas suas palavras e opiniões não pratica calúnia, não pratica difamação, não pratica injúria. Exemplos: senadores, deputados federais, deputados estaduais ou distritais, vereadores nos limites do município que exerce a vereança. Vereador também tem imunidade absoluta, também tem imunidade material no limite em que exerce a vereança. Agora, a pergunta vai envolver: e o advogado? Ele tem imunidade? Vocês viram comigo que ele não tem Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 imunidade na calúnia. Tem imunidade na difamação e tem imunidade profissional na injúria. Só relembrando que este é o art. 7.º, § 2º, do Estatuto da OAB. Injúria e difamação ele tem. Calúnia, não. E, aliás, o Supremo acabou de decidir isso. Tem uma decisão deste ano que não reconheceu imunidade para advogado na calúnia contra promotor. Se o Supremo decidiu isso este ano, pode ter certeza: vai ser pergunta da prova do Cespe. Lembrem-se: advogado tem imunidade profissional, mas só para difamação e injúria. Vocês estão lembrados da pergunta que eu fiz na calúnia: é possível autocalúnia? E a resposta foi que era possível, sim, mas não em crime contra a honra, mas em crime contra a administração da justiça. É o crime de autoacusação falsa. Eu quero saber de vocês se a autoinjúria é punida. Uma pessoa se autoinjuriar. Você consegue imaginar? “Ah, eu sou um idiota.” Você pode ser punido por isso? Então, a resposta é: em regra, não. Salvo quando a expressão ultrapassa a ordem da personalidade do indivíduo. Então, em regra, não se pune a autoinjúria, salvo quando a expressão injuriosa ultrapassa a órbita da personalidade do indivíduo. Quem me dá um exemplo? “Ai, eu sou um corno.” Se você está dizendo que é corno é porque sua esposa te traiu. Ou seja, o fato de você admitir ser corno, você está injuriando alguém. A expressão que você utilizou ultrapassou a órbita da sua personalidade. Uma questão importante é a seguinte: quem pode ser sujeito passivo? Quem pode ser vítima de injúria? Ora, você vai encontrar em livros afirmação que é qualquer pessoa. Não é bem assim. É qualquer pessoa com capacidade de entender a expressão ofensiva. Isso significa que o sujeito passivo tem que ter capacidade para entender a ofensa contida na expressão. Isso porque o crime ofende a dignidade e o decoro. Se você não entendeu a ofensa contida na expressão, a sua dignidade ou decoro não foi atingida. Chegar para uma acriança de três anos e falar: “sua anencéfala!” ela vai entender? Ou seja, não tem condições de entender. Me tira uma dúvida, chamar alguém, “Filho da puta!”, quem é a vítima, o filho ou a puta? Os dois? Concurso formal! Mas é verdade. Vocês já pararam para pensar?! “Fulano, você é um filho da puta”. Você pode entrar com a queixa crime ou tem que avisar a puta da sua mãe? Vocês pensam que isso é brincadeira? Caiu na fase oral de concurso público. O examinador chegou e perguntou: “doutor, sabe aquela expressão, ‘filha da...’? quem é a vítima da injúria? O filho ou a mãe?” Eu, particularmente, acho que é a mãe porque ser filho não é injurioso. Injurioso é ser puta. Mas o examinador entendeu diferente. Nessa injúria, você é a vítima porque ele falou aquilo para ofender a sua honra, não a honra da sua mãe. Eu não concordei, mas foi a resposta do examinador que falou que a expressão “filho da puta” é para ofender a honra do filho e não a da mãe. É para o filho entender-se um bastardo. Caiu isso em concurso. Ele não falou “puta”. Falou “filho da”. Pessoa jurídica pode ser vítima de injúria? Tem como você injuriar uma pessoa jurídica? Não. Não por quê? Porque pessoa jurídica não tem honra subjetiva. Não tem dignidade ou decoro. Aliás, não se esqueçam. Mirabete entende que pessoa jurídica não pode ser vítima de nenhum crime contra a honra pois o capítulo só protege a honra das pessoas físicas. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 É punível injúria contra os mortos? Vamos rever: é punível calúnia contra os mortos. Tudo bem, lembrando que a vítima é a família. A família do morto é a vítima. Não é punível difamação contra os mortos. Não é punível a difamação contra os mortos. Eu falei isso e fiz uma observação: a Lei de Imprensa punia a difamação contra os mortos, mas a Lei de Imprensa não foi recepcionada. Isso significa que difamação contra os mortos não é punível nem mais por Lei da Imprensa. Agora eu quero saber da injúria. Anotem a resposta: não é punível injúria contra os mortos. A mesma observação tem que ser feita: a Lei de Imprensa punia a injúria contra os mortos, mas a Lei de Imprensa não foi recepcionada. Logo, a injúria contra os mortos não é punível nem mesmo por meio da imprensa. Já caiu isso em concurso: “como tratar a ofensa contra a honra dos mortos. Você tem aqui a resposta: como tratar a ofensa contra uma calúnia, contra uma injúria, contra uma difamação e o que aconteceu com a Lei de Imprensa. O que o art. 140, do CP, pune? “injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou decoro.” A conduta punida é “injuriar alguém” e como você pode injuriar alguém? Simples. Atribuindo qualidade negativa. Pronto. Assim, você passa a injuriar alguém, atribuindo-lhe qualidade negativa. Agora vejam, cuidado! É um crime de execução livre. O que significa isso? Pode ser praticada por palavras, por escritos, por gestos. Pode ser praticado por ação ou omissão. Isso já caiu em concurso: “dá um exemplo de injúria por omissão.” É o único exemplo que tem. Toda a doutrina dá o mesmo exemplo. É o único exemplo de injúria por omissão: não retribuir cumprimento. A pessoa vai te cumprimentar, você não retribui como forma de humilhá-la na frente das pessoas. É interessante o exemplo. Vocês repararam que, ao contrário da calúnia e da difamação, à injúria não se atribui fato. Portanto, cuidado! Essa é a observação mais importante da aula no que diz respeito à injúria. Vocês viram que imputar determinado fato criminoso é igual à calúnia. Vocês viram que imputar determinado fato desonroso é igual à difamação. E agora viram que atribuir qualidade negativa é injúria. Cuidado! No seu concurso vai cair: que crime configura imputar fato indeterminado a alguém? Fato genérico, um fato vago a alguém? Que crime configura? Vejam: não pode configura calúnia porque na calúnia o fato tem que ser determinado. Não pode configurar difamação porque na difamação o fato, igualmente, tem que ser determinado. Só sobrou injúria. Cuidado! Então, vejam que a imputação de fato pode, sim, ser injúria, desde que indeterminado, genérico, vago ou impreciso. Aí pode. Aí é injúria. Vocês entenderam por que eu insistia no código de vocês para vocês acrescentarem nos arts. 138 e 139 a palavra DETERMINADO em “fato”? Porque se for fato indeterminado é injúria, se assemelha a qualidade negativa. Entenderam essa observação? Agora, o que cai em concurso: diferencie injúria absoluta de injúria relativa. Já ouviram falar disso? Isso tem em dois livros: no de Manzini (caro) e no meu, que copiei de Manzini. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Injúria absoluta – É aquela expressão que é injuriosa em qualquer lugar em qualquer momento, em qualquer lugar e contra qualquer pessoa. “Injúria absoluta: a expressão tem por si mesma e para qualquer um significado ofensivo constante e unívoco.” Há um gesto que é universal. É uma injúria absoluta. Injúria relativa – É aquela expressão que será injuriosa dependendo do momento, do local ou da pessoa. “Injúria relativa: a expressão assume caráter ofensivo se proferida em determinadas circunstâncias de forma, tom, modo, tempo, lugar, pessoa, etc.” Isso caiu em concurso. Até porque já dá para perceber que a absoluta é mais severamente punida porque a ofensa parece ser mais clara. O delito é punido a título de dolo. Dolo com a vontade de ofender a honra subjetiva. É o animus injuriandi. Então, você quando diz aquilo para vítima, você diz para ofender a honra subjetiva dela, para ferir a dignidade, o decoro da pessoa. No mais, é só lembrar do que falamos da calúnia e da difamação. Estão lembrados do animus jocandi, criticandi, narrandi, consulendi, etc.? Tudo isso exclui o dolo. Agora quando o crime de injúria se consuma? Isso caiu em concurso. Nós vimos na aula passada que o momento consumativo do crime contra a honra está umbilicalmente ligado à modalidade de honra que ele protege. A calúnia e a difamação protegem a honra objetiva, então se consumam quando terceiros tomam conhecimento. Já injúria protege a honra subjetiva. Se consuma quando a vítima toma conhecimento, dispensando efetivo dano à sua honra. É crime formal. Então, a vítima tomou conhecimento da expressão injuriosa, o crime se consumou. Dispensa o efetivo dano. Basta a potencialidade. O crime é formal. A pergunta que caiu em concurso: cabe tentativa de injúria? 1ª Corrente: “Não se admite tentativa na injúria.” Para essa corrente é impossível. Essa corrente entende assim: se a pessoa da vítima é quem deve representar ou ingressar com a queixa-crime, no momento em que ela representa ou ingressou com a queixa-crime, ela mostrou que tem conhecimento, por essa razão, o crime estará sempre consumado. Tem farta doutrina neste sentido, mas não está certo. 2ª Corrente: Para essa corrente, quando a injúria é plurissubsistente, admite a tentativa. O que significa injúria plurissubsistente? A sua execução admite fracionamento. Quando a execução da injúria admite fracionamento, admite tentativa. O exemplo é o seguinte: eu ofendo um aluno. Antes dessa ofensa chegar ao conhecimento do aluno, ele morre. Esse fato não chegou ao conhecimento do aluno por circunstâncias alheias à minha vontade. O erro da primeira corrente é confundir possibilidade de tentativa com a possibilidade de condenação por tentativa quando a vítima ingressa com a ação Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 penal. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. É claro que se e vítima integrou com a queixa-crime, ela tomou conhecimento e o crime está consumado. Mas haverá casos em que a vítima não tomou conhecimento do crime por circunstâncias alheias à vontade do agente e o crime já existe na forma tentada, inclusive correndo prescrição. Esse exemplo é claro. Eu ofendi o aluno. O crime já está na forma tentada, correndo, inclusive, prescrição. O aluno, antes de tomar conhecimento morre. Pronto! É um crime de injúria tentado, que a família eventualmente vai querer processar, mas vai processar na forma tentada. Zaffaroni admite até a tentativa da injúria verbal. Você fala: “ô seu filho da ...” e nesse momento alguém coloca a mão na sua boca e não deixa você terminar. Zaffaroni diz que se você vai xingar, menosprezar, achincalhar alguém, no momento de fazer isso, se alguém tampa a sua boca, para Zaffaroni é tentativa, mesmo na forma verbal. Ele entende que houve o fracionamento da execução. Agora eu quero analisar se é possível ou não exceção da verdade na injúria. Você xingou: “seu idiota!” O cara entra com uma queixa-crime e daí você vai querer provar para o juiz que ele é um idiota mesmo. É possível exceção da verdade? Quando eu falei da calúnia eu disse que exceção da verdade, em regra, é admita e que excepcionalmente, não se admite. Isso quanto à calúnia. Quando falamos da difamação, vimos que é exatamente o contrário. Na difamação, em regra, não se admite. Excepcionalmente, admite-se. Vocês lembram qual é o único caso? Contra o funcionário público propter oficium, ou seja, a ofensa tem que ser a funcionário público e relativa ao exercício da função. E quanto à injúria? Na injúria não se admite exceção da verdade e não se admitem exceções. Então:  Calúnia: Regra –admite exceção da verdade/Excepcionalmente – não admite  Difamação: Regra – não admite exceção da verdade/Excepcionalmente – admite  Injúria: Regra – não admite exceção da verdade/Excepcionalmente – não admite Defensor público/ES – É possível exceção de notoriedade na calúnia? Sim, é possível exceção de notoriedade. Na aula de hoje estou revendo muitas coisas porque estou comparando os três. O art. 523, do CPP traz a exceção de notoriedade. É possível exceção de notoriedade na difamação? Vimos que é possível. Agora eu quero saber se é possível exceção de notoriedade na injúria. Eu não tenho como provar que você é um idiota, mas eu posso provar que é público e notório que todos te acham um idiota?    Calúnia: Cabe exceção de notoriedade na calúnia Difamação: Cabe exceção da notoriedade na difamação Injúria: Não cabe exceção de notoriedade. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 E por que não cabe exceção de notoriedade na injúria? Foi exatamente essa a pergunta de defensor/ES. Teve gente que não sabia nem o que era exceção de notoriedade. Não é possível na injúria? Por quê? Vamos ao art. 523, do CPP: Art. 523 - Quando for oferecida a exceção da verdade ou da notoriedade do fato imputado, o querelante poderá contestar a exceção no prazo de 2 (dois) dias, podendo ser inquiridas as testemunhas arroladas na queixa, ou outras indicadas naquele prazo, em substituição às primeiras, ou para completar o máximo legal. São duas as razões penas quais não se admite exceção da notoriedade na injúria: 1ª Razão: A injúria ofende a honra subjetiva, incompatível com a notoriedade, que está ligada à honra objetiva. 2ª Razão: Na injúria, atribuem-se qualidades, não se imputam fatos. A exceção da verdade ou notoriedade é atribuída ao fato. E quais são os crimes praticados mediante imputação de fato? Só a calúnia (fato criminoso) e difamação (fato desonroso) admitem exceção de notoriedade. Essa era a resposta correta na prova de defensor/ES do ano retrasado. Voltando ao art. 140, CP, desta vez ao § 1º. § 1º - O juiz pode deixar de aplicar a pena: I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria; II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria. Eu tenho um carinho por este § 1º porque caiu na minha prova. Meu examinador ficou com ele enchendo minha paciência. E qual é a natureza jurídica do § 1º quando diz que o juiz pode deixar de aplicar a pena? É perdão judicial e isso é importante porque se é perdão judicial, é ato unilateral. Dispensa concordância do perdoado. A natureza jurídica desse dispositivo, pois, é de perdão judicial. Dispensa a concordância de quem é perdoado. Só o perdão do ofendido tem que ser aceito. O perdão do juiz você não tem que aceitar. Ele é imposto. O juiz pode deixar de aplicar a pena, significa que é direito subjetivo do réu ou faculdade do juiz perdoar? Hoje é tranquilo. Cuidado! Sempre que você vê pode, guarda como “poder-dever”. Significa que, preenchidos os requisitos, o juiz deve perdoar. Esse “pode”, na verdade, é um “Poder-dever”. São duas as hipóteses em que cabe o perdão judicial  Primeira hipótese: A provoca B. B retruca e, com isso, realiza uma retorsão com injúria.  Segunda hipótese: A também provoca B e B devolve a provocação com a injúria. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 “Peraí, Rogério. Eu não estou entendendo nada. Nas duas hipóteses A provocou e B respondeu. Qual é a diferença?” é que na primeira hipótese, a provocação é diversa de uma injúria. Já na segunda hipótese, consiste numa injuria. A primeira hipótese é um tapa seguido de uma injúria. A segunda hipótese é uma injúria seguida de uma injúria. Se você não fica com esse esquema na cabeça, você não entende. Na primeira hipótese, A provocou. Ele provocou de qualquer modo, menos com injúria (um tapa no rosto, por exemplo). Já na segunda situação, ele provoca com injúria e recebe injúria de volta. É importante saber isso? É, porque o perdão judicial, na primeira hipótese é só para B. Agora, cuidado! Na segunda hipótese, o perdão judicial é para os dois. A e B são perdoados. Então, na primeira hipótese, se o juiz for perdoar alguém, só pode perdoar a B, que foi quem praticou a injúria em retorsão. Na segunda hipótese, o perdão do juiz alcança os dois, quem provocou com injúria e quem retorquiu com injúria. Isso é Nélson Hungria puro, e ele seguido por toda doutrina e jurisprudência. Agora, vamos para o § 2º, muito fácil, tranquilo, mas vai ser importante quando eu for falar da ação penal. Olha o que ele diz: § 2º - Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. Aqui, eu tenho a chamada injúria real. Injúria real, nada mais é, do que um injúria mediante violência ou vias de fato. Reparem, então, que a violência ou a vias de fato são meio. A injúria é o fim. Ele usa a violência para ofender a dignidade. Ele usa a vias de fato para ofender a dignidade. Nélson Hungria diz: mais do que a integridade física, o agressor quer atingir a alma. Mais do que o corpo, atinge-se a alma. A intenção dele não é ferir o seu corpo, mas a sua dignidade, seu decoro. Exemplos: puxões de orelha, de cabelo, cuspir em alguém (exemplo de injúria real de jurisprudência). Qual é a consequência da injúria real? Detenção de 3 meses a 1 ano, além da pena correspondente à violência. Vamos extrair algumas conclusões: Se for injúria real com vias de fato, a vias de fato fica absorvida. Reparem que a soma da pena ocorrerá apenas quando houver violência. Antes de estudar a segunda conclusão, eu quero saber o seguinte: quando ele diz que você vai responder também pelo crime correspondente à violência, qual é o concurso de crimes que ele está exigindo aqui? Material. Todo mundo concorda com isso? É o que prevalece na doutrina, mas eu vou dar minha humilde opinião que isso não está correto. Essa expressão “além da pena correspondente à violência” significa, para a doutrina, que o legislador quer, entre a injúria real e a lesão corporal, por exemplo, concurso material. Mas isso não está certo. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Olha que importante: temos concurso material quando duas condutas produzem dois resultados. Aí eu tenho soma das penas. Eu não tenho dúvida de que ele está exigindo soma das penas, eu não tenho dúvida de que ele está exigindo dois resultados. A minha dúvida é se houve duas condutas. Não houve duas condutas! Então, como é que você está dizendo que houve concurso material? “Ah, Rogério, porque tem dois resultados e somam as duas penas.” Mas tem um concurso, que eu não vou falar o nome, em que você tem uma conduta, produzindo dois resultados com soma das penas: é o concurso formal imperfeito. Então, quando a doutrina diz que é concurso material, esquece porque não é concurso material. Eu não tenho duas condutas! Eu tenho uma conduta produzindo dois resultados com soma de penas e isso é concurso formal impróprio, imperfeito, com desígnios autônomos, acabou. Vocês anotaram que prevalece concurso material! Mas não está correto, porque não há duas condutas para defender concurso material. Para defensoria pública: como criticar o art. 140, § 2º? Você deixaria seu assistido sofrer essa pena correspondente à violência? Quando ele diz além da pena correspondente à violência significa o quê? Qual é a pena da injúria simples? 1 a 6 meses ou multa. Agora, vejam: na injúria real, o que acontece? Por conta da violência ou vias de fato, a pena passou a ser de 3 meses a 1 ano. Isso significa que a violência gerou uma qualificadora. Como pode a violência gerar uma qualificadora e, ao mesmo tempo, soma das penas? Isso significa que você está considerando a violência duas vezes em desfavor do réu. Bis in idem. Só tem no meu livro isso. Você está usando a violência para qualificar o crime e, sem seguida, usa a mesma violência para somar as penas. Bis in idem. Isso é só para quem for prestar defensoria pública. É tese típica de defensoria pública. Você enxergar o bis in idem aqui você se diferencia tranquilamente. Vamos supor que você consiga incluir o bis in idem aqui, você detonou! Vamos para o último parágrafo da injúria. § 3º - Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência. Pena - reclusão de um a três anos e multa. Tenho certeza absoluta que vai cair esse crime. A Lei 12.033 mudou a ação penal para esse crime. Então, é certeza absoluta que vai cair. Por isso, eu quero analisar com calma. Nós temos aqui o que a doutrina chama de injúria qualificada pelo preconceito. É o que o Ratinho chama de racismo. Pergunto: é racismo? Não. Qual é a diferença do racismo? Vocês estão lembrados da historinha que contei no semestre passado? Vocês não podem confundir injúria preconceito com racismo. Vocês viram isso comigo semestre passado. Injúria-preconceito está no art. 140, § 3º, do CP e o racismo está na Lei 7.716/89. Na injúria preconceito o agente atribui qualidade negativa à vítima. Diferente do racismo. No racismo, o agente segrega a vítima, appartaid social, em razão de sua raça, cor, etc. No primeiro caso, ele usa a cor para atribuir à vítima qualidade negativa. No segundo caso, ele usa a cor para separar a vítima do convívio social (appartaid social). Então, no jogo de futebol, o jogador chamar o outro de macaquito ele atribuiu qualidade negativa ou segregou do convívio social? Atribuiu qualidade Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 negativa, injúria preconceito. Diferente de falar: “você não joga no meu time porque você é negro”, aí é racismo porque você está realizando verdadeira segregação (appartaid). Isso é muito importante porque tem consequências diversas. No caso da injúria preconceito, o crime é prescritível. Já no caso do racismo, o crime é imprescritível. Na injúria preconceito o crime prescreve. No racismo, não. É uma das duas hipóteses de imprescritibilidade previstas na Constituição. A injúria preconceito é afiançável. Já o racismo é inafiançável. Vocês têm essa tabela do semestre passado, mas já está desatualizada porque na tabela do semestre passado eu falei que a injúria preconceito era de ação penal privada. Pessoal, acabou! A injúria preconceito agora, com a Lei 12.033/09 é de ação penal pública condicionada. Quem tem essa tabela do semestre passado já está desatualizada. E o racismo? É de ação penal pública incondicionada. Não tem como errar mais. Vai cair essa tabela, por conta da Lei 12.033/09, que vamos aprofundar daqui a pouco. Compreenderam? Vejam que o art. 140, § 3º fala ainda em condição de pessoa idosa. “Seu velho babão!” Pena de 1 a 3 anos. É mais grave que rixa com morte. Você tem raiva de um idoso? Não xinga de velho babão, pratique uma rixa e mate o idoso, porque a pena é só de 6 meses a 2 anos. Se você chamar de velho babão, 1 a 3 anos. Então, não xinga. Pega e mata numa rixa, você paga cesta básica. É a proporcionalidade do nosso legislador. A pergunta que eu quero fazer, ligada ao § 3º do art. 140, pergunta mega thunder blaster blaster é a seguinte: o art. 140, § 1º permite perdão judicial na injúria quando o outro provocou. É possível perdão judicial na injúria quando a injúria é injúria preconceito? A pessoa deu um tapa na sua cara e você devolve o tapa com uma injúria fazendo referência à cor dela. Você pode ser perdoado? Você viu que é perfeitamente possível perdão judicial na injúria quando ela está retribuindo uma provocação, mas essa retribuição pode ser com injúria preconceito? Tem alguma proibição? Anote o seguinte: “O perdão judicial não alcança a injúria preconceito. Fundamentos:” a) “A posição topográfica do perdão judicial permite concluir não se aplicar ao § 3º.” Se o legislador quisesse perdoar a injúria preconceito, ele colocaria o perdão judicial como parágrafo de encerramento. Mas dizem que posição topográfica não é interpretação e se é, é uma interpretação pobre. b) “A injúria preconceito consiste em violação séria à honra da vítima, ferindo uma das metas fundamentais do Estado democrático de direito, logo, incompatível com o perdão judicial.” Vocês têm dois fundamentos para negar perdão judicial para a injúria preconceito. Com isso, nós terminamos a injúria, vamos para as disposições finais. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 4. DISPOSIÇÕES FINAIS – Art. 141, do CP Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido: Vamos parar por aqui e fazer algumas observações. 1ª Observação: O art. 141 não traz qualificadora. Ele traz causa de aumento de pena a ser considerada pelo juiz na fixação da pena definitiva, na terceira fase de aplicação da pena, no critério trifásico. 2ª Observação: É uma majorante aplicada a todos os crimes do capítulo: injúria, difamação e calúnia. O art. 141 aumenta a pena de qualquer crime contra a honra descrito no capítulo. Nenhum dos crimes escapa do aumento quando preenchidos os requisitos. Vocês vão ver que só esse aumento na calúnia, já faz ela deixar de ser de menor potencial ofensivo. O art. 141 c/c a calúnia já faz o crime sair do juizado especial e ir para o juízo comum. Caluniar uma pessoa é crime de menor potencial ofensivo, salvo se funcionário público. Caluniar funcionário público aí já não é mais de menor potencial ofensivo. Quer ver a importância do 141? Aumenta-se de 1/3 em quais hipóteses? I - contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro; Eu não preciso explicar muito, só fazer algumas observações. Por que nesse caso, do Presidente da República, a pena aumenta de 1/3? Isso porque se você ofende o Presidente da República, você ofende toda a nação. Ofender o Presidente da república é ofender todos os cidadãos. Ofenderam o Lula, sinta-se ofendido também. E por que aumenta a pena quando você ofende chefe de governo estrangeiro? “Ah, Rogério porque aí você ofende todos os cidadãos do mundo.” Não! Ofendendo o chefe de governo estrangeiro você pode estremecer relações internacionais da qual o Brasil participa. Relações internacionais pátrias. Agora vejam, cuidado. Aqui eu tenho que lembrar que, se houver motivação política contra o Presidente da República, você está fora do Código Penal. Você está na Lei de Segurança Nacional. II - contra funcionário público, em razão de suas funções; É a segunda hipótese que gera aumento de 1/3. Não basta ofender o funcionário público. A ofensa tem que ser propter oficium. Aí, sim, gera o aumento de 1/3. Por que tem esse aumento? Isso, diz a doutrina, é porque você prejudica o andamento da vida funcional dele. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Qual o conceito de funcionário público? Está no art. 327: Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. Esse é o funcionário público típico. § 1º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. O § 1º traz o funcionário público por equiparação. Pergunto: o aumento só incide quando o funcionário é o típico do caput? Aumenta-se de 1/3 quando o funcionário é só equiparado? Mirabete entende que aumenta a pena bastando ser funcionário público, não importa se típico ou atípico, se próprio ou equiparado. A pena é aumentada, não importando se o funcionário está no caput ou no § 1º. Eu particularmente discordo. Nós estamos diante de uma causa de aumento de pena. A interpretação deve ser sempre restritiva. Mas Mirabete e, parece que hoje, a jurisprudência se inclina nesse sentido: o funcionário público, sempre que referido no Código Penal, é o caput mais o § 1º. Eu, particularmente, acho que caput + parágrafo primeiro é só para funcionário público sujeito ativo, que é o conceito de funcionário público sujeito ativo. Vamos para a próxima majorante: art. 141, III, que traz mais de uma causa de aumento.: III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria. A primeira parte fala em crime praticado na presença de várias pessoas. O que é isso? O que são várias pessoa? Mais de uma? Mais de duas? Bento de Faria entende que várias pessoas são mais de uma. Nélson Hungria, junto com a maioria, discorda. Para ele há que ter, pelo menos, três. É óbvio que nesse mínimo de 3 pessoas, não vou computar coautores, partícipes e pessoas que não conseguem entender o que está sendo dito, pessoas que não conseguem compreender a expressão ofensiva. E a vítima, é computada? Pergunta de concurso. Em regra, não, salvo quando ela é testemunha de um outro crime contra a honra. Quem traz essa questão é Noronha. Vamos imaginar que A ofende B, C, D e E. Na ofensa de A contra B, eu não computo B, vítima. Mas comuto C, D e E, que, nesse caso, são testemunhas. Na ofensa de A contra C, é claro que não computo C, mas vou computar B, D e E, que são testemunhas. E por aí vai. Vejam que essa questão já caiu em concurso: quando há pluralidades de vítimas e as vítimas são testemunhas das outras vítimas, aí serão computadas como testemunhas. Vejam que aqui ele vai responder por 4 crimes contra a honra majorados. A próxima causa de aumento, também do inciso III, é certeza, vai cair em concurso: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria. Eu costumava dizer o seguinte: é uma calúnia por meio de alto-falantes, em palanques. Mas eu dizia que esse crime não abrange a imprensa porque crime contra a honra por meio da imprensa tem lei especial. E agora? Agora acabou. Agora crime contra a honra por meio da imprensa é crime contra a honra do Código Penal, mais o art. 141, III. Eu vejo muita gente comemorando, falando: crime contra a honra lá na Lei de Imprensa era mais severamente punido. Agora melhorou. Melhorou nada! Agora, crime contra a honra por meio da imprensa sempre vai sofrer o aumento do art. 141, III, 2ª parte. A Lei de Imprensa não foi recepcionada. Então, crime contra a honra por meio de imprensa cai aqui, no art. 141, III, 2ª parte. Vai ter candidato que nem vai se tocar. Que vai colocar calúnia, difamação e injúria e vai esquecer de ver que hoje, a imprensa, gera, inevitavelmente, o aumento do art.141, III, 2ª parte. Vamos para o inciso IV: IV – contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos ou portadora de deficiência, exceto no caso de injúria. O inciso VI aumenta a pena de 1/3 se o crime é praticado contra pessoa maior de 60 anos ou portadora de deficiência. Exceto no caso de injúria. Por que excepciona a injúria? Porque a injúria já tem uma qualificadora, que é a injúria preconceito, evitando-se o bis in idem. Ele tem que saber que a pessoa é maior de 60 ou portador de deficiência. O dolo dele tem que atingir todas as circunstâncias, ano só do inciso IV, mas as anteriores. O dolo do agente tem que abranger todas essas circunstâncias, condições e qualidades. Parágrafo único - Se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa, aplica-se a pena em dobro. Volto a dizer: causa de aumento de pena. Não é qualificadora. Você vai dobrar a pena na terceira fase. É uma causa de aumento. Você não vai aplicar o critério trifásico já com a pena em dobro. Tem gente falando em qualificadora? Sim. Eu, particularmente, acho que é causa de aumento de pena e isso é tranquilo. É o que a doutrina chama de ofensa mercenária. O parágrafo único traz o que a doutrina chama de ofensa mercenária. O agente age mediante torpeza. O art. 142 traz hipóteses de exclusão do crime. Exclusão do Crime Art. 142 - Não constituem injúria ou difamação punível: O art. 142 só é aplicável para injúria ou difamação. Eu sei que isso está explícito, mas na hora de você fazer a prova, vai esquecer que o art. 142, diferente do art. 141 que traz majorantes, traz exclusão de crimes e só exclui crime de injúria ou difamação. Não se aplica para calúnia. Ou seja, a calúnia, jamais será beneficiada pelas hipóteses do art. 142. Na sua prova, o examinador vai colocar: injúria, difamação ou calúnia. Esqueça a calúnia. A calúnia não está abrangida pelo art. 142. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 A segunda observação, antes de explicar os incisos é: qual a natureza jurídica do art. 142, do CP? 1ª Corrente: Causa especial de exclusão da ilicitude. Quem adota? Damásio. 2ª Corrente: Nós estamos diante de uma causa de exclusão da punibilidade. Quem adota essa segunda corrente? Noronha. 3ª Corrente: Trata-se de causa de exclusão do elemento subjetivo do tipo, isto é, da especial intenção de ofender. Quem adota? Eu coloquei na lousa, exatamente na ordem de preferência. Ou seja, prevalece a primeira. Agora, olha só: nós já podemos trabalhar uma quarta corrente. Damásio entende que as três hipóteses configuram ou o estrito cumprimento de um dever legal ou o exercício regular de um direito. E se ele tem razão, no que tange a ser estrito cumprimento de um dever legal ou exercício regular de um direito, eu posso aplicar aqui qual teoria? Tipicidade conglobante. Podemos acrescentar uma quarta corrente: 4ª Corrente: Para os adeptos da tipicidade conglobante, estamos diante de causa de atipicidade. A tipicidade conglobante tem caído em concurso. Vamos agora analisar as três hipóteses de exclusão do crime: I - a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador; (IMUNIDADE JUDICIÁRIA) Estamos diante da imunidade judiciária. Caiu em concurso. O inciso I, que traz a imunidade judiciária, abrange a parte e seu procurador. E advogado? O advogado, vocês já estudaram comigo. Vocês viram que ele está imune, não graças ao art. 142, mas graças ao art. 7.º, § 2º, do Estatuto da OAB. O advogado também está imune, mas o dispositivo para esse não é o art. 142. Antes do Estatuto até era, mas agora o estatuto é norma especial e vocês têm que citar norma especial. E o MP? A imunidade do MP está no art. 41, V, da Lei 8.625/93. E o juiz? Vai na Lei Orgânica da Magistratura que você não vai encontrar nada. Na discussão da causa, tem imunidade a parte, tem imunidade o procurador, tem imunidade o advogado, tem imunidade o MP. E o juiz? Dizem que o juiz é um expectador de pedra. A doutrina diz que o juiz também tem imunidade e ele vai usar o art. 23, do CP (estrito cumprimento do dever legal) o juiz dá a sentença e quando passa a adjetivar pessoas e comportamentos estará no estrito cumprimento do dever legal. Quando o juiz chama o estuprador de tarado, não vai responder por injúria porque ele entende que, assim agindo, está no estrito cumprimento de um dever legal. O juiz também está imune, mas ele não tem ma norma especial. Será aplicado o art. 23, do CP. Questão boa de concurso. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 A jurisprudência entende que essa imunidade do inciso I é relativa. Quando ficar inequívoca a intenção de difamar ou injuriar, ele vai responder. Apesar de não estar escrito isso aí, está implícito. É imprescindível que ele haja no exercício da função, no estrito cumprimento do dever legal. Se qualquer destes personagens extrapola, se excede, o excesso será punido. II - a opinião desfavorável da crítica literária, artística ou científica, salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar; O inciso II traz a chamada imunidade literária, artística ou científica. Vejam que o inciso II é muito claro: salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar. A crítica literária, artística ou científica tem uma imunidade relativa. Ela tem que agir como crítica. Se eu percebo que aquela crítica, na verdade, está camuflando uma verdadeira intenção de injuriar ou difamar, vai responder pelo crime. III - o conceito desfavorável emitido por funcionário público, em apreciação ou informação que preste no cumprimento de dever do ofício. O inciso III traz a chamada imunidade funcional. A imunidade do inciso I é relativa (o excesso é punido). A imunidade do inciso II é relativa (quando inequívoca a intenção de ofender, vai responder pelo crime). E a do inciso III? É absoluta ou relativa? Nélson Hungria e Fragoso defendem que esta imunidade é absoluta, ilimitada, irrestrita. Não é o que prevalece: funcionário público também será e deverá ser punido pelo excesso. Essa imunidade não agasalha quando presente o excesso. Sabe por quê? Se a sua imunidade é importante, a honra é constitucionalmente protegida. Nós temos um embate importante aqui e esse embate só é resolvido entendendo-se que o excesso será. O que estiver no âmbito do exercício da função, não, mas o excesso será punido. Então, você consegue preservar a imunidade e a honra. Há um parágrafo único que diz: Parágrafo único - Nos casos dos ns. I e III, responde pela injúria ou pela difamação quem lhe dá publicidade. Já caiu isso em concurso. Terceiros que dão publicidade para a injúria e para a difamação respondem pelo crime na imunidade judiciária e na imunidade funcional. Na crítica literária, não. Se uma crítica literária criticou um artista, é claro que o fez publicamente e se pode divulgar essa crítica para qualquer um. Agora, a opinião judicial, a opinião funcional, não. Estas têm que ficar restrita ao processo. Quem divulgar vai responder. Se eu, Rogério, ao pedir a condenação de um estuprador eu o chamo de tarado e alguém fala “fulano é tarado, estava no processo”, você que está falando isso é você que vai responder, eu não. Terminamos o art. 142, vamos ao art. 143, que trata da retratação. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Retratação Art. 143 - O querelado que, antes da sentença, se retrata cabalmente da calúnia ou da difamação, fica isento de pena. Primeira coisa: o que significa retratação? O querelado quer dizer o acusado na ação privada. Retratação significa confissão? Não. É muito mais do que isso. Retratarse é desdizer o que disse, retirar o que disse, trazer a verdade novamente à tona. Somente quando o querelado (acusado) retirar o que disse, devolver a verdade ao mundo, é que ele tem direito à isenção de pena. A retratação é uma causa extintiva da punibilidade unilateral. Dispensa concordância da parte contrária. Ela é analisada pelo juiz. Se o juiz entende que houve retratação e foi sincera, não precisa nem ouvir a parte contrária. É uma causa extintiva da punibilidade unilateral. Dispensa concordância da parte contrária. Agora presta atenção: ela extingue a punibilidade, mas não impede a consequência cível. A retratação isenta o querelado de pena, mas não isenta de responsabilidade civil. Se você caluniou alguém e se retratou, tudo bem. Você está isento de pena, mas vai responder pelos danos morais eventualmente causados. A isenção é só penal, não traz reflexos extrapenais. A retratação só é possível na calúnia e na difamação. Não existe retratação extintiva da punibilidade na injúria. Você pode devolver a verdade na calúnia e na difamação e está isento de pena. Na injúria, mesmo que retire o que disse, responderá pelo crime. Olha que interessante. Presta atenção que vai cair: a retratação só abrange calúnia e difamação. A Lei de Imprensa abrangia também injúria, mas não foi recepcionada. Isso significa que a injúria não admite retratação jamais. Nem mesmo por meio da imprensa. Quem tem que se retratar? O querelado, que é o acusado na ação penal privada. Não existe retratação extintiva em ação penal pública, mesmo se houver crime contra a honra. Não existe retratação em crime contra a honra em crime de ação pública. Só extingue a punibilidade em crime de ação privada. Então, se a calúnia ou difamação for de ação privada, existe retratação extintiva. Se for de ação pública, não adianta querer se retratara que não extingue a punibilidade. A lei é clara: querelado. Não fala do denunciado. Agora eu pergunto: até quando o querelado pode se retratar para ver extinta a sua punibilidade? A lei é clara: antes da sentença. Mas que sentença? Se ele se retratar antes da sentença, ele está isento de pena. Pergunto: existe retratação extintiva da punibilidade em grau de recurso? Essa sentença é decisão do juiz de primeiro grau ou é termo atécnico abrangendo qualquer decisão ainda não transitada em julgado? Prevalece que a retratação tem que ocorrer até a sentença de primeiro grau. Não existe retratação extintiva em grau de recurso. Se você for condenado, não adianta querer se retratar no tribunal. Não extingue mais a sua punibilidade. É o que prevalece. Eu não concordo, mas é o que prevalece. Pergunto: a retratação do querelado se estende a eventuais coautores ou partícipes que não se retrataram? Vamos imaginar que três pessoas caluniaram a outra. Só uma se retratou. A lei é clara: o querelado fica isento de pena. O querelado! Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Dá para perceber que a retratação aqui é incomunicável. É só do querelado. É uma circunstancia subjetiva incomunicável. Se liga à pessoa do querelado e não ao fato. É só para quem se retrata. Não se estende aos demais coautores e partícipes. Vamos para o art. 144, que traz um dispositivo interessante: Art. 144 - Se, de referências, alusões ou frases, se infere calúnia, difamação ou injúria, quem se julga ofendido pode pedir explicações em juízo. Aquele que se recusa a dá-las ou, a critério do juiz, não as dá satisfatórias, responde pela ofensa. Que figura é essa que o art. 144 traz? Pedido de explicações – “Medida preparatória e facultativa para o oferecimento da queixa quando, em virtude dos termos empregados, não se mostra evidente a intenção de ofender a honra, gerando dúvidas.” Você está em dúvida: será que ele quis ou não quis ofender? Isso é muito comum naquelas injúrias relativas. Peça explicações em juízo. Vou dar um exemplo. Eu chego e disso: “o Renato é flex”. Eu estou querendo que ele é versátil ou estou querendo dizer que ele bebe todas ou que ele é bicombustível? Ele pode pensar que eu quis ofendê-lo. O Renato pode pedir explicações: “juiz, o Rogério falou que eu sou flex. Chama o Rogério para ele se explicar.” É uma medida preparatória e facultativa. O que significa isso? Pede explicações quem vê necessidade. O pedido de explicações não interrompe ou suspende o prazo decadencial. Vai você pedir explicações em juízo e fica esperando 6 meses as explicações... Quando elas vierem, decaiu do direito. Então, é uma medida facultativa. Sendo facultativa, pede quem quer. Isso não interfere no prazo decadencial que continua correndo. O pedido de explicações não interrompe ou suspende o prazo decadencial. Vocês viram que o pedido é facultativo. E as explicações são obrigatórias? Pede quem vê necessidade. E a quem são pedidas as explicações ele é obrigado a dá-las? Se ele não explica, presume-se a ofensa? Lendo o final do dispositivo, parece que se não quiser responde é como se tivesse ofendido. Mas, não. O pedido é facultativo e a resposta também. Pelo silêncio, não se conclui a infração penal. Nós não podemos presumir a ofensa em razão do silêncio. Você tem que analisar o fato concretamente. O juiz não pode concluir: “eu até achava que não tinha nada, mas como ele não respondeu, agora vai ser processado.” Não! Você tem que analisar o fato concretamente. O silêncio na resposta não gera presunção. Se ele resolver não explicar, o ofendido que ingresse com a ação penal e o juiz tem a liberdade de rejeitar, absolver ou condenar. O silêncio não tem como presumir o crime, muito menos a condenação. O juiz não pode te obrigar a dar explicações. Temos um caso em que o juiz intimou a pessoa para explicar em juízo na presença dele. O Supremo concedeu habeas corpus por ser constrangimento ilegal. Obrigar uma pessoa a se explicar é constrangimento ilegal passível de habeas corpus. Ele não está obrigado a explicar. A vítima é que faz o que achar por bem fazer. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Como fazer esse pedido em juízo? Qual o rito? Pede para quem? Para o juiz? Qual juiz? A Lei de Imprensa trazia o rito. Mas o que aconteceu com ela? Foi abolida. Então, qual é o rito? É o mesmo rito das notificações judiciais. Vamos para o último artigo: Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo quando, no caso do Art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal. O art. 145 trata da ação penal. Certeza que vai cair. O parágrafo único dizia: Parágrafo único - Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do nº I do Art. 141, e mediante representação do ofendido, no caso do n.º II do mesmo artigo. Agora, o parágrafo único teve acrescentado pela Lei 12.033 o quê? Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141 deste Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como no caso do § 3º do art. 140 deste Código. (Alterado pela L-012.033-2009) Eu vou fazer uma tabela: AÇÃO PENAL NOS CRIMES CONTRA A HONRA ANTES da Lei 12.033/09 DEPOIS da Lei 12.033/09 Regra: ação privada Regra: ação privada Exceções (havia 3): Exceções (agora 4):  Injúria real com lesão que passava  Injúria real com lesão que passava a ser ação pública incondicionada. * a ser ação pública incondicionada. *  Crime contra a honra do  Crime contra a honra do Presidente da República ou chefe Presidente da República ou chefe estrangeiro: ação penal pública estrangeiro: ação penal pública condicionada à requisição do Ministro da condicionada à requisição do Ministro da Justiça. Justiça.  Crime contra a honra de  Crime contra a honra de funcionário público em razão da sua funcionário público em razão da sua função: ação penal pública função: ação penal pública condicionada à representação. ** condicionada à representação. **  Injúria preconceito – agora é de ação penal pública condicionada * Nem toda injúria real é exceção. Somente a injúria real com lesão. Injúria real com vias de fato cai na regra. Tem um livro que escreve que injúria real é sempre de ação pública. Está errado! Só a injúria real com lesão é que cai na exceção! Injúria real com vias de fato está na regra. Olha a pergunta sacana em concurso: “injúria real é de Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 ação pública.” Verdadeiro ou falso? Falso. Injúria real com lesão é de ação pública. Injúria real com vias de fato é de ação privada. ** Aqui tem uma observação. Vocês perceberam que crime contra a honra de funcionário público depende de representação, desde que propter oficium. Olha o que acontecia e não era incomum. Um delegado era ofendido em razão de sua função. Foi chamado de corrupto. O que o delegado tinha que fazer? Ele representava. Essa representação gerava um inquérito que ia parar nas mãos do promotor. O promotor olhava e dizia que o delegado não foi ofendido na honra, que foi uma coisa à toa e requer o arquivamento, aplicando o princípio da insignificância. O delegado procurava o promotor: “teve um preso que me chamou de corrupto, eu representei. O que deu aquele inquérito?” Eu arquivei porque não achei que você tivesse sido ofendido na sua honra. “Mas a honra é minha, a dignidade é minha, o decoro é meu. Como é que você pode saber se fui ofendido na minha honra?” Sabe o que esses funcionários públicos começaram a fazer? Ao invés de representar, entravam com queixa-crime, mesmo nesta hipótese. E os tribunais começaram a aceitar. Inclusive tem um julgado que diz: “ninguém pode ter a sua honra refém do Ministério Público.” Bateu no Supremo, o que o Supremo fez? Súmula 714. STF Súmula nº 714 - DJ de 13/10/2003 –É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções. A Súmula 714 deu ao funcionário público um direito de opção. Ele vai escolher se ele quer queixa, ou se ele quer representação. Direito de opção. Agora, olha só a pergunta que caiu em concurso! Pergunta muito boa: o servidor opta pela representação. O MP arquiva. Ele pode entrar com a queixa? Isso aconteceu. Não posso falar a cidade porque tem unidade nossa. O juiz e o promotor se desentenderam. E eles começaram a não se dar por causa disso. O juiz soltou um estuprador de uma criança de 8 anos. O juiz entendeu que ele era primário, de bons antecedentes e que crime hediondo cabe liberdade provisória, soltou o estuprador. O promotor ficou puto. Deu uma semana, o estuprador foi preso novamente estuprando outra criança. O promotor fez assim no flagrante: “flagrante formalmente em ordem, senhor Juiz, aguardo a vinda dos autos principais, que o senhor durma com essa.” Você não soltou? Então está aí: mais uma criança estuprada. Aí começou uma rusga entre eles. Aí deu uma briga. Esse juiz se sentiu ofendido numa manifestação do promotor e representou o promotor criminalmente para o Procurador-Geral: “o promotor praticou crime contra a minha honra e eu estou representando. Processe o seu promotor.” O Procurador-Geral olhou e falou: estrito cumprimento de um dever legal. Arquivou. Esse juiz fez o quê? Não existe o art. 28 em foro de prerrogativa. Ele, então, recorreu para o Colégio de Procuradores que fez o quê? Manteve o arquivamento. Aí o juiz foi no dia do recurso. Sentou lá para ver qual seria a decisão. Por unanimidade, insistiram no arquivamento contra o promotor. Aí o Procurador-Geral falou: “o juiz está presente, boa tarde. O senhor optou por representar, agora não pode entrar com queixa-crime porque a opção por uma via torna a outra preclusa.” Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 É por isso que eu conto a história! Para vocês lembrarem! Não é para lembrar só da história. Olha que interessante: a opção pela representação torna preclusa a queixa-crime. Essa é a posição do STF. Anotem o julgado: HC 84659-9. O Supremo decidiu exatamente isso: se você optou pela representação, a queixa-crime está preclusa. É uma preclusão lógica e consumativa. As duas. Questão boa! Caiu no TJ/SC. Olha que interessante: eu tenho como vítima um funcionário público. Vocês acabaram de ver que ele, funcionário público pode preferir a queixa ou representação. Se ele preferir a representação, não cabe perdão do ofendido como causa extintiva da punibilidade. Mas se ele preferiu a queixa, cabe perdão do ofendido que nunca teve cabimento em casos como esse. Se ele preferir a representação, não cabe perempção. Se ele preferir a queixa, é possível perempção que nunca se admitiu num caso como esse. Se ele preferir a representação, não cabe retratação do acusado como causa extintiva. Se ele preferir a queixa, cabe retratação do querelado como causa extintiva. Então, prestem atenção! Por que o juiz, no caso que eu dei, preferiu a representação? Para não correr risco de perempção e para não admitir a retratação do acusado como causa extintiva da punibilidade. Ele não é bobo. É juiz! Ele sabe isso. Então, por que esse juiz não entrou com a queixa-crime? Ele não quis arriscar uma perempção, ele não quis arriscar o promotor se retratar e ter extinta a punibilidade. Ele falou: “eu quero ir até o fim.” Se ele optasse pela queixa, um erro dele poderia gerar perempção porque o promotor, vendo que a coisa estava perdida, poderia se retratar. E como ficou agora, com a Lei 12.033/09? Ficou igualzinho, praticamente. A regra está mantida. As exceções estão mantidas. Porém, acrescentamos uma quarta exceção: o art. 140, § 3º, do CP, a chamada injúria preconceito, agora é de ação penal publica condicionada. Ela era de ação privada. Agora é pública condicionada. Então, qual foi a mudança trazida por essa lei? Está aqui: limita-se à introdução da quarta exceção. Pergunto: essa mudança é retroativa ou irretroativa? A injúria aconteceu antes da lei, mas o processo só vai ser inaugurado depois da lei. Ele vai ser inaugurado com queixa (o que era antes) ou com denúncia (o que é hoje)? A pessoa injuriou por preconceito antes. O inquérito só está relatado depois. Relatado com base na lei nova, eu tenho que pedir ao promotor para denunciar, ou eu continuo entrando com queixa? E aí? Retroage ou não retroage? Você vai encontrar gente dizendo o seguinte: ação penal? Queixa ou denúncia? Isso é matéria processual, eu aplico o tempus regit actum. É a lei vigente ao tempo da inicial. Se a lei vigente ao tempo da inicial é denúncia, então é denúncia e acabou. Então, tem uma primeira corrente que vai defender o tempus regit actum, é dizer, a lei vigente ao tempo do ato processual. Se a lei vigente ao tempo do ato processual é denúncia, então a denúncia deve ser a inicial. Mas essa corrente não está correta. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 A ação penal está umbilicalmente ligada ao direito de punir. Você transformado de ação privada para ação pública, você está retirando do acusado causas extintivas da punibilidade que a situação atual não tem e a anterior tinha. Ou seja, você está prejudicando o acusado. É uma retroatividade maléfica. Ação privada tem renúncia, tem perdão, tem perempção. Nada disso tem na ação pública. Então transformar de ação privada para ação pública é você retirar do acusado três causas extintivas da punibilidade. Se você faz isso, você está ampliando do direito de punir do Estado. Então, a retroatividade é maléfica. Não pode retroagir. Os fatos pretéritos continuam dependendo de queixa. Isso vai cair com certeza! SEQUESTRO E CÁRCERE PRIVADO Arts. 148 e ss., do Código Penal Seqüestro e Cárcere Privado Art. 148 - Privar alguém de sua liberdade, mediante seqüestro ou cárcere privado: Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos. É um crime de médio potencial ofensivo. Bem jurídico tutelado – a liberdade de movimento da pessoa. Quem é o sujeito ativo? Pode ser praticado por qualquer pessoa. É crime comum. Só faço uma observação: se o sujeito ativo for funcionário público, pode ocorrer abuso de autoridade. Quem pode ser vítima? Vocês já viram que o sujeito ativo é comum. Qualquer pessoa. E quem é a vítima do delito de sequestro e cárcere privado? Eu vou fazer uma observação e vou criticar, mas saibam que essa observação existe. Tem uma minoria que diz que a vítima só será a pessoa com liberdade própria de movimento. Isto é, pessoa que tem liberdade de movimento e não depende de nenhuma outra. Entenderam essa corrente? Se vocês concordarem com essa corrente, quem não pode ser vítima desse crime? Paraplégico, criança de tenra idade que não anda sozinha, criança de colo. Segundo eles, essas pessoas são vítimas de outro crime, por exemplo, constrangimento ilegal. Nana nina nina. Prevalece que qualquer pessoa pode ser vítima de sequestro e cárcere privado, mesmo aquelas que precisam de aparelhos ou outros para locomoção, porque elas não perdem sua liberdade de movimento. O fato de elas dependerem de aparelhos, de instrumentos ou outras pessoas, não retira delas a liberdade de escolher onde ir, onde ficar, quando vir. Isso, no Brasil, não vingou. Na Itália, há muita gente defendendo essa tese. Essas pessoas não perderam a liberdade de ir, vir e ficar. Apenas exercem essa liberdade com auxílio. Se a vítima for Presidente da República, do Senado, da Câmara ou do Supremo (Lula, Sarney, Temer ou Gilmar Mendes), o delito é contra segurança nacional se houver motivação política. Art. 28, da Lei de Segurança Nacional. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Art. 28 - Atentar contra a liberdade pessoal de qualquer das autoridades referidas no art. 26. Pena: reclusão, de 4 a 12 anos. Art. 26 - Caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação. Olha a pena! No Código Penal é de 1 a 3. Aqui, no art. 28, da Lei de Segurança Nacional, é de 4 a 12 anos. Qual é o bem jurídico tutelado? Liberdade de movimento. Esse é um bem jurídico disponível ou indisponível? A vítima consente em ficar privada da liberdade de locomoção. Exclui o crime? Prevalece hoje que a liberdade de movimento é um bem disponível. Se você consente em privar privada da sua liberdade de locomoção, não há crime. E no que consiste o crime? É privar alguém mediante sequestro ou cárcere privado, comportamentos que vamos estudar na próxima aula. Na aula passada a gente viu que o bem jurídico tutelado é a liberdade de movimento. Liberdade de ir, vir e ficar. E estamos diante de um crime comum, pode ser praticado por qualquer pessoa. Até aqui, nenhuma dificuldade. Mas vimos que há uma corrente (na Itália) que entende que só pode ser vitima quem tem liberdade de movimento próprio. Se você se movimenta com auxílio de aparelhos ou de terceiros, você não pode ser vítima de sequestro ou cárcere privado, mas é simples constrangimento ilegal. Isso não prevalece. Lembrei também que se a vítima for Presidente da Republica, do Senado, da Câmara e do Supremo, Lula, Sarney, Temer e Gilmar, esse crime pode ser espécie de delito contra a segurança nacional, desde que tenha motivação política cuidado! Os crimes da Lei de Segurança Nacional devem ser combinados com o art. 2º, da mesma lei, que exige motivação política. Aí eu comecei a analisar com vocês se a liberdade de movimento é um bem disponível ou indisponível. Você pode dispor da sua liberdade de movimento, logo, descaracterizando o crime? Se a pessoa concorda em ficar privada da liberdade de locomoção, quem priva, pratica crime? Eu comentei que no passado já houve doutrina dizendo que é um bem indisponível. Hoje prevalece que é um bem disponível. Tanto é disponível que o diretor do Big Brother está solto. Guardem o exemplo do Big Brother. O crime tem um bem jurídico disponível. O art. 148 pune qual comportamento? Pune a privação da liberdade de alguém. E essa privação da liberdade ocorre mediante dois meios. Os meios para se praticar o crime são:   Sequestro e Cárcere privado. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 São sinônimos? Não. Sequestro não se confunde com cárcere privado. Vocês vão encontrar doutrina dizendo que sequestro é gênero e cárcere privado é espécie. Mas não se confundem. Quando há sequestro e quando há cárcere privado?  Sequestro – Privação da liberdade sem confinamento – você fica privado da sua liberdade de locomoção num sítio, numa fazenda, etc.  Cárcere privado – É o meio de execução em que ocorre privação da liberdade com confinamento. Por exemplo, você fica privado da liberdade num cômodo da casa. Então, na denúncia, quando você denunciar o art. 148 tem que descrever se houve sequestro ou cárcere privado, se houve privação da liberdade com ou sem confinamento. Mas, eu estou na dúvida se houve um ou se houve o outro. Dica: usa o gênero. Se puder ser técnico, se tiver condições de apurar que houve cárcere privado, use cárcere privado. Se tiver dúvida, use sequestro, gênero. Não tem como errar. Alguns dizem que não tem sentido essa diferença prática, mas já que o legislador diferenciou, você, juiz, pode usar essa diferença como? Qual dos dois traz mais aflição para a vítima? O cárcere privado. Então, o juiz considera o cárcere privado na fixação da pena-base. Observações importantes: Observação 01: A privação da liberdade pode ser antecedida de fraude ou qualquer outro meio. Pode ser antecedida de violência, ou grave ameaça ou fraude, ou qualquer outro meio, demonstrando que é de execução livre. Observação 02: O crime pode ser praticado mediante ação ou omissão. Quem me dá exemplo de um cárcere privado/sequestro por omissão? É o exemplo que todo livro de doutrina traz. Preste atenção no exemplo e cuidado com o que vocês vão anotar. O exemplo é sempre o mesmo: médico que não concede alta para paciente já curado. Ponto. Para por aí. Se você disser que o médico assim agiu para se ressarcir de despesas médicas, o crime mudou. Então, cuidado! Médico que não concede alta para paciente já curado, este é o exemplo de sequestro por omissão. Não coloque a finalidade de ressarcimento porque aí o crime muda. Observação 03: No delito de sequestro/cárcere privado, é o que mais rotineiramente ocorre, mas não necessita que a vítima saia de um local e vai para o outro. Que personalidade do show business foi vítima de cárcere privado sem sair da própria cozinha? Silvio Santos. O sequestrador da filha dele foi até a casa dele e trancou o Silvio Santos na cozinha. Foi vítima de sequestro/cárcere privado sem sair da sua cozinha. Não pressupõe a locomoção da vítima de um local para o outro, apesar de ser o que rotineiramente ocorre. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 O crime de art. 148 é punido a título de dolo. Importante! Dolo consistente na vontade consciente de privar alguém da liberdade de locomoção. É um dolo sem finalidade especial. É importante que vocês entendam isso porque se houver uma finalidade especial animando o agente, muito provavelmente mudou o crime. Olha os exemplos: 1. Se tiver por finalidade a escravização de fato da vítima, o crime passa a ser de redução à condição análoga de escravo do art. 149 (e não do art. 148). 2. Se a finalidade doa gente é econômica, ele assim age buscando uma finalidade econômica, aí eu posso estar diante do crime de sequestro-relâmago (art. 158, § 3º) ou mesmo extorsão mediante sequestro (art. 159). 3. Se a finalidade dele é fazer justiça privada, aí o crime pode ser do art. 345, do CP e aí entra o exemplo do médico que não libera o paciente para ressarcir despesas médicas. Ao acrescentar essa finalidade especial do médico, muda o crime. Então, o médico que não solta paciente curado (art. 148) e se não faz ISS para se ressarcir das despesas médicas, é o art. 345. Vejam como a finalidade alterou o tipo. 4. Dependendo da finalidade especial, eu posso cair no crime de tortura – se a finalidade dele é torturar a vítima, submetendo-a a sofrimento físico e mental, estou na Lei 9.455/97. Com esses quatro exemplos, eu quero convencê-los do quê? De que o crime do art. 148 não tem finalidade especial. Se a finalidade especial anima o agente, muda o crime. Ou, muito provavelmente, muda o crime. Quando este crime se consuma? Com a privação da liberdade da vítima. E detalhe: durante todo o tempo da privação, a consumação se protrai, isso significa que estou diante de um crime permanente. Pergunto: a privação da liberdade tem que perdurar tempo juridicamente relevante para o crime se consumar ou não, privou da liberdade, o crime já está consumado? O tempo da privação interfere? 1ª Corrente: “É irrelevante o tempo de privação, consumando-se o delito a partir do momento em que a vítima tem subtraído seu direito de locomoção.” 2ª Corrente: “Para consumação do crime, exige-se tempo de privação juridicamente relevante.” Prevalece a primeira corrente eu vou provar daqui a pouco que é a corrente correta. Admite tentativa – estamos diante de crime plurissubsistente Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 QUALIFICADORAS – Agora temos que analisar as qualificadoras, que é o assunto que mais cai. Falou em art. 148, 90% das questões envolvem qualificadoras A pena que era de 1 a 3 anos (caput) passa a ser de 2 a 5:. § 1º - A pena é de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos: I - se a vítima é ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente ou maior de 60 (sessenta) anos. (Alterado pela L-011.106-2005) Ascendente/descendente – Só há uma questão boba para ser analisada aqui: obviamente estamos abrangendo parentesco civil, oriundo de adoção. Claro! A CF já não permite a discriminação de parentesco legítimo, ilegítimo, civil ou natural. Reparem que essa ascendência ou descendência pode ser fruto de adoção. Cônjuge/companheiro – Até o advento da Lei 11.106/05 só existia qualificadora no caso do cônjuge. Então, não dava para incluir o companheiro porque seria analogia in malam partem. Isso vai cair! Antes, o art. 148, § 1º, I, só abrangia cônjuge. Eu não podia colocar o companheiro sob pena de analogia em malam partem. Mas a Lei 11.106/05 fez inserir o companheiro do agente. Então, não preciso mais trabalhar com analogia in malam partem. Eu tenho o companheiro. Cuidado quando o crime foi praticado antes da Lei 11.106/05 pelo companheiro!! Retroagir é analogia in malam partem. Então, antes, quando se tratava de companheiro, o máximo que o juiz podia fazer era considerar essa circunstância na fixação da pena-base, no máximo. No concurso caiu sequestro de companheiro antes da Lei 11.106/05. O candidato não lembrou que foi lei posterior que incluiu essa qualificadora e condenou por essa qualificadora. Olha o que vai cair para você: ele sequestrou o companheiro antes da Lei 11.106, mas o companheiro só foi libertado após a lei 11.106/05. Incide a qualificadora? Aqui incide porque, se o crime é permanente, eu vou aplicar sempre a última lei vigente na permanência ainda que mais gravosa. Súmula 711, do STF: STF Súmula nº 711 - DJ de 13/10/2003 - A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência. Então, o sequestro de companheiro antes da Lei 11.106/05 não sofria qualificadora, era mera circunstância judicial. O sequestro de companheiro que iniciou antes, mas só terminou depois desta lei, sobre a lei nova (Súmula 711, do STF). Maior de 60 anos – Também incide a qualificadora se a vítima é maior de 60 anos – é a qualificadora incluída pelo Estatuto do Idoso. Antes de 2003, não havia essa qualificadora. Era uma circunstância que o juiz incluía na hora da fixação da pena. Depois do Estatuto do Idoso, incluíram essa qualificadora. Cuidado, portanto, com a retroatividade da lei maléfica. É o mesmo raciocínio da Lei 11.106. Detalhe no que diz respeito ao maior de 60 anos. Ele tem que ter mais de 60 anos antes da sua liberdade. Se ele foi sequestrado com menos de 60 anos e foi libertado já tendo mais de 60 anos, a qualificadora está caracterizada. Mesmo que você tenha privado alguém menor de Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 60 anos. Se no momento da liberdade, já atingiu a condição de maior de 60, incide a qualificadora. Então, eu não vou analisar a idade no momento da privação, e sim, no momento da liberdade. No inciso I, essas condições da vítima têm que ingressar no dolo do agente para evitar responsabilidade penal objetiva. Ele tem que saber que a vítima é seu ascendente, seu descendente, seu cônjuge, tem que saber que a vítima é maior de 60 anos. Essas condições da vítima tem que fazer parte do dolo do agente, para evitar responsabilidade penal objetiva. Esse rol é taxativo ou exemplificativo? Taxativo! Vocês perceberam que esqueceram do irmão? Cuidado que sequestro entre irmãos não gera qualificadora. Irmão não está abrangido, não abrange os afins. Agora, o juiz pode considerar isso na fixação da pena-base. A qualificadora não abrange os colaterais, não abrange os afins. II - se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital; O inciso II qualifica o delito, deixando a pena de ser de 1 a 3 para ser de 2 a 5 anos se o delito é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital. É o que a doutrina chama de internação fraudulenta ou simulada. Você interna alguém sem que ela necessite ou contra a sua vontade valendo-se de fraude ou violência. Clínicas de recuperação de drogados é um bom exemplo III - se a privação da liberdade dura mais de 15 (quinze) dias. O inciso III qualifica o crime se a privação da liberdade dura mais de 15 dias. Esse inciso III confirma ou, pelo menos, fortalece a corrente de que o tempo da privação da liberdade é irrelevante para a consumação. Ele pode ser considerado na pena, mas não interfere na consumação. É irrelevante para a consumação é relevante somente no que diz respeito à pena. Agora, cuidado, não adiante o sequestrado concordar antes de 15 dias pela liberdade. Esse prazo é para libertar a vítima. Se você demorar mais de 15 dias, ainda que tenha concordado com a sua liberdade, incide a qualificadora. São quinze dias para você libertar. IV - se o crime é praticado contra menor de 18 (dezoito) anos; (Acrescentado pela L-011.106-2005) O inciso IV qualifica o delito se o crime é praticado contra menor de 18 anos (criança ou adolescente). O agente tem que conhecer a idade da vítima para evitar a responsabilidade penal objetiva. Você vai analisar a idade da vítima no momento da privação. Pouco importa a idade que ela tenha no momento da liberdade. Se ela foi seqüestrada com 17 anos, Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 incide a qualificadora mesmo que durante o sequestro ela atinja a maioridade. Importa é que, durante o sequestro em algum momento ela tenha 18 anos. Eu não vou olha a idade com que ela foi libertada, mas a idade em que foi sequestrada. É exatamente o contrário do maior de 60 anos. V - se o crime é praticado com fins libidinosos. Essa é a qualificadora que mais cai. Essa qualificadora é novidade trazida pela Lei 11.106/05. Vamos analisar isso com calma: privação com finalidade libidinosa: PRIVAÇÃO COM FINALIDADE LIBIDINOSA ANTES da Lei 11.106/05 DEPOIS da Lei 11.106/05  Rapto violento – o conteúdo Configurava: criminoso migrou para o art. 148, § 1º, V  Rapto violento (privação com (que fenômeno é esse? Princípio da finalidade libidinosa + violência ou grave continuidade normativo-típica*) ameaça) previsto no art. 219, do CP  Supressão da figura criminosa do  Rapto consensual (art. 220, do CP) rapto consensual (abolitio criminis) * Fizemos quadro, diferenciando um do outro, mas na abolitio criminis, desapareceu a figura criminosa, já no princípio da continuidade normativo-típica o conteúdo criminoso continua típico. Porém, só mudou a tipicidade. Sabe por que estou insistindo nisso? É que vai cair em concurso e nós vamos trabalhar muito com esse princípio quando falarmos dos crimes contra a dignidade sexual. Já estou adiantando. Olha o que tem caído em concurso: vamos trabalhar com o rapto violento. Rapto violento – Antes da Lei 11106/05, privação da liberdade com fim libidinoso configurava o art. 219, do CP com pena de 2 a 4 anos. Agora, a privação da liberdade configura o art. 148, § 1º, V, do CP, com pena de 2 a 5 anos. O rapto ocorreu antes da Lei 11.106/05, quando ainda vigente o art. 219,com pena de 2 a 4. Porém, o inquérito policial foi relatado e enviado para a Justiça depois da Lei 11.106/05. Você juiz vai condenar este autor por qual crime e por qual pena? A sentença vai ser proferida depois da Lei 11.106/05. Você juiz, diante de um fato ocorrido antes, vai condená-lo por qual crime e por qual pena? O sequestro foi rolando, a sentença, quando for proferida, haverá um tipo novo com pena nova. Vejam: a resposta certa da Procuradoria do Estado foi: não posso retroagir porque a retroatividade seria maléfica. Então, a resposta na Procuradoria do Estado/SP foi: você tem que condenar pelo art. 219, com pena de 2 a 4 anos, evitando retroatividade maléfica. Não está correto. Esqueceram que havia o princípio da continuidade normativo-típica. Esse princípio diz: você tem que condenar pelo art. 148, § 1º, V, com a pena de 2 a 4, para evitar a retroatividade maléfica, mas o tipo é novo. O tipo é novo. Compreenderam? O princípio da continuidade normativo-típica exige que você condene o agente pela prática daquele crime considerando o tipo penal respectivo. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Qual é o tipo penal respectivo? O 219 não existe mais. O tipo penal agora é o art. 148, § 1º, V. Efeito primário do art. 148, § 1º, V, mas, respeitando a pena anterior por ser mais benéfica. Na prática isso aqui não faz diferença alguma porque você está respeitando a pena mais benéfica. Na prática! Mas se você pega um examinador que está querendo técnica ele vai descontar. O princípio da continuidade normativotípica exige que você condene pelo tipo novo, mas respeitando a pena mais benéfica. Como é que você vai condenar por um tipo penal cujo conteúdo migrou para outro? Não tem que condenar por rapto porque você tem um tipo novo. Condene pelo tipo novo com a pena antiga e acabou o problema. Eu falei que isso já caiu. Sabe como vai cair para vocês? Guardem tudo isso que eu falei porque vocês vão abreviar a minha exposição nos crimes contra a dignidade sexual. O próximo problema é o seguinte: antes, o art. 219 era de ação penal de iniciativa privada. Agora, esse comportamento que estava no art. 219, está no art. 248 e é de ação penal pública incondicionada. Pergunto: o fato ocorreu antes, porém, o inquérito policial foi relatado depois da Lei 11.106/05. Qual é a inicial do processo? Queixa ou denúncia? Essa pergunta ainda não caiu, mas vai cair. Eu vou falar disso outra vez nos crimes contra a dignidade sexual porque vai acontecer exatamente o mesmo fenômeno: o estupro antes e o estupro depois da Lei 12.015. O mesmo fenômeno que vamos analisar aqui, voltaremos a analisar quando eu falar do estupro. Por isso, se vocês entenderem aqui, quando eu falar do estupro vai ficar ridículo. Aliás, esse fenômeno nós já na alisamos quando eu falei da mudança na injúria real. Então, vamos lá: queixa ou denúncia? O crime, quando ocorreu, dependia de queixa, mas o inquérito foi relatado e a inicial vai ser oferecida quando o assunto previu denúncia. Eu vou obedecer a ação penal do fato (lei vigente ao tempo do fato – queixa) ou a lei vigente ao tempo do ato processual (denúncia)? Eu não tenho dúvida de que uma primeira corrente vai defender a denúncia com base no tempus regit actum. Tratando a questão como se fosse meramente processual penal, mas não é. Por isso, prevalece que a inicial deve ser queixa. E por quê? Vocês não podem esquecer que a ação privada tem decadência que a pública não tem, se incondicional. A ação privada tem renúncia da vítima, causa extintiva, que a ação pública não tem. A ação privada tem perdão do ofendido, causa extintiva que a ação pública não tem. A ação privada tem perempção, causa extintiva que a ação pública não tem. Ou seja, você defendendo a denúncia e não queixa, você está retirando do agente quatro causas extintivas da punibilidade possíveis. E se você retira a causa extintiva da punibilidade você amplia o espectro de punir. E isso é prejudicial. Eu falei disso na injúria real. E vou voltar a falar disso nos crimes contra a dignidade sexual. Aqui, nós vamos aplicar a ultratividade da lei mais benéfica. Isso vai cair e não vai cair aqui, vai cair no estupro ou na injúria qualificada pelo preconceito. A última qualificadora do art. 148 é o § 2º, em que a pena passa a ser de 2 a 8 anos: § 2º - Se resulta à vítima, em razão de maus-tratos ou da natureza da detenção, grave sofrimento físico ou moral: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Esse parágrafo é muito simples, é claro por si só. O que cai em concurso? Eu já vi cair em concurso o § 2º sem a expressão “grave” e a resposta era errada. Cuidado! Não basta o sofrimento físico ou moral. Tem que ser de forma grave. Agora, vamos partir para os crimes contra o patrimônio. Nós vamos ficar umas quatro aulas falando de crimes contra o patrimônio. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO Arts. 155 e ss., do Código Penal 1. FURTOS SIMPLES Furto Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. § 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno. § 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa. § 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico. Furto Qualificado § 4º - A pena é de reclusão de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa, se o crime é cometido: I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa; II - com Abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza; III - com emprego de chave falsa; IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas. § 5º - A pena é de reclusão de 3 (três) a 8 (oito) anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. O art. 155 inaugura o Título II, do Código Penal. Vamos ver a topografia do art. 155. Isso pode parecer bobagem, mas muitas das questões que estão sendo discutidas no Supremo hoje estão mencionando a topografia. Como está a topografia do furto no CP?      Caput – Traz o furto simples. § 1º - Traz o furto majorado pelo repouso noturno § 2º - Traz o privilégio § 3º - Traz uma cláusula de equiparação §§ 4º e 5º - Qualificadoras. Essa é a topografia do furto no Código Penal. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Qual é o bem jurídico tutelado aqui? “Ah, Rogério, é o patrimônio” Jura? Brilhante! Se você responder que é o patrimônio, o examinador vai perguntar: “de quem?” E você: da vítima! Brilhante! É o patrimônio de quem? Do proprietário? Na posse de alguém? Ou também o patrimônio na mera detenção de alguém? Na verdade, o art. 155 protege a propriedade? A propriedade e a posse? Ou a propriedade e a posse e a mera detenção? Há três correntes: 1ª Corrente: Protege-se somente a propriedade (Hungria) 2ª Corrente: Para a segunda corrente, a proteção recai sobre a propriedade e a posse (Noronha) 3ª Corrente: A proteção abrange propriedade, posse e detenção (Fragoso com a maioria) Observação:“É imprescindível que a propriedade, posse ou detenção sejam legítimas.” Então, o direito penal só agasalha posse, propriedade ou detenção legítimas? Sim. E o que acontece com o ladrão que furta ladrão? Tem perdão? Isso caiu em concurso! Qual é o crime do ladrão que furta ladrão? Caiu em concurso exatamente isso: A é o proprietário, B furtou A. B, logo em seguida, foi furtado por C. Vejam, A é vítima do furto de B. E quem é vítima do furto de B? Não é B, porque B tem posse ilegítima. Então, a vítima do furto de C continua sendo A. Ou seja, C vai responder por furto, não há dúvida! Não tem essa história do perdão, mas a vítima não é B, que tinha uma posse ilegítima. A vítima continua sendo A. Voltando ao caput: Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. Vejam que o crime admite, inclusive, suspensão condicional do processo. Quem é o sujeito ativo? Quem pode ser o furtador? O tipo exige alguma qualidade especial? Cuidado porque se você responde na prova apenas “crime comum e ponto”, perdeu a oportunidade de se diferenciar. Você vai responder assim: trata-se de crime comum, pode ser praticado por qualquer pessoa, salvo o proprietário pois a coisa deve ser alheia. Aí o examinador vai perguntar: “existe furto de coisa própria?” Aí você vai dizer que não. “Qual crime pratica o proprietário que subtrai coisa sua na legítima posse de alguém?” Podem ser dois crimes: o art. 345, do Código Penal ou o art. 346, do Código Penal, dependendo da natureza da posse, se é por determinação judicial ou convenção ou não. Exercício Arbitrário das Próprias Razões Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Art. 345 - Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite: Pena - detenção, de 15 (quinze) dias a 1 (um) mês, ou multa, além da pena correspondente à violência. Art. 346 - Tirar, suprimir, destruir ou danificar coisa própria, que se acha em poder de terceiro por determinação judicial ou convenção: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. Se a coisa está em poder de terceiro por determinação judicial ou convenção, art. 346. “Funcionário público subtrai coisa em poder da Administração.” Que crime pratica? O candidato responde logo: pratica peculato-furto, art. 312, §1º. Não é bem assim. Olha o que diz o § 1º, do art. 312: § 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário. Então, a gente tem que enfrentar o problema considerando se o funcionário teve ou não facilidade em razão do cargo. Tendo facilidade, é o art. 312, § 1º. Não tendo, é o furto comum. Se eu estiver diante de uma subtração facilitada, aí vai ser o art. 312. § 1º, do CP. Agora, se eu estiver diante de uma subtração não facilitada pela qualidade funcional, aí é o art. 155, do CP. A diferença é importante porque a do CP admite suspensão do processo. O crime funcional, não. Você vai ter que saber extrair do seu problema se você está diante de uma subtração facilitada ou não. Se for facilitada, peculato-furto. Caso contrário, furto comum. Um admite suspensão e o outro, não. Subtrair coisa comum de condômino ou co-herdeiro ou sócio, o crime é o do art. 156, do CP (furto de coisa comum). Furto de Coisa Comum Art. 156 - Subtrair o condômino, co-herdeiro ou sócio, para si ou para outrem, a quem legitimamente a detém, a coisa comum: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa. § 1º - Somente se procede mediante representação. § 2º - Não é punível a subtração de coisa comum fungível, cujo valor não excede a quota a que tem direito o agente. Aqui você tem um crime praticado entre condôminos, co-herdeiros ou sócio e a coisa subtraída é comum. Detalhe, este furto de coisa comum é de menor potencial ofensivo. E mais, depende de representação da vítima. É de ação pública condicionada (§ 1º). Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Quem é a vítima? Proprietário, possuidor ou detentor. O que pune o art. 155? Ele pune “apoderar-se para si ou para outrem de coisa alheia móvel” Esse apoderamento pode ser:  Apoderamento direto, que nada mais é do que uma apreensão manual ou pode ser  Apoderamento indireto, valendo-se de terceiros ou animais. No MP/RO caiu uma questão exatamente enfocando o apoderamento indireto, o agente valendo-se de animais. E a coisa alheia móvel é o objeto material. É a coisa sobre a qual recai a conduta criminosa. O que é coisa alheia móvel? Coisa alheia móvel – “Entende-se como objeto material do crime a coisa alheia móvel economicamente apreciável.” É importantíssimo que a coisa alheia móvel da qual o agente se apodera tenha interesse econômico. Se e não há interesse econômico, mas há interesse sentimental ou moral? Quem me dá um exemplo? Fotografia é o exemplo típico. Agenda de adolescente que vira diário. A agenda vira uma maleta com chiclete mascado do seu amado, como palito do primeiro picolé que tomaram juntos. Qual o valor econômico disso? Nenhum. E o valor sentimental? Todo. Ela prefere que subtraiam-lhe o carro, mas a agenda, não. Não está escrito que o objeto material do delito é a coisa economicamente apreciável? Então, onde ficam as coisas de interesse sentimental? Por isso vocês vão fazer essa observação: “Nélson Hungria abrange também as coisas de relevante interesse moral ou sentimental.” O objeto material tem que ser, antes de mais nada, coisa. Pergunto: homem vivo pode ser objeto material de furto? Não. Se você subtrair um homem, estará, na verdade, praticando crime de sequestro ou cárcere privado. Homem vivo não é coisa e não pode ser objeto material de furto. E o cadáver? Pode ser objeto material de furto? Você subtraiu um cadáver, praticou furto? Essa é a pergunta que cai. E a resposta é: em regra, não. “Em regra cadáver não pode ser objeto material de furto, salvo se destacado para uma finalidade específica, por exemplo, servir uma faculdade de medicina em aulas de anatomia.” Vocês acham que é bobeira essa discussão, mas não é. Eu não sei se vocês têm conhecimento, mas o Michael Jackson morreu, mas aquele caixão estava vazio por medo das pessoas subtraírem o corpo. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Agora, prestem atenção: essa coisa, objeto material do furto, tem que ser alheia. Não basta ser coisa. Tem que ser alheia. Pergunto: Coisa de ninguém é alheia? Pode ser objeto material de furto? Não. Coisa de ninguém não é alheia, não configurando furto. E a coisa abandonada? Não é alheia. Já foi alheia. Coisa abandonada não configura furto. Vai cair coisa de ninguém, vai cair coisa abandonada? Não. Vai cair coisa perdida. Coisa perdida pode ser objeto material de furto? Pergunto: é alheia? Coisa perdida é alheia, mas não conclua que por ser alheia é furto. Na coisa perdida, apesar de ser alheia, não há subtração, mas sim, apropriação. Logo, sendo a coisa perdida, você que dela se apropria e não entrega ao real proprietário, praticou o art. 169, § único, II, do CP, apropriação de coisa achada. O fato de ser alheia, não significa que a coisa perdida será objeto material de furto. Isso porque o fato de ser alheia não combinou porque não há subtração e sim apropriação. Apropriar-se de coisa alheia perdida é apropriação de coisa achada. Apropriação de Coisa Achada II - quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria, total ou parcialmente, deixando de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor ou de entregá-la à autoridade competente, dentro no prazo de 15 (quinze) dias. E se for coisa pública de uso comum? Pode ser objeto material de furto? Coisa pública de uso comum é alheia? Não. A todos pertence. Não é alheia, então, não pode ser objeto material de furto, salvo (e é esse salvo que cai) se destacada do local de origem, ganhando significado econômico. Exemplo: você está na praia, pega um balde de areia e leva para casa. Areia da praia é bem público que a todos pertence, você não praticou furto. Mas se levou uma retro-escavadeira, praticou crime ambiental, né idiota? Você pode, com baldinho! Cuidado, senão dá crime ambiental. Eu sou artista, e peguei a areia no baldinho e levo pra casa para fazer desenhos com essa areia dentro de garrafinhas para vender essas garrafinhas. Essa areia passou a atender ao meu interesse econômico. Se alguém se apropria dessa minha areia, pratica furto. Eu não estou dizendo que o artista furtou a areia da praia. Se alguém subtrai essas garrafinhas com areia, praticou furto porque a coisa de uso comum foi destacada para atender a interesse econômico. Passa a ser objeto material de furto. Preste atenção agora: e a pessoa que subtraiu o óculos do Drummond em Copacabana? A pessoa que levou embora o óculos praticou qual crime? A pessoa que levou o braço do Ayrton Senna, que crime pratica? Isso configura dano qualificado ao patrimônio público. Não é furto! Por fim, a coisa alheia deve ser também móvel. O que vem a ser coisa móvel? O conceito de coisa móvel no direito penal coincide como conceito do direito civil? O direito penal entende que a coisa é móvel quando pode ser transportada de um local para o outro sem perder a sua identidade. Aí é móvel. O direito penal não trabalha com os conceitos de direito civil. Para o direito penal, móvel é a coisa que pode ser Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 transportada de um local para o outro sem perder a sua real identidade. Olha o exemplo: você está reformando sua casa, derrubou a parede, mas vai reempregar os tijolos na reforma. Para o direito civil, os tijolos configuram coisa imóvel. E para o direito penal, móvel. Então, sob a ótica do direito civil, esses tijolos não poderiam ser objeto material de furto. É o exemplo que cai em concurso: tijolos que vão ser reempregados na construção. O crime de furto é punido a título de dolo. Então, preste atenção nos detalhes. Ele é punido a título de dolo + finalidade especial, caracterizada no enriquecimento próprio ou de terceiro (“subtrair para si ou para outrem”). Essa é a finalidade especial. Agora, a observação que eu vou fazer é a mais importante de todas: “E imprescindível animus de apoderamento definitivo, isto é, intenção de não mais devolver a coisa ao proprietário.” 1.1 FURTO DE USO Se ele tiver o animus de uso, eu não tenho crime. Aí vou ter o furto de uso. Cuidado com o furto de uso, lembrando que o furto de uso é atípico! O examinador pergunta por que o furto de uso é atípico e você não sabe responder. O furto de uso é atípico por ausência de dolo característico do crime. E quais são os três requisitos do furto de uso?  1º Requisito – “Intenção, desde o início, de uso momentâneo da coisa subtraída.” Ou seja, você subtraiu já com essa intenção.  2º Requisito – Coisa não consumível. Somente na coisa não consumível é que você consegue obedecer também ao requisito seguinte.  3º Requisito – Restituição imediata e integral à vítima. São requisitos cumulativos. Há doutrina que fala em coisa fungível, infungível. Discordo. A expressão que melhor se amolda é “coisa não consumível.” Faltando um desses requisitos, esqueça o furto de uso. É possível furto de uso de automóvel? Se o tanque estava cheio? O automóvel está perfeito, só com o tanque vazio. O tanque vazio caracteriza o furto de uso, pois eu não devolvi a coisa no status quo ante? Tem doutrina que está se apegando a essas questões periféricas: combustível, desgaste do freio, do óleo. Se você se apegar a isso, você nunca vai reconhecer o furto de uso. Você não pode esquecer que a coisa furtada foi o veículo. Se você devolveu o veículo nas condições iniciais, é furto de uso. Pouco importa o desgaste natural para o seu uso. Então, a jurisprudência moderna não impede o furto de uso de automóvel por desgaste do óleo ou da pastilha de freio. A coisa que você queria subtrair era o carro. O objeto que deve ser restituído imediata e integralmente à vítima é o carro e não os periféricos que servem para o seu uso regular. Se você fica se apegando a isso, você não reconhece furto de uso jamais. A jurisprudência moderna não se apega a essas questões acessórias. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 1.2. FURTO FAMÉLICO É crime? Não. Exclui o quê do crime? Tipicidade, ilicitude ou culpabilidade? À noite responderam: inexigibilidade de conduta diversa. Errado! Furto famélico é caso de estado de necessidade. Vocês estão lembrados dos quatro requisitos do furto famélico? Furto famélico é caso típico de estado de necessidade (art. 24, do CP) que tem como requisitos: 1º Requisito – “Que o fato seja praticado para mitigar a fome.” 2º Requisito – “Inevitabilidade do comportamento lesivo.” 3º Requisito – “Subtração de coisa capaz de diretamente contornar a emergência.” 4º Requisito – “Insuficiência dos recursos adquiridos ou impossibilidade de trabalhar.” Furto famélico é tese somente de desempregado ou pode ser aplicada para quem tem emprego? Você tem coragem de pedir para o juiz furto famélico para quem é assalariado? Furto famélico não é tese somente de desempregados. É o 4º requisito. Eu fiz uma pergunta à noite que teve gente que teve dificuldade. Não é para ter dificuldade na pergunta que vou fazer agora. A subtração é de comida porque é o que vai diretamente mitigar a fome (1º requisito). Você não pode furtar um ventilador porque não come um ventilador. Então, não dá. A pessoa subtraiu caviar para matar a fome. É possível furto famélico? Para matar a fome pode ser qualquer coisa! Não se pode exigir dela que subtraia para matar a fome batata chips. Se aquele era o produto que ela tinha à sua disposição para matar a fome, é válido. Então, cuidado! Não se impressione pelo caviar! Não se impressione pelo caviar! Ele estava passando fome. Ele pode pegar qualquer coisa que possa contornar a sua fome 1.3. FURTO: CONSUMAÇÃO Quando que o crime de furto se consuma? São quatro correntes discutindo o momento consumativo. “Ah, Rogério, mas eu só quero decorar a que prevalece.” Tudo bem, mas caiu em concurso recente pedindo para discorrer sobre as teorias da consumação do furto. 1ª Corrente: Teoria da Concrectatio: “a consumação se dá pelo simples contato entre o agente e a coisa alheia, dispensando o seu deslocamento.” 2ª Corrente: Teoria da Amotio: “dá-se a consumação quando a coisa subtraída passa para o poder do agente, mesmo que num curto espaço de tempo, independentemente de deslocamento ou posse pacífica.” (STF e STJ) Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 3ª Corrente: Teoria da Ablatio: “a consumação ocorre quando o agente, depois de apoderar-se da coisa, consegue deslocá-la de um lugar para o outro.” 4ª Corrente: Teoria da Ilatio: “para ocorrer a consumação, a coisa deve ser levada ao local desejado pelo agente e mantida a salvo.” Dessas quatro correntes, qual prevalece? Tomara que caia isso porque STF e STJ estão falando a mesma língua: Amotio. Essa é a corrente que prevalece nos tribunais superiores. Então, para o STF e para o STJ o crime se consuma quando a coisa subtraída passa para o poder do agente. Mesmo que num curto espaço de tempo, independentemente de deslocamento ou posse pacífica. Adotar essa teoria é importante por quê? O que importa não é o agente se enriquecer ou ter posse mansa e pacífica. O que importa é a vítima perder a disponibilidade da coisa. Pronto. O que importa é a vítima perder o poder sobre a coisa. Então, diante dessa teoria, estão consumados os seguintes exemplos:  Empregada que subtrai jóias da patroa e deixa embaixo do sofá, mesmo que ainda na casa da patroa. O crime está consumado. Se a patroa quiser usar as jóias não vai poder. É o exemplo de Nélson Hungria. A empregada sabe onde está a jóia e a patroa perdeu a disponibilidade, independentemente do deslocamento ou posse pacífica. Então, a teoria da amotio permite consumar esse exemplo.  Você subtrai uma carteira num navio. O dono viu e você a lança ao mar. O crime está consumado. Você não se locupletou, mas a vítima perdeu a disponibilidade sobre a coisa. Admite tentativa? O crime de furto admite tentativa. É delito plurissubsistente. Agora eu quero saber: o agente colocou a mão no bolso da vítima, mas naquele bolso não tinha nada. Ele cometeu algum crime? É tentativa de furtou ou é crime impossível? Pode até gerar uma importunação ofensiva. Nelson Hungria diz: tentativa, pronto e acabou. Para ele, houve uma relativa impossibilidade, não configura crime impossível, gera tentativa. Bittencourt discorda: você tem que perquirir se ele trazia valores em algum outro compartimento da vestimenta. Se ele não trazia dinheiro ou valores naquele bolso ou em nenhum outro, é crime impossível. Para Bittencourt, se ele não trazia dinheiro naquele bolso, mas trazia em outro, tentativa. Se o examinador adotar a tese de Bittencourt, vocês vão ter que diferenciar o quê no problema? Se a vítima não trazia qualquer valor, configurando crime impossível ou se a vítima trazia qualquer valor em outro compartimento da vestimenta, configurando tentativa. A última questão sobre consumação e tentativa diz respeito ao seguinte: vigilância eletrônica em estabelecimentos comerciais. Gera crime impossível? Por si só não gera. Aquele dispositivo eletrônico não serve para impedir o furto. Serve para dificultar a ação do agente e facilitar a repressão. Tem que ser analisado o caso concreto. Tem que ver qual é a ação do dispositivo de vigilância que, por si só, não Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 gera crime impossível. É preciso analisar o caso concreto: deque modo o dispositivo atua. Só filmar a pessoa não impede o furto. Você estará flagrando o furto e tentará impedi-lo. Então, tem que ser analisado o caso concreto. Isso caiu na segunda fase do MP/SP. Essa questão sobre estabelecimento vigiado caiu no MP/SP e teve candidato que, na peça prática, arquivou. 1.4. REPOUSO NOTURNO Agora vamos ao § 1º, do art. 155, que traz uma causa de aumento de pena: § 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno. Essa majorante é importante porque já não cabe mais a suspensão condicional do processo (cabível no caput) porque a pena mínima fatalmente suplantará um ano. É uma causa de aumento que vai impedir no caput, a suspensão condicional do processo. Olha a importância dela. Não é qualificadora, é causa de aumento e para você entendê-la, a gente tem que discutir o que seja repouso noturno. Repouso noturno – “É o período em que, à noite, pessoas se recolhem para o descanso diário.” Quando começa esse período e quando termina? Vocês acham que esse período é o mesmo numa grande cidade e numa cidade do interior em que as pessoas sabem o que os vizinhos comeram. Eu fui promotor em uma cidade com 17 mil habitantes. Que horas começa o repouso noturno nessa cidade? O promotor já estava repousando às duas da tarde. Tem cidades que às 20h, o pessoal já está dormindo com as galinhas, no sentido mais puro. Quando perguntarem sobre esse período, você vai ter que dizer: depende dos costumes da localidade. Se tem pessoas que não enxergam uma utilização válida do costume no direito penal, aqui está. Vamos nos valer do costume interpretativo. O costume do local dirá qual é o repouso noturno daquela coletividade. Agora, vejam: entende a maioria que essa majorante só incide se o furto atenta contra o imóvel em que a pessoa rotineiramente repousa. Entende a maioria que não abrange estabelecimentos comerciais. No meu código comentado para concurso, eu coloquei uma jurisprudência recente que entendeu que abrange até estabelecimentos comerciais. Mas para a maioria não abrange. O que significa isso? Você está dentro do imóvel e o seu carro na rua. Para a maioria não incide a majorante porque o carro estava na rua. Você não atentou contra o imóvel em que a pessoa repousa. E se o veículo estava na garagem? Incide a majorante porque o veículo estava protegido pelo imóvel que você repousa. Isso para a maioria. Mas tem uma jurisprudência recente do STJ, que abrangeu estabelecimentos comerciais. Mas isso não espelha, necessariamente, a maioria da jurisprudência. Este imóvel, para incidir a majorante deve estar habitado ou pode estar desabitado ocasionalmente? Se vocês entendem que deve estar habitado, os moradores devem estar repousando ou podem estar acordados. Para vocês Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 responderem a essa pergunta, vocês têm que ter em mente o motivo da majorante. E qual é ele? É que no período noturno, você diminui a vigilância sobre a coisa e ainda coloca em risco pessoas indefesas. Cezar Roberto Bittencourt diz, então, que só pode ser em face de imóvel, o imóvel deve estar habitado e os moradores repousando. Nelson Hungria também concorda. Se estão comemorando o aniversário de alguém no imóvel, já não incide a majorante. STF e STJ entendem que o imóvel pode estar, inclusive, ocasionalmente desabitado. É pacífico isso? Não! Já deu para perceber. Mas o STJ e o STF entendem que incide a majorante, mesmo no caso de imóvel ocasionalmente desabitado. A majorante só incide no caput (furto simples) ou também é possível aplicá-la ao furto qualificado? Prevalece que a majorante só se aplica ao furto simples. Se o furto está qualificado, não cabe a majorante, mas não impede o juiz de considerar na fixação da pena-base. Mas qual o fundamento disso? Interpretação topográfica. O §1º só se aplica ao caput. Se se quisesse que se aplicasse aos demais, estaria colocado como último parágrafo do dispositivo. 1.5. FURTO PRIVILEGIADO OU FURTO MÍNIMO (§ 2º) Isso caiu na defensoria/BA e o candidato achou que estivesse falando do furto insignificante. Errou. Furto mínimo é sinônimo de furto privilegiado. § 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa. Quantos requisitos nós temos para o furto privilegiado? Dois. Um subjetivo e outro objetivo.   Requisito subjetivo – primariedade do agente Requisito objetivo – pequeno valor da coisa Lembrando que são requisitos cumulativos. Primário é o não reincidente, mesmo que tenha condenações pretéritas. Se as condenações não geram reincidência, você é primário. E quando a coisa é de pequeno valor? Quando não ultrapassa um saláriomínimo. É possível a aplicação do princípio da insignificância (se é insignificante diminui pena)? Vocês não podem confundir pequeno valor com valor insignificante: “O pequeno valor do prejuízo não se confunde com prejuízo insignificante, este, causa de exclusão da tipicidade. Na insignificância existe mínima ofensividade na conduta, nenhuma periculosidade na ação, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica.” Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 O caso concreto dirá. A pergunta mais importante e que vai cair nos próximos concursos: “posso aplicar o privilégio ao furto qualificado? Existe furto qualificado privilegiado? O privilégio é compatível com a qualificadora?” Duas correntes! Cuidado que vai cair em concurso porque o STJ e o STF, finalmente, estão falando a mesma língua. 1ª Corrente: “A gravidade da qualificadora é incompatível com o privilégio. Não bastasse, a posição topográfica do privilégio não alcança as qualificadoras (era a posição do STF).” 2ª Corrente: “Assim como admitimos homicídio qualificado-privilegiado, também é possível furto qualificado-privilegiado. (atual posição do STF e do STJ).” A última observação que faço: O privilégio é um direito subjetivo do réu e não mera faculdade do juiz. Presentes os requisitos, o privilégio é direito subjetivo do réu. 1.6. ART. 155, § 3º - CLÁUSULA DE EQUIPARAÇÃO Toda doutrina está comentando, que o STF e o STJ estão tentando falar a mesma língua. Então, muitos posicionamentos estão mudando. § 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico. O § 3º traz uma cláusula de equiparação, equiparando à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico. Exemplo de qualquer outra energia que tenha valor econômico e que não seja elétrica: mecânica, térmica, radioatividade e genética. São as outras formas de energia. Energia genética – Sêmen de animal. Tem animais que valem fortuna, não somente por conta das suas propriedades físicas, mas do seu sêmen. O fruto que pode eventualmente advir desse animal. Eu assisti a um leilão e vi um empresário pagar dois milhões de reais por meio touro, pela parte reprodutora do touro. Mas é imprescindível valor econômico. Pergunta que caiu no MP/RO (2ª fase) e eu nunca peguei um caso como esse: dois vizinhos proprietários de dois animais da mesma raça, com pedigree, premiadíssimos. Um era dono do cachorro e o outro, da cadela. O dono da cadela sugeriu a cruza entre os animais, que foi recusada pelo vizinho. O dono do cachorro achava, inclusive, que ele tinha um brilho no pelo por causa da virgindade. O dono Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 da cadela, à noite, pegou a sua cadela e orientou o animal a romper o tapume que dividia as duas propriedades e colher o sêmen do cachorro. No dia seguinte, o cachorro estava desmaiado. O examinador queria que você oferecesse a denúncia. Qual o crime? Teve gente pensando em crime ambiental (maus-tratos de animais). Sabe qual foi a resposta? Furto mediante apoderamento indireto (que se dá por meio de animais, por exemplo), qualificado pelo rompimento de obstáculo (porque rompeu o tapume) de coisa equiparada a móvel: energia genética. Aí teve gente que colocou a majorante do repouso noturno, mas eu falei para vocês: não pode, porque o repouso noturno só se aplica ao caput. Questão interessante. Também caiu em Rondônia (MP, 2ª fase): Que crime pratica uma pessoa que convence um semi-imputável a manter relações com uma cabra. Resposta: maustratos de animais. Crime ambiental. É possível equiparar à coisa móvel sinal de TV à cabo? Vamos imaginar que você fez um contrato com a Sky. Você contratou um ponto. Mas, de repente, na sua casa tem Sky no quarto, na cozinha, no banheiro. Você contratou um ponto, mas tem Sky na residência inteira. É furto? Sinal de TV a cabo é coisa passível de furto? “Sinal de TV a cabo equipara-se a coisa móvel?” 1ª Corrente: “Não se equipara. A energia se consome, se esgota, diminui, ao passo que o sinal de televisão, não se esgota.” Cezar Roberto Bittencourt. 2ª Corrente: “Sinal de televisão é uma forma de energia.” Nucci e STJ. Sempre que essa questão chegou no STJ, o STJ decidiu de acordo com a segunda corrente. É claro que você vai ser esperto. Se for prestar prova para Defensoria, vai ficar com a 1ª corrente. A mesma discussão ocorre quando se discute pulsos telefônicos. Quando se trata de energia elétrica, não dá para confundir furto de energia elétrica com estelionato em face da concessionária. Uma coisa é furto de energia que não se confunde com estelionato em face da concessionária. São dois comportamentos que não se confundem e vou dar uma dica para vocês não confundirem:  O furto de energia é praticado mediante ligação clandestina (o famoso gato). O agente, no furto de energia, o agente não está autorizado a consumir a energia.  No estelionato, o agente altera o medidor de energia. No estelionato, o agente está autorizado por contrato a consumir a energia, fraudando, ludibriando o valor da dívida Você, no seu problema, tem que saber se ele realizou ligação clandestina ou não, se somente alterou o medidor de energia. Se isso não ajuda, tenta perceber se ele está ou não autorizado a consumir a energia. Se não está, é fruto mediante fraude. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Se está, é estelionato. Isso repercute na pena. Em um, está cumulada com multa, no outro não. Antes de começar as qualificadoras, deixa eu fazer uma observação que você não vai usar na prova, a não ser que esteja prestando defensoria. No mais, não utilize o que eu vou falar. Em caso de furto de energia e você tem que analisar o caso concreto, senão você acaba aplicando um direito penal elitista. Eu peguei o caso em que um casal realizou ligação clandestina e conseguiu trazer, com o gato, a energia do poste para a sua casa. A CIA Paulista de Força e Luz, apurou um gato exagerado, foi lá e percebeu a ligação clandestina. A Cia Paulista noticiou o fato à autoridade policial que instaurou o IPL. Qual crime? Furto de energia. Art. 155. Esse casal foi indiciado por furto de energia elétrica e o delegado ainda jogou um furto qualificado pelo concurso de pessoas (casal). Depois me chegou a notícia: o casal, quando foi indiciado, fez um acordo com a CPFL para pagar em tantas vezes. Juntaram o acordo. Qual é o benefício quando há o arrependimento e uma dívida é quitada? Qual é o benefício? Arrependimento posterior. Mera diminuição de pena. Eu, Rogério, teria que fazer o quê com o casal? Denunciar! E o juiz ia ter que fazer o quê? Condenar e depois diminuir um pouco a pena. Aí eu fiquei pensando... Vamos imaginar que não fosse um casal subtraindo energia elétrica, mas vamos supor que fossem sonegadores de 1 milhão de reais. Se eles tivessem parcelado a dívida haveria mera diminuição de pena? Não! Estaria extinta a punibilidade. Quem pratica dano ao erário público em milhões tem direito ao parcelamento extintivo da punibilidade. Eles não! Eles estavam sendo processados porque subtraíram 500 reais de energia elétrica! O que eu fiz? Eu apliquei o instituto dos crimes contra a ordem tributária no furto. Se o sonegador milionário que parcela extingue, o pobre que furta energia e parcela também extingue. Pronto! Analogia in bonam partem. O RS já tem julgado nesse sentido. Extremamente minoritário, mas para quem vai prestar defensoria, olha que raciocínio interessante: do direito penal elitista. O rico tem REFIS I, REFIS II, REFIS III e tal. O pobre, tunga, arrependimento posterior. Eu, como promotor, faço sempre, se o crime é sem violência e sem grave ameaça, a gente destrói. Sem violência, eu digo pro delegado: “chama ele, se ele reparar o dano, eu vou arquivar.” 90% ou tentam reparar ou reparam. 1.7. ART. 155, § 4º - FURTO QUALIFICADO O § 4º é o que mais cai em concurso. O § 1º traz majorante! O § 4º, o furto qualificado. A pena do furto, caput, que era de 1 a 4, dobra, passa a ser de 2 e 8 e multa. Furto Qualificado § 4º - A pena é de reclusão de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa, se o crime é cometido: I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa; II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza; III - com emprego de chave falsa; IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Inciso I – Traz um furto praticado com violência. Mas não é uma violência contra à pessoa. É o furto praticado com violência à coisa. Acreditem, no passado, isso era roubo. Antes o roubo era subtração violenta contra a pessoa ou coisa. Aí perceberam que não dava para equiparar a violência contra a pessoa à coisa. Já deu para perceber que há um obstáculo que se coloca entre o agente e a coisa. Deu para perceber claramente o seguinte: o que qualifica o crime de coisa é a violência empregada contra o obstáculo. Violência empregada contra a própria coisa não gera a qualificadora. O que gera é a violência praticada contra o obstáculo! A violência empregada contra a própria coisa visada não gera a qualificadora. Então, cuidado com isso! Para gerar a qualificadora a violência tem que romper o obstáculo que se coloca entre o agente e a coisa. Eu quero ver duas situações com vocês que vão dizer qual gera ou não qualificadora.  Eu quero furtar um carro. Eu destruo o vidro e vou embora com esse carro. Furto simples ou qualificado? Você responde: furto simples, porque a violência foi exercida sobre a própria coisa visada.  Eu quero subtrair um notebook dentro do carro. Eu quebro o vidro do carro e furto o notebook. Furto simples ou qualificado? Sua resposta: qualificado. O que vocês acharam da resposta de vocês? A resposta é legal. Mas vamos pensar sob o prisma da equidade. Está certo? Melhor você dizer pro agente: furta o carro que o notebook vai de brinde. Porque sua pena é melhor se você levar tudo. Tem uma jurisprudência importante dizendo o seguinte: quando o obstáculo rompido vale muito mais do que a coisa furtada, não incide a qualificadora. Quando o obstáculo rompido vale consideravelmente mais do que a coisa furtada, não incide a qualificadora. Porém, o STJ decidiu o assunto e decidiu pela qualificadora. Foi legalista, sem tem nada de equidade. Incide a qualificadora e pronto. O veículo é o obstáculo e o laptop é a coisa visada. Rompeu o obstáculo, subtraiu a coisa visada, conclusão do STJ: furto qualificado pelo rompimento de obstáculo. Eu removi as telhas e entrei na casa. Furto simples ou qualificado? A entrada na casa mediante remoção de telhas é simples ou qualificado. Olha a expressão! Ela diz tudo! Eu “removi” as telhas. O furto é simples. Eu não destruí as telhas. Elas continuam servindo para cobrir a casa. Mera remoção de telhas, mera desativação de alarme é furto simples porque você não rompe obstáculo. Romper obstáculo é tornar a coisa inservível, como dizem os tribunais. Romper obstáculo é você destruir as telhas, destruir o alarme. A mera remoção de telhas, a mera desativação de alarme, você venceu o obstáculo sem precisar destruí-lo. Se você venceu o obstáculo sem exercer violência sobre ele, não existe a qualificadora. Questão boa! Cuidado! Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 A violência contra coisa deve ser exercida antes, durante ou logo após o apoderamento. Se for exercida muito depois do apoderamento, aí você tem um crime autônomo de dano. Se o crime já está consumado e aí você exerce a violência contra a coisa, gera o crime autônomo de dano. Tem jurisprudência minoritária entendendo que ligação direta em automóvel é rompimento de obstáculo. Mas é entendimento minoritário. Inciso II – O inciso II tem quatro qualificadoras, quando o crime é praticado com: abuso de confiança, mediante fraude, mediante escalada ou mediante destreza. Abuso de confiança – quando incide essa qualificadora? Quando o agente se vale de uma confiança incomum nele depositada. Aqui, o agente se vale de confiança incomum nele depositada. Essa confiança pode advir de amizade, pode advir de parentesco, pode advir de uma relação laboral. Observação importante – “O criminoso pode captar propositadamente a confiança ou valer-se de confiança já existente.” Ele pode trabalhar para conquistar a confiança e praticar o crime ou então, já tendo a confiança, decidir pela prática criminosa. A mera relação de amizade, de parentesco ou laboral não induz essa qualificadora. A confiança tem que ser incomum. Você tem que dar a ele que os seus outros amigos não tem, que os seus outros parentes não tem, que os seus outros empregados não têm. É lógico que em qualquer relação de amizade, parentesco ou laboral há uma confiança. Mas a confiança tem que ser incomum. Você, na relação de parentesco, amizade e labora, tem que ser detentor da maior confiança. Observação importante – “Os tribunais para a configuração da qualificadora exige facilidade na execução em razão da confiança.” Para os tribunais, só vai haver a qualificadora se aquela confiança te trouxe facilidade na execução. Se você tinha a confiança, mas não encontrou qualquer facilidade na execução em razão dela, não incide a qualificadora. Isso é exigência dos tribunais. Na lei você não consegue concluir por isso. Pergunta do MP/MG: qual é a diferença entre o furto qualificado mediante abuso da confiança e o delito de apropriação indébita? Eu vou dar duas dicas que vocês vão ter que extrair do caso concreto. Na apropriação indébita, o agente exerce a posse em nome de outrem. Ou seja, ele tem uma posse desvigiada. Já no furto, ele não exerce posse em nome de outro. No furto, o agente tem mero contato com a coisa. Ainda que ele tenha a posse, é uma posse vigiada. É a primeira dica: natureza da posse que ele exerce. A segunda diferença está em que na apropriação indébita, a vontade de praticar o crime é posterior, superveniente à posse. Eu estou diante de um dolo superveniente. No furto, a vontade de praticar o crime é anterior à posse. Estou de diante de um dolo antecedente agora. Aí não tem erro. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Furto mediante fraude – é a qualificadora que mais cai em concurso. E vou direto para o que despenca: qual é a diferença entre o furto mediante fraude e o estelionato? Duas dicas também!  Furto mediante fraude – No furto, a fraude visa diminuir a vigilância da vítima sobre a coisa e possibilitar a subtração. Aqui, a vontade de alterar a posse é unilateral, ou seja, a coisa sai da vítima e vai para o agente de forma unilateral.  Estelionato – No estelionato, a fraude visa com que a vítima entregue a coisa espontaneamente. Ela emprega uma posse desvigiada. Aqui, a vontade de alterar a posse é bilateral. Numa prova objetiva, você consegue matar as questões só com o que eu coloquei aqui. MP/SP (caiu nos últimos 2 concursos), MP/MG, magistratura/SP e PR, delegado/DF (tudo nos últimos três anos) e MP/BA em 2005: duas pessoas se passam por funcionários da telefônica. Chegam até uma residência, anunciam para a senhora da casa que há um problema e pedem que um deles seja conduzido até a antena. Pedem que a senhora permaneça junto à antena para ajudar na verificação do problema. Ele desceu, limparam a casa da mulher. Que crime praticaram? Se vocês disserem que foi estelionato, vejam que o fato de ter sido praticado por duas pessoas não gera a qualificadora porque o estelionato não tem essa qualificadora. Se vocês disserem que foi furto mediante fraude, além da qualificadora, o juiz ainda pode considerar o concurso de agentes como circunstância judicial. E aí? É só você pensar: ela entregou as coisas espontaneamente? A mudança da posse foi bilateral? É fácil essa resposta. Exemplo clássico: a senhora está com dificuldade no caixa eletrônico. O agente usa um mecanismo e faz prender o cartão na máquina e depois oferece ajuda. Ela aceita a ajuda. Ele tira o cartão dela, troca por outro. A pessoa digita a senha, ele fica com o cartão, sabendo a senha. Que crime ele praticou? Troca de cartões. Furto mediante fraude ou estelionato? Ela entregou o cartão espontaneamente a ele? Não! Ele subtraiu o cartão. Ele usou de um artifício que fez com que ela perdesse a vigilância sobre o cartão. É só não esquecer o esquema acima que vocês não têm como errar. A única hipótese que podem, eventualmente errar é hipótese de jurisprudência divergente. Até agora, tudo o que estou falando é pacífico. MP/SP (2ª fase) – Troca de embalagens de produtos em supermercado. Exemplo do MP/SP: Você pegou uma garrafa de água, esvaziou a garrafa de água no supermercado e nela introduziu um vinho caríssimo. Você colocou um vinho, passou pelo caixa e pagou o preço da água. Você pagou água, mas levou vinho. Que crime pratica uma pessoa que abre a caixa do ventilador e coloca lá dentro uma televisão? Que crime você pratica? Estelionato ou furto mediante fraude? Muitos alunos, nessa Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 prova do MP colocaram estelionato porque a vítima representada pela caixa entregou a coisa espontaneamente numa posse desvigiada. A garrafa saiu de forma bilateral. Não! Aí você está trabalhando com a garrafa e não é isso que ele quer. Ele quer o que está dentro da garrafa. O vinho não saiu da garrafa dele espontaneamente. Em nenhum momento ela quis entregar o vinho para ele. O vinho entrou na garrafa de forma unilateral. Furto mediante fraude. Exemplo de estelionato que pode, eventualmente confundir (também caiu em concurso) – Você sai da boate e você tem o número 06, que foi onde você deixou sua bolsa, mas você percebe que a bolsa que está no compartimento 09 é Louis Vuitton. Você leva a bolsa Louis Vuitton. Aí você praticou estelionato. A bolsa saiu da mulher da chapelaria e foi para você de forma espontânea. Ela te deu uma posse desvigiada. Questão megathunderblaster. Já caiu na magistratura/SP com uma resposta e no MP/SP com outra. Falso test-drive é furto mediante fraude ou estelionato? Você vai numa concessionária e pede para testar a pick-up sozinho. Ele dá a chave do carro e o cara não volta. Ele foi vítima do quê? Estelionato ou furto mediante fraude? A magistratura colocou estelionato, mas está errado. A magistratura pensou: a vítima entregou a coisa espontaneamente, deu a chave. O carro saiu da vítima e foi para o agente de forma bilateral. Mas eu pergunto: deu a posse desvigiada? Não! Então, não é estelionato, mas furto mediante fraude. Para ser estelionato, a posse tem que ser desvigiada. De 2008 para cá temos mais de 15 julgados dizendo que é furto mediante fraude e não estelionato exatamente pela ausência da posse desvigiada. Então, falso test-drive é furto mediante fraude. A saída do carro para o agente de forma desvigiada ocorreu unilateralmente. A mesma questão caiu para delegado/DF, mas lá foi um falso test-drive de roupas. A pessoa entrou numa loja, pediu para experimentar a roupa, foi no provador, tirou o sobretudo, vestiu algumas roupas, colocou o sobretudo e foi embora com as roupas por baixo. É a mesma hipótese do falso test-drive de veículos. A resposta para a polícia civil do DF foi: furto mediante fraude. Vejam a diferença de pena: estelionato é de 1 a 5, furto mediante fraude é de 2 a 8. Acabou a suspensão do processo. Escalada – É a terceira qualificadora. Significa o uso de via anormal para ingressar no local em que se encontra a coisa desejada. Isso é escalada. Quando o candidato vê escalada, já imagina subida. Você não admite descida. Esqueça! É o uso de qualquer via anormal, seja subida, seja inclusive, ingressando por meio de túneis artificiais, de penetração subterrânea. Essa é uma via anormal. Toda e qualquer via anormal, seja subida, seja descida, seja cavando túneis, haverá a escalada, haverá a qualificadora.  Observação 01 – Não necessariamente subida. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  Observação 02 – A jurisprudência exige a presença de um esforço incomum do agente. Para configurar a qualificadora da escalada, a jurisprudência exige um esforço incomum do agente. Se não houver prova de que ele despendeu um esforço incomum, não existe essa qualificadora. Exemplo: eu tenho um muro de 1 metro. A via normal é você abrir o portão e entrar. Se você pular o muro, isso é escalada, mas só configurará qualificadora se você, para pular o muro de um metro despendeu um esforço incomum. Pedro Taques vai suar para escalar esse muro. A altura dele faz com que ele despenda um esforço incomum para vencer esse muro. O Fabrício, numa passada, vence um muro de um metro. Se vocês entenderam isso, olha como uma pergunta tem a ver com a outra: para configurar essa qualificadora é prescindível ou imprescindível perícia? 1ª Corrente: A perícia é prescindível, pois escalada não deixa vestígios. Um absurdo isso! Quem julga dessa maneira acha que escalada é só subir muro e ver se a sola está suja. 2ª Corrente: A perícia é indispensável somente quando deixa vestígio (caso do túnel). 3ª Corrente: A perícia é sempre imprescindível, pois deve atestar o desforço incomum. Pelo menos uma fotografia do muro é preciso porque o juiz tem que aquilatar se o agente, diante daquele obstáculo, empreendeu desforço incomum. Olha a pergunta que caiu: é comum, no interior, furto de cobre dos fios de energia elétrica. A pessoa sobe num poste e leva os fios de cobre embora. Incide a qualificadora? Vocês escreveram que escalada é uso de via anormal. Ele subiu num poste e levou os fios. É escalada? Isso é via anormal? Como é que você sobe num poste? Por helicóptero? Ele usou a via normal!!! A não ser que façam trocas de fios por helicóptero. Então, ele usou a via normal para atingir o alto do poste, que é escalando o poste. Não tem outro modo. Furto simples. Cuidado! Destreza – Qualifica-se o crime de furto quando praticado mediante destreza. O que é destreza? “Destreza é peculiar habilidade física ou manual praticando o crime sem que a vítima perceba que está sendo despojada.” É o famoso caso dos batedores de carteira, também chamados de punguistas. Observação:Para a configuração desta qualificadora, a jurisprudência exige que a coisa visada seja transportada junto ao corpo da vítima. Vocês acham que a destreza é analisada sob o ângulo da vítima ou de terceiros? A vítima não percebeu, mas terceiros perceberam. Incide a qualificadora? Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Cuidado! A destreza é analisada única e exclusivamente da vítima. Mesmo que terceiros percebam, o que importa é ela não perceber. A qualificadora persiste. É o que prevalece. Eu não falei que é unânime. Inciso III – O inciso III qualifica o crime quando há o emprego de chave falsa. O que é chave falsa? “Chave falsa é todo o instrumento, com ou sem forma de chave (é o conceito para os tribunais superiores), destinado a abrir fechadura.” Chave verdadeira obtida fraudulentamente é chave falsa? Você abriu com a chave verdadeira, mas obteve fraudulentamente. Noronha diz que incide e o TRF da 4ª Região já decidiu que incide, mas não é o que prevalece porque chave verdadeira, ainda que obtida fraudulentamente, é chave verdadeira. Não é falsa! Noronha abrange na expressão “chave falsa” a “chave verdadeira obtida fraudulentamente”. Não é o que prevalece. Exemplo de chave falsa: chave-lixa ou gazua, vareta, grampos, arame do cabide, canivete e por aí vai. Certeza que vai cair na sua prova: ele usou a chave falsa, não para abrir a fechadura do carro, mas para ligar o motor. Incide a qualificadora? O STJ, até 2008, entendia que não configurava essa qualificadora a utilização da chave só para movimentar o veículo. A partir de 2008 a coisa mudou. O STJ vem decidindo que qualifica o crime, sim. Anote o julgado: REsp 906685/RS. Inciso IV – Incide a qualificadora quando o crime é praticado mediante concurso de duas ou mais pessoas (a pena dobra: 2 a 8 anos). Aqui há uma discussão doutrinária, mas é só na doutrina, porque a jurisprudência já pacificou tudo. Nélson Hungria diz o seguinte: a qualificadora do § 4º, IV, exige pluralidade de executores. Nélson Hungria não abrange partícipe. Se A subtrai, e B somente auxilia A a subtrair, para Nélson Hungria, como você tem só um executor do crime e ele não computa o partícipe, para ele, este furto não é qualificado. Para ele, ambos respondem por furto simples. Já para a maioria, o § 4º, IV fala “concurso de duas ou mais pessoas” e a expressão concurso abrange coautores como também os partícipes. Para a maioria, basta a pluralidade de agentes, abrangendo partícipes. É dispensável a qualificação de todos. Basta a prova de que houve concurso de agentes, de que duas ou mais pessoas concorreram para o crime. Ponto. Incide a qualificadora mesmo que um dos concorrentes seja menor inimputável. Atenção a um detalhe importante: o que o concurso de pessoas fez com a pena do furto? Dobrou. A pena, de 1 a 4, passou a ser de 2 a 8. O roubo também tem Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 uma circunstância parecida. Porém, não qualificadora, mas majorante. No roubo, a pena é de 4 a 10 e no caso de concurso de agentes, essa pena de 4 a 10 é aumentada de 1/3 até a metade. O roubo, que é um crime bem mais grave, no caso de concurso de agentes, a pena pode, no máximo, ser aumentada de metade. No máximo, ser aumentada de metade. O que vocês acham? Tem gente dizendo o seguinte: isso é inconstitucional porque fere o princípio da proporcionalidade. Você pune menos com mais e mais com menos. Como é que pode um concurso dobrar a pena do menos e só aumentar de metade a do mais? Tese para a defensoria pública. Não é o que prevalece. Prevalece que é constitucional. 1ª Corrente: Não vai dobrar a pena de 1 a 4, passando a ser de 2 a 8 porque é inconstitucional. Aplica o aumento do roubo no furto simples. 2ª Corrente: Mas prevalece que a aplicação da majorante do roubo no furto fere o princípio da legalidade porque é o juiz legislando. Juiz não pode legislar. Essa é a posição do STJ. Parágrafo 5º – A última qualificadora do furto está no § 5º, que aumenta em 1 ano a pena mínima, mantendo a máxima. § 5º - A pena é de reclusão de 3 (três) a 8 (oito) anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. É imprescindível para a incidência da qualificadora que o veículo ultrapasse os limites do Estado ou a fronteira do País. Está falando do DF? Quando fala em Estado, é óbvio que está abrangendo o DF. Nem a Constituição lembra de diferenciar Estado de DF em todos os seus dispositivos... Então, a palavra Estado é unidade da federação, abrangendo o DF. A partir do momento que eu digo que para incidir essa qualificadora é imprescindível ultrapassar os limites de um Estado ou fronteira do País, pergunto: admite tentativa? Vamos imaginar o seguinte: SP e PR. Você furtou o veículo em SP, estava chegando no Paraná e foi preso com o veículo. Incide a qualificadora? Não incide a qualificadora. Pergunto: Mas não seria essa a hipótese da qualificadora tentada? Não, porque se o crime estava consumado, ele não passa a ser tentado só porque você não conseguiu ultrapassar os limites do Estado. Então, não incide a qualificadora e o crime continua consumado. Agora, vejam a segunda situação: Você subtraiu o veículo em SP e foi perseguido incessantemente pela polícia de SP, entrando no PR e no PR você foi preso. Incide a qualificadora? Se você ultrapassou os limites do Estado, incide a qualificadora. Eu não falei que é imprescindível ultrapassar os limites do Estado? Pergunto: crime consumado ou tentado? Para a teoria da amotio, o crime está consumado. Mas para a teoria da ilatio, o crime é tentado. Aliás, seria a única hipótese em que essa qualificadora admitiria a tentativa e mesmo assim para a teoria da ilatio. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Olha o que vai cair na sua prova: A furtou um veículo. A contratou B para transportar o veículo para outro Estado. B consegue transportar o veículo até o seu destino. Que crime pratica A? Que crime pratica B? É exatamente esse o problema da sua prova. 1ª Hipótese: B, de qualquer modo, participou do furto? Se B fez isso, seja induzindo ou instigando A, por exemplo, A responde pelo art. 155, § 5º e B responde pelo art. 155, § 5º, na condição de partícipe, combinado com o art. 29, do CP. A e B respondem pelo furto qualificado pelo § 5º. É claro que não incide o § 4º, IV (concurso de agentes). Se são duas qualificadoras, vai incidir a mais grave. Vocês já viram isso comigo em lesão corporal. O § 4º, IV, não incide, porque o § 5º é mais grave e deve ser considerado como circunstancia judicial. 2ª Hipótese: B, de qualquer modo, não participou do furto. Foi contratado para transportar o veículo sabendo que o veículo era produto de crime. Que crime praticou A, lembrando que ele conseguiu transportar o veículo para o outro estado? Art. 155, § 4º. E B, praticou qual crime? Receptação. Um detalhe, já muda o crime para B. 3ª Hipótese: B não participou do furto e desconhecia a origem do veículo. A responde por furto qualificado pelo § 5º e B, em regra, é atípico. A não ser que você consiga comprovar uma receptação culposa. O que eu coloquei nesse problema que te impede de criar situação de favorecimento real para B? Eu falei que B foi contratado. No favorecimento real, B não buscaria qualquer vantagem pessoal. B só buscaria auxiliar A. Então, jamais haverá favorecimento real aqui. Nós vamos ter uma aula para falar de favorecimento real. Aliás, na próxima aula, de receptação, a gente vai ver a diferença. No favorecimento real, B não poderia extrair qualquer vantagem. B tinha que trabalhar só para favorecer A. E é o que ele está fazendo. No favorecimento real, você favorece o furtador e aqui ele está buscando vantagem, contratado, está recebendo. 2. ROUBO – Art. 157, CP Roubo Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa. § 1º - Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro. § 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade: I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma; II - se há o concurso de duas ou mais pessoas; Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância. IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior; V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. § 3º - Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de 7 (sete) a 15 (quinze) anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, sem prejuízo da multa. Como sempre faço, vou colocar como o roubo está topograficamente colocado no CP:     Caput – Traz o roubo simples ou propriamente dito. § 1º - Traz o roubo simples impróprio ou impropriamente dito § 2º - Traz majorante de pena § 3º - Traz qualificadoras Sabe o que caiu em concurso? Quem me dá sinônimo de roubo simples impróprio? Caiu isso em concurso. Roubo por aproximação. “Doutor, fale um pouco sobre o roubo por aproximação.” O candidato ficou falando de furto com violência à coisa. Qual é o bem jurídico tutelado? Lendo o caput, vê-se que há dois bens jurídicos. É um crime complexo: patrimônio e liberdade individual da vítima. O roubo, nada mais é do que um furto + constrangimento ilegal. No furto, patrimônio, no constrangimento ilegal, liberdade individual da vítima. Pronto! É um crime complexo. Protege dois bens jurídicos. O crime é comum e pode ser praticado por qualquer pessoa, salvo o proprietário. Proprietário que subtrai violentamente coisa sua em favor de alguém, é exercício arbitrário das próprias razões. Quem é a vítima do roubo? Não é somente a pessoa ferida no patrimônio, que teve o patrimônio diminuído, mas também aquela contra a qual o agente empregou a violência ou a grave ameaça. Agora, vejam, nós temos dois comportamentos punidos da leitura do art. 157, caput: Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência.” Nós vamos falar do roubo próprio. No roubo próprio, o agente emprega a violência física ou então, emprega grave ameaça ou então, emprega qualquer outro meio para a subtração. Vejam que no roubo próprio ou propriamente dito, o ato antecedente é a violência física, ameaça ou qualquer outro meio para a pessoa subtrair. A subtração, no roubo próprio, é ato subsequente. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Quem me dá exemplo de qualquer outro meio que não seja violência física ou moral? Exemplo emblemático de qualquer outro meio: administração de psicotrópicos. O famoso boa-noite-cinderela. A doutrina comenta também da hipnose. Esse “qualquer outro meio” que configura roubo próprio é chamado pela doutrina de “violência imprópria”. Cuidado! Violência imprópria dentro modus operandi do roubo próprio. 2.1. ROUBO IMPRÓPRIO– Art. 157, § 1º, CP § 1º - Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro. É chamado roubo impróprio ou roubo por aproximação. Qual é a diferença para o roubo próprio? Tem algumas diferenças, mas já deu para perceber que o que é antecedente em um é subsequente em outro e o que é subsequente em um é antecedente no outro. No roubo impróprio, primeiro ocorre a subtração, o apoderamento. O apoderamento é o ato primeiro. Para assegurar a impunidade ou a detenção da coisa, o que o agente faz? Ele emprega violência física ou grave ameaça. Então, vejam que no roubo impróprio, o antecedente é a subtração. O subsequente é o emprego da violência ou grave ameaça. Cuidado! No roubo próprio havia violência, grave ameaça, ou qualquer outro meio (a chamada violência imprópria). E no roubo impróprio, existe espaço para a violência imprópria? Não existe violência imprópria. Eu posso incluir? Claro que não, sob pena de analogia in malam partem. Olha o detalhe que cai em concurso: para haver o roubo impróprio é imprescindível o prévio apoderamento. É indispensável o prévio apoderamento. É indispensável o contato físico agente-coisa. A doutrina diz que o roubo impróprio nada mais é do que um furto que se transforma em roubo em razão das circunstâncias. Vou dar três situações, vai cair a terceira (1ª fase do MP): 1. Eu coloco uma arma na sua cabeça, faço você descer do seu veículo e levo embora o seu carro – roubo próprio ou impróprio? Arma na cabeça é grave ameaça. O ato subsequente é subtrair para si ou para outrem. Roubo próprio. 2. Eu me apodero da sua TV, estou saindo da sua casa com a TV e você aparece. Para garantir a detenção ou a impunidade, eu te agrido e fujo – Roubo impróprio. Me apoderei, depois pratiquei a violência. 3. Quando eu ia me apoderar da televisão, não houve contato, você apareceu. Eu te agredi para fugir e saio em fuga – que crime eu pratiquei? Caiu na primeira fase do MP. Galeras responderam roubo impróprio. Cuidado! Eu ia me apoderar. Se eu falei Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 que eu ia, não houve contato agente-coisa e eu falei que no roubo impróprio esse contato é indispensável. Então, você esqueça roubo impróprio. O que você tem? Tentativa de furto (eu ia me apoderar) + crime contra a pessoa. Homicídio ou lesão corporal. Diz o § 1º: “Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa.” A jurisprudência diz que só configura roubo impróprio, configurando esse “logo depois” até a consumação do furto. Se o furto já está consumado e depois você emprega a violência, isso não transforma o furto consumado em roubo impróprio. Você responde por furto consumado + crime contra a pessoa. Eu falei que o roubo impróprio é um furto que se transforma em roubo, é um furto que ainda não se consumou e se transforma em roubo. Se o furto já está consumado, a violência posterior é crime autônomo. Vejam que ele diz que a violência que transforma esse furto em roubo impróprio deve ser exercida logo depois da subtração. Isso significa que o furto que se transforma em roubo é um furto que ainda não se consumou. O furto que já se consumou não se transforma em roubo com a nova violência. A violência é um crime autônomo. Aplica-se o princípio da insignificância, seja ele próprio ou impróprio? O princípio da insignificância é possível no roubo? Quem presta defensoria, é possível até no estupro. Um roubo de uma escova de dentes, de 2 reais, aplica-se princípio da insignificância? Não se aplica o princípio da insignificância no roubo. Não se aplica! Vamos anotar a justificativa: “É inaplicável o princípio da insignificância no roubo, por se tratar de crime complexo, no qual o tipo penal tem como elemento constitutivo o constrangimento ilegal, protegendo também a integridade física (STF e STJ).” Tem gente querendo aplicar o privilégio do furto no roubo, por analogia, sendo uma analogia in bonam partem. Se o agente é primário, e é de pequeno valor a coisa, eu posso aplicar, por analogia, o privilégio do furto no roubo. Admite-se? STF e STJ entendem que o privilégio é incompatível com a gravidade do roubo, não admitindo essa analogia. O crime de roubo é punível a título de dolo. Só dolo? Qual é o elemento subjetivo do roubo? O candidato bobeou. Você tem que dividir o roubo próprio do roubo impróprio:  Roubo próprio – É punido a título de dolo, mais elemento subjetivo (finalidade especial). Qual é a finalidade especial? “para si ou para outrem”.  Roubo impróprio – Também é punido a título de dolo, mais elemento subjetivo (finalidade especial também). Qual é a finalidade especial? “para assegurar impunidade e para assegurar a detenção da coisa”. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Então, vejam que entre um e outro, achamos mais uma diferença, qual seja, o elemento subjetivo dos crimes é diferente. Já caiu no MP/MG as diferenças do roubo próprio e impróprio. Além das duas que já vimos, vocês têm essa terceira. É possível roubo de uso? Coloquei uma arma na sua cabeça, usei o seu caso e devolvi. É crime o roubo de uso? STF e STJ: roubo de uso é crime. Agora, Rogério Greco diz: é crime, mas não de roubo. Roubo de uso: vocês já sabem que o roubo é formado de furto + constrangimento ilegal. Se ele é apenas de uso, não tem mais o furto. Para ele, se o roubo é de uso, você não tem a finalidade de animus definitivo. Desaparece o furto que integra o roubo. Então, o roubador de uso deve responder apenas por constrangimento ilegal. Essa é a tese de Rogério Greco. Quem roubou deve ser punido somente por constrangimento ilegal. Tese para defensoria pública. Quando o crime de roubo se consuma? Temos que diferenciar o momento consumativo do roubo do caput (roubo próprio) e do roubo do § 1º (roubo impróprio):  Consumação no roubo próprio (caput) – O caput é o mesmo raciocínio do furto. “Consuma-se com o apoderamento, perdendo a vítima a disponibilidade, dispensando posse mansa e pacífica.” É a teoria da amotio. Essa é a posição do STF e do STJ. Não é a do TJ/SP que parece exigir posse mansa e pacífica. Admite tentativa.  Consumação no roubo impróprio (1º 1º0 – “Consuma-se com o emprego da violência ou grave ameaça, dispensando posse mansa e pacífica.” Então, vejam que o momento consumativo difere no roubo próprio e no roubo impróprio. Mas, cuidado! A doutrina diverge quanto à possibilidade de tentativa: 1ª Corrente: “Não se admite a tentativa, pois ou a violência é empregada e tem-se a consumação, ou não é empregada, e o que se apresenta é o crime Damásio. E essa de furto.” Quem adota essa primeira corrente? Por exemplo, corrente se diz majoritária. 2ª Corrente: “É possível a tentativa quando o agente, após apoderar-se do bem, tenta empregar a violência, mas é contido.” Quem adota essa corrente? Mirabete. A primeira corrente se diz majoritária, mas eu, fazendo uma pesquisa, cheguei à seguinte conclusão: ela é majoritária na doutrina clássica. A moderna está com a segunda. A primeira corrente é majoritária em Nelson Hungria, Noronha e por aí vai. Mas a doutrina moderna (Mirabete, Rogério Greco, Nucci, etc.) fica com a segunda corrente. Nós não temos decisões dos tribunais superiores solucionando o tema 2.2. CAUSAS DE AUMENTO DE PENA – Art. 157, § 2º, CP § 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade: I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma; Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Vocês estão cansados de ouvir que aqui o roubo é qualificado. Está errado. Aqui é roubo majorado. Quantas vezes vocês escutaram que “fulano praticou roubo qualificado pelo emprego de arma.” Está errado. Aqui é roubo majorado. Não é qualificadora, é causa de aumento. Então, cuidado! Estamos diante de majorante, causa de aumento de pena. É necessário o emprego efetivo da arma no roubo ou basta o porte ostensivo da arma? Você precisa empunhar a arma no roubo ou basta subtrair alguém mostrando que você está armado? 1ª Corrente: Cezar Roberto Bittencourt entende indispensável o emprego efetivo da arma, não basta o simples porte. Ele tem que empregar efetivamente a arma no crime. 2ª Corrente: Luiz Régis Prado: basta o porte ostensivo. Tem prevalecido que basta o porte ostensivo. O que é arma? Essa expressão gera uma indisfarçável controvérsia. Arma é só revólver, pistola, instrumentos bélicos, ou abrange qualquer instrumento? Você está andando na rua, a pessoa coloca um caco de vidro no seu pescoço. Isso é arma? Coloca uma lâmina de barbear no seu pescoço, é arma? O que é arma? 1ª Corrente: “Toma a expressão no seu sentido restrito. Arma, para esta corrente, é o instrumento fabricado com finalidade exclusivamente bélica, por exemplo, revólver.” 2ª Corrente: “Toma a expressão no seu sentido amplo: arma é todo instrumento, com ou sem finalidade bélica, capaz de servir ao ataque.” Aqui, por exemplo, faca de cozinha é arma. Qual das duas prevalece? A segunda corrente está fazendo uma interpretação extensiva contra o réu. É possível? O Brasil admite isso? Essa segunda corrente é a que prevalece. Sabendo que a segunda corrente é a que prevalece, vocês já sabem: o Brasil admite interpretação extensiva contra o réu porque a interpretação extensiva não é para favorecer ou prejudicar o réu, mas para chegar na vontade do legislador. Então, vejam que para o Brasil, arma, é todo instrumento com ou sem finalidade bélica capaz de servir ao ataque. Dica para defensoria – quem for prestar defensoria jamais vai concordar com a interpretação extensiva contra o réu. Você vai usar um argumento importante: Estatuto de Roma, que expressamente proíbe a interpretação extensiva contra o réu. “Mas Rogério, isso é para o TPI, não para nós”. Como não?? Isso é tratado de direitos humanos que entra no Brasil com status, pelo menos de direito supralegal. O Estatuto de Roma é, antes de mais nada, um documento de direitos humanos. Mas você, defensor público, que usar isso, não se esqueça que o TPI admite investigação pelo MP. Não adianta usar uma parte e negar a outra. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Caiu em dois concursos: admite-se a interpretação extensiva contra o réu. E a resposta foi falso! Absurdo. O direito penal veda a analogia in malam partem contra o réu. Na interpretação extensiva existe a lei sendo interpretada para se chegar na real vontade do legislador. Mas para defensoria pública, se quiser combater a interpretação extensiva contra o seu assistido, use o Estatuto de Roma, que expressamente coíbe a interpretação extensiva contra o réu. Arma de brinquedo ou simulacro de arma de fogo gera a majorante? Não há dúvida de que a arma de brinquedo é suficiente para gerar a grave ameaça do roubo. Isso é certo! Mas a pergunta é se ela gera a majorante do § 2º. O roubo com arma de brinquedo é simples ou majorado? A arma de brinquedo que é suficiente para agrave ameaça do roubo, gera a majorante? Até 2001, se trabalhava com a Súmula 174 do STJ. STJ Súmula nº 174 - 23/10/1996 - DJ 31.10.1996 - Cancelada - RESP 213.054-SP 24/10/2001 - No crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento de pena. Ou seja, roubo com arma de brinquedo, não só configura a grave ameaça elementar do tipo como autoriza o aumento de pena. Isso até 2001. Porém, em outubro de 2001, a 3ª Seção deliberou pelo cancelamento dessa súmula. Isso significa que para o STJ e para o STF que aplaudiu esse cancelamento, para os dois tribunais superiores, arma de brinquedo não mais autoriza o aumento. Isso significa que roubo com arma de brinquedo é roubo simples ou majorado por outra circunstâncias. Por essa, jamais! Essa súmula foi cancelada sob dois fundamentos: a arma gera um maior risco à incolumidade pessoal. Uma arma, num roubo pode, tranquilamente gerar um maior risco à vítima, causando-lhe até a morte. Então, a arma de brinquedo não gera aumento porque não tem a capacidade de criar o risco que se busca prevenir. Ela é incapaz de criar o risco que se busca impedir. Logo, nós estamos trabalhando com duas teorias: com o Princípio da Lesividade e Teoria da Imputação Objetiva porque a arma de brinquedo não é capaz de criar o risco proibido. São essas duas teorias que fundamentam o cancelamento da Súmula 174. Agora quero falar da arma verdadeira, mas desmuniciada ou inapta ao disparo. Gera o aumento? Agora estou falando da arma verdadeira inapta ao disparo. Aqui havia duas correntes: 1ª Corrente: Gera o aumento do § 2º, I 2ª Corrente: Não gera o aumento do § 2º, I Uma dessas correntes saiu fortalecida do cancelamento da Sumula 174, qual foi? A segunda. Se cancelaram a Súmula 174 porque a arma de brinquedo não tem potencial para produzir o risco proibido, arma verdadeira incapaz do disparo também não tem essa capacidade. Então, a segunda corrente foi fortalecida com o Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 cancelamento da Súmula 174. Isso foi dissertação: disserte sobre o emprego majorado pelo uso de arma. Você tinha que enfrentar esse ponto da arma inapta ao disparo. Para incidir essa causa de aumento do emprego de arma, é dispensável ou indispensável a apreensão da arma? Prevalece que para incidência da majorante a apreensão da arma é dispensável, desde que comprovado o seu emprego por outros meios. Sempre prevaleceu isso. Dispensa a apreensão da arma, que não precisa ser apreendida para gerar o aumento, desde que o seu emprego seja comprovado por outros meios. Eu falei que é o que prevalece. Se para gerar o aumento a arma não precisa ser apreendida, como saber se a arma empregada no roubo era de brinquedo? A vítima não vai poder contestar porque hoje há réplicas idênticas. Se a arma não aparece você nunca vai poder apurar se a arma era ou não capaz de disparar. Por isso, este ano, temos uma decisão do STF e do STJ entendendo indispensável a apreensão e perícia na arma. “Apesar de minoria, o STJ e o STF entenderam ser necessária a apreensão da arma para que se possa implementar o aumento de pena previsto no art. 157, § 2º, I. Com a ausência da apreensão e perícia da arma, não se pode apurar sua lesividade e, portanto, o maior risco para a integridade física da vítima (STJ HC 99762/MG).” Eu gosto muito desse julgado (não que eu tenha aplaudido), porque do jeito que ele explica, ficou muito claro qual é a razão desse aumento e porque não tem que incidir quando a arma não é apreendida (o julgado é muito longo, só coloquei a ementa). Prova do Cespe, certeza que é essa a posição que vai cair. Inclusive, esse julgado até reconhece a existência de posicionamentos em contrário, mas afirma que é o tipo de coisa que não pode mais prevalecer. STJ HC 99762 RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA 6ª TURMA – 10/03/2009 1. A necessidade de apreensão da arma de fogo para a implementação da causa de aumento de pena do inciso I do § 2º do art. 157 do Código Penal, tem a mesma raiz exegética presente na revogação da Súmula n. 174, deste Sodalício. 2. Sem a apreensão e perícia na arma, não há como se apurar a sua lesividade e, portanto, o maior risco para o bem jurídico integridade física. 3. Ausentes a apreensão e a perícia da arma utilizada no roubo, não deve incidir a causa de aumento. 4. Ordem concedida, para afastar a causa de aumento de pena prevista no inciso I do § 2º do art. 157 do Código Penal, reduzindo as penas privativa de liberdade e de multa impostas, fixando-as, respectivamente, em 4 (quatro) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Por fim, eu quero saber o seguinte: roubo majorado com emprego de arma pode conviver com a quadrilha ou bando armada? Pode o MP denunciar uma pessoa pelo art. 157, § 2º, I, e pelo art. 288, § único? Roubo com emprego de arma e quadrilha ou bando armada em concurso material? Pode? Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 1ª Corrente: Não admite, configurando bis in idem. Nucci. Se você tem uma quadrilha ou bando armada, esqueça a arma no roubo ou vice-versa. Você vai excluir o que for mais benéfico para o réu. 2ª Corrente: Admite, não havendo bis in idem. Para esta segunda corrente, são infrações independentes, protegendo, cada qual bens jurídicos próprios. STF. Na verdade, para não haver bis in idem você tem que perceber o seguinte: no art. 157, § 2º, I, você está punindo o fato de ele empregar a arma do crime. O art. 288, § único pune o fato de a quadrilha ter arma. Por isso são circunstâncias diferentes. Aí eu até posso concordar que não há bis in idem. Mas se você olhar sob o enfoque da arma, vai ver bis in idem. Mas o art. 157, § 2º, I, não pune mais gravemente porque tem arma, mas porque a arma foi empregada no crime. O art. 288, § único pune mais gravemente a quadrilha porque ela possui arma. São situações distintas e aí posso concordar que não há bis in idem. Por ora, é a posição do Supremo. Eu digo, por ora, porque a hora que isso chegar lá nessa nova composição, eles aniquilam com isso. MP/MG e MP/SP já perguntaram isso e a resposta certa foi a segunda corrente. Vocês têm material suficiente para uma dissertação. O MP/SP queria que você dissertasse só sobre o 157, § 2º, I. Agora vamos para o art. 157, § 2º, II: § 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade: II - se há o concurso de duas ou mais pessoas; O que falamos sobre o concurso de duas ou mais pessoas, no furto, transportem para cá. Ou seja, lembram da discussão do Nelson Hungria? Vocês vão colocar só o que prevalece: nesse número mínimo de duas pessoas eu vou computar:    Partícipes, Concorrentes não identificados (conseguiram bem sucedida fuga) e Concorrentes inimputáveis (menores). § 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade: III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância. O legislador aqui não precisava ter dito “conhece tal circunstância” porque, do contrário, haveria responsabilidade penal objetiva. Nem precisava. Se a vítima está “em serviço de”, ou seja, é imprescindível que a vítima esteja prestando serviços para alguém. Então, não incide a causa de aumento quando a vítima está transportando seus próprios valores. Somente quando ela está no transporte de valores para alguém. Se ela está transportando seus próprios valores, não incide a majorante. Questão boa! Cuidado! O que são valores? Quais são os valores abrangidos pela majorante? Vocês vão encontrar doutrina dizendo que são apenas valores bancários. Ou seja, tem doutrina que limita à proteção do carro-forte. Mas onde está essa restrição? Eu não tenho dúvida de que a preocupação do legislador foi com o carro-forte, mas isso não Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 significa que ele tenha limitado o inciso III somente ao objeto carro-forte. Por isso, prevalece que abrange qualquer tipo de valor, seja carro-forte, seja caminhão transportando carga, não importa a carga: carne, remédio, cigarro, bebida, eletrodoméstico. Tem um caminhão transportando valor e é roubado na autoestrada, pronto, incide a majorante. É transporte de qualquer valor. Nesses roubos de carga nas rodovias, que a gente vê no jornal, incide o inciso III. § 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade: IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior; No furto, existe uma circunstância idêntica, sendo que lá é qualificadora, aqui é causa de aumento. § 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade: V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. Vamos trabalhar com esse inciso V daqui a pouco. “Mas Rogério, era aqui que eu colocava o sequestro-relâmpago?” Pode ser. O sequestro-relâmpago era uma expressão vulgar que servia a várias situações. Essa era uma das situações à qual se aplicava a expressão “sequestro-relâmpago.” Magistratura: qual é a diferença do roubo majorado pela privação da liberdade e o delito de roubo em concurso com o crime de sequestro? No roubo, a privação da liberdade da vítima é necessária para o sucesso da subtração ou da impunidade. Reparem que no roubo majorado pela privação da liberdade, essa privação é necessária ou para a detenção da coisa ou para garantir a fuga, mas é necessária. No roubo do § 2º, V, a privação não é prolongada. Ela dura o tempo absolutamente necessário para o sucesso da empreitada. Agora, você vai ter roubo em concurso com o art. 148, esquecendo o § 2º, V, quando a privação da liberdade da vítima não é necessária. E é uma privação prolongada, perdurando por tempo absolutamente desnecessário. Olha o exemplo: eu vou assaltar uma casa e coloco todos os moradores trancados no banheiro e vou embora com o veículo da família e os objetos dentro do carro. Que crime cometi? Roubo majorado pela restrição da liberdade. Outro exemplo: eu coloco uma arma na sua cabeça e subtraí o seu veículo, dizendo, “vai para o outro banco.” Você, com uma arma na cabeça fica 24 horas comigo roubando a cidade, ou coloco você no porta-malas. Eu uso o seu veículo para praticar vários assaltos com você no porta-malas. Neste caso, a privação da sua liberdade não era necessária. Eu te mantive preso por tempo prolongado. Isso é roubo em concurso material do delito do art. 148. Aumento da pena - Terminamos o §2º, que diz que a pena é aumentada de um terço até metade. Como é que o juiz varia esse aumento? Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 1ª Corrente: Quanto mais majorantes, mais próximo de metade; quanto menos majorantes, mais próximo de 1/3. STF. 2ª Corrente: Devem ser analisadas a gravidade de cada circunstância, ou seja, a gravidade do crime e não com a quantidade das circunstâncias que rodeiam o crime. Não importa a quantidade, mas a gravidade do crime majorado. Exemplo: uma pessoa assaltou a vítima sozinha com uma arma. Para o STF, o aumento vai ser de 1/3. A segunda corrente discorda porque há que perquirir sobre a natureza da arma, era um revólver ou uma metralhadora? Se era uma metralhadora, é uma circunstancia que faz com que a pena seja aumentada além de 1/3. Além da arma, ela olha que arma foi essa. Exemplo: roubo praticado com pluralidade de agentes. Para o STF, o aumento vai ser de 1/3. Para a segunda corrente, é preciso saber quantas pessoas: 30? Esquema de arrastão?? Então tem que aumentar mais. 2.3. QUALIFICADORAS E LATROCÍNIO – Art. 157, § 3º, CP Agora vamos ao § 3º, que despencou na magistratura da Bahia, no concurso de 2005, salvo engano. § 3º - Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de 7 (sete) a 15 (quinze) anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, sem prejuízo da multa. O § 3º, sim, traz qualificadoras e eu vou analisar esse dispositivo fazendo observações. Ele diz que:   Se da violência resulta lesão grave – Pena de 7 a 15 anos + multa Se da violência resulta morte – Pena de 20 a 30 anos + multa Nós estamos diante, então, de duas circunstâncias qualificadoras. Observação 01: é crime hediondo. Somente o § 3º, in fine, isto é, morte, chama-se latrocínio e Cuidado! Não vai você pensar que o § 3º inteiro se chama latrocínio. Não vá você imaginar que o § 3º inteiro é hediondo. É apenas o § 3º in fine e somente esta hipótese é chamada de latrocínio. Observação 02: Os resultados lesão grave e morte podem advir de dolo ou culpa. Ou seja, é uma qualificadora dolosa ou preterdolosa e mesmo a forma preterdolosa é hedionda. Mesmo quando a morte advém de culpa, é hediondo. Para isso serve o princípio da proporcionalidade. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Observação 03: Os resultados devem ser consequência da violência física, não abrangendo grave ameaça. A lesão grave e a morte devem advir da violência. Se a vítima morreu em razão da grave ameaça, você não tem latrocínio. Os resultados devem ser consequência da violência física. Ele colocou a arma na cabeça da vítima, a vítima se assustou e morreu. Que crime praticou? Roubo com emprego de arma + eventualmente homicídio, doloso ou culposo, tudo vai depender se ele quis, aceitou ou se não quis e não aceitou, mas era previsível o resultado. Aí o caso concreto dirá. Observação 04: A violência deve ser empregada durante o assalto e em razão do assalto (fator tempo + fator nexo). A violência empregada deve obedecer ao fator tempo: durante o assalto; e o fator nexo: em razão do assalto. Isso caiu na magistratura/BA. Ausente um dos fatores, tempo ou nexo, esqueça, não há o latrocínio. Exemplo 01: Durante o assalto, o assaltante, aproveitando que já está com a arma, mata um desafeto seu que passa pelo local. É latrocínio? Aqui responde por roubo + homicídio do desafeto. Não é latrocínio. Não é latrocínio porque há o fator tempo, mas está ausente o fator nexo. A morte ocorreu durante o assalto, mas não tem nada a ver com o assalto. Esse é um caso em que o roubo vai a júri, já que é conexo. Exemplo 02: Duas semanas depois do assalto, o assaltante mata o gerente que o reconheceu. É latrocínio? Não. Ele vai responder pelo art. 157, porque ele roubou; e vai responder pelo art. 121, qualificado pela conexão consequencial, que vocês já estudaram comigo. Ele matou para assegurar a impunidade. Aqui, eu tenho o fator nexo (ele matou em razão do assalto), mas não tenho o fator tempo. Caíram em concurso esses dois exemplos. Observação 05: Assaltante que mata o outro para ficar com o proveito do crime não configura latrocínio. Ele vai responder pelo art. 157, mais homicídio qualificado pela torpeza, ganância. O caso vai a júri. E o assaltante que mata o outro sem querer? Erro na execução, matou o comparsa, é latrocínio? Ele mirou na vítima, mas errou e matou o comparsa. Pergunto: é latrocínio, quando a morte do outro se dá por erro na execução? É latrocínio, porque aí eu vou aplicar o art. 73, do CP que diz que se consideram as qualidades da vítima virtual, como se tivesse matado a vítima que ele queria. Relembrando: Erro na Execução Art. 73 - Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do Art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do Art. 70 deste Código. O crime de latrocínio não é um crime doloso contra a vida. No latrocínio vocês têm: o meio é a morte e o fim visado é o patrimônio. O que você tem no latrocínio? A morte como meio para se atingir o fim patrimônio. Por isso, latrocínio não vai a júri, porque não é crime doloso contra a vida, mas é um crime contra o patrimônio que tem como meio a morte. Súmula 603, do STF: STF Súmula nº 603 - DJ de 31/10/1984 - A competência para o processo e julgamento de latrocínio é do juiz singular e não do Tribunal do Júri. Mas cuidado! Se a intenção inicial era a morte e depois resolveu subtrair os pertences que estavam com o outro, aí o que eu tenho? Ele queria matar! Matou e depois resolveu levar tudo o que estava com a vítima. Aqui é homicídio seguido de furto. Eu peguei um caso desses. Uma pessoa levou um casal para um canavial, matou o casal, levou a carteira e o carro. A tese que eu construí do inquérito (aliás, o delegado já havia construído essa tese) era a de que ele já queria assaltar, a intenção dele já era o patrimônio. Ele matou os dois para garantir a execução. A tese do advogado foi outra: ele queria matar, depois resolveu subtrair. O advogado é louco? Não. Ele está querendo levar o caso a júri, porque é bem mais fácil você absolver um homicídio no júri do que num duplo latrocínio, ainda mais de um casal. Onde que eu e o advogado discutíamos? Eu dizia que ele queria o patrimônio do casal e os levou ao canavial para matar. O advogado dizia que não, que ele queria matar, depois resolveu subtrair o patrimônio. Essa inversão de raciocínio pode culminar com a mudança de competência. Foram condenados pelo latrocínio. Consumação Quando o crime se consuma? Agora é a parte mais importante da aula. Preste atenção! Vamos trabalhar com a consumação do § 3º, enfocando, mais precisamente o latrocínio. 1ª Situação: Morte consumada e subtração consumada – O que eu tenho aqui? Latrocínio consumado. 2ª Situação: Morte consumada e subtração frustrada – O que eu tenho aqui? Latrocínio também consumado. O STF diz isso. Súmula 610, do STF: STF Súmula nº 610 - DJ de 31/10/1984 - Há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que não se realize o agente a subtração de bens da vítima. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Para defensoria, mitiga essa súmula. Como rebater essa súmula? Para prestar prova do MP você tem que ser xiita contra o réu? Não. Cada vez você tem menos esse predicado no MP. Tanto é que Rogério Greco é examinador em Minas e ele é garantista nato. Mas a defensoria pública tem que ser xiita ao contrário, totalmente a favor do réu. Você, defensor, não pode deixar aplicar essa súmula. E você tem que rebater a súmula porque quanto mais gente não abaixar a cabeça para ela, o Supremo acaba revendo, óbvio. E como você rebate isso? Não se esqueçam que o latrocínio é um crime complexo. Ele é formado de morte + subtração. Olha o que diz o art. 14, I, do CP, que trata do crime consumado (e essa crítica é de Rogério Greco – quando ele for examinador, esqueçam a Súmula 610 do Supremo). E o crime só é consumado: legal; Art. 14 - Diz-se o crime: Crime Consumado I - consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição Quais são os elementos que definem o latrocínio? Morte e subtração. Enquanto os dois elementos não forem consumados, o latrocínio não é consumado. Rogério Greco diz que a Súmula 610, do Supremo, fere o art. 14, I, do CP. Por que? Porque está considerando consumado um crime sem que nele estejam reunidos todos os elementos da sua definição. Legal. Entenderam como é fácil criticar essa súmula? Coloquem a Súmula 610, com a crítica de Rogério Greco. 3ª Situação: Morte tentada + subtração tentada – E agora? Latrocínio tentado! 4ª Situação: Morte tentada + subtração consumada Se isso não cair na sua prova eu corto meu braço esquerdo. O que eu tenho aqui? Três correntes principais: 1ª Corrente: Latrocínio tentado – Doutrina + maioria do STF e STJ 2ª Corrente: Roubo qualificado pelo resultado quando ocorrer lesão grave (art. 157, § 3º, 1ª parte) 3ª Corrente: Homicídio qualificado tentado em concurso com roubo qualificado. Reparem que a primeira corrente está tirando o caso do júri e está dizendo que o crime é hediondo. A segunda corrente não vai para júri e mais, não é crime hediondo (porque roubo qualificado pela primeira parte do parágrafo). Para a terceira corrente, o caso para júri e representa recentes decisões do Supremo. Eu não falei que é a posição do Supremo!! Isso ficou uma miscelânea. A primeira é corrente é a que prevalece no Supremo e te dou até o nome: Min. Ellen Gracie. E a doutrina ainda insiste que a primeira corrente é do Supremo. O problema é que o Min. Cesar Peluso levantou uma questão que embaralhou o pedaço. A segunda corrente já tem adepto no Supremo. Reparem que a segunda corrente evita de o crime ser hediondo e o caso não vai a júri. A segunda corrente retira a hediondez. A terceira corrente Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 mantém a hediondez e o caso vai a júri. E também tem adeptos no Supremo. Mas prevalece a primeira corrente. Observação 06: Havendo pluralidade de mortes e uma só subtração, quantos crimes há? Você mata o motorista, proprietário do carro, o passageiro que acompanhava o motorista e subtrai o veículo. O que você tem? Pluralidade de mortes, porém, uma subtração. Quantos crimes há? 1ª Corrente: Sendo o latrocínio crime complexo, a pluralidade de vítimas não implica pluralidade de latrocínios. Trata-se de crime contra o patrimônio, servindo há um as várias mortes para agravar a pena. Cesar Roberto Bittencourt. Aqui latrocínio e as várias mortes o juiz vai considerar na fixação da pena-base. 2ª Corrente: Haverá continuidade delitiva. As várias mortes configuram crimes diversos, porém, em continuidade delitiva, configuram pluralidade de crimes. 3ª Corrente: Haverá concurso formal. É tese institucional do MP/SP. Qual prevalece? Não tem como dizer qual prevalece. Nos tribunais superiores vocês encontram de tudo! Nesse caso, eu prefiro não falar. Observação 07: A morte tem que recair sobre o proprietário da coisa? “É desnecessário que a vítima da violência seja a mesma da subtração, desde que haja conexão entre os dois fatos.” Observação 08: No art. 157, há o caput, e os três parágrafos. O roubo qualificado qualifica, seja o roubo impróprio, seja o roubo próprio. O impróprio é também chamado de roubo por aproximação (não se esqueça). Então, o § 3º qualifica, seja o roubo impróprio, seja o roubo próprio. Se você tem § 3º, não se aplicam as majorantes do § 2º. As majorantes do § 2º só se aplicam ao roubo simples, não se aplicam ao roubo qualificado. Então, essa circunstância do § 3º devem servir somente na pena-base. O fato de ele ter utilizado arma, não vai majorar o § 3º, mas pode servir na fixação da pena-base. Então, você não pode estender as causas de aumento do § 2º quando você estiver diante do § 3º. O § 2º só majora a pena do roubo simples e não do roubo qualificado. Sabe o que aconteceu na magistratura/BA? Todo mundo aplicou a majorante do § 2º (emprego de arma) na qualificadora e aí a pena vai lá pra casa do capeta: 40 anos mínimo e 60 anos máximo. Não dá! Se você tem § 3º, esqueça § 2º, mas as circunstâncias do § 2º podem ser utilizadas na fixação da pena-base. 3. EXTROSÃO – ART. 158 Extorsão Art. 158 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 que se faça ou deixar fazer alguma coisa: anos, e multa. Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) Reparem a preocupação do legislador em punir a extorsão exatamente com a mesma pena básica do roubo: 4 a 10 anos. Qual é o bem jurídico tutelado? Continuamos tutelando dois bens jurídicos: patrimônio e liberdade individual. Reparem que no crime de extorsão, o ataque à liberdade é o meio e o patrimônio ou vantagem econômica é o fim. No art. 158, do CP, você tem:   Ataque à liberdade – Meio Vantagem econômica - Fim É exatamente este fim especial que diferencia o art. 158, do art. 146, constrangimento ilegal. A diferença do constrangimento ilegal para o delito de extorsão reside exatamente na finalidade do agente: vantagem econômica. O que está em negrito é exatamente o constrangimento ilegal e vamos ler o art. 146, para ver que ele coincide exatamente com o que está em negrito. Constrangimento Ilegal Art. 146 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. O que está em negrito no art. 158 é, nada mais nada menos do que constrangimento ilegal. Se transforma em extorsão graças ao miolo cinza. Se não fosse a finalidade em cinza o art. 158 seria idêntico ao art. 146. Então, o art. 158, nada mais é, do que um constrangimento ilegal com a finalidade econômica. Sujeito ativo – Qualquer pessoa. É um crime comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa. Cuidado quando o sujeito ativo for funcionário público. Aí você pode estar diante de um crime de concussão (art. 316, do CP). Sujeito passivo – Tratamos de um crime que protege dois bens jurídicos: patrimônio e liberdade individual (meio para se atingir o fim patrimônio) e é o fim patrimônio que diferencia a extorsão do constrangimento ilegal. Quem é, portanto, a vítima? Não é somente aquela ferida no patrimônio, mas também a pessoa que, alheia ao patrimônio, sofreu a violência ou a grave ameaça. Então, se você for atacado em qualquer um dos bens jurídicos, você é vítima. Não precisa ser o patrimônio e a liberdade individual. Os dois bens jurídicos lesados não precisam estar reunidos na mesma vítima. O que pune o art. 158? – O núcleo é “constranger”, portanto é constrangimento + finalidade de locupletamento ilícito. E esse constrangimento pode ser praticado Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 mediante violência ou grave ameaça. O crime é um constrangimento com finalidade de locupletamento ilícito e o constrangimento pode ser praticado com violência ou grave ameaça. Roubo vs. Extorsão – Vocês sabem diferenciar no caso concreto o roubo da extorsão? Eu coloco a arma na sua cabeça e digo: “passa a carteira!” Isso é roubo, eu subtraí, ou extorsão, eu extorqui? Antigamente se falava, “ah, não tem importância porque é a mesma pena”. Agora a coisa pegou. Tem importância, sim. E qual é a importância. Eu vou colocar um quadro, diferenciando roubo e extorsão. Vocês não podem confundir o crime de roubo com o crime de extorsão. Vamos usar a Fórmula de Frank, que tem várias fórmulas no direito penal e essa é uma delas.  No roubo, o ladrão subtrai, já na extorsão, o extorsionário faz com que se lhe entregue – Se você olhasse somente essa diferença, no exemplo acima, vocês concluiriam que houve extorsão. Mas cuidado, temos que analisar as outras hipóteses  No roubo, o agente busca vantagem imediata; na extorsão, o agente busca vantagem mediata, futura – Lembrem do exemplo: agora virou roubo, porque ele quer vantagem imediata.  No roubo, a colaboração da vítima é dispensável; já na extorsão, a colaboração da vítima é indispensável Com esse quadro, não tem como você confundir no caso concreto. A doutrina presta atenção principalmente na dispensabilidade ou indispensabilidade da colaboração da vítima. No exemplo da arma na cabeça, “passa a carteira”, é roubo. Mesmo se a vítima não passasse a carteira, havia como subtraí-la sem que ela colaborasse. Guardem esse quadro! Você só vai encontrar o crime de forma segura se você tiver o quadro na cabeça atentando-se, principalmente, para a terceira diferença. Isso não significa que não possa ser possível o concurso dos dois crimes no caso concreto. Eu não estou dizendo que se tiver extorsão é impossível o roubo e vice-versa. Há vários julgados dos tribunais superiores tratando disso. Olha o exemplo emblemático: o cara coloca a arma na sua cabeça e leva o carro e depois manda passar o cartão do banco com a senha. Se você não der a senha, ele não consegue a vantagem futura. Houve o roubo do carro, mais a extorsão do cartão do banco. Concurso de delitos. É perfeitamente possível. É a posição do STJ. Exemplo clássico de concurso material de delitos: arma na cabeça, passa o carro! Roubo consumado. Agora, arma na cabeça, passa a carteira e me dá a senha, extorsão. Se você não der a senha, ele não tem como tirar a vantagem econômica. E tem concurso material. É a posição do STJ. Tipo subjetivo – O crime do art. 158 é punido a título de dolo. É o dolo + finalidade específica, qual seja, vantagem econômica indevida. E se a vantagem não Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 for econômica? Há extorsão? E se a vantagem visada for, por exemplo, sexual, não tem extorsão, mas crime contra a dignidade sexual. Se a vantagem não for econômica, outro será o crime. A vantagem, necessariamente tem que ser econômica e tem que ser indevida. E se ela for devida? Neste caso configura-se exercício arbitrário das próprias razões (art. 345, CP). Consumação – Quando o crime de extorsão se consuma? Ele é material, depende do enriquecimento indevido ou é formal, dispensando o locupletamento ilícito? 1ª Corrente: O crime é material, consumando-se com a obtenção da indevida vantagem econômica. 2ª Corrente: O crime é formal, consumando-se com o constrangimento, dispensando a obtenção da indevida vantagem econômica. Para a segunda corrente, se ocorrer a obtenção da vantagem econômica, é mero exaurimento. E o que você faz com o exaurimento? Enfia na pena. Trabalha com o exaurimento na fixação da pena. Qual das duas prevalece? A segunda corrente prevalece. Tem inclusive súmula do STJ: STJ Súmula nº 96 - DJ 10.03.1994 - O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida. Para discordar do STJ, você teria que adotar a primeira corrente. Crime material. Caiu para DPU e sabe qual foi a resposta? Crime de mera conduta. Não tem nem doutrina defendendo essa porra! Onde que ele arrumou isso? Se não quer dizer que é crime formal, a única coisa que sobra é dizer que é crime material. Eles inventaram a mera conduta. Os candidatos recorreram, mas não adiantou nada. Outro dia eu vi um julgamento no STF, e o Min. Joaquim Barbosa disse: o art. 2.º, da Lei 8.137 é formal ou de mera conduta, como se fossem sinônimos. É o fim da picada! Tem alguma repercussão prática isso? Claro que tem!  Se você entende que o crime é material – a prescrição começa a correr da obtenção da vantagem. E, no momento da obtenção, admite-se flagrante.  Se você defende que o crime é formal – se você defende que o crime é formal, a prescrição começa a correr do constrangimento. No momento da obtenção da vantagem, em regra, não admite flagrante porque você está diante de mero exaurimento. O flagrante aqui é não de crime, mas de exaurimento. E para o STJ, nos termos da Súmula 96, o crime é formal. Tentativa – As duas correntes admitem a tentativa, que é perfeitamente possível. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 3.1. MAJORANTES DE PENA – Art. 158, § 1º O § 1º do art. 158 traz majorantes de pena: § 1º - Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, aumenta-se a pena de um terço até metade. Tem alguma diferença para o roubo? O roubo tem cinco causas de aumento:  Emprego de arma (inciso I) – O § 1º também prevê o emprego de arma. Então, tudo o que eu falei sobre o emprego de arma no roubo se aplica aqui.  Concurso de pessoas (inciso II) – Aqui também tem essa causa de aumento.  Transporte de valores (inciso III) – Essa majorante não está prevista aqui, mas pode ser aplicada na fixação da pena-base.  Transporte de veículos para outro Estado (inciso IV) - Não tem aqui.  Privação da liberdade (inciso V) – Tem aqui? Se não cair isso, eu devolvo o dinheiro de vocês. Majorantes: roubo e extorsão. E só vai ter isso no seu caderno: No roubo, o § 2º, traz 5 majorantes: emprego de arma, concurso de pessoas, transporte de valores, transporte para outro estado ou país e privação da liberdade da vítima. Na extorsão: O § 1º prevê o emprego de arma (e tudo o que eu falei sobre o emprego de arma no roubo, vocês transportam para a extorsão, tudo!). O § 1º fala em “cometido por duas ou mais pessoas”. É a mesma coisa que o concurso de pessoas do roubo? Não é a mesma coisa! Vocês viram que quando se fala em concurso de pessoas, abrange partícipe e quando fala em “cometido por duas ou mais pessoas”, na expressão não abrange partícipe. Então, a extorsão exige dois ou mais executores e não abrange partícipes. No roubo, a expressão utilizada foi o “concurso de pessoas” que abrange o partícipe. Já na extorsão, que fala em “cometido por duas ou mais pessoas” não abrange o partícipe. Então, para incidir a majorante na extorsão, eu tenho que ter duas ou mais pessoas, pelo menos, executando o crime. A causa de aumento “transporte de valores” prevista no roubo, não aparece na extorsão, mas o juiz pode considerar na fixação da pena-base. Transporte de veículo para outro estado ou país – também não tem na extorsão. O juiz pode considerar na fixação da pena-base. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Privação da liberdade – na extorsão não é majorante, é qualificadora do § 3º, parágrafo incluído pela Lei 11.923/09. 3.2. QUALIFICADORAS – Art. 158, § 2º e 3º Antes de estudar o § 3º, vamos ver o § 2º e vejam se eu preciso explicar alguma coisa: § 2º - Aplica-se à extorsão praticada mediante violência o disposto no § 3º do artigo anterior. Tudo o que eu falei sobre o roubo qualificado se aplica à extorsão qualificada. Tudo o que eu falei no § 3º, do art. 157, vocês vão transportar para o § 2º, do art. 158. Vamos para o que mais interessa, que é o § 3º: § 3º Se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa condição é necessária para a obtenção da vantagem econômica, a pena é de reclusão, de 6 (seis) a 12 (doze) anos, além da multa; se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no art. 159, §§ 2º e 3º, respectivamente. (Acrescentado pelo L-011.923-2009) Como era o sequestro-relâmpago antes da Lei 11.923/09? Vamos analisar antes e depois. O sequestro-relâmpago, expressão popular, vulgar, era previsto para qualquer das três situações. ANTES da Lei 11.923/09: I. O sequestro-relâmpago podia configurar o art. 157, § 2º, V quando o agente subtrai com violência e a colaboração da vítima é dispensável. II. O sequestro-relâmpago também podia configurar o art. 158, caput: o agente faz com que se lhe entregue e a colaboração é indispensável. III. O sequestro-relâmpago podia configurar também o próprio art. 159, do CP, onde o agente sequestra com privação de curta duração. No art. 159, a colaboração de terceiro é indispensável. A expressão popular “sequestro-relâmpago” era prevista para qualquer uma das três situações. No art. 157, § 2º, V configurava uma majorante e ainda configura. No art. 158, caput, era considerada pelo juiz na fixação da pena base, porque não tinha majorante nem qualificadora nesse sentido. No art. 159, do CP, a privação da liberdade é elementar do tipo. Então, vejam como o sequestro-relâmpago vai trabalhar no âmbito da Lei 11.923/09: o sequestro-relâmpago podia configurar um roubo majorado pela privação da liberdade, podia configurar extorsão e a privação da liberdade era considerada na fixação da pena-base ou podia configurar um sequestro de curta duração, porque Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 a liberdade é elementar do tipo. configurando as três situações. Como ficou depois da Lei 11.923/09: continua DEPOIS da Lei 11.923/09: I. Art. 157, § 2º, V – ficou igual II. Art. 158, § 3º – passa de mera circunstância judicial a qualificadora com pena de 6 a 12 anos. III. Art. 159 – ficou igual Então, o que a Lei 11.923, resumindo e concluindo, fez? A única diferença, com o advento da Lei 11.923/09, foi transformar o sequestro-relâmpago do art. 158 em mera qualificadora. No mais está tudo igual. Agora, o legislador foi brilhante porque ele chama apenas o art. 158, § 3º de sequestro-relâmpago. Ele adotou o termo popular. Essa é uma grande crítica, pois será que ele não percebeu que essa era uma gíria, uma expressão popular? Agora, ao invés de circunstancia judicial é uma qualificadora com pena de 6 a 12 anos. E olha o que já estão comentando: Mas o roubo majorado pela privação da liberdade é 4 a 10 anos + 1/3 até a metade. Tem doutrina dizendo que isso é desproporcional. A doutrina que diz isso não está percebendo que existe um aumento de pena. Reparem que não é de 4 a 10. É 4 a 10 + a majorante. Têm penas muito próximas, não traz desproporcionalidade alguma. Basta você lembrar de comparar 4 a 10 com 1/3 até a metade. Quem defende a desproporcionalidade é Cezar Roberto Bittencourt. Quem defende a proporcionalidade é Nucci. Olha que importante que eu vou falar agora: o roubo é hediondo quando advém morte (art. 157, § 3º in fine). O art. 159 é sempre hediondo. E o art. 158 é hediondo? É hediondo também quando advém morte. Sabe onde está isso? No art. 158, §2º, do CP. E olha o que diz a Lei 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos) e vocês vão encontrar os três crimes aqui: Art. 1º - São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados: II - latrocínio (Art. 157, § 3º, in fine); III - extorsão qualificada pela morte (Art. 158, § 2º); IV - extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada (Art. 159, caput e §§ 1º, 2º e 3º); O roubo é hediondo quando resulta da violência a morte. A extorsão é hedionda quando resulta da violência a morte. A extorsão mediante sequestro é sempre hedionda, seja na forma simples ou qualificada. Qual é o problema? É que existe morte na extorsão que não está no § 3º. E quando a morte advém do sequestro-relâmpago é crime hediondo? Vocês estão entendendo aonde estou querendo chegar? O fato da extorsão ter morte, é Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 hediondo (§2º). O problema é que também tem morte na extorsão que está no § 3º. É que quando foi feita a Lei dos Crimes Hediondos não tinha o sequestro-relâmpago da Lei 11.923. Art. 158, § 3º, com morte, é hediondo? 1ª Corrente: Hoje prevalece que, por uma falha do legislador, o art. 158, § 3º, com morte, não é hediondo. Fere o sistema legal da Lei dos Crimes Hediondos. Hoje prevalece que morte no sequestro-relâmpago não é hediondo. Quando eu digo maioria, me refiro a Nucci, Bittencourt, Rogério Greco. Só é hediondo o que está especificamente trazido na Lei 8.072/90. O legislador, ao acrescentar o § 3º, no CP, acrescentasse o resultado morte também nos crimes hediondos. Se ele assim não fez, nós não podemos fazer. É o que entende a maioria. Eu discordo. Eu acho que é hediondo, sim. Quando nasceu a Lei dos Crimes Hediondos, o sequestro-relâmpago do art. 158 estava no caput, como mera circunstância judicial. Então, se houvesse morte, o sequestro-relâmpago estava abrangido pelo § 2º. Naquela época estava abrangido pelo § 2º. Pessoal, o § 2º qualifica o caput, se o sequestro-relâmpago estava no caput e o § 2º era uma qualificadora do caput, o sequestro-relâmpago com resultado morte era hediondo. Ele estava qualificado pela hediondez. O que a lei nova fez? Ela só retirou esse modus operandi dando-lhe um parágrafo novo. Só isso! Continua sendo extorsão qualificada pela morte. Qual é a vontade do legislador? É considerar extorsão com morte crime hediondo. Essa é a vontade do legislador. O que a Lei 11.923/09 fez no § 3º? Colocou a extorsão com morte. Porém, criou-se um meio especial, qual seja, restrição da liberdade. Não mudou em nada. A situação de morte é igual, logo, também é hediondo. Aliás, seria um absurdo você punir a extorsão simples como hedionda e a extorsão agravada pelo meio de execução com morte não ser hedionda. Seria absurdo! Você vai matar? Então priva a liberdade dele! Porque se você matar sem privar a liberdade é hediondo. Então, priva da liberdade para você fugir da hediondez. É absurdo! Não tem sentido dizer que não é hediondo. 2ª Corrente: “O que fez o legislador com o advento da Lei 11.923/09 foi apenas especificar uma das várias formas de execução do delito de extorsão. Ele não criou delito novo.Explicitou uma de suas múltiplas possibilidades de execução. Sem o § 3º, já era possível encaixar o sequestro-relâmpago com resultado morte na Lei dos Crimes Hediondos. Conclusão: o sequestro-relâmpago do § 3º, do art. 158, com resultado morte é hediondo, tratando-se de interpretação extensiva, única forma de chegar na real vontade do legislador.” Mas prevalece a primeira corrente, 90% primeira corrente. 4. EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO – ART. 159 Extorsão Mediante Seqüestro Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Art. 159 - Seqüestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. Eu já disse que a extorsão mediante sequestro é SEMPRE hedionda, não importa se simples ou qualificada. Bens jurídicos tutelados: patrimônio, liberdade de locomoção e incolumidade pessoal da vítima. Sujeito ativo: Quem, no Brasil, pode ser sequestrador? O tipo exige qualidade especial do agente? Não. Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo. Sujeito passivo: Quem pode ser vítima? Pessoa jurídica pode ser vítima de extorsão mediante sequestro? A vítima no crime não é só aquela que é vítima da liberdade de locomoção, mas qualquer outra que suporta a lesão patrimonial. Então, é perfeitamente possível você privar a liberdade de locomoção alguém e quem paga o resgate é a pessoa jurídica, que vai ser vítima do crime. Se quem paga o resgate pelo Silvio Santos é o SBT, há duas vítimas: o Silvio Santos privado da locomoção e a pessoa jurídica privada do patrimônio. Rogério Greco defende isso no livro dele. Você priva da liberdade de locomoção um animal e pede um resgate para devolver. Que crime você praticou? Você privou da liberdade o cachorro da Luiza e pede dinheiro para o resgate. Animal não pode ser objeto material de delito de sequestro. Que crime é esse? Extorsão. Art. 158, do CP. Núcleo objetivo - O que pune o art. 159? Ele tem um núcleo só: “sequestrar”. Mas onde está o cárcere privado? Ele pune só sequestrar, mas e o cárcere privado? Aqui, o termo “sequestrar” foi utilizado no seu sentido amplo, abrangendo cárcere privado. Então, por que se eu, no sequestro-relâmpago, faço uma interpretação extensiva do que é hediondo e o pessoal acha que é errado? Por que você lê bigamia e sabe que lá está escrito também a poligamia? Se você pode fazer interpretação extensiva aqui e na bigamia, por que não permitir o sequestrorelâmpago com resultado morte como hediondo? É exatamente o mesmo raciocínio. O crime é de execução livre. Pode ser antecedido de violência, grave ameaça, fraude ou qualquer outro modo. Importante: a vítima não precisa ser removida de um lugar para o outro. É perfeitamente possível a extorsão mediante sequestro sem que a vítima saia do local onde se encontra. Tipo subjetivo - O crime do art. 159 é punido a título de dolo, mas não é somente dolo. É dolo com finalidade especial. E no que consiste essa finalidade especial? Obter qualquer vantagem, como condição de preço ou resgate. O art. 158 não falava em qualquer vantagem, mas em indevida vantagem econômica. O art. 159 não fala mais em indevida vantagem econômica. Ele fala em qualquer vantagem. Então, eu pergunto: isso significa que no art. 159, seja vantagem devida ou indevida configura o crime de extorsão mediante sequestro? Vantagem não econômica configura esse Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 crime? O art. 158 é claro: a vantagem buscada na extorsão deve ser indevida e não só indevida, mas também de natureza econômica. O art. 159 a expressão que o legislador usa é “qualquer vantagem”. Então, com essa expressão ampla e genérica, eu posso entender que são abrangidas todas as vantagens, ainda que indevidas? Se você sequestrar alguém e pede o pagamento de uma vantagem indevida o crime é o do art. 159? Se você sequestrar alguém e pedir uma vantagem moral, o crime é do art. 159? Prevalece que a natureza de vantagem indevida e a natureza de vantagem econômica são expressões implícitas no art. 159. Tem que ser indevida e tem que ser econômica. Se devida, o crime é de exercício arbitrário das próprias razões + sequestro. Então, prevalece que a indevida e a natureza econômica da vantagem são expressões implícitas no tipo. “De acordo com Nelson Hungria, a natureza indevida e econômica da vantagem são implícitas na redação do art. 159. Se o sequestro visa obter vantagem devida, o crime será o de exercício arbitrário das próprias razões em concurso formal com o de sequestro.” Consumação - Quando o crime de extorsão mediante sequestro se consuma? Há duas correntes: 1ª Corrente: “Consuma-se com a privação da liberdade seguida da indevida exigência.” Reparem que para essa corrente dispensa-se a obtenção da vantagem exigida. Logo, crime formal ou de consumação antecipada. 2ª Corrente: “O crime consuma-se com a privação da liberdade da vítima.” Para essa corrente, dispensa-se a efetiva exigência, bem como o locupletamento do agente. O crime continua sendo formal. STF. A diferença é que a primeira, além da privação, entende indispensável a concretização da exigência; para a segunda corrente, basta a privação com a finalidade de exigir vantagem, pouco importando se foi ou não exigida. O Supremo adota a segunda corrente. Para ambas, o recebimento do resgate é mero exaurimento que você considera na fixação da pena. O crime é permanente. Isto é, enquanto a vítima estiver privada da sua liberdade de locomoção, a consumação se prolonga. Eu falei que a consumação se prolonga enquanto a vítima estiver privada. Então, o que encerra o crime é a libertação do sequestrado e não o pagamento do resgate. Pagou o resgate e a vítima não foi solta, o crime continuará protraindo-se no tempo. Então, cuidado! A consumação persiste enquanto o sequestrado não for libertado. Pouco importa se já foi pago o resgate. Quando eu falo que o crime é permanente, vocês têm que lembrar de três coisas: 1º) Súmula 711, do STF: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 STF Súmula nº 711 - DJ de 13/10/2003 - A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência. Se durante o período em que a vítima está sequestrada vier uma lei, ainda que mais grave, essa lei vai ser aplicada. Vamos imaginar o sequestro do Abílio Diniz. Na época, o sequestro não era hediondo e o sequestro dele foi o estopim para se tornar hediondo. Se a Lei dos Crimes Hediondos tivesse vindo antes do fim do sequestro do Abílio Diniz, os seqüestradores iram responder por ela. 2º) Prisão em flagrante a qualquer tempo na permanência – caiu em concurso isso: “posso prender em flagrante o sequestrador na hora do recebimento do resgate?” sim, desde que a vítima ainda não tenha sido libertada. Se a vítima já foi libertada, aí dificilmente cabe flagrante, a não ser que seja o presumido. 3º) A prescrição só começa a correr depois de cessada a permanência – Não é depois de pago o resgate! É depois de cessada a permanência. O tempo de privação da liberdade interfere na consumação? Ficando na privação da liberdade por um tempo muito pequeno o crime deixa de ser consumado? O tempo de privação interfere na pena! E não na privação. Não há que se falar que a privação tem que durar tempo juridicamente relevante. O que é tempo juridicamente relevante? Se for para a vítima, 10 segundos já é tempo juridicamente relevante. Prevalece que o tempo da privação não interfere na consumação, mas na pena. Tentativa – É possível tentativa de extorsão mediante sequestro? Sim, porque o ato de sequestrar é plurissubsistente. A sua execução admite fracionamento em vários atos. 4.1. Qualificadoras – Art. 159, § 1º § 1º - Se o seqüestro dura mais de 24 (vinte e quatro) horas, se o seqüestrado é menor de 18 (dezoito) ou maior de 60 (sessenta) anos, ou se o crime é cometido por bando ou quadrilha: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 20 (vinte) anos. São três qualificadoras que traz o dispositivo. a) 1ª Qualificadora: Se durar mais do que 24 horas A primeira qualificadora confirma o que eu já falei para vocês, ou seja, que o tempo da privação pode não interferir na consumação, mas pode interferir na pena. Se for mais de 24 horas, sequestro qualificado. Se não for mais de 24 horas, sequestro simples. Eu falei que o que tem que durar mais de 24 horas é a privação da liberdade, mesmo que o resgate tenha sido pago antes. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 b) 2ª Qualificadora: Leva em conta a idade da vítima: Menor de 18 e maior de 60 O que importa é que no início ele seja menor, ainda que no fim seja maior. É ter menos de 18 no início do sequestro. Começou o sequestro com menos de 18, o crime está qualificado, mesmo que tenha mais de 18 no fim. No caso do maior de 60 anos, inverte. Índice a qualificadora se você tiver mais de 60 antes de acabar o sequestro, mesmo que no início, tenha menos de 60. É imprescindível que o agente conheça a idade da vítima para evitar a responsabilidade penal objetiva. Já caiu isso em concurso e o examinador não deixou claro se o agente sabia ou não que a vítima era maior de 60 anos. A prova tem que deixar isso bem claro, para evitar responsabilidade penal objetiva. c) 3ª Qualificadora: Cometido por quadrilha ou bando Neste caso, esqueçam o art. 228, do CP, para evitar bis in idem. Se a quadrilha ou bando já qualifica o crime, não pode configurar, também, delito autônomo. Então, esqueçam o art. 228. 4.2. Qualificadoras – Art. 159, § 2º e § 3º § 2º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena - reclusão, de 16 (dezesseis) a 24 (vinte e quatro) anos. § 3º - Se resulta a morte: Pena - reclusão, de 24 (vinte e quatro) a 30 (trinta) anos. Eu vou ser bem breve nos comentários porque já comentamos isso no latrocínio. Esses resultados qualificadores podem ser fruto de dolo ou culpa. Então, eu posso ter uma extorsão mediante sequestro qualificada dolosamente pela lesão grave ou pela morte ou culposamente, pela lesão grave e pela morte. São qualificadoras dolosas ou preterdolosas. A pergunta que cai, no que diz respeito a extorsão mediante sequestro é a seguinte: “quem tem que sofrer lesão grave? É o sequestrado ou qualquer pessoa ligada ao sequestro? Pode incidir a qualificadora quando a morte atinge o policial que estourava o cativeiro? Neste caso, a extorsão é qualificada pela morte ou não? Prevalece que esses resultados têm que atingir a pessoa do sequestrado. 4.3. Delação Premiada – Art. 159, § 4º § 4º - Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Quantos requisitos têm que ser preenchidos? Quais as condições para o agente se valer deste prêmio?    Crime cometido em concurso O concorrente que o denunciar Facilitar a libertação do sequestrado a) 1º Requisito: O crime tem que ser praticado em concurso de pessoas Não precisa ser quadrilha ou bando. Basta o concurso de pessoas. O delator não precisa ser um quadrilheiro. Ele pode ser um mero partícipe no concurso de agentes. Antes de 1996, o requisito era a existência de quadrilha ou bando. Agora não. Basta o concurso de agentes. b) 2º Requisito: Que um dos concorrentes noticie à autoridade Relata à autoridade quem são os comparsas, relata onde a vítima está. Quem é essa autoridade? Ele tem que denunciar à autoridade. É autoridade em sentido amplo, abrangendo delegado, promotor, juiz, etc. c) 3º Requisito: Que a delação seja eficaz Só haverá prêmio para a delação eficaz. Tem que facilitar a libertação do sequestrado. Olha o que caiu no concurso: se foi pago o resgate, a delação depende da recuperação do que foi pago ou basta a liberação do sequestrado? É requisito? A recuperação do resgate não é requisito. Tem doutrina dizendo, mas isso é absurdo. Requisitos são apenas esses três. E qual é o prêmio para este delator? Redução de pena: a pena é reduzida de 1 a 2/3. Quanto maior o auxílio, maior a redução. A diminuição é proporcional ao maior ou menor auxílio prestado pelo delator. A redução é maior ou menor, proporcional ao auxílio prestado pelo delator. 5. ESTELIONATO – ART. 171 Estelionato Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa. Bem jurídico tutelado – Patrimônio. Não vamos perder tempo. Me recuso. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Sujeito ativo – O art. 171 exige alguma qualidade especial do agente? Não. Trata-se de crime comum. Não exige qualidade ou condição especial do agente. Aqui não há interesse. Sujeito passivo – A questão passa a ter interesse na vítima. O sujeito passivo é comum. Qualquer pessoa pode ser vítima de estelionato. Observação 01: A vítima patrimonial pode não ser aquela que foi enganada. Aí haverá duas vítimas: a pessoa lesada, diminuída no patrimônio, bem como a pessoa que foi enganada pelo agente. Isto se não coincidir na mesma vítima. Isso é importante porque nenhuma das duas entra no rol de testemunhas. O MP fica com o rol livre para nomear 8 pessoas. Observação 02: A vítima deve ser capaz. Isso é importante, porque se a vítima é incapaz, o crime é o do art. 173, do CP e não mais admite suspensão do processo (o estelionato é de 1 a 5). Abuso de Incapazes Art. 173 - Abusar, em proveito próprio ou alheio, de necessidade, paixão ou inexperiência de menor, ou da alienação ou debilidade mental de outrem, induzindo qualquer deles à prática de ato suscetível de produzir efeito jurídico, em prejuízo próprio ou de terceiro: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. Se você não tem conhecimento deste artigo, você vai aplicar o art. 171 e vai errar porque vai oferecer suspensão do processo e não cabe suspensão do processo neste caso. Observação 03: A vítima deve ser certa. No caso de vítima incerta, o que eu tenho? Não tem mais estelionato. Haverá crime contra a economia popular (Lei 1.521/51). Três exemplos de fraudes contra vítimas incertas e que incidem nessa lei (cai em concurso, você não sabe da lei e joga no art. 171):  Adulteração de balança  Adulteração de taxímetro – o taxista altera para futuros clientes (vítimas incertas)  Adulteração de bomba de gasolina – você adultera o medidor. Coloca menos gasolina do que está marcando. Não se insere no exemplo desta lei a adulteração de combustível, que tem lei especial. 5.1. Elementos estruturais do art. 171 Isso caiu no MP/PE. São eles: a) Fraude Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 A fraude é o primeiro elemento estrutural do estelionato, e serve para quê? Ele se vale da fraude para levar o seu patrimônio; não se vale de violência nem de grave ameaça, como no roubo. A fraude é o meio de execução. Mas fraude para quê? Para induzir a vítima em erro? Só isso? Leiam o art. 171: ele fala em induzir ou manter alguém em erro. Então, a fraude serve para induzir a vítima em erro ou manter a vítima em erro.  No “induzir” é o agente quem cria a falsa percepção da realidade.  No “manter a vítima em erro”, o agente aproveita-se do engano espontâneo da vítima e a fraude serve para mantê-la nesse estado. A sua denúncia tem que ser induzir a vítima em erro ou a mantê-la nesse estado. Se você imputar induzir a vítima em erro para alguém que só a manteve nesse estado, sua denúncia é inepta. Reparem que é um crime de ação múltipla. É a mesma coisa que você imputar a venda de drogas a uma pessoa que só a manteve em depósito. Cuidado! A sua denúncia tem que explicar para quê serviu a fraude no evento. A fraude é empregada de três formas:    Mediante artifício Mediante ardil Mediante qualquer outro meio Artifício – Nada mais é do que uso de objetos ou aparatos aptos a enganar. Por exemplo: “bilhete premiado”, documentos falsos, disfarces, etc. A sua denúncia, além de dizer para que serviu a fraude, tem que dizer o meio da fraude: artifício, ardil ou outro meio. Ardil – Uma historinha com fins didáticos: quando você começa a namorar, você muda de vida. Você abandona os seus amigos. Ela fica colocando coisa na sua cabeça. Você passa a odiar os seus amigos. Acabou o namoro. Você pula da tribo dos mortos-vivos para a tribo dos vivos novamente. Você é um morto-vivo tentando voltar pra vida antiga. Seus amigos sumiram e você não sabe mais o que fazer à noite. Aí você resolve sair, guerreiro, sozinho. Você tá lá, camisa por dentro da calça, cintinho, morto-vivo. Entrou na fila da balada, a mulher puxa um papo aí você pergunta: “você faz direito?” Ela some, você entra na balada pronto para dançar a macarena. Roxette. Você chega no bar, outra mulher se aproxima e você conta que acabou o namoro. Aí a mulher diz que o homem tem que sair com os amigos e coisa e tal. Você, lógico, pede em namoro. Dali a um mês ela está igualzinha à sua ex. Você foi vítima de estelionato. Ela usou ardil. Então, o que é ardil? Enganar é fraude. Ardil é conversa enganosa. Engana com a lábia, sem usar um objeto. Outro meio – Sobra o que para outro meio se artifício é o uso de objetos e ardil é conversa enganosa? O silêncio é muito utilizado para manter a vítima em erro. Já caiu em concurso se é possível estelionato por omissão. É possível estelionato com o silêncio. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Essa fraude tem que ser apta a enganar. Se for fraude grosseira, é crime impossível. b) Obter indevida vantagem Observação 01: No caso de vantagem devida, o crime é de exercício arbitrário das próprias razões. Observação 02: Prevalece que a vantagem deve ser necessariamente econômica. Vantagem não econômica não configura estelionato. c) Prejuízo alheio - Prejuízo, obviamente, econômico. 5.2. Cola eletrônica Cola eletrônica é estelionato? Uma pessoa vai com um pontinho na orelha fazer a prova e lá fora ficam passando gabarito. Temos duas correntes dentro do Supremo: Minoria do STF – Diz que a cola eletrônica configura estelionato porque existe vantagem econômica indevida. Que vantagem econômica indevida? A vaga numa universidade pública, o cargo que vai te trazer salário, etc. E existe prejuízo alheio. O prejuízo do concorrente que não foi aprovados por causa da sua fraude e a própria instituição. Além disso, essa minoria do Supremo acha que configura falsidade ideológica porque o agente insere no documento ideia de terceiro, e não ideia dele. Eu acho que forçou um pouco. Maioria no STF – A maioria no Supremo diz que não há estelionato porque há ausência de vantagem econômica (eu acho absurdo, claro que há vantagem econômica) e diz que também não há falsidade ideológica. A ideia do terceiro é adotada pelo agente. Passa a ser também sua ideia. Logo, resumindo e concluindo, para a maioria do Supremo a cola eletrônica é fato atípico. Carece de tipificação. 5.3. Hacker O Hacker entra no sistema de um banco e começa a transferir dinheiro de uma conta para outra, configura estelionato? O STJ já decidiu: é furto mediante fraude. E, ao decidir assim, inviabiliza a suspensão condicional do processo. 5.4. A fraude bilateral exclui o crime? O que é fraude bilateral? É a vítima também agir com má-fé. É a vítima se achar mais esperta que o próprio espertalhão. A vítima acha que está passando a Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 perna mas, na verdade, é ela que está sendo enganada. O bilhete premiado é um exemplo. 1ª Corrente: O tipo não exige a boa-fé da vítima. Logo, a sua má-fé não exclui o crime (maioria, inclusive posição do STF). 2ª Corrente: A lei não pode amparar a má-fé da vítima. Logo, a fraude bilateral exclui o crime. Essa segunda posição é de Nélson Hungria. 5.5. Estelionato e documento falso É perfeitamente possível o estelionato ser acompanhado de documentos falsos. O agente responde por qual crime? Só pelo estelionato, só documento falso ou pelos dois? 1ª Corrente: Responde pelo estelionato + falsidade documental em concurso material. Responde pelos dois porque os dois crimes protegem bens jurídicos diversos e um não pode absorver o outro. E concurso material porque há duas condutas produzindo dois resultados. Essa primeira corrente é a posição do STJ que, no entanto, prevê exceção na Súmula 17. O STJ diz que responde pelos dois crimes em concurso material, mas manda ter cuidado com a Súmula 17 que prevê uma exceção: STJ Súmula nº 17 - DJ 28.11.1990 - Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido. Aí não tem dois crimes. O agente responde só pelo estelionato. Se o falso se exaure no estelionato, aí o agente não responderá pelos dois crimes. Lendo a súmula contrario sensu, diz que quando o falso não se exaure no estelionato, o agente responde pelos dois. Ex.: estelionato com cheque falsificado: o cheque se esgota no estelionato. Aplico, neste caso, a súmula. Aquela folha de cheque se esgotou naquele estelionato. Agora, estelionato com cartão de crédito falso. O falso não se esgotou no estelionato porque você sai da loja com o cartão, com o instrumento falso e responderá pelos dois crimes (não se aplica a súmula neste caso). 2ª Corrente: Responde por estelionato + falsidade documental, porém o concurso é formal. A segunda corrente concorda com a primeira no sentido de que não pode absorver porque os bens jurídicos são diversos. Porém, o concurso é formal: uma conduta produz dois resultados. Na verdade, você tem uma conduta dividida em vários atos. STF. É a corrente tradicional do STF, se bem que ultimamente eu vejo o STF caminhando na primeira. Mas a corrente tradicional é essa. 3ª Corrente: Se o documento é público, absorve o estelionato. É o crime mais grave absorvendo o crime menos grave. Só responde por falsidade documental. Minoria. 5.6. Tipo subjetivo Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 O crime é: “Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.” O crime é punido a título de dolo + finalidade específica (obter para si ou para outrem vantagem ilícita). Sem grandes dificuldades: é punido a título de dolo com finalidade especial. 5.7. Consumação Preste atenção: o crime de estelionato é de duplo resultado: ele se consuma com a obtenção da indevida vantagem, seguida do prejuízo. Se faltar um dos dois, tentativa. Se faltar a indevida vantagem ou o prejuízo, é tentativa. Eu emprego a fraude e consigo obter da vítima um título de crédito. A partir do momento que eu emprego a fraude, eu consigo obter da vítima uma nota promissória, estou diante do crime consumado ou tentado? Vocês acabaram de anotar que o crime de estelionato é de duplo resultado. Para se consumar depende da obtenção da vantagem econômica + prejuízo alheio. Se eu obtive uma nota promissória, o crime está consumado? Anotem: “Quando o agente, mediante fraude, consegue obter da vítima um título de crédito, tem-se crime consumado ou tentado?” 1ª Corrente: “Considerando que a obrigação assumida pela vítima já é um proveito adquirido pelo estelionatário, tem-se crime consumado.” 2ª Corrente: “Enquanto o título não é convertido em valor material, não há efetivo proveito do agente, respondendo por tentativa.” esta corrente é a mais correta. O crime é de duplo resultado. Enquanto o título não for convertido em matéria, não tem proveito, não tem prejuízo. É a mais correta exatamente pelo fato de ser um crime de duplo resultado. 5.8. Estelionato Privilegiado – Art. 171, § 1º § 1º, Art. 171. Se o criminoso é primário e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a pena conforme o disposto no art. 155, § 2º. Ou seja, o que trata o art. 155, § 2º? Do furto privilegiado, ou seja, o art. 171, § 1º, prevê o furto privilegiado. Cuidado com os requisitos. Pegadinha de primeira fase: O furto privilegiado ou furto mínimo tem como requisitos: primariedade do agente + pequeno valor da coisa subtraída. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 O estelionato privilegiado ou estelionato mínimo, por sua vez, tem como requisitos: primariedade do agente + pequeno valor do prejuízo. Cuidado! No furto, o pequeno valor é da coisa. No estelionato, o pequeno valor é do prejuízo. 5.9. Subtipos de Estelionato – Art. 171, § 2º Nos subtipos do § 2º é indispensável o mesmo rol dos elementos estruturais. Os subtipos do § 2º continua exigindo fraude, obtenção de indevida vantagem e prejuízo alheio. Os três elementos estruturais do caput se repetem no § 2º. Se no caput há fraude, obtenção de indevida vantagem e prejuízo alheio, no § 2º, continuo encontrando fraude, obtenção de indevida vantagem e prejuízo alheio. Disposição de Coisa Alheia Como Própria § 2º - Nas mesmas penas incorre quem: I - vende, permuta, dá em pagamento, em locação ou em garantia coisa alheia como própria; Quem é o sujeito ativo aqui, esse que faz caridade com chapéu alheio? O sujeito ativo é qualquer pessoa. O crime é comum. Hoje em dia, quando o examinador pergunta sobre estelionato, ele quer saber dos subtipos porque o caput está batidão. Configura o crime do inciso I o condômino que vende a coisa indivisa como se fosse o único dono? Pratica esse crime? Sim. Prevalece que abrange o condômino que aliena coisa indivisa como se só dele fosse. Quem é a vítima? Quem são as duas vítimas? O adquirente de boa-fé e o real proprietário. Se há duas vítimas, estou diante de um crime de dupla subjetividade passiva. Vocês perceberam que o agente permuta, dá em garantia, etc, coisa alheia como própria. O objeto material do crime é a coisa alheia. Guardem isso, porque é exatamente um dos pontos que diferenciam o inciso I do inciso II. No inciso I, o objeto material é a coisa alheia alienada como se própria fosse. No inciso II, o objeto material é a coisa própria. No I, o objeto material e a conduta recaem sobre a coisa alheia. O inciso I traz vários negócios jurídicos (vender, permutar, dar em pagamento, etc.). Esse é um rol taxativo ou exemplificativo? Anotem no final do inciso I: “compromisso de compra e venda” (?) Vocês estão vendo que o compromisso de compra e venda não está abrangido no rol do inciso I. E isso está caindo em concurso. O examinador coloca arbitrariamente o compromisso de compra e venda, só que o rol é taxativo. Não abrange o compromisso de compra e venda. Se alguém se compromete a vender uma coisa que é minha como se dela fosse, até pratica o Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 crime, mas é o crime do caput. O compromisso de compra e venda cai no caput porque não deixa de haver fraude e prejuízo alheio. Quando esse crime se consuma? Eu falei: os subtipos precisam dos mesmos elementos estruturais. O caput é crime de duplo resultado. Se consuma com a obtenção da vantagem seguida do prejuízo. O caso do § 2º, I também é crime de duplo resultado. Se consuma com a obtenção da vantagem seguida do prejuízo. Se a coisa alheia for móvel, quando você transfere e propriedade? Com a tradição. A transferência da propriedade se dá com a tradição. E se for coisa imóvel? É com o registro. O crime para consumar-se precisa da tradição no caso de coisa móvel e da alteração do registro no caso de coisa imóvel? A tradição, a escritura, são dispensáveis ou indispensáveis? Você tem um copo de ouro que eu vendo como se fosse meu. A pessoa me pagou pelo copo. Eu não entreguei o copo. Eu já tive vantagem e ela já teve prejuízo. Eu preciso entregar o copo para que ela tenha prejuízo e eu tenha vantagem? Não. O crime dispensa a tradição no caso de coisa móvel ou a alteração no registro no caso de coisa imóvel. Agora, se o estelionatário alterar o registro se passando por proprietário, praticou mais um crime: falsidade ideológica, além do estelionato. Se o estelionato for seguido da alteração do registro, além do estelionato, ele responde por falsidade ideológica. Essa é, inclusive a posição de Nelson Hungria. Furtador que vende a coisa furtada como se fosse dono pratica quantos crimes? Ele vende o carro furtado como se fosse dono. Responde pelo furto e pelo estelionato? 1ª Corrente: Prevalece que o estelionato é o post factum impunível. É o modo que ele encontrou a vantagem no furto. Fato posterior impunível, princípio da consunção. Prevalece que ele responde apenas pelo furto do veículo. Isso prevalece. Francisco de Assis Toledo. 2ª Corrente: Mas tem minoria que entende que responde pelos dois crimes em concurso material. É a posição institucional do MP/SP. E por que essa posição entende assim? Porque essa minoria vê que há duas vítimas distintas. O furtador responde também pelo estelionato em concurso material. Eu vendi seu carro como se fosse meu. Aí eu comprei o seu carro que eu já vendi como se fosse meu. Isso exclui o crime? Anotem o seguinte: “Efetivada a alienação, ainda que o agente regularize posteriormente o domínio, o crime permanecerá (pode configurar arrependimento posterior).” Alienação ou Oneração Fraudulenta de Coisa Própria § 2º - Nas mesmas penas incorre quem: II - vende, permuta, dá em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável, gravada de ônus ou litigiosa, ou imóvel que Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em prestações, silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias; Está trabalhando com alienação fraudulenta de coisa própria. Nós vimos que no inciso I o objeto material é a coisa alheia. Aqui, o objeto material é a coisa própria. E aqui, já ajuda para definir o sujeito ativo: o proprietário. E quem é a vítima? O adquirente de boa-fé. O que pune: “vender, permutar, dar em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável gravada de ônus ou litigiosa ou imóvel que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em prestações, silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias.” Eu vendi para uma pessoa um imóvel gravado com cláusula de inalienabilidade. Pratiquei o crime? O seu problema traz o seguinte: A vendeu para B um imóvel que estava gravado de inalienabilidade. Vendeu mais barato por causa da cláusula. Cadê a fraude, que é o primeiro dos elementos estruturais? “Silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias.” eis a fraude! Então, não basta vender imóvel inalienável. Tem que vender imóvel inalienável silenciando sobre a cláusula de inalienabilidade. Não basta vender imóvel inalienável. Não basta vender coisa litigiosa. Tem que vender silenciando sobre a disputa. Senão, não tem fraude. Você tem que descobrir na prova se ele silenciou ou não. Se não silenciou aí passa a ilícito civil. Quando o crime se consuma? Continua sendo de duplo resultado. Precisa da vantagem e do prejuízo. Defraudação de Penhor § 2º - Nas mesmas penas incorre quem: III - defrauda, mediante alienação não consentida pelo credor ou por outro modo, a garantia pignoratícia, quando tem a posse do objeto empenhado. Agora vocês vão ter uma verdadeira aula de direito civil comigo. Eu estou tratando deu ma garantia pignoratícia. Eu estou no direito real de garantia, chamado penhor. Pergunto: em regra, a coisa empenhada fica na posse de quem? No contrato pignoratício, em regra, a coisa empenhada fica com o credor. Mas, excepcionalmente, a coisa empenhada pode ficar na posse do devedor. E é aqui a hipótese do inciso III, onde o devedor, na posse da coisa empenhada defrauda a garantia em prejuízo do credor.   Sujeito ativo – O devedor no contrato pignoratício. Sujeito passivo – A vítima é o credor. Estou diante de um crime bipróprio. O que o devedor faz? O devedor defrauda a garantia ou alienando a coisa ou de qualquer outro modo, por exemplo, adquirindo a coisa. Então, o que o devedor no Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 contrato pignoratício faz? Ele aliena a coisa sem consentimento do credor ou destrói a coisa em prejuízo do credor. Oque importa é que ele, de qualquer modo, defraude a garantia. Quando se consuma? É crime de duplo resultado, crime material. Observação - Tem jurisprudência minoritária dizendo que esse crime é formal. Ou seja, se consuma com a mera defraudação, dispensando obtenção de indevida vantagem. Mas É minoria. O crime é de duplo resultado, material, mas tem minoria falando que é formal, dispensa o enriquecimento, locupletamento. Defraudação de penhor = art. 171, § 2º, III, do CP. Quando eu falo de penhor, estou falando de coisa empenhada. Estou falando de um direito real de garantia. Contrato pignoratício. Agora, quero saber que crime configura a defraudação de penhora. Quando falo de penhora, estou falando de coisa penhorada, estou falando de garantia à execução. Não se confunde. Cuidado na prova! Tem que ver se é defraudação de penhor ou de penhora. A defraudação de penhora levou o devedor à insolvência, ou seja, o seu passivo ultrapassou o ativo? Se o devedor foi levado à insolvência, haverá o crime do art. 179, do CP (fraude à execução). Se a defraudação da penhora levou o devedor à insolvência, haverá a incidência do art. 179, do CP: Fraude à Execução Art. 179 - Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou simulando dívidas: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa. Reparem que a fraude é de menor potencial ofensivo, diferente da defraudação de penhor. Se o devedor, apesar da defraudação, continua em estado de solvência (ativo suplanta o passivo), estamos diante de mero ilícito civil. Antigamente, ele poderia até ser preso como depositário infiel. Mas hoje, o Supremo vem negando essa prisão do depositário infiel. Fraude na Entrega de Coisa § 2º - Nas mesmas penas incorre quem: IV - defrauda substância, qualidade ou quantidade de coisa que deve entregar a alguém; Sujeito ativo – Qualquer pessoa juridicamente obrigada a entregar algo a alguém. Não escrevam mais do que isso no sujeito ativo. Sujeito passivo – É a pessoa prejudicada com o recebimento. Reparem que a ação nuclear continua a mesma: defraudar, agir com fraude. E aqui, o que o sujeito ativo faz? Defrauda a qualidade, substância de coisa que deveria entregar a alguém. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Substância – Natureza da coisa. Exemplo: você substitui os diamantes por vidro. Você defrauda a substância, a natureza da coisa. Qualidade – Atributo da coisa. Também pratica esse crime quem defrauda a qualidade. Entrego arroz de segunda ao invés de arroz de primeira. Quantidade da coisa – Relacionada à números: peso, dimensão, quantidade, etc. O crime o inciso IV, que estamos estudando é de duplo resultado. Vejam: olha a pergunta que caiu no MP/TO: você levou sua TV para consertar. O comerciante trocou as peças da sua TV e colocou peças recondicionadas. O comerciante trocou as peças por peças recondicionadas. Praticou esse crime? Cuidado! Se tiver uma relação de comércio, fraude no comércio, o crime é o do art. 175, do CP. Fraude no Comércio Art. 175 - Enganar, no exercício de atividade comercial, o adquirente ou consumidor: I - vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada; II - entregando uma mercadoria por outra: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa. A maioria entende que o art. 175, do CP foi revogada. Hoje, a fraude do comércio é a Lei 8.078/90 ou Lei 8.137/90, crime do CDC ou Contra as Relações de Consumo. E é uma zona isso. Tem situações que podem se encaixar tanto na 8.078/90, quanto na 8.137/90. E aí o candidato pensa: “já sei: nesses casos, eu vou aplicar a Lei 8.137 porque ela é posterior. Cuidado porque apesar de ser posterior quanto ao número, ela é anterior quanto à vigência porque a vigência do CDC foi posterior. O 8.137/90 teve vacatio longa. O art. 175 foi revogado. Por qual? Ah, em alguns casos por uma e em outros casos por outra. Tá errado! A Lei 8.137/90 é que veio primeiro. É uma zona! Vocês já viram os crimes na relação de consumo? Qual é a dica que eu dou? Vão no código do Alberto Silva Franco que ele tem uma tabela dizendo quais os artigos estão prevalecendo na 8.078 em face da 8.137 e vice-versa. Ele montou uma tabela. Isso é difícil mesmo. Fraude para Recebimento de Indenização ou Valor de Seguro § 2º - Nas mesmas penas incorre quem: V - destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria, ou lesa o próprio corpo ou a saúde, ou agrava as consequências da lesão ou doença, com o intuito de haver indenização ou valor de seguro; É pressuposto deste crime a existência de um contrato de seguro vigente e válido. Se o contrato de seguro não está mais válido ou vigente, não haverá chance de conseguir vantagem, logo, o crime é impossível. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Sujeito ativo: o segurado, podendo o beneficiário do contrato de seguro figurar como partícipe. Vítima: a seguradora. Você destrói o seu carro, joga no Tietê e diz que foi vítima de furto, para conseguir o valor da indenização do seguro que não está nem perto do que o mercado te paga pelo carro. Coloca fogo no seu carro, etc. No tipo penal, a conduta é clara. Esse crime é material ou formal? Até agora vimos que o estelionato é crime material. Aqui, é o único caso em que a jurisprudência, majoritariamente, entende que o crime é formal. O único estelionato que não é formal, que não é de duplo resultado, é este. É um caso de estelionato formal. A jurisprudência majoritária diz que é formal porque dispensa a obtenção da vantagem. Fraude no Pagamento por Meio de Cheque § 2º - Nas mesmas penas incorre quem: VI - emite cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra o pagamento. Sujeito ativo – Esse é um estelionato muito comum (fraude no pagamento por meio de cheque). Sujeito ativo é quem emite o cheque. O crime é emitir cheque. Abrange o endossante? Aquele que endossa o cheque, sabendo que não tem fundos pratica o crime? Endossante de cheque sem fundo pratica crime? É essa a pergunta megathunderblaster que vai cair na sua prova; “Endossante pratica o crime?” 1ª Corrente: “Endossante não emite o cheque. Logo, não pratica o crime, salvo na condição de partícipe. (Nucci).” 2ª Corrente: “A expressão 'emitir' abrange o endosso, pois deve ser tomada no seu sentido amplo. (Noronha).” A tendência, em concurso, é prevalecer a primeira. Sempre que caiu, caiu de acordo com a primeira corrente. O que pune o inciso VI? Duas condutas: emitir cheque sem fundos ou frustrar o pagamento. Dois são os comportamentos punidos:  Emitir cheque sem provisão de fundo  Frustrar o pagamento do cheque emitido – Por exemplo, encerrando a conta ou sustando o cheque. Nas duas hipóteses, é imprescindível má-fé. Súmula 246, do STF: STF Súmula nº 246 - 13/12/1963 - Comprovado não ter havido fraude, não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Claro! A fraude é um dos elementos estruturais do estelionato. E se o cheque sem fundos for pós-datado? É crime? Você tem que perquirir se, apesar de pós-datado, gerou fraude. Anotem: “A emissão de cheque pós-datado, em regra, não configura o crime, deixando de ser ordem de pagamento à vista, revestindo-se das características de nota promissória (garantia do crédito). Se apesar de pós-datado houver a fraude, haverá o estelionato do caput.” É preciso analisar se houve ou não fraude na emissão desse cheque. Como fica a reparação do dano nessa modalidade de estelionato? Ela é orientada não pelo arrependimento posterior, mas pela Súmula 554, do STF: STF Súmula nº 554 - DJ de 5/1/1977 - O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação penal. Essa súmula só se aplica a uma espécie de estelionato: cheque sem fundos. Não faz referência a frustrar pagamento. Porém, a maioria estende para o “frustrar pagamento”. Não vê rezões para que só seja aplicada ao cheque sem fundos. Competência para processar esse estelionato: Súmula 521, do STF: STF Súmula nº 521 - DJ de 12/12/1969 - O foro competente para o processo e julgamento dos crimes de estelionato, sob a modalidade da emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos, é o do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado. Essa súmula não se aplica para frustrar pagamentos. A Súmula 521 só se aplica para cheque sem fundos. A maioria, no entanto, admite. Então, cuidado! A Súmula nasceu para cheque sem fundos, mas não para frustrar pagamento. Na prática, a maioria abrange porque não vê sentido na diferença ou na restrição. O STJ tem uma súmula que aplica esse raciocínio (local do banco que recusa) que é a seguinte: STJ Súmula nº 244 - DJ 01.02.2001 - Compete ao foro do local da recusa processar e julgar o crime de estelionato mediante cheque sem provisão de fundos. Agora, quando o cheque for falsificado, esqueçam o local da recusa pagamento! No caso do cheque falsificado é o local da obtenção da vantagem (Súmula 48): Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 STJ Súmula nº 48 - DJ 25.08.1992 - Compete ao juízo do local da obtenção da vantagem ilícita processar e julgar crime de estelionato cometido mediante falsificação de cheque. Resumindo:  Cheque sem fundos – Súmula 521, STF e Súmula 244, STJ – Local é o da recusa do pagamento.  Frustrar pagamento – Apesar de não expressas, a maioria aplica a Súmula 521 e 244. eu não falei que é unânime, mas não há razão para diferenciar. O local competente aqui é a recusa do pagamento.  Cheque falsificado – Súmula 48, do STJ: o local competente é o da obtenção da vantagem. Observação 01: vocês não podem confundir “emitir cheque” e “frustrar o pagamento” com emitir cheque de conta já encerrada. Uma coisa é você primeiro emitir o cheque e num segundo momento encerrar a conta. Aqui incide o art. 171, § 2º, VI. Se você encerra a conta e cai por aí, num segundo momento emitindo o cheque, isso é caput. Vejam que não incide as súmulas a que fiz referência. Observação 02: é crime emitir cheque sem fundo para pagar dívida de jogo? O art. 814, do Código Civil diz: Art. 814. As dívidas de jogo ou de aposta não obrigam a pagamento; mas não se pode recobrar a quantia, que voluntariamente se pagou, salvo se foi ganha por dolo, ou se o perdente é menor ou interdito. Portanto, não pratica crime quem emitiu cheque sem fundo para pagar dívida de jogo porque essa dívida é incobrável. Cheque sem fundos para pagar dívida de jogo ou aposta não é crime porque são dívidas incobráveis. Na aula de hoje, vamos terminar estelionato. Ficou faltando somente o § 3º, que eu tenho certeza que vai cair por conta de uma discussão recente que se iniciou no Supremo, aliás, numa liminar dada pelo novo Ministro Toffoli. 5.10. Causa de aumento de pena – Art. 171, § 3º § 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência. O § 3º não é qualificadora! É causa de aumento de pena! Antes de mais nada, uma pergunta: eu aplico o § 3º se o estelionato é praticado em face do Banco do Brasil? Não! Não se aplica o § 3º neste caso porque Banco do Brasil é sociedade de economia mista, entidade de direito privado. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Eu aplico essa causa de aumento no estelionato contra o Instituto da Previdência Social? Sim. Tem até súmula nesse sentido: STJ Súmula nº 24 - DJ 10.04.1991 - Aplica-se ao crime de estelionato, em que figure como vítima entidade autárquica da Previdência Social, a qualificadora do § 3º do Art. 171 do Código Penal. A súmula 24 não chama o § 3º de majorante, mas de qualificadora. Olha que redação atécnica! O § 3º não traz qualificadora. É causa de aumento, da 3ª fase da aplicação da pena. “Rogério, o STJ errou?” Não! O STJ não erra, ora! Ele usou o termo em sentido amplo. Agora a pergunta que eu tenho certeza que vai cair: se não cair na sua prova em 2010, eu devolvo o que você paga. Estelionato contra a Previdência Social, aquele estelionato clássico, aquele que você entrega para a autarquia um atestado falso e graças a ele você está recebendo o benefício indevido. A pessoa mediante uma certidão, atestado ou documento falso, engana a previdência e, todo mês, é depositado na conta desse estelionatário um benefício indevido. Eu quero saber o seguinte: esse estelionato clássico é um crime instantâneo, de efeitos permanentes ou permanente? Em fevereiro de 2010 você recebe um benefício indevido porque apresentou um atestado falso. Em março você continua recebendo, abril, maio, junho e por aí vai. Esse crime se consumou em fevereiro e os seus efeitos perpetuam no tempo ou este crime é permanente com a consumação que se protrai durante todo o período do benefício indevido? Eu quero saber: o crime se consumou em fevereiro e o que se protrai são os seus efeitos ou o crime se consuma durante todo o tempo do recebimento indevido?   STJ – Entende que o crime é permanente. STF – Entende que o crime é instantâneo de efeitos permanentes. E qual a aplicação prática disso? Qual o interesse prático disso? São dois: 1ª repercussão prática:  Se você entende que o crime é instantâneo, lá no início deve ocorrer o flagrante.  Se você entende que é permanente, durante todo o período, é possível o flagrante. E sabe o que aconteceu? Isso está no STF, exatamente discutindo isso. Se você entende que o crime é instantâneo, admite o flagrante apenas no recebimento da primeira vantagem porque as demais configuram mero exaurimento do crime. Se você entende que o crime é permanente, ele admite flagrante a qualquer tempo do recebimento. Enquanto você não parar de receber a indevida vantagem, o crime admite flagrante. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 2ª repercussão prática:  Se você entende que é instantâneo de efeitos permanentes, a prescrição começa a correr do recebimento da primeira vantagem. As demais configuram mero exaurimento  Se você entende que o crime é permanente, a prescrição só começa a correr depois de cessada a permanência. Enquanto está recebendo a indevida vantagem, não corre a prescrição. Depois vocês não podem esquecer da Súmula 711 do STF que é de aplicação somente para crime continuado ou permanente. Não se aplica ao crime instantâneo de efeitos permanentes (salvo se em continuidade delitiva): STF Súmula nº 711 - DJ de 13/10/2003 - A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência. Está no Supremo exatamente isso. Há uma liminar do Min. Toffoli confirmando a posição do STF e contrariando a posição do STJ. Com isso, praticamente terminamos estelionato. Para terminar, temos que analisar duas leis especiais que tratam de estelionatos especiais. 5.11. Estelionatos especiais a) Estelionato da Lei 7.492/85: A Lei dos Crimes Contra o Sistema Financeiro tem estelionato especial (Lei 7.492/96): Art. 6º Induzir ou manter em erro, sócio, investidor ou repartição pública competente, relativamente a operação ou situação financeira, sonegando-lhe informação ou prestando-a falsamente: Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. Reparem que é um estelionato especial que não admite suspensão do processo. b) Estelionato da Lei 11.101/05 (Lei de Falências): Fraude a Credores Art. 168. Praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar a recuperação extrajudicial, ato fraudulento de que resulte ou possa resultar prejuízo aos credores, com o fim de obter Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 ou assegurar vantagem indevida para si ou para outrem. Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. Da parte grifada se conclui o quê? Até agora vimos que o estelionato é, em regra, um crime material. Na Lei de Falência, não. O art. 168 trata de um crime formal. Haverá o crime se resultar ou for possível prejuízo aos credores. Na Lei de Falências, o crime não é material, mas formal. É imprescindível que possa resultar no prejuízo. O fato de resultar ou não é circunstância que o juiz vai dosar na pena. Isso é importante! Vai cair. E o crime é punido independentemente de o ato do devedor falido ter ocorrido antes ou depois de decretada a falência. 6. RECEPTAÇÃO – ART. 180, CP 6.1. Topografia da Receptação Receptação Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influi para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. Receptação Qualificada § 1º - Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime: Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. § 2º - Equipara-se à atividade comercial, para efeito do parágrafo anterior, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercício em residência. § 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso: Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, ou multa, ou ambas as penas. § 4º - A receptação é punível, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa. § 5º - Na hipótese do § 3º, se o criminoso é primário, pode o juiz, tendo em consideração as circunstâncias, deixar de aplicar a pena. Na receptação dolosa aplica-se o disposto no § 2º do Art. 155. § 6º - Tratando-se de bens e instalações do patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista, a pena prevista no caput deste artigo aplica-se em dobro. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010        Caput – Receptação dolosa simples § 1º - Receptação dolosa qualificada (certeza que vai cair isso) § 2º - Cláusula de equiparação § 3º - Receptação culposa § 4º - Dispositivo explicativo § 5º - Perdão judicial e privilégio § 6º - Aumento de pena (majorante) Bem jurídico tutelado na receptação – Patrimônio. Se sua resposta ficar só nisso, será idêntica a todos os candidatos. Se cai essa pergunta é pra você falar mais, colocar um diferencial na prova. Tem doutrina que, secundariamente, entende que fere a administração da justiça. Sim, porque a partir do momento que o produto do crime sai do furtador, passa para outra pessoa e por aí vai, você está dificultando a recuperação do produto. Você está dificultando a própria administração da justiça. “Temos doutrina lecionando que o art. 180 protege também a administração da justiça embaraçada pela ação do receptador (Noronha).” 6.2. Receptação dolosa simples – Art. 180, caput Receptação Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influi para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. O art. 180, caput, traz a receptação dolosa simples. a) Sujeito ativo Qualquer pessoa, não podendo essa pessoa ter sido coautora ou partícipe do crime anterior, do crime do qual provenha a coisa. Olha como você começa a diferenciar sua resposta do concorrente. Você vai dizer que é praticado por qualquer pessoa, mas vai alertar: qualquer pessoa que não tenha concorrido para o crime anterior porque, nesse caso, ela não responde por receptação, mas pelo crime anterior. Exemplo: nós furtamos um veículo. Dividir ao meio, não dá. Eu compro a sua parte. Neste caso não estarei praticando receptação porque participei do crime anterior. Respondo só por furto. É possível receptação de coisa própria? – Caiu isso para delegado/PR (acho). O proprietário do bem pode praticar receptação? Alguém furtou o seu relógio. Aí aparece na sua casa uma pessoa vendendo o seu relógio com uma outra pulseira dizendo que é quente. Você compra o relógio. Praticou receptação? Não. Outro problema: o seu relógio foi penhorado e está lá como garantia para o credor. Uma pessoa furta o depositário do relógio e vai te vender. Você percebe que aquele é o seu relógio que foi penhorado e você compra o relógio que você percebeu que foi Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 furtado do depositário. Você pratica receptação? Neste caso você pratica receptação. Por que aqui pratica e no exemplo anterior não? Porque na receptação é preciso analisar a natureza da coisa na mão de terceiro. Vamos anotar isso: “Excepcionalmente, pode figurar como sujeito ativo o proprietário do bem, caso o objeto esteja na posse legítima de terceiro.” Então, cuidado! Se a coisa está na posse legítima de terceiro, alguém furta esse terceiro, você percebe e compra o seu relógio, você praticou receptação. Vejam que é possível, ainda que em casos excepcionalíssimos, o proprietário da coisa ser sujeito ativo de receptação. b) Sujeito passivo A teve os eu veículo furtado por B. B vende esse veículo para C, que sabe ser produto de crime. C praticou receptação. Quem é a vítima da receptação de C? O bem jurídico principal é o patrimônio, mas patrimônio de quem? De A. Então, A é a vítima. A vítima do crime anterior continua vítima da receptação. c) Conduta punida “Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime.” Nós temos uma classificação doutrinária de crime que consiste em dividir crimes principais dos chamados crimes acessórios. O do art. 180 é um crime principal ou acessório?  Crime principal – Não pressupõe outro para a sua existência.  Crime acessório – Pressupõe outro para existir, mas com punibilidade independente. Eu falei que o crime acessório pressupõe o outro para existir, mas não depende do outro para ser punido! É acessório quanto à existência, não quanto à punição. Basta você ler o art. 180, § 4º: § 4º - A receptação é punível, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa. Então, cuidado! Nunca digam que o crime acessório é aquele que depende de outro para ser punido. Você tem que dizer que no crime acessório a sua dependência é para existir. Se vai ser ou não punido, não depende do outro. Não importa o que aconteceu com o outro. Não importa se o agente do crime pressuposto foi absolvido. O que importa é que houve o crime pressuposto. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Vocês têm a receptação como exemplo de crime acessório. Vou dar mais três exemplos:    Favorecimento pessoal (art. 348, CP), Favorecimento real (art. 349, CP) e Lavagem de capitais (art. 1.º, da Lei 9.613/98) O crime de lavagem pressupõe crimes pressupostos. Um deles é a presença de organização criminosa. Vocês viram o que o Supremo está para fazer? Está para absolver o casal da Igreja Renascer, porque está entendendo que não existe ainda definição de organização criminosa no Brasil e se o crime pressuposto ainda não existe, a lavagem também não. Voltando ao art. 180, caput. Ele pune: Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influi para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte. O que está em negrito é a chamada receptação própria ou propriamente dita. É a única que lembramos. Tem gente que desconhece o que está em cinza, a chamada receptação imprópria. Então, cuidado porque a receptação simples tem duas modalidades:   Receptação própria – 1ª parte do caput Receptação imprópria – 2ª parte do caput *Receptação própria Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime Já deu para perceber que na receptação própria, a coisa sai do agente, autor, coautor ou partícipe do crime anterior para o receptador. É prescindível ou imprescindível um ajuste entre os dois? Entre o concorrente do crime antecedente e o receptador? O ajuste é prescindível, ou seja, é dispensável. Não precisa. Exemplo de uma receptação sem ajuste: você viu uma pessoa furtando a carteira. O furtador, na fuga, joga a carteira e você vê onde a carteira caiu. Você vai e embolsa a carteira. Isso é receptação. E não teve ajuste entre você e o furtador. Você está ocultando coisa que sabe ser produto de crime. *Receptação imprópria Influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte. Aqui, há o agente concorrente do crime anterior, o receptador e o adquirente de boa-fé. Percebam que receptador na receptação imprópria nada mais é do que o intermediário. O que a receptação imprópria chama de interceptador é o Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 intermediário. É aquele que está influindo para que terceiro de boa-fé adquira a coisa produto de crime. O receptador aqui é o intermediário, é quem está fazendo com que a coisa produto de crime saia do agente e vá para o terceiro de boa-fé. E se o adquirente agir de má-fé? Ou seja, ele sabe que a coisa é produto de crime. Ai não haverá a receptação imprópria. Haverá a receptação propriamente dita. E aquele que influenciou para ele comprar? É partícipe pela receptação propriamente dita. Se ele agiu com má-fé, passa a ser autor de receptação própria e o intermediário é partícipe na receptação própria. Se o último da cadeia agiu com má-fé, o receptador passa a ser partícipe de uma receptação própria. Agora vamos analisar o caput como um todo. O crime consiste em: Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime. Pergunto: abrange produto de contravenção penal? Existe receptação ao se adquirir coisa produto de contravenção penal? O examinador é claro: você tem que adquirir coisa produto de crime! Então, não é possível. Não abrange contravenção penal porque isso seria analogia in malam partem. E se for produto de ato infracional? É receptação? Um adolescente furtou um veículo. Você compra o veículo. Você praticou receptação? 1ª Corrente: Não há receptação por falta de previsão legal. Menor infrator não pratica crime. Fragoso adota essa corrente. 2ª Corrente: Há receptação, pois a lei exige coisa produto de fato previsto como crime, abrangendo o ato infracional. O ato infracional nada mais é do que um fato previsto como crime praticado por menor inimputável. É a que prevalece. É possível receptação de receptação? Isso vocês vão encontrar em Hungria. O crime precedente pode ser uma receptação? Vamos supor que B praticou um furto, aí ele vende para C que praticou receptação. Se C vender para D existe receptação? Sim. É perfeitamente possível receptação de receptação. Enquanto permanecer a má-fé dos adquirentes, haverá a receptação da receptação. A partir do momento que um deles agir com boa-fé, aí acabou a cadeia. Se ele adquirir com boa-fé, daí para frente, não há mais crime. Pergunta megathunder: é possível receptação de coisa imóvel (é coisa imóvel para o direito penal!)? quando o legislador fala em adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, abrange a coisa imóvel? “O objeto material pode ser coisa imóvel? 1ª Corrente: O objeto material pode ser qualquer coisa (móvel ou imóvel), não diferenciando o tipo penal. Aqui, a lei não distingue, como no furto, que tem que ser coisa móvel. Fragoso. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 2ª Corrente: O objeto material só pode ser coisa móvel. O significado léxico da palavra ‘receptação’ pressupõe coisa passível de deslocamento. Hungria. A coisa móvel está presente no próprio nomen iuris. STF. Vou dar um exemplo. Uma senhora vira pra mim e diz: “foi você que me salvou ontem? É que estou procurando quem me salvou ontem para doar um apartamento.” Aí eu digo que fui eu. Aí ela passou a escritura para o meu nome. Ela estava enganada. Eu a mantive em erro. Eu pratiquei o crime de estelionato. Recebi um imóvel enganando a pobre senhora. Mas aí eu vejo que não tenho condições de manter aquele imóvel (condomínio caro, etc.) e vendo por 10 mil reais explicando que eu estava vendendo barato porque recebi de uma senhora que achou que eu era alguém que eu não era. O comprador adquiriu sabendo ou não que a coisa era fruto de estelionato? Sabendo. Praticou ou não receptação? Praticou receptação. Porém, o STF está com a segunda corrente. Para concurso, já não basta Hungria, temos o STF. Agora, tecnicamente, não é a mais correta porque dá para provar a possibilidade de receptação de coisa imóvel. O crime é Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime. Tem que ser coisa genuína, autêntica? Ou pode ser a coisa transformada? A receptação é só da coisa produto do crime anterior ou pode ser a coisa transformada produto do crime anterior? Vamos imaginar o seguinte exemplo: furtaram a Taça Jules Rimet, de ouro maciço, que consagrou o nosso tricampeonato mundial. Derreteram essa taça e fizeram várias medalhinhas para comemorar o centenário do Corinthians, com o rosto do Ronaldinho. Aí vendem as medalhinhas, avisando que o ouro veio da Taça Jules Rimet. Se eu adquirir essa medalhinha estou praticando receptação? Ele não adquiriu a taça, mas a medalhinha cunhada com o ouro da Taça Jules Rimet. “Não importa ser a coisa genuína, transformada ou alterada. É receptação.” Vocês perceberam que a receptação pressupõe coisa produto de crime. Outra perguntinha de concurso: esse crime é necessariamente contra o patrimônio? É possível crime antecedente que gera receptação e que não é contra o patrimônio, que não seja roubo, furto, estelionato. Pode ser um crime contra a Administração Pública como o peculato. Peculato não é crime contra o patrimônio. É crime contra a Administração Pública que pode gerar receptação. Cuidado que o crime antecedente não precisa ser, necessariamente, contra o patrimônio. Pode ser contra a Administração Pública, como o peculato. Há algumas modalidades especiais de receptação configurando o delito de contrabando ou descaminho. Eu não estou dizendo que adquirir coisa de contrabando ou descaminho é o art. 334. Pode ser o art. 334 como pode ser o 180. Depende de quem adquire. Se for comerciante, é o art. 334. Então, cuidado! Temos algumas modalidades especiais de receptação configurando o contrabando ou descaminho. Por exemplo, o comerciante que adquire coisa produto de contrabando para revender. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Receptação X Favorecimento Real – O art. 180 pune o agente que adquire, recebe, transporta, conduz ou oculta em proveito próprio ou alheio coisa que sabe ser produto de crime. Aqui, há a primeira diferença da receptação para o crime de favorecimento real (art. 349): Favorecimento Real Art. 349 - Prestar a criminoso, fora dos casos de co-autoria ou de receptação, auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime: Pena - detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, e multa. Já deu para perceber a diferença. Na receptação, o agente, com a receptação, busca vantagem pessoal ou de terceiro que não o autor do crime anterior. Já no crime de favorecimento real, o agente, com o favorecimento, quer garantir a vantagem do autor do crime anterior. Vejam a diferença. Se eu adquiri um veículo furtado para mim ou para meu irmão, é receptação. Se eu ocultar o veículo furtado para ajudar o furtador, é favorecimento real. A diferença está exatamente na natureza da vantagem. Se o favorecimento é para garantir a vantagem do próprio autor do crime anterior é favorecimento real. Tem que analisar para quem é a vantagem. Dolo eventual – O art. 180, caput, utiliza a expressão “coisa que sabe ser produto de crime”, ao utilizar a expressão “coisa que sabe” abrange também o dolo eventual? O crime é punido apenas a título de dolo direto ou também, implicitamente, o dolo eventual também está abrangido? Prevalece (eu não falei que é unânime) que a expressão “que sabe” abrange apenas o dolo direto, não abrangendo o dolo eventual. Dolo superveniente – Dolo superveniente configura o crime? Você adquire a coisa e depois descobre que é produto de crime. Você a oculta. É crime? Você descobre que o carro que você adquiriu é furtado e você não devolve. Você praticou receptação? Prevalece que não. Prevalece que o dolo deve estar presente no momento a aquisição. O dolo superveniente não gera crime. O dolo deve ser, pelo menos, contemporâneo à prática do núcleo. Deve existir no momento da conduta. O dolo superveniente à conduta não gera o crime. Nélson Hungria discorda. Ele entende que há o crime. d) Consumação Quando a receptação se consuma? Temos que analisar a consumação no delito de receptação própria e depois na imprópria. Receptação própria – Se consuma com a prática de qualquer um dos núcleos: Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar. Lembrando que alguns núcleos configuram delito permanente: transportar, conduzir e ocultar. Cuidado! E você já sabe o que pode acontecer com crime permanente. Enquanto está ocultado não corre a prescrição. Admite tentativa ao tentar adquirir. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Receptação imprópria – Na receptação imprópria, basta a influência sobre o terceiro de boa-fé. Pouco importa se ele adquire, recebe ou oculta. Basta o ato de influir no convencimento. Admite tentativa? A doutrina diz que não. A maioria nega a tentativa na receptação imprópria. Eu discordo. É perfeitamente possível quando o ato de influir é feito por escrito. A carta interceptada, antes de chegar ao terceiro de boa-fé. 6.3. Receptação Qualificada – Art. 180, § 1º Receptação Qualificada § 1º - Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime: Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. A pena que era de 1 a 4 passa a ser de 3 a 8 anos. Por que o § 1º está qualificado? Porque estamos diante de um crime próprio. Só pode ser praticado por quem está no exercício de atividade comercial ou industrial. Deixou de ser crime comum. E por que é mais grave quando praticado no exercício dessas atividades? Porque há uma maior facilidade de repassar a terceiros de boa-fé. Por que o crime é qualificado? Por conta das condições do agente, que está no exercício de atividade industrial ou comercial, com maior facilidade para repassar a coisa para terceiro de boa-fé. Não basta ser comerciante e adquirir a coisa. Tem que ser coisa adquirida diretamente ligada ao seu comércio. Logo, será repassada mais facilmente. Você tem padaria e adquiriu um carro furtado. Você não vende carro na padaria. Não incide carro na qualificadora, obviamente. Você tem oficina, agência de automóveis e adquire o carro. Aí incide a qualificadora porque está ligado diretamente à sua atividade. É imprescindível esse nexo! Não vai ficar pensando que qualquer comerciante que compra coisa produto de crime já incide a qualificadora. Não! Tem que ter o nexo com a sua atividade. Abrange o comerciante de fato? Abrange a sua vizinha que vende coisas no quintal? Ela viajou e veio cheia de novidades. Você pratica receptação se vai lá e compra? E quando você compra no camelô? Incide ou não incide? Posso abranger o camelô, a vizinha? Se tivesse só o § 1º não ia poder. Mas temos o § 2º que não deixa dúvidas: § 2º - Equipara-se à atividade comercial, para efeito do parágrafo anterior, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercício em residência. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 O § 2º traz uma cláusula de equiparação. *A questão da constitucionalidade do § 1º O § 1º fala que o agente “deve saber ser produto de crime”. Não falou que sabe! O art. 180, caput, traz a tal da receptação simples com pena de 1 a 4 anos e exige que o agente saiba ser produto de crime e esse “que sabe” abrange somente o dolo direto. O art. 180, § 1º, por sua vez, receptação qualificada, com pena de 3 a 8 anos, ao invés da expressão “que sabe” usa a expressão “que deve saber”. E agora? Presta atenção no que vou falar: 1ª Corrente: A expressão “que deve saber” indica somente dolo eventual. Se é assim, a consequência será que o dolo eventual será punido com 3 a 8 e o dolo direto com 1 a 4 anos. Para essa primeira corrente, a pena do § 1º é inconstitucional por ferir o princípio da proporcionalidade. Sabe o que significa isso? Para a receptação qualificada, eles ignoram o 3 a 8 anos e aplicam a pena do caput para ficar proporcional. A saída é essa: substituir a pena do § 1º pela do caput. A mais recente do STJ é nesse sentido. Eu falei que é posição do STJ? Não. Isso, nos tribunais superiores está uma zona. Cada dia decide de um jeito. 2ª Corrente: A expressão “que deve saber” abrange, não só o dolo eventual, também o dolo direto, sendo a pena proporcional. A mais recente decisão do STF é nesse sentido (HC 97344). Mas não é a posição do Supremo Porque antes desta, prevalecia a posição do Min. Celso de Mello, dizendo que é inconstitucional. Eu não estou falando que a primeira corrente do STJ porque o STF também tem posições nesse sentido. Apenas a mais recente está no STJ. A mais recente do STF, eu não vou dizer que é posição do STF porque o STJ também entende assim. Tomara que não caia, mas se cair, é só prestar atenção: vai prestar concurso para o MP? Segunda corrente. Vai prestar defensoria? Primeira corrente. E magistratura? Decide e fundamenta. 6.4. Receptação Culposa – Art. 180, § 3º § 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso: Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, ou multa, ou ambas as penas. O crime culposo está normalmente redigido em um tipo aberto. Vocês têm no art. 180, § 3º um exemplo de crime culposo de tipo fechado. Vai cair em concurso: existe algum crime culposo de tipo fechado? Existe. É o art. 180, § 3º. Reparem que esse dispositivo já traz as hipóteses que configuram a negligência. É um crime culposo Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 de tipo fechado. Então, quando vocês tiverem que trabalhar isso em concurso vão escrever que o tipo culposo é, em regra, de tipo aberto porque, excepcionalmente, pode ser de tipo fechado, que é o § 3º, do art. 180, que já traz as modalidades de negligência. São três as hipóteses que presumem a negligência: são as três hipóteses grifadas. É claro que é uma presunção relativa. 6.5. Perdão judicial e Privilégio – Art. 180, § 5º § 5º - Na hipótese do § 3º, se o criminoso é primário, pode o juiz, tendo em consideração as circunstâncias, deixar de aplicar a pena. Na receptação dolosa aplica-se o disposto no § 2º do Art. 155. O § 5º traz dois benefícios: Perdão judicial – É só para receptação culposa. Não vão aplicar este benefício a outra receptação. É exclusivo da culposa e tem como requisitos: a primariedade do agente e a culpa levíssima. Vejam que o perdão judicial não observa o valor da coisa. O valor da coisa não interfere. Você pode aplicar o perdão judicial na receptação culposa de um relógio, como também na receptação culposa de um veículo importado, desde que o receptador seja primário e a culpa levíssima. Privilégio – Esse benefício se aplica à receptação dolosa e, para a maioria, abrange, inclusive, a forma qualificada. Os requisitos do privilégio são os mesmos do § 2º, do art. 155, isto é, primariedade do agente e pequeno valor da coisa. 6.6. Causa de aumento de pena – Art. 180, § 6º § 6º - Tratando-se de bens e instalações do patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista, a pena prevista no caput deste artigo aplica-se em dobro. Essa causa de aumenta só se aplica à receptação dolosa do caput. Não se aplica na qualificadora, não se aplica ao § 1º qualificado. Ele é claro: a pena prevista no caput. Essa majorante não se estende ao § 1º. 7. IMUNIDADES PATRIMONIAIS – Arts. 181 a 183 7.1. Imunidade patrimonial absoluta – art. 181: Art. 181 - É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em prejuízo: I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal; II - de ascendente ou descendente. O art. 181 traz a chamada imunidade patrimonial absoluta, hipótese de isenção de pena. Quando está isenta a pena em um crime patrimonial? Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 1ª Hipótese: Quando praticado em prejuízo do cônjuge. A maioria, através da analogia in bonam partem, abrange o convivente numa união estável. Tem gente que não abrange porque é norma de exceção, mas a maioria abrange. E se os cônjuges estão separados de fato, incide essa isenção de pena? O fato de estarem separados impede a isenção de pena? A imunidade, chamada escusa absolutória, incide mesmo na separação de fato. 2ª Hipótese: A segunda hipótese de isenção de pena é crime praticado em prejuízo de ascendente ou descendente. Observação importante: não abrange irmãos, não abrange colaterais, não abrange os afins. Furto entre irmãos não está isento de pena. Furto entre primos não está isento de pena, não abrange os afins: furtar a sogra não te isenta de pena. 7.2. Imunidade patrimonial relativa – art. 182: Art. 182 - Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é cometido em prejuízo: I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado; II - de irmão; III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita. O art. 182 traz imunidade patrimonial relativa, escusa relativa. A escusa ou imunidade absoluta isenta o agente de pena. Aqui, temos apenas uma modificação da ação penal. Modifica-se a ação penal de pública incondicionada para pública condicionada. Por isso, Cezar Roberto Bittencourt critica esse nome: não deveria se chamar imunidade porque não torna ninguém imune. Só modifica o tipo de ação penal. E quando incide a escusa relativa? 1ª Hipótese: Crime praticado em prejuízo do cônjuge separado judicialmente. Observação importante: se já divorciado, não incide imunidade.  Casados ou separados de fato – Art. 181  Separados judicialmente – Art. 182  Divorciados – Não aplica o art. 181 e nem o art. 182. Não vai ter benefício algum. 2ª Hipótese: Em prejuízo de irmãos. 3ª Hipótese: Em prejuízo de tio ou sobrinho, exigindo a coabitação entre eles. Por que tio e sobrinho? Não entendi. É imprescindível a coabitação. Mas não estou Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 dizendo que o crime tem que ter ocorrido sob o mesmo teto. Exige-se a coabitação, mas não que o crime tenha que ocorrer sob o teto da coabitação. *Exceções à aplicação das imunidades absoluta e relativa Art. 183 - Não se aplica o disposto nos dois artigos anteriores: I - se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em geral, quando haja emprego de grave ameaça ou violência à pessoa; II - ao estranho que participa do crime. III – se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos. (Redação dada pela L-010.741-2003). Inciso I - Só não se aplica quando há violência à pessoa. Violência contra a coisa, não impede a aplicação da imunidade. Só a violência contra a pessoa. O furto qualificado pelo rompimento de obstáculo merece a imunidade. Inciso II – Não se aplica a imunidade ao estranho que participa do crime. Então, o vizinho que ajudou o marido a subtrair a esposa não está imune. Só o marido. Inciso III – Esse inciso foi incluído pelo Estatuto do Idoso. Não permite qualquer das imunidades se a vítima tem idade igual ou superior a 60 anos. Eu sempre brinco com vocês que o legislador esquece o idoso com idade igual. Aqui ele lembrou do idoso com idade igual a 60 anos. Será que a imunidade patrimonial absoluta contra a mulher, no ambiente doméstico e familiar, continua tendo incidência? O crime contra o patrimônio da mulher no ambiente doméstico e familiar continua com a imunidade? Será que o marido que furta a esposa tem direito à imunidade? Ou a Lei Maria da Penha veda? Delegado/MT: marido furta a mulher. Praticou violência doméstica patrimonial. Art. 7º, IV, da Lei Maria da Penha. Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; Marido furta a esposa. Merece a imunidade ou não? Maria Berenice Dias ensina que a Lei Maria da Penha, ao prever a violência patrimonial como violência doméstica e familiar contra a mulher, não admite a imunidade. Já que a violência familiar foi prevista como espécie de violência doméstica e familiar contra a mulher, logo, incompatível com a imunidade. Só que não dá para concordar com isso porque é analogia in malam partem. Se o legislador da Lei Maria da Penha quisesse evitar a imunidade, ele teria que acrescentar mais um inciso ao art. 183, do CP, como fez o Estatuto do Idoso. Se a Lei Maria da Penha quisesse evitar a imunidade, ela teria que Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 ser expressa, como foi o Estatuto do Idoso, ao acrescentar o inciso III. Isso que a Des. Maria Berenice fez foi analogia in malam partem. E a esmagadora maioria não concorda com ela. CRIMES CONTRA A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO Arts. 197 a 207, do Código Penal Nós hoje vamos estudar os crimes contra a organização do trabalho e Código de Defesa do Consumidor. Nós temos uma vantagem nesse estudo porque praticamente não há jurisprudência sobre o tema e, praticamente, a doutrina não diverge em quase nada. Então, nossa finalidade vai ser analisar os dispositivos legais, colocar os comentários da doutrina e divergências eventualmente existentes. Mas não se trata de temas como a Lei de Drogas, por exemplo, que tudo tem controvérsia, duas ou três correntes, jurisprudência para todo lado. O mesmo quanto ao Estatuto do Desarmamento e da Lei de Interceptações, em que a aula foi toda dada em cima da jurisprudência. Nós vamos hoje ver todos os crimes contra a organização do trabalho e todos os crimes contra o consumidor. O CDC sofreu uma pequena alteração, mas que não repercute na área penal, são alterações da parte civil e administrativa. A parte criminal permanece incólume. 1. COMPETENCIA PARA JULGAR OS CRIMES CONTRA A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO Se o crime atingir direito individual do trabalhador, quem julga é a justiça estadual. Se o crime atingir direitos coletivos dos trabalhadores, ou seja, se o crime atinge a categoria profissional em geral, justiça federal. A jurisprudência do STF e do STJ diz isso. Essa jurisprudência é baseada numa súmula do antigo Tribunal Federal de Recursos, extinto com a Constituição de 1988, quando surgiu o STJ no lugar dele. O extinto TFR tinha uma súmula nesse sentido que até hoje é aplicada pelo STF e pelo STJ. 2. OBJETIVIDADE JURÍDICA OU OBJETO JURÍDICO Aqui eu me refiro aos bens jurídicos protegidos pelos crimes contra a organização do trabalho. Quais são esses bens jurídicos? São dois:   A proteção dos direitos individuais e coletivos dos trabalhadores – Art. 5º, da CF. A proteção ao direito social ao trabalho, garantido pelo art. 6º, da CF. O direito ao trabalho é um direito individual, garantido pelo art. 5º, XII, da Constituição, mas também é um direito social, garantido pelo art. 6º, também da CF. Portanto, essa é a primeira objetividade jurídica. Mas os crimes contra a organização do trabalho não protegem só isso. Conferem também: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  A proteção à organização estatal do trabalho, que é um bem comum de todos. Eu não vou ficar repetindo o objeto jurídico em cada crime. Eu já trouxe ele pra cá, pra gente economizar ter que falar toda hora do objeto jurídico. Quando o tipo penal proteger outros bens jurídicos que não estes indicados aqui, eu vou especificar. Eu vou dizer, nesse crime aqui tem um outro bem jurídico protegido. Mas, via de regras, os crimes contra a organização do trabalho (arts. 197 a 207, do CP), protegem o os direitos individuais e coletivos do trabalhador, o direito social ao trabalho e a própria organização estatal do trabalho. Vamos agora analisar cada tipo penal, seguindo aquela sistemática de, primeiro analisar a letra seca da lei, depois, caderno, doutrina, jurisprudência. 3. ATENTADO CONTRA A LIBERDADE DO TRABALHO – Art. 197 Atentado Contra a Liberdade de Trabalho Art. 197 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça: I - a exercer ou não exercer arte, ofício, profissão ou indústria, ou a trabalhar ou não trabalhar durante certo período ou em determinados dias: Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência; II - a abrir ou fechar o seu estabelecimento de trabalho, ou a participar de Pena - detenção, de 3 (três) parede ou paralisação de atividade econômica: meses a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. O art. 197 traz uma pena cominada para o inciso I e uma pena cominada para o inciso II. Não é uma forma muito comum de se redigir tipos penais. O art. 197 (constranger alguém), como dizia Nélson Hungria, é uma modalidade especial de constrangimento ilegal acrescida de uma das finalidades específicas dos incisos I e II. Aliás, essas finalidades específicas são o que diferenciam este crime do crime de constrangimento ilegal. Essas finalidades específicas, elementos subjetivos do tipo, ou como a doutrina italiana chamava, dolo específico (expressão em desuso), são o que diferenciam esse crime do crime de constrangimento ilegal. Se não houvesse este tipo penal, esta conduta descrita no art. 197 caracterizaria o crime de constrangimento ilegal. Logo, muito do que vocês estudam no crime de constrangimento ilegal pode ser importado para cá. O crime de constrangimento ilegal, do art. 146, do CP, admite como formas de execução:  A violência própria, leia-se violência física ou grave ameaça; e  A violência imprópria, que significa reduzir a vítima à impossibilidade de resistência. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Aqui, não. O art. 197 só admite a violência própria. O tipo penal não admite a violência imprópria. Apenas prevê a violência física ou a grave ameaça. Essa é uma outra diferença em relação ao crime de constrangimento ilegal. Feito esse comparativo entre o art. 146, que é o constrangimento ilegal, e o art. 197, vamos passar a analisar o art. 197. 3.1. Sujeitos do Crime Sujeito ativo – Qualquer pessoa pode cometer o crime do art. 197. Portanto, é um crime comum, que pode ser cometido por qualquer pessoa. Sujeito passivo – Aqui teremos que dividir:  Inciso I – Aqui, o sujeito passivo é o trabalhador. E quando falo em trabalhador, não estou falando só do empregado, estou falando em qualquer trabalhador: avulso, autônomo, profissional liberal.  Inciso II – Aqui, a vítima não é especificamente o trabalhador. É o proprietário do estabelecimento empresarial ou seu responsável legal. Mas o proprietário ou representante legal não é um trabalhador? Sim, mas toda doutrina indica que o sujeito passivo aqui é o proprietário ou representante legal do estabelecimento comercial. E, ainda, os trabalhadores prejudicados com a abertura ou fechamento ilegal do estabelecimento. Este crime se configura se a vítima é impedida de exercer trabalho ou atividade que já exerce ou se a vítima é impedida de exercer trabalho ou atividade que pretende começar a exercer. Digo isso porque tem a ver com sujeito passivo. O sujeito passivo dessa infração pode ser a pessoa que já está exercendo o trabalho, ou a pessoa que pretende exercer o trabalho. Ambas podem ser constrangidas neste crime contra a organização do trabalho. 3.2. Tipo penal objetivo A conduta é “constranger”. “Constrangimento, segundo Bento de Faria, é a coação ilegal imposta à liberdade física, psíquica ou moral da vítima.” 3.3.  a  Formas de execução do crime Violência, que é a violência física, a chamada vis corporalis ou vis absoluta, ou Grave ameaça (violência relativa) Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Eu não vou perder tempo aqui com isso porque há vários crimes do CP, roubo, por exemplo, que são cometidos com violência ou grave ameaça. Então, vocês já viram com o Rogério, com o Renato, o que é violência e grave ameaça. Então, aplica-se aqui tudo o que foi dito por eles no estudo, por exemplo, do roubo. O crime consiste em constranger a vítima a: a) b) Exercer ou a não exercer atividade, arte, ofício, profissão ou indústria. Trabalhar ou não trabalhar em determinado período ou dias Exemplo: uma determinada religião proíbe a pessoa de trabalhar aos domingos e a pessoa é constrangida mediante violência ou grave ameaça a trabalhar justamente no domingo. Essa pessoa está sendo vítima do art. 197, do CP. Se cai um exemplo desse na prova, vocês, com certeza, tenderão a anotar constrangimento ilegal. “Ah, Silvio, mas se ela se recusar a trabalhar no domingo, o empregador pode mandar ela embora.” Demiti-la pode. O que não pode é coagi-la, mediante violência física ou grave ameaça a trabalhar. Eu não estou dizendo que ela tem o direito de não trabalhar ao domingo, notadamente se ela trabalha em um supermercado que funciona aos domingos. Ela pode dizer: não vou trabalhar. E ele pode responder: então você está demitida porque eu preciso de empregado aqui no domingo para trabalhar. Isso é muito diferente de coagi-la. Como o tipo penal fala em “em determinados dias”, a doutrina diz, que só se configura o crime, neste caso, se a pessoa for impedida de trabalhar por mais de um dia. Se ela for constrangida a trabalhar ou não trabalhar por mais de um dia, já que o tipo penal utiliza a palavra “dias”, no plural. Ocorre que, a mesma doutrina diz o seguinte: mas se ela for constrangida a trabalhar um dia ou se ela for constrangida a não trabalhar um dia, esse “um dia” está abrangido na expressão “determinado período”, já que o tipo penal não fala que tipo de período que é (se é ano, mês, semana...). Então, se a vítima foi constrangida a trabalhar ou a não trabalhar apenas um dia, não se encaixa na expressão “dias”, mas está implícita na expressão “determinado período.” Isso é o que diz a doutrina. Essas duas condutas estão no inciso I. Mas tem mais: c) Abrir ou fechar estabelecimento comercial (Inciso II) É qualquer tipo de estabelecimento comercial. Bares, restaurantes, padarias, salões de cabeleireiro, farmácias. Se a pessoa for constrangida a abrir ou a fechar, ela está sendo vítima deste crime. Ainda tem mais uma conduta: d) Participar de parede ou paralisação de atividade econômica (Inciso II) Esta quarta hipótese de constrangimento, segundo a doutrina, está tacitamente revogada pela Lei 4.330/64, pelo seu art. 29, VII. Era a antiga Lei de Greve que, por sua vez, está revogada pela Lei 7.783/89. Conclusão, das duas hipóteses que estão no inciso II, esta não configura mais crime segundo a doutrina. Nesse sentido, Capez e o Rogério, no livro dele, também cita isso. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 3.4. Elemento subjetivo do crime Esse crime só é punido na forma dolosa, leia-se, a vontade de coagir a vítima a atuar em uma dessas hipóteses dos incisos I e II. Conclusão, se a finalidade, do constrangimento não for uma daquelas três, não há o crime do art. 197. Se a finalidade for outra, haverá outro crime, por exemplo, constrangimento ilegal. 3.5. Consumação e tentativa O crime se consuma quando a vítima, já constrangida pela violência ou grave ameaça cede à exigência do infrator, ou seja, realiza uma das condutas comissiva ou omissiva dos incisos I e II. É possível a tentativa? É perfeitamente possível a tentativa do art. 197, do CP. Quando haverá tentativa? Quando a vítima for constrangida mediante violência ou grave ameaça, porém, não cede à exigência do infrator. 3.6. Pena Inciso I - Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência; Inciso II - Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. Havendo violência contra a pessoa, haverá concurso de crimes: haverá o crime do art. 197, mais o crime correspondente à violência. Isso vai estar em praticamente todos os crimes da organização do trabalho. Então, se houver violência contra a pessoa, além do art. 197, o agente responderá, em concurso, pelo crime correspondente à violência. Qual crime? Ameaça, lesão leve, lesão, grave, tentativa de homicídio, homicídio. É o que a doutrina chama de concurso material necessário ou obrigatório, porque decorre da lei, ressalvada parte do entendimento da doutrina de que isso não seria concurso material e sim concurso formal impróprio porque se trata de uma só conduta. Havendo violência contra a pessoa, e para alguns, a agrave ameaça está, aqui, implícita na expressão violência, não haverá a absorção do crime correspondente à violência pelo crime contra a organização do trabalho. Haverá, sim, concurso de crimes, e aí fica o seguinte:  Se ocorrer esse crime do art. 197, caput, + lesão corporal leve, a competência será do Juizado Especial Federal ou Estadual – porque somadas as penas de ambos os crimes, elas não ultrapassam dois anos.  Por outro lado, se ocorrer o art. 197 + lesão grave (art. 129, § 1º) ou 197 + lesão gravíssima (art. 129, § 2º) ou 197 + lesão seguida de morte (art. 129, § 3º) ou 197 + 121, Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 obviamente que a competência não será do Juizado Especial. Será do juízo comum (federal ou estadual) ou do júri. Vejam, se ocorreu o art. 197 + lesão leve, somadas as duas penas que não ultrapassam um ano cada uma, nós teremos ainda uma pena máxima de 2 anos. Portanto, a competência permanece no JECRIM estadual ou federal. Contudo, havendo concurso entre o art. 197 e a lesão grave, gravíssima ou homicídio, então, aí sai da competência do JECRIM. Isso eu vou falar toda hora porque todos os artigos mandam aplicar a pena correspondente à violência. 4. ATENTADO CONTRA A LIBERDADE DE CONTRATO DE TRABALHO E VIOLENTA – Art. 198 BOICOTAGEM Atentado Contra a Liberdade de Contrato de Trabalho e Boicotagem Violenta Art. 198 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a celebrar contrato de trabalho, ou a não fornecer a outrem ou não adquirir de outrem matéria-prima ou produto industrial ou agrícola: Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. Esse tipo penal prevê dois crimes distintos: atentado contra a liberdade do contrato é uma coisa e boicotagem violenta é outra coisa.  “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a celebrar contrato de trabalho” – Este é o crime de atentado contra a liberdade de contrato de trabalho.  “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a não fornecer a outrem ou não adquirir de outrem matéria-prima ou produto industrial ou agrícola” – este é o crime de boicotagem violenta. 4.1. Sujeitos do Crime Sujeito ativo – Qualquer pessoa pode cometer os crimes do art. 198. Portanto, é um crime comum, que pode ser cometido por qualquer pessoa. Qualquer um pode praticar atentado contra a liberdade de contrato de trabalho, qualquer pessoa pode praticar boicotagem violenta. Sujeito passivo – O sujeito passivo, no caso de atentado contra a liberdade de contrato de trabalho é o trabalhador em geral. No caso da boicotagem violenta, o sujeito passivo é o fornecedor ou o adquirente de matéria-prima ou produto industrial ou agrícola. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Aqui, temos uma discussão doutrinária: no crime de boicotagem violenta, a pessoa jurídica pode ser sujeito passivo? Há divergência na doutrina e na jurisprudência. Magalhães Noronha, citado por Fernando Capez, que adota o mesmo entendimento, diz o seguinte: no crime de boicotagem violenta o sujeito passivo é, não só a pessoa física que sofre a violência ou a grave ameaça, mas a pessoa vítima do isolamento econômico imposto pela boicotagem. Magalhães Noronha e Capez entendem que vítima da boicotagem violenta pode ser também a pessoa jurídica. Nesse mesmo sentido: Luiz Régis Prado que admite expressamente que a pessoa jurídica pode ser vítima da boicotagem violenta. Ele diz que a pessoa jurídica, realmente, não pode sofrer a violência ou a grave ameaça, mas ela pode sofrer o isolamento econômico decorrente da boicotagem. Em sentido contrário, Cesar Roberto Bittencourt diz que pessoa jurídica não pode ser vítima do crime de boicotagem violenta por um motivo muito simples: a pessoa jurídica não pode sofrer violência ou grave ameaça e o tipo penal diz “constranger alguém” e “alguém” é pessoa física. Pessoa jurídica não é alguém, não pode sofrer grave ameaça, logo não pode ser vítima do crime de boicotagem violenta. 4.2. Tipo Penal Objetivo A conduta consiste em “constranger alguém mediante violência ou grave ameaça”. A essa parte da conduta, aplica-se tudo o que dissemos sobre o art. 197. É a mesma coisa. Não vou repetir as mesmas coisas. Agora, constranger a vítima mediante violência ou grave ameaça a: a) Celebrar contrato de trabalho - Duas observações da doutrina aqui: o tipo penal não prevê a conduta de constranger a vítima de não celebrar contrato de trabalho. Cochilo do legislador e lacuna da lei. Portanto, este tipo penal só pune o infrator que constrange a vítima a contratar contra a sua vontade. E se o indivíduo constranger a vítima a não celebrar contrato de trabalho? Se ele constrange a vítima a não celebrar contrato de trabalho, ele estará cometendo o crime do constrangimento ilegal, segundo alguns, ou crime de atentado à liberdade de trabalho, para outros. b) Não fornecer ou não adquirir matéria-prima, produto industrial ou agrícola de alguém – Aqui é o crime de boicotagem violenta. e aqui, a vítima é quem sofre a violência ou a grave ameaça, leia-se, a pessoa que é constrangida a não fornecer ou a não adquirir a matéria-prima, mas também quem é vítima do isolamento econômico, da boicotagem. Lembrando que, para parcela da doutrina, a vítima desse isolamento econômico pode ser, inclusive, a pessoa jurídica. 4.3. Forma de Execução Sobre a violência ou grave ameaça, eu já falei. Só que tem uma coisa: se a violência ou a grave ameaça for exercida contra várias pessoas no mesmo contexto Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 fático, na mesma boicotagem, por exemplo, haverá crime único. Por exemplo: várias pessoas são constrangidas ao mesmo tempo, na mesma situação e no mesmo mo mento, a não adquirir matéria-prima de determinado fornecedor. Neste caso, haverá crime único e o número de pessoas ameaçadas ou agredidas será levado em conta na pena. 4.4. Elemento Subjetivo Esses crimes só são punidos na forma dolosa. Não se pune a forma culposa. É o dolo, ou seja, é a vontade deliberada de constranger a vítima a se comportar de uma das duas formas que estamos estudando: celebrar contrato de trabalho ou não adquirir matéria-prima, insumos. Só um detalhe: e se a vítima for constrangida a fornecer ou a adquirir matériaprima ou produto industrial de alguém? Mesma coisa: haverá o crime de constrangimento ilegal do art. 146, do CP. 4.5. Consumação e Tentativa A consumação do primeiro crime (atentado contra a liberdade de contrato de trabalho) se dá quando a vítima, constrangida, assina o contrato ou consente verbalmente no contrato. Há crime, não só no caso do contrato originário, como também no caso de alteração ou renovação de contrato. Isso é o que diz a doutrina. Então, obrigar a vítima a celebrar contrato de trabalho, significa obrigar a vítima a celebrar contrato original, pela primeira vez ou a renovar contrato que não quer renovar ou a alterar o contrato. Alterar aqui, eu já acho que é interpretação extensiva do Código Penal, mas a doutrina diz que se a vítima for constrangida a celebrar contrato original a renovar ou alterar contrato já existente, há o crime do art. 198, do CP. Portanto, a consumação se dá no momento em que a vítima assina ou consente verbalmente no contrato original, na renovação do contrato ou na alteração do contrato já existente. Tentativa é possível quando a vítima, constrangida, recusa-se a celebrar o contrato. Ela sofre a violência, sobre a grave ameaça, mas não celebra o contrato, lembrando que celebrar aqui significa celebrar contrato, renovar ou alterar contrato já existente. O crime de boicotagem violenta se consuma quando a vítima, constrangida, não fornece ou não adquire a matéria-prima do boicotado. A tentativa é perfeitamente possível. Haverá tentativa quando a vítima é constrangida, mas não cede à exigência do infrator. Leia-se, quando a vítima é constrangida, mas não deixa de adquirir ou de fornecer matéria-prima ou produto ao boicotado. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 4.6. Concurso de Crimes Olha a pena desse crime: Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. Se houver a violência, o que para uns inclui a violência moral (grave ameaça), haverá concurso de crimes entre o art. 198 e o crime correspondente à violência. É o que a doutrina majoritária chama de concurso material necessário, ou concurso material obrigatório, pois decorre da lei. O que para alguns é concurso formal impróprio obrigatório. Aqui devemos considerar também aquela questão do juizado. Se for lesão leve, um ano mais um ano, não sai do juizado. Se for com lesão grave ou gravíssima, seguida de morte ou homicídio, sai do juizado. 5. ATENTADO CONTRA A LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO – Art. 199 Atentado Contra a Liberdade de Associação Art. 199 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a participar ou deixar de participar de determinado sindicato ou associação profissional: Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. Este não é um crime propriamente contra a liberdade do trabalho, mas contra a liberdade de associação. A parte inicial neste crime, como nos demais, é sempre a mesma: “constranger alguém mediante violência ou grave ameaça.” Quanto a esta primeira parte, não vou comentar. Só uma breve introdução aqui: o art. 5º, da Constituição, no rol dos direitos e garantias individuais e coletivos, diz que ninguém é obrigado a associar-se ou a permanecer associado nem a sindicato e nem a nenhuma associação profissional. A violação daquele dispositivo constitucional caracteriza o crime do art. 199. Quando vocês estiverem estudando o art. 5º, que diz que ninguém é obrigado a se associar ou a permanecer associado, vocês têm que lembrar que a violação a esse dispositivo constitucional caracteriza o crime do art. 199, do Código Penal desde que a violação ocorra mediante violência ou grave ameaça à pessoa. Não vão anotar na prova que é crime se recusar a desfiliar o associado. O crime só existirá se for cometido mediante violência ou grave ameaça. 5.1. Sujeitos do Crime Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Sujeito ativo – Qualquer pessoa, inclusive que não pertença do sindicato ou da associação. Pode ser um outro filiado do sindicato, por exemplo, que constranja a vítima a permanecer associada. Então, pode ser praticado por um outro sindicalizado ou associado. Esse crime, via de regra, é cometida pelos integrantes do sindicato ou associação, mas não necessariamente por essas pessoas. Esse crime pode ser cometido por qualquer pessoa, inclusive por quem não faça parte do sindicato ou associação profissional. Sujeito passivo – Qualquer pessoa. Mas não é somente o associado ou sindicalizado? Não. Toma cuidado! A conduta é constranger alguém a participar ou deixar de participar de sindicato ou associação profissional. No “deixar de participar”, claro, a vítima só pode ser o associado ou sindicalizado, mas na outra forma, não. Então. O sujeito passivo aqui pode ser qualquer pessoa, inclusive quem não faz parte de nenhuma associação ou sindicato. 5.2. Conduta “Constranger alguém mediante violência ou grave ameaça.” Sobre isso, não vou falar. Aplica-se aqui o que foi dito no primeiro crime que vimos, o do art. 197, do CP. Constranger a vítima a participar de associação ou sindicato. Ou seja, a filiar-se a sindicato ou associação. O crime consistem obrigar a vítima a participar ou deixar de participar. Ou seja, constranger a vítima a filiar-se à associação ou sindicato ou a desligar-se da associação ou sindicato. Configura o crime, tanto obrigar a vítima a associar-se ou filiar-se quanto constranger a vítima a desligar-se de associação ou sindicato. 5.3. Elemento Subjetivo – É o dolo. 5.4. Consumação e Tentativa Os crimes têm mais ou menos a mesma sistemática. A consumação aqui se dá no momento em que a vítima, constrangida, filia-se ou desfilia-se do sindicato ou associação. Aí se dá a consumação. A tentativa se dá quando a vítima é constrangida, mas não atende à exigência do infrator, ou seja, não se filia ou não se desliga do sindicato ou associação. 5.5. Concurso de Crimes Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 De novo: se houver violência contra a pessoa, haverá concurso entre o crime do art. 199 + o crime correspondente à violência. No mais, aplica-se tudo o que eu já disse quanto ao art. 197 e 198. Lembrando que a expressão “violência” do preceito cominatório inclui também a grave ameaça. Não é o entendimento majoritário porque violência é violência física. Não pode haver concurso com o crime de ameaça. Mas alguns dizem que essa expressão inclui tanto a violência física quanto a moral (grave ameaça). Mas essa é expressão da doutrina, não do código, que diferencia violência física de ameaça. 6. PARALIZAÇÃO DE TRABALHO, SEGUIDA DE VIOLÊNCIA OU PERTURBAÇÃO DA ORDEM Paralisação de Trabalho, Seguida de Violência ou Perturbação da Ordem Art. 200 - Participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho, praticando violência contra pessoa ou contra coisa: Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. Parágrafo único - Para que se considere coletivo o abandono de trabalho é indispensável o concurso de, pelo menos, três empregados. Vejam bem, paralisar trabalho, por si só, não é crime. Paralisar trabalho, greve, lockout, é direito. O que o tipo penal está punindo não é a paralisação do trabalho, mas a paralisação seguida de violência ou perturbação da ordem. Esse é um crime de concurso necessário, plurissubjetivo. Nós temos infrações de concurso necessário que exigem, no mínimo, quatro pessoas, quadrilha ou bando; que exigem, no mínimo, duas pessoas, associação para o tráfico. Agora aqui, nós temos um crime plurissubjetivo que exige, no mínimo, três pessoas. Feita essa leitura introdutória, vamos analisar o tipo penal. 6.1. Sujeitos do Crime Sujeito ativo – O sujeito ativo desse crime pode ser:  Empregado, no caso de greve (a paralisação de empregados é chamada de greve)  Empregador, no caso do lockout (a paralisação de empregadores é chamada de lockout) As duas paralisações estão sendo punidas no crime do art. 200, portanto, é um crime que pune a paralisação de empregados, a greve violenta e a paralisação de empregadores, o lockout violento. Então, cuidado com esse crime do art. 200. Tem como sujeito ativo, o empregado, mas não só ele, também o empregador. Quem diz isso? Capez, Magalhães Noronha, Damásio, toda doutrina. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Sujeito passivo – Poder ser qualquer pessoa, física ou jurídica. Por que a pessoa jurídica pode ser vítima desse crime com certeza? Porque a violência pode ser contra a pessoa ou contra coisa, conforme dispõe o caput. A violência pode ser exercida contra o patrimônio da pessoa jurídica. 6.2. Tipo Objetivo A conduta é participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho. Qual é a diferença entre a suspensão e o abandono? A suspensão é provisória. O abandono é definitivo. A suspensão é a greve, ou lockout. O abandono é definitivo. Só um detalhe: a simples paralisação ou abandono, por si só, não é crime. Só há crime se essa paralisação ou abandono for violenta. a simples paralisação ou abandono de trabalho, por si só, não é crime. Só será crime, se for um abandono ou paralisação violento. Leia-se, com violência contra a pessoa ou contra a coisa. Essa violência contra a pessoa pode ser: contra os empregadores, contra os próprios colegas de trabalho (agredir o colega para ele não entrar em serviço) ou contra terceiras pessoas. Exemplo: contra a polícia, contra os seguranças da empresa. Então, quem pode ser vítima dessa violência? Os empregadores, os empregados ou terceiras pessoas alheias à relação de trabalho, por exemplo, a polícia, os seguranças da empresa terceirizada que está ali. De igual forma, a violência contra a coisa que pode ser contra o patrimônio da empresa, contra o patrimônio dos empregados ou contra o patrimônio de terceiras pessoas, por exemplo, danificar viatura. Há crime, independentemente de a greve ser legal ou ilegal. Não importa se a greve é legal ou não porque o que está sendo punido aqui não é a paralisação, mas a violência exercida. Isso é pegadinha de concurso: “não há crime se a paralisação for legal.” Está errado. Claro que haverá crime se a paralisação for legal. Não importa se ela é legal ou ilegal porque o que está sendo punido no tipo não é a paralisação (que não vai ser criminosa), mas a violência que está sendo praticada durante a paralisação. Só um detalhe: só há o crime se a paralisação contar com, pelo menos, três trabalhadores. Isso está no § único, do art. 200. Isso significa dizer que este crime é crime de concurso necessário ou plurissubjetivo que exige, no mínimo três infratores. Cuidado! A paralisação precisa envolver, no mínimo, três empregados, mas não é necessário que os três exerçam a violência. Basta que um deles exerça a violência. Então, se tivermos uma paralisação com cinco trabalhadores de uma microempresa e apenas um deles executa a violência. Um deles fica encarregado de quebrar objetos da empresa, todos responderão pelo crime, obviamente. Os cinco combinam de fazer uma paralisação violenta, mas apenas um executa o dano. A violência contra a Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 coisa, como diz o tipo penal. Haverá crime. Não é necessário que os cinco executem a violência. É necessário que, no mínimo, três participem da paralisação. Não é necessário que todos os autores da paralisação executem violência contra a pessoa, contra a coisa. Mas olha o que diz o § único; Parágrafo único - Para que se considere coletivo o abandono de trabalho é indispensável o concurso de, pelo menos, três empregados. Só que eu disse que o tipo penal está punindo também a paralisação dos empregadores. E aí? No caso de paralisação dos empregadores, a lei não exige número mínimo. Essa exigência é apenas no caso de paralisação dos empregadores. Embora o tipo penal não exija número mínimo de empregadores, a doutrina diz que o verbo “participar” e a expressão “abandono coletivo” pressupõem também um número plural de empregadores. Ou seja, o crime não pode ser praticado por um único empregador. Um detalhe sobre a forma de execução do crime: o tipo penal não usa a expressão “grave ameaça” como usou nos artigos anteriores: Art. 200 - Participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho, praticando violência contra pessoa ou contra coisa: O arts. 197, 198 e 199 falam em violência ou grave ameaça. Esse, só fala em violência. Conclusão: a doutrina diz que se a paralisação for mediante grave ameaça, não há este crime. Poderá haver o crime de ameaça ou, conforme a hipótese, de constrangimento ilegal ou ainda, o crime de atentado contra a liberdade de trabalho, do art. 197, I. Então, tomem cuidado! Esse crime não admite a forma de execução da grave ameaça. 6.3. Elemento Subjetivo – É o dolo. 6.4. Consumação e Tentativa A consumação se dá com a prática da violência durante a paralisação. Tomem cuidado. Olha o que diz o tipo penal: “Participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho, praticando violência contra pessoa ou contra coisa“. Portanto, o crime não se consuma no momento do abandono ou da suspensão do trabalho porque se só isso aconteceu, o fato é atípico. O crime se consuma no momento em que é praticada a violência durante a suspensão ou abandono coletivo. Nós estamos aqui diante de um crime material. A tentativa é perfeitamente possível 6.5. Pena Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. Sobre a pena correspondente à violência, aplica-se o que já falamos sobre todos os crimes anteriores. Ou seja, se houver violência contra a pessoa, haverá o crime do art. 200 em concurso com o crime correspondente à violência. E se for violência contra a coisa? Haverá concurso com o crime de dano também? Por exemplo, empregados, durante a greve, quebram, danificam objetos da empresa. Haverá concurso com o crime de dano também, ou não? Ou seja, essa expressão, “além da pena correspondente à violência” inclui também a violência contra a coisa? Vejam: Luiz Régis Prado (e Fernando Capez) diz que a expressão inclui também a violência contra coisa. Portanto, se houver dano, haverá concurso material de crimes do art. 200 + o crime de dano. Já Mirabete, por exemplo, diz que não. Diz que só há o concurso material obrigatório, se for violência contra a pessoa. Só se aplica a pena correspondente à violência, se for violência contra a pessoa. 7. PARALIZAÇÃO DE TRABALHODE INTERESSE COLETIVO Paralisação de Trabalho de Interesse Coletivo Art. 201 - Participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho, provocando a interrupção de obra pública ou serviço de interesse coletivo: Pena detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. Vejam, aqui a conduta é a mesma que no artigo anterior. A conduta aqui é participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho. Mas aqui é crime não porque houve violência, mas porque se trata de obra pública ou serviço de interesse coletivo. No art. 200, a paralisação ou abandono é crime, porque é uma paralisação ou abandono violento. Aqui, como vimos, é diferente. O problema é o seguinte: a Constituição permite o direito à greve nos serviços essenciais: CF, Art. 9º - É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender. § 1º - A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade. Portanto, a Constituição, no art. 9º permite o direito de greve e o § 1º permite o direito de greve, inclusive nos serviços essenciais que, é claro, sofrerão uma regulamentação infraconstitucional mais detalhada. A Lei de Greve, que é a Lei 7.783/89, também permite a greve em serviços essenciais. Por isso, parte da doutrina, por exemplo, Delmanto, sustenta que o art. 201 Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 do Código Penal, que criminaliza a greve ou lockout em obras públicas e serviços de interesse coletivo, não foi recepcionado pela Constituição de 1988, porque a Constituição garante o serviço de greve, inclusive em serviços essenciais. Então, para parte da doutrina, a greve, a suspensão ou abandono do trabalho em obras públicas ou obras de serviço de interesse coletivo, não constitui mais crime porque o art. 201, do CP, não foi recepcionado porque a Constituição garante o direito de greve, inclusive em serviços essenciais. A mesma doutrina diz: não há crime, mesmo que os grevistas sejam funcionários públicos porque a Constituição, no art. 37, VII também garante o direito de greve aos servidores públicos Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica; (Alterado pela EC-000.019-1998) A emenda mudou o seguinte: antes, o direito de greve deveria ser regulamentado por lei complementar. Agora pode ser uma lei ordinária, porém uma lei específica que trata apenas do direito de greve dos servidores públicos. Então, mesmo no caso de servidores públicos, não haveria o crime. Isso é o que entende a maioria da doutrina. Agora, em sentido contrário, o professor Mirabete diz o seguinte: o art. 201 foi recepcionado pela Constituição Federal e continua sendo crime, mas não basta que seja obra pública e serviço de interesse coletivo. Continua sendo crime, desde que a paralisação ou abandono se dê em obra ou serviço que coloque em perigo a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população. Paralisar uma obra ou serviço nesses termos é crime do art. 201. Ele diz: não é crime paralisar qualquer obra pública ou qualquer serviço de interesse coletivo. Tem que ser obra ou serviço cuja paralisação coloque em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou segurança da população. Ele está se referindo à greve da polícia civil, por exemplo, à greve da Polícia Federal, à greve em hospitais, por exemplo. 7.1. Sujeitos do Crime Sujeito ativo – O sujeito ativo desse crime pode ser tanto o:   Empregado (greve), quanto o Empregador (lockout). É a mesma situação do art. 200. Sujeito passivo – A coletividade. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Só um detalhe: o tipo penal não exige um número mínimo de pessoas, mas a doutrina diz que é necessário um número plural de infratores, porque o verbo “participar” que é o núcleo do tipo penal e a expressão “abandono coletivo” pressupõem um número plural de infratores. Então, apesar de este tipo penal não exigir número mínimo de infratores, como exige o outro (o art. 200 exige, no mínimo, três empregados), a doutrina diz que exige um número plural de infratores. Leia-se, é crime de concurso necessário, ou crime plurissubjetivo. 7.2. Elemento Subjetivo – É o dolo. Só o dolo 7.3. Consumação e Tentativa Cuidado! A consumação se dá no momento em que a obra ou serviço é interrompido. Não se dá com a paralisação. Porque, reparem: “participar de suspensão ou abandono coletivo de trabalho, provocando a interrupção.” O tipo exige um resultado naturalístico que é a interrupção da obra pública ou serviço. Portanto, esse crime não se consuma no momento da paralisação, mas no momento em que a obra ou serviço é interrompido. Crime material, que exige este resultado naturalístico. A tentativa existe quando os infratores realizam a paralisação, mas não conseguem interromper a obra ou o serviço de interesse coletivo, porque os demais trabalhadores continuam trabalhando, por exemplo. Continua num ritmo menor, mas continua. 8. INVAÇÃO DE ESTABELECIMENTO AGRÍCOLA.SABOTAGEM – Art. 202 INDUSTRIAL, COMERCIAL OU Invasão de Estabelecimento Industrial, Comercial ou Agrícola. Sabotagem Art. 202 - Invadir ou ocupar estabelecimento industrial, comercial ou agrícola, com o intuito de impedir ou embaraçar o curso normal do trabalho, ou com o mesmo fim danificar o estabelecimento ou as coisas nele existentes ou delas dispor: Pena reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.   Nós estamos aqui diante de dois crimes: Invasão de Estabelecimento Industrial, Comercial ou Agrícola. Sabotagem. Eu vou separar os dois crimes:  Crime de Invasão de Estabelecimento Industrial, Comercial ou Agrícola - Invadir ou ocupar estabelecimento industrial, comercial ou agrícola Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  Crime de Sabotagem - danificar o estabelecimento ou as coisas nele existentes ou delas dispor: Os dois crimes exigem a mesma finalidade específica, qual seja: impedir ou embaraçar o curso normal do trabalho. 8.1. Sujeitos do Crime Sujeito ativo – Qualquer pessoa, inclusive sujeitos alheios à relação de trabalho. Sujeito passivo – Qualquer pessoa física ou jurídica. 8.2. Objeto jurídico Aqui há dois objetos jurídicos, dois bens jurídicos protegidos:   O direito ao trabalho, que nós já vimos lá no começo da aula, e O patrimônio alheio, porque fala aqui em danificar ou dispor de coisa alheia. Não é um crime contra o patrimônio, mas tem o patrimônio como um dos objetos jurídicos protegidos pelo tipo penal. 8.3. Condutas No primeiro crime, há duas condutas:   Invadir -Entrar Ocupar – Tomar Determinado local, sem autorização do representante legal. Esse crime pode ser cometido por:  Pessoas que estão fora do local de trabalho (por exemplo, um grupo de pessoas que entram para protestar, um grupo de ambientalistas que entra numa empresa de celulose para fazer um protesto contra a derrubada de árvores), ou por  Pessoas que já estão dentro do local de trabalho (empregados ocupam a sala do centro de processamento de dados da empresa e desligam os computadores. Eles já estavam dentro, ocuparam um ponto do local). A segunda conduta é:   Danificar coisas ou Dispor de coisas Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Com o fim de embaraçar o curso normal dos trabalhos. Esse é o crime de sabotagem. Sabotagem vem do Francês “sabot” que significa tamanco porque durante a Revolução Francesa, os trabalhadores, para parar as fábricas, jogavam os seus tamancos e jogavam nas engrenagens das máquinas para paralisá-las. Cuidado! Tanto o primeiro crime (invasão ou ocupação de estabelecimento) quanto o segundo crime – sabotagem (danificar coisas ou dispor de coisas), exigem a finalidade específica. Só haverá estes crimes do art. 202, se essas condutas forem praticadas com a finalidade de: Impedir (não deixar se realizar) ou Embaraçar (atrapalhar, criar obstáculos) O curso normal dos trabalhos. Ambas as condutas este elemento subjetivo do tipo. Não havendo esta finalidade específica, não há o crime do art. 202. Sem essa finalidade específica, essas condutas caracterização outro crime. Por exemplo, furto, roubo (se houver violência ou grave ameaça), apropriação indébita (se a pessoa tem a posse do objeto), violação de domicílio (se adentrarem locais da empresa não abertos ao público), dano. 8.4. Elemento subjetivo É o dolo de invadir, ocupar ou dispor de coisas, acrescido da finalidade específica de impedir ou embaraçar o curso normal dos trabalhos. 8.5. Consumação e Tentativa A consumação ocorre se os infratores conseguem paralisar ou perturbar o curso normal dos trabalhos. A tentativa ocorre quando não conseguem essa finalidade. 8.6. Pena Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. Agora não tem mais o concurso da pena correspondente à violência contra a coisa, por exemplo. agora, não tem mais concurso material necessário. 9. FRUSTRAÇAÕ DE DIREITO ASSEGURADO POR LEI TRABALHISTA - Art. 203 Frustração de Direito Assegurado por Lei Trabalhista Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Art. 203 - Frustrar, mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação do trabalho: Pena - detenção de um ano a dois anos, e multa, além da pena correspondente à violência. (Modificada pela L-009.777-1998) § 1º Na mesma pena incorre quem: (Acrescentado pela L-009.777-1998) I - obriga ou coage alguém a usar mercadorias de determinado estabelecimento, para impossibilitar o desligamento do serviço em virtude de dívida; II - impede alguém de se desligar de serviços de qualquer natureza, mediante coação ou por meio da retenção de seus documentos pessoais ou contratuais. § 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou portador de deficiência física ou mental. (Acrescentado pela L-009.777-1998) O art. 203 sofreu várias alterações, tendo aumentado seu espectro de abrangência em 1998, e nós vamos analisá-lo na sua integralidade. 9.1. Sujeitos do Crime Sujeito ativo – Qualquer pessoa, inclusive sujeitos alheios à relação de trabalho. Claro, via de regra, o crime é cometido pelo empregador, mas pode ser pelo capanga do empregador ou amigo do empregador, pelo contador, um outro funcionário ou responsável pelo escritório, que providencia a rescisão trabalhista. “Frustrar mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação do trabalho”, é crime que pode ser cometido por qualquer pessoa. E crime comum. Sujeito passivo – É o trabalhador, titular do direito violado. 9.2. Tipo Objetivo Vamos analisar o tipo penal. A conduta é “frustrar” e frustrar significa privar, não permitir que a pessoa exerça, que a pessoa goze, receba o direito. O objeto material é o direito trabalhista (direito assegurado pela legislação do trabalho). É dizer, só existe esse crime se o direito frustrado estiver previsto na legislação do trabalho. Portanto, estamos aqui diante de uma norma penal em branco. Ou seja, o direito deve estar previsto na lei trabalhista. E se o direito frustrado estiver previsto na lei civil, por exemplo, um contrato de prestação de serviços? Vejam, neste caso, não haverá este crime do art. 203. Haverá o crime de estelionato, se houver fraude ou de extorsão, se houver violência, mas não este crime do art. 203. As formas de execução são fraude ou violência. O tipo penal não prevê como forma de execução a grave ameaça. Só prevê a fraude, que é o artifício, o ardil ou a violência física. O tipo penal, de novo, não usa a expressão “grave ameaça”. Então, Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 se houver grave ameaça, não haverá este crime. Poderá ocorrer extorsão ou, conforme a hipótese, ameaça. Exemplos desse crime, dados pela doutrina: obrigar o empregado a assinar pedido de demissão dando quitação de verbas trabalhistas não recebidas; obrigar o empregado a assinar recibo de salário em valor superior ao efetivamente pago. 9.3. Elemento Subjetivo – Dolo, não há forma culposa. 9.4. Consumação e Tentativa O crime se consuma no momento em que o direito do trabalhador é frustrado e a tentativa é perfeitamente possível. Por exemplo, o empregador utiliza a fraude, mas não consegue violar o direito da vítima. Como na tentativa de estelionato. Embora a fraude seja empregada, a vantagem ilícita pode não ser conseguida e, portanto, não haverá prejuízo alheio e o crime não estará consumado. Aqui é a mesma coisa. 9.5. Condutas Equiparadas - § 1º § 1º Na mesma pena incorre quem: (Acrescentado pela L-009.777-1998) I - obriga ou coage alguém a usar mercadorias de determinado estabelecimento, para impossibilitar o desligamento do serviço em virtude de dívida; II - impede alguém de se desligar de serviços de qualquer natureza, mediante coação ou por meio da retenção de seus documentos pessoais ou contratuais. Essa conduta prevista no inciso I ocorre, por exemplo, em certas fazendas no Brasil. O que o empregador faz? Obriga o empregado a comprar no próprio mercadinho da fazenda e diz que o empregado tem que comprar o arroz, o feijão, o óleo, naquele mercadinho. Só que o quilo do arroz lá custa dez reais. No final do mês, o empregado está devendo para o empregador porque o salário que ele tinha a receber é menor do que a dívida que ele contraiu no estabelecimento. Essa é uma prática que, infelizmente, existe no Brasil. Aí o empregado acaba pagando para trabalhar, já que não pode ir ao mercado da cidade porque é coagido a comprar lá, onde custa dez vezes mais caro. O que a legislação quis criminalizar foi essa conduta, essa prática de escravização do trabalhador que existe em alguns lugares do Brasil. Então, vamos analisar algumas questões em relação a esse inciso I. As condutas são:  Obrigar – Impor como condição para a vigência do contrato de trabalho – o empregador diz: “você só trabalha aqui, se você fizer compra aqui.”  Coagir – É coagir moralmente, mediante grave ameaça ou violência. O crime consiste em coagir a pessoa a adquirir mercadoria de determinado estabelecimento. Vem a doutrina e diz: este estabelecimento pode ser do próprio Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 empregador e de um terceiro, estranho à relação de trabalho. Então, se o empregador coloca o mercadinho na fazenda e coloca no nome do capataz. Não importa. O crime existe da mesma forma. O crime exige uma finalidade específica, qual seja, impedir o desligamento do empregado da relação de trabalho por conta da dívida. Quer dizer, a técnica do criem aqui é obrigar você a comprar no meu estabelecimento, você vai estar sempre me devendo, portanto, nunca vai poder se desligar da relação de trabalho. É escravizar a pessoa. O tipo penal exige uma finalidade específica: impedir o empregado de se desligar do serviço em razão da dívida. Consumação e tentativa – A consumação se dá no momento em que a vítima é obrigada ou coagida a usar a mercadoria de determinado estabelecimento, ainda que o infrator não consiga impedir que o trabalhador se desligue do serviço. Portanto, estamos diante de um crime formal, ou de consumação antecipada. O empregador diz ao empregado da fazenda: “você é obrigado a comprar sua comida aqui. Se você comprar fora, eu mando meu capataz te matar.” O crime está consumado. No final do mês a dívida é de mil reais e ele tem para receber 700 reais. O empregado quer se desligar, mas o empregador diz que não será possível em razão da dívida. O empregado junta mais 300 reais que tinha na poupança e quita a dívida para se liberar. O que aconteceu? O empregador aqui, não impediu que ele se desligasse do serviço em razão da dívida porque o empregado pagou a dívida (embora injusta e ilegal). A tentativa é tecnicamente possível, embora de difícil configuração prática. Suponhamos que no final do mês o empregado ficou devendo mil reais e tem 700 para receber. Ele diz que vai embora porque trabalhou o mês inteiro e ainda estava devendo. O empregador o proíbe de sair da fazenda enquanto não pagar a dívida. A ordem para os capatazes é não deixá-lo sair, restringindo a sua liberdade de locomoção. Neste caso, haverá a redução à condição análoga de escravo do art. 149, caput, do Código Penal, que também foi alterado em 2003: Redução a Condição Análoga à de Escravo Art. 149 - Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendoo a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto: (Alterado pela L-010.8032003) - Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência. “Se o infrator, após coagir o trabalhador a adquirir mercadoria de determinado estabelecimento e, com isso, contrair uma dívida, restringir a sua liberdade em razão dessa dívida cometerá o crime do art. 149, caput.” O empregador obrigou o empregado a comprar a comida no mercadinho da fazenda. Isso gerou uma dívida para o empregado maior que o salário. O empregado Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 quis ir embora e o empregador disse: você não vai embora daqui enquanto não pagar a dívida. Neste caso, o empregador cometeu dois crimes: o crime do art. 203, § 1º, inciso I do Código Penal + o crime do art. 149, caput do Código Penal. Ele cometeu crime contra organização do trabalho + crime contra a liberdade individual, em concurso material, diz Nucci, porque os crimes têm bens jurídicos distintos. Vamos voltar para o art. 203, para o inciso II: 1º Na mesma pena incorre quem: (Acrescentado pela L-009.777-1998): II impede alguém de se desligar de serviços de qualquer natureza, mediante coação ou por meio da retenção de seus documentos pessoais ou contratuais. Aqui a conduta é impedir a vítima de se desligar de serviço de qualquer natureza. Como se dá esse impedimento? Como o infrator impede a vítima de se desligar do serviço? Ele faz isso mediante:  Coação – Que pode ser física ou psicológica, moral.  Retenção de documentos pessoais ou contratuais – por exemplo, retém a certidão de nascimento, o título de eleitor, a cédula de identidade e diz que não devolve para ele não se desligar do serviço. Cuidado! Se essas condutas forem praticadas com a intenção de reter o empregado no local de trabalho, haverá o crime de redução à condição análoga de escravo do art. 149, § 1º, II, do CP. Aí está em jogo a liberdade individual do empregado. Art. 149 § 1º Nas mesmas penas incorre quem: (Acrescentado pela L-010.8032003) II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho. Manter vigilância ostensiva no local é forma de coação. Façam a distinção. Se a coação ou a retenção de documentos tiver a finalidade de impedir o desligamento da vítima do serviço, nós estamos diante do crime do art. 203, § 1º, II, do CP, crime contra a organização do trabalho. Agora, se a coação física ou psíquica (vigilância ostensiva) ou a retenção de documento for praticada com a intenção de reter o empregado no local físico de trabalho, aí estamos diante de crime contra liberdade individual. E se a intenção for as duas condutas, haverá concurso formal de crimes. Então, percebam: no caso da retenção de documentos, o empregador está tentando impedir o desligamento jurídico do empregado. O infrator está tentando fazer isso. Na retenção no local do emprego, está tentando impedir o desligamento físico da vítima do local de trabalho. Então, não confundam o crime do art. 203, § 1º, II, com o art. 149, § 1º, II. No primeiro caso, é impedir o desligamento jurídico. No segundo caso, a finalidade é impedir que a vítima abandone fisicamente o local de trabalho. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 9.6 Causa de aumento de pena do § 2º: § 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou portador de deficiência física ou mental. (Acrescentado pela L-009.777-1998) Isso, se cair, vai cair em prova de múltipla escolha. Só tem que lembrar que No crime do art. 203 há uma causa especial de aumento de pena quando a vítima é idosa (60 anos ou mais), gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental. 10. FRUSTRAÇAÕ DE LEI SOBRE A NACIONALIZAÇÃO DO TRABALHO - Art. 204 Frustração de Lei sobre a Nacionalização do Trabalho Art. 204 - Frustrar, mediante fraude ou violência, obrigação legal relativa à nacionalização do trabalho: Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. A Constituição de 1937 e a Constituição de 1967 tinham regras que limitavam o número de trabalhadores estrangeiros no Brasil. Ou seja, a intenção dessas Constituições era proibir a entrada indiscriminada de trabalhadores estrangeiros no mercado brasileiro. Ou seja, a intenção era proteger os nossos trabalhadores. A intenção era impedir que houvesse no Brasil mais trabalhadores estrangeiros do que nacional. Essa era a chamada nacionalização do trabalho, ou seja, tínhamos que ter mais trabalhadores nacionais do que estrangeiros no nosso mercado. Essa nacionalização do trabalho, que visava proibir a entrada indiscriminada de trabalhadores estrangeiros no Brasil não foi prevista na Constituição de 1988. A atual Constituição não prevê nenhuma regra sobre nacionalização do trabalho. A Constituição, pelo contrário, ela veda qualquer distinção entre brasileiros e estrangeiros, salvo as próprias exceções nela previstas e assegura a todos (sejam brasileiros ou estrangeiros) o direito ao livre exercício do trabalho. Então, nossa Constituição não permite mais essa distinção entre trabalhadores brasileiros e trabalhadores estrangeiros, garante o acesso de todos ao mercado de trabalho e não prevê nenhuma regra sobre nacionalização do trabalho, salvo as exceções nela previstas. Por conta disso, tem doutrina sustentando que o art. 204 não foi recepcionado pela Constituição de 1988. Exemplo: Mirabete. Mas há autores que comentam o dispositivo, não entrando na questão da recepção ou não. Você pega a maioria dos autores, eles comentam o art. 204 e não falam nada sobre se foi recepcionado ou não. Ai vem o seu examinador do concurso que quer perguntar alguma coisa sobre direito do trabalho, pega esse artigo e pergunta na prova, sem entrar no mérito sobre se foi recepcionado ou não. Então, vamos analisar esse dispositivo. 10.1. Sujeitos do Crime Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Sujeito ativo – Qualquer pessoa, empregado, empregador ou terceira pessoa. Sujeito passivo – É o Estado. 10.2. Conduta Consiste em frustrar obrigação referente à nacionalização do trabalho. Trata-se de uma norma penal em branco porque essas normas legais, relativas à nacionalização do trabalho, estão na legislação trabalhista. 10.3. Elemento Subjetivo – É o dolo. 10.4. Consumação e Tentativa – frustração da obrigação perfeitamente possível A consumação se dá com a efetiva legal e a tentativa é 10.5. Pena Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência. Portanto, se houver violência, haverá concurso material entre o crime do art. 204 e o crime correspondente à violência. 11. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE COM INFRAÇÃO DE DECISÃO ADMINISTRATIVA Art. 205 Exercício de Atividade com Infração de Decisão Administrativa Art. 205 - Exercer atividade, de que está impedido por decisão administrativa: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, ou multa. 11.1. Sujeitos do Crime Sujeito ativo – Apenas a pessoa que está impedida de exercer a atividade. Estamos aqui diante de crime próprio. Sujeito passivo – É o Estado, que tem a sua decisão administrativa desrespeitada. Alguns autores falam em Administração Pública. Ontologicamente não há diferença entre Estado e Administração Pública Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 11.2. Tipo Penal A conduta consiste em exercer a atividade durante o impedimento, durante a vigência da decisão de impedimento. A expressão “impedir” aqui, inclui aquele que está suspenso, porque a palavra “impedir” aqui, não está no sentido técnico, mas no sentido de não poder exercer atividade. Portanto, a doutrina diz: comete o crime aquele que está impedido tecnicamente falando ou que está suspenso porque ambos não podem exerce a atividade. Onde está escrito “impedido”, leia-se impedido ou suspenso. Exercer atividade de que está impedido por decisão administrativa. Qual é o sentido da expressão “decisão administrativa” aqui? Em primeiro lugar, a expressão indica todas as decisões dos órgãos da Administração Pública, ou seja, decisões emanadas do Poder Público. O problema aqui é o seguinte: a expressão “decisão administrativa” inclui as decisões das entidades disciplinadoras de profissões liberais, por exemplo, decisões do Conselho Federal de Medicina e da OAB? É dizer, o advogado que está impedido de exercer a advocacia por decisão da OAB ou o médico que está impedido de exerce a medicina por decisão do CFM está cometendo este crime do art. 205, ou não? O Capez, o Rogério mencionam como exemplo de decisões administrativas, decisões do CRM e da OAB. Tem doutrina, pois, dizendo que sim, que a expressão “decisões administrativas” incluem decisões dos conselhos de profissões como a OAB, o CFM, etc., das entidades disciplinadoras das profissões liberais. STF – Já decidiu nesse sentido (HC 74826/SP, de 1993): já decidiu que um médico impedido pelo CFM de exercer a medicina e a exerce, comete o crime do art. 205. Porém, a questão não é pacífica. Há decisões do STF e do STJ em sentido contrário, dizendo que o advogado e o médico impedidos por decisões dos seus órgãos cometem a contravenção penal de exercício ilegal de profissão, caso exerçam a profissão. Essa contravenção está prevista no art. 47, da Lei das Contravenções Penais: Exercício Ilegal de Profissão ou Atividade Art. 47 - Exercer profissão ou atividade econômica ou anunciar que a exerce, sem preencher as condições a que por lei está subordinado o seu exercício: Pena - prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, ou multa. Nesse sentido: STJ, RHC 7537/SP, decisão de 1998. Não há entendimento majoritário. Há entendimento nos dois sentidos. Para essa segunda corrente, a expressão “decisões administrativas” só incluem as decisões da Administração Pública em sentido estrito, ou seja, não inclui as decisões das entidades disciplinadoras de profissões liberais. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Agora, cuidado! Exercer atividade de que está impedido por decisão judicial (olha a pegadinha!), comete o crime do art. 359, do CP. Desobediência a Decisão Judicial Sobre Perda ou Suspensão de Direito Art. 359 - Exercer função, atividade, direito, autoridade ou múnus, de que foi suspenso ou privado por decisão judicial: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, ou multa. Então, se foi decisão judicial, não se fala no art. 205. 11.3. Consumação e Tentativa A consumação se dá com o exercício habitual da atividade durante a decisão impeditiva. Portanto, nós estamos aqui, no art. 205, diante de um crime habitual, ou seja, o crime exige uma reiteração de atos, uma habitualidade. A prática de um único ato é fato atípico. O crime exige uma habitualidade, uma reiteração de condutas. A prática de uma única conduta configura fato atípico. A tentativa no art. 205 não existe porque, sendo crime habitual, não admite tentativa. 12. ALICIAMENTO PARA FINS DE EMIGRAÇÃO Aliciamento Para o Fim de Emigração Art. 206 - Recrutar trabalhadores, mediante fraude, com o fim de levá-los para território estrangeiro. (Alterado pela L-008.683-1993) Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos e multa. 12.1. Sujeitos do Crime Sujeito ativo – Qualquer pessoa. Sujeito passivo – É o Estado e, secundariamente, os trabalhadores enganados. 12.2. Objeto jurídico Segundo a doutrina, é o interesse do Estado em manter os seus trabalhadores em território nacional. Eu acho que é um entendimento um pouco defasado, em razão do intercâmbio de profissionais entre os diversos países do mundo que existe na atualidade e eu não sei se o Estado, efetivamente, tem esse interesse de manter nossos trabalhadores aqui. A questão é: antes da alteração ocorrida em 1993, o tipo penal punia o simples aliciamento. O verbo era “aliciar”, ou seja, seduzir o trabalhador para que ele fosse Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 para o estrangeiro. Era o aliciamento. Agora, a conduta é outra, é recrutar mediante fraude, por exemplo, mediante falsas promessas: recrutar uma mulher prometendo a ela trabalho de modelo quando, na verdade, será submetida à prostituição. O tipo penal usa a expressão “trabalhadores” no plural, de tal sorte que o recrutamento de um único trabalhador, não configura o crime, segundo a maioria da doutrina. Mas quantos trabalhadores? Mirabete e Magalhães Noronha dizem que é no mínimo 3. Eu não sei de onde eles tiraram isso (a lei não fala nada), mas é o entendimento deles: o crime só se caracteriza se forem recrutados, no mínimo, três trabalhadores. Damásio e Delmanto dizem: no míniom 2 trabalhadores (eu acho o entendimento mais correto). Outra questão: a expressão trabalhadores está no sentido amplo da palavra. Trabalhador aqui não é sinônimo de empregado: profissional liberal, trabalhador avulso, prestador de serviço, etc. 12.3. Elemento Subjetivo É o dolo de recrutar com fraude acrescido da finalidade específica de enviar o trabalhador para o estrangeiro. É aliciamento para fins de emigração (saída do território nacional). 12.4. Consumação e Tentativa A consumação se dá com o mero recrutamento fraudulento, ainda que o trabalhador não vá para o território estrangeiro. Ou seja, ainda que a finalidade pretendida pelo infrator não seja alcançada. A tentativa é tecnicamente possível. Quando haverá tentativa? Quando o infrator não conseguir realizar o recrutamento fraudulento da vítima. 13. ALICIAMENTO DE TRABALHADORES DE UM LOCAL PARA OUTRO DO TERRITÓRIO NACIONAL – Art. 207 Aliciamento de Trabalhadores de Um Local para Outro do Território Nacional Art. 207 - Aliciar trabalhadores, com o fim de levá-los de uma para outra localidade do território nacional: Pena - detenção de um a três anos e multa.(Modificado pela L-009.777-1998) § 1º Incorre na mesma pena quem recrutar trabalhadores fora da localidade de execução do trabalho, dentro do território nacional, mediante fraude ou cobrança de qualquer quantia do trabalhador, ou, ainda, não assegurar condições do seu retorno ao local de origem. (Acrescentado pela L-009.777-1998) Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 § 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental. (Acrescentado pela L-009.777-1998) A diferença entre o art. 206 e o art. 207 é que o art. 206 trata do aliciamento para a emigração, enquanto que o art. 207 é aliciamento para deslocamento dentro do próprio território nacional. 13.1. Sujeitos do Crime Sujeito ativo – Qualquer pessoa. Sujeito passivo – É o Estado que tem interesse em manter a organização do trabalho e, secundariamente, os trabalhadores aliciados. 13.2. Conduta O tipo objetivo é “aliciar” que significa convencer o trabalhador. O tipo penal exige uma finalidade específica: levá-los para outra região do país. Não basta o aliciamento. Luiz Régis Prado diz que deve ser um local razoavelmente distante do local que o trabalhador está porque se forem locais muito próximos não há ofensa ao bem jurídico. De fato, você convida um trabalhador para sair da cidade para ir para a cidade vizinha. Quinze minutos, uma da outra. Mesmo que chegue lá e não se tratar daquilo que foi prometido, o trabalhador tem como voltar, inclusive a pé, se precisar. Eu também concordo com o professor Luiz Régis Prado. O dispositivo diz: trabalhadores. Portanto, há a mesma discussão que existe em relação ao art. 206. Então, quanto à expressão “trabalhadores”, aplica-se o que foi dito no art. 206. 13.3. Elemento Subjetivo É o dolo. Aplica-se o que foi dito no artigo anterior, com uma única diferença: a finalidade, aqui, é levar o trabalhador para uma outra região no próprio território nacional. 13.4. Consumação e Tentativa Aplica-se o que foi dito no artigo anterior, com as devidas adaptações, ou seja, o crime se consuma com o simples aliciamento, mesmo que o trabalhador não seja levado para outra parte do país. E a tentativa é possível se o aliciamento não chegar a ocorrer. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 13.5. Conduta Equiparada - § 1º A Lei 9.777/98 acrescentou duas condutas equiparadas no mesmo parágrafo: § 1º Incorre na mesma pena quem recrutar trabalhadores fora da localidade de execução do trabalho, dentro do território nacional, mediante fraude ou cobrança de qualquer quantia do trabalhador, ou, ainda, não assegurar condições do seu retorno ao local de origem. (Acrescentado pela L-009.777-1998) Recrutar trabalhadores com fraude ou mediante a exigência de pagamento por parte deles para que eles saiam do seu local onde estejam e se dirijam até o local da execução do trabalho. Claro que se você recrutar no próprio local de trabalho você não vai provocar o deslocamento do trabalhador. A outra conduta equiparada é não assegurar condições do seu retorno ao local de origem. Isso acontece muito. O trabalhador sai do Sul do país e é levado ao Norte. Chegando lá, não era nada daquilo. Ele quer voltar, mas não tem dinheiro. O autor do recrutamento diz que não vai dar condições para ele voltar. Ou você fica aqui ou você vai para onde você quiser. Para sair do Norte e voltar para o Sul exige uma quantia em dinheiro. O trabalhador não tem, acaba escravizado lá. Com isso nós terminamos os Crimes Contra a Organização do Trabalho. CRIMES CONTRA O CONSUMIDOR - CDC Lei 8.078/90 – Arts. 61 a 80 A parte criminal do CDC começa no art. 61 que traz uma disposição inútil: Art. 61 - Constituem crimes contra as relações de consumo previstas neste Código, sem prejuízo do disposto no Código Penal e leis especiais, as condutas tipificadas nos artigos seguintes. O autor desse artigo é um gênio: ele diz que são crimes contra o consumidor aqueles previstos nos artigos seguintes. O art. 62 foi vetado, começando no art. 63. Ante de vermos os crimes, vamos fazer uma análise geral: Sujeito ativo – O sujeito ativo dos crimes contra as relações de consumo é o fabricante ou fornecedor de produtos ou serviços, tal como definido no art. 3.º, do CDC: Art. 3º - Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. Excluam aqui, para efeitos penais, a pessoa jurídica, que não comete crime contra o consumidor. Só a pessoa física. Então, o sujeito passivo é o art. 3º, no que ele se refere à pessoa física. Sujeito passivo – É o consumidor, cujo conceito está no art. 2º: Art. 2º - Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produtos ou serviço como destinatário final. Parágrafo único - Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo. Aqui, sim, o sujeito passivo, vítima, é o consumidor que pode ser tanto a pessoa física quanto a pessoa jurídica. Eu não vou mencionar sujeito ativo e sujeito passivo de cada crime. Só que, em alguns crimes, o sujeito ativo pode ser outra pessoa que não o fornecedor ou o fabricante. Quando o crime tiver outro sujeito passivo, eu vou especificar. O que eu não vou precisar é ficar repetindo toda hora quem são os sujeitos ativo e passivo. 1. CRIME DO ART. 63 Art. 63 - Omitir dizeres ou sinais ostensivos sobre a nocividade ou periculosidade de produtos nas embalagens, nos invólucros, recipientes ou publicidade: Pena Detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa. § 1º - Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de alertar, mediante recomendações escritas ostensivas, sobre a periculosidade do serviço a ser prestado. § 2º - Se o crime é culposo: Pena - Detenção de 1 (um) a 6 (seis) meses ou multa. O caput se refere a mercadorias e produtos e o § 1º se refere a serviços. Essa é a diferença fundamental. No caput, a conduta é omitir, não mencionar no produto, dizeres que são escritos ou sinais ostensivos. Sinais podem ser símbolos, imagens, códigos, por exemplo, aquele símbolo da radioatividade. Símbolo de que o produto tem OGM (organismo geneticamente modificado), símbolo do veneno, etc. Os dizeres ou sinais devem ser colocados de forma ostensiva, leia-se, de forma facilmente visível, o que significa dizer que se os sinais forem colocados de forma encoberta, discreta, de forma não ostensiva, haverá o crime. Aquelas letrinhas que se colocam sobre a nocividade e periculosidade que você não consegue enxergar nem com lupa. Se os dizeres forem discretos, não ostensivos, haverá o crime. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Esses dizeres ou sinais devem ser sobre a periculosidade (por exemplo, deve ser indicado que a substancia é inflamável) ou sobre a nocividade do produto (por exemplo, a taxa de colesterol do produto). De um produto químico altamente tóxico deve conter o aviso na embalagem. Cuidado! Esses dizeres ou sinais que devem ser ostensivos sobre a periculosidade ou nocividade do produto devem estar presentes nas embalagens (a embalagem é o aspecto exterior do produto, a caixa) ou nos invólucros e recipientes que são os materiais internos que envolvem o produto ou contém o produto. Por exemplo, é o plástico que envolve o produto dentro da caixa, a garrafa que contém o produto dentro da caixa. E ainda: esses avisos devem estar contidos na publicidade do produto. Ou seja, nos panfletos, nas propagandas de rádio, televisão. Exemplo: propaganda de cigarro. Se a omissão for culposa, haverá o crime do § 2º. Só um problema aqui. Nós temos crimes contra o consumidor também na Lei 8.137/90, que trata dos Crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e as Relações de Consumo. O art. 7.º dessa lei,. Então, você tem que sempre fazer um confronto, entre os crimes contra o consumidor e os crimes da Lei 8.137. Olha o que diz o art. 7º, II, da Lei 8.137: Art. 7º. Constitui crime contra as relações de consumo: II - vender ou expor à venda mercadoria cuja embalagem, tipo, especificação, peso ou composição esteja em desacordo com as prescrições legais, ou que não corresponda à respectiva classificação oficial; O que me interessa aqui é o seguinte trecho: “esteja em desacordo com as prescrições legais”. O Nucci entende que o art. 7º, inciso II, da Lei 8.137 revogou tacitamente o art. 63, do CDC, que estamos estudando. E revogou porque, segundo Nucci, deixar de indicar a nocividade ou a periculosidade do produto na embalagem é o mesmo que vender ou expor à venda mercadoria em desacordo com as prescrições legais. Deixar de indicar, por meio de sinais ostensivos, a periculosidade ou a nocividade do produto, diz Nucci, é o mesmo que vender ou expor à venda em desacordo com as prescrições legais. E se a mercadoria não estiver sendo vendia ou exposta à venda? Nesse caso, segundo Nucci, ainda não há nenhum prejuízo para o consumidor. Portanto, o fato é atípico. Se a mercadoria ainda não está sendo vendida, não há prejuízo ao consumidor, sendo o fato atípico. Nucci entende que o art. 63, do CDC, continua em vigor apenas no que se refere à publicidade dos produtos, ou seja, deixar de mencionar a nocividade ou periculosidade na publicidade porque, nesse ponto, o art. 7º, II, da Lei 8.137/90 nada dispõe a respeito. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Figura equiparada do art. 63, do CDC - § 1º § 1º - Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de alertar, mediante recomendações escritas ostensivas, sobre a periculosidade do serviço a ser prestado. O § 1º se refere a serviço e não a produtos, como se refere o caput. A conduta é deixar de avisar e esse aviso tem que ser por recomendações escritas, ostensivas. Ou seja, não pode ser recomendação verbal e nem recomendação não ostensiva. Tem que ser recomendação escrita e de forma clara, de forma que o tomador do serviço fique plenamente ciente da periculosidade do serviço que lhe será prestado. Entendimento de Nucci – Se o aviso for verbal, mas o consumidor aceitou o aviso verbal, não haverá crime. Não me parece o entendimento adequado porque o juiz nunca teria como analisar se o aviso foi conveniente. Imagine que eu esteja contratando os serviços de um engenheiro que tem mil explicações técnicas para me dar sobre a periculosidade do serviço. Ele pode me falar tudo verbalmente, mas como eu v ou saber se aquela recomendação foi dada de forma precisa, clara, completa. A lei diz que tem que ser por escrito para que o consumidor tenha isso em mão o tempo todo e tenha até como exercer o seu direito depois contra o prestador de serviço. Então não me parece razoável afastar o crime, caso o consumidor tenha aceitado ser avisado verbalmente. De novo: se o aviso não foi dado de forma culposa, haverá o crime do § 2º. Elemento subjetivo – O elemento subjetivo desse artigo, portanto, é o dolo e a culpa. Tanto no caput, quanto no § 1º. Esse crime admite a forma dolosa e a forma culposa. Consumação e tentativa (caput e § 1º) – A consumação se dá com a simples omissão ou falta de aviso ao consumidor, sobre a periculosidade ou nocividade de um produto ou serviço, ainda que ele não sofra nenhum dano. Estamos aqui diante de um crime de mera conduta. Não é possível a tentativa porque estamos diante de um crime omissivo puro ou próprio. Leia-se, o núcleo do tipo é uma omissão. o verbo, núcleo do tipo já é uma omissão. portanto, não há como haver tentativa. 2. CRIME DO ART. 64 Art. 64 - Deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou periculosidade de produtos cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no mercado: Pena - Detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa. Parágrafo único - Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de retirar do mercado, imediatamente quando determinado pela autoridade competente, os produtos nocivos ou perigosos, na forma deste artigo. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Qual é a diferença entre o art. 64 e o art. 63? No art. 63, a nocividade ou periculosidade do produto já é conhecida antes de ele ser colocado no mercado. Portanto, essa nocividade ou periculosidade já deve vir anunciada nas embalagens, invólucros e publicidade do produto. Agora, neste artigo 64, a periculosidade ou nocividade do produto só se torna conhecida depois que ele já está colocado no mercado. Essa é a diferença entre o art. 63 e o art. 64. Visualizada esta diferença, vamos analisar o art. 64: Conduta – A conduta é deixar de comunicar a periculosidade ou nocividade à autoridade competente E aos consumidores. A lei impõe um duplo dever de comunicação. Conclusão, a falta de uma dessas comunicações configura o crime. Por exemplo, a empresa comunica a autoridade competente, mas não comunica os consumidores. A falta de uma dessas comunicações configura o crime do art. 64. Os consumidores que devem ser comunicados da periculosidade ou nocividade do produto (que foi descoberta depois) são os consumidores em geral, ou seja, tanto os consumidores que adquiriram o produto como os que não adquiriram, mas podem adquirir um dia (potenciais consumidores). Essa comunicação, portanto, deve ser feita pelos meios de comunicação de massa (rádio, revistas, jornais, televisão). Não adianta comunicar que um carro está com um perigo numa peça só para quem comprou o carro. Não! Você tem que avisar a população em geral, tanto quem já adquiriu, quanto quem pode adquirir o carro. Trata-se de norma penal em branco porque diz em comunicar a autoridade competente e autoridade competente são aquelas indicadas nas normas, leis, portarias, etc. Então, a expressão “autoridade competente” torna o tipo penal uma norma penal em branco, embora eu ache que isso não é norma penal em branco, mas elemento normativo do tipo. Mas a doutrina fala que se trata de uma norma penal em branco. Forma Equiparada (§único) – O § único pune: Parágrafo único - Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de retirar do mercado, imediatamente quando determinado pela autoridade competente, os produtos nocivos ou perigosos, na forma deste artigo. Muitas vezes, não adianta avisar aos consumidores que o produto é perigoso ou nocivo. Muitas vezes, o produto é tão perigoso ou nocivo que ele tem que ser retirado do mercado. Não adiante avisar que o freio do carro está falhando de vez em quando. Tem que fazer o recall, retirar o freio ou o carro do mercado. Muitas vezes, a periculosidade ou nocividade é de tal monta, que o produto tem que ser retirado do mercado. Se a pessoa não retirar, quando determinado pela autoridade competente, comete o crime do art. 64, § único cuja conduta é deixar de retirar do mercado produtos nocivos e perigosos. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Mas tomem cuidado! Só há o crime se essa retirada foi determinada pela autoridade competente. Portanto, só há o crime se o fornecedor não faz o chamado recall por determinação oficial. Só há o crime se ele deixa de retirar o produto do mercado quando houve determinação oficial para retirar. Se não houve determinação da autoridade para retirar, não há o crime. Portanto, não há o crime se o fornecedor não faz o chamado recall voluntário. Essas expressões são do Ministro do STJ, Herman Benjamin, um dos maiores especialistas em direito do consumidor no Brasil. É claro que se o fornecedor não faz o recall voluntário e o produto causa lesão ou morte em alguém, ele vai responde por lesão corporal ou homicídio. Nesse caso, ele não vai responder pelo art. 64, do CDC. Mas se o produto causar lesão ou morte em alguém, ele responde por lesão ou homicídio. O § único fala em “deixar de retirar do mercado imediatamente.” O que significa isso? O início da retirada do produto deve ser imediata, logo após a ordem da autoridade. Por que o início? Porque a retirada de todo produto, às vezes leva dias, semanas e até meses. Imagina se a autoridade manda recolher do mercado um detergente que está vendendo em todos os estabelecimentos próprios do país. Isso leva tempo. Portanto, o início da retirada deve ser imediato, ainda que toda a retirada leve dias, semanas ou meses. Agora, a demora injustificada, para começar a retirar o produto do mercado, configura crime porque aí não foi uma retirada imediata. Foi uma retirada tardia. Se o fornecedor só começa a retirar 15 dias depois, ele até retirou, mas não o fez imediatamente, como determina o tipo penal, então, comete o crime do art. 64, § único. Objeto Jurídico – É o mesmo que o art. 63. Elemento subjetivo – É somente o dolo. No art. 63 é dolo e culpa. Consumação e Tentativa – A consumação se dá com a simples não comunicação (art. 64, caput) na comissão ou com a simples não retirada do mercado (art. 64, § único), ainda que não ocorra nenhum dano ao consumidor. Nós estamos, de novo, diante de um crime de mera conduta. Esse crime não admite tentativa, nem no caput e nem no § único porque são crimes omissivos puros ou próprios. Atenção no caderno: o art. 64 (caput e § único) só se refere a produtos. Não se refere a serviço. O art. 63 se refere a produtos e serviços. CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL Arts. 213 e ss., do Código Penal Sempre que se trabalha com sucessão de leis, eu trabalho o “antes” e o “depois”. Aqui, no caso será antes e depois da Lei 12.015/09. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Antes da Lei 12.015/09, o Título VI, do CP, era chamado de Crimes Contra os Costumes. O Título VI agora tem como bem jurídico “Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual”. O porquê da mudança: A doutrina observava o seguinte: costume significa moralidade sexual pública. E percebia que um estupro, por exemplo, não ofende uma moralidade sexual pública. Um estupro, mais do que uma moralidade sexual pública, ofende a dignidade sexual da vítima. Então, o nome do título estava totalmente ultrapassado. Logo, a Lei 12.015 deu ao título VI uma nova etiqueta. O título antigo estava errado porque não se aplicava a todos os crimes nos seus capítulos. Poderia se aplicar, por exemplo, ao ato obsceno. Ai vai. Mas no estupro, atentado violento ao pudor, etc., sequer atingia os costumes. 1. SUCESSÃO DE LEI PENAL NO TEMPO O que nós vamos precisar rever para estudar esses crimes agora? Prestem atenção: nós estamos diante de uma sucessão de lei penal no tempo. E quando eu trabalho com sucessão de lei penal, eu tenho que analisar quatro circunstâncias: a) Na vigência da Lei A, o fato era crime, vem a Lei B e torna esse fato atípico – O que eu tenho aqui? Abolitio criminis (art. 2º, do CP). E, haverá hipótese de abolitio criminis na Lei 12.015? Sim. Tem gente não enxergando isso, mas vai. b) Na vigência da Lei A, o fato será típico, vem a Lei B e o fato passa a ser crime – O que eu tenho aqui? Novatio legis incriminadora. Nova lei tipificando fato até então atípico. c) Na vigência da Lei A, o fato era crime, na vigência da Lei B o fato continua crime, porém tem sua pena majorada ou diminuída, por exemplo – Aqui há novatio legis in pejus e novatio legis in mellius. Tudo isso vocês já viram. Nós só estamos recordando. Antes de analisar a quarta hipótese, eu quero que vocês me digam o seguinte: no caso da abolitio criminis. Ela é retroativa ou irretroativa? Retroativa. No caso da novatio legis incriminadora, irretroativa. No caso da novatio legis in pejus, irretroativa. In mellius, retroativa. Eu sei que é ridículo. Todos dominam. d) Na vigência da Lei A o fato era crime, na vigência da Lei B, passa a ser outro crime, porém, com o mesmo conteúdo – Isso se chama: princípio da continuidade normativo-típica. Há quatro situações, todas elas estarão presentes nos nossos comentários sobre a Lei 12.015/09. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 2. CRIME DE ESTUPRO – Art. 213 2.1. O Estupro antes e depois da Lei 12.015/09 Antes – O art. 213 previa o estupro. E o que ele punia? A conjunção carnal violenta. Tinha como sujeito ativo o homem e como sujeito passivo a mulher. Tinha pena de 6 a 10 anos. E havia o art. 214, que punia o atentado violento ao pudor, que eram atos libidinosos violentos, diversos da conjunção carnal, praticados com violência. O sujeito ativo era qualquer pessoa e a vítima era de qualquer pessoa. E a pena era, também de 6 a 10 anos. Isso era o que havia antes. Depois – Com a Lei 12.015/09, os arts. 213 e 214 foram reunidos em um só tipo penal, agora chamado estupro. Então, estupro hoje abrange conjunção carnal violenta, abrange atos libidinosos diversos da conjunção carnal, também violentos. Eu reuni os dois tipos em um tipo só. A pena continua sendo de 6 a 10 anos. O legislador perdeu a chance de abolir essa expressão “estupro”. Ele poderia ter feito o que países da Europa, México e Argentina já fazem e não chamar de estupro. Agora que a lei reuniu os dois tipos em um tipo só, poderia ter mudado o nome. Ao invés de estupro para violação sexual violenta. Se vocês forem analisar o direito comparado, lá não se fala em estupro, mas se fala em violação sexual. E seria melhor não se falar mais em estupro no Brasil porque hoje o homem pode ser estuprado. § 1º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: (Acrescentado pela L-012.0152009)Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. § 2º Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. 2.1. Estupro – Art. 213, caput Estupro Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: (Alterado pela L-012.015-2009) Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. (Alterado pela L-012.015-2009) a) Sujeitos do crime Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Agora, qualquer pessoa pode ser autor de estupro. Em qualquer das modalidades: sejam atos de conjunção carnal, sejam atos diversos da conjunção carnal. O crime, de bipróprio passou a ser bicomum porque qualquer pessoa pode praticar e qualquer pessoa pode sofrer. Rogério Greco, em palestra, anunciou que discorda. Mas a esmagadora maioria que escreveu sobre o assunto diz que é bicomum. Deixou de ser bipróprio: qualquer pessoa pode praticar, qualquer pessoa pode ser vítima. Até o homem. E essa mudança ajudou muito o concurseiro. O examinador adorava perguntar se transexual era vítima de estupro. Hoje, acabou o problema. Agora, é. Antigamente isso era questionado: se transexual era vítima de estupro ou atentado violento ao pudor. Hermafrodita, idem. Para o concurso, a vida foi facilitada. O TJ/MS perguntou que crime comete a mulher que coloca a arma na cabeça de um homem para possuí-la. Esse homem, vítima, constrangido, tem que possuí-la. Que crime ela praticou? Antes era constrangimento ilegal. Agora, se ela conseguir, é o estupro. Olha o que diz o art. 226, II: Aumento de Pena Art. 226 - A pena é aumentada: II - de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela; (Alterado pela L-011.106-2005) Isso não deixa dúvida que hoje é perfeitamente possível estupro praticado por cônjuge ou companheiro/a. Não é exercício regular de direito como dizia Nelson Hungria. Homem pode estuprar a mulher, no sentido de ser possível. A mulher também pode estuprar o seu marido. Além de ser possível o crime de estupro é o estupro majorado da metade. Se a vítima é menor de 18 anos:  Antes da Lei 12.015/09 – Era uma circunstância judicial desfavorável.  Depois da Lei 12.015/09 – Agora é uma qualificadora prevista no § 1º onde a pena passa a ser de 8 a 12 anos. Estou diante de uma novatio legis in pejus. Irretroativa. Cuidado com os estupros anteriores à Lei 12.015 na prova. Observação – Se menor de 14 anos, passa a ser estupro de vulnerável do art. 217-A. Prostituta pode ser vítima de estupro. Não se exige nenhuma qualidade ou condição especial da vítima. Prostituta não perde a dignidade sexual por ser prostituta. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 b) Tipo objetivo O que pune o art. 213? Agora ele não pune só a conjunção carnal. Pune:  Conjunção carnal com violência  Constranger a vítima a praticar atos libidinosos diversos da conjunção carnal ou  Constranger a vítima a permitir que se pratique atos libidinosos diversos da conjunção carnal com violência Eu posso resumir tudo isso em atos de libidinagem violentos. Quando falo em atos de libidinagem, estou abrangendo, tanto a conjunção carnal, como atos de libidinagem diversos da conjunção carnal. Então, vou usar muito essa expressão com vocês: atos de libidinagem, que é o gênero, do qual são espécies a conjunção carnal e os atos libidinosos. Conjunção carnal, todo mundo sabe o que é: pênis-vagina e vagina-pênis. Mas o que são atos libidinosos diversos da conjunção carnal? Acariciou o cabelo é ato libidinoso diverso da conjunção carnal? Estou querendo mostrar que essa é uma expressão porosa, ambígua, genérica. Melhor seria o legislador exemplificar o que é ato libidinoso, como ele faz no homicídio, quando ele exemplifica o que é torpeza, o que é crueldade. Melhor seria o legislador exemplificar para evitar o exagero. E qual o exagero que muito se cometeu? O beijo lascivo. Vocês vão encontrar julgados dizendo que beijo lascivo é atentado violento ao pudor, hoje, estupro. E o que é beijo lascivo? Conceitua beijo lascivo! “Ah, faz barulho!” “Dá inveja?” Pessoal, dizem que beijo lascivo é aquele que provoca desconforto para quem olha. Muitos julgados colocaram beijo lascivo como ato libidinoso diverso da conjunção carnal. É absurdo! Jogar o cara numa masmorra, por crime hediondo por causa de beijo lascivo?? O que é o melhor, então? É analisar o caso concreto. Tem que ser um ato que atenta contra a dignidade sexual da vítima. Tem que ser um ato que efetivamente atenta contra a dignidade sexual da vítima. Sem exageros. Beijo lascivo tem que ser tratado como contravenção penal. Eu não estou dizendo que não é infração penal. Mas tem que ser tratado como infração penal proporcional. Para haver estupro é dispensável ou indispensável o contato entre agente e vítima? Vocês conseguem imaginar um estupro sem contato físico entre agente e vítima? Essa pergunta caiu na fase oral da magistratura/SP. No ano seguinte foi pergunta da primeira fase do MP/SP. Era a mesma pergunta. O crime é constranger a vítima a praticar atos libidinosos, à conjunção carnal. Prevalece que o contato físico é dispensável. Alguém consegue imaginar um exemplo? “Internet”. Nem pensa!! O exemplo está no livro do Mirabete com jurisprudência: obrigar a vítima a se masturbar. Obrigar a vítima a explorar o próprio corpo na automasturbação. A minoria entende que o contato físico é indispensável e, sendo assim, não havendo contato físico haveria mero constrangimento ilegal. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 b) Tipo subjetivo O crime é punido a título de dolo. É só dolo ou dolo com finalidade especial? 1ª Corrente: Mirabete entende imprescindível a finalidade especial de manter conjunção carnal ou outro ato libidinoso. Para Mirabete, isso é finalidade especial. Não é um mero dolo. 2ª Corrente: Para Capez, não há finalidade específica exigida pelo tipo. 3ª Corrente: Temos jurisprudência exigindo a finalidade especial de satisfação da lascívia. Essa terceira corrente é um absurdo porque se você mantém conjunção carnal violenta com uma mulher por amor, por ódio, por vingança, não seria crime. Absurdo! A disputa está nas duas primeiras correntes. Eu não vou falar o que prevalece porque a Lei 12.015 que podia ter resolvido o assunto, não resolveu. c) Consumação e Tentativa O crime se consuma com a prática do ato de libidinagem, sendo perfeitamente possível a tentativa. d) Conjunção carnal + atos libidinosos no mesmo contexto fático Preste atenção em um assunto que vai cair: como ficava a punição do agente que praticava atos libidinosos e conjunção carnal com a mesma pessoa no mesmo contexto fático? O agente introduz pênis-vagina e, em seguida, pênis-ânus ou obriga a vítima a praticar com ele sexo oral depois de um coito natural. Vejam como era antes e como ficou.  Antes da Lei 12.015/09 – Ele respondia pelo art. 213 + o art. 214 em concurso material. Esta era inclusive a posição do Supremo. Era posição não unânime, mas que prevalecia no supremo. Não se admitia continuidade delitiva por serem crimes de espécies diversas.  Depois da Lei 12.015/09 – Ele responde só pelo art. 213. Não há concurso porque o crime é de ação múltipla de conteúdo variado, alternativo. Ele vai responder por um só crime. O juiz vai considerar a pluralidade de núcleos na fixação da pena. O que aconteceu? Novatio legis in mellius. Essa alteração é retroativa. Casos que estão sendo investigados por art. 213 e 214 e não podem ser denunciados pelos dois. Quem já foi condenado pelos 2, o juiz da execução tem que unificar as penas. Há vários doutrinadores que pensam assim: LFG, Nucci. E é o que prevalece. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Reparem que não é mais concurso de crimes se no mesmo contexto fático. Em contextos fáticos diversos, o concurso é possível. Já tem gente escrevendo errado, dizendo que não tem mais concurso. Só não tem mais concurso se for no mesmo contexto fático. Se fora do mesmo contexto fático, é perfeitamente possível concurso de delitos: concurso material, formal ou continuidade delitiva. Depende das circunstâncias. Se você pratica 5 estupros em 5 dias distintos contra 5 vítimas diferentes. Óbvio que há aí, pelo menos, uma continuidade delitiva. Cuidado para não dizer que não existe mais concurso de crimes no delito de estupro! e) Qualificadoras: Lesão grave e morte São a lesão grave e morte. Vamos analisar isso antes e depois da Lei 12.015/09. Antes. Essa qualificadora estava no art. 223, do CP. Vamos ler a redação antiga. O art. 223 foi abolido. Seu conteúdo foi deslocado. Formas Qualificadas Art. 223 - Se da violência resulta lesão corporal de natureza grave: (Revogado pela L-012.015-2009) Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. (Alterado pela L-008.072-1990) Parágrafo único - Se do fato resulta a morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 25 (vinte e cinco) anos. A redação anterior não abrangia grave ameaça. Antes, a redação falava em “violência resultando lesão grave”. Ao concentrar-se na expressão “violência”, não incluía a grave ameaça. Havendo, portanto, grave ameaça, não incidia a qualificadora, que só estava presente se resultasse lesão física. E, no caso da morte, o caso é o oposto: falava do fato. “Se do fato” para alguns abrangia violência, grave ameaça ou qualquer outra causa. A doutrina criticava muito esse artigo e, ao entenderem as críticas, vão entender as mudanças: é absurdo você qualificar um crime apenas quando o resultado advém de violência, ignorando a grave ameaça. A grave ameaça deveria estar abrangida também. Já na hipótese da morte é um absurdo você qualificar o crime quando o resultado advém do fato, abrangida qualquer outra causa, por exemplo, a vítima fugiu e foi atropelada. Você está ampliando muito a espécie de incriminação. Deveria ter ficado somente na violência ou grave ameaça. Não abrangendo outras causas alheias à vontade do agente. O que o legislador fez com a Lei 12.015? Agora, as qualificadoras estão no art. 213, §§ 1º e 2º: § 1º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: (Acrescentado pela L-012.0152009) Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. § 2º Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Se da conduta resulta lesão grave, pena: 8 a 12a nos. O legislador observou a crítica da doutrina. Agora, a lesão grave qualifica o crime se resulta da conduta, isto é, abrange grave ameaça. Se você entender uma falha da legislação anterior, nunca mais esquece a nova. A pena foi mantida. Corrigiram fazendo abranger a grave ameaça. No caso da morte, agora, o legislador corrigiu. Também se da conduta resulta morte. E, no caso, a pena passou a ser de 12 a 30 anos. Não falo mais em fato. Falo em conduta e a pena máxima subiu de 25 para 30 anos. A qualificadora do art. 223 era e permanece sendo preterdolosa ou preterintencional. Isto é, só incidem as qualificadoras se os resultados lesão grave e morte forem fruto de culpa. Cuidado! Estou diante de qualificadora preterdolosa ou preterintencional. Só responde pela qualificadora quem agiu com dolo no estupro e culpa na morte. Se ele quis ou aceitou a lesão ou a morte, eu tenho concurso de delitos. Estupro e lesão grave, ou estupro e homicídio. Aí esqueçam a qualificadora. Então, cuidado! Era e continua sendo preterdolosa. Dolo no estupro, culpa na lesão grave ou morte. Se ele quis ou aceitou esses resultados, esqueçam a qualificadora, ele responde por estupro e lesão grave ou homicídio. É o caso do maníaco do parque. Ele não respondeu pela antiga qualificadora do art. 223. Ele queria a morte de suas vítimas. Ele foi a júri. Isso, com certeza, vai ser pergunta de todos os concursos até o final do ano. Vejam se não parece óbvio: os crimes dos arts. 213 e 214, na verdade, foram reunidos somente no art. 213. Ao que tudo indica o próximo crime estaria no art. 214 (porque o que estava aí foi para o art. 213 e agora tem um espaço no art. 214). Não! O próximo crime está no art. 215. Vamos do art. 213 ao 215, sem ter o art. 214: 2.2. Violação Sexual Mediante Fraude – Art. 215, caput O art. 215 pune o crime de violação sexual mediante fraude. Antes de ler o tipo, vamos ver o que aconteceu antes e depois da Lei 12.015/09: Antes: Havia duas figuras tipificando a violação sexual mediante fraude: O art. 215 punia a posse sexual mediante fraude: o sujeito ativo homem induzia o sujeito passivo mulher a uma conjunção carnal com fraude. O sujeito ativo não usava a violência, não usava a grave ameaça, usava fraude. Era o que Mirabete chamava de estelionato sexual. Ele induzia em erro a mulher a manter com ele conjunção carnal. Usava engodo, artifício, ardil. E havia o art. 216, que punia o atentado ao pudor mediante fraude. O sujeito ativo e o sujeito passivo eram qualquer pessoa. A conduta era: atos libidinosos + Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 fraude. Ele também não empregava violência e nem grave ameaça. Empregava fraude. O que o legislador faz na lei 12.015? O mesmo que fez com o estupro e com o atentado violento ao pudor. Aqui, ele fez o mesmo, reunindo o art. 215, o art. 216 num só tipo penal, que é o art. 215, que é a violação sexual mediante fraude. O art. 215, eu vou ler e vou fazer algumas observações. Violação Sexual Mediante Fraude (Alterado pela L-012.015-2009) Art. 215. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima: (Alterado pela L-012.015-2009) Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. (Alterado pela L-012.015-2009) Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa. (Alterado pela L-012.015-2009) Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. Vamos entender. Agora, qualquer pessoa pode praticar a violação sexual mediante fraude. Não importa se é conjunção carnal ou ato diverso da conjunção carnal. Qualquer pessoa também pode ser vítima desse delito. O sujeito ativo passou a ser comum e o sujeito passivo também, comum. Qualquer pessoa pode praticar o crime, qualquer pessoa pode sofrer as consequências do crime. Art. 226, II: Aumento de Pena Art. 226 - A pena é aumentada: II - de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela; (Alterado pela L-011.106-2005) Se a vítima é menor de 14 anos, o crime passa a ser o estupro de vulnerável – Art. 217-A. Vamos ler o art. 215 de novo e analisar com calma o que pune: “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima”. Eu falei que conjunção carnal e ato libidinoso são espécies de um gênero: ato de libidinagem. Vão se acostumando com isso. Se o examinador começar a usar essa expressão, saiba que é gênero. Qual a grande mudança no disposto no art. 215? Antes, punia-se a conjunção carnal mediante fraude. Ou atos libidinosos mediante fraude. Hoje eu puno atos de libidinagem, que é gênero e fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima. “Ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima” é a grande novidade da Lei 12.015/09. Quando esse crime só tinha um modus operandi o exemplo dado pela doutrina de ato libidinagem fraudulento: famoso exemplo dos irmãos gêmeos. Um irmão passa pelo outro. Ou a mulher no ginecologista. Ele, a pretexto de clinicá-la, satisfazia sua lascívia. Agora, há um novo Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 modus operandi. Não só a fraude, mas qualquer outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima. Mas que outro meio é esse? Onde estão os vícios da manifestação da vontade? No direito civil, que nos apresenta dois vícios da vontade: coação (se ele usar de coação, não há violação sexual mediante fraude, mas estupro), simulação (simulação é fraude,j á está abrangida pela fraude). Mas tem doutrina dizendo que esse outro medo abrange o temor reverencial. Nós nunca sabíamos onde jogar o temor reverencial. Agora, se entende que o temor reverencial é outro meio que impede ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima. Outro exemplo: embriaguez moderada da vítima. Isso também não configura estupro de vulnerável, mas violação sexual mediante fraude. A recente doutrina vem encontrando dois exemplos de “outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima”: temor reverencial, embriaguez moderada. Detalhe: vejam se configuram crime sexual mediante fraude: estou conversando com uma menina na boate, aproveito a desatenção dela e coloco na bebida boa-noite Cinderela. Ela perde o sentido e, com ela, pratico relação sexual. Aí não é violação sexual mediante fraude porque aqui foi abolida sua resistência. Nesse caso, é estupro de vulnerável. “A fraude utilizada na execução do crime não pode anular a capacidade de resistência da vítima, caso em que estará configurado o delito de estupro de vulnerável (art. 217-A). assim, não pratica estelionato sexual, mas estupro de vulnerável, o agente que usa psicotrópicos para vencer a resistência da vítima.” Isso vai cair na prova! O meio utilizado pelo agente não pode anular a capacidade de resistência da vítima, em que haverá estupro de vulnerável e o exemplo, com certeza, será o uso de psicotrópicos. O crime é punido a título de dolo. Caiu na magistratura/SP (objeto de julgado recente do STJ): jovem universitária procurou pai de santo porque estava se sentindo carregada. Ele disse que, para o descarrego, ela precisava ter com ele conjunção carnal e ainda pagar. o STJ condenou esse pai de santo à violação sexual mediante fraude + estelionato. Se fosse hoje, nesse exemplo do pai de santo, ele responderia somente pelo crime de violação sexual mediante fraude e sofreria um aumento. A finalidade econômica faria ele sofrer o aumento do art. 215, § único: Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa. (Alterado pela L-012.015-2009) Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. Hoje ele responderia por violação sexual mediante fraude + multa, pois ele agiu com o fim de receber vantagem econômica. Esse parágrafo único é novidade da Lei 12.015. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Como o delito se consuma? Com a prática do ato de libidinagem. É possível a tentativa? Perfeitamente possível. Emprega a fraude, mas não consegue consumar o ato de libidinagem por circunstâncias alheias à sua vontade. Antes da Lei 12.015, os arts. 215 e 216 qualificavam o crime quando a vítima tinha idade entre 14 e 18 anos. Inclusive, ela tinha que ser virgem no caso da posse mediante fraude. Hoje, essas qualificadoras foram abolidas. Não existe mais a qualificadora se a vítima tem entre 14 e 18 anos. Porém, o juiz pode considerar a idade dela ou a virgindade dela na fixação da pena base. Antes, o fato de a vítima ter entre 14 e 18 anos qualificava a violação sexual mediante fraude. Inclusive, tinha que ser virgem no art. 215. Hoje não. Hoje isso apenas pode interferir na fixação da pena-base. Terminamos o art. 215. O certo seria ir para o art. 216. Mas como não tem art. 216, vamos para o art. 216-A. 2.3. Assédio Sexual – Art. 216-A Assédio Sexual Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos. Assédio Sexual: “É a insistência importuna de alguém em posição privilegiada, que usa dessa vantagem para obter favores sexuais de um subalterno.” Esse conceito, importantíssimo, é dos dicionários. O examinador perguntou a diferença entre assédio sexual, assédio ambiental e assédio moral. E assédio ambiental não tem nada a ver com meio ambiente. No sexual, o assédio parte do superior para o subalterno e exige finalidade sexual. É de cima para baixo com finalidade sexual. Já com o assedio ambiental, o constrangimento é de cima para baixo, é o de baixo para cima ou de lado, dois empregados do mesmo escalão, tudo com finalidade sexual. Então, assédio sexual é de cima para baixo, com finalidade sexual. O assédio ambiental é de cima para baixo, de baixo para cima e de lado, sempre com finalidade sexual. E assédio moral? Moral também é de cima para baixo, de baixo para cima, também de lado, porém, sem finalidade sexual. Aqui, eu tenho a ridicularização no ambiente de trabalho. Um empregado ridicularizando o outro, por exemplo. São os constrangimentos ilegais no trabalho. O art. 216-A pune assédio sexual. Só de cima para baixo. O art. 216-A não pune de baixo para cima, nem de baixo. Isso é outro crime ou mera contravenção penal. O § único foi vetado. Mas o § 2º foi mantido: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 § 2º A pena é aumentada em até um terço se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos. (Alterado pela L-012.015-2009) Sujeito ativo – Crime próprio. Só pode ser praticado por superior hierárquico ou pessoa que exerce ascendência. Sujeito passivo - Quem é a vítima? O subalterno. Logo, estamos diante de um crime bipróprio. Art. 226 - A pena é aumentada: (Alterado pela L-011.106-2005) II - de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela; (Alterado pela L-011.106-2005) Cuidado! Não se pode aplicar a causa de aumento do preceptor ou empregador da vítima porque redundaria em bis in idem. O art. 226, II, se aplica no assédio sexual? Se aplica como preceptor ou empregador da vítima. Nesse caso, a aplicação do art. 226, II, resultaria em bis in idem.Você vai aplicar no art. 226, II, com exceção do que está grifado, para evitar bis in idem. Novidade da Lei 12.015 é o § 2º do art. 216-A. então, cuidado com a retroatividade maléfica: § 2º A pena é aumentada em até um terço se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos. (Alterado pela L-012.015-2009). Este aumento não retroage para alcançar os fatos pretéritos. Mas você é juiz utiliza a idade para a fixação da pena base. Antes da Lei 12.015, o fato de a vítima ter menos de 18 anos, o juiz fixava uma pena mais rigorosa. Agora, com a Lei 12.015, ele vai considerar a idade dela na causa de aumento de pena, na terceira fase. A pena aumenta em até 1/3. Cuidado! O tipo penal não faz menção ao sexo dos envolvidos. É possível assédio sexual homo ou heterossexual. Tudo é crime. O caput pune: Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Eu quero saber: existe assédio sexual professor-aluno? Isso caiu na magistratura/PR. É possível assédio sexual de professor para com aluno? Para responder isso, temos que decidir o que significa superior hierárquico ou ascendência. Foi uma pergunta de segunda fase. Ainda bem, porque aí o candidato podia explorar a divergência. Ele podia trocar a pergunta: existe assédio sexual bispo sacerdote? Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 1ª Corrente: Quem é o superior hierárquico? “Para a primeira corrente, superior hierárquico retrata uma relação laboral no âmbito público. Ascendência retrata uma relação laboral no âmbito privado.” Reparem que para essa primeira corrente, é indispensável entre eles uma relação laboral. Pergunto: existe relação laboral entre professor e aluno? Não. Existe relação laboral professor-faculdade. Então, para essa primeira corrente, a resposta é: não existe o crime. O professor vai responder por constrangimento ilegal, etc. Mas não pelo art. 216-A, já que não existe uma relação laboral entre professor e aluno. Quem adota? Nucci. 2ª Corrente: Superior hierárquico retrata uma relação laboral. Ascendência, para a segunda corrente, retrata domínio. O professor não tem uma relação laboral sobre o aluno, mas o aluno só passa de ano se o professor der a nota. Assim, a nota faz com que o professor tenha o domínio da situação. Para essa segunda corrente, por isso, o professor exerce ascendência, domínio sobre o aluno. Luiz Régis Prado (por isso magistratura/PR), ele é de lá. Isso é discutido, tanto é que a pergunta foi feita em segunda fase, para você colocar as duas correntes. Mas eu acho que o CP quis adotar a tese de Nucci porque fala em “inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função.” Assim, parece clara a relação laboral como pressuposto. Cezar Roberto Bittencourt admite o constrangimento com violência ou grave ameaça. Não é o que prevalece porque se houver violência ou grave ameaça, há estupro. Pode haver ameaça a gerar o art. 216-A, grave ameaça, não. O crime é punido a título de dolo, com finalidade especial: “com intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual.” eis a finalidade especial do crime. Questão que caiu na magistratura/RJ: pratica este crime o diretor de uma multinacional que obriga sua secretária a conceder favores sexuais ao seu filho? “Meu filho é virgem, eu preciso que você me ajude, etc.” Ele está buscando o ato sexual, não para si, mas para outrem. O tipo penal, quando quer que a vantagem seja para si ou para outrem, o faz expressamente. Prevalece que abrange porque diz o seguinte: com o intuito de obter vantagem é para si. Ou favorecimento sexual é para outrem. Foi isso que o examinador perguntou: qual a diferença entre vantagem ou favorecimento? Vantagem é para si, favorecimento é para outrem. Era isso que o examinador queria ouvir. Então, para si está implícito no obter vantagem. E para outro está implícito na expressão “favorecimento sexual”. Na doutrina, é o que prevalece. Quando este crime se consuma? A doutrina diverge se esse crime é ou não habitual. 1ª Corrente: Entende que o crime não é habitual e se é assim, ele se consuma com o primeiro ato constrangedor (o primeiro bilhetinho), independentemente da obtenção da vantagem ou favor sexual. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 2ª Corrente: O crime é habitual, ou seja, exige reiteração de atos constrangedores. Se o crime exige isso, dispensa a obtenção da vantagem sexual. As duas correntes concordam que o crime é formal. Mas a primeira se contenta com o ato constrangedor. A segunda exige reiteração de atos constrangedores. Mas as duas concordam que o crime é formal. Essa discussão tem algum interesse prático? Sim. A primeira corrente admite a tentativa (bilhete interceptado), a segunda não. Se você concorda que o crime não é habitual, admite tentativa. Se você concorda com a segunda tentativa (o crime é habitual), não admite tentativa. Prevalece a primeira corrente, mas a segunda é que está correta. Olha o conceito: assédio sexual é a insistência inoportuna. Isso pressupõe reiteração de atos. Há um juiz do trabalho que escreve sobre isso. Na justiça do trabalho, sempre que fala em assédio existe reiteração. Rodolfo Pamplona que é habitual, exige reiteração de conduta. Então, cuidado com a pegadinha em concurso: assédio sexual admite tentativa? Ele quer dizer: explore as duas correntes. 2.4. Estupro de vulnerável – Art. 217-A É o crime que mais vai cair em concurso! Há uma art. 217-A, sem ter um art. 217: Estupro de Vulnerável Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: (Acrescentado pela L-012.015-2009) Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. § 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. § 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos. § 4º Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. Atos de libidinagem com vulnerável – Vamos analisar antes e depois da Lei 12.015/09: ANTES – Ato de libidinagem configurava o art. 213 combinado com o art. 224, do CP. E no art. 224 a pena era a mesma do art. 213. ou então configurava o art. 214, c/c, art. 224, do CP. E quem era o vulnerável? Antes, o vulnerável era pessoa não maior de 14 anos. Era também pessoa alienada mental, ou então pessoa sem resistência. DEPOIS – Agora o crime do art. 213 que era combinado com o art. 224 e o art. 214, que era combinado com o art. 224 migraram para o art. 217-A, do CP, com pena de 8 a 15 anos. E quem é o vulnerável agora? Cuidado! O vulnerável é pessoa menor de 14 anos, pessoa alienada mental ou pessoa sem resistência. Qual foi a mudança Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 que o legislador não percebeu? Antes era pessoa não maior de 14 anos. Agora é pessoa menor de 14 anos. Isso significa que, no dia do 14º aniversário, não é mais vulnerável. Antes, você era vulnerável até o dia do seu 14º aniversário inclusive. Hoje você é vulnerável até o dia do seu aniversário. No dia do seu aniversário não é mais vulnerável. Pode parecer bobagem, mas já há um HC no STJ em que ele foi condenado no passado por conjunção carnal no dia do seu 14º aniversário e está pedindo a retroatividade benéfica. Ela era vulnerável e não é mais. No 14º aniversário não é mais. Sabe o que é isso? O legislador não percebeu que a expressão era “não maior”. Ele imaginava que a expressão era menor. Não maior abrange o dia do aniversário. Menor não abrange o dia do aniversário. Entenderam a burrada? Antes, nós discutíamos se havia ou não presunção absoluta de violência. Antes da Lei 12015/09, tínhamos que separar duas situações. Era preciso diferenciar duas hipóteses: 1ª Hipótese – Houve violência contra vítima vulnerável. Nesse caso, não precisava do art. 224. eu respondia só pelo art. 213 ou art. 214 e o fato de a vítima ser vulnerável gerava um aumento de pena de metade previsto no art. 9º, da Lei 8072/90. Antes, se eu usasse violência contra uma menina de 13 anos, eu ia responder com uma pena de 6 a 10 anos, majorada de metade por causa do art. 9º, da Lei dos Crimes Hediondos. Antes, se eu empregasse violência física ou grave ameaça contra uma menina de 13 anos, eu não ia responder pelo art. 224 porque não era preciso presumir uma violência que ocorreu. Eu ia responder pelo art. 214 ou pelo 214, com pena de 6 a 10 anos, mais o aumento de metade ditado pelo art. 9.º, da Lei dos Crimes Hediondos. Olha o que dizia Art. 9º As penas fixadas no art. 6º para os crimes capitulados nos arts. 157, § 3º, 158, § 2º, 159, caput e seus §§ 1º, 2º e 3º, 213, caput e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único, 214 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único, todos do Código Penal, são acrescidas de metade, respeitado o limite superior de trinta anos de reclusão, estando a vítima em qualquer das hipóteses referidas no art. 224 também do Código Penal. Se eu empregasse violência contra uma menina de 13 anos eu respondia pelo art. 213 ou art. 214, não precisava do art. 224 e a pena era aumentada de metade. Ela fica em 9 a 15 anos. 2ª Hipótese – A segunda hipótese é uma conjunção sem violência com vítima vulnerável. Respondia pelo art. 213 ou art. 224, combinado com o art. 224, do CP e a pena era de 6 a 10 anos. Nessa hipótese não incidia o art. 6.º da Lei dos Crimes Hediondos para evitar bis in idem. Como ficou agora, o estupro de vulnerável? Agora, o art. 217-A abrange o crime cometido com violência ou sem violência. E a pena passa a ser de 8 a 15 anos. Então, com o art. 217-A, nós abolimos o art. 224, do CP e o art. 217-A culminou isso em 15 anos, tenha havido violência ou não. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 A pena melhorou ou piorou? Depende. Na primeira hipótese, no estupro de vulnerável com violência,a pena melhorou. Ele respondia com 9 a 15; agora com 8 a 15. A pena melhorou. No caso de estupro de vulnerável com violência, a pena é retroativa. Já na hipótese sem violência, a pena era de 6 a 10 e passa a ser de 8 a 15, ou seja, não retroage. Para retroagir ou não, vai depender da hipótese do passado diante da qual você está. Se é estupro de vulnerável com violência, a pena é de 6 a 10 com aumento de metade, ou seja podia ficar de 9 a 15. Portanto, melhorou. Agora, se era estupro de vulnerável sem violência a pena era só de 6 a 10. não incidia o aumento da Lei dos Crimes Hediondos. Então, essa pena piorou. Antes, discutia-se se o art. 224 trazia uma presunção absoluta ou relativa de violência. Bastava a menina ter 13 anos e ele já responderia pelo estupro com violência presumida, ou não, a presunção era relativa? Ele podia fazer prova de que ela sabia o que estava fazendo? Antes, a presunção sobre se era absoluta ou relativa admitia discussão. Agora, com a nova lei, essa questão mudou? O art. 224, do CP, que era o caso de presunção de violência, pra a maioria espelhava uma presunção absoluta. Para a minoria, a presunção era relativa. Isto é, o réu tinha como fazer prova de que a vítima, apesar da pouca idade sabia exatamente o que estava fazendo e tinha capacidade para discernimento. Caso real: políticos de uma cidade de SP em orgia com meninas de 12, 13 anos. A juíza condenou todos por violência presumida. O tribunal absolveu todos sob o seguinte argumento: “eu sei que elas tinham 13 anos, elas tinham consciência do que estava fazendo, inclusive algumas cobraram para fazer, então não dava para dizer que não soubessem, que não tinham capacidade de discernimento, de vontade. Mas prevalecia, até no STJ, que a presunção era absoluta. Aí veio o art. 217-A e fez o quê? Aboliu o art. 224. E, portanto, também foi revogado o aumento do art. 9.º, da Lei dos Crimes Hediondos, que se fundamentava no art. 224. Então, consequentemente, revogou o art. 9º, da Lei 8.062/90. Para alguns, retroatividade benéfica. Aboliu o art. 224, do CP. Não fala mais em presunção de violência. E agora? Para a maioria, como o art. 217 não fala mais de presunção de violência é porque quis colocar uma pá-de-cal sobre o assunto. A intenção do legislador foi considerar a presunção absoluta. A nova redação do art. 217-A não fala mais em presunção de violência. Conclusão: a presunção é sempre absoluta. Aliás, a intenção do legislador é punir essa conjunção carnal ou ato libidinoso com menor de 14 anos, pouco importa se teve ou não violência. Assim, colocou uma pá de cal na discussão. Agora, para outra parte da doutrina, isso foi um retrocesso porque a menina tem 13 anos e manter com ela atos de libidinagem, a pena será fatalmente de 8 a 15 anos. Isso seria um retrocesso. Como a doutrina se vira com isso? Estão dizendo o seguinte: agora que o artigo tem uma nova redação, é preciso diferenciar o absolutamente vulnerável (e aqui a presunção e é absoluta), do relativamente vulnerável (e aqui a presunção é relativa). Só que o legislador não deu margem para Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 esse contorcionismo. Mas a doutrina diz que vai trabalhar com o ECA: o absolutamente vulnerável é a criança. E o relativamente, o adolescente (12-13 anos). No caso de criança, responde pelo art. 217-A. No caso do adolescente, a relatividade é relativa e o réu pode comprovar que o adolescente sabia o que estava fazendo. Para evitar o que eles chamam de retrocesso. Então trabalha-se com absoluta vulnerabilidade, no caso de criança e relativa, no caso de adolescente. Isso é coisa da doutrina. Sujeito ativo – Qualquer pessoa. Comum. Sujeito passivo – Próprio. A vítima, necessariamente tem que ser menos de 14, alienada mental, ou seja, vulnerável. Aqui também incide o aumento do art. 226, II (ascendente, padastro, madrasta, tio, cônjuge, companheiro, etc.). Conduta Típica – Ter conjunção carnal ou praticar outros atos libidinosos. Ou seja, a prática de atos de libidinagem. O crime pode ser praticado com violência (art. 217-A), grave ameaça (art. 217A – não é o art. 213), fraude (é o art. 217-A, não é o art. 215), ou pode ser praticado por qualquer outro meio. O crime aqui é conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos. Já tem doutrina apontando grave erro de redação. Comparando os dispositivos: o Art. 213 – O estupro é praticado: conjunção carnal, abrange praticar ato libidinoso. É constranger a permitir que se pratique o ato libidinoso. o Art. 217-A – Pune conjunção carnal e pune o praticar ato libidinoso. Tem doutrina dizendo que o art. 217-A esqueceu do comportamento segundo o qual a vítima permite que nela se pratique. O art. 213 pune conjunção carnal, pune o agente que obriga a vítima a praticar, pune o agente que obriga a vítima a permitir que nela se pratica. O art. 217-A pune conjunção carnal, pune o obrigar a praticar, mas não pune o agente a permitir que nela se pratique. Isso é um absurdo! É claro que no art. 217-A, quando ele falou praticar, ele falou em praticar outro ato com o menor, tendo o menor comportamento ativo, tendo o menor comportamento passivo. Então, essa “lacuna” que alguns estão querendo encontrar aqui é um absurdo. E olha o que diz o art. 217-A: Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos. E fala em “com menor”, não fala “no menor”. Assim, você pode praticar ato libidinoso envolvendo comportamento ativo ou passivo. Essa lacuna não existe. O crime é punido a título de dolo, devendo o agente ter ciência da vulnerabilidade da vítima. A pergunta que vai cair vai ser a seguinte: “e se o agente Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 desconhece que ela tinha 13 anos?” Antes, quando se falava que ele desconhecia, o fato é atípico. Agora, cuidado! É preciso diferenciar:  Se o crime foi praticado com violência e ele desconhecia a idade da vítima – Responde pelo art. 213.  Se o crime foi praticado com grave ameaça e ele desconhecia a idade da vítima – Responde pelo art. 213.  Se o crime foi praticado com fraude e ele desconhecia a idade da vítima – Responde pelo art. 215.  Se o crime foi praticado com qualquer outro meio, aí o fato será atípico. Então, o crime é punido a título de dolo e o agente tem que ter ciência da vulnerabilidade da vítima. Antes se respondia de cara: fato atípico. Agora não. Vai depender do modus operandi. Não se esqueçam disso. O crime é de execução livre. Consumação – Quando o delito se consuma? Com a prática do ato de libidinagem. Antes da lei 12.015, discutia-se se a qualificadora da lesão grave e da morte (art. 223, do CP que qualificava o estupro ou atentado violento ao pudor quando resultasse em lesão grave ou morte), se aplicava à violência presumida quando ele usava, por exemplo, psicotrópico. Essa discussão acabou porque o próprio art. 217-A traz nos seus §§ 3º e 4º as duas qualificadoras. § 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos. § 4º Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. Não importa se essa conduta é violência, não importa se é grave ameaça, fraude ou qualquer outro meio. Isso é novidade! 2.4. Corrupção de Menores – Art. 218 Corrupção de Menores Art. 218. Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem: (Alterado pela L-012.015-2009) Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. (Alterado pela L-012.015-2009) Esse é o crime mais difícil de comentar na lei. Esse artigo pune lenocínio de vulnerável. O crime de lenocínio, antes da Lei 12.015/09 estava somente no art. 227, do CP, que tratava o vulnerável nos seus parágrafos. Agora, com a Lei 12.015/09, o art. 227 do CP trata do lenocínio de vítima não vulnerável e você tem o art. 218, do CP tratando do lenocínio de vítima menor de 14 anos. O que o art. 218 pune hoje? O lenocínio de vítima menor de 14 anos. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Sujeito ativo – há três personagens nesse crime. O primeiro deles é o lenão (intermediário), o segundo é a vítima menor de 14 anos e o destinatário do ato, o consumidor. Quem é o sujeito ativo do art. 218? prestem atenção! É o lenão. Este é o sujeito ativo. O destinatário não é o sujeito ativo deste crime. O lenão é o sujeito ativo. O crime é induzir a satisfazer a lascívia de outrem. Ele não pune satisfazer a própria lascívia. Sujeito passivo – O menor de 14 anos. Cuidado! Não abrange as outras situações de vulnerabilidade. Só o menor de 14 anos. O que pune o art. 218? Ele pune induzir menor de 14 anos a satisfazer a lascívia de outrem. 1ª Observação: O crime não tem como meio de execução ou grave ameaça. Não existe violência ou grave ameaça. O agente convence o menor de 14 anos a satisfazer a lascívia de outrem. Não usa fraude, não usa grave ameaça. Ele convence o menor. 2ª Observação: Não se trata de crime habitual. 3ª Observação: Esse “outrem” deve ser pessoa certa e determinada. Se induz menor a satisfazer lascívia de qualquer pessoa, de pessoas indeterminadas, é o art. 218-B, é o crime de prostituição exploração sexual: Art. 218-B. Submeter, induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone: (Acrescentado pela L-012.015-2009) “Outrem” determinado, art. 218, “outrem” indeterminado, art. 218-B. Ponto mais controvertido – Que lascívia é essa que o menor de 14 anos deve ser induzido a satisfazer? É qualquer lascívia? Se esse consumidor mantiver conjunção carnal, vai responder por estupro de vulnerável. E eu, que induzi vou responder pelo art. 218? Que lascívia é essa? Uma construção minha: a lascívia que deve ser satisfeita aqui é apenas a lascívia contemplativa. A conclusão é minha. É uma lascívia meramente contemplativa, voyerismo. Menor que se despe. Em nenhum momento o legislador falou em conjunção carnal ou atos libidinosos. Primeira vez que ele não fala em conjunção carnal e atos libidinosos. Ele falou: “satisfazer a lascívia”. Ponto. Reparem que abranger conjunção carnal ou outros atos libidinosos, é você fazer com que quem induziu responda por uma pena de 2 a 5 e quem manteve a conjunção carnal responda por pena de 8 a 15. Isso é absurdo. Ele concorreu, de qualquer modo no estupro de vulnerável e deve responder por ele. A maioria da doutrina diz que não: é uma exceção pluralista à teoria monista. Isso é que é um absurdo na minha opinião. Porque exceção pluralista à teoria monista você nunca viu Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 uma diferença tão grande nas consequências dos atos dos autores. Uma coisa é a exceção pluralista à teoria monista na corrupção ativa e passiva (mesma pena). Uma coisa é no aborto consentido e terceiro (a pena é praticamente a mesma), outra coisa é a exceção pluralista à teoria monista aqui, em que um é crime hediondo e o outro crime não é hediondo, com pena de 2 a 5. Há uma discrepância muito grande para se aplicar a exceção pluralista à teoria monista. Mas é o que prevalece. Para a maioria, o satisfazer a lascívia abrange, sim, atos de libidinagem e é uma exceção pluralista á teoria monista. Eu entendo que não abrange. Apenas lascívia contemplativa. Se houver atos de libidinagem os dois respondem por estupro de vulnerável (art. 217-A). Na jurisprudência não tem nada que prevalece. Não teve jurisprudência. O crime é punido a título de dolo. Obviamente, o agente deve ter ciência de que o induzido é menor de 14 anos. No art. 227, a jurisprudência é tranquila: a vítima induzida não pode ser totalmente corrompida e a doutrina parece trazer esse entendimento para o art. 218. Menor de 14 anos não pode ser totalmente corrompido. Tratando de pessoas totalmente corrompidas, você não induz, porque ela já está induzida pela vida que leva. Você só dá uma dica. Quando o crime se consuma? Prevalece que o crime se consuma com a prática do ato. A vítima se despiu, etc. Independentemente ou não do consumidor sentir-se ou não satisfeito. Eu reitero o que falei: o crime não é habitual. Tentativa – É possível, no induzimento por escrito. Um artigo desapareceu, que é o antigo art. 218, que foi substituído pelo que acabamos de ver. Vamos ver o que dizia: Corrupção sexual de Menores Art. 218 - Corromper ou facilitar a corrupção de pessoa maior de 14 (catorze) e menor de 18 (dezoito) anos, com ela praticando ato de libidinagem, ou induzindo-a a praticá-lo ou presenciá-lo: ANTES da Lei 12.015/09 – O art. 218, do CP punia a chamada corrupção sexual de menores. Mas não tem “sexual” no meu código. Acrescenta para não errar. Punia corromper menor de 18 e maior de 14 anos a, com ele, a) b) c) praticar atos de libidinagem ou induzir o menor a praticá-lo ou induzindo o menor a presenciá-lo. A vítima tinha que ter entre 14 e 18. E se ela tivesse 13 anos e com ela se praticassem atos de libidinagem, o crime seria estupro ou atentado violento ao pudor. Se fosse induzida a praticar, idem. Mas se fosse induzida a só presenciar (ninguém Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 tocou nela e ela não tocou em ninguém), era fato atípico para o menor de 14 anos. Era uma lacuna! Se tivesse 16 anos, qualquer dos 3 comportamentos configurava corrupção sexual de menores. Mas se ela tivesse 13 anos e fosse obrigada apenas a presenciar, fato atípico. Daí a lacuna. O que a lei 12.015 fez? Revogou o art. 218 (aboliu-se o delito de corrupção sexual de menores) e criou um tipo específico para essa lacuna que agora é o art. 218-A, ou seja, aquele fato que não tinha previsão legal, virou crime. Vamos abolir o art. 218, que era viciar o menor nos prazeres da carne, algo ultrapassado, e vamos criar um tipo para esse fato que está carecendo de tipificação. Vamos ler o art. 218-A: Art. 218-A. Praticar, na presença de alguém menor de 14 (catorze) anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem: (Acrescentado pela L-012.015-2009) Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos. Sujeito ativo – Crime comum, aplicando-se o aumento do art. 226, II. Se o agente é ascendente, padrasto, tio, irmão, cônjuge, companheiro... Sujeito passivo – Menor de 14 anos. O art. 218-A pune duas condutas:   Praticar na presença de alguém menor de 14 anos atos de libidinagem e Induzir menor a presenciar ato de libidinagem No primeiro comportamento, você pratica na presença de alguém menor de 14 anos atos de libidinagem. Na segunda hipótese, você induz o menor de 14 anos a praticar atos de libidinagem. Qual é a diferença? No praticar na presença você percebe a presença espontânea do menor e pratica o ato de libidinagem com a parceira para satisfazer a lascívia. Percebe a presença espontânea do menor e, para satisfazer sua lascívia, pratica ato de libidinagem com a parceira. A presença do menor é espontânea e você, se aproveitando da presença dele, pratica o ato de libidinagem na frente dele. Na segunda hipótese, ele está presente porque você induziu. Então, é uma presença não espontânea. A presença é voluntária, porém, induzida por você. Seja num, seja noutro, esse menor de 14 anos não pode participar do ato. É só presenciar. Se ele participar do ato, você responde por estupro de vulnerável. Não pode redundar no seu envolvimento físico no ato. Se redundar nisso, o crime é de estupro de vulnerável. Ele tem que estar ali apenas presenciando, não participando. Se participar do ato é estupro de vulnerável, art. 217-A. O crime é punido a título de dolo. Dolo acrescido de uma finalidade especial: satisfazer sua lasciva, seu desejo sexual. Seu desejo é satisfeito somente com a presença do menor. Você aproveita a presença do menor de 14 anos para satisfazer o desejo que você tem. Olha o que aconteceu em Batatais: A mãe foi encontrar o amante e tinha um filhinho de 5 anos. Levou o filho para o motel e manteve conjunção carnal com o parceiro na frente do filho. A polícia prendeu com base no Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 art. 218-A. Ela tem que perder o poder familiar e tudo o mais. Mas ela não assim agiu para satisfazer a própria lascívia ou de outrem. A lascívia dela não era satisfeita com a presença do menor. Ela apenas não tinha onde deixá-lo. Então, não atingiu o elemento subjetivo do tipo. Não basta praticar o ato na presença de menor de 14 anos. Tem que ser para satisfazer a própria lascívia ou de outrem. Cuidado com esse elemento subjetivo. Ele é indispensável. No caso dela, em regra, o fato é atípico e ela deve responder pelas consequências cíveis na Vara da Infância e Juventude. Consumação – Aqui há divergência. Na primeira parte (praticar na presença de alguém menor de 14 anos atos de libidinagem), o crime se consuma com a prática do ato de libidinagem. Quando a presença do menor é espontânea, o crime só se consuma com a efetiva prática do ato de libidinagem. Mas quando a presença do menor é induzida, o crime se consuma com o mero induzimento, dispensando a prática do ato de libidinagem. Na modalidade “induzindo o menor a praticar”, basta o induzimento. Na primeira hipótese, o crime é material, na segunda hipótese o crime é formal. Nucci discorda. Ele acha que nas duas hipóteses a prática efetiva do ato de libidinagem é indispensável. Com isso, terminamos o art. 218, vamos ao art. 225, vamos falar de ação penal. 3. AÇÃO PENAL ANTES da Lei 12.015/09 – A regra era ação penal de iniciativa privada, ou seja, crime desse título dependia de queixa proposta pela vítima ou seu representante legal. Dizia-se que a intimidade da vítima era atingida de forma tão grave, tão mais do que a própria paz pública, por isso é que a vítima era quem devia escolher pela propositura ou não da ação penal. Havia exceções:  1ª Exceção: No caso de vítima pobre – Nesse caso, a ação penal era pública condicionada à representação.  2ª Exceção: No caso de abuso de poder – Nesse caso,a ação penal era pública incondicionada.  3ª Exceção:No caso de qualificadora (art. 223, CP) – A ação era pública incondicionada.  4ª Exceção: Súmula 608, do STF – Vamos ver o que dizia: STF Súmula nº 608 - DJ de 31/10/1984 - No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada. Antigamente, a ação penal privada era a regra que comportava exceções. Como era o crime praticado com grave ameaça? A mera grave ameaça, era regra ou exceção? Regra. A regra abrangia grave ameaça. Pergunto: estupro com violência presumida (óbvio, se a vítima não fosse pobre, etc.) caía na regra ou exceção? Na regra. Então, antes, a queixa-crime aplicava-se quando houvesse grave ameaça ou violência presumida. Se a vítima fosse pobre, abuso de poder, qualificadora ou violência real, ?. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Como ficou agora? Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação. (Alterado pela L012.015-2009) Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável. (Acrescentado pela L-012.015-2009) A regra está no caput. A exceção está no § único. DEPOIS da Lei 12.015/09 – A regra é a ação penal pública condicionada. Exceção: Vítima menor de 18 anos ou vítima vulnerável – Aqui será pública incondicionada. Ou seja, aboliram a ação penal privada do Título VI. Na sua prova vai cair assim: “Depois da Lei 12.015/09, existe alguma hipótese que admite ação penal privada nos crimes contra a dignidade sexual?” Admite: não pode abolir a ação penal privada subsidiária da pública. Cuidado! Aboliu a ação privada! Só não pode abolir a ação privada subsidiária da pública. Essa é garantia constitucional do cidadão. Está no art. 5º, da CF. “É possível ação penal privada subsidiária da pública.” Essa não tem como abolir. É garantia constitucional do cidadão. A queixa subsidiária ainda é possível. A tendência do CPP é abolir a ação privada do ordenamento. E ele vai poder abolir todas, menos a subsidiária. E se ocorrer lesão grave ou morte, qual a ação penal hoje? O legislador criou exceção especial como havia na lei anterior? Não. Por isso, prevalece que lesão grave e morte estão na regra: ação penal pública condicionada. Já há doutrina nesse sentido: LFG. Se quisesse que fosse exceção, o legislador teria sido expresso. Se a vítima morre, como representa? Obviamente não será ela, mas CCADI (cônjuge, companheiro, ascendente, descendente ou irmão). Isso é o que prevalece, porém o PGR ingressou com uma ADI. Para o PGR tem que ser uma exceção, tem que ser pública incondicionada. Porque deixar na regra é desconsiderar a razoabilidade. Ferese o princípio constitucional da razoabilidade. Alguém sabe onde está esse princípio na CF? PGR diz que lesão grave ou morte tem que ser exceção. Deixar na regra fere o princípio da razoabilidade. O crime aconteceu antes da Lei 12.015, mas o inquérito só vai para o MP depois da Lei 12.015. O MP oferece ou não denúncia. O crime, antes, era de ação penal privada. O MP recebe os autos já no tempo da lei nova (ação pública incondicionada). O MP oferece a denúncia ou tem que respeitar a queixa, que era a regra na época dos fatos? Ampliar da ação privada para pública é ampliar o espectro do direito punitivo. Não tem mais renúncia, não tem mais perdão do ofendido, não tem mais perempção. Você exclui causas que podiam excluir a punibilidade. Assim, o que deveria ser queixa, continua dependendo de queixa. Não pode haver retroatividade maléfica. Se na época do fato dependia de queixa, mesmo com a Lei 12.015, vai continuar depende3ndo de queixa, evitando-se a Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 retroatividade maléfica. Dá uma olhada na aula de injúria, em que expliquei que a ação privada tem renúncia, perdão, perempção. Denúncia não tem renúncia, não tem perdão, não tem perempção. Se você abolir 3 causas extintivas da punibilidade, você ampliou o direito de punir. Não pode retroagir. O que foi cometido na época da queixa, continua a depender de queixa. Tem gente escrevendo que aplica o tempus regit actum. Loucura! O penal está vinculado ao direito de punir. O crime, antes, caía na exceção pública incondicionada. Com a lei nova, passou a ser pública condicionada. Já foi oferecida a denúncia. O que o juiz tem que fazer? O crime era de ação pública incondicionada, o MP já ofereceu a denúncia e o juiz já recebeu. Durante o processo vem a lei nova dizendo que esse caso era pública condicionada. Você, juiz, vai fazer o quê? Vai suspender o processo e chamar a vítima para representar? Quando aconteceu o crime, não dependia de representação. Durante o processo, o crime passou a ser de ação pública condicionada, passou a ser indispensável a oitiva da vítima. O que o juiz faz? Suspende e chama a vítima para ver se ela quer manter? Há uma ADI que tem que dizer que o juiz tem que suspender todos os processos e chamar a vítima para representar. Puta absurdo! Na ADI, o PGR está sustentando a tese que, se durante o processo, virou pública condicionada, para o processo e chama a vítima para exercer o seu direito de representação. Isso é um absurdo porque representação é condição de procedibilidade. É preciso ajuizar a ação penal, não importa a vontade da vítima. Representação é condição de procedibilidade, para o MP agir. Depois que ele agiu, não interessa mais a vontade da vítima. O que o PGR está querendo fazer é transformar a representação em condição de prosseguibilidade. A posição do MPF é que essa alteração da ação penal redunda na suspensão do processo e no chamamento da vítima para exercer o seu direito. Isso é absurdo porque a representação é condição de representabividade, para o MP agir. O que o MPF está fazendo é transformar a representação em condição de prosseguibilidade. Eu vou provar que isso não está correto. Vejam a Lei 9.099/95. O que ela fez com a lesão corporal? Transformou a lesão corporal de pública incondicionada para pública condicionada. Art. 91 Art. 91 - Nos casos em que esta Lei passa a exigir representação para a propositura da ação penal pública, o ofendido ou seu representante legal será intimado para oferecê-la no prazo de trinta dias, sob pena de decadência. Quando a lei quer transformar a representação em condição de prosseguibilidade. Se a lei 12.015 não previu isso, não cabe ao intérprete prever. Se a intenção do legislador fosse essa, ele faria a mesma coisa que fez na Lei 9.099/95. Ele diria: “vítima, fique tranquila, você será intimada para representar.” SE ele não fez isso, não cabe ao intérprete fazê-lo. A Lei 9.099 transformou a representação em condição de prosseguibilidade. Se ele ofereceu denúncia sem precisar de representação da vítima você está diante de um ato jurídico perfeito. Dificilmente o MPF trabalha com estupro ou atentado violento ao pudor. Só se for num barco, num navio, num avião. Já imaginou a repercussão prática disso? Causas de Aumento de Pena Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Aumento de pena Art. 234-A. Nos crimes previstos neste Título a pena é aumentada: III - de metade, se do crime resultar gravidez; e IV - de um sexto até a metade, se o agente transmite à vitima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador. As causas de aumento do art. 234-A se aplicam a todos os tipos do Título VI, sem exceção. E quais são as causas de aumento:  Se do crime resultar gravidez – Aumenta-se a pena da metade. Mas gravidez de quem? Da vítima? Onde está escrito isso? O examinador comeu mosca. A doutrina já está dizendo que, pouco importa se a gravidez foi na vítima do estupro ou na mulher que estuprou o homem porque para o homem estuprado a gravidez na autora do crime também é um fato grave. Então, a doutrina está dizendo que essa gravidez pode ser na vítima ou no sujeito ativo e, nos dois casos, incide a majorante. Se resultar na vítima, ela pode interromper essa gravidez. Ela tem direito ao aborto permitido. Se resulta no agente, ele não tem direito ao aborto permitido. Se resultar na gravidez da mulher vítima, pode abordar (art. 128, II). Se for na mulher agente, não pode abortar porque o art. 128, II é só para a vítima. O agente não precisa ter o dolo de engravidar. É uma consequência do crime que não precisa ser abrangida pelo dolo porque é óbvio que quando você pratica o ato você, pelo menos, assume o risco. Não precisa ser abrangido pelo dolo. É uma consequência do crime que não precisa ser abrangida pelo dolo. Essa causa de aumento permanece, mesmo que a gravidez seja interrompida, naturalmente ou não. Se o agente transmite à vitima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador – Aumenta-se a pena de um sexto até a metade Antes, o sujeito respondia por estupro + crime de perigo transmissão de doença venérea em concurso formal. Agora, esse comportamento configura estupro + causa de aumento do art. 234A, IV. Agora, eu denuncio só pelo estupro majorado de 1/6 até a metade. Reparem que a pena foi aumentada de 1/6 até a metade e o juiz varia isso conforme tipo de doença e consequências para a vítima. Aqui, eu tenho que lembrar que sobre a transmissão intencional da AIDS o STJ tem entendido como homicídio e tentativa de homicídio quando a vítima não morre. Cuidado! Não vai colocar AIDS aqui porque está errado. Vocês já viram isso comigo em homicídio. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Observação: cuidado com o Código Penal Militar. Lá você continua tendo estupro, continua tendo atentado violento ao pudor, continua tendo violência presumida e nada disso é hediondo. É um código moderno e causalista até hoje (dolo e culpa estão na culpabilidade). A pena do atentado violento ao pudor no Código Penal Militar é ridícula, é de 2 anos. Tem direito a sursis e se praticar outra vez tem direito a regime aberto. Temos que atualizar o Código Penal Militar, pelo menos em algum momento da vida. DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Título XI - Arts. 312 a 359, do Código Penal Titulo XI Dos Crimes Contra a Administração Pública (312a359-A) Capítulo I Dos Crimes Praticados por Funcionário Público Contra a Administração em Geral (312a327) Peculato - Art. 312 Peculato Culposo - Art. 312, § 2º Peculato Mediante Erro de Outrem - Art. 313 Inserção de Dados Falsos em Sistema de Informações - Art. 313-A Modificação ou Alteração Não Autorizada de Sistema de Informações Art. 313-B Extravio, Sonegação ou Inutilização de Livro ou Documento - Art. 314 Emprego Irregular de Verbas ou Rendas Públicas - Art. 315 Concussão - Art. 316 Excesso de Exação - Art. 316, §§ 1º e 2º Corrupção Passiva - Art. 317 Facilitação de Contrabando ou Descaminho - Art. 318 Prevaricação - Art. 319 Condescendência Criminosa - Art. 320 Advocacia Administrativa - Art. 321 Violência Arbitrária - Art. 322 Abandono de Função - Art. 323 Exercício Funcional Ilegalmente Antecipado ou Prolongado - Art. 324 Violação de Sigilo Funcional - Art. 325 Violação do Sigilo de Proposta de Concorrência - Art. 326 Funcionário Público - Art. 327 Capítulo II Dos Crimes Praticados por Particular Contra a Administração em Geral (328a337-A) Usurpação de Função Pública - Art. 328 Resistência - Art. 329 Desobediência - Art. 330 Desacato - Art. 331 Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Tráfico de Influência - Art. 332 Corrupção Ativa - Art. 333 Contrabando ou Descaminho - Art. 334 Impedimento, Perturbação ou Fraude de Concorrência - Art. 335 Inutilização de Edital ou de Sinal - Art. 336 Subtração ou Inutilização de Livro ou Documento - Art. 337 Sonegação de Contribuição Previdenciária - Art. 337-A Capítulo II-A (Acrescentado pela L-010.467-2002) Dos Crimes Praticados por Particulares Contra a Administração Pública Estrangeira (337-B a 337-D) Corrupção Ativa em Transação Comercial Internacional - Art. 337-B Tráfico de Influência em Transação Comercial Internacional - Art. 337-C Funcionário Público Estrangeiro - Art. 337-D Capítulo III Dos Crimes Contra a Administração da Justiça (338a359) Reingresso de Estrangeiro Expulso - Art. 338 Denunciação Caluniosa - Art. 339 Comunicação Falsa de Crime ou de Contravenção - Art. 340 Auto-Acusação Falsa - Art. 341 Falso Testemunho ou Falsa Perícia - Art. 342, Art. 343 Coação no Curso do Processo - Art. 344 Exercício Arbitrário das Próprias Razões - Art. 345, Art. 346 Fraude Processual - Art. 347 Favorecimento Pessoal - Art. 348 Favorecimento Real - Art. 349; Art. 349-A Exercício Arbitrário ou Abuso de Poder - Art. 350 Fuga de Pessoa Presa ou Submetida a Medida de Segurança - Art. 351 Evasão Mediante Violência Contra a Pessoa - Art. 352 Arrebatamento de Preso - Art. 353 Motim de Presos - Art. 354 Patrocínio Infiel - Art. 355 Patrocínio Simultâneo ou Tergiversação - Art. 355, Parágrafo único Sonegação de Papel ou Objeto de Valor Probatório - Art. 356 Exploração de Prestígio - Art. 357 Violência ou Fraude em Arrematação Judicial - Art. 358 Desobediência a Decisão Judicial sobre Perda ou Suspensão de Direito - Art. 359 Capítulo IV Crimes Contra as Finanças Públicas (359-Aa359-H) Contratação de Operação de Crédito - Art. 359-A Inscrição de Despesas Não Empenhadas em Restos a Pagar - Art. 359-B Assunção de Obrigação no Último Ano do Mandato ou Legislatura - Art. 359-C Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Ordenação de Despesa Não Autorizada - Art. 359-D Prestação de Garantia Graciosa - Art. 359-E Não Cancelamento de Restos a Pagar - Art.. 359-F Aumento de Despesa Total com Pessoal no Último Ano do Mandato ou Legislatura Art. 359-G Oferta Pública ou Colocação de Títulos no Mercado - Art. 359-H Eu copiei o esquema acima do índice do DJI para se ter ideia de como os crimes contra a Administração Pública são sistematizado no Código Penal. Hoje nós vamos começar o Título XI, do CP, “Dos Crimes Contra a Administração Pública”, assim dividido:  Capítulo I – Dos Crimes Praticados por Funcionário Público Contra a Administração em Geral (arts. 312 a 327) – São os chamados crimes funcionais.  Capítulo II – Dos Crimes Praticados por Particular Contra a Administração em Geral (328 a 337-A) - É aqui que você vai encontrar o desacato, a desobediência.  Capítulo II-A (Acrescentado pela L-010.467-2002) - Dos Crimes Praticados por Particulares Contra a Administração Pública Estrangeira (337-B a 337-D) – Pensem comigo: o que o Brasil tem a ver com a Administração Pública estrangeira? Algum ordenamento jurídico alienígena se preocupa com a Administração Pública brasileira? Vocês conseguem imaginar isso? Chaves criou um crime só para a corrupção no Brasil. Absurdo. Por isso, a doutrina fala que não é esse o bem jurídico tutelado no Capítulo IIA. Na verdade, ele tutela a Regularidade das Transações Comerciais Internacionais. É aqui que vocês vão encontrar o delito de corrupção ativa de funcionário público estrangeiro.  Capítulo III - Dos Crimes Contra a Administração da Justiça (338 a 359) – Falso testemunho, falsa perícia, denunciação caluniosa, etc.  Capítulo IV - Crimes Contra as Finanças Públicas (359-A a 359-H) – Esses crimes, nada mais são, do que a tipificação de condutas antes configuradoras de mera infração à Lei de Responsabilidade Fiscal. Os crimes contra as finanças públicas, na verdade, tipificam o que antes configurava infração à LRF. O que antes configurava somente infração à LRF, o legislador entendeu que isso não era suficiente e resolveu tipificar os comportamentos. Sabem por que fiz esse esquema? Concurso público: maior número de conhecimento no menor espaço de tempo possível. O Capítulo IV caiu duas vezes em concurso, desde que foi criado. E as duas vezes que caiu foi para concurso de Tribunais de Conta. Ou analista ou até MP do TC. Duas vezes só. Praticamente não é cobrado porque é um tipo extremamente difícil. Eu tive que escrever no meu livro sobre esse tipo. A Marinela ama esse capítulo, porque tem tudo a ver com administrativo. Eu acho uma bosta. Então, se você não tiver tempo, não se preocupe. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Dificilmente cai. Quando cai, você dificilmente acerta. Brincadeiras à parte, como eu não tenho tempo, não vou dar bola para um capítulo pouco importante como esse. O que cai muito em concurso? Demais o Capítulo I. É o que mais cai. Depois, o Capítulo II e, por último, o Capítulo III. O Capítulo II-A, vocês também não se preocupem porque cai pouquíssimo. Caiu no concurso do MPF em 2002, mera repetição de artigo de lei e o candidato podia usar código, inclusive. Então, vamos estudar apenas os Capítulos I, II e III. TÍTULO XI – DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Vocês perceberam que o Título XI é o título de encerramento do Código Penal? Vocês já ouviram falar em Constituição plástica? Essa expressão é de Raul Machado Horta. O que ele quis dizer da nossa Constituição quando a etiquetou como sendo plástica? Ele quis dizer que os artigos da nossa Constituição não estão colocados aleatoriamente, mas seguindo uma ordem de importância, começando pelos mais importantes até os menos importantes. Por isso que na Constituição de 1967 os direitos e garantias fundamentais estavam no final da Constituição. O que fez a Constituição de 1988? Migrou os direitos e garantias fundamentais para o art. 5º, demonstrando a importância desse capítulo. Se eu fosse usar o mesmo raciocínio de Raul Machado Horta para o nosso Código Penal, dizendo que ele é plástico, significaria que nós colocamos os artigos conforme a ordem de importância. E qual seria a importância da Administração Pública? Zero. E é exatamente isso que se percebe na prática. Por quê? Porque nós estamos diante de crimes gravíssimos com penas insignificantes. O Brasil tem a coragem de anunciar para o mundo que admite crimes contra a Administração Pública de menor potencial ofensivo. São crimes gravíssimos com uma repressão insignificante. Só para vocês terem uma ideia, não existe um crime contra a Administração Pública considerado hediondo. E por isso eu fiz essa introdução, porque já existe projeto de lei, que não será aprovado nunca, tipificando como hediondo algumas formas de peculato, concussão e corrupção. O Congresso está discutindo com o MP quais crimes contra a Administração devem ser tidos por hediondos. É um belo projeto, mas acreditem em mim: nunca vai ser aprovado. Corrupção como crime hediondo, se existisse, estaria superlotando as cadeias. Apesar da pouca importância que se dá aos crimes contra a Administração Pública, em dois dispositivos o legislador foi firme com relação aos crimes funcionais: 1. Art. 7º, I, “c”, do CP: Extraterritorialidade Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: I - os crimes: c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço; Para esses crimes se previu uma extraterritorialidade incondicionada. Isso caiu na prova do MPF. Para essas espécies de delito, nosso legislador previu uma extraterritorialidade incondicionada. Caiu no MPF: um funcionário brasileiro solicitando vantagem indevida na embaixada brasileira e perguntou se nossa lei vai alcançar Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 esse fato. O candidato respondeu: “lógico que vai alcançar. O crime aconteceu na nossa embaixada no Egito e embaixada brasileira no Egito é território nacional.” Tunga! Errou! Você já sabe que a embaixada não é extensão do território que representa. O fundamento era outro. Era exatamente o art. 7º, I, “c”. Apesar de cometido no estrangeiro e a embaixada brasileira no Egito é território estrangeiro, vai incidir a lei brasileira porque é caso de extraterritorialidade incondicionada. Muitos erraram fundamentando que o crime ocorreu em território nacional. O segundo dispositivo que se lembrou de punir mais rigorosamente os crimes contra a Administração em geral (foi logo depois da Operação Anaconda, 2003) 2. § 4º, do art. 33, do CP: § 4º O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais. (Acrescentado pela L-010.763-2003) O § 4º traz uma condição para que o agente, autor de crime contra a Administração Pública, consiga progredir. Eu comentei do erro do legislador? Não. Qual foi o erro do legislador? Onde que o legislador errou? O legislador condicionou a concessão do benefício à reparação do dano. Sempre que ele condiciona benefício à reparação do dano, ele lembra que há pessoas que não têm condições de reparar. Ele lembrou de dizer “salvo impossibilidade de fazê-lo?” Não lembrou. Então, fica parecendo que aquele que não tem condições de reparar jamais vai progredir de regime, criando um regime integral. É só você olhar: no sursis, uma das condições é reparar o dano, “salvo impossibilidade de fazê-lo”. Reabilitação? Reparação de dano, “salvo impossibilidade de fazê-lo”. Livramento condicional, idem. Sempre se lembrou do “salvo impossibilidade de fazê-lo”. Aqui esqueceram. Então, já tem gente falando que o § 4º é inconstitucional. E o que a gente faz com ele? Analogia in bonam partem. É só fazer isso e chegar à seguinte conclusão: tem condições de reparar? Repara para progredir. Não tem condições de reparar? Não precisa reparar. Essa condição não se aplica ao seu caso. É só fazer uma analogia in bonam partem com os delitos que ressalvam a “impossibilidade de fazê-lo”. Crimes funcionais. Eu vou fazer duas afirmações e vocês vão dizer qual a verdadeira e qual a falsa: Todo crime funcional corresponde a um ato ímprobo? – Verdadeiro ou falso!? Isso foi dissertação do TRF da 5ª Região. Todo crime funcional corresponde a um ato de improbidade? É possível ter crime funcional e não ter ato de improbidade? O Código Penal prevê crimes funcionais do art. 312 ao 326 (o art. 327 é uma norma explicativa) e a Lei de Improbidade, Lei 8.429/92, prevê atos ímprobos nos arts. 9º, 10 e 11. O art. 12 trata das sanções. Invariavelmente, se você tem um crime funcional ou ele configurou enriquecimento e aí as hipóteses de enriquecimento ilícito estão no art. 9º da Lei de Improbidade, ou ele trouxe um dano ao erário (e aí cão no art. 10). E ainda que ele não configure enriquecimento ilícito ou gere dano ao erário, o crime Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 funcional fere os princípios da Administração Pública, em especial, legalidade e moralidade. Então, não tem como escapar: crime funcional necessariamente corresponde a ato de improbidade administrativa. Aqui no MP/SP os promotores criminais são orientados, quando se deparam com crimes contra a Administração Pública, a remeter cópia de tudo ao promotor da cidadania para entrar com ação de improbidade. Então, quando eu denuncio um funcionário público por corrupção, eu extraio cópias e mando para o promotor da cidadania ajuizar a correspondente ação civil pública para reparação do dano, perda do cargo, etc. Todo ato ímprobo corresponde a crime funcional? – Verdadeiro ou falso?! Agora eu inverti. Eu já vou demonstrar que essa questão não é verdadeira. O art. 10, da Lei de Improbidade, traz atos ímprobos dolosos e atos ímprobos culposos. Quando o ato ímprobo é culposo, nós só vamos ter um crime culposo, que é o peculato. Só o peculato admite modalidade culposa. Os demais crimes não têm modalidade culposa. Então, o ato ímprobo culposo, por exemplo, no máximo vai encontrar correspondência no peculato culposo. Os demais não têm correspondência alguma. Então, só um ato ímprobo culposo é que vai ter correspondência no CP, que é o peculato culposo. No mais, todos os demais atos ímprobos culposos não encontram crime correspondente. Se é verdade que todo crime funcional gera ato de improbidade, o contrário não se aplica. Isso caiu no TRF da 5ª Região. Nós vamos falar dos crimes funcionais. CAPÍTULO I – DOS CRIMES FUNCIONAIS 1. SUJEITOS DO CRIME Já deu para perceber que nos crimes funcionais o sujeito ativo é o funcionário público. O CP ainda utiliza essa expressão, mas pós 1988 passou a ser servidor. O sujeito passivo é a Administração em geral. Falou em crime funcional, coloca na sua cabeça: em regra o sujeito ativo é o funcionário público. Há duas exceções (veremos que há dois crimes funcionais que você não precisa ser funcionário público para praticar). Por isso eu gosto de falar que, em regra, o sujeito ativo sempre será o funcionário público. E a vítima? A vítima primária sempre será a Administração em geral, podendo com ela concorrer o particular. Mas o particular será vítima secundária. E quem é funcionário público para fins penais? O que é funcionário público? O que o direito administrativo responde qual o conceito de servidor público? Há administrativistas que dão à expressão um conceito amplo, outros dão um conceito restrito. E tem outros administrativistas que não sabem se vai ser amplo ou restrito. O direito penal não pode ficar ao sabor dessa discussão porque é norteado pelo princípio da taxatividade. Então, o direito penal tem um conceito de funcionários públicos para fins penais. Daí nasceu o art. 327: Funcionário Público Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. § 1º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. § 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. O art. 327 traz um caso de interpretação autêntica ou literal ou legislativa. O direito penal precisou interpretar o conceito de funcionário público para obedecer o princípio da taxatividade ou mandado de certeza. Então, vamos interpretar o art. 327. 1.1. Funcionário Público Típico ou Propriamente Dito (caput) Ele começa a enunciar no caput o chamado funcionário público típico ou propriamente dito. Para o direito penal, quem é funcionário público ou propriamente dito? É quem exerce cargo, quem exerce emprego e quem exerce função pública, ainda que transitoriamente ou sem remuneração.  Quem exerce cargo? O famoso estatutário.  Quem exerce emprego? O celetista da Administração.  Quem exerce uma função pública? Você pode exercer uma função pública sem ter cargo, sem ter emprego público. A função pública é o exercício de um dever para com a Administração pública. Exemplo de função pública transitória e sem remuneração: jurado e mesário. Isso não cai mais em concurso de tanto que já perguntaram. Função pública vs. Encargo público - O que cai agora? O antigo síndico de falência, atual administrador judicial. Vai cair isso e só vocês vão acertar. O administrador judicial da falência solicita vantagem de um credor. Ele praticou crime contra a Administração Pública? Questão boa! Vocês não podem confundir função pública com encargo público, múnus público. Aqui, é prestação de favor. O administrador judicial não é funcionário público para fins penais porque não tem função pública. Ele tem encargo público. Administrador judicial. Cuidado. Nélson Hungria há tempos alertava isso. O administrador judicial, antigo síndico da falência, não pratica crime funcional porque já há um rol de crimes que podem ser praticados por ele na própria Lei de Falência. Então, cuidado! Também exercem encargo público o inventariante dativo. Se ele se apropria de bens do monte da herança, pratica apropriação indébita, não peculato-apropriação. Também exerce encargo público o tutor dativo. Também exerce encargo público o curador dativo. Reparem que esses quatro casos despencam em concurso e o candidato que não percebe a diferença Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 de função pública para encargo público vai achar que são funcionários públicos para fins penais. Advogado dativo – E o advogado dativo? Ele é funcionário público para fins penais ou exerce mero encargo público? O advogado dativo se apropriou do dinheiro do seu cliente assistido. É apropriação indébita ou peculato-apropriação? Prevalece, inclusive, no STJ que o advogado dativo é funcionário público para fins penais. Primeiro porque está fazendo as vezes da Defensoria Pública, depois age diante de um convênio com o Estado e terceiro, ele recebe do Estado para fazer isso. Estagiário é funcionário público? Estagiário do MP, da Defensoria, etc. Caiu isso em concurso. Sim. Estagiário é funcionário público para fins penais. 1.2. Funcionário Público Atípico ou Por Equiparação (art. 327, § 1º) O art. 327, § 1º, traz o funcionário público atípico ou por equiparação. § 1º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. (Alterado pela L-009.983-2000) Até o advento da Lei 9.983/00 o § 1º era constituído da redação grifada. Por que em 2000 mudou? Por que em 2000 acrescentaram os que trabalham para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública? Se você respondeu privatização, errou, porque na privatização você transfere tudo para o particular: o serviço e o patrimônio. O Estado abre mão do serviço e do patrimônio. O que está em cinza se preocupou com a política de desestatização e é diferente de privatização. Você transfere o serviço, mas o patrimônio continua do Estado. Estou sendo bem simplista. Na desestatização você transfere a exploração do serviço, a concessão do serviço, objeto da desestatização. O patrimônio continua a lhe pertencer. Tanto é que quando acaba o contrato de concessão, a Administração volta a explorar o serviço com todas as benfeitorias realizadas pela concessionária. O que está em cinza é uma preocupação com a famosa política da desestatização. As famosas concessões das rodovias, etc. Quem é funcionário publico atípico é quem exerce cargo, emprego, função em:    Entidade paraestatal Empresa prestadora de serviço contratada Empresa prestadora de serviço conveniada Não será qualquer empresa prestadora contratada ou conveniada pela Administração e sim aquelas que buscam executar atividade típica da Administração Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 pública. Somente aquelas para as atividades típicas da Administração. Os funcionários das empresas que foram contratadas para finalidades atípicas da Administração não são considerados funcionários públicos para fins penais. O governo contratou um buffet. Isso não é atividade típica. Os funcionários do buffet não são funcionários públicos para fins penais. Na cidade que eu trabalhei a Santa Casa ia fechar. Chamei o prefeito: por que a prefeitura não faz um convênio com a Santa Casa? Isso significa injetar dinheiro público na Santa Casa e nomear um gestor. No dia que saiu o convênio, eu mandei uma informação para a Santa Casa dizendo: “a partir de agora, vocês, funcionários da Santa Casa, são funcionários públicos para fins penais. Você que levava para casa um remedinho e achava que estava praticando um mero furto, agora você pratica peculato-furto. Você, atendente que não fazia porra nenhuma, não era crime, agora é prevaricação.” Isso porque a partir do convênio os funcionários da Santa Casa passaram a ser funcionários públicos para fins penais. Causa de aumento de pena O § 2º, do art. 327 traz majorante de pena, causa de aumento de pena: § 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. Aumenta-se a pena de 1/3 quando o agente, sujeito ativo de crime funcional, exercer:    Cargo em comissão Função de direção Assessoramento Em: o o o o Órgão da Administração Direta Sociedade de Economia Mista Empresa Pública Fundação instituída pelo Poder Público E esse aumento 1/3 ajuda porque pode salvar o crime da prescrição, já que as penas são tão pequenas (quase tudo prescreve). O legislador esqueceu de alguma coisa. O quê? Da autarquia. O legislador se esqueceu da autarquia, você não pode lembrar porque isso é analogia in malam partem. Tem que pedir para o Congresso retificar. Não dá para fazer isso na prática. Eu sei que a fundação instituída pelo Poder Público é uma espécie de autarquia, mas não de todas. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Presidente/Governador/Prefeito exercem função de direção de órgão da Administração Direta? Tem como o Presidente da República corrupto, o Governador de Estado e DF corrupto e prefeitos corruptos escaparem desse aumento? Vocês conseguem imaginar na corrupção de um Presidente, Governador ou Prefeito surgir esse aumento? Eu posso dizer que essas pessoas exercem função de direção de órgão da administração direta? Isso é o que diz o Supremo por 6 votos a 5. O STF, por 6 votos a 5 decidiu que Presidente, Governadores e Prefeitos sempre respondem com aumento porque exercem função de direção em órgão da Administração direta. Sabe por que nasceu essa tese? Para evitar a prescrição do escândalo do BANPARÁ, do ex-governador Jader Barbalho. Já estava prescrito. Se não configurasse o aumento de 1/3 o Supremo não ia poder receber a denúncia porque já estava prescrito e não era da pena em perspectiva. Era a prescrição da pretensão punitiva em abstrato. O fato aconteceu em 1994 e em 2005 o Supremo não havia recebido ainda a denúncia. Considerando aumento de 1/3 o Supremo evitou a prescrição. E isso foi apertado. 6 a 5. Os cinco que perdera, diziam que o Presidente/Governador/Prefeito não exercem função de direção de órgão na Administração. Ele é a própria Administração rodeada dos seus órgãos. Acusaram os demais de fazer um contorcionismo jurídico para evitar a prescrição. A tese deles é a de que o Governador presenta a Administração que é rodeada de órgãos. O Presidente da República presenta a Administração Direta que é rodeada de órgãos. Assim como o prefeito. Mais do que representam, eles são presentantes. Mas a tese que venceu no Supremo é a de que sempre sofrerão aumento porque exercem, sim, função de direção de órgão. Funcionário da ECT é funcionário publico para fins penais? Tenho certeza que vai cair isso. A ECT tem sido alvo de alguns escândalos desde o Mensalão. Funcionários da ECT são funcionários públicos para fins penais? Os funcionários da ECT são servidores públicos. Você não pode confundi-los com os funcionários das franquias do correio. A doutrina majoritária entende que os funcionários das franquias não são servidores públicos para fins penais. Isso caiu para delegado no RS. Ele falava de um carteiro que abriu uma correspondência e subtraiu o que estava no seu interior. Se ele fosse funcionário direto da ECT, ele praticou peculato-furto. Se ele era funcionário da franquia ele praticou furto. Cuidado! Tanto é que os crimes que envolvem a ECT são da competência da justiça federal. Já os crimes que envolvem as franquias, competência da justiça estadual. Houve um roubo ao correio! Qual correio? À ECT ou a alguns de seus órgãos espalhados pelo Brasil? Competência da justiça federal. Houve roubo ao correio, franquia, a competência é da justiça estadual. Os crimes funcionais se dividem em: Os crimes funcionais próprios não se confundem com os crimes funcionais impróprios.  Crime funcional próprio – Faltando a qualidade de servidor do agente, o fato passa a ser um indiferente penal. É hipótese de atipicidade absoluta. Se você retirar a roupagem de servidor, não pratica crime funcional. Exemplo: prevaricação. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  Crime funcional impróprio – Faltando a qualidade de servidor do agente, o fato deixa de configurar crime funcional, ajustando-se ao crime comum. É hipótese de atipicidade relativa. Exemplo: peculato-apropriação, que passa a ser apropriação indébita; o peculato-furto, que passa a ser furto; a concussão, que passa a ser extorsão, etc. É o que mais tem. Mas a tendência dos concursos públicos é a dissertação explorar direito penal parte especial. E esse crime contra Administração Pública é o crime da moda. 2. PECULATO – Art. 312 O crime de peculato admite 6 modalidades:       Peculato-apropriação – Art. 312, caput, 1ª parte Peculato-desvio – Art. 312, caput, 2ª parte Peculato-furto – Art. 312, § 1º Peculato culposo – Art. 312, § 2º Peculato-estelionato – Art. 313 Peculato eletrônico – Art. 313, A e B. O examinador, na prova, vai perguntar: o peculato é próprio ou impróprio? Aí o candidato que conhece os tipos de peculato vai dizer que peculato próprio e peculato impróprio não existe. Peculato próprio ou propriamente dito – É o gênero do qual são espécies o peculato-apropriação e o peculato-desvio. Esse é o peculato próprio ou propriamente dito. O peculato do caput é o próprio. Se o probleminha retrata um peculatoapropriação ou peculato-desvio é o peculato próprio ou propriamente dito. Peculato impróprio – É sinônimo de peculato-furto. Cuidado com isso! Veja se o examinador trouxe no problema o peculato do caput, que tem como sinônimo o peculato próprio ou se ele trouxe o peculato do § 1º, que tem como sinônimo peculato impróprio. Agora, vamos analisar cada uma dessas figuras. Vamos, na aula de hoje, destruir o peculato. 2.1. PECULATO PRÓPRIO (peculato-apropriação e peculato-desvio) – Art. 312, caput Peculato Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviálo, em proveito próprio ou alheio: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. Sujeito Ativo O sujeito ativo do peculato-apropriação e do peculato-furto é o funcionário público no sentido amplo do art. 327, do CP. Ao invés de responder funcionário público, responda funcionário público em sentido amplo (do art. 3127) Coautoria e Participação - Exige qualidade especial do sujeito ativo. É, portanto, um delito próprio. Admite coautoria e participação? Sim, sem dúvida. Mas tomem cuidado. Olha o problema que vai cair na sua prova: A é funcionário público para fins penais. B é o particular. A se apropria de bens públicos, B induz A a se apropriar de bens públicos. A induzido por B se apropriou de bens públicos. Que crime pratica A? Pratica peculato. E B? Depende. Se B tinha conhecimento da qualidade funcional de A, também responde por peculato na condição de partícipe. Agora, se B não tinha conhecimento, aí B praticou apropriação indébita. Cuidado na prova! Veja se B tinha conhecimento da qualidade funcional de A. Se tinha, é partícipe. Caso contrário, pratica apropriação indébita. Você tem que explorar isso na prova. Prefeito como sujeito ativo - Sempre que se falar em prefeito, antes de ir para o Código Penal, você tem que ir para o DL 201/67. O Código Penal, nesse caso, é norma geral e o DL 201/67, como norma especial. Então, sempre que se falar em prefeito, você primeiro analisa se o crime está no DL 201/67. Somente se não estiver na norma especial é que você pode se socorrer da norma geral. Cuidado! Se você se deparou com a palavra “prefeito”, a primeira coisa que você vai fazer é analisar se o comportamento dele se ajusta ao decreto-lei. Somente na hipótese de não se ajustar ao DL 201/67 é que você vai para o Código Penal. Diretor de sindicato que desvia dinheiro do sindicato pratica peculato? Para responder a essa pergunta, você tem que decidir se o diretor do sindicato é funcionário público ou não. O fato de ser diretor de sindicato torna alguém funcionário público? Você sabe que é perfeitamente possível o funcionário público ser diretor de sindicato. Mas aí ele já era funcionário público. Eu quero saber se o fato de alguém ser diretor de sindicato o torna funcionário público. Diretor do Sindicato dos Animadores Circenses. O palhaço é diretor do sindicato. Ele desviou dinheiro do sindicato. Praticou peculato? Diretor de sindicato exerce cargo, emprego ou função pública? Não. Ele é funcionário equiparado? O sindicato é entidade paraestatal? Não. O sindicato é contratado pela Administração? Não. É entidade conveniada? Não. Se ele não é funcionário público nem típico e nem atípico, pratica peculato? Pratica! Mas como?? É o art. 552, desse documento importantíssimo, que é a CLT, diz o seguinte (foi o único artigo que abri na minha vida): Art. 552 - Os atos que importem em malversação ou dilapidação do patrimônio das associações ou entidades sindicais ficam equiparados ao crime de peculato Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 julgado e punido na conformidade da legislação penal. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 925, de 10.10.1969) O que esse artigo fez? Não equiparou a pessoa. Equiparou o fato. A equiparação não foi subjetiva, mas objetiva. O art. 552, da CLT está anunciando o seguinte: eu sei que o diretor do sindicato não é funcionário público, mas o fato que ele praticou é equiparado “a” e deve ser julgado “como”. Então, o art. 552, da CLT, não fez uma equiparação subjetiva. O que ele fez foi trabalhar com uma equiparação objetiva, do fato. Esse artigo tem uma redação dada pelo DL 925/69. O que vocês acham dessa redação? Época da ditadura. Essa redação está bem na época da ditadura, em que eles queriam o sindicato na sua mão. E o que fez a Constituição de 1988 com o sindicato? “Veda-se qualquer ingerência estatal nas entidades sindicais.” Então, questiona-se: o art. 552 foi recepcionado pela CF/88? A maioria da doutrina e da jurisprudência entende que esse artigo não foi recepcionado pela Constituição Federal. Entende que ele retrata uma ingerência estatal nas entidades sindicais, vedada pela CF/88. Então, para a maioria, o art. 552 não foi recepcionado. Sabe quem diz isso? Sérgio Pinto Martins. E é a posição também do TRF da 4ª Região. Olha o detalhe: STJ discorda. As últimas decisões do STJ são no sentido de que o art. 552 foi recepcionado pela Constituição Federal. O MP/SP denunciou diretores de sindicato do Estado por malversação do dinheiro e denunciou por peculato. Chegou no STJ, o STJ confirmou a recepção do art. 552 pela Constituição Federal. Foi recepcionado, sim. No STJ isso é tranquilo. Sujeito Passivo O sujeito passivo é a Administração em geral. É o Estado-Administração. Observação: podendo com ela concorrer o particular lesado pela ação do agente. a) Peculato-Apropriação Vamos analisar o comportamento criminoso do art. 312, caput, que terá que ser dividido em duas partes: Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviálo, em proveito próprio ou alheio: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.   1ª Parte – Peculato-apropriação 2ª Parte – Peculato-desvio Isso, só no Brasil mesmo, porque é absurdo você dividir peculato apropriação de peculato desvio. É a mesma coisa! Se você se apropria está desviando. Se você está Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 desviando é porque se apropriou. Só o Brasil consegue enxergar dois crimes distintos. Sofre, inclusive, a crítica da doutrina. Elementos do peculato-apropriação: Apropriar-se o funcionário público – O que significa “apropriar-se”? Inverter a posse, agindo arbitrariamente, como se dono fosse. E esse funcionário público se apropria de Dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel – Eu falei em bem móvel. Você já sabe que para o direito penal móvel não é o móvel do direito civil. Para o direito penal, móvel é o que pode ser transportado de um local para o outro sem perder a identidade. Cuidado que não corresponde ao conceito do direito civil. Público ou particular – Reparem que também há o crime quando o funcionário se apropria de coisa particular em poder da Administração. E quando se apropriar de coisa particular, o proprietário figura como vítima secundária. Cuidado! Tem gente que acha que peculato é só se apropriar de coisa pública. Pode ser bem móvel público ou particular. De que tem a posse – A posse é pressuposto do crime. Isso abrange a mera detenção? Apropriar-se o funcionário de bem de que tem a mera detenção também configura peculato-apropriação? Isso já foi pergunta de prova. O legislador quando usou a palavra “posse” o fez no sentido técnico, diferenciando da mera detenção ou não? Ou utilizou no seu sentido vultar, abrangendo, inclusive, a mera detenção? Anotem: A expressão “posse” abrange a “mera detenção” (TRF 1ª Região)? 1ª Corrente: Não abrange a mera detenção. Quando o legislador quer (exemplo: art. 168, do CP: abranger a detenção, ele o faz expressamente “Apropriação Indébita - Art. 168 - Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção:”). O art. 168, é claro, ao diferenciar posse de detenção. Se o art. 312 não falou em detenção é porque não quer abranger detenção. Conclusão: exercer mera detenção em domínio configura peculato-furto. 2ª Corrente: A expressão “posse” abrange a mera detenção, tendo o legislador redigido o artigo sem preocupação técnica. A posse aí abrange a posse ordinária e a posse precária (mera detenção). Para essa corrente, inverter a mera detenção Conclusão: exercer mera em domínio também configura peculato-apropriação. detenção em domínio configura peculato-apropriação. A do STJ é a primeira corrente. Era essa que o examinador queria. Eu não falei do STJ porque o STF ainda não tem posição sedimentada sobre o assunto. Em razão do cargo – Isso significa o quê? É imprescindível o nexo funcional. Isso significa que a posse da coisa tem que estar entre as atribuições do agente no cargo, Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 emprego ou função. Não se confunde com a expressão “por ocasião do cargo” (e é nisso que o examinador vai querer te pegar). Não basta uma posse por ocasião do cargo, que é um mero nexo temporal. Tem que ser uma posse em razão do cargo, em razão do vínculo funcional. Cuidado! Se não você não vai perceber que ele mudou o nexo funcional para mero nexo temporal. Para si ou para outrem – E ele assim age para si ou para outrem. Se perguntarem sobre peculato-apropriação, você tem todos os seus elementos. Não tem como errar. b) Peculato-Desvio Qual é a diferença do peculato-desvio para o peculato-apropriação? A única diferença é que na apropriação ele se apropria e no desvio ele desvia. O resto é tudo igual. Eu só vou mudar o primeiro elemento. O peculato-desvio só difere no primeiro elemento. Se o peculato-apropriação é apropriar-se, o peculato-desvio é desviar o funcionário público dinheiro, valor ou qualquer bem móvel, público ou particular, de que tenha a posse em razão do cargo para si ou para outrem. Ao invés de apropriarse, ele desvia, isso é, ele dá uma destinação diversa da que prevista em lei. Ele dá à coisa uma destinação diversa da prevista em lei, infringindo a lei. Só isso. Não tem sentido diferenciar esses dois tipos de peculato. Elemento subjetivo O crime peculato próprio é punido a título de dolo. Basta o dolo? Não. É um dolo + finalidade especial, qual seja, “para si ou para outrem”. É imprescindível o animus de apoderamento definitivo. E aí vem a pergunta de concurso: e se ele age com animus de uso, é crime? Eu vou dar um caso hipotético. Se você conhece algo parecido, é triste coincidência. Quando o caso é real, eu falo. Vamos imaginar um famoso legista da UNICAMP. Ele levou para o seu consultório particular (consultório de legista. Já pensou? “hoje vou consultar o meu legista”) um aparelho de última geração da universidade para aplicar nas suas pesquisas. Levou, usou duas semanas e devolveu. Pergunto: praticou crime? Ele só usou o aparelho e devolveu para a universidade. Ele praticou peculato? Olha que interessante: você tem que diferenciar a coisa consumível da coisa não consumível. A doutrina penal falando em fungível e não fungível e confunde tudo.  Se a coisa for consumível (se consome com o uso), você jamais vai restituí-la ao status quo ante. Aí você tem crime + ato de improbidade.  Se a coisa for não consumível, é ato de improbidade administrativa. Eu acabo de provar que todo crime gera ato de improbidade, mas nem todo ato de improbidade corresponde a crime. Exemplo: peculato de uso. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Observação: mão-de-obra não é coisa, é serviço!! Não existe peculato de mão-de-obra. Cezar Roberto Bittencourt alerta isso. Caso verídico – Eu era promotor em Santa Rosa de Viterbo e por conta de uma ausência de promotor na comarca vizinha eu estava acumulando as funções. Um dia veio de lá o oficial de justiça e me contou que viu máquinas da prefeitura cavando uma piscina na chácara da prefeita. Eu fui lá ver aquilo. Quando cheguei, até vi o carro do oficial. Ele estava em cima da árvore observando e me chamou para subir. E eu: “você sobe, você tira foto e você desce para me mostrar.” Ele fez exatamente isso. Tirou as fotos, desceu. Na hora que eu vi as fotos, as máquinas estavam lá. Eu mandei chamar o comandante da PM para entrar na chácara. Entrei, fui recebido pela prefeita e dei voz de prisão por peculato. O comandante da PM até prendeu. O prefeito tem competência especial. Até liguei para vir um procurador de justiça acompanhar o flagrante. No caminho da delegacia, o oficial vira pra mim e fala assim: “Ô doutor, o Sr. prendeu em flagrante por peculato, mas ela não estava somente usando? Máquina da prefeitura é bem consumível ou não consumível? E, doutor, se é não consumível, não tem crime! O Sr. prendeu em flagrante por quê?” Cheguei na delegacia e o delegado já estava pronto pra lavrar o flagrante. Eu expliquei e ele disse pra gente arrumar um crime ambiental. Só que no DL 201/67, art. 1º, II, o peculato pode ser, inclusive, de uso: Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: II - utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos; Vejam que no caso de prefeito, o uso é sempre crime, não importa se o bem é consumível ou não consumível. E mais: para prefeito é crime até mesmo o uso de mãode-obra! Até mesmo uso de serviços públicos. Foi pergunta do TRF da 3ª Região: explique o peculato de uso, inclusive no caso de prefeitos. Para o prefeito o uso é sempre crime, não importando se a coisa é consumível ou não consumível. É crime, inclusive, o uso de mão-de-obra. Não se esqueçam disso, para não sentirem o frio que eu senti. Consumação e Tentativa Quando o crime se consuma? Vamos dividir a consumação para o peculatoapropriação e para o peculato-desvio. Peculato-apropriação – Tem gente que diz que se consuma quando o agente inverte o animus de possuidor para proprietário. E como você vai saber isso? Vai entrar na cabeça dele? Então, o melhor é responder que no peculato-apropriação o crime se consuma no momento em que o agente passa a exteriorizar poderes de proprietário: aliena, aluga, destrói, etc. Vocês estão lembrados no direito real, quais são os poderes de domínio. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Peculato-desvio – Se consuma no momento em que ele dá à coisa destinação diversa da prevista em lei. Ambas as modalidades admitem tentativa. Princípio da Insignificância É possível princípio da insignificância no peculato? 1ª Corrente – “Tratando-se de crime contra a moralidade administrativa, é Mais do que com o patrimônio, eu estou inaplicável o princípio da insignificância. preocupado com a moralidade administrativa, logo, inaplicável o princípio da insignificância. Essa primeira corrente é do STJ. 2ª Corrente – “Sendo o princípio da insignificância um vetor de aplicação geral no direito penal, é cabível nos crimes contra a Administração Pública (regra).” Isso tem que ser interpretado como regra porque a própria segunda corrente admite que há casos em que o princípio da insignificância é inaplicável. Essa segunda corrente é a do STF. 315) Diferença entre o peculato desvio e o delito de emprego irregular de verba (art. Emprego Irregular de Verbas ou Rendas Públicas Art. 315 - Dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) meses, ou multa. O que dá às verbas públicas dolosamente aplicação diversa da estabelecida em lei, detenção de 1 a 3 meses. É mais grave você arranhar sua vizinha (3 meses a 1 ano). E qual é a diferença do peculato-desvio para esse crime? Vamos diferenciar o art. 312 do art. 315. No art. 312, você tem um desvio. No art. 315 você também tem um desvio. Até aqui, não há diferença. A diferença nasce quando você percebe que no art. 312 o desvio visa satisfazer interesses particulares, seja do agente, seja de outrem. Já no art. 315, o desvio continua atendendo o interesse público. Ele desvia dolosamente a verba da educação para a saúde. Antes ele desviasse só pensando nisso. No art. 312 ele desvia para o seu banco ou para o banco de alguém. Claro que ele pode alegar estado de necessidade. Vamos imaginar as calamidades que tomaram o Sul do País com as chuvas. Se ele desviasse verba da educação e da saúde para atender as famílias desabrigadas, é possível alegar estado de necessidade. Se o desvio acontecer para salvar a população de um perigo atual, ele pode alegar estado de necessidade. 2.2. PECULATO IMPRÓPRIO ou PECULATO-FURTO – Art. 312, § 1º Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 § 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário. Sujeito Ativo – Funcionário público no sentido amplo do art. 327, do CP. Sujeito Passivo – Administração Pública, podendo com ela concorrer o particular lesado pelo crime. No peculato-apropriação ou desvio vocês viram que o agente tem posse e, por ter posse legítima, apropria-se ou desvia. Já no peculato-furto, ele não tem posse e por não ter posse, ele tem que subtrair ou facilitar a subtração por alguém. No peculato próprio ele tem a posse. O que ele faz com ela? Ele inverte, se apropriando ou desviando. No peculato-furto, exatamente por não ter posse é que ele tem que subtrair a coisa ou facilitar a sua obtenção. ´ Por isso que no caput, o peculato é chamado de próprio e aqui ele é chamado de impróprio, porque ele não tem posse. Ele tem que subtrair a coisa. Não vai ficar pensando que qualquer subtração do funcionário público para com a Administração é peculato-furto. O § 1º diz que só haverá peculato-furto se o agente “valer-se da facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário público.” Se ele não tem facilidade alguma, é furto comum. Quando estudamos furto, eu fiz o seguinte esquema: se você tem uma subtração facilitada pelo cargo, é o peculato-furto. Mas se a subtração é não facilitada pelo cargo, isso é furto comum. Não se esqueça disso! Não fique pensando que toda subtração de funcionário público para com a Administração gera peculato-furto. Não! A subtração, para gerar peculato-furto, tem que ser facilitada pelo cargo. É isso que você vai ter que descobrir na hora da prova. Tipo Subjetivo – O crime é punido a título de dolo, exigindo apoderamento definitivo. Consumação – É só você lembrar do que falamos no furto. Tudo o que falamos no furto se aplica ao peculato-furto. 2.3. PECULATO CULPOSO – Art. 312, § 2º Peculato Culposo § 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem: Pena detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.  É o ÚNICO crime culposo da espécie dos delitos funcionais. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  É o ÚNICO crime de menor potencial ofensivo entre os delitos funcionais. Sujeito Ativo – O funcionário público, no sentido amplo do art. 327, do CP. Sujeito Passivo – Administração em geral, lembrando que com ela pode concorrer o particular lesado. Tipo Objetivo – O que estou punindo no art. 312, § 2º? “Concorrer culposamente para o crime de outrem.” Isso é o que se pune. O funcionário público, com a sua negligência, concorreu para o crime de outrem. Foi a negligência dele que permitiu o crime de outrem. Olha o que vai cair: qual crime de outrem? Qualquer crime de outrem? Ou apenas algumas modalidades de crime? 1ª Corrente – O § 2º merece uma interpretação topográfica. Então, esse crime de outrem só pode ser o do §1º, só pode ser o do caput. Então, só existe crime quando ele concorre culposamente para um peculato-furto ou peculato próprio. É a que prevalece. Prevalece essa corrente, que é a restritiva. 2ª Corrente – Ela diz que não, que apesar de o § 2º estar no art. 312, a expressão “crime” não restringe espécies de infração penal. Logo, abrange qualquer crime, inclusive o furto. Rui Stocco adota essa corrente e ele tem razão, pois a lei não diferencia. Consumação – É claro que o crime é punido a título de culpa e consuma-se o crime com a consumação do crime de outrem. Consuma-se o peculato culposo com a consumação do crime de outrem. Por que esse funcionário público não responde como coautor ou partícipe nesse crime de outrem? Porque não existe homogeneidade de elementos subjetivos. Não existe participação culposa em crime doloso. Para tanto, tem que haver homogeneidade de elementos subjetivos. Cada um responde pelo seu crime. O crime de outrem tem uma punição independente e o funcionário negligente, a punição pelo peculato culposo. Tentativa – Admite tentativa? Claro que não! É crime culposo e, cuidado, crime culposo não admite tentativa! O § 3º se aplica, única e exclusivamente, ao peculato culposo: § 3º - No caso do parágrafo anterior (de peculato culposo), a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta. São benefícios exclusivos do peculato culposo, não podendo ser estendidos ao peculato doloso. O § 3º, em apertada síntese, diz o seguinte: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  Se a reparação ocorrer antes da sentença irrecorrível, extingue a punibilidade.  Se a reparação ocorrer depois da sentença irrecorrível, diminui a pena de metade. Vejam que entre o benefício da extinção da punibilidade e a simples diminuição de pena há um divisor de águas: sentença irrecorrível. Na sua prova, o examinador vai colocar sentença recorrível. Ou ele vai colocar denúncia ou recebimento de denúncia. Mas ele tem até a sentença irrecorrível para reparar o dano. Não pode estender para o peculato doloso! É benefício exclusivo do peculato culposo! Observação: A diminuição da pena depois da sentença irrecorrível é aplicada pelo juiz da execução. 2.4. PECULATO-ESTELIONATO – Art. 313, § 2º Peculato Mediante Erro de Outrem Art. 313 - Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. Sujeito Ativo – O funcionário público, no sentido amplo do art. 327, do CP. Sujeito Passivo – Administração em geral, podendo com ela concorrer o particular lesado. Tipo Objetivo – O tipo objetivo diz “apropriar-se de coisa recebida por erro de outrem.” Vocês não podem confundir o art. 312 com o art. 312, § 1º e o art. 313. O art. 312 fala em “apropriar-se” o art. 312, § 1º fala em “subtrair” e o art. 313 volta a falar em “apropriar-se”. Se a gente parasse aqui, ficaria difícil diferenciar o art. 312 do art. 313. No art. 312, o sujeito ativo tem uma posse, por isso ele se apropria. No art. 312, § 1º, ele não tem posse. Por isso, ele subtrai. No art. 313 ele tem posse, por isso se apropria. A diferença: no art. 312, a posse que ele tem é legítima em razão do cargo. Já no art. 313, a posse que ele tem é ilegítima. Se o examinador utilizou a palavra “subtrair”, ele facilitou a sua vida. Trata do art. 312, § 1º. Se ele utilizou a expressão “apropriou-se”, aí você poderá estar diante do 312 ou do 313. Qual a diferença? É que no 312 a posse que ele tinha era legítima. No art. 313, é ilegítima. Alguém entregou aquilo para ele enganado. Detalhe importante: para configurar o art. 313, o erro tem que ser espontâneo. Se o erro foi provocado pelo servidor, se o terceiro errou provocado pelo funcionário público, aí você tem estelionato. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 O crime é punido a título de dolo, isto é, quando percebe o erro, o funcionário público não o desfaz, apropriando-se da coisa. O dolo é querer apropriar-se daquilo que você sabe que está na sua posse fruto de erro. Consumação – O crime se consuma no momento em que o agente, percebendo o erro, não o desfaz, agindo como se dono fosse. O crime não se consuma quando ele recebe a coisa, mas quando ele percebe o erro e não o desfaz, agindo como se dono fosse. 2.5. PECULATO ELETRÔNICO – Arts. 313-A e 313-B Inserção de Dados Falsos em Sistema de Informações Art. 313-A - Inserir ou facilitará o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: (Acrescentado pela L-009.983-2000) Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. Modificação ou Alteração não Autorizada de Sistema de Informações Art. 313-B - Modificar ou alterar, o funcionário, Sistema de informações ou programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente: (Acrescentado pela L-009.983-2000) Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou para o administrado. Esses dois crimes novos têm a redação muito semelhante. Vamos fazer um quadro comparativo entre esses dois delitos e você nunca mais vai esquecer a diferença entre esses dois delitos. a) Art. 313-A Para que você possa entender com segurança esse crime, vou, antes de mais nada, revelar um exemplo porque toda a explicação vai ser feita em cima do exemplo. Vamos imaginar um funcionário do departamento de trânsito, único autorizado a entrar no sistema de informações e incluir as pontuações decorrentes de multa. Ele é o único funcionário autorizado a entrar no departamento informatizado do Detran e incluir pontuações decorrentes de multa ou então alterar e incluir pontuações de multas canceladas. Esse funcionário entra no sistema de informações e exclui pontuações de amigos e inclui a pontuação para inimigos. Entenderam o crime? Sujeito Ativo – Somente o funcionário público autorizado a manejar o sistema de informática da Administração Pública. Então, já não é mais um funcionário em sentido amplo do art. 327. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Sujeito Passivo – Administração em geral, podendo com ela concorrer o particular prejudicado pelo comportamento do agente. Conduta punida – O que pune o art. 313-A? Inserir ou facilitar a inserção de dados falsos ou excluir ou alterar dados corretos dos sistemas de informação. Objeto material - O comportamento criminoso recai sobre dados do sistema. Eis o objeto material. A conduta do agente recai sobre os dados do sistema. O funcionário quando entra no sistema ele insere ou exclui um dado constante desse sistema. Ele insere pontuação do inimigo ou exclui a pontuação do amigo. Para os que têm dificuldade em informática: é preciso separar o sistema e os dados constantes do sistema. No comportamento do art. 313-A, o sujeito ativo preserva o sistema, o software. A conduta dele não recai no sistema, mas sobre os dados constantes do sistema. Ele preserva o sistema e age sobre os dados que o sistema armazena. Elemento Subjetivo – O crime é punido a título de culpa? Não! Ele só é punido a título de dolo. Mas não basta o dolo. É o dolo com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano. É o dolo acrescido de finalidade especial, elemento subjetivo. Então, o crime é punido a título de dolo, mais finalidade especial, que é exatamente o locupletamento ou o dano, prejuízo a alguém. Significa o quê? Que o promotor, na denúncia, tem que descrever o dolo especial que animou o agente. Se ofereceu denúncia com base no art. 313-A e não explicou no que consistiu a finalidade especial que animou o agente, a denúncia é inepta. Sem essa finalidade especial, o fato é atípico. Consumação e Tentativa – Quando o crime se consuma? Estamos diante de um crime material, formal ou de mera conduta? Rui Stocco diz que o crime é de mera conduta, que é aquele cujo tipo penal só descreve conduta, não descreve resultado naturalístico. “com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano” é ou não é resultado naturalístico? É. Então, não pode ser de mera conduta. Mas é um resultado naturalístico dispensável. Como chama o crime que tem resultado naturalístico mas ele é dispensável? É o crime formal. O crime é formal, significando que se consuma com a prática dos núcleos, dispensando o resultado naturalístico. Aliás, ocorrendo o resultado naturalístico, o que acontece? Mero exaurimento. Estamos diante de um crime formal e admite tentativa. b) Art. 313-B O que pune o art. 313-B? Art. 313-B - Modificar ou alterar, o funcionário, Sistema de informações ou programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou para o administrado. Há várias diferenças: Sujeito ativo – Já não é mais o funcionário público autorizado, mas sim, o funcionário público no sentido amplo, do art. 327, do CP. Se o Art. 313-A pune o funcionário público autorizado, o art. 313-B pune o funcionário público. Sujeito passivo – É o mesmo: Administração em geral, podendo com ela concorrer o particular prejudicado pelo comportamento do agente, como vítima secundária. Conduta punida – Modificar ou alterar o próprio sistema ou programa. Objeto Material - Mudou o objeto material. Lá eu estava preocupado com os dados constantes do sistema. Aqui, estou preocupado com o sistema que armazena os dados, o próprio software. No art. 313-A, o comportamento recai sobre os dados que o sistema armazena. Já o art. 313-B altera o próprio sistema. O art. 313-A se assemelha muito à falsidade ideológica, porque o documento virtual não é alterado. O que é alterado é a ideia constante do sistema. Já o art. 313-B se equipara à falsidade material porque não é a ideia que é alterada, mas o documento que é falsificado. Então, o art. 313-A está para uma falsidade ideológica, assim como o art. 313-B está para uma falsidade material. Elemento Subjetivo - O art. 313-A punia o agente a título de dolo, mas não bastava o dolo. Era imprescindível a finalidade especial. E o art. 313-B exige alguma finalidade especial (tem alguma expressão como “a fim de”)? Não. O art. 313-B pune a título de dolo, pouco importando a finalidade especial do agente, não importando a finalidade que o levou a praticar tal comportamento típico. Consumação e Tentativa – Estamos diante de um crime formal, material ou de mera conduta? Se você ler o caput, vai achar que é de mera conduta. Só que tem um parágrafo único aumentando a pena se do comportamento resultar dano para a Administração Pública. Então, tem resultado naturalístico descrito, sim, só que está no § único. Mas é um resultado dispensável. Se ocorrer, gera aumento de pena. Como se chama esse crime? Formal. Estamos diante novamente de um crime formal que admite a tentativa. ART. 313-A Sujeito ativo: Funcionário público autorizado Sujeito Passivo – Administração em geral Conduta punida: Inserir ou facilitar a inserção de dados falsos ou corretos ART. 313-B Sujeito ativo: Funcionário público em geral Sujeito Passivo – Administração em geral Conduta punida: Modificar ou alterar o sistema ou programa Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Objeto material: dados constantes do sistema (comparável à falsidade ideológica) Elemento Subjetivo: Dolo + Finalidade Especial Crime formal, admite tentativa Pena: 2 a 12 anos Objeto material: o próprio sistema (software) (comparável à falsidade material) Elemento Subjetivo: Dolo Crime formal, admite tentativa Pena: 3 meses a 2 anos – (IMPO) Qual dos dois comportamentos é mais grave? Por que eu puno o art. 313-A com uma pena de 2 a 12 anos e o art. 313-B, com uma pena de 3 meses a 2 anos? O que o legislador acaba falando para o criminoso? “Não altere um dado. Fraude o sistema!” Faltou ao legislador razoabilidade, conhecimento técnico. Imagine alguém que altera o sistema e você nunca mais consegue acessar os dados. Pronto! Ele vai responder por uma infração de menor potencial ofensivo, agora, se ele excluir um dado está ferrado. Que crime pratica um funcionário não autorizado que altera dados do sistema? Eu, Rogério, promotor de justiça, sou funcionário público para fins penais. Entro no sistema informatizado do DETRAN e excluo uma pontuação da minha carteira. Eu não estou autorizado a entrar no programa. Eu entro no sistema e excluo a pontuação da minha carteira. Que crime eu pratiquei? Não foi o do art. 313-A porque não sou funcionário autorizado. Pratiquei o art. 313-B? Não, porque minha conduta não recaiu no sistema. Que crime pratiquei? A dica eu já dei: o art. 313-A exige funcionário público autorizado. Isso significa que funcionário público não autorizado é igual a particular. O art. 313-A exige funcionário autorizado e o não autorizado está na mesma vala do particular. Documento virtual não deixa de ser documento. Que crime pratica o particular que altera a ideia de documento público ou particular? Falsidade ideológica. Ora, o funcionário não autorizado que altera a ideia de um documento virtual também responde por falsidade ideológica. Que crime pratica o particular que altera a ideia de um documento verdadeiro? Falsidade ideológica. Terminamos o delito de peculato, na sua última modalidade, peculato eletrônico, vamos para o art. 316, concussão. 3. CONCUSSÃO – Arts. 313-A e 313-B Como se chama o sujeito ativo da concussão? Do homicídio, homicida; do estelionato, estelionatário; do furto, furtador; da extorsão, extorsionário e da concussão, concussionário. Às vezes na prova pode cair. Vamos ler juntos o art. 316. E vamos estudar só o caput. O art. 316 pune: Concussão Art. 316 - Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa. Tem doutrina que diz que a concussão nada mais é do que uma extorsão qualificada pela qualidade de servidor do agente. Eu não sei se concordo totalmente Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 com isso. Tem doutrina que critica essa analogia, porque um é crime contra o patrimônio e o outro não, mas ajuda! Pode-se dizer que o art. 316 pune uma extorsão qualificada pela qualidade funcional do agente. Sujeito Ativo – Na última aula, eu afirmei o seguinte: nos crimes funcionais, em regra, o sujeito ativo é funcionário público. Eu falei “em regra” e disse que havia uma exceção. E aqui está uma exceção de um crime que pode ser praticado só por particular e não precisa estar acompanhado de servidor. Olha o que diz o art. 316: “Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida” Então, particular que está na iminência de assumir função pública pode praticar concussão se agir em razão dela. Então, o sujeito ativo é o funcionário público no exercício da função, fora da função (de férias, de licença, suspenso); mas admite ser praticado por particular na iminência de assumir função pública. Quando eu digo na iminência (não é ter passado na primeira fase), é que faltam somente procedimentos meramente burocráticos (exame médico, a posse, a diplomação). Para você assumir fica faltando somente passar pelo exame médico, apenas a posse que até está com a data marcada, falta a diplomação, porque eleito você já foi. Eu costumo brincar com os alunos (isso é para guardar e não para colocar na prova!) dizendo que isso, nada mais é do que “carteirada com diário oficial”. É aquele que recorta o diário oficial com o seu nome e plastifica e já começa bem a vida pública. Cuidado com o princípio da especialidade! Se o sujeito ativo for fiscal de renda, a exigência da vantagem indevida não configura o art. 316. É o art. 3.º, II, da Lei 8.137/90: Art. 3° Constitui crime funcional contra a ordem tributária, além dos previstos no Decreto-Lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal (Título XI, Capítulo I): II - exigir, solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de iniciar seu exercício, mas em razão dela, vantagem indevida; ou aceitar promessa de tal vantagem, para deixar de lançar ou cobrar tributo ou contribuição social, ou cobrá-los parcialmente. Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. É a concussão e a Lei dos Crimes Contra a Ordem Tributária. Sabe qual é a pegadinha aqui? O caput fala em “crime funcional contra a ordem tributária”. Sabe o que significa? Que a concussão do Código Penal é crime contra a Administração Pública. A concussão, nessa lei, é crime contra a ordem tributária!! Essa é a pegadinha em concurso. Ele vai colocar: “qual dos crimes abaixo não é contra a Administração Pública”. É a concussão da Lei 8.137. Deixou de ser um crime funcional contra a Administração Pública para ser um crime funcional contra a ordem tributária. Isso repercute até com procedimento. Militar pratica concussão? Pratica! E qual é o crime? É o do Código Penal? Não. É o do art. 305, do CPM. Alguém vai fazer DPU? Vai cair CPM na DPU e vai cair o art. 305, que pune a concussão do militar. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Concussão Art. 305. Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida: Pena reclusão, de dois a oito anos. A pena é a mesma. “Então, Rogério, qual a diferença?” Muda a competência. Aqui, a competência é da justiça militar. É um crime militar impróprio. Competência da justiça militar. Sujeito passivo – Aqui há um sujeito passivo primário e um sujeito passivo secundário. O primário é a Administração em geral e o secundário é o particular constrangido pelo funcionário público. Quando eu digo “particular”, a doutrina entende que é perfeitamente possível concussão de funcionário público contra funcionário público. Imagine o funcionário público investigado numa sindicância e quem investiga exige vantagem para não prejudicá-lo. Quando eu falo “particular” abrange, inclusive, funcionário público. E é possível concussão entre funcionários públicos. Conduta punida – O que pune o art. 316? “Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida:” O art. 316 pune, antes de mais nada, o exigir. Exigir pressupõe ato coercitivo, intimidativo. Há doutrina, por exemplo, Fernando Capez, que não admite grave ameaça em violência. Violência, eu também concordo que não pode ser meio de execução. Mas a grave ameaça está sempre implícita no ato coercitivo e intimidativo. Tem doutrina que não admite na exigência grave ameaça e violência. Violência, eu concordo, agora, grave ameaça? A grave ameaça está implícita em qualquer ato coercitivo ou intimidativo. Mas tem doutrina que, na exigência, não admite grave ameaça ou violência, hipóteses que configurariam extorsão. Quanto à violência, eu concordo que não pode existir, agora, é claro que o funcionário público vai se valer dela para conseguir a vantagem indevida. Por isso, você não pode confundir exigir com solicitar. Solicitar é pedir e pedir configura corrupção. Reparem que o concussionário pode exigir, buscando vantagem para si ou vantagem para outrem. E o que caiu na última prova de procurador federal? “O para outrem pode ser inclusive para a própria administração”. Configura concussão exigir vantagem para si ou para outrem, ainda que esse outrem seja a própria Administração Publica. Há julgado na jurisprudência em que um delegado exigiu de empresários vantagem indevida para reformar a delegacia. Ele exigiu vantagem indevida para a própria Administração. E ele exige para si ou para outrem direta ou indiretamente – A exigência direta é a exigência pessoal. A indireta é por interposta pessoa que é coautora. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Então, o crime é “exigir para si ou para outrem, direta ou indiretamente”, não está no art. 316, mas eu vou colocar: exigir explícita ou implicitamente vantagem indevida– Explícita é a exigência clara. Quando falo implicitamente é a exigência velada, camuflada. Eu quero saber de vocês o seguinte: qual é a natureza dessa vantagem? Necessariamente econômica ou pode ter outra natureza? Prevalece que é qualquer natureza: patrimonial, econômica, sexual, moral, etc. E se essa vantagem for devida? Que crime configura “exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem devida”? Isso vai depender da vantagem. Se a vantagem for:   Seguro ou contribuição social – É excesso de exação. Art. 316, § 1º Qualquer outra vantagem devida – É abuso de autoridade Excesso de Exação § 1º - Se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza: Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. Toda vez que a vantagem devida for tributo ou contribuição social, pode ser excesso de exação, desde que ao gente se valha de meio vexatório ou gravoso. Agora, se é outra a vantagem devida, abuso de autoridade. Então, cuidado, se vantagem devida for tributo ou contribuição social, é o excesso de exação (art. 316, § 1º). Se for outra vantagem, que não tributo ou contribuição social, mas ainda devida, abuso de autoridade. Não está expresso no tipo do art. 316, mas a doutrina entende imprescindível o abuso da autoridade pública. Em latim (e foi isso que caiu) é o metus publicae potestatis. É o abuso da autoridade pública. É o agente que abusa da autoridade pública. Se vale do temor que a sua autoridade acarreta nos outros. Agora, preste atenção: para configurar o crime de concussão é imprescindível que o sujeito ativo tenha poder, competência ou atribuição para concretizar o mal que ele prometeu, em caso de não atendimento da exigência. Por exemplo: o delegado exige vantagem para não oferecer uma denúncia. É concussão? Não, porque delegado não tem atribuição para oferecer denúncia. Promotor exige vantagem para não condenar uma pessoa, não existe concussão porque o promotor não sentencia. O juiz exige vantagem para não oferecer uma denúncia. Juiz não pode oferecer denúncia. Então, não é concussão. Nesses casos, que crime eu tenho? Quando falta ao sujeito ativo competência ou atribuição para o ato prometido? Ele agregou ao pedido uma intimidação. Você não atende e ele não tem competência para realizar o que prometeu. Nesse caso, comete extorsão (art. 158, CP). Se falta ao sujeito ativo competência ou atribuição, eu tenho o crime de extorsão. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Médico que, atuando pelo SUS, cobra adicionais na consulta para alguma intervenção cirúrgica – Que crime ele pratica? Há três crimes, a depender do caso concreto.  Se o médico exige essa vantagem. Ele praticou concussão e não se fala nisso. Médico pelo SUS, que cobra adicionais, se exige essa vantagem, concussão. Ou você me dá, tanto ou não vou realizar o procedimento, ainda que pelo SUS.  Se ele solicita a vantagem, ai é corrupção. Se ele chega para o paciente e pede, “olha o SUS paga mal, será que você não pode complementar, até para eu te atender melhor, mais animado, vou mexer no seu coração, cabe como é..”  Se ele não exigiu, não solicitou, mas simulou ser devida a vantagem, ele falou: “o SUS não cobra isso, não cobra isso, esse procedimento o SUS não cobra”. O que é isso? Estelionato. Ele não exigiu nada, ele não pediu nada, mas simulou que o SUS não cobria aquele procedimento. Cirúrgico. O crime é punido a titulo de dolo, acrescido de finalidade especial. Qual finalidade especial? “Para si ou para outrem.” Consumação e Tentativa – É crime formal, material ou de mera conduta? Crime de mera conduta não pode ser porque ele descreve a vantagem como sendo resultado naturalístico. A questão agora é saber se essa vantagem deve ser alcançada, logo o crime seria material. Mas o crime aqui é formal, consuma-se com a mera exigência, dispensando-se a obtenção da vantagem. Dispensa, inclusive, o sentimento de temor no particular. O particular não precisa se sentir atemorizado com a conduta do agente. Basta a exigência, sendo irrelevante se o particular acreditou ou não na concretização de algum mal. Dispensa o particular se sentir ou não atemorizado pelo que lhe foi oferecido pelo servidor. O recebimento da vantagem é mero exaurimento. Não vai dar flagrante no exaurimento!!! Admite a tentativa. Quem me dá exemplo de tentativa de concussão? Carta concussionária interceptada. Aqui admite fracionamento do iter criminis. Terminamos concussão. Vamos agora para corrupção ativa. 4. CORRUPÇAO ATIVA Vamos estudar a corrupção passiva junto com a corrupção passiva. E vocês sabem, nós estamos diante de uma exceção pluralista à teoria monista. O corrupto era para ser punido nos termos do art. 317, do CP e nunca o é. E o corruptor é punido pelo art. 333, do CP (exceção pluralista à teoria monista). Corrupto, art. 317, corruptor, art. 333. Corrupção Passiva Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Alterado pela L-010.763-2003) Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 § 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional. § 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem: Pena detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. Corrupção Ativa Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Alterado pela L-010.763-2003) Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional. O art. 316 (concussão) pune “exigir” com 2 a 8 anos. Agora vem o art. 317 e pune o “solicitar” com uma pena de 2 a 12 anos. Na concussão, em que ele “exige”, a pena é de 2 a 8. E na corrupção, em que ele só “pede”, inclusive com um ‘por favor’, a pena é de 2 a 12. O que o legislador está dizendo? Falta o que aqui? Proporcionalidade. Já tem gente dizendo que essa pena é inconstitucional por ferir o principio da proporcionalidade. A conduta mais grave (exigir) é punida menos severamente e a menos grave (solicitar), punida mais severamente. Fere o principio da proporcionalidade. Sujeito ativo do art. 317 – É exatamente o mesmo do art. 316. O art. 317 tem como sujeito ativo o funcionário público no exercício da função ou fora da função; e também o particular na iminência de assumi-la. É o segundo crime que pode ser praticado por particular sem estar concorrendo com o funcionário publico. Observação – Fiscal de rendas: o crime é o da Lei 8.137/90. Não é crime contra a Administração Pública, mas contra a ordem tributária. No caso de militar, é o art. 308, do CPM. E olha o que diz o art. 308, do CPM: Corrupção passiva Art. 308. Receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função, ou antes de assumi-la, mas em razão dela vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena - reclusão, de dois a oito anos. O art. 308, do CPM não trouxe o núcleo solicitar, significando que policial militar nunca solicita. Eu sei que é errado, mas em algum momento, policial militar solicita vantagem indevida. E como fica? Se ele recebe ou aceita a promessa, é o art. 308, do CPM, competência da Justiça Militar. Se ele solicita, aí é o crime do art. 317, do CP, justiça comum. Se, na prática, confundirem isso, gera incompetência absoluta, nulidade absoluta. Se a Justiça Militar receber uma denúncia porque o policial militar Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 “solicitou”, esse crime está sendo processado na justiça errada, absolutamente incompetente. Sujeito Passivo – Quem é a vitima da corrupção passiva? Temos que dividir em sujeito passivo primário e secundário. O sujeito passivo primário é a Administração em geral e o secundário é o particular, desde que não autor de corrupção ativa. Obvio. Conduta Punida – O que pune o art. 317? O art. 317 pune solicitar, receber ou aceitar promessa sempre atrelado a vantagem igualmente indevida. Já o art. 333 pune oferecer e pune também prometer essa vantagem também indevida. Pergunta do MP/DF: A corrupção passiva depende da corrupção ativa e viceversa? São crimes bilaterais ou unilaterais? Um depende do outro? Vejam, o particular pode prometer e isso configura a corrupção ativa. Se o funcionário recusar, não tem passiva. O funcionário solicita, o particular é vitima. Dar não é crime. Você dar o que ele solicita não é crime, você é vitima. Solicitou, pode dar porque não é crime. E por que dar não é crime? Prometer é crime, oferecer é crime, mas dar, no caso da corrupção ativa não é crime. Por quê? Olha que interessante: no caso de prometer e aceitar a promessa, a corrupção partiu do corrupto ou do corruptor? Ele, primeiro, promete, portanto, parte do corruptor. No caso de oferecer e receber, a corrupção parte de quem? Quem age primeiro? Quem recebe ou quem oferece? Quem oferece. E no caso de solicitar, a conduta parte de quem? Do corrupto. Então, o legislador só pune o particular quando a corrupção parte dele. O legislador só pune o particular quando a corrupção parte dele. Se parte do funcionário publico, o particular é vitima. Repetindo: o art. 317 pune solicitar, receber ou aceitar promessa. O art. 333 pune prometer, oferecer, mas não tem o núcleo “dar”. Por que “dar” não é crime no art. 333? Porque o art. 333 só quer punir o particular quando a corrupção parte dele. No caso do verbo dar, ela partiu do funcionário publico. Então, não quero punir o particular. Eu terminei a primeira parte perguntando se o crime de corrupção passiva pressupõe o crime de corrupção ativa e vice-versa. Não, não pressupõe. Eu falei que o art. 317 pune o “solicitar”, o “receber” e o “aceitar” promessa; e o art. 333, pune o “oferecer” e o “prometer”. Logo, o crime não é bilateral. Um crime não é pressuposto de outro. Vejam que o solicitar é o art. 317, sendo que “dar” não é crime. Você pode prometer ou oferecer e o funcionário recusar. Então, não temos a bilateralidade. E aí eu perguntei por que “dar” não é crime. Porque se no art. 317, o legislador pune o funcionário, pouco importando se a corrupção partiu ou não dele; no art. 333, ele só quer punir o particular, mas a corrupção parte dele. Se a corrupção partiu do funcionário ele é vítima. Agora, “dar” não é crime. Ele solicitou? Ou você dá ou não dá. Se você pechinchar (pedir para parcelar, diminuir um pouquinho), você está oferecendo. Aí tem o crime. Para vocês não esquecerem isso, vou contar um caso. Eu era promotor em Santa Rosa de Viterbo e na hora do almoço, eu estava na fila do banco e ouvi um Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 casal comentar uma coisa. Passou uma vereadora que também era oficial de justiça da cidade. E o casal: “olha a fulana, você não sabe o que ela fez. O meu primo tem um posto e ela foi lá realizar uma constrição nos tanques porque o posto estava com uma execução. Ela pediu para o meu primo tantos mil reais para penhorar os tanques só quando ele estivesse vazio. Aí você penhora ar. Não penhora gasolina e nem álcool.” Eu ouvi aquilo e perguntei pra gerente quem era a mulher. E falei que queria o telefone do primo dela. E a gerente tinha o telefone dele (cidade pequena). Eu cheguei na promotoria e liguei para o primo pedindo para ele ir lá. Ele disse que ia, mas foi logo dizendo que não tinha sido responsável pela importação das armas, que já tinha pagado multa de tudo, etc. Quando chegou na promotoria, ele confirmou tudo o que eu tinha ouvido no banco. Confirmou que ela solicitou a vantagem e ele deu. Disse que fez um DOC. Aí eu falei que ele teria que repetir tudo. “Ah, doutor, não faz isso, porque eu dei, ora.” “Mas foi o senhor que prometeu?” “Não”. “Foi o senhor que ofereceu?” Não. “Foi ela que solicitou?” “Foi”. “Então, o senhor é vítima”. Quando eu falei que ele era vítima: “Eu?? Vítima?? Eu sou vítima?? Que mulher ordinária!!” Eu processei somente a oficial de justiça, na época vereadora. Acabou cassada. Eu não processei o homem porque ele era vítima. Espécies de corrupção ativa Nós temos quatro espécies de corrupção ativa no Brasil. São quatro tipos principais de corrupção ativa. E isso só vai ter no caderno de vocês  Corrupção ativa do art. 333 – É a corrupção ativa em face de funcionário público.  Corrupção ativa do art. 337-B – É corrupção ativa em face do funcionário público estrangeiro.  Corrupção ativa do art. 343 – É a corrupção ativa de testemunha  Corrupção ativa do Código Eleitoral – É a corrupção ativa eleitoral O que vocês têm que perceber? Presta atenção que é para você nunca errar em concurso:  Art. 333 – Quais são os dois núcleos do art. 333? Oferecer e prometer.  Art. 337-B – Pune prometer, oferecer e dar. No art. 337-B, dar é crime! Ele pune muita coisa.  Art. 343 – Pune prometer, oferecer e dar.  Código Eleitoral – Também pune o núcleo prometer, oferecer e dar. Ou seja, “dar” só não é crime no art. 333, na corrupção ativa comum. Nas corrupções ativas especiais, dar é crime. Se você quer dar, tem que dar para funcionário brasileiro. Se você der para funcionário estrangeiro, para testemunha ou der com espírito eleitoral, é crime. Projeto de lei já no Congresso: acrescentando o núcleo “dar” ao art. 333. Não tem sentido apenas não ser crime no art. 333. É uma puta diferença e sem qualquer razão aparente. Então, o projeto de lei está na marca do pênalti para ser votado e Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 que vai tipificar o núcleo “dar” no art. 333. Quando esse projeto se tornar lei, você já sabe que é irretroativa, já que, até então, “dar” não era crime. É isso que vai cair em concurso. Corrupção passiva bilateral - Tem um caso que a corrupção passiva é bilateral, pressupõe a ativa. Caiu no MPF, 1ª fase. No núcleo receber. Se ele recebeu é porque, necessariamente, o particular ofereceu. Então, no núcleo “receber”, necessariamente o crime é bilateral. Não importa se houve o núcleo solicitar, receber ou aceitar promessa. Não importa. Todos acabam denotando mercancia da função pública. Todos acabam enfocando a mercancia da função pública. Corrupção passiva própria e corrupção passiva imprópria Em concurso vai cair o seguinte: o que é corrupção passiva própria e o que é corrupção passiva imprópria?  Corrupção passiva própria ou propriamente dita – “Tem por finalidade a realização de ato injusto (contrário à lei)  Corrupção passiva imprópria ou impropriamente dita – “Tem por finalidade a realização de ato legítimo.” Eu solicito mil reais para facilitar a fuga de preso. É corrupção passiva própria ou imprópria? Própria ou propriamente dita. Estou buscando a realização de ato contrário à lei. Tem uma outra classificação interessante, que pode ser agregada a essa, que é a da corrupção passiva antecedente e a corrupção passiva subsequente. Corrupção passiva antecedente e corrupção passiva subsequente O art. 317 distingue a corrupção passiva antecedente de corrupção passiva subsequente.  ato. Corrupção passiva antecedente – Você primeiro solicita para, depois, praticar o  Corrupção passiva subsequente – Você primeiro pratica o ato para, num segundo momento, solicitar a vantagem. Eu peço mil reais para soltar um preso (corrupção passiva antecedente). Eu solto o preso e cobro mil reais por isso (corrupção passiva subsequente)  Corrupção ativa antecedente – Eu primeiro ofereço para ver realizado o ato. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  Corrupção ativa subsequente – Primeiro realiza-se o ato para, num segundo momento, oferecer recompensa para o ato já realizado. O art. 317 pune: “solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem.” Pune-se as duas espécies de corrupção passiva, antecedente e subsequente, ou só uma delas? Pune-se as duas. A corrupção passiva antecedente é crime e a subsequente também é crime. Agora vamos para a corrupção ativa (art. 333). A corrupção ativa pune: “oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício”. E aqui? Na ativa, a corrupção ativa antecedente é crime. Mas a corrupção ativa subsequente é atípica. É fato atípico. Vocês já tinham parado para pensar nisso? Caiu em concurso. Cuidado que o concurso mistura todos esses tipos. O crime do art. 317 é punido a título de dolo, com finalidade especial: “para si ou para outrem”, sendo que esse “outrem” pode ser a própria Administração Pública. Consumação e Tentativa – Quando esse crime se consuma? Ele é material, formal ou de mera conduta? Resposta: em regra, formal. Mas é material no núcleo “receber”. Solicitou ou aceitou promessa está consumado. Mas na modalidade receber, ele é material. A doutrina admite tentativa na carta interceptada. O § 1º, do art. 317, fala da corrupção passiva qualificada, que não tem nada de qualificada. É causa de aumento de pena. Então, o certo é corrupção passiva majorada. Mas a doutrina chama de qualificada. § 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional. O § 1º aumenta a pena na corrupção passiva própria e imprópria ou só de uma delas? Qual corrupção passiva está sujeita a essa causa de aumento? Só a própria? Só a imprópria ? Ou as duas? Vocês anotaram que há uma espécie de corrupção que o agente pratica infringindo a lei. Qual é? A própria. A causa de aumento só incide na corrupção passiva própria. Não incide na imprópria. Só a corrupção passiva própria sofre o aumento. A imprópria, não. O que significa isso? No que consiste essa causa de aumento? Nós temos que dividir, num primeiro momento, para depois analisarmos um segundo momento da corrupção. o 1º Momento: Ele solicita – Consumação. o 2º Momento: Ele realiza o ato comercializado, prometido – Aumento de 1/3. A partir do momento que ele solicita, você já tem o art. 317, do Código Penal, com uma pena de 2 a 12 anos. Já está consumado. Solicitou? Você já tem o art. 317, Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 com uma pena de 2 a 12 anos. Mas se, além de solicitar, ele realiza o ato que ele comercializou, que ele prometeu; solicitou uma vantagem para praticar um ato e concretiza e pratica esse ato, aí nós estamos diante de um aumento de 1/3 da pena. Solicitei 10 mil reais para arquivar indevidamente um inquérito. Já consumei o art. 317. Arquivo indevidamente o inquérito? A pena será aumentada de 1/3. Cuidado quando este “realiza o ato comercializado” configura outro crime. Quando a realização do ato configura outro crime, esqueçam o aumento de 1/3. Ele vai responder pela corrupção passiva, mais este outro crime em concurso material. Você só vai aumentar de 1/3 quando a realização deste ato não corresponder a um fato típico. Se a realização deste ato corresponder a um fato típico, esqueça o aumento. Ele vai responder por este novo crime, mais a corrupção em concurso material. Eu pedir para esquecer o aumento para evitar bis in idem. Exemplo: eu solicitei mil reais para excluir pontuações suas da carteira de motorista. Aí eu efetivamente faço isso. Eu sou um funcionário autorizado. Eu não vou responder pela corrupção passiva majorada. Vou responder pelo art. 317 mais o art. 313-A, em concurso material. Se a realização desse ato configurar crime autônomo, esqueça a majorante porque ele vai responder pelo crime autônomo. Corrupção passiva privilegiada – Art. 317, § 2º § 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem: Pena detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. O art. 317, § 2º, pune só com detenção de 3 meses a 1 ano, uma infração de menor potencial ofensivo, “se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem”. É o que se chama de corrupção passiva privilegiada. Para resumir, este parágrafo 2º configura o quê? Os famigerados favores administrativos. Tem gente que nem sabe que existe esse parágrafo 2º. Sujeito Ativo – Você, que conheceu o parágrafo 2º hoje, quem é o sujeito ativo? É o funcionário quebra-galho (é o “deixa comigo!”). Quebrar-galho é crime! Corrupção passiva privilegiada. Quem pede para quebrar galho, pratica crime? É o que você faz no trânsito, ao se dirigir para o guarda: “quebra o galho aí.” Pedir para quebrar galho é crime? Não é! Quando você pede para quebrar galho, você não está prometendo e nem oferecendo nada. Não tem corrupção ativa privilegiada. Guardem isso: funcionário quebra-galho é crime. Você que pediu para ele quebrar um galho, o fato é atípico porque você nada oferece, nada promete. Só pede para quebrar um galho. Quem nunca viu quebra-galho, como tipificaria na hora da prova? Prevaricação. MP/MG, 2ª fase: qual é a diferença da prevaricação e da corrupção passiva privilegiada? Não confundam o art. 317, § 2º, com o art. 319. Olha o que ele pune: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 Prevaricação Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa. Qual a diferença?  Na corrupção passiva privilegiada – O agente cede diante de pedido ou influência de outrem. Há interferência externa. O agente, aqui, não busca satisfazer interesse ou sentimento pessoal.  Na prevaricação – Não há pedido ou influência de outrem. Não há interferência externa. O funcionário se desgarra dos deveres administrativos espontaneamente. Aqui, ele busca satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Na PF caiu essa questão e o examinador errou. A resposta foi prevaricação, mas o examinador esqueceu de colocar “para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”. Isso é elementar do tipo. Se não tiver isso no problema, não é prevaricação. A corrupção passiva privilegiada é crime material. Só se consuma com a realização do ato. Exige a realização do ato ou omissão do ato. 5. PREVARICAÇÃO IMPRÓPRIA – Art. 319-A É um crime funcional bastante recente. Art. 319-A. Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo: Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano. Olha que pena gravíssima para uma conduta extremamente leve! Absurdo! Total inversão de valores. Mas vamos lá. Isso é interessante. O que eu estou punindo, em apertada síntese? A entrada de aparelhos de comunicação em presídios. Vamos fazer um quadro: Antes da Lei 11.466/07:    O agente público que não vedava a entrada deste aparelho: fato atípico. O preso surpreendido com o aparelho: fato atípico. Particular que introduzia o aparelho no sistema: fato atípico. Depois da Lei 11.466/07: Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010  O agente público com dever de vedar se omite: crime do art. 319-A, do CP  O preso surpreendido com o aparelho: falta grave (art. 50, VII, da LEP)  Particular que introduzia o aparelho no sistema prisional: fato atípico – Com a Lei 11.466/07, o comportamento dele permaneceu atípico. Vejam que a Lei 11.466 cometeu dois erros: não punir com crime o preso, que é o destinatário do aparelho. Ele deveria responder como criminoso, deveria responder por algo semelhante à receptação. E o outro erro crasso: esqueceram da pessoa que introduziu o aparelho e o fato permaneceu atípico. Uma pessoa foi surpreendida do lado da penitenciária de Guarulhos com uma pipa. Ele amarrava os celulares na pipa e passava para os presos através do muro. Ele foi preso pela PM e foi levado para o delegado: “olha aqui, doutor, jogando aparelho celular dentro do presídio.” O delegado autuou em flagrante com base em qual crime? Era fato atípico. Eu quero que vocês entendam isso para entender a Lei 12.012/09. Depois da Lei 12.012/09 - Tipificou o que ainda era atípico. É exatamente o art. 349-A, do CP. Art. 349-A. Ingressar, promover, intermediar, auxiliar ou facilitar a entrada de aparelho telefônico de comunicação móvel, de rádio ou similar, sem autorização legal, em estabelecimento prisional. (Acrescentado pela L-012.012-2009) Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano. Resumindo e concluindo, o que temos hoje? o o o Crime para o diretor ou agente que deixa de vedar. Crime para quem introduz o aparelho. Falta grave para o preso. Houve um caso lá em Presidente Bernardes, onde estava o pessoal do PCC preso. O sujeito jogava os celulares através de um helicóptero a controle remoto. Ainda não havia a tipificação para esse crime, mas o delegado foi esperto, autuou o cara por formação de quadrilha ou bando. Brilhante! E já foi condenado, inclusive em segundo grau. Vamos voltar para o art. 319-A. Bem jurídico tutelado – Qual é o bem jurídico tutelado pelo art. 319-A? É a Administração em geral, bem como a segurança interna e externa dos presídios. Sujeito ativo – Diretor de penitenciária e/ou agente público. Qual é o erro do legislador? Achar que diretor de penitenciária não é agente público. Como se o diretor não fosse agente público. Então, o melhor teria sido colocar só “agente público”. E olha a pergunta: qualquer agente público?? O artigo fala em “dever de vedar ao preso o acesso a aparelho”. Somente, portanto, o funcionário público com Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 esse dever responde pelo art. 319-A. E se ele não tem esse dever de impedir/vedar a entrada do celular, que crime pratica? O do art. 349-A. Funcionário que não tem dever de vedar a entrada de celular, mas introduz o aparelho no sistema prisional, pratica o crime do art. 349-A, que acabamos de ler. E é punido com a mesma pena. O preso pratica esse crime? Não. O preso é o destinatário do comportamento criminoso. Ele pratica falta grave. É uma omissão do legislador que a doutrina está implorando para que seja corrigida. O preso não pratica crime, mas falta grave. Sujeito passivo – Vítima primária é o Estado. A vítima secundária é a coletividade. Conduta punida – O que pune o art. 319-A? Pune uma conduta omissiva. “Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever (...)”. O “deixar de cumprir” demonstra claramente que se trata de um crime omissivo. O agente deixa de vedar a entrada do aparelho que ele percebe que está sendo introduzido no sistema prisional. O crime é omissivo. E se o funcionário que tem o dever de vedar, não simplesmente se omite, mas leva o aparelho para o preso ou, mais que isso, vê o preso com o aparelho e não tira da mão do preso. O aparelho já estava lá, ele viu e não fez nada. Ou então, ele mesmo entrega o aparelho para o preso. “E se o agente público, ao invés de permitir o acesso ao aparelho, pessoalmente entregá-lo, ou então, deixar de retirar da sua posse? A expressão ‘acesso ao aparelho’ deve ser interpretada de forma extensiva, abrangendo o comportamento de não retirar ou entregar o aparelho ao preso” Nucci defende essa corrente. Objeto material – Qual é o objeto material do crime? “Aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo”. É aparelho de comunicação: celular, rádio, etc. Notebook com Skype, etc. Abrange o chip? Abrange o carregador? A pessoa que não veda a entrada da bateria, do carregador, configura o crime? O diretor vê que estão entrando chips (números novos para os celulares), baterias e nada faz. Configura esse crime? A doutrina entende que não porque houve uma omissão do legislador em querer empregar a analogia in malam partem. Errou o legislador. Deveria ter colocado aparelho de comunicação ou seus acessórios. Essa omissão não pode ser integrada, sob pena de analogia in malam partem. Atenção!! O STJ decidiu que abrange chip e carregador!! Diz o STJ: se abrange o principal, abrange o acessório que sirva ao funcionamento do principal. Essa decisão ainda não está nem no site do STJ. Ou se está não está completa. É recentíssima. Notícia já temos. A decisão, na íntegra, não. Elemento subjetivo – O crime é punido a título de dolo. É o dolo ou algum dolo acrescido de finalidade especial? Olha a pegadinha! O art. 319 traz a prevaricação própria que pune dolo + fim especial (satisfazer interesse ou sentimento pessoal). Já o Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 art. 319-A pune a prevaricação imprópria (dolo sem finalidade especial). Então, cuidado! O “com o fim de satisfazer” é finalidade especial só do caput. Não abrange a letra “a” do dispositivo. Cuidado! Consumação e Tentativa – Trata-se de crime omissivo puro. Se consuma com a simples omissão, sendo dispensável o efetivo acesso do preso ao aparelho. Crime omissivo próprio não admite tentativa. Ele é unissubsistente. Não admite tentativa. Terminamos os crimes funcionais. São crimes difíceis, cheios de detalhe e eu quis explorar os principais. 6. FALSO TESTEMUNHO ou FALSA PERÍCIA – Art. 342 Só na introdução do art. 342, eu demoro 15 minutos, explicando porque existe esse crime. Mas não vai dar tempo. Vamos fazer perguntas e respostas sobre o que há de mais importante sobre o tema. Falso Testemunho ou Falsa Perícia Art. 342 - Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. § 1º- As penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado mediante suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal, ou em processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. § 2º - O fato deixa de ser punível se, antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou declara a verdade. (Alterado pela L-010.2682001) § 3º - O fato deixa de ser punível, se, antes da sentença, o agente se retrata ou declara a verdade. É falso testemunho ou falsa perícia. Importante lembrar que os dois crimes estão na redação do art. 342. O § 1º despenca em prova do Banco Central, Tribunal de Contas, essas provas mais técnicas. Puro artigo de lei. Vamos às perguntas: 1. Nós estamos diante de um crime de mão própria, também chamado crime de conduta infungível. Só pode ser praticado por testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete. Por vítima, não. “Ah, mas a vítima mentiu”. Pode responder, eventualmente, por denunciação caluniosa. Mas esse crime não abrange a vítima. 2. Qual testemunha pratica falso testemunho? A que presta compromisso ou também a que não presta, chamada testemunha informante? Pergunta de concurso. Qual testemunha pratica falso testemunho, a compromissada ou abrange a descompromissada? Anotem: “informante pratica falso testemunho?” Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 1ª Corrente: “Pratica, pois o art. 342 não tem o compromisso com elementar integrante do tipo. Não bastasse, o CPP consagra o princípio do livre convencimento do juiz, podendo o magistrado sentenciar com fundamento num testemunho informante.” Magalhães Noronha. E decisões do STF antigas nesse sentido. Não vejo o Pleno atual seguindo esse caminho, mas é que não teve oportunidade. 2ª Corrente: “Não pratica, pois se a lei não a submete ao compromisso de dizer a verdade, não pode cometer o crime de falso testemunho.” A segunda corrente diz: então, para quê exigir o compromisso se as duas, no final das contas, vão ter que dizer a verdade, sob pena de crime? A segunda corrente é mais coerente. Mirabete e farta jurisprudência. 3. Eu falei que é um crime de mão própria ou de conduta infungível. Crime de mão própria admite coautoria? Aliás, é o que o diferencia de um crime próprio. Crime de mão própria não admite coautoria. Se é assim, existe coautoria no falso testemunho? Um advogado que induz uma testemunha a mentir é coautor da testemunha ou partícipe do falso testemunho? Partícipe, claro. O Supremo valou: nananinanina. Isso já caiu em concurso 4 vezes e prevaleceu a posição do Supremo. O Supremo decidiu que o advogado é coautor de falso testemunho. “Ué, então, o STF não acha que o crime é de mão própria?” Não! Ele acha que é de mão própria. Mas o STF, nessa questão, trabalhou com a questão da teoria do domínio do fato. O Supremo decidiu que o advogado que induz testemunha a mentir não é partícipe, é coautor do falso testemunho com base na teoria do domínio do fato. 4. São três comportamentos punidos: “fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade.” Você pode praticar esse crime de três formas. Sabe o que cai em concurso? O calar a verdade tem um nome. Já caiu em concurso: “fale sobre o crime de” e dá o sinônimo do falso testemunho na modalidade calar a verdade. Como chama? Crime de reticência. 5. Não importa o comportamento, ele se desgarra da verdade. “E o que é verdade?” Essa questão caiu em concurso. Você tem que saber isso porque o examinador já perguntou: “é possível falso testemunho sobre fato verdadeiro?” Você pode praticar falso testemunho falando a verdade? Para responder isso, você tem que saber o que é verdade. O que é verdade? “Verdade é perfeita correspondência entre a realidade e a sua expressão.” O que acontece quando eu tenho a expressão não coincidindo com a realidade? Aqui posso ter duas coisas: o erro ou a mentira. O erro é defeito de percepção. A mentira é intenção de enganar. O que configura o crime? O defeito ou a intenção de enganar? Só a intenção de enganar. O defeito de percepção é fato atípico. Isso significa que o falso testemunho não se extrai da comparação do que a testemunha falou e o que aconteceu, mas do que ele falou e sabia. Entre a realidade e a expressão, há o conhecimento. O fato de a testemunha haver expressado algo que não expressa a realidade, mas se coincide com o seu conhecimento, não é crime porque ela falou o que sabia, aquilo que percebeu, ainda que percebeu algo que não corresponda à realidade. Mas se falou exatamente o que aconteceu, mas se ela não conhecia ou orientaram a testemunha a falar isso, aí é Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected] DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches __________________________________________________________________________________________________2010 crime. Apesar de ela haver falado exatamente o que aconteceu, não correspondia ao seu conhecimento. Por isso, você conclui que é possível falso testemunho falando a verdade, desde que essa verdade tenha ocorrido e alguém pediu para você falar. Você não extrai o falso testemunho da comparação entre a expressão e a realidade. Você extrai da comparação da expressão com o conhecimento. Isso significa que adotamos a teoria subjetiva. Não a teoria objetiva. 6. O falso testemunho pode ser praticado em processo judicial, não importa se em jurisdição voluntária ou contenciosa. Pode ser praticado em processo administrativo. Pode ser praticado em inquérito policial e também em juízo arbitral. É possível falso testemunho em juízo arbitral. Cai direto isso em concurso: “Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade (...) em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral”. Existe falso testemunho em inquérito civil? A posição do MP é que sim! É uma espécie de procedimento administrativo. Mas o Congresso tem um projeto de lei que está para acrescentar o inquérito civil no art. 342 e, com isso, enfraquece o entendimento do MP. Os réus estão dizendo: se tivesse inquérito civil ai, por que o Congresso está editando uma lei incluindo o inquérito civil? O MP responde: “para tornar explícito.” Se você for prestar MP, está abrangido o inquérito civil em procedimento administrativo. O problema é que essa tese foi enfraquecida por esse projeto de lei que está no Congresso e que quer tipificar o falso testemunho em inquérito civil. Se é assim, significa que, por hora, não é crime. Esse projeto de lei nasceu de uma sugestão de um grupo de estudos de um promotor de SP. Cuidado porque o próprio MP de SP sentiu necessidade desse projeto, mas sentiu necessidade para tornar explícito, para não precisar trabalhar com algo implícito. Importantíssimo vocês estudarem em casa o que eu não consegui ministrar aqui: art. 135, art. 137 (omissão de socorro e rixa), art. 288 (quadrilha ou bando), art. 297 a 299 e 304 (falsidade ideológica, uso de documento falso). E não vamos conseguir ver aqui, mas é importante vocês estudarem o art. 329 até o art. 331 e o art. 339 ao art. 341. Todos os Direitos Reservados – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos do autor (Lei 9.610/98) é crime estabelecido pelo art. 184 do Código Penal. Contato: [email protected]
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