Caderno de Farmacologia

March 22, 2018 | Author: Leonardo Alves F Almeida | Category: Receptor (Biochemistry), Receptor Antagonist, Action Potential, Autonomic Nervous System, Acetylcholine


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Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137A UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS Faculdade de Medicina Leonardo Martins Caldeira de Deus – MED 137 Belo Horizonte 2/ 2010 2 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo III – Como Agem os Fármacos: Princípios Gerais LIGAÇÃO DAS MOLÉCULAS DOS FÁRMACOS ÀS CÉLULAS Um dos princípios básicos da farmacologia afirma que as moléculas dos fármacos precisam exercer algumas influências químicas sobre um ou mais constituintes das células para produzir uma resposta farmacológica. Para isso, as moléculas do fármaco precisam “ligar-se” a constituintes específicos de células ou tecidos para produzir um efeito, a resposta fisiológica (principal foco de pesquisa na farmacologia). Alvos Protéicos para Ligação de Fármacos Há quatro tipos principais de proteínas reguladoras que normalmente atuam como alvos farmacológicos primários:  Receptores;  Enzimas;  Moléculas carregadoras (transportadoras);  Canais iônicos. Receptores Farmacológicos O termo receptor geralmente indica uma molécula de reconhecimento para um mediador químico. Contudo, nenhum fármaco é completamente específico em sua ação e, em muitos casos, ao aumentar a dose de um fármaco, a substância pode afetar outros alvos além de seu alvo principal, e esse efeito pode levar ao aparecimento dos efeitos colaterais. Especificidade dos Fármacos Para que um fármaco seja útil como instrumento terapêutico ou científico, ele precisa agir de modo seletivo sobre células e tecidos específicos, ou seja, precisa exibir um alto grau de especificidade pelo sítio de ligação. Contudo, é preciso enfatizar que nenhum fármaco age com especificidade total e, em geral, quanto menor a potência de um fármaco, maior será a dose necessária e, conseqüentemente, maior a probabilidade de que outros sítios de ação, diferentes do sítio primário, ganhem importância. De modo inverso, as proteínas que 3 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 funcionam como alvos de fármacos geralmente mostram um alto grau de especificidade pelo ligante, elas conhecerão apenas os ligantes de um tipo específico e ignorarão as moléculas muito semelhantes. Interação Fármaco-Receptor, Agonistas Parciais e Conceito de Eficácia A ligação e a ativação de um receptor representam duas etapas distintas da geração de uma resposta mediada por receptor iniciada por um agonista. O fármaco que se liga a um receptor sem causar sua ativação e, como conseqüência disso, impede que um agonista se ligue a esse mesmo receptor, recebe a denominação de antagonista. A tendência de um fármaco de se ligar aos receptores é governada por sua afinidade, ao passo que a tendência de um fármaco de, uma vez ligado, ativar o receptor é indicada pela sua eficácia. Dessa forma, os agonistas possuem alta eficácia, enquanto os antagonistas apresentam eficácia zero (e = 0). Os fármacos que apresentam níveis de eficácia intermediários (0 < e < 1), ou seja, que desencadeiam uma resposta tecidual submáxima mesmo quando 100% dos receptores estão ocupados, são conhecidos como agonistas parciais, e se distinguem dos agonistas plenos, cuja eficácia é suficiente para desencadear uma resposta tecidual máxima (e = 1). Ligação dos Fármacos aos Receptores A resposta biológica resultante da ligação de um fármaco ao receptor pode ser representada na forma de uma curva concentração x efeito (ou dose x resposta). Nela é possível estimar a resposta máxima produzida por um fármaco (E max ) e a concentração necessária para produzir 50% da 4 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 resposta máxima (CE 50 ). O CE 50 permite comparar a potência entre drogas, ou seja, a capacidade da droga de causar uma alteração funcional que pode ser quantificada (↓CE 50 » ↑Potência). A curva concentração x efeito não pode ser utilizada para medir a afinidade de fármacos agonistas a seus receptores, pois a resposta fisiológica produzida não é, via de regra, diretamente proporcional à ocupação dos receptores. Para essa finalidade existem as curvas concentração x ligação específica, que se relaciona diretamente com a afinidade. Ativação Constitutiva de Receptores e Agonistas Inversos A literatura descreve exemplos de receptores com ativação constitutiva, ou seja, receptores que são ativados mesmo na ausência de ligantes. Como exemplo, pode-se citar os receptores para benzodiazepínicos, canabinóides, serotonina e alguns outros mediadores. Em condições normais, essa atividade pode ser baixa o suficiente para não tornar os efeitos evidentes. Contudo, situações patológicas acompanhadas pelo aumento desses receptores podem torná-la muito significativa. Nesse contexto são inseridos ao agonistas inversos, drogas com a capacidade de reduzir a ativação constitutiva. Os agonistas inversos podem ser considerados fármacos com eficácia negativa (e < 0) , o que os diferencia dos agonistas (e > 0) e dos antagonistas (e = 0). Modelo de Dois Estados do Receptor A hipótese dos dois estados postula um equilíbrio dinâmico entre a forma inativa de um receptor (R) e a forma ativa do mesmo (R*): R ⇄ R* 3 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Dessa forma, pode-se considerar a eficácia como uma propriedade determinada pela afinidade relativa de um ligante por R ou R*, onde os agonistas deslocam o equilíbrio no sentido de R*, os antagonistas não deslocam o equilíbrio e os agonistas inversos deslocam no sentido de R. ANTAGONISMO FARMACOLÓGICO Antagonismo Químico Consiste na interação entre duas substâncias em solução, resultando em inativação do efeito farmacológico do agonista. Um exemplo é o uso de agentes quelantes para reduzir a toxicidade de metais pesados e o uso de protamina para inativa a heparina (reação ácido- base). Antagonismo Farmacocinético Consiste na situação em que o antagonista reduz de modo efetivo a concentração do fármaco ativo em seu sítio de ação, seja por aumentar a taxa de metabolização ou de excreção renal, ou por reduzir a velocidade de absorção do fármaco pelo trato gastrointestinal. Antagonismo por Bloqueio de Receptores Esse antagonismo envolve dois mecanismos importantes: a) Antagonismo Competitivo: Situação comum na qual um fármaco se liga de modo seletivo a um tipo específico de receptor sem ativá-lo, mas impedindo que um agonista se ligue a ele. Nessa classificação podem-se separar dois grupos, o antagonismo competitivo reversível e o antagonismo competitivo irreversível. 6 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 No antagonismo competitivo reversível verifica-se uma competição química pela ligação ao sítio de ligação do receptor. Portanto, trata-se de um antagonismo superável, uma vez que é possível restaurar a ação do agonista apenas com o aumento de sua concentração. Na curva com esse tipo de antagonismo é possível observar algumas características que sempre se repetem, como o desvio da curva do logaritmo para a direita sem alteração da inclinação ou do valor máximo e a relação linear entre a razão de dose do agonista e a concentração do antagonista. Já no antagonismo competitivo irreversível, o antagonista se dissocia muito lentamente, ou mesmo não se dissocia (ligação covalente) do receptor. b) Antagonismo Não-Competitivo: Consiste na situação em que o antagonista bloqueia, em algum ponto, a cadeia de eventos que leva à produção de uma resposta pelo agonista. Via de regra, o efeito será o de reduzir a inclinação e o valor máximo da curva concentração x resposta (semelhante ao antagonismo competitivo irreversível), embora possa ocorrer também algum grau de desvio para a direita. Antagonismo Fisiológico Descreve a interação entre dois fármacos, cujas ações opostas no organismo tendem a se anular mutuamente. Um exemplo é a histamina que estimula secreção ácida, enquanto o omeprazol inibe a bomba de prótons. 7 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 DESSENSIBILIZAÇÃO E TAQUIFILAXIA Esses dois termos são sinônimos e utilizados para descrever a diminuição do efeito de um fármaco, que muitas vezes se desenvolve em minutos. Já a tolerância é empregada em situações semelhantes, mas que levam dias ou semanas para se desenvolver. Muitos mecanismos diferentes podem dar origem a esse tipo de fenômeno, como: a) Alteração nos Receptores: ocorre por meio de alteração conformacional do receptor ou por fosforilação de regiões intracelulares de proteínas (principalmente a proteína G). b) Perda de Receptores: a exposição prolongada a agonistas muitas vezes causa uma diminuição gradual do número de receptores expressos na superfície das células, como conseqüência da internalização desses receptores (endocitose). c) Depleção de Mediadores: ocorre depleção de uma substância intermediária essencial. d) Alteração no Metabolismo do Fármaco: a administração repetida de um fármaco pode aumentar o ritmo de degradação metabólica. e) Adaptação Fisiológica: Pode ocorrer diminuição do efeito de um fármaco quando esse efeito é anulado por uma resposta homeostática 8 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo IV – Como Agem os Fármacos: Aspectos Moleculares ALVOS PARA AÇÃO DE FÁRMACOS Os principais alvos protéicos para ação de fármacos são receptores, canais iônicos, enzimas e moléculas carregadoras. Contudo, existem exceções para o alvo de alguns fármacos, como a colchicina, que interage com a proteína estrutural tubulina, e ciclosporina, imunossupressor que interage com proteínas citosólicas conhecidas como imunofilinas. Receptores São os elementos sensores no sistema de comunicações químicas que coordenam a função de todas as diferentes células do organismo. Canais Iônicos Alguns canais iônicos incorporam um receptor e se abrem apenas quando o receptor é ocupado por um agonista; outros são regulados por mecanismos diferentes, sendo particularmente importantes os canais iônicos controlados por voltagem. A interação pode ser indireta, envolvendo uma proteína G e outros intermediários, ou direta, onde o próprio fármaco liga-se à proteína do canal e altera sua função. Enzimas Freqüentemente a molécula do fármaco é um substrato análogo que age como um inibidor competitivo da enzima; em outros casos, a ligação é irreversível e não-competitiva. Os fármacos podem também agir como falsos substratos, onde a molécula do fármaco sofre transformações químicas, dando origem a um produto anômalo que perturba a via metabólica normal. Moléculas Transportadoras Trata-se de proteínas carregadoras, cuja finalidade é o transporte de íons e pequenas moléculas orgânicas através das membranas celulares. As proteínas transportadoras incorporam um sítio de reconhecimento que as tornam específicas para uma espécie particular a ser transportada, e estes sítios de reconhecimento podem também ser alvos para fármacos cujo efeito é bloquear o sistema de transporte. 9 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 PROTEÍNAS RECEPTORAS Tipos de Receptores a) Receptores Ionotrópicos: trata-se de um canal para íons ativado por ligante. Dentre os quais, pode-se citar o receptor nicotínico da acetilcolina, o receptor GABA A e receptores de glutamato NMDA, AMPA e cainato. b) Receptores Metabotrópicos: são receptores acoplados a proteína G. Dentre os quais, pode-se citar o receptor muscarínico da acetilcolina, receptores adrenérgico e receptores de quimiocinas. c) Receptores Ligados a Quinases: apresenta um domínio extracelular de ligação para o ligante conectado a um domínio intracelular de natureza enzimática (quinase). Dentre os exemplos, pode-se citar o receptor para insulina e para os fatores de crescimento. d) Receptores Nucleares: são receptores que regulam a transcrição gênica e, muitas vezes, estão presentes no citoplasma. Dentre os exemplos, pode-se citar os receptores para hormônios esteróides. Receptores Ionotrópicos Estrutura Molecular Estas moléculas têm traços estruturais em comum com outros canais iônicos. C recepLor nlcoLlnlco da aceLllcollna e formado por uma unldade penLamerlca (α 2 , β, γ e δ) com dois sítios de ligação para a aceLllcollna necessárlos para a aLlvação do recepLor. Cada subunldade aLravessa a membrana quaLro vezes, de modo que o canal compreende no mlnlmo 20 hellces que aLravessam a membrana clrculando um poro cenLral. Cuando as moleculas de acetilcolina se ligam, as subunidades α rotacionam, promovendo a aberLura do canal. 10 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Mecanismo de Comporta Os receptores deste tipo controlam os eventos sinápticos mais rápidos do sistema nervoso. A velocidade abrupta desta resposta significa que o acoplamento entre o receptor e o canal iônico é direto. É válido ressaltar que não há etapas bioquímicas intermediárias envolvidas no processo de transdução. Receptores Metabotrópicos Muitos neurotransmissores, com exceção dos peptídeos, podem interagir tanto com os receptores metabotrópicos quanto com os receptores ionotrópicos, permitindo que a mesma molécula produza uma ampla variedade de efeitos. Estrutura Molecular A estrutura característica dos receptores acoplados à proteína G compreende uma sete α-hélices transmembrana, semelhantes àquelas dos canais iônicos, com um domínio N- terminal extracelular de tamanho variável e um domínio C-terminal intracelular A terceira alça citoplasmática longa é a região da molécula que se acopla à proteína G. Mecanismos Alternativos de Ativação dos Receptores Embora a ativação dos receptores metabotróbicos seja normalmente a conseqüência da ligação com um agonista, ela também pode ocorrer através de outros mecanismos. Um exemplo é os Receptores Ativados por Proteases (PAR). Muitas proteases, como a trombina ativam os PARS removendo a extremidade da cauda N-terminal extracelular, sendo que os resíduos expostos funcionam como um “agonista aprisionado”. Uma conseqüência deste tipo de ativação é que o receptor pode ser ativado somente uma vez, porque a clivagem não pode ser revertida, de onde há necessidade de ressíntese contínua da proteína receptora. 11 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Proteína G e sua Função As proteínas G englobam uma família de proteínas residentes na membrana cuja função é reconhecer os receptores metabotrópicos ativados e transmitir a mensagem para os sistemas efetores que geram uma resposta celular. As proteínas G consistem em três subunidades: α, β e γ. No estado de repouso, a proteína G aparece como um trímero αβγ com o GDP ocupando o sítio na subunidade α. Quando um receptor metabotrópico é ativado por uma molécula agonista, ocorre uma mudança conformacional envolvendo o domínio citoplasmático do receptor, levando-o a adquirir uma alta afinidade para αβγ. A associação de αβγ com o receptor força a dissociação do GDP ligado e sua substituição por GTP, o que, por sua vez, causa a dissociação do trímero da proteína G, liberando a subunidade α-GTP e βγ. Essas são as formas ativas da proteína G, que se difunde na membrana e podem se associar a diversas enzimas e canais iônicos, causando a ativação do alvo. A associação das subunidades α com enzimas-alvo pode causar ativação ou inibição, dependendo de qual proteína G esteja envolvida. A sinalização é concluída quando a hidrólise de GTP para GDP ocorre pela atividade de GTPase da subunidade α. O α-GDP resultante então se dissocia do efetor e se religa com βγ. A regulação da atividade GTPase pela proteína efetora significa que a ativação do efetor tende a ser autolimitante. Há quatro classes principais de proteínas G (Gα s , Gα i , Gα o e Gα q ) de importância farmacológica. Esses subtipos apresentam seletividade com respeito aos receptores e aos efetores com os quais eles se acoplam. 12 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Subtipos Efeitos Principais Gα s Estimula a adenilil-ciclase, aumentando a formação de AMPc. Gα i Inibe a adenilil-ciclase, diminuindo a formação de AMPc. Gα o Efeitos limitados da subunidade α (os efeitos devem principalmente às subunidades βγ). Gα q Ativa fosfolipase C, aumentando a produção do IP 3 e DAG. Alvos das Proteínas G a) Sistema adenilil-ciclase/ AMP O AMPc é um nucleotídeo sintetizado no interior da célula a partir do ATP, pela ação de uma enzima ligada à membrana, a adenilil-ciclase. Ele é um segundo mensageiro produzido continuamente e inativado por hidrólise através da ação de uma família de enzimas conhecidas como fosfodiesterases. Muitos fármacos atuam nos receptores metabotrópicos aumentando ou diminuindo a atividade catalítica da adenilil-ciclase, e assim elevando ou diminuindo a concentração de AMPc dentro da célula. O AMPc regula muitos aspectos da função celular, como ativação de proteína quinases, que regulam a função de muitas proteínas celulares diferentes pelo controle da fosforilação protéica.Caso ocorra a ativação de um receptor ligado a Gα i , ocorrerá inibição da adenilil-ciclase. Além disso, esta enzima poder ser ativada diretamente por certos agentes, incluindo a forscolina e íons fluoreto. b) Sistema Fosfolipase C/ Fosfato de Inositol O PIP 2 (fosfatidilinositl-4,5-difosfato) é o substrato de uma enzima ligada à membrana, fosfolipase Cβ (PLCβ), que efetua sua clivaem em DAG (diacilglicerol) e IP 3 (inositol-1,4,5-trifosfato), os quais atuam como segundo mensageiro. A ativação da PLCβ por vários agonistas é mediada através de uma proteína Gα q . Posteriormente, DAG e IP 3 sofrem etapas de fosforilação e desfosforilação respectivamente, que culminam com a reciclagem do PIP 2 . Essa via pode ser inativada pelo metal Li. O IP 3 produzido se liga a um receptor específico, que é um canal de cálcio, no retículo endoplasmático, que favorece a liberação de Ca 2+ . Já o DAG ativa a proteína quinase C, uma enzima ligada à membrana, cuja função é catalisar a fosforilação de várias proteínas intracelulares. 13 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Receptores Ligados a Quinases e Receptores Correlatos Esses receptores medeiam as ações de uma ampla variedade de proteínas mediadoras, incluindo fatores de crescimento e citocinas, e hormônios como a insulina e a leptina, cujos efeitos são exercidos principalmente ao nível de transcrição gênica. A maioria desses receptores consistem em uma cadeia única com uma única região transmembrana helicoidal, associada a um grande domínio extracelular de ligação ao ligante, e um domínio intracelular de tamanho e funções variados. Eles têm um papel importante no controle da divisão, crescimento e diferenciação celulares, assim como na inflamação, reparação tecidual, apoptose e respostas imunológicas. Os principais tipos são: a) Receptores Tirosina Quinase (RTKs): esses receptores fosforilam resíduos de tirosina. Dentre os exemplos, pode-se citar receptores de crescimento e receptor de insulina. b) Receptores Serina/ Treonina Quinase: esses receptores fosforilam resíduos de serina e/ ou treonina. O principal exemplo é o receptor para o fator de transformação de crescimento (TGF). c) Receptores de Citocinas: esses receptores carecem de atividade enzimática intrínseca. Quando ocupados, eles se associam e ativam uma quinase citosólica, como a Jak. Dentre os exemplos, pode-se citar receptor para interferon. d) Receptor Associado à Guanilil- Ciclase: são similares aos RTKs, porém a porção enzimática é guanilil-ciclase uq estimula a formação de GMPc. O principal exemplo é o receptor para ANF. Mecanismos da Fosforilação Protéica e da Cascata das Quinases A fosforilação de proteínas é um mecanismo-chave para controlar a função de proteínas. Fosforilação e desfosforilação são realizadas por quinases e fosfatases, respectivamente Em muitos casos, a ligação do ligante ao receptor leva à dimerização. A associação dos dois domínios de quinases intracelulares permite que ocorra uma autofosforilação mútua de resíduos de tirosina intracelulares. Os resíduos de tirosina fosforilados servem então como 14 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 sítios de ancoragem de alta afinidade para outras proteínas intracelulares, que constituem o próximo passo na cascata de transdução de sinal. O resultado final é ativar ou inibir, via fosforilação, diversos fatores de transcrição que migram para o núcleo e suprimem ou induzem a expressão de determinados genes. Duas vias importantes são:  A via Ras/Raf/Proteína Ativada por Mitógenos (MAP) quinase, que é importante na divisão, crescimento e diferenciações celulares;  A via Jak/ Stat, ativada por muitas citocinas, a qual controla a síntese e a liberação de muitos mediadores inflamatórios. Receptores Nucleares A família inteira de receptores nucleares é tratada como fatores de transcição ativados por ligantes. Eles não estão inseridos em membranas, mas sim presentes na fase solúvel da célula, seja esta o citoplasma ou o nucleoplasma. Considerações Estruturais O domínio N-terminal apresenta alta heterogeneidade e se liga a outros fatores de transcriação específicos da célula, modificando a ligação ou atividade do próprio receptor. O domínio central é altamente conservado e apresenta estruturas denominadas dedos de zinco, cuja função é reconhecimento e ligação ao DNA. O domínio C-terminal contém o módulo de ligação ao ligante, e é específico para cada classe de receptor. CANAIS IÔNICOS COMO ALVOS DE FÁRMACOS Canais iônicos consistem em moléculas protéicas organizadas para formar poros contendo água que atravessam a membrana e podem mudar seu estade entre aberto e fechado. Eles são caracterizados por:  Seletividade por espécies particulares de íons, determinada pelo tamanho e pela natureza do revestimento do poro (pode ser seletivo para mais de um cátion!); 13 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137  Natureza do estímulo que controla a transição entre os estados aberto e fechado do canal;  Arquitetura molecular. Mecanismo de Comporta a) Canais Controlados por Voltagem: estes canais se abrem quando a membrana celular é despolarizada. Via de regra, a abertura (ativação) do canal é de curta duração, mesmo quando a despolarização é mantida. b) Canais Controlados por Ligantes: Correspondem ao receptores ionotrópicos. c) Canais de Liberação de Cálcio: estão presentes no retículo endoplasmático ou sarcoplasmático, e não na membrana plasmática (ex.: receptor de IP 3 ). d) Canais de Cálcio Operados pelas Reservas de Ca 2+ : quando as reservas intracelulares de Ca 2+ estão esgotadas, canais na membrana plasmática abrem-se para permitir sua entrada. Contudo, esse mecanismo não é bem elucidado. Farmacologia dos Canais Iônicos Os fármacos atuam em canais iônicos modulando alguns fatores, como:  Ligação a vários sítios da proteína do canal, bloqueando o canal ou afetando o mecanismo de comporta, para facilitar ou inibir a abertura do canal;  Ação indireta por meio receptores metabotrópicos, que atuam na fosforilação de aminoácidos na porção intracelular do canal, facilitando ou inibindo sua abertura. CONTROLE DA EXPRESSÃO DE RECEPTORES A regulação a curto prazo da função do receptor geralmente ocorre através de dessensibilização. Já a regulação a longo prazo ocorre através de aumento ou diminuição da expressão do receptor. O tratamento com fármacos a longo prazo invariavelmente induz respostas adaptativas que, particularmente com drogas que agem no sistema nervoso central, freqüentemente constituem a base para a eficácia terapêutica 16 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo V – Modo de Atuação dos Fármacos: Aspectos Celulares – Excitação, Contração e Secreção REGULAÇÃO DOS NÍVEIS INTRACELULARES DE CÁLCIO A maior parte do Ca 2+ na célula em repouso está retida em organelas, especialmente no retículo endoplasmático (RE) ou sarcoplasmático (RS) e nas mitocôndrias, uma vez que a concentração de Ca 2+ intracelular ([Ca 2+ ] i ) é algo em torno de 10 -7 M. Já concentração de Ca 2+ no líquido tecidual ([Ca 2+ ] e ) gira em torno de 2,4mM, havendo assim um grande gradiente de concentração que favorece a entrada de Ca 2+ . A [Ca 2+ ] i é mantida baixa por:  Mecanismos de transporte ativo que ejetam o Ca 2+ do citosol, através da membrana plasmática, e o bombeiam para o RE;  Pela normalmente baixa permeabilidade das membranas plasmática e do RE ao Ca 2+ . A regulação do [Ca 2+ ] i envolve três mecanismos principais:  Controle da entrada de Ca 2+ ;  Controle da extrusão de Ca 2+ ;  Movimento de Ca 2+ entre o citosol e os locais de armazenamento intracelulares. Mecanismos de Entrada de Cálcio Canais de Cálcio Regulados por Voltagem São canais altamente seletivos para o Ca 2+ (não conduzem Na + e K + ), que quando ativados por voltagem, permitem a entrada de quantidades substanciais de Ca 2+ na célula quando a membrana se despolariza. Eles estão distribuídos em cinco subtipos distintos (L, T, N, P, Q e R 1 ). Em geral, os canais L são importantes na regulação da contração dos músculos cardíaco e liso, os N (e também os P/Q) na liberação de neurotransmissores e hormônios, enquanto os T medeizm a entrada de Ca 2+ nos neurônios. Canais Regulados Por Ligantes A maioria dos canais de cátions regulados por ligantes que são ativados por neutransmissores excitatórios é relativamente não seletiva, conduzindo íons Ca 2+ e outros 1 L – longa duração, T – transitório, N – nem longa duração nem transitório, P, Q e R são os demais na ordem alfabética. 17 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 cátions. Nesse aspecto, o mais importante é o receptor de glutamato do tipo NMDA que apresenta uma permeabilidade ao Ca 2+ particularmente alta, sendo um contribuinte de grande importância para a captação de Ca 2+ pelos neurônios pós-sinápticos no SNC. A ativação desse receptor pode facilitar a entrade de Ca 2+ de tal forma que a célula morre (apoptose) por ativação de proteases dependentes de Ca 2+ (excitotoxicidade). Canais de Cálcio Operados por Armazenamento Estão localizados na membrana plasmática e se abrem para permitir a entrada de Ca 2+ quando as reservas no RE estão reduzidas. Mecanismos de Extrusão de Cálcio O transporte ativo de Ca 2+ para fora da célula, através da membrana plamática, e para dentro da célula, através da membrana do RE ou do RS, depende da atividade de uma ATPase dependente de Ca 2+ . O cálcio também é retirado da célula por um transportador Na + - Ca 2+ (sai 1Ca 2+ e entram 3Na + ) Nesse processo, transporte ativo secundário, o gradiente eletroquímico do Na + , e não a hidrólise de ATP, fornece a energia para a extrusão de Ca 2+ . Esse transportador também pode funcionar no sentido inverso, caso [Na + ] i aumente excessivamente. Mecanismo de Liberação de Cálcio Existem dois tipos principais de canais Ca 2+ na membrana de RE e do RS:  Receptor de Trifosfato Inositol (IP 3 R): é um canal iônico regulado pelo ligante IP 3 ;  Receptor de Rianodina (RyR): são ativados por uma pequena elevação na [Ca 2+ ] i , efeito conhecido como liberação de cálcio induzida por cálcio. A cafeína aumenta a sensibilidade dos RyRs ao Ca 2+ , causando sua liberação no RS mesmo em níveis basais da [Ca 2+ ] i . Papel das Mitocôndrias As mitocôndrias acumulam Ca 2+ passivamente, como resultado do potencial intramitocondrial, que é fortemente negativo em relação ao citosol. Essa negatividade é mantida pela extrusão ativa de prótons. Esse reservatório de Ca 2+ só é liberando em condições de hipóxia (↓[ATP]). 18 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Calmodulina O Ca 2+ controla funções celulares graças a sua habilidade de regular a atividade de diversas proteínas. Na maioria dos casos, uma proteína ligante de Ca 2+ serve de intermediária entre o Ca 2+ e a proteína funcional que esta sendo regulada. Das proteínas ligantes a mais conhecida é a calmodulina, um dímero que, quando apresenta os 4 sítios de ligação ao Ca 2+ ocupados, sofre uma alteração conformacional, expondo um domínio hidrofóbico que atrai e mantém unidas muitas proteínas, afetando assim suas propriedades funcionais. EXCITAÇÃO Corresponde à capacidade de uma célula em apresentar uma resposta elétrica regenerativa do tipo tudo-ou-nada em resposta à despolarização de sua membrana, conhecida como potencial de ação. As principais características da célula em repouso são:  Potencial de membrana entre -30 e -80 mV, dependendo do tipo de célula;  Permeabilidade da membrana plasmática a diferentes íons;  Concentração intracelular dos íons, especialmente [Ca 2+ ] i . O potencial de ação é gerado pela combinação de dois processos: 1. Aumento rápido e transitório da permeabilidade ao Na + (corrente de influxo) que ocorre quando a membrana é despolarizada além de aproximadamente -50mV; 2. Aumento mais lento e sustentado da permeabilidade ao K + (corrente de efluxo). 19 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Função dos Canais Em geral, os potenciais de ação são iniciados por correntes na membrana que causam a despolarização da célula. Essas correntes podem ser produzidas pela atividade sináptica, pela aproximação de um potencial de ação vindo de outra parte da célula, por um estímulo sensorial ou pela atividade espontânea de um marca-passo. A excitabilidade das células é governada pelo estado dos canais de Na + e/ou Ca 2+ voltagem dependente e do canal de potássio. Portanto, qualquer evento que aumente o número de canais de sódio ou cálcio disponíveis, ou que reduza seu limiar de ativação, tende a aumentar a excitabilidade, enquanto que, aumentando a condutância de repouso ao K + , ela se reduz. Os canais controlados por voltagem existem em três estados:  Em repouso (fechado);  Ativado (aberto);  Inativado (oclusão do canal por um alçapão localizado na porção intracelular da proteína do canal. Essa etapa implica no período refratário). CONTRAÇÃO MUSCULAR O fundamento molecular básico da contração é a interação entre actina e miosina, com energia derivada do ATP, iniciada por um aumento da [Ca 2+ ] i . Existem diferenças entre os três tipos de músculo responsáveis pelas diferentes reações a fármacos e mediadores químicos, dentre as quais: 20 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137  Conexão entre os eventos na membrana e aumento da [Ca 2+ ] i ;  Mecanismo pelo qual a [Ca 2+ ] i regula a contração. Músculo Esquelético A membrana do túbulo T contém canais de cálcio do tipo L, que respondem à despolarização da membrana conduzida passivamente ao longo do túbulo T quando a membrana plasmática é invadida pelo potencial de ação. Esses canais de cálcio estão muito próximos dos receptores de rianodina (RyR) na membrana do RS adjacente, e sua ativação causa a liberação de Ca 2+ do RS. O Ca 2+ liberado se liga à troponina, uma proteína que bloqueia a interação entre a actina e a miosia. Quando ocorre essa ligação, a troponina se afasta, permitindo que o mecanismo contrátil entre em ação. Músculo Cardíaco A membrana plasmática contém muitos canais de Ca 2+ do tipo L, que se abrem durante o platô do potencial de ação, permitindo a entrada do cátion na célula, mas não em quantidade suficiente para ativar o mecanismo contrátil diretamente. Em vez disso, essa entrada inicial de Ca 2+ atua nos RyRs para liberar Ca 2+ do RS, produzindo uma onda secundária de Ca 2+ muito maior. Músculo Liso As propriedades do músculo liso variam consideravelmente nos diversos órgãos, e o vínculo entre os eventos que ocorrem na membrana e a 21 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 contração é menos direta e não tão bem conhecida quanto nos outros tipos de músculo. O potencial de ação é, na maioria dos casos, gerado pelos canais de cálcio do tipo L, e não pelos canais de sódio controlados por voltagem, constituindo uma rota importante para a entrada de Ca 2+ . Contudo, em contraste com os outros dois tecidos musculares, a Liberação de Ca 2+ pode ocorrer também por meio da ativação de receptores (mediadores químicos), e não necessariamente pela despolarização. O mecanismo de contração do músculo liso é ativado quando a cadeia leve da miosina sofre fosforilação. Soltando-a dos filamentos de actina. LIBERAÇÃO DE MEDIADORES QUÍMICOS Os mediadores químicos que são liberados das células pertencem a dois grupos principais:  Mediadores que são pré-formados e armazenados em vesículas das quais são liberados por exocitose (ex.: neurotransmissores, hormônios, citocinas, etc.);  Mediadores produzidos em função da demanda e que são liberados através da difusão ou de transportadores presentes na membrana (ex.: NO, e muitos mediadores lipídicos). O Ca 2+ desempenha um papel essencial nos dois casos, pois uma elevação na [Ca 2+ ] i inicia a exocitose e também é o principal ativador das enzimas responsáveis pela síntese dos mediadores difusíveis. Exocitose Envolve a fusão entre a membrana das vesículas sinápticas e a superfície interna da membrana plasmática em resposta a um aumento do [Ca 2+ ] i . É o principal mecanismo de liberação de transmissores nos sistemas nervoso central e periférico, assim como nas células endócrinas e mastócitos. As vesículas contendo transmissores rápidos (ex.: glutamato) estão localizadas junto às zonas ativas, enquanto as vesículas contendo transmissores lentos (ex.: neuropeptídeos) estão mais distantes. Graças à organização espacial compacta, a liberação do transmissor rápido ocorre assim que os canais de cálcio próximos se abrem, antes que o Ca 2+ tenha chance de se difundir através do terminal, enquanto a liberação do transmissor lento requer uma difusão mais ampla de Ca 2+ . Como resultado, a liberação de transmissores rápidos ocorre a 22 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 cada impulso, mesmo em baixas freqüências de estimulação, enquanto a liberação de transmissores lentos só ocorre em resposta a altas freqüências de estimulação. Após a exocitose, a vesícula vazia é recapturada por endocitose, retornando ao interior do terminal, onde se funde com a membrana endossômica maior. Do endossomo brotam novas vesículas, que captam transmissor do citosol através de proteínas transportadoras específicas, e se ancoram novamente na membrana pré-sinaptica. O óxido nítrico e os metabólitos do ácido araquidônico (ex.: prostaglandinas) são dois exemplos importantes de mediadores que são liberados por difusão através da membrana ou por extrusão mediada por carregadores, e não por exocitose. Os mediadores não são armazenados, escapando da célula assim que são sintetizados. Em ambos os casos, a enzima de síntese é ativada pelo Ca 2+ e o controle da taxa de síntese a cada momento depende da [Ca 2+ ] i . Esse tipo de liberação é necessariamente mais lento que o mecanismo clássico de exocitose, mas no caso do óxido nítrico, rápido o suficiente para comportar-se como um verdadeiro transmissor. 23 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo VI – Mediadores Químicos e Sistema Nervoso Autônomo Este capítulo trata da transmissão química no sistema nervoso periférico e das diversas maneiras pelas quais esse processo pode ser farmacologicamente alterado. O SISTEMA NERVOSO PERIFÉRICO O sistema nervoso periférico (SNP) é formado pelos elementos principais apresentados a seguir:  Sistema nervoso autônomo (SNA), que inclui o sistema nervoso entérico;  Nervos eferentes somáticos, que inervam os músculos esqueléticos;  Nervos aferentes somáticos e viscerais. Anatomia e Fisiologia Básica do Sistema Nervoso Autônomo O SNA é composto de três divisões anatômicas principais: a simpática, a parassimpática e o sistema nervoso entérico. O SNA conduz todas as informações provenientes do SNC para o resto do corpo, exceto para a inervação motora dos músculos esqueléticos e, além disso, ele está em grande parte fora da influência do controle voluntário. Os principais processos que ele regula são:  A contração e o relaxamento da musculatura lisa de vasos e vísceras;  Todas as secreções exócrinas e algumas endócrinas;  Os batimentos cardíacos;  O metabolismo energético, particularmente no fígado e nos músculos esqueléticos. Em alguns locais, os sistemas simpático e parassimpático produzem efeitos opostos. Há contudo, outros locais onde apenas uma divisão do sistema autônomo opera. As glândulas sudoríparas e a maioria dos vasos sanguíneos, por exemplo, têm apenas invervação simpática, ao passo que o músculo ciliar do olho tem apenas inervação parassimpática. A musculatura lisa dos brônquios tem apenas inervação parassimpática (constritora), embora seu tônus seja altamente sensível à adrenalina circulante, que provavelmente age inibindo a inervação constritora, e não diretamente sobre o músculo liso. As artérias de resistência possuem inervação simpática vasoconstritora, mas não apresentam inervação parassimpática; em vez disso, o tônus constritor é contrabalançado por uma liberação basal de NO proveniente das 24 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 células endoteliais. Existem outros exemplos, como as glândulas salivares, onde os dois sistemas produzem efeitos semelhantes, e não opostos. Transmissores do Sistema Nervoso Autônomo  Todas as fibras nervosas motoras que deixam o sistema nervoso central liberam acetilcolina, que age nos receptores nicotínicos (embora, nos gânglios autônomos, uma pequena parte da excitação seja resultante da ativação de receptores muscarínicos);  Todas as fibras parassimpáticas pós-ganglionares liberam acetilcolina, que age nos receptores muscarínicos;  Todas as fibras simpáticas pós-ganglionares liberam noradrenalina, que pode agir sobre α ou β-adrenoceptores. A única exceção consiste na inervação simpática das glândulas sudoríparas, onde a transmissão resulta da ação da acetilcolina sobre receptores muscarínicos. ALGUNS PRINCÍPIOS GERAIS DA TRANSMISSÃO QUÍMICA Sensibilidade por Desnervação Quando um nervo é seccionado e suas terminações degeneram, a estrutura pó ele inervada torna-se supersensível à substância transmissora liberada pelas terminações. Vários mecanismos contribuem para a supersensibilidade por desnervação:  Proliferação de receptores;  Perda dos mecanismos de remoção dos transmissores;  Aumento da responsividade pós-juncional (mecanismo desconhecido). A supersensibilidade também pode ocorrer através do bloqueio farmacológico. Modulação Pré-Sináptica As interações em um neurônio podem ser heterotrópicas, nas quais um neurotransmissor afeta a liberação do outro. Entretanto, também ocorrem interações 23 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 homotrópicas, nas quais o transmissor, ligando-se a auto-receptores pré-sinápticos, afeta as terminações nervosas de onde está sendo liberado. Os receptores pré-sinápticos regulam a liberação dos transmissores, principalmente influindo na entrada de Ca 2+ na terminação nervosa. A maioria dos receptores pré-sinápticos é do tipo acoplada à proteína G. A liberação dos transmissores é inibida quando a abertura dos canais de Ca 2+ é inibida, ou quando a abertura dos canais de potássio é aumentada. Modulação Pós-Sináptica Os mediadores químicos agem com freqüência sobre as estruturas pós-sinápticas de tal modo que a excitabilidade ou o padrão de descarga espontânea dessas estruturas é alterado. Em muitos casos, como na modulação pré-sináptica, isso é causado por alterações no funcionamento dos canais de cálcio e/ou potássio que são mediadas por um segundo mensageiro. Os efeitos pré e pós-sinápticos descritos anteriormente freqüentemente são referidos como neuromodulação, porque o mediador age aumentando ou diminuindo a eficácia da transmissão sináptica, sem, contudo, participar diretamente como transmissor. A neuromodulação é definida de forma imprecisa, mas, de modo geral, envolve processos mais lentos (que demoram de segundo a dias) do que a neurotransmissão (que ocorrem em milissegundos) e opera por meio de cascatas de mensageiros intracelulares e não diretamente sobre os canais iônicos controlados por ligantes. 26 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Transmissores além da Acetilcolina e da Noradrenalina Os compostos que provavelmente atuam como transmissores não-adrenérgicos e não- colinérgicos (NANC) incluem o ATP, o peptídeo intestinal vasoativo (VIP), o NYP e o NO, que agem nas terminações nervosas pós-ganglionares, bem como a substância P, a 5- hidroxitriptamina, o GABA e a dopamina, que desempenham certas funções na transmissão ganglionar. Término da Ação dos Transmissores As sinapses de transmissão química, com exceção das peptidérgicas, incorporam invariavelmente um mecanismo para o rápido processamento do transmissor liberado, de modo que sua ação seja breve e localizada. Nas sinapses colinérgicas, a acetilcolina liberada é rapidamente inativada na fenda sináptica pela acetilcolinesterase. Na maioria dos demais casos, a ação do transmissor é finalizada pela sua captura ativa realizada pelo neurônio pré- sináptico ou por células de suporte, como a glia. Tal captura depende de proteínas transportadoras,sendo cada uma específica para determinado trasmissor. ETAPAS BÁSICAS DA TRANSMISSÃO NEUROQUÍMICA: SÍTIOS DE AÇÃO DOS FÁRMACOS Todas as etapas mostradas na figura ao lado (com exceção da difusão dos transmissores – etapa 8) podem ser influenciadas por fármacos. Por exemplo, as enzimas envolvidas na síntese ou na inativação de um transmissor podem ser inibidas, assim como os sistemas de transporte responsáveis pela captação neuronal e vesicular do transmissor ou de seu precursor. 27 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo VII – Transmissão Colinérgica AÇÕES MUSCARÍNICAS E NICOTÍNICAS DA ACETILCOLINA Os receptores para a acetilcolina (ACh) são classificados em muscarínicos e nicotínicos. As ações muscarínicas correspondem àquelas da ACh liberada nas terminações nervosas pós-ganglionares parassimpáticas, com duas exceções importantes:  Vasodilatação Generalizada: consiste em um efeito indireto da ACh sobre o endotélio dos vasos, promovendo a produção de NO. Esse mecanismo não é todo elucidado, porque o sangue normalmente não possui ACh circulante;  Secreção de Glândulas Sudoríparas: inervação colinérgica do sistema nervoso simpático. As ações nicotínicas corresponde às ações da ACh sobre os gânglios autônomos dos sistemas simpático e parassimpático, sobre a placa terminal do músculo voluntário e sobre as células secretoreas da medula da supra-renal. A figura abaixo ilustra as ações muscarínicas e nicotínicas da ACh. Doses pequenas e médias de ACh produzem uma queda transitória da pressão arterial resultante de vasodilatação arteriolar e uma redução da freqüência cardíaca – efeitos muscarínicos que são abolidos pela atropina. Uma dose grande de ACh, administrada após a atropina, produz efeitos nicotínicos: uma elevação inicial da pressão arterial, decorrente da estimulação dos gânglios simpáticos e conseqüente vasoconstrição, e uma segudna elevação dessa pressão, resultante da secreção de adrenalina. 28 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 RECEPTORES DA ACETILCOLINA Receptores Nicotínicos Os receptores nicotínicos da ACh podem ser divididos em três classes principais:  Musculares: estão confinados à junção neuromuscular esquelética;  Ganglionares: são responsáveis pela transmissão nos gânglios simpáticos e parassimpáticos;  SNC: estão espalhados por todo o cérebro e são heterogêneos com respeito à sua composição molecular e à localização. Receptores Muscarínicos Os cinco receptores muscarínicos (M 1 – M 5 ) são acoplados à proteína G, sendo que os ímpares (M 1 , M 2 e M 3 ) acoplam-se à proteína G q (via fosfatos de inositol), enquanto que os pares (M 2 e M 4 ) agem por meio da proteína G i (inibição de adenilato-ciclase). Alguns desses receptores encontram-se muito bem localizados:  Receptores M 1 : são encontrados em neurônios do SNC, em neurônios periféricos e nas células parietais do estômago. Atuam como mediadores dos efeitos excitatórios por produzir diminuição da condutância ao K + e aumentando a secreção ácida do estômago que ocorre após estimulação vagal.  Receptores M 2 : estão presentes no coração e também nas terminações pré-sinápticas de neurônios centrais e periféricos. Atuam como mediadores dos efeitos inibitórios por produzir aumento da condutância ao K + e inibição dos canais de Ca 2+ .  Receptores M 3 : estão presentes na musculatura lisa de modo geral e em glândulas. Atuam por meio de efeitos excitatórios, estimulando as secreções glandulares e contração do músculo liso das vísceras.  Receptores M 4 e M 5 : estão em grande parte confinados ao SNC, e seu papel funcional não está bem esclarecido. 29 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 FISIOLOGIA DA TRANSMISSÃO COLINÉRGICA Síntese e Liberação de Acetilcolina A ACh é sintetizada no interior da terminação nervosa a partir da colina, que é levada para dentro da terminação por um transportador específico (não transporta ACh). A colina livre dentro da terminação nervosa é acetilada por uma enzima citosólica, a colina acetiltransferase (CAT), que transfere o grupo acetil da acetil-coenzima A. A ACh sintetizada é armazenada em vesículas sinápticas, onde sua concentração é muito alta. A liberação de vesículas ocorre por exocitose desencadeada pela entrade de Ca+2+ na terminação nervosa. 30 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo IX – Hormônios Locais, Inflamação e Reações Imunológicas A resposta inflamatória entra em ação para nos proteger, mas ocasionalmente ela se descontrola, levando ao desenvolvimento de um espectro de doenças inflamatórias, e é nessas circunstâncias que precisamos recorrer à terapia com fármacos para atenuar ou abolir a resposta inflamatória. COMPONENTES DA REAÇÃO INFLAMATÓRIA AGUDA A reação inflamatória aguda apresenta dois componentes:  Uma resposta inata, não-adaptativa, que se acredita ter se desenvolvido no início da evolução, e está presente de uma forma ou outra na maioria dos organismos multicelulares;  A resposta imunológica adaptativa. A resposta inata é ativada imediatamente após uma infecção ou lesão. Além disso, ela tem o papel de impedir que a resposta adaptativa seja dirigida contra as células do hospedeiro, danificando-as. Já a resposta imunológica adaptativa somente é desencadeada após um patógeno ter sido reconhecido pelo sistema inato. Os quatro sinais cardinais da inflamação são: dor, calor, rubor e tumor. Um quinto sinal seria a perda da função em função das alterações que ocorrem localmente nos tecidos, seja por eventos celulares ou por eventos vasculares. Resposta Imunológica Inata Um importante evento inicial na resposta imunológica inata é o reconhecimento de padrões moleculares associados ao patógeno (PAMPs), que são específicos nos microrganismos, pelos receptores de reconhecimento pelo padrão, ou receptor Toll (TLR), presentes em macrófagos teciduais. Os PAMPs são componentes altamente conservados, que são comuns a classes inteiras de patógenos (bactérias, vírus e fungos). Eles são geralmente componentes estruturais essenciais do patógeno, sendo fundamentais para a sua sobrevivência e patogenicidade, como o LPS (lipopolissacarídeo) ou o pepetideoglicano de algumas bactérias. A interação de um PAMP com os TLRs estimula as células dendríticas ou os macrófagos a responder imediatamente. Vias de sinalização intracelulares ativam a produção 31 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 das principais citocinas pró-inflamatórias, o TNF-α, e a IL-1, assim como outros mediadores (como prostaglandinas e histamina) que atuam sobre as células endoteliais vasculares das vênulas pós-capilares, provocando a expressão de moléculas de adesão da superfície da íntima e um aumento na permeabilidade vascular. Isso permite a exudação, para o espaço extravascular, de líquido contendo os componentes das cascatas de enzimas que levam à produção de mais mediadores inflamatórios. Os leucócitos se aderem às células endoteliais através de interações entre suas integrinas de superfície celular e as moléculas de adesão das células endoteliais. Esse processo permite a migração dos leucócitos para fora dos vasos, atraídos por quimiotaxinas produzidas durante a ativação dos TLR pelos microrganismos ou como resultado da interação destes com os tecidos. Eventos Vasculares e os Mediadores Derivados do Plasma A dilatação das pequenas arteríolas resulta em aumento do fluxo sanguíneo, já o aumento na permeabilidade das vênulas pós-capilares resulta na exsudação de líquido. A vasodilatação é efetuada por mediadores, incluindo histamina, prostaglandina E 2 (PGE 2 ) e prostaciclina (PGI 2 ), produzidas através da interação do microrganismo com o tecido. O exudato líquido contém os componentes do sistema complemento, do sistema de coagulação e do sistema fibrinolítico. A ativação do sistema complemento pode ser iniciada por três vias distintas, todas levando à produção de C3a (estimula a secreção de mediadores químicos pelos mastócitios) e de C3b (adere a superfície de um microrganismo facilitando a fagocitose). O C3b inicia as etapas posteriores da cascata, levando a formação de C9 polimerizado, que origina um poro na membrana do microrganismo invasor. 32 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Na ativação do sistema da coagulação e do sistema fibrinolítco, o fator XII é ativado pelo colágeno para XIIa, cujo resultado final é a deposição de fibrina nos tecidos para limitar a extensão da infecção Eventos Celulares a) Mastócito: São células que, quando ativadas por IgE, C3a ou C5a¸ liberam as seguintes substâncias: histamina (é a principal), heparina, leucotrienos, PGD 2 , fator de ativação de palquetas (PAF), fator de crescimento neural e algumas citocinas. b) Leucócito polimorfonucleares: Os neutrófilos são células que matam os microrganismos através da geração de produtos tóxicos do oxigênio ou através da digestão enzimática. Se o neutrófilo for inadequadamente ativado, os produtos tóxicos do oxigênio e as enzimas proteolíticas podem danificar os tecidos do próprio hospedeiro. Os eosinófilos têm ação mais pronunciada em infecções helmínticas. Suas principais substâncias são a proteína catiônica eosinofílica, uma peroxidase, a proteína básica principal e uma neurotoxina. Os basófilos são muito semelhantes aos mastócitos. São mais pronunciados em reações de hipersensibilidade. c) Monócitos/Macrófagos: Os monócitos presentes no sangue, quando migram para o tecido, originam os macrófagos. Estes últimos, quando ativados, produzem citocinas e quimiocinas. Os macrófagos ingerem restos teciduais e células mortas, assim como fagocitam e matam muitos microrganismos. Quando estimulados por glicocorticóides, eles secretam anexina-1, um potente polipeptídeo antiinflamatório. d) Células Endoteliais Vasculares: As células endoteliais secretam NO, que provoca o relaxamento do músculo liso subjacente, vasodilatação e aumento da liberação de plasma e de células sanguíneas para a área de inflamação. Elas ainda sintetizam e liberam a PGI 2 (agente vasodilatador), a endotelina (agente vasoconstritor), o ativador de plasminogênio, o PAF e várias citocinas. As células endoteliais também expressão moléculas de adesão (família das ICAM) bem como receptores de histamina, de acetilcolina e de IL-1. 33 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 e) Células Natural Killer: São células que matam as células-alvo que carecem de ligantes para os receptores inibitórios presentes nas próprias células NK. Os ligantes em questão são as moléculas do complexo principal de histocompatibilidade (MHC). Resposta Imunológica Adaptativa Fase de Indução As células apresentadoras de antígenos (APC) ingerem e processam o antígeno para apresentar os fragmentos deste para as células T CD4 virgens, não-comprometidas, em conjunto com as moléculas do MHC da classe II, ou para as células T CD8 virgens em conjunto com as moléculas MHC da classe I, tornando-as desta forma “equipadas”. As células T CD4 + equipadas sintetizam e expressam receptores de IL-2 e liberam esta citocina, a qual estimula as células 34 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 através de ação autócrina, induzindo a produção e a proliferação de células T helper (Th 0 ). As citocinas autócrinas (por exemplo, IL-4) induzem a proliferação de algumas células Th 0 dando origem a células Th 2 2 , que são responsáveis pelo desenvolvimento das respostas imunológicas mediadas por anticorpos. Essas células Th 2 cooperam com as células B e as ativam para proliferar e dar origem, eventualmente, a células B de memória (MB) e plasmócitos (P), que secretam anticorpos. Outras citocinas autócrinas (por exemplo, IL-2) induzem a proliferação de algumas das células Th 0 , originando células Th l 3 , que secretam citocinas capazes de ativar macrófagos (responsáveis por algumas reações imunológicas mediadas por células). As células T CD8 + equipadas também sintetizam e expressam receptores de IL-2 e liberam IL-2, que estimula as células, por ação autócrina, a proliferar e dar origem a células T citotóxicas. Fase de Efetora É a fase que pode ser mediada por anticorpos ou por células. Nas respostas mediadas por anticorpos, existem cinco classes (IgA, IgD, IgE, IgG e IgM), cujas principais funções são:  Ativação do sistema complemento por meio da exposição do domínio Fc no complexo antígeno-anticorpo;  Promove a fagocitose de microrganismo por meio da opsonização dos mesmos;  Ligação à superfície de mastócitos ou de basófilos. Quando antígenos reagem com esses anticorpos, ocorre desgranulação da célula; Nas respostas mediadas por células, pode-se citar a ação das células T citotóxicas e a ativação de macrófagos por meio de T CD4 + . Os linfócitos T citotóxicos podem destruir células infectadas por vírus. A IL-2 secretada pelas células T CD4 + também tem participação na estimulação da proliferação das células T CD8 + . Já os macrófagos ativados por células T CD4 + atuam como verdadeiras fábricas para a produção de mediadores químicos e podem produzir e secretar não apenas muitas citocinas, mas também metabólitos tóxicos do oxigênio e proteases neutras que matam organismos extracelulares, componentes do complemento, eicosanóides, NO, fatores estimulantes de fibroblastos, pirógenos e o fator tecidual que inicia a via extrínsica da cascata de coagulação, assim como vários outros fatores de coagulação. 2 As células Th 2 produzem citocinas (IL-4, TGF-β e IL-10) que estimulam as células B, estimulam a diferenciação e ativação dos eosinófilos e inibem as funções das células Th 1 . 3 As células Th 1 produzem citocinas (IL-2, TNF-β e IFN-γ) que ativam macrófagos, estimulam os linfócitos T CD8 + e inibem as funções das células Th 2 . 33 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Observe que a “fase efetora” esquematizada no desenho acima se relaciona com a ação “protetora” da resposta imunológica. Quando a resposta é desencadeada inadequadamente – como em condições inflamatórias crônicas, por exemplo, na artrite reumatóide – o componente Th 1 da resposta imunológica é dominante e os macrófagos ativados (mΦ) liberam IL-1 e TNF-α, os quais, por sua vez, estimulam a liberação de quimiocinas e citocinas inflamatórias, que têm um papel fundamental na patologia da doença. Respostas Sistêmicas na Inflamação Além das alterações locais observadas na área de inflamação, ocorrem freqüentemente manifestações sistêmicas, como febre, leucocitose e liberação de proteínas de fase aguda pelo fígado, tais como: proteína C-reativa, α 2 -macroglobulina, fibrinogênio, α 1 -antitripsina e alguns componentes do complemento, as quais, aparentemente, apresentam ações antimicrobianas. É válido ressaltar que o cortisol também aumenta e exerce um importante efeito contra-regulatório sobre a resposta inflamatória. MEDIADORES DA INFLAMAÇÃO E DAS REAÇÕES IMUNOLÓGICAS Histamina Histidina Histidina Descarboxilase > Histamina Em nível celular, a histamina é encontrada no interior de grânulos de mastócitos e de basófilos. A liberação é estimulada pela interação da célula com C3a, C5a e pela combinação de antígenos com anticorpos IgE fixados às células. Dentre as ações da histamina, pode-se citar:  Relaxamento de músculo liso do leito vascular – Vasodilatação – (receptor H 1 );  Aumento da permeabilidade vascular (receptor H 1 )  Contração do músculo liso dos tratos gastrointestinal, respiratório e reprodutor (receptor H 1 );  Estimulação da secreção gástrica (receptor H 2 );  Estimulação cardíaca (receptor H 2 );  Inibição da liberação de uma variedade de neurotransmissores (receptor H 3 ). 36 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Eicosanóides Não são encontrados pré-formados nas células, mas são produzidos a partir de precursores fosfolipídicos quando há necessidade. Eles são implicados no controle de vários processos fisiológicos e estão entre os mediadores e moduladores mais importantes da reação inflamatória. Fosfolipídeos Fosfolipases > Araquidonato → Ácido Araquidônico (20C) O ácido araquidônico livre é metabolizado por diversas vias, incluindo as seguintes:  Ácido Graxo Ciclooxigenase (COX): as duas principais isoformas, COX-1 e COX-2, transformam ácido araquidônico em prostaglandinas e tromboxanas;  Lipoxigenases: vários subtipos sintetizam leucotrienos, lipoxinas ou outros componentes; Prostanóides O termo "prostanóides" abrange as prostaglandinas (PG) e os tromboxanos (TX). As ciclooxigenases (COXs) atuam sobre o araquidonato, produzindo endoperóxidos cíclicos (PGG2 e PGH2). Aridonato COX-1 ou COX-2 > PGG 2 e PGH 2 Isomerase ou Sintase > PGE 2 , PGI 2 , PGD 2 , PGF 2α e TXA 2 A COX-1 está presente na maioria das células como uma enzima constitutiva produtora de prostanóides, enquanto que a COX-2 não está normalmente presente, mas é fortemente induzida por estímulos inflamatórios e, por essa razão, acredita-se que ela seja mais relevante para a terapia da inflamação. O conjunto de eicosanóides assim produzidos varia entre os tipos celulares dependendo das específicas isomerases ou sintases de endoperóxidos presentes. As enzimas específicas para prostaglandinas estão presentes em altas concentrações no pulmão, e 95% da PGE 2 , PGE 1 , ou PGF 2α infundidas são inativadas durante a primeira passagem. A meia-vida da maioria das prostaglandinas na circulação é de menos de 1 minuto. Os receptores para as prostaglandinas são: DP (PGD 2 ), FP (PGF 2α ), IP (PGI 2 ), EP (PGE 2 ), TP (TXA 2 ) As principais ações dos prostanóides são:  PGI 2 (prostaciclina): predominantemente do endotélio vascular, atua sobre os receptores IP. Os efeitos principais consistem em vasodilatação e inibição da agregação plaquetária.  TXA 2 (tromboxano A 2 ): predominantemente das plaquetas, atua sobre os receptores TP. Os principais efeitos consistem em agregação plaquetária e vasoconstrição. 37 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137  PGF 2α : atua sobre os receptores FP, que são encontrados no músculo liso do útero e no corpo lúteo. O principal efeito consiste em contração do útero.  PGD 2 : deriva particularmente dos mastócitos e atua sobre os receptores DP. Seus principais efeitos incluem vasodilatação e inibição da agregação plaquetária.  PGE 2 : é proeminente nas respostas inflamatórias e constitui um mediador da febre. Os principais efeitos incluem:  Receptores EP 1 : contração do músculo liso brônquico e do trato gastrintestinal (TGI);  Receptores EP 2 : relaxamento do músculo liso brônquico, vascular e do TGI;  Receptores EP 3 : inibição da secreção de ácido gástrico, aumento da secreção gástrica de muco, contração do útero grávido e do músculo liso do TGI, inibição da lipólise e da liberação de neurotransmissores autônomos. A resposta inflamatória é inevitavelmente acompanhada da liberação de prostanóides. As prostaglandinas PGE 2 , PGI 2 e PGD 2 são em si poderosos vasodilatadores e atuam sinergicamente com outros vasodilatadores inflamatórios, como histamina e bradicinina. Os prostanóides não aumentam diretamente a permeabilidade das vênulas pós-capilares porém potencializam este efeito da histamina e da bradicinina. De forma semelhante, eles por si sós não produzem dor, mas potencializam o efeito da bradicinina ao sensibilizar as fibras C aferentes Leucotrienos São sintetizados a partir do ácido araquidônico pelas vias catalisadas pela lipoxigenase. Essa enzimas são encontradas em pulmões, plaquetas, mastócitos e leucócitos. Araquidonato 5-lipoxigenase > LTA 4 → LTB 4 , LTC 4 , LTD 4 , LTE 4 , LTF 4 O LTB 4 consiste em uma série de compostos de glutadiona, enquanto o LTC 4 , o LTD 4 e o LTE 4 são cisteinil-leucotrienos. O LTB 4 atua em receptores específicos, provocando aderência, quimiotaxia e ativação de polimorfonucleares e monócitos, além de estimular a proliferação de macrófagos e linfócitos e a produção de citocinas por estas células. Já os cisteinil-leucotrienos provocam:  Contração da musculatura brônquica;  Vasodilatação na maioria dos vasos, porém constrição coronariana O LTB 4 é um importante mediador em todos os tipos de inflamação, enquanto os cisteinil-leucotrienos são particularmente importantes na asma. 38 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Fator de Ativação de Plaquetas (PAF) O PAF é um lipídeo biologicamente ativo, que pode produzir efeitos em concentrações extremamente baixas. Ele é liberado indiretamente por muitas células inflamatórias ativadas, processo que ocorre por meio da fosfolipase A 2 , e atua sobre receptores específicos em muitos tipos celulares. As ações farmacológicas do PAF consistem em vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular, quimiotaxia e ativação de leucócitos (particularmente eosinófilos), ativação e agregação das plaquetas e contração do músculo liso. Trata-se de um mediador em muitos tipos de inflamação, estando implicado na hiper-responsividade brônquica e na fase tardia da asma. Bradicinina (BK) A bradicinina é um nonapeptídio extraído a partir de uma α-globulina plasmática, o cininogênio, pela ação da calicreína. Cininogênio Calicreína > Bradicinina Ela é convertida pela cininase I num octapeptídio, o BK 1-8 (des-Arg 9 -BK), e inativada pela cinase II no pulmão. A cinase II é uma enzima semelhante à ECA e, por essa razão, pode ser inativada por inibidores da ECA, o que resultará em aumento da capacidade de ação da bradicinina. Existem dois subtipos principais de receptores de BK: o B 2 , constitutivamente presente, e o B 1 , que é induzido na presença de inflamação. Existem antagonistas competitivos seletivos para os receptores B 1 (des-Arg Hoe 140; pA 2 :8) e para os receptores B 2 (icatibanto, pA 2 :9). Ações farmacológicas:  Vasodilatação (que é amplamente dependente do NO e da PGI 2 produzidos pela célula endotelial);  Aumento da permeabilidade vascular;  Estimulação das terminações nervosas para a dor;  Estimulação do transporte epitelial de íons e da secreção de líquidos nas vias aéreas e no trato gastrintestinal;  Contração do músculo liso intestinal e uterino. 39 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Citocinas As citocinas são peptídeos que, nas reações imunológicas e inflamatórias, são liberados, regulando a ação das células inflamatórias e do sistema imune. As superfamílias das citocinas incluem os interferons (IFN), as interleucinas, o fator de necrose tumoral (TNF), vários fatores de crescimento, as quimiocinas e os fatores de estimulação de colônias. Utilizando tanto mecanismos autócrinos quanto parácrinos, elas exercem efeitos complexos sobre leucócitos, células endoteliais vasculares, mastócitos, fibroblastos, células- tronco hematopoéticas e osteoclastos, controlando a proliferação, a diferenciação e/ou a ativação. A IL-1 e o TNF-α são importantes citocinas inflamatórias primárias, que induzem a formação de outras citocinas. O IFN-α e o IFN-β possuem atividade antiviral. Já o IFN-γ desempenha uma importante função imunorreguladora e é utilizado no tratamento da esclerose múltipla. 40 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo X – Fármacos Antiinflamatórios e Imunossupressores ANTIINFLAMATÓRIOS NÃO-ESTERÓIDES Esses agentes proporcionam alívio sintomático de dor e edema em artropatia crônica e em afecções inflamatórias mais agudas. Também proporciona alívio de dor pós-operatória, dental e menstrual e de cefaléias e enxaqueca. Ações Farmacológicas Efeito Antipirético Durante a reação inflamatória provocada pela infecção por um microrganismo, os macrófagos liberam grande quantidade de IL-1, que estimula, no hipotálamo, a geração de PGE 2 , prostaglandina responsável por elevar o ponto de ajuste da temperatura corporal. Nesse contexto, os AINEs exercem sua ação inibindo a produção de prostaglandinas (PGs) no hipotálamo. Contudo, há evidências de que as PGs não sejam os únicos mediadores da febre e, por isso, os AINEs podem ter um efeito antipirético adicional por mecanismos ainda desconhecidos. Efeito Analgésico No estudo da dor, os AINES desempenham ação periférica, diminuindo a produção de PGs que sensibilizam os nociceptores a mediadores inflamatórios, como a bradicinina. Além disso, pode-se citar uma ação central dos AINEs, uma vez que a produção de PGs por lesões inflamatórias facilitam a transmissão de informações das fibras de dor aferente para os neurônios de retransmissão no corno posterior. Efeito Antiinflamatório Embora varie no grau em que inibem cada isoforma da COX, o fundamento para a atividade da maioria dos AINEs é a inibição da COX-1 e da COX-2 e, conseqüentemente, da produção de prostaglandinas e de tromboxanos. A COX-1 é uma enzima constitutiva expressa na maioria dos tecidos, inclusive nas plaquetas do sangue e, portanto, participa da homeostase dos tecidos, sendo responsável pela produção de prostaglandinas envolvidas na citoproteção gástrica, na agregação plaquetária, na auto-regulação do fluxo sanguíneo renal e no início do parto. Já a COX-2 é induzida nas células inflamatórias quando são ativadas, e, nesse contexto, são importantes as citocinas inflamatórias primárias (IL-1 e TNF-α). 41 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Acredita-se que a ação antiinflamatória dos AINEs esteja relacionada à sua inibição de COX-2, enquanto seus efeitos indesejáveis, que acometem principalmente o trato gastrointestinal (TGI), resultem predominantemente de sua inibição da COX-1. Mecanismo da Ação Inibitória da Ciclooxigenase Os AINEs entram no sítio catalítico das COXs, impedindo que os ácidos graxos do substrato entrem no domínio catalítico. Normalmente estes fármacos inibem a COX-1 rapidamente por processo competitivo reversível, enquanto que a inibição da COX-2 demanda mais tempo e costuma ser irreversível. A aspirina, contudo, é uma anomalia, pois inativa irreversivelmente a COX-1. Além disso, essa droga ainda inibe a expressão do fator de transcrição denominado fator nuclear κB (NFκB). Efeitos Indesejáveis Comuns A inibição da produção de PGs por COX-1 (constitutiva) resulta em alterações na auto-regulação vascular renal, na inibição da agregação plaquetária e, principalmente, no comprometimento TGI. Neste último, o principal órgão acometido é o estômago, uma vez que a inibição da síntese de PGE 2 , responsável pela diminuição da secreção ácida e pelo aumento da produção de muco, pode resultar em perfurações, úlceras ou hemorragias. Nesse contexto, os fármacos seletivos para COX-2 apresentam menor toxicidade gastrointestinal A COX-1 sempre foi considerada a principal fonte de PGI 2 antiagregante. Contudo, estudos mostram que alguns indivíduos dependem de COX-2 para sintetizar esse importante regulador da função cardiovascular. Dessa forma, a perturbação desse mecanismo pode aumentar episódios trombóticos, incluindo infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral. Esse episódio comprova um desfecho desapontador para uma estratégia terapêutica aparentemente promissora com o uso de inibidores seletivos para a COX-2. Assim, o uso crônico dos clássicos AINEs deve ser combinado com estratégias gastroprotetoras, como omeprazol (inibidor de bomba de prótons) ou misoprostol (um análogo de prostaglandina). Os AINEs também podem causar insuficiência renal aguda em indivíduos suscetíveis, como recém nascidos, idosos e pacientes com doenças cardíacas, hepáticas e/ou renais. Isso ocorre através da inibição da biossíntese de PGE 2 e PGI 2 , prostanóides envolvidos na 42 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 manutenção do fluxo sanguíneo renal, especificamente na vasodilatação compensatória mediada por PGE 2 , que ocorre em resposta à ação da norepinefrina ou da angiotensina II. Os AINEs ainda podem desencadear outros efeitos adversos menos comuns, como distúrbios da medula óssea e alterações hepáticas. Além disso, todos (exceto os inibidores da COX-2) impedem a agregação plaquetária e, portanto, podem prolongar os sangramentos. Alguns AINEs Importantes Aspirina A aspirina (ácido acetilsalicílico) é o mais antigo AINE. Ela atua inativando irreversivelmente as ciclooxigenases COX-1 e COX-2. Além de suas ações antiinflamatórias, a aspirina inibe a agregação plaquetária e, hoje em dia, sua principal importância clínica reside no tratamento do infarto do miocárdio. Estudos ainda avaliam o uso de aspirina associado à redução da incidência de câncer colorretal e de doença de Alzheimer. O ácido acetilsalicílico é um ácido fraco e, por essa razão, permanece protonado no interior do estômago, o que favorece o processo de absorção apesar de a maior parte da absorção ocorrer no íleo. Aproximadamente 75% de toda aspirina absorvida é metabolizada pelo fígado. Nesse processo, as estearases hepáticas hidrolisam o ácido acetilsalicílico, produzindo salicilato. Este composto tem ações antiinflamatórias e pode ser utilizado em preparações tópicas. Com baixas doses, sua eliminação segue uma cinética de primeira ordem (meia-vida de 4h) e, com altas doses, cinética de saturação (meia-vida de mais de 15h). Se for administrada concomitantemente com o varfarina, a aspirina pode causar aumento potencialmente perigoso no risco de sangramento por deslocar a varfarina das proteínas plasmáticas. Paracetamol Ainda que o paracetamol tenha excelente atividade analgésica e antipirética, que pode ser atribuída à inibição da síntese de PGs no SNC, tem fraca atividade antiinflamatória e não compartilha os efeitos adversos gástricos e plaquetários dos outros AINEs. Uma possível explicação para esses eventos benéficos é a inibição da COX-3, embora isso ainda não seja conclusivo. O paracetamol é administrado por via oral e é bem absorvido, sendo alcançadas as concentrações plasmáticas máximas em 30-60 minutos. A meia vida plasmática das doses terapêuticas é de 2-4h, mas, com doses tóxicas, pode se estender de 4-8h. 43 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Doses tóxicas (10-15g) causam hipatotoxicidade potencialmente fatal. Isso ocorre quando as enzimas hepáticas que catalisam as reações normais de conjugação ficam saturadas, fazendo com que o fármaco seja metabolizado por oxidases de função mista, resultando na produção de N-acetil-p-benzoquinona imina. Esta última é extremamente tóxica e, se não for inativada por conjugação com glutationa, pode reagir com proteínas celulares, promovendo necrose tanto no fígado quanto nos túbulos renais. Os sintomas iniciais de intoxicação aguda pelo paracetamol são náuseas e vômitos, sendo a hepatotoxicidade uma manifestação tardia que ocorre 24-48h mais tarde. Se a intoxicação for detectada precocemente, a lesão hepática poderá ser prevenida por administração de agentes que aumentam a formação de glutationa no fígado (acetilcisteína por via intravenosa ou metionina por via oral). Agentes Seletivos para a COX-2 (Coxibes) Os riscos de precipitar eventos cardiovasculares devem ser cuidadosamente considerados antes do tratamento com qualquer inibidor da COX-2. O celecoxibe e o etoricoxibe são medicamentos utilizados para o alívio sintomático no tratamento de osteoartrite e artrite reumatóide. Eles são administrados por via oral, possuem boa absorção, sendo a concentração plasmática máxima atingida em 1-3h. São metabolizados principalmente no fígado (mais de 99%). Em razão do papel potencial da COX-2 no fechamento de úlceras, ambos os fármacos devem ser evitados, se possível, por pacientes com doença preexistente. O parecoxibe é um terceiro medicamento, empregado por via parenteral, intravenosa ou intramuscular, utilizado no tratamento de curto prazo de dor pós-operatória. Após a injeção, o paracoxibe é convertido em valdecoxibe por hidrólise enzimática no fígado. Este último é ativo e atinge a concentração máxima em 30-60min, sendo metabolizado pelo fígado e excretado na urina. ANTAGONISTAS DA HISTAMINA Há três grupos: antagonistas dos receptores H 1 , H 2 e H 3 . O termo genérico anti- histamínico refere-se, convencionalmente, apenas aos antagonistas do receptor H 1 . O principal 44 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 efeito clínico dos antagonistas do receptor H 2 é a inibição da secreção gástrica. Atualmente existem vários agonistas e antagonistas do receptor H 3 4 , cujo potencial para uso clínico para doenças do SNC está sob investigação. Antagonista do Receptor H 1 (anti-histamínicos) Dentre as principais ações farmacológicas, verifica-se inibição do aumento da permeabilidade vascular e diminuição da contração da musculatura lisa dos brônquios, intestino e útero mediada pela histamina. Alguns fármacos são sedativos razoavelmente potentes e podem ser usados por esta ação (difenidramina). Contudo, alguns não são capazes de atravessar a barreira hematoencefálica e, portanto, não atuam no SNC (cetirizina e terfenadina). Outros fármacos mais recentes, que não possuem ação sedativa, são a loratadina e a mezolastina. Ainda há aqueles que desempenham ação antiemética (evita o vômito), como a prometazina. Eles são administrados por via oral, possuem boa absorção, sendo a concentração plasmática máxima atingida em 3-6h. São metabolizados no fígado e excretados na urina. FÁRMACOS USADOS NA GOTA A gota é uma doença metabólica na qual a concentração de urato no plasma se eleva em razão de superprodução ou por comprometimento da eliminação de ácido úrico. Caracteriza-se por crises intermitentes muito dolorosas de artrite aguda produzida pela deposição de cristais de urato de sódio, o que desencadeia uma resposta inflamatória. Os fármacos utilizados nessa doença têm a ação de inibir a síntese ou aumentar a excreção de ácido úrico, inibir a migração de leucócitos para a articulação inflamada e efeito antiinflamatório e analgésico geral. Alopurinol Alopurinol Xantina Oxidase > Aloxantina Hipoxantina Xantina Oxidase > Xantina Xantina Oxidase > Ácido Úrico 4 O receptor H 3 está presente em neurônios secretores de histamina. 43 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 O alopurinol é convertido em aloxantina um eficaz inibidor não-competitivo da enzima xantina oxidase, responsável pela síntese de ácido úrico. Por essa razão, o alopurinol é o fármaco de escolha no tratamento a longo prazo da gota, mas não tem efeito no tratamento de uma crise aguda e pode até exacerbar a inflamação. Deve ser utilizado com um AINE. O alopurinol é administrado por via oral, possui boa absorção, sendo sua meia-vida plasmática de 2-3h. Já como aloxantina, possui meia-vida de 18-30h. O medicamento é eliminado via renal. Agentes Uricosúricos (probenecida e sulfimpirazona) São medicamentos que aumentam a eliminação de ácido úrico por ação direta sobre o túbulo renal. Trata-se de fármacos utilizados como profiláticos para pacientes com gota recorrente grave que tenham reações adversas intensas ao alopurinol. Deve ser utilizado com um AINE. Colchicina É um fármaco que tem um efeito específico na artrite gotosa e pode ser usado tanto para prevenir como para aliviar as crises agudas. Ela impede a migração de neutrófilos para a articulação. A colchicina é administrada por via oral, possui boa absorção, sendo a concentração plasmática máxima alcançada em até 1h. É eliminada em parte no TGI e em parte na urina. FÁRMACOS ANTI-REUMATÓIDES A doença artrítica consiste em alterações articulares, que provavelmente representam uma reação auto-imune, compreendendo inflamação, proliferação da sinóvia e erosão da cartilagem e do osso. Os fármacos mais frequentemente utilizados na terapia são os ARMDs (anti-reumatóides modificadores da doença) e os AINEs. 46 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Fármacos Anti-Reumatóides Modificadores da Doença (ARMDs) Os ARMDs, geralmente, melhoram os sintomas e podem reduzir a atividade da doença na artrite reumatóide, conforme deduzido pela redução do número de articulações com edema e dor. Seus efeitos clínicos geralmente têm início lento (meses), sendo habitual fornecer “cobertura” com AINE durante essa fase de indução. Estão incluídos, nesta categoria, o metotrxato, a sulfassalazina, compostos de ouro, a penicilamina e cloroquina. FÁRMACOS IMUNOSSURESSORES Consiste em medicamentos utilizados na terapia de doenças auto-imunes e com o objetivo de prevenir e/ou tratar rejeições de transplantes. Podem ser caracterizados, aproximadamente, como:  Fármacos que inibem a produção ou a ação da IL-2 (ciclosporina e tacrolimo);  Fármacos que inibem a expressão de genes de citocinas (corticosteróides);  Fármacos que inibem a síntese de purinas ou pirimidinas (azatioprina e micofenolato de mofetila);  Fármacos que bloqueiam as moléculas de superfície dos linfócitos T envolvidas na sinalização (agentes à base de anticorpos monoclonais). Ciclosporina Trata-se de um peptídeo de ação imunossupressora e que não envolve citotoxicidade. Suas principais ações de relevância são:  Diminuição da proliferação clonal de células T, primariamente por inibição da síntese de IL-2 e possivelmente também por diminuião da expressão dos receptores para IL-2;  Redução da indução e proliferação clonal de células T citotóxicas a partir de células T precursoras CD8 + ;  Redução da função das células T efetoras que são responsáveis pelas respostas mediadas por células (por exemplo, redução da hipersensibilidade tardia);  Alguma redução das respostas das células B dependentes das células T. A ciclosporina é mal absorvida por via oral e, portanto, pode ser administrada por infusão venosa. Sua concentração máxima é alcançada em 3-4h, com meia-vida plasmática de 47 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 24h. Trata-se de uma droga que se acumula nos tecidos. Após o metabolismo no fígado, o fármaco é eliminado na bile. Dentre os efeitos adversos, destaca-se o efeito nefrotóxico, que pode ser acompanhado por hepatotoxicidade e hipertensão. A ciclosporina não tem efeito depressor sobre a medula óssea. Tacrolimos Trata-se de medicamentos semelhantes à ciclosporina, porém mais intensos. Dentre os exemplos, pode-se citar o pimecrolimos (uso tópico para eczema atópico) e o sirolimos (usado para prevenir rejeição de órgãos depois de transplante). O tacrolimos pode ser administrado por via oral, tópica ou intravenosa. É metabolizado pelo fígado e possui meia-vida plasmática de 7h. Os efeitos adversos do tacrolimos são semelhantes aos da ciclosporina, porém mais intensos. Glicocorticóides, Azatioprina e Micofenolato Mofetil Os glicocorticóides são imunossupressores principalmente pela sua capacidade de restringir, como a ciclosporina, a proliferação clonal de células Th, através da redução da transcrição do gene da IL-2. A azatioprina interfere na síntese de purinas e é citotóxica. Ela é metabolizada, produzindo mercaptopurina, um análogo da purina que inibe a síntese de DNA. Ela deprime reações mediadas imunes mediadas por células e por anticorpos. Seu principal efeito adverso consiste em depressão da medula óssea. O micofenolato mofetil, no organismo, é convertido em ácido micofenólico, que restringe a proliferação dos linfócitos T e B e diminui a produção de células T citotóxicas ao inibir a inosina monofosfato desidrogenase, uma enzima essencial na biossíntese de purinas. As células T e B dependem particularmente dessa via, de modo que a droga possui ação bastante seletiva sobre essas células. 48 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XI – Agentes Anestésicos Gerais Os anestésicos gerais são administrados sistemicamente e exercem seus principais efeitos no SNC, em contraste com os anestésicos locais, que funcionam bloqueando a condução dos impulsos nos nervos sensitivos periféricos. Observa-se que compostos muito simples e não reativos produzem efeitos narcóticos, com é o caso do gás xenônio. Para que um fármaco seja útil como anestésico, ele tem que ser prontamente controlável, de forma que a indução e a recuperação sejam rápidas, permitindo que o nível de anestesia seja ajustado conforme o necessário durante a cirurgia. A inalação é, ainda, a via de administração mais comum para os anestésicos, embora a indução seja executada, usualmente, com agentes intravenosos. MECANISMO DE AÇÃO DOS FÁRMACOS ANESTÉSICOS Teoria Lipídica Nos seres humanos, a potência anestésica é usualmente expressa como a concentração alveolar mínima (CAM), necessária para abolir a resposta à incisão cirúrgica em 50% dos indivíduos. O gráfico 5 ao lado corrobora com a teoria lipídica, a qual postula que a potência anestésica está intimamente correlacionada com a solubilidade lipídica, e não com a estrutura química. Efeitos nos Canais Iônicos Muitos anestésicos são capazes, nas concentrações alcançadas durante a anestesia, de inibir a função dos receptores excitatórios, como os receptores ionotrópicos do glutamato, da acetilcolina ou da 5-hidroxitriptamina, bem como reforçar a função dos receptores inibitórios, 3 O coeficiente de partição óleo-água (P) é definido como a relação das concentrações de uma substância em óleo e em água. Para se determinar o valor de P, realiza-se um experimento no qual se misturam uma quantidade conhecida da substância em volumes determinados de uma mistura heterogênea de água e com solvente orgânico imiscível. Para se calcular P utiliza-se a seguinte expressão: 49 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 como o GABA A e a glicina. O canal de potássio com “domínio de dois poros” conhecido como TREK é outro canal especificamente sensível ao anestésico. Ele é ativado, reduzindo assim a excitabilidade da membrana, por baixas concentrações dos anestésicos voláteis. Assim, essas alterações nos canais iônicos têm como alvo domínios hidrofóbicos específicos das proteínas do canal. EFEITOS DOS ANESTÉSICOS NO SISTEMA NERVOSO A anestesia envolve três principais alterações neurofisiológicas: inconsciência, perda da resposta ao estímulo doloroso (analgesia) e perda dos reflexos (relaxamento muscular). Em doses supra-anestésicas, todos os agentes anestésicos podem causar morte pela perda dos reflexos cardiovasculares e por paralisia respiratória. Ao nível celular, os agentes anestésicos afetam a transmissão sináptica, ao invés da condução axonal. A inibição da transmissão sináptica pode ser devida à:  Inibição da ação do transmissor;  Redução na liberação do transmissor excitatório;  Redução da excitabilidade da célula pós-sináptica. Embora esses três efeitos tenham sido descritos, a maioria dos estudos sugere que os dois últimos sejam os fatores principais. Além disso, a transmissão inibitória mediada pelo GABA é aumentada pela maioria dos anestésicos. Apesar de todas as partes do sistema nervoso serem afetadas pelos agentes anestésicos, os principais alvos parecem ser o tálamo, córtex e hipocampo. Ainda, os anestésicos, mesmo em baixas concentrações, causam amnésia de curto prazo. Além disso, a maioria dos agentes anestésicos (com exceções, como a cetamina e os benzodiazepínicos) produz efeitos neurofisiológicos semelhantes e diferem principalmente em relação às suas propriedades farmacológicas e toxicidade. EFEITOS DOS ANESTÉSICOS NO SISTEMA NERVOSO Todos os anestésicos diminuem a contratilidade cardíaca, porém seus efeitos sobre o débito cardíaco e sobre a pressão sanguínea variam. O N 2 O aumenta a descarga simpática e a 30 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 concentração plasmática de noradrenalina e, conseqüentemente, aumenta a freqüência cardíaca e a pressão sanguínea. Já os halotanos e outros anestésicos halogenados têm efeito oposto. Contudo, os fármacos anestésicos halogenados provavelmente causam arritmias cardíacas, acentuadas pelas catecolaminas circulantes. Com exceção do N 2 O e da cetamina, todos os anestésicos deprimem marcantemente a respiração e aumentam a PCO2 arterial. ANESTÉSICOS INALATÓRIOS Os anestésicos inalatórios consistem em pequenas moléculas lipossolúveis que cruzam rapidamente as membranas alveolares e, portanto, os pulmões são a única via quantitativamente importante pela qual esses fármacos entram e saem do corpo. Além disso, é válido acrescentar que a barreira hematoencefálica é livremente permeável aos anestésicos, de forma que a concentração do anestésico no cérebro é muito próxima daquela encontrada no sangue. O coeficiente de partição óleo:gás é uma medida da solubilidade na gordura, determina a potência de um anestésico e também influencia a cinética de sua distribuição no corpo. Seu principal efeito é que uma alta solubilidade retarda a recuperação da anestesia. Já o coeficiente de partição sangue:gás é o principal fator que determina a velocidade de indução e de recuperação de um anestésico inalatório e, quanto menor o valor desse coeficiente, mais rápida será a indução e a recuperação (isto é, coeficientes baixos significam que o anestésico interage muito fracamente com o sangue e, portanto, não ficará retido no mesmo). Se um anestésico com baixo valor de coeficiente de partição sangue:gás for adicionado ao ar inalado em uma concentração que, em equilíbrio, produza anestesia cirúrgica, rapidamente será alcançado um valor de pressão parcial do anestésico na corrente sanguínea (isto é, anestesia com o mínimo de movimentos respiratórios e em um tempo muito curto). O mesmo princípio se aplica em reverso para a remoção do fármaco, com a recuperação sendo mais rápida com o agente de baixa solubilidade. Devido a elevada lipossolubilidade dos anestésicos, pacientes muito gordos demoram mais para entrar numa fase de equilíbrio associada a fase sangue:gás. Nesses casos, quanto maior a ventilação alveolar, mais rapidamente será alcançado o equilíbrio. 31 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 ANESTÉSICOS INALATÓRIOS INDIVIDUAIS Halotano O halotano é um anestésico inalatório amplamente usado, já que a indução e a recuperação são relativamente rápidas. Ele é altamente potente e pode, facilmente, produzir insuficiência respiratória e cardiovascular e, por isso, a concentração administrada precisa ser controlada com precisão. Como efeito adverso, o halotano sensibiliza o coração à adrenalina, predispondo-o a arritmias. Isso é muito importante em cirurgias do feocromocitoma. Outro efeito adverso, mas pouco comum é a hipertermia maligna, síndrome causada pela produção de calor no músculo esquelético, devido à liberação excessiva de Ca 2+ do retículo sarcoplasmático. O resultado é contratura muscular, acidose, aumento do metabolismo e conseqüentemente aumento dramático da temperatura corporal que pode ser fatal se não tratado imediatamente com dantroleno, um fármaco relaxante muscular que bloqueia esses canais de cálcio. Óxido Nitroso (N 2 O) É um gás que apresenta características vantajosas, como rápida ação (↓coeficiente de partição sangue:gás) e poder analgésico efetivo, o que permite seu uso durante o parto. Contudo, até mesmo a 80% em uma mistura com gás inspirado, o N 2 O não produz anestesia cirúrgica (baixa potência) e, portanto, não é utilizado como por si próprio como um anestésico, e sim freqüentemente utilizado como um adjunto para os anestésicos voláteis, permitindo que estes sejam usados em menores concentrações. Trata-se de um gás desprovido de qualquer efeito tóxico sérico, porém a exposição prolongada (>6h) causa inativação da metionina sintase, uma enzima necessária par a síntese de DNA e de proteína, resultando em depressão da medula óssea que pode causar anemia e leucopenia. Assim, seu uso deve ser evitado em pacientes com anemia relacionada com deficiência de vitamina B 12 . Enflurano É um éter halogenado similar ao halotano em sua potência e na velocidade moderada de indução. Ele foi introduzido como uma alternativa ao metoxiflurano, já que é menos lipossolúvel e produz menos F - durante seu metabolismo (menor toxicidade renal). Contudo, 32 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 pode causar convulsões, tanto durante a indução quanto em seguida à recuperação anestésica. Ele ainda pode causar hipertermia maligna. Esoflurano, Desflurano e Sevoflurano O isoflurano é, no momento, o anestésico volátil mais amplamente utilizado. É similar ao enflurano, porém sem propriedades epileptogênicas. Contudo, por ser um potente dilatador coronariano, pode precipitar isquemia miocárdica em pacientes com doença coronariana. O desflurano é quimicamente similar ao isoflurano, porém sua menor solubilidade no sangue e na gordura significa que a indução e a recuperação são mais rápidas. Por essa razão, é um anestésico útil para o uso em cirurgias pequenas com altas no mesmo dia. Contudo, é um irritante respiratório, podendo causar tosse e laringospasmo. O sevoflurano é similar ao desflurano, porém é mais potente e não causa irritação respiratória. Contudo, assim como os outros anestésicos halogenados, pode causar hipertermia maligna. AGENTES ANESTÉSICOS INTRAVENOSOS Os anestésicos intravenosos agem muito mais rápido que os inalatórios, produzindo inconsciência em cerca de 20s. Contudo, são mais comumente usados para indução da anestesia, seguidos por um agente inalatório (exceto propofol e cetamina) Tiopental O tiopental é o único barbitúrico remanescente usado como anestésico. Apresenta uma ação rápida por transpassar facilmente a barreira hematoencefálica. Possui curta duração (cerca de 5min) por causa da redistribuição, principalmente para o músculo (↑vascularização). É lentamente metabolizado e com probabilidade de acumular-se na gordura corporal, portanto, pode causar efeito prolongado se administrado repetidamente. Não possui efeito analgésico e pode causar vasoespasmo grave se injetado acidentalmente na artéria. 33 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Etomidato É similar ao tiopental, porém é metabolizado mais rapidamente. Apresenta menor risco de depressão cardiovascular, podendo causar movimentos involuntários durante a indução, com possível risco de supressão das supra-renais. Propofol É similar ao tiopental, porém tem vantagem de ser rapidamente metabolizado, o que permite recuperação rápida sem qualquer efeito de ressaca. Isso permite que ele seja usado em infusão contínua para manter a anestesia cirúrgica sem a necessidade de agente inalatório algum. Por isso é altamente indicado para cirurgias simples com alta no mesmo dia. Cetamina Produz um estado similar à anestesia e profunda analgesia. Diferentemente dos demais agentes anestésicos intravenosos, a cetamina, provavelmente, atua bloqueando a ativação de receptores de glutamato tipo NMDA. Ela produz uma anestesia “dissociativa”, na qual o paciente pode permanecer consciente, embora com amnésia e insensível à dor. 34 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XII – Anestésicos Locais e outros Fármacos que afetam os Canais de Sódio Nesse tópico serão discutidos anestésicos locais, que atuam principalmente por bloqueio dos canais de sódio e modificação do comportamento de controle de comporta. ANESTÉSICOS LOCAIS Embora muitos fármacos bloqueiem os canais de sódio controlados por voltagem e inibam a geração do potencial de ação, os únicos nessa categoria clinicamente úteis são os anestésicos locais, vários antiepilépticos e os antiarrítmicos de classe I. Os anestésicos locais são bases fracas 6 , constituídas por uma parte aromática unida por uma ligação éster ou amida, com valores de pK a entre 8 e 9, de modo que são principalmente, mas não completamente, ionizadas em pH fisiológico. Os compostos contendo éster são geralmente inativadas no plasma e nos tecidos (principalmente fígado) por esterases inespecíficas. As amidas são mais estáveis, e estes anestésicos, em geral, têm meias-vidas plasmáticas mais longas. Mecanismo de Ação Os anestésicos locais bloqueiam o início e a propagação dos potenciais de ação por impedirem o aumento de condutância de Na + voltagem-dependente. A principal ação desses fármacos é bloquear os canais de sódio, fechando fisicamente o poro transmembrana. Além disso, por se tratarem de bases fracas, a atividade dos anestésicos locais é fortemente dependente do pH, aumentando em pH alcalino (forma não-ionizada = ↑absorção) e reduzindo em pH ácido. Isto porque o composto precisa penetrar a bainha nervosa e a membrana do axônio para chegar à extremidade interna do canal de sódio (onde reside o sítio de ligação aos anestésicos locais). Essa dependência do pH justifica a resistência de tecidos inflamados (pH ácido) a anestésicos locais. Os anestésicos locais quaternários, devido a estrutura química, sempre apresentam carga e, por essa razão, possuem funcionamento do lado de dentro da membrana. Para isso os canais de sódio precisam estar em seu estado aberto pouco antes de aparecer o efeito do 6 A benzocalna e um anesLeslco local aLlplco, pols não possul grupo báslco. 33 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 bloqueio. Já com anestésicos locais terciários, o bloqueio pode se desenvolver mesmo com os canais fechados. O desenho ao lado esquematiza o funcionamento de anestésicos locais terciários e quaternários. Conforme o esquema, o local de bloqueio no canal pode ser alcançado através do portão aberto na superfície interna na membrana pela molécula química carregada BH + (via hidrofílica) ou diretamente da membrana pela molécula química B não- carregada (via hidrofóbica). Muitos anestésicos locais mostram dependência do uso (a profundidade do bloqueio aumenta com a freqüência do potencial de ação). Isso ocorre:  Porque as moléculas de anestésico têm acesso ao canal mais rapidamente quando o canal está aberto;  Porque as moléculas de anestésico têm afinidade maior por canais inativados do que pelos canais em repouso. A dependência do uso tem importância principalmente em relação aos efeitos antiarrítimicos e antiepilépticos dos bloqueadores dos canais de sódio. O bloqueio por anestésico em fibras de menor diâmetro é mais rápido que em fibras de maior calibre e, por essa razão, as fibras nociceptivas são bloqueadas mais rapidamente que as motoras. Os anestésicos locais bloqueiam a condução na seguinte ordem: axônios curtos mielinizados, axônios não-mielinizados, axônios longos mielinizados. A transmissão nociceptiva e simpática é, portanto, bloqueada antes. Efeitos Adversos e Farmacocinética dos Anestésicos Locais Os anestésicos locais de éster são rapidamente hidroxilados pela colinesterase, enquanto que os de amida são metabolizados no fígado. As meias-vidas plasmáticas de ambos são geralmente curtas, cerca de duas horas. Os efeitos adversos resultam principalmente do escape dos anestésicos locais na circulação sistêmica. Os principais são: 36 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137  Efeitos sobre o SNC: confusão, agitação e tremores, prosseguindo para convulsões e depressão respiratória;  Efeitos cardiovasculares: depressão miocárdica e vasodilatação, levando a uma queda na pressão sangüínea;  Reações ocasionais de hipersensibilidade. Os anestésicos locais variam na rapidez com que penetram nos tecidos e na sua duração de ação. A lidocaína penetra nos tecidos prontamente e é apropriada para a aplicação superficial; já a bupivacaína tem uma duração de ação particularmente longa. OUTROS FÁRMACOS QUE AFETAM OS CANAIS DE SÓDIO A tetrodotoxina (TTX), isolada do peixe baiacu, e saxitoxina (STX), produzida por microrganismos presentes na maré vermelha, são toxinas que, diferente dos anestésicos convencionais, atuam exclusivamente pelo lado de fora da membrana, sendo que sua associação ou dissociação são independentes de o canal estar aberto ou fechado. Ambas são moléculas complexas que exibem uma porção guanidínio com carga positiva. O íon guanidínio é capaz de passar pelos canais de sódio sensíveis à voltagem, e esta parte da molécula e do TTX ou da STX aloja-se no canal, enquanto o restante da molécula bloqueia a sua abertura externa. Alguns canais de sódio sensíveis à voltagem são insensíveis à TTX , notavelmente aqueles do músculo cardíaco e dos neurônios sensoriais periféricos nociceptivos, o último sendo de interesse como um possível alvo para os novos agentes analgésicos. 37 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XIII – Fármacos Analgésico MECANISMOS NEURAIS DE DOR Basicamente, os mecanismos neurais da dor consistem em:  Neurônio aferente nociceptivo periférico, que é ativado por estímulos nociceptivos;  Mecanismos centrais pelos quais a aferência gera sensação de dor. Neurônios Aferentes Nociceptivos A dor 7 associa-se à atividade de impulsos em fibras aferentes primárias de pequeno diâmetro dos nervos periféricos. Esses nervos têm terminações sensitivas que são ativadas por estímulos mecânicos, térmicos ou químicos. Contudo, são fibras que apresentam um limiar mais elevado e, portanto, só são ativadas por estímulos de intensidade nociceptivas. No homem, duas fibras têm relevância no estudo da dor:  Fibra C: são fibras não-mielinizadas, com baixa velocidade de condução. Relacionam- se com dor em queimação, surda e difusa. Esse grupo é conhecido como nociceptores polimodais;  Fibra Aδ: são fibras mielinizadas ligadas a mecanorreceptores com limiar alto. Relacionam-se com dor aguda e bem localizada. Os corpos celulares das fibras aferentes nociceptivas situam-se nos gânglios da raiz dorsal. As fibras entram na medula espinhal através das raízes dorsais, terminando na substância cinzenta do corno posterior. Os neurônios aferentes não-mielinizados contêm vários neuropeptídeos, particularmente a substância P e o peptídeo relacionado ao gene da calcitonina (CGRP). Estes 7 É importante ressaltar uma pequena diferença: a nocicepção é o mecanismo pelo qual estímulos periféricos nocivos são transmitidos ao sistema nervoso central; já a dor é uma experiência subjetiva, nem sempre associada à nocicepção (p. ex.: uma espetada de lápis pode doer ou não, mesmo que a intensidade do estímulo nociceptivo se mantenha. 38 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 são liberados como mediadores nas terminações centrais e periféricas e desempenham importante papel na patologia da dor. Modulação na Via Nociceptiva A dor aguda consiste em um estímulo nociceptivo excessivo dando origem a uma sensação intensa e desagradável. Já as dores crônicas resulta de aberrações da via fisiológica, dando origem a hiperalgesia, aumento da intensidade da dor associada a um estímulo nocivo leve, alodinia, dor provocada por um estímulo não-nocivo, ou dor espontânea, dor sem qualquer estímulo precipitante. A hiperalgesia envolve sensibilização das terminações nervosas nociceptivas periféricas e facilitação central da transmissão no nível do corno posterior e tálamo – alterações definidas como neuroplasticidade. O componente periférico deve-se à ação de mediadores como a bradicinina e as prostaglandinas atuando sobre as terminações nervosas. O componente central reflete a facilitação da transmissão sináptica (↑sensibilização) e deve-se à ação da substância P, do CGRP, bem como do Fator de crescimento neural (NGF), um mediador produzido pelos tecidos periféricos, particularmente na inflamação, que atua especificamente sobre os neurônios aferentes nociceptivos, aumentando sua excitabilidade elétrica, a quimiossensibilidade e o conteúdo de peptídeos e também promovendo a formação de contatos sinápticos. O aumento da produção de NGF pode ser importante mecanismo pelo qual a transmissão nociceptiva torna-se facilitada na lesão tecidual, levando a hiperalgesia. 39 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 A citação de neurônios sensitivos nociceptivos depende, como em outros neurônios, de canais de sódio controlados pela voltagem. No corno posterior, a facilitação é bloqueada por antagonistas do receptor NMDA, também pelos antagonistas da substância P e por inibidores da síntese da síntese do NO. Por essa razão, muitos antiepilépticos e antiarrítmicos, que atuam por bloqueio de canais de sódio, também encontram aplicação clínica como analgésicos. Substância Gelatinosa e Teoria do Controle da Comporta As células da lâmina II do corno posterior (substância gelatinosa, SG) são principalmente interneurônios inibitórios curtos que se projetam à lâmina I e à lâmina V e regulam a transmissão na primeira sinapse da via nociceptiva entre as fibras aferentes primárias e os neurônios de transmissão do trato espinotalâmico. A SG é rica em peptídeos opióides e receptores para opióides, e pode ser local importante de ação para fármacos semelhantes à morfina. Controles Inibitórios Descendentes As vias descendentes constituem um dos mecanismos de controle da comporta. Uma parte chave desse sistema descendente é a área cinzenta periaquedutal (CPA) do mesencéfalo. A CPA recebe aferências de muitas outras regiões cerebrais, inclusive do hipotálamo, córtex e tálamo, sendo a principal via através da qual aferências corticais e outras atuam sobre o controle da comporta nos impulsos nociceptivos no corno posterior. Dois transmissores importantes nessa via são a 5-hidroxitriptamina e a encefalina, que atuam, diretamente ou através de interneurônios, inibindo a descarga de neurônios espinotalâmicos. Tanto a CPA quanto a SG são particularmente ricas em neurônios contendo encefalinas. 60 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Dor neuropática É uma doença neurológica que afeta a via sensitiva e pode produzir dor crônica intensa, sem guardar relação com qualquer lesão tecidual periférica. Isto ocorre em distúrbios do SNC, tais como AVC e esclerose múltipla, ou condições associadas à lesão nervosa periférica, como lesão mecânica, neuropatia diabética ou infecção pelo herpes zoster. A parte simpática do SN também desempenha uma papel, pois os neurônios sensitivos lesados podem exprimir receptores α-adrenérgicos e desenvolver uma sensibilidade à noradrenalina, a qual é expressada em situações de ativação do simpático. Trata-se de uma dor de difícil controle com os fármacos analgésicos convencionais. Sinalização Química na Via Nociceptiva Quimiossensibilidade das Terminações Nervosas Nociceptivas Um excesso de estímulos mecânicos ou térmicos obviamente pode causar dor aguda, mas a persistência de tal dor depois de removido o estímulo reflete alteração do ambiente químico dos aferentes de dor. Os principais grupos de substâncias que estimulam as terminações nervosas na pele são: a) Receptor Vanilóide (TRPV1): é um receptor com características polimodais, que responde a agonistas, como a capsaicina, bem como a outros estímulos, incluindo temperaturas excessivas (~45ºC), pH < 5,5. A capsaicina, substância das pimentas, é um potente agonista TRPV1 e, portanto, estimula a abertura de canais permeáveis a Na + , Ca 2+ e outros cátions, causando despolarização e início de potenciais de ação; b) Cininas: compreende a bradicinina e a calidina. A bradicinina é potente na produção da dor, uma vez que atua sobre receptores B 2 de neurônios nociceptivos, os quais ativam uma proteína quinase C (PKCε), que fosforila TRPV1 e facilita a abertura do canal aos íons; c) Prostaglandinas: são liberadas na reação inflamatória ou sob ação da bradicinina (efeito de auto-sensibilização). As prostaglandinas não causam dor por si só, mas, devido a sensibilização das terminações nervosas (inibição de canais de K + ou facilitação de canais de Na + ), intensificam o efeito produtor de dor de outros agentes, como 5-hidroxitriptamina ou bradicinina; 61 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 ANALGÉSICOS Fármacos Semelhantes à Morfina O termo opióide aplica-se a substância, endógena ou sintética, que produza efeitos semelhantes aos da morfina e que sejam bloqueados por antagonistas como a naloxona. Aspectos Químicos Os principais grupos de fármacos discutido são os seguintes: a) Análogos da Morfina: são compostos com estrutura estreitamente relacionada à da morfina e que costuma ser sintetizados a partir dela. Podem ser agonistas (morfina, heroína e codeína), agonistas parciais (nalorfina e levalorfano) ou antagonistas (naloxona). b) Derivados Sintéticos:  Série da Fenilpiperidina: a petidina foi o primeiro fármaco semelhante à morfina inteiramente sintético. A fentanila é um derivado mais potente, sendo usados por via intravenosa para dor crônica ou por meio de adesivos para complementar a ação da anestesia.  Série da Metadona: a metadona tem ação mais longa que a da morfina, guardando grande semelhança com esta. O dextropropoxifeno é muito semelhante e foi utilizado para tratar dor leve ou moderada, mas é cardiotóxico.  Série do Benzomorfano: diferem da morfina em seu perfil de ligação a receptores. Os mais importantes são pentazocina e ciclazocina. 62 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137  Derivados da Tebaína: a etorfina é um fármaco semelhante à morfina e é altamente potente, contudo utilizado na prática veterinária. Receptor Opióide Existem três tipos de receptores de opióides, denominados µ, δ, κ 5 , que medeiam os principais efeitos farmacológicos dos opiáceos. Contudo, estudos sugerem que os receptores µ sejam responsáveis pela maioria dos efeitos analgésicos dos opióides e por alguns efeitos adversos importantes (depressão respiratória, euforia, sedação e dependência). Ainda, a maioria dos opióides analgésicos são agonistas dos receptores µ. Mecanismo de Ação Todos os receptores de opióides estão ligados através de proteínas G para inibição de adenil ciclase, assim reduzindo o conteúdo intracelular de AMPc. Também facilitam a abertura dos canais de potássio (hiperpolarização) e inibem a abertura dos canais de cálcio voltagem dependente (↓[Ca] i = inibição da liberação de transmissor). Esses efeitos de membrana reduzem a excitabilidade neuronal. Em nível espinal, os opiódes, em especial a morfina, inibem a transmissão de impulsos nociceptivos através do corno posterior e suprime os reflexos espinhais nociceptivos, mesmo nos pacientes com transecção da medula espinhal. Ações Farmacológicas Os efeitos mais importantes da morfina ocorrem no SNC e no trato gastrointestinal.  Analgesia  Euforia (contentamento)  Depressão respiratória = ↑PCO2  ↓motilidade gástrica = constipação  Náuseas e vômitos (40%)  Miose (estimula núcleo oculomotor)  Suprime a tosse (agente antitussígeno); A depressão respiratória resulta da diminuição da sensibilidade do centro respiratória à PCO2. O efeito local da morfina e de outros opiáceos sobre os neurônios do plexo mioentérico é inibitório, associado à hiperpolarização decorrente de aumento da condutância de K + . Outro efeito da morfina é a liberação de histamina por mastócitos por ação não relacionada aos receptores opióides, o que resulta em constrição brônquica e hipotensão. Portanto, a morfina não deve ser utilizada em pacientes asmáticos. Além disso, há evidências de que o sistema imune é deprimido por abuso dos opiáceos por longo tempo, levando a aumento da suscetibilidade a infecções. 63 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Tolerância e Dependência A tolerância para a morfina desenvolve-se rapidamente, sendo acompanhada pela síndrome da dependência física. O mecanismo de tolerância pode envolver supra-regulação adaptativa da adenil ciclase, uma vez que a infra-regulação dos receptores não é um fator importante. Portanto, os dependentes podem tomar doses 50 vezes acida da dose analgésica normal de morfina com depressão respiratória relativamente pequena, mas acentuadas constipação e miose. Contudo, em ambientes clínicos, a dose de opiáceo necessária para alívio efetivo da dor pode aumentar em decorrência do desenvolvimento de tolerância, mas não constitui um grande problema. A dependência compreende dois componentes:  Dependência Física: associada à síndrome de abstinência que dura alguns dias ou semanas, com sintomas de agitação, coriza, diarréia, tremores e piloereção;  Dependência Psicológica: associada ao desejo compulsivo, dura messes ou anos. Contudo ela raramente ocorre em pacientes que estejam recebendo opióides como analgésicos. Certos analgésicos opióides, como a codeína, a pentazocina, a buprenorfina e o tramadol, têm muito menos probabilidade de causar dependência física ou psicológica. Aspectos Farmacocinéticos A absorção dos opióides varia de acordo com o fármaco utilizado. A morfina, por exemplo, apesar de ser lentamente absorvida, pode ser usada como dose oral para dor crônica (liberação lenta), bem como por injeção intravenosa ou intramuscular para dor aguda (rápida ação). A meia vida plasmática da maioria dos análogos da morfina é de 3-6h. o metabolismo hepático é a principal modalidade de inativação, geralmente por conjugação com glicuronídeo. Esses compostos conjugados de morfina pode ser eliminados pelas fezes ou então pela urina, de modo que a dose precisa ser reduzida em casos de insuficiência renal. Efeitos Adversos A super dosagem aguda com morfina resulta em coma e depressão respiratória, caracteristicamente com miose. É tratada com naloxona por via intravenosa, a qual também serve como teste para diagnostico, pois a falha de resposta à naloxona sugere que a intoxicação não tenha sido causada por opiáceos. 64 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Outros Analgésicos Opiáceos A dimorfina (heroína) é o derivado diacetilado da morfina. No corpo, é rapidamente desacetilada à morfina, e seus efeitos são indistinguíveis após a administração oral. No entanto, em razão de sua maior lipossolubilidade, atravessa a barreira hematoencefálica mais rapidamente que a morfina e dá maior afluência quando injetada por via intravenosa. Sua única vantagem sobre a morfina é a maior solubilidade, que permite que menores volumes sejam dados por via oral, por via subcutânea ou por via intratecal. Exerce o mesmo efeito depressor respiratório que a morfina e, se dada por via intravenosa, tem mais probabilidade de causar dependência. A codeína (3-metilmorfina) possui uma potência analgésica de 20% ou menos que a morfina. Ela produz o mesmo grau de depressão respiratória que a morfina, mas a resposta limitada até em doses altas significa que quase nunca é um problema na prática. A petidina (meperidina) é preferida à morfina para analgesia durante trabalho de parto, porque não reduz a força da contração uterina. A metadona também é farmacologicamente semelhante à morfina, sendo a principal diferença que sua duração de ação é consideravelmente mais longa (meia-vida plasmática > 24h) e, por essa razão, ela é amplamente usada como meio de tratar a dependência à morfina. 63 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XIV – Fármacos usados no Tratamento das Infecções e do Câncer A BASE MOLECULAR DA QUIMIOTERAPIA Os quimioterápicos são substâncias químicas designadas para serem tóxicas ao organismo patogênico (ou células cancerosas), porém inócuas para o hospedeiro. Essa toxicidade seletiva depende da descoberta das diferenças bioquímicas entre o patógeno e o hospedeiro que possam ser adequadamente exploradas. Reações Bioquímicas como Alvos Potenciais Reações de Classe I Consiste em interferir em reações que utilizam a glicose e outras fontes de carbono para produzir ATP e compostos carbônicos simples. Contudo não são alvos promissores, já que as células bacterianas e humanas usam mecanismos similares. Além disso, mesmo que a oxidação da glicose fosse bloqueada, muitos outros compostos (aminoácidos, lactato, etc.) poderiam ser utilizados pelas bactérias como fonte alternativa de energia. Reações de Classe II Consiste em interferir em vias que utilizam a energia e os compostos de classe I para fazerem pequenas moléculas. Nesse caso são importantes as vias presentes nas células do patógeno e ausentes na célula do hospedeiro, bem como vias comuns a ambos, desde que haja uma sensibilidade diferencial aos fármacos.  Folato: a biossíntese do folato é um exemplo de uma via metabólica encontrada nas bactérias, porém não em seres humanos. O folato é necessário para a síntese de DNA, tanto nas bactérias quanto nos homens e, portanto, estes últimos têm que obtê-lo a partir da alimentação. Dessa forma, uma estratégia quimioterápica a muito utilizada é a administração de sulfonamidas, as quais competem com o PABA pela enzima envolvida na síntese de folato e, assim, inibem o metabolismo bacteriano. Como a maioria das espécies de bactérias não apresenta os mecanismos necessários para o transporte de folato pré-formado a partir domeio extracelular , o resultado é a morte. A utilização do folato, na forma de tetraidrofolato, como um co-fator na síntese 66 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 de timidilato é um exemplo de uma via em que se observa uma sensibilidade diferencial das enzimas humanas e bacterianas a substâncias químicas. Esta via é praticamente idêntica nos microrganismos e nos seres humanos, porém uma das enzimas-chave, a diidrofolato redutase, que reduz o diidrofolato a tetraidrofolato, é muitas vezes mais sensível ao antagonista do folato (trimetoprima) nas bactérias do que nos seres humanos. O uso de bloqueio seqüencial através de uma combinação de dois fármacos, que afetam a mesma via no parasita em diferentes pontos, como, por exemplo, sulfonamidas e antagonistas do folato, pode ter mais êxito do que a administração de qualquer um desses fármacos isoladamente. Além disso, concentrações menores são efetivas quando os dois são usados em conjunto. Reações de Classe III Consiste em interferir em vias que convertem as pequenas moléculas em macromoléculas como proteínas, ácidos nucléicos e peptídeoglicano.  Síntese de Peptídeoglicano: A parede celular da maioria das bactérias contém peptideoglicanos, uma substância que não ocorre nos eucariontes. A síntese desse constituinte é uma etapa vulnerável e pode ser bloqueada em vários pontos por antibióticos, como ciclosserina, vancomicina e as penincilinas.  Síntese Protéica: O ribossomo bacteriano consiste em uma subunidade 50S e em uma subunidade 30S, enquanto que no ribossomo dos mamíferos as subunidades são 60S e 40S. Assim, os antibióticos podem afetar a síntese protéica em qualquer um de seus estágios.  Síntese de Ácido Nucléico: é possível interferir com a síntese de ácido nucléico de cinco maneiras diferentes: inibição da síntese de nucleotídeos, alteração das propriedades de pareamento das bases no molde, inibição da DNA ou RNA- polimerase, inibição da DNA-girase (topoisomerase) ou pelo efeito direto no próprio DNA. Estruturas Formadas da Célula como Alvos Potenciais A membrana plasmática bacteriana é similar às das células dos mamíferos, porém ela pode ser mais facilmente alterada em certas espécies bacterianas e fúngicas. As polimixinas são antibióticos peptídeos catiônicos, contendo tanto grupos hidrofílicos quanto lipofílicos, 67 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 que têm efito seletivo nas membranas celulares bactérias. Elas agem como detergentes, alterando os componentes fosfolipídicos da estrutura da membrana, destruindo assim a célula. No caso das células fúngicas, a presença de ergosterol possibilita o desenvolvimento de fármacos que inibem a síntese dês esteróide, como os azóis, ou mesmo que agem como ionóforo, causando extravasamento de cátions, como polienos (anfotericina e nistatina). O funcionamento dos microtúbulos pode ser alterado por diversos agentes, como os benzoimidazóis (albendazol), que exercem sua ação anti-helmíntica ligando-se seletivamente à tubulina do parasita, ou como a vimblastina e vincristina, que agem como agentes anticancerígenos que comprometem o funcionamento dos microtúbulos durante a meiose. RESISTÊNCIA AOS FÁRMACOS ANTIBACTERIANOS O fenômeno da resistência impõe sérias restrições às opções disponíveis para o tratamento clínico de muitas infecções bacterianas. A resistência a antibióticos nas bactérias dissemina-se de três maneiras:  Transferência de bactérias entre as pessoas;  Transferência dos genes da resistência entre as bactérias;  Transferência de genes da resistência entre os elementos genéticos no interior da bactéria, nos transposons. Determinantes Genéticos da Resistência ao Antibiótico A taxa de mutações espontâneas nas populações bacterianas é muito baixa, cerca de 1:10.000. Entretanto, como é provável que existam muito mais células que isto na evolução de uma infecção, a probabilidade de uma mutação causar desde alteração na sensibilidade ao fármaco até resistência ao fármaco pode ser bastante elevada. Contudo, felizmente, uns poucos mutantes não são suficientes para produzir resistência, pois a redução drástica na população pelo antibiótico usualmente possibilita a prevalência das defesas naturais do hospedeiro. Os plasmídeos consistem em alças fechadas de DNA que podem compreender um único gene ou até tantos quanto 500 ou até mesmo mais. Muito da resistência aos fármacos encontrada na prática clínica é determinada por plasmídeos. Alguns segmentos de DNA (transposons) são prontamente transferidos (transpostos) de um plasmídeo para o outro, e também do plasmídeo para o cromossomo, ou vice-versa. 68 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Contudo, ao contrário dos plasmídeos, os transposons não são capazes de replicar-se independentemente. Assim, os transposons podem transportar um ou mais genes de resistência e, ainda, podem “pegar carona” em um plasmídeo para uma nova bactéria. A Transferência dos Genes de Resistência entre as Bactérias Dos principais mecanismos de transferência gênica descritos abaixo, o mais importante é a conjugação, sendo os outros de pouca importância.  Transformação: é um processo que ocorre principalmente em ambiente aquático. Nele a bactéria doadora morre, o que propicia a degradação do DNA que é solúvel no meio. A bactéria receptora, então, engloba o fragmento de DNA, o qual passa por uma análise para identificar se o mesmo tem origem bacteriana. Em caso afirmativo, o fragmento de DNA é incorporado durante o processo de replicação, o que origina uma célula filha com a variabilidade  Transdução: o fago infecta a bactéria e coordena o metabolismo desta para produzir novos vírus. Durante a produção do capsídeo, para armazenar o material genético virótico, pode ocorrer um erro que culmina com a produção de um fagócito defectivo em cujo interior encontra-se o DNA barteriano com uma ou duas fitas. Nesse processo, tanto a bactéria doadora, quanto a bactéria receptora devem compartilhar do mesmo receptor par o fago em questão. Logo, a probabilidade de ocorrer esse processo é maior em bactérias com maior proximidade filogenética. Replicação Bactéria Recombinante 69 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137  Conjugação: nesse processo, normalmente, ocorre a transferência de uma fita do DNA plasmidial por meio do pili sexual da bactéria doadora. O plasmídeo conjugativo é o responsável pela decodificação para formar o pili sexual. Vale ainda ressaltar que nem todo plasmídeo é conjugativo. Mecanismos Bioquímicos de Resistência aos Antibióticos Os principais mecanismos são os seguintes:  Produção de enzimas que inativam o fármaco: por exemplo, as β-lactamases, que inativam a penicilina; as acetiltransferases, que inativam o cloranfenicol; e as quinases e outras enzimas, que inativam os aminoglicosídeos;  Alteração dos locais de ligação do fármaco: isso ocorre com os aminoglicosídeos, eritromicina e penicilina;  Redução da captura do fármaco pela bactéria: isso ocorre por meio de efluxo dependente de energia, sendo exemplificado para as tetraciclinas;  Alteração das vias enzimáticas: por exemplo, a diidrofolato redutase torna-se insensível à trimetoprima. 70 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XV – Fármacos Antibacteriano A parede celular dos microrganismos gram-positivos é uma estrutura relativamente simples, de 15-50nm de espessura. Consiste em cerca de 50% de peptidoglicanos, em cerca de 40-45% de polímeros ácidos (que resultam da elevada polaridade da superfície celular e que apresentam carga negativa) e em cerca de 5-10% de proteínas e polissacarídios. A camada de polímeros fortemente polares influencia a penetração de moléculas ionizadas e favorece a entrada de compostos com carga positiva, como a estreptomicina, na célula. A parede celular dos microrganismos gram-negativos é muito mais complexa. A partir da membrana plasmática, de dentro para fora, consiste nos seguintes componentes:  Um espaço periplasmático, que contém enzimas e outros componentes;  Camada de peptidoglicano de 2 nm de espessura (5% da massa da parede celular);  Membrana externa, que consiste numa dupla camada de lipídios, semelhante, em alguns aspectos, à membrana plasmática; contém moléculas de proteína e, em sua face interna, apresenta lipoproteínas ligadas ao peptidoglicano;  Polissacarídios complexos 8 , que representam importantes componentes da superfície externa; os quais constituem os principais determinantes da antigenicidade do microrganismo. AGENTES ANTIMICROBIANOS QUE INTERFEREM COM A SÍNTESE OU COM A AÇÃO DO FOLATO Sulfonamidas A sulfanilamida é um análogo estrutural do PABA (precursor do ácido fólico) e compete com este pela enzima diidropteroato sintetase. Assim, a ação da sulfonamida é inibir o crescimento bacteriano (efeito bacteriostático), já que o folato é essencial para a síntese dos precursores do DNA e do RNA. A resistência aos fármacos, que é comum, é mediada por plasmídeo e resulta da síntese de uma enzima bacteriana insensível ao fármaco. Além disso as sulfonamidas não têm efeito na presença de pus, uma vez que as bactérias utilizam diretamente timidina e purina presentes no local da degeneração tecidual. As sulfonamidas são prontamente absorvidas no trato gastrintestinal e alcança concentrações máximas no plasma em 4-6h. Os efeitos adversos incluem a cristalúria e as hipersensibilidades. Elas ainda podem cruzar as barreiras placentária e hematoencefálica. Os 8 Os polissacarídios complexos constituem as endotoxinas. 71 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 principais exemplos são: sulfadiazina, sulfadimidina, sulfametoxazol, sulfametopirazina (longa duração) e sulfassalazina (↓ absorção no TGI). Trimetoprima Trata-se de um antagonista do folato, cuja similaridade química é próxima o suficiente para enganar a diidrofolato redutase bacteriana, que é muitas vezes mais sensível à trimetoprima que a enzima equivalente nos seres humanos. Por isso é um agente bacteriostático. A trimetoprima é prontamente absorvida no trato gastrintestinal e alcança altas concentrações nos pulmões e nos rins, e concentrações razoavelmente elevadas no líquido cefalorraquidiano (LCR). Por se tratar de uma base fraca, sua eliminação pelos rins aumenta com a diminuição do pH urinário. ANTIBIÓTICOS β-LACTÂMICOS Penicilina Todos os antibióticos β-lactâmicos interferem na síntese do peptideoglicano da parede celular bacteriana. Após a sua fixação a sítios de ligação na bactéria (denominados proteínas de ligação da penicilina, das quais pode haver sete ou mais tipos em diferentes microrganismos), os antibióticos β-lactâmicos inibem a enzima de transpeptidação que forma ligações cruzadas das cadeias peptídicas ligadas ao arcabouço do peptidoglicano. O evento bactericida final consiste na inativação de um inibidor das enzimas autolíticas na parede celular, levando à lise da bactéria. Uma das primeiras penicilinas foi a benzilpenicilina, que ocorrem naturalmente e ainda é o fármaco de primeira escolha para muitas infecções. Suas principais restrições são a baixa absorção pelo TGI (administração por injeção) e a susceptibilidade às β-lactamases bacterianas. Por meio de modificações laterais no núcleo da penicilina, várias compostos semi-sintéticos foram preparados. Assim, penicilinas resistentes à β-lactamases 72 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 (flucloxacilina) e penicilinas de largo espectro (ampicilina, pivampicilina e amoxicilina 9 ) foram produzidas. As penincilinas podem ser administradas via oral ou intramuscular, dependendo da cinética de absorção pelo TGI. Por não serem solúveis nos lipídeos, elas não entram nas células dos mamíferos e não cruzam, portanto, a barreira hematoencefálica, a menos que as meninges estejam inflamadas, caso em que alcançam prontamente concentrações terapêuticas efetivas também do LCR. A maior parte das penicilinas é excretada rapidamente pelos rins, o que acarreta em uma meia-vida plasmática curta. Cefalosporinas e Cefamicinas As cefalosporinas e as cefamicinas, agentes hidrossolúveis e relativamente estáveis em ácido, foram inicialmente extraídas de fungos e, ao longo dos anos, da mesma forma que a penicilina, foram modificadas quimicamente para reduzir a susceptibilidade às β-lactamases. Assim, os membros originais do grupo, como a cefradina, a cefalexina e o cefradoxil, foram amplamente substituídos por fármacos de “segunda geração”, como a cefotaxima, a ceftazidima e a ceftriaxona. O mecanismo de ação desses agentes é similar ao das penicilinas, ou seja, interferência com a síntese de peptideoglicano bacteriano depois da ligação com as proteínas ligadoras dos β-lactâmicos. A resistência a esse grupo de fármacos aumentou por causa das β-lactamases. Algumas cefalosporinas podem ser administradas oralmente, porém a maioria é administrada via intramuscular, parenteral ou intravenosa. Elas se distribuem amplamente pelo corpo e algumas, principalmente os fármacos de segunda geração, podem atravessar a barreira hematoencefálica. A eliminação se dá pela bile e por via renal. Cabapenens e Monobactâmicos As carbapenens e os monobactâmicos foram desenvolvidos para enfrentar os microrganismos gram- negativos produtores de β-lactamase resistentes à penicilina. 9 A amoxilina é, às vezes, combinada com um inibidor da β- lactamase, o ácido clavulânico. 73 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Os carbapenens possuem um espectro muito amplo de atividade antimicrobiana, sendo ativo contra muitos microrganismos gram-positivos e gram-negativos aeróbios e anaeróbios. O imipenem 10 é um dos principais exemplos e, originalmente, era resistente a todas as β- lactamases. Contudo, alguns microrganismos possuem agora genes cromossômicos codificando β-lactamases que hidrolisam o imipenem. Dentre os monobactâmicos, o principal é o aztreonam, um β-lactâmico efetivo apenas contra bastonetes aeróbicos gram- negativos (Pseudomonas sp., Neisseria meningitidis e Haemophilus influenzae), não apresentando ação contra microrganismos gram- positivos ou anaeróbios. Uma vantagem desse medicamento é que ele não causa reações alérgicas nos indivíduos sensíveis à penicilina. AGENTES ANTIMICROBIANOS QUE COMPROMETEM A SÍNTESE PROTÉICA BACTERIANA Tetraciclinas Após a captura pelos microrganismos sensíveis por transporte ativo, as tetraciclinas atuam inibindo a síntese protéica. O mecanismo de ação consiste em competir com o tRNA pelo sítio de ligação A na unidade 50S e, dessa forma, interferir no processo de montagem da proteína. As tetraciclinas são consideradas bacteriostáticas, e não bactericida. As tetraciclinas são antibióticos de amplo espectro. O grupo inclui a tetraciclina, a oxitetraciclina, a doxiciclina e a minociclina. A resistência apresentada a esses fármacos é de origem plasmidial e, como os genes que controlam a resistência às tetraciclinas estão intimamente associados aos genes para resistência aos outros antibióticos, os microrganismos podem desenvolver resistência a muitos fármacos simultaneamente. A absorção da maioria das tetraciclinas pelo TGI é irregular e incompleta, porém pode melhorar na ausência de alimentos, uma vez que essa droga é um quelante de metais como Fe e Ca. Portanto, a ingestão de leite concomitante ao medicamento diminui o processo de absorção do fármaco. Dentre os efeitos adversos mais comuns, podem-se citar distúrbios 10 O imipenem é usado com a cilastina, que bloqueia sua degradação no rim. 74 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 gastrointestinais e hipovitaminose B. Além disso, por serem agentes quelantes, as tetraciclinas se depositam nos ossos e dentes em crescimento, causando manchas ou deformidades ósseas. 73 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Cloranfenicol Assim como a eritromicina e a clindamicina, o cloranfenicol se liga à subunidade 50S do ribossomo bacteriano para inibir a síntese protéica. Trata-se de um antibiótico bacteriostático de amplo espectro, incluindo gram-positivas, gram-negativas e riquétsias. A resistência é produzida pela enzima cloranfenicol acetiltransferase, mediada por plasmídeo. A administração oral é acompanhada por uma absorção rápida e completa, sendo amplamente distribuído nos tecidos, incluindo o LCR. É um fármaco inativado no fígado e eliminado na urina. O efeito adverso mais importante é a depressão severa e idiossincrásica da medula óssea, resultando em pancitopenia. Portanto, o cloranfenicol deve ser reservado para as infecções sérias nas quais o benefício do fármaco supere sua toxicidade hematológica incomum, porém séria. Ainda pode-se citar os distúrbios gastrointestinais secundários à alteração da flora indígena intestinal. Aminoglicosídeos Os principais agentes aminoglicosídeos são a gentaminicina, a estreptomicina, a amicacina, a tobramicina, a netilmicina e a neomicina. O mecanismo de ação consiste na ligação desses antibióticos bactericidas na subunidade 30S, o que acarreta alterações na conformação do mRNA, interrompendo ou gerando sínteses protéicas com erros. São agentes efetivos contra muitos microrganismos gram-negativos e contra alguns microrganismos gram- positivos, sendo amplamente utilizados contra microrganismos entéricos gram-negativos e na sepse. Os aminoglicosídeos apresentam ação mínima contra microrganismos anaeróbios. A resistência consiste na inativação desses fármacos por enzimas microbianas ou na deficiência na penetração, sendo que esta última pode ser largamente superada pelo uso concomitante de penicilina e/ou vancomicina. Os aminoglicosídeos são policátions (altamente polarizados) e, portanto, não são absorvidos pelo trato gastrintestinal, sendo usualmente administrado por via intramuscular ou intravenosa. Ele cruza a barreira placentária, mas não a hematoencefálica. Os efeitos adversos de maior risco são a ototoxicidade, com lesões progressivas das células sensitivas da cóclea e do vestíbulo, e a nefrotoxicidade, com lesões dos túbulos renais. Macrolídeos Os principais macrolídeos são a eritromicina, a claritromicina e a azitromicina. O mecanismo de ação consiste na ligação desses fármacos na subunidade 50S, o que inibe a 76 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 síntese protéica por impedir o processo de translocação do tRNA. Os fármacos ligam-se à mesma unidade 50S do ribossomo bacteriano que o cloranfenicol e a clindamicina, e os três fármacos podem competir se administrados conjuntamente. O espectro antimicrobiano da eritromicina é muito similar ao da penicilina, e ela mostrou ser uma alternativa segura e efetiva para os pacientes sensíveis à penicilina. A eritromicina é efetiva contra bactérias e espiroquetas gram-positivas e tem excelente ação contra o Toxoplasma gondii, destruindo o cisto. A resistência pode ocorrer em virtude de uma alteração controlada por plasmídeo no sítio de ligação da eritromicina no ribossomo bacteriano. Os três medicamentos descritos acima podem ser administrados oral e parenteralmente e se difundem prontamente na maioria dos tecidos, porém não cruzam a barreira hematoencefálica e há pouca penetração no líquido sinovial. Os macrolídeos entram e, na verdade, concentram-se nos fagócitos e, por essa razão, podem reforçar a morte de bactérias que vivem no interior de macrófagos. Os efeitos desses fármacos no sistema citocromo P450 podem afetar a biodisponibilidade de outros fármacos. A principal via de eliminação é por meio da bile. Dentre os efeitos adversos, podem-se citar os distúrbios gastrintestinais, que são comuns e não sérios, as reações de hipersensibilidade, febre, distúrbios da audição e icterícia colestática. Estreptograminas A quinupristina e a dalfopristina são os principais membros deste grupo. O mecanismo de ação é inibir a formação de proteína ligando-se à subunidade 50S do ribossomo bacteriano. A dalfopristina altera a estrutura do ribossomo de modo a promover a ligação da quinupristina, o que provavelmente explica a efetividade melhorada dos fármacos quando administrados em conjunto. Ambas as drogas são degradadas no fígado e precisam ser administradas por infusão intravenosa. Dentre os efeitos adversos, podem-se citar inflamação e dor no local da infusão, artralgia, mialgia e náuseas, vômitos e diarréia. Lincosamidas A clindamicina é ativa contra cocos gram-positivos, incluindo muitos estafilococos resistentes à penicilina e muitas bactérias anaeróbicas, tais como as espécies Bacteroides. Seu mecanismo de ação envolve a inibição da síntese protéica através de uma ação similar à dos macrolídeos e do cloranfenicol. 77 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Esse medicamento pode ser administrado oral ou parenteralmente, sendo amplamente distribuído nos tecidos (incluindo ossos), mas não cruza a barreira hematoencefálica. Trata-se de um medicamento metabolizado no fígado e eliminado na bile ou na urina. Os efeitos adversos consistem principalmente em distúrbios gastrintestinais, podendo ocorrer a colite pseudomembranosa 11 , uma situação potencialmente letal. Oxalazidononas É uma nova classe de agentes antibacterianos, sendo a linezolida seu primeiro membro. O mecanismo de ação consiste na inibição da ligação tRNA-metionina ao ribossomo 80S. É um medicamento ativo contra uma ampla variedade de bactérias gram-positivas e bactérias anaeróbias. O fármaco está usualmente restrito à infecções bacterianas sérias onde outros antibióticos falharam. A linezolida pode ser administrada oralmente ou por infusão intravenosa e seus principais efeitos adversos incluem trombocitopenia, diarréia e náusea. Ácido Fusídico É um antibiótico esteróide de pequeno espectro, ativo principalmente contra bactérias gram-positivas. O mecanismo de ação consiste na ligação desses fármacos na subunidade 50S, o que inibe a síntese protéica por impedir o processo de translocação do tRNA. Trata-se de um medicamento absorvido pelo intestino que se distribui amplamente nos tecidos. Os principais efeitos adversos são os distúrbios gastrintestinais, podendo ocorrer erupções cutâneas e icterícia. AGENTES ANTIMICROBIANOS QUE ALTERAM A TOPOISOMERASE Quinolonas As principais quinolonas são: ciprofloxacina, levofloxacina, ofloxacina, norfloxacina e moxifloxacina. Esses agentes inibem a DNA-girase (Topoisomerase II) bacteriana, uma enzima que produz um supernovelo negativo no DNA, permitindo sua transcrição ou replicação. As quinolonas possuem um largo espectro efetivo contra 11 É uma inflamação aguda do cólon causada por uma toxina necrosante, produzida por um microrganismo resistente à clindamicina. 78 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 microrganismos gram-positivos e gram-negativos. Contudo, já se verifica uma alta incidência de resistência estafilocócica. A administração oral é acompanhada por uma absorção rápida e completa. Todas as quinolonas ficam concentradas nos fagócitos e a maioria não consegue atravessar a barreira hematoencefálica (ofloxacina é a que melhor penetra no LCR). Além disso, os antiácidos com alumínio e magnésio interferem com a absorção das quinolonas e a metabolização ocorre no fígado, sendo os rins os responsáveis pela excreção. Os efeitos adversos são infreqüentes, mas podem se caracterizar por distúrbios gastrintestinais, erupções cutâneas, cefaléia e tonturas. MISCELÂNEA DE AGENTES ANTIMICROBIANOS A vancomicina é um antibiótico glicopeptídico com ação bactericida e que age inibindo a síntese da parece celular, sendo efetiva principalmente contra gram-positivos. Ela não é absorvida pelo TGI e, portanto, só é administrada por via oral para tratar infecções gastrintestinais. Para uso parenteral, ela é administrada por via intravenosa e tem meia-vida plasmática de cerca de 8 horas. Seu uso clínico está limitado principalmente à colite pseudomembranosa (via oral) e ao tratamento de algumas infecções estafilocócicas multirresistentes (via intravenosa) e, ainda, é uma alternativa valiosa para pacientes alérgicos tanto à penicilina quanto às cefalosporinas. Dentre os efeitos adversos, destaca-se a febre, as erupções cutâneas e a flebite local na região da injeção, podendo também ocorrer ototoxicidade e nefrotoxicidade. Os antibióticos polimixínicos em uso são a polimixina B e a colistina (polimixina E). São fármacos com ação bactericida, que possuem propriedades detergentes catiônicas que age desestabilizando a estrutura fosfolipídica da membrana celular, o que ocasiona a passagem de diversos íons e culmina com a lise celular. As polimixinas são altamente neurotóxicas e nefrotóxicas, sendo usadas apenas topicamente. AGENTES ANTIMICOBACTERIANOS Fármacos Usados para Tratar a Tuberculose Os fármacos de primeira linha utilizados na tuberculose são a isoniazida, a rifampicina, a rifabutina, o etambutol e a pirazinamida. Alguns fármacos de segunda linha 79 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 que estão disponíveis são a capreomicina, a ciclosserina, a estreptomicina, a claritromicina e a ciprofloxacina. Esses são usados para tratar infecções com probabilidade de resistências aos fármacos de primeira linha, ou quando os agentes de primeira linha têm que ser abandonados por causa de reações adversas. Para diminuir a probabilidade de emergência de microrganismos resistentes, uma estratégia freqüente é o tratamento com vários fármacos. Isso envolve comumente:  Uma fase inicial de tratamento (cerca de 2 meses) com uma combinação de isoniazida rifampicina e pirazinamida (juntamente com etambutol, se houver suspeita de microrganismo resistente);  Uma segunda fase continuação (cerca de 4 meses) de tratamento com isoniazida e rifampicina; um tratamento mais prolongado é necessário para pacientes com meningite, envolvimento ósseo/articular ou infecção por microrganismo resistente a fármacos. Isoniazida É um bacteriostático, cuja ação antimicrobiana está limitada às micobactérias (agentes intracelulares), uma vez que passa livremente para o interior das células dos mamíferos. Há evidências de que ela inibe a síntese dos ácidos micólicos, constituinte importante para a parcede celular das micobactérias. A resistência pode ocorrer pela redução da penetração do fármaco no microrganismo. Os efeitos adversos dependem da dose, sendo os mais comuns as erupções cutâneas alérgicas; a isoniazida ainda pode causar anemia hemolítca nos indivíduos com deficiência de glicose 6-fosfato desidrogenase. Rifampicina A rifampicina age ligando-se e inibindo a RNA-polimerase dependente de DNA nas células procarióticas, porém não nas eucarióticas. Ela entra nas células fagocíticas e pode, portanto, destruir microrganismos intracelulares.A resistência pode se desenvolver por mutações cromossômicas, com modificação da RNA-polimerase bacteriana. A administração oral é acompanhada por uma absorção rápida e completa, sendo amplamente distribuída nos tecidos, incluindo o LCR; ela é eliminada na bile. Os efeitos adversos são infreqüentes, sendo os mais comuns as erupções cutâneas, a febre e os distúrbios do TGI. 80 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Etambutol O etambutol não exerce nenhum efeito em outros microrganismos além das micobactérias. É captado pelas bactérias e exerce efeito bacteriostático depois de um período de 24 horas. O mecanismo de ação permanece desconhecido. Verifica-se o rápido aparecimento de resistência se o fármaco for utilizado isoladamente. Os efeitos adversos dependem da dose, sendo o mais comum a neurite óptica. Pirazinamida A pirazinamida é inativa em pH neutro, porém é tuberculostática em pH ácido. Mostra-se eficaz contra os microrganismos intracelulares em macrófagos, visto que, após serem fagocitados, os microrganismos são contidos em fagolisossomas, no interior dos quais o pH é baixo. Os efeitos indesejáveis consistem em gota, que está associada a concentrações plasmáticas elevadas de urato. Foi relatado distúrbios do TGI, febre e mal-estar. Capreomicina A capreomicina é um antibiótico peptídico administrado por injeção intramuscular. Os efeitos indesejáveis consistem em lesão renal e lesão do nervo craniano VIII, com surdez e ataxia. Ciclosserina É um fármaco hidrossolúvel, destruído pelo pH ácido, que age inibindo competitivamente a síntese da parede celular bacteriana. A administração oral é acompanhada por uma absorção rápida e completa, sendo amplamente distribuída nos tecidos, incluindo o LCR; ela é eliminada na urina. Os efeitos adversos ocorrem principalmente no SNC, variando de cefaléia e irritabilidade até depressão, convulsões e estados psicóticos. Seu uso é limitado à tuberculose que seja resistente a outros fármacos. Fármacos Usados para Tratar a Lepra Dapsona A dapsona é quimicamente relacionada às sulfonamidas e age provavelmente através da inibição da síntese bacteriana de folato. A administração oral é acompanhada por uma absorção rápida e completa, sendo amplamente distribuída nos tecidos. A meia-vida plasmática é de 24-48h, porém pequena quantidade de dapsona persiste em certos tecidos, 81 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 como fígado, rim e pele, por períodos mais prolongados. Os efeitos adversos são bastante freqüentes e incluem hemólise, metemoglobinemia, anorexia, náuseas e vômitos,frebre, dermatite alérgica e neuropatia. Rifampicina Semelhante ao descrito para tuberculose. Clofazimina É um corante de estrutura complexa, cujo mecanismo de ação pode envolver uma ação no DNA. Ela também possui atividade antiinflamtória e é útil nos paciente em que a dapsona causa efeitos colaterais. É administrada oralmente e acumula-se no corpo, já que a meia-vida plasmática é de 8 semanas. Por se tratar de um corante, a pele e a urina podem desenvolver coloração vermelha, ao passo que as lesões se coram de azul. Podem ocorrer distúrbios como náuseas, tonturas, cefaléias e distúrbios do TGI relacionados com a dose. 82 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XVI – Fármacos Antivirais FÁRMACOS ANTIVIRAIS Os vírus apresentam algumas enzimas que são específicas, as quais provaram serem alvos úteis para os fármacos. A maioria dos agentes antivirais disponíveis atualmente é efetiva apenas enquanto o vírus está se replicando. Inibidores Nucleosídicos da Transcriptase Reversa Engloba um grande grupo de análogos de nucleosídeos (base nitrogenada + pentose), os quais são fosforilados por enzimas da célula do hospedeiro para originar os derivados 5’- trifosfato (=nucleotídeo). Esses elementos competem com os nucleotídeos da célula do hospedeiro pela síntese do DNA proviral pela transcriptase reversa viral (DNA polimerase dependente do RNA viral). A α-DNA-polimerase dos mamíferos é relativamente resistente a este efeito. Contudo, a γ-DNA-polimerase na mitocôndria da célula do hospedeiro é bastante sensível ao composto, e isto pode ser a base de alguns efeitos adversos. Os principais inibidores nucleosídicos da transcriptase reversa são:  Zidovudina: é um análogo da timidina. Ela pode prolongar a vida dos indivíduos infectados com o HIV 12 e diminuir a demência associada a esse vírus. Contudo, em função da rápida mutação do vírus, a resposta terapêutica diminui com o uso a longo prazo, particularmente na doença em estágio final;  Didanosina: é um análogo da desoxiadenosina;  Zalcitabina: é um homólogo da citosina;  Lamivudina: é um análogo da citosina que, quando usada sozinha, pode selecionar mutantes de HIV que são resistentes ao próprio fármaco quanto aos outros inibidores da transcriptase reversa. Esse medicamento também é utilizado no tratamento da hepatite B;  Estavudina: é um análogo da timidina;  Abacavir: é um análogo da guanosina e, até o momento, comprovou-se mais efetivo que a maioria dos outros inibidores nucleosídicos da transcriptase reversa. 12 O tratamento combinado no tratamento do HIV compreende dois inibidores não-nucleosídicos da transcriptase reversa com um inibidor da transcriptase reversa não-nucleosídico ou com um ou dois inbibidores de protease. O vírus não é erradicado, porém permanece latente no genoma do hospedeiro das células T de memória, pornto para ser reativado se o tratamento for interrompido. 83 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Inibidores Não-Nucleosídicos da Transcriptase Reversa São compostos quimicamente diversos que se ligam à enzima transcriptase reversa próximo ao local catalítico e a desnaturam. A maioria dos inibidores não-nucleosídicos da transcriptase são indutores, substratos ou inibidores, em graus variados das enzimas hepáticas do citocromo P450. Os principais fármacos são o efavirenz e a nevirapina, sendo que esta última pode evitar a transmissão mãe-bebê do HIV se administrada à gestante e ao neonato. Inibidores de Protease Nas infecções virais, o mRNA transcrito a partir do provírus é traduzido em duas proteínas bioquimicamente inertes. Uma protease específica do vírus, então, converte as poliproteínas em várias proteínas estruturais e funcionais pela clivagem nas posições apropriadas. Dado que esta prótese não ocorre no hospedeiro, ela é um alvo útil para a intervenção quimioterápica. Os inibidores da protease específica do HIV ligam-se ao local onde a clivagem ocorre, e seu uso, em combinação com os inibidores da transcriptase reversa, transformou o tratamento da AIDS. Os principais fármacos são: saquinavir, nelfinavir, indinavir, ritonavir e amprenavir. Inibidores da DNA-Polimerase Aciclovir Este agente é um derivado da guanosina com uma alta especificidade para os vírus herpes simples e varicela zoster. No interior celular, o aciclovir é convertido a monofosfato pela timidinaquinase viral (a qual é muito mais efetiva na fosforilação que as quinases do hospedeiro). Portanto, o aciclovir só é ativado adequadamente nas células infectadas. As quinases da célula do hospedeiro convertem então o monofosfato de aciclovir em trifosfato de aciclovir, o qual inibe a DNA-polimerase viral, interrompendo a cadeia nucleotídica. Existem outos fármacos com ação similar à do aciclovir, como o valaciclovir e penciclovir. O aciclovir é 30 vezes mais potente contra a enzima do herpesvírus do que contra a enzima do hospedeiro. Contudo, resistências causadas pelas modificações nos genes virais que codificam a timidinaquinase ou a DNA-polimerase já foram relatadas. Os efeitos adversos são mínimos, contudo, pode haver inflamação local durante a injeção intravenosa se houver extravasamento da solução, disfunção renal, náusea, cefaléia e, raramente, encefalopaita. 84 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Ganciclovir Este análogo acíclico da guanosina é o fármaco de escolha para a infecção pelo citomegalovírus, que é freqüente em pacientes imunocomprometidos. Este medicamento suprime a replicação do DNA viral, porém, diferentemente do aciclovir, não age como um terminador de cadeia. Dentre os efeitos adversos, pode-se citar a depressão da medula óssea e a carcinogenicidade em potencial desse medicamento. Tribavirina (Ribavirina) É um nucleosídeo sintético, com estrutura similar à da guanosina. Acredita-se que esse fármaco iniba uma ampla gama de vírus DNA e de vírus RNA, incluindo muitos que afetam as vias aéreas inferiores. É uma droga que se mostrou efetiva na hepatite C e, principalmente, na febre Lassa, uma vez que nesta última doença a taxa de mortalidade caiu de 76% para 9%. Foscarnet (Fosfonoformato) É um análogo do pirofosfato que inibe a DNA-polimerase, ligando-se diretamente ao local de ligação do pirofosfato. Ele pode causar nefrotoxicidade séria. Inibidores da Fusão do HIV com as Células do Hospedeiro O enfurvirtide é administrado por injeção subcutânea em combinação com outros para o tratamento do HIV, quando a resistência se torna um problema, ou quando o paciente não tolera os outros anti-retrovirais. Dentre os efeitos adversos, pode-se citar cefaléia, tonturas e efeitos gastrintestinais. Inibidores de Neuraminidase e Inibidores de Desmontagem da Capa Viral Na infecção por vírus, ocorre ligação da hemaglutinina viral aos resíduos do ácido neuramínicos nas células do hospedeiro. A partícula viral, então, entra na célula por um processo endocítico. O endossoma é acidificado em seguida ao influxo de H + através de outra proteína viral, o canal iônico M2. Isso facilita a desmontagem da estrutura viral, permitindo que o RNA entre no núcleo do hospedeiro. Os vírions recém-replicados escapam da célula do hospedeiro por brotamento, o qual é promovido pela neuraminidase viral. Os principais fármacos inibidores de neuraminidase são o zenamivir e o osteomalvir (tamiflu), que são 83 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 ativos contra os vírus influenza A e B. Dentre os efeitos adversos desse medicamento, pode-se citar náusea, vômito, dispepsia e diarréia, porém estes são menos freqüentes e severos na preparação par inalação. Moduladores Biológicos e Imunomoduladores Imunoglobulina Os anticorpos são direcionados contra o envelope viral e podem neutralizar alguns vírus e evitar sua ligação com as células do hospedeiro. A globulina hiperimune, específica contra vírus particulares, é usada contra hepatite B, varicela zoster e raiva. Palivisumabe O palivisumabe é uma anticorpo monoclonal direcionado contra uma glicoproteína na superfície do vírus respiratório sincicial. Interferon É um imunomodulador que reforça as defesas do hospedeiro. Há pelo menos três tipos, α, β e γ, constituindo uma família de hormônios envolvidos no crescimento e na regulação celular e na modulação das respostas imunológicas. Eles induzem, nos ribossomos das células do hospedeiro, a produção de enzimas que inibem a translação do mRNA nas proteínas virais, interrompendo assim a replicação viral. O interferon-α-2a é usado no tratamento das infecções por hepatite B e dos sarcomas de Kaposi relacionados à AIDS, já o interferon-α-2b é usado para a hepatite C. Dentre os efeitos colaterais, pode-se citar febre, cefaléia e mialgia, sendo que também podem ocorrer depressão da medula óssea, erupções cutâneas, alopecia e distúrbios nas funções cardiovasculares, tireoidiana e hepática. Inosina Pranobex É um imunomodulador que reforça as defesas do hospedeiro e que pode interferir na síntese de ácido nucléico viral, porém também possui ações imunopotencializadoras no hospedeiro. 86 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XVII – Fármacos Antifúngicos Os fungos clinicamente importantes podem ser classificados em quatro tipos principais, com base em suas características morfológicas e outras características. São eles:  Leveduras  Leveduras com pseudo-hifas  Fungos filamentosos  Fungos dimórficos FÁRMACOS USADOS PARA TRATAR AS INFECÇÕES FÚNGICAS Antibióticos Antifúngicos Anfotericina (ou Anfotericina B) Trata-se de moléculas muito grandes (“macrolídeos”) que atuam nas membranas celulares fúngicas, interferindo com a permeabilidade e com as funções de transporte das mesmas. A propriedade mais importante dessa droga é a capacidade de formar grandes poros na membrana, uma vez que o centro hidrofílico da molécula cria um canal iônico transmembrana, causando distúrbios graves no equilíbrio iônico, incluindo a perda de K + intracelular. A anfotericina possui ação seletiva sobre a membrana de fungos e de alguns protozoários e é padrão-ouro no tratamento das infecções disseminadas causada por vários fungos. A base dessa especificidade relativa é a grande avidez do fármaco pelo ergosterol. A anfotericina é muito pouco absorvida pelo TGI, logo só é administrada oralmente para tratar infecções fúngicas do trato gastrintestinal superior. No caso de infecções sistêmicas, a anfotericina é administrada por injeção intravenosa. Dentre os efeitos adversos mais sérios, pode-se citar a toxicidade renal, uma vez que se verifica redução da função renal em mais de 80% dos pacientes que recebem o fármaco. Ainda podem ser verificados quadros de hipocalemia, hipomagnesemia, bem como anemia, comprometimento hepático e tromboflebite (o fármaco é irritante para o endotélio das veias) no local da injeção. Nistatina É um macrolídeo poliênico com estrutura similar à da anfotericina e com o mesmo mecanismo de ação. Por não ser absorvida por mucosa, seu uso é restrito a infecções por da pele, das membranas mucosas e do trato gastrintestinal. 63 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Griseofulvina É um fármaco com ação fungistática que interage com os microtúbulos fúngicos e interfere no processo da mitose. Pode ser administrado oralmente, porém é pouco hidrossolúvel, sendo que a absorção varia de acordo com o tipo de preparação. A griseofulvina é um agente que induz potencialmente as enzimas citocromo P450 e causa várias interações farmacológicas clinicamente importantes. Trata-se de um fármaco com efeitos adversos infreqüentes, mas que podem causar reações alérgicas. Equinocandinas Todos os fármacos deste grupo estão baseados na estrutura da equinocandina B, que é um agente responsável pela inibição da síntese de 1,3-β-glicano, um polímero de glicose que é necessário para manter a estrutura das paredes celulares fúngicas. Na ausência deste polímero, as células fúngicas perdem a integridade e a lise rapidamente se segue. A absorção oral desse medicamento é pobre e, portanto, deve ser administrado intravenosamente. 64 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Agentes Antifúngicos Sintéticos Azóis Os azóis são um grupo de agentes fungistáticos sintéticos com amplo espectro de atividade, baseado nos núcleos imidazol (clotrimazol, econazol, fenticonazol, cetoconazol, miconazol, tioconazol e sulconazol) ou triazol (itraconazol, voriconazol e fluconazol). Os azóis inibem a enzima fúngica 3A (CYP3A) do citocromo P-450, a lanosina 14α-desmetilase, que é responsável pela conversão do lanosterol em ergosterol. A conseqüente depleção de ergosterol altera a fluidez da membrana, interferindo na ação das enzimas associadas à membrana. O efeito final consiste em inibição da replicação. A depleção do ergosterol da membrana reduz os sítios de ligação da anfotericina, portanto, este último não deve ser combinado com um azol.  Cetoconazol: foi o primeiro azol que pôde ser administrado oralmente para tratar as infecções fúngicas sistêmicas. Ele é bem absorvido pelo TGI e é metabolizado no fígado, sendo eliminado na bile e na urina. O efeito adverso mais importante é a toxicidade hepática, que é rara.  Fluconazol: é um fármaco que pode ser administrado oralmente (bem absorvido) ou intravenosamente. Ele atinge grandes concentrações no líquido cefalorraquidiano (LCR) e é útil no tratamento de meningite fúngica. Os efeitos adversos, que são geralmente brandos, incluem náuseas, cefaléias e dor abdominal. Contudo pode desencadear a síndrome de Stevens-Johnson 13 .  Itraconazol: é um fármaco altamente lipossolúvel que pode ser administrado oralmente, porém com extensa metabolização hepática, sendo eliminado na urina. Pode ser administrado intravenosamente, mas não penetra no LCR. Distúrbios gastrintestinais, cefaléia e tonturas podem ocorrer. Os efeitos adversos raros são a hepatite, a hipocalemia e a impotência, além de poder desencadear a síndrome de Stevens-Johnson.  Miconazol: é um fármaco administrado oralmente para as infecções orais e outras infecções do TGI. Ele atinge concentrações terapêuticas nos ossos, nas articulações e no tecido pulmonar, porém não no sistema nervoso central, e é inativada no fígado. Os efeitos adversos são raros, sendo os distúrbios gastrintestinais os mais relatados. 13 Esta é uma situação grave e usualmente fatal, envolvendo bolhas na pele, na boca, nos olhos e na genitália, freqüentemente acompanhadas de febre, poliartrite e insuficiência renal. 63 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Flucitosina É um agente antifúngico efetivo principalmente contra leveduras de infecções sistêmicas. Mutantes resistentes podem emergir rapidamente se o fármaco for administrado sozinho, de modo que ela é usualmente combinada com a anfotericina para as infecções sistêmicas graves. A flucitosina é convertida no antimetabólito 5-fluorouracil (5-FU) nas células dos fungos, mas não nas células humanas. O 5-FU inibe a timidilato sintetase e, portanto, a síntese de DNA. É usualmente administrada por infusão intravenosa e distribui por todos os líquidos corporais, incluindo o LCR. Os efeitos adversos são infreqüentes, mas podem ocorrer distúrbios gastrintestinais, anemia, neutropenia, trombocitopenia e alopecia. Terbinafina É um agente antifúngico altamente lipofílico e particularmente útil nas infecções das unhas. Ela age inibindo seletivamente a enzima esqualeno epoxidase, que está envolvida na síntese de ergosterol a partir do esqualeno na parede celular fúngica. O acúmulo de esqualeno dentro da célula é tóxico para o microrganismo. É um fármaco que pode ser administrado por via oral ou tópica, sendo rapidamente absorvido por ambas as vias. Os efeitos adversos ocorrem em 10% dos pacientes e incluem distúrbios gastrintestinais, prurido, cefaléia e tonturas. 66 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XVIII – Quimioterapia do Câncer O câncer é uma doença caracterizada pela multiplicação e disseminação descontroladas de formas anômalas de células do próprio corpo. O câncer é basicamente uma doença dos estágios posteriores da vida e, com o avanço na saúde pública e na ciência médica, muito mais pessoas vivem hoje até idade mais avançada, na qual são mais suscetíveis ao desenvolvimento dessa doença. Tanto tumores benignos, quanto malignos manifestam proliferação descontrolada, mas os últimos distinguem-se pela sua capacidade de desdiferenciação, de invasividade e de metastatizar. Atualmente, existem três enfoques principais ao tratamento do câncer estabelecido – excisão cirúrgica, radioterapia e quimioterapia – e o valor relativo de cada um desses enfoques depende do tipo de tumor e do estágio de seu desenvolvimento. PATOGÊNESE DO CÂNCER As células cancerosas manifestam, em graus variados, quatro características que as distinguem das células normais: proliferação descontrolada, desdiferenciação e perda de função , invasividade e metástase. Gênese de uma Célula Cancerosa Uma célula normal torna-se cancerosa em decorrência de uma ou mais mutações em seu DNA, que pode ser adquirida ou herdada. Um bom exemplo é o câncer de mama: mulheres que herdam uma única cópia defeituosa dos genes de supressão tumoral BRCA1 e BRCA2 apresentam um risco maior de desenvolver câncer de mama. Há duas categorias principais de mudanças genéticas importantes:  A ativação de proto-oncogenes a oncogenes por ação viral ou carcinogênica;  A inativação de genes de supressão tumoral por mutações nesses genes. Esses dois fatores podem conferir autonomia no crescimento a uma célula e, assim, resultar em proliferação descontrolada ao produzir mudanças em diversos sistemas celulares. Dentre as principais características de uma célula cancerosa, pode-se citar: 67 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137  Proliferação Descontrolada: resultado da resistência à apoptose (inativação de fatores pró-apoptóticos ou ativação de fatores antiapoptóticos), da expressão de telomerase 14 e da angiogênese (assegurar o crescimento tumoral);  Desdiferenciação e perda da função durante a replicação celular acelerada;  Invasividade: as células cancerosas não só perderam, pela mutação, as restrições que operam nas células normais, como também secretam enzimas que desintegram a matriz extracelular, permitindo que elas se movam.  Metástase: consistem em tumores secundários, formados por células que foram liberadas do tumor primário; 14 1elômeros são esLruLuras especlallzadas que recobrem os Lermlnals dos cromossomos, proLegendo-os da degradação. A unA pollmerase não consegue dupllcar facllmenLe os ulLlmos poucos nucleoLldeos nos Lermlnals do DNA, e os telômeros impedem a perda dos genes “finais”. Com cada ciclo de divisão celular, uma porção do Lelômero sofre erosão, de manelra que acaba por Lornar-se não-funclonal. nesse ponLo, a repllcação do unA pára e a celula Lorna-se senescenLe. Celulas que se dlvldem com rapldez expressam !"#$%"&'(", uma enzlma que manLem e esLablllza os Lelômeros. Cerca de 93° dos Lumores mallgnos em esLáglo flnal expressam de faLo a enzlma, e e lsLo o que pode conferir “imortalidade” às células cancerosas. 68 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 FÁRMACOS USADOS NA QUIMIOTERAPIA DO CÂNCER Fármacos Citotóxicos Agentes Alquilantes Os agentes alquilantes estão entre os mais empregados de todos os fármacos anticâncer. O processo de alquilação consiste em formar ligações covalentes com alvos no DNA, que, no caso, é o nitrogênio na posição 7 (N7) da guanina (principal alvo). Seu principal impacto é visto durante a replicação (fase S), quando algumas zonas do DNA estão não-pareadas e mais suscetíveis à alquilação. Isso resulta em bloqueio em G 2 e subseqüente morte celular apoptótica. Todos os agentes alquilantes deprimem a função da medula óssea e causam transtornos gastrintestinais. Com o uso prolongado, ocorrem dois outros efeitos adversos: depressão da gametogênese (sobretudo nos homens), levando à esterilidade e aumento no risco de desenvolvimento de leucemia não-linfocítica aguda e outras malignidades. a) Mostardas Alquilantes: são compostos relacionados ao gás mostarda, cujos principais exemplos são a ciclofosfamida, a estramustina (clormetina + estrógeno), a melfalana e a clorambucila. A ciclofosfamina é o agente alquilante mais usado e é inativada no fígado. Ela possui efeitos pronunciados nos linfócitos, razão pela qual pode ser utilizada como imunossupressor. É administrada por via oral ou por injeção intravenosa, mas pode, também, ser administrada por via intramuscular. Dentre os efeitos adversos, podem-se citar as náuseas e vômitos, a depressão da medula óssea e a cistite hemorrágica. b) Nitrossouréias: são compostos hidrossolúveis que atravessam a barreira hematoencefálica, podendo ser usada contra tumores no cérebro. Contudo a maioria das nitrossouréias apresenta efeito cumulativo depressor severo sobre a medula óssea. Os principais exemplos são a lomustina e a carmustina. c) Bussulfano: o bussulfano tem efeito seletivo na medula óssea, sendo usado na leucemia granulomatosa crônica. Tem pouco ou nenhum efeito sobre o tecido linfóide ou o TGI. OBS.: a cisplatina é um complexo de coordenação plana hidrossolúvel contendo um átomo de platina central cercado por dois átomos de cloro e dois grupos amônia. Sua ação é análoga à dos agentes alquilantes. Quando entra na célula, o Cl - dissocia-se, deixando um composto reativo que causa ligações intrafilamentos no DNA, resultando na desnaturação local do 69 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 mesmo. É um fármaco administrado por injeção ou por infusão intravenosa lenta, que apresenta baixa mielotoxicicidade, mas que causa náuseas e vômitos severos, além de ser nefrotóxica, ototóxica e neurotóxica. Antimetabólitos Consistem em fármacos que bloqueiam ou subvertem uma ou mais vias metabólicas envolvidas na síntese do DNA. a) Antagonistas do Folato: o principal antagonista do folato é o metotrexato. Os folatos são essenciais para a síntese de nucleotídeos purínicos e timidilato que, por sua vez, são vitais para a síntese de DNA e para a divisão celular. Para agirem como coenzimas, os folatos precisam ser reduzidos a tetra-hidrofolato (FH 4 ). Essa reação em duas etapas é catalisada por diidrofolato redutase, que converte o substrato primeiro em diidrofolato (FH 2 ) e depois a FH 4 . O FH 4 opera como um co-fator essencial de transporte de grupos metil necessários para a transformação de 2’-desoxiuridilato (DUMP) no 2’-desoxitimidilato (DTMP) vital para a síntese de DNA e purinas. O metotrexato possui maior afinidade que o FH 2 pela diidrofolato redutase e, assim, inibe a enzima depletando o FH 4 intracelular. Em geral esse antagonista é administrado via oral, mas também pode ser administrado por via intramuscular ou intravenosa. Por ser um fármaco de baixa lipossolubilidade, não atravessa a barreira hematoencefálica. Seus principais efeitos adversos incluem depressão da medula óssea e dano ao epitélio do TGI. Ainda pode causar nefrotoxicidade quando em altas doses. b) Análogos de Pirimidina: a 5-fluoruracila é um análogo do uracil. Ele é convertido a um falso nucleotídeos, o monofosfato de fluordesoxiuridina (FDUMP) que interage com a timidilato sintetase, mas não pode ser convertido em DTMP. O resultado é a inibição do DNA, mas não do RNA ou da síntese de proteínas. A 5-fluoruracila e administrada via parenteral e seus principais efeitos adversos são danos ao epitélio do TGI e mielotoxicidade. A citarabina (citosina arabinosídeo) é um fármaco que, quando entra na célula, sofre fosforilação, produzindo trifosfato de citosina arabinosídeo, que inibe a DNA polimerase. Os principais efeitos adversos envolvem a medula óssea e o TGI. A gencitabina é outro fármaco com ação semelhante à da citarabina, mas com reações adversas mais brandas. 70 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 c) Análogos da Purina: os principais análogos da purina anticâncer incluem fludarabina, pentostatina, cladribina, mercaptopurina e tioguanina. A fludarabina possui ação e efeitos semelhantes aos da citarabina, já a pentostatina atua inibindo a adenosina desaminase, enzima que transforma adenosina em inosina. Antibióticos Citotóxicos São substâncias de origem microbiana que evitam a divisão celular nos mamíferos. Como regra geral, não devem ser administrados em conjunto com a radioterapia, já que a carga acumulada de toxicidade é muito alta. a) Antraciclinas: a doxorrubicina é o principal fármaco desse grupo. Ela possui diversas ações citotóxicas, já que se liga ao DNA, inibindo tanto a síntese de DNA, quanto a de RNA, mas sua principal ação citotóxica parece ser mediada por um efeito na topoisomerase II. A doxorrubicina intercala-se no DNA, e seu efeito é essencialmente estabilizar o complexo DNA-topoisomerase II depois dos filamentos terem sido cortados, interrompendo assim o processo nesse ponto. Trata-se de um medicamento administrado por infusão intravenosa e que, além dos efeitos adversos gerais, acarreta em dano cardíaco cumulativo relacionado à dose. Outros exemplos de antracinas são: idarrubicina, daunorrubicina, epirrubicina, aclarrubicina e mitoxantrona. b) Dactinomicina: é um fármaco que se intercala entre pares adjacentes de guanina- citosina, interferindo no movimento da RNA polimerase. É usada principalmente no tratamento de cânceres pediátricos e apresenta efeitos os adversos gerais dos quimioterápicos para o câncer. c) Bleomicinas: é um fármaco mais efetivo na fase G 2 do ciclo celular e da mitose, mas é também ativa nas células em não-divisão. Sua ação consiste na degradação do DNA pré-formado, causando fragmentação da cadeia e liberação de bases livres. Ao contrário dos demais anticâncer, a bleomicina causa pouca mielossupressão. d) Mitomicina: após ativação enzimática, a mitomicina age como agente alquilante bifuncional, isto é, faz ligações cruzadas no DNA e degrada o DNA por meio da geração de radicais livres. Causa mielossupressão, dano renal e fibrose pulmonar. e) Procarbazina: é um fármaco que inibe a síntese de DNA e RNA e interfere na mitose na fase de interfase. Causa efeitos adversos usuais e, portanto, pode ser leucemogênico, carcinogênico e teratogênico. 71 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 f) Hidroxicarbamida: é um análogo de uréia que inibe a ribonucleotídeo redutase, interferindo assim com a conversão de ribonucleotídeos em desoxirribonucleotídeos. Derivados de Plantas a) Alcalóides da Vinca: Os principais alcalóides da vinca são a vincristina, a vinblastina e a vindesina. Atuam através de sua ligação à tubulina e inibem a sua polimerização em microtubules, impedindo a formação do fuso mitótico nas células em divisão, com conseqüente interrupção da metáfase. Além disso, inibem outras atividades celulares que envolvem os microtúbulos, como fagocitose e quimiotaxia dos leucócitos, bem como transporte axonal nos neurônios. Os alcalóides da vinca são relativamente atóxicos, mas podem causar efeitos neuromusculares adversos. b) Taxanos: o paclitaxel e o docetaxel são agentes que atuam nos microtúbulos, estabilizando-os (“concelando-os”) no estado polimeriazado, inibindo a mitose. É relativamente tóxico e podem ocorrer reações de hipersensibilidade, razão pela qual requer um pré-tratamento com corticosteróides e anti-histamínicos. c) Etoposídeo: inibe a síntese de DNA por ação na topoisomerase II e também inibe a função mitocondrial. Os efeitos adversos comuns incluem vômitos, mielossupressão e alopecia. d) Campotecina: os exemplos são o irinotecano e o tepotecano. O primeiro inibe a topoisomerase I e, além disso, tem relativamente poucos efeitos tóxicos. Hormônios Tumores derivados de tecidos sensíveis a hormônios podem ser hormônio- dependentes, efeito relacionado com a presença de receptores de esteróides nas células malignas. Glicocorticóides Os glicocorticóides, como prednisolona e a dexametasona, exercem efeitos inibitórios sobre a proliferação dos linfócitos e são utilizados no tratamento das leucemias e dos linfomas. 72 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Estrógenos Os estrógenos, como o dietilestilbestrol e o etinilestradiol, podem ser utilizados para recrutar células de câncer de mama em repouso para o reservatório de células em proliferação, permitindo, assim, a morte das células por outros agentes citotóxicos. Progestágenos Os progestágenos, como megestrol, norgesterona e medroxiprogesteroa têm sido úteis em neoplasias endometrias e tumores renais. Antagonistas Hormonais Os antagonistas hormonais também podem ser efetivos no tratamento de diversos tipos de tumores sensíveis a hormônios. Antiestrógenos O tamoxifeno é notadamente efetivo em alguns casos de câncer de mama hormônio- dependente. No tecido mamário, o tamoxifeno compete com os estrógenos endógenos pelos receptores de estrógeno e inibe a transcrição de genes estrógeno-responsivos. Há relatos de efeitos cardioprotetores devido a sua capacidade de proteger as lipoproteínas de baixa densidade contra a lesão oxidativa. Antiandrógenos A flutamida,a ciproterona e a bicalutamida são antagonistas que podem ser usados como monoterapia ou em combinação com outros agentes para tratar tumores da próstata. Isótopos Radioativos Os isótopos radioativos têm um lugar de destaque na terapia de certos tumores; assim, por exemplo, o iodo radioativo (I 131 ) é utilizado no tratamento de tumores da tireóide. 73 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Outros Agentes Crisantaspase É uma formulação da enzima asparaginase que degrada a asparagina em ácido aspártico e amônia. Ela é utilizada na leucemia linfoblástica, cujas células perderam a capacidade de sintetizar asparagina e precisam de uma fonte exógena. Como a maioria das células sintetizam normalmente a asparagina, o fármaco tem ação razoavelmente seletiva e muito pouco efeito supressor na medula óssea. Ansacrina Possui ação semelhante ao da doxorrubcina. Há relatos de depressão da medula óssea e toxicicidade com o agente. Anticorpos Monoclonais Em alguns casos, a ligação do anticorpo ao seu alvo ativa os mecanismos imunes do hospedeiro e a célula cancerosa é destruída por lise mediada pelo complemento ou por células killer. Outros anticorpos monoclonais fixam-se a receptores de fatores de crescimento nas células cancerosas e os inativam, inibindo, assim, a via de sobrevida e promovendo o processo de apoptose. Dois anticorpos monoclonais são usados clinicamente hoje:  Rituximabe: utilizado no tratamento de linfomas, lisa os linfócitos B ao ligar-se à proteína CD20 formadora do canal de cálcio e ativando o complemento. O agente é efetivo em 40-50% dos casos quando combinado com a quimioterapia padrão.  Trastuzumabe: utilizado no tratamento de câncer de mama, liga-se à proteína HER2 induzindo as respostas imunes do hospedeiro e ou inibidores p21 e p27 do ciclo celular. Mesilato de Imatinibe Aclamado como um a descoberta conceitual na quimioterapia direcionada, o mesilato de imatinibe é um inibidor de pequenas moléculas das quinases da via de sinalização. Não só inibe o fator de crescimento plaquetário (um receptor tirosina quinase) como também uma quinase citoplasmática (Bcr/Abl quinase) considerada como um fator singular na patogênses da leucemia mielóide crônica. 74 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XXIX – O Pâncreas Endócrino e o Controle da Glicemia HORMÔNIOS DAS ILHOTAS PANCREÁTICAS As ilhotas de Langerhans são compostas por:  60-70% de células β, as quais secretam insulina, um hormônio anabólico, e o polipeptídeo amilóide, o qual retarda o esvaziamento gástrico e opõe-se à ação da insulina;  20-25% de células α, que secretam glucagon, um hormônio catabólico que se opõe à ação da insulina;  10% de células δ, as quais secretam a somatostatina, um hormônio com ação parácrina inibitória sobre a secreção de insulina e glucagon;  5% de células PP, que secretam o polipeptídeo pancreático, o qual possivelmente atua inibindo a secreção exócrina pancreática. Insulina No interior de Golgi, o precursor pró-insulina é clivado no peptídeo C e nas cadeias polipeptídicas A e B que constituem a insulina, sendo ambos armazenados em grânulo e, consequentemente, secretados em quantidades equimolares. A produção e a secreção de insulina são controladas pela glicemia, sendo que as células β são responsivas tanto a concentrações absolutas quanto a variações na concentração de glicose no sangue. Por meio transportador de membrana GLUT-2, a glicose penetra na célula β, o que aumenta as reservas de ATP que bloqueia os canais de K + voltagem dependente (K ATP ). Como resultado, ocorre a despolarização da célula seguida pela abertura de canais de Ca 2+ voltagem dependente, sendo o influxo de Ca 2+ o responsável por induzir a secreção de insulina. Muitos hormônios gastrintestinais também estimulam a secreção de insulina, incluindo a gastrina, a secretina, a colecistocinina, o polipeptídio inibitório gástrico (GIP) e o peptídeo semelhante ao glucagon (GLP). Esses hormônios são liberados com a ingestão de alimentos, o que justifica o fato de a glicose por via oral provocar maior liberação de insulina que a mesma quantidade de glicose administrada por via intravenosa. 73 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 A principais ações da insulina encontram-se resumidas no quadro abaixo: Tipo de Metabolismo Células Hepáticas Células Adiposas Músculo Metabolismo dos Carboidrátos ↓Gliconeogênese ↑Captação de Glicose ↑Captação de Glicose ↓Glicogenólise ↑Síntese de Glicerol ↑Glicólise ↑Glicólise ↑Glicogênese Metabolismo dos Lipídeos ↑Lipogênese ↑Síntese de TG ↓Lipólise ↑Síntese de AG ↓Lipólise Metabolismo das Proteínas ↓Degradação das Proteínas ↑Captação aa ↑Síntese de Proteínas Mecanismo de Ação O receptor é um grande complexo glicoprotéico transmembrana, que consiste em duas subunidades α (extracelulares) e duas subunidades β (proteínas transmembrana com atividade tirosina quinase). Após a ativação do receptor, a insulina é internalizada e degradada em lisossomas, enquanto os receptores são reciclados para a membrana plasmática. Glucagon Um dos principais estímulos fisiológicos para a secreção de glucagon é a concentração de aminoácidos no plasma, particularmente da L-arginina. Baixas concentrações plasmáticas de glicose e de ácidos graxos estimulam a secreção, ao passo que elevadas concentrações desses elementos inibem o processo. A somatostatina também inibe a liberação do glucagon. O glucagon aumenta o nível de glicemia e provoca degradação dos lipídeos e das proteínas. Atua sobre receptores específicos para estimular a adenilato ciclase. Ele é mais ativo sobre o fígado, onde estimula a degradação do glicogênio e a gliconeogênese e inibe a síntese de glicogênio e a oxidação da glicose. Somatostatina É responsável pela regulação inibitória local da liberação de insulina e de glucagon no interior das ilhotas 76 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 DIABETES MELITO O diabetes melitos é um distúrbio metabólico crônico caracterizado por níveis elevados de glicemia. Quando o limiar renal para a reabsorção de glicose é ultrapassado, ocorre perda de glicose na urina (glicosúria), causando diurese osmótica (poliúria) que, por sua vez, provoca desidratação, sede e aumento na ingestão de líquidos (polidipsia). As principais complicações resultantes dessa doença são as alterações vasculares por meio da disfunção do endotélio. Como exemplo de doença macrovascular, pode-se citar o processo de aceleração do desenvolvimento de ateromas. A microangiopatia constitui uma característica que afeta particularmente a retina, os rins e os nervos periféricos. A hipertensão promove o desenvolvimento de lesão renal progressiva, e o tratamento da hipertensão retarda a progressão da nefropatia diabética e reduz o infarto do miocárdio. Os inibidores da enzima conversora de angiotensina (ECA) ou os antagonistas dos receptores AT1 de angiotensina são mais eficazes na prevenção da nefropatia diabética do que outros agentes antihipertensivos. A neuropatia diabética está associada ao acúmulo de metabólitos da glicose osmoticamente ativos. O diabete tipo I caracteriza-se por uma deficiência absoluta de insulina em decorrência da destruição auto-imune das células B. Na ausência de tratamento com insulina, esses pacientes acabam morrendo com cetoacidose diabética. O diabete tipo 2 é acompanhado de resistência à insulina e comprometimento da secreção de insulina com o passar do tempo. A secreção de insulina nas duas formas principais de diabete é mostrada esquematicamente na figura ao lado, em comparação com a resposta normal. A insulina é essencial para o tratamento do diabete tipo I. Já para o tipo II, a dieta constitui a base do tratamento, combinada com exercícios físicos. São utilizados agentes São utilizados agentes orais para controlar os sintomas da hiperglicemia, bem como para limitar as complicações microvasculares. A insulina é freqüentemente necessária, uma vez que a secreção endógena de insulina torna-se ainda mais comprometida com a idade. 77 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Tratamento do Diabete Melito a) Tratamento com Insulina – Aspectos Farmacocinéticos e Preparações de Insulina Uma vez absorvida, a insulina possui meia-vida de eliminação de cerca de 10 minutos. É inativada enzimaticamente no fígado e no rim, e 10% são excretados na urina. A presença de comprometimento renal diminui as necessidades de insulina. Um dos principais problemas no uso da insulina consiste em evitar as amplas flutuações observadas nas concentrações plasmáticas e, portanto, na glicemia. Para solucionar esse problema, dispõe-se de várias formulações, que variam no momento de seu efeito máximo e na duração de ação. A insulina solúvel produz efeito rápido e de curta duração. As preparações de ação mais prolongadas são feitas através da precipitação da insulina com protamina ou zinco, formando, assim, cristais sólidos amorfos finamente divididos ou relativamente insolúveis, que são injetados como suspensão a partir da qual a insulina é lentamente absorvida. A insulina lispro é um análogo da insulina, que atua mais rapidamente, porém por menor tempo do que a insulina natural, uma característica que permita ao paciente injetá-la imediatamente antes de uma refeição. A insulina glargina é outro análogo de insulina modificado, desenvolvido com o propósito de proporcionar um suprimento basal constante de insulina. A insulina glargina, que é uma solução clara, forma um microprecipitado no pH fisiológico no tecido subcutâneo, e a absorção do local de injeção subcutânea é prolongada. O principal efeito indesejável da insulina consiste em hipoglicemia. A hipoglicemia é comum e, quando muito grave, pode causar lesão cerebral. O tratamento da hipoglicemia consiste em ingerir uma bebida com açúcar ou lanche ou, se o paciente estiver inconsciente, em administrar glicose intravenosa ou glucagon por via intramuscular. b) Agentes Hipoglicemiantes Orais – Biguanidas: É utilizada apenas no diabete II e a metformina é o único fármaco dessa classe. As biguanidas reduzem o nível de glicemia, pois aumentam a captação de glicose e a sua utilização na musculatura esquelética (reduzindo, assim, a resistência à insulina) e diminuem a produção hepática de glicose (gliconeogênese). A metformina, também reduz as os níveis de LDL e de VLDL. Os efeitos indesejávels mais comuns consistem em distúbios gastrintestinais, como anorexia, diarréia e náuseas. Em seu uso clínico, ela diminui o apetite, não provoca hipoglicemia e ainda pode ser combinada com sulfoniluréias, glitazonas ou insulinas. 78 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 c) Agentes Hipoglicemiantes Orais - Sulfoniluréias As sulfoniluréias exercem a sua principal ação sobre as células β, estimulando a secreção de insulina, reduzindo, assim, o nível plasmático de glicose. As sulfoniluréias se ligam com alta afinidade e bloqueiam os canais de K + , causando a despolarização, entrada de Ca 2+ e secreção da insulina. Os principais fármacos dessa classe são a tolbutamida, a glibenclamida e a glipizida. As sulfoniluréias (ou seus metabólitos ativos) são excretadas em sua maioria na urina, de modo que a sua ação encontra-se aumentada em indivíduos idosos e pacientes com doença renal. A maioria das sulfoniluréias atravessa a placenta e estimula a liberação de insulina pelas células B fetais, causando hipoglicemia grave ao nascimento (contra indicada na gravidez). Os efeitos adversos mais comuns consistem em hipoglicemia, que pode ser grave e prolongada. Esses medicamentos estimulam o apetite, provavelmente através de seus efeitos sobre a secreção de insulina e sobre a glicemia, e, com freqüência, produzem ganho de peso. Vários agentes aumentam o efeito hipoglicemiante das sulfoniluréias. Foi relatada a produção de hipoglicemia grave quando agentes antiinflamatórios não-esteróides, alguns agentes uricosúricos (por exemplo, sulfimpirazona), álcool, inibidores da monoamina oxidase, alguns agentes antibacterianos (incluindo sulfonamidas, trimetoprima e cloranfenicol) e alguns agentes antifúngicos imidazólicos foram administrados com as sulfoniluréias. A provável base para a maioria dessas interações consiste na competição pelas enzimas de metabolismo; todavia, a interferência na ligação às proteínas plasmáticas ou na excreção também pode desempenhar algum papel. Os agentes que diminuem a ação das sulfoniluréias incluem os diuréticos tiazídicos em altas doses e corticosteróides. As sulfoniluréias exigem a presença de células β funcionais, de modo que são úteis nos estágios iniciais do diabete tipo 2. Podem ser combinadas com metformina ou com tiazolidinodionas. d) Agentes Hipoglicemiantes Orais – Tiazolidinodionas (glitazonas) Os efeitos das tiazolidinodionas sobre a glicemia é lento no início, sendo o efeito máximo alcançado apenas depois de 1a 2 meses de tratamento. As tiazolidinodionas reduzem a liberação hepática de glicose e aumentam a captação de glicose no músculo, aumentando a eficácia de insulina endógena e reduzindo a quantidade de insulina exógena necessária para 79 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 controlar a glicemia. É comum um ganho de peso de 1-4 kg, que geralmente se estabiliza em 6 a 12 meses. Parte desse ganho ponderal é atribuível à retenção de líquido. As tiazolidinodionas ligam-se a um receptor nuclear, presente principalmente no tecido adiposo, mas também no músculo e no fígado. Elas aumentam a lipogênese e intensificam a captação de ácidos graxos e glicose. Os efeitos indesejáveis mais comuns das tiazolidinodionas consistem em ganho ponderal e retenção de líquidos. As tiazolidinodionas estão contraindicadas para mulheres grávidas ou em fase de lactação, bem como para crianças. 80 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XXX – Aterosclerose e Metabolismo das Lipoproteínas A doença ateromatosa é ubíqua e está na origem das causas mais comuns de morte (por exemplo, infarto do miocárdio) e incapacidade (por exemplo,acidente vascular cerebral) nos países industrializados. A hipertensão constitui um dos mais importantes fatores de risco de doença ateromatosa, mas neste capítulo, consideraremos outros fatores, particularmente a dislipidemia, que, a exemplo da hipertensão, é passível de tratamento farmacológico. ATEROGÊNESE Acredita-se que a aterogênese envolve vários estágios 1. Ocorre disfunção endotelial com alteração na biossíntese de PGI 2 (prostaciclina) e NO; 2. A lesão do endotélio disfuncional estimula a fixação dos monócitos; 3. LDL se liga às células endoteliais que, juntamente com monócitos, produzem radicais livres que oxidam as LDL, resultando em peroxidação dos lipídios; 4. A LDL modificada por oxidação é captada por macrófagos (futuras células espumosas), que migram para a região subendotelial. 5. As coleções subendoteliais de células espumosas e de linfócitos T formam as estrias gordurosas que anunciam o ateroma (lesão primária); 6. As plaquetas, os macrófagos e as células endoteliais liberam citocinas e fatores de crescimento, que induzem a proliferação do músculo liso e a deposição de componentes do tecido conjuntivo (resposta fibroproliferativa), que resulta na formação de um denso revestimento fibroso de tecido conjuntivo, que origina a placa ateromatosa; 7. A placa pode sofrer ruptura originando êmbolos ou formando substrato sobre o qual irá se desenvolver a trombose. TRANSPORTE DAS LIPOPROTEÍNAS NO SANGUE As lipoproteínas transportam lipídios e colesterol através da corrente sangüínea. Elas apresentam-se por meio de uma estrutura esférica, cujos componentes hidrofílicos encontram- se na periferia e os hidrofóbicos no centro. A relação proteína/lipídeo reflete a densidade da 81 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 proteína e, por isso, os quilomicrons possuem a menor densidade (↑lipídeo) e o HDL possui a maior densidade (↑proteína). As apolipoproteínas associadas às partículas liporpotéicas fornecem sítios de reconhecimento para receptores nas superfície celular o atuam como ativadoras ou coenzimas para enzimas envolvidas no metabolismo das lipoproteínas. As lipoproteínas consistem num cerne central de lipídio hidrofóbico (triglicerídios ou ésteres de colesterol) envolvido por um revestimento mais hidrofílico de substâncias polares, como fosfolipídios, colesterol livre e apolipoproteínas associadas. Existem quatro classes principais de lipoproteínas:  Lipoproteínas de alta densidade (HDL);  Lipoproteínas de baixa densidade (LDL);  Lipoproteínas de densidade muito baixa (VLDL);  Quilomícrons. Lipoproteínas % Lipídeos % Apoproteínas Origem Função Quilomicrons TG: 90% 2% Intestino Transporte TG exógeno VLDL TG: 55% 5 a 8% Fígado e Intestino Transporte de TG endógeno LDL Colesterol: 45% 20-24% Intravascular Transporte de colesterol aos tecidos HDL Fosfolípides: 30% 50% Fígado e Intestino Transporte reverso do colesterol dos tecidos para o fígado. Cada uma dessas classes de lipoproteínas desempenha um papel específico no transporte dos lipídios na circulação, e existem diferentes vias para os lipídios exógenos e endógenos.  Via Exógena: O colesterol e os triglicérideos (TGs) absorvidos pelo TGI são transportados no plasma sob a forma de quilomícrons que, no músculo e no tecido adiposo, sofrem a ação da lipoproteína lípase que hidrolisa os TGs do cerne a ácidos graxos livres (AGs) que são captados pelos tecidos. Os remanescentes de quilomícrons, ainda com seu complemento total de ésteres de colesterol, passam pelo fígado, ligam-se a receptores nos hepatócitos e sofrem 82 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 endocitose. O colesterol liberado no interior do hepatócito pode ser: armazenado, oxidado a ácidos biliares ou secretado na bile em sua forma inalterada.  Via Endógena: O colesterol e os TGs recém-sintetizados no fígado são transportados na forma de VLDL até o músculo e o tecido adiposo, onde sofrem hidrólise conforme o esquema descrito anteriormente. Durante esse processo, as partículas de lipoproteínas, ainda com o complemento total de ésteres de colesterol, tornam-se menores e transformam-se em LDL, lipoproteína que, ao ser endocitada, constitui a fonte de colesterol para incorporação nas membranas celulares e para a síntese de esteróides e de ácidos biliares. O colesterol pode retornar ao plasma a partir dos tecidos em partículas de HDL. O colesterol é esterificado com ácidos graxos de cadeia longa nas partículas de HDL, sendo os ésteres de resultantes são subseqüentemente transferidos para partículas de VLDL ou LDL por uma proteína de transferência presente no plasma. Dislipidemia A dislipidemia pode ser:  Primárias: características genéticas associadas a fatores ambientais (ex.: hipercolesterolemia falimiar);  Secundárias: está associada a condições patológiacas, como diabetes melito, alcoolismo, síndrome nefrótica, insuficiência renal crônica, hipotireoidismo, hepatopatia; e ao uso de medicamentos, como a isotretinoína (um isômero da vitamina A, administrado no tratamento de acne) e inibidores da protease (tratamento HIV); Classificação das Dislipidemias a) Hipercolesterolemia isolada: elevação isolada do LDL (≥160mg/dL); b) Hipertrigliceridemia isolada: elevação isolada dos TGs (≥150mg/dL); c) Hiperlipidemia Mista: valores aumentados de LDL e TGs; d) HDL Baixo: redução de HDL (homens <40mg/dL e mulheres <50mg/dL) isolada ou em associação cm aumento de LDL ou de TG. 83 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 SUBSTÂNCIAS QUE REDUZEM OS LIPÍDEOS A terapia farmacológica para reduzir os lipídios plasmáticos devem ser utilizadas em associação a controle dietético e correção de outros fatores de risco cardiovasculares modificáveis. As principais classes de substâncias utilizadas clinicamente são: Inibidores da HMG-CoA (Estatinas) A HMG-CoA redutase é a enzima responsável pela conversão da HMG-CoA (3- hidroxi-3metilglutaril-coenzima A) em ácido mevalônico, intermediário na síntese de colesterol. A sinvastastina, a lovastatina e a pravastatina são inibidores competitivos específicos e reversíveis da HMG-CoA redutase. A conseqüente redução na síntese hepática de colesterol resulta em aumento da síntese dos receptores de LDL, o que acarreta na redução das LDL circulantes e do colesterol total. , portanto, aumento da depuração das LDL . Além disso, observa-se que as estatinas também reduzem os TGs plasmáticos e aumentam os níveis de HDL. Os inibidores da HMG-CoA também aumentam a síntese de NO (melhora a função endotelial), diminui a infiltração de monócitos, a agregação plaquetária e a inflamação vascular. Dentre os principais efeitos colaterais dos inibidores de HMG-CoA redutase são: distúrbios gastrintestinais, aumento das concentrações plasmáticas de enzimas hepáticas, insônia e eczantema. Fibratos Dispõe-se de vários derivados do ácido fíbrico, incluindo bezafibrato, ciprofibrato, genfibrozila, fenofibrato e clofibrato. Esses fármacos produzem acentuada redução das VLDL circulantes e, por conseguinte, dos triglicerídios, com redução moderada (de cerca de 10%) nas LDL e aumento de cerca de 10% nas HDL . Os fibratos atuam como agonistas no receptor ativado pelo proliferador do peroxissoma α (PPARα), um receptor que estimula a degradação β-oxidativa dos AGs. Os fibratos estimulam a lipoproteína lipase, com conseqüente aumento da hidrólise dos TGs de em quilomícrons e de partículas de VLDL. Além disso, essas substâncias provavelmente diminuem a produção hepática de VLDL e aumentam a depuração hepática de LDL. Resinas de Ligação de Ácidos Biliares A colestiramina e o colestipol são resinas de troca aniônica. Quando administradas por via oral, seqüestram os ácidos biliares no intestino e impedem a sua reabsorção e 84 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 circulação êntero-hepática. O resultado consiste em diminuição da absorção do colesterol exógeno e aumento do metabolismo do colesterol endógeno em ácidos biliares no fígado. Essa situação resulta em maior expressão dos receptores de LDL nos hepatócitos com conseqüente redução das concentrações plasmáticas dessa lipoproteína. As concentrações de HDL permanecem inalteradas e pode haver aumento indesejável dos TGs. Como as resinas não são absorvidas, a toxicidade sistêmica é baixa; entretanto, é comum a ocorrência de sintomas gastrintestinais de náusea, distensão abdominal, constipação ou diarréia, que estão relacionados com a dose. As resinas de ligação de ácidos biliares interferem na absorção de vitaminas lipossolúveis e de certos fármacos, como a clorotiazida, a digoxina e a varfarina. Ácido Nicotínico O ácido nicotínico é uma vitamina que tem sido utilizada em doses da ordem de gramas como agente hipolipêmico. Essa substância inibe a produção hepática de TGs e a secreção de VLDL, resultando, indiretamente, em diminuição moderada das LDL e aumento das HDL. Dentre os efeitos adversos, pode-se citar o rubor (produção de PGD 2 ), as palpitações e os distúrbios gastrintestinais. 83 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XXXI – O Sistema Reprodutor CONTROLE ENDÓCRINO NA REPRODUÇÃO E FÁRMACOS MODULADORES Controle Neuro-Hormonal Do Sistema Reprodutor Feminino Na puberdade, a secreção de esteróides sexuais estrogênicos é estimulada por um aumento na secreção dos hormônios do hipotálamo e da adeno-hipófise. Os esteróides sexuais estrogênicos são responsáveis pela maturação dos órgãos reprodutores e pelo desenvolvimento das características sexuais secundárias, bem como por uma fase de crescimento acelerado, seguida de fechamento das epífises dos ossos longos. A partir deste momento, os esteróides sexuais estão envolvidos na regulação das alterações cíclicas expressas no ciclo menstrual e são importantes durante a gravidez. O ciclo menstrual começa com a menstruação, cuja duração é de 3-6 dias e durante a qual a camada superficial do endométrio uterino é eliminada. O GnRH do hipotálamo atua sobre a adeno-hipófise, liberando FSH e LH, que atuam sobre o ovário. O LH atua sobre as células da teca estimulando a produção de andrógenos, os quais difundem para as células da granulosa. Nestas últimas, o FSH atua aumentando a produção da enzima aromatase, que converte os andrógenos em estrógeno. O LH ainda estimula a ovulação na metade do ciclo e constitui o principal hormônio que controla a secreção subseqüente de progesterona pelo corpo lúteo. O estrogênio controla a fase proliferativa do endométrio e exerce efeitos de feed-back negativo sobre a adeno-hipófise. Já a progesterona controla a fase secretória e exerce efeitos de feed-back negativo tanto no hipotálamo quanto na adeno- 86 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 hipófise. Se houver implantação de um óvulo fertilizado, o corpo lúteo continua secretando progesterona. Após a implantação, a gonadotropina coriônica humana (HCG) do córion toma- se importante na manutenção do corpo lúteo até que, mais tarde, durante a gravidez, a progesterona e ouros hormônios sejam secretados pela placenta. Estrogênios O estrogênio atua em conjunto com a progesterona e induz a síntese de receptores de progesterona no útero, na vagina, na adeno-hipófise e no hipotálamo. Por outro lado, a progesterona diminui a expressão de receptores de estrogênio no trato reprodutor. Os estrogênios endógenos são o estradiol (o mais potente), a estrona e o estriol. Existem numerosas formas sintéticas exógenas, como, o etinilestradiol. O mecanismo de ação envolve uma interação com receptores intracelulares (denominados ERα ou ERP) nos tecidos alvos, resultando em modificação da transcrição gênica. Os efeitos dos estrogênios exógenos dependem do estado de maturidade sexual por ocasião de sua administração:  Hipogonadismo Primário: os estrogênios estimulam o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários e aceleram o crescimento;  Adultos com Amenorréia Primária: os estrogênios, quando administrados ciclicamente com um progestogênio, induzem um ciclo artificial;  Mulheres Sexualmente Maduras: o estrogênio (com um progestogênio) é contraceptivo;  Durante ou Após a Menopausa: a reposição estrogênica previne os sintomas da menopausa e a perda óssea. Os estrogênios exercem várias ações metabólicas, incluindo ações mineralocorticóides (retenção de sal e de água) e ações anabólicas discretas. Eles também atuam no metabolismo por meio do ↑HDL, ↑TGs, ↓LDL e aumentam a coagulabilidade do sangue. Este último fator que deve ser avaliado quando uma paciente faz uso de anticoncepcionais com alto conteúdo estrogênico. Existem muitas preparações disponíveis de estrogênios (via oral, transdérmica, intramuscular, implantável e tópica) para uma ampla variedade de indicações. Essas preparações incluem estrogênios naturais (Ex.: estradiol e estriol) e sintéticos (Ex.: mestranol, etinilestradiol, estilbestrol). 87 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Os antiestrogênios são antagonistas ou agonistas parciais competitivos. O tamoxifeno é utilizado no câncer de mama estrogênio-dependente. O clomifeno induz a ovulação ao inibir os efeitos de retroalimentação negativa sobre o hipotálamo e a adeno-hipófise. Estão sendo desenvolvidos fármacos seletivos que atuam como agonistas dos estrogênios em alguns tecidos, porém como antagonistas em outros. O raloxifeno é um exemplo, já que é utilizado no tratamento e na prevenção da osteoporose; além disso, protege contra o câncer de mama. Usos clínicos dos Estrogênios e Antiestrogênios Estrogênios  Terapia de reposição: para insuficiência ovariana primária (síndrome de Turner) e para insuficiência ovariana secundária (menopausa - ondas de calor, ressecamento da vagina e preservação da massa óssea);  Contracepção;  Câncer de próstata e de mama. Antiestrogênios  No tratamento do câncer de mama sensível aos estrogênios (tamoxifeno);  Para induzir a ovulação (clomifeno) no tratamento da infertilidade. Progestogênios O hormônio endógeno é a progesterona. Exemplos de fármacos sintéticos incluem o derivado da progesterona, a medroxiprogesterona, e o derivado da testosterona, a noretisterona. O mecanismo de ação envolve receptores intracelulares, seguidos por alteração da expressão gênica, a exemplo de outros hormônios esteróides. Os principais usos terapêuticos consistem em contracepção oral e esquemas de reposição estrogênica, bem como tratamento da endometriose. O antiprogestogênio, mifepristone, em combinação com análogos das prostaglandinas, constitui uma alternativa clínica eficaz para a interrupção cirúrgica da gravidez inicial. Usos clínicos dos Progestogênios e dos Antiprogestogênios Progestogênios  Contracepção: progesterona apenas ou combinada com estrogênio;  Combinados com estrogênio para terapia de reposição hormonal a longo prazo em mulheres com útero intacto, para impedir o desenvolvimento de hiperplasia endometrial e carcinoma;  Para endometriose;  Como agentes de segunda ou de terceira linha no câncer de mama, também utilizados no carcinoma endometrial e renal; Antiprogestogênios  Interrupção clínica da gravidez: mifepristone (agonista parcial) combinado com prostaglandina (Ex.: gemeprost). 88 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Terapia de Reposição Hormonal na Pós-Menopausa Na menopausa, seja ela natural ou induzida cirurgicamente, a função ovariana diminui, e ocorre queda dos níveis de estrogênio. A secreção de gonadotropinas aumenta, em virtude da perda do mecanismo de feed back negativo. A terapia de reposição estrogênica (TRH) apresenta alguns benefícios bem definidos:  Melhora dos sintomas causados pela redução dos estrogênios, como ondas de calor e vaginite;  Prevenção e tratamento da osteoporose;  Possível redução no risco de coronariopatia. O uso da T R H apresenta algumas desvantagens definidas:  Sangramento uterino,  Alterações do humor;  Aumento no risco de câncer de endométrio se os estrogênios forem administrados sem regulação pelo progestogênio;  Aumento no risco de câncer de mama, relacionado à duração da TRH , que desaparece dentro de 5 anos após a interrupção da terapia. Isso contrasta a ação do raloxifene. Controle Neuro-Hormonal do Sistema Reprodutor Masculino Como ocorre no sexo feminino, as secreções endócrinas do hipotálamo, da adeno- hipófise e das gônadas controlam o sistema reprodutor masculino. O GnRH do hipotálamo atua sobre a adeno-hipófise, liberando FSH e LH, que atuam sobre o testículo. O LH atua sobre as células de Leydig estimulando a produção de testosterona, a qual se difunde para as células de Sertoli que, sob ação do FSH, produz a ABP (proteína ligadora de andrógenos). O FSH ainda estimula a gametogênese. O hormônio endógeno é a testosterona; a mesterolona é uma preparação exógena, sendo que o mecanismo de ambos é por meio da ação de receptores intracelulares. Na maioria das células-alvo, a testosterona atua através de um metabólito ativo, a diidrotestosterona, a qual é convertida localmente por uma enzima 5a-redutase. Os efeitos dependem da idade/sexo e incluem o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários masculinos em meninos pré-puberais e masculinização nas mulheres. A testosterona ainda exerce efeitos anabólicos pronunciados, causando o desenvolvimento da musculatura e aumento do crescimento ósseo, resultando no rápido ganho de altura (o estirão de crescimento puberal) na puberdade, seguido de fechamento das epífises dos ossos longos. 89 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Por essa razão, a administração de administração desse andrógeno a pré-púberes pode diminuir o crescimento esperado por fechamento prematuro das epífises. Esteróides Anabólicos Os androgênios podem ser modificados para aumentar os efeitos anabólicos e diminuir outros efeitos. Esses esteróides anabólicos (Ex.:nandrolona e estanozolol) aumentam a síntese de proteínas e o desenvolvimento muscular, resultando em ganho de peso. Esses agentes são utilizados para diminuir o prurido da obstrução biliar crônica e na terapia de algumas anemias aplásicas. São utilizados em alguns casos de câncer de mama metastático hormônio-dependente. Os esteróides anabólicos ainda são utilizados por alguns atletas para aumentar a força e o desempenho atlético. Quando combinados com treinamento, um pequeno curso de doses semanais de 600 mg de testosterona (uma dose seis vezes maior do que a utilizada para terapia de reposição) aumenta a massa livre de gordura e o tamanho dos músculos. Como resultado, vários efeitos indesejáveis podem ocorrer, como atrofia testicular, esterilidade e ginecomastia nos homens; e inibição da ovulação, hirsutismo, engrossamento da voz, alopecia e acne nas mulheres. Usos clínicos dos Androgênios e dos Antiandrogênios Androgênios  Os androgênios (preparações de testosterona) são utilizados como terapia de reposição na insuficiência testicular e como agentes anabólicos. Antiandrogênios  Os antiandrogênios (Ex.: flutamida, ciproterona) são utilizados como parte do tratamento do câncer de próstata;  Os inibidores da 5a-redutase (finasterida) são utilizados na hipertrofia prostática benigna. FÁRMACOS UTILIZADOS NA CONTRACEPÇÃO Contraceptivos Orais Existem dois tipos principais de contraceptivos orais: A pílula Combinada (Eficácia:99,9%, Eficiência:97-98%) As pílulas de “primeira geração” são aquelas que apresentam em sua composição estrógenos em quantidade superior a 50µg. Contudo, tais pílulas estavam associadas a um maior risco de trombose venosa profunda e embolia pulmonar. 90 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 As pílulas de “segunda geração” têm o etinilestradiol como o principal componente em quantidade inferior a 35µg e, por essa razão. O progestogênio utilizado pode ser a noretisterona, o levonorgestrel, o etinodiol. Em função dessa composição o rico de doenças vasculares tornou-se pequeno e quase despresível. As pílulas de “terceira geração” também possuem etinilestradiol em quantidade inferior a 35µg. Contudo, utilizam progestogênios novos, como o desogestrel ou o gestodeno, que são mais potentes, exibem menos ação androgênica e provocam menos alterações no metabolismo das lipoproteínas. No entanto, há evidências de que ambos os componentes estejam associados a um maior risco de tromboembolia do que as preparações de segunda geração. Em geral, os ciclos normais de menstruação começam logo após a interrupção do tratamento, sendo rara a perda permanente da fertilidade (que pode resultar de menopausa precoce, mais do que de uma conseqüência a longo prazo da pílula). O mecanismo de ação é o seguinte:  Estrogênio inibe secreção de FSH: supressão do desenvolvimento folicularovariano;  Progestogênio inibe secreção de LH: o muco cervical torna-se menos apropriado para a passagem dos espermatozóides e implantação a ovulação;  Estrogênio e o Progestogênio atuam em conjunto, alterando o endométrio de modo a não favorecer a implantação. Os efeitos adversos comuns ao uso da pílula consistem em:  Ganho de peso decorrente da retenção de líquido;  Náusea discreta, rubor, tonteira, depressão ou irritabilidade;  Alterações cutâneas (por exemplo, acne e/ou aumento da pigmentação);  Amenorréia de duração variável com a suspensão da administração da pílula. A Pílula com Progestogênio Apenas (Eficácia:99%, Eficiência:96-97,5%) As substâncias utilizadas nas pílulas apenas com progestogênio incluem a noretisterona, o levonorgestrel ou o etinodiol. A pílula é tomada diariamente sem interrupção. Esta forma de contracepção atua primariamente sobre o muco cervical, que se torna inóspito aos espermatozóides. O progestogênio provavelmente impede também a implantação através de seu efeito sobre o endométrio, bem como sobre a motilidade e a secreção das tubas uterinas. 91 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Os contraceptivos apenas com progestogênio oferecem uma alternativa adequada para a pílula combinada em algumas mulheres para as quais o estrogênio está contraindicado (Ex.: pacientes com trombose venosa, tabagistas ou de idade mais avançada); além disso, mostram- se apropriados para mulheres cuja pressão arterial aumenta indevidamente durante o tratamento com estrogênios. Todavia, o efeito contraceptivo é menos confiável que o da pílula combinada, e a omissão de uma dose pode resultar em gravidez. É comum a ocorrência de distúrbios da menstruação (particularmente sangramento irregular). O levonorgestrel implantado por via subcutânea em cápsulas não-biodegradáveis está sendo utilizado por cerca de 3 milhões de mulheres no mundo inteiro. Esta via de administração evita a sua passagem pelo fígado, não havendo, conseqüentemente, metabolismo de primeira passagem. Um dispositivo intra-uterino impregnado com levonorgestrel apresenta ação contraceptiva durante 3-5 anos. Contracepção Pós-Coito (de Emergência) O método de Yuzpe utiliza altas doses de etinilestradiol e levonorgestrel, os quais modificam as condições do endométrio, que se torna hostil à implantação do ovo. A eficácia desse método é de 90-98% em até 72h após o coito. O uso após esse tempo aumenta as chances de gravidez. 92 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XXXII – Fármacos Antidepressivos A depressão é o mais comum dos distúrbios afetivos (distúrbios do humor ao invés de distúrbio do pensamento ou da cognição); pode variar de uma condição muito branda, beirando a normalidade, a uma depressão severa (psicótica) acompanhada por alucinações e delírios. No mundo inteiro, a depressão é a principal causa de incapacidade e morte prematura. Os sintomas de depressão incluem componentes emocionais e biológicos:  Sintomas Emocionais: indigência, apatia e pessimismo, baixa auto-estima, sentimentos de culpa, de inadaptação e de feiúra, indecisão e perda da motivação.  Sintomas Biológicos: retardo de pensamento e de ação, perda da libido, distúrbio do sono e perda do apetite. A depressão pode ser unipolar, com oscilações do humor sempre na mesma direção, ou bipolar, na qual a depressão alterna-se com a mania. AS TEORIAS DA DEPRESSÃO A Teoria Das Monoaminas A teoria das monoaminas, proposta em 1965, sugere que a depressão resulta da deficiência funcional da transmissão monoaminérgica (noradrenalina e/ou serotonina 15 ) no SNC. A teoria baseava-se na capacidade de fármacos antidepressivos conhecidos (antidepressivos tricíclicos e inibidores da monoamino oxidase), facilitarem a transmissão monoaminérgicas e de fármacos como a reserpina em causar depressão. Contudo, análises bioquímicas e neuroendócrinas não sustentam de forma eficiente essa teoria. Clinicamente, parece que os inibidores da recaptação da noradrenalina e da serotonina são igualmente eficazes como antidepressivos, embora pacientes individualmente possam responder melhor a um do que a outro. FÁRMACOS ANTIDEPRESSIVOS Todos os tipos de fármacos antidepressivos demoram pelo menos duas semanas para produzir qualquer efeito benéfico, embora seus efeitos farmacológicos sejam produzidos de modo imediato, indicando que são importantes as alterações adaptativas secundárias. 15 Também chamada de 5-HT (5-hidroxitriptamina). 93 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Inibidores da Captação de Monoaminas Atuam por inibir a captação de noradrenalina e/ou 5-HT pelas terminações nervosas monoaminérgicas, facilitando agudamente a transmissão. Estão classificados em: Antidepressivos Tricíclicos (ATC) O principal efeito dos ATCs é bloquear a captação das aminas pelos terminais nervosos, por competição pelo sítio ligante da proteína de transporte. A síntese das aminas, o armazenamento em vesículas sinápticas e a liberação não são diretamente afetadas. A maioria dos ATC inibe a captação de noradrenalina e de 5-HT pelos sinaptossomos cerebrais em um grau semelhante, mas têm muito menos efeito sobre a captação de dopamina. Foi sugerido que a melhora dos sintomas emocionais reflete principalmente uma potenciação da transmissão mediada pela 5-HT, enquanto que o alívio dos sintomas biológicos resulta da facilitação da transmissão noradrenérgica. Além dos seus efeitos na captação das aminas, a maioria dos TCAs afeta um ou mais tipos de receptores de neurotransmissores, incluindo os receptores muscarínicos da acetilcolina, os receptores da histamina e os receptores da 5-HT. Os efeitos antimuscarínicos dos ATC não contribuem para os seus efeitos antidepressivos, mas são responsáveis pelos vários efeitos colaterais incômodos. Dentre estes pode-se destacar a sedação, a confusão e a incoordenação motora e hipotensão postural. Estes efeitos tendem a declinar em 1-2 semanas, quando o efeito antidepressivo se desenvolve. Eles ainda, devido a interferência no SNA, podem causar constipação, boca seca, visão turva e retenção urinária. Estes últimos efeitos são fortes com a amitriptilina e muito mais fracos com a desipramina. No plasma o ATC está fortemente ligados às proteínas plasmáticas de modo que seus efeitos tendem a ser potencializados por fármacos competitivos, como a aspirina e a fenilbutazona. Eles contam com o metabolismo microssomal hepático para a eliminação do corpo e isto pode ser inibido por fármacos competidores, como fármacos antipsicóticos e alguns esteróides. As meias-vidas globais para a eliminação dos ATC são geralmente longas, variando de 10 a 20 horas para imipramina e desipramina e aproximadamente 80 horas para protriptilina. Elas são ainda mais longas em pacientes idosos. Portanto, é possível acúmulo gradual, levando a efeitos colaterais que se desenvolvem lentamente. O uso de ATC com álcool promove uma forte depressão do SNC, a qual pode levar o indivíduo a óbito por depressão respiratória. Além disso, esses fármacos são freqüentemente usados na tentativa de suicídio, sendo que a overdose provoca: 94 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137  SNC: inicialmente ocorre uma excitação com delírios e convulsões, sendo seguida por depressão respiratória e, se não houver hospitalização 16 , morte;  ACV: arritmias cardíacas, podendo ocorrer morte por fibrilação ventricular. Inibidores Seletivos da Captação de Serotonina (ISCS) Os fármacos que inibem a captação de 5-H T incluem a fluoxetina (antidepressivos mais prescrito), a fluvoxamina, a paroxetina, o citalopram e a sertralina. A fluoxetina é atualmente o antidepressivo mais prescrito. Por serem mais seletivos em relação à captação de 5-HT, eles têm menos chances que os ATC de provocarem efeitos colaterais anticolinérgicos, além de serem menos perigosos em casos de overdose. Eles são tão eficazes quanto os ATC e os IMAO no tratamento da depressão de grau moderado, mas são menos eficazes que os ATC no tratamento da depressão severa. A meia vida plasmática dos ISCS varia de 15-24 horas, sendo que a fluoxetina possui uma ação mais prolongada (24-96 horas). A paroxetina e a fluoxetina não podem ser usadas em combinação com os TCAs, já que elas podem inibir o metabolismo hepático dos TCAs e daí aumentarem a toxicidade destes. Os efeitos colaterais comuns são náusea, anorexia, insônia, perda da libido e falência do orgasmo. Em combinação com os IMAO, os ISCS podem provocar a "síndrome da serotonina" associada com tremor, hipertermia e colapso cardiovascular, da qual ocorreram mortes.  Antidepressivos Tricíclicos (ATC): são geralmente inibidores não-seletivos, como imipramina e amitriptilina;  Inibidores Seletivos da Captação de Serotonina: fluoxetina, fluvoxamina, paroxetina, sertralina; Inibidores da Monoamino Oxidase (IMAO) Os IMAO foram os primeiros fármacos a serem introduzidos clinicamente como antidepressivos. Contudo, foram superados pelos ATC e outros antidepressivos que, além de serem mais eficazes, possuíam menos efeitos colaterais. Ação principal dos IMAOs consiste 16 Na hospitalização, é utilizado algum agente anticolinesterásico, como a fisostigmina, embora isso não seja rotineiramente recomendado. 93 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 em inibir uma ou ambas as formas da MAO cerebral, aumentando assim os estoques citosólicos de noradrenalina e de 5-HT nos terminais nervosos. Os principais exemplos são a fenelzina, a tranilcipromina e a iproniazida. Esses fármacos causam inibição irreversível da enzima e não distinguem entre as duas isozimas. A recuperação da atividade da MAO após a inibição dura várias semanas como a maioria dos fármacos, mas é mais rápida se for utilizada a tranilcipromina, que forma uma ligação menos estável com a enzima. Além disso, a moclobemida atua como inibidor competitivo reversível. A MAO é importante na inativação das aminas endógenas e ingeridas, o que pode por outro lado produzir efeitos indesejáveis.. A MAO é encontrada em quase que todos os tecidos e existe em duas formas moleculares semelhantes, codificadas por genes separados:  MAO-A: tem uma preferência de substrato pela 5-H T e é o alvo principal para os antidepressivos IMAO.  MAO-B: tem uma preferência de substrato para a feniletilamina 17 e é seletivamente inibida pela selegilina, que é usada no tratamento do parkinsonismo. Estudos clínicos com inibidores específicos de subtipo da MAO mostraram claramente que a atividade antidepressiva, assim como os efeitos colaterais principais dos IMAO, está associada com a inibição da MAO-A. Além disso, é válido ressaltar que ambas as enzimas atuam sobre a noradrenalina e dopamina Os MAOIs promovem aumento no conteúdo cerebral de 5-HT, noradrenalina e dopamina, sendo mais afetada a 5-HT e menos a dopamina. Esse aumento decorre do aumento na concentração de monoaminas nos terminais sinápticos, sem nenhuma acarretar em nenhuma alteração nos estoques citoplasmáticos. Ações semelhantes ocorrem nos tecidos periféricos, como coração, fígado e intestino. Contudo não há aumento na resposta dos órgãos periféricos à estimulação simpática, como ocorre com os ATC. Os indesejáveis relacionados aos IMAOs podem ser produzidos por outros mecanismos que não a inibição direta da MAO. A hipotensão é um efeito colateral comum, cuja explicação é que as aminas, como a dopamina ou a octapamina, são capazes de se acumular dentro dos terminais nervosos simpáticos e deslocar a noradrenalina de suas vesículas de armazenamento, assim, reduzindo a noradrenalina liberada, associada com a atividade simpática (bloqueio simpático). Outros efeitos são: ganho de peso, estimulação do SNC, promovendo agitação e insônia e, mais raramente, lesão hepática. 17 Neurotransmissor conhecido como “hormônio da paixão”. 96 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 A interação com outros fármacos e alimentos é o problema mais sério com os IMAO e é o principal fator que causou o seu declínio no uso clínico. Um exemplo é a tiramina 18 , uma amina presente em queijos cuja ação é deslocar a noradrenalina do citoplasma da célula nervosa para o terminal nervoso. Na utilização de IMAO, a tiramina promove hipertensão aguda e cefaléia intensa, sendo que a inativação da MAO entérica (responsável pela inativação de amina durante o processo absortivo) é a principal razão para isso. Os MAOIs não são particularmente específicos em suas ações e inibem uma variedade de outras enzimas, assim como a MAO , incluindo muitas envolvidas no metabolismo de outros fármacos. Isto é responsável por algumas das muitas interações clinicamente importantes de fármacos associados com os MAOIs. Antidepressivos Variados Estes são compostos com efeitos bloqueadores não-seletivos de receptor e suas ações antidepressivas são muito pouco entendidas. Os principais exemplos são: mianserina, bupropriona e trazodona. As principais alegações feitas para estes agentes mais novos são:  Menores efeitos colaterais (Ex.: sedação e efeitos anticolinérgicos);  Toxicidade aguda menor em dose excessiva;  Ação com menos retardo;  Eficácia em pacientes que não respondem aos ATC ou aos IMAO. ELETROCONVULSOTERAPIA (ECT) A eficácia da ECT no tratamento da depressão severa tem sido repetidamente confirmada. O processo é feito com a colocação de eletrodos na cabeça do paciente anestesiado e paralisado com um fármaco bloqueador neuromuscular, de modo a evitar lesão física. Testes controlados mostraram que a ECT é tão eficaz quanto os fármacos antidepressivos, com taxas de respostas variando entre 60 a 80%; parecendo ser o tratamento 18 O principal efeito da tiramina nesses casos é elevação da pressão sanguínea em animais de teste. 97 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 mais eficaz para a depressão suicida severa. A principal desvantagem da ECT é que ela com freqüência causa confusão e perda da memória por dias ou semanas. FÁRMACOS ESTABILIZADORES DO HUMOR Lítio O lítio trata-se de um íon inorgânico, administrado oralmente na forma de carbonato de lítio. Seu mecanismo de ação ainda não é bem compreendido, mas algumas possibilidades bioquímicas são levantadas:  Interferem com a formação do inositoltrifosfato;  Interferência com a formação de cAMP O lítio atua para controlar a mania, assim como a depressão, sendo o principal medicamento de uso profilático na depressão bipolar. A meia-vida plasmática é longa, com uma estreita janela tterapêutica. Por conseguinte, são comuns os efeitos colaterais, sendo essencial o monitoramento da concentração plasmática, especialmente na presença de doença renal. Os principais efeitos indesejáveis são náusea, sede e poliúria, hipotireoidismo, tremor, fraqueza, confusão mental e teratogênese. A dose excessiva aguda causa confusão, convulsões e disritmias cardíacas. Fármacos alternativos estabilizantes do humor, como carbamazepina, valproato e gabapentina, estão ganhando predileção, graças ao melhor perfil de efeitos colaterais e de segurança. 98 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XXXIII – O Rim A principal função do rim consiste na excreção de produtos de degradação, como uréia, ácido úrico e creatinina, e na regulação do conteúdo de NaCl e eletrólitos e do volume do líquido extracelular. ESTRUTURA E FUNÇÃO DO NEFRON O néfron consiste num glomérulo, túbulo contorcido proximal, alça de Henle, túbulo distal e ducto coletor. O aparelho justaglomerular é constituído por uma conjunção de arteríola aferente, arteríola eferente e túbulo contorcido distal próximo ao glomérulo. Nestes locais estão as células da mácula densa, que respondem a alterações na velocidade do fluxo e na composição do líquido tubular; além disso, controlam a liberação de renina pelas células granulares na arteríola aferente. O aparelho justaglomerular é importante no controle do fluxo sangüíneo para o néfron e no 99 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 controle da taxa de filtração glomerular, além de ainda influenciar a produção de angiotensina I e II. Na filtração glomerular, o líquido atravessa três camadas: o endotélio capilar, a membrana basal e a camada de células epiteliais da cápsula. Essas camadas formam um complexo filtro que exclui as grandes moléculas. Portanto, o sangue que passa através da arteríola eferente para os capilares peritubulares apresenta uma concentração mais elevada de proteínas plasmáticas e, portanto, maior pressão oncótica do que o normal. Túbulo Contorcido Proximal Cerca de 60%-70% da carga filtrada de Na + e de água são reabsorvidos no túbulo proximal. A água é reabsorvida em conseqüência do gradiente de pressão osmótico gerado pela reabsorção desse soluto, sendo que o aumento da pressão oncótica nos capilares peritubulares contribui para esse efeito. Alça de Henle O ramo descendente é altamente permeável à água, que sai passivamente devido à pressão oncótica, de modo que o líquido que finalmente alcança a ponta da alça apresenta elevada osmolaridade (cerca de 1.200 mosmol/L, sendo a concentração do plasma e o líquido extracelular igual a 300 mosmol/L). O ramo ascendente apresenta permeabilidade muito baixa à água. E neste local, no segmento espesso desse ramo, que ocorre reabsorção de 20-30% do Na + filtrado. Ocorre reabsorção ativa de NaCl, que não é 100 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 acompanhada de água. O líquido tubular, após a sua passagem através da alça de Henle, sofre uma redução adicional de volume de 5% e, devido à absorção de NaCl, torna-se hipotônico em relação ao plasma quando penetra no túbulo contorcido distal. Túbulo Distal No túbulo distal inicial, o transporte ativo de NaCl, acoplado à impermeabilidade da zonula occludens, continua diluindo o líquido tubular,de modo que a osmolaridade cai ainda mais, tornando-se inferior à do plasma. É nesta parte do néfron que ocorre regulação da excreção do Ca 2+ . Tanto o paratormônio quanto calcitriol aumentam a reabsorção de Ca 2+ . Túbulo Coletor e Ducto Coletor Vários túbulos distais deságuam em cada tubo coletor e o conjunto destes unem-se para formar os ductos coletores. O túbulo coletor possui dois tipos diferentes de células: as células principais, que reabsorvem Na + e secretam K + , e as células intercaladas, envolvidas principalmente na secreção de H + . Essa porção do néfron apresenta baixa permeabilidade tanto para íons quanto para a água. A absorção de NaCl encontra-se sob o controle do mineralocorticóide, aldosterona, enquanto a absorção de água está sob o controle do hormônio antidiurético (ADH), também denominado vasopressina. A secreção de aldosterona é controlada indiretamente pelo aparelho justaglomerular, já que qualquer redução na concentração de NaCl do filtrado é percebida pelas células da mácula densa do túbulo distal, que estimula a liberação de renina. Esse processo leva à formação de angiotensina I e, em seguida, de angiotensina II, que, por sua vez, estimula a síntese e a liberação de aldosterona pelo córtex da suprarenal. O ADH é secretado pela neurohipófise e liga-se a receptores V 2 presentes na membrana basolateral, aumentando o número do aquaporinas (canais de água) na membrana apical. A inibição do ADH ocorre como efeito colateral de algumas substâncias, como carbonato de lítio, 101 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 demeclociclina e agentes que afetam os microtúbulos, como a colchicina e os alcalóides da vinca. Os peptídios natriuréticos endógenos estão envolvidos na regulação da excreção do Na + do néfron distal. O peptídio natriurético atrial é liberado quando a pressão atrial apresenta-se elevada. Provoca diurese de solutos e de água através de efeitos hemodinâmicos renais (aumentando a pressão capilar glomerular através da dilatação das arteríolas aferentes e eferentes constritoras) e ações tubulares diretas. As ações tubulares consistem na inibição da reabsorção de água e Na + estimulada pela angiotensina II e na reabsorção de água mediada pelo ADH no túbulo coletor. O efeito consiste em diminuição do volume sangüíneo, com conseqüente redução da pressão atrial. FÁRMACOS QUE ATUAM SOBRE O RIM Os diuréticos são substâncias que aumentam a excreção de Na + e de água do corpo, através de uma ação sobre os rins. O efeito primário consiste em diminuir a reabsorção de Na + e de Cl - do filtrado, sendo o aumento da perda de água secundário à excreção aumentada de NaCl. Esse processo pode ser obtido:  Através de uma ação direta sobre as células do néfron;  Ao modificar indiretamente o conteúdo do filtrado. É importante observar que os diuréticos que exercem ação direta sobre as células do néfron (à exceção da espironolactona) atuam no interior da luz tubular e alcançam seus locais de ação ao serem secretados no túbulo proximal. 102 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Diuréticos de Alça Os diuréticos de alça são os mais poderosos de todos os diuréticos e têm a capacidade de provocar a excreção de 15-25% do Na + existente no filtrado. O principal exemplo é a furosemida; outros diuréticos de alça incluem a bumetanida, a piretanida, a torasemida e o ácido etacrínico. Esses fármacos atuam primariamente sobre o segmento espesso da alça ascendente de Henle, inibindo o transporte de NaCl para fora do túbulo e para o interior do tecido intersticial ao inibir o carreador de Na + /K + /2C1 - na membrana luminal. A ação dos diuréticos de alça tem o efeito adicional de fornecer uma maior quantidade de solutos nas porções distais do néfron, onde a sua pressão osmótica reduz, ainda mais, a reabsorção de água. Até 25% do filtrado glomerular podem sair do néfron (em comparação com a perda normal acerca de 1%), resultando em diurese profusa. Os diuréticos de alça parecem exercer ação venodilatadora, direta e/ou indiretamente através da liberação de um fator renal. Após sua administração intravenosa a pacientes com insuficiência cardíaca aguda, observa-se um efeito vascular terapeuticamente útil antes do início do efeito diurético. A concentração aumentada de Na + , que alcança o túbulo distal, resulta em maior perda de H + e K + . Por conseguinte, os diuréticos de alça podem produzir alcalose metabólica. Ocorre aumento na excreção de Ca 2+ e Mg 2+ , com excreção diminuída de ácido úrico. O efeito sobre o Ca 2+ é benéfico no tratamento da hipercalcemia. A torasemida provoca menos perda de K + e Ca 2+ . Os diuréticos de alça são utilizados com muita cautela nos seguintes tratamentos: edema pulmonar agudo, insuficiência cardíaca crônica, cirrose hepática complicada por ascite, síndrome nefrótica e insuficiência renal. Os principais efeitos adversos que podem ocorrer são a hipocalemia e a alcalose metabólica (↑excreção de H + ). A hipocalemia pode ser evitada ou tratada através da administração concomitante de diuréticos poupadores de K + ou suplementos de potássio. Diuréticos que Atuam sobre o Túbulo Proximal Os inibidores da anidrase carbônica causam aumento da excreção de bicarbonato, acompanhado de Na + , K + e água, resultando em fluxo aumentado de urina alcalina e acidose metabólica discreta. A ação desses fármacos resulta em depleção do bicarbonato extracelular, sendo o efeito diurético auto-limitado com o declínio dos níveis sangüíneos de bicarbonato. 103 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Diuréticos de Atuam sobre o Túbulo Distal Os diuréticos, que atuam sobre o túbulo distal, incluem as tiazidas e fármacos relacionados. A principal tiazida é a bendroflumetiazida (bendrofluazida). Outros tiazídicos incluem a hidroclorotiazida e a ciclopentiazida. Esse grupo de fármacos apresenta ação diurética moderadamente poderosa, diminuem a reabsorção ativa de Na + e do Cl - que o acompanha através de sua ligação ao sítio do Cl - do sistema de co-transporte de Na + /Cl - eletroneutro e ao inibir a sua ação. A perda de potássio associada a esses fármacos é significativa e pode ser grave. A excreção de ácido úrico e de Ca 2+ encontra-se diminuída, enquanto a do Mg 2+ está aumentada. Exercem algumas ações extra-renais – produzem vasodilatação e podem causar hiperglicemia. Quando utilizados no tratamento da hipertensão, a queda inicial observada na pressão arterial decorre de uma redução do volume sangüíneo causada pela diurese; todavia, a fase tardia parece ser devida a uma ação direta sobre os vasos sangüíneos. Além disso, inibe a secreção de insulina por meio da abertura dos canais de potássio sensíveis ao ATP. Os diuréticos tiazídicos são utilizados no tratamento da hipertensão, da insuficiência cardíaca leve, do edema resistente grave e do diabetes insípidos nefrogênico. Os principais efeitos adversos incluem hiperglicemia, aumento do colesterol plasmático e impotência masculina. Espironolactona A espironolactona tem ação diurética limitada. Trata-se de um antagonista da aldosterona que compete pelos receptores intracelulares nas células do túbulo distal. O resultado consiste em inibição da ação de retenção de Na + da aldosterona, com redução concomitante no seu efeito de estimulação da secreção de K + . A espironolactona exerce ações subsidiárias ao diminuir a secreção de H + , bem como a excreção de ácido úrico. Dentre os efeitos adversos, ocorre desconforto gastrintestinal com bastante freqüência, sendo que também pode haver hipercalemia e, possivelmente, acidose metabólica. As ações sobre os receptores de esteróides em outros tecidos, além do rim, podem resultar em ginecomastia, distúrbios menstruais e atrofia testicular. 104 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Triantereno e Amilorida O triantereno e a amilorida também possuem eficácia diurética limitada. Atuam sobre os túbulos e ductos coletores, inibindo a reabsorção de Na + e diminuindo a excreção de K + . A amilorida bloqueia os canais luminais de sódio através dos quais a aldosterona produz seu principal efeito, resultando em menor quantidade de Na + disponível para transporte através da membrana basolateral. O triantereno provavelmente exerce ação semelhante. Ambos os fármacos são levemente uricosúricos, isto é, promovem a excreção de ácido úrico. A principal importância desses diuréticos reside na sua capacidade de poupar o K + . Podem ser administrados com diuréticos perdedores de K + , como os diuréticos tiazídicos, a fim de manter o equilíbrio do potássio. A hipercalemia, que constitui o principal efeito adverso, está relacionada à ação farmacológica dos fármacos e pode ser perigosa. Diuréticos Osmóticos São substâncias farmacologicamente inertes (por exemplo, manitol), que são filtrados no glomérulo, mas que sofrem reabsorção incompleta ou que não são reabsorvidos de forma alguma pelo néfron. No interior deste, o principal efeito é exercido sobre as partes que são livremente permeáveis à água: o túbulo proximal, o ramo descendente da alça e os túbulos coletores. A reabsorção passiva de água encontra-se reduzida, devido à presença do soluto não-reabsorvível no interior do túbulo. Em conseqüência, um maior volume de líquido permanece no túbulo proximal. Isso exerce o efeito secundário de reduzir a reabsorção de Na + , visto que a concentração de Na + no interior do túbulo proximal é menor do que deveria ser, alterando o gradiente eletroquímico para a reabsorção. O principal efeito dos diuréticos osmóticos consiste em aumentar a quantidade de água excretada, com aumento relativamente menor na excreção de Na + . Assim, essas substâncias não são úteis no tratamento de condições associadas à retenção de Na + , porém apresentam aplicações terapêuticas muito mais limitadas, que incluem elevação aguda da pressão intracraniana ou intra-ocular e prevenção da insuficiência renal aguda. Em geral, os diuréticos osmóticos são administrados por via intravenosa, sendo que seu principal efeito indesejável é a hiponatremia. 103 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XXXIV – O Coração As características eletrofisiológicas do músculo cardíaco, que o distinguem de outros tecidos excitáveis, incluem:  Ritmo intrínseco, espontâneo, gerado normalmente por células especializadas no nodo SA (isto é, a atividade de marcapasso);  A ausência de corrente rápida de Na + nos nodos SA e AV, onde a corrente lenta de Ca 2+ para o interior da célula é responsável pelo desencadeamento e pela propagação do potencial de ação;  A longa duração do potencial de ação e o período refratário prolongado;  O grande influxo de Ca 2+ durante o platô do potencial de ação. FISIOLOGIA CARDÍACA Para atuar como uma bomba, os ventrículos devem ser eletricamente ativados e, em seguida, contrair. No músculo cardíaco, a ativação elétrica se deve ao potencial de ação cardíaco que, normalmente, se origina no nodo sinoatrial (AS). Os potenciais de ação, gerado no nodo AS são conduzidos para todo o miocárdio em seqüência ordenada. Essa “seqüência” é crítica, visto que os átrios devem ser ativados e contrair antes dos ventrículos, sendo que estes devem se contrair do ápice para a ponta a fim de que a ejeção de sangue seja eficiente. Potenciais de Ação Cardíacos O coração é formado por dois tipos celulares  Células Contráteis: são responsáveis pelo trabalho cardíaco;  Células Condutoras: atuam na geração e condução do potencial de ação sendo sua contração insignificante. Estão presentes no nodo AS, nos tratos internodais, no nodo atrioventricular (AV), no feixe de His e no sistema Purkinje. A propagação do potencial de ação pelo miocárdio é a seguinte: 1. Nodo AS: gera o potencial de ação do coração (marcapasso); 2. Tratos Internodais e Átrios: condução para os átrios pelo trato internodal e simultaneamente para o nodo AV; 3. Nodo AV: possui uma condução com velocidade menor que a dos demais tecidos cardíacos. Isso garante aos ventrículos tempo suficiente para se encherem antes de 106 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 serem ativados e se contraírem. O aumento da velocidade de condução no nodo AV provoca enchimento deficiente dos ventrículos e redução do débito sistólico e do débito cardíaco; 4. Feixe de His, Sistema Purkinje e Ventrículos: a condução feita pelo sistema His- Purkinje possui elevada velocidade e resulta na contração ventricular. O potencial de ação também se propaga de uma célula cardíaca para outra por meio de gap junctions. Conceitos Associados aos Potenciais de Ação Cardíacos O potencial de membrana é resultante da condutância (permeabilidade) a íons, sendo que, caso o íon seja permeável, ocorre deslocamento livre deste em direção ao seu potencial de equilíbrio. O potencial de repouso da membrana (PRM) guarda relação direta com a condutância de um íon, ou seja, o PRM tem valor próximo ao potencial de equilíbrio do íon de maior condutância. Por essa razão o PRM das células cardíacas é determinado primariamente pelos íons K + , sendo que o Na + pouco contribui (baixa condutância). No processo de despolarização a célula torna-se menos negativa devido ao influxo de íons positivos (corrente de influxo). Já na hiperpolarização a célula torna-se mais negativa devido ao efluxo de íons positivos (corrente de efluxo). Potenciais de Ação dos Ventrículos, Átrios e o Sistema de Purkinje Duração dos potenciais de ação:  Nodo AS: 150ms  Átrio: 150ms  Ventrículo: 250ms  Fibras Purkinje: 300ms Quanto maior a duração do potencial de ação, maior será o período refratário, tempo em que a célula fica incapaz de gerar novo potencial de ação. Os potenciais de ação nas células atriais, ventriculares e de Purkinje são caracterizados por um platô, período sustentado de despolarização que explica a longa duração do potencial de ação e, consequentemente, a longa duração dos períodos refratários. 128 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 As fases do potencial de ação são representadas abaixo:  Fase 1 (Repolarização Inicial): ocorre em função do fechamento das comportas de Na + e da corrente de efluxo de K + em razão do seu gradiente eletroquímico;  Fase 2 (Platô): ocorre relativa estabilidade do potencial de membrana devido a igualdade entre as correntes de influxo e de efluxo. Essa igualdade é garantida pela corrente de influxo de Ca 2+ , também chamada de corrente lenta de Ca 2+ , derivada da abertura de canais tipo-L de Ca 2+ , e pela corrente de efluxo de K + ;  Fase 3 (Repolarização): caracterizada pela diminuição das correntes de influxo e aumento das correntes de efluxo. Logo, ocorre diminuição da condutância de Ca 2+ e aumento da condutância de K + ;  Fase 4 (Potencial de Repouso da Membrana): caracterizado pela repolarização da célula em torno de -85mV. Nessa fase também ocorre igualdade entre as correntes de efluxo e de influxo. Potencial de Ação no Nodo AS As características do nodo AS resultam das seguintes características:  Automatismo, geração de potencial de ação sem estímulo nervoso;  Potencial instável de repouso na membrana;  Não apresenta fase de platô sustentável.  Fase 0 (Deflexão Inicial): resulta da corrente de influxo de Ca 2+ por meio de canais tipo-T;  Fase 1 e Fase 2: não existem;  Fase 3 (Repolarização): caracterizada pela corrente de efluxo de K + ;  Fase 4 (Despolarização Espontânea ou Potencial Marcapasso): é a mais longa e também a fase responsável pelo automatismo das células do nodo AS. Nessa fase, o 129 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 potencial de membrana permanece em torno de -65mV, voltagem responsável pela abertura de canais lentos de Na + , o qual produz uma corrente de influxo denominada I f a qual provoca a despolarização necessária para a abertura dos canais de Ca 2+ tipo-T. A velocidade de despolarização desta fase determina a freqüência cardíaca. Os efeitos do SNA sobre a freqüência cardíaca se baseiam nessas variações da velocidade de despolarização da fase 4. Marcapassos Latentes Além das células do nodo AS, as células do nodo AV, do feixe de His e as fibras de Purkinje também podem apresentar a capacidade para despolarização espontânea da fase 4. Dentre elas, o marcapasso com maior velocidade de despolarização da fase 4 e o potencial de ação com menor duração (período refratário mais breve) controla a freqüência cardíaca. Esse processo caracteriza o fenômeno conhecido como suspensão por ultracontrole, logo os marcapassos latentes só têm oportunidade para controlar a freqüência cardíaca quando o nodo AS for suprimido. Nesse caso o marcapasso é denominado marcapasso ectópico. Velocidade de Condução É a velocidade com que os potenciais de ação se propagam no tecido, a qual não é a mesma em todos os tecidos miocárdicos, sendo mais lenta no nodo AV (0,01-0,05 m/s) e máxima nas fibras de Purkinje (2-4 m/s). A diferença na velocidade de condução tem implicações para a função fisiológica. Por exemplo: a velocidade muito lenta no nodo AV (retardo AV) assegura que os ventrículos não sejam ativados antes de serem preenchidos com o sangue oriundo dos átrios. Apesar de ser controvérsio, a velocidade de condução não depende da duração do potencial de ação, sendo essa duração o tempo decorrido entre a despolarização e a completa repolarização da célula. Na realidade, essa velocidade depende da corrente de influxo na deflexão inicial. Excitabilidade e Períodos Refratários Excitabilidade é a capacidade do miocárdio de gerar potenciais de ação em resposta a correntes despolarizantes de influxo. A excitabilidade de uma célula miocárdica varia durante o decurso do potencial de ação e essas variações são refletidas no período refratário. 130 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137  Período Refratário Absoluto (PRA): independente da intensidade do estímulo, a célula está completamente refratária, ou seja, incapaz de gerar um novo potencial de ação. O PRA inclui a deflexão inicial todo o platô e parte da repolarização, sendo seu término marcado no potencial de -50mV.  Período Refratário Relativo (PRR): começa no fim do PRA e termina quando a célula se repolariza a -70mV. Durante esse período é possível gerar outro potencial de ação, mas para isso é necessário um estímulo maior que o normal. Se gerado nesse período, o potencial de ação terá configuração normal;  Período Supranormal (PSN): começa quando o potencial de membrana atinge -70mV e continua até que a membrana fique completamente repolarizada em -85mV. Durante esse período a célula fica mais excitável que o normal. Efeitos Autonômicos sobre o Coração e Vasos Sanguíneos Efeito Cronotrópico É o efeito do SNA sobre a freqüência cadíaca, sendo que a estimulação simpática aumenta a freqüência cardíaca, enquanto que a estimulação parassimpática a diminui. Norepinefrina → Receptor β 1 nodo AS → ↑I f (↑velocidade de despolarização da fase 4) Acetilcolina → Receptor Muscarínico nodo AS → ↓I f (↓velocidade de despolarização da fase 4) Efeito Dromotrópico É o efeito do SNA sobre a velocidade de condução, sendo que os eventos mais importantes ocorrem no nodo AV. A estimulação simpática promove aumento da velocidade de condução, enquanto que a parassimpática diminui. Dessa forma, o efeito dromotrópico positivo aumenta a velocidade com que os potenciais de ação são conduzidos dos átrios para os ventrículos, enquanto que o efeito dromotrópico negativo diminui. O aumento da estimulação parassimpática ou lesão do nodo AV produz o bloqueio cardíaco. 131 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Efeito Inotrópico Sobre esse efeito, faz-se necessário destacar primeiro o acoplamento excitação- contração, que ocorre conforme as fases: 1. Potencial de Ação: gerado na membrana da célula miocárdica e a despolarização é levada para o interior celular por meio dos túbulos T (corrente de influxo de Ca 2+ ); 2. Entrada de Ca 2+ : produz aumento da concentração intracelular de Ca 2+ que promove a liberação de Ca 2+ das reservas do retículo sarcoplasmático (liberação de Ca 2+ provocada por Ca 2+ ), sendo que o Ca 2+ que entra na fase de platô chamado de Ca 2+ ativador; 3. Ca 2+ se fixa a Troponina C: o Ca 2+ combina-se com a troponina C e a tropomiosinase desloca-se permitindo o acoplamento actina-miosina; 4. Ciclo das Pontes Cruzadas: actina e miosina se atam, formam-se pontes cruzadas e ocorre o deslizamento dos filamentos de actina sobre os de miosina. A ciclagem das pontes continua enquanto houver Ca 2+ suficientemente alto. No relaxamento, o Ca 2+ é reacumulado no retículo sarcoplasmático pela ação da Ca 2+ ATPase; 5. Tensão: é proporcional à concentração intracelular de Ca 2+ , logo, fármacos, hormônios ou neurotransmissores que alteram a corrente de influxo de Ca 2+ ou a concentração sarcoplasmática de Ca 2+ são capazes de modificar a quantidade de tensão produzida pelas células miocárdicas. Ao final do processo ocorre reacúmulo do Ca 2+ no retículo sarcoplasmático, sendo o Ca 2+ excedente, oriundo da corrente de influxo, trocado por Na + pela própria Ca 2+ ATPase. A contratilidade, ou inotropismo, é a capacidade intrínseca de as células miocárdicas desenvolverem força em determinado comprimento da célula muscular. A contratilidade está diretamente correlacionada à concentração intracelular de Ca 2+ , a qual depende tanto da corrente de influxo de Ca 2+ quanto da quantidade desse íon armazenada no retículo sarcoplasmático. Portanto, quanto maior a corrente de influxo de Ca 2+ e os depósitos intracelulares de Ca 2+ , maior será a concentração intracelular de Ca 2+ e a contratilidade. Norepinefrina → Receptor β 1 miocárdio → ↑Influxo de Ca 2+ → ↑Contratilidade Acetilcolina → Receptor Muscarínico átrio → ↓Influxo de Ca 2+ → ↓Contratilidade Muitos efeitos dos fármacos sobre a contratilidade cardíaca podem ser explicados em termos de suas ações sobre a [Ca 2+ ] i secundárias a efeitos sobre os canais de cálcio sensíveis à voltagem na membrana plasmática ou no retículo sarcoplasmático, ou sobre a bomba de Na + /K + . Outros fatores que afetam a força de contração incluem a disponibilidade de oxigênio e uma fonte de energia metabólica, como os ácidos graxos livres. 132 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Relação Comprimento-Tensão no Músculo Cardíaco O aumento do comprimento de um fibra muscular aumenta ao número de sobreposições dos filamentos de actina e miosina. Nas células do miocárdio, o desenvolvimento máximo da tensão ocorre nos comprimentos celulares de 2,0-2,4µm (grau máximo de sobreposição dos filamentos). Acima e abaixo desses valores, a tensão, que pode ser desenvolvida fica menor do que a máxima, pois, além do menor número de sobreposições, o aumento do comprimento da célula acarreta em maior volume de sangue na diástole, o que acarreta no estiramento da fibra e, consequentemente, redução do grau de sobreposição. A lei do coração de Frank-Starling estabelece que o volume de sangue ejetado pelos ventrículos depende do volume presente no ventrículo ao fim da diástole (tensão máxima que pode ser desenvolvida por uma célula depende do seu comprimento no repouso). Essa relação assegura que o volume de sangue que sai do coração seja igual ao que chega, ou seja: Débito Cardíaco = Retorno Venoso Alça Pressão-Volume Ventriculares  Contração Isovolumétrica (1→2): ventrículo relaxado e cheio de sangue é ativado e começa a se contrair, mas as valvas estão fechadas;  Ejeção Ventricular (2→3): a pressão ventricular passa a ser maior que a aórtica, o que provoca abertura da valva aórtica;  Relaxamento Isovolumétrico (3→4): quando a pressão ventricular cai abaixo da aórtica, ocorre fechamento da valva aórtica. Como todas as valvas estão fechadas, processo de diástole ventricular torna-se isovolumétrica;  Enchimento Ventricular (4→1): no ponto 4, a pressão ventricular cai para valores menores que a pressão ventricular, o que determina a abertura da valva mitral. 133 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 As alças pressão-volume podem ser usadas para visualizar os efeitos de variaçõs da pré-carga (variações do retorno venoso ou volume diastólico final) e da pós-carga (variações da pressão aórtica). A figura A mostra o efeito da pré-carga que, devido à relação Frank-Starling, e caracterizada por aumento do volume diastólico final e, conseqüentemente, aumento do débito sistólico. A figura B mostra o efeito da pós-carga, o que condiciona o ventrículo a aumentar a pressão para ejetar o sangue, no entanto ocorre diminuição do débito sistólico e aumento do volume sistólico final. Já na figura C, o aumento da contratilidade acarreta no aumento do débito sistólico e diminuição do volume sistólico final. Trabalho Cardíaco Trabalho Sistólico = Débito Sistólico x Pressão Aórtica Potência (Trabalho-Minuto) = Débito Cardíaco x Pressão Aórtica Dos dois componentes da potência do coração, verifica-se que o trabalho da pressão (pressão aórtica) é muito mais custoso que o trabalho de volume (débito cardíaco). Essa observação explica porque o consumo de O 2 pelo miocárdio pouco se correlaciona com o débito cardíaco. Por exemplo, na estenose aórtica, o consumo de O 2 fica muito aumentado porque o ventrículo esquerdo tem que desenvolver pressões elevadas para bombear sangue pela valva aórtica estenosada, muito embora o débito cardíaco fique reduzido. Embora o débito cardíaco seja o mesmo nos dois lados do coração, a pressão aórtica médica (100mmHg) é muito maior que a pressão pulmonar (15mmHg). Desse modo o trabalho do ventrículo esquerdo é muito maior que o do direito, o que explica a maior espessura daquele quando comparada com a deste. Na hipertensão sistêmica, verifica-se aumento do trabalho de pressão, o que tende a aumentar a parede do ventrículo esquerdo. Já na hipertensão pulmonar ocorre aumento da parede do ventrículo direito. Distúrbios do Ritmo Cardíaco Do ponto de vista clínico, as arritmias são classificadas de acordo com:  O local de origem da anormalidade: atrial, juncional ou ventricular;  Aumento da freqüência (taquicardia) ou redução (bradicardia). Os tipos mais comuns de taquiarritmia consistem em fibrilação atrial (FA), os batimentos cardíacos são totalmente irregulares, e taquicardia supraventricular (TSV), na qual 134 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 os batimentos cardíacos são rápidos, porém regulares. As taquiarritmias ventriculares sustentadas são muito menos comuns, porém de maior gravidade: incluem a taquicardia ventricular e a fibrilação ventricular, em que a atividade elétrica nos ventrículos encontra-se totalmente caótica, e o débito cardíaco cessa. As bradiarritmias incluem vários tipos de bloqueio cardíaco (por exemplo, no nodo AV ou SA) e interrupção completa da atividade elétrica. Quatro fenômenos básicos estão na origem dos distúrbios do ritmo cardíaco tanto patológicos quanto induzidos por substâncias: Bloqueio Cardíaco O bloqueio cardíaco resulta de fibrose ou de lesão isquêmica do sistema de condução, mais comumente do nodo AV. No bloqueio cardíaco completo, os átrios e os ventrículos apresentam batimentos independentes, com batimento dos ventrículos numa freqüência lenta determinada por qualquer atividade de marcapasso distalmente ao bloqueio. A falência completa esporádica da condução AV provoca súbitos períodos de inconsciência, e seu tratamento consiste na implantação de marcapasso artificial. Pós-Despolarização Tardia A pós-despolarização ocorre após um potencial de ação se houver aumento excessivo do [Ca 2+ ] i . É acentuada se a [Ca 2+ ] e estiver aumentada,ou se houver ação de agentes, como glicosídios cardíacos, noradrenalina (norepinefrina) ou inibidores da fosfodiesterase, que aumentam a [Ca 2+ ] i . A pós-despolarização resulta de uma corrente de entrada efetiva, conhecida como corrente de entrada transitória. Possivelmente ocorre uma troca de Na + /Ca 2+ , com saída de um Ca 2+ e entrada de três Na + , ou seja, verifica-se um influxo de carga positiva, com conseqüente despolarização da membrana. Além disso, o Ca 2+ abre os canais de cátions não-seletivos na membrana plasmática, permitindo a entrada de Na + e de outros íons, de modo análogo ao potencial da placa motora na junção neuromuscular. 133 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Reentrada Um anel simples de tecido pode dar origem a um ritmo de reentrada na presença de bloqueio de condução transitório ou unidirecional. Normalmente, um impulso que se origina em qualquer ponto do anel irá propagar-se em ambas as direções e desaparecer quando os dois impulsos se encontrarem. Todavia, se uma área lesada causar bloqueio transitório (com bloqueio de um impulso, enquanto o segundo pode prosseguir) ou bloqueio unidirecional, poderá ocorrer uma circulação contínua do impulso. O ritmo de reentrada só irá persistir se o tempo de propagação ao redor do anel ultrapassar o período refratário, de modo que pode ser detido por fármacos capazes de prolongar o período refratário. A lesão do miocárdio pode provocar extrema redução da propagação do potencial de ação, favorecendo a reentrada. Essa redução está freqüentemente associada à atenuação ou ao desaparecimento da corrente de Na + responsável pela rápida ascensão do potencial de ação. Essa corrente é reduzida, uma vez que as células comprometidas estão, em parte, despolarizadas durante a diástole; em conseqüência, os canais de sódio rápidos permanecem parcial ou totalmente inativados, de modo que apenas a corrente de entrada lenta sustenta a propagação do potencial de ação. Atividade de Marcapasso Ectópica A ativação de marcapassos ectópicos ocorre principalmente em função da ação de catecolaminas e da despolarização parcial resultante de processos isquêmicos. No infarto do miocárdio, por exemplo, as catecolaminas, liberadas pelas supra-renais atuam sobre os receptores β 1 -adrenérgicos, aumentando a velocidade de despolarização durante a fase 4 e podem fazer com que regiões normalmente quiescentes do coração adquiram ritmo espontâneo. Consumo de Oxigênio do Miocárdio e Fluxo Sangüíneo Coronariano Os principais fatores fisiológicos que regulam o fluxo coronariano são: Fatores Físicos O fluxo coronariano (perfusão) só ocorre durante a diástole, sendo que a pressão de perfusão efetiva equivalente à diferença entre a pressão aórtica e a pressão ventricular. Se 136 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 houver queda da pressão aórtica diastólica ou elevação da pressão ventricular diastólica, ocorrerá queda na pressão de perfusão. Na estenose da valva aórtica ambos os fenômenos estão presentes e, com freqüência, provoca dor torácica isquêmica (angina), mesmo na ausência de arteriopatia coronariana. Além disso, na taquicardia, a diástole é mais curta que a sístole, o que reduz o período disponível para a perfusão do miocárdio. Controle Vascular por Metabólitos/Mediadores Constitui o mecanismo mais importante de regulação do fluxo coronariano. Controle neural e humoral Os vasos coronários são dotados de densa inervação simpática, porém os nervos simpáticos (como as catecolaminas circulantes) só exercem um pequeno efeito direto sobre a circulação coronariana. Os grandes vasos coronários possuem receptores α-adrenérgicos que medeiam a vasoconstrição, enquanto os vasos menores têm receptores β 2 -adrenérgicos que exercem efeito dilatador. SUBSTÂNCIAS QUE AFETAM A FUNÇÃO CARDÍACA As substâncias que exercem ação importante sobre o coração podem ser divididas em três grupos.  Substâncias que afetam diretamente as células miocárdicas:  Neurotransmissores autônomos e substâncias relacionadas;  Agentes antiarrítmicos;  Glicosídios cardíacos e outros agentes inotrópicos  Substâncias diversas e substâncias endógenas;  Substâncias que afetam indiretamente a função cardíaca: são substâncias que exercem ações em outras partes do sistema vascular, como substâncias antianginosas, diuréticos e inibidores da enzima da ECA;  Antagonistas do Cálcio:. afetam a função cardíaca através de uma ação direta sobre as células miocárdicas, bem como indiretamente ao relaxar as arteríolas. 137 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Transmissores Autônomos e Substâncias Correlatas Controle Autônomo do Coração pelo Sistema Simpático Os principais efeitos da atividade simpática sobre o coração são:  Aumento da força de contração (efeito inotrópico positivo);  Aumento da freqüência cardíaca (efeito cronotrópico positivo);  Aumento da automaticidade;  Repolarização e restauração da função após despolarização cardíaca generalizada;  Redução da eficiência cardíaca (isto é, o consumo de O 2 aumenta mais do que o trabalho cardíaco). Todos esses efeitos resultam da ativação dos receptores β 1 -adrenérgicos, que provavelmente atuam aumentando cAMP intracelular, o qual ativa a proteína quinase A, que fosforila sítios sobre as subunidades α 1 dos canais de Ca 2+ . Isso aumenta a probabilidade de abertura dos canais, aumentando a corrente de entrada de Ca 2+ e, portanto, a força da contração cardíaca. A ativação dos receptores β 1 também facilita a captação de Ca 2+ pelo retículo sarcoplasmático (↑[Ca 2+ ] i ). A entrada aumentada de Ca 2+ também provoca aumento da automaticidade, em decorrência do efeito da [Ca 2+ ] i sobre a corrente de entrada transitória, podendo resultar numa série de potenciais de ação após um único estímulo. A ativação dos receptores β 1 repolariza o miocárdio lesado ou hipóxico ao estimular a bomba de Na + /K + . Por essa razão o uso de epinefrina constitui uma das manobras mais importantes durante a parada cardíaca. Controle Autônomo do Coração pelo Sistema Parassimpático Os principais efeitos da atividade parassimpática são:  Lentificação cardíaca e redução da automaticidade;  Inibição da condução AV. Esses efeitos resultam da ocupação dos receptores muscarínicos de acetilcolina (M 2 ), que são encontrados em quantidades abundantes nos tecidos nodal e atrial, mas que são escassos nos ventrículos. Esses receptores atuam inibindo (proteína G i ) a produção de cAMP, o que inibe a corrente lenta de Ca 2+ . Os receptores M 2 também abrem um canal de potássio (denominado K ACh ), que produz uma corrente hiperpolarizante, que se opõe à corrente de marcapasso dirigida para o interior da célula (↓freqüência cardíaca e ↓automaticidade). A atividade vagal está freqüentemente aumentada durante o infarto do miocárdio, o que acarreta 138 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 no encurtamento do potencial de ação atrial e na diminuição do período refratário, podendo resultar em arritmias de reentrada. Agentes Antiarrítmicos Substâncias da Classe I São substâncias que bloqueiam os canais de sódio sensíveis a voltagem. Seu efeito característico sobre o potencial de ação consiste em reduzir a taxa máxima de despolarização durante a fase 0. Essa característica é que permite que todos os fármacos da classe I tenham a capacidade de bloquear a excitação de alta freqüência do miocárdio que ocorre nas taquiarritmias, sem impedir os batimentos cardíacos em freqüências normais. As substâncias da classe I ligam-se aos canais mais fortemente quando estão no estado aberto ou refratário e menos fortemente aos canais no estado de repouso. Por conseguinte, sua ação mostra a propriedade de "dependência do uso", isto é, quanto mais freqüentemente os canais são ativados, maior o grau de bloqueio produzido.  Substâncias da Classe Ib: são substâncias que se associam e se dissociam rapidamente dentro do tempo do batimento cardíaco normal. Elas se ligam aos canais abertos durante a fase 0 do potencial de ação, afetando muito pouco a velocidade de elevação, porém deixando muitos canais bloqueados quando o potencial de ação atinge o seu pico. A dissociação ocorre a tempo para o próximo potencial de ação, contanto que o ritmo cardíaco seja normal. Todavia, um batimento prematuro será impedido, uma vez que os canais ainda estão bloqueados. O principal exemplo é a lidocaína, que é administrada por infusão venosa e apresenta efeitos adversos sobre o SNC, como sonolência, desorientação e convulsão. Outro exemplo é a fanitoína, cujo uso tornou-se obsoleto por se tratar de um anticonvulsivante. Uso clínico: tratamento e prevenção da taquicardia ventricular e fibrilação durante e imediatamente após o infarto do miocárdio.  Substâncias da Classe Ic: são substâncias que se associam e se dissociam muito mais lentamente, atingindo, assim, um nível de bloqueio de estado de equilíbrio dinâmico que não varia de modo apreciável durante o ciclo cardíaco. Por conseguinte, produzem uma redução bastante geral da excitabilidade e não discriminam particularmente os batimentos prematuros ocasionais, como o fazem as substâncias da classe Ib, porém suprimem os ritmos de reentrada. Inibem acentuadamente a condução através do 139 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 sistema de His-Purkinje. Os principais exemplos são a flecainida e a encainida, que são utilizadas de maneira profilática contra a fibrilação atrial paroxística, sendo seu uso abolido após o infarto visto forte evidência de associação a morte súbita. Uso clínico: prevenção da fibrilação atrial paroxística (flecainida), taquiarritmias recorrentes associadas a vias de condução anormais.  Substâncias da Classe Ia: são substâncias que se situam a meio caminho entre as classes Ib e Ic. Todavia, além disso, essas substâncias prolongam a repolarização, embora menos acentuadamente do que as substâncias da classe III. Os principais exemplos são: quinidina, procainamida e disopiramida. Uso clínico: arritmias ventriculares, prevenção da fibrilação atrial paroxística recorrente, desencadeada por hiperatividade vagal. Substâncias da Classe II Compreendem os antagonistas dos receptores β, visto que a epinefrina pode causar arritmias em virtude de seus efeitos sobre o potencial de marcapasso e sobre a corrente de entrada lenta de Ca 2+ . Esses fármacos são utilizados principalmente após infarto do miocárdio (↑atividade simpática), já que eles aumentam o período refratário do nodo AV e, portanto, impedem ataques recorrentes de taquicardia supra ventricular. Os principais exemplos são o propranolol e o timolol, que apresentam importante ação broncoespasmática e, por essa razão, não deve ser receitado para pacientes asmáticos ou outra DPOC. Esperava-se que o uso de agentes β 1 seltivos, como o metoprolol e atenolol, pudesse reduzir o risco de broncoespasmo, mas o grau de seletividade desses fármacos é inadequado para atingir tal objetivo. Uso clínico: redução da mortalidade após o infarto do miocárdio e prevenção da recidiva de taquiarritmias provocada por aumento da atividade simpática. Substâncias da classe III São substâncias que prolongam consideravelmente o potencial de ação cardíaco. O mecanismo desse efeito ainda não foi totalmente elucidado, porém envolve o bloqueio de alguns dos canais de potássio que atuam na repolarização cardíaca. O prolongamento do potencial de ação aumenta o período refratário, responsável pela poderosa e variada atividade antiarrítmica, como, por exemplo, ao interromper as taquicardias de reentrada e ao suprimir a 140 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 atividade tópica. Entretanto, todas as substâncias que prolongam o potencial de ação cardíaco também podem, paradoxalmente, exibir efeitos pró-arrítmicos, deflagrado pelo uso de outros fármacos passíveis de também prolongar o potencial de ação cardíaco, como agentes antipsicóticos. O mecanismo pró-arrítmico não está totalmente elucidado, e as possibilidades sugeridas incluem aumento da dispersão da polarização e da entrada de Ca 2+ durante o potencial de ação prolongado, com conseqüente aumento da pós-despolarização. A amiodarona é utilizada no tratamento da taquicardia associada a síndrome de Wolff-Parkinson-White (causada por uma anormalidade anatômica da via de condução que pode efetivamente determinar um curto-circuito do nodo atrioventricular). Mostra-se também eficaz numa ampla variedade de taquiarritmias supraventriculares e ventriculares, porém é reservada para pacientes para os quais outros fármacos são ineficazes ou estão contra- indicados, em decorrência de seus efeitos adversos graves. O sotalol (mistura racêmica) combina as ações e os efeitos adversos das substâncias da classe III com as da classe II, sendo utilizado nas arritmias supraventriculares paroxísticas, pois suprime os batimentos ventriculares ectópicos e episódios curtos de taquicardia ventricular. Substâncias da classe IV São agente bloqueadores de canais de cálcio sensíveis à voltagem, diminuindo a velocidade de condução nos nodos SA e AV, onde a propagação do potencial de ação depende da corrente de entrada lenta de Ca 2+ , lentificando o coração e interrompendo as taquicardia supraventricular ao produzir bloqueio AV parcial. Reduzem a fase de platô do potencial de ação, bem como a força de contração. A entrada diminuída de Ca 2+ reduz a pós- despolarização e, por conseguinte, suprime os batimentos ectópicos prematuros. O verapamil é o principal fármaco, sendo utilizado para prevenir a recidiva da taquicardia supraventricular (TSV) paroxística e para reduzir a freqüência ventricular em pacientes com fibrilação atrial (em particular se for inadequadamente controlada com digoxina), contanto que não tenham síndrome de Wolff- Parkinson-White ou algum distúrbio relacionado (contra-indicação). Substâncias que Aumentam a Contratilidade do Miocárdio Glicosídios Cardíacos A digoxina é o fármaco mais importante do ponto de vista terapêutico, sendo a ouabaína um agente semelhante, porém de ação mais curta. As principais ações dos 141 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 glicosídios são observadas sobre o coração; todavia, alguns de seus efeitos adversos são extracardíacos, incluindo náuseas, vômitos, diarréia e confusão. Os efeitos cardíacos são os seguinte:  Lentificação cardíaca e redução da velocidade de condução através do nodo AV;  Aumento da força de contração;  Distúrbios do ritmo, particularmente:  bloqueio da condução AV;  aumento da atividade de marcapasso ectópico. Os efeitos adversos são comuns e podem ser graves. Além disso, a estreita margem de eficácia e a toxicidade constituem um dos principais inconvenientes do uso clínico dos glicosídeos. Os principais mecanismos de ação dos glicosídeos cardíacos consistem no aumento da atividade vagal no SNC (↓velocidade de condução AV) e na inibição da bomba de Na + /K + . Na fibrilação atrial rápida, a freqüência ventricular também é rápida, sendo inadequado o tempo disponível para o enchimento diastólico. Assim, o aumento do período refratário do nodo AV aumenta o intervalo mínimo entre os impulsos e diminui a freqüência ventricular. A arritmia atrial não é afetada, porém a eficiência de bombeamento do coração melhora, em virtude do melhor enchimento ventricular. Na TSV o mecanismo de ação dos glicosídeos é o mesmo. Além disso, a redução da velocidade de condução AV pode progredir para o bloqueio AV. Os glicosídeos causam batimentos ectópicos, pois a inibição da bomba Na + /K + promove a despolarização, predispondo a distúrbios do ritmo cardíaco. Ainda podem promover aumento da [Ca 2+ ] i pelo seguinte mecanismo:  Inibição da bomba Na + /K + pelos glicosídeos;  ↑[Na + ] i = ↓extrusão de Ca 2+ pelo trocador Na + /Ca 2+ ;  ↑ [Ca 2+ ] i = ↑armazenada no retículo sarcoplasmático, com conseqüente aumento da quantidade de Ca 2+ liberada por cada potencial de ação. Portanto, os glicosídeos podem desencadear o aumento da pós-despolarização, resultando, inicialmente, em batimentos acoplados (bigeminismo), em que um batimento ventricular normal é seguido de um. batimento ectópico, evento seguido de taquicardia ventricular, com sucessão contínua desses batimentos e, por fim, de fibrilação ventricular. Os efeitos dos glicosídios cardíacos aumentam se houver redução da [K + ] plasmática, em decorrência da competição diminuída pelo sítio de ligação do K + na Na + /K + ATPase. Esse 142 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 aspecto é importante quando há uso também de diurétido no tratamento da insuficiência cardíaca. Uso clínico: redução da freqüência ventricular na fibrilação atrial persistente rápida e tratamento da insuficiência cardíaca em pacientes que permanecem sintomáticos, a despeito do uso ótimo de diuréticos e inibidores da ECA. Outras Substancias que Aumentam a Contratilidade do Miocárdio Certos agonistas dos receptores β 1 -adrenérgicos, como a dobutamina, são utilizados no tratamento da insuficiência cardíaca aguda, baseando-se na sua ação inotrópica positiva. O glucagon também aumenta a contratilidade do miocárdio ao aumentar a síntese de cAMP e tem sido utilizado em pacientes com disfunção cardíaca aguda em decorrência da superdosagem de antagonistas dos receptores β-adrenérgicos. Os inibidores do subtipo específico do músculo cardíaco da fosfodiesterase (tipo III), como a amrinona e a milrinona, a enzima responsável pela degradação intracelular do cAMP, aumentam a contratilidade do miocárdio, porém são pró-arrítmicos pelo mesmo motivo. Substâncias Antianginosas A angina é controlada por fármacos que melhoram a perfusão do miocárdio ou que reduzem suas demandas metabólicas ou que apresentam ambos os efeitos. Nitratos Orgânicos O trinitrato de gliceril (nitroglicerina) é o mais utilizado na atualidade, sendo que esforços empregados para aumentar sua duração de ação levaram à síntese de vários nitratos orgânicos relacionados, dos quais o mais importante é o mononitrato de isossorbida. Os nitratos orgânicos relaxam o músculo liso vascular, causam principalmente acentuado relaxamento venoso, com conseqüente redução da pressão venosa central (↓pré-carga). Ocorre estase venosa na posição ortostática, podendo causar hipotensão postural e tonteira. Com doses mais altas, as artérias de resistência e arteríolas sofrem dilatação, e verifica-se uma queda da pressão arterial. Entretanto, ocorre aumento do fluxo coronariano através da vasodilatação coronariana. Verifica-se redução no consumo de oxigênio 143 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 do miocárdio, em decorrência de reduções da pré-carga e da pós-carga cardíacas. Isso, juntamente com o aumento do fluxo sangüíneo coronariano, produz acentuado aumento no conteúdo de oxigênio do sangue do seio coronariano. Quando metabolizados, os nitratos orgânicos liberam NO, que ativa a guanilato ciclase, aumentando a formação de cGMP, que ativa a proteína quinase G e resulta numa cascata de efeitos no músculo liso, culminando na desfosforilação das cadeias leves de miosina e seqüestro do Ca 2+ intracelular, com conseqüente relaxamento. A tolerância é um evento importante no uso dos nitratos. Contudo não ocorre em grau clinicamente importante com as formulações habituais de agentes de ação curta (Ex.: trinitrato de gliceril), porém é observada com substâncias de ação mais longa (Ex.: mononitrato de isossorbida), ou quando se administra trinitrato de gliceril de forma prolongada. Os principais efeitos adversos dos nitratos são hipotensão postural e cefaléia. Uso clínico: angina estável, instável e insuficiência cardíaca crônica. Ativadores dos Canais de Potássio O nicorandil combina a ativação do canal de potássio K ATP com ações nitrovasodilatadoras (doador de NO). Trata-se de um dilatador tanto arterial quando venoso, que produz os efeitos indesejáveis esperados de cefaléia, rubor e tonteira. Antagonistas do Cálcio Os antagonistas do cálcio terapeuticamente importantes atuam sobre os canais de tipo- L, os quais compreendem três classes quimicamente distintas: as fenilalquilaminas (Ex.: verapamil), as diidropiridinas (Ex.: nifedipina e amlodipina) e as benzotiazepinas (Ex.: diltiazem). Todas as substâncias de cada uma das três classes químicas mencionadas anteriormente ligam-se à subunidade α 1 do canal de cálcio tipo-L, porém em sítios distintos, impedindo indiretamente a difusão do Ca 2+ através de seu poro no canal aberto. Os antagonistas do cálcio podem causar bloqueio AV e lentificação cardíaca através de suas ações sobre o tecido de condução; todavia, esse efeito é compensado por um aumento reflexo da atividade simpática secundária à sua ação vasodilatadora. Os antagonistas do cálcio também exercem efeito inotrópico negativo, que resulta da inibição da corrente de entrada lenta durante o platô do potencial de ação. Apesar disso, o débito cardíaco geralmente permanece constante ou aumenta, em virtude da redução da resistência periférica. 144 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Os efeitos indesejáveis dos antagonistas do cálcio o rubor e a cefaléia, em virtude de sua ação vasodilatadora, e, quando administradas de modo crônico, elas freqüentemente causam edema maleolar, relacionado à dilatação arteriolar e ao aumento de permeabilidade das vênulas pós-capilares. Uso clínico:  Arritmias (verapamil): redução da freqüência ventricular na fibrilação atrial rápida e prevenção da recidiva da taquicardia supraventricular (TSV);  Hipertensão: em geral, uma diidropiridina, como, por exemplo, amlodipina;  Prevenção da angina: em geral, uma diidropiridina ou diltiazem. 143 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XXXVI – Obesidade MECANISMOS HOMEOSTÁTICOS QUE CONTROLAM O BALANÇO ENERGÉTICO O balanço energético depende da ingestão de alimentos, do armazenamento de energia na forma de gordura e do consumo de energia. A regulação do balanço energético exige:  Um mecanismo para perceber o nível das reservas de energia na gordura corporal e transmitir a informação a locais de controle no hipotálamo;  A integração da informação no hipotálamo e, por sua vez, a determinação do balanço energético através do controle da ingestão de alimentos e consumo de energia. Mecanismo de Ligação das Reservas de Energia na Gordura Corporal com o Hipotálamo Leptina como Sensor das Reservas de Energia na Gordura Há muitos anos, sabia-se que os camundongos podiam tornar-se obesos através de mutações de certos genes, dos quais pelo menos cinco foram identificados, incluindo o gene ob (obesidade) e o gene db (diabetes) 19 . Os camundongos homozigotos ob/ob e db/db alimentavam-se excessivamente e apresentavam baixo consumo de energia, tornando-se excessivamente gordos e apresentando numerosas anormalidades metabólicas. No entanto, esse ganho de peso era suprimido quando a circulação de um camundongo ob/ob era ligada à circulação de um camundongo normal, indicando que a obesidade era causada pela ausência de um fator hematogênico. Em 1994, descobriu-se que o produto protéico do gene ob era a leptina, que, quando administrada por via intravenosa ou intraperitoneal a camundongos ob/ob, diminuía acentuadamente a ingestão de alimentos e o peso corporal. O mRNA da leptina é expresso nas células adiposas, sendo sua síntese aumentada pela ação dos glicocorticóides, da insulina e dos estrogênios, enquanto é reduzida por agonistas os receptores β-adrenérgicos. No SNC, a leptina atua sobre os núcleos hipotalâmicos que expressam receptores específicos de leptina. 19 Os outros genes são denominados agouti yellow, tubby e fat. Ocorrem versões de todos os cinco genes nos seres humanos. 146 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Insulina como Sensor das Reservas de Energia na Gordura A insulina estimula fortemente a expressão da leptina nas células adiposas. Entretanto, o papel da insulina como sensor de gordura é mais complexo, apesar de a leptina desempenha o papel principal. Integração da Informação e Efeito sobre o Balanço Energético A leptina age em receptores específicos de dois grupos de neurônios no núcleo arqueado do hipotálamo, sendo que ambos desempenham ações opostas.  Grupo 1: a ativação por níveis reduzidos de leptina desencadeia a liberação de neuropeptídio Y (NPY) e do peptídeo relacionado a agouti (AGRP). Como resultado ocorre aumento da ingestão de alimentos;  Grupo 2: a ativação por níveis elevados de leptina acarreta na liberação de hormônio estimulante α-melanócito (α-MSH) a partir da proteína pró-opiomelanocortina (POMC). Como resultado ocorre diminuição da ingestão de alimentos Portanto, a homeostasia da energia depende do balanço entre essas duas ações. Regulação do Consumo de Energia e da Ingestão de Alimentos Consumo de Energia A energia é consumida no metabolismo, na atividade física e na termogênese (produção de calor). Os aspectos metabólicos do consumo de energia incluem, entre outras coisas, o trabalho cardiorrespiratório e as ações de numerosas enzimas. Ingestão de Aumentos A ingestão de alimentos é modificada por fatores fisiológicos, psicológicos, sociais e outros. A colecistoquinina, hormônio liberado pelo duodeno, atua sobre receptores A do TGI, sendo o sinal transmitido ao tronco encefálico pelo vago. O efeito consiste em diminuir a ingestão de alimentos. A colecistoquinina circulante não atravessa a barreira hematoencefálica, porém o peptídeo é também um neurotransmissor que atua sobre os receptores B de colecistoquinina no cérebro, funcionando como fator de saciedade. 147 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 OBESIDADE COMO PROBLEMA DE SAÚDE A obesidade representa um problema de saúde crescente e oneroso e, hoje em dia, é considerada como doença crônica atingindo proporções epidêmicas nos países desenvolvidos. Com um IMC acima de 30, verifica-se um aumento significativo no risco de diabete melito tipo 2, de hipertensão, de hipertrigliceridemia, de cálculos biliares e de cardiopatia isquêmica. Os indivíduos obesos correm risco aumentado de câncer de colon, mama, próstata, vesícula biliar, ovário e útero. Numerosos outros distúrbios estão associados a um excesso de peso corporal, incluindo osteoartrite, hiperuricemia e hipogonadismo masculino. A distribuição do tecido adiposo também é importante. A distribuição central da gordura (gordura visceral) está associada a uma maior morbidade e mortalidade do que a sua distribuição periférica. A circunferência da cintura fornece uma medida clínica simples da gordura visceral. O risco de desenvolver doença cardiovascular ou diabete tipo 2 apresenta-se elevado quando essa medida ultrapassa 88 cm nas mulheres ou 102 cm nos homens. Fisiopatologia da Obesidade Obesidade como Distúrbio do Controle Homeostático do Balanço Energético Quando foi revelada a história da leptina, acreditouse que as alterações na sua cinética pudessem fornecer uma explicação simples. Entretanto, os níveis plasmáticos de leptina estão mais elevados nos indivíduos obesos, em comparação com indivíduos não-obesos, e não mais baixos do que o esperado. Nesse contexto, a resistência à leptina parece constituir uma característica da obesidade, podendo ser causada por defeitos na síntese de leptina, no seu transporte na circulação e no SNC ou nos receptores de leptina hipotalâmicos. Além disso, várias alterações já foram sugeridas, como: reduçãoda atividade simpática, diminuição do consumo metabólico de energia, termogênese diminuída nos adipócitos, decorrente de uma redução da ação mediada pelos receptores β 3 -adrenérgicos sobre o metabolismo dos lipídios e/ou disfunção das proteínas que desacoplam a fosforilação oxidativa Fatores Genéticos e Obesidade Estudos realizados em gêmeos e em filhos adotivos e suas famílias indicam que 40 a 80% da variação no IMC podem ser atribuídos a fatores genéticos. Estimase que a hereditariedade contribui com até 30-40% para fatores relevantes para o balanço energético, como distribuição da gordura corporal, metabolismo basal, consumo de energia após a ingestão excessiva de alimentos, atividade da lipoproteína lipase e taxas basais de lipólise. 148 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Existem alguns casos raros em que a obesidade representa a conseqüência de um distúrbio gênico isolado; todavia, em geral, a obesidade provavelmente envolve a interação de muitos genes. Até o momento, foi constatada a associação de 200 genes, marcadores gênicos e regiões cromossômicas com a obesidade humana. Ingestão de Alimentos e Obesidade Os indivíduos obesos fazem dieta para perder peso. Entretanto, quando um indivíduo reduz a ingestão de calorias (passa para um balanço energético negativo e perde peso) o metabolismo basal diminui, e ocorre uma redução concomitante no consumo de energia. Assim, um indivíduo previamente obeso, que apresenta, no momento atual, um peso normal, geralmente necessita de menos calorias para manter o peso do que um indivíduo que nunca foi obeso. Essa adaptação à redução calórica contribui para a dificuldade em manter o peso perdido através de uma dieta. Exercício Físico e Obesidade A atividade física desempenha um papel muito positivo na redução das reservas de gordura e no ajuste do balanço energético dos indivíduos obesos, particularmente, quando associada a uma modificação da dieta. ABORDAGENS FARMACOLÓGICAS PARA O PROBLEMA DA OBESIDADE As principais abordagens terapêuticas para a obesidade consistem em dieta cuidadosamente controlada e exercício físico; entretanto, um número crescente de pacientes também pode necessitar de agentes contra a obesidade. Esses agentes poderiam atuar ao suprimir a ingestão de alimentos, aumentar o consumo de energia ou aumentar a lipólise. Orlistat O orlistat é um inibidor da lipase pancreática, que impede a degradação da gordura dietética em ácidos graxos e gliceróis. Produz um aumento da gordura fecal e quando administrado em combinação com uma dieta hipocalórica a indivíduos obesos, gera perda moderada do peso corporal em comparação com dieta e placebo. 149 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 A maior parte do orlistat é excretada nas fezes, e apenas diminutas quantidades são absorvidas. Dentre os efeitos indesejáveis, podem ocorrer cólicas abdominais, flatulência com descarga e incontinência fecal, assim como borborigmos intestinais e perdas oleosas. Pode ser necessária uma terapia suplementar com vitaminas lipossolúveis, e houve relato de redução da absorção de anticoncepcionais orais. Sibutramina Recentemente, foi constatado que a sibutramina, originalmente desenvolvida para uso como antidepressivo, exerce uma ação contra a obesidade. Suas principais ações consistem em reduzir a ingestão de alimentos e aumentar a saciedade e a termogênese. Foi relatado que ela produz uma redução da circunferência da cintura (isto é, redução da gordura visceral), diminuição dos níveis plasmáticos de TGs e VLDL, mas com elevação de LDL. Além disso, são observados efeitos benéficos sobre a hiperinsulinemia e a taxa de metabolismo da glicose. A redução do peso corporal obtida com a sibutramina isoladamente não é facilmente mantida. Para ser eficaz é necessário combiná-la com outras medidas contra a obesidade. A sibutramina é um inibidor da recaptação neuronal de serotonina/noradrenalina nos locais do hipotálamo que regulam a ingestão de alimentos. É bem absorvida na administração via oral, sendo que sofre extenso metabolismo de primeira passagem, cujos metabólitos são os verdadeiros responsáveis pelas ações farmacológicas do agente. Os efeitos indesejáveis consistem em ressecamento da boca, constipação e insônia. 127 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Capítulo XXXVII – Hemostasia e Trombose A hemostasia, que se refere à interrupção da perda de sangue de vasos sangüíneos lesados, é essencial à vida. Uma ferida provoca vasoconstrição acompanhada de:  Adesão e ativação das plaquetas;  Formação de fibrina. A ativação das plaquetas resulta na formação de um tampão hemostático, que interrompe o sangramento, sendo subseqüentemente reforçado por fibrina. COAGULAÇÃO SANGUÍNEA Eventos na Hemostasia Existem mais de 50 substâncias, dividias em pró ou anticoagulantes, cujo equilíbrio determina se ocorrerá ou não a coagulação. Na circulação há predomínio de anticoagulantes, sendo os pró-coagulantes predominantes na região da lesão. A coagulação ocorre em 3 etapas:  Formação do complexo de substâncias chamado ativador de protrombina;  Protrombina Ativador de Protrombina ► Trombina;  Fibrinogênio Trombina ► Fibrina. Formação do Tampão Plaquetário Ocorre em cortes pequenos e torna desnecessária à formação de um coágulo sanguíneo. Esse processo é mediado por plaquetas, fragmentos celulares do megacariócito que possuem em seu interior diversas organelas e substâncias, como REL (armazena Ca 2+ ) e fatores de crescimento endotelial, que atuam de maneira sinérgca para conter a hemorragia. Permanecem no sangue de 8-12 dias e são destruídas principalmente por macrófagos no baço. As plaquetas possuem, em sua membrana, glicoproteínas que repelem a aderência ao endotélio, enquanto favorece a aderência às áreas lesionadas. Numa lesão, a presença de fibras de colágeno promove diferenciação drástica nas estruturas das plaquetas, como:  Emissão de pseudópodes;  Liberação de fatores pegajosos que se aderem ao fator de Von Willebrand;  Liberação de ADP e tromboxano A 2 que ativam outras plaquetas a se agregarem. 128 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 Dessa forma, as plaquetas ativadas formam um agregado, um tampão plaquetário que inicialmente é solto, mas que se torna posteriormente um tampão compacto devido à produção de fibrina que se prende as plaquetas firmemente. Coagulação Sanguínea no Vaso Lesado O coágulo começa ase desenvolver entre 15-20 minutos (trauma intenso) ou entre 1-2 minutos (trauma leve). O processo é iniciado com a liberação de susbtâncias ativadoras originadas da parede vascular, das plaquetas e das proteínas sanguíneas. Uma vez formado, o coágulo pode seguir dois caminhos:  Ser invadido por fibroblastos, formando tecido conjuntivo no entorno;  Ser dissolvido. Mecanismos de Coagulação Sanguínea Conversão de Protrombina em Trombina O ativador de protrombina é formado em resposta à ruptura de vasos sanguíneos e ocorre no sangue como resultado de uma cascata com a participação de mais de uma dúzia de fatores de coagulação. Dessa forma, por ser a etapa mais lenta, a formação do ativador de protrombina constitui o fator limitante da coagulação sanguínea. A protrombina é produzida continuamente no fígado, sendo a vitamina K um elemento requerido para sua síntese. Portanto, problemas hepáticos ou deficiência de vitamina K provocam o aumento da temdência ao sangramento. A protrombina (fator II) é convertida em trombina na presença do fator ativador de protrombina e de quantidades suficientes de Ca 2+ . A trombina formada causa, dentro de 10 a 15 segundos, a polimerização de fibrinogênio em moléculas de fibrina. Além da coagulação, a trombina também provoca agregação plaquetária, estimula a proliferação celular e modula a contração do músculo liso. Os efeitos da trombina sobre as plaquetas e o músculo liso são desencadeados pela sua interação com específicos receptores ativados por protease (PAR), que pertencem à superfamília dos receptores acoplados à proteína G. O fibrinogênio trata-se de uma molécula produzida no fígade e que apresenta elevado peso molecular, o que dificulta sua passagem dos vasos sanguíneos para o fluido intersticial. Protrombina Trombina Fibrinogênio Fibrina Fibras de Fibrina Ca 2+ 129 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 A trombina age no fibrinogênio retirando 4 peptídeos, o que resulta na formação de monômeros de fibrina que se polimerizam, mantendo-se unidos por ligações de hidrogênio (o coágulo pode se romper facilmente). Porteriormente, a trombina ativa o fator XIII (fator estabilizante de fibrina), que promove a formação de ligações covalentes entre os monômeros de fibrina. O coágulo é composto por: rede de fibrina + células sanguíneas + plaquetas + plasma. Além disso, as fibras de fibrina se aderem à parede do vaso lesado, o que impede hemorragia. Após 20-60 minutos, o coágulo, em função da ação de plaquetas, contrai, expelindo grande quantidade de soro, elemento líquido que não pode coagular devido a inesxistência de fibrinogênio e outros fatores de coagulação que ficaram retidos no coágulo. Com a retração do coágulo, as bordas da abertura dovaso sanguíneo são tracionadas, contribuindo ainda mais para o estado final de hemostasia. Fatores da Coagulação Fator I Fibrinogênio Fator VIII Fator A Anti-Hemofílico Fator II Protrombina Fator IX Fator B Anti-Hemofílico 20 Fator III Tromboplastina Fator X Fator Stuart-Prower Fator IV Cálcio Fator XI Fator C Anti-Hemofílico Fator V Pró-acelerina (fator lábil) Fator XII Fator de Hageman Fator VII Acelerador Sérico da Conversão de Protrombina (SPCA) Fator XIII Fator Estabilizador de Fibrina Desencadeamento da Coagulação: Formação do Ativador de Protrombina Os mecanismos para a formação do coágulo consistem em:  Trauma na parede vascular e nos tecidos adjacentes;  Trauma no sangue;  Contato do sanguem com células endoteliais lesionadas ou com o colágeno. Após a ruptura de um vaso, a coagulação ocorre de forma simultânea pelas vias extrínseca e intrínseca, sendo que o contato do fator VII e das plaquetas com o colágeno na parede vascular desencadeia esta, enquanto o fator tecidual desencadeia aquela. O ativador de protrombina pode ser formado por duas vias distintas, com fatores de coagulação diferentes 21 : 20 Também chamado de Fator de Christmas. 21 Na ausência de Ca 2+ , a coagulação sanguínea não ocorre em nenhuma das vias. 130 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137  Via Extrínseca (Fator VII e Tecidual): Essa via começa com o trauma da parede vascular ou dos tecidos estravasculares que entram em contato com o sangue. O tecido lesado libera o fator tecidual ou tromboplastina tecidual, uma mistura de fosfolipídeos de membrana com um complexo lipoproteíco, na qual ambos atuam como uma enzima proteolítica. O fator X ativado (X a ) combina-se, em presença de Ca 2+ , como fator V para formar o ativador de protrombina, que desencadeia o processo de coagulação. A trombina ainda acelera a ativação do fator V que atua como catalisador da ação proteolítica desempenhada pelo fator X a .  Via Intrínseca (FatorXII, XI, IX e VIII): Essa via começa com o trauma sanguíneo ou com o contato do sanguem com o colágeno. Nesse processo o vator XII sofre alterações conformacionais que o ativam. Tal processo também ocorre quando há trauma de plaquetas ou mesmo quando em uma superfície eletrizada de um vidro. Prevenção da Coagulação Sanguínea no Sistema Vascular Normal (Anticoagulantes Intravasculares)  Fatores da Superfície Endotelial:  Lisura (maciez) da superfície endotelial;  Glicocálix que repele fatoes de coagulação e plaquetas;  Presença de sulfato de heparan (glicosaminoglicano relacionado à heparina);  Produção de prostaglandina I 2 e NO, que transforma o agonista plaquetário ADP em adenosina, que inibe a função plaquetária;  Síntese do Ativador de Plasminogênio Tecidual (tPA) que expressa a Trombomodulina, um receptor de trombina ligado à membrana endotelial. O complexo trombomodulina-trombina lentifica o processo de coagulação e ativa a Ca 2+ Trauma Tecidual Fator Tecidual Ativador de Protrombina Protrombina (Fator II) VII VII a X X a V Trombina Ca 2+ Ca 2+ Trauma Sanguíneo ou Contato com Colágeno Trombina Ativador de Protrombina Protrombina (Fator II) XII XII a V Trombina XI XI a IX IX a VIII VIII a X X a 131 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 proteína C, que, auxiliada pelo seu co-fator proteína S, atua como anticoagulante ao inativar os fatores V e VII ativados.  Ação Antitrombina da Fibrina e da Antitrombina III:  As fibras de fibrina, que são formadas durante um processo de coagulação, removem de 85-90% da trombina presente no sangue  A antitrombina III, uma α-globulina, inativa o excedente de trombina (~10%).  Heparina: composto produzido principalmente por mastócitos e basófilo, quando sozinha possui pouco ou nenhum efeito anticoagulante, mas, quando conjugada com a antitrombina III, é 100 a 1000 vezes mais eficaz em remover a trombina. O complexo heparina-antitrombina III remove diversos outros fatores de coagulação, como o XII, XI, X e IX. FÁRMACOS QUE ATUAM NA CASCATA DE COAGULAÇÃO Defeitos da Coagulação Entre os exemplos, destacam-se a hemofilia clássica (deficiência de fator VIII) e, mais raramente, a hemofilia B ou doença de Christmas (deficiência de fator IX). Os fatores ausentes podem ser supridos através da administração de plasma fresco ou de preparações concentradas de fator VIII ou de fator IX. Os defeitos adquiridos são mais comuns do que os hereditários. Eles incluem hepatopatia, deficiência de vitamina K (universal nos recém-nascidos) e terapia anticoagulante oral excessiva, podendo, todos eles, exigir tratamento com vitamina K. Vitamina K (do alemão Koagulation) é uma vitamina lipossolúvel, de ocorrência natural nas plantas, e essencial para a formação dos fatores da coagulação II, VII, IX e X. A vitamina K natural (fitomenadiona) pode ser administrada por via oral (dependente de bile) ou por injeção intravenosa. É muito pouco armazenada no corpo, sendo metabolizada pelo fígado a substâncias mais polares para serem excretadas na urina e na bile. Seu uso clínico se resume em:  Tratamento e/ou prevenção do sangramento: em decorrência do uso de agentes anticoagulantes (Ex.: warfarina) ou em recém-nascidos na prevenção da doença hemorrágica do recém-nascido. 132 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137  Tratamento de adultos com deficiências de vitamina K, causada por doenças, como o espru (doença celíaca, esteatorréia) ou a icterícia obstrutiva (ausência de bile). Trombose A trombose refere-se à formação patológica de um tampão "hemostático" no interior da vasculatura, na ausência de sangramento. Há mais de um século, Rudolph Virchow definiu três fatores predisponentes (tríade de Virchow), que consiste em:  Lesão da parede do vaso;  Alteração do fluxo sangüíneo;  Coagulabilidade anormal do sangue. O trombo, que se forma in vivo, deve ser distinguido do coágulo, que se forma no sangue estático in vitro. Estes são são amorfos e consistem numa difusa rede de fibrina no interior da qual são seqüestrados os eritrócitos e leucócitos de modo indiscriminado. Já os trombos apresentam estruturas distintas, sendo classificado em:  Trombo Arterial (Trombo Branco): consiste em plaquetas e leucócitos no interior de uma rede de fibrina. Em geral, está associado à aterosclerose. Os principais fármacos utilizados na prevenção consistem em agentes antiplaquetários (Ex.: aspirina) e agentes fibrinolíticos;  Trombo Venoso (Trombo Vermelho): consiste numa pequena cabeça branca e numa grande cauda vermelha semelhante à geléia, cuja composição se assemelha à de um coágulo sangüíneo, que escoa no fluxo. Os principais fármacos empregados na prevenção ou no tratamento dos trombos vermelhos incluem os anticoagulantes injetáveis 22 e os anticoagulantes orais (warfarin e substâncias relacionadas). Anticoagulantes Injetáveis A heparina não é uma única substância, porém uma família de glicosaminoglicanos sulfatados, cujas preparações comerciais são extraídas do pulmão bovino ou do intestino de suínos. Os fragmentos de heparina, conhecidos como heparinas de baixo peso molecular (LMWH) estão sendo utilizados cada vez mais em lugar da heparina não-fracionada. 22 As heparinas atuam imediatamente, enquanto os anticoagulantes orais necessitam de vários dias para exercer seus efeitos. Por conseguinte, os pacientes com trombose venosa são tratados imediatamente com anticoagulante injetável, que é mantido até que o efeito do warfarin esteja estabelecido. 133 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 A heparina inibe a coagulação ao ativar a antitrombina III, que inibe a trombina e outros fatores de coagulação. Para inibir a trombina, é necessário que a heparina se ligue à enzima, bem como à antitrombina III, já para inibir o fator X, é apenas necessária a ligação da heparina à antitrombina III. Portanto, as LMWH aumentam a ação da antitrombina III sobre o fator Xa, mas não a sua ação sobre a trombina. A heparina não é absorvida pelo intestino em virtude da sua carga e grande tamanho; por conseguinte, é adminis trada por via intravenosa ou subcutânea. A heparina atua imediatamente após administração intravenosa, porém o início é retardado em até 60 minutos quando é administrada por via subcutânea. A meia-vida de eliminação é de cerca de 40-90 minutos. As LMWH são administradas por via subcutânea e apresentam meia-vida de eliminação mais prolongada do que a heparina não-fracionada. O uso de heparina dentro de 2-14 dias induz quadro de trombocitopenia causada por anticorpos IgM ou IgG dirigidos contra complexos de heparina e do fator plaquetário 4. Assim, paradoxalmente, quando a imunoglobulina se liga a um fator plaquetário 4 que esteja ligado a glicosaminoglicanos da parede endotelial, ocorre lesão imune da parede vascular, com trombose e coagulação intravascular disseminada. As LMWH têm menos tendência que a heparina-padrão de ativar a liberação do fator plaquetário 4 pelas plaquetas e ligam-se menos avidamente a este fator (menor probabilidade de gerar trombose). Anticoagulantes Orais : Warfarin Os anticoagulantes orais atuam apenas in vivo e não exercem nenhum efeito sobre a coagulação quando adicionados ao sangue in vitro. Eles interferem na γ-carboxilação pós- tansdução dos resíduos de ácido glutâmico nos fatores da coagulação II, VII, IX e X. Exercem este efeito ao inibirem a redução enzimática da vitamina K a sua forma hidroquinona ativa. A inibição é competitiva (refletindo a semelhança estrutural entre o warfarin e a vitamina K). São necessários vários dias para o aparecimento dos efeitos, em decorrência do tempo levado para a degradação dos fatores carboxilados. O warfarin atravessa a placenta e não deve ser administrado nos primeiros meses de gravidez (teratogenicidade) e nem nos estágios mais avançados, visto que pode causar hemorragia intracraniana no recém-nascido durante o parto. Além disso, aparece no leite 134 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 durante a lactação. Porém, devido a ampola de vitamina K administrada ao recém-nato logo após o parto, o tratamento da mãe com warfarin geralmente não representa risco para o lactente amamentado ao seio materno. As principais drogas que interagem com a warfarin são:  Agentes que inibem o metabolismo hepático: cimetidina, imipramina, cloranfenicol, ciprofloxacina, metronidazol, amiodarona e azóis antifúngicos;  Drogas que inibem a função plaquetária: AINES, aspirina;  Drogas que deslocam a varfarina de seus sitos de ligação na albumina: hidrato de cloral e alguns AINES;  Drogas que inibem a redução da vitamina K: cefalosporinas;  Drogas que diminuem a disponibilidade de vitamina K: antibióticos de amplo espectro e algumas sulfonamidas, pois deprimem a flora intestinal que normalmente sintetizam a vitamina K.  As drogas que induzem o metabolismo hepático através das enzimas P450 aumentam a degradação da varfarina (rifampicina, carbamazepina, barbitúricos, griseofulvina). Da mesma forma, o hipotiroidismo diminui o efeito da varfarina devido ao fatfato da redução na degradação dos fatores de coagulação. Agentes Antiplaquetários Aspirina A aspirina inibe de modo irreversível a COX-1. O equilíbrio entre a PGI 2 (um inibidor da agregação produzido pelo endotélio vascular) e o TXA 2 (um estimulante da agregação produzido pelas plaquetas) encontra-se, portanto, alterado, visto que o endotélio é capaz de sintetizar mais enzima, enquanto as plaquetas não podem fazê-lo. A síntese de tromboxano só se recupera com a formação de novas plaquetas. Agentes Fibrinolíticos O plasminogênio é uma proteína do plasma que, quando ativado a plasmina, enzima semelhante à tripsina, age digerindo fibras de fibrina e outras proteínas da coagulação, como os fatores V, VIII e XII e a protrombina. A estreptoquinase, proteína extraída de culturas de estreptococos, ativa o plasminogênio. Sua ação é bloqueada por anticorpos antiestreptocócicos, que aparecem dentro 133 Leonardo MarLlns Caldelra de ueus – Med 137 de cerca de 4 dias ou mais após a administração da dose inicial. E necessário um intervalo de pelo menos 1 ano para que seja administrada novamente. A alteplase e a duteplase são formas recombinantes de ativadores de plasminogênio tecidual (tPA). Ambas são mais ativas sobre o plasminogênio ligado à fibrina do que sobre o plasminogênio plasmático, sendo, portanto, consideradas "seletivas do coágulo". Em virtude de suas meias-vidas curtas, ambas as substâncias devem ser administradas na forma de infusão intravenosa.
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