Home
Login
Register
Search
Home
adorno - o fetichismo na música e a regressão da audição, parte 1 (1)
adorno - o fetichismo na música e a regressão da audição, parte 1 (1)
March 19, 2018 | Author: Fernanda Nathali | Category:
Pop Culture
,
Market (Economics)
,
Classical Music
,
Science
,
Philosophical Science
DOWNLOAD
Share
Report this link
Comments
Description
THEODOR W.ADORNO TEXTOS ESCOLHIDOS I Consultoriaz Paulo Eduardo Arantes $® r*{% __-2 COPIADORA N°__________. °ROF. I.‘ ‘um-mnuvu R$‘Q2 K362’3}-,;c.S7 E;\;-fR;(71’ Ia‘)? 107.- u_,/ \*// \~%\Q s.\~\/VA MH._ M., . ,. £3 §'I'.E; .41- 71*“ _ A ._ 1“ ,‘___. __.:;._.:.:.1u~¢~:=u"-——- I- _,_,__;-._.-.: r Q‘, NOW CUIJUIMI. O ressoa da flauta encantadora de P5. . Entretanto. O proprio conceito de gosto esté ultrapassado. Vanclenhoeck und Ruprecht. pp. 9-45. Ela desperta a danga das deusas. se desde o tempo da noética grega a fungéio disciplinadora da mfisica foi considerada um bem supremo e como tal se manteve. 1963. assim como nao se pode qualificar de dionisiaca a consciéncia musical contemporanea das massas. ao mesmo tempo. todos tendem a obedecer cegamente 51 moda musical. em torno da qual se congregam saciadas as diversas formas do instinto humano. em Dissonanzen. em nossos dias. a marufestagao imediata do instinto humano e a instancia propria para 0 seu apaziguamento. como alias acontece igualmente em outros setores. Contudo. a saber: a musica constitui. pode-se falar da decadéncia do gosto. Toda vez que a paz musical se apresenta perturbada por excitagoes bacanticas. da mesma forma pouco tém a ver com o gosto artistico em geral as mais recentes modificagoes desta consciéncia musical.iq O FETICHISMO NA M1'Js1cA E A REGRESSAO DA AUDIQAO1 AS QUEIXAS acerca da decadéncia do gosto musical sao. certamente mais do que em qualquer outra época historica. tao antigas quanto ‘esta experiéncia ambivalente que 0 género humano fez no limiar da época historica. Goettingen. A arte responsével 1 Traduzido do original alemior "Ueber Fekischcharakter Fetischchrakter in der Musik und die Regression des l-Ioerens". brotando ao mesmo tempo da lira de Orfeu. na pratica. Mas é essencialmente verdadeira quando se trata da compreensao da prépria mfisica. que o individuo simplesmente nao consegue mais viver empiricamente. nem sequer se coloca mais o problema. a existéncia do pro- prio individuo. esta espécie de musica é afetada pela mudanca. considerando-a uma "degenerac50". Uebertragung von Preisendanz (A Repliblica. o verdadeiro e 0 falso. é 6bvio também que ja ninguém é capaz de ouvir. também com as categorias da musica séria. sim. ou mesmo a situagao concreta em que a mfisica é ouvida'. Iena. Aldous . e isto precisamente em virlude da seguinte razao: pro- Huxley levantou em um de seus ensaios a seguinte pergunta: quem ainda se diverte realmente hoje num lugar de diversao? Com o mesmo direito poder-se-ia perguntar: para quem a mfisica de entretenimento serve ainda como entretenimento? Ao invés de entreter. que no dizer do sabio grego "se recomendam em banquetes e orgias". mesmo durante o proprio ato da audigao. e ninguém exige que os canones da convengao sejam subjetivamente justificados. o critério de julgamento é 0 fato de a cancao de sucesso ser conhecida de todos. procurada e cultivada em virtude do seu préprio valor intrinseco. Se ninguém mais é capa‘z“de falar realmente. ainda que a pessoa interrogada se exprima em termos de gostar e nao gostar. no qual se proibem tanto os modos musicais "queixosos" como os "moles". na realidade. A mfisica de entretenimento preenche os vazios do siléncio que se instalam entre as pessoas deformadas pelo medo. porém. que no entender de muitos amolece e torna a pessoa incapaz de qualquer atitude heroica. que poderia fundamentar tal gosto. A musica de entretenimento serve ainda -—— e apenas — como fundo. que. uma vez que tudo o que se lhe oferece é téo semelhante on idéntico que a predilegao. Um especialista americano em propaganda radiofonica — que utiliza com predilegao especial a mfisica —— manifestou ceticismo com respeito ao valor de tais anuncios. néo ha como negar a verdade desta objecéo. se costuma designar com o qualificativo de "classica". 1920. em grande escala. De resto. parece que tal musica contribui ainda mais para 0 emudecimento dos homens. O mais pertinaz é o do encantamento dos sentidos.'As categorias da arte autonoma. Assume ela em toda parte. tornou-se tao problematica quanto. tradugao de Preisendanz). Tal observagiio é contestavel quanto ao valor publicitairio da musica.OS PENSADORES ADORNO orienta-se por critérios que se aproximam muito dos do conhecimento: 0 logico e o ilogico. se prende apenas ao detalhe biografico. ha certos motivos que se repetem ‘constantemente. ja nao ha campo para escolha. p. _67_ porciona. pelo cansago e pela docilidade de escravos sem exigéncias. para a incapacidade de comunicagao. gostar de um disco de sucesso é quase exatamente o mesmo que reconhecé-lo. Isto ocorre. O comportamento valorativo tornou-se uma ficgao para quem se vé cercado de mercadorias musicais padronizadas. e sem que se perceba. Nas queixas usuais acerca da decadéncia do gosto. no polo oposto. Se perguntarmos a alguém se "gosta" de uma mfisica de sucesso langada no mercado. para a morte da linguagem como expressao. até hoje néo se sabe com clareza 1 Staal. néio conseguiremos furtar-nos a suspeita de que o gostar e o nao gostar jé nao correspondem ao estado real. alegando que os ouvintes aprenderam a n50 dar atengiio ao que ouvem. ja nao tém valor para a apreciacao musical de hoje. Tal recriminagéio encontra-se ja no terceiro livro da Repiiblica de Platéio. atrativo e prazer. 398. Em vez do valor da prépria coisa. entretenimento. Tais motivos estfio presentes nas consideragoes rancosas e sentimentais dedicadas 5 atual massificagéio da musica. apenas para ao mesmo tempo recusar os valores que concede. nem tampouco pode decidir com liberdade quanto ao que lhe é apresentado. para descartar com maior facilidade. o tragico papel que lhe competia ao tempo e na situagao especifica do cinema mudo. 0 direito a liberdade de uma escolha. Contudo. Tal individuo jzi nao consegue subtrair-se ao jugo da opiniao publica. Se se objeta que a mfisica ligeira e toda a musica destinada ao consumo nunca foram experimentadas e apreciadas segundo as mencionadas categorias.1 alias. _53_ musica da opressao magica que a escraviza.1 . praticamente representava apenas um residuo da mais crassa supersticao. A "Flauta Maigica". no sentido da decisao de Haydn pelo "galante" contra 0 erudito.OS PENSADORES _ ADORNO por que razéo o filosofo atribui tais caracteristicas aos modos mixolidio. o qual corresponde ao jonico. Apos a "Flauta Magica". Nos atrativos proibidos entrelacam-se a variedacle do prazer dos sentidos e a consciéncia diferenciada. o equilfbrio musical entre prazer parcial e totalidade. Tais motivos entraram na grande mfisica e foram por ela absorvidos. apresenta-se como profanagao aquela superficialidade que liberta a 1 Loc. onde a propria classificagéo segundo modos suaves e fortes. As objegoes mais marcantes sao a da superficialidade e a do "culto da personalidade". Na variedade dos encantos e da expresséio comprova-se sua grandeza como forca que conduz 5 sintese. que "na guerra ou em qualquer acao que ex1]a a forca singular. na era do capitalismo. porém. ja ao tempo de Platao. O encanto. Os tradicionais fermentos antimitologicos da mfisica conjuram. 399. Na Repiiblica de Platao seria considerado tabu 0 modo maior da mfisica ocidental posterior. por outra parte. evidentemente. p. verberado pelo moderado Apolo. Todavia. inclusive na musica. lidio. O Estado platonico disciplina os seus cidadaos incitando-os tanto para a salvaguarda do Estado como de sua propria existéncia. A preponderéincia da pessoa sobre a coagao coletiva na musica proclama a relevéncia da liberdade subjetiva. que perpassa a mfisica em periodos mais tardios. de uma campanha de saneamento de estilo espartano. ser ferido ou ser atingido pela morte ou por uma infelicidade". A ironia platonica gosta de ridicularizar maldosamente o flautista Marsias. Dos diversos modos. na qual a utopia da emancipacéio _e o aspecto de prazer e entretenimento coincidem exatamente na canconeta do "Singspiel". A sintese musical nao somente conserva a unidade da aparéncia e a protege do perigo de derivar para a tentacao do "bonvivantismo". a pessoa livre e sem peias como portadora da expressao e da humanizacéio da propria musica. Todas essas recriminacoes fazem parte do progresso. entre superficial e profundo permanece téio precario quanto os momentos de equilibrio entre a oferta e a procura na economia burguesa. porém. O programa ético— musical de Platéo possui a caracteristica de uma agao de purificacao ética. A Repliblica de Platao niio. constitui a utopia tal como e descrita pela historia da filosofia oficial. a subjetividade e a profanagao — os velhos adversarios da alienagao coisificante — sucumbem precisamente a ela. na relacéio dos momentos particulares com um todo em producao. porta-se com bravura ainda que vez por outra possa incidir em erro. Os aspectos censurados entram desta forma na grande mfisica ocidental: 0 prazer dos sentidos como porta de entrada para a dimensao harmonica e finalmente coloristica. também. entende-se a decisao de Haydn e nao a despreocupacéio de um cantor dotado de boa garganta ou de um arranjador de mau gosto. constitui apenas um momento em si mesmo. tanto do ponto de vista social como sob o aspecto estético especifico. Até o fim da pré-historia. contra esta mesma liberdade que havia sido outrora a causa de sua _69_ .. lgualmente pI‘O1l)1ClOS seriam a flauta e os instrumentos "de muitas cordas" tangidos com os dedos. entre expressiio e sintese. cit. so se permitem aqueles que "de forma adequada imitam a voz e a expressao do homem". o que entao se emancipa da lei formal nao sao mais impulsos produtivos que se opoem as convencoes. contra a liberdade. fixa-se a imagem de uma situagao social na qual — e so nela — esses elementos particulares de felicidade seriam mais do que mera aparéncia. A mesma classe pertencem outros tragos da pregacéio musical dos capuchinhos. nunca mais se conseguiu reunir musica séria e m1'1sica ligeira. hipolidio e jonico. Em tal unidade. a "superficialidade" como critica da fria e muda objetividade das formas. a grande mfisica nao foi assumida por eles. ou seja: na dissonancia. Assemelha-se tal fenomeno aos comportamentos que as pessoassoem manter em face do esporte . nos dias que ocorrem ela se transformou em caracteristica e bandeira da arte avancacla. cuja exigéncia esta incluida na audicao adequada e justa. e esta filtima sucumbe aqueles toda vez que a obra artistica tenta elevar-se para transcendéncia. embotam o espirito. exerce a sua influéncia desde 0 periodo inicial da burguesia. Somente se mantém fidelidade a possibilidade do prazer onde cessa a mera aparéncia. a nao ser onde a pessoa tira a mascara da falsa felicidade. sem grande oposigao. nao pode ser desfrutada. renunciam ao impulso insubordinado e rebelde que lhes era proprio. que nega a fé a fraude da harmonia existente. corporal. A forca de sedugao do encanto e do prazer sobrevive somente onde as forcas de renuncia sao maiores. Quem a eles se entrega é téio pérfido quanto os antigos noéticos em seus ataques ao prazer sensual dos orientais. Quem ainda se deliciasse com os belos trechos de um quarteto de Schubert ou com um provocantemente sadio "concerto grosso" de Haendel seria catalogado como um defensor suspeito da cultura. e de todas as variantes da banalidade. _A expressao "prazer artistico" ou "gosto artistico" assumiram um significado curioso e comico. O prazer so tem lugar ainda onde ha presenga imediata. A unidade sintética é sacrificada aos momentos parciais. Os referidos momentos isolados de encantamento n50 sao reprovaveis em si mesmos. como se na arte os valores dos sentidos nao fossem portadores dos valores do espirito. que somente se revela e se degusta no todo. mas antes por rigorosa excluséio de tudo o que é culinariamente gostoso e que deseja ser consumido de i1nediato. Os porta-bandeiras da oposicao ao esquema autoritario se transformaram em testemunhas da autoridade ditatorial do sucesso comercial. O que o cataloga nesta categoria de amadores nao é o "novo". ao se isolarem. o ouvinte se converte em simples comprador e consumidor passivo. O fascinio da cangéio da moda. Toda arte ligeira e agradével tornou-se mera aparéncia e iluséio: 0 que se nos antolha esteticamente em categorias de prazer ja néio pode ser degustadorz a promesse du bonheur — foi assim que uma vez se definiu a arte — ja nao se encontra em lugar algum. na qual a miséria e a pobreza sao enal_7g_ tecidas. tangivel.OS PENSADORES __ ADORNO proibigéio. que ha muito tempo ja deixou completamente de existir. O prazer do momento e da fachada de variedade transforma-se em pretexto para desobrigar o ouvinte de pensar no todo. Os momentos parciais ja nao exercem fungéio critica em relagéo ao todo pré-fabricado. Se em outros tempos a ascese derrotou as exigéncias estéticas reacionérias. do que é melodioso. tao diferente das cangoes de sucesso. Os momentos de encantamento demonstram-se irreconciliaiveis com a constituigéo imanente dag obra de arte. devido as afinidades que os uniam a ela. a qual se contrapoe hoje a antecipagao apenas parcial e positiva da felicidade. mas suspendem a critica que a auténtica globalidade estética exerce em relagéio aos males da sociedade. Onde carece de aparéncia estética é ele mesmo ficticio e aparente segundo critérios estéticos e engana ao mesmo tempo o consumidor acerca da sua natureza. Os momentos de encanto e de prazer. que jzi néio produzem nenhum outro momento proprio a nao ser os codificados. apresenta em todo caso uma analogia com elas: nao é degustada. Em outros tempos este fascinio atacou o privilégio cultural das ca_71_ . Colocam-se a servico do sucesso.ou da propaganda. conjuram-se para aprovar e sancionar tudo o que um momento isolado é capaz de oferecer a um individuo isolado. O proprio conceito de ascética é dialético na musica. A arte considera negativa precisamente aquela possibilidade de felicidade. A mfisica de Schoenberg. e mostram-se condescendentes a estes ultimos. e n50 em momentos isolados da matéria artistica. A nova etapa da consciéncia musical das massas se define pela negagao e rejeicao do prazer no proprio prazer. bem abaixo dos colecionadores de borboletas. mas tao-somente na medida em que cegam a vista. Obviamente tal néo acontece em virtude de sua deficiéncia arcaizante de meios. a de incentivar e promover os chamados valores culturais. na contradicao dos excluidos da cultura. é ilusoria — chegou-se a atribuir ao totalitarismo do radio a tarefa de. como se ainda pudesse haver bom entretenimento e como se os bens da cultura nao se transformassem em algo de mau. ilusoria conviccao da superioridade da musica ligeira em relacao a séria tem como fundamento precisamente essa passividade das massas.de pressentimentos. cujas exigéncias — onde ainda eventualmente existirem — sao ilusorias. que as pessoas na realidade apreciam a mfisica ligeira. e a padronizacao dos sucessos se efetua mais abaixo. forcadas a se amoldarem aos padroes gerais. O resto da musica séria é submetido a lei do consumo. a partir da mera soma das duas metades seccionadas.os PENSADORES _ ADORNO» madas sociais dominantes. quanto a desiluséio do superior. da mesma forma presta ela ho]e em dia testemunho. na despreocupada simplicidade da musica ligeira. de sombrias experiéncias. propiciar entretenimento e distragao aos ouvintes. da banalidade se tornasse definitiva. por exemplo. Entre eles jei nao ha espaco algum para o "individuo". a linha de demarcacéio que as separa é variavel. nos seus representantes mais credenciados. Hoje. A produgao musical avangada se independentizou do consumo. tem a sua historia na fuga da banalidade e como aspecto negativo reflete os tracos da mfisica ligeira. sua funcao se modificou. A liquidagéio do individuo constitui o sinal caracteristico da nova época musical em que vivemos. mediante as quais transfigura o mundo musical inferior: um submundo que 1a nao ajuda. precisamente em virtude do modo de cultivé-los. A barbarie cinica de forma alguma é preferivel a fraude cultural. N50 é possivel. admitindo somente a mera participagéio. Em consequencia. ou como se a superior pudesse haurir da inferior a sua perdida forga coletiva. Ambas nao se relacionam entre si como se a inferior constituisse uma espécie de propedéutica popular para a superior. Ouve-se tal musica séria como se consome uma mercadoria adquirida no mercado. e so tomam conhecimento da mdsica séria por motivos de prestigio social. ao passo que 0 conhecimento de um unico texto de cancéo de sucesso é suficiente para revelar que funcao pode desempenhar 0 que é lealmente aceito e aprovado. quando este poder da banalidade se estendeu a toda a sociedade. Se a fuga. mas em cada uma delas aparecem. ainda que em perspectiva. as modificagoes do todo. contudo. em conseqiiéncia de suas demandas objetivas inerentes. A unidade e harmonia das esferas musicais separadas deve ser repensada erecomposta. reduzir-se-ia a zero a possibilidade de venda e de consumo da producao séria._Inversamente seria igualmente comodo ocultar a separagao e a ruptura entre as duas esferas e supor uma continuidade. A sua separacao estatica. tal como a defendem e promovem ocasionalmente alguns conservadores da cultura antiquada. formar o todo. que colocam o consumo da _72_ musica ligeira em oposigao as necessidades objetivas daqueles que a consomem. com respeito aos meios mecarucos de d1fusao. por um lado. ou seja. Entre a incompreensibilidade e a inevitabilida— de__ n50 existe meio-termo possivel: a situacao polarizou-se em extremos que na realidade acabam por tocar-se. desde Mozart. de modo a néio atingir de maneira alguma o sucesso de estilo antigo. a este proposito. Assim como a mfisica séria. a unidade de ambas as esferas da mfisica resulta de uma contradicao nao resolvida. E habitual alegar. que permitiria a formaciio progressiva passar sem perigo do jazz e das cancoes de sucesso aos genuinos valores da cultura. pelo prego do seu conteudo. Carecem totalmente de significado real as dis_73_ . O que alcanga. carregadas . que se prefiguram. e por outro. que so se move em constante contradigéio. A modificagao de fungao atinge todos os tipos de mfisica. N50 somente a ligeira — reino em que o poder da banalidade se faria notar comodamente como simplesmente "gradual". mas limita—se a se alimentar com o que lhe é dado de cima. Se as duas esferas da mfisica se movem na unidade da sua contradicao reciproca. é por ela compensado através das ideologias de originalidade e vinculacao com o natural. mesmo Bach que tomou de_ empréstimo alguns dos mais relevantes temas do seu Cravo Bem Temperado ——. Quanto mais premeditadamente os organismos dirigentes plantam cercas de arame farpado para separar as duas esferas da musica. é dominado por fetiches. Esta selecao perpetua-se e termina num circulo _74_ vicioso fatal: 0 mais conhecido é o mais famoso. Ter boa voz e ser cantor sao hoje expressoes sinonimas para" o vulgar apreciador materialista da musica. e com isto se torna cada vez mais conhecido. o bom como termo médio de qualidade. Entretanto. seja compreendida sob a categoria de "achados" e se vigiem com o maximo zelo os plagios musicais. O atrativo exercido por estes ultimos é tradicional. Uma certa musica famosa -—— "Music. a Quarta Sinfonia de Beethoven ja se perde entre as auténticas raridades. Melodia significa aqui o mesmo que melodia no registro médio-agudo com simetria de oito compassos. antes. e este processo de encolhimento vai separando nao somente 0 que é medianamente bom. da mesma forma como é atribuida ao compositor como sua propriedade legal. Isto nao impede que toda a mfisica. Em outros tempos exigia-se dos ases do canto. As "estrelas" nao sao apenas os nomes célebres de determinadas pessoas. Os programas vao se encolhendo. O principio do "estrelato" tornou-se totalitario. bem como o é a vinculagao estreita do sucesso com a pessoa do cantor dotado de bom "material". O conceito de "achado" é precisamente inadequado para a mfisica considerada classica. Os dois tipos de mfisica sao manipulados exclusivamente a base das chances de venda. please" — obteve éxito impressionante imediatamente depois que Toscanini foi condecorado pela opiniao publica. O reino daquela vida musical que se estende pacificamente desde as organizagoes de compositores como Irving Berlin e Walter Donaldson (the world's best composer — 0 melhor compositor do mundo). 0 mais das vezes triades desagregadas. nos dias de hoje. tanto maior é a suspeita de que sem tais separacoes os clientes nao poderiam entender-se com facilidade.OS PENSADORES ADORNO tingoes entre a audicao da mfisica "classica" oficial e da musica ligeira. é gravado e ouvido sempre mais. de modo algum pertence ao autor na forma especifica em que cabe. parece comandado pelos editores. Conseqiientemente. no lied romantico. de sorte que afinal de contas um comentarista musical pode justificar seu éxito com 0 titulo de "detetive" de melodias. que se acredita poder levar para casa como uma coisa comprada. As reacoes dos ouvintes parecem desvincular-se da relagao com o consumo da mfisica e dirigir-se diretamente ao sucesso acumulado. até a Sinfonia em Si Menor denominada Inacabada. deve-se assegurar ao fa das musicas de sucesso que os seus idolos nao sao excessivamente elevados para ele. magnatas do cinema e senhores do radio. A grandeza de Beethoven se avalia pela subordinagao total do elemento melodico casual e isolado ao conjunto formal da obra. Nos Estados Unidos. com a cobertura do radio. e tem mais sucesso. Tanto Toscanini como o chefe de uma "bandinha" qualquer sao denominados "maestros". esqueceu-se que a voz é apenas um elemento material. passando por Gershwin. nao pode ser suficientemente explicado pela espontaneidade da audigao mas. o qual. . Sibelius e Tchaikovski. maestro. dos "castrati" e das primas_15__. Esta é registrada como um "achado" do compositor. por exemplo. embora neste ultimo caso com uma certa ponta de ironia. Vai-se construindo um verdadeiro panteao de best sellers. O seu material tematico. os crescendo da Sétima Sinfonia de Beethoven sao colocados no mesmo plano do indizivel solo de trompa do movimento lento da Quinta Sinfonia de Tchaikovski. O campo que o fetichismo musical mais domina é o da valorizagao poblica dada as vozes dos cantores. A propria escolha das produgoes-padrao orienta-se pela "eficacia" em termos de critérios de valor e sucesso que regem a mfisica ligeira ou permitem ao maestro de orquestra famoso exercer fascinio sobre os ouvintes de acordo com o programa. por sua vez. As proprias produgoes ja comecam a assumir esta denominacao. mas os proprios classicos comumente aceitos sao submetidos a uma selegao que nada tem a ver com a qualidade. a mfisica atual. com a distribuicao gratis das partituras as diversas orquestras. Agora exalta-se 0 material em si mesmo. com todos os atributos do etéreo e do sublime que lhes sao outorgados com liberalidade. soam como imitacoes dos arrivistas. as relagoes sao as mesmas que se verificam entre as mfisicas de sucesso e os seus consumidores. é dominada pela caracteristica de mercadoria: os ultimos residuos pré-capitalistas foram eliminados. Cai-se prontamente em estado de éxtase diante dobelissimo som convenientemente anunciado pela propaganda de um Stradivarius ou de um Amati. no ambito da mfisica ligeira tal funcao se impoe em toda parte. Todo este processo culmina abertamente no absurdo do culto que se presta aos grandes mestres do violino. A mfisica. Na realidade. As vozes dos cantores constituem bens sagrados de valor igual a uma marca de fabricacao nacional. esta orientado no sentido de a execucao ser usada como instrumento de propaganda para a compra de discos e de reducoes para piano. Com efeito._ deparara de imediato com uma situagao de inimizadee hostilidade que afetivamente reveste-se de muito maior importancia que o proprio motivo da discussao. destituido de qualquer funcao. Quanto mais progride a moderna técnica de fabricacao de violinos. Marx descreve o carater fetichista da mercadoria como a veneracao do que é autofabricado. so podem ser distinguidos de um violino moderno razoavelmente bom por um ouvido especializado. em idéntico isolamento lhes respondem — igualmente distanciadas e alheias ao significado do conjunto e igualmente determinadas pelas leis do sucesso — as emocoes cegas e irracionais. Infimeros sao os textos de mfisicas de sucesso que enaltecem a propria cangao. “Todo o movimento do jazz. na qualidade de valor de troca se aliena tanto do produtor como do consumidor. da voz e do instrumento sao fetichizados e destituidos de suas funcoes unicas que lhes“poderiam conferir sentido. como instrumento para a propaganda comercial de mercadorias que é preciso comprar para poder ouvir musica. como alguém que tenta falar aos mudos. O conceito de fetichismo musical nao se pode deduzir por meios puramente psicologicos._. é utilizada sobretudo nos Estados Unidos. como as relacoes _7fi. Se estes porventura ainda reagirem. alienado da consciéncia das massas por um espesso véu. cujo titulo repetem constantemente em maiusculas. com a mfisica na qual entram carentes de relagao.OS PENSADORES ADORNO donas. ja comegam a perder o encantamento dos sentidos em cujo nome sao tratadas. ja nao fara diferenga alguma se se trata da Sétima Sinfonia ou do short de banho. Requer-se tao-somente que a sua voz seja particularmente potente ou aguda para legitimar o renome de seu dono. Na maioria dos casos. mesmo quando elas mesmas sao arrivistas. constitui uma evidéncia da sua caracteristica de mercadoria. Nem sequer se espera que o cantor domine mecanicamente os recursos técnicos. por sua vez. na sua totalidade. ou seja. De vez que os atrativos dos sentidos. da qual sempre se poderia ainda tirar algo de valor. Se é verdade que a funcao propagandistica é cuidadosamente ofuscada em se tratando de mfisica séria. Como se as vozes quisessem vingar-se disto. Parece-lhes proximo 0 totalmente estranho: tao estranho. no minimo. sem que suas qualidades especificas sejam sequer compreendidas ou apreendidas pelo consumidor. no entanto. tanto maior é o valor que se atribui aos instrumentos antigos. alto virtuosismo técnico. nao obstante essas conviccoes. do "homem". quiser se atrever a por em dfivida — mesmo que numa conversacao privada -— a importancia decisiva da voz e externe a opiniao de que com uma voz modesta se pode produzir mfisica tao boa quanto a que se pode tocar em um piano de sonoridade modesta. esquecendo-se de prestar atencao a composigao ou a execugao. o qual. no qual o quantum do prazer possivel desapareceu. Escreve Marx: "O mistério da forma mercadoria consiste sim- . O fato de que "valores" sejam consumidos e atraiam os afetos sobre si. O que transparece em tais letreiros monstruosos é o valor de troca. Quem. E infitil perguntar pela capacidade de exposigao puramente musical. em que tratam dos cabelos e fazem a maquilagem. Por outra parte. todos os homens se sintam irmaos ao som das palavras "este é um Rolls Royce". . na linguagem convencional americana. E o mero reflexo daquilo que se paga no mercado pelo produto: a rigor.. Tudo se movimenta e se faz segundo o mesmo comando: o casal de automovel. A aceitagao e o acordo social harmonizam a contradicao. ecliqio popular Viena-Berlim.OS PENSADORES ADORNO V plesmente no seguinte: ela devolve aos homens.__ . que passa o tempo a identificar cada carro com que cruza e a alegrar—se quando possui a marca e o modelo _. sao mais agradaveis do que as situacoes de intimidade familiar e conjugal para as quais se destinam o penteado e a maquilagem. o mero valor de uso — aparéncia ilusoria. O consumidor "fabricou" literalmente o sucesso.é substituido pelo mero valor de troca. 177. fazem parte do mundo da mercadoria. mas por ter comprado a entrada. as situagoes de intimidade. nao porque o concerto lhe agradou. Para elucidar tal fato pode contribuir aquela transferéncia do valor de uso dos bens de consumo para o seu valor de troca dentro de uma constituicao global. sem se reconhe~ cer nele. precisamente enquanto valor de troca.79_.. em conseqiiéncia. A aparéncia de proximidade e imediatidade é tao real quanto é inexoravel a pressao do valor de troca. Having a good time ("Passar momentos agradaveis") significa. como um setor de imediatidade em relagao aos bens. a forma mercadoria reflete também a relacao social dos produtores com o trabalho global como uma relacao social de objetos existente fora deles". A religiao do automovel faz com que. E obvio que no especifico carater fetichista da mfisica: os efeitos que se dirigem para o valor de troca criam a aparéncia do imediato. todo prazer que se emancipa do valor de troca assume tracos subversivos. porém. como propriedades naturais e sociais dessas coisas. sao preparados para o mercado e sao governados segundo os critérios deste mercado. A relacao com o que é destituido de relacao trai a sua natureza social na obediéncia. participar do divertimento dos outros. tanto mais impenetravelmente se mascara o proprio valor de troca como objeto de prazer. A mulher que possui dinheiro para as compras delicia-se no ato mesmo de fazer compras. tal setor se apresenta no mundo das mercadorias precisamente como excluido do poder da troca. para muitas mulheres. De tal processo de substituicao social depende toda a satisfacao substitutiva. na sociedade capitalista -. p. Com efeito. finalmente. A aparéncia de imediatidade apodera-se do que na realidade nao passa de um objeto de mediagao do proprio valor de troca. que os bens da cultura devem conservar. A0 mesmo tempo. e a falta de relagao com o objeto ao mesmo tempo desmente tal aparéncia. Temse perguntado qual seria o fator que ainda mantém coesa a sociedade da mercadoria (e consumo). a seu turno. 1932. como um espelho. que ele coisifica e aceita como critério objetivo. Se a mercadoria se compoe sempre do valor de troca e do valor de uso. na qual. no momento sacramental. contudo. "Fabricou" o sucesso.1 Este é o verdadeiro segredo do sucesso. E neste qiiiproquo especifico que consiste o 1 Das Kapital. os caracteres sociais do seu proprio trabalho como caracteres dos proprios produtos do trabalho. Quanto mais inexoravelmente o principio do valor de troca subtrai aos homens os valores de uso. divertimento que. o consumidor idolatra o dinheiro que ele mesmo gastou pela entrada num concerto de Toscanini. A modificacao da fungao da mfisica atinge os proprios fundamentos da relagao entre arte e sociedade. o qual. assume ficticiamente a fungao de valor de uso. e é exclusivamente a esta aparéncia que os bens da cultura devem o seu valor de troca. O aparecimento do valor de troca nas mercadorias assumiu uma funcao especifica de coesao._ 73 . setor dos bens da cultura o valor de troca se impoe de maneira peculiar. Esta caréncia de relagao baseia-se no carater abstrato do valor de troca. tomo I. toda a posterior substituicao "psicologica". tem como finico objeto e motivo o participar. sob aspectos diversos. Contudo. enquanto totalidade. verifica-se o mesmo fenomeno. O valor de recordacao das partes dissociadas possui na propria grande musica uma forma prévia ou antecipada nas técnicas de composicao do romantismo tardio. o ameacado vé-se recoberto de . A adap- tacao a lei comum é racionalmente apresentada como disciplina. a aparéncia nao é apenas o ocultamento da esséncia. é muito facil compreender de que se compoe na verdade este gosto. na realidade relaciona-se apenas com suas ruinas. Tornam-se depravadas. espontaneamente. neste setor conseguem abdicar de sua vontade. Uma sinfonia de Beethoven. Isto. Tais obras transformam-se em um conglomerado de idéias. A ocupagao efetiva do valor de troca nao constitui nenhuma transubstanciacao mistica. bem como o fazer o que todos fazem. os que em setor algum se sujeitam a outros. Por outra parte. também produz uma tendéncia contraria. Quanto mais coisificada for a mosica. nao somente no sentido de que as poucas que sao sempre de novo tocadas ou cantadas se desgastam como a-Madona -da Capela Sistina. seguem-se do fato" basico de que a produgao padronizada dos bens de consumo oferece praticamente os mesmos produtos a todo cidadao. rejeicao da arbitrariedade e da anarquia. aproximando-o das mfisicas de sucesso. Entretanto. que sao inculcados aos ouvintes através de amplificacoes e repeticoes continuas. jamais poderia tornar-se propriedade de alguém. Se a romantizacao do individuo se alimenta com o corpo da totalidade. imposta pelas leis do mercado. pereceu também a noética musical. executada e ouvida. mediante este processo. tanto mais romantica soara aos ouvidos alienados. o "juizo critico" do entusiasta do jazz. que comumente é colocada no quarto de dormir. Também no ambito da superestrutura. A renuncia a individualidade que se amolda a regularidade rotineira daquilo que tem sucesso. deixando-se enganar totalmente. sobretudo na wagneriana. a moca cujo unico prazer consiste em observar que ela e o seu parceiro "sejam elegantes". destituido de relagao. A igualdade dos produtos oferecidos. O processo de coisificagao atinge a sua propria estrutura interna. Se contestamos a validade do gosto na situagao atual. Diante dos caprichos teologicos das mercadorias. de ocultar tal equacao conduz a manipulagao do gosto e a aparéncia individual da cultura oficial. mascara-se no rigor de um estilo que se proclama universalmente obrigatorio. Corresponde ao comportamento do prisioneiro que ama a sua cela porque nao lhe é permitido amar outra coisa. a necessidade.-» O5 PENSADORES » ADORNO mais recentes. a ficgao da relacao de oferta e procura perpetua-se nas nuangas pseudo-individuais. que tem sua parodia nos tempos dos compassos rigidamente contados. A isto une-se complementarmente a diferenciagao casual no contexto estrito do que é oferecido e preceituado. E precisamente através disto que tal musica se torna "propriedade". tanto quanto a decadéncia do fetiche representa um perigo para o proprio fetiche. A pessoa que no metro assobia triunfalmente 0 tema do filtimo movimento da Primeira Sinfonia de Brahms. a qual forcosamente aumenta na proporgao em que se agiganta o processo de liquidacao do individuo. O consumo. que se legitima pelo fato de estar ao corrente do que é moda inevitavel. sem que a organizacao do conjunto possa exercer a minima influéncia contraria. alteragoes constitutivas. de "achados". A masoquista cultura de massas constitui a manifestacao necessaria da propria produgao onipotente. assim como o encantamento musical. se 0 individuo liquidado aceita realmente e com paixao a exterioridade consumada das convencoes como critério. Tanto no adorador feitichista dos bens de consumo como no de "carater sadomasoquista" e no cliente da arte de massas de nosso tempo. As obras que sucumbem ao fetichismo e se transformam em bens de cultura sofrem. no intuito de conservar o seu carater fetichista. em tal situacao. que todos devem aceitar. deve-se dizer que a época aurea do gosto irrompeu num momento em que nao ha mais gosto algum. os consumidores se transformam em escravos doceis. mas resulta imperiosamente da propria esséncia. faz com que se corrompam. por quem reproduz. montando-os num pot-pourri. Precisa— justificar os arranjos. que desapareceram da propria obra. a conviccao de que a mfisica mais antiga necessita de um toque coloristico renovador supoe que a relacao cor—desenho é esporadica neste tipo de mfisica. Em segundo lugar.32. enfatica e impotentemente. no qual sao esconjurados. objeto predileto dos arranjadores. isto so pode leva-los a se sentirem vocacionados e manipular os bens da cultura com muito maior desenvoltura. intimidade. o objetivo visado é tornar assimilavel a grande mtisica distante do homem. que ressaltariam em cores brilhantes a partir da unidade dinamica do conjunto.OS PENSADORE5 ADORNO cobre. O argumento anula-se igualmente porque. essas razoes sao lamentaveis pretextos. A despeito de todo o falatorio sobre a "nova objetividade". perde seu carater de necessidade dentro da harmonia sinfonica e se transforma. as tergas do fagote no inicio da abertura do terceiro ato de Leonora. que precisamente sublinha as partes coisificadas. a nao ser que algum intérprete famoso os proiba. a técnica do arranjo se converte no principio da coloristica. tais momentos lhe sao injetados de fora. o que trai um desconhecimento brutal do classicismo vienense e de um compositor como Schubert. da qual sao exemplos os lieder para piano transcritos depois para orquestra. Dilacera a unidade poliédrica de obras inteiras e apresenta apenas frases ou movimentos isolados e conjugados. que volta para casa exausto. Os novos fazedores de musica fazem arranjos com toda mfisica de que possam apoderar-se.__ . que sempre possui tracos de carater pfiblico. Precisamente em razao de tal sobriedade. os arranjos acabam tendo custo substancial maior que uma interpretacao da versao original da obra. é imperioso aceitar que a pratica dos arranjos musicais se tem imposto em virtude de motivos sui generis. Além disso. a sobriedade coloristica de Haydn ou de Beethoven tem uma profundissima relacao com a preponderancia do principio construtivo sobre os elementos melodicos individuais e isolados. por galvanizacao. Separa manifestamente os "achados" (idéias criadoras) coisificados e os arranca do seu contexto original. é anulado praticamente a constatacao da riqueza de instrumentagao de que dispoem precisamente aqueles que mais propaganda fazem do arranjo. nas maos de quem o executa. O homem de negocios. ou a cadéncia do oboé na repetigao da primeira frase da Quinta Sinfonia adquirem uma imponéncia que se perderia inexoravelmente se houvesse grande riqueza de vozes e instrumentos. afastar dela a depravacao. tao estereotipados quanto as idéias criadoras. coabitam nos "arranjos" que passaram a dominar permanentemente vastos setores da mfisica. afirrnam que os compositores tém uma técnica de instrumentacao imperfeita. Depravacao e redugao a magia. Diante do que vimos dizendo. Em que pese tal constatacao. Admitamos que a descoberta verdadeira e propria da dimensao coloristica se deu na época de Berlioz e de Wagner. com muita freqtiéncia. assume o carater de um ritual magico. Na realidade. juntados artificialmente: 0 minueto da Sinfonia em Mi Bemol Maior de Mozart. consegue digerir e até _g3__ ' mente porque a obra dos momentos. executado isoladamente. inspiracao e espontaneidade. nao privado. ou entao. a funcao essencial das representagoes ou execugoes musicais conformistas nao é mais a representacao da obra "pura" mas a apresentacao da obra depravada com um enorme aparato que procura. O argumento do barateamento. todos os mistérios da personalidade. irmas inimigas. em uma peca comum. renuncia a sua espontaneidade. A pratica dos arranjos estendeuse e amplia-se continuamente nas mais diversas dimensoes. Antes de mais nada. Invocam toda espécie de motivos para _. que do ponto de vista estético se julga e se condena a si mesmo. Se no campo da mfisica ligeira os arranjadores sao os unicos mfisicos dotados de alguma formagao. que se assemelha mais a Gavota de Stéphanie do que aquele tipo de classicismo de que faz propaganda e para o qual tenta ganhar adeptos. em decadéncia. A ampliacao. No caso de grandes obras orquestradas. Primeiramente apodera-se do tempo. alegam que os arranjos contribuem para 0 barateamento da execugao. Os ouvintes de hoje teriam o maximo prazer em destruir o que os mantém em atitude de respeito cego.OSPENSADORES ADORNO fazer amizade com os classicos "arranjad0s". com a estfipida superacen tuacao dos compassos intermediarios imitativos. porém transforma-os em objetos de entretenimento do tipo das milsicas de sucesso. A ditadura social total confirma o seu poder e a sua gloria pelo selo que é impresso em tudo quanto cai na engrenagem de seu maquinismo.s'p. Tal entretenimento. Os momentos de encantamento dos sentidos. se torna plastico para o ouvinte que nao mais necessita compor o corpo da cancao com d1ferentes cores. em relagao aos ouvintes. alegando que se oferece aos ouvintes uma mercadoria de primeira qualidade.u~ blicitarios que lhes sao impostos. torna-se tao absurda como se tivesse surgido no Dreimaederlhaus. por contradizer 0 material. que resultam das umdades isoladas e decompostas. forma-se um falso equilibrio. e sua pseudo-atividade ja se encontra prefigurada e recomendada do lado da producao. nao obstante todo o falatorio em torno da cultura. e para cumprir os requ1s1to. Todavia. Contudo. que ninguém mais leva a sério. a quem objetar que se trata de mercadoria embolorada. E a pratica do entretenimento elevado. A Serenata de Schubert. quando executado por uma simples orquestra~de cordas. na qual encontrava 0 seu limite a ma imediatidade na grande mfisica. _g5_ . a dimensao do intimo. Para cfimulo dos males.— pelo fato de serem apenas momentos separados do COI'l]l1Ilt0 ——demasiadamente fracos para produzir o encantamento dos sentidos que deles se exige. pre- cisamente por esse motivo. tem-se ainda a ousadia de manter a consciéncia tranqiiila. e manipular tudo com que topar pela frente. O embelezamento artificiale a exaltagao do individual fazem desaparecer os tracos de protesto que estavam tragados na limitacao do 1nd1v1dual a si proprio em face dos negocios. ao som compassado da combinagao de cordas e piano. Trata-se de um impulso semelhante aquele que obriga os disc-joqueis do radio a imiscuir-se como tios e tias nas festas famihares dos seus ouvintes e fingir que se interessam pelos seus pr0blemaSO processo de coisificacao radical produz a sua propria aparéncia de imediatidade e intimidade. Tal tendéncia torna-se tanto mais forte quanto maior é a estabilidade do existente. Na monocromia perde objetivamente a articulacao que lhe da plasticidade na partitura original de Wagner. Igualmente ridiculo se apresenta o Preislied dos Mestres Cantores. A falta de compromisso e o carater ilusorio dos objetos do entretenimento elevado ditam a distracao dos ouvintes. no qual sucumbem hoje em dia as obras consideradas classicas. precisamente por ser excessivamente s0b1'10. difunde-se hoje em todo o campo da vida musical. mas somente analisando o processo em sua totalidade. {mica e ininterrupta. que consiste em diabolicamente levar os consumidores a concordarem com os critérios ditados pelos produtores. que em outras épocas se limitava a acompanhar 0 murmfirio ou tartamudeio da voz humana. Inversamente. e a verdadeira musica desaparece sempre mais. A pratica dos arranjos provém da mfisica de salao. e colorida. replica-se em seguida que é exatamente isto que os ouvintes desejam. sao em si mesmos. o qual a cada passo se evidencia falso. Ao invés disso. Tal réplica poderia ser refutada nao por diagnostico realista do estado dos ouvintes. Neste exemplo torna-se palpavel o antagonismo. mas pode abandonar-se tranquilamente ao som da melodia dominante. que toma emprestada a exigéncia de nivel e qualidade dos bens da cultura. Entretanto. ou aceitar essa pornografia musical que é fabricada para satisfazer as supostas ou reais necessidades das massas. Na pratica ha apenas duas alternativas a escolher: ou entrar docilmente na engrenagem do maquinismo — mesmo que apenas diante do alto-falante no sabado a tarde —. é exagerada e explorada pelos "arranjos". esta afirmagao é ao mesmo tempo destrutiva. da mesma forma como na intimizagao do que é grande se perde a contemplacao da totalidade. pode—se presumir que 0 segredo ou a razao _34_ mais obscura da técnica do "arranjo" reside na tendéncia ou instinto denao deixar nada tal como é. Documents Similar To adorno - o fetichismo na música e a regressão da audição, parte 1 (1)Skip carouselcarousel previouscarousel nextslid+músi..Rádio Nacional - dissertação 1 FinalEstratégias de Mediação Cultural_ Inovação e Experimentação No Serviço Educativo Da Casa Da MúsicaLivrostech-12446Ext Proc Arr Mus Mg IntroducaoVoz e processos criativos em ambientes de ensino e aprendizagemClaudio César Pipe 4Atividade Educação Musical - Representação gráfica da forma musicalDa Cozinha Para PalcoPlano de Curso BETEL e Currículo.docRepertorio Big BandProjeto Musicalrevista10_artigo13Texto_sons_que_saem_do_papel.pdfRelato de Pesquisa - Literatura e Música-A Abordagem Didática Dos Textos.marciaogandoPROJETO PALAVRA CANTADA HELENA PORPOINT.pptxarranjo 21Fichamento o Público Moderno e a Fotografia e Interartes, IntertextoA Musica Como Possibilidade de Trabalho No Ensino MedioFestival Anos 80Mão de Arte_ Jogo de Expres...11116-52138-1-PB.pdf01 Música e Linguagem.docMonografia Maialu CorreiaPaulo Frederico PerformanceA Arte Da Pesquisa Em Performance de Musica Ao VivoPassagem de Som_ Dá Trabalho, Mas Vale a Pena _ David FernandesMaterial Didático para o Canto PopularMore From Fernanda NathaliSkip carouselcarousel previouscarousel next5 HERITIER, Françoise - Masculin Feminin - Introdução, Capítulos 1, 2 e 3Edital.pdfTOLEDO, Dionísio de Oliveira (Org) - Teoria Da Literatura - Formalistas RussosUSOS E ABUSOS DOS ESTUDOS DE CASO.pdf2 - O Conceito de Alienação No Jovem Marx57471045-Kabengele-Munanga-Bibliografia-Sobre-o-Negro-No-BR-2002.pdf1 - Caio Prado Jr - Teoria marxista do conhecimento e método dialético materialista.pdfAfroperspectividade_ Por Uma Filosofia Que Descoloniza - Negro BelchiorBASSI, Francesca. Atos Rituais- Eventos, Agências e Eficácias No CandombléFluxo do Sistema de Justiça Criminal Brasileiro.pdfquadro objeto-método dos clássicos.docxEmentas Ciso.pdfABBAGNANO, Nicola. Dicionario de Filosofia.1 - A Dialética Como Discurso Do MétodoSTAM, Robert - Da Autocrítica à Antropofagia 1964-1971 in Multiculturalismo TropicalAntropologia. In A formação da antropologia americana 1883-1911 - BOAS, F.pdfAntropologia nos serviços de saúde - integralidade, cultura e comunicação.pdf2 - Arremate de uma reflexão - a revolução burguesa no Brasil de Florestan Fernandes.pdfFenômeno, estrutura, sintoma e clínica- a droga.pdfLUHMANN, Niklas. Sociologia do Direito II.pdfPrograma de Disciplina UFPR.pdf7 - durkheim por Filloux - Sociologia da Educação.pdfSimetria e Entropia - Sobre A Noção de Estrutura de Lévi-Strauss.pdfCom - A recepção da sociologia alemã do Brasil.pdfKroeber. O Superorgânico.pdf2 - Caio Prado Jr e o intelectual marxista.pdfFERRELL, Jeff. Tedio ,Crime e Criminologia um convite à criminologia cultural.pdf1P - Ferreira Sociologia da educação.pdf8 - La condicion de la posmodernidad.pdfCiências Sociais e Saúde Coletiva - Novas Questões novas abordagens.pdfFooter MenuBack To TopAboutAbout ScribdPressOur blogJoin our team!Contact UsJoin todayInvite FriendsGiftsLegalTermsPrivacyCopyrightSupportHelp / FAQAccessibilityPurchase helpAdChoicesPublishersSocial MediaCopyright © 2018 Scribd Inc. .Browse Books.Site Directory.Site Language: English中文EspañolالعربيةPortuguês日本語DeutschFrançaisTurkceРусский языкTiếng việtJęzyk polskiBahasa indonesiaSign up to vote on this titleUsefulNot usefulYou're Reading a Free PreviewDownloadClose DialogAre you sure?This action might not be possible to undo. Are you sure you want to continue?CANCELOK
Report "adorno - o fetichismo na música e a regressão da audição, parte 1 (1)"
×
Please fill this form, we will try to respond as soon as possible.
Your name
Email
Reason
-Select Reason-
Pornographic
Defamatory
Illegal/Unlawful
Spam
Other Terms Of Service Violation
File a copyright complaint
Description
Copyright © 2024 DOKUMEN.SITE Inc.