AS BOCAS DO MUNDOEra uma vez um homem muito velho que tinha na sua companhia um neto, filho de uma sua filha já falecida, como falecido era o marido desta. Teve o velho de ir a uma feira vender um jumento e como o neto era rapazola muito turbulento, não o quis deixar sozinho em casa, e levou-o consigo. O jumento era já adiantado em anos e o velho para não o estropiar resolveu levá-lo adiante, caminhando a pé avô e neto. Passaram a um lugar onde estava muita gente a brincar na estrada. — Olhem aqueles brutos! Vão a pé atrás do burro que se não dá da tolice dos donos. O velho disse ao neto que se pusesse em cima do burro. Mais adiante passaram próximo doutros sujeitos que se puseram a dizer: — O mariola do garoto montado, e o velho a pé; o que um tem de esperto tem o outro de bruto. O velho então mandou apear o neto e ele montou-se no burro. Mais adiante começaram a gritar: — Olhem o velho se é manhoso! A pobre da criança a pé e ele repimpado no burro. — Salta para cima do burro — ordenou o velho ao neto. O garoto não esperou que o avô repetisse a ordem e lá foram os dois sobre o jumento. Andaram assim alguns passos e logo viram muita gente sair-lhes à estrada, cheia de indignação e gritando ameaçadora: — Infames! Criminosos! Canalhas! Matar o animalzinho com o peso de dois alarves, podendo ir a pé. O velho e a criança foram obrigados a descer do burro. Então disse o avô ao neto: — É para que saibas o que são as línguas do mundo: preso por ter cão e preso por o não ter. José Gomes Ferreira, Contos Tradicionais Portugueses, Iniciativas Editoriais O velho, o rapaz e o burro O mundo ralha de tudo, Tenha ou não tenha razão: Quero contar uma história, Em prova desta asserção. Descia um velho campónio Do seu monte ao povoado; Levava um neto que tinha, No seu burrinho montado. Encontra uns homens que dizem: - Olha aquele que tal é! Montado o rapaz que é forte, E o velho trôpego, a pé! - Tapemos a boca ao mundo. O velho disse: Rapaz, Desce do burro que monto, E vem caminhando atrás. Monta-se, mas dizer ouve: - Que patetice tão rata! O tamanhão, de burrinho, E o pobre pequeno, à pata! - Eu me apeio, diz prudente O velho de boa fé; Vá o burro sem carrego, E vamos ambos a pé. Apeia-se e outros lhe dizem: - Toleirões, calcando lama! De que lhes serve o burrinho? Dormem com ele na cama? - Rapaz, diz o bom do velho, Se de irmos a pé murmuram; Ambos no burro montemos, A ver se inda nos censuram. Montam, mas ouvem dum lado: - Apeiem-se, almas de breu! Querem matar o burrinho? Aposto que não é seu. - Vamos ao chão, diz o velho, Já não sei que hei-de fazer! O mundo está de tal sorte, Que se não pode entender. É mau se monto o burro, Se o rapaz monta, mau é, Se ambos montamos é mau, E é mau, se vamos a pé! De tudo me têm ralhado; Agora que mais nos resta? Peguemos no burro às costas, Façamos inda mais esta. Pegam no burro: o bom velho Pelas mãos ergue-o do chão, Pega-lhe o rapaz nas pernas, E assim caminhando vão. - Olhem dois loucos varridos! Ouvem com grande sussurro, Fazendo às avessas, Tornados burros do burro! O velho então pára e exclama: - Do que observo me confundo! Por mais que a gente se mate, Nunca tapa a boca ao mundo. Rapaz, vamos como dantes, Sirvam-nos estas lições; É mais tolo quem dá Ao mundo satisfações. Curvo Semedo O Fazendeiro, seu Filho e o Burro "Um fazendeiro e seu filho viajavam para o mercado, levando consigo um burro. Na estrada, encontraram umas moças salientes, que riram e zombaram deles: - Já viram que bobos? Andando a pé, quando deviam montar no burro? O fazendeiro, então, ordenou ao filho: - Monte no burro, pois não devemos parecer ridículos. O filho assim o fez. Daí a pouco, passaram por uma aldeia. À porta de uma estalagem estavam uns velhos que comentaram: - Ali vai um exemplo da geração moderna: o rapaz, muito bem refastelado no animal, enquanto o velho pai caminha, com suas pernas fatigadas. - Talvez eles tenham razão, meu filho, disse o pai. Ficaria melhor se eu montasse e você fosse a pé. Trocaram então as posições. Alguns quilómetros adiante, encontraram camponesas passeando, as quais disseram: -A crueldade de alguns pais para com os filhos é tremenda! Aquele preguiçoso, muito bem instalado no burro, enquanto o pobre filho gasta as pernas. - Suba na garupa, meu filho. Não quero parecer cruel, pediu o pai. Assim, ambos montados no burro, entraram no mercado da cidade. - Oh!! Gritaram outros fazendeiros que se encontravam lá. Pobre burro, maltratado, carregando uma dupla carga! Não se trata um animal desta maneira. Os dois precisavam ser presos. Deviam carregar o burro às costas, em vez de este carregá-los. O fazendeiro e o filho saltaram do animal e carregaram-no. Quando atravessavam uma ponte, o burro, que não estava se sentindo confortável, começou a escoicear com tanta energia que os dois caíram na água." (Quem a todos quer ouvir, de ninguém é ouvido) Fábula de Esopo O velho, o rapaz e o burro Um homem ia com o filho levar um burro para vender no mercado. – Ó homem, o que você tem na cabeça para levar um burro estrada fora sem nada no lombo enquanto você se cansa? – disse um homem que passou por eles. Ouvindo aquilo, o homem montou o filho no burro, e os três continuaram seu caminho. - Ó rapazinho preguiçoso, que vergonha deixar o seu pai, um velho, andar a pé enquanto vai montado! – disse outro homem com quem cruzaram. O homem tirou o filho de cima do burro e montou ele mesmo. Passaram duas mulheres e uma disse para a outra: – Olhem só que egoísta! Vai o homem no burro e o filhinho a pé, coitado... Ouvindo aquilo, o homem fez o menino montar no burro na frente dele. O primeiro viajante que apareceu na estrada perguntou ao homem: – Esse burro é seu? O homem disse que sim. O outro continuou: – Pois não parece, pela maneira como o senhor trata o bicho. Ora, o senhor é que devia carregar o burro em vez de obrigar a carregar com duas pessoas. No mesmo momento, o homem amarrou as pernas do burro num pau e lá foram pai e filho, aos tropeções, carregando o animal para o mercado. Quando chegaram, toda a gente desatou a rir, a rir tanto que o homem, enfurecido largou o burro, pegou no filho pela mão e voltou para casa. Moral da história: Quem quer agradar a todos não agrada a ninguém.