A Linguagem e Seu Funcionamento - Eni Pulcinelli Orlandi

March 17, 2018 | Author: Dimas Gomez | Category: Science, Mediation, Knowledge, Sociology, Ideologies


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A LINGUAGEMh E SEU FUNCIONAMENTO As formas do discurso Eni Pulcinelli Orlandi Caminhos Cruzados -- Linguagem, Antropologia e Ciências Naturais Div. Autores Coleção • 0 que • 0 que • 0 que • 0 que • 0 que Primeiros Passos é Comunicação - Juan E.D. Bordenave é Ideologia - Marilena Chauí é Leitura - Maria Helena Martíns é Literatura - Marisa Laiolo é Propaganda Ideológica - Nelson Jahr Garcia A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO As formas do discurso o 1" r. o a a. .2 1983 40 anos de bons livros Copyright C) Eni Pulcinelli Orlandi Capa: Revisão: Moerna Cavalcanti Jos6 E. Andrade Rosangela M. Dolis 1 1 1 1 1 1 1 Indice Apresentação ............ 0 discurso pedagógico: a circularidade Para quem é o discurso pedagógico? ... * linguagem em revista: a mulhex-fernea * discurso da história para a escola ......... Algumas considerações discursivas; sobre a educação indígena ......... A sociolingüística, a teoria da enunciação e a análise do discurso (convenção e linguagem) Funcionamento e discurso . . ................ ................. ......... 0 sentido dominante: a literariedade como produto da his88 105 tória 124 Tipologia de discurso e regras conversacionais r .0 Uma questão da leitura: a noção de sujeito e a identidade do .M o leitor 164 .D A produção da leitura e suas condições 180 editora brasiliense s.a. Sobre tipologia de discurso 01223 - r. general jardim, 160 0 discurso religioso são paulo - brasil 137 191 214 . 1 ~I Para o Edu e para a Pat, duas paixões. Não adianta querermos ser claros. A lógica não convence, a explicação nos cansa. 0 que é cla ro não é preciso ser dito. Noturnidade, de Cassiano Ricardo. Apresentação i 1 .À Ik Para alguns, o já-dito é fechamento de mundo. Porque estabelece, delimita, i mobiliza. No entanto, também se pode pensar que aquilo que se diz, uma vez dito, vira coisa no mundo: ganha espessura, faz história. E a história traz em si a ambigüid ade do que muda e do que permanece. Não me proponho a resolver esse impasse, que se expressa através da tensão ent re o retorno e o avanço, entre o que restringe e o que alarga, entre o que já é e o que pode ser, entre o mesmo e o diferente. Ao contrário, mantenho a tensão como motivo da minha reflexão. Embora, na ilusão da onipotencia, não deixe de tentar a especificidade, o único, o definido. Tendo como objeto de estudo a experiência de linguagem, a prática do dizer, coloco alguns conceitos, alguns princípios teóricos e metodológicos, algumas técnicas de análise como constantes e procuro explorar as conseqüências a que elas podem levar-me em cada pretexto que tomo para a reflexão, como, por exemplo, a literariedade, as regras conversacionais, a tipologia do discurso, a convenção, o pr ocesso de leitura. Nesse percurso, coloco-me no próprio centro do risco que é a tensão entre o já-d ito e o a-se-dizer. Assim, aceito passar pelos mesmos lugares, procurando o que me leva a conhecer alguma coisa a mais a respeito dos objetos provisoriame nte tomados para • reflexão, como o discurso pedagógico, o discurso da história, • questão da educação indígena, a argumentação, o discurso religioso e outros. 8 ENI PULCINELLI ORLANDI Se o objeto de estudo em que me detenho é de caráter múltiplo e indeterminado, o objetivo, entretanto, é sempre um: incorporar as noções de social e de história, distinguir o estabelecido do não-estabelecido e questionar a consciencia (o sentim ento) dessa distinção no homem, quando este produz linguagem. Como a área em que se inserem esses estudos é a da análise de discurso, não pode ria prescindir do compromisso com o fragmentário, o múltiplo, o provisório. 0 que leva ao reconhecimento da falta de limites categóricos, que se poderia prete nder, entre um método de demonstração científico e outras formas de conhecimento, outros modos de reflexão sobre a produção da linguagem. No domínio da linguagem em geral, e não só no espaço do poético, como pretende um clássico poeta ingles, parece dizer-se uma só coisa, sempre a mesma, usando-se o já usado, vestindo-se de novo as velhas palavras, "For as the sun is dailY new a nd old ...... Qual é a extensão dessa ilusão, se é uma ilusão? Campinas, abril de 1983. Ik lt o o 0 discurso pedagógico: a circularidade* INTRODUÇÃO Partindo da suposição de que se poderiam distinguir tres tipos de discurso, em seu funcionamento - discurso lUdico, discurso polêmico e discurso autoritario - procuraremos caracterizar o discurso pedagógico (DP), tal qual ele se apresenta atualmente, como um discurso autoritario. 0 critério, para a distinção dos tres tipos de discurso, podemos encontrá-lo tom ando como base o referente e os participantes do discurso, ou seja, o objeto do discurso e os interlocutores. Consideramos que há dois processos - o parafrástico e o polissemico - que são constitutivos da tensão que produz o texto (Orlandi, 1978). Podemos tomar a polissemia enquanto processo que representa a tensão consta nte estabelecida pela relação homem/mundo, pela intromissão da prática e do referente, enquanto tal, na linguagem. Nesse sentido, podemos caracterizar os tres tipos de discurso da seguinte maneira: o discurso lúdico é aquele em que o seu objeto se mantém presente enquanto tal' e os interlocutores se expõem a essa presença, (*) Texto apresentado na mesa-redonda "Linguagem e Educação", no XX Seminário do GEL, 1978. Posteriormente, foi publicado na Série Estudos, n? 5, Uberaba, 1978. (1) Isto é, enquanto objeto, enquanto coisa. 10 ENI PULCINELLI ORLANDI resultando disso o que chamaríamos depolissemia aberta (o exagero é o non-sense). 0 discurso polêmico mantém a presença do seu objeto, sendo que os participantes não se expõem, mas ao contrário procuram dominar o seu referente, dando-lhe uma direção, i ndicando perspectivas particularizantes pelas quais se o olha e se o diz, o que resulta na polissemia controlada (o exagero é a injúria). No discurso autoritári o, o referente está "ausente", oculto pelo dizer; não há realmente interlocutores, mas um agente exclusivo, o que resulta napolissemia contida (o exagero é a ordem n o sentido em que se diz "isso é uma ordem", em que o sujeito passa a instrumento de comando). Esse discurso recusa outra forma de ser que não a linguagem. Considerando-se que o DP se insere entre os discursos do tipo autoritário, procuraremos caracterizá-lo enquanto tal. AS FORMAÇõES IMAGINÃRIAS: 0 QUEM, 0 0 QUÊ, 0 PARA QUEM Analisando-se o esquema que constitui o percurso estrito da comunicação peda gógica, temos: Imagem do professor (A) lt Inculca Imagem do referente 4 Metalinguagem (Ciência/Fato) (R) Que pode ser representado como segue: A ensina R a B em X Para Quem I~M 1~r Imagem do aluno (13) Escola Aparelho Ideo16gico (X) Procuraremos, pois, analisar essas variáveis (A, R, B, X) tendo em vista a função de ensinar. Se utilizarmos a técnica de imagens (formações imaginárias) de Pecheux, tal como ele a define em sua AAD (Pecheux, 1969), temos no esquema seguinte o que deveria ser a imagem dominante do DP: â1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 11 IB (M A questão que se constituiria na estratégia básica' do DP deveria ser a pergun ta pelo referente (R), isto é, o objeto do discurso, que, no DP, aparece como algo que se deve saber. Entretanto, parece-nos que, enquanto discurso autoritário, o DP aparece como discurso do poder, isto é, como em R. Barthes, o discurso que cria a noção de erro e, portanto, o sentimento de culpa, falando, nesse discurso, um a voz segura e auto- suficiente. A estratégia, a posição final, aparece como o esmagamento do outro. Nesse sentido, poderíamos dizer que A ensina B = A influen cia B. a utilidade ou a lei da informatividade (*) Imagem que 13 (o aluno) faz de R (referente).1 . é a chamada motivação no sentido pedagógico .3 . Exemplo: exercícios. etc. Em virtude dessa concepção utílitarista da linguagem considera-se razoável indagar.. o uso das palavras "dever". ou seja.: no léxico. converte-se em poder de ordenar e.resposta por considera rmos que o circuito do ensino passa pelo movimento criado pela questão. isto é.Lei da utilidade: lei "psicológica" segundo a qual não se fala somente por falar. para cada ato de fala. tais como as enunciadas por 0. o que há é mascaramento. a imagem que o professor tem de si mesmo. 0 esquema da imagem dominante . para ordenar exige-se uma certa relação hierárquica entre quem ordena e quem obedece. Essa motivação aparece no DP como motivação que cria interesse. Ducrot (1972): o interesse. 1.A lei da informatividade diz que: se se quer informar e preciso qu e o ouvinte desconheça o fato que se lhe aponta. além das características da ordem social em que vivemos. da hipertrofia da autoridade. explicar. como o DP lida com essa lei.IB(R) . 1. influenciar ou mesmo persuadir.uma vez que o professor é uma autoridade na sala de aula e não só mantém como se serve dessa garantia dada pelo seu lugar na hierarquia -.por exemplo. Além dessas leis gerais válidas para o comportamento lingüístico em geral. (2) Trabalharemos aqui com o esquema de pergunta. há também a exigencia de certas condições. Por exemplo. ensinar aparece como inculcar. Nas formações imaginárias que citamos mais acima . isto é. para mascarar a quebra das leis de interesse e de utilidade. São questões diretas a que se dá o nome de "ques tões objetivas-. não pode ser atribuído indistintamente. 0 que produz um discurso individualizado em seu asp ecto estilístico e de perguntas diretas e sócio-cêntricas: "Não é verdade?". logo. há uma regulamentação para cada categoria de atos de fala. "ser preciso". V'.aparece declinado segundo uma gr adação de autoritarismo. os m otivos que poderiam te-lo suscitado.b. que cria uma visão de util idade. No DP. 12 ENI PULCINELLI ORLANDI 1. Vejamos esses fatores: 1 . fazendo com que o DP apresente as razões do sistema como razões de fato. provas. Mantida a regulamentação para o ato de interrogar e de ordenar .. mas porque há uma utilidade em fazê-lo. Ex. exercido por uma autoridade.A estratégia básica das questões adquire a forma imperativa. as questões são questões obrigativas (parentes das perguntas retóricas).po demos incluir a mediação do "dever": 1 que B deve ter da I que A deve ter do .Lei do interesse: lei geral do discurso segundo a qual não se pode f alar legitimamente a outrem senão daquilo que possa interessar-lhe. cuja formulação é: "Responda. "Percebem?" "Certo?".. IB(IA(R)) . para interrog ar. no item 3. Para cada uma das leis gerais pode-se fazer corresponder um tipo particu lar de subentendido. desde IB(IA(R)). Veremos aqui mesmo.2 .A quebra de leis do discurso. IB(IA(IB(IA(R)))) até a forma mais autoritária . o recurso didático. Podemos caracterizar a inculcação através de vários fatores próprios ao discurso. etc. do professor: IA(A). entretanto. e o direito de interrogar. ENSINAR 9 Mais do que informar. etc. isto é. Daí a estranheza de um discurso que é diluidor e Quído. de falar sobre a natureza dessa "informação".R. temos sempre a anulação do conteúdo referencial do ensino e a sua substituição por conteúdos ideoi 1 t 1 3 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 13 lógicos mascarando as razões do sistema com palavras que merecem ser ditas por si me smas: isto é o conhecimento legítimo. cortes polissernicos. constróise aí o reino da objetivid . 0 conteúdo aí é a forma (artefato) e se aponta a forma como rép lica do conteúdo. ao mesmo tempo em que é defin itório e extremamente preciso e coerente. Até o momento falamos do tipo de "informação" (comportamento) que ele "transmite" (inculca). 0 conhecimento do fato fica em segundo plano em relação ao conhecimento da m etalinguagem. Através da metalinguagem. Na realidade. pela quebra das leis de discurso. Ao nível da linguagem so bre o objeto. a repetição. E o que se explica é a razão do "é porque C e não a razão do objeto de estudo. perífrases. E sua car acterística está em que ele se pretende científico. o que se visa é a construção da via 14 ENI PUICINELLI ORLANDI científica do saber que se opõe ao senso-comum. da via de acesso ao fato. utilidade. As mediações são sempre preenchidas pela ideologia. definições rígidas. o uso de deiticos. isto é. e b) a apropriação do cientista feita pelo professor. etc.0 -e porque eA apresentação de razões em torno do referente reduz-se ao "é porque C. apresentandose assim um só caminho: o do saber institucionalizado. agora. a objetalização ("isso"). Ao nível de metalinguagem. Assim como. temos no DP duas características bastante evidentes. aquele que se deve ter). o que temos é ainda a mediação: a desrazão cede lugar à mediação da motivação que cri# interesse. encadeamentos autor natizados que levam a conclusões exclusivas e dirigidas. Gostaríamos. Essa motivação tem validade na esfera do sistema de ensino e deriva dos valores sociais que se lhe atribui. Nesse passo. da forma de procedimento. legal (ou legítimo. em relação ao objeto. não há questão sobre o objeto do discurso. Em um e outro caso.A cientificidade A transmissão de informação e fixação são consideradas objetivos do DP. ao nível da metalinguagem. Vejamos essa relação da metalingua gem com seu espaço. 0 estabelecimento da cientificidad e do DP pode ser observado especialmente em dois pontos: a) a metalinguagem. seu conteúdo referencial. 3 . a) A metalinguagem A metalinguagem tem um espaço para existir. 2 . Racionalidade. formulam-se. tornando-se ele próprio poss uidor daquele conhecimento. médio. em outras palavras. E a voz do saber fala no professor. Essas divisões se agrupam: sala. Desconhece-se a história dos conceitos. No entanto. nem da história das diferentes formulações dos mes mos problemas colocados pelos fatos. pois a instituição do saber como um todo (o sistema de ensino. ou. uma vez que não se trata de uma reflexão sobre fatos. ao que é fortuito e ocasional (a perspectiva ) atribui-se um estatuto de necessidade. Há aí um apagamento. sensibilidade. problemas clássicos. Nessa perspectiva de escolaridade. que os conceitos tem uma hist6ria. Matemática Geografia Lingüística etc. objetividade. dividindo espaços dentro da insti tuição: mais específica: distinção de disciplinas e métodos: mais ou Menos específica: distinção das ciências: menos específica: distinção Ciencia/Fato (Escola/fora dela): Semântica Fonologia Sintaxe Estruturalismo Transformacionalismo etc. É no espaço da instituição que o conhecimento é homogêneo. sistematicidade. dizer e saber se equivalem. disciplina. série. apaga-se o modo pelo qual o professor apropria-se do conhecimento do cientista. de maneiras diferentes. instituindo um conhecimento que é considerado valorizado ou. superior). u m saber legítimo. nível (primário. . tendo no cum e a Universidade) abriga todas as divisões. as questões não se podem dizer nem verdad eiras nem falsas pois não se trata de explicar fatos mas de se mostrar a perspecti va de como podem ser vistos. diz que z = sabe z. etc. através de metalinguagem da época. sem que se tenha consciência disso. isto é. ou melhor. Pela posição do professor na instituição (como autoridade convenientemente titul ada) e pela apropriação do cientista feita por ele. isto é. Experiència. aula. sua unidade. A opinião assumida pela autoridade professoral torna-s e definitória (e definitiva). A LINGUA A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1r A ddisso. através da avaliação que a escola produz. Cada coisa é posta em seu devido lugar e assim se perde a noção do todo do sab er.ade do sistema. se diz que pode para depois se recusar essa linguagem e substituí-Ia por outra "ma is adequada". A homogeneidade é c riada a partir da instituição. E dessa perspectiva de metalinguagem que se podem entender questões do tip o: posso dizer com minhas palavras? Cuja resposta é: ou não pode. subjetiv idade. ocasionalidade. faculdade. 0 objeto aparece refletido nos recortes de uma metalinguagem que se constrói com maior ou menor especificidade. As divisões são estanques e a perda da unidade é recuperada em um outro conceito que toma seu lugar: o da "homogeneidade". mais benevolen temente. universidade. b) 0 professor-cientista is 0 professor apropria-se do cientista e se confunde com ele sem que se ex plicite sua voz de mediador. A LEGITIMIDADE Podemos ler em Bourdieu (1974) que a escola é a sede da reprodução cultural e o sistema de ensino é a solução mais dissimulada para o problema da transmissão de poder. sabe que. ordenar seqüências. a imagem social do aluno (o que não sabe e está na escola para aprender). a diz er que sabe. Se define como ordem legítima porque se . ele aprendeu. 0 material didático também sofre o processo de apagamento (como toda mediação) e passa de instrumento a objeto. dentro de um grupo. de mistura. Além disso. 0 que interessa. o cumprimento dessa função. na realidade. o material didático.Poderíamos. Como objeto. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 17 méritos ou competências e não como hierarquia fundada na afirmação brutal de relações de forç Convertem hierarquias sociais em hierarquias escolares e com isso legitimam a perpetuação da ordem social. • ESCOLA (0 ONDE): • REPRODUÇÃO CULTURAL. A reflexão é substituída pelo automatismo. Através de que ação a escola faz isso? A escola atua através da convenção: o costume que. e o que interessa é saber o material didático (como preencher espaços. ele se dá em si me smo. e o professor é idealmente A. e. supõe a posse prévia de um código que permite deciftá-los. isto é. então. por exemplo. a partir de seu contato com o professor. sob a aparencia da neutralidade. há uma correspondência entre a distribuição do capital cultural e do capital economico e do poder entre as diferent es classes: a posse de bens culturais. saber o material didático é saber manipular. Atua através dos regulamentos. A distância entre a imagem ideal e o real é preenchida por presunções. mediação essa que não é feita no vazio mas dentro de uma ordem social dada com seus respectivos valores. logo. e que uma formação social seleciona como dignos de serem possuídos. a do interesse e utilidade: a fala do pr ofessor informa. 0 professor diz que e. E as sim instala-se uma circularidade: só os possui o que já tem condições de possuí-lo. isto é. a imagem social do professor ( aquele que possui o saber e está na escola para ensinar). se considera como válido e está garantido pela reprovação da conduta discordante. logo . Entre a imagem ideal do aluno (o que não sabe) e a imagem ideal do profess or (o que tem a posse do saber que é legitimado pela esfera do sistema de ensino) há uma distància fartamente preenchida pela ideologia. fazer cruzinhas. não é saber manipular o material didáticopara algo. Por outro lado. Podemos citar. a escola tem uma função de dissimulação: apresenta hierarquias sociais e a reprodução dessas como se estivessem baseadas na hierarquia de "dons". Enqua nto objeto. que tem esse caráter de med iação e cuja função é dar "concretude" ao DP. perguntar: o que é o aluno e o que é o professor? 0 aluno é ide almente B. o material didático anula sua condição de mediador. As mediações se sucedem em mediações provocando um desloca16 ENI PULCINELLI ORLANDI mento tal que se perdem de vista os elementos reais do processo de ensino e apre ndizagem. isto é. É assim que se "resolve" a lei da informatividade e. tem interesse e utilidade. a definição da escola em sua função de transmissão da informação acumulada (definição tradici dissocia sua função de reprodução cultural de sua função de reprodução social. No entanto. então. do sentimento de dev er que preside ao DP e este veicula. por que. etc. o que autoriza o aluno. aparecendo como colaboradora que harmoniza a transmissão de um patrimOnio cultural que aparece como bem comum. pois contribui para a reprodução da estrutura das relações de classe dissimula ndo.). estar apartado da sociedade que a produz. (*) Esse texto foi apresentado em uma mesa-redonda da 32! Reunião da SBPC (1980). mas pensamos."Protagonistas do/no Discurso".a linguagem como instrumento.orienta por máximas e essas máximas aparecem como válidas para a ação. ainda assim sua naturalidade não é natural nem sua arbitrariedade arbitrária. isto é. garanti ndo a instituição em que se origina e para a qual tende. como algo que deve ser. E esse o domínio de sua circularidade. Perspectiva. 1 Inicialmente. Dunod. Paris. que se garante.Dire et ne pas Dire. 1974. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 19 0 estudo da linguagem não pode. por discurso pedagógico (DP). nessa perspectiva que a&Áfamos. antes. pela qual a escola atua. consideramos que um estudo importante a s er feito é o dafunção referencialpara o DP. 1975). E essa nec essidade se assenta na homologia que podemos fazer entre linguagem e trabalho. Orlandi. sobre as coisas. 1978. como modelos de conduta. mas necessário. que faz do DP aquilo que ele é. tipicamente. Foco e Pressuposição. no sistema de produção a que pert ença (Rossi-Landi. -~uçprocessos que entram em jogo na . pois. . com o obrigatória. Hermann. E. No sentido de que não tem um cai ater nem arbitrário nem natural. . . . gostaríamos de dizer que não pensamos essa mediação no sentido de col. 3 Finalmente. neste volume. que transforma. Pêcheux. Quando falamos em mediação.. é o fato de estar vinculado à esco la. procurarei explicitar minha concepção de linguagem. aparece como modelo. mostrando-o em sua função: um dizer institucionalizado. uma vez que o produtor' de linguagem não pos sua seu controle. Aparece. logo. Circularidade da qual vemos a possibilidade de rompimento atr avés da critica.o car . 1972. a uma instituição. mediação necessária.Analyse Automatique du Discours. Série Estudos 4. como a nossa suposição é a de que o que caracteriza o DP é a elisão (i lusão?) do referente através de mediações que rompem o discurso ao dizer e se transformam em fins em si mesmas. Uberaba. ação que modifica. logo. M. pois. BIBLIOGRAFIA Bourdicu. _ Ainda que pareça pseudonatural. a mediação como re ração constitutiva. produção social. (3) Desenvolvemos este aspecto de ruptura em relação ao DP dominante em "Para quem é o DP". pois encontra sua motivação na forma social. Na medida em que a convenção. P. i. Ducrot. Posso considerar a'linguagem como um trabalho. Então. 1969. Em última instância. situar o q ue entendo por discurso e. considerando que ambos são resultados da interação entre homem e realidade natu ral e social. Para quem é' o discurso pedagA aico* 1-145 INTRODUÇÃO i . isto é.A Economia das Trocas Simbólicas. como obrigatórias. e. São Paulo. E a escola é a sede do DP. tem o prestígio da legitimidade. Paris. F ista. 0. . wredl~20 ENI PULCINELLI ORLANDI tando ser a fonte exclusiva de seu discurso. os. institucionalizad .co mo M. "consti tui um conjunto complexo de atitudes e representações que não são nem individuais nem universais mas se reportam. faz parte de uma formação ideológica determinada. fazem par te. Haroche (Haroche et alii. É o lugar assim compreendido.. Cada formação ideológica. a partir de seu próprio lugar de locutor. as condições de produção) constituem o sentido da seqüência verbal produzida.como resultando &'processos discursivos sedíraentados. qualquer seqüencia deve pertencer a uma formação discursiva que. situar-se no lugar do ouvinte (antecipação das representações).constituição da linguagem sâo-processos histórico-sociais. fInâmente. As palavras mudam de sentido ao passarem de um ~ formação discursiva para ou tra. retoma um se ntido preexistente. E. há nos mecanismos de toda formação-sõcl--ãT-re-gfà-s-&é-~fõj-e-ç-íó qúé -estabelecem a relação e oncretas e as representações dessas situações no interior do discurso. isto é. por isso. Segundo essas considerações. enquanto espaço de representações so ciais. nas teorias lingüísticas-_o_síúeitQ que produz ~zç~também está reproduzido n ja. Quando se diz algo. a situação. 1 que é constitutivo da significação discursiva.. Há uma articulação entre intençã . os interlocutores. por sua vez. 1971). o contexto histórico-social (i. alguém o diz de algum lugar da soci edade para outro alguém também de algum lugar da sociedade e isso faz parte da significação.. a relação entre as condições sócio-históricas e as signi ações de um texto é constitutiva e não secundária. .É preciso dizer que J todo discurso nasce de outro discurso e reenvia a outro. para ter sentido. no discurso se explicita o modo de existén cia da linguagem que é social. quando. segundo CI. talvez. Considerando-se ainda o estudo da linguagem no processo do eu e do outro. o escopo do discurso. na reali dade. falar é outra coisa que produzir um exemplo de gramática.-na'*sim-ultaWêí~radé'Talãnfe--õW~l-ntè podemos chegar à articulaçàõ-sõclaFI _entre interlocutores e deriva daí a Possibilidade de se apreender a ilusão subjetiva que muitas vezes está refletida. Especificando agora a noção de discurso. porque o discurso pode ser visto como a instanciação do modo de se produzir linguagem. e. em se tratando de processos. e seria. às Posições de classe as outras". interessante acrescentar que.. Então.! _iiL se pode falar em um discurso mas em estado de um processo discursivo. e não criticada. Essa ilusão de ser a fonte de sentido se desfaz se atentarmos ao fato de q ue. enquanto parte do funcionamento social geral. uma ou mais formações discursivas interligadas. Por isso tudo. de acordo com os autores citados acima. Assim. As formações discursivas são formações componentes das fõ-rmá-ç'ões ideológicas e que determinam o que pode e deve ser dito a partir de uma p osição dada em uma conjuntura dada. Dessas formações ideológicas. o que regula a possibilidade de respostas.o discurso não como transmissão de informação mas como efeito de sentidos entre interlocutores. devo acrescentar que considera .. Como é exposto por Pêcheux. mais ou em conflito umas com menos diretamente. faz parte da estratégia discursiva prever. enquanto componentes. Pecheux em sua Analyse Automatique du Discours (1969) . não consideramos nem ã-ãõciedade como um dado ou a linguagem como um produto. não são somente as intenções que determinam o dizer. e esse estado deve ser compreendido . Em decorréncia dessa perspectiva é que vemos como região privilegiada da lingüística a d a Análise do Discurso. Indo mais além. e em termos bastante gerais. o out ro). Há um conflito entre o que é garantido e o que tem de se garantir. -w -sedi-menf a . então. escoa s insti 1 por reí~lamentos~. seleção feita pel alante que vai delimitando o que diz e. diz~-q-ue mais qu 1 e . na sua força contradi Tó-ria:"põrque o social é constitutivo da linguagem. Paulo -d-c-29 de junho (1980). razão para se considerar o discurso como mera transmissão de informação mas. Quando falo em DP estou falando em um tipo de discurso. o garantido. a educação agora é tomada pelo seu aspecto económic 1 . manifestação da prática e do referente na linguagem. por máximas que aparecem como validas par a-~_ação. Como a escola---faz isso? 1 .e. Bourdieu (1974) trata da escola como sede da reprodução cultural. sendo a função da escola reproduzir a força de trabalho. 1969). antes. cõffió modelos.um dizer institucionalizado sobre as ríc11 s 1w.' ao. conseqüentemente. Teoricamente.que desloca o mesmo. das estruturas de classe e das relações d poder. Diz ela: -ho je a educação é encarada imediatamente rõmo capital. de outro. 1978). gaFãà`tindo-ã"lEflItiu-íj6 em que se origina e para a qual tende: a escola. Entre a paráfrase e a polissemia. 0 fato de estar vineu .contribuir f~fa a reprodução da estrutura das relações de classe mascaran do sob a aparencia. Dessa maneira. pois. Isto é.da íTp_í6lissemia).~ ---------__A coisas. Há uma seleção em relação aos meios formais que uma língua oferece. podemos dizer que a produção da l inguagem se faz na articulação de dois grandes processos: o pí~rafrástico e o políssêmico. ou seja. o DPJ Eu o tenho definído como um o circtilar). 1 esta. e porque é fato social ela mi. Essa é a tensão bási-ca-do -discurso.. tudo o que seria possível dizer. Tipo. proàu-i~çlõ e -Inve-s-fi---mê-n-W Cuí-e-do~ve----Re-r-ar lucro . da neutralidade o cumprimento dess fÜnção. devemos considerá lo como efeito de sentidos (Pecheux. aq . a reprodução da ideo '~ggia dominante. sua intc-rpçlgçkc! feita pela ideologia.do . há no texto uma tensão qqç aponta para o rompimento. Marilena Chauí.e convenções sociais.. Esta é uma manifestação da relação entre o homem e o mundo (a natureza. Ela atua pelo prestígio de legitimidade e pelo seu discurso. de um lado. -Não há. a sociedade.14da à_esco~a. o social aparece em relação à _Jinguagem. há um retorno constante a um mesmo dizer sedimentado a paráfrase . faz do DP---~guilo que ele é. isto é. A nofisserniA ê1 i i i i 1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 21 essa força na lin~an--. na Folha de S. -tensão entre o text-cí-é--ó contexto histórico.~gis imediato.se íe-di EiWí~ (ilusão do sujeito). sua ilusão -e-tido o de sujeito. e o sistem a de ensino como sendo a soluçã6'mais dissi-Eu-lada para o problema dá transmissão de poder. portanto. a uma instituição.social: o conflito entre o mesmo e o Xárente (Orlandi. que se garante. 1 0 que é. o DP. e o mostra (revela) em sua função. Porém. o sujeito não se apropria da linguagem num movimento individual: há uma forma social de apropriação da linguagem em que está re_ eti o o 'do como ele o fez. isto é. E a empresa tipológica é uma retórica: um tipo de discurso é uma configuração de traços formais associados a um efeito de sentido caracterizando a atitude do locutor face a seu discurso e através deste face ao destinatário (Marandin. no discurso autoritário há a contenção da polissemia já que o agente do discurso se pretende único e oculta o referente pelo dizer. inclui o lúdico.ui. 22 ENI PULCINELLI ORLANDI sência de problemas de enunciação: não teria sujeito na medida em que quàTquer uni (dejí~trõ as regras do jogo evidentemente) poderia ser seu sujeito (credibilidade da ciência). Criei outra tipologia. 5! a M vista éomj-ir. então.Ç~_ .distinção es a nã~_relaçãb tFe os interlocutores e o referente. 1979). que. pudemos observar que tal qual ele se mostra atua lmente em uma formação social como a í 1 i 1 . ou melhor. e onde existiria a distância máxima entre emissor e rece tor (não haveria t ensão portanto).~. a ssa neutralidade não me foi suficiente.. No entanto. com a dinâmica das condições de produção teremos os vários tipos de discurso. isto é. o referente do disc urso e. cada um por si. a maneira como o 'irabalho se dá em uma form Qcigi determinada pode excluira Possibi ~nuãQ-S-C. nas suas condições de pro Cução. tal como os definimos em---0Discurso Pedagógico: a Circularidade": no discurso lúdico. isto~ é.Lmverúbjfidad ~ o lúdico -vive (de-Ia. na minha reflexão sobre o DP. tres tipos de discurso em seu funcionamento: o lúdico. o DP seria puramente c ognitiyo.---.smite informação (teórico ou científico). a pratica. ~nopoíêmico.É-dUe--do __ UÚãico.a reversibilidade se dá sob condiç S. informacional.__-----------------------. A reversibilidade na relação dos interlocutores pode fazer parte do critério de distinção desses tipos de discurso. finalmente.gÇ----------forma como utilizamos a noção de trabalho. a polissemia é controlada uma vez que os ínterlocutores procuram direcionar. teià como mír nominalização e como fras"e base a frase com o verb~ ser (definições). E_~-s-satipoiõ_gia que tematiz e No entanto. Do ponto de vista de seu referente. desses funcionamentos discursivos: o discurso autoritário vro çpig-e£taacat. ao colocar entre os tipos de discursoQ diSCu isso não contraria a í~ alÊo:'IA hipótese. fundamentalmente. 0 critério para a.b . De acordo. Minha experiên cia me mostrava outra coisa que essa neutralidade suposta.--qçsse momento. . devendendo das características desta for1 Procurando caracterizar o DP. E como é este DP? Em su"efiniçãç) seria um discurso nguíra-que-tra Lpn. A de que existem. Gosta 'a de explicita1~. feita no início. no polêmico. há a expansão da polissemia pois o referente do discurso está expost o à presença dos interlocutores.__-----. enquanto eu mesma faço parte da escola. em relação a outros. como media ção. o polêmico e o autQx_ ~.. o que torna mais difícil decidir-sqb~p_9~jimites del e e as vozes que falam nele. 1 1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 23 nossa.: uso do verbo ser nas definições "X é As questões não sã nem falsas.1 1 . ele se apresenta como um discurso autoritário. métodos. se gundo o que pudemos verificar. 28 -serie. e a apropriação do cientista feita pel5 pro e isi. há cortes polissêmicos.técnica e buro craticamente sob o pretexto de níveis de---eSípecialização Não se lftt. 0 que se explica é a razão---&'emi~õ-f-qÚãe-e í~_~ro ã-f-Czlu-dõ-õbi-~íj-dje-s-tu-Cõ).91 mais específicos (disciplinas. Na realidade. desde recortes mais gergis_até. cedeluggr ao de homogeneidade e com elei se tranquiliza. de~_de os mais teóricos até os mais concretos (Humanas. ciência/fato). Ç_AO sistema. Exatas. segá---ão o que observamos. 'cÔíis'tr6i'-'se-c-om a_ metalinguagem o domínioft~ obiç~tLvid ad . I-t .).~e-põrq~u-e-é. o e cimento do fat o DP p-eld---WõhecimenIb-diê _uma certa metalinguagem: fixam-se as . uma linguagem que dilui 11 re-u Objeto ao mesmo tempo em que se cristaliza como metalin guagem: as definições são rígidas.-et 1 c. recortes esses refletidos dentro do sistema ---deensino em sua totalidade 1 . A citação e cáuTrõs iscursos ~M di ---di -podê Ser ou não explicitaàa no DP.-õ-uTra -fmrç-ãúi U ih-etãlrnguãgem. isto é.Eí-. então. 1~ séri rie. dêssamaneira.. é produ--recO zir ries no Objeto. A essa perspectiva e pela ~valiqçãq_que-a-t~. 0 estabelecimento da cientificidade é observado.cola es r~ tabelece. 0 DP utiliza. enunciados Plícitos. _S Àõ ráfe~in~ia-1É ÃGãvés da metalinguagem estabelece e o conteú o estatuto científico do sabçr que Àe` ao . ma~e~-~é' determinar a perspectiva de onde devem ser vistos e ditos. E o sistema de ensino é essa fragmentação toda em que o conceito de unidade . não há questão sob~o ob-j-e-fo--cT6-d-iscu~ rso~. dessa forma. da expliêãçn-dd-s-'Tãfõ-s'. pois a apresenja~_as razões em torno do referente se í~e_Tuz ão._se comurn-j-s-to T.__ ---0 problema da metalinguagem se fúndino ratamento do referente. sem nenhuma neutralida de1---0-UP _sedissáula como transmissor de informação.aU2uí-ãL-um-e&tatuto je-neêessidade (de dever) e se institui. enca deamentos automatizados que levam a conclusões exclusivas (Ex."~le ~lioes'e ex_luem-se ~ . ~'alãs-dê-Ãu-íi--dlléi~é-út-é-s-. em dois aspectos do DP: a metalin. Q referente é um referente dis cursivo: são conceitos elaborados naquele ou em outros dis cursos. DrõFe guagem. um conhe . isto é. e faz isso caracterizando essa informação sob a rubrica da cientifi cidade. seu . logo. -os-fatos. detentor LÇA-0.-Ãssim seco 1~61ojabgr devido.-..~en_siqar. -i daquele conhecimento. através 24 dessa metalinguagem. autori zando-o.aulgri arismo mais exacerbado ~ . se_apro .11 . 0 professor. diWld~'a's ou questões sem resPoffã-. Isso é a incul cação.a exploracão dessas representações que fixam o . ele ainda não sabe o que verdadeiramente lhe interessa. no espaço escolar.). o DP se caracteriza pela quebra de leis discursivas.NpUeç.0 i i1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO . paralelo ao-da-maturaç-ão---do aluno (enquanto ele for aluno "alguém" resolve por ele.---u'-m--sã-b-er__Içgítimo. se torna óbvio o que é complexo e se complica o que é óbvig. informa tividade e utilidade. Desenvolvem-seÁ Aipos de comporta mento que podem variar d .o. há uma aceitação e um . na aquisição da metalinguagem. c omo a s enunciadas por Ducrot: interesse. etc.-o-wdp.-.-.~tud. a partir de seu contato com o professor.. a dizer que sabe: a isso se chama escolarização. na instituic -é autorídade convéni entemente-flOada~_e como ele---seapropria do cientiNtã. i . As mediações. A quebra dessas leis se resolve pela moti vação pedagógica e pela legitimidade do "conhecimento" escolar (daí sua utilidade) escorada .1 Isto é.à do conhecimento & cientista tornando-se. do seu interlocutor e do objeto de conheci __-----.-s-jr-dlz-~e-c-6~n-Vê~lè-e-ffi-édãh~e-im-ent~. o professo?-. Na interlocução. Pelo lado do aluno (nessa caracterização do DP). ao paternalismo mais doce.. Há uma indistinção feita pela linguagem escolar q1 se presta a uma função tranqüipe -1 lizante: n~o há sustos'.-.déig . ENI PULCINELLI ORLANDI 1 .professor como que se repre senta o papel de tutelado.---. Nesse sã-ber.o se a_chata.1. pna do cientista e se confunde com ele séfil~se mostrar como voz mediá(fõ-ra-. de que há um desenvol vimento no processo escolar. ~kade t __-----.se _qual se faz essa apropriaç o --. o saber üÚ1 0 sistema de ens linõ-ãtíiUu-l-"~i &~ãe dessa metalinguagem ao professor.UU=10 vão çstar dominadas pela imagem que ele eve Jazer 49--1!~&gr dó _ve professor. P "' . Como o professor. -o 4ííé----autorizao aluno. 0 que o profes._o aluno é aquele que não sabe e e stá na escola pára aprender.'diáre saber se eqpivakmessor é institucional e 1 idealmente aquele gue p ssuí o sabe-r-e utá. por sua vez. se transformam em fins em si mesmas e as imagens que o aluno vai fazer de si mesmo.-----. _---ci nto ~ãiõii-zãd-6.-.na . nesse jogo ideológico.'íi~entõ . --~_ ------1 . Se a ideologia dDminafite coloca. e na ilusão discursiva dos sujeitos de serem a origem de seus próprios discursos. não aceitar aquild _5". o espaço'ão instituído. Ora. S .da. é. tal qual ela se apresenta hoje. em relação ao DP. 1 e exe_~çgT a isto é. significação. é (1) Em um curso de p6s-graduação (UNICAMP) sobre o Discurso da História. certos implícitos.n . e . esta no seu discurso. certos pressupostos. _ _~a gL DL q ir colocar de forma polêmica é construir seu--textQ. de um sentido único. Com os implícitos. eleestá despedaçado e a aparência de unidade é dada pelo sentido garantido. Espe cificamente. -é precis o interferir na constituição dos sentidos assim construí'dos. Esses implí citos prendem os interlocutor . Maria Irma HadIer£51u~ 26 ENI PULCINELLI ORLANDI d J P~AL vago um espaço para o outro (o ouvinteí dentro do discurso e construir a Própria possibilidade de ele mesmo (locutor) se colocar como ouvinte. C M ---0--q_ 9. possíveis. plo.. w_de-se.não autoritária é explicitar o jo$~9-0c-. eleitos de sentido em relação a '-'informa .0 autoritarismo está incorporado nas relações sociais. o sentido sedinientado. informações que aparecem como dadas. o . torná-lo um discurso polemico. e insisti no fa~o de que um discurso é efeito de sentidos e não transmissão de informação._~iÍs-efe-itos-dé sentí-do-tem-origem'na constituiçÃo -i---coi~texto como elementos s inte_rlocutoreS e do --. então.social. a sociedade.'ê@õágias nos textos e dadas pelo contexto histórico.Do Ponto de vista do autor (professor) uma . É saber ser ouvinte do próprio texto e do outro. uma forma. Está na escola. talv ez. . _predetermi nadas. Da parte do aluno. seu caráter informativo. e não deixa espaço para que se situe a articulação eRis tente entre o discurso e o seu contexto-mais am . uma forma de inter ferir no carater autoritário do DP é questionar os seus implícitos. o dominante. sua "unidade" e atingir seus efeitos de §entido. há um compromisso da linguagem com o processo histórico -ãõêiJ. uma maneira de instaurar o pol^mico é .PROPOSTA 25 Como encaminhar uma posição crítica diante dessa caracterização do DP? Seria.c pacidade de discordância. çõês ---. dividi. institucionalizado. o discurso coloca algumas "infor m ações".-scu-dÈ de maneira a expor-se a efeitos de sentido-s. o sentido distrib uído não é só múltiplo. Falei anteriormente que há uma relação entre a formação discursiva e a formação ideol ca. a. é deixar um espaço para a existencia do ouvinte como "sujeito" 1 Isto é. 0 jogo ideológico está na dissimulação dos efeitos de sentido sob a forma de inf ormação. Pois bem.. 7. é não aceitar a és. Ainda desse ponto de vista. Desse ponto de vista. no meu parecer. Sró rio. Ne o a4 1 gar iss n o r neíar a Possib b:llida&-de-ser ouvinte.. Como cQnsidero-qtie-a-apr2púaçã'. embora. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO mento d Ia. como dis_qiV _yçj o_ _êurso autoritário. produtores da instancia de interlocução. .de ~ -PR1~ ~osu*i d niçpgulhado no so i p is da contradição giLe o constitui. do discurso autoritario fixar o ouvinte na si ão d ouvinte a ~~ó . no entanto..de condições de rodução abrqnge enrnn todo. isto é. pois acredito que a ---. ~ e -----. cada um tenha seu tempo de atu ação.o. uMa-dissêrtaç*o em que falam sobre o caráter informaQional do' urso em que "são jogadas informações sem efeito de sentido" e contrapõem a ele "urn texto em que existe um jogo de sentidos X informações". Então_. de fato. Distinguem o texto em que há "espaço para o re-fazer do percurso do autor"_24ãgeles em que não existe esse espaço.. exercer ã1 e t u c. aquilo que chamo de um funcionamento discursivo. de direito. e cuja sedimentaçáo sõcio-histórica resultam um tipo. Seria oportuno fazer. o su*eito em--si.g. recusando tanto a fixidez do.-a]2s-t . nesse passo.i]---. deslize este que se caracteriza por constituir uma lingüística feita do pon to de vista do locutor.papçi. Isto é.. iria que consit r10C ção q M 1 erloc 1 ão na int derro=e-quadia a teuminolORIA e condições de pro dução e condições de rerepc?. Isso porque se desart 1 icula o caracteríStiCo'da . é um modo de funcionatrabalho final.d~de autor n gito co mo a fixação do seu lugar como ouvinte ~ çJLa e . uma observação a respeito da noção de sujeito.agnação nS Pí esse. Lie o texto propõe e o garante em seu valor social: é a capa cídWe dõ-~álúifõ'dé-se constituir ouvinte e se construir como autor na dinâmica da interlocução. Essa lingüística. tanto e issor quanto receptor são. . ---toda linguagem é vista sob a perspectivado e . . Por isso prefiro a no ão de e a 0 na interlocução. ambos interagem simultaneamente. mostrando que é deste moviment o que nasce o espaço que dá lugar para a incorporação do leitor como sujeito..-..çec=Wi tinguimos emissão e recepção é por ~ma ques de fato e não de direito. jlUguagtm-É-cQnsüiulda~âacialmcntqcssÇ--~gjeito do qual falo não R mas o su eito 1 -Ç. a emissão e a e is --ff~õ .ko da í 4 1. considera como fundamental algo que . gostaria de notar que há um deslize teórico na lingüística. generaliza para a caracterização da natureza da linguagem. nessapoáção. q é'o a'torit'ri . nem um dos dois termos se concebe sem -o outro 1 _À parti r -à ai ele desenvolve uma análise que. dos acontecimentos. E se há. Não coloco em causa a especificidade da linguagem em relação ao trabalho . ao lidar com essas marcas.interlocução que é a articulação locutor/ouvinte e as outras articulações que daí decorrem constituARdo---dicõtomias.jig Jrontq-~ç. junto a isso. o que propomos é que se considere o outro pólo. em relação à p&cola.--e. Há. a forma polemica pode ser construida através dessas marcas. Do interior de uma de suas perspectivas. dos fatos. apáàr~isso. interesses soci ' P t n '~d .TEã-õÕlÇ~í. formas lingüísticas que marcam a presença do ouvinte dentro do texto.à-zpa~t~~ de-ia -e qü-em _não f az. que organizam as rela ções espaciais e temporais em torno do "sujeito tomado como ponto de referência". Mas como -nenhum dos dois termos se concebe sem o outro". i~íijd` não é imóvel e está no o o ~=1_procesn~ 1~ocutorkr or a o. visando os funcionamentos _discursivos.~ de discur -o . L~ çcepSI~o_1. constrói no texto o aprisionamento do outro no escasso lugar que lhe é atribuído pelo discurso autoritario. n m inculcar. Segundo Benveniste (1976). se pode ver através do funcionamento discursiYo.. Tomar a palavra é um ato dentro das re lações de um grupo social. e. mais adiante diz que . pois. justamente opondo-se ao discurso que. desta---ca as ~formai n stiás que revelam a subjetividade na linguagem.a Onde está a.entre linguagem e trabalho. dizer nã nas informar nem comunicar. a do eu_Locutop.ís-s"í" significa igualdade nem simetria: ego tem polaridade não sempre uina posição de transcendência quanto a tu. 0. É essa dinâmica de papéis que caracterizaria a possibilidade do discurso -P~olê~ mico.--r-objeto da reflexão. de antemlõ-. quem -1 está em condi .---------u . e se procure suas marcas.-1 ~1 .. uma seleção que decide. enco bertos pelà fixidez desse tiii. o do ouvinte. é a re t% er n 28 1 ENI PULCINELLI ORLANDI também reconhecer pelo afrontamento ideológico. á_sãIát-igando-a~ ----E -de-ntro -desses limites que--yçnho consideran-da-a--hamologia. S ~ u~Ç. considerando a apropriação da ÁCgüi língua pelo sujeito falante.haverig 4 r cuperação do ~ -. considero entretanto que a homol estabelecida entre essas duas noções me =iÊ _permite observar melhor esse aspecto da linguagem que. "a polaridadedas pessoas é na lingu~ gem a condição fundamental-". IiR"agem está a ideologiê úá confronto de senti-' do~. isto é. -q-u-e m-7. as formas lingüís ticas que revelam seu papel. neLa_Sç~gene . .se pronunciam sobre a~êaúca-ção) . Isto e. questionar as condições de produção desses dis cursos. mas. Sejam 6 boas ou más. em termos de análise de discurso. certos pontos passí veis de discussão a respeito de ideologia.e . entre--Iãnr-iTõ. deve-se questionar os implícitos. cristalizamos (em ÚôSso-fr-ak?lho de educação). professores. Pois bem. Mas gostaria de acrescentar que. os locutores. E em que lugar se coloca essa voz? É ainda nessa direção que gostaria de comentar outra passagem desse texto: "Quem porta nto está excluído do discurso educacional?". _. sua finalidade. do T i meu ponto de vista. estamos excluídos desses dizerato. sJ ~em ~'elq ao . onde há colocações fecundas sobre o problema da educação.çomo.-s-Ckq-n1~.decisão quando se trata do discurso do poder que se pronuncia sobre a educação de finindo seu conteúdo. incorpora !tomo tal. na revista Educação e Sociedade (1980).. Também não vejo o procedimento autoriarlQ.çnticamenté. Por exemplo. er-ato-decisão quando se trata do tfába. ela_prescindç de nossas intenções. e aos que nós. a finalidade. dç -qu-ç._W-(ç!s. quando a ideologia é vista como estando dentro de nós.o-de-siMples-e-.. não es.lho pedagó ico. tamos excluíd os .~.p. fazer a mesma coisa com o disA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 29 curso que nós reproduzimos internamente no tr _.t -rc! i -_ -q dQ ou ---Rã -um artigo de Marilena Chauí. reprodutoramente.ando Marilena fala do professor. trata-se antes de dominação. então. enquanto professores. o conteúdo. de outro. o ~ ost o à igura de auto22en .-de onde vem e por que vem em nós e nos alunos .ê14ÃÕ piíS mas o o esnigLament . E o "talvez" usado na expressão (talvez porque tenh amos boas intenções) revela. sua forma.qgç. e concordo com Marilena quando diz que nós. encontramos a afirmação: "ela está dentro de .à. de atuwnlw. agora voltada para o próprio texto de Marilena.Óe: d ç s e se apropriar esse discurso_ e_ quem não est .---um~-ut~o~tq~Siõ__------e_mo sim. o sentido dado ao ensino pelo DP do poder e. diz que "uma_pedagogia crítica deveri a interrogar esse risco cotidiano: de onde vem ---p ~rq vem as re ÀÍie.nós talvez porque _tenhamos boas i intenções". _4gj_~_ uM _Me tLe.1 -aL]2alhQ-Pedagógico. Não vejo essas ivisões. Cõ-ncordo em que àa esteja dentro de nós.se . é o poder de decidir. Trata-se. uma questão que podemos fazer-lhe: que voz é essa qu e fala em seu discurso? É uma voz crítica.1 do 1 diz .U_r~k~xçlusão.~p ao discurso educacional.. portanto.~`e o dominador não e xclui o_Liiii~n`àdo-:._ nas duas direções. ---De um lado.ie . em relaç. em relação aos que nos cristaliza . Ao que Marilena responde: os professore s e os estudantes. Há. seu sentido. como ato de linguagem. 6u. Ficam entretanto. a meu ver.------à ução de toma . não são silêncios. "gurus"). 29 da revista citada): "se fizermos falar o silêncio da imaturidade o discurso sobre a imaturida de permanecerá intacto?". E o "talvez" usado na expressão (talvez porque tenh amos boas intenções) revela. é também o resultadg~ 51q_l~ma situação discursiva. Esse intervalo não é um v azio. ela---prescinde de nossas intenções. àTRU iIzur. se já não se está de acordo com ela. Ao que Marilena responde: os professore s e os estudantes. como ato de linguagem. Não acompanhamos o aluno. e vejo nisso um processo. Ainda em relação a essa questão do silêncio. Concordo em que ela esteja dentro de nós. Pois bem. g ostaria Xe-fi:~ã~r-m-iin-Wa ã-t-enção i~õ -que-Marilena diz (p.i em n~ o i r. mas. Uma outra coisa que Marilena traz à tona com muita propriedade é a questão da maturidade e imaturidade atribuídas aos que participam do processo da edãéí~fãõ. e concordo . q-Te-ffi-Ta-i~ãÍte dela -em não faz. Ti-camõs no mesmo lugar e esse lugar é o que no s aponta como professores (mestres. aquilo que garante o texto em sua legitimidade. E em que lugar se coloca essa voz? É ainda nessa direção que gostaria de comentar outra passagem desse texto: "Quem porta nto está excluído do discurso educacional?". quem está em condi-Ç-õ-e-s-de--s-Eíip-fõbriar desse discurso e quem não está. em relação __ À_Wola. Há. Há um momento no processo do discurso pedagógico ou outro discurso (autoritário?) qualquer em que o outro ouve no esmagamento. Tomar a palavra é um ato dentro das re lações de um grupo social. Mas eu gostaria de ver isso de uma outra manei ra. a minha posi. uma espécie de intervalo entre enunciados áfetivamente realizados. os pressupostos. o espaço ocupado pelo social. o e nos al no se' ~s -dea s aria de acompanhar isso o a ult o =d a d e n à ol qu~-Níã~ii~na'diz'com umã'_õbser e críticos yK49: mesmo qu (quando o somOS~-nós estamos fixados pela frã-fifuRç-ão~nquanto professores. um outro processo. agora voltada para o próprio texto de Marilena. Não vejo essas ivisões. a meu ver. é o poder de decidir. Há..ção é a de que não acredito e apenas não se esteja dizendo o suficiente. e pronto. entretanto. a da-simp f~i. artigo de Marilena Chauí. de antemão. quando a ideologia é vista como estando dent ro de nós._ Não-é abstrata essa vontade da autoridade. A vontade é a de considerar a pergunta como pergunta retórica e responder "Não". na revista Educação e Sociedade (1980). onde há colocações fecundas sobre o problema da ed ucação. ela é claramente marcada na relação de ensino. do meu ponto de vista. Daí o risco da cristalização. aqui. as lacunas constitutiva s da ideologia são os implícitos. Não se está ouvindo o necessário. êin-tes. que não é.sele ç 'mas 6 do e~s~íígMçiRtq do outrç~. em termos de análise de discurso.Càio Eficíla~dQ. Nem há separação entre essas coisas. encontramos a afirmação: "ela está dentro de nós talvez porque tenhamos boas intenções".. interno. uma seleção que decide.---Er outro lugar desse trabalho. . tentando repro28 ENI PULCINELLI ORLANDI também reconhecer pelo afrontamento ideológico. portanto. Ficam entretanto. Q-smtidp. Nesse sentido. nesse passo. falo -sobiê"Õ'-íl-u-ii6. Por exemplo. isto é. Coloco. Sejam 6 boas ou más. a disputa a nível de exp licitação de pressupostos. certos pontos passíveis de discussão a respeito de ideologia. Dentro de um está o outro e se sussurram. uma questão que podemos fazer-lhe: que voz é essa qu e fala em seu discurso? É uma voz crítica. Não há separação entre o cio do oprimido (da imaturidade) e o discurso do opressor (da maturidade). o conteúdo. é também o resultado. '&gurus"). o sentido dado ao ensino pelo DP do poder e. uma espécie de intervalo entre enu~ã~C_os áfetivamente realizados.-ê-. 1 . então. não es ta 1 ~---------.qgç e aos que nós. enquanto professores. de atuarmos. ela é claramente marcada na relação de ensino. nesse passo. Também não vejo o procedimento autoritá?IQ. nas duas direções..o-de. os locutores. xiticamente. diz que "unia peda gogia crítica deveria interrogar esse risco cotidiano: ãÍ_ on vem e porque vem a se tomar-se 'Ruru'. falo sobiê. as lacunas constitutivas da ideologia .o _àÍ~'cõR_j~. em relação -Ç. Gostaria de acompanhar isso que Marilena di~ com obser . sua finalidade.---gLUC J~_RM_Ine .decisão quando se trata do t aba lho pedag . questionar as condições de produção desses discurso s.çç)mp-. trata-se antes de dominação. Uma outra coisa que Marilena traz à tona com muita propriedade é a questão da maturidade e imaturidade atribuídas aos que participam do processo da edãe~iCá Em outro lugar desse trabalho.4g . de outro. aos que nos ç_ristalizaIn re a_êdÚcação) i ---~e prç)4qpei4R Sob -(os. sua forma. Fi-camõs no mesmo lugar e esse lugar é o que nos aponta como professores (mestres. fazer a mesma coisa com o diso A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 29 Surso que nós r u Í 2s internamentR_~ag6gico. mos excluídos do dizer-ato. isto é. estamos excluídos desses dizer se trata do discurso do poder que se pronuncia sobre a educação definindo seu conteúdo. .'b in corporaitomo tal.de uma situação discursiva.~4qs pela iIi~tituiç_ "onquanto professores. Q_=tidp. Esse intervalo não é um vazio. aqui.~e o dominador não exclui o dominãdõ.simples -e--pujea exclusã o. Daí o risco da cristalização. -ato-decisão quando professores. f. e pronto. ---í~u_ando Marilena fala do professor. Mas eu gostaria de ver isso de uma outra maneira. Mas gostaria de acrescentar que. reprodutoramentC -cri stalizamos (em hósso-rraIkalho d e educação). de onde vem e por que vem em nós e nos aiRR25_2-£kse2 d s~çe 1 ç ue. ---De um lado. a finalidade. Isto é. Não acompanhamos o aluno. seu sentido. portanto. o -Ali-gu y ade?".com Marilena quando diz que nós. Trata-se. Nesse sentido. em relaçko ao di curso educa6 ÉC-0 cional. 29 da revista citada): "se fizermos falar o silencio da imaturidade o discurso sobre a imaturidade permanec erá intacto?". gostaria Xe -fi:~i_rm_EnTã -ã-tenção ao que Marilena diz (p. deve-se questionar os implícitos. o espaço ocu ado pelo social. A vontade é a de considerar a pergunta como pergunta retórica e respond er "Não".inã--te-s. Não é abstrata essa von tade da autoridade.LÀLtqa__mesnio que críticos (quando o somosfíiós estamos_f. 9 da disputa pela posse da palavra. refletir a ordem social na qual existe~ Mas como essa não é . o que não n os ajuda a deslocar efetivamente a relação de dominação. foi-me feita uma quespei tão.-. Dentro de um está o outro e se sussurram.~ -um di~curso institmonal. o bar logo.nada_Rosimpedede imaginar--gma socie . ". tentando repro/ ~. aparece abruptamente o estilo formal: "Água és tu o a limento mais importante da terra". outro texto em que há problema de consistência de registro quando.---M~. ento há a ambigüidade3 de falantes sem ouvintes: à força de tentairesi~lá !-f~a(~4. 1980). ~. Ele mostra como o aluno. Filho.-n-os relegar à posição de apenas ouvintes (e ouvintes de discursos já cristalizados).-. Nem há separação entre essas coisas. a minha posi. .f 30 ENI PULCINELLI ORLANDI duzir. aquele em que se estabelece uma relação menos hierarquizada entre i nterlocutores. Não há separação entre o siléticio do o (da imaturidade) e o discurso do opressor (da maturidade). em um trabalho do curso de pós-graduação (UNICAMP) . por exemplo. aquilo que garante o texto em sua legitimidade. justamente pelo qual no texto diz que.são os implícitos. E aí perguntamos: . . provas e redações de alunos pré-vestibulandos. o que é também um ato autoritário. quanto dos professores. reflete relações institucionais das quais faz parte: se essas rela ç ões são autoritárias. Ainda em relação a essa questão do siléncio. imi tar o que o professor faz com a linguagem. ei diria..ção é a de que não acredito e apenas não se esteja dizendo o suficiente. Da primeira vez em que expus algumas dessas idéias. os pressupostos. se já não se está de acordo com ela. pois.mutraditória? ( . produz textos estropiados. deixamos de ouvir mesmo os nossos pares. ao copiar. o D1~.__podemos dizer que a criaç ções pode ser obra dê-t*o dos ( em se ntido amplo e não no do conjunto de professores e alunos) e portanto não é preciso que a (2) Lourenço Chacon J. e vejo nisso um processo. Não se está ouvindo o necessário. Há um momento no processo do discurso pedagógico ou outro discurso (autoritário?) qualquer em que o outro ouve no esmagamento. E há um terceiro momento. a res*to do DP. não são siléncios. repetir..: "o texto está mostrando situações que se encontram numa sociedade relativamente de nível econômico precário. portanto. ele será autoritário. lotou etc.de criar'cond~çk!i(o que pode ser obi~ tanto dos alunos. E volto ainda uma vez à fala da Marilena: "Não seria mais rica uma pç o _dagogia que levasse a sério o fenémeno da consciencia . copiar2 a voz auto-suficiente do locutor. 0 seu mal de raiz é. pelo colega R. como d iscurso autoritário. trabalhadores misturam com malandros. analisou trabalhos. dadesem-escola. Coloco. se levarmos ao limite essa qx~çst&i ão dessas condiq. e. alguma coisa escapa e é sempre possível a crítica. em que há problema de coesão textu al. em out mom .uma relação mecânica. Ex. a disputa a nível de exp licitação de pressupostos. abordando algumas conseqüências do autoritarismo no É)P.Ü-e --p-r~õc"u-r-a-m. (3) Ambigüidade: porque o fato de se negar como ouvinte pode ser tratado c omo a recusa da cumplicidade com um certo dizer mas também como a negação pura e simples do outro. ) Lt~ata-se de _uma pedagogia capaz . Ilari: seria o autoritarismo um mal de raiz do DP? Hoje. em um ttwto coloquial. é o momento crítico. quanto de todos) para que a descoberta possa acontecer" (Chauí. P. . Pêcheux. C ia. Ed. Há uma distânci. que se aplaude enquanto fato vivido na literatura.. em Langages. Paris.. E. As palavras são carregadas de sentidos: uma deusa é tudo isso e uma femea também o é. essa."Problèmes d'analyse du discours. em l ingüística. 1 1 A linguagem em revista: a mulher-fêmea* Um ninho de contradições: a mulher tem de ser casta esposa e eficiente messa lina.-La Semantique et Ia Coupure Saussurienne: Langue. sempre fica algo essencial. E. talvez. ~Rossi-Landi. para se encontrar unidade. 1980. Discours". através das grades analíticas. a uniM Texto publicado na Série Estudos 3. Uberaba.e que não-nos . nossa realidade é a presente e a minha proposta atual é a de buscarmos. . 1. É verdade que alguns tropeços explodem em uma Medéia ou uma Antígone. Langage. Perspectiva. dito de outra forma."Protagonistas do/no Discurso". Série Estudos 4. . . A utores Associados. Do lado de fora. Olhar a linguagem. vista de um certo mo do. um DIP . Problemas de Lingüística Geral. fala. invariança. n? 5. Mas a linguagem. Didier/ Larousse. Haroche. CEDES.imaginar uma outra sociedade. global. . CI. E o que tem a lingüística a ver com isso? A lingüística.. do Jato lingüístico. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 33 dade e a invariança da língua. Marandin. P. Ano 11. Ora. Ou. Processa-se a dicotomização. Bourdieu. quando não é conseqüência do tratamento técnico e normativo ao .~ farta entre o que o homem sonha e o que • homem faz. no míni mo. etc. Paris. não o fazemos sem uma intenção: essas distinções a que se submete a linguagem. Nacional/EDUSP. 1977. M. . Mas isso é 0 clássico.que seja pelo menos polemico . professores e alunos. para que a escola como lugar privilegiado para essa desebSé-FU? fisó para o caso -de'realniente podermos.obrigue a nos des pirmos de tudo que e vida lá fora ao atravessarmos a soleira da porta da escola. têm-se mostrado barreiras a uma compreensão harmÔnica. .-~es~QU_o. M."Da Subjetividade na Linguagem". o 1 R-io-de-Janeiro. uso. 1976.Analyse Automatique du Discours. 1974. Dunod. Langages."A Linguagem como Trabalho e como Mercado". norma. A tentativa é a de procurar levar a lingüística tão longe quanto o sugerir seu compromis so com a linguagem. Larousse. 1969. São Paulo. F.A Economia das Trocas Simbólicas. essai de description du Discou rs Français sur Ia Chine-. necessariamente. M. 1971. n? 24. Paris. Mas não se usa indiferentemente deusa e fernea. em Semiologia e Lingüística Hoje.. e Pêcheux. é tapar a significação co a peneira. 1975. em Educação e Sociedade. n? 55. não tenha nada. de Souza . Henry.1978. Oriandi. Chauí. E se falamos "linguagem" e não língua. São Paulo. espaço delimitado pelo brilho do palco e • sombrio conforto das poltronas. um resto mais determinante do que o que se conseguiu aprisionar. P. 1979. No entanto. .A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO escola ocM2Ê&=Jugar. M."Ideologia e Educação". BIBLIOGRAFIA lBenveniste. Pallas S/A. Cortez Ed. tem. Uberaba. artigos de revistas para homens (Status) e p ara mulheres (Nova). n~'42. Para outros. o químico suíço Peter Iten procurou determinar. n ~o 32. de natureza biológica. o homem se vê compelido a procurar compensações para esta per da de prestígio doméstico. Para os homens. 00) ---0status do marido e o preço do corpo fem nino--Muita gente duvida de que o feminismo seja o caminho certo para tornar m ais felizes as mulheres. 1 ~o Texto: Status. e. a socióloga americana Marie LaLiberté Richmond. Segundo o estudo de uma mulher. as dife34 ENI PULCINELLI ORLANDI renças entre homens e mulheres são mais básicas. entretanto. na qual convivem contradições. Aban donando seu habitual status de chefe da casa. de outro. todo esse jogo é apenas um problema social. do linhagem) propondo modelos para a análise. superável com a transformação dos padrões culturais. na curiosa conclusão do químico: se fossem compradas no mercado de produtos químicos.de Rávia Amaral. Essas considerações tampouco são novas. 00) ---Acolecionadora de culpas.o do momento de existência da linguagem tem sido objeto de reflexão de muitos lingüistas. quando seria mais conforme torná-la como processo. quando na verdade o signo existe enquanto plasticidade. A diferença salta aos olhos. Poderíamos aí distinguir. interessa-nos tomar a linguagem (verbal) como lugar de conflito social .a construção da gramática . os que. do texto. Seria preciso alguma intuição feminina p ara prever que a mulher acabaria custando mais caro? Z' Texto: Nova. Para o corpo da mulher. os que elaboram teorias em que visam a recuper ação do falante. a coisa se complica . Uma unidade dinâmica. Para alguns especialistas. os homens enfrentam terríveis problemas sociais quando cedem à pressão feminista. os gastos subiriam para nada menos que Cr$ 264 milhões.qual se circunscreve a linguagem . pode ser. março de 19 77 (Cr$ 25. ou seja. março de 1977(Cr$ 15. de um lado. da situação do discurso. Mas é difícil negar que afinal a igualdade de direitos para homens e mulheres seja uma possibilidade futura quase inevitável. indo mais além. não comporta a fixidez em que a estacionam os que a tomam como dado (pro duto). Nesse nosso trabalho. Será que os direit os idênticos trarão a felicidade para todos? Para as mulheres. Pretendemos social. 0 simples papel da mulher ia implica . quais as substâncias que compõem o corpo masculino e quais as que formam a anatomia feminina. recentemente. em seu caráter mutável.origina-se de um modo unificante de se considerar o signo. mais do que discutir essas diferentes tendências. Para provar este ponto de vista. como constitutivos da linguagem (ou cios atos de fazer isso através de manifestações específicas da linguagem. as substâncias para compor um corpo mascu lino custariam Cr$ 90 milhões. que falam de mulheres. propõem a c rítica da ideologia como via para uma lingüística realmente explicativa (ou o que se chama Crítica Lingüística) e que recusa a lingüística analítica como poder explicat ivo. e esse tipo de preocupação . en tretanto. insegurançi e culpa". nas po ntuações e nas relações entre frases. "pela própria educação". inficam a ordem de dominancia. crescendo num mundo em que a imagem da mulher é a de "eter na sacrificada". entretanto.. num relacionamento de troca. sem ser preciso pedir desculpas por cada gesto. pela própria educação. Vejamos exemplos do análise pela dorninancia: "Por ter sido semprenais limitada do que o hornem". 1? segmento = A 2? segmento = 13 3? segmento = C 4? segmento = D Temos: . É um exemplo de expansão.13 ~ (por causa de) c Depois. Talvez amanhã essa aber tura de opção passe a integrar sua condição de ser humano. e a relação entre frases ped e ser de expansão (um enunciado domina diretamente dois ou mais enunciados) e de saturação (um enunciado é dominadD por dois ou mais enunciados). Aquela que opta por uma carreira julga-se carente de femini lidade.muitas culpas. " até a momento de opções de vida resulta em incertezas. 1? segmento = 13 2? segmento = C 3? segmento = A As letras A. gentil e fiel àquele que a sustenta. B. de adulto e de criança . uma vez que. explicitando. colocando os enunciados em uma ordem de dominância. E tanto homens como mulheres aprenderão a viver sem culpa. Em um primeiro passo. sente-se sempre em "dívida". Nesse dia pode ser possível ter seus momentos de comando e submissão. Por outro lado. pois um enunciado domina vários outros. vamos transcrever os texto*s. ainda que uma coisa nada tenha a ver com a outra. a mulher pode escolher entre trabalhar ou não. com os o peradons indicados nos parenteses: (porque) A---------0. os operadores que fazem as ligações. casar ou não. um mundo que louva a abnegação (e negação) feminina. Por ter sido sempre mais limitada do que o homem. Então. Tanto num caso como em outro. Hoje. sente como tendo sido em detrimento de outra. C. de esposa dependente. a mulher pod. E ela acha que deve se * r sempre agradável. ficará preJudií 1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 35 cada. Raramente acredita que agiu corretamente. ela não consegue ainda se sentir digna quando atende a seus próprios anseios. acaba se envol vendo em crises igualmente dolorosas porque a sensação de depen dência também gera culpa. "limitar ou não o número de filhos". na trariscrição."trabalhar ou não" 46 casar ou não". temos: "Hoje. Esta ordem. limitar ou não o número de filhos. em função das próprias necessidades. teremos. insegurança e culpa. alternando papéis de dependência e independência. Aquela que cumpre seu papel tradicional. obedecemos à linearidade. até o a umento de opções de vida resulta em incertezas. Quando opta por alguma coisa.escolher (entre). quando for possível. o da transcrição linear. casar ou não ". isto é. pois. B (ou) B' A (entre) Wou) D' 36 C (ou) C' ENI PULCINELLI ORLANDI Por um problema prático. (mas) é difícil negar (que) afinal a igualdade de direi tos para homens e mulheres seja uma possibilidade futura quase inevitável. D ou D'. Vejamos. das dominâncias.) limit ar ou não o número de filhos (mas) por ter sido*sempre mais limitada do que o homem (por causa) da educação (até(mesmo)) o aumento de opções de vida resulta em incertez as. a socióloga americana Marie LaLiberté Richmond (po rque) o homem se vê compelido a procurar compensações para esta perda de prestígio doméstico (quando) abandona seu habitual status de chefe da casa (e) todo esse jog o é apenas um problema social (que é) superável com a transformação dos padrões culturais para alguns especialistas (entretanto) as diferenças entre homens e mulh eres são mais básicas e de natureza biológica para outros (e) o químico suíço Peter Iten procurou determinar recentemente quais as substâncias (que) compõem o corpo mas culino e quais as (que) formam a anatomia feminina (para) provar este ponto de vista (e) a diferença salta aos olhos na curiosa conclusão do químico (pois) *as substân cias custariam 90 milhões (para) compor um corpo masculino (entretanto) os gastos subiriam para nada menos que 264 milhões para o corpo da mulher (se) fossem compradas no mercado de produtos químicos (logo) seria preciso alguma intuição feminina (para) prever (que) a mulher acabaria custando mais caro? 2~ Texto (Nova) Hoje a mulher pode escolher entre trabalhar ou não (j casar ou não (.. Guardaremos a ordem da dominancia.. então . nessa reescrita. temos o desdobramento: B ou W. os textos. privilegiando. e trabalharemos em um nível parcial. A (entre) \\--(-e) --e. e um menos prático. insegurança e culpa (porque) sente (que (como)) tendo sido em detrimento de outra (quando) opta por alguma coisa (e) raramente acredita (que) agiu corret ai i . ete. de acordo com a dominancia e os operadores: IP Texto (Status) Muita gente duvida de (que) o feminismo seja o caminho certo (para) torn ar mais felizes as mulheres. C ou C'. (no entanto ) será (que) os direitos idênticos trarão a felicidade para todos (?) Pode ser (que tragam) para as mulheres (mas) a coisa se complica para os homens (porque) os homens enfrentam terríveis problemas sociais (quando) cedem à pressão feminista (segundo) o estudo de uma mulher. D (e) _C Considerando que cs segmentos são formados por "trabalhar ou não.. que é o do espaço.__B --o. não a dominancia mas a explicitação dos operadores. em gráfico. não faremos a representação. que é o do objetiv o desse trabalho. os adjetivos. que seria "é inegável". Basta que haja muita gente que duvide do caminho do feminismo. as mulheres já são felizes. nessa perspectiva. Gostaríamos de destacar. duas espécies de elementos lingüísticos: as palavras e as construções. aqui. Isto fica claro quando. num relacionamento de troca (e) em função das próprias necessidades (então) nesse dia pode ser possível ter seus momentos de comando e submissão. os circunstanciais. e se não bastasse. as palavras enquanto classes e. ao falar não da mulher mas de todos. terríveis problemas sociais: o problema da mulher é mais felicidade. podemos considerar. habitual status de chefe da casa: o soci al é o status. CIRCUNSTANCIAIS 0 que é bastante evidente é a indeterminação veiculada por esses elementos lingüísti cos. Vejamos. sem quantificação alguma. QUANTIFICADORES. a sua construção no texto. tratase. Vejamos: Muita gente duvida: Quem são? Não há especificação. em termos de indeterminação. e caracterizar alguns aspectos de sua ocorrência no texto. direitos idênticos: por que não direitos iguais? Porque o contraargumento é o biológico e aí se é obrigado a recus ar a identidade. os quantificador es. ADJETIVOS. de adult o e de criança (sem = e não) ser preciso pedir desculpas por cada gesto. mas é habitual. de um grau (talvez exorbitante) de felicidade. segue um plano: No discurso de Status. em relação ao feminismo. inicialmente. não tem causas sociais mais determinadas. é futura e é quase inevitável. Observando os textos. principalmente. possibilidade futura quase inevitável: é uma possibilidade. porém. gentil e fiel àquele (que) a sustenta (e) ela sente-se sempre em dívida tanto num caso como no outro (por outro lado = e) ela não consegue ainda se sentir digna (quando) atende a seus próprios anseios (p orque) cresce num mundo (em que) a imagem da mulher é a de "eterna sacrificada" (e no qual) mundo (que) louva a abnegação (e negação) feminina (mas) talvez amanhã essa ab ertura de opções passe a integrar sua condição de ser humano (e) tanto homens como mulheres aprenderão a viver sem culpa (e) alternando papéis de dependência e independência. mais felizes as mulheres: isto é. é uma indeterminação que grifa o argumento negativo. pois. enquanto função. os substantivos e verbos. depois. logo. Não se trata pois de uma necessidade histórica 0 hoje.1 1 1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 37 mente (e) aquela julga-se carente de feminilidade (porque) opta por uma carreira (ainda que) compreenda (que) uma coisa nada tem a ver com a outra (e) aquela ac aba se envolvendo em crises igualmente dolorosas (porque) cumpre seu papel tradicion al de esposa dependente (porque) a sensação de dependência também gera culpa (e) ela acha (que) deve ser sempre agradável. não se discute. 38 ENI PULCINELLI ORLANDI e dij'icil negar: não faz uma negação direta. Traz . a expressão é felicidade para todos. o do homem é terrível e é social. Essa indeterminação. curiosa conclusão: o que significa curiosa. sem especificidade alguma. que. é claro. adquire características econômicas. em que o sobrenome de Marie . deslocando. E o que é terrível (terríveis problemas) é "ser compelido a procurar compensações" para esta perda de prestígio. aí. nada menos que Cr$ 264 milhões: a avaliação é reforçada. enquanto para o homem se anuncia o preço sem determinações. isto é. qua l é seu peso em termos de conclusão? 0 conjunto do texto preenche esse sentido. biológico. recentemente: afirma a novidade da notícia. . o mais básico.uma perda que também é adjetivada: perda de prestígio domestico. sugere "nenhuma". soam muito falsamente. ainda. Em termo de argumentação. Notando-se. adjetiva "intuição". ainda estamos em casa. A diferença de verbos compor/formar ligada à que existe entre corpo/anatomia mostra bem a perspectiva de dentro. de essencial (para o homem) e a de fora. como o faz usualmente. reforça a idéia de que hoje não há possibilidade de. nesse contexto. o inviável. enquanto a s diferen~as "são mais básicas".LaLiberté . Aqui não se adjetiva as compensações e tampouco se as quantifica. um quí suíço deve ser argumento que convence pelo simples fato de ser suíço.11 i k 1 1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 39 natureza biológica: não é sem motivo que biológico esteja adietivando natureza. sem dar determinações temporais. Como v eremos mais adiante. é intere sante a citação de nomes próprios. a construção da frase no condicional e com interrogação reforça esse aspecto.. enquanto para mulher su rge a forma analítica "corpo da mulher" e seu correlato "anatomia feminina". que. assim. Marie (socióloga americana?) e P eter (nome próprio bastante comum). de natureza biológica. Maria LaLiberté Richmond e Peter Iten. o que torna ainda mais pejorativo o alcance da tal intuição.. e quando o presenteiam à mulher o fazem de fora (o corpo da mulher) ou como objeto: "o status do marido e o preço do corpo feminino". se fossem compradas no mercado de produtos químicos: esse circunstancial é o apoio d e toda a argumentação e faz a virada do social e do -biológico para o econômico. nem mesmo diz se é preciso. o mais caro não é o de prestígio mas o menos econômico. Até aí. tod o essejogo: o jogo. Corpo então é algo único. al go mais básico. afinal. sair de casa para encontrar compensações. quanto às substincias. em sua indeterminação. alguma intuiçâofeminina: o feminino mais uma vez. de cerne. Não se falou em problema de natureza soçial mas em jogo que é apenas social. 40 . Não se determina que compensações (no plural) são essas e se são de caráter social.não parece sem motivação. padrões culturais: generalizados. da forma como periferia. E. refere-se ao social e vem bastante indeterminado: aquilo que foi dito faz parte de "todo esse jogo é apenas um problema social". pressão feminista: e não pressão feminina. 0 social aí é superficial (apenas) mas esse "apenas social" causa problemas terríveis para os homens. químico suíço: assim como as clínicas suíças tem muito prestígio. corpo masculino: curiosa formação de adjetivo para homem. alguns especialistas. do superficial (para a mulh er). nesse caso. outros (especial istas): usa-se o prestígio da palavra "especialistas" sem a necessidade de outras determinações. Inclusive. Para perceber essa diferença de usos é preciso se ir para o contexto em que aparecem essas duas formações: "substancias que compõem o corpo masculino" e "as que formam a anatomia feminina". Mas a quantificação "alguns" coloca a divisão de opiniões. aí. e o alguma. do fato para o movimento de opinião.igualdade. o desp erdício. o caráter dessa indeterminação é o da subjuntividade. o que. os dois lados se confundem no uso de um operador que expressa bem essa falta de nitidez das diferenças: o operador também .. há a tentativa de mostrar lados diferentes mas a linguagem se debate confusa mente no mesmo ponto de vista. cada gesto: sugere que sejam todos. diferentes ordens de razões: no discurso de Status. ~Prias necessidades: quais são essas necessidades? São próprias. para o homem. há cristalizações como "a responsabilidade do chefe de família". fica claro ao longo do discurso. quando. também há uma indeterminação. aliás. coisa é nome indeterminado e alguma não específica. sempre em dívida. generaliza. sociais (terríveis)/ dolorosas. a que casa e a que se dedica a uma carreira. o problema das diferentes ordens de razões. 0 passado que continua no presen te é dito com precisão. a indeterminação e a subjuntividade aparecem quando se fala em futuro e em opção. segundo alguns especialistas/segundo outros) circunscreve o valor da igualda de entre homem e mulher na relativização de diferentes pontos de vista. A magia da palavra. Mesmo quando procura distinguir dois tipos de mulher. mas. 1 1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 41 temporalidade: já (implica culpas). quando caracterizada. do ponto de vista dos circunstanciais. ao contrário. hoje/talvez amanhã (indeterminação na oposição). No discurso de Nova. isto é.esposa dependent e -. assim como.). mas que anseios são esses? condição de ser humano: trata-se também de uma cristalização. por exemplo. se o nome ao qual se referem não fosse "anseios". oposição (para a mulher/para o hom em. sempre (sempre mais limitada. E não é apenas um problema de som. raramente. Observemos esse aspecto: simples papel da mulher: simples indetermina papel e da mulher não especifica que mulher.ENI PULCINELLI ORLANDI No discurso de Nova. há doi s fatores essenciais de indeterminação e subjuntividade: a temporalidade e o problem a ligado aos diferentes lados. sem determinação alguma. Aqui ela se indetermina em si mesma. c seus prOPrios anseios: tautologia em #dpróprios" e "seus" que poderiam dar uma for te determinação à expressão. Mas quais? Os ditados pelas opções mas também os d a atitude tradicional. São próprios e são seus. crises dolorosas: indefinição e subjetividade que contrasta c om 64 os terríveis problemas sociais" alegados pelo texto de Status: problemas/cri ses. alguma coisa. essa fo rmação sintagmática é também cristalizada. Nesse dia: total indeterminação. muitas culpas: indeterminação da linguagem subjetiva . abnegação feminina: parceira da intuição feminina. Soa estranh a "a abnegação masculina" como a "intuição masculina". etc. sempre agradável. seu papel tradicion al: esse tradicional aparece definido em outra parte do texto . Pw Queremos ainda observar que. desta vez. nesse dia. Uma suposição. determinando-a: alguma intuição. mas como integração dos elementos numa totalidade. . apenas um problema social. a outra coisa. abertura de opções.F_VER-RO: Em Status. Incluímos. alguma coisa. A partir daí. substâncias. etc.fica reduzidc a uma co ndição (se fossem) que transforma o argumento da diferença básica em diferença de mercadoria. a coisa se complica. intuição. seja. que cada unidade também tem seu valor em si e que. mulheres. subiriam. em uma forma circunstancial. são referidas ao c orpo masculino. entretanto. isto é. seus próprios anseios. problemas. E o verbo não foge a essa carac terística. sente c omo tendo sido. de um lado.e o uso das formas subjuntivas . gesto. as formações 1 parafrásticas que margeiam. compensações. quantificadores e circunstanciais. e essa direção está na construção do texto e leva-nos a detectar qual é seu apoio. b) Se fossem compradas no mercado de produtos qui/nicos. etc. sensação de culpa. imagem.se fossem compradas. Em Nova. são os seguintes. E o encon tramos. Podemos observar que há uma relação entre os substantivos. possibilidade. Na construção estão esses modos de ligação entre as unidades e o modo de organização delas no texto. no conjunto dos quais há o domín io do substantivo status: gente. quando atende.da mulher. os outros elementos realçam a indeterminação. A maneira como elas acontecem no tex to inclui não só as suas ligações entre si. terríveis problemas. de outro. As outras caracterizações . deve-se procurar determinar a direção da argumentação. problemas sociais. gas tos. anseios. através de "entretanto". . caminho. especialistas. sensação. Quando não é circunstanciado 42 ENI PULCINELLI ORLANDI no sentido da indeterminação . papéis. não conseguir. etc. homens. aquela. felic idade. os gastos sub iriam para nada menos que Cr$ 264 milhões". podemos constatar que contam as palavra s e a maneira como elas acontecem no texto. jogo. em b. com o domínio do substantivo culpa: incertezas. E o que foi colocado antes . insegurança. se vê compelido a procurar. etc. momentos. ainda que compreenda. mundo.por ter sido sempre. os outros elementos o indeterminam: a lguns especialistas. diferenças. No primeiro texto . sustenta a objetividade da argumentação. temos os seguintes substantivos. essa não é vista como oposição entre elementos. quando falamos em organização. o uso de formas compostas do verbo .a nossa entrada para o nível da construção é feita através de duas formações: a) Por entretanto em: "Para o corpo da mulher. simples papel da mulher. nesse dia. de natureza biológica . necessidades. é difícil negar. possibilidade futura quase inevitável.. CONSTRUÇõES: Por essa primeira fase da análise. padrões. de c aráter comercial. E a diferença de q ue são capazes é a existente em relação ao dito e o que poderia ser dito. e adjet ivos. SUBSTANTIVOS. mas um aspecto mais geral que chamaremos constr ução. relação essa que está caracterizada da seguinte maneira: a) Quando o substantivo determina. b) Quando o substantivo tem um caráter de indeterminação.químico suíço. nesse jogo de indeterminação.o próprio verbo é impreciso: sentir. Esse é o jogo da indeterminação nos dois textos. etc. todos. Não esquecendo. desculpas. nada menos são amarradas quando. todavia. todo texto.o da revista Status . 0 que passa por irônico. que o estilo não é indiferente ao que se diz. As referencias ao espaço do texto.e no texto sucede . quando colo cado na transcrição exata de sua ordem (a da dominancia das frases. ou. a) Em "até o aumento de opções resulta em incertezas. Esta é a base da argumentação. crescendo. 0 que nos autoriza a restituir operadores para " até" (até = mas mesmo). com fatores de estilo e verificarmos. continua o mesmo lado. Esse estilo é que chamamos "subjuntivo". justamente no níve l da construção. limitar ou não o número de filhos". mundo. imagem. No segundo texto .da revista Nova . etc.alguns elementos da construção também são r eveladores. num mundo em que a imagem da mulher é a de " eterna sacrificada". insegurança e culpa-. E. E ntão temos: Hoje a mulher pode optar entre trabalhar ou não . isto é. E 0 Outro lado. Essa ordem restitui um pouco de determinação à indeterminação desse elemento "até". Passado pela ordem de dominancia. Perguntando pelo hoje. ou" mas isso não é suficiente para caracterizar a opção para os elementos que estão separados por vírgula e corresponderiam ao operador e. podemos relacionar a ordem. no texto. et erna. a construção. não é espaço. podemos verificar mais um fator: f A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 43 o da ordem dos enunciados. Em que esta última difere da que opta pela 44 ENI PULCINELLI ORLANDI carreira? Não é outro lado. A ironia é um argumento. a que atende seus próprios anseios e não se sente digna. não indica realmente um outro lado. no texto. insegurança e culpa". Nesse sent ido. indeterminadas. Pela análise da dominancia de frases.0 artigo estaria justificado pelo seu tom de ironia. é tempo: talvez amanhã. podemos verificar que o operador "en tre" incide sobre "ou. nessa confusão de lados e de tempos. temporalmente . b) Por outro lado. casar ou não. chegamos à razão d a indeterminação e ao que seria o argumento basico do texto: hoje. Todos os elementos são carregados de indefinição: crescendo. limitar ou não o número de filhos. a mulher pode escolher entre trabalhar ou não. ate representa um fator relevante na ordem dos enunciados com relação à argumentação. ao espaço dos argumentos também são confusas. às intenções do locuto r e à sua localização em uma determinada ordem social. 0 tempo todo é um só e mesmo lado. casar ou não. De um lado. que se faz da seguinte forma: 11 mas por ter sido sempre mais limitada do que o homem mesmo o aumento de opções re sulta em incertezas. Vacilam. a ordem canónica) aparece como encadeamento grosseiro de razões. em formas (principalmente as do verbo) compostas ou subjuntivas e. pois."Hoje a mulher pode escolher entre trabalhar ou não. a que opta pela carreira e a que cumpre o papel tradicional e. E não é só no aspecto temporal que há vacilação. de outro lado. podemos verificar que esse "até" antecede . ao como se diz. E a formação que os introduz. "Por outro lado". dilui-se em impressões. etc. aceitável. Encontraremos em b ess a vacilação no espaço. ou. A ilusão da possibilidade total de opções (em abstrato) nasce. é uma escamoteação de uma dificuldade real. não se refere a deveres e direitos que estejam ou não sendo cumpridos. E a subjuntividade é isso: mais do que em fatos.(e) entre casar ou não (e) entre limitar ou não o número de filhos 0 que nos dá a falsa idéia de que pode optar entre todas essas Possibilidade s quando. Essa passagem não se fará sem intermediário: construiremos uma rede ' em que o rganizaremos os elementos lingüísticos junto a uma perspectiva social. Primeiro Texto (Status): Feminismo torna mais felizes as mulheres possibilidade futura duvida que traga a felicidad e para todos igualdade de direitos para homens e mulheres (direitos identicos) p roblema social: abandono do status e perda do prestígio doméstico.Da forma como está formulada. o estilo. fazemos um estudo que leva em conta os diversos aspectos do contexto (lingüístico). Tomaremos a definição de feminismo como elemento que organiza os elementos dos quais falamos até o momento. Na verdade esse problema que aparece apenas como um problema de construção lingüística. que tem como interlocutor ideal a mulher . através da introdução de um novo elemento nesse estudo: o da situação (contexto social). e). só atribuiremos importancia aos fatos que estiverem inscritos lingüisticamente no texto. Por exemplo. Gostaríamos de alargar essa perspectiva. criando uma falsa representação de opções. necessidade de compensações p roblema biológico (direitos idênticos): substancias. ideologicamente. se ref ere a sentimento de culpa. para as mulheres. No entanto.os argumentos ut ilizados são das ciências humanas.Nova. Não se trata de uma relação de simples co-ocorrència de fatores lingüísticos e. Ambos os textos trata m do feminismo. as opções não se calçam de condições reais e mantêm a hierarquia já estabelecida. Isso também é ideológico. a construção. 46 Feminismo - . há uma hierarquia estabelecida. a construção explicita a~ opção ao nível horizontal (ou) e deixa indefinido o nível vertical (e). Corpo = mercadoria (1) Esse procedimento nos foi sugerido pela colocação de Halliday da rede se mântica enquanto intermediária entre o social e o gramatical. a argumentação se indetermina num talvez amanhã de alternância de papéis de dependencia e independência. ou não. as indefine e. sociais. Por e emplo. mas a A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 45 sensações. uma mulher que quer "trabalhar (e) casar (e) ter filhos" enfrenta o problema social da existência. Com isso. o tom. a ordem.Status. em função das próprias necessidades (quais?). cujo interlocutor ideal é homem . a mulher pode "não casar (e) não trabalhar (e) não limitar o número de filhos"? A forma.usa argumentos baseados em uma razão (pretensamente) das ciências exatas e no segundo . po r isso. Formuladas de forma vaga. entre um hoje (que é ontem também) indesejável e um talvez amanhã que não se sabe muito bem qual será. mas e m que o social é determinante. de creches. do jog o dos operadores (entre. encobertos. de comando (9) e submissão (?). de fato. no texto. 0 texto ap arecerá como frouxo e indeterminado. como estão enunciadas as opções. mantém os conflitos. Não se refere a fatos. Na análise dos dois textos podemos observar que nada na linguagem é indifere nte ao sentido: as palavras. custam mais caro. Não é por acaso que o primeiro texto . subjacentes a esses dois textos. gentil. ser eterna sacrificada e o complexo em relação à carreira sugere que os deveres estão ligados à feminilidade(?).ENI PULCINELLI ORLANDI Segundo Texto (Nova): opções: trabalhar ou não. em bases do context o social. ser agradável. e) Causa da diferença: o preço das substâncias que formam o corpo masculino e as que formam a anatomia femini na. o que. os seguintes componentes: a) base da relação homem-mulher b) direitos 0 deveres d) igualdade e) causa das dife renças f) evolução dos padrões culturais Vejamos como ocorrem. em cada texto. e quando não opta. f) Evolução dos padrões culturais: f') hoje: quando cedem às mulheres. no futuro. F~) amanhã: "não dá para negar que seja umá*possibilidade quase inevitável". b) Direitos: Y) homem: casar ou não. em função das próprias necessidades não sentimento de culpa . num relacionamento de troca. segundo o texto. d) Igualdade: altemáncia de papéis. limitar ou não o número de filhos. c') homem: sustentar a mulher. é uma diferença de natureza biológica. Ao fal ar da mudança dos padrões culturais. b) Direito: b') homem: chefe da casa. Primeiro Texto: esses componentes: a) Base da relação homem-mulher: status de chefe da casa. b") mulher tradicional: ser sustentada. limitar ou não o número de filhos integração de sua c ição de ser humano alternância de papéis de dependencia e independencia. não especificam o que é igualdade nessa possibilidade futura quase inevitável. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 47 Segundo Texto: a) Base da relação homem-mulher: papéis sociais num relacionamento de troca. e m função das próprias necessidades. c) Deveres: mulher que opta: trabalhar ou não. F) hoje: sentimento de culpa quando opta. e) Causa das diferenças: educação que limita. mulher: abnegação. Hoje: casamento. para as mulheres distribuição do poder: comando e submissão alternados Podemos distinguir. limitar ou não o número de filhos. casar ou não. fiei. f) Evolução dos padrões culturais. b") mulher:? 0 Deveres:? d) Igualdade: igualdade de direitos (ser chefe da casa). tem problemas de prestígio doméstico e são co mpelidos a procurar compensações. trabalhar (ou não). f") amanhã: alternância de papéis sem sentimento de c") . casar ou não. é claro). 0 artigo "0 status do marido e o preço do corpo feminino" está na revista St atus. Mais do que de informações. "Brasil de fora para dentro" e "As invenções do mes". podemos chegar à seguinte conclusão: o homem e chefe da casa porque trabalha. 0 contexto. por outro lado. aqu i. tudo isso significa. porque. Essa afirmação. tampouco se distinguem as diferentes classes. no caso da indústria cultural. que é carregada de toda uma ide ologia do sistema capitalista que não é possível discutir aqui. está a idéia da família e a veiculação dessa idéia pela in cultural. 0 trabalho remunerado aparece. Essa revista tem 154 páginas de ótimo papel. o direito de ser sustentada. aindai. Não são apenas as palavras e as construções. pois. no mesmo dia. Para isso. entrevistas. enquanto publicações de revistas especializadas. fofocas. em que está o artigo que fala da mulher.culpa. mais do que informação. literatura. abandonamos o domínio daquilo que está inscrito. Ou. Fica difuso o conceito de trabalho. em sua sustentação. não pretendemos discutir o conceito e o 48 ENI PULCINELLI ORLANDI valor social do trabalho. sob a forma gramatical. estória em quadrinhos. Na observação da determinação entre o lingüístico e o social. Ibrahim Sued (falando de gente de status) e tudo isso mu ito bem distribuído entre magníficas fotos de nus femininos. o dever de su$tentar a mulher e. o lugar social da produção do texto. um texto está p renhe de sentidos e. o estilo. para olharmos para o que transborda dela. 0 lugar social do falante e do ouvinte. superposição de dois problemas: o da distinção de sexos e o da distinção das classes sociais.apenas compramos. críticas. Poderíamos p erguntar se a mulher rica e a mulher pobre têm as mesmas possibilidades de opções em relação ao trabalho. E se. mas se mantém. economi a. Há aí u m espaço social que significa. E isto é a polis semia. Há. que mulheres podem optar entre "trabalhar ou não"? Os textos camuflam as distinções: falam para (de) "todas" as mulheres e reduzem as dificuldades ao complexo de culpa ou ao preço de substâncias. como d iferença fundamental. Agora. i Os textos éscolhidos ao acaso . o tom que significam. A variedade de artigos é bem ampla: cartas. Por trás do texto. pois. trata-se da divisão do trabalho. não está expressa em nenhum dos textos. gostaríamos de acrescentar que. o valor da revist a como parte do mecanismo da indústria cultural. então. os arquivos secretos sobre as aventuras homossexuais de figurões americanos. nesse segundo texto. o nivelamento de opinião e a ideologia do sucesso. Trata-se do problema da reprodução e das relações economicas. tr az o A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 49 . existe a persuasão. a forma de distribuição do texto. ficção. Pelos dois textos. na linguagem. como tal. o sentido é indiferente à linguagem. exemplares recentes de cada revista . nos textos. 0 artigo que escolhemos pertence a uma seção chamada Periscópio.pertencem a publicações específicas. fotos e composição muito bem cuidadas. os deveres e os direitos da mul her. dissemos que nada do q ue está na linguagem é indiferente ao sentido. quanto à mulher. 0 Periscópio não vem assinado e trata de uma mist ura de pequenas notícias como os incríveis métodos anticoncepcionais da moralista era vitoriana. "As tendencias de Status". a explicação científica para a maior virilidade dosjiomens de países ensolarados e as muitas dicas e informações de 4 seções diferentes: "Nos bastido res do poder". política internacional (com Paulo Francis. quanto ao homem. Não estão muito claros. não deixaremos de refletir a respeito dos valores que es tão presentes nesses artigos. "A adúltera perante a lei". a discussão das tendencias e mode los.. São artigos que pretendem "educar a mulher para a vida". e está na revista Nova. não levam à produção de um texto realmente. "As armadilhas que o dinheiro prepara". em uma parte que não anali samos. e a que fazemos. na medida em que deslocamos seus limites. é a seguinte: co mo caracterizar o lingüístico. em indicar vias reais para a solução de conflitos (ou. na indústria cultural. "Confesso que vivi: Pablo Neruda". Em ambos os textos não temos o novo. 0 texto "0 simples papel da mulher já implica culpas" faz parte de um arti go mais amplo. em sua burocratização de produção.no sentido de formarem um process o discursivo . Uma das questões. a preoc com o efeito. como sensações. não se distinguem quando vistas como publicações de massa. a "nova" compreensão da vida. cinemas. des cubra o que pode fazer. intencionalmente. e do que se compreende. E a mul . discos. "0 mito do orgasmo múltiplo". fizemos o seguinte percurso: l?) Análise de palavras 2?) Análise de construções 3?) Construção de uma rede semantica. e se resolvem em um talvez amanhã. sedimenta certos sentidos e institucionaliza o dizer. a "autora" conclui: "aceitando que tem limites. "Pepita Rodrigues: de repente o sucesso!". "Homens passivos e co mo lidar com eles".tom das "curiosidades. pretendendo ser guia para o desamparo da mulher. o consumo imediato. Moda e Beleza. "0 que há de novo sobre alergia". Ficção e Sempre em Nova (informações sobre atualidades em livros. sua compreensão). intermediária entre o social e o gramati cal 4?) Consideração da produção social do texto como constitutiva de seu sentido. quando se trata do sentido? .). levá-la a se situar nesse mundo tão caótico. E não é por acaso que a revista se cha ma Nova (a "nova" mulher. nesse passo. criamos um espaço de questões que faz parte do trabalho do lingüista e que ele deve responder. de lado. reportagens várias (Nathali e e Bob.Nova -. está nisso: a sociedade é d ividida e o sentido distribuído não é só polissétnico: está despedaçado. no outro . isto é.' consideran do necessário esse deslocamento. se diferem em seus objetivos imediatos. mas mudança exte rior da mesma coisa: a indeterminação do problema homem mulher.o problema é colocado de forma irônica. etc. interessado em formar opinião. A comercialização. os conflitos aparecem confusamente. Aliás. o ritmo das publicações. etc. horóscopo) . embora o tom seja sério. Pelo procedimento que seguimos. Essa revista tem 114 páginas e se compõe de artigos. Mas. a variedade sistematizada. como vimos. her sonha e fica feliz com seu complexo de culpa.Status . etc. compras.).o que é dito nesses dois especificamente. se resolvem em aparencia. Em um deles . 0 artigo que escolhemos está junto com outros artigos como: "Um homem conta sua pr imeira experiência sexual". A ilusão de que se é sujeito do so ENI PULCINELLI ORLANDI que se diz. "Poluição sonora". dentro desses limites". pelo menos. no final do artigo. chega-se a uma "cur iosa" conclusão). de Flávia Amaral. São revistas especializadas: para homens e para mulheres. Assim como o lugar que o leitor ocupa socialmente determina a leitura que faz dele. Nesse ponto cumpre bem o papel de revista: o imaginário é real e o real é imaginário.(no texto sobre a mulher. Ao deixarmos. Todas essas características da publicação compõem o sentido do texto. "A colecionadora de culpas". 0 fato de existirem outros textos que garantem . mas textos de livros didáticos de História do Brasil. Uberaba. Dunod. 1979. um elemento em (*) Texto publicado na Série Estudos 7. a unidade a ser considerada é o texto. Será. . do período que começa em 1964 e vem até nossos dias. ou seja. V. mais especificamente. tendo em vista a estrutura da frase. Voloshinov. Editora Nacional. Albero Editor. que estará nos ocupando nesta a nálise. ENI PULCINELLI ORLANDI sua relação com outros. Barcelona. 1976. T.). Mame.em "Os Protagonistas do/no Disc urso" e "0 Social e o LingUístico'% em Foco e Pressuposição. Ariel. E. Aires. a consideração do texto. . sobre a relação verbo. 1976. em termos de marcas lingüísticas. com o ouvinte. a relação com o mundo. o material sobre o qual incidiu a análise. A. limitar-me-ei a explorar uma das direções da análise. (2) Discutimos esse problema. 1981. se assim se pode dizer. a que incide sobre tipologia e. Alguma observação a respeito de disc urso referido será feita ocasionalmente. Eis a indicação dos livros de que tiramos os textos: 1) Borges Hermida (B. isto é. o enunciado e. Para a apresentação desse trabalho. K. Daí derivam as grandes aquisições feitas através da reflexão sobre enunciação: o falante. então. = T) mas é de outra natureza.. Por outro lado. de forma cada vez mais abrangente. Hafliday . uma vez que o texto. 1969. Ponzio. Uberaba. que foi a reflexão sobre a tipologia e um pretexto an alítico. que a lingüística desenvolve seu projeto na consid eração do contexto. do nível segmental (a passagem frase-texto) e outro qualitativo. não se define como uma soma de frases (f.BIBLIOGRAFIA Adorno.. e entra no foco das atenções o contexto situacional. Série Estudos 4. em Análise do Discurso (1? semestre de 1980). História do Brasil III. Madrid. Cia. Em um terceiro momento. + f. em que me propus a análise de livros didáticos de História do Brasil.H.La Industria Cultural. enquanto unidade significativa. e Morin. tomei estrategicamente dois pretextos para delimitar o escopo da análise: um pretexto teórico. 1973. f. M. que se fez considerando os tipos de discursos referido e referidor.. Como se tratava de um curso que tinha como objetivo a prática da análise de discurso e a reflexão sobre problemas que deriva m dessa prática. 1978. ou seja. Pêcheux. inicialmente. Esses textos didáticos de história formam. .Analyse Automatique du Discours. Paris. Devo dizer. São Paulo. não estatica mente. . em 3 níveis: em um primeiro momento considerouse o que chamamos contexto lingüístico. a análise de textos didáticos da chamada "3~ República". Paris.Pr oducciôn Linguistica y Ideologia Social. . ou seja. implicando as condições de sua realização.enquanto sociolingüística . + . Essa terceira é a proposta da análise de discurso. advérbio e sujeito em português. em que enco ntramos dois saltos: um quantitativo. Nueva Visân. a consideração do t exto como unidade complexa (dinâmica) de significação. em um segundo momento e xplorou-se a relação frase-situação."La Sémantique et Ia Syntaxe dans une Grammaire Fonctionelle". não serão quaisquer espécies de textos. através dele. 0 discurso da história para a escola* Este trabalho representa a exploração parcial dos resultados de um curso de pós-graduação. B. . qual seja. nesta perspectiva. M. portanto. Sémantiq ue et Logique. situando a necessidade da consideração do social na linguagem . mas como processo de significação em que também entram os elementos do contexto situacional. 1974.El Signo Ideologico y Ia Filosofra del Lenguaje. A. Consideramos que a atividade de dizer é "tipologizante". Historia do Brasil. sua fisionomia.um tipo mas de uma atividade estruturante de um discurso determinado. pois. poderia analisar palavras ou frases de base que determina ssem alguma especificida. M.). pareceu-me mais adequado tomar trechos de textos diferentes que tratassem de um mesmo assunto. paralelamente . A partir de que momento dizemos que um discurso é de tal ou tal tipo. então. E a noção de condições torna54 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 5 . seu funcionamento. o autoritário e o lúdico e que também orienta esse trabalho. Rio de Janeiro. um cruzamento de características. História do Brasil (para o ensino de 2? grau e vestibulares). 6~ série do 1? grau. 1979. Editora Nacional.). Cia. que era o que eu procurava. 1979. todo falante quando diz algo o diz estabelecendo uma "fisionomia" para seu discurso de tal fo rma que. uma mistura. Funcionam ento porque não se trata de um modelo que o falante procura preencher .2) Marlene e Silva (M. t ratamos de duas "espécies" de discurso. para meus objetivos. trabalhamos no cruzamento do discurs o didático e histórico. 1979. o relato do fim de um mandato e início de outro. São Paulo. 6~ série. C. série Sino pse. Souto Maior (S. 2? grau. Isso também se deve ao fato de que se trata de processo discursivo e não de unidades cristalizadas. ou seja.de do texto. qu e é o do texto didático. Atual Editora. G. A questão é. eu diria que essa "fisionomia" representa um funcionamento discursivo. que vamos estudar o texto didátic o. nossa atenção na A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1 53 maneira como se tomava posse do poder. Há vários procedimentos possíveis em análise de discurso. Porém. isto é. encontrar marcas formais que explicitem. São Paulo. Hi stória da Sociedade Brasileira. 1977. em relação ao fenômeno discurso observável. ao analisar.). Em nosso trabalho. Pereira (K. 1977. São Paulo. 4) Esau e Gonzaga (E. Moderna. na íntegra.). na caracterização desse funcionamento discursivo específico. representa tal ou tal funcionamento discursivo? Depende das condições. Dissemos mais acima que o pretexto teórico para essa reflexão foi a tipologi a. Saraiva. e procurando as marcas que o caracterizavam. ou m elhor. História do Brasil para Estudos Sociais (com Or ganização Social e Política). para um interlocutor determinado. R. 5) A. Pod eria ter-me limitado a um texto. São Paulo. História do Brasil. 19 75. qu e é a que distingue o polCmico. no entanto. são muitas. ou melhor . São Paulo. As dificuldades. por um falante det erminado. u ma vez que só o estudo comparativo de textos poderia me levar a uma caracterização de funcionamentos discursivos distintos. com finalidades especfficas. Se atentarmos para as classificações existentes a respeito de tipos de discurso. Ed. isto é. podemos reconhecer essa fisionomia como um tipo. F. L).). procurando um funcionamento discursivo específico. E é assim . 7) Luís Koshiba. tomamos certos trechos. sem eleições. os que tratam de "eleição indir eta" e. 6) Francisco Alencar. Acrescente-se a essas variedades aquela que tenho proposto. História do Brasil. Ao Livro Técnico. S. Pa Desses livros. Assim. 0 fato de privilegiarmos certos trechos se deve a uma questão de organização do material analisado e da quantidade de dados que se ofereciam. Ibere. P. veremos que há uma grande variedade de critérios e que há. 3) Francisco Silva e Pedro Ivo Bastos (P. Lúcia Carpi e Marcos Vinicius Ribeiro (A. Denise M. Fixamos. ) a) Assumia a Presidência. H.).admi nistrativa que se instalava no país iniciou-se com a edição pelo alto comando revolucionario (general Artur da Costa e Silva. os trechos que tratam da eleição ind ireta e conseqüências. sob a forma de adjuntos ou orações adverbiais. dos locais e das circunstâncias. tod a substituição no poder se fez com mudanças nas regras do jogo. mais uma vez. b) 0 primeiro presidente eleito. é a de que se evitam as afirmações categóricas. q ue formavam o Alto Comando da Revolução. em uma leitura atenta dos textos. isto é. que diz que a significação está na interação entre locutor e re ceptor. para mim . havendo sempre modalização apreciativa. Essa mudança de regras que corresponde à sucessão está explicitada. Ranieri Mazzili. É no lugar dessa interação. E é essa interação que pretendo observar no texto. b) A 9 de abril. Pois bem. e isso nos permitiu distinguir espécies. decretaram o Ato Institucional n? 1 que tornav a indiretas as eleições para a presidencia da república. em caráter provisOrio. foi o Marechal Castelo Branco. o texto com duas negações: "Apesar das medidas tomadas pela Junta Militar. que. tendo sempre havido necessidade de se mexer em regras para se preparar a posse do sucessor. da mudança de regras no processo sucessório e de outros fatos a ele ligados. Notamos também que há textos em que não há essa indeterminação. Almirante Augusto Rademaker e br . mesmo s em a análise. os ministros militares. c) Em Brasília de acor do com a revolução ocupou o cargo de Presidente da República o deputado Ranieri Mazzili. como. pois. general Artur da Costa e Silva.): "A fim de preparar a transição a Junta Militar realizou uma reforma constitucional. que contribuições a análise que fizemos pode trazer para o escl arecimento dessa questão acerca do funcionamento discursivo. quadro institucional. Analisaremos. o Presid ente da Câmara dos Deputados. Vejamos os textos que falam de eleição indireta: 1) (B. repetir Voloshinov (1976). foi a descaracterização ou acobertamento do sujeito da história. os Atos e as mudanças na Constituição. Fica claro. I. P. foi publ icado o Ato Institucional que estabeleceu. num grupo de textos. dados sócio-h istóricos. se caracteriza o funcionamento discursivo. 3) (P. a eleição indireta: o Presidente não seria mais eleito pelo voto de todos os eleitores (eleição direta) mas pelo voto dos deputados e senadores. 0 que nos pareceu óbvio. 0 processo sucessório não é automático. como foi dito mais acima. por exemplo. expressão do sujeito face a outro sujeito. P. No dia 11 de abril de 1964 é eleito pelo Congresso Nacional o general Humberto de Alencar Castelo Branco . a partir da impressão de que essa história. ou melhor . a questão da posse do poder em 1964 e a sucessão nos períodos subseqüentes. no seguinte texto de Koshiba e P ereira (K. d) Uma Junta Militar passou a governar até tomar posse o novo Presidente. o general Médici. o uso de datas.5 se híbrida e nela se misturam: intenções do locutor. nesse passo. era contada de maneira fortuita. Eu poderia.) a) 0 Senado declarou a vacanci a do cargo presidencial. E ve rificamos que isso se dá através de um jogo de linguagem que afeta basicamente a relação do verbo com o sujeito. da terceira república. funcionamentos diferentes de textos didáticos de história. por exemplo. em parte dos textos analisados. Podemos dizer que essa também é uma característica dos textos de história dess e período. o brigadeiro Correia de Mello e o Almirante Augusto Rademaker. que. eleito ainda em 1969. 2) (M. ainda em (K. procuramos alguma marca que nos lev asse -a uma caracterização lingüística desse discurso. a escolha do sucessor de Costa e Silva não se deu sem atritos na área militar".) a) Ainda em Abril de 1964. para a escolha do Presidente da Repúbli ca. incorporando no texto da constituição o AIS e demais atos no artigo 182". desse confronto. Uma outra impressão que nos fica da leitura atenta de vários textos. S. a partir dessa forma indireta ou atenuada de se falar das eleições indiretas. essa descaracterização. a partir de 1964. b) A estruturação da nova ordem político. Vejamos. Mudavam a cena e o ato. restabelece-se o direito às cassações. posto em vigor pelo Alto Comando Revolucionário. integrada pelo Ministro do Exército . Médici. e Israel Pinheiro.) a) Dando continuidade ao processo revolucionário. Brigadeiro Francisco de Assis Correia e Mello. redigiu o Ato Institucional n? 1. um dos líderes do Movimento de Março. ambos candida tos da oposição. poderes ao novo presidente para que decretasse estado de sítio por trinta dias e suspensão das garantias constitucionais. a fim de completar o qüinqüenio Janio Quadros -João Goular t. do "Ato Institucional n? 1" (9/4/64). M.. Aeronáutica e Marinha. Determinava tambem que o novo presidente e vice presidente deveriam ser eleitos pelo Congresso. c) No dia seguinte à promulgação do Ato Institucional.. Dentre essas medidas destacavam-se a eleição indireta para presidente da República. a 3 de outubro de 1966.. C. f) No mesmo dia da posse entrou em vigor a Emenda Constitucional de 1969. foi editado o Ato Institucional n~'2. através do Congresso Nacional. obteve a promulgação do Ato Institucional n? 2 pelo qual os partidos são dissolvidos.. Ministro da Marinha e Ministro da Aeronáutica. 0 documento pr eservava. determinou-se que as eleições para a presidencia deveriam ser indiretas. o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco seri a eleito pelo Congressopara exercer a suprema magistratura do pais. o marechal Artur da Costa e Silva. e) Novos Atos Institucionais foram editados no governo Caste lo Branco. Almirante Augusto Rademaker. d) A eleição de Negrão de Lima. pressionando o presidente. promulgaria no dia 10 de abril um Ato Institucional que mantinha a constituição de 1946 e as constituições estaduais e impunha uma série de medidas que deveriam ser observadas até o dia 31 de janeiro de 1966. 5) (S. Marechal Castelo Branco. c) Em 24 de janeiro de 1967 era promulgada a Nova Constituição e dois meses depois tomava posse o novo presidente. b) 0 Alto Comando da Revolução vitoriosa. na Guanabara. 6) (A. ) a eleição do novo presidente seria feita pelo Congresso dois dias após a publicação do Ato. m arechal Artur da Costa e Silva. e) Durante esse curto governo. h) A 2 de abril de 1964 declarava-se vaga a Presidênc ia da RepUblica que seria provisoriamente ocupada pelo Sr.. à Presidência da República. foi elei A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 57 to pelo Congresso. composto pelos novos ministros da Guerra. entre outras coisas que ( . além de se determinar que as eleições para a presidéncia da República deveriam ser indiretas. Almirante Augusto Rademaker e Brigadeiro Correia de Mello. no qu al entre várias disposições ( . originou imediata reação da linha dura que. (1464 a 15-4-64). de uma forma geral. d) Assim. ) determinava-se que o presidente seria escolhido por eleições indiretas. cujo mandato deverá estender-se até 1974. Mílton Campos. Ministro da Justiça. Ranieri Mazzili. assumiu o poder uma Junta Militar.. a Constituição de 1946 e estabelecia. 4) (E. . b) No impedimento do Presidente. deputados feder ais e senadores elegiam o militar cearense. assumiu a presidência o marechal Humberto de Alencar Caçtelo Rranco56 ENI PULCINELLI ORLANDI d) Em 27 de outubro de 1965. com algumas modif icações em seu texto. G. gen eral E. respectivamente. General Artur da Costa e Silva. c) No dia 15 de abril.) a) Com a vitória . em Minas Gerais. de 27/10/65.igadeiro Correia de Mello). composto pelo general Artur da Costa e Silva . f) Determinava essa lei que seria mantida provisoriamente a Constituição de 1946. g) Novas reformas políticas foram postas em prática: pelo Ato Institucional n? 2.) a) A 30 de outubro reunia-se para eleger o novo presidente. a 11 de abril de 1964. G. R. G. B (A.): . o último é uma variação do penúltimo. e outro. isto é. E sse passa-passa de autoria encontra sua forma explícita no texto de (E. o episódico. g) Foi nessas condições jurídico-políticas que se deu o crescimento econÔmico conhecido como "milagre brasileiro". G. 0 presidente eleito foi tal. o Comando Supremo da Revolução editou o Ato Institucional n? 1. e) No inicio de 1967.). Já em uma primeira aproximação desses textos é possível uma divisão que distingue os cinco primeiros dos dois últimos: os cinco primeiros são episódicos. o projeto do gener al Castelo Branco. suspendendo as garantias constitucionais e estabelecendo um prazo de 60 di as para cassar mandatos e direitos políticos. H. passou a ser encarada sob o ângulo da Segurança Nacional. pois o processo era indireto. (E.) a) Dessa maneira. com a edição do Ato Institucional n. torna-se presidente o chefe do Estado-Maior do Exército. foi impedido de assumir a presidência tal a desc onfiança dos militares em relação aos civis. (S.) B' (K. factuais e os últimos são mais interpretativos.des falcado de alguns parlamentares . b) Log o após a queda de J.9 2. d) A intervenção militar liquidava não só o regime populista mas a própria expressão política direta da burguesia. vice-presidente. (P. C. Goulart formaram-se dois poderes paralelos: um civil. põe em vigor.). c) A incompatibilização de alguns sitores civis da "revolução-. Quanto ao MDB. dando mais realce ao pro cesso do que aos fatos. em 15 de abril de 1964.nem sempre está claro em qual se estabeleceu que as eleições para presidente seriam indiretas . 58 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 5 9 f) A Arena o elegeu no Congresso Nacional. com o poder militar. M. edita. S. no sentido de que alia à interpretação a factualidade. Em relação ao agente determinante das eleições indiretas. além da indiferenciação do to Institucional n? 1 e n? 2 . R. militar. P. h) Foi no governo Médici que chegou ao seu auge o modelo político e econômico brasileiro. constituindo assim u ma subdivisão: Grupo A: Grupo B: (B. cronológicos. o verbo na passiva ou na forma impessoal e a posse do presidente vem diluída. segundo a Constituição.).). o Congresso foi reaberto .e aprovou uma nova Constituição. e) Pedro Aleixo. represent ado pelo Congresso.). o sistema de partido. elaborada por Juristas do Governo. Vejamos os textos do grupo A. deu-se de forma muito clara em 27 de outubro de 1965.: Por uma questão de espaço não colocamos todos os trechos analisados aqui . d) No dia 3 de outubro de 1966 ele foi eleito pelo Congresso. e é o Ato que estabelece. determina. incluía o fortalecimento do Executivo e a segurança do Estado.). c) A escolha do Presidente da República que até 1964 era um fato p artidário e eleitoral. o general Humberto de Alencar Castelo Branco.há uma estratégia sintática para a atri buição de agente: coloca-se a data. "No dia tal do ano tal foi publicado o ato ta l que determinava tal coisa. que dissolveu os partidos políticos existente s e estabeleceu a eleição indireta para a presidência da República. integrado pelo General. justificou sua abstenção para não "coonestar uíma farsa". para a qual foram criados órgãos como o Serviço Nacional de Informação_ (SNI). torna indiretas as eleições. representado pelo "Comando Revolucionário". escolhido como Presidente. (M. Nesse sentido.do movimento militar." 0 Alto Comando decret a. com a decisão nas mãos do Alto Comando Militar. Obs. b) Politicamente. 7) (K. composto apenas de fiéis areni stas. Na medida em que formos expondo nossa análise faremos referência a outros trechos desses mesmos autores. I. P. Ou. em relação ao grupo de textos A.) quando trata do AI-2: a eleição na Guanabara e em M inas provoca reação na linha dura que pressiona o presidente e obtem a promulgação do Ato que determina que as eleições sejam indiretas. que diz: "a escolha do Presidente da R epública que até 1964 era um fato partidário e eleitoral. Junto a essa transitividade. ou adjuntos adverbiais . ao mesmo tempo que o Almirante A. ou. em formas enfraquecidas. 60 ENI PULCINELLI ORLANDI a política da segurança nacional como estratégia do regime. o que é próprio do grupo B. 0 último texto (K. 1. como no exemplo do texto de (S.. Temos também um exemplo interessante no texto de (S. P. de forma geral. comandante do III Exército . G. expressam tarefas de a utorias diferentes embora haja um jogo entre elas no texto: (P. Médici. Do ponto de vista lexical. indicando os agentes e restituindo os fatos ao processo de que fazem parte.. através dessa li nguagem indefinida: (S. não tinha condições de governar e que a situaçio política impedia a transferencia do poder para o vice-presidente Pedro Aleixo. de processo. no texto do grupo A. M. resulta. não deixa de ter interesse amenidades como: "Declarava-se vaga a presidência da república".. como toda vez em que aparece m mediações em um processo.) do gr upo B (variante B') coloca como os do grupo A as mediações.Mílton Campos redige. para presidente da República.) "No impedimento do presidente. Em 30 de outubro de 1969 tomou posse o president e Médici e o vice-presidente A. foi indicado pelo Alto Comando das Forças Armad as como candidato à sucessão. Pela observação dessa escrita. que escolher (ou indicar) o presidente e eleger o presidente não são sinÔnimos. M. Rademakerfoi apresentado como candidato. "0 Senado declarou a vacância do cargo". passou a ser encarada sob o angulo da Segurança Nacional. Pode mos lembrar. os autores desse texto partem para a expl icitação do processo político e do jogo de poder. eleitos indiretamente pelo Congresso Naci onal". ma s. o que nos lev a a pensar que não são só as eleições que são indiretas. o comandant e do III Exército. M.. isto é. dos efeitos de senti do) distinto estabelecido. Esse é o encadeamento a que nos leva a escrita sobre eleições indiretas. como previ . mostra que isso vem da "irícompatibilização de setores civis da revolução com o poder militar". pelo penúltimo texto (A. G. podemos dizer que o que se mostra é a transítivid ade das relações de poder. em um jogo ideológico de ocultação e de legitimação. Rademaker. nos textos do grupo A. por exemplo. (E. " Ainda do ponto de vista lexical. Ess a linguagem mais precisa é possível porque ao invés do jogo de ocultação de sujeitos através de recortes epis6dicos. G. C. assumiu o poder uma Junta Militar". ao mesmo tempo. A esse respeito. mostrando a posição determinante da segurança nacional. autocensura e até mesmo cumplicidade com o poder dominante mas.) "A 31 de agosto os ministros militares anunciaram oficialmente ao país que o presidente Costa e Silva gravementé enfermo. em geral com sujeitos pospostos. M.como analisaremos a seguir .): "Poucos dias depois.) "assumiram as responsabilidades presidenciai s_". "eleito pelo Congresso para exercer a suprema magistratura do país". A história do arbítrio vai se dizendo. em termos de interpretação.. é notável a diferença do modo de dizer (e..temos a posse do poder com expressões como: (S. do sujeito que pode se r atribuída a vários fatores como censura. logo. Médici. com a decisão nas mãos do Alto Comando Militar---. em que o Ato assume as funções de sujeito---quedissolve partidos e estabelece eleições indiretas". há uma ocultação do autor. pertencente ao grupo B. representada lingüísticamente por um certo modo de dizer.). R. vítima de um d errame cerebral. São mediações que funcionam em relação ao agente. o Alto Comando poe em vigor e essa lei (o Ato) determina que o novo presidente e o vice deveriam ser eleitos pelo Congresso e o Congresso el ege. ao contrário. há verbos que funcionam para a indeterminação. General E.) "0 Alto Comando das Forças Armadas escolheu o General E. a a Constituição de 1967. " Observe-se a vaga afirmação &da situação política impedia" comparada à interpretação feita por (K. P.), do grupo B, em relação a esse A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO mesmo fato: "Pedro Aleixo, vice-presidente, foi impedido de assumir a presidência, tal a desconfiança dos militares em relação aos civis". Além disso, um dos pontos interessantes a se notar é a referência à Constituição. Na leitura dos textos do grupo A, pudemos observar que há sempre uma Constituição que é preservada apesar das modificações: (P. 1.) "0 documento preservava, de uma form a geral, a Constituição de 1946 e estabelecia que Chega-se, assim, à "confecção de uma nova Constituição" em 1967 e a uma emenda constitucional em 1969. Essas mudanças de Constituição antecedem mudança de presidente: (E. G.) "Em 24 de janeiro de 1967 era promulgada a nova constituição e dois meses mais tarde tomava posse o novo presi dente Marechal Artur da Costa e Silva"; (S. M.) "... fez diversas emendas à Constituição de 1967, delas resultando o texto que entrou em vigor a 30 de outubro de 1969, data da posse do general G. Médici". Isto é, nos dizeres dos textos do grupo A não se faz uma relação explícita entre a mudança na/da Constituição e a sucessão no poder e tampouco se explicita a natureza das mudanças ("preserva deforma geral a de 1946", "essas mudan ças", "diversas mudanças"). Os textos do grupo B explicitam o que está implícito nos textos do grupo A, por isso podemos dizer que são menos indeterminados: (A. C. R.) "Do ponto de vista jurídico a situação continuava problemática: coexistiam a Constituição e o Ato que neg ava vários capítulos da Carta Magna. 0 Estado de fato superava o Estado de Direito"; (K. P.) "A Constituição de 1967 incorporava as prerrogativas autoritárias conferidas ao Executivo pelo A12 e surgiu aliada à Lei de Imprensa (fevereiro de 67) e à Lei de Segurança Nacional. 0 novo presidente assumia então com poderes prat icamente ilimitados, conferidos a ele por essas leis, o que levou a oposição a denunciar a institucionalização da ditadura". Deve-se notar em relação a esse último tex to que ele incorpora o discurso da oposição, citando-o. Pudemos observar, nessas estratégias de dizer, a relação do verbo com seu suje ito e também' o funcionamento lexical. de certos verbos. Gostaria, agora, de observar os advérbios. Se fizermos uma leitura dos textos que foram analisados até aqui, veremos que é bastante homogeneo o uso de advérbios: datas, locais e modos. E desde já podemos adiantar que o uso de datas e locais é bem mais freqüente nos textos do grup o A. 62 ENI PULCINELLI ORLANDI Comecemos por um exemplo claro acerca da função do adverbio: (B. H.) "Em Bra sília de acordo com a revolução ocupou o cargo de Presidente da República o deputado Ranieri Mazzili". Há aí dois adjuntos adverbiais: "Em Brasília" e "de acordo com a rev olução". Observando-se o texto em que aparecem (obra citada, p. 139) podemos perceber que o uso da referência ao lugar faz parte de uma série de citações, de mesma n atureza, resumindo acontecimentos distribuídos geograficamente: em Minas, no Rio, em Brasília. Essa referencia geográfica tem a função textual de estabelecer o es copo do discurso, isto é, sua area comum de significação, aquilo que dá unidade ao discurso, amarra suas partes. As datas também tem essa função. Por exemplo: (B. H.) "Ainda em abril de 64 foi publicado o Ato Institucional..."; (P. I.) "No dia 15 de Abril, assumiu a presi99 dência..."; (M. S.) "A 9 de abril, os ministros decretaram... E de se notar, entretanto, que ao lado dessa função estrutural, tanto as datas, como a indicação de lugares, tem outra função textual importante: trata-se do fato de que essas indicações locativas ou temporais, aliadas à voz passiva ou, na voz ativa com posposição de sujeito, ou ainda com verbo acompanhado de partícula "se", têm a função, nos textos do grupo A, de indeterminar ou obscurecer a relação com o sujeito ou agente. Por uma questão prática não nos cabe aqui fazer uma lista de exemplos, mas as obras citadas no início desse trabalho podem ser consultadas para comprovar esse fato. Vejamos agora a análise do adjunto "de acordo com a revolução". "Revolução" aí está p r Forças Armadas, Comando Militar, etc. Do ponto de vista da estrutura da frase, esse adjunto permite que a posposição do sujeito obscureça o agente real da tomada de posse: "de acordo com a revolução" = 41a revolução determinou (permitiu) que ocupasse o cargo o deputado Ranieri Mazzili". Existe aí, velada, uma estrutura de causatividade: A faz B fazer C. Podemos ligar essa estrutura causativa ao pr oblema mencionado mais acima acerca das mediações, lembrando que, aqui, se alia à causativida de um outro fator que é o da indeterminação, acobertamento do agente. Podemos citar outros exemplos, como: (P. I.) "A estruturqção da nova ordem... iniciou-se com a edição pelo Alto Comando Revolucionário... do Ato Institucional n? 1 (9/4/64)" = "0 Alto Comando Revolucionário edita o Ato que inicia a nova ordem". É ainda no ad junto adverbial que está o real agente em um 1 1 t i A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 63 exemplo como: (P. I.) "Novos Atos Institucionais foram editados no governo Castelo Branco" Há também um fator a se observar que é a relação entre adjuntos adverbiais e orações dverbiais. Os adjuntos que são nominalizações de orações adverbiais - "no impedimento do presidente" = "porque o presidente estava impedido", "com a edição pelo Alto Comando" = "0 Alto Comando editou", etc. são formas que tornam diluída a função de agente. Nos textos do grupo A são freqüentes as nominalizações desse tipo Em resumo, em relação aos advérbios, segundo o que pudemos observar, podemos a firmar que o seu funcionamento é determinante para a caracterização do discurso didático de história. E, no seu funcionamento, o mais importante é o que chamamos de r elevo do adverbio: é o fato do advérbio vir ou não em posição enfática, em relação aos outros elementos do texto. Em relação aos textos do grupo A, temos: 1) 0 circunstante, isto é, o advérbio, em relação ao relevo, pode vir em realce. É o caso das ocorrencias de local e datas Do ponto de vista de sua função textual essas ocorréncias criam o efeito de sentido que resulta na ilusão da informação imparcial dos acontecimentos, em sua objetividade. Na realidade, a colocação em realce, do local e/ou data, permite a indeterminação do sujeito ou ocultação do agent e através da posposição do sujeito, ou do uso da passiva sem agente. 2) Vimos também que, em relação ao relevo, ao contrário do item 1, o advérbio pode aparecer como elemento sem importância, sem posição de realce. É , o caso dos textos em que o adjunto adverbial oculta o agente, isto é, o contém. 3) Como variante dessa última observação, temos advérbios que, embora não ocultem o agente, pois este está expresso, passam por informações marginais quando, na verdade, representam a área de significação decisiva para se distinguir um grupo de textos do outro. Vejamos o exemplo: (E. G.) "Determinava essa lei que seria mantida provisoriamente a Constituição de 1946 com algumas modificações no seu texto". S e tirarmos os adjuntos grifados teremos: "Determinava essa lei que seria mantida a Constituição de 1946" o que modificaria totalmente o sentido do texto. Ago ra, se tirarmos os circunstantes de suas posições e lhes dermos outras funções, teremos: "Essa lei modificava o texto da Constituição de 1946 e a tornava provio4 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 65 sOria". Nesse caso, teríamos uma paráfrase do texto inicial mas que se colocaria no outro grupo de textos, o grupo 13. Esse jogo de realce, ou seja, o relevo do advérbio, serve para, nos textos do grupo A, caracterizar a indeterminação como base dessa formação discursiva. Alie-se a esse problema de ordem o fato de que os advérbio s são tidos como elementos de maior liberdade na posição, em relação aos outros elementos da frase, e podemos perceber que isto representa um jogo significativo na obtenção de certos efei tos de sentido. Vejamos o exemplo: (S. M.) "No dia 15, o presi Como funciona o advérbio nos textos do grupo B? Esses dente provisóri o Ranieri Mazzili entregaria simbolicamente a textos não apresentam, como característica, o obscurecimento faixa presidenci al ao novo presidente". Em relação à ordem ou do agente, ou sua indeterminação. 0 uso de datas e locais é incidência do advérbio, podemos dizer que aí está dito que a Pouco freqüente nos textos 13 e um pouco mais freqüente em W. entrega é simbólica e não, como seria esperado, que afaixa é Em ambos, como para os textos do grupo A, o advérbio tem a simbólica. Isso po de criar um efeito de sentido - que se cria função de determinar o escopo do discurso, quando se refere a toda vez em que há alteração na ordem - que nos leva a indagar locais ou datas já mencionados. Nos textos W, os advérbios sobre o que finalm ente é simbólico em relação ao ritual da posse, partilham, além dessa característica de amarrar o texto, dar sua dada a provisoriedade de Mazzili A ordem, pois, é constitutiva unidade, às vezes também a de POsPosição de sujeito, como nos do sentido. textos do grupo A. 0 que, entretanto, distingue esses textos é o Pa ra os textos do grupo B observamos que, embora também fato de que, para os textos do grupo 13 (inclusive W), o uso de haja inve rsões - menos freqüentes e mais atenuadas do que as formas adverbiais não serve ao jogo do relevo na direção em que do grupo A -, a dominância e antes a do encaixe e não a da ofazem os textos do grupo A, isto é, em direção à indetermiinversão, o que result a em um maior número de orações do tipo nação. Podemos observar isso nos exemplos que seguem: (A. C. R.) "Foi nessas condições juridico-políticas que se deu o cresci mento econômico conhecido como 'milagre brasileiro`, "Foi no governo Médici que chegou ao seu auge o modelo político e econômico brasileiro". Nesses exemplos, podemos verificar que os advérbios são colocados em destaque pelo artifício sintático "E... que", que serve, justamente, para estabelecer o foco nos advérbios. Não se trata, pois, de um jogo de indeterminação, ao contrário, é algo que precisa, determina. A informação dada pelo advérbio não fica, aí, lateral. Vejamos, agora, o que se passa com a ordem dos elementos. Como Pudemos o bservar em "A linguagem em revista: a mulherfêmea", o que passa por ironia ou mesm o razoável na ordem inversa, quando restituído à ordem canonica, se apresenta como encad eamento grosseiro de razões pouco sutis. Aqui, a ordem inversa, junto aos outros fatores de que tratamos, serve de reforço, no grupo de textos A, à indeterminação do age nte: (S. M.) "Dando continuidade ao processo revolucionário, foi eleito pelo Congresso, a 3 de outubro de 1966, o Marechal Artur da Costa e Silva". Colocando -se na ordem canonica, haveria, no mínimo, um problema em relação à atribuição do adjunto: "0 Marechal Artur da Costa e Silva foi eleito pelo Congresso a 3 de out ubro de 1966 dando continuidade ao processo revolucionario " explicativo, restritivo, causal, etc. Seria interessante lembrar os casos em que o problema da ordem e do enca deamento não afeta apenas adjuntos ou orações, mas atinge unidades mais amplas como períodos e parágrafos- É o caso de certas datas, citações de locais - como já observamos - m as também o de partículas como "ainda", 46assim" e outras expressões que têm função no encadeamento e do discurso e que merecem um estudo mais aprofundado. Picam também à 9 margem desse trabalho advérbios que eu chamaria de modalizadores ou apreciativos e que revelam claramente a posição do locu tor em relação ao que ele diz e para quem ele diz. São advérbios como "realmente", ' "provavelmente", etc., que têm uma função diretamente apreciativa. No entanto, pelo que analisamos, podemos generalizar a afirmação de que o advérbio, assim como outros elementos - como pronomes, tempo verbal, etc. -, é um lugar de contato entre locutor e destinatário. Quando se diz "provisoriamente", "simbolicamente", está-se a valiando, opinando, da mesma forma que quando se usam datas para se obscurecer a relação com o agente, ou outras das formas que analisamos. Isso nos leva a afirmar que a distinção de elementos privilegiados na enunciação (como os shifters) tende a ser corroída, se passamos Para a análise de discurso. 66 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 67 CONCLUSõES PARCIAIS ente fazer o (oculto sob a forma de adjunto adverbial) fez o presid Ato fazer X. B. A política de segurança fez Castelo fazer X. Podemos utilizar, nesse passo, a noção defOrmaÇão discurEsses recortes diferentes representam momentos diferentes siva (cf. p. 23). A formação discursiva se constitui na remissão do pro cesso e o privilégio de um ou outro momento desemboca que Podemos fazer de todo texto a uma formação ideológica, de em uma di ferença textual relevante, do ponto de vista do efeito tal forma que seu sentido (do texto) se define por essa relação * i d e sentido.' Isso quer dizer que dependendo da inserção do texto em uma ou Podemos ver aí, pois, um critério para distinguir as forma outra formação discursiva, pode-se observar uma variação de ções discursivas A e 13. Para precisar ainda mais essa distinção, sentido, pois há diferenças nas relações distintas que cada foracrescentamos qu e B leva em conta o fato de que as ações fazem mação discursiva mantém com a formação ideológica. Dessa parte de um processo e a for mação discursiva A, ao contrário, forma, a formação discursiva determina o que pode e o que deve data e localiz a os acontecimentos, segmentando-os. Seria a dife ser dito a partir de uma certa região da formação social, a partir rença, em term os de encadeamento, entre uma série (grupo A) e de um certo contexto sócio- histórico. Quer dizer, todo texto tem uma seqüenci a (grupo 13) de acontecimentos. sua ideologia, e podemos determinar a relação do texto com a Essas ob servações nos levam a propor que, pela transitivi ideologia através da caracterização da formação discursiva da dade que é comum às dife entes formações discursivas de que qual ele faz parte. Pelo que pudemos constatar em nossa análise, tratamos a paralela à de se pensar o sujeito da história. Exemplo: A. pudemos determinar o modo como operam os tipos de a dvérbios . 68 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 6 9 Pelo que analisamos. também. ao contrário do grupo 13. por sua vez. no grupo A. que encontramos as determiuma das formas q ue ele pode ter. ao mesmo tempo em que obscurecem ou indeterminam os agentes. como nações mais decisivas para o texto. determina sobre a consideração do processo no texto narrativo. em seus implícitos. ou. além de ser transitivo. 0 "episodismo" é cunstâncias. Para os discursos do grupo A. somos levados a distinguir as duas forsujeito. Isto.em relação às duas formações discursivas A e B. que é feita de mediações.qui. e. satividade. história anda diluído e lingüisticamente isto se revela pela cauB) In terpretativo ou processual. curso transitivo . o chamo transitividade das ações (ou causatividade) e conseqüeneterminação e. ou seja.que é o dis tuída pelos textos do grupo 13 (e W). é fortuita e indetermina. entretanto. consideremos o discurso da história como um podemos remeter os textos do grupo A a uma formação discurdiscurso transiti vo (nas atuais condições sócio-históricas). Aqui fica meu agradecimento. de causatividade. e modal (Mattoso Camara. há encadeamento. em domínios d istintos dos considerados na presente análise. em geral. é distinta da formação discursiva constitanto.temporal e de lugar. feito pelo Cláudia Lemos sobre o problema do momento da segmentação. ao meu ver. bios. A e B se distinguem. E. como es sa mesma configuração discursiva . nesses casos. 0 sujeito da A ) Episódico ou factual. por exemplo -. junto aos verbos . isto é. Dificuldade esta. e. nesse caso. a conversas com Jesus Durigan discurso na disposição dos elementos encadeados. isto é. se deve ao quadro completo da caracterização dessas duas formafato de que o poder é transitivo. tanto em relação Uma coisa está clara: na formação discursiva constituída ao corte feito n o encadeamento como à importancia dada ao pelo grupo A há uma grande dificuldade na atribuição de um processo ou ao fato. esse episodismo é fator de indeterminação. ~C (1) A esse respeito gostaria de me referi r a conversas que tive com Na causatividade. uma vez que a escrita dos textos do grupo A. R hierarquias: A faz 13 fazer C. daí a importancia dos advérpudemos observar . 1975) . e temente temos o estilo transitivo. as relações de poder são transitivas. 0 Alto Comando mam. em que são colocados os agentes . os agentes. o fato de que. alguns dos meus pontos de vista. mações: talvez. no grupo B. porque representam o sistema de esta-nos dizer que o que é próprio do discurso da história é relevo serve à ind temos o ções discursivas. contem. à determinação. não se pode fugir do que que é a do relevo do adverbio. É.tem uma distinção int erna. Entre siva que. Essas conversas confirformações discursivas diferentes.como a Segurança Nacional. e o corte. do L recorte feito na estrutura causativa. os advérbios de tempo e lugar dão o escopo do discursivo. implicitamente. um agente para os fatos narrados. os moda is. Mesmo quando se trata dos Acresce ntamos a essa distinção uma outra característica textos do grupo 13. na análise das cirque seja tr ansitivo e não que seja episódico. para um certo público . Os fatos não se narram a si mesmos. ao conter. na história. no grupo B. existe uma relação entre o que chamei de estilo subjuntivo e o estilo transitivo do grupo A (fortuito. isto é. 1971) fala da história não como ciência. de um certo período. de relações causais e explicativas. os advérbi os servem para remeter. "quem sabe um dia". Não é. comparando os textos.. A respeito da causatividade de que já falamos. etc. Mais a inda. enquanto formações discursivas. eles se distinguem pelo relevo. servem para precisar circunstancias e não para ocultar os agentes. Nos textos do grupo A. Logo. passemos a expor alg umas conclusões provisórias a que pudemos chegar. o uso de advérbios (temporais e de lugar) é menos freqüente e. o romance e verdadeiro. ficam aguardando uma reflexão mais rigorosa. a estrutura dominante não distingue elementos centrais e margi nais.. não são arti fícios para se elidir o sujeito ou o agente. mostra que o que temos é uma visão parcial. indeterminam os sujeitos.) "No dia 3 de outubro. pudemos observar que a perspectiva pela qual se olha o fato é constitutiva dele. quando usados. a escola . 0 que pudemos verificar. um comentário. analisando o discurso sobre mulher. é o discurso escolar de história.. Feitas essas ressalvas. mas o discurso dos livros didáticos de história. pois trata. ou melhor. como já dissemos mais acima. E uma intriga e o fato não é nada sem sua intriga. Foi nessa perspectiva que camin hou nosso trabalho. em termos de linguagem. são narrados por um certo autor. o que foi possível estabelecescom esse trabalho. ele foi eleito pelo Congresso". entretanto. o didático. romance verdadeiro (sublunar ). acerc a de análise de discurso? Antes de tudo. e do estilo transitivo. 0 uso do advérbio. 1 . aquele que se indetermina através do uso de subjuntivos e partículas como "talvez amanhã". mas como narrativa de acontecimentos. P. isto é. Por outro lado. 0 discurso didático de história tem a forma [(advérbio). entretanto. estruturas sintáticas das quais falamos ra pidamente quando analisamos o problema da ordem dos elementos. sob esse aspecto. de uma certa perspectiva. Merecem. são e ssas perspectivas. de uma certa maneira. Além disso. o seu funcionamento é de mesma natureza dos anteriores. A faz B fazer C . Não são opiniões diferentes sobre os mesmos objetos. Nos textos do grupo B. indeterminado. mas naquele que recobre apenas o que eu chamo de pedagógico. é diferente do grupo A. CONCLUSÃO GERAL E PROVISõRIA De uma forma geral. isto é. Essa conclusão acerca do funcionamento do advérbio serve também para os outros fatos observados. Quanto aos advérbios modais. Já Paul Veyne (Veyne. quando referido (regulado) a um uso institucional. situar o que se narra em um contexto mais amplo. oculta os agentes. Creio que. as formações discursivas. didático aí não deve ser tomado em seu sentido mais abrangente. escolar. ou seja. Primeiramente porque. e o que temos. em que o s acontecimentos se narram a si mesmos. Para se caracterizar o discurso da história seria necessária outra análise que tomasse textos de história sem finalidade pe dagógica. fragmentária. episódico) e isso tem a ver com o que Pecheux (1975) trata como rel ação entre formação discursiva e formação ideológica. Quando não aparece o sujeito. antes. Essas considerações. Pretende-se que o discurso da história seja um discurso objetivo. Exemplo: (K. pude destacar o funcio namento discursivo que tem como característica o que denominei "estilo subjuntivo". podemos dizer que a estrutura dominante é a qu e separa elementos centrais e elementos marginais: ou o advérbio é central e ele indica datas e locais ou ele é marginal e. os autores se interessam . uma vez que são fatos que estão ligados ao seu funcionamento. quero lembrar que não foi o discurso da história que foi anal isado. gos taria de lembrar que. um gênero literário pois. de alguma forma. e ainda em direção à indeterminação. referido. é um lugar privilegiado de confronto de vozes. Essa relação.A e B . A partir daí podemos. Pode-se fazer um paralelo entre os textos do grupo A e o Primeiro Grau d o Sistema Escolar. etc. Não deixando de notar que não há tipos puros de discurso e. portanto. a partir dos res ultados a que chegamos em nossa análise. podemos mostrar que não é isso que se passa. se encontra encaix ado em sistemas referidores.). autoritários e lúdicos. etc. tendo ou não uma forma lingüística (Guespin. A sua forma é: "A revolução diz que". Formação discursiva representada pelo grupo B: o "Quem" representa uma voz m odulada. vista a escola como reprodutora. Mas se pensarmos em sentido lato. P.) do grupo A. definir algumas características do Quem e do P ara Quein: Formação discursiva representadapelo grupo A: o "Quem" representa a voz da " revolução". ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 71 Como se trata de discurso didático. essencial. podemos dizer que o discurso da história. I. o situacional e o textual): o sujeito do enunciado (Castelo Branco. podemos d izer que todo discurso é ao mesmo tempo referidor e referido: referidor. entre o dito e o implícito.o cruzamento desses dois tipos de discurso daria como produto o discurso mais ascético na hierarquia dos discursos. 0 "Para Quem" é o aluno. vista a escola como lugar de crítica. há um cruzamento entre este e o histórico. com sua perspectiva). Esta afirmação não pretende atribuir nada aos autores.embora saibamos que ele não é isso . mas não identifica um lugar explícito (quando cita o discurs o da oposição parece ocupar esse lugar). uma questão de dominancia e não de característica fundamental. o sujeito da enunciação (o autor. o Alto Comand o. logo. isto é. porque é sempre produzido no interior de instituições que possuem regras precisas que determinam quem deve falar sobre que tema. Pela análise que fizemos. Segundo Paul Veyne. Nesse sentido. Os textos que analisamos não se apresentam como discurso referido ou referidor stricto sensu. Uma vez que se considera o discurso pedagógico o de pura informação . se mostra pela existência de um jogo de sujeitos (e de sua ocultação). logo. 1976). a história contada do ponto de vista dos que estão no poder. relativos aos três níveis considerados no início deste t rabalho (o lingüístico. Para isto é necessário se atentar ao problema das vozes. em relação aos dois tipos de formação discursiva . o leitor e que constitui o sentido do texto. parece se definir basicamente por não representar a voz da 16 revolução". em relação à nossa proposta de classificação dos discursos em polêmicos. responde a outros. Os do gr . o que se tem o hábito de considerar um acontecimento histórico único explode em uma multidão de obietos de conhecimento. Assim. do discurs o referido e referidor. em que momento. dizendo que a formação discursiva do grupo A é do tipo autoritario e a do gru po B é a do tipopolêmico. Ao compararmos textos diferent es. A sua forma é: "Nós dizemos que 0 "Para Quern" é o aluno. pois contém sempre uma análise de outros discursos. é possível se perceber a identidade (ou o gênero) do Quem e do Para Quem deles. E. ou seja. verificamos que as estruturas sintáticas segundo as quais as frases são reconstr uídas nos diferentes textos revelam que eles significam diferentemente. pela análise feita. ao colocar em relação o que f oi dito e o que foi feito. Isso porque há u ma relação. E isso pode ser observado na proximidade que existe entre o discurso do grupo B. essa afirmação só é válida em termos de características pensadas do ponto de vista de seu funcionamento dominante e não fundamental. o Ato Constitucional. e o sujeito dado pelo texto (a Segurança Nacional.). o autor. esse nosso trabalho definiria as duas formações discursivas. e. só diz que seus text os são reprodutores.por objetos diferentes.). uma vez que a maioria desses textos se endereça a ele. ou seja B'(K. e o discurso (P. ou modalizadora no sentido de que procura se colocar do ponto de vista dos que não estão no poder. mas. etc.apontados. Há uma dinâmica na relação entre esses sujeitos ao longo dos textos. De toda forma. que estabelece relações entre o texto. Wn-gages. d o ponto de vista pedagógico. Paris. J. Buen os Aires. N. Padrão. em termos do desenvolvimento do aluno. emprestarído agora o discurso a P. a que tive acesso. . 1976. 1982.Comment On Êcrit lHistoire. . Rio. Esse é o sintoma. N.' le vou-me imediatamente à questão: qual a concepção de linguagem que orienta todos esses trabalhos? Mais ainda. V. Esse "mes . é que faz com que. a não explicitação da concepção de linguagem do educador (ocidental) coloca esta concepção como geral. Texto apresentado no Congresso da ABA. qual deva ser a língua (*) Quero agradecer a contribuição valiosa da leitura da versão inicial desse trabalho feita por Yonne Leite. Mattoso . Devo acrescentar que considero admirável a publicação da CPI. Agradeço também a Mércio Pereira Gomes. quer se considere se é uma técnica de escrever apenas que deve ser ensinada ou se a dimensão da escrita é de outra ordem e que vai além da técnica.outra iniciativa isolada. Paris. São Paulo. à distinção entre o dominador (ocidental) e o dominado (índio)... .. Não se distinguiriam também em relação a suas concepções de linguagem? A não reflexão sobre e distinção.todas essas discussões têm a ver com alguma concepção de l inguagem. que é a de que. ou seja. Melià) e xerox esparsos de uma ou. como única (a pressuposta). E. etc. P. explícita ou implici tamente. V. L. 73 (indígena ou "nacional") da alfabetização. embora os autores não reflitam sobre suas concepções de linguagem. à compreensão do processo.E1 Signo Ideologico y Ia Filosofia del Lengugie. primeiro é preciso dar dados (datas. E essa coisa não desejada leva sempre a impasses. em relação aos trabalhos que li. n? 37. sempre se referem. Bruna Franchetto e Ruth Montserrat.. Ademais. . Isso supõe uma distinção. Pêcheux.Autor-nfttiquedu Discour-s`. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO o Algumas considerações o discursivas sobre a educação indigena* INTRODUÇÃO A leitura do material disponível sobre educação indígena. (1) Basicamente: A Questão da Educação Indigena (CPI). Clastres (1978): "sempre o encontro entre o Oci dente e os selvagens serviu para repetir sobre eles o mesmo discurso". n? 41. 1976. e em conseqüencia disso. qual é a concepção de linguagem que é atribuída ao índio e que deriva da do seu educador branco? A meu ver. 1971. locais. BIBLIOGRAFIA Câmara Jr. A postura crítica que assumo nesse trabalho nasce antes das qualidades e não dos defeitos daquela pu blicação. Seuil. e por isso torna desn. 1 Veyrie. alguma coisa não desejada acabe se reproduzindo nesses discursos sobre educação indígena . Voloshinov. quer se discuta. Quer se distinga alfabetização e educação indígena. Paris. Larousse. Guespin. Educação Indígena e Alfabetiz ação (B. W Fuchs .upo B são indubitavelmente textos para o Segundo Grau. que relação com a linguage m os "educadores" indígenas estão atribuindo aos índios. eu creio.História e Estrutura da Lingua Portuguesa. fatos isolados) e só depois l evá-lo à interpretação."Mises au Poirit et E=Rectives à Propos de l'Analvse . suspeita. 1975. pois me permitiu uma visão ampla e sistemática do problema da Educação Indígena."IritToduction'% Langages. apesar de todos os cuidados. cessário o conhecimento da do -índio. no interior d a alfabetização. De minha parte. o u melhor. considero relevante a colocação de algumas observações que partem desses pontos críticos que acabo de enunciar.que se articula como fo rmações imaginárias . para quem se diz. a perspectiva da análise de discurso é uma perspectiva interessante p ara se observar esse processo de constituição. Para tanto. entendida como mediação necessária. mas é ação que transforma. então. uma vez que há a interpelação do indivíduo em sujeito pela ideologia. então.isto a que chamamos tecnicamente de condições de produção . Pode-se considerar a linguagem de várias maneiras . visto dessa perspectiva. como trabalho. como um modo de ação que é social. Assim. basicamente. não consideramos nem a sociedade como dada . Gostaria. 0 di scurso. A homologia que tenho procurado estabelecer entre trabalho e linguagem se baseia no fato de que ambos não tem um caráter nem arbitrário nem natural e assentam sua necessidade no fato de serem produção social. Isso acontece porque. etc. ou seja.pode ser analisado na relação existente entre as formações discursivas e a formação ideológica dominante. Essas afirmações acerca do funcionamento do discurso levaram à formulação de uma n oção de sujeito menos formal.constitu em a instancia verbal produzida. nessa relação. . ou seja. menos idealista.que se mostrava como impasse . próprias. ou seja. ainda. etc. tenho me proposto a considerar a linguagem como interação. ou melhor. Tratando. Não falamos apenas para "forniar sentenças". não é 74 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 75 instrumento. nem a linguagem como produto: elas se constituem mutuamente. em análise de discurso.e cada uma dessas concepções de linguagem terá suas conseqüências teóricas e metodológicas 1 . do que poderia chamar o discurso sobre (da?) educação indígena. de observar que o processo do ouvinte. a relação de discursos. altera-se a relação com a formação ideológica. . dois pontos comuns: a) a afirmação de que a nossa escola apresenta uma série de dificuldades para o índio (e não se falava se apresenta dificuldades já para nós). o discurso. interação entre homem e realidade (natural e social). mas tal como e xiste socialmente.mo. Resta observar que. ao lugar social do qual se diz. As palavras mudam de sentido ao passarem de uma formação discursiva para outra: compare-se o sentido da palavra "nação" na formação discursiva ocidental e na do índio. o entendimento . 197 5). não podemos estudá-la fora da socieda de. A linguagem.a relação com a exterioridade que o constitui. então. isto é. se chama a "ilusão discursiva do sujeito" (Pêcheux.me chamou a atenção na leitura dos textos sobre edu cação indígena. Dessa forma. como parte do funcionamento social geral. b) a afirmação de que se deve ouvir o índio. etc. 0 contexto histórico. Portanto. Desse "mesmo.deve ser referido às condições de produção (o lugar so ial. Nós os retomamos.linguagem como instrum ento de comunicação.) da leitura. a situação. Há uma contradição na constituição do sujeito: o sujeito da linguagem não é o sujeito em-si. uma vez que os processos constitutivos da linguagem são históricosociais. em suma. pois é o de uma análise que procura ver em seu objeto .posso apontar. sendo considerado como ação social. os interlocutores . da leitura . o discurso não é fechado em si mesmo e nem é do domínio exclusivo do locutor: aquilo que se diz sig nifica em relação ao que não se diz. é equivalente. Pensar que somos a fonte do sentido do que dizemos constitui o que.a atri- buição ou reconhecimento de sentidos . ao passar de uma formação discursiva para outra.social.o discurso . Igo quer dizer que os sentidos que produzimos não nascem em nós. é menos transmissão de informação do que efeito de sentidos entre locutores. linguagem como produto da história. Isso tudo . em relação a outros discursos. retomarei algumas afirmações que faço em outros trabalhos e que esclarecem minha concepção de linguagem e de discurso pedagógico. na concepção de linguagem que temos. pois o uso da linguagem por si mesma. p. de acordo com essa distinção. ao contrário do polemico e do autoritário. tenho observado que o lúdico é o desejável. pelas análises que fizemos. do "mesmo". de qua lquer maneira. discurso polemico e discurso autoritário (cf. 141). Por outro lado. de alguma forma. hoje. 11). resumidamente. Então. Tenho apoiado essas considerações de tipos na colocação de que há dois processos f undamentais na linguagem: o da polissemia e o da paráfrase.atestado pela linguagem e não 76 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 7 7 pelo psicológico -. mas como lugar de conflito. de tal maneira que é possível se reconhecer essa configuração como um tipo. no lúdico a da polissemia e o pQlemico é aquele em que melhor se observa o jogo entre a paráfrase e a polissemia. Distingo assim. ou suporte de pensamento. segundo o q mos considerado. numa certa formação social. Este é um deslize ideológico que faz com que se atribua à natureza da linguagem em geral algo que é histórico e se dá em relação à dominan ia de um tipo de discurso. havendo u ma gradação entre um tipo e outro. À articulação entre polissemia e paráfrase é que atribuo o jogo entre o mesmo e o diferente na linguagem. no discurso autoritário. entra em contraste com o uso para finalidades mais imediatas. Os tipos seriam. o DP é um discurso autoritário: sua reversibilidade tende a zero (não se dá a palavra). que a distinção entre os tipos não é rígida. Vale dizer: o discurso autoritário é o discurso do mesmo e isto está refletido. No lúdico. Segundo o que pudemos observar em nossas análises anteriores. aqui.De forma geral. em nossa sociedade. há um agente único (aquele que tem o poder de dizer). procurei elaborar uma tipologia. na perspectiva do discurso. temos a polarização da paráfrase. Em relação ao conceito de discurso. a linguagem não aparece a penas como instrumento de comunicação ou transmissão de informação. o tipo de discurso dominante na nossa sociedade atual é o autoritário. ou seja. Podemos mesmo afirmar que. a informação e a comunicação dão lugar à função poética e à fática. Isso se dá pelo processo histórico de legitimação das form as de dizer em que a linguagem é instituída. na forma dos estudos de linguagem. a partir dessa reflexão. e é este jogo que está na b ase da tipologia que estabeleci. uma configuração para nosso discurso. Em uma sociedade como a nossa. etc. 0 DISCURSO PEDAGOGICO COMO DISCURSO AUTORITÃRIO 1 i . A polissemia se define como multiplicidade de sentidos e a paráfrase como sendo formulações diferen tes para o mesmo sentido. à instituição em que se origina e para a qual tende: isso lhe dá um caráter circular. Assim. pode-se distinguir tipo e funcionamento discursivo (cf. nessa tipologia. o lúdico é ruptura. então. * po . pelo prazer . funcionamentos discursivos diferentes que se sedimentam. em qualquer situação. 0 discurso pedagógico não foge a essa dinâmica de tipos: tal como existe na no ssa sociedade. p. de confronto ideológico. e em que a sig nificação se apresenta em toda sua complexidade. Isso significa dizer que o uso da linguagem está polarizado para o lado da paráfrase. três tipos de discurso: discurso lúdico. a partir des sa concepção de linguagem e de discurso. o que caracteriza o discurso pedagógico é o fato de estar vinculado à escola. entre o mesmo e o diferente. comprometidas com a idéia de eficiência e resultados práticos. A relação entre eles não é de exclusão mas de dominancia. ocupa um lugar marginal. nos m oldes de análise propostos. Disso resulta que as diferentes situações de linguagem são reguladas: não se diz o que se quer. fica como princípio básico qu e todo discurso deve ser referido a suas condições. Gostaríamos de lembrar. é o q ue vaza. A partir da reflexão de que toda vez que dizemos algo o fazemos estabelece ndo uma fisionomia. que o conhecimento pode se fazer de maneira conflituosa.lissemia é contida (se coloca o sentido único). que nasce da apropriação do cientista feita pelo professor: o professor torna-se representante do conhecimento sem que se mostre como ele incorpora a voz que fala nele (o professor está no lugar do). Da perspectiva do aluno. 0 DISCURSO PEDAGõGICO E A EDUCAÇÃO INDIGENA Vejamos agora o que se passa em relação à educação indígena. homogeneidade. 0 conhecimento escolar é o que tranqüiliza: nós nos reconhecemos no saber que é considerado desejável pelos nosso s pares e isso nos é garantido pela reprodução social. Uma perspectiva que 78 ENI PULCINELLI ORLANDI aponto então. A escola cumpre. ser crítico. a criação dessas condições pode ser obra de todos e não de alguns especialistas: não é preciso que a escola seja o lugar dessa descoberta. naquele trabalho. Pela metalinguagem: o conhecimento do fato é substituído pelo ccohecimento de uma metalinguagem. o dizer recobre * ser (o referente está obscurecido). no contato com o professor e. a não relevância desses aspectos se resolv ela motivação pedagógica e pela legitimidade do saber escolar.na nossa escola . Do ponto de vista do professor. coincidem. de acordo com nossa posição. o caráter informativo. à simetria. Como o discurso pedagógico é um discurso autoritário. isso é "apaziguado". tanto pelo lado do locutor quanto do ouvinte. Dado que a função é a inculcação. A voz do professor é. está autorizado a dizer que aprendeu. Na escola. Esse discurso aparece como transmissor de informações que tem o estatuto da cientificidade. A nossa proposta de uma po . deixar um espaço para a existência do "ouvinte" como sujeito. 0 estatuto científico do DP se constrói pela metalinguagem e pela apropriação do cientista feita pelo professor. que esse mecanismo de reprodução pode ser vis to de uma forma menos técnica na relação entre conhecimento e reconhecimento. Eu diria. Vale ressaltar. a partir desse contato. isto é. se dispor à reversibilidade. a unidade do DP e atingir seus efei tos de sentido. questionar o que o discurso garante em seu valor social. nas análises que visam à caracterização do discurso peda gógico. é questionar as condições de produção desses discursos. As características que atribuímos ao DP . É assim que se constrói o saber legítimo. em termos de uma crítica radical. não são relevantes para as s uas condições de significação a utilidade. A proposta que fizemos. é determinante a presença e função da escola. não utilidade. foi a de transformar esse discurso autoritário em um discurso crítico: questionar os implícitos. então. é a da reflexão sobre a necessidade da escola. Observando-se que tomar a palavra é um ato dentro das relações de um grupo social. exp lorar a dinamica da interlocução. etc. saber ouvi r. a informatividade e o interesse do destinatário. que é considerada legítima. por extensão d a do cientista. coloco como desejável a possibilidade de uma outra sociedade. com rupt uras. Não há por que temer.e que o mostram como discurso autoritário são as que vimos criticadas nos textos sobre educação indígena: não interesse. a da reprodução. Em suma. dessa forma. Nessas condições de produção. Esse é mais um aspecto da circularidade do discurso pedagógico e. é um aspecto que compõe a nossa identidade social. recusando a cristalização do dito e a fixação do seu lugar como ouvinte. mais do que isso. a essa altura. 0 aluno realiza sua escolaridade no espaço da escola. 0 legitimado e o legitimável. a voz do saber. questionar os pressupostos que garantem o texto em sua legitimidade. sua função social. sem escola. isto é. Porque se a proposta é a de uma pedagogia que sej a capaz de criar as condições para que se descubram as contradições. que é o lugar pró discurso pedagógico. Não podemos dizer se isso se passa exatamente dessa forma entre os índios. o propósito da nossa educação é a homogeneização e o método é a inculcação. pelo menos tal como o são as nossas. a diferença. em relação à nossa cultura. assumir a diferença. pelos seus pares? 0 índio é educado para o prazer de viver. gostaríamos de fazer. E o modelo em direção ao qual se quera modificação é o da cultura ocidental: o adulto letrado. onde a imitação pelo exemplo ganha uma importância muito grande. há uma violência que exercemos no contat o. Eu lembraria aqui o que diz Clastres sobre o etnocentrismo ao mostrar que este "mediatiza todo olh ar sobre as diferenças para identificá-las e finalmente aboli-Ias". em uma posição crítica. A educação é múltipla e contínua e a aprendizagem não tem modalidades formalizadas ou institucional izadas. assumir as diferenças como diferenças e não como desigual dades. Trata-se ainda de uma questão de etnocentrismo. As palavras que usamos têm um compromi sso com a ideologia. trata-se da "necessidade de exercermos nosso discurso científico sobre as outras culturas" (Clastres. necessariamente: a nossa educação visa não só a reproduzir.o ensino. assumindo e procurando ma nter. tanto e quandu possível. isto é. De uma forma mais sistemática. as etapas são difer entes das nossas. ças---quantoao conceito de educar e suas modali1 a diTe-r-eindades. 0 ENCAMINHAMENTO DE ALGUMAS PERSPECTIVAS 1. Vivendo. vão-se educando. sem paternalismos. não Merarquizar as diferenças porque a referencia para a hierarquização é cultural e nela exercemos nosso etnocentrismo (o nosso 46mesmo"). É ainda uma questão de identidade social: nós gostamos de nos reconhecer no outro. níveis. 1978). mas se transmuda em paternalismo: "ouvir o índio para modificá-lo". ou seja. Acho que pode haver aí uma declin ação cristã ocidental dessa expressão. Cabe-nos. sair da pos ição "compreensiva" e assumir o conflito. Se isso é um problema dentro de nossa própria cultura. isso é. cursos. situá-los na sua história. io .com . nesse passo. visamos à hornogeneidade e nossa educação é generalizante. algumas pr opostas que contribuíssem para uma definição do que seja "ouvir o índio". um espaço para o outro. na educação indígena. mas sobretudo reproduzir a desigualdade (abolindo as diferenças sob o simulacro da unidade). Nós temos muitas divisões (especialidadeí profissionalízação. a da possibilidade de um discurso polêmico seria ela mesma possível e desejável para a educação indígena? Ao invés de responder a essa questão vamos colocar uma outra: quando se diz "é preciso se ouvir o índio". isto é. Sem esquecer que a situação de ensino é situação de contato e este é o traço próprio das suas condições de produção. 0 que queremos dizer com "ouvir o índio?". Normalmente. sabemos que não é essa a função da nossa escola. Como é feita (ou seria) a educação indígena em situação homogêne . Não se considera A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 79 que ouvir o índio Pode modificar-nos. Por outro lado. segundo o que li em Melià. o será muito mais claramente . classes. num paralelo com o que acabamos de dizer para o discurso pedagógico na nossa escola. etc. respondendo ao autoritarismo e c onseqüentemente dando um lugar.? Temo que apenas em parte.stura crítica. as relações simétricas. 0 que a gente não conhece (reconhece) incomoda. desconfiar dos conceitos. em nossa perspectiva. a aprendizagem é feita pelo jogo. Então. por isso é importante fazê-lo à nossa própria imagem. o autoritarismo não cede magicamente o lugar a um outro discurso. todos aprendem de todos. mas.). etc. Como seria para o Quaisquer que sejam essas diferenças. 1. permitindo a reversibilidade . estar-se-ia. E modificar-nos pode significar. aceitando. Relação do índ . A nosso ver seri a fundamental. há um alto grau de espontaneidade. os métodos de ensino indígena parecem ser diferente s. as distinções são pelo sexo e pela idade. eu creio. dependendo das características da comunidade indígena. na fundação da ANDES. É melhor aparece rmos com o que é nosso e deixar para eles o modo de entrar. Assim. 80 81 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO não é reproduzir nele o que ele recebe como ideologia do dominador. Não se trata.e a nossa . de modo que ele possa dar a seus problemas encaminhamento apropriado . Ouvir o índio Ir (2) Lula. A proposta é a de deixar espaço para que eles elab orem sua relação com o ensino. E é nossa experiencia que podemos colocar à disposição deles. a imputação da caricatura da nossa cultura (e vice-versa). que se coloca problemas e que trata de resolvê-los segundo sua própria metodologia. ao pedir uma escola igualzinha à nossa. Acho que aí devemos assumir nossa posição crítica (se somos críticos). não se trata de fazermos um arremedo da nossa para q ue seja "acessível". a meu ver. é focaliz ar.que visa à hornogeneidad e e é entregue a especialistas -. Ouvir o índio que já tem contato e que já está ao alcance dos mecanismos de reprodução. pode ser interessante criar situações sociais ca racteristicamente pedagógicas. A partir daí. 1 Um exemplo do que queremos dizer pode ser dado em relação à necessidade.e não nos esqueçamos que. trariscultural. críticas e contradições no interior de nossa sociedade em relação à nossa escola. Po rém. Se eles quiserem. e esse é um aspecto muito relevante para toda a reflexão sobre educação indígena. de um lugar especial para a escola. desde a que se aproxima mais da cultura deles até a que está mais próxima da n ossa . não se trata. como costumamos dizer. em que aparecemos disfarçados. a situação e ensino é uma situação de contato. É reconhecer que se está diante de um sujeito. uma sede. pode ser uma nossa tarefa nos apresentarmos com nossas formas institucionais. como se não fizéssemos parte dessas contradições. intelectualmente ativo. porque se trata de distinguir se estamos ouvindo o ín dio ou a voz do branco que fala nele. é outro engano etriocen trico. 2. 0 método do arremedo se justifica com o argumento de que assim se faz "para facili tar". e estes as elaborariam de acordo com as necessidades de sua classe. Ouvir o índio é reconhecer que ele tem hipóteses sobre a linguagem. como disse anteriormente. apresentar-lhes.quando vai em direção a outra cultura. . Por outro lado. porque o que resulta dessa facilidade é uma coisa sem cara. Esse. como acontece em nossa sociedade. que procura adquirir conhecimento. Isso porque. não significa reproduzir automaticamente para ele uma situação com a qual já não estamos de acordo.múltipla e continua . ou seja. dadas as grandes diferenças da idade do co ntato nos diferentes grupos indígenas. o natural) corresponde. Essa é a nossa experiência. assimilando-a. de fazer issopor eles. ou suas contradições. Ser críticos em relação a "ouvir o índio" seria dei xar para ele a possibilidade de refletir sobre sua própria experiència de contato. maniqueisti camente. Creio que. eles elaborarão sua experiéticia. como se não houvesse diferenças. Carregamos nossas contradições na tensão do contato em que se instala a educação indígena. isso s e traduz por uma imagem monolítica da escolapadrão. na relação com a linguagem. 1 Eles não dominam a instituição escola. o puro. suas atitudes. Na situação . Creio que é preferível enfrentar a dificuldade mesmo-. a variàção de atitude pode ser muito grande. dar-lhes a conhecer.ser críticos em relação à nossa educação não significa aderir à deles mas colocar com clareza as diferenças. ou não. ou em nome deles pois seria uma apropr iação indevida (seria ser no lugar de). à imputação da pureza do índio (xinguano. falou sobre a necessidade de se dar ao operári o o mesmo direito de acesso às informações. Em termos de educação. considerando a diferença que existe entre sua forma de educação . então. comprova. etc. Paralelamente à importância de se reconhecer todo esse processo. creio que s e deveria dar ênfase à distinção daquilo que nos processos cognitivos é específico ao nível de conceptualização próprio do aprendiz e o que é conhecimento socialmente transm itido. estimular ou bloquear a metodologia do aprendiz. em suas etapas. ordena. exclui. então. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 83 reformula. admitese também que os mét odos de ensino são diferentes dos processos de aprendizagem. é a seguinte: na interação entre o sujeito e o objeto de conhec imento. eles davam uma festa. pontuação. Para E. distingue o que está escrito e o que se pode ler. Ao se admitir que o aprendiz tem uma metodologia. reorganiza. Um outro fator importante. Por exemplo. por exemplo. 82 ENI PULCINELLI ORLANDI 0 aprendiz tem idéias. o que se está dizendo é que aquele que ensina já encontra um sujeito com sua própria metodologia e a metodologia proposta por quem ensina pode favorecer. há um sujeito que procura adquirir conhecimento e não apenas um indivíduo bem ou mal disposto a adquirir uma técnica particular. um sujeito ativo é aquele que compara. A autora mostra também que muitas vezes não se trata de se ensinar a fazer uma distinção. trabalhando no interior de uma teoria piagetiaria. de Nancy Modiano. mas a tornar consciente uma distinção que o aprendiz já sabe fazer (pela experiencia da oralidade). fingiam bater na criança com uma varinha e diziam "agora você pode ir para a escola e apanha r". por exemplo. d istingue número. ir por vias insuspeitadas e que não começam de zero . a obtenção do conhecimento é result do da própria ação do sujeito.(3) Um exemplo interessante citado é o dos Navajos em The Indian Student. A criança era preparada não para a dor mas para a noção de que um adulto poderia agredir uma criança. o valor e a função da escrita. que caminho percorrer para compreender as características. aparece um momento em que as propriedades do texto passam a ser relevantes. letras. hipóteses que põe continuamente à prova frente à r ealidade e que confronta com as idéias dos outros. Um trabalho em que isso aparece com clareza é o de Emília Ferreiro sobre alf abetização (Ferreiro. tem a hipótese de que deve haver variedade de caracteres. etc. Isso era feito pelo cerimonial mais do que por palavr as. Nós chamaríamos. em certo momento. assim. categoriza. em ação interiorizada (pensa mento) ou efetiva.. É um sujeito que aprende basicamente através de ações sobre os objetos do mundo e que constrói suas próprias catego rias de pensamento ao mesmo tempo em que organiza seu mundo. organizar o seu contat o com o ocidental. dos manuais. Esse cerimonial representa uma forma do índio elaborar. 0 que quem ensina não pode fazer é desconhecer a metodolo gia do aprendiz. a criança e faríamos um longo discurso (didático) acerca dos costumes da outra cultura. Assim. e que é constitutivo do processo de aprendizage . a criança não sabe ler mas tem idéias acerca das características que deve possuir um texto para permitir um ato de leitura. Ela parte do princípio de que além dos métodos. 1979). Antes da criança ir para a escola. A questão para ela. a criança tem hipóteses a cerca da quantidade suficiente (mais ou menos 3) de letras que deve ter o que se lê. Nossa forma (verbal) e a deles (cerimonial) de elaboração são diferentes. teorias. Ferreiro. quando é a escrita o objeto da sua atenção? Ela procur a discernir quais são os processos de aprendizagem mostrando que esses processos podem. o seu conhecimento da cultura ocidental. Em suma. formula hipóteses. podemos diZer que o método apropriado é o da explicitação. em termos de escrita. dos recursos didáticos. pela relação com o contexto de situação e que ter acesso a cert os textos escritos: as narrativas (S. só de gramática. quem conta uma história. em geral. no entanto. pois.social. e outros de cunho social. há a situação que é constitutiva da linguagem. em atividade espontânea. por exemplo. Essa seria a ajuda metodológica possível. mos quando procuramos entender a relação entre o verbal e o cerimonial. um índio ffilk i. Além das regras. Estes rabiscos eram feitos de bai xo para cima e da direita para a esquerda. é que. e fatos mais complexos relativos ao uso de línguas diferentes se ente nder a si mesmo. quando o ensinamos a escrever com movimentos que vão da esquerda para a direita e que são lineares. de "competência comunicativa". Isto também é interessante observar porque representa uma hipótese de sse índio sobre leitura e escrita: só se lê (se escreve) nomes. . de que unidades partir (palavra. trata-se de algo que inclui a capacidade específica do uso de regras formais consti84 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 85 tuídas. Esse lugar privilegiado que é o mito é em contato. se fala. há uma cultura que é dominante e a outra dominada. onça. a desse trabal ho. ele enunciou só nomes Uabuti. há o contexto histó ico. na situação de contato entre culturas diferentes. ou seja. para propor modos de avançar no sentido de u ma estruturação. tal com a exemplificada na nota 3 Exemplo: Ainda segundo informações de Ruth Montserrat. isto é. som texto. Não se identificando linguagem com gramática a nível das concepções gerais da l inguagem. etc. nos apontam a entrada professora fazia grandes esforços para ensinar a palavra borboleta para se poder entender a concepção de linguagem que eles tem e (kaatai).). se poderia chamar. também não se pode conceber o ensino da língua só como ensino de gramática. observando a professora. Esses aspectos. há os valores sociais atribuí&s às regras. Essas diferenças. y 1 i 1 i 1 Exemplo: Segundo informações que tive através de Ruth Montserrat.. Segundo Melià. começou a fazer rabiscos em um papel. etc. 1979). Então.).. Não se trata. A perceber a diferença entre a sua concepção e a nossa. as perturbações. Quando a professora solicitou a ess e índio que lesse os rabiscos que ele havia feito. em que situação. o mito é um lugar privilegiado para o índio etc. L. Desenhava uma borboleta e escrevia o nome ao lado. E isso devia ser levado em conta. e preciso se conhecer a cabeça do índio). é preciso se conhecer os processos de aprendizagem para propor um método compatível (i sto e. enquanto esta escrevia uma carta. Não é. a relação entre elas é marcada. regras de uso em situação de bilingüismo. como se fala. também o lugar da diferença. um total acaso. em Há princípios discursivos que devem ser levados em conta: o que estrutura e função. que função tem (terá) a escrit a em sua cultura. para se responder em que língua alfabetizar. atravessam os processos de aprendizagem mas nem sempre são levados em conta. portanto. 3. Saber os momentos cruciais. Uma leitura sup erficial me leva a afirmar que é diferente. Esses movimentos são os que ele usa para fazer o cesto e outras atividades manuais. das nossas narrativas. os conflitos cognitivos.m. I. mato. creio. Diferença que também encontra etc. é ruptura. Ele mostra como pelo canto se é um "substituto" (Ferreiro. canto dos Guaiaq ui "ilustra de modo exemplar a relação geral através da escrita. não se faça isso para eliminar a diferença ou pletamente exterior le. No poético.dificuldade para a aprendizagem era grande e o resultado pequeno: Retomem os o discurso lúdico. Isso. Só me foi possível que é já em si mes ma aliança com o sagrado. nam a ne nhuma escuta. É o que vaza. Clastres vai mostrar como o USO. ele mesmo é o seu próprio canto: meu ponto de vista. souberam manter com ela essa relação interior curei ter algum contato com textos indígenas.) assim como de fatores que atinjam a çador não é o d iscurso de um louco e suas palavras não são gestos relação das formações discursivas com as formações ideológicas ( ) 0 que ele nos convida a escutar é que falar não é sempre (as diferenças sociais correspondendo a diferenças de poder de colocar o outr o em jogo. de aspectos como os tratados pelas regras do tipo convernão deixa. e a professora aproveitou o fato de que eles começaram o que está no poético e no fático. mas também das condições dos atos de linguagem não é absolutamente o infr a-individual. do mito. em nossa os índios repetiam mecanicamente. o mito. etc. eu creio. do meu ponto de vista. na cultura e o generalizaram para outras palavras. de ser o lugar do sentido: o metassocial sacional. Clastres (1978) nos diz que o uma palavra fora de contexto. Tratar. assim. isso se deu porque a nomeação sobre o lugar privilegiado das narrativas. Não era só entre o verbal e o c erimonial. do para si em e por seu canto. o discurso lúdico contrário. pelo "estar com-. e para deve ser o texto e deve-se tratar não só da organização do disquem as p ronuncia se convertem em valores ( ) a linguagem curso. que se desvendou naquela situação. 1979) e é preciso estabelecer com chega à conscien cia de si mesmo como EU. mais preocupadas em celebrar a linguagem do que em Como considero que a unidade significativa é o texto." Mais ainda. que a linguagem pode ser manejada por palavra. era o próprio ato de nomear. indígena. Como dissemos. abolindo o universo guagem e não só a gramática. explícita. em suma. logo exist o. proservir-s e dela. A escrita do homem com a linguagem". eu canto. são elas mesmas seu próprio fim. 41 separadas de sua natureza de signos as palavras não se desti A unidade no.ensino da linguagem. é na classe.). fez o desenho. etc. o uso da linguaiaqui é a reflexão em si da linguagem. no entanto. das condições de produção da si mesma e que ela não se reduz à função que exerce: o canto linguagem. da relação apareceu numa situação discursiva clara. a falar kaatai e refez o procedimento: escreveu kaatai na lousa e no fático . Um dia. só se faz levando em conta a situação. o canto solitário do ca (pergunta e resposta. etc. A narrativa. Ainda aqui o que se pretende é social dos signos par a dar lugar à eclosão do sentido como valor que ao explicitar sua concepção de linguagem e a diferença em absoluto ( ) A linguagem do homem civilizado tornou-se comrelaçãó à do índio. o mecanismo da "substituição". E isso se pode notar pelo que dissemos mais acima Entre outras coisas. pois é para ele apenas um puro meio para assimilá-la. Isso significa que se ensinaria. Não há para o 86 . de comunicação e informação ( ) As cultur as primitivas. Eles descobriram rapidamente qual era o procedimento Não dev e ser esse lugar marginal o do lúdico. pelo jogo da interlocução. entrou uma borboleta sociedade não há lugar para o lúdico. ao 4. "0 homem existe clareza a natureza. dada a polissemia. etno (sócio) lingüísticos (dialetos. 0 desequilíbrio necessário da nossa exposição se deve ao fato de c onhecermos bem a nossa e de estarmos perguntado pela outra. me leva à reflexão sobre o dis curso lúdico que. mais acima. etc.a cultura indígena acolhe o lúdico. Nesse sentido.. é a melhor entrada para a compreensão da educação indígena e o ponto inicial para a construção de uma metodolog ia apropriada. apontando a "outra" (a diferente) como ideal. pois sua linguagem já é em si mesma um poema natura l em que repousa o valor das palavras".). etc. Porque essa é uma diferença importante: o lugar ocupado pelo lúdico na cultura indígena instaura uma convivencia com a linguagem que. . qual a sua relação com situações discursivas específicas como o cotidiano. ass im como ao falarmos. que sempre são diferentes. em termos da tipologia que construí. não há relação entre saber e poder. Isto é. observar que ao falar dessa diferença. processos de aprendizagem. a Psicolingüística. é diferente da nossa. o funcionamento do discurso lúdico na distinção entre o privado e o púb lico. a forma e a função do mito. não pretendemos estar. da narrativ a. Creio que aí está uma contribuição importante para a reflexão sobre a educação in a: à diferença de nossa sociedade . no confronto. dada a diversidade dos grupos. bilingüismo. como o caracterizei. não é possível se falar em um projeto geral. mas. etc. hipóteses s obre a linguagem. atestados. em relação a cada grupo. Isso tudo.EN1 PULCINELLI ORLANDI homem primitivo linguagem poética. na cultura indígena. ou seja. para a melhor compreensão do funcionamento dos tipos de discurso e sua relação com a natureza da lin guagem. a Análise de Discurso. as regras do discurso. mas é necessário se estabelecer em certos princípios para se refletir em cada prática.em que o discurso autoritário é o dominante. não pretendemos estar afirmando que. etc. Ao criticarmos uma não estamos apontando a outra como modelar. das diferenças em relação ao processo de educação. discursivos (a relação dos interlocutores e da situação com o que é dito. é que considero um passo inicial muito importante o da reflexão sobre a função do discurso lúdico. só existe o lúdico ou que o lúdi co não tem função social nenhuma. na especificidade do domínio da área em que desenvolvo minha reflexão. o político e as festas. finalmente.). acredi tamos. uma vez que a questão da educação indígena a range problemas que incluem os mais vai 1 i A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 87 riados aspectos: sócio-culturais (desde a forma da sala de aula e a disposição dos col egas até a concepção de educação). etc. é o contraponto para o autoritário e o polêmico. em qualquer cultura. os estágios das diferenças sociai s dos diferentes grupos. na cultura indígena: como aparece. variação. Não só para a cultura indígena. o polêmico é o que se pode instituir a partir da crítica. relação do verbal e cerimonial. 0 que pode nos levar a uma reavaliação crítica dos conceitos com os quais operamos. etc. con siderados e criticados por domínios de conhecimento como a Etnolingüística. etc. CONSIDERAÇOES GERAIS Em conclusão. Seria interessante. em retorno.). E esses princípios são princípios que podem ser levantados. ou que. cognitivos (metodologia. Essa. e o lúdico é ruptur a . os tipos de discursos. que é a área do dis curso. na educação indígena. creio. assim como a qualidade e a idade do contato. México. como se considerar que existe uma causalidade entre eles.Lendas Mundurukus. devemos questionar o uso lingüístico e deslocar o estudo para o domínio da sociolingüística.por exemp lo: como entender a variação em língua.BIBLIOGRAFIA Clastres. condicionar os fatores de uso aos fatores internos ao sistema lingüístico. Pêcheux. diversas tem sido as perspectivas. Pierre . 1977). fatos que concernem diretamente à natureza da convenção na linguage m. Rio de Janeiro. pois o que existe é simultaneidade (Benveniste. Entretanto.-------. 1978. Sigio Veintiuno.--. Podemos citar autores que estão no campo de ssas distinções: Whorf. constrangem o compQrtamentçl~--P.Los Sistemas de Escritura en el Desarrollo del Nião . de sde se considerar que esses elementos apenas co-ocorrem. brangente e mais exi)licativo sobre a linguagem. para. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO A sociolíngUiStica. ou seja. Berrístein. vol. como significar -. As tentativas de explicar o funcionamento da linguagem somente ao nível da lingüística imanente. 3. Brasília.. SIL . entendida aqui em seu sentido amplo. 1979.r-a--Lâb-qy. 1981. não se trata de propor uma teoria sociolingüística que se constitu a de uma teoria lingüística (sintaxe e fonologia) com parametros sociológicos que se teria que formalizar adequadamente (B. 1975.quem o homem vive rodeado pelo mundo-tal-Val a linguag em o representa. não faz sentido colocar-se a_p~:toridade genética (*) Texto publicado na Série Estudos 6. Schlieben-Langue. Uberaba. se mostra m parciais e não satisfazem um olhar mais 1~. E. 1979. Francisco Alves. Paris.~ tkÇq_qi~e se_ tornou senso comu m nos estudos sociolingüísticos. qual o domínio das mudanças em língua..gem no contexto social revela seus aspectos fundamentais. A. n? 37."Mises au Point et Perspectives à Propos de YAnaIyse Autom atique du Discours". e Fuchs. Sapir. para quem a linguagem interpenetra a experiência. M. Menos corn~q-u-eirõs. Quanto à natureza da relação entre eles. 1 89 de um desses elementos. . 1974). e Teberosky.@. ---------E1 . em Langages. 6 dFk os estrutura social dá oriRem às formas E-g-ü_:~u distintos e estes códigos transmitem ---------gIr U tu essenci -rim-te-a ml rae _desta forma. iiUa~-Fam~e~j~-in-cã-diUõ~-Wõ'pens~ ãíãe-nfõ lingüístico. o a ~ a teoria da enunciação e a analise do discurso (convenção e lingun£yem)* "415 INTRODUÇÃO Para se responder a determinadas questões colocadàs pela lingüística .A Sociedade contra o Estado. p ara quem a ri ísfiç~as-. Que existe uma relação entre língua e ~oç:iedade. . se encontram os conceitos de interação (intercursc social) e trabalho. Ferreiro. M. estrutura social s e reflete na linguagem e só o estudo da in--. e deixa de lado o que haveria de mais caracterizador. Ou seja. Saussure toma. "Q_gelg~1es_ReniAr-çLi-~e s s_qr k~ Rapports de Ia Sociologie et Ia Liqguistique: E. estão dicotomizados) Saussure. Quando nos perguntamos pela natureza da relaç o entre linguagem e sociedade. isto é. seu aspecto social.Pelo que vemos tanto no domínio das perspectivas da socioI riELis-iode lingüísticacomo no domínio de autores. deriva da sociologia de Durkheim (cf. à distinção Língua/Fala. então. banal presumir o isomorfismo: a um determinado tipo de estrutura social acompanharia determinado tipo de estrutura lingüística. 6histórico e o social. e individual. apoiando-Íse na caracterização abstrata da língua. a de valor. Durkheim-et F. qual os fatos sociais se impõem ao indivíduo. o social e o lingüístico. ocasional. Poderia ser mais fecundo -partir do condicionamento recíproco desses dois tipos de estrutura em duas direções: consi deraríam o cion 1 amento lingüístico da sociedade tão . Melhor seria. dotada de um poder de coerção em virtude do 90 . devemos retomar a afirmação de Saussure. eÃsR caracterização da língua como fato social leva à dicolõiiílizãçãõ-. no entanto. está implicada pela noção de vaIÕE.-à. tratasse da relação entre ações não lingüísticas e lingüísticas Scl en-Langue. que historicamente precede a língua. a língua como um produto social do qual exclui o processo de produção.-sepãração do que é abstrato (social) e o que é vidual).a es ru. entre outras coisas. 1977). nessa procura. Quando fala do caráter convencional da linguagem. 1~ segundo a qual a~língua é u~1ãt~õ'social E o que é fato social para Saussure? Em termos teór icos. e tem por substrato e suporte a consciên cia coletiva. seria. da qual exclui qualqÜie-r-Reférencia ao social. Ainda assim. A questão decisiva para a sociolingüística está em como considerar aquilo que é so cialmente constitutivo da linguagem. est aríamos considerando relações que permanecem exteriores ao fato lingüístico. .í tão -cíon '~g aecria ~identidade s ru r a socied~ 2 lín!La cria identidade e o condicionamento social da a s [e oc: . apenas seu caráter arbitrario (e abstrato). definem a linguagem como produção e situam a produção lingüística na . -De Saus sure" (Cassirer. desvinculou-a daqui lo que é propriamente social e histórico.S-es-sa noção. l~69)). ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 91 V. A arbitrariedade. como F. E representação coletiva (exterior ao indivíduo). mas olhar-se a partir de uma teoria geral da atuação que. em Saussure. A fala 1 . da convenção. en ao. em S aussure. aúca---. é bastante criticada por autores que. Em termos de análise lingüística. Rossi-Landi (1975). E. líniã . A lingüística e a sociologia encontram-se no mesmo plano analíticq~-Qúos sistemas e instituições.__------------ . toma. encontramos diversidade. Doroszewski. r a sociedade está "refletida" na estrutura lingüística. a historic idade_èo_ sujeito. não se observar estaticamente os tipos de sistemas que se est uda. 1972). a regularidade. poi s. imí as um trabalho humano. a língua não é só um instrumento. Ainda segundo Rossi-Landi. dentro de uma perspectiva convencional do estudo da linguagem. 0 problema da arbitraHedãae--ã~fCíc6. o aspecto teleológico. partia-se de posições estabelecidas como as de que: se estudam as constantes. pela perspectiva do estudo da língua como ação (trabalho). Saussure leva ao fetichismo verbal.aUtrário. A representação. Segundo esse autor. não ao jogo ras intenções.q ue.rela1 __ 1ÇJ ti-vã-e-sfãSllí-dã-de do-sistema e das funçõe comportamento. assim. A sua não causalidade remete se. recuperar o caráter da sua lí'ls-to-ri-ci-dade-as-si~-m-cõííío o da sua função social.-e a sua arbitra * dade não aparece como arbitrária. etc. sincrônico...ao que---~. -cr-ifeí~õs-. Segundo ele. Podem os. mas ao fato de ser mediação necessária (produto da história).~Íua-i ~iodução social. É assim que a língu devé~-iêf ista.Ou cominent concevoir le rapport organique de 1'individuel et du social dans le langage) (Cassirer.pr~---o sociai J~eral. o social e o histórico coincidem. seu caráter arbitrário. ao separar o produto lingüístico de . e o fato de não ser acidental podemos concluir que. o tra~formando. confirmam-se os critérios da regu laridade e do aspecto túWJ~Ó&ico.que o produtor não possua o seu a' __ . nem um dado. o sistema é homogêne o. Por exemplo.. Esse automatismo com que a lingüística foi-se fazendo re flete o automatismo que se imputava à linguagem. Em suma. é autônomo.seu coritèüdo social e ve a sua is ---da-aL LC . Trata-se sempre de ação (trabalho) humana--NeM a soÇic-dadç__ nem as línguas se modificam -autonomamente. em sua teoria do valor lingüistico (Orlandi.~ [que produz o reflexo da realidade na língua é trabalho lin ---ís tic tico. a lÃt-er-venç-ãõ--~rã-mi~mória.'analisado dessa perspectiva: c! que é_prod4Xo do trabalho humano se contrapõe tanto ao que é natural Sganto. convenção. ----Tôníãndãj~ê-céiffic. 1978). deve-se encarar a_linguagem como trabalho e a s línguas como produto desse trabalho. . se caracteriza pelo. pela caracterização da linguagem como trabalho e da língua como produto histórico social. dç-mps. 1969). podemos chegar à concepção de que. No entanto. As convenções estão estreitamente ligadas ao ráter histórico da língua.--11-1 controle. para a -de~Ti-nição da convenção (Landesman. São os "atos d ~om~ens~q~-e-Tomãm:íp~ar-te-delãsq-ue as-. entram o caráti---r~di---ppr~õ`ce-sso. Sechehaye (La Pensee et Ia Langue .i natural ou arbitrário uma vez. e-ntão. mas motivaJã -pelo~sistema de ~6dp'ça-o.--gug in MeK é convencional-T 0 PONTO DE VISTA DA SOCIOLINGÜISTICA 1 Vários desses aspectos que abordamos não faziam parte da reflexão lingüística. entretanto. que distingue a invenção lingüística (instrumento que o homem cria para as suas necessidades) e o seu uso automático. À .eÜten esse senti . um produto híst6rico-soci L e _So L Se partirmos do fato de que as línguas 5~è=xa medida em que se acham associa das a grupos humanos.ainda que pareça .a qúe.perl-e-n~éé (15fõd_ulô -&o---trábMEJ. na língua. não faltaram lingüistas que alertassem para esses aspectos mais dinâmicos da linguagem. 0 caráter hísiffiféjâ~ língua está em ser ela um fato social em. a. o ato de linguagem torna-se um reflexo de valor essencialmente so cial. a heterogeneidade . 0 critério para se distinguirem as línguas não é nem a intercompreensibilidade. Coloca a possibi-0 i 1 i A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 93 lidade de tomar como centro de estudo o caráter sistemático da variação lingüística. Assim como também é ficção a língua homogênea. pseu donaturalidade) se substitui ao ato consciente. mas em situações histórico. Correspondentemente. a eliminação da propriedade privada lingüística (reestruturação total da realidade históricoocial presente e desalienação sócio-económica). como supõe o estruturalismo e o transformacionalismo. mas o uso ativo de uma língua consiste em fazer apelo a hábitos adquiridos e o reflexo desempenha um papel preponderante. 0 ato automático (ilusão do sujeito. o inglês. Um dos autores que trabalhou mais explicitamente sobre a questão da hetero geneidade da língua é Labov. para o lingüista. consciente da manipulação exercida pelo sistema social sobre o falante. Essa língua individual histórica constituída pela consciencia de seus falantes não é homogênea. caracterizando-a como realização da possibilidade crítica e da intervenção responsável no pr ocesso de elaboração dos códigos sociais. considerando que não é necessário que a distinção sistema/ manifestação do sistema recubra a distinção invariança/ e a de social/ individual. como o portugues. b) porque cada falante dispõe.sociais específicas (cf. propõe o que chama desalienação lingüística. Este é o conceito de ' a a o . Um grupo determinado a leva e vive na consciência de sua identidade. samento das coisas esteja verdadeiramente em movimento. 1977). Fazendo a crítica a esse uso automático. Bourdieu. A homogeneidade atribuída à língua é abstração. Para ele.dje e~ língua histórica. o francês. Em dois sentidos: orque apresenta vários subsistemas. de vários subsistemas. trabalhos de Labov (1976) e Pecheux (1969) ). o alemão. que não discuta concepções de li guagem no vazio. trabalha o conceito de língua oficial. na coesão para dentro e na distinção. Ele critica a hornogeneidade. economica. há a possibilidade de uma prática crítica. a tomada da palavra. rejeita ndo a relação entre estrutura e homogeneidade. não existe. Faz parte própria essência da língua revestir-se de concretizações históricas determinadas. em si. A vida em comum consolida certos traços característicos da língua e a delimita. Essa consciencia da identidade pode ser puramente h istórica ou ideal (exemplo: Occitan) ou pode corresponder a uma sociedade política e econômica. pode-se falar pensando palavras sem que o pen . isto é. A língua. Ponzio (1974).falax não é puro reflexo. etc. para fora (B. que responde simplesmente às situações estereotipadas da vida comum. cultura l. nem as características estruturais. Então. Na maior parte das vezes se apóia na unidade política. Schlieben-Langue. visando o problema da legitimidade. até certo ponto. Não indo às causas primeiras 92 ENI PULCINELLI ORLANDI do pensamento. A língua individual concreta é heterogênea. Procura. A semantica de A. embora uma língua apresente muitos subsistemas. de sua adap. quando pensado concretamente. na medida em que discute a relativa constancia da relação semiótica. se dá um saber cotidiano (senso comum) que é determinado por uma rede de estruturas de relevancia (o falar de prestígio. Daí a afirmação de que conhecer uma língua não é apenas conhecer as formas engendradas pela gramatica. Trata-se. pois. um aspecto importante da competência lingüística é a aptidão de se empregar regras variáveis e que só pode ser demonstrada por um estudo aprofundado da língua no seu emprego (contexto social). para que haja comunicação efetiva é preciso que os inte rlocutores partilhem as convicções relativas a ele.tação a suas norma s. A relação com a língua é fator primordial do conheci mento lingüístico. ou seja. Tomando como base a comunicação. então. são ingenuos. que fazem parte do ato da linguagem. um nível de estrutura variável. é antes de tudo compre ensão (condição necessária. as atitudes são homogêneas. mas com dificuldade se podem comprovar as difer enças semanticas. atitudes. As avaliações estão em estreita dependencia das circunstancias sociais da comunidade em questão. isto é. de que na língua só existem unidades funcionais in variantes. 1976). Labov distingue as variações sociais. conseqüentemente. do ponto de vista da sociolingüística. sintáticas. mas não suficiente). A situação da variação. é possível construir instrumentos formais para o tratamento da variação. E. As convenções estão relacionadas aos grupos e é à heterogeneidade dos grupos que se deve referir seu estudo. A chamada competência lingüística inclui muitos outros fatores que não apenas os estritamente lingüísticos. coloca marcos importantes acerca da natureza da linguagem e sua relação com o pensamento e a realidade. 94 ENI PULCINELLI ORLANDI Em geral. da relação expressão/ conteúdo. diferenças fonéticas. que são a adaptação da linguagem do locutor ao contexto imediato ao seu ato de fala. da comunicação. Assinalam-se . e também acerca da língua . Portanto. pode-se falar em diferenças diatópicas (regionais). Desde que não e pense estrutura e homogeneidade. diastráticas (ca madas sociais) e diafásicas (funções e estilos) (Schlieben-Langue. Schaff (1966). que não prescinde do conceito de comunicação. A ausência de permutações estilísticas e sistemas de comunicação estratificados é que se revelaria disfuncional (Weinreich. A comunicação efetiva. Não podemos recusar esses fatores . é normal e a heterogeneidade é coerente. 1977). abrem-se perspectivas para o estudo da linguagem concreta. Dentro de uma mesma sociedade. vem acompanhada de uma rede de avaliações homogêneas. o estigmatizado). segundo ele. pois. mas além de se compreender um enunciado da mesma maneira. então.é normal e constitui o resultado natural dos fatores lingüísticos fundamentais. e as estilísticas. inerente à comunidade lingüística e. que caracterizam discursos de subgrupos. Os julgamentos categóricos. convicções. avaliações em relação à língua. Como situar esse fator. São apenas de conotação trazidas por diferentes âmbitos da experiencia ou é a própria significação do signo que se modifica de um grupo a outro? Questão bastante relevante para a lingüística. é que podemos compreender que o uso lingüístico implica atitudes. pelo desenvolvimento que vimos fazendo. As desigu ades primárias estariam na semântica? A sintaxe teria função mediadora? As desigualdades fonéticas teriam função simbólica? Estas são questões que aguardam resposta . mas também o valor social atribuído a elas. pois. juntam-se premissas sociais. Fazem parte da identidade do grupo e. a estrutu ração interna da variação se revela. ao estritamente lingüístic o. Labov define a comunidade lingüística como um grupo de pessoas que compartil ham um conjunto de normas comuns com respeito à linguagem e não como um grupo de pessoas que falam do mesmo modo. isto é. de se perguntar como está distribuído o saber geral de uma sociedade dividida em grupos e estratificações sociais. que é essencialmente social. Nesse passo. o saber em torno da língua? Acerca de todos os objetos da vida diária. com normas veladas. Para e sse autor. opostas às normas da correção gramatical explícita. 9 0 uso se define como a probabilidade de uma regularidade li conduta. está dada unicamente pelo exercício de (to. Não se trata aqui. É. isto é. Ou. uma competência que compreenderia também regras absolutamente sociais que descrevem como se utiliza a competencia gramati cal adequadamente em situações de interação. A competência comunicativa compreenderia todas A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1 1 i 1 . ve a necessidade de se introduzir o conceito de competencia comunicativa. pois. considerando. se é realizável. mas como chegam a se institucionalizarem as atuações da "fala". E nesse caminho encontramos o discurso. inclusive as da competencia gramatical. mas da descrição de atos lingüísticos dialógicos.como constitutivos. qua ndo e na medida em que essa probabilidade. permitiria decisões também acerca da aceitabilidade. As unidades lingüísticas devem ser concebidas como unidades que se fazem his tóricas e que são basicamente recuperáveis na realização. Weber (1964). o costume. em direção à competência comunicativa que vão os estudos sociolingüísticos. é que se deve repensar a relação entre o falar e o sistema da língua. e acrescentaria as de performance. como se estabelecem e como se modificam as con . 1 1 f 95 as regras de comunicação. a partir dos conceitos de competencia e performance. como sua sis tematização alcança certo peso próprio e como podem-se modificar em novas atuações. na ação social. Indo mais longe. Isto é. 0 que se torna cada vez mais claro. se é apropriado e se é lizado de fato. entro de um grupo. Um certo setor da sociolingüística americana. mas os distingue. . ve mos como uma perspectiva futura. mostra a existCncia de transito entre esses conceitos. do estabelecimento correto de enunciados em dependencia de certas variáveis. Por esse caminho. sob quatro formas: se um ato lingüístico é possível. pode-se atingir o que é constitutivo. como se chega a aceitá-las comumente numa sociedade. a convenção e o di reito. percurso agora feito no sentido inverso: não como as línguas se deformam na sua realização. muito desejável. a articulação da sociolingüística com a Análise do Discurso. 0 PONTO DE VISTA DA SOCIOLOGIA As convenções são de natureza social e só uma teoria da ação social em sentido amplo pode dar conta do seu papel na constituição do ato de linguagem. o uso. encontramos a concepção de competência comunicativa de Haberm as que considera uma competência comunicativa que tematiza a faculdade dos falantes de entenderem-se em diálogos. dada a polissemia do conceito de performance. isto é. Por isso. levando-se em conta a heterogeneidad e das línguas e seu caráter histórico. como no desenvolvimento da s GT. venções. representado por Hymes (1974). E há vali4de quando a orientação de fato por essas máximas tem lugar IDrque em algum grau significativo quer dizer em um grau cue pese praticamente . As atribuições da validade legítima a uma ordem determinada se dá: pela tradição (va . religosa).: . ENI PULCINELLI ORLANDI (costume carece de "validade". Há ordem quando a ação 5 orienta por máximas que podem ser assinaladas. A validade de uma ordem significa algo fiais que a regularidade determinada pelo costume. 0 costume aparece Çmo uma norma não garantida exteriormente. ninguém exige que se o tenha en conta. isto é. A convençao é costume estamental e a punição tem conseqüências eficazes e sensíveis (mais do que as jurídicas) pela ação dos membros do p róprio estamento.Direito: quando está garantida externamente pela possi11lidade de "coação. E é pela validade que se distinguem a convenção e o Çreito d o costume. A probabilidade Q que isso ocorra de fato se chama validade da ordem em (aestão. A legitimidade.e xercida por um "quadro de indivíduos" ástituído com a missão de obrigar a observância dessa ordem ou Cistigar sua transgressão. A ordem que aparece com o prestígio de ser (brigatória e modelo é a que aparece com o prestígio da legitirtidade. quer dizer. A submissão à convenção não tem caráter livre. Aparece como Ago que deve ser. pode estar garantid a: A de maneira íntima (afetiva. por sua vez. A ordem legítima pode chamarS. valores morais.pousa em uma est abilidade duradoura.rnas (de determinado genero).aparecem válidas para a ação. A eficácia da repressão reside em que os meios repressivos não são entregues a um quadro de pessoas instituído. crenças). dentro de um grupo de pessoas. deve aceitar incomodidade. dentro de um determinado gmPo. c)mo obrigatórias ou como modelos de conduta. uma conduta discordante provoca "reprov ação" geral e Praticamente sensível. se considera como válido e está garantido pela reprovação da conduta discordante. As ordens são garantidas de modo externo e de modo interno (representações nor mativas de caráter ético.0 uso deve chamar-se costume quando o exercício de fato X. e que se mo stra como individual.Convenção: quando sua validade está garantida externaQente pela possibilidad e de que. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO i 1 1 i 1 97 A convenção é o costume que. b) pela expectativa de determinadas conseqüências ext. pela represent ação de uma ordem legítima. A ação social pode orientar-se. Se exige muito seriamente do indivíduo como obrigação ou modelo. . inconveniên(as enquanto a maioria do grupo conta com a subsistência do Ostume e dirige por ele sua conduta. Nesse sentido. mas ao proprio grupo. racional em face de valores. A estabilida de do costume se apóia essencialmente no tto de que quem não orienta sua conduta por ele age improIriamente. quanto aos seus participants. Entram aí o Ilgulamento e o sentimento de dever.. Isto é. Em geral a ade são à ordem está determinada pelas situações de interesse de todas as especies e pela mistura de vinculação à tradição e idéias de legitimidade. em sua distinção entre semiótico e semantico (cf. A linguagem aparece. então. se define como um processo de apropriação. Hoje. produtor de mensagens. é composta de unidades fixas. colocando a ação lingüística junto à ação não lingü nessa perspectiva não se pode estudar o ato lingüístico sem estudar o ato social em geral. enquanto re alização individual. no semi6tico. feita pelo autor. E. como uma dualidade: instituição social. no semântico. que se realiza e se divide em signos particulares (palavras). mais ou menos. Benveniste coloca o convencio nal no domínio do semiótico: o signo existe e é reconhecido como significante pelo conjunto dos membros da comunidade lingüística e evoca para cada um. mérito do estatuído positivamente em cuja legalidade se cre. E aí está o convencional. dos estudos de Benveniste (1974). podemos dizer que. em Benveniste. a historicidade (a tradição) e a sua motivação na forma social (a legitimidade). as mesmas associações e as mesmas oposições. E aqui reencontramos as características atribuídas à convenção na análise da linguag em: o aspecto teleológico (os interesses e o grupo). nessa dualidade. é Iústórico. o autor diz que. praticado pelo indivíduo. é praticada pelo in divíduo. uma teoria lingüística que busque o que de social é constitutivo da linguagem e que se mostre como teoria da ação não pode prescindir da reflexão sobre a ação social em geral. como a possibilidade da subjetividade e o disc urso como provocando a emergência da subjetividade. 5 9). Do outro lado. instituição social. nesse texto. encontramos o discurso contínuo. a ordem semantica se identifica ao mundo da enunciação e ao universo do discurso. pois é o sentido. os conceitos de unidade. 1a signifiance de l'art ne renvoie done jamais à une convention identiquement reçue entre partenaires" (p. que a língua se apresenta. Haverá aí lugar para o c onvencional? Observando a distinção. entre o semiótico (que deve ser reco nhecido) e o semantico (que deve ser compreendido). vemos que a enunciação. É o locutor no exercício do discurso que se apropria das formas que a linguagem propõe e às quais ele refere a s ua pessoa definindo-se a si mesmo (como eu) e ao parceiro (como tu). i 1 95 ENI PULCINELLI ORLANDI Podemos depreender. Semiologie de Ia Langue). Nessa persp ectiva o processo do eu é sernantico. A v alidade pode valer como legítima em virtude de um pacto ou por outorga (por autori dade). ao contrário da língua. significância. aí. Do outro lado. Benv eniste diz que temos "no locutor a vontade de referir pelo discurso e . 0 PONTO DE VISTA DA TEORIA DA ENUNCIAÇÃO i i i Vejamos como é tratado o problema da convenção pela teoria da enunciação.lidade do que sempre existiu). não há sucessão de unidades que se identificam separadamente. Ao discutir a natureza das unidades nas artes de figuração e n a língua. a forma de legitimidade mais corrente é a crença na legalidade. crença afetiva (o exemplar). em todos os seus aspectos. processo mediador do semântico. compreende o domínio que se refere ao fato da língua ser instituição social e composta de unidades fixas (o domínio do sistemático). Pelo que podemos observar. Em resumo. sistema. 0 semiÓtico. concebido globalmente. não separamos. não é uma adição de signos que produz o sentido. enquanto o tu permanece no nível semiótico. discurso contínuo. crença racional baseada em valores. E a concepção dialética do eu-tu (indivíduo e sociedade) proposta por Benveniste (1976) em "Da Subjetividade na Linguagem" (p. na relação com a linguagem. 2) A lingüística como teoria ao mesmo tempo dos mecanismos sintáticos e dos pr ocessos de enunciação. o histórico. obscuro e disso decorre uma série de dificuldades na interpretação dos planos de Benveniste.e mesmo. se apresenta como a articulação de três regiões do conhecimento científico: 1) Materialismo histórico como teoria das formações sociais e suas transformações. É só nesse sentido que vemos um contato entre o semi6tico e o semantico. essas regiões são atravessadas por uma teoria da subjetividade. pois este só se faz presente se se torna um eu. mais do que isso. produz enunciações. é um social geral. aí compreendida a teoria da ideologia. Que. se faz locu tor. Assim. etc . o interlocutor. para tornar as comparações frutuosas. enquanto tal. do efeito-leitor como constitutivo da subj etividade. E aí ficamos. como fez Pecheux (1975). Mas Benveniste diz que para isso e necessario puxar mais longe a teoria. Exclui. quando se faz semantico. a não ser quando Benveniste fala na língua como sistema produtivo. Benveniste distingue dois níveis nas entidades língua e sociedade: o nível histórico e o fundamenta l. 0 quadro epistemológico colocado por Pecheux. 0 PONTO DE VISTA DA ANÃLISE DO.as duas figuras em posição de participantes que são alternativamente protagon istas da enunciação . Conclui pela relação entre língua e sociedade no nível fundamental. fundamental. e é dissimétrico. Ao 11 invés disso. de princípio. considerando a língua como condição depossibilidade do discurso. Ao demonstrar que não há correspondência nem de natureza nem de estrutura entr e os elementos constitutivos da língua e os constitutivos da sociedade.aparece como cenário para que o eu represente seu papel. E o social. se exploraria mais o asp ecto funcional da relação linguagem/ sociedade. cria objetos lingüísticos que são introduzidos no circuito da comunicação. portanto. no mínimo. . Nesse passo. Nesse sentido.enquanto relação de sistemas semióticos . 3) A teoria do discurso como teoria da determinação histórica dos processos se manticos. 287) desaparece: o que há é um eu que subsume um tu. que é considerado. o quadro figurativo da enunciação . é possibilidade estabelecida pelo semiótico e. entre língua e fala. DISCURSO (AD) Procura-se uma passagem entre enunciação e enunciado. de natureza psicanalítica (que deverá ser explicitada) em que uma das questões centrais é a de leitura. para a análise do discurso. 0 estatut o da enunciação é. segundo Pecheux.no outro a Possibilidade de correferir identicamente no consenso pragmáA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 11 99 tico que faz de cada locutor um colocutor". e afirma que ali foi possível dar apenas uma primeira aproximação. é contido pela linguagem. é por ela determinado . mas que não s e faz como passagem. Além disso. no inter ior da sociedade: produz sentido. Não há nada parecido com as determinações histórico-sociais de que estamos falando. E talvez da' derive a dificuldade. poder-se-ia deslocar a distinção para o nível língua/ 100 ENI PULCINELLI ORLANDI discurso. 1976). introduzem subrepticiamente o recurs o ao sentido. a nossa colocação inicial. E é.. mas não se trata de uma distinção estanque. A semântica lingüística é uma semântica formal. na teoria. A análise. e é próprio da relação entre língua e discurso que as regras fonológicas. as sistematicidades da língua não exis tem sob a forma de um bloco homogeneo de regras organizadas à maneira de uma máquina lógica. da variação do contexto. que as dificuldades se apresentam com toda sua intensidade. e deve ter como objeto os processos de arranjo dos termos em uma seqüencia discursiva e em função das condições em que a seqüencia discursiva é produzida. segundo ele.que tem como objeto a análise não subjetiva do sentido . segundo Pecheux . Daí a proposta da AD de uma teo ria não subjetiva da enunciação. assim. segundo Pécheux.. não reproduziria esse efeito e. podemos dizer que. ao invés de nível superior de análise. é preciso distinguir entre essa semantica e aquela que é pro posta pela análise do discurso. o constituem e como tal são objeto da análise. reconheceria sua existencia no objeto de estudo. pois. Com a distinção entre semântica formal e semantica discursiva. Em suma. a ilusão do sujeito. em particular. Não é uma semântica lexical. Nesse passo. realmente.passa por uma fase de análise lingüística. no domínio da semantica. embora concordemos com a autora quando ela recusa a idéia de que. As regr as sintáticas aplicadas na AD. Em Benveniste é o sujeito que se apropria da linguagem. se não mantivermos a existencia de uma base lingüística comum. Como Pecheux. Essas condições de produção erizam o discurso. Não da maneira colocada por alguns autores (como Maingueneau.que são as condições materia is de base sobre as quais se desenvolvem os processos discursivos . é possível atingir o lugar específico da língua qu. corresponde à construção do efeito-sujeito. A fronteira que separa o lingüístico e o discursivo é sempre colocada em c ausa em toda prática discursiva. 0 conceito básico para a AD é o de condições de produção. que deve dar conta da articu lação entre o processo de produção de um discurso e as condições em que ele é produzido. teremos um pluralismo heterogeneo de micro línguas. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO i 101 Para se perceber bem a natureza dessa proposta de Pecheux. em que o text o é uma unidade de um nível de análise superior (à frase) que faz parte da língua. o discursivo e o ideológico-cultu ral). nesse domínio. refletem. São necessariamente heterogêneos. num movimento indi vidual.sejam objeto de recobrimentos e de apagamentos parciais. uma sistematicidade que não se opõe ao não sistemático (língua/fala). sem uma passagem. deve-se lembr ar a crítica que ele faz às teorias da enunciação que. Voltando. Essa modificação na perspectiva do objeto traz consigo a necessidade de se ver a enu nciação não como desvio mas como processo constitutivo da matéria enunciada. ao mesmo tempo. dada a diversida de das ideologias dos locutores. preferimos ver essa relação como a existente entre condições materiais de base e processo. isto é. Uma das maneiras de se ver o discurso é a que faz dele o sintoma de uma cr ise interna à lingüística. o lingüístico e o discursivo permanec em distintos. tra balhar com a noção de funcionamento. Qual o estatuto dessa análise em relação ao discurso? Essa análise lingüística é de n tureza morfo-sintática. Mas o recurso a um semantismo implícito não está excluído. Segundo P eux essasemantica ainda não está feita. A semântica discursiva é a análise científica dos processos característicos de uma formação discursiva. mas que se articula sobre processos". No entanto. pois o lingüístico e o discursivo se comunicam. Pêcheux deixa claro que a AD . . Seria "uma teoria do funcionamento material da língua na sua relação com ela mesma. morfológicas e sintáticas . através da articulação entre semântica discursiva/semantica lingüística (ou formal). Ao distinguir os tres níveis (o lingüístico. Como diz Pecheux. uma vez que os pontos comuns na consideração do objeto de que tratam são evidentes. sabemos que o termo socioli ngüística recobre trabalhos extremamente diversos . por exemplo. pois. não é o sujeito (locutor) que apropria. ao contrário. A "arbitrariedade" resulta do fato de haver uma relação entre o discurso e o sistema de produção no qual existe. variação lingüística. trata-se de se visar à relação entre o social e o lingüístico através do reflexo. então. processo históricosocial) como constitutivas do discurso. Na teoria da en unciação trata-se da determinação entre o funcional (enunciação) e o formal (enunciado). como pudem os observar por este nosso estudo. Mais do que isso. Por outro lado. sua interpelação feita pela ideologia. se define como uma lingüística. sistema/discurso. Não se trata de opor enunciação/enunciado. pois. pela análi se do discurso. de refletir sobre essas sistematizações de uma outra perspectiva. entre formação discursiva e formação ideológica. a partir de Labov. podemos dizer que. Há. Benveniste. . pode ser bastante fecundo para um domínio como o da AD que procede. relação essa ainda sujeita a muita controvérsia. Na sociolingüística. Dessa forma. algo que até o momento foi pouco explorado e merece uma ma ior atenção é a relação da análise do discurso com a sociolingüística. desde uma concepção mais periférica do que seja "refletir" até uma concepção mais abrangente (competência comunicativa). mas os sistemas de signos são tomados no jogo das formações discursivas que são reflexos e condições das praticas sociais. Tratar-se-ia. mas ha uma forma social de apropriação da linguagem em que está refletida a ilusão do sujeito. É nes se jogo do lugar social e dos sentidos estabelecidos que está representada a determinação histórico-social do discurso. para a AD.102 103 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO pela consideração fundamental das condições de produção na AD. ou hors-contexte). r elação com a linguagem e até mesmo análise de discurso . procura constituí-la. a AD procura tipificar os discursos das diferentes formações discursivas. ainda que diversamente à perspectiva de. isto é. Retomando-se os critérios do que é convencional. é sob essa perspectiva que é vista a convenção: a não acidentalidade e o aspecto teleológico der ivam da relação estabelecida. a uma vigorosa reavaliação crítica de conceitos estabelecidos por uma lingüística que já podemos chamar de Lingüística Tradicional (ou imanente. procura constituí-Ia como teoria não-subjetiva. em que a sociolingüística já estabeleceu sistematizações bastante claras. a teoria da enunciação e a AD. trabalhos que tratam da análise da linguagem no contexto. considerando as condições de produção (exterioridade. refletir sobre a questão da discussão metodológica estabelecida pela sociolingüística que. 1 k Devemos acrescentar que a análise do discurso não prescinde de uma teoria da enunciação. atualmente. Pelo que podemos concluir. Além disso. um domínio de interesses com uns. A análise do discurso procura estabelecer essa relação de forma mais iman ente. a sociolingüística. de sua perspectiva.etnografia da comunicação. a partir da reflexão desses domíni os do estudo da linguagem. isto é. tr abalhando com a exterioridade que envolve a linguagem. Podemos. 0 critério da regularidade é mais complexo porque pressupõe a relação entre o lingüís ico e o discursivo. procura destacar constantes justamente no lugar em que o lingüístico e o social se a rticulam (no discurso). reavaliar alguns conceitos.ou seja. recupera-se o processo histórico-social. o fazem de maneiras distintas. no quadro teórico de Pecheux. Assim como na sociolingüística se percebeu que a variação é sistemática e funcional. 1972. Albero Editor.. na reflexão lingüística acerca das funçõe da linguagem. . xerox. Nacional. Rossi-Landi. 1969. Gallimard. Paris."0 Lingúístico e o Social" em Foco e Pressuposição. M. 1964. Schaff. 1976. podemos afirmar que não basta dizer que a função fundamental não é apenas informar. U. pp. acrescentando-se que não é apenas a comunicação. P. São Paulo. pensando-se essas modificações. BIBLIOGRAFIA Benveniste. Mas cantava". E (mas) expli cam. São Pauto. citado por Labov em Sociolinguistique.Initiation aux Méthodes de VAnalyse du Discours. 284-293. Langue et Idéologie". ou apenas a persuasão mas é também o reconhecimento pelo afrontamento ideológico. et alii .Sociolinguístique.Discourse and its Presupositions. H ymes. 1974. ver isto na perspectiva de uma ciência. n? 37. 1976. . Schlieben-Langue. A. Paris. Minuit. pp. Minuit. W. E o mistério da linguagem talvez esteja em ser fundamentalmente tudo isso e não ser prioritariamente nenhuma coisa. Paris. E. pelo menos.Producciôn Lingüística e Ideologia Social. Madrid. .Essais sur le Langage. INT RODUÇÃO 1977. . . Funcion amento e discurso Ponzio. Cassirer. 75-80. E puxo a sardinha pro meu lado. Rio de Janeiro. . et alii . Gredos. Weber. Philadelphía. Problèmes etPersp ectives. . Tentemos. -Economia y Sociedad. M. 1976. Paris. ao citar como entra da para esse trabalho um poema de Adélia Prado (1977): "Minha mãe cozinhava exatamente: Arroz. P. tudo isso. ----DaSubjetividade na Linguagem". Série Estudos 4. 1966.Foundations in Sociolinguistics. Paris. Labov. México. . Minuit. II. molho de batatinhas. E. E que muitos homens entendem.Analyse Automatique du Discours. A. México. 99-109. D. Não vou disfarçar meu ponto de vista. D. não. Langages. Benveniste. Que qualquer mulher pressente nesse mas. . Pècheux. É. 1974. P.1 969)."Analyse du Discours. Que análise lingüística imanente pode dar conta do sentido desse mas? Do senti do. Dunod. então. S.Problémes de Lingüistique Générale.Le Fetichisme de Ia Langue. Fondo de Cultura Económica. Hachette. Entre cozinhar e cantar se passa toda uma vida. porém é necessário referi-lo ao conjunto de discursos possíveis a partir de um estado definido de condições de produção" (Pecheux. London .Finalmente. Pècheux. . Nacional. 1975. da linguagem que não se defina como uma lingüística imanente- . . E.. B. em Problemas de Lingüística Geral. Fondo de Cultura Econômica. Paris."A Linguagem como Trabalho e como Mercado'% em Semiologia e Lingüística Hoje. 1975.Introducciôn à Ia Semántica. Benveniste. 1974.Introducciôn a Ia Sociolingüística. 1978. F. 104 E.Problemas de Lingüística Geral. Também não dá para analisar esse mas considerando o texto como "uma seqüência lingüís ica fechada sobre ela mesma. 1969. provar que a ciência é neutra. Orlandi. p p. Dos sentidos. Paris. . M. nem vou tentar Weinreich. I. Ch. E. ENI PULCINELLI ORLANDI Bourdicu. Maingueneau. feijão roxinho. 1976. . 1976. Yale University Press. Landesman. Madrid. . o sintático. 1981. Explicitaria esse ponto de vista dizendo que. Porque parto da totalidade e não das partes segmentad as. ou melhor. a paráfrase e a polissemia são os dois grandes p rocessos da linguagem: a matriz e a fonte do sentido. a linguagem como lugar de debate. Em resumo. Não é. também fornece dados. aquela em cujo processo de significação também entram os elementos do contexto situacional. com duas afirmações que procurarei fundamentar d urante a exposição: A) uma afirmação ao nível metodológico e B) uma afirmação ao nível da análise. semantico . PRIMEIRA PARTE Inicio. morfológico. mas pragmática. coloquei a necessidade de se discutir. estarão unidas as duas coisas. Em uma mesa-redonda sobre Foco e Pressuposição (Orlandi. isto é. considerarei. não é um nív diferente de análise. é o lugar mais adequado para se obsera o r_ o var o fenomeno da linguagem. diria que. por assim dizer.mas sim que a perspectiva d o discurso também é constitutiva delas. sentenças. procedo analiticamente. a paráfrase como proces so heurístico e como fato lingüístico que deve ser explicado. entretanto. o ponto de vista cria o objeto. Pode-se trabalhar. sob dois aspe ctos: tanto quando a utilizamos como procedimento heuriStico quanto quando a con sideramos como fato lingüístico que deve ser explicado. do ponto de vista analítico. de conflito. Podemos aqui adotar a definição de Guespin (1971): "Um olhar lançado sobre um texto do ponto de vista de sua estrutu-ração em língua faz dele um enunciado. Por isso. Isso porque.isto é. enquanto sinonímia (paráfrase) e ambigüidade (polis semia). Processus esses que aparec em domesticados nos modelos lingüísticos. Isto é. 106 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 107 Para essa reflexão. com unidades de vários níveis . Dessa forma. nesse tipo de análise. pois. períodos. ou seja. UNICAMP. é possível tratar um texto sob outros aspectos que não o discursivo e aí texto e discurso se distinguem (cf. entretanto em níveis c onceptuais diferentes: discurso é conceito teórico e metodo16gico e texto é conceito analítico. lexical. a meu ver.(*) Texto publicado em Estrutura do Discurso. 1978). o semantico. Nesse trabalho. Como em S ussure. antes. na perspectiva da análise do discurso. É. olhase através do texto enquanto unidade significativa. isto é. o problema é antes de tudo metodológico. seria necessário definir sobretudo o jogo entre o mesmo e o diferente. trabalharei com (e sobre) paráfrases.sob o enfoque do discu rso. um acaso. então. Esse vai ser. Isso -não significa que essas unidades não tenham a especificidade ^seu nível . esse uso de paráfrases. i i Pensando-se aqui o texto não como unidade formal. posso dizer que texto e discurso se equivalem. na perspectiva da análise de discurso. IEL. Um estudo lingüístico das condições de produção desse texto fará dele um discurso". pois. umponto de vista diferente. A) Uma afirmação ao nível metodológico: a análise de discurso.palavras. acredito. este trabalho. em termos da estratégia da composição do meu texto. o texto visto. Sob esse último aspecto. quando pensamos níveis como o fonético. etc. meu modus operandi. E. tensão entre o uno e o múltiplo. gramática de texto). se definir o lugar da paráfrase nas teorias da linguagem. sintático. . como r unidade de significação. A noção fundamental, parece-me, é a de funcionamento. Quer dizer, do pont-9 de vista da análise do discurso, o que importa é destacar o modo de funcionamento da linguagem, sem esquecer que esse funcionamento não é integralmente lingüístico, uma v ez que dele fazem parte as condições de produção que representam o mecanismo de situar os protagonistas e o objeto do discurso. Diria, pois, a partir dessa reflexão sobre a análise do discurso como ponto de vista, que esse ponto de vista - diferente do da lingüística estabelecida - instaura um objeto diferente. E é esse objeto de conhecimento, diferente do da l ingüistica, que se está pretendendo descrever e explicar através da análise do discurso. Assim, posso dizer que os operadores (articuladores) de discurso o são a p artir do ponto de vista. Isso significa dizer que, em termos de estruturação discurs iva, as unidades que concorrem para isso não o fazem por sua essencia mas por seu modo de funcionamento. Um operador pode ser operador de frase (lingüístico, portanto) ou de discurso, dependendo da maneira como analiso seu funcionamento. Então, não é uma unidade de nível diferente, nem categoria diferente. Por isso s e podem analisar unidades de qualquer nível ou qualquer tipo de categoria, sob a perspectiva do discurso. 108 ENI PULCINELLI ORLANDI Vamos tomar, como exemplos, resultados de uma análise recente sobre o discurso da história: a) Categoria: advérbio Nível: morfossintático No entanto, fizemos uma análise do advérbio em seu funcionamento discursivo. E isso traz modificações, isto é, essa análise demonstrou que a perspectiva do discurso é capaz de revelar aspectos do advérbio que passam despercebidos em um o utro tipo de análise. Por exemplo, pela análise que fizemos, ficou claro que o adjunto adverbial pode indicar o agente - "com a morte de Costa e Silva subiu ao poder..." - o que determinava, nos textos que analisamos, um certo estilo de dizer da história. b) Categoria: conjunções subordinadas Nível: sintático (orações adjetivas/orações adverbiais) Nesse mesmo trabalho, em que analisamos o advérbio, observamos que, de um lado, o uso de adjetivas e, de outro, o uso de adverbiais concorre para o estabe lecimento de estilos discursivos diferentes. N /1- 9 / \\14 adverbiais e. (*-~) o (+--*) o adjetivas Em uma estrutura (adverbiais) a expansão se faz com elementos centrais e m arginais. Na outra (adjetivas), há o que chamaria de expansão linear, o que determin a um mapeamento diferente do escopo, da progressão do discurso. Isto também concorre p ara que se constituam estilos diferentes. Logo, não importa o nível ou a categoria das unidades, nessa perspectiva. Importa o funcionamento delas no discurso. E inegável, por outro lado, que, em relação à significação, o laço que liga o discurs vo e o lingüístico é bastante complexo. 0 lingüístico e o discursivo são distintos, mas não são estanques na sua diferença. A separação entre o lingüístico e o discursivo é colocada em causa em toda prática discursiva, pois há uma relação entre eles: é a relação que existe entre condiçõ teriais de base e processo. Isto é, funcionamento. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 109 A língua, assim, aparece como condição de possibilidade do discurso. Em geral, em termos metodológicos, podemos dizer que a relação da Lingüística com a análise do discurso é a da "aplicação" (Marandin, 1979), SEGUNDA PARTE Vejamos, agora, as seguintes paráfrases: 1) Com a ida para São Paulo, no fim de semana, você atrapalhará seus estudos. 2) Se você for para São Paulo no fim de semana, voce atrapalhará seus estudos. 3) É porque voce vai para São Paulo no fim de semana que voce atrapalhará seus estudos. São paráfrases. Mas como determinar os limites entre o sentido de uma e de o utra? Do nosso ponto de vista não há o mesmo no diferente, isto é, formas diferentes significam diferentemente. E perguntamos: qual é a diferença? Do ponto de vista da Análise de Discurso, a mera repetição já significa diferent emente, pois introduz uma modificação no processo discursivo. Quando digo a mesma coisa duas vezes, há um efeito de sentido que não me permite identificar a s egunda à primeira vez, pois são dois acontecimentos diferentes. Nas paráfrases acima, não se trata nem mesmo de mera repetição e é inegável que exis tem diferenças propriamente lingüísticas, sintáticas: nominalização (1), oração condicional (2) e explicativa (3). Como, no processo de enunciação, todo elemento sintático tem um contorno significativo, é preciso procurar a diferença do sentido instaurada pela diversidade dessas construções. Assim, enquanto visamos ao funcionamento dessas formas, podemos consider ar a segunda afirmação desse trabalho: 13) Uma afirmação ao nível da analise propriamente dita: a diferença de construções tem sempre uma razão que não é a simples diferença de informação mas sim de efeitos de sentido. Por exemplo, no caso da indústria cultural, o texto está prenhe de outros sentidos que não a informação, efeitos esses tais como 110 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 111 • persuasão, o nivelamento de opinião, a ideologia de sucesso, • homogeneização, etc. No discurso pedagógico, como tivemos a ocasião de mostrar, temos a inculcação. E assim por diante. 0 fato de não se considerar apenas a informação no discurso, embora não neguemos que também faça parte importante, evita uma certa simplificação que é reducionista frente a natureza e ao funcionamento da linguagem. Aí incluímos, por exemplo, o fato de que, se não considerarmos apenas a inform ação, não incorremos em afirmações mais ou menos dogmáticas como aquelas que muitas vezes eliminaram falantes de sua língua materna: afirmações do tipo "Essa frase não existe em portugues" dita de uma frase realizada por algum falante nativo. Essa afirmação deriva do fato de que se considera, nessas teorias, que a linguagem não é diretamente observável. Mais ainda, se funda na crença de que aquilo que é observável não e. 1 Fazendo-se um paralelo, uma posição, que leve em conta apenas a informação, pode chegar, em relação ao discurso, a afirmações semelhantes às acima citadas em relação às frases, como: "este texto não é um texto", isto dito, por exemplo, de um tex to de redação escolar que não se enquadre em um certo modelo, como por exemplo o de Halliday (com os elementos de coesão, sem pensar o outro lado do mode lo, que ele apontou e não desenvolveu, que é o da consistência de registro), uma vez que a definição de texto, nesse modelo, repousa na existencia de certos elemento s que o constituem. Não negamos a necessidade de se construir uma matriz do 1 que seja um texto, mas essa matriz deve poder acolher as diferenças sem apelar par a a noção de erro. E a noção de erro, acredito, tem muito a ver com o caráter informativo da linguagem, quando ele é absolutizado. Essa noção de erro deriva das concepções da lingu agem que caracterizam, tal como a transformacional, uma competencia lingüística completamente apartada das condições de uso. Nossa perspectiva é a que privilegia o uso, de tal forma que, para nós, um t exto e um texto porque assim se define no uso da linguagem. Como dissemos mais acima, a visão através da competencia - isto é, aquela em que a teoria produz os dados tende, de um lado, a desrespeitar a existência do fenômeno como tal, e, de outro, a absolutizar a função da informação, imobilizando a linguagem fora de sua multip licidade. is Nessa mesma perspectiva crítica, entraria, a nível d~ d97 curso, qualquer po sição normativa que deixasse de lado a Obser vação de que um discurso não é apenas transmissão de inforj mação, mas efeito de sentidos. 1) Os efeitos de sentido são produzidos por mecanismos tais como o dos reg istros, o dos tipos de discurso e são produzidos também pelo fato de que o lugar dos interlocutores significa. Essa é uma especificidade: nas marcas de interlocução há v estígios da relação entre a formação discursiva e a formação ideológica (cf. p. 23). ' --Vamos observar os mecanismos de efeito de sentidos, tais como enunciamos aci ma, utilizando para isso jogos de paráfrases. Vejamos alguns grupos: 1? grupo 4) Determinava essa lei que seria mantida provisoriamente a Constituição de 1946 com algumas modificações no seu texto. 5) Essa lei modificava o texto da Constituição de 1946 e a tornava provisória. Há uma diferença de sentido entre (4) e (5) que deriva da diferença de formações d iscursivas (FD). Ou melhor, invertendo-se a perspectiva, o funcionamento discursivo é tal que essas diferenças de construção estabelecem as que existem entre uma FDJ, cuja característica é a indeterminação, e uma PD2, em que há determinação, como tivemos ocasião de mostrar em "0 discurso da história para a escola". Há ainda o fato de que essas formações tem estilos diferentes. 2? grupo Vejamos as paráfrases: 6) Trabalha bem mas é preto. 6. 1) Trabalha bem e é preto. 6.2) Trabalha bem apesar de ser preto. 7) Saiu mas volta já. 7.1) Saiu-evoltaiá. 8) Cozinha of~aà canta. 8. 1) Cozinha apesar de cantar. 8.2) Cozinhane canta. A natureza das 'diferenças em relação a esses exemplos é vária. Mas podemos perceb er que, em alguns desses usos, "e" 112 113 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO equivale a "mas", a "apesar de". De meu ponto de vista, é uma diferença que deriva d o registro. Vejamos como interpretar isso. Em seu trabalho sobre o "se" hipotético, João Wanderley Geraldi (1981), a meu ver, coloca em relação tres conceitos o de raciocínio, o de esquema sintático e o de relação -, ope rando com eles a nível da distinção dos usos do "se". A partir daí, pode dizer que um '_se" pode expressar rel"-causÂl, mas também concessiva, etc. Assim como, em relação às conjunções, poderia dizer que "e" significa '~~_~Ue ', a partir da equi valência das- rela f feç~es. Segundo esse mesmo caminho de re eíão, posso dizer que, como o---e"pode ocupar o lugar de "mas" e de outras conjunções, e como podemos observar que a freqüencia de seu uso se distribui de maneira específica pelos diferentes grupos s ociais, a diferença instaurada é uma diferença de registro. 0 que, de nosso ponto de vista, nos leva a dizer que "e", então, não significa "Uc$a de" pois tem um efeit o de sepitido 4r~ ( que o impregna e que deriva da diferença de registro (ele diz isso porque seu registro é baixo, ele diz isso mas quer dizer aquilo, etc.). Não desconhecemos, entretanto, que a noção de registro tem sido caracterizada de maneira estática sem levar em conta a dinâmica dq-iínterlqcução. Não é do registro assim caracterizado que estamos falando, mas de uma outra concepção, relaci onada com a de estilo, tal como é formulada por Pierre Encrevé interpretando os trabalhos de Labpv, na introdÜ~ç-ã-o-ãõ livro Socioiingü~ ^ Labov, 1976): "Curiosamente, Labov não formula uma das lições principais desta pré-enquete, que concerne ao style schiffing do grupo observado ( ... ) Sua-Im'gua_varig segundo-a-es-tatu to social do interlocutor. (clientela). _ç_iqo sentido ~ La st ~yaried,uIe-da língua associada a este e_atuto. Dito & outra forma, a var: .ação estilística - pois é tipicamente uma - também é socialmente determinada, ela é a resposta do locutor (ou '"'ã-n-te,,si-dõ igrupo de-locutores) à coerção simbólica exerc ida pelo interlocutor na relação (presumidãY --que --este último tem com a `norma legítima". 0 que confirma nossa interpretação da varia ~àL _estifisticã na enquete por entrevista como tradução de uma relação social e não de uma relação psicológica". Observe-se, nesse texto, o deslocamento do "social" em relação a Labov. ---Socialaí ap, -segundo nossa interpretação (e nossa pro posta), não como um dado produto, mas como processo de produção, ou seja, interação, instância de interlocução. A diferença de "registro" é, então, constitutiva do sentido. E, assim, também di ríamos em relação aos usos equivalentes de conjunções, que, do nosso ponto de vista, apresentariam sempre alguma diferença de sentido derivada de suas condições de uso, fosse ela do domínio do registro ou outra qualquer. Vejamos agora outro grupo de paráfrases: 3? grupo Nessas paráfrases tratarei de exemplos com conjunções observadas por Eduarda-Q uí"rãesem ' 'Arguni entação e Pressuposto- (Encontro Nacional de Lingüística,Rio de Janeiro, 1980) e 'Ãlgumas Considerações sobre a Conjunção Igmbora" (Série Estudos 7, Uberaba, 1981). Tal trabalho se faz dentro de uma perspectiva argumentativa (Vogt, 1980) com o exemplo: "Embora não quisesse fez o trabalho". Ele nos servirá de refereân-cia para um estudo feito da perspectiva da análise do discurso, no tratamento de algumas questões de argumentação. Como nos interessava a relação com a ideol ogia, procuramos exemplos com marcas ideológicas muito-c~. - -- menos categórica talvez. como pudemos observar nas relações trabalho-cor e trabalho-sexo há necessi dade de se considerar que ENI PULCINELLI ORLANDI as marcas podem ser mais ou menos categóricas.2) A diferença entre (9) e (10). j Essas paráfrases. de outro.que devem ser considerados nas figuras. A formação ideológica é a mesma: a que distingue preto e branco. uma distinção: do exemplo (9) ao (14) a marca ideológica que opõe trabalho/preto é mais categórica e._e deriva das condições de produção. poderia dizer que. é a que opõe trabalhar/c antar em relação à mulher.além dos sintáticos e entoacionais . Entretanto. Essa diferença se deve às características das formações r Ld5~10gicas. Em seu trabalho "A litQtes_ uma abordagem conversacional". reto e`ffiVo -aa trabal . E é nesse passo que podemos ver a relação entreV-uncionamento discursivo e argulnu~. e (11) e (12). do ponto de vista da ide ologia. Ainda a que dissesse "trabalha bem . 11) B t t j 13)'.~4 B 14) rabalh~ Xheem erw~oor4. é uma difere nça de funcionamento discursivo que distingue Formações Discursivas (M). de um lado. ni~' preto. trabalham com exemplos em que há. Ub 1 r~akbalh~ bim nni 0_ in pr É 1 1 ral 10) T b Ih >Rm n~a iç preto. Eduardo Guima raes (1980) diz que há certos traços ideológicos . em termos racistas. A em. São diferenças de argumentação mas de natureza diferente. mas o léxico em geral. Nós diríamos que não só as figuras.9) En bora trabalhe bç e reto.ão. 1 ~. como a observada no 1? grupo de paráfrases. nos outros exemplos. 15) Cozi~ . %a~i 16)-Çmbo cozinhe ~pn-t o 17) È`ffibora (5?1 c o ~zlEn h a. as dif erenças não são de registro. pode estar marcado por traços ideologicamente interpretáveis.tr -1 m ( et? . . ou melhor. . D 1 11) _m or s reto I-rabalha bem. Então. nelas. em geral. s~apreto. de naturezas diferentes porque são de diferentes regiões da ideologia. . 0) Tr.e~he Om To ia 11-1 C12) r_e o mtrabalha bem. mas também existente. em relação a estas paráfrases. uma -. Se.er a . segundo o que pude analisar nos text£)£ da história. Nesse sentido considero relev ante para qualquer análise de discurso a observação disso que chamo seu funcionamento. o que se pode verificar em relação à argumentação é que a orientação da argume sto é. "trabalha bem" por lgpensa" e "preto" por "mulher". Elaborei esse conceito a partir dos prin cípios teóricos propostos por Pecheux e através dele pude empreender uma análise de marcas formais que me remetessem à formação ideológica. Todos esses mecanismos caracterizam o estilo e dão a forma interna da form ação discursiva. Nas c onstruções estão as marcas com que me represento e ao meu interlocutor. há outros mecanismos que defl-. Daí a fecun didade do verso de Adélia que permite uma multiplicidade de sentidos. Para se verificar rssô~hasta substituir. 0 recorte em relação a sexo-trabalho não se faz exatamente como para trabalho-cor._para fora caracterizam as formações discursivas. ó--recoríe-e_q_uÁvalente para a mulher é a ze açã~ xo e capacidade _dç_ pensar (nos moldes cartesianos). Sem se esquecer que no texto de Adélia há um advérbio Lexatamen .que chamo de dimensão pragmática da argumentação. das marcas para a ideologia. isto é. tem a sua especificidade. Além da argumentação. Então. Essa inversão de perspectivas.segundo a definição estabelecida na análise sobre o discurso da história acima referido é a atividade estruturante de um discurso . que a argumentação também concorre para a existencia de marcas formais que definem o estilo do texto. "alavtã iíècess-idãde" no discurso do patrão e no do empre gado. no texto. Eles se recobrem exatamente. nos exemplos citados. Isso porque a progressão do texto em (9) e* em (10) é ~Mérente. então. Por outro lado. quando penso certas paráfrases.. E aí entram em consideração dois conceitos: o qç~_te. o da r 1_. em minhas análises. 0 funcionamento discursivo . nem o estilo. como aquele s que determinam o uso de subjun.porque é preto". Na relação entre o dito e o não dito. aqui a Formação Discursiva P^:D e vist a sob o seu aspecto interno. eu veria aí o mecanismo de diferenciação interna das formações discursivas. PIJ progressão do texto Veuma direção: há marcas formais que apontam uma direção.te-'~ que carrega o texto de efeitos de sentido. Eu poderia dizer que essa é uma visão de fora para dentro '(-da ideologia para a linguagem). Uma formação ideológica diferente não neces sitaria da referência a e uando fala de trabalho e sua quali dade.ou outra for mação discursiva~--muç~a --~o amúdQ_de-uma_palavra. ou seja. a argumentação é A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO vista em relação a di * ~o ~as formações discursivas. como tive ocasião de observar no texto sobre mulheres ou o uso de advérbios no lugar de agentes. no outro caso. em Q_) e_(10) o preto não consegue o emprego e em ( 11) e (12) ele consegue -junto às marcas ideológicas lexicais é que podem caracterizar formações discursivas distintas entre si. os resultados para que aponta . e co ncorrem para a determinação do estilo. 0 que significa. Isto é.de dentrç . tivos.!ç~o como unidade de significação e o fato que se deve contar com as Êo qndições de produção. 3) As diferentes paráfrases estabelecem diferentes relações de interlocução. a partir do momento em que passei a operar com o conceito de funcionamento discursivo. a diferença entre (912Á10) é uma diferença de funcionamento disc ursivo que resulta em uma diferença de esá1~. eu diria . só me foi possível. Invertendo agora a perspectiva. Por exemplo. a orientação da argumentação e as marcas ideológicas lexicais indicam formações discursivas distintas. A argumentação deixada a si mesma não o faria.que há marcas formais que . Pecheux diz que o fato de pertenc . New York Academic Press. e d. As regularidades são cristaliz ações desse procedimento de antecipação. 116 ENI PULCINELLI ORLANDI Em um discurso. Há "decis ões antecipadoras" do locutor. mas também a relação que eles mantem com a formação 1 1 ideológica. 1978).. "Explanation in Syntax". GEL. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 117 . L Slobin ("The Repeated Pattern between Transparency and Opa city in Language") e T. a partir de seu proprio lugar: 1 é a maneira como o . com f inalidades específicas. uma 0n1 conversa. uma exposição. ao meu ver. 4) Carlos Vogt e lara Frateschi. em Kimball. Eu diria. em um trabalho chamado "~unções -do narratári o nas narrativas orais de experiência pes_~1' (Estudos Lingüísticos. Como resposta. o produtor concebendo o interlocutor antecipadamente. -1 --locutor representa as representações de seu interlocutor e viceersa. são diferentes desse ponto de vista. E isto está marcado no e pelo funcionamento discur Sivo. Syntax and Semantics. 2. daí a posição do locutor. para um interlocutor determinado. 2. nas línguas naturais. Vennemann (1973). o Outr o é o pólo: nada pode ser omitido-. Segundo Cláudia Lemos.As--va I~ . para o locutor. etc. transformar. isso pode ser visto em' autores como D. então. vol. segundo os tipos de discurso. que.determinado. no que Pecheux chama a-nteçí a ~n_ ção. por um falante determinado. não só se representam os interlo cutores.-". Pela __ antecipação.e [ouv] locu Vers gi"Oes da interlocução são definidas pelo funciona I~ er mento da instituição que molda o discurso: um sermão. "No primeiro caso o narrador assimila a imagem do interlocutor à sua própria . ser a de influenciar. mostram que o inte~focutor pode estar representado como "espelho" ou como 11 abismo". ainda. Todo esse mecanismo assenta.S-V-0 .or-experimenta o lugar de Seu ouvinte. sancionadas pelos valores que precedem as eventuais respostas do interlocutor. No segundo caso.é determinada.. (1) Uma visão funcionalista recente da sintaxe (estrita) explica que a ord enação . verbais ou não verbais. pela percepção optimal. que é um processo sobre o qual se funda a estratégia do discurso e que é de natureza argumentativa. inculcar. o seu interlocutor ou c oncorda ou não concorda com ele (ou é seu cúmplice ou seij adversário). importa notar que o mecanismo de respostas é afetado pelas antec ipações. o locut . 1 e Além disso. o ouvinte pode a poiar ou bloquear o discurso por intervenções diretas ou indiretas. nessa direção. segundo o tipo de discurso. e em (9). caracterizam esse procedimento argumentativo de antecipação a posição do locutor. e refletem uma relação específica de interlocução. é diferença de estilo: textos produzidos na direção apontada por (9) ou (10) são textos diferentes qu anto ao estilo.e -que vai determinar os usos argí. a do interlocutor assim como o tipo de relação de interlocução estabelecida. a antecipação diz respeito a um mecanismo mais complexo que o de discor dar e concordar. A antecipação pode dizer respeito à variável locutor. a nosso ver.com meu interlocutor. então. há uma relação entre (13) e (10) que também decorre desse mecani smo de topicalização: em (13) o argumento negado é o tópico e em (10) o argumento mantido é o tópico. é do funcionamento discursivo e vai concorrer . estou dizendo.-mentativõs-ão locutor.' Outras vezes não aparece explicitamen te. do ponto de vista de minha análise.além dos outros processos .sintáticos e s emanticos . gostaríamos de acrescentar que a antecipação lida com a distância. entre ele e seu interl ocutor: 66assim se encontram formalmente diferenciados os discursos em que se trata para o orador de transformar o ouvinte (tentativa de persuasão. e isto vai constituir o seu próprio (do locutor) dizer.para a caracterização dos diferentes est ilos. que o locutor pretende saber a relação existen te entre o que o interlocutor vai dizer e o seu lugar.que caracterizam a antecipação no discurso. isto é. (2) 1 = imagem. Portanto. do locutor. se inscreveriam entre as diferenças estilísticas. A mesma relação existindo entre (14) e (11). mas porque quero estabelecer esta ou aquela relação lúdica. polernica. mas resulta no que denominei estilo. a nível das formações imaginárias. (13) e (10) se equivalem argumentativamente. ou interlocutor ou objeto (referente) do discurso. que certos efeitos de sentido e que são de natureza estilística derivam do jogo entre tópico e argumentação. a = locutor. explicitamente: "você vai pensar que sou indiscretaIa(Ib(a)). Então. Não escolho formas lingüísticas no vazio. presumida pelo locutor. Ia (Ib (a)) = imagem que o locutor faz da imagem que o ouvinte faz 118 ENI PULCINELLI ORLANDI A diferença produzida pela argumentação em relação à estratégia de discurso que funda enta a antecipação é que.A antecipação do que o outro vai pensar é constitutiva do discurso. A diferença entre (9) e (10) é dessa natureza. Eu diria. Daí termos: a})) jb L~ Ia _ ( a b r A dominância de um tipo de variavel em termos de imagem . Essas diferenças.Ib(a) ou Ib(b) o u lb(r) . Essa modificação acarreta. polem ico ou lúdico. b = ouvinte. Por outro lado. A mesma relação existe entre (14) e (12). respectivamente. Os exemplos (13) e (14) estão relacionados. por exemp lo) e aqueles em que o orador e seu ouvinte se identificam (fenômeno de cumplicida de cultural. do meu ponto de vista. Fora essa diferença. . Às vezes. Isso tudo é ainda sobredeterminado pelo tipo de discurso: autoritário. não é. Ainda retomando Pecheux. Em (13) o argumento mantido é o tópico. uma diferença na argumentação que se deve ao mecanismo da topicali zação. em termos discursivos. autoritária . com os exempl os (9) e (11) através de uma modificação na ordem. Quando digo que o locutor supõe o que o outro vai pensar. "piscar de olhos" manifestando acordo). E há traços retóricos . em ação. Nesse ponto. 0 locutor está impregnado do ouvinte e vice-versa. por isso . antes. em A pode-se tomar como ponto de vista a argumentação e acrescentar-se que o argumento que é mantido é tópico ou não é tópico. o mecanismo. visto do ponto de vista que aqui proponho. Isto porque cada uma d elas é parcial em relação ao centro comum que seria a substância que está cindida nas duas ordens de razão. justifica o seu contrário. a razão de Antígone.Esse jogo se faz sob a forma da co-ocorrência. me distanciaria das metáforas de espelho e abismo e proporia o paralelo com as chamadas tragedias do destino duplo . no texto. isto é. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO i 119 São.por exemplo a Antígone . pode-se tomar como ponto de vista o tópico e acrescentar que este ou é mantido ou é negado. Continuando o paralelo. estamo s sempre no movimento que vai de Antígone para Creonte e de Creonte para Antígone. justifica o seu contrário. isso ser entendido como o processo que permite a tirania do ouvinte. ao contrário. nesse passo. como dissemos. ao fa lar na antecipação. a relação que existe entre os vários di scursos) e a antecipação (que examinamos mais detidamente neste trabalho). se pensarmos ambos como representando formas de interação entre interlocutores. Creonte. constituindo formações imaginári s. 0 mecanismo da argumentação. de forma geral. a de Antígone e a de Creonte. De um dos pólo s vejo o outro. Nem sequer podemos dizer que haja um debate: cada um é absoluto em sua esf era.em que se apresentam duas consumações . Esses fatores derivam das condições de produção do discurso. convergem para produzir certos efei tos de sentido. podemos dizer que nessa tragédia. Indo mais longe.co -C Então.9e14-11W (N) 13-10e14-12(Ê à é mantido Tópico '~ é negado não e tot). acredito. Antígone. de interlocução. podemos dizer que topicalizar é argumentar. e nas de destino duplo em geral. 0 que é mantido -c::: é tópico 13. eles não discutem suas razões. 5) Gostaria de fazer uma observação. Não vejo assim es sa coisa. então. E a razão de Creonte. a dominancia do interlocutor como é visto pela retórica. em momentos diferentes do mesmo processo. Trata-se do fato de. relação de sentido (o "coro de vozes" em um dizer. resu lta numa diferença do funcionamento discursivo. Nesse processo de bipolarização -contraditória. tres coisas que presidem a argumentação em termos de disc urso: relação de forças (lugares "sociais" e posição relativa no discurso). o que vejo é realmente um processo de interação. Em termos de discurso. em ação. ou melho r. o jogo da interação. e essa diferença revela.no caso. Em B. Eles persistem em si mesmos. 0 mecanismo da antecipação coloca o ouvinte como constitutivo mas não desvalor iza com isso papel (e a posição) do locutor. não negam as razões do outro. a estruturação de processos semânticos de topicalização e de argumentação são da mesma ordem e não se excluem. Há um s entido de totalidade que amarra os dois personagens de tal maneira que só a consumação dos dois destinos instaura a necessidade trágica: a condenação de Antígone e a queda de Creonte estão indissoluvelmente ligadas. é o que se dá (faz) no processo de reversibi lidade se dá sob condições. nem para o do ouvinte. rio D o meu ponto de vista é a relação de interlocução enIsso. é o texto visto como processo de significação e não as formas da interação interlocução. visto pela zações de func ionamentos discursivos distintos: o discurso lú perspectiva de discurso.' A escolha de um 11 mas" ou de um orientação da argume ntação. entretanto. o debate que determina toda De tod a forma. a troca de uma unidade que se revela na situação recíproca dos dois e na papéis entre locuto r e ouvinte: o discurso autoritário procura sua relação com um "ponto comum". efeito de sen tido caracterizando a atitude do locutor face a seu Resta ainda a observar que o que vai contar não e a imagem do discurso e at ravés desse face ao destinatário" (J.' Pois bem. não é um dado anterior. Nem por isso deixa de haver progressão. polêmica ou lúdica. M. é o que se quanto interação q ue deve ser considerada e é ela a base da trata de definir na própria relação de interlocução. todo esse funcionamento discursivo está atravesentre o in dividual e o universal. cristalizado.psicologizante . uma "ordem". outro . através dele. uma discussão ou é ideológica. isto é. Interação. mas perceber sua inter-relação. a tipologia estabelece uma relação de interiocução. 6) Retomando a análise das diferenças através da paráfrase Foi a partir dessa concepção de tipo que procurei construir e da caracterização dos múltiplos tipos de diferença. logo.mas a do lugar do outro no discurso.120 121 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1 se limitam. como o visto na tragédia. não se trata de pender nem para o lado do cursivo. E isso é dessa atividade tipificante que se constitui a partir das condições uma manif estação do que chamo de sobredeterminação da tipo . enq uanto cristalização de funcionamento dis Em suma. mas. no entanto. com o mundo. falta-nos a tipologia que c onsidero mais fecunda para a reflexão acerca do explicitar o lugar da tipologia nisso tudo. o Iúdico vive dela e no polêmico a algo estabelecido. Em resumo. isto é. o que pensamos é que qualquer que seja a forma de interação verbal. o que se refere à "atitude do locutor face ao destinatádetermina o tipo de relação: autoritária. uma substância. essas fronto. Creio que há em relação aos personadico. Marandin. Sobredeterminado por ela. E é o todo relação com o obje to de discurso e. 1979). então. de con sado pela tipologia. que tipo. ela tem de se estabelecer segundo 11 embora" de uma "explicativa" ou de um 11 adjunto" depende os tipos de discurso tal qual os descrevemos mais acima. Quando se tipologia que propus . lugar social. E aí está o conflito. é "uma co nfiguração de traços formais associados a um locutor. são essas interação. naquela definição de marcas estarão determinadas pela atividade estruturante. Um critério importante para o gens do discurso também essa bipolaridade contraditória: há reconhecimento dess es tipos é a reversibilidade. mas não se que proponho tem base n a relação da formação discursiva com a define a priori se isso é uma brincadeira. seria. lugar de debate. Mais do que na enunciação. o autoritário e 0 polêmico. Então. pois. os tipos de discur so que consideramos são cristali Voltemos agora para o processo de interlocução. discurso como o concebo. se propõe. Desloquei. antes. Tipo. Esse centro comum não é estancar a reversibilid ade. pois. que nos dá essa progressão para um fim obscuro. espaço particular Para nós. Por outro lado. Isso só é possível. podemos afirmar que ess as considerações nos i 1 (4) 0 tipo é. Cavalcante de Souza. condições de produção. "negociado". essas mesmas con siderações nos permitem entender melhor a relação do trabalho analítico com a operacionali zação de conceitos tais como formação discursiva.de produção. do meu ponto de vista. de funcionamento discursivo é. A formação discursiva é caracterizada pelas marcas estilísticas e tipológicas que se constituem na relação da linguagem com as condições de produção. da interação entre locutor e ouvinte e sua A lém disso. procuraremos esclarecer melhor o que preela concor re para a distinção de estilos e de formações discur tendemos com a sobredeterminação atribuída ao processo tiposivas. em outros trabalhos. etc. em relação a todos esses mecanismos. ou seja. Retomando o que já desenvolvemos. mantendo-se o conceito de Formação Discursiva como mediador. J. dizer que acerca de tipologia. formação ideológica. há. De outro lado. registro. mais A tipologia que propusemos deriva de considerações sobre a amplo do que o de argumentação.) FD Formação Delimitações . a sobredetermi 1 nação. podemos dizer que o que define a formação discursiva é sua relação com a formação ideológica. podemos perceber como se faz a relação das marcas formais com o ideológico. permitem dizer que esse nosso modo de trabalhar caracteriza o 122 ENI PULCINELLI ORLANDI que Pecheux (1975) chama de semântica discursiva. Podemos fazer o percurso nos dois sentidos: o que vai do ideológico para as marcas formais ou destas para aquele. da atividade estru turante que chamamos tipologia do discurso e que se cons titui (3) Essas observações são o resultado de um trabalho que fiz quando em qualquer funcionamento discursivo. 1 Funcionamento discursivo: tipologia e estilo (argumentação. indeterminação ou determinação. 8) Enfim. FUNCIONAMENTO DISCURSIVO Marcas formais Condições de Produção L_0. 7) E m relação à argumentação podemos. enunciação. isto é. por assim dizer. mas não é o único mecanismo que o faz. logia e afetará a argumentação. Assim. entretanto . na área complementar do curso de pós-graduação na USP em 1975. como dissemos acima. aluna do prof. o conceito lógico. enfim. Paris. de outro . C. . ou melhor. creio eu. lúdico e polemi co. 1976. Langue et Idéologie". Paris. M. Vogt. as duas visões de d entro para fora e vice-versa . W. 1981. c orresponde a um procedimento que tem implicações fortes para a análise e a teoria do discurso: esse percurso feito nos dois sentidos. A. 1978. 0 que as distingue entre si. Série Est udos 7. Uberaba. pela visão de fora para dentro e. Larousse. A. GEL. 2. . Nova Fronteira. . Vogt. isto é. Minuit. 1978 (p. Pêcheux. jurídico. Toda tipologia. pode ser vista como aquela em que a relação d e interlocução. Anais III. relevantes para uma formação discursiva.Linguagem Pragmática e Ideologia. et alii . . Essai de Description du Dis cours Français sur Ia Chine". . M. d o meu ponto de vista. J. M. 1969 (p. São Paulo. Ed. posteriormente publicado na Série Estudos 4."Problèmes de I'Analyse du Discours. 32). político. analisando o funcionamen to discursivo. Mas essa é uma outra história que espero contar em uma outra vez. BIBLIOGRAFIA Geraldi. Prado. Uberaba.são ambas pecessárias e complementares. as marcas são definidas pela sua relação com a ideologia. . descrevo as marcas que vão caracterizar as formações discursivas. n? 23. 0 mesmo se dando com a tipologia que distingue discurso teórico. Marandin. 16). uma vez que privilegiamos um certo tipo de relações. a interação falanteouvinte. 1976. Paris. Pêcheux. de dentro para fora. Estudos Lingüísticos. Rio de Janeiro. 1977. Paris."Notas para uma tipologia lingaística dos Períodos Hipotéticos". ."A litotes: uma abordagem conversacional"."Funções do narratário nas narrativas orais de experiência pe ssoal". 9) Por fim. assim como construímos a tipologia que distingue discurso autoritário. FI Ideológica A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 123 De um lado. etc. isto é. ao mesmo tempo. E. Hucitec. W. e Frateschi."Protagonistas do/no Discurso". podemos fazer uma generalização em relação à tipologia. Larousse. Paris. A forma como d efino tipo e sua relação com o funcionamento discursivo permite dizer que. . 1975."Analyse du. Orlandi. 1980. então. científico. descrição pode ser vista como derivand diferentes relações de interlocução também. assim também podemos entender outras tipologias sob esse aspecto. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 125 .Analyse Automatique du Discours. Langages. GEL. E.Discursiva Mediação 0--1 0 percurso pode ser feito nos dois sentidos e isto. Dunod. n? 37. 1980. Guespin. Guimarães. é algo que tem a ver com a caracterização social dessas relações enquanto relações simbólicas. T. Langages. Coleção Poeiesis.Langages. Discours.0 Coração Disparado. é básica para o reconhecimento das configurações de traços formais que a caracterizam. derivam das condições de produção do discurso. . n? 55. 1979. delimito o conjunto de marcas pertinentes.Sociolinguistique. metodologicamente. Labov. dissertação. Então a distinção entre narração. 1971. jornalístico. C. . Gost aria de esclarecer que as críticas que faço ao modo como se segmenta tópicos-comentário . sobre uma mesa-redonda a respeito de tópico e comentário da qual participaram Eunice Pontes. a margem do dize r e que é constituída pela relação com o que foi dito. uma palestra. me proponho a comentar o compromisso ideológico com ce rtas teorias da linguagem no tratamento desses fenomenos lingüísticos. mesmo ao se criticar uma teoria da l inguagem. Pareceu-me mais adequada esta primeira versão para esta publicação. 0 que estou chamando de compromisso ideológico é o fato de. tem-me parecido que o não dito. de mero acaso. Tudo isso para dizer que o móvel inicial desse trabalho foi ter assistido a uma mesa-redonda sobre tópico que me deixou M Essa é a versão original e reduzida de um trabalho que.' Porque faz parte da incompletude e se faz desejo. Em relação a tópico. pois é a que está na b ase de outros dos meus trabalhps como o de "Tipologia e regras conversacionais". Como discordância e como concordancia. Jogo perigoso entre o dizer e o compreender. ou como produtora (e o mundo é dado) ou como produto (e a linguagem é dada). d a minha curiosidade pelo que se tem chamado "criação" na linguagem e também da reflexão sobre o excelente trabalho de Eunice Pontes. Parte. uma exposição. por exemplo. entretanto. essa escolha. isto é. Retomando uma perspectiva de um trabalho sobre tópico. Ainda em volta disso. discussões. em seu Prefácio a Tutaméia. na verdade estar-se reproduzindo seus pressupostos quando se opera com os fatos. pode-se criticar o modo de se considerar a linguagem. é que acaba sendo mais fecunda. então.muita coisa a refletir. cujo título é Aletria e Hermenêu tica" e onde tece considerações a respeito da anedota e à definição---porextração": "0 livro pode valer pelo muito que nele não deveu caber". ainda que sob a luz da pragmática? Para falar disso ficarei em torno de dois pretextos: o da natureza do re corte e o da abrangência da analise. posteriormente. mais desenvolvido. Então. procurarei privilegiar o conceito de polissemia em detrimento do de informação. foi apresentado no Encontro Nacional de Lingüística da PUC-Rio de Janeiro (1981). essa é uma introdução para dizer alguma coisa sobre o que se tem dito sob re tópico. Mas que longe da exigencia formal eu me dou o direito de jogar. optando-se então por uma forma de ver a linguagem no momento (2) Não se trata. quando coloco que ha no discurso informações novas que se apOiam em conhecimentos anteriores partilhados pelos agentes do discurso. eu diria que o prazer de dizer tudo não chega aos pés do desejo de i compreender um pouco. 0 sentido dominante: a literariedade . antes. onde faço considerações s obre a definição de foco. uma conversa. DOIS PROCESSOS: A POLISSEMIA E A PARÁFRASE De acordo com a perspectiva que proponho. Luiz Carlos Cagliari e Eduardo Guimarães. etc. eu perguntaria: não se está segmentando tópico ao modo co o se segmenta Sujeito/Predicado. A nível crítico se recusa a teoria mas se a reabsorve a nível de análise. Nas situações acadêmicas. 'Ma Importância do Tópico em Por tuguês" e.# a como produto da história * INTRODUÇÃO Há escolhas que determinam a forma que tem uma situação de linguagem: uma mesa -redonda. (1) Guimarães Rosa diz.' Mais especialmente. a partir das regras recursivas: a produção de um número infinito de frases. Pragmáticos. segundo n ossa perspectiva. A paráfrase é considerada. ou seja. mesmo nos modelos em que se trata de considerar as funções da linguagem. os que fazem o percurso da linguagem em sua prática: os modelos funcionalistas e os de análise de discurso. Segundo o que eu disse. como a "matriz do sentido". Se o sentido não fosse múltiplo não haveria necessida de do dizer. a meu ver. para o processo. ou melhor. É o que pode ser visto por um estudo da linguagem que se volte para o uso. a meu ver. Preocupou-me. o mesmo e o diferente. Daí vê-Ia em sua dinamica através do jogo que existe entre os processos de polissemia e paráfrase. a polissemia é a "fonte do sentido" uma vez que é a própria condição de existencia da linguagem. polissemia e paráfrase se limitam reciprocamente. não há garantias de que se esteja utilizando o mesmo conceito de "novo". os modelos que lidam com essa modulação são os que levam em conta o social. isto é. ao contrário. A tensão constante com o que poderia ser.mantém o homem num retor no constante a um mesmo espaço dizível: a paráfrase. são igualmente determinantes para o funcionamento da linguagem. Matriz ou fonte de sentido. então. como propriedade fundamental d a linguagem. em sua dimensão técnica. Considera. estão incluídos.o (3) Benveniste. como discurso.nasce antes da fecundidade do trabalho da Eunice. conflito entre o produto. E é esse ponto específico que aqui discuto. e o que tem de se instituir. A polissemia é regulada. veja-se o---novo"que é gerado. A NATUREZA DO CONHECIMENTO E 0 CONCEITO DE INFORMAÇÃO . distinguir criatividade e produtividade. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO exemplo. na perspectiva da análise de discurso. reiteração de processos já crist zados pelas instituições. para a criatividade: presença da relação homem-mundo. Os modelos que levam em conta o social podem atingir essa modulação de lingu agem: sua expansão e sua contensão. na lingüística. é produtividade. isso sim. intromissão da prática na/da linguagem. o importante é que esses dois processos são igualmente atuantes. em seu conjunto. que é a perspectiva que assumo. quando tratamos do problema do "novo e do dado" em lingüística. a distinção dos modelos que fazem o percurso linguagemsociedade em relação aos que fazem o seu percurso transitando entre linguagem-pensamento' vem à tona necessariamente . Mas a paráfrase convive em tensão constante com outro processo: a polissemia . A criação. a constituição da subjetividade. parece considerar a linguagem de um nível em que esses dois percursos não se excluem. essa "criatividade. E. A polissemia desloca o "mesmo" e aponta para a ruptura. quando coloca. p ara a interação. 126 ENI PULCINELLI ORLANDI i i i i 1 de sua existencia como tal. a disc ussão possível a respeito da progressão do discurso e das retomadas e repetições que subjazem às noções de Tópico e Comentário. A isso chamo produtividade. já de início. a linguagem como produto. Por . assim. de distinguir criatividade e produtividade e de se sit uar a relação entre o processo parafrástico e o polissemico. Podemos. Daí a necessidade. na Gramática Transformacional. Além disso. ou seja. o institucionalizado. E. a meu ver. Multiplicidade. quanto à natureza desses conhecimentos (Ponzio. no lingüístico. em termos de análise. se faz considerando-se que a unidade de significação é o texto. margem de rvalo não é um vazio. É o resultado de uma situação enunciados efetivamente realizados. se consid erarmos o falante dentro da ordem social na qual ele vive. é a possi bilidade dos múltiplos sentidos e não a informação. em termos de unidades. Através dessa noção. do informativo. caudatário do distribucionalismo. é ainda essa mesma noção de informação . isto é. 1974). poder-se dis tinguir entre saber (técnico) e conhecimento (domínio teórico) . Essa desigualdade é jogada na interlocução. em natureza. a informação nova. É nesse sentido que. a passagem da segmentação para o recorte. podemos dizer q ue os conhecimentos podem ser "comuns" mas não "iguais". semânticas) e sobre o encadeame to do discurso (em que se coloca o tópico em relação com aquilo que é retomado ou repetido). complicada relação de unidades. da soma d e frases . pois os ag entes do discurso podem ocupar posições diferentes. Então. 0 falante "sabe" a sua língua mas nem sempre tem o conhecimento do seu diz er: o que diz (ou compreende) tem relação com o seu lugar. Isso significa deixar a certeza da distribuição de segmentos por uma bem men os "objetiva" relação de partes. nessa gar em um segmento da discursiva. se pensarmos o discurso. entendida como unidade diferente . aliás. dentro de formações discursivas diferentes Além de. E o que interessa. A partir da consideração do lugar social dos interlocutores. a passagem dafrase para o texto.. com as condições de produção de seu discurso. e mesmo polemicas. É intervalar. que revela a int enção de comunicação do locutor fica assim circunscrita àquilo que. Isto. este inte é o espaço ocupado pelo social. Efeito de sentido. Há desigualdade na distribu ição dos conhecimentos. Lugar. não é exclusividade do foco nem precisa ter um lu linguagem.factual e mensurável . é preciso se considerar o lugar soci al dos interlocutores. aquela que é gramaticalmente explícita. . embora críticos à teoria da sintaxe transf ormacional. com a dinamica de interação que estabelece.Os estudos que não consideram as condições de produção do discurso e os seus agent es não se dão conta de que os conhecimentos não são partilhados pelos agentes do discurso mas sim que esses conhecimentos são socialmente distribuídos. diria que ela está presente na análise sob a forma do segmental. efeito de sentidos) e não como linearidade informativa. * TEXTO E OS RECORTES: * LINGUAGEM COMO IMCOMPLETUDE i i A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO Pois bem. perspectiva.nos instalamos no domínio da significação como multiplic idade (polissemia. onde a noção de diferença ganha certamente outras atribuições. A ultrapassagem desse nível segmental. não há partilha. 128 ENI PULCINELLI ORLANDI 0 novo. é factual e mensurável. Esta margem. Duas passagens se fazem: em termos de operação. É então a noção de texto que estamos colocando como nuclear para a operacionaliz ação dos conceitos. que é o lugar próprio para se observar aquele que fala.corno conceito que acolhe o processo de interação e a relação com o mundo pela e na linguagem .com o todo.podendo-se assim delimitar melhor o conceito de informação nova -.que vejo p resente nas considerações sobre tópico e comentário quando se fala sobre a delimitação do tópico (em relação a suas marcas sintáticas. A idéia de recorte remete à polissemia e não à informação. etc.não pode ser uma sintaxe horizonta l. São recortes feitos de maneira bem menos or ganizada e linear. Y: As mulheres. espaço que. como ela só sabia o nome do livro mas não sabia ao certo quem o teria dado nem se o livro teria sido dado para essa amiga mesmo. mas também de interlocução. ver esse jogo sob a forma de interação soc ial como a colocamos. aí compreendido. o outro retoma e completa. E a sintaxe . Essa maneira de tratar o tópico seria a que sobrepõe esquemas de Tóp ico-Comentário (T-C) a esquemas de Sujeito-Predicado (S-P) mas não os ultrapassa. Não vejo essa coisa como algo linear e cronológico: alguém fala. de uma amiga. Penso que a incompletud e é a condição da linguagem. para mim. Acho interessante a proposta da Gesta lt que ve nisso o jogo do todo e partes. elas ainda vão ter de lutar muito para mudar um pouco essa herança histórica. Voltando ao problema do que é retomado em termos de tópico e comentário. E esse todo tem compromisso c om as tais condições de produção. 0 recorte é naco. No entanto. 0 espaço e o tempo da linguagem são outros. As retomadas e repetições também nada têm a ver com esse esquema. como dissemos mais acima. não sera uma extensão da sintaxe da frase. linear. o limite que separa o meu dizer e o do outro. Um exemplo do problema do recorte foi-me dado por uma orientanda" que me relatou a dificuldade que teve em fazer o recortes que estabelece o "tópico" na seguinte situação: ela queria saber. também um espaço menos imediato.0 texto e o todo que organiza os recortes. o que quero dizer aqui é que com essa idéia de incompletude eu apago. espaço entre enunciados efetivamente realizados. como as relações textuais são representadas. mas é preciso. E. É nisso que os modelos tropeçam com sua segmentalidade. através dos recortes. Os recortes são feito na e pela situação de interlocução. certamente. sendo preciso se determinar. colocava-se o seguinte problema: começar por onde? Pelo livro? (Sabe o livro X?) . Não adiante querer estancá-la em compartimentos que se preenchem a cada turno da interlocução. mas acredito também que não é suficiente falar em todo e partes. não é vazio mas social (interacional). Exemplo: X: Maria apanha do marido. Ela é sintaxe de texto segundo a definição de texto que propusemos mais acima.se se fala nela a essas alturas . eu retomo e com130 ENI PULCINELLI ORLANDI pleto. acerca de um livro que teria sido dado a essa amiga. em relação a turnos. 0 que foi retomado? Que conhecimentos são partilhados? Que informação -nova" e stá aí? Não há algo dado. então. Assim. que é o da ideologia. Não é segmento mensurável em sua linearidade. quero acrescentar que os recortes que faço são determinados por muita coisa mais que a frase que foi dita antes e tem pouco a ver com o esquema sintático SN-SV. não há por que partir de modelos que segmentem ao estilo de modelos f ormais (S-V-0 ou S-P ou SN-SV). quanto retomo. ao qual acrescento. a situação disi 1 i 1 1 1 i 1 129 cursiva. pedaço. Principalmente. Para mim. Aí. etc. produzindo um certo tipo de efeito de sentido. A ESTRUTURAÇÃO DOS PROCESSOS DE SIGNIFICAÇÃO E OUTROS CONCEITOS AFINS Procurando. diria que esse jogo de dominância pode explicar muitos mecanismos gerais da linguagem. não é o caso quando se trata d a articulação entre tópico e argumentação. para se usar um termo muito usado. lançarei mão desse jogo de dominancia para situar o problema da multiplicidade de sentidos. Se tomarmos ta nto o S-P como o T-C em relação às condições de produção da linguagem. mais adiante. oposição entre conceitos tais como Sujeito-Predicado e Tópico-Comentário. organizada pelo CLE UNICAMP.Pelo nome do amigo? (Sabe o Z?) A amiga poderia desconhecer ambos e não serviria c omo apoio para estabelecer o ponto de contato. temos: Mecanismos semânticos gerais: nesse nível é que devemos pensar a tipologia. Em relação à linguagem. também. Além disso. por exemplo. Para mim. e se hierarquiza sintático e pragmático. a meu ver. Com isso não prete ndo dizer que não possa haver dominancia de certos processos sobre outros. fala dos recortes em relação aos elos de cadeias causais. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 131 informação. 0 que há é o jogo de um processo em relação aos outros. como acabo de observar. na delimitação das marcas formais acaba havendo sobreposição do sintático ao pragmático. a história. Mais ainda. co Creio que se está usando indiferentemente certos termos que se deviam dist inguir segundo níveis teóricos. Agradeço a ela a oportunidade do exe~pplo. Para mim. que prepara uma tese no domínio do disc urso pedagógico. e outros que resta determinar. Esse lugar p ode ser qualquer um e isso é "negociado". o que. E. poderia dizer que não há. (5) Maria Fausta Castro Campos. do meu ponto de vista. em uma mesa-redonda sobre Representação e Li nguagem. E aí está. No entanto. mas que são da mesma ord em e não são exclusivos. gostaria de dizer que não concordo que haja circunstancialmente a dominancia do processo T-C sobre o de Argumentação e vice-versa. Eu mesma. este sim. um lugar na incompletude. é redutor. eles se definem como estruturação de processos de significação distintos. dadas certas circunstâncias. deve-se articul ar em termos de dominancia com outro mecanismo. 0 problema se dá quando se privilegia o conceito de (4) Maria Augusta de Matos Bastos. Operação e Representação onde. falando sobre princíp . Não alternam. embora teoricamente distintos. é confronto. estabelecer uma relação entre essas unidades distintas. o jogo entre processos semanticos distintos não tem de ter neces sariamente a forma de dominancia. apresentou um trabalh o chamado Linguagem. podendo co-ocorrer ou não. de composição e não de dominância. a relação do discursivo e do lingüístico. dessa perspectiva. ios estruturante s da construção de justificativas. em relação à articulação de tópico e comentário. é jogo de intersubjetividade e pode até mesmo chegar a ser disputa (conflito). mais do que negociação. quando se fala em interação. de forma ainda superficial. creio. . T-C e Argumentação devem compor um outro nível de mecanismo mais geral que. em dezembro de 1980. são "processos" de mesma natureza e que se misturam. No nível específico do T-C e Argumen tação creio que o que há é uma relação de combinação. parece-me. uma das funções importantes do tópico: estabelecer um começo. é reconhecimento . e sem pensar o mecanismo semântico geral da li nguagem. institucional .Processos semânticos: no presente trabalho considerei um desses processos que seria a relação polissemia e paráfrase. a que demonstra maior fragilidade nos estudos da significação. É nesse nível que vejo localizada a relação do sintático e do pragmático.). (6) Tratei mais explicitamente disso na análise de conjunções enquanto operado res de discurso. a paráfrase é o conceito dominante da lingüística segmental. Por outro lado.em detrimento de outros percursos (linguagem /sociedade). enquanto a polissemia estaria mais ligada a uma lingüística de recortes e de texto (como o definimos acima). a mais usada no estruturalismo fonológico e sintático.). como processo. Por definição. visto segundo as colocações que fiz. tais como especifico acima. 0 que Saussure diz da língua como . não fecha cada nível em si m esmo: não se pode verificar a estruturação de um processo semântico sem se pensar o próprio processo semântico. assim. a sintaxe. a função representativa da linguagem. logo. o processo sintático e a estruturaçao do processo sintático. de forma múltipla e fragmentária. de outras operações (recortes. entretanto. Desse modo. 0 "princípio de classificação" de Saussure fica. a articulação T-C. todos os sentidos são possíveis e. No processo que é a interlocução. Só há margens. penso revisitar Saussure (1962). 132 ENI PULCINELLI ORLANDI E o problema da estruturação de processos que nos remete ao problema da segm entação ou do recorte. na fala. Estruturação de processos semânticos: Argumentação no sentidQ restrito (orientação argumentativa). em "Funcionamento e Discurso". não mais recorta a de língua e fala. talvez. A HISTORIA Através da idéia de recortes . S-P.' etc. Ao abandonar o conceito de informação na comunicação. que é o sentido literal. "depósito". então.é o histórico: é o produto. quanto ao conceito de recorte. torna-se necessário pensar o sentido em sua pluralidade. em certas condições de produção. etc. deslocado pois t em seu lugar no processo. isto é. A relação entre o sincrônico e o diacrônico. Daí os estudos de paráfrase sofrerem sempre de um certo distribucionalismo e de ser a prova de comutação. a argumentação no sentido ret6rico e outros p rocessos como as estratégias de relação. privilegia ndo assim o percurso psíquico . por exemplo. É nesse aspecto que. os sentidos se recolocam a cada momento. há a dominância de um del 0 que existe. A fala é o processo. etc. gostaria de acrescentar que. é um sentido dominante que se institucionaliza como pro duto da história: o "literal". em favor do de interação e de confronto de interlocutores no próprio ato d e linguagem. A língua aqui . o efeitos de sentido A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 133 que se constituiriam no uso da linguagem. creio ter localizado a manipulação teórica desses conceitos (operatórios) em relação a teorias que privilegiam a informação. Nesse passo. instância de constituição da linguagem. se tem privilegiado um aspecto do sintático. Essa distinção de níveis. a textualidade. pode-se pensar. se tomo. Não há um centro. no domínio semantico. OS SENTIDOS POSSIVEIS: 0 PROCESSO. o segmental.o sistemático. que são os efeitos de sentido. Dessa maneira não se mantém a noção de um sentido literal em relação aos outros sentidos.em termos do texto como unidade de significação recupero o conceito de polissemia. etc. tal como se tem estabelecido n os estudos da linguagem. Portanto. e suas margens. segundo o que penso. em relação ao de segmentação. também terei o mecanismo sintático.linguagem /pensamento . 0 PRODUTO. de outrasfunções (expressiva. como qu er Saussure. fática. é um produto social do qual exclui o processo de produção. como atividade constitutiva e . entre os vários sentidos. do uso e não de uma forma abstrata. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 0 ABRANGENTE E 0 DETALHE i 1 13. outras operações na análise da linguagem. a fática. de processo constitutivo e de confronto de interlocutores no próprio ato de linguagem. em termos de funções. em "Tipologia de discurso e regras conversacionais". parte-se. produto. o histórico e o social também estão dicotornizados. em Saussure. uma atenção especial. privilegiando as cristalizações. multiplicidade. do texto (da palavra) o documento fundamental da linguag em.fato social. então. A relação que existe entre eles é uma relação mais complexa do que a que colocamos aqui e deve m erecer. ao contrário. 0 que eu gostaria de propor aqui. a historicidade.5 . e a nossa posição é a de qu e não se pode separar o histórico e o social. portanto. de um lado. é preciso levar em conta funções como a conativa. etc. do funcionamento. a expressiva como tão importantes (ou mais) do que a cognitiva ou referencial. Visto agora esse problema de acordo com os conceitos de processo e produto. A língua. Por enquanto. a) Conseqüência teorica: a literariedade é produto da história. (7) Observar a lingüística histórica clássica que tem trabalhado no percurso da evolução. então. tratase de verificar como. e se consideramos básicos os conceitos de interação. 134 ENI PULCINELLI ORLANDI ALGUMAS CONSEQUÊNCIAS Se rompemos com a tradição lingüística que não considera a multiplicidade de senti dos como inerente à linguagem. por outro lado. um (ou mais) se tornou o dominante. é individual. Nesse sentido. c) Conseqüência analítica: parte-se do múltiplo. em Saussure. chegamos a algumas conseqüencias que passarei a enumerar. sempre me pareceu complicar-se em relação aos conceitos de sincronia e diacronia. sincronia e diacronia . faz-se. vista a língua então. Operações como a segmentação e distribuição per dem sua importancia em relação à de recortar seqüências textuais. em Saussure.para os de produto e processo. neste volume. A teoria do disc urso é a teoria da determinação histórica dos processos semanticos (Pêcheux. para Saussure. 0 conceito do social.8 Além disso é preciso considerar outras funções. pois. é que permite esse deslize. do observável e se procuram as co ndições que estabelecem a dominancia de um ou outro sentido. é o que se dá entre o conceito de língua enquanto "princípio de classificação" (processo) e o de língua enquanto "instituição" (produto). o da. A fala. porque o social é um social visto como dado. o sujeito. na lingüística. en quanto a fala é vista como individual e não interacional. Então. 0 percurso psíquico (linguagem/pensamento) deixa lugar para o percurso social (lingu4gem/soci edade). ' b) Conseqüência metodológica: se não é de um sentido nuclear que derivo os vários se ntidos mas se.com o língua e fala. as regras que servem para derivar sentidos perdem seu valor metodológico. podemos dizer que o deslize. como fingua oficial. basta-nos lembrar que não são estanques mas se intercomunicam sendo parte de uma coisa só: a produção da lin guagem. de outro. ocasional e nada tem de social. e as conseqüências metodo lógicas da consideração da polissemia como inerente à linguagem. é o deslocamento de conceitos . a Lingüística Histórica é a história da língua oficial (idioma histórico). 1975). como diz Voloshinov (1976). Por exemplo. (8) Desenvolvi esse aspecto. da qual participaram Eu nice Pontes. Em Orlandi. N. posição típica do estruturalismo. em Formal Semantics of Natural Language. M. a de múltiplo. University Press. 1973. não devem met er medo.mudase o ser. . P. . as famílias parafrásticas q ue se formam ao longo do dizer (na relação do dito/não dito mas que se poderia dizer). 1976. Luiz Carlos Cagliari e a autora. Não há como opor a essa abrangência uma maior especificidade do estudo em detalhe. Sgall."Conditions of Use of Sentences and a Semantic Representation of Top icand Focus". que entendo o processo discursivo. Visión."Estratégias d e Relação e Estruturação do Texto". comunicação aprei . 1975. Langages. Orlandi.pois eu poderia dizer que trabalho o pormenor pensa ndo o todo. pp. Mame. mas como possíveis). ou níveis que possam servir de suporte para explicitar o que não dá para explicitar. matique du Discours". Cambridge.El Signo Ideológico y Ia Filosofia dei Languaje. . Rio de Janeiro. "Mudam-se os tempos. Buenos Aires."Mises au Point et Perspectives à Propos de I'Analyse Auto . IEL. não há categorias estritas. muda-se a confiança. aquele que diz sacrificar a abrangencia à especificidade. 7-81. Dunod.New Horizons in Linguistics. A. Madrid. Lyons. F. ou seja. V. Tipologia de discurso Pêcheux. nem simplificar o que não dá para simplificar. não se trata de analisar um maior número de fatos. K. UNICAMP. por definição. E é assim. 0. pp. BIBLIOGRAFIA Ducrot.Cours de Linguistique Générale. A idéia de movimento. E aquele que ousa aceitar que não há hierarquias. 1981. E. Voloshinov . por natureza. é aquel e que vai mais fundo na sua natureza. Sobre a Estruturação do Discurso. 1978a. E. ou clarear o que.d. trata-se da relação entre o ponto de vista e a natureza da linguagem. 1981b. 1 Pêcheux. ou de pegar no foco "explicativo" da teoria um maior número de fenômenos."Protagonistas do/no Discurso"."Language Structure and Language Function". os efeitos de sentido (sem pensar um centro do qual partem. . a essa altura dos estudos da linguagem. . é a do pormenor em relação ao todo . a de fragmento. E o lingüista não precisa se obrigar a outros escritos que não sejam ensaios.Analyse Automatique du Discours. é aquele_que perde menos de sua multiplicidade. A. é uma análise mais abrangente.. 1970. tomando sempre novas qualidades.Não há.La Preuve et le Dire. ."Tópico-Comentário e Argumentação". sua complexidade. Um estudo mais abrangente. Halliday. Saussure. Corazon Ed. mudam-se as vontades. J. f nalmente. da sintaxe (em relação com a pragmática). Campinas. a relação de interlocução e as circunstancia em que se realiza -. o processo de interação . M. Em John Lyons (1970). m. Paris. é composto de mudança. L ogo. . po r exemplo. pp. Paris. 136 EM PULCINELLI ORLANDI Guimarães.. 297-312. Penguin Books. se faz obscuro. 1962. tampouco. 30-41. Paris. a de fugaz. . E.Ç> sentada no V Encontro de Lingüística. Há multiplicidade. . . UNICAMP. Ponzio. Texto inédito apre sentado em mesa-redonda no IEL.'Ma Importância do Tópico em Português".5. e regra s conversacionais* Pontes. . 197. n? 37. E é nesse sentido que vejo a colocação de que uma análise que leve em conta as c ondições de produção da linguagem.Producción Lingüística y Ideologia Social. Nueva.isto é. London. . então. 1969. . todo . Série Estudos 4. A. Payot. . E. Guimarães. um centro e uma margem. E. Volto a repetir. et alii. M. 1974. A oposição. Trata-se de ir mais fundo na n atureza da linguagem. no final. os sujeitos da lingua gem não são abstratos e ideais. são apenas um. Não é só de Benveniste essa posição. então.polaridade das pessoas aponta para a possibilidade de se ultrapassar essa divisão. Quando se contesta essa posição. pois. diz Ben veniste) do eu sobre o tu (e. se o faz através da retórica. 138 ENI PULCINELLI ORLANDI (1974 e 1976). E. Camões INTRODUÇÃO De certa forma. do conceito de intersubjetividade. Produção/recepção. do semiótico sobre o semantico). o do eu e do outro na sua relação: dialética do reconhecimento ou conjuntura da interlocução. se ve toda manifestação de linguagem através da tirania do tu. A palavra é um ato de duas caras: está tão determinada por quem a emite como por aquele para quem é emitida. representação/eomunicação. embora não a realize na medida em que fica nas primeiras aproximações. É o que se pode ver. Em especial. pode-se dizer que a lingüística tem tido seus tropeços. ou seja. o do ouvint e. que teoriza a dominância (transcendêncía. mas me afastando dela . 19 81. partirei de dois deles que. a perspectiva pela qual se considera o 16 eu" e o "outro" dá-se pelo enfoque do "eu". intenção/convenÇão. mas sujeitos mergulhados no social que os envolve. outra mudança faz de mor espanto.na medida em que propõe a transcendência do eu -. de onde deriva a contradição que os define.é o da lingüística feita a partir do locutor. UNICAMP. mas a relação que os constitui: a instância da interlocução. os nterlocutores constituem-se na bipol aridade contraditória daquilo que. Quando Benveniste fala da intersubjetividade . não se estará privilegiando nem o locutor nem o ouvinte. a) 0 primeiro para o qual apontarei . por sua vez.. Transcendéncia do eu ou tirania do tu são modos diferentes a de manter as divisões: semiótica/semântica. em que o privilégio agora cal do outro lado. dizer/comp percurso psíquico/percurso social.E. Como a apropriação da linguagem é constituída socialmente. Dessa forma. Neste trabalho.. a interação verbal C a realidade fundamental da l inguagem. isto é.-L. em Benveniste. Ela pode ser vista através de toda a teoria de enuncíação. do processo simultâneo do falante e ouvinte na interlocução. afora este mudar-se cada dia. procuro o lugar da interação. gostaria de agradecer a Eduardo Guimarães pela contrib uição valiosa na discussão de problemas de semântica e pragmática. que não se muda mais como soía. por exemplo. Uma palavra e territóri . a interação. É produto de relação recíproca. e a Cláudia Lemos cujo trab alho me levou a uma elaboração precisa do conceito de interação. em Benveniste (*) Gostaria de agradecer aos colegas do IEL cuja convivência me tem sido muito fecunda. Segundo Voloshinov (1976). Partindo.. Este texto foi apresentado no Encontro Internacional de Filosofia da Linguagem. em que se trabalha o privilégio do falante.e do qual já tratei de passagem em o utros textos . V. constituem: o texto (o discurso) enquanto sua unidade. ete. Cada um sendo o seu outro i 14 Próprio" e o "complemento" do . se dizer que a linguagem é odo de ação. de postulados ou de condições de atos de fala. Grice. o percurso social da linguagem é pensado sob o enfoque da comunicação enqua nto informação.pela transcendêncía do "eu" em turnos sucessivos. e que procurarei demonstrar aqui. 1975). não deriva só de diferenças culturais ou outras. generaliza-se p ara toda a caracterização da linguagem o que seria próprio de um tipo de discurso. A isso eu chamaria variação inerente. isto é. . Há tensão entre o texto e o contexto (social. logo.o partilhado pelo emissor e pelo receptor. informacional. Daí se pensar a comunicação sob o enfoque da informação. de um lado. em toda linearidade. Segundo o que suponho. confronto. do meu ponto de vista. simétrica e estável entre interlocutores. Além de ser uma necessidade metodológica para o estudo. P. A PROPOSTA DE UMA TIPOLOGIA Creio que a noção de tipo é necessária como princípio de classificação para o estudo a discurso.social). por assim dizer. ao fato de se poderem reduzir à relevancia. em relação à pragmática. ao mesmo tempo em que procurarei mostrar que a variação. é social e. Há tensão entre interlocutores: tomar a palavra é um ato social com todas suas implicações. do ponto de vista funcional. as regras de discurso que até agora foram estabelecidas são carreg adas dos tropeços que acabamos de citar. de máximas conversacionais. são regras que supõem uma relação homogênea. Pois bem. etc. ou seja. Isto é. linguagem em uso. Essas críticas incidem sobre vários aspectos: sobre a variação dessas regras em relação às várias culturas. histórico. isto é. reconheci mento e mesmo conflito na tomada da palavra. creio haver necessidade met odológiCa da noção de tipo~ assim como tem-se colocado para vários autores . ao fato delas serem normativas ou constitutivas. para a análise de disc urso. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 139 b) 0 segundo tropeço é o da consideração da linguagem prioritariamente em sua fu nção representativa. o estabelecimento da tipologia tem a ver com os objetivos específicos da análise que se estiver empreendendo e com a adequação ao exemplar de linguagem que é objeto da análise. mas de diferenças que se origi140 ENI PULCINELLI ORLANDI nam no fato de haver vários tipos de discurso. do Para se tratar da variação no domínio do discurso. com características próprias mas que se relacionam com as ações sociais em geral. são dois locutores bem formad os. Tem-se considerado a função representativa como a essencial. a que define a linguagem. É já um adquirido da lingüística. cuja intenção é a da comunicação. a partir da representação. Do meu ponto de vista. da informação e quase sempre eles se alternam . não é tudo essa placidez: há tensão. Várias críticas foram feitas à elaboração das regras de discurso a partir das máxima s de Grice (H.de que trataremos mais adiante . E se há sentido em se falar em dois 4~eus" é no sentido de que há conflito na constituição dos sujeitos. ou então a interação de qu e fala. Eu procurarei incorporar essas críticas. a que essas regras estão sujeitas. Isto quer dizer que as tipologias são.a necessidade da noção de regras de discurso. pensa-se o percurso psíquico da linguagem (relação pen samento/linguagem) sob o aspecto formal e. de outro lado. mas gostarríamos de incorporar a essa visão da linguagem como modo de ação o fato de que esse modo é interacional e a ação. dis curso teórico. Não há discurso sem configuração. Ou. descrição. Por exemplo. como diz Voloshino v (1976): "Organização social e época são limites que o ideal do destinatário não pode ultrapassar: a fala se constrói entre duas pessoas socialmente organizadas.de aplicação relativa. Temos afirmado que um tipo de discurso resulta dofuncionamento discursiv o. discurso literário. com finalidades es pecíficas. estruturais. Na ausência de um destinatário real. Trata-se de formações imaginárias. Por outro lado. compreendendo-se contexto em seu sentido estrito (situação de interlocução. Além do nível de generalidade da tipologia que eu procurava. Há. essa tipologia deveria também acol her o outro lado da variação: as formas e sentidos diferentes. etc. ou à situação objetiva dos interlocutores que pode ser descrita pela sociologia. a meu ver. os tipos são cristalizações de funcionamentos discursivos distintos. funcionamentos discursivos que se configuram como discurso jornalístico ou discurs o jurídico. Vemos isso através do meio social concre to que nos rodeia. Porém. narração. uma maior ou menor Ao analisar o discurso pedagógico. ideol cas. circunstancia de comuA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO nicação. etc. ainda que possuindo um cert o grau de generalidade. Em suma. Pecheux. por um falante determinado. essa tipologia. mas o que se define na própria interação. que esse "determinado" não se refere nem ao número. ou seja. ou seja. interessava-me sua dimensão histórica e seu -fundamento social enquanto capaz de absorver o conceito de interação. relação entre a atividade e o produto do dizer e assim os tipos passam a fazer parte das condições de produção do discurso. mas sim de uma configuração que ele estabelece: não é um dado anterior. Dessa forma. de representações. essa tipologia'devia incorporar a relação da linguagem com suas con dições de produção. nem à presença física. instanciação de linguagem) e no sentido lato (determinações histórico-sociais. corno é definido o discurso religioso em relação ao jornalístico~ ao jurídico. se institucionalizam historicamente e passa m a contar nas condições de produção. um homem 'em si'. com o uso e a sedimentação. não se trata de um modelo que o falante preenche. Daí essa tipologia ter como características a interação e apolissemia. a normas institucionais. ganham legitimidade. Esse não é entretanto um destinatário abstrato. estabeleci uma tiPologia que não derivava de critérios Presos diretamente à noção de instituição. Por outro lado. enquanto produtos. como 142 ENI PULCINELLI ORLANDI 11 . Também nã me interessava uma distinção cujo critério fosse a distinção de domínios de conhecimento como a que existe entre discurso científico. sempre. etc. podendo ter generalidade. da posição dos sujeitos no discurso (M. Interessavam-me características que já estivessem pressupostas. É ne sse sentido que usamos "determinado". para um interlocutor determinado. Consideramos que a atividade de dizer é tipificante: todo falante quando d iz algo a alguém estabelece uma configuração para seu discurso.. enquanto partissem de características formais. 1969). etc. se pressupõe um. Pressupomos certa esfera social típica e estabilizada para a qual se orienta a criatividade ideológica da nossa própria época e grupo social". não me atraía a distinção de tipos como dissertação. Da perspectiva da atividade. devia dar conta da relação linguagem /contexto. sendo este último definido como a atividade estruturante de um discurso determi nado. Observando-se.). no interior de cada um desses tipos. enquanto resultados. ou justamente por isso. pois. etc. 0 discurso polemico seria aquele que procura a simetria. a relação com a referência é respeitada: a verdade é disputada pelos interlocutores. Nesse sentido. Ainda sob esse aspecto. Isso porque. da maneira como se dá a p olissemia e por causa da reversibilidade nesse tipo de discurso. respectivamente. Discurso polêmico: é aquele em que a reversibilidade se dá sob certas condições e em que o objeto do discurso está presente. estand o o objeto do discurso oculto pelo dizer. No lúdico. é o que determina a dinamica da interiocução: segundo o grau de reversibilidade haverá uma maior ou menor troca de papéis entre locutor e ouvinte. 0 uso da linguagem pelo prazer (o lúdico). Discurso autoritário: é aquele em que a reversibilidade tende a zero.. não é a relação com a referência que importa: até o sense e possível. . o discurso lúdico se coloca como contraponto para os outros dois tipos. etc. eu diria que não há lugar para o lúdico em nossa formação social. é ruptura. 0 ou tro critério tem a ver com a relação dos interlocutores com o objeto do discurso: o objeto de discurso é mantido como tal e os interlocutores se expõem a ele. Os critérios para o i estabelecimento dessa tipologia derivam das características que enunciamos mais acima. ou a relação entre interlocutores é qualquer uma. como acontece nos discursos autoritário e polemico. Em relação à função referencial e. como modelos. 0 lúdico é o que '6vaza". ou seja.tipos cristalizados que retornam ao processo da interlocução. Desse mecanismo. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 143 Tal como é caracterizado. no tipo de sociedade em que vivemos. isto é. dessa forma de relação com o objeto do discurso é que podemos derivar o critério da polissemia: haverá uma maior ou menor carga de polissemia de acordo com essa forma de relação. A partir de que momento dizemos que um discurso é de tal ou tal tipo. havendo um agente exclusivo do discurs o e a polissemia contida. 0 exagero é a ordem no sentido militar. o lúdico representa o desejável. repr esenta tal ou tal funcionamento discursivo? A tipologia que estabelecemos distingue: discurso lúdico. ou seja. o autoritário pro cura a assimetria de cima para baixo e lúdico não colocaria o problema da simetria ou assimetria. a relação com a referencia é exclusivamente determinada pelo locutor: a verdade é imposta. No au toritário. no lúdico. 0 exagero é o non sense. resultando disso a polissemia aberta. sendo que a polissemia é c ontrolada. São mais importantes a poética e a fática por causa. conseqüentemente. Da i primeira resulta o critério que leva em conta o modo como os . sendo que o objeto do discurso se mantém como tal na interlocução. discurso polemic o e discurso autoritário. afi nal. eu diri a que a função referencial. 0 exagero é a injúria. a interação e a polissemia. oassujeitame nto ao comando. No polemico. ou se constitui na disputa entre os interlocutores que o procuram dominar. no discurso. práticos. contrasta fortemente com o uso eficiente da linguagem voltado para fins imediatos. em relação às práticas so ciais em geral. em uma formação social como a nossa. ou está e ncoberto pelo dizer e o falante o domina. Daí t ermos os tipos de discurso como segue: Discurso lúdico: é aquele em que a reversibilidade entre interlocutores é tota l. entra o critério da reversibilidade que. ao problema da verdade. é a menos importante. mas sob perspectivas particularizantes dadas pelos participantes que procuram lhe dar uma direção. não o leva em conta. 1 i interlocutores se consideram: o locutor leva em conta seu interlocutor de acordo com uma certa perspectiva. enquanto esper am encher o tanque. Como X tem o habito de brincar c om Z. na me dida em que instaura uma forma de interação.Ainda pensando-se em funções da linguagem. o polêmico como o ato de perguntar e o lúdico como o ato de dizer. h o exemplo uma combinação de discurso lúdico e autoritário. dá-se o seguinte: X: Z.que consideramos ser o fundamento da linguagem. ao considerar os tipos como modos de ação. entre o processo parafrástico e o poltuemico. Essa posição representaria um enorme reducio nismo. entre paráfrase e polissemig. Dada a tensão. segundo. o polemico tende para o equilíbrio entre polissemia e paráfrase. diríamos que o discurso lúdico é o pólo da polissemia (a multiplicidade de sentidos). o discurso). Isto quer dizer que não posso consid erar o discurso autoritário como o ato de -ordenar. perdendo assim a sua plasticidade. A noção de tipo. há um aspecto importante. outras vezes um tipo é usado em função de outro. 0 barulho e a confusão irritam Z. então. cada tipo 144 ENI PULCINELLI ORLANDI não se define em sua essência mas como tendência. X e Z estão em um carro. etc. i sto é. Tal como a função metalingü a metacomunicação aponta para si mesma enquanto seu objeto. 1955). Em relação à tensão entre os dois grandes processos a paráfrase (o mesmo) e a poli ssemia (o diferente) . que esses tipos de discurso não têm de existir n ecessariamente de forma pura. porque seria redut A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 145 zir a linguagem a três atos fundamentais. Conseqüentemente . parados em um posto de gasolina e. equivaleria a um ato de linguagem. Mas não são ação como os atos de linguagem são considerados a nírel de enunciados. há um jogo de dominância entre eles que deve ser observado em cada prática discursiva. não creio que se deva . o jogo. no domínio do discurso. estamos considerando que o texto todo. Há mistura de tipos e. não pretende ser um porto-seguro. Daí que um fator importante no funcionamento discursivo dos tipos é que eles se apon tam como tais. o autoritário é o da paráfrase (a permanência do sentido único ainda que nas diferentes formas) e o polêmico é aquele em que melhor se observa o jogo entre o mes mo e o diferente. entre um e outro sentido. de uma função que tem seu homólogo no domínio lingüístico: trata-se da metacomunicação. e que deriva. enquanto unidade de significação (logo. que estabelece uma r eferencia para a constituição da tipologia. às vezes seqüências se alternam em difer entes tipos. Finalmente. o que faria? Z: Eu calava a boca. Um exemplo do caráter não categórico da tipologia pode ser visto na seguinte s ituação de linguagem.uma vez estabelecida uma noção. isto é. o dizer lúdico diz isto e um jogo (G. Devemos observar. estagná-la metodologicamente. o polemico se diz disputa e o autoritário se diz autoritário. Isso signif ica que é preciso analisar o funcionamento discursivo para se determinar a dinamic a desses tipos: às vezes todo o texto é de um tipo. se você estivesse em um mato sem cachorro. o autoritário tende para a paráfrase. porque a relação do material lingüístic o com a ação realizada ficaria extremamente delimitada. isto é. o lúdico tende para a polissemia . em relação à ti pologia. Primeiro. isto é. Bateson. em geral. enquanto matéria de conhecimento. além disso. outras vezes ainda eles se combinam. Esta é uma situação de linguagem que é complexa quanto à dinâmica de tipos. todos que estão tambem no carro conversam ruidosamente. faland o ao mesmo tempo. Essa função metacomunicati va se deve ao fato dos tipos serem configurações que se constituem na interlocução. endurece-la categoricamente. em relação à tipologia gostaríamos de acrescentar que. a sua provisoriedade.como usualmente tem ocorrido . 0 que acontece é que . Como as formações discursivas determinam o que pode e deve ser dito a partir de uma posição dada em uma conjuntura dada. talvez. são constitutivos da significação. vai se caracterizar. o fato de que ele produz linguagem e também está reproduzido nela. o texto equivale a ato de linguagem na medida em q ue instaura uma forma de interação e não como extensão do conceito de ato do nível do enunciado. 0 uso que estou fazendo do conceito de discurso é o da linguagem em interação. são formações imaginárias. nes~e passo. o da produção. Falar em discurso é falar em condições de produção e. Do ponto de vista discursivo. Conseqüentemente. que assim se faz. o parcial se abs olutiza. o discurso é lugar social. do agente exclusivo da linguagem da contenção da polis semia. os textos. etc. o que seria incompatível com a concepção de multiplicidade que é a maneira como concebemos a linguagem. tende a privilegiar a função referencial. Primeiro se dicotomiza para depois se igualar tudo através de um dos lados. Assim. em relação às condições. as palavras. ou. Segundo o que temos proposto. são partes da formação ideológica. a informação. são partes de for mações discursivas que. o do percurso psíquico. essa lingüística. Estabelece-se. como o exposto por Pêcheux (1979). DIÃLOGO Alguns conceitos merecem. o seu dizer nasce em outros discursos. a relação que existe entre um discurso e os outros) e a antecipação (a maneira como o locutor representa as representações do seu interlocutor e viceversa).colocando-o como fundamental. . ou seja. isto é. etc. assim. por sua vez. Em relação a essas formações imaginárias e aos fatores que contam nelas.se desarticula o característico da interlocução que é a articulação locutor-ouvinte. é aquele em que considera que a relação estabelecida pelos interlocutores. Logo. 0 deslize que apontamos no início desse trabalho. aquele em que se considera a 146 ENI PULCINELLI ORLANDI linguagem em relação às suas condições de produção. TEXTO. o de te xto e o de diálogo. E a forma do discurso autoritário passa a ser a forma da linguagem em geral. a analise de discurso não e . o da intenção. DISCURSO. interessante se chamar aqui a atenção para considerações de ordem teórica e metodológica. No interior dessas dicotomias. assim como o contexto. a relação de sentido (o coro de vozes. gostar destacar que. Seria. nossa atenção: o de discurso.o do eu locutor. Nasce aí a possibilidad e de se considerar linguagem como trabalho. a paráfrase. assim como se rompem as outras articulações que daí decorrem e que se constituem sob a forma de d icotomias.sob a égide do Discurso Autoritário . se passa a olhar através de um de seus pólos . e que se caracteriza por constituir uma lingüística feita do ponto de vista do locutor. em relação aos tipos. e nessas formações contam a relação de forças (os lugares sociais dos interlocu tores e sua posição relativa no discurso).se teria que apelar para a noção de derivação a partir de tres atos fundamentais. o modo de existência social da linguagem: lugar particular entre língua (geral) e fala (individual). acreditando ser a fonte exclusiva do seu discurso quando. assim é que se considera o discurso como fenômeno social. Dessa forma. na verdade. o da rep resentação. toda linguagem é vista sob a dominancia do eu. a intertextualidade. devemos l embrar a ilusão subjetiva que é constitutiva do sujeito falante. por generalizar para a caracterização da natureza da linguagem alg o que é próprio de um modo de funcionamento dela. dito de outra forma. pela noção de di scurso. relativas ao desenvolvimento dos estudos da linguagem e à proposta dos tres tipos de discurso. a unidade que se faz no processo de interação entre falante e ouvinte. 0 texto pode ter qualquer extensão: desde uma simples palavra até um conjunt o de frases. Pensando-se o texto no processo da interlocução.o texto . ou seja. se constitui pela ação dos interlocutures. em si. frases. portanto. dizendo que sua unidade (do texto e do diálogo) é a do texto. Esse objeto. Isso significa que o discurso é tomado como conceito teórico e metodológico e o texto. reflexo da situação social. podemos dizer que o domínio de cada um dos interlocu tores. Essas unidades não perdem a especificidade de seu nível . por isso. É então uma unidade de ise não formal. é a totalidade da qual se parte na análise da est ruturação do discurso. A característica da relação entre discurso e texto é a seguinte: eles se equival em. semântico . Indo mais além. mas pragmatica. É. as noções de texto. etc. Podem-se analisar unidades de vários níveis . Mas se distinguem de conversa. Nesse passo. . Teremos.e diálogo. 1976). diferentes espécies de texto. veremos "* outras deter minações que revelarão aspectos dessas unidades que passam despercebidos em outras perspectivas. antes. Há. acolhe essa entidade. 0 enunciado completo que. dis curso e diálogo. morfológico. mas em níveis conceptuais diferentes.. na lingüística (imanente) fica a cargo de outras disciplinas: a retórica e a poética.mas.é parcial e só tem a unidade no/do texto. mas sim que texto é a unidade complexa de significação.. Nessa mesma perspectiva consideramos que a unidade da análise de discurso é o texto. podemos torná-lo como o centr o comum. não basta dizer que o texto é a unidade de análise.como centro comum que se faz na interlocução . como o conc eito analítico correspondente. em contrapartida. Pensando-se a linguagem comoprocesso. eu diria que o texto é o enunciado como entid ade total.pala vras. ao olharmos pela perspectiva da análise do discurso. como ele diz. o semântico. que é um objeto de conhecimento. uma relação necessária entre eles. Lembrando Voloshinov (1976). são espécies diferentes de texto. se consideramos níveis como o fonético.]e xical. A noção de discurso. uma aula. não é só da ordem de um dos interlocutores ou do outro.é unidade no processo de significação. no entanto. É interação. Esse ponto de vista que é o da análise de discurso é diferente do da lingüística e stabelecida e. a idéia de diálogo está na base de qualquer reflexão sobre a linguagem (Voloshinov. se equivalem. o sintático. como a colocamos mais acima. diria que a relação dialógica é básica para a caracterização da linguagem: o conceito de disc rso se assenta sobre a relação dialógica na medida em que é constituído pelos interlocutores. é o discurso como o vimos c aracterizando. Essa unidade . Em termos de interação. isto é. enquanto interação.na perspectiva da análise de discurso. e fazendo do uso o documento lingüísti co essencial. então. e invertendo agora a perspectiva dessa afirmação. ou seja. podemos fazer um paralelo entre a noção de texto .um nível diferente de análise. portanto. um comício. consideradas as condições de sua realização. instaura um objeto A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO diferente. segundo as diferentes formas de relação que se estabelecerem entre locutores. períodos . sintático. um ponto de vista diferente. uma conversa. Se considero o texto nesta perspectiva teórica estabelecida pelo discurso. todo texto supõe a relação dia161 1 1 148 ENI PULCINELLI ORLANDI gica. nesse trabalho. 0 que o define não é sua extensão mas o fato de que ele é uma unidade de significação em relação à situação. Assim. assim. segundo. a particula ridades que derivam da ideologia. não creio que haja uma sucessão linear. quando se trata de texto. Nem há segmentos que se juntam linearA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 149 mente para formar uma unidade maior. o que redunda em não haver um limite claro que separa o dizer de um e o dizer do outro. A questão para a anális e do discurso incide sobre o estatuto do sentido literal. são situações particulares de discurso (texto.. e seu espaço é intervalar. etc. não implica. menos mensuráveis que segmentos lineares e número de interlocutores. a da história. de tota lidade. e. nem e m outro. a linguagem tem como condição a inc ompletude. nem na soma de todos os segmentos que constituem um texto determinado. 0 texto tem unidade. Se já se considera. por não se tratar d e segmentos que se sucedem linearmente. observando-se os turnos em uma conversa. porque se pode relacioná-lo com suas paráfrases (seus fantasmas). que o contexto. Aliás. através da noção de to. Há. o domínio do distribuciona lismo (relação dos segmentos) e entramos em um outro campo teórico. A intertextualidade pode ser vista sob dois aspectos: primeiro. não está no outro: está no espaço discursivo (intervalo) criado (constituído) pelos/nos dois interlocutores. . mas a relação das partes com o todo . Dito de forma mais direta: ao considerar texto como unidade de significação não estou dizendo que esta unidade. de forma mais abrangente. em que a noção de recorte nos remete à situação de interlocução. Na constituição do texto entram elementos menos determinados . 0 texto não é a soma de frases e não é tampouco soma de interlocutores. por isso é completa.é complexa. 0 sentido é intervalar. mas como efeito de sentidos entre locutores (M. as condições de produção são constitutivas do sentido. Em termos de condições de produção. Ao contrário. SENTIDO LITERAL E EFEITOS DE SENTIDO: UMAQUESTÃODAHISTõRIA Postula-se sempre um sentido literal e seus efeitos. sermão. com o discurso. então que o sentido. Está na unidade a partir da qual os segmentos se organizam. que.quando se trata de texto . Não está em um inter locutor. passam a contar desde determinações no contexto mais imediato (ligados ao momento da interlocução) como as do contexto m ais amplo (como a ideologia). em que o proces so da interlocução aparece em sua forma mais direta. Não diria. mas sim simultaneidade. Deixamos. propomos falar em recortes que o todo organiza. pois sempre se pode referir um texto ao conj unto de textos possíveis naquelas condições de produção. a relação de espécie para genero. Assim como não está em um segmento. um domínio de indeterminação na constituição da unidade textual. com certa insistência. Como o texto é um espaço. é completo quando tomamos o centro comum (texto) que se constitui com (e por) eles. mas um espaço simbólico. um dos fatores que constituem a unidade do texto. Dessa forma. não é fechado em si mesmo: tem relação com o cont o e com os outros textos. a variação é inerente ao próprio conceito entido. Pecheux. uma vez que o discurso é definido não como transmissão de informação. o conceito de completud e. A intertextualidade é. entra também em consideração. que se faz pelos vários (dois ou mais) interlocutores. Tenho observado. porque se pode relacionar um texto com outros nos quais ele nasce e outros para os quais ele aponta. de partida. Na verdade. pois. parcial na ordem de cada um dos i nterlocutores. Por outro lado.debate. estas. Intervalar nas duas dimensões: a dos interlocutores e a da seqüência de segmentos. que o conceito de unidade. 1969). diríamos que não há compartimentos estanques que se preenchem a cada turno dos interlocutores. então. diálogo) e tem. em relação ao que estamos caracterizando. Não é. A sedimentação de processos de significação em termos de sua dominância se dá histor icamente: o sentido que se sedimenta é aquele que. mas . na consideração do sentido. no diálogo (conversa): em uma seqüencia de conversa. enquanto processo. A institucionalização de um sentido dominante sedimentado lhe A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO È 151 atribui o prestígio de legitimidade e este se fixa. ou o regi stro (enquanto estilo que aponta uma identidade social que tem uma função significat iva). produto . Em nossa tipol ogia. em duas linhas (A e B) uma mes ma palavra pode figurar em dois contextos mutuamente antagonicos. seria um exemplo de discurso polemico. segundo Pecheux (1975). então. como se um nada tivesse com o outro: os contextos se encontram em constante tensão. dadas certas condições. o sentido literal. não há separação categórica entre lingüístico e discurs vo. É o que dissemos mais acima quando falamos da sucessão não linear do s turnos e da incompletude. dominancia de um sentido possível sem por isso se perder a relação com os outros sentid@s possíveis. portanto.Se pensarmos o contexto como constitutivo. interação e mesmo conflito. além do contexto. por isso a tipologia tem . é que pod e ser visto como a história da língua: a história dos sentidos cristalizados é a história do jogo de poder da/na linguagem. preciso se manter a idéia de um centro de sentido e suas margens (contextuais). até relações menos diretas como é a da formação discursiva com a formação ideológica. E é essa relação dinâmica. Por outro lado. é esse movimento entre processo e coisa produzida que constitui a linguagem. abandona-se a posição que privilegia a hipótese de um sentido nuclear. Os diferentes contextos não estão um ao lado do outro. o sentido se constitui na interlocução a cada momento. lingüístico (prOduto) e discursivo (processo) se recobrem e. de fato. a relação entre eles é a que existe entre condições materiais de base (lingüístico) e processo (discursivo). pois. a sedimentação de processos se faz em termos de dominan cia em relação a determinadas condições de produção.logo. o aspecto histórico é através da reflexão acerca da relação entre o lingüístico e o discursivo. Daí podermos citar como mecanismos de efeitos de sentido desde o lugar social do locutor. Do ponto de vista da história se podem apreender os produtos como tal. Como. Há um movimento contínuo entre produto e processo. é o sedimentado. podemos dizer que as condições mate riais de base resultam. Então. há. a fronteira que os separa é colocada em causa: aquilo que é processo discursivo sedimentado . todos os sentidos são de direito sentid os possíveis. o produto dessa sedimentação. ISO ENI PULCINELLI ORLANDI~ Os diferentes contextos não estão no mesmo plano. o oficial. ganha estatuto dominante.se faz processo de interlocução e assim ind efinidamente. em cada prática disc ursiva. Tomando essa afirmação em nossa perspectiva. por sua vez. qualquer variação relat iva às condições de produção é relevante para a significação. uma vez que o contexto é c onstitutivo dele. Dessa forma. segundo Voloshinov (1976). como centro: o sentido of icial (literal). Se se considera que a variação é inerente ao sentido. Como dissemos acima. de processos discursivos sedimentados. Tratando-se das condições de produção. Eles contrastam entre si e isso pode ser visto. linearmente. considerado dessa perspectiva. uma forma de se integrar. Conseqüentemente. com os interlocutores A e B. mais importante hierarquicamente (sentido literal) em relação aos outros (e feitos de sentido). dessa institucionalização. Em certas condições de produção. qual é a relação que existe entre ele.um papel fundamental: é ela que determina o jogo de dominancia. no entanto. quando. sociais. 0 que queremos estabelecer nesse passo. Distinguindo as implicaturas conversacionais das convencionais e mostran do que as conversacionais estão ligadas a certos traços gerais do discurso. É a isso que me referia. Em Grice. Lakoff. Uma vez que nos interessa. 1979) e Speech Acts (J. a poesia). 0 princípio cooperativo diz: faça sua contribuição conversacional tal como é reque rida. em outra parte desse trabalho. no discurso polêmico se disputa algum sentido procurandose privilegiar um ou outro. da relação e do modo . 3) tente fazer sua contribuição tal que seja verdade. 1972) e "Le Sens Littéral" (J. o contexto e as regras.Princípio Cooperativo . no nosso trabalho. a p olissemia é aberta (veja-se. mas o único. Searle. em geral. 1973). A tipologia que estabeleci determina. e que se cons iderarmos que a função primeira da linguagem não é a informação e o texto é a unidade significativa que se constitui pela interação. no autoritário é contida (vejam-se definições estritas como argumentos de autoridade). generalizar o esquema de regras para . é ela que dete rmina a forma que terá a relação de um dos sentidos com os outros possíveis. se faz de tal maneira que se preserve o máximo de ecos. algumas só funcionam quando outra opera (espécie de pré-requisito). morais. não há por que se considerar um sentido l iteral e seus efeitos: há múltiplos sentidos. 2) não faça sua contribuição mais informativa do que é requerido. há polissemia. por exemplo. o estatuto do sentido literal. da maneira que segue. No entanto.---ConversationalPostulates" (D. de regras conversacionais. dizia que. Grice coloca o princípio geral . temos claramente o processo da interpretação do sentido incidindo sobre a relação sentido-contexto-máximas (com suas implicaturas). Além disso. a forma que terá o jogo de dominancia: em um discurso lUdico a relação de dominancia de um sentido com os outros. "Les Lois du Dis cours" (D. 152 ENI PULCINELLI ORLANDI POSTULADOS. no discurso lúdico. no estágio em que ocorre. 1979). não é a que encontramos nos autores que passarem os a comentar e que constituem o ponto de partida para a avaliação do recurso às regras conversacionais no estudo da linguagem no domínio da pragmática. Grice. observaremos. um sentido se torna dominante e adquire estatuto de literariedade. segundo Grice. G. E as máximas são: 1) faça sua contribuição tão informativa quanto é requerido (pelos propósitos concer nentes da troca). 4) seja relevante. Esse sentido sobre o qual incide as regras é o sentido convencional. Algumas leis são mais urgentes de serem observadas que outras (por exemplo . 1 975). deve-se tratar todas co m a mesma importância. 5) seja claro. de tal maneira que aquele não se torne apenas o dominante. no discurso autoritario se procura absolutizar um sentido só. podemos chegar a algumas afirmações a respeito da função metodológica do que eu chamaria. Ducrot. é menos grave ser prolixo do que ser falso). Essa nossa posição.da quant idade. Mesmo Grice diz que há outras espécies de máximas: estéticas.sob uma ou outra das quais cairão máximas e submáximas mais específicas. no polemico é controlada (vejase um debate real). e tc. pelo propósito ou direção aceita da troca de fala na qual você está engajado. nesses autores. Searle.e as quatro categorias . LEIS DE DISCURSO: SUA FUNÇÃO METODOLõGICA A partir da leitura de textos como "Logic and Conversation" (M. MÁXIMAS. como dissemos no item anterior. enquanto seus ecos. da qualidade. isto é. ele mesmo também diz que a enunciação das regras depende do fato de que a finalidade buscada seja a eficácia máxima de troca de informação e se d everia estendê-la. ou seja. Gordon. Em certas condições de produção. sem a intervenção do contexto). corresponderão a certas expectativas. preservando o sentido literal. Nesses autores a noção de inferência é central: toma-se a noção de i ferência relativa a uma classe de contextos e se juntam postulados de conversação para obter implicações de conversação pertinentes para uma classe de contexto s. Searle relativiza o sentido literal . Daí incluírem essa rel ação nas regras de transderivação: La implica conversacionalmente LI. ele mostra que a introdução das "suposições prévias" não afeta o princípio da exprimabilidade. nem a existencia do sentido literal (embora o relativize) e nem tampouco perturba a relação entre sentido literal de um lado e. Por outro lado. determinando a di stribuição dos morfemas. para eles. que dependem do sentido transmitido das frases (e não do sentido literal).sentido da enunciação). as particulari zadas e as generalizadas e mostra como as generalizadas são difíceis de ser distingu idas das convencionais (que são interpretadas apenas a partir do sentido convencional. Há. as condições de verdade da frase variarão segundo as variações dessas suposições. ele diz que o que acontece em rel . Dizem ainda que há regras de gramática. Em Lakoff e Gordon.de um outro tipo de contexto. de um lado. então. etc. Essas suposições introduzem o conhecimento de mundo. ou sentido primeiro e sentido inferido conversacionalment e. as supos ições prévias e. sua exis tência . esses postulados devem fazer parte da teoria da gramática. sendo dado o conteúdo literal do enunciado e o contexto no qual é emitido". Eles falam em sentido normal e senti do transmitido diferente. esse autor distingue.considerando como Constitutivo desse sentido uma espécie de contexto que ele chama de "suposições prévias". postulados de conver sação que determinam o sentido que um enunciado transmite. do outro. de seu ponto de vista. temos a inferência de atos de fala através de postulados que agem sobre os sentidos e os contextos. na atribuição de sentido feita pelo interlocutor. então. isto é. Generalizando. a certas presunções. "regras particulares. de outro. ele continua distinguindo.A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 153 abranger fins gerais como o desejo de influenciar ou orientar os outros. o próprio Grice coloca os limites do espaço das máximas que formula. Isto é. o metafórico. nas implicaturas conversacionais. entretanto. Essa diferença se mantém porque ele continua distinguindo a inter 1 1 1 i 1 154 ENI PULCINELLI ORLANDI ferência dessa espécie de contexto . as implicaturas e a distinção entre atos de fala diretos e indiretos. o contexto de enunciação por um locutor (sentido literal t. e esse é um aspecto que nos interessa bastante.resguardando. No entanto. Trata-se de um uso de precisões mais ou menos apropriadas qu e. a ironia. Resta ainda a observar a respeito de Lakoff e Gordon que. Como a noção de sentido literal se aplica relativamente a um conjunto de suposições prévias.as suposições prévias . se efetua sobre o fundo de suposições que não são e. depois.e Searle cita o exemplo da percepção . as formulações de regras desse tipo têm como referencia o trabalho de Grice. ou melhor. já que há uma pragmática ao nível da fra se. Inicialmente. isto é. "primeiro extrai certos elementos com a ajuda dos quais constrói. E há uma hierarquia: não se faz intervir ao mesmo tempo todos os c omponentes da situação. Mantém também a distinção entre ato de fala primitivo e derivado. sobre este. 1979). são normas impostas pela coletividade lingüística ao ato de enunciação. Mais ainda.depende m dessas suposições. um primeiro sentido que. 0 recurso às leis serve para isolar as pressuposições primitivas (já que podem existir subentendidas). podemos dizer que a função metodológica das regras conversacionais é a seguinte: dados um sentido literal e um contexto. isto é. "aspectos puramente visuais da experiência não produzirão um conjunto de condições de satisfação senão sobre o fu de um conjunto de suposições prévias que não fazem elas mesmas parte da experiência visual" (J. segundo Ducro t. engendram um sentid o segundo" (Ducrot. podemos colocar as observações que derivam do fato de que as r .sobre o sentido literal . é mostrar como esta pragmática virtual se realiza e se diversifica segundo a situação de enunciação. depois faz agir. por exemplo.ação às condições de verdade (frases indicativas) também ocorre com as condições de obediência (frases imperativas) e condições de realização (frases optativas): há suposiçõe variação para todos esses casos. então. outros componentes que. variações de sentid o. pode-se determinar através da regra a variação de sentido. ou seja. sentido literal (instanciação referencial e argumentativa que produz um primeiro esb oço de sentido) e variações ou efeitos de sentido. A representação. regulando a ação dos contextos. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 155 As realidades sernanticas (significação e sentido literal) anteriores à ação das leis de d iscurso m e antêm já indicações relativas ao que se pode fazer quando se cumpre a enunciação. já há a inclusão de um tipo de contexto no sentido literal. nesses autores. Searle. tal qual para Searle. na primeira. As leis regulam a ação das situações sobre o lingüístico. De maneira geral. Isto é. Ducrot distingue significação (com as instruções). é a pragmática integrada. não há meio de eliminar essa dependência do sentido literal do contexto porque outras formas não convencionais de intencionalidade das quais depende o sentido literal . também o tomaremos como referencia em relação às crít icas.derivando do sentido literal as. são normativas. Essa função é interpretativa. junto às leis de discurso. mostrando que o contexto age duas vezes. no caso da percepção. segundo essas colocações. Nessa segunda vez é que se torna necessário o apelo às leis de discurso que. a de derivar do sentido literal as variações de sentido. desempenha o papel de sentido literal. em geral. 0 papel das leis. POR UMA RETõRICA INTEGRADA 1 Como as diferentes elaborações de regras conversacionais tem. como origem. 1979). as máximas de Grice. pela especificação da significação. em seguid a a essa escolha. não podem ser representadas como parte da representação (conteúdo semantico da frase) ou como pressuposições desta porque a s suposições são em número indefinido e toda tentativa de representá-las dá lugar a novas suposições. ao constituir o sentido literal e. na maior parte dos casos. Quer dizer. o contexto incide uma s egunda vez . as suposições prévias são fundamentais e onipresentes. para Ducrot. Para Ducrot. Outros. Além dess as. diríamos. Gostaríamos de. Todas essas críticas têm sua razão e contribuem em alguma coisa para a melhor compreensão da linguagem em ato. Outros discutem o fato de serem as máx imas normativas e não constitutivas (F. Keenan. dizendo. a sustentação do princípio não poderia ser a informação. Uma primeira observação se refere ao fato de que as regras se fundam na natu reza informativa da linguagem. mas sim atribuído. partindo dos tropeços dos quais falamos no início des te trabalho. fazer algumas observações a respeito das regras. Ainda que se alargue e se considere a argumentação (como em Ducrot) ou a linguagem como ato (como em Searle). segundo o que p ensamos. haveria as críticas que consideram que as máximas estariam subsumidas pela máxima da relação (D. incorporando. segundo nossa perspectiva. Assim como.as. além disso. pelo jogo da antecipação. criticam o princípio cooperativo avaliando sua dimensão sociológica. Além disso. pela ilusão subjetiva do falante sabemos que os sentidos produzidos não nascem no locutor. como ele se sustenta n a concepção de que o fundamental é a informação. o que significa que a ação do locutor também inclui atribuição de sentido. não é aceito mas reconhecido.m o problema da variação das regras como inerente ao funcionamento da linguagem. Wilson e D. Uma outra forma de critica r as máximas é dizer que elas ficam só em 156 1 i i i ENI PULCINELLI ORLANDI torno dos implícitos e que elas deveriam servir também para explicar como é determinad o o explícito. 1979). mas sim o afrontamento. 0. Flahault. Ora. colocam que há um certo tipo de A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 157 . pela antecipação. ainda. em geral. esses autores. Sperber. 1976). mesmo quando se diz 11 sentido atribuído" se o faz como se houvesse uma distinção estrita na relação falante-ouvinte: o f alante produz sentido e o ouvinte atribui. na aplic ação das regras. Em relação ao princípio cooperativo de Grice. nesse sentido. sabemos que não é assim que as coisas se passam e. procuraremos fazer observações que coloque. se privilegia a informação na medida em que se opera com a literariedad e. nós o deslocaríamos. que. No entanto. a partir de certo mo mento. não é possível dizer que há um saber partilhado. inicialmente. então. Além disso o propósito em um troca de fala. 1979). o reconhecimento pela interação (a conjuntura da interlocução). se pensadas em relação a diferentes culturas. É na dinâmica das atribui que se dá a troca de fala. Todos os autores a que nos referimos colocam que o processo de interpret ação dos enunciados depende de fatores tais como: Sentido literal Contexto Regras conversacionais 11 Pelo que Pudemos observar.egras seriam prototípicas e. que. ainda assim. haveria uma variação a que estariam sujeitas (E. 1979). ou derivar o sentido. 0 que nos le va. conseqüentemente. isto é. então. como distinguir as suposições prévias. como a palavra necessidade. a relação com a situação que estabelec e aquilo que será o explícito e o implícito. com o qual os efeitos das máximas devem estar de acordo. pragmática e retórica. discutir a natureza do contexto que é considerado pelos autores. está-se desvelando. não é um dado definitivo aquilo que é contexto-1 e contexto-2. ou as instanciações referenciais e' arg umentativas. uma vez que estes não seriam fixos como tais. da ação de interlocução. as regras conversacionais permitiriam calcular. Paralelamente. quando se diz: o que você esta querendo dizer com isso? Dessa forma. dois tipos de contexto que são considerados n a interpretação dos sentidos (dizemos interpretação e não constituição. as leis ou as regras conversacionais aparecem como instru mentos de derivação e não de constituição de sentidos. Debrun. à ideologia. Ou. o jogo de explícitos e implícitos faz parte do confronto. é o centro mesmo da noção de regras conversacionais que perde sua função metodológica. Se considero qualquer espécie de contexto como constitutiva do sentido. uma vez que se considere alguma espéci e de contexto como constitutiva (sejam as suposições prévias. Rest a-nos. E aí entra nossa proposta. É o uso. uma vez que tratam de derivação de sentido): o conte xto-1 para Ducrot e Searle e o contexto-2 para todos esses autores. e para Searle este contexto é c onstituído pelas suposições prévias. Há. a implicitação pode ser a mesma para os interlocutores ou pode ser disputada na própria interlocuçãoÉ isso que se passa. ou Seja. que representa o contexto amplo. Em geral. Paralelamente. na conversa. pois é assim que trabalham os autores. Então. a perguntar como distinguir o que elas representam em termos de bom-senso e os seus limites em relação ao senso comum (Grams158 ENI PULCINELLI ORLANDI i i ci. se apago os limites entre sentido literal e derivações ou efe itos de sentido. para Ducrot. como estabelecer teoricamente os limites do contexto que é relevante para a significação. dito de outra forma. fazendo agora observações que dizem respeito mais de perto aos objetivo s desse trabalho. tratar-se-ia de dar conta do jogo entre implícito e explícito.contexto que é suplementar e não constitutivo. acontece o mesmo com o princípio cooperativo. efeitos de sentido. 0 contexto-1 é. 1966. isto é. a esses contextos poderíamos chamar contextos pragmáticos. Um exemplo disso pode ser observado na dificuldade que tem Grice em distingu ir implicatura convencional e implicatura conversacional generalizada. como fica a distinção entre implícito e explícito? Não se trataria mais de dar conta do implícito. ou. ou interpretar.como o demonstramos no item " Sentido literal e efei tos de sentido: uma questão da história" a existencia do sentido literal do qual derivam os efeitos de sentido. 0 segundo contexto é o contexto retOrico (do níveida enu nciação). pode acontecer de tal forma que X pode implicitar em X' o que Z explicita em V e vice-versa. o jogo entre o explícito e o implícito. se não distingo sentido literal e efeitos de sentido. . aquilo que é implicitado ou explicitado dependeria do contexto. seja a pragmática integrada) fica difícil delimitar a separação entre um e outro tipo de contex to. passaremos a falar sobre o problema da consideração do sentido literal e do contexto. Assim. já que consideramos que a palavra tem tantos sentidos quantos são os con textos do seu emprego. Isto permite manter a distinção: Sentido literal/ /derivado. Se não consideramos . dado o contexto retórico. e. De uma forma geral. em relação às suposiçõesWévias. e dita por Z numa situação V. Na interlocução. o responsável pela pragmática integrada. indireto. Uma forma lingüística. dita por X numa situação X'. pelo que pudemos entender. então. de outros contextos? Eu diria que essa dificuldade de distinção nasce da ação corrosiva da noção de contexto. de outr a forma. são tres: polêmico. aqui. tal como os formula Searle (J. seria não distinguir estritamente as dimensões semântica. a questão da na tureza das suposições prévias e da literariedade. E como é a relação entre os dois que os delimita. isto é. podemos dizer que todo explícito determina implícitos e vic e-versaOutra conseqüência dessa nossa proposta.) em qualquer mundo? Retorna. é qu e fica perturbada a relação entre atos de fala diretos e indiretos (ou derivados). Se os sentidos são múltiplos não há derivação de sentidos. A forma de fazer isso é através da noção de tipo. a seguir. algumas observações a respeito da relação da tipologia com os atos de fala e com as regras conversacionais. como vemos. fazer um estudo dos atos na perspectiva da teoria dos tipos. Caracterizamos a tipologia incorporando a noção de modo de ação. ou seja. Dadas certas condições. a noção de tipo absorve a de contexto e polissemia. Entre os tipos. consid eramos como a instituição do sentido dominante. o problema é que a sua delimi tação se dá na interlocução e no contexto. Cada um deles constitui o sentido das formas lingüísticas. em relação às regras conve rsacionais. ou seja. mas também o contexto-2 (ou retórico). Uso uma forma procurando configurar um tipo (um modo de interação) e porque procuro constituir esse modo de ínteração. ou a natureza. 0 que. proporíamos. o tipo especifica a ação do contexto sem no entanto excluir elementos importantes da interlocução. tal como as regras. etc. A questão que coloca o problema dessa relação entre tipos e atos é a seguinte: u ma ordem (uma promessa. ou as formas de interaçâo. Consideramos então que não só o contexto-1 (ou pragmático) é que deve ser levado e m conta. do nosso ponto de vista. uma vez que o discurso lúdico. a forma passa a ter o sentido que o tipo pode nela constituir. aquilo que é implícito e o que é explícito. pragmática e retórica. p odemos dizer que a proposta da tipologia coloca duas possibilidades. um espaço teórico diferente. o estabelecimento dos tipos especificaria as condições de significação de tal maneira que ficaria estabelecido como seriam observadas as condições de realização dos atos. Não é por acaso que. nos referimos ao discurso lúdico. Os modos de ação. pois ele subsume a noção de contexto mais amplamente. do contexto qu e é constitutivo da linguagem. ta l como é caracterizado. "literal") delimita-se. Em relação aos atos de fala. tem de ser referida ao que. Faremos. A outra possibilidade é condicio nar os atos à teoria dos tipos. segundo o que propusemos na tipolog ia que estabelecemos. ação que é interação entre locutores e que tenha características específicas ue se comunique com as ações sociais em geral. Searle. o que pode haver é a stituição de um deles como dominante. desloca a noção de literariedade. ao contrário. em que um sentido se coloca como dominante (legítimo. Dessa forma. a retórica integrada. isto é. para questionar a natureza da relação entre a tipologia e o s atos. lúdico e autoritário. assim. constituindo. etc.Não negamos que existam o implícito e o explícito. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO PRINCIPIOS E CONDIÇOES DE SIGNIFICAÇÃO 159 Toda essa reflexão tem a ver com o estatuto. isto é. ele funciona realmente .) é uma ordem 160 ENI PULCINELLI ORLANDI (uma promessa. na e pela i nterlocução. no item "Sentido literal e efeitos de sentido: uma questão da história". Uma delas é a de que a concepção de ato de fala não inclui o lúdico. a de integrar o contexto retórico. 1972). Nessa medida. e uma brincadeira). Os tipos de discurso é que fazem variar essas condições de significação. Assim. uma vez estabelecido.autoritário. no entanto. como dissemos anteriormente. Exemplo: discurso polêmico . e não s. da qualidade. As máximas da quantidade. elas perdem su a importância. Isto é. de tal forma que importa o como estas se articulam para a caracterização da configuração do discurso. dado o é porque é do discurso pedagógico em que não há razões de fato. é um discurso para o qual não é relevante a verdade ou falsidade. Em relação a regras conversacionais. Logo.conversa ou aula. torna-se metodologicamente inoperante o princípio cooperativo. Podemos especificar. além dis so. pelo processo da metacomunicaçâo. se manter somente o que Grice coloca na máxima da relação: a relevancia. Daí. no texto enquanto totalidade. pelo tipo de discurso que se contrata. na sua esfera. oral ou escrito etc. a relevancia. Uma vez que se aponta como tal. para nós. jurídico. Passaremos a enumerá-los de acordo com o que desenvolvemos nesse trabalho. lúdico ou polemico -. Há. na relação de interação que ele estabelece. A relevancia se faz no texto enquanto este é a unidade. Em suma. embora possam aparecer ocasionalmente como requisitos especificados pela relevância na consideração da significação. etc. teórico. etc. uma variação interna que se mostra em subunidades que são as seqÜências. éordenar? Essas nossas considerações tem a ver com o que dissemos acima sobre a difere nça entre os tipos e os atos enquanto modos de ação. importando. Exemplo: brincar de ordenar. do modo.como contraponto e representa a pedra de toque em relação às funções da linguagem. ci entífico. a noção de recorte (que. em linguagem. as dif erentes situações de discurso. Por exemplo. toma o lugar metodológico das regras conversacionais. o discurso se aponta como lúdico (isso é um jogo. como a noção de tipo é capaz de instaurar o escopo da relevância e. . como o conceito de interação é que se coloca como fundamento. a questão da relevarícia. Resta ainda observar que há articulação entre as diferentes tipologias. Os tipos estabelecem o quadro de relevancia para o discurso. como as seqüências se organizam no todo do qual são partes. se estabelece. aquilo que vai serpertínente. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO o 161 Cada tipo de discurso estabelece a relevancia de fatores significativos de maneira específica. em nossa perspectiva. condições de obediência (para frase imperativa) e con dições de satisfação (para frase optativa). o que podemos concluir é o seguinte: quan do na relação de interlocução se negocia o modo de interação . E. ele desloca a relação referenci al se a sua relação for com o mundo real ou um mundo possível. o lúdico não joga necessariamente com a oposição verdadeiro ou falso. a noção de tipo estabelece a relevância e é através da relevancia que se estabelecem as condições de significação do texto. a totalidade que organiza os recortes. creio que o melhor em relação à sistematização do uso é se falar em condições de significação do discurso. etc. Tanto a noção de tipo corno a de relevancia podem-se aplicar às seqüências. como dissemos. Isso se dá porque. enquant o discurso autoritário. o discurso pedagógico. Então. ou direção do discurso também é determinado pelo tipo. desloca a de segmentação) é a operação que representa a maneira de instaurar a pertinencia. embora arie segundo o tipo de discurso. poi s há nele um outro espaço possível: o do fingir ou enganar. algun s princípios gerais que conduziram nossa reflexão sobre a função das regras e as condições de significação que derivam desses princípios. não se mantem com o mesmo papel teórico que desempenham na teoria de Grice. além do tipo (enquanto atividade estruturante). como o propósito. político. se mantém. Porque o lúdico desloca a relação referencial e pode modificar as condições de verdade (para frase indicativa). Assim. lúdico e autoritário tem uma generalidade tal que. Pela versão forte. H. Civilização Brasileira. gostaríamos de dizer que a função metodológica da tipologia que e stabelecemos pode ser interpretada em sua versão forte ou em sua versão fraca. 0.-Gramsci: 0 Porquê do Bom-Senso". 1976. mantics. a relação do implícito e do explícito. nt et Perspectives A Propos de I'Analyse Automatique du Discours". Gallimard. Para terminar.Analyse Automatique du Discours. M. 1979. . movimento 162 ENI PULCINELLI ORLANDI t 1 1 É i~ entre o lingüístico e o discursivo. em Çommunications. . Pela versão fraca.polêmico. n? 1. 73-79. pp."Le Fonctionnement de Ia Parele". 1975. n? Syntax and Se Language in S "Mises au Poi em Langages."Logic and Conversation". Benveniste. 41-58. . Pecheux. E. 21-33. n? 2. Se observarmos bem o que foi enumerado. P. 1976). n? 30. G. Langages. e Lakoff. o texto enquanto unidade de significação se constitui na interlocução. 1973. F. São Paulo. . 1 Ducrot. p p. Paris. há movimento entre as formas da linguagem que s e sedimentam e o processo de produção da linguagem. Rio de Janeiro."The Universality of Conversational Polulates". Keenan. A. . a relação do texto textos possíveis naquele contexto. diríamos que há sempr necessidade de uma tipologia na qual se inscrevam os princípios e as condições de significação para o discurso e a tipologia que estabelecemos seria uma d as tipologias possíveis. pp. vol. determinam as condições de significação para qualquer discurso. Paris. Ed. 39-51. diríamos que esses tipos de discurso . Debrun. ed. . em seu nível de generalização. Dunod. . L. 32-54.Princípios: os contextos são constitutivos do discurso. E. em Manuscrito III. 0. 111.social enquanto capaz de refletir o movimento entre o lingüístico e o discursivo. em Psychiatric Research Repo rts."Postulats de Conversation". em Langue française. 1974 (Problema s de Lingüística Geral. quando esta é definida como modo de ação. Peter Cole e Jerry. de suas condições de produção. ."Play Signals and Meta-Comunication"."Les Lois du Discours". . Morgan.Problèmes de Linguístique Générale II. a relação de forças.Concepção Dialética da História. n9 5. percebemos que constitui o que s e chama condições de produção de um discurso. D. a antecipação. M. para cada texto. Condições de significação: o contexto histórico. . . 1969. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 163 Grice. 1979. BIBLIOGRAFIA Bateson. não há um sentido centra l definido previamente e sentidos marginais. n? 30. a relação de dominância de um sentido sobre os outros possíveis. pp . Gordon. podemos dizer que as condições de significação são a especificação. partindo de certos princípios. G. Flahault. 1955. pp. em ociety. 67-80. pp. n? 42. 1 966. em Speech Acts. EDUSP/Cia. a informação não é a única nem a mais importante função d guagem. Editora Nacional. outubro/1979. Gramsci. a relação de sentidos. Searle. "Le Sens Litt6ral". qual é a relação entre a metalinguagern e seu objeto.é o de que se trata de uma precisão que se deve estabelecer sobr e suas próprias bases e não a partir de outras metalinguagens. F. No entanto. Paris.37. em lingüística. nela. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO Uma questão da leitura: a noção de sujeito e a identidade do leitor* INTRODUÇÃO 0 propósito deste estudo é sugerir. n? 30. Negando-se a ser uma análise de conteúdo e se propondo como uma lingüística . o uso de cada uma terá conseqüencias específicas importantes. imagem. .são ainda bastante nebulosas. observados pela análise de discurso. acreditamos que a análise de discurso pode ser vista como uma forma de conhecimento da linguagem. . Que uns prefiram uma metalinguagem a outra é natural.)". Hermann. a história:---essasteses regulam as metodologias de descrição e dão um sentido aos resultados que produzem".5 "cientista" no rigor estrito da palavra.. mais exatamente de prática científica na descrição de seu objeto.Les Actes de Langage.a análise de discurso está estabelecendo sua metodologia. Wilson. 16. . ao contrário das teorias clássica s da linguagem. São Paulo."Remarques sur l'Interpr6tation des Pnonc6s selon Pau l Grice". 1975. texto. se há um sent ido em se dizer que a precisão de conceitos é necessária . Diríamos mesmo q ue certas noções . sabemos. Nueva Visi6 n. pp. 1979) que diz que a análise de discurso "está partida e ntre duas tentações contraditórias: um ideal científico. 1979. e Sperber. Dessa forma. determinações h istóricas. 1972. Cremos mesmo que a operacionalização de conceitos na análise de discurso não poderá ter a rigidez de outros domínios da lingüística. aos que trabalham com leitura. 7-80. o discurso ( .El Signo Ideologico y la Filosofia del Lenguaje. V. e uma apreensão totalizante na definição de se objeto. Também não cremos que algum analista de discurso se pretenda M Texto publicado em Cadernos 14. D. ) Ora. . que devem ser levados em conta na reflexão sobre o processo da leitura. Desde Saussure. ete. PUC. sociais. a linguagem não é um conceito mas uma noção fluida subsumindo um nevoeiro de fatos e causalidades (enunciação. Não cremos que este autor esteja muito longe da verdade. ainda segundo esse mesmo autor. J. 34-47. a prática tenha caminhado mais rápido que a teoria. dadas as propriedades de seu objeto - . isto é. Porém. Buenos Aires.. formação discursiva. pp. essas colagens e bricolages são possíveis por causa de um certo número de teses (implícitas) s obre a língua. 80-93. Voloshinov. porque essa outra linguagem (precisa) pode ser a li nguagem do mesmo. Ainda que. N. a falta de precisão de certos conceitos.e acreditamos nessa necessidade . E na prática das análises que esses con ceitos adquirem nitidez e se colocam criticamente em relação à constituição da teoria. 1976. Daí a afirmação de que a análise de discurso é uma "colagern teórica" (dado o empréstimo selvagem de noções a corpos teóricos heterogêneos e uma "bricolage prática". pp. discurso. em Langue FranCaise. etc. 1979. D.tais como as de sujeito. a enunciação. 1982.' Disto tudo resulta. E é também na prática que a análise de discurso acaba revelando aspectos da l inguagem que não seriam conhecidos através de outras perspectivas. n? 42. Há um autor (Marandin. em Communications. 0 esforço da precisão é muito necessário. que há cert os aspectos da linguagem. a nosso ver.di stinguindo-se assim das práticas de análise de texto . Mas aí surge um primeiro problema: preci sar conceitos não significa estabelecer uma outra linguagem que não a que a análise de discurso se propõe. mas. a da lingüística imanente e que não incluiu o discursivo. ou seja. nas teorias formais. o objeto A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 167 discursivo e o processo discursivo e a maneira de se passar de um a outro através de diferentes análises (Pêcheux. o ensaio. tal como se apresenta hoje. Não é sem razão que temos propost o. aceitar que há coisas na linguagem que não são tão "claras e. há propostas de modelos e de teorias que se procuram fundamentar. Assim. 166 ENI PULCINELLI ORLANDI com os conceitos. quanto ao aspecto efetivo dos resultados de análise. então. quando se fala de certas definições e conceitos utilizados em análise de discurso. provisoriamente. porque ele é realmente outra forma de ver a linguagem. nem por isso se deixam de ter sistematizações: há princípios teóricos e metodológico s muito. pode muitas vezes ser apenas um uso polêmico da l inguagem e. como. às vezes. Por exemplo. e essa distinção é fundamental para a análise de discurso. as suas condições de produção. o de se considerar a distinção entre a superfície lingüística. o ponto de vista da análise de discurso revela novas propriedades do objeto que se analisa. 0 estatuto da lingüística (o de aplicação). então. antes. como.em que entram em consideração fatores como o contexto. etc. diríamos que a análise de discurso. se lhe falta uma teoria. por exemplo. Daí resultam seu caráter exploratório. Não há precisão em abstrato. as condições de produção. proc . 0 estranhamento. E o que se pode chamar de metafórico. com r egularidades e não regras. 1975). pois. já é inegável que a perspectiva da análise de discurso tem revelado aspectos da linguagem que não seriam passíveis de reflexão e sistematização em outras perspectivas. 0 que nos leva a essas afirmações é o fato de considerarmos que há uma distinção radical entre a descrição de uma língua . Ou seja. por isso. é complexo e imp lica uma série de reformulações. que o discurso da análise de discurso não deve ser tal que rep roduza o discurso da lingüística clássica. externo. de se procurar apreender a singularidade sem perder de vista a possibilidade de se construir a sua generalidade. reavaliações e deslocamentos de conceitos operatórios. pela língua. intencional e justamente sujeito a discussões. p ode ser vista como uma forma de conhecimento da linguagem que procura constituir sua metodologia e suas técnicas. Mas. Depende do "lugar" de que se olha. E. Não é sem motivo que preferimos.que visa for necer as regras que permitem construir toda frase da lírigna . deverá aver uma maior flexibilidade na forma como se opera (1) Não estamos aqui negando a dinâmica entre a teoria e prática em outros domínios dos estudos da linguagem. essa precisão deve ter um lugar certo. Resumindo. 0 objetivo externo é procurar dar alguma contribuição para a reflexão sobre a leitura. 0 objetivo interno é buscar tornar mais claras certas noções e explic itar certos processos que podem ser observados pela análise de discurso: as noções são as de leitor e sujeito. há procedimentos já claramente deli dos. na constituição da linguagem. por exemplo. nos colocamos dois objetivos. isto é. sua relativa imp recisão e a falta de um modelo acabado de análise. Is to é.cujo objeto é descrever uma seqüencia real única não repetível (instância h istórica da linguagem). faz parte. estamos pensando. lidar-se-á com instruções e não procedimentos estritos. um que chamaríamos de interno e outro . bem assentados. o de se levar em conta. etc. no processo pre dominante de uma ou outra em momentos diferentes da evolução de cada ciência ou disciplina. não nos parece que seria p ossível distinguir um discurso de outro. Não é de qualquer precisão que necessita a análise de discurso. distintas". no propósito de se chegar a formulações mais definidas. Trata-se. Diríamos. na análise de discurso.e a descrição de um discurso . o processo é o da interação que constitui a leitura. o que lhe dá um caráter não acabado. ou seja. não se pode distinguir estritamente entre condições de produção e condições de recepção do discurso. Daí haver uma característica indefinível no texto que só pode ser apreendida se levarmos em conta sua totalidade. podemos ainda observar que o texto não é uma unidade com. meio e fim. . enquanto objeto teorico. segundo o ponto de vista que adotamos. o texto tem relação com a situação e m outros textos.esso esse fundado na noção de texto. Sua unidade é a unidade do/no texto. o centro comum que se faz no processo de interação entre falante e ouvinte. consideramos que o texto é o lugar. Do ponto de vista de suas condições de produção. a de que a leitura é produzida. considerando que estas condições incluem locutor e receptor. no domínio dos limites do texto. Observando-se a dinâmica de interação que existe entre falante e ouvinte sob a forma da bipolaridade contraditória querendo com isso dizer que de um dos pólos (o do autor) nos colocamos no lugar do outro (o do leitor) e vice-versa . Acreditamos que é a isso que se refere Pêcheux (1975) quando f ala no " efeito. as suas condições de produção. se poder falar. Enquanto objeto empiriCo (superfície lingüística). em condições de produção da leitura do texto. assim. na escrita já está inscrito o leitor e. autor e leitor. Preferimos falar.leitor". que. o momento da escrita de um texto e o momento de sua leitura se jam distintos. Não vamos. pois. então. Daí. também não está em um ou outro segmento isolado em que se pode dividir o texto.l _ e ca a um dos interlocutores. em si.cons ideradas suas condições de realizaçao . Tomando a definição pragmática que temos proposto para texto.e procurando caracterizá-lo em termos de processo de interação. o texto não é um objeto aca bado. a análise de discurs o lhe devolve sua incompletude. sua unida de. Isto é. o texto pode ser um objeto acabado (um produto) com começo. 0 sentido do texto não está em nenhum dos in terlocutores especificamente. pensando-se o texto como unidade complexa de significação . de fato. embora. Afirmaríamos. tal como o compreendemos. em geral. plet a. enquanto objeto empírico. . No entanto. ALGUNS PRINCIPIOS E NOÇõES 1 1 De direito. sem que isto pareça estranho. o leitor interage com o autor do texto. na leitura. a análise de discurso reinstala. é parcial.po demos 168 ENI PULCINELLI ORLANDI concluir que o domí i d ri 1 ~ é i i i i ~ 1. mas sim na unidade a partir da qual eles se organizam. Mais ainda. pois sua natureza é intervalar. em condições de produção de um texto. está no espaço discursivo dos interlocutores. Sua unidade não se faz nem pela soma de interlocutores nem pela soma de frases. Nossa perspectiva é. . formais. como recuperar o processo da leit ura? Sendo isto feito com a condição de se ver na leitura não só a aplicação de uma técnica mas. ou ecto . então. pensando-se as condições de produção da pode-se e perguntar se. interlocu podemos privilegiar. nesse trabalho.social. Assim. Julgamento A. é se a uma relelação entre bem formado a nível gramatical e bem . Halliday e Hasan reconhecem tamcessiâdade de se estudar a consistencia de registro. Entretant(to.acteririzam o texto como sendo coerente sob esses dois s. A LI LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO ÁRACTTERIZAÇÃO DA LEGIBILIDADE 169 niodo coic)mo se ve um texto. em uma análise que busca o movimento. contexto histórico. itos automes tem-se dedicado a estudar a capacidade de leide um tex~xto. isto acarretaria também duas possibilino limitite: compreende-selnão se compreende o texto. E o que faremos e. Indo mais além. por uma questão prática de trabalho. Igamento ~ de gramaticalidade é feito sobre sentenças (com caraleterísisticas próprias) e é do nível gramatical.. Resumiríamos essa variação arnentos z acerca da legibilidade do texto em uma oposição o texto:) é bem e scrito/o texto não e bem escrito. etc. Isto é. deixando-se de lado sua avaliação ente eRstética e considerando-se sua legibilidade. outros tOres .. sua legibilidade. já poderíamos responder que não. procurla remos refletir sobre a relação entre interlocutores como um dos fatores que constitu em o processo da leitura. um confronto de interlocução.to de texto.texto entram eleme tos menos definíveis do o são as m~iarcas. pelo que viemos dio a respeit(. pois julgamentO:os de natureza diferente. preferentemente. ou seja.' coer-rente com relação ao contexto de situação (consis170 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCI ONAMENTO 171 . a dinamica da interação constitutiva da linguagem. o que também poresumir. dizendo que a sentença pode ser considerada formadalilmai formada. podemos observar a instanciação da linguagem.to a nível 1 discursivo. 0 julgato que inci. ao se fazer esse julgamento. 0 que perguntamos. ara tratarir disso.situação. em função do uso adequado marcas forr-mais a nível de sentenças.r.falam retObilidade (distinta da inteligibilidade) do texto em sua ccoesão interna. não se pode m desconsiderar fatores como a boa ação de seientenças na cons tituição da legibilidade do texto. A questão que fazemos é: como o texto representa o que consid eramos ser o espaço discursivo? Ou seja. esse texto é e não e:entendi nada . Em relação às condições de produção .conmo Halliday e Hasan (1976) por exemplo . Ime diatamente. um de seus aspectos. examinan do a relação que se faz entre quem escreve (o autor) e quem lê (o leitor). pode sso assisim: esse texto é claro e entendi tudo.ide sobre o be m escrito é feito sobre o texto (com condições s de produção) e é do domínio do discurso. o julgamento que o diante e de um texto. leva-se nível do[o texto o julganiento do nível gramatical.entretanto. Em de resubitado.. explorar mais extensamente os aspectos do que podemo s chamar intertextualidade (relação do texto com outros textos) e implicitação (relação do dito com o não dito). Neste consider&am-se julgamentos como: esta sent ença é gramaramatic~cal (em referência à gramática) e sua extensão ellnão auceitável (fenomeno int itivo). sobre objetos diferentes. nisto que constituirá nosso recorte. esse texto é confuso e entendi um esse text(to é claro mas. dito de outra forma. deixando de lado. trabalho. fazendo maiores exigências ao seu uso é preciso se considerar. gostaríamos na da boa formação das sentenças. -lo mais ou pectiva pragmática. Já Osakabe (1977). fazendo considerações que levam em i conta a unidade de interlocução. que é o que define a substância do texto. os problemas encontrados trabalh o. um texto pode ter todos esses 1 reendido. da coe mesmo. em relação a um mesmo texto. cri ta. estudando o período. a não compreensão ou compreens do o não tem de ser. fica-se no texto como objeto de acrescentar que. e. trata de tres hipóteses de pesquisa princir X p ode achá-lo obscuro. de outro. Embora legib ilidade do texto em função de outros elementos que não reconhecendo a necessidade de se considerarem esses dois as apenas suas marcas formais explícitas Pectos. não dá para se analisar o próprio c ados pelos diferentes autores. a texto não apenas corno conseqüência direta e unilateral da es consistência de registro. Terceiro. no âmbito de conhecimento prévio do assunto". estudam a relegostaríamos de dizer que a legibilidade envolve outros elementos vancia da sinalização de tópicos do texto para a legibilidade do além da boa formação de sentenças. trata-se do texto como objeto acabado. Y achá-lo claro e Z achá pais: "primeiro. Halliday e Hasan (1976) dedicaram-se ao estudo da De nossa parte. Do elementos em sua forma optimal e não ser cornP do que deveria ao leitor. conseqüentemente. e a maneira de fazê-lo é tratar dos interlocutoresq sença do outro no em sua realização estariam. como característica da textualidade. Consideramos que todos esses elementos. Cremos que. têm sua importância e são neces processo de interação da leitura. e como 0 outro (o leitor) se repre senta no próprio processo da leitura. atribuída a ele.tente em registro) e coerente consigo mesmo (coeso). "um texto mal sinalizado dá menos rência. tão de tudo ou nada mas uma questão de graus. produto finito. de tal modo a favorecer um text o. tomado corno produto. Este é uni ponto que gostaríamos de firmar nesse a explicitação do raciocínio. o texto e com 0 autor. ao analisar a questão das 1 . Porém. a relação do leitor com incluem elementos como os tópicos discursivos. ligados a mecai i aprofundar um Pouco mais a questão da pre nismos discursivos de argumentação. gostaríamos de pensar a legibilidade de um coesão. Aí está um aspecto importante da legibilidade de zação das relações a serem estabelecidas. da coesão textual. ão3 text a legibilidade. Segundo este autor. Ou. como o de Perini (1980). o outro (o leitor) foi fixado. a partir da relação que se estabelece com a maneira como comum". também nesse nosso po nto de vista. na perspectiva da coesão e sários para a caracterização da legibilidade. Outros trabalhos. a legibilidade não é uma ques acabado. Assim. de um lado. a de que o período teria por função a organimenos claro. pois. através de uma persexempl o. então. necessariamente. Por Pécora (1977). que são colo o que ele significa. Assim. mas já se da legib ilidade. na reflexão sobre a re lação de interação que a leitura envolve. Segundo. em s i mesmo. as relações esta belecidas no interior do período seriam fornecidas pelo senso texto . não pode ela. certamente. da se~ N (2) Segundo Osakabe: " a argumentação constitui utU tipo d e racioguinte maneira: a) o que tem relevância para o leitor é a relação cínio. 0 que procuramos fazer acima. sucintamente. Há. dado o fato de que. Contexto. assim como as reflexões de Pécora sobre o período. esses são problemas que dizem respeito à relação do leitor com a situação que envolve a leitura. foi colocar algum critério para o estabelecimento de modos de leitura baseados na forma como o leitor se representa no processo de leitura. e como a progressão do texto não se faz por acúmulo mas também por retomadas. por exemplo. leitura. entre os lenômenos de inteligibilidade e ínterpretabilidade intenta assumir. distingue coesão (que é relativa a índi0 LEITOR E ALGUNS ASPECTOS DAS CONDIÇ ces. que a configuram. mas sim como textual. aquele em que considera mos o texto em sua unidade. não há o distanciamento necessário Para a leitura. a leitura comparativa). d) a relevancia é a da relação do texto com o leitor (seria a exp licitação do papel do leitor. considerado não enquanto contexto lingüístico. a compreensão engloba os dois fenômenos. e não apreende o sentido global do texto. isto é. sem os elementos que unificam o processo da leitura. totalidade que organiza suas partes. É isso que se dá quando o leit or lê palavra por palavra. E por isso ela pode aparecer em i qualquer texto produzido nesse tipo de língua. sendo um valor lógico'). b) a relevancia é a da relação do texto com outros textos (seria. por exemplo. o modo de leitura que responde à questão: "o que o autor quis dizer?"). dispensar um mínimo de (3) Preferimos falar em e exatidão lógica. no entanto. Se sua aparência lógica não i ~~ c omo Ralliday ompreensão para não distinguir exige um rigor matemático. Isso pelo próprio efeito que se pretende obter no ouvinte". no processo de leitura. um mínimo de pertinência entre o tipo de prova e a tese que se e Hasan (1976). de forma seletiva. c) a relevancia é a da relação do texto com seu referente (seria. aqui. embora estejam Uma primeira forma de abordagem da maneira corno 0 voltadas para aprodução do texto. que se realiza pela língua natural. ou seja. Gostaríamos de 1 acrescentar que. pode ser observada i isto é. ou se pergunta. Sem o contexto e a relação definida do leitor com a situação. vários modos de leitura e suas c orrespondentes estratégias. segundo nossa definição de i texto. de forma geral. no final de uma leitura: "o que é que devo entender diss o?". antecipar.õES provas de argumentação. Há um outro fator que pode ser considerado sob o aspecto com que o leitor representa sua relação com a situação e o contexto. por exemplo. há constituição permanente do que . sentença por sentença. procuramos estabelecer uma referencia para a sua seletividade. 172 ENI PULCINELLI ORLANDI do texto com o autor (seria. Segundo o que pensamos. a leitura que responde à questão:---oqu e o texto diz de x?"). que podem ser caracterizados. já nos permitem considerar a leitor s e representa. Segundo alguns autores' isso se dá porque sem uma distancia mínima o leitor não pode prever. isto é. Para nós. responr dendo à questão: "o que você entendeu?"). e o leitor perde o acesso ao sentido. o espaço discursivo não é linear. há vários modos de pelo fato de que a leitura é seletíva. Ist o é. Essa distinção. a marcas formais) e coerencia (que se refere à consistência DE PRODuÇÃO DA LEITURA de significado. começa o debate. " ão. em geral. (5) Este aspecto é trabalhado por Eduardo Guimarães. Esses outros fatores também tem seu papel na legibilidade. Há um interlocutor que é constituído no próprio ato da escrita. tee e. W Nesse mesmo Encontro. um pouco tardiamente. Colocamos esta nota. A relação entre o leitor virtual e o real pode ter uma maior ou menor distânci a.' dependendo da distancia entre o leitor real e o virtual deramos os diferentes tipos de discurso. essa sentada no VI Encontro Nacional de Lingüística. se constitui. 0 outro. se identifica. Assim. há um outro aspecto importante da representação do leitor no processo da leitura. e que na retórica. fatores discursivos. quando falamos de leitor real e virtual não estamos nos re ferindo ao problema da discordância ou concordância. podemos dizer que. podemos observar o jogo existente entre o leitor virtu al e o leitor real. A questão da compreensão não é só do nível da informação. "Tópico-C omentário e Argumentação na constituição do texto".' (4) Chegou-nos às mãos. Se pensamos a escrita como se constituindo na interação. isto é. do ponto de vista do autor. Haverá uma variação grande na relação entre autor. Mais amplamente. sua estratégia pode ter d uas direções: mudar o interlocutor ou mudar de interlocutor. na medida em que le. 174 ENI PULCINELLI ORLANDI do texto. A leitura é o momento crítico da constituição do texto. a não compreensão do texto se deve também ao fato de não se poder voltar atrás e re fazer percursos. uma forma dessa variação. em uma comunicação. Quando a distancia é tal que leva à r' 7. Nesse passo. porque achamos que este autor coloca uma direção interessante para a reflexão sobre a leitura. volvimento de estratégias de leitura na criança". 0 que. o 0.se diz e do que já foi dito. Angela Kleim an apresentou . desencadeiam o processo de significação do texto. aquele em que os interlocutores se identificam como interlocutores e. significa dizer que. em suma. '5~ ) "nsar'P 'o na rela o . que é o de pedir ao orador que se adapte ao seu au .. Isto. apreA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 173 assim. o leitor. Gostaríam var. de acordo com um princípio da teoria da retórica. A discordância ou concordan cia já se faz sobre um sentido reconhecido ou atribuído ao texto. um leitor const ituído (o leitor virtual) no texto. sem distancia não se pode apreender o texto em sua totalidade e sem a a preensão da totalidade não há acesso ao sentido do texto. na medida em que o interlocutor (o leitor real) já encontra um outro. mas quando falamos em leitor real e virtual estam os pensando no aspecto elementar do acesso ao sentido. A tensão. apesar de não termos indicações mais precisas. quando não há distancia suficiente. se representa. É un. podendo o leitor real coincidir ou não com o leitor virtual. de Daniel Coste (xerox). a ideologia. gostaríamos de dizer que. ao se constituírem como tais. o confronto existente é aquele que podemos observar quando perguntamos pelo interlocutor do te xto. é o momento privilegiado d a interação. um des*ses textos: "Lectures e t Linéarité".~~Z o . Faz e ar em conta o processo de interação. há ainda um aspecto retórico interessante a se observar: dizer-se que não se entendeu um texto. só pode haver mudança de auditório. Essa é a qualidade de sua identidade de leitor. mesmo na perspectiva pedagógica que se faz em relação a um aluno-padrão. havendo incompreensão. ou seja. não se usam estra tégias discursivas capazes de modificar as condições de produção de leitura do aluno para que ele chegue a se aproximar desse aluno-padrão. Quer dizer. Diante do interlo cutor real. pode significar que se está dizendo que o texto é obscuro ou mal escrito. tal classe. Especificando o que dissemos acima sobre a mudança de interlocutor. integra. 0 que. há do lado do leitor o princípio de levar em conta a disposição do autor. uma vez que a escola tende para a homogenei zação. tal curso. como o carac terizamos. Este discurso tem como interlocutor um aluno-tipo. é um discurso autoritário. porque distingue. mas que aqui fica apenas como sugestão e que representa um outro domínio em relação aos fatos que estamos aqui observando. atomiza. Em relação à outra possibilidade que é a de mudar o inter locutor. tal instituição. Do ponto de vista do leitor. ao marcar a identidade. com funcionamentos discursivo& que se A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 175 definem em um outro espaço que o propriamente lingüístico. Tem a ver com a consideração do discurso enquanto processo de interação. É o caso extremo de identificação ou exclusão. Nesse caso. diríamos que se trata de uma estratégia muito usada em discursos em que as pessoas "se reconhecem pela palavra-. A NOÇÃO DE SUJEITO: 0 AUTOR E 0 LEITOR i i 1 Gostaríamos de concluir (provisoriamente) este trabalho. é assim que o aluno se coloca no lugar do inter locutor desejado. nos leva a dizer que o discurso pedagógico não dá importancia à com preensão: ou o aluno já tem as condições favoráveis ou ele decora. ao mesmo tempo. ou com coesão. 1 Aí está um problema que se insere no domínio da legibilidade e que pouco tem a ver com sentenças bem ou mal formadas. repete. ou seja.ditório. Podemos refletir sobre isso a partir do discurso pedagógico. Esse é um acordo (provisório ou não) que faz parte do process o da leitura. Como o discurso pedagógico. queremos com isso dizer que se podem mudar as condi ções de produção da leitura. o discurso é feito ou para reproduzi-lo (se ele se aproxima do virtual) ou para transformá-lo (se ele dífere do leitor virtual). virtual. quando se é considerado um bom leitor. o discurso que tem o interlocutor já definidame nte delineado. porque esta . fazendo com que o aluno real e o virtual coincidam sem que se opere uma mudança nas condições de produção. Po r essa via poder-se-ia observar todo um aspecto de implícitos da relação de leitura. Há uma contradição inerente à noção de sujeito que vem da relação entre identidade e eridade e que se constituem mutuamente. e. ou seja. ele não leva em conta as condições de produção da leitura do aluno. em geral. Assim como diríamos. fazendo algumas c onsiderações a respeito da noção de sujeito. É um movimento que. em última instância. a imagem que se faz do aluno de tal idade. Tem a ver com a relação entre forimações discursivas e ideológicas. imita. em relação à noção de sujeito. dos textos. podemos dizer que 0 sujeito da linguagem não é um sujeito-em -si. De forma geral. ao mesmo tempo. Essa contraditoriedade é pensada na análise de discurso em dois lugares espe cialmente: a) pela ilusão do sujeito de que ele é a fonte de seu dizer quando na verdade o seu dizer nasce em outros. ) A ideologia aparece como um processo de 176 ENI PULCINELLI ORLANDI comunicação implícito que determina as práticas (discursivas e outras) dos indivíduos cons tituídos em sujeitos-. etc. b) pela relação existente entre a formação discu rsiva e a formação ideológica. cujas condições de possibilidade são sistematicamente articuladas sobre formações ideológicas". Essa modulação se faz em direção aopara quem do discurso e a contraditoriedade. não há apagamento na coijstituição do sujeito de tal modo que. essa contraditorieade deriva do fato de que há a interpelação do indivíduo em sujeito feita pela ideologia. Assim. ou seja. Segundo Slakta (1971). é partilhar. Seria interessante lembrar aqui o trabalho de Romualdo (1981). 0 que há é uma modulação do nosso discurso e da nossa identidade nas diferentes relações. em situações diferentes. como diz Maingueneau (1976): "o conceito de discurso despossui o sujeito falante de seu papel central para in tegrá-lo no funcionamento dos enunciados. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO . deslocamento es te que é apreendido pela própria noção de discurso. isto é. A questão que faríamos seria: o disc urso caboclo para o pesquisador é ainda o discurso caboclo? Suas características são diferentes do discurso caboclo para o caboclo (simetria) de tal forma que conf igurariam outro tipo de discurso? Do nosso ponto de vista. podem nos levar a algumas conseqüênc m vista da noção de autor e de leitor. diríamos que é o discurso caboclo para o pesquisador (ou para o branco). por causa da determinação soci l. é ser fora-de-si. é a seguinte: o sujeito é o mesmo e é diferente simultaneamente. isto é. para nos. Isto é. Ou seja. desapareça. mas tal como existe socialmente e.. "0 indivíduo concreto é constituído ao mesmo tempo como eu pela língua e interpelado como sujeito pela ideologia ( . Por isso. não é o indivíduo enquanto tal que se apropria da linguagem uma v ez que há uma forma social dessa apropriação. em termos de discurso. É ainda essa contraditoriedade que pode nos servir para compreendermos e r efutarmos a observação b. em relação ao autor. De um lado. ou.é sempre feita de uma relação. a apropriação da linguagem é um ato social. podemos fazer duas observações que representam o exagero para mais. ser na linguagem é ser-se estranho. Isso resulta no deslocamento da centralidade do sujeito. Essas afirmações... respectivamente. 0 caso de a pode ser exemplificado com o fato de que assumimos papéis e di scursos diferentes quando falamos com pessoas diferentes. Ambos os exageros são interpretações pessimistas: a) Há um sujeito para cada situação. também não mudamos completamente nosso discurso nem nos transformamos em outro. em que se an alisam relações discursivas assimétricas * 0 resultado da análise caracteriza o discurso caboclo falado para o pesquisador (assimetria). Ao contrário. há uma tensão c onstante nesta constituição: o sujeito de linguagem é ele mesmo e o complemento do outro. ser sujeito. tanto em a como em b está em causa a identidade do autor. e o exage ro para menos. não perdemos nossa identidade em cada relação de linguagem diferente. A relação de linguagem é interação. o que lhe é mais próprio. ou para o caboclo. mas é aind a o discurso caboclo. b) não há sujeito nenhum. então. etc. além disso. mas que não nos cabe explorar aqui. pela leitura. nem um sujeito absolu tamente dono de si. Na versão pessimista da interpretação da noção de sujeito. até leituras que permitem uma variação de sentidos de maneira bastante ampla. só o autor tem o domínio completo do que diz. estaríamos lidando com a posição de que só o autor tem domínio completo do que diz. pela consideração das condições de produção e pela definição de texto como c tituído pelo processo de interação. Há o exagero para menos. pelo leitor. o que deve trazer conseqüências fecundas para o estudo da leitura. Esse espaço de interlocução. Com isso poderíamos caracterizar a própria leitura como um discurso. essa 1-8 ENI PULCINELLI ORLANDI incOmpletude que faz parte da linguagem é fundamental para a leitura. A esse respeito podemos também observar que essa afirmação pode s er relativizada levando-se em conta o processo de interação que é constitutivo do discurso. temos desde o simples reconhecimento do que o autor quis diz er. Não se deve enrijece-la em nenhum dos pólos: nem no pólo individual.1 1 Resumiríamos essas objeções dizendo que a relatividade da noção de sujeito não é abso uta. a r elação existente entre paráfrase e polissemia se coloca como autolimitativa. 0 autor também é levado em conta e isso também faz parte das condições de prod ução de leitura. autoritário ou lúdico). Em relação a a diríamos que as leituras são múltiplas. como o lugar que os interlocutores e a e. Essas duas afirmações. na leitura o outro é o autor. tem a ver com a identidade do leitor . b) nenhuma leitura é boa . se pensarmos que o autor. Com respeito à relação entre'formação discursiva e forma ção ideológica. uma dá os limites da outra. Dessa f orma um texto pode significar mesmo o que não faz parte da intenção de significação de seu autor (ilusão discursiva do sujeito).que nesse caso seria a reprodução do que o autor qu is dizer. OBSERVAÇõES FINAIS Em suma. resta-nos especificar que. Ainda em relação ao domínio do autor sobre o texto. que também constituem interpretações pessimistas. necessariamente. Daí não se poder afirmar. o reconhecimento do sentido dado pelo autor . ou seja. Assim. Por outro lado. dependendo das di ferentes formas de interação estabelecidas (ou tipos de discurso como o polêmico. Seria ainda interessante notar que. pois cada leitor compreende de acordo com suas condições de produção da leitura. nem um sujeito totalmente determinado pelo que lhe vem de fora. de outros sentidos ao texto . na sua . i nverte-se a perspectiva do mesmo e do outro. isto é. 0 espaço da subjetividade na linguagem é tenso.é articulado.e a polissemia . podemos acrescentar que su a relatividade vem do fato de que o texto tem relação com outros textos e com as condições em que se produz. mas não são tais que qualquer ma é boa. 0 jogo entre a paráfrase . Há o exagero para mais: a) qualquer leitura é boa. Há uma relação de interação que regula as possibilidades de leitura. por extensão sobre o Processo de leitura.que seria a atribuição. tanto sobre a caracterização do autor com o a do leitor e. na relação do leitor com o texto. o mesmo pode ser observado em relação ao leitor. relativiza-se a noção de sujeito e isso tem conseqüências. nem no social. logo. especialmente. constitui sua escrita na relação com um interlocutor. segundo o que cremos. ou então a imposição de um sentido único que é atribuído pelo leitor ao texto (sem levar em conta seu autor). em relação à noção de sujeito. como tivemos ocasião de observar anteriormente. corno Pudemos notar. que coloca que nenhuma leitura é boa. 1 i i é 1 I~ i 1 1 A Produção da leitura e suas condições* 0 QUE É A LEITURA Já podemos considerar como um adquirido. talvez. Perini. Finalmente. Osakabe. isto é. J. a interação entre autor e leitor do texto está marcada por essa relação. M. 1971. . é constitutivo de seu discurso. Paris. D. certam ente. . e Hasan . Resta como perspectiva um estudo mais sistemático e aprofundado dos fatores que agrupamos sob a rubrica das condições de produção da leitu ra. Slakta. . 5 Pécora. Langages. Essai de Descrip tion du Discours Français sur Ia Chine".Cohesion in English. J. necessárias. K. xerox. Cadernos de Pesquisa.Analyse Autornatique du Discours."Esquisse d'une Théorie Lexico-Sérnantique: pour une analyse d'un texte politique (Cahiers de Doléances)-. Paris. M.1977. Fuchs.* mas. Halliday. 1981. uma vez que. F Maingueneau. 1979. Langages n? 23. D. a leitura é produ zida. A. Larousse. . então."Problèmes de l'Analyse du Discours. M. 1975. London. 1977. comunic ação apresentada no Encontro Internacional de Filosofia da Linguagem. . Dunod. na perspectiva da análise de discur . Ocupam numa formarão cr. 1976. o que vai constituir a com preensão do texto. Campinas. . . Fundação Carlos Chagas. numa proposta pragmática". A. xerox. Funda ção C arlos ê-hagas-."Assimetria no diálogo: relação entrevistador/entrevistado". concluir que são vários os fatores que devem ser l evados em conta em relação à legibilidade de um texto e que colocam as exigências do nível gramatical e do nível da coesão textual como. 1976. n? 37. Larousse. j 1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO BIBLIOGRAFIA Coste. constitui aquilo que eles significam.Initiation aux Méthodes de VAnalyse du Discours1 Ha chette. não suficientes."Mises au Point et Perspectives à Propos de L'Ana lyse Automatique du Discours". H. M. A. B."Tópicos Discursivos e a Legibilidade dos Textos". . a posição entre leitor e autor pode variar desde a maior harmonia até a maior incompatibilidade ideológica. UNICAMP."Provas de Argumentação". Ca P dernos de Pesquisa. pode-se. Assim. D.relação com a ideologia. . Romualdo. A. 1969. Paris. Langages n? 55. como vimos. M. . 1980. Longman. ."Lecture et Lin6arit6". Didier-Larousse. Pêcheux. Paris. Marandin."Estudo do período. uma vez que o conceito de discurso define um lugar entre "a singularidade individual e a universalidade" (Pecheux. Para esse objetivo. Esta marg em . é o espaço determinado pelo social. necessariamente. nosso objetivo. idem). fatores que constituem as condições de produção da leitura. 1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 0 DETERMINADO E 0 INDETERMINADO: A CONDIÇÃO DA LEITURA 181 Antes de enumerar alguns desses elementos. 0 deslocamento da noção defunção para funcionamento é. então. Assim. 1983. isto é. segundo esse mesmo autor. 1969). pois é o momento privilegiado do processo da interação verbal: aquele em que os interlocutores. nesse estudo. nem da soma de interlocutores: o(s) sentido(s) de um texto resulta(m) de uma situação discursiva. p.não é vazio. mas com a condição de acrescentar imediatamente que esse funcionamento não é integralmen . enquanto seqüencia sintaticamente correta. 0. No domínio da análise do discurso. Dessa forma. (*) Texto publicado na revista da Associação de Leitura do Brasil (ALB). n? 1. o fato de que a leitura é produzida (cf. Autor e leitor confrontados definem-se em suas condições de produção e os fatores que constituem essas condições é que vão configurar o processo da l eitura. c orrespondendo a um certo lugar no interior de uma formação social dada" (Pêcheux. ou seja. 0 discurso.contexto de enunciação e context o sócio-histórico .mostra o texto em sua incompletude.este intervalo . isso se dá. E isto se dá não em abstrato. é o de estabelecer.so. desde que s e leve em conta as suas condições de produção. (1) A noção de funcionamento é básica para se entender a possibilidade de sistem atização dos elementos constitutivos da significação de um discurso. desencadeiam o processo de significação. mas "como parte de um mecanismo em fu ncionamento. coni a situação . margem de enunciados efetivamente realizados. 176). que significa dizer que a noção de funcionam ento remete o discurso à sua exterioridade. Essa relação com a exterioridade. Isso tudo nos permite conceber o funcionamento' do discurso. Em outras palavras: é na sua interação que os interlocutores instauram o espaço da discursividade. ao se identificarem c omo interlocutores. uma postura produtiva é a de considerar que a leitura é o momento crítico da constituição do texto. uma noção relevante é a de social. como pertencente a um sistema de normas nem puramente individ uais nem globalmente universais. "os fenômenos lingaísticos de dimensão superior à frase podem efetivamente ser concebidos como um funcionament o. Entendemos como incompletude o fato de que o que caracteriza qualquer di scurso é a nlultiplicidade de sentidos possível. gostaríamos de lembrar que estamos tratando a leitura na perspectiva do discurso. é conceito intermediário que se coloca no lugar em que se e ncontram tanto a manifestação da liberdade do locutor quanto a ordem da língua. condição para que se stitua qualquer ciência que trata do signo. mas que deriva da estrutura de uma ideologia política e. logo. Assim. segundo Pêcheux. com alguma precisão. o texto não resulta da soma de frases. ou de lugar d e sentidos. aquilo que se poderia dizer e não se disse. idem). i tal outro. prévio( ) " (Pêcheux. .que abrange pressupostos e subentendidos nplícito d) Retornamos pa ra a indeterminação que é o confronto Não Podemos deixar de observar que a noção de ir c) Pousamos provisoriamente na determinação. idem). sabemos que ur é uma noção complexa. também constitui o espaço a) Partimos da aparente determinação do texto enquanto de discursividade daquelas condições. espécie de implícito que deriva da *n i. frente ao qual é urna resposta direta ou indireta. de direito. ne sse processo de interação da leitura. compõe também a noção de intertextualidade o mos de colocar. A noção de intertextualidade n texto tem relação com outros gundo essa noção. Assim. E esse confronto de sentidos que nos interessa observar na um início: o discurso se estabelece sempre sobre um discursivo interação da lei tura. 182 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 183 Podemos colocar como reveladores da incOmpletude toda Ela deriva de sua relação com as condições de produção. No modelo de Pêcheux. por sua vez. com a intertextualidade mas é r . da relação com a situação e com os interlocutores. se parta de sua indeterminação (como que Poderiam ter sido produzidos naquelas condições e que não se existissem lac unas) para a sua determinação (uma vez preen o foram.te lingüístico" (Pécheux. ele mesmo instala. aqu 1 tertextualidade. tal discurso envia a i~ de comunicação. a atenção para uma espécie de implícitos. Na análise de discurso Proposta por Pé z Resga tado da perspectiva da linguagem como instrumento caracterizada a relação de sentidos: cheux. forças. que ele 'orquestra' os termos Principais. Se0 texto é incompleto porque o discurso instala o espaço da textos nos quais ele nasce (sua matéria-prima) e/ou Outros para intersubjetividade. ou seja.com pletas ou a serem preenchidas . estaria aí incluída a relação de produto. b) Recuperamos o processo que o indetermina. não creio fato de que um texto tem relação com outros (suas paráfrases) que. o text o não é o lugar de informações . Chamaríamos. Dadas as características d a incompletude. pela qual se liga 0 locutor ao lugar social do qual diz. pela relação de interação qu e. diante de um texto. em que ele. estaria aí 1t "assim. é tomado não enquanto fechado em si mesmo (produto finito) mas enquanto consti tuído os quais ele aponta (seu futuro discursivo). isto é. ou destrói os argumentos Assim é que o processo discursivo não tem. É mais complicado que isso: condições determinadas de produção. o .inclui a relação com o outro. texto. em chidas as la cunas). tal como acabaAlém disso.mas é processo de signific ação. Ponto de vista do estabelece. com suas condições de produção. A natureza de sua incompletude é outra. essas afirmações como base. já de início.1 Essas questões se fazem em torno d as seguintes noções: Tipo . uma vez que contam também outras determinações de situação. Visamos assim contribuir para a reflexão sobre a legibilidade.Determinação---0. pois.2 das Condições Indeterminação --N o. modo específico de leitura. c om os interlocutores. Dessa forma. com a situação. Ou seja: ao explicitar o funcionamento desse fenÔmeno lingüístico a que chamamos discurso. múltiplas contexto produto quanto objeto teórico. ao considerarmos a leitura c omo interação. gostaríamos de abordar algumas questões que têm como função esclarecer elementos c onstitutivos das condições de produção de todo discurso. Considerar as condições de Produção da leitura é texto como objeto Determinação -* Indeterminação---0~ Determinação trabalhar fundamentalmente com essa espécie de indetermiacabado nação: a incompletude do texto. nais abrangente. em relação à incompletude não se trata de texto fecha do texto referido uma leitura considerar o texto como matriz com lacunas que são Preenchidas em s i mesmo às condições de determinada nos dizendo que a natureza da pelo leitor. (2) A propósito da distinção do texto enquanto objeto empírico e en específico. além das eva a distinguir dois planos segundo os quais 0 que nos l intertextuais que mencionamos. tal como Pecheux. Sem esquecer que o traço essencial desse funcionamento é a relação do texto com os outros textos. outras leituras. 1 i 184 ENI PULCINELLI ORLANDI Tendo. Ponto de vista 0 texto. etc. 0 que expressaríar produção incompletude não é lacunar mas intervalar. que se repõe possíveis leituras questão da leitura: a noção de sujeito e a identidade do leitor-. a análise de discurso fornece subsídios metodológicos para a prática de produção e leitura. neste volume. 13.autor.Leitura Parafrástica e Leitura Polissemica . a noção de funcionamento como central para a análise de discurso. meio e fim. ou seja. objeto acabado. e considerando. não desconhecendo que. ao mostrar como um texto funciona.Contexto e Sujeito . é que vemos a contribuição desse domínio de conhecimento para a área de produção e leitura. f m---Umaespecífico. seguimos diferentes percursos em relação à inde terminação: Tudo isso faz parte da relação de interação que a leitura A. 4 4 No entanto. Indeterminação constitui uma totalidade com de Produção começo. há uma seletividade que revela o modo de leitura assumido pelo leitor. fizemos algumas observações mais especí icas e leitor como processo. não se refere a um falante em si mas à sua posição no discurso. nos mecanismos da formação social. de acordo com a perspectiva na qual no colocamos. todo d izer é. e se tornam típicas. entra. cit. por um falante determinado. ou seja. mas na sua relação com o funcionamento discursivo. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1 r 1 1 f 185 pouco se trata. mas de um estado do processo discursivo. este último de uma maneira mais específica. segu do hipóteses que vimos desenvolvendo. portanto. 1969). atra vés de regras de projeção. então.deve ser entendida em função de sua relação com funcionamen to. na relação de intera ue a leitura (envolve) estabelece. a capacidade do leitor em reconhecer os tipos de discurso e. considerando-se~ agora. conseqüentemente. com finalidades específicas. já está inscrito um tipo. nas condições de produção da leitura. logo. e. considera mos que o tipo (produto) é funcionamento discursivo (processo) que se cristaliza historicamente. de um todo fechado em si me smo. Aquilo que é relevante em um tipo de discurso pode não se-lo em outro. a respeito dos interlocutores. como o venho definindo: o funcionamento é a atividade estruturante de um discurso determinado. esse "determinado" utilizado na definição. certas configurações se institucionalizam. E ist o. (4) As regras de projeção.NOÇÃO DE TIPO Essa noção . tam(3) Mantemos aqui o conceito de legibilidade tal como o estabelecemos no estudo sobre leitura citado na nota 2. Dessa forma. no discurso. evidentemente. Faz parte da estratégia de leitura levar em conta o tipo não de forma estanq ue. Conseqüentemente. em estabelecer a relevancia de certos fatores e não outros para a significação do texto em questão. a relevancia de fatores que constituem as condições de significação de qualquer dizer é determinada pelo tipo de discurso. compõe a legibilidade de um texto.` Paralelamente. configurado. de acordo com Pécheux (op. dada a dinamica das condições de produção. trata-se do jogo de formações imaginárias e. Devemos ainda observar que.a de tipo . pela relação entre processo e produto. Na leitura. um fragmento de um continuum . quando se pensa a legibilidad e em relação ao uso efetivo da linguagem e não apenas como propriedade imanente do texto . logo. Por outro lado. A consideração do tipo como parte das condições de produção é fundamental. ao se falar em discurso determinado. constituindo. estabelecem as relações entre as situações (objetivamente definíveis) e as posições (representações dessas situações). pois. pode ser referido a um tipo.. para um interlocutor determinado. Sem esquecer que. historicamente. modelos para o funcionamento de qualquer discurso. A NOÇÃO DE CONTEXTO E SUJEITO . necessariamente. a relação do texto com a . tres classes. isto é. assumiu a presidência o marechal 1 Humberto de Alencar Castelo Branco' . depende da apreensão da uni dade do texto. voz passiva sem agente.que. então. nesse nível (o textual) entra em cons ideração o fato de que todo texto é necessariamente incompleto. da percepção do ~texto c omo um todo. podemos considerar o funcionamento de dois dos tres níveis de sujeito do discurso. Por outro lado. construções com sujeito indeterminado. do contexto textual. em outros textos os autores se colocavam como representando a voz da oposição. acreditamos. extraído da anál ise de textos de História do Brasil para a escola: "No dia 15 de abril.0 sujeito da enunciação.Tenho considerado. no caso. ou melhor. 0 Um sujeito textual: a Segurança Nacional (o sistema econofflico. os autores falavam do ponto de vista de quem estava no po der. dada a necessidade da interpretação global da unidade. Daí ser este um nível de mais difícil acesso à compreensão. b) uni sujeito da enunciação: os autores dos livros didáticos de história que an alisamos. etc. que deriva da análise do con186 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO de: ENI PULCINELLI ORLANDI . ou seja. Está em causa. da presença do autor na constituição do texto . Dessa forma. já se tornava difícil mesmo o reconhecimento do sujeito a nível do enunciado. Como ternos afirmado. do con. Podemos citar.). A identificação do sujeito nesse nível. sem urna certa explicitação da função do sujeito da enunciação. que deriva da análise texto de situação. o desen volvimento a qualquer preço. não se chegava ao sujeito da en unciação. Resta um terceiro nível: o nível do sujeito textual. que deriva da consideração do texto corno um todo. . Para ilustrar essa distinção de níveis. etc. Nesse exemplo. podemos constatar a presença Simultânea a) um sujeito do enunciado: Castelo Branco (Médici etc. Como. com insistência. o fato de que.. como exemplo da variação dessa perspectiva. tres nlveis de sujeito: texto lingüístico.0 sujeito do enunciado.). a relação do texto com outros textos (a intertextualidade). nos textos que analisamos de História do Brasil havia muita inversão d e sujeito. isto é. Poderia citar um exemplo. era a da perspectiva pela qual a história era contada -. em alguns textos. etc.0 sujeito textual. no funcionamento discursivo. conseqüen temente. sua relação com a gramática. Ou seja. também não basta se entender sentença por sentença. assim como a maneira com que se dá a dinâmica de sua inter-relação. a leitura polissemica. deve ser diferente da observada em um discurso polêmico. etc. Assim. Para a leitura de qualquer nível de sujeito. entre outras coisas. com a explicitação desses níveis. sua capacidade de distinguir formas-padrão. Dominar o nível de sujeito textual. o grau de relação entre o que chamamos leitura parafrástica. sua ideologia. a função de cada um dos níveis de sujeito. Isto deve corresponder a estratégias de leitura diferentes. já podemos determinar como alguns eleme ntos das condições de produção estão inscritos no processo de leitura. demonstra que não basta se entender palavra por palavra. varia de acordo com os diferentes tipos de discurso: num conto de fadas deve ser diferente da observada em uma dis sertação científica. por exemplo. em um discurso poético e maior a possibilidade da leitura polissemica. LEITURA PARAFRÃSTICA E LEITURA POLISSÊMICA Cremos que esses diferentes níveis de sujeitos e esses diferentes tipos de discurso é que vão determinar.187 k 1 1 i 1 i 1 1 i i 1 1 i experiência do leitor tanto em relação à linguagem. etc. sua capacidade de análise ngüística. que se define pela atribuição de múltiplos sentidos ao texto. o leitor. e o acesso a eles corresponde a níveis diferentes de leitura. Além disso. etc. com certo grau de escolaridade. Um fator que pode caracterizar os tipos de leitores é sua experiência de lin guagem. sua competência gramatical escolar faz parte de sua relação com a linguagem e. etc. acreditamos que deve haver explic itação desses diferentes níveis. que se caracteriza pelo reconhecimento (reprodução) do sentido dado pelo autor. deve compor as condições de sua leitura. em suas condições de produção da leitura. Então. merece também mençao o fato de qu e existem diferentes tipos de leitores. é suposto incluir. em um autoritário. como em relação ao seu conhecimento de m undo. por exemplo. 188 ENI PULCINELLI ORLANDI Em um discurso lúdico. que correspond em a diferentes modos de interação na leitura. . em grau menor. em um discurso científico é menor. em um discurso Iúdico. a leitura polissêmica se faz em maior gr au. Quanto aos diferentes níveis de sujeito. se não se apreende o texto em sua unidade. corresponde aos diferentes tipos de discursos. basta lembrar que há uma variação hi stórica. todavia. dizendo que a leitura paraf rástica e a polissêmica não se distinguem de forma estanque mas gradualmente. Talvez por isso. Já que. por exemplo . E nos indica também que as condições de produção da leitura abrangem mecanismo . deve-se esquecer que a leitura parafrástica coloca menos do conhecimento extra-texto-conhecimento de mundo. não queremos levar a crer que a distinção ex istente é só quantitativa. como o privilegiado. a leitura mais adequada pode ser. Isso depende das condições e dos objetivos da leitura. Outro aspecto.Se observamos isso. que é o que separa o dito da espécie de não dito que é constitutivo da significação do texto. de um lado. e que não o foram em outras épocas. a leitura como recepção (assimilativa) e. então. isto é. Desse modo. um limite sempre difícil de ser estabelecido. em relação ao sujeito textual é mais ampla. como sabemos. é o de que esta distinção não deve nos levar a atr ibuir uma espécie de valoração. por exemplo. a mais par afrástica: por exemplo. da forma de interação que ela estabelece. Dentro da idéia de produção da leitura. em sua situação momentanea. a leitura como alta capacidade individual de imaginação (criativa). quanto aos tipos de discurso. a se observar. Deve haver uma correspondente distinção de natureza. do jogo de poder. Aí está um limite que. Isso nos mostra que a ação do con texto abrange mais do que os fatores imediatos da comunicação. Podemos chegar assim a uma caracterização geral. no entanto. de out ro. Haverá.do leitor. a leitura é processo de interação. ou melhor .o que caracteriza a leitura parafrástica . 0 que pode haver.o da leitura po lissemica. nem há só recepção nem concordamos com o uso que se tem feito d a noção de criatividade. na leitura . qualitativa portanto. etc. de tal forma que o pólo polissêmico apareça. mesmo no reconhecimento de sentido (leitura parafrástica) já há inferencia. é o dizer do aut or). isso sim. da distinção de tipos e de níveis de sujeitos. ou seja. do que a leitura polissêmica. sempre. de outros text os.foi para deslocar a distinção já marcada entre. ist o é. o mesmo pode ser obser vado em relação aos níveis de sujeitos: em relação ao sujeito do enunciado. em relação ao mesmo texto. em A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO i i 189 detrimento do parafrástico. tanto para menos (que é o risco da leitura parafrástica) quanto para mais (que é o risco da leitura polissemica) é muito difícil de ser explicitado: aquilo que é o mínimo que o texto "diz" e aquilo que ele já não "diz". a leitura é seletiva. considerando-se a intertextualidade. principalmente no ambito escolar. há leituras que são possíveis hoje. são graus diferente s de inferencia. podemos dizer que a polissemia é menos ampla. preferimos distinguir diferentes graus de inferencia e compreensão. Dependendo. entre outros fatos.até o mais alto . Assim. Se preferimos falar em leitura parafrástica e leitura polissemica . se devesse falar em especies diferentes de inferencia e não em graus. os implícitos em geral. etc. há sempre ação por parte do leitor. etc.ao invés de leitura assimilativa e leitura criativa. circunstancialmente. desde um ponto mais baixo . Do nosso ponto de vista. . Logo. a leitura ortodoxa escolar de um texto científico quando se objetiva reproduzir o que o autor disse (o que é relevante. há modos de leitura. o grau de inferência implicada na leitura pode variar amplamente. Afirmação esta que é bastante compatível com a caracterização que fizemos da leitura como produzida. há uma decisão feita pelo leitor em relação àquilo que não está dito no texto e que o constitui. Nem por isso. que ainda não pudemos formular mais precisamente. entre o pólo mais parafrástico e o mais polissemico. Quando falamos em graus. Isto é. Para avaliar a dificuldade dessa delimitação. de tal forma que cada discurso sejai um dis curso sem nada a ver com os outros. levando em conta as condições de uso) da linguagem.isto é. D reio . é w próprio objeto. tratando-se discurso.e agora o dizendo de uma forma menos ingênua -. BIBLIOGRAFIA Pêcheux. E.Analyse Automatique du Discours. Essa atomização. Dunod.s bastante complexos e que não se resolvem na imediatez de relações escolares mal colocadas. 1 Sobre tipologia de discurso* A FUNÇÃO METODOLOGICA DO CONCEITO DE TIPO A análise de discurso. Dessa maneira se estaria incluindo. em um domínio) comum. IV UMA SUGESTÃO PARA A ESCOLA Finalmente o que propomos é que se explicite o funcionamento desses elemen tos na constituição da leitura. Mais do que isso. para que se possa desenvolver. é preciso permitir que ele conheça como um texto funciona. e. o conh ecimento de mecanismos discursivos que 190 ENI PULCINELLI ORLANDI fazem parte do uso da linguagem. Assim. imitar. as formas de leitura mais adequadas e mais conseqüentes. ele terá acesso ao processo da leitura em aberto. Rio de Janeiro. De um ponto de vista ingenuo. colocando-se como sujeito de sua leitura. procura distinguir um discurso de outro . De posse do conhecimento dos mecanismos discursivos. o aluno terá acesso não apenas à possibilidade de ler como o professor le.) do objeto. Mais do que lhe fornecer estratégias. nas condições de produção da leitura. M. não se t em procurado modificar as condições de produção de leitura do aluno: ou ele já tem as tais condições (como as tem o leitor ideal que é o padrão) ou ele é obrigado a deco rar. repetir. pro cura apreender a singularidade desse uso -isto é. se coloca a necessidade metodológica do. estabelecimento de uma (ou várias) tipologia(s) de di scurso.ao mesmo) tempo em que visa a construir uma generalidade . Objetivos à primeira vista contraditórios e que revelami um dilema na constituição do objeto da anál ise de discurso. a própria possibilidade da análise. enquanto unidade pragmática. se estaria trabalhando com a leitura em um nível mais exigente do q ue o das simples estratégias.. não podemos excluir' as determinações concretas que o caracterizam. . então. eu diria que esse dilernai nasce do fato d e que. A melhor. desse discurso. ao mesmo) tempo. réplica (descrição. etc. não podemos nos perder nessa concretude (empir ismo?).. simulação. ao invés de vítima. Paris. 1982. Eu (*) Texto apresentado no V11 Encontro Nacional de Lingüística da PUC. no ensino. . ele poderá usufruir a indeterminação. De acordo com o que pudemos observar acerca da leitura na escola. ficando ao sabor dos fatos. a esse nível. conseqüentemente. Estar-se-ia dando elementos para que o aprendiz trabalhasse explicitamente com o que se tem chamado competencia discursiva. aL i nserção desse uso particular. negaria qualquer possibilidade de sis tematicidade do objeto e. 1969. a sistematização deriva da relação com a exterioridade. segundo nossa pers pectiva. ou de enunciação. mas que se poderia dizer . no sentido estrito) como os fatos do contexto sóciohi stórico. sobre o estatuto das diferentes espécies de contexto. temos procurado estabelecer distinções operacionais. Isto é possível considerando-se não os discursos fechados em si mesmos. isto é. que tem as categorias (se as pensamos como sedimentos de processos) na Análise Lingüística. no sentido lato). tem a mesma função classificatória. em Análise de Discurso. Essa exterioridade. A distinção dessas duas espécies de contexto de situação imediato. Em suma. Isto é. deve incluir tanto fatores da situação imediata ou situação de enunciação (contexto de situação. 0 que significa dizer que pensar a sisternaticidade do objeto da análise de discurso é refletir sobre a questão da tipologia e. Por definição.192 ENI PULCINELLI ORLANDI diria. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 193 ideológico . 1975). Essa possibilidade .qual seja a da sistematização . e o amplo u sócio-histórico. necessariamente. Essa afirmação traz no bojo a contraditor ade da noção de sujeito. sob a forma das seguintes distinções: a) contexto lingüístico (ou co-texto) b) contexto textual C) contexto de situação c) no sentido estrito: contexto imediato. ideológico A forma mais abrangente de estabelecer uma tipologia. com suas paráfrases. . que o tipo. relativ as ao contexto. ou com o domínio dos seus implícitos. de tal forma que qualquer "formação discursiva deriva de condições de produção específicas" (Pêcheux. toda formação discursiva se caracteriza por sua relação com a formação eológica. Daí o fato de se considerar a intertextualidade (a discu rsividade): a relação de um discurso com outros discursos existentes e a relação de um discurso com outros discursos possíveis. segundo a perspectiva que adotamos. Dessa forma é que se pode entender o dizer de Pecheux de "que os fenom enos lingüísticos de dimensão superior à frase podem efetivamente ser concebidos como um funcionamento.está refletida nas diferentes formas com que se constituem as diversas tipologias. então. no sentido atual desse termo. de enunciação C2) no sentido lato: contexto sócio-histórico. em referência ao mecanismo de colocação dos protagonistas e do objeto do discurso que nós chamamos d e 'condições de produção' do discurso" (1969). mas considerando-se os discursos como estados de um process o discursivo. embora eles se realizem neces sariamente nesse sujeito. se agruparem certas propriedades e se distinguirem classes. De nossa parte. 0 TIPO COMO FATOR DAS CONDIÇõES. é a que inclui a referencia ao contexto no sentido lato. ideológico (que é o contexto de situação.está inscrita na própria de finição de discurso e na sua (do discurso) necessária inserção na ideologia. que é a marca da análise de discurso: os processos discursivos não tem sua origem no sujeito. a relação do dito com o não dito. mas com a condição de acrescentar imediatamente que este func ionamento não é integralmente lingüístico. meto dológica. naquelas condições. que chamamos de condições de produção. É princípio organizador: primeiro passo para a possibilidade de se generalizarem certas características. nem como propriedades de um locutor observado fora de qualquer det erminação históricosocial. ideologia. normalmente. privilegiarei um de seus aspectos. deriva dos objetivos da análise proposta. etc. eu creio. Isto significa.DE PRODUÇÃO DA ANÃLI SE 0 que ocorre. que determinam a tipologia adotada na a nálise de qualquer discurso. isto é. esse meu trabalho pode ser visto como uma reflexão sobre as cond ições de produção da analise. o fato de se usar uma ou outra tipologia dá uma direção à análise. quando se analisa um discurso jurídico. Poder-se-ia resumir. dois extremos. de acordo com o que tenho observado na leitura de análises de discurso em geral. a de expl icitação do tipo de discurso que constitui o seu material de análise. quç é o uso (pressuposto ou explícito) de uma ( Çou mais) tipologia(s) A meu ver. também decisivo. ou melhor. etc. Exemplos: as análises que Marilena Chauí faz supõem a relação entre um discurso ideológico e um discurso crítico. tanto o desconhecimento da função da tipologi a em análise de discurso. deste ou daquele traço. a meu ver. Daí. duas coisas: a) que a tipologia é condição necessária da análise e b) que o tipo está inscrito nas condições de produção do discurso sob dois aspectos: enquanto modelo e enquanto atividade tipificante. quanto o desconhecimento dos diferentes critérios que instituem as diferentes tipologias. Dessas condições . pois. que estabelecerá a relevância deste ou daquele dado. Acreditamos ainda que a escolha de uma tipologia não se faz "em abstrato" mas deri va da concepção de discurso do analista. isso tudo. Assim. entra um outro fator. São esses fatores. de forma geral. Dian te de um material a ser analisado. então. é que todas as análises de discurso supõem uma tipo logia. segundo o que penso. em sua relação. que são tipos que resultam do conf ronto ideologia/contra. e discursos muito difusos em que a relação com as condições de produção seria imediata demais. NA ANÃLISE DE DISCURSO. na análise. Na relação com os objetivos. a tarefa do analista é. Por outro lado. em grande parte. da sua posição em relação ao problema da ideologia. 194 ENI PULCINELLI ORLANDI então. São. ao religioso. os dois tipos extremos: o muito comp lexo e o muito difuso. mas não apenas disso. Já que a análise pode ser vista como um discurso. Daí decorre. Por isso. Ela coloca. SE TÊM DEFINIDAS AS TIPOLOGIAS Maingueneau (1976) diz que a análise de discurso tem por especificidade pr ocurar construir modelos de discurso articulando estes modelos sobre condições de produção. são esses dois fatores em sua relação que consideramos como dominantes na escolha da tipologia que vai fazer das condições de produção da análise : o objetivo da analise e sua relação com a natureza do texto que é o objeto da analise. esses. ela cita o discurso teológico A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1 195 . que considera como obstáculos simétricos na teoria do discurso: discursos muito complexos para os quais a relação com as condições de produção seria delicada. como uma leitura que se constitui em determinadas condições.que praticamente nada tem a ver com as condições de produção mais imediatas e em que o . o fato de se utilizar uma ou outra tipologia resultará em um recorte que é seletivo. Como exemplificação desses dois tipos extremos. do domínio de conhecimento no qual s e insere. raros são os analistas que explicitarn a tipologia que está implícita na análise. se supõe sua distinção em relação ao político. COMO. que é o da na tureza do texto. do modelo de análise que utiliza. dizendo-se que a escolha da tipologia. temos uma referencia explícita e direta ao problema da tipologia. Estaria tão próximo quanto possível da descrição gramatical da competencia: descrevendo-se a língua. Como ponto de equilíbrio. a distancia. mais transparente. o discurso didático é caracterizado co mo invariante de base. Courdesses (1971) chega à caracterização dos discursos de Blum e Thorez.produto daquela estabelecid a entre o gramatical e o contextual. entre a base e a derivação. e opor então polêmico a didático? Parece-me que isto se deve aos objetivos da análise e à posição (preferência) da analista frente aos partidos. De forma geral. Seu oposto. sem marcas pronominais.que tem muito a ver com as condições de produção mais imediatas. segundo esse autor. entre a função referencial e as outras funções da linguagem. diz ele. entre o subiacente e o superficial. Socialista). menos modalizada. como necessária para se dar conta de diferenças formais da língua: as dos tempos do verbo em frances. produto da atividade cognitiva. a modalidade e a transparência (Dubois. e o de Th orez (P. e a caracterização das tipologias.s textos remetem a outros textos e não à situação . Aponta então o movimento que existe em direção a uma nova tipologia: aquele que se define na relação do discurso . a marca que o sujeito dá a seu enunciado). Em Benveniste (1966). 1969). na verdade. ela chama rá discurso político tradicional e ao seu oposto. Creio que podemos ver essa distinção como um sub. Em Guespin (1976). ele afirma que as categorias são emprestadas e metafóricas. diferentes planos da enunciação: discurso/história.distanci a (a atitude do sujeito falante face ao seu enunciado). é o discurso polêmico. dos quais ela analisa. 0 tipo é definido. descrev e-se um tipo de discurso cujo sujeito de enunciação está ausente. etc. uma vez que se está na fase pré-taxonomica dessa ciência. como e m Dubois. ela cita o discurso político. é relativamente intuitiva. mais uma vez. sobre o rec eptor) . ela chamará discurso político didático. que ela caracteriza como send o mais marcado pela enunciação. a refletir sobre as condições de produção da análise. e em que há maior distancia. enquanto mod o de enunciação. os discursos. frase de base com o verbo ser. mais tenso. no qual há falsificação de uma tese oposta. etc. entre a informação e os efeitos de sentido. Nessa proposta. Já em Dubois. temos a distinção de tipos de discurso segundo distinções da enunci ação: a tensão. o que temos é a distinção entre discurso didático e discurso polêmico. São dois tipos: o de Blum (P. Por que chamar de tradicional? Por que não chamar de polêmico. Ainda em Dubois. Partindo da distinção dos quatro conceitos . Dessa maneira. menos transparent e e em que há menor distância na atitude do sujeito em relação ao seu enunciado. Comunista) em que a enunciação é menos marcada. e que está suposta a essa elaboração de tipologia.: ontologia/ideologia) ou retóricas (ex. isto é. Dubois colocará o discurso didático como invari ante . menos tensa.L. tensão (relação estabelecida entre o sujeito falante e o interlocutor) e transpa196 rencia (maior ou menor transferência do sujeito da enunciação. ond e há marcas específicas de enunciação. 0 que nos leva.: didático/polêmico) se está condenado ao artefato". Segundo esse autor. Ao primeiro. o de Thorez. "forem filosóficas (ex.com nominalizações. isto é. onde há uma articul ação harmônica entre discurso e condições de produção. mais modalizado.em relação ao qual se deverá formular as diferentes regras que permitirão constru ir os outros tipos de discurso. E é interessante observar como os objetivos da análise determinam fortemente a forma da tipologia adotada. modalização (a adesão. do locutor.e o discurso ordinário cotidiano ou conversa . na ciencia do discurso. há postulação de um tipo central (ideal?) e suas derivações. ele coloca a tipologia de discursos como necessária mas futura. os tipos representam. Enquanto as categorias que descrevem o discurso. A tipologia aparece. Daí esse autor concl uir que o que é preciso categorizar é o que faz com que um discurso funcione e não o julgamento que se pode fazer sobre ele. assim. então. Partindo da idéia de que a categorização. . Ainda uma outra forma de se considerar . segundo o discurso citado: a) modo do como ele diz (intertextualidade: diálogo com outros textos). com a oposição "di scurso patronal público" (polifônico) e i ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1 k 1 1 197 discurso sindical público (a conquista do discurso). em Gardin (1976). ReyDebove (1971) que con sidera tres modos de dizer. ou seja. ou ainda. b) o modo do como se diz (discurso com encadeamento de lugares-comuns. o das configurações enunciativas não retóricas "onde a enu ciação não está mais no desvio em relação ao enunciado. por sua vez. Para ele. Aponta como exemplos da fase pré-taxonômica alguns trabalhos: o de Marcellesi com o discurso da individualização. na perspectiva de Voloshinov. Um desenvolvimento dessa tipologia é feita por J. Nessa perspectiva. em geral. faça um giro pelosfuncionamentos discursivos". Gardin. tendo como critério o modo de enunciação. na menção feita por Benveniste sobre o discurso indireto como um terceiro tipo em relação à distin~ão di scurso e história (1966). o discurso citado como exemplar desse modo. "tipificar os discursos das diferentes formações discursivas. Uma outra tipologia que é bastante utilizada é a que se refere ao discurso c itado. o que implica que seja repe nsada a noção de embrayeur". violenta o código das unidades lingüísticas ao mesmo tempo que a ideologia). Courdesses e o discurso de en unciação por "eu" (Blum) e de enunciação por '&nós" (Thorez). dicionário de idéias rece198 ENI PULCINELLI ORLANDI bidas: código lingüístico que o eu não assume completamente) e c) o modo do como eu digo (citações de si mesmo: se opõe ao como se diz. Segundo Voloshinov. um tipo de discurso demonstra o modo como as formas da língua reagem a certas cara cterísticas de ordem social. podemos dizer que a proposta de Guespin é a de que "antes de qualquer progresso tipológico. Ilustra a forma como o contexto social atua nos esquemas da língua e como a língua organiza o ideológico. É a que vemos. Indo mais além . aliás. o discurso indireto é dominante no Renascimento e o discurso indireto livre é o dominante no século XX. é preciso que a pesquisa. Na análise de discurso é retomada. Em resumo. Não aponta essa possibilidade sem mostrar seu cuidado ao se trabalhar com as formações discursi vas pois.com as formações discursivas. mas deve ser vista como processo constitutivo da matéria enunciada. segundo Guespin. então. Ele mesmo. isto é. ao menos no quadro estreito do discurso político. não o pode nenhum fato lingüístico. propõe um outro nível típico. por exemplo. Para este autor. segundo a formulação feita por Voleshinov (1976). ele vai dis tinguir o discurso direto e o indireto livre. 0 discurso citado mostra a maneira dinamica pela qual a enunciação de outrem é apreciada e assimilada. há o perigo de um certo simplismo na delimitação provisória das formações discursivas. Voloshinov vai vincular cada uma das formas de discurso a um contexto sócio-econ omico: o discurso direto é dominante no século XVII na Rússia e na França. a substância da língua é o fenôme no social da interação verbal realizada através da enunciação. destacar as dominantes de seu funcionamento". que evoca o problema da responsabilidade ideológica. Toma. o discurso citado põe às claras o modo como a enunciação de ou trem é incorporada ao discurso interior e não pode ser estudado fora dessa perspectiva de interação. como. Reboul (1980). É uma tipologia que se coloca de forma consensual. Grumbach (1975) um estudo sistemático da tipolog ia proposta por Benveniste. A nossa posição é a de que todo discurso deve ser referido a uma formação ideológica. até certo ponto produtivo. nas análises. que não há um tipo puro de discurso e.). a espécie de tipologia que distingue discurso político. Quando digo que esta tipologia é historicamente marcada. não se coloca a possibilidade de se dist inguir um discurso ideológico. os que consideram a oposição discurso ideológico/ discurso crítico (ou contradiscurso. De outro. pareceme. o religioso. dadas de acordo com um critério já estabelecido alhures: ou pela sociologia. etc. Uma variação dessa tipologia é a que loca a distinção entre domínios (institucionais) do saber: discurso filosófico. de finem o ideológico como sendo obscuro Í irrácional. É o caso.que os discursos são produzidos. em linhas gerais. é que já partem de distinções apriorísticas. Referido. sobre que tema. isto é. etc. jornalístico. 0 critério. Além desses. Em relação à distinção do discurso ideológico. que já vem dado. através do critério da explicitação (ou não) do intertexto. sem dúvida. porque contém sempre uma análise dos outros discursos. Pois é. logo. e b) a posição contrária a essa que é a de afirmar a existência de um discurso ideológico distinto. colocando várias formas de discurso (oral. procura diferenciar discurso ideológico e discurso científico. ao mesmo tempo. ou suas variaveis. Merece atenção. primeira pessoa no passado. quero dizer que ela deve ter nascido de uma necessidade metodológica específica cuja origem e importân cia deriva de uma época determinada. é herdado pela análise de discurso como tal. No discurso teórico. Valeria a pena um estudo que pudesse determin ar as condições sócio-históricas do estabelecimento dessa tipologia. dada a relação necessária do discurso com a ideologia. após fazer criteriosamente essa dist inção. o que mascara. descrição. Também é geral. logo. Reflete ' então. Ela é referida à existência de instituições. escrito. etc.) no escopo em que ele distingue discurso/história. o jurídico. devemos observar que há. etc. Ela procura chegar a algumas conseqüências. poético. De um lado. é a que distingue narração. por exemplo. S. religioso. terc eira pessoa no presente. Para essa caracterização. científico. ju rídico. em que momento. responde sempre a um outro discurso e preve outro (é a questão da intertextualidade). . Na maior parte das vezes. etc. o científico. a meu ver. etc. ou pela teoria do conhecimento. em relação a essas espécies de tipologia. No entanto. o que acaba por A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 199 obscurecer a distinção colocada no início. resta o v 1 alor metodológico dessa distinção como um recurso. se combina com elas. É do domínio . É uma distinção tipológica que está presente em qualquer programa escolar.a distinção discurso referido/ discurso referidor é a que assume que todo discurso é ao mesmo tempo referido e referidor. os que assim o fazem. dissertação. de 0. dua tendências em análise de discurso: a) a de considerar que. Esse autor. E nesse caso (b) também há duas maneiras de fazê-lo. em geral. i sto é. Essa também. consensual. Outra tipologia.que determinam quem pode falar. a meu ver historicamente marcada. tácita e geral. 0 problema. uma ti pologia que se caracteriza pela constancia e gener-lidade. há mistura do ideológico com os outros. etc. E está subjacente às outras tipologias ou. sobre outras formas como o discurso teór ico e poético. a possibilidade de generalização (e não-generalização) e a tra nsformação da realidade criada (ou não-transformação). porque é sempre no interior de instituições que possu em regras precisas . a noção de tempo e de acontecimento tem sido referências fundamenta is. Podemos dizer que os critérios em que se baseia são. Referidor. que esgotari am a proposta daquele autor. em geral. se encontram encaixados em sistemas referidores (tendo ou não uma forma lingüística). é ema tipologia consensual. os que consideram o discurso ideológico como um tipo de discurso ao lado de outros como o político. temos em J. há uma relação necessária entre discurso e ideologia. acaba por afirmar. etc. aqui. Mais adiante. inicialmen te. procura-se a especificidade de categorias de discurso.que é um dos objetivo s colocados como proposta inicial desse trabalho . Pensan do-se. trocam seus resultados ou suas problemáticas próprias". da sociolingüística. duas espécies de tipologias: a ideal (de Sumpf. ou delimitam. ) as categorias que ela empresta ou estabelece ( . É uma tipologia que tem uma força didática considerável. etc. Há. as condições de produção: de forma típica (relação entre locutor e destinatário) e histórica (lugar e época em que o discurso é emitido). da retórica ou da lingüística. Sem esquecer que o que interess a dos locutores é sua ação lingüística e o que interessa 4a ideologia é aquilo com que o texto tem a ver. o registro é definido por "traços . Todas tem em comum o fato de "repousar em um esquema comum: a noção de enunciação".da literatura no tratamento do texto. sobre a tipologia de discurso é Marandin (1979). inicialmente. E Marandin propõe a reflexão acerca de algumas espécies de tipologias: o tipo classificatório (o estudo de Meleuc sobre a máx ima . o ideal (Dubois e o discurso polêmico e didático . mas diversas espécies de tir)Ologias que ---1. o extremo (Courdesses e os discursos de Blum e Thorez . podemos destacar espécies diferentes de tipologias dado que seus critérios derivam de diferentes teorias do uso da linguagem: da teoria da enunciação. de forma explícita.1971) e o típico (Gardin e o discur so patronal e sindical . de suas funções e de seu instrumento favorito: a linguagem". de Guespin). cuja definição de registro permite uma distinção tipológica. Finalmente. na tipologia que formulei. A partir dessa crítica.1965). Outra tipologia que podemos considerar como sendo dessa mesma espécie é a que distingue os gêneros. Gostaria de citar. etc. Mais do que isso. entretanto.podemos perceber que há heterogen eidade quanto às categorias utilizadas. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO OUTRAS PERSPECTIVAS TIPOLõGICAS 201 Em geral. da pragmática. ) enviam a uma concepção estruturalista da sociedade. a tipologia "opera a mesma operação que a velha retórica ( . entretanto. p arece-me. os tais critérios subjacentes às tipologias . Isto é...1971).1976). de Dubois) e a sociolingüística (de Ma rcellesi. a tip ologia do discurso se pretende "o lugar de proposições teóricas autônomas sobre o discurso". Mas diferem na forma como definem. no interior do domínio literário. Ainda segundo Marandin. "não há uma tipologia de discurso. levo e m conta essa necessidade: a de buscar critérios que derivem do discurso como tal e não da sociologia. o que ele propõe é que se busquem critérios discursivos (do discurso como tal) para o estabelecimento da(s) tipologia(s).11 i 1 9 o aco ertamento de um termo único e de um objeto aparentemente semelhant e. procurarei mostrar como. Segundo esse 200 ENI PULCINELLI ORLANDI autor. Para ele. Um outro autor que também trabalha. conteúdo/expressão.. Ele considera.. vários estudos atuais feitos d a perspectiva da análise de discurso. esse autor faz a crítica dessas tipologias por considerar que elas repetem "em sua dupla referência a Harris e a J akobson/Benveniste" a dicotomia fundo/forma. Halliday (1976). então. Ele mostra. Não pretendo com isso afirmar que Halliday estabelece assim uma tipologia. é uma noção que permite. esse tipo de aproximação. uma forma de tiPologia hoje muito explosegundo M ain rada pela etnolingüística. como as que distinguem: objeto de trab alho. É uma que essa comp lexidade impeça um melhor conhecimento do distinção que está subiacente a outras. essa distinção é do domínio da psicologia. ainda. defesa das condições de produção sendo que o discurso aparece com o o de linguagem: conversa. e pensando-se o contexto momendiscursos analisávei s não o são. ou seja. coloca que os fazer corr esponder subdivisões. o estilo' e o tipo são os fatores que caracterizam qualquer funcionamento discursivo. assim. Do ponto de vista das marcas formais. conversa/conferência. 1976). é a que se faz entre disc urso planejado/não planejado (Ochs. junto a palavras e estruturas que são usadas na realização desses significados". longe mática em geral é a que distingue a situação-escrita e a situaçãogueneau (1976). Quanto m ais especificamente se pode caracterizar o contexto de situação. E. mais especificament e se pode predizer as propriedades do texto nessa situação". a partir do concei to de variação social e estilística e através da noção de registro. defesa de tese isso é possível porque se toma como referência a homogeneidade . isto está Paralelamente. Há relação entre os discursos taneo da enunciação em relação às regras conversacionais. necessidade de se buscar invariantes na constituição do corpus. a noção de regist ro. dessa vez de natureza pragmática. 1979). Tannen (1981). pelos etnometodologistas e pela pragde levar à sis tematização do objeto de análise.Há. Uma outra distinção. as distinções que derivam de diferentes situações . assim como da relação entre a linguagem da criança e a de se considerar em tipos. Em relação à pragmática. etc. etc. Isso porque é fácil cair no risco das subcategorizações cada vez mais estritas e escrita/oral. a configuração de modelos semanticos. do compor(1) A esse respeito. definindo.E ternos relações de aliança. segundo o que tenho obs ervado.lingüísticos. a todas essas múltiplas possibilidades social. Aliás. sutis. palestra. como veremos. seria interessante observar que. Segundo Ochs. podemos ver usos mais planejados da linguagem incluem o uso de estruturas que há uma im ensa complexidade tipológica. 202 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 203 tamento característico de adultos de uma determinada classe Se acrescentarm os. que farão de cada discurso um tipo único. é interessante a leitura de D. Isso se deve. um melhor domínio do discurso. o fato de que a cada tipo se podem do adulto. o cuidado é evitar sintáticas complexas e artifícios discursivos mais formais. que são tipicamen te delineados em condições específicas. pode-se estabelecer uma clara distinção de discursos: o discurso formal e o informal (Labov. antagonismo. Em relação à sociolingüística. à relação entre registro e estilo. subtipos. Toma como critério as noções de previsão e organização prévia do di rso em relação a sua expressão. então. É uma tipologia que envolve considerações a respeito da educação formal. nessas condições. as formações discursivas. que o re gistro define a substancia do texto (o que o texto significa). E. Nesta definição de registro. aula. inclusão. a meu ver. encontramos os requisitos que são necessários para o estabelecimento da tipologia: a caracterização do texto em relação às suas condições (a relação com a exterioridade) e a espe ação das propriedades do texto. tipicamente associados com uma configuração de traços situacionais. pois o registro é $Aum contexto de significados. em geral. o número de corpora é infinito mas os tipos de oral. a menção à distinção de soma das frases qu e o constituem. o fato de que os processos etc. Os códigos são causados pela escalas de complexidade entre as estruturas discursivas e as da Para esse autor. entretanto. com uma unidade delimitável. 1973). da alta burguesia. aqui.) até mais particu um atributo da i códigos lares. discurso da classe média. de um a base lingüística comum (não é Oecaso de elaborado. se definem em sua relação com formações 204 ENI PULCINELLI ORLANDI ideológicas. do caboclo. as distinções em termos de análise. o diálogo. expressam-na e ao mesmo tempo a regulam. distinto. Não se trata de tipos de discurso mas de códigos diferentes o que. o dos economistas. 0 fato de esse autor por a distinção a nível de .texto/ discurso . Fazendo um paralelo. Creio que se faz necessária. saria homem. estrutura social. resulta em NA CO NSTITUIÇÃO DA TIPOLOGIA conseqüências metodológicas totalmente diferentes. há várias lingüísticas ovi códigos distintos. Daí termos considerado o discurso como conceito teórico e metodológico e texto como seu equivalente. a estrutura lingüística dá origem a formas pensar uma mul tiplicidade de microlínguas). Essas todas são situações reguladas e com formas típicas. não nos permite cOlocá-lo ao lado dos outros que. etc. Assim. o sistema lingüístico constitui língua: há tipos de estruturação discursiva mais gerais (como a estrutura social. discurso que remetem à ideologia em geral: o discurso domi Dado o fato de que o conceito de discurso é um conceito nante e Os outros que se relacionam com ele no processo de teórico e cuja delimitação é impossível de ser feita em termos de dominação. etc geral: da mulher. mas um estado de um profissões: o discurso médico. As formas citadas são apenas algumas de uma Possibiuturações transfrásticas em função das condições resultado da articulação de uma pluralidade mais ou menos grande de estr lidade muito ampla de situações e que são objeto de estudo de de produção. contribuem para uma elaboração A DISTINÇÃO TE XTO E DISCURSO E SUA FUNÇÃO tiPOlógica de discurso. etc. mas supõe a existência de códigos proposta por Bernstein (1975): código restrito e código uma língua. eu diria que. Sem esquecer. discursivos se delimitam e se definem na sua inclusão em forma ções que. de nosso Ponto de vista. do para empreendermos análises de discurso com o controle . a a rgumentativa. do negro. pois não xiste um discurso. assim como. Ou diferentes Em nossos estudos de análise de discurso temos proposto a Há ainda distinções que remetem a diferenças de classe: distinção entre texto e discurso. de análises de discurso' texto constit ui uma totalidade lingüística específica além da de análises pragmáticas.jurídica. ainda. segundo essa mesma autora. analítico. um análises Sociológicas (Schegloff. Para ele. também. Por outr o lado. narrativa. etc. de uma forma ou outra. dado. em um plano conceptual. ou seja. Assim como há distinções de de alguns procedimentos operacionais. na análise. por sua vez. Essa distinção se mostrou neces tipos estabelecidos pelas divisões sociais em 1 .para que Pu déssemos operar. proces so discursivo. o terapêutico. pareceu-nos necessário criar essa distinção . sua co ntrapartida. na Gramática Transformacion . Procurando enfatizar o aspecto interacional. então. faz er comentários a respeito da concepção de tipos que desenvolvi em meu trabalho. entretanto. Dessa forma.al. Além das distinções tais como texto e discurso. eles são 'atravessados' por leis que derivam de ordens diferentes de determin ação e funcionamento". é no texto. meio e fim. 0 texto reflete essa duplicidade de sua constituição: enquanto objeto teórico. parale lamente. lhe devolvemos sua incompletude. construção teóric a elaborada a partir de categorizações heterogeneas sobre o texto: categorizações que são retóricas (discurso didático. na sua materialidade específica (seus traços) que se constitui a discursividade. etc. se propõe uma certa metodologia e uma espécie distinta de tipolo gia. não retomarei toda a formulação da tipologia. p. o texto não é um objeto acabado. e é essa sua qualidade discursiva. como há uma relação necessária entre eles. então. talvez se evitem categorizações heterogêne as. representam uma construção teórica. se o consideramos na p erspectiva da análise de discurso. etc. são interdependentes.tem um alcance que afeta também o problema da tipologia. De acordo. é que com efeito os textos produzidos e difundidos no interior de uma formação social dada ( . que "o texto. é possível procurar no texto o que faz com que ele funcione. ) são por assim dizer os lugares de manifestação de uma pluralidade de sistemas de coerção. enquanto objeto empírico. deriva de uma concepção de linguagem distinta. 150). pois o referim os a suas condições de produção. permite uma dinâmica.que venho definindo como atividade estruturante do discurso .) que podem também incidir sobre classes de textos (discurso político. UMA TIPOLOGIA ESPECIFICA Nas considerações a respeito da tipologia que estabeleci (cf . da linguagem e . nesta reflexão. A. as propriedades detectáveis do texto são aquelas que o constituem enquanto visto na perspectiva do discurso. uma passagem entre esses conceito s. envia necessariamente a discurso. Dessa forma. Considerados dessa forma. metalingüísticas (discurso referen cial. Partindo da mesma idéia de que o discurso é objeto teórico. por sua vez. o objeto da explicação é a competencia e a unidade de análise é a sentença.. como abordei mais acima. cognitivo. na Análise de Discurso. em OPOSiÇão à atividade de produção. não os estagnando em uma relação unilateral: através da idéia de funcionamento . Lendo A. enquanto traço escrito' de uma atividade de produção.texto e discurso se determinam mutuamente. aqui. o texto pode ser um objeto acabado (um produto) com começo. ou seja.. Interessa-me. Bouacha e D. com a noção de discurso que adotei. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 205 logias são elaboradas a partir de categorizações heterogêneas sobre o texto e são da ordem do discurso.). procu rei levar em conta outros fatores como o de que a tipologia deve-se constituir internamente à noção de discurso e se estabelecer sobre critérios que derivem dessa noção. Bertrand (1981) pude perceber que essa distinção texto/discurso . a tipologia que propus considera como constitutiva a relação com as condições de produção. Os autores mostram. esses autores vão dizer que "a relação te xto-discurso pode ser apreendida de múltiplas maneiras. encontro mais uma determinação üIperacional para a distinção de texto /discurso que vinha fazendo: as tipo(2) "Traço escrito". com a formação ideológica. científico. 0 conceito de funcionamento. é usado a prop6sito do texto como unidade Produzi da. polernico. etc. E. o objeto da explicação é o discurso e a unidade de análise é o texto .). Creio mesmo que esse é um fenomeno geral em relação às tipologias de discurso: a cada definição de discurso que. Porém. Mediador no sentido de que e configurado por certas marcas. havendo uma gradação entre um tipo e outro. por exemplo. na tipologia que estabelecemos e que se sustenta na reflexão sobre os processos parafrásticos e polissemicos.aquilo que se deve e se pod e dizer em determinadas condições de produção . relação de aliança. há. em sua tensão. Ainda em relação à tipologia que estabelecemos. as configurações se estabelecem no/pelo ato de dizer. procuramos enfatizar a idéia de pluralidade no que diz respeito às formas e sentidos diferentes da linguagem.como um conceito mediador. de inclusão. não acredito que os tipos se definem em-si. Temos tomado o conceito de formação discursiva . Dadas certas condições de produção. são definidas pela sua relação com a .derivam da noção de interação e de polissemia. funcionamento discursivo e formações discursivas. gostaríamos de dizer que se pode m relacionar tipo. através do conceito de polissemia. Os critérios para o estabelecimento da tipologia que propusemos . de determinação. mas em sua ten dência. É assim que. e outras espécies de relação que devem ser observadas pela análise do funcionamento discursivo e que fazem com que o tipo.discurso polêmico. ent re eles. os diferentes tipos se definem por tender para um dos pólos (o lúdico tende para o polissemico. é. Ainda nessa perspectiva de se resguardar o princípio da multiplicidade com o característica da linguagem. estabelecendo o domínio da significação do que se diz. nessa reflexão sobre tipologia. mas relativamente aos pólos para que tendem. com o conceito de interação. predominantemente lúdico ou polêmico ou autoritário. o outro conceito que gostaríamos de introduzir . Não se definem. por outro lado. Por outro lado. Dessa f orma. se caracterize por uma relação não absoluta mas de dominância. na sua relação com funcion amento. eles entram como tipos nas condições de produção de qualquer discurso: o produto (tipo) se recoloca como processo. certos traços formais ao mesmo tempo em que é definido por sua relação com a formação ideológica. 206 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 207 Dada a institucionalização da linguagem. que a noção de tipo. é fundamental para a semântica discursiva pois o tipo determina a relevância de certos fatores que constituem as condições de significação da linguagem. tenho procurado incorporar a noção de históri .os tipos se estabelecem como produto dessa institucionalização e se fixam como padrões. categoricamente. o fato de que há um processo de legi timação histórica das suas formas . é o conceito de tendência. Isto é. segundo o que desenvolvemos. finalmente. decorre que o funcionamento discursivo se define como atividade est ruturante. E o tipo que estabelece o recorte no contexto de situação. um estado do processo discursivo. é que consideramos que os tipos não se distinguem de forma estanque. por sua vez. pois. determina os traços pertinen tes que podem vir a constituir novos tipos ou a confirmar (reproduzir) a forma estabelecida do tipo. aqui. ou seja. Assim. o autoritário tende para o parafrástico) ou para o equilíbrio tenso entre os dois pólos (o discurso polemico). tenho estabelecido uma distinção entre tip o e funcionamento discursivo: os tipos (produtos) são a cristalização de funcionamentos (processos) definidos na própria relação de interlocução. Gostaria ainda de lembrar. é através da caracterização dos funcionamentos discursivos que podemos determinar as for mações discursivas que. A essa noção de história procuro atribuir uma dinâmica. lúdico e autoritário . tomando como referência o processo.a relação existente entre processo e produto. Assim. Uma vez que. por sua vez. considerando a relação entre conceitos como os de processo e produto: aquilo que é tipo (produto) s e constitui como um dos fatores que entram nas condições de produção de um funcionamento discursivo (processo) que. um discurso. Além do conceito de dominância. o ato de dizer é tipificante.pois elas são disciplinadas . procuramos incorporar a dimensão histórica e social da linguagem e. Assim. de conflito. também em relação ao tipo. Quer dizer. quando recon hecemos nos textos do grupo (A) as marcas de indeterminação do sujeito. Além disso. Assim como. A sua interpretação deve levar em conta as condições (3) elação está A colocação 208 A definição de formação discursiva. Finalmente. a int etPretação dos dados obtidos pela aplicação da tipologia tem de ser referida ao contexto. Procuramos os processos mais gerais que vão se dar diferentemente nos diferentes 0iscursos. por sua vez. a duas formações discursivas que se caracterizavam ou pelo episodismo (A) ou pelo seu caráter interpretativo (B). Os dados não têm um sentido único. que pudemos caracterizar. gostaríamos de chamar a atenção para um problema metodológi 1c0 1nIPortante que nos surgiu ao procurarmos estabelecer uma t'POIOgia. A forma que encontramos de evitar a dicotomização categórica foi pel a noção de processo. Em out ras condições de produção (de enunciaçao e sócio-históricas). Isto quer dizer que. em relação à aplicação da tipologia.A e 13 . !'Cnl cçjnstituem uma evidência em si. ENI ]~ULCINELLI ORLANDI de produção dos textos analisados e a relação com a formação ideológica. Ao se distinguir tipos e funcionamentos discursivos.com seu caráter de determinação ou indeterminação. por exemplo.formação ideológica. a indeterminaçãO do su jeito nos textos da história de 1964 a 1974 (que foi o período que analisamos) pode derivar de vários fatores (como a censura. segundo o uso que se fazia dos advérbios. em relação ao disc urso da História do Brasil para a escola. essas passagens se fazem por mediações. por exemplo. com a dicotomia modelo abstrato e uso concreto de forma estrita. É ainda uma questão de níveis de abstração. ou seja. também se deve ter o mesmo cuidado em relação à interpretação dessa (ou qualquer outra) tipologia. Estas formações. sendo os tipos cristalizações de processos (fun Í cIOnamentos). na interpretação das características do texto que o situaM ern uma formação discursiva e não outra. n os remetiam a dois tipos de discurso: (A) o autoritário e (B) o polêmico. em "Funcionamento e discurso". está sujeita ao mesmo condicionamento de qualquer Outra: sua aplicabilidade está regulada pelos objetivos da análise eni sua relação com a riatureza do texto A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 209 . não podemos prescindir do contexto sócio-hist6rico. em relação a sua relativa generalidade. nos rem etiam. uma posição autoritária diante do leitor que e impedido de refazer o percurso do dizer. Por e xemplo. assim caracterizados. Evidenteme nte. se não se considerar essa di stinção na perspectiva da relação produto/processo. não determinar o sujeito pode significar a desrnistificação da noção de herói. Assim. Portanto. Esses dois grupos. de qualquer forma. neste volume. do uso da linguagem. a autocensura e até mesmo a posição ao l ado dos que estão 11o poder) e significam. De toda forma. de formação ideológica e a caracterização de em "Para quem é o discurso pedagógico?". tambérn essa tipologia que propomos. da noção de formação discursiva como mediadora. se estaria reproduzindo a dicOtOnia rnodelo/ocorrencia (língua/f ala). os tipos têln como ba se parao estabelecimento dos critérios a relação de interação dos interlocutores.' Foi assim. historicamente sedimentados. ainda utilizando cOnio dado a análise do discurso da História do Brasil para a escola o fato de se atribuir uma relação com a ideologia. não no~ leva a atribuir automaticamente a mesnia marcas de indeterminaçâo relação a textos com as mesmas Produzidos em outras condições. agora internamente ao dor111nic. deve-se manter uma grande flexibi lidade. por sua vez. agora a nível do uso. pode-se cair no risco de se estar lidand o. a relação entre certos textos e a tipologia: o funcionamento discursivo dos textos nos levaram a distinguir do is grupos deles . Em termos de sua constituição formal. no discurso teórico. em seu nível de general ização. que é o processo discursivo. etc. Isto é. certas características que se costumam atribuir a um certo discurso estão presentes também em outros. que são muito presentes nesse discurso. os performativos que têm uma função importante (as fórmulas religiosas) nesse discurso também o tem no discurso jurídico. os criterios de constituição das diferentes tipologias são heterogeneos e revelam a conce pção de linguagem e de discurso que se adota. o que define o discurso é como o traço se estabelece no funcionamento discursivo. Por outro lado. assim como a espécie de contexto que se está conside rando. o que determinará o tipo de discurso e o modo como esse traço aparece em um discurso. A heterogeneidade de critérios resulta numa grande variedade e complexidad e de tipologias de discurso. Daí propormos que não se desvincule o estudo dos tipos de sua r elação com o funcionamento discursivo. chegamos a concluir que as tipologias. também o são. pois esses resultados não são evidentes por si. Acreditamos. Assim. os discursos não se definem p or um traço exclusivo. gostaríamos de lembrar que. no entanto. uma essencia que define o tipo. Se nós a elaboramos é por termos necessidad e de alguns de seus critérios e por considerarmos que essa tipologia nos oferece uma perspectiva fecunda para a exploração das propriedades que encontramos n os discursos e na ideologia. tem uma generalidade relativa e o que conta em seu estabelecimento e sua aplicação é o objetivo da análise em relação à natureza do texto. de dominancia e de processo que utilizamos em relação aos tipos lúdico. isso se explica pelo fato de que os d . em relação às suas c ondições de produção. elas mesmas. polêmico e autoritário. Ao observar. por exemplo. que a tipologia tem uma fu nção metodológica fundamental de sistematização dos diferentes discursos: é um ponto de encon tro entre o singular e o geral. o discurso religioso. todo ti po é produto histórico. Assim. pudemos verificar que as antíteses. Por isto é preciso se observar o funcionamento discursivo e se trabalhar com a noção de processo. cristalização de algo dinarnico. pois. Podemos generalizar para todas as espécies de tipologias os conceitos de t endência. de qualquer maneira. Do ponto de vista da relação entre formações discursivas e formações ideológicas.a ser analisado. podemos dizer que não há uma marca exclusiva desse discurso. entre outros. 210 1 i 1 1 1~ ENI PULCINELLI ORLANDI Em relação à sua qualidade e às suas marcas formais. o imp erativo. CONCLUSÃO Toda análise supõe uma tipologia. Por isso é que. também o é no discurso da propaganda e em qualquer discurso em que haja "doutrinação". A decisão acerca de seu uso depende das condições de produção da própria análise que se estiver empreendendo. os resultados da aplicação de uma tipologia devem ser referidos ao contexto sócio-histórico do texto que foi objeto da análise. Como última observação. Não há. A interpretação de qualquer tipologia também não deve ser feita de forma automátic a. procurando refletir sobre a capacidade de generalização de propriedades a partir da noção de tipo. que é muito comum no discurso religioso. Essa é uma tipologia entre as várias possíveis. logo ela faz parte das condições de produção de qu alquer análise. ou seja. Isso vale dizer que. Essas nossas considerações indicam que não adianta se dizer que se usa mais um esquema gramatical ou outro (imperativo. Falar desses esquemas não significa nada se não sabemos a função deles em relação à propriedade do discurso que é objeto de nossa análise. assim como há. etc. dada a dominância (saliência) . sobredeterminação e toda es ie de relação. o f ato de que a relação entre a lingüística e a análise de discurso é a de aplicação. De um lado. ou no discurso cotidiano. Assim. como segue: situação não reversibilidade dos planos (espiritual e temporal) texto antítese gramatica negação 0 que explicita o estatuto da lingüística na análise de discurso. Nesse passo. por isso compartilham marcas. pois o esta belecimento da propriedade do discurso é o estabelecimento do funcionamento típico de suas condições de produção. 0 que temos são processos gerais que se cruzam de várias maneiras e que faze m com que um discurso tenda para uma certa forma típica. não há tipos puros de discurso e. antítese. tres fatores. não há possibilidade de distingui-lo. p ela performatividade das fórmulas religiosas. pelo processo de metacomunicação. Tomando como exemplo o discurso religioso. Portanto. ou seja.iscursos se sustentam mutuamente. Como é a voz de Deus que se fala em seu representante. por exemplo. pela visão. negação. Segundo a distinção que estamos estabelecendo. por tod as essas espécies de relação entre discursos. podem ser encontradas em certas canções po pulares ou em certas poesias. aliança. entre os discursos. Mas é só ao referir o esquema gramatical constituído pelas marcas à propriedade é que estaremos caracterizando o dis curso em sua especificidade. podem os dizer que a propriedade do discurso religioso é a não-reversibilidade entre os planos (temporal e espiA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO r 1 i 211 ritual) e a conseqüente ilusão de reversibilidade que se dá pela profecia. sem a consideração do funcionament o do discurso em suas condições de produção. na caracterização típica dos discursos. características que são tidas como típicas do discurso religioso. A observação das marcas (esquema gramatical) pode nos indicar procedimentos relevantes para a descoberta da(s) propriedade(s). de outro. de cruzamentos. o texto e a gramática. tal como vimos fazendo. ou no científico. há inclusão.) para se caracterizar um discurso em relação a outro. o uso de um discurso pelo outro. Isso tudo nos leva a considerar. Como podemos exemplificar através do Discurso Religioso. faz também parte da propriedade desse discurso o fat o de que não há autonomia desse representante em relação a sua voz. as marcas dizem respeito à organização do discurso e as propriedades tem a ver com a t otalidade do discurso e sua relação com a exterioridade. etc. em sua relação: a situação. gostaríamos de introduzir a distinção entre as marcas (traços) e as propriedades do discurso. para se caracterizar um tipo de discurso é preciso se determinar qu al é sua(s) propriedade(s) e depois referir as marcas a essa(s) propriedade(s). etc. é remeter essa dominancia à configu11 212 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO ENI PULCINELLI ORLANDI 213 ração de um tipo. Guespin. 1971. Ochs. Essai de Description du Dis cours Français sur Ia Chine". A. 1975.Cohesion in English. vol. S. Paris. Paris. ções de contexto . Nueva i Retomando. B. . Hachette. Semiotica 4.Sociolinguistique. Halliday. ou fonctionnements discursils?". 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Tarmen. dos processos discursivos gerais style". 0 analista de discurso proc urará determinar o modo como os processos gerais estão presentes num funcionamento discursivo determinado. finalmente. A. Discours."Planned and Unplanned Discours" em Discourse and Syntaxe. d. enquanto produto histórico. Larousse. k BIBLIOGRAFIA Benveniste. . PUF. 1965. 1969. Paris. Larousse."The Machine-Gun Question: an example of co nversational i isto é. Mouton. Larousse. ao explicitar a dominância desse ou daquele traço.colocada no início desse estudo."Types de discours. 1971. S euil. E. Pêcheux. Schegloff. 1971. J."Recherches Sémantiques". Lorigman. sedimentados. . 1981. Analyse Automatique du Discours. Langages. . Journal ofPragmatics. também em relação à monossemia. Em minha perspectiva. ou se ja. então. proponho não fixar de forma categórica o locutor no lugar do locutor e o ouvinte no lugar do ouvinte. têm como parâmetro essa noção e. esses pólos. na sua relação. Como nesse tipo de discurso há um deslocamento. Podemos. Isso. 0 hiper-social (fático) e o hipo-social (poético): ambos vão além do esperado.procurei tomá-la como um dos parametros na definição do discurso religioso em suas propriedades.-~ko" fosse entendida aqui antes como se ntimento do que como engano. gostaria de dizer que ele pode suspender essa co ndição.a de reversibi lidade . embora não haja reversibilidade de fato. não se constitui. * exagero para mais. não podemos afirmar que o discurso autoritário e um discurso monossêmico mas sim que ele tende para a monossemia. E entendo reversibilidade como a troca de papéis na interação que constitui o discurso e que o d iscurso constitui. o que importa é a linguagem em si (o prazer de dizer. Ao propor a reversibilidade como condição do discurso. é constituído pelo seu contexto imediato de enunciação e pelo contexto histórico(1) Gostaria que a palavra "ili. Todas as formas de discurso. afirmar que o discurso autoritário tende par a a monossemia. então. o discurso não se dá. não prossegue. estancada. Iúdico e autoritário. não significa que todo discurso se estabelece na harmonia dessa condição. embora o discurso autoritário seja um discurso em que a reversib ilidade tende a zero. entretanto. Pela noção de reversibilidade. esses lugares. A questão da reversibilidade traz como conseqüência necessária a consideração do out ro critério que temos utilizado para a distinção de tipos de discurso: trata-se da polissemia. uma vez que é um discurso que está no limiar da concepção de linguagem como dialogia. o contato. Entretanto. Isso porque. há. no poetico. em se tratando do discurso autoritário. como posição inicial dessa reflexão. ou seja . em relação à reversibilidade. sem essa dinâmica na relação de interlocução. quando é zero o discurso se rompe. em direção ao poético. não se definem em sua essencia mas quando referidos ao p rocesso discursivo: um se define pelo outro. Pois bem. e. é a ilusão da reversibilidade' que sustenta esse discu rso. o discurso polêmico a realiza segundo certas condições (a dinâA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 215 mica da tomada da palavra) e o discurso autoritario busca anular essa possibilid ade. enquanto limite. e o d omínio (o escopo) do discurso fica comprometido. desfaz-se a relação. o sentido absoluto). Coloco. de um lado. Como já tive ocasião de observar. e. em direção ao fático.INTRODUÇÃO: A NOÇÃO DE REVERSIBILIDADE Tenho colocado a noção de reversibilidade como um dos critérios subjacentes à ti pologia em que distingo os discursos polêmico. . aponta para duas possibilidades mais radicais. que a reversibilidade é a cond ição do discurso. as duas possibilidades radicais se revelam nessa duplicidade: no fático. É um discurso que. de outro. definem o espaço da discursividade. Isto porque todo discurso é incompleto e seu sentido é intervalar: um discurso tem r elação com outros discursos. buscando as determinações que caracterizam essa noção . Daí a necessidade de se manter o desejo de torná-lo reversível. gostaríamos de observar que. uma vez que esse discurso se caracteriza pela polissemia contida . Daí a ilusão. no entanto. E essa ilusão tem várias formas nas diferente s manifestações do discurso autoritário. o centro desse discurso tende para * troca de papéis em si (o prazer do bate-papo). Quanto ao discurso ludico. * relação com a reversibilidade tende para menos. procuro estabelecer q ue. b) só existe ideologia através do sujeito e para sujeitos. e se institui na relação entre formações discursivas e ideológicas. Poderíamos. as duas teses conjuntas que sustentam sua argumentação na análise dess e exemplar são: a) só existe prática através e sob uma ideologia. esse discurso fictício religioso como um exemplar que funciona co mo um "dicionário" discursivo. nos seus rituais. na perspectiva do discurso autoritário. ou sua pretendida monossemia. nesse trabalho. Althusser procura mostrar como a estrutura de toda ideologia é especular e duplamente especular: submete os sujeitos ao Sujeito e dá-lhes. 0 autor passa. então. Segundo esse autor. no seu caráter tendencialmen te monossêmico. segundo AIthusser: a) a interpelação dos indivíduos como sujeitos. Deus nomeia. mas também n as suas práticas. por outro lado. na condição de os s . d) a garantia absoluta de que está tudo bem.216 ENI PULCINELLI ORLANDI social.ao haver interpelação dos sujeitos com uma identid ade pessoal . o sentido (os sentidos) de um discurso escapa(m) ao domínio exclusivo do locutor. pode ser considerado. e do próp rio Sujeito em sujeito-Sujeito (o dogma da Trindade). para ele.o fato de que há uma condição absoluta para se pôr em cena sujeitos religiosos cristãos: só 1 1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 217 existe essa multidão de sujeitos religiosos possíveis porque existe um Outro Sujeito único absoluto. nas suas cerimônias e nos seus sacramentos". nos seus teólogos. Como. os seus espelh os. Mostrando a necessidade do desdobramento do Sujeito em sujeitos. ele reúne em um discurso fictício "o que ele diz não só nos seus testamentos. A DEFINIÇÃO DO DISCURSO RELIGIOSO Althusser (1974) dá.. Então. decisivo. os seus reflexos (não foram criados à Sua imagem?). assim. a ideologia religiosa cristã. a distinguir o Sujeito dos sujeitos vulgares: Deus é o Sujeito e os homens são os seus interlocutores-interpelados. nunca é ele que dá a si próprio o seu nome". o reconhecimento do sujeito por ele próprio. então. c) o reconhecimento mútuo entre os sujeitos e o Sujeito. ) eis quem tu és: és Pedro". aquele que e por si e para si (Sou Aquele que É) e aquele que interpe la seu sujeito ( . nos seus sermões. 0 indivíduo não nomeia nem a si próprio item a Deus. como exemplo da estrutura formal de qualquer ideologi a. o que procurarei mostrar aqui é a forma que a ilusão da reversibilidade adquire nesse tipo de discurs o. Como a questão da reversibilidade está necessariamente ligada à questão da polis semia. é a noção de sujeito. e entre os próprios sujeitos e. A estrutura duplicada da ideologia assegura. 0 objeto de nossa reflexão. por definição. o termo central. ao falarmos na ilusão da reversibilidade. dizer que todo discurso. o religioso. todo "indivíduo é chamado pel o seu nome no sentido passivo. no Sujeito. então. em termo s tipológicos. não é no meado. Althusser destaca ainda . "Deus define-se portanto a si mesmo como sujeito por excelencia. garantia de que é efetivamente deles e Dele que se trata. ou seja. é polissemico. b) a sua submissão ao Sujeito. finalmente. Mais ainda.. e que. Para tal. Ele constrói. estaremos também falando nas condições de significação do discurso autoritário. sendo q ue o discurso autoritário tende a estancar a polissemia. Assim sendo. e pensando essa relação de sujeitos e Suje ito. estudos comparativos. a partir da formulação de certos conceitos e certos procedimentos.um centro de iniciativa. qual é o estatuto da sua voz na comunidade indígena. ou. em geral. no discurso religioso. sobretudo o discurso religioso cristão .sujeito a uma autoridade superior. Assim seja! Temos. de qualquer representante s eu . então. o lugar atribuído à Palavra. as diversas maneiras que o homem tem de se relacionar com o sobrenatural.particu larmente o católico. então. não é nem necessário dizer que não se trata de força ou coerção a ideologia determina o 218 ENI PULCINELLI ORLANDI espaço de sua racionalidade pela linguagem: o funcionamento da ideologia transform a a força em direito e a obediencia em dever (0. qual é a natureza da relação do pajé com a voz do sobrenat ural. começaria por dizer que. não estamos propondo que se desconheçam (nem se supervalo rizem) as diferenças. da caracterização do discurso religioso como aquele em que fa la a voz de Deus. salvo a de aceitar livremente a sua submissão.ujeitos reconhecerem o que eles são e de se conduzirem de acordo. 1980). posteriormente. É assim que se expressa o livre arbítrio. Isto . Para os objetivos desse trabalho. etc. e variando-se inclusive de cultura. o pajé pode ser considerado um representante. Deus) e o ouvinte é do plano temporal Ços sujeitos. podemos entender que a definição de sujeito aponta para duas direções: a de ser sujeito e a de assujeitar-se. A partir dessas reflexões. De acordo com Althusser.e um ser submetido . a identidade. ao mesmo tempo. ou seja. A religião constitui um domínio privilegiado para se observar esse funcionamento da ideologia dado. um parametro cuja função é exploratória. autor e respo nsável por seus atos .ou do pregador. por essas relações de sujeito: o reconhecit 1 1 1 mento. Creio que dessa forma poderemos chegar à distinção de características que são próprias ao discurso religioso em geral e a outras que são particulares a certas espécies de discurso rel igioso. uma subjetividade livre . uma vez que a n oção de livre arbítrio traz. E o objetivo desse nosso estudo é justamente o de instituir um parâmetro exploratOrio. Reboul. Ou seja.é a voz de Deus. em si. Partindo. em sua duplicidade: sujeitos submet idos ao Sujeito/ sujeitos reconhecidos pelo Sujeito. quando dizemos que este nosso trabalho procura estabelecer um parametro explorat6rio. eu perguntaria se. A nossa intenção. os homens). no c aso dos índios. Em relação à coerção. a partir do qual se poderão observar as formas da religião em geral. ent re outras coisas. Tomaremos. por tanto desprovido de toda liberdade. a de coerção. Para tal é necessário que se façam. repito. ao contrário. como referência. No sujeito se tem. 0 que nos leva a afirmar que o conteúdo da ideologia religiosa se constitui de uma contradição. o apaziguamento. há um desnivelamen to fundamental na relação entre locutor e ouvinte: o locutor é do plano espiritual (o Suj eito. Por exemplo. vamos caracterizar o discurso religioso como aquele em que fala a voz de Deus: a voz do padre . foi estabelecer. tudo correrá bem. "o indivíduo é interpelado como sujeito (livre) par a que aceite (livremente) a sua sujeição Só existem sujeitos para e pela sua sujeição". esta é uma forma de se elaborar uma sistematização para se poder reconhecer as diferenças quando e se elas existirem. porque a desigualdade imortalidade/ mortalidade instala. Na desigualdade. MODOS DE REPRESENTAÇÃO E OBSCURIDADE fessor. de acordo com a A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 219 crença. infalível. 0 apagamento da forma pela qual o rep resentante se apropria da voz é que caracteriza a mistificação. 0 "faz-de-conta" 220 ENI PULCINELLI ORLANDI se constitui da relação com o imaginário. eferneros. Ao contrário. para os homens. quando digo que a voz de Deus s e fala no padre. mortais. a subsunção de uma voz pela outra é o como se. a relação vida/mor te e dessa relação nasce a necessidade de salvação para a vida eterna. segundo a assimetria. Portanto. riador. imortal.' 0 que nos leva a afirmar que há. que assim se constitui. com o domínio da disciplina e das instituições.de -conta". dotados de poder relativo. Logo.é. que constitui o discurso religioso. devemos distinguir esse "como se" do -f az. eterno. Procuramos distinguir o modo dessa representação nos diferentes tipos de dis curso e pudemos perceber que a distinção repousa na maior ou menor autonomia do representante em relação à voz que fala nele. é "como se" Deus falasse: a voz do padre e a voz de Deus. A assimetria. Dessa assimetria original vão decorrer. e) no discurso da história: a voz dos fatos se fala no histo- Poderíamos estender esse mesmo procedimento de análise do mecanismo de incor poração da voz para todos os outros tipos de discurso. sem que se mostre o mecanismo pelo qual essa voz se representa na outra. infinito e todo-poderoso. é a subsunção de um voz pela outra (estar no lugar de). quando falamos do "como se". finitos. Assim. . essa relação de interlocução. 0 locutor é Deus. locutor e ouvinte pertencem a duas ordens de mundo totalmente diferentes e afet adas por um valor hierárquico. b) no discurso político: a voz do povo se fala no político. como veremos. é dad a e fixada.desses discursos. 0 móvel para a salvação é fé. Pensando-se o mecanismo de incorporação de vozes. c) no discurso pedagógico: a voz do saber se fala no prod) no discurso terapêutico: a voz da natureza (saúde) se fala no médico.uma voz que se fala na outra da qual é representante . a forma da mistificação: em termos de discurso. Deus domina os homens. várias outras. Em outras palavras. tal como colocamos na defi nição do discurso religioso . est amos tratando não da relação com o imaginário mas com o simbolico. Essa é a forma da representação. ou seja.podemos fazer um paralelo entre o discurso religioso e outros tipos de discurs o: a) no discurso religioso: a voz de Deus se fala no padre. por uma desigualdade em sua relação: o mundo espiritual domina o temporal. caracteriza a tendencia para a não-r eversibilidade: os homens não podem ocupar o lugar do Locutor porque este é o lugar de Deus. os ouvintes são humanos. falíveis. logo. Segundo o que pensamos. pois. logo. da relação simbólica. Essa é. para nós. são cismas. A interpretação própria da palavra de Deus é. pois. em relação ao político. devemos atentar para a assimet ria dos planos. manipular. há uma relativa autonomia. pela Igreja. por exemplo no catolicismo. o Bispo. Sua natureza é particular. Há regras estritas no procedimento com que o representante se apropria da voz de Deus: a relação do representante com a voz é regulada pelo texto sagrado. Os sentidos não pode m ser quaisquer sentidos: o discurso religioso tende fortemente para a monossemia. Há. pois.Na ordem espiritual. a relação se faz pelos mediadores: Nossa Senhora. Assim. por Luiz Henr ique Lopes dos Santos. também em relação à interpretação das palavras. o temporal e o espiritual. ou seja. deve-se crer e obedecer. É assim que se cria o consenso. modificar relativamente o saber estabelecido. Dada a forma da representação da voz. etc. DISCURSO RELIGIOSO 1 . o representa nte da voz de Deus não pode modificá-la de forma alguma. in stituem novas seitas. os Santos.` o lugar próprio para a palavra é determinado segundo as diferentes cerimOnias . que é a revelação da palavra de Deus. principalmente. mantém-se a distância entre o dito de Deus e o dizer do homem. podem os dizer que o discurso religioso não apresenta nenhuma autonomia. no sentido de que. Em relação ao professor. e dada a assimetna fundamental que car acteriza a relação falante/ouvinte no discurso religioso. as regras são referidas às duas ordens de mundo. DISCURSO TEOLõGICO. . inventar a voz do povo que lhe for mais conveniente. os diferentes tipos de discurso. isto é. a respeito do papel da representação. aqui. inace ssível e desejada. o professor pode elaborar. dessa forma.diferentes graus de autonomia. há uma maior independência: o político não só é autOno relação à voz do povo como ele pode até mesmo criar. é o próprio Deus. (3) Eis uma importante função do esoterismo: porque não se compreende. o discurso religioso. os Padres. ao inco rporar o saber. um grau de autonomia razoável. há sempre a possibilidade das diferentes interpr etações (leituras) das palavras (do texto). Segundo essa assimetria. mas essas diferenças observam um regulamento categórico: além de um certo limite.' o (2) Agradecemos aqui as colocações feitas em conversa pessoal. deve ocupar lugar à parte Jesus Cristo: sendo o Deus que habi tou entre os homens.Na ordem temporal. elas são consideradas transgressões. E assim se mostra e se mantém a obscuridade dessa significação. pois. separação essa que deriva da dissimetria entre os planos. o texto prOPrio é a Bíblia. regulada. enquanto religião institucional. a relação com o sagrado. se faz pelos representantes da Igreja: o Papa. No cristianismo. a interpretação própria é a da Igreja. Importa -nos. embora seja a parte acessível de Deus. Como. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO Uma vez que há obscuridade. os agentes da interpretação são de duas espécies: . Desde que lhe seja atribuída legitimid ade. pelas cerimônias. não é nem representante nem mediador. Poderíamos observar. Visto nesta perspectiva. há uma separação'(diferença?) entre a significação divina e a linguagem humana. Nessa distinção. e. é preciso que os homens. Como a dissimetria se mantém.. não vemos como necessário. devem ter mérito. assumem as qualidades do espírito. A própria fala é ritualizada. ou se poder falar diretamente. é dada de antemão. a relação com o Sujei to diante do qual a alma religiosa se define: esses sujeitos. 1968). sob a homogeneidade ideológica. o discurso religioso seria aquele em que há uma relação espontânea com o sagrado. fenômenos bastante controversos. para serem ouvidos po r Deus. Então. mesmo quando há relação direta com o sagrado. se considerarmos a distinção entre discurso religioso e teológico. distingue-se o discurs o teológico do religiose por ser aquele mais formal e este mais informal. 222 ENI PULCINELLI se observar que as religiões de conversão (de exclusão) são as As religiões de culturas sem escrita. manten do-se a dissimetria. por Marilena Chauí. que eles assumam a relação da dualidade. se submetam às regras: eles devem ser bons. que é a que nos interessa nesse trabalho. a não-reversibilidade se mantém. e que são mais ecléticas (cf. com respeito a esta propriedade. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 223 Por isso tudo. pela informalidade.i Todas essas observações. o lugar de onde fala. uma vez que essa distinção não afeta a característica da nãoreversibilidade. po r um autor como Granisci. ter fé. para nossos objetivos. por exemplo. certamente. Como os que podem ser vistos nas considerações feitas. É preciso. em análise de linguagem. Destacamos esse aspecto por considerarmos a sua relevância para a caracterização da noção de reversib ilidade. pois. Não se alterou o poder de dizer. não havendo alteração do estatuto jurí o dos interlocutores: de um lado. Isso porque. para serem ouvidos. qu e se trata de noções complexas que abrigam. etc. de passagem. nessa relação de interlocução. Há f6rmulas para se falar com Deu s. ORLANDI teólogo. o espontaneo. Em oposição a este. . Ess a autora. para essa nossa reflexão. 0 que. Isso se considerarmos o teológico como o discurso em que a mediação entre a alma religiosa e o sagrado se fa z por uma sistematização dogmática das verdades religiosas. só se efetuam por rituais. distinguir entre discurso teológico e discurso religioso. de outro. Goody. significa que não se alterou o estatuto jurídico do locutor. dá outras determinações a essa distinção. ele mesmo. quando se fala com Deus. qualidades do homem que tem fé. A reversibilidade não está em se poder falar também. tem suas formas já d adas. 9 (5) Essa é uma distinção que me foi dada. temos sempre a onipotência divina.uma subdivisão paralela aos grupos sociais afetados . ). a submissão humana.enquanto conjunto cultural . se o faz por orações ou po r expressões mais ou menos cristalizadas (como: õ meu Deusi faça com que . Segundo Gramsci (1966a). e onde o (4) É interessante religiões que têm escrita. A dissimetria se mantém pois se mantém a mesma qualidade da relação. A propriedade que estamos considerando na caracterização do discurso religio so é a reversibilidade.. em seu interior. informalmente.' Em geral. existe na religião . mesmo quando se caracteriza essa relação de fala pela familiaridade. entretanto. E são algumas dessas considerações que gostaríamos de trazer. o que acontece é que. estariam situadas mais no domínio do teológico. Não nos devemos esquecer. 0 eu-cristão pode falar diretamente com Deus mas is to não modifica o seu poder de dizer. o informal. puros. sendo que essa espontaneidade não afeta a reversibilidade. aparece como aquele que faz a relação entre dois mundos: o mundo l iebraico e o mundo cristão. uma multidão de religiões distintas e. 0 senso comum é. desde os escritos da juventude aos Quaderni.Qualquer religião é. etc. observar a forma como a reli gião popular lida com os representantes e mediadores (promessas. como a concepção da hier arquia eclesiástica (dos intelectuais da religião). Essas relações. a síntese desses dois erros teóricos". na realidade. ele coloca a existencia de um catolicismo de camponeses. muitas vezes. da concepção de mundo é que podemos ver a relação entre filosofia. uma vez que (6) Segundo Grarnsci. um catolicismo de i ntelectuais. com efeito. Dessa forma. podemos. No ambito. embora part am de um ponto comum. "A linha teórica de Gramsci. segundo ele. ex-voto s). Segundo Portelli (1974). por sua vez velado e incoerente. a de não distinguir de forma estanque o discurso religioso do teológico: p referimos trabalhar no interior da tensão que os constitui em sua relação. Paralelamente. a religião abarca duas dimensões: a de concepção de mundo e a de atitude prática. a nossa proposta é. Tomando o domínio do catolicismo. para Gramsci. Podemos observar que. A contradição entre os termos dessa oposição ue caracteriza a religião (católica) e a assemelha às doutrinas utópicas. Da religião do povo fazem parte.se manifestará como a filosofia da religião. sens o comum e folclore: "o senso comum é o folclore da filosofia e se acha sempre na metade do caminho entre o folclore verdadeiro e próprio (quer dizer tal como se o considera comumente) e a filosofia" (1966b). são puramente negativas.no catolicismo . Essa dupla crítica culmina na análise da religião: esta é. superstições científicas vinculadas a religiões do passado. no interior de u ma mesma religião. Essa heterogeneidade social e ideológica é que explica que. não se pode desconhecer que há multiplicidade também quanto às fo rmas e funções da religião. Se assim fizermos. podem-se distinguir a teologia e a religião popular. A teologia . o estudo das ideologias política e religiosa é necessári . uma importante contribuição: a que coloca a concepção religiosa das relações entre Homem e Natureza. o termo médio: o folclore é a concepção de m undo das classes subalternas e a filosofia é a ordem intelectual das classes fundamentais. ao concordar com o que diz Gramsci e ao considerar a import ancia de sua dupla crítica na reflexão sobre religião. segundo Gramsci: formas precedentes do catolicismo atual. que é distinta daquela como os teólogos se posicionam diante dos mesmos. só para ficar em um exemplo. a dualidade da ideologia 6 religiosa pode ser ilustrada pela oposição entre o materialismo da religião popular e a especulação idealista dos teólogos. um catolicismo de mulheres. milagres. ainda em Grams ci. 224 EN1 PULCINELLI ORLANDI i i i 1 1 A partir da distinção entre intelectual e popular. como já dissemos. para Grartisci. ESPIRITO E FE No escopo dos dualismos que caracterizam a religião. contraditórias. a religião popular forma o essencial da ideologia que compõe o folclore e o senso-comum. se baseia em duas críticas constantes: a do materialismo positivista e a do idealismo especulativo. temos. movimento s heréticos populares. assim. o homem como puro espírito. lhe vem de Deus.torna possível a articulação entre a ordem temporal e a espiritual. é a disposição de mudar e ireção à salvação.a passiva e conservadora do cristianismo jesuítico. espírito/ matéria .e quando tem a forma de "ópio do povo" . mas como a fé é um dom divino. duas atitudes totalmente opostas: quando esta replesenta uma necessidade . Entretanto. ela não emana do próprio homem. Isto é. Distingue. os demais já enumer ados.o porque elas constituem as formas principais de concepção de mundo. podemos dizer que a articulação entr e o homem e Deus se faz através da noção de espírito. a alma religiosa deve assumir as qualidades do espírito. é o parâmetro pelo qual se delimita a comunidade e constitui o escopo do discurso re ligioso em suas duas formações características: para os que crêem. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 225 ambos se referem a mundos diferentes: a natureza (o mundo exterior) se apreende como uma realidade objetiva. Esse é um dualismo que irá compor. dada a separação indicada por essa condição (o pecado existe). em relação à religião. Já que. do cristianismo primi tivo. segundo Portelli (1974). teremos um quadro aproximado como segue: s i Homem Plano Humano Ordem Temporal sujeitos Homem espírito matéria Plano Divino Ordem Espiritual Sujeito Natureza Deus Observando-se esse quadro de dualismos. os convictos dos não-convictos. Essa é uma passagem e. Deve-se pois estudar a relação entre o sistema religioso e o sistema político em cada formação soc ial. então.homem/natureza. como vimos . que é o móvel para a salvação. Um outro aspecto importante da fé. é ela que tem a palavra da revelação.a ativa .representa uma ideologia "inútil". é preciso referi-Ia a uma outra noção. a do protestantismo . a defié. E a Igreja que atribui os sacramentos . A fé remove montanh as. não é capaz de modificar a relação de não-reversibilidade do discurso religioso: a fé é uma graça recebida de Deus pelo homem. Entre as qualidades do espírito está a fé. a ser observado. Uma . Com esse dualismo. para a relação com o Sujeito. etc. para os que não crêem é uma ameaça.fornece a base ideológica para uma ação positiva.a ativa. com suas características. dad condição humana em relação a Deus. 1~ 226 A fé é um dos parâmetros em que se assenta o princípio da exclusão. podemos dizer que a fé não a elimina. o discurso religioso é uma promessa. tem muito mais poder. E o espaço em qu e se dá a exclusão é a Igreja: os que pertencem a ela (os que acreditam) e os que não pertencem (os que não acreditam). material. em que esgotou sua função histórica e só se mantém p or artifícios e/ou por repressão. com fé. o interesse principal de Granisci está mais centrado na dimensão prática do que na concepção de mundo que corresponde a cada religião. é o fato de que a fé é que d istingue os fiéis dos não-fiéis. a fé é a possibilidade de mudança. 0 homem. independente do mundo matefial. Interpretando-se a fé com referencia à assimetria. Logo. isto é. a outra . A caracterização desse dualismo . na relação com Deus. a leitura correta do texto sagrado. enquanto se considera.a passiva . . para entendê-la. a. aquele em que Deus desce a té os homens e partilha com eles suas qualidades divinas. a po ssibilidade de ministrar sacramentos. que anunciamos no início desse trabalho. etc. Qualquer que seja a forma da ilusão. pelo poder temporal. o movimento de cima para baixo. é o caso em que se conside ram as fórmulas religiosas em seu carater performativo: a infalibilidade do Papa. trata-se sempre de uma ilusão produzida e mantida dentro de regras. longe de negar. do misticismoÉ a partilha do movimento de baixo para cima: aí estão o profeta. é preciso estar investido de uma autoridade dada. se dá pela visão. consagraçao na missa. o---que o homem é que va se alça até Deus. etc. veremos que há regras estrita s para que esses atos de linguagem se constituam efetivamente em performativos: as fórmulas religiosas. em condições muito bem determinadas. Para realizar esses atos. e confirmando. é o da profecia. da passagem de um plano a outro: nele se i 1 i 1 1 A LINGUAGEM E SP~U FUNCIONAMENTO 227 juntam a interferencia divina e a inexplicabilidade da ciencia dos homens 1. é mais um fator que comprova a não-reversibilidade. os Padres. pela performatividade das fórmulas religiosas. Deus partilha com os homens suas propriedades. a ilusão da reversibilidade. ou pelo menos reconhecida. e assim alcança cas suas qualidades atemporais (onipotência.). o vidente. o homem Essas são as formas de ultrapassagem. em si- . pela profecia. A ilusão é a da passagem de um plano a outro. Se tomarmos. a dissimetria dos planos em que se constitui. os performativos. sendo um dom divino e se submetendo ao espaço religioso determina do pela Igreja e suas leis. ENI pULCINELLI ORLANDI AS FORMAS DA ILUSÃO DA REVERSIBILIDADE De forma geral. onisciência. ir--nos que essa ilusão pode ter duas direções: de cima para baixo. Feitas essas considerações. ou seja. as bençãos. a fé. etc. onipresença. Inversamente. eternidade. de baixo para c ima. em última instância. o milagre é a confirmação da ilusão da reversibilidade. pela revelaÇão. para ter validade. de um mundo a outro. até Deus. Visto nesta perspectiva. dadas as dualidades e a intransponibilidade das diferenças .Então. como exemplo. isto é. podemos agora determinar as formas da ilusão da re versibilidade. da visão. têm de ser usadas em situação apropriada e be m configurada. os Bispos. Aí estão: o Papa. o místico. etc. ULTRAPASSAGEM E TRANSGRESSÃO: A VONTADE DO PODER ABSOLUTO Como a relação com o sagrado revela. Respondem. A. 0 poder da Palavra na religião é evidente. esses lugares são disput ados e a retórica e uma retórica de apropriação. é a expre ssão fundamental da não-reversibilidade. ou s eja. Então. ordena. E o exame desse mecanismo resulta na confirmação da dissimetria de que estamos tratando ao lorgo desse trabalho: Deus (Sujeito) Institui. interpela. em Religião e Sociedale. salva. n? 5. é não ter limite nenhum. A performatividade da linguagem está ligada intimamente a uma visão da linguagem como ação. lhe será próprio. a ilusão da reversibilidade toma apoio na vontade de poder.tuações sociais bastante ritualizadas. etc. Aí está uma EN1 PULCINELLI ORLANDI diferença fundamental entre o discurso religioso e outros: nos outros discursos a que nos referimos. 228 discurso religioso. etc. do determinado. E daí deriva a "ilusão" como condição necessária desse tipo de discurso: o como se fosse sem nunca ser. desculpam-se. 0 representante. "Eu te batizo". 0 mecanismo da perform atividade atesta esse poder de forma clara. com o poder absoluto. em relação a orações que. entre outros fatores. Refletindo a respeito da f orma de representação de que estamos tratando. do meu ponto de vista. etc. não e Deus. é estar no lugar de. pela diferença das ações jue instituem ao dizer. No entanto. ou então. e tendo o estatuto jurídico que lhe compete. exortam. aquele que fala do lugar de Deus transmite Suas palavras. daquilo que é aprisionamento. no (7) A respeito da caracterizaçãodo milagre: "Milagre e Castigo Divino" de Al ba Zaluar. etc. a reconhecer que o poder da pa lavra está bem distribuído e regulado na relação entre o homem e Deus. no caso. . condena. agradecem. E ter poder divino é ultrapassa r tudo. regula. com a própria justiça. suficientemente munido de seu diploma. ou "estão casados' . mas não se confunde com Ele. o político. não é estar no lugar proPrio. em relação 1 condição da reversibilidade (ou não. é ser completo. dadas certas condições. Como acontece nas situações em que se diz. Ter poder é ultrapassar. a relação do homem co m o poder. por ex emplo.0 mesmo se dá com o juiz. 0 representa legi timamente. devemos L-mbrar que ser representante. Por esse mecanismo de apropriação e les acabam por ser confundidos com o próprio saber. o antesaluno falará do lugar do professor .' Essa.reversibilidade). mais uma vez. devem ser feitas em condições precisas. então. o representante passará a fala r do lugar próprio. 0 que nos leva. 0 sujeito se transforma naquele do qual ele ocupa o lugar. 1980. Por exemplo.. Não ccmo ação decorrente do falar mas como ação estruturalmente incrita no próprio ato de falar. pedem. Essa vontade aponta para a ultrapassagem das determin ações (basicamente de tempo e espaço): ir além do visível. limite. que. para ter vali dade. Pela distinção colocada acima podemos ver confirmada a expressão da diferença do estituto jurídico entre os interlocutores. isso não se dá no caso do discurso religioso. como vimos mais acima. Deus escapa à compree nsão. Segundo ela. Seria interessante um estudo próprio a cada espécie de transgressão. ago ra sob nosso enfoque. usando seu nome em vão. por exemplo. tal como o pacto com o diabo. à interpelação dos suj eitos pelo Sujeito. do tucano Carlos Machado. o pecado . ou nas formas de loucura. E é nessa relação com o poder que reside o prazer de transgredir. Tanto que era ser imortal para nós que foi um choque quando os primeiros padres faleceram. veremos que a gratuidade apontada pela autora. como compon . são formas de tentar ocupar um lugar nunca ocupado. não prejudica nenhum ser humano. Quanto a esse último temos um exemplar na literatura. a heresia. se observarmos bem. não morna. Ou. para se c onhecer assim a sua qualidade. em relação ao mecanismo da ilusão da reversibilidade. Se. um sinal de dornesticação. Em um estudo magnífico sobre inter dições. não devendo ser nomeado. porque é sempre-já simbólico. segundo Althusser. que caracteriza a forma ilegítima dos mecanismos impróprios. pode ser ou uma quebra das regras do jogo . se se exclui. como o caso Schroeber. Todas essas formas de transgressão. colocada no âmbito das diferenças cultura is.t al como a blasfêmia. não traz nada. Sendo a nomeação uma maneira de aproximação. o ato de nomear está submetido a regras da relação Sujeito/ sujeitos. Nancy Huston (1980) mostra como. é atestada por uma fala indígena. pois ao se tomar o lugar. ela pressupõe a compreensão do objeto e. sendo a bla sfêmia a apropriação do inapropriável. que e o caso de Mefi stófeles. a blasfêmia topou-se preocupação obsessiva para o cristianismo. Eis uma diferença do domínio das regras discursivas. para nós eles eram imorta is". a ilusão da reversibilidade cria o sentimento de identidad e com Deus.ou a usurpação do lugar. Vejamos o caso da blasfêmia. ou ultrapassagem. por sua vez. Já que eles mesmos se diziam pregadores da palavra de Deus. apresentando-se assim como uma forma legítima de ultrapassagem. de um lado. dado o lugar atribuído à Palavra. Esta também é uma forma de experimentar o lugar do poder absoluto. ou ocupável. há o outro lado. 229 Temos estado observando a ilusão da reversibilidade no interior do maniqueís mo instalado pela própria religião. um seu traço fundamental é a gratuidade: não muda nada. E como ele o ultraja? Nomeando-o. Essa gratuidade reside no exercício de uma liberdade e por isso é um pecado atroz: o blasfemo ultraja Deus gratuitamente. através de mecanismos próprios (de que tratamos no item anterior).1 í A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1 i i (8) A incompreensão desse mecanismo. que já não se apresenta então como ultrapassagem mas como transgressão. A transgressão. do Alto Rio Negro (1982): "o padre era um ser imortal para o índio. i 230 EN1 PULCINELLI ORLANDI Interpretando o procedimento da blasfêmia. por pura malícia. tal como o estabelecemos para as formas legítimas. que é considerado por Huston. que nos diz que a blasfêmia nasce da contradição. É a própria Huston. Essa contradição deriva do maniqueismo.não deixa lugar para meio termo. eu diria "Essa gratuidade reside no exercício de uma liberd ade que se quer sem limites". preenchendo o mesmo papel semantico. fora do domínio do maniqueísmo. segundo a qual. deriva da energia conservada graças ao percurso instantaneo de um trajeto infinito ". de doze anos. Assim. se apropriam (ou se beneficiam) um pouco do prestígio desse dize . às vezes de forma mais explícita. indubitavelmente. da distinção corpo e alm a. E se encontra s ua manifestação. a da ilusão da reversibilidade. NO COTIDIANO E EM QUALQUER FORMA Mas também podemos observar a vontade Oe poder absoluto. para o cristão.ente dessa forma de trangressão (pecado). o sentimento religioso é fortemente ambivalente e essa ambivalência é que está presente no mecanismo da blasfêmia: pode-se dizer "Deus" ou "Dia bo"-na mesma situação. não está fechado no espaço dos templos religiosos ou nas formas institucionais da religião. etc. de Andrade (1926): "0 carnaval no Rio é o acontecimento religioso da raça". estes. deriva justamente da relação com a não-reversibilid ade e a vontade de ultrapassá-la. não entre termos. colocaremos um. a aspiração aos dons divinos. Pelo menos no domínio do cristianismo. Ou seja.ou está comigo ou está contra mim . presente no Fantastico (outubro). A expressão limite do maniqueismo . entre estar ao lado de Deus ou vender a alma ao seu contrário. temos a afirmação de Nietzsche. Adquire múltiplas formas e companha o homem em seu dia-a-dia. para citar algo mais forte. em qualquer fragmento de linguagem. E é dessa f orma que entendo uma afirmação como a de 0. etc. a passagem dos limites. Por isso. E com a condição de "ter decretado uma distancia infinita entre Deus e o Diabo que se pode confun di-los num fim regressivo e transgressivo: o prazer de blasfemar. ou seja. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO Í 1 1 1 231 0 sentimento religioso. Só para exemplificar. com o sagrado. Entre Deus e o Diabo. nasce do desejo de transgredir a dissimetria dos planos. o misticismo. Há uma referencia explícita a essa aspiração em um verso de um poeta jovem. Mas jornalistas também g ostam de deixar entrever sua familiaridade com o dizer religioso. Os novelistas se colocam entre os criadores e. onde Huston diz "Essa gratuidade reside no exer cício de uma liberdade". as vezes de forma heróica. se houvesse um Deus. Ou. ele não suportaria não ser Deus. não podemos deixar de aponta r para esse outro lado que constitui a ilusão da reversibilidade. e. que diz: "Ser poeta é ser Deus". aspiram atravessar limites. encontrado casualmente na revista Veja n? 736 (outubro de 1982): "0 grande divertimento de quem escreve uma novel a é brincar de ser Deus durante seis meses. no espaço determinado pelo desejo de par tilhar do poder ilimitado só tem essa escolha: entre o bem e o mal. mas no interior de uma só e mesma palavra. Às vezes de forma grave. E aí podemos entender o prazer do ilimitado sem ter de dividir entre o bem e o mal. explica Manoel Carlos prometendo muito s uspense até o momento em que tirar (vai tirar mesmo?) Abel de seu purgatório". nesse mesmo trabalho. Entre um e outro. Está espalhado pelo cotidiano. outras mais disfarçadas. Isto é. E pela palavra. ao citar a palavra divina. da concepção dual do mundo. a relação com aquilo que representa o não-limite (Deus). em que o homem. vender a alma ao diabo é o outro lado da relação com o poder absoluto . r:---0golpe de 64 nos deformou. Não culpo os pichadores do muro do Museu. Eles - alguém já falou uma coisa assim antes? - não sabem o que fazem" (Tarso de Castro, Fo lha de S. Paulo, outubro de 1982). Poderíamos alongar aqui o número de citações, indefinidamente. Além das referencias, mais ou menos explícitas, ao desejo da reversibilidade , nos vários fragmentos de linguagem, podemos também encontrar propriedades do discurso religioso presentes em muitos outros tipos de discurso que não o religios o: no literário, no jornalístico, no jurídico, na propaganda, etc. Segundo nossa hipótese, isso se dá porque os discursos se relacionam, se comunicam entre si, se su stentam mutuamente. Há relações de inclusão, de determinação, de interdependência entre eles. Há ainda, o uso que um discurso pode fazer das propriedades do outro discu rso. Há uma relação de fundamentação reciproca entre os diferentes tipos de discurso. Todas essas possibilidades de relação nos levam a afirmar que os discursos não 232 ENI PULCINELLI ORLANDI se distinguem entre si de forma categórica mas segundo seu funcionamento. Aquilo q ue consideramos como propriedade do discurso religioso pode ser encontrado, por exemplo, em uma música como "Força Estranha" de Caetano Veloso, ou em poesias, como acontece freqüentemente. Pode ser encontrado em um discurso político, ou no editoria l de um jornal. Enfim, em qualquer outro tipo de discurso. A RELAÇÃO ENTRE AS PROPRIEDADES E AS MARCAS NO DISCURSO RELIGIOSO Creio que se deva distinguir entre propriedade e marca (ou traço). Esta é um a distinção muito importante para o domínio da teoria do discurso. Segundo o que penso, a propriedade tem mais a ver com a totalidade do discurso e sua relação c om a exterioridade, enquanto a marca diz respeito à organização do discurso. A propriedade que caracteriza o discurso religioso é a não-reversibilidade e ntre os planos temporal e espiritual e a conseqüente ilusão de reversibilidade com suas formas determinadas. Faz ainda pai te dessa propriedade o fato de que a voz de Deus é que fala em seu representante. Dessa forma, não há, pois nenhuma autono mia do representante em relação à voz que ele representa. Em termos dessa representação, resta dizer que é importante se lembrar que o representante, ainda que legítimo, jamais se apropria do lugar do qual fala, ou seja, jamais muda seu estatuto jurídi co de interlocutor, seu poder de dizer. Então, as formas que a ilusão da reversibilidade toma pela ultrapassagem e p ela transgressão - configuram o funcionamento desse discurso. E, segundo o que dissemos, isso pode ser visto através da relação do homem com o poder: em Deus o poder absoluto/no homem, a vontade desse poder. Quanto aos traços, às marcas, desse discurso, podemos procurá-los a partir da dissimetria entre os dois plangs. Resulta, então, que o que se pode apreender imediatamente, no texto, é o uso de antiteses, que e a forma semantica corresponde nte à dissimetria. A antítese, por sua vez, se apóia no mecanismo gramatical da negação. Como os mundos - temporal e espiritual - são opostos e afetados de um valor h ierárquico, a nega4 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO ção tem um efeito invertido, quando referidas às diferentes ordens do mundo: Temporal morrer não ver perder-se etc. para para para Espiritual viver ver salvar-se Do ponto de vista pragmático, o mecanismo geral da negação e o si . m pressupo sto no ouvinte. Então, a retórica do discurso religioso é a que se pode denominar a retórica da denegação, ou seja, a negação da negação. Isso porque, pela caracterização da d etria, o ouvinte (o homem) acumula os valores negativos e, entre eles, o de que nasceu com o pecado, e o pecado é o não a Deus. Assim, o discurso rel igioso, para afirmar o que é positivo, deve negar o negativo, ou seja, deve negar o sim pressuposto, do homem, ao pecado (que é negação). É ainda a retórica da denegação, agora referida ao problema da fé - disposição para m dar em direção à salvação -, que explica a configuração típica das grandes partes de várias espécies de discurso religioso. Essas grandes partes, diríamo s, se organizam segundo o seguinte esquema: Exortação - Enlevo - Salvação 1 Em relação à Exortação, podemos distinguir os seguintes componentes característicos: a) A identificação dos sujeitos entre si, uma vez que para transformar é preciso, antes, se reconhecer na igualdade. A característica desse processo de ide ntificação pode ser observada no exórdio do sermão: "Caríssimos irmãos!". Diferente, por exemplo, de outros tipos de discurso que começam por "camaradas" ou "Ineus sen hores, minhas senhoras", etc. Dessa forma são atribuídas diferentes idades. b) A quantificação, que significa, na realidade, a delimitação da comunidade: separa-se o " nós", os "aqueles queconstitutivos dos que fazem parte, dos outros que são excluídos. c) A denegação. Se tomarmos agora a parte que denominamos Enlevo, veremos q ue ela corresponde à identificação com os propósitos divinos; mais do que isso, é no enlevo que se dá o processo de 234 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 235 ultrapassagem de que falamos mais acima, ou seja, é nessa parte que se pode expres sar a ilusão da reversibilidade. Quanto à parte que chamamos Salvação, ela se constitui do pedido feito pelo re presentante,' ou do agradecimento apresentado pelo ouvinte, ou seja, o fiel, a alma religiosa. Evidentemente, esta é uma forma superficial de falar na distinção das partes d esse discurso. Dados os objetivos desse nosso trabalho, entretanto, procuramos não entrar em considerações detalhadas a respeito dessas distinções. Além de nos termos atid o à forma ortodoxa do discurso religioso, sem especificarmos suas variações. É ainda sob a forma de enumeração que gostaríamos de chamar a atenção para outros tr aços do discurso religioso: o uso do imperativo e do vocativo, enquanto formas próprias de discursos em que exista doutrinação; o uso de metáforas que são, depois , explicitadas por paráfrases (sobretudo nos sermões), pois, como o dizer religioso é obscuro, e sempre são possíveis muitas leituras, as paráfrases indicam a lei tura própria para a metáfora; procedimento análogo a esse é o das citações em latim que depois são traduzidas porperífrases extensas e explicativas, aproveitan do-se o máximo de efeitos de sentido (religiosos) sugeridos pela diferença de língua; o uso de performativos; o uso de sintagmas cristalizados (as orações), etc. Em termos da caracterização das unidades textuais, podemos ainda citar a função importante de certas formas típicas do discurso religioso como a Parábola, ou o uso de certos temas que também são típicos desse discurso, como a vida eterna, a provisoriedade do homem, etc. Enfim, podemos dizer que todas essas formas que enumeramos são marcas form ais do discurso religioso. Essas marcas podem derivar de qualquer nível de análise lingüística (fonoló(9) Um acontecimento inusitado, em relação às regras do discurso religioso catól ico, foi relatado pela revista Veja (7 de julho de 1982): quando um padre, a certa altura da missa, que rezava a convite do governador Francelino Pereira, propôs que se elevasse orações pelos irmãos, Padre Gouriou e Camio, presos e condenados pela justiça militar, um general, presente ao ofício, interpelou o padre com as segu intes palavras: "Um momento, por favor. Isto que está para se passar aqui é inadmissív el. Os amigos do governador estão aqui para homenageá-lo e o senhor não está comportando-se de maneira adequada, usando essas palavras o senhor cria um problema para nós-. 1 gico, morfológico, sintático, semântico) ou de unidades de qualquer extensão (fonerna, m orferna, palavra, sintagma, frase, enunciado, partes do texto, texto). Resta falar de uma característica do discurso religioso que tem a ver com a relação entre o texto e suas condições de produção. Trata-se do fato de que uma característica forte que é atribuída, principalm ente, ao discurso teológico é a intertext uafidade. A intertextualidade se define pela remissão de um texto a outros textos para que ele signifique. Assim, podemos definir o discurso teológico como u m discurso sobre outro discurso. Com isso, pretendemos dizer que o discurso teológ ico, ao contrário da conversa cotidiana ordinária, pouco tem a ver com o seu contexto ime diato de enunciação, ou seja, com a situação imediata em que ele se dá. Segundo nossa perspectiva, esse caráter fechado do discurso teológico, ou re ligioso, em geral se deve à não-autonomia do representante em relação à voz que fala nele. Há um dizer, obscuro, sempre-já dito, que se fala para os homens. Para to dos os homens. Para este discurso, então, a situação imediata só entra como motivo (ilustração?) para se redizer a significação divina. Fica, então, estabelecida a existência de marcas que caracterizam o discurso religioso assim como também existem, como explicitamos mais acima, propriedades que o definem. A condição para que as marcas (traços) caracterizem o discurso religios o é que elas sejam referidas à(s) sua(s) propriedade(s). 0 que nos leva a essa conclusão é o fato de que os traços não são exclusivos de um só tipo de discurso, ao contrário, são comuns a vários: o imperativo também é abundante no discurso da propaganda, a antítese também é característica do discurso teóric o, os performativos são importantes no discurso jurídico, a intertextualidade tem sua. função relevante também no discurso político, etc. A forma como os traços são usados em relação à propriedade de um tipo de discurso é que o caracteriza, o define. Assim, determinar a forma dessa relação entre traços e propriedades é estabelecer o funcionamento discursivo específico. Segundo o que pudemos observar no discurso religioso, podemos especifica r a relação entre os três fatores que, de acordo com nosso ponto de vista, o caracteri zam: a assimetira entre os planos temporal e espiritual e a não-reversibilidade; o uso de 23t ENI PULCINELLI ORLANI)1 aníteses; e O'Aecanismo da negação. A partir d,-sses fatores, Polemos ,stabqecer o seg uinte esquena para a caracterização dodiscuno reliÁioso: sitz,aÇão assimetria eltre os planos esprituale temporal (não - revesibilidade) propliedade Esse seria ) esquema correspondente à texto artítese parábola metáfora etc. traço; gramática negação perífrase paráfrase etc. form2 ortodoxa do di,~urso r,-Iigioso cristão. Podernos, Inesmo, chegar a uma jornia geral e abstrata da arjumentição cesse tipo de discurso, consíderandú-se a retórica dalenegação, a dimensão da negatividade constan:e na religião: Aquele que _X~ y porque Aquele que X, _Y Sendo X c() plano temporal e Y d) plano espiátual. Condição: ter fé para se salvar. UMA. PROPOSTA Em análise de discurso essas for-nas abstratis são proda tivs, antes, pelo caminho q 1 ue fazemos para chegir até elas, e, depis, pelo r^rno imprescindível qu. devernOs fizer delas até os atos d~ discarso. São, assim, menos ulii resultado em si do qu um iristrurnento de trabalho. Aqu.lo que, no percurso para su, descoberta, ficamos conhecendo s)bre 0 funcionamento do Ob~to (discurs0)1 que é o alvo de nos;a análise, ~, creio, mais rev,lador. Por oatro Ndo, ainda em relação o funcionainento do discu%o, háima liferença ent re as marcas e as propriedades que go,~aríam)s de ~'olocar, enquanto hipó~ese de trabalho. Segundo 0 (ue pudemoç ~ observar, há uma naior variaçw quanto às macas, em rel~ção às diferentes espécies d discurso religioso: difTentes religi~es, diferentes prática,, diferentes rituais, difeA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO rentes cerimÔnias, podem fazer variar amplamente as marcas dos discursos que carac terizam. Entretanto, ainda segundo essa mesma perspectiva, haveria uma estabilid ade maior em relação à propriedade que define o discurso religioso, ou seja, a nãoreversibil idade dos planos e a conseqüente ilusão da reversibilidade. Isso não significa que a propriedade não sofra variação nenhuma, mas sim que, relativamente às marcas, a pr a católica. Hoornaert (org. Gramsci. em Religião e Sociedade. Reboul.Langage et Idéologie. Ed. em Das Reduções La tino-Americanas às Lutas Indigenas Atuais. A autora trabalhl)u na Univeisidade de São Paulo e.. Paris. os autores mostram que o antigo pod er da repressão sexual foi substituído por um outro. . Martins Fontes.como subsídios para o estudo de outras espécies desse tipo de discurso e para a analise de fatos desses discurs os em suas diferentes práticas. 1982. não menos terrível: a obsessão do orgasmo."Fala de Dois Tucanos aos Participantes do Simpósio".Hjelmslev.o aos quais se dedicou.11 Materialismo Storico e Ia Filosofia di B. C ambridge. . a nossa proposta é justamente a de alargar a reflexão sobre o discurso religioso. C. E. Biblioteca de Ciências Sociais.). . o poder dofalus. Paris.opriedade se mantenha com mais constância. 1980. Portelli. 1974. Presença. logo se evidenciou para ela a importância des estudos so l~-e signif icaç~. sem esquecer o aprendizado do latim. i 1 Biográfia Tendo iniciado seas estudos so)re a linguagem através da Filologia e da Li ngÜístca Indo-Eunpéia. A. SAo Paulo. Andrade. H. Laia. 1974. 1968. T urim. . 1980. é professorado Instittitode Estudos da Linguagem da UNICAMP. mais recentemente pela Análist de Discurso. Ed. Goody. ou mais especificamente. Paulinas. PUF. A. J. 1966a. marcas e formas . 1966b.Literacy in Traditional Societies. Ed. L. Einaudi. Então. Nesse sentido é que colocamos como próxima etapa desse nosso trabalho a anális e do discurso missionário entre os índios. J. cujo cenário dominante é a imagem g . N. . o parâmetro para a nossa reflexão foi a ideologia religiosa cristã. pela S:)ciolingüística e.Gramsci y Ia Cuestion Religiosa. BIBLIOGRAFIA Althusser.-~m seu está& na França (na Universidade de Vinc=es).. Grarrisci. Brasil.Ideologia e Aparelhos Ideológicos do Estado. -Manifesto Antropof6gico.di teve cornoiniciação n aLingüística Geral o Estruturalismo d. São Paulo. Ed. e Liv. Barcelona. n? Tempo e Prese nça Edit. A. Eni Pulcinelli Orla. Rio. atualmente. 1980. Zaluar. Machado.. . Ed. Tem pablicado div(rsos artigos em revistas especializadas1 Ç AS . 0.Gli Intellectuali e VOrganizazione della Cultura. University Press. OUTRAS PA~ Í A NOVA DESORDEM AMOROSA Pascal Bruckner/Alain Finie1kraut Analisando a propalada revolução sexual. Payot. Emaudi. através de ab3rdagens feitis pela Semântica.Dire et Interdire.propriedades. . . 1926. que foi seu primeib contato con a reflexão sobre a linguagem. Portugal. Como dissemos no início desse estudo. Huston. Croce. Goody Ed. Tu rim."Milagre e Castigo Divino-. . 0 palco dos afetos. 0. tomando es ses instrumentos . Fourier. Arqueologia da Violência: Ensaios de AntroPolOgia poilítica Píerre Clastres o autor descarta a visão de que o Estado seria um destino da humanidade. . v oitarse primeiro para os pequenos detalhes. Colcha de Retalhos: Urn Estudo Sobre a FarnIffia no Brasil Vários autores i i Em todos os artigos figura o objetivo de 'armar o pulo do gato'.) Urna coletánea de escritos Clevárias pessoas que fazem.assumindo uma determinação social que permite aos Outros descarregarem sobre essa pessoa necessidades de en carnação. Militante anarquista. passa por uni crivo sério e rigoroso. o auto r sustenta essa isaios que discutem aspectos das obras de Reich. a lógica que rege essas sociedades seria uma outra. Proviélhon. seria uma das formas de salvaguardar a individualidade. E a procura. que espelham as mitologias e tornadas de consciência do grande intelectual italiano. o seu modo de ser. os gestos quase nunca nomeados.um pouco no sentido em que se falava outrora de . escritor público" . de resistir à sociedade autoritária.Se as sociedades ditas primitivas desconhecem o Estado. isto é. 1 . Gide e Shakespeare. um fim in exorável. ANTROPOLOGIA Pesquisa participante Carios R. Paulo Freire e outros. Brandão (Org. Afinal. . orlando Fals Borda. A CONTESTAÇÃO HOMOSSEXUAL Guy Hocquenghem Em que momento alguém mergulha no papel de homossexual público . totalmente diversa da nossa. tese em er Kinsey. transgressor da ordem. de algum ipo de prática politica de compromisso popular..enital.. de um papel novo e diverso na sociedade que subjaz às suas interrogaçoe s mais profundas. para restitui-10s depois a um painel mais i amplo das relações sociais e 1. UM ENSAIO SOBRE A REVOLUÇÃO SEXUAL Daniel Guérin 0 erotismo. acusação e distanciamento? CAOS: CRõNICAS POLíTICAS Pier Paolo Pasolini 0 o-aunta de 68 serve de pano de fundo a esses escritos de Pasolini. isso não significa um ~ estágio primitivo a ser superado. que resulta num texto desmistificado r e divertido. Reúne textos de Rosiska de miguel Darcy de oliveira. W Mal criado pela sociedade. há constituição permanente do que se diz e do que já foi dito. Segundo o que pensamos. Sem o contexto e a relação definida do leitor com a situação. Urna terra livre. aEnsc'el fascinante estudo tem urn alc e muito além da singular visão religi?sa. antecipar. c) a relevancia é a da relação do texto com seu referente (seria. aquele em que considera mos o texto em sua unidade. Gostaríamos de 1 acrescentar que. esses são problemas que dizem respeito à relação do leitor com a situação que envolve a leitura. aqui. sentença por sentença. dado o fato de que. apreA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO . Há. a plenitude da liberdade. apesar de não termos indicações mais precisas. por exemplo. mas sim como textual. foi colocar algum critério para o estabelecimento de modos de leitura baseados na forma como o leitor se representa no processo de leitura. e não apreende o sentido global do texto. em uma comunicação. isto é. Há um outro fator que pode ser considerado sob o aspecto com que o leitor representa sua relação com a situação e o contexto. Contexto. É a. totalidade que organiza suas partes. considerado não enquanto contexto lingüístico. sem os elementos que unificam o processo da leitura. "Tópico-C omentário e Argumentação na constituição do texto". a leitura comparativa).~ 0 trabalho P as leis são. portanto. 0 que procuramos fazer acima. procuramos estabelecer uma referencia para a sua seletividade. por exemplo. É isso que se dá quando o leit or lê palavra por palavra. b) a relevancia é a da relação do texto com outros textos (seria. a leitura que responde à questão:---oqu e o texto diz de x?"). não há o distanciamento necessário Para a leitura. isto é. de forma seletiva. lugar de abundância: o milho crescel sozinho e as flechas vão também sozinhas à caça. o espaço discursivo não é linear. e o leitor perde o acesso ao sentido. sem proscrições. um des*ses textos: "Lectures e t Linéarité". responr dendo à questão: "o que você entendeu?"). um pouco tardiamente. e como a progressão do texto não se faz por acúmulo mas também por retomadas. tupi -guarani do Paraí so172 ENI PULCINELLI ORLANDI do texto com o autor (seria. que a configuram. porque achamos que este autor coloca uma direção interessante para a reflexão sobre a leitura.problernatizar um pouco as visões comuns que temos deias1 Terra Sern Mal* 0 ProfetisrnO Tupi-Guarani Héjène Clastres~ A Terra Sem Mal é antes de tudo urni. segundo nossa definição de i texto. por exemplo. (5) Este aspecto é trabalhado por Eduardo Guimarães. de Daniel Coste (xerox). vários modos de leitura e suas c orrespondentes estratégias. certamente. Segundo alguns autores' isso se dá porque sem uma distancia mínima o leitor não pode prever. contra-ordern. Colocamos esta nota. ou seja. sucintamente. d) a relevancia é a da relação do texto com o leitor (seria a exp licitação do papel do leitor. ou se pergunta.' (4) Chegou-nos às mãos. sem prescriç4es. Ist o é. no final de uma leitura: "o que é que devo entender diss o?". o modo de leitura que responde à questão: "o que o autor quis dizer?"). Assim. se representa. Quando a distancia é tal que leva à r' 7. queremos com isso dizer que se podem mudar as condi ções de produção da leitura. W Nesse mesmo Encontro. Haverá uma variação grande na relação entre autor. " ão. Nesse caso. Esses outros fatores também tem seu papel na legibilidade. só pode haver mudança de auditório. sua estratégia pode ter d uas direções: mudar o interlocutor ou mudar de interlocutor. em suma. uma forma dessa variação. A leitura é o momento crítico da constituição do texto. havendo incompreensão. '5~ ) "nsar'P 'o na rela o . aquele em que os interlocutores se identificam como interlocutores e. ao se constituírem como tais. A tensão. quando não há distancia suficiente. se identifica. Nesse passo. quando falamos de leitor real e virtual não estamos nos re ferindo ao problema da discordância ou concordância. podemos dizer que. podendo o leitor real coincidir ou não com o leitor virtual. de acordo com um princípio da teoria da retórica. Podemos refletir sobre isso a partir .173 assim. A discordância ou concordan cia já se faz sobre um sentido reconhecido ou atribuído ao texto. mas quando falamos em leitor real e virtual estam os pensando no aspecto elementar do acesso ao sentido. Angela Kleim an apresentou . Gostaríam var. a não compreensão do texto se deve também ao fato de não se poder voltar atrás e re fazer percursos. o confronto existente é aquele que podemos observar quando perguntamos pelo interlocutor do te xto. 0 outro. um leitor const ituído (o leitor virtual) no texto. a ideologia. que é o de pedir ao orador que se adapte ao seu au ditório.. diríamos que se trata de uma estratégia muito usada em discursos em que as pessoas "se reconhecem pela palavra-. na medida em que le. Há um interlocutor que é constituído no próprio ato da escrita. há do lado do leitor o princípio de levar em conta a disposição do autor. Mais amplamente. o 0. A relação entre o leitor virtual e o real pode ter uma maior ou menor distânci a. significa dizer que. É o caso extremo de identificação ou exclusão. Em relação à outra possibilidade que é a de mudar o inter locutor. o leitor. isto é. ou seja.' dependendo da distancia entre o leitor real e o virtual deramos os diferentes tipos de discurso. A questão da compreensão não é só do nível da informação. o discurso que tem o interlocutor já definidame nte delineado. Assim como diríamos.~~Z o . há um outro aspecto importante da representação do leitor no processo da leitura. Esse é um acordo (provisório ou não) que faz parte do process o da leitura. tee e. é o momento privilegiado d a interação. do ponto de vista do autor. 0 que. Isto. em geral. fatores discursivos. Faz e ar em conta o processo de interação. sem distancia não se pode apreender o texto em sua totalidade e sem a a preensão da totalidade não há acesso ao sentido do texto. se constitui. começa o debate. volvimento de estratégias de leitura na criança". É un. Especificando o que dissemos acima sobre a mudança de interlocutor. e que na retórica. gostaríamos de dizer que. Se pensamos a escrita como se constituindo na interação. podemos observar o jogo existente entre o leitor virtu al e o leitor real. essa sentada no VI Encontro Nacional de Lingüística. na medida em que o interlocutor (o leitor real) já encontra um outro. desencadeiam o processo de significação do texto. 174 ENI PULCINELLI ORLANDI do texto. 1 Aí está um problema que se insere no domínio da legibilidade e que pouco tem a ver com sentenças bem ou mal formadas. Isto é. em geral. pode significar que se está dizendo que o texto é obscuro ou mal escrito. deslocamento es te que é apreendido pela própria noção de discurso. repete. porque distingue. a imagem que se faz do aluno de tal idade. nos leva a dizer que o discurso pedagógico não dá importancia à com preensão: ou o aluno já tem as condições favoráveis ou ele decora. com funcionamentos discursivo& que se A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 175 definem em um outro espaço que o propriamente lingüístico.do discurso pedagógico. É um movimento que. imita. ele não leva em conta as condições de produção da leitura do aluno. quando se é considerado um bom leitor. virtual. fazendo com que o aluno real e o virtual coincidam sem que se opere uma mudança nas condições de produção. em última instância. é um discurso autoritário. b) pela relação existente entre a formação discu rsiva e a formação ideológica. ou. como o carac terizamos. tal instituição. tal classe. uma vez que a escola tende para a homogenei zação. atomiza. ao mesmo tempo. Essa é a qualidade de sua identidade de leitor. fazendo algumas c onsiderações a respeito da noção de sujeito. há ainda um aspecto retórico interessante a se observar: dizer-se que não se entendeu um texto. ou seja. ou seja. Há uma contradição inerente à noção de sujeito que vem da relação entre identidade e eridade e que se constituem mutuamente. Do ponto de vista do leitor. mas que aqui fica apenas como sugestão e que representa um outro domínio em relação aos fatos que estamos aqui observando. Quer dizer. mesmo na perspectiva pedagógica que se faz em relação a um aluno-padrão. Isso resulta no deslocamento da centralidade do sujeito. integra. ao marcar a identidade. 0 que. não se usam estra tégias discursivas capazes de modificar as condições de produção de leitura do aluno para que ele chegue a se aproximar desse aluno-padrão. Como o discurso pedagógico. porque esta é sempre feita de uma relação. Este discurso tem como interlocutor um aluno-tipo. e. Tem a ver com a relação entre forimações discursivas e ideológicas. essa contraditorieade deriva do fato de que há a interpelação do indivíduo em sujeito feita pela ideologia. Essa contraditoriedade é pensada na análise de discurso em dois lugares espe cialmente: a) pela ilusão do sujeito de que ele é a fonte de seu dizer quando na verdade o seu dizer nasce em outros. é assim que o aluno se coloca no lugar do inter locutor desejado. cujas condições de possibilidade . como diz Maingueneau (1976): "o conceito de discurso despossui o sujeito falante de seu papel central para in tegrá-lo no funcionamento dos enunciados. Diante do interlo cutor real. tal curso. A NOÇÃO DE SUJEITO: 0 AUTOR E 0 LEITOR i i 1 Gostaríamos de concluir (provisoriamente) este trabalho. Tem a ver com a consideração do discurso enquanto processo de interação. o discurso é feito ou para reproduzi-lo (se ele se aproxima do virtual) ou para transformá-lo (se ele dífere do leitor virtual). ou com coesão. dos textos. Po r essa via poder-se-ia observar todo um aspecto de implícitos da relação de leitura. b) não há sujeito nenhum. respectivamente. mas tal como existe socialmente e. além disso. o mesmo pode ser observado em relação ao leitor. Não se deve enrijece-la em nenhum dos pólos: nem no pólo individual. e o exage ro para menos. Essas afirmações. então. Há o exagero para mais: a) qualquer leitura é boa. isto é. isto é. ou seja. tanto em a como em b está em causa a identidade do autor. segundo o que cremos. é a seguinte: o sujeito é o mesmo e é diferente simultaneamente.. por causa da determinação soci l. ) A ideologia aparece como um processo de 176 ENI PULCINELLI ORLANDI comunicação implícito que determina as práticas (discursivas e outras) dos indivíduos cons tituídos em sujeitos-. Por isso. De forma geral. podemos fazer duas observações que representam o exagero para mais. não é o indivíduo enquanto tal que se apropria da linguagem uma v ez que há uma forma social dessa apropriação. 0 espaço da subjetividade na linguagem é tenso. em termos de discurso. 0 que há é uma modulação do nosso discurso e da nossa identidade nas diferentes relações. Segundo Slakta (1971). Ambos os exageros são interpretações pessimistas: a) Há um sujeito para cada situação.. A questão que faríamos seria: o disc urso caboclo para o pesquisador é ainda o discurso caboclo? Suas características são diferentes do discurso caboclo para o caboclo (simetria) de tal forma que conf igurariam outro tipo de discurso? Do nosso ponto de vista. é partilhar. não há apagamento na coijstituição do sujeito de tal modo que. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1 1 Resumiríamos essas objeções dizendo que a relatividade da noção de sujeito não é abso uta. mas é aind a o discurso caboclo. para nos.. ser na linguagem é ser-se estranho. também não mudamos completamente nosso discurso nem nos transformamos em outro. em relação à noção de sujeito. etc. ao mesmo tempo. Ao contrário. podem nos levar a algumas conseqüênc m vista da noção de autor e de leitor. a apropriação da linguagem é um ato social. não perdemos nossa identidade em cada relação de linguagem diferente. diríamos que é o discurso caboclo para o pesquisador (ou para o branco). ou para o caboclo. podemos dizer que 0 sujeito da linguagem não é um sujeito-em -si. "0 indivíduo concreto é constituído ao mesmo tempo como eu pela língua e interpelado como sujeito pela ideologia ( . em situações diferentes. há uma tensão c onstante nesta constituição: o sujeito de linguagem é ele mesmo e o complemento do outro. Ou seja. ser sujeito. Por outro lado. É ainda essa contraditoriedade que pode nos servir para compreendermos e r efutarmos a observação b. Seria interessante lembrar aqui o trabalho de Romualdo (1981). pois cada leitor compreende de acordo . A relação de linguagem é interação. desapareça. Essa modulação se faz em direção aopara quem do discurso e a contraditoriedade. Daí não se poder afirmar. De um lado. é ser fora-de-si. 0 caso de a pode ser exemplificado com o fato de que assumimos papéis e di scursos diferentes quando falamos com pessoas diferentes. nem um sujeito absolu tamente dono de si. nem um sujeito totalmente determinado pelo que lhe vem de fora. etc. o que lhe é mais próprio. nem no social.são sistematicamente articuladas sobre formações ideológicas". em que se an alisam relações discursivas assimétricas * 0 resultado da análise caracteriza o discurso caboclo falado para o pesquisador (assimetria). Assim. em relação ao autor. que também constituem interpretações pessimistas. o que deve trazer conseqüências fecundas para o estudo da leitura. mas que não nos cabe explorar aqui. Ainda em relação ao domínio do autor sobre o texto. se pensarmos que o autor. relativiza-se a noção de sujeito e isso tem conseqüências. estaríamos lidando com a posição de que só o autor tem domínio completo do que diz. Com respeito à relação entre'formação discursiva e forma ção ideológica. logo. ou então a imposição de um sentido único que é atribuído pelo leitor ao texto (sem levar em conta seu autor). pela consideração das condições de produção e pela definição de texto como c tituído pelo processo de interação. autoritário ou lúdico). Assim. essa 1-8 ENI PULCINELLI ORLANDI incOmpletude que faz parte da linguagem é fundamental para a leitura. só o autor tem o domínio completo do que diz. Seria ainda interessante notar que. tem a ver com a identidade do leitor . na leitura o outro é o autor. A esse respeito podemos também observar que essa afirmação pode s er relativizada levando-se em conta o processo de interação que é constitutivo do discurso. constitui aquilo que eles significam. como tivemos ocasião de observar anteriormente. OBSERVAÇõES FINAIS Em suma. Resta como perspectiva um estudo mais sistemático . a r elação existente entre paráfrase e polissemia se coloca como autolimitativa. podemos acrescentar que su a relatividade vem do fato de que o texto tem relação com outros textos e com as condições em que se produz. a posição entre leitor e autor pode variar desde a maior harmonia até a maior incompatibilidade ideológica. isto é. certam ente.e a polissemia . uma vez que. Na versão pessimista da interpretação da noção de sujeito. 0 autor também é levado em conta e isso também faz parte das condições de prod ução de leitura. pela leitura. por extensão sobre o Processo de leitura. Assim. especialmente. o que vai constituir a com preensão do texto. constitui sua escrita na relação com um interlocutor. resta-nos especificar que. necessárias. ou seja. temos desde o simples reconhecimento do que o autor quis diz er. em relação à noção de sujeito. de outros sentidos ao texto . b) nenhuma leitura é boa . dependendo das di ferentes formas de interação estabelecidas (ou tipos de discurso como o polêmico. Esse espaço de interlocução. Essas duas afirmações. 0 jogo entre a paráfrase . necessariamente. a interação entre autor e leitor do texto está marcada por essa relação. como o lugar que os interlocutores e a e. como vimos.com suas condições de produção da leitura. na sua relação com a ideologia.que nesse caso seria a reprodução do que o autor qu is dizer. a leitura é produ zida. é constitutivo de seu discurso. Finalmente. Dessa f orma um texto pode significar mesmo o que não faz parte da intenção de significação de seu autor (ilusão discursiva do sujeito).que seria a atribuição. Com isso poderíamos caracterizar a própria leitura como um discurso. que coloca que nenhuma leitura é boa. corno Pudemos notar. talvez. i nverte-se a perspectiva do mesmo e do outro. isto é. Há uma relação de interação que regula as possibilidades de leitura. tanto sobre a caracterização do autor com o a do leitor e. mas não são tais que qualquer ma é boa.* mas. pelo leitor.é articulado. uma dá os limites da outra. Há o exagero para menos. concluir que são vários os fatores que devem ser l evados em conta em relação à legibilidade de um texto e que colocam as exigências do nível gramatical e do nível da coesão textual como. o reconhecimento do sentido dado pelo autor . Em relação a a diríamos que as leituras são múltiplas. então. na relação do leitor com o texto. até leituras que permitem uma variação de sentidos de maneira bastante ampla. pode-se. não suficientes. UNICAMP. Paris. Autor e leitor confrontados definem-se em suas condições de produção e os fatores que constituem essas condições é que vão configurar o processo da l eitura. J.Cohesion in English. Campinas. A. n? 37. A. ao se identificarem c omo interlocutores. B. 176). . . na perspectiva da análise de discur so. . 1980. Fundação Carlos Chagas. Ocupam numa formarão cr. Halliday. A."Tópicos Discursivos e a Legibilidade dos Textos". D. Larousse."Provas de Argumentação". Langages n? 23. j 1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO BIBLIOGRAFIA Coste.1977."Assimetria no diálogo: relação entrevistador/entrevistado". Funda ção C arlos ê-hagas-. Ca P dernos de Pesquisa. M. ."Esquisse d'une Théorie Lexico-Sérnantique: pour une analyse d'un texte politique (Cahiers de Doléances)-. 1971. Pêcheux. 1981."Mises au Point et Perspectives à Propos de L'Ana lyse Automatique du Discours". 1969. Para esse objetivo. Dessa forma. p. fatores que constituem as condições de produção da leitura. 1976.Initiation aux Méthodes de VAnalyse du Discours1 Ha chette. pois é o momento privilegiado do processo da interação verbal: aquele em que os interlocutores. H. Essai de Descrip tion du Discours Français sur Ia Chine". Osakabe. London. Slakta. 1976. M. Didier-Larousse.e aprofundado dos fatores que agrupamos sob a rubrica das condições de produção da leitu ra. Langages n? 55. F Maingueneau. . . . 1 i i é 1 I~ i 1 1 A Produção da leitura e suas condições* 0 QUE É A LEITURA Já podemos considerar como um adquirido. 1977. D. M. Paris. Cadernos de Pesquisa. ."Estudo do período. M. é o de estabelecer. Marandin. J. xerox. 1975. A. Longman. numa proposta pragmática". . . Perini. o fato de que a leitura é produzida (cf. Fuchs. . nosso objetivo. . xerox. desencadeiam o processo de significação. M. D. com alguma precisão.Analyse Autornatique du Discours. Langages. uma postura produtiva é a de considerar que a leitura é o momento crítico da constituição do texto."Lecture et Lin6arit6". Dunod. e Hasan . Em outras palavras: é na sua interação que os interlocutores instauram o espaço da discursividade. comunic ação apresentada no Encontro Internacional de Filosofia da Linguagem."Problèmes de l'Analyse du Discours. Paris. K. Larousse. 1979. Romualdo. nesse estudo. 5 Pécora. Paris. Chamaríamos. n? 1. aqu 1 tertextualidade.(*) Texto publicado na revista da Associação de Leitura do Brasil (ALB). Essa relação com a exterioridade. coni a situação . necessariamente. a atenção para uma espécie de implícitos. isso se dá.este intervalo . isto é. margem de enunciados efetivamente realizados. então. mas "como parte de um mecanismo em fu ncionamento. idem).contexto de enunciação e context o sócio-histórico . enquanto seqüencia sintaticamente correta. "os fenômenos lingaísticos de dimensão superior à frase podem efetivamente ser concebidos como um funcionament o. Entendemos como incompletude o fato de que o que caracteriza qualquer di scurso é a nlultiplicidade de sentidos possível. c orrespondendo a um certo lugar no interior de uma formação social dada" (Pêcheux.mostra o texto em sua incompletude. (1) A noção de funcionamento é básica para se entender a possibilidade de sistem atização dos elementos constitutivos da significação de um discurso. da relação com a situação e com os interlocutores. nem da soma de interlocutores: o(s) sentido(s) de um texto resulta(m) de uma situação discursiva. idem). 0. desde que s e leve em conta as suas condições de produção. segundo Pêcheux. 1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 0 DETERMINADO E 0 INDETERMINADO: A CONDIÇÃO DA LEITURA 181 Antes de enumerar alguns desses elementos. mas que deriva da estrutura de uma ideologia política e. é conceito intermediário que se coloca no lugar em que se e ncontram tanto a manifestação da liberdade do locutor quanto a ordem da língua. ou seja. E isto se dá não em abstrato. Isso tudo nos permite conceber o funcionamento' do discurso. uma vez que o conceito de discurso define um lugar entre "a singularidade individual e a universalidade" (Pecheux. . uma noção relevante é a de social. o texto não resulta da soma de frases. 0 discurso. gostaríamos de lembrar que estamos tratando a leitura na perspectiva do discurso. No domínio da análise do discurso. como pertencente a um sistema de normas nem puramente individ uais nem globalmente universais. 182 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 183 Podemos colocar como reveladores da incOmpletude toda Ela deriva de sua relação com as condições de produção. mas com a condição de acrescentar imediatamente que esse funcionamento não é integralmen te lingüístico" (Pécheux. 1983. condição para que se stitua qualquer ciência que trata do signo. espécie de implícito que deriva da *n i. Assim. 0 deslocamento da noção defunção para funcionamento é. Assim. ou seja. é o espaço determinado pelo social. 1969). que significa dizer que a noção de funcionam ento remete o discurso à sua exterioridade. Esta marg em . logo.não é vazio. segundo esse mesmo autor. em chidas as la cunas). pela qual se liga 0 locutor ao lugar social do qual diz. que ele 'orquestra' os termos Principais. b) Recuperamos o processo que o indetermina. nais abrangente. Considerar as condições de Produção da leitura é Determinação -* Indeterminação---0~ Determinação texto como objeto . compõe também a noção de intertextualidade o mos de colocar. forças.A noção de intertextualidade n texto tem relação com outros gundo essa noção. Se0 texto é incompleto porque o discurso instala o espaço da textos nos quais ele nasce (sua matéria-prima) e/ou Outros para intersubjetividade. estaria aí incluída a relação de produto. tal discurso envia a i~ de comunicação. por sua vez. isto é.com pletas ou a serem preenchidas .mas é processo de signific ação. aquilo que se poderia dizer e não se disse. Dadas as características d a incompletude. ele mesmo instala. diante de um texto. não creio fato de que um texto tem relação com outros (suas paráfrases) que. E esse confronto de sentidos que nos interessa observar na um início: o discurso se estabelece sempre sobre um discursivo interação da lei tura. sabemos que ur é uma noção complexa. frente ao qual é urna resposta direta ou indireta. prévio( ) " (Pêcheux. idem). seguimos diferentes percursos em relação à inde terminação: Tudo isso faz parte da relação de interação que a leitura A. tal como acabaAlém disso. além das 0 que nos l eva a distinguir dois planos segundo os quais intertextuais que mencionamos. ne sse processo de interação da leitura. com a intertextualidade mas é r . No modelo de Pêcheux. se parta de sua indeterminação (como que Poderiam ter sido produzidos naquelas condições e que não se existissem lac unas) para a sua determinação (uma vez preen o foram. estaria aí 1t "assim. em que ele. de direito. pela relação de interação qu e. ou destrói os argumentos Assim é que o processo discursivo não tem. também constitui o espaço a) Partimos da aparente determinação do texto enquanto de discursividade daquelas condições.que abrange pressupostos e subentendidos nplícito d) Retornamos pa ra a indeterminação que é o confronto Não Podemos deixar de observar que a noção de ir c) Pousamos provisoriamente na determinação. uma vez que contam também outras determinações de situação. É mais complicado que isso: condições determinadas de produção. é tomado não enquanto fechado em si mesmo (produto finito) mas enquanto consti tuído os quais ele aponta (seu futuro discursivo). o text o não é o lugar de informações . . Na análise de discurso Proposta por Pé z Resga tado da perspectiva da linguagem como instrumento caracterizada a relação de sentidos: cheux.inclui a relação com o outro. texto. i tal outro. ou de lugar d e sentidos. Ponto de vista do estabelece. Assim. o autor. ou seja. Dessa forma.` Paralelamente. como o venho definindo: o funcionamento é a atividade estruturante de um discurso determinado. essas afirmações como base.Determinação---0. 1 i 184 ENI PULCINELLI ORLANDI Tendo. ao considerarmos a leitura c omo interação. múltiplas contexto produto quanto objeto teórico. há uma seletividade que revela o modo de leitura assumido pelo leitor. com finalidades específicas. já de início. esse "determinado" utilizado na definição. portanto. meio e fim. neste volume. não se refere a um falante em si mas à sua posição no discurso. não desconhecendo que. por um falante determinado. trata-se do jogo de formações imaginárias e.1 Essas questões se fazem em torno d as seguintes noções: Tipo . fizemos algumas observações mais especí icas e leitor como processo.trabalhar fundamentalmente com essa espécie de indetermiacabado nação: a incompletude do texto. ao mostrar como um texto funciona. objeto acabado.a de tipo . Ou seja: ao explicitar o funcionamento desse fenÔmeno lingüístico a que chamamos discurso. Sem esquecer que o traço essencial desse funcionamento é a relação do texto com os outros textos.Leitura Parafrástica e Leitura Polissemica NOÇÃO DE TIPO Essa noção . A natureza de sua incompletude é outra. Ponto de vista 0 texto.2 das Condições Indeterminação --N o. em relação à incompletude não se trata de texto fecha do texto referido uma leitura considerar o texto como matriz com lacunas que são Preenchidas em s i mesmo às condições de determinada nos dizendo que a natureza da pelo leitor. c om os interlocutores. etc. Indeterminação constitui uma totalidade com de Produção começo. a análise de discurso fornece subsídios metodológicos para a prática de produção e leitura. a noção de funcionamento como central para a análise de discurso.Contexto e Sujeito . considerando-se~ agora. f m---Umaespecífico. a respeito dos interlocutores. é que vemos a contribuição desse domínio de conhecimento para a área de produção e leitura. e considerando. tal como Pecheux. 4 4 No entanto. tam- . com suas condições de produção. para um interlocutor determinado.deve ser entendida em função de sua relação com funcionamen to. Sem esquecer que. este último de uma maneira mais específica. pois. 0 que expressaríar produção incompletude não é lacunar mas intervalar. Visamos assim contribuir para a reflexão sobre a legibilidade. 13. no discurso. modo específico de leitura. com a situação. atra vés de regras de projeção. (2) A propósito da distinção do texto enquanto objeto empírico e en específico. gostaríamos de abordar algumas questões que têm como função esclarecer elementos c onstitutivos das condições de produção de todo discurso. que se repõe possíveis leituras questão da leitura: a noção de sujeito e a identidade do leitor-. outras leituras. logo. mas na sua relação com o funcionamento discursivo. pela relação entre processo e produto. um fragmento de um continuum . dada a dinamica das condições de produção. conseqüentemente. certas configurações se institucionalizam. nas condições de produção da leitura. ou seja. e se tornam típicas. em estabelecer a relevancia de certos fatores e não outros para a significação do texto em questão. 1969). configurado. e. tres nlveis de sujeito: texto lingüístico. compõe a legibilidade de um texto.(3) Mantemos aqui o conceito de legibilidade tal como o estabelecemos no estudo sobre leitura citado na nota 2. modelos para o funcionamento de qualquer discurso. considera mos que o tipo (produto) é funcionamento discursivo (processo) que se cristaliza historicamente. constituindo. pode ser referido a um tipo. Devemos ainda observar que. A NOÇÃO DE CONTEXTO E SUJEITO Tenho considerado. então. logo. E ist o. todo d izer é. na relação de intera ue a leitura (envolve) estabelece. ou melhor. de um todo fechado em si me smo. tres classes. necessariamente.. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1 r 1 1 f 185 pouco se trata. Por outro lado. Aquilo que é relevante em um tipo de discurso pode não se-lo em outro. segu do hipóteses que vimos desenvolvendo. mas de um estado do processo discursivo. A consideração do tipo como parte das condições de produção é fundamental. ao se falar em discurso determinado. de acordo com a perspectiva na qual no colocamos. . (4) As regras de projeção. nos mecanismos da formação social. entra.0 sujeito do enunciado. cit. Dessa forma. Conseqüentemente. a relevancia de fatores que constituem as condições de significação de qualquer dizer é determinada pelo tipo de discurso. no funcionamento discursivo. quando se pensa a legibilidad e em relação ao uso efetivo da linguagem e não apenas como propriedade imanente do texto . a capacidade do leitor em reconhecer os tipos de discurso e. estabelecem as relações entre as situações (objetivamente definíveis) e as posições (representações dessas situações). historicamente. de acordo com Pécheux (op. já está inscrito um tipo. Na leitura. pois. evidentemente. Faz parte da estratégia de leitura levar em conta o tipo não de forma estanq ue. que deriva da análise do con186 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO . dada a necessidade da interpretação global da unidade.0 sujeito textual. que deriva da análise texto de situação. no caso. construções com sujeito indeterminado. em alguns textos. ou seja. Por outro lado. a relação do texto com outros textos (a intertextualidade). voz passiva sem agente.. Como.0 sujeito da enunciação. etc. podemos considerar o funcionamento de dois dos tres níveis de sujeito do discurso. extraído da anál ise de textos de História do Brasil para a escola: "No dia 15 de abril. podemos constatar a presença Simultânea a) um sujeito do enunciado: Castelo Branco (Médici etc.). os autores falavam do ponto de vista de quem estava no po der. não se chegava ao sujeito da en unciação.). em outros textos os autores se colocavam como representando a voz da oposição. da presença do autor na constituição do texto . do contexto textual. acreditamos. assumiu a presidência o marechal 1 Humberto de Alencar Castelo Branco' . do con. Poderia citar um exemplo. Nesse exemplo. Para ilustrar essa distinção de níveis. Dessa forma. nesse nível (o textual) entra em cons ideração o fato de que todo texto é necessariamente incompleto.que. Daí ser este um nível de mais difícil acesso à compreensão. isto é. a relação do texto com a 187 k 1 1 i 1 i . etc. que deriva da consideração do texto corno um todo. depende da apreensão da uni dade do texto. isto é. já se tornava difícil mesmo o reconhecimento do sujeito a nível do enunciado. 0 Um sujeito textual: a Segurança Nacional (o sistema econofflico. o desen volvimento a qualquer preço. como exemplo da variação dessa perspectiva. o fato de que. Resta um terceiro nível: o nível do sujeito textual. Está em causa. Como ternos afirmado. sem urna certa explicitação da função do sujeito da enunciação. com insistência. A identificação do sujeito nesse nível. etc. nos textos que analisamos de História do Brasil havia muita inversão d e sujeito. b) uni sujeito da enunciação: os autores dos livros didáticos de história que an alisamos. da percepção do ~texto c omo um todo. era a da perspectiva pela qual a história era contada -. Podemos citar.de: ENI PULCINELLI ORLANDI . então. que se define pela atribuição de múltiplos sentidos ao texto. como em relação ao seu conhecimento de m undo. demonstra que não basta se entender palavra por palavra. por exemplo. a leitura é processo de interação. Dominar o nível de sujeito textual. LEITURA PARAFRÃSTICA E LEITURA POLISSÊMICA Cremos que esses diferentes níveis de sujeitos e esses diferentes tipos de discurso é que vão determinar. mesmo no reconhecimento de sentido . Podemos chegar assim a uma caracterização geral. sua ideologia.até o mais alto . Quanto aos diferentes níveis de sujeito. 188 ENI PULCINELLI ORLANDI Em um discurso lúdico. o mesmo pode ser obser vado em relação aos níveis de sujeitos: em relação ao sujeito do enunciado. em um discurso Iúdico. com a explicitação desses níveis. quanto aos tipos de discurso. a função de cada um dos níveis de sujeito. Então. etc. também não basta se entender sentença por sentença. Além disso. Se observamos isso. Assim. em um discurso poético e maior a possibilidade da leitura polissemica. assim como a maneira com que se dá a dinâmica de sua inter-relação.1 1 i i 1 1 i experiência do leitor tanto em relação à linguagem. Dependendo. sua capacidade de distinguir formas-padrão. deve compor as condições de sua leitura. Ou seja. corresponde aos diferentes tipos de discursos. Logo. Um fator que pode caracterizar os tipos de leitores é sua experiência de lin guagem. merece também mençao o fato de qu e existem diferentes tipos de leitores. acreditamos que deve haver explic itação desses diferentes níveis.o da leitura po lissemica. Isto é. conseqüen temente.o que caracteriza a leitura parafrástica . em grau menor. sua capacidade de análise ngüística. por exemplo. etc. sua competência gramatical escolar faz parte de sua relação com a linguagem e. dizendo que a leitura paraf rástica e a polissêmica não se distinguem de forma estanque mas gradualmente. entre outras coisas. Isto deve corresponder a estratégias de leitura diferentes. Afirmação esta que é bastante compatível com a caracterização que fizemos da leitura como produzida. a leitura polissemica. a leitura polissêmica se faz em maior gr au. podemos dizer que a polissemia é menos ampla. entre outros fatos. deve ser diferente da observada em um discurso polêmico. o grau de inferência implicada na leitura pode variar amplamente. etc. em um autoritário. o grau de relação entre o que chamamos leitura parafrástica. em um discurso científico é menor. em relação ao sujeito textual é mais ampla. etc. é suposto incluir. se não se apreende o texto em sua unidade. ou melhor . com certo grau de escolaridade. em suas condições de produção da leitura. desde um ponto mais baixo . que se caracteriza pelo reconhecimento (reprodução) do sentido dado pelo autor. da distinção de tipos e de níveis de sujeitos. e o acesso a eles corresponde a níveis diferentes de leitura. Para a leitura de qualquer nível de sujeito. varia de acordo com os diferentes tipos de discurso: num conto de fadas deve ser diferente da observada em uma dis sertação científica. já podemos determinar como alguns eleme ntos das condições de produção estão inscritos no processo de leitura. sua relação com a gramática. há sempre ação por parte do leitor. que correspond em a diferentes modos de interação na leitura. etc. o leitor. nas condições de produção da leitura.ao invés de leitura assimilativa e leitura criativa. etc. em relação ao mesmo texto.(leitura parafrástica) já há inferencia. a leitura como recepção (assimilativa) e. todavia. e que não o foram em outras épocas. Assim. Dentro da idéia de produção da leitura. etc. não queremos levar a crer que a distinção ex istente é só quantitativa. ist o é. então. deve-se esquecer que a leitura parafrástica coloca menos do conhecimento extra-texto-conhecimento de mundo. ou seja. de out ro. entre o pólo mais parafrástico e o mais polissemico.foi para deslocar a distinção já marcada entre. Aí está um limite que. Outro aspecto. do que a leitura polissêmica. como sabemos. se devesse falar em especies diferentes de inferencia e não em graus. um limite sempre difícil de ser estabelecido. isso sim. é o dizer do aut or). Talvez por isso.do leitor. a leitura como alta capacidade individual de imaginação (criativa). considerando-se a intertextualidade. de outros text os. Dessa maneira se estaria incluindo. Para avaliar a dificuldade dessa delimitação. de tal forma que o pólo polissêmico apareça. Isso nos mostra que a ação do con texto abrange mais do que os fatores imediatos da comunicação. no ensino. os implícitos em geral. a leitura é seletiva. . Do nosso ponto de vista. sempre. a mais par afrástica: por exemplo. isto é. Já que. basta lembrar que há uma variação hi stórica. por exemplo . Haverá. Quando falamos em graus. Deve haver uma correspondente distinção de natureza. há leituras que são possíveis hoje. 0 que pode haver. Desse modo. Se preferimos falar em leitura parafrástica e leitura polissemica . é o de que esta distinção não deve nos levar a atr ibuir uma espécie de valoração. no entanto. IV UMA SUGESTÃO PARA A ESCOLA Finalmente o que propomos é que se explicite o funcionamento desses elemen tos na constituição da leitura. são graus diferente s de inferencia. a leitura ortodoxa escolar de um texto científico quando se objetiva reproduzir o que o autor disse (o que é relevante. E nos indica também que as condições de produção da leitura abrangem mecanismo s bastante complexos e que não se resolvem na imediatez de relações escolares mal colocadas. para que se possa desenvolver. em A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO i i 189 detrimento do parafrástico. do jogo de poder. preferimos distinguir diferentes graus de inferencia e compreensão. circunstancialmente. da forma de interação que ela estabelece. principalmente no ambito escolar. nem há só recepção nem concordamos com o uso que se tem feito d a noção de criatividade. de um lado. tanto para menos (que é o risco da leitura parafrástica) quanto para mais (que é o risco da leitura polissemica) é muito difícil de ser explicitado: aquilo que é o mínimo que o texto "diz" e aquilo que ele já não "diz". na leitura . o conh ecimento de mecanismos discursivos que 190 . há uma decisão feita pelo leitor em relação àquilo que não está dito no texto e que o constitui. que ainda não pudemos formular mais precisamente. por exemplo. que é o que separa o dito da espécie de não dito que é constitutivo da significação do texto. a leitura mais adequada pode ser. Isso depende das condições e dos objetivos da leitura. Nem por isso. em sua situação momentanea. como o privilegiado. as formas de leitura mais adequadas e mais conseqüentes. a se observar. qualitativa portanto. há modos de leitura. ) do objeto. estabelecimento de uma (ou várias) tipologia(s) de di scurso. Estar-se-ia dando elementos para que o aprendiz trabalhasse explicitamente com o que se tem chamado competencia discursiva. e. ao mesmo) tempo. imitar. não podemos nos perder nessa concretude (empir ismo?).. em Análise de Discurso. é preciso permitir que ele conheça como um texto funciona. ao invés de vítima. meto dológica. De acordo com o que pudemos observar acerca da leitura na escola. eu diria que esse dilernai nasce do fato d e que. é w próprio objeto. então. ele poderá usufruir a indeterminação. aL i nserção desse uso particular. se coloca a necessidade metodológica do. 1 Sobre tipologia de discurso* A FUNÇÃO METODOLOGICA DO CONCEITO DE TIPO A análise de discurso. Essa possibilidade . 1969. 192 ENI PULCINELLI ORLANDI diria. em um domínio) comum. BIBLIOGRAFIA Pêcheux. Objetivos à primeira vista contraditórios e que revelami um dilema na constituição do objeto da anál ise de discurso. não se t em procurado modificar as condições de produção de leitura do aluno: ou ele já tem as tais condições (como as tem o leitor ideal que é o padrão) ou ele é obrigado a deco rar. Mais do que isso. tem a mesma função classificatória. tratando-se discurso. Rio de Janeiro. então. Eu (*) Texto apresentado no V11 Encontro Nacional de Lingüística da PUC. Mais do que lhe fornecer estratégias. conseqüentemente.está inscrita na própria de finição de discurso e na sua (do discurso) necessária inserção na ideologia. De posse do conhecimento dos mecanismos discursivos.qual seja a da sistematização . ele terá acesso ao processo da leitura em aberto. negaria qualquer possibilidade de sis tematicidade do objeto e. a própria possibilidade da análise. É princípio organizador: primeiro passo para a possibilidade de se generalizarem certas características. De um ponto de vista ingenuo. de tal forma que cada discurso sejai um dis curso sem nada a ver com os outros.ao mesmo) tempo em que visa a construir uma generalidade . que tem as categorias (se as pensamos como sedimentos de processos) na Análise Lingüística.Analyse Automatique du Discours. pro cura apreender a singularidade desse uso -isto é. enquanto unidade pragmática. Essa atomização. o aluno terá acesso não apenas à possibilidade de ler como o professor le. colocando-se como sujeito de sua leitura. repetir. M. que o tipo. 1982. etc.e agora o dizendo de uma forma menos ingênua -.ENI PULCINELLI ORLANDI fazem parte do uso da linguagem. se agruparem certas propriedades e se distinguirem classes. . não podemos excluir' as determinações concretas que o caracterizam. E. réplica (descrição. desse discurso. D reio . . a esse nível. se estaria trabalhando com a leitura em um nível mais exigente do q ue o das simples estratégias. Assim.isto é.. Dunod. A melhor. Paris. simulação. levando em conta as condições de uso) da linguagem. procura distinguir um discurso de outro . ficando ao sabor dos fatos. toda formação discursiva se caracteriza por sua relação com a formação eológica. de enunciação C2) no sentido lato: contexto sócio-histórico. naquelas condições. é a que inclui a referencia ao contexto no sentido lato. ou de enunciação. tanto o desconhecimento da função da tipologi . em referência ao mecanismo de colocação dos protagonistas e do objeto do discurso que nós chamamos d e 'condições de produção' do discurso" (1969). embora eles se realizem neces sariamente nesse sujeito. eu creio. em grande parte. a sistematização deriva da relação com a exterioridade. de tal forma que qualquer "formação discursiva deriva de condições de produção específicas" (Pêcheux. 0 TIPO COMO FATOR DAS CONDIÇõES. Em suma. relativ as ao contexto. a relação do dito com o não dito. mas que se poderia dizer . nem como propriedades de um locutor observado fora de qualquer det erminação históricosocial. com suas paráfrases. Isto é. é que todas as análises de discurso supõem uma tipo logia. 0 que significa dizer que pensar a sisternaticidade do objeto da análise de discurso é refletir sobre a questão da tipologia e. mas considerando-se os discursos como estados de um process o discursivo. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 193 ideológico . e o amplo u sócio-histórico. segundo a perspectiva que adotamos. que chamamos de condições de produção. Isto é possível considerando-se não os discursos fechados em si mesmos. no sentido lato). a de expl icitação do tipo de discurso que constitui o seu material de análise. Daí o fato de se considerar a intertextualidade (a discu rsividade): a relação de um discurso com outros discursos existentes e a relação de um discurso com outros discursos possíveis. no sentido atual desse termo. duas coisas: a) que a tipologia é condição necessária da análise e b) que o tipo está inscrito nas condições de produção do discurso sob dois aspectos: enquanto modelo e enquanto atividade tipificante. A distinção dessas duas espécies de contexto de situação imediato. ideológico (que é o contexto de situação. Daí. raros são os analistas que explicitarn a tipologia que está implícita na análise.Por definição. sobre o estatuto das diferentes espécies de contexto. no sentido estrito) como os fatos do contexto sóciohi stórico. a tarefa do analista é. Essa exterioridade. normalmente. Por outro lado. isto é. ideológico A forma mais abrangente de estabelecer uma tipologia. DE PRODUÇÃO DA ANÃLI SE 0 que ocorre. Daí decorre. mas com a condição de acrescentar imediatamente que este func ionamento não é integralmente lingüístico. 1975). necessariamente. De nossa parte. sob a forma das seguintes distinções: a) contexto lingüístico (ou co-texto) b) contexto textual C) contexto de situação c) no sentido estrito: contexto imediato.está refletida nas diferentes formas com que se constituem as diversas tipologias. Dessa forma é que se pode entender o dizer de Pecheux de "que os fenom enos lingüísticos de dimensão superior à frase podem efetivamente ser concebidos como um funcionamento. Isto significa. deve incluir tanto fatores da situação imediata ou situação de enunciação (contexto de situação. temos procurado estabelecer distinções operacionais. segundo o que penso. que é a marca da análise de discurso: os processos discursivos não tem sua origem no sujeito. segundo nossa pers pectiva. ou com o domínio dos seus implícitos. de acordo com o que tenho observado na leitura de análises de discurso em geral. a meu ver. Essa afirmação traz no bojo a contraditor ade da noção de sujeito. o discurso didático é caracterizado co mo invariante de base. em sua relação. os dois tipos extremos: o muito comp lexo e o muito difuso. NA ANÃLISE DE DISCURSO. São. que considera como obstáculos simétricos na teoria do discurso: discursos muito complexos para os quais a relação com as condições de produção seria delicada. SE TÊM DEFINIDAS AS TIPOLOGIAS Maingueneau (1976) diz que a análise de discurso tem por especificidade pr ocurar construir modelos de discurso articulando estes modelos sobre condições de produção. que é o da na tureza do texto. Como ponto de equilíbrio. e discursos muito difusos em que a relação com as condições de produção seria imediata demais. quando se analisa um discurso jurídico. deriva dos objetivos da análise proposta. do domínio de conhecimento no qual s e insere. etc. o que temos é a distinção entre discurso didático e discurso polêmico. Dian te de um material a ser analisado. Como exemplificação desses dois tipos extremos. na verdade. dois extremos. isto é. deste ou daquele traço. esses. Dessas condições . ao religioso. Exemplos: as análises que Marilena Chauí faz supõem a relação entre um discurso ideológico e um discurso crítico. ela cita o discurso teológico A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1 195 . Ela coloca. Acreditamos ainda que a escolha de uma tipologia não se faz "em abstrato" mas deri va da concepção de discurso do analista. ou melhor. São esses fatores. etc. como necessária para se dar conta de diferenças formais da língua: as dos tempos do verbo em frances. então. Já em Dubois. então. que são tipos que resultam do conf ronto ideologia/contra.que tem muito a ver com as condições de produção mais imediatas. Por isso. como uma leitura que se constitui em determinadas condições. se supõe sua distinção em relação ao político. Segundo esse autor. isso tudo. mas não apenas disso. ela cita o discurso político. pois.ideologia. são esses dois fatores em sua relação que consideramos como dominantes na escolha da tipologia que vai fazer das condições de produção da análise : o objetivo da analise e sua relação com a natureza do texto que é o objeto da analise.que praticamente nada tem a ver com as condições de produção mais imediatas e em que o s textos remetem a outros textos e não à situação . da sua posição em relação ao problema da ideologia. Assim. quç é o uso (pressuposto ou explícito) de uma ( Çou mais) tipologia(s) A meu ver. que estabelecerá a relevância deste ou daquele dado. o fato de se usar uma ou outra tipologia dá uma direção à análise. o fato de se utilizar uma ou outra tipologia resultará em um recorte que é seletivo. Poder-se-ia resumir. A tipologia aparece. os tipos representam. do modelo de análise que utiliza. Estaria tão próximo . Na relação com os objetivos. 0 tipo é definido.a em análise de discurso. esse meu trabalho pode ser visto como uma reflexão sobre as cond ições de produção da analise. dizendo-se que a escolha da tipologia. Em Benveniste (1966). assim. na análise. de forma geral. privilegiarei um de seus aspectos. entra um outro fator. COMO. diferentes planos da enunciação: discurso/história. produto da atividade cognitiva. 194 ENI PULCINELLI ORLANDI então. Já que a análise pode ser vista como um discurso. enquanto mod o de enunciação. também decisivo. onde há uma articul ação harmônica entre discurso e condições de produção. quanto o desconhecimento dos diferentes critérios que instituem as diferentes tipologias. que determinam a tipologia adotada na a nálise de qualquer discurso.e o discurso ordinário cotidiano ou conversa . sobre o rec eptor) . é o discurso polêmico. Gardin. e opor então polêmico a didático? Parece-me que isto se deve aos objetivos da análise e à posição (preferência) da analista frente aos partidos. Comunista) em que a enunciação é menos marcada. e que está suposta a essa elaboração de tipologia.: ontologia/ideologia) ou retóricas (ex. entre o subiacente e o superficial. 0 que nos leva. Daí esse autor concl uir que o que é preciso categorizar é o que faz com que um discurso funcione e não o julgamento que se pode fazer sobre ele. diz ele. uma vez que se está na fase pré-taxonomica dessa ciência. no qual há falsificação de uma tese oposta. e a caracterização das tipologias. Enquanto as categorias que descrevem o discurso. com a oposição "di scurso patronal público" (polifônico) e i . a modalidade e a transparência (Dubois. entre a base e a derivação. menos tensa. dos quais ela analisa. temos a distinção de tipos de discurso segundo distinções da enunci ação: a tensão. ela chamará discurso político didático. isto é. São dois tipos: o de Blum (P. mais transparente. é relativamente intuitiva. Dessa maneira. mais tenso. ele afirma que as categorias são emprestadas e metafóricas. etc. Aponta como exemplos da fase pré-taxonômica alguns trabalhos: o de Marcellesi com o discurso da individualização. Creio que podemos ver essa distinção como um sub.em relação ao qual se deverá formular as diferentes regras que permitirão constru ir os outros tipos de discurso. destacar as dominantes de seu funcionamento". "forem filosóficas (ex.produto daquela estabelecid a entre o gramatical e o contextual. tensão (relação estabelecida entre o sujeito falante e o interlocutor) e transpa196 rencia (maior ou menor transferência do sujeito da enunciação. há postulação de um tipo central (ideal?) e suas derivações. há o perigo de um certo simplismo na delimitação provisória das formações discursivas. segundo esse autor. a distancia. mais modalizado.quanto possível da descrição gramatical da competencia: descrevendo-se a língua. segundo Guespin. Seu oposto. o de Thorez. e o de Th orez (P. Partindo da idéia de que a categorização. que evoca o problema da responsabilidade ideológica. Por que chamar de tradicional? Por que não chamar de polêmico. E é interessante observar como os objetivos da análise determinam fortemente a forma da tipologia adotada. etc. entre a informação e os efeitos de sentido. Ainda em Dubois. Socialista). Dubois colocará o discurso didático como invari ante . isto é. sem marcas pronominais. e em que há maior distancia. Não aponta essa possibilidade sem mostrar seu cuidado ao se trabalhar com as formações discursi vas pois. . a refletir sobre as condições de produção da análise. isto é. frase de base com o verbo ser.L. Em Guespin (1976). "tipificar os discursos das diferentes formações discursivas. Nessa proposta. ou seja.distanci a (a atitude do sujeito falante face ao seu enunciado). na perspectiva de Voloshinov.: didático/polêmico) se está condenado ao artefato". Courdesses (1971) chega à caracterização dos discursos de Blum e Thorez. ond e há marcas específicas de enunciação. na ciencia do discurso. mais uma vez. modalização (a adesão. a marca que o sujeito dá a seu enunciado). temos uma referencia explícita e direta ao problema da tipologia. Aponta então o movimento que existe em direção a uma nova tipologia: aquele que se define na relação do discurso com as formações discursivas. como e m Dubois. menos transparent e e em que há menor distância na atitude do sujeito em relação ao seu enunciado. De forma geral. 1969). Ao primeiro. Partindo da distinção dos quatro conceitos . descrev e-se um tipo de discurso cujo sujeito de enunciação está ausente.com nominalizações. do locutor. entre a função referencial e as outras funções da linguagem. os discursos. ela chama rá discurso político tradicional e ao seu oposto. que ela caracteriza como send o mais marcado pela enunciação. ele coloca a tipologia de discursos como necessária mas futura. menos modalizada. ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1 k 1 1 197 discurso sindical público (a conquista do discurso).que determinam quem pode falar. por sua vez. ao menos no quadro estreito do discurso político. Toma. o que implica que seja repe nsada a noção de embrayeur". Um desenvolvimento dessa tipologia é feita por J. sobre que tema. 0 discurso citado mostra a maneira dinamica pela qual a enunciação de outrem é apreciada e assimilada. não o pode nenhum fato lingüístico. segundo o discurso citado: a) modo do como ele diz (intertextualidade: diálogo com outros textos). Para ele. ReyDebove (1971) que con sidera tres modos de dizer. a substância da língua é o fenôme no social da interação verbal realizada através da enunciação. Ela procura chegar a algumas conseqüências. terc . em Gardin (1976). Além desses. etc. Referidor. segundo a formulação feita por Voleshinov (1976).que os discursos são produzidos. b) o modo do como se diz (discurso com encadeamento de lugares-comuns. Courdesses e o discurso de en unciação por "eu" (Blum) e de enunciação por '&nós" (Thorez). ou ainda. Uma outra tipologia que é bastante utilizada é a que se refere ao discurso c itado. Referido. violenta o código das unidades lingüísticas ao mesmo tempo que a ideologia). S. Na análise de discurso é retomada. ele vai dis tinguir o discurso direto e o indireto livre. em geral. que esgotari am a proposta daquele autor. colocando várias formas de discurso (oral. como. escrito. responde sempre a um outro discurso e preve outro (é a questão da intertextualidade). mas deve ser vista como processo constitutivo da matéria enunciada. na menção feita por Benveniste sobre o discurso indireto como um terceiro tipo em relação à distin~ão di scurso e história (1966). Voloshinov vai vincular cada uma das formas de discurso a um contexto sócio-econ omico: o discurso direto é dominante no século XVII na Rússia e na França. um tipo de discurso demonstra o modo como as formas da língua reagem a certas cara cterísticas de ordem social. Nessa perspectiva. Ilustra a forma como o contexto social atua nos esquemas da língua e como a língua organiza o ideológico. se encontram encaixados em sistemas referidores (tendo ou não uma forma lingüística). é preciso que a pesquisa. porque é sempre no interior de instituições que possu em regras precisas . Ainda uma outra forma de se considerar a distinção discurso referido/ discurso referidor é a que assume que todo discurso é ao mesmo tempo referido e referidor. Indo mais além . o discurso citado como exemplar desse modo. faça um giro pelosfuncionamentos discursivos". porque contém sempre uma análise dos outros discursos. Para este autor. o discurso citado põe às claras o modo como a enunciação de ou trem é incorporada ao discurso interior e não pode ser estudado fora dessa perspectiva de interação. Ele mesmo. o das configurações enunciativas não retóricas "onde a enu ciação não está mais no desvio em relação ao enunciado. É a que vemos. aliás. Em resumo. Segundo Voloshinov. logo. o discurso indireto é dominante no Renascimento e o discurso indireto livre é o dominante no século XX. tendo como critério o modo de enunciação. Grumbach (1975) um estudo sistemático da tipolog ia proposta por Benveniste. por exemplo. dicionário de idéias rece198 ENI PULCINELLI ORLANDI bidas: código lingüístico que o eu não assume completamente) e c) o modo do como eu digo (citações de si mesmo: se opõe ao como se diz. propõe um outro nível típico. em que momento. temos em J. podemos dizer que a proposta de Guespin é a de que "antes de qualquer progresso tipológico. então. . de forma explícita. no interior do domínio literário. que já vem dado. jornalístico. 0 problema. i sto é. Para essa caracterização. É uma distinção tipológica que está presente em qualquer programa escolar. se combina com elas. poético. a possibilidade de generalização (e não-generalização) e a tra nsformação da realidade criada (ou não-transformação). Outra tipologia. nas análises. é a que distingue narração.) no escopo em que ele distingue discurso/história. Valeria a pena um estudo que pudesse determin ar as condições sócio-históricas do estabelecimento dessa tipologia. dissertação. até certo ponto produtivo. através do critério da explicitação (ou não) do intertexto. dada a relação necessária do discurso com a ideologia. que não há um tipo puro de discurso e. há mistura do ideológico com os outros. científico. não se coloca a possibilidade de se dist inguir um discurso ideológico. a meu ver. e b) a posição contrária a essa que é a de afirmar a existência de um discurso ideológico distinto. descrição. ou pela teoria do conhecimento. é ema tipologia consensual. sobre outras formas como o discurso teór ico e poético. consensual. primeira pessoa no passado. É uma tipologia que tem uma força didática considerável. há uma relação necessária entre discurso e ideologia. No entanto. vários estudos atuais feitos d a perspectiva da análise de discurso. E nesse caso (b) também há duas maneiras de fazê-lo. Também é geral. de 0. após fazer criteriosamente essa dist inção. o que acaba por A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 199 obscurecer a distinção colocada no início. de finem o ideológico como sendo obscuro Í irrácional. sobre a tipologia de discurso é Marandin (1979).). acaba por afirmar. resta o v 1 alor metodológico dessa distinção como um recurso. Quando digo que esta tipologia é historicamente marcada. De um lado. Em relação à distinção do discurso ideológico. Segundo esse 200 ENI PULCINELLI ORLANDI autor. etc.eira pessoa no presente. Há. aqui. Na maior parte das vezes. procura diferenciar discurso ideológico e discurso científico. sem dúvida. De outro. Esse autor. Essa também. por exemplo. mas diversas espécies . etc. 0 critério. tácita e geral. em geral. ju rídico. E está subjacente às outras tipologias ou. o científico. entretanto. o religioso. os que consideram a oposição discurso ideológico/ discurso crítico (ou contradiscurso. Reflete ' então. os que consideram o discurso ideológico como um tipo de discurso ao lado de outros como o político. em geral. Merece atenção. No discurso teórico. em relação a essas espécies de tipologia. o que mascara. religioso. Pois é. A nossa posição é a de que todo discurso deve ser referido a uma formação ideológica. devemos observar que há. etc. é herdado pela análise de discurso como tal. quero dizer que ela deve ter nascido de uma necessidade metodológica específica cuja origem e importân cia deriva de uma época determinada. dua tendências em análise de discurso: a) a de considerar que. o jurídico. em linhas gerais. Reboul (1980). Ela é referida à existência de instituições. É do domínio da literatura no tratamento do texto. ou suas variaveis. dadas de acordo com um critério já estabelecido alhures: ou pela sociologia. etc. os que assim o fazem. ao mesmo tempo. Outra tipologia que podemos considerar como sendo dessa mesma espécie é a que distingue os gêneros. isto é. É uma tipologia que se coloca de forma consensual. Um outro autor que também trabalha. a noção de tempo e de acontecimento tem sido referências fundamenta is. É o caso. é que já partem de distinções apriorísticas. Uma variação dessa tipologia é a que loca a distinção entre domínios (institucionais) do saber: discurso filosófico. etc. logo. a meu ver historicamente marcada. etc. uma ti pologia que se caracteriza pela constancia e gener-lidade. "não há uma tipologia de discurso. a espécie de tipologia que distingue discurso político. Podemos dizer que os critérios em que se baseia são. etc. pareceme. procurarei mostrar como. conteúdo/expressão. Não pretendo . inicialmente. da sociolingüística. o registro é definido por "traços lingüísticos. Todas tem em comum o fato de "repousar em um esquema comum: a noção de enunciação". na tipologia que formulei. esse autor faz a crítica dessas tipologias por considerar que elas repetem "em sua dupla referência a Harris e a J akobson/Benveniste" a dicotomia fundo/forma. Ele considera. a tip ologia do discurso se pretende "o lugar de proposições teóricas autônomas sobre o discurso".. inicialmen te. as condições de produção: de forma típica (relação entre locutor e destinatário) e histórica (lugar e época em que o discurso é emitido). Isto é. etc.podemos perceber que há heterogen eidade quanto às categorias utilizadas. de Dubois) e a sociolingüística (de Ma rcellesi.1971). Ele mostra. o ideal (Dubois e o discurso polêmico e didático . ) as categorias que ela empresta ou estabelece ( . o que ele propõe é que se busquem critérios discursivos (do discurso como tal) para o estabelecimento da(s) tipologia(s). que o re gistro define a substancia do texto (o que o texto significa). os tais critérios subjacentes às tipologias . A partir dessa crítica. cuja definição de registro permite uma distinção tipológica.11 i 1 9 o aco ertamento de um termo único e de um objeto aparentemente semelhant e.. o extremo (Courdesses e os discursos de Blum e Thorez . Finalmente.1976). Mais adiante. ou delimitam. da pragmática. nessas condições. procura-se a especificidade de categorias de discurso. Ainda segundo Marandin. que são tipicamen te delineados em condições específicas. p arece-me. a tipologia "opera a mesma operação que a velha retórica ( . junto a palavras e estruturas que são usadas na realização desses significados". Mas diferem na forma como definem. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO OUTRAS PERSPECTIVAS TIPOLõGICAS 201 Em geral. tipicamente associados com uma configuração de traços situacionais. Sem esquecer que o que interess a dos locutores é sua ação lingüística e o que interessa 4a ideologia é aquilo com que o texto tem a ver. etc. mais especificament e se pode predizer as propriedades do texto nessa situação". podemos destacar espécies diferentes de tipologias dado que seus critérios derivam de diferentes teorias do uso da linguagem: da teoria da enunciação.que é um dos objetivo s colocados como proposta inicial desse trabalho . ) enviam a uma concepção estruturalista da sociedade. então. trocam seus resultados ou suas problemáticas próprias". Pensan do-se. Gostaria de citar. Halliday (1976). E Marandin propõe a reflexão acerca de algumas espécies de tipologias: o tipo classificatório (o estudo de Meleuc sobre a máx ima . levo e m conta essa necessidade: a de buscar critérios que derivem do discurso como tal e não da sociologia.. Para ele. de Guespin).. Nesta definição de registro. de suas funções e de seu instrumento favorito: a linguagem".de tir)Ologias que ---1. pois o registro é $Aum contexto de significados.1965). Quanto m ais especificamente se pode caracterizar o contexto de situação. encontramos os requisitos que são necessários para o estabelecimento da tipologia: a caracterização do texto em relação às suas condições (a relação com a exterioridade) e a espe ação das propriedades do texto. da retórica ou da lingüística. Mais do que isso. a configuração de modelos semanticos. entretanto.1971) e o típico (Gardin e o discur so patronal e sindical . duas espécies de tipologias: a ideal (de Sumpf. a todas essas múltiplas possibilidades social. É uma tipologia que envolve considerações a respeito da educação formal. é uma noção que permite. um melhor domínio do discurso. segundo essa mesma autora. a noção de regist ro. é a que se faz entre disc urso planejado/não planejado (Ochs. o cuidado é evitar sintáticas complexas e artifícios discursivos mais formais. a meu ver. definindo. à relação entre registro e estilo. ou seja. aqui. 1973). Essas todas são situações reguladas e com formas típicas. defesa de tese isso é possível porque se toma como referência a homogeneidade . a partir do concei to de variação social e estilística e através da noção de registro. em geral. as distinções que derivam de diferentes situações jurídica. aula. uma forma de tiPologia hoje muito explosegundo M ain rada pela etnolingüística.E ternos relações de aliança. o fato de que a cada tipo se podem do adulto. necessidade de se buscar invariantes na constituição do corpus. Isso porque é fácil cair no risco das subcategorizações cada vez mais estritas e escrita/oral. antagonismo. e pensando-se o contexto momendiscursos analisávei s não o são. etc. o estilo' e o tipo são os fatores que caracterizam qualquer funcionamento discursivo. Isso se deve. Aliás. pelos etnometodologistas e pela pragde levar à sis tematização do objeto de análise. ainda. Segundo Ochs. Toma como critério as noções de previsão e organização prévia do di rso em relação a sua expressão. a menção à distinção de grande de estr de produção. pode-se estabelecer uma clara distinção de discursos: o discurso formal e o informal (Labov. como veremos. Creio que se faz necessária. defesa das condições de produção sendo que o discurso aparece com o o de linguagem: conversa. longe mática em geral é a que distingue a situação-escrita e a situaçãogueneau (1976). E. seria interessante observar que. palestra. esse tipo de aproximação. o número de corpora é infinito mas os tipos de oral. inclusão. assim. assim como da relação entre a linguagem da criança e a de se considerar em tipos.com isso afirmar que Halliday estabelece assim uma tipologia. Por outr texto constit soma das frases qu . Há relação entre os discursos taneo da enunciação em relação às regras conversacionais. E. de análises de discurso' ui uma totalidade lingüística específica além da de análises pragmáticas. coloca que os fazer corr esponder subdivisões. podemos ver usos mais planejados da linguagem incluem o uso de estruturas que há uma im ensa complexidade tipológica.Há. do compor(1) A esse respeito. como as que distinguem: objeto de trab alho. 1979). Em relação à pragmática. um análises Sociológicas (Schegloff. dessa vez de natureza pragmática. etc. É uma que essa comp lexidade impeça um melhor conhecimento do distinção que está subiacente a outras. As formas citadas são apenas algumas de uma Possibiuturações transfrásticas em função das condições resultado da articulação de uma pluralidade mais ou menos lidade muito ampla de situações e que são objeto de estudo de o lado. as formações discursivas. Do ponto de vista das marcas formais. 1976). conversa/conferência. subtipos. então. Em relação à sociolingüística. etc. Uma outra distinção. segundo o que tenho obs ervado. Tannen (1981). essa distinção é do domínio da psicologia. sutis. isto está Paralelamente. é interessante a leitura de D. que farão de cada discurso um tipo único. 202 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 203 tamento característico de adultos de uma determinada classe Se acrescentarm os. 0 fato de esse autor por a distinção a nível de .) até mais particu um atributo da i códigos lares. etc. Fazendo um paralelo. Bouacha e D. distinto. a a rgumentativa. 0 texto reflete essa duplicidade de sua constituição: enquanto objeto teórico. há várias lingüísticas ovi códigos distintos. de uma forma ou outra. pois o referim os a suas condições de produção. entretanto. a estrutura lingüística dá origem a formas pensar uma mul tiplicidade de microlínguas). pois não xiste um discurso. eu diria que. na análise. narrativa. Assim. Não se trata de tipos de discurso mas de códigos diferentes o que. as propriedades detectáveis do texto são aquelas que o constituem enquanto visto na perspectiva do discurso. em um plano conceptual. resulta em NA CO NSTITUIÇÃO DA TIPOLOGIA conseqüências metodológicas totalmente diferentes. na Gramática Transformacion al. Os códigos são causados pela escalas de complexidade entre as estruturas discursivas e as da Para esse autor. se definem em sua relação com formações 204 ENI PULCINELLI ORLANDI ideológicas. de um a base lingüística comum (não é Oecaso de elaborado. do caboclo. não nos permite cOlocá-lo ao lado dos outros que. se o consideramos na p erspectiva da análise de discurso. Lendo A. proces so discursivo. A. lhe devolvemos sua incompletude. ou seja. Assim como há distinções de de alguns procedimentos operacionais.texto/ discurso . o objeto da explicação é a competencia e a unidade de análise é a sentença. Para ele.para que Pu déssemos operar. o diálogo. discurso que remetem à ideologia em geral: o discurso domi Dado o fato de que o conceito de discurso é um conceito nante e Os outros que se relacionam com ele no processo de teórico e cuja delimitação é impossível de ser feita em termos de dominação. também. o texto pode ser um objeto acabado (um produto) com começo. do negro. o dos economistas. Sem esquecer. enquanto objeto empírico. estrutura social. discursivos se delimitam e se definem na sua inclusão em forma ções que. analítico. saria homem. mas supõe a existência de códigos proposta por Bernstein (1975): código restrito e código uma língua. assim como. etc. ainda. Essa distinção se mostrou neces tipos estabelecidos pelas divisões sociais em 1 . mas um estado de um profissões: o discurso médico. discurso da classe média. Ou diferentes Em nossos estudos de análise de discurso temos proposto a Há ainda distinções que remetem a diferenças de classe: distinção entre texto e discurso. o sistema lingüístico constitui língua: há tipos de estruturação discursiva mais gerais (como a estrutura social.e o constituem. as distinções em termos de análise. contribuem para uma elaboração A DISTINÇÃO TE XTO E DISCURSO E SUA FUNÇÃO tiPOlógica de discurso. o texto não é um objeto acabado. o fato de que os processos etc. Porém. pareceu-nos necessário criar essa distinção . com uma unidade delimitável. dado. da alta burguesia. expressam-na e ao mesmo tempo a regulam. etc geral: da mulher. do para empreendermos análises de discurso com o controle . na Análise de Discurso. meio e fim. Daí termos considerado o discurso como conceito teórico e metodológico e texto como seu equivalente. o terapêutico. Bertrand (1981) pude perceber que essa distinção - . como há uma relação necessária entre eles. sua co ntrapartida. por sua vez. E. o objeto da explicação é o discurso e a unidade de análise é o texto . de nosso Ponto de vista. com a noção de discurso que adotei. então. Partindo da mesma idéia de que o discurso é objeto teórico. 150). são interdependentes. o ato de dizer é tipificante. científico. ou seja. entretanto. eles são 'atravessados' por leis que derivam de ordens diferentes de determin ação e funcionamento". tenho estabelecido uma distinção entre tip o e funcionamento discursivo: os tipos (produtos) são a cristalização de funcionamentos (processos) definidos na própria relação de interlocução. com a formação ideológica. em OPOSiÇão à atividade de produção. p. polernico. permite uma dinâmica. como abordei mais acima. etc.). enquanto traço escrito' de uma atividade de produção. representam uma construção teórica. esses autores vão dizer que "a relação te xto-discurso pode ser apreendida de múltiplas maneiras. encontro mais uma determinação üIperacional para a distinção de texto /discurso que vinha fazendo: as tipo(2) "Traço escrito". aqui. nesta reflexão. deriva de uma concepção de linguagem distinta. parale lamente. que "o texto.texto e discurso se determinam mutuamente.texto/discurso . De acordo. é no texto. a tipologia que propus considera como constitutiva a relação com as condições de produção. Dessa forma. 206 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 207 Dada a institucionalização da linguagem. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 205 logias são elaboradas a partir de categorizações heterogêneas sobre o texto e são da ordem do discurso.. Creio mesmo que esse é um fenomeno geral em relação às tipologias de discurso: a cada definição de discurso que. talvez se evitem categorizações heterogêne as. então. decorre que o funcionamento discursivo se define como atividade est ruturante. Uma vez que. faz er comentários a respeito da concepção de tipos que desenvolvi em meu trabalho.tem um alcance que afeta também o problema da tipologia. não os estagnando em uma relação unilateral: através da idéia de funcionamento .) que podem também incidir sobre classes de textos (discurso político. não retomarei toda a formulação da tipologia. UMA TIPOLOGIA ESPECIFICA Nas considerações a respeito da tipologia que estabeleci (cf . é que com efeito os textos produzidos e difundidos no interior de uma formação social dada ( . segundo o que desenvolvemos. é possível procurar no texto o que faz com que ele funcione. Além das distinções tais como texto e discurso. etc. ou seja. cognitivo. procu rei levar em conta outros fatores como o de que a tipologia deve-se constituir internamente à noção de discurso e se estabelecer sobre critérios que derivem dessa noção.. Procurando enfatizar o aspecto interacional. ) são por assim dizer os lugares de manifestação de uma pluralidade de sistemas de coerção. Dessa forma. etc. o fato de que há um processo de legi . da linguagem e a relação existente entre processo e produto.). as configurações se estabelecem no/pelo ato de dizer. Interessa-me. tomando como referência o processo. construção teóric a elaborada a partir de categorizações heterogeneas sobre o texto: categorizações que são retóricas (discurso didático. envia necessariamente a discurso. 0 conceito de funcionamento. e é essa sua qualidade discursiva.que venho definindo como atividade estruturante do discurso . é usado a prop6sito do texto como unidade Produzi da. Os autores mostram. na sua materialidade específica (seus traços) que se constitui a discursividade. uma passagem entre esses conceito s. metalingüísticas (discurso referen cial. Considerados dessa forma. por sua vez. se propõe uma certa metodologia e uma espécie distinta de tipolo gia. Assim. pois. lúdico e autoritário . n os remetiam a dois tipos de discurso: (A) o autoritário e (B) o polêmico. é através da caracterização dos funcionamentos discursivos que podemos determinar as for mações discursivas que. por sua vez. em sua tensão. por exemplo.como um conceito mediador. funcionamento discursivo e formações discursivas. segundo o uso que se fazia dos advérbios. havendo uma gradação entre um tipo e outro. considerando a relação entre conceitos como os de processo e produto: aquilo que é tipo (produto) s e constitui como um dos fatores que entram nas condições de produção de um funcionamento discursivo (processo) que. há. Assim. um discurso.pois elas são disciplinadas . Dessa f orma. se caracterize por uma relação não absoluta mas de dominância. gostaríamos de dizer que se pode m relacionar tipo. também em relação ao tipo. Assim. os diferentes tipos se definem por tender para um dos pólos (o lúdico tende para o polissemico. é que consideramos que os tipos não se distinguem de forma estanque.A e 13 . finalmente. Esses dois grupos. Não se definem. Ainda em relação à tipologia que estabelecemos. por outro lado. determina os traços pertinen tes que podem vir a constituir novos tipos ou a confirmar (reproduzir) a forma estabelecida do tipo. em relação ao disc urso da História do Brasil para a escola. que a noção de tipo. em relação à aplicação da tipologia. de inclusão. Evidenteme nte. Mediador no sentido de que e configurado por certas marcas. de determinação.timação histórica das suas formas . a relação entre certos textos e a tipologia: o funcionamento discursivo dos textos nos levaram a distinguir do is grupos deles . na tipologia que estabelecemos e que se sustenta na reflexão sobre os processos parafrásticos e polissemicos. tenho procurado incorporar a noção de históri . é o conceito de tendência. deve-se manter uma grande flexibi . ent re eles.' Foi assim. não acredito que os tipos se definem em-si. É assim que. assim caracterizados. é fundamental para a semântica discursiva pois o tipo determina a relevância de certos fatores que constituem as condições de significação da linguagem. de conflito. E o tipo que estabelece o recorte no contexto de situação. Gostaria ainda de lembrar. Isto é. um estado do processo discursivo. Dadas certas condições de produção. mas em sua ten dência. Quer dizer. através do conceito de polissemia. por sua vez. A essa noção de história procuro atribuir uma dinâmica. relação de aliança. procuramos incorporar a dimensão histórica e social da linguagem e. Por outro lado. o outro conceito que gostaríamos de introduzir . mas relativamente aos pólos para que tendem. nessa reflexão sobre tipologia. eles entram como tipos nas condições de produção de qualquer discurso: o produto (tipo) se recoloca como processo. Ainda nessa perspectiva de se resguardar o princípio da multiplicidade com o característica da linguagem. por exemplo. Estas formações. essas passagens se fazem por mediações. são definidas pela sua relação com a formação ideológica.derivam da noção de interação e de polissemia. categoricamente. Assim como.aquilo que se deve e se pod e dizer em determinadas condições de produção .com seu caráter de determinação ou indeterminação. Além do conceito de dominância. aqui. predominantemente lúdico ou polêmico ou autoritário. por sua vez. e outras espécies de relação que devem ser observadas pela análise do funcionamento discursivo e que fazem com que o tipo. é. procuramos enfatizar a idéia de pluralidade no que diz respeito às formas e sentidos diferentes da linguagem. na sua relação com funcion amento. com o conceito de interação. a duas formações discursivas que se caracterizavam ou pelo episodismo (A) ou pelo seu caráter interpretativo (B). Temos tomado o conceito de formação discursiva . o autoritário tende para o parafrástico) ou para o equilíbrio tenso entre os dois pólos (o discurso polemico).os tipos se estabelecem como produto dessa institucionalização e se fixam como padrões. certos traços formais ao mesmo tempo em que é definido por sua relação com a formação ideológica. estabelecendo o domínio da significação do que se diz. que pudemos caracterizar.discurso polêmico. nos rem etiam. por sua vez. Os critérios para o estabelecimento da tipologia que propusemos . logo ela faz parte das condições de produção de qu alquer análise. na interpretação das características do texto que o situaM ern uma formação discursiva e não outra. Assim. em relação a sua relativa generalidade. em "Funcionamento e discurso". a int etPretação dos dados obtidos pela aplicação da tipologia tem de ser referida ao contexto. Portanto. ou seja. agora internamente ao dor111nic. não podemos prescindir do contexto sócio-hist6rico. se não se considerar essa di stinção na perspectiva da relação produto/processo. gostaríamos de chamar a atenção para um problema metodológi 1c0 1nIPortante que nos surgiu ao procurarmos estabelecer uma t'POIOgia. pode-se cair no risco de se estar lidand o. !'Cnl cçjnstituem uma evidência em si. por exemplo. A sua interpretação deve levar em conta as condições (3) elação está A colocação 208 A definição de formação discursiva. Ao se distinguir tipos e funcionamentos discursivos. de qualquer forma. A forma que encontramos de evitar a dicotomização categórica foi pel a noção de processo. não determinar o sujeito pode significar a desrnistificação da noção de herói. Em out ras condições de produção (de enunciaçao e sócio-históricas). Por outro lado. uma posição autoritária diante do leitor que e impedido de refazer o percurso do dizer. a indeterminaçãO do su jeito nos textos da história de 1964 a 1974 (que foi o período que analisamos) pode derivar de vários fatores (como a censura. Finalmente. ainda utilizando cOnio dado a análise do discurso da História do Brasil para a escola o fato de se atribuir uma relação com a ideologia. sendo os tipos cristalizações de processos (fun Í cIOnamentos). da noção de formação discursiva como mediadora. em seu nível de general ização. se estaria reproduzindo a dicOtOnia rnodelo/ocorrencia (língua/f ala). quando recon hecemos nos textos do grupo (A) as marcas de indeterminação do sujeito. a autocensura e até mesmo a posição ao l ado dos que estão 11o poder) e significam. De toda forma. de formação ideológica e a caracterização de em "Para quem é o discurso pedagógico?". A decisão acerca de seu uso depende das condições de produção da própria análise que se estiver empreendendo. com a dicotomia modelo abstrato e uso concreto de forma estrita. também se deve ter o mesmo cuidado em relação à interpretação dessa (ou qualquer outra) tipologia. CONCLUSÃO Toda análise supõe uma tipologia. Isto quer dizer que. Além disso.lidade. Essa é uma tipologia entre as várias possíveis. É ainda uma questão de níveis de abstração. Procuramos os processos mais gerais que vão se dar diferentemente nos diferentes 0iscursos. os tipos têln como ba se parao estabelecimento dos critérios a relação de interação dos interlocutores. tambérn essa tipologia que propomos. ENI ]~ULCINELLI ORLANDI de produção dos textos analisados e a relação com a formação ideológica. do uso da linguagem. Por e xemplo. agora a nível do uso. não no~ leva a atribuir automaticamente a mesnia marcas de indeterminaçâo relação a textos com as mesmas Produzidos em outras condições. neste volume. Se nós a elaboramos é por termos necessidad e de alguns de seus critérios e por considerarmos que essa tipologia nos oferece uma perspectiva fecunda para a exploração das propriedades que encontramos n os discursos e na ideologia. historicamente sedimentados. Os dados não têm um sentido único. os . está sujeita ao mesmo condicionamento de qualquer Outra: sua aplicabilidade está regulada pelos objetivos da análise eni sua relação com a riatureza do texto A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 209 a ser analisado. de cruzamentos. de outro. assim como a espécie de contexto que se está conside rando. podem ser encontradas em certas canções po pulares ou em certas poesias. etc. assim como há. que são muito presentes nesse discurso. Como última observação. pudemos verificar que as antíteses. Ao observar. entre outros. certas características que se costumam atribuir a um certo discurso estão presentes também em outros. pois esses resultados não são evidentes por si. ou no científico. características que são tidas como típicas do discurso religioso. também o são. Em termos de sua constituição formal. o discurso religioso. pois. Acreditamos. por isso compartilham marcas. polêmico e autoritário. Podemos generalizar para todas as espécies de tipologias os conceitos de t endência. . que a tipologia tem uma fu nção metodológica fundamental de sistematização dos diferentes discursos: é um ponto de encon tro entre o singular e o geral. de qualquer maneira. Daí propormos que não se desvincule o estudo dos tipos de sua r elação com o funcionamento discursivo.criterios de constituição das diferentes tipologias são heterogeneos e revelam a conce pção de linguagem e de discurso que se adota. chegamos a concluir que as tipologias. que é o processo discursivo. em relação às suas c ondições de produção. o uso de um discurso pelo outro. entre os discursos. por exemplo. procurando refletir sobre a capacidade de generalização de propriedades a partir da noção de tipo. também o é no discurso da propaganda e em qualquer discurso em que haja "doutrinação". por tod as essas espécies de relação entre discursos. Assim. não há tipos puros de discurso e. Por isto é preciso se observar o funcionamento discursivo e se trabalhar com a noção de processo. que é muito comum no discurso religioso. Nesse passo. os performativos que têm uma função importante (as fórmulas religiosas) nesse discurso também o tem no discurso jurídico. cristalização de algo dinarnico. os discursos não se definem p or um traço exclusivo. aliança. todo ti po é produto histórico. podemos dizer que não há uma marca exclusiva desse discurso. Portanto. etc. ou seja. o imp erativo. há inclusão. Assim. o que define o discurso é como o traço se estabelece no funcionamento discursivo. Isto é. isso se explica pelo fato de que os d iscursos se sustentam mutuamente. Do ponto de vista da relação entre formações discursivas e formações ideológicas. ou no discurso cotidiano. o que determinará o tipo de discurso e o modo como esse traço aparece em um discurso. A heterogeneidade de critérios resulta numa grande variedade e complexidad e de tipologias de discurso. gostaríamos de lembrar que. Por isso é que. no entanto. por exemplo. elas mesmas. tem uma generalidade relativa e o que conta em seu estabelecimento e sua aplicação é o objetivo da análise em relação à natureza do texto. Não há. de dominancia e de processo que utilizamos em relação aos tipos lúdico. os resultados da aplicação de uma tipologia devem ser referidos ao contexto sócio-histórico do texto que foi objeto da análise. A interpretação de qualquer tipologia também não deve ser feita de forma automátic a. De um lado. gostaríamos de introduzir a distinção entre as marcas (traços) e as propriedades do discurso. uma essencia que define o tipo. no discurso teórico. 210 1 i 1 1 1~ ENI PULCINELLI ORLANDI Em relação à sua qualidade e às suas marcas formais. Segundo a distinção que estamos estabelecendo. pelo processo de metacomunicação. sobredeterminação e toda es ie de relação. as marcas dizem respeito à organização do discurso e as propriedades tem a ver com a t otalidade do discurso e sua relação com a exterioridade. ) para se caracterizar um discurso em relação a outro. Schegloff. Como é a voz de Deus que se fala em seu representante. para se caracterizar um tipo de discurso é preciso se determinar qu al é sua(s) propriedade(s) e depois referir as marcas a essa(s) propriedade(s). podem os dizer que a propriedade do discurso religioso é a não-reversibilidade entre os planos (temporal e espiA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO r 1 i 211 ritual) e a conseqüente ilusão de reversibilidade que se dá pela profecia. A sua tarefa. negação. Como podemos exemplificar através do Discurso Religioso. Falar desses esquemas não significa nada se não sabemos a função deles em relação à propriedade do discurso que é objeto de nossa análise. como segue: situação não reversibilidade dos planos (espiritual e temporal) texto antítese gramatica negação 0 que explicita o estatuto da lingüística na análise de discurso. Tomando como exemplo o discurso religioso. Mas é só ao referir o esquema gramatical constituído pelas marcas à propriedade é que estaremos caracterizando o dis curso em sua especificidade. E os tipos. nas estruturações de um discurso. pois o esta belecimento da propriedade do discurso é o estabelecimento do funcionamento típico de suas condições de produção. A observação das marcas (esquema gramatical) pode nos indicar procedimentos relevantes para a descoberta da(s) propriedade(s). tal como vimos fazendo. faz também parte da propriedade desse discurso o fat o de que não há autonomia desse representante em relação a sua voz. ao explicitar a dominância desse ou daquele traço. pela visão. o f ato de que a relação entre a lingüística e a análise de discurso é a de aplicação. 0 analista de discurso proc urará determinar o modo como os processos gerais estão presentes num funcionamento discursivo determinado. enquanto produto histórico. E. em sua relação: a situação. tres fatores. antítese. é remeter essa dominancia à configu11 212 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO ENI PULCINELLI ORLANDI 213 ração de um tipo. dessa ou daquela propriedade. Isso vale dizer que. dada a dominância (saliência) de um de seus fatores em determinadas condições de produção. 0 que temos são processos gerais que se cruzam de várias maneiras e que faze m com que um discurso tenda para uma certa forma típica. Isso tudo nos leva a considerar. em relação à tipologia. sem a consideração do funcionament o do discurso em suas condições de produção. e . na caracterização típica dos discursos.Assim. ou seja. Essas nossas considerações indicam que não adianta se dizer que se usa mais um esquema gramatical ou outro (imperativo. não há possibilidade de distingui-lo. etc. p ela performatividade das fórmulas religiosas. o texto e a gramática. então. etc. Paris. Paris."Types de discours. 1979. proponho não fixar de forma categórica o locutor no lugar do locutor e o ouvinte no lugar do ouvinte. Londres. Paris.Pêcheux."Notes sur une interpretation antonymique de Ia littérarité: le mod e du commeje dis"."Opening up closings". Paris. . Mouton. Pêcheux. 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Dun*od. n? 1."Planned and Unplanned Discours" em Discourse and Syntaxe. as diferentes noções de contexto em suas diversidades. Essai de Description du Dis cours Français sur Ia Chine". 1969. 1976. Lorigman. H. 5. 0.El Signo Ideologico y Ia F ilosofia del Lenguage. S. 0 discurso religioso INTRODUÇÃO: A NOÇÃO DE REVERSIBILIDADE Tenho colocado a noção de reversibilidade como um dos critérios subjacentes à ti pologia em que distingo os discursos polêmico. Pela noção de reversibilidade. . 1971."Recherches Sémantiques". a distinção das diferentes concepVis ión. . Langages 41. n? 13.Langage et Classes Sociales. 1965. Paris. . . Paris. Bouacha. . Marandin. na sua relação. n? 41. D. M. Larousse. Courdesses.lingüístico. Société. J. em Langue. esses pólos. Reboul. Bele. representam o cruzamento determinado. M. 1966. Linérature 4. Grumbach. Iúdico e autoritário. Larousse. 1976. Larousse. finalmente. . D. B.colocada no início desse estudo. 1976. e o d omínio (o escopo) do discurso fica comprometido. as duas possibilidades radicais se revelam nessa duplicidade: no fático. é polissemico. no entanto. Como já tive ocasião de observar. não se constitui. estaremos também falando nas condições de significação do discurso autoritário. desfaz-se a relação. procuro estabelecer q ue. em se tratando do discurso autoritário. Podemos. estancada. em relação à reversibilidade. * exagero para mais. então. ou seja . Isso porque. em direção ao fático. uma vez que esse discurso se caracteriza pela polissemia contida . Como nesse tipo de discurso há um deslocamento. Assim sendo. 0 objeto de nossa reflexão. Isso. afirmar que o discurso autoritário tende par a a monossemia. quando é zero o discurso se rompe. então.procurei tomá-la como um dos parametros na definição do discurso religioso em suas propriedades. buscando as determinações que caracterizam essa noção . gostaríamos de observar que. É um discurso que. o sentido absoluto). é constituído pelo seu contexto imediato de enunciação e pelo contexto histórico(1) Gostaria que a palavra "ili. não podemos afirmar que o discurso autoritário e um discurso monossêmico mas sim que ele tende para a monossemia. no seu caráter tendencialmen te monossêmico.Pois bem. têm como parâmetro essa noção e. como posição inicial dessa reflexão. uma vez que é um discurso que está no limiar da concepção de linguagem como dialogia. ou se ja. * relação com a reversibilidade tende para menos. ao falarmos na ilusão da reversibilidade. dizer que todo discurso. o centro desse discurso tende para * troca de papéis em si (o prazer do bate-papo). o que importa é a linguagem em si (o prazer de dizer. Ao propor a reversibilidade como condição do discurso. Poderíamos. 0 hiper-social (fático) e o hipo-social (poético): ambos vão além do esperado. gostaria de dizer que ele pode suspender essa co ndição. sendo q ue o discurso autoritário tende a estancar a polissemia. embora não haja reversibilidade de fato. que a reversibilidade é a cond ição do discurso. Coloco.a de reversibi lidade . ou sua pretendida monossemia. o contato. não significa que todo discurso se estabelece na harmonia dessa condição. Como a questão da reversibilidade está necessariamente ligada à questão da polis semia. o sentido (os sentidos) de um discurso escapa(m) ao domínio exclusivo do locutor. Isto porque todo discurso é incompleto e seu sentido é intervalar: um discurso tem r elação com outros discursos. 216 ENI PULCINELLI ORLANDI social. é a ilusão da reversibilidade' que sustenta esse discu rso. E essa ilusão tem várias formas nas diferente s manifestações do discurso autoritário. o discurso não se dá. Daí a ilusão. o discurso polêmico a realiza segundo certas condições (a dinâA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 215 mica da tomada da palavra) e o discurso autoritario busca anular essa possibilid ade. no poetico. e se institui na relação entre formações discursivas e ideológicas. Daí a necessidade de se manter o desejo de torná-lo reversível. A questão da reversibilidade traz como conseqüência necessária a consideração do out ro critério que temos utilizado para a distinção de tipos de discurso: trata-se da polissemia. entretanto. também em relação à monossemia. em direção ao poético. embora o discurso autoritário seja um discurso em que a reversib ilidade tende a zero. ou seja. sem essa dinâmica na relação de interlocução. há. de outro. então. Entretanto. pode ser considerado. de um lado. não prossegue. Quanto ao discurso ludico. aponta para duas possibilidades mais radicais. e. nesse trabalho.-~ko" fosse entendida aqui antes como se ntimento do que como engano. Todas as formas de discurso. por definição. enquanto limite. em termo . a ideologia religiosa cristã. d) a garantia absoluta de que está tudo bem. Mostrando a necessidade do desdobramento do Sujeito em sujeitos.s tipológicos. a distinguir o Sujeito dos sujeitos vulgares: Deus é o Sujeito e os homens são os seus interlocutores-interpelados. nos seus rituais. c) o reconhecimento mútuo entre os sujeitos e o Sujeito. como exemplo da estrutura formal de qualquer ideologi a. nos seus sermões. então. garantia de que é efetivamente deles e Dele que se trata. segundo AIthusser: a) a interpelação dos indivíduos como sujeitos. não é no meado. então. é a noção de sujeito. 0 indivíduo não nomeia nem a si próprio item a Deus. Althusser procura mostrar como a estrutura de toda ideologia é especular e duplamente especular: submete os sujeitos ao Sujeito e dá-lhes. ele reúne em um discurso fictício "o que ele diz não só nos seus testamentos. na condição de os s ujeitos reconhecerem o que eles são e de se conduzirem de acordo. os seus espelh os. Assim seja! Temos. Como. aquele que e por si e para si (Sou Aquele que É) e aquele que interpe la seu sujeito ( . o que procurarei mostrar aqui é a forma que a ilusão da reversibilidade adquire nesse tipo de discurs o.o fato de que há uma condição absoluta para se pôr em cena sujeitos religiosos cristãos: só 1 1 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 217 existe essa multidão de sujeitos religiosos possíveis porque existe um Outro Sujeito único absoluto. por outro lado. e que. todo "indivíduo é chamado pel o seu nome no sentido passivo. o termo central. A DEFINIÇÃO DO DISCURSO RELIGIOSO Althusser (1974) dá. mas também n as suas práticas. "Deus define-se portanto a si mesmo como sujeito por excelencia. o reconhecimento do sujeito por ele próprio. nunca é ele que dá a si próprio o seu nome". no Sujeito. na perspectiva do discurso autoritário.. decisivo. Ele constrói. para ele.ao haver interpelação dos sujeitos com uma identid ade pessoal . Então. e entre os próprios sujeitos e. ) eis quem tu és: és Pedro". os seus reflexos (não foram criados à Sua imagem?). por essas relações de sujeito: o reconhecit 1 1 1 . Para tal. nas suas cerimônias e nos seus sacramentos". Althusser destaca ainda . o religioso.. Segundo esse autor. Mais ainda. b) a sua submissão ao Sujeito. finalmente. esse discurso fictício religioso como um exemplar que funciona co mo um "dicionário" discursivo. as duas teses conjuntas que sustentam sua argumentação na análise dess e exemplar são: a) só existe prática através e sob uma ideologia. e do próp rio Sujeito em sujeito-Sujeito (o dogma da Trindade). tudo correrá bem. Deus nomeia. A estrutura duplicada da ideologia assegura. nos seus teólogos. então. b) só existe ideologia através do sujeito e para sujeitos. assim. 0 autor passa. mento, a identidade, o apaziguamento. A partir dessas reflexões, podemos entender que a definição de sujeito aponta para duas direções: a de ser sujeito e a de assujeitar-se. No sujeito se tem, ao mesmo tempo, uma subjetividade livre - um centro de iniciativa, autor e respo nsável por seus atos - e um ser submetido - sujeito a uma autoridade superior, por tanto desprovido de toda liberdade, salvo a de aceitar livremente a sua submissão. De acordo com Althusser, "o indivíduo é interpelado como sujeito (livre) par a que aceite (livremente) a sua sujeição Só existem sujeitos para e pela sua sujeição". É assim que se expressa o livre arbítrio, em sua duplicidade: sujeitos submet idos ao Sujeito/ sujeitos reconhecidos pelo Sujeito. 0 que nos leva a afirmar que o conteúdo da ideologia religiosa se constitui de uma contradição, uma vez que a n oção de livre arbítrio traz, em si, a de coerção. Em relação à coerção, não é nem necessário dizer que não se trata de força ou coerção a ideologia determina o 218 ENI PULCINELLI ORLANDI espaço de sua racionalidade pela linguagem: o funcionamento da ideologia transform a a força em direito e a obediencia em dever (0. Reboul, 1980). A religião constitui um domínio privilegiado para se observar esse funcionamento da ideologia dado, ent re outras coisas, o lugar atribuído à Palavra. Para os objetivos desse trabalho, e pensando essa relação de sujeitos e Suje ito, vamos caracterizar o discurso religioso como aquele em que fala a voz de Deus: a voz do padre - ou do pregador, ou, em geral, de qualquer representante s eu - é a voz de Deus. Tomaremos, como referência, sobretudo o discurso religioso cristão - particu larmente o católico. E o objetivo desse nosso estudo é justamente o de instituir um parâmetro exploratOrio, a partir do qual se poderão observar as formas da religião em geral, ou seja, as diversas maneiras que o homem tem de se relacionar com o sobrenatural. Por exemplo, e variando-se inclusive de cultura, eu perguntaria se, no c aso dos índios, o pajé pode ser considerado um representante, qual é o estatuto da sua voz na comunidade indígena, qual é a natureza da relação do pajé com a voz do sobrenat ural, etc. Ou seja, quando dizemos que este nosso trabalho procura estabelecer um parametro explorat6rio, não estamos propondo que se desconheçam (nem se supervalo rizem) as diferenças, ao contrário, esta é uma forma de se elaborar uma sistematização para se poder reconhecer as diferenças quando e se elas existirem. Creio que dessa forma poderemos chegar à distinção de características que são próprias ao discurso religioso em geral e a outras que são particulares a certas espécies de discurso rel igioso. Para tal é necessário que se façam, posteriormente, estudos comparativos. A nossa intenção, repito, foi estabelecer, a partir da formulação de certos conceitos e certos procedimentos, um parametro cuja função é exploratória. Partindo, então, da caracterização do discurso religioso como aquele em que fa la a voz de Deus, começaria por dizer que, no discurso religioso, há um desnivelamen to fundamental na relação entre locutor e ouvinte: o locutor é do plano espiritual (o Suj eito, Deus) e o ouvinte é do plano temporal Ços sujeitos, os homens). Isto é, locutor e ouvinte pertencem a duas ordens de mundo totalmente diferentes e afet adas por um valor hierárquico, por uma desigualdade em sua relação: o mundo espiritual domina o temporal. 0 locutor é Deus, logo, de acordo com a A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 219 crença, imortal, eterno, infalível, infinito e todo-poderoso; os ouvintes são humanos, logo, mortais, eferneros, falíveis, finitos, dotados de poder relativo. Na desigualdade, Deus domina os homens. Dessa assimetria original vão decorrer, como veremos, várias outras, porque a desigualdade imortalidade/ mortalidade instala, para os homens, a relação vida/mor te e dessa relação nasce a necessidade de salvação para a vida eterna. 0 móvel para a salvação é fé. A assimetria, que assim se constitui, caracteriza a tendencia para a não-r eversibilidade: os homens não podem ocupar o lugar do Locutor porque este é o lugar de Deus. Portanto, essa relação de interlocução, que constitui o discurso religioso, é dad a e fixada, segundo a assimetria. MODOS DE REPRESENTAÇÃO E OBSCURIDADE fessor; Pensando-se o mecanismo de incorporação de vozes, tal como colocamos na defi nição do discurso religioso - uma voz que se fala na outra da qual é representante - podemos fazer um paralelo entre o discurso religioso e outros tipos de discurs o: a) no discurso religioso: a voz de Deus se fala no padre; b) no discurso político: a voz do povo se fala no político; c) no discurso pedagógico: a voz do saber se fala no prod) no discurso terapêutico: a voz da natureza (saúde) se fala no médico; riador. e) no discurso da história: a voz dos fatos se fala no histo- Poderíamos estender esse mesmo procedimento de análise do mecanismo de incor poração da voz para todos os outros tipos de discurso. Essa é, para nós, a forma da mistificação: em termos de discurso, é a subsunção de um voz pela outra (estar no lugar de), sem que se mostre o mecanismo pelo qual essa voz se representa na outra. 0 apagamento da forma pela qual o rep resentante se apropria da voz é que caracteriza a mistificação. Em outras palavras, a subsunção de uma voz pela outra é o como se- desses discursos. Segundo o que pensamos, devemos distinguir esse "como se" do -f az- de -conta". 0 "faz-de-conta" 220 ENI PULCINELLI ORLANDI se constitui da relação com o imaginário. Ao contrário, quando falamos do "como se", est amos tratando não da relação com o imaginário mas com o simbolico. Logo, com o domínio da disciplina e das instituições. Assim, quando digo que a voz de Deus s e fala no padre, é "como se" Deus falasse: a voz do padre e a voz de Deus. Essa é a forma da representação, ou seja, da relação simbólica. Procuramos distinguir o modo dessa representação nos diferentes tipos de dis curso e pudemos perceber que a distinção repousa na maior ou menor autonomia do representante em relação à voz que fala nele.' 0 que nos leva a afirmar que há, pois, diferentes graus de autonomia. Assim, em relação ao político, há uma maior independência: o político não só é autOno relação à voz do povo como ele pode até mesmo criar, inventar a voz do povo que lhe for mais conveniente. Desde que lhe seja atribuída legitimid ade. É assim que se cria o consenso. Há, pois, um grau de autonomia razoável. Em relação ao professor, há uma relativa autonomia, no sentido de que, ao inco rporar o saber, o professor pode elaborar, manipular, modificar relativamente o saber estabelecido. Poderíamos observar, dessa forma, os diferentes tipos de discurso. Importa -nos, aqui, principalmente, o discurso religioso. Visto nesta perspectiva, podem os dizer que o discurso religioso não apresenta nenhuma autonomia, isto é, o representa nte da voz de Deus não pode modificá-la de forma alguma, Há regras estritas no procedimento com que o representante se apropria da voz de Deus: a relação do representante com a voz é regulada pelo texto sagrado, pela Igreja, pelas cerimônias. Dada a forma da representação da voz, e dada a assimetna fundamental que car acteriza a relação falante/ouvinte no discurso religioso, mantém-se a distância entre o dito de Deus e o dizer do homem, ou seja, há uma separação'(diferença?) entre a significação divina e a linguagem humana, separação essa que deriva da dissimetria entre os planos. E assim se mostra e se mantém a obscuridade dessa significação, inace ssível e desejada.' o (2) Agradecemos aqui as colocações feitas em conversa pessoal, por Luiz Henr ique Lopes dos Santos, a respeito do papel da representação. (3) Eis uma importante função do esoterismo: porque não se compreende, deve-se crer e obedecer. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO Uma vez que há obscuridade, há sempre a possibilidade das diferentes interpr etações (leituras) das palavras (do texto), mas essas diferenças observam um regulamento categórico: além de um certo limite, elas são consideradas transgressões, in stituem novas seitas, são cismas, etc. A interpretação própria da palavra de Deus é, pois, regulada. Os sentidos não pode m ser quaisquer sentidos: o discurso religioso tende fortemente para a monossemia. No cristianismo, enquanto religião institucional, a interpretação própria é a da Igreja, o texto prOPrio é a Bíblia, que é a revelação da palavra de Deus,` o lugar próprio para a palavra é determinado segundo as diferentes cerimOnias . Como, também em relação à interpretação das palavras, devemos atentar para a assimet ria dos planos, as regras são referidas às duas ordens de mundo, o temporal e o espiritual. Segundo essa assimetria, os agentes da interpretação são de duas espécies: - Na ordem temporal, a relação com o sagrado, por exemplo no catolicismo, se faz pelos representantes da Igreja: o Papa, o Bispo, os Padres. - Na ordem espiritual, a relação se faz pelos mediadores: Nossa Senhora, os Santos. Nessa distinção, deve ocupar lugar à parte Jesus Cristo: sendo o Deus que habi tou entre os homens, não é nem representante nem mediador. Sua natureza é particular, pois, embora seja a parte acessível de Deus, é o próprio Deus. DISCURSO TEOLõGICO, DISCURSO RELIGIOSO 1 i Todas essas observações, se considerarmos a distinção entre discurso religioso e teológico, estariam situadas mais no domínio do teológico. Isso se considerarmos o teológico como o discurso em que a mediação entre a alma religiosa e o sagrado se fa z por uma sistematização dogmática das verdades religiosas, e onde o (4) É interessante religiões que têm escrita. só se efetuam por rituais, 222 ENI PULCINELLI se observar que as religiões de conversão (de exclusão) são as As religiões de culturas sem escrita, e que são mais ecléticas (cf. Goody, 1968). ORLANDI teólogo, ele mesmo, aparece como aquele que faz a relação entre dois mundos: o mundo l iebraico e o mundo cristão. Em oposição a este, o discurso religioso seria aquele em que há uma relação espontânea com o sagrado.' Em geral, distingue-se o discurs o teológico do religiose por ser aquele mais formal e este mais informal. A propriedade que estamos considerando na caracterização do discurso religio so é a reversibilidade, e, com respeito a esta propriedade, o que acontece é que, mesmo quando há relação direta com o sagrado, a não-reversibilidade se mantém, manten do-se a dissimetria. A reversibilidade não está em se poder falar também, ou se poder falar diretamente. 0 eu-cristão pode falar diretamente com Deus mas is to não modifica o seu poder de dizer, o lugar de onde fala. 0 que, em análise de linguagem, significa que não se alterou o estatuto jurídico do locutor. A própria fala é ritualizada, é dada de antemão. Há f6rmulas para se falar com Deu s, mesmo quando se caracteriza essa relação de fala pela familiaridade, pela informalidade. Isso porque, quando se fala com Deus, se o faz por orações ou po r expressões mais ou menos cristalizadas (como: õ meu Deusi faça com que ... ). Então, o informal, o espontaneo, nessa relação de interlocução, tem suas formas já d adas, sendo que essa espontaneidade não afeta a reversibilidade. A dissimetria se mantém pois se mantém a mesma qualidade da relação, não havendo alteração do estatuto jurí o dos interlocutores: de um lado, temos sempre a onipotência divina, de outro, a submissão humana. Não se alterou o poder de dizer. Como a dissimetria se mantém, é preciso que os homens, para serem ouvidos po r Deus, se submetam às regras: eles devem ser bons, puros, devem ter mérito, ter fé, etc. É preciso, pois, que eles assumam a relação da dualidade, a relação com o Sujei to diante do qual a alma religiosa se define: esses sujeitos, para serem ouvidos, assumem as qualidades do espírito, qualidades do homem que tem fé. 9 (5) Essa é uma distinção que me foi dada, informalmente, por Marilena Chauí. Ess a autora, certamente, dá outras determinações a essa distinção. Destacamos esse aspecto por considerarmos a sua relevância para a caracterização da noção de reversib ilidade, que é a que nos interessa nesse trabalho. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 223 Por isso tudo, não vemos como necessário, para nossos objetivos, distinguir entre discurso teológico e discurso religioso, uma vez que essa distinção não afeta a característica da nãoreversibilidade. Não nos devemos esquecer, entretanto, qu e se trata de noções complexas que abrigam, em seu interior, fenômenos bastante controversos. Como os que podem ser vistos nas considerações feitas, por exemplo, po r um autor como Granisci. E são algumas dessas considerações que gostaríamos de trazer, de passagem, para essa nossa reflexão. Segundo Gramsci (1966a), sob a homogeneidade ideológica, existe na religião - enquanto conjunto cultural - uma subdivisão paralela aos grupos sociais afetados . Qualquer religião é, na realidade, uma multidão de religiões distintas e, muitas vezes, contraditórias. Tomando o domínio do catolicismo, ele coloca a existencia de um catolicismo de camponeses, um catolicismo de mulheres, um catolicismo de i ntelectuais, por sua vez velado e incoerente. Essa heterogeneidade social e ideológica é que explica que, no interior de u ma mesma religião, podem-se distinguir a teologia e a religião popular. A teologia - no catolicismo - se manifestará como a filosofia da religião, como a concepção da hier arquia eclesiástica (dos intelectuais da religião); a religião popular forma o essencial da ideologia que compõe o folclore e o senso-comum. Da religião do povo fazem parte, segundo Gramsci: formas precedentes do catolicismo atual, movimento s a passiva e conservadora do cristianismo jesuítico. observar a forma como a reli gião popular lida com os representantes e mediadores (promessas. a do protestantismo . podemos. embora part am de um ponto comum. milagres. ESPIRITO E FE No escopo dos dualismos que caracterizam a religião. assim. Entretanto. segundo Portelli (1974). Dessa forma.a ativa . sens o comum e folclore: "o senso comum é o folclore da filosofia e se acha sempre na metade do caminho entre o folclore verdadeiro e próprio (quer dizer tal como se o considera comumente) e a filosofia" (1966b). a nossa proposta é. . a outra . o estudo das ideologias política e religiosa é necessári o porque elas constituem as formas principais de concepção de mundo. a dualidade da ideologia 6 religiosa pode ser ilustrada pela oposição entre o materialismo da religião popular e a especulação idealista dos teólogos. temos. A contradição entre os termos dessa oposição ue caracteriza a religião (católica) e a assemelha às doutrinas utópicas. 224 EN1 PULCINELLI ORLANDI i i i 1 1 A partir da distinção entre intelectual e popular.fornece a base ideológica para uma ação positiva. o interesse principal de Granisci está mais centrado na dimensão prática do que na concepção de mundo que corresponde a cada religião. Deve-se pois estudar a relação entre o sistema religioso e o sistema político em cada formação soc ial. o termo médio: o folclore é a concepção de m undo das classes subalternas e a filosofia é a ordem intelectual das classes fundamentais. ex-voto s). da concepção de mundo é que podemos ver a relação entre filosofia. No ambito. Essas relações. em que esgotou sua função histórica e só se mantém p or artifícios e/ou por repressão. segundo ele. em relação à religião. Podemos observar que. a religião abarca duas dimensões: a de concepção de mundo e a de atitude prática. Paralelamente. Distingue. a de não distinguir de forma estanque o discurso religioso do teológico: p referimos trabalhar no interior da tensão que os constitui em sua relação. Se assim fizermos. etc. que é distinta daquela como os teólogos se posicionam diante dos mesmos. ainda em Grams ci. não se pode desconhecer que há multiplicidade também quanto às fo rmas e funções da religião. se baseia em duas críticas constantes: a do materialismo positivista e a do idealismo especulativo. para Gramsci. a síntese desses dois erros teóricos". para Grartisci. então. Essa dupla crítica culmina na análise da religião: esta é. uma vez que (6) Segundo Grarnsci.heréticos populares.e quando tem a forma de "ópio do povo" . superstições científicas vinculadas a religiões do passado. duas atitudes totalmente opostas: quando esta replesenta uma necessidade . Uma . Segundo Portelli (1974). "A linha teórica de Gramsci.representa uma ideologia "inútil".a passiva . são puramente negativas. do cristianismo primi tivo. como já dissemos.a ativa. desde os escritos da juventude aos Quaderni. ao concordar com o que diz Gramsci e ao considerar a import ancia de sua dupla crítica na reflexão sobre religião. 0 senso comum é. com efeito. só para ficar em um exemplo. uma importante contribuição: a que coloca a concepção religiosa das relações entre Homem e Natureza. Um outro aspecto importante da fé. não é capaz de modificar a relação de não-reversibilidade do discurso religioso: a fé é uma graça recebida de Deus pelo homem. Logo. com suas características. independente do mundo matefial. Entre as qualidades do espírito está a fé. enquanto se considera. os convictos dos não-convictos. E a Igreja que atribui os sacramentos . é a disposição de mudar e ireção à salvação. como vimos . a alma religiosa deve assumir as qualidades do espírito. o discurso religioso é uma promessa. etc. teremos um quadro aproximado como segue: s i Homem Plano Humano Ordem Temporal sujeitos Homem espírito matéria Plano Divino Ordem Espiritual Sujeito Natureza Deus Observando-se esse quadro de dualismos. Interpretando-se a fé com referencia à assimetria. longe de negar. a ser observado. podemos dizer que a fé não a elimina. é o parâmetro pelo qual se delimita a comunidade e constitui o escopo do discurso re ligioso em suas duas formações características: para os que crêem. E o espaço em qu e se dá a exclusão é a Igreja: os que pertencem a ela (os que acreditam) e os que não pertencem (os que não acreditam). Essa é uma passagem e. Já que. ENI pULCINELLI ORLANDI AS FORMAS DA ILUSÃO DA REVERSIBILIDADE De forma geral. podemos agora determinar as formas da ilusão da re versibilidade. a leitura correta do texto sagrado. que é o móvel para a salvação. espírito/ matéria . é o fato de que a fé é que d istingue os fiéis dos não-fiéis. é preciso referi-Ia a uma outra noção. material. tem muito mais poder. A fé remove montanh as. a defié. dad condição humana em relação a Deus. dadas as dualidades e a intransponibilidade das diferenças . para entendê-la.homem/natureza. para os que não crêem é uma ameaça. Feitas essas considerações. com fé. isto é. sendo um dom divino e se submetendo ao espaço religioso determina do pela Igreja e suas leis. ela não emana do próprio homem. Isto é. é ela que tem a palavra da revelação. A caracterização desse dualismo . podemos dizer que a articulação entr e o homem e Deus se faz através da noção de espírito.A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 225 ambos se referem a mundos diferentes: a natureza (o mundo exterior) se apreende como uma realidade objetiva. é mais um fator que comprova a não-reversibilidade. Esse é um dualismo que irá compor. na relação com Deus. lhe vem de Deus. 0 homem. a fé é a possibilidade de mudança. a fé. os demais já enumer ados. Então.torna possível a articulação entre a ordem temporal e a espiritual. 1~ 226 A fé é um dos parâmetros em que se assenta o princípio da exclusão. Com esse dualismo. para a relação com o Sujeito. o homem como puro espírito. mas como a fé é um dom divino. dada a separação indicada por essa condição (o pecado existe). o---que o homem é que va se alça até Deus. isto é. o místico. do misticismoÉ a partilha do movimento de baixo para cima: aí estão o profeta. a. trata-se sempre de uma ilusão produzida e mantida dentro de regras. Como acontece nas situações em que se diz. pelo poder temporal. 0 mecanismo da perform atividade atesta esse poder de forma clara. o homem Essas são as formas de ultrapassagem. a ilusão da reversibilidade. 0 poder da Palavra na religião é evidente. Qualquer que seja a forma da ilusão. eternidade. de um mundo a outro. em situações sociais bastante ritualizadas. para ter vali dade. onipresença. é preciso estar investido de uma autoridade dada. o movimento de cima para baixo. as bençãos. e confirmando. ou seja. de baixo para c ima. ou então. a po ssibilidade de ministrar sacramentos. Visto nesta perspectiva. é o caso em que se conside ram as fórmulas religiosas em seu carater performativo: a infalibilidade do Papa. e assim alcança cas suas qualidades atemporais (onipotência. que anunciamos no início desse trabalho. etc.. onisciência. os Bispos. pela performatividade das fórmulas religiosas. os performativos. em condições muito bem determinadas. se dá pela visão. da visão. ir--nos que essa ilusão pode ter duas direções: de cima para baixo. Inversamente. Aí estão: o Papa. os Padres. até Deus. A ilusão é a da passagem de um plano a outro. A performatividade da linguagem está ligada intimamente a uma visão da linguagem como ação. veremos que há regras estrita s para que esses atos de linguagem se constituam efetivamente em performativos: as fórmulas religiosas. como exemplo. Não ccmo ação decorrente do falar mas como ação estruturalmente incrita no próprio ato de falar. "Eu te batizo". devem ser feitas em condições precisas. Se tomarmos. para ter validade. ou "estão casados' . E o exame desse mecanismo resulta na confirmação da dissimetria de que estamos tratando ao lorgo desse trabalho: . etc. a dissimetria dos planos em que se constitui. Para realizar esses atos. consagraçao na missa. é o da profecia. Deus partilha com os homens suas propriedades. etc. em última instância. o milagre é a confirmação da ilusão da reversibilidade. por ex emplo. o vidente. aquele em que Deus desce a té os homens e partilha com eles suas qualidades divinas. têm de ser usadas em situação apropriada e be m configurada. ou pelo menos reconhecida. pela revelaÇão. da passagem de um plano a outro: nele se i 1 i 1 1 A LINGUAGEM E SP~U FUNCIONAMENTO 227 juntam a interferencia divina e a inexplicabilidade da ciencia dos homens 1. pela profecia. em relação a orações que.). Deus (Sujeito) Institui. suficientemente munido de seu diploma. é não ter limite nenhum. A. devemos L-mbrar que ser representante. a ilusão da reversibilidade toma apoio na vontade de poder. esses lugares são disput ados e a retórica e uma retórica de apropriação. daquilo que é aprisionamento. etc.reversibilidade). Por exemplo. Por esse mecanismo de apropriação e les acabam por ser confundidos com o próprio saber. E daí deriva a "ilusão" como condição necessária desse tipo de discurso: o como se fosse sem nunca ser. ou s eja. 1980. o antesaluno falará do lugar do professor . pedem. 1 í A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 1 i i . limite. não e Deus. interpela. salva. pela diferença das ações jue instituem ao dizer.. Essa vontade aponta para a ultrapassagem das determin ações (basicamente de tempo e espaço): ir além do visível. etc. Pela distinção colocada acima podemos ver confirmada a expressão da diferença do estituto jurídico entre os interlocutores. o político. 0 sujeito se transforma naquele do qual ele ocupa o lugar. no caso. isso não se dá no caso do discurso religioso. Ter poder é ultrapassar. do determinado. lhe será próprio.' Essa. em Religião e Sociedale. Então.0 mesmo se dá com o juiz. etc. Respondem. que. é a expre ssão fundamental da não-reversibilidade. agradecem. 0 representa legi timamente. com a própria justiça. mais uma vez. no (7) A respeito da caracterizaçãodo milagre: "Milagre e Castigo Divino" de Al ba Zaluar. do meu ponto de vista. a relação do homem co m o poder. não é estar no lugar proPrio. E ter poder divino é ultrapassa r tudo. o representante passará a fala r do lugar próprio. etc. Refletindo a respeito da f orma de representação de que estamos tratando. ULTRAPASSAGEM E TRANSGRESSÃO: A VONTADE DO PODER ABSOLUTO Como a relação com o sagrado revela. entre outros fatores. dadas certas condições. 0 que nos leva. exortam. e tendo o estatuto jurídico que lhe compete. aquele que fala do lugar de Deus transmite Suas palavras. em relação 1 condição da reversibilidade (ou não. n? 5. é ser completo. então. No entanto. desculpam-se. regula. etc. 228 discurso religioso. ordena. é estar no lugar de. com o poder absoluto. 0 representante. Aí está uma EN1 PULCINELLI ORLANDI diferença fundamental entre o discurso religioso e outros: nos outros discursos a que nos referimos. mas não se confunde com Ele. condena. a reconhecer que o poder da pa lavra está bem distribuído e regulado na relação entre o homem e Deus. nasce do desejo de transgredir a dissimetria dos planos. por exemplo. não devendo ser nomeado. veremos que a gratuidade apontada pela autora. É a própria Huston. não traz nada. tal como o estabelecemos para as formas legítimas. como o caso Schroeber. para nós eles eram imorta is". pois ao se tomar o lugar. onde Huston diz "Essa gratuidade reside no exer cício de uma liberdade".ou a usurpação do lugar. Nancy Huston (1980) mostra como. A transgressão. do tucano Carlos Machado. Já que eles mesmos se diziam pregadores da palavra de Deus. ou ultrapassagem. não morna. dado o lugar atribuído à Palavra. pode ser ou uma quebra das regras do jogo . Tanto que era ser imortal para nós que foi um choque quando os primeiros padres faleceram. segundo Althusser. i 230 EN1 PULCINELLI ORLANDI Interpretando o procedimento da blasfêmia. a blasfêmia topou-se preocupação obsessiva para o cristianismo. da distinção corpo e alm a. 229 Temos estado observando a ilusão da reversibilidade no interior do maniqueís mo instalado pela própria religião. que caracteriza a forma ilegítima dos mecanismos impróprios. E é nessa relação com o poder que reside o prazer de transgredir. por pura malícia.(8) A incompreensão desse mecanismo. ago ra sob nosso enfoque. se se exclui. o sentimento religioso é fortemente ambivalente e essa . um sinal de dornesticação. Se. usando seu nome em vão. do Alto Rio Negro (1982): "o padre era um ser imortal para o índio. porque é sempre-já simbólico. que e o caso de Mefi stófeles. Em um estudo magnífico sobre inter dições. Essa gratuidade reside no exercício de uma liberdade e por isso é um pecado atroz: o blasfemo ultraja Deus gratuitamente. ou ocupável. um seu traço fundamental é a gratuidade: não muda nada. Quanto a esse último temos um exemplar na literatura. há o outro lado. deriva justamente da relação com a não-reversibilid ade e a vontade de ultrapassá-la. o ato de nomear está submetido a regras da relação Sujeito/ sujeitos. a heresia. a ilusão da reversibilidade cria o sentimento de identidad e com Deus. da concepção dual do mundo. etc. em relação ao mecanismo da ilusão da reversibilidade. de um lado. é atestada por uma fala indígena. mas no interior de uma só e mesma palavra. nesse mesmo trabalho. à interpelação dos suj eitos pelo Sujeito. que nos diz que a blasfêmia nasce da contradição. ou nas formas de loucura. ela pressupõe a compreensão do objeto e. que já não se apresenta então como ultrapassagem mas como transgressão. Todas essas formas de transgressão. se observarmos bem. por sua vez. Ou. através de mecanismos próprios (de que tratamos no item anterior). Segundo ela. colocada no âmbito das diferenças cultura is. eu diria "Essa gratuidade reside no exercício de uma liberd ade que se quer sem limites". Essa contradição deriva do maniqueismo. como compon ente dessa forma de trangressão (pecado). Sendo a nomeação uma maneira de aproximação. Assim. E como ele o ultraja? Nomeando-o. são formas de tentar ocupar um lugar nunca ocupado. Vejamos o caso da blasfêmia. Esta também é uma forma de experimentar o lugar do poder absoluto. que é considerado por Huston. Deus escapa à compree nsão. tal como o pacto com o diabo. apresentando-se assim como uma forma legítima de ultrapassagem. o pecado . ou seja. sendo a bla sfêmia a apropriação do inapropriável. não prejudica nenhum ser humano. Eis uma diferença do domínio das regras discursivas. não entre termos. como vimos mais acima. Seria interessante um estudo próprio a cada espécie de transgressão.t al como a blasfêmia. Isto é. para se c onhecer assim a sua qualidade. A expressão limite do maniqueismo . outubro de 1982). de Andrade (1926): "0 carnaval no Rio é o acontecimento religioso da raça". de interdependência entre eles. explica Manoel Carlos prometendo muito s uspense até o momento em que tirar (vai tirar mesmo?) Abel de seu purgatório". estes. se apropriam (ou se beneficiam) um pouco do prestígio desse dize r:---0golpe de 64 nos deformou. Ou. Entre um e outro. E aí podemos entender o prazer do ilimitado sem ter de dividir entre o bem e o mal. deriva da energia conservada graças ao percurso instantaneo de um trajeto infinito ". o misticismo. de doze anos. em que o homem. a relação com aquilo que representa o não-limite (Deus). no jurídico. E pela palavra. NO COTIDIANO E EM QUALQUER FORMA Mas também podemos observar a vontade Oe poder absoluto. e. Só para exemplificar. às vezes de forma mais explícita. para o cristão. se houvesse um Deus. na propaganda. segundo a qual. no jornalístico. outras mais disfarçadas. que diz: "Ser poeta é ser Deus". não podemos deixar de aponta r para esse outro lado que constitui a ilusão da reversibilidade. a passagem dos limites. A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO Í 1 1 1 231 0 sentimento religioso. . Segundo nossa hipótese. Adquire múltiplas formas e companha o homem em seu dia-a-dia. Fo lha de S. fora do domínio do maniqueísmo. para citar algo mais forte. a da ilusão da reversibilidade. etc. Mas jornalistas também g ostam de deixar entrever sua familiaridade com o dizer religioso. etc. a aspiração aos dons divinos. Há relações de inclusão.alguém já falou uma coisa assim antes? . ao desejo da reversibilidade . E se encontra s ua manifestação. nos vários fragmentos de linguagem. não está fechado no espaço dos templos religiosos ou nas formas institucionais da religião. Por isso. indefinidamente. Paulo. entre estar ao lado de Deus ou vender a alma ao seu contrário. Eles .ou está comigo ou está contra mim . Pelo menos no domínio do cristianismo. indubitavelmente. no espaço determinado pelo desejo de par tilhar do poder ilimitado só tem essa escolha: entre o bem e o mal. com o sagrado. em qualquer fragmento de linguagem. Ou seja.não deixa lugar para meio termo. encontrado casualmente na revista Veja n? 736 (outubro de 1982): "0 grande divertimento de quem escreve uma novel a é brincar de ser Deus durante seis meses. isso se dá porque os discursos se relacionam. colocaremos um. presente no Fantastico (outubro). aspiram atravessar limites. ao citar a palavra divina. as vezes de forma heróica. Não culpo os pichadores do muro do Museu. preenchendo o mesmo papel semantico. E com a condição de "ter decretado uma distancia infinita entre Deus e o Diabo que se pode confun di-los num fim regressivo e transgressivo: o prazer de blasfemar. se comunicam entre si. de determinação. Além das referencias. ele não suportaria não ser Deus. Entre Deus e o Diabo. mais ou menos explícitas. Os novelistas se colocam entre os criadores e. Às vezes de forma grave. vender a alma ao diabo é o outro lado da relação com o poder absoluto . Poderíamos alongar aqui o número de citações. E é dessa f orma que entendo uma afirmação como a de 0.não sabem o que fazem" (Tarso de Castro. temos a afirmação de Nietzsche. se su stentam mutuamente. Há uma referencia explícita a essa aspiração em um verso de um poeta jovem. Está espalhado pelo cotidiano. podemos também encontrar propriedades do discurso religioso presentes em muitos outros tipos de discurso que não o religios o: no literário.ambivalência é que está presente no mecanismo da blasfêmia: pode-se dizer "Deus" ou "Dia bo"-na mesma situação. pois nenhuma autono mia do representante em relação à voz que ele representa. Como os mundos . ainda que legítimo. ou seja.são opostos e afetados de um valor h ierárquico. jamais muda seu estatuto jurídi co de interlocutor. que e a forma semantica corresponde nte à dissimetria. as formas que a ilusão da reversibilidade toma pela ultrapassagem e p ela transgressão .temporal e espiritual . Em termos dessa representação. E. não há. se apóia no mecanismo gramatical da negação.Há ainda. seu poder de dizer. A antítese. resta dizer que é importante se lembrar que o representante. no texto. às marcas. então. podemos procurá-los a partir da dissimetria entre os dois plangs. Esta é um a distinção muito importante para o domínio da teoria do discurso. para Espiritual viver ver para para .configuram o funcionamento desse discurso. Então. Dessa forma. por sua vez. Aquilo q ue consideramos como propriedade do discurso religioso pode ser encontrado. que o que se pode apreender imediatamente. Faz ainda pai te dessa propriedade o fato de que a voz de Deus é que fala em seu representante. A propriedade que caracteriza o discurso religioso é a não-reversibilidade e ntre os planos temporal e espiritual e a conseqüente ilusão de reversibilidade com suas formas determinadas. Pode ser encontrado em um discurso político. Quanto aos traços. por exemplo. quando referidas às diferentes ordens do mundo: Temporal morrer não ver perder-se etc. como acontece freqüentemente. ou no editoria l de um jornal. ou em poesias. jamais se apropria do lugar do qual fala. é o uso de antiteses. em qualquer outro tipo de discurso. Há uma relação de fundamentação reciproca entre os diferentes tipos de discurso. enquanto a marca diz respeito à organização do discurso. a vontade desse poder. a nega4 A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO ção tem um efeito invertido. Segundo o que penso. em uma música como "Força Estranha" de Caetano Veloso. Todas essas possibilidades de relação nos levam a afirmar que os discursos não 232 ENI PULCINELLI ORLANDI se distinguem entre si de forma categórica mas segundo seu funcionamento. segundo o que dissemos. o uso que um discurso pode fazer das propriedades do outro discu rso. a propriedade tem mais a ver com a totalidade do discurso e sua relação c om a exterioridade. Enfim. isso pode ser visto através da relação do homem com o poder: em Deus o poder absoluto/no homem. desse discurso. Resulta. A RELAÇÃO ENTRE AS PROPRIEDADES E AS MARCAS NO DISCURSO RELIGIOSO Creio que se deva distinguir entre propriedade e marca (ou traço). Dados os objetivos desse nosso trabalho. . diríamo s. antes. se organizam segundo o seguinte esquema: Exortação . dos outros que são excluídos. Diferente. ou o uso de certos temas que também são típicos desse discurso. é no enlevo que se dá o processo de 234 ENI PULCINELLI ORLANDI A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO 235 ultrapassagem de que falamos mais acima. ao pecado (que é negação). esta é uma forma superficial de falar na distinção das partes d esse discurso.disposição para m dar em direção à salvação -. a alma religiosa. mais do que isso. para afirmar o que é positivo. depois . Então. etc. explicitadas por paráfrases (sobretudo nos sermões). Essas grandes partes. podemos ainda citar a função importante de certas formas típicas do discurso religioso como a Parábola. como a vida eterna. b) A quantificação. em relação às regras do discurso religioso catól ico. ou seja. deve negar o sim pressuposto. na realidade. pois. do homem. podemos distinguir os seguintes componentes característicos: a) A identificação dos sujeitos entre si. podemos dizer que todas essas formas que enumeramos são marcas form ais do discurso religioso. foi relatado pela revista Veja (7 de julho de 1982): quando um padre. o uso de sintagmas cristalizados (as orações). etc. o mecanismo geral da negação e o si . procuramos não entrar em considerações detalhadas a respeito dessas distinções. Isso porque. c) A denegação. a retórica do discurso religioso é a que se pode denominar a retórica da denegação. como o dizer religioso é obscuro. aproveitan do-se o máximo de efeitos de sentido (religiosos) sugeridos pela diferença de língua. que significa. Quanto à parte que chamamos Salvação. Além de nos termos atid o à forma ortodoxa do discurso religioso.Salvação 1 Em relação à Exortação. ou seja.Enlevo . de outros tipos de discurso que começam por "camaradas" ou "Ineus sen hores. veremos q ue ela corresponde à identificação com os propósitos divinos. o uso de performativos. Dessa forma são atribuídas diferentes idades. É ainda a retórica da denegação. por exemplo. os "aqueles queconstitutivos dos que fazem parte. ela se constitui do pedido feito pelo re presentante. Em termos da caracterização das unidades textuais. e sempre são possíveis muitas leituras. Essas marcas podem derivar de qualquer nível de análise lingüística (fonoló(9) Um acontecimento inusitado. Evidentemente. enquanto formas próprias de discursos em que exista doutrinação. o fiel. Se tomarmos agora a parte que denominamos Enlevo. a delimitação da comunidade: separa-se o " nós". o ouvinte (o homem) acumula os valores negativos e. ou seja. e o pecado é o não a Deus. sem especificarmos suas variações. pela caracterização da d etria. minhas senhoras". o uso de metáforas que são. é nessa parte que se pode expres sar a ilusão da reversibilidade. a provisoriedade do homem.salvar-se Do ponto de vista pragmático. Enfim. se reconhecer na igualdade. o de que nasceu com o pecado. uma vez que para transformar é preciso. a negação da negação. É ainda sob a forma de enumeração que gostaríamos de chamar a atenção para outros tr aços do discurso religioso: o uso do imperativo e do vocativo. procedimento análogo a esse é o das citações em latim que depois são traduzidas porperífrases extensas e explicativas. as paráfrases indicam a lei tura própria para a metáfora. etc. m pressupo sto no ouvinte. entre eles. entretanto. agora referida ao problema da fé . A característica desse processo de ide ntificação pode ser observada no exórdio do sermão: "Caríssimos irmãos!". que explica a configuração típica das grandes partes de várias espécies de discurso religioso. Assim. deve negar o negativo. ou seja. o discurso rel igioso.' ou do agradecimento apresentado pelo ouvinte. Fica. e O'Aecanismo da negação. obscuro. a situação imediata só entra como motivo (ilustração?) para se redizer a significação divina. determinar a forma dessa relação entre traços e propriedades é estabelecer o funcionamento discursivo específico. A forma como os traços são usados em relação à propriedade de um tipo de discurso é que o caracteriza. Para este discurso.a certa altura da missa. ao contrário da conversa cotidiana ordinária. enunciado. então. Os amigos do governador estão aqui para homenageá-lo e o senhor não está comportando-se de maneira adequada. por favor. o caracteri zam: a assimetira entre os planos temporal e espiritual e a não-reversibilidade. texto). esse caráter fechado do discurso teológico. Trata-se do fato de que uma característica forte que é atribuída. pouco tem a ver com o seu contexto ime diato de enunciação. etc. que se fala para os homens. podemos especifica r a relação entre os três fatores que. ao discurso teológico é a intertext uafidade. podemos definir o discurso teológico como u m discurso sobre outro discurso. Segundo o que pudemos observar no discurso religioso. a intertextualidade tem sua. morfológico. ou seja. partes do texto. A condição para que as marcas (traços) caracterizem o discurso religios o é que elas sejam referidas à(s) sua(s) propriedade(s). um general. propriedades que o definem. Há um dizer. sempre-já dito. o define.stabqecer o seg uinte esquena para a caracterização dodiscuno reliÁioso: sitz. de acordo com nosso ponto de vista.aÇão assimetria eltre os planos esprituale temporal (não . semântico) ou de unidades de qualquer extensão (fonerna. presente ao ofício. Isto que está para se passar aqui é inadmissív el. pretendemos dizer que o discurso teológ ico. a antítese também é característica do discurso teóric o. Assim. com a situação imediata em que ele se dá. Assim.revesibilidade) propliedade Esse seria ) esquema correspondente à . sintático. A partir d. propôs que se elevasse orações pelos irmãos. estabelecida a existência de marcas que caracterizam o discurso religioso assim como também existem. Resta falar de uma característica do discurso religioso que tem a ver com a relação entre o texto e suas condições de produção. principalm ente. Padre Gouriou e Camio. que rezava a convite do governador Francelino Pereira. função relevante também no discurso político. Segundo nossa perspectiva. sintagma. presos e condenados pela justiça militar. Para to dos os homens. m orferna. ou re ligioso. palavra. frase. Com isso.-sses fatores. A intertextualidade se define pela remissão de um texto a outros textos para que ele signifique. interpelou o padre com as segu intes palavras: "Um momento. usando essas palavras o senhor cria um problema para nós-. então. Polemos . em geral se deve à não-autonomia do representante em relação à voz que fala nele. como explicitamos mais acima. são comuns a vários: o imperativo também é abundante no discurso da propaganda. os performativos são importantes no discurso jurídico. o uso de 23t ENI PULCINELLI ORLANI)1 aníteses. 0 que nos leva a essa conclusão é o fato de que os traços não são exclusivos de um só tipo de discurso. ao contrário. 1 gico. diferentes rituais. a católica. a dimensão da negatividade constan:e na religião: Aquele que _X~ y porque Aquele que X. háima liferença ent re as marcas e as propriedades que go. creio. pelo r^rno imprescindível qu. pelo caminho q 1 ue fazemos para chegir até elas. form2 ortodoxa do di. o parâmetro para a nossa reflexão foi a ideologia religiosa cristã. Segundo 0 (ue pudemoç ~ observar. ainda em relação o funcionainento do discu%o.lador. marcas e formas . depis. ~. BIBLIOGRAFIA . relativamente às marcas. ficamos conhecendo s)bre 0 funcionamento do Ob~to (discurs0)1 que é o alvo de nos. antes. mais rev. a pr opriedade se mantenha com mais constância. enquanto hipó~ese de trabalho. Por oatro Ndo. Entretanto. assim. Como dissemos no início desse estudo.. Aqu. Então. UMA. ou seja.~aríam)s de ~'olocar. a nãoreversibil idade dos planos e a conseqüente ilusão da reversibilidade. podem fazer variar amplamente as marcas dos discursos que carac terizam. ainda segundo essa mesma perspectiva. no percurso para su. Inesmo. Nesse sentido é que colocamos como próxima etapa desse nosso trabalho a anális e do discurso missionário entre os índios.propriedades. devernOs fizer delas até os atos d~ discarso. _Y Sendo X c() plano temporal e Y d) plano espiátual. São. Podernos. menos ulii resultado em si do qu um iristrurnento de trabalho. tomando es ses instrumentos .como subsídios para o estudo de outras espécies desse tipo de discurso e para a analise de fatos desses discurs os em suas diferentes práticas. consíderandú-se a retórica dalenegação. chegar a uma jornia geral e abstrata da arjumentição cesse tipo de discurso. há uma naior variaçw quanto às macas. descoberta.-Iigioso cristão. haveria uma estabilid ade maior em relação à propriedade que define o discurso religioso. gramática negação perífrase paráfrase etc. PROPOSTA Em análise de discurso essas for-nas abstratis são proda tivs. ou mais especificamente. mas sim que.~urso r. em rel~ção às diferentes espécies d discurso religioso: difTentes religi~es. difeA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO rentes cerimÔnias. diferentes prática.texto artítese parábola metáfora etc.lo que. Isso não significa que a propriedade não sofra variação nenhuma. traço. a nossa proposta é justamente a de alargar a reflexão sobre o discurso religioso. e. Condição: ter fé para se salvar.a análise. E. N. Zaluar. . Militante anarquista. transgressor da ordem. 1968. Portugal. é professorado Instittitode Estudos da Linguagem da UNICAMP.Dire et Interdire. Rio."Fala de Dois Tucanos aos Participantes do Simpósio". H.Literacy in Traditional Societies. os autores mostram que o antigo pod er da repressão sexual foi substituído por um outro. A. Croce. 1980.-~m seu está& na França (na Universidade de Vinc=es). 1980. . A. Goody Ed. e Liv. A autora trabalhl)u na Univeisidade de São Paulo e. 1966b. A. T urim. Brasil. em Religião e Sociedade. Paris. 0. Machado. Portelli.. . 1966a.Langage et Idéologie. Ed. o auto r sustenta essa . PUF. . Barcelona. University Press. Eni Pulcinelli Orla.Gramsci y Ia Cuestion Religiosa. cujo cenário dominante é a imagem g enital.. OUTRAS PA~ Í A NOVA DESORDEM AMOROSA Pascal Bruckner/Alain Finie1kraut Analisando a propalada revolução sexual. em Das Reduções La tino-Americanas às Lutas Indigenas Atuais. de resistir à sociedade autoritária.di teve cornoiniciação n aLingüística Geral o Estruturalismo d. São Paulo. passa por uni crivo sério e rigoroso. i 1 Biográfia Tendo iniciado seas estudos so)re a linguagem através da Filologia e da Li ngÜístca Indo-Eunpéia. L. Tu rim. Paris. Reboul. 0."Milagre e Castigo Divino-. Ed. 1982. através de ab3rdagens feitis pela Semântica.Hjelmslev. . 0 palco dos afetos. Goody. Ed. Ed. atualmente. 1974.. 1974. logo se evidenciou para ela a importância des estudos so l~-e signif icaç~. UM ENSAIO SOBRE A REVOLUÇÃO SEXUAL Daniel Guérin 0 erotismo.Althusser. Laia. Hoornaert (org. . mais recentemente pela Análist de Discurso. Biblioteca de Ciências Sociais. sem esquecer o aprendizado do latim. -Manifesto Antropof6gico. pela S:)ciolingüística e. o poder dofalus. C. que resulta num texto desmistificado r e divertido. n? Tempo e Prese nça Edit. seria uma das formas de salvaguardar a individualidade. J.Gli Intellectuali e VOrganizazione della Cultura. Grarrisci. SAo Paulo. Huston. . . J. 1926. Martins Fontes. C ambridge. que foi seu primeib contato con a reflexão sobre a linguagem.11 Materialismo Storico e Ia Filosofia di B. Presença. Emaudi.o aos quais se dedicou. 1980. . Andrade. Paulinas. Gramsci. Ed. Payot. não menos terrível: a obsessão do orgasmo.Ideologia e Aparelhos Ideológicos do Estado.). Tem pablicado div(rsos artigos em revistas especializadas1 Ç AS . Einaudi. a lógica que rege essas sociedades seria uma outra. Arqueologia da Violência: Ensaios de AntroPolOgia poilítica Píerre Clastres o autor descarta a visão de que o Estado seria um destino da humanidade. ANTROPOLOGIA Pesquisa participante Carios R. A CONTESTAÇÃO HOMOSSEXUAL Guy Hocquenghem Em que momento alguém mergulha no papel de homossexual público .~ . Brandão (Org. Afinal. de um papel novo e diverso na sociedade que subjaz às suas interrogaçoe s mais profundas. o seu modo de ser. isto é.um pouco no sentido em que se falava outrora de . sem proscrições.. v oitarse primeiro para os pequenos detalhes. um fim in exorável. isso não significa um ~ estágio primitivo a ser superado. tese em er Kinsey. a plenitude da liberdade.) Urna coletánea de escritos Clevárias pessoas que fazem. Paulo Freire e outros. E a procura. Gide e Shakespeare. Colcha de Retalhos: Urn Estudo Sobre a FarnIffia no Brasil Vários autores i i Em todos os artigos figura o objetivo de 'armar o pulo do gato'.Se as sociedades ditas primitivas desconhecem o Estado. totalmente diversa da nossa. que espelham as mitologias e tornadas de consciência do grande intelectual italiano.isaios que discutem aspectos das obras de Reich.assumindo uma determinação social que permite aos Outros descarregarem sobre essa pessoa necessidades de en carnação. Proviélhon. 1 . para restitui-10s depois a um painel mais i amplo das relações sociais e 1. Reúne textos de Rosiska de miguel Darcy de oliveira. Fourier. acusação e distanciamento? CAOS: CRõNICAS POLíTICAS Pier Paolo Pasolini 0 o-aunta de 68 serve de pano de fundo a esses escritos de Pasolini. . sem prescriç4es. orlando Fals Borda. Urna terra livre. os gestos quase nunca nomeados. É a. contra-ordern. escritor público" . de algum ipo de prática politica de compromisso popular. problernatizar um pouco as visões comuns que temos deias1 Terra Sern Mal* 0 ProfetisrnO Tupi-Guarani Héjène Clastres~ A Terra Sem Mal é antes de tudo urni. lugar de abundância: o milho crescel sozinho e as flechas vão também sozinhas à caça.. aEnsc'el fascinante estudo tem um alc e muito além da singular visão religi?sa.0 trabalho P as leis são. W Mal criado pela sociedade. tupiguarani do Paraí so- . portanto.
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