71Adeus à verdade1 Metamorfose é o nosso título geral, e eu vou começar comentando-o resumidamente, porque o meu título "Adeus à verdade", tem muito a ver com a metamorfose, A metamorfose é uma categoria ontológica fundamental para mim. O que quer dizer uma categoria ontológica? Quer dizer que à luz dos autores que considero mais pertinentes para a nossa cultura filosófica atual e que, naturalmente, são os dois que mais estudei Nietzsche e Heidegger, a própria noção de "ser", que é aquela da qual a filosofia se ocupou desde os tempos dos pré-socráticos, deve ser pensada sob a categoria da metamorfose. Isto é, um dos resultados da filosofia de Nietzsche e de Heidegger, que agora não vou ficar resumindo, mas que, de uma certa forma, esclarecerei brevemente ao longo de minha exposição, é que o "ser" não "é" mas "acontece", advém. Como se chega a essa concepção do "ser" que depois é somente um modo de dizer que o "ser" não é? Alguém pode até dizer: certo, O "ser" não é uma coisa caso contrário não seria o "ser". E esse era um problema que certamente já tinha Aristóteles quando falava das categorias, das substâncias e dos acidentes, mas a substância era justamente somente o que era verdadeiramente, isto é, a expressão platônica ontos on, aquilo que é "substancialmente", aquilo que é "verdadeiramente ser", que sempre foi pensada a partir de Platão, certamente, e depois de Aristóteles e da tradição filosófica ocidental como aquilo que está. Também na nossa palavra substância, do latim substancia, que significa está sob. Bem, está sob no sentido que permanece nas variações de cor, de forma, etc. 1 VATTIMO, Gianni. Adeus à verdade. In: SCHULLER, Fernando; SILVA, Juremir Machado da (orgs.). Metamorfoses da cultura contemporânea. Porto Alegre: Sulina, 2006, p. 71-89. O engenheiro Taylor escreve o seu livro sobre a organização científica do trabalho em 1907. fazer o trabalho compartimentado. o surrealismo. aquilo que dura. no existencialismo em geral que retomava as idéias de Kierkegaard e falava da existência individual e da liberdade. é um problema de Parmênides. cada um girando o seu próprio parafuso. aquilo que resiste. isto é. Para produzir mais. em partes. o dadaísmo. Existe uma quantidade de outros aspectos da cultura da época.a Europa se sente impelida a intensificar a produção e a racionalização da sociedade. Por exemplo. como diabos se faz depois para explicar o "tornar-se"? Mas este. em relação à industrialização. tinha motivos seus. essa concepção do "ser" foi duramente discutida por Nietzsche no século dezenove e por Heidegger no século vinte. em suma. o expressionismo literário. lembrem que a FIAT. entre outras coisas aquilo que não muda. nós herdamos uma concepção do verdadeiro "ser" ou do "ser" verdadeiro como aquilo que está.72 Então. nascem no final do século dezenove. dos anos trinta me parece. é o que se chama de trabalho taylorista. profundos. são todos modos nos quais as artes e. Esses são anos nos quais . uma quantidade de gente que se pre- . Heidegger. como fábrica de automóveis. Porém. em que ele é um operário na linha de montagem. digamos. Tudo isso perturbava muito os filósofos.o filme de Chaplin intitulado Tempos Modernos. como fábrica de automóveis. Vamos começar por Heidegger alterando a cronologia. os sociólogos. Um exemplo do espírito que circulava na época pode ser encontrado num filme mais tardio. os poetas. em sintonia com grande parte da vanguarda intelectual européia da época. por exemplo. Parece-me que foi mais ou menos nos mesmos anos. e a FORD. é necessário organizar-se. os artistas. na arte abstrata de Kandinski. no início do século vinte.seja preparando a primeira guerra mundial. toda esta sensibilidade do mundo humanístico e da cultura em geral. todos os "ismos" das vanguardas artísticas do início do século como o cubisrno. como todos sabem. obviamente. pode pensar nas artes. se revolta contra o perigo da objetivação universal. seja depois de 1918 . Naturalmente se não muda. Em todo caso. a cultura humanística da época. depois se tornou marxista. Eram áreas em que o conhecimento fenomenológico rigoroso não entrava. deve continuar o trabalho. Isto é. um rigor comparável ao das ciências naturais. com cálculos. então. Como numa fábrica. publicou um livro intitulado O espírito da utopia. com uma citação do sofista Platão que diz que há muito tempo nós não nos perguntamos mais o que significa "ser" e sobretudo até nos esquecemos do motivo pelo qual nós nos fazemos esta pergunta. Porque. tinha idéias mais aceitáveis. ao conhecimento fenomenológico. Notem bem que. é um perigo mortal para a liberdade dos indivíduos. espirituais. E este era um outro aspecto do mesmo problema: não é que aos cientistas morais. isto é. etc. surgia toda a discussão sobre como defender as ciências do espírito. E o que se fazia daquilo tudo? Tudo era reduzido somente à sensibilidade individual. E Kant. em que devo passar um componente concluído ao meu vizinho.73 ocupava. Tudo isso escandalizava muitíssimo Heidegger e Bloch. ou seja aos historiadores. a aquela que a moral nos impõe. no final do século XIX. a razão prática. era um problema que tinha sido colocado sobretudo pelo historicismo alemão. O imperativo categórico kantiano seria fazer sempre aquilo que os outros esperam de nós. aos filósofos. em 1918. A razão prática era a crítica do juízo. obviamente. Filosofia. intitulada Ser e tempo. Importava defender uma área que era aquela que Kant subtraía à razão pura. Ernst Bloch era um grande pensador. como o pensa a tradição filosófica desde Platão até Nietzsche. Heidegger começa sua obra de 1927. Teologia. se o verdadeiro "ser" é a objetividade. e. que são ciências experimentais com leis. a realidade da nossa existência é a organização racional do trabalho. Kant que. Direito. um dos temas filosóficos mais difusos e debatidos era o tema da relação entre as ciências da natureza e as ciências do espírito. Coloca essa pergunta não porque deseja redefinir o "ser" mas porque considera que pensar o "ser". por sua vez. no qual se dizia. interessasse o método das ciências do espírito. com previsões. o juízo. sempre com a razão pura. era como uma . como fazemos para dar para as ciências morais (Moral Sciences) como História. tinha falado no século XIX da ética como ética industrial. é muito pouco objetivável. impor as nossas projetividades utópicas à ordem objetiva do mundo que não nos agradava ou que nos agradava pouco. medos. etc. Era isso que o existencialismo do início do século XX defendia. vocês não podem objetivar essa coisa. O "ser" não é nada além que o acontecer de horizontes históricos dentro dos quais os entes se tornam visíveis. tudo aquilo que tem a ver com a nossa vida. Por que devemos pensar assim? Porque se não pensamos como objeto em primeiro lugar nós não chegaremos a lugar algum.com a reflexão sobre "ser" e tempo. Não é que nós criemos as coisas. não sabemos como é. digamos 'a verdade. O "ser" não é nada mais do que temporalidade. modificá-lo a partir do seu interior. memórias.74 filosofia do expressionismo. Ou seja.não que ele use exatamente a palavra metamorfose. fora das nossas percepções. Por que o ser humano não ser chamado "ser"? Porque tem um passado. esperanças. o mundo. a idéia de que aquilo que tentava fazer não era ver como é o mundo. então não vamos desenvolvêIa nós. escolhas? Todas essas coisas não podem cair na categoria do objeto. expectativas. obviamente. Não que simplesmente chegamos e dizemos que exis- . Se vocês dizem "eu te amo" a uma garota ou a um garoto. isto é. Então. mas acho que podemos usá-la legitimamente . mas também não a ordem dos sentimentos. ou seja. O que vão descrever? Que o pulso acelera quando vêem a pessoa amada ou que ficam vermelhos no rosto? Não faz sentido. Como se chega. a idéia de que o "ser" seja essencialmente metamorfose é aquela à qual Heidegger chega . Kant dizia que o mundo se constitui na nossa percepção espaço-temporal dos objetos. a nossa vida particular. poder-se-ia até colocar sobre o "e" o acento do verbo ser. então. mas o mundo não tem uma ordem a não ser porque é visto por um sujeito racional maduro que funciona segundo as prioridades de espaço e de tempo e depois as categorias de causa. de substância. mas sim. um futuro. da objetividade. a pensar que o "ser" não "é" objetivamente mas "é" o que acontece? Ali temos que colocar a herança de Kant. Em italiano. Mas esta não é uma discussão que Heidegger tenha verdadeiramente desenvolvido. em suma. é o sistema das prioridades kantianas que torna possível falar do mundo como um conjunto de objetos. Mas. A idéia de cavalo garante que quando dizemos cavalo aludimos sempre à mesma coisa. até um certo ponto. aquilo que Heidegger chama de "ser". as mesas. Este era Kant que. quando ter dor de barriga ou não. que se aqui apagamos a luz não se enxerga mais nada. isto é. Obviamente. naturalmente. Isto quer dizer que algo acontece fora de nós que não depende na nossa vontade explícita. que faz ser possível falar das coisas como objetos existentes é a luz do "ser". nós não podemos aqui . ou seja. depois resolveram esse problema de outra forma.75 tem as cadeiras. o que faz? Pensa que aquilo que torna possível as coisas. coisas. O "ser" é a própria luz. aquilo que era essencial era que o mundo organiza-se somente ao redor de sujeitos que colocam no espaço e no tempo os acontecimentos. o mundo. mas não da própria luz. as estruturas estáveis são já alguma coisa que acontece dentro dos horizontes do "ser". ela se torna visível dentro de um horizonte iluminado. etc. os idealistas. Mas. O "ser" não é algo que está dentro da luz. como a luz que ilumina aquelas coisas que depois vemos de fato. Não temos .dizer que o espaço e o tempo são estruturas eternas como seria o triângulo da geometria e os objetos sobre os quais nós tratamos. E por que essa luz deveria ser a metamorfose? Porque o caráter de permanência já faz parte do caráter dos objetos que são vistos na luz. Podemos dizer. Mas ao "ser" não podemos atribuir a mesma eternidade que atribuímos aos objetos matemáticos ou aos objetos da natureza. mas também temos que pensar que a luz vai e vem. Então. quando morrer ou não. para nós. no sentido que um cavalo é sempre um cavalo. nenhum de nós se identifica com a luz. nunca afirmou que nós produzimos a realidade quando a percebemos. como Fichte e Hegel. isto é.e surge sempre o paralelo com Kant . quando sofrer ou não. pessoas. Heidegger. as pessoas. Então. fatos. tudo o que acontece e organiza o mundo. mas Kant nunca se tornou um idealista empírico. Certamente existe algo . os teatros. as coisas. nunca foi tomado por louco por quem quer que seja. Por quê? Porque não somos nós que decidimos quando sentir frio ou calor. É como se nós nos revoltássemos contra algo que até tem as raízes em Platão. diabos. que pensa no "ser" como estabilidade. mas é metamorfose. até para os padrões de Parmênides. etc. pela tradição metafísica. não me importa se é estável. sem defeitos. Se o "ser" nasce pronto. uma história da idéia do "ser" que faça com que nós mesmos 'nos tornemos objetos. Até aqui alguém poderia chegar e dizer: "Tudo bem. Aristóteles. lido com os objetos. isto é. relativamente estável. isto é. existe o mundo totalitário." Sim. já que o "ser" não é deste ou daquele modo. Dizer que algo é metamorfose não quer dizer nada. pleno. o que diabos somos? Por que. Pensar no "ser" como estabilidade objetiva significa renunciar à própria existência de seres livres. estaríamos no mundo? Por que motivo existiríamos? . experimentei que essa idéia de estabilidade do "ser" funda o mundo da totalização racionalizante. às vezes está de outro modo. é também mais confortador. por Aristóteles. mas digamos que. Não se pode dizer que o "ser" não é estável. Portanto. o que fundamentalmente não muda? Nós. porque de verdadeiro aqui não temos nada. quem o diz com certeza? Escreve-o Nietzsche (e não podemos dizer "lo dice Nietzsche" porque em italiano soaria cacofônico). Que viole a nossa liberdade. perfeito. é verdade que no fim da época como aquela que inicia com Platão e chega até Nietzsche.76 nenhuma obra que diga que o "ser" possui aquela estabilidade que lhe era atribuída por Platão. como objetividade. instável. tudo isso para explicar que pensar no "ser" como metamorfose não é mais verdadeiro. renunciar a própria existência de seres livres significa pensar que estamos no mundo para fazer algo que já está programado. Basta que eu esteja na luz e veja os outros e veja as coisas. Escreve-o Nietzsche porque ele pensa exatamente que a história do pensamento ocidental é a história da afirmação da objetividade e da dissolução da objetividade. Mesmo que ainda não estivéssemos na época da indústria racionalizada do início do século XX. Às vezes está de um modo. existe o mundo de Chaplin que aperta parafusos. Não me interessa. Este não é somente um discurso teoricamente mais válido. entretanto. nós não devemos aceitar uma história do "ser". Isso Heidegger diz e não diz. mas que nos incomoda. isto é. era toda uma questão que se referia a quê? Ao modo como a cultura ocidental pensou o "ser" com todas as conseqüências que isso trazia. Assim. Quando Nietzsche escreve que Deus morreu. na vida religiosa. . É um problema gravíssimo esse. Isto é. Porém. baseado nisso. se desenvolve sob o perfil do monoteísmo. ele pensava na predestinação. Os grandes problemas da teologia católica. a ciência física. ridicularizadas. Por exemplo. Deus. que havia retomado o pensamento grego. discutidas. digamos. Mas antes nos servia e como nos servia! O homem das florestas era como um animal que rodeava sem lei nem honra. ou seja. que era dominante no mundo da teologia católica da época. uma única ordem. por exemplo. pensava Deus e o homem. como havia explicado Max Weber. que tinha começado protestando contra a teologia. o que disse exatamente? Disse que deus atualmente é uma representação que não nos serve mais. e os cientistas desenvolvem as tecnologias baseados nessas descobertas. eram: como se justifica a liberdade humana? Somos os escolhidos? Não somos os escolhidos? Quando eu escolho o faço livremente? Mas Deus já sabia? Sim. Não existem tantas divindades no mundo das quais depender. água de Netuno. Depois naturalmente. calor de algum outro deus e assim por diante. à existência da sociedade. até por causa da predestinação. Existe um único Deus.. e Newton desenvolve essa ordem. subjazia a nossa própria existência pessoal. porém. Então. porque as aparências vão e vêm. funda até a ciência. todas as conseqüências de pensar o "ser" como estabilidade tinham sido criticadas. se o "ser" é estável não pode deixar de sê-lo apesar das aparências. essa problemática existia. já sabia. deve estabelecer normas. Estas normas são tão ou mais fortes se representam à vontade de um "ser" transcendente. o restante se organiza. A ciência. Mas se o é apesar das aparências. o que podemos fazer a um certo ponto? Nada.77 Heidegger tinha iniciado também como estudante de teologia e tinha toda uma série de problemas ligados ao modo em que a teologia medieval.. Até por Nietzsche na sua obra. a Alemanha é pátria de Lutero. Depois entra em acordo com os demais. etc. não era somente uma questão de se defender da objetivação. E isto é importante por quê? Porque nos ensina que. que o perturbavam da manhã à noite.. neste caso também. digamos os grecizantes. que vocês tranqüilamente possuem. acreditava que estava matando o Deus da Bíblia. mas para os rapazes: seja homem! E vocês respondem: bem. da teoria cristã. que grecizaram o Deus da Bíblia. a tua . sua mãe e sua irmã. que diz que não devemos mentir. Então porque deveríamos continuar a mentir. que eram grandes coisas reservadas ao Pai Eterno. não é que Deus apareça principalmente nos raios. na realidade. homem eu sou ou não. Então. quando já inventamos tudo isso. Porém. Mas. temos uma lei social que é suficiente. quando . Por que me dizes que devo sê-Ia? E replicam: porque tu és! E vocês pensam: então. Vejam bem que eu. como dizia. com valor divino. Deus te fulmine! É uma frase que se dizia e que ainda hoje se diz. o Deus de Nietzsche que morre é o Deus dos princípios absolutos. o deus da metafísica é o deus da ordem autoritária. São somente os gregos. não o deixavam fazer nada do que queria. Nasceste assim. E vocês replicam: mas realmente não me sinto muito bem assim. Tem inclusive uma lei. não para as senhoras naturalmente.. Muniz Sodré. Não só ele mas também as leis que tínhamos prometido respeitar. pastor protestante. então. Fazer com que façam alguma coisa em nome de uma natureza de vocês como se fosse uma lei moral. se Deus se revela supérfluo. citando-me. é toda uma outra conversa. que acredito ser um bom cristão. Isto é. uma mentira supérflua. Mas por que motivo alguém deveria conhecer a essência verdadeira das coisas? Para poder impôlas! Quando alguém diz. quer que vocês façam alguma coisa em nome de uma natureza de vocês. torna vocês escravos e vocês devem respeitar o padrão. ah! Nietzsche. ou seja. Temos a ciência que nos protege dos temporais e até os pára-raios. por que devo vir a sê-Ia se já o sou? E todo esse discurso é porque quer que vocês vão para a guerra. naturalmente. se eu já sou.78 Depois de fazermos tudo isso. de nos colocarmos todos de acordo. não falo do Deus cristão. falando da existência de Deus. se devo ser sincero. mas ali havia todo um problema edípico contra o seu pai. o Deus dos fundamentos. então. Deus deixa de ser necessário. E que até deve impor aos outros. está unido. até vinte anos atrás. A metafísica. das uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo.79 natureza é esta. também. levo-te ao restaurante. se vives na Itália e queres te divorciar. tu ainda queres te atirar. Porque a natureza do matrimônio é indissolúvel. os guerreiros são guerreiros. não podias. e te trato assim por uns quinze dias até não deixando que tu saias sozinho. como aqueles que vão à missa. desde sempre. digamos. Mas certamente não à Igreja hierárquica. Os escravos são escravos. somos vizinhos do Vaticano. dos casamentos. Na Itália. dou-te um quarto aquecido. Ou seja. mas pouco favorável ao Papa. na tradição. pois sente que esse é o seu dever. hoje. Mas como? Por exemplo: Queres te atirar de uma ponte e. sempre foi. Sou a favor da Igreja como igreja. faço um belo sermão sobre o valor da vida. ao cinema. em algum lugar que alguém. como um animal que deve ser contido. Tu não deves te matar. O autoritarismo é quando alguém quer lhes impor algo em nome de algum grande princípio. . Converso contigo. Repito. a base de todo e qualquer autoritarismo. Não posso te respeitar se te trato como uma criança. eu te paro. isto é. mas. Mas. se eu tenho princípios diferentes? Por exemplo. Se. porque tu és um sujeito como eu. aos que querem impor. Olhem que o próprio Platão tinha uma visão da sociedade bastante rígida. tudo está junto. e cada um responde a sua própria natureza. conhece melhor que todos os outros e que depois tenta impor aos outros. depois de quinze dias. acreditam. atira-te. eu sou um bom cristão. caminha junto. ao mesmo tempo. podes. etc. que é a identificação do "ser" com algum dado estável de uma vez por todas. tentam viver descentemente. pela tua capacidade de entender. Nem se fala. escritas. o respeito que eu tenho pela tua vida é o respeito que tenho pela tua liberdade. A idéia de que existam leis naturais. sobre as quais na Itália quase nem se fala porque é um tabu. os mecânicos são mecânicos. são numerosas as pessoas contrárias a isso. mas. Se tu queres dissolvê-Ia és contra a natureza. Não existe. não se pode. obviamente. entre outras coisas. como um burro. porque a caridade ao próximo é respeitar aquilo que ele deseja e quer. Mas se as coisas que ele quer não são baseadas na verdade. do inimigo. lo faccio fuori. posso até acabar com ele. tanto pior para ele. sim. etc. como se sabe.80 o amor pelo próximo é amor pelo próximo. mas nunca aparece nele. não lhe dou ouvidos. mas ele nunca escreveu de fato. a um certo ponto. diz sempre que não há liberdade sem a verdade. Pobres dos judeus. depois. mas sou ainda mais amigo da verdade". coitados. com esses círculos viciosíssimos. Tudo se concatena. quem sabe tentando não fazê-Ias sofrer tanto. Essas seriam as razões fundamentais para dar razão a Nietzsche e a Heidegger sobre o "ser" como existir. Se Platão se manifesta contrariamente à verdade. Pensar no "ser" como evento significa perguntar-se como o "ser" se dá na nossa época. vamos construir algumas câmaras de gás. dentro de certos limites. é bem feito. não o que o "ser" é eternamente. é um mote que se atribuiu a Aristóteles.. Todo o mecanismo. Amicus Platus sed magis amica veritas. um copo de vinho antes. na Igreja. é assado. Um dos grandes motes que sempre regularam a metafísica na tradição européia. Traduzindo: "Sou amigo de Platão. como se costuma dizer em bom italiano. dos homens. Porque. . ajudá-lo a se sentir mais contente. Isto é. mas vamos acabar com eles. na moral (etc. depois. tento até vetá-Ia. inclusive o dos campos de concentração israelenses. pensar no que o "ser" é eternamente já significa abraçar a tese do adversário. se o discurso dele está sendo difundido. está em algumas velhas biografias dele. porém sabe-se que para fazer uma raça humana verdadeiramente perfeita é necessário exterminá-Ias. vocês já contemplaram tudo. não há caridade sem a verdade. eu posso me lixar para com o próximo. aliás. é mal feito. É assim. Tanto é verdade que tanto Levinas quanto Adorno sempre escreveram que a metafísica é o início de Auschwitz. sendo assim. arquiviciosos. bem. era Amieus Platus sed magis amica veritas. vamos organizar as coisas. se realmente é necessário. E. se continua. tu deves ser aquilo que és. se existem essências verdadeiras que transcendem à existência concreta dos indivíduos. O discurso católico.). Vamos. por exemplo. quando nós falamos sobre como se dá o "ser" na nossa época. temos que nos dar conta de que se o "ser" não é. um prete (padre) que está no meio. mas a experiência não acontece quando eu vejo um caderno aqui diante de mim.81 Como se dá o "ser" na minha época? É aqui que entra em questão até a noção de pós-modernidade. pois nós mudamos. mas acontece. o modo como o "ser" acontece na nossa época. essa é a experiência dos empiristas. O que é a nossa época? Quando começa e quando acaba? A nossa época. que é uma noção filosófica. Porque é como a tentativa classificar em uma categoria. Se o "ser" aparece.. Então. Quero dizer.vocês são uns coitados. para outros em outros períodos. a televi- . a minha época é aquela em que eu mesmo vivo dentro dos mecanismos que me envolvem. quando jogo com as palavras em italiano. Isso era aqui Ia que faziam os empiristas. não é que posso olhá-Ia de fora. se não posso olhá-lo de fora e se acontece é algo interno. em um conceito. integramos. quando encontro uma pessoa pela qual me apaixono ou que me abandona. vejo isto. como dizia Aristóteles. Sim. Então. Então. sempre com um ar de superioridade. é o Erfahrung do qual falava Hegel. se fosse algo objetivo. então. acontece de uma forma que também nos envolve. digo que eu sou um intérprete. Porém. depois se imprime a imagem na minha mente. depois a elaboro. Eu. no "ser" estamos envolvidos e perguntar-se o que significa o "ser" na nossa época não é absolutamente absurdo. e não simplesmente o empirismo. inter (meio) prete (padre). eu posso somente interpretar. entre outras coisas. É verdade que alguns podem dizer: como podes pretender saber o que é a tua própria época?' Eu respondo: bem. a experiência verdadeira é aquela que temos quando fazemos de fato a experiência. para alguns começa no ano mil e acaba em mil e novecentos. Essa é a experiência. algo com o qual eu estou envolvido. nós os empiristas. enquanto. acontece também quando eu dou de cara numa parede. isto é.. estamos simplesmente refletindo sobre a nossa experiência. isto é. aqui. e diziam . eu poderia descrevê-Io: tem dez categorias. substância mais sei lá eu O quê. Tudo isso é muito dúbio ou muito vago. em 1963 ou 1961 .descreve como paradigma e como mutação de paradigma.entre muitas aspas. Aconteceram mudanças paradigmáticas. . nós vivemos hoje numa situação que não é eterna e que também não é o prosseguimento linear daquela de 1500. naturalmente. do "ser sendo". Nesta época até a verdade possui uma essência diferente. . na Transilvânia. Em 1700. o modo de alguma coisa acontecer é a sua essência. abrir os túmulos porque alguém tinha denunciado que ali havia um vampiro. Este é o discurso. Falei de 1700. fez uma experiência crucial para demonstrar que não existem bruxas e que não existem vampiros. como é a essência do "ser" da nossa época? A essência da verdade da minha época? O que aconteceu. A palavra essência. mas somente metamorfose. depois de Nietzsche e de Heidegger. com a verdade? Se nós descobrimos. porque não é um dado objetivo . Essa é uma mudança de paradigma. é pronunciada como verbo. Em 1600. isto é. são manchas do vidro que você colocou na frente do meu olho".se nos demos conta de que o "ser" não pode ser objeto. etc. Hoje. mas aquilo que Thornas Kuhn autor de A estrutura das revoluções cientificas. Então. obviamente. o ptolomaico. como sabem os que leram Heidegger. trezentos anos atrás. Nós sequer cogitamos isso. esse é um exemplo que poderia ser muito discutido e pouco provável. acontecimento e instituição de mundos históricos. teria dito: "não. isto é. Certamente. esquecemos isso. como se fosse o particípio presente da substancialidade (essentità). dasein. jamais. Ele usava como exemplo um ptolomaico e um copernicano no século XV e sustentava que. Simplesmente. se queimavam as bruxas com normalidade. O que quero dizer é que ninguém. os policiais do império dos Habsburgos ainda iam em certas zonas da Europa centro-oriental. a mídia. é alguma coisa como esta: acontecem transformações em nosso horizonte que não são concatenadas argumentativamente com aquelas que as precedem.82 são. se um copernicano desse um binóculo a um ptolomaico e dissesse: "olha ali as manchas da lua". não sabemos se aqui tem um vampiro ou uma bruxa entre nós. mas de horizontes que mudam. através do qual se poderia passar de um para o outro. Se queremos demonstrar algo em termos de física quântica. É como se eu dissesse: para entender a religião. nós as aceitamos como certas. deves te tornar um frei. devemos encontrar um público educado para essa linguagem. Então. Por exemplo. mas somente dentro daquele conjunto de coisas. Mas o que significa? Tudo isso pode até fazer sentido. por exemplo. quando eu digo que o "ser" é o acontecimento de horizontes históricos que não possuem um meta-horizonte que os coloque juntos. que nós não checamos. às vezes. Esse discurso. . como a vida. sobre outros perfis. nós estamos dentro de horizontes históricos que constituem um conjunto de premissas para nós. É a mesma coisa. segundo a lógica que se adota. dentro daqueles horizontes demonstramos ou falsificamos proposições. que um horizonte histórico. também possui critérios para estabelecer se uma coisa é verdadeira ou falsa. pois vão começar a ver como de fato estão as coisas. como óbvias. antes de mais nada. temos. dentro de uma época. está lá. Vocês têm de mudar vocês mesmos. "o gato de Schrodinger".. que atravessa um limite e depois desaparece . que se demonstra ou se falsifica. às vezes não está. digamos. porque nós somos diferentes. eu digo. porque se não te tornas um frei não vais entender. que. não acreditam? Mas rezem. tem a ver com a essência da verdade. Pascal dizia já: "Vocês têm problema de fé. eu nunca entendi muito bem isso. tanto Muniz Sodré quanto Michel Maffesoli.83 Existem condições de experiência que não mudam de jeito nenhum porque são heterogêneas. mas existe uma entidade sobre a qual falam os físicos quânticos que é o "gato de Schrbdinger". vejam bem que aquilo que dizem.." Não é que vocês podem começar a acreditar. Uma vez.. de nos tornar físicos quânticos. quer dizer. Por quê? Porque é a verdade formal. mas não podemos expor isso em termos cotidianos. Mas. eu falo mais ou menos essa mesma coisa. seja a de Popper ou não. muitos cientistas falam sobre isso com racionalidade. Certamente o faz. rezem uns rosários para acreditar. . aquilo.porque os torcedores fanáticos são um problema. o que tem a ver? Se adotarmos a lógica de Popper.se torna. porque a emoção está ali. etc. uma intérprete confundiu o Popper com Harry Potter. O paradigma é este. a abertura do "ser" é esta. naquilo que observava Maffesoli existe verdade. E o tradutor de espanhol traduzia: Harry Potter também. porque nunca se sabe até aonde vão esses horizontes. falsifiquem mas não verifiquem. Quando passo por outras coisas..". existe a' idéia de que nós experimentamos. tudo isso. isto quer dizer que a nossa verdade é encontrada na medida em que participamos da vida de uma comunidade. Não é que conheça somente Beethoven. experimento-as. que existem esses grupos que se comportam como os torcedores fanáticos . é um problema. é um comportamento que compartilho com outros.acredito nisso no nosso mundo. mas como é que tu começaste a pensar nisso. Estou tentando conectar essas coisas ao que diz Michel Maffesoli. o que é Ótimo. E. mas os outros podem até me dizer "me desculpe. somos pessoas que pensam numa perspectiva.. . mas.84 no parlamento europeu. e os Beatles me dêem nojo. em outros mundos seria difícil reconhecer que fosse assim . O meu horizonte de pressupostos nunca está assim rigidamente colocado como se fosse um objeto. Porém. existe todo um mecanismo pelo qual efetivamente a experiência da verdade . Mas esses instrumentos nós possuímos. isto é. Por exemplo: até que ponto eu posso entender uma obra de arte? Tenho que tentar. Não é nada bonito de se ver. etc. os torcedores fanáticos destroem uma cidade inteira por estarem irritados com o juiz. antes de qualquer coisa. porque. antes de mais nada. enfim. De qualquer forma. que diz. . uma experiência de comunidade. para falsificar ou verificar uma proposição temos de possuir alguns instrumentos. Naturalmente a pergunta que surge é: então cada pessoa fica fechada dentro do seu horizonte e não pode nunca sair? Não. uma identificação de origem que nos permite depois aceitar ou recusar certas propostas. quando fala que existem as tribos. efetivamente. se tinhas lido isso.. Eu tinha uma pessoa que fazia um discurso e dizia: Popper também. E todos pensavam: Harry Potter. conhecedores de música. Ou seja. se entendes. o imperador. desfrutamos também do fato de fazer parte do grupo que desfruta daquela obra. ao que parece. escutar a Traviata é compartilhado com todos aqueles que são capazes de ouvir a Traviata. etc. A mesma comunidade estética está também na base do conhecimento científico. os outros a compartilham e fim. ele fala dessa coisa. Isso tem a ver com a sua experiência na ópera? Eu acredito que sim.85 No parágrafo nove da Crítica do Juízo de Kant. Na nossa sociedade. isso se sabe. se multiplicou a quantidade de agentes que recolhem e distribuem informações. Porque eu digo que essa concepção da verdade é uma coisa moderna tardia ou pós-moderna. não poderíamos nem formalizar a nossa linguagem para criar a física. gente de bem. isto é. vai ao teatro da ópera. que torna possível as linguagens especializadas. a primeira verdade. Então. Nas sociedades tradicionais. gente que pode cantarolar a ópera. é óbvio que é assim. por sorte. Como existe uma só que é aquela da autoridade. porém. mesmo que pareça que não fale disso. se alguém vai à ópera para ver a Aida. veste um terno escuro. que isso tem a ver. apesar de todos os monopólios. a Traviata. A primeira verdade dentro da qual estamos e que torna possível todas as outras. Isto é. em resumo.o papa. Mas veja . gente elegante. etc. sabemos que essas são todas interpretações dos fatos e até podemos pensar mais: será que os fatos existem? Porque alguém pode sempre dizer. etc. os jornais. não existem dúvidas. que é uma experiência diferente de ir a um teatro popular. Falando em obras de arte. vamos dizer. gente rica. Nós. quando desfrutamos de uma obra de arte. etc. nós vivemos sempre na base de um compartilhamento de comportamentos existenciais que é. nós. as televisões. se não falássemos a mesma língua. o dono da fábrica . O seu prazer de.. é o que Kant chamaria de comunidade estética.é difícil distinguir as nossas crenças da verdadeira realidade. tens ele ir ao local. porque quando existe um único agente de verdade na sociedade . todos nós sabemos disso. se queres distinguir a interpretação dos fatos.. a matemática. é mais difícil descobrir a interpretação. Se não existisse uma comunicação entre nós. fundo. para nós. de certa forma. e não de olhar objetivo sobre o mundo porque um olhar objetivo sobre o mundo não existe. E que eu posso depois tentar desvendar. como nos a priori de Kant. Exclamação: "agora ele também vai dizer que devemos fazer caridade?!" Não. para fazer diminuir o preço dos remédios con- . é sempre mais evidentemente um negócio de relações interpessoais. porque naquela posição vimos somente um pouco. que se ouvimos uma batida sob a janela. depende sempre de onde te posicionas para olhar e se és. Ou seja. Aonde vai parar todo esse discurso sobre a verdade que muda? Antes de mais nada. onde te posicionas para ver um acidente que aconteceu na estrada? À direita. Bem. Ao se tentar estabelecer como aconteceu um acidente na estrada. ficam mentindo. Eu comecei a me questionar sobre esses problemas quando fazia grandes protestos contra Bush e Blair que diziam existir armas de destruição em massa no Iraque e ficava exclamando: são falsos. A interpretação é tudo isso. que nós compartilhamos. peritos. de verificação possível. não se interroga só as testemunhas oculares. Um não pode se tornar tudo. O mun do acontece somente organizado em primeiro plano. sem pudor C0ll10 fizeram. por favor! Não se trata de fazer caridade. por acaso. a meu parecer. Significa que estou dentro de um sistema de fatos que. olhamos pela janela. mas se vai a um tribunal onde existem regras. em suma. E me questionei: se os dois tivessem mentido. com nosso mundo e o conhecimento das verdades específicas é como lidar com os especialismos e a imediatez da vida. devia chegar numa transformação que eu indicaria assim: "da verdade à caridade". é apresentado já pré-cozido. existem linguagens específicas para cada campo de verdade possível.86 bem. ou olhas pela janela. mas depois vamos assistir à televisão para entender exatamente o que aconteceu. ou lá. Mas significa que a verdade. amigo de um dos dois que bateram tens uma tendência a também ver a coisa. A relação entre esses conhecimentos difusos. ou do outro lado. de uma forma diferente. É tão verdade. mesmo estando presente. de dar esmolas. dentro do nosso projeto. por exemplo. ou seja. Importa somente no momento em que se torna relevante para um interesse seu. nem o ferver da água no laboratório. Mas. Muniz Sodré me impressionou muito com o seu discurso sobre a diversidade. o fazemos porque estamos interessados em concluir . e que eles estavam mentindo. nós somos quase uns budistas. eu ficaria tão escandalizado') Não me importaria absolutamente nada. não sei nem se tinham razão ou não. eu teria ajudado a mentir sempre que necessário. na verdade. parece que agora até se sabe que. bem pelo contrário. na África. é dado corno algo que deve ser interpretado. além disso. estamos envolvidos nisso. Simplesmente não podemos nunca objetivar nada. nós também dialogamos com essas coisas. que nós dizemos que vimos como estão realmente as coisas quando todos concordamos uns com ás outros? Ou seja. a interpretação está toda aqui. por exemplo. se existe ainda um terceiro ponto de vista. Eu. estamos dentro. porém.87 tra a AIDS. controlamos a temperatura e acendemos o fogo. supõe-se que sempre é feita por alguém que está sentado na cadeira alta do árbitro de tênis. que era pura diversidade externa. fechamos as janelas. A quem interessa a comparação da cultura islâmica com a cultura cristã? Ao historiador. nós vamos concordar? Será que não é exatamente o contrário? Ou seja. Mas a comparação. Porém. Então. francamente. eu não ficaria tão escandalizado e. porque ali também. Tudo bem. como eu dizia no início. vendo como verdadeiramente estão os fatos todos. Isto tem a ver com a idéia de "ser" como metamorfose? Bastante. quem sabe. porque. uso-os como exemplo. é basicamente o mesmo discurso que eu fazia antes. desde quando esses mundos podem ser considerados assim como se fossem objetos? Nós estamos sempre falando de um ponto de vista e. Mas. porque alguém o pagou para que fizesse essa comparação. é exatamente o oposto. abomino Bush e Blair e. quando vamos para o laboratório. se o "ser" é evento. então. alguém que vê as coisa de lá. se estivessem mentido com uma outra finalidade. Vocês acreditam que. as armas realmente não existiam. conclui-se que não importa a quase ninguém sobre a verdade dos fatos objetivos. quando posso falar que são grandes mentirosos. eu resolvo. Berlusconi é mais ou menos como quando Nixon era contestado. de objetos.se torna uma porcaria. "Quando estivermos no Paraíso veremos finalmente toda a verdade!" E passar todo o tempo da eternidade a estudar isso. que acreditem em mim e fim. depois. Não estamos ali para olhar o mundo como ele realmente é. tendencialmente. etc. Existe todo um conjunto de coisas que dependem desta reflexão sobre o caráter interpretativo. Isto é. dos manuais da física e química. a liberdade é baseada na verdade porque é baseada na idéia de liberar-se de ídolos. É óbvio que nele nós não confiamos. a ciência é objetiva!" Entre outras coisas. a sair de um mundo de violência. não digo que vocês têm de crer naquilo que dizem e fim.independendo das leis sociais. e esta é a velha história que sempre tentaram nos vender na tradição metafísica. tentando buscar um projeto... se forem aceitas. . interessado. Até mesmo conhecer as verdades objetivas. "Não. vocês pensam que ele está falando do Teorema de Pitágoras. quando essa ciência reivindica o direito de conhecer . de certa forma." Mas ele . Isto é aquilo que Berlusconi sempre faz na Itália: "Deixem que eu vou pensar nesses problemas. que finalmente deveria nos ajudar. violentas. ele não pensa em coisa alguma. mas nem pensar! Nem pagando! O que quero dizer é que a verdade que me liberta é aquela que me liberta. por exemplo. Claro que também baseando-me em elementos. . é muito importante para a liberdade. Quando Jesus Cristo diz: "A verdade libertará vocês". de todas as leis da geometria. não se preocupem.88 alguma coisa sobre a ebulição da água visando à construção da máquina a vapor. envolvido da verdade. mas se uso essas coisas para algum projeto. As verdades são somente ditas a pessoas. como se fosse esse o grande valor da verdade. saber a quantos graus ferve a água ou como funcionam os átomos. da política. entre pessoas e em grupos sociais e. porque pode chegar inclusive a fazer certas coisas que a nenhum de nós interessa que sejam feitas. As verdades objetivas são. Ninguém começaria a querer constatar os fatos só pelo amor da constatação dos fatos. aconteciam passeatas e se exibiam faixas com o rosto dele dizendo: "Você compraria um carro usado deste indivíduo?" Algo pa- . adeus às estruturas fixas. etc. Parece-me que. porque. mesmo que a verdade tenha sempre sido considerada um valor muito alto. é verdade que a verdade é um fato de consenso interpessoal. mesmo ele sendo muito hábil. caso contrário. é lindo! Porém. conta piadas. Quando ouço ele falar. a possibilidade de violência. tenho de ficar atento. Portanto. abandoná-Ia em nome da redução da violência é algo que vale até a pena fazer." Mas desde quando? A natureza é onde o peixe grande come o peixe pequeno. Então. põe guampinhas nos outros nas fotos oficiais. significa niilismo positivo. Se não existem valores absolutos. no fundo. nós podemos construí-Ios com o nosso consenso. o título desta reflexão. Ninguém acredita. isto veremos. para limitar a liberdade destes. porém. contra outros indivíduos. Ele é simpático. outros livres. significa reduzir a possibilidade de violência. eu me torno berlusconiano. faz de tudo. sem que alguém nos imponha limites e diga: "Além desse limite. você não pode ir. Adeus à verdade. significa. porque aqui tens de respeitar a natureza. abandonar a idéia de verdade significa abandonar a idéia de violência. em primeiro lugar. mas. não é confiável segundo o meu parecer.89 recido acontece agora com a política italiana. ou seja. e nós temos de participar desse torpe mercado dos seres. quando pretende ser objetiva certamente é porque está sendo usada contra outras pessoas. Então. .