Caso Dos Exploradores de Caverna

March 26, 2018 | Author: Dih Campari | Category: Judge, Crime & Justice, Justice, Statutory Law, State (Polity)


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ANÁLISE D’O CASO DOS EXPLORADORES DE CAVERNAS EM UMA VISÃO CRÍTICA DA POSTURA DOS MAGISTRADOS NO PROCESSO Eduardo da SilvaGonçalves. et al.1 Trabalho entregue à professora Luciana de Sousa Silva, como requisito parcial da disciplina de Introdução ao Estudo de Direito, integrante da ementa curricular do primeiro período do curso de Direito do Centro Universitário de Formiga – UNIFOR-MG RESUMO O Caso dos Exploradores de Cavernas, livro de Lon Luvois Fuller, apresenta uma abordagem prático-ficcional sobre um julgamento recursal de um caso envolvendo, basicamente, um homicídio seguido de antropofagia. Na obra, são dispostos os votos dos juízes incumbidos de rever a sentença dada em primeira instância, e é apresentada uma emaranhada rede de complicações e pormenoridades. Esta obra prima, sobretudo pelo papel das Leis, e do Direito na ordem social e no ordenamento jurídico; e ressalta ainda, a passividade e a necessidade de interpretação da norma, para que esta atenda a sua função. Também é evidenciado na obra, a diferença entre aquilo que é legal e justo, e é estabelecida uma reflexão implícita acerca do papel do legislador e do magistrado na esfera jurídica. Palavras-chaves: Sentença. Direito. Justiça. Legislação. Lei. 1 INTRODUÇÃO O Caso dos Exploradores de Cavernas prima por uma análise mais profunda acerca do debate jurídico, e do papel dos juízes e da legislação na execução do justo e da equidade. Vale ressaltar que nem sempre a mera execução da lei, especialmente nos casos ad litteram, fornece a equidade nas relações, e o justo nos casos sob julgamento. Neste livro, isto se evidencia, no transcorrer dos votos dos juízes, e em suas observações acerca do caso. O Poder Judiciário possui a premissa de pacificar a sociedade, estabelecendo a justiça propriamente dita, entre os litigantes. O justo, porém, não está vinculado obrigatoriamente à norma; sendo que, para obtê-lo, faz-se necessária uma análise crítica da norma elaborada pelo Poder Legislativo, para extrair dela o princípio para o qual foi criada; para estabelecer uma compreensão da intenção explicita e implícita do legislador, quando da criação da lei; e para que ela possa ser efetivamente aplicada ao caso concreto, de forma justa, e de forma a evocar a justiça, dando a cada um aquilo que por direito lhe é devido. É precisa esta análise, a fim de dirimir eventuais falhas na lei; uma vez que ela é feita por seres humanos falhos, e, por isso, é passível de falhas. Também deve-se ressaltar que na adequação da regra ao a doutrina. ou seja. ao Poder. deve-se primar pelo princípio do jus est ars boni et aequi. kelsianos. a utilização sistêmica. após o vigésimo dia de confinamento. Dentre estes elementos. e é corrido por livre escolha dos mesmos. a jurisprudência. a decisão do juiz deve passar pelo campo do Direito. que estavam a realizar o resgate dos exploradores de cavernas. é a inserção comedida e sutil da filosofia aplicada ao campo jurídico. 2 DESENVOLVIMENTO 2. etc. Na justiça como um todo. sofistas. nota-se diversos elementos pertinentes ao caso. dinâmica e proativa de diversos elementos do hemisfério jurídico. a analogia. Um aspecto ímpar nesta obra. . uma vez que a vida deles custou onze outras. caso não ocorressem novos deslizamentos. é o fato de que. os costumes. Contudo. Há. pertinentes ou não. hegelianos. e o inerente perigo a que se expõe é necessário. a previsão de resgate era de mais dez dias. cujo papel é resgatar aqueles que necessitam. a lei. também. uma vez que os trabalhadores são profissionais que exercem uma profissão de risco. maquiavélicos dentre outros. o senso comum. é conhecido por eles. à moralidade.caso concreto. não emitindo comentários ou considerações. Outro elemento que deve ser analisado neste caso. Um dos primeiros elementos passíveis de análise é a morte de dez trabalhadores. de forma implícita e entremeado nos engendramentos das ideias presentes nos discursos dos juízes. ao papel do Estado. Procede-se a análise destes. há especial destaque para as fontes do direito. neste processo que ele se manteve fidedigno ao caso. Há também a colocação filosófica quanto ao contrato social celebrado. Nota-se. o jusnaturalismo. a moral. Isto pode ser percebido nas sutilezas da obra. Durante o relatório. mas não apenas por ele. os princípios gerais do direito. à legalidade. a interpretação extensiva. conforme a ordem em que foram expostos na obra de Fuller. até o momento de exarar seu voto. Sem dúvidas. neste livro. aristotélicos. que para tanto são remunerados e contam com benefícios como adicionais de periculosidade e insalubridade. e quanto à própria justiça. aos estados natural e de direito. este prazo culminaria por levá-los à morte por inanição. abstendo-se a narrar os fatos. platônicos. este não é um argumento válido. o positivismo.1 VOTO DO JUIZ TRUEPENNY Este foi o magistrado responsável por proceder ao relatório do caso. “o Direito é a arte do bom e do justo”. com evocação a princípios socráticos. Pode-se argumentar que tais mortes são um elemento a ser considerado quanto à absolvição dos acusados. tal como explicitado pela equipe médica. 123. § 1º. os jurados apenas julgaram como procedentes as informações colidas. pois a função exclusiva é decidir se o réu é culpado ou inocente. em seu art. A petição do júri ao tribunal de primeira instância. não o fazendo por crer na licitude do sorteio. 124. o fato de. para que decorresse a emissão de uma “decisão especial”. Pode-se dizer. que. emocional. que o Estado se disponha a julgá-los por algo a que o próprio Estado se omitiu no derradeiro momento. e a veracidade do ato. o julgo sobre a autoria delitual dos acusados ficaria ao encardo do magistrado. uma vez que em conformidade com o Código de Processo Penal Brasileiro. §§ 1o e 2o. constitui uma complicação. pois conforme o relatório. que os exploradores atentaram para a equidade do método escolhido. Quando os exploradores rogaram por aconselhamento. ou representante religioso se dispôs a auxiliá-los e aconselhá-los neste caso. socorrista. e psicológico. dado seu estado físico. juiz. constitui uma peculiaridade processual. se o quantum a cumprir deve ser muito ou pouco. O fato de ter sido a vítima aquele que propôs isto.Um fato que deve ser meticulosamente considerado. primarem por uma forma de escolha aleatória e isonômica no que concerne à determinação daquele que serviria de alimento aos demais. segundo o referido código. É dotado de necessidade analítica o fato de. Compete ao júri. clamando pela . Neste caso. autoridade governamental. quando os réus clamaram por aconselhamento sobre como sanariam sua necessidade fisiológica de alimento. tanto os jurados quanto o próprio magistrado terem endereçado petições ao chefe do Poder Executivo. O fato de Whetmore ter declinado quando do lançamento dos dados. nenhum médico. eles não se encontravam em seu juízo perfeito quando do homicídio e do antropofagismo. neste caso. que evocam de forma irrevogável e incontestável o instinto de sobrevivência. Deve-se ressaltar. Eles optaram por um sorteio utilizando dados. E corroboraram que. não é pertinente para o caso. houve omissão no que tange à decisão pela culpa ou inocência dos acusados. 126 e 127 do Código Penal. faz-se necessário destacar ainda. 74. “Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes previstos nos arts. consumados ou tentados”. É no mínimo imoral e impertinente. parágrafo único. 121. uma vez que o acordo entre eles já havia sido lançado. incluindo Whetmore estavam sob grande pressão física e psicológica. É ainda digno de apreciado acuro. e conforme evidenciado em sua seção XIII. o que contraria os deveres do júri. 125. uma vez que ao conselho de sentença não cabe analisar se a pena é justa ou injusta. Aqui. os exploradores. Ressalta-se ainda que ele teve a oportunidade de contestar o resultado. e ante à necessidade premente à qual ele e seus companheiros estavam submetidos. 122. eles se ocuparam com questões matemáticas para verificar a isonomia do processo. mas não tende para a ilicitude. porém. No caso em questão. foi a omissão do Estado. sem qualquer restrição. que todos eles. decidir. Com isto. o julgo da própria legislação. não é o mero julgamento de quatro acusados. apreciar os casos que lhe são apresentados. e acima de tudo. e que foi sumariamente ignorado pelos juízes que o antevieram. deve primar pela Justiça. neste caso. seja remida. haveria o cumprimento da Lei. decidiu por seguir a mesma linha de pensamento da instancia anterior. mas não seria alcançada a Justiça. e que interpretá-la e aplicá-la ao caso concreto. com todas as suas peculiaridades pode macular o texto legislado e. não se posicionando à respeito. caso o tribunal considere os acusados culpados. Cabe ressaltar que o Poder Judiciário não deve. mantendo a condenação e invocando a clemência do Executivo. portanto. e nem tudo que é legal é justo.A (n.2 VOTO DO JUIZ FOSTER O meritíssimo senhor juiz Foster aborda. fato que levou a se recorrer à corte em que ora o processo se encontra.C. Além de destacar a sordidez e a incontestável obviada solução apresentada por seus antecessores. ele aborda que o que este caso impõe. eventualmente. a distinção entre justiça e legalidade. Eles peticionam ainda. às repartições e órgãos públicos. mas sim. e. avaliar o caso. que é a Lei. incentivar a transgressão. e não esperar que outro Poder o faça. Ao apresentar que. que especifica que “Quem quer que prive intencionalmente a outrem da vida será punido com a morte”. ele . pois nem tudo o que é legal é moral.s. em seu texto. O juiz Truepenny. íntegro e direito. É dever do Judiciário. o juiz Foster aponta algo extremamente relevante no ambiente jurídico. se sua aplicabilidade. A legislação que serve de alicerce para o processo de acusação dos réus é a N. fazendo aquilo que é correto. Ele argumenta que não há razões para não crer no deferimento de tais petições. Contudo. e determinar sua libertação ou pena. escusando-se de apresentar criticidade sobre os fatos em questão. ou então seja substituída por uma outra de caráter simbólico. uma vez que esta é sua incumbência. determinando a inocência ou culpabilidade dos réus. e de sua equidade e justiça.) § 12-A. 2. esta clemência pode ser indeferida. Outro elemento relevante no que pertine ao voto do magistrado é a presunção de que deve-se primar pelo fidedigno segmento à norma escrita.clemência que este Poder pode conceder aos condenados. despachar ordens aos demais poderes. aos cidadãos. Nota-se ai uma fonte do direito. algo deveras relevante. que a pena que foi imputada aos exploradores de cavernas. se não que certamente. o Judiciário e seus juízes. em hipótese alguma proceder na crença de que outro Poder Estatal faça ou deixe de fazer algo. sua eficácia. Vale ressaltar ainda o fato de o Poder Executivo se manter omisso quanto às petições.S. como a reclusão pelo período de seis meses. o próprio tribunal será apontado como injusto e será condenado pelo senso comum. Deve. Usando o campo da Filosofia do Direito. e crucial para o caso. para conseguir a manutenção de suas vidas. até mesmo. Retomando ao caso. Eles. e em extremo estado de necessidade. como os exploradores estavam em um estado de necessidade indubitável. que é os costumes. ao invés de definirem sumariamente aquele que seria morto para alimentar aos demais. Deste modo.evidencia uma fonte judicial. Mas. é certo que eles criaram um ‘estado próprio’ ao acordarem sobre o sorteio. e. o homem é como qualquer outro animal. tem-se a constatação de que. Quando se encontra entronizado no Estado de Natureza. agiram como agiram. fora do Estado de Direito. Ainda no que pertine ao contrato social. é nítido que se encontravam em um Estado de Natureza. De forma complementar. a fim de possibilitar o convívio em sociedade. e as impõe coercitivamente. com o contrato social. parcial. valendo-se dos meios de dispunham para conseguir um bem visível futuro. pois quando uma lei é falha. passível de julgamento no ordenamento jurídico positivado e/ou sequer deveriam estar sendo submetidos a um tribunal de um Estado de Direito. quando se está inserido neste estado. Outro aspecto apresentado pelo magistrado é o fato de que há casos em que a lei é insuficiente para a realização da justiça. desde seus primórdios até o presente momento. “ela não incorpora os preceitos básicos para a realização da justiça”. Esta é ainda uma atitude enaltecedora. se dá. pois. imoral. ad rem. Thomas Hobbes e Jean-Jacques Rousseau como doutrinadores neste difuso campo. Um ponto abordado pelo magistrado. a fim de dissuadir a prática lesiva. foi . Neste contrato fica acertado que. mas para castigar a infração à norma. em sua obra O Leviatã. e por isso gozam de liberdade infinita para defender seu bem mais precioso [se não único]. ou seja. quando isolados do aparato e do apoio estatal. o bem-estar e a ordem social. o que se pune. os riscos que os homens correm são inúmeros. para garantir a segurança de seus membros. observa-se no ordenamento jurídico. que a punição. face à sua necessidade. se encontravam em um incontestável Estado de Natureza. não para sanar ou pugnar o ato cometido. A transição para o Estado de Direito se dá com um pacto celebrado entre as pessoas. Os exploradores. a liberdade dos homens passa a ser limitada. exposto em sua obra homônima. não é o crime em si. estipula regras comportamentais. portanto. a sua vida. a vida. o Estado impõe sanções para a violação das normas por ele impostas. e sem o amparo do Estado. como exposto por Hegel e Foucault. em troca da proteção do Estado. e vale-se de seus instintos para assegurar seu bem mais precioso. dispuseram da vida e da carne de um deles. ou apresenta qualquer tipo de vício. como exposto por Thomas Hobbes. Analisando o que foi narrado supra com maior ênfase. e invocando Niccolò Machiavelli. é o fato de que os acusados se encontravam fora do ordenamento jurídico positivo. não sendo. que firma um Estado. pois o Estado. A transição do Estado de Natureza para o Estado de Direito é explicada por Rousseau. as pessoas hão de ceder parte de sua liberdade. mas a violação da norma que diz que não se deve fazer algo. portanto. no caso em questão é evidentemente impossível. face à realidade que vivenciavam. . a função do Direito é “facilitar e melhorar a coexistência dos homens e de regular com justiça e equidade as relações resultantes de sua vida em território comum”. sendo que neste caso. a doutrina. dado que as condições são anômalas e não usuais. Para corroborar sua perspectiva. encontravam-se distantes da ordem jurídica. e de sua aplicabilidade. no caso em análise. e que desse chances iguais a todos. porém. em seu Estado de Natureza. a legislação passível de aplicabilidade não é a de um Estado de Direito positivo. é um pacto feito para assegurar a ordem e a vida em sociedade em dadas circunstâncias. onde cita os doutrinadores do séc. É certo que a vida humana detém um valor absoluto. e sim. Como o próprio M. e que. O M. entronizados em um Estado de Direito. e. Juiz Foster apresenta. Externa-se que. cessat et ipsa lex (cessando a motivação da legislação. prova isto. é mais do que certo a aplicação da máxima jurídica cessante ratione legis. da autoridade e do poder. O direito positivo. o que. uma vez que a preocupação e as considerações matemáticas acerca da eficácia do método. Como os acusados se encontravam em uma situação alheia à realidade onde os homens podem viver em comum. não se aplicavam a eles as disposições estatais. Percebe-se nos autos. impõe um princípio de isonomia.criado um sistema que permitisse uma igualdade de possibilidades. e em situações comuns. A deliberação acerca do sorteio com os dados. Juiz Foster diz em seu texto. há a impossibilidade de se imputar qualquer tipo de conduta criminosa e/ou infracional aos acusados. uma vez que seu cárcere subterrâneo os mantinham separados da sociedade. inicialmente. quando cometeram o ato que deu causa ao processo. é aplicável apenas quando partindo do pressuposto de que é possível a coexistência pacífica dos homens em sociedade. alheios ao aparato estatal. este princípio não se aplica. A legação de que Whetmore estava violando o acordo ao declinar de lançar os dados endossa a formação de um contrato social entre eles. de sua coercibilidade. sob o amparo do Estado. até porque. em premente necessidade. e sob uma formação jurisprudencial e estatal ‘própria’. em condições usuais de existência e convivência. que os exploradores. as que eles próprios firmaram. tanto no sentido abstrato. Frente ao estado em que se encontravam. as premissas elementares subjacentes ao ordenamento jurídico encontramse privadas de seu significado. Frente a todo o exposto. XIX. não pode ser sacrificada em circunstância alguma. quando se encontra em um Estado de Natureza. mas sim a legislação inerente e própria das circunstâncias vivenciadas. a justificação das leis. cessa a própria norma em questão). entronizado em um Estado de Direito. privados do amparo do Estado. quanto no sentido físico. Outro aspecto levantado pelo magistrado é o fato de que o Estado adota uma política segundo a qual os ganhos superam as perdas. em caráter jurisprudencial e análogo é o caso “Fehler v. como a doutrina aponta. é algo que se faz necessário no direito. perdão incondicional. pois. Eis que isto é algo . uma vez que em face de uma ameaça à sua vida. não sendo pertinente o que a lei diz. sendo que seria como se nunca tivesse sido estabelecido o processo judicial. mesmo que a norma legislada considerasse-a como uma conduta criminosa. neste caso. Também é apontado por Foster que a legitima defesa. é algo que. ele firma-se ainda na premissa de que. disto. mais do que certo que tal preceito jurídico se aplica ao caso dos exploradores de cavernas. em favor dos acusados. há uma exclusão de jurisdição estatal. Neegas”. foi a inexigibilidade de conduta diversa. esta regra não poderia agir de forma preventiva. se é que deveriam ser processados. e interpretá-la racionalmente à luz de seu propósito evidente. Neste caso há um excludente de culpabilidade não previsto expressamente na legislação. na concepção mais extensiva e dinâmica do termo. é pelo pressuposto da legítima defesa. constata-se que. há ainda um excludente de ilicitude por legítima defesa. uma vez que os acusados estavam agindo em defesa da vida deles próprios. ele defende que seja concedida uma interpretação extensiva. foram reformuladas as sentenças. onde a perda de uma vida se deu em favor de preservar outras quatro. Mediante isto. cuja causa é a não-exigibilidade de comportamento lícito. Nestas jurisprudências. rege a legislação que o juiz deve encerrar o caso. em uma série de jurisprudências do tribunal em que exerce a magistratura. Nestes casos. ainda mais [compreensível] que sejam corridos tais riscos em situações desesperadoras como a vivenciada pelos réus. deve-se aplicar por analogia os conceitos supra mencionados. afastando a condenação. é abarcado pela impossibilidade de conduta diversa. a depender da perspectiva sob a qual os analisa. e que. a vítima irá repelir seu agressor. Neste caso. É. Foster defende ainda que. concedendo aos acusados. uma pessoa pode contrariar a norma legislada (lei). ainda. e nem sequer se poderia esperar que agissem de outra forma. Um dos princípios empregados para justificar tal proceder. infringir a própria legislação. Outra forma de se interpretar o caso. De forma análoga. contudo. desde o direito grego e romano. Destacar a necessidade de se analisar criticamente a lei. o que impediria a denúncia e consequente processo. sem. Desta forma. se riscos [sobre vidas humanas] são corridos na sociedade (em um contexto normal). Um exemplo por ele utilizado. uma vez que a situação na qual se encontravam não os deixava uma escolha diversa. Foster respalda sua decisão. a fim de se alcançar a justiça. dados os fatos. pois. invariavelmente. embora os casos sob julgamento se enquadrassem perfeitamente no enunciado literal da norma legislada. muito embora. o homem age em resposta a um impulso enraizado na natureza humana. mas em fazê-la mais eficaz”. sendo que. 2. Prova disto. alienação. não se deve interpretá-la. porém. se contradiz. adaptando-a às particularidades de cada caso que se apresenta ao tribunal. segundo Hegel. que não se aplicam a este caso. recognição. “que os acusados devem ser considerados inocentes das coautorias do crime de homicídio contra Roger Whetmore e que a sentença de condenação deva ser reformada”. embora considere isto como premeditação. sensações]. Ele afirma ainda que “o objetivo de qualquer norma criminal é a prevenção”. o M. Tatting afirma ainda que a norma não deve ser aplicada de forma a contradizer seu propósito. a alma atual […]. em sua teoria lógica dos cinco estados. ao afirmar que ao repelir uma ameaça agressiva à própria vida. Tatting. e a mente prática [sentimento prático. para se evitar questionamentos destes propósitos. que face a adversidades como as vivenciadas pelos acusados abandona. a consciência da razão […] e a mente livre [autoreflexividade prática]. se olvida de que a norma pode estar errada. as peculiaridades do caso devam ser consideradas para que se proceda a um julgamento justo. na verdade. embora o tribunal deva obedecer às normas legisladas. incluindo o homem. ser passível de interpretação. não têm qualquer similitude com o caso em questão. O magistrado afirma ainda que. Ele defende ainda que. contudo os casos sobre os quais se fundamentou no embasamento de suas colocações. transplantando-o para o hemisfério jurídico. nem a nenhum outro caso hipotético. a consciência de si [apetite. equivocada.instintivo que está presente em todos os animais. para que ela possa ser aplicada ao caso concreto. juiz Tatting recorre a falácias. O juiz invoca a jurisprudência em seu favor. Para confrontar os argumentos do juiz Foster. ser incoerente.3 VOTO DO JUIZ TATTING O magistrado Tatting revelou em seu texto sua dificuldade em alienar suas convicções pessoais e emocionais. uma interpretação e criticidade quanto ao texto da lei. sim. incompleta. e adentra em um estado onde se evidencia a alma natural [qualidades físicas. O meritíssimo senhor juiz Foster. dentro do campo do espirito subjetivo. . dos aspectos intelectuais necessários à analise justa e imparcial do caso. os juízes devem realizar. Ele defende ainda que “a correção de erros ou equívocos legislativos óbvios não importa em substituir a vontade do poder legislativo. eles ponderavam as alternativas que tinham. é dada por Foster ao usar uma analogia de um clichê social. mas vários. em seu voto. contudo. consciência universal de si]. e a eficácia dos métodos de que dispunham. Ele ainda aponta que os exploradores deliberaram. e acima de tudo. como uma espécie normativa não tem um único propósito. declara portanto. impulso]. é um tribunal que pode ser considerado como vicioso em sua jurisprudência. É certo que o papel do Judiciário. ele afirma que o tribunal não deve considerar a possível clemência do Poder Executivo. não sendo. e não como magistrado. Outra peculiaridade abordada por este magistrado é o fato de os acusados. os princípios gerais do direito. mau ou bom”. sociais. o juiz deve julgar conforme a moral. devendo a decisão do judiciário se dever unicamente a ele próprio. se retirou do caso sem emitir juízo. por crer que “já sofreram o suficiente para pagar por qualquer crime que possam ter cometido”. segundo a ótica do perdão passível de concessão pelo Poder Executivo. quaisquer que sejam elas. e a divisão constitucional dos poderes assegura este distanciamento dos mesmos. é ele se negar a julgar. as posturas adotadas por este tribunal. e que é. é primar pela Justiça. O magistrado. legal e judicial. O juiz encontra-se atado à obrigação de julgar. o senso comum… O M. pelo art. a jurisprudência. que não é competência do Poder Judiciário. éticas e morais. Em seu texto. 2. pois como a norma é criada e aplicada por humanos [que são seres imperfeitos]. e às coisas inerentes à ele. considerar este perdão. portanto. da ética. é passível de amplo questionamento ético. juiz Tatting. Valjean”. do bom senso. na melhor das hipóteses. corrupto e distorcido. caso este competisse a ele (o juiz). o perdão total aos exploradores. os costumes. e. pois isto é uma competência do chefe do poder executivo. pois um tribunal que condena o furto famélico. do conceito de justiça. da competência do tribunal. que é defender a específica divisão de poderes. 4º da LInDB e pelo art. como deve valer-se da moral.Outra coisa que se percebe no texto de Tatting. algo louvável. do direito. o bom senso. moral. mais do que apreciar casos. Na invocação à jurisprudência do caso “Commonwealth v. ela é passível de falhas. não seria uma mera redução de pena e/ou uma pena simbólica. que nem tudo o que é . desde o Código de Napoleão (art. Ressalta-se neste caso. no mínimo questionável. se não inadmissível. o juiz Keen apresenta em seu texto. Todavia. é. mesmo que não disponha de leis. uma série de disparidades jurídicas. não apenas pode. para avaliar criticamente a norma legislada. mas sim. inicialmente. 4º). Outra postura adotada por Tatting. portanto. a doutrina. a analogia. 126 do Código de Processo Civil. é que o tribunal em que tramita o caso. Ele diz ainda. etc. no direito brasileiro. Portanto. tomar em consideração o que o chefe do Poder Executivo possa ou não fazer.4 VOTO DO JUIZ KEEN O meritíssimo juiz Keen aborda. Prova disto tem-se com sua colocação de que não se deve avaliar e/ou “decidir se o que estes homens fizeram foi justo ou injusto. fica claro tal vício. Sendo que. 2 Ele ressalta ainda que esta colocação/opinião ocorre enquanto cidadão comum. segundo ele. para contestar uma norma legislada que se apresente errônea e/ou lesiva à ela. ele se esquece que dadas as circunstâncias em que se encontravam. uma vez que a lei é passível de interpretação para que se adeque aos casos. uma vez que a escassez de alimentos. e que exigia que eles resistissem a ela. Outra postura defendida por Keen é o fato de que a lei deve ser aplicada tal qual está escrita. sem qualquer resquício de dúvida. Esta colocação é. no mínimo abusivo e obsoleta a consideração extensiva e literal do “patere quam ipse fecisti legem” (suporta a lei que tu próprio fizeste). psicológico e emocional a que foram submetidos. é sim detentora de poder social e quiçá político. e ressalta ainda que. que segundo ele gera na população um sentimento de responsabilidade ante a legislação. por isso. era sim. dada a impossibilidade de todos os cidadãos legislarem (como em um estado anárquico). para que se sanem eventuais erros e brechas que ela possa apresentar. quaisquer que fossem eles. e. o princípio da legitima defesa. .legal é moral. O povo. escolhe seus representantes. além de uma descabida falácia. um tremendo equívoco. pois. É. algo por completo destituído de razão. uma vez que o povo é responsável por ela. e. esta situação. O juiz alega ainda que não é passível de se pleitear atribuir aos acusados. este princípio somente “se aplica aos casos de resistência a uma ameaça agressiva à própria vida de uma pessoa”. é sua defesa quanto às sentenças ditas severas. neste ponto está parcialmente certo. não havia outra postura a ser adotada pelos mesmos. um caso de resistência à situação por eles vivida. Há ainda o fato de que o instinto de sobrevivência sobrepuja todos os demais sentidos [morais]. e que a norma legislada nunca deve contrariar a moral. Ele alega ainda que esta legislação é uma criação do povo [e. uma ameaça agressiva à vida dos mesmos. para a manutenção de suas próprias vidas. quando de uma necessidade extrema. “não há nenhum princípio de perdão pessoal que possa aliviar os erros” dos representantes populares. Outro ponto que o magistrado Keen interpõe ao caso. primando sempre pelo bem comum e pelo justo. em uma interpretação extensiva. mediante a eleição (poder de voto) que concede àqueles que foram da escolha popular o poder de legislar e criar as leis]. A concessão máxima que o M. lhes cabe a condenação. luz. evocando em seu endosso a lei como fonte do direito. é. Sucede que o excelentíssimo senhor juiz Keen esqueceu-se de considerar as circunstâncias vivenciadas pelos exploradores. bem como o desgaste físico. Este. mas a sociedade. e sabe-se lá mais o quê. e. é que esta deve ser contígua ao significado evidente desta. Quando o magistrado afirma que os acusados privaram Whetmore de sua vida de forma intencional. constituiu. com os meios de que dispunham. também. sem dúvidas. juiz Keen faz à respeito da interpretação da norma jurídica. que de douter. O juiz Keen levanta uma questão [em tom de crítica]. tal como explicitado no Discurso 4 de Descartes 5 seguido pela referida tradução 6: “Ensuite de quoi. basta evocar René Descartes.C. apresentando. e para a manutenção da paz e da ordem no ambiente jurídico. desejável ou indesejável”. quem age por ouvir dizer. pois. matemático e filósofo francês. descrito no original de 1637 na obra Discours de la Methóde como “puisque je doute. et que par conséquent mon être n’étoit pas tout parfait. Isto é. ergo cogito. se encontra em sua obra Discurso sobre o Método. a fim de consolidar seu posicionamento. Esta frase. age por ouvir dizer. quando este afirma que “quem sabe por ouvir dizer. Muitas vezes. devendo ela ser tomada como uma premissa tácita subjacente ao ordenamento jurídico. um raciocínio de um silogismo aristotélico. e nada mais é do que a célebre “dubito. aplicar as normas ao caso concreto. faisant réflexion sur ce que je doutois. e se ela está certa ou errada. o juiz. embora. que marca o princípio desenvolvido ele. Eis ai outro ledo engano. em essência. político e social. o que pode levar à injustiça. car je voyois clairement que c’étoit une plus grande perfection de connoître. pois se está escusando algo que afeta de forma direta. os alicerces de sua teoria e argumentação se encontram tão precários que ruem ante à mais débil brisa de raciocínio e argumentação. juiz Keen. a fim de rebater o M. para fundar o sistema conhecido como cartesianismo.Ele alude ainda que não deve haver “revisão judicial das normas legisladas. e. dar a cada um aquilo que lhe é devido por direito. quando abandonou os princípios tradicionais da filosofia do magister dixit. je m’avisai de chercher d’où j’avois appris à . puisque je pense. uma vez que este Poder é responsável por analisar os casos que lhe são apresentados. requisitando ao Poder Legislativo que a altere caso ela contenha algo que seja indesejável para o bem comum da sociedade. é corrupto” (citação proveniente de informação verbal). ao dizer “Se nós não sabemos a finalidade do § 12 – A. logo existo -. ou escolástica. célebre físico. mas que permite uma análise séria e pertinente.. segue um trecho do original. por volta do século V a. Isto é ainda mais grave na esfera judiciária.… O desconhecimento dos propósitos daquela norma. A nível de mera complementação. não se preocupam com a finalidade e o propósito de determinado elemento legal. e dos motivos que levaram à sua formação. em sua notória frase. 3 O excelentíssimo senhor juiz Keen apela ainda para a analogia. ergo sum” (DESCARTES apud MORENTE 1967) 4 – eu duvido. impossibilitam uma análise ampla e dinâmica de sua aplicabilidade [e das formas de se aplicá-la]. j’existe”. logo penso. emitir pareceres à respeito. je pense. assim como qualquer cidadão [se não mais ainda que estes] pode e deve avaliar a moralidade de uma lei. as pessoas. como fica evidente. afinal. se ela está certa ou errada. seu modo de agir e viver. tal como já evidenciado por Sócrates. como podemos dizer que haja uma possível lacuna nele?”. dotando-se de um caráter vulgarmente chamado de ‘curiosidade’. sem dúvida uma omissão que fere sobretudo o indivíduo e a sociedade. é deliberar acerca do que fazer com os acusados. ao alegar que a questão que se impõe ao tribunal. sobre o caso em questão. é . Ele corrobora a si mesmo. busca aplicar a lei ao caso concreto que se apresenta ao tribunal. qui fût Dieu. portanto. dada sua clareza e autoafirmação. o que possibilitará dar a cada um aquilo que lhe pertence”7 O juiz Keen confirma a sentença condenatória dos acusados. et je connus évidemment que ce devoit être de quelque nature qui fût en effet plus parfaite. sobre as implicações futuras de o judiciário criar exceções interpretativas à aplicação da legislação. em similitude com o juiz Foster. diga-se de passagem. desde que tais exceções e interpretações se deem com equidade.” Seguindo esta linha de pensamento. (…) C’est à dire. Pode-se dizer. que deve ser uma premissa daqueles da lide judiciária. e cujo cargo lhes dá a incumbência de decidir o que deve suceder aos acusados. e apresenta as minúcias dos votos da turma de juízes que se manifestaram. E. que era Deus. uma vez que eles são funcionários públicos que devem primar pelo bem-estar social. eu percebi que dessa reflexão concluía a existência de algo mais perfeito que eu era. (…) Para ser dito em uma palavra. será a elaboração de sentenças mais justas.” “A seguir. mediante a expedição de uma sentença condenatória ou absolvedora. a refutação dos argumentos e perspectivas levantados pelo meritíssimo senhor juiz Keen é evidente. e eu claramente percebi que essa percepção vinha de uma natureza que era de fato mais perfeita [que a minha].5 VOTO DO JUIZ HANDY O juiz Handy inicia seu texto com uma crítica ao legalismo exacerbado apresentado por seus colegas. e incontestável. pour m’expliquer en un mot. o que fará com que “o Direito vá ao encontro da Justiça. esta contestação. Perpassando ainda por outra preocupação evidenciada pelo M. e sua razão de ser. pois esta refutação evoca ‘o pensar’. e age em uma postura condizente com o cargo que ocupa. isonomia e moralidade. simples. e que por conseguinte meu ser não era absolutamente perfeito. porque eu via claramente que era perfeição maior conhecer do que duvidar. e que deu início aos atos praticados. pode-se afirmar categoricamente que as consequências disto. e com a sabedoria que se espera de um alto dignitário do Poder Judiciário. é sim dotada de inquestionável irrefutabilidade. e da humanidade como um todo. 2.penser à quelque chose de plus parfait que je n’étois. que o juiz Handy. e alega que sua postura nada mais é que o fiel e estrito cumprimento à norma legislada. Ele preza ainda por uma análise da natureza jurídica do contrato celebrado entre os acusados. fazendo a reflexão sobre o fato de que eu duvido. sendo que esta é a causa final do Direito. O magistrado defende ainda que a problemática que pertine a eles. juiz Keen. mas dotada de primazia. deveras básico. a eficiência no cumprimento das atribuições. Esta colocação se confirma com a premissa defendida como justa. que serve para governar as relações humanas. leva à perda da perspectiva geral. para o meritíssimo senhor juiz Handy. O juiz Handy defende ainda que é apenas mediante uma postura reflexiva. para ele. Isto prova que não é a norma que rege a sociedade e as relações humanas. faz-se necessário que o governo. Outro aspecto. e a interpretação sistêmica e dinâmica da lei. O M. dentre o leque de opções dos meios de que dispõe . para quem o gestor modelo é aquele capaz de de adaptar os procedimentos ao caso concreto. em sua forma literal) que estabelece o governo dos homens. o fato de que “o governo é um assunto humano. Nisto nota-se que a postura humana e o que dela provém é [e deve ser] passível de interpretação. e para que ela seja justa e equânime. que também contribui para com o enunciado supra. as relações humanas que determinam as leis. mas sim. o excelentíssimo senhor juiz Handy. Ele destaca ainda que. e estes compõe apenas parte do todo. o que ele expõe de forma simples. para que este governo se dê de forma correta. e a condizência com o senso comum. No que pertine à interpretação. ao tentar se focar constantemente na norma legislada. quais são os mais adequados para se obter os resultados pleiteados. e não no campo da abstração. o que mitiga a essência do processo e da justiça. mas sim a interpretação humana da mesma. e capaz se selecionar. que é a adequação da regra ao caso concreto. mas por outros homens”. Não é a lei ad litteram (literalmente. compreendam e externem os sentimentos e concepções do povo. ou seja. é o fato de que o judiciário se abstém a analisar alguns fatos. de modo que a abstração é necessária para o efetivo efeito positivo da norma. tem-se a argumentação do magistrado. Em uma comprovação desta postura. e que os homens são governados não por palavras sobre o papel. e que esta deve ser exercida na realidade humana vivenciada. as formalidades e os conceitos abstratos constituem apenas instrumentos a serem empregados para se alcançar a justiça. Em face do exposto acima.uma questão de sabedora prática. focar-se no tratamento destes elementos por um tempo considerável. com a expressão “[…] bem governados […]” (Grifo nosso). Seguir tal metodologia de procedimento apresenta como vantagens. que se pode manter a flexibilidade necessária para a manutenção das ações em . senhor juiz Handy expõe outro fator relevante que tem sido o foco a priori do caso. O mesmo se evidencia na aplicação das leis. íntegra e louvável. se distanciando assim do real. Sendo que. os governantes e as leis. afirma que “sempre que houver regras e princípios abstratos […] os juristas poderão fazer distinções […] (‘sendo’) um mal necessário que une todo regulamento formal das condutas humanas”. e sua adequação às relações humanas que se evidenciam na concretização dos fatos. o juiz Handy afirma ainda que o Poder Judiciário é o que “tem maiores possibilidades de perder o contato direto com o homem comum”. razão pela qual povo e governo devem estar sempre unidos. Prova disto tem-se em sua expressão de que o fato de o tribunal declarar os exploradores inocentes não os coloca em um impasse capcioso no hemisfério jurídico-social. Juiz Keen. política e econômica. tanto no campo da filosofia. e desprovido de interesses que não sejam o de fazer a justiça e de se estabelecer uma equidade. ao dizer que “mais governos foram aniquilados e miséria humana mais intensa foi causada pela ausência deste acordo entre governantes e governados do que por qualquer outro fator que se possa discernir na história”. O juiz Handy ressalta também outro ponto importante. e tampouco requer o emprego de uma interpretação normativa contrária ao procedimento do tribunal. contudo sem tolher-lhe o discernimento e a capacidade de julgo. por possíveis fundamentos de que ela é emotiva. Sr. ainda no preâmbulo do mesmo. verdadeiro. em sua suprema maioria. analítico e sistêmico. A preocupação com a opinião pública também tem lugar no pensamento do magistrado. que geraram na sociedade esta opinião em sentido de absolver os acusados. Sr. O magistrado Handy defende ainda que. Juiz Foster. caso seja necessária uma esmiuçada demonstração da linha de raciocínio empregada. juntamente com os costumes. Da forma em que foram apresentados. Isto se encontra arrazoado na passagem em que ele defende a obviedade da postura a ser adotada pelo tribunal para manter a opinião do mesmo e a opinião pública em um patamar digno e razoável na escala de valores e da decência. pois estas duas vertentes do Direito não se excluem. ocorreria a absolvição dos acusados]. e no do direito. quando há uma cisão entre o povo e aqueles que dirigem sua vida jurídica. sendo que. Juiz Foster. Ele também atenta para o fato de o caso possuir uma vasta repercussão pública. Sr. e defende seu uso [destaca-se que caso fosse empregado o julgo do senso comum para o caso. quanto no da ciência política. que é o fato de o Estado existir para servir ao povo. e ainda leva em consideração o senso comum. e tampouco do direito positivo apregoado pelo M. favorável à absolvição dos acusados. . De forma análoga ocorre com o Direito. e mais detalhadamente em seu capítulo III. Este elo entre governantes e governados evidenciado no enunciado supra é facilmente comprovado por Niccolò Machiavelli em sua obra Il Principe – O Príncipe –8. O meritíssimo juiz Handy apresenta ainda em seu texto a facilidade com a qual o caso pode ser encarado e resolvido mediante o pensamento crítico. Ele faz ainda uma importante reflexão sobre esta temática.condizência com os sentimentos e com a vontade da sociedade que está submetida à autoridade estatal que os funcionários do judiciário [e dos demais poderes] representam. alicerçado em um pensamento filosófico sólido. Contestando toda e qualquer possibilidade de discordância para com sua postura de acolher a opinião pública. mas se complementam de forma intrínseca. não se pode aproveitar nada do direito natural defendido pelo M. e que a opinião social é. pode-se aproveitar com louvor a segunda parte do voto do M. há a destruição da sociedade. também é citada. mediante sua postura. e não o seguimento da regra legislada. o magistrado desfralda algo óbvio e imprescindível. no bom senso). literal e pétreo da norma legislada. Ele ainda alega que. Sr. que. e nem o corrompe de forma alguma. O Exmº. o tribunal condenar e o chefe do Executivo conceder clemência. a preocupação com o que se pode considerar do magistrado. valendo-se de seus conhecimentos. isto não deve ser um elemento de refreio à execução da Justiça. portanto. para que o corpo do júri se remisse de suas atribuições. a emotividade. com isto. ao afirmar que o júri não tomou tal postura. e salienta que as praxes. e ainda assim se alcançar a Justiça ao final. principalmente. Ele prova. que é a possibilidade de o chefe do Poder Executivo não conceder o perdão aos acusados ou não proceder à substituição da pena. na moral. Não há nenhum senso. podem estar presentes nos processos e nas decisões. Juiz Handy atenta também para um fator de risco menosprezado pelos demais magistrados. e. pois o foco de um tribunal deve ser a Justiça. o juiz Handy afirma que “a verdade será conhecida e que qualquer consideração racional referente às possíveis soluções do caso será tomada em consideração”. é uma preocupação com os assuntos errados.caprichosa e capciosa. Em se tratando do poder de clemência do Poder Executivo. no senso comum. caso tivesse sido informado ao júri que as condições a que os acusados estavam sujeitos não constituíam defesa à acusação de homicídio. pelo fato de seu portavoz ser um advogado. nem os escusava da pena capital. e mesmo que se externassem. O M. com sutileza pelo magistrado. valendo-se do senso comum para fundamentar sua decisão. A manipulação da norma. que tomar a opinião pública não exclui a racionalidade do processo. o erro. De forma ainda mais primorosa. nos costumes. ao externar a possibilidade de o representante do Ministério Público decidir fora do tribunal o destino dos acusados. ele diz ainda que se preocupar em seguir estritamente em observância à norma escrita. Sr. e que portanto ela pode e deve ser alterada para atender às necessidades do povo. pois o Direito é uma ciência humana. é passível de falhas. a pessoalidade e as informalidades. O juiz Handy expõe ainda que. não deve ser um impedimento para que ele realize aquilo que é justo. erros e interpretação. Entretanto. Juiz Handy apela ainda para o senso comum e para os costumes. Isto encontra-se fundamentado no fato de que a lei existe para servir à sociedade. e. caso o . o magistrado expõe que mesmo ante os rígidos padrões que imperam no antro jurídico. Ele afirma ainda que. nada mais é do que uma forma de se proceder ao cumprimento estrito. formalidades e repercussões jurídicas raramente se externam para a sociedade. lógica e sentido que um Poder Estatal condene os acusados para que outro os ‘absolva’ [conceda clemência] (pode-se inferir que tal colocação se funda na lógica. este teria procedido à interpretação ou até mesmo repúdio da norma. buscou o subterfúgio da oratória e da dialética. Vale ressaltar aqui que ainda há a possibilidade de clemência do Poder Executivo. Cabe destaque que. segue transcrita infra (HANDY in FULLER 1999): “O mundo não parece mudar muito mas desta vez […] se trata […] da vida ou morte de quatro homens que já sofreram mais tormentos e humilhações do que a maioria de nós suportaria em mil anos” O juiz Handy conclui que os réus são inocentes do crime de que são acusados. que é uma análise conjunta do caso. tampouco que soma.6 MANIFESTAÇÃO DO JUIZ TATTING Foi aberta nova possibilidade para que o M. Por tais razões. tendo em seus termos finais a estipulação da data da execução e a forma como deve transcorrer. O M. Uma ação audaz e absolutamente íntegra e louvável é inovação proposta pelo juiz Handy. portanto. e defende que a sentença seja alterada. É admirável a consideração feita pelo juiz Handy antes de declarar explicitamente seu voto. apreciar um caso e emitir juízo de valor acerca dele. que ele deixa de ser verdadeiro e importante. terminando este. . Juiz Handy apela ainda a uma crítica sagaz à postura adotada por seu colega Keen. alegando que sua convicção de não participar do julgamento se encontrava ainda mais consolidada 2. O magistrado também vale-se da analogia e da jurisprudência.7 CONCLUSÃO DO CASO Frente à divisão do tribunal. pelo caráter ético e humanístico dela. não sabe se os réus foram executados. a democracia.tribunal os julgue culpados. muito embora ela não seja algo que diminua. mas esta questão não é abordada por Fuller no livro. não é porque um fato não é dotado de formalidade. Isto é relevante. entre os Poderes Executivo e Judiciário. e a sociedade como um todo. e consequente empate nos votos. encontra. mas sim multiplica. Algo inovador que é apresentado pelo juiz Handy é a consideração de fatos informais. fica mantida a decisão do tribunal da instância inferior. com a sentença. 2. Sr. contudo barreira na rigidez dos demais juízes em ceder a uma alternativa como esta. sendo que. são atitudes como esta que aprimoram o sistema estatal. o leitor. para endossar suas posições. pois. Sr. devendo-se proceder à execução dos réus. Esta ação proposta por ele. mas ele novamente declinou. ou se foram agraciados com a clemência do Poder Executivo. a impressão moralista e rígida defendida por este é destituída. considerando a culpa ou inocência dos envolvidos. Juiz Tatting se manifestasse. com esta crítica. pois cabe única e exclusivamente ao Poder Judiciário. Isto é pertinente. em reexame à posição anteriormente assumida pelo mesmo. liberdade. 2003 BITTAR. Curso de Filosofia do Direito. neste caso. é evidente que a norma. da ética. A. Trad. 3.… As fontes do direito. poder. correta compreensão e aplicabilidade crítica em um estudo da obra. para se adequar ao caso concreto e poder assim gerar efeitos em favor da equidade. Guilherme Assis de. análise.. Carlos Nelson Coutinho. 1988. Isto se erige fundamentalmente no estado em que se encontravam. é ineficaz. é a distinção entre legalidade e justiça. Norberto. têm papel de destaque na obra de Fuller. tal como está escrita. relações públicas. BONAVIDES. justiça. Há ainda. 1995. Campus. imperando estado de natureza e estado de direito. B. por si só. tanto da natureza humana quanto da natureza jurídica fica evidente ao se analisar com mais acuro os votos dos magistrados.3 CONCLUSÃO O Caso dos Exploradores de Cavernas é uma obra ficcional criada por Fuller. necessidades humanas. 2009 BOBBIO. como a absolvição dos acusados. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. em gerar o justo. . a concessão da clemência. assim como a analogia. São Paulo: Malheiros. REFERÊNCIAS BIGNOTTO. e que requer interpretação. posturas éticas. Era dos Direitos. etc.… e sobre os mais diferentes enfoques e argumentações. e de muitos outros temas que permeiam o universo jurídico e social simultaneamente. há. silogismos. Teoria do Estado.ed. a substituição desta. ALMEIDA. A desvirtuação de princípios fundamentais. campo para diversas linhas de argumentação. uma primazia pela absolvição dos réus. da moral. relações sociais. e os princípios gerais do direito. passível de ser travado neste contexto. Paulo. e constituem um desafio à parte no que se refere à sua assimilação. lei. e afins. como a noção de direito.. Eduardo C. mediante o exposto. A filosofia no campo jurídico também se evidencia de forma nítida e com especial destaque. e na inexigibilidade de conduta diversa. a condenação dos mesmos. a manutenção da pena. relações privadas. Tal como fica implícito no decorrer deste. São Paulo: Editora Atlas S. Rio de Janeiro. direito positivo e direito natural. que possibilita um amplo debate acerca do ordenamento jurídico. Há também a possibilidade de se confrontar diversos elementos em uma análise desta obra literária. Um dos debates mais profundos. Maquiavel. Newton.. Nesta obra. no livro. a pena capital e penas alternativas. da postura dos poderes públicos e de seus representantes. 1996. São Paulo: Martins Fontes. Sérgio. Níccolò. Maquiavel.: Livraria do Advogado. s. PAIVA. Lon L. Alexander. Porto Alegre: EDIPUCRS. 1967 NIVALDO. Trad. Nicolau.l. Belo Horizonte: Del Rey. Direito Discursivo. s. Alessandro. René. José. 1996. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 1814. São Paulo: Martins Editora. 2003 DAMÁSIO. 7. s. Direito Positivo. 2004. Liberdade para além do Estado em Thomas Hobbes: o rei nú em busca da equidade soberana (ou do homem à máquina e da máquina ao homem: a liberdade como reino da Ética). Teoria Crítica do Direito. São Paulo: Martin Claret.COELHO. O Conceito de Liberdade no Leviatã de Hobbes. Leviatã. Tomás Antônio. HOLLERBACK. Coimbra: Universidade de Combra. Andityas Soares de Moura Costa. Razão e o Cérebro Humano. 1999 GONZAGA. 7. Elementos de Direito Natural ou de Philosophia de Direito. Italia. Manuel García. Keila. p. 2002 VOLTAIRE. HOBBES. Maquiavel & O Príncipe. Filosofia do Direito e Justiça na obra de Hans Kelsen. 2006 FULLER. Campinas-SP: SAFE.d. São Paulo. Trad. GRINBERG. Curso de Filosofia: lições preliminares. Discurso do Método. São Paulo: Martins Fontes.l. MATOS. ROUSSEAU. 1994 NOTAS . 1850 PINZANI. Tratado sobre a tolerância: a propósito da morte de Jean Calas. Luiz Fernando. 2004. Vicente Ferrer Neto. 2004 HECK. António R. Jean-Jacques. 2008 MACHIAVELII. Tratado de Direito Natural. Cláudia Berliner. Direito Natural. O Príncipe. Luis Afonso. Do Contrato Social: princípios do direito político. O Erro de Descartes: Emoção. MAQUIAVEL. São Paulo: Martins Fontes. Thomas. p. Belo Horizonte: Del Rey.: Edições 70. São Paulo : Mestre Jou. Companhia das Letras. O Caso dos Exploradores de Cavernas. 2000 WOLLMANN.com. 2006 MORENTE. Maria Júlia Goldwasser. Rafael Augusto. São Paulo: rafaeldeconti. 2010 DESCARTES. São Paulo: RT. o Poder. DE CONTRI. s. Il Principe.l. O Príncipe. 7. 1996. São Paulo: Martins Fontes. 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