Apostila Química Farmacêutica

April 2, 2018 | Author: Jaqueline Gomes Dos Santos | Category: Biotransformation, Isomer, Stereochemistry, Coordination Complex, Chemistry


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Centro Universitário de Araraquara - UNIARA Depto.de Ciências Biológicas e da Saúde Curso de Farmácia APOSTILA APOSTILA QUÍMICA FARMACÊUTICA QUÍMICA FARMACÊUTICA Prof. Antonio Távora de A. Silva 2008 Sumário Noções Básicas Introdução a Química Farmacêutica. .................... QF_T01 (001) Aspectos Teóricos na Ação de Fármacos ......................................... QF_T02 (016) Desenvolvimento de Fármacos ........................................................... QF_T03 (048) Latenciação de Fármacos ..................................................................... QF_T04 (084) Antiinflamatórios .................................................................................. QF_T05 (130) Antiinflamatórios Esteroidais .............................................................. QF_T06 (132) Histamina e Anti-histamínicos ............................................................ QF_T07 (138) Anticoagulantes ...................................................................................... QF_T08 (149) Anti-helmínticos .................................................................................... QF_T09 (158) Antibióticos ............................................................................................ QF_T10 (166) Cardiotônicos ......................................................................................... QF_T11 (180) Antiarrítimicos ....................................................................................... QF_T12 (182) Diuréticos ............................................................................................... QF_T13 (186) Anticonvulsivantes ................................................................................ QF_T14 (194) Anestésicos Locais ................................................................................. QF_T15 (199) Analgésicos Opióides ............................................................................ QF_T16 (206) Professor Antonio Távora da A Silva Química Farmacêutica 1 Noções Básicas Introdução a Química Farmacêutica 1. CONSIDERAÇÕES GERAIS. A farmacoterapia é uma atividade muito antiga de desde antes da escrita. A grande maioria dos agentes quimioterápicos foram introduzidos na terapêutica clínica entre os anos de 1940 a 1980, sendo que alguns já eram conhecidos no início do século XX e outros existentes há séculos bem anteriores à nossa era. Grandes povos antigos como Maias, Incas, Hindus e Chineses já conheciam preparações antimicrobianas eficazes. O imperador chinês Shen Nung (2735 a.c.) elaborou um livro sobre ervas terapêuticas, onde havia entre as mesmas até ervas com atividade antimalárica. O papiro de Ebers (~1500 a.c.) recomenda a utilização de substâncias dos reinos animal, vegetal e mineral e alguns desses são hoje conhecidos pela sua atividade quimioterápica. No século IV (460-370 a.c.) Hipócrates recomendou o emprego de sais metálicos para algumas doenças, hoje atribuídas a organismos patogênicos. E, em 50 d.c., Dioscórides (grego) prescreveu produtos naturais para o tratamento dessas mesmas moléstias em seu livro De Materia Medica. Galeno, em 131-201 d.c., defendeu o emprego de misturas herbáceas para qualquer tipo de moléstia. Os árabes entre os séculos VII e VIII disseminaram sua cultura e prática médica pelos países da Europa, assim como o uso da pomada mercurial. Cabe lembrar que em 1495, Cumano indicou o mercúrio para o alívio dos sintomas da sífilis. Na Idade Média, no período de 1493 a 1541, Paracelso afirmou que o corpo humano era um grande laboratório químico e que poderia ser tratado pela administração de substâncias químicas (Korolkovas, 1988). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 2 De Paracelso em diante, a quimioterapia européia fez poucos avanços. E o grande novo impulso fora dado por Paul Ehrlich no período de 1854 a 1915 (pai da quimioterapia moderna) (Korolkovas, 1988). No século XVI foram publicadas as primeiras farmacopéias. No século XVII novas drogas de origem animal e vegetal aumentam o arsenal terapêutico, e com o progresso da química, os compostos purificados, passaram a ser preferidos aos extratos brutos. No século XVIII introduziu-se no mercado o(s): digitálicos, éter, ópio, cloreto de mercúrio, entre outros. Entre 1854 e 1915, Paul Ehrlich (pai da quimioterapia moderna), deu um grande impulso a Química Farmacêutica, uma vez que descobriu sobre a toxicidade seletiva de certos agentes químicos para determinados microorganismos. Sendo na mesma época desenvolvida a teoria de chave-fechadura, por Emil Fischer, que fornecia uma explicação lógica para o modo de ação das drogas. As pesquisas de Paul Ehrlich e de seus colaboradores geraram diversos agentes quimioterápicos, como os antibióticos (1929) e as sulfas (1932). 2. CONCEITO DE QF. Engloba a descoberta (identificação de compostos bioativos), desenvolvimento de novos compostos, suas sínteses e o estudo (no campo molecular) da relação entre a estrutura química e a atividade biológica, para que se possa entender os diversos mecanismos do fármaco sejam eles terapêuticos ou colaterais, assim como entender seu comportamento farmacocinético e físico-químico. 3. SINÔNIMOS DE QF. • Inicialmente conhecida como Farmácia Química. • Atualmente como: Farmoquímica, Química Terapêutica e Química medicinal. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 3 4. INTERDISCIPLINARIDADE. É tudo que é comum a duas ou mais disciplinas ou ramos do conhecimento. Visa a unidade de saber, impondo-se como um grande princípio de organização dos conhecimentos; onde a interação entre duas ou mais disciplinas ou ramos do conhecimento possam fazer surgir um novo saber. Para se desenvolver a Química Farmacêutica, é necessário o conhecimento básico das ciências biológicas, farmacêuticas e exatas. Ciências Biológicas/Farmacêuticas - Biologia, genética, fisiologia, biofísica, bioquímica, hematologia, parasitologia, micologia, microbiologia, virologia, toxicologia, patologia, farmacologia (farmacodinâmica e farmacocinética), farmacotécnica e tecnologia farmacêutica. Ciências Exatas - Química orgânica e analítica. - Física, matemática e estatística. 5. ASPECTOS FUNDAMENTAIS SOBRE MEDICAMENTOS. 5.1. Algumas definições. • Droga - Toda substância química, exceto alimento, capaz de produzir efeito farmacológico, provocando alterações somáticas e funcionais benéficas ou maléficas. • Tóxico ou Veneno - Droga ou preparação com drogas que produz efeito farmacológico maléfico. • Fármaco - Toda substância de estrutura química bem definida utilizada para modificar ou explorar sistemas fisiológicos ou estados patológicos, para o benefício do organismo receptor. • Medicamento - Toda substância ou associação de substâncias, de ação farmacológica benéfica, quando utilizada de acordo com as suas indicações e propriedades. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 4 A Organização Mundial de Saúde (OMS), não faz distinção entre fármaco e medicamento. • Remédio - Tudo aquilo (inclusive o medicamento) que sirva para combater a dor e doenças, mas os leigos usam este termo como sinônimo de medicamento e especialidade farmacêutica. 5.2. Forma química dos fármacos. Fármacos são ácidos ou bases orgânicas, por várias razões são utilizados na forma de sais: • Modificação de propriedades fisíco-químicas, tais como solubilidade, estabilidade, fotossensibilidade e características organolépticas; • Melhoramento da biodisponibilidade, mediante alteração da aumento da potência e prolongamento do efeito; • Redução da toxicidade. Contudo nem todos os sais são adequados para uso terapêutico, portanto o FDA, aprovou alguns ânions e cátions (orgânicos e metálicos) para tal uso. • Ânions: acetato, bicarbonato, brometo, cloreto, cloridrato, estearato, fosfato, difosfato, fumarato, glutamato, iodeto, maleato, nitrato, salicilato, succinato, sulfato, tartarato e outros. • Cátions orgânicos: benzatina, meglumina e procaína. • Cátions metálicos: alumínio, cálcio, lítio, magnésio, potássio, sódio e zinco. 2.3. Emprego / Uso dos fármacos. • Fornecer elementos deficientes no organismo (ex.: vitaminas, sais minerais e hormônios); • Prevenção de doenças ou infeções (ex.: soros e vacinas); • Controle de infecção (ex.: quimioterápicos); • Bloqueio temporário de uma função normal (ex.: anestésicos); Prof. Antonio Távora absorção, Química Farmacêutica 5 • Correção de função orgânica desregulada: Disfunção: cardiotônicos no tratamento de insuficiência cardíaca congestiva; Hipofunção: hidrocortisona no tratamento de insuficiência supra-renal; Hiperfunção: metildopa em hipertensão arterial; • Destoxificação do organismo (ex.: antídotos); • Agentes auxiliares de diagnóstico (ex.: radiopacos / contraste). 2.4. Ação Biológica. Na ação dos fármacos observa-se 03 fases: • Fase farmacêutica (fase de exposição): ocorre desintegração da forma em que o fármaco é administrado. A fração da dose disponível para a absorção constitui medida da disponibilidade farmacêutica. • Fase farmacocinética: absorção, distribuição, biotransformação e excreção do fármaco. A fração da dose que chega à circulação geral é medida da disponibilidade biológica. • Fase farmacodinâmica: processo de interação do fármaco com seu receptor. Desta interação resulta um estímulo que, após um série de fenômenos químicos e bioquímicos, se traduz no efeito biológico. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 6 2.6. Metabolismo / Biotransformação. É o conjunto de reações bioquímicas que os fármacos sofrem no organismo, geralmente por processos enzimáticos. Ex: Fármaco administrado Fenacetina (ativo) Prontosil (inativo) Fenobarbital (ativo) OBS: ( = Biotransformação). Produto da metabolização Acetoaminofeno (mais ativo). Sulfanilamida (ativo). Glicuramato (inativo). 2.6.1. Local de Biotransformação. Os fármacos são biotransformados principalmente por enzimas microssomais no Fígado, que é o órgão central do metabolismo dos fármacos no corpo. Entretanto o metabolismo pode também ocorrer em outros locais, como: pele, pulmões, rins, plasma e mucosa intestinal. 2.6.2. Fases do metabolismo Segundo Bordie o metabolismo dos fármacos tem como finalidade torná-los mais polares (menos lipossolúveis) para serem mais facilmente excretados pelos Rins, e para que não fiquem indefinidamente pelo organismo, causando, então, o surgimento de efeitos colaterais e tóxicos, ou seja, fisiologicamente, pode-se dizer que a biotransformação é um mecanismo de defesa do organismo, pois acelera a eliminação de substâncias estranhas do corpo. Fármaco Reações da Fase I Reações da Fase II Produto Intermediário Produto Final Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 7 Fase I: fármacos apolares são inativados ou tem sua polaridade aumentada através de reações de: • Oxidação: desalogenação, desalquilação, desaminação, hidroxilação, etc.. • Redução: azorredução, nitrorredução, redução aldeídica ou cetônica; • Hidrólise: desaminação, desesterificação; • Retirada de grupos (alquílicos) apolares. Fase II: compostos polares são inativados por processos de metilação, acilação ou conjugação com sulfatos, dentre outros. Gera um produto menos tóxico do que o produzido pela Fase I, sendo excretado em uma das seguintes formas: conjugado, oxidado, reduzido, hidrolisado ou inalterado. 2.6.3. Indução e inibição do metabolismo. • Indução Enzimática: Quando um fármaco acelera a biotransformação de outros fármacos e também acelera a sua própria biotransformação, estimilando a síntese de enzimas microssômicas hepáticas. Ex: Barbitúricos, Anticonvulsivantes, Anestésicos gasosos, Hipoglicemiantes orais, Anti-inflamatórios e outros. Explica o surgimento da tolerância, quando da utilização de um fármaco por inteiro. • Inibição Enzimática: É o inverso da indução, onde certos fármacos, por mecanismos diversos, inibem as enzimas que metabolizam os fármacos, e deste modo prolongam seus efeitos. Ex: Iponiazida, que inibe a MAO, prolongando os efeitos da noradrenalina. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 8 2.6.4. Fatores que afetam a Biotransformação. • Internos constitucionais: peso corporal, fator genético, espécie, idade e sexo. • Internos condicionais: temperatura corporal, estado nutricional, estado patológico, gravidez, etc. • Externos: temperatura, umidade, luz, etc. • Outros: via de administração, volume administrado, etc. 2.7. Interações A interação entre fármacos pode gerar os seguintes efeitos: Aumento do efeito terapêutico desejado (Agonismo Sinergismo). Diminuição ou anulação do efeito terapêutico desejado (Antagonismo). Alteração da farmacocinética (absorção, distribuição, biotransformação e excreção), por interação com o outro fármaco, com o meio (pH) ou com estruturas protéicas. Desencadeamento de efeitos adversos (colaterais). Os anti-ácidos e o sulfato ferroso diminuem a absorção das tetraciclinas, formando quelatos com elas. Adição ou Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 9 2.8. Reações Adversas / Efeitos Colaterais. O fármaco pode levar a efeitos benefícios, indesejáveis, tóxicos e morte. Paracelso que viveu de 1493 a 1541 já afirmava que “todas as substâncias são venenos; não há nenhuma que não seja veneno. A dose correta diferencia um veneno de um remédio.”. Somente após a tragédia com a talidomida (mal formações fetais), é que a Organização Mundial de Saúde (OMS) e alguns governos se interessaram pelo assunto. Portanto atualmente sabe-se que nenhum fármaco é totalmente seguro, devendo-se considerar o controle de qualidade e ensaios de mutagenicidade, carcinogenicidade e teratogenicidade. 3. CLASSIFICAÇÃO DE FÁRMACOS Podem ser classificados quanto a: • Estrutura química (ácidos, álcoois, ésteres, amidas, etc.) • Ação farmacológica (fármacos cardiovasculares, antiinflamatórios, etc.) • Emprego / classe terapêutica (semelhante ao anterior) • Mecanismo de ação a nível molecular (fármacos que atuam sobre enzimas, que suprimem a função gênica, etc. – não são todos os mecanismos conhecidos) 4. NOMENCLATURA DE FÁRMACOS • SIGLA. • Nome químico. • Nome oficial, genérico, ou DCI (divulgado pela OMS). • Nome fantasia. • Sinônimos (mais de 01 nome oficial, por atualização de nomenclatura). A inicial de todos os nomes sempre começam com letra minúscula exceto no caso do nome comercial. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 10 Estrutura O OH Nomenclatura • Sigla: AAS. • N. químico: ácido 2-acetoxibenzóico. • N. oficial: ácido acetilsalisílico. CH3 O O • N. fantasia: Aspirina®. CH3 NH • N. químico: N-acetil-p-aminofenol. • N. oficial: paracetamol. • N. fantasia: Tylenol®. • Sinônimo: acetaminofeno. • N. químico: 1-fenil-2,3-dimetil-4metilaminometanosulfonato de sódio-5-pirazolona. • N. oficial: dipirona sódica. • N. fantasia: Novalgina® e Anador®. • Sinônimo: metamizol sódico. • Obs: Pirazolona é o nome do anel principal, que é o núcleo fundamental do fármaco em questão. O HO N O H2O - N CH3 Na O + N S CH3 CH3 O O Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 11 6. ASSOCIAÇÕES DE FÁRMACOS É a combinação de duas ou mais substâncias ativas numa mesma formulação. 6.1. Objetivos da associação. • Potenciação de efeitos (por sinergismo). • Adição de efeitos (efeito aditivo). • Inibição de efeitos (por antagonismo). 6.2. Vantagens da associação. • Mesmo efeito terapêutico com dose e RAM menores. Ex.: 50 mg/kg do fármaco A são necessários para produzir redução da pressão arterial. Associando-se 5 mg/kg do fármaco A + 5 mg/kg do fármaco B produzem o mesmo efeito e com menos reações adversas. • Alivívio de sintomas enquanto o fármaco principal exerce seu efeito. Ex. nas infecções respiratórias utiliza-se quimioterápico para curar e um analgésico, anti-histamínico e descongestionante para aliviar os sintomas. • Reduzir os índices de resistência antimicrobiana. • Promover profilaxia durante um tratamento com antimicrobiano. Ex. tetraciclina (antibiótico) + nistatina ou anfotericina B (antifúngicos) para tratar de certas infecções bacterianas. • Tratamentos urgentes, onde não há tempo de se identificar rapidamente o agente infectante. • Combate à infecções múltiplas. Ex. infecção por bactérias Gram-positivas e Gramnegativas. • Quando a associação é mais barata e conveniente do que quando os fármacos são utilizados isoladamente. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 12 6.3. Desvantagens da associação. • Não permitem flexibilidade de dose; • Nem sempre contêm os fármacos adequados ou a dose adequada; • Podem interferir com a identificação do agente etiológico; • Podem conduzir à diagnose descuidada e terapia inadequada; • Dificilmente é necessário mais de um fármaco para combater uma infecção ou corrigir uma disfunção orgânica; • Podem potencializar demasiadamente os efeitos de outro; • Podem antagonizar os efeitos de outro ou inibi-lo; • Podem promover o surgimento de resistência. 7. OUTROS CONCEITOS: 1. Medicamento Magistral - É aquele prescrito pelo médico e preparado para cada caso, com indicação de composição qualitativa e quantitativa, da forma farmacêutica, e da maneira de administração. 2. Medicamento Oficial - É aquele que faz parte da farmacopéia. 3. Medicamento Oficinal - É aquele que é preparado na farmácia, seguindo normas e doses estabelecidas por farmacopéias ou formulários e com uma designação uniforme. ex: Tintura de Iodo e Elixir parigórico. 4. Forma Farmacêuitica - É a forma na qual um medicamento pode ser utilizado, ou seja, é a forma de apresentação do medicamento (Ex: xarope, cápsula, comprimido, infusões, supositórios, etc.). 5. Fórmula - Refere-se à composição do medicamento, ou seja, descreve quais fármacos e quais aditivos (adjuvantes) estão presentes num determinado medicamento. 6. Manipulação - Em farmacotécnica, este termo significa o conjunto de operações usadas no “aviamento” ou execução da fórmula magistral. 7. Alopatia - É o tratamento de doenças através da criação de condições incompatíveis com o estado patológico, ou antagonizando o agente causal. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 13 8. Homeopatia - É o tratamento de doenças através da administração de um agente que possa causar o mesmo sintoma de sua moléstia, quando administrado em um indivíduo sadio, ou seja, “o semelhante combate o semelhante”. (As doses usadas na homeopatia são infinitesimalmente menores do que as usadas em alopatia). 9. Agonista - Substância endógena ou fármaco que interage com um biorreceptor específico, provocando uma resposta fisiológica ou farmacológica, respectivamente, típica do biorreceptor envolvido. 10. Antagonista - Fármaco ou composto-protótipo que apresenta efeitos fisiológicos ou farmacológicos opostos a um outro. Ao nível do biorreceptor, é a entidade química que bloqueia as respostas associadas ao agonista. 11. Alvo terapêutico - Sítio receptor eleito (enzima ou biorreceptor) com bases farmacológicas para a ação de um fármaco ou protótipo capaz de permitir um determinado efeito terapêutico. 12. Análogo - Um composto cuja estrutura química é relacionada a um outro, podendo manifestar respostas farmacológicas distintas. 13. Antípodas - Contrário, oposto. 14. Atividade inotrópica - Atividade relativa à contratibilidade de fibras musculares. 15. Atividade intrínseca - É a resposta máxima induzida por uma substância em relação a um composto de referência. 16. Atropoisomerismo - Tipo de isomerismo conformacional ou rotacional, sendo os isômeros, conformacionais ou rotacionais, isoláveis. 17. Biodisponibilidade - Termo que expressa a taxa ou concentração de fármaco que atinge a circulação sistêmica a partir do seu sítio de administração. 18. Biofase - Diversos compartimentos biológicos do organismo. 19. Bioligante - Substâncias endógenas e/ou exógenas capazes de interagir por complementariedade estrutural com os biorreceptores (p.ex., hormônios, neurotransmissores, fármacos, etc.). 20. Biomacromolécula - Macromoléculas endógenas de natureza enzimática e/ou receptora. 21. Biorreceptor - Estrutura complexa, geralmente de natureza protéica, capaz de reconhecer estereoespecificamente um determinado ligante. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 14 22. Citocromo P450 (CYP450) - Família de enzimas com propriedades oxidativas, envolvidas principalmente na primeira fase do metabolismo de fármacos. 23. Coeficiente de partição - Relação de solubilidade de uma substância em fase orgânica/aquosa. 24. Configuração absoluta - O arranjo espacial de átomos em uma molécula quiral que a diferencia de sua imagem especular. 25. Configuração relativa - O arranjo espacial de elemento estereogênico (centro, eixo ou plano) em relação a outro elemento estereogênico na mesma molécula. 26. Conformação bioativa - Conformação na qual um determinado composto interage, através de complementariedade molecular, com as biomacromoléculas endógenas. 27. Distômero - Enantiômero de um composto quiral que é menos potente para uma determinada propriedade farmacológica, em relação ao seu antípoda, podendo apresentar outras propriedades farmacológicas ausentes no antípoda, geralmente responsáveis por efeitos colaterais do emprego do racemato. 28. ED50 - Dose de fármaco necessária para atingir 50% do efeito farmacológico desejado. 29. Esterases - Enzimas capazes de hidrolisar seletivamente ligações químicas do tipo éster. 30. Eutômero - Enantiômero de um fármaco quiral que apresenta maior atividade do que o antípoda. 31. Farmacóforo ou grupamento farmacofórico - É o conjunto de características eletrônicas e estéricas que caracterizam um ou mais grupos funcionais ou subunidades estruturais, necessários ao melhor reconhecimento molecular pelo receptor e, portanto, para o efeito farmacológico desejado. Farmacóforo não é uma molécula real, nem associações de grupos funcionais; ao contrário, é um conceito abstrato que representa as diferentes capacidades de interações moleculares de um grupo de compostos com o sítio receptor. O farmacóforo pode ser considerado como a "parte" molecular essencial à atividade desejada. 32. IC50 - Concentração requerida para atingir 50% do efeito inibitório máximo. 33. Protótipo - Primeiro tipo ou exemplar original, modelo. Composto originalmente identificado que apresenta atividade farmacológica in vivo. 34. Quiralidade - Propriedade que destingue uma configuração espacial de átomos de sua imagem especular. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 15 35. Racemato - Qualquer mistura constituída por dois antípodas óticos, em proporção equimolecular - logo, oticamente inativa. 36. Tautomeria - Isomeria em que as substâncias têm fórmulas estruturais distintas e comportamentos químicos diferentes, mantendo-se sempre em equilíbrio. 37. Xenobiótico - Substância exógena que é absorvida pelo organismo (p.ex., fármaco, aromatizante de alimentos, antioxidantes, etc.). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS KOROLKOVAS, A; BURCKHALTER J.H.. Química Farmacêutica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1988. 3-38 p. RANG, H.P et al. Farmacologia. 2.ed Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1993. 595 p. SILVA, Penildon. Farmacologia. 4.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1994. 1450 p. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 16 Aspectos Teóricos na Ação de Fármacos 1. RELAÇÃO ESTRUTURA E ATIVIDADE BIOLÓGICA (SAR). Considerando o modo de exercerem a ação biológica, os fármacos podem ser divididos em 02 grandes classes: estruturalmente inespecíficos e estruturalmente específicos. 1.1. Fármacos Estruturalmente Inespecíficos. São aqueles em que a ação biológica não está diretamente ligada à estrutura química específica do fármaco, e sim às suas propriedades físico-químicas. Admite-se que os fármacos estruturalmente inespecíficos atuam por um processo físico-químico pelas seguintes razões: • Atuam em doses relativamente elevadas; • Embora apresentem estruturas químicas muito variadas, sem nenhuma relação entre si, podem provocar reação biológica semelhante; • Pequenas alterações em sua estrutura química, não resultam em alterações acentuadas na ação biológica. 1.2. Fármacos Estruturalmente Específicos. São aqueles cuja ação biológica decorre essencialmente de sua estrutura química tridimensional, que deve adaptar-se à estrutura química tridimensional dos receptores existentes no organismo, formando um complexo com eles. A prova de sua existência é que: • São eficientes em concentrações menores do que os fármacos estruturalmente inespecíficos; • Apresentam características estruturais em comum (estrutura fundamental, grupos funcionais e orientação espacial) responsável pela ação biológica análoga que produzem; • Pequenas alterações em sua estrutura química resultam em alterações significativas na atividade farmacológica, obtendo-se assim compostos que têm ação desde antagônica até análoga à do fármaco matriz. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 17 2. PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS E ATIVIDADE BIOLÓGICA 2.1. Parâmetros utilizados A idéia de que a estrutura química dos fármacos pode ser correlacionada matematicamente com a resposta biológica que produzem é bastante antiga. Em 1870, Crum-Brown e Fraser propuseram que a resposta biológica (RB) era função da estrutura química (C). Isto é, RB=f(C). Até 1960, entretanto, não se havia feito nenhuma tentativa de estabelecer quantitativamente as relações entre estrutura química e atividade biológica, por considerar-se demasiadamente complexa esta área de conhecimento. Ultimamente, contudo, vários autores vêm tentando expressar as relações entre estrutura química e atividade farmacológica por meio de equações matemáticas, principalmente com o objetivo de planejar fármacos biologicamente mais específicos e mais potentes. Nessas equações entram determinados parâmetros que representam as propriedades físico-químicas dos fármacos e sua correlação com a atividade farmacológica. Tais parâmetros, cujo número já ultrapassou 40, podem ser agrupados em 04 famílias: solubilidade, eletrônicos empíricos, eletrônicos semi-empíricos e estéricos. 2.1.1. Parâmetros de Solubilidade. Medem o grau de atração dos fármacos pelos lipídios e pelas regiões hidrofóbicas das macromoléculas, ou seja a interação entre regiões hidrofóbicas do fármaco e do receptor. A atividade anestésica local de alguns ésteres estão diretamente relacionadas com a sua lipossolubilidade. A atividade biológica de vários grupos de compostos pode ser correlacionada com os seus coeficientes de partição em solventes polares e apolares. Overton e Meyer foram os pioneiros nesses estudos. Recorreram aos coeficientes de partição primeiramente para explicar a atividade de certos narcóticos e, mais tarde, dos anestésicos gerais. Segundo os mesmos, tais compostos, devem sua Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 18 ação biológica, à sua maior afinidade pelos lipídios, se fixando preponderantemente às células do sistema nervoso, ricas em lipídios. Correlação melhor foi encontrada com o coeficiente de partição óleo/gás. Medindo a concentração alveolar mínima de vários anestésicos gerais necessária para produzir um efeito anestésico padrão. Eger e colaboradores verificaram que os anestésicos com alta lipossolubilidade são eficientes em concentrações alveolares baixas. Certos grupos químicos caracterizam-se pela propriedade de conferir hidrossolubilidade às moléculas de que fazem parte. Entre tais grupos, chamados hidrofílicos, lipofóbicos ou polares, podem ser citados, na ordem decrescente de eficiência, os seguintes: • -OSO2ONa, -COONa, -SO2Na, -OSO2H e SO2H. Menos eficientes são os grupos: • -OH, -SH, -O-, =CO, -CHO, -NO2, -NH2, -NHR, -NR2, -CN, -CNS, COOH, -COOR, -OPO3H2, -OS2O2H, -Cl, -Br e -I. Além disso, a presença de ligações insaturadas, como as que existem em: CH=CH- e -C≡C-, coadjuva na hidrofilicidade. Grupos, lipofílicos, hidrofóbicos ou apoIares, tornam lipossolúveis os compostos de que são constituintes. Como exemplo temos: • Cadeias de hidrocarbonetos alifáticos, grupos arilalquílicos e grupos de hidrocarbonetos policíclicos. Determinados tipos de moléculas diminuem a tensão superficial concentrandose e orientando-se numa disposição definida na interface ou na superfície de uma solução, e a isso devem a sua ação biológica. Tais compostos, chamados tensoativos. Os tensoativos apresentam duas regiões distintas: lipofílica e hidrofílica. Por esta razão recebem o nome de anfifílicos, do grego (ambos amigos). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 19 Tensoativos Não-iônicos Não são ionizáveis e contêm grupos fracamente hidrofílicos e lipofílicos, o que os torna dispersáveis em água. bastante empregados em preparações farmacêuticas para uso oral (até parenteral, às vezes) como solubilizantes de fármacos insolúveis ou pouco solúveis em água. Tensoativos Catiônicos O grupo hidrofílico tem carga positiva, podendo ser amônio quaternário e sulfônio. Desorganizam as membranas celulares e produzirem hemólise, tendo somente uso tópico como desinfetantes da pele ou esterilizantes de instrumentos. Tensoativos Aniônicos Tensoativos Anfóteros O grupo hidrofílico apresenta carga negativa e pode ser carboxila, sulfato, sulfonato e fosfato. Contêm 2 grupos hidrofílicos: um catiônico (sal de amina, nitrogênio quaternário) e outro aniônico (carboxila, sulfato). 2.1.2. Parâmetros Eletrônicos Empíricos Devido à natureza parcialmente lipídica das membranas biológicas, a passagem dos fármacos através das mesmas é facilitada quando apresentam lipossolubilidade alta. Esta, passagem é influenciada pelo pH do meio e pelo grau de dissociação ácida (pKa) do fármaco. Geralmente os fármacos são ácidos fracos ou bases fracas. O grau de dissociação ácida (pKa) do fármaco é o valor de pH em que o fármaco encontra-se 50% na sua forma ionizada e 50% na sua forma não ionizada. É um valor calculado a partir das equações de Henderson-Hasselbalch. Ácidos fracos têm pKa alto e bases fracas têm pKa baixo. A atividade biológica de determinados ácidos e bases está diretamente relacionada com o seu grau de ionização. Enquanto alguns agem na forma molecular (fenóis e ácidos carboxílicos), outros o fazem na forma ionizada (sais de amônio Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 20 quaternário). Portanto, o pH desempenha papel importante na atividade biológica. Os ácidos são mais ativos em pH mais baixo e as bases são mais ativas em pH mais alto. O aumento da ionização aumenta a hidrosolubilidade do fármaco e diminui a sua lipossolubilidade, conseqüentemente, dificulta sua absorção e passagem através das barreiras e membranas biológicas. Em geral, os fármacos atravessam as membranas celulares nas formas nãodissociadas (ionizadas), como moléculas íntegras, e atuam nas formas dissociadas (ionizadas). Isso se dá porque a passagem de íons através da membrana celular é impedida por dois fatores: • A membrana celular é fosfolipoprotéica e eletricamente carregada, o que atrai ou repele os íons; • A hidratação dos íons aumenta os seus volumes, dificultando a difusão destes através dos poros e transportes ativos. 2.1.3. Parâmetros Eletrônicos Semi-Empíricos Relacionam-se com os elétrons π, visto que os mesmos por serem deslocalizados, condicionam a maioria das propriedades físico-químicas das moléculas. 2.1.4. Parâmetros Estéricos Representam a forma e o tamanho do substituinte introduzido na molécula do composto matriz. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 21 3. MÉTODOS DE ESTUDAR AS RELAÇÕES ENTRE ESTRUTURA E ATIVIDADE BIOLÓGICA (SAR). A atividade biológica das substâncias químicas não se deve a uma só, mas a todas as propriedades físico-químicas da molécula. Atualmente são 5 os métodos básicos para estudar as relações quantitativas entre estrutura química e atividade biológica: • • • • • Método De Novo; Método de Hansch; Reconhecimento de padrão; Análise de grupo; Modelos de Química Quântica. 3.1. Método De Novo. Este método empírico baseia-se num modelo matemático aditivo em que se presume que um substituinte determinado numa posição específica contribui aditiva e constantemente para a atividade biológica de uma molécula numa série de compostos quimicamente relacionados. Ele é atraente quando não se dispõe de parâmetros físico-químicos e se deseja classificar quantitativamente as contribuições dos diversos grupos. Diversos tipos de fármacos foram submetidos a esse método, com resultados relativamente satisfatórios: antineoplásicos, hipoglicemiantes e tetraciclinas. 3.2. Método de Hansch. É um método mais perfeito do que o método De Novo. Baseia-se em parâmetros físico-químicos. Pois os processos biológicos apresentam natureza físicoquímica. É o modelo de relação quantitativa entre estrutura e atividade, mais amplamente usado. Desde 1964, quando iniciou suas pesquisas no campo da Química Farmacêutica, com o objetivo de correlacionar a estrutura química com as Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 22 propriedades físicas e a atividade biológica dos fármacos, Hansch vem estudando dois processos muito complexos: 1. Deslocamento do fármaco desde o local de administração até o local de ação; 2. Ocorrência de reação física ou química nos sítios receptores. Hansch parte de uma substância química de ação biológica conhecida e compara a sua atividade com a de compostos de estrutura análoga, dela diferindo apenas nos grupos substituintes. Determina os coeficientes de distribuição do composto matriz e dos seus derivados entre a água, solvente polar, e o octanol normal, solvente apolar. A diferença entre os respectivos logaritmos dos coeficientes de distribuição recebe o nome de constante de hidrofobicidade, sendo representada pela letra π. A equação de Hansch e suas variantes também têm sido empregadas para propor o mecanismo de ação de diversos tipos de fármacos e para planejar racionalmente novos fármacos. 3.3. Reconhecimento de Padrão Introduzido em 1972, a partir de informações acumuladas, se reconhecem padrões entre as propriedades físico-químicas das moléculas de fármacos e suas atividades biológicas correspondentes. Assim, de um grupo de substâncias determinam-se quais parecem merecer estudo mais detalhado. Em geral, este método compreende as seguintes fases: • Definição e designação de atividade biológica a um grupo de fármacos (chamado grupo em aprendizado) que foi usado para estabelecer o critério de atividade; • Criação de representações matemáticas das moléculas; • Seleção e aplicação dos métodos de reconhecimento de padrões; • Predição da atividade de um grupo de fármacos em ensaio (denominado grupo em ensaio); • Análise dos resultados. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 23 O método de reconhecimento de padrão está sendo utilizado por diversos autores no planejamento, ensaio e desenvolvimento de substâncias biologicamente ativas. Diversas classes de fármacos já foram estudadas por este método: analgésicos, anticolinérgicos, anticonvulsivantes, antidepressivos, anti-histamínicos, antineoplásicos, antipsicóticos, hipnóticos, neurolépticos e sedativos. A taxa de predição correta tem sido da ordem de 80 a 85%. 3.4. Análise de Grupo. Introduzida por Hansch e colaboradores em 1973, a análise de grupo constitui refinamento do método de Hansch e pode ser empregada em conexão com ele. Consiste em juntar os possíveis substituintes em grupos, de modo que, uma vez introduzidos na molécula protótipo, forneçam a quantidade máxima de informações, com a finalidade de estabelecer mais rapidamente uma relação estrutura atividade viável. 3.5. Modelos de Química Quântica. Utilizam-se de cálculos de orbital molecular, efetuados por computadores, dada a enorme quantidade de parâmetros considerados. Os cálculos de orbital molecular, foram utilizados para os seguintes fins: • Determinar as distâncias interatômicas e a densidade eletrônica em moléculas de interesse biológico; • Estudar a estereoquímica de macromoléculas e a conformação preferida de vários compostos biologicamente ativos; • Fornecer explicação racional para as atividades de certos compostos e gerar hipóteses para o mecanismo de ação, aos níveis molecular e eletrônico, de vários grupos de fármacos; • Propor topografia para os hipotéticos receptores de diversas classes de fármacos e deduzir indiretamente como se daria a interação fármacoreceptor aos níveis molecular e eletrônico; • Planejar novos fármacos em bases racionais, e que sejam mais específicos e mais potentes. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 24 Dois dos índices muito usados em Química Farmacêutica são o HOMO e o LEMO, que medem a capacidade, respectivamente, doadora de elétrons e aceptora de elétrons. Quanto maior a energia do HOMO, tanto maior a capacidade doadora de elétrons porque a propensão do átomo ou da molécula para doar elétrons será mais forte; inversamente, quanto menor a energia do LEMO, tanto menor será a resistência para aceitar elétrons. 4. EFEITOS FARMACOLÓGICOS DE GRUPAMENTOS ESPECÍFICOS. 4.1. Efeitos gerais de grupamentos. A atividade biológica de fármacos estruturalmente específicos depende diretamente de seu tamanho, forma e distribuição eletrônica. A presença de um grupo específico não afirma que a molécula terá determinada atividade biológica, visto que o efeito biológico da molécula depende dela como um todo. Os grupos químicos presentes ou introduzidos num fármaco exercem 2 tipos de efeitos: Estéricos e Eletrônicos, sendo importantes por 2 motivos: • Ser essenciais para a manifestação de determinada ação biológica, em razão de sua reatividade química ou da disposição espacial; • Modificar a intensidade de determinada ação biológica. Portanto, a atividade biológica requer atividade química ótima e propriedades físico-químicas ótimas. Nos grupos biofuncionais importa fazer distinção entre as partes essenciais e as partes acessórias. Onde as primeiras requerem alta especificidade estrutural, pois são responsáveis pela interação com o receptor gerando o efeito farmacológico. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 25 4.2. Grupos Ácidos e Básicos (COOH e NH2). Devido à sua polaridade, os grupos ácidos e básicos determinam as características físico-químicas dos fármacos em que estão presentes, influindo decisivamente nas atividades biológicas. Grupos ácidos, como SO3H atribuem a molécula atividade tripanomicida e quimioterápicos. Alguns ésteres alquílicos conferem a molécula maior lipossolubilidade e atividade anestésica local. Amidas possuem atividade biológica de fármacos estruturalmente inespecíficos, contudo fazem pontes de hidrogênio com macromoléculas orgânicas, gerando atividade narcótica. As bases fortes apresentam reduzida atividade biológica. Entretanto, em aminas quaternárias ionizadas e nas aminas primárias, secundárias e terciárias protonizadas, os grupos básicos, que são positivamente carregados, desempenham a função de ligar-se eletrostaticamente a grupos negativamente carregados dos receptores e, por isso, são essenciais para atividade farmacológica. 4.3. Grupos Hidroxila (OH). Exercem 2 efeitos farmacológicos principais: alteração das propriedades físicas (melhorando a solubilidade do composto) e modificação da reatividade química (interação fármaco receptor). Inúmeros são os fármacos que, in vivo, sofrem hidroxilação, podendo gerar produtos: (a) menos ativos que o fármaco matriz ou até inativos; (b) mais ativos que o fármaco matriz que, em alguns casos, não tem nenhuma atividade; (c) diferentes na atividade com relação ao fármaco matriz. 4.4. Grupos Tiólico e Dissulfeto. Têm a capacidade de: (a) interconverter-se em dissulfetos mediante reações de oxidação-redução (atraído ao receptor por forças eletrostáticas e pontes de H); (b) adicionar-se a ligações duplas; (c) formar complexos não-dissociados com metais Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 26 pesados (como ocorre na cisteína e na penicilamina); (d) formar complexos de adição com o anel piridínico de certas enzimas. 4.5. Grupo Nitro (NO2). Entre os vários efeitos exercidos pelo grupo nitro, os principais são: físicoquímicos, bioquímicos e farmacológicos. Fornece atividade antiparasitária, bactericida e mutagênica após sua redução via enzimática. Graças ao efeito indutivo no sentido de atrair elétrons, o grupo nitro pode: (a) formar quelatos; (b) modificar de uma quelação preexistente; (c) modificar a polarização da molécula. O grupo nitro aumenta a lipossolubilidade da molécula do fármaco, portanto, geralmente, os compostos nitrados permanecem no organismo por mais tempo do que os seus análogos não-nitrados e, por esta razão, suas ações terapêuticas e tóxicas são mais persistentes. A ação quimioterápica dos compostos nitrados é conseqüência de sua redução à aminas, como na figura a seguir. O N + O - H N H + H CH3 NH2 NH2 CH3 HO 4-hidroxianfetamina (-) tóxico (-) estimulante atividade pressora O O Anfetamina (estimulante) Nitrofural O H N O O H N O N NH H2N O H2N N NH HN CH3 HN CH3 O O O Fenobarbital (sedativo-hipnótico) 4-hidroxifenobarbital (inativo) OH Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 27 5. ASPECTOS ESTEREOQUÍMICOS DE FÁRMACOS 5.1. Complementaridade entre Fármaco e Receptor. Sendo o receptor provavelmente uma porção limitada de uma macromolécula, em geral de natureza protéica, este apresentará estrutura específica, semi-rígida, não podendo sofrer, na maioria dos casos, grandes alterações conformacionais. Só assim se explica a necessidade dos fármacos estruturalmente específicos apresentarem, em muitos casos, conformação complementar à do receptor. As substâncias químicas que manifestam atividade farmacológica semelhante contêm, em geral, grupos funcionais comuns dispostos no espaço de maneira análoga. Essa disposição estérica é, no caso dos fármacos estruturalmente específicos, de fundamental importância para a interação do fármaco com o receptor. São os fatores estéricos determinados pela estereoquímica tanto do receptor quanto do fármaco que possibilitam a formação de um complexo entre ambos e, conseqüentemente, o surgimento do efeito farmacológico. Quanto maior for o grau de complementaridade, maiores serão a especificidade e a atividade do fármaco. A substituição de um grupo volumoso por um grupo pequeno, a re-disposição dos grupos constituintes de uma molécula no espaço, podem modificar profundamente a estabilidade do complexo fármacoreceptor. A atividade dos fármacos depende de 3 fatores estruturais: • Estereoquímica da molécula; • Distância entre átomos ou grupos; • Distribuição e configuração eletrônicas. 5.2. Estereoquímica dos Fármacos A diferença acentuada na atividade farmacológica de muitos estereoisômeros fornece a melhor prova da existência de receptor. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 28 5.3. Configuração Absoluta e Conformação Preferida. Admite-se que na interação fármaco-receptor as moléculas dos fármacos estão na sua conformação preferida. Entretanto, isso não ocorre em todos os casos. Daí a razão do grande interesse em determinar não só a configuração absoluta, mas também a conformação preferida dos fármacos e outros compostos biologicamente ativos. São várias as técnicas usadas para isso: difração de raios X, ressonância magnética nuclear (RMN), dispersão rotatória óptica, dicroísmo circular e cálculos de orbitais moleculares. A conformação de um fármaco é estudada em 4 situações principais: • • • • Molécula isolada; Molécula no cristal; Molécula em solução; Molécula no receptor. É evidente que os resultados obtidos pelo uso de métodos diferentes e considerando as moléculas em situações diversas, freqüentemente não são concordantes, nem poderiam ser. Em alguns poucos casos, todavia, a concordância é quase perfeita. 5.4. Isomeria Óptica. Isômeros ópticos, são substâncias de mesma estrutura química, contudo não superponíveis. São imagens especulares um do outro. Não raro, os isômeros ópticos apresentam ação farmacológica em diferentes graus de intensidade. Provavelmente relacionada com a diferença de afinidade. A potência do composto racêmico é equivalente à média das potências dos 2 enantiomorfos, sendo raro o antagonismo entre eles. Por manifestarem, em geral, diferenças nas atividades biológicas, os isômeros ópticos têm sido muito utilizados em pesquisas que visam a determinar a natureza da interação fármaco receptor. Fundamentados nesses estudos, diversos autores têm formulado teorias referentes a essa mesma interação e apresentado hipóteses relacionadas com a topografia da superfície receptora. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 29 5.4. Isomeria Geométrica. Isômeros geométricos são esteroisômeros que têm estrutura igual, mas disposição espacial diferente de átomos ou grupos. Entretanto, não constituem imagens especulares um do outro, como no caso dos isômeros ópticos. A isomeria geométrica é determinada pela restrição à rotação dentro da molécula, seja por ligações duplas, seja por sistemas rígidos ou semi-rígidos. Podendo explicar a alta atividade estrogênica do trans-dietilestilbestrol, ao passo que o isômero CIS é inativo. 5.5. Distâncias Interatômicas. Em muitos casos as distâncias entre os grupos funcionais em determinados fármacos são críticas para atividade biológica ótima. Isso constitui mais um indício de que tais fármacos são estereoespecíficos, isto é, a ação por eles produzida resulta da complexação com receptores orgânicos. Quando os fármacos atuam como antagonistas metabólicos, a configuração e as distâncias interatômicas se tornam de capital importância. O exemplo clássico é o das sulfas, que apresentam notável semelhança estrutural, mesmo em distâncias interatômicas, com o ácido p-aminobenzóico, de que são antagonistas. As distâncias interatômicas foram invocadas para explicar o mecanismo de ação, ao nível molecular, de diversos tipos de fármacos, tais como: agentes antiinflamatórios, antineoplásicos, hipnoanalgésicos e sulfas. Em vários tipos de fármacos, todavia, a distância interatômica ótima para a atividade biológica não apresenta correspondência com as distâncias encontradas nas Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 30 proteínas. Isso talvez se deva à possibilidade de estas poderem adotar muitas conformações diferentes dependendo do meio em que se encontrem. 5.6. Distribuição Eletrônica. A distribuição eletrônica num composto químico determina muitas propriedades físico-químicas, tais como carga eletrônica, força de ligação, distâncias interatômicas, caráter da ligação, constantes de dissociação, espectros de absorção eletrônica, reatividade química e capacidade de formar complexos. Determina, também, em grande parte, a ação biológica produzida por este mesmo composto. O estudo desta distribuição eletrônica deu origem à Farmacologia Quântica. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 31 6. RECEPTORES DE FARMACOS. 6.1. Conceito e considerações gerais. As provas experimentais indicam que os receptores são partes integrantes de determinadas macromoléculas dos seres vivos, segmentos de proteínas, complexos lipoprotéicos (principalmente na membrana celular), centros alostéricos de enzimas e ácidos nucléicos (DNA e RNA), ou seja, estando ligado ao canal iônico, enzima, Proteína G ou ácido nucléico. A hipótese da existência de receptores foi aventada em decorrência de três características notáveis da ação dos fármacos: • Alta potência, onde são conhecidos fármacos que atuam em concentrações tão baixas como 10-9 a 10-11M; • Especificidade química devido a existência de isômeros ópticos com diferenças de efeito. • Especificidade biológica, como no caso da epinefrina, que exerce efeito acentuado sobre o músculo cardíaco, mas possui ação mais fraca sobre o músculo estriado. Em 1967, Fridborg e colaboradores, determinaram a estrutura tridimensional do complexo formado entre a anidrase carbônica C humana e a acetoximercurissulfanilamida (inibidor modificado desta enzima), utilizando métodos de difração de raios X. 6.2. Receptor e Aceptor. Receptores são macromoléculas biológicas que interagem com substâncias endógenas (acetilcolina, epinefrina, norepinefrina, histamina, serotonina e dopamina). Aceptores são macromoléculas que interagem com substâncias exógenas, como certos fármacos e venenos. Com base em dados experimentais, alguns autores calcularam que existe cerca de 106 a 107 receptores por célula em nosso organismo. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 32 6.3. Estrutura dos Receptores. O receptor consiste em uma entidade tridimensional elástica constituída, talvez na maioria dos casos, de aminoácidos integrantes de proteínas, apresentando uma estrutura estereoquímica complementar à do fármaco e que, às vezes, após sofrer alteração conformacional, é capaz de interagir com ele, via de regra na sua conformação preferida, para formar um complexo unido pelas diversas forças de ligação em jogo. Em resultado desta complexação fármaco-receptor é gerado um estímulo ou cadeia de estímulos que, por sua vez, causa uma ação ou efeito biológico. 6.4. Formas Ativa e Inativa. O receptor existe em 2 estados conformacionais: ativo e inativo, independentemente do fármaco estar ligado a ele. Os fármacos atuam ou como agonistas ou como antagonistas, de acordo com sua afinidade relativa por uma ou outra conformação. 6.5. Interação Fármaco Receptor. A complexação do fármaco com grupos químicos especiais do receptor, resulta numa seqüência de alterações químicas ou conformacionais que causam ou inibem reações biológicas. A capacidade do fármaco de adaptar-se ao receptor depende das características estruturais, configuracionais e conformacionais de ambos, fármaco e receptor. 6.5.1. Tipos de ligação. Para se compreender o modo e o mecanismo de ação dos fármacos é importante conhecer as forças de interação que os unem aos receptores. A determinação destas forças por métodos experimentais é muito difícil. A tabela a seguir apresenta não só uma relação das forças responsáveis pela complexação fármaco-receptor como também expõe alguns exemplos típicos de seus efeitos. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 33 Entre as moléculas que interagem deve existir, em muitos casos, uma relação análoga àquela que há entre chave e fechadura, embora o fenômeno seja muito mais complexo. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 34 A força de uma ligação depende da distância que separa dois átomos; onde na distância ótima forma-se a ligação mais forte. A formação espontânea de ligação entre átomos ocorre com diminuição da energia livre. A quantidade de energia livre assim desprendida, que se converte em outra forma de energia, será tanto maior quanto mais forte for a ligação. Na formação de ligações covalentes há diminuição de 170 a 460 kJ/mol de energia livre, ao passo que nas interações de Van der Waals o desprendimento desta é só da ordem de 2 a 4 kJ/mol. Quanto maior for a variação da energia livre, maior será a proporção de átomos na forma ligada. 6.5.2. Ligações fracas. Em geral, as ligações que se estabelecem entre o fármaco e o receptor são relativamente fracas: iônicas, polares, pontes de hidrogênio, transferência de carga, hidrofóbicas, van der Waals. Em conseqüência, os efeitos produzidos são reversíveis, pois com o rompimento das ligações fármaco-receptor tem-se o fim do efeito farmacológico. Tal ligação é ideal para fármacos que atuem nos receptores de nosso organismo, pois sabemos que o efeito desejado terá um tempo limitado. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 35 6.5.3. Ligações fortes. Há ocasiões, porém, em que se almeja que os efeitos produzidos pelos fármacos sejam prolongados e até irreversíveis, como no caso de quimioterápicos, que exercem ação tóxica (prolongada) contra organismos patogênicos e outras células estranhas ao nosso organismo. Tal interação com o receptor é feita por ligações covalentes. Isso é verdade especialmente no caso de compostos que contêm anéis altamente tensos como epóxidos (epóxido de butadieno = agente antitumoral). 6.6. Topografia dos Receptores. Com o fim de ajudar a compreender como se dá a interação fármaco-receptor, têm-se feito tentativas para identificar e isolar diretamente o receptor ou deduzir indiretamente sua topografia. Entre os vários meios usados para isso sobressaem os seguintes: 1. Marcação covalente de grupos integrantes dos hipotéticos receptores, não raro com reagente radiativo, 2. Emprego de antimetabólitos que, por terem semelhança estrutural com metabólitos, são altamente específicos, e os dados com eles obtidos permitem a formulação de hipóteses sobre a superfície dos receptores. 3. Experiências com substâncias de estrutura rígida, cujo formato é tal que, possibilita encaixe perfeito com os hipotéticos receptores. 4. Estudo das relações entre estrutura química e atividade farmacológica, verificando qual o efeito farmacológico da introdução de diferentes grupos substituintes na molécula de um composto biologicamente ativo, identificando o grupo mais favorável e especular sobre a presença de grupos complementares no receptor; 5. Cálculos de orbital molecular realizados para determinar a conformação preferida dos fármacos mais potentes e, assim, deduzir a posição de grupos complementares dos receptores. 6. Estudo cristalográfico de moléculas de substâncias biologicamente ativas Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 36 que reconhecidamente, interagem com receptores. Importa lembrar, todavia, que a conformação do fármaco no estado cristalino nem sempre é aquela do fármaco em solução; 7. Métodos físicos, tais como espectrometria de ultravioleta, infravermelho, massas, RMN, espectroscopia de fluorescência, dentre outros. Evidentemente, os mapas de receptores de fármacos assim obtidos, de que constam contornos superficiais, distribuição de carga e, em alguns casos, até a presença de certos grupos químicos são apenas hipotéticos, estando sujeitos a alterações periódicas, à medida que novos conhecimentos vão sendo acumulados sobre este assunto tão complexo e ainda não suficientemente estudado. 6.7. Isolamento de Receptores. Diversas tentativas foram e estão sendo feitas para isolar os receptores de fármacos contudo, até o momento, o êxito tem sido muito relativo. As dificuldades de separá-los das proteínas teciduais são grandes, pois durante o processo de extração as forças que unem as duas entidades (fármaco e receptor) são rompidas. Ademais, no processo de isolamento, o receptor sofre alteração na sua disposição espacial e na distribuição de cargas naturais, fatores essenciais à sua interação com o fármaco. Apesar do grande terreno que já se percorreu no caminho de isolar e caracterizar os receptores farmacológicos, ainda não se conhece a topografia exata e completa de nenhum. Isso não impediu, todavia, a formulação de hipóteses acerca de sua estrutura e estereoquímica. Os mapas hipotéticos serviram a propósitos muito úteis, especialmente para a explicação racional de como os fármacos atuam e para o planejamento de novos fármacos potenciais. Existem 2 métodos básicos para o isolamento de receptores: direto e indireto. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 37 6.7.1. Método Direto. Consiste em marcar os grupos funcionais do receptor mediante o emprego de substâncias capazes de ligar-se a eles de forma irreversível, por covalência, com posterior isolamento do complexo fármaco-receptor. O método direto apresenta a inconveniência de ser inespecífico, já que os grupos capazes de formar tal ligação reagem não só com os grupos funcionais do receptor mas também com outros sítios. Um meio de reduzir ao mínimo esta desvantagem consiste em primeiramente isolar a macromolécula que contém o receptor e depois efetuar a marcação covalente. 6.7.2. Método Indireto. Consiste em identificar a macromolécula que contém o receptor mediante emprego de substâncias capazes de se complexar com ele reversívelmente, por ligações fracas e, em seguida, isolar e caracterizar a referida macromolécula. 6.8. Modificação dos Receptores de Fármacos. Além das tentativas de isolar receptores, realizaram-se também trabalhos no sentido de modificar os receptores in situ, mediante processos físicos e químicos. Entre os primeiros, foram empregados o frio e o calor. Entre os últimos, utilizaram-se alterações do pH, agentes quelantes, solventes de lipídios, enzimas, desnaturantes de proteínas e reagentes tiólicos. 7. TEORIAS DA AÇÃO DOS FÁRMACOS. A ação dos fármacos resulta de suas propriedades físico-químicas (nos fármacos estruturalmente inespecíficos) ou diretamente de sua estrutura química tridimensional (nos fármacos estruturalmente específicos). A respeito de como se daria tal interação e, portanto, sobre o modo de ação dos fármacos, surgiram várias teorias: da ocupação, da velocidade, do encaixe induzido e da Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 38 perturbação macromolecular. 7.1. Teoria da ocupação Formulada por Clark e Gaddum, esta teoria afirma, que o efeito farmacológico é diretamente proporcional ao número de receptores ocupados pelo fármaco. Tal número depende da concentração do fármaco no compartimento do receptor (local de ação) e do número total de receptores por unidade de área ou volume. O efeito do fármaco será tanto mais intenso quanto maior for o número de receptores ocupados, portanto, a ação máxima corresponde à ocupação de todos os receptores. Esta teoria apresenta várias incongruências, como: • Alguns agonistas de uma dada classe, que por mais que se aumente a dose, não se observa a resposta máxima. • Não consegue explicar satisfatoriamente por que os antagonistas não causam os mesmos estímulos que os agonistas, embora se liguem, aos mesmos receptores. Com o objetivo de oferecer uma explicação para essas e outras incongruências, foi proposto modificações à teoria da ocupação, onde a interação fármaco-receptor compreende duas fases: (a) complexação do fármaco com o receptor; e (b) produção do efeito. Portanto, para que um composto químico apresente atividade biológica é preciso que o mesmo tenha afinidade pelo receptor e atividade intrínseca, que é a capacidade do complexo fármaco-receptor em produzir o efeito biológico. Portanto tanto os agonistas e os antagonistas têm afinidade pelo receptor, contudo somente os agonistas possuem atividade intrínseca. É importante ressaltar a diferença entre afinidade e especificidade. A afinidade de um fármaco pode ser pelo sistema adrenérgico, contudo o mesmo possui especificidade somente para receptores β2-adrenérgicos e não para α1, Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 39 α2 e β1. Os agonistas são constituídos de moléculas pequenas contendo grupos polares (ex. epinefrina). Pode-se transformar um agonista em um antagonista pela incorporação progressiva de grupos volumosos apolares (anéis aromáticos), que ajudam a estabelecer ligação mais firme com os receptores em áreas acessórias, bloqueando a ação dos agonistas. 7.2. Teoria da Charneira. É um tipo de teoria de ocupação. Baseia-se na hipótese de que existem 2 centros no receptor farmacológico: • Especifico ou crítico, que interage com os grupos farmacofóricos do agonista; • Inespecífico, ou não-crítico, que se complexa com grupos apolares do antagonista. Segundo esta teoria, tanto o agonista quanto o antagonista se fixam ao centro específico por ligações reversíveis fracas, mas o antagonista se liga também, firmemente por interações hidrofóbicas. A competição entre agonista e antagonista se dá no centro específico do receptor. E como o antagonista está ligado firmemente com o centro inespecífico do receptor, mesmo um excesso de agonista é incapaz de desalojá-lo daí. 7.3. Teoria da Velocidade. Esta teoria não exige a formação de um complexo estável para a ativação do receptor por parte de um fármaco, pois a atividade farmacológica é função somente da velocidade de associação e dissociação entre as moléculas do fármaco e os receptores e não da formação do complexo fármacoreceptor. Cada associação constitui um quantum de estímulo para a reação biológica. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 40 No caso de agonistas, as velocidades tanto de associação quanto de dissociação são rápidas (a última mais rápida que a primeira), com o que se produzem vários impulsos por unidade de tempo. No caso de antagonistas, a velocidade de associação é rápida, mas a de dissociação é lenta, o que explica a sua ação farmacológica. Em suma, os agonistas são caracterizados por velocidade de dissociação alta (e variável); os agonistas parciais, por velocidade intermediária; e os antagonistas, por velocidade baixa. A teoria da velocidade, assim como a teoria da ocupação, não consegue explicar, ao nível molecular, por que um fármaco atua como agonista e outro, estruturalmente análogo, como antagonista. 7.4. Teoria do Encaixe Induzido. Baseia-se na idéia de que centro ativo de uma enzima cristalina isolada não precisa ter necessariamente topografia complementar à do substrato, pois adquire tal topografia somente após interagir com o substrato, que lhe induz tal alteração conformacional. Portanto o centro ativo da enzima é flexível (plástico ou elástico) e não rígido com a capacidade de voltar à forma original após se desligar do substrato. Segundo a teoria do encaixe induzido, o efeito biológico produzido pelos fármacos resulta da ativação ou desativação de enzimas ou proteínas, através da mudança reversível na estrutura terciária das mesmas. A alteração conformacional não se restringe só as proteínas, pois os fármacos, também apresentam estrutura flexível podendo sofrer mudança conformacional ao se aproximarem do local de ação ou do sítio receptor. Por isso, pode-se considerar a interação fármaco-receptor como um ajuste ou acomodação topográfica e eletrônica dinâmica. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 41 7.5. Teoria da Perturbação Macromolecular. É muito semelhante à teoria do encaixe induzido, levando em conta a adaptabilidade conformacional na interação do fármaco com o receptor, sendo 2, os tipos gerais de perturbação que podem ocorrer no complexo: 1. Perturbação conformacional específica (ou ordenamento específico), que condiciona a adsorção de certas moléculas relacionadas com o substrato; este é o caso do agonista; 2. Perturbação conformacional inespecífica (ou desordenamento inespecífico), que pode servir para acomodar outras classes de moléculas estranhas; neste caso trata-se de antagonista. Caso o fármaco apresente ambas as características, teremos um agonista ou antagonista parcial. Tal teoria oferece base físico-química plausível para a explicação dos fenômenos que ocorrem com o receptor ao nível molecular. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 42 8. MECANISMO DE AÇÃO DOS FÁRMACOS. Os fármacos, em sua vasta maioria, atuam ao nível molecular por um dos seguintes mecanismos: ativação ou inibição de enzimas, supressão da função gênica, antagonismo metabólico, quelação, modificação da permeabilidade das membranas biológicas e ação inespecífica. Vários fármacos, todavia, atuam por mecanismos diversos. Há também inúmeros fármacos cujo mecanismo de ação pode ser classificado em duas ou mais das categorias. 8.1. Ativação de Enzimas. Os fármacos que podem fornecer íons que podem: (a) interagir com um inibidor da enzima e assim impedir que este a inative; (b) interagir diretamente com a enzima e alterar-lhe a conformação e a carga no sentido de ativá-la. 8.2. Inibição de Enzimas. Pode ser reversível ou irreversível, dependendo do alvo que se quer alcançar (fisiológico ou estranho). Há 2 tipos principais de inibição: competitiva e não-competitiva. Na inibição competitiva, o fármaco compete com o substrato pelo mesmo sítio da enzima com a qual se combina reversívelmente. Efetivamente, na presença de excesso de substrato o fármaco é deslocado do receptor, que passa a ser ocupado pelo substrato; Na inibição não-competitiva, o fármaco combina-se com a enzima ou com o complexo enzimasubstrato com igual facilidade, mas num sítio diferente daquele ao qual o substrato é atraído. Portanto, após a ligação do inibidor à enzima, por maior que seja a concentração do substrato, ele jamais desloca o inibidor. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 43 8.3. Inibição Alostérica. O antimetabólito é composto de estrutura química semelhante à de um dado metabólito e essa característica de complementaridade permite que ele se combine com o centro ativo de uma enzima específica, interferindo na ligação enzimasubstrato. Este mecanismo é válido para as enzimas em geral, com exceção das ditas enzimas alostéricas, por terem um sítio ligante diferente do centro ativo, o centro alostérico. Portanto, o inibidor alostérico não precisa apresentar nenhuma semelhança estrutural com o substrato, porque o centro alostérico e o centro catalítico estão situados em porções diferentes da enzima. A interação do inibidor enzimático com o centro alostérico resulta em alteração conformacional da enzima, diminuindo a afinidade da enzima pelo substrato. Como exemplo temos os inibidores: da acetilcolinesterase, da MAO (antidepressivos), da Fosfolipase A2, COX-1 e 2 (antiinflamatórios), dentre muitos outros. Alguns agentes atuam inibindo processos de biossíntese e metabolismo de neurotransmissores (serotonina), mediadores químicos (histamina) e constituintes da parede celular bacteriana (antimicrobianos). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 44 8.4. Fármacos Supressores da Função Gênica. É grande a lista de fármacos que atuam como supressores da função gênica. Como representantes temos alguns fármacos dentro das seguintes classes: antimicrobianos, fungicidas, anti-maláricos, tripanomicidas, esquistossomicidas, antineoplásicos e antivirais. Os fármacos supressores da função gênica podem atuar como: (a) inibidores da biossíntese dos ácidos nucléicos; (b) inibidores da síntese protéica. Os inibidores da biossíntese dos ácidos nucléicos são poucos usados na terapêutica, devido sua alta toxicidade, e interação tanto com os processos bioquímicos do parasito quanto do hospedeiro. A sulfonamida, um análogo estrutural do ácido p-amino-benzóico (pABA), essencial para a síntese de ácido fólico (Folato) para as bactérias. E este último é necessário para a síntese dos precursores do DNA e RNA. A cloroquina, que complexa-se por intercalação entre pares de bases do DNA. Os agentes alquilantes (mostardas nitrogenadas e epóxidos) complexam-se com os ácidos nucléicos por aposição, formando uma ligação cruzada com os cordões adjacentes da hélice dupla do DNA. Os inibidores da síntese protéica (cloranfenicol, estreptomicina, e tetraciclinas) interferem com a tradução da mensagem genética. Em ambos os casos o fármaco impede que o organismo patogênico sintetize estruturas protéicas (enzimas e/ou receptores) essenciais a sua sobrevida ou multiplicação. Ou ainda que passe a sintetizar proteínas anormais, às vezes tóxicas, e enzimas não-funcionais. Também é importante comentar que tais fármacos podem gerar mutações, tanto no parasita quanto no hospedeiro. 8.5. Antagonismo. É quando o efeito farmacológico de 02 fármacos é menor que o efeito dos fármacos isolados. Existem 05 tipos de antagonismo: farmacológico, fisiológico, funcional, metabólico e químico. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 45 8.5.1. Antagonismo Farmacológico: Ocorre entre o agonista e seu antagonista, onde este último reduz ou impede o efeito do causado pelo primeiro (a nível do receptor), e pode ser de 02 tipos: competitivo e não competitivo. 8.5.2. Antagonismo Fisiológico: Ocorre entre 02 fármacos agonistas que tenham efeitos farmacológicos opostos que se equilibram, e por isso, são denominados antagonistas verdadeiros. Ex: - Insulina X Glucagon. - Epinefrina X Acetilcolina. 8.5.3. Antagonismo Funcional: Ocorre entre 02 fármacos agonistas que atuam sobre o mesmo sistema enzimático, mas em sentidos opostos no desencadeamento de uma dada resposta celular. Ex: - Histamina e Isoprenalina (no músculo liso dos brônquios). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 46 8.5.4. Antagonismo Metabólico: O antagonista é um análogo estrutural do metabólito normal da célula e inibe a ação do metabólito normal competindo pelo mesmo receptor celular. Exemplo de metabólitos: hormônios, minerais e vitaminas. O antagonista que é um metabólito alterado, recebe o nome de antimetabólito, onde este pode ser de 02 tipos: Antimetabólito Clássico: são os que apresentam nítida semelhança estrutural com os metabólitos normais, e podem atuar como inibidores enzimáticos ou causar síntese letal (morte celular). Antimetabólito Não Clássico: são os que apresentam remota semelhança estrutural com os metabólitos normais, e podem atuar sobre enzimas-alvo originais, para impedir a formação do complexo enzima-substrato funcional. 8.5.5. Antagonismo Químico: O antagonista interage quimicamente com o agonista inativando-o e produzindo substâncias tóxicas ou pouco tóxicas. Ex: - Cu++ e enzimas. 8.6. Agentes Quelantes. Agentes quelantes são as substâncias que possuem a propriedade de combinarse com um íon metálico através da doação de pares de elétrons e assim formar compostos anelares, ou quelatos, geralmente de 5 ou 6 membros. Três são os principais empregos de agentes quelantes em Química Farmacêutica: 1. Eliminação do microrganismo por quelação de metais essenciais a sua sobrevida (oxina capaz de quelar o ferro); 2. Como antídotos (oxina e penicilamina), para retirada de metais indesejáveis (íons metálicos) dos organismos vivos; Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 47 3. Inibição de metais e enzimas metálicas para estudar suas funções em meios biológicos. 8.7. Ação inespecífica de fármacos. A ação dos fármacos estruturalmente inespecíficos, como alguns anestésicos gerais, não decorre de sua interação com receptores específicos, mas resulta de suas propriedades físico-químicas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS KOROLKOVAS, A; BURCKHALTER J.H.. Química Farmacêutica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1988. 54-123 p. SILVA, Penildon. Farmacologia. 4.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1994. 1450 p. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 48 Desenvolvimento de Fármacos 1. Fontes de Fármacos. Antigamente o tratamento das doenças consistia em uso de drogas de origem animal e vegetal, mas ainda desconhecendo o modo de ação dessas substâncias. Para estabelecer uma relação entre doença, sintoma e as drogas, alguns estudiosos, como Paracelso (1493 a 1541) pai da farmacoquímica ou iatroquímica e fundador da medicina moderna, adotaram a doutrina da assinatura, onde, os talos da hepática, cuja forma é semelhante à do fígado, seriam úteis no tratamento de doenças hepáticas; o açafrão, por ter cor amarela, curaria a icterícia; as raízes vermiformes seriam eficientes medicamentos contra vermes intestinais; a flor de verônica, que se assemelha a um olho, debelaria as doenças oculares; as folhas de ervacidreira, cordiformes ajudariam nas moléstias cardíacas; a mucosa do estômago de carneiro eliminaria as perturbações gástricas. Tal doutrina embora fundada em crenças populares e na superstição, contribuiu, para o progresso das ciências médicas. Observando casualmente os efeitos curativos produzidos por partes de determinadas plantas ou certos órgãos animais, o homem comprovou que as raízes do ruibarbo tinham ação purgativa; que a mandrágora possuía propriedades analgésicas; que o fígado de peixe fazia desaparecer a cegueira noturna; que as glândulas adrenais preveniam as hemorragias; que sementes de determinadas plantas (café, chá-mate, noz, cola, guaraná, cacau) eram estimulantes do SNC. Só com a descoberta de alcalóides, entre 1803 e 1920, que o estudo dos fármacos recebeu grande impulso. Até 1930 as drogas usadas na Medicina eram, em sua maioria, de origem natural: vegetal, animal e mineral. A descoberta acidental de que fungos e outros microrganismos produzem antibióticos, que podem inibir processos vitais de outros organismos, mesmo em Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 49 concentrações mínimas, levou os pesquisadores, sobretudo depois de 1940, a uma busca intensiva de novos antibióticos, não só entre microrganismos, mas também entre vegetais e animais superiores. Essa investigação resultou na descoberta, isolamento e identificação de mais de 3.100 antibióticos, dos quais, entretanto, menos de cem são empregados na terapêutica, pois os outros são demasiadamente tóxicos. Contudo, graças ao grande progresso da Química Orgânica, no arsenal terapêutico predominam atualmente os fármacos de origem sintética. A síntese química vem contribuindo cada vez mais com novos fármacos, mormente depois que passou a aplicar os conhecimentos dos mecanismos de reações químicas e bioquímicas e dispor de eficientes e rápidos métodos analíticos e de identificação, principalmente cromatografia, espectrofotometria, espectroscopia, RMN e difração de raios X. Ao lado dos produtos de origem microbiana (antibióticos e vitaminas principalmente), de novos alcalóides e daqueles obtidos totalmente por síntese química, o arsenal terapêutico foi também enriquecido por muitos fármacos semisintéticos, introduzidos mediante modificação química de produtos vegetais, animais ou microbianos, como alcalóides, hormônios e antibióticos, respectivamente. Outrossim, o progresso da Microbiologia e da Imunologia possibilitou, a fabricação de soros e vacinas. Atualmente possuímos aproximadamente 5.000.000 substâncias químicas, perfeitamente identificadas e caracterizadas. A este número se acrescentam anualmente cerca de 100.000 compostos novos. São de uso comum aproximadamente 63.000 substâncias químicas, das quais 4.000 são fármacos e 2.000 são aditivos de medicamentos; outras 2.500 a 5.000 são aditivos alimentares e mais 1.500 se empregam como ingredientes em agrotóxicos (também denominados, embora erroneamente, pesticidas, praguicidas e defensivos agrícolas). A percentagem de medicamentos de origem natural (vegetal, animal, mineral e Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 50 microbiana) vem declinando paulatinamente, ao passo que a daqueles de origem sintética aumenta. Hoje em dia, dos fármacos mais usados na terapêutica, 50% são de origem sintética, 18% de origem vegetal, 10% de origem animal, 9% de origem mineral, 5,5% de origem microbiana, 3,5% de origem semi-sintética, 3% são vacinas e 1% soros. Origem dos fármacos mais usados na terapêutica 4% 3% 1% 50% Sintética Vegetal Animal Mineral Microbiana Semi-sintética 10% 18% Vacinas Soros 6% 9% 2. Custo e Local de Desenvolvimento de Fármacos. O arsenal terapêutico foi muito enriquecido, de 1940 a 1975, no mercado norte-americano, foram introduzidos 971 fármacos novos, sendo estes os mais utilizados hoje em dia na terapêutica. Os países que mais concorreram para isso foram: Estados Unidos, com 622 (64,0% do total); Suíça, com 68 (7,0% do total); Inglaterra, com 51,5 (5,4% do total); Alemanha, com 48 (4,9% do total); e França, com 27 (2,9% do total). O Brasil, infelizmente, não contribuiu, neste período, com nenhum fármaco novo. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 51 Desenvolvimento de Fármacos de 1951-1975 4,9% 2,9% 5,4% 7% 64% USA Suíça Inglaterra Alemanha França A introdução de novos fármacos é atualmente muito onerosa. Na década passada custava 6.000.000 de dólares na França e 8.000.000 na Inglaterra. Os Estados Unidos, vêm despendendo cada vez mais em suas pesquisas. Onde a introdução de cada fármaco novo, desde a sua concepção até a comercialização, custou cerca de 60.000.000 de dólares. O motivo desse alto custo quando deve-se às dispendiosas fases compreendidas na gênese de um medicamento, que leva em média 7 a 10 anos. Há ainda outras razões para a introdução de um novo fármaco na clínica médica ser tão cara. Uma delas é o fato de ser cada vez mais difícil desenvolver novos fármacos. Em 1958, das 14.600 substâncias sintetizadas e ensaiadas como fármacos potenciais. 47 encontraram emprego clínico. Hoje em dia, calcula-se que é necessário sintetizar ou extrair de fontes naturais e ensaiar de 3.000 a 5.000 compostos químicos para que, desta triagem longa e onerosa, resulte 01 fármaco de uso terapêutico. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 52 Nos últimos 20 anos, 90% dos novos fármacos foram desenvolvidos em indústrias, 9% nas universidades e outras instituições acadêmicas e 1% nos laboratórios de pesquisas oficiais. Estes dados contrastam com os das décadas anteriores, quando as universidades contribuíam com cerca de 50%. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 53 Indituições que desenvolveram fármacos no Sec. XX 9% 1% Indústria Universidades Lab oficiais 90% 3. Busca de Novos Fármacos. Com o objetivo de descobrir novos agentes terapêuticos úteis, muitas substâncias estão sendo sintetizadas e testadas todos os anos. Calcula-se que até hoje foram ensaiadas mais de 15.000 sulfas, 40.000 tuberculostáticos potenciais, 220.000 antimaláricos potenciais, 50.000 compostos organofosforados como inseticidas potenciais, 250.000 esquistossomicidas potenciais e, só nos Estados Unidos, mais de 300.000 antineoplásicos potenciais. Potenciais Fármacos testados 300000 250000 220000 sulfas tuberculostáticos antimaláricos organofosforados 40000 15000 50000 esquistossomicidas antineoplásicos O arsenal terapêutico está agora relativamente bem suprido com diversos tipos de fármacos, tais como anti-histamínicos, antiespasmódicos, miorrelaxantes e barbitúricos. Por esta razão, novos fármacos pertencentes a um destes tipos atraem pouco interesse. Por outro lado, devido à situação atual da terapêutica, grande esforço está Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 54 sendo efetuado para introduzir novos agentes antiinfecciosos, agentes antineoplásicos, agentes cardiovasculares, fármacos para sistemas endocrinos e nervoso central. 4. Gênese de Fármacos. Os fármacos são introduzidos na terapêutica principalmente por um dos seguintes processos: acaso, triagem empírica, extração de princípios ativos de fontes naturais, modificação molecular de fármacos conhecidos e planejamento racional. 4.1. Acaso Alguns fármacos ou empregos novos de fármacos conhecidos foram descobertos em laboratório ou clínica por farmacêuticos, químicos, médicos e outros pesquisadores por mero acidente. Foi a observação alerta que resultou, na introdução, da acetanilida e fenilbutazona como antipiréticos, da penicilina como antibacteriano, do dissulfiram para o tratamento de alcoolismo crônico, da piperazina como anti-helmíntico, da imipramina e IMAO (tais como iproniazida) como antidepressivos, da clorotiazida como diurético, da mecamilamina como o primeiro agente anti-hipertensivo de um novo grupo, das sulfoniluréias como hipoglicemiantes por via oral, das benzodiazepinas (tais como clordiazepóxido) como ansiolíticos. As propriedades antipiréticas da acetanilida foram descobertas por 2 médicos de Strasbourg, Cahn e Hepp, em 1886, quando se cometeu um erro numa farmácia que aviou sua prescrição: em vez do receitado naftaleno, o paciente tratado de parasitose intestinal recebeu acetanilida e este medicamento causou redução na sua temperatura elevada. As atividades antiinflamatória, analgésica e antipirética da fenilbutazona foram encontradas enquanto ela estava sendo utilizada unicamente como agente solubilizante da aminofenazona. A ação antibacteriana da penicilina foi primeiramente notada por Fleming, em 1929, numa cultura de bactérias que estava contaminada por um fungo. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 55 A atividade hipoglicemiante de uma sulfa foi observada primeiro por Janbon e colegas, em 1942, e a utilidade da carbutamida no tratamento de diabetes mellitus conduziu ao desenvolvimento das sulfoniluréias, nova classe de agentes hipoglicemiantes por via oral. A eficácia do dissulfiram no tratamento do alcoolismo foi vislumbrada por Hald e Jacobsen, em 1948, durante uma pesquisa de novos antihelmínticos. A ação anti-helmíntica da piperazina foi descoberta pela primeira vez por Boismaré, farmacêutico de Rouen, que a usou para o tratamento da gota, antes de 1949. As propriedades antidepressivas da iponiazida foram observadas por Fox, em 1952, durante seus ensaios deste composto como agente tuberculostático esta descoberta resultou no desenvolvimento dos inibidores da MAO. A mecamilamina foi planejada para ser medicamento hipertensor, mas verificou-se que, em vez disso, apresentava atividade hipotensora, primeiramente observada por Stone e colaboradores, em 1955. O benéfico efeito antidepressivo da imipramina foi notado casualmente por Kuhn, em 1958, durante uma investigação clínica de novos hipnóticos potenciais da classe de análogos da fenotiazina. A clorotiazida foi produto inesperado da síntese orgânica planejada por Sprague e Bayer, em 1958, para obter novos compostos relacionados com a diclorfenamida, potente inibidor da anidrase carbônica usado como diurético. Tentativas para formilar um derivado aminado da diclorfenamida (II), não tiveram êxito, mas conduziram à clorotiazida, o primeiro membro das tiazidas e hidrotiazidas, duas novas classes de diuréticos administrados por via oral. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 56 O clordiazepóxido, primeiro membro dos agentes ansiolíticos benzodiazepínicos, foi obtido por Sternbach e colaboradores, os quais estavam empenhados num programa de pesquisa cujo propósito era preparar um composto químico diferente, tendo tipo diverso de ação. Eles estavam realmente tentando sintetizar 3,1,4-benzoxadiazepinas, como anticonvulsivantes. Na síntese planejada desta nova classe de substâncias surgiram dois resultados inesperados: a desidratação de o-acilaminoaldoximas ou cetoximas não forneceu 3,l,4-benzoxadiazepinas, mas sim quinazolina-N-óxido, e a aminação por metilamina de 6-cloro-2-clorometil-4-fenilquinazolina-N-óxido, não ocorreu como desejado resultando na expansão do anel, gerando o clordiazepóxido e cujas propriedades sedativas, miorrelaxantes e antíconvulsivantes semelhantes às dos barbitúricos são utilizadas para o alívio da tensão, apreensão, ansiedade, angústia e outros das sintomas neuroses. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 57 4.2. Triagem Empírica. Neste processo de descobrir novos fármacos todas as substâncias químicas disponíveis são submetidas a uma variedade de ensaios biológicos na esperança de que algumas manifestem atividade útil. É um método não muito recompensador, pois para ter-se um novo fármaco tem-se de submeter à triagem 500.000 a 400.000.000 compostos químicos. Uma variante deste método é a triagem empírica racionalmente dirigida, a qual foi usada durante a II Guerra Mundial para descobrir novos antimaláricos. Desde 1940, tão logo a comunidade científica ficou ciente da ação antibacteriana da penicilina, esta ampla triagem empírica em grande escala resultou na descoberta de muitas centenas de antibióticos, mas somente menos de 100 são usados em medicina humana ou veterinária. Outro exemplo de triagem empírica racionalmente dirigida é o isolamento e identificação de produtos do metabolismo de medicamentos. Pois diversos fármacos são em si mesmos inativos, mas devem a sua ação aos metabólitos, como a acetanilida e fenacetina: estes 2 fármacos são metabolizados a paracetamol, que exerce a principal ação analgésica. Por esta razão o paracetamol foi introduzido na terapêutica, ao lado da acetanilida e fenacetina, há muito conhecidas, mas hoje pouco usadas. NH CH3 NH CH3 NH CH3 O ACETANILIDA O HO PARACETAMOL H3C O FENACETINA O 4.3. Extração de fontes naturais. Durante séculos a humanidade usou extratos de partes vegetais ou de órgãos animais para o tratamento de várias doenças. E devido aos bons efeitos produzidos por estes, a medicina popular em todo o mundo tem sido extensivamente explorada. Diversos medicamentos como antibióticos, vitaminas e hormônios, resultaram Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 58 da purificação de extratos (como alcalóides) e do isolamento e identificação de seus princípios ativos. Cerca de 160 fármacos contidos na USP-NF (USA) eram utilizados pelos índios norte americanos. Em 1960, 47% dos fármacos prescritos pelos médicos nos EUA provinham de fontes naturais, sendo, em sua maioria, antibióticos. Considerando que na Terra existem aproximadamente 600.000 espécies vegetais e que somente cerca de 5% foram investigadas especificamente sob os aspectos químico e farmacológico, é de se esperar o aumento do arsenal terapêutico com novos fármacos de origem vegetal. Ressalte-se que, segundo Gottlieh e Mors das 120.000 espécies vegetais brasileiras até hoje foram estudados somente alguns dos constituintes químicos de cerca de 470 (0,4%) dessas plantas, nada se sabendo sobre a constituição química dos 99,6% restantes da flora nacional. Os animais marinhos foram, até agora, pouco explorados como fontes potenciais de novos fármacos. Onde uma dada espécie de tubarão tem sido estudada como fonte de princípios ativos de interesse terapêutico. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 59 4.4. Modificação molecular. Também denominado manipulação molecular, é o mais usado e, até agora, o mais recompensador. Constitui um desenvolvimento natural da química orgânica. Consiste em tomar uma substância química bem determinada e de ação biológica conhecida, como modelo ou protótipo e daí sintetizar e ensaiar novos compostos que sejam congêneres, homólogos ou análogos estruturais do fármaco matriz. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 60 H3C N prometazina (1947) CH3 clorpromazina (1952) CH3 N CH3 N Cl N CH3 S S fisostigmina (1925) CH3 HN CH3 N CH3 H3C N N CH3 O O H3C N + CH3 O O CH3 neostigmina (1928) CH3 Vantagens deste método: 1. Maior probabilidade dos congêneres, homólogos e análogos apresentarem propriedades farmacológicas semelhantes às do protótipo do que aqueles selecionados ou sintetizados ao acaso; 2. Possibilidade de obter produtos farmacologicamente superiores; 3. Síntese semelhante à do protótipo, com economia de tempo e dinheiro; 4. Os dados obtidos poderão elucidar a relação entre estrutura e atividade; 5. Emprego dos mesmos métodos de ensaios biológicos utilizados para o protótipo. Objetivos deste método: 1. descobrir o grupamento farmacofórico; 2. Obter fármacos que apresentem propriedades mais desejáveis que o protótipo em potência, especificidade, duração de ação, facilidade de administração, estabilidade e custo de produção. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 61 Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 62 Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 63 5. Processos Gerais. 02 processos gerais podem ser utilizados no método da modificação: • Simplificação molecular ou dissociação ou disjunção ou dissecção; • Associação molecular ou conjunção. 5.1. Simplificação molecular. Consiste na síntese e ensaio sistemáticos de análogos cada vez mais simples do composto matriz, tais protótipo. O fármaco matriz é geralmente um produto natural de estrutura química muito complexa. Como exemplos deste processo de simplificação temos a seguir: análogos são réplicas parciais ou do fármaco matriz ou Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 64 5.2. Associação molecular. Consiste na síntese e ensaio de análogos cada vez mais complexos do composto matriz, tais análogos incorporam determinadas características do composto matriz ou todas elas. Distinguem-se três tipos principais de associação: • Adição molecular: associação de grupos diferentes mediante forças fracas (atração eletrostática e ponte de hidrogênio); • Replicação molecular: associação de grupos idênticos através de Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 65 ligação covalente. Se a associação for de 02 grupos, teremos duplicação molecular; se for de 03, triplicação molecular; e, assim sucessivamente, tem-se tetraplicação, pentaplicação e hexaplicação moleculares; • Hibridação molecular: associação de grupos diferentes ou mistos através de ligação covalente. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 66 6. Processos Especiais. Além dos 02 processos gerais, o método da modificação molecular utiliza diversos processos especiais, agrupados em 02 classes: • Alterações que aumentam ou diminuem as dimensões e a flexibilidade de uma molécula, por processos como: fechamento ou abertura de anel; formação de homólogos mais baixos ou mais altos; introdução de ligações duplas; introdução de centros opticamente ativos; introdução, retirada ou substituição de grupos volumosos; • Alterações de propriedades físicas e químicas, incluindo estado eletrônico, pela da introdução, substituição ou modificação espacial de determinados grupos na molécula. 6.1. Fechamento ou abertura de anel Como exemplos temos fisostigmina e neostigmina e diversos anestésicos locais sintéticos, estradiol e dietilestilbestrol. fisostigmina (1925) CH3 HN O O O CH3 OH HO dietilbestrol CH3 O H3C N + CH3 N CH3 H3C N N CH3 CH3 CH3 neostigmina (1928) CH3 estradiol HO H3C OH Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 67 6.2. Formação de homólogos mais baixos ou mais altos Infelizmente, não é possível estabelecer regras rígidas para as propriedades farmacológicas de compostos homólogos. Contudo, nas séries alcânicas e polimetilênicas, observa-se que a atividade aumenta regularmente, até atingir um máximo, sendo os membros mais altos quase ou totalmente inativos. Isso é mais observado em fármacos estruturalmente inespecíficos (hipnóticos, anestésicos gerais, e desinfetantes), contudo também ocorre, raramente, em fármacos estruturalmente específicos (anestésicos locais); 6.3. Introdução de ligações duplas Pode originar um composto com atividade biológica diferente daquela apresentada pelo composto saturado. Isso pode ocorrer por 02 processos: (a) modificação da estereoquímica do fármaco e (b) modificação das propriedades físicoquímicas; 6.4. Introdução de centros opticamente ativos Modificando-se a estereoquímica da molécula do fármaco, pode-se alterar, às vezes drasticamente, sua atividade farmacológica. Como exemplos, temos: • Os (-)-aminoácidos são ou insípidos ou amargos, mas os (+)aminoácidos são doces; • A (+)-cortisona é ativa, contudo a (+)-cortisona é inativa. • Dos 4 isômeros do cloranfenicol, somente a forma D-(-)-treo é ativa; • O ácido L-(-)-ascórbico possui propriedades antiescorbúticas, ao passo que o ácido (+)-ascórbico não; • D-(-)-isoprenalina é 50 a 800 vezes mais ativa como broncodilatadora que a L-(+)-isoprenalina; • A (+)-muscarina é 700 vezes mais ativa que a (-)-muscarina; Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 68 6.5. Introdução, retirada ou substituição de grupos volumosos apolares Geralmente é usado para converter agonistas em antagonistas, e vice-versa. Na figura abaixo, observa-se que a diferença entre agonistas e antagonistas é a presença de grupos volumosos apolares nos antagonistas. Outro exemplo interessante encontra-se nas penicilinas resistentes à βlactamase. Sabe-se que as penicilinas perdem atividade quando se rompe o anel βlactâmico. Esta ruptura do anel pode ocorrer pela ação catalítica da β-lactamase (antigamente chamada penicilinase). Contudo, grupos volumosos introduzidos na proximidade do anel impedem por obstrução estérica a aproximação da enzima, tornando as penicilinas assim formadas resistentes a ela. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 69 6.6. Substituição isostérica (Bioisosterismo) Grupos isostéricos e bioisostéricos são muito aplicados no planejamento de fármacos, para modificação molecular de fármacos já conhecidos, ou no planejamento racional de antimetabólitos. Em 1919, Langmuir definiu isósteros como sendo compostos ou grupos de átomos que tem o mesmo número e disposição de elétrons, como: N2 e CO, N2O e CO2, N3 e NCO-. Os isósteros caracterizam-se por propriedades físicas semelhantes. Em 1925, Grimm ampliou o conceito de isosterismo, com a idéia de que com a adição de um átomo de hidrogênio com o seu elétron solitário a outro átomo resulta no que se convencionou chamar pseudo-átomo. Algumas das propriedades físicas deste pseudo-átomo são análogas às do átomo que apresenta um elétron mais. Mais tarde, Erlenmeyer redefiniu isósteros como sendo “átomos, íons ou moléculas em que as camadas periféricas de elétrons podem ser consideradas idênticas”. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 70 Atualmente, isósteros também são grupos que possuem configurações eletrônicas e estéricas semelhantes, a despeito do número de elétrons compreendidos. É o caso dos seguintes grupos: • Carboxilato (COO) e sulfamido (SO2NR); • Cetônico (CO), e sulfônico (SO2); • Cloro (Cl), e trifluormetila (CF3). Por exemplo, a X R1 N R3 R2 estrutura geral dos anti-- histamínicos é a seguinte: Onde X pode ser qualquer um dos seguintes grupos isósteros :O, NH ou CH2. Outro exemplo é o dos agentes anticolinérgicos, cuja fórmula geral é a mesma acima, contudo X pode ser um dos seguintes grupos isósteros: -COO-, -CONH-, COS-. Friedman introduziu o termo bioisósteros para significar “compostos que preenchem a mais ampla definição de isósteros e que possuam o mesmo tipo de atividade biológica”, mesmo que antagônica. Portanto, devem existir 2 tipos de isósteros: • Isósteros clássicos: os abrangidos na definição de Erlenmeyer, os Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 71 representados na lei de deslocamento de hidreto e os equivalentes anelares como –S- e -CH=CH-; • Isósteros não-clássicos: os que dão origem a um composto com disposição estérica e configuração eletrônica semelhantes às do composto matriz, como: PO(OH)NH2. H e F, -CO- e -SO2-, -SO2NH2 e - Mesmo que não seja possível o isosterismo puro, os princípios do isosterismo e bioisosterismo são muito empregados para modificar a estrutura de compostos biologicamente ativos. Mediante tal substituição obtêm-se não só produtos de ação idêntica à dos compostos que serviram de modelo, mas também antagonistas. Podem ser citados vários exemplos de equivalentes de produtos naturais, parametabólitos, para-vitamínas, para-hormônios e miméticos, bem como seus antagonistas específicos, antimetabólitos, antivitaminas e anti-hormônios, obtidos aplicando-se o conceito de isosterismo. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 72 Ultimamente, está sendo estudada a possibilidade de substituir o C por Si em alguns fármacos. Os resultados foram promissores em muitos casos, como nos derivados de colina, barbitúricos, penicilina, cloranfenicol e inseticidas. H3C O CH3 Si H N O N H O Salbarbitúricos (hipnótico) 6.7. Mudança de posição ou orientação de certos grupos A posição de certos grupos é às vezes essencial para uma dada atividade biológica. Por exemplo, dos três isômeros do ácido hidroxibenzóico somente o ohidroxi é ativo, porque pode formar ponte de hidrogênio intramolecular e, deste modo, agir como quelante. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 73 Outro exemplo ocorre nos monoclorofenois. Eles possuem propriedades antisépticas diferentes: o p-clorofenol é o mais ativo, em conseqüência da posição do átomo de cloro que, por estar adequadamente situado, pode exercer seu efeito indutivo negativo no sentido de realçar a acidez do fenol. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 74 6.8. Introdução de grupamentos alquilantes Quando adequadamente situados, estes grupos podem conferir ação prolongada aos fármacos devido à formação de ligação covalente no local de ação (DNA ou enzimas). Eles são utilizados especialmente em agentes antineoplásicos. Estes grupos estão indicados na tabela abaixo. Formam um íon carbônio, que pode sofrer ataque nucleofílico por parte de tióis, aminas, fosfatos e ácidos carboxílicos. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 75 6.9. Modificações para inibir ou promover estados eletrônicos diversos Determinados grupos químicos produzem 2 efeitos eletrônicos importantes: indutivos e conjugativos. Tais efeitos podem alterar muito, as propriedades físicas, químicas e biológicas. 6.9.1. Efeitos indutivos (ou eletrostáticos) Resultam de migrações eletrônicas ao longo de ligações simples, em virtude da atração exercida por determinados grupos, em razão de sua eletronegatividade. Assim, os grupos que atraem elétrons mais fortemente que o hidrogênio exercem efeitos indutivos negativos (–I), ao passo que aqueles que os atraem menos intensamente que o hidrogênio manifestam efeitos indutivos positivos (+Ì). Os grupos que exercem efeito –I são os aceptores de elétrons: • NH3, -NH2R, -NHR2, -NR3, -NO2, -CN; • -COOH, -COOR, -CHO, -COR; • -F, -Cl, -Br, -OH, -OR, -SH, -SR; • -CH=CH2, -CR=CR2, -C≡CH. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 76 Os grupos que exercem efeito +I são doadores de elétrons: • -CH3, -CH2R, -CHR2, -CR3 e -COO-. De acordo com a intensidade dos efeitos indutivos, é possível dispor certos grupos ou átomos em ordem decrescente de efeito –I ou em ordem crescente do efeito +I: • F>Cl>Br>I>OCH3>C6H5 efeito –I. • Me<Et<CHMe2<n-Pr<Cme3 efeito +I. Os efeitos conjugativos (ou de ressonância) devem-se à deslocalização e alta mobilidade dos elétrons nos compostos que com ligações duplas conjugadas. Os grupos que aumentam a densidade eletrônica nos sistemas conjugados apresentam caráter +R e os que diminuem tal densidade, caráter –R. Os seguintes grupos apresentam simultaneamente efeito –R e –I: • -NO2, -CN; • -CHO, -COR, -COOH, -COOR, CONH2; • -SO2R, -CF3. Os seguintes grupos apresentam simultaneamente efeito +R e +I: • -O, -S, -CH3, -CR3. Os seguintes grupos apresentam simultaneamente efeito +R e -I: • -F, -Cl, -Br, -I; • -OH, -OR, -OCOR; • -SH, -SR; • -NH2,-NHR, -NR2, -NHCOR. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 77 Os halogênios exercem 3 tipos principais de efeitos: estéricos, eletrônicos e obstrutivos. Os quais quando inseridos em diversos fármacos geram compostos estruturalmente análogos com atividade biológica modificada. Exemplo do efeito obstrutivo é a halogenação na posição para dos anéis aromáticos de alguns fármacos como o fenobarbital, a fim de impedir a hidroxilação,nessa posição, seguida de conjugação com o ácido glicurônico. fenobarbital O OH CH3 O O N H O Cl O O HN CH3 N H O HN p-hidroxifenobarbital HN CH3 N H O O p-clorofenobarbital 7. Exploração de Efeitos Colaterais. Uma prática muito comum de descobrir novos fármacos consiste em explorar os efeitos colaterais de fármacos conhecidos através de modificação molecular adequada. Vários exemplos indicam que este método é recompensador. A modificação molecular da atropina e de seu óxido, escopolamina, para explorar seus efeitos colaterais, conduziu a diversos novos fármacos: midriáticos, Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 78 antiespasmódicos, antidiarréicos, antiulcerosos, anti-parkinsonianos e fármacos que atuam no SNC. A observação de que o anti-histamínico prometazina produz efeitos sedativos sugeriu a modificação molecular deste fármaco visando a realçar tal propriedade. Isto originou a clorpromazina e a outros agentes antipsicóticos fenotiazínicos. O caso clássico, é o das sulfas, onde modificando a estrutura das sulfas que manifestaram outra atividade além da antibacteriana da primeira sulfa, nasceram muitos novos fármacos: antibacterianos (sulfas), hansenostáticos (sulfonas), diuréticos (tiazidas), antidiabéticos (sulfoniluréias), antimaláricos (proguanila), anti-tireoideanos (tiamazol) e agentes para o tratamento da gota (probenecida). O H2N S O NH2 O S O NH NH CH3 O tolbutamida (hipoglicemiante) sulfanilamida (antibacteriano) H3C O NH S O OH Cl O S O S NH O Cl O O H3C O N S O H3C Cl O NH CH3 clorpropramida (hipoglicemiante) probenecida (tto gota) proguanila (antimalárico) HN NH NH CH3 H2N O Cl N H2N S O O S NH O clorotiazida (diurético) HS H N N H hidroclorotiazida (diurético) NH NH CH3 N timidazol (anti-tireoideano) Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 79 8. Ensaio de Produtos Intermediários. Devido à sua semelhança estrutural com os produtos finais de uma síntese planejada de novos fármacos potenciais, é aconselhável ensaiar os produtos intermediários. Seguindo-se este método, foram descobertos vários fármacos. Na síntese de tuberculostáticos, um intermediário (a isoniazida) era mais ativo, que o produto final, sendo agora utilizada na clínica. 9. Análogos, Pró-Fármacos e Latenciação de Fármacos. Serão estudados em um capítulo especial. 10. Planejamento Racional de Fármacos. Consiste originalmente em uma série de programas postos em prática com o propósito de descobrir novas substâncias químicas que possam ser usadas em medicina, quer para a cura ou prevenção de doença, quer para o restabelecimento da saúde física ou mental . Tal conceito vem sendo expandido e englobando bioisosterismo, latenciação e pró-fármacos. O grande sonho dos químicos farmacêuticos e dos farmacologistas, porém, tem sido obter fármacos mediante planejamento verdadeiramente racional, isto é, fármacos sob medida, que apresentem ação farmacológica específica. Vários recursos têm sido utilizados para atingir este objetivo. As probabilidades de êxito, todavia, são escassas. Em geral, é preciso sintetizar e depois ensaiar milhares Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 80 de novos compostos químicos antes que 01 chegue ao uso clínico. Os cientistas que se dedicam ao planejamento racional de fármacos, devem possuir grande capacidade imaginativa, objetiva e estatística para ter êxito. Os pesquisadores que se dedicam ao planejamento de novos fármacos necessitam de conhecimentos profundos e modernos de várias áreas do conhecimento humano, principalmente as seguintes: Química, Bioquímica, Biologia (Clássica e Molecular), Fisiologia, Microbiologia, Parasitologia, Imunologia e Farmacologia (Clássica, Molecular e Quântica). Nas suas investigações, devem aplicar o método científico de trabalho e formular hipóteses válidas. Assim armados, têm aumentadas as probabilidades de lograr o seu objetivo. Em suma, o planejamento racional de fármacos consiste em utilizar os conhecimentos ora disponíveis, mormente aqueles relacionados com: • Local e mecanismo de ação dos fármacos ao nível molecular; • SAR e QSAR; • Receptores de fármacos e topografia de receptores; • Modo de interação fármaco-receptor; • Efeitos farmacológicos de grupos químicos específicos; • Parâmetros físico-químicos relacionados com a atividade dos fármacos: hidrofóbicos, estéricos e eletrônicos; • Diferenças citológicas, bioquímicas e outras, entre mamíferos e parasitos, quando se desenvolve novos quimioterápicos. Lançando mão destes conhecimentos, nos últimos anos o arsenal terapêutico foi enriquecido com diversos fármacos novos. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 81 11. Inibidores de Enzimas. São fármacos sintetizados com o objetivo de inibir enzimas com funções específicas no organismo humano e do parasita. Um dos processos para o planejamento de inibidores de enzimas é a substituição isostérica em moléculas de substratos das mesmas, tendo-se como exemplo: • Brocresina, inibidor da histidinadescarboxilase e, portanto, da biossíntese da histamina; • Alopurinol, inibidor da xantino oxidase e, desta maneira, do ácido úrico, responsável pela gota; • Tranilcipromina, inibidor da amino oxida-se, usada no tratamento da depressão. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 82 12. Antimetabólitos. São fármacos que, em razão de sua semelhança estrutural com metabólitos celulares normais, podem substituí-los nos processos biológicos, mas não conseguem executar seu papel normal. Geralmente são planejados, por substituição isostérica de certos grupos químicos de metabólitos essenciais. Tendo-se como exemplo o alopurinol e a sulfanilamida. O H2N S O NH2 N H N N N sulfanilamida alopurinol OH A incorporação destes antimetabólitos nos processos biológicos de uma célula determina a morte da mesma, daí o nome de síntese letal dado a este processo. Os grupos isostéricos utilizados para converter um metabólito em antimetabólito são chamados grupos deceptores. Tais fármacos são classificados em antimetabólitos clássicos (metotrexato e aminopterina), com alta semelhança ao metabólito original, e os não clássicos com remota semelhança com os metabólitos, tendo-se como exemplo destes temos os antimaláricos (pirimetamina e cicloguanila). N H3C N H3C N N NH2 H3C N NH2 NH2 Cl Cl NH2 pirimetamina cicloguanila Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 83 13. Agentes Alquilantes. Estes fármacos, usados na maioria como antineoplásicos, foram planejados para alquilar certos grupos presentes nas macromoléculas de células cancerosas. Infelizmente, são destituídos de seletividade e, são tóxicos. 14. Antídotos. Alguns fármacos usados como antídotos resultaram do planejamento racional de compostos químicos. Outro exemplo é a pralidoxima, planejada para ser reativador da acetilcolinesterase inativada pelos compostos organofosforados, segundo o mecanismo indicado na figura a seguir. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS KOROLKOVAS, A; BURCKHALTER J.H.. Química Farmacêutica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1988. 54-123 p. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 84 Latenciação de Fármacos 1. INTRODUÇÃO. Ainda hoje, existem diversos fármacos (alguns muito potentes) com características físico-químicas, organolépticas, farmacocinéticas, farmacológicas e toxicológicas, que caracterizam-se como barreiras para sua aplicação clínica (HAN & AMIDON, 2000; ZHENG, 1999). Para otimizar as características físico-químicas de um fármaco pode-se derivar certos grupos funcionais polares com pequenas moléculas orgânicas biorreversíveis, mascarando tais características sem alterar permanentemente as propriedades da molécula. Tal estratégia tem sido utilizada com sucesso, onde grupos funcionais tais como álcoois são convertidos em ésteres os quais podem ser rapidamente hidrolisados in vivo quimicamente ou enzimaticamente (ZHENG, 1999). O processo existente para a superação dos problemas anteriormente referidos e para a busca de novos compostos químicos terapêuticos é a latenciação de fármacos, onde o termo latente significa: presente ou existente, mas não manifestada, exibida ou desenvolvida (CHUNG & FERREIRA, 1999). A latenciação de fármacos fora proposta em 1959 por Harper, a qual consiste na transformação do fármaco em forma de transporte inativo que, in vivo, mediante reação química ou enzimática, libera a porção ativa no local de ação ou próximo dele. Entretanto, somente em meados da década de 70, quando pesquisadores começaram a localizar os alvos dos fármacos no organismo e compreender a farmacocinética dos mesmos é que o processo de latenciação tomou uma direção mais definida (CHUNG & FERREIRA, 1999; HAN & AMIDON, 2000). O fármaco latente é uma espécie de “Cavalo de Tróia”, uma vez que este engana o organismo, mas não para destruí-lo e sim para ajuda-lo. Tanto o fármaco latente quanto o análogo, possuem estruturas químicas similares, mas as propriedades biológicas desses compostos diferem à do fármaco matriz quanto Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 85 a(o): atividade, potência, biodisponibilidade, síntese, espectro de ação, índice terapêutico, entre outros (KOROLKOVAS, 1988). Um análogo muitas vezes difere do fármaco protótipo em um só átomo ou em um grupo de átomos que geralmente sustentam o fármaco matriz. Todavia, estruturalmente, o fármaco protótipo e o análogo possuem características farmacológicas próprias, oriundas de sua estrutura química (FIGURA 1) (KOROLKOVAS, 1988). FIGURA 1. Diferenças entre Fármaco, Pró-fármaco e Análogo. Nos últimos anos a latenciação tornou-se uma das principais ferramentas no desenvolvimento de novos quimioterápicos para o combate às maiores enfermidades na atualidade como o câncer e a SIDA (CHUNG & FERREIRA, 1999). Muitas razões relacionadas ao fármaco matriz justificam a busca por novos fármacos latentes. São elas: 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. Inconvenientes farmacocinéticos; Elevada toxicidade; Baixa estabilidade química; Solubilidade inapropriada; Odor e paladar inconvenientes; Dor no local da administração; Formulação farmacêutica de difícil preparo. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 86 Os principais inconvenientes farmacocinéticos incluem: 1. 2. 3. A deficiência de biodisponibilidade oral (devido à polaridade e/ou Insignificante distribuição específica no local de ação; Incapacidade de atravessar diversos tipos de barreiras biológicas (mucosa solubilidade); gástrica, pele, córnea e barreira hematoencefálica) que separam o fármaco de seu local de ação (BUNDGAARD, 1981). As formas latentes de fármacos podem ser divididas em pró-fármacos e fármacos alvo. Em 1958 Albert definiu pró-fármacos como qualquer composto o qual sofre biotransformação antes de exibir seus efeitos farmacológicos. Uma definição expandida, considera um pró-fármaco como um fármaco ativo, quimicamente transformado em um derivado inativo, o qual é convertido no fármaco matriz dentro do organismo antes ou após alcançar seu local de ação por um ataque químico ou enzimático ou de ambos; (FIGURA 2). FIGURA 2. Diagrama esquemático do conceito de pró-fármaco. Os pró-fármacos possuem alguns fatores importantes em seu desenvolvimento, para permitir o aprimoramento das propriedades do fármaco matriz, tais como: 1. Ser inativo ou menos ativo do que o fármaco matriz; Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 87 2. 3. 4. 5. 6. Sua síntese não deve ser significativamente mais expansiva do que a do A ligação entre o fármaco matriz e o transportador deve ser desfeita “in O transportador não deve ser tóxico; Possuir cinética adequada, assegurando níveis eficazes do fármaco no Possuir cinética adequada, minimizando tanto a biotransformação direta fármaco matriz; vivo”, por via química ou enzimática; local de ação; do fármaco matriz quanto sua inativação. O desenvolvimento de pró-fármacos tem como objetivo resolver diversos problemas relacionados aos fármacos atuais, tais como: 1. 2. 3. 4. 5. Alterar a farmacocinética do fármaco in vivo, para melhorar sua absorção, Diminuir a sua toxicidade e efeitos adversos; Aumentar sua especificidade; Melhorar sua duração de ação; Melhorar sua solubilidade e estabilidade. distribuição, biotransformação e excreção; A vantagem do desenvolvimento de pró-fármacos é a facilidade de obtenção de novos compostos, não considerados “me tôo” e portanto, passível de patentes. Os principais grupos reversíveis utilizados no desenvolvimento de prófármacos estão listados em KOROLKOVAS, 1988. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 88 2. MACROMOLÉCULAS UTILIZADAS COMO TRANSPORTADORES DE FÁRMACOS. O uso de macromoléculas como transportadores é um dos sistemas baseados no princípio da latenciação para diminuir toxicidade de um fármaco (STELLA, 1991; TAKAKURA & HASHIDA, 1994). A quimioterapia para tratamento do câncer é um bom exemplo desta aplicação devido à alta toxicidade dos agentes antitumorais, uma vez que, são na sua maioria, desprovidos de seletividade (TAKAKURA & HASHIDA, 1994). Várias macromoléculas biológicas naturais e sintéticas têm sido empregadas como transportadores de agentes quimioterápicos, partindo-se do conhecimento de que as características anatômicas e fisiológicas dos tecidos tumorais são diferentes dos tecidos normais. A estrutura anatômica dos vasos tumorais possui papel essencial na distribuição do fármaco no espaço intersticial, apresentando: (1) aumento da permeabilidade microvascular em relação ao vaso normal, permitindo, assim, a penetração de macromoléculas, (2) alta pressão intersticial, que pode retardar o extravasamento de macromoléculas e, (3) a falta de sistema linfático para drenagem, resultando em acúmulo de macromoléculas no interior dos tecidos tumorais, (JAIN, 1987; O’CONNOR & BALE, 1984; MATSUMARA & MAEDA, 1986; TAKAKURA et al, 1987, 1990). Os transportadores poliméricos (macromoléculas) devem apresentar as seguintes características (SEZAKI & HASHIDA, 1984; SEZAKI et al, 1989): (1) ser, de preferência, biodegradável; (2) não apresentar toxicidade ou antigenicidade intrínseca; (3) não acumular no organismo; (4) apresentar grupos funcionais para ligação química; e (5) manter a atividade original do fármaco liberado até que este atinja o local de ação. A seguir encontra-se alguns exemplos destes transportadores (QUADRO 1 e FIGURA 3). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 89 QUADRO 1. Classificação de macromoléculas utilizadas como transportadores não específicos. Macromoléculas naturais • Proteínas (albumina, globulina); • Polissacarídios (dextrano, quitina, quitosano, inulina); • Ácidos nucléicos (DNA). Macromoléculas sintéticas • Ácidos poliamínicos (polilisina, ácido poliaspártico, ácido poliglutâmico). Macromoléculas mistas • Copolímero de anidrido estireno de ácido maléico (SMA) • Copolímero de anidrido éter divinil maléico (DIVEMA) • Copolímero de N-(2-hidroxipropil) metacrilamida (HPMA) • Polietilenoglicol (PEG), • Álcool polivinílico (PVA). Fonte: CHUNG & FERREIRA, 1999. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 90 O HO OH HO HO CH2OH O OH HO NH2 O HO HO O O O OH HO HO O OH OH dextrano CH2OH O OH O . NH2 quitosana COOH O OH O COOCH3 O OH O . OH COOH O OH . SO 3HO O OH CH2OH O OH pectina O . OH HN CH3 O O HO HO O O OH HO sulfato de condroitina O OH O HO O HO HO O HO OH O HO OH HO O OH O O HO O OH HO O HO O OH O HO HO O OH HO O HO HO HO O HO inulina CH2 ciclodextrina FIGURA 3. Estrutura de alguns transportadores para pró-fármacos. Outro tipo de transportador foi obtido por Yokoyama e colaboradores (1990 e 1991). Estes pesquisadores desenvolveram micelas (FIGURA 4) poliméricas de doxorrubicina. Onde a doxorrubicina foi diretamente ligada ao polímero poli(etilenoglicol)-(ácido poli aspártico) através de ligação peptídica (aminogrupo do Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 91 fármaco e grupo carboxílico do ácido aspártico da cadeia polimérica), conferindo caráter anfifílico ao conjugado. FIGURA 4. Representação de uma micela. Disponível Acesso em em (www.bioq.unizar.es/EMvirtual/OK1agua/micelas.JPG). 25/02/2003. A micela obtida apresentou características hidrofóbicas internas “revestida”, externamente, pela parte hidrofóbica. O conjugado micela-doxorrubicina mostrou-se mais potente que o fármaco livre em relação à leucemia e tumores sólidos em camundongos (YOKOYAMA et al, 1990 e 1991). Acredita-se que os mesmos apresentem atividade citotóxica sem a liberação da doxorrubicina, uma vez que a sua ligação com o polímero é bastante estável (YOKOYAMA et al, 1990). É possível, mediante ajuste do tamanho da micela, conseguir fármacos dirigidos a células específicas. Transportadores peptídicos: derivados de aminoácidos ou peptídios têm sido utilizados como transportadores com o intuito de diminuir a toxicidade e/ou melhorar a biodisponibilidade (aumentando a hidrossolubilidade) (CLERICI et al, 1994; NISHIDA et al, 1994; VITOLS et al, 1995). A utilização de peptídios como transportadores surgiu de trabalhos de Carl e colaboradores (1980), com o intuito de diminuir a toxicidade de fármacos altamente tóxicos, como os antineoplásicos. Nesse sentido, em 1983, Chakravarty e colaboradores sintetizaram pró-fármacos peptídicos de doxorrubicina, planejados Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 92 racionalmente com base na seletividade da plasmina. Estes pró-fármacos poderiam ser ativados localmente em razão dos elevados níveis de plasmina produzidos em certos tumores sólidos, através da ação de ativadores de plasminogênio associados ao tumor. Os resultados demostraram seletividade in vitro maior dos derivados peptídicos em relação ao fármaco de origem. Entretanto, os efeitos in vivo não foram satisfatórios, possivelmente por deficiência na transformação do pró-fármaco em sua forma ativa. Com o mesmo objetivo, Trouet e colaboradores (1984) prepararam diversos derivados de aminoácidos e peptídios de primaquina com atividade antimalárica e demostraram que estes derivados eram menos tóxicos que a primaquina. Os peptídios utilizados por estes autores foram os mesmos utilizados no caso dos antineoplásicos. 2.1. Exemplos de pró-fármacos poliméricos: Vlieghe e colaboradores (2002) desenvolveram a kappa-carrageenan-3'-azido-3'deoxythymidine, um pró-fármaco recíproco polimérico derivado de zidovudina, possuindo como transportador a kappa-carragenina, a qual apresenta atividade antiHIV intrínseca (FIGURA 5). FIGURA 5. Pró-fármaco polimérico da zidovudina (VLIEGHE et al, 2002). Os pró-fármacos poliméricos, além de promover liberação lenta do fármaco matriz, também podem diminuir a toxicidade do fármaco, aumentando sua seletividade. Neste sentido, o pró-fármaco polimérico PK-2 (HMPA-doxorrubicinagalactosamina) (FIGURA 6), foi planejado contendo um grupo sítio dirigido ao fígado e encontra-se em fase clínica II, para o tratamento de carcinoma hepatocelular e doenças secundárias do fígado (FERRY et al, 1999). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 93 FIGURA 6. Pró-fármaco polimérico fármaco PK-2 (HMPA-doxorrubicinagalactosamina, hepato-específico) (FERRY et al, 1999). Recentemente, Duncan e colaboradores (1999), verivicaram que o pró-fármaco antitumoral PK1 (HPMA-Gly-Phe-Leu-Gly-doxorrubicina), não apresenta toxicidae / imunogenicidade. Além de obter bons resultados em estudos de modelos de tumores sólidos in vivo, demonstrando que os pró-fármacos acumulam-se em maior concentração que os fármacos matrizes. Os dados obtidos com PK-1 podem ser explicados com base de que as características anatômicas e fisiológicas dos tecidos tumorais são diferentes dos tecidos normais (FIGURA 7) (TAKAKURA & HASHIDA, 1994). A estrutura anatômica dos vasos tumorais desempenha papel importante na distribuição do fármaco no espaço intersticial; estes apresentam aumento da permeabilidade microvascular em relação ao vaso normal, permitindo, dessa forma, a penetração de macromoléculas (JAIN, 1987). Além disso, os tecidos tumorais são caracterizados, também, por alta pressão intersticial, que pode retardar o extravasamento de macromoléculas e, a falta de sistema linfático para drenagem resulta em acúmulo de macromoléculas no interior dos tecidos tumorais (efeito EPR – Enhanced Permeability and Retention) (O’CONNOR & BALE, 1984; MATSUMARA & MAEDA, 1986; TAKAKURA et al; 1987, 1990). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 94 FIGURA 7. Características anatômicas e fisiológicas dos tecidos tumorais e normais (TAKAKURA & HASHIDA, 1994). Quando o fármaco é administrado intravenosamente, ocorre: 1. distribuição dentro do espaço vascular; 2. penetração através da parede microvascular; 3. movimento através do espaço intersticial; 4. interação com a superfície celular. Com base nestes estudos, novas estratégias foram propostas para o desenvolvimento de polímeros terapêuticos de segunda geração. Entre estas estão os sistemas de liberação lisossomotrópico e intracitoplasmático e sistemas PDEPT (Polymer-Directed Enzyme Prodrug Therapy) e PELT (Polymer–enzyme Liposome Therapy) (DUNCAN et al, 2001). A FIGURA 8 mostra de forma esquemática destes novos sistemas. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 95 FIGURA 8. Representação esquemática dos sistemas PDEPT e PELT (DUNCAN et al, 2001). Os pró-fármacos poliméricos também são utilizados em conjunto com outras tecnologias para melhoria da atividade. A FIGURA 9 microsferas de liberação controlada (OH et al, 1999) mostra a conjugação de fármacos a ácido poli-(D-L–lático-co-glicólico) (PLGA) para utilização em FIGURA 9. Ilustração esquemática do sistema conjugado fármaco-PLGA (OH et al, 1999) Em 1999, Yura e colaboradores prepararam o FK 506-dextrano (FIGURA 10), pró-fármaco polimérico derivado de tacrolimus (FK 506) e dextrano. O FK 506 é um agente imunosupressor extremamente potente (cerca de 100 vezes mais potente que a ciclosporina), utilizado em terapêutica (EUA, Europa e Japão) na prevenção de rejeições em transplantes de fígado e rins. Entretanto, a utilização deste fármaco na Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 96 terapêutica requer a administração de injeções freqüentes ou infusões prolongadas causando sérios efeitos adversos, especialmente toxicidade renal. Contudo, os resultados obtidos por Yura e colaboradores, demonstraram vantagens na utilização do pró-fármaco em relação ao fármaco matriz (FK 506), pois o mesmo permanece por mais tempo íntegro na circulação sangüínea, levando à uma redução substancial dos efeitos adversos. FIGURA 10. Pró-fármaco polimérico FK 506-dextrano (YURA et al, 1999). As camptotecinas (CTPs), tais como itinotecano (CPT-11) e topotecano, disponíveis clinicamente, representam uma classe muito promissora de antitumorais, apesar de sua toxicidade. Sendo mielosupressão, toxicidade gastrintestinal e diarréia os principais problemas observados clinicamente. Neste sentido, Okuno e colaboradores (2000), sintetizaram um pró-fármaco polimérico denominado de T-0128. Este composto é um derivado do análogo da CPT, o T-2513, que utilizando o carboximetilado-dextrano, como transportador e o tripeptídeo Gly-Gly-Gly como agente espaçante (FIGURA 11), objetiva alterar o comportamento farmacocinético, diminuindo sua toxicidade e aumentando sua eficácia. Onde os resultados deste estudo demonstraram que o pró-fármaco polimérico T-0128 derivado de T-2513 promoveu regressão de tumor sólido, além de encontrar-se em concentração tecidual superior ao fármaco matriz. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 97 FIGURA 11. Estruturas do T-0128, T-2513, CPT-11, topotecano e SN-38. DS= grau de substituição de grupos carboximetilados. (OKUNO et al, 2000) 3. CLASSIFICAÇÃO DE PRÓ-FÁRMACOS. Os pró-fármacos podem ser classificados como: • Bioprecursores; • Pró-fármacos clássicos; • Pró-fármacos mistos; • Pró-fármacos recíprocos; • Pró-fármacos dirigidos. 3.1. Bioprecursores. São fármacos latentes que não apresentam um transportador, pois são moléculas obtidas por modificação molecular, que devem sofrer biotransformação (geralmente pelo sistema redox) para transformar-se em metabólito ativo. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 98 O derivado N-alquilaminobenzofenona é exemplo de agente bioprecursor, pois é necessária a ciclização do anel, in vivo, para formar o derivado benzodiazepínico correspondente (FIGURA 12) (GALL, 1976; LAHTI, 1976). H3C N N N N H3C O CH3 N-alquilaminofenona X N Cl N N H3C N X X = H alprazolam X = Cl triazolam Cl FIGURA-12. Representação da ativação de bio-precursores de benzodiazepínicos (GALL, 1976; LAHTI, 1976). 3.2. Pró-fármacos clássicos. Por si só são inativos ou menos ativos que o fármaco matriz, devendo sofrer hidrólise (química ou enzimática) para liberar a porção ativa. São obtidos ligando-se o fármaco matriz a um transportador adequado (geralmente lipofílico) sendo capaz de melhorar a atividade terapêutica, promovendo o aumento da biodisponibilidade, aumento da seletividade, redução da toxicidade e prolongamento da ação. 3.2.1. Pró-fármacos que promovem alterações na farmacocinética. Liao em 1999, sintetizou pró-fármacos sensíveis a estearase (FIGURA 13), obtendo aumentos significativos na taxas de liberação. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 99 FIGURA 13. Sistema de pró-fármacos sensíveis a esterase baseados na cumarina (LIAO, 1999). Apesar de já se utilizar a abordagem clássica de derivados lipofílicos de fármacos polares para melhorar sua permeabilidade à membrana celular, também pode-se sintetizar pró-fármacos onde parte de sua molécula é constituída de um transportador (glicose, peptídio ou aminoácido) que facilitará a passagem do fármaco pela membrana (HAN & AMIDON, 2000). Dentre estes transportadores, os peptídios são os alvos mais atraentes no planejamento de fármacos para diminuir a toxicidade e melhorar a biodisponibilidade oral (aumentando a hidrossolubilidade) do fármaco matriz, tais como ácido 5aminossalicílico, budesonida, dapsona, fenitoína, hidrocortisona, levodopa, lorazepam, metronidazol, oxazepam e tetraciclina. Outros transportadores podem ser utizados com o objetivo de diminuir o metabolismo acelerado do fármaco. No caso do 17-β-estradiol, a esterificação do grupo fenólico aumentou em 5 a 7 vezes a sua biodisponibilidade oral (FIGURA 14) (PATEL, 1995). CH3 17− Β-estradiol OH HO CH3 OH O N S O O O Pró-fármaco Ο−sacarilmetil-17−Β-estradiol FIGURA 14. Pró-fármaco do 17-β-estradiol (PATEL, 1995). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 100 Outro exemplo é o da captação cerebral do ácido 7-clorocinurenico e do ácido 5,7-diclorocinurenico potentes antagonistas de receptor glicina-NMDA, que tiveram aumento significativo de sua captação cerebral por seus pró-fármacos de aminoácidos: L-4-chlorokynurenine e L-4,6-dichlorokynurenine (HAN & AMIDON, 2000). Para melhorar a absorção oral dos bisfosfonatos, Aviva e colaboradores (2000) sintetizaram pró-fármacos de peptídios dos mesmos (FIGURA 15). Verificando alta afinidade destes pró-fármacos pelo tecido intestinal, além dos mesmos serem transportados de forma mais eficiente do que o fármaco matriz pelas células tipo Caco-2, sendo 3 vezes maior a biodisponibilidade oral dos pró-fármacos dipeptídicos de bisfosfonatos quando comparados ao fármaco matriz. O O P NH N H O NH HO P OH O OH OH OH Pro-Phe-alendronato O NH N H O NH HO O OH P OH OH P OH O Pro-Phe-pamidronato FIGURA 15. Pró-fármacos dipeptídicos de bis-fosfonatos sintetizados por AVIVA et al (2000). Jarkko e colaboradores (2000) desenvolveram diversos pró-fármacos de naproxeno com a finalidade de uso tópico, para tais ésteres metilpiperazinilaciloxialquil de ácido 2-(6-metóxi-2-naftil) propiônico (3c-f) (FIGURA 16). Tais compostos demonstraram alta hidrosolubilidade e lipofilicidade semelhante ao naproxeno em pH 5,0. Em pH 7,4 esses mesmos compostos foram significativamente mais lipofílicos que o naproxeno. Sendo o melhor pró-fármaco o Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 101 3c, com capacidade de permeabilidade cutânea de 4 e 1,5 vezes maior que o do naproxeno em pH 7,4 e 5,0 respectivamente. Portanto, Jarkko e colaboradores (2000) demonstram que a característica de solubilidade bifásica e a rápida hidrólise enzimática dos derivados metilpiperazinilaciloxialquil melhoram a permeabilidade cutânea (liberação) do naproxeno. X N R2 O Pro-Phe-pamidronato CH3 R1 O O O H3CO 3c: R1= (CH2)2, R 2= CH 2, X = NCH 3 3d: R 1= (CH 2) 4, R 2= CH 2, X = NCH3 3e: R 1= (CH 2) 4, R 2= (CH2) 2, X = NCH 3 3f: R 1= (CH2)4, R 2= (CH2) 3, X = NCH3 FIGURA 16. Pró-fármacos de naproxeno sintetizados por JARKKO et al (2000) 3.2.2. Pró-fármacos que auxiliam a farmacotécnica. Alguns fármacos apresentam problemas relacionados a solubilidade, como o metronidazol e o α-tocoferol (vitamina E) (CHO, 1982; CHUNG & FERREIRA, 1999). Porém um grupo de pesquisadores desenvolveu um pró-fármaco de metronidazol livremente solúvel em água para uso parenteral, o qual é convertido enzimaticamente no fármaco matriz por reações de hidrólise (FIGURA 17) (CHO, 1982). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 102 OH HO P O O OH biotransformação enzimática H3C N metronidazol fosfato N NO2 H3C N metronidazol N NO2 FIGURA 17. Regeneração do metronidazol por biotrasnformação enzimática (CHO, 1982). Devido o α-tocoferol, ser praticamente insolúvel em água além de ser rapidamente oxidado pelo oxigênio atmosférico (o que dificulta sua administração parenteral), Takata em 1995, sintetizou pró-fármacos os quais mostraram maior hidrosolubilidade (FIGURA 18). CH3 H3C CH3 CH3 ( HO CH3 d-α-tocoferol )3 CH3 CH3 H3C O CH3 CH3 ( (CH3)2N O éster de d-α-tocoferol O CH3 )3 CH3 FIGURA 18. Pró-fármacos de α-tocoferol sintetizados por TAKATA (1995) O cloranfenicol apresenta sabor amargo, dificilmente mascarado em preparações orais. Pesquisadores da Parke-Davis descobriram, décadas atrás, que o fármaco tornava-se insípido quando transformado em éster palmitato (FIGURA 19). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 103 Observaram, também, que esterases intestinais eram as responsáveis pela liberação da porção ativa no organismo (CHUNG & FERREIRA, 1999). Cl NH Cl palmitato O CH3 O NO 2 OH cloranfenicol O FIGURA 19. Palmitato de cloranfenicol (CHUNG & FERREIRA, 1999). O paclitaxel é um potente antitumoral utilizado no tratamento de leucemia, tumores sólidos de mama, ovário, cérebro e pulmões. É altamente lipofílico e insolúvel na água (hidrosolubilidade < 0,004 mg/mL), sendo que para resolver tal problema, Nicolaou e colaboradores (1993) sintetizaram pró-fármacos com a finalidade de conferir hidrosolubilidade à molécula do paclitaxel gerando os prófármacos 1 e 2 com hidrosolubilidade de 0,5 e 1,2 mg/mL (FIGURA 20). H3C O O O H3C CH3 HN R1 O R1 OH (placlitaxel) O HO O O O O CH3 O O CH3 O CH3 OH pró-fármaco - 1 R1 O OH O O R1 O OH OCH3 OH O Placlitaxel pró-fármaco - 2 FIGURA 20. Pró-fármacos do paclitaxel (NICOLAOU et al, 1993). Allen e colaboradores (2001) sintetizaram potenciais pró-fármacos de paclitaxel, onde o protaxel (FIGURA 21), é estável em condições ácidas moderadas, sendo sua solução para uso clínico mais estável que a do paclitaxel, possuindo tolerância Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 104 sistêmica de 2,5 – 3 vezes maior que a do fármaco matriz, além de ser mais efetivo contra certos tipos de câncer humano em modelo animal (camundongos). H3C O O O CH3 CH3 HN OH O HO O O O O CH3 O O CH3 placlitaxel O O H3C O O OH OH protaxel FIGURA 21. Pró-fármaco do paclitaxel (ALLEN et al, 2001). 3.3. Pró-fármacos mistos. São aqueles com características de bioprecursores e de pró-fármacos clássicos, constituindo-se de uma molécula biologicamente inerte que necessita sofrer diversas reações químicas para se converter na forma ativa, aumentando a concentração do fármaco ativo em um sítio de ação específico. Um dos melhores exemplos é o sistema denominado CDS (Chemical Delivery System), o qual utiliza transportadores de ação central para atravessar a barreira hematoencefálica (BHE) (FIGURA 22), pois assim que atravessa, sofre primeiramente oxidação sendo acumulado no SNC e em seguida hidrólise, liberando a porção ativa, diminuindo a concentração de fármaco matriz (ativo) no sistema periférico, diminuindo em conseqüência a toxicidade (FIGURA 23) (BREWSTER, 1994). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 105 FIGURA 22. Representação da barreira hematoencefálica (BHE). Disponível em (www.arts.uwaterloo. ca/~bfleming/psych261/image22.gif). Acesso em 25/02/2003. FIGURA 23. Representação do Sistema CDS / SNC (Chemical Delivery System no SNC). 26/02/2003. Este sistema vem sendo usado para o planejamento de vários fármacos antivirais, principalmente aos usados no tratamento da AIDS, como a zidovudina (AZT) (AZT-CDS) (FIGURA 24) e análogos da dideoxiadenosina, da encefalite provocada por herpes simplex, citomegalovirus e da ecefalite viral japonesa (LITTLE et al, 1990). Disponível Acesso em em (www.chemsoc.org/chembytes/ezine/images/1998/bodfig1.gif). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 106 O H3C NH O H3C NH O O O O N zidovudina - CDS N3 CH3 zidovudina N3 N O O OH N FIGURA 24. Pró-fármaco da zidovudina (AZT) para o sistema CDS (LITTLE et al, 1990). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 107 3.4. Pró-fármacos Recíprocos. Caracterizam-se por seu transportador também possuir atividade terapêutica, ou seja, podemos ter um pró-fármaco com atividades terapêuticas diferentes ou semelhantes, atuando por mecanismos da ação diferentes ou iguais (KOROLKOVAS, 1988; SINGH, 1994). Os pró-fármacos recíprocos não são tão recentes, já que vários compostos foram introduzidos na terapêutica antes do conhecimento de pró-fármaco propriamente dito. A sulfassalazina, é um bom exemplo, pois foi usada em 1942 para o tratamento de artrite reumatóide e atualmente é utilizada no tratamento de colite ulcerativa. Este fármaco, após sofrer ação das azo-redutazes, libera sulfapiridina e ácido 5aminossalicílico (5-ASA), ambos farmacologicamente ativos (FIGURA 25) (CHUNG & FERREIRA, 1999). O N NH S O N N OH sulfasalazina O AZO-redutases O N NH S O H2N OH O OH + NH2 sulfapiridina OH 5-ASA FIGURA 25. Pró-fármaco recíproco de sulfapiridina e ácido 5-aminossalicílico (5ASA) (CHUNG & FERREIRA, 1999). Após a descoberta de que o 5-ASA era o responsável pela atividade terapêutica da sulfassalazina, foram desenvolvidos vários outros pró-fármacos derivados do mesmo, incluido o pró-fármaco recíproco de duas moléculas de 5-ASA, a olsalazina (FIGURA 26) (CHUNG & FERREIRA, 1999). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 108 HOOC COOH HO N N OH olsalazina FIGURA 26. Estrutura química do pró-fármaco olsalazina (CHUNG & FERREIRA, 1999). Em 1983, Ferres sintetizou pró-fármacos recíprocos de antibióticos βlactâmicos, como éster probenecida da ampicilina, para prolongar os efeitos da ampicilina (B), usando a probenecida (A) (FIGURA 27) para bloquear sua secreção ativa nos túbulos renais. O O H3C (A) N O S O H3C S O NH2 O (B) N O NH CH3 H3C FIGURA 27. Pró-fármaco recíproco de ampicilina (B) + probenecida (A) (FERRES, 1983). Em 1994, Singh ligou a ampicilina (A) a um inibidor da β-lactamase (sulbactam) (B) originando-se assim a sultamicilina (FIGURA 28), para melhorar sua ação contra bacterias já resistentes (SINGH & SHARMA, 1994). H2N O S NH N O CH3 O CH3 (A) O O sultamicilina H3C (B) N S O O O H3C FIGURA 28. Pró-fármaco recíproco de ampicilina + inibidor da β-lactamase (sulbactam) (SINGH & SHARMA, 1994). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 109 Os pró-fármacos recíprocos de antiinflamatórios não esteroidais, podem reduzir seus efeitos colaterais gástricos, permitindo seu uso crônico. Como exemplos pode-se citar os pró-fármacos de: (a) paracetamol + ácido acetilsalicílico, (b) paracetamol + tolmetina (FIGURA 29), (c) ibuprofeno + guaiacol, (d) salicilamida + ácido acetilsalicílico (FIGURA 30), (e) anidrido acetilsalicílico + outros (CHUNG & FERREIRA, 1999). O N CH3 H3C O tolmetina O + paracetamol O NH CH3 FIGURA 29. Pró-fármaco recíproco de tolmetina + paracetamol (CHUNG & FERREIRA, 1999). O O H2N O O salicilamida O ácido acetilsalicílico CH3 FIGURA 30. Pró-fármaco recíproco de salicilamida + ácido acetilsalicílico (CHUNG & FERREIRA, 1999). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 110 3.5. Pró-fármacos dirigidos. A liberação de fármacos sítio específica via pró-fármacos, tem gerado interesse considerável para aumentar a potência e diminuir os efeitos colaterais de um fármaco (HAN & AMIDON, 2000; HIRABAYASHI, 2001). Esta classe consiste de fármacos latentes acoplados a um transportador específico para dados receptores ou enzimas existentes no sítio de ação específico do fármaco, reduzindo sua ação inespecífica sobre outros órgãos e/ou tecidos. Recentemente, com o avanço das técnicas de clonagem e de expressão controlada de genes em células de mamíferos, verificou-se a elucidação da natureza molecular de enzimas e transportadores de membrana, tornando possível um planejamento racional de pró-fármacos dirigidos (HAN & AMIDON, 2000). Dentro desta classificação, foram desenvolvidos diversos sistemas, como: • CSDDS; • ADEPT; • GDEPT / VDEPT; • ODDS. 3.5.1. Cólon-Specific Drug Delivery System – CSDDS. Este sistema consiste na utilização de enzimas específicas produzidas pela microbiota intestinal normal, para a liberação (ativação) do fármaco no cólon (FIGURA 31) (HAN & AMIDON, 2000). FIGURA 31. Representação anatômica do cólon. Disponível em (www.gastronet.com.br/images/colon.jpg). Acesso em 25/02/2003. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 111 Desde que se conheceu a microbiota normal do trato gastrointestinal, e a existência das azo-redutases, o uso pró-fármacos com ligações azo tornou-se uma forma de direcionamento intestinal atrativa. Um bom exemplo é o da olsalazina (FIGURA 32), a qual consiste em duas moléculas de 5-ASA (ácido 5-aminosalicílico) (CHUNG & FERREIRA, 1999; SCHACHT, 1996). HOOC COOH HO N N OH olsalazina FIGURA 32. Estrutura química da olsalazina (CHUNG & FERREIRA, 1999). Schacht em 1996 também sintetizou derivados de 5-ASA ligados a transportadores por meio de uma cadeia espaçadora de aminoácidos capazes de liberar o pró-fármaco lentamente (FIGURA 33). Os tansportadores foram o: dextrano, PHEA (poli[N-(2-hidroxietil)-DL-aspartamida]) e PVP-MA (poly(1-vinil2-pirrolidona-co- anidrido maleico). COOH OH PHEA dextrano PVP-MA HN (CH2)n N N Espaçante Lig. Azo Azo-redutases 5-ASA COOH OH PHEA dextrano PVP-MA HN (CH2)n NH2 5-ASA Espaçante + H2N FIGURA 33. Derivados 5-ASA sintetizados por SCHACHT (1996). Outro pró-fármaco, recentemente aprovado pelo FDA, é a balsalazina (FIGURA 34), específico ao cólon, apresentando grupo azo como diretor (www.fda.gov, 2002). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 112 HOOC NH HO N N O COONa balsalazina FIGURA 34. Estrutura química da balsalazina. Disponível em (www.fda.gov). Acesso em 2002. 3.5.2. Antibody Directed Enzyme Prodrug Therapy – ADEPT. A eficácia da quimioterapia para o tratamento do câncer é limitada pela ocorrência dos efeitos colaterais, devido os fármacos usados na quimioterapia tradicional, não distinguirem as células normais das células neoplásicas (HOUBA, 1996). O sistema ADEPT utiliza uma enzima acoplada a um anticorpo monoclonal para ativar o pró-fármaco, o que aumenta, e muito, a seletividade dos agentes anticancerígenos. Primeiramente administra-se o conjugado anticorpo monoclonal + enzima (1), em seguida o anticorpo reconhece a superfície de um determinado agente patogênico (2), administra-se então o pró-fármaco (3), que quando aproxima-se do complexo monoclonal + enzima + agente patogênico, é clivado (4), liberando o fármaco ativo (5), o qual promoverá ação (6) contra o agente patogênico (bactéria, helminto, ou célula tumoral) (FIGURA 35) (DUVAZ, 1997; HAN & AMIDON, 2000; HOUBA, 1996; WANG, 2001). FIGURA 35. Diagrama esquemático de ADEPT. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 113 Várias classes de tumores humanos tem se mostrado sensíveis a utilização de diferentes combinações de anticorpo, enzima e pró-fármaco no sistema ADEPT. Experimentos clínicos recentes, indicam que o ADEPT pode tornar-se uma forma de tratamento eficaz contra o câncer sólido, desde que conheçamos os anticorpos específicos para ele (HAN & AMIDON, 2000). Os anticorpos que se ligam aos antígenos de superfície da célula tumoral, são os componentes chave do sistema ADEPT, uma vez que conferem a localização específica da ativação do pró-fármaco e consequentemente a sua seletividade. Um dos maiores problemas na terapia do câncer é a pobre vascularização do tecido tumoral e sua barreira fisiológica, que tornam difícil o acesso a esse tecido, portanto para atravessa-lo, os pró-fármacos devem ter lipossolubilidade ótima e ao invés de se utilizar anticorpos inteiros, pode-se utilizar somente os fragmentos Fab e scFv dos mesmos para melhorar tal acesso, os quais mostraram-se eficientes (FIGURA 36) (DUVAZ, 1997). FIGURA 36. Diagrama esquemático de ADEPT com um anticorpo e com o fragmento Fab. Disponível em (www.nature.com/nrc/journal/v2/n2/slide show/nrc723_F4.html). Acesso em 27/02/2003. Os pró-fármacos desenvolvidos para o sistema ADEPT devem ser menos citotóxicos que seus fármacos ativos correspondentes, requerendo também grande conhecimento da relação estrutura e atividade biológica (QSAR) (DUVAZ, 1997). Tanto no sistema ADEPT como no GDEPT, prefere-se a utilização de enzimas que não sejam de mamíferos ou não humanas, que possam catalisar Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 114 substratos geralmente não ativados em humanos. Portanto, as enzimas de origem bacteriana, que pode-se controlar sua imunogenicidade são vantajosas, uma vez que dão mais especificidade. Várias combinações de enzimas e pró-fármacos (QUADRO 2) já foram propostas para os sistemas ADEPT e GDEPT, observando-se que há combinações mais adequadas para um sistema do que para outro, uma vez que a ativação do prófármaco no sistema ADEPT é feita no meio extracelular enquanto que no GDEPT a ativação ocorre no meio intracelular (HAN & AMIDON, 2000). QUADRO 2. Enzimas e pró-fármacos que tem sido propostos na terapia do câncer. enzima DT diaforase pró-fármaco 5-(Aziridina-1-il)-2,4nitrobenzamida (CB 1954)* Plasmina Carboxipeptidase G2 Timidina quinase (viral) Peptidil-p-feniletilenoaminamostarda Glutamatos acido benzóico mostarda* Ganciclovir* 6-metoxipurina arabinonucleosideo (araM) fármaco 5-(Aziridin-1-il)-4hidroxil-amino-2nitrobenzamida Feniletilenoaminamostarda acido benzóico mostarda (varias) Ganciclovir trifosfato Adenina rabinonucleosideo trifosfato (araATP) Citosina deaminase Glicose oxidase Xantina oxidase Glicose Hipoxantina Peróxido de hidrogênio Superxido, Prof. Antonio Távora 5-fluorcitosina* 5-fluoruracila Química Farmacêutica 115 peróxido de hidrogênio Carboxipep tidase A αGalactosidase βGlicosidase Azoredutas e γ-Glutamil transferase βGlucuronidase βLactamase Feniletilenoamina-mostardacecfalosporina* Mostrada nitrogenadacefalosporina Mostradas nitrogenadas (varias) Fosfatase alcalina Fenolmostarda fosfato* Doxorubicina fosfato Mitomicina fosfato Etoposideo fosfato Penicilina Palitoxina-4-hidroxifenilFenolmostarda Doxorubicina Mitomicina alcohólica Etoposideo Palitoxina Prof. Antonio Távora Metotrexato-alanina N-[4-(-Dgalactopiranosil)Benziloxicarbonil]daunorubicina amigdalin Metotrexato Daunorubicina Cianeto / Cyanide Azobenzeno mostardas γ-Glutamil-p-feniletilenodiamina mostarda Fenolmostarda-glucoronideo Epirubicina-glucoronideo Vinca-cefalosporina* Feniletilenoaminamostarda (varias) Feniletilenoaminamostarda Fenolmostarda Epirubicina 4desacetilvinilblastina-3carboxihidrazina Feniletilenoaminamostarda Química Farmacêutica 116 aamidase acetamida Doxorubicina-fenoxiacetamida Melfalan-fenoxiacetamida Doxorubicina Melfalan Fosfamida mostrada (+acroleina) 5-(Aziridin-1-il)-4hidroxil-amino-2nitrobenzamida Eg actinomicina D, mitomicina C Citocromo P-450 Nitroreduct ase Ciclofosfamida Ifosfamida CB 1954 Derivados de 4nitrobenzilcarbonil Fonte: HAN & AMIDON, 2000. Segundo Duvaz (1997) as enzimas do sistema ADEPT podem ser classificadas segundo sua origem em: Mamífera: • Fosfatase alcalina (AP); • α-galactosidase (α-g). Não mamífera com homologia mamífera: • Carboxipeptidase A; • E. coli β-glicuronidase (β-g); • E. coli Nitroredutase (NR). Não mamífera sem homologia mamífera: • β-lactamase (β-L); • Carboxipeptidase G2 (CPG2); Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 117 • Citosina deaminase (CD); • Penicilina G amidase (PGA); • Penicilina V amidase (PVA). Segundo o mesmo autor o sistema ADEPT possui as seguintes vantagens e desvantagens. Vantagens: • Ser possível na clínica; • Aumento de seletividade para células malignas; • Liberação do fármaco ativo, que tem baixo peso molecular, penetrando facilmente na célula tumoral; • A concentração do fármaco na célula tumoral é bem maior quando o mesmo é administrado na forma de pró-fármaco; • Não há necessidade de internalização do complexo anticorpo enzima; • Amplificação do efeito uma vez que uma enzima pode atuar em diversos pró-fármacos. Desvantagens: • Imunogenicidade do complexo anticorpo enzima. Mas que pode ser resolvido usando anticorpo com enzima de mamíferos; • Potencial para matar célula normal devido a liberação do fármaco pela célula tumoral morta. Mas que está sendo resolvido pelo uso de fármacos com meia-vida curta. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 118 Exemplos de pró-fármacos de agentes alquilantes. O ZD2767 é um pró-fármaco que encontra-se na fase pré-clínica de desenvolvimento, o qual demonstrou pelo sistema ADEPT, gerar regressão de tumores coloretais (FIGURA 37) (NICULESCO & SPRINGER, 1997). FIGURA 37. Pró-fármaco ZD2767 (NICULESCO & SPRINGER, 1997). O pró-fármaco CB 1954, possui atividade contra carcinosarcomas em ratos e após sofrer ação da NR, gera um composto com atividade citotóxica de 104 a 105 vezes maior que o pró-fármaco CB 1954 (FIGURA 38) (NICULESCO & SPRINGER, 1997). FIGURA 38. Ativação do pró-fármaco CB 1954 (NICULESCO & SPRINGER, 1997). Em 2001 Wang e colaboradores sintetizaram um pró-fármaco constituído por uma cefalosporina e um análogo do composto CC-1065. Onde por meio de testes in vitro, o pró-fármaco mostrou ser 10 vezes menos tóxico que o fármaco livre, e eficaz contra tumores em ratos (FIGURA 39). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 119 FIGURA 39. Pró-fármaco derivado de cefalosporina (WANG, 2001). Outros exemplos de pró-fármacos em ADEPT. O pró-fármaco 5-FC (5-fluorocitosina), um agente antifúngico é convertido pela enzima Citosina deaminase (CD) em um agente anticancerígeno 5-FU (5fluorouracil) (FIGURA 40) (NICULESCO & SPRINGER, 1997). FIGURA 40. Biotransformação do pró-fármaco 5-FC (Niculesco & Springer, 1997). Niculesco & Springer (1997) descrevem o uso da enzima β-glicuronidase (β-g) para regenerar a 5- fluorouridina (fármaco matriz) (FIGURA 41). FIGURA 41. Regeneração da 5-fluorouridina partindo do pró-fármaco (NICULESCO & SPRINGER, 1997). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 120 Foram sintetizados por Wei (2000) o derivados 5’-dipeptidil da 5fluorodeoxiuridina (FdU) (1a-d) (FIGURA 42), sendo estes biologicamente inativos, contudo, podendo ser ativados pela peptildeformilase (PDF), a qual remove o grupo formil N-terminal do dipeptídeo, para liberar o fármaco ativo FdU. Sendo o mais interessante a informação de que esta enzima é exclusiva de bactérias e ausente em células de mamíferos, podendo gerar potentes agentes antibacterianos (WEI, 2000). FIGURA 42. Regeneração do fármaco matriz (FdU) a partir de seus pró-fármaco (WEI, 2000). 3.5.3. Gene Directed Enzyme Prodrug Therapy – GDEPT. Utiliza genes que codificam enzimas ativadoras de pró-fármacos, os quais podem ser transportados por lipossomas, lipídios catiônicos ou vírus (retrovírus ou adenovírus), atingindo células tumorais e normais. A expressão de tais genes pode ser feita ligando os mesmos na extremidade da seqüência downstream das unidades de transcrição específicas do tumor (FIGURA 43). Esta abordagem tem mostrado resultados promissores em sistemas laboratoriais (HAN & AMIDON, 2000). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 121 FIGURA 43. Diagrama esquemático do conceito de VDEPT. Exemplos de pró-fármacos em GDEPT e ADEPT. Em 1999 foi sintetizado um pró-fármaco (10) derivado do 2-nitroimidazol-5ilmetil carbamato, o qual, na presença de nitroredutase (NR), mostrou citotoxicidade 10 a 24 vezes maior contra carcinoma ovariano humano (SKOV3) e 15 a 40 vezes sob hipóxia (FIGURA 44) (HAY, 1999). FIGURA 44. Ativação enzimática do pró-fármaco 10 por meio de nitroredutase Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 122 (NR) (HAY, 1999). Em 2000 foram sintetizados três pró-fármacos (PBD) N10-(4-nitrobenzyl) carbamato protegidos (9a, 9b e 15) e avaliados para seu uso em ADEPT e GDEPT, usando como enzima ativadora a nitroredutase (NR), sendo que o fármaco ativo do pró-fármaco DC-81_9a mostrou atividade 100 vezes maior contra o adenocarcinoma humano (FIGURA 45) (SAGNOU, 2000). FIGURA 45. Ativação enzimática do pró-fármaco DC-81_9a, por meio de (NR) (SAGNOU, 2000). 3.5.4. Osteotropic Drug Delivery System – ODDS. Embora muitas formas de pró-fármacos tenham sido desenvolvidas, o tecido ósseo ainda permanecia como um alvo limitado devido suas propriedades biológicas e a falta de um sistema circulatório ósseo semelhante ao de outros tecidos. Recentemente fora proposto um novo e promissor sistema de liberação de fármacos para atingir o tecido ósseo via pró-fármacos, onde estes são constituídos por uma molécula de bisfosfonato ligada a um fármaco específico (FIGURA 46) (HIRABAYASHI, 2001). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 123 FIGURA 46. Diagrama esquemático do conceito de ODDS. Os Bisfosfonatos são uma nova classe de compostos sintéticos estruturalmente relacionados ao Pirofosfato, um modulador endógeno na homeostase do cálcio, são utilizados clinicamente em diversas desordens metabólicas ósseas, como na doença de Paget hipercalcemia maligna, metástase óssea e osteoporose (HIRABAYASHI, 2001). Os Bisfosfonatos também são conhecidos por possuir alta afinidade pelo HAP, além dos tecidos calcificados serem os principais alvos de acumulação dos mesmos após a administração. Utilizando esta propriedade de tropismo ósseo dos Bisfosfonatos, o sistema ODDS faz com que a liberação de fármacos nas estruturas ósseas ou na medula óssea, torne-se possível. Uma classe terapêutica já testada por esse sistema foi o dos antiinflamatórios não esteroidais (NAIDS) contra artrite induzida em ratos, onde constatou-se que o sistema ODDS para o diclofenaco, é um método terapêutico altamente potente, não tóxico e com menor número de administrações (FIGURA 47) (HIRABAYASHI, 2001). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 124 O OH P NH O O Cl NH O P O O OH Et O Et DIC-BP Cl FIGURA 47. Pró-fármaco do diclofenaco com Bis-fosfonato (HIRABAYASHI, 2001). 4. PERSPECTIVAS. O simples avanço no campo da imunologia e da biotecnologia não bastam para o desenvolvimento de novos pró-fármacos, pois somente o trabalho conjunto de profissionais da imunologia, enzimologia, farmacologia, histologia, biologia molecular, química orgânica e outros poderá trazer para o uso clínico sistemas tão fantásticos como o CDS, ADEPT, GDEPT, VDEPT e outros por vir. 5. CONCLUSÃO. A síntese de pró-fármacos para o tratamento de diversas patologias, seja esta causada por um agente patogênico ou por um distúrbio na fisiologia normal, tem-se mostrado como uma via extremamente importante, racional e possível, uma vez que é cada vez mais rápido o avanço no campo da biotecnologia e da identificação de compostos orgânicos. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 125 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. 1. ALLEN, L. SELIGSON; RONALD, C. TERRY; JEROME, C. BRESSI; JAMES, G. DOUGLASS, III; MILOS, SOVAK. A new prodrug of paclitaxel: synthesis of Protaxel. Anti-Cancer Drugs. 12. p. 305-313, 2001. 2. AVIVA, E; AMNON, H; ELI, B; IVAN, S. A; JUKKA, M; NAAMA, E, HANANY-ROZEN; GAL, W; DAVID, S; IRITH, G; HAGIT, C; SOILI, T; GORDON, L. A; GERSHON, G. A Peptide Prodrug Approach for Improving Bisphosphonate Oral Absorption. J. Med. Chem. 43. p. 3641-3652, 2000. 3. BREWSTER, M. E; BODOR, N. Adv. Drug Delivery Rev. 14. p. 177, 1994. 4. CARL, P. L.; CHAKRAVARTY, P. K.; KATZENELLENBOGEN, J. A. E. WEBER, M. J. Proc. Natl. Acad. Sci. USA. 77. p. 2224, 1980. 5. CHAKRAVARTY, P. K.; CARL, P. L.; WEBER, M. J. E KATZENELLENBOGEN, J. A. J. Med. Chem. 26. p. 638, 1983. 6. CHO, M.J; KURTZ, R.R; LEWIS, C; MACHKOVECH, HOUSER, D.J.; Metronidazole Phosphate: A water soluble prodrug for parenteral solutions of metronidazole. Journal of Pharmaceutical Sciences. 71. n°4. p. 410 – 414, 1982. 7. CHUNG, MAN-CHIN; FERREIRA, ELIZABETH IGNE; O processo de Latenciação no Planejamento de Fármacos. Química Nova. v.22. n°1. p. 75-84, 1999. 8. CLERICI, C. et al. Dig. Dis. Sci. 39. p. 2601, 1994. 9. DUNCAN, R.; SEYMOUR, L.W.; O'HARE, K.B.; FLANAGAN, S.; WEDGE, P.A.; ULBRICH, STROHALM, K. J.; SUBR V.; SPREAFICO, F.; GRANDI, M.; RIPAMONTI, M.; FARAO M.; SUARATO, A. Preclinical evaluation of polymerbound doxorubicin. J. Control. Rel. 19. p. 331-346, 1992. 10. DUVAZ, NICULESCU; SPRINGER, C. J. Antibody enzyme prodrug therapy (ADEPT): a review. Advanced Drug Delivery Reviews. 26. p. 151 – 172, 1997. 11. FERRES, H. Drugs Fut. 19. p. 499, 1983. 12. FERRY, D.R.; SEYMOUR, L.W.; ANDERSON, D.; HESSELWOOD, S.; JULYAN, P.; BOIVIN, C.;POYNER R. ;GUEST P. ;DORAN J.; KERR ,D. J. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 130 Antiinflamatórios 1. CONSIDERAÇÕES GERAIS. Os antiinflamatórios são fármacos com a finalidade de controlar o processo inflamatório, quando este encontra-se exacerbado, uma vez que tal processo fisiológico nada mais é do que um processo de defesa de nosso organismo contra algo danoso. 2. CLASSIFICAÇÃO. Segundo os diferentes mecanismos de ação. • Fármacos antiinflamatórios não esteroidais (FAINES); • Fármacos antiinflamatórios esteroidais (FAIES). Segundo a estrutura química. • Salicilatos; • Derivados do p-aminofenol; • Ácidos Aryl e Heteroarilacético; • Ácidos Aril e Heteroarilpropiônico; • Ácidos Fenâmicos (N-arilantranílico); • Derivados do pirazol; • Oxicams; • Inibidores Seletivos de COX-2. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 131 3. PROCESSO INFLAMATÓRIO. É dependente de enzimas como Fosfolipase A2, 5-LO, PGHS ou COX-1 e 2, as quais sintetizam os mediadores do processo inflamatório na Cascata do ácido Araquidônico. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 132 3.1. Fosfolipase A2, COX e 5-LO. A Ciclooxigenase ou Prostaglandina H sintetase foi inicialmente purificada em 1976 e clonada em 1988. Recentemente foi isolada a 2a forma da COX, sendo expressada na presença de citocinas e fatores de crescimento. A COX-1 e a COX-2 possuem alto grau de similaridade. Os resíduos de aminoácidos destas enzimas são essenciais para a transformação do ácido araquidônico em PGG2. Inibidores seletivos de COX-2 não se ligam a Argenina 121, sítio de ligação do ácido araquidônico e dos ácidos carboxílicos dos inibidores de COX-1, gerando um antagonismo não competitivo. Fosfolipase A2 COX-1 COX-2 L.O Hidrolisa os fosfolipídios da membrana celular, liberando o ácido araquidônico. Constitucional. Presente em células da mucosa gástrica (muco), hipotálamo (°C) e renais. Condicional, presente somente em processos inflamatórios. Presente em células em repouso (vasculares, epiteliais, muscular lisa e fibroblastos). Geram menor efeito colateral gástrico e renal. Transforma ác Araquidônico em uma série de HPETE – ác.hidroxiperóxieicosatetraenóico Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 133 3.2. Prostaglandinas. São produzidos em tecido de mamíferos. Pertencem a classe dos eicosanóides (PGs, PGI, TxA, LT). São derivados de ácidos gordos insaturados, com um ciclopentano e cadeia alifática de cerca de 20C. Estrutura geral das PGs 9 8 10 12 11 13 14 15 16 17 18 19 7 6 5 4 3 2 O 1 OH CH3 20 OH 3.3. Mediadores do processo inflamatório. Leucotrienos. (LTB4, LTC4, LTD4, LTE4). - Vasodilatação na maioria dos vasos. - Quimiotaxina. - Brôncoconstrição. - Rubor adjacente por via intradérmica. - Vasodilatação. - F i b r i n ó l i s e. - Inibição da agregação plaquetária. - Vasoconstrição. - Brôncoconstrição. - Agregação plaquetária. - Vasodilatação - Brôncoconstrição. - Inibição da agregação plaquetária. - Brôncoconstrição. - Contração do útero. - Luteólise. - Vasodilatação. - Broncoconstrição. - Mediador da febre e Hiperalgesia. - Inibição da ativação de células inflamatórias. Prof. Antonio Távora Prostaciclina. (PGI2). Tromboxano A2. PGD2. PGF2α. PGE2. Química Farmacêutica 134 - Vasodilatação. FAP - Aumento da permeabilidade vascular - Quimiotaxina. - Brôncoconstrição. Fonte: (RANG, 1993; RANG, 1997; SILVA, 1994). 4. REA ou SAR dos FAINES. Em 1971 foi proposto um receptor para a atividade antiinflamatória, baseado na estrutura dos ácidos acéticos indóis, tendo como protótipo a indometacina. O OH indometacina O H3C N CH3 O Cl A maioria dos FAINEs, tais como Salicilatos, Oxicams e outros, possuem em comum: • 1 ácido central; • 1 anel aromático ou hetero-aromático; • 1 centro lipofílico adicional (de cadeia alifática ou outro anel aromático). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 135 4.1. Salicilatos. São analgésicos, antipiréticos e antiinflamatórios. ác. salicílico O OH ác. acetilsalicílico O OH 1 6 5 4 2 3 OH 6 5 1 2 3 4 O O CH3 Utilizado desde o séc. XIX, descoberto em 1838 e sintetizado em 1860. Usado localmente para retirada de calos e verrugas. Atua ligando-se na porção Ser-530 da COX-1 e Ser-516 da COX-2. Toda a estrutura é necessária para seus efeitos farmacológicos. Reduzindo sua acidez, diminui-se a atividade antiinflamatória. OH em para ou meta, gera perda de atividade. Halogênios no anel aromático, gera aumento de atividade e toxicidade. Substituições no C5 no ác. Salicílico, gera um aumento da atividade antiinflamatória. Derivados menos agressivos ao tecido e ao paladar podem ser obtido por: • Formação de sais, ésteres ou amidas no grupo carboxila; • Substituição do gp OH; • Modificação de ambos os gps funcionai;. Possui atividade Antiinflamatória, analgésica e antipirética. É o mais utilizado dentre os salicilatos. É antiagregante plaquetário devido poder doar o gp acetil. Possui um metabólito ativo (salicilato) O OH OH O inativos 1 6 5 4 2 3 6 5 1 2 3 4 OH OH aumento atv antiinflamatória e toxicidade O O OH 1 1 6 5 4 2 OH OH 2 3 OH F 3 6 5 4 F F Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 136 salicilato de metila O O CH3 1 6 5 4 2 3 salicilato de sódio O ONa salicilamida O NH2 OH 6 5 1 2 3 4 OH 6 5 1 2 3 4 OH Causa irritação tópica. Usado somente em mialgia e artrite. Uso por via oral Tem atv analgésica mas não antiinflamatória. Salicilatos Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 137 4.2. Derivados do p-aminofenol. Tem como principal representante o paracetamol, metabólito da acetanilida e da fecacetina. O paracetamol é um analgésico e antipirético, devido inibir a COX-1. NH CH3 NH CH3 NH CH3 O ACETANILIDA O HO O H3C O FENACETINA paracetamol acetaminofeno NH2 CH2 fenacetina H3C NH CH3 O atividade maior basicidade NH CH3 + CH2 H3C O O atividade menor basicidade ++ H3C O O atividade menor basicidade +++ Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 138 Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 139 4.3. Ácidos Aril e Heteroarilacético. A atividade antiinflamatória aumenta com a acidade e diminui com a substituição do grupo carboxílico por outro grupo menos ácido. Onde análogos com amida são inativos. A presença do anel indólico, não é essencial para a atividade antiinflamatória. Cl diclofenaco de Na NH Cl O Os 2 átomos de Cl forçam o anel benzênico para fora do pano, favorecendo a ligação com o sítio ativo da COX. ONa Cl indometacina O N CH3 O Aumenta a atividade: Substituição na posição 5. Substituição na posição para com grupos: F, Cl, CF3 e tiometil. Substituintes no anel indólico como: F, CH3, OCH3, CH2CH3, CH2-NH-CH3. Reduz a atividade: Acilação do N indólico com ácidos carboxílicos alifáticos, gerando amidas. O anel indeno no lugar do anel indólico, mantém a atividade antiinflamatória e reduz os efeitos colaterais no SNC e TGI. Tal alteração confere pouca hidrosolubilidade. O efeito analgésico aumenta, com a presença do átomo de flúor. O gp sulfinil melhora a hidrossolubilidade. H3C O anel indólico OH O S H3C H CH3 O OH sulindaco anel indeno F tolmetina sódica O N CH3 H3C O anel pirrólico NaO O anel pirrólico no lugar do anel indólico, mantém a atividade antiinflamatória A substituição do CH3 em para por um Cl aumenta 4 vezes sua potência. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 140 etodolac anel indólico O N H R3 R1 R2 Gp alquil em R1 e ácido acético em R2 aumentam a atividade antiinflamatória. Gp etil ou n-propil em R1 e/ou R3 gera composto mais potente. Cadeia ácida grande, éster ou amida, inativam o composto. 4.4. Ácidos Aril e Heteroarilpropiônico. ibuprofeno CH3 OH H3C CH3 O Substituições no Gp. α-metil, do ác. carboxóilico melhora a atividade antiinflamatória e reduz seus efeitos colaterais. Mais lipossolúvel que o ibuprofeno, devido o anel aromático. Possui atividade antiinflamatória, antipirética e analgésica. A substituição no C6 com ác naftilacético, gera atv antiinflamatória máxima. A substituição por ác naftilpropiônico aumenta a potência. Gps lipofílicos (Cl, CH3S, CHF2O e CH3O) aumentam a potência. Gps (COOCH3, CHO, CH2OH) mantém a atividade. O isômero (S) (+) é o mais potente. Possui Gp α-metil ligado ao anel pirrol cetorofeno O CH3 O OH O H3C CH3 naproxeno HO O cetorolac O N O anel pirrol OH Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 141 4.5. Ácidos Fenâmicos (N-arilantranílico). ác. mefenâmico F H3C NH NH F F ác. flufenâmico O OH anel aril CH3 O OH anel antranílico As metilas do anel aril, geram uma torção, fazendo com que este fique fora do plano do anel antranílico, aumento na atividade antiinflamatória. O mesmo faz o CF3 do ácido flufenâmico. O grupo NH é essencial para a atividade. Sua substituição por (O, CH2, S, SO2, NCH3, NCOCH3), reduz significativa-mente a atividade. Os derivados meta e para aminobenzóico são inativos. 4.6. Derivados do pirazol. fenilbutazona O H 4 3 5 O N 1 Na O 5 + dipirona ou metamizol O 5 H3C 4 N 1 3 O S O H3C H3C N 4 N 1 3 N 2 N 2 N 2 CH3 H3C O H3C O Responsável pela atv antiinflamatória derivado inativo Sem atv antiinflamatória Com atv analgésica Analgésicos, antipiréticos e antiinflamatórios. Podem causar agranulocitose e outras discrasias fatais. Possuem a tendência de formar compostos N—nitrosados, que são cancerígenos. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 142 4.7. Oxicams. oxicams R2 OH HN piroxicam S CH3 OH HN N meloxicam OH HN N O N S O O R1 S O O N CH3 O O O N S O CH3 Possuem atividade antiinflamatória e analgésica. Atividade ótima quando R1=CH3. Boa atividade quando R2=aril ou heteroaril. As maiores atividades foram ferificadas onde R2= anel 2-piridil ou 2-tiazolil. O isoxicam foi retirado do mercado europeu por gerar severas reações cutâneas. No piroxicam a estabilização do ânion enolato é feito pelo N da piridina. isoxicam OH O N O CH3 NH N S O O CH3 4.8. Inibidores Seletivos de COX-2. rofecoxib CH3SO 2 celecoxib NH2SO 2 O S HN N N CF3 CH3 O O O O H3C nimesulida N O + O - Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 143 Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 128 Biotransformação e Metabolismo dos FAINES Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 129 Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 130 Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 131 Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 132 Antiinflamatórios Esteroidais, Adrenocorticóides ou Glicocorticóides. 1. INTRODUÇÃO. A cortisona possui elevada atividade inflamatória e é produzida pelas glândulas adrenais. Na finalização do tratamento com glicocorticóides, a dose deve ser reduzida aos poucos, descontinuando seu uso (dia sim dia não) até a parada total. Os glicocorticóides são largamente utilizados em reumatologia para suprimir inflamação e reações imunológicas. Embora extremamente úteis e muitas vezes capazes até de salvar a vida dos pacientes, são dotados de um grande número de efeitos colaterais importantes tais como imunossupressão, síndrome de Cushing, etc. Ao decidir se o paciente deve ser introduzido no uso dos Fármacos Antiinflamatórios Esteroidais (FAIES), o prescritor deve levar os seguintes elementos em consideração: • Existência de hipertensão ou diabetes; • Pré-existência de cataratas e/ou glaucoma; • Risco significante de osteoporose. O FAIES mais usado em reumatologia é a prednisona. FAIES contendo flúor como dexa e betametazona devem ser evitados em patologias reumáticas, pois possuem maior risco de gerar miopatias. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 133 1.1. Uso na Gravidez. A relação risco X benefício deve ser bem analisada antes do seu uso. Os FAIES, com exceção da dexametazona e da betametazona, são metabolizados pela placenta. O feto recebe apenas 10% do fármaco administrado à mãe, estando relativamente livre dos seus efeitos colaterais. Contudo a administração de altas doses, traz a possibilidade de retenção hídrica e hipertensão materna. 2. RELAÇÃO ESTRUTURA ATIVIDADE (R.E.A / S.A.R.) As características estruturais comuns a todos glicocorticóides e essenciais à sua atividade são: • 21 átomos de carbono; • 01 ligação dupla entre os átomos de C4 e C5; • 01 grupo cetônico no C3 e C20; • 01 grupo alfa cetol no C21. Os glicocorticóides usados como anti-reumáticos, contém 01 oxigênio no C11 e 01 alfa cetol (-OH) no C17. O núcleo fundamental é formado pelo anel fenantreno (A, B, C) ligado a um anel pentagonal (D), com todos os carbonos saturados em suas valências livres pelo H. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 134 O O 20 17 21 cortisona CH3 O 11 12 18 13 hidrocortisona OH CH3 HO 11 12 18 13 20 17 21 OH OH 16 15 OH 16 1 2 CH3 1 2 19 9 10 C 14 8 D 15 CH3 19 9 10 C 14 8 D A 3 5 4 B 7 6 3 A 5 4 B 7 6 O O hidrocortisona 2D OH CH3 H3C O OH HO O Estrutura, estereoquímica e nomenclatura dos glicocorticóides, exemplificadas pelo cortisol (hidrocortisona) Os 4 anéis - A, B, C e D - não se encontram num plano uniforme. A planaridade dos ângulos de valência em torno da dupla ligação entre C4 e C5 impede que o anel A fique em forma de cadeira e sim na forma de meia cadeira, que não é facilmente representada em 2D. A orientação dos grupos ligados ao sistema de anel esteróide é importante para a atividade biológica. Os grupos CH3 no C18 e C19, o grupo OH no C11 e a cadeia lateral cetol de dois carbonos em C17 projetam-se acima do plano do esteróide e são designadas por β. Sua conexão com o sistema em anel é mostrada por linhas cheias. O grupo OH no C17 projeta-se abaixo do plano, sendo designado por α, e a conexão com o anel é indicada por uma ligação pontilhada. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 135 A cortisona e a prednisona possuem um oxigênio no C11, que sofrem redução pelas enzimas hepáticas e transformam-se em hidrocortisona e prednisolona, respectivamente. O O 20 17 13 21 cortisona CH3 O 11 12 18 hidrocortisona OH CH3 HO CH3 OH OH OH 16 CH3 1 2 19 9 10 C 14 8 D 15 A 3 5 4 B 7 6 O O O O prednisona CH3 O CH3 OH OH prednisolona CH3 HO CH3 OH OH A O O As alterações na molécula da hidrocortisona e da cortisona deram origem aos compostos glicocorticóides atuais, sendo mais potentes como antiinflamatórios e com menor capacidade de retenção de sódio. O acréscimo de uma dupla ligação entre C1 e C2 da cortisona e da hidrocortisona deu origem respectivamente a prednisona e a prednisolona, com a atividade antiinflamatória 4 vezes maior do que a hidrocortisona. Através da metilação do C6 e C16 da hidrocortisona e da introdução de um anel pirazólico (heterocíclico) unidos ao C2 e C3 e do acréscimo de uma dupla ligação entre o C6 e C7, tem-se o cortizarvol, um potente antiinflamatório, além de apresentar melhor tolerância que os glicocorticóides habitualmente usados. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 136 O cortizarvol O 11 12 CH3 18 13 20 17 21 OH OH CH3 H3C N N 3 4 1 2 CH3 19 9 10 C 14 8 D 15 A 5 B O CH3 A falta de qualquer uma destas características químicas no núcleo desses compostos tira deles a habilidade de atuarem fisiológica ou farmacologicamente como glicocorticóides. A introdução de grupo CH3 no C10 e C13 e um grupo etila no C17, origina o pregnano, núcleo fundamental de todos os esteróides supra-renais com atividade corticóide, isto deve-se a oxidação no C3 e C20 e a dupla ligação entre C4 e C5. pregnano 12 11 20 17 13 CH3 21 CH3 18 CH3 1 2 19 9 10 C 14 8 D 15 16 A 3 4 5 B 7 6 A introdução de um grupo CH3 no C13 (substituindo o H), forma o núcleo estrano com 18 carbonos (chamado núcleo dos esteróides C18) do qual derivam o estradiol, estrona e o estriol. Todos os corticosteróides naturais e a maioria dos análogos sintéticos ativos possuem um grupo OH no C21, o qual é responsável pela retenção de sódio. Salientando que a atividade antiinflamatória pode ocorrer na sua ausência deste grupo. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 137 3. BIBLIOGRAFIA. • Korolkovas, A., Burckhalter, J. H.. Química Farmacêutica, Ed. Guanabara, Rio de Janeiro, RJ, 1988, cap. 8, pg. 181. • Gilman, A. G., RalI, 1. W., Taylor, P.. As Bases Farmacológicas da Terapêutica, 88 ed., Editora Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, RJ, 1991, Seção IV, cap.26, pg. 421 e Seção XV, cap. 60, pg. 951. • Monografia do CELEBRA® (celecoxib) - cedida pelo Laboratório Pfizer Ltda, 2002. 4. Sites acessados: www.unisantos. com. br/—metropms/unitox/medica/anant. htm www.gwmnet.com . br/usuarios/abj/analg%C30/oA9sicos. html www.caoqa . hpg . ig com .br/cientifica/analgesícos. htm www.terravista. ptlnazare/5049/. htm Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 138 Histamina e Anti-histamínicos. 1. HISTAMINA. 1.1. Histórico. A histamina foi obtida por síntese, pela primeira vez, em 1907 por Windaus e Vogt. Em 1910 foi isolada do esporão de centeio, por Barger e Dale, tendo sua atividade biológica (estimulante da musculatura lisa e como depressor) descoberta. Em 1927, Best e colaboradores isolaram-na do fígado e pulmões. Em 1927, Lewis, mostrou que a histamina é liberada de tecidos agredidos e em interações de antígeno-anticorpo. Em 1949, Jones sintetizou o betazol, isômero da histamina. 1.2. Química. A histamina é biossintetizada nos mastócitos, sendo armazenada nos grânulos de heparina, dos quais pode ser liberada por: antígenos, venenos, toxinas, enzimas proteolíticas (tripsina), detergentes e várias aminas. A histamina é formada pela descarboxilação da histidina. O H N 2 1 5 4 OH H N 2 1 5 4 NH2 NH2 N 3 histidina N 3 histamina Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 139 A histamina (5-imidazoletilamina ou β-aminoetilimidazol) existe em 2 formas que não podem ser separadas, onde no pH fisiológico, o átomo de nitrogênio amínico da cadeia lateral é protonizado. H N 2 1 5 4 NH2 2 H N 1 5 4 NH3 + N 3 histamina N 3 tautômero ativo 1.3. Conformação. Segundo Ganellin, a conformação essencial para a histamina interagir com o receptor H1 é a que a cadeia lateral está completamente estendida (trans) e todos os átomos de carbono e nitrogênio são co-planares ao anel imidazólico. Sendo ainda muito provável que a histamina deva sofrer mudança conformacional durante a interação com o receptor H1. 1.4. Propriedades farmacológicas. É um dos mediadores químicos dos processos alérgicos, incluindo o choque anafilático. Produz vasodilatação capilar, podendo gerar edema. Estimula a secreção do suco gástrico no estômago. Acelera o batimento cardíaco. Inibe a contração do útero de ratas. Estimula a contração da musculatura lisa do intestino e brônquios. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 140 2. ANTI-HISTAMÍNICOS. 2.1. Introdução. Os anti-histamínicos são antagonistas competitivos da histamina, bloqueando os seus receptores H1 ou H2. A ativação do primeiro resulta em vasodilatação capilar. A ativação do segundo estimula a produção de suco gástrico. Os anti-histamínicos são usados como: antialérgicos, anti-ulcerosos, antitussígenos, ansiolíticos, antipsicóticos, anti-parkinsonianos, antieméticos. Os efeitos colaterais mais comuns são: sedação, zumbidos e distúrbios na coordenação do sono profundo. Ocasionalmente, pode surgir: insônia, tremores, irritabilidade, convulsões, fadiga, cefaléia e antecipação menstrual. 2.2. Histórico. Fourneau, em 1933, sintetizou o 1° anti-histamínico, o β-(5-isopropil-2metilfenoxietil)dietilamina, sendo esta testada Bovet e Staub, em 1937. A substituição isostérica do oxigênio etéreo por um grupo amino, visando a agentes anti-histamínicos mais potentes, resultou no Antergan, chamado oficialmente fembenzamina. Este foi sintetizado por Mosnier e testado por Halpern, em 1942, sendo o 1° membro do grupo das etilenodiamínas. Esta substância foi o primeiro anti-histamínico usado na terapêutica. Nos EUA, em 1946, Low e colaboradores desenvolveram a difenidramina. E no mesmo ano Yonkman e colaboradores desenvolveram a tripelenamina. A síntese e triagem posteriores de milhares de novos compostos enriqueceram o arsenal terapêutico com cerca de 50 agentes anti-histamínicos. A gênese de agentes anti-histamínicos através da modificação molecular pode ser observada na figura a seguir. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 141 Em 1966, para explicar a ação dual da histamina (vasodilatação capilar e produção de suco gástrico) Ash e Schild aventaram a hipótese de que há dois receptores para a histamina: H1 e H2. Em 1972, após síntese e ensaio de cerca de 700 novos compostos químicos resultantes da modificação molecular da histamina, Black e colaboradores descobriram, a burimamida, a qual bloqueia especificamente o receptor H2, cujo estímulo provoca aumento na secreção gástrica. Mais recentemente, outros novos compostos como a metiamida, cimetidina e a ranitidina manifestaram atividade de bloqueio seletivo para o receptor H2. A primeira, porém, por causar agranulocitose, embora reversível, não é usada nem mesmo em pesquisas. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 142 2.3. Classificação. Anti-histamínicos H1. Anti-histamínicos H2. 2.4. Anti-histamínicos H2. São estruturalmente aparentados à histamina. Contêm o grupo imidazólico ou isóstero e uma cadeia lateral, com pequena ramificação na extremidade, constituída de 8 átomos, dos quais o 2°, o 5° e o 7°, são N amínicos secundários; o grupo da extremidade, metiltiouréico ou metilguanidínico, é polarizado, e essa característica provavelmente possibilita a ligação deste grupo às adjacências do receptor, de conformidade com a teoria da charneira, conferindo a estes compostos a propriedade de antagonistas. Antagonistas de Receptor H2. H N 2 1 NH2 5 4 histamina N 3 H N metiamida N H N CH3 S NH S CH3 NH cimetidina N CH3 S N N CH3 NH NH NH CH3 ranitidina H3C N CH3 O S O - NH NH Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 143 2.5. Anti-histamínicos H1. Os anti-histamínicos que atuam no receptor H1 são representados pela fórmula R1 X geral: R N R3 R2 Onde X pode ser oxigênio, nitrogênio ou carbono. Se X for O, tem-se atividade sedativa pronunciada. Se X for N são mais ativos e mais tóxicos. Se X for CH os anti-histamínicos são menos ativos e menos tóxicos. O N terminal deve ser necessariamente, terciário. Derivados dimetílicos possuem atividade mais intensa do que outros homólogos. A cadeia alquílica entre X e N, para atividade ótima, deve possuir 2 átomos de carbono. A atividade ótima é obtida quando R e R1 são aromáticos. Um agente anti-histamínico deste tipo deve possuir um grupo amino ionizável e um dipolo central. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 144 2.6. REA / SAR dos Anti-histamínicos H1. Kier deduziu que a histamina existe em 2 conformações preferidas e pode, portanto, exercer duas ações biológicas distintas, dependendo da presença de um ou de outro dos receptores complementares. Em 1976, Weinstein e colaboradores propuseram que a interação da histamina com o receptor se daria por 3 pontos: 1. 2. 3. Atração eletrostática entre o N+ da cadeia lateral e o sítio I do receptor; Ponte de hidrogênio entre o N3 do anel imidazólico e o sítio II; Ponte de hidrogênio entre o N1 do anel imidazólico e o sítio III; Os anti-histamínicos H1, atuando como antagonistas competitivos da histamina, podem desalojar a histamina de sua ligação ao sítio específico do receptor. Seus grupos aromáticos volumosos formam ligações adicionais com o sítio inespecífico do receptor através de interações de Van der Waals, transferência de carga e hidrofóbicas. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 145 2.7. Classificação dos Anti-histamínicos H1. Derivados da etanolamina; Derivados da etilenodiamina; Alquilaminas; Derivados da piperazina; Derivados fenotiazínicos; Outros. 2.8. Derivados da Etanolamina. N CH3 N O CH3 Cl O CH3 N CH3 difenidramina carbinoxamina ⌦ Difenidramina. É o protótipo desta classe. Fármaco de escolha para uso parenteral no tratamento de reações anafiláticas. Apresenta também atividade antiemética e anti-parkinsoniana. ⌦ Carbinoxamina. É a que apresenta menor incidência de sonolência dentre as de sua classe. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 146 2.9. Derivados da Etilenodiamina. N CH3 N N CH3 N CH3 N N CH3 N N CH3 N CH3 metapirileno S tripelenamina CH 3O mepiramina O metapirileno foi retirado do mercado em diversos países, por causar câncer hepático em animais. A tripelenamina é o protótipo desta classe. 2.10. Alquilaminas. triprolidina N clorfenamina N N CH3 Cl CH3 N H3C Alguns fármacos desta classe são utilizados como misturas racêmicas (clorfenamina), embora os isômeros dextrorrotatórios (dexclorfeniramina) sejam mais ativos. Outros anti-histamínicos desta classe incluem a feniramina, pirrobutamina, etc. Na triprolidina, é ativo, somente o isômero em que o grupo pirrolidinometílico está em posição trans com relação ao grupo 2-piridílico. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 147 2.11. Derivados da Piperazina. A ciclizina e meclozina são usados na profilaxia de enjôos de viagem. A cinarizina é utilizada em dermatoses alérgicas, rinite vasomotora e rinite alérgica. Contudo, seu principal uso é na insuficiência vascular periférica, sobretudo cerebral, causada pela arteriosclerose, pois é um bom vasodilatador cerebral. S cinarizina N N N Cl H3C H3C prometazina N CH3 2.12. Derivados Fenotiazínicos. ⌦ Prometazina. É um anti-histamínico muito potente, mas por seus efeitos sensibilizantes não é aconselhável para uso tópico. É usada como antialáegico, antiemético e como adjuvante à anestesia geral. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 148 2.13. Anti-histamínicos diversos. Todos os anti-histamínicos incluídos nesta classe podem ser encarados como análogos das estruturas das classes anteriores citadas. S N N N H H3C N N antazolina isotipendila N N ciproeptadina H3C CH3 CH3 ⌦ Antazolina. É usada topicamente, em conjuntivites alérgicas, por sua baixa incidência de efeitos sensibilizantes. ⌦ Ciproeptadina. É usada para aliviar pruridos associados aos distúrbios cutâneos (urticária, dermatite alérgica, neurodermatite). Possui efeitos antiserotoninérgicos. ⌦ Isotipendila. É isóstero da prometazina, sendo mais potente que esta, contudo com duração de ação menor. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 149 Anticoagulantes. 1. INTRODUÇÃO Os anticoagulantes são agentes que prolongam o tempo de coagulação do sangue. São utilizados em diversos distúrbios cardiovasculares, como infarto do miocárdio, embolismo pulmonar, doença vascular cerebral, doença vascular periférica e trombose venosa. Possuem efeitos adversos raros, contudo, são contra-indicados para pacientes com: hemofilia, discrasias sangüíneas hemorrágicas, doença ulcerativa ativa do trato gastrintestinal, endocardite bacteriana subaguda, doenças hepáticas ou renais graves, ulceras expostas e hipertensão intensa. Atravessam a barreira placentária, devendo ser usados com precauções. Há necessidade de cuidado na sua administração a mães em período de lactação. 2. HISTÓRICO Em 1916 McLean (aluno de medicina da Universidade Johns Hopkins) descobriu por acaso o 1° anticoagulante, durante uma pesquisa por novos pró-coagulantes. Em 1918, tal substância foi descrita por Howell e Holt, que a denominaram heparina, devido à sua abundância nos tecidos hepáticos. Em 1937, Crafoord utilizou a heparina pela 1a vez na prevenção de trombose. Contudo, a história dos anticoagulantes orais começa na década de 20 (Século XX), com a descrição, por Schofield, da “doença do trevo doce” que, na época, afligia o gado de Dakota do Norte (USA) e do Canadá. O principal sintoma desta doença era a hemorragia, atribuida à uma substância tóxica no feno de trevo doce quando inadequadamente seco. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 150 Tal substância foi isolada, identificada e sintetizada por Link e colaboradores, em 1933-39. Foi chamada inicialmente de dicumarina, mas agora é conhecida como dicumarol. Em 1941, Bingham, Butt e colaboradores usaram-na pela primeira vez em ensaios clínicos. Em 1944, Nichol e Fassett introduziram a terapia prolongada com dicumarol para prevenção do infarto do miocárdio. Centenas de derivados da cumarina foram isolados de fontes naturais ou sintetizados e ensaiados, na busca de anticoagulantes orais melhores e mais seguros, mas apenas alguns chegaram ao estágio clínico. Os anticoagulantes orais derivados da indandiona surgiram de estratégia racional. Tais anticoagulantes, foram projetados para ser antimetabólitos da vitamina K, com a qual estão estruturalmente relacionados. Em 1944, Kabat demonstrou a ação anticoagulante destes compostos. O primeiro clinicamente empregado foi a fenindiona, em 1947. No fim da década de 20 (Século XX) foi estudada a ação anticoagulante de metais de terras raras. Sendo observado pela 1a vez sua atividade terapêutica, em 1937 e, em 1943, foram introduzidos no arsenal clínico. Em 1949, Vincke e Sucker desenvolveram o sulfoisonicotinato de neodímio, fármaco mais usado desta classe. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 151 3. CLASSIFICAÇÃO Podem ser divididos em 5 classes: Heparina e heparinóides; Derivados da cumarina; Derivados da indandiona; Agentes diversos; Anticoagulantes para estocagem de sangue total. 4. HEPARINÓIDES. Os principais membros desta classe são: apolato sódico, galactopolissulfato sódico, heparina sódica, heparinato cálcico, heparinato de etamifiuna, hirudina, iodoeparinato sódico, manopolissulfato sódico, metilgalactopolissulfato de cálcio e sódio, polissulfato de mucopolissacarídeo, sulfato de glusaglicano, sulfato de quitina, sulfato de xilano, sulfato sódico de dextrano, sulfato sódico de polietileno, xilampolissulfato sódico. A heparina é isolada de diversas fontes, contudo sua constituição não é sempre a mesma. Portanto, a heparina de porco não é idêntica à bovina. Além do fato de já se ter separado por eletroforese 2 frações distintas: a α-heparina e a β-heparina. Os heparinóides são obtidos a partir da heparina por meio de reações tais como: oxidação, hidrólise e condensação. Outra maneira de obtenção de heparinóides consiste na esterificação exaustiva de alguns mucopolissacarídeos naturais ou polímeros sintéticos com ácido clorossulfônico. Outros heparinóides devem o nome à sua semelhança estrutural com a heparina. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 152 Existem 2 características estruturais associadas à atividade anticoagulante desta classe de fármacos: O grau de dissociação de todos os grupos ionizáveis; Dimensão e forma molecular. Devido aos seus grupos fortemente ácidos, a heparina e os heparinóides são rapidamente neutralizados por compostos de natureza básica, perdendo assim sua capacidade anticoagulante. 4.1. Heparina HEPARINA O OH O SO3Na O O SO3Na SO3 Na COONa OH O O OH O O SO3Na O O SO3Na SO3 Na COONa OH O HN HN Monômero É um mucopolissacarídio sulfatado, consistindo de porções alternadas de ácido D-glicurônico e 2-amino-2-desoxi-D-glicose, formando unidades dissacarídicas. Isolada comercialmente do pulmão e do fígado de mamíferos. É comercializada como sal sódico ou solução. Unidades dissacarídicas são usadas para a estocagem de sangue. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 153 5. DERIVADOS DA CUMARINA. OH 4 3 2 O 1 O 4-hidroxicumarina Esta classe inclui as 4-hidroxicumarinas. Seus isômeros ceto são estreitamente relacionados à vitamina K. Aparentemente, a atividade anticoagulante depende do resíduo 4hidroxicumarínico e de um hidrogênio ou substituinte hidrocarbônico na posição 3. Agem somente in vivo, não in vitro. São classificadas em: Monocumarinas (acenocumarol, femprocumona, warfarina, etc.); Dicumarinas (ciclocumarol, cumetarol, dicumarol, eticumarol, etc.). São administrados por via oral, com exceção da warfarina sódica, que também pode ser administrada por via intravenosa ou intramuscular. Quanto à duração, são classificadas de: Ação intermediária: acenocumarol, dicumarol e warfarina; Ação prolongada: femprocumona. Praticamente todos isentos de efeitos colaterais. Os espectros de IR e RMN indicam que as cumarinas e dicumaróis formam pontes de hidrogênio. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 154 OH 4 3 2 OH 4 3 2 HO O O 1 O O 1 O HO 4-hidroxicumarina OH 4 3 dicumarina CH3 OH 4 3 O O CH3 Ph 2 2 Ph-NO2 O 1 O 1 O O warfarina acenocumarol 5.1. Warfarina O isômero (-) é 7 vezes mais ativo que o isômero (+). É utilizado na forma de sal sódico e potássico. 5.2. Acenocumarol É tido como o anticoagulante mais ativo na clínica. Difere da warfarina pela presença de um grupo nitro (NO2) em para no grupo fenila (Ph). óssea. Mesmo com o grupo NO2, não foram relatados casos de depressão da medula Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 155 6. DERIVADOS DA INDANDIONA O indandionas oxazidiona O R N O R = OCH 3 ---> anisindiona R = Br --------> bromindiona R = F ---------> fluindiona R = H ---------> fenindiona O difenadiona O O O Ph O Ph Os principais são: anisindiona, bromindiona, clorindiona, difenadiona, fenindiona, fluindiona, oxazidiona. Suas ações farmacológicas e terapêuticas assemelham-se às dos derivados da cumarina. São ativos somente in vivo não têm efeito in vitro. Entre os mais usados, a fenindiona é de ação curta, sendo rapidamente absorvida e excretada, enquanto a anisindiona e a difenadiona são de ação prolongada, por serem excretadas lentamente. A fluindiona, graças ao átomo de halogênio que apresenta, têm duração mais longa ainda e maior potência. A bromindiona é o p-bromoderivado da fenindiona. Onde o átomo de halogênio aumenta a potência e a duração da ação, possibilitando a administração de uma única dose por dia. A bromindiona e fluindiona, graças ao átomo de halogênio que apresentam, têm duração mais longa ainda e maior potência. Os derivados da indandiona podem provocar graves efeitos adversos, tais como: leucopenia, leucocitose, agranulocitose, hepatite, icterícia, dermatite grave, edemas generalizados e albuminúria, sendo algumas destas fatais. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 156 7. AGENTES DIVERSOS Como representantes desta classe, temos: cianato, citrato de magnésio, liapolato sódico, naftionina, sais de metais de terras raras (cério e neodímio), venenos de cobra (ancroda, proteinase da Agkistrodon rhodostoma e que atua sobre o fibrinogênio, fosfolipase A2 da Vipera berus). Os venenos de cobras com atividades anticoagulantes são extraídos de diversas famílias, especialmente das Hydropheidae e Elapidae. Contudo, ainda não se firmou seu uso clínico. 8. ANTICOAGULANTES PARA ESTOCAGEM DE SANGUE TOTAL Estas substâncias têm uso restrito para conservação de sangue total estocado e não são consideradas agentes terapêuticos. Como representantes desta classe, podemos citar: citrato sódico, dextrose citrato, dextrose fosfato citrato, edetato sódico, heparina, sulfato de polianetol. 9. MECANISMOS DE AÇÃO O mecanismo de ação dos anticoagulantes varia de acordo com a classe à qual pertencem. Os heparinóides agem: Mobilizando a heparina ligada a proteínas plasmáticas. A heparina age: Como inibidor do fator Xa; Na ativação da antitrombina. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 157 Os derivados da cumarina atuam: Por antagonismo competitivo com a vitamina K; ou Inibindo irreversivelmente o transporte da vitamina K, impedindo a síntese dos fatores II, VII, IX e X no fígado. As indandionas agem: Pelo mesmo mecanismo que as cumarinas. Os sais de metais de terras raras agem: Interferindo com a atividade do fator VII, impedindo a formação da tromboplastina. Os venenos de cobras provavelmente agem: Primariamente, por destruição enzimática da tromboplastina; Posteriormente, por dissolução da fibrina, devido à protease específica presente na sua constituição. Os anticoagulantes usados no armazenamento de sangue total agem por se complexarem com o Ca+2, prevenindo a formação de coágulo. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 158 Anti-helmínticos. 1. INTRODUÇÃO. 1.1. Conceito. Os agentes anti-helmínticos são fármacos empregados no combate de qualquer espécie de helmintíase. Atuam seja destruindo os helmintos, seja expelindo-os dos pacientes infestados. A helmintíase é a doença parasitária mais disseminada e comum no mundo, e mostra tendência a aumentar em importância. Embora algumas infestações sejam não sintomáticas, outras debilitam e até matam (esquistossomíase). 1.2. Epidemiologia. Quadro das Helmintíases no mundo. 1200 1 bilhão N° de casos (milhões) 800 Ascaridíase Ancilostomíase tricuríase Filaríase Enterobíase Esquistossomíase Estrongiloidíase 500 300 285 600 250 80 70 50 10 0 Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 159 1.3. Tratamento. Na estratégia racional no combate aos helmintos, deve-se conhecer: A natureza do parasita; O ciclo de vida do parasita; Os hospedeiros reservatórios; O hospedeiro intermediário animal; O local da infestação no homem; O hospedeiro humano definitivo; O fármaco a ser empregado na terapia.. Para bloquear o ciclo evolutivo do parasita, pode-se: Destruir os ovos ou cistos; Impedir a contaminação do local de vida normal por ovos ou cistos; Destruir as formas intermediárias; Destruir os hospedeiros intermediários (moluscos); Tratar os pacientes infestados. 1.4. Ensaios. São realizados in vivo, devido ser mais confiável que os ensaios in vitro. Para busca de novos anti-helmínticos. Na determinação do nível de atividade antiparasitária, são utilizados os seguintes critérios: Desaparecimento ou redução do n° de ovos nas fezes animais; Morte dos helmintos; Eliminação dos parasitas da corrente sangüínea; Migração dos vermes dentro do hospedeiro para órgãos onde possam ser destruídos por fagocitose. Os fármacos que mostram atividade na helmintíase animal são subseqüentemente testados nas infestações humanas, não raro com resultados equivalentes. Algumas vezes, contudo, os fármacos ativos mostram-se por demais tóxicos, o que restringe seu emprego em seres humanos. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 160 Atualmente, há disponibilidade de fármacos eficazes para a maioria das helmintíases. Alguns fármacos têm atividade de amplo espectro, sendo utilizados para infestações múltiplas. 2. HISTÓRICO. As Helmintíases são tão antigas quanto o próprio homem. 23-79 E.C., Plínio descreveu o uso de aspídio como anti-helmíntico. 1821, Faraday sintetizou o tetracloroetileno. 1925, HaIl e Shiflinger verificaram sua atividade anti-helmíntica. 1924, Dohme e colaboradores sintetizaram o hexilresorcinol. 1930, Lamson e colaboradores verificaram sua atividade anti-helmíntica. 1853, Cloez sintetizou a piperazina. 1942, Giroud verificou sua atividade anti-helmíntica. 1946, Van Lare e Brooker sintetizaram o pirvínio. 1949, Peters e colaboradores verificaram sua atividade anti-helmíntica. 1955, Bayer sintetizou a niclosamida. 1960, Gõnnert e Schraufstãtter verificaram sua atividade anti-helmíntica. 1961, Brown e colaboradores introduziram o tiabendazol, inicialmente para uso veterinário e posteriormente Vilela e associados testaram-no, na helmintíase humana. 1966, Pfizer sintetizou a pirantel. 1966, Janssen e colaboradores introduziram o mebendazol como antihelmíntico de amplo espectro. 1973 foi desenvolvida a oxamniquina. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 161 3. CLASSIFICAÇÃO. Fármacos ativos em nematódeos ou nematicidas; Fármacos ativos em cestódeos; Fármacos ativos em trematódeos. 3.1. Anti-helmínticos de uso em humanos. Alcalóides: desidroemetina; Antibióticos: antelmicina, cefamicinas, paromomicina; Derivados uréicos: carbantel; Fenóis: bromoxanida, closantel e rafoxanida; Organofosforados: haloxona, vincofos e zilantel. 3.2. Anti-helmínticos de uso veterinário. Antibióticos: rnonensina; Derivados do nitroimidazol: dimetridazol; Derivados quinolínicos: buquinolato, nequinato; Derivados da tiouréia: tiofanato; Fenóis halogenados: clopidol. 3.3. Nematicidas. Pertencem a diversas classes químicas. Os principais são: Tetracloroetileno, piperazina, embonato de pirvínio, tiabendazol, mebendazol, tetramisol, levamisol e diclorofeno. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 162 Cl Cl HN NH H N S N Cl Cl N tetracloroetileno N piperazina S N tiabendazol H N NH O N O O CH3 tetramisol H N N S mebendazol levamisol diclorofeno Um grupo importante dos nematicidas é o íon amidínio, nitrogênio quaternário ligado a um átomo de nitrogênio terciário através de uma cadeia carbônica conjugada ou ressonante de ligações duplas alternadas com ligações simples. CH3 N H3C + CH3 C Cn N CH2 N H2C Cn C N + CH3 Este sistema é, aparentemente, essencial para a atividade anti-helmíntica. São todos quase insolúveis em água, sendo pouco absorvidos no trato intestinal, permanecendo por períodos prolongados em contato com os parasitas intestinais, facilitando a ação letal sobre estes. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 163 3.4. Fármacos ativos em cestódeos. Os principais representantes de uso humano são: Niclosamida e quinacrina (ou mepacrina). Albendazol e mebendazol; Diclorofeno e praziquantel. Cl O N O + CH3 CH3 quinacrina NH O N CH3 mepacrina HN O CH3 niclosamida Cl OH Cl H N NH O N O O CH3 N albendazol H N NH CH3 O O mebendazol H3C S OH OH O N praziquantel N N diclorofeno Cl Cl O No tratamento de infestações por cestódeos inclui o seguinte cuidado: Purgação salina antes e depois do tratamento, para eliminar o helminto paralisado. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 164 3.5. Fármacos ativos em trematódeos. Os principais representantes são: Derivados do benzimidazol e albendazol; Cloroquina, praziquantel, metrifonato e oxamniquina. CH3 CH3 N N HN CH3 H N derivados benzimidazóis Cl O N cloroquina CH3 O O P O N N H3C Cl Cl OH Cl praziquantel metrifonato CH3 - O O N O HO HN oxamniquina CH3 + H N 3.5.1. Metrifonato Também é usado como inseticida e como anti-helmíntico veterinário. É um organofosforado de baixa toxicidade, agindo por inibição da acetilcolinesterase nas sinapses nervosas no verme. As intoxicações são tratadas com atropina ou com oximas (pralidoxima). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 165 4. MECANISMOS DE AÇÃO. Os anti-helmínticos agem por um ou mais dos mecanismos seguintes: Ação direta, causando narcose, paralisia ou morte do helminto, com a sua subseqüente eliminação (piperazina e tetracloroetileno). Ação irritante, queimando os tecidos do verme (hexilresorcinol). Ação mecânica, causando distúrbios à permanência do verme, forçando-o a migrar e subseqüentemente ser destruído por fagocitose (dietilcarbamazina). Interferência no metabolismo do helminto. Este mecanismo é o mais comuns. Diversos anti-helmínticos agem inibindo enzimas específicas dos vermes. Inibem a acetilcolinesterase pirantel e metrifonato; Inibem a fumarato redutase / succinato desidrogenase suprimindo a energia do verme tiabendazol, piperazina e tetramisol; Inativa a fosforilase do esquistossomo niridazol. Os corantes cianínicos (pirvínio) interferem com sistemas enzimáticos respiratórios e também com a absorção de glicose exógena em helmintos intestinais. O mebendazol inibe reações metabólicas relacionadas à absorção de glicose pelo verme. A niclosamida e o diclorofeno agem como desacopladores da fosforilação oxidativa. Após este ataque inicial dos fármacos, os helmintos se tornam altamente vulneráveis às enzimas proteolíticas do intestino do hospedeiro e sofrem digestão parcial. A niclosamida interfere na absorção de glicose. O praziquantel deve a sua atividade à depleção de glicogênio. Há, ainda, anti-helmínticos que atuam por inibição da biossíntese dos ácidos nucléicos. Os que se intercalam no DNA (cloroquina e mepacrina). A tubercidina, que inibe a utilização de adenosina para a formação de nucleotídios. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 166 Antibióticos. 1. DEFINIÇÕES. Antibióticos são substâncias químicas específicas derivadas de organismos vivos ou produzidas por eles, bem como seus análogos estruturais obtidos por síntese, capazes de inibir processos vitais de outros organismos, mesmo em concentrações diminutas, sem séria toxicidade ao hospedeiro. Antibiose é o termo utilizado para descrever o princípio de que os microorganismos competem entre si pela sobrevivência. Potência é um meio de garantir a uniformidade dos antibióticos em todo o mundo e facilitar o trabalho dos clínicos, a potência ou a atividade dos antibióticos é atualmente expressa em unidades internacionais (U.I.), que podem ser transformadas em mg de peso. Para se calcular quantas U.I. existem em 1 mg de antibiótico, basta dividir 1 pelo valor em mg da U.I.. Por exemplo: Bacitracina tem 0,01351 mg = 1 U.I., portanto, 1/0,01351 = 74 U.I./mg. 2. NOMENCLATURA. Penicilinas (sufixo cilina. Ex. ampicilina); Cefalosporinas (prefixo cef. Ex. cefotaxima); Fluoroquinolonas (sufixo floxacin; Ex. norfloxacin). 3. CLASSIFICAÇÃO. Antibióticos β-Lactâmicos (Clássicos e Não Clássicos); Cefalosporinas; Cloranfenicol; Tetraciclinas; Polipepitídicos; Aminoglicosídeos e Aminociclitóis; Macrolídeos. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 167 4. ANTIBIÓTICOS β-LACTÂMICOS CLÁSSICOS. 4.1. Penicilinas. Possuem a seguinte estrutura geral: O H NH 7 H 5 S 1 R CH3 2 A N 4 B 3 O CH3 COO+ EG - Penicilinas H , Na , K + + ⌦ Relação Estrutura Atividade (REA / SAR). A atividade das penicilinas dependem: Do anel β-lactâmico (A) ligado a um núcleo tiazolidínico (B); Da carboxila livre; De um ou mais grupos amino substituídos na cadeia lateral; Outras informações: Os anéis (β-lactâmico e tiazolidínico) são dobrados no eixo C-5 e N-4. A intensidade da atividade depende da estereoquímica da cadeia lateral. A molécula contém 3 centros quirais (23 = 8 isômeros opticamente ativos, sendo o isômero natural presumivelmente o mais ativo). ⌦ Propriedades físico-químicas. Devido ao grupo carboxílico ligado ao anel condensado, todas as penicilinas são relativamente ácidos fortes (pKa≅2,65). As que possuem grupo de natureza básica na cadeia lateral comportam-se como anfóteros. É o caso da ampicilina, cujo pKa é 7,4. São inativadas por hidrólise e também por ação catalítica de enzimas: acilases e β-lactamases. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 168 ⌦ Características especiais: Resistência ácida: conferida por potente grupo eletrófilo ligado a cadeia lateral aminada, impedindo o rearranjo ácido; Resistência a β-lactamase: conferida por grupo volumoso ligado a cadeia lateral aminada, o qual gera impedimento estérico no acoplamento enzima – antibiótico (meticilina). Resistência ácida e a β-lactamase: conferida por ambas as características supracitadas (oxacilina). Amplitude de espectro: conferida pela hidrofilicidade da cadeia lateral aminada ou ácida, ampliando o espectro contra bactérias gram (-) (amoxicilina e ampicilina). ⌦ Reações de degradação das penicilinas clinicamente relevantes. No anel β-lactâmico, a ligação amida cíclica é a mais instável devido tensão do anel e reatividade, pois quebra: Lentamente em água. Rapidamente em solução alcalina. Pela β-lactamase (amido-β-lactama hidrolase), em bactérias resistentes. Por proteínas, gerando conjugados antigênicos que causam alergia. Em taxa variável em solução ácida, dependendo do Radical da cadeia lateral. β-lactamase Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 169 ⌦ Penicilinas clinicamente relevantes. O H NH N O CH3 COO- Na / K + + H S CH3 Ácido sensível. Utilizada no tratamento de infecções provocadas por estreptococos β-hemolíticos, gonococos, meningococos, pneumococos, Clostridium, Treponema pallidum, Corynebacterium diphtheriae, Bacillus antracis e alguns Actinomyces. penicilina G O H NH O O N H ou benzilpenicilina S CH3 CH3 COOH Ácido resistente. Possui espectro de ação idêntico ao da benzilpenicilina. penicilina V H3C O O H NH H S N CH3 CH3 COO- Na + Ácido resistente. Seu uso mais comum é em infecções por estafilococos resistentes a benzilpenicilina. O CH3 O meticilina H H S O H2N Amplo espectro. CH3 CH3 COO- Na / K + + NH N O Sua atividade é atribuída ao grupo amino, responsável pelo poder de penetração na parede celular. Amplo espectro. ampicilina O H2N H NH N O H S CH3 CH3 COO- Na / K + + Difere da ampicilina somente pela presença do grupo OH em para no anel aromático. amoxicilina OH Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 170 Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 171 5. ANTIBIÓTICOS β-LACTÂMICOS NÃO CLÁSSICOS. Possuem estrutura diferente das penicilinas clássicas. Os principais representantes são: ácido clavulânico, tienamicina, ácido olivânico e nocardicina A. ác. clavulânico O N O OH Antibiótico Suicida. OH Inibe de forma específica e irreverssível a βlactamase das bactérias Gram (+) e Gram (-). Usado em conjunto com outras as penicilinas Amplo espectro e β-lactâmico mais potente. COOH tienamicina S N NH3 + H3C O OH COO- ác. olivânico S N NH3 + Estrutura semelhante à tienamicina com potência antibiótica maior que o ácido clavulânico e menor que a tienamicina. O H3C O COO- O nocardicina A OH NH H 2N COOH N OH O N COOH Estável à diversas β-lactamases e com atividade contra Gram (-). ⌦ REA / SAR. A única característica essencial para a atividade é a presença do sistema anelar; A cadeia lateral amídica pode estar ausente. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 172 6. CEFALOSPORINAS. São β-lactâmicos clássicos, contudo com estrutura diferente das penicilinas clássicas. Possuem a seguinte estrutura geral: O H NH O 7 8 H S 6 1 2 3 O H NH 7 H 5 S 1 R1 A1 N 5 B1 4 R R2 + + + CH3 2 A N 4 B 3 O CH3 COO+ EG - Cefalosporinas COO- H , Na , K EG - Penicilinas H , Na , K + + OMS: O alto custo das cefalosporinas não compensa seu espectro de ação. ⌦ REA / SAR. A única característica essencial para a atividade é a presença do sistema anelar; A cadeia lateral amídica pode estar auseante; A cadeia lateral em C3 confere resistência a algumas β-lactamases; A quebra do anel β-lactâmico depende do R em C3 e C7; O anel β-lactâmico das cefalosporinas é menos reativo, devido: O anel B1 ser menos tensionado do que o anel B das penicilinas. A presença da cadeia lateral em C3. A presença de dupla ligação entre C3 e C4. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 173 ⌦ Cefalosporinas clinicamente relevantes. O O H NH N S O O COOH H3C O H NH N N N N N O S H3C COOH HOOC CH3 O H S S H2N N N H S H3C O H2N NH N O CH3 COOH H H S cefalotina cefalexina S O H NH H S N N + O COOH cefazolina ceftazidima ⌦ Reações de degradação das cefalosporinas clinicamente relevantes. Hidrogenação do anel β-lactâmico. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 174 7. CLORANFENICOL E DERIVADOS. Antibiótico de amplo espectro produzido por Streptomyces venezuelae. Existem diversos tipos de pró-fármacos de cloranfenicol: Cinamato, estearato e palmitato de cloranfenicol, o qual mascara o sabor do fármaco e o libera no intestino, mas pode causar a síndrome cinzenta do recém-nascido. Hemissuccinato de cloranfenicol, o qual aumenta a hidrossolubilidade do fármaco para o uso oftálmico. cloranfenicol OH O Se: NO2 = SO2 (tiafenicol) NO2 = CH3CO (cetofenicol) NO2 OH NH CHCl 2 O H3C Palmitado de cloranfenicol O O NO2 OH NH CHCl 2 ⌦ REA / SAR. Sua estrutura fundamental é essencial para atividade. Apenas o isômero natural possui atividade antibacteriana elevada. Modificações moleculares não conduziram a compostos melhores. O grupo nitro pode ser substituído, sem perda significativa de atividade, por outros grupos puxadores de elétrons: acetil (CH3CO– cetofenicol); metilsulfonila [CH3SO2– tianfenicol]. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 175 8. TETRACICLINAS (TCs). Antibióticos de amplo uso e largo espectro isolados de Streptomyces aureofaciens e S. rimonis. A quelação é uma importante propriedade química que forma complexos insolúveis com sais de ferro, cálcio, magnésio e alumínio. Administração oral de tetraciclinas é incompatível com medicamentos ou alimentos contendo metais multivalentes. As TCs quelam cálcio de ossos e dentes (dentes descoloridos chegando até marrom devido a cor amarela das TCs), não sendo indicados para crianças com dentição em formação (6-12 anos). São bem absorvidas por via oral na ausência de íons metálicos multivalentes. As TCs envelhecidas perdem potência devido a epimerização em meio ácido perdem hidroxila do C6, gerando a anidrotetraciclina, que é inativa. Algumas TCs geram fototoxicidade, principalmente as com o cloro em C7 devido absorverem luz visível (solar), formando radicais livres e gerando eritemia severa. ⌦ TCs clinicamente relevantes. R4 7 8 9 10 6a 10a 11 R3 6 R2 5 5a 11a 12 R1 4a 12a N(CH3)2 4 3 2 1 EG - Tetraciclinas OH Fármaco H N R5 O R1 H OH OH R2 OH OH H R3 CH3 CH3 CH3 R4 H H H R5 H H H Tetraciclina Oxitetraciclina Doxiciclina OH O OH OH O ⌦ REA / SAR. A remoção do grupo 4-metilamino reduz a atividade. O sistema conjugado formado de C10, 11 e 12 parece ser essencial para a atividade biológica. Alterações nesta porção inativam ou reduzem muito a atividade. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 176 9. ANTIBIÓTICOS POLIPEPITÍDICOS. São altamente tóxicos (principalmente para os rins), sendo reservados para situações graves com poucas alternativas terapêuticas. Resistência rara. ⌦ Representantes. O Glu CH3 H3C S N Leu IIe Lys Orn IIe Phe His Asn Asp NH2 gama gama R DAB polimixina B Thr Z DAB DAB DX Y Thr DAB DAB NH2 NH2 gama bacitracina NH2 CH3 CH3 H3C O H3C O O O NH OH NH2 OH OH O O O O novobiocin CH3 CH3 ⌦ Bacitracina. Mistura de pelo menos 10 diferentes polipeptídeos. É produzido pelo Bacillus subtilis. Possui neuro e nefrotoxicidade. ⌦ Polimixina B. Mistura de pelo menos 12 polipeptídeos cíclicos básicos; É produzido pelo Bacillus polymyxa. Usado em infecções sérias do trato urinário, meningite e septicemia por Pseudomonas aeruginosa. ⌦ Novobiocin. Pertence à família das cumarinamicinas. É produzido pelo Streptomyces niveus. Inibe a função da DNA girase e interfere com o metabolismo de ATP. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 177 10. AMINOGLICOSÍDEOS E AMINOCICLITÓIS. Esta classe de antibiótico possui 1 grupo farmacofórico derivado de 1,3 diaminoinositol: estreptamina, 2-deoxiestreptamina ou espectinamina. São pouco absorvidos por via oral devido alta hidrosolubilidade (alto número de OH). ⌦ Canamicina. É quimicamente estável (suporta calor, sol. ácida ou básica). OH R1 HO HO HO H2N O R2 HO H2N O OH O O NH2 Fármaco Canamicina A Canamicina B Canamicina C R1 NH2 NH2 OH R2 OH NH2 NH2 ⌦ Amicacina. Antibiótico semi-sintético produzido a partir da canamicina. O grupo amida ligado a N3 inibe a adenilação e fosforilação no anel aminoaçucar distante (em C2’ e C3’), aumentando o espectro e a potência. OH HO NH2 H2N O HO OH HO O H2N O OH O NH HO H H2N O HO OH HO NH2 H2N O NH2 HO O H2N O OH O NH2 HO amicacina tobramicina ⌦ Tobramicina. Possui ototoxicidade e nefrotoxicidade. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 178 ⌦ Estreptomicina. Possui o grupo farmacofórico estreptamina. É produzida pelo Streptomyces griseus. NH NH HN H2N NH OH OH OH O H H O O NH NH2 estreptomicina O O CH3 OH OH OH H3C OH Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 179 11. MACROLÍDEOS. São caracterizados por 5 estruturas em comum: Grande anel lactona (éster cíclico) com 12 a 17 carbonos; 1 grupo cetona; 1 ou 2 aminoaçúcares unidos ao núcleo por ligações glicosídicas; 1 açúcar neutro ligado ao aminoaçúcar ou ao núcleo; 1 grupo dimetilamino no resíduo de açúcar. Sofrem hidrólise da ligação glicosídica em sol. ácida gerando acetais, que, além de inativos, geram dores abdominais. Em meio básico ocorre saponificação da lactona. O H3C OH H3C H3C 11 12 13 7 9 10 8 O CH3 OH CH3 HO O O H3C O CH3 O CH3 O CH3 OH H3C H3C H3C OH 9 10 11 8 7 CH3 O CH3 CH3 H3C CH3 OH O 1 6 5 4 3 H3C N CH3 12 13 OH O 1 N H3C H3C 5 4 3 HO O O CH3 H3C O 2 O 2 O O CH3 CH3 CH3 ERITROMICINA CLARITROMICINA O CH3 OH ⌦ Claritromicina. A OH no C6 da eritromicina foi convertido em –OCH3 (metoxila). Tal grupo estabiliza a molécula, impedindo a formação do acetal e as dores abdominais. A metoxila também aumenta a lipofilicidade e a absorção, diminuindo as doses. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 180 Cardiotônicos. 1. CONCEITO. Cardiotônicos são fármacos que aumentam a força contrátil do coração e exercem ações importantes na excitabilidade, automaticidade, velocidade de condução e períodos refratários do coração. São indicados principalmente na insuficiência cardíaca congestiva. 2. EFEITOS ADVERSOS. Superdoses acumuladas ou o uso prolongado levam à intoxicação por digitálicos, cujos primeiros sintomas são anorexia, salivação, vômitos, náusea e diarréia, podendo causar também extra-sístoles ventriculares. Tal estado geralmente desaparece com o fim da terapia. 3. CLASSIFICAÇÃO e RELAÇÃO ESTRUTURA ATIVIDADE (REA/SAR). O O δ− 22 Cardiotônicos R4 R6 R5 10 2 10 9 11 R3 CH3 12 13 17 Fármaco digitoxina digoxina R1 X3 X3 R2 H H H OH R3 H OH OH H R4 H H H OH R5 CH3 CH3 CH3 OH OH glicose O R6 H H H OH 20 δ+ 16 21 C 14 8 D 15 deslanosídio X3+glic. ouabaina X CH3 A 3 5 4 B 7 6 δ−OH O R1 R2 O OH C6H11O 4 OH OH OH OH OH OH Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 181 Para terem atividade cardiotônica, as estruturas devem possuir 3 características essenciais: • Um anel de Lactona insaturada na posição 17β; • Uma função β-oxigenada na posição C-14; • Configuração CIS entre os anéis A e B e entre os anéis C e D. • A fração sacarídica, anteriormente considerada importante no transporte destes fármacos até o local de ação, não é essencial à atividade. 3.1. Digoxina. É o mais usado dos glicosídos cardíacos. Preferido para o tratamento de insuficiência cardíaca congestiva. É excretada pelos rins predominantemente na forma inalterada, o que obriga a diminuir a dose para pacientes com função renal debilitada. Pode ser administrada por via oral ou injetável. 3.2. Digitoxina. Tem meia-vida longa, de 5 a 9 dias. Efeito terapêutico por tempo prolongado, mas pode constituir desvantagem em caso de intoxicação. Sofre intensa metabolização hepática sendo excretado 80% na urina na forma de metabólitos inativos. 3.3. Deslanosido. É estável em solução hidroalcoólica, sendo apropriado para administração parenteral em casos de tratamento digitálico de emergência, tais como edema pulmonar, taquicardia paroxística, fibrilação atrial, insuficiência ventricular esquerda e palpitação atrial. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 182 Antiarrítimicos. 1. CONCEITO. São fármacos utilizados no tratamento de distúrbios no ritmo dos batimentos cardíacos. Sendo a arritmia uma anormalidade na iniciação ou propagação dos estímulos cardíacos. 2. CLASSIFICAÇÃO. 2.1. Glicosídios cardíacos: Digitoxina, digoxina, deslanosido e ouabaína; 2.2. Vasodilatadores coronários: Amiodarona e verapamil; 3.3. Anticonvulsivantes: Fenitoína; 3.4. Adrenérgicos: Epinefrina, fenilefrina e isoprenalina. 3.5. Bloqueadores β-adrenérgicos: Propranolol, atenolol e metoprolol (cárdio-seletivos). 3.6. Colinérgicos: Edrofônio e neostigmina. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 183 3.7. Anticolinérgicos: Atropina; 3.8. Anestésicos locais: Lidocaína; 3.9. Antieméticos: Metoclopramida. 4. MECANISMO DE AÇÃO MOLECULAR E REA/SAR. quinidina + procainamida . + lidocaína . + N N . R N . O R A ação antiarrítmica da quinidina resulta de sua ligação à membrana celular do miocárdio via seu anel quinolínico, e também a lipídios e lipoproteínas; a fração quinuclidínica, com seu átomo de nitrogênio protonizado, causa um ou mais dos seguintes efeitos: • Repulsão de cátions, incluindo sódio; • Espessamento da membrana por hidratação; • Quelação de íons cálcio. Tais interações corrigem o movimento patológico de íons no miocárdio (reduzindo a entrada de Na+ e a saída de K+ através da membrana celular) produzindo efeitos antiarrítmicos. Esta similaridade explica os efeitos cardíacos análogos produzidos pelos 3 Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 184 fármacos, pelo mesmo mecanismo de ação. Estando o efeito antiarrítmico correlacionado com o efeito anestésico local. Vários outros antiarrítmicos apresentam estrutura análoga: amiodarona, tocainida, aprindina e mexiletina. O CH3 O H3C amiodarona tocainida HN O CH3 H2N CH3 N N CH3 CH3 I O I H3C CH3 N aprindina Os fármacos simpatomiméticos, tais como epinefrina e isoprenalina, devem sua ação cardíaca ao estímulo de receptores adrenérgicos, onde tal estímulo aumenta a pressão sanguínea e, por reflexo, aumenta o tono do vago e faz cessar o paroxismo da taquicardia atrial. Já o estímulo de receptores β aumenta a automaticidade e melhora a condução. CH3 OH H3C NH H3C NH OH CH3 H3C NH OH epinefrina isoprenalina OH OH OH OH propranolol O Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 185 O efeito antiarrítmico produzido pelo propranolol e outros agentes bloqueadores β-adrenérgicos resulta de sua interação com o transporte celular de Ca2+, e não do bloqueio β-adrenérgico. O verapamil bloqueia o transporte de Ca2+ através da membrana celular do miocárdio. A nifedipina é outra antagonista do cálcio. CH3 O O CH3 H3C H N CH3 CH3 O nifedipina O H3C O CH3 O CH3 O O O N + H3C verapamil H3C N O N CH3 - Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 186 Diuréticos. 1. CONCEITO. Não são somente substâncias que aumentam o volume urinário, são fármacos que atuam primariamente na excreção de íons Na+, Cl- ou HCO3-, principais eletrólitos do fluido extra-celular. São utilizados no controle de edemas e como coadjuvantes no controle da hipertensão, assim como na: insuficiência cardíaca congestiva crônica (ICCC), insuficiência renal crônica, oligúria aguda, glaucoma, hipercalcemia e cálculos renais. Os efeitos adversos podem ser desprezíveis, graves e até fatais. 2. CLASSIFICAÇÃO. 2.1. Quanto ao efeito biológico, tem-se: • Diuréticos propriamente ditos (aumentam apenas a excreção de água e não de eletrólitos); • Natriuréticos (aumentam a excreção de sódio); • Salurétieos (aumentam a excreção de sódio e cloreto). 2.2. Quanto a seu mecanismo de ação, tem-se: • Diuréticos osmóticos: glicose, glicerol, isossorbida, manitol, sacarose, sorbitol, uréia; • Sais formadores de ácidos: cloreto de amônio, cloreto de cálcio, nitrato de amônio, sais de potássio; • Inibidores do transporte tubular renal: ácidos acilfenoxiacéticos, antagonistas da aldosterona, benzotiadiazinas, inibidores da anidrase carbônica, organomercuriais, pirazinas, pteridinas, sulfonamidas Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 187 aromáticas e xantinas. 2.3. Quanto a sua constituição química, tem-se: • • • • • • • • • • • • Xantinas: piperazina e aminofilina; Organomercuriais: mercaptomerina e merdroxona; Pirimidinas: aminometradina. Pirazinas: amilorida; s-Triazinas: formoguanamina; Ácidos acilfenoxiacéticos: ácido etacrínico; Sulfonamidas e relacionados: acetazolamida, furosemida, quinetazona; Tiazidas e fármacos relacionados: benzotiazida, clorotiazida e hidroclorotiazida; Pteridinas: triantereno; Espironolactonas esteróides: espironolactona; Imidazolinas e relacionados: azolimina; Diversos: cloreto de amônio, cloreto de cálcio, glicerol, glicose, isossorbida, manitol, nitrato de amônio, sacarose e uréia. Os diuréticos mais amplamente usados foram divididos em 7 classes: • • • • • • • Xantinas; Diuréticos osmóticos; Compostos mercuriais; Inibidores da anidrase carbônica; Tiazidas; Compostos sulfamídicos relacionados; Diuréticos diversos. Também utilizam-se algumas associações: • Aldazida (espironolactona + butizida); • Clofan (furosemida + triantereno); • Moduretic (cloridrato de amilorida + hidroclorotiazida); • Triclorana (hidroclorotiazida + triantereno). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 188 3. XANTINAS. São usados como diuréticos, isolados ou em associações com diuréticos organomercuriais. O principal uso da aminofilina é de broncodilatador e antiasmático. 4. DIURÉTICOS OSMÓTICOS. Consideram-se como tais os seguintes compostos: glicose, isossorbida, manitol, sacarose, sorbitol. Com exceção do manitol, não são úteis como diuréticos. O H3C N H3N + N NH3 + manitol OH OH glicose OH OH OH O OH HO H2C N CH3 N OH OH OH OH aminofilina 5. COMPOSTOS ORGANOMERDURIAIS. Apresentam a fórmula geral: R O Y Hg X - • Uma cadeia de, pelo menos, 3 átomos de carbono; • Um átomo de mercúrio em uma das extremidades da cadeia; • Um grupo hidrófilo separado do mercúrio na outra extremidade. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 189 Os grupos substituintes R, X e Y determinam a potência e os efeitos colaterais. O grupo R tem maior influência, podendo ser aromático, heterocíclico ou alicíclico. O grupo Y geralmente é uma metila. O grupo X, teofilina, que tem atividade diurética por si, embora pouco intensa. O O meralurina teofilina H3C N O H N NH NH O Hg - teofilina COOH H3C H3C CH3 O H3C O N CH3 N mercaptomerina sódica NH Hg O H3C S - NaOOC COONa São saluréticos, inindo a reabsorção tubular de sódio, cloreto e água. Têm seu uso principal no tratamento de distúrbios cardíacos congestivos. Sua ação diurética se deve à inibição da ATP-ase da membrana tubular, responsável pela reabsorção ativa do Na+. Através do seu átomo de Hg, eles reagem, pelo menos, com um grupo sulfidrila da ATP-ase. O elemento ativo é o íon mercúrio, que se liga especificamente a 2 sítios receptores, sendo um deles um grupo sulfidrila e, o 2°, outro grupo sulfidrila ou uma hidroxila fenólica. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 190 6. INIBIDORES DA ANIDRASE CARBÔNICA. Têm como principal uso adjuvante no tratamento de glaucoma. O mais empregado é a acetazolamida. acetazolamida H3C NH S O S O O N N NH2 6.1. Acetazolamida. Foi usada como diurético oral, mas visto que a tolerância se desenvolve rapidamente, hoje em dia, para a administração por via oral, preferem-se as tiazidas. É ainda usada como adjuvante no tratamento de glaucoma. Devido à sua semelhança estrutural do grupo sulfamílico com o ácido carbônico (H2CO3), as sulfamidas diuréticas inibem a anidrase carbônica. O inibidor se insere numa fenda estreita na cavidade da enzima e se liga ao átomo de zinco presente na estrutura da anidrase carbônica através do grupo sulfamílico. Outra molécula do mesmo inibidor liga-se ao único grupo sulfidrílico da enzima através do átomo de mercúrio. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 191 7. TIAZIDAS E COMPOSTOS SULFAMÍDICOS RELACIONADOS. São saluréticos e inibem a reabsorção de sódio, cloreto e água. Também aumentam a excreção urinária de K+ e bicarbonato. Todas as tiazidas e agentes sulfamídicos relacionados são quase idênticos na sua ação, diferindo apenas no período de ação e nas doses. A duração da ação da: • Clorotiazida é de 6 a 12 horas; • Hidroclorotiazida e benzotiazida, 12 a 18; Estes fármacos são usados em todos os tipos de distúrbios cardíacos, sendo empregados em substituição aos demais agentes diuréticos. Podem provocar hipocalemia e outros desequilíbrios eletrolíticos, mas resolvidos com ingestão de alimentos ricos em potássio (como banana). Uma vez que reduzem a excreção renal de ácido úrico, tendem a elevar os níveis deste ácido, causando, ataques de artrite gotosa aguda. clorotiazida Cl O S H2N O O S O H2N N CH NH O S O O S O Cl hidroclorotiazida H N CH2 NH Cl O S H2N O O N S NH S O benzotiazida Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 192 7.1. Clorotiazida. É o protótipo das tiazidas, útil no tratamento de edemas. 7.2. Hidroclorotiazida. É utilizada no tratamento de edemas e também como anti-hipertensivo. furosemida clortalidona HO N H O O OH O NH H2N H2N S O O Cl S O O Cl 7.3. Clortalidona. É um derivado ftalimídico, com porção sulfamídica e não tiazídica. Suas ações, usos e efeitos adversos são similares aos da clorotíazida. É usada também como anti-hipertensivo. 7.4. Furosemida É um salurético muito potente, causando efeito diurético mais pronunciado que as tiazidas ou a acetazolamida. Por via oral, seu período de latência é de uma hora e atua durante 6 horas. Por via IM ou EV, sua ação é imediata e dura 1 hora. É utilizada no tratamento de edema. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 193 8. DIURÉTICOS DIVERSOS. Esta classe é constituída de diuréticos de constituições químicas diversas. ác. etacrínico CH2 H3C O O H2N N N O N S COOH CH3 CH3 Cl Cl O espironolactona O triantereno H3C NH2 O 8.1. Ácido etacrínico. É um salurético. Usado no controle de edema associado a distúrbios cardíacos congestivos, edema pulmonar e como coadjuvante no controle de crises de hipertensão. 8.2. Triantereno. É um salurético, estimula a excreção de água, sódio e cloreto, mas retém potássio. Usado no tratamento de edema associado a distúrbios cardíacos congestivos, cirrose hepática e síndrome nefrótica. 8.3. Espironolactona. É um salurético, estimula a excreção de água, sódio e cloreto. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 194 Anticonvulsivantes. 1. CONCEITO. São fármacos que deprimem seletivamente o SNC, com principal utilização na supressão de crises, acessos ou ataques epilépticos sem causar dano ao SNC e nem depressão da respiração, sendo eficazes em 75-80% dos pacientes. 2. CLASSIFICAÇÃO. • Brometos, barbitúricos, hidantoínas, oxazolidinodionas, succinimidas, acilureídas, benzodiazepinas (benzodiazepínicos) e diversos. 3. REA / SAR. Estrutura fundamental dos principais anticonvulsivantes: fenobarbital, fenitoína, carbamazepina, etosuximida, valproato, diazepam e clonazepam. R1 5 X 2 H3C CH3 trimetadiona CH3 H3C O NH O N CH3 O O O R2 4 O N 3 O O R3 N H O EG - Pcp anticonvulsivantes etosuximida fenitoína H N 4. BROMETOS. Hoje de valor essencialmente histórico (NaBr e HBr). Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 195 5. BARBITÚRICOS. Usados como anticonvulsivantes, mesmo em doses sub-sedativas, prevenindo acessos epilépticos. São usados no controle da maioria das formas de epilepsia, principalmente nos ataques tônico-clônicos generalizados e acessos focais. O O CH3 O O H3C O N H NH H3C O N CH3 NH H3C O O N N O O CH3 O fenobarbital eterobarbo metilfenobarbital 6. HIDANTOÍNAS. • Usada com o fenobarbital ou etosuximida para controlar ataques convulsivos generalizados. NH O O • Sendo também parcialmente eficaz em ataques focais. N H fenitoína Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 196 7. OXAZOLIDINODIONAS. CH3 H3C O O • Usada principalmente no controle de acessos de abstração. • Possui RAMs graves e alguns fatais. O N CH3 trimetadiona 8. SUCCINIMIDAS. H3C CH3 • Fármaco de escolha para acessos de abstração. O N H O etosuximida 9. ACILUREÍDAS. O O H2N NH fenacemida Considerada análogo de cadeia aberta das hidantoínas. É eficaz em ataques tônico-clónicos generalizados, de abstração, do lobo temporal e mistos, refratários a outros fármacos. Por ser muito perigosa, só deve ser usada quando outros fármacos se mostrem ineficazes, onde alguns autores advogam a sua exclusão do arsenal terapêutico. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 197 10. BENZODIAZEPÍNICOS. Principais benzodiazepínicos utilizados como anticonvulsivantes: diazepam Cl N Cl N clonazepam Cl NO2 HO H O N lorazepam Cl N O CH3 O N H N H oxazepam Cl N HO N H O O N nitrazepam NO2 triazolam Cl N Cl N N H N N CH3 ⌦ Diazepam. Usado principalmente como agente ansiolítico, este fármaco mostra fortes propriedades anticonvulsivantes. É ativo em espasmos mioclônicos e acessos de abstração. ⌦ Nitrazepam. Possui o mesmo uso do diazepam, contudo é mais eficaz em espasmos mioclônicos. ⌦ Clonazepam. Possui o mesmo uso do diazepam, contudo é contra-indicado à pacientes sensíveis aos benzodiazepínicos. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 198 11. DIVERSOS. • Usado no tratamento da epilepsia do lobo temporal e também para ataques N generalizados. O H2N • Provoca efeitos colaterais em cerca de 25% dos pacientes. • Seu principal uso é como diurético inibidor da O carbamazepina H3C O S NH2 O anidrase carbônica. S NH N • Uso no tratamento de ataques de abstração em crianças, sendo muito útil como coadjuvante de outros fármacos. • Seu principal uso é como anestésico local, sendo usado como antiarrítmico e no N acetazolamida CH3 O H3C N NH CH3 CH3 tratamento de convulsões, mesmo podendo em alguns casos provocá-la. lidocaína O OH • É usado em acessos tônico-clônicos generalizados, acessos focais e em abstrações. CH3 H3C valproato • Produz efeitos teratogênicos em animais. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 199 Anestésicos Locais. 1. CONCEITO. Anestésicos locais são agentes que atuam em receptores intracelulares de canais de sódio bloqueando reversívelmente a geração e a condução de potenciais de ação através do neurônio, inibindo a sensação de dor em regiões específicas do corpo. Os anestésicos locais, podem ser ineficazes em áreas inflamadas, pois nestas o pH é ácido facilitando a ionização do fármaco, impossibilitando sua penetração no neurônio e consequentemente não havendo interação com seu receptor intracelular. 2. REA / SAR. Os anestésicos locais, em sua maioria, possuem parentesco estrutural com a cocaína, com a seguinte fórmula geral. EG - Anestésicos Locais R2 N R1 O H O O(CH2)n Ar CH3 N O O CH3 cocaína O Gp lipofílico Gp hidrofílico Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 200 Para manutenção da atividade anestésica, é essencial que haja equilíbrio entre as partes hidrofílica e lipofílica. Além da amina terciária. Todos os anestésicos locais do tipo éster e amida possuem ligações conjugadas entre o anel aromático e a carbonila, além de possuírem Cδ+ e Oδ-. A introdução de um grupo retirador de elétrons (NO2) na posição para do anel fenílico diminui esta Cδ+ e Oδ-, reduzindo a potência do anestésico local. A introdução de um grupo doador de elétrons (NH2) na posição para do anel fenílico aumenta esta Cδ+ e Oδ-, aumentando a potência do anestésico local. O mesmo resultado será obtido se o sistema de duplas ligações conjugadas for interrompido. Quanto à duração do efeito, ela depende da velocidade de hidrólise enzimática e da hidrofobicidade dos compostos. Assim, na seguinte série de anestésicos locais a duração do efeito aumenta progressivamente na seqüência: • Procaína < lidocaína < prilocaína < mepivacaína < bupivacaína. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 201 3. CLASSIFICAÇÃO. Os anestésicos locais são agrupados em três classes: • Derivados de ésteres; • Derivados de amidas; • Anestésicos locais diversos. 4. DERIVADOS DE ÉSTERES. ⌦ Cocaína. Extraída das folhas da Erythroxylon coca e outras espécies do mesmo gênero, ou pode ser sintetizada a partir da ecgonina. É utilizada topicamente no olho, nariz, ouvido, garganta, vagina e reto, mas não deve ser injetada nem ingerida. CH3 N O CH3 O CH3 cocaína O H O ecgonina OH N O OH ⌦ Procaína. É o protótipo dos anestésicos locais de uso parenteral. H2N procaína O N O H3C PABA O CH3 OH H2N É utilizada por via EV no tratamento de arritmias cardíacas. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 202 É contra-indicada para pacientes tratados com digitálicos, anticolinesterasicos e suxametônio. Por ser hidrolisada à ácido p-aminobenzóico, não devendo ser usada simultaneamente com fármacos sulfamídicos, dos quais este ácido é antagonista competitivo. ⌦ Tetracaína. Deve ser conservado em recipientes opacos e herméticos. Suas soluções aquosas resistem mais à hidrólise, podendo ser esterilizadas por ebulição. O O N CH3 tetracaína CH3 HN CH3 Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 203 5. DERIVADOS DE AMIDAS. Esta classe de fármacos compreende 3 subgrupos: • Amidas básicas, representadas pela cinchocaína; • Anilidas, toluididas e xilididas, representadas pela lidocaína; • Amidas terciárias, representadas pela oxetacaína. Os primeiros 2 grupos são resultantes da substituição do átomo de oxigênio estérico dos derivados de éster pelo grupo isóstero NH. Tal substituição aumenta a estabilidade e a resistência à hidrólise. N O CH3 cinchocaína H3C NH NH O NH Cl CH3 CH3 N H3C N O N CH3 CH3 O + CH3 O H3C N lidocaína CH3 CH3 CH3 OH oxetacaína H3C ⌦ Lidocaína. É o mais estável dos anestésicos locais conhecidos, mostrando-se extremamente resistente à hidrólise. É utilizada por via EV no tratamento de arritmias cardíacas. Possui atividade mais intensa além de possuir duração de ação prolongada, de 60 a 75 minutos, sendo também administrada com epinefrina para aumentar a duração de ação para até 2 horas ou mais. ⌦ Prilocaína. Possui estrutura e ação semelhantes às da lidocaína, mas com duração de ação superior. É eficaz sem a necessidade da adição de epinefrina ou outro vasoconstritor. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 204 CH3 O prilocaína NH NH CH3 CH3 O N NH CH3 H3C lidocaína CH3 CH3 CH3 H3C CH3 O N NH bupivacaína ⌦ Bupivacaína. Seu efeito anestésico dura de 2 a 3 vezes mais que o da mepivacaína e lidocaína. Utilizada em trabalhos de parto, normalmente junto com epinefrina. Sua potência é igual à da tetracaína, mas 4 vezes maior do que a da mepivacaína, lidocaína e prilocaína. H3C O O N mepivacaína CH3 O N NH CH3 bupivacaína HN CH3 CH3 OH CH3 CH3 tetracaína NH O N CH3 H3C lidocaína CH3 H3C O NH N CH3 H3C Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 205 6. TIPOS DIVERSOS. O CH3 N diclocaína O N CH3 CH3 O fenacaína O NH CH3 ⌦ Diclonina ou diclocaína. É uma cetona, com uso primário superficial, por ser irritante tecidual. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 186 Analgésicos Opióides. 1. INTRODUÇÃO. Os analgésicos opióides são bem conhecidos por sua habilidade em reduzir a percepção a dor sem perda de consciência, ativando receptores opióides. Este grupo de fármacos foi anteriormente denominado de hipnoanalgésicos ou narcóticos, sendo atualmente utilizado o termo opióide para todos os fármacos naturais ou sintéticas, agonistas ou antagonistas, semelhantes a morfina. A morfina é obtida de uma planta chamada Papaver somniferum, conhecida como papoula do oriente. Ao se fazer cortes na cápsula da papoula, quando ainda verde, obtém-se um suco leitoso, o ópio. Quando seco, este suco passa a se chamar pó de ópio, onde existe várias substâncias com grande atividade, sendo a mais conhecida a morfina. O ópio natural (vegetal) e seus derivados são drogas destiladas do suco extraído do fruto imaturo da papoula que, depois de refinadas, servem para a manufatura e de pelas pela medicamentos convenções considerados internacionais legislação brasileira como narcótico ou entorpecente, isto é, drogas e fármacos que produzem hipnose e analgesia. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 187 Os fármacos sintéticos chamados opiáceos são também classificadas como narcóticos. Gravações e escritos antigos revelam que o ópio era conhecido pelos primitivos médicos e usado centenas de anos antes do advento do cristianismo. Os povos antigos já conheciam as propriedades curativas das plantas, como as da papoula e do suco extraído, o ópio. Na Europa renascentista, o ópio era utilizado como remédio, para os mais diversos males, e foi também empregado no tratamento da histeria, sendo considerado por alguns autores como a primeira droga a ser ministrada no tratamento de doenças mentais. Friedrich Sertürner (1783 - 1841), farmacêutico alemão, estudou a substancia química que o francês Armand Seguin tinha extraído do ópio em 1804, demonstrando suas propriedades básicas, e preparou os sais dessa base a que chamou morphium (morfina). Este foi o primeiro composto ativo extraído de um vegetal iniciando-se daí os estudos e pesquisas para isolar os elementos ativos das plantas. A morfina é o mais ativo alcalóide de ópio, com o teor de 10% de seu peso, e se apresenta sob a forma de cristais solúveis, servido para a preparação de numerosos derivados, como a diamorfina, codeína, codetilina, heroína, metopon e outros. 2. CLASSIFICAÇÃO. Podem ser classificados em 4 grupos: • Compostos naturais do ópio; • Compostos semi-sintéticos; • Compostos sintéticos; • Antagonistas opióides. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 188 3. RELAÇÃO ESTRUTURA ATIVIDADE (REA / SAR) 3.1. Alterações em C3, C6 e na dupla ligação de C7 e C8. HO 3 2 1 A 4 12 11 Morfina 10 A = anel aromático B = anel cicloexano C = anel tetrahidrofurano O C 13 5 6 B 9 14 E 15 8 7 D 17 16 N CH3 D = anel piperidínico E = anel cicloexeno HO CH3 HO 6 CH3 HO 6 A inversão da configuração do carbono 6: ↑ analgesia, pois o centro quiral está invertido. • A codeína que é 15% menos analgésica que a morfina, devido ao grupo metóxi em C3. • A morfinona é 2 vezes menos potente que a morfina, devido ao grupo cetona em C6. • A hidromorfona tem sua atividade analgésica aumentada pelo grupo cetona em C6 e pela retirada ligação dupla entre C7 e C8. • A heterocodeína é 6 vezes mais potente para a atividade antitussígena, devido ao grupo metóxi em C6. • A heroína é 3 vezes mais potente que a morfina, além de possir maior lipossolubilidade e com grande poder de penetração no SNC, devido aos grupos acetóxi em C3 e C6. • Ocorre redução da atividade analgésica em 90%, com a quebra da ligação etér do anel tetrahidrofurano e com a adição de um grupo OH em C4 do anel aromático. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 189 HO 3 2 1 H3C morfina A = anel aromático B = anel cicloexano 10 O 3 A 4 12 11 O heroína O 6 O C 13 5 6 B 9 14 C = anel tetrahidrofurano N CH3 D = anel piperidínico E = anel cicloexeno O N CH3 E 15 8 7 D 17 16 HO H3C HO O HO H3CO 3 O O N CH3 6 O N CH3 N 6 8 7 CH3 O HO codeína HO A 4 O morfinona hidromorfona HO 3 A HO O C B D N CH3 C B D N CH3 6 E heterocodeína HO E H3CO • O aumento na atividade ocorre devido a: Retirada da dupla ligação entre C7 e C8. Retirada da dupla ligação entre C7 e C8 e a adição de um grupo metóxi em C3. Retirada da dupla ligação entre C7 e C8 e a adição de um grupo cetona em C6. HO H3CO 3 HO O N 8 O CH3 8 O N CH3 8 7 N 6 CH3 HO 7 HO 7 O Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 190 3.2. Alterações na substituição do R em N. HO 3 2 1 A 4 12 11 10 O C 13 5 6 B 9 14 E 15 8 7 D 17 16 N R HO Se R for: • H Reduz em 75% a atividade analgésica. • CH3 Ótimo agonista com afinidade e atividade aumenta. • CH2-CH3 agonista com atividade semelhante a da morfina. • CH2-CH2-Fenil agonista com atividade aumentada 14 vezes. • Grupo muito volumoso gera antagonista da morfina. 3.3. Alterações nos Anéis. • O rompimento da ponte etérea (anel tetrahidrofurano) e a adição de uma hidroxila (OH) em C4, reduz em 90% a atividade. • A adição de uma OH em C14 e saturação da ligação dupla entre C7 e C8, aumenta em 10 X a analgesia da molécula (oximorfona). • A adição de uma OH em C14, de um grupo OCH3 em C3 e saturação da ligação dupla entre C7 e C8 gera a oxicodona com atividade igual a da morfina. • A adição de um CH2, de uma dupla ligação em C6 e a retirada da dupla ligação entre C7 e C8, aumenta em 80 X a atividade da molécula. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 191 4. COMPOSTOS NATURAIS DO ÓPIO. Dentre os alcalóides mais conhecidos do ópio, 6 são os mais importantes, os quais se encontram fazendo parte dos grupos abaixo: • Derivados da Benzilisoquinolina. Depressores da musculatura lisa sem nenhuma atividade sobre o SNC. Alcalóides principais: papaverina (1%), narcotina 6%) e narceína (0,3%). • Derivados da Fenantrênicos. Tem ação estimulante da musculatura lisa, espamogênica, sendo agentes analgésicos com propriedades euforizantes. Alcalóides mais importantes: morfina (10%), codeína (0,5%) e tebaína (0,2%). 5. COMPOSTOS NATURAIS. ⌦ MORFINA. Principal alcalóide de ópio e foi muito usada como analgésico para aliviar as dores. Depois, com a introdução dos narcóticos sintéticos e outros fármacos analgésicos, a aplicação da morfina na terapia foi diminuindo, embora seja ainda considerado um protótipo de fármaco narcótico. A euforia pode ser obtida com pequenas doses e a tolerância se forma rapidamente. HO 3 2 1 A 4 12 11 morfina 10 A = anel aromático B = anel cicloexano C = anel tetrahidrofurano O C 13 5 6 B 9 14 E 15 8 7 D 17 16 N CH3 D = anel piperidínico E = anel cicloexeno HO Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 192 6. COMPOSTOS SEMI-SINTÉTICOS. ⌦ CODEÍNA (metilmorfina). Tem como ação mais específica de deprimir os acessos de tosse, sendo por essa razão usada como antitussígeno. É também usada como hipnoanalgésico em doses de 5 - 10 vezes maior que a morfina para produzir o mesmo efeito. A dependência à codeína ocorre quando é ingerida em grandes quantidades e por período bastante longo. H3C 3 H3CO codeína O 3 O heroína O N 6 O N CH3 O CH3 HO H3C O ⌦ HEROÍNA (diacetilmorfina) É sintetizada a partir da morfina. Ambas são tão relacionadas que a heroína, ao penetrar na corrente sangüínea e ser processada pelo fígado, é transformada em morfina. Em 1898, a Bayer, na Alemanha, acreditou na época ser ela o substituto ideal da morfina, por ser 3 vezes mais potente que a morfina. Devido a essa potência, considerada "heróica", a Bayer decidiu batizar oficialmente a nova substância com o nome de heroína. Nunca é vendida pura: os traficantes adicionam ao pó lactose, bicarbonato, farinha etc., e a taxa de pureza é de 5 - 10%. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 193 A heroína adicionada à cocaína constitui uma mistura tóxica forte, sendo usada freqüentemente nos Estados Unidos, onde é conhecida por speedball. Possui ação depressora respiratória acentuada, de maneira que 4 mg de heroína corresponderiam ao uso de 10 mg de morfina. Sua capacidade euforizante, juntamente com a qualidade de produzir uma excelente sensação de bem estar, confere-lhe a condição de droga extremamente perigosa em produzir hábito e vício, além de tolerância e crise de abstinência. ⌦ HIDROMORFONA. Possui propriedade analgésica bem mais potente do que a morfina, da ordem de 5 a 10 X mais. Embora possua os efeitos farmacológicos mais ou menos semelhantes aos da morfina, a sua ação sedativa e capacidade em produzir euforia são bem menores. Possui também efeito antitussígeno. HO HO O N 6 8 7 O CH3 6 OH 14 8 7 N CH3 O O hidromorfona oxmorfona ⌦ OXMORFONA. Possui a mesma fórmula estrutural da hidromorfona, a única diferença é a introdução de uma hidroxila no carbono 14. A sua ação analgésica é 10 X maior que a da morfina. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 194 7. COMPOSTOS SINTÉTICOS. ⌦ DERIVADOS MORFINÂMICOS. Resultante de uma simplificação molecular da morfina pela perda do anel C. Possuem excelentes propriedades analgésicas e uma boa característica destes fármacos é seu emprego por via oral com atividade analgésica prolongada. HO A levorphanol C B D N CH3 E ⌦ DERIVADOS DO BENZOMORFANO. Resultante de uma simplificação molecular da morfina pela perda de um núcleo hexagonal. Pertencem a este grupo a fenazocina e a pentazocina. HO 1 CH3 A fenazocina C B D 6 HO 1 CH3 pentazocina CH3 N 6 N CH3 E H3C H3C Fenazocina. É um poderoso analgésico sintético. Possui ação bastante parecida com a da morfina, diferenciando-se por ser mais poderoso como analgésico e por possuir efeito depressor bem mais acentuado. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 195 Pentazocina. Foi um dos primeiros fármacos a ser comercializado com ação mista agonistaantagonista. Devido à sua ação mista, a pentazocina tem menor capacidade de provocar dependência do que a morfina, entretanto, tem sido reportada dependência física e psíquica após administração parenteral do fármaco. É empregada como analgésico no alívio de dores crônicas e de grande intensidade. ⌦ DERIVADOS FENILPIPERIDÍNICOS. Os derivados deste grupo são obtidos por substituições em um dos 3 hidrogênios do grupo piperidínico. CH3 N meperidina O CH3 O O alfaprodina CH3 CH3 CH3 N O Meperidina. Conhecida como petidina, demerol, dolosal, dolantina. Substância sintética de grande aceitação e superando muitas vezes a morfina. Descoberta em 1939, quando procuravam novas drogas anticolinérgicas. Posteriormente, verificou-se sua atividade analgésica, se bem que inferior à da morfina, porém com uma atividade espasmolítica que lhe conferiu qualidades originais nos grupos dos analgésicos centrais. É um dos substitutos analgésicos para a morfina mais freqüentemente usados. Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 196 Alfaprodina (Nisentil) Resulta da introdução de um grupo metila na meperidina. É dotada de maior potência analgésica do que a meperidina, embora inferior à da morfina. ⌦ DERIVADOS DA DIFENILPROPILAMINA. Metadona. É primeiro opioíde de síntese a perder o anel piperidínico, caracteriza-se por possuir uma potência analgésica capaz de elevar o limiar da dor de 100%. É usada sob a forma de cloridrato racêmico porque possui dois isômeros: a L-metadona, responsável pela ação analgésica e sedativa, e a D-metadona, com atividade antitussígena. O isómero levógero (L-metadona) é o mais ativo. É usada no alívio de dores como do câncer e muito utilizada para o tratamento de viciados em narcóticos (morfina, heroína), aliviando os sintomas de abstinência provocados por esses narcóticos. metadona H3C CH2 C O C CH2 CH CH3 N CH3 CH3 Prof. Antonio Távora Química Farmacêutica 197 8. ANTAGONISTAS OPIÓIDES. Os antagonistas opióides são usados no tratamento da toxicidade induzida por opióides, principalmente na depressão respiratória e no diagnóstico da dependência física dos opióides. As substituições químicas promovidas no nitrogênio do anel piperidínico da molécula da morfina são capazes de fornecer substâncias de ação antagonistas. A nalorfina, o levalorfan e a naloxona compartilham as seguintes características: 1. Não desencadeiam dependência física semelhante à da morfina; 2. São considerados pelos ex-dependentes como substâncias neutras ou desagadáveis; 3. Não produzem um tipo de dependência física que leve ao comportamento de busca compulsiva da droga. 2 3 1 HO HO 3 2 1 HO levalorfano 3 4 10 11 2 1 A 4 12 11 nalorfina 4 10 12 naloxona 11 12 10 O C 13 5 6 B 9 14 C D 17 16 6 O 13 9 14 15 8 7 17 16 N CH2 5 N CH2 5 13 15 6 OH 14 8 9 17 16 N CH2 E 15 8 7 HO HO HO 7 Nalorfina (Naline) É o cloridrato de N-alil-normorfina, derivado semi-sintético da morfina, empregado principalmente ao combate da depressão respiratória provocada por opióides. Prof. Antonio Távora
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