A escrava que não é Isaura - uma fotografia de 1922 da poesia modernista

March 28, 2018 | Author: Leo Assunção Segovia | Category: Poetry, Modernism, Arts (General), Philosophical Science, Science


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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULOFaculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas Literatura Brasileira I Prof. Dr. Priscila Loyde Gomes Figueiredo A escrava que não é Isaura - uma fotografia de 1922 da poesia modernista Leonardo Assunção Segovia (FFLCH-USP) Nº USP: 9330314 Resumo: propõe-se a realização nas seguintes páginas, de uma breve análise d’A escrava que não é Isaura: (discurso sobre algumas tendências da poesia modernista), de Mário de Andrade, livro publicado em 1925 e escrito em 1922, no qual o escritor busca teorizar a poesia modernista, movimento do qual é um dos principais expoentes e idealizador. Palavras-chave: Mario de Andrade; Escrava que não é Isaura; Poesia; Modernismo.. “Je suis mille fois plus riche” Artur Rimbauld 1. Introdução Nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922, no Teatro Municipal de São Paulo, acontece a Semana de Arte Moderna, primeira manifestação de impacto do Modernismo brasileiro. O evento, “aberto” por Graça Aranha, ligado à Academia Brasileira de Letras, contou com a participação de diversos artistas unidos em prol de um único e comum objetivo: a renovação das artes. Em pé, no segundo dia do evento, Mário de Andrade, um desses artistas, nas escadarias do Teatro, lê trechos de sua obra crítica, A escrava que não é Isaura – causando choque à “sociedade educadíssima, vestida e policiada” que assistia aos espetáculos. A Escrava, que realizou algo como uma “teoria poética da renovação”1, reuniu e teorizou as tendências modernistas do início do século XX, e foi, segundo Mário, “derivada duma explicação oral que fiz da poética modernista universal”2. É fato que se confundem a história de Mário de Andrade e a do Modernismo: não é possível falar do movimento sem falar do autor, assim como não é possível falar do autor sem 1 Antonio Candido e José Aderaldo Castello. “Mário de Andrade”, in Presença da literatura Brasileira: Modernismo, p.85. 2 Mário de Andrade em carta à Joaquim Inojosa, in: Joaquim Inojosa, O movimento modernista em Pernambuco. 1 cubismo e dadaísmo) e. 5-6. Mário de Andrade e L’ESPRIT NOUVEAU.] Todos estavam de acordo com o fato de que se revelavam falidos os moldes acadêmicos e conservadores de uma arte envelhecida e cristalizada”. É este movimento o Modernismo. oficialmente.] Apesar de suas grandes diferenças. foi escrita após o encontro do autor com as vanguardas europeias (futurismo. 2 . SP. é publicado o livro A escrava que não é Isaura. que tem por finalidade destrinchar as principais ideias do autor presentes no texto sobre o Modernismo brasileiro. expressionismo. in Modernismo Brasileiro e Vanguarda. ele foi dividido conforme as “partes principais” indicadas por Mário de Andrade ao final das primeiras cópias do escrito publicadas em janeiro de 1925. Assim. sobretudo. Em relação à organização deste trabalho.falar do movimento. revela um ideal em comum entre as principais vanguardas europeias – o Futurismo (1909). todos os movimentos tiveram em comum o questionamento da herança cultural recebida. Na sua primeira fase. crítica. tanto é que no começo dos anos 20 já começa a se formar. é proposto nas seguintes páginas uma análise de algumas tendências do modernismo em 1922 a partir da leitura de A escrava que não é Isaura: (discurso sobre algumas tendências da poesia modernista). em São Paulo. pela Livraria Lealdade. 5 Maria Helena Grambeck. foi proposta esta leitura e análise. [. o Surrealismo (1924) –: a “revolta” contra a arte envelhecida e cristalizada produzida por escolas artísticas anteriores. 4 Ibidem. com as teorias expostas na revista francesa L’Esprit nouveau. A obra. hoje históricas. pelo seu cunho guerreiro de desbravador”4. inaugurado. pp... chamada “heroica.. [. Análise “As vanguardas (europeias). conforme o diz seu subtítulo. o Cubismo (1913). Além da Europa essa revolta também acaba ganhando fôlego. 2. foram movimentos altamente radicais que alteraram os rumos da literatura e das demais artes. p. 3 Lucia Helena. posteriormente. no trecho acima. um forte movimento vanguardista que propunha a renovação das artes aliada à realidade deste país. no Brasil. Introdução. o Dadaísmo (1916) e. 6.. compreendida por volta dos anos de 1920 a 1930. segundo Maria Helena Grambeck5 Tendo em vista a importância histórica da Escrava. na famosa Semana de 1922. que reunia as principais tendências do modernismo à época. o Expressionismo (1910).3 Lucia Helena. 2. a quem os modernistas puseram-se a adorar. estética e transitória”. De modo a recriar no expectador a sensação por ele sentida. 6 Mário de Andrade. a realidade interior e exterior. Colocou-a. conta que Iavé fez nascer Eva a partir da costela de Adão. coincidir com as dele. critica ao embelezamento e à linguagem artificial da Poesia. que a deforma e esconde. Artur Rimbaud. então. é a Poesia. criar. nesse primeiro momento. essa mulher. de modo que só se viam as suas roupas. ocasionalmente. Parábola Mário inicia o livro com uma parábola. com novas vestes. a necessidade de ação – rememora os gestos recebidos. ampliando as habilidades expressivas. “um vagabundo genial” (p. a dele é verdade só dele. Cada geração posterior a cobriu ainda mais. seria possível retratar. cada um “deus de sua própria religião” e com ideias próprias. O autor. a exemplo de Iavé. Assim define Mário de Andrade as belas-artes. 13). narrativa alegórica com a qual também Cristo adotava para ensinar a seus seguidores. Sem inteligência. 12). 2. Então tirou da língua um plágio de Eva e a recriou. 2. que redescobriu o fazer poético. independentes. 11. Vê em Rimbauld. mas os reconstrói criticamente. As citações referentes a esta obra serão indicadas apenas pelo número de página em que estão localizadas. no entanto. o autor continua com sua teoria sobre a poesia modernista. “humana. então. conceito de belas artes e da poesia “Necessidade de expressão + necessidade de comunicação + necessidade de ação + necessidade de prazer = Belas Artes” (p. Já que o homem nunca está inativo. então. menos rebuscada e mais pura. deixa claro nas primeiras linhas do texto que sua intenção não é de fazer proselitismo. nasce nele. pp. o homem precisa se comunicar. o homem sente a necessidade de expressar aquilo que recebe pelos sentidos por meio dos gestos: a sensação.1. mas ficou com vergonha e cobriu sua nudez com uma folha de parra. encontrou essa mulher e a despiu novamente. Assim. Na parábola. 17). uma nova forma de poesia. A escrava que não é Isaura: (discurso sobre algumas tendências da poesia modernista). “nua e eterna no cume do Ararat” (p. a escondendo. até porque a verdade anunciada por Cristo é “imutável e divina”6. resume-se o livro. Posto isso. Invejoso. La parte. que podem. também quis o homem. mas amigos. com maior sensibilidade. ele não possui discípulos. Mário faz. mais livre. Pela parábola. Assim. 3 . Pode-se entender que isso excluiria o Belo do modernismo. os assuntos a serem tratados no poema. Assim. não a sua finalidade. –. afirma que foi “a ideia de uma Beleza absoluta e com bê grande a culpada da maior parte dos equívocos artísticos. 311 (Edição fac-similar. 32-33. ficava a função de reproduzir o telegrama. 24). lembra a concepção de poesia de Dermée.. que podem ocasionalmente surgir como resultado do fazer poético. com a qual Adão cobriu a mulher do monte Ararat. na revista Estética.”7 Dando sequência ao texto. exaltação. neto. E era esse o erro das tentativas de se fazer poesia que antecederam ao modernismo. Mário não condena o uso do ritmo ou a rima. se sensualizarem’. à inteligência. prejudicando. Mário de Andrade – A escrava que não é Isaura. que nasce “de uma réstea de cebola como de um amor perdido” (p. isto é. pp. A folha de parra – ritmos preconcebidos. precisamente para demonstrar que Mário de Andrade não fulminou as folhas de parra onde estivessem a calhar: por isso mesmo continuou a sua fidelidade antiga ao princípio de que ‘toda canção de liberdade vem do cárcere’. a que se utiliza de vozes articuladas é a poesia. Das belas-artes. a impulsão lírica. Observo para interpretar os gerúndios como futuros condicionais: ‘se prejudicarem. e as outras vestes que vieram a seguir. abril-junho de 1925. in Estética.realizando-os de maneira mais expressiva e mais agradável. 7 Fernando Mendes de Almeida. Assim..3. desde a metrificação e a rima até a arte pela arte. E assim faço. em 2014. não é possível definir.) 4 . segundo Mário. afirma: “Observo que Mário de Andrade em 1925 usou desta expressão: ‘folhas de parra. sensualizando a nudez virgem da escrava do Ararat’ (isto é. dando-lhe comoção. Prudente de Moraes. Ao consciente. Assunto poético O movimento lírico nasce no interior do poeta. ignorando todos os demais. pela inteligência. mas acidentais. seria preciso utilizar do máximo de lirismo e do máximo de crítica para obter-se o máximo de expressão. Dessa forma. rimas etc. neto. Fernando Mendes de Almeida.”8 2. sobre isso. n° 3. publicado pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo. Não há tema poético. não são essenciais à poesia. no que Mário nega: “a beleza é uma consequência” da poesia. Poesia). 20). 8 Prudente de Moraes. para se fazer poesia de verdade. conforme pensava Ribot. p. independe do poeta e sua inteligência: o que existe é o inconsciente mandando um “telegrama” para o consciente traduzir. o autor de Macunaíma. também explicitada em forma de conta de soma (Lirismo + Arte = Poesia) e o corrige: “Lirismo puro + Crítica + Palavra = Poesia” (p. Mário de Andrade. 5 . o poeta vive a vida como qualquer outro cidadão. coroada acima pela frase de Rimbaud. Não seria.4. enumeração de novos princípios Na segunda parte do livro. no uso desses assuntos poéticos antigos vê-se a liberdade e a riqueza do poeta modernista. exclamava: “Je suis mille fois plus riche!” (p. 2. mas somou toda a experiência poética da história. 2.5. então duas questões polêmicas acerca da poesia: 1. conforme mostra em vários exemplos. encerra. ficar à mercê de assuntos poéticos. O resultado disso é uma poesia rica e farta. Lembro ainda que o autor deixa claro que os ex-assuntos poéticos não foram abandonados. 2. Mas anda de automóvel” (p. a rapidez e síntese e o polifonismo. “Eu sou mil vezes mais rico”. “O amor existe. Também por isso o modernismo foi tão rico e impactante – podia o poeta escrever versos com rimas ricas. citado por Mário. Mário nesse ponto da Escrava. então. Redescoberta da eloquência O passado não foi esquecido e da contemplação do século XX os modernistas redescobriram a eloquência. ILa parte. observa-se que os modernistas usaram do passado para seguir em frente. Daí o leitor deve traduzir também o telegrama. são a substituição da ordem intelectual pela ordem subconsciente. 26. E a partir desse respeito participam novos princípios à poesia modernista. do qual faz parte também o consciente. Já que a impulsão lírica é inconsciente.). mas um processo complexo. de acordo com a “vida sempre nova em monotonia” (ibid. e são. a poesia apenas um fluxo inconsciente de inspiração. Mário afirma que pelo respeito à liberdade do subconsciente. o verso livre. elevando-se à sensibilidade de poeta. naturalmente. Inclusive.) – também os modernistas o são. os quais concorrem para a existência do lirismo. pode-se chegar à criação pura. perfeitas e raras sem ser julgado e “expulso”. por isso Rimbaud. a rima livre e a vitória do dicionário. o modernismo não negou o que o precedeu e substituiu por algo definido como sua verdade. 28) – o passado não foi esquecido. portanto. Diferente de escolas artísticas. dentro dos quais sua produção artística deve-se inserir. Deste modo. em tradução livre. mas novas imagens surgem e geram novas sensações. na ordem técnica. não devendo. Na ordem estética.sublimação e poesia para lança-lo no papel. sobretudo em seu início. então. de modo muito patente. é preciso libertar-se de parte da sintaxe. Vitória do dicionário Mário de Andrade não negou. A partir daqui.6. rompendo o conceito de reprodução fotográfica da natureza. também Mário de Andrade afirma. abandonando a palavra. diferente do que aos leitores menos atentos pode parecer. pp. in 1930: a crítica e o Modernismo. então. que não é abandonada. Bem como com a eloquência e outros “acertos” artísticos do passado. irregular. ao não preestabelecimento de uma forma que deve orientar o “reproduzir do telegrama”: são livres. segundo o autor. que é científica e possui conclusões verdadeiras e psicológicas. 9 João Luiz Lafetá. no rápido excurso em que. assim. dessa forma. procura mostrar como a música. Esta provocação é. na Escrava. dando lugar a uma construção muito mais larga. como o parnasianismo.52). consciência que se encontra. Voltando à parábola. novamente Mário faz valer a soma apresentada no início do texto – Poesia = Lirismo puro + Crítica + Palavra –. 6 . como a frase elíptica. enérgica. sobretudo. uma das grandes características do modernismo. vale lembrar que o metro é uma vestimenta que cobre – e ofusca – a mulher do Ararat. também poesia na prosa – cai. refuta o metro. a ideia de que o que diferencia a prosa da poesia é o metro. separada da realidade. o verso continua a existir. rápida e simples. 50). aliás. afirmando que “o que interessa sob o ponto de vista formal na constituição das artes do tempo é o ritmo” (p. 2. imprevista. mas como consequência do processo poético. Pode haver. é livre. como uma brincadeira – cujo um dos benefícios é irritar os movimentos “passadistas”. abandonar a construção fraseológica tradicional e padrão. quando A escrava foi escrita. independente do metro. Não é mais a rima. aliás. verifica-se a preocupação com a forma – não como o fizeram os parnasianos e outras escolas. Mas propõe certa modificação: para expressar o lirismo puro. muitas vezes ocorrendo no interior do verso” (p. A consciência da linguagem. “variada. mas utiliza- se da gramática. “nasce assim uma consciência da linguagem enquanto organização específica. torna-se puro som.” 9 Aqui. sugestiva. mas algo com o qual o poeta pode se utilizar a sua própria vontade. a gramática. Assim. em 1922. quando acontece. como único motivo e finalidade. 164. o descrivismo. Sobre a rima. Mas. De acordo com João Luiz Lafetá. mas. correspondendo. É preciso. algo sério e patamar a ser alcançado. Percebeu-se que o importante no poema não é a forma. fosse a poesia muito comprida. que conhecia cada vez mais os adventos da eletricidade. romper definitivamente com técnicas do passado. dessa forma. Em relação à ordem do subconsciente. mas sempre se voltará a ele. exagerando. até porque tal realização não seria possível: a impulsão do eu profundo é independente do poeta. frutos de uma intelectualidade exagerada. e. não a criação. A poesia modernista é resumo.mimese. por isso não há concatenação de ideias. o poeta deve alterar o modo de reapresentação da realidade.8. Alerta. Conclui então o poeta que o dicionário. Combinando o esforço do consciente. também. o autor corrige a ideia de que o poeta fotografa o subconsciente. nunca o tema principal da poesia será deixado de lado. o que é. dispensável – e desprezável. com o impulso do inconsciente. e pela fadiga intelectual – o homem dos tempos modernos tem rapidez de raciocínio maior que a de um homem dos séculos mais antigos. influenciada. é o meio que mais possibilita a realização do lirismo puro. Rapidez e síntese É característica que acompanhou boa parte da produção modernista a rapidez e a síntese. O autor não pretende. sobretudo pelo esforço do poeta. ao contrário. pelo contato com a poesia oriental. 7 . essência e substrato. pretenciosa e. busca associar o caráter psicológico da poesia aos recursos técnicos disponíveis aos poetas. por conseguinte. ao uso das analogias e perífrases – perigo aos modernistas. do automóvel e de outras invenções. Substituição da ordem intelectual pela ordem subconsciente Neste ponto. então. ela poderia se tornar prolixa. Também a falta de “ordem” incomoda esses passadistas. mas o seu conteúdo interior. como pedem os passadistas (sobretudo os parnasianos) mas associação de imagens e superposição de ideias e imagens. após isso. 2. E para criar exige-se um esforço de vontade de modo a uniformizar as impulsões líricas para que a arte se realize. Não rege. por isso. comemorado também pelos modernistas.7. ordem intelectual no eu profundo. de certa forma. 2. A inspiração que vem do consciente. ela não é correspondente à lógica intelectual. do telégrafo. independente da sintaxe e da retórica. deformando e a sintetizando – para obter o máximo de crítica. visto que ambas são recursos forçados. retrato da rapidez da sociedade da época. Jazz-band. Pelo primeiro verso da poesia de Sérgio Milliet.9. já que é empregado por todos aqueles que.” (p. senão a maior. apenas a última nota presentes nos apêndices do texto analisado. é possível exemplificar a questão: o poeta. Apêndices Limito-me a comentar. que dá certa musicalidade ao poema por meio de melodias. Polifonia é a união artística de duas ou mais melodias cujos efeitos passageiros de embates de sons concorrem para um efeito total final. sabemos a posição do autor. Nesta nota. em tom de questionamento. ao entrar num baile. fazendo uma poesia sincera. aqui. O homem. mas ser sincera e verdadeira. 144) Preparar obras imortais. esclarece que o analisado nas páginas anteriores refere-se a uma fotografia da poesia de 1922. sobre a missão do artista: “qual a obrigação do artista?” (p. no posfácio. o autor da Escrava afirma que será essa uma das maiores. Antes de tudo. Mário dá o nome de Polifonia Poética – conceito que já fora apresentado no “Prefácio Interessantíssimo” de Paulicéia Desvairada. A esse aspecto da literatura modernista. Risos Perfumes Decotes. em tradução livre). 62). não deve ter máscaras. após. que são complexas. 2. seguem e respeitam a ordem do subconsciente. não de 1925. A poesia. Postfacio Derradeira “parte” do livro. Mário fala. ou de 1924. 102) Ainda sobre a simultaneidade. está cercado de sensações. mesmo que a muitos não seja agradável? Ora. Mário dá suas últimas considerações sobre a poesia modernista. Simultaneidade ou polifonismo Da vida moderna e da observação do nosso eu interior nasce a simultaneidade como processo artístico. mas várias simultâneas – “Rires Parfums Decolletés” (p. poesia. 2. que colaborarão na alegria das gerações futuras. hoje e naquela época. Assim. citado por Mário. o poeta modernista procura transmitir essas sensações para a ordem artística – faz. conquista da poesia do Modernismo. razões para tanto: “Simultaneidade é a coexistência de coisas e fatos num momento dado. resultado da inspiração subconsciente. quando 8 . não tem uma só sensação. 2.11. penduricalhos para agradar. trabalhada e sintetizada pelo consciente. quando o livro é publicado. onde respeitam e destacam-se as impulsões líricas. São dadas. de fato. ou construir obras passageiras. dessa forma. percebendo-as.10. Daí a fórmula de Mário: POESIA = máximo de lirismo + máximo de crítica + máximo de expressão. O movimento modernista em Pernambuco 9 . portanto. 11 Mário de Andrade em carta à Joaquim Inojosa. já não corresponde à verdade inteira do autor. cabe o domínio. é relembrada a questão da inteligência: é nela que moram razão e consciência. onde se lê que a poesia resulta da relação entre a sensibilidade (o fluxo lírico) e a inteligência (a reelaboração).”10 No trecho acima. mas que muitos pontos ali tratados ainda se conservam. Não se abandonou. criticando àqueles que. a inteligência para dar valor apenas ao subconsciente – até porque mesmo “o lirismo subconsciente é ainda filho da inteligência ao menos na teoria” (p. afirma isso. 187. O texto de Mário é capaz de reunir as principais tendências usadas pelos escritores e outros artistas do movimento Modernista. associando a primeira parte (La parte). Ainda no posfácio. A escrava que não é Isaura. 152) Termina o livro afirmando que. in Vanguarda Europeia e Modernismo Brasileiro. Conclusão “A escrava que não é Isaura é. Não fosse assim. à segunda parte (ILa parte). p. implicitamente. Gilberto Mendonça Teles consegue sintetizar em poucas linhas A escrava que não é Isaura. então. 153). uma POÉTICA MAIOR. A Poética de Mário de Andrade. que fala sobre a poética do Modernismo. por meio dessa poética maior. não haveria “crítica” na conta de somar do lirismo apresentada por Mário. em carta à Joaquim Inojosa. 3. orientação e palavra final” (p. consequência da poesia sincera. Mário. por conta de medo. dando-nos um panorama geral da poesia da década de XX. e descrente de que muitas pessoas observarão também essa “lição”: 10 Gilberto Mendonça Teles. que é o “abrasileiramento do brasileiro” 11 – ou seja. “se não cabe a ela a superioridade e prioridade.escreve este posfácio – assim. sobre a retórica do movimento. que trata de uma poética menor – o fenômeno da criação – e de uma retórica – a inteligência do criador na expressão da poesia. o escritor da Escrava revela- nos outra característica do modernismo. in: Joaquim Inojosa. Além disso. no nº1 da revista L’Esprit Nouveau). Tal equilíbrio entre poética e retórica correspondia ao espírito clássico de Mário e encontrava apoio num artigo de Paul Dermée (Decouverte du lyrisme. tampouco haveria a poesia alguma comoção. ignorância e fraqueza estão presos ao período da imitação. a aproximação da poesia a realidade do país. Prudente. é também certo que a grande maioria se esquecerá de tirar a lição e verá mais certamente do livro certos ditames práticos mais fáceis de apreender. Rio de Janeiro: Gráfica Tupy. LAFETÁ. Mário de Andrade e L’Esprit Nouveau. sobretudo em seus livros posteriores a publicação deste. 4. 2000. neto. Vanguarda Europeia e Modernismo Brasileiro: (Apresentação e crítica dos principais manifestos vanguardistas). São Paulo: Difel Difusão Editorial. São Paulo: Conselho Estadual de Cultura. Editora 34. português ou mesmo americano do norte é um selvagem. 10 . 1969. Mário de Andrade. ALMEIDA. 1986. O movimento modernista em Pernambuco. do mimetismo a que o selvagem é levado pela dependência. abril-junho de 1925. 1925. verifica-se a sua grande importância perante o Modernismo brasileiro e também para entendermos melhor os rumos da poética de Mário de Andrade. (Edição fac-similar. São Paulo: Ática. São Paulo: Instituto de Estudos Brasileiros/USP. 12 Ibidem. 1962. São Paulo: Lealdade. in 1930: a crítica e o Modernismo. em 2014. esse abrasileiramento do brasileiro está implicitamente promulgado. publicado pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo. “Nós temos que criar uma arte brasileira. Maria Helena. CANDIDO. 9ª ed. José Aderaldo. Joaquim. Bibliografia ANDRADE. 1969. in Estética. Gilberto Mendonça. n° 3. GREMBECKI. Está no período da imitação.) TELES. Se é certo que nas consequências espirituais que a minha 'Escrava' dita. Antonio. Fernando Mendes. Quem dentre nós refletir ideais ou apenas sentimento alemão. como Losango Cáqui.”12 Pela leitura do texto. 1983. Lucia. pela ignorância e pela fraqueza que engendra a covardia e o medo. 1973. Mário de Andrade – A escrava que não é Isaura. INOJOSA. São Paulo: Duas Cidades. Mário de. Rio de Janeiro: Vozes. A escrava que não é Isaura: (discurso sobre algumas tendências da poesia modernista). João Luiz. Esse é o único meio de sermos artisticamente civilizados. CASTELLO. Presença da literatura Brasileira: Modernismo. onde veem-se muitos dos ideais aqui declamados. não está no período civilizado de criação. (Coleção Espírito Crítico). Modernismo Brasileiro e Vanguarda. MORAES. A consciência da linguagem. HELENA.
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