Contos Eróticos

April 2, 2018 | Author: Vagner Aux Cad | Category: Diana, Love, Horses


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CONTOS ERÓTICOSALBERTO MORAVIA ESTE LIVRO FOI INFORMATIZADO POR AM RICO e Angelina AZEVEDO. CASO ESTEJA INTERESSADO EM OBTER MAIS OBRAS DESTE G NERO, CONTACTE COM AM RICO AZEVEDO - RUA MANUEL FERREIRA PINTO, 530 - 4470 GUEIF ES MAIA - TELEF.: 02/9607039. Alberto Moravia CONTOS ER¢TICOS ALBERTO MoRavia nasceu em Roma em 1907 e faleceu na mesma cidade em 1990. Alberto Pincherle, mais tarde Alberto Moravia, pertencia a uma fam¡lia culta, de origem judia. Durante a adolesc ncia, uma tuberculose ¢ssea obrigou-o a um repouso quase absoluto. Tinha 18 anos quando abandonou a cl¡nica de Cortina d'Ampezzo com o seu primeiro romance terminado. Mais tarde, colaborou em revistas de vanguarda e em 1929 publicou as novelas "Os Indiferentes". autor de dezenas de obras. Para Carmen A COISA Muito querida Nora, Sabes quem encontrei h  pouco tempo? A Diana. Lembras-te? Diana, a que andou connosco no col gio das freiras francesas. Diana, a filha £nica daquele homenzarr o r£stico, propriet rio de terras em Maremma. A Diana que nunca chegara a conhecer a m e, morta ao d -la luz. A Diana de quem diz¡amos que, t o fria, branca, educada, saud vel, com os cabelos louros e os olhos azuis e o corpo com formas de est tua, se tornaria numa dessas mulheres insens¡veis e fr¡gidas, que talvez ponham no mundo uma ninhada de filhos, mas que n o chegam jamais a conhecer o amor. A recorda o da Diana encontra-se curiosamente ligada ao in¡cio da nossa rela o; e esta, por sua vez, a uma famosa poesia de Baudelaire que "descobrimos" juntas nos nossos tempos de col gio e acerca da qual, hoje como ent o, nos encontramos em desacordo quanto ao sentido a atribuir-lhe. A poesia "Mulheres Condenadas". Lembras-te? Em vez de nos apaixonar-mos pelos versos humanit rios de Victor Hugo que as irm zinhas nos aconselhavam, l¡amos s escondidas AI florer do rri", com essa curiosidade ardente pr¢pria da primeira adolesc ncia (t¡nhamos ambas treze anos), sempre em busca de alguma coisa que n o se sabe ainda o que seja e que, todavia, se pressente como predestinada ao conhecimento. ramos amigas, muito amigas, talvez j  algo mais do que amigas, embora por certo ainda n o amantes, e assim, quase fatalmente (h  uma fatalidade tamb m para as leituras), entre tantas poesias de Baudelaire, fomos cair na que tem por t¡tulo "Mulheres Condenadas". Lembras-te? Fui eu, para dizer a verdade, quem descobriu essa poesia fui eu a ler-ta em voz alta e a explicar-te o seu sentido, apoiando-me prontamente nos pontos, por assim dizer, essenciais. Estes eram, sobretudo, dois. O primeiro, na estrofe: "Os meus beijos s o leves como as borboletas / que afloram tarde os grandes lagos transparentes, / os do teu amante cavar-te-iam rugas / como trilhos de carro ou cascos de cavalo"; o segundo, na estrofe: "Maldito seja para sempre o sonhador in£til / que primeiro quis, na sua estupidez / vangloriando-se de uma quest o insol£vel e est ril, / misturar as coisas do amor e da moral". Aqui, como v s na primeira estrofe, surge privilegiado o amor homossexual, t o delicado e afectuoso em contraste com o amor heterossexual brutal e grosseiro; e na segunda, deixa-se o terreno limpo dos escr£pulos morais, que nada t m a ver com as coisas do amor. Claro que eu pr¢pria, que te explicava o sentido da poesia, captava muito imperfeitamente o alcance das duas estrofes; mas compreendia, apesar de tudo, o bastante para as escolher entre todas as outras, como as mais suscept¡veis de favorecerem a minha paix o por ti. Para dizer a verdade, esta paix o, hoje t o exclusiva e t o conscient" de si pr¢pria, teve um come o confuso. Foi, de facto, para a Diana que, num primeiro momento, orientei as minhas aten es. Como talvez te recordes quando havia exames da parte da manh , as alunas externas passavam, tamb m elas, a noite anterior no col gio. Diana, que habitualmente passava a noite em casa, ficou, numa dessas ocasi es, a dormir no col gio e o acaso quis que a sua cama ficasse ao lado da minha. N o hesitei mais, se bem que fosse a primeira vez; exigiam-no os meus sentidos e obedeci. Assim, depois de uma longa espera ansiosa, levantei-me da cama e, num pulo, alcancei a cama da Diana, levantei-lhe os cobertores e insinuei-me por baixo dos len ¢is, cingindo-me imediatamente a ela, num abra o lento e irresist¡vel, tal como uma serpente que, sem pressa, envolve nos seus an is os ramos de uma bela  rvore. Diana certamente despertou, mas, um pouco pelo seu car cter entorpecido e passivo e um pouco, talvez, por curiosidade, fingiu continuar adormecida e deixou-me avan ar. Digo-te sinceramente, mal me dei conta de que Diana parecia assentir, experimentei o mesmo impulso voraz de uma faminta frente presa: tinha vontade de a devorar com beijos e car¡cias. Mas, logo a seguir, impus-me uma esp cie de ordem e comecei a percorrer arrastadamente o seu corpo, deitado de costas e inerte, de cima a baixo: da boca que toquei com os meus l bios (o meu desejo, para qu neg -lo?, era pela outra" boca) ao seio que destapei e beijei compenetrada; dos seios ao ventre, onde a minha l¡ngua, lesma apaixonada, deixou um lento tra o h£mido; do ventre para baixo, at ao sexo, alvo supremo e £ltimo daquela minha deambula o, o sexo que pus minha merc , agarrando os joelhos da Diana com as duas m os e abrindo-lhe as pernas. Ela continuou a fingir-se ensonada e eu lancei-me com maior avidez sobre o meu alimento de amor, sem abrandar sen o quando as coxas dela se apertaram convulsivamente no meu rosto, como a mordedura de uma ratoeira de fresca e bem musculada carne jovem. O meu ardor, por m, deparou com os limites da minha inexperi ncia. Hoje, depois de ter suscitado o orgasmo de uma amante, voltaria a fazer o caminho inverso; do sexo ao ventre, do ventre aos seios, dos seios boca e abandonar-me-ia, ap¢s tanto furor, do ura de um abra o meigo. Mas eu era ainda inexperiente, n o sabia ainda amar e, depois temia ser surpreendida por alguma freira que estivesse de vigia ou de alguma aluna insone. Assim, sa¡ de junto da Diana pelos p s da cama e, sempre s escuras, voltei para a minha. Estava arquejante, tinha a boca cheia de suaves humores de sexo, sentia-me feliz. Mas, no dia seguinte, esperava-me uma surpresa que, no fundo, teria podido prever, ap¢s o obstinado sono fingido da primeira amante da minha vida: quando me viu Diana comportou-se como se nada, entre n¢s, tivesse acontecido; fria e serena como de costume, manteve todo o dia uma atitude n o hostil nem perturbada, apenas completa e perfeitamente indiferente. Chegou a noite e fic mos de novo as duas em camas ao lado uma da outra; a uma hora j  tardia, deixo a minha cama para entrar na da Diana. Mas a rapariga, robusta e atl tica, est  acordada. Quando tento insinuar-me entre os seus len ¢is, um sac o violento repele-me e faz-me cair por terra. Nesse momento, tive como que uma esp cie de ilumina o. A tua cama ficava tamb m junto da da Diana, mas do outro lado. Disse para comigo, de repente, que tu n o podias ter deixado de ouvir, na noite anterior, o tumulto do meu ruidoso amor e que, assim, estarias agora " minha espera". Foi com a seguran a de quem se dirige para um encontro prometido que me arrastei at tua cabeceira. Como previra, n o me repelistes. Foi assim que come ou o nosso amor. Volt mos ent o a Baudelaire. Torn mo-nos amantes, mas com certas precau es, a que chamarei rituais, por tua vontade, porque continuavas um pouco hesitante e amedrontada. Pediste-me e eu, para te agradar, aceitei que fiz ssemos amor somente em duas ocasi es precisamente definidas: no col gio, de noite, todas as raras vezes que l  dorm¡amos, ou em minha casa, quando a tua m e, uma vi£va bonita e mundana, sa¡a de Roma no fim de semana, na companhia do amante, e te permitia ent o que viesses dormir na minha companhia. Salvo estas duas ocasi es, as nossas rela es deveriam ser castas. Assim, embora aceitando-o, n o compreendia t o singular planeamento; depois, com o passar do tempo, compreendi: estavas obcecada por aquela moral de que fala Baudelaire e, para adormeceres o teu sentimento de culpa, querias que entre n¢s as duas acontecesse como num sonho sonhado entre dois sonos, em minha casa ou no col gio. Mas, do mesmo modo, nunca te habituaste completamente nossa rela o, nunca a aceitaste no fundo como um modo de vida est vel e definitivo. E aqui quero citar uma vez mais Baudelaire, que, numa outra estrofe, fornece uma perfeita descri o da tua atitude para comigo. Eis a estrofe: "As indolentes l grimas dos olhos fatigados / o ar alquebrado, o transe, a vol£pia ba a / os bra os vencidos abandonados como armas v s / tudo contribu¡a para o fasc¡nio da sua beleza fr gil. / Estendida a seus p s, calma e cheia de alegria, / Delfina chocava-a com olhos ardentes, / como um animal forte que vigia a presa / depois de a ter marcado com os seus dentes". A teu ver, eu seria Delfina, a tirana, a calma e cheia de alegria", e tu Hip¢lita, a pobre criatura devastada pelo meu desejo, a presa "marcada" pelos meus dentes. Esta ideia bizarra inspirava-te um medo invenc¡vel que, uma vez mais, Baudelaire descreveu na perfei o: "Sinto abaterem-se sobre mim pesados terrores / e destacamentos obscuros de fantasmas confusos / querendo arrastar-me por caminhos de erran a / rodeados por toda a parte de horizontes sangrentos". Tudo isto, realmente, dito de uma maneira rom ntica, segundo o gosto da poca, mas espelha bastante bem a aspira o chamada "normalidade" que te obcecava, dois anos depois do come o do nosso amor. Curiosamente, essa aspira o assumiu em ti um sentimento violento de insatisfa o perante a virgindade. Eu era virgem, como ainda hoje sou, gra as a Deus, e n o sentia a menor insatisfa o por causa dessa condi o natural, que n o me impedia de modo nenhum de ser uma pessoa e uma mulher completa. Tu, pelo contr rio, lembras-te? parecias a todo o momento convencida de que havia qualquer coisa a impedir-te de viver livre e completamente; e essa qualquer coisa identificavas-la com a virgindade, da qual dizias que, se a nossa rela o continuasse, nunca chegarias a libertar-te. Recordo a este prop¢sito uma tua frase, para mim ofensiva: "Vou envelhecer a teu lado e transformar-me nessa triste figura que a solteirona virgem que se arranja com outras mulheres. Um dia, Diana, de quem continu ramos amigas ap¢s o fim dos para um quarto no segundo piso. envergava uma camisola branca e cal as de montar verdes. recordo apenas que. sentira como um sac o subtil e doloroso nas virilhas. tendo-se . limpa. quem fora que se prestara a garantir-Lhe o servi o. mas um terreiro cheio de lama e sujo. come aram a subir ao encontro deles. na sua casa de Maremma. com efeito. a Diana e o pai voltaram. estavam nessa altura a pastar nos prados que ficavam um pouco abaixo da casa. acima e abaixo de uma paisagem de colinas despidas. N o quero atardar-me nos temas preliminares. Mas n o descans mos. n o havia jardim. ap¢s um longo sil ncio: "Viste a Diana? Fresca. Fomos de comboio at Grossetto. havia j  alguns meses que deixara de ser virgem. comemos bifes grelhados florentina. Os cavalos. Senti-me imediatamente ofendida pela reprova o impl¡cita nas tuas palavras: "O que que quer dizer? Que eu te impe o de ser como a Diana. n o isso. mas que n o aquecia: era inverno. come aste a sair com um homem. descobrira manchas de sangue no slip. come  mos a tagarelar as tr s. com a sua f£ria de cavalgadas. Viaj mos cerca de uma hora. Sa¡ram. para descansar. o desvirginamento sucedera sem que ela quase desse conta. a Diana. acontecera que. come aste a falar do problema que ent o te obcecava: o da virgindade. o pai voltou a sair e n¢s dirigimo-nos as tr s. aconteceu algo de extraordin rio: com a sua voz l¡mpida e tranquila. por causa de passar tanto tempo montada. de certo modo. cal as de veludo e botas altas de pele crua. Em seguida. um dia de tramontana. a imagem viva da sa£de f¡sica e moral". corpulento. desculpa. a Diana e o pai." Entretanto.estudos no col gio. regressada a casa. como se fossem mais c es do que propriamente cavalos. "N o. com as pernas abertas. que. Lembras-te? Disseste-me. menos rusticamente. com um capote de casentino vermelho. um cavalo n o grande demais?" A Diana largou a rir. num daqueles dias. S¢ estou a dizer que gostava de ser como ela e que. as coisas entre n¢s as duas mudaram muito rapidamente. na esta o. depois convidaram-nos a entrar e a esper -los dentro de casa: tinham que ir a cavalo encontrar-se com certos foreiros seus. Em resumo. deitadas numa imensa cama de casal. a seguir ao caf . de maneira nenhuma a villa senhorial que t¡nhamos esperado. Ap¢s esta excurs o a Maremma. estavam nossa espera. um bonito homem com cerca de quarenta anos. Perguntaste-lhe com mal dissimulada inveja como fizera. depois. cozinhados directamente no lume da lareira. pelo que. Ela respondeu. n¢s viemos sentar-nos na sala. contei-os e pareceram-me seis. Cheg mos por uma estrada enlameada ao topo de um pequeno monte. com o autom¢vel. Depois. Mas assim que a Diana e o pai apareceram. em certo momento. Separava-nos uma esp cie de crescente impasse. branca e rosada. e eu deixei de ver-te a n o ser de fugida. diante de um fogo ateado no interior de uma grande lareira. tinham posto o terreno naquele estado. enfiadas num par de botas altas e negras. convidou-nos a passar o fim de semana com ela. alto. a invejo. Na realidade. a uma esp cie de celeiro ou curral extremamente tosco. volta do edif¡cio. com toda a candura: "Quem? Um cavalo. O pai da Diana. o ch o de um cercado de cavalos. com os cascos. a Diana informou-nos de que j  arranjara maneira de resolver esse problema. f¡sica e moralmente s ". um advogado meridional. estava vestido de pastor. at porque o col gio acabara e a tua m e. banhadas por um sol brilhante. depois explicou-nos que o cavalo era apenas a causa indirecta do desvirginamento." Estupefacta. montaram e afastaram-se. A Diana e o pai fizeram algumas festas aos animais. barbudo. exclamaste: "Mas. conheces. sabes agora muito bem n o passar de um fruto da imagina o. A que n o te esqueceu nunca ao longo destes anos. Perguntar s: que condena o? E eu respondo-te: a da escravid o perante o membro viril. Vivo no campo. n o sem certa complac ncia masoquista da tua parte. somos duas mulheres corajosas que se salvaram da condena o. porque uma vez. eu. foi assim que a tua m e me p s a quest o ao telefone. Mas n o quero antecipar-me na minha hist¢ria. descobri que a Diana e a amiga continuam mais do que adoradoras do membro viril. muito querida Ludovica. feliz e livremente. no fundo. arranja um pretexto qualquer. E decorrido um ano. Voltaste para perto dela.pelo menos. como duas "mulheres condenadas". sempre foste boa para mim e s t o s ria e inteligente que. chegou-me um dia uma carta com o carimbo de uma terra pr¢xima de Roma. a pouca dist ncia de Roma. Voltemos. O meu encontro com ela. Continuava a ter presente na mem¢ria a poesia de Baudelaire que tanto nos fizera discutir acerca da condena o. nos seguintes termos: KQuerida. a £nica a poder salvar-me. N o somos. Olhei para a carta e reconheci. suplico-te. ao fim de dois anos de amor clandestino. Basta que saibas que a sua servid o se alargou muito para l  do humano. a assinatura da Diana. que ficarei condenada para sempre. uma mulher horrenda.Diana. de uma maneira. arranc mos. Com efeito. As coisas s o como vou contar-tas. deves saber que a Diana j  n o est  sozinha h  muito tempo: uniu-se. e eis que tamb m . numa liga o aparentemente semelhante nossa. separaste-te do teu marido por "incompatibilidade de caracteres" . na realidade. na casa que ainda hoje habitamos. isto : salv mo-nos de uma ilus o de normalidade que. potenciada. mas tu pr¢pria disseste que se encontra unida Diana por uma liga o semelhante nossa. mas que tu. at uma zona obscura que nada tem a ver com a humanidade. Depois da tua partida para os Estados Unidos. no final. o que eu disse foi "aparentemente" semelhante nossa. ajuda-me. Mas vem "". nesse caso. Sim. j  n o sei quando. apenas com vinte anos. Tr s anos mais tarde. encontrando-me agora numa situa o dif¡cil. Digo-to j : porque. por m. onde est . Diana. que eu nunca vira. como espero. a m scara e come  mos a viver juntas. passava agora contigo os fins de semana em casa. voltei tua vida e recome  mos a fazer amor. anunciaste-me o teu casamento com o advogado. nem de longe. me falaste dela e a definiste como "horrenda". duas mulheres condenadas. al m disso. Finalmente.a primeira. tu continuas a identificar-te com Hip¢lita e persistes em ver-me como Delfina . mas se caracteriza apenas pela cegueira e brutalidade pr¢prias da agress o masculina. dever s estar com interesse em saber porque misturei nossa hist¢ria Baudelaire e Diana. At j . por minha vez. sinto que n o conseguirei. Dir s: pois sim. como costume dizer-se. forneceu-me ocasi o de deparar exactamente com esse g nero de mulheres a que se aplica o ep¡peto baudelairiano de "condenadas". tua . por assim dizer.separado do amante. Li depois o seu conte£do. Mas a realidade n o essa. e vem fazer-me uma visita. ao que parece. a uma tal Margherita. por exemplo. ap¢s a tua desgra ada experi ncia matrimonial. Agora. depois de dois anos sem a ver. sem ti." Devo dizer-te que a carta me produziu uma estranha impress o. Ou seja: continuas a ver-nos. pensei logo em ti. portanto. tirana implac vel. Pe o-te. embora sempre s escondidas e com imensas precau es. Era breve. v¡tima e a segunda. s a £nica a poder compreender-me. o facto de termos sido colegas no col gio. a condena o? Eu respondo-te: mais devagar. sa¡ de autom¢vel e dirigi-me para a villa da Diana. fingi. ainda que infeliz. de in¡cio. usava. como de uma vela consumida pela chama. Desaparecera a sua formosura rija e vivaz. mas at desproporcionada tratando-se de uma rela o de amor. Vinha em fato de banho. e a boca. Dir-se-ia que emagrecera menos do que se dissolvera. para o n£mero que ela me indicara na carta. podia ser tamb m que Diana escrevesse condenada" por n o conseguir desfazer a sua liga o com a "horrenda" Margherita. atravessando o jardim. de cabe a baixa. refor ando-a ainda por cima com um "para sempre" de desespero. nem a sua voz reconheci: lembrava-me dela clara e arg ntea. Mas naquela palavra havia algo mais do que a impaci ncia pela liberta o de uma submiss o sentimental insuport vel. depois. precedeu-me. da mesma cor do fato de banho. Gostas de cavalos. bem tratado. com o peito descoberto. tive como que um sobressalto de pasmo ao ver como a Diana mudara e de que maneira. desembocou no largo de um jardim italiana. onde se erguia uma casa de bela apar ncia. vem c . e ent o. Sem d£vida. desse modo. Cheguei pouco antes da hora de almo o. um estranho ar de liquefac o. volta daqui a nada. que pretendia "matar saudades" de antigos tempos de col gio. uma depress o achatada e esticada entre os dois ossos salientes da bacia. Dirigi-me porta. ela disse-me. n o tive tempo de tocar. Tossiu e reparei que. com dois pisos. n o notara. vou mostrar-te a casa. assim. soava-me agora baixa e rouca. como se estivesse espera da minha chegada no  trio da entrada. De toda a sua pessoa emanava. telefonei imediatamente Diana. e era n o s¢ forte. mas com a seguinte particularidade: em vez de sand lias. percorreu uma  lea de loureiros. duas maminhas que mal se destacavam do corpo. encovavam-se nele os olhos azuis que a magreza tornara enormes e que dois vincos de fadiga sexual faziam mais carregados. com um ar casual que me pareceu contrastar com o tom desesperado e urgente da sua carta: " Margherita foi dar uma volta pelo campo. Abra  mo-nos. em vez das belas pernas musculadas. porque a Diana abriu e apareceu no mesmo instante. A Diana caminhava lentamente. como me fora aconselhado que fizesse. como se . de uma  lea para outra. vamos come ar pelas cavalari as. Por isso. Os cavalos s o realmente estupendos. por sua vez. na direc o de um edif¡cio baixo e comprido que eu. procedi a uma esp cie de invent rio instant neo de tudo o que houvera outrora na sua pessoa e agora Lhe faltava.a Diana. cal ava botas altas vermelhas. Quando lhe dirigi um segundo olhar. em lugar do ventre redondo e cheio. em lugar dos seios altivos. Entretanto. levando de vez em quando boca o cigarro aceso. para o campo. qualquer coisa de obscuro e de indecifr vel. O meu autom¢vel entrou por um port o escancarado. sem esperar resposta. dois paus esgalgados. A fieira de janelas em boca de lobo fez-me adivinhar que era ali a cavalari a. branco e macilento. segurava um cigarro aceso. outrora de um rosa natural e nunca retocado. De manh . a palavra "condenada". com canteiros verdes e passagens ensaibradas entre eles. No instante em que a fitei. muito mais forte do que na poesia de Baudelaire. na sua carta. afinal de contas escrita noutra poca. Mas a transforma o maior era a do rosto. Ouvi-a exclamar em tom alegre: "At que enfim. consegui ser prontamente convidada para almo ar no dia seguinte. surgia agora desgra adamente aumentada por um borr o de b ton vermelho-ger nio. por causa do calor do ver o. n o?" E dizendo isto. A palavra era forte. Ludovica! Espero-te desde o nascer do sol!". entre dois longos dedos esquel ticos. digo-te sinceramente. dele posso dizer como certas mulheres: o meu rapaz.estivesse a reflectir acerca de qualquer problema preciso. falava. fechando-o. do pesco o. Por isso. sob o dil£vio dos longos p los. com ele. depois a m o teve um impulso quase mec nico e sobrep s-se declaradamente no membro do animal. A Diana estava agora completamente apertada contra o p¢nei e n o se conseguia ver o que fazia. e disse. e compreendi. entre os seus dedos. n o um defeito. Vi um comprido e estreito recinto rectangular com cinco baias de um lado e cinco do outro. n o me escapou que. magra e branca. A Diana deteve-se diante de cada um dos cavalos. fechado na sua bolsa de p lo castanho. chamando-os pelo nome um a um. n o tanto ele. o meu homem. logicamente. Ela anunciou: "H  aqui seis cavalos e um p¢nei. entre ele e um homem n o h  a m¡nima diferen a." E com estas palavras.. a m o descia um pouco mais. um ru o e tr s castanhos. que passava e voltava a passar pelo flanco fremente do animal. estou eu aqui. devia antes olh -la. mas que se aproximava agora de muito perto do sexo do p¢nei. depois. apenas por falar. mas ali exactamente igual a um homem. que a Diana estava a masturbar o animal. Tive a estranha sensa o de que a Diana falava no vazio. entrou na baia. estava im¢vel. excepto talvez no tamanho. Digamos que o meu preferido porque. ela continuava a falar. O p¢nei. todavia. pelo contr rio. Depois. embora tais animais n o sejam a minha especialidade. Lustrosos e esbeltos. sugeriam uma impress o de luxo. com dedos h beis e unhas escarlates afadas. como se meditasse. mas. vi claramente que o bra o dela. pela sua pequena envergadura. em . ouvi bruscamente a Diana dizer-me: " o meu preferido. tem a cabe a. Em vez disso. num tom desprendido e ligeiro: "Mas este o meu preferido. como se me tivesse libertado de uma s¢ vez daquela esp cie de surdez passageira. embora n o sem incredulidade. estendido por baixo da barriga do animal. enquanto falava. O p¢nei.. aproximou-se do p¢nei. Os cavalos s o puros-sangues. mas tenho que acrescentar mais alguma coisa que n o sei como dizer. e que eu. uma vez que aquilo que ela estava a fazer era mais importante do que aquilo que me dizia. reparei imediatamente que eram exemplares magn¡ficos. Sim. mas tudo isso. o corpo e as pernas diferentes das de um homem. fazendo-me observar os seus dotes e acariciando-os. A Diana come ou a gabar-me a sua beleza e. que. lenta e incerta e todavia animada de n o se sabia que inten o. acontece a "coisa". Cheg mos porta da cocheira e entr mos. em direc o ao ventre do p¢nei. simplesmente uma maravilha". acariciava o animal no flanco. de uma maneira algo abstracta. At porque. com uma estranha pressa quase hist rica. segundo a Margherita. ap¢s um momento de hesita o. mas o que A Margherita e eu com ele fazemos. para a frente e para tr s. com a cauda e a crina louras. eu j  nem dava pela sua voz. os meus olhos fixaram-se na sua longa m o. esse. ia e vinha. em vez de a ouvir. o que. olhava a m o. Entretanto. eu n o notara ainda. o resultado da medita o foi escasso. dois brancos. E assim. Por causa dessa "coisa". falava. castanho claro como um cor o. a cada festa. Os cavalos gabados pela Diana ocupavam seis dos compartimentos e. segui-a com curiosidade. mas longe de a ouvir. Muito naturalmente. nas suas baias enceradas e revestidas de um vidrado claro no ch o. por causa dessa "coisa" te escrevi a carta. a Margherita n o p ra de mo repetir. Entretanto. n o to escondo. isolada como que por uma estranha surdez. como se acompanhasse com a voz o ritmo das car¡cias: Aquilo a que chamo a "coisa". Vem c  v -lo. n o t m nada a ver com os do meu pai. Ent o. mais claros. Houve mais duas ou tr s festas da Diana. Por fim. a m¡nima. a Diana dizia: "Irei ficar provisoriamente contigo. em algo de rid¡culo e monstruoso." Eu respondi quase com furor: "Ficar comigo. sou capaz de querer recuar. tira essa m o do meu bra o". agitou as patas dianteiras no ar e imobilizou-se soltando um longo relincho sonoro. Queria-Lhe bem. e n o podia impedir-me de pensar para comigo que a submiss o de tantas mulheres ao membro viril encontrava na Diana uma confirma o caricatural. s¡mbolo de degrada o e de escravid o. Foi-me persuadindo gradualmente. eu insisto". Na realidade. elas sim. e n o n¢s. como s capaz de fazer aquilo?" "Foi a Margherita. Mas. um dia. lament veis v¡timas. n o. e s¢ tu me podes salvar". n o o que puderes. te obstinas por vezes em pensar. agora. escrevi-te porque ca¡ numa ratoeira. acalmando-o com a voz e novas car¡cias. Ela continuou." . e tive a certeza de que dizia respeito. Eu n o disse mais nada e precedi-a com alguma pressa. depois despe o-me da Margherita e tu levas-me embora". numa aut ntica ratoeira. Voltou-me mente o final da poesia: "descei. p s-me um ultimato". sobretudo.certas ocasi es. "N o. n o te excites. Comovida. com essa m o. muito cobarde e.. respondi-Lhe ent o: "Pois bem. N o tenhas vergonha. Ludovica. podes ir comigo". Mas eu n o a ouvia. estavas a mexer naquela "coisa". eram v¡timas de si pr¢prias. pensei que seria s¢ uma vez. inesperadamente suplicante. Lembrava-me daquela sua incr¡vel e. uma vantagem." "N o consigo esquecer que ainda h  pouco. Entretanto. diz l . n o sejas porco". porque n o podiam deixar de prosternar-se perante o macho e porque. depressa e hoje mesmo". em nada v¡timas. profanando com essa indigna com dia o amor afectuoso e puro que as poderia ter feito felizes. agarrou-me com for a o bra o. a:Mas vais ter que insistir. uma coisa assim: um capricho. no entanto. descei. mas miser vel Diana e sua "horrenda" Margherita. no £ltimo momento. depois. como n¢s. Ludovica.. como tu. "Ludovica. n o verdade que lindo?" De repente. por favor. nem pensar nisso. Ela queixou-se: "Porque que s o todos t o cru is comigo? At tu. Eu ia-me afastando. mas para adorarem no p¢nei o eterno falo. No jardim. detive-me. Assim. a Diana e a amiga tinham-se juntado j  n o para se amarem. e recome ou a falar. transformando a chamada "normalidade". l¢gica afirma o de que "o p¢nei era o homem dela". mas uma s¢ coisa precisa: levares-me daqui para fora. o p¢nei empinou-se. a Margherita pensa que nos amamos e deixar-me-  em paz. na sa¡da da cocheira. fingiam amar-se para melhor esconderem a sua pervers o. mas. a que em certa altura tamb m tu aspiravas. E. porque eu sou vil. a Diana alcan ou-me. como se falasse consigo pr¢pria: "Vamos almo ar." Um pouco aborrecida. balbuciei: "Farei o que puder". recordei as nossas pol micas sobre a poesia de Baudelaire e disse para comigo que Diana e Margherita. Sim. eram as "mulheres condenadas" de que falava o poeta. chamou por mim: "Ludovica!". a Diana apressou-se a amans -lo. como se falasse com o p¢nei: "Vamos l . por mim. colhida pela entoa o da sua voz. "E ent o? Tinha sido uma bela ocasi o para te ires embora. n o a n¢s as duas. "Que ultimato?" "Ou fazes "a coisa" ou separamo-nos". olha e diz-me se n o uma aut ntica beleza. numa ratoeira infame. num tom diferente. "Se quiseres. Devia ter no rosto uma express o eloquente porque a Diana interrompeu o fluxo do seu discurso cont¡nuo e murmurou em voz baixa. Depois." "Parecia-me imposs¡vel deix -la. sa¡ de dentro da baia. Depois. em momentos de mau humor e d£vida. com uma camisa aos quadrados. Em resumo. dirigindo-se especialmente a mim. fria e imperiosa. enormes. mas de l bios delgados. faziam pensar no focinho de alguns grandes s¡mios."Mas onde est  ela. Ela deixou-nos avan ar e depois exclamou. com os taLheres postos para tr s pessoas. satisfeita. chegou ao ponto de estender a m o engordurada e. as barrigas das suas pernas. como essas que vemos. exclamando: "Como bonita a nossa Ludovica. cal as de p¢lo brancas. de coisas insignificantes. Era uma sala de estar convencionalmente r£stica. lembrava-me o pai da Diana. Fixava-me com aqueles seus olhos encovados. paredes caiadas. a Margherita era realmente "horrenda". no seu velho casar o. para minha surpresa.tra ava como que um elnio por cima dos olhos. brilhantes e inflamados por n o sei que bestial concupisc ncia. mas n o deixava por um momento de fazer-me compreender os sentimentos. com a desculpa de ver o amuleto que trago ao pesco o. a testa. me acariciar os seios. acho que vamos ser amigas. saltarem a p s juntos por sobre o est mago da advers ria. m¢veis maci os e escuros. A voz de uma directora de col gio. com uma cordialidade que me pareceu fingida e premeditada: "Tu s a Ludovica. dei-me conta de que a Margherita procurava transformar o beijo de hospitalidade num beijo de amor. mas ela apertava-me com for a entre os bra os poderosos e n o consegui evitar que a ponta da sua l¡ngua penetrasse por um segundo no canto da minha boca. Entr mos em casa. fitei-a demoradamente. que havia alguns minutos parecia alimentar por mim. h£midos e tenazes. a Margherita?" "Olha-a. por baixo. um cinto com uma fivela enorme.e n o sei porqu . puxarem-se os cabelos. de p . Naturalmente. e ent o. com as pernas afastadas e as m os nas ancas. encovados e penetrantes. pontapearem-se na boca. por baixo da mesa. n o s? Benvinda a nossa casa. cumpriment mo-nos com um beijo. tal como o v¡ramos daquela vez no campo. uma atleta de luta livre feminina. na televis o. aquele p¢nei louro? Lindo. apertavam as minhas como se mordessem.. desviei-me o melhor que pude. Por baixo da massa redonda dos cabelos escuros e crespos. insolitamente baixa. torceu os l bios grandes como num esgar de dolorosa . Os seus l bios salientes deslizaram. Estava por baixo do p¢rtico da villa. depois. na realidade. n o . das minhas faces na direc o da minha boca. mas n o antigos. Alta. De que falava ela? Como costuma dizer-se. Em suma. A voz era semelhante pessoa: aparentemente jovial. Uma dessas mesas compridas e estreitas ditas de "refeit¢rio. recuou ent o e perguntou: "Pode-se saber onde estiveram? Na cavalari a. de tudo e de nada ou seja. Descarada. tudo pronto". de uma madre abadessa ou de uma enfermeira-chefe." Levantei os olhos e vi ent o a Margherita. podes imaginar bem o quadro. ali. botas altas negras . a boca proeminente. O min£sculo nariz adunco. claro! A Diana mostrou-te a paix o dela. est  tudo pronto. corpulenta. benvinda". excluindo a Diana da conversa. n o ? Mas entrem. era uma giganta. Olhei-a no rosto. como que para descobrir nela a confirma o do teu ju¡zo. benvinda. verdadeiramente espantosos pela sua imprevisibilidade e natureza s£bita. mostrava-se de um dos lados. N o vou alargar-me com as nossas conversas durante o almo o. Diana?" Esta £ltima n o respondeu. Sim. Pensei logo no teu adjectivo t o decidido: "horrenda". foi s¢ a Margherita quem falou. mas. talvez por causa da sua atitude arrogante. pensei-o mal te vi. chamin de pedra em lage. com barrotes negros vista no tecto. um tanto mecanicamente: "Vais lev -los para outra casa?" A Magherita calou-se por um instante. depois. posso fazer deles o que quiser". Portanto. daquelas declara es da Margherita. no mesmo instante. A alternativa seria p -los em liberdade. esta casa est  venda". n o vejo como poderei l  meter sete cavalos. Aproveito esse sil ncio. a sublinhar a import ncia do que iria responder a seguir. Por outro lado. Era como ter o p preso numa ratoeira. com alguma ansiedade: embora fosse claro para mim. a partir de hoje. "Como que os vais matar?" "O mais humanamente poss¡vel: a tiro de pistola. Entretanto. no sentido de constitu¡rem uma esp cie de jogo entre ela e a Diana. s o propriedade minha. falei contigo. Vou vender toda a propriedade. A Diana olhou-me e repetiu mecanicamente: "Sim. qual se dirigia claramente esta comunica o. Mas a Margherita. para te dizer o que pensei. devo confessar. do seu canto. incluindo os terrenos que rodeiam a casa. gosto demasiado deles e n o consigo imagin -los nas m os de outr m. Ela ent o disse: "Tenho que te anunciar uma coisa importante. " Margherita. Mas n o vendo os cavalos. virei os olhos para a Diana. Olhei para ela. "Puta. eu procurava libertar a minha perna das da Margherita.perplexidade. linda". Em vez de olhar para a Margherita. T¡nhamos almo ado um excelente mel o com presunto. depois articulou: "Mas eu n o quero que os cavalos morram. porque n o respondes?" "N o tenho nada a dizer". mas n o me parece poss¡vel. mas inutilmente. Pensei que eram falsas e sem fundamento." "N o queres. tirou os olhos de mim e voltou-os para a lareira. surpreendidas. hein?" . disse-Lhe brutalmente: "Diz qualquer coisa. na realidade. tinha necessidade de mostrar que acreditava nas amea as." Era um convite expl¡cito a que a Diana se decidisse. Mas se a Diana mudar de ideias. a Margherita fez o que costumam fazer os oradores no fim dos banquetes: bateu tr s vezes com o garfo na mesa. Por isso. minha muito querida. mas." A Diana perguntou ent o. a Diana fez-me saber que tencionava voltar para junto do pai. n o podia deixar de esperar que a Diana conseguisse a for a suficiente para se libert r da Margherita. A Margherita n o tinha a m¡nima inten o de vender a casa e ainda menos de matar os cavalos. Depois deste £ltimo. tens que dizer que linda". tal esperan a em breve se dissipou. ent o. Olh mo-la. Afinal de contas. sobremesa. explicou: A minha pr¢xima casa vai ser um andar em Mil o: por muito grande que seja. a Diana tamb m n o acreditava que a amiga estivesse a falar a s rio. como j  disse. Tinha a boca mais franzida do que nunca. bifes na grelha. devolv -los ao estado selvagem. que tudo aquilo era um jogo. Digo-te agora porque est  aqui a Ludovica e ela poder  testemunhar que falei a s rio. Amanh aparece um grande an£ncio num dos jornais de Roma. depois perguntou: "O que que disseste . n o fiquei excessivamente espantada quando a Margherita prosseguiu: "Ontem de manh . por qualquer motivo. durante esta cena embara osa.vender a casa?" "Encarreguei disso uma ag ncia. vou mat -los. muito prov vel que nada disso aconte a. e Diana. Infelizmente. Assim. sentia necessidade de amea ar Diana. essa mesma ratoeira "infame" de que a Diana me falara na cocheira. Foi por isso que decidi vender a casa e matar os cavalos. se decidires ir-te . pelo mesmo motivo.a Margherita parecia estar agora a divertir-se: "n o queres. Vi a Diana baixar os olhos." Houve um sil ncio prolongad¡ssimo. esses n o. Vi a Diana fitar a Margherita com uma express o t¡mida e subjugada. Entretanto. Diana. a tomar o lugar da Diana. em nada jocoso. talvez por estupidez. porque a Margherita se corrigiu quase no mesmo instante: "Entend mo-nos: estou a brincar. porque." "De mim?" "Se estiveres disposta. nesse caso. mas a Diana era pior precisamente por ser melhor: uma pessoa incerta. E isto por dois motivos: antes de tudo. Pelo menos no que diz respeito aos cavalos. Mas o meu convite continua a ser v lido. a amea a de ser substitu¡da por mim parecia exercer sobre ela um efeito indubit vel." "Posso lev -la l  eu. Depois. depois. o jogo que ela tentava travar comigo. Por isso. apesar da minha promessa." "A dona da casa sou eu. Mas o ¢dio um sentimento complicado." Devo ter feito uma cara de estupefac o. Tu. devo dizer-te que. Tomou as minhas palavras como a aceita o pelo meu lado de um outro jogo. naquele momento." . disse ambiguamente: "Digamos. neste ju¡zo. " Neste ponto. Diana." "Mas eu queria falar com a Ludovica. Afinal de contas. Portanto. disse com decis o: "Para os cavalos n o morrerem. Sim. querida Ludovica. da Margherita." " J ?" A Diana protestou com uma m  vontade c£mplice: "Vais-me primeiro deixar pelo menos digerir o almo o. talvez influa inconscientemente a minha infeliz experi ncia de colegial. tecido de elementos heterog neos.. ap¢s o convite. n o tugi. com Diana ou sem Diana. mesmo que provisoriamente.. minha querida. n o poder salvar a Diana sen o ao pre o excessivo de aceitar substitu¡-la. j  l  vou ter contigo." "De acordo. nunca odiamos por um motivo s¢. enquanto a Diana n o parecia ter dado cr dito amea a de matar os cavalos." "Falam mais tarde. que tudo depende de ti. tenho que levar a Ludovica ao quarto dela. intervindo. fechada. o que queres mesmo. tu s-me simp tica. estou disposta a fazer todas as coisas". porque. nesta altura. a Margherita era um monstro irremedi vel e definitivo. vamos as tr s descansar um peda o. quis intervir neste jogo entre elas: "Desculpa Margherita. poder s ir hoje mesmo a Roma buscar as tuas roupas. n o o fiz." Curiosamente. cobarde. eu deveria intervir com energia para arrancar a Diana s garras da "horrenda" Margherita. mas de ti. a "coisa"! Pois bem. Mas ter s que mo dizer j . temia. Tu dir s que. "N o s o todas as coisas.embora. gostava que viesses e ficasses por c . n o vendo a casa e n o mato os cavalos. e a Diana aproveita para se ir embora daqui. fui eu quem a fez vir c . Mas. Se aceitares. vai para o quarto. Olhava-me com os seus grandes olhos azuis." N o sei porqu . dilatados n o se sabia por que brusca suspeita. em segundo lugar. mas n o exacto: tudo depende n o da Diana. Assim. respondeu num sopro: "Est  bem. tu ainda n o me respondeste e. odiava mais a Diana do que a pr¢pria Margherita. sou eu que vou com ela. Talvez. fresca." "O que que est  bem? Farei o que quiseres" "Hoje mesmo?" "Sim. a Margherita n o pareceu ofender-se. Esta discuss o acabou da maneira previs¡vel: a Diana. necess ria n o a amea a. a Margherita quase me fez medo." Eu exclamei: "H  bocado. Ela chama-se Nora." " que h  bocado n o queria que a Diana partisse e sabia que a amea a bastava para a fazer ficar. Agora amea as mat -lo para a fazeres ir-se embora. os cavalos. Uma coisa ouvir certas coisas ditas por ti. Objectei no mesmo instante: "O que isso? Que que est s a fazer?" A Margherita n o se embara ou: " porque aquela puta muit¡ssimo capaz de aparecer aqui de repente e sem bater. Mas para a fazer ir-se embora. entr mos as duas num quarto de mansarda. objectei: aMas porque lhe chamas puta? J  h  bocado mesa Lhe chamaste assim. A Margherita aproximou-se.. E n o te deixes enganar por aqueles sentimentalismos: n o pensa sen o numa coisa. e com um gesto ligeiro e desenvolto. naquele momento. com tecto inclinado e uma £nica janela. sa¡u da sala por uma porta que daria provavelmente para a parte inferior da casa. Por exemplo. por baixo do tecto inclinado do s¢t o. naturalmente favor vel." Porque o que ela . Puta." Tentando interromper aquela pesada declara o de amor. cem vezes melhor do que aquela puta da Diana. mas sem xito. Ela precedeu-me ao longo de um corredor. o constrangimento aumentou quando a vi dar uma volta chave na porta. o que ela . " Diana. "desta vez. digamos por uns dois meses. . se eu amanh os matasse. tem motivo para isso. beijou-me o pesco o e depois os ombros. Para a decidir a ir-se embora. pelo contr r¡o. inclinou-se." Eu n o disse nada." Entretanto. Mas estou farta dela! Ent o. basta-me matar o p¢nei. abriu uma porta. Ficou calada um instante." "Isso que tem? Sei tudo a teu respeito. quis mostrar que tem uma alma sens¡vel. ela vai-se embora. Ali est vamos as duas. Sentia-me j  pouco vontade por causa da insist ncia da Margherita em querer-me mostrar o quarto. mas a sua execu o. E. Tentei libertar-me do bra o dela. A Margherita continuou: "Ela ciumenta. tentando ganhar tempo: "Mas h  j  a Diana". nada conta para ela. depois acrescentou: "H  bocado falei em matar os cavalos. Fiz uma certa ideia de ti. passou-me um bra o volta da cintura. Julgas que realmente. Tu tomas o lugar dela". nunca me dar : um verdadeiro amor. abatida e perplexa.. ela experimentaria o grande desgosto que diz? Nada de nada. amea avas matar o p¢nei para impedires a Diana de te deixar. com uma das m os." Garanto-te que. Mas tu s cem vezes melhor do que eu supunha. e tudo o mais. n o ? Tr -la para aqui tamb m. Se eu matar o p¢nei. faremos as coisas de maneira a despach -la. isto para come ar?" Objectei. sobretudo. Mas como estavas presente. ela que fingia dormir. Contou-me tudo: o col gio e que ias ter com ela de noite. por fim. disse contra a minha pr¢pria vontade: "que queres afinal de mim?" "Aquilo que a Diana n o me pode dar. venham as duas viver comigo. de p . a Margherita e eu sa¡mos. mas." Estava encostada a mim. que decides? Senti-me sinceramente surpreendida: "Mas o que que queres dizer?" "Aceitas vir para aqui comigo. e outra s o as mesmas coisas ditas por uma giganta com olhos de porco e focinho de macaco. mostra-se desdenhosa e depois acaba sempre por dizer que sim. em direc o ao piso superior. quase embara adas. empurrava-me para a cama e. Objectei debilmente: "eu j  gosto de outra pessoa. Faz birras. est s a ver qual. Falou-me tanto de ti. Ao fundo do prado. Trazia uma coroa de flores vermelhas volta do pesco o. a Diana fez men o de se inclinar na direc o onde devia estar o p¢nei. vinha a Diana. antes de dizer fosse o que fosse. a sua cabe a desapareceu. para repousar por fim um pouco. estou pronta. a cabe a da Margherita. circundada por uma alta sebe de buxo aparado. bateram porta. n o era. quase ¢dio por ela. O p¢nei. com efeito. A Margherita disse impulsivamente: "Est  bem. como um c o. do lado direito. Finalmente." A Margherita por um momento. t o vil e t o vol£vel: minha chegada. cheguei-me porta e abri-a. frente. Olhava a piscina e dizia para comigo que n o passava duma esp cie de cen rio de teatro: em breve. pouco tempo depois. com efeito. Com os olhos cintilantes de excita o. Ent o uma sequ ncia alternada de ac es e contempla es come ou a desenrolar-se. destacava-se uma grande piscina de  gua azul. ordenando-me que n o a abrisse. as flores pareceram-me ser rosas. me agarra os pelos do p£bis com os dedos e puxa com for a. que sobe a m o entre as minhas pernas.levantava-me desajeitadamente a saia. por baixo dos seus olhos. Atr s do ponei. continuou vis¡vel: dir-se-ia que olhava para qualquer coisa que estava acontecer atr s da sebe. via-se o prado que se estendia atr s da villa. Esperei um bocado. desapareceram e. desembocava ali uma pequena prociss o. vinda do lado da cocheira e atravessando o prado. espera que voc s acabassem. No mesmo instante. ei-la. Este seguia docilmente. Ora. demasiado baixo. n o achou que responder. Depois falou: "Marguerita. Soltei um grito de dor e libertei-me com um sac o. Vi as tr s figuras seguirem at pastagem aberta entre as duas sebes altas de buxo. segurando-lhe a longa cauda loura com ambas as m os." Eu perguntei com surpresa: "aqui. levantei-me de um salto e fui janela: tinha a certeza de que havia qualquer coisa ali destinada a ser vista por mim. E. com o focinho tapado pela pelagem comprida das crinas ca¡da para diante e com a apar ncia de quem est  a meditar. mas n o sabia exactamente o qu . confesso-te." Sa¡ram e eu atirei-me para cima da cama. uma constru o alongada e baixa. sem olhar para mim: "Aqui no corredor. laia de resposta. com a solenidade de quem segura o manto de um soberano. A Diana estava entrada e olhou-nos em sil ncio a ambas. Mas ao cabo de alguns minutos. pelo contr rio. trazia o p¢nei pelo cabresto. Da janela. ofegava ainda mostrava-se alterada. pois. articulou com esfor o: "ent o n o foste dormir?" A Diana sacudiu a cabe a: "estive aqui o tempo todo. para l  da piscina. a Margherita fez-me violentamente sinal com a m o. suplicara-me que a levasse dali. ap¢s tantas emo es." Senti. vinha a Margherita. tu sabes que muitas vezes. aconteceria alguma coisa mais. exactamente como faria um homem libidinoso e brutal. agora acocorara-se atr s da porta. O recinto tra ado pela sebe de buxo abria-se a meio e revelava. voltaram a aparecer por tr s da sebe. Primeiro. . depois. Passou talvez um minuto. vis¡vel. vamos" E depois. mas sendo agora apenas vis¡veis as cabe as das duas mulheres. em perspectiva. n o visto nada por baixo da saia. com o "li" e as botas de cano alto vermelhas. virando-se para mim: "Ent o estamos combinadas! At j . da variedade mais simples. com uma £nica fieira de p talas na corola. espera que "acab ssemos". e especialmente no Ver o. devagar. sem d£vida as cabinas dos vesti rios e o bar para os aperitivos a seguir do banho. onde?" Ela respondeu em voz baixa. sentada no ch o. dando certa ordem outra. como j  fizera na cavalari a. Houve um momento de imobilidade. de mart¡rio. Voltou a desaparecer logo a seguir. sa¡ do quarto. s¢ com uma das m os. Tua Ludovica. empalidecida e gasta por uma maturidade precoce. n o tivesse mantido comigo uma atitude pelo menos ins¢lita no plano profissional. te contei toda esta hist¢ria bastante sinistra. num sinal de recusa. Na express o absorta e preocupada dos grandes olhos negros. Vais agora perguntar-me porque que. durante uma viagem aos tr¢picos. dialectal. no tremor que tantas vezes lhe aflorava aos cantos da boca.ent o. Confesso que. Em palavras ch s. eu vencera j  a tenta o e s¢ pensava em ti e em tudo o que de bom e de belo representas na minha vida. desci ao r s-do-ch o. na qualidade de convidado especial. Voltei. Mas uma menina. A Margherita estendeu um bra o e carregou com a m o na cabe a da Diana. A seguir. depois a Margherita. agora as cabe as das duas mulheres eram simultaneamente vis¡veis. Vi ent o a cabe a da Diana come ar a descer lentamente e desaparecer de novo. Mas a Marta n o me teria inspirado qualquer forma de curiosidade sentimental se. mi£da. uma enfermeira que conhecera alguns meses antes. por debaixo dos seus olhos. como tu dizes "horrenda". sa¡ da janela. o p¢nei. Nessa altura. uma frente outra. tive quase a tenta o de Lhe ceder. e a cabe a da Diana reapareceu acima da sebe. no hospital onde tivera que estar internado por causa de certas febres misteriosas. afinal de contas. j  corria pela estrada fora em direc o a Roma. dir-se-ia. E respondo-te: por arrependimento. Mas a Diana n o cedeu. T -lo-ia feito precisamente por ela me repugnar. a mergulhar. contra¡das provavelmente em  frica. Era a Diana agora quem contemplava qualquer coisa que se passava atr s da sebe. na brincadeira. com uma cabe a encimada por densos cabelos castanho-avermelhados encrespados e finos. por minha sorte. j  tudo tinha acabado. durante a minha doen a. uma bofetada em cada face. Escreve-me depressa. Pequena. precisamente por a achar. Mas. esbofeteou duas vezes a Diana`. foi ent o a vez de desaparecer a cabe a da Margherita. uma vez que sabia que ambas se encontravam agora consagradas "coisa". ou quando . a Marta acariciava-me todas as vezes que me voltava a fazer a cama ou a compor os cobertores. como s vezes algu m faz no mar a outra pessoa para a obrigar. Talvez a Margherita tenha falado. precisamente por ela me implorar que tomasse o lugar da Diana. cheguei ao jardim. apartados por uma risca ao meio. a tua lembran a n o me abandonou. cheia de alegria. Vi claramente a Diana sacudir a cabe a. empinou-se mostrando bruscamente acima da sebe as patas dianteiras e a cabe a. no minuto seguinte. decorreram mais alguns intermin veis minutos. o p¢nei n o voltou a empinar-se. no momento em que a Margherita se me encostou na sua mansarda. a Marta tinha um rosto redondo de menina. AO DEUS DESCONHECIDO Durante aquele inverno. a ver o meu autom¢vel estacionado diante da porta de casa. Quando a Diana bateu porta. a Margherita emergiu por seu turno. inopinadamente. melhor. encontrava-me muitas vezes com a Marta. Sem me apressar. a ideia da inf ncia mesclava-se estranhamente com a de sofrimento ou. £ltimo pormenor: tinha uma voz um pouco rouca e falava com um sotaque rude. Pus-me ao volante e. o sil ncio." "Apesar de tudo. o que o impede de fazer certas coisas. isso que cria imediatamente a atmosfera da cl¡nica. para mim. n o. que estou ali a fazer bem ao doente e que n o devo ultrapassar certos limites. serve tamb m de mortalha aos cad veres. mais . cujo sentido real n o me fora poss¡vel compreender: "A sala interior est  sempre vazia. sabe-se l  porqu : "o len ol. na sombra e no abandono da sala de dentro. por m. O len ol. isto : sentia que n o me visavam a mim. se para tanto se lhe prestasse a ocasi o. e soubera desde sempre que aquilo. melhor que mo digas j . e disse-me com dureza: "Se vieste at c  para recome ar as coisas como na cl¡nica. Mas eram. Tais palavras pareciam lugares comuns um tanto pat ticos. a n o ser por debaixo do len ol. sempre entre as virilhas. car¡cias de certo modo impessoais. num recanto escuro. mas apenas uma parte precisa do meu corpo. havia em tudo isto algo de misterioso. disse-me num tom de desd m: "Est s a comportar-te exactamente como todos os outros." E isso que quer dizer?" "E isso recorda-me que sou uma enfermeira. a Marta parecia vontade e falava com toda a liberdade da nossa rela o. vamos poder estar sozinhos"." "Mas em que consiste a atmosfera da cl¡nica" Ela respondeu com leve impaci ncia: "A atmosfera da cl¡nica. ela t -lo-ia feito com qualquer outro doente. Mas sem irmos muito longe. depois da minha sa¡da da cl¡nica. Depois. o facto de o doente estar deitado na cama e tapado pelos cobertores. e nada mais. Aqui. os m¢veis met licos. Confesso que tive a impress o de que. ao mesmo tempo. eram simplesmente a verdade. O encontro f¢ra marcado para um caf dotado de uma chamada sala interior. mas com uma estranha condi o: "Est  bem. destinados a salvar a dignidade da Marta. como descobri pouco depois. Mas mal me sentei sua frente. quase ingenuamente: "Mas porqu na cl¡nica e aqui n o?" Olhou-me com certa demora antes de responder." Agora. vamos ver-nos. h  qualquer coisa em ti que me inspira confian a. assim. habitualmente. Eram car¡cias fugitivas e extremamente breves.entrava em contacto com o meu c¢rpo por ocasi o das minhas necessidades naturais. Porqu na cl¡nica e aqui n o? Porque me falta aqui a atmosfera da cl¡nica. como arrancadas ao segredo que as tornava furtivas e incenas. Ela tinha a cabe a lan ada para tr s. pedindo-Lhe um encontro. a cl¡nica. N o recebera nunca um beijo sequer da Marta. com a seguinte frase. encostada parede e olhava-me com desconfian a. situado no mesmo bairro em que morava a Marta. mudei completamente de ideias. Ela marcou-mo imediatamente. o cheiro do desinfectante. Por fim. parecia-me uma coisa nojenta." "O len ol? N o percebo. como hei-de dizer-te? Os m dicos. deves lembrar-te que aquelas festas que tanto te impressionavam." N o pude deixar de exclamar. a Marta talvez fosse recome ar as suas invulgares incurs es pelo meu corpo. vi-a sacudir a cabe a. porque n o quero perder tempo e vou-me embora. semelhan a do que se passara na cl¡nica. E no entanto. Assim." "Para mim. enquanto eu Lhe ia explicando que sentia o maior prazer em voltar a v -la: a sua presen a na cl¡nica ajudara-me a passar um momento dif¡cil da minha vida. foi mais por curiosidade do que pelo desejo de reatar qualquer rela o que. a ideia da doen a. No entanto. Fora ela a indicar o local. Eu disse ent o. da cura. mas s¢ porque me pareces ser diferente dos outros e me inspiras confian a". as irm s. telefonei Marta. da morte. nunca tas fiz no corpo despido mas sempre por cima do len ol. o quadro este e n o pode ser sen o este: a irm . s escondidas. fui despej -la e lav -la casa de banho e depois voltei para Lhe arranjar a cama. e. " Ela redarguiu de pronto e com vivacidade: "Mas eu n o sou nenhuma viciosa. N o este o quadro" "Sim. Onde est  o v¡cio em tudo isto?" O meu pensamento girava em torno daquilo que ela me estava a dizer como se andasse volta de qualquer coisa obscura e indecifr vel. De facto. ro as. esse. n o insisto mais. Levantei-Lhe os cobertores. o doente a quem. sempre naquele mesmo caf . como se estivesse a falar sozinha: "N o acreditas. "Mas foste tu quem ma indicou. como exemplo. a vida continua ali. com o term¢metro.precisamente: os do len ol. Que horror!> Retorqui-Lhe. e apostos. por um lado. por m. queres ir um destes dias a minha casa? Ponho-me na cama. porque perto da minha casa. do outro lado.! Gosto de tocar o sexo do doente atrav s do len ol por um motivo que n o tem nada com o v¡cio. quer dizer: logo que sinto que a festa produziu o efeito esperado." "Apostos para qu ?" Ela disse ent o. Tem uma mulher. finjo que estou doente. Mas a minha festa como um pedido. tirei a arrastadeira. o m dico.. n o tanto por vaidade como. e fa o com que me internem de novo." "Que motivo?" "Como te hei-de explicar? Digamos que como que para me certificar com a m o de que.basta-te?" "Evidentemente. O quadro. movido n o sabia por que curiosidade experimental: "Tens que me desculpar." Insisti. E mal sinto a resposta. N o conseguia. mas de cuja realidade n o fosse l¡cito duvidar. tentando ver o que ela desta feita me responderia: "Se quiseres. com um bigode e um rosto de express o mesquinha e vulgar.. Um homem de meia idade. disse-Lhe: "Portanto. calvo. ro ar . negociante ou lojista. Nunca prolonguei a car¡cia at ejacula o do doente. explicar-me porque que fazia o que fazia." " esse. por tentar assim compreender melhor ela pr¢pria porque se comportava daquele modo. Enquanto aqui." "Est s louco? Chegaste a esse ponto" "J  te disse: estou um peda o apaixonado por ti. como "bons amigos" e com a promessa rec¡proca de nos voltarmos a ver. preferia contar-me hist¢rias em que aconteciam sempre as mesmas coisas: via-se que Lhe dava prazer falar-me disso. Ou melhor: pelo teu v¡cio. Na condi o. e fico embrulhado no len ol. presente. tocas. que est  sempre ao p da cama dele a rezar passando as contas de um ros rio a grande velocidade. embrulhado no len ol. uma das suas hist¢rias: "ontem. . como Lhe chamas. acaricias por um momento o sexo. talvez.. com a cruz no peito. no meio. Talvez quisesses que eu agora te mexesse pela abertura das cal as por baixo da tua roupa de dentro. g nero beata. O certo que estou um peda o apaixonado por ti. volt mo-nos a ver mais vezes." "Mas continua a ser a tua casa e n o a cl¡nica. Por fim. nesta saleta de caf .." "Sim. tinha ido p r a arrastadeira a um doente grave.. rude. por m.. de que. apesar da doen a. Eis. e nunca fiz nada mais do que isso" Depois deste e outros discursos semelhantes. pus-Lhe a arrastadeira por baixo das n degas magras esperei que defecasse. deix mo-nos. v s ter comigo ao quarto. digo que preciso de an lises. pelo menos por um instante s¢. Vamos ver. como costuma dizer-se. deixar de exclamar: "que estranha sensa o!" "era uma impress o de vitalidade e de pureza. molhados e ressumantes de  guas marinhas. de dentro do escuro da sala. Que h  . o mais tranquilo de todos os doentes. morreu esta noite" "Mas como que pudeste fazer isso com um homem desses: t o doente. mas. olhos rasgados e risonhos. nariz encurvado. um atleta. Alguns minutos passaram. gostava que me apertasse a m o. vulgar. imprimi palma da m o um lento movimento rotativo. entre os cobertores e o len ol e poisei-a aberta no seu sexo. embrulhadas em celofane. apanhando-Lhe o sexo todo. N o digo nada. de toda a sua pessoa emana uma vitalidade rude e simples. n o sei como. que eram de mau agoiro. a Marta chegou com o rosto perturbado. mas olhando para o visor vibrante de luz. cujo visor est  sempre aceso diante da cama dele. como de costume estava a rezar ao p da cama. com a voz velada: "Sim. enquanto lhe dizia em voz velada: "Vai ver que se cura depressa"." Uma outra vez. a seguir irritou-se com a mulher que continuava a rezar. j  deviam ter passado as tr s." " Porqu ?" "H  um doente que eu acho muito simp tico. nessa altura.Era tarde e a mulher. estendo-Lhe a m o e ele aperta-ma com for a: estava realmente a sofrer muito. antes pelo contr rio: delicado e leve. de repente. adequada ao homem vulgar que era: "Se voc quem mo diz. Foi operado h  pouco tempo. das pessoas que est o com uma dor muito intensa e mal conseguem falar: "Por favor. a palma da minha m o comprimiu um volume t£mido semelhante ao de um molho de flores frescas." N o pude. E eu confirmei. "E ele sempre se curou a valer? "N o. sabes. chama-me e vou dar com ele como de costume com a televis o acesa. embora n o se queixe nem diga nada a ningu m. e ele. senti-o apertar-me os dedos com mais for a. olhando para a televis o. como se se interrogasse a si pr¢prio. nunca diz uma palavra: mant m-se direito e olha para a televis o. vivos. garanto-te. Tem uma cara grande e s¢lida. Poderia ser o jovem mais belo de toda a terra. como para assinalar a irup o de uma dor mais aguda. tirei a m o da sua. campe o j  n o sei de que desporto. gritando-Lhe que acabasse com as ora es. fazia-me parecer que tenho ao p de mim a minha m e ou a minha irm e sofrer um bocadinho menos". Ele respondeu de forma alusiva e maliciosa. mesquinho. respondeu que sim. mas nem pesado nem insistente. entretanto. Sempre em sil ncio. tem sofrido muito. ter  uns trinta anos. seja prefer¡vel um contacto mais ¡ntimo". e depois. Disse-me bruscamente: "esta noite passei um grande susto. de m os dadas. Ele n o disse nada. imagino-me impulsivamente a aliviar de qualquer maneira aquele sofrimento. no escuro da sala. Ele repetiu: Mais ¡ntimo" de maneira ins¢lita. mais ¡ntimo". onde apareciam os personagens de n o sei que filme de gangster". Arranjei-Lhe as roupas. Esta noite. boca sensual. im¢veis. Este era da mesma conforma o que todo o seu corpo. ainda a mexerem-se. um homem novo. Murmurei: "N o melhor assim?". introduzi-a por baixo dos cobertores. n o era nada disso. pelo menos a julgar pelo seu agarrar convulsivo. e ent o . na altura de esticar os cobertores por cima do len ol. repugnante" "No s¡tio onde Lhe pus a m o. como que de campon s. e digo-Lhe em voz baixa: "talvez. Assim.sabes que impress o tive? Que por baixo do len ol havia como que um emaranhado de polvos acabados de pescar. mudando a todo o momento de canal. ainda por cima. com um gesto r pido dei-Lhe um pux o n o violento mas envolvent . Aproximo-me e ele sussurra-me com a voz extinta. curo-me de certeza". fic mos calados. para o ajudar a vencer a dor. tiram-lhe a roupa da cama." "E depois. um bruto. Esta manh entrei no quarto e ele olhou-me e sorriu-me. ele come a de repente a repetir: "vou morrer. mais bonito e mais sincero. at porque ele dizia que tinha o p frio e insens¡vel. embora de uma comicidade um tanto macabra. aflu¡ra em for a quando eu apoiara a palma da m o no sexo dele. vou morrer. para ti que c  os tenho". agora tem a cara vermelha.." J  percebi. por baixo do len ol dele. vou morrer.?" Ela respondeu obstinada: "N o." Uma outra vez ainda. e com esse sorriso libertou-me do remorso. parecia moribundo.de mais puro do que um animal vivo. a Marta contou-me uma hist¢ria de certa maneira c¢mica. o m dico de servi o nocturno. de estender a minha m o num lugar onde. com efeito. tirar francamente o len ol e. Fic mos assim ainda por um momento. aquilo continuou a ser mais forte do que eu.. mas n o teria sido melhor. se ergue um volume realmente enorme.. n o resisti tenta o. eu n o queria de maneira nenhuma tirar-Lhe o len ol. aproveitando um momento em que Lhe arranjava a cama. acabado de sair da profundidade do mar? N o sei se consigo dar-te uma ideia. Cometi o erro. imagina o que descobri: dois test¡culos grandes e duros como os dos touros de cobri o e uma esp cie de tubo mole ou serpente sonolenta. ao fundo da qual agora havia j  s¢ um p a despontar. por cima do len ol. ou outra vulgaridade do estilo. a transbordar sa£de. que aconteceu?" "Bom. como caracter¡stico das hist¢rias de hospital." "Desculpa. Pelo contr rio. Continu mos. que me tratar  como uma rainha. propriet rio de um restaurante. um dia declara-me que quer casar comigo: diz-me que rico. A impress o era t o forte que n o fui capaz de deixar de lhe segredar de novo: " bom. e ia-o ro ando de leve. exactamente como certas  rvores depois de serem podadas. E depois. que devia ter-me afastado no mesmo instante. Foi mais forte do que eu. porque pensava que o sangue que antes deixara de circular. ele tinha a perna esquerda inchada. Disse-me: "Est -me a acontecer uma coisa extremamente aborrecida. de leve. era eu quem estava mais assustada e dizia-me que era minha a culpa. Curiosamente. outros m dicos. para mim. como te contei." "o que ?" "H  um doente que quer a todo o custo que eu case com ele e me amea a: ou casas comigo ou fa o um esc ndalo. de maneira nenhuma. E que aconteceu? Ele ejaculou?" "N o. E. digamos um par de minutos mais e. Estavam todos assustados. mas despertou imediatamente e murmurou-me: "Faz-me mais. nunca tinha visto uma coisa assim. evidentemente. depois. Ele parecia estar a dormitar. Mas sabes que mais? Naturalmente. ele j  n o dizia nada: estava. enorme. Chegam a irm . para sentir o maravilhoso volume dos test¡culos e a grossura extraordin ria do p nis. com o dobro do tamanho da direita e viol cea: um ataque de flebite. a meditar na sua proposta de casamento. Tinha uma perna com um abcesso no joelho. estupefacta retiro a m o pressa e come o a chamar. que n o deixar  que me ." "Quem ele?" "Um homem horr¡vel. cortaram-Lhe a perna e ele refloresceu de novo em dois dias. N o v s? Tirar o len ol seria como trair a cl¡nica e tudo o que.. outras irm s. e eu. a cl¡nica significa. a flebite est  sob controlo. mas n o sem alguma vaidade. apenas para me certificar de que aquilo continuava ali. n o ?" Ele n o respondeu e deixou-me continuar. deixei-me cair. numa terra qualquer do sul. que eu iria l  ter logo que me fosse poss¡vel. " "O que que est s a dizer?" "Isto mesmo: matei o homem que amava. Pois bem. eu. Quem que alguma vez O viu? N o sou uma miraculada." "Porqu ?" " Porque tiravas de uma vez o len ol e vias tua frente o deus desconhecido. mas depois.. um dia ter s que casar. deposit rio de algo que n o lhe pertence. continuas a mexer-Lhe. imagina tu. Surpreendido. Mas n o vejo a menor rela o entre ele e os ¢rg os genitais dele. Mas arrisquei: "mas s. pareceu-me estar ao mesmo tempo com uma express o transtornada e muito calma: uma estranha mescla de humores. consagrado ao deus desconhecido. os homens que se encostam a mim s¢ me fazem nojo. com a mais profunda convic o: "eu nunca me hei-de casar". apesar de esta me parecer indiscreta.falte coisa alguma. aconteceu uma coisa estranha: de repente. ent o?" "N o sei. Mas logo que ele saia da cl¡nica: pois sim" "E entretanto. Nos transportes cheios. sentada na obscuridade do interior." Eu disse-lhe: "Se te apaixonasses. Disse-me abruptamente: "Matei um homem. tal como era meu costume com todos os outros. N o preciso de me casar." Misteriosamente. " Ela olhou-me e depois respondeu-me de modo enigm tico: "deus esconde-se. Dissera que me telefonaria." "Um deus desconhecido?. No entanto." "Oh. sozinha. talvez por ele ser intelectual como tu. j  te disse. Ele ." Olhou-me e respondeu. mais forte do que eu. ressuscitou. tudo isso mudava. n o pude deixar de Lhe contar o passo dos Actos dos Ap¢stolos onde se fala da visita de S. jurei-Lhe que nos ¡amos casar. sinto-o apenas na cl¡nica. Tamb m com ele. um pouco como um soldado a quem se confia uma arma para lutar. mas completamente diferente daquele que as irm s trazem pendurado ao pesco o. Encontrei-a minha espera. por quem eu me sentia a todo o momento . e sempre serei. eis que." "E como que te vais sair dessa?" Um sorriso malicioso enrugou-Lhe o rosto macilento e chupado de menina maltratada: "disse-Lhe que fosse ele frente para a terreola. Aperto as coxas e esfrego-as uma na outra e a¡ est . Ela ouviu-me sem mostrar grande interesse e disse secamente. E ele. depois: "Em todo o caso. como o entende o dono do restaurante. aconteceu: apaixonei-me por um rapaz de vinte anos. casada! E com um tipo daqueles!" "Bom. Imagina. Basta a ideia do amor. marcando-me um encontro para o caf de sempre. como hei-de dizer. ap¢s este £ltimo encontro. a ro  -lo?' "Sim." "Amavas um homem tu?" "Disseste-me que devia apaixonar-me para poder olhar de frente o deus que se escondia por baixo dos len ¢is. para me gelar de horror. Paulo a Atenas e do templo misterioso. as coisas come aram com os mesmos toques. Mas a arma n o dele" "E de quem . de repente. o amor" Senti vontade de Lhe fazer uma pergunta. s vezes penso que perten a a um deus desconhecido. virgem?" ""Sim. certa manh . "Mas s uma rapariga nova e tens necessidade de amor. esse deus desconhecido. pelo contr rio: justamente a minha virgindade que o atrai. depois. n o a vi durante muito tempo. feito e bem feito. eu. doente do cora o. isso fa o eu bem. mas n o o fez.. certa noite. decidi tirar de uma vez os len ¢is. Depois." Fiquei calado por um momento. sentia um vago horror e n o sabia que dizer. os saleiros de prata. Por fim. que. De um s¢ gesto. tenho a certeza. E. n o pode ter morrido por culpa tua" Ela sacudiu a cabe a: "N o. os copos de cristal da Bo mia. ofendida: "O len ol n o era apenas o s¡mbolo da cl¡nica."" Calou-se por algum tempo e. as coisas mudaram muito entre a sua mulher e ele pr¢prio. aquelas festas como algo de vicioso. uma enorme bola de s men encheu-me a boca. enquanto mergulhava o rosto no ventre dele. ent o. Diz-me l  como se pode amar um homem com o len ol de permeio. em carne e osso. para deitar fora aquela coisa. os talheres com cabos de marfim. E acrescentou: "tinha as roupas da cama puxadas para baixo at aos joelhos. juro-te. ser mais o fantasma de uma recorda o do que uma pessoa viva. a seguir. Mas n o tive coragem de voltar ao quarto: fui para a minha saleta e dormi at de madrugada. como arrancar. H  at as mesmas rosas na jarra de vidro verde. Disse-me bruscamente que o rapaz doente do cora o fora encontrado morto. ao mesmo tempo. Respondi-lhe que me sentira mal. agora trabalho num instituto de beleza. no hospital. Assim. assaltou-me n o sei que furor. que estava a dizer um adeus definitivo cl¡nica e a tudo o que a cl¡nica representara para mim no passado. separei-me pressa dele e corri para a casa de banho. como dar um grande salto no vazio e no escuro. o v u da face desse deus de que me falaste. parecia que tinha querido descer da cama. Tudo se passou em poucos minutos. a mesma toalha e os mesmos naperons vermelhos recamados de branco e. Talvez a irm n o tenha acreditado. Mas. ao contr rio do que acontecia h  quatro anos. finalmente. Mal deixei de ser a enfermeira que sabe parar para n o fazer mal ao doente e me transformei na mulher que deixa de p r limites ao seu amor. luz do incerto clar o do visor.e numa assassina. enquanto ele me perseguia com a sua voz subtil e maliciosa. interrompendo-a com alguma ironia: "o que isso? Uma met fora? Est s a falar simbolicamente" Ela olhou-me. faz rebrilhar as porcelanas. naquele momento. deu-me uma informa o: "Despedi-me do hospital. que me sacudia e me perguntava o que acontecera e porque me deixara adormecer. pela primeira vez." A MULHER DE CAPA NEGRA Na mesa. concluiu filosoficamente: "era uma enfermeira honesta e conscienciosa. de repente. Senti.compreendida e julgada. se era a minha vez de estar de vela. objectei: "bem. matei-o. entrando de trav s pela janela. Agora transformei-me numa mulher saud vel e normal . A tal ponto que Lhe parece. Foi para mim. as pratas e os cristais. vi. Fui acordada pela irm . o galheteiro de estanho . o mesmo raio de sol que. talvez tenha tido o pressentimento de que alguma coisa acontecera. fui eu. arranquei os cobertores e lancei-me sobre o seu corpo nu. no tempo do seu casamento: o servi o ingl s de porcelana azul e branca. era tamb m um obst culo material. ." Exclamei. com o visor da televis o a vibrar mais luminoso do que nunca no escuro da sala. mas viciosa.tudo igual ao que era nesses dias distantes. tudo est  exactamente como h  quatro anos. ao menos a¡ s¢ h  mulheres. tudo mudou e mudou profundamente. dizendo-me que nunca teria coragem. no sil ncio profundo da noite." Depois. acaba de prever com absoluta seguran a. o imprevisto. de um s¢ golpe. com efeito. enquanto segue a mulher at ao quarto. ter voltado a si. A solid o pesa-Lhe. depois levanta-se deitando por terra o guardanapo. pelo menos. se recusar a fazer amor com ele. atira-se para cima da cama. Porqu ? Por motivo nenhum. porque n o se trata da solid o provis¢ria que pode ser desfeita por meio de companhias.L  est  ele. se saciar definitivamente o pensamento com a ideia da mulher morta. induzem-no a entrar numa certa veleidade alucinat¢ria: no sil ncio apura o ouvido. abruptamente. esperando quase escutar a voz da esposa a falar na cozinha com a criada. deixando-se cair lentamente no fundo do luto como no fundo de uma  gua negra e estagnada. mas. obscuramente voluptuoso. como contemplar os vestidos dela arrumados no arm rio. para ele. quase acredita ir encontr -la j  na cama. fazendo as mesmas coisas de sempre: dirige-se todos os dias ao seu atelier de arquitecto. por isso. sim. assim e nada mais. se comprazer-se na dor. onde se refugiaram durante a viagem de n£pcias. um prato que. mais imaginosamente. cozinhado em fogo brando. Deste modo. por agora. sai noite com os amigos. torna-se expectativa do seu "regresso". uma vez mais a retomar a pol mica resignada e discreta. Estes gestos rituais levam-no a ultrapassar as divaga es feiticistas. h  mais de um ano. servem-se. com ele atr s. Ela corre. esfor a-se por tossir. Mas dorme sozinho. ela deixou de o sentir. esse acordo poder  talvez voltar. ainda mais dolorosa. a £nica pessoa que poderia p r-lhe fim morreu. vem a casa para as refei es. Come a. de facto. O prantear da mulher exprime-se em toda uma s rie de comportamentos rituais.. A cozinheira apresenta a travessa primeiro mulher. ningu m o recebe noite quando regressa. Ela respondeu. como se diz em tais casos. Ele espera agora . sucede. ele fica na casa que foi de ambos. come am a comer com a cabe a baixa. ou tocar um dos seus objectos de toilette. e larga a correr pelo andar. come sozinho. invenc¡vel. sim. de modo a que a carne se impregne do salgado peculiar das azeitonas e da acidez dos lim es. de algum modo. Ent o. uma solid o irremedi vel. Nesta altura. a ler. a segunda op o acaba por prevalecer. ao mesmo tempo. enquanto a discuss o se reinstala. a criada entra com o segundo prato: frango marroquina. mas. e que acontece pouco depois na urg ncia do hospital. A¡. Mas o contr rio do imprevisto o que ele. ningu m Lhe d  os bons dias de manh quando vai para o trabalho. ele est  s¢. a mulher morre sem. olhar "com os olhos dela" da janela do quarto do casal para a rua onde a casa de ambos se situa. sai sozinho. leva as m os garganta. ou. com algum sumo de lim o e uma grande quantidade de azeitonas. afastando precipitadamente com uma das m os o prato e os talheres. Insensivelmente. A mulher solta um grito sufocado. a expectativa de uma "apari o" da mulher avan a. depois. se liga intimidade de ambos: cozinharam-no em Marrocos. havia entre os dois um acordo f¡sico perfeito. assim. sabe que ele a ama. he com uma do ura estranha: sim. ama-o. em torno do facto de a mulher. fulminante. ou. perguntando-se a todo o momento o que h -de fazer. refugia-se no quarto do casal. A receita exige que o frango seja partido em peda os pequenos e. no momento de deitar-se. seguindo-a sem perceber. n o h  porqu . sim. um per¡odo l£gubre e. O imprevisto um osso pequeno de frango que se lhe cravou na garganta. reclinada nas almofadas. etc. com as duas m os no pesco o. etc. de noite. depois a ele. Depois da morte da mulher. Por fim. o choro da esposa n o termina. n o Lhe escapa o car cter m¢rbido destas "fabula es. de maneira nenhuma. fantasiar. Sim. aqui. Assim. a frequentar salas onde tem a obscura esperan a de a "reencontrar". come no hotel. Em Roma. enfiar-se em Capri. Esta fase do reencontro mais duradoura do que a do "regresso" e parece nunca mais ter fim. a fazer qualquer coisa banal. come a a abrir nele o caminho do "reencontro". de carne e osso. encontr -la em casa. d  um primeiro passeio. Parte. porque n o havia de ser eu?" "mas s um fantasma!". Toca-me. ele quem vai abrir e ela diz-lhe que se esqueceu das chaves de casa. como sempre esquecera datas. ao seu pranto. especialmente se vista de costas e de longe. voltar  a encontr -la exactamente porque isso imposs¡vel. loura e alta. para dissipar esta atmosfera l£gubre. Em suma. para Capri. v televis o. qualquer mulher nova. por motivos igualmente banais e normais." Naturalmente. Novembro. encontra a solid o: quase todos os hot is e restaurantes fechados. Praticamente. ela estar  ali. faz-me uma festa. Mas. o h bito de n o o avisar de antem o do dia e da hora em que chegava das suas viagens. Come a a andar pelas ruas. n o haver  ningu m. sou Tonia. como sempre acontecera. poder  abandonar-se s suas recorda es. ainda que. objectos. o seu "reaparecimento". decide mudar de ares. normal. nenhum turista. sou eu. como previra. pode ser ela. s¢ a gente do lugar. nessa altura. limita-se a assumir um aspecto diferente. Se continuar assim. substitui o. ela n o tenha dado sinais de vida durante algum tempo. Vai passear. entre os vinte e os trinta anos. estar  sozinho por op o. olhar  no rosto uma mulher e exclamar : "mas s tu. Entretanto. terei que reconhecer tamb m que sou um demente que acredita nas suas pr¢prias alucina es". radica-se nele a convic o de que. imagina. e n o exactamente magra. janta. por reencarna o. pensa: "estou a enlouquecer. reflectir. de imprevisto. Tonia". Apesar desta regularidade. de resto. volto com certeza a encontr -la. Que mais n o seja porque apenas se "regressa. mais simplesmente. a entrar nos s¡tios p£blicos. a caminho da piazza di Spagna. E ela responder : "Sim. esta o morta. a p . Come a bruscamente a fazer uma vida extremamente regular: levanta-se tarde. encontr -la numa carruagem do metropolitano. Assim. Ou sup e ent o que ela telefona do aeroporto. por exemplo. para fazer compras.que a mulher bata porta. n o o impede de continuar espera de reencontrar a esposa. onde. Quando a emiss o acaba. Ou ainda. Sim. na ilha. ao passo que o "encontro" poss¡vel em qualquer momento e em qualquer lugar. ressurrei o. Como se a morte tivesse . Um dia. em ocasi es determinadas. Por fim. Por fim. vai descansar e procurar recuperar a energia gasta na dor. At porque. fecha-se no quarto a ler. a ouvir m£sica. pedindo-Lhe que a v  l  buscar: tinha. e depois. acrescenta um travo de desafio sua esperan a. Mas uma solid o diferente da de Roma. no sal o quase deserto do hotel. a esposa est  morta. mas de que tal n o impede que seja poss¡vel. cada vez mais profundamente. Deste modo. ap¢s a ideia do "regresso". por conseguinte. vai deitar-se. talvez a sua obsess o seja apenas uma quest o de nervos. com efeito outrora. conta. sua frente. estava obrigatoriamente sozinho. acontecimentos. d  um segundo passeio tarde. Este medo da loucura. "N o. como acontecia quando ficava espera que ele voltasse do atelier para o jantar. sem d£vida. de desequil¡brio f¡sico. refugiando-se em Capri? H . quisera ter a certeza de a penetrar primeira tentativa. come a a recordar cada vez com maior precis o e objectividade epis¢dios do tempo em que a sua mulher e ele ainda faziam amor. sem juntar a isso. Tratava-se de um sexo de . entrara sem hesitar na primeira porta que encontraram frente. a essa irrealidade m¢rbida a que quizera fugir. embora tivesse uma erec o muito forte e decidida. havia na rua numerosos hot is. ele aproximara-se e. certa manh de Primavera. ela respondera em voz baixa: "N o. Os dois grandes l bios estavam ainda colados e como que adormecidos e mortificados. semelhante a uma ferida informe e n o cicatrizada. da sua parte. ela estendera a m o para tr s e pegara-Lhe. qualquer participa o f¡sica. A esposa e ele tinham-se encontrado casualmente. cheias. sob a forma de um olhar carregado de desejo. Falara sem olhar para ele. nada de hot is. levantando a saia acima dos rins. disposto em camadas sucessivas. como uma flecha lan ada com destreza e seguran a." Ele olhara volta: para al m das lojas elegantes. voltando-Lhe as costas. Aparecera-lhe. Entraram no elevador. contando-se entre os melhores da cidade. por m. fazemos l  amor. erecta diante da porta." Vira-a ent o debru ar-se nas escadas. Se n o. avan ara directamente para o elevador: parecia saber perfeitamente para onde se dirigia. inclinara-se at ver. sempre podemos comprar uma mala. no sexo. algo que. diante dos olhos. "Queres que vamos para casa?" Para sua surpresa. surpreendidos e felizes com aquele encontro fortuito. partira dos olhos dela e o fitara directamente no centro das pupilas." Ela olhara-o demoradamente e dissera a seguir: "N o. teme cair numa esp cie de necrofilia: na adolesc ncia. a masturba o nada mais era para al m do prolongamento imagin rio de uma rela o normal. Por isso. vendo-nos chegar sem bagagem. Estendera a m o e afastara-os delicadamente com os dedos. emergiam as n degas dela. a que poderia levar sen o. ent o. o interior do sexo." Pegara-Lhe na m o. gravando uma incis o funda na carne. ent o. agarrar-se ao corrim o com uma das m os e lan ar a outra para tr s. podemos ir para um hotel. as mulheres cujas lembran as o levavam a masturbar-se eram mulheres vivas. vem comigo. ela dissera que sim com um meneio da cabe a. tinham desembocado no patamar e verificado que a sa¡da para o terra o estava fechada. O elevador parou. no intervalo superior das coxas. Se a sa¡da para o terra o estiver aberta. apertando com for a. mas j . Ele aproximara-se e. Estas "voca es n o s o diferentes das que se fazem na adolesc ncia e que. Ele dissera-lhe de repente: "Queres fazer amor?" Como incapaz de falar. a fenda r¢sea e tortuosa do sexo. muito brancas. justamente. e ela explicara: "Quase nunca h  quem more no £ltimo patamar. como as p talas de uma flor por abrir. de um rosa incendiado e brilhante de licores. ficamos no patamar e n o apar ce ningu me. sobretudo. Acima de tudo. Mas duvido que nos d em quarto. de um disco. quero que seja j ". verdade. um epis¢dio do tempo feliz em que a mulher e ele se amavam que Lhe torna insistentemente mem¢ria. numa rua da cidade onde h  um grande n£mero de lojas elegantes. visando e atingindo o centro do alvo. muitas vezes. E dissera depois: "Se quiseres. ele. a mulher dissera-Lhe entre dentes: "vamos fazer aqui. de forma oval. Mas masturbar-se em inten o a uma morta. e J . entre a pelagem loura. limita-se a fantasiar a mulher "em ac o>. ele.. ent o. Ela andava procura de um saco.. t m a masturba o como desfecho. que d  para o terra o.retirado a tal g nero de "voca es o seu car cter er¢tico. Na penumbra do patamar. mas onde?" "N o sei. rijas e brilhantes. Algo de decisivo acontecera no momento em que se reconheceram. que a primeira parte do corpo a decompor-se depois da morte s o os ¢rg os genitais. de substitui o: uma mulher id ntica esposa. tinham sempre feito amor estendidos na cama. certamente. . um destes dias. acaba por cair em si. vendo que semelhante transforma o da nostalgia de uma pessoa particular em obsess o fetichista por uma parte do corpo de qualquer pessoa. o seu sexo. no fundo. mas tal como o viu nessa manh . mas encontrar .mulher ou do corte de uma faca afiada? Ficara-Lhe. N o. Em vida. agora e sem ele se dar conta. dizendo para consigo que. Tudo isso ser  simples e f cil. depois. mas n o gorda. ao fundo. £nica. entre as n degas. com as n degas muito brancas e ovais. mas todo o seu pensamento se recusa e agita perante esse pensamento. corpo a corpo. pedir-lhe-  que se debruce numas escadas. ele penetrara-a profunda e completamente com um s¢ golpe de rins. os sexos. desse olhar. na fantasia. Assim. abra ados. Leu. entre os vinte e os trinta anos. cheia de formas. aquele sexo rasgado e informe. com as m os nos degraus da escada. At porque. para a eternidade vivo e cheio de desejo. em Capri. no fundo. este pensamento engendra um outro. l  no alto. at quele dia. Parece-lhe estar a seguir. uma mulher misteriosa que. agora torna-se emblem tica. mas um afortunado reencontro. ele afastar . a primeira jovem loura que Lhe calhar encontrar e convenc -la-  a entregar-se-Lhe exactamente do mesmo modo . um dia. n o existe. Naturalmente. durara apenas um instante. mas que outras agora estavam em condi es de Lhe oferecer. de reencontro. por m. por uma frac o de segundo. s o realmente intercambi veis. a mulher fora inconfund¡vel. n o quer imaginar o sexo da mulher como ele agora. apanhar  na rua. conclui no termo desta rumina o. ele sonha qualquer coisa de que a mulher fora apenas deposit ria enquanto viva. Numa dessas noites. Ent o. A pouco e pouco. j  n o o desfecho de uma obsess o l£gubre. da morta ao seu sexo pode significar a sua transforma o em s¡mbolo misterioso e fascinante da feminilidade. de algum modo. Agora. teve o seguinte sonho. e a mulher come ara a mover os flancos de um lado para o outro. a ferida n o cicatrizada. Sim. que lhe parecia imposs¡vel ter entrado em decomposi o no fundo de uma tumba. uma vez garantida a semelhan a de certos pormenores. cruento e briLhante como uma ferida. o choro pela mulher torna-se insensivelmente choro por qualquer coisa que a mulher tinha em comum com tantas outras da sua idade e complei o f¡sica. no patamar do edif¡cio da via Veneto. se assemelha sua esposa. o sentimento de uma descoberta irrevers¡vel. voltava-lhe muitas vezes mem¢ria como algo de vivo. embora isso n o seja de excluir por completo. como as duas p talas de uma flor.como a esposa se Lhe entregou naquela manh . em Roma. com dois dedos. mas um sexo semelhante ao dela f cil de encontrar. abre terreno a um in¡cio de esquecimento. insubstitu¡vel. por cima dos rins. Tudo aquilo. n o se lembra onde. ao mesmo tempo imediatamente fulminante e lenta nos seus efeitos. se incline para a frente e levante para tr s a saia. id ntico. provavelmente. e voltar  a ter diante dos olhos. enquanto imposs¡vel substituir um rosto. aqui em Capri. Talvez n o volte a encontrar a esposa. Consola-se. Bastar  para tanto. Atrav s dos desvaneios em torno do seu sexo. os grandes l bios. deitada para a frente. a redu o. no patamar da casa da via Veneto. Ela e ele ser o amantes. era a primeira vez que via o sexo dela com tanta nitidez e precis o. descobrir uma mulher loura. olhos nos olhos. no passeio solit rio e tranquilo de Tragara. diz para consigo. bem aberta. no momento preciso em que se aproxima da ferida e a vai penetrar. julgou que se tratasse de um beco. com uma cor branca e luminosa que nenhumas meias podem imitar. Mas no sonho. se sentia mais livre e mais segura de si. tem a mesma maneira de andar: incerta. A mulher. por cima das botas. ela n o poder  fugir-Lhe: o passeio de Tragara acaba no belvedere dos Faraglioni. meditabunda. N o traz.Ela surge envolta numa grande capa negra: e a sua mulher. "fez-se sonhar" para o prevenir de que ele a encontraria. o vento marinho . Al m disso. Enfim. arranca o seu sexo de dentro das cal as. O sonho continua. sob a apar ncia de uma mulher de capa negra. para levantar a capa acima dos rins. julgara que a mulher estava encurralada na via aparentemente sem sa¡da do casamento. passeia em direc o aos Faraglioni e v . no largo do 6elvedere. quando a mulher n o trazia meias. l  em baixo. que avan a meditabunda ao longo do passeio deserto. desembocam. entretanto. ele aproxima-se. ao longe. Como a mulher morta. na algibeira. no passeio de Tragara. na noite seguinte. uma curta faca bem afiada? E. um seguindo o outro. como que tacitamente de acordo com ele. fica-lhe. sobretudo. fende profundamente essa bainha num ponto um tanto abaixo das n degas. calmo e preciso. Decep o! As n degas e as coxas da mulher surgem fechadas e como que cobertas por um inv¢lucro branco e opaco. prepara-se para a penetra o. isso queria dizer que tinha o corpo completamente nu. esta tem cabelos louros e compridos. com os cabelos louros espalhados pelos ombros. v a ferida causada pela sua faca. al m das roupas de fora e das altas botas negras com manchas e desenhos vermelhos. muitas vezes n o punha nada por baixo. at localidade do Arco Naturale. por Fim. apressa o passo. no patamar da via Veneto. dirige-se imediatamente ao parapeito e. Sente-se agora feliz: atrav s do rasg o na bainha. exactamente como a morta fizera. continua volta da ilha. solidamente agarrado pelo cabo. desse modo. a mulher ficar  sua merc . Cheio de alegria. pelo contr rio. segue-a com a decis o do homem que sabe o que quer. espaLhados largamente pelos ombros. tem subitamente a certeza de que se trata da mulher do sonho. inconscientemente provocante. desta feita. Lembra-se ent o de que. procurando alcan ar a desconhecida. Por isso. a mulher e ele. de resto. n o hesita: tira a faca do bolso e. Deste sonho. com os bordos rosa p lidos e as camadas profundas de carne viva. tivera uma muito parecida. e tem a certeza de que o ter . Era h bito dela: quando envergava uma pele ou uma saia ou um vestido suficientemente largo e quente. traz as pernas nuas. estende a m o para tr s. uma figura de mulher envolta numa capa escura. Mas. Tamb m naquela manh da via Veneto. o passeio "n o" um beco fechado. eis que desperta. Na realidade. cada vez mais incendiadas at se tornarem de um vermelho de sangue. a recorda o da figura feminina com a capa negra. encurralada. Este pormenor do passeio de Tragara sonhado como semelhante a um beco fechado surpreende-o quando desperta. dizia que. pois n o ter  por onde escapar em frente. onde ele esperava surpreender o sexo n o v sen o o tecido duro e herm tico de uma bainha. a¡. descobre-o pela cor da pele exposta. o homem segue aquela mulher que se assemelha tanto que morreu. como no seu tempo. quando se inclinara para fazer amor com ele nas escadas e levantara a saia acima dos rins. pouco antes de morrer. quando. e trata-se de um pormenor decisivo. Sim. Com estes pensamentos. No seu sonho. A noite est  suave e h£mida. pudera verificar que n o tinha nada em cima do corpo. Ent o. certa manh . al m disso. na realidade da vida. com excep o de um pequeno pormenor. ela vai encostar-se ao parapeito e olha para baixo a voragem obscura da qual se levantam. " Ela limita-se a dizer: "est  bem. Entretanto. depois. e tem um rosto. incertos e enormes. Como no sonho. com precis o e calma." O tom dela ¡ntimo." A mulher fica calada por um momento.e pergunta. Mas tem que prometer-me que n o se ofende. em todo o caso. os dois grandes rochedos em sombra negra. com naturalidade e facilidade. Mas tenho medo de que se pare a com ela tamb m em certo tra o que ultimamente me desagradava muito nela" "N o estou a entender. enquanto finge absorver-se na contempla o do panorama. parece-Lhe desej vel que assim seja. ou. Mas acaba por dizer: "Parece-se muito com ela fisicamente. De repente." O homem sente-se bruscamente t o perturbado que quase n o capaz de articular palavra."poderia ainda vir a acontecer" . sem o menor embara o. Limitava-se a dizer que n o sentia desejo. Tive a desgra a de perder a minha mulher. Conte-me ent o o sonho. c£mplice. afinal de contas. nariz arrebitado. de modo que o homem acaba por a alcan ar apenas no largo do belvedere dos Faraglioni." "Quando morreu. mas. talvez da idade da sua mulher. perturbado: "Que pormenor" eEu n o uso cal as por baixo. comenta com uma crueza imprevista: "Sabe-se l  o que que voc quereria dela! Provavelmente. Depois. D -se conta de estar a comportar-se como um louco. e parece caminhar lentamente. A mulher ouve-o atentamente. sem omiss o do mais pequeno pormenor. mas. nunca o soube. come a a falar com ela: "Sabe que sonhei consigo esta noite?" Como previa.balou a as l mpadas frouxas." Ele conta-Lhe o sonho. observa-a de relance. a mulher est  agora em plena luz. de um azul duro e frio. de novo na sombra. volta-se para ele e diz-Lhe em voz baixa. qualquer coisa do g nero do seu sonho da noite . ao mesmo tempo desesperada e lisongeira. pelo contr rio. Voc parece-se com a minha mulher. quase a tocar com o bra o no bra o dela. "eu conto-Lhe. Ele olha-a e v que ela sustenta o seu olhar com uma estranha express o de dignidade. n o se sabe como. responde ele. n o muito diferente do dela: cabe a redonda e levantada. Como no sonho. Isso t -lo-ia feito de qualquer maneira. que amava muito. os olhos um pouco encovados. Por fim. ele aproxima-se. boca t£mida e um queixo ligeiramente recuado. parece-se com a sua mulher. Mesmo sem o sonho. E sobretudo. suspensas a intervalos regulares. a minha mulher havia mais de um ano que se me negava. mant m sempre a mesma dist ncia entre ela e ele. n o se admira e n o o recha a. muito pr¢ximo." Ele repara na frase . nova. embora continue apoiada no parapeito. Diga-me em que que me pare o com ela. que n o vai julgar que me estou a servir do sonho como de um pretexto para a abordar. se encontra inclinada a satisfaz -lo. Volta-se para ele. Como se quisesse dar-Lhe a entender que sabe o que ele quer e que n o se recusar . diz: "tudo isso poderia ainda vir a acontecer. Sim. sim? E que acontecia?" "Se quiser". considera-o por um instante e depois pergunta: "Ah. Depois. E depois morreu. teria tentado falar consigo. mas assiste-o e guia-o uma esp cie de seguran a de vidente: sabe com toda a certeza que a mulher n o o ir  repelir. num tom de conversa ociosa e casual: "agora fale-me da sua mulher. quase provocante." " Porqu ?" "n o sei. Esta noite irei ao teu quarto. fechando a capa num sereno tom de desafio: "agora. mas logo que deixam o largo e enfiam pelo passeio de Tragara. Trata-se de uma coisa que realmente t¡nhamos feito h  uns dois anos. enrolei-me na capa e . por fim. como ela recusava?" ":N o." "Num patamar? No £ltimo. neste parapeito" "n o. de p e de costas. com a sua express o incompreens¡vel de h  pouco. agora. decide-se a trat -la por tu: "E gostavas de o fazer comigo?" Ela olha-o. nas coxas e no peito. certa manh em que nos encontr ramos por acaso. " "O qu ? Fizeram isso aqui. " "E f -lo-ias agora?" "Sim. teria gostado que ela fizesse exactamente isso mesmo comigo.passada". depois vamos para a varanda. p ra. Eu j  reparara em ti e por isso n o fiquei muito espantada quando me come aste a falar. que Lhe recorda igualmente a mulher. o mesmo p lo espesso. como no meu sonho?" "Sim. Depois. desabotoa o fecho. Mas n o era apenas um sonho. n o podendo deixar de lhe dizer: "Tenho tanto medo de que acabes por n o aparecer." "tamb m gosta de fazer amor assim. j  acreditas. n o" "Mas andas por a¡ assim nua?" "Tinha pressa. eu ponho as duas m os na balaustrada e faremos o mesmo que fizeste com a tua mulher no patamar dessa casa da via Veneto. prossegue num tom mais discursivo: "Vamos at ao hotel. o homem exclama: aSim. como sempre no quarto. ele n o pode deixar de achar algumas semelhan as: o mesmo peito. embora n o tenhas dado por isso. num patamar de um edif¡cio da via Veneto. E ainda um certo fluir transparente e vermelho de sangue flor da pele." Ele cala-se. Ela nada responde. O homem v ent o que. Ele aceita com al¡vio este tom de conversa. endireita-se e come a a afastar-se. deixa que os seus l bios cheios e franzinos pronunciem lentamente: "Sim. por sua vez. ent o. rotundo e cheio. A mulher pergunta-lhe: "achas que sou parecida com ela tamb m no corpo?" Estranhamente. junta as duas m os no pesco o. ao mesmo tempo ofendida e c£mplice. o mesmo ventre que emerge. acima do p£bis. curto e crespo de um louro quase fulvo. estamos no mesmo hotel. entreabre por um instante a capa. mas aqui. Pergunta: "Mas como que nunca te vi na sala de jantar?" Ela responde secamente: "Nunca l  entro. est  completamente nua. At porque. n o. aqui em Capri est  quente. Ele segue-a. baixo e s¢lido." " N o te recusas. ele receia que ela tenha mudado de ideias por qualquer motivo desconhecido e pergunta ansioso: "mas como que vamos fazer?" Desta vez." Dizendo isto. Talvez para introduzir uma nota de realismo em qualquer coisa que tem demasiado ainda do sonho que foi a sua origem. talvez iludido pela perturba o que sente." Ent o. Estupefacto e feliz com tanta sagacidade." N o sabe porque disse tais palavras. no do terra o" "Como que conseguiu saber isso" " porque me pare o com a sua mulher tamb m em certos gostos.. Ela diz. Todas as varandas t m uma balaustrada. depois. por baixo da capa." Cala-se por um instante. ela volta a mostrar-se c£mplice: " J  deves ter notado que cada quarto tem uma varanda que d  para o jardim. Entra e dirige-se por entre todas aquelas prateleiras cheias de objectos met licos e mostru rios guarnecidos de facas. n o ser  suficiente cortar os ramos que cobrem a balaustrada. quase o mesmo nome". por volta da meia-noite. quase. prevalece nele a imagem da mulher com a capa al ada acima dos rins. aplica-se a deslocar do seu lugar o vaso corrido. depois. Ele pensa: "tonia e Tania." Ora a mulher dele chamava-se Ant¢nia. de modo algo intempestivo: Quando que l  vais ter? "esta noite. como se reflectisse. por fim. entretanto. mas ter  ainda que afastar um pouco a base de cimento do vaso. Est o agora diante do hotel. rumina intensamente uma preocupa o bizarra: como poder  ela agarrar com as duas m os a balaustrada da varanda quando se inclinar para a frente. ele. deixam de falar. quase duvido dos meus olhos" Ela sorri-lhe pela primeira vez. os olhos pregados no ch o." "Pequenas ou grandes" "M dias. tesouras e outros utens¡lios de ferro. mas coisa que ele n o tem e ter . Estava atr s de ti esta manh quando pediste a chave ao porteiro." Ele sentiu vontade de perguntar porqu t o tarde. Hesita perante uma opera o que se anuncia fastidiosa e algo man¡aca. Ela tem o habitual passo errabundo e inconscientemente provocante. o homem caminha agora pela pequena rua que leva piazza de Capri. n£mero 11". no escuro. e ela responde: "J  sabia. que ir agora comprar. uma vez despida a balaustrada. Primeiro. " "Sim. O homem pega-Lhe na m o e diz: "Sabes que ainda n o disseste como te chamas?" "Chamo-me Tania. e lan a-se ao trabalho com toda a alma.sa¡. com a tesoura na m o. examina a trepadeira e v que esta cresce a partir de um recipiente de cimento e para que mais tarde a mulher possa debru ar-se devidamente na varanda. uma vez chegado pra a." A partir deste momento. diz para consigo que ter  que arrancar a trepadeira. portanto. Mas como? Poderia ser com tesouras de jardinagem. vai. mas a que horas?" eTarde. caminham apressadamente. anda depois por uma ruela estreita e escura.  o mesmo tempo. j  noite. se toda a balaustrada se encontra recoberta pelo corpo de uma trepadeira com espinhos? Debate-se longamente com este problema. Cheio de pressa. olhando para ela furtivamente. Diz ent o para a mulher. H  ali uma loja de ferragens. em seguida. Diz-Lhe: "queria um par de tesouras de jardinagem. debru ada sobre a balaustrada. ainda n o sou capaz de acreditar que existes realmente. escapa-se rapidamente. e com um "at logo". passa por baixo de um arco. Olha dissimuladamente para o rel¢gio e v que s¢ faltam vinte minutos para a hora do fecho das lojas. pelo contr rio. porque receia que as lojas estejam a fechar. acaricia-Lhe o rosto. Sabe onde dever  dirigir-se. Mas tem pressa por causa da hora do fecho das lojas. quase sem acreditar ainda no acordo por ambos firmado. do quarto dirige-se prontamente varanda. e n o consegue impedir-se de exclamar: "n o poss¡vel" "o qu ?" Ele sente-se confuso e explica: "Nada. transpondo o port o do jardim do hotel. ." Volta ao hotel. corta todos os ramos e ramifica es menores que sobem mais alto. como se n o se conhecessem. a uma mulher que o fita por tr s do balc o. diz-Lhe: "o meu quarto no segundo andar. separados um do outro. vai at casa de banho. N o posso. enquanto o duche o moLha. esperei substitu¡-la por mim e ao meu marido por ti. N o se sabe porqu . mas n o posso. se espalham pelo terra o. n o posso. despe-se. H  algu m a solu ar ao telefone. levanta o auscultador. enquanto ele. e finalmente. Pois bem. at ao fundo do tempo. completamente nu. de p . atira-se para cima da cama. mas sem o conseguir. aproximar-se da casa de banho. realmente n o posso. totalmente encharcado ainda. com um ru¡do seco. perdoa-me. Este pensamento fez com que uma sensa o de impot ncia se apoderasse do seu nimo. desculpa. Por um instante. ele esse marinheiro. a mulher era uma dessas vi£vas inconsol veis. mas pela rigorosa impossibilidade de continuar a vida sem ela.Novo problema: onde meter este. emergindo da tempestade dos solu os. Ent o. embora ainda por endurecer. quando me disseste que a tua mulher tinha morrido e que eu sou parecida com ela. Agora est  im¢vel. depois desliga. mergulhar  na profundidade da vida. para o fundo da varanda e deitar fora todos os ramos maiores e mais mi£dos que. cortados. j  n o pelo pranto. t¡mido e dilatado. expressamente e de maneira obsessiva? Por fim. Mas. leva-o ao ouvido e come a por nada ouvir. compreendendo que aquela balaustrada nua e desimpedida foi preparada em aten o a si." Repete algumas vezes ainda aquele "n o posso". caindo a pique de uma idade para outra. Exactamente como Tania. com o seu . depois. Est  precisamente a deslocar o vaso quando. a comunica o interrompida. no fundo. n o fora capaz e. levanta-se da cama para onde se lan ara agarrando o telefone. com solu os que Lhe entrecortam as frases. V -se a si pr¢prio ligado morta. se vira e revira no duche. tivera a esperan a de ser capaz de trair a mem¢ria do marido com ele que. Lembra-se de ter l¡do num romance de aventuras juvenil que um marinheiro. aspirava mesma trai o libertadora. como a sua mulher fizera antes. diz para consigo. v -lo sem ser vista. decide afastar o vaso para o mais longe poss¡vel. por fim. que matara um camarada. Tem a impress o de que sufoca. depois avan ava e estendia a m o at lhe colher o sexo. esfor ando-se por falar. nada ouve que se pare a com palavras. no patamar da casa da via Veneto. Olha um instante para o receptor. A porta est  aberta. a sua busca de uma mulher que se assemelhe sua adquire uma nova e sinistra carga de sentido. n o posso. os dois mortos tinham sido mais fortes. Ou melhor. crescendo por pequenas pulsa es quase impercept¡veis. eis. luz desta verifica o. vivo e amarrado ao cad ver da sua v¡tima. sim". como costuma dizer-se na mais convencional das linguagens. fecha bruscamente o duche e. mais forte do que eu. a reflectir. mas a impot ncia para amar outra mulher diferente dela. a voz dela que declara de um s¢ f lego: "Desculpa. por isso. olha para o pr¢prio ventre e d -se conta de que o sexo se levanta a pouco e pouco. e ele e ela ficaram de novo cada um com o seu morto. Mas dou-me agora conta de que n o posso. a fim de que ela n o descubra imediatamente com o olhar. como que indicando. o telefone retine no quarto. Ele vai murmurando repetidamente: "Sim. bruscamente. d  por si ainda espera que a mulher da capa negra se arrependa e Lhe acabe por bater porta. ela poderia entrar quase s escondidas na sala. mas n o posso ir porque o meu marido morreu h  apenas um m s e eu. perdoa-me. Amarrado morta por cordas inquebr veis. O que o une morta n o o amor. enfia-se por baixo do jacto escaldante do duche. Tomado pela for a destas imagens. ele n o "poderia trair a esposa defunta. Corre para a mesinha de cabeceira. fora lan ado ao mar. v que o sexo agora se levanta mais. como a erup o de um vulc o n o diz respeito aos campos e s casas que. Sim. tal e qual segundo os mesmos gestos: a mulher surge na " varanda. volta a subir e a descer de novo. lentamente. Agora o sentido dos acontecimentos daquela noite desdobra-se-Lhe . sepulta. Agora. "irei masturbar-me?" Sai do compartimento do duche. derrama-se-lhe no ventre e ele n o pode deixar de comparar a ejacula o a uma erup o m¡nima. como se uma camada de n voa se interpusesse entre ele e ela: a imagem tolda-se. enfia um roup o. se avizinha da balaustrada. depois. como se estivesse a sopes -los. a massa das  rvores do jardim perfila-se contra o c u escuro onde se adivinham vagas nuvens brancas. depois desfaz-se para voltar a formar-se. Agora a m o sobe e desce segundo um ritmo duro e lento. chega o orgasmo. como lan ado no vazio para a escurid o da noite. Diante de si. vermelha. debru a-se sobre a balaustrada. Olha por um momento o p nis. ou antes: uma dor ardente que se transforma em vol£pia. o jacto violento e abundante do esperma irrompe do p nis. durante demasiado tempo reprimida. eis que avista a varanda e o tro o da balaustrada que limpou do amaranhado. Depois. a erup o da vitalidade. circunda-o com o anel de dois dedos. Colhe-os na palma da m o. em estado de erec o completa. que parece prestes a rebentar. e ent o. pensa que fez amor. dos quais parece partir a for a que palpita no seu membro. e depois. Nova dissolu o e nova repeti o da imagem. olhando as  rvores e o c u. dirige-se janela. estende a m o para tr s. E eis que a mulher de capa negra surge na varanda. Finalmente. aperta-o. despeda adas pelo siroco. desce. diz para consigo. despe-se. duros e rugosos. segue com os dedos as veias salientes e ramificadas. r¡gido e obl¡quo. Mas a imagem das n degas brancas emolduradas pelo negro da capa n o dura mais do que um instante. tumefacta e briLhante como cetim. A cena repete-se uma e outra vez. passa para o quarto. escorre-Lhe para a m o. a m o sobe at acima. escura. sai para a varanda. apanha-o pela base. atira-se para cima da cama e fecha os olhos. recolhe-o na palma da m o. a obscura persist ncia do desejo. pensa de s£bito. uma £ltima golfada de esperma irrompe-lhe do p nis e. mas com qualquer coisa de infinitamente mais real. enquanto o s men cai longe dele. estende a m o para tr s e repuxa a capa at aos rins. o homem arranca-se ao torpor desta repeti o obsessiva. De uma s¢ vez. depois. permanece direito e de p . o homem n o pode impedir-se de colocar uma das m os por baixo dos test¡culos. desvanece-se. enquanto o homem fixa os olhos nas nuvens esbranqui adas e incertas de h  pouco e sente uma vol£pia que vai at dor. saindo do roup o entreaberto. Por fim. o estremecimento do orgasmo f -lo debru ar-se sobre a balaustrada. que oscila quase imperceptivelmente. quase sem dar por isso. atinge o p nis. mas agora suspensas e im¢veis no ar sem vento. apesar de incorp¢rea. todavia.jeito potente e aut¢nomo. mas n o ultrapassa nunca o gesto da m o que al a a capa. Esta vitalidade n o diz respeito muLher morta nem mulher de capa negra. no mesmo momento. p ra entretanto. que finalmente se liberta. Leva a m o ao p nis. A cada vaga de orgasmo. repuxa a bainha da pele que o envolve e faz emergir no ar a extremidade tumefacta e viol cea. tal como uma erup o. erguendo-se junto ao ngulo agudo dos " p los do p£bis. como que para ensaiar a resist ncia da extremidade. abre os olhos. Subitamente. Ent o. n o j  com uma mulher de carne e osso. "Que estou eu a fazer?". nesse momento. mas nem por isso menos profunda. e recome a o movimento para cima e para baixo. se inclina para diante. mas posso garantir-vos que essa consci ncia n o pesou para ele um segundo sequer nos pratos da inclin vel balan a do mal e do bem.ter  que se reconhecer que n o sou um diabo menor. no intuito de o fazer assinar a carta fatal. Neste ponto. haver  talvez quem queira saber como que um homem.no esp¡rito: a muLher morreu e o amor de ambos morreu. No m ximo. mas nem um bom diabo nem. todos eles se dessem lucidamente conta de que eram descobertas absolutamente diab¢licas. embora. O DIABO N o PODE SALVAR O MUNDO Sou um velho diabo. h  outros que pretenderiam um xito suplementar. o homem contempla as nuvens brancas. um pobre diabo. fui eu a sugeri-los. procurava n o pensar no caso. indiz¡vel. atrav s do seu professor de F¡sica. h . H  os que. vai despegando do ventre as pel¡culas do s men coagulado. Nenhum dos que assinou pacto comigo se sentia inclinado a renunciar s descobertas que eu lhe ia proporcionando. por m. "instein n o era. mas sem . da sua fidelidade m¢rbida. p¢de alguma vez vender a alma quele que habitualmente designado como o inimigo da humanidade. o caso £nico de Gualtieri. ainda estudante. me dediquei sobretudo ao progresso cient¡fico e que. Com estes pensamentos. com as pontas dos dedos. Se se pensar que. E esta a hist¢ria ver¡dica dessa tentativa. magro. um a um e rapidamente. era-o j  quando. menos ainda. simplesmente ang lico como "instein. para dizer pouco. Gualtieri. excep o a esta regra. grande nariz encurvado e imprecioso. e. os que procuram enredar-me. a come ar pela de Albert "instein . sim. a quem eu gostaria de devolver a sua d¡vida. aos maiores cientistas do s culo. tem ainda a voz mais suave e as maneiras mais convincentes que poss¡vel imaginar. necess rio recorrermos psic logia caracter¡stica dos chamados esp¡ritos criadores. Para responder a essa pergunta. ao mesmo tempo. Agora. simultaneamente severo e sorridente: olhos penetrantes sombra de fartas sobrancelhas negras. chegado o momento. a vi£va da capa negra curou-o atrav s da sua Fidelidade absurda. Nem tudo l¡mpido. ele libertou-se e ressuscitou. j  n o ter  que buscar o reencontro com a mulher ou a descoberta de outra parecida com ela. sem d£vida. como se verificou mais tarde. me aproximei dele pela primeira vez. mais poder e gl¢ria. Este homem extraordin rio. de aspecto juvenil: alto. Palmisano. ou seja: que gostariam de levar a melhor sobre o diabo. muito velho. E com este aspecto. impressionante. Conhecia-o j  de nome. sejam eles ou n o inspirados pelo diabo. pelo menos em fotografia? Um homem de idade e. J  ouviram falar de um poeta que tenha renunciado alguma vez a publicar um verso da sua autoria? De um pintor que tenha destru¡do uma tela que Lhe parecia conseguida? Os cientistas n o s o diferentes. cabelos de prata. e sabia muit¡ssimo bem que as suas inven es conduziam directamente a qualquer coisa terr¡vel. quem n o o conhece? Quem n o o viu j . lan ar a responsabilidade das cat strofes previs¡veis e previstas para os ombros de cientistas que introduziram desenvolvimentos posteriores nas suas descobertas e dos chefes de Estado que delas se serviram. se recusam a pagar a d¡vida. boca altiva e nobre. sob tantos aspectos. finalmente. incertamente suspensas no c u negro. entretanto. em troca das suas almas. com um rosto sedutor. de maneira nenhuma. Houve. nos £ltimos cem anos. nestes contratos diab¢licos. por f¡m. os conhecimentos que resultaram da bomba de Hiroshima. e elegante. outro s bio que me vendera a sua alma. Fitava com ar de profunda aten o um grupo de rapariguinhas. no fim de um ver o particularmente abafado. arranjara-me de maneira a n o ter nada vestido por baixo. Que mais n o seja porque acompanha a tenta o do sucesso com a outra. at que acabei por me dar conta de que os seus olhos era para outra coisa que olhavam. mas fechado. quando. Palmisano dissera-me: "Tanto pior para mim: condenei-me para nada. um dia. Com esta ideia na cabe a. O olhar de Gualtieri descobriu rapidamente esse nada. Estas mulheres em quem incarnava eram todas de not vel beleza e procuravam de todas as maneiras fazer compreender a Gualtieri que estavam dispostas a satisfazer-Lhe todos os caprichos. e decidir que encontrara n o s¢ o disfarce adequado. um pouco afastadas. muitas vezes irresist¡vel. a entrar de seguida no jogo e a puxar para cima as saias para melhor saltar. n o de espantar que. Disfarcei-me de formosa jovem morena. como se sabe. Assim. levantasse a saia muito mais do que o necess rio. J  desesperava de o poder contactar. se se decidir a fazer o pacto contigo. muito intuitivo. Mas quero recomendar-te o Gualtieri. hoje ainda t o tranquilo. elas n o tinham para ele o m¡nimo dos interesses. olhei-o com insist ncia. os cambiantes e as ambiguidades n o s o coisas para mim. grosseiros. foram uma e a mesma coisa. do desejo. o encontrei no £ltimo lugar em que teria pensado v -lo: num jardim p£blico. parecia observar com aten o bem desperta uma coisa sua frente. que. n o se dignava sequer a olh -las. mas tamb m a maneira de o fazer assinar imediatamente a carta do pacto infernal. entre os doze e os quinze anos que. Hesitei longamente sobre a melhor maneira de o fazer. O disfarce que prefiro o da figura feminina. Sou o diabo e reconhe o que os meus processos s o muitas vezes brutais. sentei-me na frente dele." Esta recomenda o inspirou-me um ardente desejo de entrar em contacto com Gualtieri. se dedicavam ao jogo bem conhecido de saltar ao p coxinho de um para outro quadrado. Estava sentado num banco de ripas de madeira. um verdadeiro g nio em pot ncia. Em artigo de morte. pondo a ferro e fogo o seu campo. portanto. sabia ter acertado primeira no . Ver Gualteri com os olhos presos nas rapariguinhas. Estava segur¡ssimo do que fizera. e a¡ mudei-me de uma s¢ vez (o diabo pode fazer tudo o que quiser neste g nero de coisas!) numa menina com cerca de doze anos. Pouco depois. o meu melhor aluno. al m disso. demonstrando uma indiferen a aparentemente f cil e sem esfor o: dir-se-ia que. Que apar ncia deveria eu assumir para lhe aparecer e me apresentar? A do companheiro de estudos? A do industrial em busca de novos engenhos para o seu laborat¢rio? A da mulher apaixonada? Ative-me nesta £ltima possibilidade. cabe a coberta por abundantes cabelos. separei-me do grupo e fui ao encontro dele. percebi-o pela pressa com que subitamente mergulhou na leitura do livro que tinha nas m os. desenhado a giz no ch o. ent o um homem ainda novo. eis-me. ora como mulher casada num dos sal es ou grupos que ele costumava frequentar. podes estar descansado que revolucionar  a ci ncia.qualquer resultado. Mas Gualtieri. para saltar. internei-me num bosquezinho do jardim. com cerca de trinta anos. com um livro nas m os. pus-me a seguir Gualtieri por onde quer que ele andasse. pernas esguias e musculadas. apresentando-me ora como aluna da universidade onde ele ensinava. s quais o jogo a todo o momento descobria as pernas bem acima do joelho. ora como prostituta esquina da sua rua. O diabo. dada a sua inacredit vel pregui a patol¢gica. do modo mais simples. Levantei-me do banco. busto delgado. depois. Ele ergueu o rosto. Vai brincar. vai brincar. E julgo saber porqu . depois ergueu os olhos para mim. As suas li es. neste ponto. n o. daqui para diante. e corri a reunir-me ao grupo das minhas colegas. no abafado do dia estival. se me fazes o favor. Pois bem." Trazia a sacola a tiracolo. dizendo com uma voz cortante: "e agora in£til continuares a¡ especada diante de mim. N o obstante a fama e a riqueza decorrentes. indicada no contrato (n o h  um pacto tipo. Ele assinou com decis o. Digo-Lhe com a voz t¡pica de uma rapariguinha petulante: "estou a fazer colec o de assinaturas. flamejar-Lhe diante dos olhos. como para se certificar das minhas inten es. no decurso de trinta anos de trabalho furioso por mim sugerido e inspirado." "E tu que me d s em troca?" Voc s pensar o que. como para lhe explicar o que queria. Esta ideia encontrava-se claramente. e ele. Deste modo. Aproximo-me dele. Digamos que por causa da sua insaci vel curiosidade pelo feminino. que me queres?" "Colecciono assinaturas: Quero que ponhas a tua neste caderno. basta que me d s uma caneta para assinar o caderno. nessa ocasi o. peguei na minha caneta escolar e estendi-lha. Ele deitou-me uma olhadela penetrante e. escuta. nada disso. eu estava ali com um des¡gnio grandioso: fazer dele um  rbitro dos destinos do mundo. ainda que sob uma forma breve. cada pacto sempre pessoal). Procurei l  dentro. v se n o te esqueces de p r umas cuecas". N o estava ali para favorecer as suas tend ncias para o v¡cio. j  compreendera tudo no momento em que poisara os olhos na p gina do caderno. as quais. para al m de l¢gico. pode saber-se o que me d s em troca?" Respondi com a m xima sinceridade: "Tudo o que quiseres. tenho na m o um caderno escolar qualquer. depois a minha cara. Qualquer coisa semelhante a um abismo devia ter-se aberto sua frente. ponho-lhe o pacto debaixo dos olhos. sem d£vida. mas tenho que reconhecer que nem um m£sculo do seu rosto se moveu. Olhou-me bem a direito. se encontra escrito em letra g¢tica (infelizmente. decidido a explorar toda a sua insond vel profundidade. com . N o quer assinar-me este caderno?" . restituiu-me o caderno. na primeira p gina. com os olhos fechados. E. Ele pegou nas folhas e eu. entretanto. na banalidade do jardim p£blico. continuava a ensinar na universidade de Roma. seria f cil. Era exactamente o que se diz ao diabo quando aparece vestido de rapariguinha. nesse momento. Repetiu: "Ent o. As letras do texto do contrato deviam. disse de um s¢ f lego: "Obrigada pela assinatura e at breve". N o fiz com que ele mo tivesse que repetir. Gualtieri assinou o pacto que. e depois inquiriu: "queridinha. lan ou-se de cabe a no abismo. responder-lhe que estava pronta a fazer tudo o que lhe agradasse no momento e da maneira que preferisse. no qual. voltou a examinar o caderno." Dei-Lhe o caderno aberto na p gina do pacto. noutros lugares. ao mesmo tempo. n o me desfiz ainda dos meus velhos h bitos de diabo de origem alem ) o texto do contrato costumado. fitando primeiro as minhas pernas nuas.e. o fez tornar-se um dos mais famosos cientistas do mundo. N o. fingi ter comich o no p£bis e cocei-me atrav s do vestido. Leu e releu aquelas poucas palavras e finalmente disse: Ent o queres a minha assinatura?" "Sim. ele poderia satisfazer perfeitamente sem ter necessidade de me vender para isso a alma.centro do seu alvo mais ¡ntimo." ":Mostra l . Depois." Ele retorquiu com extrema frieza: "ent o. Havia nele uma insol ncia soberba que n o me parecia realmente de acordo com a condi o de inferioridade em que se colocara a partir do momento em que assinara o pacto comigo. de severidade e do ura. se quiser. de alguma maneira luciferino. sim. Por isso. que lidavam todos os dias com as rapariguinhas ainda imp£beres dos primeiros anos do liceu! uma regra nunca infringida da rela o do diabo com os que assinam o pacto com ele. seria f cil voltar a p -lo. "a mim"! Tanta presun o indispunha-me. Gualtieri. espiar. aqui. num restaurante onde os colegas o tinham querido festejar com um banquete. o momento da morte do devedor. n o. de aspecto modesto e s rio. mas n o a ponto de as p r frente do seu xito. O diabo pode. n o ter s por acaso feito um pacto com o diabo?" E ele com uma imensa calma: "n o fiz. independentemente da sua profiss o. Houve algu m que. Mas eu ainda n o esquecera o longo e penetrante olhar que Gualtieri lan ara s pernas nuas da rapariguinha. embora o sexo tivesse servido para facilitar o pacto. Em suma. vigiar. A este seu desejo secreto opunham-se o n¡vel do seu ensino. como j  referi. Tamb m creio saber o motivo de tal correc o. pelo que imagino. e n o ele comigo. pus-me espera de Gualtieri nos jardins da universidade. a pensar que. no seu lugar de m¡sera criatura humana. Isto . Queria debelar aquele seu orgulho. o pacto. forma que eu assumira para o abordar. Assim. tomei como ponto de honra achar o ponto fraco desse homem que parecia ignorar que me devia a mim. o seu estrepitoso sucesso. mas eu a ditar-lhas a ele. de agora em diante n o te esque as das cuecas". hora do termo de uma sua aula habitual. vigiava-o disfar ado de copeiro. e s¢ a mim. numa aula guarnecida de rapariguinhas de doze anos do g nero das que o vi observar no jardim. onde todos os elementos do sexo feminino ultrapassaram j  os dezassete anos de idade. Nos primeiros tempos.efeito." Est o a ver! Queria ditar-me as condi es. n o deve ele ter invejado de todo o cora o alguns colegas modestos. baseando-me no nosso primeiro encontro que. como homem. seguir de perto a sua v¡tima. Parecer . todavia. acertado transformar-me. era ele o diabo. Recordo a este prop¢sito um epis¢dio significativo. Gualtieri deveria ter ensinado n o na universidade. mas numa escola secund ria. como costuma dizer-se. por conseguinte. estranho que eu n o me desse conta de que o ponto fraco de Gualtieri era a sua ambi o desmesurada. disfar ando-se de todas as maneiras que Lhe pare am convenientes. eram muito procuradas por alunas que o aspecto dele fascinava. Disfarcei-me de mulher de certa idade. segui de perto Gualtieri ao longo dos seus numerosos xitos crescentes. Na realidade. Devo confessar que Gualtieri me intrigava. no fim de uma tarde. de n¢s os dois. Lhe disse: "Escuta c . descoberto o seu ponto fraco. pareceu-me por isso. seria eu a faz -lo com ele. Mas a inclina o er¢tica particular de que me servira para o fazer assinar o pacto escondia-me a realidade. com a sua mescla. Mas nunca me chegou aos ouvidos a menor not¡cia de qualquer rela o amorosa com uma aluna. muito orgulhoso da minha conquista. vestindo roupas . na realidade. este referia-se ci ncia e n o ao sexo. Mas. n o seria ele a ditar-me as condi es. com cerca de cinquenta anos. quase chegava. entretanto." "e porqu ?" "porque o diabo est  hoje numa situa o inferior do homem. com efeito. mas estaria pronto a fazer. a de que o credor infernal s¢ se mostre duas vezes: na assinatura do pacto e chegado o momento do pagamento da d¡vida. a sua fama. nem da sua frase de ent o: "e escuta. Mas quantas vezes. criara para sempre um certo tipo de rela o entre mim e ele. Certa noite. ou seja: que as garotinhas o interessavam. olha-me e diz-me: "desculpe-me. imprevistas e perempt¢rias." "com a m e?" "claro. podem. tapo-Lhe os olhos com as duas m os e digo-lhe: "adivinha quem sou eu. Sabia que Gualtieri estacionava o autom¢vel perto de casa. corto-Lhe bruscamente o passo e digo-Lhe: "S¢ uma palavra. pondo-me em p e tirando o. No entanto. vim refugiar-me no teu autom¢vel. sem saber para onde ir. Tu apareces e tiras-Lhe a virgindade com o teu caralh o. em vez disso. Desta feita. passa-te a pressa. vejo-te sempre passar por aqui. liga o motor. Mas enganava-me.. Parado. afasta-se sem se despedir de mim. ditas no momento devido. eu estou ao lado desse telefone quase vinte e quatro horas em cada vinte e quatro. Nem no dia seguinte." Interrompo-o no mesmo instante. deu Gualtieri sinais de vida.de cor escura. De s£bito. estava completamente nua. est  intacta. aceita imediatamente aquele jogo infantil: "quem s?" Respondo-lhe com a voz arrastada e vulgar de certas rapariguinhas do povo: "a minha m ezinha p s-me fora de casa porque fiz asneira da grossa. porque sabia que poucas palavras. a rapariga chega dez minutos depois. por fim. n o tenho o prazer de a conhecer e estou com pressa. incarnar uma velha alcoviteira marcada e lev -la a prostrar-se nos jardins da universidade para oferecer os seus pr stimos a um professor respeit vel n o coisa de somenos. E com estas palavras entregou-lhe um peda o de papel com o n£mero escrito. conjunto. E agora. ouve s¢: ela tem onze anos. qual qu ! Olha. a m e j  concordou e tem-na tua disposi o neste n£mero de telefone". limita-se a dizer: "E o n£mero do telefone este?" " esse mesmo. anda volta da ideia da m e que vende a filha como de qualquer coisa fascinante e incompreens¡vel. Telefonas. desta vez mais directa.. embora o diabo tudo possa. Certa noite. em certos casos. s¢ gastei tempo e fadiga: porque. pega maquinalmente no papel. baixando exageradamente a voz e tratando-o por tu: "quando souberes o que tenho para te dizer. num bairro antigo da cidade. tenho a certeza de que n o vais correr tamb m comigo." Ele franze as sobrancelhas e responde: "Mas quem voc ?" Eu digo-Lhe de repente: "Algu m que te conhece e te pretende fazer um favor. sob a apar ncia de uma rapariga de treze anos. com a m e. um rubor carregado enche-Lhe o rosto. J  te conhe o. no entanto. por isso. numa outra metamorfose. entra no carro. abri a porta do carro e escondi-me no banco de tr s. "Com certeza. leva a m o ao espelho retrovisor. fazer cair de vez a resist ncia mais denodada.. por isso. ent o soergo-me. foi como se um golpe no cora o Lhe tivesse retirado o f lego e paralizado as pernas.clip: "Qual mi£do. Depois exclama: "Mas tu s um mi£do!" Eu respondo-Lhe. Mas." Ele n o estremece sequer. v l  se sou um mi£do!" Ele olha . Gualtieri caminha de cabe a baixa. apanha a minha imagem no espelho." Ele n o diz nada. hesita e por fim diz: "A m e concordou?" "Claro" "E ela virgem?." Ele parece obcecado. Pensei. a perturba o t o vis¡vel e profunda de Gualtieri ante a proposta da alcoviteira convencera-me de que estava no bom caminho: tratava-se apenas de insistir. como se se sentisse insultado e quisesse reagir. Espera. sei quem tu s. metendo na algibeira o peda o de papel com o n£mero de telefone. abre a boca. professor" Ele det m-se. vens. Querem saber como ia vestida? Est  j  quase dito: excepto um triangulozinho de pano por cima do p£bis. Gualtieri sai de casa. Por fim. nem nos que depois vieram. Deste modo. n o se espanta. desmentido de modo irrecus vel por um certo tom equ¡voco e a dar nas vistas. estava completamente seguro do xito da minha interven o. mergulhado nas suas reflex es. como era o de Gualtieri. De repente. ou digamos at : mais demon¡aca. mais criminosa." "n o vou. depois separara-se da mulher. sem mais. N o me queres comprar uma roupinha?" "N o. decidida. como se extra¡sse um molusco da sua concha. diz: "ah. Neste caso. Por outras palavras. que tinha agora onze anos. mas insolitamente nada imatura. Paola. Percebi ent o que deveria ter pensado em algo diferente: um homem como Gualtieri n o se deixa ca ar por uma alcoviteira vulgar nem por uma prostitutazinha qualquer. verdade. se enamorasse da filha. dado o calor intenso que fazia. a delibera o. completamente nua. da sua pessoa infantil. Ora bem. por sua vez. contra o qual muito pouco poss¡vel fazer-se. Al m disso. tivera uma filha. ainda mais provocante. a seguir. tenho vergonha de sair assim despida. indica-Lhe a cadeira ao lado da sua. L  estava a bel¡ssima Paolinha. de maneira inesperada. Esta filha era o que se chama uma verdadeira beleza. existiam: Gualtieri gostava de rapariguinhas. mas. a tenta o era favorecida pelo car cter soberbo de um homem para quem precisamente o tab£ poderia tornar-se. A minha interven o "actua". Voltejando por aqui e por ali. e a filha. em certo momento." Eu protesto no mesmo instante: "A minha m ezinha correu comigo de casa toda nua e disse-me: vai ter com os homens que te d o dinheiro. entra e diz a Gualtieri. agarra-me por um bra o e tira-me para fora do autom¢vel. eles que te d em a roupa. chamadas das hortas. que era a primeira coisa que parecia dever ter-me vindo ao esp¡rito: Gualtieri casara tarde. alternava as estadias com a m e e com o pai. e. estendida com as pernas afastadas fora dos len ¢is ca¡dos. Restava a rapariga. at o diabo. Esvoa ando." Ele n o diz mais nada. era necess ria uma tenta o mais complexa. que estava a ler. por isso mesmo. sim. foi muito simples. em seguida. emanava o fasc¡nio de uma sensualidade inconsciente e. tais condi es especiais. mergulhada no sono.demoradamente e. s¢ de m  vontade comete. tinhas prometido ajudar-me a corrigir este trabalho. pega no livro de matem tica e no caderno e dirige-se. acabo por poisar no p£bis da adormecida. Eu pecara por grosseria. assim verei melhor as correc es". porque. mais um incentivo do que um obst culo. excessivamente confiante. empresa que. tratava-se de fomentar um incesto. Pensei um bom bocado no problema. Ora. mais estranha. Certa manh desse ver o. nesse segundo. Sem bater. o desejo de uma mulher de trinta. s uma rapariga. tal era o nome da fiLha. com uma mulher muito mais nova do que ele. sai do carro. como que inspirada. transformei-me apressadamente numa dessas borboletas brancas. sai do autom¢vel. a rela o sexual entre os progenitores e os filhos encontra-se submetida a um tab£ f rreo. Passa-se tudo num segundo." Gualtieri n o pensa em nada de mau. por uma vez. induzisse o pai em tenta o e que Gualtieri. vai-te embora. abre a porta de tr s. responde que est  pronto. senti-me estupefacto por n o ter ainda pensado no seguinte. Depois volta a entrar para o carro e arranca. c  estou. sentado sua mesa: "pap . Mas Paola responde: "Vou sentar-me nos teus joelhos. sobe-lhe para os joelhos e instala-se a¡ o melhor que pode. O que eu tinha a fazer era que Paola. Haver  quem queira saber o que faz o diabo para esoltar" uma rapariguinha de onze anos. exactamente no ponto onde uma leve prega de carne anuncia o in¡cio do sexo. ao gabinete de trabalho do pai. Aproveito os movimentos dela ao instalar-se para fazer com que pare a estar a tentar com as n degas uma . particularmente favor veis. consigo infundir na menina de onze anos a mal¡cia. entrei pela janela aberta do quarto da filha de Gualtieri. excepto em condi es especiais e particularmente favor veis. Para o fim dessa mesma tarde. por isso. Trata-se de um dos empreendimentos mais ousados da minha longa carreira: fazer "entender" a Gualtieri que Paola est  a fazer de prop¢sito e. esta sala. Paola ent o salta-lhe dos joelhos e prop e: "basta de exerc¡cios. Mas isso n o basta: Gualtieri julgando que a filha est  a fazer aquilo sem querer. por fim. favorece o meu plano. como se as suas m os fossem de um outro. pega-Lhe na m o e guia-a francamente para o ponto certo. escusado andares-me com as m os por cima. Para criar uma atmosfera adequada tr gica transgress o do tab£ do incesto."Escondi-me. Gualtieri continua sentado mesa de trabalho e p e a cabe a entre as m os. Actuo da forma seguinte: Paola move-se. ilumina de modo clar¡ssimo e irreal a antec mera onde Gualtieri revolve j  as pregas dos cortinados. quando o chamamento esperado ressoa . servindo-me da tempestade. Mas. como . num clar o vibrante e intenso. pai e filha instintivamente tendem a estreitar o seu contacto. da¡ a um minuto. cujos arcos foram fechados por grandes janel es. eis que consegue "agarrar" Gualtieri. ao mesmo tempo. Ora. Se o incesto ocorrer. Paola. Paola. por seu lado. Rebento com as luzes de todo o bairro onde mora Gualtieri. Gualtieri mostra na voz hesita es inexplic veis que indicam uma perturba o profunda. pode repelir a tenta o de tirar Paola de cima dos seus joelhos. que n o se d  conta de que o est  a fazer de prop¢sito. instala-se nos joelhos paternos e. Procedo. num som argentino. A sala . o gabinete de trabalho fica assim quase s escuras. Gualtieri. bufa de impaci ncia. consistindo este em fazer com que o tab£ do incesto seja violado no interior de uma atmosfera demon¡aca. est  sossegada de maneira fora do vulgar dada a sua costumada extrema vivacidade. um antigo miradouro. uma provoca o. com a m o livre acende a luz. fa o "coar ao longe um trov o rouco e cavernoso. quase incr dulo. enquanto um rel mpago ofuscante. Gualtieri. O rel mpago extingue-se. desaparece na ponta dos p s. depois. por m. acrescenta ainda uma recomenda o: "Se me encontrares. como que atenta a qualquer coisa que est  a "sentir". escura e parada.esp cie de press o sobre o membro do pai. porque s¢ estamos n¢s os dois c  em casa. quando acabar de me esconder. entretanto. nesta altura que eu intervenho de novo. o trov o morre ao longe."de se levantar de um pulo e sair pressa do seu gabinete." E com esta advert ncia que na realidade. V se me achas. Mas Gualtieri tem um £ltimo impulso de resist ncia. Enquanto a li o decorre. sob influ ncia minha. as c£pulas. Paola deixa-o fazer por um momento. pela sua pr¢pria configura o. os telhados de Roma como uma fonte carregada de pensamentos turbulentos. eis de repente a voz de Paola que grita: "porque que n o me vens procurar?" Entre trov es e rel mpagos. distra¡da e pensativa. Eu vou esconder-me." Gualtieri aceita: neste momento aceitaria ir procurar a filha no inferno. arranjo maneira de adensar sobre a cidade um temporal tremendo. depois. arrisca uma car¡cia t¡mida. n o fico com as m os paradas. no escuro e no sil ncio do andar ouve-se apenas o murm£rio difuso da chuva a cair sobre a cidade. na realidade. Uma imensa nuvem. excepcionalmente longo. mas numa atmosfera muito diferente da que envolve habitualmente um bom pai que corrige os deveres filha. Vamos jogar agora um jogo. e a li o pode come ar. suspende-se sobre os campan rios. aparentemente j  informado do que vai suceder. ao mesmo tempo. de maneira a que Paola d a ver que "fez de prop¢sito". sai tacteando da antec mera e avan a pela sala de estar. Basta que grites o meu nome. Ent o imobiliza-se de repente. chamo-te e tu vais minha procura. Este gesto de desconforto n o o impede. para o diabo que sou. ou o bruscamente um surto de riso sarc stico. todas as coisas se tornam fantasmas da mente perturbada. Paola dissolver-se.em n voa entre os bra os do pai e este ter  apenas o estofo do sof  para morder. depois. s¢ se sentir  desse modo talvez mais determinado. E para te iluminar. for a de fotografias dissipou a apet ncia incestuosa e. ordenou fiLha que voltasse a vestir-se para ir estudar mais um bocado. exactamente por ter favorecido a ambi o de Gualtieri que me achava impedido. desfiz imediatamente a carga precoce de lux£ria de Paola. Recorrera ao antiqu¡ssimo truque da reprodu o art¡stica. constitua o centro da vis o. me deixei desencorajar depressa demais. decidi n o mais o tentar.inevit vel que aconte a. portanto. com efeito. dos "meus" rel mpagos. o ventre recuado e as pernas bem fechadas. Paola j  ter  ultimado certos preparativos e desencadeio assim um rel mpago intens¡ssimo. servindo-se dos rel mpagos da "minha" tempestade como de l mpadas de magn sio. verdadeiramente possesso. Tenho que fazer uma fotografia da minha duquesinha de Alba. para al m desse ponto. entre acessos de riso cont¡nuo e com uma entoa o verdadeiramente diab¢lica. em vez do magn sio. nesta altura. Ent o. Alguns poder o objectar agora que. Gualtieri escolhera a via contemplativa. abandono a partida. E ainda por cima. J  sei o que vai suceder: no mesmo instante. ele. foi. Passados alguns dias. Gualtieri tira do fundo de um arm rio uma m quina fotogr fica e. como Gualtieri. restava-me doravante esperar a meia-noite do dia fatal e exigir ent o o meu cr dito. o peito avan ado. Gualtieri. suspendo a tempestade antes do tempo. Trata-se. os trov es. na atitude de convincente expectativa (eh. a £nica diferen a em rela o ao quadro reside no facto de Paola ter arranjado as coisas de modo a que a fenda branca. de o tentar de novo atrav s da inclina o pelos amores infantis. e a chuva que lhe servir o de fundo. N o se podem . ou quase. derrotado. cujo l¡vido clar o dura p lo menos meio minuto. eh. a partir da noite do temporal. digamos assim. enquanto qualquer outro no seu lugar se sentiria por isso desencorajado. a voz de Gualtieri que exclama: "um Goya! Um Goya em minha casa! Tenho que conservar a mem¢ria desta apari o. De raiva. In£til contar o que se seguiu. Antes de eu ter tempo para me recompor. a¡. Mas espera-me uma surpresa. os rel mpagos. espero apenas que Gualtieri se lance sobre a filha. de ruptura: como os sonhos. no fim. No escuro. fotografa uma e outra vez a filha deitada nua em cima do sof . at ao ponto. vou utilizar estes magn¡ficos rel mpagos tempestuosos!" Dito e feito. O rel mpago extingue-se por fim e a obscuridade volta a reinar. servindo-se. Cheio de mau humor. Gualtieri v Paola estendida em cima de um sof . Sinto que devo uma explica o sobre esse ponto. Mas certo que. Est  completamente nua. Fica quieta. em vez de se descarregar na ac o. O nosso pacto chegava ao termo dentro de dois anos. soube que Gualtieri aceitara ensinar numa universidade americana e partira para os Estados Unidos. ou seja. conforme anunciara. da norma deste tipo de sortil gios diab¢licos. Gualtieri volta para o seu gabinete e eu. levando-  a cair de novo no torpor da inoc ncia infantil. Compreenderam? No £ltimo momento. apanhara-me na jogada. e. selvagem. h o-de convencer Gualtieri de que at a pr¢pria natureza se revolta contra o seu horr¡vel crime. sou um diabo culto!): as duas m os juntas atr s da nuca. Tenho raz es para crer que. na realidade. no fundo da sala. entra a tactear na sala. cheia e implume do sexo seja bem vis¡vel. depois. Como j  indiquei. Quanto a Gualtieri. s o reais apenas at certo ponto. O pap  vai tirar-te um retrato. na minha figura de adulta. pequeninos p s? Um peito apenas insinuado? Estatura inferior au normal? Uma a uma. durante quase dois anos. como se o pr¢prio disfarce se tivesse tornado a minha segunda natureza. Ent o. afastava estas hip¢teses pela boa raz o de que quase todas as mulheres t m. irremediavelmente feminina. uma vez que. indispens vel que Gualtieri. descobrisse alguma coisa da rapariguinha que outrora o seduzira. O segundo dos dois anos referidos estava a terminar. O diabo pode ser indiferentemente macho ou f mea. queria-o meu amante e. uma reprodu o fotogr fica ampliada e emoldurada. Deste modo. Um grande cientista n o pode passar o tempo a meter-se com rapariguinhas de escola. mas ao mesmo tempo. Habitualmente. por resolver a dificuldade do disfarce. Chegavam-me da Am rica os ecos dos seus xitos extraordin rios. cheguei £nica conclus o poss¡vel: tinha-me apaixonado por Gualtieri. se perdia para sempre. decidi-me: iria ter com Gualtieri aos Estados Unidos. antes de Lhe apresentar o caderno fatal. como um art¡fice competente perante o belo objecto que fabricou. Porqu ? Finalmente. mas isso n o me dava prazer. franja e tra os mi£dos. pelo menos. descobrira finalmente na ambi o o limite que a simples consci ncia Lhe n o podia garantir. eu era feminina. dei-me conta de que um insistente sentimento de frustra o levava a melhor sobre o costumado orgulho artesanal. Incapaz de dominar "'. todavia.. Gualtieri salvara-se no mesmo instante em que. a qualquer pre o. Mostrava uma jovem mulher . coisa que n o sentia ser estranha. E era. Desprezada e repelida por ele sob a apar ncia que me fora ditada pelas suas inclina es viciosas. servira-me do sexo como de um meio para atingir o meu fito. a sua secreta inclina o.servir dois senhores. uma destas caracter¡sticas e nem por isso s o tomadas por meninas. veio-me uma recorda o ideia. Levando-o a assinar o meu caderno escolar. desinteressei-me da sua pessoa. procuraria tent -lo uma vez mais antes de Lhe aparecer com a minha verdadeira apar ncia de diabo e exigir-Lhe o cumprimento do pacto. Era mulher e amava Gualtieri e de nada me servia sab -lo loucamente ambicioso e cheio de sucesso. Alguns pensar o num amor homossexual: o diabo masculino. fizera com que ele pusesse a ambi o no pico mais alto da sua vida. E como seria de outro modo. O jovem solit rio e inseguro quanto ao seu destino. Gualtieri ensinava na universidade de A. a partir desse momento. Seja como for. se entre outras coisas. os seus xitos eram obra minha. Mas n o assim. sob a apar ncia de uma mi£dita de doze anos.". afinal de contas. o diabo pode ser tamb m borboleta? No caso de Gualtieri. fazer amor com ele. Gualtieri. enamorara-me agora dele. por m. eu dava-me conta de que n o queria frequentar as suas li es. hesitava ainda entre a ambi o e o sexo. na parede em frente da sua mesa de trabalho. Depois. repentinamente. poder. enquanto espero envi -los para a condena o eterna. no caso de Gualtieri. heterossexual ou homossexual. um rosto de menina num corpo de mulher? M os pequenas. que se encontrara num jardim p£blico. como teria sido necess rio. Na noite em que levara Gualtieri ao limiar pr¢ximo do incesto observara no seu gabinete. Restava-me. bruscamente. assinando o caderno. Devia tratar-se de uma fotografia feita por Gualtieri durante uma sua viagem ao Oriente. olhos esbugalhados. Pelo contr rio. sigo atentamente os triunfos de todos os que firmaram pactos comigo e n o posso furtar-me a experimentar alguma satisfa o. ao cabo de longas reflex es. Pus-me a espremer os miolos: um rosto redondo. Criei uma figura de acordo com as observa es atr s mencionadas: uma mulher n o excessivamente nova. recordaria a Gualtieri a rapariga malaia sem. Pensava assim fascin -lo por meio de duas monstruosidades simult neas: . deixando ver o sexo nu.cambodjana. compreendi pela primeira vez que n o eram tanto as rapariguinhas com o seu sexo. imaginava muito bem Gualtieri a pagar uma boa maquia para obter aquela pose da rapariga malaia: uma menina pequena pela m o e um cesto carregado de fruta cabe a. dar demasiado nas vistas. para um coleccionador de selos. pelo contr rio preparada de antem o. No gesto de erguer o bra o para segurar o cesto. flancos estreitos. Ficava o problema. com um dos joelhos em terra. Paradoxalmente. nariz e boca min£sculos. ou seja. na proximidade dos trinta anos. Este £ltimo. para algu m como Gualtieri descobrir semelhante anomalia. Al m do mais. apenas o suficiente para deixar ver completamente o sexo nu. Enquanto Gualtieri me corrigia o exerc¡cio de matem tica. visando visivelmente com a objectiva o centro do meu corpo. alta. Talvez se enamorasse de uma velha se o sexo dela tivesse as caracter¡sticas do de uma garota. enquanto com a outra amparava um grande cesto cheio de fruta. Por fim. o que fascinava Gualtieri. cabelos pretos e lisos. Acrescentei seios baixos e abundantes. em suma. com uma consist ncia branda e contornos resolutamente maternais. Um golpe de sabre exposto e por fechar. o seu desenho e o seu relevo pr¢prios. malaia. abrira-se na parte da frente. Al m disso. os euroasi ticos serem em grande n£mero: deste modo. mas o comprimento da fenda era de mulher adulta: come ava pouco abaixo do umbigo e acabava sem que se visse onde. N o hesitei mais. deveria ter sido como. pretendi que fosse exactamente como o de uma menina. com o seu colorido. entre a jun o das pernas. podia pensar-se que ele se sentisse extremamente atra¡do pelo contraste entre um corpo adulto e um sexo infantil. Ent o. que trazia cabe a. ltimo pormenor: seria sapient¡ssima acerca de todas as mat rias versadas por Gualtieri no seu semin rio. ou japonesa. Gualtieri mandara ampliar e emoldurar aquela fotografia unicamente por causa desse pormenor t o an¢malo do sexo infantil num corpo de mulher. e o seu sexo apenas. sem p los e bordos t£midos. sem d£vida. sem p los e com os bordos entumescidos. j  que a fotografia nada tinha de curioso para al m desse pormenor: era uma dessas fotografias que os turistas trazem aos milhares das suas viagens ao Oriente. que. uma muLher com um sexo de menina. nos Estados Unidos. o tecido que Lhe envolvia os flancos. excepto no sexo. ali s pouco interessante. e pensara que aquele sexo era semelhante ao meu e que. Via-o depois abrir a cobertura da mulher como um pano de boca de cena. pernas bem torneadas e compridas. ficava assim explicada uma das muitas fotografias que me tirara na tarde da tempestade: de muito perto. t o invulgar e surpreendente com o seu aspecto infantil e as suas dimens es adultas. e que formava todo o seu vestu rio. um traseiro reduzido. que tudo o mais n o o interessara. Inclinava-me mais para esta segunda hip¢tese. recordando-me da fotografia da jovem malaia. tanto mais impressionante quanto contrastava com a atitude maternal da mulher fotografada. olhara para essa fotografia. s¢ que monstruosamente grande: branco. contava com o facto de. Era £m sexo de menina. de saber se a fotografia fora casual ou. com uma das m os guiava uma menina. uma simples fenda branca. com um corpo de adulta em tudo. desencantar um exemplar at a¡ imposs¡vel de encontrar. ao mesmo tempo. Compreendia-se. tentei que o meu rosto tivesse certos tra os euroasi ticos: olhos um pouco obl¡quos embora n o propriamente mong¢licos. onde continuamente se realizam experi ncias at¢micas. O semin rio tinha a sua primeira sess o quando me apresentei na sala de aula e me sentei na primeira fila. uma das suas numerosas alunas. Para ele. expressar sem reserva os sentimentos de amor que experimentava perante ele. Para falar verdade. apanhei o avi o e. Mas isto era apenas o come o. e sabia com toda a seguran a que s¢ o conseguiria por meio da exibi o do meu inacredit vel. ap¢s a aula. Era um tema prometedor. por meio de olhares. Gualtieri. mas era tudo. para dizer tudo. estava a anunciar o tema do semin rio: as possibilidades a longo prazo dos futuros desenvolvimentos das descobertas mais recentes. eu n o compreendia. Eu era a sua aluna mais sabedora e mais brilhante. Gualtieri. Vi Gualtieri estremecer e fitar-me surpreendido por baixo das suas fartas sobrancelhas negras. seja porque esperava ainda n o ser obrigada a exibir-me. a pretexto da mat ria que ele expusera ao longo da sua li o. nunca visto e monstruoso sexo infantil. Seria embara o perante o sentimento que eu. aproximei-me de Gualtieri e apresentei-me. como j  disse. justamente nesse momento. seja porque. precisava de fazer o papel de estudante instru¡da e inocente. tendia a fugir-me. eu era uma elegante rapariga euroasi tica. ou mesmo espantosamente informada. em pleno deserto. n o passa de um ap ndice da central.sexo enorme e cultura nunca vista. pelo menos.. pressupondo um conhecimento superior ao dos seus alunos. n o haveria mais do que tr s ou quatro pessoas no mundo a poderem consider -la em todo o seu alcance. de resto lisonjeiro para a sua vaidade. n o tirava os olhos dele e tentava. perguntou-me em que universidade me formara. Que fazer? Procurei abord -lo de novo. de as alunas se enamorarem dele. doravante. Mas havia no modo como procurava fugir-me qualquer coisa que. aterrei no aeroporto de A. em vez de se interessar mais por mim. Ent o. j  n o lhe seria poss¡vel confundir-me com os seus outros alunos. como rapidamente verifiquei. pela parte da minha pessoa que Lhe era vis¡vel. Fiquei muito feliz com a surpresa que Lhe inspirara. e eu respondi-lhe que vinha da universidade de T¢quio. Perguntei-me muitas vezes qual seria o motivo de semelhante atitude. a universidade. no termo de uma viagem demorada. que incidiu sobre quest es gerais. Depois. atrav s das quais uma mulher procura atrair as aten es do homem que ama. ent o. pretendi recorrer s manobras normais. Mas agora. Sentava-me. t o claramente deixava transparecer? Ou seriam os meus conhecimentos cient¡ficos que o intimidavam? Ap¢s longa reflex o. Agora precisava de fazer com que ele se apaixonasse por mim. na primeira fila. pelo menos nos primeiros tempos. nos meus olhares. Mas rapidamente tive que reconhecer que Gualtieri n o alimentava o menor interesse por mim ou. Uma observa o da qual. aproveitando um momento em que o apanhei sozinho. O Estado onde se encontra A. no fundo. porque tentava ele. manter-me dist ncia? Por fim. Isso sucedeu quando o semin rio ia em meio. A empresa n o era f cil: mais simples exibir o saber do que uma anomalia sexual. passada a primeira surpresa perante os meus excepcionais conhecimentos. pelo contr rio. Compreendi logo que ele n o me atribu¡a a menor import ncia: para ele. famoso pela sua central nuclear. Muito satisfeita comigo pr¢pria. sem d£vida. desde o in¡cio. disse para comigo que Gualtieri devia estar j  bastante habituado ao facto. lancei-Lhe a flecha de uma observa o de ¡ndole cient¡fica. muito sabedora. foi o pr¢prio Gualtieri que me forneceu uma explica o. As exposi es de Gualtieri tinham-se tornado ultimamente cada vez mais dif¡ceis . eu era apenas uma aluna entre muitas. a cobrar o pre o dos meus interessados favores. ocorreu-me uma ilumina o. tomei uma quantidade de notas. Ningu m. encontravam-se dispersos n o mais de uns doze outros estudantes.ou. Chegara a conclus es catastr¢ficas. durante uma exposi o particularmente  rdua. visivelmente. portanto. sabia nada acerca dessa descoberta. Mas a este sentimento amoroso opunha-se a minha consci ncia dos limites que ao amor impunha o facto de eu ser o diabo. por fim. ao mesmo tempo. finalmente. Recordo que ergui os olhos da mesa de trabalho e. Naturalmente. O que pude. Ent o. Por fim. entre a viol ncia e a melancolia. Depois. que ningu m. imprevistamente. pelo menos. de o apertar contra mim. obtida pelo pre o da cat strofe pessoal. levavam os desenvolvimentos futuros da ci ncia a que dedicara o seu semin rio. n o teria feito a sua descoberta e justamente essa descoberta. um humor estranho. Gualtieri falava daquela maneira porque. encontrava-se sob a amea a de uma cat strofe pessoal. Na primeira fila. por um momento. em geral. estranhamente. chegaria o termo aprazado e eu apresentar-me-ia diante dele. mas porque o amava. havia alguma coisa mais. o que significava. Esta intui o muito humana fez-me rapidamente compreender qualquer coisa que a minha natureza de diabo at ent o me escondera: estava ali j  n o para tentar Gualtieri e para o humilhar atrav s do seu v¡cio. tinha a impress o de que n o era somente o pacto a atorment -lo. que. Sentia vontade de estar perto dele.e obscuras. eu sabia muito bem que pensamento era esse: dentro em breve. estava apenas eu. se Gualtieri n o tivesse vendido a alma. J  disse que sabia . Voltei a debru ar-me sobre os meus pap is. ou porque se recusava. Realmente. numa sala bastante grande. pelo menos para mim. sabendo-o t o triste e desesperado. retomei o estudo das notas e. por cima do qual morria um sol vermelho de fogo. entender fez com que empalidecesse.o drama profundo de Gualtieri. Mostrava-se rude e simultaneamente triste. algumas semanas apenas. de Lhe dirigir palavras amigas. olhei fixamente pela vidra a da janela o deserto cinzento e frio. Compreendi-o pelo sentimento de compaix o afectuosa e inteiramente feminina que experimentara ao contempl -lo enquanto ele falava da sua c tedra. penetrava-o. Nesse dia. por conseguinte. Uma e outra entrela avam-se. Dir-se-ia que um pensamento dominante e inconfess vel o atormentava cada vez mais medida que o tempo passava. com o meu rosto verdadeiro. Era a isso e a nada mais do que isso que. amea ava agora provocar a cat strofe universal. tive que me convencer de que a minha primeira intui o fora justa: Gualtieri. para al m dele. Mas o qu ? Subitamente. na realidade. aludia a uma sua descoberta pessoal que ainda n o revelara aos demais. perante qualquer pedido de esclarecimento. Mas. com efeito. chegada a casa. era a £nica altura de entender onde Gualtieri queria chegar. excepto eu. estava a falar do fim do mundo. impaciente e simultaneamente como que toldado. procurei articular os fragmentos recolhidos. segundo toda a evid ncia. depois. numerosos alunos desertaram das suas aulas: as maneiras bruscas do professor. de Lhe acariciar a fronte. duas ou tr s filas de bancos atr s. ao mesmo tempo. intu¡a . as li es acerca dos futuros desenvolvimentos da ci ncia assumiram um car cter ao mesmo tempo fant stico e catastr¢fico. Ou porque ele falava agora sobretudo por enigmas. fic mos muito poucos. Compreendia agora . a atmosfera carregada desconcertavam a maioria. o seu discurso obscuro e. entre todos os alunos. poderia dar-se conta do seu alcance. a dar explica es. Embora sabendo que jamais poderia unir-me carnalmente a ele. a norma infernal pudesse ser transgredida. n o influ¡a sobre os meus sentimentos para com Gualtieri. dos dois. um desses rapazes que v m aqui s aulas. e al m disso. pelo menos neste caso. com as penas eri adas e hostis. " Ele disse ent o. fazia-o parecer uma ave de rapina. s¢s. Deste modo. dava-me conta de que. Mas o que era essa esperan a. pronta a agredir quem quer que ousasse aproximar-se de si.perfeitamente que. Mas agora que descobrira que o amava." Ele exclamou. disse-lhe como se de uma confid ncia se tratasse: "Parece-me que o desenvolvimento da ci ncia. o nariz aquilino. secretamente esperava. que eu adoptara. E deixe-me em paz de uma vez. por um instante. por sorte. para discutirmos todas estas quest es. a exigir-Lhe a sua alma de acordo com o habitual ritual implac vel. Mas acontece que n o estou apaixonado por si e creio que jamais o estarei. No final da li o seguinte que me esclarecera. aproximei-me dele e. seria eu a escarnecida. falando em voz extremamente baixa. continuar a esperar com o corpo. Olhei a sala. era eu agora a ver-me ca¡da? Assim. . decidi aplicar o que havia intuido para for ar Gualtieri a conceder-me um encontro fora da universidade. Basta dizer-me que compreendeu. onde todas aquelas fieiras de bancos vazios pareciam encorajar-me a uma maior intimidade. levam directamente ao fim de tudo. Desvanecer-me-ia justamente no momento supremo. isto. sem o menor alicerce real. sentia-me impelida na sua direc o por uma atrac o f¡sica violenta. Era uma magra consola o. e quase esperava. n o verdade? Foi isso o que quis dizer?" Senti-me impressionada pelo aspecto dele: escanzelado. mesmo quando a mente j  desesperou. como os perspectivou no seu semin rio. visto estar t o precisada. me desvaneceria como n voa ao sol." "Mas porque que n o pode ser? Tudo poss¡vel aos homens de boa vontade. macilento. de que prescindiria de boa vontade: n o queria a sua alma numa outra vida. Quando a minha ideia era ainda a de punir Gualtieri pela sua soberba. que. de certo modo desesperada e. sim. servindo-me do seu gosto por rapariguinhas. sempre com a voz alterada: "Em minha casa? N o pode ser. brutalmente: "Olhe. pelo contr rio. n o poderia voltar a aparecer-Lhe a n o ser sob a minha horr¡vel apar ncia de diabo. com as sobrancelhas hirsutas encimando os olhos encovados e febris. se faz o favor?" A sua voz era t o  spera que preferi responder: "gostava de ter uma entrevista consigo. respondeu-me quase com raiva: "N o estive a falar propriamente de coisas insignificantes. originalmente. sen o o meu amor? Sen o esse amor que." "E apesar de tudo. caracter¡stico da natureza humana. inef vel. ' "Que premissas. todavia. os outros alunos tinham j  sa¡do e apenas ali est vamos n¢s dois. me deveria ter servido para ca ar Gualtieri e em cujos la os. talvez em sua casa. a certeza que possu¡a de me desfazer em fumo mal a hora do amplexo amoroso chegasse. desde h  algum tempo que percebi o que voc pretende de mim. se poss¡vel em sua casa. Com efeito. claro: de certas premissas s¢ se pode chegar a um resultado. no momento preciso em que Gualtieri me abra asse e penetrasse. imaginara que o facto de me desvanecer nos seus bra os conferiria puni o um car cter de esc rnio muito adequado minha natureza demon¡aca. seja como for." tTem a certeza absoluta?" "Arranje um amante. queria-a nesta vida que est vamos a viver juntos! ." Estas £ltimas palavras foram ditas em voz alta. durante toda a sua li o. pe o-te que me fa as um sinal de assentimento. baixando os olhos. agulha e linha. e fazer-me possuir. Nesta posi o quase horizontal. bastar-me-  soltar a lingueta que o prende para que o meu ventre cheio e el stico de mulher jovem irrompa da roupa demasiado cingida. soltar o fecho das cal as e. sei que a fenda branca e t£mida do sexo vis¡vel em toda a sua dimens o invulgar. no local correspondente ao p£bis. assime. abrir. Se realmente gostares do que te vou mostrar. Depois. perplexo e talvez j  perturbado. Foi um momento de desejo tresloucado e violento. levei-a aos l bios e beijei-a com paix o. solto a lingueta do fecho clair. casaco e cal as. for a de tesoura. finalmente. que. depois reaplico o fecho clair que tinha descosido: agora. Gualtieri falava. o mesmo sexo infantil que h  trinta anos o fez assinar o caderno no jardim p£blico. que Gualtieri parecia perturbado. que envolvia as minhas pernas como uma bainha. uma vez que Gualtieri. na minha direc o.senti a louca tenta o de despir a reduzida mini-saia. as cal as abrem-se no mesmo instante. come a a encher um copo de  gua. que a pequena prostituta de onze anos Lhe mostrou despindo slip no autom¢vel. N o estou dispon¡vel." Peguei-Lhe na m o. ali mesmo. que no dia anterior eu me gabara de poder proporcionar-Lhe. Segui a exposi o sem excessiva aten o. do fundo das coxas entreabertas at quase ao umbigo. Ele olhou-me por um momento. ao mesmo tempo. tirei do arm rio um vestido cambodjano. para ele." Recuperei a coragem e expliquei audaciosamente: "Tenho motivo para crer que h  no meu corpo um pormenor f¡sico suscept¡vel de te agradar. desapareci. que a alcoviteira Lhe ofereceu uma vez sa¡da da universidade. Na tarde do dia seguinte. irresist¡vel. a coberto da c tedra de Gualtieri. destacando o p£bis para fora. como se fosse um pano de palco dando para o espect culo do meu sexo. Notei imediatamente. n o h  nada a fazer. a n o ser do olhar. bestial e inocente. pondo em evid ncia o meu incr¡vel sexo de menina. alternando frases pronunciadas pressa com sil ncios demasiado prolongados. ei-lo que se endireita. o ventre irrompe e eu afasto ent o as abas do casaco. mal a aula come ou. o fecho mal chega a correr at acima. Prevenida. os olhos orientados para o fundo da sala. inquirindo: "Amas-me de verdade?" Respondi com ¡mpeto: "amo-te tanto!" Ele disse com um tom resoluto: "n o pensemos mais nisso. talvez comovido. e cerrei lentamente as minhas p lpebras. queria surpreend -lo com a minha exibi o na altura em que ele olhasse para baixo. disse num tom paternal: " s uma rapariga estranha. abro as pernas. Depois. a filha o deixou fotografar t o demoradamente . as duas abas do casaco. vestidas as cal as do conjunto. esse pormenor f¡sico estranho e. me acariciou o rosto. Desse modo. A seguir. Falava num tom de fadiga. A minha ideia era sentar-me como de costume na primeira fila e. numa ocasi o prop¡cia. Na pr¢xima li o. Gualtieri teria debaixo dos olhos. deve ter ficado na voz muito baixa e cheia de humildade com que respondi: "amo-te e s¢ a ti que amo". como qualquer f mea de c o ou gato. decidi limitar-me a declarar o meu amor. com uma modera o mais humana. com um d bil "at amanh ". por tr s. mas antes como algu m que n o consegue concentrar-se no seu discurso por ter o pensamento preso a outra coisa. de tecido preto. alargo a abertura na parte da frente. em seguida. n o tanto como quem n o conhece bem aquilo de que est  a falar. antes de me dirigir ao semin rio. farei de modo a que esse pormenor te surja debaixo dos olhos. com a cabe a apoiada na m o. Mas algo do desvario inicial. Tinha a certeza de que nenhum dos poucos alunos que se distribu¡am pelo fundo da sala me podia ver. Depois. depois. enquanto espalmava distraidamente a m o por cima do ventre. Quase no mesmo instante. apressara-me a correr o fecho das cal as. a levantar. sem se dar sequer ao trabalho de o dissimular convenientemente. veio sentar-se ao meu lado. Este sentimento de medo transformou-se em p nico. por sua vez. tendo tido a alegria de sentir que ele mo apertava num sinal de estreita cumplicidade. cerrando-as. olhei volta e vi que a porta da sala estava entreaberta e que dois olhos coruscantes me espiavam pela frincha.. notei claramente que os seus olhos imprimiam s p lpebras. ou. Ent o. d -me o bra o e faz por falar comigo. por cima do bordo deste. professor." "ou o qu ? Sou assim desde crian a. o sexo com que ele sonhou toda a vida e que a ambi o o impediu de gozar a n o ser em sonhos. de forma perempt¢ria. Agora esse objecto privilegiado e obsessivo dos seus desejos mais secretos -Lhe exibido. um movimento de acordo. Ent o. ele elogiava aquilo que eu estivera a exibir para Gualtieri. num momento em que ele j  nada tem a perder se o aceitar e consentir com o seu pr¢prio agrado. retorquiu-me. Segredei-Lhe veladamente: "estou perdida. Gualtieri compreendeu imediatamente. Mas compreendi logo que era tarde de mais. olhou para o estudante que. nem fazes nada parecido?" "Depilar-me? E para que preciso eu disso? Nunca tive a sombra de um p lo. Bem podia repetir para comigo: "Mas lembra-te de que s o diabo!". s mesmo naturalmente assim naquele s¡tio. proposto. inconscientemente imp£dicas e provocantes. minha seguran a habitual sucedera um sentimento confuso de medo e de vergonha. quando a porta se abriu por completo e um rapaz de bluej ans e blus o aos quadrados. se estava. Naturalmente.. em passar a m o pelo p£bis. como fazem algumas vezes as rapariguinhas. deixei o meu lugar de um salto e fui colocar-me a um passo da c tedra. continuava a experimentar os sentimentos de uma mulher jovem que sabe ter sido espreitada enquanto cedia a uma galanteria demasiado audaz. senti-me mais morta do que viva. sem olhar para mim. N o pude deixar de ler o seu conte£do. aquele tipo de cabelo ruivo viu-me". Depois de ter visto aqueles olhos que me espiavam. e por isso. Pensei at . exactamente na altura em que Gualtieri vinha a descer. Com os devidos termos de cal o estudantil.e com tamanha complac ncia durante o temporal que fiz abater-se sobre Roma." Exclamei com uma vivacidade fingida: "que magn¡fica li o. mal vira o sinal de assentimento de Gualtieri. num tom de circunst ncia: "Quem pergunta sou eu. depois disse-me: "Vamos sair juntos. posso fazer-Lhe s¢ uma pergunta?". n o hesitei em conservar aberto todo o tempo poss¡vel o pano de cena das duas abas do casaco. virei o olhar para Gualtieri: vi-o beber a  gua que deitara no copo e. nesse momento. Pus o bilhete na algibeira e com o cora o em alvoro o olhei para Gualtieri: a li o terminara e ele estava a levantar-se. dizia-me que esperasse por ele no fim da aula. em certa altura. cabelos ruivos e olhos cer£leos a brilhar. Estou aos trinta anos igual ao que era j  aos oito" "n o te depilas. O meu vizinho escrevinhou um bilhete e depois passou-mo para as m os. oferecido. A natureza feminina extremamente impression vel ainda que esteja apenas a servir de disfarce a um diabo. e ao mesmo tempo enfiei o bra o no dele. " . "porqu Dem¢nia?" "ou Mefista". perante ele. Gualtieri conduzia com intensa concentra o. e n o de um arruaceiro. com o rosto pequeno por cima do pesco o robusto. ao mesmo tempo. esta a minha mi£da. h  muitas mulheres chamadas Mona. mas j  passou tudo. Eu respondi: "S o s¢ disparates." "Dem¢nia". ao alto de um pesco o forte e musculado. que mostrara pol¡cia. De repente. ao mesmo tempo. Ou melhor. tratava-se de um rapaz bem educado. ela minha filha e a verdade que n o te conhece. precipitado na terra. Por isso. vamos. vem c ." Desta feita." Apesar de tudo. estendendo uma das m os e agarrando-me o bra o: "vamos. Disse. Por um instante. como se falasse consigo pr¢prio: "N o." Senti-me pouco vontade. Sem d£vida. fitava-me nos olhos com as pupilas cintilantes. quase a passo de corrida. em direc o ao horizonte ainda incendiado pelo p r do sol. eu seja um esp¡rito e. temos um encontro esta noite. repeti. interroguei-me sobre o que aconteceria se admitisse. como quem pensa com afinco em qualquer coisa acerca da qual n o consegue chegar a uma conclus o segura. significa o que me mostraste durante a li o. possa ser seja o que for). esse amor imposs¡vel ao qual eu aspirava. De resto. s capaz de me dizer como se chama?" O rapaz. " O pequeno rosto triangular dele mostrava-se duro. como que de pedra. Percebia-se que estava com vontade de gritar a verdade. disse: "a prop¢sito. Gualtieri. Finalmente. n o temos encontro nenhum. horrorizado pela ideia de que. nunca te vi na vida. que me vira com o p£bis exposto em inten o do homem que se dizia agora meu pai. afinal de contas. deixaria de querer fazer amor comigo. de todo o meu cora o. Ele respondeu com seriedade. sob apar ncias t o am veis. vou tratar-te por Mona" "Mona. expulso do c u." Eu respondi um tanto histericamente: "N o verdade. embara ado e decidido. Acabou por me responder em voz baixa. para fora do edif¡cio.Est vamos agora j  fora da sala de aula. Mas. Limitou-se a pronunciar entre dentes: "belo pai" Gualtieri arrastou-me rapidamente. movido por uma suspeita mais do que leg¡tima. eu vi-te muit¡ssimo bem. Gualtieri ¡nterveio com uma autoridade convencional e fingida: "Bom." O rapaz mostrava-se. tinha um nome no passaporte. se escondia o velho e repugnante bode infernal ( assim que a humanidade me imagina e figura desde h  tempos imemoriais. a n o conheces a ela. aquele estudante n o sabia o teu nome. Mas agora reparo que tamb m eu n o o sei. despede-te do professor e vamo-nos embora" Segurava-me com for a o bra o. como tal. deve tratar-se de um equ¡voco. Mas estava a ver que o esquecera. estamos um bocado amuados. n o disse nada. porqu " "No dialecto veneto. o rapaz de cabelos ruivos e olhos cer£leos e brilhantes cortou-nos o passo: "Professor Gualtieri. Os seus olhos falavam por ele. de resto. Mas. como se quisesse excluir Gualtieri do di logo: "em compensa o. rod vamos de autom¢vel pelo deserto. que era o diabo. um diminutivo de Dem¢nia. Queria dizer que ele compreendera. Como tu. punha-se a adivinhar. Poucos minutos depois. embora. Disse ao acaso: "Chama-me ngela. por m." . decidi negar rapidamente e por completo: "Mas que ideia? N o percebo. na realidade. era um nome que dizia a verdade: o diabo um anjo ca¡do. quando chegara ao aeroporto. aqui na Am rica. Por favor. um pouco de louco. no corredor. suspensos de postes alt¡ssimos. um desejo violento e um igualmente violento desespero. da noite. vem para cima de mim. Na realidade. que lancei as duas m os ao fecho clair. parou o carro numa zona de sombra. n o para o acariciar. abri e afastei o mais que me foi poss¡vel a roupa volta. Enquanto falo. aquela esp cie de enorme largo completamente deserto. poderei olhar-te e isso dar-me-  coragem. Havia um pequeno n£mero de autom¢veis estacionados volta: uma grua e um par de autocarros do ex rcito americano. nas t mporas. Ent o. a perder de vista para um e outro lado. como se fosse dia. Grandes candeeiros. atirei-lhe os bra os ao pesco o e murmurei-Lhe ao ouvido: "Se te d  prazer. enlouquecida: "aqui a tens. procurando os seus l bios com a l¡ngua. iluminavam. dissolver-me-ia em fumo. Mas Gualtieri. Ao fundo. estirava-me no autom¢vel. o impedia de correr o fecho. Mas ele virava a cara. Mas o desejo era mais forte do que o desespero. v .Ele respondeu ap¢s um momento de sil ncio. n o te tapes. Depois. abria as pernas e sussurrava. Olha. porque o meu ventre. " Na minha perturba o. depois de um prolongado trajecto. imagina ent o que sou o diabo. ao mesmo tempo. transbordando das cal as demasiado cingidas. francamente. virou-se para mim: "Porque que. Por m. a um grande espa o asfaltado no meio do deserto." Verifiquei. " T¡nhamos chegado. Sentei-me um . para ti." Esperava. eu penso que s o diabo?" "Porque te parece que s¢ o diabo te poderia induzir em tenta o de maneira t o particular. eu pensaria o mesmo. mas acendeu a luz interior do autom¢vel. deste modo. no rosto. nem sabia o que havia de dizer. falando entre dentes: "porque s o diabo. Reconhece o facto e ser  tudo mais simples. como por um momento ainda pensei. e foi com uma estranha esperan a de infringir a lei a que at ent o me sabia subjugada. No teu lugar." Que quereria ele dizer com aquele "tudo"? A fatal revela o da meia-noite j  pr¢xima? O amor? Retorqui: a:Sei porque que julgas que eu sou o diabo. tua. depois. desaparecendo na escurid o. segredei-lhe: "Queres fazer amor aqui no autom¢vel? Olha. n o o conseguiu. entrevia-se a barreira fechada de um recinto rodeado de arame farpado. na tua opini o. que ele me possu¡sse ali." Olhou-me de trav s. Apagou os far¢is. por baixo das espessas sobrancelhas. podes ver. Foi antes a coisa que me mostraste." Beijava-o atr s da orelha. tanto quanto mo permitiam as suas dimens es. disse de s£bito: "est  bem. Gualtieri deu meia volta. obstinadamente. naquele anseio de algum modo tresloucado pelo desespero. sou apenas uma pobre rapariga. mas t o s¢ com a inten o de me fechar as cal as abertas frente. muit¡ssimo feliz por estar agora aqui contigo e te agradar. repeliu-me com suavidade e depois estendeu a m o na direc o do meu ventre. gostas dela. ao abrigo da luz ofuscante das grandes l mpadas. mete-mo c  dentro. pelo contr rio. vou mostrar-te outra vez aquilo que te perturbou tanto durante a aula. Experimentava. muito. agora total." Fingi que n o percebia: "O que que um sexo de mulher pode ter de diab¢lico?" Ele respondeu numa voz meditativa: "O certo que s¢ o diabo podia conhecer a minha prefer ncia er¢tica particular" Senti um impulso aut ntico atrair-me na direc o dele. Entretanto. que continuava a existir nele um apetite insaci vel pelo que fora a origem da sua trag dia. "n o foi bem a maneira que achei diab¢lica. porque sabia que me n o era poss¡vel fazer amor com Gualtieri: no momento do amor. mexe-Lhe. filha da sua porteira. Falava-me de maneira ordenada. que entretanto era atravessado. da long¡nqua adolesc ncia at ao presente. um grande cientista." Fingi uma vez mais n o perceber e disse num tom ligeiro: "Mas poss¡vel que tu. falava precisamente como um famoso cientista.pouco de lado. desde o fim da inf ncia. absolutamente nada diab¢lica. se fores apenas uma rapariga apaixonada por mim. chamemos-lhe assim. poder s verificar que falo verdade: s¢ o diabo a conhece. quisera servir dois senhores igualmente exigentes: a ambi o e o sexo. racional. mas o sexo infantil. Este £ltimo. ordenado ou racional. Ora. Mas n o disso que se trata agora. O amor com a garota durara. um inverno inteiro. disse por fim." Assim come ou Gualtieri o que depressa se revelou ser a hist¢ria de toda a sua vida. Se n o fores o diabo. "Trata-se daquilo". com plena satisfa o de ambas as partes. tenho que saltar at trinta anos atr s. da maneira que se sabe. de modo a ele poder olhar-me vontade e respondi: "Olha quanto quiseres. essa confus o. e apontou o meu sexo nu. Depois. n o o sexo depilado. afeita fria estranheza das demonstra es cient¡ficas. a . A este prop¢sito. vamos dar esse salto para tr s. A qual. sem remorso ou escr£pulo algum. procurava agora iluminar o panorama de uma vida que nada tinha de simples. s¢ que a sua voz. no assento do autom¢vel. precisemos. Gualtieri disse-me que a sua mais secreta inclina o se manifestara da primeira vez com uma rapariguinha de doze anos. sejas tu o diabo ou n o." "Em primeiro lugar. como havia eu de acreditar no diabo? Mas o certo que h  toda uma s rie de elementos da realidade que tendem a fazer crer que o diabo existe." "De qu ?" Ele olhou volta: pelo largo asfaltado. s¢ ele poderia desmentir-me. acredites no diabo?" A resposta dele foi estranha e amb¡gua: "n o acredito. Mas que isso que tens para me dizer? Porque precisas de coragem para me falares?" Ele ficou calado por um momento. "Para poderes compreender essa liga o. tudo ali era luz. simples. solid o e sil ncio. especializara-se. e depois come ou. pus-me a adivinhar e o acaso quis que acertasse. Era a vida de um homem que. segundo Gualtieri. indicando com a m o o largo deserto. evidente. numa esp cie de trote tranquilo. Entre o estudante de vinte anos e a garota de doze nascera uma liga o amorosa que." Encoragei-o com simpatia: "Pois bem. por um animal que parecia um c o ou um chacal: "Sabes onde estamos? Em frente do recinto que veda o terreno onde se fez explodir o mais recente engenho nuclear. j  bastante diab¢lico que tenhas adivinhado com tanta exactid o a minha. o c o ou chacal desaparecera. nada tinha de vicioso: a especializa o ped¢fila ainda n o se instalara. "embora em ¡ntima liga o com isto"." Quis minimizar aquelas palavras: "Que elementos? O facto de eu saber que gostas de um sexo depilado? Ora. por assim dizer. deves saber que se te trouxe aqui. trata-se de uma coisa muito diferente. foi para te dizer uma coisa estreitamente relacionada com o uso dado a este lugar. como que falando consigo pr¢prio: "Se fores o diabo como ainda penso." Gualtieri disse. c lebre em todo o mundo. indicando a entrada do recinto. que ia muitas vezes ao seu apartamento levar-lhe o correio. com o passar do tempo. talvez aprecies a minha confian a: s a primeira pessoa do mundo a quem conto estas coisas. especialidade er¢tica. ou seja ocorridos n o directamente como da primeira vez. continuara a conviver com as suas duas paix es. Gualtieri forneceu uma vers o muito semelhante minha do nosso primeiro encontro. Disse-me que as provoca es da garota o haviam perturbado profundamente. Estavam as coisas nesse p . como j  disse. sucede porque se pretende que o condenado se condene com plena liberdade de escolha. E essa fraqueza. se a tentadora se aproximasse dele. em certos casos. Dava-se conta de que isso significaria o fim da ambi o. continuava consciente de estar prestes a arruinar-se para sempre.rapariga fora ter com os av¢s prov¡ncia e ele ficara com a nostalgia de qualquer coisa que . j  recusada e reprimida. procurara repetir a experi ncia. tentara Gualtieri regressar ao Para¡so dos amores infantis? N o mo disse. pelo que o condenado. ele acrescentava: "Resta o facto de que assinei num momento de fraqueza. entretanto. Portanto. Curiosamente. experimentara um imenso al¡vio: melhor era condenar-se na outra vida por causa da ambi o do que nesta por causa de umas virilhas infantis nuas. quase de ru¡na.se assemelhava muito rela o que deve ter existido entre Ad o e Eva antes da expuls o do Para¡so. Esta explica o. Mas. Ele disse-me. poderei responder o seguinte: provavelmente. Quantas vezes. " Nesse ponto. que no momento de assinar se dera conta de que as letras do pacto desapareciam da folha. uma folha branca. Naturalmente. tornar-se um incentivo e um condimento da tenta o. eis que. nesse momento preciso. mostrando-os escritos em letras n¡tidas numa folha. Mas n o se matara. e assim. Estes encontros fizeram-no cair numa degrada o t o profunda que chegara a acarinhar a ideia do suic¡dio. duvidando at ao £ltimo momento. mas pela vis o daquele sexo infantil t o parecido com o teu. por um dos numerosos mist rios da rela o existente entre o diabo e os homens. o que assina. Mas pensara imediatamente que tal . de tal modo que decidira que. numa atitude que demonstrava eloquentemente que recusa e repress o podem. do que todas as maravilhosas descobertas de Albert "instein. ainda longe de cumprimento adequado. e a da carne. Assim foi igualmente com Gualtieri. antes de renunciar definitivamente. sem saber ao certo se n o sofreu uma alucina o ou um sonho.s o palavras suas . uma vez lido o pacto. mas os resultados foram t o maus que o fizeram jurar a si pr¢prio n o voltar a cair. a da ambi o. embora permanecendo presente como tenta o. o diabo dever  fazer saber sua v¡tima os termos do pacto. na realidade. sumindo-se. sobre a qual a v¡tima por  a sua assinatura. deverei apresentar uma indica o importante acerca do modo de assinatura do pacto infernal. No entanto. da rapariguinha que jogava. essa ru¡na haviam sido provocadas j  n o pelas perspectivas de xito cient¡fico. a escrita desaparece como se tivesse sido tra ada com uma tinta que se evapora. como ele pr¢prio me disse. quando o surpreendi no jardim p£blico a olhar para as pernas das garotas. com efeito. tinha para si mais import ncia a observa o das virilhas. coincidia com a minha: tamb m eu pensara que a ambi o levara a meLhor sobre o sexo porque o pacto viera a ser a garantia absoluta de que Gualtieri a poderia satisfazer para al m das suas esperan as mais exaltadas. quando a garota Lhe pusera debaixo dos olhos a f¢rmula do pacto infernal. limitando-se a referir muito vagamente dois ou tr s encontros "preparados". se libertaria dos escr£pulos. Mas. abandonando-se definitivamente sua fatal paix o. mas por interm dio dessas figuras cuja apar ncia eu pr¢pria tomara quando o abordei uma vez sa¡da da universidade. mas. ora vis¡veis ora n o. Se se quiser saber porque que isto sucede. pela ci ncia. Fingiu n o ter ouvido a alus o nossa rela o presente e disse que a prova de que o diabo existia e de que ele pr¢prio assinara realmente o pacto estava nas caracter¡sticas actuais da investiga o cient¡fica. advertia com seguran a a presen a dessa entidade misteriosa que outrora se chamava inspira o e que prefiro indicar pelo nome de dem¢nio. Quero dizer que. Tanto melhor: pelo menos. era ele que me fazia dar o salto de qualidade da fria cogita o at a isso a que necess rio dar o nome de canto. porque. Nesse campo. O meu melhor era. Sim. a assinar o pacto. quando est vamos a falar da nossa profiss o. enquanto escrevia. devo ao exerc¡cio da poesia ter compreendido muito rapidamente certas coisas fundamentais acerca da criatividade. mas da exibi o do sexo infantil. E passemos depois ao diabo. n o me sentia atra¡do pela ci ncia. n o de poesia. t m-no tanto os bons como os maus poetas. pela poesia. se se tivesse tratado de uma alucina o causada pelo que ele chamava a sua ru¡na. dedico-me apaixonadamente f¡sica. Ele era ent o j  um homem de idade muito avan ada. o que te poder  parecer estranho. o que se deve pensar. um dia. a certa altura. Em suma. Vou com uma bolsa de estudos para os Estados Unidos e torno-me o melhor aluno do c lebre Steingold. me dava conta de que isso acontecera porque. Mas. o dem¢nio far-te-  escrever exactamente a poesia que s capaz de escrever. era de uma ambi o extrema. digamos apenas dem¢nio. salvar-se-ia de um destino que lhe repugnava e que era algo que. Perguntar s tu neste ponto: "Mas essas poesias eram realmente belas?" E eu respondo-te: eram o melhor que eu podia escrever. apesar de tudo. a poesia desaparece da minha vida. com efeito. as tuas poesias eram m s?" "Provavelmente. colocando a ambi o acima do sexo. no fundo. em rapaz. Se estiver presente. vou retomar a hist¢ria da minha vida desde os primeiros tempos at ao momento em que decidi fazer-me cientista. n o estava s¢. acreditava agora no diabo com tanta convic o que chegara a imaginar que ele talvez se encontrasse escondido sob as minhas inocentes apar ncias de jovem euroasi tica. Tanto melhor. queria vir a ser um novo Leopardi. o facto de a garota diab¢lica o ter levado. " Concluindo. Junto a mim. um novo Helderlin. por m. Depois. No entanto.desaparecimento n o devia modificar a sua decis o. mas antes. nada mais. queria evitar. E. como j  disse. uma vez que nem sequer tinha a certeza de ter assinado o pacto. At porque. a poesia servira-me para adivinhar a exist ncia e a fun o do dem¢nio." "Devagarinho: para j . S¢ que n o era assim: na investiga o cient¡fica que residia actualmente a for a do diabo. Perguntei-lhe ent o porque que. De resto. ele saiu-se com a . era igualmente um grande leitor da B¡blia. os poetas eram tamb m cientistas e os cientistas. sim. e. o dem¢nio. judeu de origem. Pelo menos. esse facto parecia demonstrar que o diabo continuava a cont r sempre com os velhos e tradicionais meios sexuais. pensava que n o havia contradi o entre a poesia e a ci ncia: na antiguidade. poetas. Portanto." "Ou seja. Era esse dem¢nio quem me ditava por dentro. prosseguiu: "Para compreenderes melhor estas provas que demonstram a exist ncia do diabo. uma quest o de presen a. inscrevera-me na faculdade de F¡sica. do diabo. todas as vezes que me parecia ter escrito uma poesia menos m  do que o habitual. Ora. abandonei a poesia pela f¡sica. como tinha um interesse vivo. n o j  atrav s da promessa do xito e da gl¢ria. o pior de um aut ntico poeta. acima de tudo. tal como as interpretara e decifrara ap¢s trinta anos de sucesso crescente e ininterrupto. do ponto de vista da utilidade para a humanidade. Da¡. Depois. de modo absoluto. Estava j  muito adiantado na investiga o que." "Pensa bem. desembocaria na descoberta final de que falei. durante este £ltimo semin rio quando fui surpreendido pela seguinte reflex o: todo o progresso cient¡fico do £ltimo s culo. como. dado o car cter totalmente . d -se por impotente e deixa actuar o diabo"" "Muito pessimista. tentando saber mais do seu pensamento. aos generais. o dem¢nio agia. O poder passou para as m os do diabo". Por isso. voltei a Roma e continuei a dedicar-me com a mesma paix o s experi ncias da f¡sica nuclear. estranhamente. E eis o motivo: no decurso do trabalho. Os efeitos das suas inven es n o Lhes interessavam. me acontecia pensar nostalgicamente e com desejo nos meus amores infantis de havia muito. Enquanto eu n o creio em Deus nem no diabo mas apenas em mim mesmo. J  n o pensava em Steingold nem no que ele me dissera. primeiro raramente. ele ainda cria em Deus.seguinte frase singular: "Deus doravante impotente. n o havia d£vida. no caso da cria o de novas fontes de energia. diziam respeito aos chefes de Estado. afinal de contas. quando est  j  tudo dito e a £nica coisa que deveras ent o conta. Sentiam-se justificados pela certeza de caminharem pela estrada real da ci ncia e n o Lhes interessava irem al m dessa consci ncia. uma vez que expulsava esses fantasmas do esp¡rito e me reaplicava ao estudo dava-me conta de que algu m. por fim. Sim. me fizera dar o salto da cria o. como n o ver a rela o entre a ren £ ncia ao sexo e a cria o cient¡fica? E entre o que poderia ter sido a minha ru¡na e o que parecia ser a minha gl¢ria?" Nesta altura. mas a sua aplica o tecnol¢gica dirige-se por inteiro destrui o final da humanidade. Terminado o semin rio anual. dei-me conta de que todas as vezes que dava o salto qualitativo da cogita o para a inven o. Mas eu n o podia deixar de recordar as palavras de Steingold acerca da doravante comprovada impot ncia de Deus e do consequente refor o dos poderes do diabo. Perguntei-lhe porque dizia uma coisa dessas. completamente negativo. Deus decidiu a perda da humanidade. que surge. mas ele fechou-se com as seguintes e definitivas palavras: "A impot ncia de Deus talvez seja ainda sinal do seu poder. Quando as descobertas parecem £teis. mais tarde. fui levado a chegar £nica conclus o poss¡vel: o dem¢nio que estava a meu lado durante as minhas experi ncias. Ora. Insisti. depois de modo cada vez mais frequente e sempre em conex o com a minha especialidade er¢tica. fora. aos ministros. As nossas descobertas s o maravilhosas em si e para si mesmas. ou seja o dem¢nio. De qualquer modo. todavia um correctivo poderoso na positividade implicada pela consci ncia de que nos aproximamos cada vez mais da verdade. ele um homem crente e praticante. interrompi-o: "Mas ainda n o me disseste porque que esse dem¢nio se transformou no diabo." " simples. Respondeu-me: "Porque se Deus fosse poderoso n o permitiria nem por um instante o progresso da ci ncia e sobretudo deste ramo da ci ncia a que tu e eu nos dedicamos". podemos ter a certeza de que a mesm¡ssima utilidade teria podido ser obtida por outros meios. o teu Steingold. e por conseguinte o diabo. O car cter autodestrutivo do progresso cient¡fico encontra. por exemplo. mas devo ter recordado a conversa no dia em que fiz a primeira das muitas descobertas a que devo a minha celebridade. vemo-lo por inumer veis ind¡cios. sucede que muitos cientistas levaram a termo as suas investiga es sem se preocuparem com as suas aplica es pr ticas. n o voltei a falar nem de Deus nem do diabo com Steingold. embora em termos algo enigm ticos. repito : n o acredito no diabo ." Sem se dar conta. Esta noite esses trinta anos chegam ao fim. entrega-te vida. ent o. Falei de maneira impetuosa: "o diabo n o est  nem fora nem dentro de ti. Onde est  a l¢gica de tudo isso" "mas assim mesmo. sen o obra do diabo." "Queres dizer ao teu amor. ou seja. n o possa deixar de se manifestar dentro em breve. Exclamei: "essa garota n o passava de uma garota. Como os fantasmas que presidem masturba o. E foste tu quem imaginou isso tudo. Tudo leva a crer que. mas apenas em ti pr¢prio. a meia-noite." A resposta de Gualtieri foi estranha: "Mesmo que tenha sido eu a imaginar. mas nesta meia-noite porqu ? Porque que o diabo dever  aparecer logo nesta meia-noite e n o na meia-noite do ano que vem" Ele respondeu com toda a seriedade: "Porque esta meia-noite completam-se exactamente trinta anos desde que encontrei o diabo e Lhe vendi a minha alma em troca dos seus favores. os trinta anos. eu me desvanecer em fumo. ele colocava assim o problema maior da minha exist ncia diab¢lica: o facto de. estava escrito que o pacto duraria trinta anos. junto ao recinto onde se deu a explos o. que me estava a p r num dilema: ou aceitas as minhas condi es ou n o fazemos amor. n o pode ser. Compreendia onde ele queria chegar e dizia-me. com o cora o em alvoro o. ainda que com o consentimento de Deus. mas dentro de mim." Era verdade. Como os sonhos que o desejo inspira. Disse. se o diabo me voltasse a aparecer disfar ado de garota. n o v s que isso justamente o que o diabo n o poder  jamais fazer? . te tenha trazido aqui. o inimigo da humanidade. Salvar a humanidade. desta feita. no momento do abra o." "Mas n o est s a falar a s rio! Primeiro. dizes que n o acreditas nem em Deus nem no diabo. O resultado vem a ser o mesmo." Sentia-me mortalmente perturbada.autodestrutivo da nossa ci ncia. Mas n o podemos falar com ligeireza destas coisas." N o esperava aquela conclus o imprevista." "Que sentido seria esse?" "Como hei-de dizer? No sentido de uma descoberta que salve a humanidade da cat strofe doravante inevit vel. mas sob uma condi o" "Que condi o?" "Primeiro. O pacto referia-se a trinta anos: um tempo suficiente para a constru o de uma carreira." Ficou calado por um momento e depois acrescentou de maneira inopinada: "O diabo cumulou-me de favores. meia-noite. no caderno da garota do jardim. Agora vens-me com esses absurdos: vendeste a alma ao diabo. n o verdade" Suspirou e depois prosseguiu: "De qualquer modo. era preciso que o pacto fosse dilatado por um per¡odo de mais trinta anos. tantas vezes descrito num passado ainda bastante recente. o pacto. de acordo com a l¢gica diab¢lica. condena o por condena o. esse dem¢nio n o podia deixar de ser o velho diabo. senti-me desconcertada. Em poucas linhas. Por isso. E depois que o diabo me assegurasse uma carreira em sentido oposto que tem sido a minha at agora. mas acredito nos ind¡cios que demonstram a sua exist ncia. Sim. de modo subjectivo. Embora para te falar delas. n o hesitaria em fazer amor com a mi£da. objectivamente. que importa? Isso querer  dizer apenas que o diabo n o est  fora de mim. exclamei: "Desculpa. um desenvolvimento cient¡fico que conduz directamente ao fim do mundo. N o penses mais no diabo. fingindo n o ter notado que a frase se me referia de modo caracter¡stico: Ser  assim. Mas n o te d s conta de que o diabo pode fazer tudo excepto aquilo a que geralmente se chama o bem. est  apaixonada por ti. era verdade. inspirando-lhe descobertas ben ficas. possa tamb m fazer o bem? Seria um milagre. Quando te deres conta de que nenhum diabo aparecer  para te levar a alma" As minhas palavras eram sinceras. a minha arrancando-Lhe das cal as um membro extraordinariamente grande e rijo. Exclamou: "ora. com os flancos. a sua afastando os l bios nus e t£midos de desejo do meu sexo de menina. conceder-Lhe-ia um prazo suplementar de trinta anos. anelante. ou n o fazemos amor: ficamos com o pacto antigo. Excita-me a ideia de que. porque s¢ o diabo podia saber que a tua monstruosa conforma o. tomas a minha alma e a humanidade continua a seguir direita cat strofe. decidi-me. tudo se desfaz em fumo. sim. vamos fazer amor os dois. parecia excitado com a perspectiva de est r prestes a fazer o que se proibira ao longo de toda a sua vida. por exemplo. Quero fazer amor com ele e s¢ com ele. as nossas l¡nguas misturam-se. sou uma pobre rapariga que. Depois. Um impulso mais. no melhor momento. porque sinto que desta vez haver  um milagre e a seguir poderemos viver juntos e felizes para sempre. se oculta o velho bode fedorento." Gualtieri n o disse nada." "Eu. sob essa tua apar ncia t o graciosa." E eu." Deitei um olhar volta. numa agonia de medo e de incerteza. Tu gostas de mim e eu digo-te: ou prolongas o prazo e afectas a minha futura carreira de um sinal positivo. mete-te dentro. por amor de Deus.que. viveria esses trinta anos ao lado dele. no estreito espa o interior do autom¢vel." "Mas quem que te disse isso" "Dizes-mo tu. Quero fazer amor precisamente com o diabo. at o bem. dada a imensa for a do amor. caso contr rio que diabo ser ? Respondi. o diabo s¢ pode fazer o mal. desembara ando-me o melhor poss¡vel. Mas sou eu quem tem a faca e o queijo na m o. por todo o imenso espa o daquele largo asfaltado. impetuosamente. Que me importava? Para conseguir a satisfa o do meu desejo incandescente estava disposta a fazer at o bem. enquanto as nossas bocas se .Gualtieri tinha os olhos fixos em mim. as nossas m os orientam-se na direc o certa. A pobre rapariga apaixonada por mim n o me interessa para nada. lan o-me para diante. ao ouvido: "aperta-me. n o se faz amor. porqu eu?" Apontou-me bruscamente um dedo ao peito: "porque tu s o diabo. atirei-Lhe os bra os volta do pesco o e gritei: "Sou o diabo. Retorqui: "V -lo- s meia-noite. Farei amor com o diabo e depois sigo para o inferno. N o v s que sou uma mulher de carne e osso e n o um fantasma de fumo?" E dizendo isto. me enlouquece. em proveito da humanidade." "Porqu ? Como que verei tal coisa?" N o quis dizer-Lhe a verdade . encavalito-me nos seus joelhos." Agora mil sonhos explodiam como fogo de artif¡cio na minha cabe a. E agora que j  o sabes. fora de toda a d£vida. mas o diabo tem que acreditar em milagres. como tu dizes. Mas ele respondeu com um ardor estranho: Ora n o. Ele sussurra-me: "Vem tu para cima. deixando o meu sexo entreaberto frente ao seu p nis em estado de erec o. o diabo pode fazer tudo. porque. Segredo-Lhe. s o diabo. Sim. mas talvez o diabo apaixonado. Vamos fazer amor e logo ver s que n o sou o diabo. Faria amor com ele. ao mesmo tempo desesperada e esperan osa: "n o sou o diabo. sim. vamos fazer amor. As nossas duas bocas unem-se. dizia-me eu. sou o diabo e amo-te. com o diabo. . resta apenas o meu incr¡vel sexo de menina. a desaparecer. que andava a pintar simultaneamente nos £ltimos dias. branco. Representavam os tr s a mesma coisa: um torso de mulher cortado a meio da coxa e um pouco acima do busto. come o a agitar furiosamente o corpo. negros. com a forma de uma ameixa. sala grande de tecto obl¡quo e grandes janelas envidra adas. O ventre era proeminente. as costas encurvadas davam uma impress o ao mesmo tempo de vigor e de esfor o. No mesmo instante. E Gualtieri olha estupefacto e desgostoso para o seu pr¢prio membro que. o peito. passou para o est£dio. sinto que me vou desvanecer. apesar do meu espasm¢dico desejo de permanecer real. com espasmos intermitentes e violentos. de carne e n o de fumo. tal como estava. contra a brancura clara e como que de celul¢ide da pele. em dois dos quadros. surgia dividido pela fenda cor de rosa de ciclamen do sexo. duro como um tambor. e fazer com que seja feito. realmente assim: o diabo pode fazer. Desceu cuidadosamente da cama e. Gostaria de mudar alguma coisa no habitual torso feminino que vinha a pintar. os fantasmas. Os tr s ventres exibiam. estendido para fora das cal as. o queixo nos seus ombros. gradual e molemente. havia anos: juntara. Mas tratava-se. crespos e n¡tidos. os meus bra os volta do seu pesco o. come a a desfazer-se. Contra a minha vontade. como se fossem uma mola tensa no limite da sua resist ncia. ele come ou a examinar com uma aten o escrupulosa e profissional os tr s quadros. Semelhante a um desses c¡rculos de fumo que os fumadores mais h beis conseguem introduzir volta da ponta acesa do charuto. entre os bra os e os joelhos do meu amante n o h  j  mais do que um t nue fumo tr mulo. onda sobre onda de s men. Havia uma luz precisa. no qual agora se encontra mergulhado um p nis tamb m real. os p los tinham sido pintados um a um. Agora. sem um p lo. no rel¢gio de pulso. como frequentemente acontece com mulheres louras e maduras. o pesco o. Por fim. O exame dos tr s quadros deixou-o descontente. vis¡vel atrav s do vidro do autom¢vel. o meu olhar cai no bra o que lhe rodeia os ombros e vejo. que meia-noite. a abertura oblonga do sexo mant m-se por um momento suspensa na extremidade do membro de Gualtieri. a marca branca da opera o do ap ndice. e olhou atrav s da penumbra o dorso da mulher. cheio. Depois. Com um suspiro de al¡vio sinto que tenho um ventre real. pousados em tr s cavaletes. demasiado branco. Dissolvo-me peda o a peda o: primeiro a cabe a. caminhando na ponta dos p s descal os. ejecta. com as cal as e o tronco nu. de carne e n o de fumo. A MARCA DA OPERA O Marco soergueu-se. completamente depilado. depois os p s. tudo excepto o bem. de c u encoberto. pelo contr rio. dou-me conta de que me estou a transformar na mat ria impalp vel de que s o feitos os sonhos. E quem imagina possu¡-lo acaba por abra ar o nada. cujo sono parecia significar queda e ru¡na. e. os olhos voltados para o largo. Era um dorso branco. as pernas.estrangulam num beijo e o membro dele me penetra profundamente na vagina. Ela dormia recolhida em si pr¢pria. sempre igual. de uma brancura gorda e clara. que poderia muito bem ser uma consequ ncia do motor sobreaquecido do autom¢vel. os bra os. entumescido por uma lux£ria insaciada. pensou ele ainda. No terceiro quadro. h£mido e oblongo. a bacia. o p£bis. depois. do lado esquerdo. sentando-se na cama. com indiz¡vel horror. de um corpo vencido e abatido. ainda adormecida. com as coxas estreitando os flancos dele. fecha de novo a caixa e. n o sem ambiguidade: "tu que est s a olhar para mim. arrasta o banco para junto da mesa. s¢ ent o que trinca um peda o do bolo. o homem pegou numa l mina de barba. desce com um pulo leve e. tirava-lhe a tampa. e tra ou as telas de alto a baixo. Com efeito. introduziam uma nota de realismo num quadro que deveria. como de costume. vamos jogar" Marco finge n o compreender e pergunta: "Jogar a qu ?" "Vamos l . se cair a culpa tua. Marco adverte. mas com determina o. porque ignorava a sua cota o mais recente no mercado. perguntava-se porque o faria. decidiu tratar-se de uma provoca o inconsciente. sem pressa. o mar era de um azul retinto. em contrapartida. alguma coisa proibida e igualmente tentadora. sob um c u nebuloso. tamborilando com os dedos na vidra a. Viam-se alguns arbustos rijos e amarelos que se agitavam ao vento. E respondeu: "A mam est  ainda a dormir. puxa um banco." Acaba de colocar a caixa na prateleira. e mais adiante. voltando a p r-se na ponta dos p s. duas vezes. configurado por linhas paralelas que avan avam e se desfaziam umas nas outras. Aqui. Finalmente." A mi£da responde novamente. depois foi sentar-se no div e p s-se a fixar. sem impaci ncia. a porta fechada que estava sua frente. Olha-a enquanto ela se dirige a passo mi£do at ao fundo da sala. se vem sentar frente de Marco. erguendo-se na ponta dos p s. Bruscamente. O jogo da montanha russa. paternalmente: "Cuidado. descobrindo as pernas altas e musculadas. nada ter de realista. dava directamente para a praia.resposta onde o bolo podia significar o doce ou. Quanto dinheiro perdera destruindo aquele quadro j  terminado? N o conseguia calcular." Marco responde: "primeiro acaba de comer o bolo. como as do est£dio. Perguntou com cautela: "Onde est  a mam ". podes cair. o vestido muito curto levanta-se-Lhe no ventre.por isso. Mas que n o seria inconsciente numa mi£da daquela idade? Agora que conseguira agarrar a grande caixa redonda e segur -la contra o peito. No horizonte. coloca-o entre os dentes. pelo contr rio. sabes muito bem ao que . enquanto. Marco perguntava-se se a rapariguinha faria de prop¢sito para lhe mostrar as pernas. na direc o da prateleira onde a m e costuma guardar a caixa com os bolos. quase desproporcionadas em rela o ao resto do corpo. mas fazia de prop¢sito para n o evitar mostrar-lhas. n o estejas a fingir. em absoluto. a porta abriu-se lentamente e a rapariguinha apareceu no limiar. o mar que. desenrolava fatigadamente ondas verdes e brancas. os p los do p£bis no terceiro quadro. dizendo: "ent o. Atirou fora raivosamente a l mina e dirigiu-se para a sala de estar. Nessa posi o. produzindo dois cortes entrecruzados. com significativa pontualidade. esperava e sabia com absoluta certeza o que ia suceder. a janela. procura deix -la no seu lugar. passado pouco tempo." Gostava que ela fosse levada a dizer-lhe porque tinha tanta pressa: devia existir . descobrindo assim uma vez mais as pernas. com o bolo nos dentes. Marco olhou durante um momento o mar. enquanto olhava. e Marco n o p de deixar de pensar que se tratava exactamente da mesma pergunta que teria podido fazer uma mulher desejosa de ficar sozinha com o seu amante. em vez de dar para as dunas. que lhe servia para afiar os l pis. mas permaneceu incerto: talvez n o fizesse de prop¢sito para lhas mostrar. sobe-Lhe para cima e estende o bra o. t o negros e t o hirsutos. evasiva e amb¡gua: "n o quero que me veja a comer o bolo . mas o resultado era decepcionante: aqueles p los. Obtido o bolo. O que que queres dela" A resposta foi. N o pensava em nada. " Marco compreende que n o poder  ir ao fundo do problema do que a mulher quer e n o quer. A mi£da escapava-se-Lhe. vamos ent o jogar. como toda a gente. at que o seu p£bis chocava com o p£bis do padrasto. ou. O jogo prolongara-se assim durante alguns dias." "Mais uma raz o para comeres j  o bolo. que era inevit vel e de certo modo involunt rio. depois. . pousar o bolo em cima da mesa. cansada. a preens o dos l bios do sexo dela sobre o membro dele. V-la parada. originado apenas por um instinto obscuro. Se tivesses. estava bem." "A mam nunca quer nada. e ainda por cima. com um grito de alegria. deixava-se escorregar depressa pelas pernas dele. seguia-se um segundo contacto diferente. O jogo continuava. com dois vincos escuros de fadiga por baixo dos olhos azuis. durante o embate. Mas tens as pernas curtas." "Que maneira?" "este jogo chama-se o jogo da montanha russa porque eu me deixo escorregar pelas tuas pernas at ao fundo. ele levantava-os o mais que podia. no entanto. ele sentia com toda a nitidez que a rapariga. " "Porque que n o o comes j . ou seja. N o podia haver a m¡nima d£vida: os l bios fechavam-se maneira de uma ventosa. a mi£da desmontava dos seus joelhos. apertando o membro dele e retendo-o por um segundo. pelo contr rio. mas sem jamais conseguir a certeza absoluta. era volunt rio. dizia entusiasmada: "outra vez" Ele aceitava e tudo se repetia sem a menor altera o: o grito de triunfo durante a descida ao longo das pernas de Marco. resultado j  de uma decis o de h bil sedu o? Essa d£vida. sempre na esperan a de alcan ar resposta. Por isso. vir ter com ele. repetira v rias vezes o jogo. pelo contr rio. ao choque. s¢ o como depois do jogo. antes do jogo?" "Porque a mam pode entrar de um momento para o outro. Mas a rapariguinha responde evasivamente: "O bolo. a reten o era confirmada pelas contrac es imprevistas e simult neas que assaltavam os m£sculos das coxas dela. e diz com indiferen a: "como quiseres. como um cavaleiro da sela e puxando o vestido para ter os movimentos mais livres. E parecia. com uma volubilidade inconsciente de borboleta que voa no preciso momento em que a m o a vai agarrar. n o?" A mi£da olhou-o. pernas com cem metros de comprimento. de facto. Ora. p es uma m o frente para me fazeres parar antes de eu chegar ao fim? A minha descida acaba logo e adeus montanha russa!" Era verdade: ela subia para os joelhos de Marco. Passada a primeira perturba o. Mas. uma e outra vez. espantada: "Mas n o v s que est s a ser mau? o jogo que a mam n o quer que eu jogue.uma raz o. n o podia ter a certeza de que ela soubesse o que estava a dizer. nem ele sabia porqu . por exemplo. estreitos e trai oeiros como duas seteiras. E. tentava e conseguia prender-Lhe o sexo com o dela. Aquele contacto final dos dois sexos seria inconsciente. a contrac o dos m£sculos das coxas. de Repente." V a mi£da levantar-se prontamente. acabava apenas quando a rapariga se declarava "cansada". Depois. como se a tivesse tomado uma d£vida: "Tu tens uma maneira de jogar que n o muito boa para mim. ele habituara-se e t -lo-ia certamente interrompido se n o tivesse sentido curiosidade acerca da consci ncia e intencionalidade do comportamento da garota. Insistiu: "mas a mam tamb m n o quer que tu roubes os bolos. sendo evit vel." Marco sentiu-se surpreendido com o realismo da resposta. que. assumira durante dias uma natureza obsessiva. justamente no momento do habitual embate." Com uma sinceridade brutal e imprevista. com a ambiguidade de "' sempre. como uma prostituta que discute com um cliente: "ent o n o jogo mais. contudo. prontamente e com decis o. Marco disse. inesperadamente. "vais ver que n o te magoo. Depois." Marco retorquiu num tom razo vel: "Ponho a m o." Marco pensou: c  est . vamos fazer o jogo como tu queres.. Durante a frac o de segundo que demorou a descida. sem pudor. compreendera que n o teria resposta enquanto com t cita intencionalidade. em seguida. Mas a £ltima vez. pensou Marco. escapar-se-Lhe-ia sempre. disse Marco. satisfeita. muito calmo: "Est s a ver? N o sabes o que dizes. por m. em tom de persuas o: "e o que que achas que um man¡aco sexual?" A garota olhou-o confusa. fazes-me doer" Ela torna-se imediatamente s ria e comenta. Por isso. desdobrado sua frente. perguntou logo a seguir. a seguir. detectava na voz da rapariguinha n o sabia que incerteza. como que o panorama que se olha de uma torre: todo o seu futuro at velhice. num sarcasmo evasivo: "por n o te deixares magoar nem um bocadinho nesse s¡tio t o fr gil. disse para ver o que Lhe diria ela: ":Mas o jogo. est s pronto?" Marco respondeu: "Vem. podes magoar-me nas partes delicadas. interpusera a m o entre o seu ventre e o da rapariga. ent o. como se o imitasse: "cuidado. e. E eis que ela agora lhe punha um dilema novo: ou jogar como ela queria. eu sei l  o que ." A mi£da soltou um grito de triunfo e deixou-se escorregar ao longo das pernas dele. que cresceria a seu lado e a seu lado . Por isso. ou n o jogar "" de todo. com preens o do membro dele entre os l bios do seu sexo." Cala-se de novo e. vai desmascarar-se." "Bom. n o volto a jogar." "S o partes delicadas". e. apoiou-se com os flancos e disse por fim: "Ent o. a justifica o dele: aDoer? Deve ser c  uma dor!.' Cala-se por um momento e depois diz. mas igualmente sem ostenta o. Uma vez montada. j  caiu. "n o sabes isso? preciso cuidado. porque verdade. Marco. porque se n o a puser. Mas se a mam diz. no dia anterior." Puxou o vestido e escarranchou-se-Lhe nos joelhos. disse ela. quando chocas comigo. daqui em diante." Marco compreendeu que n o havia nada a fazer: a mi£da era mais forte do que ele. na tua opini o. eu quero jog -lo exactamente assim. e que. em voz de falsete. a mi£da disse de repente: "a verdade que n o tens coragem. E perguntou suavemente: "Diz l  porque que eu. resolvera renunciar definitivamente a uma investiga o que amea ava tornar cada vez mais obscura a mat ria investigada.. fingisse estar a jogar o jogo. com a m o entre mim e ti." A mi£da responde. para mais." " o que a mam est  sempre a chamar-te. levantando primeiro uma perna e a seguir a outra. Disse. era claro que n o sabia como responder. num tom conciliat¢rio: "Est  bem. com a rapariguinha sua amante. assim est  bem". n o tenho coragem" Viu-a hesitar um instante e responder." . lan a-lhe na cara: "Sabes o que que tu s afinal?" "O qu ?" "Um man¡aco sexual. por outro lado. proferido com inten o ofensiva." Era um insulto. Marco teve tempo para ver. terminando a sua reflex o. a pergunta n o poderia ser formulada a n o ser que o jogo desse lugar a uma rela o directa e irremedi vel.Por fim. " uma fronte inchada de Apolo. Abre os olhos. havendo entre eles.se faria mulher. ilumina es. e ele. Depois. o que estava para suceder agora. t o ilimitadas como irrealiz veis. N o jogo mais contigo" "E com quem vais jogar agora?" "Com a mam . Compreendia que a verdade que perseguia h  tantos dias consistia numa adula o e numa tenta o. Entretanto. t£mido. tenho medo. enquanto mantinha ainda as m os por cima dos olhos. E depois?" Mas ela estava j  a pensar noutra coisa. cabelos louros e pendentes. eis que a l¡ngua abre facilmente passagem entre os seus dentes. n o ? Pois claro." Era assim que ela continuava a escapar-se-Lhe. com um ar de benevol ncia. fica espera. Enquanto eu me escondo. duro. Comentou com despeito: "Joga com quem te apetecer. indo e voltando de modo gradual e calculado da direita para a esquerda e vice-versa. com o p£bis depilado e a marca branca da opera o do ap ndice ao lado esquerdo. boca murcha e caprichosa. interrogou-o com uma ponta de severidade: "que estavas a fazer com as duas m os a tapar os olhos?" "estava a jogar com a pequena" "Tinhas uma estranha express o no rosto e foi isso que me fez vir aqui dar-te um beijo. a mulher inclinava-se para ele. Marco ergueu os olhos e olhou para ' cima. talvez a mi£da quisesse somente o jogo. cheia e agu ada. Disse bruscamente: "vamos jogar outro jogo. mas este consistia no facto de ele dever comportar-se como se n o fosse um jogo. enquanto ele estende os bra os para diante. com o roup o aberto. os l bios come aram a ro ar lentamente os dele." "Porque tenho medo que tu me magoes. lan ando-se para tr s com vivacidade: a mulher estava de p sua frente. cada vez mais h£midos e abertos medida que se iam deslocando. um ventre em tudo semelhante ao que ele costumava pintar nos seus quadros: branco. Fiz mal" . o ventre sa¡a de entre as pregas do tecido. nariz grande. e o envolvimento directo com ela parecia doravante t o ileg¡timo como inevit vel. Estas reflex es. sentiu de repente dois l bios que Lhe tocavam a boca e um h lito leve que se misturava ao seu. n o olhes!". n o vale. definitivamente e sem rem dio. ambas sem fim. ou melhor. decidiram-no. e agora a l¡ngua atacava-Lhe a boca como se procurasse uma passagem. No momento exacto em que o ventre dela ia tocar o seu. mantendo os olhos fechados. Ele pensou que daquela vez n o podia haver d£vida: a mi£da era um monstro de sensualidade precoce e perversa. Do alto. penetrando inteira no interior da boca de Marco. E ent o sente nas suas m os j  n o os ombros fr geis da rapariguita. tanto poderia ter sido um segundo como um minuto. pondo as duas m os na cara. isso mesmo. mas tu s um medroso." A garota afasta-se a correr gritando: "Vou-me esconder. tens que tapar os olhos com as m os e n o podes tir -las da cara antes de eu te dizer. os l bios iam e vinham." "Que jogo?" tVou esconder-me e tu vais minha procura. Sim. gritando: "n o vale. mas as esp duas fartas e maci as da sua mulher. Marco interp e a m o de trav s. A rapariga desmontou imediatamente." Marco respondeu com al¡vio: "Est  bem. Depois. Passou um lapso de tempo indefin¡vel. vamos jogar esse jogo. a tapar os olhos. depois. precisamente quando parecia que a tinha agarrado. Passado um momento de sil ncio." "Pois jogo. Foi esconder-se e eu tenho que ver se a descubro. passou ao corredor escuro. eis que a voz estridente da mi£da rebentou muito pr¢xima. merguLhando na penumbra. introduzindo-o por fim no quarto. Ora." Pegou-Lhe na m o. ressoou no apartamento. imprevistamente. Sente a m o da mulher na sua testa. pensando que a mulher n o acreditaria nele. a mam ainda n o se vestiu. pelo menos. porque ele toca-me quando jogamos. De repente. em direc o porta. Ela n o tem pai. dizia para consigo que devia simular o ardor de um desejo que n o sentia ou que. atrav s do corredor. no entanto. anda. n o me achaste" A mulher desembara a-se com for a de Marco." Ela pegou-Lhe na m o e guiou-o atrav s da sala. zangado. lan ou-se de costas na cama desfeita. at ao est£dio. lan ou-se com viol ncia entre aquelas pernas. um grito frouxo e distante. estava atr s do biombo... Mas o Marco insiste e eu depois aceito para lhe fazer a vontade. Queres vir?" Ele pensou que n o havia modo de furtar-se a semelhante convite." Marco respondeu. n o volto a jogar nem esse nem nenhum outro jogo com ela. da¡. tens que prometer-me que n o voltas a fazer com ela esse jogo" "Mas porqu ?" "Porque no jogo acontece inevitavelmente um certo contacto f¡sico. Disse. a mi£da saiu de tr s dele. com as pernas dobradas e abertas. t o cheias e t o brancas."Pelo contr rio". beijando-a altura do umbigo. Mas a mulher deteve-o: "Deixa-a estar onde est . Marco esteve beira de exclamar: "Mas que mentirosa?". Disse: "sim. j  controlado: "Tens raz o. daqui para fora. aproxima-se do quadro que cortara com a l mina. vamos embora. Marco fecha a porta. Marco acendeu a luz e olhou para o canto de onde ouvira sair o grito. saindo da cama. A mi£da . de s£bito. dentro do quarto: "n o me achaste. pousando-lhe a m o nos cabelos: "Sabes que aquele beijo me deu vontade de fazer amor? H  j  muito tempo que n o me beijavas dessa maneira. com uma viol ncia aplicada. Eu n o quero. apesar de n o querer parec -lo: "Est  descansada." Ele fitou-a. Estende os bra os e mergulha o seu rosto no ventre dela. L  dentro. " "E. fazes o favor. por se conter. abriu sem delongas as pernas e esperou assim. n o?" Marco fica espantado: "como que sabes?" "Ouv¡a-vos. gritando: "Cucu!" Marco perguntou: "mas onde que tu estavas?" " Aqui atr s. disse bruscamente: "Bem. Ela fecha o roup o e pergunta: aOnde est  ela?" Marco responde: "n o sei ao certo. e ent o afasta-se um pouco e recua. entretanto." "Porqu ? Devias jogar com ela outros jogos. Marco fez men o de se levantar. que o acaricia docemente. farei as vezes de pai. Sabes o que que a pequena me disse?" "Que foi?" "Disse-me: "Ele quer estar sempre a jogar montanha russa. estava ali atr s da porta. que que viste?" "O que que eu havia de ver! Nada. enquanto ela se deixava guiar suavemente para fora do quarto. Depois." A mulher disse ent o. que ele despisse as cal as. acabou. disse Marco. desfez-se do roup o. ergue-se toda nua.. Tu devias ser um pai para ela. inseguro. por fim. e foge do quarto. n o sentia por ela." Quase no mesmo momento. Havia um biombo. O que que voc s estavam a fazer h  bocado? O jogo da montanha russa. Marco. ao meu marido. porque n o queres fazer o meu" Ficou um momento calada. eu disse mam : agora j  tenho uma ferida como tu. como me agradava ent o esta semelhan a entre os dois nomes! Era quase para n¢s um excelente motivo de casamento. como uma m£mia nas suas faixas. encontro-me voltada sobre o lado esquerdo. Onde est  o meu marido? Sem mudar de posi o. J  n o gostas de fazer o retrato da mam ? Se j  n o gostas. bem dobradas. O casaco est  pendurado nas costas da cadeira. e encontro o vazio: j  deve ter-se levantado. fiz gravar uma esp cie de dedicat¢ria: para V. pedi que lhe fizessem tr s furos suplementares. Ent o. Estou nua. liso. espesso. por isso. fecho os olhos. O cinto era apertado demais para ele.exclamou: "Olha. vejo uma parte do couro do cinto. " . com esfor o: Eu sei que tens. A mi£da indicou.. o quadro em frente: "mas a mam tem uma ferida na barriga. Volto a p r a m o entre as pernas. estendo uma das m os para tr s. "E porqu ?" " Porque n o gostava dele. quadrada. fechado na fivela. talvez de crocodilo. as cal as aparecem. na qual o meu marido. apertadamente envolta nas roupas da cama. mas n o consigo por causa daquela angustiante sensa o de ter sido irremediavelmente ofendida. tento retomar o sono. depois acrescentou: "eu tamb m tenho essa ferida. com um olho esmagado contra a almofada e o outro. ela disse. tal e qual como esta mulher. depois das refei es. ele poderia us -lo tanto de dia como de noite. por um leve ru¡do calmo." Marco sentiu-se tocado: como o esquecera? Fora havia um ano. ultrajada em qualquer ocasi o do dia de ontem. logo de seguida: "Porque que n o me fazes um retrato como fazes mam ? Marco respondeu: "n o fa o retratos. Ah. se n o exactamente corpulento. Fui a uma sapataria de luxo da via Condotti. olho minha frente. h  cinco anos. Acabou por dizer. porque costuma comer e beber muito. para quando sa¡sse noite. bastante forte e. por baixo do casaco: o meu marido tirou-as sem desapertar o cinto. aberto. n o me fazes o retrato? O CINTO Desperto com a sensa o de ter sido ofendida. n o podemos ser sen o vitoriosos. o que quer dizer: para Vittorio da sua Vittoria. algu m te rasgou o quadro!" Marco disse com secura: "fui eu. assim castanho-escuro. de  gua a escorrer." Loquaz. Muitas vezes. da sua V. ela retorquiu de pronto: Quando me fizeram a opera o. Volto ent o a abrir os olhos. um couro sem costuras. ferida. Na fivela. deixou as roupas dele antes de vir deitar-se. pende da cadeira. Isto pode ser o corpo de uma mulher qualquer. escuro e como que oleado por um prolongado uso. enquanto ele estava no estrangeiro. disse para comigo que. Com o meu £nico olho fiaco e dispon¡vel. Este cinto. deduzo que deve estar no banho. por cima da cama. apesar destas palavras. para a roupa do meu marido. Depois. e escolhi-o ap¢s prolongad¡ssimas hesita es: come ara por pensar em comprar-Lho negro. olhando em direc o cadeira. ele afrouxa o cinto." Ent o. durante os primeiros tempos do nosso casamento. ontem noite. Dizia-Lhe de vez em quando: "chamamo-nos Vittorio e Vittoria. fui eu que o dei de prenda. que. a mi£da fora operada ao ap ndice. e tamb m a fivela de metal amarelo. exactamente por ele. olha" E mostro-lhe o bra o. magro e moreno." "mas n o era isso. n o estou louca. mas n o sei porqu . em suma: infantil e alegre.Agora. viam muito bem que eu n o era o teu tipo ideal. volto a experimentar o sentimento de ontem noite. pelo contr rio. no rosto. ele se sentara na borda da cama. casca de banana."" "e ent o" "e disseste ainda que a imaginavas com os p los do p£bis parecidos com espuma de champagne: louros. Repensando agora nessa resposta do meu marido. magr¡ssima. E ent o. a pancada que nos foge da m o. hoje um desses dias em que chega aquilo a que. a palavra que nos escapa contra vontade. numa mescla de humilha o e ci£me. E eis o meu marido que se inclina agora sobre mim e me perpassa um beijo junto do ouvido. disseste que o teu tipo ideal era uma rapariga grande. loura. gelo que se queria evitar e onde. desportiva. pelo meu marido. senti vontade de me enfiar pelo ch o abaixo. excepto no traseiro. com uma mem¢ria imprevista." "mas est s louca" "n o.o meu marido respondeu com a maior espontaneidade que a sua mulher ideal a inglesa loura. tenho a certeza. de engolir. chamo a desgra a". de notar que eu. dizes-me sempre que tenho frente como que a barba negra de um frade" "E depois" "Depois. perante tanta gente." "N o me toques. como certas prostitutas de prov¡ncia. baixa e num rosnido: "olha. entretanto. O que a desgra a? qualquer coisa casual. Tenho um rosto macilento. onde e por quem fui ontem ofendida: por ele. inglesa. pelo contr rio. no qual. ontem noite. dir-se-ia devorado por um qualquer febril ardor. de uma seriedade nublada e amea adora. o meu marido abre a porta da casa de banho e. s¢ o contacto da tua m o me p e em pele de galinha. em vez de o expressar o mais depressa poss¡vel e sem contempla es. a viol ncia." "mas o que foi?" "Foi que quando se falou do tipo ideal de mulher. porque. dentro de mim. insidiosa e negativa. Para al m do impulso que tive. encaracolados. Uma louca no meu lugar. depois do jantar em casa do industrial para quem ele trabalha. que pergunta: ""O que que te aconteceu? O que que tens". menos ainda. sem me mexer. ter-se-ia raspado dali o mais depressa poss¡vel. boca grande e grossa. pergunta: qual o seu tipo ideal de mulher? . Depois. depois. de facto. interp e-se entre mim e a cadeira. Respondo-lhe imediatamente. mas sem chegar a ser propriamente gordo." Estas palavras disse-as." de notar que digo: "hoje n o o meu dian. insultaste-me. tenho olhos verdes." At porque o sinto. n o s nem loura nem cheia de formas. como se uma rajada de vento passasse pela superf¡cie lisa e im¢vel de um lago. Ou o a voz profundamente espantada do meu marido. a correr. bem dotada de formas. e respondo: "ontem noite. ¢leo de autom¢vel. insultaste-me diante de toda a gente. se acaba por escorregar fatalmente. j  em slip e camisola de dentro. recordo como. Ora. transparentes. pe o-te. de alegre. era s¢ que todos estavam muito satisfeitos e riam porque tu. Ando sempre demasiado pintada. A mim. Um tipo desportivo de rapariga. ao contr rio. hoje. ofendeste-me. nada tenho de infantil e. se vai alargando um vis¡vel . Em resumo: a desgra a. com a minha pior voz. quando deveria ter dito: e o meu dia. descobrira-me at ao fundo dos rins e tentava acariciar-me o traseiro. completamente lisa. n o me beijes. sou morena. nariz adunco. o certo que n o resisto tenta o de pintar a cara at a transformar numa esp cie de m scara violenta. Estavam todos a olhar para mim. Ponho-me de bru os e acrescento: "N o uma maneira de dizer. hoje n o o meu dia. clara de pele e cheia de formas. o seu corpanzil grande e forte. ele atira-se para cima de mim. Ele solta um grito de dor e exclama: "Mas que que te deu. fecho os olhos e gemo uma vez mais por for a da nova e estranha sensa o que ele me inflige. n o assim. velhas e requentadas. sarc sticas. tenho no pulso um bracelete maci o. por fim. ou. certos delitos chamados preter-intencionais. o tenhamos desejado ou. Evitamos falar do caso. puxa ainda mais a roupa da cama. ou seja: algo em que escorregamos como numa casca de banana. E eu. nisso que nos tornamos apenas durante os cinco ou dez minutos de uma rela o sexual. bate-me!". " Para se compreender esta frase. muito diferente da minha voz normal. me insultas e me bates. Provoco-o. preciso saber que a referida "desgra a" que chega durante os "meus dias" foi. baixa-se e tenta beijar-me exactamente a¡. nem ele nem eu. esgotados os argumentos. no fim. tira o cinto. ofegante. destapa-me as n degas. ele. nessa altura." Pois bem. saio desta casa e n o voltas a ver-me. ent o. Agora. Ou o j  exclamar: "Que bela descoberta? O amor sado-masoquista! S o coisas mais que sabidas. semelhante ao da respira o dele. invento frases cru is. n o tanto para escapar aos golpes como para fazer com que o cinto me fira de modo uniforme. t o verdade que assim que. o uso do cinto por parte do meu marido. movo o traseiro. sua cabra?". no mesmo instante em que pegares no cinto. como certas rixas de b bados o s o. envergonhamo-nos os dois. de tipo b rbaro. Eu digo-Lhe com for a e de seguida: "Agora. embora. e algo que somente nos acontece por "desgra a". que t m um ritmo igual e lento. abaixo do c¢ccix. n o quero ser chicoteada. continue sempre repetindo: "v . e passa-mo por baixo do pesco o. apesar do seu furor sincero. Depois. insulto-o. Nem eu sou masoquista. quase um ganido. de bru os. N o. tal como quando a enfermeira me d  uma injec o. exactamente como um c o. para me castigar da minha l¡ngua demasiado comprida. menos ainda. embora. com golpes alternados e bem distribu¡dos. e que me surpreende enquanto o solto. Sob esses golpes. ainda com o cinto em punho. emitindo um gemido subtil e plangente.. para que fiques ciente. Gemo. por exemplo. como que de frio. a desgra a. certas viol ncias que mergulham num momento de felicidade cont¡guo.. enquanto o desafio a que me bata. ultimamente. e vibra-me um dos punhos no ombro direito. junto cabeceira e leva a m o s minhas virilhas. para facilitar a penetra o. Estendo ent o o bra o para tr s. sob os quais as minhas n degas morenas e magras rapidamente se zebram de marcas vermelhas e pesadas. como rel mpagos num c u sereno. Depois.arrepio. ofensivas. Limito-me a dar a ver a sensa o bastante complexa que experimento. ou antes os insultos. a simples ideia de ser batida me inspira desgosto e tristeza. com ele. paciente e atenta. nem o meu marido s dico. examino o meu ¡ntimo e n o descubro o menor tra o de desejo. ainda por cima. como aconteceu da £ltima vez. quente e rouca. que. n o. porque dou ent o por toda uma faceta de mim que parece que ignoro. custe o que custar. n o me debato nem tento esquivar-me: fico quieta. voltarmos a cair no mesmo. T o vigorosamente que tenho a impress o de lhe ter quebrado o septo nasal. F -lo sistematicamente. Que mais h ? Porque que n o desenfias o cinto das cal as e n o me chicoteias como da outra vez? Aviso-te. olho a tira de couro que entrevejo enfiada nas cal as e n o tenho a certeza absoluta de a ver com esse horror antecipador e indignado que as minhas palavras talvez . mordo com for a o couro do cinto. prometemos um ao outro nunca mais. v . que o ferem e humilham. larga-o. sem que. Ele n o diz nada. previsto. atinjo-o vigorosamente na cara. ou melhor. tira o cinto e bate-me. acabou-se tudo e para sempre. atribu¡ ao afecto. destruindo-me a inoc ncia ao tornar-me testemunha das suas indecentes intimidades com o meu pai. primeiro a porta do quarto. a porta da rua. sim. fico estupefacta vista do meu rosto: transtornado. tens medo de que eu te deixe a s rio desta vez e me v  mesmo embora. o simples gesto de me bateres. sen o o principal carcereiro de entre os que me atormentaram durante toda a vida e me reduziram a ter que provocar vergonhosamente. as mesmas torturas contra as quais pretendo revoltar-me? Enquanto des o do meu andar para o dela. de algozes e de s dicos. Sinto que existe um nexo entre as frustra es filial e conjugal. de conveni ncia. inquiridor e surpreso de quem julga ter achado de repente alguma coisa importante. com as suas atitudes desumanas e indignas. d  de ombros com viol ncia e sai. no andar de baixo: sistema escolhido por mim e que. afinal. pegar nas cal as. instalo-me de maneira a poder receber melhor as pancadas. roubou. sim. N o. de s£bito. dirigir-se cadeira. de' pois a porta do corredor e. paralisada pela frustra o. tinha direito a uma juventude iludida e desinteressada e a minha m e roubou-ma. puxo para baixo a roupa da cama com que tapara de novo os rins. bem vistas as coisas. toda a raz o: no momento em que fizeres o gesto. n o tem mais do que esse programa m¡nimo de vida a propor-me. finalmente. vejo o cinto como um objecto familiar. envolvendo-me nas v rias intrigas com que se foi consolando ap¢s a separa o do meu pai. arranjar-me e vestir-me: a minha imagina o. com o olhar fiaco. depois. e dizendo isto. com o qual. como noutras ocasi es veste-se muito simplesmente. o rosto de uma mulher faminta. pronta a sofrer a tua brutalidade destemperada. nada mais se passa. Vejo-o. digo-Lhe com toda a raiva: "ent o. em lugar de se vestir pressa. enumero mentalmente todas as coisas a que tinha direito. Mas. obrigando-me a fazer um casamento. O que a minha m e. mas trata-se de um . E esta manh . em vez disso. como qualquer criatura humana deste mundo. na poca do meu casamento. digo para mim pr¢pria: entretanto vou ter com a minha m e e anuncio-lhe que decidi separar-me do Vittorio. entre as suas m os. pelo contr rio. desta feita. o cinto ali est . mas ele olha-me como que interdito e n o se mexe.  vida e cobi osa. quando vou ao espelho para me maquilhar. eu continuo: "Diz l  a verdade.sugiram. est s com medo. tua disposi o. Procuro provoc -lo no £ltimo instante: afinal de contas. apertou o cinto e p s-se a andar. n o sei porqu nem como. mas que descubro agora ligado minha necessidade instintiva e fatal de me rodear de carcereiros. De que est s espera?". quase sem me dar conta do que fa o. em vez de arrancar delas o " cinto. batendo. diz l . Mas. Tinha direito a uma inf ncia inocente e sem consci ncia e a minha m e roubou-ma. o arrancasse da cintura." Vejo-o olhar-me. enfiou as cal as. mas faminta. E digo-te que tens raz o. de cu ao l u. e bastaria que. no fundo. e que a minha m e me roubou." A minha m e mora na mesma casa. vamos. aqui estou eu. ao sair do banho. com os olhos esbugalhados. como que enlouquecida. entre n¢s os dois. n o me encontro de m s rela es. tinha direito a uma adolesc ncia serena e feliz e a minha m e roubou-ma. vamos. uma atr s da outra. mas. velhaco como s.  vida e cobi osa de qu ? Acabo de pintar-me. como h  poucos minutos. uma boca grande que parece devorar-me a face descarnada e anelante. n o posso impedir-me de concluir que tinha direito a ser tomada a chicote pelo meu marido e que ele. que esperas para me bater como de costume? De que que tens medo. saindo para fora num trejeito de zanga carregada e voraz. N o me resta sen o levantar-me. a porta abre-se e aparece a minha m e. feitos de tantos peda os novos e velhos misturados. H . s tu! Era mesmo de ti que eu estava a precisar. a minha m e permaneceu t o jovem porque serena. n o as tive. e a minha m e tem. a come ar por mim pr¢pria. boas e justas da vida e. mas este calo est  sempre a nascer. sinto que me estou a encolher de c¢lera. com a cabe a enrolada numa toalha. olhos lacrimosos e fei es desfeitas?" O certo que a minha m e conseguiu. escapar ao tempo. que . C  est . e serena. tamb m a¡. esta manh . n o sei como. mas nem isso consegui. s m os de car¡ssimos especialistas de cirurgia facial. O rosto da minha m e produz-me sempre a mesma impress o. se queres saber. arm rios. segura de si. E depois. cadeir es. dentro de um roup o esponjoso. Fecha rapidamente o roup o e pergunta quase espantada: "e ent o porque que c  vieste? "n o foi com certeza para te tratar dos calos. livre de nervos porque se encontra antecipadamente convencida de que as loas da regularidade burguesa s o o nec plus ultra da perfei o moral. Como fiz para chegar t o baixo? E de quem a responsabilidade directa. ter-me-ia contentado com ser chicoteada. Sigo-a at sua sala. inspira-me sempre a mesma ideia: "Mas quando que ela se resolver  a envelhecer? Envelhecer a s rio." Olho-a sem uma palavra e entro. vai antes ao pedicura. ela estende para fora do roup o a perna e mostrando-me o p nu. Exclama: "ah. verdade que aquele rosto requebradamente gracioso no seu oval foi inteiramente reconstitu¡do e recosid o na Su¡ a. Hoje n o estou nos meus dias. por culpa da minha m e.nexo humilhante e s¢rdido: outrora esperava muitas coisas belas. aos vmte e nove anos. porque uma cretina que de nada duvida. uma vez que duvido de tudo. uma degrada o profunda. esmaltado. Com estes pensamentos. portanto. com rugas. realmente. mas. mordiscando o l bio inferior. tem o mesmo rosto liso. mesas e escabelos espanh¢is. sinto-me explodir: "olha. o que em mim sempre sinal de ang£stia. a n o ser da minha m e? Estou porta e espero com impaci ncia. ou seja. n o posso deixar de atribuir igualmente essa sua inalterabilidade f¡sica a uma id ntica inalterabilidade moral. Sim. N o sei como . n o posso impedir-me de formular a mesma reflex o de sempre: como poss¡vel que todos estes m¢veis pseudo-antigos. na minha vida." Ela tem imediatamente a reac o que eu esperava: de pessoa candidamente ego¡sta que refere tudo a si pr¢pria. diz: "N o tenho tempo de ir pedicura. com cinquenta anos. os teus calos enojam-me. sempre que a vejo. segura de si. o rosto marcado por rugas profundas. dentes amarelos e oscilantes. livre de nervos. eu acho sumamente injusto ter. que ela comprou em antiqu rios desonestos e da moda nos seus tempos de jovem. no estilo dos anos cinquenta. Ora. como um despertador a que se d  corda. como perante a sua falsa juventude. um rosto liso e odiosamente abonecado pela raz o oposta. pelo contr rio. e. h£mido que tinha aos trinta. proven ais ou toscanos de imita o n o se tenham ainda desintegrado e para a¡ estejam ainda a ludibriar os visitantes cr dulos com a sua apar ncia de solidez e autenticidade? Pergunto secamente minha m e: "precisas de mim? E para qu ?" Com a natureza da patroa que se volta para a escrava." A minha m e finge ocupar-se com um grande ramo de flores." Bruscamente. E tu sabes resolver isto lindamente: queria que me tirasses este calo pequeno que est  junto ao dedo mindinho. como poss¡vel que estes trem¢s. parava e ia-se embora dizendo: "que isto te sirva de li o para a pr¢xima vez". eu respondia-lhe letra. que ajustam as flores na jarra. como hoje. com dedos grandes e fortes. Era o que acontecia na minha inf ncia. chegava at a segurar-me pelo queixo para me fazer virar a cabe a e melhor poder desse modo assestar-me a pancada. que ent o provocava a sua viol ncia maternal. Ou melhor: tentando esbofetear-me. Ele n o me ama. J  ent o. uma sala onde. o mesmo que hoje leva o meu marido a bater-me com o cinto. Conhe o bem essas m os. o que not vel que nunca o fiz. diante da sua t bua de brunir. a minha m e. entretanto. E. sobretudo. de uma maneira ou de outra. A minha m e alcan ava-me e. ofegante. porque me pareciam revelar uma parte desconhecida de mim. ela decidia bruscamente esbofetear-me. imediatamente. mas o esquema da citada "desgra a. a minha m e. A minha m e repreendia-me de maneira particularmente est£pida e irritante. o nosso casamento um fracasso" "Voc s deviam ter filhos. sendo uma mulher fria e bastante amarga. que parecia quase prometer que haveria "outras vezes". por m." Ela responde com indiferen a: "est s sempre a dizer isso e nunca fazes nada. uma decis o que n o chegara a tomar: "Vim dizer-te que me vou separar do Vittorio. unhas ovais." Anuncio. Arranja as corolas. mas sempre senhora de si. chegava o momento daquilo a que justamente chamo a "desgra a". carnudas e lisas. como podiam ser desapiedadas e sistematicamente brutais. pode saber-se o que que queres?" Olho-Lhe para as m os. improvisando ent o. Ver¢nica. os ganidos caninos com que acompanho as sovas do meu marido. os gritos espantavam-me obscuramente. atirava-me para os bra os de Ver¢nica. quando. n o mexera um dedo para me . eu refor ava a dose. refugiava-me finalmente na casa dos arm rios. mas eu fugia amea a das suas grandes m os exactas e brutais. eu come ava a gritar. de facto. de p . corria a escapar-me por toda a casa. a nossa criada. S o m os grandes de mulher grande. Por fim. Do meu canto. ao mesmo tempo. continuava a esbofetear-me com m todo. sentia que estava a fazer tudo para o provocar. e. dado que eu n o desejava de maneira nenhuma que chegasse o momento da pancada e." "N o quero. assim. recordo. na realidade. no desfecho de uma disputa demasiado prolongada. Esta cena prolongava-se consideravelmente pelo que eu teria tempo. entre quatro paredes formadas por outros tantos arm rios. com efeito. esbofeteando-me. costumava estar a engomar. as bofetadas da minha m e. para me recompor e deter. abra ava-me a Ver¢nica que. de magn¢lia. mas o £nico rem dio." "Mas desta vez a valer. frase amb¡gua. come ava a esbofetear-me. com uma cor branca opaca. palavra puxa palavra. ou seja do pretexto fatal e obscuro. com precis o e sangue frio. movem-se com um vagar inerte e como que involuntariamente. m  e insuport vel. de notar. limitando-me aos uivos como £nica reac o. Aborrece-me a ideia de ser av¢. tira as flores que murcharam. Irrompia na sala. Que faria eu dos filhos?" "Ent o. primeira bofetada.est  numa jarra em cima da mesa de centro. os estridentes berros de porca degolada que as bofetadas da minha m e me arrancavam me desconcertavam: era poss¡vel que fosse eu quem assim uivava? Apertava-me contra Ver¢nica e uivava. absolutamente nada impressionada. nem querido nem criado por mim. a minha m e acabava por se lan ar de repente sobre mim. ela repreendia-me a seguir por eu Lhe responder daquele modo. Diz com um suspiro: " s t o mal-educada. mas provocar a "desgra a". Diz. Foste tu quem praticamente me vendeste ao Vittorio. fui eu a exigir que o meu marido oferecesse o andar minha m e. literalmente. Mas o homem n o se prestou ao meu jogo e. depois de algumas brigas. Olho para ela. Tinha direito a uma inf ncia feliz. uma vez mais. Depois de uma inf ncia de espectadora." "Roubar-te? Mas que est s para a¡ a dizer" "Sim. E n o me apare as antes de isso de ter passado. uma vez mais. n o se preocupavam por a¡ al m com o facto de eu os surpreender quando faziam amor. E o pre o da escrava que sou justamente este andar que ele te deu ao fechar o neg¢cio.> "Que o teu pai. m e e filha. com o instinto do carcereiro. a oferecer-me como medianeira entre a minha m e e um dos seus amantes. fui eu.defender. tira do ramo uma flor murcha e diz: "acabaste?" "N o. n o vou acabar t o depressa. n o reage. Era eu que. vi-te fazer-lhe car¡cias com a boca. bruscamente exclamo: "n o quero nada. tinha a ilus o de poder vir a suplantar a minha m e junto dele. nada. como j  disse. os quais. porque tenho que fazer. Mas ela. e isso porque o homem me agradava e. ela pergunta apenas: "Acabaste?" "n o. roubaste. bem sei. esperando surpreender nela um sinal de perturba o. "Sim. fizeste-me ter uma adolesc ncia de alcoviteira. n o fazia outra coisa sen o espiar a minha m e e o meu pai. de resto numa £nica ocasi o. tornando-me testemunha das tuas porcarias com o teu marido. "Eu." Agora olho essas mesmas m os e digo-me que a minha m e seria perfeitamente capaz de voltar a esbofetear-me como outrora. que lhe fosse fazendo umas festinhas: est -se a ver. n o quero ficar c  em casa nem mais um minuto. entre solu os: "odeio-a. como muitas vezes o caso. odeio-a. recusa-se a satisfazer-me. Pela terceira vez a olho. na minha imagina o l£cida e delirante de rapariga ambiciosa. n o acabei. j  intuiu. um tremor das suas m os. outrora t o prontas a castigar-me. N o. Tamb m me roubaste a felicidade da juventude. crian a ainda. se n o me engano!" Sei muit¡ssimo bem que n o foi assim. vi-te enquanto te fazias penetrar por tr s. serviste-te de mim para reatares as coisas com o teu amante descoro oado pelos teus ci£mes. inflex¡vel: "Agora vai-te embora. como se n o fosse nada. e dizia-Lhe. Ao fio destes pensamentos. mas precisamente o contr rio do que realmente se passou. vi-te masturb -lo." Ela n o parece perturbar-se. Mas n o hesito em mentir. bastaria que se recriasse entre n¢s o clima da adesgra a". Acabaste at por me sugerir." . com sensatez paciente. Ou achas que n o roubar defraudar uma criatura humana da felicidade a que ela tinha direito" "E quem essa criatura humana?. n o verdade. que queria ter ao p de mim. repeliu-me de forma particularmente humilhante. uma esp cie de neg¢cio de fam¡lia. porque. por exemplo. n o acabei. Envolveste-me nas tuas complica es amorosas. mas tu impediste-me de a ter. porque o meu objectivo n o dizer a verdade. e isso tamb m n o o pude jamais perdoar minha m e. que quero provoc -la e. claro. sempre minha disposi o. Na realidade. no mesmo pr dio. que homem resistiria a t o rara tenta o" Tamb m isto. impelida j  n o sei por que irresist¡vel curiosidade. tentando descobrir se esta mentira perversa a consegue indignar. A £nica coisa que quero que me restituas o que me roubaste. logo a seguir ao casamento. " Isto n o s¢ n o verdade. mal dobr mos. de repente. Caminho apressadamente. toma corpo uma imagem. sem percebermos como tinha aquilo acontecido. quer e pode salvar-me. Mas quando chego porta da rua n o resisto tenta o de Lhe gritar: "isso n o me passa mais. que fica ao fundo. chocavam e desfaziam. num dia em que. por m. o port o abre-se e eu dirijo-me ao atelier. T¡nhamos partido da praia a norte do promont¢rio. por baixo da colina do Gianicolo. t o expressivas da sua impot ncia . no mar do Circeo. na n voa do pranto. tornou-se o s¡mbolo de tudo o que. me parecia agora quase calmo. aqui e ali. por um carreiro aberto entre canteiros. no mesmo instante. aparentemente sem ordem e sem direc o. eis que a onda vai abater-se sobre mim. com n¡tida inten o de me alcan ar e me destruir. p s-se a nadar atrav s das ondas que me rodeavam num frenezim. vi-a h  muitos anos. com um zumbido. visa bem e vibra-me com o punho um golpe tremendo no rosto. em direc o ponta do promont¢rio. Mas eu n o cedo. e depois. em suma. cada vez mais agitado. morde o l bio inferior. Com um terceiro grito de: "pap !". £nico ser que me pode salvar da antiga amea a. o meu pai e eu nos afast mos a nado. Agora. bem desenhada e . entre a erva alta deJunho.ciente da sua orienta o e seu destino. O meu pai. que se encurva. Por isso. numa maldade crescente. N o uma fantasia do meu des nimo. De novo gritei. com toda a sua for a. Exactamente nesse momento. sozinha no meio do mar que. Ent o. erguer-se da desordem extrema do mar uma vaga inexplicavelmente compacta. . quando voltei a mim. Que vou fazer com o meu pai? Pergunto-mo. que escultor. o meu pai inclinava-se sobre o meu corpo e fazia-me respira o boca a boca. amea ava-me a mim e a mim s¢. o mar revelara-se. Mas o meu pai n o estava longe e alcan ou-me antes de a onda desabar. umas contra as outras. e o punho do meu pai. Depois. emergir as suas esculturas. ele libertou-se dos meus bra os. a onda come a a encurvar-se sobre mim. apertando-o com for a. em desespero: "pap ! e. e depois. um momento mais tarde. num emaranhado de ervas viscosas. com o meu pai a tentar nadar at margem e comigo agarrando-me mais do que nunca ao seu pesco o. esta onda esmagadora. vendo. tentando libertar-se do meu abra o." Estou outra vez no patamar. carrego num bot o de velha campainha. Desmaiei. enquanto me esfor ava por acompanh -lo. e eu decido dirigir-me rapidamente ao meu pai.Vou-me embora. sua volta e por contraste. habita um v lho est£dio ao fundo de um jardim farto e pouco cuidado. n o o tendo conseguido. coroada de an is brancos de espuma. imprudentemente. j  tradicional na minha exist ncia breve e angustiada: a de uma onda marinha alta e verde. amea adora. Passam dois ou tr s minutos. com o mar calmo. vimo-nos num caos onde as ondas se cruzavam. A onda alta e intencional daquele dia tornou-se o s¡mbolo de tudo o que me amea a no caos desta exist ncia. vi. com um atroz sentimento de frustra o: todo o corpo me treme. O meu pai gritou-me que o seguisse. arrastou-me pelos cabelos para a praia. por fim. sinto os olhos marejados de l grimas. A onda quebrou-se por cima de n¢s. abaixo do Gianicolo. por sua vez. digamos assim. a uma dist ncia n o muito grande. acab mos por emergir dela ap¢s uma luta fren tica no escuro. por cima de mim com a sua v¡trea massa cintilante. ainda que com viol ncia. lancei-Lhe os bra os ao pesco o e agarrei-me a ele. ele atira-se para tr s. Gritei precipitadamente: "Pap !>. realmente. aperto-me mais contra ele.como dizer? . o promont¢rio. Deixo o autom¢vel do lado de fora da entrada do jardim. A £ltima coisa que vejo o meu pai que procura afastar-me os bra os do seu pesco o. Essa onda. eis a onda por cima de mim. que devo tentar reconciliar-me com o meu marido. enquanto observo as esculturas de fugida. em pleno rosto. cinzenta. e que tu. o meu marido." Aperto-me como louca contra ele. bem sei). j  completos. murmurando qualquer coisa indistinta. conforme me vou dizendo. Estupefacto. " Desenrola-se ent o o seguinte di logo. finjo que me interessam. s o £nico a querer-me bem. oprime-me a ang£stia e anuncio-Lhe. e entra minha frente no est£dio. maneira das pedras da Ilha da P scoa ou do M xico pr -colombiano. obrigando-o a um perp tuo envesgar dos olhos." O meu pai sente-se visivelmente espantado. fazer com o autor de semelhantes pisa-pap is? Respondo a mim pr¢pria: evidente que vou pedir-Lhe que me atinja de novo. Ele beija-me. recito. Que vou. o meu pai tem o rosto grotescamente deformado por uma afec o facial: dir-se-ia que dois dedos impiedosos Lhe apanharam a face esquerda e a mant m repuxada com for a. pap . deito-Lhe os bra os ao pesco o. bruscamente e com a voz estrangulada: "Vim dizer-te que o Vittorio e eu vamos separar-nos. ele n o mo dar . que fala a gemer de maneira inarticulada. cuja futilidade radical n o alterada pelas dimens es descomunais. gigante desengon ado e vacilante. Levanto os olhos: ali est  o meu pai. Balbucia que n o h  lugar ali no atelier. com a sua camisa de pano creme e cal as caneladas de veludo. quando me salvaste de morrer afogada? Lembras-te que me agarrei a ti com os dois bra os. inten o equ¡voca e insegura. que sinto a voz embargada pelo choro. o meu pai recua e geme: "mas quem que te quer ferir?" "A mam . e ent o esque o a sua paralisia facial e grito: "Na realidade. ando um pouco volta das esculturas." "Bate-te como?" "Obriga-me a p r-me deitada de bru os. para n o nos afogarmos os dois. Tanto mais que. vem-me a ideia. Outros descansam contra a parede. toscamente talhados. me deste um murro na cara? Oh. e bate-me com o cinto. nua. h  dois anos." "Toda a gente?" "A mam acabou ainda agora de me esbofetear. est  um dos habituais monolitos ainda mal encetado pelo trabalho. de que esse punho a que aspiro com t o amb¡gua nostalgia. h  quinze anos em Circeo. num esgar idiota de :. Mas. Na realidade. com tra os de monstros ou de cabe as humanas disformes. de pedra rosa. inesperadamente.criadora. Ele: "Porqu ?" "Porque ele me bate. e grito-lhe: "Lembras-te. Mas como estou por baixo em rela o a ele. n o passam de enormes pisa-pap is ou cinzeiros enormes. porta do atelier. exactamente como fiz outrora no mar. volto a ver a onda alta e negra que se abate. e eu. toda a gente. e lembro-me do teu punho como da £nica pancada que me foi dada por amor. azulada. volto a ver o meu pai a apertar entre os dentes o l bio inferior para melhor vibrar o golpe do seu punho. devendo eu contar apenas comigo se n o me quiser deixar envolver pela vaga que me amea a. S o enormes blocos monol¡ticos. em nada nova. o meu papel de visitante respeitadora e entendida. Queria abrir-me com . por fim. portanto." "e por isso que o vais deixar?" De repente. encurvando-se acima da minha cabe a. entretanto. Mas n o Lhe dou ouvidos e. e outras coisas do mesmo g nero. tal e qual como agora. Por cortesia. que existe uma mulher na sua vida (a empregada. em resumo. entre ele. pap . com o seu punho redentor. entre tanta gente que me quer bater e ofender. A meio deste. vou deix -lo porque quero vir viver contigo. O meu pai n o me acompanha porta." Eu grito-Lhe: "Mas n o v s. Mas. um dos far¢is ficou em peda os. n o me resta sen o ir-me embora. o p ra-choques est  torcido. s tu que j  n o s o mesmo. levanto a saia no traseiro. des o e vou ver: a calandra est  desfeita. estreito e musculado. Resmoneia: "A mam quer-te bem." O meu pai fita-me com os olhos vesgos. eis-me uma vez mais repelida e frustrada. diz com uma voz arrastada: "Vai-te embora. est s fora de ti por causa do teu marido. consegue dizer. Eras um homem admir vel. e ei-lo que diz com not vel clareza: "Olha. Mas. levo-a aos meus l bios. vejo-o minha frente. olha-me por sua vez e. interrompe-a e afasta-a. olha!" N o sei que furor exibicionista me tomou. segura-me os pulsos com as duas m os. Vou-me embora. n o sou louca. Na realidade. Mecanicamente. por fim. Viro-me para ele.funcional: ir ter com o Giacinto. na minha cara. depois de o meu marido me ter batido j  com o cinto! N o acreditas? Ent o.. Tenho um traseiro bastante m sculo. Apoio-me no monolito que se encontra a meio do atelier. Eras um homem capaz de dar um murro na tua filha. as marcas das horr¡veis m os dela? E al m disso. agora transformaste-te num estrago. agora tens medo de Lhe ver o traseiro!" Desta vez. Mas n o me sobrev m a raiva impotente e miser vel que experimento habitualmente em circunst ncias semelhantes. Mas a m o do meu pai sobrep e-se minha. com a cara toda torta. apanho-lhe a m o. vamos a ver se com essa m o s capaz de fazer alguma coisa para al m dos teus pisa-pap is monol¡ticos! Mas nada: ele levanta lentamente a m o enorme. mas n o vibra o seu punho. v . O autom¢vel d  um sac o para diante e vai esbarrar contra um lampi o que. depois." Grito-lhe: "Velhaco. Atiro-me para os seus bra os. Assim. mas aberta. beijo-a. ele enfurece-se. Este desastre deu-me uma ideia . essa mesma m o volta a descer-me a saia. aquilo que est  a pensar desde o in¡cio da minha visita: " s louca. enquanto procuro puxar para baixo o slip. engano-me na mudan a. meto a marcha atr s. olha. uma em cada n dega. com a cabe a para baixo. Exactamente como aconteceu com o meu marido e com a minha m e." E perante isto. mas n o tenho o costume de bater em mulheres. J  voltou a empunhar um escopro para esculpir: faz-me um gesto de adeus. uma vez que. v  l  saber-se por que azar. contanto que me v  embora. Que me queres? Que me ria de ti? Pe o desculpa. devido minha ang£stia. bate-me com o teu punho. v como o meu marido me trata!" Que se passa? Ou o. Depois. desemboco na nxa. volto a atravessar o carreiro entre os canteiros cheios de grandes ervas.ela e foi assim que ela me respondeu. com a sua ferramenta. se estivesse um metro mais deslocado. inclino-me para a frente. ligo o motor. entro no autom¢vel. ao longe. Travo. estranhamente. nada teria acontecido. um grande sil ncio atr s de mim. com duas reentr ncias frementes. se encontra ali mesmo em frente. caso de o dizer. abro a porta. a raiva leva-o a superar a afec o que lhe desfigura o rosto e a fala. O melhor que tens a fazer ires-te embora daqui." Ele solta a m o. com vis¡vel esfor o. abanando a cabe a e balbuciando: "N o fa as isso. Exclamo: "olha. dizendo: "s¢ tu me podes salvar.como hei-de dizer? . como me digo: nada se importa comigo e at os insultos me perdoa. liberta-se de mim. como que para me fazer medir bem as suas dimens es. por entre as quais emergem os monolitos do meu pai. a alus o paralisia atinge-o num ponto sens¡vel." "N o. . Giacinto o £nico homem com quem. Disse ent o. foram de facto importantes. quanto me custaria a repara o. pelo meu lado. para ele. ainda antes de Lhe ter visto o rosto. Esse mec nico era o Giacinto. e. formavam um volume vis¡vel logo dist ncia. porque sou casado e gosto da minha mulher. quase tive a ilus o de que n o tivesse dado por nada. Ser  isso uma trai o?" Foi assim. estava uma bela manh e o Giacinto. se isso me agradava ou desagradava. entre. claro. ao lado dele. que. uma £nica vez. Juro que n o pensei realmente em fazer amor com o Giacinto no dia do meu primeiro acidente. mas n o verdade. do lado esquerdo da rua. Tive um acidente do mesmo g nero do de hoje: em vez de meter a marcha-atr s. Digo que enganei. magro e severo.. no entanto. reparara j  nos seus ¢rg os genitais. Havia sempre. sem saber. Como hoje. atravessando uma estrada suburbana. s¢ estava fora de mim por se tratar do meu primeiro autom¢vel e o ter para ali avariado. numa rua secund ria onde passava todos os dias. sem dinheiro para concertos caros. meti a terceira. em cinco anos de casada. a calandra sofreu com o embate. com nariz aquilino e boca altiva. Ele viu o autom¢vel e disse-me rapidamente. uma oficina." E ap¢s um momento de reflex o: tVenha. j  mudei de carro duas vezes e vou sempre ter com o Giacinto para as repara es. um minuto por favor. com ele deitado de costas. Era bastante. deitado de costas no ch o. disse-lhe: "Para mim. muito caro. muito mais do que receara. paralela ao Tibre. muda e surpresa. como habitualmente. ocupava-se a reparar um carro. ele ao volante e eu. enquanto continuava a conduzir pelo atalho: " s¢ esta vez. N o sei o que me passou pela cabe a. num tom brusco e seco. havia. claro. na realidade.. entre a vegeta o. Inclinei-me e. Depois. era Maio.. t o importantes que o dispuseram a reparar-me gr tis o autom¢vel . a quem as manchas de ¢leo de motor davam uma express o curiosamente transtornada. De repente. O autom¢vel era o meu primeiro autom¢vel e eu n o tinha mec nico. Lembrei-me de s£bito que. com ele. senti uma imprevista crise de avareza e quase sem reflectir. porque. o que uma sua maneira de me dizer que. Digo para comigo pr¢pria muitas vezes: "Que quer dizer "enganar" em casos destes? O Giacinto entrou e saiu de dentro de mim. e acabam aqui as semelhan as. de costas. Depois. um autom¢vel em repara o com o mec nico deitado no ch o. para al m do mais. dei-Lhe um leve toque precisamente onde um certo volume emergia por baixo dos bluejeans dele. Quem sabe o que me faria t o avara naquele dia? Desde ent o. haver h . virou por um atalho. o Giacinto n o conta. Mas haver  talvez outra maneira de pagar?" Ele olhou para o carro e depois para mim. metade de fora. passaram tr s anos. vi-Lhe o rosto: era um belo homem de meia idade. com ar de antigo romano. mas ter  sido exactamente o que se chama uma inspira o. o meu marido. vamos experimentar o carro. sem dizer nada. me diz invariavelmente: "Oferta da casa. n o longe de minha casa. uma vez que ele n o me cobra nada e. muit¡ssimo. e foi s¢." E assim partimos. sempre que levo a m o carteira. a ver se o motor n o tem nada. metade do corpo debaixo do carro. exactamente como se eu fosse um objecto de troca e respondeu com a sua seriedade de art¡fice: "Outra maneira. aqueles dez minutos durante os quais entrou e saiu de dentro de mim. diante dessa oficina. n o poder  ver-me este carro?" O toque fora t o leve que. com metade do corpo por baixo e metade fora. Eu respondi calorosamente: "De acordo s¢ esta vez. Fui directamente ruela do costume. chamei-o: "Ou a. enganei o meu marido. quando ele saiu debaixo do carro e me fitou por um momento com os seus olhos azuis perplexos. porque realmente n o tenho dinheiro. com as pernas abertas. E ainda por cima com o . o £nico homem do povo com quem fiz amor em toda a minha vida. te enganava. "Bah. Ele sai imediatamente debaixo do autom¢vel. mas que fazias. afinal de contas. dirijo-me a ele como £nica pessoa capaz de me ajudar nesta atribula o da minha vida.. a profiss o e." "O que que isso quer dizer?. me fizesse muito jeito que este c o mordesse deveras. onde fica a sua oficina. com os olhos franzidos. e se algu m tem que me matar. o verbo "justi ar" e por a¡ adiante. desconfio que n o passe. Agora. vem-me cabe a esse verbo cruel e comprazido: "justi ar". at uma defini o da v¡tima.e segue-se o nome pr¢prio. Mas de amor. tenho mulher.. dirijo-me ruela. meio de fora. conversa! C o que ladra n o morde. nunca mais fal mos. indigna de prosseguir por mais tempo a sua miser vel exist ncia de maxoquista inveterada. Ent o agacho-me. Engana-te com o Florenzo. vejo que n o h  ningu m e dou-Lhe uma pancada bastante forte no volume emergente por sob as suas cal as. Digo-Lhe: "Vem ver o que me aconteceu. Mat -la! Sim. quero o dinheiro e mais nada. depois articula com secura: " uma avaria pequena. Ele volta a ficar calado. t¡pica senhora burguesa." Ele responde sem se virar para mim: "N o. J  Lhe disse: sou casado. digo-lhe de repente. de prop¢sito. por muito inverosimil que tudo isto possa parecer. prefiro que seja ele a faz -lo.. mas. uma vez que ele adiantara havia pouco o facto de ser casado: tSe soubesses que a tua mulher. de quem gostas tanto. de um pequeno-burgu s como tantos outros.. encontro-o como habitualmente. S o cinquenta mil liras.. por vezes. depois de termos feito amor. perguntei-lhe. que ainda h  um minuto n o pensara sequer em dizer ao Giacinto que a mulher o enganava. Soa bem esse verbo aos meus ouvidos de v¡tima predestinada a todas as viol ncias: "Ontem justi  mos Vittoria B." "Bom. vir at aqui. n o distante de minha casa. Estou pronta a pagar a repara o como da primeira vez. um homem do povo. Por isso. Digo-Lhe em voz baixa. justamente como eu hoje enganei o meu marido.. em que h  um pouco de tudo: a avareza." Mais um juramento. ripostando: "Tens mulher. um prolet rio. diz l ?" "Acho que era capaz de a matar. intencional: "Vamos ao atalho." certo que o Giacinto n o o justiceiro ideal. nesse dia em que entrou e saiu de dentro de mim. como se houvesse um pacto entre n¢s. a ideia de que n o quero continuar a viver. v -se que zangado." Ele n o diz nada. Mas entra para o carro e eu sento-me a seu lado. Juro. olho volta. que os terroristas adoptam tantas vezes nos seus panfletos: "justi  mos" . Embora. hein? Pois fica sabendo que a tua mulher te engana. "Nem quero pensar nisso. o apelido. a frustra o. Foi para te dizer isso que te fiz. cheia de ¢dio e desprezo. anda volta dele. dirige-se em sil ncio ao meu carro. n o h  cr dito. N o vou ter com ele por avareza. olha-o. Durante o trajecto. que fazias?. ent o arranjas-mo?" "Mas. digo-lhe entre dentes: "N o quero nada gr tis. desta vez. Ent o. "Quer dizer que ter  que me pagar as cinquenta mil liras. em suma. desta feita: vou ter com ele porque. Estranhamente. Trata-me por voc ! Obriga-me a pagar! Assalta-me uma f£ria total. talvez porque o Giacinto um oper rio.durante toda a vida. meio metido por baixo do carro que est  a arranjar. n o sei porqu . Tenho que falar contigo. arrancamos. agora. Da decep o com o meu marido esta manh . dou de repente por que. doravante. O quarto est  vazio. com uma mulher que te p e os cornos sem sequer dares por isso. acelera a fuga. como que por s£bita inspira o. sentada beira da cama. Depois. todavia. talvez seja apenas a impress o do contraste entre esta ordem. como qualquer esposa que se respeite. um dos seus oper rios. At agora. tranquila. Minutos depois. Depois. Mas n o. a confus o com o meu pai. por um instante. todas as chicotadas que recebi do meu marido foram provocadas por aquela fatalidade imprevista e imprevis¡vel. enquanto olho para a cama. Acabei por Lho dizer sem motivo. permane o quieta. a correr. com efeito. a chicoteie. A £ltima coisa que vejo s o as costas dele. enquanto est s debaixo de um carro qualquer. vieram todas as outras decep es: a alterca o com a minha m e. se n o me engano. Vou busc -lo e depois fico com ele nas m os. e s¢ isso. Diz-me: "Mas quem que te disse isso?" Nos meus olhos. insinuo-me no interior como uma ladra. Vejo-o ficar com o rosto vermelho por baixo das manchas de ¢leo. este sil ncio e esta tranquilidade e a cena que se desenrolou ali entre mim e o meu marido. n o d s porque. Ei-lo que me solta. ligo o motor. h  algo mais. mas. digo-me que. Por fim. um pobretanas. Sim. em qualquer coisa ins¢lita. at¢nita e com os olhos cheios de l grimas. discreta. Mal abro a porta. de certo modo. deste. Justamente o que eu queria! Solto um solu o. Refor o rapidamente a dose: "Pareces um romano antigo. porque me falta o ar. h  j  uma ponta de amea a. pensando melhor. com essa cara severa. arranco em direc o a casa. estou no patamar do meu apartamento. na realidade. passo em pontas dos p s ao corredor . perturbada e surpreendida. justi a-me!" Ai de mim. que. atrav s da qual vejo o ch o do matagal. sim. Fecho a porta do carro. afinal de contas. cautelosamente e evitando causar o menor ru¡do. o verdadeiro preju¡zo a valer de toda esta hist¢ria. n o sou uma louca procura de algu m que Lhe bata. n o ? Foi exactamente uma dessas frases venenosas que penetram fundo e fazem mal. dirijo-me ao quarto de dormir. n o passas de um romano moderno. exactamente do lado onde durmo. reparo. as persianas est o semi-fechadas e h  uma sombra agrad vel. Ele perde. um vermelho carregado. pois que. mentira: mas exactamente o tipo de mentira de que preciso para provocar a viol ncia dele. cheio de pap is velhos e de lixo. a mate. est  pendurado. esquerda na cabeceira. entretanto. Sinto-me. e depois grito por entre aquelas m os que me sufocam: "Mata-me. a ruptura com o Giacinto. Est  j  arrumado. algo novo e ins¢lito que n o consigo precisar. Talvez tenha sido o verbo "justi ar" que o p s de sobreaviso. aliviam-me. afasta-se pelo atalho. todos estes meus desastres v m do facto de querer ser amada pelo meu marido. ao . Estes pensamentos terra a terra. o Florenzo est  em cima da tua mulher!" preciso descaramento. pela fivela. Do  trio. talvez tenha sido isso o que o assustou.Florenzo. quase negro. a cabe a. por entre os arbustos da charneca. ao mesmo tempo. vira-se bruscamente e agarra-me o pesco o com as duas m os. a minha invoca o sune um efeito oposto ao pretendido. com a porta aberta. sempre em pontas dos p s. de um gancho que n o me lembro de alguma vez ter visto. a mulher a dias fez as limpezas e saiu. sou simplesmente uma mulher necessitada de amor. Naturalmente. que. o cinto do meu marido. N o sei porqu . desce. mata-me. abre a porta do autom¢vel. terei que pagar as repara es do carro. pelo contr rio. dentro do autom¢vel. Transformei o div da sala em cama. por m. como um instrumento de tortura na cela do inquisidor. Antes". t m um sentido a que chamarei "organizativo". quer dizer estar no lugar que me foi designado e da¡ n o me afastar por raz o nenhuma. o fim de tudo o mais. olhando o cinto em cima dos meus joelhos. este cinto pendurado cabeceira. Assim. recebidas. se torna. levanto-me e volto a pendur -lo no prego. se verdade. Depois. ele queira e n o queira. uma certa quantidade de massa. Por exemplo. como poderei crer . n o sei verdadeiramente o que espero e talvez. l  dormirei.mesmo tempo temida e inconscientemente desejada. uma vez planificado. dentro de uma hora. Como se me dissesse: "Olha. Agora n o me resta mais do que esperar: ele (ou ela). Em suma. por isso mesmo. este cinto aterra-me como sinal de que tanto eu como ele nos adentramos decididamente pelo caminho de uma cumplicidade l£cida e consciente. e que. repugnante! Mas talvez aquele cinto pendurado no gancho seja um aviso afectuoso. Ele est  a chegar e falaremos de todas estas coisas durante a refei o. Comprei algumas embalagens de comida. sacudir para baixo as roupas da cama at descobrir as n degas. isto . no meu caso. quase uma. tempo de ir arranjar alguma coisa para o almo o. que em toda a espera est  em jogo um elemento pessoal. que. isto n o uma espera. a repugn ncia de agora. de acordo com o telefonema de ontem. chamo a "desgra a". Por fim. na minha linguagem interior. Mas agora. Agora vejo as horas. na minha exist ncia imediata e quotidiana de homem comum. que me pender  sobre a cabe a enquanto durmo e me estar  diante dos olhos enquanto estou acordada. Mas ent o. em determinado momento. eu devo p r-me de bru os. alguns queijos e charcutarias para o caso de ele (ou ela) n o querer ou n o poder sair de casa. o meu marido me bater . "agora". que foi ele a pregar o gancho e a pendurar dele o cinto. O meu marido pregou o gancho e pendurou dele o cinto simplesmente para me inspirar as reflex es de h  pouco. doravante. bem vistas as coisas. digamos assim. decido-me. nada espere. este cinto. que n o sou mais do que um meio. O certo. Dentro de pouco tempo. como creio que . Como tudo isto. o meu marido e eu. o verbo esperar. em seguida. O PROPRIET RIO DO APARTAMENTO Os preparativos acabaram. que Lhe pegar  logo que necess rio. no m ximo. ele voltar  para comer. acompanhado pela minha emiss o de estranhos ganidos de dor. apesar da nossa vontade em contr rio e sem disso nos darmos conta. em sentido organizativo. Mas preciso entendermo-nos acerca das palavras. Ele (ou ela) dormir  na minha cama. normal. A menos que me decida a transformar o meio em fim. entre as minhas m os. como eu. que est  pendurado cabeceira e saio do quarto. dever  chegar. Saberemos. tinham um sentido. Nela ca¡amos juntos. Hesito. embora nem por isso menos for ada. desembaracei das minhas roupas o arm rio de parede que lhe dever  servir (a ele ou a ela) para arrumar as suas coisas. a fazer de mim pr¢prio. Deito um £ltimo olhar ao cinto. sempre ao alcance da m o. com a antecipa o pr¢pria dos prazeres organizados. a que. por assim dizer. verifica-se uma estranha contradi o: enquanto espero que aconte a algo preciso num futuro ut¢pico. como dote. Para isso serve ao menos uma cumplicidade como a nossa: para falarmos. n o quer dizer esperar algu m ou alguma coisa. neste abismo que estamos a deixar-nos cair!' Quem sabe? Talvez. Mais para c . at o termo "homem comum". e. n o totalmente destitu¡do de cabe a. aos grandes pl tanos j  revestidos " da folhagem mi£da da primavera. que me deleitasse quando abria a janela e olhava para fora. que separa o desejo da sua satisfa o. Naturalmente. dou-me conta de que se encontra transformada. por antonom sia. quase com uma ponta de comprazimento. em frente ao peitoril. por exemplo. todas iguais. como me comprazia com o facto. Entretanto. Por fim. ainda que excessivamente remoto? De resto. embora de n¡vel quotidiano.no fim £ltimo. ficar comprometido. abro a vidra a e coloco-me de p . incluindo as mais sublimes e ut¢picas. Houve um tempo em que eu pr¢prio parecia fazer parte dela. Antes. e muitas lojas no r s-do-ch o. ia janela. o £nico satisfat¢rio. . n o estarei tanto " a viver a espera de uma mulher como a represent -la. "sente-se". Na realidade. Assim. Cai agora a noite. depois de um dia de chuva primaveril. ¢viamente n o as vejo. mas "sinto" que ali est o e que s o em tudo semelhantes fachada e s lojas fronteiras. Em primeiro lugar. "homem comum" no meu caso significa um homem comum que finge ser um homem comum para fazer algo n da comum: bastante complicado. De resto. sobrepondo-se at ao c u. levantava-me. vejo um outro passeio. o olhar dirige-se-me directamente para o outro lado da rua. nica diferen a: o quiosque dos jornais. deles. farei como se esperasse " deveras o momento. devo o papel bastante ins¢lito que fui chamado a desempenhar. resume todas as outras. enquanto olho esta paisagem urbana. que morava num bairro dos mais comuns e fazia vida de bairro. Ora. precisamente ao facto de ser um homem comum. em sentidos opostos. que deixou o asfalto molhado e o ar fumegante e h£mido. embora n o esperando. depois de um dia passado mesa de trabaLho. de ser nada mais na verdade do que um homem semelhante a tantos outros. de meia idade. tudo o que normal e comum n o se imagina. para al m de inevit vel. erguendo-se a intervalos regulares. da rua. conhece bem. Trata-se de um g nero de espera que um homem como eu. n o s¢ me dava conta disso. duas filas de autom¢veis. Quanto fachada da minha casa e s lojas que nela se alinham ao n¡vel do r s-do-ch o. que havia nisto de estranho? Eu era um homem comum. uma mulher. fica o asfalto por onde v o e v m incessantemente. Pois . era justo. tenho igualmente que fazer passar o tempo e n o posso faz -lo passar a n o ser maneira de "antes" = como quando esperava. direita e esquerda da porta comum. Da minha janela. estava convencido. abria as vidra as e acendia voluptuosamente um cigarro. olhando a rua. em tudo semelhante ao do outro lado. Depois. sobretudo ao cair da noite. ao longo do passeio. vivendo sozinho num apartamento com duas divis es e casa de banho. sei com toda a certeza que. com um discreto estip ndio. dado que a Organiza o esvazia as palavras da sua polpa e Lhes deixa apenas a casca. menos ainda. do palazzo em frente. um lugar ideal para observar sem ser observado ou. n o ? Mas. entre todos privilegiado. a que. com filas e filas de janelas. n o observava tanto todas aquelas coisas conhecidas e j  mil vezes observadas como saboreava o afecto do reconhecimento que elas me inspiravam: era como reencontrar presen as afectuosas e cordiais que me ajudavam a viver. o meu olhar retrocede em direc o aos autom¢veis estacionados em espinha. Moro no segundo piso. vou janela. para um edif¡cio muito parecido com o meu. "agora". com os pl tanos e os autom¢veis arrumados em espinha. adquiriu para mim um sentido diferente. desde que fa o parte da Organiza o. a espera por excel ncia. jovem. com os seios lan ados para fora e os flancos ressaltando para tr s. Anda com a graciosa falta de jeito das mulheres que apenas quando nuas s o  geis. depois de ter sido por muito tempo o lugar onde vivia. Mas. Aquilo que eu era parecia-se com a rua. a rua. traz uns bluej ans que. N o resisto. produzem uma s rie de pregas subtis volta do p£bis. Tamb m desta feita experimento as duas sensa es conjuntas do sonho e da culpa. est o perto. ao fundo do qual assomam as escadas. com os olhos virados para cima. Tal pensamento torna-me feliz. ela. onde dentro em breve emergir  a figura da mulher de camisola s . ela. Trata-se do gesto que tantas vezes fiz no passado. alta. Onde vi j  esse rosto? Talvez na reprodu o de uma figura de mulher de Piero della Francesca. em vez de acender o cigarro. quando me acontecia estar espera de uma rapariga. na realidade. ela a pessoa que me envia a Organiza o. n o h  d£vida. sem transi o. desaparecer  da minha vista. de t o apertados. nas virilhas. avan ando direita. levemente cheio nas faces e mais estreito nas t mporas. levanto o bra o. da sombra confusa do crep£sculo visibilidade enganadora da noite. Vejo o meu pequeno patamar transformado num corredor longu¡ssimo. Todos fizeram j  de tudo. dentro de um instante. N o sou um homem que tenha tido muitas aventuras. como a amo j . enquanto assim penso. o rosto grave. sem saber que fazer. numa cilada serena. a sensa o de estar exclu¡do da realidade que se me oferece vista. na minha direc o. com os zigomas altos e os olhos grandes e l¡npidos. Esta mulher t o bela veste-se com as cores escuras da noite. Talvez por parecerem t o distantes. a verdade. atinge logo o resultado m ximo. Em suma. Ent o. como um jogador que. f£nebre. sei bem que tamb m nesse campo a minha experi ncia normal. Com o cora o em tumulto. de tal modo que penso num sol que dispara os seus raios por cima do horizonte. e eu sou o homem mais feliz da terra. iluminada pelas luzes da cidade. aquilo que sou tem apenas necessid de da rua. retiro-me da janela. Est  vestida com uma comprida camisola de riscas horizontais. vinda n o se sabe de onde. de frente. V em-se as coisas numa perspectiva remota. moro no segundo piso. eis que os far¢is se acendem todos ao mesmo tempo e a rua passa. irreal: parecem figuras de sonho ou mesmo fantasmas de defuntos.Mas agora deixou de ser assim. mesmo debaixo do nariz. fa o-lhe com a m o um gesto expressivo que significa: "Sobe. como se estivessem ali. e experimento de repente. n o me reconhe o j  na rua. que tenho pendurada no quarto de dormir. Tem o pesco o redondo e forte. como que aureolada de um halo de beleza. primeira. nesse preciso momento. entre os autom¢veis estacionados. Dou-me conta do facto de que. caminha na minha direc o. Sim. destaca-se no passeio uma mulher que. tornou-se agora o lugar onde finjo viver. por uma vez." Ela v -me. encosto um olho ao ¢culo da porta que d  para as escadas. majestosa. desaparece. ao primeiro olhar. assomo ao peitoril quase com embara o. Espreitar pelo ¢culo da porta teve sempre sobre mim um efeito estranho. quando. Agora chegou abaixo do meu palazzo e. as pessoas t m um ar meditativo. talvez muito jovem. inspiram-me um sentimento de culpa. corro para a entrada. tenho a impress o de que me est  a acontecer algo de raro e £nico: a pessoa que a Organiza o me envia tamb m a muLher que vou amar. para reprovarem alguma falta minha. concorda com um menear de cabe a. Inesperadamente. como se estivesse diante de um espelho embaciado no qual imposs¡vel reflectirmo-nos. ou seja: n o muito repetida e bastante limitada. Ela exclama apressada e num tom agrad vel: "o que que te deu?" Digo-Lhe atrav s da porta: "desculpa. subindo. vulpino. tu! Onde vais?" Ela p ra de repente e volta-se para mim. Nessa altura. com efeito. Dever¡amos partir. pura e simplesmente um amigo. depois de hesitar um momento. a camisola n o se levanta no peito. Os cabelos escorrem-lhe ao longo da face apagada. A MINHA FILHA tAMB M SE CHAMA GIULIA Eis-me sozinho neste dia 15 de Agosto. ela me cair  de s£bito nos bra os. vir  tamb m um certo Tullio. em busca do meu nome." Ela responde com humildade: "J  devia ter adivinhado: o que me acontece sempre. quando abrir a porta. subindo as escadas. se perfila. com o rosto muito branco e a barba muito escura e dois olhos redondos como castanhas. hein? Ou ser  para te drogares" "V  l . ainda ao longe. sei que. dou-me conta de que alguma coisa n o deve estar a bater certo. exactamente nesse instante. E respondi com raiva: aComer. t o pr¢xima estar  ent o de mim. ent o. Tem pendurada da m o uma mala bastante grande. Bem. eis a sua cabe a que desponta em baixo. bruscamente. Giulia e eu." N o sei porqu . entretanto. abanando desgraciosamente as ancas magras. Ela muito mais magra do que a mulher que vi na cua. para uma est ncia balnear. ao fundo. descubro que n o olha para o cart o junto porta. Ela inclina-se para a apanhar e." Tem uma voz  spera. ao mesmo tempo. No £ltimo momento. que ultimamente tem acompanhado Giulia ao cinema. por tr s dela. Depois. nos arredores de Roma. um olhar interrogativo rapariga. Aproxima-se e. Eu abro a porta e o homem entra. como se os seios tivessem sido devorados pelo ventre. entrar  em minha casa. Desce em direc o ao meu patamar. Esta volta-me as costas e vai-se embora. olhando os cart es da porta. a caminho do terceiro piso. d s-me as cinco mil liras ou n o?" Tiro a nota da carteira. injectara-se ali mesmo. enfia pelas escadas. d -me. por baixo da fronte calva. com uma express o aturdida. descubro que n o estaremos s¢s. lisos e como que molhados. mas. mas muito mais abaixo. lembro-me ent o de que h  poucos dias encontrei no  trio do edif¡cio uma seringa. Sem d£vida. para n o ter que o fazer na rua. dentro de um instante. lan a. das que se deitam fora depois de usadas uma £nica vez.. mas agora at no dia 15 de Agosto! . segundo Giulia. um rosto triangular. confundem-me com outra. Fizeste-me um sinal e depois desapareceste. tomei-te por outra pessoa. pelo menos. um amigo. Tem uma mancha vermelha entre o nariz e o ngulo da boca. e. apare o e digo: "eh.riscas. talvez a mulher se demore. mas fr gil e nervoso. demasiado impaciente para esperar. a procurar o meu nome. ent o. entre rouca e estridente. talvez. como faria uma mulher da Organiza o. eis que. enfio-a por baixo da porta. algu m. As escadas parecem a um milh o de anos-luz. O rosto n o tem a express o de gravidade ang lica das mulheres de Piero della Francesca. abro. O patamar continua vazio durante um tempo infinito. Tullio. De repente. alguma coisa" "o que que queres?" D -me cinco mil liras para comer. O pesco o n o redondo e forte. a figura de um homem gorducho e baixo. volto a fechar a porta. por uma dessas fatalidades a que geralmente chamamos um rel mpago no c u sem nuvens. esbo a um sorriso: "n o sabia onde te ia encontrar. tu. saltei como uma fera: "Ah. de impaci ncia. como quando me dirijo a um aluno ignorante: "Sabes perfeitamente que. Mas temos que falar da nossa rela o. queres mudar tudo. temos que falar a s rio." N o sei porqu ." "Mas falar de qu ?" Fica um momento calada. talvez sonhar". Penso de mim para mim. "dormir. experimento um sentimento de alegria mesclado. atiro-os para longe. enquanto eu quero acima de tudo nada mudar. acabar  por cansar-se". desaperto o cinto. psicanal s. para nos entendermos." Pergunto-me agora porque rompi com Giulia." "Ent o. afrouxo o n¢ da gravata. somos perfeitamente estranhos um ao outro. E respondo: "Sim. tendo lan ado um olhar em volta aos meus queridos e t o numerosos livros in£teis. mas n o de m e e filha. deixo-me adormecer. mas." Respondo num tom paciente. ao longo de dois intermin veis anos. desconsoladamente. pelo contr rio. sou o professor. ao ouvir estas palavras. ou o o toque do telefone. quero dizer: do facto de que. talvez uns quinze minutos. depois diz algo excitadamente: "Sei que tu achas que eu falo em. porque levei por diante uma rela o t o est ril e t o irritante. Durmo pouco tempo. salto do div e levanto o auscultador. Ser  uma quest o de gera es. como se suspende uma representa o por uma falta de luz." E ela com uma calma desconcertante: "tamb m acho que melhor. Pergunto-mo. ainda dormindo: "Deixemo-la insistir. Mal ou o a voz da Giulia que pergunta: " o professor?". mas n o de pai ou filho. porque n o rompi antes. adeus. Depois. ou de cultura. compreensivelmente. Entre n¢s. Na realidade. como se os encarregasse de velarem pelo meu sono de intelectual emancipado. voluptuosamente. Ent o. porque n o te d s conta de que se pode mudar de mulher. j  devias ter compreendido isso. n o h  comunica o. parafraseando Hamlet. entretanto. porque se pode mudar de homem. e durmo com a impress o de que choro a Giulia e de que gostaria de ser acordado por ela. no sil ncio do feriado estival. como que costumas dizer? " Psicanal s. ap¢s dois anos de servid o sentimental." "Adeus. que me faz pensar nos telefones que se ouvem no cinema. ainda no sono. fizemos tudo menos falar. na realidade. Em suma. de me inebriar. age sobre mim como um sopor¡fero. desta vez. no teu inconsciente. Depois. Ou melhor. Que mais queres?" "Temos que falar os dois. ela respondeu-me com o habitual cal o psicanal¡tico: "Gostavas de me convencer de que est s com ci£mes." "Sim. Mas pergunto-mo aborrecido. suspender por um pouco o real. tiro com os p s os sapatos. em todo o caso. ou seja de n¢s dois. enquanto me encontro estendido no div do est£dio. . para qu continuar" "n o. tu te obstinas em ignorar que eu sou ao mesmo tempo tua filha e tua m e. Mas o telefone n o se cansa e. a sensa o de estar finalmente livre. desejas que eu te atrai oe. quase como se o facto de me ter livrado de Giulia me desse o direito de dormir em vez de procurar resposta para certas perguntas. Sim. para deixarmos de ser estranhos um ao outro.. mas acontece contigo o mesmo que com a minha filha: n o nos compreendemos. isso? Ent o melhor n o nos vermos mais. um retinir forte e agressivo." " a isso que chamas falar?" "E por isso. desabotoo o colete. e sei que estou a pensar na Giulia. enquanto eu sei com toda a certeza que tu s ao mesmo tempo meu pai e meu filho.Perante estes meus protestos. Penso estas coisas e. ent o. ou de n o sei o qu . digo-me. nestes dois anos.. em vez de me estimular. sinto-me ao mesmo tempo contente e descontente. Mas quem o disse? Um novo toque de telefone interrompe estas minhas ideias. eu pr¢prio. A homonimia das duas Giulia parece exactamente um desses truques de prestidigitador. Giulia. e assim. "N o. Levanto o auscultador e pergunto com viol ncia: "Pode saber-se quem fala?. n¢s os dois." "De uma mulher que se chama Giulia. pap . de voluntarismo: "Mas. de maneira nenhuma. mas com uma ponta de conven o. o pai que dissera filha de dezoito anos que queria sair de casa: . eu sou Giulia. entre n¢s acabou tudo de vez. s tu? E que queres de mim?" A voz da minha filha n o tem o tom provocante e did ctico da outra Giulia. temos que falar". depois desta afirma o t o dr stica. Pois bem. desesperado. "falar". Seja como for. n o posso receber-te. Penso que seja a Giulia. Disse que chegava dentro de um momento. pap . pronuncia: "Sou a Giulia. n o fazias outra coisa sen o repetir-me: "Temos que falar." a isso que chamas falar?" Ela cala-se por um instante e depois pergunta cautelosamente: "est  algu m ao p de ti?" "n o. Naturalmente. Vou j . Assim. ainda impelido pela minha decis o de romper com a "outra" Giulia: "Ah. Estou aqui em baixo. ningu m." "Eu chego a¡ primeiro do que ela." Sinto-me. pap !" "n o sei o que que isso tem de estranho. com efeito. pap . compreender. N o reconheces a minha voz?. Por um segundo. maliciosos e inexplic veis. inarticulada. h  dois anos que n o nos vemos e tu recebes-me assim? Quando sa¡ de casa." " Espera. que vens c  fazer?" Mas a liga o foi cortada. Falar. Desagrada-te a ideia?. a tua filha. volto a deitar-me no div . Quem que disse "temos que falar no meu passado recente? Algu m. " "Uma Giulia que n o podes suportar. porqu ?" "Ent o vou j  a¡ ter. E. quer dizer: explicar. mas que estava espera de algu m. fora eu. afectuosa. no bar da piazza. ent o grito: "Ouve. estive a pensar e acho que melhor n o nos vermos. por m: "N o.. como eu! Ah. t o ansioso que n o consigo abotoar o colarinho. de repente. A voz responde. juntamente com a frase. que n o queres ver mais. e eu. desta vez digo para comigo pr¢prio que a informarei com a m xima firmeza de que n o quero. que quer dizer um momento? Uma hora? Duas? Dez minutos? Vinte? Naturalmente. o eco traz-me o tom em que a frase pronunciada. n o desligo o telefone." "est s sozinha?" " claro. deixa na minha mem¢ria um eco t o indubit vel como misterioso. vim falar contigo. sem d£vida. fico a olhar um peda o para o telefone. dizes-Lhe: estou aqui com a minha filha. mas no sentido literal. filial. vou a¡ eu.. fico espera da resposta. Pois bem. olho para o receptor como se olha a m o de um ilusionista durante um golpe de m gica. um tom doloroso. compor a gravata. Digo por fim. aliviado e oprimido. ter s uma boa desculpa para a mandares embora. depois. a frase de Giulia: tTemos que falar. desejoso e indiferente: tal a normalidade. em vez dela." "Mas ela deve estar mesmo a chegar. com a maldade habitual. Uma voz submissa. Giulia um nome muito corrente. que entendia a frase n o j  no sentido psicanal¡tico e pr -fabricado que lhe d  a Giulia. ao qual se encontra apoiado. como que comprazendo-se na pr¢pria gra a." "Quem? A Giulia? Vi-a mesmo agora na pra a a falar com um fulano qualquer. para continuar com a . tivesse encontrado a outra Giulia. talvez a minha mulher. esperava. bamboleando-se levemente. atrav s de um estreito corredor forrado de livros. o encerramento da rua ao tr nsito adquire para mim um valor simb¢lico." Vejo-a avan ar minha frente pelo corredor. as mam s levam at l  os seus meninos. e ela respondera. certas mulheres de pequena estatura. a minha filha. Digo automaticamente: "Estava espera da minha filha. Sem d£vida. e as obras de repara o come aram. os namorados fazem por ali amor sem precau es. a rua ao longo do Tibre tornou-se um lugar tranquilo. tem um toque de campainha curto e reticente. Deito para longe a gravata. de p . olhos enormes e boca caprichosa e essa indefin¡vel gra a que t m. nem um certo Tullio a acompanh -la ao cinema. o elevador que se p e em movimento. sim. algu m sai de l  de dentro. Hoje v -se um £nico carro. dirijo-me ao  trio. fecha as portas. precisamente a tempo de come ar a ouvir. que venha c  amanh . onde apenas se aventuram os autom¢veis dos que aqui habitam. que n o tinha a menor curiosidade acerca do que eu teria para Lhe dizer. no fundo. que dissera: "Estou na piazza. Sim. tendo-se prolongado at ao presente. no piso de baixo. volta c . quantas filhas queres ter? N o te basto eu?" HAVIA UM CESTO NA RUA AO LONGO DO TIBRE H  alguns anos. como. corro¡da pelo rio. habitualmente tapado pelos autom¢veis ali estacionados. quem desejo eu ver aparecer no patamar? O barulho do elevador deixa de se ouvir. vou janela. Qual das duas chegar  primeiro? E. saio da janela e. parado sombra. entretanto. a montante do meu palazzo. tamb m a minha vida se encontra. com a cabe a grande e o corpo mi£do. digamos assim. a minha mi£da. Quem vir  agora bater-me porta? A Giulia ou a Giulia? Giulia. quatro pisos abaixo. de quem estou separado h  muitos anos. Que n o tenha um rapazola barbudo espera dela l  em baixo. Ent o. v -se o empedrado deserto. o seu bar. o habitual jovem. Foram ent o colocadas vigas. que n o seja minha filha nem se considere minha filha. ou talvez uma terceira Giulia. Vou j  a¡ ter". acrescenta: "E al m disso. Encho-me de coragem e abro. desmoronou. a minha filha sai do bar e caminha na diagonal. A minha filha diz-Lhe qualquer coisa. de certo modo. uma pra a pequena da Roma barroca. teimosa e com menosprezo. assomo e olho a pra a. mas. ou Giulia. a minha mi£da. n o foi apenas a derrocada da margem do Tibre a abrir-me os olhos para o facto de me ter tornado doravante no simples reformado que sou. fechada ao tr nsito. tamb m ela em fuga. algumas vezes. Assim. apenas uns meses ap¢s a fuga da minha filha. o homem responde-lhe. Giulia. Fora eu. a rua ao longo do Tibre. porque parou neste andar onde moro. Bah. Est  descansado: precisa de ti. atravessando a pra a e dirigindo-se para o autom¢vel. com os seus pal cios. Os rapazes passeiam-se de patins. e agora n o me parecia j  t o casual que. Depois. devidamente barbudo e cabeludo. as suas lojas fechadas por causa do 15 de Agosto: De c  de cima. Pequena. de agora em diante. tamb m ela de dezoito anos. n¢s os dois". com o desejo estranho de que seja uma terceira mulher. dizes-lhe que tens que fazer.. Vou abrir. vedado o tr nsito."temos que falar. que dissera: "Estarei a¡ dentro de um momento. n o p ra. para l  do parapeito da rua. de cor e de forma. da minha janela de reformado. Passo horas a olhar da janela. Al m disso. essa sim. Sai do carro uma rapariga loura. ainda. a margem baixa do Tibre est  coberta de  rvores que inclinam os seus ramos para a corrente. diante do parapeito. a mata junto margem encontra-se semeada. Que olho? Tudo o que seja levemente diferente das coisas que habitualmente dali se v em. Mas cada cor e cada dimens o tem cambiantes e transi es inumer veis. ser sempre nova. espreitando o terreno sujo de desperd¡cios e cheio de silvas. Assim. um grupo de rapazes que observam em conjunto uma motocicleta. sucede de s£bito. de modo inconsciente. enquanto ela o galga. por causa do parapeito ser bastante baixo. deitam as coisas fora por cima do parapeito e voltam a ir-se embora.met fora. por conseguinte. Hoje. grito ao ver os despejos: "Javardos!". Certas alturas. Olho-a com aten o: baixa. descem. a novidade que. preciso dizer que. a intima o habitual: "e se pensasses antes na tua vida. camionetas. encontro-me ao abrigo de acidentes. observo as mudan as de cor das folhas dos pl tanos. um peito de ama. Vejo-a aproximar-se do parapeito. onde emergem aqui e ali objectos maiores e ainda n o completamente desfeitos: poltronas rasgadas. por m. que se alinham a perder de vista ao longo da rua e do rio. como esses de que as caseiras se servem nos mercados de prov¡ncia. autom¢veis. colch es esventrados. cadeiras sem pernas e outros despojos an logos. neste lugar. um pouco cheia. n o se pode respirar por causa do fedor. mudam. que nada tem a fazer para al m de olhar. Agora continua a caminhar com precau o. um desportista que corre. entre o verde escuro das silvas. de tipo giardinetta. avermelham-se com o outono. com o peito bastante sa¡do para fora. pela primeira vez desde h  muito tempo. Pois bem. bem conformada. Rebentos claros. j  do lado de l  do parapeito. dois amantes que se beijam apoiados ao parapeito da rua. sobranceira e robusta. sem saber porqu . ao longo do rio. a pr¢pria falta de novidades me impele a atribuir valor de novidade s coisas mais insignificantes. mas. frigor¡ficos estragados. de um verde quase l¡vido na primavera. As pessoas chegam com carros. com um fato de treino azul. Traz no bra o um grande cesto de vime entran ado. como penso de repente. a mata da margem transformou-se num local de despejo para todos os que querem desfazer-se de qualquer esp cie de refugo. velhadas!" Hoje. As folhas dos grandes pl tanos. sobretudo quando constitu¡do por pe as de maiores dimens es. Naturalmente. espero h  tanto tempo. Pego num bin¢culo que tenho sempre ao alcance da m o e aponto-o . reparo que tem coxas fortes e poderosas. com a cabe a e os cabelos louros cortados pagem inclinados para a frente. passar-Lhe por cima com desenvoltura. falta de melhor. encarquilhadas e amarelas caem por terra no in¡cio do inverno. sobretudo nos dias de tiroco. pode dizer-se todos os dias. Ao longo do parapeito. ao mesmo tempo. sempre nova. em "blue j ans" e camisola vermelha. verde e castanho. mas recebo como resposta um gesto de desd m ou. sob a condi o de a sabermos olhar. tornam-se folhas verde-escuras e do tamanho de m os com os dedos abertos no ver o. de montes de lixo. estou certo de que nada de novo voltar  a acontecer-me. no fundo. por fim. Um pequeno autom¢vel. at uma folha de pl tano pode. parece-me estar a acontecer alguma coisa verdadeiramente nova. entra na rua ao longo do Tibre e p ra junto s barreiras que a fecham. com os punhos contra o peito. A natureza. Um c o que corre e ladra. Sou vi£vo. precisa-se no meu esp¡rito a suspeita que me aflorou j  quando observava o curioso procedimento da rapariga com peito de ama. a rua ao longo do Tibre est  completamente deserta. est  uma poltrona de pernas para o ar. de repente. Naquele cesto.na direc o da rapariga. o autom¢vel descreve um trajecto em "U"". depois. ou seja: prolongarei a minha vida familiar por mais quinze ou vinte anos. para al m do parapeito. Portanto. n o queria ser mal-entendido. onde n o poder . tradicional. Mas este pensamento comporta a necessidade de um segundo: que farei se a minha suspeita se confirmar? estranho. Em seguida. ainda que. sai da rua ao longo do Tibre e desaparece. com a rua. contestat rio. em cima dos desperd¡cios. enfio um casaco de marinheiro e ponho na cabe a uma boina basca. levando para casa esta crian a. duas coisas com que me concedo uma ilus o de juventude. apesar do cesto que trazia pendurado no bra o. abandonou o chamado fruto do seu pecado num monte de lixo. descobertas pela camisola que Lhe subira um pouco com o salto. vidros e destro os. apenas um homem com um c o pela trela atravessa o passeio. H  um cheiro . defronto-me. Levanto-me pressa. Agora. mas de costas para ela. a £ltima coisa que vi dela foi. Em pouqu¡ssimo tempo. terei que a receber em casa e que a criar. bato com um dos joelhos na pedra e magoo-me. tornar-se-  um adolescente. junto ao parapeito. na realidade. pelo menos por agora. em cima do outro. Os meus eram da segunda esp cie. grito da entrada criada que vou passear e saio de casa. por m. o que basta para ligar o motor e arrancar. um pouco do mesmo modo que outrora os mesmos frutos eram abandonados nos degraus das igrejas. Quanto tempo dura uma fam¡lia? Se os filhos forem do g nero. Vejo-a percorrer. porque a hora da sesta. volta a galgar agilmente o parapeito e corre at ao carro. Pobre de mim. A rapariga lan a um olhar em redor: naquele momento. deixar de ser descoberto em breve. o cesto em cima do monte de lixo sem nada em cima. Em cima de um desses montes. dois rapazes e uma rapariga. estou certo. Neste ponto. gostaria de fazer como a rapariga que o transp s de um pulo. digamos assim. O cesto continua ali. uns cinquenta metros mais. n o mais de quinze anos. rapidamente. as costas nuas. em passo r pido e balou ado. Um homem como todos os outros. levando-o para aquele lugar de despejo de desperd¡cios. todavia. tenho tr s filhos. mas acabaram igualmente por partir. Em suma. pelo contr rio. sem filhos. mas n o me vem mente que poderei entregar a crian a a alguma institui o: a primeira e £nica ideia que me ocorre a de que aquela crian a foi ali posta para mim e que. sei perfeitamente onde me dirigir. Depois. Depois. uns vinte ou vinte e cinco anos. no momento em que saltava o parapeito. detenho-me um momento como que para me orientar. a rapariga decide-se e poisa. est  um rec m-nascido. Que esp cie de homem vir  a ser? f cil diz -lo: um entre muitos. O menino crescer . aponto de novo o bin¢culo em direc o aos montes de lixo. p ra diante de dois montes de lixo. com a minha avan ada idade. cheio de pap is. se forem. n o h  nada. Enquanto o elevador desce. Segui com o bin¢culo todos os movimentos da rapariga. o come o da tarde. quando. caminho coxeando e esfregando o joelho atrav s do terreno irregular. Ent o. os tr s j  casados. refarei de alguma maneira uma fam¡lia. Na rua ao longo do Tibre. com as m os enterradas nas algibeiras do gab o de marinheiro e a boina basca puxada para os olhos. A rapariga desfez-se dele. quase sem se apoiar. de um g nero. um homem. por assim dizer. mas as minhas pernas n o s o capazes de tanto. Parece o s¡mbolo de tudo o que vivo contrastando com tudo o que est  morto. salta. Procuro na mem¢ria o nome desta cor feita de tantas cores e acabo por descobrir: ru o. talvez justamente porque o cesto parece t o vivo. Orgulhoso. compreendo tudo. cheira-me. espera-me outra novidade nesta tarde de novidades. preto. O c o. evidente: o animal est  triste porque foi abandonado pelo antigo dono. etc. terminado o passeio. No entanto. sobe". Puxo a boina mais para os olhos e afasto-me sem tocar na boneca. este g nero de mulheres recebia o nome de m es desnaturadas. no peitoril. parece definitivamente sossegado: agita a cauda. sem pressa. Entretanto. castanho. apoio as duas m os no parapeito. intacto e brilhante. Naturalmente. O . em breve o terei do outro lado do parapeito. nem todo o mal vem dos preconceitos. Que tenho eu a ver com os ritos propiciat¢rios de uma rapariguinha tonta. tencionava realizar uma esp cie de rito de liberta o de tipo inici tico. Desta feita. ao mesmo tempo. O c o enrosca-se aos meus p s. A rapariga n o teria por certo mais que dezoito anos. o c o. atravesso-a com dignidade. semicerra os olhos como se quisesse dormir. com uma voz resignada. come a a fazer-me uma festa. simbolizada pela boneca predilecta. Entretanto. por fim. Quase estreme o de medo: de dentro do cesto. um encimado por uma poltrona de pernas para o ar. pego no bin¢culo. por fim. na minha velha cabe a. num tom t o amig vel. aponto-o na direc o da rua ao longo do Tibre. com o seu vime claramente entran ado em cima do monte nojento dos desperd¡cios. Digo-lhe: "Vamos. abro o cesto. Abandonando a boneca na margem do rio. o bin¢culo est  onde h  pouco o deixei. A delicadeza com que poisara o cesto em cima do monte de lixo denotava uma liga o supersticiosa e cheia de afecto. baptiza-o com o nome de Cartagna. esvoa am como morcegos os habituais lugares comuns: que ideia abandonar o filho no lixo. levanto a perna e.. A criada descobre-lhe volta do pesco o uma coleira que tem pendurado um grande "C" de metal branco. t o forte que levanto a gola do casaco e protejo com ela as narinas. E decido-me. Mas. evidentemente. que parece prata. no £ltimo momento. Ent o. porta de casa. ao ouvir-se chamar Cartagna. Depois. Trata-se de uma boneca. vejo o nariz min£sculo e a boca mimosa entre duas bochechas coradas e. de um acaso nasce outro acaso. o c o muito bem recebido em casa. com a cauda entre as pernas e gane de forma muito expressiva. de m os enfiadas nas algibeiras do gab o. outrora. de uma vulgar¡ssima boneca. com o p lo comprido e de cores variadas: cinzento. Olho em redor. eis a rua. cheia de n o sei que ansiedade. dois enormes olhos azuis fitam-me muito abertos. est  contente porque o seu instinto Lhe diz que encontrou um dono novo. depois. o outro pelo cesto. branco. Queria libertar-se da meninice. em tr s tempos. um c o nem pequeno nem grande. todavia. chego ao outro lado. enfatuada com o seu pr¢prio desenvolvimento interior? Tenho que transpor outra vez o parapeito. volta para tr s. c  est o os dois amontoados de lixo. para a rua ao longo do Tibre: agora o homem com o c o. estupefactos. ao p da janela. tomo as minhas precau es. mas. embora mantendo a cauda entre as pernas. Est  em ¢ptimo estado aquele cesto. arruivado. Vem um c o ao meu encontro. Estendo a m o. ao passeio. E a verdade que n o se engana.agudo de decomposi o. etc. Estou no ponto onde a rapariga se deteve. e ele segue-me prontamente para dentro do elevador. tenho quase medo de o abrir e ver o que l  dentro me est  reservado. segue-me para o escrit¢rio. Vou sentar-me na cadeira do costume. do ainda por fazer. Sim. a do j  acontecido ou a do n o acontecido ainda. justamente disso que se trata. tal prova tem que residir na certeza de existir. por mim. UM ENGARRAFAMENTO MONSTRO DA MEM RIA Aconteceu ou n o aconteceu? Fez-se. Ora. porque confirmaria a minha funesta dissocia o insuport vel. o fecho clair aberto e encravado. pelo contr rio. limpo. na minha cabe a. Por outro lado. uma vez que tenho a mem¢ria obstru¡da. ponho o cigarro na boca. O al¡vio com que descubro este projecto sinal de que pensei com acerto. Depois da prova. a coisa em quest o refere-se-me directamente e de modo imediato: se n o aconteceu h  quinze minutos. que tanto pode ser devido ao choque do que aconteceu como remo o do que est  para vir. do ainda por sofrer? Com uma das m os apenas. continuo a apertar o bra o esquerdo. n o se sabe como. continuarei a ignorar por "dentro" se o acontecimento se verificou ou n o. Por exemplo. em cima do monte de lixo. mas tamb m e sobretudo porque tenho que superar. No entanto. mas terei. a desconcertante certeza de que j  aconteceu ou de que ainda n o aconteceu "a um outro . . por baixo da l¡ngua e n o se decide a assumir ou o aspecto do j  visto. do j  sofrido. a prova da minha exist ncia. esta esp cie de bloqueamento que me impede de fazer algo que para mim fundamental: tomar consci ncia. intacto. que. Mas ter-se-  encravado com a coisa j  feita ou ainda por fazer. deve ter-se encravado esta manh . de qualquer maneira e o mais brevemente poss¡vel. poderia interrogar a realidade. e n o que eu n o veja a enorme diferen a que existe entre tomar consci ncia antes ou depois da ac o. do j  feito. para saber se a coisa j  aconteceu ou est  ainda para acontecer. Vem-me ideia que. mas trata-se de uma prova do "exterior". examinar a pistola e ver se chegou a disparar. ao mesmo tempo. como se pedisse s roupas que visto. procurar nela os ind¡cios do j  ou do ainda n o acontecido. e esse vazio. e digo-me que s¢ disponho de uma maneira de apurar se o acontecimento se verificou j  ou n o. devido a um pux o demasiado brusco por for a do choque do j  acontecido ou. n o consigo preench -lo. de modo que a coronha da pistola sobressai e se torna vis¡vel. por assim dizer. por conseguinte. Ontem funcionava ainda. porque reconhe o nele a mesma ambiguidade indecifr vel que se encontra na origem da amn sia. N o posso esperar um minuto sequer. um vazio amb¡guo. do nervosismo do ainda por acontecer? Abandono imediatamente este dilema. aos sapatos que tenho nos p s. Como que ainda n o me viera mente uma solu o t o l¢gica e t o simples? Mas o al¡vio de pouca dura. tirando-o do ma o que est  minha frente e acendendo-o depois com o isqueiro do autom¢vel. se abriu e ficou aberto. Mas como tomar consci ncia quando a ac o est . no entanto. n o s¢ porque tenho que me preparar para fazer frente a duas situa es muito diferentes. a um sentimento de igual impaci ncia quase fren tica.cesto continua no mesmo s¡tio. uma certeza sem necessidade de outra prova. dobrado no fecho clair do blus o. assente justamente no facto de n o ser neces rio prov -la. o que me torna imposs¡vel esperar que os factos me forne am a explica o definitiva de que preciso. ou o do ainda por ver. a prova da pistola assusta-me. a pistola pode fornecer-me a prova de que estava t o afanosamente procura. vivo. saberei ao certo que a coisa aconteceu ou n o aconteceu. Entretanto. dever  acontecer dentro de quinze minutos. As duas eventualidades ligam-se. na alternativa. No entanto, vou ter que saber; n o posso continuar espera. como se tivesse mergulhado at ao fundo do mar e a minha m scara de respira o subaqu tica se tivesse rompido e eu sufocasse e soubesse n o ter mais do que poucos segundos para voltar superf¡cie. A minha urg ncia de saber, de resto, justifica-se por um engarrafamento do tr nsito no qual o nosso autom¢vel se enfiou, segundo todas as apar ncias, de modo irremedi vel e como que para sempre. Estamos numa via larga da periferia que n o conhe o. Os autom¢veis encontram-se parados em filas de quatro, dos dois lados, para tr s e para diante. minha frente, tapa-me a vista o rect ngulo amarelo e negro de uma colossal camioneta de carga. direita da camioneta, l  muito ao fundo, a luz do sem foro j  se tornou alternadamente verde e vermelha por tr s vezes, sem que os carros se tenham mexido. Deve ter havido um acidente; ou talvez um desses engarrafamentos inextrinc veis que duram por vezes v rias horas. E eu, antes do engarrafamento se resolver, tenho de conseguir saber, seja como for, apenas com as minhas for as, s¢ com a minha mem¢ria e n o com os ind¡cios fornecidos pelos objectos, se a coisa j  aconteceu ou est  ainda por acontecer. Recordo neste ponto (a minha mem¢ria funciona tanto melhor quanto mais distantes s o os acontecimentos que procuro lembrar) que, h  alguns anos, atravessei o Sahara, da Tun¡sia a Agadesh, e que, durante o trajecto, perdemos algumas vezes a estrada. Que faz¡amos ent o para a redescobrir? De acordo com uma regra ditada pela experi ncia, volt vamos atr s at ao ponto de onde t¡nhamos partido. Da¡, volt vamos a partir e, com efeito, ap¢s um percurso mais ou menos longo, descobr¡amos o lugar preciso onde nos t¡nhamos transviado. Uma vez, tivemos que refazer tr s ou quatro vezes o mesmo percurso antes de descobrirmos o nosso erro. Perd¡amo-nos sempre do mesmo modo, sempre no mesmo ponto. Por fim, por m, quando est vamos quase a desesperar, com o sol escaldante e a perspectiva de ficarmos sem gasolina, imprevistamente, redescobrimos a estrada perdida: estava escondida por um arbusto n o mais alto do que uma crian a, formando uma barreira que n o tinha mais de tr s ou quatro metros de comprido. f cil perdermo-nos no deserto. Terei que fazer agora a mesma coisa. Voltarei atr s at ao ponto em que a minha mem¢ria deixou de funcionar; at ao ponto em que come a o vazio e, ia a dizer, o deserto. Mas tenho que me apressar nessa opera o mnem¢nica, porque, de um momento para o outro, o engarrafamento da estrada poder  desfazer-se e, ent o, muito veros¡mil que, passados poucos minutos, eu venha a saber ao certo se a coisa j  ou ainda n o aconteceu. Mas sab -lo-ei n o por m rito pr¢prio, n o gra as s minhas for as, mas por um choque com a realidade: alguma coisa que nunca poderei perdoar-me e que, de resto, nada resolveria, porque o meu problema j  n o o de saber, mas o de recordar. Portanto, vejamos, em que ponto da manh (agora cerca de meio-dia) a minha mem¢ria parou de funcionar? Ent o, com uma estupefac o inesperada, descubro que nada recordo at ... at ao momento de despertar. Quer isto dizer que me lembro apenas do despertar e de mais nada a seguir, porque, antes dele, h  o vazio da noite passada a dormir e, depois, o vazio do engarrafamento mental. Mas o despertar, esses poucos minutos que passei no escuro ainda, j  de manh , antes de me levantar, recordo-os muit¡ssimo bem e sou capaz de os descrever com todo o pormenor. Terei que os descrever agora: atrav s de tal descri o, tenho a certeza, redescobrirei a ponta da meada da mem¢ria; descobrirei, como no deserto, o pequeno arbusto atr s do qual se esconde o caminho. Coragem, pois. Acordei mais ou menos hora prevista, mas por mim, antes ainda de o despertador tocar. Acendi a luz, olhei para o rel¢gio de pulso e vi que faltavam cinco minutos; o meu primeiro impulso foi apagar a luz, voltar a deitar-me e adormecer de novo. Mas n o era poss¡vel; n o se pode dormir apenas cinco minutos; assim, apaguei, de facto, a luz, mas fiquei sentado na cama, com os olhos abertos no escuro. N o pensava em nada: ou melhor, pensava na cor da escurid o. De que cor era aquele escuro? Cor de caf muito torrado? Cor de fumo negro? Cor de bano? Cor de tinta? E qual a sua consist ncia, de que seria feito? Seria um formigueiro de mol culas negras contra um fundo imperceptivelmente luminoso, ou antes um formigueiro de part¡culas luminosas contra um fundo uniformemente negro? Lembro-me de ter afastado, uma atr s das outras, estas defini es, porque nenhuma delas me satisfazia; mas sentia, em compensa o, que o escuro me "apetecia"; que tinha fome disso, como se tem fome de comida ap¢s um prolongado jejum. Recordo ainda que, entretanto, ia acendendo a luz, olhando o rel¢gio, vendo que tinham passado dois minutos, depois tr s, depois quatro, e que, a cada vez, voltava a apagar a l mpada para gozar ao menos por um minuto, ao menos por trinta segundos, um pouco mais daquele escuro delicioso. Por fim, acendi a luz, sabendo que era a £ltima vez que o fazia e que era agora altura de me levantar. Foi precisamente nesse momento, no instante exacto em que acendi o candeeiro, que deixei tamb m de registar o que estava a fazer, porque, a partir desse momento, nada lembro do que me aconteceu a seguir. Olho o rect ngulo amarelo e negro da parte posterior da camioneta de carga; vejo que n o se moveu; por outro lado, a luz do sem foro, ao fundo, a seguir camioneta, est  vermelha; talvez tenha um minuto de tempo mais; talvez, se os autom¢veis continuarem im¢veis com a luz verde, mais dois minutos. Ent o, retomo esfor adamente a reconstru o do despertar. Assim: a mem¢ria apagou-se no preciso momento em que a luz se acendeu. Que quer isso dizer? Como poss¡vel que semelhante coisa tenha acontecido? Porque iria acontecer precisamente a mim? Digo-me que n o dif¡cil imaginar o que terei feito. Sou uma pessoa bastante regular nos h bitos: ter-me-ei levantado, tomado duche, feito a barba e assim por diante. Mas dou-me subitamente conta de que nada disso recordo; reconstruo-o simplesmente, na base da recorda o dos meus outros despertares do passado. Mas o que preciso de, pelo contr rio, recordar precisamente a toilette desta manh , essa e mais nenhuma. Somente se a puder recordar, poderei em seguida recordar tamb m o que aconteceu mais tarde; ou seja: descobrir o arbusto acr s do qual o caminho se esconde. Fa o um esfor o enorme ; repito para comigo : Portanto, acendi a luz... portanto, acendi a luz... portanto, acendi a luz e..." Mas j  tarde demais. A luz do sem foro est  verde e, quase de repente, a estrada inteira p e-se em movimento. Os autom¢veis andam por todos os lados, para tr s, para diante, direita e esquerda do meu; o rect ngulo amarelo e negro da camioneta de carga avan a. Deste modo, saberei depressa se a coisa j  aconteceu ou est  ainda por acontecer. Mas dou-me conta com ang£stia de que n o serei eu, com a minha mem¢ria, a descobri-lo; ser o os objectos e as circunst ncias a revelar-mo. O DIABO VAI E VEM Escondermo-nos relativamente f cil; o problema como ocupar o tempo enquanto estamos escondidos. Neste buraco ou quarto independente, como se quiser chamar-lhe, n o tenho livros, n o tenho discos, n o tenho r dio, n o tenho televis o, apenas um jornal que a minha vizinha do andar de baixo me traz todas as manh s, juntamente com a conta di ria; assim, s¢ me resta ocupar-me de mim pr¢prio, exactamente o que gostaria de n o ter que fazer. S¢ que n o sei fazer outra coisa, ou melhor: n o h  mais nada que fazer. Assim, reflicto, calculo, medito, especulo, analiso e assim por diante, sem parar; mas, sobretudo, o que fa o fantasiar. Chove h  alguns dias; o ru¡do que faz a chuva tamborilando no resguardo met lico da porta-janela, l  fora, na varanda, como se fosse gente a cavaquear em voz baixa e interrompendo-se de quando em quando para retomar o f lego, favorece as minhas "fabula es. Fantasio quando estou estendido no enxerg o velho que me serve de cama e de div ; fantasio quando encosto a fronte contra a vidra a e ao olhar a pequena varanda encastoada entre telhados velhos, espig es, trapeiras e campan rios grandes e pequenos; fantasio de p na cozinha improvisada a um canto, estreita e escura, esperando que a  gua do ch  levante fervura. E assim que imagino que um destes dias ouvirei o elevador parar no piso onde moro, facto ins¢lito, dado que o meu quarto independente n o passa da antec mara do terra o, onde nunca ningu m vem; e um passo ligeiro, lento, talvez coxeando, aproxima-se da minha porta. Depois, um dedo, o seu, carregar  no bot o da campainha, dando origem a um som alusivo e breve que eu reconhecerei, indo abrir, ainda que com alguma demora e repugn ncia: embora invocada e esperada, a sua visita pouco agrad vel. A primeira surpresa ser  v -lo aparecer sob a apar ncia de uma rapariga loura, com olhos azuis deslavados, nariz franzido nas asas, boca desdenhosa. Estar  vestida com uma capa grossa e branca de imita o de pele cara; serei impressionado pelo facto de essa capa n o estar molhada embora esteja a chover a c ntaros: est  certo, o diabo faz as capas, mas n o leva a perfei o ao ponto de as encharcar. Ela dir-me-  de repente, com voz arg ntea e petulante: "Vim ter contigo, que estavas a fazer?" Responderei: "Est s a ver: nada. E tu, de onde que vens?' Far  um gesto vago: "Moro aqui ao lado, neste mesmo beco. A mam saiu e eu aproveitei a sa¡da dela para vir visitar-te., N o direi nada; pensarei que tudo mentira: a mam , o beco, a visita - embora tudo se adecue sua metamorfose em rapariga. Depois perguntarei: "Porque que est s a coxear?' "Magoei-me, ca¡ nas escadas, quando vinha do leite." Nessa altura, ela tirar  a capa, dizendo: "Est  tanto calor aqui dentro. Tens sempre o aquecimento ligado?"; e verei ent o que est  vestida com uma blusa m¡nima e uma saia curt¡ssima; tudo o resto s o pernas: altas, robustas, musculadas, pernas de mulh r. Do peito, ter  pendurado um pingente curioso: uma garra encastoada em ouro. Poderia ser uma garra de le o, como se v em por toda a parte em frica; mas os le es t m as garras claras e esta, pelo contr rio, negra. Enquanto olho, a rapariga deambular  pela £nica divis o onde moro, fazendo uma s rie de perguntas acerca deste ou daquele objecto, exactamente como as crian as fazem. Isto o que ? Isto para que serve? Porque que tens isto? Quem te deu aquilo? E por a¡ fora, sem nunca mais acabar. Os objectos que Lhe despertam a aten o ser o dos mais banais; mas terei que estar atento, porque suspeitarei a todo o instante de que ela em breve passar  dos objectos insignificantes aos mais Quem era? Uma menina como eu?" "n o. h  uma bala. o lugar." "O que que isso quer dizer?" "Para uma pessoa se defender. rebrilhante de chuva: "Errare bunzanunz ert. mas sempre sem me voltar: "Revelaste-te enfim! Uma menina. a verdadeira. bruscamente. mando-te embora." "ent o." "Um homem mau" "n o sei. descobrirei uma grande l pide de travertino que. com aplica o. depois direi: "Sim. o nome do personagem que mandou colocar ali a l pide. E. exactamente minha frente. uma arrebicada torre de igreja barroca." "e contra o segundo homem. porque a bala tem uma for a de choque muito forte" "e se. quem te diz que eu repetirei e. em vez do arm rio. n o tens coragem." Eu direi: "Se n o te calas. e. A estas horas. for uma mulher. a data. Sentar-se-  mesa e lentamente. dentro dos limites da humanidade comum. Estar s bem e. Quando se carrega no gatilho. deixa-me escrever alguma coisa a mim!" "escreve l . porque que disparaste?" "N o. depois ir  sentar-se minha mesa de trabalho." Ela n o dir  nada: continuar  a saltitar ainda um peda o pelo quarto. sem me ter achado em casa. n o duvides." aMas tu j  disparaste contra algu m?e Ficarei calado por um momento. " Dirigir-me-ei ent o janela e apoiarei a fronte na vidra a. "erreverare diabolicum". disparando." Mas ela continuar  a saltitar e a repetir: "N o tens coragem. n o o conhec¡a. esculpidas com grandes letras antigas. Abaixo desta frase. nada disso. ouvirei a sua voz." nN o tiveste coragem de disparar contra o segundo homem?" "mas o que que est s para a¡ a dizer? Repito: n o houve nem haver  segundo homem nenhum. mais altos e mais baixos. ranger de dentes. na realidade. como ser  o inferno? Fogo. era um homem." "Mas. repetindo como um refr o: "n o tens coragem. hein? E por favor. suponhamos que ali no arm rio. diante da m quina de escrever: "e o que que andas a escrever?" tOs meus trabalhos. avan ando logo at s £ltimas consequ ncias: "Por isso que morreu. ainda n o notara. antes de mais nada. Verei o terra o engastado entre outros terra os. ent o o que que acontece?" "Fica ferido. ent o". depois saltar  da cadeira e recome ar  a saltitar pelo quarto. Justamente por baixo do sino. por cima da sua cabe a inclinada. a bala sai a grande velocidade do cano da arma e vai cravar-se num lugar qualquer c  de fora. n o houve segundo homem nenhum. Ou pode morrer. ouvirei atr s de mim a voz da mi£da a dizer: "Agora vou outra vez ter com a mam .> "Bah. na pedra amarela e gasta." Exdlamarei. batendo as teclas com um s¢ dedo. verei outras palavras em latim. em segundo lugar. ser s at feliz.significativos. lerei as seguintes palavras." Imediatamente. Depois. dizendo para comigo que a m scara foi agora arrancada e que o interrogat¢rio est  a tomar a direc o prevista. mas contigo. n o tens coragem. na luz funda e escura da chuva. verei formar-se a seguinte frase: "N o tens coragem!" Acabar  de escrever. disparaste porque n o o conhecias?. sabe-se l  porqu . cheiro a carne queimada?' "A repeti o daquilo que s." "Podemos quase dizer que foi isso. Mas foi s¢ uma vez. Nesse momento. que repetir ser  para mim um tormento infernal?" "Pelo contr rio. n o ser  tormento nenhum. um homem ou uma crian a. para me defender. come ar  a escrever qualquer coisa na folha de papel. Irei olhar e." "disparando?" "Est s a ver estes buracos? Em cada um deles." "Mas porque dizes ent o que . respondendo-me com calma: "irei. deve estar em cuidado por minha causa. abrir  uma gaveta da c¢moda e pegar  com a m o pequena no cabo da pistola: E esta coisa para que serve?" "Serve para defesa." E ela. e faz l  um belo buraco." Direi maquinalmente sem me voltar: "Vai mas para o inferno. em vez de aceitares o que te ofere o: depois falamos" "Sim.. uma vez mais. como fazem certas vezes as mulheres em casa de um homem que para elas novo. justamente no momento do maior abandono." "ah. que lindos vasos de flores. sim. al m do mais. dar-me-ei conta de que coxeia um pouco. H  pouco estava a olhar pela janela e vi pela primeira vez aquela l pide. at breve. vou ter com a mam . s um outro. Eu vim e respondo-te: posso aceitar. tornares-te outro. que me ficaria na algibeira?" "Ent o. conversaremos." Voltar-me-ei para ela e a pequena. vai-te embora. com os olhos verdes. far-se-  um curto sil ncio. Coxeando. na minha idade e com a minha posi o? Enquanto assim penso. qualquer outro. vir  abra ar-me e beijar-me nas duas faces." "." "mas o que que querias dizer ao certo?" "Queria dizer que tu me invocaste. declaravas-te pronto a ser outro. que bela torre de igreja!"." "Um outro. tornando-a mais ousada. repetir o j  feito e." "outro? N o entendo.. ela ir  ficando e tudo acabar  da maneira prevista e previs¡vel.ser  o inferno?" "O inferno n o sofrer mais. Depois. E eu? Com que ficava na m o? Um peda o de papel? "N o estou de acordo com esse pacto. verei que traz ao pesco o o colar com a garra negra.continuar o mesmo" "N o.. se eu." "voltarei." "a repeti o. N o restituirei os seus beijos. adeus. darei uma vez mais por que coxeia. Agora. Vir  com um pretexto qualquer.. seria demasiado c¢modo.." "Mas bastante simples: cometes um erro. tentando pegar no sono e sem o conseguir. e agora dizes-me. que me propuseste a venda do que sabes. atrav s da repeti o. cometes outro erro id ntico. isso n o. s sempre tu pr¢prio. come ar  a passear pelo quarto. medida que a repito. enquanto estava a cozinhar dois ovos no fog o. uma bela rapariga p lida. por exemplo. Diz que repetir diab¢lico. mas com a recorda o de ter sido o que sou. ter s que descobrir argumentos convincentes para me fazeres repetir. de que maneira?" "Sem teres sequer a recorda o do homem que eras antes de repetires o erro. por isso que h  pouco cantarolavas: n o tens coragem.. mas se n o o reconheces. vai-te embora. reconheces t -lo cometido. abrir-lhe-ei a porta." "Pois. Esta fantasia repete-se diariamente e eu. imaginava que." "Isso coisa que n o posso fazer." "At que enfim que percebes. E quando." "Com isso n o te preocupes: sou um mestre a descobrir argumentos. em primeiro lugar. te fizer recome ar a vida no ponto preciso em que te aconteceu o que te aconteceu. depois voltamos a falar. QUE ME IMPORTA O CARNAVAL? carnaval! Que me importa o carnaval? O carnaval." "invocaste-me dizendo que n o aguentavas ser mais aquilo que s. mas de uma £nica maneira: fazendo-te ser um outro atrav s da repeti o. exclamando ao olhar l  para fora: "Que belo terra o este. ali. n o precisavas do latim para entender isso." "Mas. se dirigir da cama janela. vou-a aprofundando. olh -la-ei enquanto atravessa o patamar. j  enfiada na sua capa de falsa pele. batia minha porta a estudante universit ria do primeiro andar. n o tens coragem. h  uma recorda o que me persegue: a da rapariguita que encontro todas as manh s (ela vai ." "admitamos que eu repita. N o ser  poss¡vel que reconhe a pela segunda vez que me enganei?" "n o. um momento de reflex o teria bastado. gostava de ser outro. no escuro. completamente nua. em troca. pelo contr rio." Nesta altura. e ent o abrir  a gaveta. em vez da mi£da. depois a voz da mi£da dir : " tarde. com a boca obscena e vermelha de fogo. que. eu vou comprar o jornal) e que tem sempre um ar aflito. como aconteceu com a rapariguita t¡mida. descobriu que era uma selvagem. talvez sugestionado pela minha m scara. Pouco depois. olhos do tamanho de ovos estrelados: "que est s a fazer. Vemo-nos l . por assim dizer. dou por mim apertado contra o parapeito. j  chega. ajustando com uma das m os a m scara ao rosto e segurando. por cima das casas da Giudeca long¡nqua. n o s¢ no aspecto f¡sico. Penso e repenso uma e outra vez neste encontro.para a escola. desta vez. por uma travessa vizinha. uma rapariguita muito banal. E contudo. com grande parte dos passageiros mascarados. como de costume. numa restolhada de folhas de bananeira de pl stico. todos mascarados e tu. espavorido. em compensa o. quer tendo-me comprado justamente aquela m scara. a testa encurvada. pego nela. o cabo de uma faca que. com os cabelos compridos e lisos. deitas-te s dez horas! Levanta-te. olho para a m scara que a minha mulher me comprou e sinto-me ma ado: a m scara do diabo. t o triste e t¡mida. de noite. O vaporetto atraca. sou o £ltimo a entrar. vejo passar. por baixo do casaco. o carnaval est  a actuar e actuar . com as suas  guas tenebrosas. ao facto de a pequena estar mascarada. uma m scara: a m scara de Arlequim. ponho-a no rosto. os cornos. a barba de bode. com a outra. depois de comer. ou seja. pelo contr rio. quando ia a sair. seria o seu rosto verdadeiro. a nossa famosa via aqu tica deveras sinistra. velhos alco¢licos. vou p r-me a andar. ressoa na noite o uivo de uma sirene. des o da cama e vou ver-me ao espelho. mas tamb m. est  a chegar o vaporetto e vejo logo que vem che¡ssimo. atirou-me de perto com uma nuvem de papelinhos para cima e. hoje. onde . com todos os seus pal cios mortos e velhos. j  deitado a esta hora? Anda tudo na rua. perguntando-me que teria sucedido para que aquela rapariguita. O rosto aflito que habitualmente trazia na rua era. que. a negra desaparece. n o pude deixar de ir buscar a uma gaveta da cozinha. no car cter. camponeses pasmados. depois. ou melhor: gra as ao carnaval. H  algum nevoeiro. C  est  a ponte sobre o Grande Canal. vou para a pra a. tenho a impress o de que a minha mulher exerceu uma prepot ncia sobre mim. que nos encontramos na pra a. escapou-se. viro a cara para o Grande Canal e penso. encontrei-a completamente transformada. ao dar o meu costumado passeio higi nico pelas Zattere. chineses. esse. na realidade. Maquinalmente. Mas eis que algu m acende a luz na minha mesa de cabeceira. v como bonita! Bom. adeus" Trata-se da minha esposa. Agarro-me com as duas m os amurada. dirigiu-me prontamente um sorriso de reconhecimento. Estou de mau humor. quer obrigando-me a mascarar. mortificado. atr s de mim. cal as brancas e escarpins negros. se tivesse tornado assim alegre e sem vergonha. as faces negras. anda. tendo eu compreendido logo que tal transforma o se devia exclusivamente ao carnaval. vejo debru ar-se para mim uma negra de enormes l bios. conclu¡ que se tratava da "ac o do carnaval. veste-te. Comprei-te uma m scara. por contraste. peles-vermelhas. Pois bem. um enorme transatl ntico branco. comprimem-se rostos de toda a esp cie: loucos. loura. se mascarou de selvagem. o rosto descolorido e p lido. come o a soerguer-me na cama. uma mulher muito s ria. alguma coisa me diz que. e por a¡ fora. com um riso sufocado. sem saber porqu . contudo. candidamente provocante. Quando me viu. Estava mascarada de Arlequim. saio de casa. Precisamente neste momento. toda aos losangos coloridos. directora escolar. os olhos de um azul deslavado. com todas as luzes acesas. Digo-Lhe que sim. Volto-me: l  em baixo. Em seguida. ao fundo. com giz. pernas altas e esbeltas. verdade? Ent o estamos de acordo. andam de bra o dado. justamente porque a morte e o diabo. exasperado." Afasta-se de mim. comprime ora os seus seios contra os meus ombros. Este pesco o encontra-se encimado por uma pequena caveira rangente. amea am. aperta-se contra mim. n o sabes que o diabo a vida?" "Eu imagino a vida diferente. o pal cio desaparece no escuro. uma vozinha suave murmura-me ao ouvido: "Horr¡vel diabo. tudo isso envolvido num par de bluej ans extremamente justos. com todas as janelas iluminadas. Nas obras. por dever. esta rapariga de seios macios e ventre musculoso encontra-se mascarada de morte. desperta. eis um pal cio estreito e alto que n o me lembro de ter alguma vez notado. um pouco mais adiante. h  uma multid o enorme. "Talvez com a cara de um belo adolescente. no qual. ultrapassa em altura a massa de gente com a cabecita insegura e escaveirada. esquerda da pra a. O vaporetto passa depressa. o seguinte: "Segues a morte at por baixo da galeria." "Ah. e sobre isso n o pode haver a m¡nima d£vida. fazendo-Lhe a injun o que sabes. volto-me bruscamente. um pouco cavado na base. Mas. mas a mulher. retorque vivamente: "Morte. com a sua cara dura. f -la atravessar a ponte. Quem diria? O diabo n o fica realmente espavorido com esta apari o f£nebre e. h  um portal de arcada: arranja maneira de a desviares por a¡. Depois. formula pensamentos que melhor calar. desce na ponte de San Marco. cuja apar ncia trago no rosto. como o de certas camponesas da montanha. sendo muito alta. e dar-me- s raz o. a caixa tor cica de um esqueleto." tTu a vida? Mas n o s o diabo?" tPois ent o. No cais. A casaca fecha-se no pesco o. que. digamos assim. ou melhor uma mulher que. oitenta por cento mascarados. redondo e forte. tamb m desenhada a giz num fundo de papel negro. Sem hesitar. Enquanto sigo a morte. Da cintura para cima. segundo todas as apar ncias mascarados. de repente. com as v rtebras e o externo vis¡veis. Mas eis que surge um novo motivo de perplexidade. verdade que est  aqui uma multid o apertada. at j . como se sabe. Procuro fazer frente situa o. veste uma esp cie de casaco de leve pano preto. com este contacto a que terei de chamar ¡ntimo. apertando-me o mais que posso contra a amurada. a morte. porque eu sou a vida e tamb m te quero. ora o ventre contra o meu ventre. uma muLher. Trata-se provavelmente de uma rapariga muito jovem. lan o-me atr s dela. Mas.brilham frouxamente manchas de ¢leo. diabo! Vemo-nos na pra a. faz aquilo de prop¢sito. Esses indiv¡duos agitam os bra os. concentrando a minha aten o nas trevas familiares do Grande Canal. de ter sofrido uma alucina o. ajustando a m scara no rosto e apertando mais do que nunca o cabo da faca por baixo do casaco. como se adivinha pela parte n o mascarada do seu corpo: ancas estreitas embora redondas. o melhor poss¡vel. se mascarou de morte. subitamente. o resto vir  . sabe-se l  porqu . de hospitalidade. solta esperan as irreais." "Adeus. Naturalmente. mistura-se a um grupo de m scaras. num canto mais escuro. foi desenhada. onde se recortam os perfis negros e irregulares de estranhos indiv¡duos." "Hist¢rias! Pensa bem. atrai-a para os estaleiros das obras de uma casa em reconstru o. tenho que executar. o diabo. Algu m. o diabo sugere-me todo um programa que. a certa altura. que queres tu?" A vozinha suave afirma prontamente: "Sou a morte e quero-te a ti. porque me tentas?" E ent o. riem. mudo de ideias. mexem-se. magn¡fico." "e como que a imaginas?" "Diferente. fico com a impress o desconcertante de ter visto mal. Com o frio que faz. puxa da tua faca e aponta-lha barriga. organiza projectos dementes. " "Separarmo-nos. precipito-me no seu encal o. deitando-me a l¡ngua e fazendo-me caretas. n o ?"' Tem raz o. mas ela repele-me. reagrupam-se. mas perco mais de um minuto antes de aqueles desvairados me deixarem passar. num momento em que a roda abranda o andamento. a bas¡lica resplende de doirados. Mas a pra a est  realmente estupenda. com um pequeno inconveniente: n o me interessa. j  est s a fazer o que eu quero. vestido. Por cima da multid o. quando acontece algo de imprevisto: um grupo de m scaras rodeia-nos de s£bito." E ele. para qu "" "ora. reviradas. chamam. despontam umas cal as azuis de marinheiro. foge e desaparece entre a multid o. uma morte baixa e corpulenta. entretanto. h  uma outra rapariga mascarada de fidalgo do s culo XVIII. vem. Estreito o bra o da morte e segredo-Lhe: "Morte. uma multid o alegre e violenta parece tomada por uma crise epil ptica colectiva. excelente." Um programa magn¡fico. de maneira nenhuma. deve haver um tambor turco. fazendo ouvir a intervalos o seu som pesado e regular. com todas aquelas feiras de janelas que as fazem lembrar camarotes de teatro. que dizes. por exemplo. detenho-me bruscamente: por baixo da casaca negra espreitam agora duas pernas de umas cal as de homem. para nos conhecermos. Ponho-me a correr. No rect ngulo final da pra a. a quinta morte surge-me enquanto ando volta do Palazzo Ducale. quase de baixo do meu nariz. e eis de novo a morte: uma mulher. Louco de raiva. Enquanto rodam vertiginosamente.por si. vacila e escorrega. bah! Mas. mas n o se fala mais nisso. encaminho-me para a galeria. mas n o se esfor a a valer e desiste em breve. para o lado da Mercearia? H  um lugar onde poderemos separar-nos muit¡ssimo bem desta multid o toda. vejo a morte na galeria. sendo t o baixa! Mas aparece a quarta morte junto aos Schiavoni: uma morte bria. cantam n o sei que desenxabida can o e aproximam-se de mim. por isso: "belo. bailam. respondem. Renuncio. estou junto s portas do Flon n. dando-se as m os. vamos. Nova corrida por entre a multid o. depois. voam notas misturadas de m£sica variada. Volto para tr s. . direita e rosa. sard¢nico: "N o se fala mais nisso. para falarmos. a pretexto da pra a de San Marco transfigurada pelo Carnaval. dizendo-lhe: " bonito. por m. avan ando for a de empurr es. que traz pela m o um mi£do. a torre ergue-se ao alto. procura tirar a minha do seu bra o. ao mesmo tempo. de cowboy do Far West. cantam. em p . maldito diabo. do tamanho de um enorme tonel. atiro-me contra a roda das m scaras. assustada: com a m o. com as c£pulas que parecem milhares de tiaras de fant sticas rainhas do oriente. Algures. como um colossal falo de tijolo. empurram-se." E tento avan ar. parece tentada e. com tric¢rnio. agora mesmo Lhe deitaste a m o ao bra o. As fachadas dos pal cios est o iluminadas parecendo ser dia. Todos gritam." "que dirias de irmos os dois at ali ao fundo. formam um c¡rculo. por baixo da casaca. Felic¡ssimo. Todos saltam. vejo a terceira morte entrada da Mercearia: uma an . como flocos de neve arrastados por um ciclone. dispersam-se. iniciam nossa volta uma roda fren tica. como se v . passei o meu bra o por baixo do bra o da morte. Eu insisto: "anda. " A morte n o diz que sim nem que n o. Aperto-me contra a morte. Respondo. n o maravilhoso?" "digo que me largues o bra o. mas n o ela. Sen o porque que. por sua vez. parece dirigir-se expressamente para o lugar de que lhe falei. ei-la que rompe a cadeia das minhas m os. ao lado dela. de repente. Ora quem ali est ! A rapariguita vestida de Arlequim: est  em frente da porta. traz botas altas.que ideia mascarar-se de morte. depois. Depois. com os n£meros da matr¡cula limados e uma muni o de vinte balas. com  gua at meio. at demais! Mecanicamente. deixo-me cair. Tamb m aqui est  um escuro carregado. calibre novo. P ro e digo em voz cavernosa: "arlequim. ou ela me destruir  ou a destruirei eu. acabei por a comprar no mercado negro e." "e quem sou eu. Encontro uma barrica de cal. sapatos brilhantes. Imagina o que fariam contigo que tens uma verdadeira arma de guerra!" Ou ainda. arrisco-me. depois de uma alterca o mais violenta.peruca. acendo a luz pelo caminho. fui eu e s¢ eu a meter-me nesta embrulhada. com essa pistola de n£meros limados que te deixou aquele teu lindo amigo. de tal maneira que se me apanham com ela. da cama. com o dedo no gatilho. agora para aqui estou. em pijama e descal o." Ou ent o. no termo da qual quase cheg mos a vias de facto me advertiu com franqueza: "No teu lugar. Finalmente. Tem cuidado. adentro-me no escuro do estaleiro. cal as brancas. n o falo nem em sonhos" At que um dia. sabes muito bem que podes ser preso." Fico sem f¢lego: como me ter  ela reconhecido apesar da m scara? Atiro-Lhe um punhado de papelinhos. A m scara flutua na  gua: a luz de um candeeiro avermelha-Lhe a boca. mas mantenho l£cido o pensamento. ent o?" " s o senhor que encontro todas as manh s quando vou para a escola. quase como se dormisse. porque. denuncio-te" Ou ent o. Na realidade. d¢i-me um pouco a cabe a por causa do vinho que bebi. vou at sala. pede-me que Lhe entregue a arma. a partir desse dia preciso. MALDITA PISTOLA Que fazer? Ap¢s duas ou tr s horas de ins¢nia furiosa. no escuro. ningu m a n o ser ela sabe da exist ncia desta pistola de marca americana. a partir do dia em que comecei a estar farto dela e a falar em nos separarmos. n o falaria tanto de separa o. Ningu m o sabe e. sabe Deus porqu . acende um reflexo na laca negra das faces. da forma seguinte: "Tu. al m disso. proibid¡ssima. tacteio procura da pistola. por exemplo. das quais cinco no tambor e uma j  no cano. Lan o l  para dentro a m scara e fico. A pistola. eh. excepto Dirce. faz chantagem comigo. a hora mais escura. com uma arma proibida. Sim.. em seguida. sendo preciso dizer que a hist¢ria do amigo a inventei eu para justificar aos olhos dela a pistola. na poltrona pr¢xima do espelho negro e nocturno da vidra a. Trata-se. com amea as jocosas: "est s nas minhas m os com essa pistola. levanto-me. magn nima: "Est  descansado. sem que sobre tal facto possa haver qualquer d£vida. Dirce sabe que ningu m o sabe.. que neste momento dorme pesadamente no quarto. devem ser tr s da madrugada. em seguida. Dirce sabe disso e n o se inibe de mo lembrar. pelo que. no final. sempre . ela. encontro-a e. fato de veludo negro. a tr s anos de pris o. Se n o andas na linha. num gesto que exprime por completo a rela o existente entre mim e este objecto amado-odiado. por isso. sem d£vida. Naturalmente. s¢ por a teres c  em casa. no m¡nimo. "A pistola. sabes que te conhe o?" E ela. a olh -la por um momento. muito cuidado: sei muitas coisas acerca de ti". ing nua: "Tamb m eu te conhe o. seguro-a no punho. de uma amiguinha dela. A pistola tinha-se tornado uma obsess o e. atravesso a ponte. Mas recapitulemos. eu sou muda como uma cova. depois atravesso a pra a e chego ao portal de arcada. deito tamb m a faca para dentro de  gua e vou-me embora. Ningu m. trata-se de uma chantagem hip¢crita. mascarada de solicitude. de forma mais sinistra: "Leste o jornal? Prenderam um tipo porque trazia uma simples pistola de press o de ar. E entretanto. Um nariz de servi o secreto. come o a compreender o que poderia significar esse obscuro e funesto "outras coisas"." "Mas o que que ele quer?" "Na minha opini o. porque a impress o de falsidade amb¡gua e sinistra que me inspira esse homem vem toda do seu nariz. poder  saber-se a verdade? Alessandro convida-me por estar apaixonado por ti. sem sair do carro: "Mas. deveria t -lo feito antes de Dirce saber que a possu¡a. O facto que fiz tudo. do nariz de Alessandro! Sim. que todo um programa. de que que ele vive?" eEle diz que de um neg¢cio de export-import. mas o que seja esse programa. De outro modo. quadripartida. antes de mais. Nele tudo suspeito. por vaidade e exibicionismo. se o olhamos de frente. os habituais pretensos neg¢cios. querer  outras coisas. Mas sente-se que um dia ele pode perfeitamente deitar fora esse cinzento todo e aparecer-nos de uniforme militar." "Sim." "Sim. num s¡tio deste g nero?" Respondo: "entretanto. uma vez." "E porqu ?" " claro que para te denunciar. ou para te ter na m o para o que ele quisesse mandar-te fazer. diante do port o de Alessandro. durante uma das nossas disputas habituais. mas se o olhamos de perFil." "Est s a ver? Tamb m achas o mesmo. o seu modo de vestir. em resumo. parece encurvado. Por exemplo. sempre t o cinzento. v -se l  saber! Ou melhor: eu n o conhe o o seu programa. fotograma a fotograma. o nariz de Alessandro? um nariz que n o pode ser. mas verdade. t o burocr tico. para dizer tudo. em resumo. afei oara-me a ela. julgo que esteja perfeitamente a par." No entanto. a primeira coisa que fiz quando ela veio viver comigo. com n o sei quantos gal es. Mas. tudo o que era poss¡vel para justificar essa frase amea adora: "A pistola e outras coisas. um nariz que. no rio. numa abertura dos esgotos. mas Dirce. ou porque pretende entrar na nossa intimidade para melhor me espiar?" "Na minha opini o. Farei como no cinema (profissionalmente. porque que. teria lan ado. em pormenor. depois do que sucedeu durante a festa em casa de Alessandro. Como . demonstrar a sua pot ncia de fogo. maldito seja eu. eis o primeiro fotograma. ent o.a pistola!" "A pistola e outras coisas. Eu digo. custara-me uma quantidade de massa. de espi o. sabes. " Ou o j  algu m exclamar nesta altura: "Se essa pistola era t o comprometedora. parece direito. antes." "E ent o que me aconselhas? Por exemplo. porque n o deit -la fora nalgum lugar seguro." "Mas. parece-me que daria tudo o que fosse preciso para saber da tua pistola. aquele que est  sempre a convidar-nos. por diversos ind¡cios. tr¡plice. E depois. Dirce e eu. "Quem sabe? Um tipo bastante esquisito. N o posso sequer negar ter-me gabado de ter as minhas boas raz es para ter em casa aquele objecto proibido. o ser o de ontem." Deixemos isto. mont -la e desmont -la diante dela. antes de tudo o mais. de pessoa d£plice. foi mostrar-lha. era um bel¡ssimo objecto. afinal. Um nariz. Um nariz. ao mesmo tempo. Examinemos. como que por acaso: "alessandro. n o tinha pensado nisso. ou seja: numa recorda o particularmente significativa. que hei-de fazer com a pistola?" . ' Claro Alessandro! Falemos de Alessandro! E." Agora. Estamos no autom¢vel. quer-me a mim. com as narinas pequenas e a ponta arrebitada. sou t cnico de montagem): deterei o filme da mem¢ria. com as narinas grandes e a ponta para baixo. quem Alessandro?. as duas coisas. na verdade." "mas o qu ?" "Outras coisas. sobretudo comigo!a Um amor! Mas n o percamos tempo. n o consigo descobrir onde ter  ele a m o. em camisa de noite. entretanto finge vacilar e resvala contra Alessandro. um brinquedo. a festa prossegue. cheg mos ao momento ritual em que um charro passa volta compungidamente.. se apoia com a m o atr s de Dirce e. Naturalmente. o inef vel Alessandro. uma in pcia. uns contra os outros. com o cabo de madrep rola.. Por isso. mal me sinto amea ado por um rival. Tenho uma garrafa na m o e um copo na outra. uma ridicularia. ando volta da casa. Na sala. deixando-me no patamar. punhais. que abro porque gosto de doces. o filme do ser o corre a toda a velocidade na mem¢ria e c  est  um outro fotograma. naturalmente. em suma: oriental . t m coisa melhor a fazer. j  acabaram de comer ou. procurando n o perder o equil¡brio nem entornar o copo cheio de vinho. mais hip¢crita. Mas a quem julga Alessandro meter medo com uma pistola assim? Do quarto. por assim dizer. todo em estilo turco ou  rabe. t o tosca. Na realidade. desapareceram. que entalei de p numa das almofadas. com manta de retalhos.. encostada parede. desde o primeiro dia da nossa liga o. ai de mim. ao mesmo tempo. paci ncia. . responde: "n o verdade? E dizer que nos conhec¡amos h  tanto tempo sem termos dado ainda por isso. enquanto com uma das m os seguro o prato cheio de massa escorrida e com a outra empunho o garfo. com passo inseguro. n o esperes conselhos meus! s¢ te digo uma coisa: tem cuidado. mais provavelmente. Continuemos: C  est  novo fotograma. por muito que apure os olhos. e por compara o com a minha. Surpresa: aqui nada de orientes. Estou embriagado. de senhora. em resumo. como ser  poss¡vel conversar sempre no ch o. n o posso impedir-me de olhar para Dirce. de m o em m o. agora. uma pistola.cama muito baixa. em cima da sua almofada. " Outro fotograma. um a um. cheia agora com os casacos dos convidados.. Levanto-me com esfor o da minha almofada. sempre no ch o? Claro. a minha companheira t o desprezada. a sua fuma a. viver. volta a seduzir-me como por milagre. Conversam. em primeiro lugar. ainda ontem me pegaste por um bra o e me puseste literalmente fora de casa. ro a-lhe o ouvido com os l bios."Tu queres que nos separemos. ao quarto de dormir. ros rios. vejam bem. Falta-me dizer que o dono da casa. imagens coloridas. o pressuposto de todas aquelas desenvoltas e m¢rbidas almofadas a promiscuidade mais descarada e. esta Dirce que nada tem de bonita. Mas comunicam por que meios? f cil e r pida a resposta: Dirce. passo ao escrit¢rio. Sala! Digamos antes exposi o permanente de almofadas de tipo oriental. muit¡ssimo inquietante. Entre par ntesis. Uma pistola muito pequena. Num passo exageradamente titubeante. P ro de p diante deles e levanto o copo num brinde sarc stico: " vossa sa£de! Que belo par voc s fazem! Como ficam bem os dois!" Dirce. colares. deve dizer-se. em suma: comunicam. com maldade. dirijo-me directamente para Alessandro e Dirce. sentada mesmo minha frente. se afunda ao lado dela e. com o copo na m o.. o qual. por sua vez. as almofadas do costume e. Devo agora dizer que. numa caixinha de lukami. enquanto lhe fala. com todos os presentes tirando dele. riem. n o comem. xailes. ou melhor finjo estar embriagado. comer sempre no ch o. ponho-me procura de Dirce e Alessandro que. nas quais nos afundamos o melhor que podemos uns por cima dos outros.." "Cuidado com qu ?" "Cuidado. Estamos cerca de uma vintena de pessoas na sala de Alessandro. que est  sentada com as pernas tra adas. de quem quero desfazer-me. Dirijo-me. . ataco: "Espia. mas n o s¢ a pistola." "Se n o tens nada a esconder." "Sim.. por m. Vem depois a casa de banho. embora. pequen¡ssima. tento faz -lo. est  em jogo a quest o da pistola.. devias legalizar a tua. como se se tivessem queimado. fa o pontaria e atiro o copo cabe a de Alessandro. coloco no s¡tio do costume a pistola. diz com singular penetra o: "por minha vontade. e tudo. Mas. Estou deitado de costas. ao lado dela. Quero que nos casemos. n o posso deixar de irromper: "Referes-te pistola. cheia de toalhas. tr s vezes. de resto." "N o tenho nada a esconder. a avaliar os pr¢s e os contras da situa o. L  est o eles. porque limaste ent o os n£meros da matr¡cula? Porque n o tiras antes uma licen a de porte de arma?" Fico sem saber o que dizer. A prop¢sito: que estudar  Alessandro? N o se v um livro. cinjo Dirce. regresso escurid o quente e ¡ntima do quarto. porque que n o pegas na ." Digo de repente: "bah. Dirce e eu temos uma discuss o violentissima. em pijama. volta-me as costas e. segundo creio." Ponho-me a uivar de ¢dio: "Ele tem uma pistola de brincadeira. sinto-a puxar-se para tr s com um grito sufocado. Que me resta visitar para descobrir os dois inencontr veis? Chego ao fundo de um pequeno corredor. a que pouco chamar desvergonha. ou o a voz dela a sussurrar com uma desconfian a caracter¡stica: "Mas o que que te deu?" "N o me deu nada. nada v  mudar. No escuro. simples. Ent o. delatora. cobarde!" Ela n o se altera. mas a dele est  registada como a lei manda. e ela. Depois. abro a gaveta. mas a tua legalmente proibida e a dele n o. Pen£ltimo fotograma. limita-se a repetir: "Tem cuidado com a maneira de me falares. nada seria melhor. de objectos de toilette. deita-se sem uma palavra. Estou sentado na poltrona. adeus. com uma voz t o amea adora que. mais do que o abra o do jardim. nem. h£mido. um jardim muito pequeno. vamos mas dormir!" Ela n o espera que Lho repita. despe-se como habitualmente. n o pego no sono. sussurro-Lhe: "queres casar comigo. e de apagar a luz. de roup es. escuro. meto-me de novo entre os cobertores. como sempre. depois de me meter na cama. nus. apenas o telefone: aqui h  gato. denunciante. no fundo da qual. duas vezes. as m os dela nos ombros dele. ser minha mulher?" Passa um instante. para senhoras. torna-se mais meiga: "Bom. ergo-me da poltrona. Diz isto uma vez. depois. em frente da retrete.. entretanto. plantas. pelo contr rio. dou com uma porta envidra ada que liga ao jardim. Acuso com palavras muito duras o seu comportamento. trepadeiras. n o a queiras comparar com a minha. Tacteando. levanta-se. com mulheres nuas de revistas recoladas parede por cima da banheira." "e depois?" "Depois. numa atitude inequ¡voca: apertados um contra o outro. por fim. entretanto. ltimo fotograma: o que estou a viver. atraio-a para mim. se fez menos nocturna e onde j  o branco sujo da alvorada citadina se mistura ao negro da noite. n o achas? Para ti diferente. cheio de luminosidades incertas e de sombras fant sticas. Chegados a casa. Eu. afogado em  rvores. Subitamente decido-me. a seguir. maridinho querido." Ela cala-se mais um momento e. estranhamente d¢cil. austeros." Depois. v -se que pensaste e que achas que te conv m: da¡ nenhum mal pode vir. Diz calmamente: "Alessandro tamb m tem uma pistola. adormece quase imediatamente. com as m os atr s da nuca e passo tr s horas assim. n o?" tSim. Separam-se de repente. que me parece uma hora. ervas..m¢veis em estilo sueco. a seguir. as m os dele sabe-se l  onde. sentada na cama. a pistola em punho diante da janela da sala que. dirijo-me c¢moda. empurrando-me o peito com as m os. Se se quiser. j  que. Mas preciso entendermo-nos. Vou conduzindo e. esses motivos reduzem-se a um s¢: sou filho £nico de um pai riqu¡ssimo e. ajusto o espelho retrovisor. a segunda. Afinal de contas. Queria enfrent -lo. nada poder  obter: nem dinheiro nem vingan a. sei l . ¢viamente. um carro t o an¢nimo que. Obrig -lo a uma explica o. como de luxo o bairro todo. serve-se de um carro utilit rio. apesar de contra vontade. Moro numa rua das que se chamam particulares. A primeira. "ele" n o est  l . ou melhor dizendo. Enquanto conduzo devagar para Lhe permitir que me siga. hoje. por isso. Portanto. na cidade. a sociedade da qual. ressalta vista como o autom¢vel de um milion rio numa rua de gente pobre. sem sa¡da. sa¡ por causa dele. nesta rua de milion rios. Tanto poder  ser um rapaz s rio. Olho outra vez: atrav s do p ra-brisas vejo a cara dele. atrav s de mim. menos oviamente. "ele" an¢nimo dessa maneira. sinto-me estranho. No entanto. num tipo do g nero funcion rio p£blico ou empregado de empresa privada. antes o homem sem emprego. Sim. conveniente para se confundir no meio do tr nsito da cidade. recapitulo uma vez mais os motivos por que "ele" poder  andar atr s de mim. pitoresco. paradoxalmente. A tal ponto que n o quis recorrer pol¡cia. N o. Entro no meu carro com um sentimento de frustra o angustiante: sem "ele". atrav s de mim. l  vem "ele". com um vistoso blus o vermelho e encarnado e bluej ans. pelo contr rio. muito odiado. Mas. diante uns dos outros. sim. e ao longo da qual se rasgam. uma den£ncia equivaleria a uma implica o. no mesmo instante. como realmente sou. como "ele". acerca do que o an¢nimo. um intelectual. digamos. Quero enfrentar o meu perseguidor e demonstrar-lhe que est  a seguir o homem errado e que. quando ao acaso volto esquerda e. h  milhares. chamemos-Lhe assim. teremos uma bela noite de marido e mulher. tamb m esta completamente an¢nima." TODA A MINHA VIDA GAGUEJEI Saio de casa. ostensivo. verdadeiramente an¢nimo. na medida em que serei o s¡mbolo de uma certa situa o. eis que avisto o seu autom¢vel a seguir-me. implica o homic¡dio. qualquer coisa ao acaso. aqui. poderia distingui-lo entre mil. an¢nimo. nada de den£ncias. como um assassino. pouco depois. cuidadoso. espiando-me onde quer que eu v  e seja a que horas for. "Ele". que posso fazer agora. o novo anonimato. Para mim. algu m que me segue h  uma semana. Vai e vem c  ter outra vez e ent o. os jardins de tr s ou quatro mans es. o qual. trata-se de atingir. a tudo isto. fa o parte. para ver se "ele" l  est .maldita pistola e n o a vais deitar no tanque do jardim p£blico. nesta primeira hora vazia da tarde? Na realidade. simb¢lica. olhando direita e esquerda. vestido correctamente e sem colorido. em suma. N o. aqui ao lado? A esta hora n o est  l  ningu m. bigodudo. Assim. surgem agora duas dificuldades. A primeira . levo os olhos ao espelho do retrovisor para ver se continuo a ser seguido. realista e a hip¢tese. Algu m poderia pensar. comporta o sequestro com o fito de fazer com que o meu pai pague um resgate mais ou menos avultado. cabeludo. Ora. n o esse tipo de empregado ou funcion rio. "ele". em primeiro lugar. Vejo apenas um par de autom¢veis estacionados junto ao passeio e s o autom¢veis de luxo. continuo a pensar. de certo modo. para me seguir. as hip¢teses sobre os objectivos da persegui o s¢ podem ser duas: a hip¢tese. provavelmente. Vejo que ele entrou na garagem atr s de mim e me segue a pequena dist ncia. De resto. "ele. tenho que o obrigar a todo o custo a uma explica o. ao lado do meu lugar. fumando pensativamente. Come o a descer a rua. E ent o tenho uma ideia. caminhando a direito entre um carro e outro. desaparece. folha morta. dou pela mulher que finjo procurar. penso em ter a explica o na garagem. precede-me. Gaguejo. Conduzo devagar. subitamente." Sa¡ da ag ncia bastante indisposto. o sil ncio. fecha a porta. para "ele. Julguem voc s. com uma t ctica previs¡vel. mal chego escada rolante que me leva do subterr neo superf¡cie. verdade que o fez esta manh . minha frente. C  est  a entrada da garagem subterr nea onde guardarei o carro. Avisto dois lugares vazios. desalentado e subtilmente impuro. Ter  terminado a persegui o? Tenho que mudar de ideias. onde vou continuar os meus estudos de f¡sica. ali. porque confirma aos meus olhos a minha j  mencionada estranheza total em rela o ao sistema de que decorre a persegui o destes £ltimos dias. a sombra do local dissuadem-me: exactamente o lugar ideal para arrumar um homem e continuar em frente como se nada tivesse sido. a cor dos cabelos parece continuar no rosto e no pesco o. com o ar de um estrangeiro que. ou melhor. nova. o qua. pelo contr rio. entrevejo o meu perseguidor barbudo. que se demora com ar entendido diante dos livros de bolso ingleses em exposi o num quiosque. s¢ raramente consigo ir al m da primeira s¡laba da frase.".. Acrescento: uma ideia de gago . parece faz -lo com cansa o e des nimo. Precisamente nesse momento. p ra diante da montra de uma loja qualquer e aplica-se a apanhar no seu o meu olhar. completou com uma sinistra cortesia: "o senhor quer dizer o quatro. Caminha bamboleando-se um pouco mais do que o normal. precedendo-me alguns passos. n o s¢ para mim. viro bruscamente a direc o e introduzo o autom¢vel na fila. Vejo-o. que entretanto se pusera ao meu lado diante do balc o. a frase acaba por ser completada pelo meu t o perspicaz como compadecido interlocutor. segue pelo passeio mais famoso de Roma com a inten o de abordar. mas com alguma coisa. Com "ele". dourado por recentes banhos de mar. Mas o deserto... Em seguida. claro que n o experimento qualquer desejo desse g nero. por m. Vou pensando nestas coisas e eis que. mas isso ocorreu em circunst ncias tais que temi o pior. Sou gago num grau quase absoluto. Sai do carro. mas. de repente. Por um momento. ap¢s ter feito um almo o abundante e solit rio. de cansado. de modo entusiasta: n o falei. aprovo com a cabe a. tal m todo n o funciona. Agora o tempo aperta. mas fui compreendido como se o tivesse feito. Ent o. quase invenc¡vel: a minha gaguez. "ele" n o parece interessado na garagem. se quiser enfrent -lo. de se fazer abordar por uma transeunte desocupada. Entrei numa ag ncia de viagens para reservar um lugar no avi o para Londres. Estou agora na via Veneto. apinhada de autom¢veis alinhados em espinha entre colunas cicl¢picas. o qua.. N o posso realmente esperar que o meu assassino me complete as frases. deixando-se transportar para cima. tenho que estacionar e prosseguir a p . sobretudo.super vel: trata-se do autom¢vel. A segunda. Antes da minha partida. Tamb m quero reservar um lugar para o mesmo dia. Como n o consigo sen o repetir: "O qua. at esse chamamento profissional. gaguejo e.. mas. Mas a ideia de me comportar como se estivesse procura de uma mulher agrada-me. e depois na roupa: uma esp cie de t£nica de um amarelo velho. Loura. dir-se-ia que completamente absorto. atrav s da imensa sala mergulhada em penumbra. Tamb m ele vira e vem estacionar no espa o vazio. no rosto e na pessoa.. muit¡ssimo t¡mido com mulheres. eu. Dito e feito. lembro-me de ter surpreendido de passagem uma estranha troca de olhares entre a mulher e o meu perseguidor. explico-Lhe o que quero dela: "Est s a ver aquele rapazote.. uma gratid o imensa para com a mulher: como se a houvesse buscado toda a vida e finalmente a encontrasse.. O teu amigo desta vez parece ter vencido a timidez.".. Com surpresa. Talvez a tens o pr¢pria de uma situa o excepcional e amea adora tenha expulsado a gaguez.que. apoiado a um lampi o. nua." Ela aceita com a maior prontid o: "Se s¢ isso que queres. a mulher tira da bolsa uma chave. ao mesmo tempo. empurra-me para um div e." Infelizmente. recorre linguagem figurada.. ali. e aponto-lhe o dedo. Mas agora est  aqui o teu amigo. em seguida. em duas palavras. ou o girar a chave na fechadura. N o te pe o mais nada para al m disso: que te exibas janela. premeditadamente. o pequeno ventre proeminente e murcho lan ado para diante com soberba.. profunda. avizinha-se da janela e encosta o p£bis ao vidro por um momento. Tudo isto presenciado por mim do fundo da sala. na rua. toda nua. metaf¢rica: vou agarrar aquela mulher e servir-me dela como de um sinal simb¢lico para transmitir uma mensagem ao sistema inimigo que me quer raptar ou matar. sobe-o de uma s¢ vez at ao peito. ainda que com risco de morte.." Com um gesto grandioso." Ofere o-Lhe o bra o e ela coloca o seu bra o na minha m o. Pois bem. aqui ao lado. eu. Esse instante ser  o s¡mbolo de tudo o que ele ignora. na impossibilidade de comunicar pela palavra. introduz-me numa entrada sombria e depois numa saleta cheia de luz. com um gesto intencional. eis-nos agora numa ruela deserta. pela primeira vez na minha vida. Ei-lo a bater porta: ficas aqui enquanto eu vou abrir. no passeio defronte? um amigo meu. Vou janela. vejo ent o que n o tem nada vestido por baixo. sai rapidamente. abre uma porta. A mulher est  agora a meu lado e diz-me: "Fechamos a janela. nada disto logra sair da minha boca. pega com as duas m os na orla do vestido. est s combinada com ele. ela concorda: "sim. a mulher volta a descer cuidadosamente o vestido e diz: "Est  feito." Perante tais palavras. Ent o... Tu. atra¡ste-me a uma emboscada. inclina-se. no passeio da via Veneto. Logo a seguir. Volto a ver-me diante da montra. exactamente ali. que se encontra aberta. sem nada em cima de ti. foi como se na minha cabe a se desse uma explos o silenciosa. olhando-me descaradamente. por um instante apenas. Avizinho-me dela e digo-lhe: "Est s livre? Podemos ir os dois a um lado qualquer" Milagre! Aconteceu tudo com tanta naturalidade que n o me dei conta de que. E agora tinha vontade de gritar: Mas tu conheces aquele homem. Tu. n o gaguejei.. Subimos dois andares a p . Quando entramos no  trio comum. Mas pondero que . Gaguejo apenas: tTu.. diria. Falei! Falei! Falei! Sinto uma alegria desmesurada. Fez-me sinal de que ia subir. Sem modificar o seu ac cansado e decepcionado. e vejo que "ele" continua l  em baixo. Depois. quase. lhe tirasses a timidez. como se levantasse o pano de cena sobre um cen rio excepcional e nunca visto. mal reparo que ela responde: "Vamos para minha casa. Caminhamos n o sei por onde durante uns dez minutos. com as suas casas velhas e modestas. lan o uma olhadela por cima do ombro e vejo que "ele" ficou l  fora minha espera. brio de alegria. com os olhos fixos na sua coluna magra e dourada. gostava que tu o provocasses. n o?" Ent o. aproximo-me da janela e pergunto-me se n o ser  altura de saltar para a rua. eu." Dizendo isto. Nua dos p s aos seios. eis o passo hesitante nos degraus barulhentos. todavia. estou a escrever os di logos de um filme cujo tema dif¡cil: o terrorismo. um passo meditabundo. A tal proposta. n o desperto como nos sonhos anteriores. nas minhas costas. mesmo o diabo. de me meter medo. enquanto o man¡pulo se move. em vez disso. os argumentos que escrevo me permitem plenamente. Sei-o enquanto o sonho dura. tenho a certeza de que essa pessoa que sobe as minhas escadas o diabo. sou argumentista de cinema. Sei. Uma lentid o angustiante que n o sei explicar a n o ser pela inten o. ap¢s uma longa pausa silenciosa. como que tornado mais pesado por uma inten o amea adora. algo singular. enquanto sonho. o sonho o seguinte: parece-me que  lgu m sobe lentamente as escadas de madeira. diante da m quina de escrever. Um destes dias. Profissionalmente. det m-se de novo. Desgra adamente. mas talvez. eis a m o que bate porta. que. com um sentimento de horror. depois. como sou um homem de poucas e tradicionais leituras. chegue a compreend -lo. salto do div e fa o um caf muito forte. J  que como e bebo muito. em troca. abro-a e n o encontro ningu m. vou porta. det m-se por fim diante da porta. Depois. imaginar que cara ser  a do diabo. tal como no sonho. eis a pausa de retomada de f lego. talvez seja sequestrado e morto. Ora. mas em troca tu d s-me a tua alma. Tudo excepto o facto de que algu m est  efectivamente a bater porta. sou-lhe totalmente estranho. eis o bater de uma m o. justamente. Portanto. contando o sonho. A luz branda e indirecta do c u nublado assombra-me. uma magn¡fica mansarda atrav s de cujas vidra as se rasga uma vista de conjunto sobre a cidade. ent o. de degraus muito barulhentos. EM SONHOS OU O SEMPRE PASSOS NAS ESCADAS Como tanta gente. O passo det m-se. Neste ponto. que conduz mansarda. Desta vez. oferece-me o xito. Sou um homem de pouca ambi o. mil¡metro a mil¡metro. naturalmente. decido do fundo do cora o opor uma recusa firme. dentro em breve. suspenso. tenho o costume de dormir depois do almo o. Mas eu n o quero xito. Grito: "entre!. comunicar. Porque n o abre ele francamente a porta? Que significa aquela lentid o? Com esta £ltima pergunta. desta vez mesmo ele. e ao mesmo tempo fora dela. desperto. por parte do visitante desconhecido. desperto neste ponto. mas explicar-me. Vejo o man¡pulo da porta mover-se com uma lentid o extraordin ria. coisa que. grito "entre!". voltei a ter o sonho. Que rela o existe entre o tema do filme e um sonho que me acontece sonhar desde h  algum tempo a esta parte? N o sei. Poder o eles compreender? Serei capaz de lhes explicar? Entretanto. N o posso impedir-me de pensar: "C  estamos. encantado. adorme o facilmente. n o consigo . Que quer dizer este sonho? Claro: o diabo quer a minha alma e. Talvez seja gra as a essa decis o que. desperto e dou-me conta de que tudo foi um sonho. com uma certeza absoluta o que o diabo vem fazer junto de mim: vem propor-me o habitual pacto assinado a sangue: dar-te-ei o xito. sem perder um minuto. desejo apenas viver o ritmo habitual da vida quotidiana com um certo vontade. a porta abre-se. Durmo no meu est£dio." N o t o estranho. recome a uma vez mais. recome a. tente. fazer-me entender. Sucede. por m. estou quieto. em contrapartida. hesitante. ponho-me mesa de trabalho. Mal desperto. Estou dentro da vida a tal ponto que. por outro lado.aquilo que quero n o salvar-me. e ent o. vejo que o man¡pulo come a a mover-se com extrema lentid o. precisamente neste momento. tamb m n o estava tua espera. algures. e uma das m os enfaixada apressadamente num pano ensanguentado. na sua moldura. que. subjugado e fascinado pela sua seguran a. o tipo de jovem que se v s centenas em certos bairros da cidade. Mas ainda estavas a dormir?" Sem saber porqu . este homem que nunca vi. estava a dormir e a sonhar um sonho que se repete. Explica: "tenho aqui dentro uma coisa que preciso esconder. com um grande t¡tulo negro na primeira p gina. olhando volta. depois. de me despachar tamb m a mim. sob apar ncias asc ticas. porque t¡nhamos agora justamente necessidade de ti. est s pronto. n o me permite explicar-lho. de v rios compartimentos. com o objectivo simples de se desembara ar de uma testemunha. inesperadamente. que n o sei se um terrorista de d¡reita ou de esquerda ou antes um ladr o surpreendido em flagrande delito. e depois em N poles. tamb m o terrorista ou ladr o seu c£mplice. penso. " Digo-Lho para o fazer notar que a sua presen a me parece inexplic vel. aconteceu ontem noite.. Diab¢lico n o parece. de lobo: "Diz-me l  uma coisa. Ele continua: "Sim.evocar sen o a habitual m scara de Mefist¢feles. o nariz encurvado. Na verdade. De qualquer modo. Ele n o pestaneja ao ouvir o meu nome. respondo: "Sim. Ele entra. o que me feriu. Finalmente. tu h s-de me dizer onde. interroga-me: "Que sonho era?" Conto-Lho e ele solta uma risada breve. que Lhe descobre os dentes brancos. assoma uma cabe a de homem novo. Duas coisas. feriram-me naquele tiroteio. a lentid o com que abriu a porta. N o sei que dizer. s¢ c  estou eu" Dirige-se mesa e desembara a-se da bolsa. Diz: "Vim c  para cima directamente. com uns bigodes pendentes e cabelos compridos. Diz-me. Pergunto cautelosamente: "Como deste aqui comigo? Disseste ao porteiro que estavas procura do senhor Proietti?. sentindo-me embara ado. uma vez que neste palazzo habita muita gente e. que ele traz a tiracolo. Ele era muito capaz." Ele. n o" Digo. ainda o tenho na cabe a. "pronto? Sim. Ele diz. por outro lado. ao saber que se enganara na porta. Evidentemente. Mas como convenc -lo de que se enganou? Aquela frase sinistra: tDespachei-o logo". todavia. mas estive em Mil o." A frase intriga-me. a barbicha em ponta. a porta abre-se e. mas hier tico sim. enganou-se na porta. desconfiado: "n o est  c  ningu m?" "n o. Mas ele toma as minhas palavras a s rio: "Sim. eu sei." Ainda bem. com as sobrancelhas carregadas. estendi-o logo. Que necessidade tinha de perguntar? J  c  tinha estado e sabia muito bem onde moravas. a ligadura explica-me. escondem a sabida f£ria de viver. por acaso andar s com a inten o de nos trair? Caio sinceramente das nuvens: "O que que est s a dizer?. despachei-o. Est s espera de algu m?" "n o estou espera de ningu m. "O diabo poderia ser um da pol¡cia a quem j  vendeste ou est s para . com um vozeir o de baixo: "Pode-se?" Respondo-lhe que entre. Mas eu. estou pronto. embora maneira de tantos rapazes de hoje. ei-lo a meio do est£dio com os bluej ans estreitos e o blus o de couro. A bolsa parece cheia a transbordar n o sei de qu . me impressionam de chofre como incongruentes: uma grande bolsa de couro negro. Quem s o esses an¢s"? E porque precisam de mim? Pergunto para ganhar tempo: "que fizeste na m o" Ele indica o jornal que li esta manh e que deixei desdobrado em cima da poltrona. " Esta banalidade de romance de cordel assusta-me. Mas lembro-me de que. ou seja." Casimiro diz: "Bravo. o meu querido amigo. truculentamente: "que importa? A mim n o se fazem perguntas. As pancadas s o cada vez mais fortes e insistentes e eu. Caio-Lhe nos bra os e depois digo. est vamos muito alegres. Tinha uma mi£da e n o sabia para onde havia de a levar. com um certo Enrico. esse Enrico n o um dos envolvidos naquele tiroteio de ontem?. a¡ vai: encontr mo-nos justamente aqui no teu est£dio. digamos assim. eu vou l  abaixo comprar qualquer coisa para a refei o da noite. escondes o saco onde quiseres. digo em tom de concilia o: "Ah." No mesmo momento. reflecte e diz por fim: "Mas sabes que realmente aconteceu uma hist¢ria semelhante? Em 68. Vinha fugido de n o sei que recontro com a pol¡cia. eu ainda vivia com a minha fam¡lia. com uma falsa desenvoltura: "Posso perguntar-te uma coisa?" Ele responde. quem nos apresentou. com os diabos?" Casimiro. que veio comigo e andava metido na contesta o. deixaste-o dormir c .pediu-te para me dares abrigo por uma noite. o Casimiro. corro a abrir e eis Casimiro. ou de um engano ou de uma conjura. n o sei onde nem como. acordo. quem saber  quem ele ? Nunca ouvi falar nele! Definitivamente convencido de que sou v¡tima. nessa noite. j  vendi a minha alma. tudo foi um sonho.. saca de uma enorme pistola do blus o e aponta-ma ao peito." UM TROV O REVELADOR . Ele fica s rio.lhe: "Imagina que sonhei contigo e que no sonho dizia que n o te conhecia e realmente n o sabia quem eras. Entretanto." E mostra-me a chave. dentro do sonho! Mas as pancadas na porta continuam. justamente ele." aQuem nos apresentou? Mas foi o Casimiro. Deste modo. porque. contigo o diabo n o acertou. gra as a Deus. Casimiro! Claro. Deste-ma a mim. Protesto: "Mas est s doido?" Ele continua. mas dos quais certamente imposs¡vel sair. uma para ti e uma para mim. Mas aten o: tenho aqui dentro uma arma com tr s balas: uma para ele. Portanto. S¢ queria saber como nos conhecemos. Exactamente um desses grupos fora da lei nos quais f cil entrar. demais. e indico-Lhe o jornal. n o vais chamar a pol¡cia. pedi-te que me emprestasses o est£dio e deste-me a chave. cordialmente: "Muito bem. porque a tua alma j  no-la vendeste a n¢s e n o podes vend -la duas vezes. hein? Pois bem. entretanto. "N o est s l  muito seguro." Sinto gelar-se-me o sangue. quem havia de ser mais? Mas quando foi?... Dormi aqui. imperturb vel: "de qualquer maneira. em linguagem corrente. batem porta. Digo. deste-me at esta chave. "n o te zangues. Diz: "N o. Ele olha e sacode a cabe a: "N o.vender a alma. lembro-me at de me teres dito na brincadeira. Pergunto surpreendido: "Por acaso. Ent o. nessa altura.. que traz junto ao t¡tulo uma s rie de fotografias. tal a tua amizade!" Ent o conto-Lhe o sonho. com a qual h  pouco abri a porta. vim ter aqui contigo. n o nenhum destes." Fica um momento como que hesitante e depois acrescenta: tMas tu n o Lhe deste nesse dia a chave de casa." Que se passa com ele? De repente. Sinto que tomei deveras uma decis o. mas comecei a fazer parte de um grupo terrorista ou de bandidos. t¡nhamos comido e sobretudo bebido muito. ao entregares-ma: "Aqui tens o penhor do meu empenhamento". Eu vinha fugido e o Casimiro. A meu pedido. Digo. a primeira coisa que Lhe perguntei foi se encontrara um lugar onde eu pudesse dormir em seguran a. estavam em curso obras de repara o. de Hamburgo a Marselha. disse-Lhe que a m e. e julgo que teria adormecido at perante esse mesmo pelot o de execu o de que procurava escapar com a minha fuga sem fim. fazia projectos para o meu futuro e o da sua m e. Respondeu-me que isso dependia da sua satisfa o com o trabalho: come ara a trabalhar numa empresa de import-export. em que nos v¡ramos. sorrindo. mas segui com aten o. a seguir. que tinha. sem d£vida. com prazer sentido. Respondeu-me que haveria um andar s¢ para mim e que a¡ poderia dormir vontade. o percurso do autom¢vel e fiquei com a impress o de que. atravess ramos todo o centro antigo da cidade. para confundir as minhas pr¢prias pegadas. cheia de  rvores. n o passavam ali carros e. com rel mpagos. noite. de Amsterd o a Londres. tanto mais que estava noivo de uma rapariga italiana. alinhavam-se as casas por cima das casas. quando. ora de comboio. levantava-se um temporal. apinhada . mais por curiosidade do que por qualquer outra coisa. chegada a Roma. enquanto guiava. ora de avi o sem dormir ou dormindo pouco e incomodamente. pois ningu m no mundo conhecia a exist ncia desse apartamento para al m dele pr¢prio. o carro parou num lugar sossegado e livre de tr nsito atravessado por uma dessas barreiras pintadas de vermelho e branco que fecham as estradas ou ruas intransit veis. viria a¡ uma tempestade. ele sentou-se ao volante e partimos. Agradeci-lhe o ter vindo e arranjado o apartamento. negras e amea adoras. Pareceu-me. tinha-j  mais vontade de dormir que de viver. Do carro. de Paris a Amsterd o. que ficara em Paris. N o pude impedir-me de olhar para ele: havia quase dois anos que o n o via. O meu filho explicou-me que. depois o dia estragava-se e. ocupando a zona ainda azul do c u. tirara-me da m o a mala e caminhava ao meu lado enquanto sa¡amos da esta o. cujas densas folhas de prata afloravam as  guas amarelas e brilhantes. mas em breve teria casa sua. tamb m isso uma novidade. de Viena a Roma. dois anos antes. podia ver a margem oposta. um sem foro atr s de outro. que ele n o mudara em nada. O meu filho. infalivelmente. e a fixidez inquietante dos olhos. de Marselha a Viena. naquele tro o. que antes n o tinha. grandes nuvens de trovoada. de t o confuso que estava por causa da extrema fadiga. estas informa es. Lhe mandava muitas lembran as. O meu filho disse-me que. O autom¢vel rodou um peda o pelo asfalto da rua ao longo do rio. ganhava bem. do outro lado do rio. Por tr s das  rvores. que estava com ¢ptimo aspecto. melhor do que da £ltima vez. era assim. Enquanto me fornecia. excepto em dois pormenores: a barba. na esta o Termini. conforme o combinado. disse-Lhe ainda. havia j  alguns dias: de manh estava bom tempo.Havia cinco dias que eu fugia em ziguezague. Entretanto. uma fila ininterrupta de casas e edif¡cios. P s a minha mala no porta-bagagens. trov es. depois. N o conhe o l  muito bem a cidade de Roma. o dique do Tibre e. o dique do rio desmoronara. por enquanto vivia numa pens o. por esse motivo. Corr¡amos agora ao longo do Tibre. dizia como estava contente por me ver ap¢s uma separa o t o longa. aquilo era um verdadeiro o sis de paz no meio da cidade. vento e chuva. cruz mos uma ponte e pass mos para o outro lado do Tibre. subiam rapidamente. o meu filho. que. de Londres a Hamburgo. de um lado. veio ter comigo. do outro lado. cheg vamos ao carro. entrei. com quem contava casar dentro em pouco. assim. Tinha tanto sono. n o parava de falar afectuosamente comigo. O meu filho convidou-me a comer. o azul ficara reduzido a um pequeno rect ngulo. como que com falta de espa o. quase de repente. De agora em diante. dispunha os pratos na mesa. Perguntei ao meu filho quem era aquela mulher e ele respondeu-me que era uma empregada somaliana. e depois foi-se embora. a mulher entrou. a come ar pelas honras devidas ¢ptima cozinha nacional preparada pela mulher somaliana. ancas estreitas. respondi: " igualmente um s¡tio ideal para se assassinar algu m. que cozinharia para mim e me faria as limpezas enquanto ali estivesse a morar. disse. junto da entrada. "podes ter absoluta confian a". tratarei de te organizar uma vida serena e segura. flex¡vel e elegante. por isso.e tumultuosa. Respondi que o medo me tirara todo o apetite. insistiu para que eu me alimentasse. junto ao parapeito da muralha. ainda adoecia. O meu filho abriu a porta e entrou minha frente no interior. n o comia havia um dia. procedeu a uma leve inclina o. uma verdadeira beleza no seu g nero. que me pareceu logo bastante triste. bra os redondos e fortes. fez-me notar uma vez mais a tranquilidade do lugar: "Ent o. olhando-me directamente nos olhos. apenas a cama. O meu filho pareceu contrariado com a minha recusa. segundo a minha pr¢pria confiss o. Ergui os olhos para o c u: o temporal adensava-se cada vez mais. o melhor seria que ele me deixasse agora repousar. n o deves pensar em coisas dessas. mas n o tivemos que nos meter no elevador: o apartamento era no r s-do-ch o. cozinhada. lancei uma olhadela aos pratos e vi que continham comida tradicional do nosso pa¡s. "Fala a nossa l¡ngua". uma cadeira e uma mesa pequena. deves confiar em mim. no quarto de dormir. muito risonho. com um catre desfeito onde parecia ter dormido algu m h  pouco tempo. n o um s¡tio ideal para quem n o quer fazer-se notar?" Quase sem pensar. eu em cima da cama e o meu filho na cadeira". Pass mos diante da cozinha e ent o vi. um homem e uma mulher ouviam r dio. volta do qual as nuvens se comprimiam agitadamente umas contra as outras. quase mais de escrit¢rio do que de casa de habita o. a rua ao longo do Tibre estava ali quase deserta: dois ou tr s garotos andavam de patins. senti uma repugn ncia t o invenc¡vel como misteriosa e disse ao meu filho que n o tinha fome. ver-nos-¡amos no dia seguinte e ent o eu faria j  todas as coisas normais da exist ncia. Desci do autom¢vel e olhei volta: efectivamente. com essa tristeza particular que fastidiosamente caracter¡stica das casas h  muito sem gente. havia apenas um div e duas poltronas. comendo pelo menos um pouco. Os m¢veis eram completamente neutros. mas mal pensei estender a m o e come ar a comer alguma coisa. de agora em diante. Havia ainda uma esp cie de quarto mais pequeno. acabado de cozinhar. inclinando-se para diante. uma jovem africana. mas apenas sono e que. num carro parado. trazendo num tabuleiro o jantar. com todo o apuro. como se tivesse querido fazer-me compreender alguma coisa. dormindo. e reduziam-se ao m¡nimo necess rio: na sala. agora queria dormir. desse modo. O meu filho. segundo parecia." Tinha extra¡do do bolso um molho de chaves e aproximara-se do port o de um palazzo. com ombros largos. tamb m sem se ser notado. um par de namorados caminhava lentamente abra ados pela cintura. acrescentou o meu filho. . disse-me que o edif¡cio n o tinha porteiro e que. podia sair e entrar sempre que quisesse sem ser visto nem observado. o medo ir-se-ia. Enquanto com gestos graciosos. vamos. de p junto ao fog o. Entr mos no  trio comum. Fomo-nos sentar no quarto. Disp¢s bem os pratos na mesa. uma vez que. de outro modo. olhei-a e notei que era alta." O meu filho bateu-me com a m o nas costas: "Vamos. tal como estava. Levantei-me de repente. ei-lo de novo sentado. Durante todo o tempo. irresist¡vel. A porta do quarto estava entreaberta. entre os bra os seguros e quentes da minha m e. A mulher devia star ainda na cozinha. abri as portadas e olhei l  para fora. o que seria normal. . Pouco satisfeito. enquanto me abra ava. dei-me a seguinte resposta: na inf ncia. por um impulso instintivo. Ent o. antes de sair. apesar do tormento daquela terr¡vel vontade de dorm¡r. estava ele a sair de casa e a entrar para o autom¢vel. enquanto me dava conta de que l  dentro estava o meu filho. nos intervalos dos trov es. adormeci. demorei-me janela. uma e outra vez. maneira de uma n voa espessa que ocupa uma paisagem. pesado e clamoroso. Dormi violentamente. O meu filho pusera-se agora em p algo bruscamente. Embalado por essa toada que parecia. atirou-me os bra os ao pesco o. esta chuva?" Sempre a dormir. j  teria fome e ent o pensaria em comer. desceu do seu poiso e dirigiu-se ao autom¢vel. sentia a queda da chuva e o ru¡do do trov o. Precisamente naquele momento. voltou a partir. no parapeito do dique. Uma vez mais sem motivo. Finalmente. ela reapareceu. impedindo-nos de ver tal como . Na barreira vermelha e branca. em seguida. formou-se no meu esp¡rito esta pergunta: aOnde e quando ouvi estes trov es. relampejava com for a e eu vi um homem sentado na muralha numa atitude ociosa. Era na casa dos meus pais. Em certo momento da noite. mas resignado. contudo ainda dentro do sono. pareceu-me ver o asfalto da rua ao longo do rio inundado pela  gua abundante que ca¡a. Como agora. Estou mais perto dos sessenta anos que dos cinquenta. que. com as pernas a balou ar. depois. disse para comigo que deveria t -la fechado chave. senti que cerrava os dentes com for a e os punhos com raiva. N o pensei coisa nenhuma. o meu filho chamou a empregada somaliana pelo nome. for a de ouvir os trov es e a chuva.quando despertasse. ouvia-a cantar em surdina n o sei que can o do seu pa¡s. olhando-me a direito nos olhos. como os olhares de havia pouco. mas tamb m ao longo dos flancos at base da coluna. para seguir com os olhos o autom¢vel que se afastava. Corri janela. a recorda o fazia-me recuar meio s culo. deteve-se. beijando-me nas duas faces e dizendo-me que dormisse: encontrar-nos-¡amos no dia seguinte. ouvi o murm£rio da chuva a alastrar. talvez contra o pr¢prio sono. Revi esta cena v rias vezes: o homem estava sentado. e. Um homem que estava sentado numa atitude ociosa. acordava sobressaltado no escuro. Mas o carro n o foi muito longe. ent o levantava-me da cama e corria a refugiar-me no quarto do lado. voltando a descer e a correr e assim sucessivamente. atravessei o quarto e sa¡ para o corredor. depois descia da muralha e corria para o autom¢vel. destinar-se-me exclusivamente. reflecti que. mas n o o fiz. e fiquei um peda o de costas. A este reparo seguiu-se em mim um desejo s£bito de observar de novo o meu filho. como se protestasse contra qualquer coisa. com os olhos abertos. atirei-me para cima da cama. O meu esp¡rito estava ocupado pelo sono. para ver se n o estar o armadas. enquanto voltava a p r os pratos no tabuleiro. ouvi o trov o ribombar. sentira a sua m o tocar-me n o s¢ os ombros. descia do seu lugar e se dirigia a um autom¢vel parado chuva. embora adormecido. N o sei porqu . e depois. inclinou-se de novo para mim. O meu filho abriu a porta do carro e. um gesto ins¢lito e improv vel da sua parte: desse modo que se tocam as pessoas suspeitas. mal o meu filho saiu da sala. subitamente. Fechei a janela. completamente vestido. era ela quem me queria dizer alguma coisa ou eu quem desejava que me fosse dita alguma coisa. demoradamente. tomara uma decis o e agora n o me restava mais do que p -la em pr tica. atravessei a entrada do edif¡cio e sa¡ para a rua ao longo do Tibre. No corredor. os edif¡cios. reflecte ainda. entre rel mpagos. S¢ atrav s desta premissa. Esperei. . e corre direita sua pr¢pria extin o. com a face apoiada na palma da m o. abre as suas p ginas. podemos analisar a Bomba N. diz para consigo enquanto l . numerosas esp cies de animais se perderam no caminho e se extinguiram por exemplo. Na realidade. pensava que me bastaria entrever a mulher no intervalo de dois rel mpagos. De qualquer modo. h  cinquenta anos. como entrevira a minha m e naquela noite. na praia. sabe-se l  porqu . ou at catastr¢fica. depois. fechando a porta atr s de mim e voltei para o meu quarto. os monumentos. Muito bem. talvez para equilibrar o sentimento de profunda tranquilidade que emana da janela preenchida por um c u ainda frio e vazio. C  est . o c u estava mesclado. De prefer ncia. ler  qualquer coisa de dram tico. pegar no primeiro livro. Retirei-me. o corpo envolvido no len ol. antes de acordar de todo e retomar contacto com o mundo. No momento em que fechei a porta do edif¡cio para a rua. Sim. Por fim. que dormia profundamente. dos vermelhos da aurora. que outra coisa h  mais catastr¢fica do que o fim do mundo? Aconchega melhor a almofada atr s da cabe a. Observei-a assim. o t¡tulo que ele buscava. O facto n o novo. o asfalto brilhava em po as de  gua esparsas. levantei-me. agrada-Lhe deitar-se completamente nu em cima da cama. na cama. Mas n o me chegou o mais pequeno rumor: estava adormecida. n o se sabe bem quando. a humanidade parece ter-se enganado no caminho em dado momento. talvez na poca do Renascimento. entre o branco e o cinzento. os candeeiros ainda acesos no passeio apagaram-se todos ao mesmo tempo. mais umas duas horas. recordava agora o seu olhar directo no meu enquanto me servia e levantava os pratos depois do jantar. depois de ter aberto a janela. Relampejou e vi a mulher. p e o jornal altura dos olhos e l . N o quis acender a luz. deitado de costas. revista ou jornal que lhe venha m o e ficar a ler qualquer coisa durante uns dez ou quinze minutos. cheguei entrada do quarto. o quadro parece ser o seguinte: 1) A bomba N mata os homens sem destruir as casas. Entre a escurid o de pez e a luz violenta e ef mera dos rel mpagos. estende a m o para o ch o e apanha ao acaso o jornal que na v spera a¡ deixara cair. ou at de catastr¢fico. A'T PARA AS FORMIGAS H  UMA BOMBA N s sete da manh . Comecei a caminhar a passo r pido em direc o ponte vizinha. em que ponto est o as coisas? Vejamos. Em resumo. e perguntava-me o que teria querido ent o dizer-me e se. com vagos tra os. Era de madrugada. Esta manh . os dinossauros. enquanto contemplava a mulher adormecida. o bra o nu e dobrado. Abri a porta de fora. senti-me mais calmo e senhor dos meus nervos. detive-me um momento diante da porta dela e escutei. depois. peguei na minha pequena mala e sa¡ em bicos de p s do quarto. vencido pelo sono. a quatro colunas. aqui e ali. ao primeiro alvor da manh . acerca dos argumentos contra e a favor da bomba N.A porta do quartito onde a somaliana dormia estava mal fechada. E assim foi. gostaria de descobrir uma coisa dram tica. etc. todas as  rvores estavam encharcadas de chuva.. na verdade. na devida altura. conseguiram. furioso contra os invasores que lhe entraram na cozinha e Lhe saquearam o mel. atravessa o passeio. mas n o se v ainda o sol. esta manh . 2) Tem um efeito selectivo e circunscrito. quase im¢vel. Vai dar uma olhadela praia. Uma fila negra e fervilhante. S o horas de se levantar. ou seja. O homem fita. cal es e sand lias. amarrota-a. Entretanto. que logo Lhe parecem superficiais e parciais. que algu m deixara imprudentemente aberto em cima da mesa. Sem pensar. o mar seren¡ssimo. passar pelo espa o m¡nimo que h  entre o vidro e o metal da tampa e afogam-se agora no mel. e assim. quer isto dizer. Este pensamento aumenta-Lhe a raiva. A fila negra das formigas desce ao longo da perna da mesa. Volta rapidamente cozinha. pelo meio do ch o da "sua" cozinha. por um momento. atravessa o ch o da cozinha. 4) Como arma convencional. atrav s do passeio do "seu jardim. passa pela janela. h  o insecticida. O recipiente est  crivado de formigas. E depois. sabe-se l  como. caindo umas atr s das outras no ch o. pode ser utilizada sem causar o fim do mundo. Bem penteada. surpreendentemente numerosas. entra na casa de banho. procura pelas diferentes prateleiras a bomba insecticida. para as formigas. o incans vel ex rcito dos himen¢pteros. mas n o a descobre. as formigas apareceram nessa noite. a areia castanha clara ainda h£mida da mar da v spera noite. passo a passo. n o gostei de ver a tua cara enquanto deitavas fogo s pobres formigas. pega numa folha de jornal. o "homem ter  que sacrificar o mel na sua refei o. pode aspirar a tornar-se uma arma convencional. num amplo tro o. Desgra adamente. tamb m ela com uma blusa. desprende-se dele na esquina da casa. campo de batalha predestinado de um eventual conflito entre a URSS e os EUA. por entre as folhas das plantas. Que cara era a minha?" "N o sei dizer-te bem: era cruel. pergunta-se agora o que ser  poss¡vel fazer para evitar o uso da bomba N. num vaiv m incessante. mata um n£mero limitado de pessoas e precisamente as que tem que matar. cal es e sand lias. Aproxima a chama da perna da mesa: as formigas ardem num instante. perde-se no canteiro. com aten o. com a areia branca completamente seca. depois. 3) Ao contr rio da bomba at¢mica tradicional. n o?""Mas. fresca. graciosa. afastando de imediato as primeiras solu es. Exclama: "Que est s a fazer?" Ele responde: "v -se bem. talvez por causa do calor sufocante que se prolonga j  h  alguns dias. Mas espera a¡ que eu . O pote s¢ serve j  para deitar fora. torce-a e chega-lhe um isqueiro aceso. Desta vez. Por fim. ao longo do muro da "sua" v la. O c u est  j  brilhante e azul. como se diz nos romances de aventuras. "agora vou eu tratar delas". para baixo e para cima. em p de guerra. Ele abre-a e segue depois. pela perna da "sua" mesa. parte uma breve ondula o que se forma a dois passos da praia. as formigas continuam a ir e vir. O jornal incendeia-se. lavado e barbeado. De l  sai. entra a mulher dele. outras formigas. o muro da vila. com uma camisola. embate na £nica resposta poss¡vel: o rem dio para tudo isso que a humanidade "n o" queira mais a pr¢pria destrui o. passados uns vinte minutos. Este rodeia. dirige-se cozinha onde tomar  o pequeno almo o. muito prov vel que venha a ser utilizada na Europa. Sai da cama.etc. diz para consigo. pensa demoradamente. por fim a areia escura em contacto mais directo com o mar. da janela da sala: a praia um espa o tricolor. A porta abre-se. Mantendo sempre a premissa de que a humanidade quer a pr¢pria destrui o. atingiu o pote do mel. O homem volta agora a entrar na cozinha. uivavam. com novas formigas substituindo as clareiras abertas pelo insecticida no corpo do ex rcito? Sem d£vida. pelo contr rio. Mas a carnificina desenrolou-se em sil ncio. apenas o cego instinto vital. ele nada sentiu. que querem elas? N o me vais dizer que tamb m as formigas querem morrer? "N o. nada mais. estendendo-Lha: "Aqui tens. dirige o jacto para os insectos. sabe-se l  se as formigas n o se lamentavam. algumas mil. Ele n o tem tempo para se demorar a observar a morte das formigas. enquanto l . Saiu j  da cozinha e ataca a parede da casa. um segundo um segundo. O efeito. Instant neo ou n o. da mesa a que est  sentada. embora essa instantaneidade diga mais respeito a ele pr¢prio. afinal de contas. mortas. as formigas n o h o-de voltar? Porque "compreenderam"? Ou antes por falta de soldados espera apenas que o formigueiro esteja bem cheio. talvez o melhor seja descobrir onde fica o formigueiro e acabar com elas de vez. basta. Por outro lado. porque havemos de ter medo dos lugares comuns? Somos formigas e o nosso insecticida ser  a bomba N. vai levando boca a ch vena de ch ... a vez da rectaguarda do passeio. porque. entre as folhas. det m-se com a seguinte refiex o: e J  lhes dei uma boa li o. l as habituais recomenda es. como lhe ocorre agora pensar. Junto ao canteiro... De repente. As formigas. gritavam. incita-o: "N o basta matar as que entraram em casa. Porque n o aplicamos o nosso pensamento para descobrirmos uma maneira de evitarmos a bomba N?" O homem reflecte um pouco e responde. depois tira a tampa do spray. im¢veis. queremos morrer". est  a l -lo e. aponta a bomba para o ch o." Tira-lha da m o. como se poder  responder a tal pergunta se. segue o ex rcito das formigas e vai-o regando de insecticida. "Mas eu n o quero morrer. onde a fila das formigas est  ainda intacta. At porque n o se pode saber o que o tempo para as formigas. E com toda a simplicidade. Logo que a espessa nuvenzita de spray as atinge. as formigas tombam volta. diante de uma ch vena de ch . ou seja: querem . No entanto. e. ser  uma esp cie de consci ncia. n o me vais dizer que tamb m pensam. toma l . vai sala e volta de l  com a bomba vermelha e verde do insecticida. do que s formigas que s o atingidas." "Mas n¢s pensamos. no fundo. que dispara..vou buscar o spray. A mulher tem na m o o jornal que ele trouxera consigo do quarto. n o poss¡vel estabelecer uma rela o directa com as formigas? Talvez tenha matado. em resumo. pensa. Para ele. Por hoje. as formigas querem o mel. as formigas surgem como pontinhos pretos." Mas este pensamento desperta-Lhe outro: porque que. suspirando: "N o aplicamos o nosso pensamento. sob a figura negra de uma formiga enorme: "Espalhar o produto mantendo a bomba a cerca de 5-10 cent¡metros de dist ncia da superf¡cie visada. pelo contr rio. Pelo menos durante alguns dias n o voltam. a segu¡r. para as formigas.. pergunta. trata-se de uma quest o importante: no primeiro caso. por tr s do jornal desdobrado: "Mas o que vem a ser afinal esta bomba?" Ele senta-se e serve-se tamb m de ch . e. no segundo. na realidade. Depois diz: " um lugar comum mas. E as formigas.. porque a mulher. " O homem n o diz nada. accionando com o dedo a v lvula. E mais: quem viu j  a "express o" da formiga no momento em que morre atingida pelo insecticida? Perante os homens. dir-se-ia que de costas. desta feita.. o efeito certamente fatal. depois da li o. preciso segui-las at l  fora. Depois. realmente instant neo. apanham sol. A solid o come a a pesar-lhe. Ent o. alguns raros casais. do outro lado da porta. ora o c u com vagas nuvens de calor esparsas. J  lho gritou outras vezes durante este primeiro ano de casados. at 1945. vem at ao mar. Este pensamento do eclesiastes foi v lido. ser o estas as barras da gaiola em que ambos ficar o presos sabe-se l  por quanto tempo." Chega aos pinheiros. E. surge-Lhe uma decis o precisa: ir  o mais longe poss¡vel naquele passeio involunt rio. mas uns e outros. desemboca na praia e. atravessa as dunas." O PASSEiO DO ESPECTADOR lilan e vlan! A chave gira na fechadura da maneira violenta com que gira uma chave quando quer exprimir repugn ncia e rejei o. claro que n o. para desfazer todos os equ¡vocos. ora o mar num torpor inerte. por acaso. assim. surge um longo tro o de costa sem vivendas nem barracas de praia: nada al m dos arbustos das dunas. caminha. dizer-se a prop¢sito da bomba N que n o h  nada de novo por baixo do sol? N o. que se inclinam aqui e ali. querem viver. o facto enche-o de um desespero maior do que aquele que Lhe inspiraria uma recusa aberta e definitiva. com as duas m os poisadas no arame.viver. Portanto. portanto. N o pensa em nada. De repente abandonando a sua distrac o. com efeito. com os troncos dos pinheiros fulvos e estalados pelo sol. decide chegar at um grupo de pinheiros que se avista ao longe. come a a olhar o pinhal. arrastando uma quantidade de pap is velhos e outros detritos que flutuam sem se ficarem na areia nem se afundarem de vez. a voz da sua mulher." Ele suspira de novo e depois diz: "n o leste o eclesiastes? H  alguns miLhares de anos. nem hoje nem amanh nem nunca mais. No meio do pinhal. olhando ora a bordadura negra e elegante deixada pelas ondas na areia molhada. ora repelindo-se. por fim. at bomba at¢mica. logo a seguir.torne a mulher mais afectuosa na pr¢xima noite. vamos ver. s o exterminados pelo insecticida. a areia do mar. segundo tu dizes." "em que ficamos ent o? Os homens. Setembro e todas as vivendas das dunas se encontram fechadas e sem gente. ser  sempre assim. E assim. O pinhal est  deserto.quem sabe? . como se tivesse uma meta a atingir e um lugar preciso onde chegar. estendendo a cabe a o mais para o interior da cerca que Lhe poss¡vel. agora deixou de valer: h  muitas coisas novas e. talvez o melhor seja calarmo-nos acerca das coisas de que n o poss¡vel falarmos. Ser  essa a meta em direc o qual caminhou aqueles quil¢metros? Sem saber porqu . continua a caminhar agora mais apressadamente. as formigas. n o voltar  a casa para o jantar. v -se uma grande e velha vivenda de um vermelho pompeiano desbotado. Com esta ideia despeitada e mesquinha de n o voltar a casa para o jantar. mecanicamente. A £ltima dessas coisas novas a bomba N. dando para a praia. isto novo". A meio destas reflex es. l  se escrevia: n o h  nada de novo de baixo do sol. espalhados aqui e ali pela praia. ora cruzando-se. pelo menos de momento. sai do terra o da villa. digamos. Poder . come a a caminhar ao longo do mar. os estabelecimentos balneares encerrados e desertos. ningu m pode dizer: "Olha. primeira desilus o: uma cerca de arame farpado circunda o pinhal. n o conseguimos ter delas uma ideia clara. com todas as janelas . pelo contr rio. grita-lhe muito explicitamente que n o quer voltar a fazer amor com ele. Talvez a sua aus ncia . Depois da zona dos banheiros. querem morrer. diz para consigo: "talvez. recorda subitamente as fotografias dos campos de concentra o. com as m os nos arames. Levanta os olhos. ap¢s o primeiro olhar do conjunto. em suma. com efeito. sobre o mar. com efeito. repara que n o consegue continuar a olhar. no qual lhe parece ouvir o canto do vento l  em baixo. como por sugest o de tais ideias. pensa de s£bito. onde se v em os prisioneiros numa postura an loga. entre a redondez dos bra os e a das coxas. v . De outro modo. Mas n o consegue faz -lo. h  diversas pe as de roupa de mulher e de homem espalhadas pelo ch o coberto de caruma. o homem d -se conta de que n o os v tanto como. misteriosamente. de algum modo indefin¡vel. Examina-a com mais pormenor e nota nela numerosas correspond ncias singulares. ou. de um azul el ctrico brilhante. mas seguro. sobretudo. numa cova do terreno. agora a vez da mulher. afinal. por exemplo. como a desejar a ac o deles. Ent o. De s£bito. Sim. para "reserva" a mulher para uma contempla o mais longa e pormenorizada. ou melhor a espreitar. numa express o de cupidez. Lhe diz respeito. d -se conta de que. No momento em que os avista. estiveram a mergulhar no mar e agora sobem o ligeiro declive da praia. doce e plangente. todavia. "queria' que os outros dois agissem no sentido de uma maior intimidade. como mais prov vel. evidentemente. Pensa que deveria afastar nascen a aquela tenta o indiscreta. entre o negro dos cabelos e o do ventre ao fundo. H  um sil ncio profundo. e depois. De forma inesperada.fechadas. Precisamente dessa intimidade. porque que. E neste caso. o prisioneiro ele. mas forte. d -se conta de que est . que a sua mulher lhe recusou nessa manh . sofismas. um desejo semelhante ao do espectador de uma prova desportiva. apesar destes pensamentos l£cidos. alta. S o um homem e uma mulher completamente nus. Quase no mesmo instante. partir dali sem mais tardar. Ent o. os olha. um autom¢vel parado. e. fechando-lhe a porta na cara. a espreit -los. est  agora n o tanto a olhar os dois enquanto eles agem. pensa ele com tristeza. do outro lado do recinto. a n o ser com uma impress o de impaci ncia furiosa e tensa. Mas eles n o Lhe obedecem. embora viva aparentemente em liberdade. n o pode ele deixar de pensar. n o p ra de observar o casal com uma avidez insaci vel. examinaria com escrupulosa aten o o homem antes da mulher? D -se conta de que o faz ou para dar a si pr¢prio uma impress o de desinteressada objectividade. surpreende-se a murmurar entre dentes: "que est s a fazer agora? Porque n o te aproximas dela? E tu. enxerga na direc o do mar e descobre o casal. n o os procurou: apenas o acaso quis que assomasse ao recinto na altura em que eles vinham a sair do mar. com pernas e bra os robustos. enquanto a mulher se inclina para . dirigindo-se para o encovamento do terreno onde deixaram as roupas. como certos apreciadores reservam o melhor bocado para o fim da refei o. que incita com a voz e os gestos o seu jogador favorito a fazer isto ou aquilo. Por outro lado. Tem a cabe a com uma fronte calva e o rosto como que lan ado para a frente. no fundo. entre o jeito do pesco o e o da cintura. O homem novo e de pequena estatura. olhando o recinto de arame farpado. disp em do seu tempo. Tudo isto s o. o pinhal n o est  deserto. que. molhados e a pingarem da cabe a aos p s. como se tivessem "outra coisa" em vista. Entretanto. O que o impede disso a ideia de estar a olhar alguma coisa que.. talvez gra as quele gesto de assomar. como uma harpa distante. bela.. com as formas indolentes de uma est tua. porque que est s a olhar para o pinhal em vez de olhares para ele?" Sim. Imprevisivelmente. o mesmo mar. Mas se est  escrito. mas da pe a "deles". Na realidade. ora o mar. se ofenda. Era depois de um longo tro o de costa desabitado e antes de certo promont¢rio. A mulher entra na  gua. n o t m que fazer amor. n o consegue redescobrir o pinhal. tomar uma refei o leve e adormecerem ambos. enjoado. ora o c u. com o mesmo c u. ent o. exclama para consigo: n o se trata da representa o da pe a abruptamente interrompida nessa manh pela mulher. agitando descompostamente os bra os e as pernas e dando risadas cheias de uma intencionalidade ¢bvia e gritos de falso medo. com ¡mpeto. Nada feito. mas f -lo. A mulher. caminha de novo sem pensar em nada. do que um par enla ado a fazer amor no mar. seja esse ou n o o desejo dele. A mulher. Depois. que se v encostada a um pinheiro. A £ltima coisa que o homem pensa. tem que ir at ao pinhal com a sua mulher e fazer com ela o que viu os outros dois fazerem. ele n o algu m que espia a presa como um ca ador emboscado. ora as dunas. acendendo um cigarro. os mesmos estabelecimentos de banhos desertos e as mesmas vivendas fechadas. bruscamente a cena calma e serena desfaz-se e transforma-se no sentido indicado pelo seu desejo de h  pouco. por entre os troncos dos pinheiros. depois. perseguindo-se.apanhar uma toalha e come a. o homem apanha-a. como ele previra. ¢ptimo. ele espera por um momento que a mulher se oponha quele assalto t o grosseiro e inconveniente. subitamente uma resolu o emerge do sil ncio da sua mente: para abolir a sensa o inc¢moda e humiLhante de ter estado a espiar um casal. Mas embora ande para tr s e para diante ao longo da praia. fa am-no. Este pensamento introduz na sua curiosidade um elemento novo que a modifica profundamente. um passeio at esse bel¡ssimo pinhal m¡tico que ele afirma ter "descoberto". apanhado num arp o e a debater-se na rede. entre flocos de espuma. que n o deixam a menor d£vida acerca da sua cumplicidade. pois bem. Limita-se. excepto um pormenor importante: por muitos esfor os a que proceda. inclina-se para apanhar do ch o a blusa. mas um cr¡tico que segue com aten o desprendida uma representa o. o recinto n o chegam a materializar-se . Assim. exactamente como um espectador que v uma m  actua o dos int rpretes. enquanto se afasta. que acabou de se enxugar. Durante o regresso a casa. cai com ela na  gua pouco funda. tudo se passa exactissimamente do mesmo modo. em p . agarra-a pelas ancas. Indignado. ele um espectador de teatro ou de televis o que segue uma intriga da qual nada sabe e que deve olhar com paci ncia e o respeito devidos a todo o artif¡cio. A mulher endireita-se e foge. Mas que quer dizer representar "bem" nestas circunst ncias? a¡ que bate o ponto. correm na direc o do mar que se entrev l  em baixo. nesse caso. Tudo. Estar  escrito nessa pe a que ambos devem fazer amor depois do banho de mar? Sim? Ent o. que nada se assemelha mais agonia de um grande peixe. o pinhal. mudou de humor. a caminhar olhando ora a praia. pelo contr rio. ponha o companheiro no seu lugar. est  de novo com um estado de esp¡rito afectuoso e aceita de bom grado. que poderia muito bem n o se desenvolver na direc o da intimidade er¢tica que o seu pr¢prio desejo sugere. no dia seguinte. a casa. como ida. esperando que os int rpretes representem "bem". Mas quando est  a chegar   villa. o homem d -lhe uma vulgar¡ssima palmada no traseiro e. a esfregar lentamente o corpo molhado e o homem se senta. ironicamente. Dito e feito. tudo acontece da pior e mais banal das maneiras: os dois. Sim. que devem abrir a cesta do piquenique. vem-Lhe subitamente ideia que est  a assistir a um espect culo predeterminado. coberto de palha. alta e indolente. com reflexos verdes e violetas rasgados intermitentemente por prec rias cristas de espuma branca. entre as n degas redundantes: ela viera directamente da cama para a cozinha. esperando conseguir juntar os dedos volta dela. era imposs¡vel. A mulher estava de p diante do fog o. cada vez mais taciturno. quase com um movimento a salient -lo para diante. dizendo: " este o lugar perfeito para vir c  com ela amanh ". o rosto. pensa ele com certa amargura. Mas tinha que se apressar. com o seu pesco o em cone. nervoso. Mas os dedos continuavam separados. instintiva. porque cavar uma cova de baixo de chuva n o seria nem f cil nem agrad vel. voltou a tentar circundar a estaca com as duas m os. e. descansa as m os na balaustrada e olha o mar. com censuras. erguia-se sobre duas estacas de pinho mal descascadas. furiosamente. parecia-lhe belo. pelo contr rio. de l . dada a proximidade do temporal. com excita o. impelidas pelo vento. dirigiu-se cozinha. E realmente. n o se dera conta de que tinha . Por fim. consistido em n o ver ningu m. apesar disso. Mas como o faria? Levar o corpo pelo mar dentro e deix -lo ao largo. quero ver se consegues dar-me a volta ao pesco o com as tuas m os. n o tem coragem de Lhe dizer que no sonho n o se viu a si pr¢prio com ela. N o tenhas medo de me magoar. N o achas que isso j  por si muito bonito?" Mas n o foi assim. com alguns peda os de carrasca presos ainda aqui e ali. semelhante a um pano de cena levantado apenas de um dos lados. tinha que se desembara ar do corpo antes de a chuva come ar. O alpendre. frente ao mar. Timoteo entrou de novo na sala e. O verdadeiro amor teria. por um espa o de pelo menos um cent¡metro. N o estranho? Um homem grande e atl tico como tu. Os troncos tinham aproximadamente o di metro do pesco o da mulher dele. A cova encher-se-ia de  gua. restava a cova. A camisa de noite da mulher. que parecia quase negra. diante da mulher que se ri dele. Ent o. Ficou ainda a olhar por um momento o mar. as paredes de areia molhada desmoronariam. justamente por ser t o expressivo. suspendia-se por cima da superf¡cie marinha. depois. continuam reduzidos a uma lembran a da qual ele pr¢prio come a a duvidar. ela aceita sem hesitar esta hip¢tese: "Viste em sonhos um s¡tio lind¡ssimo e pensaste logo em ir l  comigo. Um v u escuro e obl¡quo. desaparecendo logo a seguir. estava arrepanhada atr s. com umas m os t o pequenas? V  aperta. com um volume pesado preso aos p s. obstinada e soberba. reabsorvidas pela  gua. mas dois estranhos que espiara com inveja. cheio. claramente vis¡vel sob a massa ociosa e compacta dos cabelos densos. mais largo em baixo do que em cima. A espuma aparecia em linhas que corriam rapidamente tona. at me dares a volta ao pesco o com os dedos. cega. formula a £nica hip¢tese que Lhe parece agora veros¡mil: "Queres ver que foi tudo um sonho?. Timoteo p e as duas m os volta de um deles. numa e noutra m o. Timoteo saiu da sala e foi apoiar-se na balaustrada do terra o.de novo. Timoteo olhou-Lhe o pesco o: era forte. Mas expressivo de qu ? De uma vontade de vida. AS M OS NO PESCO O A sua mulher diz-Lhe: Segura-me no pesco o com as duas m os. Timoteo pensou que dentro em breve haveria um temporal. E a chuva fustigar-Lhe-ia. Estranhamente. ainda ensonada. Mecanicamente. rasgada. tenta juntar os dedos e n o consegue. A falta da enxada. queria que eu me pusesse assim. por for a da estiagem. A mulher disse: "o caf est  pronto. A mulher apareceu porta da cozinha e disse: "Algumas vezes. Mas poderei saber onde est  a enxada. como que espera." A mulher protestou: "Foi h  tantos anos. e verificou uma vez mais que o seu pesco o tinha uma forma c¢nica. Depois disse: "Agora. E agora ele punha-te as m os no pesco o enquanto tu estavas assim dobrada por cima da mesa. saindo da terra como de um estranho corpete. desenhou com o ferro o contorno da cova. o terreno arenoso mostrava-se cinzento e fri vel. ligeiramente entumescido adiante. Nesta posi o. mas a barriga sa¡a para fora. tinha as m os pequenas demais. com as duas m os abertas junto aos ouvidos. Comemos os biscoitos ou queres que fa a torradas?" Timoteo responde: "biscoitos. um grande canteiro onde Timoteo tinha a inten o de p r algumas plantas. levou as m os atr s. enquanto ela. E agora apanhaste essa ideia fixa. acrescenta. Mas ele n o conseguia. levantando a camisa. descobrindo as n degas brancas e oblongas. o umbigo estava cheio de terra. na sua curva convexa. Ela continuava dobrada sobre a mesa. apanhara terra s m os cheias e espalhara alguns punhados por cima do corpo. durante a noite: de costas. havia um pequeno tro o de cimento. surgia a fenda entre as coxas. como este m rmore me magoa a barriga. debru ou-se em ngulo recto. depois. vigiava a cafeteira. como se dissesse: "J  que fazes tanta quest o!e Afastou-se do lume. passado um momento: "Se n o queres fazer amor. os olhos tamb m abertos." V -a encolher os ombros. lisas magras como as de um rapaz. puxando em primeiro lugar cuidadosamente a camisa para baixo e depois sacudindo com um movimento de cabe a os cabelos desfeitos. No canteiro. diante do fog o. As pernas eram compridas. Mais longe. ficava o declive arenoso da duna. cabe a lan ada para tr s. de forma oval. . onde ele o pusera. estava t o obcecado por isso como tu" . depois. como se tivesse querido. e ela obedece. at assentar no tampo de m rmore o ventre. O corpo estava ali. mais do que tap -lo. Timoteo empunhou o cabo da enxada e. em tom enraivecido: "Levanta-te". Diante da cozinha.levantado a camisa de noite. cheio de caixas velhas de garrafas vazias e embalagens in£teis. Timoteo estendeu o polegar e o indicador em pin a e soltou as pregas da camisa com um gesto ligeiro e respeitador. deitava-se por cima de ti e faziam amor?" A mulher responde: "Sim. O pesco o de uma mulher jovem e bonita que qualquer homem seria capaz de rodear com as m os. os seios despontavam tamb m. Depois. muito antes de te conhecer. sombreada pelos cabelos escuros. o peito e a face esquerda do rosto." Timoteo insistiu: "V . Timoteo disse: "pareces uma r . dirigiu-se mesa. vou-me levantar. Depois. Agora tinha que cavar dentro daquele contorno at uma profundidade de pelo menos meio metro." Timoteo responde. procurando n o tocar no corpo. que ele n o conseguira descobrir.com uma voz fatigada. Ele vai busc -la e sai para o jardim. vesti-lo de terra. hein? Mostra-me l  como era. ele pedia-te para fazerem amor em cima da mesa e tu cedias. aquela que tem o cabo pintado de verde?" A mulher respondeu-Lhe que estava no s¡tio das ferramentas. mal o cobrira e apenas muito desigualmente: o rosto estava coberto mas o pesco o emergia com aquela zona levemente t£mida volta da qual os dedos dele n o conseguiam fechar-se. de p . pernas e bra os abertos. Come ou a faz -lo lentamente. Na realidade. quase como se fosse p¢. mostra-me como . Timoteo olhou-a de novo. mesa. rodeando-Lhe o pesco o com as duas m os. voltam para Roma. depois pisou cuidadosamente a superf¡cie exterior da cova. n o tens aquele olhar terr¡vel. sa¡ste da cama e foste buscar a pistola. .. Queria deixar descoberto. como te dobravas e ele como que te agarrava. com a cabe a inclinada. o pesco o que se podia agora ver de lado. como um louco acabado. Est  bem porque estamos numa villa isolada. n o estejas para a¡ a sonhar de olhos abertos. como Girolamo fazia. A seguir. bra os e pernas dobradas: parecia estar a dormir. Timoteo volta a pegar na enxada e come a a atirar terra para dentro da cova. ou porque mostrava uma cor distinta. Depois. por exemplo.. pegas na pistola. abandonados pelos donos quando. com o movimento. Em que est s a pensar? No c o? Pobrezito.terr¡vel e t o lindo!" Ele agarrou a m o esquerda e o p esquerdo e puxou o corpo para si. animais. antes que venha o temporal. do ouvido at ao peito: era a parte do corpo dela que mais o atra¡a. a terra caiu do corpo em muitos gr os min£sculos.. mas pensa o que seria se tivesses matado um homem! Agora p ra com isso." "E est vamos a fazer o qu ?" "Eu tinha-te dito para me pores as m os no pesco o. Timoteo perguntou irritado: "Poderei saber em que est s a pensar?" "estou a pensar naquilo que est vamos a fazer no momento em que ouviste o c o. Era muito pesado. apanhou com a enxada alguma terra cinzenta e distribuiu-a escrupulosamente por cima da cova de maneira a esconder a cor mais escura da terra h  pouco removida." "Eu?" "Tu fizeste uma cara terr¡vel. enterras o c o mais tarde. A mulher disse: "vem. interrompeu-se. a terra que o cobria sofreu como que um terramoto: as partes mais salientes j  semi-destapadas emergiram por completo. Mas era tudo uma brincadeira. Impressionara-me de repente a pequenez das tuas m os. o corpo rolou para a cova e. mas era uma terra mole e escura e formava uma mancha vis¡vel ou porque se erguia um pouco acima do terreno plano. pensativa. acrescentando por fim: ". embora dizendo: "Tu e essa tua obsess o de te porem as m os volta do pesco o. anda para dentro e vem beber o caf . n o dev¡amos p r o caixote do lixo c  fora durante a noite. pela sua for a e vivacidade soberbas." Timoteo obedeceu. Quero ver se tens o mesmo olhar desta noite. at ao fim.. como te apertava o pesco o. E tu. vem beber o caf e depois vamos dar um passeio pela beira do mar. Esta noite. mas cedeu.. Mas de maneira a eu poder olhar-te nos olhos. ao fim das f rias. de lado. t o bonito andar pela beira do mar." Mas levantou-se e p s-se de p junto da mulher. Sabes que esta praia est  cheia de c es vadios. primeiro cobrindo as pernas e iepois o resto at cabe a."." Estava escuro na cozinha. quando chove!" A cova estava agora cheia de terra.. vens c  abaixo e matas aquele pobre c o vadio que andava a farejar o lixo. at a terra ficar nivelada. Ele era capaz de rodear-me o pesco o com os dedos. l  dentro. queria ver se tu eras tamb m capaz... Timoteo puxou uma vez mais. a mulher estava sentada com um olhar distra¡do.pareces mesmo louco. Ela atirou a cabe a para tr s e olhou-o nos olhos: "N o. tirou uma das m os de Timoteo do pesco o e beijou-a com fervor. fazes-me um interrogat¢rio do terceiro grau para saberes como Girolamo e eu faz¡amos amor em cima da mesa: e tu como te punhas. Timoteo hesitou. Anda. exactamente como um louco. na areia. o rosto meio escondido pelos cabelos. Agora faz-me l  a vontade: levanta-te e p e-me as m os volta do pesco o." Timoteo respondeu: "quero acabar a cova antes que venha a tempestade. A mulher disse-Lhe: "vamos." Timoteo perguntou: "mas n o vais mudar de roupa? Ainda est s em camisa de noite." Ela encolheu os ombros: "e ent o? A camisa de noite uma roupa como outra qualquer". Timoteo n o disse nada e seguiu-a fora de casa, pelas escadinhas que, entre a vegeta o, levavam da duna praia. A cova, depois de alisada e recoberta de terra velha, deixara de ser vis¡vel. Um grande c o vadio, amarelo e castanho, apareceu vindo da duna e foi direito cova. Farejou-a e, depois, com al¡vio de Timoteo, foi al ar a perna j  muito depois dela. Portanto, podia considerar-se doravante em seguran a: a cova n o s¢ n o se via, mas tamb m n o "cheirava". A mulher caminhava sua frente, ao longo do mar, pela areia ainda cinzenta e seca. As primeiras gotas de chuva come aram a cair na areia, cada vez mais densas. Depois, um trov o ribombou como uma enorme bala de canh o por cima da superf¡cie v¡trea e ressoante do mar. Agora a chuva, como que sacudida pelo vento frio e violento, abatia-se em cheio sobre a mulher. Ca¡a e fazia aderir o tecido que molhava ao corpo dela, fazendo com que a roupa deixasse transparecer a cor p lida da pele. A mulher tinha a cabe a inclinada para o ombro; um dos lados do pesco o era totalmente vis¡vel a partir do ouvido. Ela disse-lhe, ent o: "D -me a volta ao pesco o, com as duas m os. N o estranho? Um homem grande e atl tico como tu, com as m os t o peque- nas? V , aperta, at me rodeares o pesco o com os dedos. N o tenhas medo de me magoar, quero ver se consegues dar-me a volta ao pesco o com as tuas m os. UMA MULHER EM CASA DO GUARDA ALFANDEG RIO Sou um homem de ordem, n o s¢ psicol¢gica, mas profissionalmente tamb m: presto servi o como guarda alfandeg rio no aeroporto. Como todos os homens de ordem, todavia, gosto de, por vezes, esquecer a ordem e deixar passar a mercadoria de contrabando da imagina o. O s bado e o domingo dedico-os, justamente, s minhas fantasias. Tiro o uniforme, estendo-me na cama e fixo o pensamento em qualquer coisa que recentemente me tenha impressionado de maneira particular. Hoje, depois de me deitar na cama, no sil ncio da casa deserta, n o tardei muito a descobrir o objecto que recentemente mais me ferira a imagina o. Era a mala de uma viajante j  madura, que devia ter sido linda na sua juventude. Fizera-me desconfiar dela o jeito embara ado, de uma pressa excessiva para ser sincera. Perguntei-Lhe, como de costume fa o, se nada tinha a declarar, e ela estremeceu, como se eu Lhe tivesse poisado acusadoramente a m o no ombro; apressou-se a repetir que n o tinha nada, absolutamente nada, s¢ pe as de roupa. Olhei-a com aten o: tinha um rosto magro, de tra os finos e bem desenhados, mas insignificantes, nos quais era, sobretudo, not vel o esfor o para, artificialmente, esconder a idade: cabelos apanhados e cheios por cima da testa e dos ouvidos; sombras nas p lpebras e por baixo dos olhos; l bios pintados; cara empoada. Al m disso, uma express o - como direi? - pateticamente, atormentadamente, fr¡vola e aduladora. Trazia uma tal quantidade de roupa vestida, que era dif¡cil distinguir pe a a pe a; confusamente, notei um len o de pesco o, uma esp cie de sobretudo de veludo, um casaco de l , uma camisola, uma blusa, um corpete; tudo isso de corte e cores diferentes. Talvez por esta sua maneira complicada de vestir, talvez pela sua inseguran a, pensei que fosse uma dessas chamadas "aventureiras", figuras liter rias, mas ainda actuais, e isso poderia significar sabe-se l  o qu , da droga espionagem. Ordenei-lhe secamente, indicando a mala elegante, de couro flex¡vel: "abra." Ela objectou logo: "mas se Lhe estou a dizer que n o tenho nada a declarar." "Abra, por favor." Suspirou, tirou da bolsa um molho de chaves, deu a volta chave. Eu abri a mala com uma esp cie de viol ncia s dica, enterrei as m os no seu in terior. Continha um amontoado de panos, sedas e n o sei quantos outros tecidos, todos muito leves e esvoa antes, numa confus o, segundo pensei, tipicamente feminina, j  que n o passaria pela cabe a de um homem meter a roupa na mala de maneira t o prom¡scua. Continuava com as m os metidas entre todos aqueles tecidos moles, vagamente perfumados e, entretanto, pensava que as mulheres, mais do que vestir-se, como os homens fazem, tendem, por assim dizer, a enfeitar-se; e na realidade, os vestidos que p em n o aderem ao corpo, mas envolvem-no de modo sedutor e misterioso, escondendo o que t m e simulando o que n o t m. E que dizer, pensei ainda, continuando a busca, do facto de os vestidos das mulheres n o assentarem no corpo, como os fatos dos homens, mas se agitarem, moverem, incharem ou desfazerem e assim por diante? Ou, na alternativa, o extremo oposto: aderem de mais, e ent o o corpo feminino surge prisioneiro de uma quantidade de tecidos el sticos, ligas,cintas e outras cadeias semelhantes? Portanto, ou o tecido esvoa ante e lisonjeiro ou a bainha estreita, herm tica. Entre estes pensamentos, acabei a busca sem nada achar e, ent o, tirei as m os do interior da mala, fechei-a eu pr¢prio e fiz com um pau de giz uma cruz no couro, indicando que a bagagem podia passar. A mulher agradeceu-me, talvez algo excessivamente, com um sorriso rasgado e brilhante; e depois desapareceu empurrando o porta-bagagem. Agora, pensando neste incidente m¡nimo, ocupo-me de novo da diferen a entre as roupas das mulheres e as dos homens. Porqu tal diferen a? O que leva as mulheres a vestirem-se desse modo? Porque que as suas roupas s o cortadas de forma a p r em relevo as linhas curvas enquanto as dos homens tendem a definir linhas rectas? Que significa a prefer ncia da mulher pelos tecidos leves, transparentes, moles, acariciantes, esvoa antes? Ponho-me estas perguntas e, por fim, sempre s voltas com elas, acabo por adormecer. Durmo talvez meia hora; depois, o som da campainha da porta, um ru¡do estridente que, vivendo sozinho, quis que fosse muito forte, faz-me sobressaltar na cama. Fico um momento escuta, perguntando-me quem poder  vir procurar-me a estas horas, numa tarde de domingo; por fim, ponho a camisa e o casaco e, descal o, dirijo-me entrada e espreito para o patamar. Ora, uma mulher! Uma mulher com cerca de quarenta anos, com um rosto magro e fino que, n o sei porqu , tenho a impress o de ter j  visto. Depois, o casaco comprido de veludo aberto, os pequenos adere os que Lhe enquadram o rosto, o len o do pesco o mal atado, fazem-me descobrir de repente onde foi que a vi j : h  dias, no aeroporto, chegada de um voo - deixa l  ver... - de Madrid. O meu olhar desce e, ent o, confirmando a minha mem¢ria, avisto a mala que remexi t o demoradamente e em v o. Ponho o fecho de seguran a, entreabro apenas a porta e pergunto: "sim, o que quer?" Ela responde com uma familiaridade, desconcertante: "A ti, justamente, simp tico." "Desculpe-me, mas n o a conhe o, a primeira vez que a vejo e.." "Vamos, vamos, pouca conversa, abre a porta e deixa-me entrar." Fascinado por tanta seguran a, tiro o fecho e abro. Ela entra e logo uma vaga de perfume me envolve, um perfume adocicado, pesado e, contudo, penetrante e, de algum modo, tamb m apimentado. Ao entrar impetuosamente, com um movimento vivo da saia plissada, ela diz com uma voz vibrante: " Justamente a ti, Athos Canestrini, justamente a ti." "Mas repito: n o a conhe o." "eRealmente n o me conheces, ou melhor: n o queres conhecer-me. Isso n o me impede de te procurar" "Que quer isso dizer"? "Ora, j  te explico. Entretanto, mostra-me o caminho para o quarto." N o seria melhor irmos para a sala?" "Eh, n o, n o! Temos que ir para o quarto." "Mas, porqu ?" " J  vais ver." Dirijo-me frente dela para o quarto. uma divis o grande, com duas janelas; h  uma cama de casal, um arm rio, uma c¢moda, cadeiras: os m¢veis do costume. Ela diz prontamente ao entrar: "Que quarto frio, austero e sobretudo... mentiroso." "Mentiroso, essa boa, e porqu ?" "Porque, na realidade, gostavas de ter um quarto muito diferente." "Como?" NUm quarto, assim, mais feminino. Mas agora eu vou arranjar-te o quarto, olha." Poisa a mala em cima de uma cadeira e come a a tirar de dentro dela uma quantidade de objectos de toilette que vai pondo no tampo de m rmore da c¢moda: escovas, escovinhas, pentes, frascos, bocetas, caixinhas, estojos, recipientes pequenos, enfeites e assim por diante. Disp e tudo aquilo em boa ordem, volta do espelho. A mala parece inexaur¡vel; quanto mais coisas tira, mais coisas parece haver ainda l  dentro. Por fim, diz-me: "pronto. Agora j  n o est  t o triste." N o digo nada, limito-me a observ -la. Ei-la a extr ir da mala uma longa camisa recamada, uma combina o de seda, outras pe as de vestu rio ¡ntimo que vai pendurar nos cabides. Entretanto, no seu vaiv m, fez as coisas de modo a deixar pelas cadeiras cal as, combina es, camisetas, saias e n o sei quantas outras pe as de roupa diferentes. Agora, al m disso, salta da mala m gica um pijama negro, uns chinelos verdes, um roup o cor-de-rosa. Diz, voltando-se para mim, finalmente satisfeita: "Que achas, n o est  melhor assim?" Olho para ela, estupefacto. Depois, ei-la que acrescenta de s£bito: "vem c . Aproximo-me. Estamos ambos, um ao lado do outro, diante do espelho do toucador. Ela diz: "Olha, olha bem, n o achas que somos parecidos?" Olho e reconhe o que tem raz o. Temos os mesmos tra os, os mesmos olhos, o mesmo nariz, a mesma boca. Ser¡amos ainda mais parecidos se n o fosse, no seu rosto, aquela express o fr¡vola e pat tica que, por sorte, se encontra plenamente ausente do meu. Ela diz, por m, calmamente: "Compreendes agora? Eu sou tu e tu s eu. Ou seja, eu sou a vers o feminina e tu a vers o masculina do mesmo indiv¡duo, do mesmo Athos Canestrini. Bem, agora vou deitar-me, estender-me na cama e descansar um bocadinho. E tu, que vais tu fazer?" Aturdido, balbucio: "Mas estou em minha casa, tenciono fazer o que sempre fiz, at ao dia de ontem: repousar, ler, reflectir, fantasiar..." "Fantasiar o qu ? Que eu tomo o teu lugar? J  n o preciso: est  feito. De ora em diante, no aeroporto, estar  a vers o masculina de Athos Canestrini e, em casa, a vers o feminina. E agora, ninharias nas paredes. n o h  nenhuma raz o para ter que te explicar isso tudo. Comecei a pensar nos melhoramentos que gostaria de introduzir: flores. houvesse alguma coisa de verdadeiro: a aspira o inconsciente de ter uma casa mais habitada e mais habit vel. desperto.". me inquire: A senhora Canestrini" "Aqui n o h  senhora nenhuma. mais acolhedora. n o se envergonha de me mostrar um corpo no qual.". talvez no meu sonho. De qualquer modo. fei es grosseiras e sensuais. tens que ir para o aeroporto. em vez de esconder.." Entretanto. Fim . quase embato num tipo enorme de estilo ultra-vulgar: moreno. saio do quarto. e eis-me na entrada. cabelos desgrenhados. despe-se. voltamos a ver-nos logo noite. vou p r a casa mais alegre. Assim era tudo um sonho: aquela senhora da mala. Penso que n o me resta nada a fazer. e. mais fr¡vola. sem outras explica es. envergadura atl tica.. com uma voz que exibe bem as inflex es n o sei de que dialecto. almofadas. deve ter-me realmente impressionado bastante! Olhei o meu quarto frio e triste de celibat rio e disse para comigo que. como no rosto. quadros. no aeroporto. o artif¡cio. sublinha os sinais da idade. estofos e por a¡ fora. tapetes.. seguido pela voz dela que recomenda: "fecha bem a porta. Ao abrir a porta. E foi no meio destas imagens prazenteiras que voltei a adormecer.adeus. o qual." "Mas que vais fazer aqui em minha casa?" "Fico a tratar as coisas minha maneira..
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