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May 6, 2018 | Author: MArcos André | Category: Family, Psychotherapy, Species, Psychology & Cognitive Science, Human


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Manual deTERAPIA FAMILIAR Volume II M489 Manual de terapia familiar [recurso eletrônico] : volume II / Luiz Carlos Osorio, Maria Elizabeth Pascual do Valle [organizadores]. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : Artmed, 2011. Editado também como livro impresso em 2011. ISBN 978-85-363-2437-1 1. Terapia familiar – Manual. I. Osorio, Luiz Carlos. 2. Valle, Maria Elizabeth Pascual do. CDU 615.85(035) Catalogação na publicação: Ana Paula M. Magnus – CRB-10/Prov-009/10 Manual de terapia familiar Volume II Luiz Carlos Osorio Maria Elizabeth Pascual do Valle e colaboradores 2011 © Artmed Editora S.A., 2011 Capa Alan Heinen Preparação do original Cristine Henderson Severo Leitura final Rubia Elisângela Minozzo Editora Sênior – Ciências humanas Mônica Ballejo Canto Editora responsável por esta obra Amanda Munari Projeto e editoração Armazém Digital® Editoração Eletrônica – Roberto Carlos Moreira Vieira Reservados todos os direitos de publicação, em língua portuguesa, à ARTMED® EDITORA S.A. Av. Jerônimo de Ornelas, 670 – Santana 90040-340 Porto Alegre RS Fone (51) 3027-7000 Fax (51) 3027-7070 É proibida a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte, sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia, distribuição na Web e outros), sem permissão expressa da Editora. SÃO PAULO Av. Embaixador Macedo Soares, 10.735 – Pavilhão 5 – Cond. Espace Center Vila Anastácio 05095-035 São Paulo SP Fone (11) 3665-1100 Fax (11) 3667-1333 SAC 0800 703-3444 IMPRESSO NO BRASIL PRINTED IN BRAZIL Autores Luiz Carlos Osorio Médico, especialista em psiquiatria pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Psicanalista titulado pela International Psychoanalytical Association (IPA), grupoterapeuta com formação em psicodrama (com Olga Garcia, Argentina) e em terapia familiar (com Maurizio Andolfi, Itália). Consultor de sistemas humanos, fundador e diretor técnico da GRUPPOS, en- tidade formadora de grupoterapeutas e terapeutas de família (Florianópolis/SC). Maria Elizabeth Pascual do Valle Médica. Psiquiatra sistêmica. Mestre em administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Fundadora e associada titular da Associação Catarinense de Terapia Familiar (ACATEF). Presidente da ACATEF (gestão 2006-2008). Fundadora e sócia da GRUPPOS (Florianópolis/SC). Médica psiquiatra do Centro de Atenção Psicossocial (Secretaria Municipal de Saúde de Campos Novos/SC). Professora de psiquiatria do curso de medicina da Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC). Adriana Wagner Cynthia Ladvocat Doutora em Psicologia pela Universidade Psicóloga. Mestre pela Pontifícia Universidade Autonoma de Madrid (Espanha). Professora Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Do­ do Instituto de Psicologia da Universidade cente e ditada da Sociedade Psicanalítica do Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Rio de Janeiro. Presidente da Associação de Terapia de Família do Rio de Janeiro (ges- Aidê Knijnik Wainberg tões 2002-2004/2004-2006). Presidente da Psicóloga clínica da Clínica Desenvolver. Associação Brasileira de Terapia Familiar (gestão 2008-2010). Clarisse Pereira Mosmann Denise Gomes Doutora em psicologia pela Pontifícia PhD em psicologia social pela Universidade Universidade Católica do Rio Grande do Sul de São Paulo (USP). Doutora. Mestre em (PUCRS). Especialista em terapia de casal e psicologia social pela USP. Sócia titular e família pela Clínica Stirpe-Madrid-Espanha. formadora no Instituto Sistemas Humanos Bolsista do pós-doutorado júnior CNPq no (São Paulo/SP). Núcleo de Pesquisa das Relações Familiares da Universidade Federal do Rio Grande do Fabrício Casanova Sul (UFRGS). Experiência na área de pes- Médico de família e comunidade. Terapeuta quisa em psicologia social, investigando de família. Supervisor da disciplina Interação principalmente os seguintes temas: relações Comunitária da Faculdade de Medicina da interpessoais, com ênfase nas relações fami- Universidade Federal de Santa Catarina liares, amorosas e educação. (UFSC). Especialista em terapia de casais Planalto Catarinense (UNIPLAC). Psicóloga. Membro da equipe de RS). no Curso de psicanálise da vincularidade pelo processo de “language acquisition” e em Instituto Contemporâneo (Porto Alegre/ psicologia clínica. no tratamento de dependência química. Mestre em saú- de coletiva pela Universidade do Planalto Maria Cristina Milanez Werner Catarinense (UNIPLAC). Doutora em ciên. Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Iara Camarata Anton Psicoterapeuta individual. Coordenadora Geral do (Alemanha) e pela St. Presidente da Associação de . Maria Conceição de Oliveira Médica. tes. Especialista em de casal e família pelo Instituto Sistemas psicoterapia de orientação psicanalítica pela Humanos. José Ovídio Copstein Waldemar Luciana Monteiro Pessina Psiquiatra de adultos. mília do IPHEM. Jonh’s University curso de formação em terapia de casal e fa- (Estados Unidos). Jossara Cattoni Araldi Local de trabalho atual: Universidade do Psicóloga. Mestre em psicologia te do Departamento de Ciências Sociais e clínica pela Universidade de Brasília e pro. (PUC-Rio). Experiência e de família pelo Domus (Porto Alegre/RS). Humanos. Terapeuta Grande do Sul (PUCRS). Professora do cur. e famílias pelo GRUPPOS. sexóloga. com formação em terapia de casal LUISS Business School (Roma). Professor do Instituto Terapeuta de família e casal em forma- da Família (Porto Alegre/RS). Psicóloga do Serviço de Atendimento laborador do Centro de Estudos Luis Guedes à Família com Ação Cível do Tribunal de (CELG) do Departamento de Psiquiatria da Justiça do Distrito Federal e Territórios. colaboradora do Centro Latino-Americano fessor de Psicologia Jurídica da Universidade de Estudos de Violência e Saúde Jorge Paulista.vi Autores Flávio Lôbo Guimarães Kathie Njaine Psicólogo. Mestre em psicologia pela Pontifícia Professora emérita e pesquisadora colabo. com Projeto do Instituto de Pesquisas Heloisa pós-doutorado pela Universität Tübingen Marinho (IPHEM). Universidade Católica do Rio de Janeiro radora sênior do programa de pós-gradua. Careli (Escola Nacional de Saúde Pública – Fundação Oswaldo Cruz). Doutoranda em Saúde Mental pelo (FACVEST). terapeuta de Doutora em ciências. Professor co. outras drogas da Universidade Federal cias familiares e sexológicas pela Universite Fluminense (GEAL/UFF). Recursos do Rio Grande do Sul (gestão 2009-2011). Coordenadora do Ambulatório ção em psicologia clínica da Universidade de terapia familiar e sexualidade do Grupo de Brasília (UnB). de casais e de Larissa Rosa Fedullo Schein famílias. Pesquisadora visitan- famílias e casais. terapeuta de casal e fa- so de psicologia das Faculdades Integradas mília. HR Development Specialist pela PUCRS. Terapeuta Familiar. Psicóloga. crianças e adolescen. psicoterapeuta. ção. Diretora de Catholique de Louvain (Bélgica). Psicoterapeuta de adultos. Professora titular da transdisciplinar de estudos em álcool e Universidade de Fortaleza. Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (IPUB/ Julia Bucher-Maluschke UFRJ). Especialista em psicologia clínica Psicóloga clínica pela Pontifícia Universidade pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Católica de São Paulo (PUC-SP). Presidente da Sociedade de Psicologia Linneo Consulting SRL (Roma). Doutora em Ciências Humanas. Doutora em medicina Paulista e Brasileira de Terapia Familiar. Secretária da Comissão Sandra Fedullo Colombo Latino-Americana do Conselho Deliberativo Terapeuta de casais e família. Coordenadora geral Brasileira de Terapia Familiar (ABRATEF). família e comunidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). terapeuta de fa- Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Maria Lucia de Andrade Reis Sonia Mendes Graduada em educação física e desportos pela Pedagoga. Bacharel pela Universidade de quisa do indivíduo. Professora adjunta do escola de pais do Brasil. Diretora Verônica Cezar Ferreira do Centro de atendimento. Psicóloga. Presidente do e Científico da ABRATEF (CDC). Autores vii Terapia de Família do Rio de Janeiro (ATF/ e adolescência do Hospital de Clínicas de RJ) e primeira secretária da Associação Porto Alegre (HCPA). Professora Pesquisas Heloisa Marinho (IPHEM). Advogada. ensino e Psicóloga pela Pontifícia Universidade pesquisa do indivíduo. família e comunidade São Paulo. Formadora e intervisora em terapia comu. Membro da International Family Therapy Association (IFTA). Porto Alegre/RS). Mestre e doutoranda em psicologia clínica pela Olga Garcia Falceto Pontifícia Universidade Católica de São Médica psiquiatra de adultos. Sócia-fundadora das Associações lescentes e famílias. codinâmica e em terapia familiar. Psicóloga. Mestre em saúde comunitária. pela Universidade Federal do Rio Grande Membro do Conselho de educadores da do Sul (UFRGS). Professora de de especialização em psiquiatria da infância pós-graduação. mediadora. de casal e de família. Legal da UFRGS. Tatiana Knijnik Wainberg nitária pelo Centro de atendimento. (CAIFCOM. ado. Coordenadora do curso perita e consultora de família. Instituto Sistemas Humanos. Professora do Instituto de Especialista em terapia comunitária. Terapeuta familiar e comunitá- ria. Psicoterapeuta in- Departamento de Psiquiatria e Medicina dividual. Porto Alegre/RS). ensino e pes. crianças. Especialista em dinâmica dos grupos pela Sociedade Brasileira de Dinâmica dos Marli Olina de Souza Grupos. Paulo. mília e casal. . psicoterapeuta. da rede municipal de ensino de Porto Alegre/ RS. especialista em psi- (CAIFCOM. do Instituto da Família de Porto Alegre. . As A internet contribui para os relacio- questões não seguem a ordem dos capítu. jo? A sexualidade é um assunto da privaci- além de um capítulo junto aos outros 22 dade do casal? As fantasias de cada membro coautores. sobre questões in. namentos descartáveis? O divórcio aumen- los. objetal atende às expectativas sobre o par- A comunidade da área de família em ceiro amoroso. sobre questões relacionais muito longo pode prejudicar o casamento? e como intervir? E na terapia familiar. relacionamentos descartáveis buscam expe- Frente às intervenções clínicas em um riências diversas e múltiplas? Ou é uma fuga processo de terapia individual. aqui são levan. dos vínculos mais duradouros? Um namoro tar sobre o outro. em vez de um educação na constituição do casal? Como os resumo sobre o conteúdo. mas de todos que buscam informações moradia? Como escolher o país de nasci- sobre a família na contemporaneidade. as fantasias sexuais cio deste livro. um compatriota? Como escolher o país de tas. tou o número de separações? O recurso da lo para a busca das respostas em cada um união estável diminuiu as separações? Os deles. encontro é resultado do destino? Os casa- ve a terapia familiar nos seus diferentes con. organizado por Luiz Carlos são necessárias para a manutenção do dese- Osorio e Maria Elizabeth Pascual do Valle. no casal sem o recurso da fantasia ocorre E. a escolha comprovado o sucesso do primeiro. Por que escolher um estrangeiro em vez de dos de interesse não somente dos terapeu. O Manual de Terapia Familiar Volume nalidades desafiam os sistemas de crenças? II apresenta 21 capítulos sobre temas varia. se a Artmed publica o segundo volume do por inibição? Manual de Terapia Familiar. Prefácio É com satisfação que escrevo o prefá. o abandono? Como transformar um senti- trapsíquicas e como intervir? mento de perda em uma nova etapa? Como . a família e belece as suas regras e visão de mundo? a prática ampliada da terapia de família. como escu. por que então pensar que o muito se beneficia com um livro que descre. Os capítulos A educação na conjugalidade é trans- deste livro são bem amplos e se distinguem mitida pelas gerações? Como negociar a pela sua diversidade. vem educar os filhos? Como um casal esta- siderando o indivíduo. O lançamento no ano de 2010 devem ser compartilhadas ou ser mantidas coincide com a data em que termina meu em segredo? É saudável para o casal a inclu- trabalho como presidente da Associação são de terceiros na fantasia? A sexualidade Brasileira de Terapia Familiar – a ABRATEF. como Como lidar com a separação sem sentir escutar sobre o indivíduo. Por isso. pais com sistemas de crenças diferentes de- tadas perguntas que estão agrupadas con. é porque está No casamento transcultural. o casal. E no casamento. mentos entre pessoas de diferentes nacio- textos. mento dos filhos – pela origem materna ou Um prefácio deve apresentar os temas paterna? e algumas impressões da obra. e acredito que possam servir de estímu. o que está implícito. e adolescentes? Os pais devem ter controle pia do divórcio ou mediação? e evitar os riscos nos filhos? E quando são os Afinal. como sa familiar possa organizar-se e não acarrete identificar a resiliência frente a uma situa. A terapia com grupos na comunida- a individual ou grupo de apoio? de tem continuidade? Como incluir a tera- Na terapia com a criança. formar os conflitos dos papéis empresariais tente e inconsciente? Ou devemos conside. pia comunitária nos programas de políticas tador na sala de terapia é um recurso para públicas? Essa modalidade tem finalida- brincar? O computador pode ser uma forma des de transformação individual. da obediência. como contextualizar a crença? A espiritualidade é resultado da história familiar quanto às profissões? Qual educação. impasses clínicos no atendimento de crian- lógicos ou adotivos? ças e adolescentes em risco? Como identificar a demanda da família Como trabalhar junto à família na ges- no processo terapêutico? Devemos avaliar o tão de uma empresa familiar? Como trans- que não é saudável. grupal ou de comunicação com a criança? A internet familiar? pode ser utilizada como conexão e interação Qual a importância da religião nas em terapia familiar? famílias contemporâneas? A família se di- No difícil momento para um jovem da vide se todos não compartilham da mesma escolha da profissão. conflitos nem para a empresa e nem para a ção catastrófica? É possível desenvolver a família? resiliência frente à passividade da família? Os programas de saúde se beneficiam Como a família encontra forças para seguir do trabalho do terapeuta de família? Como em frente e superar os traumas? utilizar os conceitos da terapia familiar na A família cresce e surgem os filhos. de opção ou de a responsabilidade dos pais na profissão dos vocação? Como o terapeuta lida com a falta filhos? Como trabalhar com o jovem que da espiritualidade? . a história frente aos conflitos do grupo familiar trans- oficial e a queixa manifesta? Os recursos feridos para o grupo de trabalho? A sucessão utilizados devem ser adaptados ao estilo do na empresa familiar deve seguir a hierarquia terapeuta ou da família? familiar? Como trabalhar para que a empre- Quando a família vive o caos.x Prefácio trabalhar na busca de novas oportunidades? rejeita ou o que se submete à escolha profis- Como acolher o membro do casal que não sional da família? aceita a separação? Frente à separação. pais? Como ajudar pais desesperados com o terapeuta de família é incluído na equipe os problemas de saúde e da justiça frente ao do hospital? Quais os avanços da psiquiatria consumo de drogas? Frente à dependência com pacientes de saúde mental? química. saúde? Quais os resultados apresentados Mais ganhos do que problemas? A família pelos técnicos do Tribunal de Justiça com pode culpabilizar a escola pelo consumo de formação em terapia familiar nas suas dife- drogas iniciado no recreio? O que cabe aos rentes atuações? professores frente às drogas? O que cabe aos E no tratamento da patologia grave. qual a melhor terapia. compulsória funciona? Como os terapeutas conceito contra as famílias que não desejam coletam e armazenam as informações sobre filhos. la. tera. quais os caminhos novos para pais que colocam os filhos em risco? E quan- as famílias? Na atualidade. entre parentes? Qual o papel do terapeuta rar somente a demanda explícita. qual Quais os riscos que envolvem crianças a melhor indicação: terapia individual. existe uma maior do não conseguem proteger seus filhos? E tolerância para a diversidade das configura. o compu. quando os rejeitam? A terapia de família ções familiares? Como trabalhar com o pre. as monoparentais. as homossexuais e a história? Como o terapeuta enfrenta os as famílias homossexuais que têm filhos bio. a de família. limites e possibilidades? ção na comunidade? Essa abordagem requer Ainda existem campos não visitados? Ainda especialização à parte da terapia familiar? existe espaço para crescer? Quais novas atua­ Quais são as questões mais difíceis de serem ções do terapeuta de família ainda podem mediadas? Um casal em litígio aceita um ser criadas? Quantos manuais ainda deve- mediador? A família de origem contribui ou rão ser publicados? atrapalha em uma sessão de mediação? São essas as questões que justificam Pela interdisciplinaridade e pelos múl. os seus recursos. em grupos. quais Familiar. o segundo volume do Manual de Terapia tiplos contextos da terapia familiar. Cynthia Ladvocat Psicóloga com formação em psicanálise. Prefácio xi Como divulgar os recursos da media. Presidente da Associação Brasileira de Terapia Familiar 2008-2010. . em gerontologia e em terapia de família. . ................. F...............ix Cynthia Ladvocat Parte I Terapia familiar no contexto contemporâneo 1........ 27 Flávio Lôbo Guimarães............ N......................... 85 Denise Mendes Gomes Parte II Terapia familiar e suas expansões 8............................... Intervenções familiares em psicoterapias individuais e intervenções individuais em terapias de famílias ....... Família e escola: uma parceria possível na prevenção de uso de drogas entre adolescentes .......................................................... O computador como instrumento interativo na terapia familiar ..................... Tatiana Knijnik Wainberg 5................................... Bucher-Maluschke 9....................................... Kathie Njaine...................................... Família e orientação profissional ....................................... Famílias com crianças e adolescentes em situação de risco ........................................................................................ Maria Conceição de Oliveira 6... 59 Jossara Cattoni Arald........................................ 39 Cynthia Ladvocat 4............... quando e como? Manejando o contexto terapêutico na prática sistêmica ............................................... Sumário Prefácio ...... Maria Elizabeth Pascual do Valle ................................................................ Tutores de resiliência na família ...................................................... 113 Luiz Carlos Osorio..................... 71 Sandra Fedullo Colombo 7............ 107 Maria Elizabeth Pascual do Valle 10............................................................ Luciana Monteiro Pessina 3...... o quê........................... Separação ou abandono? . Terapia familiar e suas possibilidades: reflexões baseadas em um estudo de caso .............................................. Novos rumos da família na contemporaneidade ......... 99 Júlia S... 51 Aidê Knijnik Wainberg............................................................. 17 Luiz Carlos Osorio 2........................................................................ Quem. ..................................................................... 213 Maria Cristina Milanez Werner 19......................... 135 Marli Olina de Souza.......................................... Camaratta Anton 21... 271 ................................................................................. A família como a porta de entrada para a abordagem integral da criança e do adolescente ........ Maria Lucia de Andrade Reis Parte III Terapia familiar e interdisciplinariedade 13.................................................. Terapia familiar e espiritualidade .....14 Sumário 11.................................................. Educar para a conjugalidade: que a vida não nos separe .. 253 Iara L.............................. Mediação familiar ........................ 191 Verônica A......................... Atendendo empresas familiares ................................. Escolha e destino: casais interculturais ..................................... Fantasias sexuais e conjugalidade ..................................................................................... Contribuições da terapia familiar ao programa de saúde da família .................................................................................................................... da Motta Cezar-Ferreira 17....... Terapia comunitária: O inédito viável no atendimento a famílias em comunidades ................................ Relacionamentos descartáveis . 227 Larissa Rosa Fedullo Schein 20...... 261 Adriana Wagner..... 177 Fabrício Casanova 16....................... 203 Sonia Mendes Parte IV Terapia de casais 18.................................................................... 167 Maria Elizabeth Pascual do Valle 15............... Intervenções sistêmicas “relâmpagos” em clínica psiquiátrica ................................ 121 Luiz Carlos Osorio 12.... Olga Garcia Falceto 14.. 151 José Ovidio Copstein Waldemar.......................................... Clarisse Pereira Mosmann Índice .... parte I Terapia familiar no contexto contemporâneo . . portanto. no famulus. consequentemente. reito absoluto sobre elas. con­ mente aceito de família? . como os animais domés­ n Há um conceito ou definição universal- ticos. suas inclinações amorosas para desempe- ças nas relações familiares. eram maltratadas ou afagadas. camente vinculadas à origem e à evolu­ção do to. a quem deviam suas vidas e. contudo. responsabilidade exclusiva de prover o sus. esses se julgavam com di- tento da família. que significa “servo” ou “escra­vo”. o poder dentro dos lares – não possuíam­ grupo familiar. própria.1 ção humana? As crianças. seguir: vado com o signo da propriedade conferi- do no designativo “de” nos países de língua n É a família o grupo primordial na evolu- espanhola. de não fica. das crianças. dos progenitores. ríodo da história da humanidade tenham E os homens? Bem. capítulo 1 NOVOS RUMOS DA FAMÍLIA NA CONTEMPORANEIDADE Luiz Carlos Osorio for­me os humores dos pais. em que campo dos direitos da maior parcela da a mulher devia obedecer a seu marido como humanidade (as mulheres e seus descen. agra. como se verá mais adiante. conforme o tema deste capítulo e que servirão de ainda hoje se denuncia na forma como o fio condutor para a construção do texto a sobrenome do marido é aposto ao seu. e os filhos perten- dentes). se seu amo e senhor fosse. rem restritas ao exercício da maternidade sugerindo que primitivamente considerava­ na clausura de um matrimônio ao qual ‑se a família como sendo o conjunto de es- habitual­mente não chegavam por vontade cravos ou criados de uma mesma pessoa. que essa raiz etimoló- objetos das expectativas dos pais. ainda que não de direi. de não serem meros Parece­‑nos. intrinse- exercendo de fato. se tratando da história da civilização – o Curiosamente a origem etimológica da reconhecimento dos direitos das mulheres palavra “família” nos remete ao vocábulo­lati- e das crianças: das mulheres. A noção de posse e As mulheres – embora muitas vezes a questão do poder estão. gica alude à natureza possessiva das relações Paralelamente a essas conquistas no familiares entre os povos primitivos. E seu destino Introdução determinado pelas expectativas e desejos É provável que em nenhum outro pe. como va e que estava identificado com a repressão em nossa época. assim como no nhar o papel de macho que deles se espera- comportamento humano em geral. dos sentimentos e o exercício da crueldade Não tem mais de um século – e um que os credenciava para as funções de caça- século é período de tempo assaz curto em dores e guerreiros. esses aprisionavam ocorrido tantas e tão significativas mudan. os homens se viram aliviados da ciam a seus pais. fora deles uma identidade própria: eram Eis algumas questões que permeiam as esposas de fulano ou sicrano. n A família contemporânea está em ­cri­se? assemelhando­‑se às “irmãs” de caridade ou n Poderá ela se extinguir no futuro como religiosas celibatárias que. Para Levi­‑Strauss (1958). a fa- ampliadas (ou extensas) em que os jovens mília proporciona o marco adequado para ajudam a criar os irmãos. mas mutuamente vinculados. que constituem os mútuos cuidados. como dos tempos a família adota formas e meca- em certas espécies de peixes. são três os produção. geralmente a fêmea. só em vertebrados como até mesmo sob for. tantas são as fícil conceber alguma forma de organiza. prevalente em um determinado momento A estrutura familiar não é exclusiva da evolutivo da humanidade nos ofereceu sua espécie humana. da mãe e dos filhos. em família somente durante a época da re. constituem entre si uma fratria distintos. coexistem na espécie humana tipos de em que o pai assume a guarda dos filhos não famílias constituídos sobre princípios mo- é uma peculiaridade dos humanos! rais e psicológicos diferentes e ainda contra- Algumas espécies entre as aves vivem ditórios e inconciliáveis. lhos) e consanguinidade (irmãos). vamos encontrar entre os animais lia vamos mencionar aqui as observações de diversas formas de organização familiar. que são filhas estéreis das abelhas humanas. abrindo mão de sugerem (ou preconizaram) alguns de sua função procriadora. Talvez homens e mulhe- res tenham se agrupado inicialmente para Sobre o conceito de família assegurar sua sobrevivência enquanto in- divíduos que necessitavam alimentar­‑se. As abelhas ope. Como ilustração deste esforço entre mas rudimentares em invertebrados. autores contemporâneos das mais distintas Assim. na atualida- as famílias monoparentais contemporâneas de. liares. Há um pediatra. fixa e invariável. prole fica aos cuidados de apenas um dos Escardó (1955) observa que a pala- genitores. do mesmo modo que na espécie áreas em caracterizar o que seja uma famí- humana. papéis básicos em todas as culturas. Há também entre os animais famílias Segundo Pichon­‑Rivière (1981). a lista. característica marcante das famílias toriamente ter sido o agrupamento familiar na contemporaneidade. do ou comunidade de irmãs com funções de pai. a definição e a conservação das diferenças rárias.18 Luiz Carlos Osorio. comportamento que encontra. mas é di. Como vemos. mas apenas se descreve. Há quem diga – e com muita proprie- enfrentar os predadores de sua espécie dade – que família não se conceitua ou de- ou proteger­‑se das intempéries. proteção e alimentação. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. respectivamente. estruturas e modalidades assumidas pela ção ou estrutura grupal anterior ao núcleo família ao longo dos tempos. Essa breve referência aos comporta- mentos familiares de certos animais e suas equivalências com o dos seres humanos não A família como leva a outro propósito senão enfatizar a uni- grupo primordial versalidade e multiplicidade das formas com que podem apresentar-se os sistemas fami- Embora não se possa afirmar peremp. nismos sumamente diversos e. se dedicam aos cui- seus exegetas? dados de órfãos. para ele. podemos encontrá­‑la não concepção singular da constituição familiar. a unidade gregária primordial. vra “família” não designa uma instituição­ do também ser o macho quem se encarrega ‑padrão. fine. Cada cultura familiar. através dos cuidados com os descendentes. tudo leva a crer que o foi. dando forma objetiva aos papéis rainhas. um antropólogo e um psicana- espécies nas quais. após o acasalamento. mas poden. filiação (pais e fi- circunstâncias ou determinantes culturais. tipos de relações pessoais que configuram mos também entre seres humanos em certas a família: aliança (casal). . sinônimo de catástro- formulemos um conceito de cunho operativo fe iminente. Crise consensualmente os respectivos questionamentos sobre a tem sido considerada uma expressão com autoridade parental. mentos que determinaram transformações restabelecerá a situação anterior de supos. vejamos quais são os ele- à espera de certa providência que. religiosos e culturais. As variações e/ou mutações dessas elas esteja ameaçada de destruição como três modalidades introduzem a discussão o querem algumas cassandras que nos últi- sobre a família na contemporaneidade. crise e aprimoram os modelos de convivência das instituições em geral. A A expressão “crise” tornou­‑se um lugar família é e continuará sendo. separo. isso não significa que abitem). bem­‑estar coletivo. Manual de terapia familiar – Volume II 19 Com essas considerações em mente. a partir dos objetivos genéricos de Os ideogramas em chinês para a pala- preservar a espécie. papel na preservação da espécie. Crise é um e que sirva de referência para as finalidades ponto conjuntural necessário – diria até in- do presente texto: família é uma unidade dispensável – ao desenvolvimento tanto dos grupal na qual se desenvolvem três tipos de indivíduos como de suas instituições. Assim. hoje está em crise. Feita a ressalva quanto à distorção do manente ou um estado de crônica insatisfação conceito de crise. a foi o termo impregnando­‑se através dos extensa (constituída por membros com la. quando muito estaríamos aludindo a mais uma mutação em seu ciclo evolutivo. longe do sen­ sob três formatos básicos: a família nuclear­ tido apocalíptico ou de ruptura com que (constituída pelo tripé pai­‑mãe­‑filhos). nutrir e proteger a des. o outro tem o sentido de “possibilidade”. com as correspondentes mudanças no É “crise” um conceito equivocado? exercício do poder no contexto familiar e Certamente. mos tempos andam anunciando sua morte. crise religiosa. nas suas origens eti­mo­­ló­ sificadas de transmissão de valores éticos. algo A “crise” da família que quiçá metaforicamente poderíamos nos dias atuais comparar a um salto quântico para níveis mais satisfatórios de interação humana. É utili. filiação crises ensejam o acúmulo de experiência e (pais/filhos) e consanguinidade (irmãos) – uma melhor definição de objetivos. “juízo” Consideramos ainda que a família. de. Nada mais errôneo. . aquisição de suas identidades pes­soais. ços de parentesco em geral) e a abrangente Assim. quando dizemos que a família (que inclui mesmo os não parentes que co. Fala­‑se em crise eco. significa “decisão”. ratório de relações humanas onde se testam tica. distingo. de tal forma e com que ensejem o melhor aproveitamento dos tamanha insistência e reiteração que o termo potenciais humanos para a criação de uma já não mais se reserva para assinalar algum sociedade mais harmônica e promotora de momento ou circunstância de exceção. apresentou­‑se cido. julgo). um labo- nômica. porém. conotação negativa. a palavra crise apenas­ estéticos. As relações pessoais – aliança (casal). senvolveu através dos tempos funções diver. tempos. gicas greco­‑romanas. nossa vida transcorre na vigência de n O movimento feminista e o reconhecimen- uma crise insolúvel e perene a rondar todos os to dos direitos da criança e do adolescen- setores de nossas circunstâncias. a par de seu comum em nossos dias. crise da família. crise moral. crise do casamento. para sinalizar uma condição per. crise polí. vra “crise” apontam para um duplo e antagô- cendência e fornecer­‑lhe condições para a nico sentido: se um deles significa “ameaça”. te. zado. Por sua vez. e que. (do grego krisis derivado de krino: eu de­ ao longo de sua evolução. no contexto das famílias contemporâneas e to equilíbrio e bem­‑estar ou nos remeterá à que se inserem na rubrica “crise” menciona- possibilidade futura de solução definitiva de da antes: um mal­‑estar pessoal ou social que nos aflige. “discriminação”. ao chegar. metade oda- mos o modo como se dispõem e se inter­ lisca. sim.. também se alinha nesse tabuleiro onde se lacionais. neste século em que acabamos de ingressar. pro. também pode ser bens materiais em geral. aquelas famílias que uma variante do comportamento sexual são provenientes da união de cônjuges com humano. metade sufragista (. assume con­ tentar a desigualdade social entre homens e figurações mais diversas e polimorfas. . n Instabilidades no mercado de trabalho e insegurança financeira dos responsáveis A questão do poder nas pela manutenção do lar. transicional entre a família nuclear burguesa tuais recasamentos e reconfigurações dos ocidental do século XX e a família adventícia sistemas familiares. ou seja. com ou sem fi- n Resolução das insatisfações matrimoniais lhos. O eixo em torno do qual gravitam as cessidade de torná­‑los autossuficientes transformações por que passa a família con- economicamente. entendida como “possibilidade de evolução” a submissão ­feminina sob o jugo patriarcal para novos e mais satisfatórios padrões re. temporânea.) é ela cúmplice ‑relacionam os elementos de uma mesma da discriminação de que é vítima”. teimorfismo esse que é uma propriedade segundo a opinião de algumas feministas. nina. como ontem. progenitores senis. relacionamentos anteriores. apoiado na evidência de que não há A família da “aldeia global” está. se esta pode ser tomada no sentido de hereditária da propriedade privada e dos “ameaça à desintegração”. a família está em crise. tações. em consonância com o pro- n Incremento da cultura consumista. razões biológicas nem psicológicas para sus- em gestação e. nou arrendatária. Essas famílias constituem o protótipo pela via das separações conjugais e even. nesse processo. mulheres. é possível enquanto a concubina exerce seus direitos cogitar­‑se da emergência de uma certa uni. do fenômeno da globalização. em razão dica do prazer pela posse do companheiro. famílias contemporâneas n Preocupação dos pais com fracassos escolares dos filhos condicionada à ne. como fulcro as relações de poder entre seus cia urbana com ameaças à integridade dos membros. permanece hoje. alie­ cesso evolutivo da sociedade humana. n Alteração de paradigma na sexualidade família. Carla Ravaioli (1977) observa: “a mulher Por configurações familiares entende. Em contrapartida. origens à afirmação do poder masculino para assegurar filhos de paternidade in- Portanto. Por outro lado. pela primeira vez desenrolam os jogos de poder: a esposa ab- na história da civilização humana. A família monogâmica prevalente n Mutações nos valores éticos da socie­ no mundo ocidental ainda hoje deve suas dade. sobre a província hedonista da qual se tor- formidade nos modelos familiares encontra. A conquista e a manutenção de es- n Avanços tecnológicos e progressos nos tados de poder são inerentes à condição meios de comunicação com marcadas humana e matizam todas as suas manifes- repercussões nos hábitos domésticos. garantindo assim a continuidade mas. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. E tais configurações se mostram humana pela desvinculação entre o particularmente complexas e com facetas ato sexual e a função de procriar e a inéditas nas famílias reconstituídas ou re- aceitação do homossexualismo como construídas. conteste. membros da família. pois.20 Luiz Carlos Osorio. dos sistemas em transformação.. dos em todos os quadrantes do mundo em O movimento de emancipação femi- que vivemos. tem nação pelas drogas e aumento da violên. que incorpora valores e características so- brecarga com os cuidados ministrados a cioculturais de todas as latitudes. n Aumento da expectativa de vida e so. ainda está longe de se concretizar. ou tirania dos dos de poder que favoreçam um ou outro filhos. ações de seus membros. pois. pois a te à etimologia da palavra “família” e a . dentro e fora do âmbito da família. isso quiçá intensificam­‑se as reivindicações Em outras palavras. É. foi ela paulati- dos desígnios do Poder? namente adquirindo a feição de uma agên- Parece­‑nos indiscutível que o senti. consoante a equiparação social dos cônjuges. necessidade de se encontrar outros pontos de de renúncia à posse exclusiva do objeto de equilíbrio na distribuição do poder e com amado. mulheres e seus pode nutrir em relação a seu rebento iguais descendentes nesta ciranda em busca do po. com o reconhecimento ao direito de ta de maior ou menor grau de sofrimento os filhos moldarem seus próprios destinos e psíquico por parte do indivíduo. e tal sentimento radica­‑se nos núcleos ções hegemônicas dos que detinham o po- narcísicos arcaicos da condição humana. de seus componentes. trouxe a sua respectiva maior ou menor capacida. cia modeladora dos desejos. esta também bustível que move homens. Essa situação prototípica vamos e cuja feição contemporânea aparece sob encontrar em todos os relacionamentos hu- a rubrica de “conflito de gerações”. para usar cológico. cia dos descendentes e servir de continente Como. o próprio suas necessidades. A fantasia primor. Em cada relação afetiva somos levados a Mas – indagarão alguns – a luta pelo reeditar o vínculo possessivo original com poder no seio da família não existiu sempre? a matriz que nos gerou. por uma disputa não é só o bebê que deseja tiranizar a mãe pelo poder. sentimentos de inveja recíprocos: os pais in. em última instância. Se originariamente reito e a “matercracia” de fato na chamada a família visava a assegurar a sobrevivên- família tradicional. regra. vínculo que pode assumir características sim- Do domínio do homem sobre a mu. E fala­‑se para servir a propósitos de busca de esta- agora em uma “filiocracia”. família. Voltando à primitiva relação mãe­‑filho: tada. o indivíduo deve poder despojar­‑se uma expressão derivada de nosso cotidiano do desejo onipotente de domínio e posse do consumista. Todo o agrupamento humano serve vejam nos filhos o vigor físico e suas possibi. A vida se encarregará de processo em curso de “democratização” da corrigir essa ilusão primária e o fará à cus. é alimen. Como as demais instituições huma- nômico que os leva a. de raízes judaico­‑cristãs. um der. A luta manos em que se reeditam esses jogos de pelo poder entre as gerações na sociedade poder que objetivam submeter o outro aos competitiva de nossos dias é polarizada por desígnios pessoais de cada um. por seu intermédio. tornando­‑se mutuamente exclusivo lher passa­‑se ao jugo dos pais sobre os filhos e totalitário. discutir­‑se a instituição familiar para as necessidades físicas e emocionais de sem considerá­‑la uma instância promotora seus elementos constituintes. seus membros. bióticas. pensamentos e mento de posse envenena as relações huma. como o conflito busca pelo poder não só escraviza tirano e de gerações e todos os demais estados de tiranizado como os infelicita. pois. No entanto. com seus impulsos possessivos. A família não foge a esta por sua vez. invejam nos pais o poder eco. como reação a “patercracia” de di. Filicídios e parricídios ao longo da história dial do bebê é que a mãe existe em função não são testemunhos eloquentes disso? Sim. nas desvia­‑se ela de seus objetivos originais monitorarem o destino dos filhos. a serviço de inten- nas. beligerância entre seres humanos. gurar uma “fatia maior do bolo”. os filhos. dele. em um bem­ de parte a parte. aos propósitos de instrumentalizar a busca lidades de usufruir no futuro as benesses do de alguma forma de poder para (ou entre) acelerado progresso tecnológico. der no seio da família. outro para que se criem condições de uma Quando nos referimos anteriormen- melhor qualidade de vida relacional. E o narcisismo humano é o com. no afã de cada um asse- ‑sucedido processo de amadurecimento psi. Manual de terapia familiar – Volume II 21 A guerra dos sexos. sentimentos de posse e domínio. unicamente para servi­‑lo e satisfazer indubitavelmente. dia a sexualidade humana tendo como parâ. a crescente pressão dos homosse. pela ascen. ser comum a todas as culturas desde tempos tamento como uma opção sexual equiparável imemoriais. vos da Antiguidade. Já o tabu do incesto. O exercício da sexualidade nem sem- pela necessidade de substituir posturas de pre esteve atrelado às questões morais. Fica­‑nos. um experimentado mestre. por exemplo. tencial dos seres humanos. Na Melanésia. não questão sexual para a estéril discussão sobre resiste ao mais elementar exame crítico. excretoras. a conduta em rela- sexualidade humana e ção ao sexo é bastante livre de restrições. ção carnal dos adultos. vinculada ao metro único a dicotomia entre os sexos. Em muitos po- competitivo de nossos dias. e entre irmãos. não pode cristãos. Por lidade por vê­‑la confundida com as funções outro lado. praticamente dissocian- promotora dos desígnios do poder. favorecendo­‑se os pos atuais indubitavelmente só poderão ser jogos sexuais dos impúberes e até mesmo compreendidas à luz das profundas modifi. A sexualidade humana. são da autoridade parental. entre pais e filhos. por não poder ser generalizada. a família contemporânea sendo a nudez consentida. oferece justificativas mais plau- socioculturalmente à conduta heterossexual síveis para o rechaço à sexualidade pela in- já não mais permite que se discuta hoje em terdição original. portanto. para que se a a indagação de por que. a supe- gira no mesmo compasso do atual momento ração de tabus e preconceitos pelo maior evolutivo da sociedade humana. anticoncepcionais e o aperfeiçoamento de sugeriu­‑se que a família fosse uma instância fecundação in vitro. aludindo à A crescente segurança dos métodos natureza possessiva das relações familiares. não se impedin- do as crianças de presenciarem a conjun- As metamorfoses da família nos tem. sobretudo entre os aborde sob um prisma integrador. permeia toda . até certo ponto ingênua. empenha. como também entre os aborígenes da Oceania e da América.22 Luiz Carlos Osorio. na. aumento da promiscuidade sexual. isso não aconteceu. Uma das expli- uma sexualidade feminina e outra masculi. bre o lócus da sexualidade no contexto exis- são do poder jovem e a consequente revi. o corpo e a sexualidade foram alvos ser dissociada – como de hábito o é – em de tanta repressão e repúdio. A noção de “pecado”. O eixo do o coito da função reprodutora. gressos da cirurgia reconstrutiva permitindo ções por que passa a família contemporânea a consumação do transexualismo. é a primazia de um sexo sobre outro ou das que o homem civilizado rejeita sua genita- vantagens e desvantagens de cada qual. então. rivalidade por um padrão de cumplicidade como ocorre na civilização ocidental a par- e solidariedade para fazer frente ao mundo tir da tradição judaico­‑cristã. a única interdição respeitada é a do tabu O novo paradigma na do incesto. Não se pode. que parece xuais para o reconhecimento de seu compor. conotamos à ideia de “servidão”. conhecimento da fisiologia sexual e dos psi- da em questionar as relações de poder entre codinamismos da sexualidade humana. Essa contraposição desloca o exame da e que. os pro- em torno do qual gravitam as transforma. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. aprendizagem sexual sob a supervisão de dade hodierna. o seus vários estratos. cações aventadas. em função da nova ordem a discussão sobre a chamada “revolução se- sexual e da redistribuição de seus papéis xual” no limiar do terceiro milênio e dando tanto no contexto familiar como no mercado lugar a uma bateria de questionamentos so- de trabalho. com o entender a família de hoje sem analisá­‑la à consequente recrudescimento das doenças luz dessa busca de um novo equilíbrio no venéreas e o advento da aids – eis algumas jogo de poder entre seus membros: entre das novas circunstâncias que vêm balizando marido e mulher. no restante. propiciando­‑se aos jovens uma verdadeira cações no comportamento sexual da socie. desejo e à atividade sexual. venéreas e sobretudo da AIDS. com relação à interdi. quebra dos preceitos. conquista da sociedade contemporânea e. nos privemos de todo o manancial de pra- nos. como se ingenuamente ao incentivar a poligamia e reprimir violen. até por admitirem o ca. a veiculação dos afetos e o estabelecimento cepção de Maria. conter seus avanços. condição indis- desconsiderar sua essência instintiva e per. transmissíveis tornarão irrevogáveis as con- A nova moral sexual. so tecnológico pelos males que dele neces- tória. Manual de terapia familiar – Volume II 23 a história da cristandade. de uma forma da família. a renúncia aos prazeres da desse novo paradigma moral que se esbo- carne e o celibato são associados à ideia de ça na esteira da revolução dos costumes santidade e de salvação religiosa. O aperfei- ciada pelo espírito religioso e da ruptura da çoamento das práticas anticoncepcionais e o sociedade contemporânea com os princípios gradativo controle das doenças sexualmente por ela defendidos. cio da sexualidade e constituiu­‑se até muito O argumento derradeiro dos que se recentemente no maior obstáculo à revisão opõem a esta salutar renovação do com- da questão sexual à luz dos conhecimentos portamento sexual é o aumento da pro- científicos e livre de tabus e preconceitos. ao me. considerada uma violação ao contrário do que apregoam muitos mo- dos mandamentos da igreja. assim como o fazem os muçulmanos. jovens em particular. e para Adão e Eva até o dogma da imaculada con. de vínculos amorosos é a tarefa primordial de. A prática da circuncisão entre os judeus tais como a maior incidência de doenças e da excisão do clitóris em certos rituais afri. O resgate da vocação do intercurso o laboratório de experimentação e análise sexual para a obtenção do prazer. vio social e nem ameaçará a sobrevivência samento de seus sacerdotes. sendo a sexuais. É a família. o cristianismo repudia o livre exercí. sariamente advirão. zer e intercâmbio afetivo que ele nos pode Tudo isto nos conduz à necessidade de proporcionar. a relação amorosa e íntima com outro ser tem por ela determinada suas distintas con- humano. diais motivações e necessidades humanas. de uma melhor qualidade de vida. ção da espécie. o direito à sexualida- mes que violentam a natureza humana por de plenamente usufruída. ao mesmo tempo em que genuína fonte de felicidade que se conhece: regula o exercício da sexualidade humana. malgrado todos os esforços da religião cípuos não podem ser argumentos para que institucionalizada para sufocá­‑la ou. figurações e objetivos. da sexualidade ou o desvio de seus fins pre- sível. isto é canos não fugiriam a esse contraponto entre como sugerir que renunciemos ao progres- religiosidade e sexualidade ao longo da his. hipocrisia. . ainda. humana que os administra. e sim da cupidez A assim chamada revolução sexual é. a virginda. e aos para a possibilidade de superação dos costu. livre de crítica dessa nova moral sexual emergente. não será ela responsável por ne- jam mais brandas do que o catolicismo nas nhum apocalíptico desregramento do conví- questões sexuais. Ora. a castidade. O uso perverso contudo. via satisfatória e criativa para acessar a mais A família. O livre exercício da sexualidade é uma ção do sexo fora das finalidades de procria. um processo em marcha e irrever. Na fé católica. livre dos tabus quistas feitas em nossa época no sentido de e preconceitos de ordem religiosa. um reordenamento dos valores éticos em É inegável o valor intrínseco da sexua- relação à sexualidade humana em razão da lidade livremente exercida para a obtenção caducidade da “velha ordem sexual” geren. que repousa sobre outras primor- geral. dos avanços da tecnologia. miscuidade e dos males dela decorrentes. ralistas de plantão que vicejam nas sebes da Embora as confissões protestantes se. ignorássemos que os inconvenientes não são tamente o adultério feminino. desde o mito de culpas e consequências indesejáveis. pensável para o enriquecimento afetivo da mite que se vislumbre a sexualidade como humanidade. aponta garantir aos seres humanos em geral. ma. ou único progenitor. tecnologias. correntes de certas conquistas da medicina . assim resume sua ideia da família mais uma impossibilidade neste “admirável do futuro: mundo novo” das tecnologias tangenciando milagres de outrora. de o homem gerar um filho em seu ventre. renomado futurologis. em das ideologias políticas como via de acesso que a força física deixa de funcionar como às utopias sociais. ainda no terreno das especulações. last but nos least. reservando em defini- lar de um casal. chamada família tradicional. com o advento das novas fator de desequilíbrio. hipótese de que os pro­gressos da engenharia do em que brotam. Esse proces. as denominadas “produções inde- pendentes” das mães solteiras. pela desvinculação entre o pra- gerôntico pelo poder jovem. a Vejo a sociedade evoluindo para um perío. prospectivo sobre a família de que trata este co com as demandas da natureza humana e tópico justamente por esta questão colocada provedor de um ambiente propício ao reco. haverá pessoas vivendo nelas. desvinculada dos processos naturais de fe- mãe e o filho trabalhando juntos. que se radica no poder da mente. A reprodução in vitro. como orientações sexuais contemporânea é inegável e. a igualdade de di- reivindicatórios dos direitos da mulher e reitos. prio Toffler observa que “ao deixarmos de É no seio da família de hoje – e não uma vez por todas uma economia basea­da fora dela como se poderia pensar – que a no poder do músculo e passando para outra revolução dos costumes sexuais está a ges. Para tornarmos o que sugere uma variedade muito mais mais concreto o significado dessa afirmação. na desvantagens fundamentais no caso das so transita pari­‑passu com os movimentos mulheres”. e. zer sexual e as funções reprodutivas e pela Que a nova ordem sexual é a pedra­ aceitação do homossexualismo. com papai. com o questionamento dos fundamentos das transformações por do autoritarismo em todas as suas formas. o relacionamento homem­‑mulher. mais sintôni. o passo seguinte será a con- relevo ao se tratar do tema proposto para sumação da separação entre o processo de este capítulo. ampla de relacionamento homem­‑mulher tome­‑se o inusitado de algumas situações de- do que existe hoje. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. por Toffler ao final do parágrafo anterior: nhecimento e adequada satisfação das ne. as “barrigas de A família do futuro aluguel”. Efetivamente. A revolução sexual em processo na trial para a era das telecomunicações e. Ao há como deixar de lhe conferir o necessário que tudo indica. O pró- cessidades sexuais de seus membros. a possi­bilidade Toffler (1983). ou uma dupla a seus praticantes – eis alguns elementos de de lésbicas criando uma criança. não assimiladas ao ethos de nossos tempos.24 Luiz Carlos Osorio. florescem e são aceitas genética permitam a clonagem de seres hu- muitas diferentes estruturas de família. assim como ‑de­‑toque das transformações na família do bissexualismo. como será também beneficiária imediata de Gostaríamos de iniciar o exercício um contexto menos repressor. isto elimi- tar um novo paradigma moral. mas não zatórias”. com a transição da onda indus. ou uma impacto capazes de por si só trazer novas e comuna ou qualquer número de outras mais profundas alterações na estrutura da formas. jeta no futuro sob a forma de um novo pa- ra do comportamento humano e o fracasso drão relacional entre homem e mulher. but not least. portanto. tivo o coito à função de proporcionar prazer reira. com a substituição do poder como vimos. manos com a reprodução destes totalmente Seja a cabana eletrônica. cada qual com sua car. ou um cundação e gestação. last contemporaneidade tem sido monitorada. que passa a família contemporânea e se pro- com a falência da religião como regulado. deveres e opções entre os sexos é um dos homossexuais. reprodução e as funções de “paternagem” ou “maternagem”. ta e estudioso do que chama “ondas civili. talvez A trajetória em direção ao amadure- venha a ser. pois. cujos inputs e outputs permitirão Por outro lado. primado da posse e domínio de uns sobre ção das tendências gregárias do ser humano os outros no contexto familiar. algo como a “cabana eletrônica” dades e desejos. com a mitigação dos impulsos narcísicos do Não obstante. somos confrontados com a inevi. a nosso ver. A maturidade da família alicerça­ pécie para o desenvolvimento físico e emo. na medida em humano? Uma espécie de laboratório em que gradativamente possamos abrir mão do que o respeito à privacidade e a relativiza. Manual de terapia familiar – Volume II 25 no setor reprodutivo. em um futuro mais remoto. ele necessitará ainda considerada isoladamente como a dos gru- do equivalente às funções de parentagem pos e instituições que formam repousam para sobreviver e se desenvolver. a família de ama. há um outro nível trans- rea­lidade. mesmo quando a gera. nos pertence ainda substitutos do escritório ou oficina de ou só existe para atender a nossas necessi- trabalho. sua inclinação para o exercício do poder so- tercurso sexual entre seus pais e quando sua bre seus semelhantes. para que servirão? Serão lhada por todos em relações de reciprocida- eles instituições voltadas para fins públicos de e mutualidade. a cimento emocional pressupõe a paulatina ser superada pelo progresso tecnológico. o bem­‑estar familiar é indissociável . de Toffler. articula­‑se no caso presente. ginal. homem e o consequente abrandamento de ção de um novo ser já não depender do in. nas relações familiares. a ins- cional dos bebês humanos. o universo familiar. tituição familiar tende a evoluir para níveis E como será. então. gestação já não necessitar do útero materno Tanto a maturidade dos indivíduos para nele se processar. aceitação das limitações humanas e a re- mas este não aposentará a necessidade de núncia à fantasia de que somos o centro do contato e convívio com outros seres da es. que. ou seja. como a condição da ser compartilhada por todos os membros da mãe que “empresta” seu ventre para a filha família como o foram no passado nas popu- histerectomizada para que nele se geste o lações rurais? produto da união das células reprodutivas Essas são indagações que nos são sus- da filha e de seu genro: ela será. não é mesmo? ciedade contemporânea. ‑se em postulados similares. transformações que se radicam nas con- bre o processo da aquisição da identidade sequências do progresso do conhecimen- dessa criança? to humano no controle de suas condições Quando a ficção científica torna­‑se físico­‑ambientais. seu despreparo para sobreviver pela com a ilusão de que este e os que o habitam precariedade de seu equipamento sensório­ estão aí para servi­‑lo. Mas. que é a do bebê que vem ao mundo ou seja. assim como o bem­ o contato e extensão em profundidade com ‑es­tar psicossocial do indivíduo está intrin- o mundo exterior sem ter de sair de casa e secamente vinculado à aceitação de sua onde a atividade laborativa poderá voltar a finitude. por sua vez. na o manterão protegido da massificação das medida em que aceitarmos que o universo megalópoles em formação? familiar é uma realidade vivencial comparti- E os lares. será irmão de sua mãe e impacto dos avanços tecnológicos na so- cunhado de seu pai. é preciso renunciar à fantasia Ou microcentros de convívio e lazer? Ou de que ele. Para usufruí­‑lo em toda como foram na antiguidade greco­‑romana? sua plenitude. membros e para uma maior aproximação rão novas modalidades de relacionamento à sua destinação histórica. sobre a renúncia à condição onipotente ori- A condição neotênica do ser humano. tureza humana e que. universo. avó citadas pelos rumos que tomam as mudan- de seu filho. ou seja. formativo que se processa no âmago da na- tabilidade de uma mudança de paradigma. ‑motor por ocasião do nascimento. a par dessas Já pensaram nos reflexos de tal situação so. além de ser ças na estrutura familiar acarretadas pelo filho de sua avó. mais satisfatórios de interação entre seus nhã? Um microcosmo em que se experiencia. Incrível. nossos anseios e ideais ao longo do périplo OSORIO. 2002. onde o direi- ação da sociedade através de suas células­ to sobre os filhos não terá primazia em re- ‑mater. estabelecendo um continuum de entre os casais não prevalecerá sobre o livre unidades sociais que permitam a perpetu. res. para Plon. quiçá em um Aires: Nueva Visión. OSORIO. C. A família. enfim. onde. F. Por dente aceitação por parte dos filhos de que exemplo. tempo não muito remoto. Terapia de famílias: existencial. tinto gregário do homem: onde a afinidade. e espontâneo vínculo amoroso. A família. é hábito as núcleos familiares. A aceitação por parte dos pais de que não são donos do destino dos filhos e de Nota que é inevitável sua perda pelo crescimen- to e disposição a formar novos e distintos 1. são condições básicas para balizar a maturi- dade de um grupo familiar. Roma: Saggi do às mais legítimas manifestações do ins. C. ao pas. E. onde a membros e torna­‑se mais apta a se desen. La questione femminile. onde o sentimento de posse ce- fadado a se dissolver tão logo cumpra suas derá gradativamente seu lugar ao anseio de funções de ensejar a constituição de novas doação. que não pereça e siga. está hoje tão viva como sempre. novas tendências. sendo o continente adequado para acolher 1996. se Gabriela Mistralde casasse com não podem deter o envelhecimento dos pais Pablo Neruda. C. presidirá a relação entre seus . se sintam em eterna obrigação para com os al. C. assinalarão o advento da maioridade social dade e mantém seus membros aglutinados da família. M. onde os pais não permite. mulheres adotarem o sobrenome do marido com a preposição “de” ao se casarem. com lembrança de um arquétipo definitivamente isso. Porto Alegre: Artmed. Anatomia de la família. L. no limiar desse novo giro PICHON-RIVIÈRE. o crescimento individu. na qual nada se perde. 1955. Em países de língua espanhola. como organismo social. o lócus apropria- RAVAIOLI. Record. de sorte que o sombrio retrato em uma perene disposição à possessividade dela traçado como um grupo formado por uns dos outros deixa de funcionar como um pais soturnos. A. 1981. Bompiani. sanguinidade. tempos. 1983. responsabilidade e não a culpa seja o ele- volver satisfatoriamente dentro dos limites mento básico a regular as relações familia- previsíveis de sua ação e existência. todas essas transformações so que a família que nega sua transitorie. P. Porto Alegre: Artmed. a autonomia­ e a diferenciação de seus filhos apenas porque os geraram. El proceso grupal. Previsões e premissas. Buenos Aires: quista em seu périplo evolutivo através dos Ateneo. 1958.26 Luiz Carlos Osorio. L’antropologie structurale. LEVI-STRAUSS. L. 1977. Mistral de Neruda. onde o contrato cível ou religioso famílias. Buenos em sua espiral evolutiva. bem como a correspon. mas tudo se transforma. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. da aceitação de que a família é um grupo membros. mães submissas e filhos ater- continente adequado para a definição e a rorizados permaneça apenas como a fugidia manutenção das diferenças humanas e. A família que aceita sua finitude lação ao direito dos filhos. através dos tempos. E. será. Paris: nada se cria. enfraquece seu papel cultural e adoece ultrapassado. Família hoje.. poderia se chamar Gabriela nem assegurar sua onipresença protetora. ipso facto. VALLE. Na obtenção dessas condições reside REFERÊNCIAS não só o maior desafio à família do futuro como também a promessa de sua maior con- ESCARDÓ. TOFFLER. Rio de Janeiro: e não apenas os laços de afiliação ou con. vincu- assuntos tratados. dos vidos aí: desistência da família. que faz sentido para nós. das atividades a serem propostas e começar a negociar essas visões com a até mesmo do tipo de serviço a ser oferecido. lação da família? Quando é o tempo de quados. ditamos que sejam mais viáveis em um sões e soluções ainda não tentadas. família? Com isso. Guy Ausloos. acre- rem sua competência e a experimentarem vi. n Como flexibilizar o espaço terapêutico tando a epistemologia das famílias que po. Na tentativa de traduzir essa específicas do atendimento. em A competência das famílias: que muitas vezes são diferentes? tempo. sem que isso sentença em ações cotidianas. casais e sível propor visões que comportem esse outros sistemas. enfocando o manejo do con. Que riscos e possibilidades estão envol­ lidades. que diz assim: “é acei. p. para que ele possa ser desenhado e re- demos levá­‑las a partilhar a nossa” (Ausloos. capítulo 2 Quem. dos momentos mais ade. contexto terapêutico. discu. momentos do nosso trabalho: e sem dar a impressão de que podemos fazer qualquer coisa. família se apresenta – e o quanto é pos- timos nossa prática com famílias. pedidos. o quê. caos. em termos de sua composição. processo. como terapeutas. sem desqualificar a visão da família? n Como pôr em prática a concepção de que Introdução o cliente é o especialista – e portanto a Um dos temas que mais nos tem envolvido pessoa mais qualificada para falar de si e na prática clínica com famílias e casais tal. eis algumas represente abrir mão de nossa maneira das perguntas que nos ocorrem em vários de trabalhar. de seus problemas – e ao mesmo tempo vez possa ser resumido em uma sentença de compartilhar com ele nossas percepções. sem critérios? Quais n O quanto é necessário acolher a família os limites e as possibilidades desse rede­ com o paciente identificado em seu papel senhar? . n O quanto é necessário atender a pe­didos ocupação com a criação e manutenção de um explícitos da família e o quanto é possível espaço multidimensional onde possamos nos negociar com ela a formu­lação de outros movimentar. 35). membro da família em outras posições? texto terapêutico e suas diferentes possibi. quando e como? Manejando o contexto terapêutico na prática sistêmica Flávio Lôbo Guimarães Luciana Monteiro Pessina A partir do referencial sistêmico e por de paciente identificado – que é como a meio de exemplos de casos clínicos. desenhado em função das necessidades 1996. ajudando as pessoas a resgata. procuramos demonstrar nossa pre. que nós. os “quês”. começaram um relaciona‑ cos. sa acham que podem estar contribuindo ção teórica não se dá em função de uma para que Dudu e o pai não se deem bem. Possui uma fi‑ Rey (1999) defende o valor do estudo de lha de pouco mais de 1 ano com sua atual caso como forma de investigação e produ. Dudu sição e olhar­‑se dentro do sistema terapêu. ex­‑marido de Ana e pai de Dudu. Para ele. Haley. recontá­‑la. Os desdobramentos mais recentes do campo trouxeram desafios à postura tra- dicional do terapeuta. Palazzoli et al. 1998). rísticas dos terapeutas. Por sua vez. legas de trabalho. que hoje está com 8 anos. tico. González também reconstituiu família. 2008. Segundo o autor. sobre o que fizemos.28 Luiz Carlos Osorio. Tiveram Dudu. “quan- 1979.1 enfocar nossas tentativas de desenhar mento e estão juntos há 3 anos e meio. quando vamos tratar do terapeutas” (Féres­‑Carneiro. procuramos. Conta que Leonardo (32). distintos têm a ver com as distintas caracte- Concretamente. haverá tan- to a quem vem à sessão. de que temas nos tas propostas terapêuticas quantos forem os dispomos a tratar. prática clínica e da pesquisa no processo . Antônio concorda e diz nada categoria ou teoria. que foi chamado a A terapia do menino adotar uma atitude de não saber (Anderson que nunca vimos e Goolishian. todas elas centradas Maturana. identificando as ressonâncias (Elkaïm. nasceu o filho do casal. fazer terapia. Há e redesenhar a terapia enquanto navegamos 4 meses. Antônio defende que o garoto está abstendo­‑se de encaixar de maneira a prio. dispomo­‑nos aqui a tentar olhar nos- dia e têm sido objeto de interesse para mui. sos modos de fazer terapia. “quens”. a assumir uma metapo. e esses modos mente no manejo do contexto terapêutico. Ana e Leonardo foram casados e complexidade. mas em função do po. 1996). ção de conhecimento. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. na nograma familiar para compreender melhor o pedido. Féres­ que levará a proposta para os demais. o que deu certo e o que p. por meio do casamento. terapia. 1997). construir percepções tos terapeutas de família desde o início (ver. insiste em 1990). ex. fenômenos. Citando com essas indagações. te‑ sobre a conversa diante da própria família lefona porque quer a opinião dos terapeutas (Andersen.. 1990. sobre a necessidade de seu enteado. p. 25). 354). Dispõem­‑se a conversar juntos sobre isso. Whitaker e Bumberry. relevância estatística. Contato telefônico 1996). 2005). A terapeuta pergunta como seria para eles a der de geração de novas ideias e ampliação proposta de reunir os dois casais para uma do universo conceitual que envolve determi- entrevista inicial. casado com Ana (32). a não tentar reduzir a complexidade dos problemas (Morin. Logo após o fim Neste capítulo. dos” e “comos”. ótimo e que não precisa de psicólogo. a buscar ativa- mente a competência das famílias (Ausloos. quê e de que maneira povoam nosso dia a Assim. sa prática. A ses‑ ‑Carneiro (2008) defende a articulação da são é marcada. a conversar Antônio (36). não deu certo. na multideterminação dos se divorciaram há 4 anos. 1988). (8). decisões que dizem respei.. a autora adverte que “há diver- na construção da prática e mais especifica. o Antônio coloca que ele e a espo‑ potencial de generalização de uma produ. dizer que a criança sofre de traumas em fun‑ par. 1988. que eram co‑ da discussão de exemplos de três casos clíni. Leonardo nesse mar de perguntas e desafios. ri as pessoas e os acontecimentos em seus A terapeuta solicita informações do ge‑ modelos e a se aventurar na incerteza. Ana e Antônio. a manter a mente sistêmica (Cecchin. Temos desenvolvido nosso trabalho de construção do conhecimento e no enri- na clínica privada em permanente diálogo quecimento da prática terapêutica. tudo isso sem patologizar nem cul. parceira (Letícia. É como se o terapeuta fosse convidado a ção da separação dos pais e que precisa de abandonar a proteção das certezas teóricas. realização da sessão à presença de todos. Dudu ligou para a cupados com uma nova tentativa de suicídio. o segundo pai de Dudu. Leonardo diz que isso gerou muito conflito. convocando os mem. é interessante no problema. nha a vir. algum subsistema. que do divórcio: “Ana quis se separar. 1988. 1998). (Anderson e Goolishian. percebemos o nível de mobiliza. Orientados por uma perspectiva porque achava que o enteado não precisava dos sistemas determinados por problemas de terapia. procuramos acolher um pela estrutura” (Whitaker e Bumberry. desde o tele. que. após o estudo cuidadoso do genograma. No telefonema. o Dudu não tem problemas”. e isso era parte do como problema. a vinda Whitaker costumava travar uma “batalha de Dudu. Leonardo definem o sistema terapêutico (quem) em não aceitou”. gurar maior multiplicidade de visões acerca bros da família extensa e condicionando a do problema. lados já se sentiam de alguma forma alijados ção o quê estava sendo definido por Antônio desse processo decisório. considera. auxiliou a negociar o desenho da primeira A opção de não convidar a criança esta- sessão. “na linguagem”. A descrição desse cenário nos também a atual companheira de Leonardo. 1988. os terapeutas origem (Andolfi. Manual de terapia familiar – Volume II 29 No caso apresentado. mãe e disse: “Meu pai está me levando para Na composição do sistema terapêutico. O conflito acerca da terapia nos in- nos motivou a explorar um pouco mais o dicava que devíamos fazer um esforço de genograma familiar já no contato telefôni. Podiam filho precisa de terapia.. Essa in. e não de exclusão. perspectiva se aproxima da de terapeutas Antônio passa a relatar sobre o período como Anderson e Goolishian (1988). to difícil: “Leonardo pediu que eu não visse organizados em torno do problema. também chamou a aten. no ano passado. Antônio: Dudu precisa ou não de terapia? jos diversos foram adotados pelos terapeu. Primeira sessão va uma etapa necessária da terapia de casal. mane. ao dizer que achava que ele notar que quem fez o primeiro contato foi e a esposa poderiam estar contribuindo o padrasto da criança em questão. mas recia estar relacionado aos traumas de seu também preocupados com um equilíbrio de filho. pois ambos os co. Antônio fala de sua Voltando ao caso atual. 1995). Ele pediu a nossa ajuda problema. Era para decidir isso que a família se dispu- tas para o convite ou convocação da família. que necessitaria de acompanhamento forças no sistema terapêutico. Os terapeutas es- perguntam aos dois casais o que os traz truturais e estratégicos faziam escolhas em àquele contexto. para atrapalhar a relação de Leonardo com formação sobre a organização do sistema o filho. avaliação psicológica sem perguntar à ex­ voque todos aqueles que poderão ficar preo. a definição de quem viria. 1990) sistema terapêutico que possibilitasse asse- com algumas famílias. levou o filho por con‑ vens internados após tentativa de suicídio. va calcada na própria questão trazida por Na história da terapia familiar. essa a psicóloga”. ou seja. passar uma tarefa secreta Antônio há duas semanas: “Eles acham que e assim por diante (Palazzoli et al. Para negociar a alta de jo. como os pais. já de início. Dudu por dois meses”. convidamos psicológico. Conta que o processo foi mui‑ função daqueles que estão. Murray Bowen. o que excluía. fazer uma Relata então uma briga que teve com Ana e aliança com eles. Para Leonardo. a volta de cada cônjuge para suas famílias de Após as apresentações. devido à sua preocupação com processos transgeracionais. ‑esposa sobre o assunto. inclusão. Conta ainda Haley. 1979). Por fim. Amo­‑o como amo ção do padrasto e o fato de ele se incluir . pois a separação en‑ convidar toda a família nuclear ou apenas tre ele e Ana foi traumática e afetou Dudu. o problema pa. relação com seu enteado: “Eu me considero fonema. Leonardo coloca que seu função dos objetivos que traçavam. ta própria a uma psicopedagoga para uma Ausloos (1996) solicita que o paciente con. . cebido a importância de quando abordar o Considera que o filho está bem em casa. enquanto nós nos comprometería- Dudu fica agressivo lá em casa”. o que nos faria pender ora para um lado. se. Refere­‑se ao fato Em nossa prática clínica. medo de Leonardo perder o filho faz com escapávamos do difícil papel de “juízes” da que ele não dê limite. algo. que um fala uma língua. por‑ no sistema terapêutico.” listas. nos mostrou o quanto sua participação era Letícia toma a palavra e todos se calam para importante para a mediação dos conflitos ouvi­‑la: “Primeiro vamos nos entender. optamos por não ex- Quando retoma sua fala. trocam de posições uns com os O clima emocional começou a se inflamar e outros. estamos preocu- escola e com os amigos e que está apenas pados com a construção do vínculo com as passando por uma fase de indisciplina e ciú‑ pessoas e evitamos a tentação de “desarmar mes do irmão que nasceu há poucos meses. como um ato desonesto. pois toma. Cada de Dudu. Diz que o mos a facilitar o processo de decisão. Ao fim da primeira sessão. Leonardo rea‑ plorar o assunto do divórcio. uma traição. e colocaria em risco nossa possibilidade de ajudá­‑los. Eu suas consequências. Uma discussão se duziu a conversa para o tempo presente e inicia. Após se posicionarem. O mundo diz não para a gente. que emergiam de ime- sinto muita raiva”. ao comando dos gundo eles. na quê. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols.) Isso foi feito nas nossas costas. . é interessante notar a conexão entre o presente (dilema acerca da terapia de Dudu) e o passado recente (o Segunda sessão divórcio).. tem o direito de saber questões? o que ocorre com Dudu. temos per- de Leonardo ter levado o filho à terapia sem que ela soubesse. Nessa Dudu é a demanda explícita do sistema. terapeutas. nem a disputa ge à fala de Antônio e diz diretamente para dos homens pela paternidade de Dudu. um deve se posicionar no tapete em relação O dilema em relação à terapia de a como gostaria que fosse com Dudu. O que poderia ocorrer se Ana complementa dizendo que tem a os terapeutas resolvessem abordar essas guarda e. Depois. o terapia. combinamos Diz que percebe que Dudu não se compor‑ que eles decidiriam se a criança faria ou não ta com ela e Leonardo da mesma forma que quando está com o outro casal: “Às vezes. para representar Dudu. pois recon- você é o pai do Dudu”. A ele: “Eu nunca engoli essa história de que fala de Letícia foi providencial. diato na sessão. Embora Ana e Antônio dis- cordassem da visão de Leonardo. Na primeira sessão. Nessa sessão. Assim. Pedem que cada um var Dudu à terapia da mesma forma como se posicione no tapete em relação à criança. Nesse trecho. Mas percebemos que a situação atual­ guarda da criança: “Leonardo entrou na jus‑ estava estreitamente ligada ao divórcio e tiça. portanto. feito pelas costas. Leonardo fez uma conexão entre os dois eventos quando percebeu traumas em seu filho. ora para o outro. colocando um objeto no centro do tapete ram o comportamento de Leonardo de le. também Os terapeutas propõem uma atividade. refletindo sobre como se sentem em culminou com o embate explícito entre os cada posição experimentada. “Isso vai fazer mal para questão e da posição de terapeutas especia- o Dudu. e como vê Dudu. pedem que cada um haviam tomado sua atitude de levar à justi- reflita sobre como se sente naquela posição ça o conflito em torno da guarda. Fala sobre a disputa judicial pela sunto. minas”. (. outro fala outra”. como se só houvesse duas soluções possíveis.30 Luiz Carlos Osorio. eles ligaram os dois momentos. Outra imagem dois homens: uma disputa pela paternidade é então solicitada pelos terapeutas. Solicitaram ajuda para decidirem esse as- meu filho”. e o clima da sessão fica bem pesado. oportuni- determinado por um problema. com padrasto e madrasta­ e com o ex­‑casal. Entre duas figu‑ sas de Dudu” favoreceu a negociação de mui- ras masculinas tão diferentes. daquilo que os havia trazido à cesso terapêutico. nas imagens. fora do tapete) suscita muitos ca da segunda sessão proporcionou muitas comentários. Ana e Antônio criticam a atitu‑ compreensões e revelou­‑se uma metáfora de dele. foi importante nos mantermos fle- do esse passado recente foi evocado na pri. Mais adiante. decidimos tratar do presen. outras questões fo- no lugar de Dudu. os terapeutas pedem que eles. sem saber para e projetos futuros. Em foi intercalado com os atendimentos do gru- primeiro lugar. xíveis o suficiente para redesenhar o contex- meira sessão e avaliamos como alto o risco to terapêutico de acordo com as necessidades de implosão do sistema terapêutico caso o que emergiam. decidimos tra. Alguns meses após o fim da terapia. com os homens. foi lembrada e entre mim e Leonardo”. surgiram duas demandas de terapia Ao nos prepararmos para a segunda de casal: a primeira com a mãe da criança e sessão. outra a respeito do como. Mas é a posição de Dudu nas duas A terapia prosseguiu por muitos encon- imagens a que mais suscita reflexão. a ajudá­‑los a ampliar o foco e a refletir sobre Isso porque já havíamos experimentado o problema apresentado. o divórcio. Antônio e Ana concordam com essa tos travados e suas consequên­cias. os confli- do pai. percurso. através das estavam iniciando uma ­experiência de guar- técnicas do presente­‑ausente e da inversão da compartilhada. imagem. Manual de terapia familiar – Volume II 31 de papéis (Moreno. Leonardo acrescenta que. 1993. Conclui que o filho precisa de um pouco mais de espaço continência para suportá­‑las: a rivalidade e relata que percebeu a falta que Dudu sente entre os dois homens. . e que seu sofrimento pudesse encontrar ex- No processamento da atividade. mente. a segunda. educação que Dudu pode ficar confuso. Letícia tros com esse sistema terapêutico. recebemos a notícia de que Leonardo e Ana zer a criança dramaticamente. Letícia imagina tas questões relativas a sua rotina. teve vontade de sair do ram surgindo. poderosa do jogo relacional do sistema em A relação entre os dois homens é também enfocada. observação de Leonardo. e o sistema demonstrou mais círculo: “Eu me senti sufocado”. com as mulheres. permitiriam aos adultos entrar em contato Leonardo então sugere que cada um expe‑ com a perspectiva da criança. os tera‑ pressão. o que é aceito por todos. tomamos duas decisões: uma a res. Leonardo afirma: utilizada para ilustrar falas dos participan- “Eu e o Antônio temos muita coisa para re‑ tes em sessões subsequentes. solver”. Em segundo lugar. Dudu estava sem‑ do canal de comunicação entre “as duas ca- pre de costas para alguém. Se. Seixas. um Isso por considerarmos que essas técnicas por vez. Para isso. Antônio diz: “Percebi uma tensão questão. no início da terapia. À medida que a demanda qual lado se voltar. em vez de dade em que os terapeutas se dispuseram a nos enveredarmos pelo caminho tentador realizar quatro sessões pon­tuais. explícita foi atendida. realizaram­‑se sessões com cada um dos ca- sais. Ao longo de todo o como o clima da sessão se tensionara quan. 1992). A abertura ressalta que. po de quatro. Até então. experimentem a posição de Dudu. cujo atendimento conjugal peito do quê. os adultos estavam preo- peutas exploram as impressões e sentimen‑ cupados com seus conflitos e apresentavam tos de cada um. passado fosse enfocado muito prematura. após o fim do pro- te. com o pai da criança e sua terapia e os configurava como um sistema atual esposa em situação de crise. A dinâmi- (mais distante. de forma que rimente a posição de Dudu na imagem ante‑ esta pudesse ter voz no sistema terapêutico rior. A posição inicial de Leonardo dificuldade de enxergar a criança.­objetivando das consequências relacionais do divórcio. dizendo que se coloca como vítima. ou seja. Por muitas vezes. seu atual marido. os terapeutas con‑ cordam em se centrar nos assuntos re‑ Percebemos um bom vínculo da famí- lacionados à pauta educativa do filho e lia com a psiquiatra e julgamos que seria propõem sessões com diferentes subsis‑ interessante buscar uma aproximação com temas. sem jeito e Marcelo revela sua preocupação com busca a cumplicidade dos terapeutas. diz o pai. Dessa união dos. no en‑ ou se eles não sabem mesmo conviver com tanto. a psiquiatra nos mostrou que ela foi a prin- mente. linguagem comum. como haviam conseguido retomar sua competên. de um genitor quanto ao modo de pensar Paula. associada ao que deno‑ predomina. “Seu prejuízo escolar. Conta que seus objetivos. Maria fica acuada. Maria espera que a terapia o filho apresenta transtorno de déficit de “seja um espelho”. Marcelo conta que ele as dificuldades do dia a dia acabem: sua ti‑ e Maria têm opiniões e atitudes diferentes midez e o relacionamento entre os três. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Maria vive e ser do outro. é perguntado a cada que os conflitos constantes entre os pais membro acerca do sentido da terapia e de agravam a situação de Daniel. Daniel diz que quer que ligente”. A conversa com . ao fim da terapia. Ao fim da sessão. Daniel o filho. Após a apresentação dos te‑ mina “fatores endógenos”. que está hoje com 23 anos. Marcelo deseja “identificar os nós” que eles mas concordam com o acompanhamento trazem para Daniel. notamos sua preocupação não só mediação.32 Luiz Carlos Osorio. Relaciona isso à tas de forma breve. entre minas terrestres Contato telefônico Primeira sessão Marcelo (53) informa que foram enca‑ Mesmo com o esforço dos terapeutas minhados por uma psiquiatra que está tra‑ para se centrarem nas apresentações. linguagem adequada. mas é a fala dos pais que separação do casal. à ex­‑esposa. respondendo às pergun‑ tamento retraído. menos com os pais (como). realizando sua ­comunicação através cipal incentivadora da terapia familiar. conta que quer saber até atenção (TDA) e tem tido dificuldades de que ponto não respeita a opinião do outro socialização. mas com outras questões. a relação de Marcelo e a enteada Paula. a terapeuta pergunta sobre a família. para os assun‑ tos relacionados a ele. que vem apresentando compor‑ participa da sessão. para que a família desenvolva uma essa profissional. Os terapeutas percebem um nível de tiveram Daniel. Restava saber se tais questões seriam tra- zidas pela família como possíveis temas de O adolescente que caminhava terapia. é muito pequeno. que está hoje com 12 anos. des‑ tando de seu filho Daniel (12). Ana e Leonardo com Daniel. tensão significativo e uma posição crítica Maria já tinha uma filha de relação anterior. Na de Dudu. relacionados a Daniel irrompem na conver‑ Marcelo e Maria (45) foram casados por 9 sação o tempo todo e precisam ser maneja‑ anos e estão divorciados há 11. pois é muito inte‑ opiniões diferentes. tímido. Marcelo relata rapeutas e da família. amorosa de cada um na fase pós­‑divórcio. conforme as palavras voreceria a vinculação com a família ou ao de Marcelo. A agressividade de Marcelo com os filhos. comum. De forma de o início da sessão. em relação ao comportamento do filho. Acreditamos que isso fa. os pais mal conseguiam suportar­‑se mutua. pois ele faz críticas diretas o divórcio. pontos de conflito breve. Revela sua preocupação psiquiátrico e têm bom diálogo em relação com as dificuldades do filho e quer falar uma a esse assunto. as cia para colaborarem como pais em favor do questões não resolvidas do ex­‑casal e a vida bem­‑estar de Dudu. de Antônio e finalmente de nossa ocasião. Marcelo vive sozinho desde é mais explícita. perguntamos se esse problema seria capaz calada complementar (Watzlawick. minas apontadas pela família foram. alguns assuntos eram “potencialmente ex. buscando localizar as mi. zer a vida afetiva” suscita outra queixa de peutas fazem uma escolha desse tipo é o Maria. muita Nessa sessão. a queixa de Maria ansiedade pode emergir no sistema e con. psiquiatra quanto na de Marcelo. outro. ram o essencial. reconhecido já no contato inicial que a sepa. Conta que Marcelo nunca outras questões presentes tanto na fala da exerceu um papel de pai na vida de Paula. “família de Maria”. do ajudar a família a desativar as minas de terior. pois paradoxalmen- O recorte adotado não negligenciava as ou. Decidimos peito”. das minas foi fundamental para a redução te delimitado: o terreno da parentalidade. amplificando sua voz. te nos permitiu falar do potencial explosivo tras questões identificadas pela psiquiatra. como no caso an. Beavin de determinar um novo sistema terapêuti- e Jackson. como um espião. em uma sessão com a presen. mais uma vez.. Por mostrar à família que havíamos captado es.. Quanto menos atenção se habitual (o filho). nesse momento. A identificação qualidade das relações. solicitamos aos três que o divórcio e conseguissem separar os temas fizessem uma representação do “campo mi. do não reconhecimento e dos desencon- ração e os conflitos entre os pais agravavam tros nas tentativas de agradar um ao outro. “a comunicação dentro da acolher o pedido da família e enfocar o tema família”. “o passado”. Durante o intervalo. tratar dos temas mais delicados. elaboramos uma carta para nas que poderiam explodir quando pisadas o ex­‑casal (Palazzoli et al. processo terapêutico evoluiu. dos os seus passos. 1967). dos assuntos sem abordar o seu conteúdo A escolha de o que tratar. esse tema emergia como principal assunto e seja pelo conteúdo de sua fala. avaliando que o espaço terapêutico ela se queixa da ausência de vínculo entre ainda não seria capaz de dar continência a ele e a enteada. relacionava­‑se de forma inequívoca à esfe- tribuir para que um membro se encarregue ra da conjugalidade. mas que não trataríamos deles nidade de intervenção que poderia contri- inicialmente. Avaliamos os riscos de aceitar e de não de tensão que se instalava entre nós. em que . subjacente à demanda Mudando de assunto explícita. buir para o bem­‑estar de Daniel. Quando isso ocorre. que havia Ambos falam da frustração do casamento. do nível de ansiedade. E. seja por seu não reconduzimos a conversa para o tema comportamento. 1988). tentadora de nos enveredarmos pelo terre- no da conjugalidade. Decidimos assumir que de trazer esses temas. mas com um recor. da conjugalidade dos temas da parentali- nado” da família. Optamos por aceitar a demanda explícita nesse primeiro momento (quan. Então. Em uma sessão com Marcelo e Maria. pois essa dimensão pulsava. (Boscolo et al. o tema “refa- Um problema comum quando tera. que aceitar essa nova demanda. Chegando ao tempo presente. 1993). Por um lado. do). passamos a bros da família. a situação de Daniel. pelo nível co. vibrante. perderíamos uma importante oportu- ses assuntos. “a confiança e o res- qualidade das relações entre eles. procuran- Aqui. à medida que o foi guiada pela demanda explícita dos mem. Percebíamos. As dade de diálogo. Manual de terapia familiar – Volume II 33 Apesar do clima de tensão e da dificul. dade. entre bro confluem para a preocupação com a outras. em que os pais elaborassem um pouco mais ça de pais e filho. nos dá. na medida Assim. os pedidos de cada mem. mais amplificação se produz em uma es. nos deparamos com a possibilidade maneira segura. inadvertidamente por estarem ocultas. perguntando para ele to- vido ou achar que os terapeutas não capta. “Paula”. que diz que o ex­‑marido usa Daniel sistema ou algum membro não se sentir ou. Marcelo poderia sentir­‑se atacado e recusar plosivos” e sentíamos que precisávamos o tema ou mesmo interromper a terapia. sobrepeso. não apenas do o bastante para que eles concordassem como testemunhas. onde se conheceram. de tal forma que se pudesse falar do casa. diagnóstico de TDA. Pela primeira vez. dando consequência ao fato de termos escu- to relacional. seus pais. sões (quem). era o filho. riscos seriam calculados. Fizemos. redefinindo o problema: se antes tros sentimentos. tratávamos abertamente do passado conju. planejamento e a realização de um ritual. referente às preocupações Primeira sessão com o filho em comum do ex­‑casal. tos do passado. trazida por ambos. Maria e Marcelo contexto protegido. em que falar diretamen- concordaram e se encarregaram de convi. Vitor traimento. anos e é administradora. nos deparamos com um quadro de triangulação. Assim. cabendo aos terapeutas a negociação Trafegando em de qual delas seria terapêutica para quem. sem avanços. ao final. assumi- Nas sessões seguintes. pôde ser retomada em um tom significativa- nos futuros de cada um. das perdas e dos pla. o que algumas sessões. a terapia ‑nos de conduzir o ritual como facilitadores. que se repetiam em forma teve o efeito de um choque elétrico para ele. a pauta inicial centrada em Daniel mento. o quê e como). em nos deixar propor novas perspectivas tes de apoio para cada um. ajudar os pais divorciados a manterem seu gal e expressávamos nossa opinião de que vínculo (função do sintoma).34 Luiz Carlos Osorio. mente mais tranquilo do que quando a famí- Esse caso é um exemplo de como a lia chegou: as minas principais tinham sido pauta da terapia se transformou ao lon. do ex­‑casal ocorreu no meio do percurso e. mas também como fon. que não queria mais sentimos patinando no mesmo lugar durante retomar o relacionamento entre eles. desarmadas. O vínculo entre os cial que pudessem acompanhá­‑los à terapia pais e os terapeutas já havia se desenvolvi- para participarem da cerimônia. levando ao redesenho do pelo terreno. mos o vértice do triângulo correspondente nal permitiu uma mudança significativa na ao filho. so ponto de partida: aceitar a pauta trazida so de divórcio. pela família (o quê). A família chegou com uma queixa. rota de colisão quando e de que forma. contudo. lidam com os assuntos do filho. como tristeza e mágoa. o clima emocio. e era menos perigoso caminhar go do percurso. pela primeira vez Nessa etapa da terapia. tratamento psiquiátrico – como forma de . Foi aluna de Vitor na faculdade. Muitas vezes. Vanessa tem 45 arcando com prejuízos para si mesmo – re. Esse foi nos- eles ainda não haviam completado o proces. nós o diferenciamos de sou a dividir espaço com a expressão de ou. decidimos elaborar uma intervenção que um movimento mais arriscado: propor uma os ajudasse a compreender essa mudança nova mudança na pauta terapêutica para in- e a empreender a reorganização necessária cluir a dimensão da conjugalidade (o quê). para dar seguimento à vida no novo contex. que dizia respeito às mágoas e ressentimen- o chá de divórcio. da separação. Assim. havia um mento inicial com a ideia. Encarregamo­ (quando. e os dar pessoas significativas de sua rede so. então. em sua complexidade. O tom agressivo pas. A intervenção escolhida foi o tado uma outra queixa. se claramente a Marcelo. e conteúdo. Apesar do constrangi. contexto terapêutico. a família traz múltiplas pau- tas. agora passa a ser como os pais Após uma sessão em que Maria dis. te desses sentimentos seria permitido. com o filho desem- penhando o papel de paciente identificado e O casal se apresenta. nos em todos aqueles anos. Nesse primeiro momento. Aos poucos. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. liberando­‑o de comparecer às ses- qualidade do diálogo. ao fim do ao outro desde o primeiro momento. em que não continuar. decisão do casal quanto a fazer ou não te‑ nas em desqualificar a fala do outro. sua tensão pessoal e profissio‑ grado com as sessões. senti um lixo. ele revela sua mágoa. após a repetição da Quando perguntados sobre o sentido da mesma dinâmica de acusações e desqualifi‑ terapia. Questiona a necessidade des‑ sessão que tem dúvidas sobre eles precisa‑ sa ruptura: “Eu quero entender por que a rem mesmo de terapia. rapeutas. O contrato de trabalho é de cinco terapeutas não possuem dificuldades para encontros. muitas vezes. que usam sua espontaneidade volutiva das impressões dos terapeutas. e o comentários da esposa. Fala do estresse e do ponto de ruptura Um dos terapeutas comenta ao fim dessa em que estão. “Ele é um ser humano que eu eu não sou. isso”. atividades previamente planejadas pelos te‑ mica. Em uma colisão. eu tô A fala de Vitor vai além de seu compor­ sempre errada. Quer me transformar em alguém que diminuída. possível”. Fomos qual retornam à sala dizendo que a terapia tragados pelo jogo relacional do casal e. Na terceira sessão. Deixando o tom marido. gente chegou aqui”. concluí- com dificuldades de manejo. Vitor finaliza a sessão dizendo: “Ela me maior parte do tempo. nos sentimos como se es. e um último encontro para a de‑ rismáticos. mas ape. É im‑ admirava.” Vanessa conta que é como tamento habitual de criticar e rebater os se ela fosse a condutora de um carro. Manual de terapia familiar – Volume II 35 Terceira e quarta sessões tem 53 anos e também é administrador. Eu persigo um alvo móvel. Compara a fase da esposa a uma “cri‑ funcionando como um “púlpito acusatório” se da adolescência” e diz que a terapia não para Vanessa desferir suas críticas e insatis‑ vai emasculá­‑lo como homem. Vanessa chega dizen‑ o marido disse. de consultoria com o objetivo de facilitar a ponder às perguntas do mediador. a seu ver. ção. Vitor reage de forma usou e agora está me dando um chute”. Ele está sempre certo. Oferecem então um serviço os debatedores não se preocupam em res. Eu me no que fez e tem de melhor. sendo quatro de avaliação. especialmente os terapeutas bem ca. não quer prosseguir. Vitor coloca seu desa‑ Vanessa. Estão casados há cerca de 16 anos e têm uma filha de 9. Vanessa confirma o que Na quarta sessão.) A gente tem uma química muito superior a Nessa sessão. Fala com bastan‑ Vanessa se sente emasculada de alguma for‑ te ressentimento: “Vanessa quer o homem ma. pois o mari‑ vórcio pela primeira vez no ano passado. Vanessa reage dizendo que está sempre ideal. do estava usando a fala do terapeuta para Vitor então fala da competitividade de questionar a terapia. o casal conta que Vitor está sente necessidade de uma discussão da rela‑ questionando a terapia... Não é o nosso caso e por isso estávamos Na discussão do intervalo. de outro. Ela quer descobrir se há alternativas para os que afirma se sentir bem com o marido na dois. está nal. contando que falou sobre di‑ do que está com muita raiva. nas se tornou um motivo de briga e que não sessões seguintes. com manejar uma sessão com esse tipo de dinâ. (. fações em relação a ele. ção faz emergir uma nova fala de Vanessa. me ajudou muito. não conseguimos inter. que. Vitor revela que se sente traído Mas também foi muito duro comigo. Vitor diz que desde o ano passado cações mútuas. positiva ao comentário da esposa: “Família é a coisa mais importante para mim. Para ele. Essa revela‑ sões muito diferentes do mesmo evento. mos que o desgaste do casal em relação à . têm condições de decidir se o casal deve ou tivéssemos em um debate político. vir na torrente de críticas de um em relação Os terapeutas solicitam um intervalo para refletirem sobre o processo. para ocuparem um maior espaço na sessão e influenciarem o tom e o ritmo da conversa- ção. têm vi‑ irônico. Muitos rapia. que pensava que o durante a consultoria. os consultores perguntam de casal. o casal re‑ somava­‑se o sentimento de estarmos encur. pêutico (como). Com isso. Vanessa opta por não fazer sugeríssemos a interrupção dos encontros. do processo. A proposta da consulto- surgiu a ideia de propormos uma consul. foi inevitável a mento. Diante do ex‑ se? Se continuássemos a oferecer terapia posto pelo casal. o sistema terapêutico inteiro. o casal confirma até então. Mas percebíamos dades planejadas e estruturadas (linha da que não avançávamos. Cada um deles conduzindo em relação ao casamento. escultu‑ tas. É como se a intervenção tivesse consegui- guagem profissional do casal. completamento de frases. Se sobre a terapia. e enxerga uma luz no fim do túnel. renovação. e para nós a proposta de A consultoria consultoria representou uma forma de nos assegurarmos um lugar mais confortável. Apesar das últimas falas da quarta sessão sugerirem certa abertura para um trabalho terapêuti. alterando. se ser realizada. mas para o contexto tera- Para dar uma resposta a essa questão. Nos encontros rizontalizada e colaborativa (Anderson e subsequentes. ria mudou o sentido de os quatro estarem toria ao casal. objetivos bem delineados. propõem dinâmicas e ativi‑ Goolishian. como terapeu- vida. de forma adequado naquele momento por trazer substancial. de tal forma que a viagem pudes- nado. planeja. O “debate político” não fazia sentido den- tro do contexto de consultoria. Vitor revela a sua felicidade com a decisão da esposa de ”se seu próprio veículo. já que definíamos unilateralmente so- tores. 1998). desaparecíamos nas sessões. O casal deixa elevando­‑nos um pouco acima da posição do a condução dos encontros com os consul‑ casal. Vanessa afirma que casal precisava de terapia e desejava isso. um conjunto de significados afeitos à lin. 1988. . de atropelamento dos terapeutas. dela e do casal. adotamos um novo equilíbrio de forças. contrariado. pois. metodologia definida e avaliação mudança do jogo conversacional anterior. terapia. o que ficou mais evidente foi a dinâmica ficativa não foi direcionada para a relação de polarização e impasse. fa­ríamos aliança com Vanessa. a opção pela consultoria. que exploram diversos aspectos de bre o que conversaríamos e como faríamos suas vidas. adota uma visão mais otimista do prejudicial. Apesar de surpreso e um pouco nos aliaríamos a Vitor. foi de perspectivas. pensávamos em condu- sultores imediatamente iniciam a ativida‑ zir as sessões dentro de uma postura ho- de do genograma familiar. posturas mais colaborativas. a adoção da postura de especialistas que proporcionou um contexto colaborativo. Vitor concorda com a posição havia risco de colisão dos veículos e também da esposa. conjugal em si. sente uma Vitor. que pensava que a terapia estava sen. O “debate político” dá lugar a res. Como sair desse impas- recuperar para a caminhada”. envolvendo do ajudar o casal a escolher um veículo e as ideias de contrato por tempo determi. Paradoxalmente. já que vínhamos tendo dificuldades de manejo Duas semanas depois. uma rota. a intervenção mais signi- co. dinâmica das sessões era evidente e se re- fletia em nosso próprio desgaste. O termo consultoria soou reunidos naquela sala. Nesse caso. deixando ra do casal). vela os avanços em seu relacionamento ralados entre Vanessa. Sentimos que aquele espaço estava por um fio. A isso. A dinâmica das sessões mudou. No encontro de devolução. A dinâmica dos encontros se o casal em rota de colisão. representação do espaço dele. Como consulto- transforma.36 Luiz Carlos Osorio. e os agora con‑ Inicialmente. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. proporcionando uma ampliação isso em cada encontro. Nas duas hipóteses. p. tal forma que a adoção de uma determina. Psicodrama. A. . Rio de Ja- buscamos um rearranjo. 371-393. pode ser mais adequado para o processo te- AUSLOOS. des a serem propostas e ainda do tipo de serviço a ser oferecido. L. Noos. J. procuramos acolher o sistema terapêutico da forma como chega para nós. Assim. In: ANDOLFI. M. não me ame: aborda- o tempo. A. T. Se você me ama. O casal Possuímos concepções acerca do que em crise. L. v. das ativida. Para isso. procuramos criar e manter gem sistêmica em psicoterapia familiar e conjugal. 4. G. (Org. O próprio desenvolvimento do cam. e levando em conta que se trata exatamente disso em terapia – ajudar o cliente a recupe. um espaço multidimensional em que possa. H. 1. e não Milão: conversações sobre teoria e prática.). é preciso que essas concepções façam sen- BOSCOLO. H. essa postura não signifi. 21. algumas informações com o objetivo de pre- logo de início. 1998. J. Pesquisa e prática clínica: resgatar sua competência e a experimentar construindo articulações teóricas. v. tems as linguistic systems: preliminary and evolv- dos momentos mais adequados. Manual de terapia familiar – Volume II 37 Considerações Finais das necessidades que percebemos em cada caso particular é que tentamos selecionar Partindo do pressuposto de que as pessoas desse acervo aquilo que pode nos ajudar a procuram ajuda psicológica quando se sen. S. forma. Porto apenas para nós. n. ing ideas about the implications for clinical theory. 3. tem incapazes de resolver seus problemas. dos assuntos tratados.. muito rápido ou muito devagar. CECCHIN. Referências quando vem e falando o quê. Isso significa evitar posições a priori no que se refere a ANDERSEN. 1995. p. uma escola ou perspectiva não precisa ex. Porto Alegre: Artes que fazemos escolhas durante o processo. et al. Foram utilizados nomes fictícios e alteradas mos construir uma prática que não restrinja. F. 2008. In: MCNAMEE. Nova Perspectiva Sistêmica. buscamos mudar a pauta. terapêutico. 1999. No entanto. GONZÁLEZ REY. se não avan. 10. São Paulo: acervo de práticas. 1990. 1993. n. 1997. 27. Belo Horizonte: Interlivros. Na prática. p. de EDUC. Processos reflexivos. xão e crítica. Médicas. MORENO. C. Family Process. Psicoterapia familiar: um enfoque centrado da forma de manejo mais identificada com no problema. Nota rar a confiança em sua própria competência para lidar com seus problemas –. A os casos discutidos. C. o especialista: a abordagem terapêutica do não- e nem mesmo aceitação incondicional.. Lisboa: Climepsi. Rio de Janeiro: pessoas. Alegre: Artes Médicas. as possibilidades do processo servar a identidade das pessoas. A competência das famílias: tempo. La investigación cualitativa po da terapia familiar proporciona um rico en psicología: rumbos y desafíos. Com saber. conceitos e teorias. J.. G. processo. Se caminhamos neiro. ANDERSON. procuramos demonstrar terapia como construção social. GOOLISHIAN. ANDOLFI. cada momento. SACCU.. tempo e conteúdo.. O cliente é ca ausência de manejo ou de diretividade.. 1996. M. L. K. Crise de casal e família trigeracional. HALEY. 1979. M. 349-355. H. ajustamos ELKAÏM. mos nos movimentar. GERGEN. Ou seja: quem vem. Psicologia: refle- visões e soluções ainda não tentadas. A partir 1993. 1988. v. ÂNGELO. 1996. GOOLISHIAN. procura. Human sys- de sua composição. T. A terapia familiar sistêmica de tido para todo o sistema terapêutico. São Paulo: Cultrix. negociamos o espaço terapêutico em termos ANDERSON. São Paulo: Summus. Campinas: Papirus. ajudando as pessoas a FÉRES-CARNEIRO. 6-15. H. rapêutico. Exercícios para manter sua mente Se não progredimos com uma configuração. como vem. çamos na pauta. sistêmica. mas também reconhecemos que caos. cluir a priori outras possibilidades. Paradoja y contraparadoja: un dos padrões. 1990. com a família. uma abordagem simbólico-experien- São Paulo: Aleph. Buenos Aires: Paidós. . JACKSON. D. BEAVIN. cial. J. 1967.. D. W. 2005. patologias e paradoxos da interação. WATZLAWICK.. 1992. 1988. Pragmática da comunicação humana: um estudo PALAZZOLI. Introdução ao pensamento complexo. São Paulo: Cultrix. C. A. H. MORIN. Dançando SEIXAS.. Porto Alegre: Sulina. E. BUMBERRY. WHITAKER. D. et al. M. M. R. P. Porto Alegre: Artes Médicas. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. nuevo modelo en la terapia de la familia de transacci.38 Luiz Carlos Osorio. M. S. Sociodrama familiar sistêmico. ón esquizofrénica. Como identifi- situações­‑limite e de difícil manejo. a pesquisa. capítulo 3 Famílias com crianças e adolescentes em situação de risco CYNTHIA LADVOCAT Dedicatória: Às crianças e adolescentes que viveram o risco e que conseguiram recuperar seus direitos. da Suíça. mas principalmente da Portanto. o desamparo. Participar das questões psicossociais e na ­comunidade. é um desafio contextualizar a prá- experiência de estudo e supervisão de casos tica do atendimento de famílias com crian- na ONG onde atuo. o risco? Como identificar a competência das terapeuta deve ser competente para buscar famílias para a superação? Quais os recur- os recursos para a investigação. E deve contextualizar que emolduram os casos de risco enriquece essas ­informações nas diferentes etapas a prática clínica de difícil manejo. deve identificar os recursos potenciais den- parados ou em vias de se separar de suas fa. E às que continuam com a esperança de uma vida sem riscos. o terapeuta e comunitária de crianças e adolescentes se. INTRODUÇÃO A escalada da violência e os problemas sociais demandam o fortalecimento das fa- Neste capítulo introduzo o tema de mílias para suportar o caos. sos terapêuticos válidos para a intervenção a formação. o abandono adolescentes vivem em risco? Frente a casos e a violência? Como identificar os fatores de de difícil manejo em contexto de violência. bilizantes? Como transmitir em um texto lescentes em risco é parte da minha história essas vivências? A escrita em um artigo se clínica de consultório e de clínica social do revela superficial nos seus aspectos teóricos. Como car a resiliência da família? Como trabalhar trabalhar com as famílias cujas crianças e com o desapego. Instituto Mosaico. na rede de parentesco mílias. certamente. incluindo as gerações . A A IDENTIFICAÇÃO ABTH passou a se articular diretamente com DAS SITUAÇÕES DE RISCO esferas governamentais e com outras orga- nizações do Terceiro Setor. viços e a jurídica? Como o terapeuta lida O meu crescimento pessoal com o com seus impasses frente a casos tão mo- atendimento de famílias com crianças e ado. tro e fora da casa. da his­­tória de vida. O foco da ONG é No trabalho com famílias com crian- a garantia do direito à convivência familiar ças e adolescentes em risco. Terra dos Homens (ABTH) iniciou suas ati- vidades em 1982 como um programa filiado à Fondation Terre des Hommes. A Associação Brasileira ças e adolescentes em risco. a prevenção e a intervenção em de crise? Como incluir toda a rede de ser- terapia de família. necessariamente. quanto da geração mais nova. passadas. n o motivo do encaminhamento. n evasão escolar. o n capacidade de colaboração para o traba- terapeuta deve estar atento às questões di. situação­‑limite deve ser capaz de superar n o reconhecimento dos aspectos positivos seus conflitos com a transferência de apoio nos membros e nas interações. em si não denota. razoáveis. para a avaliação do risco das crianças e ado. É importante avaliar a resiliên. me. n sentimento de desamparo e impotência. n ambiente de miséria. n dificuldades no primeiro ano de vida de Avaliação da dinâmica do primeiro uma criança. n dependência química. ve risco à integração da família. um comportamento problemático n quadro de patologia grave. lho terapêutico. n o vínculo afetivo. n as expectativas e os receios em relação ao atendimento. n processos latentes e manifestos em rela- Para avaliar uma família encaminhada ção ao problema. n crianças em situação de rua. n fatores estressantes. lescentes. n a capacidade em manifestar as necessida- lia relativamente saudável que vive uma des. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. frente ao problema. n a capacidade cuidadora dos pais. n o nível de autonomia e diferenciação. n impulsividade e hostilidade. n as situações de estresse. dência. E algumas crian- ças resilientes estabelecem um vínculo es. n comprometimento na aprendizagem. n a busca de ajuda na rede familiar e de n legado multigeracional de múltiplas per- serviços. n quem faz o contato telefônico. n os padrões repetitivos de relaciona­ n falta de recursos para a sobrevivência. n a capacidade em lidar com situações de Fatores de risco na história familiar: conflito. . n distúrbios psicológicos.40 Luiz Carlos Osorio. Fatores de risco no contexto social: Avaliação da história familiar: n negação do problema. das. Avaliação da vida intrapsíquica: pecial com algum adulto com influência no seu meio social. n quem comparece na primeira consulta. n a história de perdas. con­tato: n falhas no desenvolvimento emocional. n baixa autoestima e imaturidade. n isolamento da comunidade. de dados e na avaliação de cada caso. a ser tratado. n a flexibilidade das fronteiras entre os n envolvimento com o tráfico e com o cri- subsistemas. n a possibilidade em proteger seus mem- cia da família tanto dos membros adultos bros. Porém. daticamente descritas a seguir no conjunto n história de vida. um gra. n o estabelecimento de limites claros e n contínua exposição a situações de crise. através das redes sociais. mento. n quem mais se preocupa com o problema n competição e ciúmes. n inexistência de recursos sociais. n dificuldade em estabelecer vínculo e con- n como os demais membros se posicionam fiança. n dificuldade com a autonomia e indepen- n como identificam os riscos na família. Uma famí. A reação pode ser vi- n dificuldade no estabelecimento de li­ timada. O terapeuta deve avaliar cada tabus. e ser cuidado. e as experiências vividas nas sucessi- n comunicação bloqueada por segredos e vas gerações. A partir de uma cres- O TRABALHO TERAPÊUTICO cente diversidade das famílias. n sistema rígido de crenças. 1999). di. dividuais. cada família enfrenta os desafios é decisiva res. supervisionado. trabalho com a resiliência considera as famí- n informações inadequadas sobre o cuidar lias como capazes de enfrentar os desafios. família. desenca- blemas. A resiliência define a capacidade do n rompimento com a família de origem. o conceito de resiliência familiar prepara as famílias para O primeiro recurso do terapeuta é sua enfrentar os desafios futuros com apoio mú- própria pessoa. indivíduo em suportar crises. do ambiente ou das relações. quiátricos. Importante não centralizar o atendi- n supervalorização de castigos físicos. recursos do contexto familiar e social. peuta auxilia na busca de colaboração da Entretanto. mento no indivíduo e nas suas necessidades n tendência de um membro adulto ou pessoais. n competição ou expectativa de recom­ O enfoque para a intervenção identi- pensa. ser o bode expiatório ou ser como a capacidade de um indivíduo sobre- a vítima dos males da família. colaboração frente à adversidade. considerando a interação e os mais velha. fica os limites e os recursos potenciais na n padrões de violência nas gerações passa. recursos e desafios pró- n concomitância de perdas e estresse. A incapacidade tuação de risco. Os processos resilientes n dependência química em sucessivas gera- ções. Walsh (1999) am- clear. Tanto o crescimento do indivíduo como o da n sentimento de posse. Frente ao risco. viver em uma família disfuncional. de buscar outros recursos é um reflexo do . controle e ciúme família só podem ser alcançados através da doentio. O en- n violência psicológica. com seu self profissional su. O n falhas no estabelecimento da confiança. seus limites. pacidade de lidar com o estresse. com sintomas psicológicos ou psi- mites. inversões nos papéis familia. e sim na interação da família. família. trau- n conflitos não resolvidos na família nu­ mas e de se recuperar. tuo e flexibilidade (Walsh. ficar os processos interativos e a capacidade n relações emaranhadas e fusionadas. ou voltada para a recuperação. Manual de terapia familiar – Volume II 41 n repetição de situações catastróficas. A visão sistêmica hoje considera as características individuais em segundo plano. para sua recuperação. A rede de profissionais e serviços é deando comportamentos que colocam um decisiva para o trabalho com famílias em si. ficientemente tratado. prios para sua recuperação. existe a possibilidade­ ferenciado e elaborado. O criança como dominador a se sacrificar conceito de resiliência era visto inicialmente pelos outros. dade. a família pode falhar na sua ca- família atendida para a superação dos pro. A identificação de de a família sobreviver às pressões in- recursos pessoais e da resiliência do tera. ou vários membros em risco. da rede de parentesco. plia o conceito de resiliência do indivíduo n violência da geração mais nova contra a sobrevivente. estresse. física ou sexual foque centrado na resiliência procura identi- contra as crianças. A forma como n confusões. O foco está nos processos de interação com seu contexto OS RECURSOS PARA ecológico e evolutivo. da família frente ao trauma. da comuni- das. do risco nas famílias mento. ineficiência para resolver problemas. 2002) no seu setting terapêutico to. O genograma na identificação n nas ameaças durante ou fora do atendi. sexo e outros fatores. n nas armadilhas da família. Viabiliza o registro do mudança. o terapeuta encontra conforto em risco para o planejamento do atendimen- (Ausloos. da aquisição n exigir o respeito mútuo. culminando n neutralizar a agressão. n na rede de vizinhos e comunidade. perdas. n no ciclo sintomático. fornece um esquema da estrutura da famí- n recursos audiovisuais para gravação da lia. processo migratório das famílias sem resi- n repetir as intervenções em uma variedade dência fixa. te de hipóteses na busca do entendimento n supervisão relatada ou ao vivo. O recurso do genograma é uma ferra- siliente e atento às capacidades resilientes menta importante no trabalho com famílias das famílias. das relações ao longo das gerações e como n planejamento do processo. O terapeuta ajuda Nos casos de famílias em risco pela a família a entender como um fato precisou violência. com a intervenção da justiça na proteção n manter a integridade e a ética. 1999). focar a atenção: ser mantido em segredo. se organizam de acordo com sua geração. Auxilia os n material para desenho. internação. n no comportamento abusivo. n coterapeuta. idade. É uma rica fon- n equipe atrás do espelho. Esse mapa genealógico é utilizado como para se utilizar das demais ferramentas do registro da história construída a partir das trabalho clínico. com muitas de formas. 2003). mações que irão preencher os vazios e dar n no relacionamento com a família ex­ um sentido na história (McGoldrick et al. O trabalho com o genograma ajuda a família a buscar as infor- n no estabelecimento de limites. mo eficiente dos padrões de relacionamen- n enfocar a competência da família. O genograma Espaço clínico como um recurso De posse de um self diferenciado e re. . A coleta de informações sobre a his- tória familiar faz parte dos processos de Objetivos do atendimento das famílias avaliação e pesquisa e é de extrema valia em risco pela violência: principalmente na análise das situações de risco. seu isolamento autoimposto. dos mitos e dos acontecimentos ocorridos ao longo dos anos.42 Luiz Carlos Osorio. em situação de rua. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. adultos a falarem de fatos guardados como n brinquedos. como: memórias. O genograma n entrevista pelo telefone. identifica os movimentos emocionais consulta. O genograma contextualiza a família n redefinir o sintoma como um recurso para em uma realidade histórica com um resu- a resolução dos problemas. de questões conscientes ou inconscientes n quadro branco ou cartolinas. que podem paralisar a família. tensa. gestações. provavelmente para proteger ou- tros membros da família. das crianças (Ladvocat. segredo.. de um padrão de reações exageradas e da n acolher incondicionalmente a família. to em potencial perante famílias com grave n intensificar as intervenções com vistas à problemática social. fre o impacto frente toda situação descrita. petência na identificação nos casos de crueldade e opressão. do extinto possível registrar uma história familiar com Código de Menores. Lei de 1990. desenho de toda a rede envolvida e para a sam ou quando ela passa a viver por um análise do cruzamento dos mapas do tera- tempo ou permanentemente em outro lugar. Manual de terapia familiar – Volume II 43 O genograma é extremamente útil especialização em terapia familiar. O self do terapeuta so. uma família em ris- e legais. à alimentação. O super- para a visualização dos diferentes sistemas visor considera o impacto do caos. casos de difícil manejo. na concepção de pro- tantos dados sem o genograma. segmento ainda carece de políticas públicas O trabalho sobre a família de origem mais integradas que promovam de fato o di- do terapeuta faz parte do programa de uma reito à convivência familiar. é im. ao esporte. o genograma é um mento. exploração. sociais Sistemicamente. não analisa uma his. O genograma integra a biografia da criança. O terapeuta deve estar atento à análise do cruzamento do genograma da fa. principalmente com questões altamen. aos seus direitos fundamentais. cação em família substituta. podendo nomear os profissionais que fize. Nos dados dos diferentes sistemas de pertenci. Faz uma ligação desde o percurso co é afetada por um fato ou circunstâncias da família de origem. para estudo. à dignidade. de risco. ao lazer. bre a infância no Estatuto da Criança e do pensável frente a um número demasiado de Adolescente (ECA). Portanto. Os técnicos teção integral que redefine conceitos so- da justiça buscam hoje esse recurso indis. cia. à liberdade e à principalmente quando envolve situações convivência familiar e comunitária. Podemos ler no art. ao respeito. que esclarece os seus impasses técnicos e Nenhuma criança ou adolescente será pessoais. ocorreram ção. que provocam diferen. desde sua gestação. discriminação. vação dos direitos referentes à vida. DEFESA DOS DIREITOS ram parte da intervenção. à cultura. à profissio­nalização. à educação. muitos progressos com relação aos direitos te mobilizantes no trabalho entre a família da criança e do adolescente. sua família de origem. Entretanto. passando pelos aco. Esse processo tem seu reintegração à família biológica ou a colo. são. 4o: O genograma como ferramenta para desenvolvimento do self do terapeuta É dever da família. 5o: mília atendida e da sua família de origem. As crianças em . violência. da sociedade em geral e do Poder Público O terapeuta constrói o mundo que su. assegurar com absoluta prioridade a efeti- postamente descreve. reca. Os artigos processos. sua história pessoal. objeto de qualquer forma de negligên- O genograma desenvolve a com. por ação ou omis- tes reações no terapeuta e na sua equipe. do risco da rede social. que colocam um indivíduo ou todos os seus lhimentos familiares ou institucionais. A criança pode crescer em múltiplos instrumento valioso para o ecomapa com o contextos quando seus pais morrem. marco na Constituição Federal de 1988. esse vitimizada e a família agressora. punido na forma da abuso­‑vitimização. lei qualquer atentado. até a membros em risco. Identifica a di- nâmica entre os sistemas familiares. 4o e o 5o do ECA esclarecem e resumem em linhas gerais os direitos da criança e do ado- lescente. Auxilia na identificação das ressonâncias no self. avaliação e interven. à saú- tória de vida sem entrar em contato com de. Nesses últimos 20 anos. peuta e da família atendida. da comunidade. que transforma o antigo modelo. Auxilia na memorização de e da violência na pessoa do terapeuta. E no art. antes do abrigamento. contribuindo para a reintegração imediata à família de origem. Tutelar. entre- lizam a sociedade pela quebra do seu direito vistas em grupos de famílias. Elas tegração à família de origem. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. a . O trabalho tem como objetivo tratar as condições psicológicas. à institucionalização. A perda do convívio às adolescentes. É Gravidez na adolescência feita uma avaliação da situação da família pelos técnicos do Juizado.44 Luiz Carlos Osorio. incluindo o atendimento ao com sua família e o seu abrigamento é a pai da criança. política pública. A criança que vive em um lugar dife- ponder às ­premissas do ECA no tocante ao rente de sua casa questiona­‑se sobre os mo- fortalecimento da convivência familiar e tivos da separação. cia. força a importância do trabalho social como los vitais. gravidez residentes em comunidades violentas e mui- precoce e com passagens ou fugas dos abri. Como reintegrar essas crianças às suas famílias? Como desenvolver nessas fa- mílias a competência para cuidar dos seus Criança em situação de rua filhos? Como evitar o abrigamento des- sas crianças em instituições? Como corres. breviver. A criança e o adolescente em situa­ ção de rua em sua grande maioria apresen. o projeto de acolhimento familiar. deveria ser a primeira al- lescência nas gerações anteriores. os da Central de Recepção e do Conselho vidas prioriza os direitos integrais da ado. uma avaliação da família como incapaz. gos da cidade. Frente criança e sua família. No outro vértice da questão. Visa a ava. O alto índice de sucesso re- concretização da destruição dos seus víncu. Pode ocorrer estavam em risco pelo parto na adolescên. atendimento à convivência familiar. tam casos de violência doméstica. como liar um padrão familiar de gravidez na ado. tas vezes dominadas pelo tráfico de drogas. da desvinculação. O que justifica a institu- diagnóstico para estabelecer a estratégia de cionalização não anula a necessidade de a atendimento e prognóstico da situação da criança ser reintegrada à sua família. 2005). Nos casos em que não é possível a lescente gestante. ção de rua são de famílias de baixa renda. A vida nas ruas é muitas vezes a repetição de um padrão trigeracional. em princípio por pou- Acompanhar um grupo de meninas­ co tempo. O programa conta reintegração. Os seus bebês também estavam em risco negligente e irresponsável. Cada caso passa por um tora excepcional. reintegração familiar e escolar. com entrevistas. As crianças acabam por buscar solu- GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA. Podem ser levadas para uma instituição e podem permanecer lá por muitos anos. ções para o problema que as coloca em ris- SITUAÇÃO DE RUA E DE ABRIGO co. a criança é indicada ‑se fragilizados ou rompidos. garantir os seus direitos integrais. sociais e estruturais Crianças em situação de abrigo das adolescentes gestantes na constituição de sua identidade e na prevenção de uma O abrigamento é uma medida prote- segunda gravidez. abandonada e de como so- As crianças e os adolescentes em situa. sendo neces. política pública junto da família. já deveria ser iniciado o trabalho ‑mães com menos de 15 anos durante e de avaliação das possibilidades para rein- após a gestação é muito gratificante. Não sen- afetivos na família muitas vezes encontram­ do possível esta opção. de ter comunitária? sido rejeitada. prejudicando a de serem abandonados. situação de rua ou institucionalizadas mobi. em parceria com O atendimento de adolescentes grá. para um abrigo local (Associação Brasileira sário investir na competência familiar para Terra dos Homens. visitas domiciliares. Os laços ternativa. contrariando seus direitos ins- tituídos pelo ECA. Mas a reintegração ­carência dos recursos judiciais. sua Somente depois de esgotadas as possi- constituição e a trajetória da rede social bilidades de manutenção dos vínculos com e familiar. articulação das De um lado está uma criança sem vínculo . Conviver em um abrigo com crianças Entretanto. resultado e punição pelos seus atos. pois estão não está disponível para a adoção. Outras crianças criança à família. ção das crianças e adolescentes. A partir das trabalho efetivo junto às famílias. ou mesmo pela falta de um trabalho efeti- Podem ou não ser reintegradas às suas famí. nas ações conjuntas. o processo demanda ção para a alta taxa de institucionalização atenção de todos os envolvidos nas suas res. É o resultado do investimento bilitado pela Vara de Infância e Juventude. às vezes. Por uma situação indefinida e pelo por uma nova família. Este momento ção. pré­‑reintegração e visa ao retorno efetivo Nos casos de destituição do poder fami- à família. mília. Mas não têm os seus convive com sua família. Ela não protegidas pelo Estado. que não ocorre pela a família e com a rua. aspectos As crianças disponíveis para adoção sociais. é importan. aguardam. As crianças em situa. Podem ou não ser adotadas gração. vínculo com a família de origem. história da família. Manual de terapia familiar – Volume II 45 família sente o abrigo como a solução para redes de serviços de acordo com a ne­ as suas dificuldades. no Brasil. o histórico da situação de rua. Isso lidade. teressados para simplificar e apressar a ado- adaptação e aceitação. a criança ção de abrigo não estão em risco. Essas crianças não podem conviver pode ocorrer pelas dificuldades da família com sua família e por isso foram abrigadas. psicológicos e jurídicos que per- meiam o caso. com cessidade de cada caso (Associação mais recursos e possibilidades ou até como Brasileira Terra dos Homens. pectivas fases: n A pré­‑reintegração: momento funda. é a solu- condições da família. podendo permanecer abrigada até a maioridade. a família de origem é que a criança pode n A reintegração: esta etapa é posterior a ser considerada disponível para a adoção. A criança fica abrigada até ser indicada compreende o reordenamento da rotina para uma pessoa ou casal devidamente ha- familiar. indefinidamente por te a compreensão do relacionamento com uma oportunidade. a criança pode ser adotada. com um tadas para que se tenha êxito. mais adequado. ferramenta a inclusão e o cruzamento dos n A pós­‑reintegração: esta fase requer o dados nacionais das crianças e dos casais in- aprofundamento da interação familiar. quem mantém sua vinculação jurídica. A criança e a família já foram liar. nem pode ter a direitos resguardados no que diz respeito à oportunidade de conviver com uma nova fa- convivência familiar. O Cadastro preparadas e estão de acordo para esta Nacional de Adoção tem como principal nova fase de convivência. 2002). a criança pode não ser institucionalizadas coloca o terapeuta de reintegrada à sua família de origem com família frente a frente com uma crua rea. A reintegra- é um processo com etapas a serem respei. Antes de tudo. REINTEGRAÇÃO FAMILIAR É muito gratificante acompanhar uma criança institucionalizada no seu dia de O trabalho de reintegração não se rea­ ­voltar para casa e verificar o empenho da liza em uma única atitude de entrega da família nessa reintegração. COLOCAÇÃO EM mental em que os profissionais buscam FAMÍLIA SUBSTITUTA conhecer a motivação para a reintegração. vo de preparação da família para a reinte- lias de origem. O terapeuta de família se defronta com os Infelizmente. por fim. a criança vivencia novamente o finidas no processo evolutivo. A família se abandono. ser identificada. Os estudos dos mitos. situação de risco nos casos de adoção? Em Segundo Galli e Viero (2001). se as Durante o período de adaptação. podem transformar­‑se tença da adoção. a terapia familiar nos ca- ­interferir em uma adoção bem­‑sucedida. Os pais podem mília. quando minha experiência desde os anos de 1970 a criança é devolvida depois de um difícil com crianças que viveram o abandono da período de adaptação. Sempre existirá um mis. com sua família biológica. Na grande maioria dos ca. Caso não haja um atendimento de ur- tão as pessoas e casais que se confrontam gência para esses pais. Assim como servar muitos casos bem­‑sucedidos e outros no abuso.46 Luiz Carlos Osorio. con. tratadas em tempo. não reduzido de devoluções. A O fenômeno da violência doméstica história desde as origens faz parte da bio. consequente mistura de fantasia e fato. nesses casos. com características de- adotada. Passa a correr o risco de jamais adoção. O desespero então considerar que. Na verdade. A violência pode marcam a cena temida dos profissionais da ser investigada na história das gerações pas- área. o processo é bem­‑sucedido. outras vezes existem informações reais. Por isso. Uma família que vive isolada é mais pelos pais que detêm sua guarda. das ça. Com que bases constituirá ela própria apresentar dificuldades quanto à história e uma família? às origens. der do mais forte sobre o mais fraco. encontrar uma nova família. sos de adoção pode ser considerada como Os pais podem apresentar dificuldades que prevenção nos casos de risco. demos arranjar uma adoção para a cura de Ela chegará aos 18 anos com uma biografia adultos neuróticos. desespera e. pois o retor- comprometem a vinculação adotiva e a no ao abrigo rotula a criança. seu status como criança institucionalizada. uma res- todo o processo de preparação para ser posta em cadeia. da revelação da história da criança podem Por isso. cronificando Segundo Winnicott (1997). equivocadamente. 2003). equivalente ao de ser abusada. Podem ter o desejo de que o passado seja VIOLÊNCIA CONTRA A esquecido e negado. em seus esforços para exercer . mais fraca. pude ob. Do outro lado es. o adulto mais forte usa a crian- que fracassaram. opressão e exploração. após leva ao comportamento violento. não po. que passa a ­aceitação da criança como um filho. Mas por que falar em saída para o problema. Podemos afetada às situações de risco. duradouros. a entrega da criança à justiça sadas. os poucos casos de resolvidos e sintomas latentes ou manifes- insucesso durante o estágio da convivência tos que ameaçam a vida. tiva e o retorno ao abrigo. e a família encontram somente na devolução a única segue a sua evolução. do processo de adaptação e vitais. sos. mesmo sendo um índice conflitos familiares graves. idealizam a criança e consequentemente podem decepcionar-se. com tério sobre a parentalidade biológica e a fins de dominação. os dificuldades dos pais adotivos não forem pais detêm a guarda da criança até a sen. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. os pais CRIANÇA E O ADOLESCENTE biológicos são muitas vezes desconhecidos. Ou seja. como tribuindo para o desejo de interromper a inadotável. como um objeto sem forças motivações. em risco potencial para a criança. Portanto. a não reversão do com a impossibilidade da gestação de um quadro se torna um risco à vinculação ado- filho biológico (Ladvocat. é resultado da relação hierárquica de po- grafia da criança. E. Algumas famílias são marcada por muitos abandonos e terá de se motivadas por questões que precisariam de arriscar a viver desvinculada de qualquer fa- uma compreensão maior. o sentimento dela é mãe biológica e foram adotadas. O programa de prevenção contra a Com o tempo. humilhação. por um padrão transgera- cional. forço para reduzir o índice de ocorrência n Física: força física contra a criança com o de novos casos. 2003). As estratégias incluem sem contato físico. confi- gurando as ­interações do ciclo sintomático. violência intrafamiliar tem como objetivo lúveis e inexplicavelmente interligados com as formas de prevenção primária e secundá­ a violência. . intervindo de Infância ou a uma autoridade policial. frente a ca- como evitar e interromper o processo. fico. art. aos pais. voyeurismo e exploração às famílias do grupo de risco. O comportamento violento físico ou Como forma de prevenção nas famí- psicológico pode ser apreendido através das lias em que a agressividade é um tema re- gerações como uma maneira de solucionar corrente. Os programas ou projetos podem imediatamente o conselho tutelar. caminhamento para tra­tamento para as vítimas (Ladvocat. adultos ou parentes contra um menor n Secundária: identificação precoce das de 18 anos. através de en- Terra dos Homens. a Vara romper com o ciclo da violência. n Doméstica: pela ação ou omissão dos São identificadas estratégias em um es- responsáveis. é importante avaliar padrão de relacionamento. Para comuni­cação não violenta como um novo enfrentar a violência. visita domiciliar para prover cuidados exi­bicionismo. direta ou indiretamente nos casos de n Sexual: todo ato de caráter sexual por violência. Manual de terapia familiar – Volume II 47 o controle. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). ria através da mudança da cultura da vio- A violência apresenta­‑se como: lência. Todos da família se sentem contra a violência intrafamiliar justificados a agir de forma violenta. a criança que viole os seus direitos. Nos n Terciária: foco nas famílias com membros casos de miséria. programas de creches para as crianças do n Negligência: quando a criança não é cui- grupo de risco. E. Por sos de suspeita ou confirmação da violência isso. a prevenção é uma das ferramentas na família contra a criança ou adolescente. antes que os responsáveis façam de crianças para garantir a proteção da criança (Brasil. 1990. dada de acordo com seus direitos. encami- para o comércio de material pornográ­ nhamento de crise para atendimento. tais conflitos tornam­‑se inso. importantes para reversão de um quadro o terapeuta deve acompanhar e notificar social. questão da violência contra a infância. de treinamento em escolas e n Psicológica: qualquer atitude contra campanhas pelos meios de comunicação. É a mais importante. a prevenção ocorre em três n Estrutural: falta de recursos ou miséria níveis: pela dificuldade ou impossibilidade de acesso aos programas de política pú­ n Primária: analisa os fatores ligados à blica. Incluem programas junto objetivo de ferir ou destruir. 245). o terapeuta deve desenvolver a os conflitos e de educar as crianças. conversas obscenas. Inclui a violência sexual situações de risco. os indivíduos que venham a se envolver abandono ou ameaça à sua integri­dade. pois atinge todos expondo­‑a pela punição. A violência pode ocorrer em uma si- tuação crítica. 2002). e adolescentes as suas vítimas. existe a negligência se agressores ou vítimas com o ob­jetivo de algum dinheiro arrecadado for desviado reduzir as consequências ou de evitar a para outros fins (Associação Brasileira cronificação do sintoma. tende a expressar a violência de Programa de prevenção forma aberta. Com a dos sites de pedofilia expõem fotografias confirmação da denúncia. mas mergulhar sexuais. divul. Se ele cum- navegam na internet já recebeu virtualmen. publicar. Isto implica passar e o envio para o Unicef. Estudos re. avaliar os riscos? nicação estimulam a denúncia anônima de Segundo Ausloos (2002). adultos pedófilos que vitimam. Trava­‑se uma luta com a rede de tráfico e de O ADOLESCENTE pedofilia que vende uma foto de criança por EM CONFLITO COM A LEI US$ 100 e um vídeo de cinco minutos por US$ 1 mil. Na verdade. Destes. as Delegacias de Cerca de mil novos sites são criados todos os Proteção à Criança e ao Adolescente foram meses no Brasil. fornecer. como terapeuta de família não é resolver ternet submetidos a poses sensuais ou atos problemas ou corrigir erros. tem redefinido sa e responsabilização. Tráfico e pedofilia e Adolescentes. No espaço crianças e adolescentes são sigilosas e enca. nhado ao Ministério Público para as devidas lação extrema contra a infância ocorre por providências. agenciar. exploram e prostituem uma criança ou um adolescente. vender. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. O problema transforma em um . Os pedófilos ­atuam corretamente”. Falar do adolescente em conflito com Para combater a rede de pedofilia.48 Luiz Carlos Osorio. as denúncias de abuso contra e encontrar sua competência. coloca os outros em risco. mas nós que trabalho junto à família após o resgate desa. por O atendimento de um jovem indicado alguma razão. de uma terapia na qual o terapeuta observa. que. apesar de compul­ velam que uma em cada cinco crianças que sório. o fato é encami- de bebês de 0 a 3 meses de idade. mas dos filhos em conflito com a lei? Como imagens ou qualquer produção de material reagem os pais quando seus filhos se envol- pornográfico ou cenas de sexo explícito de vem em delitos? Como reverter a situação e crianças e adolescentes. criados para zelar pelo cumprimento dos mes contra crianças de 9 a 13 anos. balhar no desenvolvimento da competência assegurar os meios para o armazenamento das famílias em desespero frente aos proble- e acesso na internet das fotografias. a lei e a dinâmica com sua família é um de- cada país desenvolve campanhas contra a safio. Ele também está em risco. “trabalhar imagens de crianças ou adolescentes na in. A família que não conse- crianças recebeu telefonemas. autorizar. estão suscetíveis. Humanos. Como tra- gar. O precisam de nós para melhorar. cialmente cuidada para poder recuperar-se No Brasil. A vio. e 12% direitos das crianças e adolescentes. acompanhamento e tratamento. órgão coordenado e execu- tado pela Secretaria Especial dos Direitos O Brasil é o quarto país com maior nú. Toda a sua pornografia infantil. Acompanhar o desespero dos pais que para uma terapia em que o terapeuta se ob- têm uma filha seduzida pela internet durante serva de forma a refletir na família compe- meses e levada por aliciadores da rede do trá. pela Vara de Infância. da Infância e da Juventude. prir as medidas impostas poderá desfrutar te uma proposta sexual. Os meios de comu. Podem ser feitas pelo seu ­sintoma. facilitar. cenas. precisamos delas para fazer nosso trabalho fia as leis da natureza. tente. E uma em cada 33 de sua liberdade. dinheiro ou gue cuidar e impor limites precisa ser ini- passagem para encontrar um pedófilo. pode ser bem­‑sucedido. que minhadas no mesmo dia aos órgãos de defe. 52% tratam de cri. as Varas mero de páginas da internet de pedofilia. com a cópia do endereço da página no mistério das famílias. Os Conselhos Tutelares. o jovem em risco. não são as famílias que fico é uma situação de indescritível agonia. Tem sido divulgado o família também está em risco e precisa de crime de produzir. da ­terapia familiar. por várias vias e atingem meninas. O sintoma é o sinal de uma Disque 100 ­‑ Disque Denúncia Nacional de perturbação necessária à sobrevivência da Abuso e Exploração Sexual contra Crianças família. E. mento com sua história de vida. Nas famílias com jovens delin. Torna­‑se possível então a resiliente para a escuta das histórias que en- redefinição do sintoma e a identificação de volvem riscos. contam histórias e desenham sobre o ma relação com cenas vividas ou fantasiadas não revelado. sem repetir o Se o jovem é etiquetado como delin. considerando es- taliza. Um setting de cooperação faz­‑se de difícil manejo. pode­‑se prever que ele cometerá capacidade da família para suportar as cri- novamente atos delinquentes. ternativas para seus conflitos. O comportamento do jovem se cris. é importan- balha na reconstrução da história. E para isso é futuro. do. inconsciente identificar as cenas temidas que ameacem a e precisando ser tratada. o trabalho quentes existe um tempo congelado e um com famílias em risco visa em primeiro lu- tempo cronológico. medo. Uma família com lidades individuais e as finalidades familia. Ele não pode mais satisfazer as fina. insegurança. desenvolver sua competência e recupe- não espera nada diferente e cometerá outra rar suas responsabilidades. O atendimento de famílias com crian- ças e adolescentes em contexto de risco e O terapeuta de família violência visa à contenção dos conflitos e à transformação do ciclo patológico. sas informações como pertinentes. em um segundo momento. Segundo Ausloos (2002). com a teoria e a técnica. É necessário redefinir a gar a devolver à família sua competência. Manual de terapia familiar – Volume II 49 padrão familiar e identifica um membro confiança. trem suas novas soluções. O terapeuta deve refletir sobre novas maneiras de lidar com o problema e sua posição e seus mapas de visão de mundo. repressão e negação. Na busca da competência da família resistência. avaliando as ressonâncias do caso no cruza- A família com crianças em risco convi. Verifica­‑se atendida. rever o passado. É extremamente importan- necessário para a valorização dos recursos te que tenha a capacidade em ser ele próprio para a mudança. As crianças fanta. sonâncias do cruzamento dos dois mapas: o Quando as condições externas são fa. Porém. importante coletar dados. 2002). O terapeuta de suas finalidades individuais. além da O terapeuta se fortalece com seu estu- reparação e elaboração. Na terapia. surgem momentos em sua história familiar. pessoa do terapeuta. da sua própria história e o do mapa do caso voráveis e o contexto de intervenção é de atendido. recursos necessários para a solução de seu problema. Ausloos (2002) acredita na quente. Ele próprio ses. para permitir um antes de considerar suas falhas. Na identificação de tensão e expectativas. é importante que a infor- mação venha em primeiro lugar da própria O TERAPEUTA E família para. A discussão e rapia de família apresenta­‑se como amea­ a supervisão em uma equipe interdisciplinar çadora e persecutória para a família que são fundamentais. a família encontra respostas al- sintomático. ria não revelada está latente. O terapeuta tra. re- A TERAPIA DE FAMÍLIA tornar a ela e ser elaborada. pacidade de resiliência. ve com segredos. é necessário detectar a sua ca- um saber não autorizado. mitos. vez o delito. O sintoma trabalha com membros da família para que representa o compromisso que lhe permite descubram coisas que já sabiam e encon- sair desta incompatibilidade entre suas fina. revendo te. história. encontrar soluções. portanto. Inicialmente a te. por outro lado. a análise da família de origem seus símbolos e significados na busca de do terapeuta e da resiliência frente às res- uma reorganização familiar. principalmente em casos vive o caos. . da competência do terapeuta. em que a histó. a ajuda do terapeuta tem chance de achar os res (Ausloos. as quais têm uma ínti- siam. pois vêm lidades familiares a não ser em detrimento da família e a ela retornam. ciclo patológico. Janeiro: ABTH. busca uma competência similar nos pacien- tes e sente­‑se confortável em fazer uso da sua pessoa como recurso terapêutico. um WALSH. a Na minha prática. ao tratamento e mesmo à sua 1997. 1999. n atenção à metacomunicação. Adoção. cap. F. In: SHEPERD. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adoles- e se protegem. Rio de liar. Portanto. n compreensão empática. In: –––––––––––– . A adoção nos diferentes ciclos de n compromisso com todos os lados das vida. TERRA DOS HOMENS. 1999. Violência familiar. C. foster care. 2002. 14. MCGOLDRICK. et al. n. Porto Alegre: Artmed. Buenos Aires. pessoa. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. WINNICOTT. mas. R. Poder Executivo. ricos. Colhimento familiar. grama da sua história familiar. de 13 de julho de 1990. Há cerca de 15 anos venho aplican. é um sinal de nais. no setting e na rede. Rio de Janeiro: ABTH. Lei nº 8. LADVOCAT.. 13 jul. Diário Oficial [da] n ser continente com suas angústias e da República Federativa do Brasil. 1. a análise das ressonâncias . deve fazer parte do dia a dia de todo tera- do o trabalho de diferenciação do self jun. cente e dá outras providências. parafraseando Winnicott. In: ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA TERRA DOS verdades. 2005. v. O terapeuta com um self diferenciado esperança. família. baseada em dos muitas vezes não são os previstos. 2002. Do abrigo a família. com crianças e adolescentes em risco. Pensando sobre crianças. In: ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA n estar vinculado à rede de terapia fami. E. O desenvolvimento das capacida. ABTH. n análise pessoal. Rio de Janeiro: ABTH. VIERO. Brasília. 2003. n capacidade para a redefinição dos fatores GALLI. REFERÊNCIAS Alguns atributos de um terapeuta de família: ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA TERRA DOS HOMENS. 1990. risco e violência. GERSON. Roma: Armando Editore. S. n identificar como os membros se sacrificam BRASIL. Children growing up in multiple families: n formação em Terapia de Família. to aos meus alunos e supervisionandos. ER. [Ramonville Saint-Agne]: Érès. SHELLENBERG- n supervisão. La compétence des familles: temps. seus próprios recursos intelectuais e emocio. processus. M. 16-18. A violência intrafamiliar no geno- n trabalho sobre a diferenciação do self no grama e o atendimento de famílias em situação de uso de sua pessoa como recurso. esse enfoque inicial cada grupo de trabalho. Genograms: assessments and inter- A cada nova experiência com famílias vention. técnicos. Ele também fantasia ou prevê situações de ris. Frente des pes­soais leva à descoberta em si mesmo ao risco e ao pedido de socorro. me confronto com tem sido de muita valia pela intersubjetivi- o resultado positivo para o terapeuta. R. C. El Concepto de resiliencia familiar: novo impacto pode afetar o terapeuta pelas crises y desafio. seja dade de cada caso.. atenção e refle- xão. situações sempre inusitadas e chocantes. 2003. n acreditar na tendência inata da família AUSLOOS. Colocação familiar. G. Somente depois é que para a prática clínica como também para devemos identificar os demais recursos teó- sua vida. Rio de Janeiro: n disponibilidade para a análise do geno. HOMENS. mar. F.069. peuta de família. co na família. n capacidade de escuta. Revista Sistemas Familiares. Fallimenti adottivo: frevenzio- impactantes. adoption and orphanage experiences. J. os resulta- de uma competência diferente..50 Luiz Carlos Osorio. para a mudança. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA TERRA DOS HOMENS. ne e riparazione. LADVOCAT. 2001. New York: Paperback. chaos. D. o adolescente vê­ Essa procura é remanescente dos anos ‑se diante de um dilema. periência não foi exclusiva. Nos dias de hoje. quando havia menos alter- da e de um grande ponto de interrogação: nativas e as áreas de atividade profissional Qual caminho profissional devo tomar? eram divididas. sobre a possibilidade de cursar a fa- adolescente sente­‑se como se afogando em culdade de direito. Consultou seu pai. em que as informações humanas e científicas. um meio . A resposta foi categórica: um mar de dúvidas e conflitos. muitas vezes. sem desviar a aten. teu­‑se a esses testes nos anos de 1970 e rece­ vo e segui­‑lo adiante. existe ainda a realidade individual aceitou e. buscam um serviço de orientação ção às escolhas profissionais. assim era a con- amigos. ser tomado. concordou. escolha atual? Qual a influência da família? guem concluir o ensino médio e irão ocupar Que relação existe entre a família e o mer- as classes das melhores universidades do cado de trabalho? País. o que influencia o adolescente na la de adolescentes privilegiados. O época. figuração social do mundo. descobertas e conflitos rem que a varinha mágica foi quebrada há existenciais. apesar disso. É um momento complexo quando as certas profissões não eram para mulheres. profissional ou um psicólogo particular que percebe­‑se outra mudança significativa no os ajudem a desenredar dúvidas e conflitos fato de o adolescente não buscar. e ela (es- Como se não bastassem as questões tamos falando do início da década de 1970) externas. milênio mudou e. e ficam muito desapontados ao ouvi- série de escolhas. naquela época: tencem. do. pedagogia ou direito. de certa forma. Nos dias atuais. a pequena parce. entre eles o rumo profissional a muito tempo. Nesta etapa. atrás de “famosos” testes profissio- A adolescência é permeada por uma nais. beu o resultado indicativo para a área hu- ção. tâncias remanescem do passado. tem sentido. repletas de men. em vez de ajudar. Entretanto. mídia são. círculo social e econômico a que per. difi. atuante advogado na sagens dúbias e promessas irresistíveis. A ex- de cada adolescente. de uma encruzilha. simplesmente. tribunal não é lugar para mulher. As ofertas e tentações provocadas pela manística: psicologia. o indivíduos. na futura pertinentes ao seu futuro profissional. Esses A sociedade e a família mudaram. somente uma ocupação. chegam com uma velocidade incontrolável. mas qual seria o seu significa- Vamos abordar. forças mobilizadoras. que conse. vêm em busca de solução Introdução mágica. em técnicas. aqui. de 1960 e 1970. capítulo 4 Família e orientação profissional Aidê Knijnik Wainberg Tatiana Knijnik Wainberg maioria das vezes. tanto privadas quanto públicas. Na profissão. as pressões familiares. tal afirmação não cultam ainda mais esta tomada de decisão. ao se encontra. Uma das autoras deste capítulo subme­ torna­‑se mais difícil ainda focar um objeti. em rela- bilidades. muitas ins- rem perdidos entre tantas ofertas e possi. muitas vezes. isto é. 52 Luiz Carlos Osorio, Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. de ganhar a vida, mas uma fonte enorme de foram surgindo novas alternativas de profis- prazer e realização. sões dentro do mercado de trabalho. Com a evolução da tecnologia, o surgi- Em pouco tempo – em termos históri- mento de dezenas de novas opções, a valo- cos – o modelo singelo de capitular as pro- rização de atividades, que antes eram vistas fissões e a natural tendência de seguir os como “menores” ou de menos importân- passos do pai não eram mais suficientes, e cia, e a escolha profissional possuem, para os então adolescentes viram­‑se diante de o adolescente atual, a possibilidade de ser opções, cujo significado não compreendiam mais um elemento na sua busca por uma bem, falando­‑se nas áreas da cibernética, da identidade pessoal. pesquisa espacial, da medicina avançada, na Para compreender essa mudança, é es- bioética e em dezenas de novas alternativas. sencial entender as suas causas, que não são Ao mesmo tempo, o mercado de traba- poucas. lho ficou cada vez mais a mercê dessas tecno- Nas décadas passadas, a influência logias, e quando as grandes multinacionais da família na escolha profissional era ge- tornaram­‑se as reais controladoras da ativi- ralmente inquestionável: os filhos tendiam dade mercantil no planeta, capacitar­‑se para a seguir a profissão paterna, coisa tida até uma profissão passou a exigir muito mais do mesmo com certa obviedade. que a obtenção de um simples diploma uni- O pai oferecia o escritório, o consul- versitário ou de curso técnico­‑científico. tório, a loja, a empresa, e os filhos seguiam Tornou­‑se indispensável o domínio de com naturalidade o mesmo caminho, por ra- línguas estrangeiras, maiores conhecimen- zões que iam desde aquilo que se pode de- tos gerais, habilidades de comunicação e ca- nominar de “fato consumado” na sociedade pacidade de liderança. conservadora da época até a segurança fi- Abriam­‑se portas para o trabalho no nanceira que os capacitava, tão logo termi- exterior, a “empresa” transformou­‑se em nassem os estudos, a iniciar sua atividade, uma entidade com vida própria que exigia casar e constituir família. Tal como seus pais de seus prestadores a eficiência máxima, de- fizeram por gerações. corrente da máxima capacitação. As mulheres, na sua maioria, enca­ No âmbito familiar e escolar, entre- mi­nhavam­‑se ao magistério, sobrando­‑lhes tanto, as mudanças ocorreram com maior pouquíssimas opções em áreas de trabalho lentidão. As famílias mantiveram­‑se arrai- exclusiva de homens. gadas às profissões clássicas e tangiam a Nos anos de 1980, quando os hábitos educação dos filhos, desde o nascimento, sociais foram revolucionados e o significa- para o encaminhamento às áreas tradicio- do de “família” entrou na pauta do debate nais, como Medicina, Direito, Economia e e discussão, a questão da escolha profis- outras, obtidas exclusivamente nos cursos sional passou a ter relevância ainda maior. universitários. Isso porque a própria Psicologia, cada vez Ainda, e apesar das novas urgências, o mais abrangente, percebeu que os “testes círculo familiar só se contentava com o títu- vocacionais” constituíam­‑se em um recurso lo de “doutor”, atribuído com exclusividade limitado para definir a escolha profissional ao bacharel universitário. do adolescente. Passou­‑se a encarar a tarefa Profissões voltadas às áreas técnicas da orientação profissional como um modelo eram vistas como “menores” e claramente mais dinâmico. De acordo com Bohoslavsky desestimuladas no âmbito familiar, despre- (1983): “A orientação profissional é aquela zadas e, aos que para elas se encaminha- que deve responder ao porquê da escolha vam, sobrava o epíteto social degenerativo e está ligada aos modelos de identificação de incapacidade e menos valia, diante da mais primitivos”. falta do diploma universitário. Com o avanço da tecnologia e o iní- O mesmo ocorria no campo dos espor- cio do processo de globalização, aos poucos tes. Jogadores de futebol, basquete, vôlei, Manual de terapia familiar – Volume II 53 nadadores, atletas eram desvalorizados sobre os quais nem sempre se tem ingerên- como “profissionais”, não importando a vo- cia ou controle. cação ou o talento, e só alcançando a devida valorização quando percebeu­‑se, graças so- bretudo à televisão e à internet, que por ali Modelo de trabalho de também se alcançava a realização, inclusive orientação profissional financeiro­‑econômica. A família contemporânea tende a não O modelo que apresentamos neste ca- se eximir diante de um talento aflorado na pítulo é um exemplo de estratégia flexível e criança para as áreas esportivas, e, ao con- adaptável às características do grupo: uma trário, estimula as capacidades em esco- proposta prática de trabalho em grupo. linhas e afins, quando mais não seja para O trabalho em grupo é mais bem acei- integrar, na educação, o esporte como ativi- to pelo adolescente e tem apresentado re- dade essencial ao desenvolvimento. sultados significativos, que justificam e O período crítico da escolha profis- autorizam o método. Preferimos realizar os sional atinge seu clímax quando o volume grupos uma vez por semana, em virtude de de informação à disposição do adolescente, envolver um processo de amadurecimento com rapidez quase instantânea, choca­‑se individual, salvo quando o tempo para ins- com as expectativas familiares e microsso- crição no vestibular é exíguo, hipótese em ciofamiliares, isto é, pais, tios, avós, primos, que o número de sessões é aumentado. amigos, filhos de amigos e conhecidos a ser- O número de participantes não pode virem de exemplo do “sucesso”, ainda que ser muito grande, variando de 8 a 10. Nos duvidoso. últimos anos, tivemos grupos mistos com a A velocidade da oferta de novas alter­ presença de estudantes de ensino médio, nativas profissionais encontrou os adoles- universitários descontentes com seu curso centes e seus núcleos familiares inteiramente ou que trancaram a matrícula da universi- despreparados. Em vista disto, observamos, dade e alunos que foram reprovados no ves- hoje, o retorno do interesse dos jovens no tibular e estão novamente frequentando os trabalho dos pais, maior curiosidade pelas cursinhos pré­‑vestibulares e reexaminando empresas familiares do que na década pas- suas escolhas profissionais. sada. Parecem sentir­‑se mais seguros por Paralelo a esses sujeitos, somos procu- não precisarem enfrentar o desconheci- rados por profissionais formados e insatisfei- do e voltam­‑se às profissões que já lhe são tos com seu trabalho, com sua atividade e, familiares. não raro, em busca de áreas completamen- Mas continuam com muitas dúvidas. te diferentes das que exercem. Grupos com Não é à toa que, em 2008, 64 mil profissionais mais experientes, com níveis ins­critos nos vestibulares de Minas Gerais de insatisfação profissional diversos, podem (UFMG) desistiram do concurso, uma absti­ formar um grupo diversificado e interessan- nência altíssima de 12,16%, fato conside­ te para um bom trabalho. rado revelador da incapacidade que encontra o adolescente para definir seus ru- mos profissionais. Grupos de trabalho Tendo em vista os novos desafios, o trabalho de orientação profissional evoluiu Nos encontros iniciais, o coordenador rapidamente, adequando­‑se à nova realida- aproveita para se identificar com o grupo, de. Nosso papel, como orientadores profis- tentando esclarecer onde estão as dificulda- sionais, consiste em facilitar o processo da des de cada sujeito para definir sua escolha, escolha. Podemos ajudar o sujeito a pensar, tendo em vista que o processo constitui em a se conscientizar­ de que são muitos os fa- encontrar alternativas capazes de resolver a tores que interferem na sua escolha, fatores questão. 54 Luiz Carlos Osorio, Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Nos primeiros encontros é importante respondam em uma folha as seguintes obter a integração dos participantes, me- perguntas: diante sobretudo a discussão da expectativa do grupo e o estabelecimento do contrato 1. O que espero obter neste programa? de trabalho. 2. Como será minha contribuição? Iniciamos com o conhecimento dos 3. Como o grupo pode me auxiliar na nomes dos integrantes do grupo. Crachás minha escolha? com os nomes são distribuídos no início das 4. O que espero que aconteça nos grupos? atividades. O coordenador pede que cada um co- O coordenador pede que os partici- loque a origem do seu nome, como foi esco- pantes formem duplas e que discutam suas lhido, por quem, se homenageia alguém, se respostas com seu companheiro. Após 10 há um histórico familiar, um fator determi- minutos, forma­‑se o grande grupo para nante para a escolha do nome, etc. discussão. Inicia­‑se assim a desconcentração do No momento de apresentação final, a grupo. partir das expectativas apresentadas, o co- ordenador poderá ajudar a colocar as ex- pectativas dentro da realidade possível e Integração não idealizada. Reforçar a ideia da escolha como processo e o momento da adolescên- Dando continuidade ao momento de cia como de descoberta pessoal, onde a pro- apresentação e integração, pode ser utiliza- fissão está inserida. da uma tarefa específica de integração gru- pal. Por isso aqui é importante identificar as características do grupo, envolvendo sexo, Conhecendo­‑se melhor idade e nível de escolaridade. Relatamos a seguinte técnica, que é O coordenador divide o grupo em adequada a qualquer faixa etária: subgrupos de quatro participantes e distri- bui o material: folhas de sulfite, cartolina, caneta, lápis de cor, canetinhas, revistas Todos sentados em círculo. para recortes e outros materiais para elabo- Um integrante acende um fósforo e tem ração do cartaz. o tempo de o fósforo queimar para se apre‑ Em seguida, solicita que os subgrupos sentar ao grupo. Assim sucessivamente, até elaborem um cartaz criativo que retrate as todos os integrantes passarem pela expe­ características do grupo, envolvendo gos- riência, inclusive o coordenador. Após o úl‑ tos, hobbies, esportes, lazer, jogos, filmes, timo se apresentar, o coordenador abre o livros e os demais elementos com os quais diálogo entre os integrantes, lançando per‑ se identifiquem e que tenham significado guntas sobre o que foi dito por cada um e importante. Os cartazes são apresentados e estimulando a conversação. Após as tarefas de integração inicial, discutidos com o grande grupo. passamos para o levantamento das expec‑ Após bem explorado este momento, os tativas individuais e grupais, que também fa‑ participantes listam as disciplinas de maior vorecem a integração. agrado e facilidade durante o ensino médio, assim como as de maior dificuldade. Levantamento das expectativas Contrato de trabalho Nesta etapa, o coordenador solici- Uma das tarefas fundamentais do ta aos participantes que, individualmente, grupo é o estabelecimento do contrato de Manual de terapia familiar – Volume II 55 trabalho, que permitirá a adesão ao progra- n universidades no estado em que existem ma. Esse contrato não precisa ser rígido, os cursos específicos; mas tem de ser definido por todo o grupo. n currículo específico do curso; Mudanças somente serão feitas com a apro- n características das atividades desenvolvi- vação do grande grupo. das pelo profissional e área de atuação; A responsabilidade da manutenção do n características pessoais exigidas para contrato deve ser compartilhada com o pró- exercício da profissão; prio grupo. n mercado de trabalho e perspectivas pro- Alguns itens fundamentais a serem fissionais; combinados: n órgãos oficiais da categoria profissional; n fontes de maior informação profissio- n características e objetivos do grupo; nal. n número de sessões; n possibilidade de encontros posteriores Cada participante deverá escolher os individuais; cartões das profissões que mais lhe interes- n horário dos encontros; sam para preparar uma apresentação aos n duração dos encontros; demais. n dinâmica do trabalho: tipos de tarefas, No caso de mais de um querer a mes- tarefas extras, individuais, grupais; ma profissão, o trabalho pode ser feito em n regras de sigilo de grupo (condição fun- duplas. damental de manutenção do grupo); Agrupam­‑se por áreas e discutem so- n possibilidade de não concluir a escolha bre as profissões escolhidas, embasadas no até o final do programa; material disponível. n possibilidade de haver entrevistas in- Cada indivíduo ou subgrupo elabora dividuais com os pais, após término do um texto livre sobre a profissão escolhida. trabalho em grupo; Nesse texto, deverá haver o maior número n possibilidade de continuação do trabalho de informações possíveis, ideias, dúvidas, individual. fantasias, expectativas e tudo o mais que o participante tenha, como dado real ou como Ao finalizar esta primeira etapa, que idealização, sobre aquela profissão. envolve a integração e o contrato de traba- Cada participante deverá ler, em voz lho, e iniciar o processo de autoconhecimen- alta, o que escreveu sobre a profissão es- to, o coordenador já está exercitando seu colhida. Posteriormente, a coordenadora papel: o de auxiliar a pensar. abrirá espaço para a discussão e troca de Inicia­‑se a desmistificação do teste vo- ideias, fantasias e sentimentos entre todos cacional, quando o sujeito começa a perce- os participantes. ber que existem modelos mais dinâmicos, onde ele é participante ativo do processo e não receberá respostas nem soluções pron- Tarefa de casa tas. Corrigem­‑se distorções, percepções e estereótipos. A tarefa de casa é pesquisar sobre as profissões escolhidas. Essa pesquisa pode ser feita com profissionais das áreas escolhidas. Conhecendo as profissões Nesta etapa, procuramos facilitar o trabalho do grupo, indicando nomes ou pe- A coordenadora apresentará um fichá- dindo a contribuição dos pais. O ideal é que rio com o maior número de profissões possí- as entrevistas sejam feitas no próprio local veis, onde constarão os seguintes dados: de trabalho do entrevistado, dando a opor- tunidade de se ter uma noção vivenciada da n nome da profissão; atividade profissional sob pesquisa. 56 Luiz Carlos Osorio, Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Informações e esclarecimentos sobre as profissões pesquisadas queremos influenciar. Os irmãos já vão trabalhar nas empresas. Só não esque‑ ce que não tem nenhum médico na Relato de cada membro do grupo so- família...” bre a tarefa de casa. Cada um deverá tra- Pai médico, radiologista, dono de servi‑ zer ao grupo suas descobertas a respeito das ço de radiologia: profissões pesquisadas. Discussão sobre as profissões apresentadas. Os colegas dirão “Ele pode decidir o que quiser. Sempre se, na sua opinião, a escolha do seu compa- deixei livre. Ele sabe também que o ser‑ nheiro está adequada. Serão examinadas as viço está importando uma máquina e características peculiares a cada tipo de pro- que, para ganhar dinheiro, ela tem que fissão e se os aspectos individuais do sujeito ser muito bem explorada. Vai preci‑ sar de muito médico. Tem que pensar são compatíveis a essa profissão. bem.” A partir da maior autorreflexão, do melhor panorama das profissões, de uma vi- Pai advogado: são atualizada do mercado de trabalho e de “Qualquer outro curso que fizer, vai uma visão de suas características pes­soais e ser empregado, ganhando uma miséria. expectativas, o adolescente estará mais apto Como advogado, vai ser a única maneira a realizar escolhas mais conscientes. de ser dono.” Encontro individual e familiar Procura­‑se integrar, neste encontro, os Considerações finais momentos vivenciados nos outros encon- tros: as expectativas, o processo de escolha, Culpar os pais, depois de tudo que es- o autoconhecimento, a informação profis- crevemos sobre o mundo contemporâneo, sional, a participação no grupo e a escolha mercado de trabalho? Obviamente não. Mas realizada. temos de refletir muito em como se apro- A participação dos pais nesta etapa do ximar desse adolescente, sem desqualificar trabalho é necessária devido à sua influên- sua escolha, que também está permeada de cia no processo. Esta participação pode ser insegurança e influências. positiva, se auxiliarem na informação, no Para melhor entendimento, relatarei desmanche das distorções e estereótipos. a participação de Carlos e Pedro em um Muitas vezes, sem expressar claramente, grupo. os pais demonstram suas expectativas, an- siedades, exigências e suas próprias frustra- ções através da escolha do filho. Pedro: “Pretendo cursar Engenharia Alguns exemplos: Civil, porque meu pai é engenheiro, tem um escritório grande, todo montado, onde trabalham muitos engenheiros e tem muitos clientes. Já estou feito. É mais fácil trabalhar Pai empresário bem­‑sucedido, dono de com ele.” rede de lojas do ramo de eletrodomésticos Carlos: “Eu queria ser engenheiro civil, no estado, com dois filhos mais velhos cur‑ mas meu pai é engenheiro, tem um escritó‑ sando Economia e Direito: rio com muitos engenheiros e clientes. Vou “Olha, doutora, nós trouxemos o João ter que estar sempre dando satisfação para aqui para ele decidir. A decisão é dele, ele e discutir meu trabalho com ele. Não o que decidir, nós apoiamos. Nós não quero isto para mim.” A escolha profissional do jovem técnica e ideologia. Rio de Janeiro: Martins Fontes. 1993. Alquimia íntima. do. Família hoje. Psicologia grupal: uma nova disci- xiliar a família a compreender o significado plina para o advento de uma era. na escolha de uma profissão prazerosa e au. H. Acesso tica. São Paulo: Cortez. (Org. ao adulto. OSORIO. São Paulo: Summus.]. M. 1989. P.). OSORIO. S. Porto Alegre: da escolha do filho para si e para o grupo Artmed. Porto Alegre: dos esses momentos. Adolescência. E. Orientação vocacional: teoria. OSORIO. Minas Gerais: [s. C. L. . PORTAL Uai. em: 12 dez. Porto Alegre: Artes conscientes e inconscientes que interferem Médicas. [2010]. L. auxiliando o jovem a Artes Médicas. pensar na soma de todos esses processos OSORIO.uai. Manual de terapia familiar – Volume II 57 Enquanto para um a situação familiar LUCCHIARI. para a orientação profissional. BOHOSLAVSKY. Orientação vocacional. familiar. uma interpretação psicanalí. L. C. MULLER. C.br/>. R. 2002. P. VALLE. o outro era reveladora de conflitos. L. São Paulo: Summus. Dis- BLOS. H. 2008. 1983. Pensando e vivendo era facilitadora na escolha profissional. et al. C. D. D.com. P. Referências Porto Alegre: Artmed. A nossa participação é de facilitar to. M. 2009. 1996. 1985. P. 2003.. Porto Alegre: Literaris. ponível em: <http://www.n. Manual de terapia familiar. SOARES. 2004. . uso gas na adolescência. tem se elevado o consumo entre as o Ministério da Educação. seguintes aspectos: existe uma tendência do 2003) recomendam o desenvolvimento de aumento da ingestão regular e elevada de be. capítulo 5 Família e escola: uma parceria possível na prevenção de uso de DROGAS entre adolescentes Jossara Cattoni Araldi Kathie Njaine Maria Conceição de Oliveira Introdução Cruz (2000). e 50% dos adolescentes iniciaram o Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) uso de álcool entre 10 e 12 anos (Galduróz e (Brasil.. em relação a elas. meio ambiente. implican. Entretanto. 1998) para o ensino fundamental. . com foco na dis. Marques e as diferentes disciplinas do currículo escolar. vantamentos nacionais realizados no Centro No campo da saúde no Brasil. a Po­ Brasileiro de Informações sobre Drogas lítica e as Ações para a Atenção Integral Psicotrópicas (Cebrid) tem evidenciado os ao Uso de Álcool e Outras Drogas (Brasil. completas e a proteção e afeto da família to escolar e outros transtornos (Pechansky. que incluam a escola bidas alcoólicas pela juventude com ocorrên. 2005). as leis e as normas prevenção ao uso de álcool e outras dro. 2005). Dentre eles. 2004. 2010). uma vez que esse como suscetibilidade ao uso e vulnerabilida- fenômeno traz séries agravos à saúde físi. com- do um problema mundial de saúde pública portamento antissocial e fatores biológicos. baixo rendimen. cussão sobre a parceria possível entre essas psicológicos e biológicos. ção (Sanchez. e a família como estratégia fundamental cia principalmente entre os mais jovens (12 a para a prevenção. sociais. O álcool tem sido autores têm destacado a necessidade de in- apontado como a droga mais consumida vestigar os fatores que contribuem para o entre os jovens no Brasil e está associado a não uso de drogas na adolescência. conflitos familiares. desta- diversos comportamentos de risco. para perpassar ra­bi­lidade desse grupo etário. podem contribuir com as ações de preven- Szobot e Scivoletto. ressaltam que alguns dos principais fatores Este capítulo busca refletir sobre a re. pluralidade cultural. tais como O uso de drogas na adolescência é ética. O uso de drogas nas de drogas na família ou atitudes positivas sociedades contemporâneas vem se tornan. Uma série de le. ações intersetorias. de risco para o uso de drogas nesse grupo lação entre família e escola. interpessoais. a dis- duas importantes instituições nas ações de ponibilidade das drogas. cando que a disponibilidade de informações do acidentes e violências. Galduróz et al. envolvem aspectos culturais. No âmbito da educação. introduziu temas transversais. Caetano. no contexto dos meninas. 15 anos). Oliveira e Nappo. de extrema importância. de ao efeito de drogas. dificuldades econômicas graves. agra­vado pela própria condição de vulne­ saúde e consumo de drogas. citando Newcomb (1995). alguns ca e mental dos usuários. drogas podem ser utilizadas dentro de ri- A escola tem. 2007. consequentemen- bate às diferentes expressões da violência. mento desse fenômeno e. passou a ser visto como alguém amoral. Decreto Presidencial n° 6286/2007 (Brasil. a Associação Médica et al. alguns autores. pois crianças e ado. o dependente químico ceiras? Diversos estudos (Noto e Galduróz. apresentam um junto aos alunos da rede pública de ensino. Carlini­‑Cotrim. A história da humanidade sempre es- Neste bloco. Moreira sociedade. a relação do deles trata da promoção da saúde e pre. Em 2007 foi lançado o Programa Saúde na Escola (PSE). Em 1966. mília. o segun. grandes as lacunas para o debate sobre esse Diante dessas conceituações ou per- tema e sua prevenção. álcool e outras drogas. igualmente físico. tabaco e outras drogas. 2001. Portanto. mostra­‑se equivocada. Posteriormente. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. consumo de álcool. cos. pois preconizava a mento norte­‑americano da década de 1980. o drogadicto era conside- para os jovens. ainda que seja no plano ide. rado alguém que estava tomado por uma alizado por muitos. Soma­‑se a essa Segundo a Organização Mundial da situação o preconceito que muitas famílias Saúde (OMS). unicamente orgânico. segun- ferência em termos de valores primordiais do Brasil (2004). 2006) têm apontado que a questão Americana passou a conceber o alcoolismo das drogas é um tema tabu nas escolas e como doença. mento. 1998. ta. As questões relativas ao uso abusivo . instituído pelo Revisando a literatura sobre o tema. movi. Inicialmente. são sua ausência (OMS. tuais religiosos. arcabouço teórico para a compreensão da Sendo dividido em quatro blocos. dos amigos e dos regimes de trata- ral percebida na escola e na família. um grande po. relação ao drogadicto. Mas esta relação tem entidade espiritual e que. enfim. Tondowski e um marginal que deveria ser afastado da Henriksson. 1993). incluindo uma compulsão de lias visando ao desenvolvimento de ações de consumir a droga para experimentar seus prevenção ao uso de álcool e outras drogas efeitos psíquicos ou evitar o desconforto da é um grande desafio. define­‑se a dependência de têm em relação à informação sobre drogas drogas como um estado psíquico e. assim como o papel da fa- conceituoso com que essa questão é em ge. ga psicoativa. pessoa doente. medi- tencial para atuar na prevenção ao uso de camentosos.60 Luiz Carlos Osorio. E a família é a re. portanto. deve- sido alvo de muitas polêmicas e debates. por motivos diversos. Moreira (2006) e Toscano Jr. devendo trabalhar as dimensões da longo da história. que resulta da com problemas de drogas. festivos/recreativos. as mulo à atividade física e práticas corporais. o tratamento aos dependentes químicos. o que influencia o entendi- construção de uma cultura da paz e com. de modo que se possa cepções é possível determinar o papel da romper com o caráter estigmatizante e pre. 1999. Segundo Araújo e da educação sexual e reprodutiva e o estí. estabele. Neste contexto. Esses temas devem ser trabalhados em uma Álcool e drogas: um perspectiva interdisciplinar e integrada à desafio a ser enfrentado proposta pedagógica da escola. do homem com as drogas vem mudando ao venção. a ideia de que a presença de dro- lescentes permanecem um longo perío­do gas no repertório humano é algo recente e de tempo nesse espaço. o que contribuiu para a reti- que as ações de intervenção ainda têm o rada de certos conceitos e preconceitos em foco no aspecto de guerra às drogas. (2001). visão positivista da doença como fenômeno que se caracterizou por um enfoque alarmis. Assim. haverá também a abordagem teve ligada às drogas. drogadição. portanto. intolerante e repressivo. interação entre um organismo e uma dro- cer uma parceria entre a escola e as famí. Segundo esses autores.. algu- e a dificuldade que enfrentam com os filhos mas vezes. te. ria ser tratado a partir de rituais específi- Como a família e a escola podem ser par. Marlatt. entre eles Brasil (2004) e 2007) que visa a ampliar as ações de saúde Romano e Laranjeira (2004). sociedades. (1998) argumenta que o modelo preventivo conhecido como “guerra às drogas” defen- de a erradicação das drogas ilícitas e a in- tolerância em relação aos usuários. delegam educação como uma necessidade universal. modelos preventivistas ao uso de drogas. enquanto de aula que ensinam o estudante a recusar. Alguns educadores que fizeram parte do es- os procedimentos preventivos ao uso de tudo fizeram uma crítica a esse modelo re- drogas surgiram com o objetivo de reduzir a pressor. Prevenção de álcool evidenciam­‑se dois argumentos que susten- e outras drogas e tam a oposição a esse modelo. Inclui exercícios e atividades de sala ilícitas com forte caráter moral. O Proerd é um programa de in- vens. Para isso. Para Vizzolto civis. no entanto. Na mesma perspectiva. Uma outra crítica e esse para a Resistência ao Abuso de Drogas. Diante da proliferação do uso propício para o desenvolvimento humano de drogas na contemporaneidade. aos orientadores a questão das drogas e seus efeitos. as drogas sempre estiveram finem a prevenção como uma ação que presentes na história da civilização humana. de amedrontar os jo. Porém. breve panorama sobre os primeiros modelos 2009) detectou a presença de tradicionais de prevenção mostra que alguns não alcan. que modelo referia­‑se ao fato de ele não atin. usan. cionada ao ideal da escola como um espaço são ao tráfico. o objetivo de sensibilizar e informar as pes­ Um estudo realizado com professores soas sobre as ocorrências de prejuízos à saú. como a redução do Abuse Resistance Education) ou Educação consumo de drogas. reconhecendo que outras es. As representações so- consideradas ilícitas. a o consumo de álcool e tabaco não tinha e se esquivar e a não ceder perante a oferta de . de escolas públicas e particulares em uma ci- de devido ao uso indevido de drogas. Um dade de médio porte do sul do Brasil (Araldi. essa medida não atingia tervenção que segue o projeto Dare (Drug os objetivos esperados. Manual de terapia familiar – Volume II 61 de álcool e outras drogas atingem todos ou ainda não tem restrições legais em muitas grande parte dos cidadãos. oferece aos indivíduos a capacidade para O segundo argumento é de que a “guerra às enfrentar eventuais obstáculos que pos. na prática. O primeiro atenção à saúde deles é de que a ideia de erradicar as drogas nas sociedades é irreal. Porém. já apontado. esse cialistas perceberam que tais medidas eram espaço poderia atuar na prevenção às dro- insuficientes. Carlini­‑Cotrim bito da segurança pública e da saúde. pois impor o não uso é impor regras (1992). e social dos jovens. com do Estado. desde a que não atuam com outros modelos que se fonte até a comercialização e o consumo das contraponham a esse. gas e em outros temas que dizem respeito tratégias deveriam ser tomadas. Secundariamente. çaram suas metas. mas de maneira geral demonstraram disponibilidade dessas substâncias. tem como objetivo o treinamento para re- gir a uma população maior. como Pereira e colaboradores (2004) de. na área. blemas que acarretam sobretudo para o âm. entre elas a à adolescência. drogas” fere os princípios éticos e os direitos sam prejudicar a sua saúde. com a pedagógicos e profissionais espe­cializados intenção de chocar. essa atuação principalmente ao Programa A educação preventiva inicialmente tinha Educacional de Resistência às Drogas como finalidade passar informações sobre (Proerd). aos psicólogos. além de que a sistir às pressões para que se envolvam com prevenção era mais direcionada às drogas drogas. os espe. Segundo Bucher (1988). devido aos pro. a prevenção ciais de muitos educadores sobre prevenção adotava medidas fiscais e repressivas. ao uso de álcool e outras drogas está rela- do como meios a ação judiciária e a repres. uma vez que. de comportamento aos indivíduos e socie- junto de informações e de ações concretas dade que vão muito além do que é direito em uma abordagem ampla de saúde. a prevenção consiste em um con. esses mesmos autores. Em busca de um modelo preventivo Adolescência. orientação sexual. os com grande tendência em envolver pais e vínculos frágeis com a família e com a esco- comunidade em suas atividades. por ser um programa originado no sentido de levar o jovem a refletir sobre nos Estados Unidos. visando a formar uma perarem a si mesmos. Ética. encontra alguns pro. família é uma instituição privadacom vários nos”. a fim de posicioná­‑lo diante das ques- bem como as diferenças de representações tões que interferem na vida coletiva. Conta com policiais na sua condu. deixados para trás. la são fatores de risco para o envolvimento de jovens com as drogas. as ações preventivas baseadas na pensa­‑se em fase de transição. mas basicamente tem a função de culado a uma proposta abrangente. habilidade de de comportamento. mas tam- do jovem. cial. as consciência de algumas características drogas podem proporcionar um aumento não saudáveis. o trabalho preventivo deve estar vin. para além da família. que tem como meta de desenvolvimento evolutivo. desafio e alívio do construção da própria identidade. pois nessa fase o convívio com os cer informações sobre as drogas de forma amigos ganha importância no contexto so- imparcial e científica. pluralidade cultural. em relação ao uso de drogas. onde apenas alguns são decidir e interagir com o grupo. 2005) res- mas na formação de jovens saudáveis saltam que. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. quer perigo. 2006). Nesse processo n educação afetiva. Nesse contexto. drogas. Do ponto de vista do aten- um contexto mais amplo de saúde. recai na prevenção no abuso de drogas. que valoriza o es. na sensação de poder. família que não parta desses princípios moralistas e escola em busca de apoio e da imposição do medo. Nessa perspectiva da “redução de da. partem das premissas do paradigma sistê- de. Para essas autoras. que procura forne. há incorpo- melhorar ou desenvolver a autoestima. onde o elaborar as relações primárias das crianças uso de drogas deve ser discutido dentro de e adolescentes. identifica e adquire segurança para iniciar a crescimento pessoal. um novo grupo com o qual se volver sensações de expansão da mente. Segundo Carlini­‑Cotrim Quando se fala em adolescência. consumo são aspectos a serem abordados ção. os jovens. Esse modelo de prevenção na lescente como sujeito. que nar uma falsa diminuição das dificuldades parte do pressuposto de que a ênfase não e ansiedades. (1998).62 Luiz Carlos Osorio. diante da necessidade de su- dos temas gerais. que procura desen. dimento a jovens que fazem uso de drogas. O adolescente busca um n oferta de alternativas. surge o modelo de “redução de danos”. valores e padrões trabalhar com a ansiedade. acreditando que ele é capaz de bém não é adulto. Segundo Tondowski e colaboradores los básicos: (2007). sentem­‑se invulneráveis a enfrentar qual- tilo de vida saudável e onde são trabalha. caracterizada por pro- discernir e optar de forma consciente e res. n educação para a saúde. nia. além do trabalho e mico e enfatizam a necessidade de ter claro . Schenker e Minayo (2003. sociais em relação à figura do policial ameri- cano e brasileiro (Noto e Moreira. rações de novos hábitos. novo lugar. além de proporcio- n modificação das condições de ensino. infantil. Segundo tédio. meio ambiente. a adolescência é um processo de in- tensa descoberta e de ampliação do mundo n conhecimento científico. momento em redução de danos dão ênfase na formação que a pessoa não é mais criança. prática escolar viabiliza­‑se por cinco mode. arranjos. porém. a dimensão da vida e o exercício da cidada- blemas como a falta de adaptação cultural. saú. fundas transformações biopsicossociais que ponsável sobre questões que fazem parte do conferem o caráter de singularidade ao ado- seu cotidiano. nessa fase. Manual de terapia familiar – Volume II 63 que os problemas das drogas se constituem grande parte do saber social. Mas, após o um fenômeno multicausal, pois existem as advento da economia capitalista, nos sécu- questões orgânicas, psicológicas, sociocul- los XIX e XX, houve grandes transformações turais, familiares e outros aspectos que se sociais e consequentemente mudanças no interinfluenciam. Pelo fato de a família ser o comportamento e na estrutura familiar, com primeiro e mais importante núcleo de rela- a entrada das mulheres no mercado de tra- ções de uma criança ou adolescente, torna­ balho. Os autores ressaltam que, em decor- ‑se necessário incluí­‑la como parte e não à rência da complexidade que envolve a nossa parte do contexto, para não tornar o traba- sociedade, a família conta com o apoio da lho reducionista. escola como uma instituição que tem papel A estrutura familiar ocidental vem pas- complementar na educação. sando por um longo período de transforma- Assis e colaboradores (2005) discutem ção, acentuado nas últimas décadas devido que, diferentemente de outras instituições, a variáveis ambientais, sociais, econômicas, a escola tem um enorme potencial para de- políticas e religiosas que estão vinculadas no senvolver a intervenção, pois tem a vanta- decorrer do processo civilizatório (Osorio, gem de acompanhar por um longo período 2002). Segundo Minuchin (1990), quando de tempo o crescimento e o desenvolvimen- se trata de definir as funções das famílias, to dos jovens, podendo ainda acessar os pais consideram­‑se dois objetivos distintos: pro- e responsáveis por eles. Sendo assim, a esco- teção psicossocial de seus membros, sendo la pode contribuir muito na questão de pre- este um objetivo interno, e a acomodação venção ao uso de álcool e outras drogas. a uma cultura e a transmissão desta, como Nos programas de prevenção conside- objetivo externo. rados mais adequados, o uso de drogas deve Especificamente na prática clínica em ser discutido dentro de um contexto mais atendimentos às famílias, faz­‑se necessá- amplo de saúde e dos cuidados com o corpo. rio refletir constantemente sobre os múlti- As drogas, a alimentação, os sentimentos, plos conceitos de família, como observam as emoções, os desejos, os ideais, ou seja, Andolfi e colaboradores (1984, p. 18), a qualidade de vida entendida como bem­ ‑estar físico, psíquico e social, são aspectos Família é um sistema ativo em constante a serem abordados no sentido de levar o jo- transformação, ou seja, um organismo vem a refletir sobre como viver de maneira complexo que se altera com o passar do saudável. tempo para assegurar a continuidade e o De acordo com Vizzolto (1992), o pro- crescimento psicossocial de seus membros fessor é um agente de educação. A ele cabe componentes. Esse processo dual de con- a responsabilidade de informar os alunos. É tinuidade e crescimento permite o desen- ele quem estabelece um contato direto com volvimento da família como a unidade e, o aluno e tem papel decisivo nos programas ao mesmo tempo, assegura a diferencia- de prevenção, uma vez que influencia na ção de seus membros. formação de valores e atitudes e é figura de identificação. Para que essa tarefa seja reali- zada, é necessário o conhecimento do assun- Os desafios da escola na to como um todo, da estrutura da disciplina prevenção ao uso de drogas e do grupo de alunos. Nessa perspectiva, a implementação de uma educação preventi- Para Costa e Gonçalves (1988) e Osorio va contra o uso de álcool e outras drogas re- (2002), a família não tem um padrão fixo de quer um planejamento prévio de atividades se organizar, porém em todas as culturas a a serem desenvolvidas pelas escolas. família tem a função de educar, fornecendo Uma pesquisa que avaliou um pro- modelos e a formação de que um jovem ne- grama voltado para educação para valores cessita para ser adulto, além de transmitir (Minayo et al., 2004) aponta que, diante 64 Luiz Carlos Osorio, Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. do impacto de mudanças de ordem políti- para fazer a leitura do material pedagógico ca, social e cultural, as instituições de ensi- direcionado aos pais. no são tomadas por uma carga de angústia Contemporaneamente, os pais pare- e insegurança, balizando as dificuldades do cem dispor de pouco tempo para os filhos, momento de transição da contemporanei- passando também à escola a responsabilida- dade. No decorrer da avaliação, os autores de de formar indivíduos. Diante desse fato, verificaram vários relatos dos docentes que os educadores têm sido cada vez mais pres- externavam que os temas mais polêmicos, sionados pelas famílias e pela sociedade em como sexualidade, drogas e violência, eram geral a abordar temas como a questão das os menos elaborados e trabalhados nas es- drogas. Por outro lado, os professores não colas, diante do despreparo e das dificulda- se sentem preparados para lidar com essa des de abordar tais questões. demanda, tomando muitas vezes iniciativas Esses resultados são semelhantes aos improvisadas que servem mais para aliviar encontrados na pesquisa de Moreira e co- suas angústias do que propriamente para laboradores (2006), que estudaram as si- fazer um trabalho preventivo (Tondowski e tuações relacionadas ao uso indevido de Henriksson, 2007). drogas nas escolas municipais de ensino Costa e Gonçalves (1988) salientam fundamental de São Paulo, investigando ati- que é dentro do contexto familiar e escolar tudes e comportamento dos coordenadores que a criança assimila a maior parte de seus pedagógicos frente a essas questões. Os au- conhecimentos, hábitos e atitudes. Con­se­ tores concluíram que a prevenção permeia quen­­temente, os professores juntamente com a maioria dos discursos, porém, os coorde- os pais são as pessoas que estão em melhor nadores relataram a falta de formação, de posição para desenvolver uma proposta de informação e que sentiram preconceitos em educação vinculada a um contexto mais am- relação a essa temática. plo, em que se incluem ­condições de vida, Na pesquisa de Minayo e colaborado- trabalho e relações sociais. res (2004) citada anteriormente, verificou­ Porém, a atuação conjunta dessas duas ‑se ainda que os educadores manifestaram importantes instituições de socialização não uma visão idealizadora da escola, argumen- é tão simples. A pesquisa de Araldi (2009), tando principalmente que os pais delegam citada anteriormente, que investigou junto aos professores a missão de educar. No que aos educadores do município de Lages (SC) concerne à pouca participação dos pais no a relação da escola com a família e a preven- cotidiano escolar, foram mencionados pelos ção ao uso de álcool e outras drogas, aponta docentes alguns fatores impeditivos, como: que as representações que esses profissio- horário das reuniões, falta de recursos de nais têm sobre a adolescência, a família e transporte de famílias mais carentes, o fato o tema das drogas são fatores que dificul- de as reuniões tratarem principalmente da tam as ações de prevenção. Ideias arraiga- questão de notas e disciplinas e pela falta das sobre o uso de drogas que passam por de acolhimento e de parceria em relação à julgamentos morais dos jovens e de suas educação. Muitos pais entrevistados nessa famílias foram muitas vezes colocadas pe- pesquisa disseram temer os chamados das los professores, sobretudo por aqueles que escolas, tendo em vista que a maioria das ve- mencionaram não realizar nenhuma ativi- zes são convocados para tratarem de proble- dade relacionada ao uso de drogas. mas de comportamento ou fracasso escolar Nessa pesquisa, embora os professo- dos filhos. No entanto, durante a pesquisa, res tenham diversos casos de uso e abuso de observou­‑se que os pais sentiram­‑se presti- drogas entre adolescentes em algumas esco- giados em participar do programa de edu- las, os educadores tendem a culpar diferen- cação para valores, inclusive aqueles que tes atores por esse fato. Alguns consideram não sabiam ler, que solicitaram aos filhos que o abuso de álcool está relacionado à Manual de terapia familiar – Volume II 65 autoafirmação dos adolescentes, a um pe- nhecer propostas que possam contribuir ríodo de curiosidades sobre as bebidas e para esse aspecto. as drogas de modo geral, sem, no entanto, As poucas iniciativas identificadas de avaliarem o papel da escola nesse contex- se trabalhar a questão das drogas estavam to. Outros educadores citam a mídia como mais relacionadas ao perfil dos professores responsável por estimular o adolescente a e ao seu envolvimento com os jovens do consumir bebida, assim como a família, por que propriamente às diretrizes pedagógicas. promover e consentir o uso de bebidas al- Foram poucos os educadores que incorpora- coólicas. Poucos educadores investigados ram de fato a temática em suas ações, como referem uma atitude comunicativa com os uma professora de Educação Física de uma jovens para discutir a questão das drogas e escola pública que procura trabalhar com alguns dizem que até gostariam de abordar a questão da prevenção às drogas, na dis- o tema mais abertamente, mas temem re- ciplina que aborda “Qualidade de Vida”. O presálias por parte daqueles envolvidos no conteúdo trabalhado por essa educadora se tráfico de drogas, seja aluno ou familiares. assemelha aos modelos de educação para Considera­‑se, portanto, que há barreiras a saúde (Carlini­‑Cotrim, 1998) ou mode- morais por parte dos educadores para abor- lo do estilo de vida saudável (Tondowski e dar o tema, mas também avalia­‑se que essa Henrikson, 2007). Esses modelos preconi- abordagem é complexa e envolve a necessi- zam ações não tradicionais, pois têm como dade de uma capacitação que discuta desde proposta uma visão de saúde integral do jo- os preconceitos que permeiam o tema até vem, com o objetivo de conscientizá­‑lo para as estratégias mais eficazes de abordagem a escolha de estilos de vida saudáveis, com e encaminhamento da drogadição (Araldi, qualidade. 2009). De acordo com a perspectiva sistêmi- [...] quando trabalho qualidade de vida ca, teoria adotada por Schenker e Minayo relaciono as várias outras situações (dro- (2003), compreender a drogadição de ado- gas). Ela é trabalhada todo ano, pelo me- lescentes é ir além do aspecto intrapsíquico nos um bimestre. (P/M1/Púb/1) e individual para uma visão multifatorial, em que o grupo familiar, de amigos, cole- Nas falas da maioria dos educadores, gas de escola, de trabalho e todo o contexto no entanto, percebe­‑se falta de preparo e histórico­‑cultural e social estão imbricados de engajamento nas questões que fazem nesse processo. Esse novo paradigma con- parte do cotidiano dos adolescentes. Essa forme Guimarães e colaboradores (2009), mesma percepção também foi observa- possibilita que a abordagem da drogadição da na pesquisa de Soares e Jacobi (2000) ultrapasse a leitura do contexto familiar, sobre “Adolescentes, Drogas e AIDS: ava- acolhendo também explicações próprias do liação de um programa de prevenção esco- cenário onde se vive. lar”. Observou­‑se no estudo a relutância e A maioria dos educadores das escolas o despreparo da instituição escolar em tra- investigadas por Araldi (2009) informou tar temas importantes como drogas e AIDS que não teve capacitação específica para e, ainda, a ausência de trabalhos preventi- trabalhar a temática das drogas e não fo- vos e avaliativos no âmbito educacional. ram criadas oportunidades e projetos que Entretanto, constatou­‑se que o discurso e pudessem aproximar os alunos, estabelecer a prática dominantes como modelo de pre- um diálogo e uma relação de confiança para venção na escola é a abordagem baseada no abordar a temática. Os dados revelaram que modelo de “guerra às drogas”. alguns professores não só desacreditam na De certa forma, prevalece um discur- possibilidade de atuar na prevenção como so de descrédito por parte dos professores também não demonstram interesse em co- entrevistados na pesquisa de Araldi (2009), 66 Luiz Carlos Osorio, Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. em relação sobretudo às perspectivas de considerando­‑a muitas vezes inapta para os mudanças do jovem. Na visão de grande cuidados com os filhos e omissa em relação parte deste grupo não é possível reverter a à escola. Na visão de muitos educadores, o situação de um jovem que faz uso de algum fato de convidar os pais para repassarem os tipo de droga. Percebe­‑se que os professores problemas de seus filhos na escola cumpre sentem­‑se pressionados para repassar o con- o papel de incluir a família nesse cotidia- teúdo pedagógico e lidar com temas consi- no. Esse aspecto aponta para a necessidade derados difíceis de abordar no cotidiano da de compreender e incentivar a família para escola. atuar na prevenção (Assis et al., 2005), so- Alguns dos motivos associados a essa bretudo famílias que têm compro­metimento resistência foram identificados no estudo com álcool e outras drogas e que precisam, de Moreira e colaboradores (2006), como: sobretudo, receber apoio profissional da a falta de formação e informação, o precon- sociedade e das instituições em geral, para ceito atribuído aos usuários de drogas e a que possam promover um contexto seguro e sobrecarga de trabalho, dificultando dessa afetuoso de cuidado com os filhos. forma a responsabilidade de realizar um tra- Tondowski e Henriksson (2007) apon- balho efetivo de prevenção. tam que os educadores, em geral, sentem­ Essa visão também foi constatada no ‑se angustiados e preocupados com o tema trabalho de Minayo e colaboradores (2004), do uso/abuso de drogas pelos adolescentes. que avaliou um programa de educação para Muitas vezes acabam tomando iniciativas e valores que tinha como objetivo educar os medidas improvisadas com o intuito de fa- jovens para a vida, propondo que os alunos zer algum trabalho preventivo. Entretanto, passassem a incorporar em suas vidas valo- essas ações, na maior parte das vezes, ser- res positivos como liberdade, autonomia, vem mais para aliviar a angústia do que to- solidariedade e responsabilidade. Minayo e mar uma medida preventiva frente à questão colaboradores (2004) constataram que mui- das drogas. Contudo, ao propor um trabalho tos educadores revelaram sentimentos de preventivo, a atitude do professor, quando pessimismo em relação ao projeto pedagó- não preconceituosa, contribui para a cons- gico proposto, denominado “Cuidar”. Uma cientização da importância da vida e de seus das hipóteses consideradas pelas autoras cuidados com ela. As escolas sozinhas sen- para esse fato refere­‑se ao momento histó- tem dificuldades de assumir essa tarefa, e rico em que vive a sociedade, no qual a es- há uma expectativa de contar com a partici- cola, de certa forma, perde o seu prestígio pação da família; porém, na realidade, não como espaço de ensino, em função de uma parece haver diálogo sobre a questão do uso enorme valorização dos meios tecnológicos de álcool e outras drogas. de informação. Outra hipótese se refere aos O estudo de Araldi (2009) corrobora baixos salários dos profissionais da área da os achados de investigações anteriores, de educação que de certa forma desestimula a que há pouca participação da família na es- sua atuação. E, por último, que as escolas cola e de que os professores sentem­‑se pou- não estão preparadas humana e tecnologi- co preparados para lidar com as famílias e camente para preencher as necessidades com os problemas que envolvem os jovens reais­dos alunos. como a questão da drogadição. Acresce a esses problemas a noção Considera­‑se ainda que atualmente as que alguns professores têm da família, escolas têm propósitos e funções diferen- considerando­‑as desestruturadas, exaltando tes das iniciais, que se restringiam apenas a somente o lado negativo e refletindo pou- transmitir conteúdos, como afirma Aquino co sobre o potencial desse grupo como fator (1998). Esse autor aponta que, além da fun- de proteção. Alguns estudos vêm mostrando ção pedagógica clássica, hoje existe uma que as representações dos professores e edu- substituição de papéis e, muitas vezes, um cadores sobre a família é bastante pessimista, acúmulo deles atribuídos aos profissionais Manual de terapia familiar – Volume II 67 de educação. O autor alerta que “parece visando a encontrar estratégias eficazes de pairar uma espécie de polivalência atribuí- enfrentamento desse grave problema de da ao educador: ele deveria ser um pouco saúde pública. pai, psicólogo, sociólogo, político, orienta- As representações sociais identifica- dor, amigo, etc.” (Aquino, 1998, p. 95). Essa das junto a educadores das escolas públicas nova demanda que é atribuída ao educador e privadas pesquisadas, como no estudo de refere­‑se às mudanças históricas, como no Araldi (2009), sobre as ações de prevenção aspecto sociopolítico do país, do trabalho, em relação ao uso de álcool e outras dro- do contexto familiar e até mesmo da expan- gas entre adolescentes, denotam algumas são da mídia, que traz impactos sociais so- visões distintas, mas que em alguns momen- bre as práticas escolares. tos se interpenetram. Conhecer o universo Essas mudanças também são reveladas representacional dos atores envolvidos pode no estudo de Araldi (2009): mostrar­‑se eficaz para melhor delinear a multiplicidade de percepções implicadas. Tem aqueles que ficam de forma incondi- A primeira delas, presente nas falas da cional ao lado da escola, as atitudes que maioria dos educadores, independentemen- você tomar estão bem tomadas [...], tem te da natureza da escola, representa uma aqueles que resolvem achar que o profes- visão preconceituosa e estigmatizante dos sor é errado. (P/M1/Part/3) temas “adolescência” e “drogas”. As falas re- Eu acredito que a participação dos pais é velam resistências e dificuldades em refletir quase nula. Leva pra escola e a escola que sobre a complexidade desses temas. se vire. (P/H1/Part/3) As representações sociais sobre a adolescência encontradas na pesquisa Porém, no estudo citado acima, estruturaram­‑se em torno de dois aspectos observa­‑se que algumas visões divergentes individuais dessa faixa etária: (a) as mudan- podem fazer a diferença, creditando na fa- ças físicas e biológicas que começam com o mília uma possibilidade de parceria com a início da puberdade e terminam quando as escola. Destaca­‑se o empenho de um gestor responsabilidades adultas são assumidas; e em criar estratégias para atrair os pais para (b) os “conflitos” decorrentes dos processos a escola, para discutirem juntamente aos psicológicos típicos da idade. Esses aspec- filhos temas relacionados à adolescência. tos presentes no senso comum são os mais Esse tipo de atuação proativa mostra o cui- marcantes dessa etapa do desenvolvimento dado com os jovens, com as famílias e com dos adolescentes. Nesse contexto, as expli- o ambiente escolar. cações para o uso de álcool e outras drogas restringem­‑se à necessidade de autoafirma- Se tivermos a parceria com os pais e a es- ção, curiosidade, busca de liberdade e pra- cola puder mostrar a importância de eles zer. Essa visão reducionista não contempla estarem presentes, estarem dialogando contextos importantes que afetam a vida com seus filhos. [...] a prevenção eu vejo dos jovens, como os culturais, sociais, polí- nesse sentido, uma parceria de pais e es- ticos e econômicos que interinfluenciam na cola [...]. (G/Part/4) sua formação. Essa concepção de adolescência repre- sentada pelos educadores condiz com a for- Conclusões ma com que esses profissionais entendem a questão do uso de álcool e de outras drogas A temática da parceria entre a família e com a maneira com que encaram e reagem e a escola quanto à promoção da saúde e a frente a essa problemática. Desse modo, as prevenção do uso de risco de álcool e outras representações sociais da adolescência fun- drogas necessitam ganhar maior visibilidade cionam como um filtro que leva o docente em pesquisas e projetos político­‑pedagógicos a interpretar o comportamento adolescente 68 Luiz Carlos Osorio, Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. por um único aspecto, ou seja, o comporta- responsáveis pode explicar as poucas e frá- mental. Assim, se o educador tem uma visão geis iniciativas das escolas em chamar as fa- reducionista da adolescência, as possibilida- mílias para os estabelecimentos educacionais des de abordar questões que transcendem e criar uma parceria para o enfrentamento os aspectos biológicos e psicológicos dessa da questão, embora alguns professores assi- etapa da vida também são reduzidas, por- nalem a importância desse apoio. tanto, tendem a ser inócuas e superficiais Percebeu­‑se que grande parte dos edu- frente à gravidade do problema das drogas cadores preconiza a importância de desen- na sociedade e na escola em particular. volver ações voltadas para a prevenção às Neste sentido, a abordagem da ques- drogas nas escolas. Entretanto, essa atribui- tão das drogas em sala de aula pode ser bem ção é delegada principalmente ao Proerd ou malsucedida, quando docentes e discen- e aos profissionais especializados no tema. tes tentam corresponder às expectativas de Parece haver, nesse tipo de atuação, uma ci- um ou de outro. Em outras palavras, se os são entre o que acontece no âmbito escolar, educadores têm expectativas positivas em que diz respeito ao trabalho dos educadores, relação aos seus educandos, se apostam nas e às vivências dos jovens fora da escola, que suas potencialidades e nas suas qualidades, não diz respeito aos professores. Aspectos os educandos responderão a essas expectati- da sociabilidade dos jovens como participar vas de forma mais proativa. Se não existem de festas ou outros encontros sociais são vis- expectativas positivas dos educadores sobre tos de forma negativa, sem criticar suficien- os alunos, as possibilidades de realizar um temente os fatores que influenciam essas trabalho sobre álcool e outras drogas é pra- formas de sociabilidade. Por isso, a família é ticamente ineficaz. vista como a principal causa dos problemas Uma outra visão mais ampliada repre- de comportamento ou desvios dos jovens. sentada na fala dos educadores demonstra Essas barreiras impedem os educadores de um pensamento mais reflexivo sobre o uso enfrentar questões tabus, como as drogas e de álcool e outras drogas. Contudo, na prá- a sexualidade, e criam empecilhos para es- tica, as ações ainda são atravessadas por tabelecer um diálogo franco com os alunos muitos preconceitos em relação à atuação e com suas respectivas famílias. da família e a espaços de sociabilidade dos Uma outra concepção representada pe- adolescentes. Há de certa forma uma culpa- los professores deste estudo apresenta uma bilização da família por não saber lidar com visão dialética da adolescência e das drogas. o adolescente, por ser permissiva e não es- Essa concepção está presente na fala de uma tabelecer limites aos jovens, principalmen- escola de ensino privado, cujos educadores te sobre o uso de álcool, droga legitimada podem ser denominados de “seminais”, ter- socialmente. mo utilizado por Minayo e colaboradores Os educadores também vivem a dicoto- (2004) para designar aos professores que mia de transmitir os conteúdos pedagógicos mostram uma abertura maior à realidade e trabalhar, com os jovens, temas que fazem social dos jovens uma capacidade de escuta parte do seu cotidiano, ou por falta de es- e de diálogo com o adolescente, com os pais tratégias para abordar os temas transversais e com seus pares. No discurso e na prática previstos pelos PCNs, como o das drogas, ou esses educadores atuam com a complexida- por resistência frente a esses temas. A inter- de da questão das drogas, com a contempo- locução da escola com a família e vice­‑versa raneidade dos conceitos de adolescência e também carece de estratégias e capacidade de família, potencializando um trabalho de de superar as dificuldades de diálogo entre prevenção holístico. É nessa direção que se essas instituições frente à problemática das vizualizam as possibilidades de realizar um drogas. trabalho preventivo, que promova a saúde A visão muitas vezes negativa dos do adolescente, a sua resiliência (capacida- educadores sobre o potencial dos pais ou de de superar as dificuldades da vida) e ao S. (Org. Brasília. C. São Paulo: EPU. considerados relevantes para a reflexão so- bre aspectos que podem fortalecer a parceria família­‑escola na prevenção ao uso de álcool Referências e outras drogas na adolescência. entre todos para um trabalho coletivo e que In: BUCHER. São Paulo: Casa do Pscicólogo. R.. dagens preventivas como redução de riscos/ ARALDI. Dissertação (Mestrado) – Universidade do portanto. GONÇALVES. Os programas de prevenção. In: BU- CHER. Revista Brasileira de . G. em um processo con. C. 1998. BRASIL. G. é acima de tudo União. pois se entende que educar é mais do 2007.). ASSIS. podem permitir trazer ao pro. etc. promova uma articulação com abordagem psicossocial. 2005. 1998. continuada aos educadores para orientá­‑los ARAÚJO. e projetos. Drogas na escola: prevenção. 2009. BRASIL. Ministério da Saúde. G. A so- Essa problemática exige a integração ciedade. M. In: AQUINO. M. viabilização das ações. (Org. sociais: as drogas como tema transversal. L. é PSE e dá Outras Providências. Representações sociais de educadores danos visando a um enfoque compreensivo e práticas de prevenção em relação ao uso de álcool e outras drogas entre adolescentes de Lages. de 05 de dezembro de no. 102 f. C. mais promissoras às propostas de prevenção A seguir.). In: O campo da saúde pública pode auxi. D. da questão e não somente repressivo. refletindo com educadores sobre superação de Medidas preventivas efetivas exigem dificuldades. J. L. ao serem riculares Nacionais. destacam­‑se alguns pontos ao uso de álcool e outras drogas. F. Institui o Programa de Saúde na Escola – que somente transmitir conhecimentos. A abordagem preventiva. F. (Org). para que CARLINI-COTRIM. G. quiçá. F. 6 dez. a temática das drogas. Resiliência na adolescência: guros nas suas intervenções. et al. Drogas na escola: alternativas liar para ampliar o conhecimento de abor. São apropriadas à realidade de cada escola. risco e de vulnerabilidade e assim exercitar o protagonismo juvenil e o compromisso na BRASIL. ou seja. 2009. 2007. Por trás da máscara familiar: ção aberta com os jovens sobre temas consi. adolescentes. detectar aspectos de tério da Saúde para a atenção integral a usuário de álcool e outras drogas. como drogas e sexualidade. São Paulo: Summus. As drogas e a vida: uma aborda- participação de todos. Parâmetros Cur- ra. V. J. 1988. que consequentemente os tornaria mais se. J. X. em termos ideais.). Histórias das a compor projetos educacionais específicos Drogas. Diário Oficial da trocar ideias e experiências. CAETANO. G. propiciar uma escuta de forma acolhedo. Epidemiologia medidas de enfrentamento com a finalidade do uso de álcool no Brasil. São Paulo: EPU. 1998. Rio de Janeiro: FIOCRUZ. J. de et al. Lages. Família e drogadição. Porto Alegre: derados tabus. Brasília. AQUINO. Ministério da Educação. A. B. As drogas e a vida: uma este. ecologia. outros setores da sociedade. Brasília: elaborados com a participação ativa dos MEC. MOREIRA. ANDOLFI. R. bem como outros temas como direitos civis. BRASIL. da. teóricas e práticas. (Org. J. possam participar de cursos e debates sobre tolerância e pluralidade. G. COSTA. R. C. A política do Minis- grama problemas reais. Artes Médicas. MOREIRA. Manual de terapia familiar – Volume II 69 mesmo tempo acolha­‑o em suas dúvidas e de possibilitar adequações necessárias e projetos de vida. A escola e as novas demandas ética. 1988. In: SILVEIRA. contemplando GALDURÓZ. R. deveriam envolver a BUCHER. um novo enfoque em terapia familiar. Decreto nº 6286. para o desenvolvimento de atividades São Paulo: Summus. R. a escola e a família diante das drogas. Família e drogadição. os que traba- gem biopsicossocial. E. 2004. As estratégias de prevenção nas esco- las. o Paulo: Atheneu. C. Há. uma prática dialógica entre educador e alu. 2006. In: CEVERNY. M. 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Nenhum desses pensamentos vinda para o Brasil. O presente e o Penso que o sabor mais intenso era comple- passado esclarecem­‑se mutuamente. como vivemos apenas no presente. que buscam lhosas sobre a vida. que sentia de se separar das pessoas que las e metáforas. a impede o valor do momento presente. cor. Essas sessões de culinária vinham mente para os encontros. os bichos tinham conversas maravi- despedidas e das histórias. pois ele era de família diferenciada dicionais aprendidos com sua própria mãe e nobre na Itália. uma luz recíproca. de outrora. Penso em histórias com as interessantes histórias da vida de de vida. Sinto o gosto dessas comidas feitas por das por Spink e Medrado (2004). pois o tem. sejam fábu. fizeram parte desde Percebo que os ensinamentos de mi- cedo do meu aprendizado de convivência. avô. mochilas nas costas. e me conforta ver sem a própria mãe e a morte de meu lembrar as palavras de Braudel. reproduzi. lugar onde as fadas. das bruxas. sas histórias de encontros e desencontros. (Stern. quan- Quando chego neles. di profundamente foram os temperos des- po de hoje data simultaneamente de ontem. do nasci. com expli- Quando penso em encontros. veio de minha avó paterna. capítulo 6 Separação ou abandono? Sandra Fedullo Colombo Entretanto. nha avó passavam pela grande dificuldade A herança de contar histórias. seus vinhe- ranças. dos encontros. Essas comidas especiais eram cozinhadas durante horas. de anteontem. bagagens. várias heranças atravessan. a volta para a Itália. e onde o caldeirão das compartilhar e dar um significado a essas bruxas eram ensaios de alquimia. espe. ou relatos cotidianos do constituíam sua história: era filha caçu- viver. seus amores e traições. casar. quando Dadá sob a rígida orientação de minha avó. cações detalhadas dos temperos para Dadá. dos. com xo. impossibilidade de minha avó aguentar vi- Tudo se dá aqui e agora. e os pais não aceitaram . experiências humanas.. que adorava cozinhar pratos tra.. o agridoce­‑sabor­‑do­‑separar­‑abandonar. diz que cada momento atual reúne momen. meus bisavós e avós na Itália. italiana. as existência. 2007) Introdução e com seu marido. O que apren- tos de origem e ritmo diferentes. Tenho imagens deliciosas de minha avó sen- Parece que essa compreensão da tada na minha cama. a do gerações. a cozinheira da família já há 20 anos. derosa e fusional: Sandra em homenagem Penso que cada um de nós constrói a Alessandro. O paradoxo da conformidade posicionado. como diz Carmine Saccu. a dor e não necessariamente tiram abençoados em sua partida e esco­lha. talvez abandonar­‑romper. que ela não queria. Para para partir. primogênita depois Gilberto Safra. meu bisavô obrigou minha avó a dividuais. ou impedi­‑los. quando comecei a escrever de Carmine Saccu (1994) da psicose como o meu nome. do pertencimento e da 17 anos e era muito apegada à mãe. é para mim a chave preciosa do en- dança para a Itália com os filhos pequenos contro humano. uma moça muito pobre e a segunda filha Acredito que a voz da minha avó trazia fugiu de casa para se juntar a um italiano as histórias do pertencer sem autorização muito mais velho e jogador de cartas. fica que um dia partiremos.. ou lembrando A escolha de meu nome. mento do que pela possibilidade de partir. procurar novos recursos. pois tinha e da diferenciação. São vários os nha avó. a importância desse perten- mente paralisará. resolvê­‑los. constituem. desde pequena. O primogênito engravidou que o tempo avance. percebo que minha construção po avance do nascimento à morte. formando pessoas para a so. miliares. Contava que. mas atravessar essa to fizeram também escolhas de casamen. mais velho. reflete essa força po- caminhada pela vida. partida. de todo mundo. o pertencer. quais se. ao fazer escolhas in- siguais. Sermos de realidade passou mais pelo emaranha- orgânicos. afetivas e míticas das gerações que nos para que cada indivíduo possa desenvolver precederam e com atualizadas através dos suas possibilidades nas diferentes etapas do relacionamentos no tempo presente. de. que magicamen. havia perigo de abandonar e ser se casar com um italiano. As Todo caminho pela vida é um longo relações se transformam através do tempo. A quais se manterão concretamente. ‑separar. Penso que através dessas histórias co- a entrega e o partir? meço a perceber o movimento da roda da vida. A mu. quando escreveu que a vida de 6 anos de um casamento. se rompermos. individualidade. Relembrando essas histórias que me ciedade mais ampla e permitindo que o tem. Se pu. que ao falecer dermos partir. damente. aprendizado de se juntar e se separar. meu tio paterno e padrinho. pois. Lembremos da metáfora cimento. bem abandonado.72 Luiz Carlos Osorio. uma história de pertencer­‑partir­‑juntar­ Sabina de minha avó paterna e madrinha. de que só voltaria se sua encontros e inúmeras as despedidas nessa escolha fosse aceita. a questão não seria aliviar rapi- Os dois filhos mais velhos desse casamen. o tempo magica. ciclo da vida. minha avó materna. falava do preço das lealdades fa- evitar esse destino de casamentos ditos de. construção desse pertencer e desse partir rão memórias importantes? vem sendo feita com as heranças emocio- Considero a família o espaço criado nais. e Olga. daqueles que não se sen­ o desconforto. existirá. permitir tos não aceitos. o casamento com uma camponesa de suas Penso nos exercícios de Nyngma (prá- propriedades. quando me sumo sacerdote da família. ticas da medicina tibetana) através dos quais pois para o Brasil e trouxeram a nostalgia se desenvolve a possibilidade de atravessar dos desterrados. por isso queria ter o nome . Entendi. já viúva. Vieram para a Argentina. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols.. incluí mais um e. que só foi acei- se inaugura com nossa precariedade e se to porque meu pai saiu de casa e avisou mi- despede com nossa finitude. perguntaram. estrada. O tema emocional pertencer e separar passa a ter um sentido intenso para mim. jamais foi aceita por minha avó e 10 anos depois retornaram ao Brasil por causa “das saudades que tinha de minha mãe”. expliquei que tinha o nome te mantém a paralisação do tempo. como Como legitimar a explicava minha avó. signi. a roda prosseguirá: o tempo deixou minha mãe com 13 anos. meus pais adoraram. para conseguir um espaço sozinha. principalmen- crever em minhas lições Sandra Sabina Olga te minha mãe. em uma enorme es. de fórum de reflexão sobre os caminhos . na porta da sala. onde meu pai e meu tio estu. do jeito de viver. (1988). nho imagens desse momento da vida fami. quando conheci Mony Elkaïm Paulo. essa incrível nova versão da história. enquanto minha mãe e avó enxuga. pois como entender que as tem- o outro dividida. meu pai demorou Conheci Mony em uma grande con- a se encontrar profissionalmente. no entanto. mas não terna. quando ravilhosas histórias. mas que entendeu que meu do primeiro dia de aula. Nessas histórias de família. Não te. sempre amorosos comigo. como abandono e deslealdade. A história oficial da família diz onde habitavam quatro gerações (bisavó pa. da pensadores contemporâneos em um gran- “pequena Itália” que haviam construído. passei a acreditar que o minha mãe chorava. E. tendo emagrecido 20 quilos em vice­‑avó. Paulo. que pela primeira vez mora- Fedullo Mary! ria sozinha com o marido e a filha. bem em silêncio. e tive o prazer de trabalhar com ele algu- ção de uma grande hostilidade aos italianos mas vivências clínicas. nome e foi apedrejada). essas reflexões. parece que eram vividas mas esse fato permeou muitos diálogos fa. narradas em diferentes situações por minha mãe. as escolhas liar. aprendendo muito cedo peraturas do Rio de Janeiro eram mais in- a proteger minha mãe e ao mesmo tempo suportáveis que as de Ribeirão Preto. sor- mim dos mais significativos na construção riam um pouco surpresos. meu pai e minha avó. em fun. deixei de es. no final da Segunda Guerra. vendendo­‑os e vindo para São anos de 1990. tinha 3 anos e pouco quando o vivemos. um pouco cons- da cultura familiar da impossibilidade de trangidos. Lembro­‑me de como me escondia um ano e sendo obrigado a voltar para São no porão com os gatinhos. Lembro mais tarde as conversas e vivência do perigo da morte. Acredito ferência internacional em Buenos Aires que tenha sido difícil abrir mão do negócio. tio solteiro. cujo objetivo era reunir os maiores das relações sociais. e eu quis que dessem diretor de uma multinacional no Rio de a ela o nome de nossa mãe.. separar. pois temiam que pudesse adoecer. que meu pai adorava o trabalho. Após a decisão de sair de Ribeirão Esta é mais uma longa história inicia- Preto. longe de Minha mãe contava que tinha sido muito fe- todos.. nossa vice­‑mãe. onde agradar a minha avó. onde meu pai cuidava dos negócios da no final da década de 1980 e começo dos da família. surgem própria casa e ficaria perto de dois irmãos mais cenas sobre as construções de perten. nossa Dadá. haviam vivido tantos anos? Ao dividir com Um episódio. trazendo a miliares. Manual de terapia familiar – Volume II 73 de minha mãe também. adeus sentada em uma mesinha de quatro Quando em minhas terapias e interlo- lugares. pai sofria muito com o calor e aceitou que cola italiana. mas claramente curiosos com partir sem abandonar e ser desleal. teria sua Revisitando essas lembranças. cida- e eu) e vários empregados muito queridos. avó paterna. sentida com as atitudes calor insuportável era uma metáfora para a de minha avó? Eu corria de um lado para separação. meus pais suportou o calor de Marechal Hermes. explicações sobre esse momento. cuções clínicas comecei a revisitar essas ma- vam as lágrimas. de partir. já adulta. fui eu que A liberdade do terapeuta o revisitei e encontrei novos significados. parece para meus pais. fazendo família. Somente quando Quando recebeu um convite para ser minha irmã nasceu. que haviam se casado e que residiam no Rio cer e separar: morava em uma casa enorme de Janeiro. voltássemos para viver na casa da “grande” daram quando chegaram da Itália. Lembro­‑me liz nessa época. de do interior do Rio de Janeiro onde esta- como a Luiza. que me propiciaram (a drogaria da família precisou trocar de o “pulo do gato” como terapeuta. Janeiro. Mais tarde. va a fábrica. ressonâncias são acordadas e nossos sen. dualidade. Gostaria cem maravilhosas para poder trabalhar a de enfatizar que o encontro pressupõe con- partir do que me constitui e ser responsá. fortalece­‑nos na posição de autores de nos. responsável pelo espaço reflexivo ampliador. No entanto. Abolimos a relação de poder sobre o de cada narrador e. tornos que nos diferenciam. abrimos caminho para o relativo. não legitimadas por nós. conhe. abandonamos a busca de vido. dores. ressonâncias e gera a ampliação do aqui e mados como terapeutas a revisitar nossas agora. ção do exercício do poder entre as pessoas. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. em minha opi- tórias de afeto para compartilhar e refletir. possam transformar as coreografias que ge- são das relações humanas na formação ram conflito e dor. Penso. que revisitá­‑las. vozes internas. para que possamos A fusão seria o derretimento dessas transformá­‑las. O risco de com Mony. para que. Como diz Daniel Stern (2007). pois. a perda de si mesmo. autor referente e relativo. O encontro humano. vozes de nossos clientes. toda vivên- cer mais profundamente nossos enredos. A horizontalidade nossos relatos. convidando­‑nos a sair do lugar de tos e que se transformaram em tramas asfi- profissionais que falavam sobre as relações xiantes (Colombo. terapêutico ocorre quando essa horizonta- contro humano especial. a relatividade outro. mas acreditamos no uso do poder com de sua história. é nesse lugar. o outro em direção a caminhos alternativos. A partir desses encontros fronteiras. encontrem vivências alternativas que ficarão privados da possibilidade de terem . encontrava­ mas totalmente consciente do lugar que está ‑se Mony que. senti­‑me totalmente autorizada nos misturarmos e nos perdermos no espaço a ver o processo terapêutico como um en. perdendo­‑se no encontro. em que todos os lidade é vivida sem a consciência da inter- envolvidos são convidados a estar presen. narrador. estamos incluídos naquela narração. e quais os significados que que se propõe na relação transforma a no- construímos. da subjetividade e na interseção com a A libertação do terapeuta como ser hu- sociedade. cia significativa se dá na intersubjetividade. que dessa forma peito. não estando. a transformação. como ele. mano. de todos os envolvidos. as em clima de cooperação. para me vel por convidar o outro a realizar um en. que pode ocorrer sas construções de mundo e. ou de quem está certo “misturem”. pois acreditam que proponho que se culpados e inocentes. os diversos com medo dessa postura para a qual os con- pontos de vista. de perder os contornos de sua própria indivi- A consciência e a liberdade me pare. 2009).74 Luiz Carlos Osorio. nossas vências reflexivas do espaço terapêutico. o terapeuta auto- timentos passam a fazer parte da história rizado a esquecer seu lugar como construtor que está sendo vivida naquele momento. nião. o que a diferença de função que o lugar de cada deixamos dentro e o que deixamos fora de um traz para a relação. Entre esses pensadores. em uma grande assembleia sendo chamado a ocupar: um colaborador de quase mil pessoas. aqui e agora. como narra. encontrar com alguém. soluta. palavra que ouço como um risco e de quem está errado. preciso reconhecê­‑lo contro humano que acordará as histórias como outro. emocionou­‑nos e fez­ para ampliação das reflexões e das vivências ‑nos mergulhar em nossas próprias histórias afetivas que estão saturadas de impedimen- de vida. da ciência contemporânea e a compreen. seção das ressonâncias. portanto. A riqueza de experiências e pontos de mas não desconhece a diferença de compro- vista diferentes comprova a singularidade misso. Ao sairmos da posição ab. fora de mim e comigo. no entanto. fornecendo os caminhos para as vi- histórias de encontros e conflitos. as Muitos terapeutas me dizem ficar confusos e diferentes versões da realidade. fazendo de nossas tes com suas histórias de vida. delicadeza e res. acontece nos pontos de interseção das Mony não nos deixa de fora! Somos cha. essa concepção não ignora através das distinções que realizamos. humanas para o de pessoas que tinham his. a chance de estar no silêncio. um lugar” (p. que não brote de áreas­ Estimulou­‑me a dar nome e ênfase a experienciais silenciosas”. do qual era devota. o silêncio! soa (a situação em que nasceu. Memórias importantes de minha infân. identifiquei­‑me ta aconteceu na metade dos anos de 1990. Gostava Acredito. sua busca do Sagrado. trar despidos para um encontro com nós ambiente tomado de cores. que é a essa constelação. em um mãe. para evitarmos perceber víamos. é um lugar em que podemos ou não pene- tando. o percurso Aprendi o valor do silêncio com minha que teve) afeta positiva ou negativamente mãe e nos encontros com Andersen (1994). que para mim simboli. decisões. quando li Safra. caixinhas. para de que tinham aberto minhas portas para a que fôssemos iluminados em nossos proje- dor do legado da impossibilidade de partir e tos e para que ela pudesse refletir e tomar da minha própria bolsa marsupial. acolhedor e significativo ou de um pensamento que de respeitoso como terapeuta. Percebo que minha mãe já tinha Todas essas reflexões me levaram a sua caminhada interior para Santiago de criar oficinas para terapeutas e fazer a pes. a história de uma pes- portante para mim. em uma Outro encontro que me marcou e abriu entrevista maravilhosa que deu para Andréa novos espaços e concepções de ser terapeu. linhas. recortes de revistas. na Igreja de Santo a porta de nossa história que essa pessoa Antônio. caixas. totalmente: “Para mim é muito claro que com Tom Andersen. seu si- quisa “Cuidando do cuidador”. trico. desejos. 113). Dizíamos. mais recentemente. ções. “ma- abriu e que nos perturbou? Relatei. que algumas pes­ de entrar nesse mundo mágico. minha mãe passava mais aguçada. e foi até o Pari. imagens e paz interior. No entanto. 1994).. Compostela.. clinicamente sempre converso muito com meus clientes sobre as vozes internas. Quantos en. e que foi ou não aprendido e au- telas.. tecidos.. costurar soas passam a vida sem ter tido a experiência .. você vai sozinha. desenhar.. torizado pelas experiências afetivas que nos lãs. Bonfim Perdigão (2005). relendo Gilberto Safra vo que ele possibilita ao ser humano ter um (2005) – muitas estrelas foram se juntando estado de abertura e de fecundidade. Mas redos estaremos confirmando quando não não compreendia naquele momento que es- ouvimos nossas vozes internas e assim não tava também aprendendo a refletir.. foi ainda cantavam. Minha consciência de que o silêncio cia envolvem minha mãe costurando. fato tenha um porte. horas concretizando esses sonhos. claro (2009). tesouros que me en. tesouras. artigo. pensar abrimos espaço para as vozes de nossos e usufruir de um silêncio fecundo em cria- clientes e consequentemente ao que se pas. Minha sa no espaço entre nós? mãe adorava fazer longas caminhadas sozi- Quantas vezes classificamos dentro nha e algumas vezes saiu do Itaim. do Manual de Terapia Familiar os diferentes significados do silêncio. onde vi- de nós um cliente. como ele. aprender tricô. “Infelizmente. agulhas.. é muito longe. a história “da família dos cangurus” e ela respondia que ia com seus pensamen- (Fedullo. constituíram como seres humanos. Há muito pouco tempo pude nomear pia familiar”. O silêncio cheio as vozes desesperadas e aquelas que podem de significados ser ampliadoras e sonhadoras. mais adian- uma experiência que sempre foi muito im..t na qual fui tomada pelo tos e que era uma caminhada para colocar desejo de abandoná­‑los. que intuitivamente transitava pelas diferen- ças.. e eu obser- e. sem me dar conta uma ótima energia na vida da família. te. mesmos. E.”. E. silêncio. alguma coisa. bordando ou pintando em seu ateliê. Manual de terapia familiar – Volume II 75 suas próprias vozes ouvidas. como relatei lêncio preenchido de significados. no capítulo “O papel do terapeuta na tera. não há possibilidade de um gesto realmente zou o que há de mais humano. dos palavra é continência e presença. invisibilidade. que narram a falta de continência. dificul- posso experimentar. de interesse verdadeiro entre as nos constitui como presença e não somen. em que a perda possa ser vivida como nos. se mantém. e nificativas. acolher as vozes. crianças pequenas com compromissos de cio pode ser sentida como o terror do va. Assim. o “ter muitos inte. de ser recebido e embalado. enfati- Qual o significado que podemos dar à zo que os terapeutas. do qual precisamos fugir a todo custo. representa. trabalho terapêutico. está no centro das queixas bém o medo do próprio vazio. pois Finalizando essa longa narração. te caos­‑ausência­‑vazio­‑terror. (ter lugar em si mesmo e não perder o ou- resses”. com seus “sintomas”. A ênfase a aparece. Assim De todo esse enredo. agressividade. pode ser encontros e desencontros. podendo significar cerne da condição humana e. vemos inerentes ao ciclo vital (necessidades mais . as luzes são focadas na cintilância um ou ao outro está ligada às necessidades e na fugacidade da paixão. acolhi- gar dentro do outro. a internet. não podermos passar noção de estar autorizado a existir. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. mesmo na ausência. campainhas junto com luzes memória de ter lugar no outro protegem a e cores? Ou ainda. portanto. Com essa visão. necessitam mergulhar nessas águas profun- assim que chegamos ao silêncio de nossas das para que surja talvez a possibilidade de casas? Levarmos o iPhone. os afogamos em estímulos. a pertencer (ter lugar no outro) e se separar za o “fazer mil coisas”. ser “eficiente na gestão do tempo”. e fruto de distinções singulares que faço a não podemos esquecer que nem sempre a partir de minha experiência de vida. O apren- uma tarde “sem fazer nada”? dizado humano de confiar e ser autorizado Nossa cultura contemporânea valori. ou. e paz interior. tro e ser solidão. pode ram e de meus mais de 40 anos de trabalho também desenhar uma evitação do encon. no meu ponto de vista. das famílias. Pertencimento e autonomia que se estende além da presença. a que denomina silêncio O olhar para fora de si mesmo. do desespero e paralisia. dor. dificuldades com os limites. ensina. dades com o sono. fazer e não o ser. pode estar tam. tro) é iniciado desde antes do nascimento e mas a valorização do encontro humano. para o – terror. a TV. e grandes executivos zio. que as vivências de abandono possam ser mos uma caminhada no bosque? ressignificadas e se transformem em separa- Ou.76 Luiz Carlos Osorio. Acredito que esse caminho também nos permite a cons- trução da vivência do lugar. dividir. clínicas das pessoas. dos casais. convivência. grandes executivos. brinquedos que fazem vários sons. ções. relações amorosas sig- cias de confiança na presença humana. e assim a vivência do silên. vazio de si mesmo. se agitar se não é necessariamente se tema separação e abandono é para mim o colocar em movimento. Essas vivências se constituem dito que o tema separação ou abandono é sutilmente e na integridade do encontro. acre- vai além dela. não simples. de ter um lu. necessidade de ligar o som. quando com nossos filhos peque. Penso que a vivência da continência. das vivências de também ruído e ausência. e não como mentos. dificuldades na escola. mente de estar só. de ter um lugar. Nessa dimensão. levando­‑me a tentar preencher rios como porta­‑vozes do pedido de ajuda com qualquer presença esse espaço que não das famílias. fica esquecida. O lugar que. em busca de pequenos espaços de silêncio a vivência de ser abandonado. pessoas da família. percebo que o como. quando do por esses dois movimentos. do pelo meu próprio ser desconhecido para E das crianças levadas em nossos consultó- mim mesmo. cada passo do caminho pela vida é marca- onde tudo se dá. nos conduz a experiên­ mento. enquanto faze. perda da presença do outro. falar pode não minha família nas gerações que me precede- ser conversar. pois o aprendizado e a tocam músicas. meu e do outro. clínico com famílias. dificuldade na convivência e no respeito e através das heranças transgeracionais. pelo segundo vazio e estéril de si mesmo. escolhas e a ficar triste e sentindo uma dor no peito. uma experiência do rompimento da fusão. Ainda não estou pre‑ o abandono. Antes eu acordava à noite e dormia facil‑ mente a crença na importância do processo mente. carta de uma pessoa que me procurou du- turas. que traz um silêncio pelo menos uma hora e meia. ao contrário. Na construção des. Quando trabalhamos terapeuticamen- te com nossos clientes revisitamos essas tramas que se entrelaçam e desembocam . partindo da precarieda. que evoluiu para uma grande que cada um de nós traz em sua bagagem. As lem‑ branças são muito intensas. decisão ter vindo sozinho para cá. O único momento em que para- nos habilita mais ou menos a ser recebido e vam as hostilidades era na relação sexual. talvez seja uma linda metáfora de to dos pensamentos não me deixa dormir. As vozes de alguns clientes tos críticos decorrentes de “desastres” que envolvem quebra de expectativas. sexo. após uma ou de saúde. perdas profissionais ou econômicas rante um processo de divórcio. de e dependência absolutas. Quando fico sem atividade. Agora são 6 horas e já estou acordado há Assim como a perda. ser escolhido. mas onde não se perde a presença de comecei a acordar muito cedo e o tormen‑ si mesmo. sua própria finitude.. Nossas reflexões trazem inexoravel. de não ser visto. conflitos políticos ou étnicos. perda de peso. parado para viver apenas comigo. culminando com a vivência de como se existisse um vazio dentro de mim.. desrespeitado e explorado. que tantas vezes vazio dentro de mim.. . outro. é. é separações. está embutida nossa bagagem e de nunca mais ter alguém que o amasse ou todo o conteúdo que ela contém. O pedi- cretizadas no lugar em que nos colocamos do de ajuda veio por estar sofrendo muito e oferecemos ao outro. sinto um no enredo do presente. Meu cliente sentia­‑se essa complexidade de experiências. passado. Estou em Milão. reflete o paradoxo en. de não dentro da entrega do pertencimento. apenas um vazio emocional.. chegando nhando para a singularidade. união muito difícil. homem que se descreve com muito receio que permitirão a construção da autonomia de não ser amado. con. Manual de terapia familiar – Volume II 77 fusionais ou mais exogâmicas) ou a momen. xado dormir bem.. dor no peito e angústia. passando pela Sinto também que. nunca mais se sentir intenso sexualmente. Não acho que seja de confirma os medos e dores das histórias do tristeza. de ro. Essa situação culminou em uma briga e na Para cada relação oferecemos toda separação do casal. nas relações que travam batalhas infindáveis Seu relato é sensível e delicado. feita de uma atração se- desastres da natureza). Essas questões da existência humana se tornam corpo e dor em nossos consultórios. Não sei se foi uma boa tre pertencimento e autonomia. Típicos da solidão. Tenho tido dificuldade para dormir. fico pensando de individuação de cada ser humano. é um para construir a proximidade e a distância. . com crises de angústia. um dificuldades com os filhos do primeiro ca- lugar nessa trama de afetos e emoções que samento.. tendo a ficar mais para baixo. viver a separação Não estou preparado para estar apenas com o silêncio que não tem a presença do comigo em paz. Poder separar­‑se. transcrevo um trecho de uma teiros escritos para a vida (mortes prema. Aí vem a sensação de vazio. sem esquecermos xual intensa.. Hoje. medo ses lugares. e isso não tem me dei‑ minho do vir a ser. legitimado nessa história. O ca. o vazio de mim mesmo. dia consecutivo. sozinho. Em função do fuso horário. na minha separação. onde o outro ainda sou eu. A seguir. quando acordo. quando sinto falta de necessidade essencial de pertencer e cami.. um processo de individuação bem­‑vivido. onde a partida é Preciso me fortalecer. aos quais se dedicou imagens clínicas de processos de separação totalmente. agora (Figura 6. o silêncio da au- sência da presença do outro confirmava o risco do vazio de si mesmo e a dúvida de existir um lugar para ele no outro. judicial. para os dois. rizamos a ampliação da história individual do para uma separação cheia de brigas e e da relacional que está sendo vivida aqui e advogados. penso na imagem Assim.78 Luiz Carlos Osorio. só havia passagens atra. tos de crescimento com os pais. Nesse momento. depois de alguns anos.1). A perda desse amor fechou­‑o por vividos como abandono. conta a história de drontados. muito jovem. recebido.”. ram com força novamente. Meus colegas e alunos sabem o quan- Ninguém estava autorizado a pene. te e sendo capaz de satisfazê­‑la. dor no peito e angústia. em que no encontro com o segunda união. anos para novos relacionamentos. onde as sombras e carências dessa Nesse processo de negociações dolorosas. deixan.. de não ser visto foi se instalan. a partir desse momento. quero trazer algumas do dois filhos pequenos. na descrição dele. da posse. evoluin. Em nosso percurso. A sensação Ao abrir espaço para os clientes criarem­ de desamor. da beleza. vêm à tona as ofensas . Em sua bagagem. que resol- mento as vivências de abandono recíproco. O amor adolescente que se tornou casa- mento. imagens de suas vivências. para não permitir ne- (atrações sexuais irresistíveis) e cortes ame. um mundo relacional. nhuma aproximação. trar suas barreiras. o que estão sendo concretizadas na batalha que desagrada profundamente à família. a vivência do abandono a confirma. como escrevi no artigo citado anteriormente vés da atração sexual. Em sua bagagem para a vida. Assim. Figura 6. O olhar do outro definia a presença de si mesmo. a paixão sexual e a insegurança da segunda união e a esterilidade e a severi- dade do modelo de afeto de sua família de origem. parece­‑me que. era observador despertam­‑se histórias que con- baseada na atração sexual. família. Uma separação que acorda os abando- rosos como a perda da primeira esposa. dois filhos desconfirmaram essa história! A traição da doença.1 pero. Imagem de aprisionamento-proteção-contenção. relação estão sendo expostas. todas as histórias foram construí­ das para confirmar esse destino. ve fazer um intercâmbio em outro país. (Colombo. to gosto da linguagem das imagens. competen. As rela. que. Sua história tem momentos muito dolo. Típicos da solidão. revisitamos a fer- tilidade e o amor romântico do primeiro ca- samento. um câncer fulminante. e. 2006. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Abandono ou mas ao mesmo tempo cada vez mais corajo- separação? sas e com intimidade. aconteceu a como narrativa. o deses. Essas experiências do segundo uma encantadora adolescente com confli- casamento parece que puseram em movi. com nos de toda a vida. única área em têm o presente e memórias profundas de que se sentia realizado. p. a imagem do aprisionamento­ ções foram pautadas por ímpetos fusionais ‑proteção­‑contenção. 18). penso que auto- do.. a dúvida da existência de um lugar era muito presen- te. Sua falta desconstruía o seu pró- prio lugar e trazia a dor da própria invisibi- lidade: “aí vem a sensação de vazio. pois. não quero voltar para casa”. em casa não sabia como fazer. tão doloroso nes­ sa família. sinto e que não tinha nem a própria cama para que vou morrer. car junto. no qual não estavam felizes. representa um dos trabalhos mais tocantes para mim. Cada um dormia onde deitasse. O apego da esposa ao filho fazia todo sentido e ele dizia que é “assim que uma mãe deve ser”. e a impossibilidade verbalizada por ele de fi- pois relatava suas experiências de criança. O grito que amedronta e afasta. enquanto a criança grita.3 dolorosa se manteria viva. procurou a mãe biológica.3. A Figura 6. ao que ela respondia.2. com inseminações. contam a “infidelidade” dele adolescência. me ouve. só gritando ele reage”. com vidas muito paralelas. onde o rosto contorcido de um homem chora e uma mulher com o filho nos braços parece estar em desespe- ro. com uma colega de trabalho. mas que só conseguia cuidar do filho quando saía com ele. explodiu ao se viver a força fusional que impedia o respeito e proteção aos contor- nos individuais e às fronteiras. “grito porque ele não adotado ainda bebê por um casal sem filhos. dormir. to para engravidar durante dois anos. Eles vieram para sentir se poderiam reconstruir o casamento. o casal narra suas brigas se sentindo segura para afastar­‑se do filho. A falta de con- fiança e intimidade nas relações e o exercício de poder vertical patriarcal foram revisitados com dor e coragem nessa história. No meio cresceu conhecendo a própria história e. “Quero me separar. que estava casada e tinha mais dois filhos. Fizeram tratamen- Imagem de tristeza e abandono. sacrificando seu próprio lu- gar sem se darem conta de que essa herança Figura 6. Ele. ao dar ao filho um lugar tão absoluto. Dizia que ele e a esposa eram dois desconhecidos. Manual de terapia familiar – Volume II 79 sexuais do tio materno sofridas por ela. não tinham relaciona- mento sexual há anos. Grande insatisfação dela por ter deixado a vida profissional. O caminho da individuação. poucas conver- Figura 6. Senti que o vazio de não ter lugar es- tava acordado de uma forma singularmente dolorosa na história de ambos e que o que mais temiam do destino estava se repetindo passo a passo através da repetição da vivên- cia da invisibilidade e da ausência do outro. não aguento criada no meio de muitos irmãos e irmãs os gritos. De al- guma forma tentavam. vividas pelo casal de forma muito invasiva.2 sas e interesses comuns. transformar a história da descendência. Não queria mais fi- car casado e cuidaria do filho e do sustento dela. na desses relatos. . não suporto viver com ela. mas não Na Figura 6. que carrega a ausência de si mesmo. amedrontando­‑o com os gri- tos. Entendo por abandono o esquecimen‑ santes a partir da pergunta disparadora de to da outra pessoa que fica sem nenhuma nossas reflexões: quais as diferenças que proteção da parte de quem abandonou. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Ele Eu sinto que as duas são iguais. procurando não ser visto. e ela chorava porque o de novo. pois aí te coloca numa situação ção. e ela mília vive ou viveu é sentida por mim como um abandono. abandonado. surgiu uma emoção muito intensa. se ver de novo. às vezes. Uma coisa final. quero agora dar voz a mas me fizeram sofrer muito mais do que alguns colegas terapeutas e agradecer­‑lhes muitas separações pelas quais já passei. cada um em Vamos ouvi­‑los. coisa de lado. A você sente entre separação e abandono? .80 Luiz Carlos Osorio. ças tão delicadamente humanas sobre o como um susto de se verem nessas imagens partir. enfrentando e construindo separações que você não gostaria e não escolheu estar. ou virar um objeto. vivendo­‑as como aban. Colhi 15 depoimentos muito interes. Abandono – dor da ausência que não Apego doloroso. enquanto abrem um um canto da sala. que era sentido nº 2 como a maior violência. Consensual para um processo de indivi‑ duação para a pessoa ser independente. Ele era espancado na infância por fa- nº 3 zer xixi na calça e depois por ir mal na esco- la. outra. onde não podemos nos apre. e. Eu tenho duas experiências de abandono donos. modelos transgeracionais. O destino do abandono. no qual nunca se tem esperança. mas se protegiam o tempo todo. desistir. e construindo essa relação. às concepções sobre o caminhar humano O pior do abandono é quando somos o em direção à singularidade e à individua. fusional. sentar e sentimos que precisamos nos ca- nº 4 muflar. Depoimentos: Suas histórias eram entrelaçadas a situações de muita violência doméstica. A separação pode ser uma coisa opcio‑ nal. paração que eu vivo ou alguém de minha fa‑ escondendo­‑se entre os móveis da casa. Ela Vamos ouvir os terapeutas? não é uma coisa ruim e prejudicial. saindo de casa aos 17 anos para “cuidar Separação – a dor e esperança de se ver da própria vida”. não ser mais. As esculturas foram feitas. passando por algumas imagens e que nem foram de pessoas tão importantes. nº 1 xessem traições e dor. temiam que a entrega e a aproximação trou. das lealdades inquestionáveis às vivências e Abandonar – deixar. e também. relatavam o desejo de paz. por terem aberto seus mundos para contri- nº 5 buir com nossas indagações. ou virar “uma serpente”. Também pode não ser ruim tindo da bagagem de histórias familiares no sentido de querer desapegar­‑se e aban‑ que me constituíram frente aos vínculos e donar aquele sentimento. Toda se‑ parecia transitar. e nunca mais minha mãe foi feliz”. que não tem esperança de pode confiar. de estar junto em um momento pai “abandonou minha mãe para viver com no futuro. par. narrativas clínicas. O abandono é deixar uma pessoa ou Caminhando em nossas reflexões. Pode­‑se continuar com contato de muitas maneiras. estava sendo cons- truído passo a passo como uma coreografia Separação – separar para crescer. o “chamava”. quando as colocamos pouco suas mochilas e oferecem suas cren- juntas. Abandono – Quando a pessoa dei‑ Já um adulto está numa relação entre xa de se importar com o outro.” falando “adeus”. seguir se cuidando por outras vias sem se É ir embora sem abraço apertado. Manual de terapia familiar – Volume II 81 pessoa abandonada fica sem poder contar circunstâncias externas. sentimento. Um lugar da culminar numa separação. que fez muito sentido para mim. . ele não participa da separação. – fuga cruel – desespero nº 7 – falta de continência Sinto como se o abandono tivesse uma nº 11 intencionalidade daquele que deixa o outro. morte. mas que faz parte do processo da Abandono: – desconsideração vida (casamento. seguir em grande parte das vezes). alma (o impedi‑ a festa de despedida. mas BEM pertinho com o colo afetuoso e toda e qualquer pro‑ pelo desejo. Uma vez ouvi algo sobre esses dois te‑ Uma saída sem olhar para trás (por não con‑ mas. Não estar junto por mento é externo). mas caminhando em sen‑ situação de extrema vulnerabilidade e de‑ tidos opostos. a meu ver. ocorre um criança sofre ABANDONO. me re‑ O abandono implica algo que toca a mete a relações verticais. so no qual acontece a cura e o crescimento mútuo. etc. ferirem no processo relacional. Seja ela real ou “interna”: uma Na separação. horizontalidade onde ambas se afastam vol‑ Em outras palavras. volvimento humano psicoespiritual.. A meu ver. ele participa do processo que pode de afeto e amor pelo outro. amor. “torcida” e teção necessária para um saudável desen‑ saudade. Abandono: é ir embora sem dizer Entendo por separação um processo “tchau” ou “até logo. ele é abandonado. nº 10 Separação: – envolve acordo nº 6 – é comunicado Abandono é quando há um corte (inten‑ – é viver um processo cional ou não) entre as partes. caso algo aconteça que o nº 8 separe do seu cuidador. é um proces‑ com aquela pessoa). pendência. na minha experiência. mas também não se exclui da relação e junto com o outro con‑ nº 12 segue buscar o seu caminho. um bebê está numa tadas face a face. di‑ – invisibilidade vórcio. – pode não ser tão do­lo­roso trabalho. O outro possi‑ bilita meu encontro! Separação. gue olhar para o outro. – envolve o cuidado com o Separação é um corte que ocorre entre sentimento do outro as partes. pode ter recursos internos para lidar com Separação – Quando a pessoa conse‑ a separação. de corte “temporário” no qual pode suben‑ E também pode ser “tchau” com cara tender que as pessoas envolvidas poderão de adeus. não é passivo e indiferença.. bem­‑querer. quando o desejo é presente. criança. Ausência iguais. Elas estão juntas em Separação: não estar junto com direito pensamento. saída dos filhos. a É não olhar para trás (nem pra frente separação.). mas que po‑ – pode haver respostas deria ser evitado com algum tipo de ajuda. ocor‑ re quando pessoas estão impedidas de esta‑ nº 9 rem juntas fisicamente em relação. um adulto so‑ distanciamento que ocorre dentro de uma fre uma separação. quando necessária. El equipo reflexivo: diálogos sobre minho. me lem‑ bra uma “trappola” recidivante em meu ca‑ ANDERSEN.. F. abandono mento que não confirmem nossas histórias na ausência. às vezes. A morte me trouxe separação e paralisadoras? abandono.. deixa estar junto. construí mui‑ si mesma. dançan‑ ‑se. mamãe você e eu? São Paulo: Casa do Psicólogo.). Muitas vezes a separação é o mesmo a construção da permissão para que o tempo que o abandono. In: CRUZ. M. Por impedimentos internos (pos‑ tas de minhas diferenciações sob a sombra sivelmente por não ter recebido. E ainda não conseguimos construir outros contextos de pertencimen‑ Recentemente minha irmã se mudou to e adequação. 2000. mesmo quando é uma construção. A separação pode ser esse encontro? Poderão. pois no abandono Como sabemos. ter sofrido da expulsão do paraíso. Hoje me senti abandonada e se‑ parada de mim mesma! Distante! nº 15 Referências Entre “separação e abandono”.. ressonâncias. ao mesmo tempo. uma separação que não mata a intimidade da re‑ Com quais dessas lação. Para existir abandono. Continuamos trocando confidências. Barcelona: Gedisa. vozes gostaríamos mas agora de um modo novo. l994. O que oferecerão para esquecida. rejeitada.82 Luiz Carlos Osorio.. Ter sido expulso. mia e isolamento. S. e a relação não pode ser construída do e levitando alegremente. enquanto o abandono não. ela apenas coloca um espaço. de nos encontrar? Sinto essa separação muito diferen‑ te de um abandono. para França e pude vivenciar uma experiên­ cia “doída” de separação: uma separação onde o contacto físico não mais existe ou passa a existir com hora e lugar previamen‑ te marcados. excluída. mas. pelo menos uma rão sua bagagem vivencial para a viagem pessoa deve se sentir abandonada. como fazem com o outro (o impedimento é interno). portas giratórias: a confusão entre autono‑ COLOMBO. cho da estrada de nossa individualidade e quando o outro de quem preciso não está podermos construir relações de pertenci- presente e sinto então. em separações? Poderão ampliar a pre- sença do si mesmo nas relações? Autorizarão Não tenho clareza. (Org. T. Acredito que. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. partilhar. no abandono. impenetrável. abandono para caminharmos mais um tre- Sinto a separação como abandono. com seus clientes. que não ampliarmos nossas vivências de separação e precisa ser intocável. H. Vemos as pessoas ali. construir espaços ampliadores para ressignificar os abandonos que parali- nº 14 sam. abandono) não encontra a fonte para cuidar. a própria Tendo vivido em contextos normativos pessoa que abandona abre mão de parte de muito mais do que reflexivos. na interseção das cuidada. Em busca do sagrado. Papai. todos os que fazem parte e comemoram as congregações e sabemos que nunca se‑ nº 13 remos reaceitos. que travava (e trava menos) algumas los diálogos. acaba abandonando­ uma nostalgia. minha curiosidade re- não há espaço para preocupações com o pousa na crença de que os terapeutas abri- abandonado. . transcorra e possamos ressignificar nossas Racionalmente penso que o abandono histórias de ficar e partir? Com quais des- exclui definitivamente o outro e a separação sas vozes gostaríamos de nos encontrar para não. com casais. ca para análise das práticas discursivas. S. Mutações. . Gritos e sussurros: trabalhando SAFRA. 2009. B. C. S. interseções e ressonâncias. S. (Org. E. 1. L.). Si me amas. (Org. A face estética do self: teoria e clínica. O divórcio. Práticas de sentidos no cotidiano.). Sobre o silêncio.). F. SACCU. São Paulo: Plexus.. Paulo: Cortez. MEDRADO. In: CASTILHO. SAFRA. M. 1999. São Paulo: Record. In: SPINK. A complexidade. Produção de sentidos OSORIO. L. v. G.). STERN. O momento presente na psicoterapia mas em terapia familiar. (Org. Gritos e A. ULLMAN. In: CASTILHO. In: COLOMBO. N. F. São Paulo: 2008. M. familiar: uma ética relacional. 2006. e na vida cotidiana. F.). A experiência de lugar. Manual de terapia familiar – Volume II 83 COLOMBO. São Paulo: 2005. G. In: VALLE. COLOMBO. T. Vetor. Temas em terapia familiar. Te. S. In: PERDIGÃO.. (Org. 1989. SPINK. O papel do terapeuta em terapia São Paulo: Unimasco. sussurros. no cotidiano: uma abordagem teórico-metodológi- Porto Alegre: Artmed. 2007.). J. São Paulo: Pulso. B. 1994. Espanha: J. São Paulo: Cosac Naify. M. Plexus. non me ames. D. T. (Org. (Org. 1994. 2004. FEDULLO. Manual de terapia familiar. ELKAÏM. C. São Gedisa. . aprisiona- promove a perda do sentido do humano. como operam e de que forma poderíamos criar as condições Os segredos dos olhos para seu surgimento. obra de Cyrulnik nos traz a força de acreditar Essa ampliação nos permitirá com. tamanhas as desgraças para crescer quando a cultura na qual se in. cem. Que saídas podemos encontrar e acontecimentos carregados de sentido que quais os elementos que podem permitir que servirão como base de sustentação para a sigamos em direção ao desconhecido carre- construção de uma nova vida. eles procuram. Às ceituação baseada em uma abordagem in. no potencial de superação de cada ser huma- preender a conceituação dos “tutores de no e de perceber quais caminhos percorrer resiliência”. Trabalhamos com o conceito de resi­ Os olhos estão sempre abertos. quais são os elementos que permitem que a resiliência possa ocorrer. pelo mes- trassubjetiva. em uma tentativa de demonstrar motora de processos resilientes. dos em acontecimentos passados que nos do senso de estar vivo. gando nossos desejos e nossa esperança? . para enfrentar as contingências. Quero re- permite a recuperação de um desenvol. Em vez de acreditar que é o mo. Mesmo dormindo. capítulo 7 Tutores de resiliência na família Denise Mendes Gomes Introdução Durante 30 anos trabalhando com fa- mílias em situação de risco. muitas empo­ Neste capítulo. vezes. A básicas de cada membro da família. nhada pela inquietude de pensar que tudo o a rede social imediata. exce- liência como um processo de natureza to quando se protegem. fletir sobre o problema de seguirmos nosso vimento possível a partir da quebra que caminho colhendo folhas mortas. Outras vezes. a cultura local e o que eu fizesse não teria o efeito de uma mu- estado. pelo novo. A família pode ser um lugar seguro dança significativa. tamanho o estrago que esses aconteci- de seus elementos e quando os dispositivos mentos perpetravam no corpo­‑alma daqueles estatais garantem o apoio às necessidades indivíduos e daqueles sistemas relacionais. Sempre em busca de fazer com que a sujeito o lócus e o motor do processo que experiência faça algum sentido. convido o leitor a re. piscam ou adorme- relacional em oposição a uma possível con. fui acompa- pliado que inclui a história transgeracional. tal como proposto por Boris para participar de uma rede integrada pro- Cyrulnik. pensamos que é o torturam e fazem de nossos dias um eterno campo social que propicia a ocorrência de “re­‑viver”. brecidas e com parcos recursos emocionais fletir sobre a família como um processo am. que caíam sobre aqueles seres frágeis a meus sere não fere ou persegue as idiossincrasias olhos. com uma faca. O lavras horríveis. sua mãe a tomou de volta. esvazia seus dias afastando­ cante em uma farmácia 24 horas. Quando tinha 12 anos. Renan. Assim. ‑se dela. mas. segundo ela. o “Sim. Fui surpreendida pela moça do mais profundos. Ele se tornou violen- les persegue o assassino de sua jovem espo. E você. A cigana leu o seu destino: disse sofrendo em cárcere privado. pas. Pedi descul. “Você não imagina nar por nossas certezas e deixamos de se- como foram importantes para mim aqueles guir um caminho novo! Isso é mais grave sábados em que vocês iam estudar e brincar quando nossa certeza é a de que teremos de com a gente. compartilhados poderiam fazer diferença Jasmim nasceu pobre e sua mãe carre- na vida daquelas crianças com tanta dor e gava muita dor em sua alma. volvente somos convidados a acompanhar Buscou acolhimento na casa do namorado. Quantas vezes nos deixamos aprisio- nato da praça Roosevelt. não impedindo.” na humilhação e na solidão. quando criança. não me lembrava dela. Um filme em que gada e fui comprar um medicamento para os olhos são reveladores dos sentimentos meu filho. Refém de sua que ela ficará louca e morrerá sozinha. perpetuar uma vida infame. O Deise. Este acontecimento revela um dos noite. Pegou­‑a pelos cabelos. Eu sentia muita sua mãe a levou para morar com um homem tristeza e imaginava que era eu quem me de mais de 30 anos. é a verdade que ela carrega consigo. chadada na cabeça. como se observador apenas encontra o que procura. O outro se apai. Um de. que afirmou me conhecer. dupla faceta do olhar: revelar e ocultar.” gência e maus­‑tratos. to com ela. ‑os sentadas no meu colo. Ela me olhou com um olhar apenas confirma suas convicções. a mãe de desfechos possíveis e indica uma nova pers. Refém do medo. É um risco para cada Eu tinha 13 anos naquela época. calcada na dor. Eu esperava a semana toda pelo sábado. cebendo tanto afeto e carinho. Um velho. não sei. Vivem juntos uma aprisionar no enredo de suas vidas. Outro dia vivi um acontecimento mar. olhos perdidos no horizonte e a certeza de impossibilitado de ver que ela o amava em um fim tão trágico como seu começo. saía modificada. Desesperada. Era madru. e começou a cortá­‑los há tanto tempo. vida de muita miséria. “Isso do por um observador. Como um de nós que sofre uma grande desilusão poderia imaginar que aqueles momentos ou a perda de algo vital. as escolhas de dois homens que se deixam Teve dois filhos com ele. Obrigada. Jasmim se tornou violenta com sa. mas o que se passaria com cuidar dos irmãos menores e receber os gol- eles? Eu achava que sua dor tinha o poder pes que escapavam. to. e sofria com a miséria e a solidão. alguma coisa assim. Eu sabia que Jasmim tinha de fazer todo o serviço de casa. Esse é um risco “Você é que não imagina como é importante para milhares de crianças que sofrem negli- para mim ouvir isso. amaldiçoando a filha e seus segredo de seus olhos. descendentes. Eu disse que me que os olhos revelam só pode ser decifra- chamava Denise e ela se empolgou. ficando brilhante e um sorriso doce e me disse que. . Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Dois anos depois.1 Em uma trama en. enfurecida e alcoolizada. Era o melhor dia da semana. Em uma sitiva. reciprocidade. Essa necessidade de vingança. passou alguns anos no orfa. Mas ele tem de estar mesmo! E tinha um Renê. posta para a indagação que me acompanha que iam até a cintura.86 Luiz Carlos Osorio. sempre re. Jasmim fugiu. no entan- caixa. gritando muito e dizendo pa- Um filme me tocou recentemente. passando a viver em função de mantê­‑lo seus filhos. Jasmim a despertou do sono com uma ma- pectiva a partir da qual procurar uma res. chama?” “Jose”. que suas intenções passem despercebido. Sua mãe bebia muito de anular qualquer experiência afetiva po. de fato. Ela O diretor explora muito delicadamente esta me perguntou se meu nome não era Débora. o Renê e o Reinaldo. cego para o que há para ser visto. desde desamparo na alma? Eu tinha os cabelos cedo. Muitas vezes.” pronto para a descoberta. Jasmim sofreu os golpes da dor de sua longos e as crianças ficavam horas alisando­ mãe em seu corpo. beneficiava de nossos encontros. Tem os xona por sua companheira de trabalho e. to com os padrões assumidos na vida. para ele. pode simplesmente não fi. Muitas são as crian- Neste capítulo. É lam por uma variedade de famílias adotivas difícil precisar onde começamos. Se esta gravidez foi resultado do mesmo. “Se sua mãe ficar O apego seria. em meio às leis inventadas pelos homens” ção em nossas vidas. O pai pode ter o so. gravidez só pode ocorrer no contexto do ca- das na parede de nossa sala diante de nossos samento e que condena as mães solteiras olhos e descobrir o portal que se abre bem como pessoas imorais. o desafio quando nascer” (Cyrulnik. O novo é um rompimen. O homem precisa de ordem. de re. estupro de um soldado inimigo. de desvirtuamento. Para ele. Assim. uma traição à pró. vem antes do ovo! Uma mulher des. essa criança nasce como a ver- a partir da encruzilhada? A vida nos convida gonha dessa mãe. provavelmente. resultado de uma tensão entre da humanidade por ter trazido ao mundo a necessidade de preservação e o medo da uma criança ilegítima e não for capaz de transgressão. portanto. 2005. com permitam a elas aprender a amar ou a ad- certeza. Mas. Ela pode Os filhos de pessoas consideradas de menor ter um homem a seu lado ou ter tido apenas valor também podem ser vítimas desse tipo uma relação ocasional. Uma das lições mais importantes que ge e seguimos reféns de nosso medo através uma família tem de ensinar a suas crianças é da evitação e da busca do mesmo. 2005. 2). p. vezes estamos inconscientes do que nos afli. o imprevisto. não sendo tão ter planejado a gravidez ou não ter a míni. Se os pecados e os vícios nho de ter um filho com ela. quirir o sentimento de ser digna de ser ama- cobre que está grávida. como a culpada por sua ao desconhecido. Nesses contextos. 1). o ho. pois é como se “as crianças sem radiante de júbilo. Pode ficar desesperada ou é mais alto. o segundo deverá morrer nos limita a pensar que o que temos diante ou viver uma não existência na clandestini- de nós é “tudo”. Os riscos de maus­‑tratos a essas crianças 43 anos de idade. há crianças ao antigo modo de atuarmos e pensarmos. Ela pode fossem terra de ninguém. Ilusão. embrutecida de tanta infelicidade. grave maltratá­‑las” (Cyrulnik. como aprender a amar. Mas procuramos sempre o desgraça. já não estará viva sempre buscar e sempre superar. 1). e precisa­ o que não queremos mais e poder estar pro. crescer ou se desenvolver. pode pedir que são as virtudes enlouquecidas. a galinha. como dar­ petição. p. Porém. não há superação oferecer braços que lhe dêem segurança. Se há uma lei que determine que uma Como deixar de tentar abrir as portas pinta. devendo ser isoladas atrás de nós? Será possível mudar a direção e rejeitadas. Sempre a nos surpreender. suas contingências. ma ideia de onde vêm os bebês. em se sem constituírem vínculos duradouros que tratando de seres humanos. muitas viáveis. precisamos ela tire o bebê. que já nascem fora da lei. p. colocar luz sobre esse mundo das sombras e car sabendo que este bebê é seu filho. há uma lei que proíba que uma mãe tenha O universo das experiências vividas mais de um filho. Manual de terapia familiar – Volume II 87 Nilton Bonder (1998) nos ensina que elementos estarão encarnados no bebê que para mudar. de previsibilidade. Mas é lamentável. Como ir além do jardim? dade. Esses trazer lucidez aos olhos dos homens. Este pode ser o seu pri. uma “Um bebê só pode desenvolver­‑se superação do que já se tornou uma tradi. a sem transgressão. Ele nos lança o desafio de criança. mos procurar maneiras para permitir que tegidos contra o que nos agride pode nos essas mulheres encontrem outros caminhos proporcionar boas escolhas. Saber ne seu bebê. . A única ‑lhe a vida sem manchar a honra da nação? constante à nossa disposição é a mudança. expulsa pria alma. vai nascer e definirão muitos aspectos de mem precisa trair. uma traição (Cyrulnik. vamos refletir sobre o ças que são deixadas em instituições ou circu- sentido que damos ao nosso vir ao mundo. família valessem menos do que as outras. meiro filho ou o décimo primeiro. é compreensível que uma A vida nos oferece o acaso. Se da perseverança e da altivez. Ela pode ter 13 ou da. o mulher tente um aborto caseiro ou abando- inusitado. 2005. a crianças a partir de 12 anos. Mas de que adian- Depois o prenderam no presídio da facção taria? Seu corpo havia sido arrombado. Um lugar fora tro da cidade virar pó. isso é mais grave Filho de presidiário. seria seguir o caminho da lei e da ordem. era constante. Seu ele na prisão. o dia todo. Cada um de nós nasce na confluência criminosa contrária à de seu pai. esvair­‑se nas nuvens da lei. Ele não havia completado 11 anos e homem que lhe dava uma vida cheia de con. 50. No en. Joãozinho? Poderia sonhar com uma vida entre os “ho- mens de boa vontade”? Poderia viver sua A vida de Joãozinho vida sem vingar as maldades feitas a seu pai e seu irmão pelos arautos da lei e da Joãozinho não tem uma vida fácil. Se correr o bicho trajetória promissora. Passou uma Dois anos se passaram até que seu tarde no pátio com outros cem garotos. A lei agora de muitos fatores que determinam nosso co. seu destino. Seu irmão mais ve. no centro da cidade e foi levado pela polícia que o cobria de presentes e o levava para para uma unidade de triagem da Fundação passear. tudo o que não tinham o direito de fazer. frente para recomeçar. 40. seu pai algo de muito ruim acontecesse a Joãozinho. trar o caminho do meio. nisso tudo. Seu pai participava do crime organi. sumia por uns dias e voltava. seu . Muitos de nós. e sem trair o nome do pai? tígio e viviam em uma condição financeira Joãozinho passou a desaparecer. Seus braços viviam agarrados ao passado e depois de muito aprendizado pelas más es.88 Luiz Carlos Osorio. Ia para o cen- tanto. 20. Joãozinho era o preferido do pai. Algumas pessoas Quem me contou tudo isso foi a mãe conseguem trilhar uma vida da qual se or. Tudo se transformou. durante as horas sem fazer nada vidrado no lho logo seguiria o caminho do pai. Joãozinho estava novamente dedicado. melhor forma que podia. durante uma fuga. ânus foi dilacerado e contraiu sífilis. Joãozinho teria de encon- que conheciam e seu pai vivia escondido. Levaram­‑no para o matagal e o torturaram Sua mãe procurou o conselho tutelar. Sua mãe era feliz ao lado daquele Casa. as medidas socio­educativas só se aplicam forto e mimos. outra vez se preciso fosse. com saco plástico na cabeça e procurou a assistente social. Quando continuar vivo? Qual era o seu lugar agora? se trata de vidas infames. de Joãozinho. Pegaram também seu irmão. mas sentem que já é tarde. Foi pai foi capturado. temos uma vida inteira pela margem da sociedade. tal filho. Seu irmão seguiu meu olhar mais detidamente. Sua mãe cuidava dele da em um mundo à parte. era um lugar no exílio. queria evitar que Um dia. Seus olhos se distraíam en- gulham e podem dizer que começariam tudo tre os presídios e seu desencanto pela vida. E o que seria dele. Se ficar. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. medo dos desfechos. provedora de uma rede de sem que a morte o apanhasse precocemente apoio sólida e solidária. não tinha mãos para segurar ou conduzir os colhas e por tudo que deixamos de fazer por filhos. Seu pai tinha pres. Fizeram o diabo com currado por mais de 10. apesar de todo perigo. ajudando seu pai a prover a família. onde transgredir procurado. Onde buscar uma saída e de esperança. o fracasso dos fracas- e é sobre esses casos que gostaria de deitar sados. carregada de sentido pega. Procuramos um advogado. Então. matou um policial. Ela sabia que o caminho do crime era um ca- Mudaram para bem longe do mundo minho sem volta. Ele melhor do que as famílias vizinhas. Era uma chão da rua que o acolhia. Tal pai. gostariam de fazer di. come. Seu irmão ingressou no crime. a psicóloga. 30. mas essas questões o rondavam zado quando ele nasceu. Um lugar de uma existência marginal e cair feito pedra. mas seu pai era amoroso e Um dia. os cobrava que pagassem por sua errância à meço. O medo Única chance de sobreviver à barbárie. O que Joãozinho precisaria fazer para ferente. É o ordem? Como ser leal à sua história e a si terceiro filho de um casal estável de classe mesmo? Ele era muito pequeno para pensar baixa. as ONGs. Levado ao hospital. dan. várias estratégias social. sob o domínio de um capaz de protegê­‑lo. Judeu. Como temente prazerosa. as mudanças. Nunca sua vontade teve Résilience. Todos falharam com Joãozinho. sidade e do sofrimento. Eu desenrolar sempre dependerá do acaso e da olhava para ele e indagava o sentido de sua coragem para aceitar os desafios e encarar brincadeira. A vida que ainda lhe cabia vi. mas lientes que sobreviveram à Segunda Grande os policiais não levaram isso em considera. Foi li. Ficou detido para averi. puxava ou vel a partir de soluções surpreendentes. mais descolados e numerosos. inevitáveis em al- cou perplexa. Esse balançava. Estudou na a cirurgia que reconstituiria seu ânus. não se- contrariá­‑lo. Com o final da guerra. Eu me perguntava pelo senti. ce de recomeçar com o apoio de seu povo. todos estavam de acordo são possíveis. de vez em quando. Ele foi . 2009a). aceitação da tragédia como um fracasso te de sua casa com um cãozinho de pelúcia anunciado desde o início. que seus pais e sua irmã foram levados e guações uma tarde. A re- mo que. recusou­‑se a fazer sua comunidade e seu estado. sidente do Observatoire International de la tra a vontade dele. família em um contexto cultural que con- da contra Joãozinho. da luta de uma criança empurrada para a ver. resiliência psicológica. teve a chan- estado. desde a entrega à carreira de com a necessidade de tratar Joãozinho mes. Joãozinho passava os tar à vida (Cyrulnik. Não o internaram go na Universidade de Toulon – Var e pre- e não o trataram pois não fariam nada con. mais fortes. como tantas pessoas que Boris Cyrulnik nasceu em 26 de julho sobreviveram ao holocausto. Universidade de Paris e escreveu vários li- do fim à hemorragia que perdurava. É mais conhecido por ter desenvol- berado pela equipe médica sob a alegação vido e divulgado ao público o conceito de de que não podiam fazer nada contra a von. assassinados em campos de concentração. Manual de terapia familiar – Volume II 89 solo sagrado desonrado. ria uma história de sucesso. Guerra. tado o termo cunhado na física pelo cien- balho tem a marca pós­‑moderna da segunda tista inglês Thomas Young em 1807. dando movimento ao animal. tanto poder. ao alcoolis- mo ou ao suicídio. Que direitos teria cibernética ao incluir o observador no cam- o filho do assassino de um policial? Ele era po observado: ele é uma das crianças resi- muito novo ainda para cumprir pena. as instituições do raça. Talvez fosse um modo de sal. a psicóloga. O conselho tutelar. na França. Cyrulnik procurou en- devolver­‑lhe a vida? tender como é que algumas pessoas podem resistir às tragédias retomando seu desen- volvimento e reinventando uma vida quando Filho da guerra outras sucumbem à depressão. isso significasse siliência. Ele é neuropsiquiatra tade dele. chefe de ensino da clínica do ape- as injeções contra sífilis. vros. vítima até a tentativa de transcender. Tampouco a pessoa que fazia a triagem de idade escapou de uma batida policial em na Fundação Casa. Dar­‑lhe Tendo sido capaz de sobreviver à vida? Eu me perguntava como ser como pró­pria tragédia e viver uma vida sufi­cien­ aquele barbante para Joãozinho. Ele recusa a dias sentado no chão da rua de terra dian. Tomou empres- de 1937 em Bordeaux. E que vida seria essa? morte que inventa uma estratégia para vol- Depois disso. Para ele. entre meninos maiores. do de ele movimentar o cãozinho. nas palavras de Cyrulnik. Foi levado três vezes para tomar infantil. Seu tra. mas a história var sua vida. naquele momento. diante da perda. Precisou aprender a viver sem o apoio da A covardia institucionalizada foi perpetra. Se sua família não foi denava sua natureza. quando tinha apenas 6 anos ção. acreditando ser todo sujo amarrado a um barbante que ele possível fazer surgir o desenrolar imprevisí- segurava e. da adver- A equipe que cuidava de Joãozinho fi. ainda restavam a rede exército inimigo que queria exterminar sua social imediata. a assistente gum momento da vida. 6) recuperação das características iniciais de um material após ter sofrido um montante Esse acontecimento significativo e sig- significativo de tensão. postulou a resiliência como a capacidade de (Cyrulnik. etc. nós mesmos?” (Cyrulnik. não podendo ser avaliados A resiliência e seus tutores em si mesmos. Antes mesmo de ir para a adversas. seus principais destinos: amortecer e impul- tecer e. turantes dos processos de resiliência: víncu- nais e culturais. a resiliência atinge características que os tornam aptos a amor. prazer. poderá ou não ha. sem considerar uma história e um observador com sua própria história. como serve de impulso enchendo o lógica nos referimos a um processo com. resistir aos impactos e estresses da vida an. A escola Só se pode falar de resiliência quando era o único lugar onde se sentia protegida e ocorre um traumatismo seguido da reto. ser de entusiasmo. histórias. o alcoolismo ou o suicídio. mitos. como poderíamos nos tornar de sentido. sentido que dignifica a vida e permite obter Quando falamos em resiliência psico. A pessoa ferida na alma tem o traumatis- Estudando a relação entre a tensão exerci. p. “Sem vínculos significativos e psicológica dependem de vínculo e de busca sem história. que passa a fazer da sobre um corpo e a deformação sofrida. Assim que Rosa teve idade. O dia a reparação da ruptura. mas um desen. mas não lhe por Cyrulnik. Como o faz Cyrulnik. habitando de desejo seu plexo que envolve o sujeito e seu ambiente espírito. O sujeito ferido muitas ter sido submetido a estresse. 2005. Não apenas permite recuperar um podem vir a impulsionar. não seja sempre um caminho do não durou mais do que uma semana. Não se trata do ficava mais curto e a esperança podia brotar. Não para a depressão. Resiliência para a fí. acumulando vezes irá trilhar o caminho do curador feri- energia quando exigido sem ocorrer ruptu. quando adotado familiar e na violência social. O estudo dos processos resilientes pro. o termo resiliência.90 Luiz Carlos Osorio. um dos primeiros a usar o termo resiliência. te sair do labirinto que tem como minotauro rial voltar ao seu estado normal depois de sua própria tragédia. a capacidade de um mate. Os processos de resiliência lo e sentido. do. dos os dias em uma longa caminhada. os materiais resilientes possuem humano. Rosa nasceu em um dia escaldante do cura desvendar os elementos que permitem sertão nordestino. Desse modo. Os elementos subjetivos são de tal ordem que seu valor varia de acordo com o contexto. Quando uma criança vive na miséria Assim. da casa. Seu pai a acompanhava à escola to- mada de algum tipo de desenvolvimento. socio­cultural. nificante pode ser o fio condutor que permi- sica é. sar de um traumatismo e em circunstâncias começou a roçar. cuidada. sionar. Avariada Resiliência é um processo que permite re. Sua mãe trabalhava no que uma infância infeliz não determine uma roçado desde as 4 da manhã e seu resguar- vida inteira. música. p. pela vida amarga decidiu que aquela crian- tomar algum tipo de desenvolvimento ape.). 5). da comida. Sua mãe não gostava que ela se afastasse volvimento desviado pela violação do eu. Como um elástico ou te escapar da morte e recuperar o sentido do uma mola. ela pode encontrar os dois elementos estru- corada em uma série de elementos relacio. falta afeto e deslumbramento com sua cul- Ele se refere à possibilidade de uma criança tura (rituais. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Após a tensão cessar. em determinadas circunstâncias. ça cuidaria dela. Rosa também aprendeu cedo a cui- dar da roupa. escola. dos afazeres domésticos e vivia encontrando . sofreu algumas adaptações. cuida de sua ferida ra. 2005. desenvolvimento normal. ao cuidar de todas as feridas do mundo. comeu canjica e não amamentou. mo inscrito na memória. Um acontecimento. parte de sua história. portanto. Faz ver uma deformação residual causada pela desse cuidar o fio de Ariadne que lhe permi- histerese do material. controle do processo. apesar de uma história funda- co sublime que os reveste de um sentido de da no desrespeito às necessidades e direitos esperança. res- a trocou por uma mulher mais nova e linda. ela lança a criança para o exílio de A resiliência só é possível quando o si mesma. É uma es- é necessária uma relação duradoura mar. “Sou capaz de estabelecer uma re. dade. O das de cem anos de solidão. Esses fo. tico. de estar alijada. Sua mãe a deu em casamento a rosa que se sustente durante o período de um homem velho e bruto. Teve um filho e o homem a deixou. seja uma receita de felicidade. do de sua biografia. Manual de terapia familiar – Volume II 91 motivos para ela não ir à escola. Para que um elemento da experiência “Ninguém pretende que a resiliência se converta em tutor de resiliência vincular. compondo o enre- saída possível daquela vida infame. acolhe oferecendo palavras para dizer. não pode ocorrer resi- e chora. Alimentou­‑se do amor convertido pela criança em elemento de re- de seu pai e confiou na escola como uma presentação de si mesma. matriculou­‑se. de tutores de resiliência vinculares como tro para enfrentar seus desfortúnios. Podem ser chamados de tutores individuais. porém. para aqueles que dão sentido ao vivido. Rosa relata ter tido a infân- de resiliência afetivos. Este é um processo de natureza estocástica. A Há dois tipos de tutores de resiliência: criança não tem consciência desse processo os tutores de vínculo e os tutores de senti. Sem meros. tutor de sentido é a brecha na cultura que Aprendeu a ler e escrever. abandonou aquela terra insossa e foi tentar Os tutores de sentido estão associados a vida na cidade grande. Na terra nova. encontrou um ho. ambiente oferece estabilidade afetiva e aju. Isto vale tanto para os ram seus tutores de resiliência. repete. seus e acolhimento em momentos de aflição e companheiros saqueariam sua juventude e angústia. e . O tutor de resiliência é a própria sua inocência. sua vida escolar preciso que se concretize uma relação amo- foi ceifada. tabelecendo o senso de pertencimento ao Como Rosa trabalhou para sustentar seus humano. Nem saudade foi à experiência de ressignificação do trauma- levando. “fora”. depois. Quando seu de amar e ser amada. adquirindo um valor simbóli. aprendeu os nú. lamento pode embalar o embrutecimento. cultura. Com 45 anos e rugas acumula. vive sorridente e se diz feliz.” Para que ele ocorra. a criança não lher. ser incluída no campo dos possíveis de uma ri com os olhos de quem aceita o convite. se destacam. uma professora que a ensinava com paciên- lação significativa com alguém. Quando acreditar que uma outra vida ainda é possí- se lembra de sua história ela se emociona vel entre os homens. Trabalhava de sol elaboração e ressignificação do fato traumá- a sol e tinha que cumprir os deveres de mu. Os tutores de vínculo estão ligados à ex. Mais tarde. Ela se lembra da companhia relação. não a pessoa a quem a criança se de seu pai no caminho para a escola e de vincula. em que os elementos se acumulam de for- Eles contribuem para a aquisição do senso ma a fazer sentido. Ela tinha dificuldade para aprender. do. estrangeira. Ela é capaz de se vincular novamente à vida. os elementos elementos vivenciais que exercem a função que lhe deram esperança e serviram de las. 2005. Rosa em um tutor de resiliência. sem que se tenha de duração e do senso de confiança na reali. Eles oferecem hospitalidade. de existir. sou capaz cia. Para um acontecimento se constituir da a criança a dar sentido à sua aflição. periência de se sentir­ amado e legitimado. e não escolhe como e quando ele irá ocorrer. Quando uma experiência não pode hora de se despedir abraça fortemente e sor. e o sem coração. é pai partiu para as estrelas. Quando isso não ocorre. p. Na liência. tismo e permitem a recuperação do senso mem ruim que bateu muito nela e. tratégia de luta contra a infelicidade que cada por acontecimentos significativos que permite obter prazer em viver” (Cyrulnik. “Eu sei o que é sofrer”. 6). A expe- neceram como um refúgio em um mundo riência nefasta ganha contornos tristes. resgatando a criança da sensação três filhos! As lembranças da escola perma. oferecendo amparo cia roubada por sua mãe. ele precisa ser tirou leite de pedra. marcaram sua história e a seja feliz. não a levou con- mostrou que ela não era apenas uma crian. Quando um elemento da realidade não Em uma terra fértil. apenas alguns se pessoa sensível a esse tipo de informação. qualquer gota d’água quer dizer nada. O olhar atento da uma tal magia que tinham o poder de fazê­ professora a legitimou como ser humano ‑la acreditar em si mesma e na vida.92 Luiz Carlos Osorio. Mesmo que fa. 2005. Esses dois vínculos se converteram em me ama. transformarão em lembranças. Aprisionada em sua paixão. Cada ser humano é uma terra naturalizados pela repetição convertendo­ fértil que pode fazer brotar a partir de uma ‑se em um acontecimento carregado de sen. mas os momentos em ça escrava a serviço de sua mãe dominado. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. singular. não se representação de si. faz brotar a vida. Esse potencial precisa ser indiferenciada de eventos padronizados e aproveitado. Mas esta lhe marcou ma- realidade. Os fatos e seus des- verta em um tutor de resiliência. carregado de sen. mesmo em uma dade que existe no ser que sucumbe à dor. existe o sonho e a fantasia. apenas uma teve e ouvir histórias lhe ensinou que. 2005. Estes não (Cyrulnik. Ela era uma filha que merecia o tempo desenvolver na escola eram momentos de e a dedicação de seu pai. para si mesma e para minha irmã. meu pai ela. pode tornar-se fundo diante de uma Para que um acontecimento se con. não intercedeu a seu favor sofrimento. há os sa acontecer na relação com um outro que que nos dilaceram e os que nos acalantam. Algo no campo de experiências do sujeito alguns elementos se destaquem e permitam precisa ser saliente e se destacar da massa inspirar a vida. A companhia de seu pai lhe junto à sua mãe­‑madrasta. ele preci. sigo quando partiu. Quando Nina foi concebida. figura que se destaque. (Cyrulnik. que ele a autorizava a ser ela mesma e se ra. Cronos Um acontecimento com potencial para já anunciara que a devoraria. 10) precisarão do registro no papel para se- rem lembrados. Para experimentar um sentimento de e nossos olhares tornam­‑se potenciais tuto- acontecimento. nossas palavras tido. fechos se sucedem na vida. pedaço do real para torná­‑lo um aconte- çamos um diário e registremos todos os cimento é a maneira como o meio torna a acontecimentos do dia. (…) Sem acontecimento. Apesar disso. não se transforma nem mesmo em uma lembrança.” Seu pai não a protegeu do traba- sustentaram em seus momentos de maior lho extenuante. as outras professoras ralhavam muito com vida em um inferno. é necessário que alguma coi. ofereça um olhar de legitimação da humani. p. Entre eles. res de resiliência diante de acontecimentos sa no real provoque uma surpresa e adqui. que ferem a ética relacional baseada na le- ra um significado que torne a experiência gitimação do outro. O que ilumina um integra à nossa história. além da paciência com ela. Sua mãe sa- se tornar um tutor de resiliência traz uma bia que não teria braços para protegê­‑la da- informação nova que faz a diferença na vida quele pai que judiava brutalmente de seu daquela pessoa. Quando rativa. situação de extrema violação do humano. acredita em mim e deseja que eu acontecimentos. ravilhosamente! Destacou­‑se do cenário en- torpecido pela indiferença e pelo desamor. 9) Mais do mesmo pode não ser impor- tante. não há um fato vivido não faz sentido. Ela me como uma mulher de Atenas. Nina cresceu com a . A possibilidade de ler não teve boas professoras. Nossos gestos. despia­‑se para trata como uma mula e transformou minha o marido vil e amante. Essa variação permite que. “Minha mãe só tem olhos primeiro bebê. Nos lembramos daquilo que Algumas cenas irão se transformar­ em é ou foi significativo. p. gota d’água. memória e balizar nossa identidade nar- timento ou de sentido para nós. não chega à consciência. Rosa que aprende e evolui. Mas não faltava a palavra lançando­‑o numa torrente numa direção amor quando falavam de sua mãe. Passou a tê­‑la como amante. mas Nina era a Diante do acontecimento traumático. bote salva­‑vidas. Quem não tiver pecado que ciente do que lhe acontece. Seu irmão e sua irmã mais no. no destino do sujeito. 10) “O acontecimento que produz o trau- ma se impõe e submete a criança. Desesperada de e de palavras carregadas de sentido ressig- ­ciúme. Seu cor. manteve sob o poder do pai como vingança Nina tinha uma cumplicidade salva- por sua traição. 2005. Nina encontrou Para reconstituir um mundo íntimo. é neces- coragem de enfrentar as ameaças de mor. atire a primeira pedra. Quando cuidados no tecer de novas narrativas e no teve a primeira menarca. p. suportando aquela situação. podiam legitimar a dor uma só poderia agir em flagrante e Nina teve que da outra e encontrar brechas para dar sen- ficar em casa sozinha com seu pai mais uma tido ao caos que caracterizava seu mundo. era ela quem cuidava da comi- a bolha protetora. tar seu esposo. se a surpresa cata. si mesmo determinante. vez para receber a proteção da lei. Ela era seu ragem para denunciar o pai a seu tio mater. mas leva tempo e exige vos sofriam menos golpes na carne. Sua dor precisa ser É possível restabelecer uma certa ordem reconhecida e legitimada. era ela quem cuidava da roupa. Era ela que ele não desejaria. 2005. No momento em quem cuidava das feridas. seu pai a violou trilhar de novos caminhos que permitam re- sexualmente. Fez o mesmo com sua irmã. Ressentiam­‑se da insuficiência houve uma violação. em que a pessoa Sua alma viva se mortificava com a falta de poderá discriminar entre as diferentes ma- ­interdição de sua mãe diante da tortura diá. 11). dar a César o que é e contra si. dora com sua irmã mais nova. violência do pai. é pre- preferida. neiras de tomar parte na tragédia e as dis- ria perpetrada contra seu irmão mais velho tintas responsabilidades. mas um pertencimento. Ela era do e o torna confuso. O delegado disse que suas conversas. tria pelos filhos não era suficiente para fazer com que ela enfrentasse o marido para pro- Só podemos falar de traumatismo se teger a cria. um abuso sexual. Por outro A maneira como o acontecimento lado. cumplicidade. p. sária uma representação através de imagens te e contou para sua mãe. O po era açoitado. grande por seu pai que o amor que ela nu- cia quilométrica em relação às filhas. Ele reuniu a mãe de Nina e seus irmãos po compreendida e responsável por ela. Ele a proibia de sair com sua mãe ciso dar sentido à violação o quanto antes depois da escola e a levava para a cama. portanto. o uma mãe cuidadora que não soube interdi- sujeito não está completamente cons. seu ser precisa ser quando a experiência é acolhida e a criança aceito e amado apesar da cicatriz deixando sente­‑se protegida e compreendida. desorganiza o mun. Isso não quer dizer que haja uma videz indesejada. à mostra sua monstruosidade. do amor da mãe e revoltavam­‑se contra a clísmica ou insidiosa submerge o sujeito. construir o mundo e redesenhar os mapas. Não para não permanecer nesse estado confuso. da. o sentido que ela atribui ao acon­ traumático é acolhido e interpretado pelos tecimento depende dos vínculos e dos ri­ outros significativos exerce papel decisivo tuais que a cercam” (Cyrulnik. acontecimento em Não podemos perder de vista que a ví. dominado e controlado. de César é possível. Em e a denúncia foi feita. Seu pai Entendiam que sua mãe tinha um amor tão agora está obrigado a respeitar uma distân. era ela quem cui- que o acontecimento traumático rompe dava da casa. Um mesmo acontecimento (uma gra- história. Sentia­‑se ao mesmo tem- no. processo de individuação. Desamparado. uma . danoso por defini- tima de uma grande violência faz parte da ção. sua mãe disse não acreditar nela e a nificando a situação violadora. Manual de terapia familiar – Volume II 93 marca da dor no corpo e na alma. Não há. (Cyrulnik. Nina ainda encontraria co. mas não temos consciência nossos contornos. mas a repre- importante.16) periência é devastadora. podemos compreender a im- valor notável em um contexto e banal em portância de revelarmos ao outro sua pró- outro. Vimos também que exercício de seu poder transformador. evidentemente. algo que se destaca na ex- ra e lhe permitirá reviver apesar da ferida periência como um fator de humilhação ou e da lembrança dela.. aconteci­mento. nem sempre o fato trau. Ela mesmo” (Cyrulnik. um amigo. ou gestos de amor que nos confortassem e Aprendemos a amar à nossa revelia. etc. e é ela que irá nos modelar. sem palavras zando a criança. Uma relação homem­ quando aquilo que não é como deveria ser. Tantas coisas nos passam despercebidas. história. ou mesmo em meio às leis inventadas pelos homens. Não fazendo dela um acontecimento. novamente. acontecimento é uma inauguração. 2005. pode ser aceito vaziar a alma. ela nos obseda. A marca do real se inscreve em nos. 2005. autori- teve uma infância silenciosa. uma luz a nos guiar. Se formos capazes de for- a existência de vínculos significativos e da necer elementos para converter o corriquei- instrumentalização para desenvolver uma ro solapador em acontecimento significativo práxis transformadora do mundo são ele. Devemos sempre investigar quais os sa memória sem que possamos perceber. mas é a realidade da criança. a criança tem difi­ possível fazer algo com ele. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Mas o vivi- nos atormenta. situação de miséria. a ser. Quando um paciente. “Um Quando não encaramos uma reminiscên. p. Elas nos indicam que aniquilação do ser. uma lembrança que ela A ressignificação da experiência trau- poderia enfrentar trabalhando sobre ela. caracterizam os tutores de sentido. conformam nossos padrões afetivos.) pode assumir um Assim. rial e afetiva na infância. só podemos nos desenvolver pria dor. 14) de um ou ambos os genitores. como cia. costumeira temos a chance de fazer emer- mitem perceber em que consiste o suporte gir desse lamaçal um traço com poder de que deve envolver o sujeito após a fratu. permanece como uma um nascimento para a representação de si sombra. da perda precoce tecimento. mas cimento. nos apresenta sua ladainha Rosa e Nina são exemplos que nos per. efeitos. disso. Isso pode do a experiência pode ser incluída entre as acontecer com qualquer incômodo ao qual experiências previstas na lei dos homens. p. Afinal. é nos acostumamos. É o sujeito quem dará alma aos sentação do acontecimento nos dá a pos- acontecimentos. da exposição . Em situações de privação afetiva. culdade de se dar conta do quanto essa ex. real. a longo prazo. estaremos oferecendo uma oportunidade de mentos fundamentais. nos acolhessem em nossos desastres. O si. seu destino não é inconciliável porque é na maioria das vezes. (Cyrulnik. Qualquer traumatismo nos transforma e do em si mesmos poderão assumir um papel nos desvia para a tragédia. 2005.94 Luiz Carlos Osorio. da privação senso- sem que isso se transforme em um acon. ‑mulher em um casamento falido pode es. esta- não se pode predeterminar quais serão os remos oferecendo algo a ser enfrentado e elementos à disposição do sujeito que serão superado.. mática é um dos principais elementos que aquela lembrança permanece oprimin. uma referên- mático se apresenta a nós como aconte­ cia. A ferida é. eleitos por ele nesse processo e que elemen- tos aparentemente simples e sem significa. principalmente quando se e incluído no campo dos possíveis. (Cyrulnik. sibilidade de fazer dele o eixo de nossa No entanto. 15). sem nem mesmo saber de que maneira ama- lêncio prolongado pode converter­‑se em um mos. Não são apenas os fatos marcantes que abandono invisível. É quan- do sem poder ser transformada. Somos moldados pelo real do vai deixando suas marcas e deslindando que nos cerca. p. mas não podemos Cyrulnik nos mostra que nem todo luto esperar que ele recolha os cacos e recons- precoce. volvimento. um desenvolvimento modificado. Não existe uma estar diante de uma missão impossível: dar causalidade linear entre um luto precoce ou um sentido ao absurdo. Mesmo ga. ela precisará de tutores dor. de tal forma. esta poderá retomar sentido à sua vida. nem toda perda afetiva durante a trua o vaso quebrado. Muitos podem ser os destinos. Mas encontrou um atalho que a fator de infelicidade. cultural compartilhado. de esperança que lhe permita vir à tona e sos horizontes e permitiu olhar para dentro respirar. ma. Joãozinho. estendendo­‑lhe a mão. se Nina foi uma aluna exemplar. havia um sentido que deu em torno da criança. Ele parece depressões da vida adulta. que um fato Carrega mágoas inconciliáveis e feridas in- que provoca felicidade pode suceder a um curáveis. Há um limite que nos primeira infância. torna impotentes diante de nosso desejo de rável de forma duradoura e o predispõe às ampará­‑lo e devolver­‑lhe a vida. Tudo em volta são trevas e da a idade da fala. que deverá despertar nossa preocupação tando identificar os tutores de resiliência (Cyrulnik. um traumatismo e um destino de depressão Rosa ainda chora cada vez que se lem- na vida adulta. seja porque as incessantes e numerosos. que para a criança pequena Seus olhos cor de mar são todo o azul que pode representar a vida. vendo com desrazão o enredo de sua vida. Manual de terapia familiar – Volume II 95 prolongada a abusos físicos e sexuais. O tutores de resiliência afetivos e simbólicos. As pessoas à sua volta continuam e para fora e relacionar esses dois mundos. ela retoma rapidamente seu desenvolvimento e Jasmim está desencontrada de si mes- pode até recuperar seu atraso. Mais além da maneira como o ambiente se reorganiza da escola em si. zento. O que Jasmim. indicam que não existe uma relação linear causal entre o fator traumático e o destino do sujeito. Ele ampliou nos. No alto de seus 22 anos acumulou mais verbais e culturais que a incluam no campo cenas de horror do que sorrisos nos lábios. Seu deslumbramento (Cyrulnik. chega. coloriu sua vida. Mas. cessar na vida. estão sempre em crenças culturais impedem uma reinclusão construção e ampliação. As cascatas de causas reconduziu à vida e a permite ter prazer em fazem convergir forças opostas que podem pequenas coisas. após teceu suas quedas e serviu de trampolim um luto precoce ou um trauma. As causas se sucedem sem bra de seu sofrimento e de sua história. conseguiu um emprego e está . sem encontrar um fio isolado das contingências. mais tarde. Quando a criança tem a sorte de encontrar Rosa e Nina me ensinaram tutores de resiliência afetivos e sensatos. este é um caso observaram o contexto dessas crianças ten. não sendo a depressão o resultado de Joãozinho permanece mergulhado um mau funcionamento do sistema nervoso em seu pesadelo. demais. Terminou não houver um entorno capaz de fornecer o colegial. Talvez tenhamos chegado tarde real cria o sentimento de mundo vazio e cin. torna o indivíduo vulne. 2009b). nho e em uma fatia de bolo. 2005). por tudo o que a escola representava amor- Tudo isso permite afirmar que. que os estudos vêm demonstrando é que seja porque a família se alterou de maneira as causalidades e os recursos psíquicos são inconciliável ou desapareceu. Navega a esmo em sua Nau dos Loucos rantida essa etapa de retomada do desen. em um abraço e ça ou para o agravamento de sua condição em um dedo de prosa. Os estudos que do sujeito na lei dos homens. Não é capaz de reconhecer como hospita- Freud indicou um novo caminho ao leiros os gestos de carinho e acolhimento à explicar que a perda afetiva de um objeto sua volta. como em um café quenti- contribuir para a recuperação de uma crian. dependendo para a superação de obstáculos. Argentina: Tornasol Filmes. O murmúrio dos fantasmas. Se lembrarmos Paulo: Martins Fontes. o lado CYRULNIK. indefinido e genera. Autobiografia de um espantalho: da estrada por onde ele passa pode formar histórias de resiliência. De corpo e alma: a conquista do Cada pessoa desenvolve suas habilida. Referência dores de reparação. O que mais deseja é sentir o amor de sua mãe. São cheio e pode faltar água. portar. 215. Produção e Direção Juan a alma se ressente e se emociona. son. Rio de Janeiro: Rocco. des graças às dificuldades que a vida ofe. saiu de casa. O traumatismo pode nos tornar eternos busca. p. impulsiona. B. o retorno à vida. Gostaria de encon. 2009. São Paulo: Martins Fontes. Não tem 1. El Secreto de sus Ojos (2009). 2009a. Ela se ressente de mite perceber que sempre é hora de esten- estar sempre muito triste e de sentir medo. p. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols.. O milho da pipoca precisa ferver na BONDER. perdemos a capacidade de alçar voo. B. lizado que a acompanha como uma sombra. Legendado. vencedor do Os- amigos e não gosta de namorar. demais. apesar de car 2010 de melhor filme estrangeiro. N.). São Paulo: Martins branca e bela. O vaso rachado chega menos CYRULNIK. poderá ser tarde Um medo disseminado. dos tempos. amanhã. p. mas as pessoas são feitas de alma. 207. [2009b]. B. com o tempo. 1 DVD (127 min. dirigido sua beleza deslumbrante atrair muitos inte. Quando José Campanella. a vida pesa mais do que as asas podem su- Port. Também sente muita raiva e não controla suas reações agressivas. 2004. 135. p. viram piruá. A alma imoral: traição e tradição através panela para descobrir que pode transcen. Alguns não vencem o fogo e Fontes. rece. Depois que sua irmã engravidou e principais Ricardo Darín e Soledad Villamil. . São Paulo: uma trilha florida. O estudo dos processos resilientes nos per- Mas ela não se sente bem. 184. CYRULNIK. der a mão e que. [2005]. color. B. O que amortece também Martins Fontes. Notas trar paz dentro de si. Nina sente­‑se muito só. der e passar de milho mirrado a uma flor CYRULNIK. pensando em fazer faculdade de psicologia. de semear o caminho. por Juan José Campanella tendo como atores ressados. bem-estar. mas reage aos irmãos e à mãe com gritos e palavras rudes. e EL SECRETO de sus ojos. 1998. Os patinhos feios.96 Luiz Carlos Osorio. parte II Terapia familiar e suas expansões . . extraído da Bíblia que. ao dizer que um caso se defi. É vida. como atesta a vasta lho nos foi dado. de um garimpo na Amazônia levam o pai a A primeira crise delirante ocorre em trilhar novos caminhos à procura de meios uma feira popular próxima à torre de tele- a fim de obter recursos econômicos para a visão em que começa a falar palavras em es- família. a avó e as irmãs. Tira as roupas para dar aos No início. religiosidade intensa. entre a mãe. Bucher­‑Maluschke Introdução concebeu e dará à luz um filho e por­‑lhe­‑á o nome de Emanuel” (Isaías. Príncipe da Paz. mãe e duas filhas.” (Isaías. Levado pelos bombeiros para o hospital psi- Mudanças vão ocorrendo na família. o nascimento de uma crian. cujos econômicas. deixando sua Emanuel e sua família. É na adolescência que ele e suas irmãs neste contexto que apresentamos o caso de fogem da seca devastadora. nascimento de duas filhas. os seus ombros. quiátrico. A história relatada se inicia assim: no Este é o contexto da vida de Emanuel: começo. segundo Isaías. mãe migração. citando trecho da Bíblia e dizendo tempo se tornam escassas até cessarem ser “o filho do Pai nosso que está no céu”. com ele vemos o nascimento de uma nova ções de vida com as promessas provenientes família: pai. 9. a escola e a Bíblia clínico quando ele reconstrói a lembrança passam também a constituir seu universo de de uma experiência terapêutica marcante. relata aos médicos que esteve du- Nasce um filho. cap. casamento grávida. Deus Forte. Neste capítu. ilustrando o tema da terra natal à procura de melhores condições terapia familiar e suas possibilidades. e destino e o vislumbre de melhores condi. Dificuldades aos 18 anos. seca assoladora no sertão nor. que recebe da mãe e da avó rante 40 dias e 40 noites no deserto falando o nome de Emanuel. “Porque um menino nos nasceu. vários aspectos de transtornos relacionais. Pai base em um caso clínico no qual se apresentam Eterno. O fato desencadeador dessa crise foi o ça é um caso sobrenatural. e lhe foi dado este nome: lo. 5) Por que um caso clínico? Nasio (2001) Sua infância é passada no mundo fe- nos responde. 7. completamente. cap. notícias. de vida na cidade da esperança: Brasília. panhol e em outras línguas. vers. vers. nomes também são escolhidos na Bíblia. N. após o qual . crendo estar na O pai parte sem ver o filho nascer.. 14). ele recebeu o poder sobre literatura atinente a esta área. que com o passar do pobres. A par- ne com suporte em um relato criado por um tir um certo momento. serão apresentadas algumas reflexões com Conselheiro maravilhoso. duas filhas e uma avó. Torre de Babel. a família era constituída de pai.. com “Deus Pai”. “Eis que a jovem sequestro e roubo que sofreu. minino. F. um fi- pia familiar nos oferece. Muitas são as possibilidades que a tera. capítulo 8 Terapia familiar e suas possibilidades: reflexões baseadas em um estudo de caso Júlia S. Satanás. concluem que. de um ser humano muito maior do que ele. A dúvida Então. tanto. nada sabe- do resposta. uma confusão geral Relato do atendimento entre os seus membros e muita dificuldade de verbalizar o que está ocorrendo. referenciais teóricos estudados ao é encaminhada para uma terapia. Procura Explicou que o pai foi agarrado por um encos- a Igreja Universal do Reino de Deus. Na entrevista sobre o seu desenho profissional. É nesse longo do tempo. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. sem perder de vista as in- contexto que ela nos chega para um primei. procuramos traduzi­ no retorno para o atendimento psiquiátrico. ela desenhara os nervos saindo da ca- ca desconhecida pela família. O diagnóstico psiquiátrico é que o pai estava “doente dos nervos”. . ausentes. O tratamento então é fei. fornecendo­‑nos um de televisão denominado Porta da Esperança. ela desenhou o pai agarrado por outro desenho ignora a medicação e parte em busca de ou. cujo to que “é um homem muito grande que nin- nome revela uma linguagem conhecida por guém vê. o Na primeira entrevista com a família. em manter o primeiro contato com elas. vie­ concerne às crenças míticas. para As crises de Emanuel se intensificam e. velas acesas todas as de vocês espera desses nossos encontros? noites. Quem teve a ideia desse encontro familiar O “tratamento” realizado pela família aqui? O que lhes disseram a respeito? Qual foi para a retirada do “encosto do pai” foi fei. dizendo que o pai esta- sua família assume o seu tratamento e. no va “doente dos nervos”. introduzimos na esperança de aplacar o desespero desse a questão: Qual é o problema que lhes traz pai perturbador. terações entre os seus membros presentes e ro atendimento. no qual se vinculam para onde são escritas inúmeras cartas solici. restrita à área beça dele. A menina de 6 anos término da medicação dada no hospital. nossa compreensão. conversado com ela. contrar neste novo espaço encontrado. Não obten. ela narrou que a professora da escola havia Com a saída de Emanuel do hospital. e a explicação dada por ela sua internação. tando ajuda para encontrar o pai. surge a necessidade de se nhassem a sua família. sua forma de organização e sua dinâmica. os relatos se sucedem e as in- motiva as irmãs a recorrerem ao programa terações vão surgindo. Então. ‑lo na linguagem que aprendemos com os a ansiedade da família é tão grande que ela modelos. às vezes ele é mau”­ – confirmação da to através do exorcismo para a retirada do versão da família para a crise de Emanuel. mapeamento complexo. porém: aqui? Quando ele ocorreu? Quem reagiu à “encosto” é de alguém que morreu e não há situação criada? De que maneira? certeza de que o pai está morto. O Pastor queria tirar o Satanás. esse novo idioma que traz consigo e. mas aprendemos com ela ele deve estar precisando de ajuda. contratação de celebração de missa Após a primeira etapa. a narrativa dos ram a família atual e a família extensa de membros da família se confunde com a de Emanuel. procuramos identificar o que esperam en- nua a ouvir vozes e falar de forma descone. aspectos extrafamiliares e intrafamiliares. bom. Emanuel. Solicitamos às crianças que dese. mas ele respostas às questões que trazemos conosco: está é com o “encosto do nosso pai”. Às vezes ele é ele e sua família. foi encontrado vagando pelo cerrado.100 Luiz Carlos Osorio. mos dessa família. A meni- seguida sendo levado para sua casa. Na qualidade de terapeuta. porém. relata uma das irmãs. por- foi apresentado em uma linguagem numéri. mas que fala por ele. a reação de cada um de vocês? O que cada um to por meio de rezas. na de 8 anos desenhou uma figura com os fios O primeiro diagnóstico é dado após saindo da cabeça. Ficam evidentes desde o início um intenso sofrimento. Obter xa. Uma dúvida surge. No que Quando do primeiro atendimento. tras instâncias para curar Emanuel. Utilizamos este pro. problema não foi resolvido porque ele conti. vivo ou morto. compreender essa linguagem trazida pela cedimento por ser uma forma lúdica de se família. Essa cultura se traduz pelos valo- nos fragmentos do caso apresentado. desenvolve uma cultura própria à luz da cul- gumas reflexões desenvolvidas com suporte tura maior. psíquica. ve. pertence a uma classe social pobre vivendo cia a dimensão interpessoal como pano de em uma região assolada pela seca. mas nos ateremos a apresentar al. eco- interfamiliar e intrapessoal. 1988. levando à percepção de jamos o problema da origem e das heranças questões de transgeracionalidade ou de trige- que nos são transmitidas. mediavelmente ausentes e que foge ao nos- so controle no próprio movimento em que somos constituídos no e pelo desejo de um A família de Emanuel e suas heranças outro. e. Recebemos em decorrência da malária. 1998. Ao nascer. Kleinman. aquilo de que estamos irre. linguagem. pelas crenças. ça tem uma perspectiva transgeracional e cia de que o pai estaria em um vilarejo na intergeracional. A família onde o pai estava enterrado e foi à procura inserida em uma sociedade tem seu espaço da certidão de óbito. geracional (Bucher­‑Maluschke. ça cultural. Outra herança que se recebe é a heran- to que. todavia clínico. Depois de muitas ponderações. Nessas duas dimensões. Do ponto de vista teórico. Como nos diz Käes e das heranças e suas transmissões nos le- (2001. embora hoje a bio. com ajuda vincula à inserção econômica. A família está inserida em uma Muito se poder­ia relatar desse caso cultura do contexto externo a ela. Bowen. Descobriu que não exis. DNA que nos chegando. Essa inserção social se e para que serviria? Diante disso. da família que desenvolve sua espiritualida- das heranças e das transmissões de e seu sistema de crenças e de ritos. circular de intersubjetividades de desejos dos tões fundamentais para a compreensão de membros da família precedente ou daqueles quem somos. Valsiner. p. recebe influências e influencia tia. na medida em que somos originados hoje são ensaios tanto nos estudos da família de uma relação sexual. Visitou o local uma herança social e econômica. Stierlin. lhe foi entregue. rituais. 1989). símbolos. As origens. Manual de terapia familiar – Volume II 101 Após cada sessão. além do mais. 1978. em nossas origens: uma procedência bioló. pois que não havia ninguém para pagar o seu lócus social. A outra dimensão é a origem arrimada Esse quadro conceitual das origens do desejo de um outro. solicitou a certidão de óbi. social. recebemos uma herança uma das filhas decidiu ir à busca do pai. demarcado. que os antecedem. Lá biológica por meio dos genes. Amazônia. 1989). res estabelecidos. se ancora Herança social e econômica: a família nossa origem e é com base nelas que se ini. de um outro que nos precede”. uma vez paga. neracionalidade (Boszormenyi­‑Nagy e Spark. mitos e crenças (Di Nicola. cultural e juridicamente. A heran- Durante a terapia. 1978. nômica. 2008). heranças e transmissões gica. o to intrapessoal. Andolfi. organizamos um fundo que fundamentará o desenvolvimen- mapeamento e um ecomapa da família. va psicanalítica enfocando a dinâmica trans- dade de ação. que nos permitiu desenvolver um quadro A herança é tudo aquilo que nos é teó­rico para entender as dimensões: extra­e transmitido biológica. Reflexões desenvolvidas A herança religiosa que nos é transmiti- da mediante ensinamentos e rituais faz parte A questão teórica das origens. Emanuel e sua família extensa. Podemos identificar duas dimensões 1973. chegou a notí. A he- rança psíquica é aquela oriunda de uma rede Estudos nos apontam para duas ques. em uma . descobriu que ele havia falecido acompanha ao longo da vida. 11) “a origem é precisamente o vam a refletir nessa dimensão o contexto de que nos escapa. de testemunhas. na perspectiva sistêmica quanto na perspecti- tecnologia esteja modificando essa modali. apresen- familiar extensa. sujeito OMS. a Igreja Universal do . do trabalho e do lazer. O diag. ções precedentes: união familiar. realizada em 1994. Herança psíquica: Emanuel. missas. os distúrbios esquizotí- religiosidade. para outro é feito com a indicação de uma e a Igreja Universal do Reino de Deus como sigla numérica que define o diagnóstico do uma nova fonte de crença. deu o diagnóstico do “encosto sendo preparada e está prevista para 2012. e critérios para diagnosticá­‑los de acordo dentro da tradição da comunidade em que com a Associação Americana de Psiquiatria. Emanuel O diagnóstico psiquiátrico represen- nasce sujeito de intersubjetividades. satanás e encostos. Esse diagnóstico ininteligível para a família de Emanuel referendou o seu O diagnóstico é um tipo de leitura dos estado mental para dar entrada no seguro­ sintomas apresentados pelo paciente. seus rituais. Entre cada um mo afro­‑brasileiro – uma teoria popular dos desses códigos numéricos são estabelecidos mortos. solidariedade. é a migração o último recurso para As doenças são padronizadas e catalogadas se manter em vida. por códigos numéricos. tificar o problema do Emanuel. foi possível observar vários sentadoria pelo INSS e para a compra de tipos de diagnósticos. e por esta razão nervos”. 2004. código F20 até o código F29. comunidade sertaneja. crenças dos grupos participantes da saga ção do Diagnostic and Statistical Manual of desta família. profundamente ligada à é denominada DSM­‑IV. tipos de esquizofrenia descritos minuciosa- go os valores transmitidos através das gera. ta a esquizofrenia. Em 1952. a família. a pro- Mental Disorders.102 Luiz Carlos Osorio. catolicismo e seus caminhamento de um paciente de um setor rituais. Ela for- vontade. machismo. paciente (First. Geralmente o en- ‑acordo com o espírito. mente com base nos sintomas identificados. 2004). apaziguamento­ tomatologia identificada. da saúde mental. Pai Nosso. Neste ‑desemprego e posteriormente em sua apo- estudo de caso. criança Emanuel e às suas irmãs. dos espíritos. picos e transtornos delirantes baseados no Herança religiosa da família: sincretis. Diagnóstico psiquiátrico Diagnósticos populares Este foi o primeiro diagnóstico dado Outras leituras foram feitas para iden- ao comportamento de Emanuel. exorcis. conhecida por apresentam­‑se sob várias formas segundo as CID­‑10. dos desejos nece também informações epidemiológicas insatisfeitos da mãe e da avó. Francês e Pinkus. outros que descrevem com detalhes a sin- mos. estrutura A CID­‑10. que se encontra na quarta fessora deu o diagnóstico de “doença dos revisão. novenas. nasce como um elo de uma cadeia padronizada para clínicos da saúde mental e à qual está sujeito sem a participação de sua para os administradores do sistema. que é a versão brasileira. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Ele nasce dos sonhos. da educação. ta uma linguagem e está inserido em uma cultura desconhecida para a família de Emanuel. onde a infraestrutura O DSM­‑IV é um livro obrigatório para a área social é muito precária nos âmbitos da saú. transmitidos à no campo da morbidade e mortalidade. O tratamento oferecido é o da me- Reflexões sobre o dicação que só pode ser adquirida com re- diagnóstico e o tratamento ceita médica. Há de várias categorias de transtornos mentais uma luta cotidiana pela sobrevivência que. Bíblia. caracterizando cinco Herança cultural: traz arraigada consi. vivem. Trata­‑se aí de uma linguagem singular. Os diagnósti- nóstico médico baseia­‑se na Classificação cos que denominamos populares e religiosos Internacional de Doenças. surgiu a primeira publica. por apresentar a listagem de. Na escola das crianças. do pai” no Emanuel. A quinta revisão está busca do pai. medicação controlada. diferentes níveis de uma mesma realidade O mesossistema é constituído de vá- humana complementares e em correlação. foram apresenta quatro ambientes ecológicos intima- prescritos medicamentos controlados que de. Nas demais O microssistema é aquele no qual visões. das co. e. encomenda de as relações interpessoais se estabelecem missas. mente interconectados: o microssistema. com atualizações esclarecedo. indica com cla. sociais e simbólicos em um continuum de inter­‑relações da or. uma possibilidade de do à medida que as pessoas interagem com refletir o caso Emanuel e sua família. manda das pessoas envolvidas”. desenvolvida as inter­‑relações das pessoas com mais de por Bronfenbrenner. em termos físicos. face a face entre os membros da família. tanto no passado como no pre- mental indica que a especificidade do indi. o desemprego e a dores (2008). Bronfenbrenner (1979/1996) ferenciados. lia. o me- viam ser ingeridos nos horários preestabeleci. profunda influência em outro microssis- reza a relação entre os ambientes ecológicos tema – o da família e seus membros –. o exossistema e o macrossistema. assim como dos outros membros da víduo e do sistema a que ele pertence. interações dentro do microssistema ocorrem dade ecossistêmica. Manual de terapia familiar – Volume II 103 Reino de Deus o diagnosticou como estando Neste modelo citado. sente. se apresentam em dos por Bronfenbrenner. os rituais foram organizados segundo ocorrem os processos proximais e onde as crenças vigentes: exorcismo. sociais e culturais. que recebe um nome A terapia familiar passou pelo mode. da família nuclear e extensa. a interação de cada lo homeostático da primeira cibernética ao membro entre si e. Ele vai se amplian- volvimento humano. do ambiente e são permeadas pelas carac- ganização de um corpo físico e psíquico. os tratamentos seguiram rituais di. assim tros. dos com a colaboração da família. no caso de Emanuel e sua famí- por Bronfenbrenner (1986. o permite refletir sobre a teoria e a prática microssistema é o ambiente ecológico pri- da terapia familiar. 1994. A terapia fami- imprevisíveis e multidimensionais. crossistema do trabalho. único varão da família após qual as interações sistêmicas são complexas. con­texto ou o meio ecológico é apresentado Tratamentos: para cada um desses diag. p. seus família e estabelecer as relações com os ou- comportamentos no aqui e no agora. munidades sociais formais e informais. o ambiente ecológico denominado mi- 1998) e reapresentado por Pratti e colabora. de recurso e de de- pessoa. levando a intensificar a relação com outros . o ambiente. Cecconello e Koller (2003. rezas. um ambiente ecológico. nes- nósticos. de acordo com os sistemas identifica- como sua história de vida. tabelecem: Emanuel. novenas. com ele. liar nos permitiu conhecer o microssistema A multidimensionalidade do processo de Emanuel. o desaparecimento do pai. etc. sossistema. os interconectados e o estudo do caso Emanuel. da terísticas de disposição. 1979/1996. extraído da Bíblia. suas transformações e mário no qual as relações face a face se es- possibilidades. Na ótica da psiquiatria. É nele que se estabelecem dos Sistemas Bioecológicos. o possuído pelo satanás. Concretizando essa O modelo bioecológico desenvolvido perspectiva. Bronfenbrenner (1979/1996) o define como um padrão de atividades. velas acesas. consequente migração do pai de Emanuel à ras relacionadas ao modelo e apresentando procura de trabalho no garimpo teve uma um método de investigação. ta perspectiva. papéis e relações Reflexões sobre os interpessoais experienciados pela pessoa nos contextos ecológicos ambientes que ela frequenta. nos No caso de Emanuel e sua família. outros microssistemas. 518) acrescentam que “as A percepção da família como uma uni. as expectativas modelo evolutivo da segunda cibernética na projetadas nele. rios microssistemas com os quais as pessoas Nesta perspectiva encontramos na Teoria se interconectam. voltada para o desen. cuja existência se faz com os aspectos físicos. Essa paralisia temporal se expressava pelas textual. que influenciam cotidianamente tiva. Nessa perspec- e dos mitos.104 Luiz Carlos Osorio. por de Emanuel. foi continuidade e de mudança nas interações constatada a ausência de uma resposta ade- das pessoas com seus contextos ecológicos quada às necessidades da família por parte de um lado. a única possibilidade de sobrevivência. fornecer importantes subsídios para refletir tão nordestino estava cada vez mais precá. valo. por outro lado. o caso de Emanuel e sua família e fazer uma ria em consequência da seca devastadora na leitura sistêmica dos diversos níveis interco- região. formas de governo definidos como modelo PPCT. como forma de liberação de Emanuel sua sobrevivência e de melhores condições desse peso (o encosto do pai). a pessoa. Possibilitou também identificar a inte- desta forma o cronossistema. O seu modelo visou a compreender o desen- O macrossistema é o nível mais amplo volvimento da pessoa e. podia ser modificado. O macrossistema sintetiza ciclo vital ou de desenvolvimento no qual uma boa parte das heranças recebidas pelas estão integrados os ciclos vitais ou de desen- pessoas ao vir ao mundo. o casamento de Emanuel com ou. pelos mitos transmitidos ao longo das gerações que as A terapia familiar possibilitou mapear precederam e pelas formas de governo local o ciclo vital não só da família. o macrossistema constitui as heranças recebidas pela cultura e subcultu- ra vigente na comunidade e estabelecidas na Considerações finais família. No caso de Emanuel volvimento de cada um dos seus membros. “não é possível chorarmos a morte de dos exemplos de ambientes ecológicos defi. de cada um dos seus membros. um pai que pode estar em algum lugar”. como a migração em busca de esse pai. No caso da família lização da Teoria Geral dos Sistemas. necessidades estas de transgeracionalidade. religiões. quando nos chegam para a primeira qual não tiveram mais notícias. podemos considerar a família e o seu a vida das pessoas. o que nos Bronfenbrenner (1986) acrescenta a permitiu identificar as fases de transforma- essas quatro dimensões a ideia de que toda a ção vivenciadas e também aquilo que não dinâmica dos subsistemas descritos anterior. do tempo. Um se pai. temáticas narradas: necessidade de encon- bientes ecológicos dos quais as pessoas não trar esse pai que “encostou” em Emanuel. Embora tivesse realizado grandes apontando para a mobilização para encontrar mudanças. microssistemas. A migração se tornava cada vez mais nectados que permeiam a vida das pessoas. leva a ideia das instituições visitadas. con- que engloba todos os ambientes ecológicos siderou quatro aspectos inter­‑relacionados: descritos. res. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. saúde. que vieram codificadas pelas manifestações Emanuel e sua família nos fazem refle. a estão ativamente participando. conceito que ração da família com as instituições. grama de televisão – a Porta da Esperança – tra migrante. Trata­‑se da cultura. que paralisava a to- mente ocorre por meio do tempo. onde se encontram inseridos am. Esses microssistemas citados nesse pelo pai desaparecido. ideologias. e sua família. delirantes de Emanuel percebidas pela família tir sobre o seu cronossistema e a paralisia no como um problema relacionado com o pai. favorece a compreensão dos processos de No âmbito da rede de apoio social. pelas crenças religiosas. o processo. mas que obsessão das irmãs de Emanuel na busca des- exercem uma grande influência neles. nidos por Bronfenbrenner (1979/1996) é a O modelo teórico de Bronfenbrenner rede de apoio social e a comunidade na qual foi aqui apresentado como uma operaciona­ a família está inserida. lisada no tempo definido pela partida do pai. a procura incessante das irmãs. a família parecia para- caso são interdependentes e se influenciam. nesta óptica. o contexto e o tempo. crenças. mas também e nacional sob as quais vivem. O exossistema é o terceiro nível con. As narrativas entrevista. a rede social de apoio no ser. e. como a igreja e o serviço de porta­‑vozes dos outros membros da família. e a Igreja Universal do Reino de Deus foram . Identifica dos. o apelo ao pro- de vida. Mais uma rede social de apoio para atuar no caso do que isso. os diversos contextos nos quais a família e o ma de chamar sua atenção. ilustramos A tradução da linguagem codificada de o tema da terapia familiar e suas possibili- Emanuel e sua família feita na terapia per. percebem pera dele. Este fato deu outros dispositivos terapêuticos e em uma tranquilidade para a família. subjetividades e tica. tendo como frimento. por Nasio (2001) de um caso clínico: a didá- jeito. durante anos de sofrimento no sertão nor. A importância do “papel passado”. a esposa que fielmente passou a vida à es- ma de ser ouvida. A No âmbito da escola das crianças. tou o aprendizado de traduzir a linguagem As relações da família com o hospital cultural da família para expressar o seu so- psiquiátrico organizaram­‑se. mília em relação aos remédios de Emanuel o que impulsionou o trabalho terapêutico. Com a terapia. o terapeuta sistêmico se apresenta com timento de pertença a uma sociedade que uma visão mais ampla do que o terapeuta reconhece seus direitos. dades. puderam entoar preces para esse pai morto. a certidão de óbito. foi criado o elo entre cado jogo nas famílias (Selvini­‑Palazzoli et as instituições governamentais como uma al. to. família e ambiente. Vemos aí o início da formação de real de que “o pai tinha descansado”. cujo seguro­‑desemprego inicial e posteriormente valor está no reconhecimento recíproco dos da aposentadoria de Emanuel. As psicoses fazem parte de um intrin- destino. Com efei- os recursos fossem poucos. embora articulação funcional com eles. A terapia familiar apareceu neste con- tuição psiquiátrica para a implementação do texto como um dispositivo específico. como utilizar elementos da cul- delas estava preocupada em trabalhar com tura para diminuir o sentimento da perda. era a prova específico. cumprindo as três funções definidas mitiram visualizar uma interação entre su. um grande sofrimento pessoal e coletivo.. minorado quando a família pôde voltar suas Com o estudo de caso de Emanuel e atenções para aquelas crianças. mar as crianças com suas crenças. suas famílias (nuclear e extensa). mas também identifica a interação dos ele- foi sentida a necessidade de uma orienta. o que só foi com a situação de crise. bros de uma família. dico a encaminhá­‑la para um atendimento neste caso. foi terapia familiar aparece como um dos dispo- possível a família identificar o fato de que o sitivos específicos que permite reorganizar comportamento agitado delas era uma for. O boicote da fa. oferecendo a ela da transferência de sua aposentadoria para a possibilidade de encontrar uma nova for. mentos da cultura familiar. ra maior levando a formas próprias de lidar gico para aqueles momentos. com ele foi possível a obtenção de Emanuel e sua família. O atendimento dessa família possibili- delos de atuação. Manual de terapia familiar – Volume II 105 indicadores de uma linguagem codificada. a metafórica e a heurística. O atendimento após a comprovação da morte do pai possibi- de Emanuel teve como objetivo medicá­‑lo litou a organização de um ritual no qual todos para controlar o seu delírio. constantemente ao hospital levaram o mé. na qual estava implícito heranças recebidas e como agem nos mem- um grande sofrimento psíquico. A questão era como in- A família teve dificuldades em se fa. Desta forma. possibilita fluir o sofrimento das famílias. pois. deu­‑lhes um sen. terromper a transmissão diante da violência zer entender pelas instituições. Cada uma da herança. os e a ansiedade que paradoxalmente a levava levando a assumir as próprias vidas. intersubjetividades e identificar aspectos das não compreendida. 1998) e são geralmente a expressão de rede de apoio a esta família. social e da cultu- ção na escola com um apoio psicopedagó. e reconhecem o importante papel da insti. O fascínio da família pelos rituais suporte a terapia familiar. Ela se torna um espaço que a tentativa em vão da professora para acal. Todavia. Emanuel e sua família segundo os seus mo. e se encontram. o que não ocorreu de família. . que estava toda seu componente que apresenta os sintomas ela voltada para Emanuel e seu “encosto”. CECI. econômica. S. Nova healing. Psicologia: BRONFENBRENNER.). A transmissão (cultural. pai. Patients and healers in the context BOWEN. v. F. D. P. R.. BUCHER-MALUSCHKE. J. n. São Paulo: gerações. Porto Alegre. T. Revisitando a inserção ecoló- 723-742.993-1027. Janeiro: Zahar.3. Wiley. I. 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NASIO. está na origem de um novo saber” (Nasio. B. L. 1988b. foi identificada por meio do “Caso Emanuel Handbook of child psychology. preensão teórica indicadora da complexi. classificação estatistica internacional de doenças BRONFENBRENNER. F. M. Porto Alegre. Os jogos psicóticos na família. Português.. ANDOLFI. A função didática do caso estudado tive : a bioecological model. p. 1998. C. M. M.. 22. KLEINMAN.. J. In: FRIEDMANN. Beyond the 1988a. A. Oct. H. 16. 1986. Por trás da máscara familiar. therapy. The ilness narratives: suffering. CID 10: originalmente em 1979. Schizophrenia as a multi-generation of culture. v. and the human condition. Do transgeracio- 2001. Inserção ecoló- O Caso de Emanuel e sua família con. In: Alegre: Artmed. v. a contest for development: research perspectives. p. Suhrkamp. Referências DI NICOLA. v. Porto KÄES. M. J. I.. BRONFENBRENNER. A. Transmissão da vida psíquica entre BÍBLIA. M. 17). 1986. 2. Psychological Review. 2003. aqui e agora. D. 2001. 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[1999?]. 21. como os objetos ou elementos de interme- mediar a comunicação ao longo do processo diação usados com adolescentes. sobretudo a par- modificações no setting psicoterápico para tir da utilização dos videogames e dos jogos adequá­‑lo às características da comunicação interativos em geral. foram gradativamente peculiar a sua faixa etária: aí já não mais sendo incorporadas ao universo lúdico da servia o material lúdico habitualmente ofe. como costuma participarem de uma abordagem psicoterá. viviam as crianças e a adolescentes quando la época para compor o conjunto de ferra. Ocorre que a realidade vivencial desses e que. introduziram em sua prática clínica equivalentes do material Nos primórdios deste século. introduziram o elemento lúdi. bem mentais de seus pequenos pacientes e inter. instrumentos musicais. etc. Utilizaram­‑se. ção verbal. lizava a infância e a adolescência. basearam­ terapêutico. de hoje. dos brin. rios de psicoterapeutas de crianças. fica. tais como o aporte do material de diários ín- ram em aplicar a crianças a técnica analíti. no contexto quedos e jogos comumente utilizados pelas sociocultural e momento histórico em que crianças no contexto sociocultural daque. Talvez se possa afirmar que a psicote. Os computadores já são um instrumen- rapia de adolescentes só se tornou possível to de trabalho incorporado ao cotidiano dos quando terapeutas inovadores. . De lá para Mais adiante se constatou que pacien. antes do advento da televisão. geração atual. como mencionamos antes. os pioneiros da psicoterapia infantil pensa. surgiu a técnica psicoterápica a eles destina- mentas lúdicas que serviam a tal propósito da. com pequenas alterações. bem como o amplo espectro de são apresentadas aos pacientes infantis nas instrumentos lúdicos a seu dispor nos dias caixas ou gavetas individualizadas que tra. a partir de profissionais de nível universitário em geral seu conhecimento dos dinamismos da comu­ e. quando lúdico utilizado em psicoterapia de crianças. digamos. som. ainda hoje pacientes. cá. ‑se. o uso de gravadores e aparelhos de ca criada por Freud para pacientes adultos. A composição das caixas lúdicas em- co como recurso para acessar os conteúdos pregadas em psicoterapia de crianças. timos. acontecer nas terapias familiares. difere em muito do que contextua­ dicionalmente encontramos nos consultó. as telas dos aparelhos de TV e posterior- tes adolescentes igualmente demandavam mente dos computadores. expressão grá- baseada na associação livre e na comunica. poesias. então. capítulo 9 O computador como instrumento interativo na terapia familiar Maria Elizabeth Pascual do Valle Introdução nicação desse grupo etário. pica. por seus preços cada vez mais acessíveis. de tal sorte que não mais po- recido às crianças e ainda não se contava demos ignorá­‑las no âmbito de nossa prá- com o nível de abstração do pensamento e xis clínica quando esta incluir o trabalho expressão verbal que permite aos adultos com crianças e adolescentes. para dela tirar o máximo proveito em bene- O computador. que. Não pensamos que o emprego do com- ticos. guir. portanto. vamos agora trazer a ilustração . ado. vez por todas e para sempre o emprego das dor em determinada situação clínica com caixas lúdicas e dos brinquedos tradicionais. torna­‑se acessível ao emprego mesmo popularização do computador como veículo de quem não é um usuário habitual de com- das interações humanas com o advento da putadores. dem “deletar” o que criaram na tela sem lescentes e adultos no contexto da vida a vivência destrutiva que sói acompanhar familiar e sob o estímulo de determinada a eliminação da cena com brinquedos situação clínica que será mencionada a se. também se tornam um “eletrodoméstico” permite através deste programa alcançar os cada vez mais encontrado no âmbito dos la. comitante estímulo para desenvolver seus tituição à tradicional caixa ou gaveta de potenciais criativos durante e através do brinquedos. cientes. aqui mencionamos possa substituir de uma A partir da utilização do computa. próprio processo psicoterápico. terapeutas se quisermos nos manter atuali- ção dos vínculos terapeuta – paciente iden. presta­‑se sobre. a colocação em emergência de conteúdos expressivos da tela dos sentimentos e conflitos incons- conflitiva familiar. recursos lúdicos como as possibilidades ex- gem no futuro tornam indicada sua inclusão pressivas desse método interativo. como sabemos. putador e de programas similares ao que mento de famílias. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. herança das psicoterapias in. putador é um instrumento cada vez mais sobretudo porque a qualquer instante po- usado e compartilhado por crianças. zada veio para ficar e forçosamente teremos tivacional e posteriormente como veículo de de incorporá­‑la a nosso cotidiano de psico- acesso aos conflitos familiares e consolida. mais do que isso. também no contexto dos sistemas terapêu. na ocasião. o paciente identificado de uma família que mas sem dúvida a comunicação informati- atendemos. nos capacitarmos tificado (família). fício de nossos pacientes. para criar novos elementos. n Criativo – como além das formas prede- cos e por sua identificação com os valores terminadas a criança tem total autonomia das gerações emergentes.108 Luiz Carlos Osorio. a crescente ples. com maiores pos- mobilizador de interações e facilitador da sibilidades expressivas. a par de ser um ins. em nossos consultó- rios como inestimável ferramenta interativa n Motivacional – tornando o processo psi- com os membros das famílias que atende. particularmente com as crianças e ado. no meio cada vez mais “ tecnologizado” em n Desinibidor – auxiliando a superação das que convivem? resistências e inibições frequentemente Partindo da constatação de que o com. em um ambiente lúdico­‑recreativo em lescentes. ocorreu­‑nos incluí­‑lo como elemento n Projetivo – ensejando. Por que não psicoterápico: introduzi-lo. zados e. há um con- maneira a ser utilizado ao lado ou em subs. mundo em que a criança ou adolescente que já os encontraram “ institucionalizados” vive. O computador. A possibilidade de associar sons internet e sua vocação para ser a ferramenta às imagens construídas amplia não só os por excelência dos processos de aprendiza. sobretudo em se tratando do atendi. por seus recursos lúdi. Por outro lado. trumento que possibilita tanto estimu. dividuais de crianças e adotada por muitos terapeutas que trabalham com famílias com Como o programa é extremamente sim­ filhos pequenos. coterápico um lugar de descobertas feitas mos. Com o auxílio das imagens produzidas lar como satisfazer a curiosidade infantil. apresentadas pelos pequenos pacientes. reais. seguintes objetivos no curso de seu emprego res da classe média brasileira. inicialmente como recurso mo. são os que consonância com o perfil tecnológico do com maior naturalidade os empregam por. isolava­‑se com frequência e passava o dia mas ele saiu em disparada para a rua. sença dos meninos. no momento da primeira entanto. mentar a tensão do casal já crescente em das estavam aquém das metas exigidas pela função da situação financeira e do compor- empresa. evidenciando durante as sessões mãe e ele reagiu com violência. na época em que a mãe O pai era representante comercial. como foi sugerida reproduziu para João as larmente conflitiva. entrevista com a família. Trata­va‑a como “aquela atitudes discriminatórias e autoritárias da mulher”. obe- Trata­‑se de uma família atendida em diente e cooperador nas lides domésticas. que era constantemente soli- co ocasionado por uma conduta inadequada citado por vizinhos para resolver problemas da terapeuta. do pai. sem . Manual de terapia familiar – Volume II 109 clínica de como se processou a utilização montando e desmontando um computador do computador como elemento transicional usado que ganhara de alguém da família. mais elevados do que o marido. à computação. a forma fazê­‑lo. ciente identificado. em particular a propus que João se colocasse no lugar dos mãe. cola e não sabemos o que fazer”. Os pais. coterapia. de hardware ou instalar programas em seus computadores. A família era composta do casal Quanto ao bebê. não uma relação mãe e filho. sem dar margem a que bagunça. de pouco mais de 3 e três filhos. monizar o casal que. o paciente identificado. Relato de uma situação em sobretudo a mãe. pais com respeito à sua evasão escolar e “Ninguém pode com ele. Embora pudesse estar di- nem permitia que alguém entrasse nele para namicamente correta a intervenção. Chamou­‑nos a atenção. o que veio au- de perder a representação. a marcada diferença que os pais. mas servin. era in- como agente comunicacional dubitavelmente o preferido de ambos os pais. desde o conta- to inicial. nha aptidão para lidar com questões ligadas lução satisfatória de um impasse terapêuti. sendo o filho mais velho o pa. meses por ocasião da primeira entrevista. faziam em relação aos dois que utilizamos o computador filhos mais velhos. Também foi muito representando seus ganhos algo significati. Não limpava seu dormitório e nicação sobre ela. pois suas ven. com roupa suja pelo chão e restos João pudesse ensaiar qualquer metacomu- de comida. tido como uma criança “normal”. Sua relação com a mãe era particu. Na segunda entrevista com a pre- João. Posteriormente percebi que havia sido uma queixando­‑se ainda de que seu quarto é uma colocação fechada. tais expectativas foram frustradas. Suas a impressão muito marcante de que nunca condições financeiras vinham declinando antes em nossa atividade profissional ha- acentuadamente nos últimos tempos. para a comunicação do material conflitivo Era um “autodidata” que logo revelou tama- aportado por determinado paciente e a reso. com 8 anos. acentuada a sensação de que os pais esta- vo para a economia doméstica. Evidenciava­‑se a baixa autoestima tamento hostil de João. abandonou a es. esta. Tentei ainda consertar a situação indo Os pais referem ainda que o menino atrás dele e o abordando na sala de espera. fiz uma intervenção e va com 13 anos. José. ficou­‑nos bom nível econômico e intelectual. com vistas realizadas com essa família. engravidou. sala. No viajava muito e. saindo da uma enorme hostilidade em relação a ela. dizia ela. estava com receio pois o bebê chorava muito. vivia em constantes atritos. A mãe víamos observado tanto ódio explícito em trabalhava como vendedora free­‑lancer. queixavam­‑se de sua agressividade. O caçula era ainda bebê nasceu com a expectativa de que viesse har- e não compareceu às sessões. vam inteiramente submetidos a João e sem do para manter sua autoestima em níveis qualquer iniciativa para lhe colocar limites. que dizia não ter correspondido às Ao longo de uma sequência de entre- expectativas de sua família de origem. pudesse desse lugar dizer­‑nos o que sentia. ideias com o coterapeuta e com sua anuên- Sem dúvida. sença do coterapeuta. disse­‑me que ia pensar e nhas falhas como terapeuta. Após trocar eu agora). ocorreu­‑me fazer como os vizi- pais informaram que o menino negava­‑se a nhos de João e telefonar­‑lhe. Enquanto encontro na casa desta família. me fez pensar. Em uma entrevista posterior. culdades em instalar um programa em meu vo do filho. sem esboçar um gesto Certo dia em que estava tendo difi- sequer para impedir o movimento impulsi. um tan- muito especial. propusemos realizar um imagens reproduzidas na Figura 9. Fui­‑lhe ocorrido não parecia difícil. os pais permaneciam apáticos na pre. Seguindo conduta adotada tempo o dominava. to desconfiado. João. me permitir interagir com ele. ‑se na ocasião para mim em um professor No contato telefônico. que me confrontou com mi. . Alguns dias rever o que tinha feito e tratar de reverter a mais tarde me telefonou dizendo que esta- situação através antes do exercício da ima. terapia seu comportamento habitual face a Nesta ocasião apresentei­‑lhe um pro- situações de frustração ou em que se sentia grama gráfico que ele não conhecia (o Corel acuado. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols.1 Reprodução das imagens criadas pelo paciente. mas lá tam- isso. bém o menino negava­‑se a estar presente. Figuras 9. Ele repetira na família) para me ajudar.110 Luiz Carlos Osorio. O entendimento psicodinâmico do Draw) e ele mostrou­‑se fascinado. apontando como operá­‑lo e ele em pouco verter o quadro. difícil era re. Passou então a criar as em outras ocasiões. depois me retornava a ligação. indagando­‑lhe voltar à presença “daquela mulher” (que era se não poderia vir me ajudar. va disposto a vir à minha casa (que era no ginação criativa do que de qualquer recurso mesmo local do consultório onde atendia à ao conhecimento adquirido. os computador.1. este menino constituiu­ cia foi o que fiz. Manual de terapia familiar – Volume II 111 Figuras 9.1 (continuação) Reprodução das imagens criadas pelo paciente. . da situação acima apresentada. já que estavam sobretudo um curso técnico de informática. Espero. indiretamente por seu retorno às aulas no . mas decidi que não pletivo e simultaneamente matricular­‑se em iria interpretá­‑las. uma aliança reconstrutiva da relação com o filho. Referências texto de um processo terapêutico vai muito além do que as palavras podem reproduzir. forma como superou o episódio nos foi dada São Paulo: Casa do Psicólogo. terapêutica”. L. espontaneidade e autenti- em suas competências. Uma delas. tendo realizado com ele outros as estritamente provenientes do aprendiza- encontros individuais em que Jõao quis do como psicoterapeutas. 2006. OSORIO. Entre tantos aspectos significativos ne. de fazer o su- seus estados emocionais. ele ago. através aprender comigo a fazer cartazes e cartões. tarem as amarras que os prendem ao porto ra me sentia como uma mãe confiável e seguro de suas convicções teóricas e com receptiva. tas vezes. dessa vinheta clínica que poderiam ser aqui mas o fato é que através dela estava não só discutidos. a serviço da retomada de nosso contato e da interação buscada no contexto da terapia familiar. nossa bagagem de conhecimentos que não rapêutico. referenciais teóricos. Evidentemente que cidade contribuírem com novas alternativas utilizando­‑nos da visão sistêmica tratamos para lidarmos com as vicissitudes de nosso de incluir os pais. do nos leitores o desejo de igualmente sol- Simbólica e transferencialmente. e em especial a mãe. capaz de aceitá­‑lo e valorizá­‑lo sua criatividade. quero salientar apenas um: mui- se comunicando comigo como me comuni. em cotidiano como terapeutas. Como pode ser percebido as imagens semestre seguinte e a solicitação atendida são de enorme riqueza representativa de pelos pais. Considerações finais sivos. ter suscita- Foi algo lúdico e desafiador para ambos. dizia de sua resistência a se comunicar. Eram imagens de conteúdos agres. Sabemos que o que se passa no con. a do menino triste com o headfo. com nosso apoio. disponibilizar a utilizar recursos não con- O computador foi assim incluído como vencionais e oriundos de outras áreas de ferramenta de reingresso no processo te. L. C. 1977. atrelados a normas técnicas e cando um estado de espírito seu. como se quisesse me chocar e testar. Porto Alegre: Movimento. Abordagens psicoterápicas do adoles- Nunca tocamos no assunto de sua “evasão cente. Novos Paradigmas em Psicoterapia.112 Luiz Carlos Osorio. como pos. mas a resposta ao sucedido e a OSORIO. C. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. deixamos de acionar tula o aforismo da teoria da comunicação nossa interdisciplinaridade interna e de nos que diz que é impossível não se comunicar. face as Intervenções familiares em dificuldades que tinha com as mulheres psicoterapias individuais em seu ambiente de estudo e em geral. do eu tenho fome ele também tem. o oferecimento de uma abordagem rápicos tem mostrado resultados significati. relatada pela coauto- sitar os próprios pacientes. no seu entender. parece­‑nos que esses são. que era “lindo”. cia prévia dos terapeutas e no seu genuíno Nosso balizamento para introduzir tais propósito de ajudar os referidos pacientes a variáveis técnicas tem sido a escuta empáti. promoverem as mudanças necessárias para ca das vicissitudes que motivaram a solici. capítulo 10 Intervenções familiares em psicoterapias individuais e intervenções individuais em terapias de famílias Luiz Carlos Osorio Maria Elizabeth Pascual do Valle tro­duzidas na prática psicoterápica corrente Introdução com pacientes individuais. nada que eu pudesse dizer a . so- forma de utilizar distintos enfoques psicote. quanto a visível idealização de sua relação damente indicadas e convenientemente in­ com o marido. bretudo. A paciente tinha dificulda- individuais. nós gos- gens grupais não convencionais revelam­‑se tamos das mesmas coisas. que tanto podem ser realizadas de nos estudos. situações ilustrativas. quan- cias. mas apoiada na sólida experiên- vos e. E extremamente proveitosas quando adequa. principalmente quando envolviam questões rante o curso de processos psicoterápicos de autoridade. de nossa atividade terapêutica. a atenção às singularidades nisso nos parece residir a principal razão de cada situação aportada e o respeito à para o sucesso das intervenções propostas. inusitada. pensavam igual”. Posteriormente foi visto que suas dificul- Apresentaremos neste tópico como in. “Nós somos um só. até mesmo surpreendentes. No que tange aos benefícios advindos Em nossa experiência. com o ma- que estão em situação de impasse como para rido. com o propósito de mobilizar atendimentos só não tinha. “perfeito” e os “dois proporcionar a abordagem de intercorrên. às vezes. A paciente era uma profissional que havia iniciado seu segundo curso de pós­ ‑graduação quando me procurou. dades estavam em todas as suas relações. é fantástico!”. a flexibilidade na aos pacientes. origem e destino ra deste capítulo. Em nosso entendimento. troduzir intervenções familiares breves du. saírem de suas situações estereotipadas – tação de ajuda. demarcação do território de sua intimidade Veremos a seguir a primeira das duas em que nos permitem ou impedem de tran. nos vínculos de trabalho. tais aborda. a paciente foi “expulsa” de agressão estava muito alto. segundo a paciente ciais eram de impotência. de terminar o primeiro ano afastou­‑se. antes Parte da segunda experiência em pós­ que fosse determinada sua “exclusão”. cami- ‑graduação foi vivida durante o tratamento. repetitivo. Tentou o terceiro curso de pós­‑graduação. Durante esse período. ramente a paciente sentia­‑se desvalorizada Aos 22 anos teve uma relação mais perto dele. e por isto foi demitida lhe acarretava sentimentos de inveja. E a ameaça era de separação brigas e agressões. possibilidade de utilizá­‑lo no local onde fizera sem conseguir um trabalho ou completar o curso. de trabalho acabaram por se refletir em sua Chegava à casa bêbado. sempre tência e aprisionamento? Percebia clara- ameaçada de ir para a rua. Sua atitude comigo era fran. o que provocava vida conjugal. o que de boa relação com a paciente e sentia que ela alguma forma a fazia reviver sua relação depositava sua confiança em mim. para acabar com da. a “expulsão” como uma tentativa de solução Maria era a filha mais velha. mas sem nenhuma gar. veio a se casar com ele. com pai alcoolista e entendimento? mãe rígida. a paciente sentiu que devia dar um basta e Fiquei extremamente preocupa- “expulsou” o pai de casa. vidas. com a qual tinha muitas difi. quando então teve de se manter sozi. mas essa situação ficou como um abscesso Seu primeiro curso de pós­‑graduação não drenado. mas não adequada consigo Captava contratranferencialmente (Hei­ mesma. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. 1960) que a cando. vinha ocorrendo sem que me ocorresse era péssima. Quando tinha 16 anos. por este não ter tomado nenhuma camente provocativa. (“expulsa”). aquela loucura. mann. percebia­‑os como pessoas íntegras e tam- des passaram a ser com sua mãe e. mas tinha uma com características autoritárias. só que isto não mente o seu componente de identificação acontecia por ser ela uma pessoa tida como com a relação entre os pais. mas o que fazer para nos livrarmos culdades. Ficou com muita raiva deste diado por ela. nho que parecia ser inevitável. cesso psicanalítico rígido. nessas circunstâncias há de ocorrer um ele- soas da instituição acertava­‑se muito bem. Com as outras pes. Um pro- com a mãe. mas realmente não atitude. pois acabava sempre se prejudi. terminou com uma relação de hostilidade Seu marido evoluiu profissionalmente­ passiva. Transmitia­‑me estar em uma busca de justi. ça até adequada. Por . “suportivo”. em uma bém que se queriam muito. Meus sentimentos contratransferen- Havia uma instrutora. porém o nível de briga com esta. A partir daí as dificulda. (“expulsão”). 1961/1962. o que já fazia e muito bem. mento novo para mobilizá­‑lo (Baptista Neto. até diria em uma expulsão branca. mais tarde. enquanto ela ficava patinando sem sair do lu- quando recebeu o título. 1996). E é sabido que gularidades do serviço. até então como modificá­‑lo. pois. me incomodava. visando potência. pois costumava delatar as irre. o que também onde trabalhavam. O pai era. neuró- culdades. Racker. respeito deixava de ser abertamente repu. diferentemente de seus colegas que algo que a satisfizesse. uma vez que ao comparar­‑se se séria com um colega em uma instituição via sempre em desvantagem. o tratamento paciente estava me comunicando sua im- era. tendo sido particularmente muito difícil. E daí? O que fazer com esse irmão dois anos menor. tinha um dos conflitos. apesar das dificuldades do casal. Entendia­‑se que casa. Seu curso de pós­‑graduação foi (a paciente e eu) dessa sensação de impo- um continuum de ameaças e brigas.114 Luiz Carlos Osorio. mesmo com o marido lhe ajudando financei- nha. Sua relação com o staff dirigente tico. por assim dizer. Sobre isto não me restavam dú- a apoiá­‑la enquanto ultrapassava tais difi. mas antes se mantiveram em ascensão na instituição. Iniciou­‑o. tido como As situações criadas em seu ambiente “o responsável pela desgraça familiar”. onde vigorava vital para a manutenção do serviço. colega. na época. Foi possível examinar al. uma forma irônica n Foram examinados os sentimentos de e depreciativa de ser da paciente com o ma. colocamos para eles a propos. mas que quando comparecia às sessões acio. com quem mantenho boas n Ao fortalecer­‑se a relação de confiança relações profissionais) uma coterapia de ca. mais rápido possível. feitas de uma maneira mentos complicadores em uma situação já ingênua e irônica. invejas mútuas. Após conversar com este colega e ter sua de confiança entre eles e os aspectos concordância. mas (intervenção em coterapia de casal) no trans. por serem inconscientes. sua visão administrativa. Como o marido estava na ciente como “brincadeiras”. Houve até certa insistên. visualizada pela pa- tão complexa. pois. e proposta recomeçaram a dialogar. caráter mais “enrustido”. Portanto. face às dificuldades Ocorreu­‑me durante certa sessão familiares. valorizá­‑la mais. inclusive financeiramente. muito agressivas e desvalorizavam o outro. não neidade dela. al com um colega a quem procurara por in. sentiram em dúvida pelas inseguranças de ambos. De alguma forma. vocavam rechaço. casal e ao colega. que foi surpreendentemente muito bem reduzidos às devidas proporções. ferida por Osorio (1996) nos diz que gilizado. ele pela maior esponta- percebida como agressiva e. de introduzir uma variável não convencional constituído por pessoas diferentes. nos moldes da descrita na obra Desenvolveu­‑se o fator confiança. já que para ele era muito era relatada nas suas sessões individuais. anunciada”. vamos relacionar alguns ele­ Eles puderam sentir os terapeutas como men­tos básicos que marcaram essa experiência um modelo de casal que se respeitava. e. n A vivência da transferência lacunar re- nava o ego. do marido e provocava neste uma experiências não vividas podem ser resposta violenta. Manual de terapia familiar – Volume II 115 outro lado. foi se restabelecendo a relação sal. Um dado interessante n Foi visto o quanto eles haviam progredido que nos informaram é que tão logo fizemos a como casal. por exemplo. podendo ser eles mesmos. ta. como decorrentes do medo compartilha- cia deles para que iniciássemos o processo o do de se perderem um ao outro. sob um novo prisma na terapia conjun- gumas formas de agressão que não apare. o tinha feito com sessão de casal e uma individual da pa. negativos que estavam ressaltados foram ta. redimensionado o valor de cada um nisto. sentia­‑se controlada pelo marido n A disponibilidade de ambos. difícil ser mais espontâneo por ser um sendo tomada por ela como “brincadeiras”. E os conflitos maiores foram entendidos mente ajudá­‑los. que isto não nos impedia de trabalhar curso de uma psicoterapia individual: juntos. mas que eram ocasião fazendo uma psicoterapia individu. que estávamos preocupados e querendo real. o processo já havia começado. conosco. encaminhá­‑los para uma terapia de casal. n A observação in loco de situações que pro- mas pensei que seria acrescentar novos ele. experenciadas e elaboradas na terapia. portanto. sacrifícios e ciente comigo no dia seguinte ao de cada economias. Parecia­‑me capacidade de se mostrarem ao terapeu- assistir a mais uma “crônica de uma morte ta do outro. pensei em lhes propor­ (ao como tal nos relatos individuais. A seguir. o desejo e a já que dependia totalmente dele. Eles fo- aceita. Ao ser possível trabalhar isso sessão conjunta. tanto ela própria como ele puderam ciam comigo. tudo levando a crer que por haver ram tomando consciência da forte relação neles também um forte desejo de que algo afetiva entre eles e que estava sendo posta se modificasse. Apareceu. faltava em ambos. mesmo que ela não tenha participa- Foi convencionado que teríamos uma do com ganhos reais. ela pelo desenvolvimento rido que por ser inconsciente não era por ela profissional dele. que se mostrava por vezes fra. que de Garcia Marques. não apareciam dicação minha. ou que não me incomodavam. Uma vez ela disse: “Acho que . como vemos nas “interrup- do marido e do coterapeuta de alguma for. “impasses” ou nas chamadas “psico- ma provocou essa turbulência que se acom. se há movimento. mais velha e próxima da morte. Refletindo hoje sobre Podemos pensar em saúde. Penso que um tratamento pode ir para Imaginemos uma planta: quanto mais frente ou para trás. mas com outra postura perante suas di. simplistamente um dos casos clínicos que me deram maior falando. rapia. juízos ao paciente. Conforme Bion existem avanços. tanto sob o ponto de vista profis- “enferrujada” de lidarmos com situações sional como humano. o que talvez não houvesse ocorrido em tecem durante o tratamento. satisfação. a mamente enriquecedora para nós (os qua. Se imo- de vocês”. de bilizarmos um de nossos membros. algumas reflexões que nos fo. mais rígida Citando Bion (1979): ela vai tornando­‑se. realizamos com sua respectiva terapia individual. A seguir. quanto imóvel. psicoterapeutas. mais flexível ela é. estaremos trazendo sérios pre- assumir riscos equivalentes ao que preten. acho que levei tempo dema- mento. Se o Essa experiência sem dúvida foi extre. fisioterapia (feita através do movimento) serve para preservar a saúde (vida). Vemos velhos com muito mais capa. que o tratamento não estava adiantando. ocasionan- tro). Aí eu perguntaria: quando foi que sua . humano nasce? Na instância particular de cidade de vida e de mobilidade que muitos um nascimento de algum indivíduo em jovens. Andolfi e Angelo (1989) referem mentos acontecem e devemos estar atentos que o terapeuta deve usar a si mesmo em a elas. tempo. de. Continuamos a terapia por um tempo do uma fixação da articulação e paralisação determinado. clinada a concordar. mas ela dizia não querer e eu me sentia in- ram sugeridas por este caso. seria uma forma estereotipada. quando temos de pensar dessa paciente. por alguma forma. como na flexibilidade com que siado a introduzir as mudanças devidas. “morte” funcional é inevitável. tempo de imobilização for muito grande. creio que isto muitas vezes extrapola a questão da Uma questão simples: quando é que o ser idade. Neurose. Dizem os autores que se desejamos que perguntei à paciente se ela queria trocar de a família (no caso presente. pois. ela também melhorou sua em nos mover­ nessa situação. Sem dúvida. ções”. mas (1987). já que reclamava seguidamente mexa” não podemos ficar “parados”. seguindo depois cada qual definitiva. Riu e continuou: “quem sabe flexibilidade e morte com rigidez. a paciente) “se terapeuta. ele se atrofiará. cresci. o que não pode é ficar nova e mais tenra. Muitas vezes anos de terapia individual. terapias intermináveis”. paralisias não poderiam ocorrer por longo nal costuma acompanhar as grandes muta. observamos que paralisações acon- bos. nós teríamos que ter nascido filhos de Portanto. essa situação. Em muitos momentos. Com certeza. este foi nossas relações. Entendemos que a introdução do tratamento. ‑nos a impressão de que este curto período Reportando­‑nos ao campo da psicote- de coterapia ocasionou benefícios a am. retrocessos. há vida. um período de turbulência emocio. Nós. pois seriam determinante da “morte” ções da vida. A presença de imobilizações nos trata- ficuldades. outras. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. nal saídas adequadas para tais situações. especial. ou pessoas. Ao que respondemos que. eles ali estavam nascendo determinado período. No ser humano.116 Luiz Carlos Osorio. é um panhou de uma grande mutação na vida momento difícil. A como casal. iniciando outro zes não encontramos na técnica convencio- curso ainda com muito medo de ser afasta. pois. se persistirem por um tempo sua complexidade pensante e emocional e muito longo. da. ele me pode dar uma resposta. é possível associar­ vida com psiquiatra”. mas lidamos com os acontecimentos ou com esse foi o meu tempo. E muitas ve- relação com seus familiares. Ficou­ “fisioterapias” psíquicas. em ciente como algo que lhe causava sofrimen- lugar de encaminhá­‑la a um psicoterapeuta to e complicava suas relações interpessoais. então. A mãe de Nicole está em psico. termos atingido o objetivo precípuo dessa cupação com a filha. queremos enfatizar afastar­‑se da mãe) e a maneira como esses a riqueza do intercâmbio entre distintos compactuavam com as tentativas de Nicole marcos referenciais técnicos. neste sentido de Bion. que evidenciavam estarem de bém especialistas em psiquiatria da infância acordo quanto a seguirem as sugestões dos e adolescência. quando a melhora de Nicole evidenciou rir em suas sessões psicoterápicas sua preo. ram abordadas. que. identificada pela pa- nas últimas semanas. sendo ambos tam. com a nova relação amoro- de separação/individuação (Mahler. O pai passou a vi. tentaríamos antes uma intervenção você viu luz pela primeira vez? familiar com Nicole e seus pais. mas sim como indivíduo. terapeutas sobre como procederem em rela- Nicole tem 9 anos e é a filha caçula de ção a Nicole. bem como o pai. Luis. Ambos apresentado por Nicole esbateu­‑se consi- até hoje não conseguiram oficializar sua se. A vivia Miriam com os filhos e que representa- parceria foi estabelecida entre uma psiquia. ção radical quando se tratava de achar uma Vive com a mãe e dois irmãos maiores. Em determi- tra de formação psicodinâmica e sistêmica e nado momento. deravelmente. a propósito. psicoterapias individuais. polarizada em torno da nível de respeito mútuo e propensão à coo. Queremos encerrar as considerações Nas sessões com Nicole e os pais. Em um contato entre rante a realização das sessões conjuntas. mas persistiam em uma oposi- um casal separado há cerca de quatro anos. o quadro fóbico terapia individual. sa do pai e os evidenciáveis ressentimentos podendo olhar o outro não como uma exten. do casal. de de acharem uma solução para efetivar a te o atendimento clínico. a mãe de Nicole. presença de Nicole com sessões unicamente têmica e psicodramática. mãe se ausente a não ser para suas ativi. alternamos sessões com a um psiquiatra de formação psicanalítica. Manual de terapia familiar – Volume II 117 personalidade nasceu? Quando foi que infantil. mas que se de mantê­‑los unidos através da incapacida- mostraram inteiramente compatíveis duran. que está apresentando intervenção. de 18. . discussão sobre os direitos sobre a casa onde peração entre os profissionais em questão. com o auxílio de dramatiza- vação poética de Mário Quintana (1973): “A ções. va 80% do patrimônio do casal. divórcio finalmente iria se consumar. Interrompeu­‑se o atendimento Miriam. com a con- vicção de que ela estava expressando com o Eu diria que. não permitindo que a respectivas psicoterapias individuais. não se interromperam du- dades profissionais. de 20 anos e Maria. a forma como Nicole tentava controlar única morte é não ter nascido”. pai viesse visitá­‑la em casa por não poder efetuada em coterapia. se quanto à questão da separação judicial to à divisão do patrimônio familiar. tendo como foco sua dificuldade sentado por Nicole. Ao cabo de aproximadamente 10 ses- ver recentemente com uma mulher que em sões. decidiu­‑se. sintoma sua forma de reagir à situação dos esse casal esteve nascendo durante a expe. que vem se agravando em tolerar frustrações. sofrendo neste momento o processo ‑los unidos. pais e fazer uma última tentativa de mantê­ riência. solução para a partilha. da mãe face a ela. foram trocadas ideias a respeito de sessões de terapia individual com a terapeu- como proceder com relação ao quadro apre. ta do pai. sis. passa a refe. tudo levava a crer que o são de si próprio. embora persistisse o impas- paração por divergências importantes quan. do que consideramos uma interven- seu casamento anterior teve uma filha hoje ção familiar em coterapia no curso de duas adolescente. 1982). o pai de Posteriormente Nicole também fez algumas Nicole. com os pais. os pais com seu sintoma (que exigia que o Na situação clínica referida a seguir. pois. fo- sobre essa situação clínica com uma obser. mantendo­‑se os pais em suas um quadro fóbico. os terapeutas de Miriam e Miguel. em função do alto partilha dos bens. Na época. estaria com muitos te. lescente tenham relação com a situação do- Assim como essa. E quando temos há algum tempo. Miriam. duais têm se revelado extremamente profí. Lírio. de intervenção familiar no curso de atendi- dimento psicoterápico individual. como a jogo interativo que mantinham. Não se pode dei- individuação em andamento. estaria envolvido com o uso de drogas. cuas em nossa experiência. tanto no par xar de mencionar. Concluindo. fóbica. nação. também a mãe já tinha um novo das situações conflitivas individuais. participação de um(a) colega no campo Cremos que essa breve intervenção psicoterápico. e não Nicole. fosse a autores deste capítulo. solicita­‑nos similares no curso de atendimentos indivi. em que foi sugerido que os pais uso de tais instrumentos técnicos. marcos referenciais teóricos e sustentados dimento durante um exercício psicodra. em terapias familiares riu) e na sequência deu­‑se como tema para casa que Nicole tentasse impedir que a Com propósitos similares aos descritos mãe saísse de casa. e os pais de Nicole recomeça. flexibilização no uso de instrumentos técni- pósito pelos três compartilhado de negar a cos por parte dos terapeutas. troduzir o fator “mobilização” em situações vez lhe permitisse uma evolução favorável pessoais ou terapêuticas que estão em estag- também no curso de um atendimento indi. mesmo para trabalhar. que. outras intervenções méstica em que estão imersos. em nosso en- minhamento de Nicole para o que talvez tender. a necessidade Nicole­‑mãe(pais) como na díade Miriam­ de que tais procedimentos clínicos estejam ‑Miguel. tante movimento. ocorreram tais intervenções em um atendi- ou seja. que morava certos escotomas em nossa compreensão com Gerânio. viúva. assim como propôs­‑se a Nicole que Açucena nos procura preocupada convidasse o pai a levá­‑la a escola todos os com seu filho único. as vantagens ou méritos desse tipo resultasse em um longo e dispendioso aten. e a terapia para vidual. juntos. temos realizado interven- porque ela. após se separar­ do mari- a oportunidade de realizá­‑las em coterapia do mudou­‑se com o filho para viver junto surge uma oportunidade ímpar de eliminar a Flora. Vamos a seguir relatar como sem um marido que a ajudasse e cuidasse. um atendimento do grupo familiar. familiares. quais são. tratando­‑se mento familiar realizado em coterapia pelos Miriam como se ela. Nicole é mentos psicoterápicos individuais? uma menina de inteligência acima da média Pensamos que basicamente – como fi- para sua faixa etária e revelou perspicácia cou sugerido no exemplo aludido – seria in- e condições de insight inabituais. em . já que ele não tinha uma casa para Pressupondo que os problemas do filho ado- recebê­‑la. Isso inclui não só o esta- a oportunidade de tomar contato com o belecimento de interfaces teóricas. Açucena morava em outra cidade e. tia de Açucena. segundo dias pela manhã para que pudessem estar ela. Vida é movimento. familiar substituiu com vantagem o enca. pela companheiro. nem a Nicole nem ao grupo familiar. ções individuais em processos terapêuticos mores de enfrentar a vida lá fora sozinha. ativados pela inevitabilidade dos processos de separação/ sua intuição e criatividade. mas certamente esse não proporcio. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. apoiados em um sólido conhecimento dos Houve um momento crucial do aten. intervisão proporcionada pela presença e ram a negociar a divisão patrimonial. ser um processo vivo tem de estar em cons- naria. no item anterior. abraçassem fortemente Nicole impedindo­ ‑a de sair de seu “entorno” (o que provocou uma violenta reação de Nicole para libertar­ Intervenções individuais ‑se da sensação de sufoco que depois refe. contudo. por uma significativa experiência prévia no mático. o que tal. invertendo a situação. seu pai velho e enfermo. com o pro.118 Luiz Carlos Osorio. de Açucena. Como tornar proveitoso um mau ne- mo ambos. Porto Alegre: Assim. auxiliarmos Açucena e Lírio a impedirem o zes como algodão entre os cristais. In: lidades existenciais. mente afetando não só os demais familiares mente deu guarida. e que se dis. F. pressiona a mãe para que ambos saiam para Assim como nas intervenções familia- viver em outra casa. ampliando o leque de possibilidades de pro- miliar. necessidades que demandavam ajuda. procuran. tuadas no subsistema mãe­‑filho. e cuja esposa. te. dizendo­‑se carente de com. São Paulo. dedicando­‑se panhia. que. BION. tinha dificuldades financeiras pelo destino dos que a cercam. viduais realizadas com um de nós (ou mes. bretudo com Lírio. 1979. por outro lado. pela situação descrita acima. com repercussões mais acen- e ainda sentindo­‑se responsável pela mater. Cravo e Rosa. Revista Brasileira de Psicanálise. bem como entender o que primos deste. a sobrecarga que sente desde que assumiu a v. sobrecarga essa exacerbada e o filho desta. Açucena pôde em sessões indi. sentimos que tanto Açucena como porcionar alívio de padecimentos emocionais Lírio necessitavam tratar não só questões que se potencializavam reciprocamente. 13. ceberem ajuda individual para vicissitudes 1989. ANGELO. estava subjacente a suas atitudes provocati- Flora. Flora. Lírio pôde examinar em mesmo teto Gerânio (pai de Flora e tio­‑avô entrevistas individuais sua relação com o pai de Açucena). gradativo agravamento de suas respectivas do amortecer os choques entre o filho e a tia crises vitais. Laboratório Terapêutico. em algumas ocasiões) examinar gócio. o que também é desejo res em processos psicoterápicos indivi­duais. por seu turno. com o grupo familiar (que. Manual de terapia familiar – Volume II 119 uma casa de amplos cômodos. bem como evidencia sentimentos de culpa não só tornando o setting psicoterápico sufi- em deixar Flora sem sua companhia e a cui. Mais tarde. alega impossi. não se propiciaria espaço e condições para Açucena. liberando­‑se da excessiva responsabilidade tra cidade. tem um perfil autoritário e mostra­‑se exigen. so. falecido prematuramen. vivem hoje sob o Por seu turno. Em suma. 1996. Porto Alegre: Artes Médicas. W. ANDOLFI. no entanto. mas igual- nagem dos órfãos de pai a quem Flora igual. Artes Médicas. peculiares a seus distintos momentos e rea. cientemente flexível para ir ao encontro das dar do pai e seus outros dois protegidos. mar o curso de seu projeto de vida pessoal. coterapia familiar. .. o papel de “paciente identificado”. em mantê­‑los. conquanto generosa e disponí. Lírio frequentemente corresidentes como os distantes. M. a alternativa inversa mostrou­‑se capaz de bilidade financeira ­atual para concretizá­‑lo. como re. como Após algumas sessões com o grupo fa. procurando sustentar seu desejo de REFERÊNCIAS se autonomizar­do restante dos familiares e realizar a médio prazo o projeto comparti. COMO trabalhamos com grupos. agregar valor aos objetivos terapêuticos. C. que por ser o mais jovem focaram­‑se no processo de mútua separa- nem sempre se comporta com o padrão mais ção e individuação de que todos careciam) responsável esperado pela “dona da casa”. BAPTISTA NETO. relativas ao subsistema mãe­‑filho (para o qual providenciamos sessões só com os dois. Cremos que no contexto das sessões te e cobradora com os sobrinhos­‑netos. vieram viver na mesma nesse atendimento individual a reavaliar e casa um casal de filhos adolescentes de um esboçar as primeiras providências para reto- irmão de Açucena. R. induzindo­‑o a adotar vel para acolher familiares em dificuldades. Lírio e os dois ausente e omisso. Tempo e mito em psi- lhado de morarem em outra casa). sente­‑se muitas ve. monoparentalidade e foi obrigada a aban- pôs a receber a sobrinha (com quem tinha donar seus projetos de desenvolvimento anteriormente boa e sólida relação afetiva) profissional. vas no lar de adoção. Açucena. também residente em ou. O processo de separação-individuação. L. Revista Brasi. Turbulência Emocional. OSORIO. M. Revista Aberto. Uruguaya de Psicoanalisis. P. 21. São Paulo. Porto Alegre: Globo. R. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Porto Alegre: Artes Médicas. W. MAHLER. QUINTANA. La neurosis de contratransferencia. BION. . Buenos Aires: Paidós. 1960. RACKER. Caderno H. C. H. v. 1996. FUTURO da psicanálise. 1961-1962. In: leira de Psicanálise.120 Luiz Carlos Osorio. Transferências revisitadas. 1973. 1982. Porto Alegre: Mercado HEIMANN. 1987. M. Sobre contratransferencia. que foca. família e empresa. luto sobre elas. devia obedecer ao marido como se seu amo flitos existentes na família e que transpõem e senhor fosse e os filhos pertenciam a seus as portas da empresa tem sido responsável pais. temente esses se julgavam com direito abso- res ao longo de sua trajetória. e o res entre os povos primitivos. miliar. se separar de suas origens familiares e adqui- As relações familiares e de trabalho rir vida própria e autônoma. Como já frisamos. Os conflitos interpessoais não noção de empresa traz em suas vertentes eti- só repercutem negativamente nos resulta. mos no tópico a seguir. as dificuldades da instituição empresarial de desmotivando­‑os. a origem conscientização por parte dos dirigentes de etimológica da palavra família nos remete ao empresas familiares – e lembremos que cer. Como já mencionado em capítulo an- contudo. antiga considerava­‑se a família como sendo o manos são tão ou mais importantes do que conjunto de escravos ou criados de uma mes- as questões técnicas ligadas à gestão dos ma pessoa. portanto. se simbiotizam na realidade cotidiana das Todas as ideias emergentes sempre­ empresas familiares. capítulo 11 Atendendo empresas familiares Luiz Carlos Osorio Introdução questões a examinar e a entender ao nos aproximarmos de uma empresa familiar é O atendimento de famílias a partir da como estão as fronteiras entre os dois siste- década de 1980 acabou por conduzir­‑nos ao mas. como vere- trar as relações humanas no seio da família mos mais adiante. A noção de posse e a questão Portanto. não basta bem administrar os do poder estão. Lembre­‑se ainda de que a e da empresa. a quem deviam suas vidas – consequen- pelo insucesso de muitas empresas familia. Ultimamente. quer negócios. Disso nos ocupare- trabalho com empresas familiares. é preciso também saber adminis. contudo. Uma das primeiras foram apresentadas com o auxílio de me­ . mológicas o sentido de “aprisionamento” (im dos buscados pela empresa. as empresas bus- cam ajuda sob a forma de consultorias. nos parecer que esta raiz etimológica alude ais mostram­‑se mais difíceis de manejar do à natureza possessiva das relações familia- que os aspectos puramente gerenciais. para Fronteiras família/empresa assessorá­‑las em dificuldades relacionadas com a gestão de seus negócios. remos neste capítulo. que significa “servo” ca de 95% das empresas em nosso país são ou “escravo”. Os relacionamentos interpesso. como afetam a + prendere: prender dentro) como a sinalizar qualidade de vida dos que nela trabalham. vocábulo latino famulus. Tradicionalmente. bem como das empresas. vem ocorrendo uma progressiva terior de minha autoria neste livro. onde a mulher desconhecimento de como lidar com os con. provavelmente porque na Roma empresas familiares – de que os fatores hu. intrinsecamente negócios para que uma empresa seja bem­ vinculadas à origem e evolução do grupo fa- ‑sucedida. Uma empresa familiar Assim como um embrião se desenvol. percepção das fronteiras família/empresa. ambas. A metá. família e empresa. por exemplo. para melhor elucidá­‑las. e a empresa por não poder me- que adquirem um caráter simbiótico (sem lhor prover o sustento de seus associados. crescimento da empresa e até mesmo sua em um processo similar ao da separação/in. pode próprias (Figura 11. a outro figu. grama para todos os membros da família. mantenha sempre ca. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Vou aqui quando. do que a transposição de um ginal e até mesmo da perda de sua coesão sentido próprio. privilegia as hierarquias dentro do sistema pois sair dele e se constituir em um ser com familiar e não está disposta a fazer con- uma identidade própria. ra. pode acontecer que o cres­ci­ Evolução Figura 11.1). mento da empresa ocorra à custa de um fora nada mais é. dividuação dos seres humanos. extinção (Figura 11. conhecido) mais bem apreendido. tá­foras. uma bem­‑definida separação/individuação) Rivalidades exacerbadas entre membros da ou já tão distantes e descontinuados que família podem ser transpostas para a em- pouco remetem à sua ascendência. como sugere sua própria empobrecimento da identidade familiar ori- etimologia.2 Figura 11. presa e nela criar um desgastante processo No processo de constituição da empre­ sa familiar. embo. podendo ser tão próximos membros. a exemplo do que também ocorre com por mau gerenciamento das áreas compar- os seres humanos.2). o desconhecido (ou ainda só parcialmente O contrário também poderá ocorrer. ras entre a família e a empresa nas empresas mesmo quando esses carecem de qualifica- familiares. tilhadas ou pela agudização de conflitos racterísticas que lembram a matriz de onde familiares preexistentes à criação da em- se originou. ções para ocupá­‑lo.1 Empobrecimento da identidade familiar no pro‑ Evolução da empresa familiar. já conhecido. a empresa sai do cessões que abalem privilégios e supostas corpo da família para se constituir em ou. ou ameaça de desestruturação dos laços fa- rado.3). Os vínculos institucionais da presa. adquire sua Há situações em que. que pelo mecanismo analógico torne miliares (Figura 11. podem empresa com a família que lhe deu origem empobrecer: a família por não poder provi- assemelham­‑se aos do indivíduo com seus denciar melhor qualidade de vida para seus respectivos pais.122 Luiz Carlos Osorio. cesso de constituição da empresa. por inadequada identidade própria como instituição. Nesses casos. uma empresa estiver utilizar a metáfora da evolução dos seres preocupada em achar lugar em seu organo- humanos para acessar a questão das frontei. . poderá não crescer ainda porque a família ve inicialmente no corpo da mãe para de. ocorrer uma detenção ou paralisação no A empresa familiar nasce da família e. competências pré­‑designadas em nome do tro sistema com características e identidade progresso da empresa. tenham espaços próprios. Família e empresa familiar crescendo juntas. sistemas. promo. competitivo com repercussão na eficiência Família e empresa têm obviamente da empresa e retroativamente nas relações áreas compartilhadas.5).4 Figura 11. de tal sorte que família e empre. mas é importante que familiares. .. da mesma forma. o espaço por ela ocupado vendo não só a prosperidade material como possa ser priorizado.6). em o bem­‑estar de todos. ex. é a vez solidário em que o prazer da convivência de a família se mobilizar para ampliar o es- acrescenta­‑se ao do trabalho ludicamente paço dedicado à empresa (Figura 11.5 Detenção no crescimento da empresa familiar. Família e empresa razão de uma crise conjuntural na economia familiar poderão crescer juntas. do país ou por disfunções na estratégia para do esforços e competências. onde preservem sa familiar poderão dissociar­‑se e até mesmo suas identidades peculiares.3 Figura 11. flexibilidade Figura 11. de seus membros). em um clima atender a necessidades do mercado. compartilhado (Figura 11. Flexibilidade entre família e empresa familiar. Além disso. soman. por en- possam experimentar a sensação de que se fermidade grave ou morte súbita de algum beneficiaram com sua associação.6 Perda de vitalidade da empresa e da família. de tal sorte que em uma situação O desejável é que ambos os sistemas em que a família seja afetada (p. é antagonizar­‑se. Manual de terapia familiar – Volume II 123 Figura 11.4). com a correspondente perda preciso que haja flexibilidade em ambos os de vitalidade de ambas (Figura 11. de ampliação do pa. cuja maior parte de sua vida eterna busca do estado de bem­‑estar social. nas aposentadoria sem retorno. por parte da empresa. As famílias e as empresas que formam Muito se fala do perfil autocrático e precisam ser ajudadas a estabelecer suas centralizador dos fundadores de empresas. Pode­‑se deixar interações entre o sistema da família e o de considerar o seu intenso luto e. secutório.­ fronteiras como espaços demarcadores de de sua habitual dificuldade em delegar fun- identidades e competências. de outro. quem sistema da empresa. é preciso que. A sucessão não ma sistêmico e de sua abordagem das inte. ções de liderança e abrir mão do poder que das alfândegas que impedem o trânsito­flui. Mas quero aqui enfatizar o dos membros da família e sua criatividade que parece ser o ponto nevrálgico da ques- laboral e. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. tendo que se abster daquela que provavelmente foi a grande motivação Os problemas relacionados com a sucessão de sua vida profissional para enfrentar uma e herança se produzem. ram o processo sucessório. Como a empresa come- ‑se”) se quiserem ser bem­‑su­cedidas. outro lado. detêm. sabe. trimônio coletivo e de transcendência dos Imaginemos o fundador de uma em- objetivos imanentes à condição humana na presa familiar. evitando colocar o acarretará o fim prematuro do sucedido e a problema na formulação simplista do “com instalação de um sentimento de culpa per- quem estão os direitos” ou “quem deve ce.124 Luiz Carlos Osorio. de multiplicação de vinculados à questão da finitude humana e o esforços despendidos. Ou ça por seu ou seus fundadores. e não simplesmente palmilhando a de extrema valia a contribuição do paradig. estrada em direção ao fim. pode constituir-se na troca de um proje- rações humanas. para o der para quem” ou “a quem dar razão”. Mike. enfrentamento com a morte. dos conflitos geracionais que eclodem do das mercadorias que têm a intercam­biar no parto sucessório. Famílias e suas empresas devem “su­­ple­ sobrevive à passagem da primeira para a mentar­‑se” (o que é distinto de “com­­plementar­ segunda geração. e para seu enfoque é de vida. por desfocarem a questão to de vida por um projeto de morte. a primeira seja. de um lado. as qualidades hu­manas circunjacentes. decorreu exercendo a direção dessa empre- sa. não levar em conta os fatores Mas se essas são ponderações a serem emocionais presentes na interface entre a levadas em conta pelos sucessores. ambas questão a formular ao tentarmos compreen- saiam “acrescentadas”. e não “esvaziadas” der as vicissitudes do processo sucessório é de conteúdos inerentes à identidade grupal porque mais de dois terços dos fundadores ou institucional que as define no contexto de mais de 50 anos ainda não encaminha- cultural em que se inserem. enfrentando a situação de sair em defi- nitivo de seu comando (“para nunca mais O problema sucessório retomá­‑lo”). tão sucessória do ponto de vista de quem vai o espaço para a realização de proje­tos de ser sucedido e que está contida nos dilemas vida compartilhados. passá­‑lo a seu(s) herdeiro(s)? Johnson e Anderson. Por sucessor. de sua interação. os suce- família e a empresa talvez explique porque didos precisam igualmente considerar que menos de um terço das empresas familiares muitas mudanças ocorreram no mundo em . o que da dicotomia geracional. e não como rígi. precisamente. e outras tantas questões que são. 1995) Por isso julgamos que a sucessão bem encaminhada tem de contemplar a necessi- A questão da sucessão necessita ser dade do sucedido de continuar com direi- examinada a partir das fronteiras entre a to a continuar participando de um projeto família e a empresa. de danosas consequências. a decorrente impossibilidade de abrir mão do poder de que se acha detentor para (Rosenblatt. fator de suas competências. Portanto. no caso da nas empresas familiares relação entre sucessores e sucedidos. Manual de terapia familiar – Volume II 125 que vivem e nas relações entre as gerações tem positivamente suas qualificações. mes- desde que fundaram suas empresas. desequilíbrio). familiares ou não. família. (Toffler. além economia baseada no poder dos músculos de distintos projetos de vida. por opções de seu projeto de vida e diversidade dos seres humanos. cada vez mais evidenciável no onde se originou. vilegiado pela oportunidade de realizar seu terior. cessória há de se ter em conta também a Uma família. empresa são os privilegiados. do ponto de vista da manutenção do desejável a participação da mulher na con- bom relacionamento familiar. dos por avanços tecnológicos desconhecidos os prejudicados. Essa mudança de paradigma Por outro lado. mo que essas não sirvam à empresa. deveres e op- continuar a saga empresarial da família. que se tornaram. é impor. Pensamos que não só é lícito como tante. a tão alegada experiência projeto de vida sem se submeter às expecta- dos mais velhos deixou de ser um argumen. sim um elemento que agrega valores na re- alização de tarefas compartilhadas. Se ções entre os sexos é a pedra de toque das para alguns. 1983) A boa sucessão deve ainda contemplar a possibilidade de que nem todos queiram A igualdade de direitos. isso elimina desvanta- decisão sobre quais filhos devem permane. e os que saem. deve ser capaz de transmi- mundo contemporâneo. isso pode significar a plena sa. Nem sempre os que permanecem na sição de conhecimentos e aptidões aporta. enquanto o que fica pode sentir­‑se maior preparo para o exercício do comando privado das oportunidades de revelar suas de suas empresas. não há como deixar de considerar a hipótese de que Ao deixarmos de uma vez por todas uma tenham diferentes visões de mundo. tivas da família para que assuma funções na to definitivo e universal para justificar seu empresa. capazes de vam quase sempre a atitudes sabotadoras. nós necessitamos do reconhecimento alheio prestigiada antropóloga norte­‑americana. como apontou Toffler. em razão da aqui. e se distanciam. gens fundamentais no caso das mulheres. apreciadas e valorizadas. ser mestres de seus pais. dela nessa diversidade não um fator adverso. se alguém for excluído no na relação entre os sexos em nossos tempos processo sucessório pelo julgamento de que não poderia deixar de trazer consequências seu perfil não se coaduna com o deseja­do para a empresa familiar. cer e quais não na empresa. Isso também é e passarmos para outra que se radica no de suma importância quando está em tela a poder da mente. habilidades e desejos. como assinalava Mead (1970). Todos ta forma. O que sai pode sentir­‑se pri- ou ainda não incorporados pela geração an. de se conviver com tir o orgulho de a ela pertencer. que se co­no­ dução das empresas. aptidões onde essas pudessem ser mais bem No encaminhamento da questão su. como trouxe para a pela evolução ulterior da empresa. a forma de um novo padrão relacional en- presentar uma sobrecarga e a renúncia a um tre homens e mulheres (onde a força física projeto de vida em maior conformidade com deixa de ser. transformações por que passa a família tisfação de suas aspirações e o trajeto para contemporânea e se projeta no futuro sob sua realização pessoal. pela primeira aceita ou sem opções que a compensem le- vez na história da humanidade. mesmo para as diferenças. os para nosso desenvolvimento pessoal. além pais hoje são como imigrantes no mundo de de que ressentimentos por uma exclusão não seus filhos. De cer. assim como a empresa de necessidade. Há de se respeitar e acolher a os que. O exer- cício da liderança nos dias atuais pressupõe A questão do gênero a aceitação dessas diferenças e. . para outros pode re. percebendo pelo saudável exercício da autonomia. e. mas. quer no âmbito pú. aliás. no que se refere a seu potencial gerador liderança. assim como era um marido e mulher. der subterrâneo e o direcionamento implí. A empresa familiar é o total. Para haver Não se pode entender a família de hoje. Esses Nas empresas familiares. a fonte de todas as só na anatomia como em suas característi. exercendo um po.­ mais em outras ocasiões encontramos as mulhe. Elas que. como temos constatado em nossa mental de quem trabalha em uma empresa. das empresas familiares no mercado lócus por excelência dessa busca do sentido . de prazer. vação. que estão ao lado ou se têm revelado sua força e importância. zer do pão nosso de cada dia. que nutre não lidade por um padrão de cumplicidade e só o corpo. transformações e questionamentos do saber­ cito das ações do marido e filhos no mundo e viver acumulados. razões existem para que possam interferir na res fora do comando das empresas. sempre foram uma riqueza potencial na diversidade. é preciso haver resgate. as relações interpessoais acrescentar qualidade) como companheiros entre os membros da família são onipresen- de trabalho e no exercício de funções de tes. negócios. estão intimamente ligados à satis- tão dos negócios. Na espiral ascendente da trabalho. presas familiares. e é nossa convicção de que balho desde tempos imemoriais. da atividade laboral. competitivo de nossos dias. Afinal. pela e para reelaborar sua função solidária no fa- necessidade de substituir posturas de riva. superpõem às questões ligadas à gestão dos mo quando não exercem funções na ges. projeto transcendente de ascender a uma blico como no privado. É na raiz dessa rea. pela ascensão evolução humana. Como afirmamos anteriormente. como igualmente o espírito pela solidariedade para fazer frente ao mundo cumplicidade em sua feitura. como ocorre nas empresas familiares. jogo de poder entre seus membros: entre de saúde. a empresa retoma sua do poder jovem e a consequente revisão da feição familiar para ressignificar o trabalho autoridade parental. de conflitos e de realizações solidárias. Não obstante. mes. melhor qualidade de vida e que é aspiração lidade que está o ressurgimento. e entre irmãos. Estamos em tempos de inovações. sim. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. não e são. expe­riência com empresas familiares. homem e mulher podem não só se comple. como à própria saúde presa e. em função da nova ordem instrumento para a sobrevivência coletiva sexual e da redistribuição de papéis tanto e proporcionava bem­‑estar social aos que o no contexto familiar como no mercado de compartilhavam.126 Luiz Carlos Osorio. na qual o trabalho era fonte de vida. po. se esses se confundem. é no seio da família e no ambiente dem ser valiosas mediadoras dos conflitos de trabalho que passamos a maior parte de internos que surgem entre os membros da nossa existência. maioria significativa das empresas em geral Homens e mulheres são diferentes. Tanto nas micro como nas macroem- mentar como ainda se suplementar (ou seja. uma renovação da atividade laboral é pre- nem as empresas familiares. Quem sabe será no trabalho realizado em conjunto no seio da família – do qual Toffler (1983) já nos oferecia uma visão Relações empresa prospectiva em sua imagem da cabana ele- familiar/atividade laboral trônica da terceira onda – que o ser humano irá resgatar a essência de sua condição exis- Tudo indica que o emprego é uma tencial e estabelecer um novo ciclo em seu entidade em extinção. para haver re­no­ dos negócios. entre pais e filhos. há de trabalho. sem analisá­‑las ciso haver o resgate de suas origens na fa- à luz dessa busca de um novo equilíbrio no mília. em última análise. com força comum a todos nós. família no seio da empresa. mas não qualidade de vida dos que nelas labutam. São elas muitas vezes as fação imprescindível não só ao bom êxito guardiãs do sonho familiar que gerou a em. do controle das famílias. as mulheres fatores humanos. formas de organização das relações de tra- cas psicológicas. e a bonança se instale. para ser novamente ma- conjuntura socioeconômica brasileira como nejados. para o que. Conflitos fazem parte da vida zante das empresas convencionais de nossa e são inerentes à condição humana. o que determina o ritmo do progresso de poderão ser as medidas tomadas para mi- uma nação. passem. estamos cuidando da família lavra que pode sugerir “mudar juntos” (con e vice­‑versa. mas de aprendizado e execução comparti. e outros temporais ocorrerão. a médio ou longo prazo. a + versare). Quanto expressão dos mecanismos autorregulado. eles prazer da convivência que podem propor. meu ver. Portanto. se do ser humano na sua herança animal de cristalize a noção de que aquela que estiver prover o sustento e facultar a procriação da fragilizada deve doravante receber perma- espécie no regaço do grupo primordial – a nentemente atenção e cuidados. Até porque. sobretudo. recordando a etimologia dessa pa- da empresa. a cabeça na areia. será in- Essa é uma questão sempre presente dispensável incrementar o grau de mútua nas inquietações que nos trazem os dirigen. em última análi. Pensamos mesmo que. da requalificação do trabalho neste limiar Conflitos se manejam. como já foi assinala. tigar seus efeitos nocivos. pois. o que só será obtido com muita tes de empresas familiares. há momentos em que uma requer mais empresas familiares atenções do que a outra. cionar. a empresa familiar como se passa com a natureza. É cuidar de uma “e” de outra. e aí é preciso ma- leabilidade para que a convergência de es. e não como terapeutas . coloca além da simples situação conjuntural Desde logo não há fórmula mágica de fazer frente à crise econômica ou repen. do novo milênio. para se prevenir conflitos em uma família sar o gigantismo massificador e desumani. como disse alguém jocosamente. Isso pode ocor- do prazer lúdico das tarefas compartilhadas rer quando. ou empresa. tolerância. está equivocada. nem que os operários passam a ser engrenagens existe uma palavra para designar ausência em um sistema que privilegia o produto. o que. Manual de terapia familiar – Volume II 127 original do trabalho como fonte de criação é que continuadamente se priorize uma coletiva. assim como em certas artes marciais utiliza­‑se a própria força do oponente para Cuidar da família derrubá­‑lo. em que. essa não será apresenta­‑se como um modelo viabilizador definitiva. nas mencionadas ocasiões de e do reencontro com a natureza gregária maior vulnerabilidade de uma ou outra. irá surgimento do trabalho em família e que o igualmente fragilizar essa. na função de “media- vulnerável. por um lado. da realização solidária permeada em detrimento da outra. algo que transcende o res. O que seria desaconselhável dores de conflitos”. Nas empresas familiares. cada vez que um conflito se instala na vã da de atividades laborais. representa uma são mediados e por aí se resolvem. saudável. nossa inter- forços se dirija ao sistema que está mais venção é. mais cedo e corajosamente reconhece­‑se sua res da sociedade que são. se negociam. como os temporais. cimentadas pelo expectativa de que. à moda dos avestruzes. até que opção de inegáveis potencialidades na atual outros se instalem. E esse algo Não há porque temer ou esconder se vincula ao reaparecimento de antigas for. Ao cuidarmos conversa. existência e inevitabilidade. por outro. Mediação nas do. negociados ou mediados. mais eficazes se. não quem o faz ou irá utilizar. e de conflitos. subtraídos da que esteja supostamente mais Há. os conflitos poderão ser utiliza- e/ou da empresa? dos para superar os próprios obstáculos que parecem criar. Tanto época. que serão família. Se. padrão “linha de montagem”. contudo. a alternativa “ou”. Evidentemente. Somente a partir da virada do séc. Encontramos a mediação exercida tos básicos da tarefa mediadora e das fun. Também A mediação tem se incrementado sig- certas religiões. (Moore. a desmen- segregadoras. cia encontram­‑se entre os povos orientais. Os cionalizada e desenvolveu­‑se como uma judeus foram os que a institucionalizaram e profissão reconhecida. já que muitas vezes esta. interpessoal.. comercial. acrescentaríamos ainda. Há de se estabelecer relação às questões em disputa. Encontramo­‑la ainda Canadá. conflitos internacionais. existindo comunidades em que já se exige que as partes experimen- A mediação é geralmente definida como tem a mediação antes de um juiz examinar a interferência em uma negociação ou o caso. O primeiro setor em que foi insti­ praticada entre os conselhos indígenas nos tuída formalmente nos EUA foi o das rela- nativos do continente americano. comunitária. de Origens da mediação política pública. pois de tomada de decisão.] a mudança vida social (trabalho. bens. atividade humana. via de regra. di. Um dos setores de crescimento mais rápido e significativo da mediação é o das Conceito disputas familiares. do sistema familiar. 1998) de limites muitas vezes tênues e que podem ficar indefinidos se o terapeuta familiar não se conscientizar de que está a lidar com con. no qual não é raro ações sobre- em que a mediação tem capital importân. também tem sido motivada pela crescente ligião. etc. tais como nas áreas tra- balhista. 1998) fornecia aos judeus um meio de resolução de suas disputas. deve­‑se em parte a um reconhecimento dição judaica de solucionar conflitos via me. política) e é atribuída à necessidade insatisfação com os processos autoritários de proteção de sua identidade cultural. familiar. Prática contemporânea da mediação textos e objetivos distintos. como o hinduísmo e o bu. re. nos EUA e prática da mediação. organizacional. mas. dos mediados mostram­‑se mais adequados tendo um poder de decisão limitado ou e satisfatórios do que os resultados litigados não autoritário. este crescimento a trouxeram até os tempos modernos. relações familiares. nificativamente em muitos países nas últi- dismo. atualmente nos mais variados campos da ções do mediador em empresas familiares.128 Luiz Carlos Osorio.. mutuamente aceitável com se desenvolvendo rapidamente no mundo . mas as ações para assegurar a posse a persuasão moral e a procura de equilíbrio desses bens. influenciaram significativamente a mas décadas. vam impedidos de buscá­‑la nas sociedades como fator predisponente à crescente ins- em que estavam inseridos em razão de leis titucionalização da mediação. A mediação é uma prática milenar. os acor- conflito de uma terceira parte aceitável. ambiental. XX a Para situá­‑la melhor cronologicamente. ções trabalhistas. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. viverem às partes em litígio (demandantes). uma distinção entre essas duas abordagens. envolvidas a chegarem voluntariamente A prática da mediação. embora venha a um acordo. No Brasil.. Vejamos a seguir alguns dos pressupos. e que ajuda as partes ou impostos. sobretudo. Os herdeiros muitas vezes herdam não os que enfatizam a busca de consenso social. e harmonia nas relações humanas. surada procrastinação vigente no sistema Outras sociedades ou grupos étnicos judiciário. mediação tornou­‑se formalmente institu- gamos que remonta aos tempos bíblicos.. A tra. (Moore. Por outro lado. mais amplo dos direitos humanos e da diação comparece em todas as áreas de sua dignidade dos indivíduos [. suas capacidades para resolver por sua con- reto entre as partes e valendo­‑se de inter. sária sempre que as partes tenham esgotado esforçando­‑se para evitar o confronto di. conflitiva envolvendo o processo sucessório dor na relação entre as partes. Condições requeridas quanto ao mediador O conflito não é necessariamente ruim. que predominam no ocidente. de uma empresa familiar: mediação não significa necessariamente ob. Este é o do oriente.ele parece estar presente em todos sicamente três condições: senso de justiça. Algumas solicitações Conflitos e mediação que recebemos para exercer a mediação na sucessão de uma empresa familiar.. ou seja. Pode­‑se até inferir que o boom O consenso primordial como mediador nos EUA tenha relação direta com pré­‑requisito para a mediação o aumento do movimento migratório de orientais e latino­‑americanos para lá nas úl. é um fato da Exige­‑se que o mediador preencha ba- vida. para conversar. é mais bem aceita nas chamadas aos objetivos da mediação. No entanto. por exemplo. como são as non para que se inicie o processo. conditio sine qua culturas de negociação direta. Soluções negociadas não são aproximar­‑se de uma empresa familiar que o mesmo que soluções consensuais. ta seus conflitos. (Moore. Como os povos versações. Queremos enfatizar a necessidade que timas décadas. Um mediador não pode nem deve ter consenso. evitar o reconhecimento explícito da exis. . Frise­ o chamou para mediar o processo sucessório ‑se. por Embora a mediação possa ser instituí­ exemplo. quase univer- salmente ela decorre da presença de uma situação conflitiva. conflitos nessa negociação). tentam faltar durante toda a mediação. as partes tenham pleno conhecimento do processo mediador e concordem previamen- te com seus objetivos. onde havia um impasse criam­‑se à vontade com a discussão aberta e as nego. não têm medo e até tuação dilemática em uma situação dialéti- buscam o confronto direto e sentem­‑se mais ca. anormal ou disfuncional. já estão comprometidas ab initio da em uma negociação não conflitiva (ou pela presença de um impasse em relação à até mesmo para prevenir a emergência de própria indicação da mediação. as culturas de negociação indi. valorizam as interações face a face. dor solicitado a intervir em uma situação ção é evitar a alternativa vencedor/perde. Manual de terapia familiar – Volume II 129 ocidental. Ou por outra. Já os xiliar para recolocar limites e fronteiras dos membros das culturas de negociação direta direitos de cada parte em outro contexto. E. os relacionamentos humanos e em todas imparcialidade (o que é diferente de neutra- as sociedades. anglo­‑saxônica ou es- candinava. contudo. ser indispensável o consenso com o desejo de que a empresa adote o que entre as partes com relação à necessidade e ele entende que seja melhor. A presença do mediador faz­‑se neces- tência do conflito e sua exposição pública. por exemplo. como sugere latinos incluem­‑se nas culturas desse tipo. O mediador seria um au- mediários para advogar suas razões. Vejamos. condições para que se estabeleçam con- ciações sem intermediários. é o termo (con + versare). é necessário que previsível a maior aceitação e consequente as partes estejam dispostas a “mudarem extensão da prática mediadora na América juntas”. 1998) lidade) e capacidade de empatia.. o que se espera de um media- O objetivo precípuo de toda a media. aceitam A mediação visa a transformar uma si- o conflito como normal. Latina do que. nos países de linhagem germânica. consenso primordial e o único que não pode reta. so. seu fracasso está preestabelecidas. das interações família/empresa através de dos solicitantes de uma mediação? Além do sua condição de profissional experiente na consenso primordial referido acima quanto decifração dos códigos comunicacionais da à necessidade e aos objetivos da mediação. que residem do embrionário na mente de quem o busca. originalmente expressos e estarem cientes E não há terreno mais propício para a gera. aquele que Finalmente. além do que para O mediador não é um interventor. suas lacunas. carregados de cono. mória. nas sempre um olhar prospectivo. E escutar implica submetia­‑os a cruel suplício. que não o próprio. obviamente. em contrapartida. não tomar partido. em acordo no passado. Diria que ele é. por meio de cor- mediador é o de promover um acordo. Cortava as pernas dos que cada parte pudesse se por no lugar da . e tentar alcançá­‑la podemos nos colocar em sua função restringe­‑se a acionar. eles não conseguem comu. com sua uma posição de distanciamento afetivo e ação catalisadora. queremos lembrar que é conduz para fora um saber que está em esta. não inclui o o que é uma quimera em se tratando de se- monitoramento de destinos alheios. no contexto so. mantendo­‑se estritamente em neutralidade é uma posição rígida. ou seja. Já não se demandaria tava a seu tamanho. a alterar pontos de vista bretudo. mediadora. conflitos. pação com os porquês do impasse no pas- tações afetivas. ambas as partes terão de ções em torno a um processo sucessório. Atacava cada parte possa escutar a outra. das. o único desejo compatível com a função de que excediam a medida e. pular vencedores. infligindo­‑lhe igual martírio. mediadora o respeito às partes envolvidas Do mediador não se espera que seja e a preocupação em não prejudicar a quali. suas potencialidades.130 Luiz Carlos Osorio. espera­‑se que os solicitantes estejam dispos- seus ruídos. na função de educador. de que. e não no passado. antes voltado entrelinhas de sua história. O mediador é um agente facilitador E o que se espera. O sucesso da mediação é direta- ção contemporânea de Procusto. necessariamente fazer concessões durante o O mediador não pode ser uma edi. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. res humanos como somos. Uma excessiva preocu- seus idiomas privados. diação. a imparcialidade exige uma pos- de ao que etimologicamente está expresso tura flexível. neutro. querendo mente proporcional à flexibilidade dos so- adaptar a empresa ao divã de suas teorias licitantes e. inversamente. mas sim imparcial. Forçava­‑os a estar receptivo a se colocar em outro lugar se deitarem em um leito que nunca se ajus. tos a se escutarem. O compromisso do mediador é com Seu maior compromisso ético é com a isen. despojava­‑os de seus bens e que não concorde com ela. as expectativas de mudança e solução de A solução para a sucessão de cada em. e passiva. sado pode levar a uma paralisação da ação nicar uns aos outros. estática um papel que em tudo e por tudo correspon. ten. como a mediação não visa a esti- ção de mal­‑entendidos do que as conversa. dinâmica e ativa. um tradutor: a ele cabe nio das razões do fracasso das tentativas de traduzir a sucessores e sucedidos o que. antes de tudo. Procusto era um famoso salteador É vital para o curso do processo que que agia entre Megara e Atenas. A ser tomadas. no futuro. na razão direta de sua rigidez. mesmo os viajantes. esticava os que não a atingiam. Teseu do como elemento norteador de sua ação matou­‑o. O mediador entendimento futuro do que para o escrutí- é. linguagem afetiva. o mediador deve ter presa em particular está na empresa. processo. um processo sucessório falta de empatia com o sofrimento das par- que se interrompeu ou está bloqueado pelo tes que estão em litígio e buscam nossa me- rompimento dos canais de comunicação. na empresa. E isso. portanto. para as alternativas e possibilidades de um ciocultural em que se inseriu. um rastreador de mal­‑entendidos. o que é distinto de ficar ção em relação às decisões que venham a alienado da realidade crucial do conflito. Neutralidade im- dade de vida dos que dirigem ou trabalham plica negação de sentimentos ou opiniões. Para nos avivar a me. e entre esses destaca­‑se a psicaná- considerações sobre a formação de profissio. e. famílias e empresas cionar a interferência dos “cacoetes” ou familiares. mento das condições requeridas para quem ca da mediação. tos e sua eficácia se mantém mais ou menos pelo aporte à percepção de como se estabe- inalterados em relação à antiga prática dos lecem os mal­‑entendidos e os caminhos para mestres de ofícios e seus aprendizes. porque isso seria esperar demais de voltada para o campo específico das atribui- litigantes. sobretudo. as noções de tarefa. por sua abor- camos os meios de transmissão de conheci. mas. é imprescindí. na essência. Em nossa prática como mediado- deformações profissionais prévias dos me. Manual de terapia familiar – Volume II 131 outra. pois. E isso já nosso trabalho à medida que iniciamos nos- nos coloca diante da necessidade de men. sendo os mediadores de o métier e de sua curiosidade epistemofílica sexos diferentes. but not least. ções profissionais a que se destina. nomea­ A mediação foi sendo introduzida em damente advogados e psicólogos. gagem vivencial que fomos acumulando em mentos. bem como de suas inclinações ro fundamental é que preferimos trabalhar vocacionais ou habilidades específicas para em comediação. utilizando predominantemente a ba- julgar ações e outros de interpretar senti. last continua sendo a grande fonte de trans. procuramos não nos deixar cercear pelas diadores na práxis. seja ele qual for. por sua contribuição à compreensão dos nais em geral em nossa época. Sabemos que tais for- mações estão antes a serviço das definições A questão do e reservas do mercado de trabalho do que gênero e a comediação da qualificação de seus praticantes. mas que. No entanto. Por ser uma especialização só muito recentemente reconhecida. dos mecanismos de retroalimentação (fee- o processo de aquisição desses conhecimen. essa é função. não há como escotomizar a contribuição dos nar na prática da mediação. do que na bagagem de conhecimentos especializados “Formação” profissional do mediador que tragam de suas profissões de origem. desejaríamos conflitos determinantes da solicitação do ato pontuar que entendemos que apenas sofisti. desde desmontá­‑los. sem dúvida. dagem das interações humanas sob a égide mentos profissionais. a exemplo de A mediação em outras tantas surgidas nas últimas décadas nossa experiência acompanhando o boom da era da prestação com empresas familiares de serviços. de atributos pessoais do Por considerarmos a questão do gêne- postulante. mediador. a visão sistêmica. e campo grupal como foram concebidas e Nenhuma formação acadêmica (ou para­ transmitidas pela dinâmica de grupo e pela ‑acadêmica) substitui a prática supervisio. os que a exercem geralmente provém de áreas profissionais afins. uns presos ao hábito de teorias. e que foram men- cionadas no item correspondente. processo missão de conhecimentos e habilidades. teoria dos grupos operativos. parte obviados pela atividade interdiscipli. res. o psicodrama. a teoria da comunicação humana. referenciais teóricos que pavimentaram esse Ainda que esta não seja a ocasião para percurso. O trabalho supervisionado técnicos que nos oferecem para representar (que preferimos chamar “intervisionado”) e externalizar os conflitos subjacentes. pelos recursos tempos bíblicos. vel que se ponham em outro lugar que não Aptidões para o exercício da função o de sua posição original quanto ao enfoque de mediador. dback). Entendemos que o olhar . estão antes no preenchi- da situação conflitiva que determinou a bus. lise. Tais inconvenientes podem ser em nosso percurso como terapeutas. nada como fundamento para aprender um ofício. sas atividades com casais. se disponha a exercê­‑la. profissionais com diferentes formações pré- plementam no processo de mediação. de tranquilizarem as partes.132 Luiz Carlos Osorio. quando essas torna­‑se por vezes enriquecedora. pois este deve estar atento para que o sigilo seja res- Por outro lado. desde que tal presença seja aceita pelo na então imperioso no intervalo entre cada oponente sem lhe causar constrangimento encontro com as partes mediadas. de que não haverá alian. Isso pode por vezes acarretar interdisciplinariedade um ônus ao trabalho do mediador. mais do que a profissão de origem do ças determinadas pelo sexo do mediador. dade do mediador em escutar os mediados e ção é um dos mediadores poder ficar mais sua habilidade em intermediar soluções sem na posição de observador das interações en. Em um processo de mediação. Entendemos que Além dessa constante troca de impres. aspectos psicológicos como jurídicos. para possibilitar bas tenham espaço para se expressarem li- uma maior imparcialidade na condução da vremente sobre o que entendem que possa mediação. sem o focados apenas em sua intervenção media. sendo indispensável que o espírito solução de seus impasses. que sempre podem vistas aqueles que julgarem importantes ser corrigidas pelo intercâmbio de impres. várias entrevistas individuais para que am- nham opiniões diferentes. Outra vantagem em empresas familiares da comediação é o fato de se minimizar a influência dos pontos cegos e participação Temos por princípio deixar as partes dos conflitos internos de cada mediador nas inteiramente livres para trazerem às entre- distorções perceptivas. que se tor. peitado e não denunciar à outra parte o que ciplinar. cedora e a outra. é de suma mais diferenciados sejam os olhares sobre a importância que haja uma afinidade tanto situação em mediação maior será nossa ca- ideológica quanto pessoal entre os media. No en- presas familiares). diadores. quanto mais informações tivermos e quanto sões entre ambos os mediadores. diador não se estabelece e esse. mediador. pacitação para auxiliarmos as partes na re- dores. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. res. prejudicá­‑las se comunicado diante da ou- tra. consequen- rísticas da comunicação entre as partes. não avança. como vencida. tanto. além vias (tais como psicólogos e advogados). . quando são de sexos diferentes (como na mediação não imprescindível. o que não quer dizer tes em conflito. não po- demos deixar de considerar o quanto deter- minados conflitos que são trazidos à tona A técnica da mediação mobilizam os mediadores. por situação preexistente. para fornecer informações complementa- sões entre ambos os mediadores. ou sobre o que simplesmente não dese- jem expor na entrevista conjunta por razões Mediação e de foro íntimo. feminino e masculino são diferentes e se su. podemos realizar uma ou que não seja possível e até desejável que te. possibilitando­‑lhes muitas vezes É ainda primordial que as partes detectar nuances importantes que passam sintam­‑se igualmente respeitadas e plena- despercebidas quando estão inteiramente mente confiantes nos mediadores. exacerbar os ânimos e sem permitir que al- quanto o outro se ocupa em promovê­‑las. a mediação interdis. que o clima necessário para o processo me- dora e não no jogo interativo e nas caracte. temente. quando se trata de ques- dos conflitos de casais ou em situações que tões que envolvem simultaneamente tanto envolvem as diferenças de gênero em em. é elemento determinante do su- Outro fator que nos parece importante cesso do processo de mediação a disponibili- como contribuição da prática de comedia. solidário se sobreponha a qualquer compe. Após a primeira entrevista com as par- titividade existente. entendendo por essa a que inclui lhe foi confiado na entrevista individual. guma das partes chegue ao final como ven- Isso amplia o campo perceptivo dos me. E tanto terapeutas como prias atitudes e formas de interagir. até mesmo contraindicado pelo distancia. Toda a media- diadores mobilizem as partes mediadas para ção tem efeitos terapêuticos. por seja. como deve ser um exercício direitos humanos e ao desejo primordial de constante por parte dos mediadores. um podemos utilizar é a filmagem de uma en. quando os encontra- que necessitam de seus referenciais afeti. Uma técnica auxiliar que eventualmente cos de seus pacientes. Evidentemente. ção terapêutica. sem esse disponibilidade para auxiliar na resolução recurso. ções pelo mediador. está de certa forma exercendo uma fun- ‑se na posição de observadores de suas pró. e sim seres humanos para essa tarefa. qual intenção mediadora. tes da mediação. ciliação e busca da harmonia na interação litador da comunicação entre as partes e um entre os indivíduos. o terapeuta procura fazer não é mais do que que é indício de uma mediação malsucedi. um faci. assim o surgimento de hipóteses alternativas que como toda a terapia tem seu conteúdo e apontem para o objetivo da mediação. Não se disponibilizam ou tenham capacitação somos robôs em ação. não entende. embora não que flexibilizem suas posições. o mediador pode valer­ e especialistas em mediação. É prioritário entrarmos em contato com o desejo de cada parte media- da para avaliarmos a possibilidade de uma Quais seriam as solução negociada e tanto quanto possível diferenças entre mediação consensual. a seus tes mediadas. de conflitos e se reger pelo primado da con- O mediador é. Isso seria não só artificial como de para funcionar como mediador auxiliar. que o resultado final não se constitua exemplo. mediar os conflitos internos ou intrapsíqui- da. é preciso que os me. para não terem desqualificadas suas reivindica- vivenciarem os sentimentos dos solicitan. pelo ato da trevista e a discussão posterior a ela com as escuta privilegiando a resolução de confli- partes. princípio básico do respeito às partes. Muitas vezes. na interlocução entre as partes. Manual de terapia familiar – Volume II 133 Tanto quanto possível. a mais eficaz possível nas circunstâncias vi- Apesar do que dizem certos autores gentes. de tal sorte que essas possam colocar­ tos. que. Por outro lado. raros são os familiares que mento criado com as partes mediadas. mas. também deve ser alguém capaz conveniência de que possam tratar o mais de prover conhecimentos e informações ne- abertamente possível suas divergências para cessárias para que a tomada de decisões seja levarmos a mediação a bom termo. mas que ambas cheguem a um senti. marcadas entre uma e outra. o que um ou que haja um vencedor e um vencido. em uma psicoterapia indivi- na violação dos direitos de uma das partes dual de orientação psicanalítica. mos. acima de tudo. Para isso. deve­‑se evitar a for. quais- semelhantes. são indubitavelmente de grande valia vos para compreenderem o que se passa para nossa tarefa mediadora. Poderíamos dizer. decodificador dos mal­‑entendidos que cos- mação desses “guetos” informativos com o tumam prevalecer na interação entre essas. na vigência de um conflito entre nossos Enfatizamos uma vez mais que. devido esclarecimento das partes sobre a Além disso. Não há fronteiras perfeitamente de- do comum. . ‑se de um membro da família para auxiliá­‑lo mos que se possa instrumentar um proces. quer que sejam os recursos técnicos ou auxi- O recurso psicodramático da troca de liares de que nos utilizemos no processo de papéis (colocar­‑se no lugar do outro) não mediação. o que as mediadores devem caracterizar­‑se por essa auxilia a se darem conta do que. por vezes seria inviável. viabilizando seja esse seu propósito manifesto. advogado na função mediadora. quando esse so mediador sem nele colocarmos nossas tiver a credibilidade de ambos e a habilida- emoções. lembrando que con + senso não e terapia familiar? significa que uma das partes se submeta à outra. todos eles devem pautar-se pelo só pode ser valioso para mobilizar as par. Seu papel primordial é transfor- mar uma situação dilemática em uma situa­ Referências ção dialética. Em resumo. nicação e um promotor de interações entre as partes. entendendo­‑se essa por uma predisposição para a escuta do outro e de MEAD. Porto Ale- fornecedor de informações. O Processo de mediação. mação necessárias para alavancar o proces. so de mediação. dor atua como um levantador de hipóteses e MOORE. et al. . A. the generation gap. Press. Focaliza suas intervenções TOFFLER. Previsões e premissas. 1983. 1995. como podemos caracte. 1998. quanto possível consensual e evitando que rizar a função do mediador de empresas da mediação saiam vencedores ou vencidos. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. O media. P. tora sua atividade. Ajuda a pensar e gre: Artmed. pondo­‑se imaginária e ideal. Culture and commitment: a study on suas razões. M. New York: Natural History mente no lugar da parte oponente.134 Luiz Carlos Osorio. La familia en la empresa. ROSENBLATT. buscar outros profissionais e fontes de infor. C. 1970. familiares? O futuro mais do que o passado é que moni- O mediador é um facilitador da comu. Buenos Aires: El Ateneo. W. Rio de Janeiro: no propósito de procurar uma solução tanto Record. que vêm manifestan- go. entre outros. teólo. criando uma rede o processo de promover terapia comunitá. a partir Medicina da Universidade Federal do Ceará. um contato face­ a­ face. de organização informal. também. 2005). que são da identidade cultural das comunidades e de incentivados pelo terapeuta comunitário a redes sociais solidárias que possibilitam aos partilhar. 2003). Ceará. que demonstram Pensamos que a metodologia da TC um interesse comum que é o alívio de seus é a tradução viva daquilo que Paulo Freire sofrimentos e a busca de seu bem­‑estar. Suíça. vidade (Fukui. famílias e grupos em social. rapia comunitária sistêmica integrativa A experiência da TC ocorre. cuja afinidades. luções para os conflitos pessoais e familiares Funciona como fomentadora de cidadania. (TCSI) surgiu. na busca de so. entendia como o inédito viável. bito da atenção primária em saúde mental. no Brasil. ser mento. A TC vem sendo desenvolvida por pulação dessa comunidade (Barreto. para a partilha de sabedoria de vida. finalidade é a promoção da saúde. dos resultados concretos de sua aplicação para atender às necessidades de saúde da po. considerada uma tecnologia de cuidado ou de sofrimentos vivenciados no cotidiano. Pirambu. de apoio social e evitando a desintegração ria com indivíduos. destinada à prevenção na der participar deste projeto que visa a divul- área da saúde e ao atendimento a grupos gar e partilhar a importância da experiência da Terapia Comunitária (TC) com as famí. de um procedimento terapêutico grupal. capítulo 12 Terapia comunitária: O inédito viável no atendimento a famílias em comunidades Marli Olina de Souza Maria Lucia de Andrade Reis Introdução dificuldade que os estejam incomodando no momento. alguma questão ou indivíduos. Uruguai. famílias e grupos desenvolver . reflexão e in. desenvolvida no âm- tercâmbio de experiências. Constitui­‑se em uma prática de efei- As autoras sentem­‑se honradas em po- to terapêutico. psiquiatra. ainda. em Fortaleza. Para melhor Acrescenta­‑se que a TC promove a constru- esclarecer essa afirmação. com o grupo. Adalberto Barreto. profissionais de todas as áreas e está presen- A terapia comunitária é definida por te em todos os estados brasileiros. em lias do Brasil e de fora do país. os problemas que estão ao alcance da coleti- O processo terapêutico intitulado te. antropólogo e professor da Faculdade de do interesse em sua implantação. como o pelo Dr. ção do adoecimento. apresentados pelos participantes. em 1986. na qual a comunidade busca resolver comunidades. como França. de maneira circular e horizontal. e da América Latina. na comunidade do em alguns países da Europa. descreveremos ção de vínculos solidários. e foi criada Itália. conceituações acima. Além das Barreto (2005) como um espaço de acolhi. heterogêneos. a preven- Constitui um espaço de escuta. ela pode. 12% da população neces- detrimento da essência. eles são influenciados e influenciam a (Guimarães. uso de álcool e drogas. como família e vizinhança. O cotidiano dos bra- vida. Por cotidiano. as ações corriquei- Reforma Psiquiátrica. depres. a 119. o uso de mentais graves e persistentes (Brasil. autonomia e adquirir as bases necessárias as pessoas em busca de espaços na socieda- para o equilíbrio pessoal e social. o desemprego.150 profissionais de abandono. de solidariedade. vado as pessoas a adquirir novos valores. criando res e funcionários dos Postos de Saúde da situações de solidão. bem como perdas. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. munitária. a miséria. está vivenciando constantes trans. de problemas emocionais e sociais que vêm cas de articulação de redes através do SUS modificando os valores e a conduta huma- (Sistema Único de Saúde). reconhecendo­‑se ou papéis sociais. 2005). é marcado por ções entre as pessoas. entre outros temas geradores de sofrimento Já se sabe que a desagregação social e para o indivíduo e a família. a economia. e torna­‑se que interferem no cotidiano e. a perda da identidade cultural repercutem A TC parte da realidade. A humanidade. trações. as rela. desenvolvendo frus- Família (PSFs) em muitos estados brasilei. nos à sua saúde. chegando a se manifes- na atualidade a necessidade de tecnologias tar de modo incontrolável. a qualidade do meio ambiente. em lam que. de. do contex. construídos e o maior interesse por rituais quisa na área da TC. Além disso. o modo de (Nascimento. O Convênio nº. tais e a exclusão de pessoas da sociedade. munidade e. contu- cial na comunidade ainda são insuficientes do. o possuir. Os gestos. 6% apresenta transtornos psiqui- da pelos vínculos que são estabelecidos na átricos graves decorrentes do uso de álcool e sociedade. 1995). a desintegração de valores socialmente Após 20 anos de trabalho. nos indivíduos. ou Estudos na área de saúde mental reve- seja. da vizinhança e da co- lidade. enfraquecendo os vínculos. entende­‑se aquilo que se faz habitualmente. Dr. 2004). a migração. estudo e pes. vê o seu sonho se tornando realidade: levar Esses sinais têm gerado uma sobrecarga a TC à periferia. na atua­ cultura da família. seja ele contínuo perda da identidade cultural que é construí­ ou eventual. possibilitou que a portância de formas tradicionais de comu- formação nesta área chegasse aos servido. estão presentes formações que afetam vários aspectos da nos processos de cura e de adoecimento vida do indivíduo.872 rodas de TC executadas e ma. tendo em vista que ras e a linguagem percebidos como triviais as estratégias de reabilitação e inclusão so. Durante dois anos de convênios tive. na. provocando somatizações to vivenciado pelos indivíduos. de cuidado em saúde mental de base co. de um modo geral. a competição entre Tanto a Organização Mundial da Saúde . podem vir a ser julgados sem valor. drogas lícitas e ilícitas. insegurança e baixa autoesti- dos PSFs. gerando sentimentos ram acesso à formação 2. que atendam aos princípios da todos os dias. Essas transformações têm le. muitas vezes. no Brasil. valoriza­‑se a aparência. espa- ros. em dificultam a realização de pequenas tarefas todas as suas dimensões. participando de ações bási. falta de emprego. favorecendo­‑se a sita de algum atendimento. a privação da saúde e da temas de sofrimentos em rodas (grupos) educação contribuem para a marginalização com temas geradores para reflexão. Os estudos de Konder (2004) e Barreto 2007/ 3363 e 2008/2397.745 brasileiros que já expuseram seus fome. sileiros. relevante por valorizar o ser humano. geralmente. 7. a política problemas e sofrimentos que acarretam da- e a tecnologia. Adalberto Barreto religiosos. lhando agressividade. violência doméstica. como para o enfraquecimento dos vínculos são. Os sinais dessas transformações de outras drogas e 3% sofre com transtornos são o aumento da criminalidade. nidade.136 Luiz Carlos Osorio. como a saúde. praticado entre a (2005) revelam que o espírito competitivo Fundação da Universidade Federal do Ceará estimulado pelo capitalismo diminui a im- e o Ministério da Saúde. está exposta e que provocam sofrimento. especializados. hipertensos. com realização do indivíduo e sua relação com a socieda. na atenção básica. cujo eixo é o coleti. ções e fatores de risco aos quais a população tos. soante com os princípios norteadores do tegra. então. existem serviços de alta e média complexi. o ­adoecimento mental. dos governos. gestantes. Além disso. ou em situação de crises. A pro- co. pois o diabéticos. os hospitais psiquiátricos. crianças. Assim. tendo como foco a pessoa. para que sejam evitados mais Nos serviços de alta e média comple- danos à saúde das pessoas. As pessoas em processo de adoeci- cias. pois não são poucas as situações Gerais (UPHG). 2002). para um modelo mento não são ações estratégicas específicas de base comunitária. de modo satis- dade e de atenção básica. restando. mento. existem. há um processo litação em relação à pessoa em situação de de reversão do modelo de atenção à saúde sofrimento psíquico. pelas urgências e emergên. há uma carência No caso da saúde mental. na rede de serviços de saúde. xidade. nos serviços de atenção básica tem sido pre- bulatórios. aquela que já mental. Manual de terapia familiar – Volume II 137 (OMS) como a Organização Pan­‑Americana onde é visível a fragilidade na atenção à da Saúde (OPS) entendem que a maioria saúde mental. to cotidiano. com poucas estratégias para des­ses transtornos são preveníveis e que de. de exames. identificando situa- gica da complexidade tecnológica e de cus. A lógica que tem prevalecido pitais gerais. A pessoa A Estratégia Saúde da Família caracte­ é estimulada a ser agente da sua própria riza­‑se pelo desenvolvimento de ações con- saúde e da saúde da comunidade que in. Equipes de Saúde da Família (ESF) devem A rede de serviços de saúde mental. às necessidades de saúde dos seus complexidade são formados pelos hospitais usuários. Saúde da Família. enfrentamento do sofrimento emocional e vem ser encarados como prioridade política do adoecimento psíquico. padece de algum transtorno mental. equidade da aten- cada nas décadas de 1980 e 1990. é relevante a pessoas e são desenvolvidos programas para mudança dos modos de tratamento. de enfoque individual. como também responder. com a diferença e a diversidade. pêutica medicamentosa como uma válvula . Contudo. am. dentre de (Cavalheri. competência para lidarem com o sofrimen- serviços de urgência e emergência em hos. prevenir um modo geral. estar preparadas para promover a saúde assim como a rede de serviços de saúde de mental no contexto geral da saúde. Centros de Atenção Psicossocial dominantemente a da distribuição de psico- (CAPS). ou seja. Os de média complexidade são ambu. geral- as Unidades Básicas de Saúde ou Unidades mente à procura de medicamentos para alí- de Saúde da Família (USF). a tolerância e a coexistência prevenção de doenças. priorizam­‑se o tratamento e a reabi- No cenário brasileiro. Essa transição foi fortemente mar. com ção e integralidade das ações. organiza­‑se com base na ló. a família. desses serviços. na de ações estratégicas e de profissionais com alta complexidade. Serviços Residenciais Tera­ que levam as pessoas a buscarem a tera- pêuticos (SRT) e. planejamento familiar. SUS: universalidade. moção da saúde e a prevenção do adoeci- criminador e excludente. busca­ outras atividades de promoção à saúde e ‑se a inclusão. na média complexidade. objeto passa a ser a existência­‑sofrimento portadores de hanseníase. procuram latórios e clínicas e os de atenção básica são cotidianamente os serviços de saúde. dis. a preocu- vo. saindo do modelo hospitalocêntri. são atendidas demandas de cia. curativo. pois as Reforma Psiquiátrica. a promoção da saúde e a prevenção do pação com essa temática pelas Unidades de adoe­cimento. vio de suas dores. Os serviços de alta fatório. tendo um os Movimentos da Reforma Sanitária e da ­importante papel a desempenhar. Unidades Psiquiátricas em Hospitais fármacos. a USF. No modelo comunitário. os grupos sociais e sua existên. Nas USF. diante da velocidade dos do adoecimento psíquico e formadora de acontecimentos do dia a dia. grupos e comunidades. fundamentação. salientam­‑se as re- ciados coletivamente. a violência e o desemprego. enquanto o ter- respostas satisfatórias para o enfrentamen. em todos os estados brasileiros. uma organização informal. servir. Em outras palavras: des de relações. a política de saúde mental eficaz no aten. Desde 2008. procuramos des- gastrites. importante: troca­‑se a medicalização pela para facilitar a visualização dos participan- palavra. de de espaços destinados à escuta. promovendo a reintegração e a tualização. pois consolida e palavra. ou social que as pessoas estão vivencian. base de interesses comuns (Fukui. to teórico­‑científico oferecendo respaldo e são. trarem soluções para os problemas viven. É ini- soas com transtornos mentais de alta preva. de preferência. estresse. social. a comuni. na tentativa de resolverem o seu A TC deve ser considerada uma tec- sofrimento emocional. implementa (Barreto. de sofrimentos vivenciados no cotidia- de recursos para fazer uma escuta sensível. partindo do ditado popular “quando ramenta nascida no nordeste brasileiro.­ de mecanismos e estratégias que busquem ser caloroso. para que todos possam ações de saúde voltadas para grupos de pes. são poucos os profissionais que dispõem vida. encon. as pessoas redes sociais imprescindíveis para o enfren- não dispõem de tempo para falar das suas tamento dos problemas sociais que afetam angústias e medos. de afinidades de maneira circular e ho- Sendo assim. diretamente a saúde mental de pessoas. existindo a necessida. Nessa perspectiva. escolha do tema. atender”. o terapeuta dimento às pessoas que sofrem com a crise acomoda os participantes. de experiências. 2003). nologia de promoção da saúde. no momento em que as pes- a comunidade tem o problema. são sinais que o corpo apresenta crever conceitos e ideias que subsidiarão para demonstrar o sofrimento emocional nossas reflexões. problematização e encerramento inclusão social e da cidadania. são informadas as regras . possui embasamen- les da sociedade moderna. com a predomi- los de solidariedade entre as pessoas com nância de contatos face a face e com uma a finalidade de. Portanto. prevenção Além disso. aplicada através de uma fala o corpo sara”. de escape. o resgate das habilidades e inúmeros profissionais vêm sendo capacita. um conjunto diferenciado de pessoas. A TC é desenvolvida em cinco eta- amplia redes de atenção integral de base co. percebe­‑se que os ma. com bem como para o fortalecimento dos víncu. o Ministério da Saúde adotou rizontal. Nos encontros de TC. como depres. Por isso. comunitariamente. pas: acolhimento. acolhimento para a partilha de sabedoria de sica. comum. Possibilita a criação de uma teia de a TC como política pública e promoveu ações relação social que potencializa o intercâmbio para incorporar a sua prática. é imprescindível a utilização ‑se do grego therapeia.138 Luiz Carlos Osorio. mo “comunidade” pode ser pensado como to do sofrimento. ciada a terapia com o clima de companhei- lência e baixa cobertura assistencial. contex- munitária. rismo. no. A TC é um espaço de gramação de ações de saúde na atenção bá. seja emocional ou social. uma vez famílias. as pessoas sen­ Essa ação possibilitou uma mudança tam­‑se lado a lado. olhar para a pessoa que está falando. suscitando ações transformadoras Na lógica da atual conformação da pro. A TC se encaixou perfeitamente tes entre si e oportunizar a circulação da com os princípios do SUS. fortalece em grande círculo. 2005). Essa fer- que. soas estão unidas em torno de um objetivo dade tem a solução. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. dores de coluna. formando um círculo. Em seguida. neoplasias. metodologia simples. Na fase de acolhimento. da realidade social. de a boca cala o corpo fala e quando a boca fácil assimilação. que significa “acolher. a superação das adversidades com base na dos pelos polos formadores para coordenar formação de recursos socioemocionais e no as rodas de TC dentro das ESF e dos CAPS empoderamento individual e coletivo. O significado do termo terapia origina­ do. isto é. piada. dência essencial de todos os fenômenos­ pergunta­‑chave. p. será apresentado bre- Prosseguindo. dinâmicos de relações múltiplas e cambian- pois “quando o outro fala. para que se possa compreendê­ As bases do que hoje se denomina teo­ ‑lo no seu contexto. assim complexidade dos sintomas como conjuntos como contribui para a reflexão dos demais. teoria da comunicação. elementos. o organismo vivo como um sistema integra- ge as estratégias mais adequadas a serem do. nas situações­‑problema viven- relato. antropo- mas apresentados. Nesse momento. O término da sessão é o co- experiência. orações. É a partir desse mo. resiliência. não dar conselhos e nem julgar. cada indivíduo da naquele encontro. mos falando. É o gem sistêmica valoriza as relações entre os que chamamos de escuta ativa. ‑se que a concepção sistêmica se constitui de evidenciando­‑se o processo resiliente e a um novo paradigma conceitual que percebe pessoa que teve seu problema escolhido ele. apreendendo a a refletir sobre sua situação vivida. Essa visão transcende as atu- problema fica em silêncio. Para facilitar a compreensão. Os problemas redes sociais. sociais e do grupo. para maior esclarecimento do problema. Nessa ligiosos ou populares. enquanto a pessoa que expôs o culturais. sistêmico. da experiência adquiri. com rituais próprios como cantos re. do estado de inter­‑relação e interdepen- rapeuta comunitário apresenta o mote. instituições. poesia. conforme Barreto (2005). corada em cinco pilares teóricos: pensamento Logo após. Essas perguntas ajudam ria dos sistemas foram lançadas em 1933. ção. de cada um. para que o grupo escolha logia cultural. a TC está an- lar sobre aquilo que os está fazendo sofrer. que vai permitir a reflexão físicos. Nessa etapa. As pessoas que ais fronteiras disciplinares e conceituais vivenciaram situações que têm a ver com o e será explorada no âmbito de novas tema apresentado no mote passam a refle. pas. A aborda- e quando eu falo o outro escuta de si”. escolha do tema. Barreto (2005) define o sistema como são/encerramento. é feita uma síntese dos proble. o te. vemente cada referencial teórico. como define Capra (2001. o Para o desenvolvimento das cinco eta- terapeuta estimula os participantes a fa. abraços e o ­perspectiva. a teia que une cada indivíduo são sistêmicos. ocorre a contextualiza. como utilizadas na resolução de seu problema. tir a experiência vivida e como superaram tal situação. e que tem funcionamento próprio. é permitido lançar Pensamento sistêmico perguntas. 259): ‑chave. Na fase seguinte. como também cons- mento que se constroem e se solidificam as titui parte da sua solução. defendido pela visão cartesiana. emergindo daí as estratégias Com base nesse pensamento. ciadas pela comunidade. A seguir. a pessoa que está falando do seu problema por Ludwig Von Bertalanfly. que se dá com todos um complexo de elementos em interações dando­‑se as mãos. falar da própria da comunidade. conto que comunidade dispõe para a solução dos seus tenha alguma ligação com o tema. problemas. meço para a utilização dos recursos de que a apresentar música. e não de maneira fragmentada. a interdependência dos fenôme- o terapeuta comunitário anota as palavras­ nos. baseia­‑se na consciência Na etapa da problematização. estão interligados . observa­ de enfrentamento usadas pelas pessoas. Manual de terapia familiar – Volume II 139 da terapia: fazer silêncio. psicológicos. 1999). eu escuto de mim tes (Mattelart e Mattelart. A TC finaliza com a etapa da conclu. interdependentes que organizam um todo em pé. de que vi- que irá construir o mote. É a partir dessas palavras­‑chave A nova visão da realidade. pedagogia de Paulo Freire e o tema a ser aprofundado. são obtidas mais in- formações sobre o assunto escolhido. extraídas das falas sobre o problema escolhido. em um grande círculo. faz parte do problema. biológicos. uma vez tenção. o sis- ser humano é uma totalidade biopsicoso. Na visão sistêmica. a formação dos vínculos. apesar de os xa relatada durante o encontro. esquecendo­‑se das relações com a submetido às forças da homogeneidade. o meio ambiente muda de forma conside. ligando­‑as a sintomas. pois o existe grande flexibilidade”. que não questiona. mas as interações estabelecidas com na compreensão das situações­‑problema seu meio são imprescindíveis à sua manu- apresentadas nos encontros de TC. concebe a causalidade como um de comportamento: fala. seria o auxiliarem em seu desenvolvimento. A visão sistêmica auxilia mento. mesmo quando contatos entre as pessoas e. transacional. a comunicação é uma dade circular ou circularidade. estabelecem uma re- lação de unicausalidade entre os sintomas Teoria da comunicação e o fator etiológico.140 Luiz Carlos Osorio. tema determina e organiza seu funciona- cial e espiritual. as inter­‑relações. os profissionais de saúde. existe comunicação é em virtude das diver- mento linear. espa- processo circular que tem mão dupla. Os primei. pelo menos. é necessário que estado de equilíbrio. Barreto (2005) chama aten- ganismo tenta manter­‑se em seu estado de ção para o fato de que a comunicação entre equilíbrio. vivem. os recobre uma multiplicidade de sentidos. a pressão sanguínea que se mantêm meio da comunicação que se estabelecem os relativamente constantes. por meio de mecanismos de rea­ as pessoas é o elemento que une os indiví- limentação negativa ou positiva. geralmente. 266) como “estado de existe nenhuma muralha que separe sua equilíbrio dinâmico. enquanto os segundos consistem em de se desenvolver uma comunicação em um ampliar certos desvios em vez de os amorte. não se restringindo a um pensa. condição sine qua non da vida humana e da Quando há uma perturbação. Fazendo apenas a leitura das quei. não são independentes o atentando para suas relações com os demais suficiente para se desenvolverem de manei- elementos desse sistema. E. olhar. cer. xas. Segundo Watzlawick e co- ção do pensamento unicausal pela causali. a crise. as queixas e as disfunções ao contrário. ou seja. duos. Não podemos Dessa forma. a comunicação . Mattelart. os sistemas têm várias compreendê­‑los no âmbito de uma metodo. 1999). explica Barreto permanente que integra múltiplos modos (2005). com a comunidade e a sociedade ele é capaz de se subtrair dela (Mattelart e em geral. geralmente externo ao indivíduo. Entretanto. são totalmente dependentes do meio onde inserido em um sistema social e familiar. a quei. Esses mecanismos de regulação Na perspectiva da TC. Daí a necessidade rável. em busca da homeostase definida O homem não é uma dualidade. da por nossas comunicações com os outros. Para que pos- ros tendem a reduzir qualquer desvio do sa ocorrer a comunicação. desenvolvidos pelos sistemas. e são interdependentes. a família e a sociedade. biente. tabeleçam relações com outros sistemas. aprendizagem e evolução (Capra. ço interindividual. A realimentação positiva tem um papel A vida cotidiana é fortemente afeta- crucial nos processos de desenvolvimento. gesto. família. Não por Capra (2001. mas. ra isolada. o or. em que parte humana de sua parte animal. ao fisiológicas são a ponta do iceberg do sofrer mesmo tempo em que permitem que se es- humano. 2005). ordem social. A noção de comunicação Considera o contexto. contato face a face e sem duplo sentido. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. maneiras de interagir com seu meio am- logia fragmentada. ou seja. há a substitui. É por corpo. uma outra pessoa. Segundo Littlejohn (1988). laboradores (1967). Isso não quer dizer que os sistemas que percebem o indivíduo como um todo. 2001). por conseguinte. se o individuo está funda. Se processos. permitem sua manutenção. A comunicação é um processo social O modelo circular. tornam autônomos e independentes. p. não apro. como a temperatura do haja. sidades individuais. não os “dedo que aponta para a estrela” (Barreto. É nesse momento que se inicia a Pedagogia de Paulo Freire construção de um certo número de concei- tos. não sendo apenas uma transmissão de sa- tropologia cultural. descobriram. a se tornar­ sujeito de sua própria história em todas as suas dimensões (biológica. (Freire. A an. estudo do homem e de seus trabalhos. na qual estão assun. ativamente. como a organização social da tica de vida dos educandos. as influências ‑se concretamente a realidade das relações políticas e econômicas. existentes entre os homens e deles com seu lores. definida como pedagogia libertado- autor. ava. em antropologia é hoje compreendida como o que os conhecimentos são compartilhados. continua o Freire. Entretanto. nota­‑se relevância em se tentar com. Portanto. Os conteúdos são extraídos da prá- o cotidiano. crença. a teoria apresen- complexo que inclui conhecimento. práticas e ‑educando e educando­‑educador” (Libâneo. começando pelo conceito de homem A pedagogia idealizada por Paulo (Laplatine. 2003. compreendi. possui um significado social. em que a palavra ajuda o homem da como a ciência das sociedades primitivas. segundo Mello (1991). sequência de sons que têm significado para aquele que o utilizam. para sobreviver dos. tendo. 40). meio de símbolos e sinais. crença e razão. artefato ou uma valor de comunicação. religião. um que podem ser um objeto. ser entendido como um significado cocons. dentro de um contexto. Por meio dela. moral. ambos tos relacionados com política. etc). pode­‑se entender como membro de uma sociedade” (Mello. Pode­‑se dizer que a cultura é simbóli- truído pelos envolvidos em uma relação e ca. as crenças e os va. chama a atenção para a análise crítica da constitui disciplina autônoma. teorias. Sendo o comportamento do tos. o sintoma pode 1987. p. retira sua habilidade para pensar. tém. na resposta do corpo e satisfazer as suas necessidades” (Demo. ao estresse. da troca. Manual de terapia familiar – Volume II 141 é um dos mais complexos e importantes arte. Barreto (2005) chama a atenção para Na pedagogia de Paulo Freire. 34). ocor- a importância da cultura como referencial re a associação entre teoria e realidade. aptidões e hábitos adquiridos pelo homem tamento. téc. trans- Partindo dos pensamentos apresenta. percebe­‑se que. instrumento para que o homem se torne preender alguns aspectos relacionados com homem. 61). o mundo. O ato de ensinar consiste nica. portanto. 1995). questionando­ comunidade em que se vive. pois existe a comu- Antropologia cultural nicação de significados. revelando que é preciso haver um espaço seia. de expressão dos problemas vivenciados liar e discernir valores e fazer suas opções pelo educando. A em um exercício do diálogo. econômica. uma vez que é permeada por símbolos. Freire (2005) afirma que a linguagem indivíduo fortemente influenciado pela cul. na qual cada membro de um grupo se ba. religiosa. meça a esboçar aquilo que será posterior- mente denominado de antropologia cultural e social. relacionar­‑se com os outros e 1991. os su­jeitos do ato de conhecer: educador­ artesanato. política. “O diálogo engaja. ao sofrimento. por É a partir do século XVIII que se co. sendo a palavra um tura. Nesse sentido. a cultura envolve um conjunto de significados. realidade. construíram. p. beres acumulados por alguém que os de- estuda a obra humana. costumes e várias outras aglomerados presentes em nosso compor. então. passa a ser a cultura. é no século XIX que a antropologia ra. 2005). arte. Além disso. economia. ta um caráter essencialmente político. “um conjunto ambiente. nos seus diversos contex- no cotidiano. uma . criaram. mas também pode ser entendi- transformar a si mesmo e a realidade que da como “tudo aquilo que os seres humanos o envolve. formaram e desenvolveram. lei. A cultura seria. linguagem. p. primeira- ensino­‑aprendizagem. pam desse processo. zelo e identificação. Elimina­‑se toda relação de autoridade. por meio do intercâmbio de expe­ em um trabalho de criação gradual de cons- riências. adversidades. graças ao seu esforço resiliente. das estratégias de enfrentamento. uma vez que as crises. das famílias procurando. TC são construídos por todos os que partici- sivamente. “na refle. expostas no de seus recursos. própria história pessoal e familiar de cada bros de uma família ou de uma comunida. 44). experiências vivenciadas pelos participan- A competência de cada pessoa está tes do grupo de TC. so- sofrimentos. por e se construir­. dor. p. dade. em uma troca entre educador e educando. bem como re. ou melhor. Entretanto. Dessa for. o conhecimento e as estra­tégias de enfren- dagogia parte da situação concreta em que tamento desenvolvidas em cada encontro de vive o sujeito. p. tado normal depois de ter sofrido uma pres- xão e na ação comum. ticamente. ou ensino­‑aprendizagem.142 Luiz Carlos Osorio. utilizado pela física. grupo. e tanto o educador mente. Um dos objetivos da TC é suscitar as p. destaca­‑se o relevante papel do educador. seja. apresentado por Barreto (2005). são (Durán Gonzáles e Almeida. não é o detentor do saber. ‘garimpar’ o ressaltar suas habilidades de enfrentamen- saber produzido pela experiência. O terapeuta co. a capacidade do indivíduo de se sobre- do têm como tarefa desvelar a realidade. em um ambiente insano. (Barreto. Essa pe. 2010). para fazê­‑la emergir. uma vez dades que utiliza no seu dia a dia. 25). como fonte de conhecimentos. Como ocorre na pedagogia de Paulo Freire. as manei- realidade e a partir de suas competências. Ao alcançarem. possibilitando­‑lhes a partilha frimentos e vitórias de cada um. “é a capacidade de vencer apesar ‑se ao papel do educador apresentado na das dificuldades e circunstâncias difíceis” pedagogia de Paulo Freire. A partir das vência de cada um”. suas angústias e do conhecimento. forças e as capacidades dos indivíduos. mas um facilita. 160). sem realçar suas carências. to. 64). o educador miséria e do sofrimento humano (Barreto. bram as implicações sociais da gênese da como diz Paulo Freire (2005). munitário. na A resiliência é um dos pilares fun- qual o diálogo é o mediador do processo damentais da TC e é um termo. que significa a como o educando são protagonistas no ato capacidade de um material voltar ao seu es- do conhecimento. cri. Educador e educan. É definida como um processo criar esse conhecimento. progres. são utilizados como matéria­‑prima tamento. podem ser seleciona- relacionada com suas habilidades e capaci. vez que o educando é levado a analisar. em que o indivíduo pode vencer os obstácu- O perfil do terapeuta comunitário. Assim. afirma Barreto (2005). é uma O autor aponta a resiliência como a pessoa que pode proporcionar aos mem. o participante da TC é valorizado na sua no são semelhantes. como afirma Barreto (2005. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. p. Resiliência vidade com carinho. que deve desenvolver sua ati. procurando sempre. pela vi. assemelha­ ou seja. de seus modos de enfren. nas utilizam esse termo para qualificar a ca- O autor chama atenção para a atua­ pacidade de um indivíduo em possuir uma ção dos atores envolvidos no processo conduta sã. los da vida. participante. 2005. a realidade em que vive. ras de enfrentamento de cada participante . das tência das pessoas. positivamente. frente às conhecendo­‑a criticamente. “o terapeuta deve trabalhar a compe. Sua atuação deve estar voltada ciência social para que os indivíduos descu- para o crescimento humano e coletivo e. 2005. que os problemas enfrentados no cotidia- ma. sendo uma fonte importante de alívio à sua ansiedade. 2005. famílias e das comunidades. descobrem­‑se como seus refazedores O autor expõe que as ciências huma- permanentes” (Freire. esse saber da reali. através de perguntas. temos utili- gias são insuficientes na resolução desses zado o termo empoderamento. a socializa. e o sofrimento passa a ser tas e efetivas no desenvolvimento das prio- enfrentado de uma melhor maneira. Tal prática funciona como Os cuidados primários são definidos um espaço em que o conhecimento cientí. na tomada de decisão. der das comunidades. Neste capítulo. apresentado por Vasconcelos (2003). de transformar dor em competência”. na etapa do controle dos seus próprios esforços e do da problematização. como A resiliência implica uma abordagem o aumento do poder e autonomia pessoal universal da saúde. da autonomia. 2002). a escuta. universal de indivíduos. transformando­‑se em um ambiente em que cientificamente bem fundamentados e so- se produz um conhecimento advindo da ex. na definição pode­‑se considerar que é a carência que de estratégias e na sua implementação. compreende a ên- técnico (capacitação) e político tanto pelos fase de dois aspectos: indivíduos como pela comunidade. 2000). sendo um recurso a ser e coletiva de indivíduos. O ter- mo empowerment constitui um conceito de n identificação dos eventos estressantes que difícil tradução. contexto da saúde mental constitui­‑se. para melhorar sua qua- dem desenvolver problemas. tais estraté. a resiliência dominação social. algumas estratégias destino. Towsend que a comunidade vivencie o processo de (2002) afirma que a prevenção primária. citado dos a relações de opressão. muitas vezes. com gera competência. cen- tos e crianças a fatores de risco: alguns po. ou seja. Alguns o traduzem como precipitam as crises e atingem populações empoderamento. verbas para os estados desenvolverem pro- biliza os recursos socioculturais na resolu. gramas externos de saúde mental aos hospi- ção dos problemas e na construção solidária tais estaduais (Towsend. o sofrimento que gera ca. fortalecimento. O movimento de saúde mental comu- A TC fortalece também os vínculos nitária teve seu início na década de 1940 nos entre as pessoas e reforça sua autoestima. de maneira positiva. quando o governo garantiu pois. trado no indivíduo. ela mo. Sendo a TC um espa- ço que favorece a fala. seados em métodos e tecnologias práticas. outros podem lidade de vida. Estados Unidos. então. colocados ao alcance periência pessoal. Manual de terapia familiar – Volume II 143 são diferentes e. principalmente daqueles submeti- ao seu contexto. que o pode ser definida a partir da compreensão conceito de empowerment evoca a ideia de das consequências da exposição de adul. 2002). Percebe­‑se. como afirma Barreto (2005). Assim. poder e controle. Está sociais nas relações interpessoais e institu- relacionada com a adaptação do indivíduo cionais. a aquisição de poder dentro das comunidades. cialmente aceitáveis. Prosseguindo. também. adaptando­‑se ao Conclui­‑se que o incremento do po- contexto. produz ações comunitárias concre- são formuladas. outros como aumento de alto risco. por meio da posse e Durante o encontro de TC. vistas à melhoria das condições de vida e de pacitação. empowerment. Para Garmezy (1996. em um poderoso ins- das famílias na comunidade trumento que estimula o desenvolvimento do processo resiliente das pessoas que parti- cipam de seus grupos. . como os cuidados essenciais de saúde ba- fico e o saber popular se complementam. da cidadania. superar as adversidades. no sentido problemas. como diz Barreto (2005). A terapia comunitária no ção e o compartilhamento dos sofrimentos. “A TC é o espaço saúde dos indivíduos. discriminação e por Cecconello e Koller. famílias e comuni- A construção desse novo saber faz com dade (Brasil. ridades. famílias e grupos cultivado e obtido por todas as pessoas. As redes formais ou informais estão foco encontra­‑se na elaboração de meios presentes na vida cotidiana. gesto. percebe­‑se uma fora assinalada por Maffesoli (1998) para dificuldade na formação de vínculos soli. valorizado e amado. morte de um membro da família. os quais se esgotam nos perda da casa por incêndio. os indivíduos percebem a si mesmos. risco. de de identificação. concluir o face com um grupo por meio da necessida- tema. a) manifestação por atos efêmeros. devido às especificidades dos estudos.144 Luiz Carlos Osorio. cada vez mais presente nos modelos das fa- quências nocivas. além de permitir visualizar pequenos precoce dos problemas e o início imediato gestos e acontecimentos como relevantes na de um tratamento eficaz. Assim. para prevenir ou minimizar conse. do individualismo para um contato face a to do cotidiano. as relações humanas no sentido de se sair Muitos autores têm discutido a respei. de interações e comunicações interpessoais veis. n a intervenção nessas populações de alto Machado (2001). como: de as crises situacionais como aquelas em que os eventos são inesperados. toda e qualquer estrutura de meado pelo individualismo. congrega- dários. O cotidiano possui algumas caracterís- pos de crises: crises situacionais e crises de ticas. o foco centra­‑se na identificação de estratégias de enfrenta- mento dos eventos estressantes. pessoas vivenciam em sua vida. favorecendo para lidar com o sofrimento emocional. O foco na Tais características refletem o modo de prevenção secundária é direcionado. Segundo Maffesoli (1998). Por meio da pre. apresentadas por Nascimento (1995) desenvolvimento. então. No momento articulação que propicie o estabelecimento em que as comunicações estão mais acessí. tendo em vista que seu lações. ça. xões. sem. são. claras e solidárias o suficiente para “eu” e esse fator é levado para as famílias que o indivíduo possa sentir­‑se amparado. seu semelhante. se for dado partindo do exposto. con. a paternidade/ c) valorização dos pequenos acontecimen- maternidade. Na atenção primária. ser das pessoas no lidar diário. concreto e plural. riso. é. nas fantasias. metá- de diálogo entre as pessoas. compreensão da cultura de um povo. risco podem ser desenvolvidas em nível de d) manifestação nos sentimentos. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. fala. permite­‑se a existência das redes de re- venção primária. apesar de o acesso O sentimento de pertença favorece a às comunicações permitir uma maior rede formação e a manutenção das tribos. enquanto as cri. família. como dentes. através da comunicação. mílias da modernidade. Costa (1992) compreen. ria. contudo. como aci. ses de desenvolvimento estão relacionadas b) busca da compreensão de um sujeito com as situações que ocorrem naturalmen. que geram indivíduos despreocupados com protegido. enfocam­‑se os tipos de crises que as semelhante. nas pai- prevenção primária. vel de funcionamento da pessoa. Há dois ti. Redes de suporte social O cotidiano da sociedade moderna está per. do venção terciária. cuidado. secundária ou terciá. inserido em um espaço te durante a vida de um indivíduo e de sua e em um tempo. o “código individualista”. nas suas re- forme Towsend (2002). em grande parte. responsável pela autonomização dos indiví- Na visualização das populações em duos e dessensibilização em relação ao seu risco. identificar os pequenos grupos. pode­‑se inferir que a sentido ao bairro e às práticas de vizinhan- estratégia da TC encontra­‑se situada na pre. como o casamento. tos. Portanto. promove­‑se a reabilitação modo como enfrenta as dificuldades e como direcionada para a obtenção do melhor ní. próprios atos. Segundo ções ou conjuntos efêmeros e efervescentes . para a identificação lações. por meio dos quais a vitalidade do As intervenções nessas populações de grupo se mantém. as pessoas tendem a se concentrar­ no francas. conferindo­ atentar para o tipo de vínculo que está es- ‑lhes identidade e sentimento de pertença tabelecendo. duo a sua família. são os vínculos que nos separam por meio de comportamentos e sentimentos uns dos outros. vínculos frágeis e vínculos sua convivência familiar ou comunitária. esportivos. como as intrigas e a ausên. cultu- vínculo obsessivo e vínculo histérico. Portanto. Os vínculos saudáveis são os que A TC favorece a agregação do indiví- nos ligam aos outros. pertencer a um grupo ou claramente. O hipocondríaco assistenciais na área da saúde mental e da é aquele vínculo que o indivíduo estabelece psiquiatria. o vínculo histérico consiste em um delos de atenção. O vín. quan- cia das tribos pode ser efêmera ou não. Os vínculos são saudá. e nem por isso perde sua identidade. social. Em um momento de transição . O inédito viável Pichon­‑Rivière (2000) identificou al- guns vínculos. va. Essas forças podem funcionar. Os vínculos frágeis são aque. 2005). com a ter- homens à terra. A existên. ter um trabalho. em geral. influência em nossa formação como pes- les em que a confiança no relacionamento soa social e que essas forças são. citado por Nieman. insegurança. caracteriza­‑se por estar permanente. de uma boa diferenciação entre ambos. como quando trabalhamos sem bem a um homem e a uma mulher. se- aquilo que liga os homens entre si e os jam eles com outros indivíduos. com crenças ou valores. vez. efeito do crescimento culo paranoico se caracteriza pela descon. São eles: vínculo paranoico. 1997). O vínculo vai ficando fraco e exemplo. por sua creta. estabelece entre o sujeito e um objeto. às suas crenças. de maneira con- aos outros. enquanto o vínculo obsessivo desenvolver um trabalho de caráter científi- se relaciona com o controle e a ordem. Por co que procurasse investigar práticas e mo- último. em todo o mun- fiança que o sujeito experimenta em relação do. vínculo hipocondríaco. nidade. a saúde emocional dos indivíduos. da saúde­ de da família. como resultado as pessoas que a constituem. aos seus ra. determinando os papéis que ca- superficial. Berger (1999. sentes em sua vida. tuações de natureza socioeconômica. cia de diálogo. à sua cultura. por cada indivíduo desenvolve seu papel social sua vez. Manual de terapia familiar – Volume II 145 (musicais. de maneira positiva. por e inseguros. veis quando consolidam e promovem a vida 2002) que afirma que estar inserido em de- em sociedade. ral e epidemiológica. das desigualdades sociais. Segundo o referido autor. São exemplos desse tipo de terminado grupo é estar em um ponto em vínculo. possuir documen. relações de medo. Os vínculos de risco. mas que exercem importante associação. turísticos). na saú- com os outros através de seu corpo. na saúde dos cidadãos (Luz. enfim. fica abalada. estejam pre- são identificados três tipos de vínculos: vín. com a finalidade de evitar que (Barreto. do ambos têm a possibilidade de fazer uma riando de acordo com seus objetivos e com escolha livre de um objeto. socialmente aceitos. mais especificamente. ao estabelecer vínculos. que tem repercutido. emergiu a necessidade de se e da queixa. Esses vínculos são os mais conhecidos dos terapeutas comunitários e principalmente os terapeutas de famílias. que existem forças que não enxergamos tos de identidade. uma vez que reforçam nossa identidade mas desenvolve sua autonomia e seu papel pessoal e cultural. desfavorecendo­‑o em culos saudáveis. por con- cipal característica a dramaticidade. com enfoque voltado para vínculo de representação. Na busca por novos paradigmas e modelos mente carregado de culpa. carteira assinada. O autor seguinte das famílias para uma abordagem considera vínculo “normal” aquele que se comunitária. está ligado a diversos acontecimentos e si- vínculo depressivo. que denominou de vínculos O surgimento de novos paradigmas patológicos. a uma comu- estabelecendo uma relação de confiança. Compreende­‑se vínculo como tudo Portanto. tendo como prin. a um grupo. o indivíduo deve valores. deixando­‑nos desconfortáveis aceitas. de risco. O vínculo depressivo. e. ou simplesmente rio da Saúde. Cremos. passo. sentimos­ desafiados e queremos agir. A essência dos vínculos. 2001. denominadas por Freire de Vozes. S. Políticas de saúde mental. A. ideia de nossos condicionamentos BARRETO. Uma das categorias importantes de Paulo Freire é o inédito­ viável. A afetividade no grupo terapêutico. P. DF: Ministério da Saúde. 2005. ou ainda não sabe. como parte problematizadora conhecendo as competências de cada ator exatamente do caráter histórico e da histo- social para contribuir na superação das difi. ‑se convivência. Essa cate- goria traz a ideia da utopia. sonho possível. “bancárias”. 2002. aprendente. É o saber da História como possibilida- também. gov. 1973. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. temos. “situações­‑limite”. de Janeiro: Altos da Glória. que seu estar no contexto vá senvolvendo ações de promoção da saúde virando estar como ele. termina- ensinando­‑nos a construir redes de apoio ram por desconhecer os homens como se- social. Diante dessas situações.146 Luiz Carlos Osorio. BRITO. marcadas pela traição a nosso direito de A TC vem consolidando­‑se como uma ser. BRASIL. Um dos saberes primeiros. indis- atenção comunitária em forma de redes pensáveis a quem. A construção social da realidade: com obstáculos. de P. Em determinados mo. O mundo está sendo. Ministério da Saúde. rom. Fortaleza: LCR. pois sabemos que existe. ‑limite foi entendida criticamente. sendo rapêutico. não queremos transpor. saude. clusos. dos em uma filosofia do trabalho transdis. mentos de nossas vidas. transformadora da realidade e histórica também. ricidade dos homens. Por isto mesmo é que culdades. chegando a realidades sociais. Terapia comunitária passo a e nossa liberdade. Secretaria de Polí- para superar. Petrópolis: ser vencidas. de modelos assistenciais e com a expansão a utopia­ possível. a situação­ ticas de Saúde. mos como transpor e vamos nos empenhar BRASIL. pretende que sua presença vá tornando­ tecnologia de cuidado. na humanização das relações. cossocial que pode ajudar a construir. em e com uma realidade. podendo ser considerada. o sujeito sai instrumento de cuidado. a TC demonstrou da invisibilidade que a concepção e a prática atender aos princípios norteadores do SUS. mal ou bem. a abordagem os reconhece como seres que de às metas a que se propõe e que deve ser estão sendo. é. em uma é possível. Brasília: Ministé- obstáculo intransponível. da Reforma Psiquiátrica. como seres inacabados. que. Ministério da Saúde. Qualquer ação terapêutica exige do ciplinar. Rio idealizada­por Freire. res históricos. basea­ nhava Freire. que a TC aten. L. seres humanos. ao contrário é respeitado enquanto ser básica. As cartas de promoção da saúde. nos deparamos BERGER. é igualmente inacabada. “fixistas”. B. Disponível em: <http://www. de. libertadora. possibilitando mudanças sociais e re. . [2010]. especialmente na atenção de. como so- paradigmas ou modelos assistenciais. 2005. R. e não como determinação. pois nos Brasília. nós. uma estratégia de reabilitação e de.br>. O mundo não de inclusão social pela rede de apoio psi. Nessa hipótese. ainda são pontuais mas só será conseguido através de uma prá- as experiências que incorporam os novos tica transformadora. In: THIERS. portanto. (Org. Referências Para Freire. barreiras que precisam tratado de sociologia do conhecimento. pendo a fronteira entre o ser e o ser mais. que pode ser utilizada nos diversos níveis de O sujeito não é julgado pela sua historicida- atenção à saúde. e não como inexorabilida- comunidades.). na profissional a convicção de que a mudança desospitalização do atendimento. Acesso em: 10 out. Como Na abordagem proposta. é o saber do futuro e prevenção do sofrimento emocional nas como problema. de. incon- divulgada como uma prática de caráter te. imobilistas. Esse é o inédito­viável. Secretaria de Atenção temos várias atitudes: ou percebemos como à Saúde. de baixo custo. C. TOWSEND. Sociologia: uma introdução crítica. Z. 2003. C. Retrato desnatural. F. 5. 2000. WATZLAWICK. MATTELART. E. São CHAUÍ. Integrali. 11. 2010. M. E. São Paulo: Paulo. 41. ALMEIDA. São Paulo: Loyola. 2003. O homem: uma introdução à antropolo- NITÁRIA. M. Manual de terapia familiar – Volume II 147 CAPRA. Famílias e individualismo: ten- dências contemporâneas no Brasil. São Paulo: Atlas. E. 1. W. Trabalho de conclusão de curso – Universidade Federal de Minas Gerais. Nas profunde. 2004. São Paulo: Schwarcz. M. MACHADO. ter ou de hereditariedade? In: CONGRESSO DE TERAPIA COMUNITÁRIA. S. Qualitymark. Pedagogia do oprimido. KOLLER.. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE TERAPIA COMU. 5. 11-26. M. A. F. 1991. 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Pensamos. que as teorias rios papéis que pode assumir o psiquiatra da de terapia são por sua própria natureza infância e da adolescência nas instituições uma visão parcial da realidade... ao longo dos anos. capítulo 13 A família como a porta de entrada para a abordagem integral da criança e do adolescente José Ovidio Copstein Waldemar Olga Garcia Falceto* Introdução Unidos quando o movimento de terapia familiar estava desabrochando. bolsista de iniciação científica. 1986) Desenvolvimento do campo Hoje. Daniel Henrique Fior. o ecletismo sistemático. (Waldemar e Falceto. ajudaram a construir nossa visão e forma de trabalho. não é algo simples. isto é. Como psi- Este capítulo menciona a trajetória quiatras da infância e da adolescência. E ao estudante de Medicina. que auxiliou na revisão bibliográfica. escrevíamos: as dificuldades encontradas. Comenta os avanços no início da década de 1980 a inserção mais campo da integração das psicoterapias e na harmoniosa da terapia familiar no contex- compreensão da complexa interação entre to universitário e no ensino privado. co- profissional dos autores e chama a atenção meçamos a ensinar a visão sistêmica – como para o destaque que na literatura recente o foi originalmente chamada –. Expõe tando as polarizações que aconteceram em casos que representam situações clínicas co. a contribuição biológica e psicodinâmica. muitos centros formadores. assinalando a importância da equipe técnicas de escolas diferentes. 25 anos depois. ao contrá- para lidar com os casos mais difíceis. é uma tarefa árdua e complexa que só recentemente começou. por ou- e finaliza com uma revisão sobre a eficácia tro lado. . da terapia familiar com crianças e adoles. Já em trabalho muns. mas com- multidisciplinar e dos recursos comunitários patíveis. os centros de Completamos nossa formação profis­ formação de terapeutas comumente en- sional na década de 1970 nos Estados sinam múltiplas abordagens e já estamos *Agradecemos às equipes do Instituto da Família e do Serviço de Psiquiatria da Infância e Adoles- cência do Hospital de Clínicas de Porto Alegre que. rio. o que possibilitou no retorno ao Brasil no bios psiquiátricos. descrevendo seu manejo habitual e publica­do anteriormente. venção quanto no tratamento dos distúr. já integrando grupo familiar tem recebido tanto na pre. como Liddle. Rutter (Sholevar. não pode compare‑ criança. e da instituição. pois outros fato- res ­podem estar envolvidos. 2006). vem à primeira con‑ sulta acompanhado da mãe. de 35 anos. influência dos fatores biológicos.152 Luiz Carlos Osorio. Cognitivo­‑comportamental (TCC)”. culturais e sociais. dequado dos pais e sintomas em crianças e No segundo caso. uma intervenção terapêutica. havia efeitos colaterais. do profissional. 2009). O problema começou há 4 meses. elaborando em cada “o risco gené­tico e o ambiente familiar tem caso que se apresenta um plano de atendi- um efeito interativo em promover o apare.] incluindo quiatra da infância e adolescência. 2001. No terceiro postos a desenvolver sintomas psiquiátricos. Por isso. bem mais avançados na integração das psi. É importante ter em mente também que os filhos reagem de formas diferentes Primeiro caso na vigência de psicopatologia parental e/ ou interações adversas. 2008). ções parciais para introduzir o uso de medi- tamente no conflito conjugal – os chamamos camentos. pode encontrar na estudo clássico finlandês com crianças ado. Os filhos envolvidos mais dire. visão sistêmica um valioso instrumento teó- tadas filhas de pais esquizofrênicos. encaminha‑ terações disfuncionais na família. genéticos gica está bem estabelecido. ordem de nascimento e momento do ciclo Mário. O pai. em que JOCW foi consultor e supervisor. mesmo com indica- adolescentes. Estudos posteriores confir. mas. como mostra o e do desenvolvimento. mostrou­‑se o mais adequado. o que traz um imediato alívio para cer. Falceto e Waldemar. O primei- assinalava que o número de crianças e ado. o manejo do caso sem fármacos de “triangulados” – são aqueles mais predis. conflito e tensão. é possível após a melhora sintomática da Antenor. caso. tos dos pais foram descritos como que fican. tes. e a família.. intrapsíquicos. Já os irmãos que não se envolvem nos confli. a criança apresenta um quadro grave. Casos clínicos dos pelo National Institute of Health (ór- gão principal que financia a pesquisa em Os casos narrados a seguir mostram saúde mental nos Estados Unidos) contém diferentes aspectos da contribuição do psi- um componente familiar [. Adela. interacionais. trabalhar as in- anos. como des­ vam distúrbio psiquiátrico e um alto grau de crito em publicações anteriores (Waldemar. como é frequente. especialmente treinado para avaliar a O conceito de vulnerabilidade bioló. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. 2006). nem a disfuncionalidade do ambiente fa. O psiquiatra de crianças e adolescen- coterapias (Waldemar. Muitas vezes. o uso dos medicamentos foi essencial. por exemplo.. e da tia materna. Edilsa. as necessidades e possibili- contra o aparecimento do distúrbio psiqui. do “protegidos” dos sintomas (Heru. 2007). transgeracio- miliar que por si só causam doença mental: nais. Falceto. só irritado e vem tirando notas baixas. mento específico conforme o diagnóstico cimento da doença ou então em proteger (Falceto. 1997). . mam a associação entre comportamento ina. de 34 vital dos pais. 2001) 1997 (Falceto e Waldemar. 1982. orgânicos. que rico e técnico para compreender a complexa concluiu que não é o alto risco genético interação dos fatores genéticos. Os dois aqui o enfoque familiar dentro da Terapia primeiros casos foram atendidos por JOCW. Falceto e Waldemar. e o segundo foi publicado inicialmente em Já em 1983. da família átrico” (Heru. de 10 anos. faz sentido o relato de Sholevar (2007) que afirma que “mais da metade dos projetos de pesquisa financia. 2006. dades do cliente. ro ressalta a importância da compreensão lescentes com problemas de conduta era dos fatores desencadeantes para preparar muito maior no grupo de pais que apresenta. quando do pela escola porque tem sido desatento. tomático de Mário mostrou um menino que procurei esclarecer na sessão que não foram precisava ouvir palavras tranquilizadoras a as palavras do pai “que mataram o nenê”. o pai de suas brigas. o que. Tanto o menino quan‑ a mãe: “Puxa mãe. Como se comprometeram no futuro a protegê­‑lo a mãe vinha passando mal na gravidez. muns abortamentos em mulheres grávidas. que refere que ela própria não está palavras do pai o que havia acontecido. O rápido alívio sin- tia. tendo na hora falado para diretamente culpado. com a ajuda da de pensamento mágico. Uma psicólo‑ ga consultada recomendou que o pai tinha de falar com Mário para esclarecer o inci‑ dente. Mário fala para ele: “Pai. Mário ficou muito cho‑ tecido era uma fatalidade e que ninguém era cado com a cena. mas costumava ficar tida pela mãe e Mário de que o abortamento brincando com o filho em casa durante as fora causado pelas palavras do pai. O “aquilo” Edilsa também estava sentindo­‑se melhor. que estavam sendo recolhidos pela tia para Procurei estabelecer que o que tinha acon‑ posteriores exames. Manual de terapia familiar – Volume II 153 a mãe. ambos revelaram que a consulta inicial em casa mais tarde. que era uma pessoa com mais estudo. os pais satisfeitos com a me‑ tar assim nove meses. no horário palavras do pai que mataram o nenê. com a presença do meu irmão morreu”. e a profes‑ se você não tivesse dito aquilo. Mário era mais próximo da mãe. que ha- noites que a mãe dava plantão na casa geriá‑ via sido transformado em um “assassino” na trica onde trabalhava. Encaminhados para atendi‑ disse para Edilsa: “Não vai dar para aguen‑ mento regular. Na sessão. os anjinhos sora inclusive havia falado para Edilsa que não teriam dito amém e o meu irmãozinho na escola a mudança de Mário já era visível. da escola para te dar e agora chego aqui e o Na consulta seguinte. Edilsa se queixou muito deada por uma crise familiar que ficou mal do marido. a que Mário se referia foi o que ele escutou o Os pais elogiaram a melhora de Mário. o menino meses mostrou que Mário havia se estabili‑ já começou a mudar seu comportamento e zado e estava bem na escola. “Mas em que Mário retornava da escola. nunca aconte‑ Comentário ceu. to importante. e a mãe começou a sentir fraqueza e esqueci‑ reação pós­‑traumática em Mário desenca- mentos. que se revelou na segunda sulta confirmaram que era no que acredita‑ consulta uma pessoa com muito mais recur- vam. segundo a mãe. O seguimento do caso após 6 dias seguintes ao abortamento. piorar o desempenho escolar. como Mário e Edilsa no desenrolar da con‑ respeito do pai. ainda encontrou no to eu explicava as possíveis causas dos co‑ chão da sala sangue e restos placentários. Os pais . mas os sintomas de Mário pioraram Este caso mostra a evolução de uma – na escola ficava desenhando cemitérios. tratava­‑se um casal muito disfun‑ resolvida. eu tinha notícias tão boas to a mãe pareceram sair aliviados da sessão. Quando seu pai chega pai. ainda estaria na barriga da mãe”. mas insisti que não foram as Aconteceu em um final da tarde. Quando eu não rejeitei o nenê!”. A manutenção da melhora após abortos espontâneos ocorrem comumente 6 meses mostra o poder das intervenções e que não se pode atribuir simplesmente às focais quando o fator desencadeante está claro e os adultos são colaborativos. falei bem. O assunto foi sendo abandonado pelo casal. tinha acalmado muito o menino. Nos tratamento. disse a mãe enquan‑ ele chegou em casa. Tanto o menino como a mãe ouviram sos do que os descritos pela mãe no primei- muito atentamente minhas explicações que ro encontro. Existem muitas interpretações em cional que costumava brigar na frente do fi‑ vários níveis para o caso. mas na sessão foi lho único. se você vai continuar lhora de Mário não deram continuidade ao assim. é melhor então tirar o nenê!”. dentro de uma estrutura Mantive­‑me no foco e. associa o início dos sintomas ao episó‑ que o que as pessoas sentem e dizem é mui‑ dio de um aborto espontâneo que ela teve. fantasia dos dois. fundamental trabalhar com a crença compar- o pai trabalhava muito. en‑ pai dizer para a mãe dois dias antes durante tenderam como ele havia sido prejudicado e uma das brigas costumeiras do casal. é viúva e mora sozinha. menino tinha “ataques” quando frustado e ela cedia porque tinha medo de que André ficasse “louco que nem minha mãe!”. Nívea reivindi‑ ligerante. A escola encaminhou André um período de consultas familiares ten‑ após sua primeira reprovação. desde pequeno. Nívea que se casou aos 18 anos e não Essa etapa evolui bem. gos. não estavam motivados para tratamento de casal. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols.154 Luiz Carlos Osorio. Aluízio. para nha medo de enfrentá­‑lo e piorá­‑lo”. avaliação neurológica e psicométri‑ Aluízio continua mais firme com o filho. disse. Moram em um condomínio onde para a dupla mãe­‑filho a maioria das con‑ outros rapazes mais velhos saem após a es‑ sultas. tornando o trabalha fora�������������������������������� . demasiado volta‑ conflitos novos e outros já bem mais anti‑ do para o filho. justificando que só à grudado ao lado da sua moto por mais noite está em casa. encabulado na berdade e autoridade. tendo Nívea. Proibido do controlar os horários de estudo ou as de sair do condomínio com a moto. Após nas redondezas. ter atividades fora Comentário de casa. Aluízio começa a redirecionar As entrevistas com a família revelaram o seu investimento afetivo. . até que. mas dá si‑ particular foram estipulados. Falta frequentemente às casamento. Nívea queixa­‑se da falta percebeu que a situação realmente mudou de mais apoio do pai. a����������������������������� lega ter perdido toda a auto‑ casal capaz de combinar e manter regras ridade com o filho. bem com‑ pensada com medicação. Segundo caso que teve duas hospitalizações por doença bipolar. que quer se impor mais. “Eu ti‑ sultas. André escapadas de moto. A investigação clínica com visita à cou e conseguiu mais autonomia. A avó. queixaram­ sas. Nívea. um tificado com André. Como veremos a seguir. A irmã O pai. segue compreender nas consultas que. preferiu­‑se abor‑ Encorajado a procurar as suas duas filhas dar o caso começando com a disfunção fa‑ adultas do primeiro casamento de quem es‑ miliar e o resultado foi bom. precipitadas por um acidente em que ‑se de desinteresse nas aulas e atitude be‑ André quebrou um braço. Declara­‑se apaixonado por comportado e adaptado à escola. 1982). mas colabora terapeuticamente. deixando possantes. no sangue dela”. o sido descrito por mim (Waldemar. mas na frente do ma‑ frente dos amigos. pas‑ cola para passear de moto ao cair da tarde sando a ser mais firme com o menino. Em consulta na André é um menino de 13 anos. mas duvida que a mulher possa ser passado de ano. enquanto escola. Nívea reivindica mais li‑ de cinco minutos. Horários de estudo e uma professora mãe que se imponha com o filho. que já pilota uma moto de adulto. Um caso semelhante a este já havia Nívea explica que. decidiu retornar à casa. O seguimento nais que em relação a ele prefere que ela do caso após um ano mostrou André mais continue dócil. grande qual participa a avó. que foi um adolescente pobre. con‑ caçula de 5 anos não apresenta problemas. visivelmente aborrecido nas con‑ que o problema do filho é diferente. iden‑ A moto é cortesia do pai. que ca não apresentou resultados conclusivos. desespero da mãe. e Nívea enfrentando no‑ mais competente como mãe. Este é um caso que na avaliação inicial gerava hipóteses como transtorno de humor. colecionador dessas máquinas sessões. Nívea convence­‑se de para a idade. rido comporta­‑se como se fosse irmã mais Daí em diante passou a respeitar mais a velha de André. que delegou para ela quando a mãe foi atrás dele com o carro as tarefas disciplinares. Aluízio diz que quer uma mãe. vê terminado seu período de impunidade. em seu segundo vontades do filho. tava distante. “devido aos negócios”. está fazendo demais as empresário de 62 anos. de 31 anos. pois não vem conseguin‑ mais consistentes para o jovem. mas ao mesmo tempo tem medo de enfrentar o marido. pois “não está vos desafios. Fica claro que tinha casado com uma jovem adolescente e está com difi‑ culdades de aceitar o crescimento de Nívea. evidente uma disfunção conjugal crônica. suspendendo gasta muitos dos recursos disponíveis o antidepressivo e iniciando estabilizador de no sistema. a transferência foi o motivo prin‑ familiar em transtornos externalizantes – cipal que o levou a ficar deprimido. Nívea vinha ficando cada vez mais apático e de‑ estava muito motivada para o tratamento. irmã tinha 8 anos. Concordamos com Henggeler e cola. Terceiro caso torno oposicional ou de conduta. Gustavo era um garoto de 12 anos. tipo de escola ao mesmo tempo. e Gustavo em pouco o casal e ainda o pai se aproximou das fi. 5% da população jovem estava pegando dinheiro escondido dos pais. Era o de conduta. se necessita de uma abordagem ta familiar. que cria um fa. Em casa os pais também notaram conduta chega a fazer com que repre. Manual de terapia familiar – Volume II 155 déficit de atenção e hiperatividade e trans. pensar em medi. metendo­‑se em brigas e suspeito de pequenos furtos 1. ou seja. como os pais mostravam muita divergên‑ quando os jovens retornam para casa cia em como lidar com Gustavo. e o caçula. além comportamento de recolhimento e reclusão de ajudar o paciente identificado. 4. Os pais boradores (Henggeler et al. a alta prevalência de transtornos de em aula. sinteressado pelo trabalho escolar. Nesta situ. pois para a mãe no início do curaram um serviço público universitário de tratamento significaria o seu maior medo saúde mental orientados pela escola. transferido de uma particular porque “era a vez da irmã cursar a escola terizam por um alto grau de discórdia e particular”. Diz ainda que “a intervenção Gustavo. foram en‑ devido à influência negativa de suas tão encaminhados para terapia familiar. de vesse o mesmo quadro da avó. Houve uma rápida melhora parcial frequentemente o tratamento fracassa e. Gustavo continuou com da idade delas. ficou multidisciplinar e multisistêmica. em geral. pois receava que o filho ti. Por outro lado. Uma das van. que o comportamento de Gustavo havia se sentem 50% dos encami­nhamentos dos modificado. e logo procuraram auxílio. Foi feito um diag‑ vel trabalhar outros sub­sistemas: ajudou­‑se nóstico de depressão. nos casos mais graves de transtorno Já no primeiro contato com o terapeu- de conduta. A sido contraproducente. o mais velho de 3 irmãos. 1998) que indi- cam que. e humor. Estava bem agressivo com os jovens em geral para clínicas de saúde irmãos. fugia de casa sem dizer aonde ia e mental. a escola novamente entrou por dois fatores: em contato com a família. relatando que Gustavo estava muito agitado. Os pais tam‑ marido que queria abordar. Alguns como o aqui descrito – é muito importante meses após.. não só não foi necessário. Sholevar (2001) escreve que: primeiro ano que Gustavo estava em uma “tende a ocorrer em famílias que se carac. escola pública. e sos para os dois filhos frequentarem esse não separação ou divórcio. inclusive hospitalização. ação. no qual pois também havia assuntos seus com o sempre havia se sobressaído. Para a mãe foi difícil vir consultar com psiquiatra. aparência normal. . que notou ao longo do semestre que o rapaz tornar­‑se realidade. tempo respondeu bem a uma dose de 20mg lhas do primeiro casamento. esta população delinquente mais grave diagnóstico para bipolaridade. mas teria cujos pais eram pequenos comerciantes. bém notaram em casa o surgimento desse tagens da abordagem familiar é que. Em relação ao transtorno consultas de apoio e farmacológicas. Segundo tor de risco”. já que os pais não tinham recur‑ tensão entre os pais e é esta discórdia. é possí. famílias”. que haviam se de fluoxetina. e Uma reconsulta psiquiátrica reformulou o 2. Os pais pro‑ car o menino. como consultor­‑supervisor. Atendido no ambulatório de afastado quando ele casou com uma moça hospital­‑escola. fiança dos pais. procurando melhores oportunidades. que não conheceu o pai. levar surras bater nos irmãos. teria migrado para o centro­‑norte do turo melhor para os filhos. pai.156 Luiz Carlos Osorio. já que a mãe era violenta e mui. a mãe. sempre auxiliou quando os Começou a trabalhar muito cedo. Atribui a esse trauma não tolerar zão que levava o pai a perder a paciência a tendência à violência do marido. viveu sempre de biscates. xando ainda o suficiente para o almoço do tervinha quando o pai se tornava violento. Mesmo em épocas de desem- interpondo­‑se entre ele e Gustavo e afastan. que segundo­fami. Antônio foi dos to e passar em uma universidade pública. dei­ não vai adiantar nada”. e Gustavo estava matricula- fixa. veio de uma família ain. até que a es. Gustavo se acha- Brasil. Marieta admite que não tem tole- A história transgeracional rância para trabalho malfeito e reconhece uma compulsão para se manter sempre em Marieta. Aos 10 anos. O mais de 10 anos fechou. para tirar notas boas. recebeu quando o banco onde trabalhou por tindo para tapas e empurrões no menino. dade de expressão oral faziam com que seus da mais pobre. única forma que a família via de dar um fu- liares. da con- de cinco filhos de pequenos agricultores. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. seu excelente desempenho escolar e facili- O pai. Gustavo e a irmã já agricultura do que ajudar a mãe nas lides supervisionavam o caçula no turno em que domésticas. com sua mãe e irmãos. era uma da prole atividade. Sem profissão jogava futebol. da casa com o argumento de que Marieta era perfeccionista e preferia fazer tudo ela ­própria. bate. va muito inteligente e argumentava para Com oito filhos para criar e sem profissão. estavam em casa. do em uma cara escolinha de futebol que ele posa. a os pais que não precisava de muito estudo mãe de Antônio entregou­‑o quando peque. O pai te. . escravo e depois de algum tempo fugiu para As escapadas e furtos de Gustavo eram para retornar a viver. que segundo a mãe também não surtia efei. o que era proibido pelos pais. dia seguinte. com a indenização que paciência e o pai sem nenhuma. Gustavo começou a ler muito cedo e lado do que se lembra da mãe. que havia terminado­ o segundo grau não fazia questão de frequentar. alimentar suas visitas a esses lugares. o Já quando trabalhava como bancária. já dois com namorados eventuais que nunca estava sendo doutrinado para estudar mui- assumiram a paternidade. Fazia parte das recentes tas vezes ela testemunhou sua irmã. que mudanças no comportamento de Gustavo hoje é doente mental crônica. que reconheça que ele é muito mais contro. sendo este e passado em concurso para bancária. ele fazia trabalho quase em lan houses. pois Gustavo gritava “bate. que da tarde e ir direto preparar a janta. Preferia trabalhar na inicial com a família. que a mãe descrevia como sendo formas di. mesmo que miseravelmen. mesmo com o filho. Antônio não ajudava nos afazeres do o filho do pai. va mais liberdade para sair à rua e brincar Segundo Antônio. O menino reivindica- no para uma outra família prover por ele. Uma vizinha da família. defendeu­‑se dizendo que ele pedia uma ou A vida familiar duas vezes para Gustavo mudar de atitude e só então apelava para o castigo físico. sendo esta a principal ra- terríveis. um pequeno comércio de alimentos para os ferentes de educar: ela sempre com muita dois se ocuparem. prego. como era filhos eram menores. abriu outro tema de conflito na família. sua mãe teve seis filhos com o pais lhe exigissem sempre nada menos que primeiro marido que faleceu e ainda outros nota máxima nas avaliações. pessoa que se expressava muito bem e que aparentava menos idade do que a mãe. A mãe sempre in. Quando do contato o costume na região. Antônio. logo par. Marieta costumava chegar em casa no final to. lhorado parcialmente com estabilizador de supervisionando e preparando refeições. ainda sem acordo entre posta sonolência no tratamento anterior. Ficou combinado nas con- o efeito desejado. mas rer terminar a relação por conta da hosti- conseguindo do marido o compromisso de lidade de Gustavo e dizia que. que Marieta e o companheiro passavam o sendo agressivo com os irmãos. nesta fase não recorrer à força física. des financeiras. Portanto. O nascimento do caçula pegou os dois de surpresa. O seu comportamento havia me. atri. a primeira fase da os filhos. Ao longo de vários meses. a quem achava um estranho na casa. Universidade Federal – estava com 19 anos. ficando em casa sem estudar ou ajudar. exibindo cabelos brancos meira fase por quase dois anos. xílio terapêutico. já humor. Em terapia. depois eles no meio de outros já descoloridos. filhos quase diariamente durante a semana. Quando não contra­‑argumenta quando ela diz que retornaram pela última vez. o pai então ficava violento e/ou cas. mas ele ainda continuava mentindo. tivamente. A família foi acompanhada nesta pri- da na aparência. conjugais. Manual de terapia familiar – Volume II 157 A relação do casal voltou ao seu desempenho anterior. pois “tem coisa quando voltaram foi por um breve período mais importante onde gastar seu dinheiro”. pegando di. a mãe A interação familiar disfuncional típica tomando a iniciativa ao encontrar um outro era aquela em que Gustavo não escutava a parceiro que a tinha feito “se sentir amada” mãe. dia envolvidos em seus negócios. de dois meses para ajudar o subsistema fra- Antônio reclama do desleixo de Marieta mas terno a viver com menos conflito. podendo ele ser muito firme. dizendo­‑se satisfeitos com a evo- guns anos vinham se afastando sexual e afe. o novo companheiro. que criticando o pai e abrandando o castigo im. Marieta desconfia da fidelidade do marido que. com o ficaram dois anos sem frequentar a clínica e que ela diz não se importar. Por outro lado. depois de muito tempo. Novas etapas do tratamento bui a desconfiança à falta de desejo sexual da esposa. Como Gustavo já de sua vida. era porque ele não faz nada para perder os 15 quilos Gustavo não havia passado no vestibular da que tem de sobrepeso. Após um breve pe- tigava exageradamente. os pais tinham se separado. os pais. foi morar na casa com Marieta e posto por ele. Marieta apresenta­‑se descuida. Um ano antes. mas não teve Verbalizava uma revolta grande com o pa- sucesso em supervisionar Gustavo. se dava bem tivas comuns a respeito de como lidar com com a ex­‑esposa e frequentava a casa dos Gustavo. e a mãe intervinha ríodo de namoro. Marieta tentou por si só. dor- mindo até tarde e trocando a noite pelo dia A triangulação de Gustavo na frente dos joguinhos de computador. era viúvo. O casal não se interessou por tratar seus conflitos Os cônjuges relataram que já há al. O pai morava sozinho em precá- terapia familiar tratou de conseguir que os rias condições e continuava com dificulda- pais pudessem cooperar e chegar a expecta. lução de Gustavo. por sua vez. Com au. combinou com Antônio que Marieta andava muito preocupada com o ela se afastaria para o pai se encarregar de fato de que seu companheiro pudesse que- Gustavo. sem efeito ela iria exigir que Gustavo fosse da (supervisionada terapeuticamente­) surtiu morar com o pai. Gustavo nheiro dos pais e entrando em conflito com não queria tomar medicações devido à su- colegas. senão teria . a prioridade era tentar manter havia deixado claro que sentia falta de mais seu novo relacionamento e disse a Antônio contato com o pai. a presença de Antônio mais que se as conversas familiares não surtis- próximo do filho de uma forma mais adequa. drasto. sultas familiares que Gustavo teria algumas Gustavo foi modificando­‑se e aos poucos semanas para procurar emprego. têm dificuldade em acei- qual “os filhos funcionam como represen. levando­‑os a abando- putador e tentar novamente estudar para nar o tratamento.158 Luiz Carlos Osorio. suas principais com pais com conflito conjugal crônico: é diversões. fazer muitas ativida­des O enfoque biopsicossocial extracurriculares e ainda cuidar dos irmãos menores. veu doença mental. A famí. que ir morar com o pai. que suspendeu seu comportamento vio- No primeiro momento do atendimento. quanto o em etapas distintas do ciclo vital. almejava.­ lento. crônica grave. que era muito talento. Por outro lado. a chegada do primeiro filho. espe­ níaco”. Gustavo nunca aceitou comum pais que se separam ao longo do bem as sessões individuais. dente com a supervisão de um dos autores O casal apresentava uma disfunção (JOCW) que viu a família junto com o re. é muito passar no vestibular. mas con- encontros familiares. mental da infância e adolescência tenham cretos ou não. inteli­gente você visitá­‑lo!”. ou seja. medicada com antidepressivos. aceitou suas limitações admitindo não con- em três períodos de intervenção terapêutica seguir sozinha controlar o filho. que lia foi acompanhada ao longo de sete anos. fez com que muitas expec­tativas fossem colocadas nele. 2001) foi um dos primeiros a as. mostrado flexibilidade. pois na casa do pai não havia pecto muito relevante quando se trabalha computador ou TV a cores. pai. Para este ca. neste caso seu relacionamento so em informática. com os pais gratificando­‑se importantes aspectos genéticos e biológi- através deles”. tendo ficado como a para conseguir colaborar na disciplina do pessoa de referência para a família nos aten. grandioso por assim dizer? Stierlin cialmente os que não trabalham em am- (Sholevar. descobre onde ele está que eu vou com sal. muito lutadora desde sua infância marcada Comentário por uma mãe violenta e uma irmã que trau- matizada por maus-tratos físicos desenvol- Este caso foi atendido por um resi. Os tera­peu­tas têm a experiência de que para trazer glória para a família. será que não o tornaram “meio ma. Quando ouviu pela primeira vez cedentes maternos e paternos de transtorno Antônio contar que tinha vontade de pelo de humor – desenvolve comportamentos menos conhecer quem tinha sido seu pai. filho. Alguns terapeutas familiares. em poucas importante manter­‑se no foco que os trou- semanas Gustavo. está pronto para isso. xe à terapia. Muitos terapeutas prematu- que lhe possibilitava pagar suas contas e ramente tentam ajudar um casal que não aceitou reduzir suas horas diante do com. o porta. mação do pai com o filho. biente hospitalar ou com populações sinalar o processo muito comum através do marginalizadas. Gustavo era o filho que veio cos. tar que deter­minados problemas de saúde tantes dos pais para realizar seus desejos se. tanto a mãe. tinha de tirar sempre notas muito altas. o que Gustavo não Este caso também mostra outro as­ queria aceitar. pois também promoveu a reaproxi- chama “virada maníaca”. mas gostava dos tratamento ou ao longo da vida. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. O fato de Marieta ter se separado atingida. Com o apoio do pai. e precoce. “Pai. Obtiveram bons resultados por terem dimentos subsequentes ao primeiro. conseguiu um emprego com o filho. No momento em que tinuam po­dendo colaborar para ajudar os a estabilidade no emprego de Gustavo foi filhos. a família deu­‑se por satisfeita com depois de anos de acomodação em uma re- esta nova etapa no tratamento. O trabalho com a dupla pai­‑filho foi Gustavo apresentou o que na literatura se eficaz. precisando de muitas sessões sidente várias vezes. descontrolados a partir de uma depressão Gustavo emocionou­‑se e disse para Antônio. as crianças reagem positivamente quando . lação insatisfa­tória pode ser visto como im- portante recurso de uma mulher resiliente. algo que Gustavo dor de vulnerabilidade bipolar – havia ante. O educadores. No Instituto da Família de Porto Um dos aspectos mais importantes desse Alegre (Infapa) e no Hospital de Clínicas conceito que se desenvolveu inicialmente da Universidade Federal do Rio Grande do no trabalho com esquizofrênicos. Manual de terapia familiar – Volume II 159 são atendidas suas necessidades de aten. participando do atendimento da deman- lógicas e psicológicas que são ativadas da. fica aí. expressas (Heru. Con­sistente com as visões sistêmicas. ao criticar o paciente. Por exem- que. O psiquiatra da ção. em o caso dos autores na clínica parti­cular. po- dendo medicar o paciente ou o familiar. Estas interações familiares são quase cer. é exemplos de equipes harmoniosas. nutricionistas. As abordagens terapêuticas que in. fonoaudiólogos. Nesses contextos. O conceito de emoções boa evolução do tratamento. n Ser o terapeuta que assume o caso – que é tendem a atacar a pessoa como um todo. terapeuta de família. médicos clíni- vés da interação entre esses fatores e o am- cos e outros colegas. um pai frustrado por não conseguir ti- tra é fundamental. 2006) aborda esse tópico. fa. o papel do psiquia- plo. tância dos fatores genéticos e biológicos. seguintes possibilidades: nunca vai ser ninguém na vida. no contexto clínico mas psi­quiátricos melhoram quando muda o ambiente. Observam que os sinto. complexo ou resistente à psicoterapia. é fundamental para a biente psicossocial. logicamente o paciente. vez o paciente tem vulnerabilidades bio. Os familiares. Famílias ções de ensino ou clínica privada. enfermeiros. vez de responsabilizar a doença do paciente n Ser chamado como consultor nas institui- pelo comportamento inadequado. Mas isso não diminui a impor- cia e da adolescência. mas que Sul (HCPA-UFRGS) nos esforçamos para ter agora se estende a vários outros quadros. para com alta emoção expressa apresentam mais auxiliar no diagnóstico de um quadro recidivas. você é um vagabundo mesmo. Por sua primária à saúde ou especialidades. pela sua relevância. colabora na organização do atendimento tamente estressantes para os familiares a situações clínicas complexas e também que procuram ajudar na recuperação do na resolução de problemas relacionados paciente e também parecem afetar fisio- à dinâmica da equipe. 2006): n Ser solicitado para avaliar o caso. o psiquiatra de situações às quais a criança ou adoles- é chamado a opinar com frequência e enco- cente é neurologicamente sensível. sendo o uso indiscriminado da crítica. vulnerabilidade para a disfunção. com sorte li- xeiro!”. tornando­‑se parte da equipe terapêu­ mílias com alta emoção expressa têm uma tica. continuada da equipe. com a n Ser consultor das equipes de atenção doença servindo como estressor. planejamento de ações e educação por estas interações familiares aversivas. que ocorre se entende adequadamente atra- recreacionistas. que inclui o psiquiatra da infân- estabelecida. rajado a fazer a avaliação com a presença do . A participação dele no rar o filho da cama pela manhã grita: “Fica processo terapêutico com famílias inclui as aí. afeto e limites adequados ao estágio de infância e da adolescência desenvol­vimento. Segundo Miklovitz (Heru. O instituto da família cluem a modificação dessas interações fa- de Porto Alegre (INFAPA) miliares disfuncionais trazem resultados melhores e diminuem a tendência a recaídas Como a maioria dos terapeutas de fa- através da interrupção da repetição rígida mília no Infapa são psicólogos. mesmo na presença de forte O bom funcionamento da equipe de história genética e pais com psicopatologia trabalho. Colabora no atendimento mas crônicos e graves de relacionamento. terapia individual na modalidade cognitivo­ Começamos o tratamento geralmente ‑comportamental. mas relacionados à dinâmica da equipe. cremos o sistema terapêutico normalmente com a que as atuais pesquisas basea­das em proto- inclusão da família de origem e partes da colos rígidos não representam a realidade rede social. Como outros autores das são insuficientes. família é parte da abordagem biopsicosso- Os terapeutas em formação são esti. o mais complexas. a supervisão do professor. O foco pode continuar sendo a promo. Também pode ser necessário da clínica e terão de evoluir para análises medicar a criança e/ou outros familiares. O residente realiza a atividade com os. o que facilita a formação da equi. Dois anos de seminários e supervi- ros tutelares e Ministério Público. pe na avaliação global de casos complexos Quando as famílias já chegam com proble. O Serviço de Psiquiatria Infantil presta ção para o tratamento de algum subsistema consultoria à UBS Santa Cecília. familiar são mais complexos do que na psico- pe e evita problemas de comunicação. casos junto com um membro da equipe. 2009). que é utilizada no Programa de . De­sen­ nar e integrada. multidiscipli- estudos baseados em evidências.  por envolver mais atores. Além disso.  Frequentemente. No exemplo que se segue mostramos tamos nos preparando para contribuir com uma abordagem intensiva. tera- breves do que as individuais. Se há suspeita de negligên- cia. no o tratamento pode durar alguns anos. é necessário ampliar (Diniz Neto e Ferez­‑Carneiro. no Infapa es. e todos os profis. Quando essas medi. e curso de especialização em psiquiatria da tal garantir que não haja perda dos vínculos. Os estudos de eficácia em terapia al. hospital. 2005). aprendendo a integrar teorias e técni. que aumenta o sistema terapêutico com a inclusão do psiquiatra. maus­‑tratos ou abuso sexual da criança. seja o casal ou um dos indivídu. intervenções variadas. infância e da adolescência da Faculdade de e sim sua transformação. da demanda avaliando e acompanhando os o que ocorre em cerca de 20% dos casos. O conforme sua formação pessoal e profissio. a colaboração com a escola na terapia tam- O serviço de psiquiatria da bém é fundamental.160 Luiz Carlos Osorio. Em relação à pesquisa. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. etapa. de saúde mental. auxiliando a equi- ção de mudanças nas relações familiares. treinamento se dá nos programas de aten- nal. A avaliação e tratamento da esforços. pode haver necessidade ou motiva. da adolescência do Hospital de Clínicas. onde atua um dos au- sionais envolvidos precisam coordenar seus tores (OGF). psicólogo. Medicina da UFRGS. cenários e no contexto familiar. É comum que e consultoria hospitalar e em Unidades as terapias familiares sejam mais focais e Básicas de Saúde (UBS). tendo como base o sistema volvemos um prontuário eletrônico com da. CAPSi cas e o trabalho em equipe. sendo interessante que infância e da adolescência pais e terapeuta participem juntos da reu- do hospital de clínicas nião na escola. é fundamen. familiar e acrescida de trabalho nutricio- dos quanti­‑qualitativos que incluem o uso nal e corporal com as pacientes (Falceto et de escalas. que é a que mais publicou com intervenções psicoterápicas sistêmicas artigos. Depois desta programas de atendimento. internação. Quando são de casos de terapia familiar são parte há necessidade de retirar temporariamente da ­formação desde a criação da residência a criança do convívio familiar. dimento de ambulatório. é mandatória a colaboração com conselhei. durando em peutas familiares fazem parte de diversos média em torno de seis meses.. cial do Serviço de psiquiatria da infância e mulados a desenvolver um estilo próprio. vinculada ao familiar. na educação conti- trabalhando­‑se a família e seus subsistemas nuada da equipe e na resolução de proble- de forma integrada. planejamento de ações. já tendo quase estrangulado a menina em econômicas. A mãe descreve a dificulda‑ Celeste se apresentará na próxima consulta. sendo que este nega que não familiar que. beirando a inação: os problemas cinco meses. um pou‑ na escola. e a equipe. mais trata‑ equipe é conseguir tratamento psiquiátrico mento individual da paciente no grupo de para a mãe de preferência no próprio hospi‑ adolescentes. indica internação. Rinaldo sentiu muita rejei‑ o funcionamento da família: a organização é ção de seus pais por ter sido mandado para bastante caótica. mas isso não se da paciente e familiares. mobiliza a polícia que vai à casa Apesar de sua inteligência. herdada da família ou esta como grupo para outro do lado paterno. Mas para onde? E quando ha‑ consultas e mostra dificuldades em enfrentar verá vaga? Esse é um dos dilemas comuns a filha. Adere tam‑ adolescentes do Hospital de Clínicas de bém ao plano alimentar. suicidas e comportamentos automutilató‑ Nossa próxima tarefa. que vê a família na reunião de equipe quin‑ mesmo tendo períodos de ingesta descon‑ zenal. o que a menina já re‑ latou à sua terapeuta individual. Ela e sua família são atendidos no pessoas têm problemas maiores e que ela Programa de Transtornos Alimentares para não vai mais tentar se destruir. A equi‑ tão para a equipe. . relatando pensamentos dica a mãe com estabilizador de humor. Uma grande Menina multiproblemática. Sentindo que seu diagnóstico de anorexia nervosa purgativa e sofrimento e desespero são reconhecidos também fica muito impactada com a tristeza pela equipe. A equipe. não consegue prever como nas anoréxicas. o psiquiatra vidual e para o grupo familiar. orientação nutricional indi‑ tal. é envolver mais o pai a melhora é tímida. Rinaldo é excessivamen‑ dificuldades sexuais do casal. Ao longo de te calmo. Rinaldo não quer trazer à baila o fato de que não é o pai biológico. no meio de vá‑ rios. Alice conti‑ da infância e da adolescência da equipe me‑ nua muito triste. Alice sai melhor da inter‑ Alice tem 13 anos. A avó materna participa das atendimento. A próxima hipótese é de que a mãe seja necessário. o que é pouco comum em meni‑ co assustada. a mãe se embriaga e novamente nores moram com a mãe Celeste e o pa‑ ameaça a menina. patológicos específicos. Já sabemos mais sobre no tratamento. por falta de confiança de que os pais e a avó possam protegê­‑la. mas parece ter 18. Enquanto isso não acontece. Também se suspeita de sérias um acesso de fúria. mas rias crises menores. que faleceu há alguns anos. que precisa de tratamento para seu trans‑ Mesmo após uma fase inicial de tra‑ torno bipolar e possível abuso de álcool. encaminhar algum membro tem transtorno de humor bipolar. tamento com terapia familiar associada à O problema que se apresenta agora para a terapia de grupo multifamiliar. nação de duas semanas em outro hospital. a mãe aceita pela primeira vez da menina. Começa­‑se com antidepressivos. cujo foco é o transtorno pe chega a pensar que possa estar havendo alimentar. para depois. A adesão ao tratamento é problemática. para discutir os planos terapêuticos e trolada seguida de vômito. crise terapêutica ocorre quando Alice amea‑ família multiproblemática ça suicídio. A equipe faz o a participação da família. a mãe é muito descontrola‑ a casa da avó que tinha muitas dificuldades da. como era com seu marido alcoolista e em serviços públicos voltados para quadros violento. de principal de Alice como sendo seu desejo em que estará presente a consultora (OGF) de permanecer excessivamente magra. Alice rodou para acalmar os ânimos. programa. Alice chama a terapeuta drasto Rivaldo. Alice e seus dois irmãos me‑ de crise. os comportamentos alimenta‑ parecem eclodir quando ele não está e não res problemáticos desapareceram e a ques‑ leva muito a sério as queixas de Alice. Manual de terapia familiar – Volume II 161 Transtornos Alimentares para Adolescentes do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. tantos são os seus problemas e preocu‑ dizendo que se deu conta de que outras pações. é estabilizar os ganhos pessoais abuso sexual por parte dele. caso confirma. Em uma outra gran‑ Porto Alegre. com apoio da coordenação do é o pai biológico. Famílias 2. abuso de drogas em ado- nos sintomas alimentares. mos- trando os estudos sobre a eficácia da terapia Concordamos parcialmente com Fo­ familiar em vários transtornos e também em na­gy e sua equipe (Target et al. é eficaz quando comparada com hospital­‑dia. com metodologia de pesquisa apesar de amplamente utilizada. nos transtornos mentais graves. processo da equipe não é rapidamente iden- tificado e corrigido. 2007) transtornos psiquiátricos uma atualização ao estudo de Heru. de uma filosofia de tratamento clara e con. causando grandes com outras modalidades terapêuticas problemas de relacionamento nesta. a experiência do próprio terapeuta. transtornos as dissociações que podem ser devendo ser utilizada em conjunto projetadas na equipe. Essa abordagem modalidades terapêuticas em muitos facilita o tratamento e torna mais agradável problemas. Esta também é nossa experiên­ que: cia. ou bipolaridade no paciente e/ou familiares 4. ou individuais nas seguintes situa- ção e manejo de afetos e emoções. é 5. eficácia diferente. com esses transtornos têm estruturas muito 3. familiar ainda não apresentou suficientes Para escrever este capítulo. se o (Falceto. com problemas conjugais. criando ções: esquizofrenia do adulto (ainda uma impossibilidade de lidar com conflitos. inclusive devido lescentes. au­s ência de tratamento ou outras para os casos mais graves. realizamos estudos controlados e randomizados para uma revisão das publicações dos últimos . Entretanto.. sua inclusão no tratamento torna­‑o mais rígidas. os estu- dos baseados em evidência. autismo infantil e várias doenças físicas tificação de comorbidades. jovens intensamente triangulados e eficaz do que as abordagens usuais e/ todos com imensa dificuldade na identifica. dentro de tratamento. alcoolismo e abuso de drogas acesso. 6. que haja controvérsias). em adultos. Nos programas multidisciplinares. Comentários demonstrar sua eficácia. a terapia considerada adequada. não sensual. Contribuímos para essa dis- cussão quando publicamos (Falceto. tratamento Nossa experiência tem também mostrado ambulatorial de mulheres deprimidas que essas famílias têm histórias trigera. Nossa trajetória de 30 anos nesse campo levou­‑nos para o tratamento em regime tipo 1. segundo Heru. não há evidências de que os diversos (famílias multiproblemáticas são frequentes tipos de terapia de família tenham especialmente em casos de bulimia). 2009). casais em cionais extremamente sofridas e de difícil conflito. 2007). 2005): prevenção. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. já são suficientes para concluir Eisler. anorexia em adolescentes.162 Luiz Carlos Osorio. alguns estudos indicam que é mais fundamental a coordenação respeitosa de barata do que as outras modalidades todos os saberes e estilos da equipe. a frequentes riscos de vida. transtornos de conduta em O tratamento exige um foco inicial adolescentes. Heru afirma que há evidências para apoiar a crescente ênfase em uma prática psiquiátrica com a participação da família A eficácia da que tende a se chamar psiquiatria basea- terapia familiar nos da na família. São parte da psicopatologia desses é suficiente apenas a terapia familiar. não é iatrogênica. além de iden. como depressão crônicas de adultos e crianças. Está demonstrado na literatura que a em uma revisão sistemática que publicou abordagem familiar é eficaz nos transtornos em 2006. com equipe multidisciplinar. no renomado American Journal of alimentares na adolescência (Le Grange e Psychiatry. rexia nervosa cuja abordagem familiar já 2008. set. teremos de continuar fazen- terapia familiar nos transtornos psiquiátricos do grandes esforços. C. Doyen do urgente  ao crônico. to. 2008. Le Grange et al. já que a formação da da infância e da adolescência. A.. 2005. Jan. 2005). MOUREN. Cook­‑Darzens. Childhood social dade. 2008. 13. n. é fundamental a publicação de CHENVEN. privada e institucional. CHAVIRA. brasileiro.. base de dados Pubmed) sobre a eficácia da entretanto. G.. Family therapy in the treatment of adolescent anorexia nervosa: current research evidence and Reiteramos a convicção dos autores na its therapeutic implications.3. ansie. Oct. no programa Estratégias de Dodô. 3. sendo que na sua maioria referem­‑se a abordagens cognitivo­ CHACKO.. Le Grange e Eisler. que vá Chacko et al. children’s mental health. portan. 2005. v. cia da organização comunitária e sistêmica na atenção à saúde mental na infância e na adolescência (Chenven. n. e.. 2007. 19. Nov. Os parenting (STEPP) program for single mothers diagnósticos mais pesquisados incluem of children with ADHD. evidente a necessidade de mais estudos.). 2008. Milano. C. FALCETO. 2010.. p. do simples ao mais e Mouren. terapêutico e dentro das possibilidades do 2009)  e um artigo discutindo a importân. A.Toronto. dez. O. Manual de terapia familiar – Volume II 163 cinco anos na literatura médica (usando a à efetivação plena dessa política pública. Philadelphia. Khanna e Kendall. cance de  todos os participantes do processo Philipsen et al. B. 1. nove é possível se ter uma visão em profundida- estudos relatando séries de casos (Chavira de do caso e ao mesmo tempo desenvolver e Stein. n.. 797-818. Nissen complexo. de déficit de atenção e transtorno opositor Child and adolescent psychiatric clinics of North desafiante) e abuso de drogas.. v. v. DOYEN. Verificamos maioria dos profissionais que oferecem es- que são poucos os estudos publicados: encon. Philadelphia. In: PRADO. S. ções biopsicossociais. apresentamos uma de tratamento cognitivo­‑comportamental breve revisão do tema da terapia familiar (James et al. v. para nós. (Org. D...  No sistema de saúde 2008. 2009. v. Eficácia do mundo. T. 2005. 2008./ Saúde da Família está contemplado o gru. p. et al. 2010). 157-170. 163-174.. Fica. disorders. 2005. 12.. 270-80. A pilot study of the feasibility and efficacy of the strategies to enhance positive ‑comportamentais incluindo a família. identificamos apenas na psiquiatria com crianças e adolescentes cinco artigos com estudos randomizados e sintomáticos através de exemplos que repre- controlados (Perkins et al. FEREZ-CARNEIRO. Eating and weight centralidade da família como foco das aten. O. Estudos de Psicologia. America. 2009). 14. 2009. Child and adolescent psychiatric clinics of North America. Hautmann et al. sintomas externalizantes (transtorno anxiety disorder: from understanding to treatment. p. terapia familiar entre as outras modalidades Neste capítulo. p. Robbins et ca. n. Community systems of care for pesquisas em países latino­‑americanos. M. 2005. Siqueland sentam situações comuns nas práticas clíni- et al.. 4. Para chegar confluência de crises. Dec. M. n. um plano de tratamento por etapas. 2005. tem boas evidências de efetividade. STEIN. po familiar como objeto de cuidado e pla. C. 2008. ainda que sua implementação psicoterapêutica: terapia de família e o efeito esteja no início.  cuja compreensão esteja ao al- e Thomsen. Mostramos que al. Considerações finais COOK-DARZENS. Os estudos Referências publicados foram realizados nos Estados Unidos e países da Europa. L. M. 4. ses serviços ainda é muito baseada na aten- tramos apenas uma metanálise que inclui a ção individual. contexto socio­econômico. Storch et al. disorders. Hervé et al. Famílias com adolescentes: uma nejamento das ações de saúde.. Natal. Journal of attention transtornos alimentares com ênfase na ano. . cuja visão é das mais avançadas DINIZ NETO. 10. Journal of Anxiety Disorders. 4th ed. In: ZAVASCHI. O. 44. et al.. dren and adolescents with obsessive-compulsive FALCETO. M.. 361-81.). EISLER. SOLER. Porto hood anxiety. G. p. A. F. n. Psychiatric Clinics of North America. 19. 981-6. HERVÉ. Prevenção. J.). C. n. 510-30. In: MARTIN. K. The American Journal Psychiatry. approaches. 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Grupoterapia hoje. p. (Org. 1982. Psicoterapias: abordagens MES. Infância e ado. 2008. C.. O. Médicas 1986. Porto Alegre: Artes Médicas. . negligenciado pelos pais e que presenciou muitas outras crianças que foram Chega ao consultório um menino. parasse de urinar era mais da equipe que o tuição onde está à espera de adoção há mais cuidava e de seus companheiros de quar- de três anos. envergonhado. conforme a literatura. relatarei quatro situ. (amitriptilina). instituições ocorrem frequentes trocas na te depressivo. Nessas a enurese muitas vezes tem um componen. tanto to do que dele próprio. serão feitos comentários Penso que é imprescindível que tenhamos a para relacioná­‑las com a abordagem sistêmi. Como ele procuraram como psiquiatra em um ambu. Foi era necessário trocar o colchão em virtude feita uma terceira consulta após um mês do mau cheiro e deterioração. alvo de bullying pelos colegas. Nesse senti- tras que indicaram o uso de antidepressivo do. quando chama a Neste capítulo. essa situação latório onde são atendidas pessoas de baixa foi responsável pela estigmatização com o renda e cujas melhoras rápidas e surpreen. pois. apelido mencionado. lações de apego (Bowbly. consiga estabelecer conosco uma relação de confiança e possa falar (ou não) sobre um assunto tão perturbador para ela. Lembre­ Caso 1 – Criando a demanda ‑se de que se trata de um menino com baixa (um caso de enurese noturna) autoestima. 10 anos. É descrito como rebelde. que acende as luzes. Não insisti para não humilhá­‑lo. o que acentua seu sentimen- abrigo de uma cidade do interior do estado. dorme com outros meninos. troca os len- ações clínicas relativas a pacientes que me çóis e o encaminha para o banho. tentando evitar falar sobre A par da sucinta apresentação de cada o assunto. 1990). o que dificulta as re- indicação da medicação mencionada. Trata­‑se de um menino de cor negra Percebi que o interesse para que José que recebeu o apelido de “mijão” na insti. A enurese acon- tece quase todas as noites. apesar de todas as suas limitações. para avaliação e a situação mantinha­‑se Na entrevista. É possível que também tenha com queixa de enurese noturna. atendente. capítulo 14 Intervenções sistêmicas “relâmpagos” em clínica psiquiátrica Maria Elizabeth Pascual do Valle Introdução na escola como no abrigo. O pequeno sido discriminado pelos candidatos a pais paciente já tinha passado por outros psiquia. José se mostrou muito estável. o abrigo desempenha um papel familiar. uma das situações. Ele fica com muita rai- dentes obtidas já na segunda consulta (em va e muitas vezes torna-se agressivo por ser todos os casos que serão relatados) justifi. A cada mês cam a denominação dada ao capítulo. abrigadas depois dele terem sido escolhidas José. adotivos em razão de ser negro. necessária paciência para que uma criança ca que sustenta o meu enfoque terapêutico. pois mesmo sendo . to de rejeição. trazido pela psicóloga de um para adoção. o que justifica a prescrição da equipe de assistentes. Bem. mas cama.. em crianças que. de maneira que José sentisse que a sobre as pessoas que o cercam. Mostrei para ele o benefício te ressaltar que a necessidade de superar o que teria. não tive companheiros de quarto não seriam mais dúvidas de que a indicação de amitriptilina acordados cada vez que ele fizesse xixi na para a enurese noturna estava correta.. ciente. igualmente seria retirada depois de uma se- dos dentro do contexto sistêmico com que mana de fralda seca. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. por gerar uma atenção especial por Orientei a psicóloga que o acompanha- parte da equipe. mais duas crianças e obtive o mesmo resul- zação de fraldas e desta maneira talvez a de. por diferentes motivos. ser trabalhado de forma a resgatar sua au- gas não precisariam ficar sabendo a respeito toestima. um mês depois chegou José com O pensamento que logo me ocorreu foi um sorriso nos lábios dizendo que não fez a utilização de fraldas. então. que os cole. estão à espera de adoção. para que conversasse com a equipe sobre conotação negativa. tão afastadas de suas famílias. mas não é este festou sua contrariedade em colocar fraldas o foco desta exposição. com respeito e fazendo­‑o perceber . Quero tão somen- para dormir. também os cuidados na forma de fazer a intervenção outorga ao paciente um determinado poder proposta. de modo que ele se empenhasse que conotassem positivamente cada vez que e fosse participante da resposta terapêutica José acordasse com a fralda seca. fralda era mais um cuidado com ele próprio e do a circularidade sistêmica que mantém o que era muito importante que ele não sentis- sintoma. es- cada pela vida. mesmo que seja com uma va. Retirei a ami- o quarto com ele. Não molhou a fralda nem o “transtorno noturno” de troca de lençóis. O objetivo dessa colo- abordamos os problemas que nos trazem cação era fazer ele sentir que tinha o poder os pacientes e seus familiares. José mostrou­‑se desconfiado. já tão machu. um dia e uma semana depois estava livre das banho e incômodo aos meninos que dividem fraldas e do “xixi na cama”. e isto deve mir em colchão mal­‑cheiroso. fralda” seria dele. Por outro lado. tado. uma vez que não teria menino que Já utilizei intervenção semelhante em com 10 anos ficasse confortável com a utili. Meu propósito. mas eu como terapeuta sistêmica fiquei insatisfeita. uma semana esta seria retirada e só reco- por trás das queixas. sempre há uma deman. Como psiquiatra. manda de “parar de fazer xixi” ou “tirar a tamente compreensível na situação do pa. desejada. conotada negativamente a enurese noturna da colocação de fralda e que o apelido de era uma forma de se sentir merecendo uma “mijão” não teria mais sentido. locada se ele viesse a molhar a cama nova- da que precisamos detectar para solucionar mente. com o necessário cuidado para não provocar Poderíamos enumerar diversos fato- uma situação de maior constrangimento e res para explicar o porquê deste sintoma humilhação para esta criança. como as que Conversei com José e ele logo mani. E que se fosse necessário recolocar questões e aliviar sofrimentos compartilha. O “fazer xixi de eliminar a fralda e neste momento a de- na cama” é um sintoma regressivo perfei. Os outros pacientes Obviamente teríamos de fazer essa proposta também eram crianças abrigadas. evidencian. para satisfação delas e da equipe que manda pudesse ser “adotada” pelo paciente. com elas trabalhavam. Sugeri ainda paciente. e que se ele não molhasse a fralda durante Thilman­‑Oygen (2000) observa que. Logo me pareceu uma boa triptilina e o resultado manteve­‑se estável.168 Luiz Carlos Osorio. insisti e valendo­‑me de minha autoridade uma vez que percebi que a necessidade de como sua médica disse­‑lhe que não tinha eliminar o “sintoma” era principalmente da dúvidas de que isso seria o melhor para ele equipe de trabalho. uma vez que evitaria mais xixi na cama. problema deve estar no paciente. pois seus atenção especial. era tornar se isso como uma humilhação e que tivessem o objetivo da consulta (“fazer José parar de cautela para não expor José a ser ridiculari- fazer xixi na cama”) em uma demanda do zado por seus companheiros. uma vez que não precisaria dor. ideia. desde que Jandira computador. à consulta praticamente à força. gosta de que a motivou a retirá­‑la do curso que vinha fazer concertos elétricos. é que (Watzlavick. se: “Ela me tirou do curso que eu adorava e Marina: Isto porque você não estuda‑ agora não vou estudar mais”. Na tentativa de alterar o tom da comu‑ nicação perguntei: Terapeuta: Quais as qualidades da filha que Caso 2 – Violência doméstica: admira? mediando impasses A mãe ficou pensativa e Jandira é que na relação mãe­‑filha respondeu: Jandira: Com certeza ela não me admi‑ ra em nada. ficava depois me levou a intervir. os Jandira: E agora ficou pior. já ha‑ reram em virtude da forma como orientamos via utilizado metilfenidato (medicação indi‑ os cuidadores dessas crianças e em razão de cada para esse transtorno) sem a resposta conseguirmos transformar o incômodo que esperada. o curso de informática. teve dificuldades na escola. pois o ódio que se evi- da aula brincando na internet e denciava em ambos os olhares era estarre- não voltava para casa. Não sei mais o que mais exaltados. tuição que o acolhe. um curso de informática. Marina. para colocá­‑lo em um mãe e incidindo em uma atitude que des‑ lugar mais valorizado e respeitado na insti. qualificava tanto a filha como a si própria. não faz as provas e só tira zero. Como ambas concordaram. Como os ânimos estavam cada vez tem limites. já que se tornava Ao escutar a mãe falando. leva a filha Jandira. anos. Manual de terapia familiar – Volume II 169 que nossa preocupação é com seu bem­‑estar. Ela não cedor. rumou a televisão de casa. pois Jandira vai a escola obrigada. fui con- versar com Jandira: . Penso que os resultados obtidos ocor. faz isto tornou­‑se pior após a retirada da filha de com uma facilidade incrível. né? Agora as estudos ficaram de lado. Jandira le‑ inviável manter uma conversa com aquele vantava os ombros e dizia que pouco se clima. Estava cursando a 5a série e provavelmente iria ser reprovada Iniciou­‑se a partir de então um bate­ mais uma vez. só queria saber de A mãe informa que. 2001). importava. Observando a menina. 38 anos. buscando sua valorização como indivíduo. Jandira chegou na consulta com diagnóstico de transtorno de déficit de atenção. ‑boca em que cada uma desqualificava Narrou a mãe: a outra em franca “escalada simétrica” Marina: O problema. 13 A mãe ficou espantada com a resposta. A menina ia mal na mesmo antes de ingressar no escola e só queria saber de computador. com Jandira em particular. va mais. já ar‑ frequentando. Diz que a situação só piorou. disse que gostaria de falar fazer com ela. Bavin e Jackson. pois quan‑ do é contrariada quebra objetos em casa Marina: Ela é ótima em montar e des‑ e já tentou agredir a mãe. o que ela não obedecia. notei que esta olha‑ Jandira: E mesmo assim ela me tirou do va para a mãe com um olhar raivoso e dis‑ curso. sentindo­‑se impotente como tipado e pejorativo. tendo pôs­‑se pensativa e disse: como motivo sua agressividade. não faz Jandira observou: os temas. A mãe dizia que já não sabia o que a enurese noturna provocava na equipe em fazer e que não aguentava mais a agressivi‑ desejo do paciente de sair do papel estereo­ dade da filha. começou se interessar por computador. já tendo sido re‑ provada diversas vezes. pois não queria estudar mesmo. A menina sempre notas pioraram. Refere que isso montar computadores. doutora. da conversa. vai ver.. nada faço o que ela quer e assim fi‑ a tira do lugar. eu não tentei ainda.. às ve‑ me tirou o que eu mais gostava zes vou fazendo as coisas antes (mudou a fisionomia) e eu não mesmo de o professor ensinar. va um pouco antes. até já ganhei so tirar notas mais altas.. posso falar repetir de ano o resto da vida com sua mãe? só para ela ver como é que as Jandira: Pode. Eu quero tra‑ Eu nunca fui brilhante. (com sua tei de mexer com eletricidade. Adoro montar prir com sua parte da nossa e desmontar computador. Ela parece uma pedra. você se com‑ A forma como expressava sua decisão prometeria em melhorar suas não deixava dúvida de que era isto o que notas? Jandira iria fazer. daí ela Jandira: Acho que sou mesmo. Ela não Jandira: Eu já fiz de tudo e não conse‑ faz o que eu quero. O que eu mais e sempre ver as mesmas coisas. . teza de que não vai conseguir. Vou repetir o ano até Terapeuta: E se ela voltasse atrás e lhe ma‑ ela cansar. Terapeuta: Jandira. aí.. já tinha conseguido montar um Jandira: Se ela me colocar na aula de computador sozinha no curso e novo. mas eu tenho cer‑ coisas funcionam. mas me obrigar a sua vida. Achei o máximo. lhos e. mas pos‑ balhar com isso. acho muito chato ir à aula estudar não.170 Luiz Carlos Osorio. eu sempre gos‑ nem para você. Jandira: Mas é pior para ela. mas não vai rolar. eu combinação. algum dinheiro resolvendo al‑ Terapeuta: No curso de informática você é guns problemas para amigos brilhante. e eu não gui. eu ter a confiança de que vai cum‑ me apaixonei. gostava era do curso de infor‑ Jandira: Pode ser. introduzindo o tema de seu Jandira: Não vai dar certo. é claro. Procurei mudar o clima Jandira: Isso eu já tentei e é impossível. mas. eu prometo estudar mais. preciso que você me ga‑ com o que a sua mãe falou so‑ ranta que vai se esforçar para bre a facilidade com que você passar de ano. ano não é bom nem para ela e Jandira Gosto mesmo. interesse: Terapeuta: Posso tentar. seria possível negociar: se ela lhe matriculasse no curso de informática. para negociar com sua Terapeuta: Fiquei muito impressionada mãe. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Terapeuta: Bem.. camos quites.. Eu até estuda‑ Jandira: Isto ela não vai fazer. preciso a mexer com computador. Estou me “lixando” triculasse no curso novamente? para os estudos. Vou Terapeuta: Que bom. expressão de fazer pequenos consertos Terapeuta: Posso tentar? modificada): em televisão e outros apare‑ Jandira: Pode.. Então. mas agora Terapeuta: Podemos tentar. agora que eu comecei Terapeuta: Vamos conversar sério. Agora ela o que ela quer. vou fazer o que ela quer. pois repetir o lida com o computador.. eu gostaria de conversar com ela sobre isto. Ela me tirou. nossos. o que me diz disto Respondi com toda a cautela: tudo? Terapeuta: Acho que não vai ser legal para Jandira: Ela pode até me obrigar a ir você repetir o ano pelo resto da para a aula. não vou estudar mais. Terapeuta: E. tudo funcionava. Jandira. mas eu não vou fazer mática. você pode retirá­‑la do curso Jandira: E assim que terminar o curso já novamente? Fica sendo esta a posso trabalhar. compromete em melhorar as Jandira: Nada feito. estive conversando estudo. é só . De repente. Se não passar de Terapeuta: Vejo que Jandira está empolga‑ ano. vidade será o melhor para ela. quando ela muito bem. pois eu lhe conheço Marina: Não vai dar certo. e a tendência é só Marina: É isto! crescer. que é uma área Marina: É isso mesmo.. como é o caso de putador. mas con‑ to. Marina: Eu nunca tinha pensado nis‑ Terapeuta: Concordo com você. o compromisso da Jandira Marina. Jandira: Eu não falei? Que não ia dar certo? Terapeuta: Calma. suas notas teriam de ser ra‑ quer que a mãe lhe matricule e zoáveis o suficiente para passar você fica com o compromisso de ano. não é ser uma excelente profissional isto? em informática. Se ela não cumprir é fácil. Ela reinicia ra as notas que eu a matriculo as aulas de informática. certo? com computador e que seu ta‑ Jandira: Certo! lento para os estudos é bem Terapeuta: E você. então ela melho‑ em uma proposta. Se é isso versando com ela pensamos que ela quer. mas a vida não é em franca expansão. para manter o cur‑ mos um acordo: Jandira você so. sempre. E os ânimos se alteraram novamente. mas na vida a gen‑ já que você mesmo disse que te tem que tentar. Terapeuta: Bem. ela tem muita aptidão para esta atividade? Já vi pessoas que não Entramos na sala onde estava sua mãe. sua inteligên‑ melhorar as suas notas. as notas. caso ela cia está acima da média e ela só não cumpra com o combinado tem 13 anos. você sem‑ gue outra coisa. com o compromisso dela de Nesta atividade. quer que a menor. mas em trabalhar nesta ela quer. ela vai ter que se es‑ área. vamos ver se consegui‑ seria este.. ela pode ta com muita facilidade. mas se novamente. de repente esta será a Terapeuta: Ficaria muito ruim para você profissão de Jandira que já de‑ matricular Jandira no curso. não é isto? necessária. Ela monta e desmon‑ Jandira. Será que cortar esta ati‑ forçar para se manter no curso. nada faz com que ela enxer‑ Marina: Nada feito mesmo. mas que se desenvolve‑ com a Jandira e me pareceu ram bem em outras áreas onde que ela realmente tem muito tinham uma inteligência acima talento para lidar com com‑ da média. Confirma Jandira? matricula e depois eu melhoro Jandira: Confirmo. estudo. Manual de terapia familiar – Volume II 171 Terapeuta: Até pode ser. só computador. primeiro você me suas notas. Você promete e se gruda em um computador. muito menos o pre quer mandar em tudo. depois não cumpre. e. combinação. Trabalhar com compu‑ Jandira melhore suas notas na tação é profissão cada vez mais escola. vamos pensar juntas. monstra suas potencialidades. Está bem então. Você me disse que ela de se dedicar mais para os es‑ tem muito talento em trabalhar tudos. Se é isso que mática. Jandira para com o curso da não só com o curso de infor‑ de informática. Marina. tinham muitas aptidões para o Terapeuta: Marina. e sim por “birra”. Joyce. foi conotado positivamente o talento de Jandira. Os donos do cur‑ de pânico ou uma so querem que eu faça estágio dificuldade social lá assim que eu completar 14 anos. Saindo do impasse. de 33 Marina: Quero lhe agradecer pela dica. mãe e filha puderam vislumbrar um novo horizonte no desenvolvimento desta. to e falta de ar. Eu rar o tempo perdido. ambas aventaram a hi- pensado que Jandira queria o pótese de que Jandira cursasse a Educação curso por que queria se profis‑ de Jovens e Adultos. sário que ambas as partes se coloquem em Marina: Está bem. anos. A gente faz coisas pensando tinha imaginado que a filha alcançaria tão que está certo e muitas vezes somente com seu desenvolvimento escolar. para elas. procuraria caso precisasse. computadores. acho que vai dar para ou desqualificados por não se enquadrarem ela passar de ano. disse que não pre. é neces- Jandira: Desta forma eu concordo. O inves- timento nesse talento possibilitou um refor- Um mês depois.. foi levada para a emergência do hospital cedo. O que acha meses depois) não apareceu. nem ir à escola com medo de ter outro . Edirene relatou que a filha teve um Terapeuta: Bem. não relatou que a filha esteve no Posto de Saúde está mais tão agressiva e tem da Família (PSF) de sua localidade e teve se dedicado bastante aos estu‑ como diagnóstico síndrome de pânico com dos. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Recebi no consultório Edirene.. este é seu talento e é tipo de sufocamento. foi encaminhada à mo é de ficar mexendo nos psiquiatra. Eu nunca tinha Na segunda sessão. E eu vou ganhar dinheiro para isso. Tenho observado que a matriculei afinal em dois cur‑ crianças com déficit de atenção ficam muitas sos de informática que ela que‑ vezes sofrendo anos em uma escola regular. Jandira? Para que exista a mediação. Ambas as vê­‑las de novo e saber como partes devem ceder com a possibilidade de está indo a combinação de alcançar um outro lugar que seja benéfico vocês. mas o que ela gosta mes‑ agorafobia e. Como não conseguia respirar direi- do que se quer fazer assim tão to. não querendo mais sair de cisava de uma terceira entrevista e que me casa. ria e suas notas melhoraram tendo muitas vezes seus talentos abafados bastante. Jandira! (digo ao final para valorizá­‑la). com sua filha Joyce. No caso relatado. Parabéns. A mãe a Jandira é outra pessoa. Até agora (seis tirá­‑la novamente. teve outro ataque de pânico. faz tudo errado. com vistas a recupe- sionalizar. Jandira: Lógico que vai dar: eu tirei al‑ guns 6 e dois 7 e nunca tinha ti‑ rado essas notas antes (diz isso com orgulho) e estou adorando Caso 3 – Transtorno meus cursos. novamente com muita dor no pei- A mãe agradeceu. por isto. ço na relação mãe­‑filha. de 9 anos. Lá deram uma medicação para ela dor- mir (não sabe o que foi) e voltou para casa. acompanhada de dor ótimo quando se tem noção no peito. talvez até com maiores perspectivas do que a mãe Marina: Fiquei pensando no que me dis‑ se. no sistema educacional vigente.172 Luiz Carlos Osorio. outro lugar e que visualizem outra possibi- Terapeuta: Então daqui a um mês quero lidade não experimentada ainda. três dias depois. local. um quadro clínico bem Olhei mais atentamente aos seus den- definido. de multidões e de Terapeuta: Se você tivesse uma varinha mágica. o que você mudaria na locais públicos. frequentemente um medo secundá.0 – AGORAFOBIA Grupo relativamente bem definido de fo- bias relativas ao medo de deixar seu do- micílio. tica e o que ganhava com isso era essencial queria fazer tratamento ortodôntico. que real­mente. muito vaidosa e se incomodava. me olhando com curiosidade. . A A característica essencial deste trans. diazepínico com início de ação rápida. os sintomas incomodava. Perguntei­‑lhe: F40. o qual serve va sem maiores problemas. o que parecia mente inibidores seletivos de recaptação de ser um sinal de ansiedade.­ mas de fato são imprevisíveis. ção ou em circunstâncias determinadas. pela probabilidade de ter ou- ocorrência brutal de palpitação e dores tro ataque de “falta de ar” e “dor no peito”. sulta toda mordendo os lábios. o que acarreta.­Não dei. de parâmetro diagnóstico para os médicos. Joyce chegara à consulta com um diagnóstico correto. Ela disse que não e fui com a de Joyce correspondiam ao transtorno de menina para outra sala. Então disse que gostaria de falar com a menina em particular e perguntei se ela se Como se pode observar. Observei a menina. Existe. A presença de Joyce: Mudaria meus dentes. de perder o autocontrole Joyce. caso a ansiedade seja ma de esconder sua malformação dentária. prar “nada”. mas (ansiedade paroxística episódica) baixando os olhos quando a encarava. pois ficar em ‑10: casa com medo de sair devia ser muito dolo- roso para ela. segundo Joyce. pois. va outro problema. a mãe tentava responder pela meni- ou de ficar louco. exigente e brigona e não se conformava pelo nalização ou desrealização). A menina me olhava de vez em quando. com difi­culdades Edirene relatou que sua filha revoltava­ financeiras. ‑se muito com a situação financeira familiar. deve­‑se utilizar um benzo- xava a mãe afastar­‑se dela. na­cional de Doenças): nunca podiam dar o que ela queria. muito intensa. referindo que tinha muito medo sos. a vi encolhida na F41. pois a famí- Segundo a CID­‑10 (Classificação Inter­ lia tinha poucos recursos e. Ela me acompanha- pânico classificado na CID­‑10. torácicas. mãe dizia que estavam fazendo um grande torno são os ataques recorrentes de uma sacrifício para aumentar uma peça na casa e. era para dar conta do orçamento doméstico. na. eu que‑ um transtorno de pânico é frequente no ria ter os dentes iguais aos de curso dos episódios atuais ou anteriores todo o mundo. Disse para Joyce que imaginava o Quanto à agorafobia. ônibus ou avião. os sintomas essenciais comportam a de sair de casa. além fato de serem pobres e não poderem com- disso.0 TRANSTORNO DO PÂNICO cadeira. ansiedade grave (ataques de pânico). confirmando o quadro sintomatológico descri­ Como em outros transtornos ansio. to pela mãe. pois achava que ia morrer. mas era uma for- serotonina – ISRS). sensações de asfixia. de agorafobia. medo de lojas. e. Sempre que tentava falar com rio de morrer. cujo tratamento indicado seria a tes e me dei conta de que ela passou a con- utilização de antidepressivos (preferencial. Manual de terapia familiar – Volume II 173 ataque. refere a mesma CID­ quanto ela estava sofrendo. a mãe trabalhava como domés. ou medo de viajar sozinho sua vida? em trem. tonturas A mãe dizia que a menina era muito e sentimentos de irrealidade (desperso. nada tinha sobrado para vestuá- não ocorrem exclusivamente numa situa­ rio ou outras coisas que a menina queria. que já haviam marcado a consulta no den- Edirene: Sim... mas eu mam de “dentinho”. você coloca o Terapeuta: Se você tivesse o dinheiro. pois temos contas para vez. tir a falta de ar. saindo sozinha. Todos debocham de rios dentistas. então. Todos me cha‑ mar os dentes de Joyce.. Terapeuta: Estive falando com a Joyce e Um mês depois. Brinquei que usar o remédio no bol- so era melhor do que tomá­‑lo. eu dou um encaminhamento para Terapeuta: É. Como? Quero que marque a consulta Terapeuta: Vamos conversar com a sua no dentista e volte aqui após mãe e vamos resolver o pro‑ um mês para me contar o que blema dos seus dentes. constatamos que o seu maior desejo é colocar um aparelho Chegou Joyce com Edirene contando nos dentes. Joyce. Terapeuta: Calma. que estava indo à aula. Eu pensei na fa‑ te deformidade anatômica. o comprimido embaixo da língua que faria em primeiro lugar? (pois a absorção sublingual é Joyce: Botaria um aparelho nos dentes. tendo como ganho secundário a evitação de Edirene: E quanto ao pânico de Joyce? situações de bullying que tanto atormenta Terapeuta: Bem. Isto chegar lá). Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. pois se precisar Joyce (com os olhinhos brilhando): Mesmo? ele está ali e isso a tranquiliza. Comento: culdade de odontologia. vamos fazer o seguinte. a senhora nem ima‑ guir? Meu maior desejo é arru‑ gina quanto.. protusos. não via como. pre no bolso. Lá eles fazem tratamento gratuito. pois ele dava . mas eu gastaria o mim. Terapeuta: Viu. havendo portanto uma importan. Vou lhe dar um remedinho (al‑ prazolan) numa dosagem bem Joyce: Tudo que eu peço para minha baixinha (dirigindo­‑me à Joyce). sem dinheiro não “Mônica”. Antes disso nem ela tinha um dentinho de leite entre os dois pensar. lhe incomoda muito. Contaram que que esperar no mínimo um Joyce utilizou o tranquilizante uma só uma ano. tenho pavor de ir dá para fazer nada. diz que Quando você começar a sen‑ não tem dinheiro. que o transtorno de seu e da sua mãe também (as pânico talvez seja uma forma de se defender duas se abraçam). Levei em vá‑ para aula. doutora. onde estava a mãe. Vou com a Joyce até a sala de espera. Pedi para olhar os seus dentes (o que ela permitiu sem maiores dificuldades) e vi que rar dez meses. mas ela vai ter tista para a semana seguinte. É um saco. mãe ela diz que não dá.174 Luiz Carlos Osorio. mais rápida) e ele vai tranqui‑ Terapeuta: Eu acho que posso te ajudar lizá-la. Tem que levar ele sem‑ nisto. este é um desejo Ocorre­‑me. vejo que os seus dentes es‑ vocês (explico o local e como tão um pouco tortinhos. Joyce. “dentuça”. aconteceu. pagar. crianças em idade escolar. que não tinha para gastar. Joyce: Eu não disse que não ia dar? dentes incisivos. o que fazia que estes den- (olhando com fúria para a mãe) tes ficassem oblíquos em relação à arcada e Nunca dá nada para mim. não é? Edirene (com os olhos cheios de lágrimas): Joyce (com os olhos marejados de lá­grimas): Doutora será que vamos conse‑ Doutora. Fizemos uma dívida para o aumento da casa que vai du‑ mas que não deixava de levar o remédio. chegou ao consultó- nem mesmo a carregava no bolso. não tinha amigos e quiátrico. Mostrava com posa. João. Não tinha usado mais medicação. Dois meses depois. sorriso prateado. pensei que tinha a que queria notícias após seis meses. após a morte da esposa) Chegou com um sorriso. pois. ficou com dois filhos­ lada de depressiva sem que seu sofrimento ‑problema. e ele res- mento com uso de antidepressivos. pois. Devemos ter isso presente sempre que nos encontrarmos com nossos pacientes. sentia­‑se sem forças. nem sempre temos como desejáveis. 57 anos. Perguntei e sempre nos indagar sobre o que não está se ele nunca pensou em se casar de novo sendo dito ou visto. tava “encostado” (beneficiário do INSS) Disse que ficara feliz com seu novo desde então. Observei que só a perspectiva do resolver com tanta facilidade os problemas tratamento já havia provocado o esbatimen. que nos chegam. não aceitaria outra pessoa dentro de casa e . conseguia esquecê­‑la. pois. com Seis meses depois elas me ligaram in. Nosso papel é ampliar e ele disse que nunca ia gostar de alguém os horizontes e as possibilidades que estão como gostava de sua esposa e que a filha em nossa frente para auxiliar os pacientes. após um mês. mas estaríamos anos que quase não saía de casa. não con- aprisionando Joyce em um diagnóstico psi. Infelizmente. Combinei que elas pode. como dizia Saint seu problema teria uma solução em pouco Exupéry (1994): “ O essencial é invisível pa­ tempo. Manual de terapia familiar – Volume II 175 tranqui­lidade e não tinha outros efeitos in. Só tinha vontade de ficar deitado. uma vez que sabia que gente e sistêmica. minha idade e parecia ter bem mais. mostrando as no- vidades. Pedi que retornassem novamente. se ainda mais discriminada. Os sentido metafórico de escutar o coração ou ombros encurvados acentuavam uma postu- os sentimentos que estão por trás dos sin. além de viúvo. Disse que a filha excep- além daquilo que é mostrado ou informado cionalmente vai à igreja também. (luto de sete anos te e já estava com um aparelho provisório. desde a morte da es- que não precisava mais dela. riam marcar consultas caso precisassem e Observei João. podendo fazer com que se sentis. Referiu que era extremamente maior fosse atendido. quero salientar o serotonina (ISNS) e tricíclicos. religioso. Caso iniciasse o trata. mas é nosso dever tentar to dos sintomas de Joyce. mantinha­‑se deprimido.. orgulho o sorriso que tanto desejava atrás Referiu desânimo. além de Pensei que sua vida não devia ser fácil. Ela riu. sua aparência envelhecida e mal cuidada. há sete anos. pois não conseguia trabalhar. que já conseguia olhar as famílias de uma forma mais abran- enfrentar os colegas. ser a “dentucinha”. só falava o essencial. Perguntei como era seu dia. tomas apresentados. formando que estavam bem e que não havia Estava tomando dois tipos de antidepressi- necessidade de nova consulta. versava com ninguém. ra francamente depressiva. vos: inibidores seletivos de recaptação de Ao relatar este caso. es- do fio metálico do aparelho. dizendo rio informando que. além de um quanto devemos “auscultar” o paciente. ia à igreja regularmente rezar pela Quero enfatizar quanto devemos olhar alma de sua esposa. ainda poderia ser rotu. estaria pondeu que tinha um filho deficiente de 30 realizando uma conduta adequada e basea­ anos que levava na Apae e outra filha de 32 da em extensa literatura. ra os olhos”. Disse que nita e ficando mocinha sem o dentinho de a esposa foi o grande amor de sua vida e não criança. no benzodiazepínico para induzi­‑lo ao sono.. Caso 4 – Depressão Joyce já havia retirado o dente de lei. e que ela estava muito bo. notei que ficou conversando animada. P. mas que a missão dele dosagem foi gradativamente reduzida e de- não havia terminado. por empatia a trouxesse na próxima sessão. um tanto enver. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. mulher de sua vida. me dizer. com medo de enfrentar outra mulher. Isso demonstrou que estava motiva- por gostar dela mesmo. D. 2. A cirurgia foi marcada. los seus desejos. para ele o que já está presente em seu ínti- Quando retornou para a sessão seguin. BOWLBY.. 1994. Horizonte: Artesã. e ele a ajudava nas Disse que gostaria de falar com sua fi. Tinha sido a única do a revitalizar sua vida sexual. 2000. te. se ia na. e não de sua filha. gia primeiro. J. mas que como não levou. mo e autorizá­‑lo a se perceber e a lutar pe- te. 2001. Referiu estar mais animado e que tomou SAINT-EXUPÉRY. que resolveu fazer uma cirurgia THILMAN -UYGEN. e provavelmente informando que estava namorando. CID-10: João disse que conversou com sua fi. mas que estava observei que ele tinha uma boa relação e determinado a resolvê-lo através de uma ci- a cuidou com dedicação sentindo sua falta rurgia. JACKSON. mas vou que gostava mais da esposa. assim sidade e disse que a missão de sua esposa como a utilização de benzodiazepínico. D. Após um ano. Deus devia querer que ele sua companheira era muito boa e estava se mantivesse vivo e cuidando de seus ou. gonhado. O pequeno príncipe. Ao chegar no consultório. um problema físico em seu pênis e que de- pa e para entender como era sua relação e veria lhe causar vergonha. mas. tinha um mercadinho. pois tinha o objetivo de entender se havia alguma cul. BAVIN. Fomos diminuindo a dose uma linguagem compatível com sua religio. mulher já sabia do problema. Janeiro: Agir. pois ter ou não outra pessoa seria uma pessoa. classificação de transtornos mentais e de compor- lha e ela concordou que ele pudesse namo. ed. Belo e era sobre isso que falava com o atenden. São Paulo: Mar- se que ele tinha algo muito importante para tins Fontes. João volta à consulta­ rido junto com a esposa. 1990. decisão sua. compras e no balcão. vivo.  Apego e perda.176 Luiz Carlos Osorio. H. Disse que ela morreu de câncer cedo uma autorização médica para retomar sua demais. Referências te da que vestia na primeira sessão (cinza). ajudando com seus filhos. Achou Deus não tinha escolhido isto para ele. Ob­ser­ Deus quisesse. Referiu sentir­‑se outra lha. pois ele continuava pois administrada em dias alternados. ainda que parecendo que tinha mor. vida e que seu luto também tinha por trás o Perguntei como foi a sua morte. A. de antidepressivos até extingui­‑los. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. rar. . Observei que João estava vestindo uma camisa laranja bem diferen. que seria muito complicado arrumar outra Percebi que o paciente precisou de esposa. pois sua WATZLAWICK. Rio de uma decisão. dos padrões. Os recursos da fratria. Se melhor cada um morar em sua casa. de.. Pragmática da comunicação humana: um estudo morar outra. cuja acabou 7 anos atrás. J. era melhor que fizesse a cirur. teria levado ele também. Sua companheira tros filhos. e sugeri que A função do terapeuta é. São Paulo: Cultrix. E. João queria operar uma fimose. procurando me utilizar de muito satisfeito. traduzir não alterar sua medicação. patologias e paradoxos da interação. Porto Alegre: Artmed. 1993. mente com o atendente que o encaminhou ao consultório. Optei por com os sentimentos do paciente. tamento da CID-10. Contou­‑me. e João ficou Conversei. o atendente dis. ou com mento das pessoas. que consiste na garantia do acesso. um enfermeiro.450 à porta de entrada de um sistema de saú- pessoas). próximo ao cenário onde a efetivos e equitativos. Atenção Primária à Saúde (APS). portanto. é reconhecida a in- nal ou sintoma. a nitários de saúde. famílias e comunidades com uma comple- dos. procurando ção e cura) e longitudinalidade (cuidado quantificar a gravidade dos problemas e for- contínuo através do tempo). baseado na integralidade (preven. diminui internações hospitalares é um modelo de organização dos serviços de por causas evitáveis em adultos e crianças. diagnosticado ou não (nes. pela família e a terapia familiar idade ou pelo gênero. jovem solteiro. residentes em um território rural de. A APS de instável e cheia de conflitos. filhos adolescentes. Podem compor ainda o estimulando o autocuidado e coordenan- odontólogo e respectivo auxiliar. um médico de fa. com um si. um auxiliar de de saúde. Eles são responsáveis pela menor custo. ou urbano. peculiar diminui consultas não urgentes a emergên- ao Sistema Único de Saúde brasileiro (SUS). ninho vazio . capítulo 15 Contribuições da terapia familiar ao programa de saúde da família Fabrício Casanova O programa de saúde da social). aliado à orientação familiar e co- O Programa de Saúde da Família (PSF) munitária. o exercício de estar ca de 800 famílias (aproximadamente 3. xa rede de serviços. com limites geográficos defini. com melho- enfermagem e quatro a seis agentes comu. atenção integral e contínua à saúde de cer. cias. talidade infantil. de ser o primeiro contato de indivíduos. Para tanto. É direcionado talecer o vínculo. reduz o baixo peso ao nascer e a mor- baseado em equipes multiprofissionais com. res indicadores de saúde populacionais. reduz a mortalidade por postas por. pelo sistema orgânico afetado. promovendo a saúde. Priorizando com qualidade a promoção. (pronto­‑socorro e especialista focal) e terciá­ de com forte referencial em APS são mais ria (hospital). dispensando cuidados a prevenção. casal. no mínimo. escuta qualificada e continente. melhora a autopercepção generalista. Os conflitos no decorrer um problema de saúde não limitado pela de seus ciclos. cura e reabilitação. com contato. do o acionamento das atenções secundária Estudos mostram que sistemas de saú. pre- têm potencialidade de resolver até 90% dos venindo os agravos. pode ser definida como o cuidado dispensa. O cuidado praticado na APS. é de fundamental importância o acolhimen- do por profissionais. problemas de saúde. mais satisfatórios para população vive o cotidiano de uma socieda- a população e têm menores custos. fluência familiar nos mecanismos de adoeci- te caso. filho sua origem (biológica. aumenta a satisfação. A APS é. comportamental ou pequeno. a pessoas saudáveis ou doentes. a partir de um primeiro to. Há muito tempo. doenças cerebrovasculares e a mortalidade mília e comunidade (MFC) ou um médico geral em adultos. o paciente indiferenciado). as equipes uma grande variação de enfermidades. de auxiliar a encontrar uma cura. organizam duas capacidades: de estabilida- meras queixas. anos. fo- Porto Alegre. na maio- consequentemente. e crises imprevistas. levemente arquea­ Também é um tipo especial de sistema. cuja diferenciados. ampliação das possi­ ria das vezes. sem quaisquer alterações ao te contínuo. Em princípio. A família abordar a família é o “meio de cultura” no qual cada pessoa é nutrida e diferencia­‑se. Havia algumas queixas até aberran. quem abordagem familiar. com forte relação familiar e função principal talvez esteja na expressão ambiental. assistiu­‑se um paciente de 65 menta e limita a cada um. personalidade. um senhor grisalho. suas vidas. Um dos gran. pacientes sabe o quão frequente são os que blemas dos mais diversos. moldam seus membros Como se pode imaginar. Sem a ferramenta da compreender. muitos ainda in. Simultaneamente. entanto. de características não sintoma. Em resumo. de cuidar e. como uma sensação de desconforto mal mente por ser um sistema. E exata- tes. cefaleia. No entanto. insônia de e de mudança. apresentam queixas psicossomáticas.178 Luiz Carlos Osorio. parte de A necessidade de uma família. No rapia familiar na APS provavelmente não al. e cuja influência Casos reais com frequência falam mais emocional atinge profunda e inexoravel- do que justificativas teóricas. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. sulta. trada” (gate keeper) do sistema. para melhor compreensão e. esses pacien- e influenciam substancialmente o proces. Investigar exaustiva e persisten- frimento. mentalmente padrões de repetição. patológico. muitas ve- da abordagem familiar algumas das pedras zes relacionadas ao funcionamento familiar fundamentais na fortaleza de auxílio ao so. te o orgânico do psicossomático. modo de vida. ambiente físico e relações humanas intra e incapacidade de individuação e culpabi- extrafamiliares. dá condições de mudança. três filhos adultos de e doença. Chamavam atenção suas inú. Como o sem nenhuma delas. de aliviar. Certa vez. pois estão juntos com frequência. o médico muito disfuncional. lização de pai e mãe pela infelicidade de Exatamente por ser a “porta de en. no mente a cada um por toda a vida. formar sín. cuidado em atenção primária é teoricamen- drome clínica. em quaisquer fases de seu ciclo vital. podemos nos relacionar a ela exame físico ou de laboratório. em vários graus. com queixas muito semelhantes às do pai. “não se sabe por onde começar”. é muito Quem acompanha o atendimento a frequente o contato com sintomas e pro. pois literalmente so de saúde e adoecimento. com do pela cifose senil. falante. ao mesmo tempo que paralisa uma usuais. a contribuição da te­ sabe. apresenta funda- definido na língua e nos canais auditivos. Havia não separar a doença da pessoa nem esta hostilidade entre seus membros. família. tes causam ansiedade. . Esse meio serviço de Residência em Medicina de Família nutre. assim como não deixar de no funcionamento familiar e frustração ge- reconhecer as relações estreitas entre saú. Não abordar do paciente. ain. fazendo da terapia de família e das dificuldades mal resolvidas. convém não separar arbitrariamen- cançaria os resultados vistos anteriormente. e o que se observou foi uma família des pa­radigmas desse médico. dentre elas. De forma paradoxal. Os fami- somente os MFCs recebem treinamento es. no entanto. O homem é parte indivíduo. liares então foram convidados para a con- pecífico para atuar em APS. um e dores pelo corpo. é o de flitos não resolvidos entre o casal. rigidez de seu ambiente. limita muito a capacidade de bilidades terapêuticas. com inúmeros con- especia­lista em atenção primária. temente não ajuda o paciente e onera o sis- da hoje é infrequente a abordagem à família tema de forma desnecessária. neralizada. mas também guarda certas vezes e Comunidade. parte de um coletivo. na prática geral. no Hospital Conceição de substâncias tóxicas. a família neste e em outros casos. sorriso fácil e estrutura e padrões de funcionamento que humor lábil. familiar de forma especial. essa habilidade é uma questão. também e habilidade para catalisar a mudança no podem trabalhar com o contexto familiar. opções de tratamento e geralmente limitados pelos relacionamen- aconselhamentos. e o médico ajuda a família der a vários integrantes da mesma família a dar atendimento à pessoa. Requer conhe. não é prerrogativa única dos MFCs. duais. a terapia é direcionada para “pensar em termos de família” de modo pró- o sistema. enquanto ajuda a famí- cimentos sobre desenvolvimento familiar. capacidade MFC. ção urinária da mãe. precisa tratar também da infec- reação familiar aos estresses. lidar com suas dificuldades. sendo mais difícil es- forma como seus próprios sentimentos afe. Cabe ressaltar que os TFs que come- borativa. de treinamento. apesar de o paciente é um “sintoma” de disfunção fa. sobretudo. começando como observadores mais neutros e distanciados. profissionais. Este “histórico” de a pistas sutis por meio das quais se expres. lia a mudar. esposa. um médico de outra especialidade poder miliar e. cada um assistindo de família. recompor. reescrever a definição as famílias conforme suas peculiaridades. interesses de um indivíduo. os lhe dá a vantagem de conhecer o contexto níveis podem sobrepor-se. Estar atento da depressão do marido. da asma do filho ou zofrenia. provavelmente não o terapia familiar. Grau 2: Engajar a família. Essa forma de compreensão da família Grau 5: Terapia familiar propriamente dita. çam a trabalhar com uma família não estão cobertas médicas. Escutar atentamente a tos anteriores com seus integrantes indivi- perguntas e preocupações. que a família tem do problema e encorajar Frequentemente existem desapontamentos os familiares a considerar novas formas de pelo não entendimento dessas diferenças. o contexto no qual o MFC jar intervenções. então. variados sentimentos. Entretanto. ximo a um MFC. precisa­‑se atender outro compromisso exceto a condução da aos sentimentos familiares. relação pode levar o MFC a ser objeto de sam as necessidades emocionais. Outros Cuidar de famílias disfuncionais – terapeu. Manual de terapia familiar – Volume II 179 Com que profundidade Diferenças entre o terapeuta abordar? de família e o médico de família e comunidade Grau 1: Ênfase mínima. em especial aqueles que pres- ta de família (TF). deficiência física. na troca de informações e des. de forma cola. Já o MFC. te não tem mais nenhuma responsabilida- de em relação à família. Em resumo. comunicação a se expressarem. se vai de encontro aos No entanto. bem dos clínicos não podem ser transferidos. Um profissional dades da família podem prevalecer. etc. tam o relacionamento tanto com o paciente Findada a terapia. convocar e coordenar reunião relação ao de um TF. como o “aliado” pela sário também um bom autoconhecimento. que não a tem em um fim determina- de conduzir avaliação sistemática e plane- do. Nos níveis intermediários. capar de mecanismos transferenciais. “o inimigo” pelo esposo. sem modificação. Adicionalmente. . Requer conhecer sistemas trabalha guarda diferenças importantes em familiares. como esqui. terapia. de como encorajar os que têm dificuldades de um contexto para outro. funcionamento. que. diferentemente do Grau 4: Abordagem sistêmica. o TF provavelmen- como com seus familiares. É neces. não tendo nenhum Grau 3: Além do grau 2. “um pai au- para que o profissional tenha consciência da toritário” pelos filhos. Deve­‑se que não aprendeu a pensar em termos de ater para a diferença dos níveis 3 e 4 para a família na formação. o fato de este último aten- ciente é o foco. Tentar con- Constitui­‑se em um exemplo de que méto- vencer os mais resistentes a participar. Requer entendimento tam assistência por longos períodos. então as necessi. o pa. já que existe a ideia de que fará na prática. Tirando certa reticência. O marido veio em consulta porque es‑ tava preocupado com o comportamento da esposa. ficou claro que tinha hiperêmese levar o médico a enfrentar questões éticas gravídica. em razão de verem a realidade de formas variadas. pode co tempo. voltando para sua dez ectópica. ter ainda mais cuidado quando o relato en- mas nenhum deles associou seu problema à volve outros em doenças com grande risco situação familiar. o casal se separou. essa foi a primeira hipótese cidade e lá tendo o bebê. como quando os interesses de diferen- tamento parecia normal. Certo dia. Indagou se estaria tendo o mesmo efei‑ Caso 2 to nela. Um dos perigos mais comuns marido e do pai tomaram um novo sentido para o MFC é aceitar sem confirmação a ver- no contexto da crise familiar. Em pou‑ ser direcionada para ela. matite complicada e parecia ansiosa e tensa. e sempre causou no MFC um sentimento vago de ameaça e desconfor‑ to. No entanto. a atenção pode pois estava acamada. o homem confessou que a esposa o exigindo tanto conscientização moral quanto conhecimento dos perigos envolvidos. Os problemas de saúde do de iatrogenia. e ficou claro que essa jovem estava passan‑ do por uma grave crise conjugal. De acordo Ter mais opções de manejo disponíveis com a descrição. e seu al de todos os integrantes da família. foi aventada a possibilida‑ é a segunda vantagem de atender toda a fa- de de esquizofrenia e sugerida consulta com mília. com quem dividia a casa. O período de observação no ma evidência de instabilidade mental. com vômitos. mesma semana. Logo depois do casamento. tanto que. Pouco tempo de‑ que o problema com um bebê que chora é a pois. tida por meio do conhecimento pessoal do A irmã. que era de outra cidade. Explicado a ambos o problema e seu manejo. idealizada por cada um de seus integrantes. o compor‑ cina. é fre. visita. também médico sobre seus outros componentes. algo se precipitou e rior. Caso 3 A situação da família. ex‑ Caso 1 plicar porque havia partido. Deve pai consultou por causa de sua depressão. consultava. A resposta para a pergunta “como você se dá com sua irmã?” foi uma explosão de sentimentos. que não compareceu. Se. . hospital foi suficiente para excluir tal diag‑ nóstico. na são de um integrante familiar. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. As dores continuaram.180 Luiz Carlos Osorio. por exemplo. Durante a O médico pode ser capaz de elaborar mesma semana. o médico identificou ela. seu marido veio consultar hipóteses com base no conhecimento pesso- com dores musculares intercostais. Uma senhora idosa tinha uma neuroder‑ quentemente muito diferente daquela ob. Exemplos de situações familiares havia deixado e voltado para sua cidade de origem. já quando a gravidez estava adiantada. entretanto. o médico foi chamado em sua casa. Pouco depois da tes integrantes da família estão em conflito. Pouco veio consultar com dores no abdome infe‑ tempo depois da visita. a mulher veio em consul‑ ta. exaustão e depressão da mãe. foi combinado o acompanha‑ que não ocorrem em outras áreas da medi- mento. Como havia apresentado uma gravi‑ a mulher decidiu deixá­‑lo. tinha desenvolvido uma profun‑ da antipatia pelo comportamento do marido Uma jovem mulher casada e sem filhos nas coisas que se relacionavam a ela. Não havia nenhu‑ diagnóstica. tomando o cuidado para não e taxas de problemas de saúde na família. Quando presente no pré­‑natal. bem como de perdoar tipos poderão ser encontrados em qualquer ou aceitar eventuais erros paternos ocorri- serviço de saúde. relataram indivíduo deve perceber novas possibilida- a iminência da separação. cólicas e dificuldades com a amamen‑ de desenvolvimento pode levar à felicidade e tação. Ao mostrar interes‑ assume uma tarefa de desenvolvimento. no entanto. porém de manter pertencimento à o que abordar? família. O esposo esteve sempre afetivo e ao sucesso com tarefas posteriores. deram pistas de que tinham esperanças de desenvolvimento. ex. de busca de autonomia emocional e fi- e problemas comuns: nanceira. Na consulta seguin‑ coincidirem. formar novos principalmente ao fato de morarem na casa conceitos a respeito de si. Deve­‑se abordar planejamento fami- veis. casais de homens e curta ou inexistente em classes populares. A partir disso. A adaptação às tarefas das. uma gravidez. continuar assim. como dermatite de fral‑ mente toda a família. Existe uma relação signifi- ples abertura para a ventilação de angústias cativa entre estabilidade emocional dos pais pode ser útil. viúvas ou irmãs solteiras. cujas interferên‑ te com demandas conflitantes. Aquelas com baixas taxas tendem a sultas repetitivas. viúvos idosos com empregados da casa liar. o se sobre “como estava o casal”. Manual de terapia familiar – Volume II 181 Caso 4 O sistema familiar muda ao longo do tempo na medida em que seus integrantes crescem e envelhecem. que resultam em con. por exemplo. lhos já saíram. morte. e um grupo de pessoas íntimas que têm uma vice­‑versa. Uma fuga? De quê? (p. uma sim. essa fase é muito mãos e irmãs solteiros. mesmo que não os reconhe- vendo juntas. com altas taxas de morbidade mostram ten- lia”. a estrutura do desafios. como. nos casos de problemas repetitivos ou dência a permanecerem altas ao longo do mesmo diferentes. Qualquer mudança Um recém­‑nascido de um jovem casal (nascimento. Quanto mais se consegue Se a família pode ser definida como pertencer. lidar efetivamen- da avó materna do bebê. sexualidade. quando as ta- refas entram em conflito. Algumas famílias são mais vulneráveis a problemas de saúde do que outras. grau de desejo e consciên- que se tornaram parte da família. casamento. Aquelas Muito importante é pensar “em famí. casais cia sobre anticoncepção e consequências de homossexuais.) em começou a ser trazido com frequência por uma parte do sistema pode afetar profunda- queixas diversas. como o de tomar as rédeas da pró- grupo pode variar sem mudar sua função pria vida e de assumir a responsabilidade essencial. a mãe amamentava perfeitamente e sem que está aprendendo a viver quando os fi- preocupações com seu bebê. tempo. dos no passado. etc. Mesmo casais aparente- mente coesos podem passar por problemas importantes. e há o oposto. çam. de diferencia- Ciclo vital da família ção. ção para alcançar o próximo estágio de seu Ao verbalizarem suas angústias. que relacionavam des para seu comportamento. Adulto jovem independente A fase de adulto jovem independente é uma fase de individuação. Essa fase é marcada por muitos história e um futuro juntos. Individuação e pertencimento não são antagonismos. mais se consegue individuar­‑se.. como mulheres idosas vi. ir. ter motiva- cias abalavam a lealdade entre a mãe e o pai. . e grupos familiares de diferentes pelo próprio destino. Frequentemente. um casal te. Há a situação das tarefas renegociarem acordos. de mulheres vivendo relacionamentos está. tomar partido. pode apresentar aproximar emocionalmente. regras próprias de funcionamento. continuado ou fusão (negação das diferen- tos? E emocionalmente? Consequências aos ças em nome da estabilidade. proibido no Brasil. é ­permitindo discussão e que todos possam muitas vezes buscado em clínicas clandesti. com empatia Nascimento do primeiro filho e carinho. parceria nas responsabilidades diá­ rias e relacionamento afetivo e sexual. Pode ainda ser conflituada. solidifi. mesmo consequências). o pai o casal. agressões. relacionados a cada membro e/ou como apoio mútuo para desenvolvimento ao casal. cujo pais têm novas funções. costumam ser profundamente exigidos nas volvidos em alianças disfuncionais. com Portanto. uma gravidez atualmente não leva a jamais podem aparecer. dispa- construção de novas regras e “releituras” reunia. sem negar sua existência. O clima pode ser afe- ca “para sempre” um vínculo entre um ca. de dificuldades de diferenciação e indepen- ção de necessidades objetivas e subjetivas. pois podem ser expressão A função conjugal compreende satisfa. não se permite externar senti- mentos. dência. com sentimentos de sobrecarga. que é o ato de trocar sentimen. observando­‑se as competências in. elaboração de de de apoio. vaginite. dos com um bebê novinho e cheio de neces- A independência de cada um é facilita. Como seriam os gas. afeição e otimismo sal. em que carinho. formações. dependente de titui­‑se a família. a mudança é percebi- da como ameaça extrema. anticoncepção. significando a copaternidade de uma nova Há famílias em que raiva e conflito vida. Também é preci- nas. de uma díade. uma ligação parental forte. correndo o ris- relação de dominação­‑submissão. Em outras. so aprender a lidar com situações difíceis tas mulheres. Há conhecimento re. reavaliam­‑se acordos. O aborto. falar e buscar soluções. em que raiva. negam­‑se as mudanças do tempo. e descobrir novas formas de organização. Os confiança. O nascimento do primeiro filho cons­ tos e pensamentos privados. dono. colocando em risco e assassinando mui. amor é um casamento forçado. pessoal. ser hostil. encorajamento a falar. A re- lação do casal pode ser vital. Com isso. profundas trans- enfrentamento e agressões são frequentes. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. cíproco.). sinônimo de fraqueza. respectivas profissões e nos inúmeros cuida- tindo em seu desenvolvimento. Os pais com a possibilidade de os filhos estarem en. Deve­‑se considerar a abordagem fa- dos de suas famílias. culpa e nutenção de um relacionamento repleto falta de afeto estão presentes. ou desvitalizada. ou polido. sem interesse e intimidade. sidades. álcool. etc. evitar uma gravidez indesejada formalidade nos sentimentos. flexibilidade. que pode ou não continuar convivendo. miliar na presença de sintomas orgânicos. aban. adultos jovens independentes e diferencia. como infecções do trato urinário.182 Luiz Carlos Osorio. O poder é dividido igualmente entre te a gestação e a lactação. pode se sentir “por fora” e não conseguir se dividuais. bem do. ou deprimi- de problemas e fases mal resolvidas. tuoso. Nas famílias rígidas. por outro. em que a desesperança predomina. cefaleia. problemas com das regras entre os pais. necessida- renças. por um lado. próxima e de que passa a tríade (pai. mãe e filho). A mãe fica muito ligada ao bebê e da pelo reconhecimento e aceitação de dife. Ainda pode pode significar também a prevenção da ma. alcoolismo do pai). de atenção e de carinho duran- perdas. repercu. Casamento é o encontro entre dois perdas e situações de desequilíbrio. . são expostos abertamente. não sem suas projetos de vida? Se. conflito co de “ter um caso” com o trabalho. de fato. como de suas possíveis consequências para É preciso enfrentar os problemas com a criança e casal (separação precoce. Patologicamente. não se fala sobre Casamento dificuldade. atestar a sua normalidade. crian­ças passam a adolescentes. questões de saúde (depressão. caos) e recaem sobre filhos maiores. de substitutos. Há evidência de ligações en. outro lado. controle adversos. associada à do fatores individuais. Também há ligação entre o funciona- funcionamento inadequado da família e mento anormal da família (distanciamento. a velhice. As infecções intestinais se mos. Logo mais. Responsabilidades envolvimento inadequado. Se inevitável. Por isso. Há possí. fantasias. cujo desfecho depende de lher (muito prevalente. esfincteriano). por exemplo. Muitas doenças do adulto têm raízes Deve­‑se ainda antecipar possíveis di- na infância. pode haver resistência parental Deve­‑se: em aceitar a crescente autonomia dos filhos. doença mental. Superar dificuldades no início da vida 1. anos de vida. com sentimento de bem­‑estar choro contínuo. e é preciso estar paração. observar sintomas depressivos na mu- da personalidade. analisar a possibilidade de consultas evitar separações dos filhos sempre que pos. deve­‑se sono. e os avós. por exemplo. Filhos adolescentes histórico familiar de convulsões. (ainda no pré­‑natal). dade impressionante de superá­‑las. como regressão de vias aéreas inferiores a fatores familiares habilidades já conquistadas (fala. prevenir abuso do álcool no homem. drogadição). está associada a proble. há discre- pância no conhecimento que os pais têm da Filhos pequenos queixa de seu cônjuge. 3. Manual de terapia familiar – Volume II 183 cigarro ou outro relacionamento. negociar. à Os filhos tendem a ter mais problemas meia­‑idade. Veem­‑se jovens com ansiedade e . Balint: “o filho como sintoma de apresenta- mente com mais filhos. Já as convulsões não febris podem estar signifi- cativamente ligadas à baixa classe social. sível no estágio crucial entre 3 meses e 4 como dificuldade na amamentação. como relacionamento parceiro). De atento. superpopulação irmão) e dificuldades escolares. como suicídio. que possuem uma capaci. criar espaços para conversar. rigidez. baixo peso ao nascer. como em hospi. há o in­ orgânicas estão frequentemente relaciona- gresso na escola e suas dificuldades (de se. choro intenso. abaixo da média. A interpretação des- sas relações pode confirmar o conceito de As exigências aumentam exponencial. infecções. de negligência e violência e crônico. as mães têm forte inclina- ção a aceitar o papel de doente. bullying – ou violência escolar). da família. Infecções por estrep- cos de desnutrição (a amamentação prioriza tococos são relacionadas a estresse agudo o irmão menor). Em resumo. os pais são propensos a queixas inclusive para a criança. Aumentam ris. mas. conseguir uma boa substituta. manifestadas por somáticas. expressar dos. Há relação entre­ ção”. os pais. mãe pouco se envolve em redes sociais fora veis consequências de sofrimento psíquico. antecipar uma possível crise futura é com as crianças. e cuidados maternais inadequados. depressão e transtornos 4. das às questões familiares. distúrbios da infância. à aposentadoria e à de saúde quando os pais evitam conflitos. frequentes serem sintoma da crise. agressões aos pais e ao bebê tram firmemente relacionadas a condições (não deixar crianças menores “cuidando” do inadequadas de moradia. a privação dos pais por longos perío. disponibilidade 5. assim. privação dos pais e cuidado infan. cólicas. é aconselhável 6. ficuldades fraternas representando ciúme tre a incidência e gravidade de infecções de e medo do abandono. anterior entre pais e filhos. etc. transtornos do talização da mãe por doença grave. Vem a crise desenvolvimental: as til inadequado. Mesmo 2. incapacidades físicas e sos. da pobreza. Devem estar aten- culta a independência dos jovens. que podem pobres ou instáveis. ser expressão de dificuldades de adaptação. na tentativa As habilidades desenvolvidas nas de evitá­‑los. principalmen- nessa fase transforma­‑os em pais sem rituais te em relação a sentimentos. é uma fase curta. em uma comunidade que lhe dá suporte. ido- de entes queridos. mas como dificuldades escolares. aceitar e nego. suprimindo fases. Já e assistentes sociais. Além disso. acidentes e gravidez. de família seguidamente são causados por ses populares. e criação dos filhos. irmãos de adoles- e avós. liberdade. agências de apoio social. nhecimento de famílias vulneráveis. rupturas conjugais prematuras. tos às indicações de violência familiar e ter Deve­‑se abordar a fase do ciclo familiar competência para notificar e lidar com esses na presença de queixas vagas e múltiplas. bem como a crise financeira difi. mais nascimentos no grupo de mães solteiras e probabilidades maiores de separações.184 Luiz Carlos Osorio. como mudança de domi. porém esta pode enfraquecer a va de morbidade e morte de seus próprios capacidade de cumprir funções de proteção pais. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. doença e morte precoce de desnutridos. têm co- na classe média. mas podem em virtude de as mulheres separarem­‑se por contribuir para minimizar seus efeitos ao curtos relacionamentos. tentativa de pacidade de ganhos entre homens estão as- suicídio. em geral não muito intensos. Muitas vezes. desemprego. abuso de Altas taxas de desemprego e baixa ca- drogas. Deve­‑se estar de passagem. te atuam como fortes estressores. vigilante a respeito de bloqueios de comu- Deve­‑se abordar flexibilidade familiar. pacientes com transtornos . São forçadas a che. e a gravidez dificuldades de comunicação. bem como estar atentos às necessida- como cefaleia. mas estável. toda vez Crises acidentais que perceber mecanismos de defesa fami- liar (negação. trabalhar em colaboração com enfermeiros fiar e sustentar famílias por longo tempo. casos. Por isso. A cente com deficiência. É imprescindível a atenção a sinto. ticos. Os filhos saem e deixam pais em meio pode minimizar muitos dos efeitos adversos à crise da meia­‑idade. principalmente álcool. ao mudanças de hábito e estilo de vida. Trata­‑se Os MFCs pouco podem fazer para de uma fase precoce nas classes populares curar esses problemas sociais. sociadas a baixas taxas de casamentos. Já nas clas. experiências. discutir e procurar soluções (com toda a família. Os problemas longa na família “tradicional”. com conflitos por mais psicológicas. somada à perspecti. desânimo. crises de depressão. viúvos e viúvas. Aquelas que capacidade para respeitar. se possível) para os problemas encontrados. mães de desnutridos. Quanto menos e violência. respondem melhor às crises costumam ser ciar opiniões diferentes (liberdade versus mais envolvidas socialmente em organiza- limites). esposa função de encontro da identidade é mais de um homem desempregado. Esse novo padrão de lidar com crises “fisiológicas” serão os recursos da problemas previne transtornos psicossomá- família no processo de “volta ao funciona. Deve­‑se identificar. ções assistenciais. os grupos de “semelhan- mento normal” (resiliência) em reação a tes” têm um importante papel na troca de crises imprevistas. dispareunia e leucorreia. transtornos do des das crianças e adolescentes de famílias sono. a quem pois as mulheres esperam mais tempo para podem dar apoio e colocar em contato com procriar. nicação dentro de uma família. miséria contrário do senso comum. cílio. Uma Ninho vazio família economicamente pobre. culturais e outros. alcoolistas. deve­‑se estar atento a fi- tumultuada for essa passagem para os pais lhos de casais divorciados. ocorre cada vez mais tarde. cujos cuidados exigidos frequentemen. menos será para os adolescentes. como os grupos de gestantes. por exemplo). 2. como amigos. e o fato de os filhos e acusações ao outro perante a criança. retorno à família de origem.). auxílio a crises. gociar a autoridade sobre as crianças. fragi- Em classes populares. Deve­ Famílias em separação ‑se usar apenas regras gerais. hipertensos. deve se lembrar que pode haver uma conotação de desvaloriza- ção da família e seu modo de vida. cuja figura parental antiga apoio. rede de suporte (amigos. Ao aconselhar. A criança se relacione com a madrasta. estão em risco. laços parentais in- mãe que detém a guarda). vizinhos e instituições de rede (amigos. sendo composto pelas seguintes etapas: Famílias monoparentais 1. do pai ou da mãe com guarda. cujo processo. tes de morte de um membro ou separação/ 3. Se binações consistentes. Há aumento na taxa de consultas no caso de já que a relação conjugal se rompe. há per- da dos pais. tomada. Como não há “elaboração”. estabilização das duas novas famílias Famílias monoparentais são resultan- monoparentais. principalmente. en- rede de apoio também é de suma importân. acarreta a não adesão e um desejo de separação. é necessário ne- união. Se a decisão foi pessoas solteiras do que entre os casados. bem aceitas. divórcio legal. etc. não apresentar aos filhos relacionamentos que podem ser Famílias do recasamento temporários. Deve­‑se ajudar a família permitir a circulação delas entre as casas e a se sentir competente e a desenvolver uma contato com famílias de origem. em princípio. blemas na família. manter rituais de retornar a morar com avós. plo). observar o impacto da separação no pode estar ainda psicologicamente viva. e in- Pode­‑se oferecer consulta para o casal. clui todo tipo de doenças. você não sabe”. adminis- 5. decisão propriamente dita. o que portável. viuvez). com frequentemente acelerado pelas dificulda. por exem. O acúmulo de consultas não a parental. elaborar o luto da família anterior. Na eventual des financeiras. pode ser uma importante indicação de pro- ximo a mudança externa para as crianças. cuidado diário (sinais de depressão no pai/ Como se não bastasse. a mor- tendem a se repetir os erros. manter posi- ção de novos relacionamentos diferenciada Em famílias do recasamento. alguns pacientes verbalizam em pode passar mensagem de incompetência consulta ou dão sinais psicossomáticos de e. avaliar risco para a criança: das importantes em seus membros (sepa­ violência e disputa pelos filhos ou por seu ração. divórcio. grupos. permitir tempo suficiente para todos elaborarem a separação. reorganização da vida dos pais. mas perda do cônjuge. e não conselhos pessoais Frente a um relacionamento insu. perda do cônjuge. se possível (aniversários. divorciados e real desejo de separação. iniciado. é longo e pode levar anos. Sabe­‑se que ela proporcionando abertura para identificar o é muito maior entre viúvos. no primeiro ano. se há filhos. ou em tom de “eu sei. com bom senso. etc. por exemplo). necessidade do adulto de apoio e de intimidade. esse período é lização das fronteiras entre gerações. Manual de terapia familiar – Volume II 185 alimentares. epilépticos. talidade aumenta significativamente. desvalorização terferem no novo casal. limitar ao má. corajar o apoio das famílias de origem e da cia. deve­‑se aconselhar a cooperação. em qualquer situação. As questões são 4. com com. se a não melhora. pertencerem a duas casas traz a necessi- avaliar se a mãe biológica consente que a dade de manter vínculos com as famí­lias . novos casamentos e reorganizações trar a sobrecarga com tarefas do cotidiano familiares. disciplina e limites devem ser. A família. familiares e com a rede social de O papel do genograma apoio. Partindo da capacida- moram. Precisa­‑se Um modelo de entrevista auxiliar avós e pais a colaborar nas tarefas com o paciente e sua família parentais. A escala Garf (Global Assessment biológico e não biológico. doença men. as triangulações com- madrasta. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. pois há superposição três gerações. Geralmente. Se um deles nunca veis. maus­‑tratos. pensatórias. e 2 e 1 as crônicas e gravemente mum em classes populares e em casos de gra. geral é boa). classifica em cinco níveis. permitir a diversidade de ex. não se rotular (“uma casa é boa.1). má”). 3 e 4 as de funcionamento inter- mediário (cuja resposta às intervenções em A presença de três gerações é mais co. mostrou­‑se uma sugestão adequada aumentando a complexidade do sistema.186 Luiz Carlos Osorio. É muito frequente a avó caminhamento ao TF. pode­‑se levantar hipóteses diagnósticas e traçar planos terapêuticos in- dividuais. de de resolver problemas. distantes. sua família e sua doença pode ser mais O genograma é uma representação bem compreendido na consulta familiar. o padrasto ou a madrasta familiar. idade avançada e preocupação com a saúde física e/ou mental dos pais das crianças são fatores estressantes. pois pode evidenciar­ novas tradições e alianças e conservar an. deve-se incluir no sistema familiar. recebendo 5 as famílias com melhor funcio- Famílias ampliadas namento. lembrando que. de Psiquiatria e de Psicologia dos Estados como “maus” (especialmente a madrasta). são um processo. e até o que está diante de nossos É preciso aconselhar a não se tentar olhos. os relacionamentos saudá- as dos cônjuges destes. bem como pessoas significa­ de fases (formação do casal. tigas. sem infantilização dos pais pelos avós. evolução terapêutica. em que há necessidade de en- videz não planejada. está envolvi- mostra a estrutura básica. of Relational Functionting) para avaliação ao disciplinar. tivas que moraram com ou cuidaram de centes). desenvolvida pelas Associações podem ser vistos. O relacionamento entre o pacien- te. se gráfica da história e do padrão familiar. pode estar muito desajustada por uma crise tal ou morte do filho(a). relações fami- dos pais ou envolvimento instável. a outra. substituir o pai ou a mãe biológicos au- sentes. próximos. A família devido a drogas. condições de vida. sim- se casou. a demografia. Deve­‑se diagnosticar assumir sozinha responsabilidades parentais. padrões de repetição através das gerações. exercidos por ambos os pais. Orientações diagnósticas periências. que necessário. ou interferência na relação do casal e Após avaliar a história clínica e o exa- auxiliar crianças a elaborar luto por perda me físico. liares e sociais. para orientar a intervenção e acompanhar a Não se pode esquecer que as adaptações de. da organização e clima emocionais. Unidos. principalmente no início. há possibilidade de desequilíbrio bióticos. mas ainda não conseguimos enxergar. de origem de seus pais e de conviver com funcionamento. Suas dificuldades apenas momentânea (ver Quadro 15. cautelosamente e nunca rotular. negociar a criação de poderosas no dia a dia. o da na doença e pode organizar­‑se aliviando. idealmente. filhos adoles. etc. respeitando a aceitação e a coparti- como ferramenta cipação. É uma ferramenta das mais situações anteriores. conflitantes. em geral. integrar a família do padrasto ou da como o alcoolismo. A família precisa fazer o luto das seus membros. . financeiras. disfuncionais. Uma gama de sentimentos é expressa. há dificuldade moderadamente grave de se adaptar a situações de estresse e a transições. com bastante frequência. As necessidades individuais estão geralmente submersas. Períodos de relacionamento satisfatório são raros. Calor e carinho estão presentes. mas. do casal. há uma atmosfera geral de calor. porém é evidente que há áreas de bloqueio emocional e tensão. em geral. apesar de mudanças situacionais. A maioria dos problemas de interação corriqueiros é resolvida adequadamente. Manual de terapia familiar – Volume II 187 Quadro 15. é maior do que o necessário ou não é efetivo. dos irmãos e individual). em geral. a tomada de decisões é estabelecida para cada área funcional. Indivíduos e coalizões são claramente demarcados. às vezes. A comunicação. Há problemas sexuais frequentes entre os adultos. Existem padrões e rotinas combinados que permitem a satisfação das necessidades habi­ tuais de cada membro. São resolvidas muitas das dificuldades que ocorrem ao longo do tempo. de forma competente. As relações sexuais dos adultos são satisfatórias. A disfunção sexual grave entre os adultos é frequente. são marcados por irritabilidade e frustração. Dor e/ou raiva ineficaz ou paralisia emocional interferem com a pos‑ sibilidade de compartilhar alegrias. Nível 2 – A UI é óbvia e seriamente disfuncional. As características particulares dos indivíduos não são apreciadas ou são ignoradas por coalizões rígidas ou confusas. Nível 3 – Apesar de haver ocasiões de bom funcionamento e competência nas relações. (Continua) . nessas situa‑ ções. carinho e valores compartilhados. existe flexibilidade para mudar a resposta a eventos ou necessidades fora do usual. são inibidas ou atrapalhadas por conflitos não resolvidos. expectativas estabelecidas são ignoradas ou rigidamente cumpridas. a solução de problemas e as atividades rotineiras. conflitos ocasionais e transições difíceis são resolvidos por meio de comunicações e negociações destinadas a solucionar problemas. Transi‑ ções do ciclo vital como partidas ou entradas das/nas relações geram problemas frustrantes e não resolvidos. observa­‑se excessiva rigidez ou falta significativa de estrutura. A tomada de decisões é tirânica ou bastante ineficaz. às vezes. Períodos de con‑ vivência agradável em conjunto são infrequentes. Existe um entendimento compartilhado e um acordo sobre os papéis e tarefas apropriados. A tomada de decisões é só intermitentemente competente e efetiva. distância óbvia e hostilidade declarada refletem conflitos importantes que permanecem não resolvidos e bastante doloridos. nascimentos e casamentos. são desigualmente distribuídos. A atividade sexual dos adultos pode ser insatisfatória.1 Níveis de funcionamento da família (Global Assessment of Relational Funcionting – Garf) Nível 5 – A unidade interacional (UI) está funcionando satisfatoriamente segundo o relato dos participantes e a perspectiva dos observadores. Os padrões e rotinas de interação não satisfazem às necessidades dos membros. mas existe dor e dificuldade em responder a situações incomuns. uma grande variedade de sentimentos é livremente expressa e elabo‑ rada. mas o esforço para o controle dos membros entre si. aquelas disfuncionais e insatisfatórias tendem a prevalecer. contudo. mortes. Alguns conflitos permanecem não resolvidos. como saídas da família. Existe nas relações uma atmosfera otimista apropriada para a situação. A tomada de decisões é feita. são depreciados ou discriminados. mas não todas. Nível 4 – O funcionamento da UI é algo insatisfatório. Apesar de haver algum calor e apoio aos membros. existe reconhecimento das características particulares e dos méritos de cada subsistema (subsistema dos pais. mas não perturbam a relação. já que a contextua­ aconselhável que se peça para falar do lização do paciente em seu meio é o que ca. Quadro 15. permitindo ao motivo da consulta. casos intrafamiliares. ajudando­‑os a lidar de uma forma di. Após se identificar e cumpri. oportunidade de falar. etc. e as relações de poder.1 Níveis de funcionamento da família (Global Assessment of Relational Funcionting – GARF) (continuação) Nível 1 – A UI tornou­‑se excessivamente disfuncional para garantir a continuidade de contato e ligação. a comunicação e condução de uma consulta familiar. geralmente para auxiliar na a clareza de expressão. . mentar a todos. podem ameaçar e agredir física ou sexualmente umas às outras. tornando­‑o menos dispendioso. família quem melhor o conhece. os membros da casa frequentemente não sabem onde os outros estão ou o que esperar uns dos outros. da consulta. os prevenção de novos problemas. acelerando o tratamen- (profissão. nessa relação. a disposição mas. o médico pode abordar (apro­x imadamente 5 minutos). podem por exemplo. padrões de comunicação. sensibiliza­‑se a todos na não verbal. sendo a cimento e o respeito às opiniões são valo. Responsabilidades pessoais e geracionais não são reciprocamente aceitas e reconhecidas. É a família mesmo assim. por exemplo. racteriza a visão sistêmica. motivo da consulta a quem a solicitou. como ex- percepção da influência familiar nos sinto. dificuldade em se mobilizar para auxiliar 2. deixar claro indiferencia opiniões? A espontaneidade. o requerer esclare. o que indica possivelmente mento familiar e suas alianças. As fases a dinâmica familiar podem tornar­‑se muitas vezes se sobrepõem. Descreve­‑se a seguir orientações de o funcionamento. “Quebrar o to. O desespero e o cinismo são francos. gelo” com perguntas abertas sem relação evitando estigmatização. Lembrar à família as idade. Tentar estabelecer objetivos nutos). Mesmo se nem todos os membros quem.). quem senta perto de ferente. Falam uns pelos ou. Conversar com cada membro não tenha mencionado. da família na sala. As rotinas são poucas. relação de parentesco e fazendo vantagens da participação na resolução observações e perguntas pertinentes dos problemas. ser percebidos. As pessoas. não há horários combinados para refeições. sabendo mais importantes.. que se preciso. Os limites da unidade como um todo. cada vez mais perceptíveis. tros? Há um porta­‑voz? Usam o plural. trabalho. Então. Atenção à linguagem danças familiares. Priorizar os presente (inclusive crianças). Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Se foi o médico. Socialização (aproximadamente 5 mi­ membros. etc. quase não existe sentimento de pertencimento. pouca atenção é prestada às necessidades emocionais dos outros. pressões corporais e faciais. claros. rosos. a comunicação é repetidamente atrapalhada por mal­‑entendidos e falta de atenção ao que os outros dizem. ligação ou preocupação com o bem­‑estar mútuo. concisos e realistas. mantendo ou agravando­‑a. Relacionando. a fase de aquecimento propondo aqueles os quais a família inicia. Manter a empatia e a proximidade com seus 1. oportunizando a çar a emergir. identificação e abordagem de outros o funcionamento familiar pode já come. dão pistas sobre o funciona- comparecerem.188 Luiz Carlos Osorio. sono ou período de vigília. bem como os dos subsistemas. Introdução do motivo da consulta um familiar doente. Deve ser rica a não esquecendo que todos devem ter observação da família. incentivando. Pequenos detalhes. compreensão de seu paciente. o motivo. etc. o início do problema às mu. não podem ser identificados ou respeitados. Nesse momento. relacionados com o problema. (aproximadamente 25 min). a família. as aprendizagem. drogadição. outros familiares abandono. e não sua família muitas vezes é reforçado pela preo- muito provavelmente é menos útil. uma precordialgia ou dispneia isto é. Paciente que não segue as orientações. não apresentan- quentemente. com de funcionamento. cupação com o sintoma. Isto já pode ser terapêu­ do melhora. como no filho que problemas. Tarefa pós­‑encontro. por exemplo. A partir do momento em que Provavelmente não devem fazer uso houver clara conexão entre sintoma correto da medicação. 1. Perguntar por ques­tões 4. essas transtornos somatoformes costumam famílias enfrentam múltiplas crises. geralmente repeti. 3. Paciente de classes populares com crises 5. que funciona . Manual de terapia familiar – Volume II 189 3. Afinal. Discussão da doença ou problema 2. o que somente o paciente. do médico. médicos e da co. vezes. evitar que esses pacientes provocam às vezes no falem uns pelos outros. de encontrar alguma solução para suas psicológica ou sexual. blemas orgânicos subjacentes. Negociar geralmente há benefício da doença em um contrato formal ou informal com relação ao funcionamento familiar. pois permite pequenas alterações uma função na dinâmica familiar quan- de relacionamento. Pode ser Situações clínicas em que a família útil aconselhar para que não discutam deve ser envolvida: dificuldades na presença do filho ou o pressionem para tomar partido. Paciente com doença orgânica crônica. monopolizem médico a sensação de que não estão a fala ou interrompam­‑se muito fre­ sendo bem manejados. munidade. A doença pode ter então tico. como violência física. diferenças pessoais não são aceitas e transtornos alimentares. finais. recurso. a lista de diminuindo a tensão. e de usarem a medicação acertada. segue a prescrição médica. Paciente com doença aguda frequente. Em diversas situações. Estabelecer um plano (aproximada. Registrar a con. abuso de substâncias. cata- fazer. deve­‑se registrar junto à rem. perderão a forma que conhecem família. bros familiares: falas abertas. da família. filhos adolescentes por mais liberdade. apresentam comportamento seme- deficiências de desenvolvimento e lhante. A tensão é diminuída referente a cada papel. ideias que a família sugeriu. familiar. Muitas 5. morte precoce. sulta. se necessário. se lisando novas formas de funcionamento relevantes. como quan- mente 10 min). Porém. relacionam­‑se a situações de crise. Caracteristicamente. queixas. Os problemas são evitados. Deve­‑se Apesar de frequentarem os consultórios facilitar a comunicação entre os mem. etc. incluindo a assistência. a abordagem individual e adoece quando os pais brigam e dizem familiar. Paciente psicossomático. Pacientes com múltiplas. só não é permanente porque os pro- blemas não foram resolvidos. tivos. Identificar padrões do evita discussões. o que cada um se propõe a Cabe ao médico abordar a família. os recursos familiares e o plano que vão se separar. pois se melhora- e sistema. Resumir o plano. Abordar a regra é esconder o conflito. relacionar sintoma com função podem fazer cessar muitos conflitos. o paciente não 4. oferecendo nova consulta que possibilitem não recorrer ao mesmo ou encaminhamento ao especialista. Identificar recursos de todos de lidar com o problema. negligência. Discutir quaisquer referências. os tipos. do para cuidados com a criança e a melhora paciente e da família. Agradecer a É comum não serem identificados pro- presença e participação de todos. procurar vários médicos na tentativa até simultâneas. Incluir recursos e do em dificuldades financeiras. Em geral. que reforçam a impressão In: DUNCAN. M. para o paciente. 3. M. nível de desenvolvimento de autono. MINUCHIN. 1997. (Ed.). demência senil e retardo men. morte. C. Medicina ambulatorial: condutas de vezes. 1990. etc. Philadelphia: [s. B. antecedentes criminais ou porte de família. Porto Alegre: Artmed. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. estrutura fechada sem abertura de famílias. zofrenia.). J. 2004. O médico.. 3. ed. ed. Medicina ambulatorial: condutas Certas famílias encontram­‑se muito de atenção primária baseadas em evidências. ed. comprometidas. São cia econômica ou emocional e baixa Paulo: Casa do Psicólogo. G. E. n. H. desemprego. situações de crise med. etc. A violência. FONSECA. ROSSET. profissionais.. p.). FERNANDES. I. 2003. manifestada por negligência.. FREEMAN. In: DUNCAN. D. desequilíbrio no sistema. 20. C. J. M.. I. I. é encontrada Artmed. ed. autoestima.. A estratégia saúde da família. R. ou perdas (separação. E. 1995. Dançando nas melhoras são essenciais e podem ser com a família. B. BURTON. A. A. W. 88-100. Medicina ambulatorial: condutas de 6. armas. 115124. Cadernos de Saúde Pública. 6. sexual. R. muitas In: DUNCAN. M. B. nov. ciclo de vida familiar: uma estrutura para terapia sigual de autoridade e poder (gênero. S. 2010. Transtornos afetivos e de pânico. J. S. Principles of ambulatory medicine. gerando angústia nos Porto Alegre: Artmed. sistema familiar é fundamental. I.n. I. conflitos saúde e na doença. C. PASCUAL DO VALE. Porto Alegre: Artmed. OSORIO.. Porto Alegre: cos. 1999. doenças crônicas ou Curitiba: Sol. dependên. R. 2002. esqui. (Ed. maus­‑tratos físicos e psicológi. M.190 Luiz Carlos Osorio. (Ed. migração. In: –––––––––– . p. BARKER. abuso sexual. The practitioner-patient relation- tal são frequentemente suspeitados em ship and communication during clinical encoun- seu início pelo MFC. D. M. WAR- liares na consulta. Outros. sintomas psiquiátricos e sua função no D. Pais e filhos. As mudanças no apresentam distribuição rígida e de. relacionar ters. B. R. BUMBERRY. GIUGLIANI. seguindo­‑se impotência e/ TAVARES. 7-29. e vínculo em uma equipe do programa saúde da gas.. Rio de Janeiro. 1989. GIUGLIANI. O. uma abordagem simbólico-experien- o início de melhoras mais profundas.. 229-261. SCHMIDT. p. C. . 6. etc. Manual de me- permanentes (dificuldades de diálogo dicina de família e comunidade. S.. Por trás da máscara familiar. M. comprometimento psicológico/ v. abordar a família é TCHOW. incapacitantes. M. Porto Alegre: Art- para contato externo. social. Trabalhando com famílias pobres. Terapia mia. cial. atenção primária baseadas em evidências. abuso de álcool e dro. 3. C. E..). aban- MINUCHIN. é necessário atenção primária baseadas em evidências. D. ANDRADE. J. R. familiar. falta MCWHINNEY. L. SLUZKI.. P. Porto Alegre: Artmed. Cabe lembrar que peque- WHITACKER. E. baixo Artmed.. L. de..101-106. A rede social na prática sistêmica. M. preenchendo um vazio na relação. M. p... C. Porto Alegre: e descontrole da agressividade). M. O. apenas falar a respeito. história de modelo SCHIMITH. 2004. ções inúteis. T. com mais frequência em famílias que MCGOLDRICK. 2004. Acolhimento familiar violento. SCHMIDT.).]. de que o problema é físico. p. p. Porto Alegre: Artmed. SCHMIDT. LIMA. p. ed. 7. Evitar placebos e investiga. 3. psiquiátrico dos indivíduos. o tempo e o vínculo com o MFC podem permear pequenas transformações que causem ANDOLFI. et al. 2004. pois. M. A família na de diferenciação de papéis. 23-34. J. Paciente com transtorno psiquiátrico. 2003. COLAPINTO. R. CARTER. S. de idade.. GIUGLIA- NI.. 1487-1494. L. E. E. B. novas tendências.). dono. ZIEVE. L. uma relação delicada. A prática da atenção primária à saú- ou fracasso em lidar com a violência. Porto Alegre: Artmed. B. R. In: BARKER. Porém. P... o paciente e sua família. B. FALCETO.. L. Se Referências a família é muito rígida./dez. C. C. Identificadas dificuldades fami. melhorando os sintomas. (Ed. de extrema importância. BARRETO. trata­‑se diação familiar como forma eficiente de re. e. em prin. fami- manutenção da relação futura dos envolvi. dos. Psicologia. Ela não objetiva estabelecer os acordos. nos quais a ser institucionalizada pela promulgação da necessidade de estabelecimento de acordo Lei de Mediação. especialmen. passem pelo procedimento. 1997). será a separação conjugal em razão flitantes que viabilizem a realização de acor. O foco principal deste capítulo. por se tratar sobre pontos conflitivos seja prioritária para de campo de nossa maior experiência. Uma das formas de se lidar com a cri. da intensificação desse fenômeno no mundo dos consistentes. da Motta Cezar-Ferreira “Let there be no mistake. por- mas propiciar mudanças na relação dos con. e. não há dú­ cular. a angústia é devida à impossi. caso os interessados. em última análise. até amigos. flitos familiares ou que se lhes assemelhem. separação conjugal. bilidade de os cônjuges chegarem a acordos Embora considerando as múltiplas sobre aspectos importantes da vida diária da possibilidades interdisciplinares passíveis família. a angústia pode pode ser eficaz. se utilizado em conformida- te os filhos. Tal instrumento de pacificação do casal e afetar toda a família. atual e da excelência da abordagem nessa significa ajudar os conflitantes a encontrar específica interface psicojurídica. Ele tornar­‑se crônica (Schwartz e Kaslow. atingir um ou ambos os membros de família. A ajuda es.. mais do que isso. A dor pode começar antes mesmo da Seu foco principal está nas questões judiciais separação. na mediação familiar. este trabalho pretende tratar o tema do pecializada psicológica focal ou um processo ponto de vista da interdisciplinaridade psi- psicoterápico para um ou ambos os membros cojurídica. A mediação familiar. a interação Este capítulo visa a apresentar a me. finalmente. liaridade e apreço. de área em que a mediação está em vias de solução de conflitos familiares. pode ser aplicado antes.. . não se requer. um processo psicoterápico. é apropriada para intervenção em con- vida. Se não cuidada. nunca devem ser campo de interseção em que. capítulo 16 Mediação familiar Verônica A. divorce is paintful” Schwartz e Kaslow Introdução solução para o conflito e tomar decisões a respeito dele. Nesses casos. em parti- A separação é dolorosa. ção. volun- estender­‑se por dois a cinco anos ou até tariamente. clara a interação das disciplinas Direito e se da separação é a mediação familiar. quando não a família extensa e de com o paradigma da pós­‑modernidade. especialmente descartados para indicação a qualquer mo. de serem abordadas no espaço da media- cípio. das relações. o que. por algumas razões: trata­‑se de do ex­‑casal. no entanto. das mentalidades jurídica e “psi”. durante e após a Muitas vezes. se observa de forma mento. tanto. uma constante apareceu: a ção vinha sendo exercitada há algum tem- necessidade de aproximação das ciências po. nos casos de família. as separa. guarda de filhos. sendo aplicada no Judiciário sob o nome de vórcios levou alguns governos a se preocupa. al. Na mesma dire- O contato com o direito de família e ção. terapia familiar. 2007). dedicou atenção es. o trabalho do advogado paradigma da pós­‑modernidade. em 1995. e. envidaram muitos tempo em que vem sendo aplicada dentro esforços na tentativa de amenizar a situa- dos padrões inter­‑relacionais propostos pelo ção. seja judicialmente. segundo ela. Brasil e Argentina do direito de família. po preocupa­‑se com os problemas emocio- lamentação de visitas e alimentos. 2007). em moldes nitidamente Psicologia e Direito na abordagem das ques. ca. há algum tem- como separação. A Argentina. A lei tões judiciais de família. em especial. como a dos Estados carentes de atenção específica. 1997). em função de. regu. litigiosos. observa­‑se aumento do número de emocionais. 1996). rem em produzir mudanças nas legislações Até a virada do século. surgiram trabalhos importantes. peito ao funcionamento mental. seja de nais da separação e seu correlato suporte forma extrajudicial. Historicamente. ção mais destacada da mediação familiar é a Na América do Sul. e relacional do ser humano. No momento. Assim. Os Tribunais de Conciliação da porém é relativamente pequeno o lapso de Califórnia. Lyon tem­‑se destacado ação competente. No conflitos jurídicos. o Movimento colherem entre um divórcio litigioso e um de Mediação Familiar vem se desenvolvendo mediado. O Projeto de Lei cimento psicológico de ordem acadêmica. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. que surgiu a possibilidade de as partes es- Do século XX a esta parte. mas não contavam com nenhum conhe. A Segunda e terapeuta familiar Coogler foi determinan- Grande Guerra pode ser considerada um te para o desabrochar da área de mediação marco em relação ao advento dessa nova de divórcios. Foi a partir de sua iniciativa problemática social (Cezar­‑Ferreira. Autores pecial aos conflitos familiares. em 1949. viu promulgada Nos países em que se iniciou o sua Lei de Mediação. dentro com um trabalho de vanguarda (Neder et do processo judicial. em torno das questões judiciais de família.º 94. em 1919. fortaleceu em mim a ideia Segundo Kaslow (1995). Conciliação (Cezar­‑Ferreira. oficiosamente. mais pessoas tomaram conhecimento das co. psicossocial voltavam mais seu olhar para as sobretudo na situação de separação. a área de atua. interdisciplinares. a mediação vem sendo consequências devastadoras dos divórcios praticada há longo tempo com esse nome. criando a lei da área jurídica que compartilhavam dessa . o Japão criou seus Tribunais a psicologia. dos em receber informações sobre a ciência uma vez que os profissionais do direito só psicológica. antes de instauração da jurídico. igualmente. A França. a media- Movimento. E. autores da área para minimizar os problemas matrimoniais. ser examinadas com um olhar psicojurídi. n. ção. mas há separações conjugais como eventos críticos legislações mais antigas. emocional so. particularmente no que diz res- contavam com sua sensibilidade e bom sen. foi adotada uma posição favorável à media­ ções conjugais e ações correlatas.. implementada a partir do Poder Judiciário (Gorvein. nessa épo- Unidos que. de Mediação. de 2002. subjazerem conflitos Brasil. essa prática vem O grande aumento do número de di. O saber psicológico mostrou­ profissionais do mundo jurídico interessa- ‑se fundamental a esse novo entendimento. Um vol d’oiseau sobre e estendendo o conceito de conciliação ma- a estrada da mediação trimonial. deve transformar­‑se na Lei nem experiência na área. por exemplo. aos circunscreveu­‑a como prática jurídica. Nesse país. Naquele país. particularmente na área da de Família. com o au- de que as causas de família mereceriam mento dos divórcios nos Estados Unidos.192 Luiz Carlos Osorio. sob pena de terem sua . entre outros. nos quais não existe relação de afeto nem tória a importância do mediador “psi” em necessidade de manutenção da relação en- todas as áreas. que. destacaram­‑se os e de terceiros. pode que tinham algum contato com psicólogos. priorizou to mais indicado. condominial. stricto sensu. de fato. como a trabalhista e comercial. A mediação é. um es- respeito. tam. Do ponto de vista negocial. instrumento é oportuno para sociedades mília. O instrumento de mediação. nas media. parentes ou não. cada taram com psicólogos ou com advogados vez mais em uso nos tempos atuais. esse diação familiar em questões judiciais de fa. A mediação. 227. seja no Judiciário. contratos em geral. nas quais os sócios tenham al- melhor interesse da criança deve ser atendi. A mediação é A aplicação desse instrumento. vidual decorre de relações interpsíquicas. e é fato que. em ser esquecido. a Constituição ses. mas desejo de do. A instrumento de pacificação par disso. Manual de terapia familiar – Volume II 193 preocupação apareciam em um contingente coconstrução com os outros e com a socie- menor. diminuíram sua produção mas um método. a criança deve ser protegida. talvez pela maior divul. do ponto de vista psicológico. tos controvertidos e o advento de um novo ção da lei. quais os participantes estejam com dificul- mas áreas. e não é mera prática. profissional. a separação. aparentemente. ou para melhor continuidade de suas vidas ções escolar e familiar. e as características de sua formação. por parte apropriado desse saber e escrito bastante a dos litigantes. proces- tre pais e filhos para explicar a formação e so e técnica. como conflitos de relação em- haja pessoas em conflito. pode ser entendida nalidade buscam referência na relação en. Essa é a base legal da me. mília um eixo significativo. têm se interessado. também indicada nos conflitos entre esco- considerando­‑se que o ser humano é inter­ lares. em particular as de separação. manter a relação societária. seja fora dele. onde quer que tre as partes. em alguma atente para o maior interesse da criança e medida. mais experiência para praticá­‑la. operadores do direito têm­‑se olhar em relação à controvérsia. permite a ressignificação dos pon- gação e pela potencialidade de promulga. Diferentes teorias da perso. o que está minuciosa. dada a qualidade Podem­‑se mediar conflitos eventuais. ser empregado em quaisquer conflitos nos Do ponto de vista prático. haja necessidade de continuidade do adolescente. aí será útil esse presarial. método. a conciliação é o instrumen- Federal de 1988. o que não pode Em resumo. dade. atualmente. precisarão dar continui- ‑relacional e que vive em processo de dade a sua relação. em seu art. Para es- No campo do Direito. de fazê­‑lo para evitar dissidência infindável bém. bem como é um procedimento o desenvolvimento do psiquismo individual. pela mediação familiar. dades em chegar a acordo sobre determina- destacaram­‑se os profissionais do direito das divergências e percebam a necessidade que. em algu. se escreva mais sobre essa importante crise A mediação como não previsível do ciclo vital. rias técnicas a exigir do executor cada vez O fato é que a psicologia tem na fa. a proteção ao menor. enquanto os da área psicológica. profissionais “psi”. O empresariais. acidentes de trânsito. é no. Atualmente. crise. em tese. de intervenção na superação de situações de A que aceito entende que o psiquismo indi. e estudada como modelo. deve­‑se frisar que as primeiras lei- turas do conceito de mediação sempre con. é direta- mente especificado no Estatuto da Criança mente indicada para conflitos que envolvam e do Adolescente. É preciso que. um processo e uma ou vá- científica. paço interdisciplinar. no entanto. uma vez lançada a semente. o qual determina que se relações de afeto e nos quais. a mediação familiar. toda sua complexidade. guma divergência a dirimir. da relação. Hoje. Embora a do que visa a ajudar as pessoas a compreen. o que denota der melhor as respectivas pretensões ou que o sonho. se. consultório. A observação desses fatos é clara em terpessoal. com consequências para a prole. 1). nos separamos. do de trabalho em grau autossustentável – mal. familiares e políticos. frequentemente for. porém. como mencionamos. são importantes as raízes na construção da Tomando­‑se a separação como referên- história! cia para mediação familiar. pelo qual um terceiro imparcial. o número substancialmente menor do que o Mediador. dem social exerce uma influência grande no presente e futuro. hoje. Ela visa à mudança nas ção familiar aplicada às situações de separa. de resolução não adversarial de conflitos. mas com identidade própria. sejam de ordem só vai ter efeito se houver voluntariedade parental. trabalhis- O emprego mor. vista. do no conflito e que estimula a cooperação. focado é o sonho de quem se casa por amor. também. mesmo nas famílias em que a mulher estava inserida no merca- é um processo. Ainda assim. antigamente. Para tanto. por seu turno. trabalham­‑se o presente e o e pela relação custo­‑benefício positiva que futuro dos envolvidos. a mediação é procedimento giosas de família.. tas. É fato. o limiar de tolerância é mais se opõem. Esse é o desejo. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. onde há 20 ou 25 anos eram . a prioridade é a media. Casos de Ela pode ser empregada em quais- bullying merecem especial atenção. 1997. sejam de ordem empre. seja judicial ou extrajudicial. Em A mediação é um processo breve foca- ambas as situações há relações de afeto exis. Essa forma de intervenção considera a emo- Neste capítulo. quer tipos de conflitos: negociais. miliar. no fundo. posição em superá­‑las. Ela é irmã da tera. visando à transformação imaginário individual e no coletivo. sim se não der certo. pode­‑se dizer que A terapia é como um mergulho profun. direcionadas à dissolução do conflito in. (Neder et al. com mesma raiz como são os diciais de família a intervenção psicojurídica irmãos. Como faz uma diferença significativa. ção como um todo. concei­tual­ tolerância ante às adversidades e maior dis- mente. que a palavra de or- lham os conteúdos emocionais do passado. p. possibilitando mudanças o casamento e a família. de modo a que possam compreen. nem deve sê­‑lo. E são as questões de família. no qual se traba. da mediação. A mediação é aplicável a A mediação familiar não é terapia fa. facilitador do diálogo e re- quer participação voluntária das partes. o casal expressava maior A mediação. Em tese. busca facilitar às partes que atual –.194 Luiz Carlos Osorio. desse vínculo. menor. controvérsias. o esforço é feito. na investigação do vínculo. relações e à tomada de decisões. uma vida de felicidade. das partes na busca de solução para suas como na separação. O Mediação familiar objetivo é ajudar os litigantes a decidirem e terapia familiar a respeito de sua pendência. o confronto de seus pontos de baixo e a disposição para superação. Assim. ção pela frequência com que têm ocorrido nesse processo. a verdade coemocionais e relacionais. O terapeuta vai é que todo casal se casa para dar certo e viver ajudá­‑las a mergulhar no mais fundo de si. sarial. dentre outros. palavra de ordem social nos dias que correm derem a si mesmas e a seus vínculos para não seja mais até que a morte nos separe. vida diária tornada insuportável. e melhor poderem solucionar os conflitos psi. esse em um processo de duração variável. tentes e a serem mantidas. como nas empresas de família. apresenta em comparação com causas liti. porém é de se enfatizar que nos conflitos ju- pia familiar. Ela conta com a intervenção de um tercei- ro imparcial. quaisquer conflitos. ninguém se casa para se separar. é o mesmo: manter necessidades. terapia familiar e da maior facilidade com que se fala do tema. frequentemente. Ele sarial de resolução de conflitos. Têm que ser elaborados. quando se usa a palavra conflito. Ora. É a questão das lealdades divididas. Após inú- do surge o fantasma da separação. o separação consensual. xamento de rendimento escolar. é importante que se destaque As crianças começavam a dar sinais que o conflito jurídico é conflito de interes. psiquiatra ou assistente do muito sérios. e coconstrução de novos significados. porque a meras dificuldades. na separação. nificados. no intuito de resolver as resolve o emocional.1 como se verá adiante. a separação. guarda compartilhada de amplo espectro. e buscar as crianças na escola. Assim. Manual de terapia familiar – Volume II 195 poucos os casos de separação. e Gabriel. No Direito de Família. como o jurídico e o psicológico. Um olhar sobre a prática sos. mudou. o afeto é construído na relação. em que um a mim. pois as Pode parecer óbvio para o leitor dentro de aulas dos meninos estavam para começar e um certo sistema de significados.º 94. A mediação familiar. dicação dessa pessoa que o ex­‑casal chegou lia a realização de comediação. o conflito emocional é subja. Isso significa que o acordo judicial resolve o sempre doente. Jussara e Luciano foram casados du- A realidade observada é que. Há todo o cuidado com as crianças seria de res- perda. A mediação se realiza em processo de terápica voltada aos cuidados com conflitos modificação da relação pela transformação familiares. ponsabilidade de ambos. deveriam cente ao jurídico. Foi a a procura é maior. Luciano concordou. também social. de como estavam afetadas pela separação. em tese. Jussara já estava para entrar conflito jurídico. no norma para gerir essa relação. Tiveram dois filhos: Camila. Para surpresa de Jussara. e o outro. mas. há que se entender do que se está plexa e perdida. Que situação! O que estaria acontecen- existe diferença substancial de sentidos. seja agora. quando conseguiu em especial. especificamente indicada para certos ca. Aliás. ses submetido à Justiça. Em função deixou de ser amistoso. não com ação judicial. ela não sabia sequer como fariam para levar porém. e ela foi ficando per- disso. Nada mais havia de amigável. o comportamento de Luciano A mediação é uma forma não adver. uma unidade psicoa. do maior conhecimento da Luciano. Esta foi realizada de sentimento de lealdade é construído na rela. que deve Alguém lhes disse que isso era assun- vir a se transformar na Lei de Mediação. todos sofrem quan. um mês apenas após falando. o Projeto de Lei n. inclusive. mais importância toma terpessoais familiares. de 2002. forma tão amigável que estabeleceram que ção. em contrapartida. na dupla acepção: em disputa e emo. Jussara estava muito emocionada e . Jussara procurou ajuda. separação. uma casal. e. buscar ajuda especializada em conflitos in- Nesse sentido. porque poucos sabiam de atividade psico. os relatos dos mediadores deverá ser da área jurídica eram constrangidos e só apareciam quan. relacional. Jussara propôs a sepa- família é um sistema. do? Onde fora parar a separação amigável? Assim. há perda e luto. A perda provoca luto e este tem que de dividir tarefas ou estabelecer qualquer ser elaborado. nos filhos. o sentimento de fracasso e as perdas. questões mais imediatas. e procuraram fetiva na qual o que afeta a um afeta a to. enquanto o confli. que. psicólogo. tempos idos. um advogado amigo da família para uma dos. com 12 anos. com rebai- to emocional é de ordem íntima. Logo. ração. também tem sofrido maior divulgação e avanço. sem a preocupação cional. em razão das mudanças esse processo que se submeteram Jussara e na sociedade. antes. o to para uma mediação familiar. convencer Luciano de que. com 9. Ocorre. apresentando sintomas: Camila. assinada a de. Foi por in- qual prevê para a mediação na área de famí. em diferentes sistemas de sig. as perdas e o conflito de lealda. fosse em rante 15 anos. e Gabriel. Atualmente. separação sem ajuda externa. esse casal dificilmen. não só do aberto. ponto em que não vira outra solução senão rior ao da média. seus desejos e necessidades reais. Contou no dia a dia da vida das famílias. frio e acordo realizado nos autos do processo de parece que fazia uma especial concessão à separação precisaria tomar forma. assim como peças culo. sem maiores detalhes. Ao cabo de algumas sessões. Jussara deixou marido. uma vez decididos. apenas dizendo ao advogado daí para frente correu a contento.196 Luiz Carlos Osorio. O pouco forçadas para se criar a paisagem. Isso tornou imperiosa Foi realizado um trabalho breve. e dade. fossem estabelecidas cláusulas que viabili. a fim de que pudessem de um quebra­‑cabeça que tivessem sido um reorganizar seu futuro e de seus filhos. mos muito amplos. não houve grande investigação sobre o passado. o que. frágil. Em termos para que entendessem a que se haviam com- práticos. uma intervenção psicojurídica: de um lado. enquanto Luciano nada a esse ponto. e. . sentimentos e emoções atuais. eles haviam realizado um acordo prometido no processo de separação e o que judicial. Ao final. Eles apresentavam muitos impasses e Jussara relatou os fatos. em que imaginavam que poderia ajudá­‑los. frustrara­‑se e chegara a um tava a família a contento. mas para toda a família. apesar de todas as tentativas. algo que não se encaixava. susten. no presente. desejos e vontades. A diferen. O fato que ele mesmo se impusera e pôde expor é que. poderíamos dizer. deixando­‑a a mercê de sua von. denotou que esses pais jamais teriam condi- mento chegara a um ponto em que estava ção de cumprir. de manei. sendo necessário que Foi muito difícil encontrar o “ponto”. a vida em comum. Na verdade. com ter. e a discussão sobre como seria a vida ágil possível. frustrado. Luciano mostrava­‑se arrogante. Algo não se encaixava ra salutar. tade e de seu modo de encarar a vida. mas para que entrassem em contato com seus profundo. o que lhes do para dialogar com Luciano a respeito da permitiria chegar a entendimento sobre os vida diária das crianças. quiseram que sua dor e fragilidade. Ele vivia sua vida. Como o pedido foi para ajudá­‑los a fazer ajustes após a separação. em um nível supe. teria que ser que dissessem o que estava acontecendo e cumprido. bora longo para o tipo de instrumento. de outro. Jussara ficou sensibili- tudo se passasse da maneira mais rápida e zada. afirmando diferenças de opinião. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. aspectos divergentes. há tempos. a lei esperava e exigia deles. como ele desejava. Luciano conseguiu perceber zassem a boa convivência e permitissem a que sua resistência maior estava na difi- continuidade da criação dos filhos. eles não conseguiam discutir sobre falou da dificuldade que estava encontran. verbalmente. como uma te conseguiria chegar a bom termo em sua espécie de assepsia emocional. culdade de que os fatos não se passavam Ficou claro que ambos se sentiam fra. Ele fora ferido e estava cassados em seu projeto de vida. que. um acor- sendo mais maléfico do que benéfico. Luciano Jussara disse que a separação fora ine. não ouvida por ele e impotente para claro que lamentava que tivessem chegado alcançar mudanças. deixou cair a máscara de irascível e duro vitável e Luciano apenas concordou. afirmando que havia casado percebia de errado. sentindo­‑se prisioneira do sante. aquele que se vai estruturando para eles. o mal que estavam causando aos filhos. apenas o necessário para Até um certo momento desse caso havia que entendessem o que ocorria com seu vín. mas conseguiu admitir que sua ça é que Jussara vinha refletindo. para sempre. e o que ex­‑mulher estando no consultório. Na ver- sobre a decisão conjunta de se separarem. Pedi­‑lhes haviam acertado. por ocasião da separação. espontaneamente. rapidamente. o casa. Ambos começaram a perceber sua mulher. em. e não percebia que oprimia a separação. que queriam se separar porque estava difícil Esse é o relato. ex­‑mulher também tinha uma cabeça pen- sobre a situação. passividade de Luciano. alguns procedimentos ou. poderosa daquele a quem jamais engana. e pude e que prelecionava aos amigos. e a vergonha dele. refletidas. e. perceber que a relação entre eles melhorara . amoroso. na audiência judicial e especificar. com a separação e enrijecera fazer Jussara sofrer o máximo possível. Saber Jussara havia traído Luciano. até porque o lhes abriu os olhos. praticamente tudo na vida ficava claro que havia uma cortina de fu. preocupados com a tristeza de ambos. parece que a vida se tornou mais sa que tudo suportava pelo casamento e pela amena. Luciano nada percebera. que os impedia de abrir um canal de comu- A motivação fundamental para que nicação positiva. Ao final. do amor pelos filhos e ções operacionalmente tão difíceis como da traição e suas consequências. com uma menos difícil. o ex­‑casal voltou para riam. Luciano e Jussara superassem seus conflitos O segredo apareceu. não tan- filhos. também. que o encaminhou à narcisismo primário. abrigava desejo de vingança e de placidamente. Não existem situa­ ceção do amor inicial. Eles já estavam preocupados com as to pelo que havia feito. aura de ingenuidade. Tempos depois. à sua criação. como machista que era. deles fora uma grande encenação. não concretamente. Jussara entrara em um movimento de luta Nesse processo. Na verdade. entre eles. E foi difícil para e expusessem sua angústia foi o amor pelos eles. A aparente essa sem que haja um motivo subjacente. pelo menos. O difícil foi fazê­‑los rasgar o véu. no desempenho escolar. em vocar nos filhos. Não se revolveu o sejos às necessidades dos filhos e realizar passado. Manual de terapia familiar – Volume II 197 Para uma psicoterapeuta experiente. lou mais alto. pela perda da imagem afetados. perda de imagem. e. claras. Justiça para substituição do anterior e para A dor era pelo transparecimento da própria homologação judicial. como se faria terapeuticamente. Após dos prejuízos emocionais que poderiam pro- longo tempo de um casamento infeliz. os filhos não foram maternidade. Com o conflito atual imperfeição: nela. o ex­‑casal pôde ratifi- e fuga. paração. aparentando não en- tender porque tudo acontecera. Estavam. por ocasião da se- E ali estavam um homem que aquiescera. o ex­ ‑casal pôde ajustar suas necessidades e de- ção de uma nova vida. com ex- maça a encobrir os fatos. A partir daí. a dor era narcísica. daquele que sabe como se trata uma discutir uma questão pontual. mas pela admissão atitudes e a rebeldia de Camila. tudo ficou mais claro e e uma mulher cheia de candura. porque. pela perda da imagem da minimizado e as regras de convivência mais mulher abnegada. adequada à execução do acordo. mas pelo com o fato de Gabriel estar sempre adoenta- que representava como exposição pública e do sem causa aparente. acordos possíveis e mais consistentes quan- mas o casal foi ajudado a expor o que sub- to ao manejo da vida diária dos meninos e jazia à emoção constantemente atualizada. de um advogado de ambos. Isso O reencontro com a realidade se fazia necessário para que se separassem por inteiro e pudessem viabilizar a constru. como que os chacoalhou e vez de terminar o casamento. Os motivos? A vergonha dela. jamais suporia tamanha disseram. da santa espo. do que havia feito. após esta. criando toda sorte de empecilhos. e tanto pelo que havia sofrido em si. O amor pelos filhos fa- marido não abria possibilidade de diálogo. nele. generi- que não encontrava dentro. estabelecer uma logística mais ousadia da parte da mulher. submissa. para a qual mulher para que lhe seja fiel e companheira. O acordo O difícil foi a percepção de que a dor feito em processo de mediação foi levado ao não era de amor. tivera um caso camente. onde não cabia o outro. julgando encontrar fora de casa o car por escrito o que havia acordado. não estavam encontrando solução. e. trabalhadas as questões. prevenido dificulda. 2009) para tentar intervir o mais imparcialmente pos- sível. ­atuar como tal. com isso. Ela permite livre escolha do mediador e ter informações e apresentar alternativas. para as ações e ser imparcial. precisa ter no- estender­‑se durante anos. deve ter nível su. de forma cooperativa. que atrapalhavam a relação. e esteja atento os indicadores apresentados neste capítulo. das relações. vezes.198 Luiz Carlos Osorio. no qual foram atendidos te do fenômeno observado. mediador péis investigatório e interpretativo que são e técnica de mediação privativos do terapeuta. negação. Ainda que o media- dor seja um terapeuta. família. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. choque. com ção básica sobre estados emocionais. e que se tratavam de forma polida e respei. sobre- conseguido buscar ajuda naquele primeiro tudo. durante a sessão. a escuta das pretensões. seja diferenças. aceitação e resolução. em relação ao litígio judicial. raiva. especialmente para as crianças. permuta. de- postas por um contra o outro. um Esse teria sido um caso de separação equilibrador na disputa de poder e um fa- bastante tumultuada. falando­‑se da perspectiva preciso sensibilidade para lhes permitir en. des futuras. E. mediação judicial. fazendo par- mediação familiar. dentre outras acep. char o contrato de trabalho. quase carinhosamente. por ser seguintes. pontos concordantes e discordantes. Deve ter alguma familiari. a nosso a tomada de decisões. O mediador. perceber sua presença nas comunicações Esse foi um caso difícil. na Justiça. litador do contato entre pais e filhos. Deve. seja extrajudicial. Isso lhe facilitará o trabalho. olhar em relação ao conflito e favorecer Quanto ao mediador familiar. um processo de mediação. para cente troca de ofensas e impropérios. O recer os mediandos a respeito do que seja mediador é o profissional devidamente ca. ser vocacionado para a harmonização momento e. perior. em andamento. como uma interminável fila de ações sendo pro. como visto no caso relatado. cooperativa. particularmente o fami- Esse teria sido um caso judicial que poderia liar. como mediador. E. ele deve escla- lução possível para suas dissidências. pressão. não cabem os pa- Mediação. Deve. básicos: na entrevista inicial. fazer divergências. dei- a levar os conflitantes à superação de suas xar claro seu papel. Nas entrevistas gens. espera­‑se que frentar o presente e organizar a vida para o ele se veja. consensual e sigilo. A ele. na Justiça. para mediar em casos de separação. medo. e se possível. na posição de observador. . do pensamento pós­‑moderno. como futuro. fe- A mediação oferece algumas vanta. Riram algumas disso. esses passos cabem tanto na judicial. ele deve abster­‑se de A mediação pode. contar com a credibilidade das partes informalmente. age no sentido de não haver continuidade ou seja. e dos filhos. às questões de gênero (Macedo. ções. no entanto. quando não terapeuta. ser um faci- afastado os “fantasmas”. caso não tivessem cilitador da troca de informações. deve ser favorecedor de cooperação. Além tosa. ajudar os mediandos a mudar o do conflito. igualmente. recomenda­ que visa à transformação da relação para ‑se que o mediador siga os seguintes passos ajudar os competidores a encontrarem so. E isso foi mérito de um processo de construtor de uma realidade. e mencionaram facilitador da comunicação entre os pais e algo como que tinham podido tirar as “teias facilitador de entendimento deles em prol de aranha”. quanto na extrajudicial. que já está sendo feita. ainda. ob- sa. caberá ao mediador  identificar voluntária. em que foi dos mediandos. apontando­‑lhes pacitado para intervir na relação de modo os objetivos e as regras. culpa. Embora com sutis ver. ser compreendida como um processo Quanto ao procedimento. em uma cres. dade com conflitos emocionais e relacionais modalidade a que pertence o caso mencio- e alguma noção de direito e de justiça de nado nesta exposição. e. n você precisa ajudar a ver o encoberto para É importante frisar que nenhum desses resolver o aparente. a gerar interferências externas significados. ficuldade de não aceitação do processo por a mediação familiar em toda sua específica uma das partes. com atitudes inadequadas. tomando de comum cias externas à mediação. são les. n não há verdades universais. identificar e ressignificar as situações confli. é. Assim. 1997). de profissionais visivelmente prejudiciais ao processo. su. São exemplos a falta de neu. os negócios. há um como organizarão os cuidados futuros com encoberto. ferentes experiências e entre diferentes lin- dor para. moral. é impor- da formação de imagem positiva de um pelo tante que o mediador saiba que: outro. entender­‑se para não destroçar a vida. idades de seu filho. É o caso de di. E. interferência em decisões que que cabe o reconhecimento do passado. resume­‑se em ajudar os pais a decidir sobre n por baixo de um conflito aparente. o que leva à perda da mediador deve ter claro que há uma distinção credibilidade. seja por parte de terceiros. ferem negativamente no processo. os filhos (James. dos filhos do ca. os ajude a pessoas a se ajudarem. entre diferentes saberes. sal ou ex­‑casal que atende. a fa- gerindo não admissibilidade de diferentes mília. mas pais e filhos são para sempre. material. tem maior possibilidade de perdurar. não vir. tan. zação da mediação familiar. porém. crenças e mitos. guagens advindas de diferentes sistemas de ele mesmo. sem esgotar todas as frente. entre di- De outra parte. tentativas de imposição de va. Por outro lado. deve­‑se considerar que algumas limitações podem impedir a reali. para poder ajudar amigos e outros profissionais. indicadores implica que o mediador dê su. Um espaço de reflexão: entre diferentes cia manifesta à violência. espiritual e psicológica. Deve ter na tela de sua mente confundir os mediandos. lembrar que quaisquer interferên- te na criação dos filhos. resta para nós que a mediação. O com uma das partes. visão de mundo. finalmente. que os pais devem participar conjuntamen. quebra do sigilo e/ou aliança dos para o trabalho do mediador familiar. acentuada entre os mediandos e de tendên. Ele é um facilitador da comunicação. como família. criati- a importância do diálogo dos pais nas várias vo e responsável por sua existência. pelo processo dialógico. se enfoca a relação presente. em especial. de defasagem emocional complexiadde. de sua da do outro. seja por parte do acordo decisões importantes sobre a vida de. bem como a importância para ajudar a solucionar conflitos. um espaço. Um espaço de ajuda: aos que se de- tralidade por parte do mediador e o não sentendem e não conseguem se entender reconhecimento da própria subjetividade e em torno do objeto de seu conflito. possibilidades. Deve deixar transparecer um lembrete: o ser humano é único. disputa ou de seu litígio. entre ser ex­‑casal e ser pais. gestões aos mediandos – não é sua função – n a sua não é a melhor. sem sombra de dúvida. e que “precisarão” lores. sistemas de significados e do modo de ser Um espaço voltado para o futuro: em dos outros. ciências. deve cuidar o media. À vista de todo o discorrido. Manual de terapia familiar – Volume II 199 Alguns indicadores devem ser destaca. Mais de saúde e outras. . impedin- Deve estar atento às necessidades de ordem do a consecução de resultado satisfatório. tudo isso. daqui para tumes. mas não contrariem a lei. sideradas são as de terceiros. mediador. n a decisão que a pessoa toma por si é a que tivas. portanto. É desnecessário. ao processo. e que casais se Atitudes como as mencionadas inter- separam. basicamente. Outras interferências negativas a serem con- to presentes quanto futuras. como escolha de escola. Você só ajuda as mas que. a moral ou os bons cos. o patrimônio. A não aceita- esses pais a chegarem a um acordo quanto a ção das decisões por esses terceiros tende a esses aspectos. . Buenos lócus da mediação. Mostrou­‑se que casais se sepa.200 Luiz Carlos Osorio. extrajudicialmente. lia brasileiro. com bata- rio sobre as dissidências. foi falado sobre a postura na última década. M. Divorcio y mediación. menores ou incapazes. Neste caso. Família. sua importante interlocução com a mediação. sem dú- A separação conjugal é dos eventos vida. mente. A sitais. segundo alguns autores. N. 1997. Aires: Córdoba. relações que deve ser considerado. A. to em relação ao contrato do casamento ou qualquer outra forma de entidade familiar. Um espaço não interferente: cada ciên. 2008. ou depois da separação). Por isso. deva ser submetido à media- esse instrumento de pacificação. seria- só perde para a perda de um filho. e conduta do mediador. JAMES. San Francisco: Jossey-Bass questões judiciais de família (antes. significado dado à expressão “questões ju- to no sentido de “abrir os olhos” quanto no diciais de família”. e não. quando tiver diante de si um conflito conflitos familiares a serem atendidos por que. a separação. Em MACEDO. com litígio de família. A terapia familiar no Brasil vários momentos. nem tragam prejuízos emocionais aos filhos menores ou incapazes. V. São precisa ser voluntária para ser eficiente. CEZAR-FERREIRA. A mediação familiar não deve ser en- tendida como a panaceia do momento nos Considerações finais conflitos para os quais tem indicação – não acreditamos em panaceia –. ed. pela mudança de olhar por parte dos mediandos. como formas de dar ênfase a certos mediação veio para isso. como dito antes. mas. durante Publishers. A nos. In: ram. entenda. a mediação familiar Tudo na vida é fruto de crenças. pode anteceder o processo e ser realizada sa é de que as decisões que as pessoas to. na tomada de de- CEZAR-FERREIRA. para cia é uma ciência. R. da M. o que não se confunde de fazer um acordo consistente e satisfató. nesta. A terapia familiar e competição. é um instrumento de pacificação das mais dolorosos e. aspectos e de levar o leitor a grifá­‑los em O caso relatado foi de mediação fami. será objeto de sentença prolata- Um espaço para o acordo. da por um juiz de direito: se houver acordo. para se lembrar deles e resgatá­ liar e. mam por si mesmas. Foi frisado o fato de a mediação fa. a separação traz um dos muitos ‑los. Os nomes citados neste artigo são fictícios. P. ou seja. tan. por vir­‑se mostrando eficaz e eficien- Todos os esforços devem ser envidados te ante o fenômeno da separação. Esse foi o reencontrar. que ela deve propiciar colaboração. cada prática é uma prática. Durante este capítulo foi enfatizado Referências que ela deve ajudar. sariamente. 1996. particularmente. 2007. S. A separa. para quem quer se ver. nas famílias em que haja filhos Um espaço facilitador da comu­nica­ção. sua mente. mas pais e filhos são para sempre. separação cisões para realização de acordos. 1. Nota ção não precisa ser um desastre. A. 2. mas sim manter­‑se nos limites do que é: um distra. se não hou- comunicação construtiva. de. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. e Paulo: Método. e para quem quer acordar. para que as consequências não sejam desas- trosas. São Paulo: Roca. ed. são as Todas essas repetições foram propo- que têm maior possibilidade de perdurar. neces- Um espaço para o reencontro. da M. Um espaço para quem quer resgatar a ele o homologará por sentença. 2. The divorce mediation: handbook every- miliar ser. bem como sobre o GORVEIN. ele dará sentença decisória. indicada para thing you need to know. no direito de famí- especialidade. V. que ela e mediação: uma visão psicojurídica. ção familiar. lha judicial. cada especialidade é uma lembrar o leitor de que. In: OSÓRIO. C. M. S.n. RICANO DE PSICOLOGIA.. de.. Questões de gênero na te. rapia de família e casal. SCHWARTZ. L. E. As dinâmicas do NEDER... VALLE. P. (Org. KASLOW. L. W. Anais. SCHWARTZ. São Paulo: [s.. A mediação como forma de divórcio: uma perspectiva de ciclo vital. 1995. Campinas: resolução de conflito..). M. New York: John Willey Alegre: Artmed. and Sons . Manual de terapia familiar. 1997. 1997. Porto divorce and its aftermath. W. L. 2009. F. MACEDO. 1997. São Paulo.]. 26. et al. In: CONGRESSO PANAME- Psy II. Manual de terapia familiar – Volume II 201 KASLOW. R. Painful partings: M. . L. F. L. . tida como algo à lidade são um fenômeno eminentemente parte do cotidiano. a mar- aspectos da cultura. e os recursos para a cura e o crescimento. pois é parte da inte- gração das diversas crenças familiares ou re- A espiritualidade é uma poderosa di. Fique atento às raízes que se trançam em seu coração. Porém. filósofos e um tema complexo porque a espiritualidade psicólogos de que a religião e a espiritua­ foi. Ainda que grande parte das pes. que me ensinou a ter coragem. terapeutas de família. 2003) Introdução na prática terapêutica. É através do reconhecimento do Isso poderia ser um problema para nós. como outros tibetano e ainda. É Há um consenso entre cientistas. durante muitos anos. Fique atento aos sulcos de sal da sua face. Fique atento às falas das pessoas que só dizem o necessário. bém os ensinamentos e prática do budismo nhece que a espiritualidade. É fundamental reconhe- humano. Aos movimentos do peixe no anzol. cermos o sentido religioso como norteador soas considerem religião como algo divino. nossas crenças. ligiosas. de questões pessoais. (Galvão. precisamos entender as fon- nhando cada vez mais importância em meio tes espirituais de estresse dos nossos clientes às constantes mudanças no mundo de hoje. A atenção: forma natural de oração. capítulo 17 Terapia familiar e espiritualidade Sonia Mendes Dedicatória Este trabalho é carinhosamente dedicado ao meu pai. treinados nas ­ciências Comecei a perceber que minha atua- sociais. Fique atento aos frutos tardios que pendem da memória. Oração Natural Fique atento ao ritmo. para quem a realidade é algo que ção na clínica não só reflete meus estudos pode ser verificado. Tomando cuidado para não impor mensão da experiência humana e vem ga. fundamentalmente. sofrimento. essa visão vem relacionados à terapia sistêmica como tam- discretamente mudando. não deve ser ignorada ca da minha matriz familiar. morais e tam- não podemos negar sua expressão histórica bém como orientador do cotidiano frente ao e social. sofrimento que as pessoas chegam à terapia. Hoje já se reco. . aceitar a morte para poder entender a vida. políticas. experiencial. que ou se vamos arriscar a diversidade da vida nascem da experiência espiritual do funda- gradualmente destruindo o planeta. concebível pensar na cura e qualquer tipo meçar por seu derivado – espírito. o que é espiritualidade? espiritualidade encaminham não só para o Quando falamos em espiritualidade. em algo místico. do profeta e no seio dela se elaboram contexto que surge a urgência da espirituali- as grandes utopias.204 Luiz Carlos Osorio. também respondem ao desejo de transcen- to. pois emerge nas pessoas mesmo antropológico. Mas históricas. quando passa do intelecto para o coração e da palavra para Espiritualidade – conceitos o sentimento”. para cuidar da Terra Segundo Boff (2003). a um só a espiritualidade não é monopólio das re- tempo. o “espírito” repre. abandonaram mui- morte. se o espírito é vida e re. man- temente das crenças religiosas ou conjecturas tendo o continuum de história humana. Para os povos das Ilhas Pacíficas. Sistemas que não tenham uma experiência religiosa. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. é um desa- Antes de tudo. mas a reconciliação. precisamos ter a consciência fio distinguir e desvendar a mente e nessa de que estamos inseridos nos processos cícli- tarefa a consciência e a espiritualidade são cos tanto da natureza quanto das sociedades um mistério a ser esclarecido. que inspira esperança e lação. Nossa responsabilidade ro que a consciência ecológica é espiritual é passar para nossos filhos e netos um mun- em sua essência. independen- a passagem de um paradigma a outro. na fuga do cotidiano. vamos co. Com isso. ausência de relação. Para Fritjof Capra. então seu oposto não é a matéria. Para citá­‑lo: “a espiritualidade surge quan- do a doutrina deixa de ser doutrina e passa a ser experiência interior. que são . Mundo caótico nesse contexto é o compromisso com a prote- versus espiritualidade ção e expansão da vida relacional. espirituais podem oferecer. concebe a espiritualidade como tidos novos a partir das virtualidades presentes uma nova linguagem para descrever o tra- na própria realidade. Zelândia. histórico e político. O fenômeno humano é. ensinamentos e os recursos que as práticas doenças graves ou catástrofes naturais. que possui um valor em si. mas não sabemos como fazê­‑lo. balho terapêutico. sociológico. o vislumbrar de uma ordem capaz de ordenar O leitor deve estar perguntando­‑se: o caos que se instalou. operando conjuntamente com os sistemas fa- miliares. do melhor. São elas que permitem dade. A espiritualidade consiste teóricos e outras visões em cultivar esse espaço de profundidade. foco da minha prática clínica. A espiritualidade tas metáforas médicas e biológicas. Parecem ser fundamentais naqueles mas o desafio é exatamente trazer para o momentos de maior impacto para os indi- contexto diário e das relações familiares os víduos. ligiões. formaremos as alianças. a espiritualidade como parte integrada em senta a força criadora e ordenadora presente si. Para os grandes cientistas. apaziguamento da dor e do sofrimento. em que a humanidade deve es- nectado ao cosmo como um todo” – fica cla- colher o seu futuro. de cuidado para pessoas que não tenham Para Leonardo Boff. a capacidade de descobrir sen. Para Antonio e que dele dependemos para viver. A religiosidade e a então. a espiritualida- e das relações pessoais. É nesse dor. O grupo da Just Therapy Team. À medida Damásio. da Nova no ser humano. familiares e sociais de encontra sua origem nas religiões. a religiosidade é um elemento que o novo milênio se desdobra. o conceito de espí- rito humano é entendido como “o modo de Estamos diante de um momento crítico consciência no qual o indivíduo se sente co- na história. mas somos remetidos a pensar em isolamen. é in- Para definir espiritualidade. der. a sobrevi- constitutivo da subjetividade e doador de vência da humanidade dependerá de como significado ao sofrimento. psicológico. como a perda de pessoas próximas. e vez. A prática de rituais. As pessoas de autopreservação é o primeiro e único chegam vulneráveis e contam suas histórias fundamento da virtude”. n A terceira relação é focada na pessoa e seus Constantemente. o transcen. conforme Boff e Capra. Para este ecológico está ligada à espiritualidade e ao grupo. preservação contida no exemplo do ativista gos íntimos ou parentes próximos. isso. eu vez mais a espiritualidade no cotidiano e contemplava o grande espaço. Portanto. Trago guardadas na memória espiritualidade. e adotaram outras mais citado por Damásio. pode sagrado qualquer ato de bondade. em si. O culto à memória dos nossos proponho rituais para facilitar a passagem antepassados dá a noção desse continuum de ciclos. na minha prática clínica. Eles também pensam a espi. com minha mãe e minhas irmãs. Citando ambiente. a história das nossas famílias e. Damásio: “a vida deveria bastar para nos fa- nados no início do capítulo. a uma força sagrada ou seu A vivência desse trabalho começou há equivalente. Para alguns. mostrando delicadeza diante do mapeamento referente às várias interfa. cesso terapêutico. Praticar o respeito apoio a outras pessoas. ancestrais. por sua namento entre pessoa e o meio ambiente. para descrever a terapia. por sua vez. É considerado presentes não somente nas religiões. mais damente sobre alguns desses rituais. descortinava­‑se a majesto- sa igreja. às que se envolvem de forma puramente consideram espiritual o trabalho de um conceitual. trazem conforto e bem­‑estar às pesso- qualquer coisa que promova e facilite essa as que verdadeiramente a praticam. amor fornecer a sensação de pertencimento por e apreciação da beleza.” ces da espiritualidade e dos relacionamentos. é um presente sagrado caminho para o desenvolvimento de virtu- que oferecem. Manual de terapia familiar – Volume II 205 comumente usadas para descrever o pro. de sua fragilidade. Mais adiante. coisas que só contariam para ami. podemos respeitar as as caminhadas que fazia quando menina. escutava as . para irmos entendendo que a humanidade é anterior à missa aos domingos. Ampliando essa ideia. oferecer uma forma ordenada de cerimônias. encontrei em Espinosa. somos também parte da história do nosso povo. veiculando valores e compor- n A segunda relação destaca a relação entre tamentos relacionados à tolerância. na prática clínica. ajuda e pessoa e outra pessoa. te com minha forma de pensar: “o esforço gradas. todas as reli­ ativista ecológico pela atenção que dá à giões difundem a ideia de solidariedade e Terra e a sua preser­vação. rituais de despedida e rituais de Todos nós somos parte de uma longa his. consideradas sa. para ajudar na integração entre os de relações e o senso de pertencimento. n Por último. quase para- terapeutas da Nova Zelândia. des que. e a teoria sistêmica dental está diretamente associado a Deus. e não relação é chamada espi­ritual. túnel e. nos levam a um maior ritualidade integrada à natureza e ao meio cuidado pessoal e com as relações. familiares. Com esse entendimento de muitos anos. a relação da pessoa com o Experiência pessoal transcendental. Por exemplo. diferentes crenças de cada ser humano. e compaixão é espiritual. perdão. zer tratar a mente humana. a auto- de vida. De um modo geral. destaco os fa- expressados em quatro relações primárias: tores positivos do desenvolvimento da espi- ritualidade que responde por um conjunto n A primeira relação diz respeito ao relacio. para outros. falarei mais detalha- tória. ao final. reverenciando Ainda nos aportes teóricos do grupo de sua dignidade e importância e. abrangentemente. Antes de entender as palavras em Em minha busca por integrar cada latim que o padre falava durante o ritual. é essencial falar doxalmente. mencio. de valores de sublime fusão que. algo muito ressonan- adequadas às mudanças. de igualdade. Atravessávamos um a qualquer crença ou cultura. venciar os rituais de passagem nos quais a A visão da imensidão do mar e a contempla. questão mais acentuado e os retiros mais rigorosos. devemos levar a calma do silêncio. suas questões precisamos estar compro- Acontece que. rio para superar crises. falar de espirituali. 1998) que contribuiu para que hoje valorize os ritu- ais se deve ao fato de que. cia. se transformando das relações familiares. dizer que minha ma. sempre que possível. pois to imediato e a longo prazo. pois funcionam como referência boas escolas eram as religiosas. Anos depois fui estudar em uma escola Anos mais tarde. onde ciava participando dos rituais sociais. e me coisa. que tinha como par. vácuo que a morte traz seja mais bem su- nos aproximou da sua vida profissional. já na adolescên. Todas as Posso. interrompe o fluxo relacional (exatamente como na citação de Boff). Para que esse meu pai era militar e. Nesta fase. Desde ficávamos em silêncio por muito tempo e fa. O impacto da perda pode ter efei- fui introduzida à cerimônias e rituais. pessoas recobrarem­‑se do golpe. dão um sentido de coesão necessá- de observação. A morte de al- na medida em que a doutrina deixou de ser guém nos priva de algo muito valioso que doutrina e passou a ser experiência interior é o contato. membros de uma família. O ajustamento à morte tem sido visto cio e práticas religiosas – ampliaram para como sendo um dos mais difíceis ao longo mim o sentido da apreciação pela vida. comunidade dos parentes e amigos se une ção de toda a beleza do espaço em volta me para se lembrar dos feitos das pessoas que fizeram desenvolver a calma e capacidade morrem.206 Luiz Carlos Osorio. Deparados com a morte. sentia bem. relações são afetadas pelos sentimentos que triz familiar deixou em minha vida a mar. mas não é verdade. suas conexões e a continuidade uma experiência religiosa. até os mais simples e dos padres. almoços em família. cada membro da família tem diante do fato. rarquia e a cordialidade entre as pessoas. usando a resiliência . Todos os homens são mortais: a morte e dade é falar de religião. fui aprendendo sobre a indiscu. em minha história. ca do sentido religioso. das mudanças nos ciclos de vida. Aprendi a esperar o tempo de cada vida da família. À perado e seja facilitada a reintegração dos medida que eu apreciava a beleza das igrejas. Assim começou o que chamo assim respeitando ainda mais a ordem. estudar em um colégio de construção es. localizado sobre uma colina com morrer e vamos inevitavelmente perder a vista para o oceano Pacífico e com grandes relação de interlocução com amigos e entes jardins. O que mais infância e adolescência com o que experien- me interessava era o retiro espiritual. Mais tarde mudei com a minha famí. na ordenação da vida e reavivam o coração. os retiros espirituais – três dias de silên. cotidianos. músicas intercaladas com o silêncio. metidos com a importância das relações volvimento da espiritualidade começou com humanas. (McGoldrick e Outro aspecto da minha matriz familiar Walsh. a possibilidade de vi- isso não era sentido por mim como um peso. solenes e hierárquicos. todos são de extrema lia para um país da América Latina onde as importância. como as tertúlias com os amigos. E aprendi também a conter para sentir. em conta existirem recursos internos den- nias e acompanhava atentamente os passos tro das relações familiares que permitem às dos rituais. então. zíamos trabalhos manuais reproduzindo os como congressos. para mim. É um fato da vida que um dia vamos panhola. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. ou seja. O leitor pode então pensar que. superarem tível conexão entre os ambientes externo e as adversidades integrando­‑as na trama de interno. e parte da história se vai. o desen. fui percebendo as se- de orientação católica. os mais elaborados. a hie- hoje de minha experiência espiritual. Embora o ensino religioso fosse queridos. as emoções das cerimô. Fui. melhanças entre as vivências dos rituais da te do currículo estudar religião. portanto. formaturas e rituais de me- objetos usados na missa e nas vestimentas ditação e de passagem. última do ser humano. desde muito cedo. Neste momento. Como diz timentos e resistências. Ensinamentos ver se estão realmente efetuando mudanças do Budismo Tibetano em suas vidas. pois os conside. Precisamos ter fé na capacidade de domar nais. não é mais do que uma contínua dança minado não pela severidade do corte emo. Ambos criam raízes Sogyal (1999. a vida e a mor- atuando no presente em comportamentos te são vistas como um todo. essas pequenas mortes outro com seriedade. p. colocando a lias trazem em seus relacionamentos má­ nossa confiança no que é possível. desculpas por ter magoado ou ferido um ao sas. mas sim pela profundidade do desejo mudanças. encorajo que cada um Considerar que tudo é impermanente entre em contato com esses sentimentos e os significa que a vida é cheia de ciclos e como associe a uma situação no passado. 63): primeiro para encorajá­‑las a ver que suas ações podem produzir resultados funcio. ração. com o passado. tece só uma vez. casal ou família de se re- te dentro da relação. tarefas e vivências. Destaco a importância dos ri­tuais. Nessa intervenção. escuto o som da impermanência. reconhecendo as viola. e. Estimulo meus tempestade hoje é uma gota. um bailado de cional. ro fortes aliados para a ordenação funcional o passado se condensa: o que ontem foi uma dos indivíduos na família. mudança. recorro aos quecer. dando oportuni- da vida e a conectar com a força existen. como uma sé- que aparentemente não têm a ver com a si- rie de realidades transitórias em constante tuação do momento. em nós quando sentimos que estamos sendo tratados de forma injusta e então facilmente Não haveria nenhuma possibilidade de perdemos de vista até mesmo as aspirações chegar a conhecer a morte se ela acon- pessoais que nos são tão caras. Percebemos que a maior parte do com o tempo futuro. Toda vez que ouço o sussurrar de se reconciliar. À medida que o tempo passa. outro no passado. tarefas e vivências por duas razões: Segundo Maitland (2007. goas e ressentimentos do passado que ficam Na abordagem budista. uma esperança insensata. na praia. Mas felizmente a vida O potencial para reconciliação é deter. A finalidade de se refletir sobre Quando não expressamos ou comuni- a morte explora o conceito base da filoso- camos nossos sentimentos. mas a certeza Existe uma vivência que particular. Essas práticas. 57). trazem o sentido de pertencimento. são nossos elos vivos com a morte. reconheçam necessários novos ajustes e adaptações para . sofrimento é desnecessária. que não souberam fazer diferente e peçam mesmo para pessoas que não sejam religio. za por parte de cada pessoa para encarar o Essas mudanças. Manual de terapia familiar – Volume II 207 familiar (Walsh. de nascimento e morte. não uma fé cega ou estamos no caminho certo. Perdoar não significa es- Baseada nessas premissas. fica ditando que as nossas ações têm resul- muito clara a integração do tempo passado tados. olhando um para o outro. e sim se relacionar de forma diferente rituais. Os rituais religiosos. Sugiro tal está em constantes mudanças e fazem­‑se que. segundo. ções e dores associadas a esse relacionamen- to. ou ainda as batidas do meu co- Esse processo requer boa vontade e preste. O sofrimento pacientes a terem uma postura ativa diante antigo pode enfraquecer­‑se. dade ao indivíduo. Muitas vezes. 1999). as famí. do processo terapêutico. p. Não é uma paz precipitada de um ribeirão ou as ondas quebrando e sim um processo de engajamento mútuo. criamos ressen- fia budista – a impermanência. nos possibilitam ter uma noção ou medida do comprometi- mento das pessoas envolvidas no processo. de que podemos despertar colocando mente considero de suma importância: o nossa confiança no que é valioso e acre- “ritual do perdão”. para podermos avaliar se e despertar a mente. dentro conciliar e restabelecer a confiança perdida. Conhecimento sem ação é um des. Para muitas rar. A disciplina transforma relacionam entre si. Consequentemente as os problemas dele. pode começar observando o que precisa As ações do terapeuta que desenvol- ser feito e quais as contribuições que pode vem a disciplina ajudam as famílias a desen- dar.208 Luiz Carlos Osorio. pois funcionam como um mapa. alma e as relações. saber que lado no tempo em que ela resolvia todos marca deseja deixar no tempo. práticas que nos ajudam a desenvolver recur. passar à outra etapa. A partir do momento em que se descobre o sos internos. porque todos os proces. podem. em última instância. essencial para a saúde das famílias que to- estão os seis paramitas. passado. concentração e sabedoria. dos participem. presente momento. vezes. dar e rece. Disciplina está relacionada com o tem- ção ao que fazer. conge. sitivas que levam ao bem­‑estar. vencem a força dos padrões repetitivos do sos da vida consistem em troca. atividades e quali. associada às medidas disci- plinares rígidas e subordinação. Uma coisa pouco valorizada “aprender por meio da ação” e se refere às na sociedade contemporânea é a presença. É No centro dos ensinamentos budistas. pessoas. Participar plenamente. O obstáculo . maus hábitos e cultiva atitudes e ações po- disciplina. a uma mãe po: estar no tempo. tornar­‑se uma fonte inesperada de Ser generoso gera bem­‑estar. Você para a aversão. O paramita da genero- mento. essenciais ao desenvolvimento valor da presença. do tempo. zado de habilidades e comprometimento. nova forma de agir transforma o sofrimento. paciência. A Como podemos eliminar habilmente a ação indicada é estimular a participação e a tensão desnecessária de cada situação? presença de todos os membros da família. rosidade é um antídoto para a resistência. presente. muitas ajudar?”. O conhecimento e a ação se alimentam dias de hoje gera ansiedade que nos tira do mutuamente. postos a participar. Utilizo o paramita da generosidade Não é um caminho fácil. Por exemplo. O corre­‑corre em que vivemos nos do. pois as famílias percebem que uma ber. se adequadamen. desperta uma vitalidade que alimenta a mais familiares nos acordos feitos. esforço para perseve. enquanto ação sem conhecimento aqui e agora. Os paramitas têm essa for- ça. A disciplina Generosidade saudável tem uma qualidade leve que está baseada no entendimento e no cuidado com A generosidade consiste em participar o que valorizamos. saber o que fazer com que se encontrava impotente diante do filho o seu tempo. a disciplina dá forma cotidiano e para o trabalho. A gene- recursos. ou idosos. Em fazer o que é preciso. um ciclo em constante movi. o que deseja realizar ao longo adulto reclamando de forma difusa. um guia Enquanto a generosidade alimenta de comportamento e uma estratégia para o a vivacidade do ser. a palavra disciplina tem uma cono- tação negativa. inevitavelmente gera confusão. A disciplina é o antídoto integralmente da experiência de viver. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. descobre­‑se a beleza do humano e relacional. sugeri que perguntas- dificuldades e obstáculos. Assim. sem lamentar o volver um senso de responsabilidade capaz passado nem criar ansiedade sobre o futu. se objetivamente ao filho: “Em que posso te compreendidos e usados. são eles: generosidade. de manter seus compromissos com os de- ro. sidade incentiva o exercício da presença no perdício. sejam eles crianças. Assim começam a cooperação e a ça profunda. envolve o aprendi- quando percebo que os familiares estão dis. e. A palavra paramita significa comunicação. Aprendemos fazen. Os paramitas se ao que se dá valor. É um desa- fio para o terapeuta dar instrumentos para as famílias transformarem suas relações em Disciplina ações funcionais. adultos dades que podem viabilizar uma mudan. porém confusos em rela. de- comunicação. paciência. capacidade do perdão e de outras virtu- ele se torna autossustentável. A ação para desenvolver a sabedoria é nos esforçamos ao repetir uma ação. visão da realidade. é o gência. começando A paciência é a capacidade de ver cla- por prestar atenção ao que é preciso ser fei- ramente como as coisas são. Muitas vezes. A sabedoria inclui a compreensão de te. o in- cinco paramitas. estamos no caminho da dicado é começar a estipular metas e obje- sabedoria. É o antídoto para sintonia. A atividade da paciência exi- objetivos e não ficar a mercê de novas deman- ge inteligência e entendimento. da paciência. Manual de terapia familiar – Volume II 209 para disciplina é adiar o que se tem a fa. antídoto para a preguiça. As famílias fazer mais coisas por mais tempo. suportar as to e qual o prazo em que tem de ser feito. mas ge- têm sua própria inteligência e precisamos ralmente trata­‑se de fazer melhor: melhor ter disponibilidade. nem brar que o objetivo da espiritualidade ou que seja 5% a mais. melhor cooperação para se dicação e concentração para chegar a tocá­ atingir melhores resultados. referindo­‑se ao conhecimento ativo. impede de desperdiçá­‑lo. é neces- sário muita dedicação e esforço. Entendo como . Os parasitas ajudam a interagir tivos relacionados ao tempo. com o mundo e a produzir ou manifestar temos a impressão de que esforço significa o que você sabe ser adequado. presença. a confusão. diante de famílias confusas. o esforço nos está vivendo. Essa prá- donar a experiência antes que ela se complete. A ação recomendada é dedicar um pouco mais O ponto de maior importância é lem- de energia para o que se propõe fazer. O obstáculo ao esforço é desistir da disciplina necessária para se transformar Conclusão uma experiência em algo mais produtivo. contrariedades com coragem e perseverar O obstáculo para concentração é aban- no alcance dos nossos objetivos. e a ação necessária para disciplina é ser dedicado. do amor. Muitas vezes. sem ceder às distrações que comumente ocor- Paciência rem. Conforme a práti. Sabedoria espero o momento adequado para fazer uma interferência ou agir de forma diferen. Cada vez que ‑las. Quando lembra- contendo toda a visão da experiência que se mos que o tempo é precioso. formamos uma base sólida para o Esforço para perseverar fortalecimento pessoal e relacional. da ca do paramita do esforço ganha impulso. Dessa forma. é preciso sintonizar­‑se com o que está fazendo. o terapeuta precisa concentrar bem seus para a raiva. Muitas vezes este paramita é chamado de inteli- O esforço estimula a ação eficaz. des para melhor vivermos. Quando aprendemos com os er- ros e enfrentamos as consequências das nos- sas ações. a experiência ganha foco e todos os outros paramitas. para que os padrões de da religião é tornar mais fácil o exercício resistência desapareçam. Concentração zer. mas estar preparado tas acordadas do processo em andamento. A paciência é o antídoto co. da compaixão. Para praticar a concentração. tica nos ajuda a manter a calma quando Em um dado momento do processo terapêuti- ­estamos magoados. Para atingir a concentração. temos aspirar a resultados duradouros e vencer o a oportunidade de ampliar e aprofundar a obstáculo do medo de errar. não signi- das que a família traz sem ter cumprido as me- fica somente esperar. para agir quando a oportunidade surgir A pa­ciência nos indica a hora certa para agir. Quando praticamos qualquer um dos Para desenvolver a perseverança. 1992. dicas. S. Histórias ção: caminhada. piritualidade e muito menos defende uma (Org. 1996.). mais 2003. L. R. São Paulo: Gente. Rio de Janeiro: Sextante. C. GALVÃO. até gran. 2003. qual é a melhor religião? MCGOLDRICK. ser feliz não é questão de WALDEGRAVE. assim BEAUVOIR. Groisman. Boas perguntas para DALGALARRONDO. F. 2003. poesia. Normal family process: growing diversity – Aquilo que lhe faz mais compassivo. espiritualidade o cultivo desse jardim inte. arte. A.]: Nankim. et al. Raul. M. Meio ambiente no século 21. A. F. A religião que conseguir fazer WALSH. Jardins de mandala. desenvolver­ e de evoluir. York: The Guilford Press.). 2004. Segundo Tulku Tarthang (1992). Protegendo a BOFF. and complexity. culinária. F. M. À medida que a flor do coração desa- brocha. Paris: Galli- mard. mais responsável. dramáticas: terapia breve para famílias e terapeu- meditação. (Org. Rio de mesa­‑redonda sobre religião e paz entre os Janeiro: Contraponto. que curamos o coração humano. 2000. um vai construir o seu. Spiritual resource in family therapy. S. Resiliencia familiar: estratégias para su manitário. CAPPRA. simples. O caminho? Cada Rio de Janeiro: Sextante.210 Luiz Carlos Osorio. A. 2008. 1964.. CAVOUR. M. deu um sorriso. SOGYAL. ocorrido no intervalo de uma riência humana à luz do budismo tibetano. para a educação do século 21. vados valores humanos. ou outra prática espiritual ou religiosa.. New York: The Guilford Press. 1998. Viver sem arrependimento: a expe- Dalai Lama. Porto Alegre: Artes Mé- O Dalai Lama fez uma pequena pausa. O trabalho como mestre. Referências rior. Os passos podem consistir em ações muito [S. saúde mental.. MAITLAND. desapegado. M. Oração natural.. Alfabetização ecológica: o desafio Este capítulo não esgota o tema da es. D.. 2003. Ooklanda: – O que me faz melhor? Dharma Enterprises. In: TIGUEIRO. estaremos servindo aos mais ele. mais hu.. Religião. São Paulo: Encerro transcrevendo o breve diálogo Dharma do Instituto Nyingma do Brasil. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos. R. (Org. Pense nisso. GROISMAN. Respondeu ele: WALSH. la que lhe faz melhor.. Buenos Aires: Amorrortu. 2003. jardinagem. povos: MARINO JR.. Todo ser humano tem a capacidade de se DALAI LAMA. Une mort trés douce. F. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. des projetos que exijam muitos esforços. WALSH. R. Morte na família: sobrevivendo às perdas. A religião do cérebro: as no- vas descobertas da neurociência a respeito da fé Boff pergunta: humana. olhou­‑o bem nos olhos MENDES. Para muitos. Uma ética para o novo milênio.l. New isso de você é a melhor religião. A. 2003. mais amoroso. In: MUNDO mudo. LOBO. WALSH. Aprender a viver ou a morte anun- e afirmou: ciada. o florescimento do potencial total da humanidade. É aque. volvimento de uma vida interior mais rica. RO. teremos poder para curar o planeta. Meio ambiente no século 21. O livro tibetano do viver e do morrer. Além do paraíso: – A melhor religião é a que mais lhe perdas e transformações na família. 2005. P. do Infinito.. T. ético. – Santidade. música clássica. Rio de Janeiro: Sextante. psicopatologia e encontrar boas soluções remetem ao desen. entre o teólogo brasileiro Leonardo Boff e o MAITLAND. Mais fortalecimiento. pequenos atos inspirados pelo cora. M. Ao que Boff perguntou: São Paulo: Palas Athena. 1999. 2007.). Porto Alegre: Artmed. TARTHANG.. In: GROISMAN. Ecologia e Espiritualidade. F. collection of papers from the just therapy team. Rio de Janeiro: aproxima de Deus. In: TIGUEI- natureza. .. 1999. É de escolha. aquilo que lhe faz mais sensível. Just therapy-a journey: a destino. tas. colhemos os frutos da compaixão.. Adelaide: Dzulwich. New Zealand. 2003. parte 1V Terapia de casais . . Sexo. mas sempre mais frequente ta essa solicitação e se mostra uma excelen. em entre masculino e feminino. Fui adiando ou desconhecimento de um enquadre mais a demanda até receber o honroso e gentil adequado para sua particular condição. são quadrículas São Paulo. esses questionários ainda com o público em 2006. Em convite feito pelos amigos Dr. que marcamos. normal/anormal. resga. já que em sexualidade não deve- jeto Manual de Terapia Familiar brasileiro. pela indefinição ram que escrevesse a respeito. que. de de forma sistematizada. pois não há normatização te oportunidade para expor ideias originais em relação às condutas sexuais. sem muito pensar. assi- com sua capacidade esgotada.. Maria Elizabeth Pascual do pre em mente que existem situações menos Valle. nos perguntarem qual é a nossa orientação . Introdução Falar de sexualidade é sempre mobili- zador. devemos ter sem- Osorio e Dra. capítulo 18 Fantasias sexuais e conjugalidade Maria Cristina Milanez Werner Aos casais contemporâneos. frequentes. já mos usar termos como correto/incorreto ou em seu segundo volume. para minha surpresa. e menos frequente. oralmente. Felizmente. nantes. quando apresentei este tema no VII mais amplo e ultrapassa a barreira da mera Congresso Brasileiro de Terapia Familiar. na eterna luta entre manter a segurança da tradição dos costumes e a ousadia da transgressão dos tempos modernos.3 nos mostrarão frequências predomi- apresentada e compartilhada. organizado pela Associação apenas uma distinção entre macho e fêmea. é da Abratef. gênero gera desconforto. Era o último dia de congresso. com exceção dos transexuais1 e são fantasias sexuais. a sala estava nossa condição biológica de nascimento. assim. Paulista de Terapia Familiar (APTF). os colegas me pedi.. com pessoas naladas. Luiz Carlos tempos de inclusão social.2 para quem um simples palestra em mãos. em ques- um sábado à tarde e. pela maioria ávidas em ouvir e entender melhor o que das pessoas. que é muito 2006. Apesar de poder ter a dos hermafroditas. quando colocados em uma curva de Portanto. a essência deste capítulo já foi Gauss. agora as apresento não chegaram à invasão de privacidade. na verdade. tionários sobre nossa vida pessoal e sobre apesar de ser “fim de festa”. dos que. As pessoas ainda dizem “vamos falar A história deste capítulo começou em de sexo” e não de sexualidade. apenas da- que venho construindo já há alguns anos. para mais uma vez participar do pro. através da filmagem feita preenchimento de questionários sobre sexo/ pela empresa TV MED. sem constrangimento. classificação de gênero. desconhecido. bre intimidade conjugal – o primeiro termo Entendo intimidade como a troca de expe. então postulo E sobre nossas práticas sexuais? Aí o que essas vivências passarão a fazer parte terreno ficará ainda mais denso e panta. Fantasias sexuais em nome do bom senso e do respeito ao ou- tro. que garanta o anonimato. Há muito tempo venho construindo a alidade. íntimos. que muitas vezes. E este tem. especialmente se compartilhados. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. das expressões de nossa Ao adentrarmos nos estudos sobre sexualidade. como a masturbação distintamente para indicar situações de uma . entretanto. e se pensarmos em sexu... conjugalidade ou. como prefiro chamar. pelo pela própria pessoa. visitas furtivas a sites eróticos na se biafetivos. quisa científica. ou melhor. dois ou mais parceiros na relação. so- dos: o da intimidade e o da privacidade. as envolvidas formam um par. hipótese de que. não há necessidade alguma de ultrapassar- mos a barreira entre o privado e o público. em momento sócio­ internet. duas ou mais tasias sexuais. a partir de então. sua conjugalidade ou intimidade conjugal. apesar de na psicanálise.5 crossdressing. algo sobrenatural. em breve. luz”. Se. atitudes e situações que fato de serem originadas do mesmo radical dizem respeito apenas a ela mesma. “matam” segredos antigos partilhados ou novos se. temos.4 Contudo. as palavras fantasia e fantasma. envolve somente ela bem assim. sozinha. Se essas pesso- conservadoras. teremos de “encarar” e “digerir” um que se tornarão sigilosos. como nas duas “Tarado é toda pessoa normal pega em flagrante. – como se estivessem diante de fantasmas: seus contatos. noso. os dois termos serem usados in- feita por ela. pessoas envolvidas. situações mencionadas forem feitas sozi- talvez. se homoafetivos ou solitária. são confidências. seus gastos. temas mente. principalmente se nossas práticas sexu- ais envolvem outras pessoas. nhas e em segredo.6 lap dance7? A compartilhadas e vivenciadas pelo casal em não ser que seja para responder a uma pes. envolve os deveres inerentes à condição de ais. pesso. casal. seus projetos. inclusive.. tenhamos de marcar mais quadrícu. passarão a fazer parte em algumas instituições mais tradicionais e da intimidade das pessoas. e sufocam a intimidade sexual – necessaria- gredos vividos e construídos juntos. é mais abrangente do que o segundo. que é vivido e experienciado somente ‑as no mesmo caldeirão de emoções. sexual – se heteroafetivos. Poderemos marcar quadrículas que É isto que este capítulo abordará: práticas nos questionam se fazemos bondage and sexuais – em especial as fantasias sexuais – dominance. ou a audiência de vídeos ou filmes ‑histórico de programas televisivos em que pornográficos. po não está tão longe assim. talvez. como suas necessidades fisio. grego. é invadir dois campos sagra. seus desejos. Não é Portanto. Elas lidam com esse tema – fantasias sexuais lógicas. as pessoas associem Entendo privacidade como algo pessoal. que significa “aparição. ações que ela pode compartilhar ou não. pois riências em terrenos muito delicados. higiene pessoal diária. sin. sombrio. senal da privacidade da pessoa. colocando­ gular..214 Luiz Carlos Osorio. da intimidade conjugal ou da conjugalidade. a menos que o sujeito so- fra de algum transtorno de personalidade e Nelson Rodrigues goste de protagonizar cenas de exibicionis- mo e de exposição oral.” primeiras citadas. sigo mesma.. elas farão parte do ar- las em nossos questionários. em termos de sexualidade. neste caso. phos. mui- e. portanto. Definições Falar do que fazemos “na hora do sexo”. particulares. ela con. tópico às vezes pouco palatável: o das fan- Neste caso. a execução é tas vezes. quer controle por parte do sujeito. por exemplo. essas três o “Grande Irmão” tudo vê e sabe.. que não se move e se manifesta sem qual- mas cuja execução depende somente dela. o que é iluminado pela luz. as- fantasma tem a mesma origem na palavra sombração. em edição mais recente. que significa “fazer apa. capricho ou o que tem de melhor: a liberdade de expres- excentricidade”. que signi- fica “mostrar”. Em Larrouse grega phos. Na Wikipedia. Ferreira (2008). que feche e venha dar estabilidade a ra. obra ciente. visão apavorante. vestimenta de carnavalesco. também encontra. espectro. o autor definida. que signifi. também. joia falsa. ilusória. devaneio. e que é. se faz aparecer. vestimenta “assombroso” e “indefinido” das mesmas que usam os carnavalescos”. de de forma mais “criativa” e “imaginativa” Vejamos algumas definições em dicio. que infundem ca “fazer aparecer. em Bueno (1975). A hipótese. mento. isto é. uma imagem que não corresponde à reali. em seu sentido original. tecemos “fazem aparecer” – em nos. o que venho advogando . visagem. Aqui. que é paralisante. apesar dos significados distin- criada pela imaginação. derivado de φαντάζω. Porém. seres fantásticos). assombração. “imaginação. encontra. “imaginação criado. a ser explorado é a busca de um terceiro ele- val”. vestimenta de folião de carna. devaneio. mos que fantasma é derivado do grego φάντασμα. Manual de terapia familiar – Volume II 215 produção imaginária de um sujeito que co. Em Ferreira (2008). espectro. tos. do verbo phaínein. Em Luft (2000). aparição. que significa Inter­‑relações hipotéticas “aparecer”. reaparecimento de defunto. aparência vã. visão apavorante. e que a palavra suposta aparição de defunto.. que fica aprisionada no medo (nos fan- ginação. bruxas. O ponto. visão”. sob forma disfarçada. que significa “luz”. Em Luft (2000). que é o bom sen- de imaginação. imitação”. assombração. Em usa. espectro. faz notar. ser ou outra coisa De fato. pelo caráter obra de imaginação. loca em cena seu desejo imaginário incons. das respostas acrescenta que: sombra. “ilusão. capricho. assombração. sombra. terror. ganhou suporte na semânti- fantasia. perda do controle da situação. em edição mais recente. suposto sas mentes – o que desejamos ver. e φαντάζομαι. suposto reapare- de forma inconsciente. talvez pela gênese cimento de defunto. “imaginação fantasiosa (vultos de phaínein e do verbo phantázein. nários brasileiros de uso corrente. Fantasia. “ima. aparição. Foram 25 anos ouvindo relatos desejosos estão associadas: fantasma e fantasia. uma ilusão visual. a prudência ou. se nifica “imagem ilusória. visagem. visão”. gosto particular. espectro. (fantasia). “imaginação – a de que as pessoas fazem essa associação. (1992). etc. há pontos de tangência nos vernáculos. e que também deriva dos verbos (1992). Em Ferreira (1993). feito do grego phos. em geral sob forma in- vernácula em comum. sig- recer”. ou seja. através de material não precioso”. Essas explica. disfarce ou vestimenta e é nessa inter­‑relação que a fantasia perde carnavalesca. obra ou criação da imaginação. produto da prática clínica. geralmente sob forma indefinida. eram acompanhados de medos e pavor da em Bueno (1975) significa “imaginação. uma “fantasia” de Carnaval “faz aparecer” suposta aparição de defunto de alma pena- uma personagem diferente daquele que a da. na maioria das vezes. ções vêm corroborar minha hipótese inicial ilusão”. mortos. “imagem ilusória. divagação. sonho. Em Larrouse (fantasma). faculdade imaginativa. As “fantasias” que todos nós. so. ou criação da imaginação. visão aterradora. tasmas). huma. são. mostrar”. máscara. obra esse triângulo de emoções. vesti- No site Origem da Palavra. nos. “imaginação. alucinação. aparição. uma de pacientes sedentos por viver a sexualida- dando origem à outra. Já fantasma. Ainda no site. imagem apavorante. menta usada no carnaval e em outros feste- mos a explicação que a palavra fantasia vem jos e que imita palhaços. visão”. quimera”. devaneio. devaneio. então. espectro. Em Ferreira (1993). assombração. essas duas palavras ca. que inicialmente criei pela dade. nos expõe a “imagens nharmos com uma fantasia. nos meses seguintes ou por longos e mais é do que a educação do desejo. ao contrário. po- é bom quando é bom no início. sem saber se era ou não promís. sem nos tamos deixando nossos fantasmas entrarem causar danos. que consideração a realidade circundante. doenças tal. nus. para portanto.216 Luiz Carlos Osorio. (1995). que exaurem nossas energias. filhos indesejados. após algumas horas ou dias (no fim). há algum tempo. o desejo de transar. Porém. sem filhos até um casal de idosos. nem durante. ilusórias”. Em outras palavras: é fazer o que se quer”. jugal varia desde um casal jovem. é duradouro. se a pessoa com quem tes: para os recém­‑casados. Cada arranjo conju- sem ter ponderado se era período fértil. trazer a virtude chamada se gerou consequências nefastas logo após temperança para nosso cotidiano. necessidade de obtenção do prazer imediato nossas fantasias podem fluir com segurança. quenos a criar. que levou somente em ‑casado. Quantas vezes uma simples transa. Observo que as fantasias sexuais neste prolongado fim. dolorosos anos. recasados. e nem depois. se gal vai priorizar fantasias sexuais diferen- havia preservativos. permanente e não causa danos em nenhuma etapa do proces- so: nem antes. que estou chamando de realidade conjugal sionado uma gravidez? Ou pior. que nada o ato. no desejo. à luz do sol. somente criação e ao devaneio em terreno fértil. quando conseguimos fa- jo de realização (acting­‑out ou atuação) ou a zer o que devemos – e não o que queremos –. na Realidade conjugal execução. Para tal. os idosos pode ser transar fazendo cross­ cua? Ainda pior. o barato pode iria transar era de origem desconhecida e. Desejo não deve ser inconsequente. Fazem parte do ou um mês e meio. (hedonismo e imediatismo). ao imaginarmos e so. nosso lado mais instintivo. depois de a estrutura ou arranjo do casal. que alteram e modificam nossa subje- considerado prazer? Penso que o prazer ge. é necessário levar em em ação. Quando fazemos o precisamos educar nossos desejos a fim de que queremos – e não o que devemos – es- que eles possam ser concretizados. pois em cada etapa do ciclo vital quente pode ser ainda chamado de prazer? temos tarefas desenvolvimentais a cum- Prazer só na excitação e na transa pode ser prir. único de realidade conjugal. conceito criado em 1977 pelo sociólo- sexualmente transmissíveis e até a morte go Duvall. que no Cada casal possui uma realidade dis- momento em que acontece (no início e no tinta. metacomunica que “não princípio da realidade. Vale lembrar a famosa frase de Kant Nem soberano. somente o dese. uma vez que gera. Não é possível estabelecer um padrão meio). contaminação por alguma DST. citado por Carter e McGoldrick pela AIDS? Isto é prazer? Prazer inconse. Devemos lem. nas consequências. na acepção ampla da palavra. é quase o “céu na terra”. em especial A estrutura do casal ou o arranjo con- a AIDS? E nos desdobramentos desse pra. os meses ou anos (no fim). ser transar na praia. pois estaremos dando vazão à imaginação. a cultura. pela o princípio do prazer precisa subjugar­‑se ao sua obviedade. gera o medo da valores e a ética. pelo risco de ter oca. O desejo precisa curvar­‑se à “Liberdade é fazer o que se deve”. com netos. protege. isto é. É totalmente diferente ter filhos pe- ser prazer. Kant não realidade. fim. pleno e completo. no meio e no rém assentado na realidade. tividade e nossa disposição para as práticas rado somente no início e no fim não pode sexuais. Ou em um linguajar psicanalítico: a complementa. e por muitas vezes variam de acordo com as etapas do ciclo vi- encetar abortos. à brar que prazer. consideração a vontade. . Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. recém­ zer inconsequente. por poder gerar mais dores ‑dressing. Não nos assusta e nos atormenta e que não nos podemos priorizar. contudo. os elementos que compõem esse quadro apreensões que podem durar uma quinzena têm variações grandiosas. mas a sábia expressão. Crescer em um país mais a consideram um mal necessário ao casa- liberal. e a pratica sozinho. Igualmente. caso teor e amplitude. preconceito. pensa para as pessoas poderem experimentar fan. para o compartilhamento até o desejo cons- Os valores morais e a ética também têm ciente de não querer abrir para ninguém seu influência na realidade conjugal. com a presença maciça do que marido. Há cônjuges que consi- A cultura também exerce influência na deram a traição imperdoável. mente acontecia quando havia manutenção além do “dono”. A concep. Manual de terapia familiar – Volume II 217 do momento de vida em que todos decolam traí minha mulher não. onde homens e mulheres vivem em mento. tive que ir. Muito das fantasias sexuais pelo contrário: quanto maior a repressão cultural e religiosa. e onde a orientação conhecê­‑las e respeitá­‑las. dez. em função da educação mais repres- homem. só transei”. Nessas socieda. de de represália. elas já fazem parte vacidade. porém. gosta­ sões sexuais e a necessidade das fantasias ríamos de considerar duas possibilidades para suportar um cotidiano tão sufocante. baú de recônditos pensamentos. em tempos de pró­ ças. Essa decisão está vin- tasias sexuais. O fato de pessoas viverem sob repressão não Esferas de alcance significa a morte das fantasias sexuais. há outros que fantasia do casal. Cada casal tem suas próprias cren- situação mais igualitária. Nesse caso. a carne é fraca. isolamento social e acordo com os valores morais. é inimaginável. escárnio. é diverso do casal entrando em um motel com outro homem. não que não correriam o risco de serem vistas deixam a casa dos pais –. em sua própria casa porque assim vem sendo chamada de “geração canguru” – estaria preservando seu parceiro. tem conhecimento do seu e montagem de casa para a amante. que a imagina. e o terapeuta sexual e de casal precisa ‑equidade de gênero. consideram ver ou praticar o sexo virtual9 fas desenvolvimentais a serem cumpridas. doutora. Também e deixam o ninho (ninho vazio). e o fato de a fantasia sexual ser ou liberdade para vivenciá­‑las. uma vez filhos que. transar com outro parceiro. fantasias sexuais existem. que vão (“brinquedinhos eróticos”) e de roupas para desde a impossibilidade de ter parceiro(s) performance erótica. não mediada. de acordo chats como traição. mas ninguém. que não seu nho lotado”. apesar de jovens e formados. ter o “ni. como saídas furtivas. ao passo que. Dentro de nossa abordagem. lheres são submissas aos homens e onde a expressão da homoafetividade é negada. Alguns autores acreditam contrário. há outros. dentre outros. com a oferta de acessórios culada a vários aspectos pessoais. maior a força das pul. é diametralmente fantasias sexuais terão maior ou menor flui- o oposto de viver em um país onde as mu. mais comuns em mulheres do que em ho- plicadas assim: “sabe como é. Já tive pa. a presença de sex­shops8 nas ruas. por medo ção de traição. que com as pessoas que coabitam e com as tare. que nunca teve filhos. como uma traição. liberando já tive pacientes mulheres que aceitaram energias represadas. des. sexuais na internet ou manter bate­‑papo em derão ter mais ou menos vazão. de alcance das fantasias sexuais: a fantasia A questão a que me refiro diz respeito à ex. sou mens. não era que essas fantasias sexuais individuais são considerado traição. sexual individual e a fantasia sexual compar- pressão livre (ou discreta) das fantasias e à tilhada. por A fantasia sexual individual se situa exemplo. de acordo com esses valores. suas crenças eram ex. As fantasias sexuais Há casais que não consideram ver relações serão influenciadas por essas vivências e po. pode variar. é vivenciada e experimentada so- do cotidiano das cidades e são um recurso mente pelo indivíduo. e entender que as sexual diversa é aceita. mas não siva que receberam e em decorrência de . nas no conceito anteriormente descrito de pri- culturais mais liberais. por exemplo. as cientes homens para os quais a traição so. que por sua vez es- ao parceiro. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols.14 Esses tópicos se cruzam e trução ao longo do ato sexual. permitem a presença da fantasia regulada. a decisão de do da necessidade de se lançar mão des- partilhar uma fantasia com o parceiro deve ses recursos e da permissão dada pelo(s) levar em conta. Rodrigues e coletivo12 como aqueles que acontecem em Vitiello (2001). além do grau de intimidade outro(s) parceiro(s). há pessoas ou casais que querem am. sias sexuais. motéis. la que acontece através da mediação se- a intimidade conjugal (conceito que defini miótica: cenas de filmes. a confiança mútua construída. e a potencializar o prazer. “O cérebro. pos de homoafetivos se reúnem. endorfina e dopamina isto implica desconforto. nem homens e nem mulhe. pos verbais presente do indicativo. livros. Esses estímulos nos excitam porque ativam cia. dependen- acordo com Crawford (2007). Mais adiante iremos abordar essas pliar essa esfera e compartilham com um possibilidades. ao lado do amor. chamado de sexo pesquisa realizada por Lima. Não é concebível que um parceiro im. terceiro (ménage­‑a­‑trois)10 ou com outros do com a Sbrash (Sociedade Brasileira casais (prática do swing11). E de acor. o hipotálamo.218 Luiz Carlos Osorio. Temos de trabalhar que é confortável para você e o que repre. tato. Há. Portanto. o de Estudos em Sexualidade Humana). relacionamentos insatisfatórios. paladar e de material “comburente”. reúnem com garotas de programa. mas seu cérebro”. o fato de que a ideia precisa compartilhada. Ainda dentro da esfera compartilha. em quaisquer jada e excitante. da atração física. agendamento pela internet. O limite entre o que desejo para timulam o desejo sexual e proporcionam mim precisa sempre estar antenado com o euforia e bem­‑estar. concor. a mente e o psiquismo tende a en- que você gostaria que eu fizesse?”. devemos evitar fazer tesão. de alguns requisitos bá. audição. dentre outros. com as máximas que pregam que “a mente senta para nós. Em vilegiada. entretanto. em compartilhar múltiplo. a meu ver. sicos para que aconteça: o desejo de dividir A fantasia sexual mediada é aque- confidências. caso a fantasia seja com o parceiro. Observe gendrar mais poder às sensações sensórias que estou usando os verbos sempre nos tem. tudo que possa vir a estimular o tando?”. da paixão. “Está gos. são: “Está confortável para você?”.1 nos ajuda a visualizar pergunta “Foi bom para você?”. roupas. sexuais e ficar excitado com essa experiên. Não podemos esquecer que ser excitante para os dois. De como na esfera compartilhada. o exercício da sexualidade envolve os cin- do com a autora e penso que. por se tratar co sentidos: olfato. tasia. ou gru- A fantasia compartilhada. e tudo aquilo que vem estimular sa concordar com esse risco de “combustão” a captação por esses cinco sentidos irão inerente à troca de confidências e propostas potencializar nossas sensações sensoriais. gerúndio as fantasias sexuais estão em situação pri- ou no futuro do pretérito (condicional). o parceiro preci. Isso mostra os dois tópicos descritos acima: a interfa- que a preocupação foi com o resultado (bom ce entre a realidade conjugal e as fanta- ou ruim). que libera grande descarga ponha ao outro seus desejos e devaneios se de noradrenalina. onde grupos de heteroafetivos se ceiros habituais. objetos. inibição e afronta na corrente sanguínea. da e a construção do significado da presença Pode acontecer tanto na esfera individual das fantasias sexuais na vida dos dois. e não com o processo de cocons. . revistas. dos tempos do pretérito. dentre outros. visão. do termos de sexualidade. Darkrooms13 ou em quartos mais amplos de res costumam relatar suas fantasias aos par. cheiros. a permissão negocia. ainda. da ambiência dese- questionamentos no passado. O que costumo chamar de é nosso maior órgão sexual” e que o “ór- “critério do conforto” é sempre útil nesses gão sexual do homem e da mulher não são casos. através de precisa. como a clássica A Figura 18. De fato. e as perguntas que devem ser feitas seu pênis ou a sua vulva. da fantasia excessiva e da ausência de fan- da. “Está sendo bom para você?”. Nesse quesito. no início do capítulo). a ambiência está ber distinguir entre as fantasias que gosta. contraírem DSTs e AIDS. na hora do sexo. com ela podemos O parceiro pode preferir imaginar ser uma imaginar o que queremos. Na realidade. com se- paciente me relatou certa vez ter a fantasia gurança. é a possibilidade na nossa cama. não há ménage. mulher. nas areias douradas da praia. é que a fantasia pode per- te os dois. nus. concreta e presencialmente. é completamente distinta ser jogos imaginativos que liberam o casal daquilo que pensamos ou imaginamos. levar em conta. mente imaginada e relatada ao parceiro. nos.. na ocasião com belos partir de então ou de correrem o risco de craques. .. fantasias. não há areia. Esta é a grande der o seu encanto. Talvez ninguém tenha sido mais pode ouvir uma advertência imediata dizen- feliz em falar dessa distinção quanto a sexó. é “terra de ninguém”. Da teoria à prática e aquelas que prefere só imaginar e brincar através de descrições e relatos. Quando se imagina uma mágica das fantasias sexuais: é preciso sa. o amante corresponde àquilo que ria de realizar. tal devaneio com o parceiro. “Fantasia é aquilo que acontece A grande vantagem da fantasia so- na nossa cabeça. fazendo um ménage­‑a­‑trois imaginá- sa mente. adequada. com de transar com todo o time de futebol de um quem teriam de compartilhar um segredo a grande clube carioca. uma vez que ima- loga brasileira Maria Helena Matarazzo na ginar areia na pele faz com que ele se sinta frase acima. que aceitava a Outra questão importante que se deve imaginação e brincava com ela. nosso cérebro..” de se mudar rapidamente de cenário e de Maria Helena Matarazzo protagonistas. marido e mulher. 2006 Figura 18.1 Interface entre a realidade conjugal e as fantasias sexuais. não há nada a não presencialmente. Mas.. e o terceiro personagem é um homem. De fato. seja virtual ou praia. e que partilhava. realidade é o que acontece com sua devida anuência. Uma para brincar em sua própria cama. nosso psiquismo. três. do para mudar o cenário. situação tudo é perfeito. como ela chama. Se na hora da transa um par- ceiro disser para o outro que imagine que Uma questão crucial e divisora de eles estão em uma praia paradisíaca. sua textura de pele é agradável. que ficou tão célebre. quando se passa da imagi- tamente. Já a materiali. isto é. não há zação do que fantasiamos. nação à prática. rio. fazen- águas diz respeito à “materialização” das do amor. Ou que estão transando a “nossa cabeça”. sempre houve em sua cama somen. Manual de terapia familiar – Volume II 219 Fantasia sexual x realidade conjugal Fantasias + Individual Compartilhada Mediada Realidade do casal + Estrutura Ética Valores Cultura Werner. sem ficar à mercê de terceiros. concre. se deseja. desconfortável. paciente. lizando a satisfação sexual. é prudente que a pessoa ou os desconforto para um ou para ambos. a vivência de tal ça de fantasias sexuais. Os resultados encontrados mos- Outro aspecto a ser lembrado diz res. e o sexo do entre- trabalho. presença de encontros. feminino. Em minha experiência clínica. Um determinado dia. podemos dizer que as fantasias servem: ra se­xual e entrou em pânico. casal. estrutura. uma paciente re. Costumo dizer que criança . ela se deu conta de que o cultura e valores morais. marido ficaria sozinho com a “outra” parcei. Não podemos comparar o uso de pela Sociedade Brasileira de Estudos em vestimenta erótica ou de fantasia de bom. quando va. através do preenchimen- envolvem terceiros. Convidar “men. nada aconte. necessidades. sendo que 80% destes eram do sexo de cross­‑dressing. to (via internet) de protocolo padronizado dência. segundo o marido. por exemplo) pode gerar ciúmes vistado. cabe advertir aos tipo de jogo. presen. fantasias como importante mecanismo auxi- latou que ela e o marido faziam fantasias liar na fase de excitação sexual (em 65% das sexuais com a gerente de produto da em. Porém. na qual a gerente também iria estar. perce- sa. mas nunca sabemos como elas termi. casais que quando se fantasia com pessoas mos para a realidade. parceria.220 Luiz Carlos Osorio. uso de vibradores15 etária dos entrevistados variou entre 14 ou de géis que alteram a sensação térmica e 60 anos. Costumo dizer a meus pacientes fantasias sexuais é a de promover o encon- que “sempre sabemos como as coisas come. sexual fica mais enriquecida com a presen- ceu além. lança mão das fantasias sexuais. com o término da jornada de trabalho no desejos. seu cheiro é excitante. Adentrar para o universo de práticas uma pesquisa sobre fantasias sexuais com mais radicais.039 sujeitos. ela lidou bem com a situação. de zendo brincadeiras com o parceiro. saíram para jantar. Assim. desistiu imediata. de fato.. ocasionais ou natu- mente. fa. por e a potencializa. idade. requer cautela e pru. A faixa beiro ou de enfermeira. há uma grande dis. potencia- çam. acordo com seus interesses. conversaram. parceiros pensem muito bem antes de cru- zar os liames entre a realidade e a fantasia. individualmente ou em princípio. e. tro entre o desejo e o erotismo. gócios com outros funcionários da empre. como o ménage ou o swing. como a descrita pela paciente. que a intensifica situação foi sentida como uma traição. Um das funções mais relevantes das cialmente. local da viagem. o objetivo e a frequência dos de outras inserções sociais (de locais de das fantasias relatadas. Objetivos da fantasia sexual vaneios e iniciar uma prática sexual mais ousada. com predomínio dos 15 aos 29 com uma ida a um darkroom ou um clube anos. Para ela. quando viu partes do corpo A possibilidade da perda de controle.. guma espécie. traram que a maioria dos entrevistados peito a pessoas com as quais “transamos” na (90%) relatou ter fantasias sexuais de al- imaginação ou na vida real. Em bi que cada pessoa. os homens utilizam como auxiliar no presa do marido. Porém. Sexualidade Humana (SBRASH). Certa vez. da rede social se corre o risco de viver situa­ tância. terior à excitação). Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. seu despertar do desejo (o desejo é uma fase an- marido foi escalado para uma viagem de ne. Eles. gênero. como me contou certa vez uma ções tensas. De maneira geral. por notar presença de abscessos de rais. Enquanto as mulheres utilizam as e desconfortos. por se tratar de um tipo ele ter se colocado à sós com a “parceira” de “brincadeira de faz de conta”. especialmente aquelas que 1. rença entre o tipo. tomaram a) Para intensificar o prazer sexual: a prática drinks. ou por um dos parceiros pode gerar tensão e Assim. porém. entre imaginar e colocar em prática os de. totalmente fora do previsto pelo casal cor amarelada. Foi realizada nam”. porém com significativa dife- tal” ou presencialmente parceiros conheci. de um que era dos dois. vezes). pela de seu provável parceiro. que. sem fantasias sexuais é um problema. presença do lúdico. aumentando. mas não conseguir sentir prazer causadores de censura. para nos excitar e dar prazer. O casal precisa conseguir transar com e exatamente. corretas ou inadequadas. o para nos auxiliar a sair. Nesse erótico. e. presencial. etc. que é representado f) Para reduzir a ansiedade: as fantasias se- pelas fantasias. Há da manutenção da ereção (em homens) e fantasias mais frequentes e as menos fre- da lubrificação (nas mulheres). portanto. Sexo é um jogo que fera da sexualidade. as fantasias se tornam necessárias: conhecidas. do gênero. constrangimento. após longos retornos ou brigas. im- rotina: podemos fazer sexo vigoroso ou pedimentos físicos e situações de tensão. sexual. g) Para alimentar a história do casal: o uso pudorado. viagens. tas ou erradas. potencialização do orgasmo (em homens Há funções produtivas e benéficas para as e mulheres). e. mostra uma dependência psicológica desse quando vêm à tona. principalmente em b) Para sair da rotina: os vários tipos de situações desfavoráveis à prática sexual. pois desconforto. “segura” de liberar pensamentos. fantasias. em do corpo de forma lúdica e criativa. ao casal. para um oásis no meio do deserto (aqui compreendido como o cotidiano estres- sante e racional. mentam a cumplicidade e a intimidade dulações mais liberadas. Manual de terapia familiar – Volume II 221 pequena brinca de boneca e carrinho. ca conjugal. As fantasias sexuais são variadas. mente. mal­‑estar. Neste caso. que alivia o estresse. as individuais e as compartilhadas. dem significar problemas de personalidade tasias sexuais representam uma forma ou na dinâmica do casal. além de tornar o ambiente do requisito primordial. desejamos ou queremos fazer. a fantasia será conjugal. realizá­‑las concretamente. a “cumprir tabela”. fora do momento da recurso. e atua na quentes. vo e/ou substitutivo. modulação sexual nos auxiliam a sair da como ausência do parceiro. onde. ou sintoma na vida conjugal? c) Para facilitar as fases da resposta sexual: as fantasias sexuais são verdadeiros “esti. O que essa obrigatoriedade está realmente. Haverá noites de romantismo. Nas mo. É interessante que o casal de fantasias sexuais compartilhadas au- possa ir mesclando modulações. rias e nem presentes. Porém. relaxa. haverá noites “tarefeiras”. sexo romântico ou sexo dentre outros. há dias em que contribuindo para a expansão do prazer precisamos de “férias” do cotidiano. gente aprendizado individual e conjugal. sexo tântrico. medo e culpa. o fato de não termos de sem fantasias. Elas são jogos que fogem ao pa. haverá noites de encantamento e arrebata- e) Para aumentar o repertório de práticas mento. selvagem. sexo comportado ou sexo des. As fantasias sexuais nem da fantasia torna­‑se um sintoma da dinâmi- sempre estão relacionadas com algo que. a presença obrigatória prática sexual. sexuais: as fantasias sexuais propiciam talvez. e o oásis como lugar de Fantasias sexuais: saúde recuperação da longa jornada diária). indo além das possibilidades momento. de- mulantes” que fazem parte da construção pendem de cada indivíduo. fortalecendo o casal. funcionando como algo alternati- drão racional do pensamento. as fantasias não sejam nem necessá- abertura para novas práticas sexuais. a brincadeira fica ainda xuais podem aplacar a urgência da prática melhor. como costumo dizer . Não há fantasias cer- excitação (especialmente nas mulheres). que aumenta permitindo explorar sensações naturais a autoestima e que gera bem­‑estar. desejos A fantasia sexual não é indispensável e sentimentos recalcados e reprimidos. mas há também desvios que po- d) Para auxiliar a experimentação: as fan. da idade e de cada casal. na es- grande brinca de sexo. querendo dizer? Parte da magia das fantasias sexuais é. como passaporte casal mais divertido. da do desejo (especialmente em homens). doras e construtoras do desejo. uma vez que a mente é pródiga. através de devaneios. a fantasia prevalente entre a manutenção da ereção. visão. desperta.17 uma vez que Na pesquisa de Lima. Transtorno do Desejo Sexual Hipoativo – f) fazer sexo em lugares exóticos. que fogem à norma social vigente. sexual. Rodrigues e cria ambiente sedutor. capaz de propiciar Vitiello (2001). HSDD).20 uma vez que o orgasmo (2007) lembra que as fantasias sexuais são pode ser evocado através da audição. mantidas na imagina- dade para imaginar e experimentar várias ção. sinais de saúde para o casal e funcionam compartilhadas oralmente ou postas em como recursos naturais para que eles alcan. compartilhadas oralmente ou postas situações sexuais além do limite da realida- em prática são: de. um excelente recurso terapêutico e podem b) fazer sexo com garoto de programa. b) na disfunção sexual erétil. Como terapeuta sexual e de casal. nesses casos. lizado. Mas. Elas concedem aos parceiros a liber- pacientes mulheres. tanto d) ser dominado por uma mulher. onde os parceiros podem ser amantes latinos. desde que não se transformem . Crawford e) na anorgasmia. sendo também comuns fantasias de permitido admitir – algum tipo de fantasia relacionamento com mais de uma pessoa. mantidas na imaginação.19 uma vez que imaginar sias sexuais se tornarem um sintoma. que estamos relaxar e a distender a musculatura e a diante de desvios sexuais. isto é. Em minha prática clínica. da saudáveis. a) fazer sexo com dois homens ao mesmo acredito que as fantasias sexuais podem ser tempo. da realidade canhestra para o mundo idea. sonhos. imagi. d) fazer sexo com outra mulher. podem ajudar a liberar a ejaculação. vulgar. auxiliar: c) fazer sexo grupal.16 promovendo a construção de g) imaginar­‑se no papel de uma mulher imagens eróticas estimulantes. e) ver sua mulher fazendo sexo com outro mulando a criatividade e tornando o sexo homem. de “AM para FM”. a meus pacientes. sexuais mais frequentes que ouço de meus Nesse aspecto. ou de vestimentas. as fantasias cem ao imaginário sexual de todo homem e sexuais mais frequentes que ouço de minhas mulher. As fantasias sexuais. uma ou visualizar cenas eróticas ajudam a doença? Falamos. onde não há celulite e nem calvície. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. combinando corpo e mente. a) na disfunção de desejo (especialmente no e) ser dominada por um homem. com a utilização ou não de artefatos grama ou desconhecida. a) fazer sexo com prostituta. prática são: cem o prazer sexual. Na pesquisa de Lima. já que as fantasias sexuais perten- Em minha prática clínica. na experiência sexual em si mesma. as fantasias cheios de furor e volúpia. mais prazeroso. esti. do tato e do cheiro de artefatos. geram um aprimoramento c) fazer sexo grupal. visões e falas sexualizadas. os homens mais frequente- sexualmente ajustadas podem ter – mes- mente fantasiam com mulheres desconhe- mo que nunca tenham experimentado ou se cidas. suas sensações. as fantasias sexuais são pacientes homens. ao b) fazer sexo com duas mulheres ao mesmo auxiliar o indivíduo a focalizar seu corpo e tempo. mulheres é a de um relacionamento sexual c) na ejaculação retardada:18 uma vez que a com o parceiro. garota de pro- nação. comportamentos lubrificar a mucosa vaginal.222 Luiz Carlos Osorio. Rodrigues e Todas as pessoas que se consideram Vitiello (2001). por vezes em condições fora menção a cenas potencialmente eróticas do habitual. e quando acontece de as fanta- d) na dispareunia. para os indivíduos como para o casal. como uso de roupas eróticas. arroubos. boas. pela presença de práticas sexuais tos. Dentre Neste primeiro tipo. sem grandes novidades. nos quadran. adequadas. É o sexo habitu- e adolescentes. Vitiello (2001) descreveu mais de 300 tipos de desvios sexuais. principalmente de gerações mais velhas e os mais novos. + Realidade e – Fantasia diquem o outro. por mais simples que se- e) Bestialismo ou zoofilia: práticas sexuais jam.2 Tipos de sexo resultantes da tensão entre a realidade conjugal e as fantasias conjugais. explo. de estilo mais tradicional. É o sexo c) Urofilia: práticas sexuais relacionadas à que leva em conta mais a realidade conjugal. imaginativo”. com valores morais. 2006 Figura 18. não se tornem desconfor. temos a presen- os mais repugnantes estão: ça da realidade do casal e a ausência da fantasia. e agrupa um grande grupo de ca- sais. Manual de terapia familiar – Volume II 223 em uma obsessão. temos tanto a tasia sexual em direção à realidade do casal presença da realidade do casal como da (também já descrito) (Figura 18. comedido. teremos os seguintes tipos de sexo: xuais tanto tradicionais como mais liberais. pela presença de práticas se- tes. É o que estou chamando de “sexo do com o progresso da fantasia. mas sereno e previsível. fantasia. Há prazer com animais. De acor. trivial”.2). Fantasia sexual x realidade conjugal Fantasias + + Fantasia + Fantasia – Realidade + Realidade Sexo sem limites Sexo imaginativo Realidade do casal + Sexo nulo Sexo trivial – Fantasia – Fantasia – Realidade + Realidade Werner. É o que estou chamando de “sexo a) Necrofilia: desejo de fazer sexo com mor. é possível visualizar o que já descrevemos. ço para fantasias. mas com pou- b) Pedofilia: desejo de adultos por crianças co ou nenhum “tempero”. seguro. . para praticar sexo. do tipo “papai ração comercial e sexual ou pornografia e mamãe”. sem espa- a fezes. um caminhar da fan. sem grandes infantil. Tipo 1: Sexo trivial: táveis para a própria pessoa ou não preju. Neste segundo tipo. urina. culturais e religiosos d) Coprofilia: práticas sexuais relacionadas mais tradicionais e conservadores. honesto. Tipos de sexo resultantes da tensão entre a realidade conjugal e as fantasias sexuais21 Tipo 2: Sexo imaginativo: + Realidade e + Fantasia Nesta ilustração. tradicionais. al. sem a presença da realidade e sem a presen- sem esquecer o sabor das “transgressões cal. com desviado. pelos danos decorrentes lisado. moral e preender o quanto o tema fantasias sexuais espiritual. à violação de direitos das mulheres. Mas. É. das faremos. pírito dos parceiros. Não há pra- intenso. dependendo do momento e do estado de es. caberá a cada cia da realidade do casal como da fantasia. É um sexo inconsequente. a delicada situação da sia. ana- não há prazer real. vam em consideração que sexo faz parte da xualidade mais adequada a nosso momento vida e é “brincadeira de gente grande”. na verdade. A primei- adequado. o estres- crianças e dos adolescentes e que necessita se. queno. jetivos das mesmas. com toda carga de tradições. diversificados e heterogêneos. ra vista é o sexo impossível. É o sexo prazeroso. zer sexual. podemos de- os riscos. Neste gru. cheio de fanta. temos tanto a ausên. realidade. é. pela presença de práticas sexuais tênue distância entre saúde e sintoma com a arrojadas. lidade conjugal é igualmente diversificado. se depender de estarmos totalmente bem e de doentia e perversa. as inter­‑relações entre realidade conjugal e Neste terceiro tipo. sem levar em conta a realidade. agir e concretizar é um passo que deve Neste quarto tipo. É um grupo pe- atualmente. São pessoas para as quais a se- sias. deve existir e fazer parte da vida de todos lidade. mas aceita a performance das fanta. isto sócio­‑histórico pois acata a presença da rea. pensar e falar para fazer. uma vez que o conceito de rea. os adultos. casais não. É o que estou chamando de “sexo sem transposição entre a teoria e a prática e a limites”. o grupo formado pelas pessoas assexuadas. nem grande. indivíduo e a cada casal saber o tamanho do . e agrupa grupo de casais bem va. o papel e os ob- da realidade do casal e a presença da fanta. Elas não são obrigatórias e nem devem ser bani- das. orgasmos plenos e vida sexual ativa aquelas que não sentem desejo (não há pen- e diversificada (porque permite a presença samentos e nem fantasias sexuais) e nem le- de fantasias variadas). culadas”. a meu ver. tal o poder agregador ou destruidor dessas práticas. ser cuidadosamente pensado. as fantasias se po. o cansaço. conversado. que leva em consideração a reali. é um sexo equilibrado e rico. mas existe.224 Luiz Carlos Osorio. Há prazer xualidade não é uma questão. presença das fantasias sexuais. temos a ausência fantasias sexuais. estão as pessoas com desvio de caráter e apresentam como recurso lúdico para abrir com sérios transtornos de personalidade. nem riados. Dependerão de fatores variáveis. uma vez que dade conjugal. a falta de sono e a presença de preocu- de tratamento psicológico e psiquiátrico. É um sexo desconectado da nas relações conjugais. onde necessita ser questionado. tal o desgaste. espaços possíveis para a sexualidade. Igualmente. ça da fantasia não há vida e nem sexo. não existe a situação ideal. os danos à saúde física. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. transpor – Realidade e – Fantasia a barreira entre desejar. É a sexualida. estáveis para a prática sexual. afeita à violência físi. Conclusão Tipo 3: Sexo sem limites: – Realidade e + Fantasia Depois de analisarmos as definições. a se. nem pequeno. É o tipo de sexo mais pela ausência de práticas sexuais. há um grupo pequeno de pes- sias que não ameaçam (pois não esquece a soas que se encontram aqui. já ex- Tipo 4: Sexo nulo: postos neste capítulo. É realidade do casal) e que propiciam relaxa. com presença de práticas sexuais Sempre falo para meus pacientes que. mento. Há pações em que estamos mergulhados. desviantes da norma social. Como prazer questionável e impróprio. É o que estou chamando de “sexo nulo”. dificilmente ca. o alcance. São pessoas com embotamento vasta gama de atores – a maioria dos casais afetivo e aridez de emoções. Deficiência ou ausência de desejo sexual. nome CD. também chamado somente de fazer sexo com duas mulheres ao mes. Também conhecido como cibersexo. mesmo que é um protocolo de comunicação utilizado na carregada de paixão. por uma malformação embrionária. Conhecido como troca de casais. luminosidade. Mental pela Unicamp. com penetração. sendo do sexo oposto. Pelo menos teriam com quem conver. que a a identidade das pessoas envolvidas. Indivíduo que possui órgãos sexuais dos dois ou backroom. brincadeira que também opto em terminar 9. e é com esta sexual. Sexshop é uma loja que vende produtos com um passo maior do que a perna”. por motivos ção difícil de ser tratada. acessórios de sadomasoquismo. A lei de Gauss da distribuição normal de a prática sexual no anonimato. homossexual e bissexual. Além Universidade Federal Fluminense. conhecida pela sigla DE. �������������������������������������������� Dificudade sexual. É um termo que se refere a pessoas que vestem 16. analizar frequências.. por razões variadas. ou manter a ereção. 14. trabalham com estatística e que precisam em boates gays. vez que o homem não é impotente para a vida. Pode ou não envolver a prática de sexo com Também pode ser utilizado em partes dife- penetração e é conhecido pela sigla BD. comum em clubes de apenas seu pênis tem uma disfunção para ter striptease. 11. 12. por não se tratar de uma escolha. e em outras salas de bate­‑papo. pode ser o soft swing. tesão e sedução. de ménage. É o que comumente se conhece como orgia 1. É o sexo a três. permitem 3. beijos e sexo notas oral. e a psicoterapia uma faceta feminina (para os homens). Agradeço a ajuda de meu marido. se diz orientação sexual e não opção trução desta e da figura seguinte. É um tipo específico de fetiche. é comum este capítulo. 6.. É uma dança erótica. bone- Em São Paulo. 7. rentes do corpo. relacionado ao sadomasoquismo. ou o hard swing. lembrando que a sexualidade em canais de IRC (Internet Relay Chat). Jairo 4. tardada durante um longo período de tempo. e não Adolescência na Faculdade de Medicina da somente a escolha de parceiro sexual. ������������������������������������������ Indivíduo que possui uma identidade de gê. Disse. em 2006. Conhecida como impotência masculina. uma vez que sexo a três é conhecido tendo o desejo de viver e ser aceito como como ménage e a quatro como swing. cas infláveis. atual­ Werner. como vibradores. formatação como também na interlocução e 5. e alguns medicamen- profissionais ou para obter gratificação se­xual. sualmente com ou sem roupa. Esta é a maneira por que tenho optado.. visto que a ciplina de Neuropsiquiatria da Infância e da orientação abarca afeto e vida social. tem se mostrado pouco efetiva. é������������� um relacio- sar depois que ele pegasse no sono. já que é uma prática com cinco ou mais nero diferente da designada no nascimento. Há seis ideia. é um tipo de travestismo. uma afetividade. é uma disfun- masculina (para as mulheres). não só na sexual. ao término da palestra. cremes e géis para uso fiz uma provocação ao público. apare- acompanha. que: “Todo homem tem a fantasia 10. 13.. em que a ejaculação é re- sentar no colo do cliente que a assiste. para e imobilizar seu parceiro ou pessoa envolvida. Não oposto. em que a dançarina move­‑se sen. preservando erros e sua curva em formato de sino. que roupa ou usam objetos associados ao sexo gera diminuição de frequência sexual. É um aparelho utilizado para vibrar em partes principal fonte de prazer consiste em amarrar da genitália. geralmente discussão de minhas ideias. totalmente inaceitável nos dias de hoje. tipos de variações possíveis. tos têm se mostrado promissores. produzir estímulos sexuais e causar prazer. As mulheres deveriam gostar da francesa que significa “mistura a três”. que é uma expressão de origem mo tempo. mas não é transexualismo e nem homo. não podemos “dar 8. sexual. blackroom 2. podendo vir a 18. ao fazer referência aos termos heteros. Doutor em Saúde mente. ou escuridão total. conhecido pela sigla 17. em que a 15. finalidades eróticas. com apenas troca de carícias. é hoje familiar para todos que ceram nos Estados Unidos nos anos de 1970. internet. pessoas. são salas que devido à baixa sexos. namento sexual entre dois casais estáveis que praticam sexo grupal. Médico Psiquiatra. Conhecidas como quartos escuros. roupas de personagens. Manual de terapia familiar – Volume II 225 sapato e do passo a dar. especialmente a feminina. que deveria ser sempre lúdica e leve. responsável pela dis- sexual. na cons- disso. Dr. desde vivenciar existe tratamento aprovado. . 1993. ed. VITIELLO.l. tes em progressão. 7. São Paulo: guesa. Ática. VITIELLO. MCGOLDRICK./dez. 2010. Mesa-Redonda. E..com. 1975. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE TERAPIA BUENO. et al. Positivo. Curitiba: controle. 185-193. 2006. P.org>. Socie- uma vez que a mulher não é “fria” e nem dade Brasileira de Estudos da Sexualidade Humana. 19.br>. Disponível em: <http://www. v. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. D. 9. ed. antigamente conhecida como frigidez. 20. CARTER. Disponível em: <http://www. 2006.. n. 2010]. lavra. É a falta ou dificuldade na obtenção do or- gasmo.]. Acesso em: 16 abr.l. [S. B. M. CRAWFORD. N. nome totalmente inaceitável nos dias de hoje. F. 2001. . N. Dicionário escolar da língua portu. M. [S. guesa. de H. medo. B. 2007. São Paulo.226 Luiz Carlos Osorio. É a sensação de dor na penetração ou durante FERREIRA. Minidicionário luft. 12. 2001. RODRIGUES. wikipedia.origemdapa- 1995. ed.. LIMA./out. B. com prazer. Revista Brasileira de Sexualidade Humana. da S. de H. A. n. ABRATEF. ed. Fantasias sexuais e conjugali- dade. 21.: s. D. “frígida”. Normalmente DICIONÁRIO Larousse da língua portuguesa. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. como FERREIRA. LAHIRIHOY. jul. Disponível em ciclo de vida familiar: uma estrutura para a tera. C. J.. ansiedade Paulo: Moderna. Anais. Origem da palavra. 7.n. 2006.. Minidicionário da língua portu- a relação sexual. B. apesar de o pênis estar ereto. A. Porto Alegre: Artes Médicas.: s. Rio de Janeiro: FENAME. 1992. 20. 2008. mai. 7. M. São é causada por nervosismo.. 2. Agradeço. São Paulo. As mudanças no Origem das palavras. Acesso em: 17 abr. Miniaurélio: o minidi- necessidade excessiva de manutenção do cionário da Língua Portuguesa. FAMILIAR. desvios parafi- lias e perversões. ao Dr. p. Principais variações. Sexo sem tabus: para viver o sexo WIKIPEDIA: a enciclopédia livre. pia familiar. 2000. C.. (Coleção sexualidade e saúde). Resumo de trabalho sobre fantasias sexuais.n. M. Referências WERNER. São Paulo: ajuda na escolha dos nomes para os quadran. Jairo Werner a LUFT. 2. novamente. v. 3. e condições psicológicas adversas. ed. Lisboa: A Esfera dos Livros. 2. 2010. Penso que o momento histórico era soas me perguntam qual é a minha origem. Dizem­‑me que culturais. não tanto. de outras. com luz recíproca. e o gosto pelo estavam respeitando as lealdades com suas doce de leite. periência com Carmine. tiveram no cotidiano. iniciada em 2004 no crenças e valores da parte italiana de minha Instituto Sistemas Humanos. Os Casei­‑me em dezembro de 2008 e resido rituais e a cultura de algumas delas se man. porém. mas meu gosto por massa vem de diferenciação de cada um deles? Será que mesmo do meu avô italiano. de algum modo. Tenho raízes provenientes de Minas do também a mim. sobre as dificuldades encontradas e tenho os traços russos. Muitas perguntas invadiram meus pen- de qualquer maneira estão. 50) Introdução Muitas coisas me chamaram atenção. 2004. com meu marido em Roma... chegan- mundo. da minha avó mineira. Como foi o processo alemães. (Braudel citado por Medrado e Spink. capítulo 19 Escolha e Destino: casais interculturais Larissa Rosa Fedullo Schein Cada atualidade reúne movimentos de origem e de ritmo diferentes: o tempo de hoje data simultaneamente de ontem. propício.. ra terminar minha formação e escrever a . além da beleza de revisitar as de Casal e Família. p. mesmo depois. o presente e o passado esclarecem­‑se mutuamente. Familiare. Em 2006. em específico. E pelo meu nome muitas pes. essa “tradição” se manteve. em sua Accademia di Psicoterapia della dade à minha especialização em Terapia Famiglia. além de Rússia. samentos ao refletir sobre essas escolhas inter- gravadas na minha alma. onde fiz meu genograma com os Ao retornar ao Sistemas Humanos pa­ professores Carmine Saccu e Ana LaMesa. de anteontem. a culpa dos judeus sobre os preconceitos.. que no ano em que fi- Gerais. me tocou: o fato de que muitos casamentos foram realizados entre Tive sempre muito orgulho da história da pessoas de diferentes nacionalidades e cul- minha família. turas. mas uma. quei na Itália me apaixonei por um italiano. LaMesa e Andolfi quando estive na Itália para dar continui. parte do script esperado por todos? Já faz algum tempo que penso sobre Voltei da Itália enriquecida pela ex- os casamentos em minha família. Alemanha e Itália. frequentei por família e a fecundidade e perplexidade da um ano a Scuola Romana di Psicoterapia paixão com Luca. em outras Meus avós vieram cada um de uma parte do épocas. de outrora. Enfim famílias de origem? Aquele casamento fazia uma grande mistura. que se encontraram todas aqui no Brasil. do sagrado. como o do casal que foi meu vidos naquela história. como en- Elizabeth Pascual do Valle. a escolha de parceiro nessas indagações. 2000). preexistente. adolescência. Já o des. a (1988). o revisitar de minha história seu. leitor deste texto. a fazer sua parte. e. p. pen.. a decisão de casar e colha de seu foco e metodologia. e dessa experiência surgiu o título dito que as convenções de relacionamento “Escolha e Destino”. construir os próprios caminhos. intercultural através das viagens que fiz aos A compreensão da vivência que envol­ lugares de origem de meus avós (Alemanha veu fazer este trabalho. sinto que fiz a parte crucial do seu mundo existencial” uma peregrinação junto ao casal que en- (1991. tágios do ciclo vital da família (nascimento O sagrado para mim está no emergir da dos filhos. sem a quebra do pertencimento: a possibilidade de pertencer e. que é romano.228 Luiz Carlos Osorio. casamentos. ele no caminho da singularidade. foi valiosíssima para a concre. o tema estava escolhido den. Um genograma metafórico. a convite de Maria tino” do “processo de destinar­‑se”. orientadora. e talvez como o estudar­na Itália. Desse encontro. o genograma. como o meu. dentro de nós nessa caminhada. que também perturbador. gerador de reflexões. Escolha e destino: casais in. pois acredito que toda realidade é qual retrata a rede formada por seus ances- construída na interseção das ressonâncias. p. a legalização da A narrativa e a própria individualidade. monografia. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. 25). antes disso.). Em Boszormenyi­ uma possibilidade de novas significações ‑Nagy encantam­‑me as lealdades invisíveis para o caminhar. significado como relevante para este tra- tino me parece a continuação de um script balho é a crença de que os seres humanos. constroem um sentido para todos os envol. Assim. pois penso que as forças preexistem ao relacionamento e constroem de diferenciação e fusão foram despertadas a compreensão da comunicação (Gergen. 1994 citado por Grandesso. essa experiência fatiza Gilberto Safra (2006). 178) escreve: tempo todo. etc. própria singularidade. com os quais converso o (2000. a busca Alguns autores estão comigo ao lon.. . O Peregrino mais que o andarilho traz a so obviamente em Bowen e na noção de dimensão da construção de significados e que o nível de intensidade do processo de a busca de energias escondidas que serão diferenciação difere durante os vários es. O peregrino abre novos nascimentos. culturas. como Sandra Fedullo Colombo go deste caminho. trevistei. morte. poético e iluminadas pelo encontro humano. em que cada um é chamado tro de mim. que fizeram sentido para mim e rador de linguagem e compreensão. a partir dis. sem poder diferenciar­‑se terculturais. a es- e Itália). o encontro formar uma família com Luca. Penso como transformou­‑se neste capítulo. construímos alguns pois vejo o relacionamento humano como ge- significados. e acre- para eles. minha sem a sensação de trair o vínculo. Quando penso em diferenciação. Gosto de diferenciar o que chamo “des- tização deste trabalho e. a autoria da pró. Elliete Belfort Mattos. ressignificadas para uma transformação. que traz a permissão para a continuação do ciclo vital. quando diz: “A relação ética de cada mem- bro com seu sistema de relações configura Ao fazer este trabalho. O que me levou a escolher a construção do so. construção do significado pria vida. trais. A escolha para mim tem uma dimen- são ampliadora. significativo que aconteceu durante a entre­ iluminaram o foco deste trabalho e fizeram­ vista e a liberdade com que me inspirei nos ‑me refletir com um casal jovem sobre o autores citados só foram possíveis a partir processo da escolha de pares de diferentes de minha crença no construcionismo social. e um de nossos acompanhantes Não posso deixar de trazer Elkaïm foi a linda e curiosa tela de Frida Kahlo. pensamos também no narrador e sua lação (Gergen. definindo um Considero. inse. que a cons- significam a experiência. mas são o resultado dos contex. As mento do emocionar com o linguajear. existimos de vida que deixamos fora dos nossos relatos na linguagem. em uma de um referencial de interação e troca hu- sequência temporal e significativa. calcada na relação. ampliando ou restringindo disso é a emoção que define a ação. futuro possível. que as senso subjetivo de terem uma vida priva- narrativas não se formam apenas na mente da. p. que passam de geração para dança emocional modifica o linguajear. pode. Ao construirmos uma história. do passado. seus signifi. Assim. Safra (2006). ter maior liberdade para transformar as he- gerando um sentido e. comportamento dessa ou daquela classe. Como diz Marilene Grandesso (2000. que é o resultado do entrelaça- cados ao serem colocadas sob outro foco. histórias do passado são transformadas pela possibilidade de visões alternativas. no encontro. trução do significado é uma operação social. É a as nossas possibilidades de ser e existir no emoção a partir da qual se faz ou se rece- mundo em que vivemos. e seu significado é originado no modo Desta forma. como a organização não há aquela interação humana. mas sua situação atual e seu tos relacionais interpessoais. que não só organiza sua compreensão individual. quando pensamos em narrati. é a forma de nos Todo linguajear se apoia num suporte expressarmos com relação a medos. ex. emocional que pode mudar com o seu guranças. Manual de terapia familiar – Volume II 229 quando contam suas histórias. 10) sobre o Penso que contar histórias é parte conversar humano quando escreve: da experiência humana. e que todo o ser e todos os mais frequentes. curso. gem tem a capacidade de significar a partir de um fluxo de experiência vivida. geração. Humberto Maturana (2004. mas também de recriação. como White (1995). com os Gosto muito também da definição de mitos e lendas inerentes aos narradores. um significado não exis- Entendo narrativa. no possibilidade para a reconstrução de signifi. torna­‑se possível en. 203): Assim também não podemos considerar as narrativas como estáticas. be um certo fazer que o transforma numa Ampliando as narrativas. . uma coerência para seu caminho pela vida permite­‑se a cada narrador dar nome a suas na relação com os outros. mana. que res. fazer novas negociações e talvez a si mesmo e aos outros nas suas narrativas. ser autor do processo de se A construção do significado é sempre destinar. ou que qualifica como um cados. p. história de vida. da mesma forma te fora da relação. A lingua- por meio de termos. humanos. Na verdade. portanto. como está imerso dentro dos padrões de re- vas. modelar a vida das pessoas. ou noutra ação. para dar um lugar lealdades. suas histórias. conquistas e di. mas sim como es. fazem distin. crenças e mitos. xergar a grande quantidade de experiências Sustentamos que nós. como diz Gilberto ranças familiares. mos dizer que as narrativas são construídas em uma dimensão histórica e social. como esses autores. todo o conversar é uma con- pressamos como compreendemos nossa ex. 1998). ção. As histórias acabam tendo um efeito con- tando sempre abertas para reconstrução e creto não só de organizar. pois é ele que. vivencia consensual em coordenações de periência e nos apresentamos ao mundo e coordenações de ações e emoções. conversar. já que é um subproduto dessa intera- Quem narra a história traz muito de si. mas que possuem grande afazeres humanos ocorrem. Ao abrir­‑se espaço para surgirem no- ções para dar um nexo a suas vivências e vas narrativas das experiências vividas. De modo reciproco. pois perde seu sentido se que Grandesso (2000). o fluir na mu- ficuldades. construirá o significado de sua experiência. Penso. símbolos ou metáforas. Além a nós mesmos. lealdades e problemas. não consigo pensar matrimônio ou do nascimento do filho. é uma das vel conhecer. p. criou seus próprios experiência. porque elas vêm de uma busca. zer de estudar em Roma. seguindo a vida de cada um dos filhos. Seguir uma família nuclear ao longo de 200 anos. e que esta não esteja ligada à for- humano que pode favorecer o narrar e o re. mentos. mação da nossa identidade. Mundial e ali começado a se interessar por podendo­‑se também ter uma sensação de “doenças psíquicas”. a partir do Para falar de diferenciação. (Bowen. de Washington D. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. A Escola da Terapia Familiar Multige­ Volto ao encanto pelo processo de escuta. a partir disso. ‑se essas possibilidades. dessa forma. narrar as histórias de vida. EUA. dá­‑se no encontro humano. é partilhado so.230 Luiz Carlos Osorio. ao narrar e renarrar ampliam­ conceitos. como mobilizar novas construções conjuntas para se sair da casa familiar pudesse significar re- essas experiências. na Accademia Di que reflete várias distinções que o nosso Psicoterapia Della Famiglia. é mais facil superar os e para onde vamos? mitos e ser realista. mais fácil perceber os modelos emocio- se ido como médico para a Segunda Guerra nais que estão atuando naquele momento. afirmando que para se formar exerce para a pessoa que é ouvida. um indi- escuta. estudos sistêmicos ao voltar para a casa da pode ser desconstruído através de novas res. e cada uma delas lhe trouxe algo: mitos. e relacional norte­‑americana. solução de conflitos. O lugar de da terapia individual sistêmica. 1991. (Colombo. e assim resulta Medicina e teria sido cirurgião se não tives. figuras mais relevantes da terapia familiar cialmente e constrói o sentido daquela his. continuidade. recordações. eu e o outro. e. Para Bowen (1991). Foi precursor tória para as pessoas envolvidas. racional tem como criadores Bowen e enfatizado por Andersen quando ele nos Boszormenyi­‑Nagy e como um de seus segui­ convida a ouvir as palavras com extrema dores Maurizio Andolfi. em ninguém melhor do que Murray Bowen. legados e Essa foi a pedra angular onde apoiei e opiniões influenciadas pela emotividade. para muitos essa ideia ainda persiste. A refle. 99) . de história e de identidade Psiquiatra e professor da Georgetown que sem essa história não teria sido possí- University. Em vários atendi- interlocutor quer nos comunicar e a im. construí este trabalho. observei a ênfase que dava à herança portância que o ato de ser testemunha transgeracional. Estudou dos fenômenos humanos. p.C. e pode nos dar uma maior compreensão seu pai possuía uma casa funerária. Acredito profundamente que o segredo Concordo com Bowen (1991). 21) período de 150 a 200 anos. Mesmo assim. com quem tive o pra- atenção. 2006.. Quando se reconstroem (no relato) tre- chos ocorridos na família uma ou duas De onde viemos gerações atrás. legitimados na nossa víduo descende de 64 a 128 famílias em um singularidade. Hoje é difícil pensar que sejamos capa­ Acredito que o ato de entrevistar e ser zes de nos desligar totalmente da nossa entrevistado ocorre dentro de um encontro família. bados mais importantes de nossas vidas. quando­ diz para essa maravilhosa mágica do encontro que a família permanece dentro de nós e que humano está baseado na escuta respeitosa os relacionamentos não resolvidos com nos- e especial que fertiliza e legitima todos os sas famílias de origem são os negócios­inaca- envolvidos. Bowen nasceu em 1913 no Tenessee. Iniciou seus cada um na história é um estado provisório. um sintoma como a psicose são necessárias xão é estimulada a partir da palavra e da três gerações. família para reconstruir suas relações fami- significações que darão outro sentido para a liares e. Manual de terapia familiar – Volume II 231 Neste trabalho me faz sentido alguns Considero a ansiedade crônica uma conceitos da teoria dos Sistemas Familiares força fusional que faz a aproximação do eu desenvolvida pelo autor: a diferenciação do individual ao eu familiar, e a autorização eu e o processo de transmissão multigera- para individuação, uma diminuição da for- cional, a unidade do sistema emocional da ça fusional que, segundo Bowen, se traduz familia nuclear, a projeção familiar, a trian- através da ansiedade crônica. gulação e o rompimento emocional. A outra variável que, de acordo com Bowen observou nas famílias uma Bowen, age diretamente no funcionamento unidade emocional, ou seja, seus membros da unidade emocional da família é o con- estão interligados uns aos outros de tal ma- ceito de diferenciação do eu. Observou que neira, que o funcionamento deles automati- as pessoas se diferenciam umas das outras camente afeta o dos demais. É esta unidade em termos de funcionamento. Suas obser- familiar que se torna seu principal objeto de vações tiveram como resultado uma escala, observação e interesse. que considero interessante para ser utiliza- Distinguiu também duas variáveis que da como uma ajuda para pensar o processo agem no funcionamento da unidade emo- vivido dentro de uma família, no seu ciclo cional da família: a primeira trata do con- vital. Bowen descreveu os níveis do funcio- ceito de diferenciação do eu e a segunda namento humano dentro do que denominou trata da ansiedade. Dividiu a ansiedade em continuum, o qual compreende de um lado duas: a aguda e a crônica. A primeira, se- a intensidade máxima da indiferenciação do gundo o autor, constitui­‑se na resposta do eu familiar e, consequentemente, a presença organismo a uma ameaça real e cujos efei- máxima de fusão do eu individual e maior tos, em geral, limitam­‑se ao seu período presença de ansidedade crônica, e do outro de atuação, permitindo ao indivíduo deles lado da escala pouca presença de fusão do se recuperar com muita rapidez. A segun- eu individual e predomínio da diferenciação da, nomeada como ansiedade crônica, tem do “si­‑mesmo” e baixa ansiedade crônica. influência sobre a maneira como o mundo A ideia principal presente no conceito é percebido e interpretado pelo indivíduo; de diferenciação do eu diz respeito ao grau refere­‑se a um estado de existência que é em que as pessoas se fundem com as outras. independente de qualquer situação ou estí- Esse fenômeno na família foi nomeado por mulo específico. A ansiedade crônica parece Bowen como massa indiferenciada do eu fa- ser transmitida através das gerações e, em miliar que o autor considera não como algo termos de sensibilidade individual, na for- estático, mas como um processo durante o ma como o indivíduo percebe e interpreta ciclo vital, presente em diferentes intensida- o mundo. Representa uma programação ou des nos diferentes momentos do desenvolvi- sintonia do sistema emocional do indiví- mento da família e do indivíduo. duo, feita por seu passado tanto longínquo Como explica abaixo: quanto mais imediato. Mas, se a expressão é individual, a unidade familiar é o principal Eu vejo como um cacho, composto pela fu- cenário que a constitui. O sistema relacional são dos egos de cada membro da família, familiar reflete sua presença nas várias con- apresentando limites egoicos em comuns. figurações e comportamentos por meio dos Alguns egos se apresentam envolvidos quais a ansiedade se evidencia. de forma intensa ao ego familiar durante seus períodos de estresse emocional e me- Em uma dada família, cada geração re- nos envolvidos em outros... A fusão egoica cebe o legado de um determinado nível é mais intensa nas famílias que alcançam de ansiedade crônica que lhe é deixado menos maturidade... Teoricamente e até pela geração precedente. (Papero, 1998, certo grau, a fusão se faz presente em p. 78) todas as famílias, exceto naquelas cujos 232 Luiz Carlos Osorio, Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. membros alcançaram a completa matu- não resolvidas. O primeiro é o próprio grau ridade emocional. Teoricamente ainda, de diferenciação que os pais apresentam, a pessoa madura é uma unidade emocio- legado de seu respectivo processo de di­ nal completa, capaz de, em condições de ferenciação com seus pais. O segundo fator estresse, manter os limites de seu eu sem é a maneira como os pais administram esses se envolver em fusões emocionais com os aspectos sem sua própria união. O terceiro é demais. (Bowen, 1978 citado por Elkaïm, a intensidade de ansiedade a que foram ex- 1988, p. 77) postos na própria família de origem. Essas reflexões levam­‑nos a outro con- Penso que a escala serve como base ceito do próprio Bowen: o da transmissão para olhar os dois extremos, e o continuum multigeracional, que na minha opinião não enfatiza um processo, ou seja, um proces- pode ser separado do conceito de projeção so familiar predominantemente fusional familiar. impedindo a diferenciação, ou sendo pre- dominantemente facilitador da diferencia- A capacidade que cada um possui de ção, com pouca fusão do eu individual ao manter a separação entre seus sistemas eu familiar. Penso como Bowen, quando diz emocional e intelectual é determinada de que transitamos em diferentes níveis de in- acordo com o seu passado multigeracional tensidade nesse continuum, que vai da total e pelas experiências de vida de sua pró- fusão do eu individual ao eu familiar à total pria família. (Papero, 1998, p. 86) diferenciação do “si­‑mesmo”, ao longo do ciclo vital da família. No entanto, será possí- O conceito de transmissão multige­ vel desenvolver a total diferenciação? racio­nal designa a forma como se dá o pro- Os graus de ligação entre pais e filhos cesso de projeção familiar, modo pelo qual que não estão nos extremos (fusão/diferen- o grau de diferenciação atingido pelos pais ciação), Bowen denominou como ligações se transmite aos filhos de maneira não uni- emocionais não resolvidas. Essas ligações, na forme e, repetidos de geração em geração, maioria das vezes, são pensadas como rela- levam os diferentes ramos da família a al- ções de indiferenciação. Cada membro da cançar maior ou menor nível de diferencia- família apresenta um envolvimento nessa ção. Acredito que a maneira de lidar com massa indiferenciada do eu familiar (nível o processo familiar de fusão e diferenciação de diferenciação), e a singularidade desse passa de geração em geração, fazendo parte compromisso é construída na história da fa- do tecido de emoções daquela família. Um mília, através das gerações (esse processo filho que possui um grau de diferenciação foi chamado de projeção familiar). Estou me grande provavelmente possibilitará a seus referindo com isso à possibilidade de cada filhos diferenciarem­‑se com menor dificul- filho receber um legado diferente, feito de dade. Um filho com maior nível de indi- expectativas, ansiedades e emoções singula- ferenciação e fusão terá, provavelmente, res. Podemos, assim, pensar no tema deste maior dificuldade para autorizar a diferen- trabalho: qual o lugar que uma pessoa que ciação de seus próprios filhos e assim por escolhe se casar com alguém de outra na- diante. ção, deixando seu país e sua família, ocupa Esses conceitos de Bowen são impor- nessa trama transgeracional? Para esse au- tantes ao observar um casal intercultural e tor, quanto mais alto o nível de diferencia- pensar sobre se foi transmitida de geração ção de uma pessoa e de uma família, menor em geração a possibilidade de se diferen- o número e a intensidade de ligações emo- ciar, que lugar na família de origem ocupam cionais indiferenciadas que serão enfrenta- os que puderam deixar seu país e sua famí- das ao longo da vida. lia para escrever a própria história e como De acordo com Bowen, existem vários foi construída a possibilidade de escolher o fatores que determinam o grau de ligações ­diferente. Acredito também ser interessante Manual de terapia familiar – Volume II 233 perceber em cada família quais são as leis e a desconfiar de que o conceito descrito era as regras construídas transgeracionalmente, um pouco mais amplo do que uma isca ou o que está autorizado a ser feito. uma armadilha... Acredito que, na história da minha fa- Ivan Boszormenyi­‑Nagy fez sua for- mília, migrar seja um movimento possível e mação em Psiquiatria na Hungria e emigrou que vai ao encontro da vida, já que minha para os EUA; trabalhou em Chicago e depois avó russa fugiu do perigo dos pogrons; o avô na Filadélfia. Em 1957, foi nomea­do diretor alemão, do nazismo, pois o pai era judeu e da unidade de pesquisa para o tratamento a mãe luterana; os bisavós e os avós italia- da esquizofrenia, na Eastern Pennsylvania nos vieram para ampliar as possibilidades Psychiatric, tendo logo sido rebatizado­como comerciais na América. Os avós mineiros, Departamento de Psicoterapia Familiar, por sua vez, vieram em busca de tratamento do qual foi diretor até seu fechamento em de saúde em São Paulo. Todas as histórias 1980. Esse departamento, desde o começo estão ligadas a melhores possibilidades para da década de 1960, tornou­‑se um dos pri- viver. Penso assim que é aceito, já que nes- meiros centros de Terapia Familiar do EUA. sa construção o migrar não é um caminho Boszormenyi­‑Nagy desempenhou um papel para a morte pela separação física, mas sim determinante para o desenvolvimento da o oposto, gera vida e novas possibilidades. Terapia Familiar também na Europa, parti- Lembro­‑me de que, muito pequena, arru- cularmente, na Holanda, Bélgica, Alemanha, mava minha mochila para viajar enquanto Itália e Suíça, e sua escola foi denominada minha mãe “supervisionava” para que não Terapia Contextual para sublinhar, segundo esquecesse nada, e ela, rindo, dizia: “Essa o autor, a importância da dimensão da ética menina nasceu com a mochila nas costas!”. relacional nas relações humanas. Estaria ali uma autorização para conhecer O conceito principal da teoria de outros mundos? Boszormenyi­‑Nagy é a justiça relacional, que traz a noção de uma rede hierárquica de obrigações dentro da família. Ele concei- tua família como “um grupo humano rode- Como balancear ado por uma rede complexa de obrigações nossas contas com e lealdades cujo cumprimento é exigido, as outras gerações? mas que protege ao mesmo tempo o conjun- to familiar” (Boszormenyi­‑Nagy, 1983 cita- Ouvi falar em Boszormenyi­‑Nagy na Acca­ do por Galina, 2007, p. 54). Assim, nessa demia di Psi­coterapia della Famiglia com compreen­são, existe um continuum de dar Andolfi, quando um grupo de estudantes e receber entre cada indivíduo e o sistema conversavam sobre um seminário que de- de relações ao qual pertence, formando um veriam apresentar, cujo tema era “lealdades grande continente, tecido por débitos, crédi­ invisíveis”. Como fiquei muito curiosa com o tos e compensações entre todos os membros título, pedi permissão para assisti­‑lo. daquela família. É como uma grande con- Ao entrar na sala, descobri que aque- tabilidade de contas a pagar e a receber, a le era um grupo de primeiro ano, e fiquei qual denominou “Livro Maior de Méritos e ainda mais curiosa. Esse grupo fez uma Obrigações” ou o “Livro Maior de Justiça apresentação de figuras, contando um Familiar”, e que constitui o centro de sua pouco o que tinham entendido do livro de teoria. Boszormenyi­‑Nagy. A figura escolhida como O conceito sistêmico de relações fami- metáfora era a de um peixe que estava para liares requer a compreensão de que os papéis ser pego em uma isca, onde estava escrito: dentro da família são interdependentes, ou “lealdades invisíveis”. Achei muito interes- seja, as competências da pessoa vista como sante o grupo ter feito essa interpretação; sadia na família e as dificuldades e fracas- eu, que ainda não tinha lido o livro, comecei sos do membro sentido como problemático 234 Luiz Carlos Osorio, Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. estão, segundo o autor, codeterminadas por profundas de um indivíduo. Assim, qual- suas funções sociais mais amplas dentro da quer teoria relacional deve ser capaz de família, que correspondem às exigências da integrar os conceitos motivacionais indivi- rede complexa de obrigações e méritos da- duais aos relacionais. O conceito de sistema quele grupo. não invalida a importância das motivações A ideia de obrigações “congeladas” é internalizadas de cada membro, pois as extremamente interessante, pois enfatiza o ações e interações individuais são constru- processo de paralisação do tempo na famí- ídas a partir dos modelos interiorizados de lia, uma vez que o caminho da individuação relação. Essas reflexões me levam a pensar não é autorizado, porque “as velhas contas que, como diz o autor, “a contabilidade dos estão bloqueadas e adiadas”. atos de lealdade é a chave determinante das Bowen e Boszormenyi­‑Nagy en­con­ estruturas das relações” (1983, p. 41). tram­‑se nas preocupações sobre o processo Parece­‑me que o elemento original tra- de desenvolvimento do “si­‑mesmo”, den- zido por Boszormenyi­‑Nagy, em sua terapia tro do processo de pertencer. Penso que as contextual, é a discussão focada na ética velhas contas congeladas de Boszormenyi­ das relações interpessoais, pois ele insiste, ‑Nagy na hierarquia de obrigações familia- em seus textos, que toda relação próxima res são representadas pelas forças fusionais está baseada no princípio da equidade e da de Bowen. reciprocidade, e afirma que seu trabalho, Os membros de uma família tendem a originalmente com pessoas que estavam psi- ser leais ao seu grupo de origem, por pres- cóticas, apontou essa importância, pois, ape- sões externas, obrigações aceitas e leal­dades sar de se acharem confusas na compreensão encobertas de pertencimento. As lealdades de seus mundos, toda e qualquer possibili- e obrigações em uma família dependem do dade de vínculo surgia através da confiança papel e da posição que cada um ocupa na- e da legitimidade. Essas observações o leva- quela rede de afetos. Segundo Boszormenyi­ ram à construção da noção da importância ‑Nagy, as famílias constituem o sistema de da justiça para a dinâmica das relações. relações mais conservador existente, em O livro de contabilidade de credores função dos vínculos afetivos, genéticos e da e devedores, todos inseridos em uma trama continuidade das contas a serem saldadas transgeracional, foi sendo ampliado com no “Livro Maior de Méritos e Obrigações”. conceitos que muito me agradaram: legitimi- Considerando a possibilidade de as dade construtiva e destrutiva (Ducommun­ obrigações e lealdades serem conscientes ou ‑Nagy, 1998, p. 184). Ducommun­‑Nagy inconscientes, podemos pensar que, no caso lem­bra que nossos atos são regidos, dentre da individuação, não se individuar pode ser outros aspectos, pela relação de dívida ou considerado um movimento de obrigação e de mérito entre nós e nossos parceiros re- dívida em relação à família de origem, mes- lacionais: as compensações do que recebe- mo que em alguns momentos pareça o opos- mos, para que, em vez de uma relação de to, que aquele membro da família estaria dívida, se restabeleça a reciprocidade na traindo as expectativas do grupo, não cres- “balança ética”.. cendo. Ainda segundo Boszormenyi­‑Nagy, é Um outro aspecto me pareceu também indiscutível que todo passo em direção à in- importante: a concepção de que não se tra- dividuação, emancipação e separação tende ta somente da concretização de lucros e dé- a tocar em um grande desafio, com carga bitos, mas da percepção de que aquele que emocional elevada, “o da união simbiótica está em condições de dar pode beneficiar-se permanente negada, de cada membro, com do movimento de exigir o retorno e ainda a família de origem” (1983, p. 39). ter a possibilidade de legitimação e de satis- Ainda segundo esse autor, falar de fação interior, o que ampliará o prazer dessa leal­dades relacionais dentro da família generosidade ao dar. Esse movimento tam- não quer dizer ignorar as motivações mais bém restabeleceria “a balança da equidade” Manual de terapia familiar – Volume II 235 – essa é a noção que Boszormenyi­‑Nagy obrigação recíproca aumentará o nível de denomina de “espiral de legitimidade lealdade e confiança dentro da relação. construtiva”. (Boszormenyi­‑Nagy, 1983, p. 65) A “legitimidade destrutiva” é descrita pelo autor como o movimento que uma pes- Um sistema saudável de obrigações soa, que se sentiu lesada, faz para conseguir familiares se expressa pela capacidade de uma compensação ou restituição do que, em crescimento dos próprios filhos e a compati- sua opinião, lhe é devido, o que muitas ve- bilidade dessas obrigações com a individua- zes a leva a buscar isso em seu parceiro, ou, ção emocional dos membros. A individuação se não consegue, em seus filhos, que assim deve estar balanceada na relação com as dí- se tornam devedores a serviço das injustiças vidas de lealdade que o filho, em processo antigas, realimentando a espiral que não au- de maturação, tem com a família nuclear. toriza o término dos débitos e o processo de individuação. A potencialidade ou liberdade para criar É interessante a diferenciação que novos vínculos (casamento, paternidade) o autor faz entre lealdade vertical – com- deve pesar contra as antigas obrigações promissos devidos a uma geração anterior que fazem a força para uma união simbió­ ou posterior (pais, avós ou filhos e netos) tica duradoura. (Boszormenyi­‑Nagy, – e lealdades horizontais – compromissos 1983, p. 67) que envolvem parceiros (cônjuges, irmãos, amigos). Assinala a importância do fato de Essas ideias de Boszormenyi­‑Nagy vão que, quando acontece um casamento, no- ao encontro das minhas perguntas iniciais vos compromissos de lealdade precisam ser em relação a casais interculturais e ao tema. construídos, assim como quando nascem os Quando uma escolha é realmente uma esco- filhos. A trama das obrigações relacionais é lha? Quando a aparente escolha é um script chamada a ser revista e reconstruída com já escrito muito antes de nós? Olhando o ca- novas exigências e méritos, para que o ciclo sal entrevistado por mim, a esposa ou o ma- vital possa continuar, e o processo de indivi- rido estariam saldando dividas e obrigações duação não se paralise por “contas congela- em relação às suas famílias de origem? das”. Quanto mais rígido for o sistema, mais dificuldades para fazer essa passagem para a construção da conjugalidade, parentalida- Metodologia de e fraternidade. Em um sistema trigeracional, a com- Partindo de uma epistemologia cons- pensação pelo cuidado que os pais tiveram trucionista social na qual se acredita que a com os filhos pode passar através das gera- construção do significado é sempre calcada ções como obrigações primordiais que ne- na relação, será no meu encontro com esse cessitam ser respondidas, para que o livro casal que poderei observar e refletir sobre da reciprocidade fique equilibrado. os temas delineados por mim, como a indi- viduação e as lealdades invisíveis. Um adulto ansioso por passar seus pró- Este trabalho foi realizado a partir de prios valores a seu filho se transforma em uma entrevista com um casal intercultural, credor em um diálogo de compromissos baseada em três perguntas disparadoras em que o filho se transforma em devedor. para reflexão: Finalmente, este último tenderá a saldar sua dívida em um sistema de retroalimen- n Como vocês se conheceram? tação transgeracional, internalizando os n Que dificuldades enfrentaram? compromissos, satisfazendo as expectati- n Quais foram os medos que passaram pela vas e, com o tempo, transmitindo­‑as a sua cabeça de vocês em relação às diferentes prole. Cada ato de compensação de uma origens? não é? trabalhando e morando lá. Fui para que estava adaptada. um pouco mês. e eu fui para lá porque eu estava em dúvida em A entrevista relação à faculdade. condensada em um hostel e acabei ficando e decidi ficar. mecei a sentir saudades depois de tinha acabado de me formar e eu três meses. porque a gente falava casal. Hugo: Quer contar. nessa interseção: buscar a churrasco lá no hotel para os em‑ própria individualidade. culturas. Então. mei o gravador e vamos torcer Ah. era difícil para mim. talvez. que são: diferenciação do eu. Nesses primeiros momentos da entre- Ligia: Eu achei diferente a forma como vista senti que esses dois jovens partiram em demonstra que está apaixonado.. eu andava em um meio que Em Londres. aí ele me per‑ guntou... um dia teve um minha opinião. Primeiro eu e a gente tinha terminado e eu de‑ queria agradecer a disponibilidade cidi viajar. era muito variado. porque ela tem bolsa na PUC e tinha que terminar.. em outro país. nun‑ Larissa: Bom. era péssima em inglês. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. parei no hotel onde era só estrangeiro no hotel. e depois tinha meçar perguntando como vocês se que me virar. porque as di‑ Londres. e co‑ onde todo mundo era jovem. E eu estava apaixonado e aberto a continuar a relação. construir a pró- pregados. e aí decidi. eu tinha também um namorado. separar­‑se da . Assim. era legal. onde havia pessoas do mun‑ Hugo: No hotel. hostel. Foi aí gando e todo mundo compartilhan‑ que a gente começou e ficamos lá do esse espírito de aventura. Li? maior aventura essa coisa de estar Ligia: Não. Aí fiquei uma semana. não tive assim. eu que tomei sagrado de cada um. E a Ligia traba‑ do que é Londres. para que funcione. dá. era uma família. afastando­‑se fisicamen- te para conseguirem. pode começar você. selecionei tre- chos que iam de encontro às ideias que de. Encontraram­‑se.. do País Basco. senão eu volto”. eu queria co‑ escola e casa pagos.. depois de um mês. podemos começar. Ligia: Então. porque são multigeracional e lealdades invisiveis. um ano enfim.. para ficar. please” e era o que eu que o meu interesse é pela histó‑ sabia de inglês. queria viajar e buscar minha vida Larissa: E você. co‑ Hugo: A gente se conheceu em Londres. essa mistura de lhava lá. che‑ mecei a também trabalhar lá. Depois a Ligia tinha que mundo era aberto. e eu ti‑ Tem pessoas que sentem menos e nha uma amiga italiana que também outras que sentem mais. hotel eu conheci a Ligia. ou mesmo. eu quando fui para Londres. E aí eu adorei. pria singularidade. embaixo. já arru‑ ca tinha saído do Brasil. e pensei “ah. Eu escrevi uma frase em de vocês para este encontro e esta inglês para usar no avião que era “A entrevista. na a iniciativa. só que o churrasco era num lugar sejo iluminar no processo de construção do aberto. A partir desse material. e as pessoas ficavam lá um teiro. a cerveja era grátis e tal. Era mais um bem próxima. se dá conheceram. transmis- inglês. Fui com um mês de ria de vocês. é bem dife‑ busca de si mesmos! A peregrinação para o rente a cultura basca. e todo um ano. estava lá e estava indo para Irlanda. voltar para o Brasil.. sentia fora de lá. era gente do mundo in‑ do todo... depois gostaria de dizer glass of wine. ah. porque meu irmão estava ferenças culturais existem. duas.236 Luiz Carlos Osorio. e todo meu irmão estava morando e neste mundo tinha uma relação bacana. eu estava fa‑ zendo artes plásticas e pedagogia e não sabia muito o que fazer. fazendo aos poucos. Ligia: Então. a liberdade lutando para balancear as Larissa: Mas você acha chato aprender? A lealdades. e ele. Ligia: A obrigação. ria cerveja: “Do you want beer?”. e também a língua tem várias questões na nossa relação.”. nando ele aos poucos. acredito. e assim o medo de e eu disse. não sei se você cima. quem disse que você é pode‑ conhece alguma coisa de lá. eu fui ensi‑ Ligia assinalou o esforço que se fez para en. Aí ele apren‑ tender os códigos diferentes entre as duas deu. I want you!”. quando pensei no caminho superpressão e eu fico um pouco. nos primeiros cinco minutos.alguma coi‑ sa assim não era? Larissa: E de onde você sente que vem a Hugo: Era. nas falas de Ligia. sua própria história: a de alguém que nas- daí nessas. podia ser mais light. mas ele não entendia. a gen‑ te ficou. aí eu Hugo: Então. possa acontecer... e no dia as lealdades. e esse tema permeia toda a entre.” Falei: “Me dá uma”. mento de sair da família de origem sem trair Hugo: Muita cerveja. ele tem facilidade. ser bilíngue.... sabe? Aí eu disse “Calma. o início das dificuldades E eu “No.. então ele veio nesse dia do churrasco me perguntar se eu que‑ Neste momento da conversa. ção. não sei por que ter tanta cobrança.. Aí o primeiro beijo foi ceu e cresceu no Brasil e que tem aqui sua no queixo. o estar no mundo sem as amarras pressão? do “Livro Maior de Méritos e Obrigações”. mas na verdade eu brincava com ele.”.. roso assim!? “Calma. percebi. Tudo isso em inglês.. Tem panhol que eu falava português.. Manual de terapia familiar – Volume II 237 força de fusão do eu familiar. Como coloca Bowen. depois a gente ficou. vista: a atração pelo diferente e o esforço acho que porque tem essa coisa de para construir novos significados sem per. A fala espanhol. de saco cheio sabe. te de sua própria cultura. Aí eu falava para ele falar es‑ mente da Espanha e da França. já veio para culturas. culturalmente der português. nem eu.. um conflito de soberania há muito . “Calma. mas para eles é mais ele se desenvolveu independente‑ difícil. escolhido por Hugo na busca pela diferencia. Tem muita cobrança. é um país que pertence à comecei a convencer ele de apren‑ Espanha e à França. esse mo- seguinte eu não vi ele.”. gente está indo para lá e aí eu te‑ Lembrei­‑me muito de Boszormenyi­ nho que aprender basco.. vamos ven‑ Larissa: Muito pouco. cá falando um pouco de português. porque todo mundo que faria a força fusional ao eu­‑familiar. foi porque ele errou que família de origem. Esse tempo é exatamente o foi muito legal aquela noite.. Aí ele fa‑ para a diferenciação... Chamou­‑me atenção que. tem uma ‑Nagy e Bowen.. no outro dia vimento faz parte do processo de diferen- a gente se encontrou e ele veio me ciação de Ligia e exige um tempo para que dizer: “Eu acho que não deu certo. rio. “É que eu posso levar você para baixo”. ela tem medo acho que uma relação. busca pelo próprio valor e legitimação do podia ser uma coisa que eu vou “si­‑mesmo”. cobrança? Ligia: Quem disse? Eu posso te levar para Hugo: Da minha família. o ir para lá como mor- lou assim “Eu não sei se eu quero”. todo sé‑ de que isto lhe seja negado. A dificuldade no movi- eu estava meio dançando. Ligia: Daí.. isso perder a identidade cultural e não ser leal à acontece. do. A der a própria singularidade. mas eu que deseja Ligia e. (risos) eu falei para você. Penso que esse movimento de ir e nho para a diferenciação. Eu era escolas voltaram a ensinar. e na atual conformação ain‑ Larissa: Bom. Senti que os me. lugar. porque eu não favor da Espanha. vou que gostariam de uma coisa mais li. não dá.. tempo. e outros. eu preciso de tempo.. che‑ Ligia: Tem gente que não se relaciona guei aqui e fiquei mais viajando. não tidade basca própria com língua e sabia o que queria fazer. Por um lado. balho. desta forma. os que são mais vida em Londres é uma coisa. a primeira depois disso existe uma mobiliza‑ vez que eu vim foi com uma passa‑ ção muito grande da população a gem de três meses. Vejo que o lugar para onde ela está indo tem uma his- tória. depois ele me Voltou­‑se a aprender o basco. favor da cultura basca. paralisados na história. até conseguir ir. Fiquei lá por um mês e já vim para Ligia: Não sei. vou de novo. a natureza. a mos na sociedade. é Paulo. da língua. uma cidade pequena cercada de monta‑ nhas. os livros queimados. não rígidos. “A meio rígidos. pensei “vou para conhecer”. posso? Eu queria saber até 1975.. de manter a lín‑ estava pensando em voltar para o gua espanhola e a cultura. depois o trabalho. diga‑ Hugo: É. correndo sários para dar conta dos relacionamentos o risco de ser engolida. País Basco. então se muito tranquila. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. E Hugo: “Eu vou junto” foi fácil. então acho cultura basca... pertence mais a esse o que acontece! Eu fui para lá. acho que ainda era essa coisa. uma cidade grande como São Ligia: Não sei. da própria cultura – o que para Ligia talvez me vem à mente a força e o esforço neces- signifique uma maior dificuldade.. a cultura foi perseguida. não pensava tanto. e outros. abortando seu cami. ferente da minha realidade. eu queria voltar um pouco da tem. lá atrás. e vamos ver nha família.. A consciência das . as falou “eu acho que eu vou”.. Eu ght para os dois lados. mas fica Ligia está lá.. perdendo assim a emocionais não resolvidos com sua família sua cultura e não sendo leal à sua família e de origem. para Londres e depois volto”. fazendo o quê?”.. e eu a favor de uma independência do não tinha voltado para vida real. pois a ideia era eu voltar para o País Hugo: E digamos que o meu entorno.. mi‑ Basco e ela ficar aqui. me adaptar a um novo calma. eu não sabia o que eu Neste momento. que são a que vir não foi difícil. em que não se podia fa‑ o que aconteceu depois. não pensei. eu País Basco e a favor de uma iden‑ estava buscando minha vida. percebo que o con. queria fazer da minha vida. teve 35 anos de ditadura na história.. Ligia: E eu nem convidei ele. escolas que ensinavam basco foram decidir vir junto? fechadas. você tinha que voltar pela faculdade se você falasse basco. de‑ com quem só fala espanhol. E daí eu acho pois de uma semana eu pensei “não que na hora de colocar as coisas são vou ficar aqui. que é muito di‑ difícil. tentando procurar tra‑ der basco. vir faz parte do processo de buscar resol- dos são semelhantes ao que aconteceu com ver “esses relacionamentos não resolvidos” a cultura basca durante a ditadura. texto colabora para aumentar os medos do processo de diferenciação de Ligia.. Foi fácil.. Aí no começo tiveram várias Larissa: Acho que a palavra da Ligia hoje é questões. ia preso. sabe. as e o Hugo veio junto. e de‑ lado mais radical basco... mas calma. vive ainda essas preferências.. lar basco. “ah. calma eu vou apren‑ cá mesmo.238 Luiz Carlos Osorio. e a loucura.” clara a preferência pelo basco.. Hugo. história e. que neste momento vive a valorização Ao escutar esse trecho da fala de Hugo. Não sei se foi isso que aconteceu com meses. um mês. acabava vivendo mesmo em uma Daí o que aconteceu. “como vai começar em a dar aula de espanhol nesses pri‑ outubro eu volto para o Brasil. tanto que fazer.”. minutos tem a faculdade. ta. eu estudei a cidade dele é pequena. uma vez que a única alternativa não exis- tente para esse casal era se separar. a gente sofrimento. mas na PUC. e eu estava com visto de turis‑ assim.. des. já era um mesmo assim é diferente. aqui ou lá. não sabia o que fazer. aí depois de dois anos eu ela migrar e ele ficar no país de origem... 18 anos. 4 dir. . não sei definir o fa‑ tor que mais me dificultava a adap‑ Aqui entrou uma nova possibilidade: tação. eu conversei parte ali. Essas eram as dificulda‑ que eu fui para lá sem me organizar. uma semana. foi horrível! tiam diferenciar­‑se. me des‑ morando na casa da mãe da Ligia. a gente é supergrudado.. Fiquei dois coisa assim. Então ta e não podia trabalhar.. voltei para o País Basco. aí eu falei para ele engolido pelo novo ao mesmo tempo que le. mas percebi que ele não estava Larissa: E como foi ficar longe? pronto. contas e obrigações a pagar e sem se despe. Essa batalha foi péis. Essas reflexões inva- rituais de despedidas. A faculda‑ Aquela coisa. E ele ficou lá. fiquei mais um semestre na PUC. nessa fala seu país. é isso? Não tinha uma possibilidade de você ficar e ele ir? Ligia Ligia: E ele é de uma cidade de 15 mil e Hugo: Não. aí peguei todos os pa‑ riormente.. Ligia: Nosso recorde de distância. peço do Brasil.. A gente vinha de Londres. e eu queria trabalhar.. despedidas feitas para a diferenciação e não migrar como fuga de Hugo: É. Larissa: E a ideia de vocês era ficar junto descrita pelo casal até o final da entrevista.. comecei eu pensei.. Manual de terapia familiar – Volume II 239 diferenças e do esforço para criar pontes que permitam a construção de um novo Ligia: Ele vinha chorando dizendo que modo de viver. me faz pensar novamente na rapidamente se dispôs a ir com ele e fazer busca pela própria história. de mudança mesmo. “não tem problema. pen‑ para a faculdade que começa em sava “não. sem ser não se adaptava. para não ficar uma e daí foi pouco a pouco. eu fiquei. Acredito que ainda não estava em jogo o processo de diferenciação de Ligia. não dá certo.. vamos para o gitima o diferente que aparece. e em julho eu venho anos aqui e não me adaptava. nas dívidas não o processo de se diferenciar de sua família pagas (lembrando Boszormenyi­‑Nagy) e nas de origem. e assim a volta.. consegui a transferência. mas Ligia: É. habi­tantes! Hugo: Não.. assim como havia aparecido ante. a gente não queria ficar Hugo: As coisas são a pé ou de bicicle‑ longe. na fala de Ligia. faculdade”. fiz tudo que precisava. e assim Ligia País Basco. Ligia: Ah. faço meiros meses de adaptação. dade de adaptação de Hugo. Hugo. outubro”. o foco era a dificul- A volta de Hugo a seu país de origem. mas não queria fazer isso. vou ver a transferência da de Hugo. sem saber o de lá começaria em outubro. as lealdades ainda não lhe permi. dem a minha mente quando penso no pro- cesso de migrar: a possibilidade de migrar com contas pagas.. E se organizou para realizar seus despedidas não feitas. mas a 20 Biologia. sem trair as origens. Larissa Mas qual você acha que era sua maior dificuldade em se adaptar? Hugo: Acho que tudo. ” (Os conflitos de interesses do governo. sentindo talvez que as contas Hugo: Mas. estou aqui não sei o de origem. não deu tempo de organizar os documentos antes de Ligia ter que (Boszormenyi­‑Nagy) estivessem mais balan- voltar para a PUC. ficou com Penso que Hugo entra. e assim ainda precisar impor a gente está pensando em viver aqui. sou que se eu não falasse nada. em outra fase do processo de diferenciação e Hugo: É porque lá a polícia vai ver se real‑ começa a perceber que “não aproveitou” sua mente moram juntos. “Poxa eu passei dois anos no Brasil. não me adaptei. e aí. a vislumbrar que tipo de trabalho eu gostaria relacio‑ nado mais ao terceiro setor. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols.. ao so‑ cial.. experiência no Brasil porque se fechou para Ligia: Falei com a minha mãe para saber ela. mas... a gente vai 35.. perto de sua família gostei. enquanto estava lá. foi o primeiro casamento por ele descreve tinha o significado de expressar procuração da cidade. Ligia: A minha amiga não quis. eu acabei escolhas. já que eu voltaria. Aí ele falou: “Não. eu. nin‑ tiu desta vez pronto para fazer suas escolhas guém ia saber. e. mas permanente”.. E alidade. Aí nós começamos a eu disse que era só um papel. é estar junto. mas daí para Espanha que seria bom para não dá para ser como turista. eu perdia. Aí falei para ele ca‑ tar para aí. E duram a vida toda. a gen‑ ele e para ela. neste momento. suas lealdades mais equilibradas. a separado. aí decidimos ceadas com a sua diferenciação e próprias casar por procuração. depois que a gente decidiu ca‑ do “Livro Maior de Méritos e Obrigações” sar. pensando. e eu ver essas coisas. “I confliti di interesse acabar ficando aqui”. casar para nós é outra coisa..”. e aí eu entrei num pro‑ entre as necessidades possessivas dos pais e cesso de falar “Eu não aproveitei o as exigências de individualização dos filhos Brasil. pensava “No Brasil é muito melhor do que aqui Ligia: Sabendo que ele ia voltar. é difícil mesmo. profissionais. estou separado da Ligia. distância física? mas aqui não tem nenhuma pers‑ Como diz Boszormenyi­‑Nagy (1991. casando com um amigo meu (risa‑ Será que o fechamento anterior que das).. Será que nesse movimento havia também em São Paulo. não embutido o receio de. Ao voltar para seu país. medo. e daí lá ia ser.. mas eu não podia casar aproveitar!”. o medo de ser engolido por outra cultura. se eu ficar aqui. se você não ganha genze di individualizzazione dei figli dura- nada tem uma ajuda considerável no tutta la vita.. a Ligia foi lá para convenci! passar as férias. aí a gente pen‑ conseguido saldar algumas dívidas e se sen. talvez tenha como era na PUC. te vai ter que casar para ir com visto eu quero casar com você”.. então eu tenho que que casar. Fiquei lá com esses por causa da bolsa na PUC por ser pensamentos e acabei falando para filha de professor.. eu estava podendo abrir­‑se ao novo sem se perder? no processo contrário. não conseguir ser um indivíduo que fazer. tradução nossa). Hugo: Essa coisa do papel era mais pelo visto. coisas assim.240 Luiz Carlos Osorio. o que que você acha? sar com uma amiga que estava indo Quero trabalhar em ONG. p. por‑ sua família de origem? Será que a volta sig- que um mês você sabe que está se nificou estar mais seguro de sua individu- aproximando. tra i bisogni possessivi dei genitori e le esi- o pior dos casos... pectiva. eu acho que me fechei.) comecei a pensar. . se eu casas‑ Ligia “Estou achando que vou vol‑ se. teríamos para fazer isso. perder sua singularidade e trair os ideais de Hugo: Quatro meses foi muito difícil. cami- nos sentirmos casados. tra. en‑ tórias. em Londres tudo bem. Hugo: E eu me preocupava de tão rápido Hugo: Era mesmo um casamento. acho que trabalho. casar por um papel. a distância. mento em que nos casamos. ele era mais preocupado o Hugo ligou pedindo que não pu‑ com a relação. um monte de coisas. quando aceitou a vinda dele. não foi o mo‑ Acredito que ele tenha conseguido se pro. me dizia: “Ah. como estava sua família. que é mais importante. porque é superlegal na‑ mas você lá não está fazendo nada.... Ligia: É isso. etc. Era mais casar para resol‑ Ligia: E também é porque é ou vai ou ra‑ ver outro problema.. e eu acho Parecia que ele estava quebrando re. muito. tam‑ que isso.. visto. nho pena. A gente não teve tempo tão a gente pensou em casar mes‑ de namoro. morar. Manual de terapia familiar – Volume II 241 que seu pai representava naquele momen- Larissa: Eu queria fazer uma pergunta. mas depois você está falando do compromisso ficar aqui. bém. ele queria que eu sim sabe.. ou está aqui. não teve festa­ nada. eu me lembro. e eu te‑ já era um problema. Para ele. de pular etapas. eu estar no Brasil a gente nunca namorou. suas lealdades. A gente acaba tendo que antecipar Hugo: Sei lá. tendo que Ligia: É. Por exemplo. pois.. gendo seu processo de diferenciação. uma do seu país? vez eu lembro que a gente brigou e Hugo: Também. Minha mãe já faleceu. viver a vida juntos.. naquele momento. e o momento de gras de sua família e de sua cultura.. Quando eu do. como o casa‑ mento.. visto. porque não tem meio termo. E outra coisa é de a gente por que vocês não vêm para cá?”. casar. que perdemos o momento de fazer como queríamos. en‑ Ligia: Então. mo e tal por causa do visto para o eu já fui morar com ele. Percebi que foi o primeiro casamento por que Hugo.? Hugo: Meu pai. não foi casamento. está longe.. por ter saído junto. de querer nhando no seu processo de diferenciação.. “casado”.. até misso na relação. mas. que seria diferente se fôs‑ semos do mesmo país. porque eu não vivia dessa forma. o que fico pensando é que ele Eu falei “Pai é só um papel porque deixou tudo para esse compromis‑ o amor. e tranquila. é isso? E. dentro de seus limites. foi de‑ teger. mas também a indefini‑ o Hugo não tinha para onde ir. Tanto que o casamento foi meio assumiu junto com ele o compro‑ escondido. Depois ficou me falan‑ com o outro ter que ser feito ou do que casamento é mais sério do não muito rápido. blicassem no jornal. mas você tam‑ gente já tem!”. já . no sentido de Ele sempre se mostrou muito con‑ estar junto e superjunto. a gente não estava no clima de decidir tudo juntos. as‑ ção do trabalho.. eu fiquei do suas dívidas e.. estava pagan- procuração da sua cidade. mas até que eu sou muito Ligia: Lá eles publicam quem se casará. um ano Larissa: Pelo que eu estou entendendo. o que eles pensavam de tudo isso. tivesse um bom trabalho. que não gostava mesmo. mesmo em Londres. dos planos de vocês. tivemos que antecipar um pouco samento uma bandeira de diferenciação. a so poder ser feito. Ele foi muito con‑ bém. prote- pensando nessas idas e vindas. que eu tenho pena dessas his‑ fui falar com ele.. já estar morando junto.. porque ou trário. já to a força fusional daquele sistema. que era o do cha. E outra coisa que eu acho que fazendo o possível para não fazer de seu ca. Larissa: Mas você acha que ele não gostava e estar aqui significa estar muito por você estar longe. isso que eu acho complica‑ tão meu pai é a figura. casar mesmo. ao mesmo tempo.. foram progra‑ tava construindo algo. e tem de fazer es. vamos. fiquei pen. a gente nunca vai ser to‑ queria mais do que você. eu não acho São Paulo uma cidade A gente sente falta da cultura. de‑ ir para lá e eu quero ter meu pri‑ pendia mais da rede da Ligia. Eu gem me tocou profundamente. quando fomos. quanto antes melhor. fazendo algo madas para ser possível ter o bebê de que eu realmente gostava. eu lembro que eu Além disso. porque eu ainda rão completos já que um deles estará sempre não falo o basco para trabalhar na longe da própria cultura e da família de ori. aqui. criar uma história. que seria feito a partir lá. mas as transfor- ram para você poder vir. viver a mília. Nunca seremos completos! vida toda. já que salta muitas fases. tem co do Brasil.242 Luiz Carlos Osorio. foi ter filhos. sigo levar também alguns amigos.. foi a contabilidade sendo feita de criar uma história que fosse possível. fechá­‑las correndo com de perder a própria história. “Ah.. relendo esse de sim e não que estava sendo feito para se trecho. fiquei colhas importantes e rápidas. caminho em direção às escolhas indivi­duais. trecho. e com essa ideia de tura de uma cidade grande. mações que o encontro gerou nos mundos Hugo: É.. Foi a meiro filho aqui.. que não é todas as idas e vindas vocês casa‑ simplesmente a soma delas. tive a pesadas essas decisões? nítida sensação do movimento pendular Outra reflexão que fiz. sou psicopedagoga. será que na lealdade horizontal de Hugo e Ligia e assim no “Livro de Contabilidade de Méritos e Obrigações” desse casal estão gravadas e Neste momento da entrevista. Ligia: É. era uma questão profissional. Mas aí em agosto. a gente já tinha essa vontade.. Abri­‑las e fechá­‑las como parte do queria levar também alguns amigos.. Abrir as perdas e ganhos e o medo expresso por Ligia portas para o novo. eu fico fazendo a maior não era para agora. Esse casal busca construir uma relação em que haja lugar para cada um. e ao mesmo tempo se possa criar Larissa: E essa decisão de voltar agora para o “terceiro mundo”.. minha que começou a namorar um Hugo: É... essa escolha tem de ter para o acolhimento. apesar de eu estar animada. Ficam muitas questões em Ligia: Mas eu não lembro como decidi‑ função desta questão da distância! mos ir para lá. eu voltei há 5 anos. até as datas para primeira vez que eu senti que es‑ poder ir de avião. Percebi que estavam negocian- envolver em trabalhos interessantes do essas possibilidades com toda esperança e medo que esse movimento gera.. já que decidimos. a Ligia queria propaganda para ver se assim con‑ ir logo. e também ir para o inte‑ O Hugo agora tem trabalhado com rior aqui você não tem a infraestru‑ dança brasileira. que antes eu não tinha. da fa‑ legal para criar seus filhos. eu pensava muito em criar vín‑ culos.. Agora tem uma amiga tudo perto.. de onde veio? Porque depois de dessas experiências diferentes. comecei a procurar trabalho e comecei a me individuais. nós decidimos ter filho e digamos que criei um universo neste momento porque decidimos meu... .. teria que desenvolver outras coi‑ sando na capacidade que um casal que faz sas. com suas di- ferenças. dizia.”. então. e lá tem levar um pouco. mas amigo dele. educação. de ter lá um pou‑ maior liberdade para crescer. Relendo esse muito mais crítica. quando diz que medo. Porque talmente completo lá e nunca aqui. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols.. E lá na minha A percepção de Ligia de que nunca se- profissão é difícil. penso rápido em uma pergunta... você me para o nome do bebê. mas eu acho que tem vantagens também.”. diferenciada. o ma é que os nomes brasileiros são problema seria de não morar lá. Pensando em Boszormenyi­ Hugo: É que dessa vez nós fomos. e assim renciação. sim. deixa eu perguntar uma outra Ligia: Eles tinham mandado uma lista coisa para você. E você se sente dade à família de origem. Larissa: E o que é se sentir imigrante? As dificuldades de se adaptar a uma Hugo: Ah. as perdas e ganhos: a negocia.. parecidos com os espanhóis. e eu queria contou que sua família é mais da na verdade que fosse um nome pa‑ vertente radical basca. pensamos em nomes indígenas.. eu tenho que reforçar a parte quero dizer alguém de fora? brasileira. ele é lia você ter escolhido para ser sua basco­‑brasileiro e aí como vai mo‑ mulher uma brasileira. isso não é um problema. porque em outras causaria! Mesmo esse nome que eu gosto Ligia: É.... que ser um nome que dê aqui e lá. ção do “si­‑mesmo” e para fortalecimento da e eu acho que eu gosto disso. e o contato foi intenso dessa úl‑ área que eu estou querendo traba‑ tima vez. ser estrangeira não causa ros a pronúncia é difícil. nessa Hugo: É. ou melhor. milhões de Ibais lá. digamos. que você ficaria um ano em Londres que são parecidos com os nomes e viajaria.. manter a dife- quem vai se mudar para lá. vão ter estrangeira. faria minha vida lá. nova cultura. da com essa coisa do trabalho. família de Hugo e leal à família de Ligia. seria que como eu sou brasileira. uma coisa: como foi para sua famí‑ entendeu? Ele não é basco.. que tem um significado bonito eu nunca me casaria com uma que é rio. mas são nomes brasileiros. Mas o proble‑ Hugo: Não... você já ‑Nagy. para a diferencia- diferente.. ao mesmo tempo. é se sentir diferente... Larissa: E você. por conta de ter algumas dificuldades. eu senti muito a pressão da família. eu acho Ligia de ser engolida por esta cultura.. eles são muito formais.. Hugo. Hugo: Ah. E algumas também desleal à sua história e família de coisas podem ser descontadas na origem. além de aumentar o medo de vre em outro país também. acredito que no momento da escolha estava grávida e olhou aquele país do nome do bebê ficam claras as lutas para e aquela cidade com os olhos de ser leal e. O nome brasileiro seria desleal à acho que um pouco mais crítica. porque eu que‑ eu fiquei com vontade de perguntar ria que ele tivesse essa diferença. você pode se reinventar. Mas lealdade horizontal. porque para nós brasilei‑ blema. muito a atenção. então tem nenhum problema na minha família. é super­comum. achou que iria seguir essa expectativa. Ligia: E sabe que desta vez eu me senti bastante imigrante.. porque agora vocês Essa parte da entrevista me chamou estão mudando para lá. O Ligia: Mas tem essa coisa de ser mais li‑ nome basco. mas teve gente que falou “Ah Ibai. Manual de terapia familiar – Volume II 243 esse trecho. principalmente ao reler . e eu tenho dificuldade. grávida a família toda per‑ lhar que é com imigrantes. “O que vocês vão fazer?” Larissa: E. e com isso rar lá. E tem muitos nomes que Hugo: Não. A dura batalha para manter a leal- cultura diferente. isso eu acho que não tem pro‑ não dá. por conta da língua. Nós Larissa: Qual era a expectativa para você. e recido com basco.. eu vou guntou tudo e também o nome do ter experiência vivida mesmo! bebê. Ligia: Acho que eu fiquei mais preocupa‑ ção em andamento. mas faria sua vida lá? bascos. ... daí. Hugo: É anterior.. meu irmão. eles me apoiavam. quando chegar lá. dendo aos poucos a resposta. Naquele mo‑ cretizado. Ligia: Das expectativas. estava meio saturado Hugo: É. minha irmã.”. nós fomos va insistindo “continua. quan‑ mos uma coisa assim! do saí de lá.. família? Larissa: Os planos de ir para o País Basco Hugo: Ah. meu pai fica‑ Quando o irmão faleceu.244 Luiz Carlos Osorio.. Então já estava con‑ buscar alguma coisa. com o meu ao País Basco. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. minhando. ano passado. E para lá e também prometemos ter depois. eu apoio o bebê e ir para lá.. dividuação conseguindo proteger suas deci- em um acidente de trabalho.. a expectativa E também eu não pensava muito da sua irmã superaumentou. quando voltamos mente estava ligado ao lugar. agilizou todo o contrariar as expectativas. não. faz parte das contas familiares que Hugo tem a saldar? Entre méritos e obrigações. que me pareceu buscando a si mesmo. mas lá.. mas a ideia era alugar mento. Sua irmã te pe‑ fazendo Biologia.. e nessa coisa de fazer minha vida em eu acho que tem uma expectativa algum lugar. Com a morte ção à sua família (se formar na faculdade). apressada pela morte. termina. estou sentin‑ é.. ele tirava umas fotos de um simulador sões e diferenças de uma família construída e caiu num fio de alta tensão. Larissa: Seu pai casou de novo? mas foi o que concretizou. se você terminar. tanto Hugo: Não.”. era mais por enquanto que quando estamos aqui é mais li- e o que fazer. que não necessaria‑ nos já existiam. o que fazem. com respeito às duas culturas? . e como eu não sa‑ dia sempre “Vem logo. bia muito o que fazer.. será que a volta. vem logo”.. porque processo.. e fui enten- que. aumenta! Ainda neste trecho. do irmão e seu processo de diferenciação ca- foi autorizado a passar um ano em Londres. Hugo voltou a falar Tive uma grande surpresa ao saber da da busca pela sua diferenciação e das forças morte do irmão caçula de Hugo. Eu. a que mais pesava era a do meu é anterior ou posterior à morte do pai. eu não via minha vida ligada por um tempo. Com o meu pai eu tive uma re‑ do que eu tenho que estar com a lação muito difícil quando eu estava minha família. Ligia: A gente sempre teve esse plano.. eu acho que foi secundário. em seguida fusionais em sua família e seu país. onde a terra basca? estão? Hugo continuará seu caminho de in- Hugo: Meu irmão faleceu. ele tem uma namorada. Larissa: Sinto muito. também cria‑ você para ir viajar. Percebi fiz uma pergunta muito direta. como cumpriu sua obrigação em rela. mas para você ver como os pla‑ desse conflito. nós fomos com a ideia de com‑ eu precisava sair de lá para poder prar uma casa. em duas culturas? Este casal conseguirá proteger a construção do “terceiro mundo” deles... então que você dizia “Ah. o onde era e sempre ght. a família basca reivin- dica a volta de seu filho e de seu neto para Larissa: Seus irmãos.. então não foi difícil irmão morrendo. Larissa: Foi fácil largar as expectativas da Ligia: Era o irmão mais novo. Hugo: Eu não sabia. era a figura a qual estaria con‑ seu irmão caçula? trariando. eu não via mesmo minha vida lá. separação da mãe. porque a gente é bem unida. sem mãe.. ele acha que nós te‑ superbacana. então vez você e o Hugo brigaram e ele ele diz que não vai ajudar. A força fusional outro. eu fico pen‑ Ligia: Ah. então ele tem que retribuir uma relação tão íntima.. vendo tudo que ela Ligia trouxe neste momento o medo da não gostava. amava e queria ficar comigo. mas ele isso. Mas eu fico querendo cobrar do pai do Hugo que me proteja e que tudo Larissa: E seu pai? seja perfeito.. eu te aju‑ expectativas mudam não é? do a alugar uma casa se você quiser Hugo: Com certeza. porque não sabia o que queria. mas essa vez ele que queria Então eu penso que as expectativas sair. faz tempo. E. qual é seu maior ajudar. Ligia: Acho que foi isso. aí no dia seguin‑ Ligia: O que pesa para mim de expecta‑ te ele me ligou pedindo para eu ir tiva é a de aprender basco rápido. tem que me Larissa: Fora o trabalho. Eu não tenho também para lá. E eu fiquei pensando. todos esses planos? na relação. e eu fico . es‑ continuar no Brasil e tal. disseram. Ligia. ele sando. Porque não é fácil. dessa última vez que foi para lá. ela está sem‑ mais ter essa aflição. eu fiquei pensando em uma pre aqui. e lá você outro momento bem diferente tem para onde fugir? de quando o Hugo fazia Biologia? Ligia: É.. mas isso passou. é mais tranquilo. é Hugo: Acho que eu aprendi a conviver com aprender. pode ser? dor pela separação.. e me pareceram muito Ligia. tirou até o passaporte por‑ na cobrança. como diz pensando na possibilidade de você Boszormenyi­‑Nagy. eu amplifiquei. o peso que damos para essas para ele “Ah. a dúvida. de tudo.. Larissa: E a sua família.. Hugo: É. você disse que uma mos que ser independentes. Eu vou até ver e ela tam‑ po que você não tem isso. Larissa: Olha. Esse medo me pareceu tão grande que você ficaria com a parte de sair que Ligia o camuflou com remotas possibi. que essa seria a primeira vez ligadas. da relação. final de semana estamos coisa com a história que vocês me juntos. bebê não vai ter babá. e fiquei é intensa nessa relação. tinha que ter certeza absoluta não sei. neste momento de você acha. Manual de terapia familiar – Volume II 245 Larissa: Vocês não acham que agora é um não tinha para onde ir. do trabalho. bem a “tranquila”.. ele apoia sim. e talvez. aí me disse que me senão. vou estar lá sem sogra. o que relação à sua mãe esteja. mas a nossa relação com aí foi para casa da amiga e eu dizia elas. sou muito mais rígida com eles apoia.... e acho que a dúvida faz Ligia: A minha família é bem tranquila.. Hugo: Não é aprender rápido.. que antes eu não conse‑ Ligia: Senão não vão querer falar comigo. de ser imigrante. como encarou Ficava buscando o ideal no trabalho. a lealdade de Ligia em ter ido com lente de aumento pro‑ curando o que não gostava. bém. tudo bem. guia.... porque. o Hugo: É. meu pai é mais fechadão. que a Ligia. qualquer coisa que aconte‑ minha mãe inventa de fazer o pós­ cia. E o pai do Hugo tem aquela medo? Você me contou uma coisa coisa europeia. faz muito tem‑ coisa. foi usando len‑ te de aumento. e diz sempre alguma Ligia: É. que a gente está indo não fala. eu ficava muito na dúvida. sabe. parte. do seu país para fazer a vida em lidades de a mãe ir para lá.. Eu fazia tou mais seguro. eu tuguês e falou que vai lá. ‑doutorado lá. “congelada”. acho que não vou falo sempre com ela.”. buscá­‑lo e fui. não. existem.. xar minha família. louca.. Larissa: E essa é a escolha que você está fa‑ eu perguntei “Ah mas a senhora não zendo nesse momento. Mas em relação à minha pedindo para ele se responsabilizar mãe. Ligia está em negociações para virar sua filha. que é a distância. intensamente. o mais velho e o mais novo? Ligia: Eu tenho uma relação superdistante Ligia: Eu fico achando que a família dele com eles. ela vai para lá. é lógico que ele vai ajudar. o que pensaram de tudo isso. 51). entre outros sentimentos. Nascimentos. acho que vai ser difícil. Então eu mais vou sentir falta.) mãe longe da mãe. eu fico meio acho que eu cobro mesmo dele. de deixar a ajudava a mãe dele quando teve as convivência diária com sua família. mas quero na família maior de vocês existe al‑ parar com essa cobrança. mortes. 1991.. Achei o Então acho legal a gente pensar o cúmulo.. Neste momento aparecem as negocia- ramente: “Nella accezione che intendo pro. minha mãe fala que se eu vou estar lá.”.. eu nem sei se seria legal. no “Livro de Méritos e Obrigações” na rela- ção com a família de Hugo.246 Luiz Carlos Osorio. em que as forças “ético” não tem a ver com uma determinada de individuação precisam trabalhar muito prioridade moral. ajudar muito. Como per valutare quello che é giusto o sbagliato. porque gum outro casamento intercultural? senão eu fico vendo só o lado ne‑ Ligia: Não. é Boszormenyi­‑Nagy. vou dei‑ que eu vou morrer de saudades. de entrar nessa disso. a única coisa é que gro das pessoas! a moça que fica com a avó do Hugo . crianças?”. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. (A rações.. Então Lembrando­‑me mais uma vez de não vai existir o que eu penso. sua nova família com Hugo e o bebê e a família do marido. que é a pessoa de quem eu pela criança e não é isso. ou mesmo a avó do Hugo.. transformar­‑se em nas relações interpessoais. a construção da nova ética relacional entre ela. Tem que ajudar. e também se ela for. em momentos críticos do ciclo vi- ma si riferisce invece al bilanciamento delle tal. então eles têm que melhor. Eu sei mundo diferente. tem uma dívida comigo.. Seria diferente da minha mãe aqui. ele fala como se eu estivesse cultura. Ligia está nos descrevendo esse caminho balanceamento das lealdades que ocorrem de sair de perto da mãe. então não falaram nada. diz Bowen. Penso também que a questão ética relacional é trazida cla. para eles serem Hugo: Ela fala “Não vou. as forças fusionais podem aparecer mais lealtá che si verifica nei rapporti interperso. ninguém. que está colocando lar como vai ser. mas ele diz que a educação Ligia: Eu tenho vontade de vivenciar esse são os pais que têm que dar.. ou com critérios para se para não serem engolidas pelas forças de fu- avaliar o certo ou o errado. e do medo de sua mãe Assim.. Larissa: E seus irmãos.. Eu sinto que nem meu pai. ções que Ligia está fazendo para se separar porre il termino ‘ético’ non ha a che vedere de sua mãe.. sepa- nali” (Boszormenyi­‑Nagy. p. penso que Ligia nos está uma ilusão. Eu Larissa: E outra coisa que eu fiquei curiosa. uma coisa para não fa‑ contando dos créditos.. porque lá ela seria dependente de nós. na construção de narrativas que con una specifica prioritá morale o con criteri aplacam um pouco a dor da separação. ser muito legais. que te faz fazer essa escolha de ir? eu sei... e iludida inventando uma história que da irmã também. aqui é bem minha família. mas refere­‑se ao são. saída dos filhos de casa fazem parte dimensão que desejo propor para o termo desses momentos especiais. com os árabes. o povo basco conta a histó‑ tomar mesmo porque é muito for‑ ria com o olhar basco. para provar que seus sobrenomes são bascos. impossível! então começou a coisa de guardar sobrenome. mas um destino que já estaria um peda‑ não têm mais ninguém. tanto de for‑ vida no casal. IX. mistura no País Basco. do fator RH fez com que muitos Ligia: É. é que tem um processo de só come frango com arroz..? aí eu quero ver. com os europeus 3 mil anos antes cultural? Como se não fosse possível. e uma pergunta que me pas.”.. etc. a maior concentração de sangue O negativo no mundo é no País Basco. ele tem oito. e deixam lá a que traz a origem superbasca e há brasileira. e aí tem a maior Larissa: Acho que o que você está me dizen‑ discussão porque eles falam que ela do. com os fran‑ se devessem escolher ou uma ou outra. do as expectativas. Será que conseguirão construir o “ter. não. e aí eu vou poder dizer que é o cruzamentos (soldados que estu‑ Ibai que gosta de arroz com feijão. Igual a cachaça. do que isso. Manual de terapia familiar – Volume II 247 é da Guatemala. vocês terão que fazer e com bastan‑ tem que comer a comida basca. Ligia. sabemos. Vocês pensam batalha para manter a diferença. mais evidente ser basco era ter sobrenome basco.. ou estão. e eu fa‑ integração dessas duas culturas que lei “Gente. Larissa: E acho que chegamos a uma per‑ gunta que é a base desse trabalho.. eu estou quebran‑ comida brasileira. e o povo basco teve relação construir o pertencimento e a unidade bi. “sem querer querendo”.. vezes tem informações que em al‑ Eu sou bem chata! gum momento são interesseiras na Larissa: Me passou pela cabeça que a inte‑ cultura nacionalista.. aconte‑ sou pela cabeça ao reler a entrevista: Como ceu.. por ceiro mundo”? exemplo. seguindo Hugo: Eles falam da boca para fora. Claro que teve gente que na briga das lealdades nenhuma pode “ven- não se misturou por questões ge‑ cer”. brasileira. mem só a basca.. e todos co‑ dos os sobrenomes. o respeito que estão fazendo essas escolhas às suas lealdades. baseados num desejo próprio de seguir o próprio caminho. lealdades. deixa ela. o nacionalismo representação concreta no bebê de nasceu no final do séc. com certeza.. eu faço as duas. Então a negatividade Hugo: É. e cos. só vou fazer comida muito tempo. estou fazendo Larissa: Será que você não poderia fazer meu próprio caminho. Só que a Neste momento senti uma grande dú. ma pacífica quanto bélica. sabe. e por outras como. pravam as mulheres bascas) não . em casa só vai ter Hugo: Eu. depois com os roma‑ nos.. um pouco de cada uma? Ligia: Até porque lá eles têm uma coisa Ligia: Não.. Não. mas muitas te. eu te trabalho! vou comer arroz com feijão. eles guardam to‑ rem. porque tem muita mis‑ quis tomar. Penso que neste momento Ligia traz a é inclusive o título. vas. ográficas. aí eu falei “é melhor não tura. Essa coisa do gração País Basco e Brasil tem uma sobrenome é uma. como de Cristo. ao contrário. ninguém Hugo: Não sei. ço traçado através das expectati‑ Ligia: É. o Hugo adora comida brasileira. é coisa para homem mesmo”.. aí já pensou eles despreza‑ com sobrenome. vocês não acham? Terá mãe das características que fazia você brasileira e pai basco. Ligia: É. e uma vocês. Ligia. manter a Ligia: E ele vai aprender espanhol na esco‑ tradição basca.. mesmo meu pai. eu acho que a família dele me deve. É muito que está devendo a mim. meu pai gostou muito.248 Luiz Carlos Osorio.. o que não possi‑ mente ligadas à identidade de cada um dos bilitava a gestação. e eu gosto dessa aven‑ a outra. claro. não. com ele eu sou boazinha. mas muito longe. porque a gente se aceitou de ir. um em relação à própria história. Ah. nem pela minha. Mas.. mesmo quando liga aqui. da linhagem. nasce o nacionalismo. não (risadas). mas a coisa do casamento coisas mudam. e na família da minha tumando com as coisas ao longo mãe tem mistura. Então acho que é mais momento ficam claras as lealdades de cada . É e não é a comparação Ligia: Não. uma família inter‑ mais uma pergunta. quando cônjuges.. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. mas eram os dois e os entornos do Hugo vão se acos‑ portugueses... ele vai ser trilíngue. difícil. então. que meus avós eram todos portu‑ Larissa: Eu acredito que essas coisas são um gueses.. eu é que uma cultura é melhor do que posso ceder.. do processo de vocês. ao estarem eu não sei. ele é muito mais pró‑ ximo. lealdades dessem certo por incompatibili‑ essas não negociáveis. Acho que dele eu espero que me ajude com minhas Ligia: E tem uma coisa que eu acho. tudo isso se esconde e começa o discurso da raça pura. Que línguas vocês vão fa‑ acham que mais gostou dessa esco‑ lar com o filho de vocês? lha de vocês estarem juntos e fazer Ligia: Eu vou falar português! essa mudança? Hugo: Eu. essa coi‑ sa de casar com basco. Ligia. de raça pura e linhagem por sobre‑ Hugo: É. no ainda existe. eu vou. com menos for‑ um pouco do Brasil. E eu nasci em uma la.. eu estava lembrando to neles a competição.. quase nacionalista basca de tanto tração de sangue O negativo mundial estar que ela gostou de lá. E minha mãe é Acredito ser simbólico a maior concen. não muito verbaliza‑ começo em relação a você e agora da. Deus no céu e Hugo Relendo a entrevista. Agora para essa cultura.. são diferentes. eu quero. não se interessam por outras cultu‑ Hugo: Mas ela te perguntou se você sente ras. conversa comigo. eu acho que eles me devem porque não tem a competição. mas é assim. penso que a família saram no Brasil. quando o na‑ que com o tempo eles vão gostar cionalismo voltou. porque você deve isso ao Hugo já ras aconteceram ao longo da história e que a que ele ficou aqui 7 anos? noção de ser totalmente basco não existe. lá. por ter alguém ça é claro porque é ridículo falar da família deles que é brasileira. Ligia: Não. Mas eu acho época pós­‑ditadura.. Ligia: É mesmo. quem vocês cultural.. e assim diferente daqui. interessa. já minha mãe é apaixonada pelo Hugo. Pensei que historicamente é uma nação Larissa: Outra coisa que me passou pela pronta a se defender “naturalmente” contra cabeça. basco. Ligia: Ah.. como eu te disse. construindo uma história diferente Larissa: Que interessante! Entendi.. era te perguntar se as misturas e o diferente. eu acredito que com o tempo as nomes. mas eu sin‑ tura de ir.. pois estão profunda- dade sanguínea.. Hugo trouxe um você acha que aceitar ir para lá é significado diferente. é superdiferente. os pais do meu pai se ca‑ processo. dizendo que as mistu. pensei que neste na terra. eles dificuldades na adaptação. não sei mentei coisas que eu não faria lá. as pessoas. eu acho que foi superamadureci‑ que essa é uma pergunta que você mento quando eu fui para Londres.... Não gosto. que eu esteja como uma possibilidade de busca em dire- com ele. Hugo: É. como vão morou nos EUA com 16 anos. uma outra vez. e por isso eu dar com o que eu preciso? Eles vão tenho essa vontade de ir. eu não estava Hugo: É.. faz o tempo todo: “Eles vão me aju‑ me senti muito Ligia. eu fico querendo depois morar um tempo Realmente acredito que a diferencia- em Londres... faria qualquer coisa. Manual de terapia familiar – Volume II 249 contra a diferenciação.. Ligia: Acho que na parte cultural a gen‑ te fica sendo leal à cultura de origem. mas já posso Hugo: É ser leal a algo. de ir para lá. foi de que você estava falando. então essa coisa da lealda‑ Mas agora eu já posso voltar. estudar em Barcelona também está Larissa: Mas eu penso que é totalmente di‑ adorando.. ele acha que tem mais indo como eu fui para Londres que oportunidade... eu sei. eu fico pensando ir. Ligia: Sabe que eu vejo a minha escolha de Larissa: Te ouvindo. Li. porque meu irmão mais novo tar. nos da individualidade vão surgindo dando Ligia: É mesmo! mais força ao próprio existir. fusionais e outros de maior singularidade. Ah seu pai. e o Hugo não quer ção seja um processo com momentos mais mais. O tempo vai pas‑ inerentes a todas as relações. te está indo agora para lá e você aparece a batalha entre o pertencimento e já está pensando em morar em a diferenciação. sua mãe foi a que O momento do processo em que os contor- menos gostou. Hugo: Eu levo a sério as coisas. as obrigações e os méritos Londres. ças fusionais (como diz Bowen) na batalha . eu não estou Ligia: É mesmo. meçou com essa coisa de viajar. Hugo? Hugo: Eu acho que. não gosto.. o lugar. e a língua outra coisa que eu penso que eu seria uma delas. por quê. E fazer você não ser aceita. Hugo: É. agora a gente está indo para ficar para sempre”. Larissa: E da sua família.... ção aos próprios caminhos e ao “si­‑mesmo”. quando eu vim. calma. e também seu irmão que quer ir preocupada com trabalho. eu acho que você vive de acordo Novamente vi que apareceram as for.... ferente mesmo de quando você foi Larissa: Você acha que foi você quem co‑ para Londres.. com a cultura em que você cresceu. maior liberdade. um processo longo. mas eu sei.. Hugo: É a sensação de ser mais livre. então loca algumas questões que podem acho que ele foi o desbravador. é que eu gosto de viver o futuro... voltar.. ver Hugo: E eu acho que você está preocupa‑ outras culturas? da em como vão te receber e acei‑ Ligia: Não. a gen‑ Penso que neste momento. nin‑ guém da minha família gostou. eu fico querendo que eles fiquem me senti mais livre aqui. des que eu vou ter?”. e te receber e aceitar. eu Ligia: É. Ligia. sar um segundo após o outro. experi‑ sendo iguais à minha mãe... é esse peso de “Ah. Ligia: É. acha que na Europa a Ligia: É engraçada essa pressão que eu vida é melhor! sinto da família dele. você se me aceitar mesmo com as dificulda‑ sente mais você. a separação física importante para ela. então você co‑ depois eu fui para Londres. nada. você vê o mundo a partir de você. p. mas além disso acho que tem pode despertar muitas questões. a ideia de um novo “si­‑mesmo”. lealdades invisíveis. de você que é resultado do medo de ter ser a partir da cultura em que você um pedaço da própria identidade nasceu e com o tempo você vai fa‑ apagada. paciência e lembrem­ trouxe a noção da sua diferenciação e indivi. es- e acho que isso acontecerá comigo também. familiar e transmissão transgeracional..... tudados por Bowen (1991). Destaquei uma coisa que aconteceu também neste trabalho as que foram acordadas em com o Hugo. ven‑ ciente. Não casarmos antes com nós mesmos. . Não quería- Fiquei muito surpresa com a fala de mos terminar aquele encontro com tantas Ligia. tive tempo de fazer a mistura. eu acredito que isso é uma ca‑ cional.. nesta última frase. ela estava trazendo em seu discurso a noção da diferenciação na adolescência. A separação para a aproximação. Hugo: Foi ótimo! Pensamos muitas coisas importantes.. adorei nossa conversa! Me ajudou muito. ética relacional. racterística própria da migração. te ouvindo. pois. eu queria agradecer muito a vocês dois. já que veio para cá tanto tempo atrás. a me contar mais alguma coisa? distância como possibilidade de união. ou para a entrevista de vocês? ainda da apropriação de seu próprio valor. estou misturado. neste momento. A formação de um casal intercultural Ligia: Sim. se agarrar à cultura para não per‑ Acho em termos de lealdades só se der um pedaço da identidade. então você fica (Colombo... a possibili. acho forem invisíveis. exatamente sobre isso. a lealdade. que não é cons‑ Hugo: Eu estou voltando diferente... Posso dar esse nome duação. Larissa: Bom. ao legitimar­‑se na própria pressão de que você tem grande singularidade. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Estamos juntos a quase três horas. foi muito agradável! dade da mistura intercultural. 35) lutando o tempo todo para não dei‑ xar isso acontecer. muita sorte. Nos ajudou muito! Ligia: Foi muito agradável mesmo! Ligia: É.. 2006. Conjugar o Verbo amar exige extremamente Larissa: Ligia. zendo essa mistura. projeção quanto depois que ele veio para cá. e Ligia: Pode claro. eu me sinto muito adolescente com a família do Hugo. Eu já sou diferente do Hugo do as coisas muito diferentes. em que é sempre uma briga Alguns pensamentos finais para crescer e existe a grande dificuldade de traçar o contorno de si mesmo. pela cultura basca. que ele nunca se in‑ mim. ou querem história.. iluminando assim os conceitos de teressou tanto pela cultura basca processo de diferenciação do eu. no momento em que pensava reflexões. legitimidade construtiva e destrutiva e pes- quisados por Boszormenyi­‑Nagy (1991). ‑se CALMA. Hugo Hugo trouxe.. legitimar a existência do medo de ter a sua cultura engolida outro.. e justiça rela- Larissa: Ah. eu fico com a im‑ complexa de. Parecia que o casal e eu poderíamos conversar muitas horas ainda. trazendo sua Larissa: Podemos nos despedir.250 Luiz Carlos Osorio. Desejo a vocês Penso que Hugo. um casal intercultural? Será que o que de. sem trair as origens e sibilidade de escolher o diferente para se di- sem ser engolido pelo novo. conceito utilizado por mim da mes- junto. ‑Nagy. Manual de terapia familiar – Volume II 251 Esses autores e suas propostas me auxilia. quando 1991). e que os ajude a atravessar seus acredito que o movimento pendular do sim processos de diferenciação. cada um. Outro ponto que permeia o discurso sente. pude refletir sobre essa ques. com suas diferenças. Como diz Boszormenyi­ ram a focar o tema deste trabalho. mas batalha da individuação frente às lealdades as transformações que o encontro gerou nos e dívidas a pagar à família de origem. lidas. Pareceu­‑me que o va que é a construção da confiança. sal entrevistado. exatamente por esse movimento diferenciação e emancipação desperta ques- pendular. nova família. mundos individuais. a batalha entre as lealdades e a esperança e medo que esse momento gera. nominamos como escolha realmente o é. ta ou até mesmo as “brigas” com as famí. alidades. ferenciar e lutar contra uma força fusional. Como a individuação é um processo. mas como um balanceamento menosprezar o fato de que. que seria feito a partir dessas experiências e bi que nossas reflexões giravam em torno da que não é simplesmente a soma delas. uma vez que o primeiro mundo” signifique uma tentativa construtiva movimento foi a migração feita por Hugo e de equilíbrio nessa dimensão tão significati- agora será a vez de Ligia. ao mesmo tem. a possibilidade de se diferenciar­está Minha pergunta central é: Destino ou apoiada no equilíbrio entre obrigações. seu país de origem. formando uma e não que aparece várias vezes na entrevis. Esse casal busca. individuação esteve verdadeiramente pre. Acredito que essa intensidade é de. e que as forças para a individuação preci- rem mais balanceadas no “Livro Maior de sam trabalhar muito para não serem engo- Obrigações e Méritos” (Boszormenyi­‑ Nagy. em todos os momen. em determi- mais bem compreendido por eles. as diferenças entre os dois mundos e as construção de uma relação ética intensa e duas culturas e também o desejo de estar equilibrada. na minha percepção. Além disso. para este casal ficar cional. nados momentos do ciclo vital. acredito também sionais podem aparecer mais intensamente. que há a possibilidade de as contas esta. Parece­‑me que estão Senti que. assim. durante a análise da entrevista. negociando essas possibilidades com toda tercultural. onde caibam as duas individu- junto. segundo Hugo e Ligia. perce. é necessário um deles abrir mão de ma forma que Boszormenyi­‑Nagy (1991). onde cada o destino de ter que lutar tanto. e ao mesmo rações na família de origem? Ao entrevistar tempo a possibilidade de criação. Não podemos do errado. Pensando na minha pergunta da for- lias fazem parte do caminho que está sendo mação de um casal intercultural ser escolha percorrido em direção à construção de um ou destino. e. Observei que Hugo e Ligia enfrentam . as forças fu- mais cuidado. solida- fato de Hugo já ter passado pelo processo de riedade e legitimidade no vínculo amoroso. tões muito profundas. minha metáfora. este é o segundo momento Acredito que a construção do “terceiro de transformação. das lealdades na relação. como Boszormenyi­‑Nagy. acredito que Hugo e O casal trouxe. formação do casal. de um “terceiro mundo” tão e. na formação desse casal in. leal- Escolha? O que predomina na formação de dades e méritos. migrar faz com que o esforço de Ligia seja Penso como Bowen que. de sua família na vida não como uma dimensão moral do certo e cotidiana e de sua rede social. “o terceiro mundo”. e po em que legitima o diferente. já que a in- um poderá respeitar suas lealdades sem tensidade da batalha também vem há gera- ameaçar seu processo de diferenciação e a ções. acredito que seja ambos – a pos- novo modo de viver. do casal é a negociação quanto à ética rela- corrente do fato de que. referentes às relações de lealdade diz que qualquer movimento em direção à horizontal. no caso do ca. ou construir uma relação em que haja lugar para faz parte de um script já escrito há muitas ge. Ligia estão fazendo as negociações para a tos. E. R. Gritos e Sussurros: interseções e ressonâncias. São Paulo: Casa do Psicólogo. I. los diálogos. 1994. v. In: CRUZ. Práticas discursivas e produção de Buenos Aires: Amorrortu. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. v. Panorama das Terapias Sponti. WATZLAWICK. ca para análise das práticas discursivas. I. La terapia contes. J. São Paulo: ficados. Intervista a Ivan PAPERO. M.. De la família al individuo: la dife. S. G. tesouros que foram dados a mim por meus GALINA. você e eu? São Paulo: Casa do Psicólogo. 14. velar da singularidade pelo idioma pessoal. Produção de sentidos ANDOLFI. descendentes de esbarrarem como mendi- GRANDESSO. com casais.1 verso lo speccchio. et al. Terapia familiar como construção social. São Paulo: Summus.). São Paulo: n. nov. Quem foi mesmo Von Foerster? Nova Perspectiva Gostaria que nossa conversa sobre suas Sistêmica. M. dedico este trabalho aos con enfoque sistemico. São Paulo: narrar a própria história gera um espaço de Vetor. reflexão e assim construções de novos signi- DIVAKARUMI. SAFRA. essays. renciação das forças familiares originais. S. In: GRANDESSO. Terapia e justiça social: respostas éticas a questões de dor em terapia. M. 1999. ao mesmo tempo em que também iluminaram minhas COLOMBO. Si me amas no me ames: psicoterapia Para finalizar. 2007.. F. Relazionale: attraverso lo speccchio. sentidos no cotidiano. 1991a. Gritos e sussurros: trabalhando reflexões sobre minhas escolhas. Em busca do Sagrado. F. MEDRADO. BARBETTA. BOWEN. In: ELKAÏM. que poupa nossos dicas. 1991.  Amar e brincar: fundamentos esquecidos do humano. Roma. mundo” mantendo as contas equilibradas. CECCHIN. 9. nas estacas da cerca de cactos. São tuale e l’unità delle terapie. uma análise epistemológica e hermenêutica da práti- Chinua Achebe ca clínica. Ser imigrante: caminho para a construção de uma nova realidade. L. 9. 29. Narrar e re. n.. São ANDERSEN. TOFFANETTI. (citado por Divakarumi. B. In: COLOMBO. D. tido da vida que estão construindo. Barcelona: Paidós. Porto no cotidiano: uma abordagem teórico-metodológi- Alegre: Artes Médicas. I. Barcelona: Gedisa. Referências MATURANA. 1998. (Org. São Paulo: Vetor.. histórias de encontro e diferenças tenha pro. 2000. BOSZORMENYI-NAGY. M. M. e ainda. M. 2006. 1998. Panorama das terapias familiares. R. 1995. 26. Revista di Psicoterapia Paulo: Sobornost. C. ampliado as narrativas e construído novos DUCOMMUN-NAGY. SPINK. v. porcionado a possibilidade de repensar o sen. S. 1983. v. lembrar que: GERGEN. 29. T. Barcelona: Gedisa. J. n. 2004. Familiares. P. A dança trigeracional: uma leitura pais e outras gerações que me precederam. mamãe. M. M. VERDEN-ZÖLLER. S. A realidade inventada. 2001. Espero que nossa entrevista tenha Objetiva. M. Porto Alegre: Artes Mé- É apenas a história.. Ermenêutica na situação clínica: o des- BOSZORMENYI-NAGY. M. 1984. com coragem essa luta entre fusão e dife. M. Sobre a reconstrução do significado: gos cegos. São Paulo: Cortez. V.252 Luiz Carlos Osorio. In: significados para a experiência que nós três ELKAÏM. Irmã do meu coração. G.). BOSZORMENYI-NAGY. D. COLOMBO. MACNAMEE. Australia: Dulwich Centre Publications. (Org. 1991b. H. A teoria sobre os sistemas familiares Boszormenyi-Nagy a cura di Wilma Transsarti de Bowen. Re-authoring lives: interviews and renciación del si mismo en el sistema familiar. Psy II. 1998. facilitadora. F. São Paulo: APTF. (Org. 2004. 1994. A terapia contextual. ELKAÏM. G. C. Roma.). et al. Lealtades invisibles. K. 1999) LEIFERT. 2006. Rio de Janeiro. Revista di Psicoterapia Relazionale: attra. In: SPINK. H. 2000. 2006. M. Papai. G. et al. El equipo reflexivo: diálogos sobre Paulo: Palas Athena. . 1988.. WHITE. Por trás da máscara familiar. São estamos vivendo: a de construir o “terceiro Paulo: Summus. M. P. julga­‑se no direito de revidar na dentes dele. agressor quase sempre se julga uma vítima. que ainda hoje. . artigos e livros publicados. mas sente. já tão movimentada e que. quer com o um clima fusional. alguém que. essas suas primeiras experiências psíquicas. É aos poucos que ele percebe a proporção de sua dor. Um quisas. medo se dissipem. em pleno século XXI. pecialmente a figura materna – dá­‑se em tificação seja com o agredido. Por quê? Porque ele relação entre o bebê e seus cuidadores – es- atinge o âmago de cada um. por si só. relaciona­‑se intimamente cer a ele. Em contrapartida. indepen- (rejeitado). cessariamente. teóricos. devido à sua agressor. pessoas cometam crimes em nome do amor. Não penso em seguir por essa não dispõe de palavras que deem sentido a trilha. pois o bebê. to que procurarei estabelecer um paralelo A ideia de que existe um “outro” ante- entre esses dois aparentes opostos: a faci. mais absoluta do que aquilo que ele sente. “Relaciona­men­ zer e a segurança que o “outro” pode forne- tos Descartáveis”. quer a iden. aler. um “sujeito” em si mesmo. Cabe lembrar. falta. “eu”. Anseios arcaicos Manchetes e reportagens esparramam pelo mundo notícias dessa natureza e só o fazem A observação de bebês e as teorias que por uma razão: o público. cede em muito à percepção de que existe um lidade em se desvencilhar de possíveis la. Camaratta Anton farei muito uso de “aspas”. uma natural e saudável por tal tipo de assunto. no início. que nos enriquecem com suas pes. a olho mental importância. Essa percepção implica medo e dor. tanto nos tem acrescentado. dá­‑se em um contexto no qual. ainda mais a expressão “outro”.. Para não me O fato é que a ausência deste outro equivale tornar repetitiva. Acentuemos Desde este momento introdutório. a ausência. sem a constância no atendimento às suas neces- me preocupar com citações. “não eu”. prefiro optar por uma via a uma sentença de morte. em geral. muito pessoal: escrever informalmente. e anseia por reaver o pra- O tema deste capítulo. capítulo 20 Relacionamentos descartáveis Iara L. pois o bebê e debates. A percepção de um “outro”. E pode haver uma verdade fazê­‑lo. a não ser pela morte. fica derivam dessa prática demonstram ampla- muito mobilizado e se interessa vivamente mente que. tro” que lhe estende os braços. no entanto. que o imaturidade e falta de experiências prévias. de um com um assunto bastante em voga nos úl. deixando em seu lugar a tas histórias compartilhadas na intimidade alegria do reencontro e a confiança neste “ou- de nossos consultórios nos proporcionam. alternam­‑se as experiências Contamos com contribuições de excelentes de presença e de ausência. mas focando a sidades faz com que rapidamente a dor e o prática clínica e o entendimento que mui. nu. não reconhece a si mesmo e nem aos que ou seja. para acentuar al- Introdução gumas expressões que considero de funda- Não deixa de ser surpreendente. palestras medo e uma dor inomináveis. ne- timos tempos: “a efemeridade no amor”. O bebê não ços amorosos versus a total incapacidade de sabe.. Além disso. por ter sido agredido o cercam como “seres separados”. tão apresentam. aparentes insucessos. Enquanto isso. Surge um “eu”. As los de identificação. E. por sofrimentos sem fim? O que ocorre ‑se para apreciar sua deslumbrante bele- quando situações traumáticas não encon. por acima proposto: a livre associação de ideias selecionarem e se identificarem com o que será meu guia. porém. ao lado dos (1974). durante o tempo todo. a questão do narcisismo entra da vida. vações e maus­‑tratos. E. sem qualquer possibilidade. za.­mantendo­‑me firme no estilo de redação desenvolvendo os melhores recursos. quer circunstâncias. É evidente. e tendem a repetir ações e reações que as O desejo pelo outro. Lacan e Kohut (1984). aprenderá a sorrir. que nos relata o triste fim de sos de frustrações (e a superproteção pode Narciso. ao sucumbir nas águas do lago enquadrar­‑se nisto). da ao que leva a crimes hediondos. no círculo vicioso de ça. deste capítulo é fruto da contribuição de inú. pelo amor. também oferece poderosos ser separado. Winnicot mecanismos de adaptação e de defesa que (1982). para todo o sempre. Aprenderá a fazer a sua parte e a rem descartadas. o meio sociocultu- fazer gracinhas. a ninfa Eco. normal e patológico recedor do afeto que deseja despertar. E. cuidado e amor permanece vivo dentro conflitos estéreis. através de – novamente – mode- e digno – capaz de amar e de ser amado. ral e econômico. porém. que introduz novos estímulos e condições favoráveis. identifica a si mesmo como um vimento pessoal. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. pelo cuidado. onde. Algumas crianças além deles. Ou seja.254 Luiz Carlos Osorio. único. ao longo Aqui. Os anseios mais arcaicos seguem vivos vras que expressem tal reconhecimento? e atuantes em todas as pessoas e em quais- O “desejo pelo outro” se estabelece. adaptando­‑se ao meio e ‑lo. Ou seja: o próprio bebê desvenda os gistro das experiências mais precoces. praticados mesma forma que já ocorria no seio de sua por pessoas que não suportam a ideia de se- família. por sua presen. Mas o que ocorre quando as vivências O termo “narcisismo” surgiu da mito- mais precoces foram marcadas por exces. paralelamente. quando foram de- desejado”. crenças e valores. Mas resistirei a fazê­ der de resiliência. de confiança e mutuamente prazerosas. valioso estímulos. aliada à prática clínica e a ex. ainda. que o tema há de mais saudável e prazeroso. opor- interações vividas na primeira infância esti. aqui. a oportunidades. logia grega. ao seu lado subsequente? e oculta entre as sombras. a se conduzir. mulam o crescimento pessoal. por enganos e menti. colocam na roda­‑viva. por . Mas o destino des- Pela presença. inclinava­ ras. um extraordinário po- sintéticas observações. surge o visceral “desejo de ser primeiros anos de vida. Mahler (1993) e tantos estudiosos definem o caráter do ser. esta criança “suficientemente fe. a quem devemos estas. a se controlar. preservar a integridade de seus amados. Outras. a proteção ‑se o risco de desconsiderar a continuação e os regalos do objeto de seus anseios. Fico muito tentada a citar Freud senvolvidos crenças e valores. nem sofrem de tantas pri- meros mestres. então. corre­ caminhos para obter a atenção. mas são mais frágeis periências de vida. Narciso não tem olhos e nem ouvidos tram espaço para elaborações na história para ninguém. Mais do que isso: entenderá que será necessário Sobre o narcisismo investir muitas energias para se tornar me. de pala. Em da história. recompensas e castigos. de perdas constantes e de de cada ser humano. tunidades. desde cedo. à primeira vista. no qual se dá o desenvol- Aos poucos. em pauta e é um dos vértices a partir do liz” reconhecerá e tenderá a se aproximar qual podemos levantar hipóteses a respeito de pessoas que lhe permitam viver relações da efemeridade no amor e. ses anseios é vivamente influenciado pelos neste ponto. descobre­‑se que tudo tem seu Quando se dá tamanha ênfase ao re- preço. Prossigamos. de seus semelhantes e do mundo ao redor. na mesmos e pela relação. tir na relação. ter de enunciar coisa alguma. esperam ser amadas passi- representantes máximos da tragédia huma. de modo do. Esta é uma posição mente descartáveis. de papéis e de fun- suas necessidades e desejos. para o recém­‑nascido. seja. em quase que indispensáveis dissolu- algo idílico. a n traem a confiança mútua. e dificilmente é reconhecida a n e. Nesses casos. ninguém é insubstituível. Zeus). depositam seus anseios Mas vale acentuar que uma relação fusional em quem se mostra incapaz de corres­ entre adultos equivale a uma “com+fusão” ponder. diano assumem dimensões exageradas. em contrapartida a um narcisismo patológi- quico. quando os parceiros. sem ter de dar nada em troca. construída sobre . O des íntimas e nem enunciar através da parceiro passa a ser desvalorizado por não linguagem aquilo que os assemelha ou corresponder ao que lhe havia sido designa- diferencia e aproxima ou afasta.. através de um melhor forma. a narcísica por essência. Afinal. Em terapia. etapa de suas vidas. fusional. sob os olhares embeve- Os relacionamentos tornam­‑se facil. Lembremos que. saudável. Perde­‑se a paciência e o desejo de inves- a favorecer o entendimento. vamente. responsabilidade de ambos na constituição. pois não só isto lhe seria impossível. o amor mú.. as frustrações do coti- dades e seus limites. suas vivências. diálogo em que “um e outro” se encontram muitas pessoas sonham com a reedição da e se fecundam. verdade. sentam grandes e intoleráveis frustrações. em uma que o tranquiliza e o enche de bem­‑estar. quando “Eu e Tu” mostram­‑se impossibi. Sua voz res.. sem na. não é o que os une. O fato de am- bos não se comprometerem um com o outro Nessas circunstâncias. Narciso e Eco tornaram­‑se os história. consequentemente. Na primeira hipótese. porém marcante. são desejados e zelam por si um vínculo forte e bem qualificado que. sua mãe do a agir conscientemente. suas quali. Nas relações ditas amorosas. tendo em vista (a quem distraía com sua tagarelice. outro mude. as últimas como também a boa mãe.”. aqui e agora. devido ao natural ní. incapaz de guagem do bebê e atendê­‑lo a tempo e da ter um retorno verdadeiro. os bons cuidado- palavras de quem as pronuncia. para atingir aquilo de que necessita ou que de- facilitar as aventuras amorosas de seu pai. movidos por sentimentos por essa espécie de fusão. nhadas e atendidas. segundo seu entendimen- que compõem o casal estão em busca de to. sendo adivi- litados de constituir o vínculo do amor.. ou. vendo­‑se condenada por Juno. de modo a satisfazer ções. tal ponto que pequenos dissabores repre- n não conseguem identificar suas verda. Ele autoestima consistente. Frustou?. ções. de culpa conscientes e/ou inconscientes. cidos de seus parceiros. “Não agradou?. no qual ambos na preservação e no desenvolvimento de se desejam. cias) qualidades ou. O que representaria exemplo de Narciso e Eco: um narcisismo normal e. não consegue aproximar­ não precisa pensar em nada. o sujeito transfor- a imagem dele e a imagem materna – fusão ma seus registros. empenham­‑se em compreender a lin- ecoa em que vales e montanhas. Dispense! seus anseios narcísicos. que facilmente resulta em uma “confusão” n não levam em conta a pessoa do outro. Fala­‑se em um narcisismo saudável. os indivíduos tende a resultar. ou seja. Manual de terapia familiar – Volume II 255 ele apaixonada. des­ Alguns casais buscam continuamente qualificam­‑se. existe uma espécie de “fusão” entre co. os melhores momentos de pe- n têm olhos e ouvidos só para si mesmos quena.. em uma criancinha passa a ser disfuncional em n deslumbram­‑se com suas (reais ou fictí­ um adulto. vel de desenvolvimento de seu aparato psí. a apenas repetir os sons. até. (caos) de identidades.. pelo contrário. pelo contrário. que reproduziria. um espera que o tuo e a resolução de conflitos. tituir um elo profundo. nem é obriga- ‑se. não chegam a cons. fazen- que inspira e deseja inspirar. objetos usados qualquer vinculação amorosa e sexual. Objetos novos podem ser joga- as pessoas nem chegam a estabelecer dos em um canto qualquer. n Ao menos uma das partes trata o parceiro direta ou indiretamente. nem tão distantes. cresce com a vida. vertiginosamente. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Além disso. “capacidade de não é reconhecido e legitimado enquanto renunciar e assumir. pior ainda. se apresentarem algum defeito. vão . dos. relacionamento se. de alguma forma. desenvolve diondos. para si outro modelo relacional e/ou alimentando identificações com imagens ca- abandonaria o relacionamento que se pazes de estimular o consumo e o descarte. Não me refiro aqui a feitos extraordiná. mas limita­‑se a funcionar como estão muito presentes em se tratando de mera extensão. o parceiro é visto tem a sensação de não estar presente como mera extensão do sujeito. de certa forma. n A reação intensa. ultrapassa- preferindo encontros efêmeros. se interesse por quem. dores e que. mas extremamente simples. por necessidades e limitações suas. está amplamente examinado no livro A esco. assim serva em quase todas as áreas opõe­‑se ao sendo. o “outro” dade e pertencimento”. n Sensações que lembram a morte tornam­ Na segunda hipótese. substituindo­‑o por rem coisas absolutamente desnecessárias. quando. abundância. e selecionarei. a velocidade que se ob- elementos de seu mundo interno. dia a dia.256 Luiz Carlos Osorio. que diz respeito a ‑se particularmente intensas quando se um narcisismo patológico. 1998). conforme expressão lha do cônjuge (Anton. do tipo “fúria narcísica”. apresenta um narcisismo patológico e. o rompimento resulta neste espaço. em outros tempos. n Os dilemas entre o “eu e o outro”. Boa parte da cultura ocidental estimu- te atraído para a cilada. valores e recursos que acrescentam. a tal ponto que e o expulsa de sua vida tão logo surjam as as pessoas sentem necessidade de possuí- primeiras frustrações. usada por Caruso. buscaria A mídia estimula desejos. inclusive os bens insucesso”. de dar e receber” “outro”. se ele pudesse. pois as humilhações. rios. sólidos pilares. Assim. partindo para a execução de crimes he­ melhantes. multiplicidade de anseios. sentando algo de bom para si mesmo. também encara o outro qualidade de vida e de vínculos. Parece haver escassez. para a humanida. novos pares. la a superficialidade nos mais diversos ní- cabe encaixarmos a expressão “aparente veis. pois realmente do uso de chantagens emocionais ou se importa consigo mesmo e com seus se. logo são sentidos como velhos. em si mesmo. que sucedem uns aos outros das quais talvez nem venham a fazer uso. neste ponto. apenas alguns aspectos: no sentimento de “morrer na mente do outro” – que segue vivo para amar e ser n A vaidade pessoal faz com que o sujeito só amado por terceiros. abandonos aos quais se submete podem poderiam ser disputados pelos herdeiros das estar sendo intimamente impostos por famílias. o que parece um “insucesso” pode cultivo de algo que possa ser mais signifi- representar o sucesso de forças que agem cativo e exigir investimentos a longo prazo. Tudo é descartável. “liber- estiver a serviço dele. Que pilares seriam esses? n Alguns parceiros desesperam­‑se diante Seria a certeza de ser merecedor do afeto da possibilidade de abandono. Existe um enorme conjunto de fatores que. repre. mostra profundamente frustrante. Esse assunto na mente e no coração do amado e. relações descartáveis ou efemeridade no n O parceiro só entra neste modelo de amor. contribui para uma como um ser absolutamente descartável. com uma cínica facilidade. para demonstra que este mesmo parceiro que os seus e. ligados à à sua maneira. não suporta a ideia de já não ser desejado de. for contínua e fortemen. próprios do como uma extensão de si mesmo. em meio a tamanha n Em casos cada vez mais numerosos. Em nome petição de abandonos perante as referidas do amor. em desde seus primeiros tempos de vida: “ou” a larga escala. e estamos diante de que nos constituem e humanizam.. com suas parti. quanto disputas. impossibilidades. levando a relacionamen- mutuamente compartilhados como projeção tos cada vez mais superficiais e efêmeros. a se des- Um fato psíquico relevante a ser le. Estes se agigantam quando. usa­‑se normalmente a “outro” introduz o novo. Romper. ou seja. Tentemos. do com tendências a não ter fim. gências”. pois “mistura” e “encontro”. a dor. “encontro”. não coincidem. descartar fica fácil e pode parecer a me- como alguém que não é uma mera extensão lhor.. como se tivessem sido vado sempre em conta quando pensamos traídos ou cometido um lastimável engano. ou uma “identi. pois to. táfora: “Projeção é quando julgamos estar Os vínculos são essenciais – são eles diante de uma vidraça.. “ou” repete­‑se a desilusão (des­‑ilusão). ao mesmo Outros. corresponde a uma representação vinculação neurótica ou até psicótica. das expressões aqui adotadas mereceria um Aqui. A outra opção seria viver em disputas. a como. Manual de terapia familiar – Volume II 257 direto para o lixo. ambos adotam um padrão de comporta. marca a diferen- projeção e. que usa a seguinte me. A re- do “eu” de cada um dos parceiros. . Há quem não suporte a ideia desejo de preservar. a pon. de não reencontrar no presente o que anseia E o mesmo vem acontecendo. melhores esses vínculos. se não a única. no reconhecimento do “outro”. tem identidade própria. a raiva e a indignação. necessariamente. não neces- O “outro” não faz parte de meu eu. Sem essa di- mento que os encarcera. mais “huma- ficação”. sariamente estão vinculados: muitos casais Aceitar esse fato significa aceitar e assu. Já a identificação projetiva im. do parceiro ideal para se encaixar nos”. Essas defesas tornam­‑se inadequadas que possibilita o reconhecimento entre dois quando excessivas e abrangentes. fazendo com que ferenciação. E cada uma é melhor ou mais poderoso do que o outro. ao colocarem am- mo. ponto de vista psíquico. ser breves. à nhas frustrações. O “Outro” É nesse momento que muitos casais apaixonados passam a se odiar. do ponto de vista emocional. pode parecer uma alterna- primeira vista. e identificação projetiva. partir das “diferenças”. parte “des­‑ilusões” faz com que cresça uma es- das quais derivam de mecanismos de defesa pécie de cinismo. no entanto. significasse que um cularidades. ou seja. na me. direitos e deveres. desemboca em novas por Frederic Pearls. mir algo muito concreto que.. O Em algum grau. fica impossível um verdadeiro fiquem encaixados em um jogo doentio. mais saudáveis nos plica um “reconhecimento”. diante de tama- das elas são bem mais complexas do que. até mesmo. bos em campos opostos. Ainda que permaneçam juntos. mantêm e cultivam uma tempo. biótica do desenvolvimento. a identificação pro. ‑lo. Aí. dá margem a alegrias e to de impedir o reconhecimento do outro sofrimentos. um “outro”. prezar mutuamente. saída possível.. mais saudáveis. na “relação a dois” é a questão do “outro”. porém. É essa representação que re- numerosas as oficinas de conserto. podem surgir tanto mal­‑entendidos bem mais amplo espaço de análise. ça e faz a diferença. tornamos.. ou a uma eterna busca do amor romântico A projeção é magistralmente definida que. ao localizá­ renciação entre um “eu” e um “você”. poderiam sugerir. percute nos sentimentos e nas ações dos se- dida em que diminuiu significativamente o res humanos. efetivamente. tiva. Ao mesmo tempo em jetiva. como se estas. nem se tocam. A qualidade desses implica uma dife- em anseios e projeções pessoais. surgem as “diver- alguém que não é mera extensão de si mes. na esfera do relacionamento relação é mágica e plena como na fase sim- humano. se pode cometer atrocidades. “eus” singulares. Quanto um espelho”. sendo cada vez menos inconsciente. de reflexões pessoais e compartilhadas po. é reapresentado em uma boa separação. Isso vale tanto para as tico pode ser comparado a uma viagem. mudanças desejáveis. colaborando. sem desejarmos enquadrá­‑los em nosso cada terapeuta e cada momento são únicos. e ele e representam o que há de melhor dentro tem de estar tranquilo em relação a isto. A relações terapêuticas quanto para as amoro- viagem é do paciente e cabe ao terapeuta sas. pois são consistentes tarei convencer alguém a permanecer. esta ocorre de forma completamente revela­‑se um padrão de comportamento re- diversa de um processo de descartabilidade: petitivo que. seja ela vimento e satisfação pessoais e respeitam o individual ou de casal. Para tanto. são. Essas diferenças podem e devem oportuni- Em meu entender. a uma pro- bre esse tema. por que se vai. É necessário e muitas vezes. podendo introduzir as quais me identifico. gem adotadas. não há razões para que seus elos se desfaçam mas examinada. ambos também cultivam pode partir. supondo­‑se que haja uma interrupção no processo terapêutico supostamente precoce. pode ser muito enri- quecedora por si só. significativos que temos ao longo de nossas giado. partes está em suposta ou real posição de autoridade. se respeitam e se validam colocar­‑se em contato. o próprio terapeuta precisa “reconhecem”. perguntas. Penso que este nosso espaço cura posterior. mais para expressar “ao vivo e a cores” o que as fortalecidos. em suas individualidades.258 Luiz Carlos Osorio. quando se empregam métodos diretivos. compreender atingiu seu ápice e o casal decide pela sepa. Aqui. ambos mantêm Pessoalmente. Mas proponho que a última ses- afinidades. não costumo marcar um significativo espaço para seu desenvol. em caso de abandono. sente e pensa através de palavras e empre- Reconhecimento naS gando recursos positivos. No geral. e acompanhando zar o surgimento do novo – e a novidade falas e escritos de inúmeros autores com os faz toda a diferença. cias à estabilidade implica um amplo es- fundar o contato consigo mesmo e com os paço de reconhecimento mútuo. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Em uma relação saudável. ração. de cada um. quem sabe. junto com ele. Em algumas circunstâncias. Ambos se . saem mais inteiros. um processo terapêu. E aqui também. as sexuais e os demais relacionamentos colocar­‑se na posição de parceiro privile. E esta última ses- relações amorosas e são. e guardam as melhores lem. Faz parte do processo terapêu- tico aprender a traduzir o que se deseja. Nunca sabemos claramente como vai deria nos levar para o setting terapêutico: desenrolar­‑se um processo. nem mesmo independentemente das linhas de aborda. espaço do parceiro. não seja simples- cuidam de si mesmos e de seu amor. Uma relação saudável e com tendên- para que o paciente possa ampliar e apro. tratada. Assim como ele veio. naturalmente. Cada paciente é único. bela herança desse encontro entre duas pes. mente anunciada por telefone ou e­‑mail. desagrada – especialmente quando uma das branças dentro de si mesmos. Dificilmente ten- como bolhas de sabão. ambos se seus. fazendo histórias pessoais. se a relação mas procuro. tempo de duração para a terapia. dando margem a uma Muito mais teríamos a considerar so. que os acolhamos com delicadeza e respei. as pessoas têm dificuldade soas diferentes. de muitas e muitas formas. assinalando o que observa. da mesma forma que to. encantam­‑se um com o outro. ambos levam uma e tratado na terapia. é necessário que levemos em Mas podemos prever que as vivências re- conta o dinamismo psíquico dos indivíduos veladas e trabalhadas reaparecem muitas ou casais que nos procuram. evolução pessoal e. dentro do possível. próprio modo de ser. já a la presencia. . Referências LACAN. L. 14). O casal diante do espelho: psico- Ambos são capazes de andar de mãos da. I. ZIMERMAN. 2002. A separação dos amantes. Porto Alegre: dimento sistêmico e psicodinâmico. C. Bahia: Paidós. tu. C. São Paulo: Imago. I. ANTON. L. nós”. 1984. C. 1984. 2009. KOHUT. inconscientes. Porto Alegre: Artmed. 1974. secretos. S. 1993. Artmed. São Paulo: e. M. Ambos do Psicólogo. J. I. L. El sujeto e el outro: de la ausência pronomes: “eu. se ouvem e se escutam. A escolha do cônjuge: um enten. 1998. O ambiente e os processos de ma- ANTON. Porto Alegre: Artmed. Porto Alegre: Artmed. Obras Completas. Homem e Mulher: seus vínculos turação. 1991. D. WINNICOTT. 2001. terapia de casal teoria e técnica. são capazes de pronunciar claramente os BERENSTEIN. FREUD. v. Nesses casos. H. Porto Alegre: Sagra. (Edição standard brasileira. ANTON. Cortez. I. Rio de Janeiro: Zahar. Porto Alegre: Artmed. em efemeridades no amor. Self e narcisismo. Os quatro vínculos. 2009. L. muito menos. Manual de terapia familiar – Volume II 259 olham e se veem. I. C.. A escolha do cônjuge: motivações MAHLER. ANTON. O nascimento psicológico da criança. I. 1982. não se pode pensar em relações descartáveis CARUSO. São Paulo: Casa das e de andarem por si mesmos. D. . Depois telefonaram e decidiram se en- ginário social e quase já se tornou uma ex. em comparação a algumas poucas clube. pen. to bem e isso faz com que nasça um vínculo ras. com data de validade. e melhor A fim de ilustrarmos tal proposta. Ela falava coisas sobre o Planalto Central pois sentiram­‑se mutuamente atraídos. neste momen- to. O Eduardo achou estranho. líquidas. entre entre eles. Se encontraram então no parque tes mesmo que se institua o laço amoroso? da cidade Nossa proposta é a de discutir e apresentar A Mônica de moto e o Eduardo neste capítulo alternativas e possibilidades de camelo do que chamamos de educação conjugal.. de Caetano e de Rimbaud um dia se encontraram sem querer. Essa parece uma Eduardo e Mônica trocaram telefone tendência que se tem incorporado ao ima. cinema comum. não comentar samos que é importante que se descreva a Mas a menina tinha tinta no cabelo trajetória que a maioria dos casais percor- re na construção de uma relação definida Eduardo e Mônica era nada parecidos como conjugalidade. de repente . contrar pectativa do tipo: vamos ver até quando dura O Eduardo sugeriu uma lanchonete. De Van Gogh e dos Mutantes. coabitar. E o Eduardo gostava de novela E conversaram muito mesmo pra tentar E jogava futebol­‑de­‑botão com seu avô se conhecer. E mesmo com tudo diferente. televisão”. educados para conjugar. Ela gostava do Bandeira e do Bauhaus sabemos que Eduardo e Monica. Nesse caminho. partindo da conhecida E ele ainda nas aulinhas de inglês e cantada história pela banda Legião Urbana (1986) desde a metade da década de 1980. veis. pois. ambos sentem­‑se mui- na atualidade sejam consideradas efême.. pouco Ela era de Leão e ele tinha dezesseis Ela fazia Medicina e falava alemão se tem inovado. an. esse casamento?. será que os ca.. capítulo 21 Educar para a conjugalidade: que a vida não nos separe Adriana Wagner Clarisse Pereira Mosmann É comum que as relações amorosas quando estão juntos. Também magia e meditação É comum que na atração as pessoas E o Eduardo ainda tava no percebam que possuem muitas coisas em esquema “escola. parecem simpáticas e até mesmo admirá... A história conta que: tantas outras conotações que apontam para sua brevidade e finitude. Isso gera uma sensação de satisfação veio mesmo.. características diferentes que. Mas a Mônica queria ver o filme do sais de hoje não poderiam ser ajudados a ser Godard casal. Entretanto. assim. E da outra parte: “E que passam juntas gera satisfação e prazer você um perdulário!!!”. na coabitação tendem a du. mas rado dia do casamento. por exemplo. quando a paixão colore o mais um dos membros do casal tem percep- cenário de cor de rosa. ções negativas sobre o comportamento do Mas a vida traz os diferentes matizes outro. Nesse processo. muitos casais ex- pensou. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. as contas a pagar. muitas vezes... então. estranhezas quase sem impor. aumentam a gravidade mas. permanecer Até a chegada do esperado dia do casamen. escuta­‑se: “Você entre similaridades e diferenças. casado tem muito mais a ver com esforço e to ou dia de irem habitar o mesmo teto. pode aparecer um das na relação a se unirem e começarem a abismo entre o casal.. que seria.. o tempo é uma gananciosa!!!”. irritantes. passem a pensar se não seria melhor separar­ tância.. é persistência do que com a satisfação no rela- comum que o casal tenha alguns desenten. a perspectiva de solução. mais parece que o outro faz coisas er- das cores da realidade quando o casal passa radas. as Entretanto. quando um quer economizar contros e despedidas de Eduardos e Mônicas e comprar um apartamento. Os te o que aconteceu neste caminho que era motivos das diferenças passam a ser mais para ser “feliz e eterno”. sem entender exatamen- das diferenças e o volume das brigas. entre compromisso entre os dois se desenvolve. os problemas do casal. quanto momento nirvana. por exemplo. gais já identificaram alguns processos­‑chave dar sobre questões importantes. um futuro a dois. conforme mas com a vizinhança. é comum que ambos se queixem de que o cônjuge se A sensação de felicidade e bem­‑estar transformou em outra pessoa. melhor não comentar” perimentam algumas situações de conflito passam a ser consideradas a raiz de todos e testam suas habilidades em resolvê­‑los. convicto de que se deve alugar por mais um Roberts (2006) considera que duas tempo e economizar o dinheiro para conhe. Em meio a esse mutuamente em decorrência da mistura impasse que.262 Luiz Carlos Osorio. Aparecem. consequente do medo problemas do casal. terminam separando­‑se. normalmente. as tare. como o uso que ajudam a entender as histórias de en- do dinheiro. “O Eduardo achou estranho.. como tinha de ser. Estabelece­‑se. esse rísticas de personalidade e formas de lidar compromisso resulta em casamento. às vezes “to- que gera o encontro e as descobertas do ou. no próximo encontro. É comum que cada e um senso de conexão nasce entre elas. muitas vezes. Neste contexto. E a vontade crescia.. Uma vontade de se ver insatisfações que terminam gerando irrita- E os dois se encontravam todo dia ção e frustação com a presença do outro. Para muitos casais. como a “tinta no ‑se e terminar com essa luta constante sobre cabelo” de Mônica. Durante a convivência antes do espe- namento. para diminuir essa ansie- rar mais tempo e. e. cionamento conjugal. É comum que ambos dimentos. o no dia seguinte. Os estudiosos que importantes que a de Monica vir de moto e tem se dedicado a estudar as relações conju- Eduardo de camelo. de repente. são situações pontuais ou com . Neste ponto da relação. então. talmente diferente de quando eu o/a conhe- tro. leva as pessoas envolvi. pessoas se conhecem e se sentem atraídas cer a Europa. pela possibilidade de perder essas sensações As diferenças que antes se resolviam de prazer e completude. com as famílias de os dados do último censo do IBGE (2007). a compartilhar um mesmo espaço. em grande parte.. reprováveis e provocativas. e o outro está que buscam a felicidade a dois. Sendo assim. nada muito sério. as distintas caracte. ci”. Como resultado desse processo. Eles começam a discor.. planejar um futuro juntos e para sempre. vem a ansiedade. carinhos e risos. cada um. os proble. Brasil. no fas domésticas. Mais da metade desses casais. Nesses momentos.. no início do relacio. Esse é o quem tem a razão. ficam sem dade. Na vez mais apareçam as reais diferenças e que medida em que o elo entre elas se fortale- um acuse o outro de ser o culpado pelos ce. com as situações que. tos. Entretanto. incentiva a agir positivamente. o conteúdo da discus. o ambiente onde vivem e as di. a ter de lidar com os estressores da vida co. pois é frustração. um ten. muitas vezes. Isso porque as interpretações ne. passa a causar desconforto. uma mudança sais são ajudados precocemente a conhecer importante ocorre ao longo do tempo nas os fatores de risco do casamento e como lidar uniões conjugais: a presença do parceiro. porque se as- e. de origem. frustração que decorre deste processo de de- tas as formas que cada um tem de lidar com sencantamento. Não é incomum que o casal entre Casar. ter filhos. o casamento termina por se tidiana. suas estratégias de lidar com os desafios do retomar o caminho para conquistarem maio- cotidiano. há uma inversão da percepção sabilidades e as consequências das opções positiva que um tinha do outro. sendo que mento tem níveis muito elevados. estabelece­‑se uma luta na sume que as pessoas naturalmente sabem qual um quer impor ao outro seus desejos e como ser um casal e como partilhar uma formas de lidar com as vicissitudes da vida vida a dois? a dois. Zordan e Wagner. com eles. Normalmente. por isso existam tantos mitos como quisas sobre esse tema indicam claramente “casaram e viveram felizes para sempre”. danças também explicam o fato de os casais sal. As pes. irritação e viver como casal pode ser apreendido. início. frequentemente. no prelo). o processo contrário também é verdadeiro A partir da convivência. sendo ele eficaz ou não. assim como feitas pelo casal. É considerado interpretação negativa. mulam à medida que não forem efetivos nas alguns casais conseguem. mente. algo que não se nasce sabendo. com muito esforço. isso é a cada são acontecimentos vitais esperados e pre- comportamento ou ação do outro há uma sentes na cultura ocidental. Isto é. ser e tivos. . sub. assim como as respon. mais isso o dos motivos pelo qual a satisfação neste mo. que reforça a ima. As decisões têm transformar no oposto daquilo que era no de ser partilhadas. esta crônica de uma morte anun- que antes era associada a sentimentos posi. Este padrão tende a ser repetido res níveis de satisfação e menores índices de inúmeras vezes durante o ciclo de vida do conflito na relação. Somam­‑se a isso os estresso. mágoas e decepções os cônjuges acu. Este é um dos comportamentos do outro. aqueles que se enfrentam com muito mais gerando atrito. os casamen- as adversidades e. as pessoas trair e. os obstáculos para a se- ficuldades financeiras decorrentes da nova paração vêm diminuindo gradualmente em economia que implica somar. Apesar desse panorama tão desolador. sados e infelizes. dividir. Nesses casos. eles ne- casal. por vezes. Já está comprovado que. se os ca- dos conflitos não resolvidos. assim. casadas porque socialmente as barreiras à são e a forma como os cônjuges tendem a separação eram muito grandes. As diferentes maneiras de resolver esses hoje em dia tenderem a não permanecer ca- conflitos definem o quanto de ressentimen. o ca- equacioná­‑la é o que caracteriza e qualifica sal seguia junto. de forma conjunta. cessitam e procuram ajuda para rea­lizar este Em decorrência dessas interações e percurso. Manual de terapia familiar – Volume II 263 menor importância frente às que terão de que quanto mais positiva é a interpretação resolver na convivência conjugal. dificuldades para terminá­‑lo do que por sa- res contextuais. Afinal. provavel- gem deteriorada sobre o parceiro. mas permaneciam Nesse processo. gativas sobre o outro se tornam constantes. Isso porque passam a ficar explíci. formar uma família em um processo de escalada. multiplicar despesas. o casal passa (Mosmann. a interferência das famílias tisfação dos cônjuges. Assim. chegavam a este ponto. natural realizar esse percurso e. mas insatisfeito. nossos tempos. Então nos questionamos. Enfim. ciada pode ter outro desfecho. Tais mu- o padrão de resolução de conflitos do ca. Antigamente. tos que permanecem intactos tendem a ser de a lidar de uma forma diferente do outro. é frequente que a o outro se torna o responsável pelo fracas- maior parte dos casais comece a entrar em so do casamento e o depositário de toda a conflito. dade conjugal. a divisão das união. casais. à luz da resultados de pesquisas na área que apon- doutrina cristã. mais a necessidade de buscar algum tipo de suscetíveis a gerar conflito. atualmente. Há um aprendi. como também realizados no início do casa- volver uma Educação Conjugal existem em mento. Esse da literatura clássica da área. pensamos que também é possí. os programas também pas- saram a dar ênfase no treinamento de ha. de. ser esposo/esposa. graças à utilização de além do modelo que herdamos na convivên. treinamento preventivo/educacional para A partir dessa trajetória. muito sal. normalmente. 2002). do destina­‑se aos cônjuges casados com Os programas de Educação Conjugal se ba. os dois tipos de programas têm enfoque ca e da educação. reflexão.. os casais com problemas sérios chegam mudanças previsíveis no ciclo de vida do ca. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. as pesquisas sobre a conjugalidade deram Nesta perspectiva. os maiores índices de divórcios se con- de três décadas. questões financeiras e as 3. conscientização e trei. Outras iniciativas ocorreram tam três evidências empíricas importantes a partir de alguns terapeutas de casais. há mais de 40 anos nos como pré­‑terapia conjugal. devido aos resulta- bons níveis de satisfação. tarefas cotidianas. teoricamente. tais como as re. tendo em vista Estados Unidos. Assim. na confiabilidade dos programas de educa- tão. conjugal está definida teoricamente como 2001). bém através de grupos de casais que se reu. à terapia conjugal. Nas duas últimas décadas. mas. como se o mais difícil fosse chegar até o aspecto veio a incrementar de forma con- casamento e não o fato de mantê­‑lo com sistente tais programas. preventivo e podem ser tanto pré­‑nupciais Programas que se propõem a desen. os programas de luz à prática clínica dos terapeutas de casais Educação Conjugal surgem como uma al.264 Luiz Carlos Osorio. Tais programas têm sido concebidos diferentes formatos. gais. que definem . cada vez mais há casais identificando aos casais sobre áreas. prejudicam os parceiros na vivência de me- tal. para que se intervenha preventivamente como sistemática fundamentada em dados com casais (Roodge et al. Rogge e Lawrence. O primeiro tipo visa a auxiliar os casais namento de habilidades no intuito de que que pretendem unir­‑se maritalmente a se estabeleçam relações com melhores níveis prepararem para o casamento. vos para casais: os pré­‑nupciais e os conju- dizagem. Na realida- seiam nos pressupostos da ciência psicológi. essa forma de intervenção? A educação ção conjugal (Bradbury. e o segun- de saúde e estabilidade (Roberts. até cinco anos de matrimônio. e vieram a contribuir no aprimoramento e ternativa nos dias atuais. centram nos cinco primeiros anos do Em princípio. casamento. Essa prerrogativa se fundamenta em niam para refletir a vida em família. Primeiramente. dos alcançados nas pesquisas que revelaram zado necessário para muitas das tarefas dos empiricamente os fatores que contribuem e distintos momentos evolutivos do ciclo vi. assim. que são: empíricos e realizada por profissionais da área. O que seria. apareceram que o foco é instrumentalizar os casais para no bojo de algumas religiões que passaram a não chegarem a níveis de necessidade de preparar os cônjuges para se casarem e tam. lhores ou piores níveis de satisfação e quali- vel aprender a ser casal. orientação pré­‑nupcial ou no início da lações com a família de origem. uma intervenção terapêutica. cia com nossos pais. Soma­‑se a isso os pressupostos teóricos bilidades para a resolução de conflitos. en. além desses tarde. temas e. um arsenal metodológico mais sofisticado. os programas existem há pouco mais 1. a partir das pesquisas na área da conjugalidade. 2006). os programas de educa. ção conjugal estavam focados em informar 2. Tal intervenção visa a engajar os existem dois tipos de programas educati- membros do casal em processos de apren. casais mostraram ter tido suas habilidades lidades em áreas críticas para a qualidade de comunicação significativamente aprimo- conjugal. terapêutico. Já tam de ajuda estruturada e de alguma forma no nível terapêutico. mensal ou em finais de semana em regime mento/aconselhamento. de Guerney tanto. O programa intitulado “Couple reunem grupos de até 20 casais que se en. foi libe- os dois primeiros níveis de intervenção fa. da área. os resultados. Higginbotham gramas de educação conjugal condensam e Lamke. economizar sofrimento dos cônjuges. embora essa abordagem já este- venções que buscam prestar esclarecimentos ja bastante difundida em outros países. estados norte­‑americanos adotaram ini- gias que compõem os programas de educa. desde um 3. Os níveis educativo e de assessora. Essa constatação levou os governos de pa- namismos do sistema familiar suponha uma íses como Estados Unidos e Austrália. instrumentos validados e com “Couple Commu­nication” (Comunicação bons níveis de fidedignidade na avaliação Conjugal). dedicam­‑se a orientar as famílias e Os Estados Unidos é o celeiro desses os casais. 2009). o facilitador é um terapeuta de 1. Communication” já foi testado e teve sua gajam em conversas. proposto por Miller. entre. sendo que. Os modelos norte­‑americanos mais re- lizado. 1994): em grupo. ção conjugal. ce­ment” (Reforço Conjugal). Manual de terapia familiar – Volume II 265 três níveis de intervenção familiar. quinzenal. em comparação ao grupo que não . educativo. discussões e atividades eficácia comprovada na medida em que os que são delineadas para desenvolver habi. No ano de 2004. Sendo assim. A duração 2. criado mundo da relação a dois. são analisados por um de seus filhos e de suas famílias extensas profissional treinado que discute com eles (Wagner e Mosmann. Nunnally (1983). e. tervenção com casais como uma questão de prias daquele núcleo. perceberam que os casais necessi- mento das tarefas do ciclo evolutivo vital. programas. questionários os quais os casais respondem assim. as intervenções visam mais sistemática para conseguirem man- a instrumentalizar a família e o casal para ter a satisfação em seus relacionamentos. Com sobre os períodos e os processos desenvolvi. 2004). entre eles. São inter. uma vez que os questionários são. de alojamento. o “Relationship Enhan­ to. conhecidos em educação conjugal são o da normalmente. e o “Prepare – PREP”. na maior parte dos programas. nos quais uma alteração excepcional dos di. St. posteriormente. bem como pesquisadores apoio e segurança que favoreçam o cumpri. objetiva proporcionar elementos de de casal e família. finem. programas de intervenção conjugal. a assumirem os programas de in- procedimentos inerentes às finalidades pró. antes que haja sintoma. os pro.Peters e Leber uma técnica bastante utilizada. em que se (1995). ciativas específicas voltadas à prevenção. por ameaça séria ao funcionamento dos meios e exemplo. Muitos Existem diferentes tipos e metodolo. terapeutas sentido. A aplicação de tais instrumentos. desde uma perspectiva de prevenção norte­‑americano para o desenvolvimento de primária do relacionamento conjugal. encontro de no máximo 2 horas até encon- tros com periodicidade semanal. podemos encontrar partindo da premissa que muito pode ser recursos e propostas que incluem o uso de feito antes que os problemas se iniciem e. Markman. Wacjman e de variáveis importantes do relacionamen. é apenas a “porta de entrada” para o (1977). Nesse veis em um percentual de 50%. rada a primeira verba pública do governo miliar. Os workshops são por Stanley. as taxas médias mundiais de divórcio está- mentais de uma família e um casal. saúde pública (Adler­‑Baeder. casal ou um conselheiro conjugal. Alguns programas combinam a radas. que são aplicação de questionários com trabalhos (Ríos­‑González. dos programas também é variada. a elaboração ou reestruturação de aspectos para que estes possam ser mais duradouros. Esse recurso é bastante uti. conforme se de. assessoramento/aconselha­men­to. recebendo sugestões sendo atualmente o mais difundido dos pro. ção deste grupo de casais com dificuldades. as estáticas e as dinâmicas (Halford. a fase do ciclo vital conjugal metade dos anos de 1970. um corpo ado nos dados da pesquisa. variáveis que compõem a qualidade con- tativas. da estabilidade como da ruptura do vínculo. O programa de anos iniciais. iniciou. então. ele e por outros acadêmicos da área. A versão mais atual do “PREP” O foco principal do “PREP” são os fa- foi aprimorada com base em recentes da. quando houve a que atravessam. municação. Por esse motivo. Utiliza téc. racterísticas da família de origem. são elas as ca- et al. A par- cia comprovada em diferentes faixas etárias tir desses achados. tores de risco e a proteção da conjugalida- dos de pesquisa. Os resultados mostraram que a qualidade Markman (2004) aponta os fatores da comunicação antes do casamento e nos relativamente estáticos e difíceis de serem . em 1981. pesquisadores são as dinâmicas. E os fatores explosão dos divórcios.. mas também é preditora tanto ram a inabilidade em formas de comunica. o próprio nar a casais habilidades de comunicação e programa foi testado longitudinalmente por resolução de conflitos. já que ex- gais. conjugais. tendo mentais na qualidade conjugal. Kline e Stanley. ção a casais com altos níveis de satisfação. programa “PREP”. juntaram­‑se a John Gottman para investigar as variáveis de maior interesse por parte dos as causas específicas dos problemas conju. o pesquisador foi aprimo- efetividade em diversos países do mundo. se submeteu ao programa. Na Universidade Norte­‑Americana casamento. de maior atenção do programa. especialmente na área da de. capacidade de adaptação e as habilidades Howard Markman e Clifford Notarius de resolução de conflitos. habilidades para lidar com as dificuldades associadas a ideias de treinamentos em co.266 Luiz Carlos Osorio. dinâmico e interativo do casal (Mosmann. regu. considerados funda. rando suas pesquisas. de outros pesquisadores da área e conse- gramas pré­‑nupciais. Markman desenvolveu e tipos de casais que se submeteram ao trei. a idade As raízes deste programa nasceram na dos cônjuges. as possíveis causas de problemas conjugais naquele momento. sua efetividade comprovada na melhora das nicas comportamentais da terapia conjugal. analisar especificamente e do divórcio. mudanças. Isto se explica porque a qua- como os casais com altos níveis de estres. lidade conjugal é resultado de um processo se conjugal se comunicavam em compara. 2003). 2006). quentemente foi melhorando e refinando o O “PREP” foi desenvolvido para ensi. resolução de conflitos. Em relação ao “PREP”. Aliados a outros investigadores norte­ pressam a natureza da interação conjugal e ‑americanos. 2007) passível de De maneira geral. essas pesquisas aponta. Essa premissa básica aliada ao conhecimen- Markman. e muitos acadêmicos dinâmicos são aqueles que podem ser mo- da área passaram a estudar as dificuldades dificados. pesquisas que indicam duas categorias de lação de afetos. Estes foram identificados a partir das comunicação. jugal. a de Indiana. por exemplo. ras de futuros problemas conjugais. um programa preventivo para casais base- namento. As está- ou limitar os fatores de risco ao casamento ticas não podem ser modificadas através de e aprimorar os fatores de proteção (Stanley programas de intervenção. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. Ao longo desses consistente de investigações comprovou sua quase 30 anos. comprometimento. Wagner e Feres­‑Carneiro. intimidade e diferenças de gênero. Aliado a isso. uma to das variáveis dinâmicas de risco sustenta investigação longitudinal para investigar e reforça a importância do caráter preventi- se essas variáveis da comunicação que não vo do “PREP” assim como ilumina as áreas eram efetivas neste grupo de casais seriam do relacionamento conjugal que necessitam preditoras de divórcio ao longo do tempo. expec. era uma das maiores predito- “Enhancement Relationship” teve sua eficá. O objetivo principal do programa é reduzir Markman. os pesquisadores buscavam. os padrões de comunicação. tais como as expectativas sobre o conjugais. no Departamento de Psicologia. espe. o processo tão conhe- das dificuldades. casal. O entendimento e a difusão desses co- n utilização da não comunicação verbal nhecimentos. mas trabalham com os fatos em n filhos de uniões anteriores e o tipo de si ou as ações de cada um. com problemas conjugais não procura aju- da especializada. mas sim recursos na pró- Dentre os fatores dinâmicos. Quer dizer. deve­‑se assumi­‑las como de risco e. pois as consi- conjugal: deram muito eficazes. a qual tende a ser utilizada durante n estilos negativos de comunicação. ção de seus conflitos. Duncan. em alguns programas de educação conjugal. entre outros. não só para os terapeutas de como forma de repreensão. adversários. efetivos. tentar decifrar o quebra­‑cabeça que n conhecer o outro muito pouco tempo ­antes compõem no jogo “interacional” de cada ca- do casamento (menos de 6 meses). as idiossincrasias de cada contexto. ou defensivamente a problemas e de. mos à realidade dos casais. Considerando interação que se estabelece com estes. assim. Nesse caso. quer dizer. mas também para a comunidade em n dificuldade de se comunicar de forma geral. que incluem a escuta ativa e for. considerando e com a união. micas. por exemplo. Informam gramas. a maneira como os ca- Fatores dinâmicos que podem ser mo- sais estabelecem sua relação inicial molda dificados ou melhorados: uma “fôrma” chamada de padrão intera- cional. n pais divorciados. Neste sentido. Em algumas ocasiões. importância de se trabalhar padrões de inte- ges. gramas sejam oferecidos em locais próxi- tantes. Sendo cepções. É fundamental que esses pro- n diferentes atitudes sobre questões impor. os processos que se dão na relação. n dificuldade em lidar como equipe na hora ou mesmo retardar. a escola e a rede social de apoio aprendizagem de padrões de comunicação (Markman et al. a proximidade afetiva. a forma de intervenção com casais. casais pria comunidade onde se insere tais como que realizaram o PREP reportaram que a a igreja. Esses feedbacks dos casais reforçam a n personalidade de um ou ambos os cônju. podem vir a contribuir na melhoria eficaz durante discussões. n casar jovem (antes dos 20 anos). 2004). em sua própria n falta de comprometimento com o cônjuge comunidade. Nessa perspectiva. tervenções. como se estabelece a comunicação. n existências de um casamento prévio. como interatuam na resolu- n dificuldades financeiras. com tendência a reagir fortemente ração com os membros do casal. cido que transforma os apaixonados em n crenças irreais sobre o casamento. tanto as variáveis estáticas quanto as dinâ- n diferença de crenças religiosas. todo o ciclo de vida a dois. é um dos motivos n padrões desenvolvidos ou experiências pelos quais o pesquisador acredita que exis- vividas se houve coabitação antes do tam tantos fracassos na terapia de casal e casamento. sal.. Já está n dificuldade em perceber o casamento como comprovado que a maior parte dos casais um investimento em longo prazo. assim como frear. Holman e também que se esforçam para manter tais Yang (2007) propuseram um entendimento . assim. n intensos conflitos. alguns terapeutas não cificamente as formas de relacionamento enfocam o processo de interação em suas in- com o ex­‑cônjuge. não voltada ao processo. das relações conjugais. Manual de terapia familiar – Volume II 267 modificados em programas de educação estratégias aprendidas ativas. é o que mais utilizam posterior. ser considerada para a eficácia de tais pro- mente em seus relacionamentos. o meio em que se mas de respostas menos agressivas e mais insere o casal surge como outra variável a empáticas. galidade do que os do grupo­‑controle – que. o casal. o que importante de seguir estudando é se existe permite aos terapeutas conhecerem as de. .268 Luiz Carlos Osorio. Ainda não se sabe como identificá­‑las e rem dos programas de educação conjugal é analisá­‑las de maneira que venham a contri- um dos desafios apontados pelos estudiosos buir para o desenvolvimento dos programas. por definição. após os cinco primeiros anos ximidade afetiva. os fatores de risco provavelmente. ferente sua vida conjugal se eles não tives- por e a falar mais sobre suas relações e suas sem participado de um programa? dificuldades do que os homens. inseridos. Eis aqui outro de- e Schermerhorn. deles não retornarão para serem reavaliados sa. É sa- gem. realizadas sobre os mesmos. 1996). O sentido de “nor. poderem intervir na direção de que determi. safio: conseguir acompanhar esses casais Baseados em tal perspectiva teórica. Mitchell. 2008). a partir dessa aborda. Considerando fatores contextuais na nadas temáticas e dificuldades são similares avaliação dos programas de educação conju- a todos os casamentos. te. deve­‑se aceitar também agrega maior confiança aos casais que inúmeras variáveis sociode­mográficas para a superação de seus problemas. se ampliam com as variáveis individuais dos ainda é um desafio mensurar qual o peso da sujeitos implicados na relação. Frente a isso. ção conjugal é a possibilidade de que ele seja zem de maneira diferente delas. Outro fator importante para a mensu- nifica que eles não aproveitem também os ração da eficácia de um programa de educa- programas de educação conjugal. Outro aspecto é a possibili- teoria ecológico­‑sistêmica. Possivelmente. da área que se impõem no desenvolvimento e não atuem de forma contrária. Sabe­‑se. principalmen- homens e mulheres têm desejos e expectati. uma vez qualidade conjugal podem ser agrupados que supõem que os casais que aceitam parti- conforme a perspectiva ecológico­‑sistêmica. talvez. Tal medida é complexa. Faircloth. mas o fa. interação sexual e conflito de casamento. que os estudiosos do tema têm considerado rem os temas a serem trabalhados. além de da intervenção para os casais. avaliado longitudinalmente. Outro ponto abrem a possibilidade de os casais escolhe. dade de analisar se há diferenças significa- são dos últimos 40 anos de pesquisa sobre tivas na qualidade conjugal de casais que os indicadores de risco pré­‑conjugais e a sua participaram desses programas em com- relação com a qualidade conjugal. sobre pro. que passaram pela intervenção por um lon- que considera a interação das diferentes va. sejam os que mais necessitem. Maria Elizabeth Pascual do Valle e cols. A exemplo educação conjugal para esses cônjuges que disso. um tempo de duração dos efeitos benéficos mandas concretas dos cônjuges. Nesse sentido. alguns programas de educação conjugal depois de quase meia década. Além disso. gal e os resultados das pesquisas que têm sido malidade”. a família já estão mais sensíveis aos riscos da conju- e o contexto sociocultural (Brofenbrenner. venham a ser melhores em e proteção propostos por Markman (2004) comparação a outros cônjuges. mel. entende. paração aos que não participaram (grupo­ ram que os preditores das características da ‑controle). considerados críticos para a (Cummings. que advém de tal informação. desde o micro até o macro. ou seja. Teria sido di- entender que as mulheres tendem a se ex. Consequentemente. go período de tempo. A partir da revi. alguns riáveis implicadas em uma relação amoro. depois de terminado o período de lua de vas distintas sobre o casamento. À luz dessa teoria. ção. distintos da- todos os contextos em que os casais estão queles que não o fazem. culturais mediam os efeitos de tal interven- Sensibilizar os casais para participa. Cummings durabilidade das uniões. Isso não sig. reforçam a importância de que os pro. da educação pré­‑nupcial e conjugal à luz da deste trabalho. as questões de gênero nos ajudam a se submeteram à intervenção. seus níveis de qualidade na vida conjugal. cipar de um programa de educação conjugal que abrange o indivíduo. bido que os casais que procuram educação gramas de educação conjugal considerem pré­‑conjugal são. Essa relação fato de assinalarem a necessidade de prepa. são bem­‑vindas pelo tro. os desafios e as perspectivas desses progra- lho. da forma caráter de obrigatoriedade para aqueles que como um recebe os afetos negativos do ou- querem casar na igreja. caram. Mitchell. Evidentemente neira mais saudável. Faircloth. a terra. o que se observa. Desse Cummings e Schermerhorn. geradoras de Ele aprendeu a beber. como também. É co. mas conjugais enfrentados cotidianamente ra. Entretanto.. caso. pois já está comprovada a namentos do que certezas e respostas sobre importância do contexto nesse tipo de traba. por exemplo. a partir de uma re- ocupação laboral que desempenham são fa. Bradbury e Markman (2000). abre­‑se a mentalidade voltada à prevenção de saúde. Essa abordagem não fotografia só contribuiria na otimização dos recursos Teatro. flexão e tomada de consciência da impor- tores que dificultam a adesão a este tipo de tância do relacionamento conjugal para o iniciativa (Cummings. que vin. não podemos deixar de re- geral em nosso meio. de conflitos e na avaliação geral da satisfa- das à Igreja Católica. resultando em menores níveis de Um dos aspectos que também explica conflito e maiores índices de satisfação. os interpreta e os devolve. podemos pensar que. O cula a realização do casamento religioso à mesmo é identificado nas pesquisas sobre os participação em cursos de preparação para casais que participaram do PREP de Stanley. as intervenções em uma perspectiva preventiva e psicossocial ainda Eduardo e Mônica fizeram natação. crescer Observa­‑se claramente a falta de E decidiu trabalhar uma cultura que apoie a ideia de que mui. o matrimônio. artesanato e foram viajar conjugais para o desenvolvimento da fa. provavelmente. Manual de terapia familiar – Volume II 269 por exemplo. parece que temos mais questio- norte­‑americana. assim como o tipo de apreen­didos e treinados. assim como os ração e instrumentalização para essa rela. na histó- po da educação conjugal é a falta de uma ria dos Eduardos e das Mônicas. entretanto. os quais com- tejam atravessadas por aspectos ideológicos provaram o aprimoramento da sua capaci- e que ocorram de maneira pontual e com dade de regulação do afeto. os formatos desenvolvidos para população Enfim. seguindo a vida: texto. levando ao crescimen- que não se pode simplesmente transpor to e amadurecimento da relação. Ainda que tais iniciativas es. deixou o cabelo sofrimento. tende a ficar mais saudável. Nesse eficaz e tem se proliferado em nosso con. são quase inexistentes. de serem manejados e administrados de ma- neficiar nossa população. muitos dos proble- Em se tratando da realidade brasilei. 2008). e o ar. ção conjugal (Carroll e Doherty. E ela se formou no mesmo mês tos dos aspectos que envolvem a relação Que ele passou no vestibular . provavelmente. riam em relações patológicas. modo. 2003). A Mônica explicava pro Eduardo mília. a água menor número de famílias e casais incorre. Assim. de conjugalidade são possíveis de serem laridade dos cônjuges. melhoras imediatas mum encontrarmos esse tipo de abordagem nos processos comunicativos. a escassez de propostas no Brasil no cam. ainda é uma incógnita saber como essa pelos casais teriam maiores possibilidades proposta de educação conjugal poderia be. são propostas isoladas forçar o relato dos casais que participaram que não chegam a solidificar um trabalho de algum desses programas e que identifi- consistente de intervenção conjugal.. possibilidade de outras alternativas que ve- Sabe­‑se que a clínica terapêutica tem sido nham a enriquecer o relacionamento. Entretanto. de modo geral. efetivos. um Coisas sobre o céu. bem­‑estar de todo o sistema familiar. de forma mas. padrões de comunicação tornam­‑se mais ção de intimidade e a vida a dois. que os baixos níveis de esco. isso é. de resolução com os cônjuges através de iniciativas liga. Journal of Marriage and the Family. W. C. v. Porto Alegre: Artes Médicas. WAGNER. Journal of Family Psychology. v. n. 537-546. CARROLL. são oferecidas Psychologist. n. Journal of Marital and zes depois Family Therapy. DOHERTY. logist. E. Putting empirical knowledge to work: linking and Relationship Therapy. K. 73-77. A ecologia do desenvolvi. qualidade conjugal como estratégia de proteção 270-278. C. C. 53. ROBERTS. The Family Psycho- casais. E vice­‑versa. J. S. Best practice in couple E também brigaram juntos. v. Psychology. D. S. 5. RÍOS-GONZÁLEZ. Charlton. 2003. n. W.. 2006. MOSMANN. et al. E. v. v. In: GURMAN. T. 52. WAGNER. 2008. JACOBSON (Ed. A.. Re. p. S. p. 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Índice A nascimento do primeiro filho. 48 casamento. 165 Computador. 59-70 Concentração. 158-159 como agente comunicacional. 141 Hospital de Clínicas. 232-235 gravidez na adolescência. 179 Comediação e gênero. 183-184 recursos terapêuticos. 45-46 como instrumento interativo na terapia. 181-184 da família. 140-141 orientação profissional. 235-237 situação de rua. 42-43 origem e destino. 44-45 Ciclo vital da família. 229-254 defesa dos direitos. 151-163 entrevista. 181-184 identificação. 52-57 uso do computador. 151-163 terapia comunitária. 182-183 Abandono. 152-158 família e escola. 235-237 família na abordagem integral. 45-46 Casais interculturais. 62-63 Comunicação família na abordagem integral. 48-49 C colocação em família substituta. Budismo tibetano. Adolescência 107-112 família e escola em busca de apoio. 62-67 enfoque biopsicossocial. 181-182 Contextos ecológicos. 182 processos resilientes. 263-272 conflito com a lei. 126-127 Instituto da Família de Porto Alegre. 59-70 Criança e adolescente na abordagem integral. 209-211 39-50 adolescente em conflito com a lei. 103-104 Álcool e drogas. adolescência. 44-45 relação com outras gerações. 151. 211 Adolescente Conjugalidade. 159 centes em situação de risco Contexto terapêutico na prática sistêmica. 162-163 B Crianças e adolescentes em situação de risco. atenção à saúde. 43 narrativa e construção do significado. 60-61 casos clínicos. 27-38 Adulto jovem independente. 181-182 pedofilia. 61-62 151-165 desafio a ser enfrentado. 160-162 Atividade laboral. 158-159 Antropologia cultural. 230-232 identificação do risco. 44 Casamento. 159 transtornos psiquiátricos. 237-238 desenvolvimento do self. 159-160 psiquiatria. 238-251 genograma. 184 Abordagem problemas comuns. 59-70 consenso primordial. família e escola em busca de saúde mental. 140-141 atenção à saúde. 135-147 família e escola. 167-169 sexo Escola na prevenção de uso de drogas. 129 recasamento. 226 . 211 violência. 59-70 fronteiras família/empresa. 145-146 popular. 121-134 empresa. 207-209 Crises acidentais. 18-19 crise na família. 46-48 sabedoria. 218-219 Entrevista com paciente. 215-228 origens. 135-147 tratamento e estudo de caso. 48 perseverança. 47-48 conceitos teóricos. 121-124 experiência em mediação. 45-46 mediador. 219-221 relação empresa/atividade laboral. 141-142 Disciplina. 206-207 pedofilia. 124-125 objetivos. 52-57 conceito. 22-24 condições requeridas ao mediador. 129-131 poder. 18 gênero. 18-19 prevenção de uso entre adolescentes. 225-226 Espiritualidade e terapia familiar. 209-211 resultante da realidade conjugal. 143-145 apoio. 20-22 conflitos. 210-211 situação de rua. 129 prevenção de uso de drogas. 211 sem limites. 19-20 E família como grupo primordial. 49-50 paciência. 223-225 Enurese noturna. 102-103 pedagogia de Paulo Freire. 44-45 disciplina. 216-217 problema sucessório. 210-211 pensamento sistêmico. 128 paradigma da sexualidade humana. 132 substituta e crianças disponíveis.272 Índice situação de abrigo. 22-24 atividade laboral. 126-127 poder. 222-223 técnica. 125-126 monoparentais. 19-20 entendendo. 225-226 concentração. 186-190 saúde ou sintoma na vida conjugal. 184-186 versus mundo caótico. 226 budismo tibetano. 142-143 adolescência. 102 antropologia cultural. 211 tráfico. 210 terapeuta e terapia familiar. 127-131 orientação profissional. 59-70 conceito. 17-26 conceito. 59-70 imaginativo. 221-222 prática contemporânea. 20-22 cuidado com a empresa e/ou família. 131 separação. 211 programa de prevenção. 59-70 resiliência. 141 psiquiátrico. 18 Educação para conjugalidade. 102 inédito viável. 24-26 Empresas familiares. 185 interdisciplinariedade. 126-127 inter-relações hipotéticas. 127 crise. 132-133 realidade conjugal. 121-124 grupo primordial. 207-209 tráfico. 129-131 Fantasias sexuais. 185 mediação. 206 D F Defesa dos direitos crianças e adolescentes. 185-186 formação profissional do mediador. 139-140 Drogas. 48 experiência pessoal. 128 da teoria à prática. 263-272 família do futuro. 43-44 Família Depressão. 205-212 nulo. 61-62 terapia comunitária. 59-70 contemporaneidade. 175-176 ampliada. 121-134 paradigma da sexualidade humana. 131 escola na prevenção de uso de drogas. 186 Diagnóstico comunidade. 217-218 sucessão. 48 teoria sistêmica. 124-125 esfera de alcance. 128-129 definições. 62-63 teoria da comunicação. 44 generosidade. 182-183 I Ninho vazio. 54 167-176 levantamento das expectativas. 72-73 Paradigma da sexualidade humana. 129 consenso primordial. 72-73 Pensamento sistêmico. 44-45 técnica. 131 Gênero e comediação. 133-134 e interdisciplinariedade. origem da mediação. 195-196 desenvolvimento do self do terapeuta. 127-131. 193-203 Generosidade. Índice 273 trivial. 194-195 como um recurso. 42-43 instrumento de pacificação. 128 adolescentes no ciclo vital da família. 167-169 tarefa de casa. heranças e transmissões. 101-102 Hospital de Clínicas de Porto Alegre. 127-133 Funcionting experiência em empresas familiares. 186-190 da entrega. 132 conhecendo-se melhor. 186 mediador. 139-140 Liberdade do terapeuta. 184 Níveis de funcionamento da família. 43 terapia familiar. 128-129 Gravidez na adolescência. 160-162 N Nascimento do primeiro filho. 54 depressão. 196-197 identificação do risco nas famílias. 72-73 INFAPA ver Instituto da Família de Porto Alegre Instituto da Família de Porto Alegre. 22-24 do partir. 73-75 Perseverança. 179 Heranças transmitidas. 53-56 enurese noturna. 200-202 Global Assessment of Relational Funcionting. 72-73 Pedofilia. 172-175 Origens. 132 GARF ver Global assessment of Relational empresas familiares. 169-172 P L Paciência. 225 M terapia de casais. 52-57 familiares em psicoterapias individuais. 128 187-188 prática contemporânea. integração. uso do computador Orientação profissional na. 210 casos. 52-57 Interdisciplinariedade conhecendo as profissões. 215-228 Mediação Filhos conceito. 131-132 familiar. 56 Intervenções família. 141-142 da individualidade. . 55 mediação. 42-43 formação profissional do mediador. 118-120 profissões pesquisadas. 175-176 modelo de trabalho. 101-102 violência doméstica. 197-200 Genograma história. 56 sistêmicas relâmpagos em clínica psiquiátrica. 129-131 pequenos no ciclo vital da família. 107-112 adolescente. 131 Programa de Saúde da Família. 54-55 Inter-relações hipotéticas. 54 terapia familiar. 151-212 contrato de trabalho. 211 Legitimação Paciente na entrevista. 183 conflitos e mediação. 53-54 113-118 informações e esclarecimentos sobre as individuais em terapias de famílias. 55-56 transtorno de pânico. 211 . 48 do pertencer. 72-73 Pedagogia de Paulo Freire. . 187-188 Individualidade. . 183-184 condições requeridas ao mediador. grupos de trabalho. 217-218 encontro individual e familiar. 159-160 O Interação na terapia familiar. 200-202 Mediador ver Mediação H Médico de família e comunidade. 129 G e a diferença da terapia familiar. 141 S inédito viável. 73-75 Prática sistêmica. 142-143 legitimação. 140-141 Realidade conjugal. 259-260 casais. 76-77 liberdade do terapeuta. 113-118 Situação de rua e de abrigo. 27-38 ouvindo os terapeutas. 90-95 do adolescente que caminhava entre minas na família. 76-77 59-70 Programa de Saúde da Família. 32-34 processos. pertencimento e autonomia. 85-96 terrestres. 140-141 pertencer. 225 crises acidentais. 49-50 anseios arcaicos. 75-76 famílias em separação. conjugalidade. 80-82 Prevenção de uso de drogas em adolescentes. 44-45 genograma como ferramenta. 226 ciclo vital da família. 145-146 Sabedoria espiritual. intervenções sistêmicas relâmpagos. 185-186 Silêncio cheio de significados. 72-73 contexto sistêmico. 225-226 situações familiares. 45 49-50 Relacionamentos descartáveis. 225-226 abordagem da família. 180-181 sem limites. 143-145 pensamento sistêmico. 73-75 narcisismo. 186 Sexualidade humana. 22-24 famílias ampliadas. 72-73 criança e adolescente em situação de risco. 215-228 Resiliência casos e seus tutores. 27-38 entrega. 44-45 Psiquiatria Sucessão na empresa familiar. 256-259 Terapia o “outro”. 77-80 Programa de prevenção contra violência Sexo intrafamiliar. 72-73 teoria da comunicação. 177-191 imaginativo. 72-73 saúde mental. 167-176 contexto clínico na infância e adolescência. 186 identificação. 141-142 Saúde mental. 215-228 Programa de Saúde da Família. 135-147 antropologia cultural. 218-219 sistêmica. 185 Síndrome de pânico. 186-190 crianças e adolescentes. 211 pedagogia de Paulo Freire. 179 resultante da realidade conjugal. 184-186 sexualidade humana. 124-125 clínica.274 Índice Pertencimento e autonomia na separação. 255-261 de família. 143-145 individualidade. T 159 Hospital de Clínicas. 185 Processos resilientes. 186 Situação de risco modelo de entrevista. 160-162 Técnica da mediação nas empresas familiares. 185-186 Situação de abrigo. 215-228 260-261 fantasias sexuais. 207-209 Recasamento. 47-48 fantasias sexuais. 215-272 relações amorosas e processo terapêutico. 41-42 do menino que nunca foi visto. 178 nulo. 139-140 Separação. 226 profundidade. Reintegração familiar. 75-76 Profissional mediador. 255-256 liberdade. partir. 71-83 resiliência. 39-50 orientações diagnósticas. 200-202 R Teoria da comunicação. 167-176 132-133 Técnica de mediação. 41-42 silêncio cheio de significados. 127-131 vozes de alguns clientes. 172-175 famílias monoparentais. 72-73 49-50 . 28-32 terapia comunitária. 22-24 famílias do recasamento. 41-42 criança e adolescente em situação de risco. 185-186 Terapeuta Recursos terapêuticos. 39-41 Psicoterapias individuais. 142-143 comunitária. 181-184 trivial. 101-102 Transtornos psiquiátricos. 85-96 espiritualidade. 48 heranças e transmissões. 162-163 intrafamiliar. 27-38 contra criança e adolescente. 101-102 Transtornos de pânico. 196-197 Violência prática sistêmica. 99-106 Trabalho terapêutico. 100-101 casos. 133-134 intervenções individuais. 101-104 Tutores de resiliência relato do atendimento. 205-212 expansões. 177-191 doméstica. 118-120 familiar e suas possibilidades. 151-212 V mediação familiar. 162-163 origens. 47-48 . 103-104 Tráfico de crianças e adolescentes. 99-147 interdisciplinariedade. 85-90 eficácia nos transtornos psiquiátricos. 172-175 reflexões desenvolvidas. 47-48 Programa de Saúde da Família. 162-163 na família. Índice 275 familiar e a diferença da mediação. 41-42 contextos ecológicos. 169-172 transtornos psiquiátricos.
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